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FACED - IPPEX

Ano.1 n.3 jul./set. 2011 ISSN 2236-9678

Diversidade de Saberes

Meditare

Revista Acadêmica dos Cursos de Graduação da FACED

Conselho Consultivo

Antonio José AlvesEdite Natividade Nogueira

Fernando de Oliveira TeixeiraJadir Vilela de Souza ( In memorian)

Jadir Vilela de Souza JúniorLúcia Maria Fonseca Rodrigues

Maria Celeste Teixeira de OliveiraMarna Elizabete da Natividade Nogueira Lima

Funções dos Órgãos Administrativos da Revista Meditare

Coordenação: Jurandir Marques Silva JúniorVice-coordenação: Luiz Augusto de Lima Ávila Secretárias: Cássia Moreira Jardim e Sirlen Márcia Borges Tesouraria: Leandro Maia e Mônica Fischer Comunicação: Célio Faria e Márcio Zacarias Lara Diagramação: Eduardo Antônio Medeiros SouzaRevisão de texto: Luiz Augusto de Lima Ávila

Conselho Editorial

Sociedade Dom Bosco de Educação e Cultural LTDA Mantenedora de: Faculdade de Ciências Econômicas, Administrativas e Contábeis de Divinópolis; Faculdade Divinópolis e Faculdade de Arte e Design. Editoria: Instituto de Pós-Graduação, Pesquisa e Extensão. Conselho Editorial: Cássia Moreira Jardim – FACEDFrancys Gomes Freitas - FACEDJurandir Marques Silva Júnior - FACEDLeandro Maia – FACED Márcio Zacarias – FACED Mônica Fischer – FACED Neusa Gontijo da Fonseca Monteiro – FACED Arte- Final / Diagramação: Eduardo Antônio Medeiros SouzaRevisão: Luiz Augusto de Lima Ávila

Diretora Acadêmica: Arlita Maria da SilvaDiretor Administrativo: Célio Fraga da Fonseca

Ficha catalográfica elaborada pelo Sistema de Biblioteca da SODBEC/FACED

Revista Mediare / Sociedade Dom Bosco de Educação e Cultura,Ltda: Instituto de Pós- Graduação, Pesquisa e Extensão, ano 1, n.3, jul. 2011. Divinópolis: IPPEX, 2011.160 p.

Trimestral

ISSN: 2236-9678

1. Generalidades. 2. Períódico. I. Título. CDD – 000

Bibliotecária Responsável: Neusa Gontijo da Fonseca Monteiro CRB- 6 - 2243

Sociedade Dom Bosco de Educação e Cultura Ltda.Praça do Mercado, 191 – Centro – Divinópolis – Minas GeraisCep: 35500-048Tel:: (37) 3512-2000 – Biblioteca: (37) 3512-2015 Site: www.faced.br E-mail: [email protected] / [email protected]

EDITORIAL

Revista MeditareRevista Eletrônica dos Cursos de Graduação e Pós-Graduação

A Revista Meditare – Revista Eletrônica dos cursos de graduação e pós-graduação da FACED tem, agora, o seu terceiro número publicado. Para nós, colaboradores da FACED, a publicação desta revista é motivo de orgulho e comprometimento com o ensino, a pesquisa e a extensão.

Porentenderqueoacessoadequadoeatualizadoàinformaçãotécnico-científicaéessen-cial ao desenvolvimento e considerando os problemas de distribuição e disseminação de periódicos impressos, a Revista Meditare – Revista Eletrônica dos cursos de graduação e pós-graduação, optou por se tornar um veículo de publicação eletrônico. Esperamos que nossa decisão seja do agrado de todos e que a facilidade da circulação permita com que nossa revista seja um veículo útil de divulgação dos estudos de diversos saberes.

O objetivo da comissão editorial é transformar a Revista Meditare- Revista Eletrônica dos cursos de graduação e pós-graduação em um periódico respeitado e conhecido nacional e interna-cionalmente.

Gostaríamos de agradecer aos colegas que muito gentilmente aceitaram nosso convite para participar do Conselho Editorial, respaldando a seriedade que buscamos para a Revista Meditare. Da mesma forma, agradecemos àqueles que atendem prontamente nossa chamada por colabo-ração e concordam, de modo desprendido, em apoiar nossa publicação. Esperamos sempre cor-responder ao apoio que nos é dado.

Sejam todos bem-vindos à Revista Meditare!

Coordenação Geral da Revista Meditare Revista Eletrônica dos cursos de graduação e pós-graduação.

SUMÁRIO

A FICHA TÉCNICA NOS PROCESSOS DE DESENVOLVIMENTO DE PRODUTO EM UMA EMPRESA DE MALHARIA RETILÍNEA Cristiane VICTER, Monica FISCHER 8

A TARIFA DO SERVIÇO DE ÁGUA E ESGOTO COMO MECANISMO DE EQÜIDADE SOCIAL: O CASO SAAE – VIÇOSA Leandro Maia Fernandes Rafael K. X. Bastos 11

ANÁLISE DA (IN) CONSTITUCIONALIDADE DA PRESCINDIBILIDADE DO ADVOGADO À LUZ DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL Autores: Francys Gomes Freitas Marcelo dos Santos Silva 18

ANALISE DO RISCO DE MERCADO NA PRODUÇÃO SOJA BRASIL Leandro Maia Fernandes 31

ASSESSORIA COMO ALTERNATIVA NA EXTENSÃO ACADÊMICA: UM ESTUDO DE CASO NA COMUNIDADE CÂNDIDES NO MUNICÍPIO DE DIVINÓPOLIS/MG Diana Maria de Resende Souza Linda Maira Santos Nunes 38

AVALIAÇÃO DO RISCO DE INVESTIMENTO NA CULTURA DO MILHO IRRIGADO NA REGIÃO DO TRIÂNGULO MINEIRO 45Leandro Maia Fernandes Carlos Antônio Moreira Leite 45

DA VALIDADE DA ASSUNÇÃO DE DÍVIDA NO CONTRATO DE FINANCIAMENTO HABITACIONAL SEM A INTERVENIÊNCIA DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA Fernanda Koch Sérgio Jacob Braga 59

FATORES DETERMINANTES DO CUSTO DA CESTA BÁSICA DE ALIMENTOS NO MUNICÍPIO DE DIVINÓPOLIS NO PERÍODO DE 2009 – 2010 Leandro Maia Fernandes Guilherme Henrique Dias 89

ÍNDICE DE CONCENTRAÇÃO DE RENDA NO ESTADO DE MINAS GERAIS: UM ENSAIO TEÓRICO Leandro Maia Fernandes 101

O DIREITO COMUNITÁRIO E OS FUNDAMENTOS DE UMA SOCIEDADE DEMOCRÁTICA: O EQUILÍBRIO DE NASH COMO FUNDAMENTO DA LIMITAÇÃO DO PRINCÍPIO DA MAIORIA FACE AOS DIREITOS FUNDAMENTAIS EM KELSEN Alexandre Lopes Rocha Lima 107

O SISTEMA PRISIONAL BRASILEIRO: UMA ANÁLISE CRÍTICA ACERCA DA FINALIDADE DA PENA Fernanda Cândida Dias Orientadora: Simone Matos Rios Pinto 116PARADIGMA E EPISTEMOLOGIA

Márcio Zacarias Lara 120

QUAL GRAMÁTICA ENSINAR NO ENSINO MÉDIO NORMATIVA OU TEXTUAL? Jurandir Marques Silva Júnior 124

RESPONSABILIDADE SOCIOAMBIENTAL: ONDE COMEÇAM AS MUDANÇAS? Adriana Nunes Lacerda e Prestupa 128

TORNOZELEIRA ELETRÔNICA - CONSIDERAÇÕES SOBRE A LEI 12.258/10 Sandro de Oliveira Sousa Simone Matos Rios Pinto 129

UMA VISÃO DA INTERDISCIPLINARIDADE Eliana Martins 135

VERIFICAÇÃO DO RISCO DE INVESTIMENTO NA CULTURA DA GOIABA IRRIGADA NA REGIÃO DO CENTRO OESTE MINEIRO Leandro Maia Fernandes Helbert Silva Batista 140

LA VALIDAD DE LAS CLÁUSULAS PÉTREAS AL FRENTE DEL DESEO SOCIAL Roberto Franklin de Sousa 152

Normas Editoriais para a publicação de trabalhos 159

A FICHA TÉCNICA NOS PROCESSOS DE DESENVOLVIMENTO DE PRODUTO EM UMA EM-PRESA DE MALHARIA RETILÍNEA

A Ergonomia Informacional Aplicada à Ficha Técnica para Aprimoramento das Peças de Vestuário

Cristiane VICTER,1 Monica FISCHER2

SUMÁRIO

Dentro das empresas do vestuário, pode-se notar as divergências que ocorrem entre os diversos setores, causadas principalmente pela comunicação inadequada. A falta de entendimento entreoprofissionaldaáreadodesigneomodelista,ouentreomodelistaeascostureiras,émuitocomum.Oartigoenfocaosaspectosdeumafichatécnicaeasuautilização;apontaalgunscamin-hos para minimizar os atritos, relacionados à comunicação não verbal utilizada pelo design, ou seja, propondo desenvolver uma linguagem através de desenhos, para favorecer uma comunicação mais objetiva e adequada.

PALAVRAS-CHAVE Ficha Técnica, Design, Moda, Vestuário, Desenho, Ergonomia Informacional.

1. INTRODUÇÃO

O processo de desenvolvimento de produto é uma etapa de suma importância para a em-presa, sendo ela a etapa iniciante para seu sucesso e dos produtos por ela confeccionados. Geral-mente nas empresas de grande porte existe um setor à parte, para realização dos processos da peça piloto. Assim,as reflexõesconseguintes têmopropósitodecontribuirnabuscaporuma funda-mentaçãoquepondereasquestõesparticularesdaconcepçãodeprodutosdevestuário,abor-dando principalmente aspectos técnicas e alternativas para renovação na construção de produtos de moda. Analisando os métodos utilizados para o desenvolvimento de produtos de moda no decorrer da observação realizada, através da pesquisa de campo em uma malharia retilínea de Divinópolis / MG,verificou-seafaltadeintegraçãoentreosdiversossetoresqueenvolvemaproduçãodeumapeça do vestuário.

2. DESENVOLVIMENTO

Privat label é termo utilizado pelas grandes grifes que buscam outras empresas para desenvolveremseusprodutos;empresaseestilistasutilizamestemétodo,quandonãopossuemmaquinário ou tempo hábil para produzirem suas peças. Para maior entendimento sobre o assunto hádeseterumabreveexplanaçãosobreasfunçõesnossetoresdedesenvolvimentodeprodutode uma malharia retilínea. A empresa de malharia retilínea se difere das outras empresas do vestuário por possuir principalmente agregada a seu corpo, a área têxtil na qual são produzidos os tecidos. Setor este que produz tecidos exclusivos, sendo necessário que tanto o designer, quanto o estilista, possuam conhecimentodetecelagemefiosparamalharia. O processo inicia-se na encomenda das peças, onde o estilista ou uma grife, encaminha via correio ou através de um receptador, desenhos, recortes de revistas e tecidos para desenvolvimen-to das peças de sua coleção. A empresa receptadora, por sua vez, possui um setor de desenvolvi-mento de produto, que recebe o material e o analisa, observando a viabilidade e a disponibilidade de execução das peças.3. O PROBLEMA

1 Faculdade de Arte e Design/FACED2 Faculdade de Arte e Design/FACED

Muitos aspectos relacionados à comunicação estão presentes na indústria da moda. O cam-inhododesenhoàpeçapilotoélongoecheiodeinterpretaçõesquecadaumtrazempiricamente.Quandoocorrededeparar-secomumesboçodeumaroupa,semespecificaçõestécnicas,busca-se o resultado que mais se adéqua com o representado no desenho, podendo ser interpretado de váriasformas.Aspectoscomocor,textura,formatamanho,nãosãobemexemplificadosatravésdodesenhodecroqui,queservemuitobemparaterumaidéiadeharmoniaecombinaçõesadequa-das,mascarecedeinformaçõestécnicasparaexecuçãodoprojetodapeçapiloto.Destaforma,odesenho técnico é tão importante para o modelista, quanto é a planta para o executor de uma obra de construção.

4. A COMUNICAÇÃO

DeacordocomodicionárioeletrônicoHouaiss,comunicaçãosignificaoprocessoqueen-volve a transmissão e a recepção de mensagens entre uma fonte emissora e um destinatário re-ceptor,noqualasinformações,transmitidasporintermédioderecursosfísicos(fala,audição,visãoetc.)oudeaparelhosedispositivostécnicos,sãocodificadasnafonteedecodificadasnodestinocomousodesistemasconvencionadosdesignosousímbolossonoros,escritos, iconográficos,gestuais, etc. Arepresentaçãográficapodeserconsideradacomoalinguagemqueodesignerutilizacomo objetivo de comunicar suas idéias através do desenho para as outras pessoas. Schulmann [1994] colocaqueodesenhopossuiduasfunçõesprincipais:adeconcretizaçãodasidéiasdodesigneratravés de um croqui e a de comunicação, no sentido de transmitir visualmente a idéia concebida para as pessoas [apud SUONO, 2007]. O desenho técnico, portanto, conforme French [1977] se constitui em uma linguagem grá-fica,utilizadapara representare registrardiferentes informaçõesdaspeças,diferindoassimdocroqui.

5. PROPONDO SOLUÇÕES

Grandes prejuízos e desgastes são causados dentro das empresas devido a esta falta de in-formaçõesparainiciaçãodeumproduto.Odesignerdeveterbemdefinidooquequercomrelaçãoao produto a ser confeccionado, e ao transcrevê-lo, é necessário que se utilize de várias formas de comunicaçãoparaqueointerpretantepossaentãocompreendê-lo,semincorrereminterpretaçõessubjetivas. Segundo Barthes [1979], o sistema da moda é constituído de várias linguagens, a imagem visual,aescrita,eareal.Fazercomqueestaslinguagenscaminhemjuntastorna-seodesafioprin-cipal para a realização de um produto de moda adequado. Notório é a importância de que os envolvidos no desenvolvimento de produto devam estar em permanente sintonia com tendências de moda, podendo assim compreender o que o estilista propõe.Ousodeenviarrecortescomdetalhesémuito freqüente,masaindasefaznecessárioassociarespecificaçõestécnicascommedidasparaexecuçãodoprojeto.Estescuidadospoderãoajudar a evitar erros comuns e simples, como o de comprimento de peças, babados, tamanhos de botões,etc.. Umaanálisedarepresentaçãográficaedaergonomia,atravésdeumestudoderevisãoteórica, pode auxiliar na busca de novas perspectivas de conhecimentos, que assim possam con-tribuir para o setor de moda no seu desenvolvimento. A ergonomia informacional vem de encontro à busca de solução do que diz respeito à comunicação.

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Muitossãooselementosqueconstituemafichatécnicadoprodutodemodaeédesumaimportância que estes elementos estejam em consonância com o que se quer propor. Ao se criar

umprodutodemoda,odesenhoplanificadooutécnicoéumdeles. Estudossobreconvençõesdedesenhosplanificadosaindaestãoemdesenvolvimento,sen-do necessário um aprimoramento no estudo da linguagem, pois na era de novas tecnologias ado-tadaspelasempresas,apadronizaçãodeumvocabuláriográficoédeextremaimportânciaparaaorganização do trabalho. Torna-se importante compreender as reais necessidades da empresa para elaboração de umafichatécnicacompatívelecompartilharestasinformaçõescomosdiversossetoresqueen-volvemoprocesso,paraquetodospossamcompreenderalinguagemespecificada,promovendoassim caminhos que corroborem na satisfação e nos resultados do trabalho desenvolvido nas fábri-cas. Falsos e inadequados conceitos são gerados dentro das empresas devido à comunicação inadequada,sendoentãoarepresentaçãográficadepapelfundamentalparaapoio. Calcar-se nos preceitos da metodologia da ergonomia informacional pode possibilitar cam-inhos para uma análise de estudo de campo, colaborando para que novos conhecimentos na área derepresentaçãográficademodatenhamumfundamentocientíficomaissólido. Comousodepesquisasbibliográficas relacionadasàantopometriaeàergonomia infor-macional,eaadequaçãodosprocessosdecomunicaçãoàpadronizaçãodasespecificaçõesdodesenho técnico, torna-se possível dar andamento às diversas etapas dos processos de desen-volvimento de produto dentro da empresa, de forma mais ágil e adequada.

7. REFERÊNCIAS

[Celso2008]SUONO,CelsoTetsuro; SILVA, Benedicto FranciscoCabral; PASCHOARELLI, LuísCarlos.Arelaçãodarepresentaçãográficaedaergonomia:umcontextonamoda.In:3ºCongres-so Internacional de Pesquisa e Desenvolvimento em Design. Anais... Rio de Janeiro, 2005.

[Denis1994]SCHULMANN, Denis. O desenho industrial. Tradução de Maria Carolina F. de Castilho Pires. Campinas: Papirus, 1994.

[Eliana2000]FORMIGA,ElianadeL.;MORAES,Anamariade.Avaliaçãodecompreensibilidadedeícones e símbolos através da ergonomia informacional. In: ABERGO, 2000. Rio de Janeiro. Anais... Rio de Janeiro, ABERGO.

[Lucas2008]ROSA, Lucas. Ficha Técnica do Produto aplicada ao processo produtivo do vestuário. In: 3° Congresso Internacional de Pesquisa e Desenvolvimento em Design. Rio de Janeiro. Anais...Rio de Janeiro, 2005.

[Lucia2004]SANTAELLA, L. e NÖTH W. Comunicação e Semiótica. São Paulo: Hacker Editores, 2004.

[Roland1979]BARTHES, Roland. O sistema da moda. São Paulo: Nacional, 1979.

[Thomas1977] FRENCH, Thomas E. 17ª ed. Desenho Técnico. Porto Alegre: Globo, 1977.

ATarifadoServiçodeÁguaeEsgotocomoMecanismodeEqüidadeSocial:O Caso SAAE – Viçosa

Leandro Maia Fernandes Rafael K. X. Bastos

Introdução Em seu atual estágio de desenvolvimento sócio-econômico, o Brasil se caracteriza como um país de contrastes. Apresenta-se ao mesmo tempo como tendo o décimo primeiro produto in-ternobruto(PIB)doplanetaeumadaspioresdistribuiçõesderenda(IBGE,1996). Segundo POSSAS,(1989), além dos contrastes, o país apresenta heterogeneidade estru-tural, ou seja, elementos de modernidade e atraso, ou seja, pobreza e riqueza coincidem num mesmo conglomerado espacial.. Teorias como estas têm sido amplamente utilizadas para explicar o atual perfil epidemi-ológicodopaís,identificadocomotípicoeaomesmotempopeculiar,detransiçãoepidemiológica(POSSAS,1989). Esse termo refere-se à passagem da predominância de doenças típicas da “pobreza” (exem-plo: doenças infecto-contagiosas) para doenças características da “riqueza” (exemplo: hipertensão, estresse, etc..), à medida que se consolida o processo de avanço tecnológico e o desenvolvimento econômico de uma dada sociedade. No Brasil, ao contrário do observado nos países desenvolvidos, a transição epidemiológica é marcada pela coincidência das doenças da modernidade e do atraso, ou seja, à medida que incidência das doenças da riqueza aumentam, permanecem resíduos elevados doenças da pob-reza. Neste quadro, o país apresenta ainda elevados índices de incidência de doenças infecto-parasitárias, as quais ainda aparecem dentre as principais causas de mortalidade infantil. Esta elevada incidência de doenças infecto-parasitárias, se dá pelo fato da precariedade dainfra-estruturasanitáriadopaís,principalmente,pelodéficitdecoberturadeserviçosdesanea-mento ( HELLER,1995). Os dados oficiais disponíveis indicam quemais de 80% da população urbana brasileiratem acesso a serviços de abastecimento de água potável, porém, em contrapartida, não mais que 40%dapopulaçãoencontra-seatendidosporserviçosdeesgotamentosanitário(HELLER,1995).Percebe-se então nestas estatísticas setorial, uma ilustração dos contrastes e da heterogeneidade acimacitados,comoelementosdefinidoresdoatualperfilepidemiológicosanitáriodopaís. Frenteaestasituaçãoenabuscapelasuperaçãododéficitdeserviços,osetordepara-secom um intenso debate sobre os modelos de gestão adequados que, em última instância, viabi-lizem a universalização do atendimento. Com o esgotamento do sistema PLANASA, os municípios tem à sua frente uma série de alternativas: administração direta, administração via autarquias ou empresas de capital misto, concessão às companhias estaduais ou mesmo abertura ao capital pri-vado (MPO,1995). Um dos pontos centrais dessa discussão reside na capacidade de geração ou captação de recursos para investimentos necessários. Tradicionalmente os recursos para o saneamento partem das receitas tarifárias complementadas por recursos orçamentários ou fundos governamentais de investimento. Na defesa da abertura do setor ao capital privado argumenta-se que as receitas tar-ifáriaserecursosorçamentáriossãoinsuficientesemfunçãodacapacidadelimitadadepagamentopor parte dos usuários e de investimentos por parte do Estado (MPO, 1995). De outro lado, argumenta-se que a abertura precipitada ao setor privado, escamoteia questões ideológicas,desviaaatençãodosaneamentocomoprioridadeemtermosdepolíticaspublicas e orçamentárias e que o setor público fortalecido, especialmente os serviços municipais, é capazdepromoverserviçosdeformacompetitivaeeficaz(WARTCTHOW,1995). Dois pontos, pelo menos, são consensuais em meio a esse debate: a necessidade do equilí-

briofinanceirodosserviçosviabilizadoatravésdatarifaeainviabilidadedosubsídioaosconsumi-dores de baixa renda, face à realidade sócio- econômica do país. Sendo os serviços produzidos sob uma concorrência perfeita, a livre ação do mercado con-duziria os agentes econômicos ao encontro da produção ótima e do preço mais adequado. Esse preço adequado é aquele que promove a alocaçãomais eficiente dos recursos e que induz àsituaçãodemáximobemestar.Sobessascondiçõesteoricamenteperfeitas,oestadoapenasga-rantiria o acesso aos serviços às camadas mais pobres que eventualmente estivessem excluídas do consumo por incapacidade de pagamento (BALTAR & MOITA, 1995). Na prática, a tarifa representa o elo de ligação entre o usuário e o órgão prestador do serviço. Para SPINDOLA et al. (1987), nesta relação, os problemas do ponto de vista do usuário referem-se à disposição para o pagamento e a justiça do valor das contas. Dopontodevistadoprestadordoserviçoomaiorproblemaestárelacionadocomaeficiên-cia,aqualenvolveaquantidadeeaqualidadedoprodutoecomasustentabilidadefinanceiradoserviço,poisapartirdomomentoquesetemumfuncionamentoeficiente,menoresserãoasperdase consequentemente menores serão os custos e maiores serão os benefícios. SUAREZ & SCHAAM (1993), consideram que a justa cobrança é aquela que visa remunerar de forma adequada os serviços, entendendo-se, como tal, todos aqueles custos intervenientes na obtençãodoprodutosemqueoequilíbriofinanceirodaempresasejaprejudicado,masquefunda-mentalmentesejamexatoseconfiáveisparaoconsumidor. SPINDOLAetal.(1987)afirmamquearemuneraçãodoserviçofeitapeloconsumidorsóésuportável se a tarifação se comportar com justiça social. O consumidor pagará suas contas com uma maior disposição se notar que a tarifa que está pagando realmente condiz com a qualidade do serviço,casocontrário,onúmerodeinadimplênciaéconfirmadamentealtodevidoaaltarestriçãoeconômica da população brasileira e devido a baixa satisfação com o serviço. Para DANTAS (1983), a tarifa que possui o objetivo social deve partir do pressuposto que as tarifas não podem ser fator impeditivo para o consumo das classes de baixa renda. Além do mais, qualquer estrutura tarifária deve ser avaliada em comparação à distribuição de renda. A própria legislação tarifária adotada em 1978 evidencia a preocupação do poder público em promover o subsídio dos consumidores de maior poder aquisitivo para os de menor poder aquisitivo,atravésdafixaçãoprogressivadastarifasemrelaçãoaosvolumefaturadosdeágua(RODRIGUES & OLIVEIRA,1987). Segundo RODRIGUES & OLIVEIRA (1987), o potencial de utilização da tarifa como mecan-ismo distributivo está longe de ser exaurido, pois não se conhece ao máximo a disposição de paga-mento do usuário de renda mais elevada, o que em muito casos proporcionaria um aumento da receitadoserviçocujobeneficiopoderiaserrepassadoaosusuáriosdebaixarenda. Em linhas gerais, a maioria das práticas tarifárias vigentes no país mantêm a estrutura bási-ca formulada na legislação de 1978, ou seja, uma conta mínima correspondente à indução de um consumo mínimo, seguido de uma cobrança progressiva por faixas crescentes de consumo. Além disso, a maioria dos serviços adotam políticas de tarifação social como subsídios adicionais aos consumidores de baixa renda. Desde então, diversas experiências de estruturas alternativas ou mesmo ajustes de preços e faixas de consumo, vêm sendo implementadas, sempre no sentido de reduzir os subsídios exces-sivos às faixas de consumo mais elevadas. Emsíntese,estasexperiênciasilustramograndedesafiodaformulaçãodeumapolíticatar-ifáriajustaeeficaz:abuscadonecessárioequilíbrioentreoauto-financiamentoeacapacidadedepagamento dos usuários. Desta forma, a meta de universalização do atendimento, baixos índices deinadimplênciaeviabilidadeeconômica-financeiradaempresa,apresentam-secomofatoresin-terdependentes. Em Viçosa, a cobertura dos serviços registram índices superiores às médias estadual e na-cional.Cercade96e85%dapopulaçãourbanasãoatendidascomosserviçosdeáguaeesgoto,respectivamente.Alémdisso,oSAAEapresentabons indicadoresdedesempenhofinanceiroeoperacional ( SAAE, 1998). Quantoainadimplência,estudosrecentesindicamíndicesde10%dototaldasligaçõese

revelam que a distribuição espacial dos inadimplentes guarda uma correspondência nítida com a distribuição da pobreza no município (FERNANDES et al. 1998). Adicionalmente, os mesmos es-tudos revelaram que o aumento da inadimplência está relacionado positivamente com os períodos de elevação dos preços e das tarifas. Em relação à política tarifária, o SAAE – Viçosa adota a estrutura sugerida pela legislação de 1978, através da qual busca o subsídio para as menores faixas de consumo. Além disso o SAAE mantém um subsídio adicional aos consumidores de baixa renda por meio do estabelecimento uma tarifa social. Resta saber, se a estrutura tarifária vigente esgota-se em si mesma como mecanismo de distribuiçãooupode-seintensificar,aindamais,seucarátersocialparaaspessoasdebaixarendasemqueseuequilíbriofinanceirosejacolocadoemrisco.

