o impacto do plnd no ensino

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a importância do livro didático

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  • 1

    Universidade de So Paulo Faculdade de Filosofia, Letras e Cincias Humanas

    Departamento de Geografia Programa de ps-graduao em Geografia Humana

    O PROGRAMA NACIONAL DO LIVRO DIDTICO PNLD

    IMPACTOS NA QUALIDADE DO ENSINO PBLICO

    KATIA PAULILO MANTOVANI

    SO PAULO 2009

  • 2

    Universidade de So Paulo Faculdade de Filosofia, Letras e Cincias Humanas

    Departamento de Geografia Programa de ps-graduao em Geografia Humana

    O PROGRAMA NACIONAL DO LIVRO DIDTICO PNLD

    IMPACTOS NA QUALIDADE DO ENSINO PBLICO

    KATIA PAULILO MANTOVANI

    DISSERTAO DE MESTRADO SOB

    ORIENTAO DA PROFA DRA

    SNIA

    MARIA VANZELLA CASTELLAR

    SO PAULO 2009

  • 3

    DEDICATRIA

    A Deus Pai, Criador de tudo, que me concedeu a vida e traou os

    caminhos que me trouxeram at essa conquista.

    A meus pais, Ida e Jos, e a minha irm Cinthia.

    A meu esposo Elizer.

    A meus filhos Elizer, Lucas e Mateus.

    A todos eles dedico este trabalho.

  • 4

    AGRADECIMENTOS

    Mesmo receosa de me esquecer de algum querido e importante, arrisco-me

    a agradecer:

    A meus queridos pais, Ida e Jos, que me criaram com amor e me

    proporcionaram condies para meus estudos.

    A meu amado esposo Elizer companheiro e conselheiro que

    sempre esteve presente me oferecendo seu ombro amigo.

    A meus queridos filhos Elizer, Lucas e Mateus, que me

    acompanharam com amor e compreenso durante essa jornada.

    A minha irm Cinthia, pelo apoio tecnolgico.

    A Dra. Maria Isabel e a Dra. Patrcia, pelo apoio teraputico.

    A querida Snia Castellar, orientadora e amiga, pela disponibilidade e

    sensibilidade.

    Aos colegas do mestrado, em especial Ana Cludia, por suas

    mensagens com palavras de estmulo.

    s editoras nas quais trabalhei, pelo conhecimento acumulado e

    aprimoramento profissional.

    Aos autores com os quais tive a oportunidade de trabalhar, pelo

    agradvel convvio e pela troca de experincias.

    Carminha e ao Marcelo, que me apoiaram nas negociaes com a

    Saraiva.

  • 5

    SUMRIO

    APRESENTAO 9

    INTRODUO 12

    DELIMITAO E PROCEDIMENTOS DA PESQUISA 12

    ESTRUTURAO DA PESQUISA 13

    1. O LIVRO DIDTICO 16

    1.1 A importncia do livro didtico 19

    2. AS POLTICAS PBLICAS DO LIVRO DIDTICO

    NO BRASIL 26

    2.1 Por que avaliar os livros didticos? 35

    2.2 A avaliao-piloto 41

    2.3. A evoluo do PNLD 42

    2.3.1 Os critrios de avaliao dos livros didticos no PNLD 60

    2.4 O papel do professor no PNLD 63

    2.4.1 As interferncias na escolha do professor: o guia de

    livros didticos do PNLD e as editoras 66

    3. CRTICAS AO PNLD 70

    4. RELAO ENTRE A AVALIAO DO LIVRO DIDTICO

    E A QUALIDADE DO ENSINO NA ESCOLA PBLICA 79

  • 6

    4.1 Benefcios alcanados a partir da implantao

    do PNLD 79

    4.2 O Sistema de Avaliao da Educao Bsica e

    a Prova Brasil 81

    4.2.1 Resultados do SAEB 82

    4.3 Anlise dos dados 84

    5. CONSIDERAES FINAIS SUGESTES DE MEDIDAS

    PARA AMPLIAR OS RESULTADOS DO PNLD 89

    REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS 95

    BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 101

    ANEXOS

    I. CRITRIOS DE ANLISE PNLD 1997 103

    II. CRITRIOS PARA ANLISE PNLD 1998 105

    III. PRINCPIOS E CRITRIOS PARA A AVALIAO DE LIVROS

    DIDTICOS DE 1. A 4. SRIES PNLD 2000 107

    IV. PRINCPIOS E CRITRIOS PARA A AVALIAO DE LIVROS

    DIDTICOS E DICIONRIOS DA LNGUA PORTUGUESA 112

    V. PRINCPIOS E CRITRIOS PARA A AVALIAO DE LIVROS

    DIDTICOS DE 1. A 4. SRIES PNLD 2007 118

    VI. QUADRO COMPARATIVO ENTRE PROVA BRASIL E SAEB 125

  • 7

    RESUMO

    Esta pesquisa tem como objetivo analisar a importncia da avaliao

    do livro didtico feita pelos programas de governo e o impacto desse

    processo na qualidade de ensino na escola pblica. A partir de levantamento

    bibliogrfico e anlise documental, como editais de convocao para o

    programa, guias de livros didticos aprovados e textos acadmicos

    relacionados ao tema, conseguimos perceber avanos na qualidade editorial

    e no contedo dos livros didticos distribudos para escolas da rede pblica

    do Brasil. Para verificar o impacto do PNLD na qualidade de ensino, fizemos

    uma breve anlise dos resultados das avaliaes nacionais: o SAEB e a

    Prova Brasil.

    Palavras-chave: Livro didtico; Polticas pblicas; Qualidade do ensino;

    Professores; Avaliao.

  • 8

    ABSTRACT

    This research aims to analyze the importance of textbooks evaluation

    made by government programs and its impact on the quality of teaching in

    public schools.

    By means of literature review and documentary analysis, as the public

    call for the program, approved guidelines for textbooks and academic papers

    related to the subject, we see improvements not only in the textbooks editorial

    quality but also in its content, considering they are distributed to public schools

    in Brazil. In order to verify the PNLD impact in the quality of education, we

    made one brief analysis of the results of the national evaluations: SAEB and

    the Brazil Test.

    Keywords: Textbooks; Public policies; Quality of education; Teachers;

    Assessment.

  • 9

    APRESENTAO

    Quanto mais eu li Marx, tanto mais encontrei uma certa fundamentao objetiva

    para continuar camarada de Cristo

    (Creditada a Paulo Freire, educador brasileiro.)

    .

    Para apresentar esta pesquisa, vou fazer uma pequena viagem no

    tempo e comear o relato a partir de 1969, quando entrei no Grupo Escolar

    Professor Paulo Rossi como ouvinte. poca, eu tinha 5 anos, e a tia Ondina

    do jardim de infncia do Externato Anchieta havia orientado minha me

    para tentar me colocar no 1. ano, de forma que eu pulasse o pr-primrio, e

    foi o que aconteceu. No me lembro com muitos detalhes, mas devo ter dado

    trabalho para dona Dagmar, minha nova professora, visto que ainda no tinha

    maturidade para ficar sem as brincadeiras no parquinho e o soninho depois

    do lanche. O fato que, em outubro daquele ano, terminei a cartilha Caminho

    Suave e recebi meu livro de leitura. Esse evento foi muito importante na

    minha vida; tanto que guardo esse volume at hoje. Havia conseguido o que

    todo aluno do 1. ano esperava: receber seu primeiro livro!

    Evidentemente, os anos na escola e, mais tarde, na faculdade

    amadureceram e estreitaram minha relao com o livro didtico, que passou a

    ser um companheiro constante.

    Profissionalmente, o livro didtico continuou presente. Ainda na

    graduao, durante quatro anos fiz um trabalho ligado pesquisa em Biologia

    Celular no Instituto Biolgico de So Paulo. Nem preciso comentar o quanto

    os livros so importantes nesse tipo de trabalho. certo que nem todos so

    didticos o suficiente, mas inegvel serem fundamentais. No trmino da

  • 10

    prorrogao da bolsa de aperfeioamento, e por conta de uma feliz

    coincidncia, acabei em uma sala de aula. Na poca, eu estava com 22 anos,

    e a partir desse momento iniciei uma apaixonada relao com a educao,

    lecionando Biologia e outros componentes curriculares ligados s Cincias

    Biolgicas. Durante onze anos, vivi com satisfao o dia a dia do magistrio,

    correndo entre alunas e alunos, aulas, provas, reunies pedaggicas e,

    claro, trabalhando com livros didticos.

    Nesse perodo, fui convidada para fazer um trabalho de leitura crtica

    de um livro paradidtico e, a partir de ento, passei a congregar o magistrio

    e o trabalho como freelance para diversas editoras. No princpio, foram

    trabalhos ligados parte tcnica e pedaggica; depois, fui me familiarizando

    com o processo de edio de livros e adquirindo experincia no trabalho

    editorial.

    Com o tempo, surgiram outras oportunidades: escrevi uma coleo de

    livros didticos de Cincias Naturais para as sries iniciais do Ensino

    Fundamental e assumi uma editoria, o que, embora tenha me afastado

    temporariamente do convvio com alunas e alunos, no interrompeu o

    trabalho com a educao. Nessa fase, pelo fato de as leituras sobre as

    tendncias pedaggicas mais atuais poderem ser feitas sem as cobranas da

    escola, as anlises dos livros didticos ocorriam a partir de uma tica

    diferente.

    Entre 2004 e 2006, depois de algum tempo distante da sala de aula,

    retornei mais experiente para o magistrio. Alm disso, voltei para os bancos

    da academia como ps-graduanda. Em 2006, reiniciei meu trabalho como

    editora.

  • 11

    Isso posto, posso afirmar que minha relao com o livro didtico

    aconteceu em diferentes instncias: como aluna, como professora, como

    leitora crtica, como editora e como autora. Nessas trs ltimas formas, senti

    mais diretamente a importncia desse material e a responsabilidade que lhe

    conferida: promover um processo que garanta o trabalho eficiente do

    professor e a aprendizagem do aluno. Mas ser que o livro didtico tem

    condies de cumprir sozinho todos esses papis?

    Um dos pontos que evidenciam a importncia do livro didtico para o

    sistema educacional brasileiro o Programa Nacional do Livro Didtico

    PNLD, o maior programa governamental de aquisio de livros didticos do

    mundo. Vivi, direta e indiretamente, todas as edies do PNLD desde a

    primeira avaliao pedaggica em 1996 e pude perceber que, por meio dele,

    os livros didticos oferecidos deram um salto de qualidade. No entanto,

    percebi tambm a incoerncia entre o resultado das avaliaes feitas pelos

    especialistas do Ministrio da Educao e a escolha dos professores. E ainda

    surgiu outra dvida: um programa to vultoso teve reflexos positivos na

    educao pblica brasileira?

    Assim, minha reflexo no mestrado prope um estudo do programa de

    avaliao dos livros didticos feita pelo governo federal, descrevendo um

    breve histrico e analisando a importncia desse processo e seus impactos

    na qualidade do ensino na escola pblica.

