o ensino da botÂnica no nÍvel fundamental: um … · me permitirem aprender tanto. a minha prima...

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UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE CIÊNCIAS CAMPUS DE BAURU PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO PARA A CIÊNCIA Patrícia Gomes Pinheiro da Silva O ENSINO DA BOTÂNICA NO NÍVEL FUNDAMENTAL: UM ENFOQUE NOS PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS Bauru 2008

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  • UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE CINCIAS

    CAMPUS DE BAURU PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM EDUCAO PARA A CINCIA

    Patrcia Gomes Pinheiro da Silva

    O ENSINO DA BOTNICA NO NVEL FUNDAMENTAL: UM

    ENFOQUE NOS PROCEDIMENTOS METODOLGICOS

    Bauru 2008

  • Patrcia Gomes Pinheiro da Silva

    O ENSINO DA BOTNICA NO NVEL FUNDAMENTAL: UM

    ENFOQUE NOS PROCEDIMENTOS METODOLGICOS

    Orientador: Prof. Dr. Osmar Cavassan

    Bauru 2008

    Tese apresentada ao Programa de Ps-Graduao em Educao para a Cincia, rea de Concentrao em Ensino de Cincias, da Faculdade de Cincias da UNESP/Campus de Bauru, como requisito obteno do ttulo de Doutor em Educao para a Cincia.

  • DIVISO TCNICA DE BIBLIOTECA E DOCUMENTAO UNESP BAURU

    Silva, Patrcia Gomes Pinheiro da. O ensino da botnica no nvel fundamental: um enfoque nos procedimentos metodolgicos / Patrcia Gomes Pinheiro da Silva, 2008.

    146 f. il. Orientador: Osmar Cavassan. Tese (Doutorado) Universidade Estadual Paulista. Faculdade de Cincias, Bauru, 2008. 1. Cincia Estudo e ensino. 2. Botnica. 3. Ambientes naturais. 4. Cerrados. I. Universidade Estadual Paulista. Faculdade de Cincias. II.Ti- tulo.

    Ficha catalogrfica elaborada por Maricy Fvaro Braga CRB-8 1.622

  • Patrcia Gomes Pinheiro da Silva

    O ENSINO DA BOTNICA NO NVEL FUNDAMENTAL: UM

    ENFOQUE NOS PROCEDIMENTOS METODOLGICOS

    Tese apresentada ao Programa de Ps-Graduao em Educao para a Cincia, da Faculdade de Cincias, da Universidade Estadual Paulista, Campus de Bauru, para a obteno do ttulo de Doutor em Educao para a Cincia. Banca Examinadora: Presidente: Prof. Dr. Osmar Cavassan Instituio: UNESP/BAURU Titular: Profa. Dra. Elenice Mouro Varanda Instituio: USP/RIBEIRO PRETO Titular: Profa. Dra. Renata Carmo-Oliveira Instituio: UFU/UBERLNDIA Titular: Profa. Dra. Jandira Liria Biscalquini Talamoni Instituio: UNESP/BAURU Titular: Prof. Dr. Fernando Bastos Instituio: UNESP/BAURU

    Bauru, maro de 2008

  • Dedico esta tese a todos que participaram (alunos, professores, monitores...) e que, de alguma forma, modificaram positivamente sua viso em relao botnica e ao ambiente

    natural, no caso especfico deste trabalho, o cerrado.

  • AGRADECIMENTOS

    com muita alegria e satisfao que chego ao final desta tese, pois sei que estes sentimentos no so apenas meus, mas de muitas pessoas e instituies que, nesse perodo de trs anos, participaram de sua elaborao, as quais considero realmente especiais. Meus sinceros agradecimentos: Ao Prof. Dr. Osmar Cavassan, meu querido orientador, por estes 10 ANOS de convivncia e de aprendizado - que se iniciou na graduao, passando pelo mestrado e agora doutorado e pela orientao precisa, confiana, apoio e amizade. Que privilgio poder trabalhar contigo! Aos coordenadores, professores, funcionrios e colegas do curso de mestrado e doutorado da Ps-Graduao em Educao para a Cincia, que conviveram comigo neste perodo, pela troca de experincias, informaes e orientaes. Obrigada Aninha da secretaria....ufah.... A todos do Centro de Divulgao e Memria da Cincia e Tecnologia (CDMCT) pela oportunidade, parceria, convivncia, aprendizado e orientaes: Prof. Dr. Joo Jos Caluzi, Profa. Dra. Ana Maria de Andrade Caldeira, Profa. Dra. Elaine S. N. Nabuco de Arajo e Paola, aluna de graduao e secretria do Centro. direo, coordenao pedaggica, aos professores, funcionrios e queridos alunos de todas as escolas de Bauru e regio que participaram do projeto Passeando e aprendendo no cerrado no perodo de desenvolvimento desta tese, pela confiana em nosso projeto, pelo aprendizado que nos proporcionaram, pelo respeito e carinho que tiveram conosco e pelas brincadeiras, bom humor, alegria e descontrao. Aos monitores e alunos de Graduao - Licenciatura em Cincias Biolgicas da UNESP de Bauru: Roseane, Adriana, Bruna e Talitha pela importantssima participao e apoio e pela convivncia. Aos queridos monitores, estagirios do herbrio UNBA e casal ...hehehe... Job e Mariana - que esto no projeto Passeando e aprendendo no cerrado desde a elaborao desta tese (incio do projeto) e que continuam desenvolvendo as atividades no campo, pelos momentos maravilhosos juntos, pela troca de experincias e informaes, pelo carinho e constante apoio. Profa. Dra. Ana Maria de Andrade Caldeira pela orientao precisa e atenciosa durante o desenvolvimento desta tese e por, junto com a Profa. Dra. Luiza Sumiko Kinoshita, permitirem o aprimoramento deste trabalho atravs de suas sugestes e reflexes no momento da qualificao e agora para a defesa. Profa. Dra. Renata Carmo-Oliveira, Profa. Dra. Elenice Mouro Varanda, ao Prof. Dr. Fernando Bastos e Profa. Dra. Jandira L. Biscalquini Talamoni (Janda) pela ateno e carinho com que tm se comunicado conosco e por terem aceitado fazer parte desta banca de defesa.

  • querida amiga Profa. Dra. Tatiana Seniciato, pela amizade e constante ajuda. Aos professores e funcionrios do Departamento de Educao da UNESP de Bauru e aos meus primeiros alunos de graduao nesta universidade - dos cursos de Licenciatura em Cincias Biolgicas (Didtica das Cincias); Educao Fsica (Filosofia da Educao) e Pedagogia (A Escola: planejamento, organizao e gesto) no segundo semestre de 2007, por me permitirem aprender tanto. A minha prima rica Silveira Campos pela disposio na elaborao das verses em Ingls. s agncias de fomento CAPES e FAPESP pelo apoio financeiro a este trabalho. Ao meu marido Antonio, aos meus pais Edson e Aracy, aos meus irmos Viviane e Gabriel, ao meu cunhado Daniel e aos meus amigos pelo imenso apoio e por tanto amor, acreditando sempre em mim. queles que neste momento fogem a minha memria, mas que, de alguma forma, deram a sua contribuio e fazem parte dessa histria... A Deus, por tudo!

    Obrigada!!!!!!!!!!!!!!!!!

  • SUMRIO

    LISTA DE FIGURAS.............................................................................................................08

    LISTA DE TABELAS............................................................................................................09

    LISTA DE ANEXOS..............................................................................................................10

    INTRODUO GERAL........................................................................................................11

    Referncias...............................................................................................................................14

    CAPTULO 1 - UM HISTRICO DA BOTNICA E AS DIFICULDADES NO ESTUDO DOS VEGETAIS: UMA QUESTO METODOLGICA?.............................15

    Resumo e Abstract..................................................................................................................16

    1 Introduo.............................................................................................................................17

    2 A histria e evoluo do conhecimento botnico e sua utilizao no ensino..................19

    3 Consideraes finais.............................................................................................................29

    Referncias...............................................................................................................................32

    CAPTULO 2 - O AMBIENTE NATURAL COMO UM CONTEXTO EXPERIENCIAL NO ENSINO DE BOTNICA................................................................35

    Resumo e Abstract..................................................................................................................36

    1 Introduo.............................................................................................................................37

    2 Experincia, apresentao, representao e contexto experiencial.................................38

    3 Consideraes finais.............................................................................................................54

    Referncias...............................................................................................................................56

    CAPTULO 3 - PASSEANDO E APRENDENDO NO CERRADO: UMA EXPERINCIA COM ALUNOS E PROFESSORES DO ENSINO FUNDAMENTAL...................................................................................................................58

    Resumo e Abstract..................................................................................................................59

    1 Introduo.............................................................................................................................60

    2 Fundamentao terica.......................................................................................................61

    3 Metodologia..........................................................................................................................64

  • 3.1 O Cerrado, o porqu de sua escolha neste estudo e o CDMCT.........................................66

    4 Resultados e Discusso.........................................................................................................69

    4.1 Avaliao da seqncia das atividades prticas e tericas................................................69

    4.2 A importncia das atividades prticas de campo...............................................................82

    5 Consideraes finais.............................................................................................................85

    Referncias...............................................................................................................................87

    CAPTULO 4 - TENDNCIAS E PERSPECTIVAS PARA O ENSINO DE BOTNICA.............................................................................................................................90

    Resumo e Abstract..................................................................................................................91

    Referncias...............................................................................................................................97

    CONSIDERAES FINAIS GERAIS.................................................................................99

    Referncias.............................................................................................................................103

    ANEXOS................................................................................................................................104

  • LISTA DE FIGURAS

    Figura 1 Procedimentos metodolgicos utilizados pelos professores das turmas participantes da trilha no cerrado (tc teoria/campo; ct campo/teoria; tca teoria/campo/ao) e respectivas porcentagens em relao ao total de alunos envolvidos neste estudo........................................................................................................................................70 Figura 2 Alguns desenhos com caractersticas e elementos do cerrado dos alunos do procedimento tc (teoria/campo)...........................................................................................78-79 Figura 3 Alguns desenhos estereotipados dos alunos do procedimento tc (teoria/campo)...........................................................................................................................79 Figura 4 Alguns desenhos com caractersticas e elementos do cerrado dos alunos do procedimento tca (teoria/campo/ao)......................................................................................79 Figura 5 Alguns desenhos estereotipados dos alunos do procedimento tca (teoria/campo/ao)...................................................................................................................80 Figura 6 Alguns desenhos com caractersticas e elementos do cerrado dos alunos do procedimento ct (campo/teoria)...........................................................................................80-81 Figura 7 Imagem de satlite da Reserva Legal de Bauru....................................................143

