o encontro real

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O ENCONTRO REAL Passos concretos à presença de Deus B I S P O ROBERTO M CALISTER

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A Coleção 3 Gerações chega com uma missão importante: apresentar para as novas gerações os livros do Bispo Roberto McAlister, com uma visão contextualizada para a Igreja do século XXI. A proposta da editora Anno Domini com essa iniciativa é mostrar como os escritos desse grande líder cristão, produzidos anos atrás, continuam mais atuais do que nunca e ainda têm muito a nos falar e ensinar. Cada livro da Coleção 3 Gerações vem com uma introdução do Bispo Walter McAlister, filho de Bispo Roberto e seu sucessor como Primaz da Igreja Cristã Nova Vida (ICNV), que analisa o texto do pai no contexto dos dias atuais. E, ao final de cada livro, o Pastor John McAlister, neto do fundador da ICNV, traz uma visão da obra aplicada para as gerações futuras.

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O ENCONTRO REALPassos concretos à presença de Deus

B I S P O

ROBERTOMCALISTER

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O ENCONTRO COM DEUS

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Estando Deus presente em todos os momentos em todos os lugares, é, no entanto, em duas ocasiões especiais que Ele Se torna mais real do que nunca: na oração e na Santa Ceia.

A oração é o caminho posto por Ele ao nosso dispor para que dEle nos aproximemos e com Ele tenhamos comunhão. Não significa uma invenção ou um artifício qualquer do homem para forçar a entrada ao salão da graça; é simplesmente o meio de fazer-nos perceber Sua presença e ter desse modo um encontro pessoal com o Pai.

A Ceia do Senhor confirma as declarações bíblicas que repre-sentam o cálice como o sangue de Jesus, e o pão, como corpo de Cristo.

“Porventura o cálice da bênção que abençoamos não é a comunhão do sangue de Cristo? O pão que partimos não é a comunhão do corpo de Cristo?” (1 Co 10.16).

Ao participarmos, pois, da Santa Ceia, não é com o cálice que te-mos comunhão, nem com o pão. Realiza-se, isto sim, um encontro entre o filho de Deus e Jesus Cristo por meio de Sua presença real.

Entretanto, para que tal encontro se verifique, quer seja por oração, quer pela Santa Ceia, duas condições básicas são essen-ciais, quais sejam: ir a uma pessoa real e levar uma pessoa real.

Se aquele Deus a quem presto culto por meio da oração ou da Ceia é fruto de minha imaginação, ou algo distante da verdade, então Ele passa a ser um deus irreal, um deus que não existe.

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32De igual modo, se em minha oração ou em meu espírito de louvor deixo de ser autêntico e honesto, já não sou eu que me apresento, pois sou uma pessoa irreal. Esta é a dificuldade: dois fantasmas não podem encontrar-se.

A oração passa então a não ter significado algum, sendo apenas um conglomerado de palavras religiosas; a Santa Ceia, por sua vez, uma simples cerimônia – nada mais. Porque, se as duas pessoas envolvidas em tais atos de súplica e adoração não são autênticas, a comunhão jamais irá verificar-se.

O DEUS SEV E RODeus deseja ter comunhão com o homem. Foi por isso que faci-litou meios pelos quais um encontro poderia ser realizado. Mas poucas pessoas chegam a desfrutar deste privilégio, visto que, por meio de sua imaginação, criaram “outros deuses”.

A fim de que haja comunhão entre o cristão e o Pai Celestial, faz-se fundamental um conceito bíblico correto sobre Deus. Muitos fatores militam contra esta compreensão a respeito dAquele a quem desejamos adorar.

Eu, por exemplo, fui criado no conhecimento de um deus por demais severo, um deus que não me permitia sorvete aos domingos por esse dia ser considerado “sagrado”. Até o circo a que assisti, quando passava por minha cidade, foi motivo de castigo, pois para meu pai aquele tipo de divertimento

“desagradava a Deus”. E assim quase todos os divertimentos me

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33foram proibidos em nome de um Deus que, por sua excessiva severidade, vim a temer bastante.

O DEUS PA PA I NOE LOutro deus muito conveniente, criado por nossa imaginação, é aquele deus máquina-de-bênçãos, um autêntico Papai Noel; deus a quem pouco importam nossos pecados e desobediências, sempre pronto a nos acudir quando em aperto, figura verdadei-ramente alegre e benigna, ou melhor, benevolente, ansiosa por tornar felizes seus queridos filhos.

O Revº. J. B. Philips, autor do livro Seu Deus É Pequeno Demais (Your God Is Too Small), disse: “Desejamos não tanto um pai celestial quanto um avô celestial, benevolente e senil, que ‘gosta de ver os jovens felizes’ e cujo plano para o universo é que, ao fim de cada dia, todos possam dizer: ‘Hoje aprovei-tamos bastante’.”

Estou me lembrando de uma senhora que veio ao gabinete pastoral certo dia e me disse: “Pastor, eu sei muito bem que tenho vivido em pecado, mas meu querido Paizinho-do-Céu, que tão bem me conhece, há de me entender.” Para ela, no momento de suas fraquezas, Deus piscava um olho e de qual-quer forma a abençoava.