  • 12

    INTRODUO

    Se a educao sozinha no transforma a sociedade,

    sem ela, tampouco a sociedade muda.

    (Paulo Freire, educador brasileiro.)

    DELIMITAO E PROCEDIMENTOS DA PESQUISA

    O cerne da nossa discusso a avaliao do livro didtico feita pelo

    PNLD. E nosso objetivo analisar a importncia desse processo e o impacto

    dele na qualidade de ensino da escola pblica. Alm disso, queremos

    contribuir propondo sugestes que levem melhoria do alcance do programa

    e, ao mesmo tempo, sua renovao.

    Nessa perspectiva, o referencial terico composto por documentos

    oficiais desse programa de governo e por literatura acadmica que nos

    ajudaram a analisar as polticas pblicas relacionadas ao livro didtico.

    Convm destacar que no nos detivemos nas motivaes ideolgicas ou

    polticas para essas intervenes governamentais no mercado do livro

    didtico, visto que esse estudo, de to profundo e complexo, mereceria uma

    dissertao prpria.

    H que se ressaltar, tambm, que esta dissertao no esgota, de

    maneira nenhuma, as reflexes propostas. Sabendo da limitao desse tipo

    de trabalho, nosso objetivo dar embasamento para nossas anlises de

    forma a contribuir para o surgimento de outras, apontando direes que

    possam inspirar trabalhos futuros.

    Nosso trabalho no envolveu uma pesquisa de campo, mas de

    gabinete, de maneira que pudssemos avaliar o estado da arte. Para que

  • 13

    essa pesquisa pudesse ser efetivamente concretizada, foram realizados os

    seguintes procedimentos:

    levantamento da literatura e dos documentos pertinentes ao tema

    proposto;

    leituras e reflexes sobre o material bibliogrfico levantado;

    reunies e colquios com a orientadora para discusso dos textos

    utilizados como referencial bibliogrfico.

    Assim que reunimos fundamentos suficientes para a construo terica

    do nosso trabalho, passamos a nos dedicar sistematizao das

    informaes, de modo a formatar o texto da dissertao.

    ESTRUTURAO DA PESQUISA

    O presente estudo inicia-se com a definio de livro didtico,

    destacando a importncia que esse material vem assumindo na educao de

    forma geral. Em seguida, inclui uma breve retrospectiva histrica sobre a

    evoluo das formas pelas quais nossos antepassados preservavam seus

    pensamentos para a posteridade, at chegar ao livro, hoje o principal meio em

    que a linguagem escrita colocada. Para concluir esse primeiro captulo,

    discutimos a importncia do livro didtico sob diversos aspectos

    pedaggico, cultural, poltico e econmico , e a percepo desse material

    por alunos e professores entre as dcadas de 1940 e 1970, de forma a

    salientar a importncia do livro didtico na vida das pessoas.

    No segundo captulo, descrevemos, em linhas gerais, as polticas

    pblicas do livro didtico no Brasil de 1938 at 2007. No item Por que avaliar

    o livro didtico?, destacamos a importncia desse processo para a melhoria

  • 14

    na qualidade dos livros. Ao focarmos o programa atual, o PNLD, descrevemos

    como se deu a avaliao-piloto e de que modo foram elaborados os passos

    da evoluo do programa como processo. Nesse item, salientamos os

    critrios de avaliao nos diferentes programas e o papel do professor, que,

    com o aluno, o usurio final do material avalizado pelos tcnicos

    responsveis. Tambm procuramos ressaltar a interferncia exercida pelo

    Guia de Livros Didticos e pelas editoras no processo de escolha dos livros

    pelo professor.

    No terceiro captulo levantamos algumas crticas ao PNLD, vindas de

    diferentes agentes relacionados ao processo de avaliao.

    No captulo seguinte, tecemos comentrios sobre a relao entre a

    avaliao do livro didtico e a melhoria da qualidade do ensino na escola

    pblica.

    Finalizamos o trabalho sugerindo medidas para ampliar os resultados

    do PNLD, de forma que ele possa, efetivamente, contribuir para a melhoria da

    educao brasileira.

    Nesse sentido, esta pesquisa ressalta que os avanos na qualidade do

    livro didtico disponvel ao professor da rede pblica no tiveram impacto

    suficiente para melhorar a realidade educacional brasileira. O uso de um bom

    livro didtico apenas um dos fatores que podem contribuir para esse

    progresso. Para que a educao pblica seja transformada e torne-se

    aceitvel, h que se voltar a ateno para um dos principais sujeitos do

    processo ensino-aprendizagem: o professor. Nesse caso, so importantes

    no apenas a capacitao continuada desse profissional da educao, mas

    tambm os cuidados com os cursos de formao acadmica. Alm do

  • 15

    investimento no professor e de sua valorizao, outras modificaes tambm

    devem ser promovidas no sistema educacional. Em primeiro lugar, os agentes

    envolvidos devem assumir com responsabilidade seus papis no sistema;

    alm disso, premente a unificao das polticas pblicas do governo

    relacionadas educao, para torn-las coerentes e com objetivos comuns.

    Outro ponto nevrlgico refere-se necessidade de descentralizar as polticas,

    envolvendo efetivamente o professor no programa de avaliao do livro

    didtico. Se esses pontos no receberem a ateno necessria, os

    investimentos do governo no PNLD podem se tornar uma luta inglria, e,

    nesse caso, perdem todos.

  • 16

    1. O LIVRO DIDTICO

    O papel so os discpulos cujas inteligncias ho de ser impressas com

    os caracteres das cincias. Os tipos ou caracteres so os livros didticos e

    demais instrumentos preparados para este trabalho, graas aos quais se

    imprime, na inteligncia, com facilidade tudo quanto se h de aprender.

    A tinta a voz viva do professor que traduz o sentido das coisas e dos

    livros para os alunos. A prensa a disciplina escolar que dispe

    e sujeita a todos para receber o ensinamento. (Comenius, criador da Didtica Magna

    e um dos maiores educadores do sculo XVII.)

    Iniciaremos este item definindo o que o livro didtico. Em nosso

    trabalho, esse material ter a definio de Richaudeau (1979, p.5 apud

    OLIVEIRA; GUIMARES e BOMNY, 1984, p.11): o livro didtico ser

    entendido como um material impresso, estruturado, destinado ou adequado a

    ser utilizado num processo de aprendizagem ou formao.

    Durante muito tempo, o livro didtico foi entendido como uma produo

    cultural menor, e, por conta disso, era desconsiderado por bibligrafos,

    educadores e intelectuais de vrios setores. Nas ltimas dcadas, porm, a

    anlise dos livros didticos foi ampliada, tendo sido destacados os aspectos

    educativos e o papel desse material na escola contempornea1

    Oliveira; Guimares e Bomny (op. cit., p.20) citam um comentrio feito

    por Robert Escarpit na obra A Revoluo do Livro (Rio de Janeiro, FGV; MEC,

    1976) destacando a importncia do livro didtico: Dentre os livros funcionais

    .

    2

    1 Essa discusso feita por Bittencourt (2004b, apresentao). 2 Em A Revoluo do Livro, Robert Escarpit faz a distino entre "livros-objeto", "livros funcionais" e "livros literrios". Esse autor usa como critrios a forma pela qual os livros so consumidos e as caractersticas do pblico que os utiliza.

    ,

    acerca do livro escolar que se possuem maiores informaes. Ele

  • 17

    representa tambm, no gnero, a categoria mais importante. Nesse sentido,

    podemos afirmar que, em todos os pases, os progressos do ensino fizeram

    do livro didtico um produto de primeira necessidade.

    Contudo, o livro didtico por vezes desvalorizado e, geralmente, essa

    desvalorizao est relacionada ao imediatismo de seu uso. Por um lado, ele

    cumpre uma funo especfica na vida dos indivduos por estar intrnseco ao

    contexto escolar; por outro, torna-se descartvel e sem valor quando est fora

    de seu contexto original. Entretanto, concordamos com Fernandes (2004,

    p.537) quando ela afirma que, para uma pessoa que valoriza a educao,

    que tem sua vida profissional ligada ao magistrio, o livro didtico ganha em

    sua memria outra colorao.

    A partir dessa tica de educador, que valoriza o livro didtico e acredita

    na sua importncia para o sistema educacional brasileiro, colocamos o PNLD

    e seus impactos na qualidade do ensino pblico como eixo central de nosso

    trabalho. Nossa inteno ampliar a discusso a respeito dessa ao

    governamental e levantar algumas questes sobre os efetivos avanos que

    esse processo tem trazido para a qualidade da educao no pas. Para tanto,

    faz-se necessrio estudar o objeto livro primeiro como o registro escrito de

    informaes dentro de um contexto sociolgico, e, depois, analis-lo como

    instrumento didtico.

    O ser humano sempre teve interesse em conhecer os meios e os

    mtodos pelos quais os antepassados preservavam seus pensamentos para

    a posteridade, desde os tempos mais remotos:

    Muito antes de o homem ser capaz de falar e escrever, ele comunicava suas experincias interiores, pensamentos e sentimentos por meio de um grande nmero de elementos no verbais, de um complexo de gestos movimentos de todo o corpo

  • 18

    ou suas partes , por meio do olhar, do silncio. Ainda hoje usa esta forma para se comunicar; quase tudo que faz, consciente ou inconscientemente, expressa pensamentos e sentimentos; podemos cham-la de linguagem e substitui e comunica to bem ou at melhor do que as palavras. Nela se inclui a linguagem articulada pelo homem e compreendida por todos os sentidos, desde tempos imemoriais, e que a linguagem simblica. (KATZENSTEIN, 1986, p.9).

    Por ser a nica linguagem universal idntica a todas as culturas, a

    expresso simblica extremamente importante na histria da humanidade.

    Ao longo do desenvolvimento humano, a linguagem tambm passou a

    ser oral. Antes de surgir a escrita, a transmisso oral era a nica forma de

    preservar a memria coletiva. Por meio da linguagem oral, o ser humano era

    capaz de transmitir diferentes informaes, como fatos sobre sua histria e

    mitos sobre a criao do Universo (KATZENSTEIN, op. cit., p.16). Ainda hoje

    a linguagem oral de fundamental importncia para a transmisso e

    consequente manuteno de diversas culturas, como o caso de muitos

    povos indgenas.

    Finalmente chegamos aos registros escritos, de fundamental

    importncia pelo fato de poderem ser consultados em qualquer poca.

    Estudos mostraram que a comunicao por meio de uma escrita que podia

    ser lida por outras pessoas data de 3500 a.C. e era feita pelos sumrios, na

    Mesopotmia. Nesse perodo, as comunicaes escritas na Europa eram

    gravaes da arte rupestre. No se tem a data exata de quando a escrita foi

    introduzida nas civilizaes antigas, mas a Mesopotmia, onde a escrita se

    desenvolveu grandemente durante 2000 anos, considerada o bero do

    livro (KATZENSTEIN, op. cit., p.22 e 23).