Objetivo

Estudar a atual estrutura tarifária do SAAE- Viçosa, com ênfase em seu alcance social.

Metodologia

Modelo Conceitual

No desenvolvimento do trabalho procurou-se basicamente analisar o alcance social da políti-ca tarifária praticada pelo SAAE - Viçosa. Inicialmente, foram analisados, conjuntamente, a distribuição de renda e concentração dos encargos tarifários sobre os usuários dos serviços de água e esgotos. Para tanto foram utilizados ocoeficientedeGINIeaCurvadeLORENZ. ParaestimaroscoeficientesdeGINIemrelaçãoaosencargostarifáriosforamutilizadosasfaixas de consumo, o percentual de consumidores de cada faixa de consumo e o percentual de participação de cada faixa de consumo na receita total do serviço. Esses dados foram obtidos no SAAE-VIÇOSA. NadeterminaçãodocoeficientedeGINIdarendaforamutilizadososseguintesdados:es-tratos de salários e percentual de famílias que representam cada faixa de renda e total de renda de cada estrato. Os dados foram coletados do questionário sócio-econômico feito pelo Plano Diretor de Viçosa, em mais de 1500 residências, no ano de 1998. OscoeficientesdeGINIvãomostrarograudeconcentraçãoderendadapopulaçãoquetêm os serviços prestados pelo SAAE e o grau de concentração dos encargos tarifários do serviço perante os consumidores. CombasenosresultadosdoscoeficientesdeGINIpoderáserobservadoseosencargostarifários são mais ou menos concentrados que a renda dos consumidores. Segundo MAEIRÁ (1983), estando a curva que representa o índice referente a renda mais à esquerda da curva que representa o índice de GINI dos encargos tarifários tem-se uma estrutura tarifaria com justiça social.

Modelo Empírico A curva de LORENZ, Figura 1, é um instrumento que permite uma boa visualização da dis-tribuição de renda de uma determinada população (SABÓIA, 1980). Para tal torna-se necessário representargraficamentenoeixodasabcissasasproporçõesacumuladasdapopulação,poror-dem crescente de renda, e, no caso do presente trabalho, encargos tarifários. No eixo das ordena-dasoscorrespondentesvaloresdasproporçõesacumuladasdarendatotal. Segundo SABÓIA (1980), no caso de uma distribuição perfeitamente igualitária, a curva de LORENZ se reduz a uma reta de 45o, visto que a cada fração acumulada da população corresponde a mesma fração acumulada da renda. No caso de uma distribuição totalmente concentrada em um único indivíduo, a curva se transforma na linha denominada linha de perfeita desigualdade.

A

C

BO

Figura 1- Curva de Lorenz

A primeira área, OAC, representa uma situação de desigualdade intermediária entre a perfei-ta igualdade e a máxima desigualdade. A segunda área OAB representa a máxima desigualdade, ao passo que OA é a linha de perfeita distribuição (COSTA, 1974). Deste modo, pode-se ter uma idéia do que se entende por Razão de Concentração. Com-parando-se a área de concentração OAC com a área de máxima concentração OAB obtém-se uma medida do grau de desigualdade da distribuição de renda e dos encargos tarifários (G).

Esta razão existente entre a área de concentração e área de máxima concentração é de-nominadadeíndiceoucoeficientedeGINIepodevariarde0a1.Quantomaispróximoocoefi-ciente estiver de um a distribuição piora. Segundo COSTA (1980), na computação de GINI também pode-se utilizar a seguinte fór-mula:

G=1-∑(Vi+Vi-1)(Ui-Ui-1) em que: Vi=Fraçõesacumuladasdasrendasrecebidas;Ui = Fração acumuladas do numero de pessoas.

Mesmoprocedimentodeveserseguidoparaobtençãodocoeficientereferenteaosencargostarifários. Deve-se observar que o índice de GINI, calculado pela última equação, fornece uma subes-timativa da desigualdade real. Algumas outras tentativas foram desenvolvidas por grandes es-tudiosos como HOFFMAM (1971), que procurou contornar o problema de subestimação de GINI fazendo ajustamentos em cada classe, e GRASTWULTH (1972), que estabeleceu limites inferiores e superiores numa tentativa de levar em consideração as diferenças de cada classe. Na prática, entretanto, a forma mais utilizada para obtenção do GINI é a fornecida pela equação anteriormente apresentada. Segundo SÁBÓIA (1980), o índice de GINI nunca deve ser utilizado isoladamente, mas sim acompanhado da curva de LORENZ, pois um mesmo valor do índice pode corresponder a situação bastante distintas da distribuição de renda.

Análise dos Resultados O índice de GINI para a distribuição de renda e encargos tarifários no município foi determi-nado com base nos dados dos quadros 1 e 2.

Quadro 1: Classe de renda, população e renda por estratos em Viçosa

Fonte: Plano diretor de Viçosa 1998.

Quadro2:Estratosdeconsumo,númerodeligaçõesefaturamentodoSAAE-Viçosa.

Fonte: SAAE

O índice GINI, referente aos encargos tarifários, foi obtido com base no quadro 2. O índice de GINI encontrado para a renda e tarifas foram de 0,50 e de 0,54, respectiva-mente. Observa-seque60%dareceitaéprovenientedasligaçõesentre31-200metroscúbicossendoqueestasligaçõesrepresentamapenas16%dototaldasligações.Poroutrolado,verifica-sequeasligaçõesentre0-30metroscúbicosrespondemporapenas40%dototalfaturado. OíndicedeGINIdarendaseaproximamuitodoíndicedeGINIdatarifa,oquepermiteafir-mar que a política tarifária praticada é razoavelmente justa, satisfazendo o pressuposto teórico de que o índice GINI das tarifas deve ser igual ou maior que o índice de GINI da renda. Nafigura2estãorepresentadasascurvasdeLORENZparadistribuiçãodarendaedosencargos tarifários em Viçosa.

Figura 2: Curva de Lorenz para a renda e encargos tarifários em Viçosa.

Comparando-seoíndicedeViçosacomorestodopaísverifica-sequeomesmoérelati-vamente maior que o GINI para o Brasil, pois segundo (IBGE,1998), o índice de GINI com base nasdeclaraçõesdepessoasfísicasparaoBrasil,em1990,erade0,44e,em1991erade0,43,chegando a 0,44 e 0,46 em 1997 e 1998 respectivamente. NoBrasilaparcelados50%maispobresem1998representou11,26%dototaldasrendaseaparceladarendados20%maisricosrepresentounomesmoanoocorrespondentea63,87%do total da renda( IBGE,1998). EmViçosaopercentualdeparticipaçãodarendadosestratosde0-2salárioséde18%darendatotal,entre2-5saláriosaparticipaçãoéde49%dototaldarendaeentreosestratosde5-20saláriosaparticipaçãoéde33%dototal.

Conclusão

Os estudos desenvolvidos revelaram que a atual política tarifária praticada pelo SAAE cumpreospressupostosdeauto-sustentaçãoeviabilidadeeconômica-financeiradoserviço.Alémdisso, a atual estrutura tarifária de Viçosa cumpre razoavelmente seus pressupostos sociais, face à distribuição de renda no município. Comoresultado,oSAAEdemonstraumbomdesempenhooperacionalefinanceiro,alémde apresentar índices de cobertura de serviços bem superiores às médias nacionais. Entretanto o índicedeinadimplêncianomunicípioatingeacasados10%dasligações Talquadro,seperpetuado,podeseconfirmarcomoumcontrapontosócio-econômicoàsmetas de universalização do atendimento. Assim sendo, em que pesem os resultados satisfatórios decorrentes da atual política tar-ifária,julgam-secabíveisrestruturaçõesnosentidodeampliarseualcancesocial. Portanto, sugere-se que quaisquer estudos de restruturação tarifária deveriam priorizar a elevação dos subsídios aos usuários de baixa renda, principalmente àqueles situados nas faixas deconsumoinferioresa15metroscúbicose,maisespecificamente,inferioresa10metroscúbicospor mês. De toda sorte, todo estudo neste sentido deve levar em consideração a garantia do equilíbrio financeirodoSAAE,alémdeoutrosaspectossubjetivosepragmáticos,comooimpactonapopu-lação resultante de reajustes tarifários, além da disposição de pagamento dos usuários de maior consumo.

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ANÁLISE DA (IN) CONSTITUCIONALIDADE DA PRESCINDIBILIDADE DO ADVOGADO À LUZ DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL

Autores: Francys Gomes Freitas1 Marcelo dos Santos Silva2

RESUMO

A Constituição Federal de um Estado é norma que deve estar no ápice da pirâmide do ordenamento jurídico, como desejava Kelsen, por mais positivista que seja esta regra. Assim, as demais deveriam guardar simetria. Salienta-se que o ponto central do constitucionalismo brasileiro está a dignidade da pessoa humana.Apesar disso, em algumas situações esse princípio estásendo desrespeitado. Esse trabalho pretende discutir a constitucionalidade do artigo 9° da lei da Lei 9.099/95sobreaprescindibilidadedoadvogadonasaçõesquetenhamvaloresmenoresquevintesalários mínimos. Para tanto, será averiguado os fundamentos do Estado Democrático de Direito que o Brasil intitula-se fazer parte, a questão do acesso à justiça, debater sobre a existência ou não da diminuição da capacidade probatória, analisar a interpelação do tema com os ideais da Teoria DiscursivadeHabermase,finalmente,opinarconclusivamentesobreotema,semaintençãodeesgotá-lo.

PALAVRAS-CHAVE: Constituição Federal. Democracia. Dignidade.

ABSTRACT

The Federal Constitution is a state standard that should be at the apex of the pyramid of the legal system, as Kelsen wanted, that is more positive by this rule. So, the other should keep symme-try. It should be noted that the focus of Brazilian constitutionalism is human dignity. Nevertheless, in somesituationsthisprincipleisbeingflouted.Thispaperaimstodiscusstheconstitutionalityofthelaw Article 9 of Law 9099/95 on the prescindibilidade attorney in actions that have values less than twenty minimum wages. To do so, will be examined the foundations of a democratic state that Brazil is entitled to take part, the issue of access to justice, debating whether or not evidence of impair-ment, analyze the interpellation of the subject with the ideals of the Theory Habermas’s discourse, andfinally,conclusivelyopineonthesubject,withnointentionofexhaustingit.

KEYWORDS:Federalconstitution.Democracy.Dignity.

1 INTRODUÇÃO

Partindo para uma sucinta análise histórica da forma de elaboração das leis em nosso país, pode-se dizer que o Brasil viveu muito tempo no período da “lei imposta”, não discutida, não vo-tada, não representativa. Portanto uma lei que não servia ao povo nem dava a ele garantia alguma. Viveu-sesobojugodaescravidãoedopactocolonialquenãobeneficiavaquasenuncaoshomense mulheres desse país. A Constituição, de 1824 foi uma resposta do poder absoluto ao povo bra-sileiro que pensava poder garantir para si um pouco de controle sobre seu país. Com a república não mudou a face do brasileiro nem tampouco ofereceu direitos, garantias e liberdades a todos. Foiduramenterepressoraeexcludente.Asconstituiçõesqueseseguiramtambémnãotiveram,defato, participação do povo nem tampouco suas ideias contempladas. Ainda assim, convivemos com a “ditadura de caráter nazista” do Estado Novo. E quando os brasileiros pensavam em conseguir para si o controle do poder, eis que os militares assumem e,novamente,impõemumregimeautoritárioeextirpaqualquerdesejodeliberdadeoudepartici-1 FREITAS, Francys Gomes. Advogado e Professor Universitário (FACED, Universidade de Itaúna), Especialista em Di-reito Público pela Newton Paiva, Mestre em Direito pela UNIFLU e cursa matéria isolada do Doutorado da PUC-MINAS.2 FREITAS, Francys Gomes. Advogado e Professor Universitário (FACED, Universidade de Itaúna), Especialista em Di-reito Público pela Newton Paiva, Mestre em Direito pela UNIFLU e cursa matéria isolada do Doutorado da PUC-MINAS.

pação. Depois de muita “luta”, suor e lágrimas, os representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembléia Constituinte, promulgam a 7ª Constituição da República Federativa do Brasil. Mas dessa vez foi elaborada de forma democrática, com todos os acertos e erros peculiares de um processo democrático. Muitos direitos individuais e coletivos foram assegurados, tais como a liberdade, a isonomia e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna. Mas na prática, a constituição ainda está distante de ser aplicada na prática em sua inteireza tornando-se uma meta a ser alcançada. Após o texto pronto, surgiu a necessidade da existência de leis que complementassem e/ou regulamentassem o texto maior. Porém, muita das vezes sua constitucionalidade era discutida nos Tribunais. Em termos de complementariedade, a Lei 9.099, criada em 1995 no governo de Fernando Henrique Cardoso, teve a intenção de diminuir a morosidade processual no Judiciário. Em que peseodesejodolegisladorotextodalei,notadamentenoartigo9ºferiram-seprincípiosconstitu-cionaisdispostosnaConstituiçãoFederal,notadamenteosdescritosnosartigos5ºe133,comoaliberdade, a cidadania, o contraditório e ampla defesa, e dignidade da pessoa humana, entre out-ros. Ora, se a Constituição é um pilar fundamental para a democracia, certamente deve ser trat-adacomreverênciaecomabsolutorespeito.Nesseponto,necessárioabordar-seascontribuiçõesdaTeoriaDiscursivadeJüngerHabermaseanecessidadedadecisãoserconstruídaapartirdeuma comunicação. Assim questiona-se: como há comunicação plausível se as partes no processo não estão em paridade de forças em um processo? Em face dessa situação, o alvo desse trabalho é questionar a constitucionalidade da dis-pensabilidade do advogado nas causas menores que vinte salários mínimos em um Estado que se autodenomina Democrático de Direito.

2 DESENVOLVIMENTO

2.1 FUNDAMENTOS DO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO NA CRFB/88

AConstituiçãoFederalde1988declaraemseuartigo1º,queaRepúblicaFederativadoBrasil seria constituída valendo-se de um Estado Democrático de Direito, tendo como fundamentos: a soberania, a cidadania, a dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, o pluralismo político, com intuito de ser este Estado Democrático de Direito. Objetivou-se diminuir, ou até mesmo erradicar-se, toda sorte de injustiças. Emboradiscutiredefinirconceitossejauma tarefaárduaepraticamente incompleta,porinjustiça, entende-se um Estado sem direitos civis completos e sem liberdade de pensamento e expressão. Partindo dos fundamentos constitucionais acima citados, Glauco Barreira Magalhães Filho conceitua o Estado Democrático de Direito da seguinte maneira:

“O Estado Democrático de Direito é aquele que se estrutura através de democracia representativa, participativa e pluralista, bem como o que garante a realização prática dos direitos fundamentais, inclusive dos direitos sociais, através de instrumentos ap-ropriados conferidos aos cidadãos, sempre tendo em vista a dignidade humana. As bases do Estado Democrático de Direito são a soberania do povo, expressa na mani-festação da vontade popular, e a dignidade humana, consagrada na enunciação dos direitos fundamentais. Em razão desse segundo pilar, evidencia-se uma ampliação do conceito de democracia a qual terá que realizar-se não apenas no plano político, mastambémnasdimensõeseconômica,socialecultural”.FILHO,Magalhães.G.B.2004, p. 103-104.

Ainda sobre a seara do Estado Democrático, insta trazer a baila os dizeres do Dr. Ronaldo BrêtassobreoparadigmacomoEstadoDemocráticodeDireito,aoafirmarquedevemsercom-

preendidos como sistemas jurídico-normativos consistentes e informadores da moderna concepção deEstadoereveladorasdasatuaistendênciascientíficas(DIAS,2010,p.57). Maisadiante,asseveraoautor,valendo-sedecitaçõesdenormasconstitucionaisoutrospaíses, sobre a harmonia necessária entre os conceitos acima referidos e a “titularidade” do poder que pertence ao povo, nos seguintes moldes:

Consideramos que a dimensão atual e marcante do Estado Constitucional Democ-rático de Direito resulta da articulação dos princípios do Estado Democrático e do Es-tado de Direito, cujo entrelaçamento técnico e harmonioso se dá pelas normas con-stitucionais.Parasechegaraessaconclusão,impõe-seperceberqueademocracia,atualmente, mais do que forma de Estado e de governo, é um princípio consagrado nos modernos ordenamentos constitucionais como fonte de legitimação do exercí-cio do poder, que tem origem no povo, daí o protótipo constitucional dos Estados Democráticos, ao se declarar que todo o poder emana do povo (por exemplo, pará-grafoúnico,doartigo1°,daConstituiçãobrasileira;artigos3°e10°daConstituiçãoportuguesa;eartigo20daLeiFundamentaldeBonn,aConstituiçãodaAlemanha).(DIAS, 2010,p. 58).

Nos ensinamentos de Kildare Gonçalves Carvalho, Estado de Direito consiste em:

[...] o Estado de Direito, conceito político que serviu historicamente ao liberalismo, vem-se transformando hoje em dia em Estado Legalista, onde nem sempre o cumpri-mento refleteaJustiça,desdequeamultiplicidadeea instabilidadedas leisvêmcomprometendo a justiça. (CARVALHO, 2003, p.273).

Sendo assim, depreendendo as palavras de Kildare Gonçalves, os legisladores com intuito de regular o ordenamento jurídico brasileiro acabaram criando leis instáveis e em exagerado núme-ro, muitas vezes sem acrescentar algo substancial, e ainda em muitos momentos, contradizendo abertamente a própria Constituição Federal, comprometendo a celeridade da justiça. Nessa seara, se a justiça brasileira é comprometida, afetado estará também o que seria Es-tadoDemocráticodeDireitoinseridono“caput”doartigo1ºdaConstituiçãoFederal.Consequente-mente, pode-se perceber uma situação desvantajosa, principalmente para os mais pobres que de-pendem efetivamente e quase que exclusivamente da aplicabilidade da Constituição no exercício de seus direitos básicos, que são cláusulas pétreas garantidos na “Carta Política Brasileira” (CF/88, art.60,§4ºIV)”.Essesdireitosmaisessenciaisficamcomprometidosporleisquecontradizemsuagarantia. Ilusório seria falar de Estado Democrático de Direito sem que haja dignidade da pessoa humana, sendo esta dignidade o mínimo de respeito que qualquer pessoa possa merecer. Embora teoricamente e legalmente estejamos avançados, tais como as principais e maiores democracias do mundo, em termos práticos, há muito de “dignidade” ainda distante da realidade de milhares de brasileiros.Pordignidadeentende-se,nomínimo,justiça,moradiadigna,condiçõesfavoráveisdealimentação e acesso à educação e saúde de qualidade. A Constituição Federal elencou a dignidade da pessoa humana como um dos princípios fundamentais da República Federativa do Brasil, sendo este, uma das maneiras pelos quais as pessoas poderão viver livres, felizes, independentes, realizadas e acima de tudo, respeitadas, sem nenhuma forma de injustiça por parte do “então” apontado Estado Democrático de Direito. Sobre esse assunto, Dalmo de Abreu Dallari disserta sobre a proteção e promoção da dig-nidadedapessoahumanacomoumadasfinalidadesmaisimportantesdaConstituiçãoalémdeacrescentar que:

Por esse motivo, não é uma verdadeira Constituição uma lei que tenha o nome de Constituição, mas que apenas imponha regras de comportamento, estabelecendo uma ordem arbitrária que não protege igualmente a dignidade de todos s indivíduos

e que não favorece sua promoção. A proteção de todos os indivíduos é fundamental, para impedir que uns dominem os outros e para evitar que existam desigualdades sociais profundas e permanentes. (DALLARI, 2010, p. 29).

Vale mencionar que Francys Gomes Freitas, citando Luís Roberto Barroso em seu trabalho “OProblemadaEficáciadosDireitosFundamentaiseaDignidadedaPessoaHumananaSocie-dade Contemporânea”, dissertou, em linhas breves, sobre a dignidade da pessoa humana com os seguintes dizeres:

Dignidade da pessoa humana é uma locução tão vaga, tão metafísica, que embora carregue em si forte carga espiritual, não tem qualquer valia jurídica. Passar fome, dormiraorelento,nãoconseguiremprego,são,porcerto,situaçõesofensivasàdig-nidade humana. (FREITAS, 2010, p. 120)

O princípio da dignidade da pessoa humana esta relacionado aos artigos da própria constitu-ição, tais como: ordem econômica, ordem social, não submissão a tortura ou tratamento desumano e degradante, proibição de qualquer forma de discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais entre outros. Kildare Gonçalves Carvalho também o relaciona com a assistência ju-risdicionalelencadanoartigo5º,incisoLXXIVdaConstituiçãoFederal:“ÉdeverdoEstadoprestarassistênciajurídicaintegralegratuitaaosquecomprovareminsuficiênciaderecursos.” Estaassistênciaégarantidatodasasvezesqueaparteforhipossuficienteenãoconseguirserrepresentadaporadvogado.Emais,aConstituiçãotambémgaranteemseuartigo5º,XXXV,que: “A lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário, lesão ou ameaça a direito.” É ferir a dignidade da pessoa, portanto, quando a justiça permite que alguém reclame um direito seu sem apresençadeumcasuístico,oquesignificadizerqueessecidadãoestásendodeixadodeladoetornando suas possibilidades reais da aplicabilidade da justiça extremamente desproporcionais. Assimoé,pelosimplesfatodenãopossuirconhecimentostécnicossuficientesparaqueaJustiça seja aplicada, maioria absoluta dos casos. É nesse viés que a Teoria Discursiva de Habermas deve ser mencionada. Para se legitimar o direito busca-se auxílio nas bases da comunicação. Entende-se que os jurisdicionados devem ser livres e iguais, para poderem construir a melhor resposta para o caso concreto. Questiona-se: há igualdade quando uma das partes está desacompanhada de um defen-sor? Em sua obra A inclusão do outro, Habermas disserta sobre a equiparação necessária do poder, para se legitimar a decisão judicial, com os seguintes dizeres:

Evidentemente,aalmejadaequiparaçãodesituaçõesdevidaeposiçõesdepodernão pode levar a um tipo de intervenção “normalizadora” que acabe por limitar o espaçodeatuaçãodeseusprováveisbeneficiários,oquese refereàconcepçãoautônoma dos projetos de vida de cada um deles. (HABERMAS, 2002, p. 295)

O professor Dr. Álvaro Ricardo de Souza Cruz menciona que a participação do interessado na prática de um provimento estatal é indispensável para a legitimação do mesmo. Acrescenta quesedevegarantircondiçõesfactíveisparaavalidadedoprovimentojurisdicional.(CRUZ,2006,p.115). 2.2 RELAÇÃO ENTRE ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA, PRINCÍPIO DA AMPLA DEFESA E O DEVIDO PROCESSO LEGAL.

