o croqui do arquiteto e o ensino do desenho volume iii

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o croqui do arquiteto e o ensino do desenho Anna Paula Silva Gouveia Orientador: Prof a . Dr a . Élide Monzeglio Tese de Doutorado FAU USP 1998 Volume III O ensino do desenho para arquitetos Kellen Muller

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Page 1: o croqui do arquiteto e o ensino do desenho Volume III

o croqui do arquiteto e o ensino do desenhoAnna Paula Silva Gouveia

Orientador: Profa. Dra. Élide Monzeglio

Tese de Doutorado

FAU USP

1998

Volume III

O ensino do

desenho para

arquitetos

Kellen Muller

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Este volume trata especificamente do desenho, enquantodisciplina, para um curso de arquitetura.

De início, apresentam-se algumas considerações sobre aquestão didática da relação ensino-aprendizagem, um brevehistórico das correntes pedagógicas e as bases teóricas nasquais se fundamentam, em especial sobre o trabalho de JeanPiaget sobre a operatividade do pensamento e a relação como desenho.

Na seqüência, uma abordagem sobre métodos de desenho,as implicações enquanto métodos possíveis para arquitetose algumas considerações finais, que sinteticamente aglutinamem propostas didáticas os conceitos desenvolvidos nos trêsvolumes que compõem esta tese.

Apresentação do Volume IIIO ensino do desenho para arquitetos

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Considerações básicas sobre Pedagogia eDidáticaPedagogia e DidáticaO processo de aprendizagemA relação ensino-aprendizagemO processo didáticoO professorMétodo e técnicaMétodo e ConteúdoNotas e referências bibliográficas

A Didática da Escola NovaA evolução das escolas - Breve história das correntespedagógico-didáticasO ensino tradicional e seus problemasA didática da escola ativaJohn Dewey e Edouard ClaparèdeGeorg KerschensteinerA psicologia de Jean Piaget aplicada à didática daescola ativaO pensamentoA pesquisa e a construção da operaçãoA assimilaçãoNotas e referências bibliográficas

Sumário

III.1.

III.1.1.III.1.2.III.1.3.III.1.4.III.1.5.III.1.6.III.1.7.

III.2.III.2.1.

III.2.2.III.2.3.III.2.3.1.III.2.3.2.III.2.4.

III.2.4.1.III.2.4.2.III.2.4.3.

Obs.: Os desenhos deste volume, com execeção dosapresentados no capítulo III.4.1. A Bauhaus, foramfotografados diretamente dos originais fornecidos pelosalunos da disciplina de Desenho e Materiais Expressivos doCurso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Mogidas Cruzes, das turmas de 1992, 1993 e 1996.

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Um curso de desenho com base na pesquisa eexemplos de experiência didáticaExperiência didática e a inserção do desenho comopesquisaA apresentação do problemaA escola nova e a arte-educaçãoNotas e referências bibliográficas

Os métodos de ensino do desenho pós escolaativaA BauhausJohannes IttenPaul KleeWassily KandinskyPós BauhausCarlo MaggioraOnofre Penteado - Desenho EstruturalBetty Edwards e o desenho com o lado direito docérebroNotas e referências bibliográficas

Considerações finaisNotas e referências bibliográficas

III.3.

III.3.1.

III.3.2.III.3.3.

III.4.

III.4.1.III.4.1.1.III.4.1.2.III.4.1.3.III.4.2.III.4.2.1.III.4.2.2.III.4.2.3.

III.5.

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A Pedagogia, enquanto ciência, deriva, tanto quanto as outrasciências, da Filosofia. A ela pertencem o estudo da naturezae da articulação do processo educativo. Considera-se, dentrode determinado conceito de ensino, que a Didática é umadas ciências pedagógicas. Assim, diferentes concepçõesfilosóficas derivam em diferentes conceitos de ensino e porfim em diferentes projetos didáticos.

Atualmente, a distinção entre Pedagogia e Didática se aclarae tende-se a dar, a esta última, sua distinta fisionomiametodológica.

A didática científica toma a si a tarefa de deduzirdo conhecimento psicológico dos processos deformação intelectual as medidas metodológicasmais aptas a provocá-los. (1)

Esta distinção, sem dúvida, intensificou o desenvolvimentoneste campo, promovendo uma diversificação quanto aosmétodos aliados às suas finalidades. Por exemplo, existemhoje várias especificações segundo o sujeito discente: comrespeito à idade, uma didática evolutiva e uma para adultos;em relação à capacidade, uma didática diferencial, outra paranormais e ainda uma para os superdotados; quanto aoambiente, uma didática para escola rural e outra para a urbana;em relação às disciplinas, didáticas especiais para cada áreado conhecimento e por último em relação aos métodosempregados no estudo dos problemas, dos quais surgirá umadidática dedutiva ou indutiva.

No entanto, para precisar melhor a Didática como ciênciaprático-normativa, deve-se distinguir os conceitos Educação,Instrução e Ensino, pois o primeiro, como veremos, estádiretamente relacionado com a Pedagogia e os dois últimoscom a Didática propriamente dita. Cabe aqui colocar que aPedagogia também se preocupa com “como fazer”, ou seja,na realidade é também uma ciência prático-projetiva, masmais genérica que a Didática.

III.1. Considerações básicas sobre Peda-gogia e Didática. O processo de en-sino-aprendizagem e seus agentes.

III.1.1. Pedagogia e Didática

Em linhas gerais, pode-se dizer que a Educação visa aformação moral do indivíduo, a Instrução (um dos meiosutilizados na Educação ou melhor um aspecto específico doprocesso educativo) visa a formação intelectual utilizando-se do Ensino como meio para a formação da mente.

Isto quer dizer que a Instrução não é uma mera acumulaçãode noções ou memorização de dados desconexos, mas é aconstrução e o aprimoramento de estruturas mentais, funçõeslógicas, perceptivas, etc.

Por outro lado, também não se deve confundir Instrução comEnsino.

“Enseñar”, etimológicamente, significa poner algoin signo, indicar, mostrar un objeto a alguien paraque se apropie de él intelectualmente. Por tanto,la enseñanza consistirá precisamente en elpresentar in signo sensibili los objetos, que elalumno deberá asimilar mediante su cono-cimiento.(2)

Restringindo-se, porém, o Ensino à proposição externasensível dos conteúdos conceituais, sem que os signos sejamperfeitamente interpretados pelo aluno, ter-se-á umaperspectiva de ensino, própria da escola tradicional, que nãointeressa a este trabalho.

Pode-se, então, dizer que a Didática, na medida em que tratade regular o processo instrutivo de formação intelectual, éuma metodologia da Instrução e pode, numa concepção maisrestrita, ser também considerada como uma tecnologia deEnsino, tendo em vista que não se trata de técnica pura (estaseria a Docência, técnica do ensino, o ato mesmo de ensinar).De acordo com o estudo das finalidades, das condições edas modalidades de ensino, é tecnologia, pois trata-se dateoria da técnica.

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Toda intervenção didática parte e retorna a um mesmo pontocentral: o processo de aprendizagem. Tal processo é condi-cionado subjetivamente pelos dois agentes da relaçãodidática. Da parte discente, pela capacidade de atividade ede auto-desenvolvimento, por fatores da motivação, dointeresse e também pelos hábitos de estudo e trabalhopessoal. Da parte docente, pela personalidade e pela técnicadirigidas pelos ideais educativos.

Por outro lado, este processo é também condicionadoobjetivamente por fatores como a estruturação da classe,do ambiente e das situações didáticas.

Segundo Antonio M. de Rezende (3), a aprendizagem é umaexperiência tipicamente humana, e isto nos mostram aAntropologia , a Psicologia e a Sociologia. Os animais sãoincapazes de aprender, embora possam ser domesticados eadestrados. Tal confusão a respeito desse conceito surgiu,segundo este autor, com as reflexões de Pavlov, o beha-viorismo e até certos trechos da teoria da Gestalt, pois pro-põem o comportamento animal como paradigma humano.

Outro equívoco, introduzido mais recentemente pelas teoriastecnocráticas, baseadas no desenvolvimento tecnológico, foi,segundo Rezende, propor como paradigma da aprendizagemhumana, o “comportamento” das máquinas, ou inteligênciaartificial. Em ambos os casos, apesar da redução em pólosopostos, existe um denominador comum: o desconhecimentoda estrutura do fenômeno humano. (4)

A Fenomenologia, no entanto, identifica aprendizagem coma compreensão, compreensão de símbolos, que por sua vezsão definidos como concentração do sentido e dos sentidosda existência (5) . Estes símbolos se referem a estruturas e àestrutura de estruturas.

Como tal, a aprendizagem humano-significativa vaiconsistir em buscar o sentido que se articula nosímbolo, procurando apreendê-lo através das

III.1.2. O processo de aprendizagem

diversas relações semânticas que se estabelecemna estrutura simbólica e a partir dela.(6)

A aprendizagem significativa é também a dos limi-tes do conhecimento e das múltiplas mani-festações da verdade. Dessa forma, a educaçãoda inteligência diz respeito não apenas aoconhecimento mas ao pensamento, isto é, àcapacidade de refletir, meditar e acrescentarsentido. Em outras palavras, a aprendizagemsignificativa é necessariamente interpretativa,hermenêutica, procurando descobrir em quesentido(s) há sentido(s).(7)

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Ensinar e aprender são dois conceitos a princípio correlatos.

Renzo Titone(8) questiona o ensinar a si mesmo e coloca comoalgo impossível de realizar-se, podendo, no entanto ocorrero “aprender por si mesmo”, ou auto-aprendizagem.

Os dois fenômenos ensinar e aprender são por conseguintealimentados por um tipo relação dinâmica, a relação didática,onde participam professor e aluno. Tal relação, na escolatradicional, inicia-se com o ato didático, relação bipolar ativaentre aluno e professor. Já nas correntes da escola ativa,esta relação expande-se para o grupo, a classe. Segundo J.Hillal(9) é um modo de interação, na qual a atitude muda deacordo com as pessoas que participam.

A relação ensinar - aprender também é “dialógica”, pois emsíntese aparece sob a fórmula do diálogo. O diálogo é umconectivo universal, é exercício do espírito e controle domesmo. Dá-se através dele a comunicação aluno-professor,não só verbal, mas gestual e no que se refere ao ensino dodesenho, este último como principal meio de comunicação.

Nesta relação dialógica, a interrogação é um estímulo aopensamento do discente, que se converte em elaborador dosaber, ao concretizar a resposta.

Esta didática, baseada na pergunta do professor e na respostado aluno, característica da escola tradicional, maisespecificamente do método maiêutico, não responde, narealidade, a todas as situações da questão ensino-aprendizagem. Ela entende o professor como agentedirecional do pensamento do aluno, na medida em que estesegue o caminho por ele estabelecido através das perguntas.Ver-se-á que na escola ativa é fundamental que as perguntaspartam também do aluno.

III.1.3. A relação ensino-aprendizagem III.1.4. O processo didático

Para um frutífero desempenho do processo didático, a relaçãoensino-aprendizagem, além de estar fundamentada em ummétodo coerente, deve contar com um profissional, que alémde adequadamente formado e informado, seja adequa-damente intencionado e estimulado. A atividade e a qualidadedo profissional estão diretamente relacionadas com o bomandamento do curso e dos resultados.

Na realidade, não é o aluno que deve se moldar ao professor,mas este último é quem por obrigação profissional deveconhecer e planejar o curso em função dos alunos.

Para tanto, um bom professor influirá no desenvolvimento doaluno em proporção ao seu grau de maturidade pessoal,envolvendo todos os aspectos da personalidade humana(inteligência, vontade, simpatia, caráter, etc.), além das outrasqualidades básicas, como preparação cultural (cultura gerale especializada), psicológica (referente ao conhecimento doaluno sob o ponto de vista fisiológico, psicológico, social,etc.), habilidade didática (capacidades inatas e aprendidas),etc.

Especificamente sobre o campo da Arte Educação, V.Lowenfeld coloca que:

Pero sí puede decirse que sea cual fuere lo que unmaestro haga para estimular la capacidad creadorade sus alumnos, su intento dependerá, princi-palmente, de tres factores: 1) su propria perso-nalidad, dela que son partes importantes su podercreador, su grado de sensibilidad y la flexibilidadde sus relaciones con el medio; 2) su habilidad parasituarse a sí mismo en el lugar de los demás; y 3)su comprensión y conocimiento de las neces-sidades de aquellos a quienes enseña.(10)

O mesmo autor enfatiza a problemática da relação aluno-professor, quanto à participação efetiva dos dois pólos destarelação na execução de um trabalho artístico. Sua pergunta

III.1.5. O professor

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Debe el maestro producir plasticamente? (11) foi respondidapositivamente pelo professores artistas da Bauhaus, comopor exemplo Klee e Kandinsky.

Un trabajo de arte, como producto del espíritohumano, solamente puede ser entendido cuandose comprenden las fuerzas que movieron a sucreación. Esas fuerzas impulsoras varían con elindivíduo y con su etapa de desarrollo; tambiénestán determinadas por la cultura en que el trabajose ejecuta y por el medio en que se realiza. Parapoder motivar juiciosamente al alumno, es esencialque el maestro conozca no solo esas fuerzas, sinoque deberá identificarse con el creador,experimentando sus mismos impulsos como sifueran parte de sus proprias experiencias.(12)

A relação didática professor-aluno, no campo da ArteEducação, deve, assim, se dar não apenas pelo diálogo, maspela pesquisa (esta é uma das bases da escola nova baseadaem Jean Piaget - V. V.III.2.4.), pelo mútuo desenvolvimentoartístico, subentendendo-se todos os conhecimentos a elevinculados. Neste caso, pode-se dizer que a relação éverdadeiramente dialética e de maior complexidade, secomparada com outros setores da educação, pois o alunotorna-se agente discente não dele próprio, mas do professor,além do fato de cada um deles se desenvolver por sua própriaauto-aprendizagem e delas poderem compartilhar.

No entanto, não se deve esquecer que a base desse processodidático está no professor, pois sem ele, método, programae cronograma não vingariam, e conseqüentemente nãohaveria nenhum processo de ensino-aprendizagem.

De maneira geral, pode-se definir método e técnica como:

... el método viene dado por el sistema de principiosgenerales directivos, que se presentan válidos parala consecución de un cierto fin, considerado en símismo y prescindiendo de posibles y variablescondiciones determinantes de un modo concreto,mientras que la técnica representaría un expedienteespecífico y bien articulado en sí mismo, capaz deresolver ciertas situaciones particulares. En suma,se trata de un “cómo” (medio, procedimiento,modalidad) adaptado a determinados momentosde la actividad educativa o didáctica.. (13)

Tanto os métodos, quanto as técnicas, são os meios dosquais o professor se serve para que possa, de maneira simplese eficaz, conduzir o aluno à assimilação do conhecimento,garantindo a aprendizagem pela parte discente.

Segundo Titone, seria perigoso para o professor confiarsimplesmente no que se denomina inspiração do momento,pois a situação na qual se dá o ato didático é de talcomplexidade que exige por sua vez, um cuidadoso controledos principais fatores, que nele intervêm.

No âmbito da Arte Educação, o método segundo Lowenfeldapresenta mais um objetivo, que é o de estimular acriatividade.

Debemos afirmar claramente que nuestraobligación es de ayudar a los individuos aidentificarse con ellos mismos, estimulando suscapacidades creadoras por los métodos quepermitan hacerlo con mayor eficacia.(14)

Em sua concepção, mais geral, método está ligado intrin-secamente com desenvolvimento e finalidade.

Por tanto, decir método equivale a decir orden.(15)

III.1.6. Método e Técnica

Esta ordem não é necessariamente, nem exclusivamente,uma estrutura lógica, mas pode-se tratar de uma ordempsicológica, concebida como contexto de estruturas efunções mentais. De fato, o método didático tem as duascomposições, psicológica em relação ao discente e lógicaem relação ao conteúdo da disciplina.

Assim, método é também adequação. Mediante ele, docentee matéria se ajustam ao aluno.

Historicamente, na metodologia didática surgiram duascorrentes opostas: a teoria do método único e o antime-todicismo.

A teoria do método único valorizou o método, enquanto meiode ordenar e unificar todos os graus de conhecimento, deforma abstrata e racionalista. Seus precursores foramComenio, Pestalozzi e Herbart. Outro teórico dessa corrente,Ziller, proclamava que o método era superior à personalidadedo professor, ou seja é onipotente. Apesar da importânciadesta teoria, no que se refere à organização lógica doprocesso instrutivo, ela é portadora de graves problemas,devido ao intelectualismo unilateral e abstrato, gerandoformas de ensino baseadas quase exclusivamente noprofessor e relegando o aluno a uma passividade contínua,sem estímulos para iniciativa pessoal e livre participação.

Em oposição a esta corrente, teóricos como Gentile eLombardo Radice deram fundamental importância ao carátercentral da personalidade do docente. Os ativistas por suavez, preferiram valorizar a espontaneidade da ação discente.

Atualmente, existe um consenso. Não se pode separaraspectos que devem estar sempre em concomitância: oaspecto psicológico, com seu jogo racional e irracional defatores, pelos quais se apresenta o discente; e o aspectológico, com as determinações objetivas do conteúdo.

O método é assim limitado por condições alheias a ele,

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subjetivas(do professor e do aluno) e objetivas (tipo deconteúdo, ambiente, etc.), o que resulta na convicção dasua relatividade quanto à eficiência por si próprio.

Se entende por conteúdo:

...un sistema orgánico de valores culturales quese traducen, en el caso del programa escolar, endeterminadas nociones y habilidades. (16)

Não se pode prescindir do conteúdo, quando da confecçãode um método específico. Esta colocação aparentementeóbvia, não se apresentou sempre desta forma no decorrerhistórico. Certas interpretações da escola ativista, quevalorizaram a espontaneidade e a liberdade do aluno atravésda atividade como processo de experiência, tenderam aminimizar o valor do conteúdo.

Por outro lado, correntes que primam pelo intelectualismoexacerbado, valorizaram o conteúdo, em detrimento dosoutros fatores.

Hoje é consenso:

se ve al método como la resultante de un encuentrosinérgico de un paralelogramo de fuerzas enequilibrio, es decir, como dependiente tanto del findel proceso didáctico como del contenido (objetodocible), así como del alumno (sujeto discente).(17)

III.1.7. Método e Conteúdo

Notas e referências bibliográficas

01. AEBLI, Hans. Didática Psicológica. Aplicação àdidática da psicologia de Jean Piaget. Atua-lidades pedagógicas volume 103. São Paulo: Ed.Nacional, 1971.p.3

02. TITONE, Renzo. Metodologia didactica. Madrid: Rialp,1966. p.29

03. REZENDE, Antonio Muniz de. Concepção Fenome-nológica da Educação. São Paulo: Cortez, 1990.

04. _________,_____________. op. cit. p.4905. _________,_____________. op. cit. p.5106. _________,_______________. op. cit. p.5107. _________,_______________. op. cit. p.5308 TITONE, Renzo. op. cit.09. HILLAL, Josephina. Relação professor-aluno.

Formação do homem consciente. São Paulo:Paulinas, 1985.

10. LOWENFELD, Viktor. Desarrollo de la capacidadcreadora. Vol.1 Buenos Aires: Kapelusz, 1961. p.3

11. __________,_____. op. cit. p.8812. __________,_____. op. cit. p.8813. TITONE, Renzo. op. cit. p.3114. LOWENFELD, Viktor. op. cit. p.315. TITONE, Renzo. op. cit. p.46516. _______, _____. op. cit. p.46917. _______, _____. op. cit. p.470

Bibliografia complementar

STEFANINI, L. Personalismo educativo.Roma:Bocca, 1955.VILLALOBOS, Maria da Penha. Didática e epistemologia:

sobre a didática de Hans Aebli e a epistemo-logia de Jean Piaget. São Paulo: Grijalbo, 1969.

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Da Escola Nova, também conhecida como ativista oureformista, surgiram importantes experiências didático-pedagógicas. No campo da Arte Educação, a Bauhaus temfundamental importância e nela os cursos ministrados porItten, Klee, Kandinsky entre outros.

Mas os fundamentos psicológicos da Escola Nova só foramelucidados com rigor a partir das pesquisas e teorias de JeanPiaget. A compreensão desses fundamentos é de sumaimportância, significa compreender o desenvolvimento dopensamento e de sua operatividade e, assim, poder planejarcoerentemente um programa de ensino-aprendizagem .

III.2. A Didática da Escola Nova

A didática, enquanto ciência pedagógica, desenvolveu-sehistoricamente, passando por diversas fases, nas quaisfilosofia e experiência contribuíram para sua orientação geral.Um dos principais e mais importantes movimentosreformadores neste contexto foi o chamado Movimento dasEscolas Novas, que pode ainda ser considerado contem-porâneo, pois suas premissas metodológicas são utilizadasna didática atual.

Este movimento, também conhecido como Movimentoativista, começou por volta de 1890, e abalou as estruturasda escola tradicional (passiva em oposição à inovadora escolaativa e com base no professor e no programa) e os substituiupelo aluno. Na escola tradicional era o programa mais que oprofessor o centro da didática.

Para alguns autores, a polêmica entre as duas escolas seencontra fundamentada em um falso dilema, pois a escolatradicional não pode ser considerada no todo como passiva,pois segundo Jean Piaget é necessária uma atividadecognitiva do aluno, mesmo quando se pensa em imprimir-lhepassivamente um conhecimento.

A desvalorização da escola tradicional começou pelo que foi,no início, uma tendência à renovação da cultura e quanto àeducação visava à formação de homens livres. A degeneraçãodeu-se pelo formalismo das escolas, onde se desenvolveramos cultos aos belos conceitos, e à forma estilística despojadade conteúdo.

No decorrer histórico no entanto, surgiram outras propostasde mudanças, em parte nada inovadoras, entre as quais pode-se destacar o Programa Enciclopédico de Rabelais (séc. XVIII),que visava preencher o vazio intelectualista por meio de umsaber mais realista. Este culturalismo enciclopédico terá seuapogeu com o Iluminismo, e fará com que os programasescolares sejam definidos fundamentalmente na ciência ena razão.

