o duopólio das empresas aéreas brasileiras tam e gol:l: u ... · artigo é analisar, usando essa...

23
Disponível em http://www.anpad.org.br/rac-e RAC-Eletrônica, Curitiba, v. 2, n. 3, art. 8, p. 486-508, Set./Dez. 2008 O Duopólio das Empresas Aéreas Brasileiras TAM e GOL: O Duopólio das Empresas Aéreas Brasileiras TAM e GOL: O Duopólio das Empresas Aéreas Brasileiras TAM e GOL: O Duopólio das Empresas Aéreas Brasileiras TAM e GOL: u u u uma ma ma ma Aplicação da Teoria dos Jogos à Competição Oligopolista Aplicação da Teoria dos Jogos à Competição Oligopolista Aplicação da Teoria dos Jogos à Competição Oligopolista Aplicação da Teoria dos Jogos à Competição Oligopolista Estratégica Estratégica Estratégica Estratégica The Duopoly of Brazilian Airlines TAM and GOL: an Application of the Game Theory he Duopoly of Brazilian Airlines TAM and GOL: an Application of the Game Theory he Duopoly of Brazilian Airlines TAM and GOL: an Application of the Game Theory he Duopoly of Brazilian Airlines TAM and GOL: an Application of the Game Theory to Strategic Oligopolistic Competition to Strategic Oligopolistic Competition to Strategic Oligopolistic Competition to Strategic Oligopolistic Competition Augusto Marcos Carvalho de Sena * Ph.D. em Economia, University of New Hampshire, Estados Unidos. Professor do CMA/UNIFOR, Fortaleza/CE, Brasil. *Endereço: Augusto Marcos Carvalho de Sena Rua Pereira de Miranda, 1110, apto. 202, Papicú, Fortaleza/CE, 60175-045. E-mail: [email protected] Copyright © 2008 RAC-Eletrônica. Todos os direitos, inclusive de tradução, são reservados. É permitido citar parte de artigos sem autorização prévia desde que seja identificada a fonte.

Upload: buitruc

Post on 20-Jan-2019

224 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Disponível em

http://www.anpad.org.br/rac-e

RAC-Eletrônica, Curitiba, v. 2, n. 3, art. 8, p. 486-508, Set./Dez. 2008

O Duopólio das Empresas Aéreas Brasileiras TAM e GOL:O Duopólio das Empresas Aéreas Brasileiras TAM e GOL:O Duopólio das Empresas Aéreas Brasileiras TAM e GOL:O Duopólio das Empresas Aéreas Brasileiras TAM e GOL: u u u uma ma ma ma Aplicação da Teoria dos Jogos à Competição Oligopolista Aplicação da Teoria dos Jogos à Competição Oligopolista Aplicação da Teoria dos Jogos à Competição Oligopolista Aplicação da Teoria dos Jogos à Competição Oligopolista

EstratégicaEstratégicaEstratégicaEstratégica

TTTThe Duopoly of Brazilian Airlines TAM and GOL: an Application of the Game Theory he Duopoly of Brazilian Airlines TAM and GOL: an Application of the Game Theory he Duopoly of Brazilian Airlines TAM and GOL: an Application of the Game Theory he Duopoly of Brazilian Airlines TAM and GOL: an Application of the Game Theory to Strategic Oligopolistic Competitionto Strategic Oligopolistic Competitionto Strategic Oligopolistic Competitionto Strategic Oligopolistic Competition

Augusto Marcos Carvalho de Sena * Ph.D. em Economia, University of New Hampshire, Estados Unidos.

Professor do CMA/UNIFOR, Fortaleza/CE, Brasil. *Endereço: Augusto Marcos Carvalho de Sena Rua Pereira de Miranda, 1110, apto. 202, Papicú, Fortaleza/CE, 60175-045. E-mail: [email protected] Copyright © 2008 RAC-Eletrônica. Todos os direitos, inclusive de tradução, são reservados. É permitido citar parte de artigos sem autorização prévia desde que seja identificada a fonte.

O Duopólio das Empresas Aéreas Brasileiras TAM e GOL: uma Aplicação da Teoria dos Jogos à Competição Oligopolista Estratégica

RAC-Eletrônica, Curitiba, v. 2, n. 3, art. 8, p. 486-508, Set./Dez. 2008 www.anpad.org.br/rac-e

487

RRRRESUMOESUMOESUMOESUMO O uso da teoria dos jogos para a formalização da competição entre empresas tem-se intensificado. O objetivo do artigo é analisar, usando essa teoria, a estrutura de competição e o processo de decisão estratégica das duas principais empresas aéreas do Brasil, em relação à variável ‘venda de PAX’. Os dados dessa variável foram levantados da ANAC (2007) e a metodologia envolveu o uso de métodos estatístico, matemático e de técnicas de cenários. A competição por receita é analisada usando-se medidas de market shares, níveis médios e dispersões de vendas entre dezembro-2006 e novembro-2007. Tendo como base as medidas de tendência, dois cenários são conjecturados, envolvendo estratégias em direção à redução ou elevação de vendas pelas empresas. O duopólio de Cournot é evidenciado pelo mercado brasileiro de linhas domésticas, onde TAM e GOL competem com market shares equilibradas. O duopólio de Stackelberg é estruturado levando em conta o mercado brasileiro de linhas internacionais, onde a TAM domina e a GOL é seguidora. Os resultados mostram que no jogo de Cournot, as decisões estratégicas de equilíbrio sinalizam a redução de venda de PAX. No jogo de Stackelberg, tais decisões apontam a manutenção de tendência de vendas. Conclui-se que a competição por receitas, via venda de PAX, deve contemplar postura estratégica cautelosa pelas empresas. Palavras-chave: duopólio TAM-GOL no Brasil; competição duopolista estratégica; teoria dos jogos; jogos não-cooperativos de Cournot e Stackelberg.

AAAABSTRACTBSTRACTBSTRACTBSTRACT The use of the game theory to model competition among firms has increased. The aim of this article is to investigate, using this theory, the structure of competition and the strategic decision-making process of the main two Brazilian airlines companies considering the ‘PAX sales’ variable. Data on this strategic variable were collected from ANAC (2007) and the methodological procedures made use of statistical and mathematical methods and scenario building techniques. Revenue competition is analyzed via measuring market shares, average levels and dispersions of sales in the period from December-2006 to November-2007. Having the trend level as reference, two scenarios are conjectured, specifying strategies by both firms toward decreasing or increasing sales. Cournot duopoly is structured through the Brazilian domestic airlines market, where TAM and GOL compete with balanced market shares. Stackelberg duopoly is structured considering the Brazilian international airlines market, where TAM dominates the market and GOL is a follower. The results show that in Cournot competition, equilibrium strategic decisions shed light toward reducing PAX sales. Regarding Stackelberg competition, such strategic decisions point to a trend of continuity of sales. It is concluded that competition in revenues via PAX sales has to conceive strategic move cautiousness by both companies. Key words: TAM-GOL duopoly in Brazil; strategic duopoly competition; game theory; non-cooperative games of Cournot and Stackelberg.

Augusto Marcos Carvalho de Sena

RAC-Eletrônica, Curitiba, v. 2, n. 3, art. 8, p. 486-508, Set./Dez. 2008 www.anpad.org.br/rac-e

488

IIIINTRODUÇÃONTRODUÇÃONTRODUÇÃONTRODUÇÃO

Teoria dos jogos, desde inícios dos anos 1990s, tem-se tornado instrumento de ampla aplicação, principalmente nas ciências sociais aplicadas, como economia e administração. Desde a agraciação do prêmio Nobel de economia, em 1994, pelos estudiosos John C. Harsanyi e John F. Nash – por terem desenvolvido análise pioneira na área de equilíbrio em teoria dos jogos não-cooperativos – esse instrumental analítico tem sido usado sobremaneira.

Harsanyi (2001) faz extensivo uso da teoria dos jogos para formalizar processos de barganha na tomada de decisão de agentes em diferentes contextos, incluindo o acessamento subjetivo de probabilidades a ações estratégicas disponíveis aos agentes. Nash (1997) usa formalmente a teoria dos jogos não-cooperativos em análises sobre o comportamento de empresas que atuam em regimes de competição duopolista estratégica.

Segundo Kreps (1992), teoria dos jogos se divide em duas vertentes, teoria dos jogos não-cooperativos e teoria dos jogos cooperativos, com a diferença básica da unidade de análise. Em jogos cooperativos o foco recai sobre um grupo, uma coalizão, enquanto em jogos não-cooperativos a análise dá ênfase ao indivíduo otimizador.

A análise que contempla a aplicação da teoria dos jogos não-cooperativos à competição duopolista das empresas aéreas brasileiras TAM e GOL, usa em detalhes as formalidades e refinamentos dessa teoria para logicamente estruturar um jogo estratégico competitivo, representar movimentos estratégicos dos players envolvidos, conceber conjuntos informacionais e determinar soluções definitivas (payoffs de equilíbrio); é o objetivo central do presente artigo. O objetivo é, portanto, analisar em detalhes a estrutura de competição duopolista e o processo de tomada de decisão estratégica das duas principais companhias aéreas brasileiras, atentando para as soluções de equilíbrio, isto é, avaliando se as escolhas estratégicas são compatíveis com o objetivo de obtenção de receita máxima pelas empresas em diferentes cenários. A variável estratégica de interesse é ‘venda de PAX’, definida como o número de passageiros pagos transportados por km, proxy para venda de passagens pelas duas empresas.

A bibliografia usada enseja a conjectura de montagem de aparato teórico-empírico que dê suporte na aplicação da teoria dos jogos à análise dos regimes de concorrência duopolista, o que se objetiva investigar. Assim, manuais seminais de teoria microeconômica em geral, como Kreps (1990) e Mas-Colell, Whinston e Green (1995); de teoria dos jogos, particularmente focando em instrumental prático e, principalmente, em teorias de representação de jogos, tais como Aumann (2000), Dutta (1999), Rasmusen (2001) e Nash, Khun e Nasar (2007); assim como artigos de scholars da área aplicada de competição duopolista do tipo Cournot-Stackelberg; por exemplo, Caruana e Einav (2006), Einav e Nevo (2006), Huck, Muller e Normann (2001), Fulton (1997), Higgins (1996) e Chiarella e Okuguchi (1995), são usados como importantes obras de referência teórico-empírica para o presente artigo.

A metodologia utilizada na parte empírica (seção O Duopólio TAM-GOL no Brasil: Representações e Soluções de Equilíbrio dos Jogos Não-cooperativos de Cournot e Stackelberg) contempla o uso da técnica de cenários, auxiliada pela estatística descritiva para cálculo de medidas de tendência central e dispersão. A extrapolação de tendências será conduzida através do cálculo de médias e desvios-padrão, as primeiras medidas sendo usadas para especificação dos cenários de continuidade, e as segundas para determinação dos cenários alternativos pessimistas e otimistas. A análise de correlação estatística também será usada para evidenciar as especificidades do processo de competição interdependente, caracterizador da estrutura de mercado duopolista, onde as empresas se inserem, através do cálculo de coeficientes de correlação de Pearson entre as taxas de crescimento da variável market share das empresas TAM e GOL. Além disso, o método matemático de determinação de equilíbrio será usado para solucionar o problema de escolha estratégica ótima pelas empresas, visto que entre os vários cenários há possibilidades variadas de decisões a serem tomadas. Tais

O Duopólio das Empresas Aéreas Brasileiras TAM e GOL: uma Aplicação da Teoria dos Jogos à Competição Oligopolista Estratégica

RAC-Eletrônica, Curitiba, v. 2, n. 3, art. 8, p. 486-508, Set./Dez. 2008 www.anpad.org.br/rac-e

489

procedimentos metodológicos são usados no tratamento e análise dos dados secundários mensais sobre o comportamento de variáveis importantes para a caracterização das distintas estruturas de competição a serem investigadas, tais como market share e passageiros pagos transportados (PAX), proxy para a variável de decisão estratégica de passagens vendidas. A fonte das informações é a Agência Nacional de Aviação Civil [ANAC] e o período contemplado é de dezembro-2006 (mês de compra da Varig pela GOL) até novembro-2007.