A “Carta Magna”, ao garantir a assistência jurídica integral e gratuita aos pobres no sentido

legalístico, teve a intenção de fazer valer o princípio do contraditório e a ampla defesa, visto que, quando deparavam judicialmente ou administrativamente com a outra parte assistida por advoga-do,ficavaamercêdeamparo. Assim,oslegisladoresintentaramparaprocedimentosquefizessemcomquenãohouvessemais disparidade na assistência jurídica, sendo o Estado obrigado a prover a parte não represen-tada de um defensor. Essa norma permite igualar defesa e acusação com provimento de conheci-mento técnico-jurídico, tornando assim a aplicação da sentença equilibrada entre as partes. Sobre o tema Uadi Iammêgo Bulos esclarece:

Estamatériaéinduvidosamenterelevante.SignificaqueaUnião,osEstados,oDis-trito Federal e os Municípios, ou seja, toda e qualquer entidade política-administra-tiva,têmodeverdeassistirohipossuficiente.AConstituiçãopretendeuasseguraraos necessitados a assistência para a defesa de seus interesses em juízo. Isto não retira a importância dos demais textos legais que contemplem prestação gratuita de serviços aos necessitados. [...]. É importante anotar que a assistência e gratuita prestada pelo Estado – aqui tomado no sentido de toda e qualquer entidade político-administrativa–qualifica-secomojurídica.Taladjetivaçãopossuienormerelevância,porqueoshipossuficiente,alémdedispensadosdodeverdearcarcomaasdespe-sas causadas pelos serviços prestados, também estão isentos do pagamento de todos os atos jurídicos, notariais e quaisquer outros praticados extrajudicialmente em prol daquilo que reivindicam em juízo. (BULOS, 2009, p.394).

Nesse viés interpretativo, Freitas assevera que se reforça a importância do princípio con-stitucional do contraditório e ampla defesa. Relacionam-se, umbilicalmente, com o princípio do devido processo legal (due process of law) também da lavra constitucional e acrescenta que:

A inovação da lei maior foi tremenda posto que a carta revogada previa apenas a existência de tais princípios na esfera penal (art. 153, §16, Constituição de 1969), apesar da doutrina manifestar a aplicação aos processos civis e administrativos. (FREITAS, 2008, p. 130)

Mais adiante, ainda sob o mesmo prisma, pontua o autor com os seguintes argumentos:

No que tange ao contraditório, existe a necessidade de ofertar aos interessados a oportunidade de manifestarem a respeito de todos os fatos a eles imputados e todas as provas contra eles produzidas, contraditando-os sempre que quiser, bem com in-fluireficazmentenaformaçãodadecisãojudicial,postoserumcoroláriodoprincípioda participação democrática (...). (FREITAS, 2008, p. 131)

Assim, deve-se garantir que o acesso à justiça seja igual para todos, sem nenhuma forma de desvantagem ou injustiça. Há que se notar que esta garantia apresentada pela “Carta Cidadã”, aindanãoseefetivouemnossoordenamentojurídico,configurandoentãoumacontradiçãoemsimesmaquenãogaranteoqueafirmadeformaimperativa.3 LEI 9.099/95 – ANÁLISE À LUZ DO ACESSO À JUSTIÇA

3.1 Princípios e objetivos

A celeridade da justiça e a inviabilidade da morosidade de julgamentos que duravam um longotempo,proporcionaramaideiadeumtribunalsimplificadoquepudessefinalizarpequenas

questõesemumtempomenore,preferencialmente,decomumacordoentreaspartesdiscord-antes. Esse procedimento ainda tem uma vantagem extra para o Estado na questão econômica, vistoquedemandamenosprofissionaisemenoscustosprocessuaiscomoumtodo,sendoqueametade dos servidores envolvidos nestes processos, são oriundos das faculdades de direito, na condição de estagiários. Um ganho duplo, pois o Estado lucra com salários e despesas trabalhistas e o estagiário ganha em conhecimento adquirido, relacionamento pessoal e ambientalização com a linguagem e o proceder jurídico. Com esse intuito, de proporcionar às partes um acesso mais fácil e rápido ao Judiciário, foi sancionado em 1995 pelo então Presidente da República, Fernando Henrique Cardoso a Lei 9.099,objetivandofazervaleroquedispõeoincisoIdoartigo98daConstituiçãoFederal.Boaventura, elucidou sobre a criação dos juizados com as palavras:

Osjuizadosespeciaisestaduais,primeiramentecriadosedisciplinadospelaLeinº9.099/95,sãocompetentesparadecidircausasdemenorcomplexidadedefinidasemvirtudedovalor(até40saláriosmínimos)oumatéria.Posteriormente,aLeinº10.259/01 criou os juizados especiais federais com competência para causas com valor até 60 salários mínimos.(SANTOS, 2007. p. 42).

Assim, como admitido pela “Lei Maior” da República Federativa do Brasil, foram criados os Juizados Especiais Estaduais, competentes para julgar as causas cíveis de menor complexidade e asinfraçõespenaisdemenorpotencialofensivo,garantindoaLei9.099,emseuartigo2º,que“osprocessos seriam orientados pelos critérios da oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade, buscando, sempre que possível, a conciliação ou a transação penal”.

Sobre o tema, Antônio Pessoa Cardoso, desembargador do Estado da Bahia, diz, em tom crítico e analítico:

A celeridade deveria ser o alicerce da credibilidade do Juizado, mas já não se encon-traagilidadenoatualsistemainformal.Ocidadãotemdificuldadeparaapresentaraqueixa, para ser chamado para a sessão de conciliação e para a instrução. Aliás, o texto da lei em vigor, Lei 9.099/95, já não se presta como procedimento para solução dasreclamações,porquantoocaminhoatualmenteseguidoestánoformalCódigode Processo Civil. (CARDOSO,2010, p. 1)

Para o desembargador a celeridade processual estabelecida na Lei 9.099/95 não passa de pura ilusão. Na prática, percebe-se que a enxurrada de recursos e o excesso de processos para seremjulgados,dificultaamarcaçãodeumanovadata,confirmandoafaladeAntônioPessoa.

3.2Análisedoartigo9ºdalei9.099/1995

Comaintençãode“minimizar”amorosidadedastramitaçõesprocessuaiseproporcionaracessoàjustiçaparatodos,oslegisladoreselencaramnareferidalei,oartigo9º,quegaranteque:“Nas causas de valor até vinte salários-mínimos, as partes comparecerão pessoalmente, podendo serassistidasporadvogados;nasdevalorsuperior,aassistênciaéobrigatória” Bom, soa como uma grande novidade e um porto de oportunidades para muitos que pos-suemquestõesaseremresolvidas,eque,sozinhosesemoauxíliodaleioudeumtribunalficariamsem retorno. Os Juizados Especiais, ao tratarem de causas de pequeno valor, abriram precedentes para alguns tipos de demanda. Vale destacar que, com esse novo regramento jurídico, sem a necessidade de contratar ad-vogado nas causas de até 20 salários mínimos, caso uma parte se senta “desprotegida” perante a outra que está em juízo acompanhada de advogado, poderá requerer ao magistrado que nomeie

um defensor público para defendê-la. Comtantoscasosficaadúvida:seráqueoEstadodisponibilizarádefensorespúblicosparatodos os litigantes perante os “Juizados de Pequenas Causas”? Podemos pensar em pleno acesso à justiça para todos diante dessa norma? É possível in-gressar com uma ação sem a necessidade de constituir advogado, segundo o que diz a lei?

4-DA(IN)CONSTITUCIONALIDADEDOARTIGO9ºDALEI9.099/95

4.1 Aspectos constitucionais

A Lei dos Juizados Especiais Estaduais, aparentemente, foi uma grande novidade positiva paraaspartesmenosabastadas.Deu-seaimpressãodequeficoumuitofácilresolverpequenosproblemas do cotidiano, com pequena complexidade e que até mesmo poderiam ser solucionados sem necessidade da justiça formal. Por outro lado, quando do momento de se apresentar uma contestação ou impugnação, váriosargumentosequestionamentos sãoapresentados sobrepontos insignificantes, emnadainfluenciandonodeslindedaquestãoeperdendo-setempoprecioso. Desta forma, nos mostra Pablo Drews Bittecncourt:

“[...] o que é realidade, a própria cidadania sai maculada se não há igualdade de meios técnicos,quandoumaparteédefendidaporprofissional habilitadoeoutranão, fazendo com que o mais fraco seja entregue à própria sorte, à sua inexperiência eaodesconhecimentodosprocedimentosedoaparelhojudiciário,podendoaofinala parte merecedora do direito sair frustrada por não saber se defender.” COSTA. 2001, p. 1

Assim,aprópriaConstituiçãoFederalde1988emseuartigo5º,incisoLXXIV,garanteque:“oEstadoprestaráassistênciajurídicaegratuitaaosquecomprovareminsuficiênciaderecurso”.Essa “assistência jurídica” refere-se claramente à nomeação de um defensor para os comprovada-mentesemrecursosfinanceirosparacontratarumprofissionaldodireito. Contraditoriamente, surge a Lei 9.099 em 1995 e muda toda a conjuntura constitucional deste inciso, tirando da responsabilidade do Estado o dever de prestar assistência jurídica. Ade-mais,comestainovação,diminuiu-semuitoaatuaçãodoadvogado,sendoesteumprofissionalindispensável em causas de pequeno valor ou não. NomesmomomentoemquefoipromulgadooincisoLXXIVdoartigo5º,daCRFB,foiprom-ulgado também o artigo 133, que determina o seguinte: “O advogado é indispensável à adminis-traçãodajustiça,sendoinviolávelporseusatosemanifestaçõesnoexercíciodaprofissão,noslimitesdalei.”Acontradiçãoestáexplícitanesteconflitodeduasleisquerezamocontrárioumadaoutra. Sobre a indispensabilidade do advogado Uadi Iammêgo posiciona da seguinte maneira:

“A advocacia é serviço público, igual aos demais, prestados pelo Estado. O advoga-do não é mero defensor de interesse privados. Tampouco é auxiliar do juiz. Sua atividade, como particular em colaboração com o Estado é livre de qualquer vínculo de subordinação para com magistrados e agente do Ministério Público” (STJ, MS 1.275/91, rel. Min. Humberto Gomes de Barros, RDA, 189.283). BULOS, 2009, p. 1.152

Uma grande desordem impôs o legislador no Judiciário ao criar a Lei 9.099/95, ferindo as normas constitucionais bem como o princípio da dignidade da pessoa humana, mencionado neste trabalho. A lei é contraditória em si, e ora fala da imprescindibilidade da presença do advogado, ora estenãofazfaltaalguma.Conflituoso,não? Insta-se registrar que Pablo Drews Bittencourt faz menção sobre o tema, senão vejamos:

“não pode haver qualquer exceção, dado o amplo alcance do art. 133 da Constitu-ição.Oprincípioéclaroaoafirmarqueoadvogadoéindispensávelàadministração

da justiça, não admitindo a postulação direta das partes, tornando-se então incon-stitucionalaLei9.099emseuartigo9º,distorcendooconteúdodoart.133daCon-stituição Federal, já que tal norma não faz qualquer ressalva à indispensabilidade do advogado na administração da justiça.” COSTA. 2001, p. 1

Se a “Maior de todas as Leis” descreve que o advogado é indispensável à administração da justiça,umaanálisedaaplicabilidadedoartigo9ºdaLei9.099/1995deveserfeitaminuciosamente,visto que ocorrem casos nos Juizados Especiais Estaduais sem a presença de advogado. Essa prática torna a referida lei passível de questionamento quanto a sua inconstitucionalidade. Uma lei complementarnãopodesobrepor-seàConstituição.Nessecaso,existeumconflitoconstitucionala ser resolvido. Sobre a importância da presença do advogado nos procedimentos judiciais, Ronaldo Brêtas de Carvalho Dias ao discorrer sobre a “Duração Razoável do Processo e devido processo Legal” em sua obra: “Processo Constitucional e Estado Democrático de Direito” nos mostra esta prescindi-bilidade nas seguintes palavras:

[...] não pode o Estado suprimir o contraditório ou olvidá-lo na construção normativa dos procedimentos, como também lhe é defeso dispensar a presença do advogado ou do defensor público no processo, eliminar o duplo grau de jurisdição, abolir a instrumentalidade das formas, restringir o direito das partes à produção de provas lícitas ou dispensar o órgão jurisdicional de fundamentar racionalmente suas de-cisões.Arestriçãodequaisquerdessasgarantiasprocessuaisconstitucionais,sobacanhestrajustificativadeagilizaroutomarcélereoprocedimento,revela-seincon-stitucional e antidemocrática, somente prestando para estimular o arbítrio dos juízes, fomentar a insegurança jurídica e escarnecer da garantia fundamental do devido processo legal, em resumo, deslavada e grosseira agressão ao modelo constitucion-al do processo concebido pelo Estado Democrático de Direito brasileiro, verdadeira fraude à Constituição. (DIAS, 2010, p. 156).

Desta forma, segundo Dr. Ronaldo Brêtas, dispensar o advogado ou defensor público, que é uma garantia processual constitucional, é fraudar a “Lei Suprema” deste país. Notadamente, a referida lei mencionou a implantação do serviço de assistência judiciária peranteosJuizadosEspeciais,oquepermaneceusónopapel,comoseverificanodispositivole-gal do artigo 56 da Lei 9.099/1995: “Instituído o Juizado Especial, serão implantadas as curadorias necessárias e o serviço de assistência judiciária”. Assim, podem-se questionar a validade de todos os procedimentos feitos sem a presença de advogados e defensores públicos, baseados nos dita-mes da própria lei 9.099/95. Issoseriaumdesastre,vistoquemuitasdecisõestomadasteriamqueseremrevistaseàsvezes até revogadas, causando enormes prejuízos a inúmeras pessoas. Por indispensável, en-tende-se a obrigatoriedade da presença do advogado em todo e qualquer processo, mesmo em casos chamados de “simples”, em que, aparentemente o defensor não seria necessário. 4.2 Normas infraconstitucionais

Além dos ditames da CF/88 que regulam a indispensabilidade do advogado perante a justiça, existemtambémnormasinfraconstitucionaisquetratamdoassunto.Vejamosoquedispõeoartigo36 do Código de Processo Civil:

“Art. 36 – A parte será representada em juízo por advogado legalmente habilitado. Ser-lhe-á lícito, no entanto, postular em causa própria, quando tiver habilitação legal ou, não a tendo, no caso de falta de advogado no lugar ou recusa ou impedimento dos que houver.” BRASIL. Lei 5.869, de 11 de janeiro de 1973. Institui o Código de

Processo Civil.

O código que regula o processo civil brasileiro trata da importância da parte ser representada em juízo por advogado habilitado, como garantia de justiça efetiva e equilibrada. Em seguida, há que se notar também que o Estatuto da Advocacia e Ordem dos Advogados do Brasil – OAB (Lei 8.906/94) reservou o capítulo I para tratar das atividades do advogado, sendo queoartigo1ºmencionaque:

São atividades privativas de advocacia:I–apostulaçãoaqualquerórgãodoPoderJudiciárioeaosJuizadosEspeciais;II – as atividades de consultoria, assessoria e direção jurídicas. [...]BRASIL. Lei 8.906,de04dejulhode1994.DispõesobreoEstatutodaAdvocaciaeaOrdemdosAdvogados do Brasil

Claro está a associação lógica e legal dos conteúdos dos dispositivos do Código de Proc-essoCivil,doartigo2ºdaLei8.906/94eoartigo133daConstituiçãoFederalde1988,repetindosobreaindispensabilidadedoprofissionaldodireitonaadministraçãodajustiça. Veja-seoquedeterminaoartigo2ºdoEstatutodaAdvocaciaeOrdemdosAdvogadosdoBrasil: “O advogado é indispensável à administração da justiça”. Vale sublinhar que se trata de uma necessáriarepetiçãodoquedizaConstituição,reafirmandopois,ainconstitucionalidadedospro-cedimentos feitos sem um advogado. Neste sentido, discorre Walter Gustavo da Silva Lemos:

Olegislador,aodefinirsobreadisponibilidadedaassistênciaadvocatícia,atuoucon-tra legem, vez que não coadunou este regramento com a legislação sobre a advo-cacia.Tal pensamento também é descrito pelo Desembargador goiano Roldão Oliveira de Carvalho em sua obra Juizados Especiais Cíveis e Criminais – Comentários a Lei n. 9.099, ao assim lecionar:“Penso que o legislador andou cochilando ao editar esta norma. Feriu a um só tempo oartigo133,parteinicialdaConstituiçãoFederale2ºdaLein.8.906/94.Ademais, o que dita a maior ou menor complexidade da causa não é o seu valor econômico.”“Este pensamento é correto, pois dá à parte a decisão sobre a conveniência de ser patrocinado ou não por advogado, o que não é bom para a perfeita administração da justiça.” LEMOS, 2004, p.1

Por essa razão, para a administração da justiça, o constituinte estabeleceu expressamente a presença do advogado nos procedimentos perante a justiça, não mencionando em momento al-gum,adispensabilidadedoprofissionaldodireito,emcontradiçãocomalei9.099/95. Repisa-se que há uma inconstitucionalidade da lei 9.099/95 a ser resolvida. 4.3 Atitudes do juiz para equilibrar as partes e suas consequências processuais – Violação da imparcialidade?

Ao presenciar um julgamento em que as partes estão em desigualdade de vantagens, o juiz, muitadasvezes,acabaporassumirparasiaresponsabilidadedeumapossíveldecisãofinalcom-prometida com equívocos que seriam evitados caso houvesse um advogado amparando o cidadão em sua necessidade argumentativa. Agindo assim, acaba ferindo o princípio da imparcialidade estabelecido no Código de Processo Civil em seu artigo 125. Vejamos:

“Art.125–OjuizdirigiráoprocessoconformeasdisposiçõesdesteCódigo,com-petindo-lhe:I–asseguraràspartesigualdadedetratamento;

II–velarpelarápidasoluçãodolitígio;III–preveniroreprimirqualqueratocontrárioàdignidadedajustiça;IV – tentar, a qualquer tempo, conciliar as partes.

Pela letra da lei, impossível que o magistrado consiga alcançar esse objetivo sem um ad-vogado, visto que as partes estão desasseguradas de igualdade e a possível conciliação pode ser injusta,por faltadeconhecimentotécnicosobreoassuntobemcomoporfaltadecondiçõesdeavaliar com destreza aquilo a que a pessoa teria direito. No procedimento da lei em comento, quando as partes não alcançam a conciliação, é des-ignada a Audiência de Instrução e Julgamento, após as partes serem esclarecidas de que poderão apresentar todas as provas admissíveis em juízo, apresentar rol de testemunhas com antecedên-cia, inclusive apresentar defesa oral e escrita. Neste momento do processo passa a se tornar in-justo ao permitir que alguém esteja desacompanhado de um defensor, pois estará em um nível de desvantagem ainda maior. Apresentada a defesa, a lei no seu artigo 31 parágrafo único que “o autor poderá responder ao pedido do réu na própria audiência ou requerer a designação da nova data, que será desde logofixada,cientestodosospresentes”.Todavia,quandoapartedeparaemaudiênciacomumacontestaçãoacompanhadadepreliminaresedocumentos,ficasemsabercomoagir.Omagistrado“perde” um bom tempo tentando auxiliá-la, o que, na maioria das vezes, acaba designando nova data de audiência de instrução e julgamento esclarecendo a parte desassistida sobre a necessi-dade de constituir advogado para representá-la, concedendo prazos para tal diligência. Não há possibilidades reais de “aceleração” do processo judiciário, estendendo-se por um período muito superior ao que foi regulado pela lei. Questiona-se a agilidade desse feito, em espe-cialemrelaçãoaoartigo5º,LXXVIIIdaConstituiçãoFederalde1988,sobreaduraçãorazoáveldoprocesso. ÉexatamentenestecontextoqueAntônioPessoaCardosoafirma:

“Ondenãoháagilidadenãohájuizado;verdadeiraestaassertiva,e,ninguémpodecontestá-la,constata-seatotaldesfiguraçãodosJuizadosEspeciais,tornandomaisdistante o sonho dos que acreditam na expressão de poder “procurar seus direitos” ao invés da outra de agrado dos poderosos “vá procurar seus direitos”. CARDOSO, 2010, p. 1)

Destarte, a importância do acompanhamento de advogado perante os Juizados Especiais Estaduais,vistoquesemeleadificuldadedoreclamanteconseguiroseuobjetivoserámaissig-nificativa,enumdeterminadomomento,ocasuísticoseráabsolutamenteindispensávelnotrâmiteprocessual. Também há de se ressaltar, que a parte não sabe que poderá formular um pedido con-traposto (art. 17, parágrafo único) em audiência ou antecipadamente via petição, tornando-se essa outradesvantagemparaodesassistido,poisestedesconheceoquedispõeaLei9.099/95. Pelo que se vislumbra, a parte sem advogado quase sempre esta em desvantagem nas cel-ebraçõesdeacordoetransações,vistoqueédesprotegidadeconhecimentostécnicosejurídicos,aceitando às vezes valores bem inferiores aos pleiteados. Visualiza-se um total disparate, uma parcialidade da aplicação da justiça nesses casos. Tal entendimento nos traz a baila que para não haver parcialidade por parte do juiz, é preciso que haja pelo menos igualdade entre as partes. Se estiver representada por procurador e a outra não, não há que se falar em igualdade. A parte não representada comparece perante a justiça, absurdamente em grande desvantagem àquela assistida, visto que é desprovida de conhecimento técnico e de argumentos de acordo com a lei. Assim, não conseguirá, de fato, fazer valer seu direito garantido pela CRFB/88, sendo prejudicada por completo e tendo seus direitos desrespeitados e sua dignidade ferida. Dessa forma, a desigualdade de representação não faz com que seja cumprida a justiça. Nota-semaisumprincípioconstitucionalviolado,sendoesteelencadonocaputdoartigo5ºda“Carta Política”, veja-se o texto constitucional:

“Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: [...]”.

Desta forma, explica Bulos:

A igualdade é a regra de ouro, que serve de diretriz interpretativa para as demais normas constitucionais. Regra de ouro no sentido de mandamento nuclear de todo o produtoconstitucionallegislado,poistodasasdemaisprescriçõesdestaConstituiçãoconvergem-se a ela. [...]. Além da isonomia, também são invioláveis o direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, que se postam com lídimos princípios nucleares da ordem constitucional brasileira. (BULOS, 2009, p.113).

Igualdade perante a lei seria o alicerce de uma verdadeira justiça. É impossível pensar a justiçasemaigualdadedeoportunidadedeacusaçãoedefesadeambasaspartes.Ajustiçaficacomprometida,sendooresultadofinalquasesempreemproldaquelequemaiscondiçãotemdese defender ou se fazer acompanhar daquele que tem o conhecimento técnico, indispensável para uma argumentação convincente ou lidar com as provas em questão. Dessa maneira, os mais “pobres”, via de regra, saem perdendo quase sempre em virtude dessa igualdade que deveria ter sido garantida pela lei. Se esta igualdade esta sendo manchada por criaçãode leis sem reflexão, cabeaosmembrosdopoder judiciário, tentarminimizar seusefeitos tendo em vista a garantia da imparcialidade da justiça que deve ser aplicada a todos, sem qualquer tipo de distinção.

6 HÁ DIMINUIÇÃO DA CAPACIDADE PROBATÓRIA?

Ao se postular uma ação, independentemente de sua complexidade e de seu valor, torna-se necessário que o demandante tenha ciência de que existem muitos conceitos, princípios e termos jurídicos, que efetivamente farão uma grande diferença na hora da aplicabilidade do contraditório e ampla defesa, prazos e no momento de fazer qualquer requerimento. Desta forma, quando a parte está assistida por advogado (defensor) existe um amparo mel-hor. Em contrapartida, a outra parte desassistida e desprovida de conhecimentos técnicos e jurídi-cos, estará à mercê da aplicação de uma justiça parcial, que, muita das vezes, não levará em conta se houve desigualdade ou não. Simplesmente aplicará o direito, como estabelece a lei. Assim, a capacidade probatória de uma parte desassistida é realmente inferior àquele com possibilidade de contratar um bom casuístico. Nota-se aqui, a possibilidade e ou a quase certeza de se cometer uma injustiça, visto que não há garantida a igualdade de direito à parte desassistida de um procurador. Verifica-sequeoprincípiodeigualdadejurídicaédesrespeitado. Exige-se ainda acrescer que o artigo 41 §2° da mencionada lei determina que no caso de recurso, a parte deve ser representada por advogado. Mais uma discrepância da própria legislação, uma vez que nesse momento não faz qualquer menção a valores. Nesse aspecto, a capacidade probatória também se encontra violada, uma vez que a parte deverá contratar um advogado que não participou da audiência de instrução e julgamento e deverá providenciar o recurso sem ter es-gotado todas as provas que deveriam ser apresentadas ao juízo para que o convencesse de que seu então cliente tinha razão na demanda. Nessesentir,hátambémainfringênciadaTeoriadiscursivadeJüngerHabermas,postoqueaspartesnãoestãoemigualdadedecondiçõesparaconstruçãodadecisãolegítimaparaocasoconcreto.

