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O ESTADO LAICO BRASILEIRO: teoria e prática Autor: IZAIAS RESPLANDES DE SOUSA Orientador: PROF. MSC. JOSÉ CARLOS IGLESIAS

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O ESTADO LAICO BRASILEIRO: teoria e prática

Autor : IZAIAS RESPLANDES DE SOUSA

Orientador : PROF. MSC. JOSÉ CARLOS IGLESIAS

Problema :

• Queremos explicar porque a laicidade não consegue ter eficácia no Brasil e o que pode ser feito para que isso se torne uma realidade.

• Esse PROBLEMA surgiu de nossas observações e primeiras leituras, quando vislumbramos aparentes contradições entre a teoria e a prática da laicidade no contexto brasileiro, de acordo com o conceito de que um Estado laico é aquele que não sofre a influência de qualquer religião.

• Nesse sentido, nos perguntamos: se o Estado brasileiro é laico, por que admite feriados religiosos, a ostentação de cruzes em cemitérios públicos, crucifixos nos gabinetes e plenários das autoridades, bem como estátuas de santos em espaços públicos?

• Nosso primeiro entendimento era de que essas práticas conflitavam com a teoria da laicidade, implicando na ineficácia das normas constitucionais pertinentes.

• Então decidimos investigar essa questão, porque entendíamos que isso ameaçava a segurança jurídica das relações sociais.

Hipótese

• Nossa hipótese nos dizia que a falta de eficácia social do laicismo no Brasil era decorrente de um descompasso entre a ideologia positivista presente na Constituição e a formação católica do povo brasileiro, cuja solução poderia se dar através da educação do povo, a fim de se conseguir que a Constituição fosse obedecida ou pela aplicação das ações previstas no ordenamento.

Objetivos:

• Então definimos os seguintes objetivos para a pesquisa:– identificar o significado teórico da laicidade;

– entender as razões da ineficácia de sua aplicabilidade na realidade brasileira;

– e, explicar porque a sociedade não se vale dos remédios que a própria Constituição Federal prevê para assegurar que suas normas sejam efetivamente cumpridas.

A pesquisa• A nossa pesquisa abordou os seguintes pontos:

– A ALIANÇA ENTRE O ESTADO E O SAGRADO• A RELIGIÃO• O ESTADO• AS RELAÇÕES ENTRE O ESTADO E O SAGRADO

– A SEPARAÇÃO ENTRE A IGREJA E O ESTADO• A REVOLUÇÃO FRANCESA• O POSITIVISMO• A RELIGIÃO COMO FATOR REAL DE PODER

– A LAICIDADE NO BRASIL• ASPECTOS INTRODUTÓRIOS• A REPRISTINAÇÃO DA LAICIDADE• ASPECTOS ESSENCIAIS DA LAICIDADE

– O instituto da mão-morta– O casamento civil

– A EFICÁCIA DA LAICIDADE

A ALIANÇA ENTRE O ESTADO E O SAGRADO

• Conceituamos religião como o elemento de ligação entre os mundos material e espiritual, ou como diz Santo Agostinho, a cidade dos homens e a cidade de Deus.

• Quanto ao Estado,entendemos que seja a sociedade política, formada pelo conjunto de agrupamentos humanos, com objetivos e vontades comuns, principalmente de defesa interna e externa, garantidor da paz entre todos, mantido por uma parte das liberdades de cada um.

• A aliança entre essas duas instituições remonta aos tempos mais antigos, com o primeiro dando suporte para assegurar a existência e manutenção do segundo.

• Maquiavel afirma que “jamais alguém criou leis extraordinárias em um povo, sem recorrer a Deus, pois se não fosse assim elas não seriam obedecidas”.

• O Direito, portanto, era algo “divino, eterno e imutável”, transmitido aos homens pelos deuses.

• Segundo consta:• Moisés recebeu o Decálogo diretamente

das mãos de Deus;• O Código de Hamurabi, com a legislação

mesopotâmica, teria sido entregue ao Imperador pelo deus Schamasch.

• O Catolicismo, cuja influência constitui o foco desse trabalho, somente se tornou religião oficial do Império Romano após a conversão de Constantino, em decorrência de visões, sonhos e revelações.

• Durante muito tempo essa igreja exerceu as funções judicante e legislativa, editando Bulas e intermediando questões internacionais, como por exemplo a divisão do mundo entre Portugal e Espanha (verdadeiro abuso de poder).

• Contudo, durante a Idade Moderna, esse poder começou a ser questionado por conta de seus abusos e privilégios, denunciados pelos protestantes (a partir de 1516), pela burguesia que tinha dinheiro, mas não tinha direitos e pelos intelectuais iluministas que propunham a explicação das coisas através da razão, em detrimento do espiritual.

• Tudo isso serviu de fundamento para a Revolução Francesa de 1789, a qual assinala o marco divisório entre a Igreja e o Estado.

A SEPARAÇÃO ENTRE A IGREJA E O ESTADO

• Por conta disso, a França, faz então a sua declaração formal como Estado Laico de forma radical, rejeitando toda e qualquer espécie de privilégio e influência do catolicismo. Até o calendário gregoriano foi mudado.

• Em conseqüência de sua laicidade, desapropriou e colocou à venda os bens da Igreja; transformou os clérigos em assalariados do governo; determinou a eleição dos bispos e padres para as paróquias, obrigando-os a jurar a Constituição Civil do Clero que estabelecia essas normas.