O cálculo do comportamento médio da variável de decisão para as duas empresas é feito como forma de especificar o benchmark de continuidade estratégica. A partir disso, vislumbram-se mais dois tipos de movimentos estratégicos disponíveis às empresas: um contemplando cenário de aumento e outro de redução de vendas de passagens. As possibilidades de escolhas estratégicas pelas duas empresas, considerando os dois cenários alternativos vislumbrados, são mapeadas de forma pura e mista, atribuindo probabilidades às escolhas estratégicas.

Os resultados mostram que no jogo de Cournot (estrutura onde as empresas competidoras são consideradas de porte similar, em termos de market share, e, em virtude disso, a aplicação é conduzida, usando o mercado brasileiro de linhas domésticas, onde TAM e GOL dividem o mercado com percentuais próximos de 50%) várias são as possibilidades compatíveis com a implementação de diferentes estratégias perseguidas pelas duas empresas, em relação a quanto vender, mas só uma combinação de estratégias é Equilíbrio de Nash [EM] e, ao mesmo tempo, próxima do par de estratégias que maximiza receitas. Nessa estrutura, os diferenciais de receitas das empresas, em equilíbrio duopolista, são de magnitude reduzida, retratando a inexistência de liderança absoluta por quaisquer das empresas competidoras.

O jogo não-cooperativo de Stackelberg implica uma estrutura onde uma das empresas competidoras é líder e a outra seguidora. Em virtude disso, a aplicação é conduzida usando o mercado brasileiro de linhas internacionais. Neste a TAM lidera com market share de mais de 65%; vários são os resultados conseqüentes dos movimentos estratégicos dos players TAM e GOL em relação a quanto vender; as estratégias de vendas ótimas são também muito próximas da combinação de estratégias de EN. No equilíbrio desse duopólio, em virtude do domínio que possui no mercado de linhas aéreas internacionais, a empresa líder TAM obtém receita de vendas em torno de três vezes maior daquela auferida pela empresa seguidora GOL.

Além do exercício que contempla a aplicação dos refinamentos da teoria dos jogos não-cooperativos na análise da concorrência duopolista estratégica no setor de empresas aéreas brasileiro, as contribuições do artigo podem ser listadas em duas frentes. i) As soluções de equilíbrio obtidas, usando-se as ferramentas da teoria dos jogos são, per si, suficientes para a caracterização do comportamento otimizador dos players. Assim, a técnica tradicional de maximização de receitas pode ser descartada sem quaisquer perdas. ii) A conjectura de determinação de níveis de receitas esperadas, resultantes de movimentos estratégicos específicos, dá às empresas competidoras o poder de mapear (tanto em equilíbrio como fora dele) resultados prováveis, se determinados cenários ocorrerem, traduzindo-se assim em importante ferramenta para embasar a tomada de decisão estratégica. TTTTEORIA DOS EORIA DOS EORIA DOS EORIA DOS JJJJOGOSOGOSOGOSOGOS:::: FFFFORMALIDADES ORMALIDADES ORMALIDADES ORMALIDADES NA NA NA NA RRRREEEEPPPPRESENTAÇÃO DE UM RESENTAÇÃO DE UM RESENTAÇÃO DE UM RESENTAÇÃO DE UM JJJJOGO OGO OGO OGO NNNNÃOÃOÃOÃO----COOPERATIVOCOOPERATIVOCOOPERATIVOCOOPERATIVO

Osborne (2006) afirma que teoria dos jogos se constitui numa coleção de modelos designados a entender situações diversas do mundo real, nas quais decison-makers (players) interagem. Existem modos variados de se representar tais situações, estabelecendo regras, especificando tipo de informação disponível, interação entre jogadores e métodos de solução do jogo. Nessa seção consideram-se as formalidades envolvidas na representação de um jogo não-cooperativo com informação completa e perfeita, no sentido de que todos os players envolvidos conhecem as regras, o conjunto informacional relevante para a tomada de decisão estratégica e os objetivos perseguidos por cada player.

Augusto Marcos Carvalho de Sena

RAC-Eletrônica, Curitiba, v. 2, n. 3, art. 8, p. 486-508, Set./Dez. 2008 www.anpad.org.br/rac-e

490

Jogos não-cooperativos finitos, com informação completa e perfeita, podem ser representados em forma extensiva (árvore) ou em forma estratégica (matriz); podem envolver estratégias puras (sem atribuição de probabilidades pelos jogadores às diferentes estratégias disponíveis) ou mistas (com atribuição de probabilidades); e os movimentos dos players podem ser do tipo simultâneo ou seqüencial, isto é, seguindo as regras do jogo, os players podem fazer suas escolhas estratégicas, tanto simultaneamente como em seqüência.

Hirshleifer (2000) adverte que simultaneidade em teoria dos jogos não se refere ao aspecto temporal, de um jogador decidir qual estratégia escolher exatamente no mesmo instante em que o outro jogador faz sua escolha estratégica, mas sim ao uso de informação relevante disponível. Nas palavras do autor:

In game theory, simultaneity refers not to clock or calendar time, but to the state of information. So long as neither side, when making its own move, is aware of the opponent's choice, their two actions are regarded as simultaneous (Hirshleifer, 2000, p. 4).

Assim, se um dos players escolhe sua estratégia em t e, em t+1, o outro jogador decide qual estratégia usar, mas sem conhecer a estratégia escolhida pelo primeiro, tais movimentos são considerados simultâneos. Representação Representação Representação Representação Extensiva Extensiva Extensiva Extensiva de um de um de um de um Jogo NãoJogo NãoJogo NãoJogo Não----cooperativocooperativocooperativocooperativo

Segundo Kreps (1992), a representação extensiva de um jogo não-cooperativo inclui: i) lista do número finito de players; ii) desenho da árvore do jogo com seus vários tipos de nós (iniciais, de decisão e terminais); iii) designação de players ou natureza a cada nó inicial e de decisão; iv) lista de ações estratégicas disponíveis aos players; v) conjunto informacional; vi) payoffs (recompensas) dos (aos) players; e vii) probabilidades atribuíveis pelos players às diferentes estratégias disponíveis. Segue-se breve explicação de cada um desses itens.

Kreps (1992) inicia com a lista de players envolvidos, i = 1, 2, ... , I, com I finito. Há o estado da natureza (situação onde, em certo nó, há eventos fora do controle dos players) agindo como player.

A árvore do jogo é definida como o conjunto T(t) de todos os nós (iniciais, de decisão e terminais) e uma relação de precedência (<) sobre T, isto é, t precederá t' (t < t') se há uma seqüência de setas de t para t'. Formalmente, a precedência (<) é assimétrica, no sentido de que t < t' e t' < t não podem ser satisfeitos simultaneamente; e transitiva, isto é, se t < t' e t' < t'' então t < t'', elimina-se a possibilidade de circularidade no desenho da árvore. O conjunto de predecessores de t, P(t) = {t': t' < t}, é definido como o conjunto de setas t' que antecedem t. A regra básica para o desenho das setas da árvore de um jogo é traçar uma e somente uma seta saindo dos predecessores t' e chegando em t. O conjunto de sucessores de t, S(t) = {t': t < t'}, é definido como o conjunto de setas t' que sucedem t.

Em relação aos nós, defina W = {t: P(t) = Ø} como o conjunto de nós iniciais t ε T sem predecessores. O conjunto de nós terminais, Z = {t: S(t) = Ø}, é definido como o conjunto de nós t ε T sem sucessores. Os nós de decisão pertencem ao conjunto X = T – Z, isto é, exclui-se do conjunto de todos os nós T os nós terminais Z, com x ∉ W e x ε X.

Sumariando, pode-se dizer que a regra básica para o desenho da árvore que representa um jogo não-cooperativo em forma extensiva, dado o conjunto T de todos os nós e a relação de precedência (<), é desenhar um nó inicial ‘o’ para cada t ε W; para cada t ε X (conjunto dos nós de decisão) desenhe um nó de decisão ‘●’; e para cada t ε Z desenhe um nó terminal ( . ; . ). Para cada t ∉ W, isto é, para cada t que tenha pelo menos um predecessor, desenhe uma seta do seu predecessor imediato único para t. Para o desenho direto da árvore, observe que um nó que não tem seta apontando para ele deve ser obrigatoriamente um nó inicial. Um nó com setas chegando nele e saindo dele é um nó de decisão. Um nó sem seta saindo dele é um nó terminal. Sempre desenhe as setas de modo que não existam círculos (transitividade). Nunca mais de uma seta pode apontar para um mesmo nó.

O Duopólio das Empresas Aéreas Brasileiras TAM e GOL: uma Aplicação da Teoria dos Jogos à Competição Oligopolista Estratégica

RAC-Eletrônica, Curitiba, v. 2, n. 3, art. 8, p. 486-508, Set./Dez. 2008 www.anpad.org.br/rac-e

491

Um jogador ou natureza é designado a cada nó inicial e de decisão, isto é, a lista finita de players é i: X U W → {1, 2, ..., I, N}, onde X representa o conjunto de nós de decisão, W o conjunto de nós iniciais e N natureza.

Considerando as estratégias disponíveis, para cada t ε X U W, defina A(t) como o conjunto de ações estratégicas disponíveis em t.

O conjunto dos nós de decisão X é partido em conjuntos informacionais h, isto é, existe uma partição H = {h1, h2, ..., hn} de X, tal que para t e t' pertencentes à h, t e t' não podem se preceder; um único jogador i é designado ao conjunto informacional h; e as estratégias disponíveis em nós de um mesmo conjunto informacional são as mesmas para cada jogador. Tal arranjo significa que certos subconjuntos informacionais (h) dos nós de decisão são tais que o jogador que escolhe a estratégia em um dos nós não sabe em qual dos nós ele está. Assim, para representar o conjunto informacional, deve-se começar desenhando linhas pontilhadas que conectam todos os nós em um dado h ε H. Se dois nós estão conectados com linhas pontilhadas, nenhum deles precede o outro. Designe somente um player para os conjuntos informacionais. Para quaisquer dois nós conectados por linha pontilhada designe o mesmo conjunto de estratégias disponíveis ao player designado a esse nó.

Os payoffs podem ser representados pela existência de uma função utilidade esperada do tipo Neumann-Morgenstern (v-N-M), U : {1, 2, ..., I}x Z → R, escrita Ui (Z), significando que para cada jogador i imputa-se um payoff, utilizando-se a função U, definida no conjunto dos reais, inserido-o no nó terminal específico Z. A função utilidade esperada v-N-M, amplamente usada em economia, deve-se à seminal contribuição conjunta do matemático húngaro John von Neumann e do economista alemão Oskar Morgenstern, Theory of Games and Economic Behavior, publicada em 1944 e considerada a base da teoria dos jogos moderna. Na mais recente edição desse livro, Neumann e Morgenstern (2004), é celebrado o sexagésimo aniversário de publicação da obra.

Por fim, uma distribuição de probabilidades δ sobre o conjunto de nós iniciais W existe e para cada nó de decisão t ε X, uma distribuição de probabilidade ρ sobre o conjunto de estratégias disponíveis A(t) é dada.