6 CONCLUSÃO Aparentemente a necessidade e a garantia da celeridade de causas menos complexas e mais facilmente resolvidos nos Juizados Especiais Estaduais, é uma tentativa nobre de facilitar a

vidadaspessoas,que,emoutrosmomentos,teriamuitomaisdificuldadesparaterasoluçãodeproblemas. Salienta-se, entretanto que um Estado ao intitular-se Democrático de Direito e possuir a dig-nidade da pessoa humana como centro de seu ordenamento jurídico, imagina-se que um indivíduo conviva com um bom nível de acesso à saúde, educação, moradia, trabalho e justiça. Ao concluir este trabalho, o paradoxo entre lei e justiça se mostra evidente pela percepção de que a dignidade ditada pela Constituição Federal de 1988 não se faz concreta na realidade brasileira, aliás, estando ainda muito distante sua aplicabilidade prática. Em consonância com o exposto nesse texto, que não tem a intenção de esgotar o assunto, está cristalino que há infringência a vários dispositivos constitucionais e legais a ausência do ad-vogado nas causas de menos de vinte salários mínimos no Juizado Especial Estadual. Constatou-se,ainda,queadificuldadedoacessoàdecisãoproduzidacomequiparaçãodeoportunidades probatórias é mais marcante na vida dos mais pobres, tendo em vista que a digni-dade e justiça lhes são negadas. EspecificamentecomrelaçãoaosJuizadosEspeciaisEstaduais,énotório,quealeifavoreceao que pode contratar um bom advogado. Há um comprometimento sério da aplicabilidade da justiça, em face da desigualdade ex-istente entre aquele que se faz representar pelo advogado e o que não se faz, desprestigiando-se o ditame constitucional do artigo 5° LXXIV. É impossível falar em uma verdadeira justiça diante dessa substancial diferença. Há que se estudar e rever algumas práticas, para que de fato, a justiça seja alcançada e a Teoria habermasiana colocada em prática para que tenhamos uma decisão baseada no diálogo quejustificariaaaplicaçãododireito,baseando-sesemprenaampladefesaeascircunstânciasdocaso concreto.

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ANALISE DO RISCO DE MERCADO NA PRODUÇÃO SOJA BRASIL

Leandro Maia Fernandes1

Resumo:Oobjetivodestetrabalhofoianalisarograuderiscodepreçodasprincipaisregiõesprodutoras de soja do Brasil. Para o desenvolvimento do trabalho foi utilizada como metodologia a análise de probabilidade juntamente com o Método de Monte Carlo. Pôde-se concluir que existe uma relativa diferença de preços entre as praças produtoras e que o Estado com maior dispersão de preços pagos aos produtores foi o Paraná e a região com a menor dispersão de preços em torno do preço médio foi o Estado de São Paulo.

Palavras Chave: Risco, preço , soja

Abstract: The goal this paper was to analysis the price’s risk of the mains markets of the soy in the Brazil. To development this paper was used the Monte Carlo`s analysis together with prob-ability analysis. The conclusion was that there’s a relating divergence between the prices in the producers markets and that the Paraná have the biggest prices dispersion around middle price and the São Paulo State have the smallest dispersion price.

KeyWords: Risk, price, soy

1-INTRODUÇÃO

Dentretodosossetoresprodutivospode-seafirmarqueaagriculturapossuialgumascara-cteristicas que a diferenciam das demais atividades econômicas. Dentro dessas peculiaridades residem os fatores que fazem desta, uma atividade de risco, e, dentre tais riscos alguns são menos oumaisprevisíveisdoqueoutros.Damesmaforma,existemmeioseficientesdeproteçãocontraalgunsfatores,enquanto,emfacedeoutros,oprodutorficasendo,emúltimainstância,otomadorexclusivo do risco. Nesse sentido, o entendimento do que é risco e de seus diferentes efeitos sobre a rentabilidade da atividade agrícola constitui-se num aspecto de grande importância na tomada de decisõesdosprodutores. Desse modo, na administração de uma atividade agrícola deve-se considerar os principais tipos de riscos. Os riscos mais comuns são: risco de produção e risco de preço. O risco relacionado com a oscilação da produtividade agrícola é o risco de produção. Os principais fatores responsáveis pelo risco de produção são os problemas climáticos, as pragas e doenças e a disponibilidade de fatores de produção, que podem alterar o nível de produção dos diversos empreendimentos e contribuir para aumentar o risco de preço (FERNANDES,2001). Oriscodepreçorefletenumavariaçãodarendadoprodutor,emconseqüênciadasvari-açõesnospreçosdemercadodosprodutos,osquaissemodificamcomrelativafreqüêncianoanoagrícola.Comoaproduçãoagrícolanãoéinstantânea,écomumocorreremalteraçõesnasexpec-tativasdepreçose,conseqüentemente,noretornofinanceirodaatividade(FERNANDES,2001). Deste modo, ao contrário do que acontece com a maioria dos preços dos produtos de outros setoresdaeconomia,ospreçosagrícolassofremvariaçõesdejaneiroadezembrodecadaano,talsazonalidadeécausadapelasafraeentressafra.Taisvariaçõesestacionaisdospreçosagrícolastêmorigemnascondiçõesclimáticasebiológicaspelo ladodaofertadoproduto,aopassoquevariaçõesculturaisesociaisotêmpeloladodaprocura. A produção de soja não está alheia a estas características da produção agrícola.Os fatores causadores do risco de preço da soja brasileira são tanto externos quanto internos. No âmbito internacional pode-se destacar a dependência com relação ao mercado estadu-nidense.Mesmosendoosegundomaiorprodutor,oBrasilaindatemseuspreçosinternosinfluen-ciados pelo mercado de Chigaco, isso faz com que os preços internos variem de acordo com as variaçõesdaproduçãoeexpectativasdoscomerciantesamericanos,emoutraspalavras,opaísé1 Mestre em economia pela UFV e Professor de economia da Faced

um tomador e não um formador de preços. Alémdasvariaçõesdademandaeoferta internacionaloprodutorsedeparacomasos-cilaçõesdovalordamoedanacionalemrelaçãoaodólar,taisvariaçõespodemestimularoudeses-timularasexportaçõesdesojaviapreço,ouseja,ocâmbiotambéméfontedeoscilaçãodopreçoda soja. Internamente,asflutuaçõesdepreçossãogeradaspelaconcentraçãotemporaldaproduçãoepelasespeculaçõesnaintermediaçãoentreaproduçãoeoconsumo.Afaltadepolíticadecrédi-tos, de garantia de preços mínimos e a baixa utilização de mercados de futuros também contribuem para aumentar o risco de preço da soja. O grande descompasso entre o crescimento da safra e a expansão e distribuição da rede de estocagem é outro fator que tem afetado o preço da soja, pois contribui para um maior desequilíbrio entre oferta e demanda. Tal efeito tem sido cada vez mais observado no Brasil nos últimos anos. Nosanosde2002e2003notou-sequehouveumasignificativadepreciaçãodopreço,issoacon-teceu principalmente pela falta de armazéns para estocar a soja produzida.

Figura 1-Evolução dos preços médios recebidos pelos produtores - sc 60 kg

Fonte: Agrianual

Estudos nessa área podem servir de suporte para a determinação de seguros agrícolas bas-eados nos retornos apresentados pelas culturas e podem servir para um planejamento da produção maisdetalhadoeconseqüentementeminimizaroserrossobreasprevisõesderentabilidadedaprodução de soja, ou seja, podem ser utilizados como importantes instrumentos de tomadas de decisão para os produtores. O objetivo deste artigo é analisar o risco de preço da soja em alguns estados selecionados.Especificamente,pretende-seanalisaradispersãodospreçosemtornodoseuvalormédioecalcu-larasdistribuiçõesdefreqüênciaacumulativasdopreçodemercadodasojanosestadosselecio-nados. O presente estudo está estruturado em três partes, além da introdução. A segunda parte do artigo é composta pela metodologia, onde é feita uma discussão sobre modelo teórico adotado e dados utilizados. A secção seguinte trata da análise dos resultados obtidos e a última parte do tra-balhoéformadapelaconclusãoerecomendações.

2. METODOLOGIA

Para o desenvolvimento desta pesquisa, os dados, de característica secundária, foram obti-dos da Revista Agrianual e Companhia Nacional de Abastecimento (CONAB).Os dados utilizados são preços médios anuais pagos ao produtor pela saca de 60kg no período de 1994 até 2003 nos principais estados produtores. O passo seguinte foi determinar o tipo de distribuição de probabilidade a ser usada na

simulação. Finalmente foi feita a análise de probabilidade, para isso utilizou-se a técnica de Monte Carlo.

2.1-Oriscoeasdistribuiçõesdeprobabilidade

Asituaçãoderiscopressupõeoconhecimentodeumnúmerosuficientedevaloresobser-vadosdosdados,flutuandoàvoltadeumvalormédiocentral,oquepossibilitaumaestimativadeprobabilidade de ocorrência desse valor central entre limites calculados. DeacordocomHOWELLS&BAIN(1998),oriscoemgeralédefinidocomoaprobabilidadedo retorno efetivo diferir do retorno esperado, o mesmo pode ser medido pelo exame do grau de variaçãodoretornonumdeterminadoperíodo,ouseja,oriscoéverificadopelograudedispersãodos retornos reais em torno de um valor médio. SHAPE(1978)defineoriscocomoadistribuiçãodeprobabilidadesdosfuturosretornosdoinvestimento. Risco é a variabilidade do retorno, ou instabilidade dos possíveis retornos de um in-vestimento, sendo que o grau de risco é função do valor econômico e da produtividade da cultura. Há uma diferenciação clara entre risco e incerteza, o risco pode ser considerado como uma situação onde os eventuais resultados obedecem a uma distribuição de probabilidade conhecida, e incerteza como uma situação na qual nada se conhece da forma de ocorrência dos resultados. Por isso, o conhecimento e estudo dos conceitos de distribuição de probabilidade são de fundamental importância para a análise de risco. As variáveis econômicas são, por sua própria natureza, aleatórias, pois não se sabe quais serão seus valores senão após observá-las. Desta forma a probabilidade torna-se uma maneira útil deexpressarasprevisõessobreeventoseresultadoseconômicos(HILLetal.,1999). Paraadefiniçãodotipodedistribuiçãodeprobabilidadeaserutilizada,deve-sefazerusodetodasasinformaçõespossíveis.Comoestasvariamdecasoparacaso,foramestabelecidosváriosformatosouperfisdedistribuições,osquaisseadequamàmaximizaçãodousodasinformaçõessobre a variável que esta sendo objeto de análise. Assim a determinação do tipo de distribuição de probabilidade a ser adotada é um passo importante para derivar o grau de risco de um em-preendimento.Aprimeiradistinçãoentreasdistribuiçõesdeprobabilidadeséaquelaquedivideasvariáveis aleatórias em discretas e contínuas. SegundoPOULIQUEN(1970),aformamaissimplificadadeumadistribuiçãodeprobabili-dade aleatória é a distribuição discreta. A cada valor da variável aleatória é atribuída uma probabi-lidade de ocorrência. Esta distribuição é útil quando a variável aleatória pode assumir um pequeno número de resultados. De acordo com GUJARATI (2000), uma variável aleatória continua é a que pode assumir qualquervaloremalgumintervalodevalores.Asvariáveisaleatóriascontinuaspossueminfinitosvalores em um intervalo contínuo, assim, não é possível atribuir probabilidades a cada valor par-ticular de X, pois os valores não são numeráveis e a soma das probabilidades de todos os valores deve ser um. Deste modo, a distribuição de probabilidade da distribuição continua é caracterizada porumafunçãodensidadedeprobabilidadequedevesatisfazerasseguintespressuposições:

A) f (x) 0, para todo x,

B) f (x) dx = 1,

C) f(x)dx=P(a≤x≤b),paraa<b.

A primeira condição estabelece a não negatividade das probabilidades, a segunda diz queaprobabilidade,dadapelaáreaabaixodacurva,éunitárianointervalo-∞a+∞,istoé,paratodos os valores possíveis de xi, a terceira condição estabelece que a probabilidade de um valor de Xificarentreospontosaebédadapelaáreaabaixodacurvadefunçãodedensidadedeproba-bilidadedelimitadapelospontosaeb(MEYER,1983).

Quando há inúmeras variáveis empíricas distribuídas segundo um modelo normal e suas distribuiçõessãosimétricasemrelaçãoàmédia,temosachamadadistribuiçãonormal.OTeoremado Limite Central diz que esta distribuição é caracterizada pelo fato de haver uma variável aleatória formada por n variáveis independes terá uma distribuição normal quando o n for muito grande. A distribuiçãonormaltalvezsejaamaisconhecidadetodasasdistribuiçõesdeprobabilidadeteóri-cas, cujo desenho em forma de sino é familiar a qualquer um que conheça estatística,a função de distribuiçãonormalservedebaseparaadefiniçãodeoutrasdistribuiçõesimportantescomoadis-tribuição de Qui-quadrado, a distribuição t de Student e a distribuição F Além da distribuição normal também pode-se destacar a distribuição do tipo Log-Normal, Exponencial, Gama, Beta e Weibull (CARMO, 2000). Há também uma outra importante distribuição de probabilidade chamada triangular. Tal dis-tribuiçãoébastanteutilizadanaanálisederisco,porquepermiteumaboaflexibilidadequantoaograu de assimetria, o que pode permitir uma característica positiva para a estimação subjetiva da distribuição.Estaédefinidaportrêsparâmetros:ovalormínimodavariávelX(a),ovalormédio(b)eovalormáximo(c)(DILLONeHARDAKER,1980;NEVES,1984;AZEVEDOFILHO,1988). A função densidade de probabilidade da distribuição triangular é dada por:

f(x) = se a x b

f (x) =seb<x≤c

A média da distribuição trian- gular é E(X) = e a variância é dada por:

σ2(X)=

Paraserútilaomáximo,todaanálisederiscodeveterumvalordefinido,umamedidamuitoimportante é o calculo do desvio padrão e da variância. Quanto menor é o desvio padrão e a var-iância mais reduzida é a distribuição de probabilidade e assim mais reduzido será o fator de risco. Utiliza-se a seguinte fórmula para o cálculo da variância:

σ=∑Pk(Rk–R)2

Onde:σ=variânciaPk = probabilidade de ocorrência do eventoRk = valor de cada evento consideradoR = retorno esperado

O desvio padrão é dado pela raiz quadrada da variância, é um desvio médio ponderado pela probabilidade do valor esperado que dá uma idéia de quanto acima ou abaixo do valor esperado o valor real provavelmente irá ocorrer.

2.2- O método de Monte Carlo

Entre os métodos de simulação que utilizam probabilidade na análise de riscos o método de Monte Carlo é o mais prático e um dos mais usados. Este método é baseado no fato de que a freqüênciarelativadeocorrênciadeumcertofenômenoaproxima-sedaprobabilidadematemáticado mesmo, quando a experiência é repetida várias vezes (CLARK & LOW, 1993). AseqüênciadoscálculospropostanométododesimulaçãodeMonteCarloconstadequa-tro etapas, que são:

a)Identificaradistribuiçãodeprobabilidadedasvariáveisrelevantes.Nocasodestapesquisaa distribuição usada foi a triangular.

b) Simulação de valores aleatórios, esta etapa consiste em utilizar o computador para gerar, aoacaso,umvalorparacadavariável,apartirdasdistribuiçõesdeprobabilidadeanteriormenteidentificadas. c) Calcular o valor das variáveis de estudo, cada vez que for feito a seleção ao acaso como indicado no item b. d)Acumulação dos valores, repetindo-se as etapas “b” e “c” cinco mil vezes,assim gera-se a distribuição de probabilidade para cada praça produtora de soja (PALISADE,1995).

3- ANÁLISE DOS RESULTDOS

Por meio da simulação pôde-se notar que o estado que apresentou o maior preço médio simulado pago ao produtor foi o estado de São Paulo, seguido respectivamente pelos estados do Rio Grande do Sul e Paraná. O estado do Mato Grasso possui o menor preço médio simulado,com quase R$ 7,00 de diferença por saca de 60 quilos em relação ao preço de São Paulo. Entretanto a região que demonstrou o maior preço simulado foi o Estado do Paraná como pode-se observar no gráficoabaixo.

Fonte: Dados da pesquisa

A região que apresentou a menor dispersão de preços foi o estado de São Paulo com um desvio padrão de R$ 1,72 e variância de R$ 2,95. O preço mais observado durante as cinco mil simu-lações,ouseja,amodafoideR$31,54.Teoricamentepode-seafirmarqueoestadoque temomelhor preço médio simulado também possui o menor risco de preço entre todos os estados anal-isados.Mesmo possuindo o maior preço simulado, o estado o estado do Paraná a região com maior dispersão em torno da média seguido pelos estados do Rio Grande do Sul e Mato Grosso do Sul, ou seja, tais estados apresentam-se como estados de maiores riscos de preço da soja.

Fonte: Dados da pesquisa

A tabela 1 mostra os intervalos e as chances de ocorrência dos preços da soja. De acordo comasimulação,oestadodoMatoGrossotemumaprobabilidadede90%dopreçosermenorqueR$30,05emaiorqueR$22,09.OestadodeSãoPaulotemaprobabilidadede5%deterpreçosmenores que R$ 30,2, o estado demonstra novamente que tem o menor risco pois possui o menor intervalodeocorrência,tem90%deprobabilidadedopreçoestarentreR$30,3eR$35,90,emcontrapartidaoestadodoParanápossuiomaiorintervalodepreços,tem90%dechancedeseuspreçosestarementreR$26,20eR$36,13oquereafirmaagrandedispersãodospreçospagosaos produtores nesse estado.

Tabela 1 : Probabilidade de ocorrência do preço de mercado da soja

Fonte: Dados da pesquisa

4-CONCLUSÃO

Por meio da simulação dos preços médios dos principais estados produtores de soja pôde-se concluir que existe uma relativa discrepância dos preços praticados entre os estados produtores. Os estados de São Paulo, Rio Grande do Sul e Paraná apresentaram os melhores preços médios simulados dos últimos 10 anos, respectivamente. Os estados com os piores preços médios foram os estados do Mato Grosso e Goiás. Uma importante informação refere-se ao estado de São Paulo, que apresentou a menor dispersão de preços em torno do valor médio, isso quer dizer que é a região com o menor risco de preço.A região com a maior dispersão observada foi o estado do Paraná seguido consecutivamente pelos estados do Rio Grande do Sul, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso. Em termos gerais o estudo aponta para o desenvolvimento de estratégias que posam con-tribuir para a redução dos riscos de preço da soja e que tenham como objetivo o aumento da renta-bilidade da atividade agrícola. Dentrodesteambiente,alémdoaumentodaprodutividadeeeficiêncianoprocessoprodu-tivo, recomenda-se que os produtores façam maior utilização de instrumentos que atuam na diminu-ição dos riscos de preços, a exemplo do Contrato de opção de venda do governo e dos mercados defuturosedeopçõesqueutilizamohedgecomoinstrumentodesegurançacontraasvariaçõesdepreçosfuturosdascommoditieseatémesmoadotaradiversificaçãodaprodução. Pelo lado do governo, sugere-se maior estímulo e aperfeiçoamento dos mecanismos que permitam uma ação estratégica de políticas de desenvolvimento regional que possam atenuar a sazonalidade dos preços, além de uma política cambial consistente acompanhada de políticas de créditos subsidiados, de garantia de preços mínimos e expansão de sistemas adequados para armazenamento de grãos. Esse último tem sido um dos grandes gargalos da produção de soja no Brasil nos últimos anos.Segundo dados da Companhia Nacional de Abastecimento (CONAB), a capacidadedearmazenagemépoucomaiorque87,5milhõesdetoneladascontraumaproduçãodeaproximadamente120milhõesdetoneladas. Comocomentáriofinal,caberessaltarasdificuldadesencontradasparavalidaçãodemod-elos nos estudos que envolvem risco e simulação. O processo de validação visa determinar o grau deconfiançaedecorreçãodosresultados,poisnãoexistemétodoformaldeprovaracorreçãodeummodelodesimulação.Emsuma,afinalidadedavalidaçãoétestarseocomportamentodosimulador está de acordo com o comportamento real das variáveis. Uma das maneiras de se ter umavalidaçãoperfeitadosmodeloséaidentificaçãodasdistribuiçõesdeprobabilidadesdasvar-

iáveisdeentrada,ou“inputs”.Essaidentificaçãodeveserfeitadamaneiramaisrealistapossível,ou seja, o analista deve estabelecer uma distribuição para cada variável que melhor se ajusta ao comportamentodamesma.Quantomaioresasinformaçõessobreasocorrênciasdavariáveles-tudada,maiorseráapossibilidadedeseconseguirumadistribuiçãodeprobabilidadequereflitaoreal comportamento dessa variável.

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Assessoria como alternativa na extensão acadêmica: um estudo de caso na comunidade Cândides no município de Divinópolis1/MG

Diana Maria de Resende SouzaLinda Maira Santos Nunes

Resumo

Este artigo consiste numa sistematização de dados históricos teóricos e metodológicos estu-dados e vivenciados por professores da FACED/FADIV, objetivando registrar experiências exitosas do PRODEC (Projeto de Desenvolvimento e Educação em comunidade) ao apresentar a assesso-ria como alternativa de trabalho de extensão acadêmica, considerando a necessidade de respeitar ás particularidades sociais, econômicas e culturais da comunidade Candides com suas demandas específicas e a formaçãode redes de assistência, voltadas a satisfazer as reais necessidadesdamesmaComoressaltaIamamoto(2003,p.17)vivemos“ummomentoplenodedesafios”.Sãorelatados vários momentos em que a resistência e o sonho foram imprescindíveis para a defesa de um projeto comprometido com a demanda local. É apontado o desenvolvimento/trajetória de trabalhos desde 2006, quando iniciou-se o mesmo sob a coordenação do Curso de Serviço social e delineia-se um novo formato de atuação. È uma leitura interessante, pois busca por meio de re-flexõescontribuirparaaevoluçãodosacontecimentoseanecessidadedenovosatoresenovasestratégias de intervenção. Vale a pena conferir!Palavras-chaves: Assessoria. Extensão acadêmica. Redes de assistência.

Introdução

O curso de Serviço Social da FACED/FADIV teve início em Fevereiro de 2006, tendo em vista atender a matriz curricular, que preconiza o Estágio Supervisionado de campo e o incentivo ás Atividades Complementares de Graduação, surgiu o PRODEC iniciativa da coordenadora do curso referido professora mestre Glays de Fátima Guerra e a professora mestre Letícia Machado(ambas Assistentes sociais) A comunidade escolhida foi o bairro Jardim Candides, indicação feita pelo poderpúblicomunicipal,considerandoascondiçõesdevulnerabilidadesocial2 existente e a carên-cia de serviços públicos e equipamentos sociais instalados na comunidade. Entendeu-se que na comunidade referida teríamos subsídios para conhecer e trabalhar com a complexa questão so-cial3, material de fundamental importância para intervenção dos estudantes do curso de Serviço Social. No início do projeto apenas a professora Letícia executava o mesmo orientando dezenas de alunos. Houve uma grande aceitação, pois o mesmo acontecia aos sábados e coincidia com a disponibilidade dos alunos, que durante a semana precisavam trabalhar para custear os estudos. Havia uma parceria feita com a Secretaria de Educação que fornecia o transporte para o desloca-mento e cedia o espaço físico da Escola Sidney José de Oliveira. Tendo em vista a necessidade de envolver mais professores/Assistentes sociais, em função até do número de alunos interessados tivemos desde 2006 a responsabilidade técnica de Pedro Joaquim Machado, Èrika Cristina Ribeiro Machado, Ana Paula Gaspar, Diana Maria de Resende Souza e mais recentemente, a partir de Fevereiro de 2009 de Linda Maira dos Santos Nunes e Gilberto Ribeiro de Castro. Durante o primeiro semestre letivo de 2009, após a resolução do Conselho Federal de Serviço Social que estabeleceu algumas exigências quanto ao exercício do Assistente social supervisor de estágio, foi preciso não mais considerar o PRODEC como campo de estágio , e a partir de então 1 A cidade de Divinópolis está localizada no Centro Oeste mineiro a cerca de 110 Km da capital do Estado, Belo Horizonte. Possui aproximadamente 250.000 habitantes; a sua economia gira em torno da indústria confeccionista e guzeira.2 Segundo manual informativo do SUAS(Sistema Único de Assistência Social). O termo vulnerabilidade social está rela-cionado a situação social em decorrência da pobreza, privação(ausência de renda e precário acesso aos serviços públicos)e da fragilidade dos vínculos afetivos e de pertencimento social.3 Questãosocial,podeserdefinidacomoconjuntodasexpressõesdasdesigualdadesdasociedadecapitalistamadura,quetemumaraizcomum:aproduçãosocialécadavezmaiscoletiva,otrabalhotorna-semaisamplamentesocial,enquantoaapropri-ação dos seus frutos mantém-se privada, monopolizada por uma parte da sociedade (IAMAMOTO, 1999, p. 27).

passou a receber os discentes em regime de cumprimento de horas complementares. AsaçõesdoPRODECatéentãoeramdenaturezasócio-econômico-educativas,culturaise recreativas, realizadas com o intuito de atender a comunidade residente no Bairro Candides. Podemoscitar:TardesdeCinema,BibliotecaComunitária,OficinasdeFutebol Infanto-juvenil eincentivo a iniciativas que contribuíram para a melhoria de renda das famílias como Feiras Comu-nitáriasparacomercializaçãodebensproduzidospelapopulaçãoeasOficinasdeCustomizaçãode Roupas, com a participação voluntária de estudantes do Curso de Design de Modas.AsaçõesdesenvolvidasnoPRODECforamalvosdediversasavaliaçõespelocurso,comcontribuiçõessignificativasdoNúcleoDocenteEstruturante(NDE),órgãoconsultivocriadoemfe-vereirode2010,quetemdentresuasmúltiplasatribuiçõesemitirpareceresdepropostasdeen-sino,pesquisaeextensão,bemcomocontribuircomaorganização,funcionamentoeavaliaçõesdas atividades de Estágio, Atividades Complementares de Graduação e Trabalho de Conclusão de Curso. Repensou-se o projeto apontando para a necessidade de envolvimento de todos os cursos mantidos pela SODBEC (Sociedade Dom Bosco de Educação e Cultura) e com um novo formato voltada para Assessoria como uma alternativa de práxis que fomenta o empoderamento tanto dos profissionais, comoalunosecomunidade, reforçandooqueaSilva,2006apud Iamamoto,2003,enfatizaanecessidadedoprofissionalsercriativoe...

de formular, avaliar e recriar propostas ao nível das políticas sociais e da organiza-çãodasforçasdasociedadecivil,envidandoesforçosdeváriosníveis,afimdecon-tribuir, também, para o acesso dos usuários a serviços públicos de qualidade, que possibilitem o fortalecimento do protagonismo dos sujeitos sociais (SILVA,2006,p.1)

Diante das necessidades de envolvimento de novos autores com uma estratégia voltada a assessorar, que implica em buscar conhecer a realidade local, suas reais necessidades, fomentan-do a criação de parcerias e redes sociais de assistência, tendo como foco o que Silva, 2006 ressalta acima: o “fortalecimento do protagonismo dos sujeitos sociais.” Podemos considerar a assessoria e a formação de redes como práxis inovadoras de intervenção na extensão, pois ainda muito persiste aidéianosmeiosacadêmicoseprofissionaisde“fazerpara”,“domeuprojeto”,“eufizsozinho”etc,quereduzaoindividualismo,acoisificação,acompetição,etc,posturasbemestratégicasdosis-tema capitalista. Mas o que vem a ser extensão acadêmica, assessoria e redes de assistência?