    Figura 8 Imagem de satlite da localizao da trilha utilizada na atividade Passeando e aprendendo no cerrado..........................................................................................................143 Figura 9 Imagem da entrada e interior da trilha utilizada na atividade Passeando e aprendendo no cerrado..........................................................................................................144 Figura 10 Imagem de diferentes espcies encontradas na trilha da atividade Passeando e aprendendo no cerrado com seus caules, folhas, flores e frutos............................................144 Figura 11 Imagem dos alunos de cada uma das nove visitas registradas no primeiro semestre de 2006 atividade Passeando e aprendendo no cerrado (1. EMEF Santa Maria/Bauru; 2. EMEF Cnego Anbal Difrncia/Bauru; 3. EE Prof. Sebastio Inoc Assumpo/Arealva; 4. EMEF Cnego Anbal Difrncia/Bauru; 5. EMEF Cnego Anbal Difrncia/Bauru; 6. EE Prof. Sebastio Inoc Assumpo/Arealva; 7. EMEF Nacilda de Campos/Bauru; 8. Colgio Criativo Balo Encantado/Bauru; 9. Colgio Criativo Balo Encantado/Bauru)..................................................................................................................145

    Figura 12 Imagens da interao dos alunos com o ambiente natural e monitores..............145

    Figura 13 Imagem da equipe envolvida na atividade Passeando e aprendendo no cerrado (1. esq. para dir. Rosiane de Andrade Severo, Talitha Plcido Palhaci, Mariana Ninno Rissi, Adriana Giselle Guimares e Job Antonio Garcia Ribeiro; 2. esq. para dir. Osmar Cavassan, Patrcia G. Pinheiro da Silva, Job Antonio Garcia Ribeiro, Talitha Plcido Palhaci e Bruna Barros Bighetti).......................................................................................................................146

  • LISTA DE TABELAS

    Tabela 1 Justificativas positivas dos alunos referentes questo: O que voc achou da atividade no cerrado?, distribudas em categorias a partir dos diferentes procedimentos (tc teoria/campo; ct campo/teoria; tca teoria/campo/ao)........................................................71

    Tabela 2 Respostas dos alunos questo: A atividade no cerrado o ajudou a entender melhor o tema estudado na escola?, distribudas em categorias a partir dos diferentes procedimentos (tc teoria/campo; ct campo/teoria; tca teoria/campo/ao)......................72

    Tabela 3 Respostas dos alunos, justificando a importncia da atividade no cerrado para entender melhor o tema estudado na escola, distribudas em categorias a partir dos diferentes procedimentos (tc teoria/campo; ct campo/teoria; tca teoria/campo/ao)......................73

    Tabela 4 Respostas dos alunos questo: Se voc pudesse escolher entre: ter aula na escola e depois fazer uma atividade prtica OU fazer uma atividade prtica e depois ter aula na escola, o que preferiria? Como acha que seria melhor para entender o tema estudado?, distribudas em categorias a partir dos diferentes procedimentos (tc teoria/campo; ct campo/teoria; tca teoria/campo/ao)....................................................................................74

    Tabela 5 Respostas dos alunos, justificando a preferncia por ter aula na escola e depois fazer uma atividade prtica, distribudas em categorias a partir dos diferentes procedimentos (tc teoria/campo; ct campo/teoria; tca teoria/campo/ao)...............................................75

    Tabela 6 Respostas dos alunos, justificando a preferncia por fazer uma atividade prtica e depois ter aula na escola, distribudas em categorias a partir dos diferentes procedimentos (tc teoria/campo; ct campo/teoria; tca teoria/campo/ao).......................................................76

    Tabela 7 Respostas dos alunos questo: Qual dessas opes (aula na escola e depois atividade prtica/atividade prtica e depois aula na escola) seus professores costumam usar?, distribudas em categorias a partir dos diferentes procedimentos (tc teoria/campo; ct campo/teoria; tca teoria/campo/ao)....................................................................................76

    Tabela 8 Caractersticas dos desenhos dos alunos distribudos em categorias a partir dos diferentes procedimentos (tc teoria/campo; ct campo/teoria; tca teoria/campo/ao)....78

    Tabela 9 Organizao das falas dos alunos durante as atividades prticas no campo no que se refere s categorias: comparao, relao com aulas anteriores, relao com conhecimentos prvios, levantamento de hipteses e estabelecimento de concluses (ainda que parciais); segundo os diferentes procedimentos utilizados pelos professores (tc teoria/campo; ct campo/teoria; tca teoria/campo/ao).....................................................................................84

  • LISTA DE ANEXOS

    Anexo 1 FOLDER DE DIVULGAO da atividade Passeando e aprendendo no cerrado...................................................................................................................................105

    Anexo 2 GUIA DA TRILHA, utilizado pelos alunos na atividade Passeando e aprendendo no cerrado..............................................................................................................................106

    Anexo 3 QUESTIONRIO (P) respondido pelos professores ao inscrever suas turmas na atividade Passeando e aprendendo no cerrado....................................................................108

    Anexo 4 QUESTIONRIO (A) respondido pelos alunos ao final dos trabalhos..............109

    Anexo 5 FICHAS DE DADOS das turmas envolvidas neste estudo e DIRIO DE CAMPO..................................................................................................................................110

    Anexo 6 - IMAGENS DA TRILHA, DOS ALUNOS E EQUIPE envolvida na atividade Passeando e aprendendo no cerrado....................................................................................143

  • 11

    INTRODUO GERAL

    Esta tese apresentada como um aprofundamento de alguns temas discutidos em

    minha dissertao de mestrado, levando em conta concluses tais como: a possibilidade de

    um ensino com limitaes e distores durante as aulas tericas utilizando como nico

    recurso o livro didtico; a observao de maiores distores e limitaes quando se realiza

    primeiro uma aula terica e depois uma aula prtica no campo, assim como uma maior

    eficincia no processo de ensino e aprendizagem de morfologia vegetal, quando a aula prtica

    de campo feita antes da aula terica em sala de aula (maior motivao, envolvimento nas

    atividades e compreenso das caractersticas trabalhadas); a necessidade de ateno em

    relao aos textos e imagens presentes nos livros didticos, principalmente quando o tema

    trabalhado refere-se aos vegetais; o reconhecimento de que a variedade de cores, formas,

    texturas, tamanhos e diversidade de espcies so caractersticas evidenciadas durante o

    trabalho prtico de campo, sendo impossvel tais observaes em sala de aula, inclusive tendo

    como nico recurso o livro didtico (PINHEIRO da SILVA, 2004).

    Assim como foi feito no mestrado, o incio de toda pesquisa se d a partir da busca de

    referenciais que lhe do suporte e a acompanham em todas as fases de sua elaborao, seja

    para fundamentar as idias ali contidas, ou para preparar o pesquisador que procura um

    contato com a situao atual em que se encontram as discusses na rea, no caso desta tese, o

    ensino de botnica e a utilizao de aulas prticas de campo.

    Atravs da leitura de trabalhos sobre o tema e da busca por uma atualizao e

    aprofundamento neste sentido que foi possvel delimitar o foco e objetivos desta pesquisa de

    doutorado. Destacam-se, na seqncia, alguns trabalhos j realizados na rea e que trazem

    contribuies importantes, lanando discusses sobre o ensino de cincias e de botnica.

    Martins e Braga (1999) e Moura e Vale (2001), estudando a opinio dos alunos sobre

    as metodologias de ensino adotadas por seus professores, verificaram a necessidade de

    mudanas enfatizando, inclusive, a importncia da realizao de aulas prticas. Segundo estes

    autores, os alunos esperam por uma aula desafiadora e interessante.

    importante enfatizar tambm a necessidade de se trabalhar a biologia vegetal, uma

    vez que alunos dos diferentes nveis de ensino e de diferentes idades vm demonstrando

    pouca atrao pelo tema. Experincias em programas de formao continuada de professores

    de cincias e biologia revelam uma preferncia por parte dos professores em priorizar certos

    temas em sala de aula, deixando aqueles referentes biologia vegetal para as etapas finais

  • 12

    (MARTINS e BRAGA, 1999), sendo estes abordados de forma superficial, rpida e por meio

    da memorizao de termos especficos.

    Tratando-se do estudo dos vegetais e da importncia de aulas prticas de campo, os

    Parmetros Curriculares Nacionais para as cincias naturais especificam que o contato dos

    alunos com a diversidade dos seres vivos, baseado unicamente nas descries morfolgicas e

    fisiolgicas de grupos biolgicos, pode ser desastroso, chegando a desenvolver repdio a todo

    este conhecimento e desvalorizando as reais curiosidades acerca dos ambientes e seres vivos

    (BRASIL, 1998).

    Pegoraro et al. (2002) colocam que argumentos sobre a importncia das atividades de

    campo, enquanto instrumentos no processo de ensino e aprendizagem, podem ser encontrados

    dispersos em publicaes relacionadas aos diferentes perodos de nossa histria educacional.

    Com efeito, aulas de campo voltadas para conceitos e contedos especficos de algumas

    disciplinas como a biologia, associadas a atividades de estudo do meio, tendem a gerar

    interesse crescente para essa modalidade de atividade educativa.

    As aulas prticas de campo permitem o desenvolvimento, no aluno, da ateno em

    relao diversidade da natureza, facilitando a observao e comparao, as quais, segundo

    Ferrara (2001), orientam o desenvolvimento da ateno. Sons, texturas, paladares, cheiros,

    cores so possibilidades de identificao do universo. Para a autora: A observao uma

    condio e uma atitude de conhecimento que dirige nosso modo de ver e, principalmente,

    nosso relacionamento com tudo o que nos envolve (FERRARA, 2001, p. 34).

    Enfim, muitos so os trabalhos de pesquisa que analisam procedimentos

    metodolgicos considerados adequados e inadequados no estudo de diferentes temas. Poucos

    so aqueles que os analisam ao trabalhar a botnica.

