o iluminismo

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O fim do reinado de Luís XIV, em 1715,deixou a França numa situação muitodifícil. O jovem rei Luís XV,

estranhamente, preferia viver à sombra das regências,desfrutando em Versalhes as diversões palacianas queesgotavam os cofres do Estado. Enquanto isso, a aris-tocracia se aproveitava da inoperância do rei manten-do privilégios e abomináveis direitos que lembravam aépoca feudal. Só em 1748, o relutante Luís XV assu-miu o trono depois da morte de Fleury, o último re-gente. Com 32 anos de idade o rei não poderia, maisuma vez, recusar o governo sob pena de provocaruma crise de graves proporções.

Mas, como era fácil de prever, o novo rei dei-xou que os aristocratas se encarregassem das tarefasreais apenas interferindo nos casos mais sérios. Acre-ditando estar num mar de rosas, faltou a Luís XV apercepção que a França já não era a mesma de outrostempos. A liberdade concedida aos pensadores eintelectuais, bem como o ambiente de investigaçãocientífica, especulação filosófica e crítica acabaramfrutificando.

Tais mudanças ressaltariam com maior ímpetona área do pensamento filosófico e político, transbor-dando com evidência no Iluminismo – movimento filo-sófico que marcou o século XVIII como o Século dasLuzes.

Olhando para trás, lembramos que oRenascimento Cultural abriu as portas do conhecimen-to, ao colocar em xeque a visão teocêntrica da IgrejaCatólica. O humanismo renascentista encorajou a for-mulação de novas teorias que derrubaram os antigospreconceitos medievais. Na mesma época, a ReformaProtestante provocou uma fissura insuperável na auto-ridade da Igreja Católica, expondo-a ao vexame de con-viver com novas religiões, que bem ou mal, propicia-vam um clima mais adequado ao desenvolvimento daciência e do pensamento crítico.

“É uma verdade eterna: qualquer pessoa que tenha o poder, tende a abusar dele. Paraque não haja abuso, é preciso organizar as coisas de maneira que o poder seja contidopelo poder”

Montesquieu - O Espírito das Leis.

Os salões daaristocraciaesclarecidareuniam osintelectuais daépoca: no salãoda madameGeoffrin, estãoretratadosDiderot, Turgote D’Alembert,em destaque,no fundo àesquerda, obusto deVoltaire

“O homem aprendetodos os dias, avança, obser-va, parece-lhe que as trevas

recuam: é o século dasluzes”

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REVOLUÇÃO CIENTÍFICA

No século XVII surgiram novas teorias científi-cas, começando com Galileu, em 1609. Montando umtelescópio pôde observar a superfície da Lua checan-do detalhes imperceptíveis a olho nu. Em seguida, ob-servou o planeta Júpiter constatando a existência devários anéis girando ao seu redor.

Pensou então: se osanéis giravam em torno deJúpiter, o mesmo deveriaocorrer com a Lua em rela-ção a Terra e, conseqüente-mente de todos em relação aoSol. Essa teoria derrubou opostulado da Terra como as-tro fixo e os outros astrosimóveis à sua volta. A IgrejaCatólica em resposta às teo-rias de Galileu, resolveu levá-lo a julgamento mostrandoque a Inquisição condenava asdescobertas do cientista.

“Em 25 desetembro de 1632, setemeses depois dapublicação do Diálogo, Galileu foi intimado a seapresentar em Roma para ser julgado como heregeperante o delegado geral do Santo Ofício. Tentoupor todos os meios evitar o julgamento, mas sóconseguiu adiá-lo. Em fevereiro do ano seguintechegou a Roma, onde teve de esperar três meses.Finalmente, entre 12 de abril e 21 de junho, foirepetidamente interrogado pelo Santo Ofício, mas,ao que parece, não foi torturado.

Em 22 de junho levaram-no para o salãodo convento dominicano da Santa Maria e lápronunciaram a sentença diante da Congregaçãodo Santo Ofício. O Diálogo ficou proibido decircular, e seu autor, veementemente suspeito deheresia, foi encarcerado. Após ouvir a sentença,Galileu viu-se compelido a se ajoelhar e retratar-se.”

Em 1687, o mundo científico foi sacudido pe-las incríveis descobertas do gênio inglês Isaac Newton.O cientista provou que os planetas descreviam sua ór-bita no universo motivada pela força exercida de umcorpo sobre outro. A compreensão do universo comoum espaço infinito sujeito a constantes transformaçõesrevolucionou a ciência, permitindo a explicação dinâ-mica e coerente dos fenômenos da natureza. A Lei da

Gravitação Universal uniu as diversas partes do mun-do físico, explicando em termos matemáticos por quea Terra e os planetas se movem.