Extensão acadêmica

No Brasil, a extensão é um dos pilares do ensino superior, conjuntamente com o ensino e apesquisa,conformedispõeoartigo207,daConstituiçãoFederal.Apesardequestionadaporal-gunsestudiososquantoasuaeficácia,deveservalorizada,porserumaformadeinteraçãoentrea população e a universidade. A extensão universitária ou acadêmica é uma ação de uma universidade junto à comuni-dade, disponibilizando ao público externo o conhecimento adquirido com o ensino e a pesquisa desenvolvidos. Essa ação produz um novo conhecimento a ser trabalhado e articulado. É um conceito adotado pelas universidades que se refere ao contato imediato da comuni-dade interna de uma determinada instituição de ensino superior com a sua comunidade externa, em geral a sociedade à qual ela está subordinada. A ideia de extensão está associada à idéia de que oconhecimentogeradopelas instituiçõesdepesquisadevenecessariamentepossuir intençõesdetransformararealidadesocial,intervindoemsuasdeficiênciasenãoselimitandoapenasàfor-mação dos alunos regulares daquela instituição. Segundo o Plano Nacional de Extensão Universitária 2000/2001, a extensão é o processo educativo,culturalecientíficoquearticulaensinoeapesquisadeformaindissociáveleviabilizaa relação transformadora entre universidade e sociedade. Neste sentido não é mais concebível entender a extensão como projetos isolados, atendendo apenas a alguns cursos da faculdade, comoeraoPRODECatéfinalde2009,atendendoapenasaocursodeServiçoSocial.Comanovaconcepção de extensão universitária e com a necessidade percebida pelos participantes do PRO-DEC e do NDE do curso de Serviço Social, passou-se o projeto para a coordenação do Instituto

de Pesquisa e Extensão IPPEX da FACED, com a abertura para a participação de todos os cursos da instituição4, envolvendo mais aréas do conhecimento e concomitantemente possibilitando uma intervençãomultiprofissional,entendendoosujeitocomoumserpolíticosocialpsico,emocionalminimizando suas múltiplas e complexas carências e necessidades. Urge a necessidade de romper com as práticas tradicionais e conservadoras conforme Vas-concelos,2002 trata em seu artigo intitulado:Relação teoria/prática: o processo de assessoria/con-sultoria e o Serviço Social.

Esse quadro repercute negativamente no ensino, reproduzindo a dicotomia teoria/prática com afastamento da realidade trabalhada pelos assistentes sociais, ou seja separandonoensino,teoriaderealidade;napesquisa,levandoàpriorizaçãodete-masgeneralizantes;napráticaprofissional,reproduzindoelegitimandotradicionaiseconservadoras, desarticuladas dos interesses e necessidades dos usuários, estimu-lando práticas individualizantes e do “aqui/agora”que impossibilitam a busca de nov-osparâmetroserumosparaofazerprofissionalecontribuindoparaamanutençãodo distanciamento entre teoria e realidade . (VASCONCELOS,2002.p.117)

Nestesentido,iremosressaltarasdiversasaçõescomestanovaroupagemocorridasnoanode2010enoprimeirosemestrede2011.Podemosafirmarquenoanode2010,tivemosinúmerasreuniõesdeavaliaçãoafimdereestruturaroprojetoequesomenteefetivamentenoprimeirose-mestre de 2011 é que tivemos atividades com esta novo olhar e posturas interdisciplinares. Mas antes continuaremos conceituando as palavras chaves deste estudo para facilitar a compreensão das experiências que iremos descrever adiante.

Assessoria

Encontramos nos dicionários eletrônicos assessoria como a arte de assessorar, auxiliar. Ela deve acontecer intrisecada no tripé acadêmico via extensão universitária e articulada com a pesquisa e a extensão. Assim, quando se vai a campo não se objetiva apenas assessorar um movimento social, por exemplo, mas também buscar elementos na realidade para a pesquisa e contribuirparaaformaçãoprofissionaledosalunosdeServiçoSocial. “Vasconcelos,2002.p.123afirma”dentreasestratégiaspossíveisparaenfrentara fraturaentre pensar e agir no Serviço Social indicamos os processos de assessoria/consultoria” A autora reforçaaindaquemúltiplossãoosdesafiospostosàprofissãomasqueacreditaqueestamodali-dadeénecessária,possíveleviávelequeexisteaindamuitaresistênciaprofissionaleminternalizarem sua prática esta modalidade de assistência, apesar de estar preconizado no Código de Ètica do Assistente Social5nosartigos4ºe5ºquedeterminamascompetênciaseatribuiçõesdacategoriaprofissionalasaber: •Prestarassessoriaeconsultoriaaórgãosdaadministraçãopúblicadireta,indireta,empre-sasprivadaseoutrasentidades; •Prestarassessoriaeapoioaosmovimentossociaisemmatériarelacionadaáspolíticassociais, no exercício e na defesa dos direitos civis, políticos e sociais da coletividade. Tanto Vasconcelos, 2002 como Bravo, 2005 relatam duas formas básicas de prestar asses-soria: a primeira se dá pela procura pela instituição que necessita da assessoria. Neste caso é mais simples, pois existe uma demanda, uma solicitação concreta que partiu da comunidade ou institu-ição solicitante. A segunda forma parte pela apresentação de proposta por parte da academia, que exige da mesma um manejo/traquejo mais delicado, pois precisa primeiro mostrar a importância que sua prestação de serviço pode levar a desenvolver na comunidade. Nestesentido,Bravo,2005afirmaapartirdesuasexperiênciasqueomaisimportantedoque poder contar com uma equipe de assessoria é o fato de acreditar no potencial da equipe que sepropõeáassessoriaemaisqueosparticipantesdosmovimentossociais,dasinstituiçõesde

4 A FACED/FADIV é mantida pela Sociedade Dom Bosco de Educação e Cultura (SODBEC) e possui os seguintes cursos: Administração, Ciências Contábeis, Design de Modas, Psicologia, Direito e Serviço Social.5 Resolução CFESS nº 273/93, de 13 de Março de 1993

ensino, saúde, conselhos de moradores etc, só nos credenciam como assessores a partir de uma análise da nossa capacidade. Comestaafirmaçãodoautoracima,percebemosserumdosfacilitadoresparaasexperiên-cias exitosas vivenciadas por alunos e professores do corpo docente da FACED/FADIV na comuni-dade Candides, pois as equipes anteriores e o próprio nome PRODEC soa com respeito, devido a credibilidade deixada pelas equipes que passaram pela comunidade. SegundoIamamoto,2008umdosmaioresdesafiosqueoAssistenteSocialvivenopresenteé desenvolver sua capacidade de decifrar a realidade e construir propostas de trabalho criativas e capazes de preservar e efetivar direitos, a partir de demandas emergentes no cotidiano. Para enfrentar os desafios que a prática de assessorar impõe á profissão é necessárioquemuitasdiscussõeseenfrentamentodosdesafiosqueosprocessosdeassessoriacolocamao serviço social, dando destaque para a necessidade de se resgatar o papel da universidade na formação e prestação de assessoria com fundamentação teórico-metodológica e técnico-operativa tendo como referência a defesa e efetivação do projeto ético-político do Serviço Social6. ONDEdo cursodeServiçoSocial temcontribuídomuito nestasdiscussõesacercadosdesafios postos à estratégia de assessorar nos trabalhos de extensão universitária e uma daspropostas surgidas foi a necessidade de fortalecer as lideranças comunitárias do bairro Candides nassolicitaçõesdesuasdemandasemergentesenoincentivonaparticipaçãodaRASA(Rededeatendimento sócio assistencial) do município de Divinópolis. Antes de iniciarmos na descrição mais detalhada desta modalidade de assessoria, veremos o conceito de redes de assistência.

Redes de assistência

Para entendermos o termo rede, temos sua origem latina retis, e nos dicionários da língua portuguesa,encontramosomesmocomooentrelaçamentodefioscomaberturasregulares,ca-pazes de formar uma espécie de tecido. A partir da noção de entrelaçamento, assim como da es-truturareticulada,apalavraredefoiganhandonovossignificados,demodoacaracterizar-sediantedasmaisdiferenciadassituações.RedessociaisparaSluzki(1997)éumconjuntodepessoasqueinteragem com o indivíduo, em sua realidade social, cotidiana, e que são acessíveis de maneira direta ou indireta ao contato personalizado.

Dabas e Najmanovich(2001), argumentam que as redes sociais são o âmbito por excelência da interaçãohumana.Neves(2009)completaafirmandoqueasredespodemaindaserconsideradascomosistemasorganizacionaiscapazesdereunirindivíduoseinstituições,deformademocráticaeparticipativa,emtornodeobjetivosourealizaçõescomuns.Ametáforadaredetemsemostradoespecialmente adequada para pensar e construir novas formas de convivência que permitam ges-tar novos mundos. Para trabalhar em redes é preciso desenvolver uma estética vincular, entendida como uma capacidade de sentir a vida, de conectar-se com os outros em sua diversidade.6 SegundoNetto,1999oprojetoético-políticodoServiçoSocialvincula-seaumprojetosocietárioquepropõeaconstruçãode uma nova ordem social, sem dominação e/ou exploração de classe, etnia e gênero.

Nospaísesemdesenvolvimentoasredessão,comfreqüência,asúnicaspossibilidadesdeajuda com que as famílias pobres podem contar, além de ser o único suporte para ajudar a aliviar as cargas da vida cotidiana. (ANDRADE e VALTSMAN, 2002). A demanda da rede do município de Divinópolis surgiu a partir de um grupo de trabalhadores dediversas instituiçõesdacidade,queangustiadoscomsuasaçõesfragmentadasecombaixaresolutividade tiveram a iniciativa de se reunir e propor mudanças no processo de trabalho. O tra-balhoemredefoiométododefinidoportodos,comocapazdeprovocaravançosnaefetivaçãodaspolíticas públicas municipais e na melhoria do bem-estar social. Nominado Rede de Atendimento Social-Assistencial (RASA) este grupo, persistiu, gerou conhecimento, cresceu e buscou parceiros. PodemosafirmarquehojeoPRODECfazpartedestarede.

Relato de experiências de assessoria na comunidade Candides

Para facilitar a descrição das experiências de assessoria que o PRODEC tem desenvolvido no primeiro semestre de 2011 na comunidade Candides ,dividiremos em 03 projetos em andamento intitulados:AssessoriaaosetorpedagógicodaEscolaMunicipalSidneyJosédeOliveira;Asses-soriaaassociaçãodemoradoreseRASAeMutirãodeassessoriamultiprofissionais.

A) Assessoria ao setor pedagógico da Escola Municipal Sidney José de Oliveira

ElaboraraçõesparaassessorarosetorpedagógicodaEscola localsó foipossível,apósreuniõescomaequipedaescola,quecolocouasdificuldadesencontradasemrelaçãoadisciplinadosalunosedaexistênciadeumnºsignificativodealunosfaltososeemabandono,equeváriassolicitaçõesforamfeitasaoConselhotutelar,massemresultadosefetivos.Estetipodeassessoriaenquadra-se na segunda modalidade que os autores Vasconcelos e Bravo, descrevem acima que não vem pronta, que exige manejo para lidar que só depois de escutar, e avaliar e da equipe da escoladepositarconfiançaéqueseépossívelproporumaintervenção.AequipedoPRODECapóschegaraestademandaespecíficavisitouoConselhotutelar,paraconhecerdepertootrabalhoqueédesenvolvido juntoàsquestões levantadas.Chegouseàconclusãodapoucaefetividadedasações,umavezquefaltamrecursoshumanos,materiaisefinanceiroseatéda“fama”depolí-cia, de caráter punitivo junto aos pais das crianças e adolescentes. Reforçamos que a intenção do PRODEC é ser parceiro, desenvolvendo um trabalho mais voltado para a prevenção, incentivando os alunos a terem projetos de vida e que percebam a escola como um meio para alcançar seus objetivos.Ficoudecididoqueserãorealizadasoutrasreuniõesnosentidodereforçaraparceria.O trabalho iniciou-se na escola, com ajuda da supervisora pedagógica e estão acontecendo várias oficinasdevivênciascomosalunos.Pensamosemfazervisitasdomiciliares,masapósdiscussõesno NDE, consideramos que as mesmas podem ser vistas como uma invasão, uma vez que se torna necessário criar vínculos afetivos, que de acordo com Santos et al, 2010, p.53.

Historicamente, a visita domiciliar vem sendo utilizada como instrumentos de controleeinquéritosocial,comoobjetivodefiscalizar,comprovarrelatosfeitospelapopulação e ensinar os cuidados domésticos. Em vista dessa abordagem, é hoje o instrumento considerado mais polêmico.

Estas só acontecerão com a solicitação do aluno ou dos pais. A proposta é contribuir para que os alunos desejem sonhar elaborando projetos de vida e também de resgatar os alunos fal-tosos e em abandono pelos próprios colegas de sala. Já estamos sendo aceitos pelos alunos, que nos recebem com “que bom que vocês chegaram, o que vamos fazer hoje?” B) Assessoria a associação de moradores e RASA

Este trabalho se insere na primeira modalidade de assessoria, abordada pelos autores Vas-concelos e Bravo. O presidente da Associação de moradores do bairro tem procurado a equipe do PRODEC para a princípio receber assessoria na resolução de pendências burocráticas da prestaçãodecontasdadiretoriaanteriorqueestavagerandoproblemasparafirmarnovoscon-

vênioserealizaçãodeprojetosdesubvençõesàassociação.ComaassessoriadoPRODEC,nãosomente este problema foi sanado como outros também estão sendo assessorados. Outras pro-postas de trabalho também estão sendo discutidas como a viabilização de cursos de capacitação paraconselheiros,bemcomoabuscaderecursosfinanceirosparaareformadasinstalaçõesfísi-cas da sede do conselho comunitário, além do fortalecimento do conselho, através do incentivo da participaçãodacomunidadenasreuniõeseeventosdoconselhocomunitário. Vale a pena registrar que foi atendido também demandas por aquisição de jogos de camisa e bolas para o time de futebol da comunidade. Mensalmente, os alunos da FACED/FADIV partici-pamdasreuniõesdaRASA,acompanhadospeloprofessordoPRODECoquecontribuiparaoentendimentodaimportânciadenãosóconhecerarede,mastambémparticipardasarticulaçõese propostas que se apresentam para fomento da qualidade de assistência aos usuários desta.

C) Mutirãodeassessoriamultiprofissionais

A Faculdade de Divinópolis possui dois núcleos de assistência a comunidade: Jurídico e psicológico, que funcionam na sede desta. Acreditamos que as condições de vulnerabilidadeeconômicadapopulaçãodobairroCandidésdificultaoacessodestaaosserviçosoferecidosporestes núcleos. Sendo assim pensou-se em levar a assessoria até eles. Estemutirãoaconteceumavezpormêseváriasaçõesdeassessoriasãorealizadaspelosprofessores e alunos dos cursos de Serviço Social, Direito e Design de Moda. Pretendemos es-tenderásaçõesparaosdemaiscursosdaFACED/FADIV.Sãooferecidasoficinasdeestamparia,bordado,ilustraçãodemodas,posturaepassarela,ginásticachinesa,mandalas,exibiçãodefilmeseducativos, futebol, jogos além do atendimento pelos professores e alunos do curso de Direito àquelas pessoas da comunidade que possuem pendências jurídicas. Após a realização do mutirão do mês de Julho, alguns comentários foram feitos por partici-pantes do evento tanto por parte da escola, como por parte da comunidade e também por profes-soresealunosdaFACED/FADIV,quenosfazemconsideraroquantofoigratificantetantodopontode vista acadêmico, como de extensão comunitária, propiciando assessoria/orientação, educação, lazer,auto-estimaevalorizaçãoatodosqueparticiparam.Seguealgumasfalassignificativasquetransitaram pelo dito acima: “... Este tipo de ação deveria acontecer mais vezes aqui...estamos sem nada aqui...” “ ...Foi muito divertido, também distrai muito... pode me chamar todas ás vezes que tiver este tipo de coisa...” “...Óhdona,meemprestaestefilmequeaSrªpassouparalevarparaomeupaiver...”Senão der eu te dou um DVD e a srª grava prá mim ? ”... “...foi muito organizado, vcs estão de parabéns pelo trabalho que estão fazendo aqui na comunidade...” “...Teve um momento que esqueci que estava trabalhando, distrai fazendo minha mandala, ao som daquela música que me deixei embalar por ela...” Conforme Iamamoto,2008 nos afirma acima, estamos propondo de forma criativa inter-vençõesquevenhamasatisfazerasnecessidadesdaquelacomunidade,masmuitoaindaháderealizar,sãomuitosdesafiosprincipalmentedenaturezadepolitizaçãodosmovimentossociais.Etambém de efetivar a inclusão na extensão universitária da assessoria como alternativa de práxis. OutrodesafioqueconsideramosimportanteédecomoconstruirdentrodarotinadetrabalhodosAssistentessociaisquenãoatuamnasuniversidades,umaaçãoprofissionalqueestimuleaasses-soria na defesa de direitos tendo em vista a organização política dos usuários/clientela assistida. Referênciasbibliográficas

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AVALIAÇÃO DO RISCO DE INVESTIMENTO NA CULTURA DO MILHO IRRIGADO NA REGIÃO DO TRIÂNGULO MINEIRO

Leandro Maia Fernandes1

Carlos Antônio Moreira Leite2

Resumo:Airrigaçãotemcontribuídodeformasignificativaparaoaumentodaprodutividadedaculturadomilho,comincrementosdeaté200%emseusrendimentos.Destemodo,airrigaçãoé considerada fator atenuante do risco climático na agricultura, entretanto, os altos investimentos nasuaimplementaçãotornaaproduçãodomilhoirrigadopassívelaosriscosfinanceiros.Assim,este trabalho tevecomoobjetivoanalisaroretornofinanceiroeograuderiscode investimentona produção do milho na região do Triângulo Mineiro. Como metodologia utilizou-se a análise de coeficientesderentabilidade,aanálisedesensibilidadeeanálisedeprobabilidade, tendocomoinstrumento básico o método de Monte Carlo. Concluiu-se que o projeto é viável para as taxas de jurosde12%e18%einviávelparataxadejurosigualà30%aoano,queexisteumpequenograuderiscofinanceiroequeopreçodomilhoeoscustoscomirrigaçãosãoasvariáveisquemaisin-fluenciamnoresultadofinanceirodoprojeto.

Palavras-chave:Irrigação,produçãodomilho,retornofinanceiro,análisederisco

1. INTRODUÇÃO

Omilhoéumadasmaissignificativasculturasemtermosdevolumeedeimportâncianaalimentação humana e animal e constitui-se em um dos principais grãos em termos de volume produzido no Brasil. A produção brasileira é a terceira do mundo, sendo superada apenas pela dos EUAedaChina.Noano2000aproduçãototaldogrãofoisuperiora35milhõesdetoneladaseem2001chegoua40milhõesdetoneladas,fatoquepossibilitouumamaiorinserçãodonossoprodutono mercado mundial. NoBrasilaproduçãodomilhovemsofrendoprofundastransformaçõesnosúltimosanos,que contribuíram mais para o crescimento do rendimento da cultura do que da área propriamente dita.Essasmodificaçõesforamconseqüênciasdasnovastecnologiasdisponíveisparaoagricultorcomo: EmMinasGeraisobserva-seamesmatendênciaverificadanoBrasil,comoaumentodaprodução decorrente mais do aumento do rendimento do que da área plantada. Mesmo assim ain-daexisteumagrandediscrepâncianosníveisdeprodutividadeentreasváriasregiõesdoestado.NestecontextooTriânguloMineiroéadasregiõesqueapresentamosmaioresníveismédiosdeprodutividade para a cultura do milho, com rendimento médio de aproximadamente 4 toneladas por hectare. Tais características fazem com que essa região seja responsável por aproximadamente 30%daproduçãototaldoestado,caracterizando-secomoaprincipalregiãoprodutorademilhodeMinas Gerais. Um dos principais fatores de destaque desta região, além das vantagem comparativa em relação ao solo e ao clima, é o uso da irrigação via Pivô Central. A utilização da irrigação em con-tribuídode formasignificativaparaoaumentodorendimentodaculturanaregião,poisomilhoquandoirrigadopodeapresentarincrementosnorendimentosuperioresà200%,podendochegar,naquela região, à 12 toneladas por hectare, quando irrigado. A irrigação, entretanto, introduz altos custos variáveis relacionados à mão-de-obra, à ener-gia,àágua,bemcomocustosfixosadicionaisparaequipamentoseconstruçãocivil,contribuindo,deformasignificativa,paraaumentonocustototaldaprodução.Consequentemente,airrigaçãotem potencial para aumentar o risco na obtenção de lucros, em razão dos custos dos equipamen-tos, do mau dimensionamento e do alto custo de manutenção dos equipamentos de irrigação. Assim, na produção sob irrigação o produtor deve estar sempre atento para realizar um dimensionamento exato do projeto e adotar métodos de irrigação mais adequados para a sua cul-1 Mestre em Economia Rural pela Universidade Federal de Viçosa ([email protected])2 Professor Titular do Departamento de Economia Rural da UFV ([email protected])

tura.Alémdisso,omanejoeficientedosistemadeirrigação,quevaidesdeoajustedosistemadeirrigaçãoatéautilizaçãodeinformaçõesclimáticaseprevisõesdeprodutividade,nuncadeveserdesconsiderado, pois contribui para o aumento da produtividade e otimização do uso de mão de obra, energia elétrica, nutrientes e outros insumos, diminuindo, por conseguinte os riscos da ativi-dade. Desse modo, diante dos riscos, o produtor rural, como qualquer outro empreendedor, preo-cupa-se com o rendimento de sua produção e busca os investimentos que apresentam os melhores desempenhostantoemtermosdeprodutividadequantoderendimentosfinanceiros.Portanto,édegranderelevânciaparaosagricultoreseogovernoaverificaçãodoretornodosistemadeirrigaçãode uma cultura tão importante para o Estado de Minas Gerais e para o país como o milho. Pormeio dessa verificação, torna-se possível a elaboração de futuras estratégias de ir-rigaçãoe plantio, abrangendoquestões como: onde, quandoe quanto investir em irrigaçãodacultura do milho no estado. Essas estratégias podem servir de suporte para estudos tanto do lado privado quanto do governamental. Doladoprivado,aavaliaçãodoriscoedoretornofinanceiro,dadapeloretornopositivoounegativo dos empreendimentos, permite ao produtor rural selecionar os seus empreendimentos, dimensionar sua produção e suas vendas e diminuir as incertezas e os riscos de sua atividade. Do lado do governo, tal análise contribui para tratamento adequado dos aspectos de desenvolvi-mento agrícola das áreas irrigadas, adequando-se os créditos de investimento e custeio às espe-cificidadesdaagriculturairrigadaeincentivandoaquelasculturasirrigadasqueapresentaremasmaiores produtividades e melhores rentabilidades. Esse tipo de estudo também pode servir de suporte, no sentido de reconverter os sistemas deirrigaçãodebaixaeficiênciaeconômicaetransformá-losemmétodosmaisbemadaptadosaculturas mais produtivas e de maiores retornos econômicos, bem como dar subsídios para determi-nação de seguros agrícolas baseados nos retornos apresentados pelas culturas irrigadas.