III.2.1. A evolução das EscolasBreve história das correntespedagógico-didáticas

Por outro lado, pode-se citar Montaigne e Juan Luis Vives,promotor do realismo e considerado um pioneiro da pedagogianova, que foi o primeiro a chamar a atenção para:

... el aspecto psicológico de la educación, sobre elvalor del método inductivo para las cienciasnaturales, sobre la lengua materna como factor deconcreción;(1)

Mais adiante, encontrar-se-á Juan Federico Herbart,inaugurando a corrente metodista, que converterá a praxisintelectualista em teoria pedagógica, selecionando eorganizando a matéria. Para ele, a educação está baseadana Instrução e na onipotência do professor, que transmite oconhecimento. O aluno é reduzido à pura máquina conceitual,desaparecendo a liberdade e a verdadeira atividade.

Seguindo a corrente neo-kantiana, aparece Pablo Barth, queparte da psicologia experimental de Wundt, mas ainda tendocomo o centro do processo didático a lição verbal doprofessor. Para ele, os fatores essenciais do processo deaprendizagem são a intuição, a atenção, a memória e opensamento, para os quais formula leis precisas e abundantes(métodos) para o desenvolvimento destas faculdades.

Atualmente, a posição do aluno, como agente principal desua própria aprendizagem, é quase consenso, pois ainda setem resquícios do regime enciclopédico baseado no totalpredomínio do programa, que visa somente o valor do saberem si, antes do desenvolvimento do aluno.

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III.2.2. O ensino tradicional e seus problemas

A didática tradicional, apesar de ser uma noção relativa,representa a herança da metodologia do século XIX, queproveio das teorias de Comenius, Rosseau, Pestalozzi eHerbart, influenciada, porém, pela concepções psicológicasda época, classificada como sensualista-empirista. Na prática,essa didática encontra sua expressão no que se costumachamar “o ensino intuitivo”(2). Esse ensino tem porcaracterístico, oferecer, na medida do possível, dadossensíveis à percepção e à observação dos alunos. (3)

Mas, mesmo na escola tradicional, para que o aluno aprendauma noção, é necessário que o dado sensível seja submetidoa uma atividade.

Explica-se, geralmente, esse fato invocando a fracaaptidão do aluno médio para o desenho. Mas umaoutra observação tende a invalidar essa explicação.É possível, com efeito, melhorar, considera-velmente, a capacidade do aluno para reproduzirdeterminada figura, se a estudarmos com ele. Ora,estudar uma figura significa aplicar-lhe umaatividade, decompô-la, transportar comprimentosuns para os outros, medir aproximadamente osângulos, contar os cantos, acompanhar oscontornos, etc. Sendo assim, não se poderia suporque mesmo as figuras espaciais não são impressaspassivamente no espírito do sujeito, mas que setrata, também no caso de uma reconstruçãointerior - ativa - da figura dada exteriormente? (4)

O aprender na escola tradicional está, assim, necessariamenteligado à cópia da explicação do professor. Essa explicação,no entanto, é caracterizada pela sua particularização edesvinculação do todo, ou seja, segundo um esquema“atomístico”, cada idéia deve ser formada no alunoseparadamente, acrescentando um elemento após o outro,pois receia-se que uma impressão apague a seguinte. Assim,esse isolamento artificial, efetuado pelo ensino tradicional,impede a compreensão e obriga a recorrer à memorização

(sup.) Um dos primeirosdesenhos de observaçãorealizados sem informaçãopreliminar. (inf.) Desenhorealizado pelo mesmo alunoapós uso de quadro reticulado,que propicia melhor apre-ensão dos contornos, propor-ções, ângulos, etc. CAU UMC1o. bimestre,1993.

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de fórmulas verbais.

Outro problema da didática tradicional é o risco de facilmentese formarem no aluno hábitos intelectuais rígidos, pois asidéias são sempre invocadas da mesma maneira. Em arteisto é típico do ensino acadêmico.

(sup.) Um dos primeirosdesenhos de observaçãorealizados sem informaçãopreliminar. (esq.) Desenhorealizado pelo mesmo alunoapós uso de quadro reticulado,que propicia melhor apre-ensão dos contornos, propor-ções, ângulos, etc. CAU UMC1o. bimestre,1993.

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III.2.3.1. John Dewey e Edouard Claparède

No início do século, surgiram vários movimentos de reformado ensino, na Europa e na América. Reconhecendo a insufi-ciência da escola tradicional, propunham uma educação cujasbases estivessem assentadas na psicologia da criança. Taistendências podem ser reunidas sob o nome de “escola ativa”.

São teóricos importantes dessa escola os pedagogos: W.A. Lay, John Dewey, Edouard Claparède e Georg Kers-chensteiner. Segundo Hans Aebli, a análise desse autoresmostra que tal escola só chegou a se desligar do ensinotradicional paulatinamente. No entanto, nenhum delesconseguiu fornecer fundamentos psicológicos completoscondizentes com a nova didática, não superando asconcepções da psicologia sensualista-empirista. Lay somenteacrescentou certos elementos ativos. Dewey e Claparède,apesar de reconhecerem a função ativa do pensamento aserviço da ação, permaneceram fiéis à psicologiaassociacionista quanto à interpretação da natureza intrínsecado pensamento. Kerschensteiner desligou-se definitivamentedessa psicologia e descreveu com perspicácia a construçãodas noções pelo aluno; infelizmente, procurou as forçasreguladoras dessa atividade em princípios de disciplina,estranhos ao conteúdo da própria atividade,... (6)

A didática de Lay baseia-se em duas descobertas psicológicasque se tornaram notórias por volta do fim do século XIX; a doarco reflexo e a da sensação cinestésica.(7) Com base nestasdescobertas, elaborou uma teoria segundo a qual a vidapsíquica se compõe de um conjunto formado pela impressão(dados percebidos) e expressão, sendo que estes dois pólosestão sempre intercalados, e a expressão reorganiza o modopelo qual se dá a impressão, o que comprovadamente se dápor acomodação motriz, como o olho ao ser excitadovisualmente, volta-se para a direção exata e acomoda-se àdistância do objeto. Assim, no campo psíquico, representandograficamente uma figura espacial qualquer, o aluno tornariamais aguçada a percepção desta, à medida que a desenha.Para Lay, a expressão desenvolve a elaboração intelectual. (8)

É importante frisar que, para Lay, esta reprodução não é um

III.2.3. A didática da escola ativa

ato psíquico isolado, mas pertence a mesma cadeia deeventos, constitui a reprodução efetiva dos movimentos deexploração.(9)

Um problema, na teoria de Lay, é que ela exige que primeirose realizem as representações intuitivas dos números, parasó depois serem deduzidas as operações. Assim, muito tempoé gasto com cópia de figuras para assimilação das formas,sem muita reflexão matemática. Pode-se dizer que o mesmoocorre com as aulas de desenho tradicionais, nas quais detêmo aluno na execução correta do traço, sem conexão com acompreensão das relações espaciais daquilo que desenha.

As concepções didáticas de J. Dewey, segundo Aebli,decorrem logicamente de suas idéias psicológicas efilosóficas e, por instrumentalistas que são, o separamradicalmente da escola tradicional. Não se limita à formulaçãode enunciados gerais, mas descreve regras didáticas precisas,baseadas na sua concepção do pensamento.

O pensamento para Dewey é sempre visto num contextoativo, de transformação das coisas físicas e na construçãode novas relações e novas estruturas sociais. Ele é uminstrumento, assim como a observação, e vem sempre deuma necessidade, que tem sua origem na execução de algo.Mas, em sua natureza intrínseca, o pensamento é descritopor Dewey como um jogo de inferências que ligam os dadosda observação com suas significações e os conteúdos daconsciência em si (10), algo semelhante à associação napsicologia clássica. Segundo Aebli as novas concepções,nessa área, só foram introduzidas a partir de Piaget.

Edouard Claparède chegou a uma interpretação semelhantesobre a questão do pensamento. Observa que toda ação tempor função readaptar o indivíduo ao meio quando rompido oequilíbrio entre eles(11) e pensamento serve para controlar talação.

Também em Claparède, a necessidade surge como causa dopensamento. Ela detona a energia necessária à atividade deobservação e reflexão.

No entanto, Dewey concebe uma visão do pensamento emsua gênese, durante a formação da criança, colocando queexiste uma continuidade genética entre ação e pensamento,pois a ação já contém um elemento cognitivo e oconhecimento, ao contrário, conserva sempre um elementoativo.

Assim, os dois pedagogos têm muito em comum, masClaparède preocupa-se sobretudo em mostrar que o ensinodeve corresponder às necessidades da criança, enquanto

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Dewey concentra sua análise nas relações entre ensinoteórico e ação prática e nos métodos de pensamento e depesquisa que o aluno deve adquirir.(12)

A didática, tanto de Dewey como de Claparède concentra-se na pesquisa, enquanto processo construtor de coisasnovas, sendo que a observação é instrumento indispensávelpara tal. Formulam-se hipóteses que serão com a experiência,demonstradas legítimas ou não. Concebem-se comodecorrentes de um mesmo desenvolvimento, os impulsosnaturais da criança e a ciência.

Um dos maiores teóricos da escola ativa alemã, propõe queo aluno deve ele mesmo elaborar as novas noções. Tambémcoloca a questão da observação ativa, ou seja, não se observasem pensar e só se observa aquilo que se quer observar.

Assim, propõe uma redução das matérias, com apresentaçãode poucos casos.

Apesar da semelhança com a concepção de Dewey sobreas etapas do pensamento, ou da formulação das noções,Kerschensteiner insiste muito mais no controle das hipóteses,mas não dá grande importância ao fato de que todopensamento deva vir do espírito próprio do aluno.

Coloca como caráter principal da escola ativa, desenvolverno aluno a elaboração e o controle da fidelidade e daobjetividade do conhecimento, adquirido por ele mesmoatravés da experiência, ou melhor, a obrigação de fazê-lo.

Este fato representa um aspecto muito importante segundoAebli, pois Kerschensteiner quer desenvolver no aluno umaatitude crítica para consigo mesmo e para com seu trabalho.O aluno deve aprender a realizar esforços prolongados, a lutarcontra sua própria inércia, a vencer-se a si mesmo.(13)

III.2.3.2. Georg Kerschensteiner

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13

Para a psicologia sensualista-empirista (associacionista)e adidática tradicional, as imagens são elementos fundamentaisdo pensamento aritmético, geométrico e das ciênciasnaturais.

Presume-se que delas derivam as noções geraispor um processo de abstração eliminatório doscaracteres acidentais.(14)

Segundo Aebli, a experiência cotidiana do ensino escolar porsi só evidencia a insuficiência dessa teoria(15), pois todos ostipos de atividades realizadas em sala de aula (compararelementos, imaginar transformações, ou simplesmenteacompanhar as demonstrações) ultrapassam o processo deimpressão e indicam que os elementos fundamentais dopensamento não são imagens estáticas, cópias de modelosexteriores, mas esquemas de atividade em cuja elaboraçãoo sujeito toma parte ativa e importante.(16)

Piaget não nega a existência das imagens, mas lhes atribuiuma função diversa. Na constituição das noções fundamentaisdo pensamento, a percepção das configurações estáticas(imagens) desempenha papel secundário em relação àoperação. A imagem é o suporte do pensamento e torna suaevocação exterior possível. O pensamento é uma forma deação que não pára de diferenciar-se, organizar-se e apurarseu funcionamento durante o desenvolvimento genético.(17)

Para Piaget, o elemento ativo do pensamento, que é antesde tudo um sistema de operações lógicas, físicas (espaço-temporais) e numéricas (18) , é a operação. (19)

É ela que assegura que os progressos essenciaisda inteligência, em oposição à imagem, quedesempenha o papel do elemento relativamenteestático, que não pára de recortar instantâneos dastransformações operatórias.(20)

Por analogia, podemos, então, compreender (e a

III.2.4. A psicologia de Jean Piaget aplicada à didática da escola ativa

III.2.4.1. O pensamento

introspeção de todos aqueles que estudaramdesenho o confirma) como deve ser concebida aatividade perceptiva visual: como para a exploraçãotátil, deve tratar-se de movimentos que sigam eexplorem as linhas e as relações das figuras,praticamente com a única diferença de que o órgãoque assegura a exploração é o olho (movimentosdo olhar), e que é preciso, provavelmente, fazerintervir movimentos interiores que não sedesdobrem mais em deslocamentos efetivos doorgão explorador. Por conseguinte, compreende-se, também, que a imagem mental nada mais éque uma reprodução interiorizada dos movimentosde exploração perceptiva: eis a razão pela qualpodemos, igualmente, chamá-la uma imitaçãointeriorizada do objeto e por que é exatamentecomparável ao desenho: a imagem mental é parao desenho o que a linguagem interior é para alinguagem falada.(21)

Didaticamente, entender a questão do pensamento, enquantoimagem e operação na formação de um sistema, implica emadmitir que o aluno só adquire uma operação apresentadapelo professor quando a imita interiormente; sem isso nãohá verdadeira aquisição de conhecimento e, sim, a aquisiçãode um hábito (reação de desenvolvimento estereotipado), eque geralmente só são aplicados em situações exatamenteiguais às quais foram apreendidos, pois o sujeito nãoconsegue atribuir-lhe significado (simples hábito sensório-motor).

Atribuir significado é compreender a regra intrínseca daoperação, o que permite evocá-las interiormente. Assim,pode-se dizer que a compreensão do significado, no ensinotradicional, é parcial, pois está, via de regra, voltado para aformação de hábitos, decorando verbalmente os passos daoperação ou mecanizando o aprendizado.

Aprender a desenhar é aprender a compreender o espaço

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14

real ou imaginário, pelo entendimento do significado dasrelações de perspectiva e projeção, e expressar graficamenteessas relações.

A principal diferença entre o hábito e a operação é que oprimeiro tem por característica ser de funcionamento rígido,porque é irreversível (está sempre dirigido para o mesmoresultado (22)). Já a operação caracteriza-se pela rever-sibilidade, o que dá mobilidade ao pensamento.

A inteligência constitui-se de um conjunto de operações epor isso de caráter reversível, ou seja, pode construirhipóteses e logo depois desconsiderá-las para reiniciar oprocesso, percorrer um caminho, e percorrê-lo novamentede modo inverso, sem modificação das noções.

Além da reversibilidade, Piaget demonstrou que opensamento (enquanto operação) possui outras duascaracterísticas: associatividade (no sentido lógico do termo)e formação de conjuntos.

A associação permite ao sujeito obter um mesmo resultadode maneiras diferentes, ou seja, realizar a operaçãoassociando diferentes relações. As operações formam,também, sistemas de conjuntos, enquanto os hábitos sãoisolados.

As análises de Piaget revelam, também, que o trabalho emgrupo e a reciprocidade propiciam o desenvolvimentointelectual. A discussão exige opiniões individuais de cadaparticipante e propicia uma comparação lógica entre elas.Assim, a socialização das atividades permite raciocinar commais lógica, pois deve-se evitar a contradição.

Desenho de observação , inte-rior do Edifício da Arquitetura.CAU UMC 2o. bimestre,1996.Kellen Muller.

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15

No método Maiêutico

...o mestre faz a classe achar o resultado desejadomediante uma série de perguntas habilmentefeitas, cada uma representando uma etapa parcialdo desenvolvimento de conjunto.(23)

A escola ativa propõe que o aluno realize pesquisa, ou seja,ele mesmo formule as perguntas e chegue ao resultado, soborientação flexível do professor. A pesquisa é o momento noqual se dá o progresso no pensamento do aluno, assim comodo cientista.

Mas segundo Piaget, toda operação e toda noção tem umahistória de construção progressiva e contínua a partir deelementos anteriores, ou seja, toda nova noção só surge deexperimentos baseados em noções anteriores. Uma novaoperação não surge do nada.

Assim, os dados de partida de uma pesquisa nadamais constituem senão os elementos depensamento anteriores a uma nova operação, e éo esforço investigador da criança que provoca essadiferenciação e integração característica doprogresso do pensamento.(24)

III.2.4.2. A pesquisa e a construção da operação

Conhecer os objetos do mundo é uma questão de leitura daexperiência (25). Submeter o objeto aos esquemas de seucomportamento, incorporá-lo. Este é o processo psíquico deassimilação esclarecido por Piaget. A assimilação é, pois,uma relação entre o sujeito assimilador e o objeto assimilado.Piaget também mostrou que a aplicação dos esquemas dadosa novos objetos acarreta na maioria dos casos suamodificação no sentido de uma diferenciação e que essaacomodação a novos objetos ocasiona a gênese progressivade reações cada vez mais complexas.(26)

A assimilação motriz do bebê é reconhecida como do mesmotipo que aquela conseguida com trabalhos manuais em aulasde artesanato. Mas, tanto na criança como no adulto, oconhecimento adquirido neste tipo de relação não se restringe

III.2.4.3. A Assimilação

(sup.e dir.) Desenhos deobservação , interior do Edifícioda Arquitetura. CAU UMC 2o.bimestre,1996. Respectiva-mente: Regina Fukuda eRicardo Guerra.

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16

às qualidades de utilização do objeto, mas na compreensãode sua forma. Isto se deve ao fato da percepção ser umprocesso ativo, ou seja, o indivíduo não se restringe a receberuma impressão do objeto observado, mas participaativamente do processo de apreensão do mesmo, ele explorao dado apresentado.

O sujeito deve acompanhar-lhe os contornos,escolher pontos de referência, estabelecerrelações, executar transportes, etc.(27)

Assim, duas são as categorias, segundo Aebli, de qualidadesapreendidas por assimilação ativa: as de utilização e aspropriedades espaciais das coisas.

O desenho de observação, tido por muitos como merarepresentação de uma impressão do visível, é também umprocesso ativo. Está relacionado mais à apreensão darealidade, ao aprofundamento da percepção das relações

físicas entre os objetos, do que propriamente ao desenhoem si. Assim, a assimilação da realidade do espaço requeruma participação ativa do indivíduo. Este tipo de desenho é,antes de tudo, um meio de leitura e incorporação da realidadefísica.

Pode-se dizer que, no ensino do desenho, particularmenteno desenho de observação deve-se primeiro desenvolver noaluno a capacidade de realização desses esquemas. Existeminúmeras técnicas, usadas no renascimento e durante operíodo áureo das academias, muitas usadas ainda hoje,como o quadro de vidro, o uso do lápis, para compararproporções, ângulos, etc. No entanto, na maioria dos casos,o que se verifica é que estes recursos são apreendidos pelosalunos como hábitos e não como verdadeiros esquemas deconhecimento. Eles apenas decoram uma técnica, semaprenderem realmente a operação nela existente.

Um dos primeiros desenhos deobservação , interior da sala deaula, Edifício da Arquitetura.CAU UMC 1o. bimestre,1993.O desenho explicita um dosmaiores problemas dos alunosiniciantes: a perspectiva.

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17(sup.) Desenho de observação,vista do interior de umambiente para o exterior. CAUUMC 2o. bimestre,1992. Oexercício objetivava umapassagem gradual do desenhode observação do espaçointerno para o espaço externo.

(sup. e esq.) Desenho de ob-servação, paisagem urbana,vista de praça e igreja em Mogidas Cruzes. CAU UMC 2o.bimestre,1993.

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Notas e referências bibliográficas

01. TITONE, Renzo. Metodologia didactica. Madrid: Rialp,1966. p.42

02. AEBLI, Hans. Didática Psicológica. Aplicação àdidática da psicologia de Jean Piaget. Atua-lidades pedagógicas volume 103. São Paulo: Ed.Nacional, 1971. p.7

03. AEBLI, Hans. op. cit. p.804. _____,_____. op.cit. p.1205. _____,_____. op.cit.06. _____,_____. op.cit. p.1807. _____,_____. op.cit. p.1808. LAY, W. Der Rechenunterricht auf experimentell -

padagogischer Grundlage. Leipzig: 1914. cit. in:AEBLI, Hans. op. cit. p.19

09. AEBLI, Hans. op. cit. p.2010. _____,_____. op.cit. p.3411. _____,_____. op.cit. p.2812. _____,_____. op.cit. p.3013. _____,_____. op.cit. p.4014. _____,_____. op.cit. p.4715. _____,_____. op.cit. p.4716. _____,_____. op.cit. p.4717. _____,_____. op.cit. p.4818. _____,_____. op.cit. p.5119. É necessário ressaltar que esta teoria não é suficiente

para o entendimento do pensamento artístico comoum sistema de “operações estéticas”.

20. AEBLI, Hans. op.cit. p.5121. _____,_____. op.cit. p.5522. _____,_____. op.cit. p.6323. _____,_____. op.cit. p.7224. _____,_____. op.cit. p.7525. _____,_____. op.cit. p.7826. _____,_____. op.cit. p.7927. _____,_____. op.cit. p.80

Bibliografia Complementar

PIAGET, Jean. A epistemologia genética. São Paulo: Abril,1983.

VILLALOBOS, Maria da Penha. Didática e epistemologia:sobre a didática de Hans Aebli e a episte-mologia de Jean Piaget. São Paulo: Grijalbo,1969.

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19

Segundo Aebli,a aplicação da psicologia de Jean Piaget à didáticadeve ter seu ponto de partida na tese fundamentalsegundo a qual o pensamento não é um conjuntode termos estáticos, uma coleção de conteúdosde consciência, de imagens, etc., mas um jogo deoperações vivas e atuantes. Pensar é operar - querse trate de assimilar os dados da experiênciasubmetendo-os aos esquemas de atividadeintelectual ou de construir novas operações poruma reflexão, “abstrata” na aparência, isto é,operando interiormente sobre objetos imaginários.A imagem não é o elemento fundamental dopensamento, antes constitui seu suporte, muitasvezes útil, sem dúvida, mas não indispensável.Além disso, em sua natureza íntima, a própriaimagem constitui um ato real e não um resíduo dasensação: é uma reprodução dos aspectosprincipais da exploração perceptiva que se deu nomomento da percepção de seu modêlo.(1)

Existe um ponto, no entanto, nesta afirmação, que não condizcom ensino do desenho. A questão da imagem para aquisiçãode conhecimento pictórico não é dispensável. Trata-se depensamento visual e não puramente abstrato. Para o alunode arquitetura, a imagem é conhecimento, é referência ebase para pesquisa.