Esse deus é um fantasma. Ele não existe. Pois, para Deus, não há duas leis, uma destinada a Seus filhos, outra aos incrédulos. Portanto, o deus que fabricamos para tolerar nossos desejos carnais é completamente falso. Deus Papai Noel é um ídolo.

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Fugindo, se for possível, aos preconceitos de nossa formação religiosa, pensemos no que possa construir um ídolo. Quem sabe não começaremos a compreender melhor não só o nosso próximo, como até a nós mesmos.

Diante de estátuas e figuras de santos que enfeitam igrejas e casas católicas, os evangélicos, apoiando-se no primeiro man-damento, “Não terás outros deuses diante de mim” (Ex 20.3), acusam os católicos de idolatria. Esquecem eles que nem todos os ídolos são pendurados na parede, enfeitam um altar ou são feitos de barro; que o que constitui o ídolo não é o objeto em si, mas, sim, o conceito que ele representa.

Assim, a pessoa que imagina um deus diferente do que Ele realmente é está criando um ídolo, um outro “deus”. Nem é necessário fazer dele uma pintura ou escultura; basta tão somente criá-lo na imaginação. Ele passa a existir como ídolo no instante de sua criação mental.

Portanto, não é idólatra exclusivamente aquele que se curva perante um altar cheio de estátuas, ou presta culto a uma imagem, mas também aquela pessoa que cria um deus a seu bel-prazer, a seu gosto, um deus que age como um robô, segundo seus pró-prios desejos e necessidades. Infelizmente, não são nada raros esses “outros deuses”!

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35O DEUS U T I L I TÁ R IOUm dos mais populares deuses entre o povo cristão é o deus quebra-galho; o deus negociante. Aquele que receberá uma boa gorjeta, e até dízimo dobrado, caso se verifique a ansiada venda do apartamento; ou culto e favores especiais da mamãe se ele fechar os olhos do fiscal e sua filha passar no exame.

Sabemos, pelas Escrituras Sagradas, que o Pai Celestial tem profundo interesse em todos os detalhes de nossa vida e que, sendo assim, não há por que andarmos ansiosos, pois Ele conhece as nossas necessidades. O que é muito diferente daquele conceito generalizado. Pois as bênçãos provêm de nosso rela-cionamento com o Pai e nada têm a ver com troca de favores ou suborno imposto por promessas nossas.

Esse deus para quem apelamos na hora de nossos apertos ou dificuldades nada tem a ver com o Deus real. Ele é fruto de nossa imaginação; pertence ao folclore de um cristianismo muito infantil – qual personagem do Sítio do Pica-Pau Amarelo. No entanto, é a esse deus utilitário e imaginário que dirigimos oração! Quanto esforço vão e – pior ainda! – quanta ofensa contra a Sua dignidade.

O DEUS DA C U LT U R AA motivação que está por trás da arte religiosa é excelente: des-viar os olhos do devoto das coisas mundanas e transitórias para fixá-los em coisas espirituais e transcendentes. Nobre inspiração! Mas o problema é que o remédio vem a ser pior que a doença.

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Posso lembrar dois retratos de Jesus que enfeitaram o meu quarto de dormir em minha infância. Um deles apresentava o Mestre como o Bom Pastor, cajado na mão, batendo a uma porta; no outro, Ele era um menino, cercado pelos mestres da lei, na sinagoga. Dois quadros que continham uma figura e uma cena bíblica.

A intenção de meus pais foi a melhor possível: lembrar-me a pessoa de Jesus. Mas eles nem de longe imaginaram que eu passaria muitos anos de minha vida concebendo Jesus como um rapazinho de doze anos de idade, ou então como uma doce e meiga figura, sempre do lado de fora batendo à porta.

Como apreciador da arte, especialmente da arte religiosa, admiro o gênio dos mestres e faço mesmo questão de visitar museus e salões onde a inspiração dessas obras me ajuda a elevar o espírito. Só que me recuso a prestar culto a qualquer uma delas, pois rejeito totalmente conceber o meu Deus nos termos dos pintores e escul-tores, a maioria dos quais levou vida imoral e dissoluta.

Com muito amor, desejo fazer aqui menção à figura que a cultura religiosa apresenta para nossa apreciação: a do Cristo pendurado na cruz, sem dúvida alguma a cena mais retratada de toda a Sua existência. Com o semblante triste e o sangue cor-rendo das cinco feridas, Jesus ali é um Jesus morto. Ele, porém, não está morto, e sim ressuscitado. Vivo! Por que então fixar de maneira tão permanente em forma de crucifixo o Cristo morto, se nossa salvação eterna depende de Sua ressurreição? Se eu não posso ter comunhão com um Deus morto? Se não posso aproximar-me em oração de quem está num túmulo?

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37Se bem que seja verdade que o pão e o cálice da Santa Ceia são um memorial da morte do Senhor Jesus, para o povo de Deus, no entanto, eles falam de vida; e de vida eterna!