    Depois das gravaes em rochas, os suportes da escrita foram

    mudando. O primeiro papel foi a entrecasca de rvore, e, aos poucos, foram

  • 19

    sendo desenvolvidos outros materiais: folhas de palmeiras, bambu, seda,

    barro, papiro, pergaminho, at ser inventado o papel que conhecemos hoje, a

    matria-prima para a impresso dos livros atualmente.

    J no Mdio Imprio [do Antigo Egito], cerca de quatro mil anos atrs,

    comeou a ser utilizado o livro texto, feito de papiro, para ajudar a uniformizar

    o conhecimento dominante (FRANCISCO FILHO, 2005, p.17). Assim, o

    registro escrito era uma forma de o conhecimento ser perpetuado e

    monopolizado, pois escribas formavam outros escribas, de maneira geral em

    famlia de escribas.

    1.1 A importncia do livro didtico

    O livro surge como instrumento de instruo no sculo XVI a.C. Nessa

    poca, era considerado sbio quem conhecesse a tradio contida nos livros,

    quem visitasse bibliotecas e pesquisasse o conhecimento para preparar

    novas geraes, ou seja, quem houvesse acumulado a antiga sabedoria e

    valorizasse os livros (FRANCISCO FILHO, op. cit., p.18).

    Essas colocaes corroboram o que afirmam OLIVEIRA; GUIMARES

    E BOMNY (op. cit., p.12), segundo quem h sculos livros so usados como

    material de ensino. Comenius, criador da Didtica Magna e um dos maiores

    educadores do sculo XVII, foi o primeiro a enfatizar que certas

    caractersticas de alguns livros fariam com que fossem mais apropriados para

    a transmisso de conhecimentos.

    Ainda assim, o fluxo contnuo de conhecimentos entre as teorias e

    filosofias do ensino e a prtica da produo dos livros didticos surge

    somente a partir da segunda metade do sculo XX. Nessa poca, eram

  • 20

    enfatizadas as teorias da aprendizagem e da instruo, as tecnologias

    desenvolvidas para fazer face s necessidades de treinamento tcnico,

    industrial e militar e, em alguns pases, os desafios colocados pela

    necessidade de modernizar o ensino ou simplesmente fazer face

    competio dos concorrentes (OLIVEIRA; GUIMARES e BOMNY, op. cit.,

    p.12).

    Sem sombra de dvidas, o livro didtico, mesmo interpretado como um

    objeto cultural que gera polmicas e recebe crticas de muitos setores da

    sociedade, ainda considerado um instrumento de ensino fundamental no

    processo de escolarizao. Conforme Bittencourt (op. cit.), esse tipo de

    material tem provocado debates em escolas, em encontros acadmicos e em

    artigos de jornais, envolvendo educadores, alunos e suas famlias, autores,

    editores, autoridades polticas e intelectuais de diferentes procedncias.

    Alm dessa relevncia no aspecto pedaggico, h que se salientar a

    importncia econmica do livro didtico para um vasto setor ligado

    produo de livros e tambm ao papel do Estado como agente de controle e

    como consumidor dessa produo (BITTENCOURT, op. cit., apresentao).

    No Brasil, por exemplo, os investimentos realizados no PNLD transformaram-

    no no maior programa de livro didtico do mundo.

    Embora as relaes entre o livro didtico e a sociedade no se

    esgotem nos aspectos pedaggico e econmico, por meio delas que

    possvel perceber, por exemplo, o quanto esse instrumento foi importante

    para comunicar, produzir e transmitir o conhecimento escolar pelo menos nos

    dois ltimos sculos.

  • 21

    No Brasil no foi diferente. Aqui, a histria do livro inicia-se com a

    chegada de Dom Joo VI e a corte portuguesa, em 1808. Alm de trazerem

    muitos livros, trouxeram a primeira mquina de impresso tipogrfica e

    possibilitaram a instalao da Imprensa Rgia. Naquela poca, o domnio

    poltico era exercido pelo Estado e pela Igreja; assim, a censura sofrida pela

    imprensa permitia que fossem publicados apenas os artigos que no

    ofendessem essas instituies e os costumes. O nico jornal de oposio

    poltica de D. Joo VI era o Correio Braziliense, impresso em Londres. Em

    1821, com a revogao da proibio de imprimir, surgiram outros jornais,

    folhetos e revistas (BORATTO et al., 2004, p.5).

    De acordo com Bittencourt (2004a, p.480), a partir de 1827, surgem no

    Brasil autores preocupados com a organizao dos cursos secundrios e

    superiores, apenas esboando algumas contribuies para o ensino de

    primeiras letras.

    Para preservar e inventariar a produo escolar que vem ocorrendo

    desde ento, os pesquisadores do Centro de Memria da Educao da

    Faculdade de Educao da Universidade de So Paulo iniciaram a

    organizao da Biblioteca do Livro Didtico (BLD). Essa instituio rene um

    acervo de livros didticos das diversas disciplinas escolares constitudas a

    partir do incio do sculo XIX. Paralelamente organizao da BLD, o projeto

    de organizao de acervos didticos elabora o LlVRES, um banco de dados

    dos livros escolares brasileiros produzidos desde 1810 (BITTENCOURT, op.

    cit., apresentao).

    possvel perceber a importncia do livro didtico e sua presena

    efetiva no cotidiano da escola entre as dcadas de 1940 e 1970 em artigo

  • 22

    publicado por Fernandes (op. cit.), no qual so transcritas entrevistas com

    alunos desse perodo. A partir desses relatos, possvel conhecer, de

    maneira indireta, de que forma os livros didticos eram utilizados por alunos e

    professores. Alm disso, pode-se levantar outros dados, como:

    o que marcou o imaginrio das pessoas sobre os temas;

    que livros ficaram na memria de geraes;

    qual contedo era estudado (relao entre livros e currculos);

    a disciplina imposta no ato de ler;

    a presena de livros com histria regional e local;

    os formatos e modelos de livros didticos (capa dura, pequenos etc.) e

    seus aspectos fsicos, como cor, espessura e capa;

    ilustraes, mapas, quadros e atividades marcantes3

    A quantidade e a variedade das informaes obtidas permitem inferir

    que o livro didtico foi sobremaneira importante na vida das pessoas

    entrevistadas. Essa importncia tambm destacada por Fernandes (op. cit.,

    p.535) quando ao afirmar que: Valores e experincias comuns a grupos e

    sociedades esto presentes, por exemplo, nos significados atribudos [...] aos

    objetos que emergem nas memrias ou que so preservados como suportes

    de lembranas. A partir disso, podemos nos perguntar por que alunos e

    professores preservam seus livros didticos. Ser que na memria foram

    fixados valores sociais que orientam suas atitudes?

    .

    Esse mesmo artigo contm o depoimento de uma professora que

    estudou entre 1950 e 1960 e que guardou seus manuais escolares. Ela fez

    isso porque considera o material smbolo da importncia da escola em sua

    3 Fernandes (op. cit., p.539 e 540) faz uma discusso detalhada a respeito desses dados.

  • 23

    vida e de sua famlia, [...] cujo acesso ao mundo letrado e literrio foi por meio

    desses corriqueiros, mas antigamente to preciosos, materiais

    (FERNANDES, op. cit., p.535).

    Conforme afirma Pereira (2004, p.71), inegvel que o material didtico,

    em especial o livro, seja um instrumento importante para o trabalho do

    professor. Por conta disso, o livro didtico tem representado um papel

    significativo no processo de ensino-aprendizagem. Entre os professores, h

    tanto os que tm nele seu nico material de trabalho, quanto os que o utilizam

    apenas como apoio s suas aulas nas atividades escolares, mas, mesmo

    assim, no chegam a abrir mo dele.

    Deste modo, podemos considerar o livro didtico um material bsico

    para a metodologia de ensino praticada nas salas de aula. Ao analisar textos

    que focalizam o tema livro didtico, Oliveira; Guimares e Bomny (op. cit.,

    p.25) ressaltam um ponto que a valorizao do livro como instrumento

    essencial, como tecnologia educacional bsica [grifo nosso].

    A importncia do livro didtico na prtica pedaggica diria tambm

    est relacionada ao fato de ele fazer a sistematizao dos contedos que

    devem ser trabalhados em classe e de ser instrumento de apoio para o

    professor e suporte terico e prtico para o aluno.

    Prova disso que, se considerados a extenso e os aspectos

    econmicos do nosso pas, possvel verificar casos em que o livro didtico

    a nica referncia bibliogrfica ou de leitura recente acessvel aos alunos

    (ROJO e BATISTA, 2003, p.15 e 16). Como nem sempre o prprio professor

    tem acesso a outras leituras, concordamos com Barreto e Monteiro (2008,

    p.2), quando afirmam que a presena do livro didtico na sala de aula um

  • 24

    modo de garantir, minimamente, as referncias de contedo e de habilidades

    exigidas em cada srie.

    Alm do carter pedaggico, tambm podemos destacar a importncia

    do livro didtico sob outros dois aspectos: o comercial, isto , em que o livro

    considerado mercadoria, visto que em torno dele criado um mercado

    (ponto que ser discutido em outro momento), e o social, uma vez que

    reproduz e representa os valores da sociedade (OLIVEIRA; GUIMARES e

    BOMNY, op. cit., p.11). Nesse caso, fica claro o importante aspecto poltico

    e cultural do livro didtico.

    Conforme Romanatto (2004, p.4), a situao em sala de aula no Brasil

    no permite que o livro didtico seja substitudo nas atividades escolares

    pela palavra do professor nem pelos modernos meios tecnolgicos de

    comunicao, visto que a esse material so atribudas inmeras funes,

    como ser fonte de informaes e ser instrumento que permite a comunicao

    no tempo e no espao. H que se considerar tambm que a importncia do

    livro didtico est condicionada ao uso que o professor faz dele. Certamente,

    os resultados sero positivos se o material for empregado corretamente e for

    explorado de forma a alcanar os objetivos esperados, anulando os pontos

    fracos do livro e ressaltando os pontos fortes (ROMANATTO, op. cit., p.5).

    Sem dvida, essa mais uma forte razo para insistirmos na necessidade de

    investir na qualidade do profissional que usar o livro didtico como

    ferramenta.

    O livro didtico pode oferecer mltiplas contribuies tanto para

    professores quanto para alunos, entre elas:

    a) aumento da capacidade de ler (aumento de vocabulrio, aumento

    de compreenso do que se l);

  • 25

    b) integrao e sistematizao da matria (graas a uma sequncia ordenada das lies);

    c) facilitao de revises peridicas; e d) desenvolvimento de hbitos de independncia e de autonomia. (Romanatto, op. cit., p.6)

    Finalizamos este captulo reproduzindo um trecho do trabalho de

    Freitas e Rodrigues (2008, p.1), que destaca a importncia desse veculo na

    vida escolar dos alunos:

    O livro didtico faz parte da cultura e da memria visual de muitas geraes e, ao longo de tantas transformaes na sociedade, ele ainda possui uma funo relevante para a criana, na misso de atuar como mediador na construo do conhecimento. O meio impresso exige ateno, inteno, pausa e concentrao para refletir e compreender a mensagem, diferente do que acontece com outras mdias como a televiso e o rdio, que no necessariamente obrigam o sujeito a parar. O livro, por meio de seu contedo, mas tambm de sua forma, expressa em um projeto grfico, tem justamente a funo de chamar a ateno, provocar a inteno e promover a leitura.