1.2. Objetivos

O presente estudo objetivou, em geral, analisar as estimativas dos indicadores de rentabili-dadefinanceiraeograuderiscodeimplantaçãodaculturadomilhoirrigadonaregiãodoTriânguloMineiro.

Especificamente,pretendeu-seoseguinte:

a)Analisarosindicadoresfinanceirosdosistemadeirrigaçãodotipopivôcentralmovidoaenergia elétrica na produção do milho. c)Verificarasensibilidadedasprincipaisvariáveisnosistemadeproduçãodaculturadomilho irrigado em relação ao valor presente líquido. d)Verificarasdistribuiçõesdefreqüênciadataxainternaderetorno,bemcomodeterminaras curvas de distribuição acumuladas da produção do milho com irrigação.

2. REFERENCIAL TEÓRICO

2.1. Conceitos de risco e incerteza

A agricultura é uma atividade produtiva que possui peculiaridades que a diferenciam das demais atividades econômicas. Dentro dessas peculiaridades residem os fatores de incerteza que fazem da agricultura uma atividade de risco, e, dentre eles, alguns são menos ou mais previsíveis doqueoutros.Damesmaforma,existemmeioseficientesdeproteçãocontraalgunsfatores,en-quanto,emfacedeoutros,oprodutorficasendo,emúltimainstância,otomadorexclusivodorisco.Nesse sentido, o entendimento do que é risco e de seus diferentes efeitos sobre a rentabilidade e rendimento da atividade agrícola constitui-se num aspecto de grande importância na tomada de decisõesdosprodutores. Desse modo, na administração de uma atividade agrícola deve-se considerar os principais

tipos de riscos. Os riscos mais comuns são: risco de produção e risco de mercado. O risco relacionado com a oscilação da produtividade agrícola é o risco de produção. Os principais fatores responsáveis pelo risco de produção são os problemas climáticos, as pragas e doenças e a disponibilidade de fatores de produção, que podem alterar o nível de produção dos diversos empreendimentos. Oriscodemercadorefere-seàvariaçãodarendadoprodutor,emconseqüênciadasvari-açõesnospreçosdemercadodosprodutos,osquaissemodificamcomrelativafreqüêncianoanoagrícola.Comoaproduçãoagrícolanãoéinstantânea,écomumocorreremalteraçõesnasexpec-tativasdepreçose,consequentemente,noretornofinanceirodaatividade.Ospreçosdosprodutosdo setor agrícola, ao contrário do que acontece com os preços dos produtos de outros setores da economia, sofrem variação acentuada de janeiro a dezembro de cada ano. Osagricultorestêmnoçõesdefinidasdequealgunsempreendimentosenvolvemmaiorriscoou incerteza que outros. A maneira pela qual eles interpretam o grau de risco ou incerteza é difícil deverificar.Contudo,amagnitudedavariaçãonaproduçãoounopreçopodeservirdebaseparaaanálise.Outrabasedeverificaçãoseriaaprópriaaperdadaprodução(MOREIRA,1980). Emtermosprobabilísticos,situaçãoderiscopressupõeoconhecimentodeumnúmerosu-ficientedevaloresobservadosdosdados,flutuandoàvoltadeumvalormédiocentral,oquepos-sibilita uma estimativa de probabilidade de ocorrência desse valor central entre limites calculados. Essa distribuição probabilística pode ser conhecida por estudos empíricos ou por estudos subje-tivos. A situação de incerteza se caracteriza pela inexistência de valores observados em número suficienteoupelaexcessivaamplitudedasflutuaçõesemtornodovalorcentral,nãosendoper-mitida a estimativa pelo emprego das probabilidades (MOREIRA,1980). Em resumo, pode-se dizer queasituaçãoderiscoémensuráveleadeincertezanãooé.Contudo,ESTÁCIO(1961),afirmaqueoslimitesentreassituaçõesderiscoedeincertezasãodifíceisdedefinir,umavezquenãosepode deixar de admitir diferentes níveis de aproximação quanto ao conhecimento da distribuição de probabilidades. Risco é a variabilidade do retorno, ou instabilidade dos possíveis retornos de um investi-mento, sendo que o grau de risco é função do valor econômico e da produtividade da cultura. CRO-COMO (1979), indica que, quando o conhecimento sobre eventuais resultados apresenta-se como adequado para realizar uma decisão, pode-se dizer que se trata de uma situação de risco e quando nãosetemespecificaçõesparaatomadadedecisões,diz-sequesetratadeincerteza. Não obstante, a situação de absoluta ignorância não é estritamente aplicável como o desta-cadoporPACHECO(1985),sugerindoqueexistealgumconhecimentopréviodasconseqüências,jáqueadmite-sequeinvariavelmentesãoformuladasdistribuiçõessubjetivasdeprobabilidade.Opontoimportanteaserconsideradoéqueaescolhadealternativassobcondiçõesderiscodepen-dem das preferências dos indivíduos. Deste modo, para a realização de análises envolvendo risco sãonecessáriosdoistiposdeinformações: a) a probabilidade de ocorrência de cada evento que se está estudando. b) aavaliaçãodasconseqüênciasrelacionadascomaocorrênciadesseeventos. Na teoria da decisão, o risco pode estar baseado em expectativas de um tomador de de-cisõesouemmedidasobjetivascomputadaspordadoshistóricos. O termo probabilidade subjetiva refere-se à obtenção de medidas de probabilidades a partir dadecisãoqueé inteiramentedaresponsabilidadedecada indivíduo,aqualé influenciadaporfatores psicológicos, representados pelos juízos subjetivos das probabilidades de ocorrência dos eventos (PACHECO,1985). Não obstante, na sua decisão, os indivíduos podem usar probabili-dadesobjetivascomouminputnaformaçãodesuasexpectativas(YOUNG,1984).Nestesentido,DILLON et all (1976), comenta que tais juízos das probabilidades amadurecem à medida em que os conhecimentos dos indivíduos aumentam. Consequentemente, existindo um relato mais completo da produção, da estação do ano, como também dos resultados médios obtidos em experiências multianuais, a combinação desses dados com o próprio juízo subjetivo do agricultor, torna este úl-timo mais habilitado para julgar a probabilidade subjetiva do risco com que se defronta. Na avaliação de um empreendimento agrícola, dado os vários tipos de risco existentes, a abordagem probabilística produz, como resultado, uma distribuição de probabilidades das medidas

deméritos,quantificandooriscodetodooinvestimento,produzindoumúnicovalorparaasmedi-das de decisão.

3. METODOLOGIA

Paraodesenvolvimentodestapesquisa,osdadoseinformaçõesforamobtidosdasseguin-tesinstituições:EmpresaBrasileiradePesquisasAgropecuárias(Embrapa),EmpresaMineiradeAssistência Técnica e Extensão Rural (Emater-MG), Associação Brasileira de máquinas e equipa-mentos (Abmaq), empresas especializadas em sistemas de irrigação (Consir) e revistas especiali-zadas em agropecuária entre os quais encontram-se a Agrianual e Agroanlisys. A metodologia utilizada, refere-se primeiramente às técnicas de desconto para o estudo de viabilidade.Ofluxodecaixadosinvestimentosnaculturadomilhoirrigadofoiformuladoparade-terminar o valor presente líquido e taxa interna de retorno do projeto. Paraanalisarosriscosfinanceirosdoprojetoutilizou-seduasopções.Aprimeira,maisex-pedita,consistenaanálisedesensibilidadedoprojetoàvariaçõesnosparâmetrosevariáveisdofluxodecaixadoprojetodeirrigaçãodotipoPivôCentral.Aoutraanálise,consistenautilizaçãode probabilidades. Por conseguinte, explicou-se o funcionamento do processo de simulação utili-zando-se da técnica de Monte Carlo, que é a metodologia básica empregada nesta pesquisa.

3.1.Caracterizaçãodofluxodecaixaparaaculturadomilhoirrigado

Fluxosdecaixasãovaloresquerefletemasentradasesaídasdosrecursoseprodutosporunidade de tempo que formam uma proposta de investimento. Sua formação só é possível se todas asespecificaçõestécnicasdosrecursosnecessários,bemcomodeprodutosaseremproduzidos,forem conhecidos. Para NORONHA (1987), é com base nos dados técnicos oferecidos pela engen-hariadosprojetosqueseiniciaoprocessodeformaçãodosfluxosdecaixa. Segundo o mesmo autor, não existe fórmula única que caracterize todos os tipos de projetos. Existem,sim,algumasnormaseprincípiosquesãocomunsnaanálisedeprojetos,refletindonofi-nalofluxoderecursos,porunidadedetempo,daunidadeadministrativa,representadapeloprojetodentro da empresa rural. Todoprojetoapresentafluxosdeentradaesaídaderecursoseadiferençaentreestesrecur-soséchamadodefluxolíquido,sobreoqualsãoaplicadasastécnicasdedescontoparaocálculoda rentabilidade dos investimentos. Paraaformulaçãodosfluxosdeentrada,osvaloresmonetáriossãoobtidosdasseguintesfontes: venda de produtos do projeto, venda de produtos secundários ou subprodutos, valor resid-ual de todos os bens de capital que ultrapassem o horizonte do projeto, subsídios governamentais erecursosfinanceirosexternosoriundosdefinanciamento. Considera-secomosubprodutoapartedoprodutofinalqueéaproveitadaparaaumentarareceita do empreendimento como: esterco, bagaço da cana ou bezerros recém nascidos. O valor residual representa todos os bens de capital que ultrapassam o horizonte do projeto. Por exemplo, asconstruçõesdealvenaria,estoquederebanhosexistentesnofinaldoprojeto,terraeoutrasben-feitorias. Comrelaçãoaosfluxosdesaídas,existemdoistipos:despesasdeinvestimentosedespe-sas operacionais. As despesas de investimentos são todos os gastos com bens de capital, inclusive despesas cujo valor se incorpora aos bens de capital na fase de construção ou implantação do projeto, ou seja, além dos gastos feitos no ato da compra de máquinas, equipamentos, materiais de construção, as despesas adicionais necessárias na fase de implantação do projeto são incorpo-radas aos bens sob a forma de investimentos. As despesas operacionais são aquelas despesas necessárias para o pleno funcionamento do empreendimento, ou seja, são despesas da fase posterior à fase de implantação do projeto. São despesas operacionais: mão-de-obra, assistências técnicas, vacinas, gastos com sementes, energia e combustível. Acaracterização,detalhamentoecomplexidadedosfluxosdecaixavãodependerdotipoe

tamanhodeprojetoaserrealizado;dependem,também,dotipodeanálisequesetememvistaeadisponibilidadedeinformações. Nopresentetrabalhoformulou-seumfluxodecaixaondeforamconsideradasentradas,saí-daseosfluxoslíquidoscomosendoadiferençaentradaassaídas.Noitemdeentrada,foiconsid-erado apenas o valor da produção, sendo esta dada pela multiplicação entre quantidade produzida pela média mensal do preço do milho pago ao produtor no município de Uberlândia de 1996 a 2000. No item saídas, foram considerados os investimentos iniciais para a implantação do sistema de ir-rigaçãoecustoscommanutençãoeoperaçãodaculturadomilhoirrigado.Ositensquecompõemas saídas são: investimentos em máquinas, implementos, infra-estrutura e sistema de irrigação, custos operacionais com os sistemas de irrigação, custos operacionais referentes a recuperação e conservação do solo, custo com o preparo do solo, plantio e adubação, custo com tratos culturais e colheita e custo com insumos como fertilizantes, sementes, e defensivos agrícolas, herbicidas e inseticidas.Ofluxodecaixatambémécompostoporcustosdepós-colheita,comocustosdetrans-portes, secagem, descargas, armazenagem e pesagem. Outros custos considerados foram custos com administração que referem-se a custos com mão-de-obra administrativa, escritório, contabili-dade, viagens e taxas. ParadeterminaçãodocustodahoradePivôCentral,considerou-seoscustosfixosevar-iáveis.Oscomponentesdoscustosfixossãoenergiademandadaemanutençãopreventiva,oscustos variáveis são energia de consumo e reparos e manutenção. O orçamento relativo ao item Pivô Central engloba os custos de um sistema de 11 torres acionadoras e o custo de captação e bombeamento, composto dos seguintes itens: conjunto de moto-bomba, demais materiais elétricos, ligação de pressão, adutora e ligação do pivô. A vida útil do Pivô Central foi estabelecida considerando uma expectativa de 15 anos, fun-cionando, em média, quatro meses por ano, durante um período de 21,6 horas por dia, irrigando uma área de 100 hectares. Esses meses referem-se a três meses de funcionamento para irrigar a cultura plantada no período seco e um mês de irrigação suplementar para a cultura plantada no período de chuvas. A lâmina líquida do Pivô Central utilizada foi considerada igual a 600 (mm), área total de 100hectares,eficiênciadeirrigaçãode0,75,potênciadomotorelétricode100cv,erendimentodabombade75%evolumeemmetroscúbicos370,37.

3.2. Avaliação Financeira

Na avaliação econômica, as técnicas mais utilizadas são as que consideram a dimensão do temposobreosvaloresmonetários,sãoelas:ValorPresentedosfluxoslíquidosdoprojeto(VPL),aTaxa Interna de Retorno (TIR) e tempo de retorno do capital investido. Chama-seValorPresenteofluxolíquidodeumprojetoagrícoladehorizonteN,emqualqueranot,deLt,(t=0,1,2,3,...<N).EmgeralL0<0,quandot=0eLt>0parat≥1,ouseja,oinves-timento(L0)éfeitonoprimeiroanoeosretornoslíquidos(Lt),t≥1começamapartirdosegundoano. SegundoNORONHA(1987),ovalorpresentedeumprojetoédefinidopelaseguinte fór-mula:

VP =

Onde: ρ=taxadedescontorelevanteparaaempresa t = anos

O termo Valor Presente Líquido, às vezes, é usado com o intuito de chamar a atenção para ofatodequeosfluxosmonetáriosmedemasdiferençasentreasreceitasoperacionaislíquidaseos investimentos adicionais feitos com o projeto. Se o projeto for avaliado independente de outras alternativas de investimentos, o critério de

decisãoconsisteemaceita-loseoVP>0.Ouseja,deve-seaceitaroprojetopoisoseuvalorhoje,calculado com base no custo de capital da empresa, é maior do que seu valor de investimento ini-cial (NORONHA,1987). TambémfoiutilizadoocritériodaTaxaInternadeRetorno(TIR),combasenosfluxoslíqui-dosdecaixadoprojeto.Pordefinição,aTaxaInternadeRetornoéaquelevalor(i),quetornaaoValor Presente Líquido (VP) igual a zero.

Ou seja, se VP = = 0

Em que : N = horizonte do projeto t = anos i = taxa interna de retorno Então p é a taxa de retorno. O projeto é aceito se apresentar uma TIR igual ou maior o custo do capital da empresa. O período de retorno do capital, é o método que considera como elemento de decisão o número de anos necessários para que a empresa recupere o capital inicial investido no projeto. SejaL0oinvestimentoinicialeLtofluxoanuladoprojeto.SegundoNORONHA(1987)define-seoperíodo de recuperação do capital n, pela relação:

∑Lt=0t=0,1,2,3,....,NondeN>n

3.3. Análise de Sensibilidade

Umavezfeitaaanálisederentabilidadefinanceiraatravésdaestimativadovalorpresenteoudataxainternaderetorno,usandoosvaloressimuladosdosfluxosdecaixa,torna-senecessárioavaliar as principais variáveis envolvidas na produção do milho. Para que se tenha um levantamento mais seguro da viabilidade do projeto, não é válido ba-sear o processo de escolha somente na TIR ou no VPL, pois os mesmos não consideram o nível de risco do empreendimento. Para que o risco seja considerado numa tomada de decisão normal-mente fazem-se duas análises. Uma é a análise de sensibilidade e outra é a análise de probabili-dade. Aanálisedesensibilidadeconsisteemdefinirarentabilidadedoprojetoemfunçãodecadauma de suas variáveis, e observar a variação que ocorrerá na rentabilidade para cada alteração nas variáveis (BUARQUE,1991). BUARQUE(1991),tambémafirmaque,atravésdaanálisedesensibilidade,determina-seemquemedidaumerrooumodificaçãodeumadasvariáveisincidenosresultadosfinaisdopro-jeto. Além disso, tal análise é um instrumento de grande utilidade na administração futura, já que permite conhecer a importância de cada insumo e de cada variável sobre o desempenho da em-presa. Comaanálisedesensibilidadepode-severificaravariaçãonovalorpresenteounataxainternaderetornoquandosevariaumelementodofluxodecaixadoprojeto,ouseja,pormeiodaanálise de sensibilidade é possível deixar variar a estimativa dos parâmetros considerados mais importantes ou mais susceptíveis às incertezas, tais como: o preço de mercado, custo com a mão-de-obra,custocomenergiaesistemasdeirrigação,paraverificarseoprojetotornou-seviávelouinviável. Aosefazeraanálisedesensibilidade,normalmentemodifica-seapenasumavariáveldecadavez,deixandoasdemaisnosníveisoriginais.Assim,pressupõe-sequecadavariávelafetao resultado do projeto independentemente das demais. Quando há uma correlação positiva entre duas variáveis deve-se examinar o efeito total das duas no valor da taxa de retorno do capital in-vestido (BUARQUE ,1991).

NORONHA (1987), relata que a análise de sensibilidade consiste em determinar o ponto críticodedeterminadasvariáveis.Istoé,aquelevalordavariáveldependentequemodificaade-cisãodeaceitarparaaderejeitaroprojeto,ouvice-versa.Talmodificaçãoocorrequandocertovalorde uma variável X torna o valor presente do projeto igual a zero, considerando a taxa de desconto relevante. Ou quando certo valor da variável torna a TIR exatamente igual ao custo do capital. Para BUARQUE (1991), a análise de sensibilidade deve ser feita da seguinte forma: a) primeiramentedeve-seescolherocoeficienteasensibilizar,nocasodeumaanálisedopontodevista do empresário, é importante a rentabilidade em relação ao capital próprio, medido num ano de funcionamento normal, ou taxa interna de retorno. b) escolhido o indicador a ser sensibilizado, determina-se a sua expressão em função dos parâmetros e variáveis escolhidas. c) prepara-se um programadecomputação,sendoquenesteestudoutilizou-seosoftware@RISK,quepermiteaobtenção dos resultados a partir da introdução de valores nos parâmetros das variáveis. d) dessa forma,pode-seintroduzirvariaçõesnumoumaisparâmetroseverificardequeformaeemquepro-porçõesessasvariaçõesafetamosresultadosfinais.e)comopontodereferência,devem-setomarosvaloresnormaisdeterminadosnoestudodoprojeto.Deve-secalcularoresultadofinalescolhido,tomando por base os valores normais do projeto, depois altera-se o valor de um ou mais parâmet-ros. Deve-se dar preferência aos valores pessimistas em relação à rentabilidade. f) introduzem-se os novos valores na expressão, mantidos constantes os demais parâmetros. g) o novo resultado é então comparado com o seu valor normal. O@RISKconsideraasvariáveisdeestudocomoaTIRouVPLcomosendovariáveis“out-put” e as variáveis aleatórias como “inputs”. Esta sensibilidade é mostrada por dois métodos, análise deregressãoouanálise“Rank”decorrelação.Oresultadoédadoapartirdeumgráficonoestilotornado.Nestegráfico,asvariáveislocalizadasnapartesuperiorexercemmaiorinfluêncianasvar-iáveis de estudo do que as localizadas na parte inferior. Os índices de sensibilidade se encontram dentrodointervalo–1e1.Quantomaispróximode1ou–1,maiorainfluênciadavariável“input”sobreavariável“output”Ossinais(+)e(-)indicamsearelaçãoentreasduasvariáveisédiretaouinversa, respectivamente. 3.4. Análise de risco

Após a análise de sensibilidade faz-se a análise de risco, tal análise deve ser fundamentada no estudo de distribuição de probabilidades. Entre os métodos de simulação que utilizam probabi-lidade na análise de riscos, o método de Monte Carlo é o mais prático e um dos mais usados. Estemétodoébaseadonofatodequeafreqüênciarelativadeocorrênciadeumcertofenô-meno aproxima-se da probabilidade matemática do mesmo, quando a experiência é repetida várias vezes. AseqüênciadoscálculospropostanométododesimulaçãodeMonteCarloconstadequa-tro etapas que são: a) Identificaradistribuiçãodeprobabilidadedecadaumadasvariáveisrelevantesdofluxodecaixadoprojeto. b) Simulação de valores aleatórios- esta etapa consiste em utilizar o computador para gerar,aoacaso,umvalorparacadavariável,apartirdasdistribuiçõesdeprobabilidadeanterior-menteidentificadas. c) Calcular o valor das variáveis de estudo no caso a TIR , cada vez que for feito a se-leção ao acaso como indicado no item b. d) Simulação dos valores – repetindo-se as etapas “b” e “c” algumas centenas de vezes, gera-se igual número de valores para os indicadores de rentabilidade, a partir dos quais estima-se a distribuição acumulativa de probabilidade para cada indicador econômico. 4. RESULTADOS

4.1.Resultadosdofluxodecaixaparaoprojetodaculturademilhoirrigado

Naestruturaçãodofluxodecaixadoprojetoirrigadoforamdefinidosasentradas,assaídaseofluxolíquido.Considerou-seopreçoparaoprodutoigualaodomilhodesequeiro,R$180,00atonelada,entretantooníveldeprodutividadefoidefinidodeacordocomosníveisdeproduçãoparaa cultura do milho irrigado na região do Triângulo Mineiro, ou seja 12 toneladas por hectare, com uma produção de plantio direto e alta tecnologia.

Quadro1–Síntesedofluxodecaixadoprojetode100hectares da cultura do milho irrigado, em reais.

Fonte: Dados da pesquisa

Para determinação das saídas, consideraram-se os gastos com investimento em equipa-mentos,eminfra-estruturaeemsistemadeirrigação;oscustosoperacionaisenvolvemoscustoscomofuncionamentodosistemadeirrigação,oscustoscominsumos;eosserviçosdeadminis-tração e pós-colheita.

4.2.Análisefinanceira

Apósconstruirosfluxosdecaixadecadaprojetodaproduçãodemilho,pôde-seobteraTIR e os VPLs correspondentes ao projeto de produção do milho irrigado. Para o projeto estudado, utilizou-setaxasdejurosanuaisdemercadoiguaisa12%,18%e30%,quesãoasestimativasmaisprováveis, dos valores máximos e mínimos das taxas de juros para o período de análise, deste modo pôde-se determinar três VPL,s diferentes para o projeto. O projeto irrigado obteve os seguintes resultados: R$ 276.871,00 para o VPL com uma taxa dedescontode12%aoano,R$136.058,78paraoVPLcomtaxade18%aoanoe-R$1.426,46paraoVPLcom30%detaxadedescontoaoanoeTIRiguala29%.ComoaTIRrepresentaex-atamente a taxa de retorno sobre o saldo do capital empatado no projeto durante sua vida útil, en-quantoocapitalinicialestásendorecuperando,pode-seafirmarqueaTIRdoprojetoirrigadoiguala29%representaataxaderetornoquerecuperatodoocapitalempatadonoprojeto.Emsuma,pode-sedizerquetodoinvestimentoérecuperadocomumrendimentode29%aoano,duranteosquinzeanosdevidaútildoprojetoirrigado.Masnota-sequeàumataxadejurosiguala30%aoano o projeto torna-se inviável.

Quadro 2 - Taxa interna de retorno (TIR) e valor presente líquido (VPL), correspondentes aos fluxosdecaixadossistemasdeproduçãodomilhocomirrigação.