Segundo Piaget todo ato intelectual é construído progres-sivamente, a partir de reações anteriores e mais primitivas.(2)

Assim, o professor deve criar situações para a construçãodas operações, apelando para os esquemas anteriormenteadquiridos. Conhecer previamente os alunos é fundamentalpara o andamento do curso. Os alunos devem expressar, deforma espontânea e livre, seus conhecimentos, para que oprofessor consiga identificar os esquemas adquiridos pelaturma e planejar o curso de forma eficiente.

III.3. Um curso de desenho com base napesquisa e exemplos de experiênciadidática

Desenho gestual, acompa-nhando ritmo de música.Composição com linhas.Nanquim sobre papel. 1o.bimestre, CAU UMC,1993.

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20

Quando o aluno adquire uma noção ou operação é porque aconstruiu, e não porque estas foram nele impressas de formapassiva.No ensino tradicional, esta construção é rigo-rosamente dirigida. A explicação é ouvida, e sendo assim, émenos interessante do que se fosse descoberta pelo próprioaluno. O método Maiêutico dirige a apreensão doconhecimento através de perguntas feitas pelo professor erespondidas pelo aluno . Muitas vezes, esta apreensão não érealizada de forma completa, ou seja, o aluno não apreendea estrutura do conjunto, como um todo, pois foi o professorquem forneceu os elementos do complexo, a organizaçãoestrutural das idéias. Logo, deve o aluno ser levado a fazer asi próprio as perguntas, deve ele mesmo elaborar a estruturada apreensão do conhecimento, deve elaborar e estruturar apesquisa.

Mas, para obter sucesso, é necessário que toda pesquisaparta de um problema bem vivo no pensamento do aluno. Apsicologia de Jean Piaget nos ensina, com efeito, que umproblema constitui uma esquema antecipador, isto é, umesboço esquemático de uma operação a encontrar, solidáriode um sistema de conjunto de operações.(3)

No ensino do desenho, verifica-se que muitas vezes a faltade repertório dos alunos faz com que esses não despertempara a compreensão do problema proposto e conseqüen-temente para a busca de soluções.

O ensino do desenho deve ser encarado como direcional daatenção do aluno para apreensão do problema, fazendo comque utilize noções já assimiladas, ou que internalize novasoperações, para que possa dar solução ao problema proposto.É verdadeiramente o “ensinar a pensar”, lema didático deKandinsky no período Bauhaus.

A atenção, no entanto, pode estar voltada para a percepçãodo objeto, no caso do desenho de observação, para o aspectográfico do desenho, no caso de formação de ilustradoresprofissionais, ou na expressão da personalidade do indivíduo.

Desenhos de observação,ambiente interno. 2o. bimestre,CAU UMC,1992. JuscelinoSilva. Os desenhos explicitama principal dificuldade dosalunos iniciantes: a pers-pectiva.

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No caso da observação, a percepção tem vários níveis. Pode-se dirigir o curso para que o aluno perceba os objetos comoestruturas tridimensionais constituídas de partes, que seencaixam, se moldam, se interligam umas às outras. Ou pode-se, também, levar o aluno a perceber esses mesmos objetoscomo projeção de luz em um quadro imaginário presente entreo observador e o objeto. (como o fizeram Da Vinci e Dürer).Neste caso, pode-se dirigir a atenção na percepção daconstrução dos objetos pelos contornos, ou pela linha(4) queos define. Também, pode-se dirigir o aluno para a percepçãodesses mesmos objetos como projeções de massas de luz esombra ou valores cromáticos, nas quais o contornoverdadeiramente não existe. Nos três casos, a percepçãoutilizada, a ação realizada pelo aluno para aquisição doconhecimento requer níveis diferentes de capacidadecognitiva. No primeiro caso, a atividade exige construirinternamente modelos de representação tridimensional paraa compreensão do objeto e sua posterior representação. Nosoutros dois, a percepção é dirigida a ver os objetos de formabidimensional, o modelo representado é plano. Mesmo nosdesenhos de imaginação, ou seja, aqueles nos quais o objetojá foi internalizado, assimilado ou já se transformou em umanova elaboração formal, os esquemas apreendidos com odesenho de observação, são características formais reais doobjeto, fundamentais para representação gráfica.

Se no, entanto, a atenção do aluno for dirigida ao aspectográfico, mais que a percepção do objeto, a construção dodesenho se dará concomitantemente no próprio fazer. É ografismo, o controle do instrumento, que define a execução.

Mas a atenção, também, pode estar voltada para arepresentação da própria expressão estética, sem vínculocom a realidade pictórica, a exemplo dos trabalhos deKandinsky antes da fase Bauhaus. O abstrato pertencente aestes trabalhos é na verdade representação direta eespontânea dos desejos, sensações e sentimentos do artista.A atenção está voltada para seu próprio interior subjetivo.

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III. 3.1. Experiência didática e a inserção do desenho como pesquisa

Coetâneo ao desenvolvimento desta tese, de 91 a 96, atueicomo docente em parceria com os professores SérgioCarneiro e Neide de Melo Nunes Machado, nas disciplinasde Desenho e Materiais Expressivos e Plástica na arquitetura,respectivamente lecionadas para alunos de 1o. e 2o. ano doCurso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Mogidas Cruzes. Deste trabalho resultaram algumas consideraçõesempíricas que serão sinteticamente aqui relatadas, de formaa demonstrar algumas colocações teóricas.

Um exemplo de hábitos adquiridos, e não de conhecimentoverdadeiramente apreendido, pode ser expresso peloexemplo a seguir. Propúnhamos aos alunos, na disciplina dedesenho, que fizessem passo a passo o exercício do quadrode vidro: traziam o acetato, fixavam no quadro de vidro,desenhavam com caneta de retroprojetor, sem se mover ,de frente para o quadro e com um só olho. Desenhoterminado, sobrepunham um papel manteiga, traçavam aslinhas que formavam um feixe de retas e achavam os pontos

de fuga. Depois, ligavam tais pontos por uma linha horizontale achavam a linha do horizonte. Tudo isso para fazer-lhesapreender o real significado do desenho em perspectiva esuas regras (projeção num plano). Apesar do exercício serrealizado por todos da mesma maneira, verificávamos quepoucos entendiam seu conteúdo e aprendiam com ele. Amaior parte dos alunos o realizava mecanicamente, sem tera menor noção do que significavam tantas linhas.Conseqüentemente decoravam as regras de perspectiva enão a entendiam como decorrentes de um processoperceptivo analítico.

A solução, talvez, esteja, então, em elaborar exercícios nosquais os alunos procurem tal processo como método depesquisa. Por exemplo, maquetes tridimensionais, nas quaispudesse o aluno visualizar a situação em questão de formaglobal (indivíduo - quadro - objeto - projeção). Entendendo aestrutura do conjunto, realizaria o exercício de forma maisadequada. O mesmo deve acontecer se o desenho for visto

como meio de entender os objetos, enquanto estruturas, ede como se relacionam as partes da mesma. A manipulaçãode maquetes induziria o aluno a se perguntar sobre oproblema.

Nas palavras de Aebli,se nos propomos levar os alunos a descobrir poruma investigação pessoal o conjunto de umsistema de operações e não apenas as operaçõesparciais desse sistema, é preciso orientar aatividade colocando cuidadosamente o problema.(5)

A intervenção do professor na pesquisa pode ocorrer, às vezesseguindo o método maiêutico, mas com significadopsicológico diverso, não conduz a reflexão dos alunos numadireção conhecida apenas por ele; ajuda-os a resolver umproblema vivo em seu espírito e a realizar um projeto depesquisa que compreendem, mas cuja realização se chocacom certas dificuldades que ultrapassam seus própriosrecursos.(6)

Aebli aconselha a reduzir a amplitude do problema, para quea classe tenha condições de dar andamento à pesquisa porseu próprio esforço.

Apresentar um problema de maneira clara e vivaé, assim, a condição sine qua non para a pesquisapessoal do aluno.(7)

Ensinar a pensar é tornar o aluno capaz da construção deoperações, pela pesquisa, a partir de um problema. Se odesenho em arquitetura é representação do pensamento,ensinar a desenhar é ensinar a pensar de forma concreta. Aconstrução das operações se dá pela pesquisa da observaçãoativa da realidade circundante. Novas noções surgem, combase nessas noções e operações já internalizadas (escala,proporção, etc.) da produção pela pesquisa, que no caso daarquitetura tem função de projeto.

Desenho de observação comuso de quadro de vidro. Canetahidrocor sobre acetato. Poste-rior marcação dos pontos defuga. 2o. bimestre, CAU UMC,1993.

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23

Se ao apresentar o problema não se apela paraesquemas de que o aluno dispõe com facilidade,se os dados iniciais não são suficientes, a pesquisa,simplesmente, não chega aos resultadosesperados, perde-se tempo e certos alunosrenunciam mesmo a qualquer esforço.(8)

Convém, então, simplificar as circunstâncias exteriores dapesquisa. Uma experiência nesse sentido foi realizada comsucesso na disciplina de desenho citada anteriormente. Oobjetivo era fazer com que os alunos intuíssem o projeto comoexercício de transformação da realidade sensível. Assim,deveriam, para tanto, elaborar de início, sem desenho, umaconstrução estereométrica, a partir de quatro planosquadrados de papelão, somente por corte e encaixe sempreno centro das figuras. Deveriam encontrar uma solução formalque os agradasse esteticamente. Feito isso, foi pedido paraque desenhassem, de observação, três vistas diferentes domesmo objeto. Durante a execução do desenho, procurou-se alertar os alunos sobre a questão da inserção do desenhona folha, que as vistas fossem suficientemente, diferentespara dar uma idéia completa do objeto, assim como tambéma colocação do fundo (mesas, cadeiras), objetos quepudessem fornecer uma noção de escala do modelodesenhado. O problema foi apresentado de tal forma que oobjetivo era fazer com que alguém, que não tivesse visto oobjeto, observando os desenhos, conseguisse montá-lonovamente.

Na aula seguinte , no entanto, tiveram que trabalhar somentecom os desenhos, sem montar o objeto. O problema estavaem modificar o objeto, imaginando-o como tal e desenhando-o novamente. As três vistas deveriam ser modificadas emrelação ao novo objeto. Pediu-se que colocassem mais umplano quadrado e que um dos anteriores se transformasseem círculo. O problema, a partir daí, ganhava ares de projeto,pois nem todos os planos eram passíveis de se transformaremem círculos, sem que destruíssem a estabilidade da estrutura.O mesmo acontecendo com o plano a ser anexado.

III.3.2. A apresentação do problema

Exercício de composição deestrutura tridimensional. De-senhos de observação e de al-teração da estrutura (transfor-mação de um plano quadradoem circular e adição de maisum plano quadrado). 2o. bimes-tre, CAU UMC,1996. Adriana I.da Silva.

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24Exercício de composição deestrutura tridimensional. De-senhos de observação. 2o.bimestre, CAU UMC,1996.

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25Exercício de composição deestrutura tridimensional. De-senhos de observação e de al-teração da estrutura (transfor-mação de um plano quadradoem circular e adição de maisum plano quadrado). 2o. bimes-tre, CAU UMC,1996. LuizCarlos Arellano Jr.

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26Exercício de composição deestrutura tridimensional. De-senhos de observação e de al-teração da estrutura (transfor-mação de um plano quadradoem circular e adição de maisum plano quadrado). 2o. bimes-tre, CAU UMC,1996. Vagner P.do Nascimento.

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Tal exercício se revelou muito interessante e de resultadossatisfatórios, pois o problema foi simplificado, levando emconsideração as noções já assimiladas, o que permitiu suaexecução. Mesmo para os desenhos de qualidade gráficainferior à média da sala, notou-se a compreensão da operaçãorealizada e da estrutura envolvida na relação entre projeto edesenho.

Isto vem de encontro às colocações de Piaget sobre a questãoda pesquisa como método de ensino, considerado por Aeblium método muito mais difícil que todos os outros. Assim, namedida do possível, deve ser fornecida ao aluno aoportunidade de executar materialmente as operaçõesdurante seus ensaios.

...um problema, que tem por objeto a realizaçãoou a descoberta de uma operação, é sempre umprojeto de ação, realizável por manipulaçõesefetivas, seja com objetos concretos, sejamediante desenhos nos quais o aluno executatransformações, partições, transportes, etc.(9)

Apresentar o problema de forma prática dá oportunidade atodos os alunos de entenderem a operação antes que sejacolocada de forma abstrata. Isto deve ser realizado emconjunto com todos os alunos, dando oportunidade dediscussão do problema. Aebli também coloca que o pontode início de uma pesquisa se deve basear em dois pólos deum conflito, num contraste de informações, para que osalunos se perguntem sobre o problema. O conflito, ocontraste, gera a dúvida que leva à pesquisa. Progres-sivamente, os termos usados na prática concreta serãosubstituídos pelos termos científicos e assim assimilados.Uma outra vantagem da prática do problema está naverificação, por parte do aluno, da aplicação deste à realidadedo cotidiano; isto contribui para despertar seu interesse,fundamental para a formação de seu pensamento.

Em desenho, é necessário que o professor conheça o

repertório do aluno e lhe forneça condições de aumentá-lo,buscando naquilo que o aluno já conhece, seu desenvol-vimento.

Aebli complementa que, apesar disto, o ensino não pode sebasear exclusivamente na prática dos exercícios, prin-cipalmente porque, quanto mais complexas as disciplinas,mais seguem suas próprias leis de desenvolvimento, demaneira que, às vezes, torna-se impossível relacionar teoriae prática.

A pesquisa por parte do aluno não termina enquanto métodode ensino na entrega do trabalho para o professor. Énecessária uma discussão, a fim de corrigir os dadosencontrados erroneamente e completá-los quando nãosuficientes. Os debates, assim como os trabalhos em equipe,propiciam a sociabilidade dos alunos e o intercâmbio de idéias.

Em desenho, observar o trabalho dos colegas aumenta orepertório, desinibe, pois o aluno verifica que está no nívelda média da sala e que seus problemas são também os doscolegas, que suas dificuldades são na maioria dos casos regrageral. Mas não só os problemas vêm à tona numa mostra dedesenhos da sala, as soluções também. Cabe ao professorsalientar de forma construtiva as variantes produtivas naresolução do problema, deve demonstrar como umaconquista do aluno e também como uma solução entre muitaspossíveis. Deve evitar a exaltação de trabalhos como modelosa serem copiados, ou seja deve evitar, na medida do possível,a exaltação à mimese de desenhos e características gráficasparticulares, e propiciar um ambiente de produção, no qual aexpressão pessoal de cada aluno possa se desenvolver.

Refazer exercícios, corrigindo os erros ou problemas, étambém um caminho que se revelou produtivo não só emdesenho, mas em outras disciplinas afins. Analisar o trabalhocom o aluno, fazê-lo perceber os problemas e refazer otrabalho, não como punição, mas como aperfeiçoamento dopróprio esforço, revelou-se também fonte inspiradora do

Desenho de observação (mesanível do chão), marcação dospontos de fuga e posteriordesenho de imaginação (me-sas sobrepostas). 3o. bimes-tre, CAU UMC,1996. RicardoGuerra.

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interesse discente. Quando o aluno percebe que pode refazero trabalho de forma a otimizar sua avaliação, ele o fazgeralmente com prazer.

Aebli coloca, ainda, que a escolha do modo de trabalhodepende da natureza do problema a ser resolvido. De umlado, problemas que exigem do aluno a construção de umanova operação ou noção. De outro, problemas que exigemsomente a aplicação de noções já conhecidas.

Estabelecida essa distinção, podemos dizer quequanto mais um problema tende para o lado dasconstruções intelectuais novas, melhor se prestaà discussão em comum, e quanto mais umaquestão se aproxima dos problemas de aplicação,melhor se presta ao trabalho em equipes.(10)

Em se tratando de desenho, no entanto, o ponto crucial dofazer está no trabalho individual, que pode ser socializadopelos debates sobre os trabalhos executados. Pôde-severificar, também, durante a disciplina, que a discussão torna-se muito mais fértil quando o enfoque recai sobre asdificuldades na realização dos mesmos, dificuldades em todosos sentidos, psicológicas, técnicas, intelectuais, perceptivas.

Vale lembrar que a operação material, ou seja, a prática doexercício, não implica necessariamente na internalização daoperação. O aluno pode, mesmo assim, não aprenderverdadeiramente, mas formar hábitos, que, como visto, sãorígidos, não associativos e sem reversibilidade. No caso dodesenho para arquitetos, isto é evidente quando da apreensãodas noções de perspectiva decorrente do desenho deobservação ou de imaginação (neste ponto o aluno já temnoções básicas da construção geométrica; linha do horizonte,pontos de fuga, etc.). Geralmente os alunos constroemmecanicamente o espaço perspéctico, sem vínculo com suarealidade tridimensional. O que pode ser evitado, trabalhando-se conjuntamente o desenho diédrico (plantas e cortes depreferência também à mão-livre) e com a construção de

pequenos modelos e maquetes. A reversibilidade da operaçãotorna-se obrigatória na prática desses exercícios.

Desenho de observação(cadeira nível do chão), marca-ção dos pontos de fuga e pos-terior desenho de imaginação(cadeira superior). 3o. bimes-tre, CAU UMC,1996.

Desenho de observação (mesanível do chão), marcação dospontos de fuga e posteriordesenho de imaginação (mesasuperior). 3o. bimestre, CAUUMC,1996.

Desenhos típicos de alunosque decoram alguns procedi-mentos de construção pers-péctica, mas que não os apren-dem realmente.

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29

Desenhos de imaginação comutilização de elementos deconstrução perspéctica. 3o.bimestre, CAU UMC,1996.(sup. dir.) Regina Fukuda.

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Desenhos de imaginação comutilização de elementos deconstrução perspéctica. Doisobjetos sob cama ou mesa,com o olho do observador aaproximadamente 20 cm dochão. 3o. bimestre, CAUUMC,1996.

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31Desenhos de observação e deimaginação. Modificação doteto da sala de aula, 3o.bimestre, CAU UMC,1996.(sup. esq.) Teto modificado,Luiz Arellano Jr. (dir.) Obser-vação e modificação, MarinaMariani.

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Desenhos de observação,quatro vistas diferentes domesmo ambiente, mudandoaltura e posição do observador.Croquis rápidos. 2o. bimestre,CAU UMC,1996. (sup. esq.)Edna F. de Oliveira.

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(esq.) Desenho de memória deum ambiente doméstico. (sup.)Desenho de observação doambiente, posterior ao dememória realizado em sala deaula. 3o. bimestre, CAU UMC,1993.

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(esq.) Desenho de memória deum ambiente doméstico edesenho de observação domesmo ambiente, posterior aode memória realizado em salade aula. 3o. bimestre, CAUUMC, 1993. Leonardo Hng.

(sup.) Desenho de memória deum ambiente domésticorealizado em sala de aula. 3o.bimestre, CAU UMC, 1993.

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35Desenhos de memória de umpercurso realizado diariamentepelo aluno. Mapa e vistas maisimportantes do percurso. 3o.bimestre, CAU UMC, 1993.

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De maneira geral, os pedagogos reformistas basearam seusesforços no objetivo de estimular a criança ou o jovem adesenvolver as habilidades ocultas, latentes, conjuntamentecom o imaginário e a criatividade, através de uma apro-ximação livre e lúdica da realidade, incentivando a apren-dizagem autônoma, ou o aprender por si mesmo.

Tais preceitos foram absorvidos com tal intensidade peloensino ligado à arte, que desencadearam uma totalreformulação dos cursos, e não somente no contexto infanto-juvenil, mas pertinentes à didática para adultos, dos cursostécnicos nos liceus aos superiores, nas universidades. Issoocorreu devido à própria condição imanente da arte, quesempre envolveu preceitos como auto-aprendizagem,criatividade, imaginação.

Assim, pode-se dizer que dentre os vários segmentos noâmbito da Escola Nova, o movimento de educação artísticafoi um dos mais frutíferos em novos métodos eprocedimentos. Destacam-se nomes como Carl Götze (DasKind als Künstler / A criança como artista, 1898), HeinrichScharrelmann (Malen und Zeichnen / Pintar e desenhar) queinsistia na união entre o desenho e a experiência da criança;e John Dewey, cujo lema “learning by doing” tornou-se umdogma da nova pedagogia. Dewey também merece maiordestaque, pois sua concepção pedagógica penetrouprofundamente no movimento das escolas de trabalho naAlemanha, por meio de Georg Kerschensteiner, que porocasião do primeiro Congresso do “Werkbund” alemão, em1908, fez sérias críticas quanto ao ensino nas escolasprimárias.

A maior parte das críticas e sugestões realizadas na épocase referiam especificamente às escolas primárias, exceçãofeita para Joseph August Lux, que postulou em sua obra “Dasneue Kunstgewerbe in Deustschland” (A nova arte industrialda Alemanha, 1908) que as idéias reformistas sobrepedagogia em Arte deveriam estender-se a todos os níveisde educação artística.

III.3.3. A escola nova e a arte-educação

A nova pedagogia conseguia, então, na Alemanha, (assimcomo em outros países europeus) do começo do século,mais e mais adeptos. Neste período, pode-se encontrar asmais importantes experiências pedagógico-didáticas, emtermos de renovação do ensino em nível técnico e superior,destacando-se a Bauhaus, e alguns de seus professores querevolucionaram os métodos de ensino da arte, entre elesJohannes Itten, Wassily Kandinsky e Paul Klee.