    A partir dessa anlise a respeito da importncia do livro didtico,

    podemos identificar os vrios significados que esse material pode ter na vida

    das pessoas. O livro vai alm de um simples manual escolar, na medida em

    que convive cotidianamente com alunos e alunas durante todos os anos da

    vida escolar, e perpassa essa definio simples deixando marcas definitivas

    na memria.

  • 26

    2. AS POLTICAS PBLICAS DO LIVRO DIDTICO NO BRASIL

    Ningum ignora tudo, ningum sabe tudo.

    (Paulo Freire, educador brasileiro)

    A preocupao do governo brasileiro com o livro didtico teve incio em

    1929, quando foi criado o Instituto Nacional do Livro (INL), um rgo

    especfico para legislar sobre a poltica do livro didtico. A partir desse fato,

    estabeleceu-se uma relao mais direta entre o governo e os manuais

    escolares. Desde ento, a ao federal vem se aperfeioando nessa rea,

    com o objetivo de fornecer obras didticas, paradidticas e dicionrios de

    qualidade para os alunos das escolas da rede pblica federal, estadual,

    municipal e do Distrito Federal.

    Assim, em 14 de novembro de 1930, o Decreto-lei n. 19.402 criou uma

    Secretaria de Estado com a denominao de Ministrio dos Negcios da

    Educao e Sade Pblica. Era o incio do Ministrio da Educao (MEC)4

    O passo seguinte deu-se ainda na dcada de 1930, quando no Estado

    brasileiro criada uma proposta de regulamentao para a produo e a

    distribuio de livros didticos nas escolas. Isso foi possvel porque o Brasil

    passava por um perodo marcado por uma poltica mais desenvolvimentista,

    na qual se buscou implantar no pas uma educao progressista e com base

    cientfica (FREITAG; MOTTA e COSTA, 1997, p.12). Nessa fase, destacamos

    duas reformas importantes: a Francisco Campos (1930-1942), que se

    .

    4 Em 13 de janeiro de 1937, pela Lei n. 378, o MEC passou a ser denominado Ministrio da Educao e da Sade. Em 25 de julho de 1953, a Lei n. 1.920 alterou o nome desse Ministrio para Ministrio da Educao e Cultura. O Decreto-lei n. 91.144, de 15 de maro de 1985, por sua vez, criou o Ministrio da Cultura (MinC), de modo que o MEC passa a ser apenas o Ministrio da Educao. Com a Lei n. 8.490, de 19 de novembro de 1992, entretanto, o MEC passou a denominar-se Ministrio da Educao e do Desporto.

  • 27

    preocupava com a formao de professores para o ensino secundrio, e a

    Gustavo Capanema (1942-1945), que dividiu o ensino secundrio em dois

    ciclos: ginasial e clssico ou cientfico. nesse contexto que sobrevieram os

    primeiros movimentos do governo em relao ao livro didtico.

    Tambm a partir dessa fase que o termo livro didtico foi

    consagrado e definido como o entendemos atualmente: o livro adotado na

    escola destinado ao ensino, cuja proposta deve obedecer aos programas

    curriculares escolares.

    O Decreto-Lei n. 1.006, de 30 de dezembro de 1938, em seu artigo 2.,

    1 e 2, diferenciou e definiu o termo livro didtico:

    Pargrafo 1 - Compndios so os livros que exponham total ou parcialmente a matria das disciplinas constantes dos programas escolares; Pargrafo 2 - Livros de leitura de classe so os livros usados para leitura dos alunos em aula; tais livros tambm so chamados de livros de texto, livro-texto, compndio escolar, livro escolar, livro de classe, manual, livro didtico. (OLIVEIRA, 1980, p.12 apud OLIVEIRA; GUIMARES e BOMNY, op. cit., p.22 e 23).

    A primeira iniciativa governamental na rea da poltica educacional veio

    nesse mesmo decreto: a criao da Comisso Nacional do Livro Didtico

    (CNLD), que tinha por objetivo regulamentar uma poltica nacional desse

    material. Entre as responsabilidades da CNLD estavam examinar, avaliar e

    julgar os livros didticos, concedendo ou no autorizao para o seu uso nas

    escolas. De acordo com Carvalho (2008, p.3), a CNLD deveria, entre outras

    atribuies, verificar se os livros didticos publicados seguiam os programas

    oficiais de ensino. Ela no examinava a qualidade dos livros, somente se

    expunham integralmente os programas.

    Tambm importante considerar que a criao da CNLD ocorreu no

    perodo do Estado Novo, um momento poltico autoritrio no qual se buscava

  • 28

    garantir a identidade nacional. Assim, a CNLD tinha como tarefa fazer o

    controle da adoo dos livros, de forma que eles possibilitassem o

    desenvolvimento de um esprito de nacionalidade. Esse fato fica claro quando

    se analisam os critrios para as avaliaes dos livros, que valorizavam muito

    mais os aspectos poltico-ideolgicos do que os pedaggicos (WITZEL, 2002,

    p.18). Oliveira; Guimares e Bomny (op. cit., p.35) comentam que o artigo 20

    do Decreto-lei n. 1.006 enumera onze impedimentos para a utilizao do livro

    didtico relacionados questo poltico-ideolgica e contm apenas cinco

    com respeito didtica propriamente dita. Assim, os aspectos morais, cvicos

    e polticos sobrepunham-se aos didtico-metodolgicos.

    Houve muitos questionamentos sobre a legitimidade dessa comisso, e

    as questes levantadas acabaram por inviabilizar o cumprimento das

    propostas. Os intelectuais da poca atribuam comisso uma funo mais

    controladora, de carter poltico-ideolgico, do que didtica.

    Assim, a falta de xito do projeto da CNLD ocorreu em funo da

    inoperncia e da ineficincia do processo, que acabava em impasses e

    frustraes decorrentes:

    da centralizao do poder;

    do risco da censura;

    das acusaes de especulao comercial e de manipulao poltica,

    relacionada com o livro didtico5

    Apesar dos problemas detectados na operacionalizao da CNLD, o

    Decreto-lei n. 8.460, de 1945, consolidou a legislao n. 1.006/38 e disps

    sobre a organizao e o funcionamento da CNLD, ampliando a comisso e

    .

    5 Freitag; Motta e Costa (1997, p.14) aprofundam a discusso desse tema.

  • 29

    mantendo seus poderes. Nos anos seguintes, novas crticas atacaram o

    desempenho dessa comisso, avaliando-o como altamente centralizador e

    atribuindo o fraco desempenho a essa forma de trabalhar.

    Por um longo perodo, a questo do livro didtico no foi solucionada.

    Os entraves estavam relacionados ineficcia da poltica governamental e a

    um novo elemento a especulao comercial , visto que o livro didtico

    havia se transformado em um lucrativo produto de mercado. Um fato

    relevante a esse respeito do novo papel do livro didtico foi o chamado

    escndalo da COLTED (WITZEL, op. cit., p.13).

    A Comisso do Livro Tcnico e do Livro Didtico (COLTED) foi criada

    nos anos 1960, sob o regime militar, a partir do acordo MEC/USAID6

    6 Nome de um acordo que incluiu uma srie de convnios realizados a partir de 1964, durante o regime militar brasileiro, entre o Ministrio da Educao (MEC) e a United States Agency for International Development (USAID). Os convnios, conhecidos como acordos MEC/USAID, tinham o objetivo de implantar o modelo norte-americano nas universidades brasileiras de uma profunda reforma universitria. Segundo estudiosos, pelo acordo MEC/USAID, o ensino superior exerceria um papel estratgico porque caberia a ele forjar o novo quadro tcnico que desse conta do novo projeto econmico brasileiro, alinhado com a poltica norte-americana. Alm disso, visava a contratao de assessores americanos para auxiliar nas reformas da educao pblica, em todos os nveis de ensino. (MENEZES e SANTOS, 2002.)

    estabelecido entre o governo brasileiro (MEC) e o governo americano

    (USAID). A criao dessa comisso mudou a orientao da poltica do livro

    didtico no Brasil em muitos sentidos. Segundo Freitag; Motta e Costa (op.

    cit., p.14), esse convnio firmado em 06 de janeiro de 1967 tinha como

    objetivo distribuir gratuitamente cerca de 51 milhes de livros para estudantes

    brasileiros no perodo de trs anos; alm dessa meta, a COLTED propunha

    um programa de desenvolvimento com a instalao de bibliotecas e cursos de

    treinamento de instrutores e professores em vrias etapas sucessivas. Para

    que pudesse executar esse programa, a comisso tinha sua disposio

    lautos recursos financeiros.

  • 30

    Esse acordo recebeu severas crticas por parte de educadores

    brasileiros; era questionada, por exemplo, a distribuio de responsabilidades:

    enquanto o MEC e o Sindicato Nacional de Editores de Livros (SNEL) tinham

    apenas responsabilidades de execuo, os rgos tcnicos da USAID eram

    responsveis por todo o controle do processo. Alm disso, segundo alguns

    estudiosos da educao brasileira, a ajuda da USAID trazia consigo o

    controle americano das escolas brasileiras. Dessa forma, os livros didticos

    tambm teriam um controle rgido de contedo (FREITAG; MOTTA e COSTA,

    op. cit., p.14 e 15).

    Por conta dos resultados lamentveis do trabalho desenvolvido pela

    COLTED foi criada uma Comisso de Inqurito para apurar irregularidades do

    comrcio de livros, principalmente o do livro didtico (WITZEL, op. cit., p.13).

    Nesse momento, importante ressaltar um comentrio feito por

    Bezerra e Luca (2006, p.30), quando afirmam que a partir da dcada de

    1960, o pblico escolar ampliou-se consideravelmente, o que ocasionou

    modificaes importantes no mercado de materiais destinados s escolas. O

    novo contexto educacional exigia modificaes tanto na composio

    pedaggica quanto no contedo dos livros. Alm disso, os professores

    passaram a sentir as consequncias, com condies de trabalho e de

    formao cada vez mais precrias e com a clientela cada vez mais afastada

    do saber formal. At essa fase, os livros didticos eram obras de referncia e,

    a partir dessas mudanas e da falta de liberdade democrtica, passaram a

    orientar e conduzir a ao dos professores.

    Em 1970, foi implementado um sistema de coedio de livros com as

    editoras nacionais, usando os recursos do Instituto Nacional do Livro (INL).