A representação extensiva (em árvore) de um jogo não-cooperativo é mais usada em especificações que envolvem jogos de movimentos seqüenciais, onde há nítida observância em relação a vantagens que certo player pode ter por primeiro se movimentar (first mover advantage). Nesse contexto, a seção O Duopólio TAM-GOL de Stackelberg: Mercado de Linhas Internacionais no Brasil usará tal representação para formalizar o jogo de duopólio não-cooperativo de Stackelberg, onde a empresa TAM domina o mercado brasileiro de linhas aéreas internacionais, possuindo, portanto, vantagens como first mover. RepreRepreRepreRepresentação sentação sentação sentação Estratégica Estratégica Estratégica Estratégica de um de um de um de um Jogo NãoJogo NãoJogo NãoJogo Não----cooperativocooperativocooperativocooperativo

Na representação estratégica (em matriz) de um jogo não-cooperativo, assume-se que não existe natureza, isto é, o jogador i tem um conjunto de estratégias Si e uma função payoff do tipo Ui : S1 x S2 x ... x Sn → R, que, por definição, é uma função utilidade v-N-M, introduzida na representação extensiva da subseção anterior.

Formalmente, a representação de um jogo não-cooperativo em forma estratégica contém uma lista finita de jogadores i = 1, 2, ..., I e uma lista de estratégias Si, i = 1, 2, ..., I, e para cada profile de estratégias (S1, S2, ..., SI), um para cada jogador, o payoff específico de cada um deles é computado usando-se a função utilidade esperada Ui : П[j = 1 ; I] .Sj → R.

Nessa representação também distribuições de probabilidades existem, no sentido de que aos profiles de estratégias específicas a cada player probabilidades subjetivas são atribuídas. Assim, payoffs esperados podem ser computados, usando-se a função utilidade esperada do tipo v-N-M.

Kreps (1990) afirma que é sempre possível passar de uma representação extensiva para uma

Augusto Marcos Carvalho de Sena

RAC-Eletrônica, Curitiba, v. 2, n. 3, art. 8, p. 486-508, Set./Dez. 2008 www.anpad.org.br/rac-e

492

representação estratégica. São necessários dois passos para tal. Primeiro, para cada jogador i = 1, 2, ..., I, o conjunto de ações disponíveis é dado por Si = П[h ε H : i(h) = i].A(h), isto é, o profile de estratégias Si, para o jogador i, especifica precisamente qual ação estratégica esse jogador escolherá em cada conjunto informacional designado a ele. Segundo, para cada profile de estratégias (S1, S2, ..., SI), avalia-se a utilidade esperada para cada jogador, tomando-se o valor esperado sobre qualquer probabilidade atribuída no nó inicial ou em nós de decisão, relacionados a movimentos estratégicos subseqüentes.

Apesar dessa possibilidade, pode-se dizer que a representação estratégica de um jogo não-cooperativo é mais utilizada em especificações que envolvem jogos de movimentos simultâneos, onde não há possibilidade da existência de first mover advantage no regime de competição onde as empresas se inserem.

Na seção O Duopólio TAM-GOL de Cournot: Mercado de Linhas Domésticas no Brasil a representação estratégica será usada para formalizar a concorrência duopolista não-cooperativa de Cournot, onde as empresas TAM e GOL competem no mercado brasileiro de linhas aéreas domésticas com market shares muito equilibradas, não tendo nenhuma delas o poder de tirar proveito em relação a primeiros movimentos. OOOO DDDDUOPÓLIO UOPÓLIO UOPÓLIO UOPÓLIO TAMTAMTAMTAM----GOLGOLGOLGOL NO NO NO NO BBBBRASILRASILRASILRASIL:::: RRRREPRESENTAÇÕES EPRESENTAÇÕES EPRESENTAÇÕES EPRESENTAÇÕES E E E E SSSSOLUÇÕES OLUÇÕES OLUÇÕES OLUÇÕES DE DE DE DE EEEEQUILÍBRIO QUILÍBRIO QUILÍBRIO QUILÍBRIO DOS DOS DOS DOS

JJJJOGOS OGOS OGOS OGOS NNNNÃOÃOÃOÃO----COOPERATIVOS DE COOPERATIVOS DE COOPERATIVOS DE COOPERATIVOS DE CCCCOURNOT E OURNOT E OURNOT E OURNOT E SSSSTATATATACKELBERGCKELBERGCKELBERGCKELBERG

A seguir, a representação estratégica é aplicada ao jogo não-cooperativo de Cournot usando-se dois players (TAM e GOL) que competem entre si, escolhendo estrategicamente quantidades a vender (estratégias) para obtenção de receitas (payoffs). Nessa estrutura de competição, os dois players, de portes (market share) similares, escolhem estrategicamente níveis de venda de passagens sem que nenhum deles observe quanto o outro decide vender (jogo de movimentos simultâneos), apesar de ambos os competidores conhecerem entre si as opções estratégicas disponíveis.

A representação extensiva será aplicada, em seguida, ao jogo não-cooperativo de Stackelberg, onde um dos players domina o mercado (líder) escolhendo a quantidade a vender, enquanto o concorrente seguidor observa a escolha do líder e então decide estrategicamente quanto vender (jogo de movimentos seqüenciais).

O objetivo dessa seção é, portanto, construir, usando as formalidades até aqui apresentadas, os dois tipos de representações, enfocando as peculiaridades das duas estruturas de competição duopolista estratégica: Cournot e Stackelberg. Vários métodos de determinação de solução de equilíbrio serão apresentados após a construção representativa das formas estratégica e extensiva dos dois jogos.

Antes da análise das estruturas de concorrência onde as empresas brasileiras TAM e GOL se inserem, os procedimentos metodológicos usados no estudo são considerados. TTTTécnicas de écnicas de écnicas de écnicas de Cenários Cenários Cenários Cenários e e e e Métodos Estatístico Métodos Estatístico Métodos Estatístico Métodos Estatístico e e e e MatemáticoMatemáticoMatemáticoMatemático: : : : Procedimentos Procedimentos Procedimentos Procedimentos MetodológicosMetodológicosMetodológicosMetodológicos

Em consonância com o objetivo de analisar a estrutura de competição e o processo de tomada de decisão estratégica da TAM e GOL, em relação à variável ‘venda de PAX’ (os dados secundários originais dessa variável são publicados mensalmente no site da ANAC, http://www.anac.gov.br/estatistica/asspassi6.asp) em distintos cenários, faz-se, de início, uso da estatística descritiva para construção dos cenários-alvos, através do cálculo de medidas de tendência central (média) e dispersão (desvio-padrão). Considerando as N = 12 observações mensais da variável PAX (ANAC - dez./2006 a nov./2007, ver Anexos A e B) que compõem o universo de investigação;

O Duopólio das Empresas Aéreas Brasileiras TAM e GOL: uma Aplicação da Teoria dos Jogos à Competição Oligopolista Estratégica

RAC-Eletrônica, Curitiba, v. 2, n. 3, art. 8, p. 486-508, Set./Dez. 2008 www.anpad.org.br/rac-e

493

esse período representa uma população, visto que em dez./2006 a GOL adquiriu a Varig; as médias são obtidas computando µxj = {Σ[i = 1; N = 12]/N} e os desvios-padrão calculando σxj = {Σ[i = 1; N = 12](xi - µx)

2/N} 1/2, j = {TAM, GOL}. A literatura sobre estatística descritiva é vasta e autores com extenso material sobre usos práticos de medidas de tendência central e dispersão são Witte e Witte (2005) e Triola (2007).

As médias µx servirão de ponto de referência caracterizador dos benchmarks de continuidade, isto é, assume-se que essas medidas incorporam os cenários de tendência, onde as vendas de PAX pelas duas empresas permanecerão, no futuro, aos mesmos níveis médios do passado. Os desvios-padrão σx, que nos dão os graus de dispersão das vendas de PAX na vizinhança dos níveis de vendas médios, servirão de suporte à conjectura de dois cenários alternativos, um contemplando redução (cenário pessimista) e o outro aumento (cenário otimista) de vendas para cada empresa.

Considerando as conjecturas de cenários, a técnica de construção via extrapolação de tendências é usada, tanto para dar suporte ao benchmark de continuidade estratégica, como para vislumbrar os cenários alternativos de pessimismo e otimismo de vendas de PAX frisados acima.

Segundo Buarque (2003), existem dois grupos distintos de técnicas de construção de cenários. Um envolve técnicas que podem captar percepções de futuros não conectados com o comportamento passado e presente de variáveis relevantes, em geral envolvendo brain storming e percepções as mais variadas possíveis de agentes envolvidos em atividades diversas dentro das empresas e fora delas. O outro grupo refere-se a técnicas de extrapolação, onde a observância do comportamento passado e presente de variáveis relevantes é de fundamental importância para a prospecção e construção de cenários. Nesse front se inserem várias técnicas de prospecção, incluindo o método Baysiano de atribuição de probabilidades subjetivas a futuros prováveis. Segundo Taylor (1974, p. 299),

... if we take the view that probability is essentially subjective in nature in that it measures the degree of belief on the part of the observer that the event is question is going to occur, then … the observer is free to provide a prior [probability] distribution on the basis of his own personal judgment.

Desse modo, através da conjectura de distintos cenários, assume-se que distribuições de probabilidades subjetivas possam ser atribuídas pelas empresas competidoras entre si às diferentes escolhas de decisão estratégicas em relação à variável ‘vendas de PAX’.

Em relação à especificação da estrutura de competição interdependente das duas empresas, a variável market share mensal é calculada via divisão do número de PAX vendido por cada empresa pelo total vendido na indústria em cada mês. Para evidenciar a interdependência competitiva em quantidades vendidas de PAX, coeficientes de correlação de Pearson entre as variáveis market share mensais das duas empresas são computados, usando a fórmula rxT,xG = {Cov(xT, xG)/[σxT.σxG]}, T = TAM e G = GOL. Segundo Ramanathan (2002), tal coeficiente mensura o grau de ajustamento linear entre duas variáveis, com valores próximos a +1 ou -1, indicando forte correlação positiva (trajetórias lineares das duas variáveis na mesma direção), ou negativa (trajetórias lineares em direções opostas), respectivamente. Para a caracterização de uma estrutura competitiva que envolve elevado grau de interdependência entre as empresas, o coeficiente de correlação de Pearson deverá apresentar valor negativo e forte, isto é, próximo a -1, significando que trajetórias opostas dos market shares das duas empresas devem ocorrer.

Por fim, o método matemático de determinação de equilíbrio é usado para racionalizar escolhas ótimas pelas empresas em relação à variável estratégica ‘venda de PAX’. Formalmente, o objetivo é, para a empresa TAM, escolher xT = f(xG) de modo que sua receita com vendas de PAX seja máxima e, para a empresa GOL, escolher xG = f(xT) com o mesmo objetivo. Tal método matemático é extensivamente usado por Chiang (1984) em problemas de otimização que envolvem maximização de funções multivariadas. Deve-se ressaltar que os métodos de determinação de soluções ótimas, usados no contexto da teoria de jogos não-cooperativos, usados adiante, também se valem dessa mesma noção de otimização, mas sem necessidade de procedimentos matemáticos.