No Brasil, um dos nomes mais conhecidos no que se refereao contexto de Arte Educação é o de Onofre Penteado.Professor da U.F.R.J., autor de diversas publicações no gênero,nas quais procurou expor seus métodos de ensino-aprendizagem, técnicas e procedimentos didáticos, OnofrePenteado também pode ser considerado um seguidor dessacorrente. Assim, quando da posição frente aos métodos deensino dos quais se utiliza, relacionados em seu livro DesenhoEstrutural, o próprio autor justifica:

Os métodos utilizados na prática docente são osda educação funcional (Escola Nova). Promove-sea experiência global: sensorial (visual, táctil,auditiva) e psíquica ou espiritual (relações esignificações através de trabalhos prático-didáticos; desenhos de criação, exposições deestampas, projeções de slides e incipientesgravações sincronizadas com projeções (início dofuturo ensino programado).(11)

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Notas e referências bibliográficas.

01. AEBLI, Hans. Didática Psicológica. Aplicação àdidática da psicologia de Jean Piaget. Atua-lidades pedagógicas volume 103. São Paulo: Ed.Nacional, 1971. p.87

02. AEBLI, Hans. op. cit. p.8803. _____,_____. op. cit. p.9204. Imaginária, fruto de abstração.05. _____,_____. op. cit. p.93-406. _____,_____. op. cit. p.9407. _____,_____. op. cit. p.9408. _____,_____. op. cit. p.9609. _____,_____. op. cit. p.9710. _____,_____. op. cit. p.11011. PENTEADO, Onofre. Desenho Estrutural. São Paulo:

Perspectiva, 1981. p.24

Bibliografia complementar

KANDINSKY, Wassily. Do espiritual na Arte. A gramáticada criação. O futuro da pintura. São Paulo: Mar-tins Fontes, 1990.

WICK, Rainer. Pedagogia da Bauhaus. São Paulo: MartinsFontes, 1989.

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Baseados mais em um espírito de época, do que propriamenteem teorias pedagógicas, exceto no caso de Johannes Itten,alguns professores revolucionaram o ensino do desenho naárea das artes plásticas, artes aplicadas e arquitetura, naprimeira metade do século. No texto que se segue analisar-se-á o trabalho pedagógico de três mestres da principal escoladeste período, a Bauhaus. São eles: Johannes Itten, Paul Kleee Wassily Kandinsky.

Na seqüência, outros três trabalhos, relativamente recentes(métodos de ensino-aprendizagem na área do desenho),serão analisados, devido à relevância dos mesmos, nemsempre da mesma ordem: Carlo Maggiora, Onofre Penteadoe Betty Edwards.

III.4. Os métodos de ensino do desenho pós escola ativa

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A Bauhaus se destaca, no período entre guerras, como aprimeira escola de design. Criada por Walter Gropius em 1919para ser uma escola de arquitetura e artes, seus antecedentespedagógicos vêm das escolas de artes e ofícios do final doséculo XIX e início do século XX. O próprio prédio em Weimar,primeira sede da Bauhaus, pertencia à Escola Superior deArtes e Ofícios do Grão-ducado da Saxônia, fundada em 1907e dirigida por Henry van de Velde.

A Bauhaus constitui o entroncamento de correntesaparentemente contrárias, que puderam sermantidas num equilíbrio tenso e produtivo graçasà extraordinária capacidade de organização ecoordenação de Walter Gropius, seu fundador ediretor durante muitos anos. Numa primeira fase,conjugam-se neste equilíbrio o pensamentoplástico do Expressionismo tardio e o ideal doartesanato medieval; numa fase posterior, passama dominar as concepções plásticas doConstrutivismo e o programa de uma criação daforma, dirigida à objetividade e funcionalidade,tendo em vista as exigências e possibilidades datécnica e indústria modernas. (1)

A estrutura pedagógica da Bauhaus estava montada sobre otrabalho de mestres artistas e mestres artesãos, que emconjunto mantinham os ateliês em permanente trabalho.

Gropius exorta o artista...,; ele considera garantidaa qualidade da produção mecânica, se o artistaparticipar “já da criação da forma a serreproduzida”,... Somente a “cooperação entreartista, comerciante e técnico” seria garantia,segundo Gropius, de que os objetivos passados efuturos da sociedade industrial fossemadequadamente alcançados.(2)

...o programa da Bauhaus compunha-se,basicamente, de dois objetivos: a síntese estética

III. 4.1. A Bauhaus

(integração de todos os gêneros artísticos e detodos os tipos de artesanato sob a supremacia daarquitetura) e a síntese social (a orientação daprodução estética segundo as necessidades deuma faixa mais ampla da população e nãoexclusivamente segundo a demanda de unspoucos, privilegiados social e economicamente).(3)

Destaca-se, nesta fase, a contratação dos pintores LyonelFeininger, Johannes Itten e o escultor Gerhard Marcks em1919. Até 22 seguiram-se Georg Muche, Oskar Schlemmer,Paul Klee, Lothar Schreyer e Wassily Kandinsky.

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Itten se destaca por ter formação pedagógica e dedicar-semais à carreira acadêmica do que à de artista. Suíço denascimento, originariamente foi professor de escolaelementar (1o. grau), treinado no método Froebel. Em 1909,decidiu estudar pintura na Escola Superior de Belas-Artesem Genebra, mas decepcionou-se com a atividade docenteacadêmica e retornou aos estudos para professor de segundograu.

Em 1912, decidiu dedicar-se à pintura e voltou à Genebra,onde entrou em contato com o Abstracionismo, exercitando-se primeiramente com os elementos geométricos básicos:triângulo, quadrado e círculo. Mais tarde, o próprio Ittenreconheceu que estes exercícios foram a base de suaintrodução nas criações abstratas, 1915 a 1919. Em 1913,foi para Stuttgard onde lecionava Adolf Hoezel (1853-1934),um dos pioneiros do Abstracionismo, mas não sendo aceitopela comissão de admissão, tomou aulas com Ida Kerkovius,discípula de Hoezel, com a qual entrou em contato com ateoria do mesmo. Esta relação professor - aluno mais tardese inverteria, uma vez que Ida passou a freqüentar o cursoda Bauhaus.

Quando convidado por Gropius para o cargo de mestre daforma, Itten estava na ocasião desenvolvendo um novométodo didático para arte -educação, baseado nas técnicasde Pestalozzi, Montessori e Franz Cizek; este último era, naépoca, conhecido por seu curso de arte jovem, integrado àescola de Artes e Ofícios de Viena; seu lema era a“Descolarização da escola” e “Nada ensinar, nada aprender!Deixar crescer das próprias raízes!”, máximas com as quaisobteve reconhecimento por toda a Europa em Congressosde Educação Artística.

O curso preliminar foi introduzido na Bauhaus seis mesesdepois da fundação da escola, por iniciativa de Johannes Itten,e se tornou, segundo Rainer Wick, a coluna vertebral dapedagogia da Bauhaus, e ao lado de Gropius, a personalidadeindubitavelmente mais destacada e dominante.

III.4.1.1. Johannes Itten

“This form has been realized bya powerful implulse. The dy-namic basis of every thingrhythmical is visibly expressed.Vienna, 1918. M.Tery-Adler.”In: ITTEN, Johannes. Designand form. The Basic courseat the Bauhaus. New York,Reinhold, 1964. p.144.

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Na verdade, Itten opunha-se radicalmente aos objetivossociais e estéticos enunciados por Gropius, assim como àutilização da arte para fins não artísticos como no caso dodesign, tanto que, em janeiro de 1921, os estatutos da escola,refeitos também sob orientação de Itten, não mencionam aspremissas de arte unificada do manifesto de fundação. O cursopreliminar destaca-se na história da Bauhaus como elementode mérito exclusivo deste artista e, por isso, aparentementedistante das outras disciplinas. A idéia de um curso preliminar,no entanto, remonta ao século XIX, e foi muito reivindicadapela corrente reformista das escolas de arte, no início desteséculo. O destaque do curso preliminar da Bauhaus, porém,está ligado intimamente à personalidade de Itten, que aliousuas concepções educativas baseadas na Escola Nova aotrabalho de artista de vanguarda.

Itten escreveu:

Em 1908, quando dei minha primeira aula comoprofessor primário num povoado de Berna, procureievitar tudo o que pudesse perturbar a ingênuadesenvoltura das crianças. Reconheci quase queinstintivamente que toda crítica e toda a correçãotêm um efeito ofensivo e destruidor sobre aautoconfiança, e que o estímulo e o reconhe-cimento do trabalho realizado favorecem odesenvolvimento das forças. (4)

Aliado a este método, Itten jamais riscava os erros noscadernos de seus alunos, fato que considerava uma inter-venção na personalidade deles, mas os discutia exaus-tivamente com a classe. Na Bauhaus e, mais tarde, nas outrasescolas de arte, Itten se utilizou deste mesmo princípio, ouseja o respeito pela individualidade do aluno.

Com Höezel, pode-se dizer que Itten estudou: as Teorias dasCores de Goethe, Bezold, Chevreul e do próprio mestre; aproblemática do claro-escuro segundo a teoria de Höezel, esua análise dos antigos mestres, com o objetivo de conhecer

a estrutura construtiva das obras. No período de 1913 a 1916,período no qual Itten esteve em Stuttgard, Höezeldesenvolveu uma série de trabalhos, colagens abstratas depapel rasgado e retalhos de tecidos. Como se verá adiante,estas tornaram-se a base do curso de Itten na Bauhaus, assimcomo exercícios de transposição das colagens para alinguagem do desenho ou pintura.

Outra influência de Höezel sobre Itten está nos exercícios deginástica, que Höezel praticava com regularidade, e que setornaram característicos das aulas de Itten para relaxar edesenvolver as potencialidades motoras do corpo, assimcomo iniciar os estudos sobre ritmo.

Itten, assim como Höezel, estimulava os alunos a desenharemuma figura humana num só traço.São fundamentais, para o curso preliminar de Itten naBauhaus:

a relação de identidade entre movimento e forma,a visão conjunta de corpo, alma e espírito, sendo oaspecto emocional mais enfatizado do que ointelectual; (5)

Na visão de Droste, o princípio pedagógico do ensino de Ittenresidia em dois conceitos opostos: intuição e método ouexperiência subjetiva e recognição objetiva.

Para Itten só se percebe o mundo devido aos contrastes,algo só é perceptível devido ao seu oposto, assim, osexercícios e todo o fundamento do seu ensino estava baseadonesta teoria.

Para Itten,O conhecimento dos meios de criação e de suasleis não representa um fim em si mesmo, mas temapenas um caráter instrumental que permitealcançar o objetivo de um autodesenvolvimentocriativo. (6)

Seus princípios pedagógicos envolviam um respeito peloindivíduo e pelas suas possibilidades criativas; tinha o alunocomo ponto central de seu trabalho como educador, cons-truindo com ele uma relação informal, concedendo prioridadeao trabalho, até antes da pura aprendizagem. Todos estesprincípios inserem-se dentro da Pedagogia Reformista, hojetambém conhecida como Escola Nova.

Itten foi também, pelo menos neste período, seguidor doculto “Mazdaznan” ou Masdeísmo, derivado do antigoZoroastrianismo. Segundo Frank Whitford, enquantoprofessor, acreditava no potencial criativo de cada um e quea doutrina Mazdaznan poderia ajudar a despertar este talentoartístico oculto. Extremamente venerado como mestre, Itten,graças à sua personalidade, conseguiu persuadir cerca devinte alunos a adotar esta doutrina, comportando-se evestindo-se com trajes especiais, criados por Itten.

Ainda segundo Whitford, muitas das críticas que recaemsobre Itten, neste período, referem-se ao curso preliminarcomo uma espécie de “lavagem-cerebral”, na qual todos osestudantes eram destituídos dos ensinamentos anteriores,e, assim, tornavam-se receptivos a novas idéias e métodos.Outros preferem ver este curso apenas como uma ajuda inicialdada aos estudantes para liberarem seu potencial criativo.

Outros indícios dão uma visão mais complexa da polêmicafigura de Itten. Paul Citroen, antigo aluno da Bauhaus,escreveu:

Havia algo de demoníaco em Itten. Como mestreera profundamente admirado e igualmente odiadopelos seus inimigos, que não eram assim tãopoucos. Ignorá-lo é que não se podia. Para nós,que pertencíamos ao círculo do masdeísmo - umacomunidade especial dentro da Bauhaus - Ittentinha uma aura muito especial. Quase se podiadenominá-lo santo, só nos aproximávamos dele emsussurros. A nossa admiração por ele era enorme

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e ficávamos encantados e inspirados sempre queele nos tratava de forma simpática e natural. (7)

Para conhecimento sobre as aulas de Itten na Bauhaus, é degrande interesse a análise de seu livro “Design and Form”,que originariamente em alemão tem como título “Mein Vorkusam Bauhaus”. Mas constam, também, deste livro, e em gran-de parte, trabalhos posteriores realizados a partir de 1926em outras escolas em Berlim e Zurich.

Ao contrário das aulas tradicionais das academias, nas quaisprevalecia a cópia de modelos, meios pelos quais osestudantes adquiriam grande parte da técnica, Itten ensinavaaos alunos as bases da teoria da cor e da forma e noções decomposição. Faziam-se exercícios com linhas grafadasespontaneamente, que lembravam as formas do expres-sionismo abstrato, com uma ou ambas as mãos ao mesmotempo. Muitos deles eram realizados com tinta sobre papel,variando as espessuras das linhas, e sem tirar o pincel dasuperfície, para não interromper o movimento. A maior partedos exercícios revela uma preocupação fundamental com oscontrastes de todos os tipos: claro-escuro, grande-pequeno,largo-estreito, preto-branco, horizontal-vertical, linha-corpo,transparente-opaco, entre outros.

Itten preferia que, em suas aulas, os alunos resolvessem seusproblemas de composição e criação, expressiva e intuitiva-mente, para depois se utilizarem de um método construtivo-intelectual. Usava-se comumente o carvão, com o qual seelaboravam escalas de tons. Também eram comuns os exer-cícios com texturas, análogas ou contrastantes, utilizando-se de diversos materiais, de papéis a tecidos e materiaismetálicos, a fim de aprimorar não só a sensibilidade visual,mas também a táctil. (Visava-se diferenciar as tensões pelosritmos criados pelas texturas.) Estes exercícios tinham tam-bém outra finalidade pedagógica, visavam propiciar ao alunouma proximidade lúdica com materiais diversos a fim de quepudesse se encaminhar de maneira mais decisiva noprosseguimento do curso, ou seja, na escolha das respectivas

“Line analysis form nature. Ber-lin, 1929. E. Baümer.” In:ITTEN, Johannes. Design andform. The Basic course atthe Bauhaus. New York,Reinhold, 1964. p.110.

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oficinas.

Além dos estudos com materiais, faziam parte do programado curso preliminar de Itten, o desenho com objetos naturais(troncos de madeira, pedras), o desenho com modelos vivose as análises dos mestres antigos (Giotto e Goya, entreoutros), nas quais se utilizavam os mesmos critérios eprincípios estético-compositivos dos exercícios acima.

Para Itten, o estudo da natureza não é l’art pourl’art, nem mesmo um mero adestramento dahabilidade manual ou um exercício de destreza, esim algo que serve ao aguçamento da capacidadede conhecer através dos sentidos e uma ampliaçãodo “pensamento concreto”, uma relação que Ittencerta feita reduziu a uma fórmula breve, cujafundamentação deixa a desejar: “acuidadesensorial = pensamento real exato” (8)

O desenho com modelos vivos, ou nus, estava condicionado,no entanto, a outras finalidades. Itten não exigia de seusalunos uma representação anatômica exata, mas uma formaexpressiva característica. Esta aula era acompanhada semprede música,

a fim de intensificar a sensação pela expressãorítmica do modelo em movimento,...(9)

Nas análises das obras de antigos mestres, tambéminspiradas nas iniciativas de Höezel, utilizava-se a intuiçãocomo forma de compreender as relações do quadro, da suaessência, através da elaboração gráfica criativa dessaessência. As sensações eram transportadas para o papelatravés do uso dos contrastes, distribuição de pesos, ritmos,linhas de força, entre outras formas de interpretação da obra.Buscava-se a síntese estrutural do quadro baseado noelemento principal. Geometrizava-se e simplificava-se.

Na teoria das formas, elaborada por Itten, destacam-se as

investigações com as três formas básicas: quadrado, triânguloe círculo, associadas a aspectos culturais e/ou sensoriaiscomo: força, vida, tranqüilidade, etc. Tais tentativas podem,segundo Wick, ter sido inspiradas em Kandinsky, maisespecificamente em sua obra “Sobre o espiritual na Arte”.

Dessa teoria surgiram exercícios, nos quais se trabalhavamas possibilidades criativas do quadrado, do círculo e dotriângulo, envolvendo divisões da forma a estudos deproporcionalidade e relação harmônica entre as figuras.Desses exercícios bidimensionais, passavam-se a exercíciostridimensionais, estereométricos, compostos a partir decorpos simples : esferas, pirâmides cilindros, etc. No cursode Itten, “desenho” não se separa de plástica.Itten foi o precursor de Klee e Kandinsky na Bauhaus e muitoinfluenciou a estes e a outros que lá ensinaram. SegundoDroste, Klee depois de assistir uma aula de Itten adotou deimediato suas teorias sobre forma e cor, em seu programadidático.

Johannes Itten deixou a Bauhaus em 1923.

“Analysis of Giotto’s “Annuncia-tion of St. Anne”. In this pain-ting Giotto has used light-darkin an elementary manner.Giotto’s light-dark effect andcompositional intent can beclearly recognized. Giotto hascreated the mistery of Annun-

ciation by placing the figuresabstractly into the light-dark ofthe space. Vienna, 1918,M.Tery-Adler.” In: ITTEN,Johannes. Design and form.The Basic course at theBauhaus. New York, Reinhold,1964. p.39.

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Paul Klee baseou todo seu curso em suas própriasexperiências como artista e pesquisador assíduo de novaslinguagens. Através da reflexão de seu trabalho, estruturavasuas aulas, propondo exercícios nos quais os alunos, atravésda pesquisa gráfica e plástica, intuiriam seus ensinamentos.

Paul Klee cresceu numa família de músicos. Conta-se que foisua avó materna quem lhe ensinou a trabalhar com lápis epincel e muitos desses desenhos de infância integram osatuais catálogos de suas obras.

A rebeldia de Klee e sua tendência a opor-se à vontade deseus pais, fez com que ele seguisse a carreira de pintor, nãoabandonando porém totalmente a música. Para Klee, a músicajá havia atingido seu apogeu e os compositores modernos,ao contrário do que pensava da pintura, não lhe interessavammais.

Concluiu o Liceu em setembro de 1898 e em outubro dirigiu-se a Munique para estudar na Academia de Belas Artes, naqual não foi aceito, sendo encaminhado para aulas particularesde desenho figurativo com Heinrich Knirr (1862-1944).

Em outubro de 1900, entrou finalmente para a Academia.Em 1901, deixou o curso de pintura e tentou o de escultura,mas recusou-se a submeter-se ao exame de admissão. Noverão deste mesmo ano, mudou-se de Munique.

A partir de então, passou três anos desenhando e dedicando-se à técnica de gravura a água-forte como autodidata, nacasa de seus pais em Berna.

Em 1905, conheceu os impressionistas em Paris e começouuma nova série de gravuras associadas com a pintura emvidro, onde predominavam, mais que as cores, os contrastesde claro-escuro.

Apesar de uma exposição em junho de 1906, onde recebeucríticas quanto à “anomalia das formas” presente em seu

III.4.1.2. Paul Klee

“A leaf from the book cities.1928. Oil on paper mounted oncard board, 16 3/3 x 12 3/8.” In:GROHMANN, Will. Paul Klee.N. York: Harry N. Abrahmas,1985. p.26.

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trabalho, Klee e sua esposa Lily, viviam afastados do meioartístico. Paralelamente, tocava violino e escrevia críticas deteatro, não restando muito tempo para o desenvolvimentocomo pintor e muitos autores referem-se à evolução artística,até esta época, como particularmente lenta.

Nesta época, trabalhava com experiências em cor compintura, além das gravuras. Começa, então, a fase dasaquarelas, a princípio em preto e cinzas, estudando astonalidades, para depois numa mistura irreverente detécnicas, abusar da cor em seus trabalhos. Durante esteperíodo, no entanto, era mais um desenhista que um pintor,realizando ilustrações a pedido de Alfred Kubin (1877-1959),um dos desenhistas conhecidos da época.

Klee escrevia artigos para revistas, defendendo comconvicção a arte primitiva e a arte infantil, pois a consideravanão alienada e não corrompida, pelo menos até a criançaentrar em contato com “obras de arte”.

Em 1912, na segunda exposição do “Blauer Reiter”, Kleeapresentou dezessete obras. Após viagem a Paris, ondeconheceu o trabalho de Picasso e Braque, Derain e Mauricede Vlaminck, além de Robert Delaunay, que impressionoudefinitivamente Klee no uso das cores, chegou finalmente àpintura abstrata.

Em 1920, surge o convite de Gropius, Feininger, Itten, entreoutros, para lecionar na Bauhaus, o que se efetiva naprimavera de 1921.

Segundo Wick, a estratégia de Gropius para o convite decertos professores, residia em convidar para a escola artistasde renome considerados progressistas e,

em utilizar seus impulsos inovadores também nasáreas “aplicadas”, sem precisar temer umretrocesso às antigas posturas das academias dearquitetura, escolas superiores de arte e escolas

de artes e ofícios... (10)

Klee era fascinado por problemas teóricos. Articulado eletrado, levava seu ensino com seriedade e cuidava-se paranão utilizar dogmas em seus pronunciamentos. Mas estes,no entanto, não foram a princípio bem quistos oucompreendidos por todos os colegas docentes. Schlemmerpor exemplo, certa vez recordou

That Klee’s work appears to inspire the greatestshaking of heads, as a kind of l’art pour l’art,removed from every practical purpose. (11)

Paul Klee começou seu trabalho na Bauhaus, como mestreda forma na oficina de encadernação, ao lado do mestreartesão Otto Dorfner, com o qual não se entendia muito bem.Não possuía qualquer experiência docente ou formaçãopedagógica. Isto talvez tenha sido de fundamental importânciana criação de um método de ensino próprio, no qual utilizavaseu próprio fazer, sua atividade artística como fonte deconhecimento para seus alunos. Segundo Wick, aliada a istoestava a forte timidez de Klee para falar em público, que ofazia, nos primeiros anos, preparar minuciosamente suasaulas. Estas anotações posteriormente deram origem a váriaspublicações, como por exemplo “Pedagogical Sketchbook”originariamente publicado em 1925 e editado por WalterGropius e Moholy-Nagy, sendo o segundo dos quatorze livroseditados pela Bauhaus, e “Notebooks” , que em algumasedições, como a italiana, aparece como “Teoria della formae della figurazione”.