  • 31

    No ano seguinte, com a extino da COLTED, a responsabilidade de

    desenvolver o Programa Nacional do Livro Didtico foi atribuda ao INL, criado

    pelo Decreto-Lei n. 93, de 21 de dezembro de 1937. O INL assumiu as

    atribuies administrativas e de gerenciamento dos recursos financeiros at

    ento a cargo da COLTED. De acordo com Oliveira; Guimares e Bomny

    (op. cit., p.57), esse programa deveria definir diretrizes para formulao de

    programa editorial e planos de ao do MEC e autorizar a celebrao de

    contratos, convnios e ajustes com entidades pblicas e particulares e com

    autores, tradutores e editores, grficos, distribuidores e livreiros. Nesse

    mesmo ano, o INL criou o Programa do Livro Didtico para o Ensino

    Fundamental (PLIDEF).

    Entretanto, no ano de 1976, ocorreu uma redefinio da poltica do livro

    didtico. A partir do Decreto-lei n. 77.107, a responsabilidade do PLIDEF foi

    transferida para a Fundao Nacional do Material Escolar (FENAME). Entre

    as competncias dessa Fundao estavam definir as diretrizes para a

    produo de material escolar e didtico e assegurar sua distribuio em todo

    o territrio nacional; formular programa editorial; executar os programas de

    livro didtico e cooperar com instituies educacionais, cientficas e culturais,

    pblicas e privadas, na execuo de objetivos comuns (MEC/FENAME.

    Programa Nacional do Livro Didtico. Braslia, 1976 apud FREITAG; MOTTA

    e COSTA, op. cit., p.15).

    O vnculo entre a poltica governamental do livro didtico e a criana

    carente estabelecido explicitamente pela primeira vez em 1980, visto que o

    PLIDEF visava colaborar no desempenho da poltica governamental e

    cultural do pas, dando assistncia ao alunado carente de recursos

  • 32

    financeiros... (MEC/FENAME. PLIDEF Programa do livro didtico. Braslia,

    1980:1 apud FREITAG; MOTTA e COSTA, op. cit., p.16)

    No incio da dcada de 1980, para solucionar os impedimentos da

    poltica do livro didtico, o governo decidiu passar a gerncia do PLIDEF para

    a Fundao de Assistncia ao Estudante (FAE). Tambm dessa vez, a

    poltica adotada era centralizadora e assistencialista e acabou apresentando

    os seguintes problemas: dificuldades de distribuio do livro dentro dos

    prazos previstos, lobbies das empresas e editoras junto aos rgos estatais

    responsveis e autoritarismo implcito na tomada de decises pelos

    responsveis no governo (WITZEL, op. cit., p.14; FREITAG; MOTTA e

    COSTA, op. cit., p.16). Na ocasio, o grupo de trabalho encarregado do

    exame dos problemas relativos aos livros didticos props a participao dos

    professores na escolha dos livros e a ampliao do programa, com a incluso

    das demais sries do Ensino Fundamental.

    A partir disso, promulgado o Decreto n. 91.542, de 19 de agosto de

    1985, que cria o Programa Nacional do Livro Didtico (PNLD) no lugar do

    PLIDEF e traz diversas mudanas, como:

    indicao do livro didtico pelos professores;

    reutilizao do livro, implicando a abolio do livro descartvel e o

    aperfeioamento das especificaes tcnicas para sua produo, visando

    maior durabilidade e possibilitando a implantao de bancos de livros

    didticos;

    extenso da oferta aos alunos de 1. e 2. sries das escolas pblicas e

    comunitrias;

  • 33

    fim da participao financeira dos estados, passando o controle do

    processo decisrio para a FAE e garantindo o critrio de escolha do livro

    pelos professores.7

    Assim, a partir desse decreto, o PNLD passa a fazer parte da poltica

    pblica para educao, com o objetivo principal de adquirir e distribuir, de

    forma universal e gratuita, livros didticos para todos os alunos das escolas

    pblicas do Ensino Fundamental brasileiro.

    Podemos afirmar que a criao do PNLD foi um passo importante para

    a educao. Por meio dele, a distribuio sistemtica de livros didticos para

    o Ensino Fundamental ficou a cargo do Estado. No entanto, h que se

    considerar que essa distribuio no era feita com base em uma seleo

    prvia, de modo a garantir a qualidade dos livros comprados para a

    distribuio (CARVALHO, op. cit., p.3).

    Os livros adquiridos em 1983 foram examinados por um grupo de

    contratados pelo MEC, o que teve como resultado a proposta de que os

    professores participassem da escolha dos livros que utilizariam em sala, bem

    como a ampliao do programa s demais sries do Ensino Fundamental.

    Podemos afirmar que, a partir de ento, a qualidade didtico-pedaggica dos

    livros didticos distribuda pelo Ministrio passou a ser relevante.

    Em 1985, parte dessas sugestes foi aceita e oficializada no j citado

    Decreto n. 91.542.

    importante destacar que at a dcada de 1980 a histria do livro

    didtico no Brasil foi praticamente reduzida promulgao de diversos

    7 Dados obtidos em: . Acesso em: 20 out. 2008.

  • 34

    decretos-lei e iniciativas governamentais que criaram comisses e acordos

    para regulamentar uma poltica aceitvel para a produo e para a

    distribuio de livros (WITZEL, op. cit., p.14). Normalmente, as decises

    partiam do rgo centralizador, que geralmente era composto por tcnicos e

    assessores do governo, sujeitos pouco familiarizados com a problemtica da

    educao e quase nunca qualificados para gerenciar a complicada questo

    do livro didtico (FREITAG; MOTTA e COSTA, op. cit., p.31 e 32).

    A partir desses fatos, podemos dizer que a ineficincia das decises

    em torno do livro didtico foi decorrente de dois pontos fundamentais: a

    inexperincia e incompetncia dos responsveis pelo ensino no Brasil e a

    adoo de polticas altamente centralizadoras, nas quais, o professor, um

    dos principais usurios do livro, no participava seja dos processos decisrios

    do sistema educacional, em geral, seja das discusses sobre o livro didtico,

    em particular (WITZEL, op. cit., p.15). No desenvolvimento dessa

    dissertao, reservamos um item apenas para trabalhar a relao professor-

    avaliao do livro didtico.

    Na dcada de 1990, o Ministrio atuou mais ativamente na discusso

    sobre a qualidade dos livros escolares. O ano de 1993 representou um marco

    em relao poltica voltada para os materiais didticos. Segundo Bezerra e

    Luca (op. cit., p.31 e 32), a criao do Plano Decenal de Educao para

    Todos8

    8 Em 1990, em Jomtien, Tailndia, realizou-se a Conferncia Mundial de Educao para Todos, promovida pela UNESCO e copatrocinada pelo PNUD, UNICEF e Banco Mundial, com a participao de 155 pases e centenas de organizaes da sociedade civil. Decidiu-se que os pases com maior ndice de analfabetismo e maior dficit no atendimento da escolaridade obrigatria elaborariam planos decenais de educao para todos. Nos anos de 1993 e 1994, o MEC liderou a elaborao do Plano Decenal de Educao para Todos (BEZERRA e LUCA, op. cit., p.32).

    uma dessas polticas. As prioridades do Plano Decenal estavam

    relacionadas :

  • 35

    necessidade da melhoria qualitativa dos livros didticos;

    capacitao adequada do professor para avaliar e selecionar os livros;

    implementao de uma nova poltica para o livro didtico no Brasil.

    O aprimoramento da distribuio e das caractersticas fsicas do

    material comprado tambm deveria ser considerado, tendo em vista que os

    livros deveriam ser durveis.

    Para que a melhoria qualitativa do livro didtico fosse efetivamente

    conseguida, em 1994 foi feita uma avaliao da qualidade dos contedos

    programticos e dos aspectos pedaggico-metodolgicos dos dez ttulos mais

    solicitados pelos professores em 1991, correspondentes s quatro sries

    iniciais do Ensino Fundamental. Para isso, o Ministrio da Educao nomeou

    uma comisso de especialistas de cada uma das reas do conhecimento. As

    anlises indicaram graves falhas em diferentes aspectos: editorial, conceitual

    e metodolgico nas obras em uso por alunos e professores, de forma que se

    fazia necessria a busca de mecanismos de controle de qualidade para os

    materiais didticos que fossem adquiridos pelo governo e utilizados pelos

    alunos (BEZERRA e LUCA, op. cit., p.31 e 32). A partir de ento, as

    avaliaes foram sendo sistematizadas ao longo dos programas.

    2.1 Por que avaliar os livros didticos?

    Desde o incio dos processos de avaliao dos livros didticos, muitas

    discusses tm acontecido. So acadmicos, estudiosos, pesquisadores,

    professores e at a imprensa emitindo opinies e pareceres a favor e contra

    as formas como as avaliaes ocorrem. Nesse item, nossa inteno, depois

    de um prembulo, levantar os aspectos didtico-pedaggicos que provam a

  • 36

    necessidade de se avaliar o material que ser comprado pelo governo e

    usado por alunos nas escolas pblicas.

    Segundo Sposito, M. (2006, p.15): No mundo contemporneo, uma

    das prticas mais valorizadas, seja no mbito da iniciativa privada, na esfera

    do poder pblico ou no que se denomina como terceiro setor, a da

    avaliao. Essa mesma autora tambm afirma que o processo de avaliao

    tem se constitudo, progressivamente, em algo complexo e polmico, e, por

    conta disso, um tema recorrente e atual.

    Agora, vamos retomar a pergunta-ttulo a partir da tica proposta: por

    que avaliar os livros didticos que sero comprados pelo governo com errio?

    Diversas matrias j foram publicadas salientando diferentes tipos de

    problemas em livros didticos. Desde a dcada de 1960, estudos realizados

    denunciavam a falta de qualidade dos livros. Os autores desses estudos

    apontavam problemas srios, como a desatualizao das informaes e a

    veiculao de ideologias e preconceitos, bem como acentuadas deficincias

    metodolgicas (TOLENTINO-NETO, 2003, p.9).

    Nosella (1981), por exemplo, analisou, em seu trabalho, perto de

    20.000 pginas de livros didticos indicados pelo Ministrio da Educao para

    serem adotados nas quatro primeiras sries do primeiro grau9

    A famlia apresentada de forma extremamente estereotipada: esttica,

    completa, fechada, autossuficiente, como um mundo existente parte, em

    si e para si. Nessa perspectiva, famlias com formaes distintas, como

    . Durante sua

    pesquisa, Nosella avaliou textos de leitura e verificou que diversas situaes

    descritas nesses textos no correspondiam ao real:

    9 Atualmente refere-se ao 2., 3., 4. e 5. anos do Ensino Fundamental.

  • 37

    av, av e netos; pai e filha; e me, filhos e sobrinhos, no eram

    contempladas, deixando margem alunos nessas condies.

    A escola apresentada como um segundo lar, fechado e imutvel, onde

    os problemas e as desigualdades sociais so ignorados ou abordados de

    forma a serem minimizados. Essa escola sem problemas no existe; alm

    disso, o modelo apresentado autoritrio e repressivo, com a

    comunicao unidirecional. Isso porque a escola tem a funo educativa

    de formar (enquadrar dentro de uma frma) o aluno que ser um futuro

    cidado da sociedade capitalista, transformando-o num ser educado =

    obediente = passivo (NOSELLA, op. cit., p.178). A quem interessante

    mostrar a instituio escola dessa forma?