Newton quebrou de vez as barreiras que impe-diam a explicação cientifica das coisas do universo.Perto de morrer, diria - “Não sei que impressão o mun-do terá de mim, mas para mim mesmo parece que fuiapenas um menino que brincava à beira-mar, diver-tindo-me de vez em quando com o achado de um sei-xo mais liso ou uma concha mais bonita do que onormal, enquanto o oceano imenso da verdade jaziatotalmente inexplorado diante de mim”. 2

Outro expoente da época foi o filósofo e cien-tista francês René Descartes, autor do livro Discursosobre o Método. Nessa obra, alegava que a providên-cia Divina legou aos homens o livre-arbítrio e o domda razão para que pudessem escolher o caminho darealização. Afirmava que a prática do livre-arbítrio to-mava o homem semelhante a Deus, aproximando-o daplenitude.

O Tempo da História

1637

“DISCURSO SOBRE OMÉTODO”

DESCARTES

1690

“TRATADOS SOBRE O GOVERNO

CIVIL”

JOHN LOCKE 1748

“O ESPÍRITO DAS LEIS”

MONTESQUIEU1689

REVOLUÇÃO GLORIOSA

NA INGLATERRA

1751-1772

PUBLICAÇÃO DA “ENCICLOPÉDIA”

1762

“O CONTRATOSOCIAL”

ROUSSEAU

SÉCULO DAS LUZES

“Vista de ummercadopúblico”deHendrickSleenuvick, visãoidealista de umasociedade empaz.

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Descartes formulou a espinha dorsal doquestionamento político dos iluministas. A partir de1650, o pensamento cartesiano, espalhou-se por todaa Europa traduzido em várias línguas.

“Os pensamentos que lhe ocuparam a aten-ção centralizaram-se na questão do que é que o ho-mem conhece, e de como o conhece. Haverá, refletiuDescartes, alguma coisa de que o homem possa abso-lutamente estar certo? Se duvidasse sistematicamen-te de tudo, haveria uma única coisa que resistisse atoda a dúvida? Meditando sobre essas questões, Des-cartes viu-se forçado a concluir que todas as fontesconvencionais do conhecimento do homem eram dis-cutíveis. Os escritos de antigos autores, tradicionalreservatório de sabedoria, obviamente se contradi-zem entre si a cada passo.

A evidência dos sentidos era igualmente ilu-sória — provaram-no os sonhos, as ilusões de ótica,as alucinações. Mesmo a razão estava longe de serinfalível, como o sabia qualquer pessoa que tivessecometido um erro de aritmética. Tendo duvidado detudo, achou-se Descartes diante de uma única coisaque não podia duvidar: sua própria existência. Con-quanto eu quisesse considerar tudo falso — escreveele na passagem mais célebre da filosofia moderna— era absolutamente necessário que eu, que assimpensava, fosse alguma coisa. Penso, logo existo ”. 3

O SÉCULO DAS LUZES

No século XVIII a França era um país afunda-do em problemas. A monarquia levou o país à miséria,enfrentando sucessivas guerras inúteis que esgotaramos cofres do Estado. Curiosamente, foi em plena cortede Luís XIV que os filósofos encontraram o clima ide-al para aprofundar as novas teorias. O monarca queriamarcar seu nome na história como protetor da arte eda cultura. Permitiu assim o início da renovação dopensamento, que encontraria sua expressão máximana época de Luís XV. No reinado do filho do rei-sol, aParis iluminista se tornou o centro de uma notável pro-dução intelectual, valorizada no início pela própria cor-te, que ouvia extasiada as pregações de Montesquieue outros filósofos.

O Iluminismo tem, nos seus fundamentos, vári-os pontos em comum: busca da felicidade, respeito àsliberdades individuais, abolição dos privilégios de nas-cimento, liberdade econômica e a crítica aos valores daIgreja Católica. No aspecto social embora não tenhanascido no seio da burguesia, o Iluminismo se adequa-va perfeitamente aos interesses burgueses. O ideárioiluminista deu à burguesia o suporte ideológico para aderrubada da ordem absolutista e a construção do capi-talismo moderno.