O mais importante trabalho de Klee na Bauhaus está no cursopreliminar que lecionou de 1921 a 1931.

Ao contrário de Kandinsky que repetia os mesmosexercícios ano após ano com poucas alterações,na aula de desenho analítico (desde 1922) e naaula de teoria da cor (desde 1925), Klee modificavaconstantemente o seu método de ensino, em parte

“View of a mountain sanctuary.1926. Pen and wash, 18 1/2 x11 3/4.” In: GROHMANN, Will.Paul Klee. N. York: Harry N.Abrahmas, 1985. p.24.

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com ajuda de literatura especializada que elepróprio criava.(12)

Na fase da Bauhaus, em Dessau, o interesse de Klee peloensino vai progressivamente decaindo, culminando no seudesligamento.

Klee já não tinha vontade. Entrou em negociaçõescom várias academias e, em 1930, foi nomeadopara Dusseldórfia. Dessau propôs-lhe entãomelhores condições de trabalho, sobretudo menorsobrecarga horária. Mas Klee recusoucategoricamente, porque uma redução da suaactividade era inconciliável com as ideias daBauhaus. Numa carta a Lily, datada de 14 de Junhode 1930, traçou um resumo da sua actividade dedez anos em Weimar e Dessau: “O trabalho naBauhaus é fácil quando, como pintor, a pessoa nãose sente obrigada a produzir. Neste momento, istoparece fácil e, como esta situação é passageira,sinto-me perfeitamente bem. O cargo em si mesmoseria bastante fácil. Se eu pudesse cedê-lo aalguém que não tivesse um outro trabalho, fariaalguém feliz. Mas, então, não seria um artista e,portanto, isto também não interessaria. Terá de seralguém que utilize as suas forças melhor do queeu. A idade, neste caso, tem um papel secun-dário.(13)

Com a saída de Itten, Klee e Schlemmer ficaram com o cursode desenho vivo, no qual revezavam-se por semestre. Mas,três meses depois, Klee já o transformara em um curso sobreteoria da forma pictórica. Até 2 de abril de 1922 escreveutodas as aulas dadas e, em 1923, ampliou o programa adi-cionando a teoria da cor.

É impossível analisar o trabalho de Klee na Bauhaus, enquantoprofessor desvinculado da sua produção enquanto artista.Os mestres artistas tinham à sua disposição, tanto em Weimar

como em Dessau, ateliês particulares onde podiam conjugaras duas atividades. Inclusive a idéia de que “se ensina aquiloque se faz”, foi uma das diretrizes básicas do pensamentode Gropius na concepção da escola; por isso os professoresdeviam participar aos seus alunos sua produção artística e,em alguns casos, como o de Paul Klee, essa atividade setornou base do método e do conteúdo da disciplina.

No caso de Klee, especificamente, os elementos pedagógicoe artístico foram concebidos como uma unidade e não sepode precisar se a pressão exterior para uma maior reflexãocom fins didáticos inspirava na criação de novas obras ouvice-versa. Nas palavras do próprio Klee:

Aqui no ateliê estou pintando cerca de meia dúziade quadros, além de desenhar e de refletir sobre omeu curso, tudo ao mesmo tempo. Pois tudo istotem que caminhar paralelamente, do contrário nãotem sentido. (14)

Segundo M. Droste, Klee descreveu da seguinte forma suasaulas:

desde o princípio e cada dia que passa vejo commaior claridade o meu papel, nomeadamente o decomunicar a experiência que tenho adquirido coma configuração das idéias (desenhar e pintar)relativa à organização da multiplicidade em unidade.Esta experiência transmito-vo-la em parte emsínteses (isto é, deixo-vos ver as minhas obras)em parte em análises (isto é, divido as obras nasuas partes essenciais). (15)

Klee, de início, adotou muito do curso de Itten (pois haviaassistido a algumas de suas aulas e muito se impressionado),como também de Kandinsky, por meio do “Sobre o Espiritualna Arte” publicado em 1912, para mais tarde encontrardesenvolver suas próprias idéias sobre o ensino da arte.

“Drawing for “Perspective of aroom with occupants” 1921.pen and pencil, 13 1/4 x 9 7/8.”In: GROHMANN, Will. PaulKlee. N. York: Harry N. Abrah-mas, 1985. p.17.

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O essencial do trabalho de Klee encontra-se reunido em suaspublicações. Nestas, encontram-se reunidos os trabalhos doartista e do intelectual teórico, aliado a uma abordagemdidática.

Teaching forced him to consider his own work onan intellectual level for the first time: “When I cameto teach I was obliged to make precisely clear tomyself what I did for the most part uncnsciously.”Klee’s theories emerged from his practice and notthe other way about.(16)

O núcleo da Teoria da forma de Klee desenvolveu-se entresua estadia em Weimar e Dessau, no período entre 1920 e1925, para depois ser ampliado por novos ensaios sobreproblemas figurativos, adaptados às exigências de suaatividade didática. Klee deixou cerca de duas mil e quinhentasfolhas de escritos pedagógicos, entre apontamentos de aula,esquemas, desenhos construtivos e esboços compositivospara seus quadros.

in essi si trata sopratutto dell’ampliamento dellaprospettiva, della teoria soggettiva dello spazio,della mobilità del punto prospettico, della teoriadell’articulazione, dei ritmi e delle strutturecandenzate e della sintesi statico-dinamica: la suateoria della figurazione vi appare arrichita di moltiassiomi concettuali. (17)

Giulio Carlo Argan dimensiona a importância desta teoriaelaborada por Klee:

The writings which compose Paul Klee’s theory ofform production and pictorial form have the sameimportance and the same meaning for modern artas had Leonardo’s writings which composed histheory of painting for Renaissance art.(18)

A importância, segundo este autor, está no fato da obra não

se configurar em uma coleção de regras estilísticas outécnicas, mas sim de uma análise introspectiva, fruto dotrabalho do artista, ou seja, da sua experiência da realidade,a qual é um elemento necessário do processo artístico.Segundo Argan, a teoria de Klee explica que a experiênciada realidade do artista não é mais nem menos concreta ouconclusiva que aquela adquirida pela pesquisa científica oufilosófica.

Klee, assim como a maioria dos mestres da Bauhaus,acreditava que a arte não pode ser ensinada ou transmitidapedagogicamente, mas pode-se, no entanto, ensinar e, assim,fazer aprender racionalmente alguns exemplos que se mani-festam formalmente. Klee também acreditava que artistasnão podem fazer arte dissociados de sua visão de mundo.

“The great dome. 1927. Tusheand pen, 10 1/2 x 11 7/8.” In:GROHMANN, Will. Paul Klee.London: Thames and Hudson,1967. p.59.

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Klee procede no desenvolvimento de sua teoria à semelhançade Kandinsky, ou seja de maneira “analítico elementar”. Ostópicos de suas considerações são semelhantes em gêneroe ordem de abordagem, começando pelo ponto, depoispassando à linha, ao plano e finalmente ao espaço. O que osdifere, está no motivo pelo qual Klee sustenta o métodoanalítico, que não seria fornecer fundamentos para umalinguagem supra-individual, que correspondesse a umavontade fictícia de ser expressão do “elemento artístico puroe eterno”, mas nas palavras do próprio Klee:

a investigação da obra com vistas aoestabelecimento de seus estágios de formação. Auma tal investigação dou o nome de gênese. (E:)Investigamos os caminhos percorridos por umaoutra pessoa para a criação de sua obra para,percorrendo-os conhecê-los. Um tal tipo deobservação evita que se conceba a obra como algoestático, irremediavelmente fixo.(19)

Para Klee, é importante ensinar aos alunos tanto sobre oprocesso de criação, como também sobre alguns “aparatos”necessários para tal. Estes são, de maneira resumida econdensada, explicados em nove lições.

Na 1a. lição, Klee inicia suas colocações sobre o ponto emmovimento, assim, seu interesse está propriamente ligado àlinha. As linhas são classificadas em três tipos: Ativa, Mediale Passiva.

Na 2a. lição é tratada a questão da terceira dimensão e daperspectiva, pois para Klee estas surgem da conversão deduas linhas para um ponto. O ensino da perspectiva por Kleeestava fundamentado na orientação do homem no espaço,pela qual se estabelecia a relação das horizontais e verticais.

Na 3a. lição continua a abordagem na inserção do homemno espaço e das forças que atuam sobre ele e em que istoimplica nas formas.

O conceito de equilíbrio é resultante do contraste. Assim,Klee postula a harmonia plástica, o equilíbrio,portanto -...-, entre o “princípio fundamentalmasculino” e o “princípio fundamental feminino”,entre espírito e matéria, e suas expressões formaisatravés do movimento contrário: “Toda energiarequer um complemento para alcançar um estadoque repousa em si mesmo, e que se encontra porsobre o jogo de forças...”(20)

A 4a. lição trata da estrutura. De natureza puramente plástica,este conceito tem sua existência dependente da repetiçãode um elemento numa freqüência rítmica.

Klee estabelece uma relação entre pintura e música.Comparando a estrutura da pintura com o compasso damúsica, reflete acerca de como representar musicalmenteo pictórico, problema do qual se ocuparam também outrosmestres e alunos da Bauhaus.(21)

Na 5a. lição, estuda questões relativas à força gravitacional eao movimento do cosmos.

Na 6a., o movimento é estudado em ligação com o organismovivo, o corpo como máquina de movimento, onde desejo eexecução estão unidos.

Na 7a. lição, ilustra esses efeitos com o exemplo do moinhode água, do crescimento das plantas e da circulaçãosangüínea, para então passar ao movimento como problemapictórico.

Klee também aborda a questão do movimento, comoelemento constituinte da recepção pictórica. O movimentodado pelo artista à obra é reativado pelos olhos do observadorao percorrer a obra. Para ilustrar a questão do movimentocriador, introduz nas aulas símbolos como o pião, o pêndulo,a espiral e a flecha, que são estudados especificamente naslições 8 e 9.

“Mechanics of a part of town.1928. Tushe and pen, 5 1/4 x 101/4.” In: GROHMANN, Will. PaulKlee. London: Thames andHudson, 1967. p.61.

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Kandinsky, por sua vez, é o menos ativista dos três, pois nabusca de uma sintaxe universal, abdicou em parte da pesquisapelos próprios alunos, dando-lhes uma gramática que seguiamatravés de exercícios fixos e rígidos. Vale a pena lembrar suapesquisa fracassada e cientificamente inválida quanto àtentativa de associar formas puras e cores primárias.

Kandinsky, russo de nascimento, em 1886 iniciou naUniversidade de Moscou seus estudos de Direito e EconomiaPolítica. Aos trinta anos resolveu estudar pintura, mudando-se para Munique.

Na sua trajetória artística, percorreu o caminho (plástico eteórico), da figuração à abstração. Sua obra foi inicialmentecomposta por desenhos figurativos, onde estuda o nu e aanatomia. Também podem ser encontrados esboços depaisagens e estudo de vestimentas.

O passado dedicado às questões jurídicas exercitou opensamento abstrato de Kandinsky, fazendo com que, noperíodo seguinte, este se dedicasse à problemática das artesplásticas de forma analítica.

Eberhard Roters confere:

Ele tinha a capacidade de reunir em hipóteses seusconhecimentos e reflexões, fundamentando-as deforma lógica, e formulando-as clara e inteligi-velmente... o que era muito proveitoso para a teoriaque elaborava, tanto mais por ele ter que superaras dificuldades decorrentes das primeirastentativas de explicar experimentos criativostestados por ele mesmo, e baseados em suaprópria sensibilidade.(22)

Kandinsky retornou à Rússia e, após a revolução, ele esteveativamente engajado na política cultural da recente UniãoSoviética, procurando reformar os velhos estabelecimentosde ensino de arte e fundando outros novos.

III.4.1.3. Wassily Kandinsky

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Retornou à Alemanha em 1921, desiludido com a Revolução,principalmente devido às reações contrárias à arteexperimental. Logo chegando a Berlim, foi contatado porGropius. Era então um homem de meia idade e em meio decarreira. Para Gropius, sua presença reforçava o quadro daBauhaus como escola de vanguarda, pois era consideradoum dos mais célebres pintores abstratos.

Em 1911, Kandinsky publicou sua primeira obra teórica “Überdas Geistige in der Kunst” (Sobre o espiritual na arte), decunho filosófico - religioso, baseado nas idéias teosofistas.Este desenvolvimento teórico culminou na eliminação doaspecto figurativo na obra do artista.

No período dedicado à Bauhaus, o abstracionismo deKandinsky assume um caráter analítico, racional e as obrasteóricas deste período acompanham esta tendência.

O trabalho de Kandinsky na Bauhaus destaca-se mais peloconteúdo do que propriamente pelos métodos de ensino.Fruto de seus primeiros anos na Bauhaus, a obra “Punkt undLinie zu Fläche” (Ponto e linha sobre o plano) publicada em1926, mostra a concepção de uma teoria da criação, que éum trabalho pioneiro sobre a interpretação racional dosfundamentos da criação.

Tanto Klee, quanto Kandinsky, destacam-se na Bauhaus pelacontribuição aos estudos sobre linguagem elementar doaspecto plástico.

Kandinsky chegou à Bauhaus em 1922 e recebeu a seuencargo, como mestre da forma, a oficina de pintura mural,até 1925. Mas esta oficina não produziu um grande númerode trabalhos e mesmo estes poucos, não tiveram importânciarelevante.

Kandinsky defendia a arte sintética, uma arte onde nãohouvesse subdivisões nem especificações, onde música epintura, por exemplo, atuassem juntas. Por conseguinte,

defendia uma formação sintética dos estudantes, a maisampla possível no campo das artes, muito próxima da visãodo “homem total” de Gropius.

A importância da atividade pedagógica de Kandinsky naBauhaus reside, não na oficina de pintura, mas no cursoobrigatório, inicialmente apenas no primeiro semestre,estendendo-se no final dos anos 20 até o quarto. Osfundamentos teóricos deste curso encontram-se em váriaspublicações, entre elas “Curso da Bauhaus”, na qual apresentanotas de aula, enfatizando a análise dos elementosfundamentais da pintura abstrata: cor e forma. Tambémpodem ser encontradas notas pessoais do artista sobre temasescolhidos para discussões em seminário: resumo sobre ahistória da arte, forma e conteúdo, a necessidade da arte,relações entre arte e técnica e entre arte e natureza. PhilippeSers, que assina o prefácio da edição portuguesa, tambémenfatiza a preocupação de Kandinsky com a síntese nas artese conseqüentemente na sua ação pedagógica.

O núcleo do ensino de Kandinsky na Bauhaus, no entanto,encontra-se resumido em “Ponto, Linha sobre Plano”, apesarda análise sumária quanto à cor.

Suas aulas, no curso obrigatório, dividiam-se em: umaintrodução dos elementos formais abstratos e um curso dedesenho analítico. Seu método baseava-se na interligaçãode análise e síntese, uso da primeira para se chegar àsegunda. Assim, seu objetivo era desenvolver no aluno umpensamento analítico-sintético. Merece destaque estaposição pedagógica, pois ao contrário da postura tradicional

“Adolf Hölzel. Analyses of apainting, 1911.” In: POLING,Clark V. Kandinsky’s Teach-ing at the Bauhaus. ColorTheory and Analytical Drawing.New York: Rizzoli International,1986. p.128.

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de apenas apresentar conceitos, Kandinsky se propõe aensinar a pensar.

As aulas teóricas eram acompanhadas de exercícios práticos,formulados rigidamente, os quais eram realizados de maneiraprecisa, segundo orientação do mestre. Mas, segundo Droste,ao contrário de Klee, Kandinsky repetia os mesmos exercíciosano após ano, com poucas alterações.

O curso de desenho analítico, que estava, segundo Kandinsky,baseado na teoria dos elementos formais abstratos,caracterizava-se

não como uma introdução ao desenho natural ede objetos, mas como uma propedêutica de visãoexata e da organização construtiva da imagem. Oobjetivo desta aula de desenho não era, portanto,a representação mais verossímil da aparênciaexterna do mundo material, mas a descoberta das“forças=tensões regulares, que se podemdescobrir nos objetos existentes, e da construçãoregular das mesmas - educação para a observaçãoe reprodução claras das relações...” (23)

Em 1926, pronunciou-se a favor do método analítico naBauhaus como corrente determinante. O artista deveria,segundo ele, pensar objetivamente, cientificamente. Confereuma função pedagógica fundamental à pintura, comodisciplina integradora na busca de uma síntese estética. Estavalorização da pintura, contradiz o rumo que então tomaria aescola nos próximos anos, com a supremacia da arquiteturaem relação às outras áreas.

Kandinsky formulou várias teorias: a das cores, a das formas,a das cores e das formas relacionadas e a dos planos básicos.Característica comum a todas é a forma axiomática daapresentação das conclusões. Essas teorias derivam de umabusca incessante do artista por um “baixo contínuo”, umdicionário elementar e uma gramática dos meios plásticos.

“Wassily Kandinsky. Graphicdiagrams as translations of mo-mentary movements, 1916.”In: POLING, Clark V. Kandins-ky’s Teaching at the Bau-haus. Color Theory and Ana-lytical Drawing. New York: Ri-zzoli International, 1986. p.126.

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Esta postura o distancia didaticamente de Itten e Klee, quetentavam levar o aluno a descobrir, por si próprio, taisconceitos.

A teoria da forma compreende a investigação dos meiosplásticos elementares, ponto e linha, e das três formas básicasdeles resultantes: círculo, triângulo e quadrado.

O ponto assume, em plástica, uma certa grandeza (emborarelativa, pois depende das grandezas do plano e dos outroselementos coexistentes no plano), através da suamaterialização, se comparado à sua abstração emmatemática. O ponto é também considerado a menor formatemporal, pois não possui movimento. Ele dá origem àcomposição mais simples quando se encontra no centro deum plano quadrado.

A linha, na concepção de Kandinsky, é o vestígio demovimento do ponto, resulta da ação de forças sobre o ponto,que podem originar um linha reta, quando nele atua somenteuma força, ou linhas quebradas ou curvas quando da atuaçãode duas ou mais forças. As retas horizontais são para o artistaa base de sustentação numa composição e por isso deconotação fria, as verticais ao contrário são quentes, e asdiagonais possuem as duas características, consideradas porisso, livres ou sem equilíbrio. (Esta conotação de quente -frio fará a ponte principal entre as teorias das formas e dascores). As retas livres podem ainda ser divididas em doisoutros grupos: as centrais, que cortam o plano pelo centro, eas acentrais, que possuem uma relação de menor rigidezcom o plano, por vezes traspassando-o.

A atuação de forças simultâneas dá origem às curvas e, senão simultâneas, às linhas quebradas. Para Kandinsky, essaslinhas tem um maior contato com o plano, pois já têm em sialgo de plano; ângulos diferentes destes são consideradoslinhas quebradas livres.

Denomina o suporte material das imagens como plano básico

“Photograpf of a typical still-lifeconstruction, 1929. HannesBeckmann. The Different Sta-ges of Analysis, 1929.” In: POL-ING, Clark V. Kandinsky ’sTeaching at the Bauhaus.Color Theory and AnalyticalDrawing. New York: Rizzoli In-ternational, 1986. p.112.

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“Grundfläche”, abreviadamente chamado GF e PB emportuguês. Estuda-o no que diz respeito às suas tensõesinternas inerentes à sua forma e àquelas que dizem respeitoàs relações com os meios plásticos elementares, ponto elinha.

Classifica três planos básicos considerados exemplares, oretangular transversal, frio como a linha horizontal, o retangularvertical, quente como a linha vertical, e o plano de formaquadrada, considerado por ele como o mais equilibrado eassim o mais objetivo, no qual se baseará para continuarsuas reflexões. Divide-o em quatro campos de força: osuperior, o inferior, o da direita, e o da esquerda.

O “campo superior” suscita a idéia de um estadode maior relaxamento, um sentimento de leveza,uma libertação, e finalmente, a liberdade... Arepressão é reduzida ao mínimo.O “campo inferior” suscita uma impressãoabsolutamente oposta: concentração, gravidade,vinculação... A repressão atinge o extremo. (24)

A associação dessa classificação à idéia de céu e terra éinevitável.

As diferenças entre esquerda e direita do plano básicocorrespondem respectivamente às existentes entre superiore inferior. Estas classificações geram um esquema dedistribuição de peso, num plano quadrado, onde o quadranteinferior direito é o mais denso graficamente, o superior direitoe o inferior esquerdo se equivalem ou possuem uma oposiçãomoderada e o superior esquerdo o menos denso. A relaçãoentre os quadrantes opostos caracteriza-se, na visão deKandinsky, por uma diagonal desarmônica e a tensão quedela resulta seria “dramática”, ao contrário dos quadrantesem oposição moderada, cuja diagonal harmônica, gera umatensão “lírica”.

Quanto às disposições de formas no plano básico, Kandinsky

as classifica em dois grandes grupos: paralelamente às bordasdo plano (paralelismo externo), ou paralelamente às diagonais(paralelismo interno, pois estariam dispostas em relação àstensões internas do PB).

Com relação às tensões geradas pelas formas acrescidas aoplano básico, Kandinsky conclui que quanto mais próxima dolimite do plano estiver a forma, maior será a tensão, até cessartotalmente quando do encontro com a borda.

São também estudadas as composições possíveis no planobásico, divididas em dramáticas e líricas. Tais conclusões são,segundo Wick, apresentadas como regras absolutas e,psicologicamente, de validade geral e não só na arte.