    Muitos so os trabalhos de pesquisa que defendem a importncia da realizao de

    aulas prticas de campo como atividade complementar no processo de ensino e aprendizagem,

    como bem define Pegoraro et al. (2002), j citado nesta introduo. Poucos so aqueles que

    discutem como realiz-las ao desenvolver o estudo dos vegetais. Difcil, ainda, encontrar

    trabalhos que avaliem a ordem de realizao destas atividades prticas e de campo antes ou

    depois de aulas tericas referentes ao estudo dos vegetais?

    Buscando, portanto, um maior aprofundamento a respeito desta situao que este

    trabalho tem como objetivo geral estudar a situao atual do ensino de botnica no nvel

    fundamental, considerando-se os procedimentos metodolgicos utilizados. Para isso, ser

    adotada aqui uma viso ampla, envolvendo o passado, o presente e o futuro.

  • 13

    Para tanto, quatro objetivos especficos so apresentados, cada qual compondo um

    captulo da tese aqui proposta. O primeiro captulo Um histrico da botnica e as

    dificuldades no estudo dos vegetais: uma questo metodolgica? discute as situaes que

    contriburam para reforar a falta de motivao em se estudar botnica, conforme traduzido

    por Nogueira (1997, p. 248): O ensino de botnica [...] considerado pelos professores e

    alunos uma dificuldade quanto ao processo ensino-aprendizagem. Dificuldade esta

    evidenciada pelo pouco interesse e baixo rendimento neste contedo.

    Para isso fez-se uma reviso terica e histrica sobre o desenvolvimento do estudo dos

    vegetais, tanto em relao aos interesses, contedos e sua organizao como quanto ao

    trabalho desenvolvido pelos professores junto aos alunos em sala de aula, caracterizado pelos

    procedimentos metodolgicos e materiais utilizados no ensino deste tema.

    O segundo captulo O ambiente natural como um contexto experiencial no ensino

    de botnica busca, nas idias de John Dewey, organizadas a partir do conceito de

    experincia, uma fundamentao terica s discusses atuais sobre o ensino da botnica e a

    utilizao de ambientes naturais no estudo deste tema. Assim, uma reviso foi realizada, tanto

    dentro da prpria obra de Dewey, como a partir de autores que a discutem, de tal forma que

    pudesse contribuir para a discusso do tema em questo.

    Com os objetivos de: avaliar atividades prticas de campo desenvolvidas em um

    fragmento de cerrado existente no cmpus de Bauru da UNESP, no estudo de sua

    biodiversidade vegetal, a partir das opinies de professores e alunos; analisar os diferentes

    procedimentos metodolgicos utilizados pelos professores envolvidos nas atividades prticas

    de campo ao trabalhar temas relacionados biodiversidade vegetal do cerrado e comparar a

    utilizao de atividades prticas de campo e tericas em seqncias distintas que foi

    elaborada a atividade Passeando e aprendendo no cerrado, descrita no terceiro captulo

    desta tese - Passeando e aprendendo no cerrado: uma experincia com alunos e

    professores do ensino fundamental.

    O quarto e ltimo captulo traz discusses a respeito das Tendncias e perspectivas

    para o ensino de botnica apresentando, frente s questes ambientais atuais e aos

    referenciais pesquisados, quais as possveis inclinaes e expectativas para o ensino de

    botnica.

  • 14

    Referncias

    BRASIL. Secretaria de Educao Fundamental. Parmetros Curriculares Nacionais: cincias naturais. Braslia: MEC/SEF, 1998. 138 p. (terceiro e quarto ciclos do ensino fundamental).

    FERRARA, L. DA. Leitura sem palavras. So Paulo: tica, 2001. 72 p. (Srie Princpios).

    MARTINS, C. M. C.; BRAGA, S. A. M. As idias dos estudantes, o ensino de biologia vegetal e o vestibular da UFMG. In: ENCONTRO NACIONAL DE PESQUISA EM EDUCAO EM CINCIAS, 2., 1999, Valinhos. Atas... So Paulo: ABRAPEC, 1999. 1 CD - ROM.

    MOURA, G. R. S.; VALE, J. M. F. O ensino de Cincias na 5 e na 6 sries da Escola Fundamental. Educao em cincias: da pesquisa prtica docente, So Paulo, n. 3, p. 135-143, 2001.

    NOGUEIRA, A. C. de O. Cartilha em quadrinhos: um recurso dinmico para se ensinar botnica. In: ENCONTRO PERSPECTIVAS DO ENSINO DE BIOLOGIA, 6., 1997, So Paulo. Coletnea... So Paulo: USP, 1997. p. 248-249.

    PEGORARO, J. L.; OLIVEIRA, H. T.; SORRENTINO, M. Atividades de Campo a partir de escolas da regio de Campinas-SP. In: ENCONTRO PERSPECTIVAS DO ENSINO DE BIOLOGIA, 8., 2002, So Paulo. Atas...So Paulo: FEUSP, 2002. 1 CD - ROM.

    PINHEIRO da SILVA, P. G. As ilustraes botnicas presentes nos livros didticos de cincias: da representao impressa realidade. 2004. 189 p. Dissertao (Mestrado em Educao para a Cincia) Faculdade de Cincias da Universidade Estadual Paulista Jlio de Mesquita Filho, Bauru, 2004.

  • 15

    CAPTULO 1 _____________________________

    UM HISTRICO DA BOTNICA E AS DIFICULDADES NO ESTUDO DOS

    VEGETAIS: UMA QUESTO METODOLGICA?

    Patrcia Gomes Pinheiro da Silva e Osmar Cavassan

    Baseado no formato geral de artigo.

  • 16

    UM HISTRICO DA BOTNICA E AS DIFICULDADES NO ESTUDO DOS

    VEGETAIS: UMA QUESTO METODOLGICA?

    AN OVERVIEW OF BOTANY AND THE CHALLENGES IN THE STUDY OF

    PLANTS: A METHODOLOGICAL MATTER?

    Resumo: So freqentes os textos que consideram que a botnica apresenta grande dificuldade no seu processo de ensino e aprendizagem, gerando pouco interesse e baixo rendimento. Mas, por qu? Quais situaes contribuem para reforar esta afirmao? A partir de uma reviso terica e histrica sobre o desenvolvimento do estudo dos vegetais, possvel dizer que uma delas seria a falta de atualizao do professor em relao ao conhecimento botnico, cada vez mais especfico. Outra situao, conseqentemente, seria a forma como a botnica vem sendo ensinada: muito terica, desestimulante, fundamentada na reproduo, repetio e fragmentao e distante da realidade dos alunos e dos problemas ambientais atuais. Percebe-se, enfim, a questo metodolgica como central no processo de ensino e aprendizagem de botnica, dificultando o entendimento e criando averses quando no adequada. Segundo estudos recentes, importante que os alunos tenham contato com os vegetais na natureza, aproximando-se do ambiente natural.

    Palavras-chave: Ensino de cincias; Botnica; Metodologia de ensino; Ambientes naturais.

    Abstract: Many papers hold the view that botany poses great challenge in its teaching and learning process, arising little interest and resulting in poor productivity. What factors account for this? Based on a historical and theoretical review on the development of the study of plants, it is possible to say that one of these factors is the lack of teachers with an updated knowledge in this increasingly specific field. Another factor is the method applied in the teaching/learning process: too theoretical, unexciting, based on reproduction, repetition and fragmentation, distant from todays reality and environmental problems. This inadequate method makes difficult for students to understand Botany, in some cases leading to aversion. Therefore, the methodological matter becomes the center of the debate concerning the teaching/learning process of the study of plants. According to recent research, it is essential that students come into contact with plants within their natural environment.

    Keywords: Science teaching; Botany; Teaching methodology; Natural environment.

  • 17

    1 Introduo

    Las plantas parecen haber sido sembradas con profusin sobre la tierra, como las estrellas en el cielo, para invitar al hombre mediante el acicate del placer y de la curiosidad, al estudio de la naturaleza; pero los astros estn colocados lejos de nosotros; se precisan conocimientos preliminares, instrumentos, mquinas, largusimas escalas para alcanzarlas y colocarlos a nuestro alcance. Las plantas lo estn naturalmente. Nacen bajo nuestros pies y en nuestras manos, por as decir, y si la pequeez de sus partes esenciales las hurta algunas veces a la simple vista, los instrumentos que las vuelven visibles son de eso ms fcil que los de la astronoma. La botnica es el estudio de un ocioso y perezoso solitario: un pico y una lupa son todo el instrumental de que ha de menester para observarlas (ROUSSEAU, 2006, p. 42).

    Neste trecho extrado do livro Sueos de un paseante solitario, escrito por Rousseau

    no sculo XVIII, dois fatores merecem destaque: o interesse pela botnica existente neste

    sculo e a comparao feita pelo autor entre a complexidade do estudo da astronomia e a

    simplicidade do estudo da botnica, no que se refere distncia e proximidade do homem,

    respectivamente.

    interessante notar, atravs da leitura desta obra, o envolvimento de Rousseau com a

    botnica de forma sensvel e romntica quando, no contexto da poca, seu estudo tinha por

    principal finalidade a busca de drogas e remdios para a medicina.

    Em se tratando da distncia dos astros e da proximidade das plantas em relao ao

    homem, traduzida na botnica pela necessidade de instrumentos bem menos complexos e

    desenvolvida de forma ociosa, pode-se dizer que por um longo perodo de tempo esta foi, de

    fato, a realidade do estudo da botnica.

    Mas, com o passar dos tempos, este estudo foi se tornando cada vez mais especfico,

    chegando ao ponto de, assim como a astronomia, necessitar sim de conhecimentos

    preliminares, instrumentos e largussimas escalas para alcanar os vegetais e coloc-los ao

    nosso alcance. Portanto, ... un pico e una lupa... j no so mais suficientes.

    Atualmente, nesta rea, as informaes so tantas e cada vez mais complexas,

    acompanhando o rpido desenvolvimento tecnolgico, que as dificuldades de transposio da

    pesquisa para a realidade escolar so visveis. Com isso, o distanciamento entre o pesquisador

    e o professor pode refletir diretamente nas escolas, sendo traduzido em seus objetivos e

    formas de ensinar ou metodologia adotada pelo professor. Em conseqncia disso, pode

    criar entre professores e alunos certo repdio ao estudo dos vegetais quando da utilizao de

    listas de nomes cientficos e descries de conceitos e estruturas.