A obra iluminista mais abrangente foi a Enciclo-pédia das Letras e das Artes. Essa ampla coleção de 35volumes demorou quase duas décadas para ser conclu-ída, contando com a participação de vários intelectuaise pensadores. A Enciclopédia foi organizada por Diderote D’Alembert: o primeiro, político por essência; o se-gundo, filósofo por natureza. Lida por dezenas de pes-soas, que se encantavam com a linguagem fácil e aces-sível, teve a publicação proibida por ordem do rei LuísXV, seguida do confisco de muitos exemplares.

“Penso, logo existo”Rene Descartes

A pintura deDumesnilmostra a rainhaCristina emembros dasua corte,ouvindoDescartes daruma aula de

Filosofia.“Os filósofos se erigiramcomo preceptores do gênero

humano. Liberdade de pensar,eis seu brado, e este brado se

propagou de uma extremidadea outra do mundo”.

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Apesar da França ter sido o berço intelectual do Iluminismo, foi o inglês JohnLocke o autor mais lido da primeira

metade do século XVIII. Seu livro, Tratados sobre oGoverno Civil foi escrito na Inglaterra, em 1689, logoapós a Revolução Gloriosa. Nessa obra, o autor afirmaque o direito de governar é delegado por quem é go-vernado. Em outras palavras, o governo existe porquefoi aceito pelo povo para exercer essa função.

A prioridade do governo deve ser a felicidade eo bem-estar da população. Em caso de transgressão danormalidade institucional defendia o dever do povoderrubar o déspota, substituindo-o por um governoconstitucional. Afirmava que diante do peso insupor-tável da opressão, não há direito divino que sustente ogoverno. Para Locke, não faz sentido a paz e a ordemquando os lobos se impõe aos cordeiros. Cabe entãoao povo julgar o governo dos soberanos e rebelar-se,caso necessário, revogando o contrato político.

O direito e o dever de o povo der-rubar os governantes despóticos tornouLocke o autor preferido dos rebeldes. Suateoria foi a “Bíblia” dos revolucionáriosque enfrentaram a opressão colonial in-glesa e lutaram pela independência dosEUA. O livro Tratados sobre o GovernoCivil inspirou Tomas Jefferson naelaboração da Declaração de Independên-cia dos Estados Unidos. O documento

norte-americano, elaborado em 4 de julho de 1776,sacramentava o direito do povo lutar contra a opres-são. Na França, o livro foi o manual do Século dasLuzes, discutido e debatido por vários intelectuais quenão se contentavam com os postulados políticos deMaquiavel e outros autores da época do absolutismo.

Na opinião de Brian Mage - História da Filoso-fia - Locke tem sido descrito como a primeira mentemoderna. Isso porque reuniu e fundiu numa visão úni-ca algumas das preocupações fundamentais do pen-samento pós-medieval. Parte de sua mensagem básicapoderia ser expressa assim: “Não siga irrefletidamenteas autoridades, sejam elas intelectuais, políticas oureligiosas. Tampouco as tradições ou convenções so-ciais. Pense por simesmo. Examine os fatos e tentebasear sua opinião e seu comportamento nas coisascomo de fato são”.

Os Pensadores

Tratados sobre o Governo CivilJohn Locke

“ Com uma das mãos, osfilósofos tentaram abalar o

trono; com a outra, quiseramderrubar os altares. Sua finali-

dade era modificar nasconsciências as instituições

civis e religiosas e , por assimdizer, a revolução se

processou”. 1

“Em nenhumoutro lugar asconfusões eilusões dalinguagem sãomais aparentes doque no mundo dapolítica, comoretratado nessequadro de Egbertvan Heemskerk - AEleição na sala daGuilda”

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O autor foi considerado o mais radical epolêmico dos autores iluministas. Nolivro Discurso sobre a Origem da De-

sigualdade entre os Homens, derrubava a visão tradi-cional, da pobreza naturalmente predeterminada pelaherança social. Para Rousseau, a miséria decorria daprópria história dos homens, das formas de poder e daconduta dos governantes, do poder despótico e a suaaceitação passiva. Nesse aspecto, ousava mais do queos outros iluministas, combatendo a desigualdade so-cial.