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Assim como a escola de ULM - Ulm School for design, surgidaapós a segunda guerra - muitas escolas de arquitetura edesign se basearam no ensino da Bauhaus, no legado detrabalhos e publicações de alunos e professores, para aestruturação de cursos e currículos. O fundamentopedagógico-didático geralmente esteve (e ainda hoje está)relacionado na prática de trabalhos em ateliês e laboratórios,através de pesquisa realizada pelos próprios alunos. A própriaFAU USP, na década de sessenta, tem sua estruturapedagógica nesta proposta revelada fisicamente no desenhopara o novo prédio assinado por Vilanova Artigas. As teoriasdas formas elaboradas pelos mestres da Bauhausfundamentam ainda hoje a base conceitual (mais conhecidapor Desenho básico ou Desenho estrutural) dos cursos dedesign.

A escola de arquitetura Irwin S. Chanin of The Cooper Union,dirigida por Peter Eisenman, revela, nas publicações própriassobre trabalhos de alunos, que o ensino da arquitetura estávinculado à pesquisa criativa através do desenho, sendo estemeio e fim em si mesmo.

O estudo das teses e dissertações, apresentados à FAU USPsobre o ensino de desenho, revela, no entanto, umadefasagem didática em relação ao que seria adequado, faceàs dificuldades enfrentadas pelos alunos e comprovadas peloexames de Linguagem Arquitetônica. Os trabalhos não sãosignificativos para o avanço dessa temática. A própriaestrutura do currículo agrava o problema, pois retirou do cursode graduação, no final da década de 60, a disciplina dedesenho (aqui entendido como artístico ou expressivo),substituída pela seqüência de Programação Visual.

Algumas faculdades particulares ainda têm em seus currículostal disciplina, o que não é suficiente para suprir a deficiênciados alunos, que têm por sua vez uma formação básica de máqualidade. Geralmente esses alunos vêm de escolas públicase conseqüentemente sem nenhum tipo de vivência plásticaou gráfica e com repertório visual muito aquém do necessário.

III.4.2. Pós Bauhaus

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Neste contexto, destaca-se o trabalho didático de CarloMaggiora e equipe, da Faculdade de Arquitetura de Firenze,Itália. A publicação referente ao curso Disegno in architetturacome metalinguaggio (25) mostra a importância e os objetivosdo desenho para o trabalho do arquiteto.

O curso tem, como premissa central, o desenvolvimentoperceptivo espacial e a representação desse espaço comoforma de comunicação. É uma das únicas publicações nogênero, ou seja, que enfoca o desenho específico para alunosde arquitetura.

A arquitetura é abordada enquanto Arte e o desenho enquantoinstrumento de pesquisa arquitetônica, aliada à pesquisacientífica.

Para o autor, o aluno deve conhecer a linguagem do desenho(técnicas e procedimentos), para utilizá-lo como elementode aprendizagem da arquitetura e do próprio processo deprojeto arquitetônico. É nítida, para Maggiora, a relação dodesenho com a questão do projeto, seja ele de edificaçõesou urbanismo. O desenho é encarado como elementoindispensável para o desenvolvimento de uma metodologiade projeto.

Os trabalhos de alunos apresentados na publicação,escolhidos com rigor, não permitem uma avaliação real docurso como um todo em relação aos resultados. Também,não existe demonstração minuciosa dos procedimentosdidáticos utilizados na disciplina, pois os trabalhos apesar deapresentados na seqüência do curso, são acompanhados delegenda (fragmentos de textos dos próprios alunos), que nospermite apenas entender a necessidade e o vínculo dosexercícios dentro do universo da arquitetura e do contextoteórico no qual são realizados.

É interessante, no enanto, a complexidade crescente ecumulativa com relação à aprendizagem. Os dados aprendidosem exercícios anteriores são utilizados para exercícios

III.4.2.1. Carlo Maggiora

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posteriores mais complexos.

Os exercícios, com exceção dos primeiros, que visamdesenvolver o gesto e sua relação com o objeto mental, sãorealizados através da observação direta, quase sempre daarquitetura. Assim, tema e técnica dos exercícios de desenhoestão vinculados a este tipo de representação.

Constam, também, da disciplina algumas viagens a outrascidades e espaços arquitetônicos diferentes daqueles daprópria Florença, o que acontece no final do curso onde pede-se ao aluno mais que uma simples representação do espaço,mas uma análise arquitetônica e urbanística através dodesenho.

Na primeira parte do livro, encontra-se um texto que visaapresentar o curso dentro das devidas linhas teóricas. Nãoesclarece, no entanto, como estes conceitos teóricos sãorepassados aos alunos. Tal publicação, única no cenário doensino da arquitetura, não pode ser considerada um métodode ensino (o que certamente o é o curso), mas uma mostrade curso baseado em premissas teóricas importantes.

Segundo Maggiora, no período em que o livro foi publicado(1971), era comum, nas faculdades italianas, o desprestígiopara com a disciplina de desenho, sendo que muitospensavam em retirá-la do currículo, como disciplinafundamental, como até então se estruturava.

Nessa época, a orientação de projeto, enquanto atividadedo arquiteto, se dirigia a um processo racional de pesquisa(em colaboração com outras disciplinas), devido às alteraçõesna estrutura de relações sociais, ou pela mudança deinteresse do arquiteto para com seu objeto de trabalho, daedificação à estrutura urbana . Mas projeto, segundo o autor,significa também um processo de análise crítica e deescolhas, configurando o seu ensino como metodologia.

Não se pode negar a experiência sensorial ligada às imagens

pelas quais a arquitetura se expressa e, muito menos, nãose pode negar o instrumento pelo qual são indagadas, odesenho. Estas experiências não são uma contradição doprocesso de projeto, mas um de seus suportes.

Chegou-se, por conseguinte, a negar ingenuamente a eficáciana formação do arquiteto, do aprimoramento da linguagemfigurativa, e dos exercícios pelos quais se desenvolvia apassagem das operações conceituais ao contexto expressivo,não se percebendo que, privando o arquiteto de seus meiosde expressão, estariam relegando-o a uma espécie desuplente de administrador ou de sociólogo.

Neste contexto, coloca Maggiora, é imprudente areformulação dos programas das escolas, sem antes definir-se a quais fins se propõe a formação do arquiteto.

Nos anos do segundo pós-guerra na Itália, já se falava emreformas no ensino da arquitetura e, naquela época, CarloMaggiora já colocava as bases de seu pensamento:

...l’esperienza dell’architettura è di natura artistica.Un’esperienza particolare, che organizza tutti i datidella tecnica in funzione dei presentimenti interiori...che è correlazione fra intenzioni, cognozioni, mezzi,e risultati. (26)

Acredita, porém, que este discurso pode estar superado, namedida em que é difícil contestar que a arquitetura pertençaao campo da arte, a não ser que se queira colocá-lo fora detodo e qualquer discurso cultural e histórico.

Para Maggiora, do ponto de vista didático, não se podeesquecer que a arte, como a ciência, é também um meio deproduzir objetos mentais, mas ao contrário desta última, nãobusca os valores de forma cognitiva lógica ou referencial,mas expressivamente.

Para o autor, ainda sob o enfoque didático, diferentemente

da conduta científica, que tende à abstração e à generalização,a conduta criativa tende à comunicação subjetiva e original.A comunicação age sobre os sentidos e pelos sentidospromove as solicitações ao intelecto. Por isso, é necessáriaa cognição das condições que dirijam essas ações das quaisderiva a obra; mas é necessário também a posse daexperiência sensorial relativa à comunicação perseguida,experiência diferente daquela sistemática do intelecto e capazde dar resultado expressivo à obra realizada.

Os alunos por sua vez, futuros arquitetos, tendemfreqüentemente a se interessar pela pesquisa científica. Aindaque necessária, esta não esgota a pesquisa arquitetônica. Aciência se expressa por símbolos adaptados paracomunicação deste tipo de conhecimento, não permitindo autilização dos símbolos próprios para expressão dos valores.

Na visão de Maggiora, deve-se resistir à tentação fácil detransportar métodos próprios de outras disciplinas para estecampo. Para ele, o processo de projeto é também umprocesso de pesquisa e deve encontrar sempre quenecessário sua própria metodologia e seu próprio cientificismopara a precisão da sua linguagem.

A arquitetura não é apenas um serviço técnico-econômicoque se presta à sociedade ou um instrumento político diretopara organizá-la, mas compreende essas funções através dainstituição das relações espaciais, que por sua vez seconcretizam em fatos perceptivos, pelos meios de construçãodo espaço, sendo assim um meio de comunicação. Por estetipo de comunicação se entende informar, não somenteconceitos, solicitando de quem fornece as informações e dequem as recebe um comportamento recíproco oucorrespondente, quando da presença dos valores implicadosna informação.

O arquiteto, ao contrário de outros artistas, não executa elepróprio suas criações, limitando-se a programar as ações,que outros realizarão. Na transcrição das várias fases deste

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processo operativo, o arquiteto deve procurar a cooperaçãode colaboradores diversos, executivos, técnicos oufinanceiros. Nenhuma dessas transcrições poderá prenunciara totalidade da obra, o que somente pode acontecer com elaedificada, mas cada uma delas está subordinada à pesquisacomplexa do resultado espacial.

Assim, Maggiora coloca algumas questões fundamentais naformação do arquiteto. Satisfazer essas condições é essencialpara se seguir as premissas anteriores. Neste contexto, odesenho, metalinguagem da arquitetura, assume real valor,pois é através dele que se desenvolve a pesquisa do projeto,aliado ao espírito crítico e aos conhecimentos científicos etécnicos. Deve-se salientar que, para o autor, arquitetura nãoé o espaço edificado pela obra ou mesmo a obra, mas asrelações sociais que advêm desta organização. Assim, aedificação ou mesmo a cidade é a linguagem da arquitetura,entendendo o desenho enquanto metalinguagem.

Maggiora parte do pressuposto de que o primeiro contatocom aquilo que nos envolve é um contato sensorial, quedesperta em nós algum tipo de interesse.

Valorizar as sensações recebidas, lhes atribuir um significado,depende das atitudes analíticas e sintéticas do intelecto.Assim, dado esse processo, pode-se dizer que se deu umacomunicação.

Assim, também a ação do arquiteto parte de dados sensoriaise se concretizam através de meios sensoriais.

Os canais sensoriais, pelos quais o arquiteto transmite suamensagem, correspondem a toda uma gama de sensaçõespertinentes à arquitetura, ou seja, à realidade poliédrica ecomplexa, formada pelo elementos visíveis, táteis, temporaise outros.

Porém, sabe-se que, para estabelecer uma comunicação, ésuficiente escolher um canal no contexto da mensagem, que

convertido na forma de signos, e decifrados, bastam paracompreender a complexidade da mesma.

Sob o ponto de vista didático, Maggiora esclarece que esteentendimento é crucial, para que se possa fazer referênciasem código de uma série infinita de sensações, que o espaçoarquitetônico fornece, permitindo, assim, uma leitura oumesmo uma prefiguração.

Para o autor, ler uma estrutura arquitetônica significa, antesde tudo, colher seu desenho intencional e, para distinguí-lodo signo gráfico pelo qual é ou foi indagado, o denominacomo desenho materializado - disegno materico. E conclui:

...se il messaggio significante dell’architettura è laproposta di un tipo di coinvolgimento spaziale fattamediante la sua connotazione con segniarchitettonici, l’architettura come linguaggioconsiste in questo sistema di segni stesso, i qualisi ordinano di volta in volta in struttura - disegnomaterico - per caricarsi dei significati voluti.(27)

O arquiteto deve entender os interesses e as técnicaspertinentes a esse contexto, não necessariamente paraempregá-las, mas para interpretá-las em novas soluçõesespaciais.

No plano didático, ele deve primeiramente aprimorar suaprópria leitura dos signos figurativos, através dos quais essesinteresses e técnicas, ou o próprio processo, se comunica. Éde fundamental importância educar a visão e desenvolver asensibilidade, facilitando, assim, o desenvolvimento daimaginação.

O arquiteto depende do trabalho de construtores e operários,trabalha para outros e não para ele próprio; assim, dependedos clientes, dos críticos e de outros observadores, quepodem ou não compreender sua proposta. No entanto, estacomplexa colaboração operativa entre especialidades

diversas, é a única forma pela qual se pode reorganizarespaços arquitetônicos e urbanísticos. Para o autor, éimportante esclarecer qual o papel do arquiteto nesteprocesso complexo e quais seriam os instrumentosdisponíveis para desenvolvê-lo.

Sappiamo che l’architettura trasmette il suomessaggio per mezzo di immagini realizzate consegni che definiscono gli spazi coinvolgenti ilsistema di relazioni umane che si vuole proporre (ein questa proposta consiste appunto il suomessaggio). Ipotizzare queste immagini, elaborarlee prefigurarle costituisce il suo lavoro. Il fatto chel’opera deve realizzarsi per parti e col concorso dioperatori diversi, non fa che mettere in maggiorluce la qualità dell’intervento dell’architetto, eriportare nelle sue mani l’aspetto della ricercafigurativa necessaria a tradurre in un’espressioneglobale e coerente tutti quei fatti per i quali ènecessaria la ricerca di molti.(28)

Si tratta cioè di un processo creativo, che prendeforza dal sistema di tendenze interiori implicite nellapersonalità di chi opera, tendenze che non sitrovano mai a livello cosciente. Proprio per questomotivo non può esprimersi che attraverso segnimediatori che abbiano la caratteristica di “offrireuna similarità strutturale con il mediato.Ciò che ci si aspetta dall’architetto è dunque la“capacità di perseguire, per via di presentimenti,questa similarità”. Cioè la capacità di “vedere”, chepuò sola condurre a intuire la forma.(29)

O desenho gráfico é sempre um sistema de comunicação.Quando o arquiteto desenha, deseja verificar sua hipótesede forma, que se estrutura e se valoriza somente emcomparação com os elementos que não são gráficos, masque constituem também um sistema de comunicação bemdefinido. Assim, pode-se considerar o desenho como um

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meio de pesquisa e de verificação deste segundo sistema,ou seja a obra construída, e o seu desenho demonstrará talconteúdo.

O autor define o desenho do arquiteto como:

metalinguaggio che indaga una struttura di rapportispaziali (architettura) connotante una struttura direlazioni umane nel loro farsi (messaggioarchitettonico). (30)

O desenho do arquiteto não tem um fim em si mesmo. Comoum instrumento de pesquisa, deve permitir a rápida maturaçãodas idéias, quando da modelação das imagens.

Referente ao ensino, o exercício desta metalinguagem - odesenho , possui um valor didático fundamental, o de educaro aluno à figuração, de familiarizá-lo com uma determinadareação neuro-cerebral que é o canal da mensagemarquitetônica.

Estabelece o caráter do desenho do arquiteto: é como umaescritura, é pessoal (é expressão da personalidade do artista),é realista e tem na figura humana seu referimento principal,tem exatidão nas proporções e a técnica gráfica deve seradequada às normas, quando desenho técnico descritivo, ouà representação emotiva da obra imaginada, quando seapresenta como um desenho de pesquisa.

Colocados os meios, a questão é como deles se utilizar. Oautor coloca o problema crucial de saber ver. Com relação àarquitetura, isto pode-se dar de duas formas diferentes, masintegradas: a intuitiva e a intelectiva.

As sugestões registradas de forma inconsciente devem sermaturadas com base no juízo crítico, pois o estudo da formaem arquitetura não pode ser realizado puramente pelaintuição, pois a arquitetura surge de exigências práticas, quese apresentam como finalidades a serem alcançadas e como

problemas a serem resolvidos. Necessita-se, assim, indagarqual a relação entre a imagem e os pressupostos de taisfinalidades e problemas.

O autor faz, ainda, uma crítica às experiências que se baseiamem abstrações rítmicas (pictóricas ou materializadas).Certamente, elas são eficazes enquanto adestramento, poiscada expressão tem seu ritmo. No entanto, não se deveesquecer a causalidade do problema, para que a pesquisade um ritmo não se torne um exercício abstrato e formalista,mas sirva para entender a dinâmica de uma operação.

Outro ponto, destacado por Maggiora, é sobre as teorias dafiguração, que podem se constituir em meios eficazes deorientação didática, mas também com a ressalva de fazê-losempre visando sua aplicação.

De todos estes meios, o autor afirma que o mais direto éaquele pelo qual se toma contato com a realidade visível.

Il disegno come metalinguaggio rimane ancora ilmezzo più eficace per sviluppare l’acquisizionevisiva, l’intuizione inventiva, la precisionedocumentaria ed operativa: disegno cometrascrizione spaziale, punto di partenza e punto diarrivo delle operazioni dell’architetto; disegno cometrascrizione ideografica, per quanto riguarda i mezziche devono informare, documentare, prescrivere,garantire le operazioni stesse.(31)

Na disciplina a premissa didática básica é a busca dos meiosinstrumentais para a pesquisa figurativa. Evita-se regras, poisa escolha metalingüística é a expressão de uma relaçãopessoal entre o arquiteto e os fatos espaciais imaginados.

Il nostro compito di docenti è solo quello di risve-gliare questa sensibilità e di stimolare questa intelli-genza, in modo che le scelte risultino sempre ade-guate e utili a prefigurare gli oggetti perseguiti.(32)

Coloca, também, algumas indicações sobre formas maisfáceis de se conseguir bons resultados, no que concerne àsqualidades espaciais dos objetos indagados, das quaisdestacam-se:

Observar e desenhar a realidade arquitetônica eurbana.

Congruência na descrição entre espaço analisadoe sua função.

Instrumentação técnica ou adaptação ao materiale à técnica utilizada, propiciando a pesquisa darelação entre o desenho materializado e o desenhográfico.

Ressalta, também, neste item, a capacidade fundamentalque o projetista deve ter, de se colocar sensivelmente noespaço imaginado.

L’esperienza che consente questo genere di verificaè esperienza prospettica. Il senso prospettico devequindi essere considerato uno strumento peraffinare la sensibilità alla valutazione critica deglispazi.(33)

Destaca, entre todas as experiências perspécticas, aconvencional do Renascimento, que já faz parte da nossapercepção, normatizada pela difusão da fotografia. Mas, deve-se, ainda, ressaltar que para um principiante é necessárioum controle maior, para que todas as representações sejamintegradas e correspondentes a uma mesma imagem ouespaço imaginado. Em suma trata-se de uma questão deprecisão.

Deve-se aqui fazer uma complementação ao trabalho deMaggiora, sobre a questão do desenho de observação.Estudos revelam que a mente trabalha com as imagensmentais, como se fossem objetos concretos. Podemosmanipular um objeto em nossa mente, da mesma forma com

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que o faríamos na realidade. Esta capacidade é resultado deum aprendizado. Assim, observar um espaço é a primeiracondição para dar-lhe mentalmente uma imagem congruentecom o real, e poder assim desenhá-lo de forma precisa.

O autor, enquanto docente, também coloca que a grandemaioria de seus alunos não tem nenhuma experiência básicafigurativa e representar uma imagem trata-se de afrontar umalíngua desconhecida. Estas dificuldades são geralmente asmesmas para qualquer um, neste tipo de estudo, variandosomente o grau de deficiência.

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Na década de 60, a didática da educação ativa esteve emalta no Brasil e no mundo, reformulando programas e cursos.Onofre Penteado sempre procurou basear seus cursos nestaconcepção didática, formando outros educadores com amesma tendência, sendo por muitos considerado comoprecursor das reformas na arte-educação.

Em 1964, Penteado apresentou uma proposta de estruturaçãode currículo à Escola de Belas-artes da Universidade Federaldo Rio de Janeiro, aprovada em 1966. É nítida a preocupaçãocom o “Homem total”, não só instruído, mas educado, levandoem conta o conceito de educação como formação cultural esocial. É também nítida a influência da Bauhaus (comparando-se a estrutura proposta por Gropius em 1919) e de alguns deseus mentores, principalmente Itten, Klee e Kandinky. Aproposta de Penteado sugere no ciclo básico, um conjuntoharmônico de disciplinas, de experiências integradas, comumaos cursos de Artes Visuais para posterior especialização,como acontecia na Bauhaus de Weimar.

De suas publicações sobre a questão da Arte-educação, alémde “Vida-valor-arte” de 1948, da tese apresentada noconcurso para provimento da cátedra de Desenho“Planejamento do Desenho Artístico”, em 1964, tambémexistem as apostilas da Escola Nacional de Belas-artes,“Desenho-artístico” de 1969, nas quais se encontramresumidas algumas questões técnicas (do uso do fusain, daspontas de metal e aguadas aos recortes, colagens emonotipias) e teóricas ( dos princípios básicos de composição,simetria, repetição, etc. às leis da boa forma - Gestalt).

Mas a obra mais importante é, sem dúvida, “DesenhoEstrutural”, pois nela procura sintetizar suas principais idéiassobre o ensino programado em arte, mais especificamentesobre o desenho. Este é conhecimento e ação construtiva,ambos elementos básicos das estruturações plásticas purase das criações simbólicas imaginárias. (34)

O ensino de Desenho Estrutural no nível básico

II.4.2.2. Onofre Penteado Desenho Estrutural

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constitui-se na objetivação de princípios gerais,numa determinada perspectiva, numa particularabordagem do fenômeno estético: a darepresentação gráfica. Esse ensino exclui, pormotivo didático, o estudo da cor (não a luz, o tom)e da tridimensionalidade física (real-euclidiana),acima de certo nível de realidade concreta ( o plano- superfície do papel). Contudo, as disciplinas Core Plástica Tridimensional visarão, necessariamente,também, objetivar os mesmos princípios gerais noexercício de suas respectivas energias ematerialidades.O desenho, assim entendido, realiza a união deprincípios formais (estruturas, gestalten) emateriais (instrumentos, materiais, técnicas,procedimentos) e a explicitação das leis deconstruções simbólicas (funcionais, puras,expressivas), através de organizações (conjuntos)espaciais. É portanto o que há de comum a todasas estruturações formais, funcionais e simbólicas(“simbolismo”).(35)

Os exercícios são, na sua maioria, inspirados nos cursos dosmestres da Bauhaus da fase Weimar, como: Itten (relaçõesde contraste) e Kandinsky (posição das linhas / relações comas cores) e Klee.