  • 18

    Joly (1976) coloca ao professor que jamais tente desenvolver o estudo da classificao

    das plantas sem recorrer a exemplares vivos, isto , natureza. Em hiptese alguma os

    ensinamentos tericos indispensveis devem ser ministrados sem a correspondente aula

    prtica, pois, para o autor, s esta pode levar o aluno a fixar as caractersticas mais

    importantes de cada grupo.

    Benetti e Carvalho (2002), ao trabalhar com depoimentos dos professores sobre a

    temtica ambiental e os procedimentos didticos, evidenciam que os prprios professores

    consideram o trabalho em sala de aula rotineiro e desestimulante. Por outro lado, para estes

    professores, o trabalho fora da sala de aula considerado dinmico e atraente, embora a aula

    expositiva seja, assumidamente, um dos recursos mais utilizados por eles.

    A utilizao de diferentes procedimentos de ensino pode fomentar uma atitude

    reflexiva por parte do aluno, na medida em que oferea a este oportunidades de participao,

    nas quais vivencie uma variedade de experincias, seja solicitado a tomar decises, fazer

    julgamentos e chegar a concluses. Cabe ao professor a responsabilidade de articular as

    diferentes modalidades didticas para que tais objetivos possam ser alcanados (BENETTI e

    CARVALHO, 2002).

    A vivncia do aluno no ambiente natural pode ser interessante, tambm, para que este

    no crie ou desmistifique concepes distorcidas da realidade, inclusive quanto prpria

    concepo de ambiente natural ou floresta. Segundo John (2006), embora fique no Brasil a

    maior floresta tropical do planeta, poucos so os brasileiros que sabem que l no vive o rei

    leo, nem a esperta raposa, nem ursos ladres de comida, todos personagens de filmes, games

    e livros, que contam a um pblico cada vez mais urbano sua verso da vida na natureza.

    Tendo conscincia deste contexto, de certo modo desfavorvel ao estudo dos vegetais,

    que este captulo tem como objetivo discutir as situaes que contriburam para reforar a

    falta de motivao em se estudar botnica, conforme traduzido por Nogueira (1997, p. 248):

    O ensino de botnica [...] considerado pelos professores e alunos uma dificuldade quanto

    ao processo ensino-aprendizagem. Dificuldade esta evidenciada pelo pouco interesse e baixo

    rendimento neste contedo.

    Para isso fez-se uma reviso terica e histrica sobre o desenvolvimento do estudo dos

    vegetais, tanto em relao aos interesses, contedos e sua organizao como quanto ao

    trabalho desenvolvido pelos professores junto aos alunos em sala de aula, caracterizado pelos

    procedimentos metodolgicos e materiais utilizados no ensino deste tema.

  • 19

    2 A histria e evoluo do conhecimento botnico e sua utilizao no ensino

    Encontra-se em Furon et al. (1959) que o estudo das plantas to velho quanto a

    humanidade, pelo fato do homem viver parcialmente da coleta. Nota-se que os conhecimentos

    tericos atuais vm de um processo prtico muito intenso, da busca por vegetais utilizveis

    para a alimentao, para a cura de doenas, para a elaborao de vestimentas, armas,

    ferramentas etc. Os chineses so, sem dvida, os povos que, na antiguidade (h vrios

    milnios da era crist), cultivaram o maior nmero de plantas, elaborando verdadeiros

    tratados sobre a utilizao de plantas medicinais na cura das mais diversas doenas.

    No mundo greco-romano, a botnica caiu na mo dos agricultores e farmacologistas,

    os quais colhiam vegetais para uso medicinal, deixando descries de plantas com grande

    preciso. Alguns deixaram, at mesmo, ilustraes de cada uma das plantas descritas e seus

    trabalhos nos fornecem informaes preciosas sobre a vegetao e sobre as formas de cultura

    conhecidas pelos antigos (BEAUJEU, 1959).

    Por meio dessa leitura sobre a histria geral das cincias, especificamente quanto

    cincia antiga e medieval (STRESSER-PAN et al., 1959), pode-se inferir que, no campo do

    mundo vegetal, os povos existentes na Amrica Pr-Colombiana possuam conhecimentos

    prticos nada desprezveis. Como colocam os autores, Seria vo atribuir uma atividade

    cientfica a todos esses grupos humanos, pois a imensa maioria orientava suas preocupaes

    de ordem intelectual mais no sentido dos problemas tcnicos ou religiosos (p. 11).

    Em relao ao conhecimento e utilizao do mundo vivo, observou-se que os ndios

    da Amrica, bem antes da era crist, j mostravam suas aptides de observadores e

    experimentadores, iniciadas pela domesticao de plantas selvagens como a batata, o milho, a

    mandioca, o feijo, o tomate, o abacaxi etc. A partir da, deve-se acentuar tambm a riqueza

    de seus conhecimentos mdicos, tendo como conseqncia a utilizao de remdios vegetais.

    Alm disso, objetos necessrios ao dia-a-dia desses povos como arcos, flechas, seringas,

    baquetas, bolsas etc., tambm foram criados a partir dos vegetais (STRESSER-PAN et al.,

    1959).

    Estudando-se a cincia rabe no campo da botnica (STRESSER-PAN et al., 1959),

    pode-se perceber que suas obras so simples coletneas de maravilhas da natureza, nas

    quais o lendrio e o fantstico se mesclam com o real. As cincias naturais constituem, entre

    os rabes e tambm entre os povos bizantinos, cincias auxiliares da agricultura e da

    medicina, imprimindo-lhes um cunho utilitrio e prtico.

  • 20

    No livro El hombre y la naturaleza en el renascimiento escrito por Debus (1996),

    encontra-se que, ainda que o conhecimento das propriedades medicinais das plantas tenha sua

    origem em pocas muito remotas, o estudo da botnica, propriamente dita, no era parte

    importante da filosofia natural da antiguidade. Dos escritos botnicos de Aristteles

    conservaram-se apenas alguns fragmentos, o que indica o carter abstrato de seus interesses.

    Somente Teofrasto (sculo IV a.C.) foi quem comps uma obra que tratava do surgimento das

    plantas (Sobre a histria das plantas e Sobre as causas das plantas), o que ia contra os

    interesses da poca, representados pela identificao de espcies e seu uso na medicina e

    agricultura. No sculo I da era crist, Discrides elaborou um tratado no qual descreveu as

    propriedades medicinais de aproximadamente 600 plantas.

    Em se tratando especificamente de Brasil, encontra-se em Ferri (1980) que a botnica

    iniciou-se realmente com os indgenas (perodo pr-cabralino), os quais tinham bons

    conhecimentos botnicos, logicamente empricos ou pr-cientficos:

    Para nutrir-se, o ndio devia encontrar, alm de caa, razes, frutos e sementes de certas plantas que no podiam ser confundidas com outras. Quando ia caa levava arco e flecha, esta s vezes envenenada com substncias extradas de determinadas plantas. [...] Para pescar, o ndio muitas vezes usava timb para envenenar as guas e recolher os peixes que quisesse, com a mxima facilidade. A habitao indgena era feita de materiais de origem vegetal. [...] claro, pois, que o indgena brasileiro j dispunha de uma cultura botnica baseada em observaes que pouco a pouco acumulara e que era transmitida oralmente, de gerao a gerao (FERRI, 1980, p. 80-81).

    A partir da segunda metade do sculo XVIII, o incio das especializaes nas cincias

    comeava vagarosamente a substituir a figura dos naturalistas polmatas, ou seja, estudiosos

    com bons conhecimentos e prtica em vrias cincias, por cientistas com conhecimentos mais

    aprofundados em uma ou duas reas (SANTOS, 2006).

    Segundo Coutinho (1976), um dos vocbulos mais freqentemente usados a partir da

    segunda metade do sculo XX , sem dvida, Cincia. Mas quais os reais significados de

    Cincia, cientfico, cientista? Para alguns esses termos representam algo de mgico, de

    fabuloso e incrvel, sempre ligados a complicadssimas frmulas matemticas, a complexos

    aparelhos cheios de lmpadas que acendem e apagam intermitentemente e a exticos frascos

    de vidro onde borbulham solues coloridas e esfumaantes.

    Se procurarmos as origens da Cincia no passado, veremos que seu bero foi a magia.

    Por algum tempo, a magia, a superstio e o misticismo dominaram o saber humano. Na era

    medieval, os magos, os feiticeiros, os alquimistas eram indivduos considerados capazes de

    predizer o futuro, de lanar pragas, de fabricar ouro, enfim, de controlar os fenmenos

  • 21

    naturais. O ponto fraco da magia era que ela geralmente no funcionava. A Cincia nasceu

    quando o homem comeou a procurar outras razes para explicar os fatos. Assim, com

    exceo das cincias abstratas, as demais cincias ditas concretas tm sua base assentada

    sobre o mtodo cientfico. Esto entre elas a fsica, a qumica, a botnica, a zoologia

    (COUTINHO, 1976). Destaca-se aqui a botnica: Cincia que tem por objeto o estudo dos

    vegetais (FERREIRA, 2002, p. 106).

    Em se tratando dos vegetais, muito embora para um leigo os termos floresta, flor,

    raiz etc. tenham um sentido extremamente unitrio podemos, por meio da observao mais

    acurada descobrir, naquilo que aquelas palavras representam, uma grande complexidade de

    estrutura e organizao. O que parece to simples para o leigo, de grande complexidade para

    o botnico (COUTINHO, 1976).