Fonte: dados da pesquisa

4.3. Análise de sensibilidade

Para análise de sensibilidade do projeto da cultura do milho com irrigação foram utilizadas asvariáveiscomasmaioresparticipaçõespercentuaisnocustototaldoprojetodeplantiodomilhoirrigado;asvariáveisdeentrada,“inputs”,foramasseguintes:investimentoempivôcentral,custocom energia elétrica para o funcionamento do pivô central, mão-de-obra utilizada no pivô central, preço da semente híbrida, preço do adubo, uréia, custo com herbicidas, colheita mecânica e trans-porteinterno;taisvariáveisjuntascontribuemcommaisde70%docustototaldoprojeto. Com base na Figura 1, pode-se notar que, a variável preço do milho aparece como a variável quemaisafetaoVPL.Quandohávariaçãode10%novalordopreçodemercado,oVPLdaculturairrigadasofreumavariaçãodeaproximadamente83%.Quandooprojetoéirrigado,avariávelquemaisinflui,deformanegativasãoinvestimentoscomainstalaçãodopivôcentral,seguidopeloscustoscomenergiaelétrica,aduboecolheitamecânica.Quandohávariaçãode10%novalordoinvestimentoinicialcompivôcentral,oVPLapresentavariaçãode-53,3%;essavariaçãotãosig-nificativapodeserexplicadapelofatodeosinvestimentosiniciaiscomPivôCentralrepresentaremmaisde25%docustototaldoempreendimentonoseuprimeiroanodevida.Outropontorelevanteéocustocomaenergianecessáriaparaoperarosistemadeirrigação;esteitemcontribuiucom-14,8%paraasvariaçõesdoVPL,seguidopelocustocomadubo,cujacontribuiçãofoi-10,3%.

Figura1-ClassificaçãodasvariáveismaissensíveisemrelaçãoaoVPLdoprojeto.

4.4. Análise de probabilidade

Considerando que as variáveis mais relevantes, obtidas por meio da análise de sensibi-lidade, foram: preço do milho, preço do pivô central, energia, mão-de-obra, transporte interno, colheitamecânicaeinsumos,tem-sequesuasdistribuiçõesdeprobabilidadeforamassociadasaoindicador de rentabilidade do projeto, a TIR. Pelo método de Monte Carlo, encontraram-se os per-

centuais de probabilidade da TIR do empreendimento irrigado. Desse modo, a simulação apresen-tou valores mínimos, médios e máximos, que foram comparados com a probabilidade de ocorrência do real valor da TIR. Comasdistribuiçõesdeprobabilidade,pôde-severificarquaisaschancesdeocorrênciadas TIRs mínima, média e máxima e do valor original . Na Figura 2, mostra-se, de forma clara, a distribuição de probabilidade para os valores simulados da TIR, considerando como referência a taxaderemuneraçãodemercadodocapitaliguala30%aoano. Tomando como base os valores mínimos, médios e máximos obtidos pela simulação iguais a25%paraaTIRdemenorvalor,30,60%paraaTIRdevalormédioe37,20%paraaTIRdemaiorvalor,torna-sepossíveltiraralgumasconclusõessobreograuderiscodoinvestimento. Observa-sequeaTIRde25%temaprobabilidadede0,06%deocorrência.ATIRde37,3%possuiumaprobabilidadeocorrênciapoucomenor,0,02%.ATIRiguala31,84%éaquepossuiamaiorprobabilidadedeocorrênciacomaproximadamente10,4%deprobabilidadedeacontecer,aTIRmédiapossuiaprobabilidadede7%deocorrência.

Figura2-DistribuiçãodefreqüênciadaTIRdoprojeto.

Deumaformageral,pode-seconcluir,pelográficodedistribuiçãodefreqüênciaderivadodassimulaçõesdo@RISK,queaTIRpossuiasmaioresfreqüênciasnointervaloquevaide30%até34,5%e,porconseqüência,oprojetotemgrandeprobabilidadedeterumrendimentomaiorqueataxaderentabilidadedomercado,poisexisteaprobabilidadede60%dechancedosvaloresdas TIRs encontrarem-se neste intervalo. Aanálisefeitapormeiodacurvaacumulativapermite-nostirarconclusõesmaisdetalhadassobre a probabilidade de ocorrência dos valores da TIR. A análise feita com a curva acumulativa de probabilidades também leva em consideração os valores mínimos, médio, máximos e o valor originaldaTIR,tomandocomomedidadeprobabilidadeafreqüênciarelativadaTIR. A Figura 3, retrata a distribuição de probabilidade acumulativa para a TIR do projeto de plan-tio de milho com irrigação.

Figura 3 - Distribuição de probabilidade acumulativa para a TIR do projeto irrigado. CombasenasinformaçõesmostradasnaFigura2,verifica-sequeaprobabilidadedaTIRserigualoumenorque25%éde0,06%,ouseja,aprobabilidadeépraticamentenula.Emcontra-

partidaaprobabilidadedaTIRestarpresentenointervaloquevaide25%até37,3%aoanoéiguala99,9%.AprobabilidadedaTIRserigualoumenor29%éde42,7%;nota-sequeaTIRde30,6%éovalormédioaproximadodaTIRsimuladaetemachancede49,3%deocorrência. O Quadro 3 mostra, de forma sintetizada, as probabilidades de ocorrência da TIR de valor mínimo, máximo e médio para o projeto a cultura do milho irrigado

Quadro 3 - Probabilidade de ocorrência da TIR original, TIR mínima, máxima e média para o projeto de milho irrigado.

Fonte: dados da pesquisa

5. CONCLUSÃO

Pormeiodoscoeficientesdeanáliseeconômica,VPL,daTIRedoperíododeretornodocapital, pôde-se concluir que o projeto irrigado é viável para o período em questão, para as taxas de descontode12%e18%aoano.Oprojetoirrigadoapresentouosmaioresretornosquandoataxadedescontofoiiguala12%aoanoeapresentou-seinviávelparaumataxadedescontosuperiora30%aoano.ATIRde29%aoanoconfirmasuaviabilidade.Comaanálisedotempoderetornodocapital o projeto apresentou tempo de recuperação do capital investido, igual a 3 anos. Na análise de sensibilidade, o indicador econômico observado foi o VPL. Pôde-se concluir que as variáveis mais passíveis de risco são: preço do milho, preço do pivô central, energia elétrica e adubo, respectivamente. Pode-se concluir que a variável custo com pivô central tem participação relevantenosresultadosfinanceirosdoprojeto.Notou-sequeopreçodemercadodomilhoéavar-iávelmaissensívelnoprojeto,umavezqueapresentavariaçõesnoVPLsuperioresa80%,quandoamesmaésubmetidaavariaçõesiguaisa10%. Selecionadas as principais variáveis de risco, realizou-se a simulação por intermédio do mé-todo de Monte Carlo, que permitiu a análise de probabilidades. Oprojetoirrigadoapresentousignificativaprobabilidadedeterumataxaderendimentosu-perior à taxa de rendimento do mercado. Mesmo assim, há o risco de se ter uma taxa de retorno menorqueadesejada,ouseja,menorque30%aoano.Talriscopodeseratribuídoàsvariaçõesdos preços de mercado e à realização, por parte do projeto irrigado, de vultosos investimentos na implementaçãoemanutençãodossistemasdeirrigação;valeressaltarqueaimplementaçãodeum sistema de irrigação do tipo pivô central custa cerca de R$1.500,00 por hectare. Conclui-se que o produtor deve estar atento aos custos de implementação do sistema e aos preçosdemercado.Eledeve-seateraofatodequeasoscilaçõesnosníveisdepreçoacontecem,em grande parte, pelo lado da oferta, causadas por fatores climáticos. Outro ponto importante rela-tivo ao preço do produto é que o Brasil tem apresentado, devido ao aumento de consumo interno, tendência de aumento no volume de importação do milho nos últimos anos. Com isso, espera-se no médio prazo uma internacionalização dos preços do milho, e isso fará com que o mercado interno passeaacompanharasvariaçõesdascotaçõesinternacionais;consequentemente,osriscosdepreço podem aumentar. Nesse contexto, recomenda-se que os produtores façam maior utilização de instrumentos queatuamnadiminuiçãodosriscosdepreços,aexemplodosmercadosfuturosoudadiversificaçãoda produção. Pelo lado do governo, sugere-se maior estímulo e aperfeiçoamento dos mecanismos que permitam uma ação estratégica de políticas de desenvolvimento regional que possam atenuar

agrandeheterogeneidadedaproduçãointernadomilho,alémdeumaeficazpolíticadegarantiade preços mínimos acompanhada de uma política de créditos subsidiados, políticas essas que au-mentam a produção e ao mesmo tempo protegem a renda do produtor rural. Além de todos os cuidados com o preço de mercado e os custos operacionais, o produtor que faz uso de irrigação também deve atentar para um fator de fundamental importância para o funcionamento do sistema, a energia elétrica. Diante da atual crise de energia pela qual passa o país, os produtores podem se defrontar com uma situação delicada, pois os sistemas de irrigação, emsuagrandemaioriasãomovidosàenergiaelétrica.Assimparasuperartaisdificuldades,reco-menda-sequeosprodutores façamummanejoeficientedosistema,evitandoodesperdíciodeágua e energia, ou até mesmo que adotem sistemas alternativos como o pivô central movido a óleo diesel, que tem como desvantagem os altos custos operacionais, que podem comprometer o resultadofinanceirodoprojeto.

6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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MOREIRA, H. M. Combinação ótima de atividades e efeito do risco de preços nos planos de produção de empresas rurais da Zona da Mata de Minas Gerais-1978-79..Viçosa: U.F.V 1980.111P.(Dissertação de Mestrado em Economia Rural)-Universidade Federal de Viçosa.1980.

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YOUNG,D.Riskconceptsandmaesuresfordecionanalysisin:BARRY,P.J.RiskManagementinagricultura. IOWA State University, Iowa, 1984, cap. 3. P. 31-42.

Apêndice

Quadro 7A - Fluxo de caixa da cultura do milho irrigado, 100 ha

Quadro 7A, Cont.

AVALIAÇÃO DO RISCO DE INVESTIMENTO NA CULTURA DO MILHO IRRIGADO NA REGIÃO DO TRIÂNGULO MINEIRO

Leandro Maia Fernandes – Mestre em Economia Rural – Professor de Economia da Faculdade de Ciências Econômicas e Administrativas de Divinópolis - FacedCarlos Antônio Moreira Leite – Professor Titular do Departamento de Economia Rural da Universi-dade Federal de Viçosa - UFV.

Endereço Residencial: Rua Olimpio Gomes Branqinho751, N. S. das Graças, Divinópolis, MG, Cep: 35501096,fone:(37)32222247email:[email protected]

Endereço Comercial: Faced, Praça do Mercado 191 – Centro – Divinópolis – MG, Cep: 35500048 , fone: (37) 3222 7055

______________________

Artigo derivado de tese de mestrado em Economia Rural do Departamento de Economia Rural da Universidade Federal de Viçosa.

DA VALIDADE DA ASSUNÇÃO DE DÍVIDA NO CONTRATO DE FINANCIAMENTO HABITACION-AL SEM A INTERVENIÊNCIA DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA

Fernanda Koch1 Sérgio Jacob Braga2

INTRODUÇÃO

Todos os dias batem as portas do Poder Judiciário centenas de cidadãos buscando a tutela doEstadoafimdeterreconhecidoocontratodepromessadecompraevendafirmadocomomu-tuário originário de pacto habitacional do Sistema Financeiro da Habitação. Taiscessionáriosbuscamoreconhecimentodeseudireitoperanteoagentefinanceirocre-dor,e,emconseqüência,terlegitimidadeativaparapleitearemarevisãodascláusulasdomútuohipotecário, o direito à quitação antecipada ou a retomada dos pagamentos em caso de temporária inadimplência. Portanto,fez-senecessárioumestudomaisprofundodotema,verificando-seotratamentodado pela doutrina e a jurisprudência à questão. Assim, no capítulo primeiro, será feito um breve histórico do Sistema Financeiro da Habit-ação, demonstrando-se seu conceito, bem como a natureza jurídica dos contratos regidos pela Lei 4.380/64. Dandoseqüênciaaoestudo,nocapítulodois,seráabordadodeformaamplaoconceitodaassunção de dívida no direito pátrio. Descendo a detalhes, serão manifestados todos os aspectos da cessão de débito no âmbito do Sistema Financeiro da Habitação - SFH, caracterizada especialmente pela ausência de anuên-cia do credor com a transferência do contrato a terceiros, estranhos ao mútuo habitacional. Será analisado o tratamento dado pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais, Tribunal Re-gional Federal da 1ª Região e do Superior Tribunal de Justiça ao tema. Já no capítulo terceiro será demonstrado como o direito de propriedade permite que seja a cessãodomútuoaterceiro.Também,comoafunçãosocialdapropriedadeedocontratoimpõemodeverdointerpreteemdarumadestinaçãosocialaosimóveisfinanciados,nãosendopossívelpermitiraoagentefinanceirodesviarafinalidadedobem. Por outro lado, se abordará a questão da cláusula potestativa de vencimento antecipado da dívida em caso de cessão do mútuo. Porfim,serádemonstradaapossibilidadedeanuênciatácitaocredorhipotecáriosenoti-ficadonosmoldesdoartigo303doCódigoCivilde2002,nãoseopuserexpressamenteàtrans-ferência.Ademais,emfacedodireitodeseqüelainerenteagarantiahipotecária,seráabordadaavalidade da recusa por parte do credor.

1. DO SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO

1.1. Do histórico e conceito do Sistema Financeiro da Habitação

O crédito imobiliário surgiu, historicamente, entre os anos 40 e 60, sendo oferecido pela Caixa Econômica Federal, pelo Instituto de Previdência Social e bancos privados, sem qualquer incentivo por parte do Estado. Posteriormente, em 1964, através da Lei 4.380, de 21 de agosto de 1964, foram criados o Sistema Financeiro da Habitação e o Banco Nacional da Habitação, como o intuito de estimular aconstruçãodehabitaçõescom interessesocialeofinanciamentoparaaconstruçãodacasaprópria, especialmente para as classes da população de menor renda.

1 Fernanda Koch é advogada em Belo Horizonte, especialista em Direito Imobiliário, sócia-fundadora do escritório Braga, Koch e Lamounier Assessoria e Consultoria Jurídica.2 Sérgio Jacob Braga é advogado em Belo Horizonte, especializada em Direito Processual, Mestre em Direito Público, professor de graduação e pós-graduação e sócio-fundador do escritório Braga, Koch e Lamounier Assessoria e Consultoria Ju-rídica.

Em 1988 foi extinto o Banco Nacional de Habitação, sendo a Caixa Econômica Federal in-cumbida da gestão do Sistema Financeiro da Habitação, com regras ditadas pelo Banco Central do Brasil, como estabelece o Decreto-lei n.° 2.291/88. A Lei n.° 4.380/64 estabeleceu normas protetivas aos mutuários, atribuindo caráter social ao buscarminimizaroproblemadodéficithabitacionaldopaís.Déficiteste,queperduraatéosdiasatuais,razãopelaqual,milhõesdecidadãoscontinuamaprocurarocréditoimobiliário. Frise-se que o objetivo primordial do Sistema Financeiro da Habitação consiste e sempre consistiu na facilitação à aquisição da casa própria. Nesse contexto, importante salientar que o artigo 5° da Lei de introdução do Código Civil es-tabeleceque“naaplicaçãodalei,ojuizatenderáaosfinssociaisaqueelasedirigeeàsexigênciasdo bem comum’’ (BRASIL, 2008, p.163). A origem dos recursos para o sistema, também foi determinada pela Lei n.° 4.380/64. Atualmente, temos duas fontes de recursos: a caderneta de poupança e o Fundo de Garan-tia por Tempo de Serviço (FGTS). Éobrigatórioque70%(setentaporcento)dosrecursosdacadernetadepoupançasejamdestinadosafinanciamentoshabitacionais,sendoque,destetotal,80%(oitentaporcento)devemseraplicadosemoperaçõesdoSFH,eorestanteemcarteirashipotecárias,quesãooperaçõesàtaxa de mercado. Deste modo, os recursos do Sistema Financeiro da Habitação advêm da própria população brasileira, seja através de suas economias depositadas nas cadernetas de poupança, seja através do FGTS. Assim,osvaloresemprestadosaosmutuáriosretornamaosagentesfinanceiros,emformadeprestações,devidamentecorrigidas,oquefazcomqueocapitalempregadonosfinanciamentosretorneaosistema,permitindoaconcessãodenovosempréstimosparaomesmofim. Aformadecorreçãodosencargosdofinanciamentoédesimplescompreensão.Noscon-tratosfirmadospeloPlanodeEquivalênciaSalarialporCategoriaProfissional–PES-CP,oreajustedasprestaçõesestávinculadoàvariaçãodossaláriosdosmutuários,nãoexcedendoavariaçãodosaláriomínimo.Desta forma,àmedidaqueacategoriaprofissionalé reajustada, tambéméatualizado ao valor da prestação. Isto, teoricamente, assegura o pagamento regular do mútuo, pois mantém o equilíbrio entre a despesa e a renda do contratante. Porém,osaldodevedordofinanciamentoécorrigidomensalmentepelaTaxaReferencial–TRououtroíndicequereflitaaperdadopoderaquisitivodamoedanacional. Temos,portanto,queasprestaçõessãoreajustadasanualmente,medianteoíndicedacat-egoriaprofissionaldomutuárioeosaldodevedoréreajustadomensalmente,medianteaaplicaçãoda TR. O resultado de tal operação não poderia ser diferente. O valor pago a título de prestação não ésuficienteparaamortizarosaldodevedor,quesófazcrescercomopassardosanos,gerandoumsaldoresidualaofinaldoprazocontratado. Foinosanos80queocorreuomaiornumerodefinanciamentoshabitacionaisnopaís. A explosão do mercado imobiliário, somando ao aumento populacional, à descoberta dos cidadãos das vantagens (e desconhecimento das desvantagens) dos financiamentos em longoprazo,eaograndevaloreconômicodisponibilizadoespecificamenteparaSFH,foramosprincipaispromotores deste crescimento. Até 1987, grande parte dos financiamentos contava com cobertura do FCVS- Fundo deCompensação de Valores Salariais, o qual concedia a quitação do contrato com o pagamento da última prestação. Deste modo, não havia interesse de agir por parte dos mutuários para buscarem o equilíbrio contratual juntamente ao Poder Judiciário, posto que inobstante o valor do saldo devedor no paga-mento da última prestação, este seria absorvido pelo FCVS. Ocorrequedepoisde1988foidrasticamentereduzidoonúmerodefinanciamentoscomacobertura do referido fundo, posto que para que o mutuário tivesse esse direito, o valor do imóvel, oudofinanciamento,considerando-sesempremaior,nãopoderiaultrapassarolimitefixadopeloConselhoMonetárioNacional,limiteesseirrisório,beneficiandopouquíssimosconsumidores.

Assim estabeleceu o Decreto-lei n.° 2.349, de 29 de julho de 1987:

Art.1°.OscontratoscommutuáriosfinaisdoSistemaFinanceirodaHabitaçãofir-mados a partir data da publicação do presente decreto-lei, somente poderão conter cláusulas de cobertura de resíduos dos saldos devedores, pelo Fundo de Compen-saçãodeVariaçõesSalários–FCVS,quandoovalordofinanciamentonãoexcederolimite,fixadoparaessefim,peloConselhoMonetárioNacional.(BRASIL.Decreto-lei n.° 2.349 de 29 de junho de 1987)

Nos demais contratos, de acordo como o parágrafo segundo desse mesmo Decreto-lei, os devedoresficaramresponsáveispelospagamentosdetodososresíduosdesaldodevedoresex-istentesatéasuafinalliquidação,naformaquefoipactuadanocontratoadesivo. Embora não haja um prazo rígido para amortização dos contratos determinado pela lei, a maioriatemseutermoem240(duzentosequarenta)meses.Assim,temosquemuitosfinancia-mentosfindarãoentreanosde2008e2011. ApossibilidadederefinanciamentodosaldodevedorresidualfezcomquemuitosmutuáriosprocurassemoPoderJudiciárioparareequilibrarseusfinanciamentos,especialmenteemrazãodamitigação do princípio da pacta sunt sevanda e das normas protetivas aos consumidores estabel-ecidos pelo Código Consumerista. A corrida de milhares de mutuários ao Poder Judiciário trouxe a tona diversos problemas do Sistema Financeira da Habitação, como a venda casada de seguros, a capitalização de juros na correçãomonetária,aplicaçãodeíndicesdiversosparacorreçãodasprestaçõesedosaldodeve-dordofinanciamento,acapitalizaçãoexistentena fórmulamatemáticadaTabelaPrince,dentreoutros. Noentanto,parapostularemjuízorequerendoarevisãodofinanciamento,énecessárioquea parte autora seja detentora de legitimidade ativa. Enesse contexto insere-seaquestãoda validadeda transferênciado financiamento re-alizado pelo mutuário original a terceiro, estranho ao contrato, sem a interveniência da instituição financeira. Atualmenteexistemmilhõesdecidadãosqueoptaramporessetipodecontratação,que,porvezes, não são sequer ouvidos pelo Poder Judiciário ao argumento de ilegitimidade ativa, cabendo a estes amargar todas as irregularidades contratuais, o que fere o direito constitucional de acesso à justiça. Afora essa questão, tais cessionários não têm o poder de negociar diretamente com a insti-tuiçãofinanceira,postoqueestanãoosreconhececomomutuários.

1.2. Da natureza jurídica dos contratos do Sistema Financeiro da Habitação

Questão relevante no Sistema Financeiro da Habitação é a natureza jurídica dos contratos definanciamentoshabitacionais,umavezquesãocaracterizadospelaatipicidade. Em verdade, em tais avenças estão contidos dois contratos: um, de compra e venda esta-belecidaentreaspartescompradoraevendedoradoimóvel;eoutro,demútuocomgarantiahipo-tecária,ondeocompradorobtémmedianteoagentefinanceirodeterminadovalorqueéentregueaovendedor,emrazãodoquedáemgarantiadofinanciamentooimóveladquirido,incidindosobreeste gravame hipotecário. O agente financeiro detém tão-somente a hipoteca, na qualidade de mero credor hipo-tecário. Já o mutuário, com a compra e venda efetuada ostenta a partir de então a qualidade de proprietário.Talqualidadesóserádesfeitaemcasodeinadimplementodasprestaçõesedacon-seqüenteexecuçãodocontrato,queacarretaráaarremataçãodoimóvelporterceiroouasuaad-judicação por parte do credor hipotecário. E, sendo o mutuário o proprietário do imóvel, tem sobre ele as prerrogativas de dono, poden-do usar, gozar e dispor do mesmo, nos limites da função social da propriedade.

2. DA ASSUNÇÃO DE DÍVIDA

2.1 Aspectos gerais da assunção de dívida

Assunção de dívida ou cessão de débito é negocio jurídico por meio do qual terceiro assume a responsabilidade da dívida contraída pelo devedor originário, sem que haja novação subjetiva passiva. O Novo Código Civil regula a matéria nos artigos 299 a 303. O artigo 299 do referido código estabelece que ‘’É facultado a terceiro assumir a obrigação do devedor, com o consentimento ex-pressodocredor,ficandoexoneradoodevedorprimitivo,salvoseaquele,aotempodeassunção,era insolvente e o credor o ignorava’’. (BRASIL, 2002). Este modelo jurídico não estava inserido no Código Civil de 1916, apesar de admitido em sede doutrinária e jurisprudencial em homenagem ao principio de autonomia privada. No Direito Romano não era possível a assunção do débito sem a novação, em razão da concepção estritamente personalista da obrigação. ApenasnoDireitomoderno,especialmentenoDireitoAlemãodofinaldoséculoXIX,passoua ser admitida a substituição do devedor sem que ocorresse a novação subjetiva passiva. OsilustresdoutrinadoresNelsonRosenvaldeCristianoChavesdeFariasqualificamoinsti-tuto jurídico:

Verifica-seaassunçãodedívidaquandoumterceiro(assuntor),estranhoàrelaçãoobrigacional, assume a posição de devedor originário na relação jurídica, com a anuência do credor. Em verdade, é uma forma de sucessão a titulo singular do débi-to, pois através de um negócio jurídico dispositivo o devedor é excluído da obrigação, sem que a substituição por outrem seja capaz de extinguir a obrigação preexistente, que subsistirá com seus acessórios. (ROSENVALD, 2008, 238p.).

Basicamente, a assunção de dívida difere-se da novação subjetiva passiva, pois naquela a relação obrigacional primitiva não se extingue, permanecendo intocável. Principalmente, na cessão de débito não se encontra presente o animus novandi. O ânimo de novar é essencial para que seja caracterizada a novação, sob pena de, não ex-istindodeformaexpressaouinequívoca,asegundaobrigaçãoapenasconfirmaaprimeira. Neste sentido, o artigo 361 do Código Civil estabelece que “não havendo ânimo de novar, expressooutácito,masinequívoco,asegundaobrigaçãoapenasconfirmaaprimeira’’.(BRASIL,2002). Assim, a assunção de dívida é a operação pela qual um terceiro, estranho à relação jurídica, obriga-se perante o credor a efetuar a prestação devida por outrem, sem que haja novação, com o consentimento do credor.