A primeira unidade do ciclo básico está dividida em trêsetapas e por isso denominada método ternário, que visatranspor o interesse pelo plano da realidade exterior para oplano da Arte; do nível das aparências para o nível da realidadeprofunda: uma abertura espiritual (comportamento).(36)

Neste método, o trabalho didático se desenvolve passandopor três etapas: desenho de observação; análise de estruturae nova estruturação formal.

Segundo o autor, na fase de observação, parte-se do realpara o abstrato.

Estudo prático-teórico dos elementos do desenhoa partir da visão de objetos no espaço físico -fragmentária ou globalmente - e da suatransposição gráfica. É o equivalente do chamado“desenho de observação” ou do natural” (37)

Numa segunda fase, analisa-se espontaneamente asestruturas percebidas:

desenho analítico-sintético, indutivo-dedutivo dasdominantes formais apresentadas pelo modelo.(38)

Na fase três, faz-se umatransposição para o plano da forma pura. Apelo àinvenção (inicialmente espontânea), à reflexãocontrolada (incipiente). Trata-se de alcançar acomposição, ou a nova construção: umaestruturação com as partes e elementos formaisestudados, mas cuidando observar:

1) manter a bidimensionalidade dasuperfície (Plano Básico);

2) revelar o caráter geral do objeto(forma) analisado (se estático, dinâmico, rijo, mole,denso, leve etc. noções de ritmo e modulação).(39)

Nas demais unidades do curso (assim como na Bauhaus deWeimar) são abordados, através de trabalhos didáticos, osinteresses para os futuros profissionais da forma.

Dá-se oportunidade, em se tratando de cursobásico, numa Universidade que possua um Centrode arte, de o jovem aluno decidir, conscientemente,o seu currículo escolar (sistema de créditos) nonível profissional. Nas Faculdades de Arquiteturaisoladas, poder-se-ia enfatizar pontos maissignificativos para o futuro arquiteto, o que dariacaráter semiprofissionalizante em alguns aspectos,mas a consciência da importância da “integraçãodas artes” evitaria distorções especializadas.(40)

O ensino de Desenho Estrutural funda-se nasrepresentações menos materiais, tais como oponto, a linha, a superfície ( o Plano Básico e assuperfícies limitadas no campo), analiticamenteestudadas e em múltiplas relações. As relaçõesque originam as combinações e as estruturaçõesdesses elementos concretizam materialmenteprincípios e problematizam supostos epressupostos. Tais são: o espaço (dimensões); omovimento (direções); o tempo; o ritmo; (asimultaneidade e a sucessão); o equilíbrio (tensão,peso, lugar, localização); as sensibilidades:

1) visual (visualidades; figura e fundo;fisionomia das formas);

2) Táctil (texturas; contexturas;densidades; cheios; vazios);

3) Estrutural (organização de unidadespuras e significativas); e expressão-comunicação(linguagem); a criação de símbolos; a luz; o claro-escuro; e, tangencialmente, a cor em sua relaçãocom o desenho.(41)

Metodologicamente, o ensino do DesenhoEstrutural fundamenta-se na ciência e conscientizao método experimental, empírico, tecnológico.Parte do real, concreto (análise) das estruturasnaturais mais ricas de significações formais eexpressivas, em busca de uma linguagem (síntese),através de elementos (análise das formasvisualizadas e dos construtos abstratos (indução)em obediência à uma finalidade (dedução)(Axiologia). (42)

Sinteticamente, o programa do ciclo básico está dividido emDesenho I (da unidade 1 a 5) e Desenho II (da unidade 6 a10) seguindo o esquema:

a) Introdução ao Desenho (estrutural): observaçãode traços do mundo exterior.

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b) Os elementos do Desenho e suas estruturações.c) Equilíbrio e ritmo no Desenho.d) Espaço e desenho.e) Tempo - movimento e o Desenho.f) Luz e o Desenho.g) Campos plásticos; Leis de organização: unidadesperceptivas e propriedades das formas.h) Expressão - comunicação: A consciênciaestética; o contexto e os “estilos”.i) Desenho estrutural e a Arquitetura. A questãoda integração das Artes. (43)

Penteado também apresenta o programa geral para o cicloprofissional, específico para o curso de Licenciatura emEducação Artística, dividindo-o em Desenho III e Desenho IV,no qual se procura desenvolver a expressão em superfície emovimento. A Teoria está centrada no estudo do Desenhopara os diversos níveis de escolaridade, nas experiênciaspedagógicas da Bauhaus, na obra de Herbert Read e ViktorLowenfeld, entre outros. Na prática, estuda-se variadastécnicas de expressão, desenho livre de iniciação e execuçãode projetos de desenhos animados.

Penteado sugere critérios para avaliação e aprovação dosalunos no ciclo básico. Segundo sua proposta, o sistema denotas estaria invalidado, visto que a atividade artística é umaqualidade, possuindo um valor inextenso; assim, adotar-se-ia o sistema de avaliação por conceitos: A (ótimo), B (bom),C (suficiente) e o conceito D equivaleria à reprovação e nocaso à dependência.

Os trabalhos seriam obrigatórios e em número compatívelcom o período letivo. Na avaliação destes, expostos à classe,os professores deveriam levar em conta:

a qualidade gráfica dos mesmos, a capacidade dofazer artístico - e na medida do possível,aprendendo a “alma artística do aluno, ou seja, seupoder de criar formas plásticas. Cientificamente

procurariam apreender a vocação artística” doaluno pela análise dos traços abaixo enumerados:1) se tem bom nível de inteligência e de naturezaestética;2) se tem perseverança volitiva;3) se possui habilidades de percepção e deexecução;4) se manifesta atividade criadora;5) se revela discernimento das relações e analogias- expressas na confecção e julgamento da obra dearte.(44)

Nos anos 80, a educação artística e a educação pela arteperderam prestígio aos olhos dos responsáveis pelaeducação básica, principalmente das escolas públicas e oresultado disso são alunos que entram no curso superior emartes visuais, sem conhecimento de desenho, de expressãográfica, ou técnicas de expressão e representação. Isto geraum problema de currículo e programático sério, pois oprofessor é obrigado a incorporar ao programa da disciplinaconhecimentos básicos de desenho, a fim de proporcionaraos alunos a oportunidade de desenvolverem, em poucosmeses, o que deveria ter sido feito em anos anteriores. Oaluno de curso superior tem de 18 a 25 anos, em média, mascom em termos visuais e de desenho situa-se entre 10 e 13anos, período no qual ocorreu a estagnação dessa linguagem,pois substituíram completamente o desenho pela expressãoverbal e escrita, e o pensamento tornou-se somente umafunção racional e lógica, suprimindo a criatividade e aexpressão artística individual.

O trabalho de Penteado, apresentado nesta publicação, é frutode toda uma carreira dedicada ao magistério. É mais que umsimples discurso, ou montagem lógica de um programa pararesolver um problema didático baseado em teorias de autoresrenomados. É uma experiência de toda uma vida, é algopessoal e fruto de várias experimentações. Trata-se de umautor que deveria ser melhor estudado pelos profissionais daarte-educação, principalmente no que se refere às suas

sugestões sobre didática, métodos e procedimentos de aula,a fim de procurar criar sempre uma atmosfera propícia parao desenvolvimento da personalidade artística e criadora.

O professor não pode pensar na sua comodidade -aplicando um método formal, rígido, que aconselha- e mal - o mais cômodo, o mais fácil (que propiciadisciplina rígida): o uso de uma técnica só paratodo o grupo de alunos. Disponibilidade atenta esensível para atender às diferenças individuais,planejamento e previsão constante dos materiaispara evitar a frustração da vontade de expressãodo aluno, constituem exigências para osprofessores da Artes Plásticas que queiram ser fiéisaos princípios da educação pela Arte. (45)

Uma ressalva, no entanto, deve ser feita quanto à colocaçãode Penteado sobre a adequação do programa por ele definido“Desenho Estrutural” em escolas de arquitetura. Defende estapremissa baseando-se na idéia da Arquitetura com arte visuale, assim, arquitetos como futuros profissionais visuais, o queindicaria o mesmo curso básico de outras áreas em artesvisuais, pintores, escultores, gravadores, etc. A ressalva aser feita não contradiz o princípio básico da arquitetura comoarte visual, mas no fato de ser por vezes considerada só comotal. A Arquitetura é uma arte sinestésica, pois todas assensações são importantes para percebê-la; o arquiteto éque se utiliza da visão como forma de unificar as sensações;se utiliza das artes visuais para expressar suas idéiasreferentes a um espaço sinestésico.

Outra questão a ser ressaltada é sobre o desenho em artesvisuais ser considerado como uma finalidade em si mesma,a expressão pelo desenho e no desenho é a obra a serobjetivada. Na arquitetura, e para o arquiteto, o desenho nãoé um fim em si mesmo, ele é um meio para a expressão deuma realidade que está além das fronteiras bidimensionaisdo papel, ele é a representação de uma idéia que transcendeos limites do grafismo e que na verdade não se refere a este

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propriamente dito, mas a uma configuração de espaçotridimensional, ou seja, é também uma simulação.

Penteado, apesar de reconhecer a complexidade daArquitetura, não explicita algumas questões. Por exemplo,aliado à sua definição de desenho e do ensino de DesenhoEstrutural, na qual exclui o estudo da tridimensionalidade(essencial para a formação do arquiteto em desenho, sem aqual este não terá função de projeto), coloca que:

Sem sair da esfera do puro grafismo - donde seucaráter geral e ideal - o ensino do DesenhoEstrutural numa Faculdade de Arquitetura,culminaria nas relações fundamentais com ofenômeno arquitetônico.(46)

Porque não sair do puro grafismo, se é este, justamente, oque não se deve procurar no desenho do arquiteto? E comoculminar nas relações fundamentais do espaço arquitetônico,sem sair da esfera do puro grafismo, já que são espaços tãodiferentes? Como relacionar desenho gráfico bidimensionalcom o desenho materializado tridimensional da obraarquitetônica, sem sair da esfera do grafismo? É defundamental importância compreender que, em se tratandode arquitetura, ou mais especificamente, de projetoarquitetônico, desenho e espaço tridimensional formam umconjunto. Estas são algumas das questões fundamentais aserem resolvidas, ao se preparar um programa disciplinar dedesenho, específico para estudantes de arquitetura.

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Nos últimos anos, mais precisamente no final da década deoitenta, alunos de arquitetura e o público leigo, em geral,foram dominados por uma febre intitulada “desenhar com olado direito do cérebro”(47). Cursos paralelos surgiram, atépor professores acadêmicos, agraciando os freqüentadorescom uma suposta nova metodologia revolucionária.

A primeira edição deste livro é de 1979 e, ao que tudo indica,publicada pela própria autora. Ainda hoje aparece como amais nova “invenção” na arte de desenhar, dando origem amuitos outros trabalhos.

A edição brasileira publicada pela Ediouro, deixou a desejarquanto à qualidade da programação gráfica, acentuando oar pejorativo da obra, como se esta pertencesse à longa listade manuais de aprendizado rápido e fácil tão comuns àspublicações desta editora. Mesmo na edição espanhola, queutilizamos como fonte para este trabalho, já aparece comosubtítulo:

“Un método garantizado”

Não consta, no entanto, o fato de que tal método só se tornarealmente um método garantido, na medida em que o alunoou o aprendiz se aplique com um alto grau de dedicação econstância no trabalho. Não se trata de nenhuma “mágica” enão é somente tendo acesso a tais conhecimentos ou lendoo livro que se aprende a desenhar.

Betty Edwards, no prefácio da edição espanhola, coloca queo trabalho é o resultado de dez anos de pesquisa, nos quaisbuscou um novo método de ensino, que pudesse ser aplicadoa pessoas de idades e ocupações muito diferentes.

Baseou seus estudos na sua própria maneira de ver odesenho, nos cursos que lecionava, percebendo as dificul-dades dos alunos, e nas pesquisas realizadas nos anos 50 e60, pela equipe de Roger W. Sperry, do Instituto Tecnológicoda Califórnia, sobre a divisão das funções do cérebro.

III.4.2.3. Betty Edwards e o desenho com o lado direito do cérebro

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A autora parte da premissa básica que, desenvolvendo umnovo modo de ver, utilizando as funções especiais dohemisfério direito do cérebro, pode se aprender a desenharfacilmente. Os requisitos básicos são uma coordenaçãomotora normalmente desenvolvida, tanto quanto visão. Ométodo tem como finalidade, fazer o aluno desenhar deobservação, ou seja, ele desenha apenas aquilo que estápresente em seu campo visual.

Segundo a autora, desenhar realisticamente é uma etapa,pela qual se deve passar para alcançar outros níveis dedesenho. Primeiro, porque dá confiança na própria habilidade,liberando o potencial de funções de todo o cérebro, necessáriopara níveis mais elevados e também porque, ao utilizar olado direito como principal processador de informações, seaprende um novo modo de pensar que permite resolver osproblemas criativos de maneira mais adequada.

A experiência com tal método revela que não seriaaconselhável sua aplicação em alunos de arquitetura, paraos quais desenhar o espaço também requer concomi-tantemente analisá-lo logicamente, pois o projeto se compõena maioria das vezes, de intervenções de ordem prática efuncional. Em segundo lugar, a passagem do desenho deobservação, para outros níveis de desenho (desenho dememória e do espaço imaginário) pode se tornar muito difícil,pois os alunos podem ficar de tal forma arraigados àobservação e, assim, condicionados pela visão imediata doobjeto.

Tal método dá confiança para o aluno praticar o desenho deobservação, pois lhe assegura uma relação direta com oobjeto a ser desenhado e fornece procedimentos de obtençãodas informações de forma simples e que estão sempredisponíveis, pois presentes visualmente no objeto. Mas, poroutro lado, toma-lhe a iniciativa para se aventurar em novotipo de desenho, no qual a presença do objeto não se efetue,no caso do desenho de memória ou ainda quando o objetonão existe e deve ser construído pela imaginação.

O método tem como base pesquisas realizadas sobre ofuncionamento do cérebro, nas quais se verificaram diferençasfuncionais em relação aos dois hemisférios.

Segundo estudos recentes, sabe-se que a função dalinguagem verbal e das capacidades relacionadas com esta,na maioria das pessoas estão localizadas no lado esquerdodo cérebro, assim como o pensamento racional.

Até bem pouco tempo, pensava-se que a metade direitaestivesse menos avançada e por isso ainda em evolução comrelação à esquerda. Hoje, porém, sabe-se que cada hemisfériotem suas funções bem definidas e estão particularmente emigual estágio de evolução. Sabe-se, também, que estão empermanente conexão, devido ao Corpus Callosum, umaespécie de cabo nervoso que interliga os dois hemisférios.Comprovou-se, através de intervenções cirúrgicas e de testesposteriores que, quando este cabo era cortado, as duas partescontinuavam funcionando, mas independentemente uma daoutra, trazendo graves problemas aos pacientes. Por exemplo:não conseguiam falar (função do lado esquerdo) sobre algopercebido pelo tato (informações processadas pelo ladodireito). Ficou claro, também, que cada metade do cérebroestá especializada, de modo a complementar as funçõesrealizadas pela outra parte, por diferentes formas depensamento, mas do mesmo nível de complexidade.

Verificou-se, então, que o modo de processar uma mesmainformação, varia de lado para outro. O esquerdo é verbal eanalítico, além de temporal, é o responsável pelo nossocontrole do tempo. O direito, por sua vez, é não verbal, globale atemporal. Posteriormente, Jerre Levy descobriu que oprocessamento no hemisfério direito é rápido, complexo,totalizador, espacial e perceptivo. Graças ao hemisfério direito,entendemos metáforas, sonhamos, criamos novascombinações de idéias, imaginamos coisas que não existem,vemos espacialmente os objetos, além de podermos entendercomo se combinam as partes para formar o todo.(Razão pelaqual os manuais explicativos de montagem de objetos,

funcionam melhor com ilustrações do que com palavras.)

Sabe-se hoje, também, que os hemisférios podem colaborarentre si, cooperando com a outra parte ao dispor de suashabilidades especiais para realizar determinada tarefa. Podem,no entanto, segundo a autora, trabalhar separadamente.Quando uma metade entra em ação, a outra é desativada.Parece haver, também, certos conflitos entre as partes,fazendo com que um hemisfério oculte informações do outro,o que explica o desenvolvimento evolutivo da assimetria docérebro.

Edwards explica que as recentes investigações sobre asfunções dos hemisférios cerebrais humanos e sobre oprocessamento da informação visual, indicam que a habilidadepara o desenho pode depender do acesso às faculdades dolado direito, para isso desconectando o hemisfério esquerdo.Da sua própria experiência, sabe que quando se desenhanão se consegue articular logicamente as palavras, oumesmo, quando tentava explicar para os alunos o processodo seu desenho, as palavras lhe faltavam. Assim como,quando se está desenhando, perde-se a noção do tempo, ashoras passam sem que se note, mas basta preocupar-se como horário para que o desenho não apareça.

Edwards coloca que o predomínio do lado esquerdo docérebro, transformando nossas ações para com o mundo emformas eminentemente racionais, lógicas e ordenadas é umfator cultural. Pode-se, acredita ela, através de exercícios,inverter essa preponderância a favor do lado direito, oumesmo articular os dois hemisférios para trabalharemharmoniosamente.

Independente da validade científica dessas colocaçõesneurofisiológicas, o fato é que o método está repleto deexercícios que, se seguidos a rigor, produzem resultadossatisfatórios no caso do desenho de observação realista. Mastais exercícios são na realidade muito conhecidos pelosacadêmicos há séculos. Desde o Renascimento, da teoria

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da perspectiva linear e dos estudos de Albert Dürer com oquadro quadriculado, até a técnica de semicerrar os olhos,muito utilizada pelos impressionistas para decomporem apaisagem, esses recursos foram passados dos mestres paraos aprendizes, muitas vezes oralmente, como “segredos” daarte da representação visual. Mesmo o exercício de desenhara contraforma, ou seja os espaços vazios dos objetos, aoinvés deles próprios, já é bem antigo. Talvez pelo fato da artemoderna ter rompido tão bruscamente com o academismoe com o desenho realístico, é que esses “segredos”reaparecem como “novidades”.

O método desenvolvido pela autora, num determinado ponto,entra num impasse. Propõe, na maioria das vezes, exercícioscom figuras humanas, retratos, pois enfatiza que estespossuem uma alta carga de conotação simbólica, sendo porisso desenhos muito difíceis de serem realizados. De fato,superada essa fase, é mais simples desenhar ambientesinternos ou externos, objetos inanimados ou vivos. Por outrolado, torna-se um fardo desenhar coisas em movimento oudar intenção de movimento aos desenhos, pois a atençãoestá na forma estática da coisa observada.

Deixa, portanto, para um segundo plano, a representação doespaço que nos envolve, como ambientes internos ouexternos. Aliás, não existe nenhum exercício cuja propostaseja registrar a paisagem urbana, pois pressupõe-se que nadadeva distrair o aluno de sua observação. Assim, os exercíciosdevem ser realizados em ambiente controlado.

Para garantir o aprendizado de retratos, Edwards acaba porensinar ao leitor regras academicistas, muito diferentes doscitados “segredos”, fornecendo dados matemáticos deproporções do corpo e rosto humano, que não são a princípiopercebidos, mas apreendidos logicamente, o que de certaforma contradiz o fundamento do trabalho.

Este método garante o aprendizado, assim como outroqualquer que esteja vinculado à prática intensiva do desenho.

Ele está estruturado de forma que o aluno reconheça osproblemas e que para comprová-los seja obrigado a realizaro desenho; com isto vai se acostumando ao seu próprio traço,desinibindo-se frente à folha em branco, surpreendendo-secom seu desenvolvimento e se auto-afirmando enquantoalguém que pode se expressar pelo desenho.

Porém, o pensamento do arquiteto, quando projeta - numaanalogia aos preceitos de neurofisiologia colocados - deveriase dar pela perfeita harmonia entre as funções cerebrais dosdois hemisférios. Seria então inútil propor para alunos dearquitetura, exercícios que “desativassem” uma parte emfavor de outra. Quando se projeta uma edificação, não sepode pensá-la por partes que, somadas, resultarão no todo.Este deve ser pensado em função das partes, mas de maneiraintegrada. Razão e estética devem trabalhar juntas e é odesenho o instrumento que deve integrá-las, é pelo desenhoque o espaço deve ser construído concomitantemente namemória e no suporte gráfico, seja o papel ou uma mesadigitalizadora.

O desenho, enquanto expressão e instrumento deestruturação do pensamento formal, deve ser ensinado,tendo-se como meta o desenvolvimento pessoal do indivíduo.Não se trata de ensinar fórmulas e regras, mas caminhospelos quais a inteligência seja utilizada em toda sua complexae harmoniosa potencialidade.

Então, o que seria necessário, conveniente, técnica epedagogicamente possível de ser realizado com relação aoensino do desenho para estudantes de arquitetura?

A resposta a esta pergunta, proposta nesta tese, surge daavaliação do desenho enquanto disciplina de múltiplaaplicação e que requer o entendimento do problema dentroda vivência do aluno e do tipo de trabalho que irá realizar.Entende-se, assim, o desenho, primeiro em sua condiçãoprimária básica de expressão individual, única epsicologicamente complexa. Segundo, enquanto linguagem

de um desejo enquanto projeto, e no caso projeto de espaço.Terceiro, desejo construído tecnologicamente dentro depremissas econômicas, sociais e culturais que devem estarbem definidas e elaborado de forma inteligível, de leituracompreensível e por isso dentro de uma linguagemestabelecida pelas normas afins. Quarto, desenho enquantoobra de arte e linguagem de uma obra de arte que está porvir a ser e, por isso, uma metalinguagem. Por fim, enquantoinstrumento de pesquisa para arquitetura e para si próprio,desenho para a criação para o despertar da imaginação.