    Raven et al. (2007, p. 10-11) destacam que o estudo dos vegetais foi realizado por

    milhares de anos, tornando-se diversificado e especializado somente durante o sculo XX,

    como todas as reas cientficas. At o final do sculo XIX, a botnica era um ramo da

    medicina. Hoje em dia, contudo, a biologia vegetal uma disciplina cientfica importante e

    com muitas subdivises:

    [...] fisiologia vegetal, que o estudo de como funcionam as plantas, isto , como elas capturam e transformam a energia e como elas crescem e se desenvolvem; morfologia vegetal, que o estudo da forma das plantas; anatomia vegetal, que o estudo da estrutura interna das plantas; taxonomia e sistemtica vegetal, estudo que envolve a nomenclatura e a classificao das plantas e o estudo de suas relaes entre si; citologia vegetal, o estudo da estrutura, funo e histrias de vida das clulas dos vegetais; genmica e engenharia gentica vegetal, que a manipulao de genes para o melhoramento de certas caractersticas dos vegetais; biologia molecular vegetal, que o estudo da estrutura e funo das molculas biolgicas; botnica econmica, o estudo dos usos passados, presentes e futuros das plantas pela humanidade; etnobotnica, o estudo dos usos das plantas com propsitos medicinais, entre outros, por populaes indgenas; ecologia vegetal, que o estudo das relaes entre os organismos e seu ambiente; e paleobotnica, que o estudo da biologia e evoluo de plantas fsseis.

    O Homem classifica as plantas desde tempos remotos (DAMIO FILHO, 1993). No

    incio, as classificaes eram relacionadas com suas necessidades, sendo algumas plantas

    classificadas intuitivamente como vitais (alimento, remdio, vesturio, moradia etc.),

    enquanto outras representavam perigo, por conterem princpios txicos. Havia, ainda, aquelas

    plantas que eram utilizadas nos ritos religiosos, por serem alucingenas.

    Com o desenvolvimento da curiosidade intelectual, os esforos do Homem voltaram-

    se para a classificao das plantas em sistemas baseados nas semelhanas existentes entre

    elas, originando grandes grupos vegetais. Gradualmente, com o aperfeioamento das idias,

  • 22

    os sistemas de classificao dos indivduos passaram a se basear em suas descendncias de

    ancestrais comuns. Pode-se dizer que existem vrios sistemas de classificao de plantas,

    sendo que os mais recentes consideram os aspectos citolgicos, bioqumicos, morfolgicos e

    anatmicos das plantas, ordenando-as em categorias taxonmicas (do grego txis ordem,

    arranjo e nomos lei, norma) (DAMIO FILHO, 1993).

    Antigamente, todos os organismos eram considerados como plantas ou animais, e os

    organismos microscpicos eram designados ao reino vegetal ou ao reino animal, na medida

    em que eram descobertos. Os fungos foram considerados como vegetais, provavelmente

    porque apresentam tambm clulas com paredes celulsicas e porque a maioria deles no se

    move, lembrando mais as plantas do que os animais. Assim, devido s caractersticas nicas

    das plantas organismos multicelulares, terrestres e fotossintetizantes elas so reconhecidas

    como um reino parte, mas com uma definio bem mais restrita do que foi tradicionalmente

    no passado (RAVEN et al., 1996).

    Para Raven et al. (1996 e 2007), tanto as plantas como as bactrias, vrus, fungos e

    protistas autotrficos (algas) foram estudados por botnicos. Somente os animais que foram

    domnio dos zologos. Conseqentemente, apesar de no considerarmos algas, fungos,

    bactrias ou vrus como plantas e nem nos referirmos a eles como plantas, acreditamos que

    estes devem ser includos nesta discusso por tradio e porque so, normalmente,

    considerados como parte do currculo da rea de botnica.

    Segundo Joly (1976), a sistemtica ocupa um ponto culminante dentro da Cincia

    Botnica, pois para ela que convergem as informaes provenientes de outros ramos da

    botnica e de vrias outras cincias afins em um esforo conjugado, visando a uma melhor

    compreenso e melhoria do atual sistema de classificao. Esta , por excelncia, uma

    cincia de sntese e de organizao (p. 3).

    De acordo com os princpios da sistemtica ou taxonomia:

    [...] todas as plantas pertencem a uma dada espcie, estas so reunidas em gneros, estes, agrupados em famlias, estas, por sua vez, em ordens, que esto dispostas em classes e assim por diante. Cabe ao taxonomista classificar seu espcimem segundo estes princpios, adotando, em geral, um dos sistemas de classificao existentes (JOLY, 1976, p. 4).

    Barroso (1978) acrescenta:

    Muitos botnicos consideram sinnimos os termos sistemtica e taxonomia; outros, porm, reservam a designao Taxonomia para a cincia que elabora as leis da

  • 23

    classificao e Sistemtica para a que cuida da classificao dos seres vivos, cincia baseada, fundamentalmente, na morfologia (p. 3).

    No conceito antigo, a sistemtica era uma cincia que se restringia ao estudo de

    fragmentos de plantas, devidamente etiquetados e conservados em um herbrio, baseando-se

    em um estudo morfolgico desses espcimes. J a sistemtica moderna tanto estuda o

    comportamento da planta na natureza, como se fundamenta na morfologia e na estrutura

    anatmica dos vegetais, nos seus caracteres genticos, na sua ecologia, na sua distribuio

    geogrfica, no estudo de seus antepassados e outras caractersticas para compreender e

    estabelecer as verdadeiras afinidades e graus de parentesco existentes entre os diversos grupos

    de plantas (BARROSO, 1978).

    Um histrico referente aos sistemas de classificao de plantas pode ser encontrado

    em Barroso (1978): I Classificao baseada no hbito das plantas: Theophrastus (370 a.C.),

    Albertus Magnus (1193-1280), Otto Brunfels (1464-1534), Andrea Caesalpino (1519-1603),

    Jean Bauhin (1541-1631), John Ray (1628-1705), Joseph Pitton e Tournefort (1656-1708); II

    Sistemas artificiais baseados em caracteres numricos: Carolus Linnaeus ou Carl Linn

    (1707-1778), considerado o pai da taxonomia vegetal e zoolgica; III Sistemas baseados na

    forma de relaes entre as plantas: Michel Adanson (1727-1806), Lamarck (1744-1829), De

    Jussieu (Antoine, 1686-1758; Bernard, 1699-1776 e Joseph, 1704-1799); De Candolle (1778-

    1841); entre 1825-1845 cerca de 24 sistemas de classificao foram propostos, destacando-se

    Endlincher, Brongniart, Lindley, Bentham e Hooker; IV Sistemas baseados em filogenia,

    baseado nas teorias de evoluo das espcies: Eichler (1839-1887), Engler (1844-1930),

    Bessey (1845-1915), Hutchinson (1884-1972), Tahktajan (1961), Cronquist (1968), Dahlgren

    (1975).

    Diversos so os sistemas de classificao apresentados ao longo da histria do estudo

    dos vegetais, cada qual com seus principais autores. At ento, sistemas parciais do reino das

    plantas foram apresentados. Muitas das inovaes destes sistemas encontram-se perfeitamente

    adaptadas ao sistema de Engler. Assim, Joly (1976), em seu livro sobre a taxonomia vegetal,

    um dos mais conhecidos entre os estudantes de Cincias Biolgicas e principalmente entre os

    botnicos, segue o sistema de classificao de Engler.

    De acordo com Engler (1954 e 1964) apud Joly (1976), o reino vegetal classificado

    da seguinte forma: diviso I BACTERIOPHYTA, diviso II CYANOPHYTA, diviso III

    GLAUCOPHYTA, diviso IV MYXOPHYTA, diviso V EUGLENOPHYTA, diviso VI

    PYRROPHYTA, diviso VII CHRYSOPHYTA, diviso VIII CHLOROPHYTA, diviso IX

    CHAROPHYTA, diviso X PHAEOPHYTA, diviso XI RHODOPHYTA, diviso XII

  • 24

    FUNGI, diviso XIII LICHENES, diviso XIV BRYOPHYTA, diviso XV

    PTERIDOPHYTA, diviso XVI GYMNOSPERMAE, diviso XVII ANGIOSPERMAE.

    Barroso (1978) adota a classificao de Cronquist em seu livro sobre a sistemtica das

    angiospermas no Brasil, por consider-la muito simples e didtica. importante esclarecer

    que Cronquist (1981) direciona sua classificao s angiospermas da seguinte forma: Diviso

    Magnoliophyta, Classe Magnoliopsida (dicotiledneas), Subclasses: I Magnoliidae, II

    Hamamelidae, III Caryophyliidae, IV Dilleniidae, V Rosidae, VI Asteridae; Classe

    Liliopsida (monocotiledneas), Subclasses: I Alismatidae, II Arecidae, III

    Commelinidae, IV Zingiberidae, V Liliidae.

    Assim como em Barroso (1978), o estudo das angiospermas foi, por muito tempo,

    baseado na classificao de Cronquist. Ao pesquisar em sua obra (CRONQUIST, 1981),

    destaca-se que seu sistema de classificao foi desenvolvido baseando-se na tradio

    filosfica de A. P. de Candolle, Benthan e Hooker, Hallier e Bessey, conquistando grande

    aceitao no meio botnico, proporcionando uma reorganizao geral.

    O sistema de classificao APG (Angiosperm Phylogeny Group) descrito por Judd,

    Campbell, Kellogg e Stevens (1999) no livro Plant Systematics: a phylogenetic approach.

    Este sistema de classificao, considerado um marco na botnica, foi organizado

    considerando-se caractersticas moleculares, por meio da utilizao de tcnicas que

    fundamentam um maior aprofundamento no estudo da evoluo e filogenia. Atualmente

    utilizado o APG II, baseado no livro de Judd et al., revisado em 2002. O sistema ainda est

    em desenvolvimento, sendo revisado constantemente medida que detalhes filogenticos e

    novas caractersticas anatmicas e morfolgicas so descobertas.

    O mtodo mais atual utilizado para classificar os organismos conhecido, portanto,

    como cladstica. A cladstica uma forma de anlise filogentica na qual o enfoque se

    concentra na ramificao de uma linhagem a partir de outra no curso da evoluo. Ela tenta

    identificar grupos monofilticos, ou clados, que possam ser definidos pela posse de atributos

    derivados exclusivos que reflitam uma origem evolutiva comum. O resultado da anlise

    cladstica um cladograma, que fornece uma representao grfica de um modelo de trabalho,

    ou hiptese, sobre as relaes filogenticas de um grupo de organismos (RAVEN et al.,

    2007).