Augusto Marcos Carvalho de Sena

RAC-Eletrônica, Curitiba, v. 2, n. 3, art. 8, p. 486-508, Set./Dez. 2008 www.anpad.org.br/rac-e

494

Os Os Os Os MMMMercados de ercados de ercados de ercados de Linhas Aéreas Domésticas Linhas Aéreas Domésticas Linhas Aéreas Domésticas Linhas Aéreas Domésticas e e e e IIIIntntntnternacionais no Brasilernacionais no Brasilernacionais no Brasilernacionais no Brasil

A competição em duopólio que caracteriza o atual mercado de linhas aéreas no Brasil pode ser estruturada usando-se o instrumental da teoria dos jogos não-cooperativos até aqui desenvolvido e os procedimentos metodológicos considerados na seção Técnicas de Cenários e Métodos Estatístico e Matemático: Procedimentos Metodológicos. Vale salientar que, em virtude das características de competição no mercado brasileiro de linhas domésticas, onde a TAM e a GOL dividem o mercado com participações muito próximas, a aplicação envolverá o jogo competitivo à Cournot.

Segundo dados da ANAC (2007), no mês de outubro-2007, a participação da TAM no mercado de linhas domésticas foi de 46,56% e da GOL (incluindo números da Varig) de 44,95%. No período de dezembro de 2006 (mês em que a GOL adquiriu a Varig) a novembro de 2007, as médias mensais de market share de TAM e GOL foram de 49,1% e 42,4%, respectivamente. Em tal estrutura, pode-se observar que as duas empresas suprem mais de 90% da demanda de mercado por linhas domésticas, com participações equilibradas (ver anexo A), caracterizando a inexistência de um líder absoluto nesse mercado.

Camacho (2007), discorrendo sobre a crítica do presidente da companhia aérea brasileira OceanAir, em relação ao duopólio formado por TAM e GOL no mercado de aviação comercial doméstico brasileiro, ressalta que a elevada concentração (92% em fevereiro-2007: TAM com market share de 47,33%, GOL com 40,26% e Varig 4,57%) poderá se traduzir em sério problema para os consumidores nesse mercado.

Para evidenciar a interdependência existente das decisões das duas empresas em quanto vender no mercado brasileiro de linhas domésticas, como exigido em uma estrutura duopolista, o coeficiente de correlação entre as taxas de crescimento dos market shares de TAM e GOL, no período de dezembro-2006 a novembro-2007, é usado. O cálculo resultou em correlação da ordem de –0,73 (ver Anexo A), indicando que os comportamentos das participações de mercado mostram trajetórias opostas: quando a TAM eleva sua participação, a GOL reduz a sua, e vice-versa, em consonância com o regime de competição duopolista.

Para caracterização definitiva dessa estrutura de competição como jogo não-cooperativo de Cournot, necessário se faz comentário sobre a movimentação estratégica em simultaneidade das duas empresas. Calculando-se o comportamento médio mensal da variável de decisão estratégica PAX (número de passageiros km pagos transportados) para o período de 12 meses, obtém-se o benchmark caracterizador da estratégia de continuidade de ambas as empresas. A estratégia de continuidade da TAM é STC = 1,8 bilhão e da GOL é SGC = 1,5 bilhão (número de passageiros pagos transportados por km), variável proxy para quantidade de passagens vendidas (ver anexo A). As outras opções estratégicas de quanto vender comporão, mais adiante, os cenários pessimista (queda de vendas) e otimista (elevação de vendas). As três possibilidades estratégicas são conhecidas por ambos os jogadores, mas não há conhecimento de qual das escolhas será a abraçada por quaisquer das empresas, caracterizando assim a simultaneidade de movimentos exigida pelo jogo de Cournot.

Em relação à estrutura de competição duopolista estratégica do tipo Stackelberg, assume-se que o mercado brasileiro de linhas internacionais, dominado fortemente por uma das companhias aqui investigadas (TAM), em termos de market share, pode ser usado para evidenciar o regime de concorrência, onde a GOL é considerada como seguidora. Nesse mercado a participação da TAM é de 73,2% contra 26,1% da GOL, no mês de novembro de 2007, e, em termos de market share médios mensais no período dezembro-2006 a novembro-2007, as participações de TAM e GOL são de 66,5% e 27,4%, respectivamente (ver Anexo B).

O Duopólio das Empresas Aéreas Brasileiras TAM e GOL: uma Aplicação da Teoria dos Jogos à Competição Oligopolista Estratégica

RAC-Eletrônica, Curitiba, v. 2, n. 3, art. 8, p. 486-508, Set./Dez. 2008 www.anpad.org.br/rac-e

495

Fato concreto que evidencia o poder de barganha e a liderança da TAM no mercado brasileiro de linhas internacionais foi a concessão feita pela ANAC, em junho de 2007, permitindo que essa empresa operasse três rotas para a Alemanha, rotas antes pertencentes à Varig, essa última adquirida pela GOL desde dezembro de 2006. Segundo Rodrigues (2007), isso foi feito concomitantemente ao indeferimento de pedido da GOL para operar tais trechos.

A interdependência existente entre as decisões das duas empresas em quanto vender no mercado de linhas internacionais, pode ser novamente evidenciada através do cálculo do coeficiente de correlação entre as taxas de crescimento mensais dos market shares de TAM e GOL. No período de dezembro-2006 a novembro-2007, para esse mercado, a correlação é negativa e forte, chegando a –0,86 (ver Anexo B): quando a TAM eleva sua participação, a GOL reduz fortemente a sua, como exigido em um modelo de concorrência líder-seguidor.

Novamente, a caracterização do duopólio é clara: a soma das participações médias das duas empresas no mercado brasileiro de linhas aéreas internacionais fica em torno de 95% (ver Anexo B), mas com domínio amplo da TAM, que possui participação média de quase três vezes à da GOL. Nesse regime de competição, o fato de a GOL ser considerada seguidora e a TAM líder faz com que os movimentos estratégicos em relação a quanto vender sejam seqüenciais: primeiro a líder TAM define quanto vender e em seguida a GOL observa a escolha estratégica da líder e toma sua decisão de venda, como é exigido pela estrutura de um jogo de movimentos seqüenciais à Stackelberg.

O cálculo do comportamento de continuidade em relação à variável de decisão estratégica (PAX) é feito de maneira similar ao jogo de Cournot. Para a TAM a estratégia de continuidade de nível de venda de passagens no mercado de linhas internacionais é STC = 0,9 bilhão e para a GOL é SGC = 0,36 bilhão (ver Anexo B), evidenciando a participação média da líder TAM em quase três vezes a da GOL nos 12 meses analisados. As conjecturas pessimistas (redução de vendas) e otimistas (elevação de vendas) são consideradas e, no regime de competição duopolista de Stackelberg, a escolha estratégica da empresa seguidora GOL é feita quando ela já conhece a decisão tomada pela líder TAM em quanto vender no mercado brasileiro de linhas internacionais, caracterizando, assim, a forma seqüencial dos movimentos estratégicos das duas empresas nesse regime de competição. Aplicações das Aplicações das Aplicações das Aplicações das Representações Estratégica Representações Estratégica Representações Estratégica Representações Estratégica e e e e Extensiva Extensiva Extensiva Extensiva aos aos aos aos Duopólios Duopólios Duopólios Duopólios de Cournot e de Cournot e de Cournot e de Cournot e Stackelberg no Stackelberg no Stackelberg no Stackelberg no Mercado Brasileiro Mercado Brasileiro Mercado Brasileiro Mercado Brasileiro de de de de Linhas ALinhas ALinhas ALinhas Aéreaséreaséreaséreas

O modelo de Cournot foi publicado originalmente em francês em 1938, e o modelo de Stackelberg em alemão em 1944. Ambos têm sido aplicados às mais diversas situações de mercados sob regime de competição duopolista estratégica. Os vários trabalhos acadêmicos que se seguiram, sobre regimes de competição oligopolista, têm referenciado as importantes contribuições desses autores. Dutta (1999), Sushko e Puu (2002) e Rasmusen (2001), apresentam de maneira clara e sucinta, as principais características da competição em duopólio, contemplando os modelos originais. Contribuições empíricas importantes, usando os modelos de duopólio de Cournot e Stackelberg em diferentes contextos, são Huck et al. (2001), Fulton (1997), Higgins (1996) e Chiarella e Okuguchi (1995).

O objetivo dessa seção é conduzir a aplicação das representações estratégica e extensiva, apresentadas na seção Teoria dos Jogos: Formalidades na Representação de um Jogo Não-cooperativo, às duas estruturas de competição caracterizadoras dos mercados brasileiros duopolistas de linhas aéreas domésticas e internacionais, onde as empresas TAM e GOL atuam, usando as variáveis relevantes delineadas acima e as técnicas de cenário e os métodos estatístico e matemático apresentados na seção Representação Estratégica de um Jogo Não-cooperativo. O Duopólio TAM-GOL de Cournot: Mercado de Linhas Domésticas no Brasil

Primeiro, a representação estratégica do jogo será aplicada à competição duopolista de Cournot. Ressalte-se que, em decorrência da simultaneidade de movimentos estratégicos das empresas nesse tipo de competição, essa forma de representação é a mais adequada.

Augusto Marcos Carvalho de Sena

RAC-Eletrônica, Curitiba, v. 2, n. 3, art. 8, p. 486-508, Set./Dez. 2008 www.anpad.org.br/rac-e

496

A representação em forma matricial exclui natureza, isto é, o jogador i tem um conjunto de estratégias Si e uma função payoff do tipo Ui: S1 x S2 x ... x Sn → R, que é uma função utilidade v-N-M. Cada célula da matriz contém os payoffs, na primeira posição para o player TAM e na segunda para o player GOL. Nesse jogo, a ordem de posicionamento das duas empresas na matriz é irrelevante, em virtude da simultaneidade de movimentos.

Atribuem-se aos players i = {TAM, GOL} os profiles de estratégicas Sij, j = {P, C, O}, determinados pelas conjecturas da técnica de extrapolação de tendências, correspondendo às estratégias de cenário pessimista (P), continuidade (C) e otimista (O). Assim, em relação a esse conjunto de ações estratégicas A(t) disponíveis aos players, há um profile Si para cada jogador, com três estratégias de escolha de níveis de venda.

Aqui necessário se faz um breve adentro sobre a escolha de apenas três possibilidades estratégicas na representação do jogo. Como Selim (2006) adverte, em jogo de competição à Cournot existe uma complicação relativa à indeterminação de quantas estratégias estariam disponíveis a cada jogador, no sentido de que um número infinito de opções poderia ser escolhido por cada empresa. Mas, como afirma Kreps (1990), se as formalidades da teoria forem bem conduzidas tal problema não coloca empecilhos e, assim, a suposição de especificação de um profile com apenas três possibilidades de estratégias disponíveis a cada jogador não inviabiliza o potencial analítico do instrumental.

Em princípio, só os valores médios da variável de escolha estratégica de venda PAX estão disponíveis: STC = 1,8 bilhão para TAM e SGC = 1,5 bilhão para GOL (ver Anexo A). As escolhas estratégicas feitas pela empresa TAM nos cenários pessimista/otimista contemplam conjecturas de redução/aumento de vendas de PAX em 16,6%, percentual em torno do dobro do valor do desvio padrão da variável PAX (8,1%) dessa empresa, no período de dezembro de 2006 a novembro de 2007. Em relação à empresa GOL, as decisões estratégicas de cenários pessimista/otimista envolvem percentuais de redução/aumento um pouco mais elevados (20%), em virtude da magnitude do desvio padrão da variável PAX (10,5%) dessa empresa ter sido um pouco maior no mesmo período (ver Anexo A).

Para o cálculo dos payoffs, usa-se uma especificação linear para as condições de demanda do mercado de linhas aéreas no Brasil, isto é, P = [a – X], onde P é o preço de mercado do produto (PAX) vendido, a > X é um parâmetro positivo (maior que X, pois P > 0) e X = xT + xG é a quantidade total de PAX vendida no mercado pelas duas empresas. É extenso o uso de funções de demanda linear na literatura sobre competição oligopolista, principalmente no contexto da análise de duopólios. Importantes contribuições com aplicações do modelo de Cournot, usando demanda linear, são Hobbs e Pang (2007) e Ohkawa e Okamura (2003).