“O primeiro que cercou umterreno, advertindo: ‘Este é meu’, eencontrando gente muito simplesque acreditou, foi o verdadeiro fun-dador da sociedade civil. Que cri-mes, guerras, assassinatos, miséri-as e horrores teria poupado ao gê-

nero humano aquele que tivesse gritado a seus seme-lhantes: ‘Não escutem este impostor; vocês estarãoperdidos se esquecerem que os frutos são de todos,que a terra não é de ninguém’... Desde o instante emque um homem teve necessidade da ajuda de outro,desde que ele percebeu ser conveniente para um só terprovisões para dois, a igualdade desapareceu, a pro-priedade se introduziu, o trabalho tornou-se necessá-rio e as vastas florestas se transformaram em camposrisonhos que passaram a ser regados com o suor doshomens e nos quais vimos então a miséria e a escravi-dão germinarem e crescerem com a colheita”. 7

O Espírito das LeisMontesquieu

A primeira obra de impacto do renomado intelectual francês foi Cartas Persas. Nesse livrode conteúdo atípico, o autor escreve em forma de ficção, descrevendo a perplexidade dedois viajantes orientais que percorrem a Europa na época de apogeu das monarquias

absolutas. No relato aos amigos do Oriente, os viajantes demonstram a decepção diante de um mundosupostamente mais coerente do que as terras do Oriente.

Em seguida publicaria O Espírito das Leis, contrariando asteorias absolutistas. Afirmava que “as leis não são fruto da von-tade pessoal de quem governa, mas da realidade social e históri-ca de cada povo”. Apesar de não se posicionar por uma forma degoverno em especial, demonstrava enorme simpatia pela monar-quia inglesa, implantada na Revolução Gloriosa de 1689 lheinfluenciando na elaboração da teoria do equilíbrio dos poderes.Com efeito, o grande legado de Montesquieu para as geraçõesfuturas, foi a teoria dos três poderes — Executivo, Legislativo eJudiciário, onde cada um exerce a vigilância e fiscalização emrelação aos outros, como forma de coibir eventuais abusos deautoridade.

“O objetivo do governo é o bem estar dos homens. E o queé melhor para eles? Ficar o povo exposto sempre à vontade ili-mitada da tirania, ou os governantes terem algumas vezes desofrer oposição quando exorbitem o uso do poder e o empre-guem para a destruição e não para a preservação das proprie-dades do povo? Mas se há uma persuasão universal baseada emprova manifesta de que estão em marcha certos desígnios contraa liberdade, e o curso geral e tendência dos acontecimentos sópodem levantar fortes suspeitas das más intenções dosgovernantes, quem terá de ser acusado? Quem poderá impedi-lo se os que podiam evitá-lo se deixamficar sob suspeita? Há de se reprovar o povo se tem o senso das criaturas racionais, podendo julgar osfatos somente pela maneira como os constata e os sente?” 6

O pintor barrocofrancês Jean-HonoréFragnardexprimepoderosamenteuma das maisesmagadoraspaixões dohomem - odesejo

O Contrato SocialRousseau

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Rousseau foi o apóstolo dos humildes. Na Re-volução Francesa, sua obra inspirou os jacobinos e asfacções mais ousadas dos “enragés”. Contudo, ao cri-ticar a desigualdade, não propunha explicitamente a des-truição da propriedade como um todo e sim a grandepropriedade remanescente da época feudal. Defendia adivisão dessas terras entre pequenos e médiosproprietários, prenunciando as reformas na agriculturaque seriam realizadas nos países capitalistas. Seusconceitos exerceram grande impacto nos meiosintelectuais que, via de regra, consideravam Rousseauum louco destoante do seu tempo. Foi marginalizado eperseguido pela monarquia francesa e atacado pelospróprios iluministas

“Nasceu livre esse homem, que entretanto, estáa ferros por toda a parte. Renunciar à sua liberdade,não o poderia fazer sem renunciar, ao mesmo tempo, àsua qualidade de homem, aos direitos da humanidadee até aos próprios deveres; isso seria incompatível comsua própria natureza. Portanto, a autoridade políticasó pode assentar legitimamente numa convenção ini-cial. Trata-se do ato pelo qual um povo é povo. Eis overdadeiro fundamento da sociedade política”.

Na obra “ O Contrato Social” defendia a reno-vação periódica do governo através de eleições, combase no sufrágio universal. Considerava que a verda-deira soberania é a que emanava do povo, e a vontadeindividual nunca deve superar o interesse geral danação. O Estado resultante do Contrato Social templenos poderes para governar em benefício da maioria.“Cada um de nós coloca em comum sua pessoa e todasua potência sob a suprema direção da vontade geral;e recebemos em corpo cada membro como parteindivisível do todo.”