    A ptria apresentada nos textos como uma entidade, sempre

    grandiosa, que existe independentemente do povo.

    O ambiente apresentado de forma irreal, sem considerar os graves

    problemas ecolgicos criados pela forma com que a sociedade capitalista

    se relaciona com a natureza. O meio rural e o urbano so descritos

    poeticamente: o agricultor um feliz proprietrio com colheitas sempre

    abundantes, no so comentadas as comuns questes agrrias

    existentes no pas; tambm no so mencionados os problemas urbanos

    e as desigualdades sociais comuns em grandes centros. A relao entre o

    ser humano e o ambiente vertical: a natureza considerada a doadora

    e o ser humano tem o papel de receptor.

    Os mecanismos econmicos e sociais que regem o mundo do trabalho

    no so analisados. Todas as profisses citadas so igualadas e as

    relaes de trabalho so idealizadas.

  • 38

    Ao tratar o tema ricos e pobres, a relao entre eles apresentada sem

    conflitos. Segundo Nosella (op. cit., p.179), ningum se revolta, porque

    afinal os ricos no so felizes, por serem ricos; e a pobreza, se suportada

    com dignidade, torna-se fonte de felicidade. Nessa temtica, a relao

    tambm vertical: os ricos tm de ser bons ricos, ou seja, doar parte de

    seus bens para os pobres, que devem ser agradecidos, para serem bons

    pobres.

    Ser obediente e conformado so virtudes necessrias para se manter a

    ordem constituda. Uma ordem que interessante classe que tem a

    hegemonia econmica e social.

    No so dadas explicaes cientficas para as causas reais dos

    fenmenos naturais. Com isso, as crianas no desenvolvem conscincia

    crtica e ou cientfica.

    O ndio descrito como um personagem idealizado, muito distante da

    realidade do ndio brasileiro. A relao com a cultura no ndia

    estereotipada e vertical, como se os no ndios fossem uma civilizao

    superior e doadores da verdadeira cultura, enquanto os ndios fazem o

    papel de receptores ignorantes e selvagens.

    Segundo Nosella:

    [...] esses temas so mais citados nos textos de leitura por se constiturem os aspectos-ncleos fundamentais da sociedade, por serem instrumentos oportunos para manter a unidade e a coeso da estrutura social tal como est constituda. A insistncia sobre esses temas por parte desses textos no gratuita, mas visa fixar os modelos esttica e ideologicamente estruturados para os jovens leitores. (op.it., p.15).

    Tendo como veculo o livro didtico, essas irrealidades e vises

    estereotipadas acabam se sedimentando no imaginrio das crianas, fazendo

  • 39

    delas pessoas incapazes de refletir e buscar solues para as desigualdades

    sociais. J sabendo da importncia do livro didtico na formao cultural do

    povo de forma geral, poderamos nos perguntar: como formar um cidado

    sem oferecer ao aluno informaes que o faro refletir sobre seu papel na

    sociedade?

    Os trabalhos a respeito da problemtica qualidade dos livros didticos

    foram alm da anlise textual, alguns estudiosos tambm levantaram

    questes especficas, que dizem respeito aos componentes curriculares.

    Nos manuais de Cincias, por exemplo, tinha-se a impresso de que o

    livro havia sido concebido tendo como prioridades as necessidades do

    professor, sem considerar o conhecimento e as necessidades do aluno,

    desestimulando-o a fazer leitura e interpretao (BIZZO, 1997).

    Vrios autores, dentre eles Bizzo (2000) e Nosella (op. cit.), corroboram

    com a ideia de que os livros didticos acabam disseminando imagens

    preconceituosas e posies discriminatrias em relao doutrinao

    religiosa. Bizzo (op. cit.) tambm comenta a respeito da sugesto de

    atividades experimentais que colocam alunos e professores em situao de

    perigo.

    Nos livros de Geografia, de acordo com Sposito, E. (2006, p.60),

    tambm existem problemas que vo alm dos aspectos metodolgicos. So:

    erros grosseiros, tautologismos ou falta de conhecimento geogrfico, como os extrados de livros de 1. a 4. sries, durante a avaliao de 1998, dos quais enumeramos alguns: Os homens e as mudanas esto em constante transformao; O dia comea quando o sol nasce; Hoje a cidade de So Paulo cresceu tanto que s existe rea

    urbana; A cana-de-acar um produto amigo do calor e da umidade.

  • 40

    Segundo Davies (2005, p.1): O livro didtico de Histria tem cumprido

    a funo de veicular a ideologia das classes dominantes e possibilitar a

    reproduo da ordem burguesa. Muitos manuais apresentam um contedo

    factual, fragmentado, sem considerar a ideia de processo, estrutura e

    temporalidades. Dessa forma, os livros didticos de Histria podem ser vistos

    como um instrumento de degradao do ensino de Histria (DAVIES, op. cit.,

    p.1).

    H que se considerar tambm que erros e inadequaes esto

    igualmente presentes em livros de outros componentes curriculares desse

    segmento de ensino os primeiros anos do Ensino Fundamental e de

    outras faixas de ensino da escola pblica. Certamente, todos esses pontos

    tornam ainda mais relevante a necessidade de se avaliar o material que

    distribudo pelo governo, com o dinheiro pblico, para as escolas.

    Sposito, M. (op. cit., p.22) deixa clara sua opinio sobre a avaliao do

    livro didtico:

    Nossa posio em relao a este dilema clara e j assumida publicamente: a avaliao deve ser feita porque o Estado, com recursos pblicos, est adquirindo milhes de livros didticos para distribuio gratuita na rede oficial de ensino bsico e deve aferir a qualidade do produto que compra. importante, para acrescentar um dado a este debate, lembrar que os livros inscritos e no aprovados no processo de avaliao do PNLD no so adquiridos pelo Governo Federal, mas no esto proibidos de circular e ser vendidos, o que refuta o argumento, s vezes apresentado, de que o governo est fazendo censura ou impedindo a livre iniciativa de oferecimento de um produto no mercado.

    Se pensarmos em nvel mundial, a ao do Estado no campo da

    avaliao de livros escolares bastante diversa. Porm, pode-se afirmar que

    esse processo uma prtica comum em muitos pases, embora os mtodos

    adotados sejam bastante variados. A poltica de avaliao do livro didtico no

  • 41

    Brasil tem como base o estabelecimento de parmetros de qualidade sem

    inibir a livre iniciativa de produo. Assim, o professor tem diferentes opes

    em termos de abordagens tericas e metodolgicas, de forma a poder

    escolher entre uma diversidade significativa de obras disponveis aquelas

    mais adequadas sua realidade e de seus alunos, bem como ao projeto

    pedaggico das escolas. (CAMPOS, 2007, p.11).

    2.2 A avaliao-piloto

    Como vimos, em 1993, com a criao do Plano Decenal de Educao

    para Todos, as metas relacionadas qualidade do livro didtico ficaram sob

    responsabilidade do MEC. Entre essas metas estavam assegurar a melhoria

    da qualidade fsica e pedaggica do livro distribudo gratuitamente e dar

    capacitao aos professores para que pudessem avaliar e escolher os ttulos.

    Junto ao objetivo de melhorar a qualidade pedaggica do livro, o Ministrio

    tambm assumiu a proposta do planejamento de uma nova poltica pblica

    (TOLENTINO-NETO, op. cit., p.9).

    Nesse mesmo ano, o MEC nomeou:

    [...] uma comisso, com especialistas das vrias componentes curriculares do Ensino Fundamental, que instituiu critrios para a avaliao de livros didticos para os primeiros quatro anos dessa fase da escolaridade e avaliou, a ttulo de exemplo, os livros mais escolhidos pelos professores, em cada uma das componentes curriculares. Os resultados dessa avaliao foram catastrficos.10

    10 Nesse caso, o termo catastrfico refere-se qualidade dos livros que eram comprados pelo governo e oferecidos aos alunos da rede.

    (CARVALHO, op. cit., p.4)

    O livro Definio de Critrios para Avaliao de Livros Didticos

    (Braslia: FAE/MEC, UNESCO, 1994) traz o resultado dessa avaliao.

  • 42

    A repercusso dos resultados foi muito grande. Diversos jornais

    publicaram artigos a respeito da pssima qualidade dos livros didticos

    comprados pelo governo. Em seguida publicao dos resultados, o Chefe

    de Gabinete do ento Ministro da Educao, Joo Baptista de Oliveira,

    desqualificou na imprensa o trabalho da comisso, dizendo que o mesmo era

    um trabalho amargo, de acadmicos, e que era melhor um livro ruim do que

    nenhum livro (CARVALHO, op. cit., p.4.). No obstante, a distribuio do livro

    s Secretarias de Educao foi suspensa.

    A partir das observaes realizadas, tambm foram traados os

    requisitos bsicos para que um ttulo fosse considerado de boa qualidade

    (TOLENTINO-NETO, op. cit., p.9). Iniciava-se o processo de avaliao oficial

    dos livros didticos.

    No ano seguinte, em 1995, foram convocados especialistas dos vrios

    componentes curriculares do ensino de 1. a 4. sries pela Secretaria do

    Ensino Fundamental. Esses especialistas deveriam preparar uma avaliao

    dos livros apresentados pelas editoras e pelos autores para o PNLD 1997.

    Vrios desses profissionais j tinham feito parte do grupo formado pela FAE

    na avaliao-piloto de 1993.

    2.3 A evoluo do PNLD

    Desde 1997, j ocorreram cinco edies do PNLD para alunos do

    primeiro segmento do Ensino Fundamental: o PNLD 1997, o PNLD 1998, o

    PNLD 2000/01, o PNLD 2004 e o 200711

    Em 1995, com a criao de comisses por rea de conhecimento para

    .

    11 O PNLD 2010 j est em andamento, os livros foram inscritos pelas editoras em julho e agosto de 2008, e o Guia com os resultados foi disponibilizado no stio do FNDE em 16 de abril de 2009.

  • 43

    elaborar critrios de avaliao, discutindo-os com autores e editores, estava

    iniciada a avaliao sistemtica dos livros, sob a denominao de Avaliao

    Pedaggica. A partir da, foi estipulado que somente os livros aprovados

    poderiam ser comprados pelo governo. A primeira avaliao deu-se no ano de

    1996 e estava focada nos livros de 1. a 4. sries, que seriam distribudos

    aos alunos no ano seguinte PNLD 1997 (BEZERRA e LUCA, op. cit., p.32 e

    33).

    No seminrio Livros Didticos: Contedo e Processo de Avaliao,

    ocorrido em outubro de 1995, as comisses estabeleceram e divulgaram os

    critrios de anlise e os critrios eliminatrios (Anexo I). Esses ltimos eram

    vlidos para todas as reas e excluam os livros de qualquer compra.