Os custos incorridos pelas empresas competidoras para viabilização dos serviços por elas prestados, apesar de muito importantes em relação a efeitos sobre a demanda de mercado, não são aqui levados em consideração. A concorrência duopolista investigada é puramente em receita de vendas, não havendo observação sobre lucros.

As funções receitas são πi = P.xi, i = {TAM, GOL}. Para eliminar a possibilidade de receita negativa, considerando-se os níveis estratégicos de venda escolhidos dos profiles Sij definidos acima, a > (STO + SGO), onde STO e SGO são os níveis máximos (cenário otimista) de venda de PAX de TAM e GOL, respectivamente.

Cada uma das nove células da representação estratégica do jogo da Figura 1 abaixo é preenchida usando as funções receita πT = (a – xT – xG).xT para a TAM e πG = (a – xT – xG).xG para a GOL. Por exemplo, usando as opções de decisões estratégicas de venda (em bilhões de unidades de PAX) disponíveis à empresa TAM, STP = 1,5, STC = 1,8 e STO = 2,1 e as disponíveis à empresa GOL, SGP = 1,2, SGC = 1,5 e SGO = 1,8, se a empresa TAM escolhe vender STP = 1,5 bilhões e a empresa GOL decide estrategicamente por SGP = 1,2 bilhões de PAX, a célula da matriz (1,5a – 4,05; 1,2a – 3,24) representa os payoffs (receitas) dos dois players para as escolhas estratégicas pessimistas de venda. Utilizando o valor mínimo do parâmetro ‘a’ (a = 3,9) para a não existência de receita negativa, os

O Duopólio das Empresas Aéreas Brasileiras TAM e GOL: uma Aplicação da Teoria dos Jogos à Competição Oligopolista Estratégica

RAC-Eletrônica, Curitiba, v. 2, n. 3, art. 8, p. 486-508, Set./Dez. 2008 www.anpad.org.br/rac-e

497

valores dos payoffs (em bilhões de unidades monetárias) seriam (1,8; 1,44), isto é, a TAM auferiria 1,8 bilhão e a GOL 1,44 bilhão. As outras células da Figura 1 são preenchidas de modo similar.

Figura 1: Forma Estratégica do Jogo de Cournot em Estratégias Puras

GOL

SGP = 1,2 SGC = 1,5 SGO = 1,8

STP = 1,5

TAM STC = 1,8

STO = 2,1

A representação estratégica do jogo de Cournot da Figura 1 só contempla o cálculo de payoffs em estratégias puras, isto é, não foram usadas distribuições de probabilidades que incorporassem quaisquer aleatoriedades existentes nos movimentos estratégicos dos players em relação às decisões de quanto vender. Mas tal refinamento é factível, assumindo-se que os players atribuem entre si probabilidades subjetivas às ações do concorrente, em consonância com o método Baysiano. Assuma que pi, ∑ pi = 1, são probabilidades atribuídas pela empresa TAM às ações do player GOL e qi, ∑ qi = 1, são as probabilidades atribuídas pela GOL às ações estratégicas do player TAM. Assim, uma distribuição de probabilidades q sobre o profile de estratégias da TAM existe (delineada pelo player designado às colunas da matriz, a GOL) e, para cada estratégia disponível ao player GOL outra distribuição de probabilidade p (delineada pelo player designado às linhas da matriz, a TAM) é dada. Calculando-se os payoffs esperados em estratégias mistas, a partir da atribuição de probabilidades pelas empresas às escolhas estratégicas de quanto vender, o par de valores (πT

E[STP] = 1,8p1 + 1,35p2 + 0,9(1 – p1 – p2); πG

E[SGP] = 1,44q1 + 1,08q2 + 0,72(1 – q1 – q2)) representaria a célula com os payoffs esperados dos dois players para as escolhas estratégicas STP = 1,5 e SGP = 1,2. Note que se a estratégia pessimista de venda SGP for jogada pela empresa GOL com alta probabilidade (p1 ≈ 1, atribuída pela empresa TAM e implicando que p2 ≈ 0), o payoff esperado da TAM será πT

E[STP] = 1,8 bilhões, e se, por outro lado, a estratégia também pessimista de venda STP = 1,5 for jogada pela TAM com alta probabilidade (q1 ≈ 1, atribuída pela empresa GOL e implicando que q2 ≈ 0), o payoff esperado da GOL será G

E[SGP] = 1,44 bilhões. Tal resultado, segundo Fudenberg, Kreps e Levine (1988), é chamado de teste de robustez de equilíbrio em jogo não-cooperativo em estratégias mistas. Adiante se mostra que os payoffs dessa célula representam a solução de equilíbrio do jogo de Cournot por vários métodos.

A seguir são apresentados três métodos de determinação de solução de equilíbrio (sucessiva dominância, equilíbrio de Nash e maximização) do jogo aqui investigado.

Uma das maneiras de se solucionar o jogo não-cooperativo de Cournot é através do método da sucessiva dominância (estrita ou não-estrita), aplicável à representação estratégica do jogo. Como afirmam Osborne e Rubinstein (1994), uma estratégia é não-estritamente dominada, se o jogador possui outras ações disponíveis que geram payoffs pelo menos igual ao payoff da estratégia dominada, para dada escolha estratégica do outro jogador.

Observando a Figura 1, primeiramente, detecte quais estratégias de venda são dominantes para cada um dos jogadores, um de cada vez, em termos de gerarem o maior payoff. Claramente, para a empresa GOL, as estratégias de venda SGP = 1,2 e SGC = 1,5 dominam (estritamente) a estratégia de venda SGO = 1,8, pois os payoffs respectivos dessas estratégias são maiores, quaisquer que sejam as escolhas estratégicas de venda da empresa TAM. Assim, pelo critério de dominância, a estratégia SGO = 1,8 é eliminada pela GOL, porque, como mostrado, tal estratégia é dominada estritamente. Agora considere a empresa TAM. É fácil observar que, pelo mesmo critério, a estratégia STO = 2.1 deve ser eliminada por essa empresa. Assim, pelo método da sucessiva dominância, o jogo não-cooperativo de Cournot

(1,8; 1,44) (1,35; 1,35) (0,9; 1,08)

(1,62; 1,08) (1,08; 0,9) (0,54; 0,54)

(1,26; 0,72) (0,63; 0,45) (0; 0)

Augusto Marcos Carvalho de Sena

RAC-Eletrônica, Curitiba, v. 2, n. 3, art. 8, p. 486-508, Set./Dez. 2008 www.anpad.org.br/rac-e

498

em representação estratégica é reduzido à matriz da Figura 2, após eliminação sucessiva da última coluna e última linha da matriz de payoffs da Figura 1.

Aplicando novamente o método da sucessiva dominância (estrita) ao jogo reduzido de Cournot da Figura 2, vê-se que a solução do jogo é a empresa TAM escolher a estratégia de venda STP = 1,5 e a empresa GOL, estrategicamente, escolher vender também a estratégia de cenário pessimista SGP = 1,2. Ressalte-se o fato de que tal solução independe de qual das empresas é considerada em primeiro lugar para iniciar o processo de eliminação sucessiva de estratégias, em consonância com a conjectura de simultaneidade de movimentos estratégicos em jogo não-cooperativo à Cournot. Além disso, apesar de esse método ter sido aqui aplicado à representação estratégica do jogo em estratégias puras (sem atribuição de probabilidades às decisões estratégicas), os resultados em nada se alteram, se tal refinamento é considerado.

Abaixo se mostra que a solução do jogo de Cournot, por sucessiva dominância, coincide com a solução via método de Nash.

Figura 2: Forma Estratégica do Jogo Reduzido de Cournot em Estratégias Puras

GOL

SGP = 1,2 SGC = 1,5

STP = 1,5

TAM STC = 1,8

Antes de proceder à maneira óbvia de se jogar o jogo, diga-se, de solucioná-lo, é importante introduzir formalmente a definição de Equilíbrio de Nash em estratégias puras.

Fudenberg e Tirole (1993) definem Equilíbrio de Nash, em jogo não-cooperativo de estratégias puras, iniciando com a lista de jogadores i = 1, 2, ..., I, especificando o conjunto de estratégias disponíveis Si para o jogador i, com s = (s1, s2, ..., sI) ε S = ∏[j = 1 ; I]sj, o profile de estratégias. Os payoffs são computados, usando a função utilidade esperada v-N-M, Ui: S → R. Assim, o profile de estratégias ŝ = (ŝ1, ŝ2, ..., ŝI) ε S é um Equilíbrio de Nash se e somente se Ui (ŝ) ≥ Ui (ŝ1, ŝ2, ..., ŝi-1, ŝi, ŝi+1, ..., ŝI) para todo si ε S, para todo i. Em palavras, tal definição diz que um profile de estratégias é Equilíbrio de Nash, se a resposta estratégica (payoff) de um jogador à escolha estratégica ótima do outro (em termos do payoff desse jogador) é da mesma forma ótima.

A definição do Equilíbrio de Nash em estratégias mistas contém as mesmas anuências da definição acima; mas, como pode ser visto em Mas-Colell et al. (1995), a complexidade aumenta em virtude da aleatoriedade introduzida a partir da atribuição de distribuições de probabilidades subjetivas às diversas possibilidades de movimentos estratégicos disponíveis aos jogadores.

Considerando a representação estratégica do jogo de Cournot aqui analisado, a definição de Equilíbrio de Nash em estratégias puras indica que as duas empresas otimizam simultaneamente, no sentido de que se uma escolhe a melhor estratégia disponível, dado que a outra já faz isso, a escolha de ambas é ótima. Gibbons (1992) afirma que Cournot já usara a solução de Nash, quase um século e meio antes, referindo-se à contribuição desse autor em fins dos anos 1930s.

Para determinar a solução de Equilíbrio de Nash na representação estratégica da Figura 1, comece com uma das empresas e uma estratégia. Se a empresa TAM escolhe a estratégia de continuidade de venda STC = 1,8, qual a melhor resposta da empresa GOL? Claramente, o melhor que a empresa GOL pode fazer é escolher a estratégia de cenário pessimista SGP = 1,2, pois o payoff 1,08 que ela aufere é maior que os payoffs 0,9 e 0,54 das estratégias de continuidade SGC = 1,5 e otimista SGO = 1,8, respectivamente.

(1,8; 1,44) (1,35; 1,35)

(1,62; 1,08) (1,08; 0,9)

O Duopólio das Empresas Aéreas Brasileiras TAM e GOL: uma Aplicação da Teoria dos Jogos à Competição Oligopolista Estratégica

RAC-Eletrônica, Curitiba, v. 2, n. 3, art. 8, p. 486-508, Set./Dez. 2008 www.anpad.org.br/rac-e

499

Agora, se a empresa GOL permanece na escolha estratégia, que é a sua melhor resposta (SGP = 1,2), ao que a empresa TAM escolhe (STC= 1,8), qual a melhor resposta da empresa TAM? Claramente, STP = 1,5 é a melhor resposta (e não STC!), pois o payoff 1,8 que ela aufere, dado que a empresa GOL otimiza em SGP, é maior que 1,62 e 1,26 das estratégias STC e STO, respectivamente. Isso viola a definição de Equilíbrio de Nash. O par de estratégias de venda STC = 1,8 e SGP = 1,2 não é EN. Apesar de a empresa GOL estar otimizando em SGP, quando a empresa TAM escolhe STC, STC não é a melhor resposta da empresa TAM, quando a empresa GOL otimiza em SGP.