    Pode-se dizer, ainda, que a sistemtica vegetal foi revolucionada pela aplicao de

    tcnicas moleculares, atravs das quais tornou-se possvel comparar organismos em seu nvel

    mais bsico, o gene. Estes dados moleculares so mais fceis de quantificar, tm o potencial

  • 25

    de fornecer muito mais caracteres para anlise filogentica e permitem a comparao de

    organismos que so morfologicamente muito diferentes (RAVEN et al., 2007).

    Outros temas importantes para esse trabalho e para o estudo dos vegetais so aqueles

    relacionados ecologia. Segundo Raven et al. (2007, p. 707), a ecologia freqentemente

    definida como: o estudo das interaes dos organismos uns com os outros e com o seu

    ambiente fsico, sendo mais simples defini-la como o estudo dos sistemas ecolgicos ou

    ecossistemas.

    Entender as interaes fundamental para a ecologia. Isso est implcito nas sempre repetidas afirmaes de que a mensagem bsica da ecologia que tudo est interconectado. Nenhum organismo, seja num fragmento florestal, numa pastagem, num lago, num recife de coral ou em uma comunidade urbana aberta, existe isoladamente (RAVEN et al., p. 714, 2007).

    Para Odum (1988), a palavra ecologia deriva do grego oikos com sentido de casa e

    logos, que significa estudo. Assim, o estudo do ambiente da casa inclui todos os

    organismos contidos nela e todos os processos funcionais que a tornam habitvel. Ento, a

    ecologia o estudo do lugar onde se vive, considerando-se as relaes entre os organismos

    e o seu ambiente.

    Ao se falar em ecologia, alm do estudo da estrutura e funo da natureza,

    importante discutir a aplicao deste conhecimento no sentido de se propor linhas de

    preservao conjunto de medidas de proteo legalmente necessrias contra a destruio e

    qualquer forma de dano ou degradao ambiental; conservao ao de reunir atividades de

    preservao, manuteno, utilizao sustentada, restaurao e melhoria do meio ambiente,

    buscando maior benefcio para as geraes atuais e futuras, permitindo a sobrevivncia das

    espcies e do ambiente natural; e manejo ambiental conjunto de atividades e prticas que,

    harmonicamente executadas, permitem o desenvolvimento scio-econmico e a conservao

    ambiental (AMBIENTE BRASIL, 2007).

    Segundo Odum (1988), um movimento mundial de conscincia ambiental j estava

    ocorrendo e nos ltimos tempos parece que aumentou a preocupao com a poluio, com as

    reas naturais, o crescimento populacional e o consumo de alimentos e energia, conforme

    evidencia a ampla cobertura de assuntos ambientais pela imprensa popular. Mas no se pode

    confundir preocupao com interesse. Para agir de modo benfico junto ao ambiente,

    preciso conhec-lo e, para isso, o estudo dos vegetais, ou seja, os conhecimentos sobre as

    plantas ou outros temas so pr-requisitos para se direcionar as aes to comuns hoje em dia.

  • 26

    Se observarmos uma floresta distncia, ou de cima de um avio, temos a impresso de um grande macio vegetal verde, cobrindo uma extenso de terra. [...] D-nos at vontade de rolar por ele, to macio nos parece. Ao nos aproximarmos vamos verificar, entretanto, que aquela idia de massa verde [...] no era bem correta. L dentro da mata, por exemplo, podemos distinguir uma espcie de teto, formado pela unio da copa das rvores [...]. sombra das rvores maiores encontramos outras de menor porte e diversos arbustos. Sob estes, desenvolvem-se pequenas plantas herbceas, por vezes bastante delicadas e ornamentais. Apoiando-se e enrolando-se nos troncos das rvores existem cips e trepadeiras, formando um denso emaranhado [...] l no alto conseguimos divisar um sem-nmero de orqudeas, bromlias e imbs apenas agarrados aos ramos das rvores (COUTINHO, 1976, p. 23).

    Lambais et al. (2006), estudando a diversidade de microorganismos presentes nas

    folhas de diferentes espcies de rvores da mata atlntica, demonstraram que as comunidades

    de microorganismos variam em sua composio, de acordo com a espcie vegetal estudada.

    Segundo os autores, cada comunidade apresenta uma quantidade de espcies de bactrias que

    variam de 95 a 671. Destas espcies de bactrias, apenas 0,5% so comuns a todas as rvores

    estudadas. Quase todas as bactrias (97%) so de espcies ainda no descritas anteriormente,

    sugerindo que sejam encontradas unicamente na superfcie destas folhas.

    Assim, pode-se verificar que uma floresta possui uma estrutura caracterstica e certa

    complexidade, comportando uma grande diversidade de seres vivos a ser estudada.

    Atualmente, o conceito de biodiversidade vem sendo muito discutido, embora muitas

    controvrsias existam. Segundo Lvque (1999), para alguns, este termo como um cesto

    vazio, no qual cada um coloca o que quer. Para outros, um conceito to global que se refere

    aos numerosos aspectos da diversidade da vida, compreendidos os usos que so feitos pelas

    sociedades humanas.

    Para Lvque (1999), o termo biodiversidade, contrao de diversidade biolgica,

    foi introduzido, na metade dos anos 80, pelos naturalistas preocupados com a rpida

    destruio dos ambientes naturais e de suas espcies, pedindo que a sociedade tomasse

    medidas para proteger este patrimnio. Foi ento popularizado na Conferncia do Rio de

    Janeiro em 1992, quando da assinatura da Conveno sobre a diversidade biolgica.

    De acordo com a Conveno, a biodiversidade pode ser definida como a variabilidade

    dos organismos vivos de qualquer origem, compreendendo, entre outros, os ecossistemas

    terrestres, marinhos e outros ecossistemas aquticos e os complexos ecolgicos dos quais eles

    fazem parte. Isso compreende a diversidade no seio das espcies e entre as espcies, bem

    como aquela dos ecossistemas. Mais simplesmente, a biodiversidade est constituda pelo

    conjunto dos seres vivos, pelo seu material gentico e pelos complexos ecolgicos dos quais

    eles fazem parte (LVQUE, 1999).

  • 27

    Concomitantemente ao desenvolvimento tecnolgico, s descobertas e ao

    aprofundamento nas pesquisas sobre os vegetais, mudanas no contedo referente biologia

    foram sendo apresentadas exigindo, conseqentemente, uma atualizao do professor para

    que este pudesse criar diferentes formas de ensinar botnica, proporcionando aos alunos um

    conhecimento geral e atualizado sobre o tema.

    Destaca-se, portanto, que esta atualizao no vem ocorrendo e que, medida que o

    conhecimento cientfico se torna cada vez mais especfico, um maior distanciamento entre

    este e o professor vem sendo assumido. Segundo Santos (2006), somente no campo da

    botnica, um sem-fim de reas e subreas e um mundo de informaes novas so

    apresentados a cada dia.

    Considerando-se o ensino da botnica desenvolvido nos dias atuais possvel dizer

    que este , em sua grande parte, feito por meio de listas de nomes cientficos e de palavras

    totalmente isoladas da realidade, usadas para definir conceitos que possivelmente nem ao

    menos podem ser compreendidos pelos alunos e pelos professores. Soma-se a isso a

    confirmao desta especializao impressa nos livros didticos, com contedos tericos

    especficos e complexos, cada vez mais distantes da realidade de alunos e professores.

    Assim, uma dificuldade em se sentir estimulado para o estudo dos vegetais

    observada entre os alunos, o que tambm se observa entre os professores, os quais, em grande

    proporo, acabam assumindo a utilizao de uma metodologia tradicional e decorativa para o

    ensino da botnica. Hoje em dia, com a intensificao do trabalho do professor e com as

    dificuldades que tornam os saberes de sua prtica difceis de serem gerenciados, os textos dos

    livros didticos ainda so considerados refgios que, muitas vezes, acabam por definir o

    trabalho docente (LOGUERCIO et al., 1999).

    importante considerar, ainda, a influncia negativa que esses livros didticos podem

    exercer sobre o aluno quando no utilizados de forma adequada pelos professores. A exemplo

    da influncia da mdia, atravs de filmes, desenhos animados, documentrios etc. produzidos

    no hemisfrio norte e comuns no dia-a-dia das crianas, os livros didticos tambm trazem

    imagens distorcidas da realidade dos alunos brasileiros, baseadas em elementos exticos e

    caractersticos do hemisfrio norte.

    De acordo com Pinheiro da Silva e Cavassan (2005a), os lees, elefantes, zebras,

    girafas e ursos, as florestas homogneas de pinheiros e eucaliptos e as montanhas com picos

    nevados, trazidos nas imagens dos livros didticos, permitem que os alunos as incorporem em

    suas concepes referentes ao ambiente natural de forma distorcida da realidade brasileira,

    como foi observado neste estudo, atravs de seus desenhos sobre a floresta.

  • 28

    Segundo Praia et al. (2002, p. 130):

    Os alunos, muitas vezes, no sabem do que andam procura e ainda que tentem dar um nexo aos seus conhecimentos fazem-no desgarradamente, por parcelas, j que lhes falta um fio condutor, um organizador, um problema que unifique as idias. Em particular, no trabalho experimental, os estudantes executam tarefas sem saber para onde caminham e que respostas ho de dar e a qu. Parece e parece-lhes que os conhecimentos surgem claros, bvios e no precisam ser interrogados e tm uma resposta que surge natural. Esta a pior maneira de usar um bom instrumento de aprendizagem.

    Pesquisas realizadas nesse mbito (CHAPANI e CAVASSAN, 1997; HOERNIG,

    2003; LEITE et al., 2005; MACHADO, 1982; PEGORARO, 1998; PEGORARO et al., 2002;

    PINHEIRO da SILVA e CAVASSAN, 2003; SENICIATO e CAVASSAN, 2003;

    SENICIATO et al., 2006) e, ainda, os Parmetros Curriculares Nacionais para as cincias

    naturais (BRASIL, 1998), buscando retomar o interesse e a ateno dos alunos para com os

    estudos, principalmente quanto aos estudos de botnica e ecologia, enfatizam a importncia

    da utilizao de procedimentos metodolgicos variados ao invs de se ater apenas aos livros

    didticos, incluindo a a importncia das aulas prticas de campo.

    A utilizao de aulas prticas de campo vem sendo muito discutida atualmente e

    avaliada positivamente, complementando as aulas de cincias, biologia e geografia realizadas

    no ambiente escolar.