    So eles:

    os livros no podem expressar preconceitos de origem, raa, sexo,

    cor, idade e quaisquer outras formas de discriminao; e no podem ser desatualizados, nem conter ou induzir a erros graves

    relativos ao contedo da rea, como, por exemplo, erros conceituais. (BRASIL. MEC/SEF, 1996)

    O PNLD 1997 foi coordenado pela Secretaria do Ensino Fundamental

    (SEF) do MEC, e foi nomeado um coordenador para cada rea do

    conhecimento Cincias, Geografia, Histria, Lngua Portuguesa e

    Matemtica. Estes, por sua vez, selecionaram professores especialistas para

    serem os avaliadores. Em cada equipe, havia cerca de 25 pessoas que

    tinham conhecimento das questes relativas ao Ensino Fundamental e

    tambm experincia acadmica (BEZERRA e LUCA, op. cit., p.32).

    As comisses ficaram responsveis pela elaborao dos critrios de

    anlise, pela avaliao e pela classificao dos ttulos.

    Conforme coloca Tolentino-Neto (op. cit., p.11), o Ministrio enviou a

  • 44

    algumas editoras uma carta-convite para a venda dos livros ao governo.

    Nessa carta, estavam descritos os critrios de anlise dos livros e as

    condies para a compra dos volumes, como valores, prazos e entregas.

    Nesse programa foram inscritos 466 livros didticos de 1. a 4. sries

    das reas de Lngua Portuguesa, Matemtica, Cincias e Estudos Sociais,

    analisados pelas comisses durante o ano de 1996. Aps a divulgao dos

    resultados, os professores escolheram os livros que ficaram disponveis aos

    estudantes de escolas brasileiras no ano letivo de 1997.

    Para facilitar o processo de escolha dos livros, eles foram agrupados

    em quatro categorias, conforme mostra a tabela a seguir.

    Tabela 1 Categorias de classificao dos livros didticos PNLD 1997

    PNLD 1997 Categoria Caractersticas da obra

    Livro excludo No atende s exigncias mnimas; contm problemas apontados como eliminatrios.

    Livro no recomendado

    Apresenta condies insuficientes para o exerccio da boa educao, com impropriedades que comprometem sua eficcia.

    Livro recomendado com ressalvas

    Apresenta caractersticas que satisfazem os critrios mnimos de qualidade, mas que requerem ateno e complementao por parte do professor.

    Livro recomendado Cumpre a funo didtico-pegaggica e atende aos mais especficos critrios da avaliao.

    Dessas 466 obras inscritas:

    63 foram recomendadas;

    42 foram recomendadas com ressalvas;

    281 foram no recomendadas;

    80 foram excludas.

  • 45

    Para os livros excludos e no recomendados, as editoras receberam

    um laudo tcnico e um parecer da comisso avaliadora a respeito das obras.

    J para todas as escolas pblicas brasileiras foi

    encaminhado o primeiro Guia de Livros Didticos, que

    apresentava no s os princpios e critrios que nortea-

    ram a avaliao como tambm as resenhas das obras

    recomendadas para escolha do professor.12

    12 Dados obtidos em: Acesso em: 20 out. 2008.

    Essa avaliao prvia de 1996, que selecionou as obras que poderiam

    ser escolhidas pelos professores, acabou gerando diversos conflitos entre o

    MEC e editores e autores, tanto no meio jornalstico quanto no meio jurdico.

    O contexto desses conflitos refere-se forte dependncia do setor editorial

    em relao s compras pblicas e aos critrios relativos excluso e no

    recomendao de ttulos.

    O PNLD 1998 foi iniciado em 1997 e, a partir de ento, o processo

    passou a ser realizado pelo FNDE, e no mais pela FAE.

    Nesse programa, foram mantidos as estratgias e os critrios de

    avaliao (Anexo II) e tambm a divulgao de resultados. Alm disso, obras

    excludas ou no recomendadas puderam ser reinscritas. Os chamados livros

    de alfabetizao, entre eles as cartilhas, tambm foram includos no

    programa.

    Houve, sim, modificao nas categorias de classificao, e foram

    criados abreviaes e cones para identificar a classificao do livro.

  • 46

    Tabela 2 Categorias de classificao dos livros didticos PNLD 1998

    PNLD 1998 Categoria Abreviao cone

    Livro recomendado com ressalvas RR

    Livro recomendado REC

    Livro recomendado com distino RD

    Segundo o Ministrio da Educao, na categoria 3 estrelas (livro

    recomendado com distino), seriam includas obras com qualidades

    inequvocas e bastante prximas do ideal representado pelos princpios e

    critrios definidos pelo governo.

    Em 1997, foi publicado o Guia de Livros Didticos do PNLD 1998. O

    volume apresentava resenhas dos livros recomendados (RR, REC e RD), e

    listagem de obras no recomendadas.

    Os 454 livros inscritos nas reas de Alfabetizao, Lngua

    Portuguesa, Matemtica, Cincias e Estudos Sociais foram classificados da

    seguinte forma:

    19 foram recomendados com distino ;

    47 foram recomendados ;

    101 foram recomendados com ressalvas ;

  • 47

    211 foram no recomendados;

    76 foram excludos.

    importante destacar que tanto no PNLD 1997 como no PNLD 1998

    foi permitido aos professores optar por um livro no recomendado.

    Em 1997, estabeleceu-se tambm a avaliao dos livros didticos

    destinados s quatro sries finais do Ensino Fundamental (antigas 5. a 8.a

    sries e atuais 6. ao 9. anos). Para esse programa, o PNLD 1999, era

    necessria a elaborao de novos critrios. Em junho de 1997, em Braslia,

    ocorreu o seminrio Critrios de Avaliao de Livros Didticos 5. a 8.a

    poca, trabalhvamos como editora e participamos desse evento.

    Depois da abertura do encontro com Iara Prado (Secretria de Educao

    Fundamental), Antnio Carletti (Secretrio Executivo FNDE) e Virgnia

    Farha (Diretora de Polticas da Educao Fundamental), os trabalhos foram

    iniciados com a apresentao da verso preliminar dos Princpios e critrios

    para a avaliao de livros didticos de 5. a 8. sries por Egon Rangel (PUC-

    SP). Em seguida, palestrantes discorreram sobre temas relacionados aos

    critrios de avaliao:

    sries, que reuniu diferentes profissionais envolvidos no programa, como

    coordenadores da avaliao, especialistas e representantes do governo e do

    meio editorial, cujo objetivo era colher subsdios para definir os critrios de

    avaliao dos livros didticos de 5. a 8. sries.

    Serguei Lazarev (UNESCO) e Roseli Fischmann (USP) Preconceito e

    discriminao;

    Gianvittore Calvi e Lucila Martnez (Banco Mundial/PNUD) O projeto

    grfico e a leitura da imagem no livro didtico;

  • 48

    Kabenguele Munanga (USP) A diversidade cultural e tnica como

    contribuio ao sucesso escolar;

    Anna Rachel Machado P. Barro (PUC-SP) Transposio do

    conhecimento de ensino cientfico para o contexto. A necessidade e as

    dificuldades;

    Claudia Davis (FDE) O livro na escola: critrios cognitivos para a sua

    escolha;

    Jos Eduardo Bicudo (USP) Saber escolar e conhecimento cientfico:

    limites e possibilidades.

    Aps cada explanao, era dado um tempo para que os participantes

    pudessem debater sobre os temas.

    Tambm houve um trabalho simultneo em grupos com a

    participao de coordenadores, especialistas e editores de rea. Ficamos no

    grupo de Cincias, que contou com Adriana Mohr (Fundao Osvaldo Cruz-

    SC), que discorreu sobre o tema A abordagem de sade nos livros didticos,

    e com Joo Batista Canalle (UERJ), que abordou Contedos de Astronomia

    no Ensino Fundamental. O coordenador desse grupo foi Nlio Bizzo (USP).

    Sem dvida, podemos afirmar que esse encontro foi de extrema valia,

    visto que aproximou elementos participantes de um processo com o objetivo

    comum: a melhoria da qualidade do livro didtico.

    Dentre as modificaes definidas para o PNLD 1999, destacam-se:

    a eliminao da classificao de livros no recomendados, que no

    apareceriam no Guia e, assim, no poderiam ser comprados com errio;

    a incluso do critrio coerncia metodolgica da obra na anlise dos

    manuais. Dessa forma, seria necessrio haver uma unidade pedaggico-

  • 49

    metodolgica no livro, tornando-o um instrumento de uso contnuo e

    conciso (TOLENTINO-NETO, op. cit., p.13).

    Nessa perspectiva, os critrios do processo de avaliao foram

    distribudos em trs grandes grupos:

    - contribuio para a construo da cidadania;

    - correo dos conceitos e das informaes bsicas;

    - correo e pertinncia metodolgicas.

    Depois da realizao do PNLD 1999, e com a experincia acumulada

    em trs edies do programa (1997, 1998 e 1999), sentiu-se a necessidade

    de se fazer a avaliao da avaliao, de forma a aprofundar questes

    relativas aos processos. A avaliao da avaliao ocorreu durante o ano 2000

    com a presena da equipe de coordenadores e da Secretaria de Ensino

    Fundamental (SEF), por meio de momentos de reflexo a respeito dos

    seguintes pontos:

    critrios de avaliao;

    contexto educacional brasileiro;

    concepo de livro didtico;

    descompasso constatado entre as expectativas do PNLD e as dos

    professores da rede de ensino;

    relaes de dependncia do setor editorial para com o PNLD;

    operacionalizao e otimizao do processo de avaliao e de escolha do

    livro didtico pelos professores. (BEZERRA e LUCA, op. cit., p.32 e 33)

    A partir das discusses internas, foi elaborado um documento que

    tornava pblica a avaliao do processo de avaliao. Para isso, esse

    documento foi enviado s Secretarias de Educao dos Estados e dos

  • 50

    Municpios e a professores de vrias instituies universitrias. Em maio de

    2000, um encontro realizado na cidade de So Paulo com a presena de

    representantes das Secretarias de Educao e de especialistas relacionados

    a livros didticos e educao permitiu o debate desses assuntos. Em 2001, os

    resultados da autoavaliao Recomendaes para uma Poltica Pblica de

    Livros Didticos foram publicados pelo MEC. Esse documento tornou-se

    uma referncia bastante importante para as edies seguintes do PNLD.

    De acordo com Batista (2002, p.30 e 31, apud CARVALHO, op. cit, p.5

    e 6), entre as recomendaes, foi proposto que o PNLD deveria implementar

    esforos para o desenvolvimento de novas concepes de livro didtico,

    acolhendo propostas de outros modos de relao do manual com o trabalho

    do professor e possibilitando mudanas nos padres editoriais, de forma a

    renovar o conceito de livro didtico cristalizado na comunidade escolar. Ou

    seja, para que a ao do MEC realmente promovesse uma melhoria da

    qualidade de ensino, seria necessrio ampliar a concepo de livro didtico,

    de forma que houvesse inscrio de outros tipos de materiais.