Pelo critério de Nash é fácil verificar que o par de escolhas estratégias de cenário pessimista STP = 1,5 (escolha estratégica ótima da empresa TAM, quando a empresa GOL escolhe SGP) e SGP = 1,2 (escolha ótima da empresa GOL quando a empresa TAM escolhe STP), que gera os payoffs (1,8; 1,44), é a solução de EN. A coincidência de melhores respostas às estratégias escolhidas significa que ambas as empresas estão otimizando e que a solução é estável, pois não há incentivos para escolhas estratégicas superiores: a solução de Equilíbrio de Nash é estável.

Em relação ao método matemático de otimização, via maximização de receita, pode-se dizer que ele sempre foi o tradicionalmente usado para solucionar o modelo de competição duopolista de Cournot. O aparato conceitual desse modelo contempla, como mostrado, a estrutura onde duas empresas competem entre si, produzindo e vendendo um mesmo produto X (PAX) em certo mercado. As quantidades vendidas pelas empresas TAM e GOL são xT (PAX da TAM) e xG (PAX da GOL), com X = xT + xG, isto é, a demanda de mercado é totalmente suprida pelas vendas das duas empresas, como antes posto.

Pelo método de maximização de receitas, de acordo com Pindyck e Rubinfeld (1992), cada empresa deve escolher sua estratégia de venda em compatibilidade com a obtenção de receita máxima. Isso é feito por cada uma das duas empresas, levando-se em conta a escolha estratégica ótima de quanto produzir da outra. Assim, as escolhas estratégicas em quanto vender estão inter-relacionadas e são interdependentes, como exigido pela competição duopolista.

A solução do jogo de Cournot pelo método de maximização de receita usa as funções receitas πi = P.xi já definidas. As funções objetivo da maximização, são πT = (a – xT – xG).xT para a TAM e πG = (a – xT – xG).xG para a empresa GOL. Das condições de primeira ordem para obtenção de receitas máximas derivam-se as duas equações de reação do modelo, que mostram as interdependências das escolhas estratégicas das duas empresas: xT = [a – 2xG]/2 para a empresa TAM e xG = [a – 2xT]/2 para a GOL. Eliminando a possibilidade de receita negativa (a = 3,9), a solução do sistema de duas equações e duas incógnitas gera o par de quantidades de vendas ótimas xT

* = xG* = 1,3 bilhão de

unidades de PAX, gerando receitas máximas para ambas as empresas de πT* = πG

* = 1,69 bilhão.

As estratégias de cenários pessimistas de venda, STP = 1,5 bilhão para a empresa TAM e SGP = 1,2 bilhão para a GOL, obtidas anteriormente como solução do jogo de Cournot pelos métodos de sucessiva dominância e EN, estão bem próximas dos valores das estratégias de vendas (1,3 bilhão) que maximizam receitas via solução do método de otimização tradicional.

Independentemente da relevância relativa à determinação de soluções de equilíbrio do jogo para a tomada de decisão estratégica real, em relação às vendas de passagens e receitas auferidas pelas duas empresas investigadas, a análise das possibilidades estratégicas abertas aos jogadores, fora do equilíbrio do jogo competitivo de Cournot, no mercado brasileiro de linhas domésticas, é extrema relevância.

Considere a Figura 1 e permita que receitas esperadas sejam calculadas através da atribuição de probabilidades subjetivas pelas empresas às estratégias (mistas) disponíveis. Assumindo que as duas empresas competidoras atribuem elevada probabilidade de ocorrência às estratégias de continuidade, isto é, que o comportamento da variável de decisão estratégica (PAX) é conjecturado permanecer em torno de seu valor médio mensal dos últimos 12 meses (fora do equilíbrio), pode-se observar que as receitas auferidas seriam de 1,08 bilhão para a TAM e 0,9 bilhão para a GOL, envolvendo perdas substanciais para ambas.

Augusto Marcos Carvalho de Sena

RAC-Eletrônica, Curitiba, v. 2, n. 3, art. 8, p. 486-508, Set./Dez. 2008 www.anpad.org.br/rac-e

500

Na verdade, pode-se observar que os movimentos interdependentes das empresas em direção a escolhas estratégicas de cenários otimistas (fora do equilíbrio), contemplando aumento de vendas de PAX, conduz a reduções de receitas para ambas. Esse resultado é crucial na atual conjuntura de problemas e estrangulamentos por que passa o setor doméstico de aviação comercial. Não é, portanto, por acaso que a ANAC, nos últimos meses de 2007, tem sinalizado em direção a restrições em relação a aumento nas quantidades de PAX a serem emitidas pelas empresas que participam do mercado doméstico de aviação comercial. Na atual conjuntura, busca por maiores receitas conduz à cautela. Em virtude da interdependência caracterizadora do regime de competição duopolista entre as duas maiores empresas no mercado brasileiro de linhas aéreas domésticas, onde nenhuma delas domina o mercado de maneira absoluta, a melhor estratégia é o de postura defensiva, no sentido de analisar os prospectos de possibilidades disponíveis aos players. O Duopólio TAM-GOL de Stackelberg: Mercado de Linhas Internacionais no Brasil

O jogo não-cooperativo de Stackelberg é representado em forma extensiva devido à conjectura de movimentos seqüenciais por parte dos players envolvidos.

A lista de jogadores é novamente i = {TAM, GOL}, isto é I = 2 e também nesse jogo não há natureza N, no sentido de que, quando um dos jogadores escolhe quanto vender, a decisão do outro está sob seu controle, sem que eventos alheios, fora do controle dos jogadores (natureza), estejam presentes. O desenho da árvore que representa o jogo não-cooperativo de Stackelberg pode ser visto na Figura 3. Há o conjunto T(t) de todos os nós e a relação de precedência (<) definida anteriormente na primeira seção. Para t ε W designe o player TAM, isto é, desenhe o nó inicial ‘o’ e o designe ao primeiro jogador. Para cada t ε X (conjunto dos nós de decisão) desenhe um nó de decisão ‘●’ e o designe ao player GOL.

Para o jogo à Stackelberg a líder TAM é obrigatoriamente designada ao nó inicial ‘o’, pois é ela a primeira a mover, escolhendo quanto vender e, em seguida, sua concorrente seguidora GOL, estrategicamente, faz sua escolha (há três nós de decisão designados à GOL), observando quanto a líder trouxe ao mercado. A competição aqui contempla o mercado brasileiro de linhas aéreas internacionais, visto que o market share da líder TAM é quase o triplo da participação da empresa seguidora GOL, como já frisado.

Em relação ao conjunto de ações estratégicas A(t) disponíveis aos players, há um profile Si para cada jogador, com três estratégias de escolha de níveis de vendas: continuidade, representando os níveis de venda médios mensais no período dezembro-2006 a novembro-2007 e usado como benchmark de continuidade estratégica (STC e SGC); os níveis de cenários pessimistas (STP e SGP); e os de cenários otimistas (STO e SGO), os dois últimos pares contemplando estratégias de reduções e aumentos nas quantidades de passagens vendidas pelas duas empresas, respectivamente.

As escolhas estratégicas feitas pela empresa TAM nos cenários pessimista/otimista contemplam redução/aumento de vendas de PAX em 25,5%, percentual em torno do dobro do valor do desvio padrão da variável PAX (12,8%) dessa empresa no período de dezembro de 2006 a novembro de 2007. Em relação à empresa GOL, as decisões estratégicas de cenários pessimista/otimista envolvem percentuais de redução/aumento mais elevados (33,3%), em virtude da magnitude do desvio padrão da variável PAX (17,1%) dessa empresa ter sido maior no mercado brasileiro de linhas aéreas internacionais no mesmo período.

Para preenchimento dos nós terminais (payoffs) da árvore da Figura 3 são usadas as mesmas funções receitas do jogo de Cournot, concebendo-se as condições de demanda de mercado via P = [a – x], com X = xT + xG e a > (STO + SGO). Se, por exemplo, a empresa líder TAM escolhe a opção estratégica de cenário otimista de venda STO = 1,13 bilhão, a GOL observa e, em seguida toma sua decisão, escolhendo a estratégia pessimista SGP = 0,24 bilhão, tais escolhas estratégicas resultariam em receitas de 0,27 bilhão para a TAM e apenas de 0,06 bilhão para a GOL, usando a = 1,61, a soma das quantidades máximas de PAX trazidas ao mercado pela duas empresas. Dada a vantagem de first mover para a líder TAM, à GOL só resta a opção defensiva de escolher otimamente a estratégia

O Duopólio das Empresas Aéreas Brasileiras TAM e GOL: uma Aplicação da Teoria dos Jogos à Competição Oligopolista Estratégica

RAC-Eletrônica, Curitiba, v. 2, n. 3, art. 8, p. 486-508, Set./Dez. 2008 www.anpad.org.br/rac-e

501

pessimista de vendas. Adiante se mostra que esse resultado não representa a solução de equilíbrio do jogo.

Aqui os cálculos dos payoffs contemplam apenas os ganhos do jogo de Stackelberg em estratégias puras, mas probabilidades podem ser atribuídas pelas empresas às estratégias disponíveis e as receitas esperadas podem ser obtidas sem qualquer dificuldade.

Figura 3: Representação Extensiva do Jogo Não-cooperativo de Stackelberg em Estratégias

Puras

;

;

;

;

;

;;

;

;

Considere os payoffs esperados em estratégias mistas, calculados a partir da atribuição de probabilidades pelas empresas às escolhas estratégicas de quanto vender. O par de valores (πT

E[STC] = 0,423p1 + 0,315p2 + 0,207(1 – p1 – p2); πG

E[SGC] = 0,208q1 + 0,126q2 + 0,043(1 – q1 – q2)), para a = 1,61, representaria o nó terminal com os payoffs esperados dos dois players para as escolhas estratégias STC = 0,9 e SGC = 0,36, após as duas empresas atribuírem entre si probabilidades às escolhas estratégicas de venda feitas por ambas. Se, por exemplo, a GOL atribuir elevada probabilidade ao movimento da TAM em direção a sua estratégia de continuidade de venda STC = 0,9 (q2 ≈ 1, o que leva à q1 ≈ 0) e, por outro lado, a TAM atribuir elevada expectativa de que a GOL a siga e escolha também a estratégia de continuidade de vendas (p2 ≈ 1, o que leva à p1 ≈ 0), então os payoffs esperados para as duas empresas serão (0,315; 0,126), o segundo nó terminal conectado ao segundo nó de decisão da representação extensiva do jogo não-cooperativo de Stackelberg da Figura 3.

É possível mostrar que os payoffs dessa célula representam a solução de equilíbrio do jogo pelos métodos de indução invertida e de EN. Esses dois métodos de determinação de solução de equilíbrio desse jogo duopolista, além do método matemático de maximização de receita, são apresentados a seguir.

O método de indução invertida (backward induction) é a forma apropriada a ser aplicada para solucionar o jogo não-cooperativo de movimentos seqüenciais do tipo Stackelberg. Usando a Figura 3, pode-se observar que a regra básica para solucionar o jogo por esse método é começar em nós terminais t ε Z. Para o jogador que tem a escolha no nó de decisão predecessor imediato do nó terminal específico (empresa GOL), escolha a estratégia de venda ótima, isto é, a GOL escolhe estrategicamente SGO = 0,48, SGC = 0,36, e SGP = 0,24, quando a empresa líder TAM escolheu, nos primeiros movimentos, STP = 0,67, STC = 0,9 e STO = 1,13, sequenciadamente.