• Por outro lado, além da revolução francesa, o positivismo de Augusto Comte também pode ser co-responsabilizado pela separação entre a Igreja e o Estado.

• Para ele, a Revolução Francesa trouxera o caos ao mundo e somente a Filosofia Positiva com seus princípios de ordem, amor e progresso poderia restaurar o estado das coisas.

• O positivismo teve grande aceitação entre a elite brasileira, influenciando a elaboração de nossa legislação laica.

A LAICIDADE NO BRASIL

• A laicidade no Brasil foi introduzida pelo Decreto 119-A, de 7 de janeiro de 1890, o qual ainda está em vigor. Foi revogado pelo Decreto nº 11/1991 e repristinado pelo Decreto nº 4.496/2002.

• Na sua adoção foram considerados os modelos francês e americano, adotando-se as diretrizes desse último, após as gestões da Igreja Católica junto a Rui Barbosa, mentor intelectual dessas medidas.

• Para os americanos perseguidos na Europa, o mais importante era a garantia da liberdade religiosa, pouco se importando que a Igreja tivesse propriedades ou exercesse influências sobre o Estado.

• Dessa forma, a laicidade do Brasil não veda de forma absoluta as relações entre o Estado e a Igreja, admitindo influências.

• Já no preâmbulo da CF/88, os constituintes declararam estar “sob a proteção de Deus”quando de sua promulgação.

• Além disso, o Brasil garante a igualdade formal a todos, a liberdade de consciência e de crença, o livre exercício dos cultos religiosos, a proteção dos locais de culto e de suas liturgias.

• Assegura ainda a prestação de assistência religiosa nos internatos civis e militares e a garantia dos direitos individuais por motivo de crença religiosa.

• De forma mitigada, veda no art. 19, I, da CF/88, a intervenção estatal nos assuntos religiosos não excepcionados pela CF; a adoção de religião oficial e o impedimento do exercício de qualquer uma, bem como as subvenções.

• A imunidade tributária visa justamente não impedir o exercício da liberdade religiosa.

• A mitigação está nas ressalvas estabelecidas. Não haverá vedação quando se tratar da colaboração de interesse publico, como a Educação, Saúde, Assistência Social, etc.

• Outro grande diferencial no modelo de laicidade adotado diz respeito àpropriedade.

• Enquanto a França desapropriou os bens da Igreja, o Brasil concedeu a todas as igrejas e confissões religiosas a personalidade jurídica para adquirir e administrar seus bens na forma da lei

A EFICÁCIA DA LAICIDADE

• Quanto a eficácia, esta pode ser vista sob as óticas técnica, jurídica e social.

• A norma terá EFICÁCIA TÉCNICA quando tiver “aptidão para produzir os efeitos que lhe são próprios”.

• Já a EFICÁCIA SOCIAL nada mais é do que a realização dos efeitos sociais pretendidos pela norma. Conforme o ponto de vista, inclusive o que eu tinha no início da pesquisa, várias das normas referentes àlaicidade não têm conseguido obter eficácia social.

• Todavia, ao estudar o assunto, verificamos que isso acontece porque as partes interessadas não requerem o cumprimento da eficácia jurídica da norma e não porque o Estado não seja laico.

• A EFICÁCIA JURÍDICA é o efeito pretendido pela norma e que pode ser requerido ao Poder Judiciário quando não for alcançado.

• Entendemos que não há normas programáticas na CF. O que há é falta por quem de interesse e de direito para requerer a eficácia jurídica cabível, usando, para tanto as ações que a própria CF estabeleceu, tais como a ADI, a ADPF, a Ação Civil Pública, a Ação Popular, entre outras.

• Dentre as modalidades de eficácia jurídica possíveis, destacam-se: (a) perfeitamente simétrica ou positiva; (b) nulidade; (c) ineficácia; (d) anulabilidade; (e) negativa. (f) vedativa do retrocesso; (g) penalidade; (h) interpretativa, entre outras.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

• Concluímos portanto que a laicidade brasileira seguiu o modelo norte-americano, sendo adaptada à nossa realidade, em função da cultura brasileira, pressupondo uma harmonização com o princípio da liberdade religiosa.

• Sua implantação no Brasil teve mais a pretensão de atender aos anseios da elite liberal e positivista do que os do povo brasileiro. Por isso, ao tempo em que proíbe certas condutas, também admite como ressalvas que elas sejam praticadas quando se tratar de regime de cooperação em questões de interesse público.

• Nossa conclusão é que o não requerimento da eficácia jurídica dessas normas se deve ao fato de que a maioria do povo brasileiro é religiosa e não vê nada de errado em relação à participação e influência da igreja nos negócios do Estado.

• Isso, todavia, não impede que qualquer interessado faça uso dos instrumentos que a própria CF/88 prevê para assegurar a eficácia de suas normas.

• Nesse sentido, o Brasil é um Estado laico, mas com uma laicidade peculiar, caracterizada mais pela proteção à liberdade religiosa do que pela vedação à participação dos diversos credos na vida pública do país. Eis porque são admitidos aos brasileiros que expressem sua fé em qualquer lugar por meio de símbolos, desde que não se perturbe a paz e a ordem pública.

• Essa é a laicidade brasileira.IZAIAS RESPLANDES DE SOUSA