“Se a ordem social é para Rousseau um direi-to sagrado que serve de base para todos os direitos,inclusive o da propriedade, ela não se origina, po-rém, na natureza: esta não designou ninguém paradar ordens aos outros, nenhum homem detém uma au-toridade natural sobre seu semelhante; e, por outrolado, a força não produz direito algum o que é umdireito que perece quando a força cessa? Se impõe aobediência pela força, não se tem necessidade de obe-decer por dever. O homem nasce livre; para Rousseau,isso é axiomático. 8

Para os filósofos do iluminismo a natureza eraquase a mesma coisa que a razão. Isto porque, paraeles, a razão era uma dádiva da natureza ao homemem oposição, por exemplo, à igreja ou aos corrompidosmétodos civilizatórios. Enfatizava-se que os povosnaturais eram freqüentemente mais sadios e mais felizesdo que os europeus, exatamente porque não possuíamuma civilização. A palavra de ordem “de volta ànatureza” é de Jean-Jacques Rousseau. Ele dizia que anatureza era boa e que o homem, portanto era natural-mente bom. Todo o mal estava na sociedade civilizada,que afasta o homem da sua natureza. 1

“OHomem

nasceu livre epor todaparte está emgrilhões”

Rousseau

Londres,em 1753

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oO mais importante pensador econômicofoi o inglês Adam Smith. No livro, “ARiqueza das Nações” defendia insis-

tentemente o ideal liberal, condenando com veemên-cia as práticas mercantilistas. Para ele, a tutela do Esta-do na economia, emperra o desenvolvimento e dificultaa expansão do comércio. Achava que o mercado seajustaria pelas leis de oferta e procura, impossibilitan-do a escassez e excesso de produtos. Estudando arealidade inglesa concluiu que a reserva de mão-de-obra era inesgotável o que impedia a escassez da ofertade trabalho.

A concepção econômica de Adam Smith foi in-fluenciada pelo contexto da nascente industrializaçãoinglesa. Em contato com as fábricas, o autor espantou-se com o desenvolvimento e o ritmo de produção daindústria fabril. Desenvolveu então a teoria que a ri-queza de uma nação estava no trabalho e no desen-volvimento da produção. Segundo o autor, o trabalhoespecializado é mais produtivo, pois cada empregadodesenvolve uma função especifica, podendo dedicar-se a especialização e a melhoria da qualidade. O livro“A Riqueza das Nações” é uma das mais importantesobras de economia de todos os tempos. Apesar deAdam Smith revelar certa ingenuidade no ajuste auto-mático da economia, as concepções de liberdade decomércio se tornaram paradigma do capitalismo até osdias atuais.

OS FISIOCRATAS

O Fisiocratismo concebia a agricultura comoprincipal fonte de riqueza de um país. Também não eraà toa, pois os autores fisiocratas viveram na Françaem fins do século XVIII.

Nesse período, a agricultura francesa ainda su-perava a produção de manufaturas. Os fisiocratas eAdam Smith tiveram em comum, a idéia do livre-co-mércio, apelidada pelos franceses de “laissez-faire,laissez-passez”. Mas, ao contrário do autor inglês,Quesnay e Turgot enfatizavam a agricultura como gran-de fonte de riqueza de um país.

“Os fisiocratas partiam do pressuposto que aterra era a única fonte de riqueza, daí a primazia daagricultura sobre o comércio, atividade estéril, que seresumia na troca de mercadorias. Faziam analogia enteo funcionamento do corpo humano e o organismo eco-nômico, ambos regidos por leis naturais: assim como

o coração era o orgão mais importantedo corpo humano, a agricultura o era navida econômica. Negavam, pois, o direitodo Estado de intervir e regulamentar avida econômica, pois, estaria atentandocontra as leis naturais. Nesse sentido cri-ticavam as regulamentaçõesmercantilistas do Estado absoluto e pre-gavam que o Estado deveria apenas limi-tar-se a incentivar o progresso técnico eeconômico, eliminando os obstáculos aolivre jogo da economia.” 10

O DESPOTISMOESCLARECIDO

As teorias iluministas influenciaram, no final doséculo XVIII, o desenvolvimento de uma versão maisamena das monarquias absolutistas, conhecidas comoDespotismo Esclarecido. Essas monarquias se desta-caram pela aplicação de reformas liberais, alterando (umpouco) o perfil de poder ilimitado exercido pelos reis.Frederico II da Prússia, Catarina II da Rússia, MariaTeresa e seu filho Joseph II, na Áustria, José I e Pombalem Portugal, investiram em novas atitudes políticas eeconômicas, tomando como base algumas idéiasiluministas.