    Ainda segundo Batista (op. cit.), para que esses objetivos sejam

    alcanados, o documento traz algumas sugestes ao PNLD:

    que se assuma uma concepo de livro didtico mais ampla, que seja

    organizado de forma variada e em suportes variados e que se destine a

    uma disciplina, rea de saber ou conjunto de disciplinas ou reas de

    saber, a uma srie, a um ciclo ou a um nvel de ensino (BATISTA, 2002,

    p.30 e 31, apud CARVALHO, op. cit, p.7);

    que sejam criados programas subsidirios que impliquem a incorporao

    progressiva desse novo conceito de livro didtico, com a compra: de

  • 51

    materiais que visem apoiar o trabalho pedaggico (fontes de informao,

    coletneas de textos ou documentos, compndios); de colees voltadas

    para temas, reas de conhecimento ou projetos com nmero de volumes

    atrelado aos ciclos de ensino-aprendizagem definidos pelas propostas

    pedaggicas que orientam as colees; de materiais didticos

    organizados no apenas no suporte livro, como suportes eletrnicos,

    fichrios, lbuns e blocos de atividades; de acessrios, como fitas de

    udio e vdeo, cartazes e cadernos de atividades, obras eletrnicas, que

    enriqueam e diversifiquem as colees; de materiais didticos,

    destinados apenas ao docente, como projetos pedaggicos;

    que as mudanas a partir dessa redefinio de livro didtico sejam feitas

    paulatinamente, levando em considerao as respostas dadas pelo

    campo editorial e pelo campo educacional;

    que exista efetiva articulao entre o PNLD e o Programa Nacional da

    Biblioteca Escolar (PNBE), para desenvolvimento de uma ampla poltica

    do livro e da leitura na escola brasileira;

    que o PNLD e o PNBE ocorram simultaneamente, de forma que a

    distribuio do acervo do PNBE esteja condicionada ao atendimento do

    mesmo segmento atendido pelo PNLD;

    que se realizem concursos, em mbito nacional, com vistas elaborao

    de materiais didticos inovadores, a partir de parmetros definidos pelo

    MEC. (BATISTA, 2002, p.30 e 31, apud CARVALHO op. cit, p.7)

    O PNLD 2000, depois transformado em PNLD 2000/2001, tambm foi

  • 52

    destinado s quatro primeiras sries do Ensino Fundamental13

    Com o objetivo de promover a melhoria da qualidade dos livros didticos destinados ao ensino fundamental e utilizados nas escolas pblicas, caber Secretaria de Educao Fundamental do Ministrio da Educao e do Desporto SEF/MEC proceder avaliao do contedo pedaggico das obras inscritas (Anexo VI), obedecendo aos critrios estabelecidos, com base tanto nas experincias acumuladas na avaliao dos livros didticos de 1.

    . Para a

    avaliao dos livros, os critrios utilizados no PNLD 1999 (5. a 8. sries)

    foram mantidos, mas adaptados s sries iniciais do Ensino Fundamental. No

    item 2.4 sobre a avaliao pedaggica do edital de convocao desse

    programa foi colocado que:

    a 4. sries, inscritos no PNLD 1997 e 1998, quanto no processo de avaliao dos livros de 5. a 8. sries realizado para o PNLD 1999.14

    A partir do PNLD 2000 foram descritos e diferenciados critrios

    eliminatrios e classificatrios, conforme o trecho do edital de convocao

    desse programa reproduzido no Anexo III.

    Em 2000, foi publicado o Guia de Livros Didticos do PNLD 2000/2001.

    O volume apresentava resenhas dos livros recomendados (RR, REC e RD).

    13 Diante de um quadro de crise internacional e cortes oramentrios, ficou o Governo Federal decidido a espaar as compras de livros didticos em intervalos de 3 anos. Isso foi planejado e articulado com uma campanha publicitria com o personagem "Menino Maluquinho", de Ziraldo. O corte oramentrio foi travestido de campanha de conservao de livros. Aqueles livros entregues em 1998 tiveram de resistir at o final do ano 2000, quando foram repostos por aqueles livros adquiridos no PNLD 2000/2001. (TOLENTINO-NETO, op. cit., p.14) 14 Dados obtidos no Edital de convocao para o PNLD 2000/2001.

  • 53

    Os 569 ttulos inscritos nas reas de Alfabetizao, Lngua

    Portuguesa, Matemtica, Cincias e Estudos Sociais foram classificados da

    seguinte forma:

    35 foram recomendados com distino ;

    76 foram recomendados ;

    210 foram recomendados com ressalvas ;

    248 foram excludos.

    Nesse mesmo ano, tambm foi realizada a primeira avaliao de

    dicionrios para 1. a 4. sries do Ensino Fundamental (35 dicionrios foram

    avaliados: 23 recomendados e 12 excludos). De acordo com os dados do

    Ministrio da Educao a respeito do PNLD 2000/2001, pessoas de

    praticamente todos os Estados do Brasil estiveram diretamente envolvidas

    com a avaliao e 200.000 exemplares do Guia foram distribudos para

    187.493 escolas, situadas em 5.507 municpios de todo o pas.

    Conforme verificado no stio do MEC, em novembro de 2002 a

    Secretaria de Educao Fundamental do MEC organizou um seminrio com o

    objetivo de colher, junto aos parceiros do PNLD, direta ou indiretamente

    envolvidos no processo de avaliao, relatos e recomendaes sobre o

    processo de avaliao pedaggica do PNLD. Nesse encontro, foram

    levantados subsdios para a continuidade do Programa, dos quais

    selecionamos alguns:

    Investir maciamente na formao docente, intensificando as atividades de orientao aos professores para a escolha e uso do livro didtico, por meio de instncias como o PNLD em Ao. [grifo nosso]

    Incentivar a autonomia de professores e escolas na escolha dos livros didticos. [grifo nosso]

    Ampliar o prazo destinado aos professores para procederem escolha dos livros. [...]

  • 54

    Induzir a produo de outros materiais didticos, contemplando propostas como projetos, obras cicladas, fichrios etc.

    Promover refinamento dos critrios: pr-requisitos para a inscrio das obras e para garantir o aprimoramento constante da metodologia e dos contedos das reas.

    Defender a melhoria da qualidade dos livros de destinao regional, visando uma melhor abordagem dos contedos das reas de Geografia e Histria.

    Incentivar para que a quantidade de volumes inscritos corresponda a uma diversidade de propostas e abordagens terico-metodolgicas.

    Melhorar a relao interinstitucional, evitando entraves burocrticos que prejudiquem o processo de avaliao, como assinatura de convnios, liberao de recursos e acesso a base de dados.

    Promover uma maior divulgao da avaliao e de seus resultados, e maior publicidade dos critrios de avaliao nos meios acadmico, escolar e na sociedade.

    Otimizar a utilizao dos meios de comunicao, inclusive os do prprio ministrio, para a divulgao da avaliao e demais aes do PNLD.

    Ampliar a discusso sobre o processo de avaliao dos livros didticos com os diversos setores nele envolvidos.

    Incluir nos questionrios do SAEB itens especficos sobre o livro didtico.

    Aumentar o nmero de avaliadores no processo, promover renovao peridica dos avaliadores e ampliar a participao de representantes de diversas instncias envolvidas com o livro didtico. [grifo nosso]

    Instalar comisses estaduais e municipais, envolvendo diferentes instncias (universidades, secretarias, entidade de professores etc.) para acompanhamento das etapas de escolha e uso do livro didtico, distribuio e monitoramento.

    Rever o modelo atual do Guia, desmembrando as informaes em dois mdulos distintos: um de orientao escolha, e outro de orientao para o uso do livro didtico.

    Encartar no Manual do Professor dicas e comentrios dos avaliadores.

    Veicular no prprio livro didtico as resenhas com os comentrios dos avaliadores.

    Promover progressivamente a descentralizao do Programa, para atender as peculiaridades dos estados.

    Reavaliar o alcance do Guia. Analisar a necessidade de se produzir material de apoio aos

    professores, complementar s orientaes disponveis nos livros e nos manuais do professor. [grifo nosso] [...]15

    Destacamos alguns itens dessa lista de subsdios porque percebemos

    que agentes do PNLD e seus parceiros envolvidos nesse seminrio

    dirigentes do MEC, especialistas em livros didticos, professores

    15 Dados obtidos em: . Acesso em: 15 set. 2008.

  • 55

    universitrios e representantes dos autores e editores tambm viram

    premente a necessidade de se investir no docente e de se implantarem

    modificaes na forma do atual programa.

    No PNLD seguinte, o 2004, as obras de Histria e Geografia foram

    inscritas separadamente pela primeira vez. Essa novidade influenciou o

    processo de inscrio das obras pelas editoras. Alm disso, com o objetivo de

    garantir o desenvolvimento curricular, a partir do PNLD 2002 (5. a 8. sries),

    passou-se a avaliar colees e no mais livros isolados, e a avaliao passou

    a ser realizada por universidades: Universidade Federal de Minas Gerais

    (UFMG) Alfabetizao e Lngua Portuguesa; Universidade de So Paulo

    (USP) Cincias; Universidade do Estado de So Paulo (UNESP)

    Geografia e Histria; Universidade Federal de Pernambuco (UFPE)

    Matemtica.16

    Em 2003, foi publicado o Guia de Livros Didticos do PNLD 2004 em

    cinco volumes: Alfabetizao, Lngua Portuguesa, Cincias, Histria e

    Outra novidade presente nas avaliaes de 1. a 4. sries refere-se

    ficha de correo o Anexo VII , que deveria ser preenchida pelo autor e/ou

    editor caso a obra tivesse sido inscrita e excluda no PNLD 2001. De acordo

    com o edital: Esta ficha dever expressar de forma clara e precisa as

    correes feitas na obra, pelo autor/editor, descrevendo os problemas e suas

    respectivas correes.

    No Anexo IV reproduzimos o trecho do edital de convocao que descreve

    os critrios eliminatrios e os classificatrios do PNLD 2004.

    16 Dados obtidos em: http://portal.mec.gov.br/seb/index.php?option=contentetask=vieweid=377. Acesso em: 20 jan. 2009.

  • 56

    Geografia. Os volumes apresentavam resenhas das colees recomendadas

    (RR, REC e RD).

    Os 260 ttulos inscritos nas reas de Alfabetizao, Lngua

    Portuguesa, Matemtica, Cincias, Histria e Geografia foram avaliados

    pelas mesmas universidades do PNLD 2002. O resultado da classificao

    foi o seguinte:

    12 foram recomendados com distino;

    60 foram recomendados;

    112 foram recomendados com ressalvas;

    76 foram excludos.

    Dos 19 dicionrios avaliados, 3 foram excludos e 16, recomendados.

    A novidade do PNLD 2007 est relacionada classificao dos livros

    aprovados, que no mais colocada no Guia.

    No Anexo V reproduzimos o trecho do edital de convocao que

    descreve os critrios eliminatrios e os classificatrios do PNLD 2007.

    Os 303 ttulos inscritos nas reas de Alfabetizao, Lngua

    Portuguesa, Matemtica, Cincias e Histria e Geografia foram avaliados

    pelas seguintes univer