Augusto Marcos Carvalho de Sena

RAC-Eletrônica, Curitiba, v. 2, n. 3, art. 8, p. 486-508, Set./Dez. 2008 www.anpad.org.br/rac-e

502

Represente o jogo reduzido, substituindo cada nó de decisão predecessor pelo correspondente nó terminal ótimo, como pode ser visto na Figura 4. Repita o mesmo procedimento, mas considerando agora a escolha estratégica ótima da TAM. A maneira óbvia de solucionar esse jogo é a TAM escolher a estratégia de venda de continuidade STC = 0,9, pois os payoffs do nó terminal (0,315; 0,126) do jogo reduzido imputa o valor de 0,315 bilhão como receita da TAM para essa estratégia, maior que quando comparado aos payoffs 0,308 bilhão e 0,271 bilhão das outras duas estratégias disponíveis à empresa líder TAM.

Figura 4: Representação Extensiva do Jogo Reduzido de Stackelberg em Estratégias Puras

;

;

;

A solução do jogo não-cooperativo de Stackelberg pelo método de indução invertida é também Equilíbrio de Nash. A empresa líder TAM obtém payoff ótimo de 0,315 bilhão, compatível com a estratégia de venda STC = 0,9, e a melhor resposta que a empresa GOL (seguidora) pode dar, dado que a empresa TAM já otimizou em seu primeiro movimento, é escolher a estratégia de continuidade de venda SGC = 0,36 e obter payoff de 0,126 bilhão.

Será mostrado a seguir que o par de estratégias [STC = 0,9 e SGC = 0,36] que representa a solução de equilíbrio do jogo de Stackelberg pelos métodos de indução invertida e de EN, tem valores muito próximos aos que solucionam o jogo pelo método da maximização de receita.

Considerando o método tradicional de solucionar o jogo de competição duopolista de Stackelberg, a mesma conjectura para as firmas que competem no mercado específico onde elas atuam pode ser delineada, com uma importante diferença: uma das duas empresas (GOL, seguidora) assume que sua escolha estratégica de produção é função do nível de produção escolhido pela outra empresa líder TAM. Isso significa que os movimentos estratégicos dos jogadores são seqüenciais, com a empresa líder agindo em primeiro lugar e, em seguida e observando o que a líder fez, a seguidora age escolhendo sua estratégia de produção ótima.

A solução do jogo competitivo de Stackelberg pelo método de maximização de receitas instrui que, antes de a empresa líder maximizar sua receita πT = P.xT, deve substituir o nível de venda da empresa seguidora, xG = f(xT) (que é função explícita de quanto a empresa líder escolhe produzir), na função receita da empresa líder. Levando em consideração a especificação de demanda linear e eliminando a possibilidade de receita negativa, a função receita da TAM, objetivo da maximização, é πT = {a – xT – ([a – xT]/2)}.x T. Das condições de primeira ordem para auferição de receita máxima obtêm-se as quantidades ótimas de xT

* = 0,8 bilhão para a TAM e xG* = 0,4 bilhão para a GOL, com receitas

máximas para a empresa TAM de πT* = 0,32 bilhões e para a GOL de πG

* = 0,16 bilhões.

Pode-se ver que o par de estratégias de continuidade de venda resultante da aplicação do método de indução invertida e EN, STC = 0,9 bilhão para a empresa TAM e SGC = 0,36 para a empresa GOL, contempla valores de vendas estratégicas muito próximos daqueles que maximizam as receitas de ambas as empresas na estrutura do jogo não-cooperativo de Stackelberg. Também as estratégias de vendas da solução de equilíbrio por indução invertida e EN geram receitas para a TAM da ordem de 2,5 à auferida pela GOL, em consonância com a competição duopolista do tipo líder-seguidor de Stackelberg.

O Duopólio das Empresas Aéreas Brasileiras TAM e GOL: uma Aplicação da Teoria dos Jogos à Competição Oligopolista Estratégica

RAC-Eletrônica, Curitiba, v. 2, n. 3, art. 8, p. 486-508, Set./Dez. 2008 www.anpad.org.br/rac-e

503

Analisando uma possibilidade aberta fora do equilíbrio, poderia até parecer que a empresa líder TAM escolheria a estratégia pessimista de venda STP = 0,67, pois nesse caso ela poderia auferir receita de 0,469 bilhão (o maior entre todos os payoffs do jogo). Mas, como a empresa seguidora GOL observa a escolha da líder e depois, estrategicamente toma sua decisão, claro é que a escolha ótima da GOL seria vender na conjuntura otimista STO = 0,48 bilhão, levando sua receita a aumentar de 0,126 bilhão para 0,221 bilhão, e, ao mesmo tempo, reduzindo a receita da líder TAM, de 0,315 bilhão para 0,308 bilhão.

Tais resultados mostram que os movimentos seqüenciais interdependentes das empresas em direção a escolhas estratégicas fora do equilíbrio, isto é, contemplando cenários pessimistas e/ou otimistas de vendas de PAX, pode conduzir a perdas substanciais de receitas. Em virtude da interdependência caracterizadora do regime de competição duopolista entre a empresa líder TAM e a seguidora GOL no mercado brasileiro de linhas aéreas internacionais, a melhor escolha é a de postura de continuidade estratégica, no sentido de as duas empresas manterem a tendência de comportamento de venda de PAX nesse mercado. CCCCONCLUSÃOONCLUSÃOONCLUSÃOONCLUSÃO

Teoria dos jogos é uma abordagem usada para se entender o comportamento humano em situações onde decision-makers interagem como jogadores. As situações de competição do mundo real, em geral, não trazem com elas livros de regras, com todas as informações relevantes já prontas. Assim, é de suma importância que teóricos dessa área procurem instrumentos corretos para especificar situações de tomada de decisões estratégicas que envolvem players interagindo em ambientes competitivos.

Este artigo apresentou tais instrumentos e os usou para analisar o comportamento de duas empresas competidoras em dois regimes distintos de concorrência oligopolista estratégica: os duopólios TAM-GOL de Cournot e Stackelberg. Após a introdução das formalidades e refinamentos da teoria dos jogos não-cooperativos, isto é, das distintas formas de representar e solucionar tais jogos competitivos, aplicou-se o instrumental aos regimes de competição duopolistas citados. Mostrou-se que as soluções de equilíbrio em escolhas estratégicas de quanto vender nos dois jogos, obtidas pelos métodos de sucessiva dominância e Equilíbrio de Nash se aproximam sobremaneira das soluções ótimas obtidas pelo método tradicional de maximização de receitas.

Os principais resultados mostraram que no jogo não-cooperativo de Cournot, caracterizador de uma estrutura duopolista competitiva, onde nenhuma das duas empresas estudadas possuía domínio absoluto de mercado (market shares equilibradas), as estratégias de vendas de PAX por TAM e GOL no mercado brasileiro de linhas domésticas apontaram para uma conjectura defensiva, isto é, no equilíbrio competitivo de Cournot, a estratégia pessimista de vendas, para ambas as empresas, é a que resultou em maiores payoffs (receitas). Nessa estrutura de concorrência, as estratégias de venda STP = 1,5 bilhão de PAX para a TAM e SGP = 1,2 bilhão para a GOL resultaram em receitas de πT = 1,8 bilhão e πG = 1,44 bilhão, respectivamente, os maiores payoffs dentre todos do jogo. Observou-se que, em termos de receitas auferidas pelas empresas, não houve supremacia absoluta de nenhuma delas. O comportamento estratégico ótimo para TAM e GOL, no mercado brasileiro de linhas domésticas, sinalizou a redução da quantidade vendida de PAX para ambas, tendo como referência seus níveis de venda médios mensais (STC = 1,8 bilhão e SGC = 1,5 bilhão), calculados no período de dezembro-2006 a novembro-2007.

Em relação ao jogo não-cooperativo duopolista de Stackelberg, estrutura caracterizada pela competição do tipo líder-seguidor, os resultados mostraram que as estratégias de vendas de PAX por TAM (líder) e GOL (seguidora) no mercado brasileiro de linhas aéreas internacionais apontaram uma perspectiva de manutenção de tendência, isto é, no equilíbrio competitivo de Stackelberg, a estratégia de continuidade de vendas, para ambas as empresas, resultou em payoff (receita) para a empresa líder TAM de 2,5 vezes mais que para a empresa seguidora GOL, pois o par de estratégias de venda de

Augusto Marcos Carvalho de Sena

RAC-Eletrônica, Curitiba, v. 2, n. 3, art. 8, p. 486-508, Set./Dez. 2008 www.anpad.org.br/rac-e

504

equilíbrio, STC = 0,9 bilhão de PAX para a TAM e SGC = 0,36 bilhão para a GOL, resultou em receitas de πT = 0,315 bilhão para a líder e πG = 0,126 bilhão para a seguidora. O comportamento estratégico ótimo para TAM e GOL, no mercado brasileiro de linhas aéreas internacionais, sinalizou, assim, para a continuidade da quantidade vendida de PAX para ambas.

Portanto, tendo em vista o objetivo central de analisar a estrutura de competição e o processo de tomada de decisão estratégica em relação à variável ‘venda de PAX’ para obtenção de receita máxima por ambas as empresas, nos dois regimes duopolistas investigados, o estudo mostrou que em equilíbrio, os movimentos estratégicos de TAM e GOL se direcionam a escolhas estratégicas cautelosas: na competição duopolista à Cournot, tanto GOL como TAM estrategicamente escolhem, em equilíbrio, o cenário pessimista de venda de PAX e no jogo competitivo à Stackelberg, ambas escolhem estrategicamente como solução de equilíbrio a opção de cenário de tendência.

Entre as contribuições, pode-se ressaltar que os resultados advindos da prospecção de futuros alternativos, ligados a cenários distintos de venda de PAX na dinâmica competitiva entre TAM e GOL por maiores receitas, são de fundamental importância como suporte à tomada de decisões estratégicas nos mercados de linhas aéreas domésticas e internacionais.

Em relação às limitações da aplicabilidade da teoria dos jogos aos regimes de competição estratégica aqui investigados, independentemente de que os detalhes das estruturas de competição específicas do mercado brasileiro de linhas aéreas, onde as empresas TAM e GOL se inserem, estejam ou não em sintonia perfeita com os preceitos dos modelos de Cournot e Stackelberg usados, pode-se dizer que, com a observância minuciosa das formalidades e refinamentos recentes dessa teoria e utilização pertinente de procedimentos metodológicos, advindos da estatística e das técnicas de cenários, ampla gama pode ser considerada de situações onde as empresas competem entre si.

Considerando tais limitações do escopo usado no estudo, e para melhor caracterizar as especificidades e detalhes da competição no mundo real, onde as empresas brasileiras TAM e GOL participam e para dar mais robustez aos resultados aqui alcançados, seria também de vital importância lançar-se à investigação direta com estrategistas dessas empresas, por meio de levantamento de informações qualitativas diretas, de modo a melhor mapear possibilidades que possam vir a ser exploradas por diferentes conjecturas estratégicas das empresas. Além disso, trabalhos futuros que vislumbrem as anuências de dispositivos legais relacionados a mercados duopolistas regulados no Brasil podem também ser de grande importância para a complementaridade e melhora dos resultados aqui apresentados. Artigo recebido em 06.06.2007. Aprovado em 29.02.2008. RRRREFERÊNCIAS EFERÊNCIAS EFERÊNCIAS EFERÊNCIAS BBBBIBLIOGRÁFICASIBLIOGRÁFICASIBLIOGRÁFICASIBLIOGRÁFICAS Agência Nacional de Aviação Civil. (2007). Dados comparativos avançados: passageiros

transportados – janeiro a novembro 2007 e dezembro de 2006. Ministério da Defesa, ANAC. Recuperado em 18 dezembro, 2007, de http://www.anac.gov.br/estatistica/asspassi6.asp

Aumann, R. (2000). Collected papers (Vol. 1). Cambridge, MA: MIT Press.