    O terceiro captulo desta tese enriquece essa discusso, trazendo a opinio dos prprios

    alunos e professores sobre as atividades prticas de campo e como elas atuam no processo de

    ensino e aprendizagem, quando relacionadas ao trabalho realizado em sala de aula.

    Os alunos, quando questionados sobre se a atividade prtica o ajudou a entender

    melhor o tema estudado na escola, responderam em sua maioria, ou seja, 98,62% que sim,

    justificando suas opinies da seguinte maneira, baseando-se nas categorias mais

    representativas: 11,7% - devido confirmao e complementao do que foi estudado em sala

    de aula; 16,9% - devido ao desenvolvimento dos sentidos e 62,5% - porque facilita a

    aprendizagem.

    Vejamos, ainda, a opinio de alguns professores: 1 uma atividade que enriquece a

    nossa prtica pedaggica e complementa os contedos trabalhados em sala. Com certeza, na

    aula prtica o interesse maior e os contedos acabam sendo fixados com mais facilidade e

    de maneira mais agradvel; 2 Os conhecimentos tericos, quando no vivenciados, se

    perdem, tornam-se vagos. Atravs da observao em campo, o aluno encontra um sentido no

    que viu na sala de aula. Nada como o conhecimento vivenciado para instigar a curiosidade e

  • 29

    o interesse do aluno; 3 O passeio foi muito importante, pois este proporcionou conceitos,

    dvidas, questionamentos, enfim, despertou curiosidades e enriqueceu as descobertas. O

    trabalho integrado em sala de aula vai contribuir para nossos conceitos no processo ensino-

    aprendizagem, caracterizando e contextualizando os contedos de vegetao, principalmente

    do cerrado.

    3 Consideraes finais

    A partir da reviso terica e histrica aqui apresentada, algumas respostas questo

    colocada por Nogueira (1997, p. 278: O ensino de botnica [...] considerado pelos

    professores e alunos uma dificuldade quanto ao processo ensino-aprendizagem. Dificuldade

    esta evidenciada pelo pouco interesse e baixo rendimento neste contedo), podem ser

    elaboradas, no que se refere s dificuldades encontradas no ensino de botnica.

    A primeira dificuldade estaria no fato de que o conhecimento botnico evoluiu

    muito rapidamente por conta do desenvolvimento tecnolgico, o qual vem permitindo a

    observao e o estudo de estruturas vegetais antes no observadas e estudadas. Essa rpida

    evoluo exige, portanto, do professor, atualizao permanente, acompanhando e

    compreendendo todo o processo para que possa ensinar e escolher uma metodologia adequada

    para isso.

    A atualizao dos professores depende, ainda, de constante interao entre

    pesquisadores e professores atravs de cursos de atualizao que dependem do interesse das

    escolas e do oferecimento das informaes pelas instituies de pesquisa. Para Kinoshita et al.

    (2006), os resultados de pesquisas acadmicas dificilmente chegam populao e,

    principalmente, s escolas. Em geral, nesses resultados, todos os processos de pesquisa

    envolvidos no desenvolvimento dos produtos esto subentendidos, dificultando ainda mais o

    acesso aos professores.

    Uma segunda dificuldade pode residir no fato da nomenclatura botnica ser

    apresentada em latim. Assim, grupos de estruturas e fenmenos botnicos, quando no

    interpretados a partir de um conhecimento prvio de radicais latinos e gregos, tornam-se

    expresses abstratas, sem vnculo com a realidade da natureza vegetal. Evidentemente, com

    isso, as aulas tornam-se desinteressantes e cansativas, comprometendo a relao ensino e

    aprendizagem.

  • 30

    Ao descreverem uma experincia no ensino de botnica para crianas da escola bsica,

    Kinoshita et al. (2006, p. XIII) destacam que:

    [...] o ensino de botnica caracteriza-se como muito terico, desestimulante para os alunos e subvalorizado dentro do ensino de cincias e biologia. [...] o ensino de botnica, assim como o de outras disciplinas, reprodutivo, com nfase na repetio e no no questionamento, seguindo sempre um nico caminho de aprendizagem: repetir afirmaes do livro. [...] as aulas ocorrem dentro de uma estrutura de saber acabado, sem contextualizao histrica. O ensino centrado na aprendizagem de nomenclaturas, definies, regras etc. As disciplinas so estanques; h dificuldade de integrao funcional dos contedos transmitidos, tanto no sentido horizontal como vertical, alm de dificuldade de integrao em qualquer outro mbito.

    A preocupao com a utilidade das plantas no mais a de cada indivduo, mas

    daqueles que, considerando-se suas especialidades tais como pesquisadores, agricultores e

    tcnicos em produo a partir de recursos da natureza, especializam-se nesta funo. Assim, a

    busca do saber sobre as plantas com aquele propsito, fica restrita a este grupo de

    profissionais. No entanto, a questo ambiental diz respeito a todos.

    A importncia das plantas nesta questo, que envolve desde o resgate de carbono da

    atmosfera, as alteraes climticas e a proteo dos rios e nascentes deve servir de

    justificativa para a recuperao da motivao para o estudo dos vegetais e para a diminuio

    do distanciamento entre o Homem e o ambiente natural, j destacado em Salatino (2001).

    Distncia essa tomada a ponto de at mesmo as escolas no enfatizarem, por um bom tempo,

    a importncia do contato do aluno com o ambiente natural, por meio do ensino tradicional. O

    fato que o estudo das plantas passou a ser to terico e complexo que se tornou maante e

    decorativo, desestimulando os alunos a estudarem este tema.

    O segundo captulo desta tese, estudando os conceitos de experincia, apresentao,

    representao e contexto experiencial, baseados em Dewey, considera o ambiente natural

    como um contexto experiencial no ensino de botnica. Este contexto est, portanto,

    diretamente ligado percepo, ao desenvolvimento do pensamento reflexivo e liberdade,

    alguns fatores essenciais, segundo Dewey, para o conhecimento.

    Este captulo traz ainda, que as aulas no ambiente natural devem ser importantes,

    inclusive porque permitem que se conheam os seres vivos de forma que sua funo, causa e

    o que representa estejam vinculados, ou seja, que sejam vistos com um todo. Isso comumente

    desconsiderado no ensino atual da botnica, fragmentado.

    Com o advento das questes ambientais, onde os vegetais ocupam posio de

    destaque, o ensino de botnica tambm tem a chance de ser motivador quando parte de

  • 31

    questes hodiernas da comunidade a que pertencem os sujeitos dessa relao ensino e

    aprendizagem. Esta discusso feita de forma mais aprofundada no quarto captulo desta tese.

    O desafio atual, ento, est em recuperar este interesse e satisfao ao se estudar a

    botnica, satisfao essa que parece ser percebida ao se levar os alunos ao ambiente natural e

    permitir que eles experimentem, formulem hipteses a partir da prtica para depois entrarem

    em contato com as teorias j estabelecidas e formuladas, enfatizando-se inclusive o processo

    histrico envolvido. No, a Botnica e a Biologia no devem ser meras multiplicadoras de

    nomes difceis a serem memorizados temporariamente e depois esquecidos! (SANTOS,

    2006, p. 226).

    Neste contexto, estudos referentes eficincia da utilizao de aulas prticas de campo

    antes de aulas tericas de botnica, motivando e facilitando a aprendizagem dos alunos, vm

    conquistando espaos. Alguns exemplos de trabalhos nesta linha so: Hoernig (2003);

    Hoernig e Pereira (2004) e Pinheiro da Silva e Cavassan (2005b).

    Pode-se dizer, no entanto, que todas estas consideraes aqui apresentadas levam

    questo metodolgica como central no processo de ensino e aprendizagem de botnica,

    podendo inclusive dificultar o entendimento do que se quer ensinar, quando no adequada.

    Enfim, voltemos ao pensamento de Rousseau:

    Hay en esta ociosa ocupacin un encanto que no se encuentra ms que en plena calma de las pasiones pero que basta por s solo, en ese caso, para hacer la vida feliz y dulce; mas no bien se le mezcla un motivo de inters o de vanidad, sea para ocupar puestos o para hacer libros, no bien se quiere aprender tan slo para instruir y se herboriza tan slo para convertirse en autor o en profesor, todo ese dulce encanto se desvanece, no se ve ya en las plantas ms que unos instrumentos de nuestras pasiones, no se encuentra ya ningn placer autntico en su estudio, no que quiere ya saber sino demostrar que se sabe, [] limitndose todo lo ms a la botnica de gabinete y de jardn, en lugar de observar los vegetales en la naturaleza (ROUSSEAU, 2006, p. 42).

    No se prendendo ao contexto em que foi escrito, mas indo alm, nota-se algo em

    comum entre o texto de Rousseau e os dias atuais: [] no se ve ya en las plantas ms que

    unos instrumentos de nuestras pasiones, no se encuentra ya ningn placer autntico en su

    estudio, [] limitndose todo lo ms a la botnica de gabinete y de jardn, en lugar de

    observar los vegetales en la naturaleza. Qualquer semelhana entre o sculo XVIII e os dias

    de hoje seria mera coincidncia?

    Precisamos recuperar em nossos professores e alunos a paixo e o prazer pelo estudo

    da botnica. Eles no devem ficar limitados botnica de gabinete (ou de sala de aula, da

    teoria, das imagens do livro didtico, da mdia) e de jardim (ou de ambientes no brasileiros

  • 32

    com plantas e animais exticos). Precisamos lev-los a observar os vegetais na natureza,

    mesmo porque, deles dependemos como espcie neste planeta.