Infelizmente, tanto na mente evangélica quanto na católica, nossa cultura religiosa conseguiu desenhar e fixar imagens e retratos de um Deus que não existe: um menino de doze anos, o homem sempre do lado de fora, um moribundo.

Muitos argumentos justificam à perfeição essas expressões de arte, mas o lamentável é que o povo, geralmente simplório e impressionável, é incapaz de ir além da imagem, fazendo, ao contrário, do símbolo a sua realidade. Mas Deus não é retrato ou escultura. Ele é Espírito!

O DEUS OBE DI E N T EEm muitas igrejas, por seu entusiasmo e espírito triunfalista, a pregação tende a criar um deus muito alheio à realidade bíblica. Usando do artifício de “textos de prova”, ou seja, versículos isolados de um contexto, a pregação popular fabrica um deus que cede a todas as nossas vontades, bastando apenas pedir em alta voz em nome de Jesus.

Sem qualquer sentimento de crítica, mas sim com muita tristeza, como líder evangélico, tenho que reconhecer essa falha muito grave em meio à nossa fé simples e à nossa pregação positiva. Quantas vezes tenho caído no erro de “declamar”: “Deus, fazei isto em nome de Jesus!”, sem reservar-Lhe o direito de recu-sar o meu pedido, respeitando-O do mesmo modo como sou

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inclinado a respeitar um ser humano, isto é, deixando-O decidir por Si. Terá Deus aceito render-Se às nossas vontades, tornando-Se obediente a nós por causa de citações bíblicas usadas quase como um martelo para quebrar-Lhe a resistência?

Fará um pai todas as vontades a seu filho? Creio que não! Nem quando expressas entre gritos e lágrimas. Pelo contrário: é por amor que ele se sente obrigado a recusar a maioria das exigên-cias e manias infantis. Como poderá o Pai Celestial conceder tudo que desejamos e pedimos, a não ser que acrescentemos a expressão “conforme a Tua santa vontade”? Esse pormenor, entretanto, é completamente esquecido pelo positivismo, que não o leva em conta.

Tenho certeza de que teria sido desastroso para mim se Deus me houvesse outorgado tudo quanto Lhe pedi nos meus anos de andar com Ele. Tantas coisas erradas imaginei. Tantas duras lições teria de aprender. Tantas agruras a suportar. Vales tão profundos a passar. Mas tanta graça a aproveitar!

Não obstante minha fé em Deus e as gloriosas promessas que en-contro na Bíblia, tenho ainda que orar como Jesus ensinou: “Pai nosso, faça-se a Tua vontade... em minha vida... como no céu”.

Quando dei com essa frase na minha hora devocional, o Espírito Santo me impulsionou a meditar nos meus pedidos. E cheguei à conclusão de que estou sempre suplicando que Deus faça a minha vontade. Sei o que quero e, conhecendo o Pai amoroso que tenho, vou a Ele para pedir ajuda – quase

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39sempre, porém, na base do que eu quero. Estou começando a aprender a orar: “Pai, faça-se a Tua vontade.”

O DEUS GR ATOQuero ainda ressaltar um deus que foi criado e que “vive entre nós” como se fosse real – o deus grato por qualquer sacrifício de nossa parte.

Existem pessoas com uma ideia tão baixa, mesquinha e indigna a respeito de Deus, que chegam a imaginá-Lo quase como um mendigo, grato por qualquer miserável esmola ou migalha que Lhe ponhamos à disposição. Esse é um deus fruto de ignorân-cia e orgulho, muito comum, aliás, entre pessoas religiosas. A fim de que se multipliquem ou se repitam contribuições para os trabalhos da igreja, essas têm de ser reconhecidas e aplaudi-das. Mas onde terá ficado o Deus que ordenou:

“Ignore a tua mão esquerda o que faz a tua mão direita... e teu Pai que vê em secreto te recompensará” (Mt 6.3,4)?

Quem é o Senhor? E quem o servo? Acaso é Deus um empregado que deva ser presenteado com as sobras, obrigado a demonstrar sempre um humilde espírito de gratidão?

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40U M A V E R DA DE T R IST EConcluímos, portanto, que a grande maioria dos encontros entre Deus e Seus filhos não acontece. Sendo corretas as palavras da prece, esta, porém, não é respondida, visto que se dirige a um deus irreal, um deus que não existe.

Quantas e quantas pessoas gastam suas vidas em atos religiosos, novenas e vigílias, sem uma vez sequer perceberem a presença real de Deus? Se por oração e jejum a emotividade é tocada, quem poderá garantir ter sido essa sensação nada mais nada menos que uma reação positiva à disciplina mental e física?

Qual será, finalmente, nosso conceito de Deus? Como será Ele? Como formamos nossas ideias sobre o Pai Celestial? Como per-cebemos responsabilidades e obrigações mútuas da comunhão que desejamos com Ele?

A resposta a essas perguntas é a coisa mais importante em toda a nossa vida, pois ela determinará o que há de mais sagrado: um encontro real com Deus. n