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Notas e referências bibliográficas

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02. WICK, Rainer. op. cit. p.3303. _____,____. op. cit. p.6304. _____,____. op. cit. p.12305. _____,____. op. cit. p.13406. _____,____. op. cit. p.15507. DROSTE, Magdalena. Bauhaus 1919 - 1933. Bauhaus

Archiv. Berlin: Taschen, 1992. p.32-308. WICK, Rainer. op. cit. p.14409. _____,____. op. cit. p.14610. _____,____. op. cit. p.31411. WHITFORD, Frank. Bauhaus. London: Thames and

Hudson, 1985. p.9112. DROSTE, Magdalena. op. cit. p.14413. PARTSCH, Susanna. Paul Klee 1879 - 1940. Colonia:

Benedikt Taschen, 1992.p.5414. WICK, Rainer. op. cit. p.32515. DROSTE, Magdalena. op. cit. p.6516. WHITFORD, Frank. op. cit. p.9117. KLEE, Paul. Teoria della forma e della figurazione.

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London: Lund Humphries, 1969. p.1119. WICK, Rainer. op. cit. p.335-620. _____,____. op. cit. p.33721. _____,____. op. cit. p.34022. _____,____. op. cit. p.25623. _____,____. op. cit. p.30224. KANDINSKY, W. Punkt und Linie zu Fläche. Berna:

1969.p.19 cit. in :WICK, Rainer. op. cit. p.297.25. MAGGIORA, Carlo. Disegno in architettura come

metalinguaggio. Firenze: L.E.F., 1971.26. MAGGIORA, Carlo. op. cit. p.927. _________, ___. op. cit. p.2128. _________, ___. op. cit. p.2829. _________, ___. op. cit. p.28

30. _________, ____. op. cit. p.2931. _________, ____. op. cit. p.3632. _________, ____. op. cit. p.3733. _________, ____. op. cit. p.3934. PENTEADO, Onofre. Desenho Estrutural. São Paulo: Ed.

Perspectiva, 1981.p.2135. PENTEADO, Onofre. op. cit. p.2136. ________, _____. op. cit. p.2737. ________, _____. op. cit. p.2638. ________, _____. op. cit. p.2639. ________, _____. op. cit. p.2640. ________, _____. op. cit. p.2841. ________, _____. op. cit. p.2242. ________, _____. op. cit. p.2343. ________, _____. op. cit. p.3344. ________, _____. op. cit. p.29-3045. ________, _____. op. cit. p.26446. ________, _____. op. cit. p.1647. EDWARDS, Betty. Aprender a dibujar con el lado

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Bibliografia complementar

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KLEE, Paul. Pedagogical Sketchbook. London: Faber andFaber, s/d.

KANDINSKY, Wassily. Do espiritual na arte. E na pinturaem particular. São Paulo: Martins Fontes, 1990.

VOLBOUDT, Pierre. Kandinsky Dibujos. ColecciónComunicación Visual Serie gráfica. Barcelona:Gustavo Gili, 1981.

The Irwin S. Chanin School of Architecture of The CooperUnion. Education of na Architect. New York:Rizzoli, 1988.

POPPER,Karl & ECCLES, John. O eu e seu cérebro. Cam-pinas: Papirus, 1991.

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68

III.5. Considerações Finais

O ato perceptivo é um conjunto interativo, que envolve todosos sentidos, e não é propriamente um modo de atuação dosujeito com o meio, mas uma relação entre os dois, uma re-lação que estabelece sentido para as coisas, é comunicação.

Merleau Ponty coloca o desenho como um esquemaexplicativo, desenhar é expressar-se tanto quanto expressara coisa.

Comunicar o objeto a outrem é marcar sobre opapel um símbolo de nossa coexistência com acoisa que se oferece aos olhos do espectador,admitindo, por seu lado, uma operação deretomada. (01)

Ver não é só perceber visualmente, mas sinestesicamente.Aprender a observar é aprender a precisar a relação com oambiente num processo de aprimoramento sensorial ecognitivo. O arquiteto Joaquim Guedes quando fala emqualidade de espaço por exemplo, se refere a isto em termosvivenciais. Fenomenologicamente, a relação do sujeito e seumeio é sua vivência.

Perceber também não é uma relação passiva com o meio.Perceber é uma atividade, é intencional. No arquiteto, oaprimoramento do ato perceptivo está aliado ao desenho.São indissociáveis. Ver significa desenhar com o pensamento.Desenhar, representando ou simulando, é transportar taisimagens para um suporte, plano ou estereométrico. Emarquitetura, isso se dá sempre pela mimese, (V. Volume I) aarquitetura é uma arte mimética, não de símbolos mas derelações de espaço, cuja referência é o ser humano. Aabstração não é o oposto da mimese. Esta última, para seconfigurar, exige que nosso processo cognitivo abstraia darealidade alguns elementos e os configure enquanto estrutura.Na representação gráfica dessa configuração, mais elementossão abstraídos, no que resulta o desenho. O desenho dearquitetura não pode ser de todo abstrato, principalmente aoque se refere à perspectiva. Dos elementos que compõem a

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sintaxe visual, alguns básicos são indispensáveis para aidentificação e reconhecimento da imagem, ou seja doespaço. Em uma escala decrescente de relevância ter-se-iaa linha, que estruturada em termos perspécticos geramimagens, reconhecíveis por contornos; a variação tonal emtextura ou manchas de claro-escuro que valorizam a estruturada forma pela luz; e a cor, o mais complexo de todos oselementos da sintaxe.

Segundo a psicóloga M. J. Abercrombrie, quando nosenfrentamos com uma tarefa com um grau de dificuldademuito acima do que estamos acostumados, tendemos a voltara nossos esquemas de conduta infantis.

Coloca, também, que o fato do projeto, no caso dosestudantes, terminar no desenho, quando muito em numamaquete, e não no edifício propriamente dito é um fatorcomplicado na aprendizagem, pois somente aqueles que bemconhecem o código do desenho podem compreendê-lo comoedifício. Assim, parte da aprendizagem de desenho consisteem aprender a usar este código, a interpretá-lo e tambémmanipulá-lo, ou seja, parte da aprendizagem está centradano uso apropriado da sintaxe visual.

... el estudiante no puede asimilar y analisar unproblema excesivamente complejo; no há tenidosuficientes experiencias como para saber lo que elcódigo que utiliza significa y representa en larealidad. (02)

No entanto, o papel da disciplina de desenho, em um cursode arquitetura, não é propriamente ensinar ao aluno técnicasou o código propriamente dito. O aluno já deve possuí-lo comopré - requisito para entrada no curso - o que não aconteceem grande parte das escolas. A disciplina deve adequar odesenho do aluno a seu fim específico: construir espaçoshabitáveis.

Abercrombrie (03) coloca que os processos de aprendizagem

em desenho podem ser considerados segundo dois aspectos,o de receber informações (ato perceptivo)- e relacionarcoisas, construção do pensamento figurativo propriamentedita.

O que se verifica é que, didaticamente, o ensino do desenhopara o arquiteto está baseado em dois pontos que parecemcomuns à maioria dos cursos, quando a escola dispõe dadisciplina em seu currículo, ou quando esta não está centradabasicamente em técnicas gráficas:

conhecer e refletir sobre o espaço real,desenvolvendo a percepção;

representar o espaço conhecido, de forma acomunicá-lo nos seus valores objetivos esubjetivos.

Representar graficamente nos termos citados envolveculturalmente o conhecimento da sintaxe visual e sistemasde desenho (perspectivas e desenho diédrico).

Mas um componente básico, no ensino do desenho paraarquitetos, deve ser também a relação com o projetoarquitetônico. No Volume I, demonstrou-se que o desenho,enquanto categoria técnica (perspéctico ou diédrico), nãoestá vinculado como estilo da arquitetura, que a arquiteturamoderna por exemplo, não está vinculada a plantas, cortes efachadas por questões estéticas, mas por razões de produção,de construção viabilizada pela racionalização do processocomo um todo, do projeto à execução da obra.

Com relação ao projeto, no volume II, demonstrou-se que odesenho, enquanto instrumento de projeto ou aliado aoprocesso projetivo, compõe com este uma relação dialógicade inferências, ou seja, um se reflete no outro; método dedesenho está associado ao método de projeto, ao processocognitivo de se configurar um novo espaço. O desenho é ummeio, que de certa forma interfere no processo e vice-versa.

A perspectiva, como visto no Volume I, é o meio maisadaptado culturalmente para se configurar o espaço emtermos sensoriais; estuda-se através dela a relação usuáriox espaço, no que se refere à sensação que o primeiro terá dosegundo.

É o espaço sob a forma de representação gráfica, que deveser apreendido pelo aluno. É o espaço o objeto a transformarpelo desenho. A sintaxe do desenho, enquanto linguagemgráfica, deve estar a serviço desta idéia, assim como tambémo ensino da técnica.

O aluno deve aprender, conjuntamente a estes aspectos, doisconceitos inerentes ao seu desenho; comunicação elegibilidade. Assim, os exercícios de experimentação gráficanão podem estar isolados ou serem apresentados sem vínculocom a idéia de projeto. Se isto ocorresse, poder-se-ia passara impressão de que no âmbito da arquitetura, o desenhoexiste por si mesmo, e que é a finalidade do trabalho doarquiteto.

O objetivo do desenho deve extrapolá-lo. É algo que estáalém dele, mas que só se concretiza por meio dele.

Assim como é um equívoco pensar desenho de observaçãodesvinculado da percepção, também o é separar - emarquitetura - desenho de projeto. Um não existe sem o outro.Um depende do outro para concretizar-se.

Torna-se necessário, então, adaptar os conhecimentosadquiridos na representação do espaço construído àtransformação do mesmo. Isto envolve relacionar métodosde desenho e de projeto. (V. Vol.II). Resolver problemasespaciais pela linguagem gráfica. É importante ressaltar queo objetivo não é ensinar métodos de projeto, mas ativar edesenvolver no aluno mecanismos básicos do pensamentoespacial inerentes ao processo de projeto. Ajudá-lo acompreender, na prática, o conceito intrínseco detransformação material da realidade física concreta .

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O desenho deve ser utilizado de forma propedêutica, ou seja,que o aluno nos primeiros anos do curso possa entender osconceitos de espaço e projeto arquitetônico, no seu aspectoplástico-sensível, não como objeto visto de fora peloobservador, mas nele inserido, participante do objeto (espaçoa ser transformado).

Os exercícios devem desenvolver a imaginação espacial, poisé através dela que se dá a resolução da problemática e nãosó do grafismo. Deve-se fazer aqui uma ressalva em termosconceituais, é necessário distinguir, neste trabalho,imaginação de criatividade. A primeira está centrada nacapacidade do indivíduo em formar imagens mentais, asegunda na capacidade deste mesmo indivíduo em trabalhá-las de forma original. Como demonstrado no Volume I, asduas são funções cognitivas que dependem da memória, quepode ser encarada como um centro de registro de dados jáabstraídos pelo indivíduo, pois perceber envolve filtrarinformações. Imaginar é tornar acessíveis mentalmente taisdados e trabalhá-los enquanto objetos mentais, que podemser manipulados. Por exemplo, posso imaginar a cadeira dasala de jantar e trabalhá-la mentalmente, mudando-a de lugar.Posso imaginar a mesma cadeira pendurada no teto, comose a estivesse vendo, mas provavelmente de um ânguloinusitado que minha memória não tem registro, mas possoalém disso trabalhar mais essa imagem, modificando formae cor e aí configurar mentalmente uma cadeira que não existeem realidade. A criatividade está associada à imaginação ecaracteriza a originalidade desta operação. As trêscapacidades estão interligadas num todo cognitivo, que emdeterminadas pessoas podem ter destaques diferentes.

Numa primeira fase de investigação, relacionada ao processode projeto, no qual se dá, de maneira geral, a análise dasnecessidades e a formulação do problema relacionandousuário e entorno, o desenho de observação é fundamental.A cidade, a paisagem pode ser pesquisada de forma a seestabelecer por exemplo, pontos focais do local para oentorno e vice-versa, estipulando graficamente critérios

possíveis de intervenção. O mesmo pode ser realizado comambientes internos.

Numa segunda fase, pode-se pedir para o aluno configurarformas de modificação desse espaço, baseadas na pesquisarealizada. Estudar pormenorizadamente a forma concebida,subdividi-la em pequenos espaços, estabelecendo percursos,dando enfoque na relação homem - paisagem, escala humanapropriamente dita. Na seqüência, pode o aluno reestruturara forma imaginada inicialmente. Passa-se, assim, pelas fasesde reflexão preliminar, síncrese (síntese formal preliminar -ver Vol. II), análise e desenvolvimento das partes, e síntese(resposta espacial final).

Todos os sistemas de desenho devem estar relacionados,perspectivas concomitantes a plantas e cortes. Istodesenvolve no aluno a capacidade de pensar no plano,problemas espaciais e vice e versa (a reversibilidade dePiaget). É aconselhável o uso de perspectiva com pontos defuga, pois simulam de maneira mais coerente as qualidadessensoriais do espaço. A isométrica pode ser trabalhada deforma a precisar problemas técnicos construtivos e detalhes.

Procedimentos estereométricos devem estar em estreitarelação com os estereográficos. Maquetes, principalmentena fase da síncrese são essenciais para desenvolver opensamento espacial. Associadas ao desenho, facilitam avisualização dos problemas e de suas soluções, além deajudarem a execução da resposta gráfica.

Os temas para tais exercícios devem a princípio restringir-sea estruturas simples, próximas à vivência do aluno iniciante.Por exemplo, no caso da cidade e da paisagem, passarelasde pedestres, abrigos para ônibus, etc. No caso de ambientesinternos, modificações de uso, elaboração de novos leiautes,etc.

Exercícios estruturados da mesma forma, mas simplificados,adaptados ao nível da turma, também podem ser realizados.

Além do já citado no item III.3., poder-se-ia trabalhar comlógica operativa espacial, relacionando diretamente o desenhodiédrico com o de perspectiva. Num exemplo simplificado,pedir ao aluno que desenhe várias maneiras de A (elementomóvel) chegar a C passando por B. A, B e C podem assumirqualquer configuração espacial e devem ser colocadosgraficamente em planta.

Outra solução didática interessante está em começar pelodesenho de invenção e pesquisar na realidade física aresposta às necessidades de configuração da imagem criada.Isso dá um caráter funcional e objetivo ao desenho deobservação, geralmente não compreendido pelo aluno emsua totalidade pragmática.

Neste sentido, a perspectiva, principalmente advinda dodesenho de observação, é de fundamental importânciapropedêutica. A representação em perspectiva exige do alunouma equivalente representação mental. Sem esta, torna-sedifícil registrar graficamente intervenções no espaço, oumesmo a criação de um objeto tridimensional não existente.

No entanto, alguns cuidados devem ser tomados. No sentidoetimológico, perspectiva significa “ver através de”. O profes-sor deve esclarecer a diferença entre o que o aluno realmentevê (projeção na retina, côncava) e seu cor-respondente gráficoplano.

O aluno precisa entender a estrutura do mundo físico que elevê, que se configura em imagem visual. Deve entender suaposição neste contexto, enquanto observador participante,compreendendo os conceitos ótico-geométricos (luz refletidano objeto, incidindo no olho do observador, perpassando umplano).

O ensino da perspectiva deve recuperar seu sentido etimo-lógico. Deve esclarecer ao aluno sua referência visual, esta-belecendo a relação entre o observador e o espaço. Tornarclaro que, no caso, o desenhista e o observador coincidem.

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Isto pode ser feito de forma simples e concreta através depequenas maquetes, e desenhando diretamente sobre umquadro de vidro. É importante aprender o conceito, para quepossa aplicá-lo em desenho a mão livre, esboço rápido, maseficiente, enquanto configuração espacial - o croqui doarquiteto propriamente dito.

Outro problema inerente ao desenho e à perspectiva é suarelação temporal. É estática, um instantâneo que negligenciao movimento. Em arquitetura, o parâmetro tempo estásempre presente, pois o observador só percebe o espaço,na sua totalidade, movimentando-se através dele. Desenhosseqüenciais (visão serial) acompanhados de mapas mentais,como os realizados respectivamente por Gordon Cullen ( 04 ) eKevin Lynch( 05 ) são didaticamente proveitosos neste contexto.

Paulo Mendes da Rocha (V. Vol. II) coloca que o processo deprojeto é o mesmo, em arquitetura, design ou cenografia.Assim, exercícios de estrutura projetiva, elaborados sobretemas pertencentes a um universo que não é totalmentedesconhecido para o aluno iniciante podem se tornareficientes. Paulo Mendes também defende que arquiteturanão se tira da arquitetura, mas da literatura, da música, deoutras linguagens. Da mesma forma, exercícios vinculados atextos que descrevam espaços, por exemplo, podem tambémdesenvolver e enriquecer a imaginação figurativa espacialdo aluno iniciante. Os alunos podem também criar seuspróprios textos, individualmente ou em conjunto com a classe.Um exemplo simples: o professor coloca e anota na lousa otema a ser desenvolvido (casa, praça, edifício, etc.); cadaaluno colabora ao acrescentar uma determinada característicade forma verbal. Todos devem acompanhar as modificações,imaginando passo a passo as mudanças. Ao final, devemdesenhar a imagem mental resultante em perspectivas,plantas e cortes.

Um outro tipo de exercício interessante, e que deveacompanhar os de observação, é aquele realizado dememória. A capacidade de memorização é essencial no

trabalho do arquiteto. Esta pode ser desenvolvida através deexercícios que se constituam, também, enquanto pesquisa,para incentivar o aluno a realizá-lo. Na verdade, todos osexercícios para dar bons resultados devem despertar acuriosidade no aluno. Técnicas e procedimentos gráficos, emqualquer que seja a situação, devem estar colocados de formasubliminar, ou seja, estar o aluno convicto de que seu objetivoé pesquisar e projetar, aprendendo a desenhar, enquantoprojeta, e vice-versa. Quanto mais o fizer, melhor o fará,projeto e desenho.

Assim, deve o professor deixar claro ao aluno o objetivo decada exercício (que nunca deve ser a qualidade gráfica darepresentação por si só) e sua relação com o processo deprojeto. Deve, também orientar o aluno, mais que instrui-lo,de forma com que este possa, por si próprio, identificar osproblemas e dificuldades. Deve o professor indicar alternativaspossíveis, para que o aluno, de forma consciente, possaescolher a que lhe é mais adequada.

Segundo Johannes Itten, é essencial para o educador oconhecimento da natureza humana, que é para ele umconhecimento intuitivo. Assim, seria aconselhável aoprofessor não idealizar um perfil modelo de aluno, mas adaptaro melhor possível seu programa e exercícios à turma.Enriquecer visualmente as aulas não só com trabalhos deartistas, que são vistos sempre como modelos para mimese,mas com desenhos de arquitetos, desenhos de projeto, paraque o aluno compreenda visualmente quais as característicasdo desenho que lhe são importantes desenvolver.

Dentro de uma abordagem ativista, evitar riscar o desenhodo aluno, valorizando a individualidade do traço comoexpressão autêntica. Deve reconhecer o desenho comoprincipal instrumento de comunicação professor - aluno.

O lema de John Dewey, aprender fazendo, é básico paraqualquer disciplina de desenho. E isto significa, também,desenhar muito e sempre que possível.

Condições otimizadas de trabalho são essenciais, como salasadequadas, bem iluminadas e aparelhadas, biblioteca ematerial de apoio, visitas a boas obras de arquitetura, etc.Poucos alunos por professor, também, é condição básica.Empiricamente, pude verificar que mais de vinte alunos emuma turma para um período de quatro horas aula torna-seinadequado, pois não é possível orientar a todos, indivi-dualmente, com a dedicação necessária.

A mostra e debate sobre os trabalhos realizados também éeficiente, primeiro porque o aluno consegue se situar dentrodo universo da sala, podendo ele mesmo se auto avaliar;aprende novas soluções, observando e discutindo outrostrabalhos e a valorizar sua expressão particular, evitandocopiar modelos como soluções únicas.

Por fim, uma disciplina de desenho para arquitetos deve emprimeiro lugar ser vista num âmbito global, dentro da vivênciado aluno e do futuro arquiteto, o que inclui o perfil da escola,do profissional, que ali será formado. Mas nunca se deverestringir o desenho a técnicas de representação gráfica, oua uma maneira fácil e rápida de perceber o espaço dentro dealgum método simplificador.

Do aluno médio, que inicia o curso, deve-se esperar certacuriosidade, muita inibição e pouco repertório gráfico, plásticoou conhecimento de desenho. Não entende o que éarquitetura, muito menos o que vem a se configurar noprocesso de criação que se denomina projeto. É função doprofessor de desenho (seja a qual área esteja relacionado)fazê-lo compreender a estreita relação de dependência,utilidade e afinidade que existe entre desenho e projeto.Entender o primeiro como linguagem do segundo, instrumentode produção, em certos casos agente catalisador da criação.

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Notas e referências bibliográficas

01.MERLEAU-PONTY, Maurice. Merleau-Ponty na Sor-bonne: resumo de cursos 1949-1952. Campi-nas: Papirus, 1990. p.267

02. ABERCROMBRIE, M.L.J. Percepción y construcción. In:BROADBENT, G. & WARD, Anthony. . . . . Metodologiadel diseño arquitectonico. Barcelona; GustavoGili, 1971.p.276

03. ABERCROMBRIE, M.L.J. op. cit p. 15704. CULLEN, Gordon. El paisaje urbano. tratado de esté-

tica urbanística. Barcelona: Blume, 1981. 4a. ed.05.LYNCH, Kevin. A imagem da cidade. Lisboa: Ed. 70,

1988.

Bibliografia complementar

ITTEN, Johannes. Design and form. The basic Course atthe bauhaus. New York; Reinhold, 1964.

KRIER, Rob. Architectural Composition. London: Academy,1988.

LEOZ de LA FUENTE, Rafael. Redes y ritmos espaciales.Madrid: Blume, 1969.