    Referncias

    AMBIENTE BRASIL. Glossrio de termos tcnicos ambientais. Disponvel em: http://www.ambientebrasil.com.br. Acesso em: 23 nov. 2007. BARROSO, G. M. Sistemtica de angiospermas do Brasil. Rio de Janeiro: Livros Tcnicos e Cientficos (LTC), v. 1, 1978. 255 p. BEAUJEU, J. Cincias fsicas e biolgicas. In: TATON, R. Histria geral das cincias. So Paulo: Difuso Europia do livro, v. 2, 1959, p. 163-172. BENETTI. B.; CARVALHO, L. M. de. A temtica ambiental e os procedimentos didticos: perspectivas de professores de cincias. In: ENCONTRO PERSPECTIVAS DO ENSINO DE BIOLOGIA, 8., 2002, So Paulo. Atas...So Paulo: FEUSP, 2002. 1 CD-ROM. BRASIL. Secretaria de Educao Fundamental. Parmetros Curriculares Nacionais: cincias naturais. Braslia: MEC/SEF, 1998. 138 p. (terceiro e quarto ciclos do ensino fundamental). CHAPANI, D. T.; CAVASSAN, O. O estudo do meio como estratgia para o ensino de cincias e educao ambiental. Mimesis, Bauru, v. 18, n. 1, p. 19-39, 1997. COUTINHO, L. M. Botnica. So Paulo: Cultrix, v. 2, 1976. 307 p. CRONQUIST, A. An integrated system of classification of flowering plants. New York: Columbia University Press, 1981. DAMIO FILHO, C. F. Morfologia Vegetal. Jaboticabal: Funep/Unesp, 1993. 243 p. DEBUS, A. El hombre y la naturaleza en el renacimiento. P. F. Fondo de cultura economica, 1996. ENGLER, A. Syllabus der pflanzenfamilien. 12. ed., v. I, 1954. v. II, 1964 apud JOLY, A. B. Botnica: introduo taxonomia vegetal. 3. ed. So Paulo: Nacional, 1976. 777 p. FERREIRA, A. B. de H. Mini Aurlio sculo XXI. 4. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2002. 790 p. FERRI, M. G. Histria da botnica no Brasil. In: FERRI, M. G.; MOTOYAMA, S. Histria das cincias no Brasil. So Paulo: EPU, v. 2, 1980, p. 3388. FURON, R.; VERCOUTTER, J.; LEFEBVRE, G.; LABAT, R.; VIROLLEAUD, C. H.; DUPONT-SOMMER, P.; FILLIOZAT, J.; HAUDRICOURT, A.; NEEDHAM, J. A cincia antiga e medieval. In: TATON, R. Histria geral das cincias. So Paulo: Difuso Europia do livro, v. 1, 1959, 207 p.

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  • 33

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    http://www.librodot.com>

  • 35

    CAPTULO 2 _____________________________

    O AMBIENTE NATURAL COMO UM CONTEXTO EXPERIENCIAL NO ENSINO

    DE BOTNICA

    Patrcia Gomes Pinheiro da Silva e Osmar Cavassan

    Baseado no formato geral de artigo.

  • 36

    O AMBIENTE NATURAL COMO UM CONTEXTO EXPERIENCIAL NO ENSINO

    DE BOTNICA

    THE NATURAL ENVIRONMENT AS AN EXPERIMENTAL CONTEXT IN THE

    TEACHING OF BOTANY

    Resumo: Busca-se nas idias de John Dewey, organizadas a partir do conceito de experincia, uma fundamentao s discusses atuais sobre o ensino da botnica e a utilizao de ambientes naturais. Atravs desta reviso terica em Dewey, foi possvel notar a importncia da existncia de uma relao ntima entre a experincia real do indivduo e a educao, diferentemente do que vem ocorrendo no ensino de botnica mais prximo da educao tradicional (nomenclaturas, descries, regras). O ambiente natural passa a ser visto, portanto, como um contexto experiencial, onde experincias positivas podem vir a se desenvolver, estando diretamente ligado percepo, pensamento reflexivo e liberdade fatores essenciais ao conhecimento, segundo Dewey. As aulas no ambiente natural devem ser importantes por permitir o desenvolvimento de atividades educativas e uma viso dos seres vivos como um todo. Quanto questo metodolgica, Dewey j destacava que o mtodo experimental vai dos fatos, atravs da teoria, para os fatos novamente.

    Palavras-chave: John Dewey; Conceito de experincia; Ambiente natural; Contexto experiencial.

    Abstract: This paper seeks in John Deweys ideas based on the concept of experience a foundation for todays debates about the teaching of Botany and the use of natural environments. By analyzing Deweys theories, we were able to observe the existence of a close connection between real experience and education, as opposed to the current approach in the teaching of Botany, which focuses on names, description, classification, rules, etc. The natural environment becomes, therefore, an experimental context, where positive experiments may be developed, being directly connected to perception, reflexive thinking and freedom essential factors to knowledge, according to Dewey. Classes ministered in the natural environment allow the development of educational activities and grant the students a view of living beings as a whole. Regarding the methodological matter, Dewey points out that the experimental method goes from facts, through theory, to facts.

    Keywords: John Dewey; Concept of experience; Natural environment; Experimental context.

  • 37

    1 Introduo

    Desde a origem do pensamento cientfico-filosfico grego cincia moderna e

    contempornea, o conceito de experincia passou por diferentes significaes (CALDEIRA,

    2005). Segundo a autora, a discusso sobre a experincia est estreitamente ligada questo

    do conhecimento, ou seja, ao conhecimento cientfico e filosfico. Acrescenta ainda que

    conhecer, para os gregos, era conhecer a essncia dos objetos, aquilo que as coisas so na sua

    essncia, ao passo que para a filosofia moderna, o conhecimento e a verdade so construes

    subjetivas ou elaboraes de um cogito que representa ou organiza as coisas.

    Portanto, a pergunta no mais sobre o ser das coisas ou essncia destas, mas sobre o

    conhecer e essa mudana de pergunta ocorre por que surge o sujeito, mediador do real e do

    conhecimento. A partir da, racionalistas e empiristas buscaram entender como o sujeito

    conhece e em que medida esse conhecimento pode ser verificado, sustentado (CALDEIRA,

    2005).

    Ainda segundo Caldeira (2005), o estabelecimento do contexto de experincia na

    educao se d a partir do movimento escolanovista e Dewey, Decroly, Claparede, Ferrire e

    Montessori podem ser considerados os tericos que ofereceram os fundamentos filosficos e

    cientficos a essa renovao da pedagogia. Dentre eles, John Dewey (1859-1952) inclui-se

    entre os pragmatistas, sendo Charles Sanders Peirce o fundador dessa corrente filosfica. Um

    dos ensaios de Peirce, "Como fazer claras as nossas idias", publicado em 1878, foi o

    primeiro esboo e marco fundador do pragmatismo.

    Encontra-se em Cambi (1999), que Dewey foi o maior pedagogo do sculo XX e que

    seu pensamento pedaggico difundiu-se no mundo inteiro e operou em toda parte uma

    profunda transformao, alimentando debates e experimentaes, bem como a reposio da

    pedagogia no centro do desenvolvimento cultural contemporneo em vrios pases. Alm de

    um grande pedagogo (terico e prtico) foi tambm (e antes ainda) um grande filsofo.

    Mas, segundo Cambi (1999), Dewey continua sendo, talvez, o pedagogo mais

    conceituado e mais sugestivo de todo o sculo pela sua capacidade, amplamente demonstrada,

    de saber pensar o problema educativo em toda a sua amplitude e complexidade, bem como

    pelo recurso explcito a alguns princpios-valores que ainda hoje esto no centro do debate

    pedaggico.

    Pode-se dizer que a revoluo de Dewey na educao reside no fato de deslocar o

    centro do processo de ensino do professor para o aluno. Ocorre ento uma: [...] valorizao

    da vida da criana no mbito escolar, isto , de seus reais interesses e da sua necessidade de

  • 38

    atividade. A escola deve, portanto, mudar seu prprio centro de gravidade que,

    tradicionalmente, era colocado fora da criana e deve agora ser formado pelas caractersticas

    fundamentais da natureza infantil (CAMBI, 1999, p. 550).

    Pitombo (1974) chama a ateno para a doutrina pedaggica de Dewey, em seu livro

    intitulado Conhecimento, valor e educao em John Dewey:

    A conscincia de que a maior parte de sua educao, at entrar na Universidade, tenha sido realizada fora da escola, veio a influir na sua doutrina pedaggica, na qual d maior importncia, tanto na teoria como na prtica, ao aprender fazendo, que julgava ser o mtodo mais prximo da verdadeira aprendizagem e disciplina do conhecimento dos indivduos (p. 17).

    A filosofia de Dewey articula-se, desse modo, em torno de uma filosofia da

    experincia e sua pedagogia caracteriza-se, em geral, como sendo baseada num permanente

    contato entre o momento terico e o prtico, de modo tal que o fazer do educando se torne o

    momento central da aprendizagem. Encontra-se, inclusive, entrelaada intimamente com as

    pesquisas das cincias experimentais e empenhada em construir uma filosofia da educao

    que assume um papel muito importante, tambm, no campo social e poltico (CAMBI, 1999).

    Tendo conhecimento de tais fatos e das contribuies trazidas pelos autores aqui

    citados, o presente captulo tem como objetivo buscar nas idias de Dewey, organizadas a

    partir do conceito de experincia, uma fundamentao terica s discusses atuais sobre o

    ensino da botnica e a utilizao de ambientes naturais, ou seja, ambientes que no sofreram

    transformaes artificiais ou interferncia humana, no estudo deste tema.

    Para isso, uma reviso foi realizada, tanto dentro da prpria obra de Dewey, como a

    partir de autores que a discutem, de tal forma que pudesse contribuir para a discusso do tema

    em questo.

    necessrio esclarecer, portanto, que este no um trabalho filosfico, mas que busca

    fundamentos na filosofia para que se entendam aspectos relacionados botnica. Como bem

    coloca Seniciato (2006), As limitaes encontradas so as que naturalmente se impe a um

    bilogo que procura interpretar um fenmeno do ponto de vista filosfico (p. 14).

    2 Experincia, apresentao, representao e contexto experiencial

    Em se tratando da questo da educao tradicional versus a educao nova ou

    progressiva, Dewey (1971) considera que a idia fundamental da filosofia de educao mais

  • 39

    nova e que lhe d unidade a de haver uma relao ntima necessria entre os processos de

    nossa experincia real e a educao.

    Em meio a todas as incertezas, admito haver consenso geral permanente quanto a pressuposto fundamental, ou seja, de que h conexo orgnica entre educao e experincia pessoal, estando, portanto, a nova filosofia de educao comprometida com alguma espcie de filosofia emprica e experimental (DEWEY, 1971, p. 13).

    Para Dewey (1971), experincia e experimento no so termos que se expli