Buarque, S. (2003). Metodologia e técnicas de construção de cenários globais e regionais. [Texto para Discussão Nº 939]. Instituto de Pesquisa em Economia Aplicada, Brasília, DF, Brasil.

Camacho, K. (2007, março 03). OceanAir critica duopólio no setor aéreo e diz que consumidor perde. Folha de São Paulo Online. Recuperado em 20 dezembro, 2007, de http://www1.folha.uol.com.br/folha/dinheiro/ult91u115705.shtml

O Duopólio das Empresas Aéreas Brasileiras TAM e GOL: uma Aplicação da Teoria dos Jogos à Competição Oligopolista Estratégica

RAC-Eletrônica, Curitiba, v. 2, n. 3, art. 8, p. 486-508, Set./Dez. 2008 www.anpad.org.br/rac-e

505

Caruana, G., & Einav, L. (2006). Production targets [Working Paper Nº 11958]. National Bureau of Economic Research, Cambridge, MA, United States.

Chiang, A. (1984). Fundamental methods of mathematical economics. New York: McGraw-Hill.

Chiarella, C., & Okuguchi, K. (1995). A dynamic analysis of Cournot duopoly in imperfectly competitive product and factor markets [Working Paper Nº 43]. University of Technology Department of Finance and Economics, Sydney, Australia.

Dutta, P. (1999). Strategies and games: theory and practice. Cambridge, MA: MIT Press.

Einav, L., & Nevo, A. (2006). Empirical models of imperfect competition: a discussion. Stanford University, Economics Department. Recuperado em 25 março, 2007, de http://www.stanford.edu/~leinav/WC_Discussion.pdf

Fudenberg, D., Kreps, D., & Levine, D. (1988). On the robustness of equilibrium refinements. Journal of Economic Theory, 44(2), 354-380.

Fudenberg, D., & Tirole, J. (1993). Game theory. Cambridge, MA: MIT Press.

Fulton, M. (1997). A graphical analysis of the Cournot-Nash and Stackelberg models. Journal of Economic Education, 28(1), 48-57.

Gibbons, R. (1992). Game theory for applied economists. New Jersey: Princeton University Press.

Harsanyi, J. (2001). Papers in game theory. New York: Springer.

Higgins, R. (1996). An economic theory of leader choice in Stackelberg models. Journal of Economic Studies, 23(5), 79–95.

Hirshleifer, J. (2000). Game-theoretic interpretations of commitment [Working Paper nº 799]. University of California, Department of Economics, Los Angeles, CA, United States.

Hobbs, B., & Pang, J. (2007). Nash-Cournot equilibria in electric power markets with piecewise linear demand functions and joint constraints. Operations Research, 55(1), 113-127.

Huck, S., Müller, W., & Normann, H. T. (2001). Stackelberg beats Cournot: on collusion and efficiency in experimental markets. Economic Journal, 111(474), 749-765.

Kreps, D. (1990). A course in microeconomic theory. New Jersey: Princeton University Press.

Kreps, D. (1992). Game theory and economic modelling. New York: Oxford University Press.

Mas-Colell, A., Whinston, M., & Green, J. (1995). Microeconomic theory. New York: Oxford University Press.

Nash, J. (1997). Essays on game theory. Brookfield, VT: Edward Elgar Publishing.

Nash, J., Khun, H., & Nasar, S. (2007). The essential John Nash. New Jersey: Princeton University Press.

Neumann, J. von, & Morgenstern, O. (2004). Theory of games and economic behavior (60th ed.). New Jersey: Princeton University Press.

Ohkawa, T., & Okamura, M. (2003). On the uniqueness of the welfare-maximizing number of firms under Cournot oligopoly. Bulletin of Economic Research, 55(2), 209-222.

Osborne, M., & Rubinstein, A. (1994). A course in game theory. Cambridge, MA: MIT Press.

Augusto Marcos Carvalho de Sena

RAC-Eletrônica, Curitiba, v. 2, n. 3, art. 8, p. 486-508, Set./Dez. 2008 www.anpad.org.br/rac-e

506

Osborne, M. (2006, April 24). Strategic and extensive games [Working Paper]. University of Toronto, Department of Economics, Toronto, ON, Canada.

Pindyck, R., & Rubinfeld, D. (1992). Microeconomics. New York: MacMillan.

Ramanathan, R. (2002). Introductory econometrics with applications. New Jersey: Harcourt College Publishers.

Rasmusen, E. (2001). Games and information: an introduction to game theory. Malden, MA: Blackwell Publishing Inc.

Rodrigues, L. (2007, junho 29). Anac repassa a TAM três rotas internacionais da velha Varig. Folha de São Paulo Online. Recuperado em 21 de dezembro, 2007, de http://www1.folha.uol.com.br/folha/dinheiro/ult91u308386.shtml

Selim, T. (2006). Endogenous quality choice: price and quantity competition. The Icfai Journal of Industrial Economics, 3(2), 45-75.

Sushko, I., & Puu, T. (2002). Oligopoly dynamics: models and tools. New York: Springer.

Taylor, L. (1974). Probability and mathematical statistics. New York: Harper & Row.

Triola, M. (2007). Introdução à estatística. Rio de Janeiro: LTC.

Witte, R., & Witte, J. (2005). Estatística. Rio de Janeiro: LTC.

O Duopólio das Empresas Aéreas Brasileiras TAM e GOL: uma Aplicação da Teoria dos Jogos à Competição Oligopolista Estratégica

RAC-Eletrônica, Curitiba, v. 2, n. 3, art. 8, p. 486-508, Set./Dez. 2008 www.anpad.org.br/rac-e

507

ANEXOANEXOANEXOANEXO AAAA

Mercado de Linhas Aéreas Domésticas no Brasil: TAM e GOL – dez. 2006 a nov. 2007

PAX – PASSAGEIROS KM PAGOS TRANSPORTADOS (000) TAM GOL(*) OUTRAS INDÚSTRIA

MESES PAX Mkt Share (%) ∆% MS PAX Mkt Share (%) ∆% MS PAX Mkt Share (%) PAX DEZ.2006 1813488 49,13 1469160 39,8 408801 11,07426921 3691449 JAN.2007 1990626 47,21 -3,908 1810709 42,94 7,88945 415628 9,85609786 4216963 FEV.2007 1571508 47,33 0,25418 1488524 44,83 4,40149 260410 7,84263059 3320442 MAR.2007 1765464 51,72 9,2753 1402852 41,1 -8,3203 245057 7,179320865 3413373 ABR.2007 1897249 50,69 -1,9915 1626347 43,44 5,69343 219069 5,853289033 3742665 MAI.2007 1828900 49,68 -1,9925 1655655 44,98 3,54512 196659 5,342232209 3681214 JUN.2007 1793419 49,11 -1,1473 1561372 42,76 -4,9355 296955 8,131863498 3651746 JUL.2007 1999593 50,63 3,09509 1565454 39,63 -7,3199 384418 9,73341959 3949465 AGO.2007 1549890 49,28 -2,6664 1232315 39,19 -1,1103 362660 11,53181456 3144865 SET.2007 1665441 48,15 -2,293 1437457 41,55 6,02194 356138 10,29587434 3459036 OUT.2007 1835409 46,56 -3,3022 1772182 44,95 8,18291 334661 8,489081875 3942252 NOV.2007 1896773 49,92 7,21649 1678993 44,19 -1,6908 223653 5,886505279 3799419

MÉDIA 1800647 49,1175 1558418 42,44666667 308676 8,434699909 3667740,75 D-PAD. 145030 1,561788747 164051 2,150984271 78256 2,099177 298876,4418

Fonte: ANAC – Agência Nacional de Aviação Civil (Dez. 2006 a Nov. 2007). <http://www.anac.gov.br/estatistica/asspassi6.asp> (*) Dados da GOL incluem os números da VARIG, adquirida em 15/12/2006. Elaboração do autor. Correlação entre as taxas de crescimento dos market shares da TAM e GOL: -0,729567

TAM X GOL: Estratégias e Payoffs no Jogo Competitivo à Cournot

STam SGol RTam RGol 1,2 (P) 1,8 1,44 P 1,5 1,5 (C) 1,35 1,35 1,8 (O) 0,9 1,08 1,2 (P) 1,62 1,08

C 1,8 1,5 (C) 1,08 0,9 1,8 (O) 0,54 0,54 1,2 (P) 1,26 0,72

O 2,1 1,5 (C) 0,63 0,45 1,8 (O) 0 0

Elaboração do autor.

Augusto Marcos Carvalho de Sena

RAC-Eletrônica, Curitiba, v. 2, n. 3, art. 8, p. 486-508, Set./Dez. 2008 www.anpad.org.br/rac-e

508

ANEXOANEXOANEXOANEXO BBBB

Mercado de Linhas Aéreas Internacionais no Brasil: TAM e GOL – dez. 2006 a nov. 2007

PAX – PASSAGEIROS KM PAGOS TRANSPORTADOS (000) TAM GOL(*) OUTRAS INDÚSTRIA

MESES PAX Mkt Share (%) ∆% MS PAX Mkt Share (%) ∆% MS PAX Mkt Share (%) PAX DEZ.2006 711411 60,6 252002 29,44 210525 17,93322986 1173938 JAN.2007 794889 58,68 -3,1683 407600 30,09 2,20788 152207 11,23550966 1354696 FEV.2007 736064 61,01 3,97069 371198 30,76 2,22665 99285 8,22885474 1206547 MAR.2007 806862 62,86 3,03229 376556 29,34 -4,6164 100072 7,796866357 1283490 ABR.2007 963625 69,68 10,8495 328825 23,78 -18,95 90574 6,548982519 1383024 MAI.2007 930801 72,36 3,84615 305478 23,75 -0,1262 50105 3,895026679 1286384 JUN.2007 904794 69,63 -3,7728 326175 25,1 5,68421 68526 5,273279235 1299495 JUL.2007 1077163 64,34 -7,5973 499706 29,85 18,9243 97421 5,818645515 1674290 AGO.2007 936299 65,34 1,55424 392838 27,41 -8,1742 103936 7,252666124 1433073 SET.2007 918920 69,78 6,79522 342364 26 -5,1441 55544 4,218014805 1316828 OUT.2007 1044690 71,19 2,02064 396594 27,03 3,96154 26136 1,78108517 1467420 NOV.2007 959741 73,18 2,79534 342022 26,08 -3,5146 9714 0,740691602 1311477

MÉDIA 898772 66,55416667 361780 27,38583333 88670 6,726904356 1349221,833 D-PAD. 114706 5,017731212 61753,9 2,486459543 54420 4,544386118 132163,9062

Fonte: ANAC – Agência Nacional de Aviação Civil (Dez. 2006 a Nov. 2007). <http://www.anac.gov.br/estatistica/asspassi6.asp> (*) Dados da GOL incluem os números da VARIG, adquirida em 15/12/2006. Elaboração do autor.

Correlação entre as taxas de crescimento dos market shares da TAM e GOL: -0,8638

TAM X GOL: Estratégias e Payoffs no Jogo Competitivo à Stackelberg

STam SGol RTam RGol 0,24 (P) 0,469 0,168 P 0,67 0,36 (C) 0,3886 0,2088 0,48 (O) 0,3082 0,2208 0,24 (P) 0,423 0,1128

C 0,9 0,36 (C) 0,315 0,126 0,48 (O) 0,207 0,1104 0,24 (P) 0,2712 0,0576

O 1,13 0,36 (C) 0,1356 0,0432 0,48 (O) 0 0

Elaboração do autor.