A condição de fraqueza dessas monarquias in-centivou a adoção de reformas, visando a ascensão rá-pida dessas nações que não conseguiam competir comFrança, Inglaterra e Holanda. Na Áustria a moderniza-ção atingiu principalmente a administração, estabele-cendo um sistema de governo bastante eficiente. Noplano externo, como não conseguiam anexar os esta-dos alemães, os austríacos voltaram-se para os estadosdo leste, realizando conquistas na região da Boêmia eHungria.

A Riqueza das NaçõesAdam Smith

A eliteretratada emquadro deGainsborough

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oA Prússia, enfatizou mais o aspecto militar, com

a pretensão de ampliar o seu poder. O ataque prussianoa Silésia estendeu o seu território, provocando um au-mento de 50% na sua população, incluindo a nova re-gião anexada. Além do mais, os novos domínios tinhamuma excelente manufatura têxtil, que foi obviamente,explorada pelos prussianos. A obsessão por organizarum exército poderoso fez a monarquia prussianadiminuir o máximo possível, as despesas da corte, ca-nalizando os recursos para o sustento do efetivo mili-tar de 200.000 soldados. Em relação à cultura, Fredericoo Grande, foi muito esperto ao aceitar exilados francesesem sua corte. A tolerância política demonstrada pelomonarca era um marketing positivo que o tornava sim-pático aos investidores e comerciantes burgueses.

A Rússia alcançou destaque no reinado deCatarina a Grande, (1762-1796). Nesse período gran-de número de artistas e pensadores perseguidos encon-traram na tolerância russa, o abrigo seguro para fugirda opressão em seus países. A corte ficou abarrotadade intelectuais, que prestavam inúmeros favores à rai-nha, incluindo o polêmico Rousseau que foi recebidocomo herói.

A rainha Catarina procurou (sem muito suces-so) aproveitar-se da dependência dos ingleses, em re-lação às reservas de ferro do território russo. Com otempo foi obrigada a dobrar-se à superioridade inglesa,aceitando liberar as fronteiras para a entrada de merca-dorias fornecidas pela Inglaterra.

Em Portugal, no período do Marques de Pom-bal, também se fez de tudo para desenvolver a indústria.As medidas se estenderam ao Brasil com a liberação daprodução de manufaturas. Sobre o tema, confira o ca-pítulo de Inconfidência Mineira.

Constata-se então que o Despotismo Esclare-cido, se apoiou no ideal iluminista, mas não conseguiuerguer nações que eram bastante dependentes das na-ções desenvolvidas. No aspecto político, as mudançasforam restritas ao incentivo à cultura e a proteção aosperseguidos. Nesse sentido, pode ser visto comomarketing de boa imagem sem alterar as questões maisprofundas.

A aplicação de medidas modernizantes semprefoi um bom negócio ao longo da história, daí a inten-ção de alterar a aparência sem modificar nada da es-sência. Reformar a estética não significava mudançaem todos níveis. O rei da Prússia acabou com os direi-tos feudais, mas não teve coragem de impor o decretoaos nobres. O José II da Áustria era tido como protetorda arte, até que a Revolução Francesa sacudisse omundo, levando o rei a censurar espetáculos musicaise exibições teatrais que lembrassem os temas revoluci-onários.

2 In. Blitzer, Charles. Op cit. Pág. 106.3 In. Blitzer, Charles. A Era dos Reis. Coleção Time-Life. Pág. 119.5 In. Gaarder Jostein. O Mundo de Sofia. Cia dasLetras. Pág. 338.7 In. Rousseau. Discursos sobre a origem da desi-gualdade. Apud. Chevallier, Jean-Jacques. Históriado Pensamento Político. Editora Zahar. Pág. 149.8 In. Chevallier, Jean-Jacques. História do Pensa-mento Político. Editora Zahar. Pág. 46.9 In. Gaarder Jostein. O Mundo de Sofia. Op. Cit.Pág. 339.10 In. Aquino, Jacques, Denise e Oscar. História dasSociedades. Das sociedades modernas às socieda-des atuais. Editora Ao Livro Técnico. Pág. 123.11 In. Perry, Marwin. Op. Cit. Pág. 415.

A Holanda naépoca doIluminismo.Quadro deJohn Sleen - ACompanhiaMusical