2.2.DaassunçãodedívidasemaanuênciadainstituiçãofinanceiranoSistemaFinanceiroda Habilitação:

A assunção de dívida no âmbito do Sistema Financeiro da Habitação é popularmente de-nominada ‘’contrato de gaveta’’ ou ‘’contrato de venda de chaves’’. Se de modo geral a cessão de debito exige a concordância expressa do credor, aqui ela é caracterizada exatamente pela falta de anuência deste com a transação. Ocorre quando o mutuário original transfere sua dívida a terceiro, sem a interveniência da instituição financeira credora,mediante contratodepromessade comprae venda.Nestaoper-ação,omutuárioalienaoimóvelfinanciado,recebendodeterminadovalor,assumindoapartirdaíopromitentecompradoraobrigaçãodepagaroencargomensalperanteoagentefinanceiro. Ofinanciamentoeaescrituracontinuamemnomedemutuáriooriginal,maséosegundocomprador que tem a posse do imóvel e faz os pagamentos dos encargos. Esta forma de contratação é largamente utilizada pela população brasileira, possuindo vital importânciaparaomercadoimobiliário.Estima-sequecercade25%(vintecincoporcento)dos

contratosdefinanciamentohabitacionaistenhamsidorepassadosaterceirospormeiode‘’contra-tos de gavetas’’. Antesde1990,astransferênciasdosfinanciamentoserampermitidasatodososcontratos,mediante a simples substituição do devedor, não havendo qualquer alteração do contrato original. Era necessário, porem, seguir, os parâmetros da Lei de Registros Públicos (Lei n.° 6.015/73), especialmente o artigo 292, que estabelece:

Art.292–ÉvedadoaostabeliãeseosOficiaisdeRegistrodeImóveis,sobpenaderesponsabilidade, lavrar ou registrar escritura ou escritos particulares autorizados por lei, que tenham por objeto imóvel hipotecado a entidade do Sistema Financeiro da Habitação, ou direitos a eles relativo, sem que conste dos mesmos, expressa-mente, a menção ao ônus real e ao credor, bem como a comunicação ao credor, necessariamente feita pelo alienante, com a antecedência de, no mínimo 30 (trinta) dias. (Incluído pela Lei n° 6.941, de 1981). (BRASIL. Lei n.° 6.015 de 31 de dezembro de 1973).

Destemodo,apósacomunicaçãopréviaaoagentefinanceiro,depoisde30dias,erapos-sívelalavraturadaescriturapúblicadecompraevendadeimóvelfinanciadoedevidamentereg-istradonoCartórioImobiliário.Édeseobservarquetalescritura,aoladodanotificaçãoprévia,de-veriaserlavradanoprazomáximode60diasacontardadatadanotificaçãoaocredorhipotecário,sob pena de perder a validade (artigo 293). ALein.°8.004,demarçode1990,ao regulamentara transferênciadosfinanciamentos,crioudiversasexigênciasasassunçõesdedívida.(BRASIL,1990). Impôs a lei, a interveniência obrigatória da instituição financiadora no ato da transferên-cia,bemcomoapermissãoparafinanciamentosemqueovalororiginalnãoultrapassasse1.500VRF(valordereferenciadefinanciamento)eavedaçãodorepasseparacontratosfirmadosapós28/02/1986. Posteriormente, a Lei 10.150/2000 deu nova redação aos artigos 2° e 3° da supracitada lei, determinando que a transferência devesse ocorrer mediante simples substituição do devedor, mantidasparaonovomutuárioasmesmascondiçõeseobrigaçõesdocontratooriginal,desdequeo novo devedor comprovasse suas capacidade de pagamento em relação ao valor do novo encargo mensal (BRASIL, 2000). Deste modo, devido ao aumento das exigências legais e da morosidade dos agentes do Sis-tema Financeiro da Habitação em concederem aprovação às transferências, após 1990 aumentou a difusão dos ‘’contratos de venda de chaves’’. Sobreoassunto,odoutrinadorAndreLuizMendonçadaSilva,naobra‘’QuestõesdoSis-tema Financeiro da Habitação’’, com excelência ponderou:

Os contratos de gaveta se estenderam por todo o Brasil, tudo com o intento de se fugirdeumnovofinanciamentoourefinanciamentoperanteoagentefinanceiro,emque o prazo do resgate da dívida seria dilatada com a desconsideração do prazo em quemutuáriooriginalpagouosencargosmensais.Ocorresseonovofinanciamento,adívidaseriaaindaaumentadae,conseqüentemente,ovalordanovaprestação,sem falar no aumento dos encargos e no fato de que quase sempre o novo contrato não contemplava mais os benefícios contidos no primeiro, mas, ao contrário, trazia cláusulas prejudiciais ao novo adquirente. Em resumo, foi em razão de tais fatos que houve a proliferação dos denominados contratos de gaveta. (MENDONÇA DA SILVA, 2004. p. 231).

Portanto, os ‘’contratos de gaveta’’ originaram-se da celeridade do comércio imobiliário e da negativadoagentefinanceiroemaceitartransferênciasdetitularidadedomútuosemrenegociarosaldo devedor. No entanto, esses contratos não se apresentam totalmente despidos de amparo legal. O poder Legislativo, comprovando sua ciência desta forma de contratação, e no intuito de regularizar a questão, deu suporte legal aos ‘’contratos de gaveta’’ através do artigo 22 da Lei n.° 10.150/2000.

Assim estabelece o art. 22 da Lei n.° 10.150/2000:

Art. 22. Na liquidação antecipada de dívida de contratos do SFH, inclusive aquelas que forem efetuadas com base no saldo que remanescer da aplicação do disposto nos §§ 1°, 2° e 3° art. 2° desta Lei, o comprador do imóvel, cuja transferência foi efetuadasemainterveniênciadainstituiçãofinanciadora,equipara-seaomutuáriofinal,paratodososefeitosinerentesaosatosnecessáriosàliquidaçãoehabitaçãojunto ao FCVS, inclusive quanto à possibilidade de utilização de recursos de sua conta vinculada do FGTS, em conformidade com o disposto no inciso VI do art. 20 da Lei n° 8.036, de 1990. (Brasil. Lei n° 10.150 de 21 de dezembro de 2000).

Pormeiodesteartigo,aleiequiparaomutuáriofinal,ouseja,aquelequefoiregularmenteaceitopeloagentefinanceiro,aoadquirentedeimóvelcujatransferênciatenhasidorealizadasema anuência deste. Contudo, o parágrafo primeiro deste mesmo artigo estabelece como condição o fato da transferência ter ocorrido até 25 de outubro de 1996, mediante a apresentação do contrato particu-lardecessãodedireitosoudepromessadecompraevendacomfirmareconhecidaemcartório,ou mediante a apresentação de procuração por instrumento público ou instrumento particular, esse tambémcomfirmareconhecidaemcartório. Temos,portanto,noatualsistemalegislativopátrioduassituaçõescomrelaçãoàstransfer-ências habitacionais sem a interveniência do credor. Uma a dos contratos efetuados até 25 de outubro de 1996, reconhecida pela legislação, com maioraceitaçãopeloPoderJurídico;eumasegundadoscontratosfirmadosapósestadata,queficamamercêdasmaisvariadasdecisõesjudiciais,furtandodosassuntoresseusdireitosessen-ciais. Assim, há uma lacuna legal em relação à normatização dos “contratos de gaveta”. Em artigo publicado no Boletim Informativo Juruá, Francisco Carlos Duarte, procurador do Estado do Paraná, e Andreza Cristina Stonga, advogada, advertem que o direito deve acompan-harosfatossociaise,conseqüentemente,onãoreconhecimentodosdenominadoscontratosdegaveta materializa uma política judiciária conservadora e própria de denegação social, a saber:

ÉimportantelembrarqueoDireitodeveretratarassituaçõesocorridasnasociedade,privilegiando sempre o interesse social, que deve ser tutelado pelo ordenamento ju-rídico. Portanto, o Direito não pode simplesmente ignorar hipótese de que ‘’contratos de gaveta’’ são celebrados pelas pessoas todos os dias. Ignorar essa questão é fechar os olhos para a realidade social apresentada, bem como para as mudanças ocorridas na sociedade nos últimos anos. Alias, em toda e qualquer eleição, uma das promessas de campanha mais difundidas pelos candidatos refere-se à aquisição dacasaprópria,sonhoacalentadopormilhõesdebrasileiros.Infelizmente,comootempo, esse sonho pode se tornar um pesadelo, inclusive no momento de se discutir ocontratocomoagentefinanceiro.Tendencialmente,ajustiça,sobretudoaJustiçaFederal, tem negado validade aos assim chamados ‘’contratos de gaveta’’, adotando umapolíticajudiciáriaconservadora,quedeslegitimaocompradordoimóvelfinan-ciado através de cessão de contrato mútuo imobiliário para solicitar, judicialmente, a suarevisãoemfacedoagentefinanceirointegrantedoSFH.Dogmaticamente, a legitimidadeativa para agir em juízo resulta da afirmaçãodealguém ser titular de direito material, que viabiliza decisão judicial favorável a tutela dessapretensão.Nasaçõesrevisionaisdecontratodemútuoimobiliário,ondesediscuteaabusividadedecláusulascontratuais,ocompradordo imóvelfinanciadopode expor uma pretensão à revisão.A legitimidade para a revisão dos contratos relativos ao SFH deve ser da pessoa que está no imóvel, independentemente de ter sido ela quem assinou ou não o contrato. Essaafirmativabaseia-senaidéiaqueatribuialegitimidadeàspessoasquesofremosefeitosdasdecisõesjudiciais.Ora, no contrato de mútuo imobiliário, quem sofrerá os efeitos de qualquer pronun-cialmente judicial será o individuo que reside no imóvel. Na realidade, a organização

judiciária, através de um excessivo formalismo, tem inviabilizado ao comprador a análise judicial de seus direitos fundamentais lesados.A locução ‘’contrato de gaveta’’ é uma expressão pública e notória utilizada, inclusive pela própria CEF, que, de volta em volta, seguramente para obter ingressos extras, faz chamamentos através dos meios de comunicação aos mutuários que possuem ‘’contratodegaveta’’pararegularizá-los.Ocompradordoimóvelfinanciado,noen-tanto, evita regularizar o contrato por causa do custo envolvido. Cabe, por último, lembrar que a própria jurisprudência tem consolidado o entendimento, na esteira da novavisãocientificadoprocesso,dequeestenãodeveserutilizadocomoobstáculoà realização da Justiça, devendo, portanto, ser abrandado o formalismo excessivo. E a legitimidade do titular de ‘’contrato de gaveta’’ deve ser considerada da perspectiva de quem vai ser afetada materialmente pela decisão.Enfim, o reconhecimento judicial da pratica social desta espécie de contrato oratratado é uma exigência de justiça social e da nova política judiciária comprometido com processo de democratização da administração da justiça e da sociedade, não podendo ser ignorada pelo Direito, nem por seus operadores.(STONGA,AndrezaCristina;DUARTE,CarlosJosé.BoletimInformativoJuruá,n.°270, p. 10-11).

Oassuntoédegranderelevância,poismilhões,sãoosadquirentesdeimóveismediante‘’contrato de gaveta’’. Semoreconhecimentodavalidadedatransferênciadosfinanciamentos,osadquirentesdeimóveis não têm legitimidade ativa para postular perante o Poder Judiciário. As causas que levam o assuntor a buscar a Justiça são as mais variadas. Desde a impossi-bilidade de dar prosseguimento ao pagamento dos encargos até a judicial dos contratos imobiliários como um todo, entre outros. Em que pese a lei ter reconhecido a validade das transferências habitacionais, sem a anuên-ciadasinstituiçõesfinanceiras,realizadasate25deagostode1996,nemmesmoestesadquirentestêm garantido seu acesso ao Poder Judiciário, isto, porque, não há uma uniformidade jurisprudencial queconfiralegitimidadeativaaos‘’gaveteiros’’parabuscaremarevisãodosmútuosimobiliários. Já as transferências ocorridas após esta data encontram obstáculos ainda maiores, forçando osadquirentesasuportaremtodaonerosidadecomprovadadosfinanciamentos,semteremdireitode acesso à Justiça, especialmente a Justiça Federal. Ora, tal situação e inadmissível diante do nosso sistema constitucional. Todoequalqueradquirentedeimóvel,deveteracessoaoPoderJudiciárioafimdebuscara tutela do Estado para revisão dos contratos habitacionais, sabidamente onerosos. Assim,atransferênciadeveserpermitidadatodososfinanciamentosdoSistemaFinanceiroda Habitação, independente da data de assinatura do contrato.

2.3. Posicionamento jurisprudencial relativo aos “contratos de gaveta’’. AquestãoenvolvendoastransferênciasdefinanciamentossemaanuênciadocredornoscontratosdoSistemaFinanceirodaHabitaçãoestálongedeserpacífica.Cadadecisãoenvolvendoo tema engloba posicionamentos jurídicos complexos e apaixonados. Portaisrazões,apresenta-separaanáliseoposicionamentodosTribunaisqueatingemaoestado de Minas Gerais.

2.3.1. Posicionamento do Tribunal de Justiça de Minas Gerais

OTribunaldeJustiçadeMinasGeraisnãoapresentaposicionamentopacíficocomrelaçãoà validade dos “contratos de venda chaves’’. No entanto, há uma tendência jurisprudencial em entender pela invalidade da relação ju-rídica em relação ao credor hipotecário. Analisem-se os seguintes julgados:

EMBARGOS DE TERCEIRO – IMÓVEL FINANCIADO – CONTRATO PARTICU-

LAR DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA – TRANSFERENCIA DO BEM SEM ANUÊNCIA DO AGENTE FINCEIRO – HIPOTECA – DIREITO DE SEQUELA – SUB-MISSÃO AO ATO DE PENHORA – APELO IMPROVIDO.Éineficazperanteocredorhipotecárioapromessadecompraevendadebemdadoem garantia, se não interviu ou anuiu expressamente ao contrato promissório.(AC 1.0024.06.974544-6/002; Des. Rel. Osmando Almeida; j: 12/08/2008; p:30/08/2008).

EMBARGOS DE TERCEIRO – DIRECIONAMENTO CONTRA CREDORA HIPO-TECÁRIA PROMOVENTE DE AÇÃO DE EXECUÇÃO CONTRA A DEVEDORA ORIGINAL – CESSÕES PROMOVIDAS SEM A ANUÊNCIA DA CREDORA – JUL-GAMENTO ANTECIPADO DA LIDE – CERCEAMENTO DE DEFESA NÃO CONFIG-URADO. (...)A hipoteca é direto real e, como tal, vincula o bem gravado, acompanhando-o sem-pre onde quer que se encontre. – Mera cessão de direitos, promovida pela devedora hipotecária,embeneficiodeterceiro,semaanuênciadacredora,éinsuscetíveldedesmerecera força inerenteàavençaprimeira, firmadaentreosparticipantesdecontratodecompraevendacomfinanciamentoepactoadjetodehipoteca.(TAMG,Ap. Civil 317.831-2, rel. juíza Beatriz Pinheiro Caires).

O Tribunal de Justiça mineiro entende que os contratos regidos pelo Sistema Financeiro da Habitaçãoatendemacondiçõesespecificasdecadamutuário,e,portanto,nãopodemsertrans-feridossemoconsentimentoexpressodofinanciador. Igualmente,entendeporineficazemrelaçãoaocredoracessãododébito. Contrariamente ao cunho social que envolve esses contratos, permite que haja a implemen-tação da cláusula potestativa de vencimento antecipado da dívida. Segundo o entendimento aqui esboçado, o direito pessoal do possuidor não pode se sobre-por ao direito real da garantia representado pelo crédito hipotecário, direito esse que confere ao agentefinanceiroopoderdeseqüela,atravésdoqualpersegueacoisahipotecadanasmãosdequem quer que seja, para nela fazer valer sua garantia. Ademais,sóadmiteaaceitaçãoexpressadocredorcomacessãodofinanciamento,nãopermitido a aceitação tácita pelo recebimento dos encargos do contrato ou o silêncio em caso de notificaçãoextrajudicialcomunicandoatransferência. Deste modo, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais tem o cessionário como parte ilegítima parainsurgir-secontraoagentefinanceiro,emrazãodesupostaausênciaderelaçãojurídicaentreeles. De outro norte, um posicionamento minoritário confere ao cessionário os mesmos direitos do mutuáriooriginário,apontodeequipará-loàqueleatéparafinsdecoberturasecuritária. Neste sentido, o seguinte entendimento:

CONTRATO - COMPRA E VENDA – IMÓVEL – SFH - FUNÇÃO SOCIAL DO CON-TRATO – SEGURO – QUITAÇÃO. – Adotando-se o novo conceito de contrato e levando-se em conta sua função social e os princípios de boa fé e equidade, deve prevalecer o contrato de transferência sem a anuência do credor mutuante, inclusive a quitação pelo seguro, no caso de morte do mutuário original, quando o novo propri-etário paga corretamente as parcelas correspondentes.(Apelação Cível 2.0000.00.428856-8/000(1); Rel. Des. Dárcio Lopardi Mendes;j.:03/06/2004;p.25/06/2004).

Pormeiodesteentendimento,muitomaisvoltadoàfinalidadesocialdoSistemaFinanceirodaHabitação,apesardeobanconão ter sidocientificadoda transferência, recebendoesteasparcelas mensais não poderá alegar descumprimento contratual do mutuário por ter alienado o imóvel. Essa percepção jurídica leva em conta que a controvérsia envolve questão de caráter emi-nentementesocialqueémoradia,nãopodendoserexaminadasomentepelaóticadosistemafi-nanceiro, essencialmente material e até mesmo através do pacta sunt servanda adotado pela teoria

clássica. Ora,amodernaconcepçãodecontratoimpõeaosoperadoresdodireitoodeverdeexam-iná-lo sob a ótica de sua função social, considerando sua importância dentro do contexto social onde é avençado. Após analise dos dois posicionamentos adotados pelo TJMG, temos que referido Tribunal nãofazmençãoaoartigo22daLei10.150/2000,tratandoigualmenteascessõesefetuadasantesou depois de 25 de agosto de 1996, ou seja, em regra, dando como inválida a assunção de dívida sem a ausência do credor hipotecário. 2.3.2. Posicionamento do Tribunal Regional Federal da 1° Região

Tendoemvistaqueaproximadamente90%(noventaporcento)dosfinanciamentosrealiza-dosnoâmbitodoSistemaFinanceirodaHabitação,ocorremtendocomoagentefinanceirocredora Caixa Econômica Federal, a questão se apresenta muito mais questionada perante a Justiça Federal. Aqui, também não há uma uniformidade jurisprudencial, no entanto, é feita a diferenciação das transferências ocorridas antes e depois de 25 de agosto de 1996. Paraos “contratosdegaveta” firmadosdentrodo referidoprazo,oTRF1entendequeocessionário de contrato celebrado no âmbito do SFH possui legitimidade ativa para discutir e de-mandaremjuízoquestõespertinentesàsobrigaçõesassumidaseaosdireitosadquiridosatravésdos “contratos de vendas de chaves”, uma vez que a Lei 10.150/2000 reconheceu legalmente a sub-rogaçãodosdireitoseobrigaçõesdoscontratosprimitivos.

Neste sentido, os seguintes julgados:PROCESSUAL CIVIL. SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO. CESSÃO DE DI-REITOS E OBRIGAÇÕES REALIZADAS ANTES DE 25/10/1996. “CONTRATO DE GAVETA”. AUSÊNCIA DE CONCORDÃNCIA DO MUTUANTE. LEI 10.150/2000. LE-GITIMIDADE ATIVA DO CESSIONÁRIO PARA DEMANDAR EM JUÍZO.1. Discute-se a possibilidade de “gaveteiro” ter direito a transferência de titularidade do contrato de mútuo. O contrato originário foi assinado em 01/08/1990, sem co-bertura do FCVS.Em30/09/1993, Juscelino de FreitasSudre firmou contrato decessão de direito com o Sr. Ricardo da Silva Diniz, tendo mais tarde, operacionali-zadocessãodedireitocomaautora,em21dejulhode1994(fl.34).2. A regra válida para o caso concreto faz incidir os arts. 19 (que alterou o § 2° da lei 8004/90 e 23 da Lei 10.150.2000), que estabelecem: Art. 19 – Nos contratos que tenham cláusula de cobertura de eventual saldo devedor residual pelo FCVS, a transferência dar-se-á mediante simples substituição do devedor, mantidas para o novomutuárioasmesmascondiçõeseobrigaçõesdocontratooriginal,desdequesetratedefinanciamentodestinadoàcasaprópria,observando-seosrequisitoslegaise regulamentares, inclusive quanto a demonstração da capacidade de pagamento de cessionárioemrelaçãoaovalordonovoencargomensal.§1ºAlémdodispostonocaput, o valor do encargo mensal para o novo mutuário será atualizado pro rata die, a contar da data do último reajustamento desse encargo até a data da formalização da transferência, com base no índice de atualização das contas de poupança manti-das no Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo – SBPE, e acrescido da quinta parte do valor atualizado do encargo, observando que: a) O acréscimo da quinta parte do valor do encargo atualizado será integralmente direcionado à elevação da parcela correspondente à prestação de amortização e juros e, quando devida, da contribuiçãomensal aoFCVS; b) nos contratos enquadrados noplanodeEquiv-alência Salarial, instituído pelo Decreto-Lei no 2.164, de 19 de setembro de 1984, o enquadramentonacategoriaprofissionaldonovomutuáriodar-se-áapartirdadatadatransferência;c)Naaplicaçãodoprimeiroreajustedoencargomensal,apósatransferência, nos contratos não enquadrados na alínea anterior, será compensada aatualizaçãoproratadiedeque trataocaputdesde inciso.§2ºNas transferên-ciasdoscontratosdefinanciamentodacasaprópriaquenãotenhamcoberturadeeventualsaldodevedorresidualpeloFCVS,edaquelesnãoenquadradosnaLein;º

8.692,de1993,aplicam-seascondiçõesprevistasnocaputenoparágrafoanterior.Art.23.OscontratosfirmadosnoSFH,semcoberturadoFCVS,poderão,acritérioda instituição financiadora, ser novados entre as partes, estabelecendo-se novascondiçõesfinanceiras relativasaprazo, taxanominalde juros,apólicedeseguro,sistema de amortização e plano de reajuste, preservando-se para a operação, en-quanto existir saldo devedor, a prerrogativa de os mutuários utilizarem os recursos da conta vinculada do FGTS nas modalidades previstas nos incisos.3. A recente jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça consolidou-se no sentido de que o cessionário de contrato celebrado no âmbito de SFH possui legitimidade ativaparadiscutiredemandaremjuízoquestõespertinentesasobrigaçõesassumi-das e aos direitos adquiridos através dos cognominados ‘’contratos de gaveta’’, nas hipótesesemqueestestenhamsidofirmadosate25deoutubrode1996eemqueos contratos de mútuo hipotecário não estejam enquadrados nos planos de reajus-tamentodefinidosnaLei8.692/93,porquanto,comooadventodaLei10.150/2000,ocessionáriotevereconhecidaasub-rogaçãodosdireitoseobrigaçõesdocontratoprimitivo.(Cf.RESP857.548/SC,PrimeiraTurma,MinistroLuizFux,DJ08/11/2007;RESP943.317/RJ,PrimeiraTurma,MinistraDeniseArruda,DJ22/10/2007;RESP785.472/DF,SegundaTurma,MinistraElianaCalmon,DJ31/08/2007;RESP565.445/PR,SegundaTurma,MinistroJoãoOtaviodeNoronha,DJ07/02/2007;videtambém:TRF1, AC 2002.41.00.002200-9/RO, Sexta Turma, Desembargador Federal Souza Prudente,DJ13/08/2007;AC2000.41.00.002013-6/RO,SextaTurma,JuizFederalconvocado Leão Aparecido Alves, DJ 28/06/2006.).4. Apelação provida.(AC 1999.38.00.041251-2/MG, Rel. Juiz Federal Avio Mozar Jose Ferraz De Novaes, Quinta Turma, e-DJF1 p. 116 de 04/07/2008).

PROCESSUAL CIVIL, SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO. CESSÃO DE DIRE-ITOS E OBRIGAÇÕES REALIZADA APÓS 25/10/1996. ‘’CONTRATO DE GAVETA’’. AUSENCIA DE CONCORDANCIA DO MUTUANTE. LEI 10.150/2000. ILEGITIMI-DADE ATIVA DO CESSIONÁRIO PARA DEMANDAR EM JUIZO. IMPROCEDENCIA DO PEDIDO COM FIXAÇÃO DE SUCUMBÊNCIA.1. A recente jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça consolidou-se no sentido de que o cessionário de contrato celebrado no âmbito do SFH possui legitimidade ativaparadiscutiredemandaremjuízoquestõespertinentesasobrigaçõesassumi-das e aos direitos adquiridos através dos cognominados ‘’contratos de gaveta’’, nas hipótesesemqueestestenhamsidofirmadosate25deoutubrode1996eemqueos contratos de mútuo hipotecário não estejam enquadrados nos planos de reajus-tamentodefinidosnaLei8.692/93,porquanto,comoadventodaLei10.150/2000,ocessionáriotevereconhecidoasub-rogaçãodosdireitoseobrigaçõesdocontratoprimitivo.(CF.RESP857.548/SC,PrimeiraTurma,MinistroLuizFux,DJ08/11/2007;RESP943.317/RJ,PrimeiraTurma,MinistraDeniseArruda,DJ22/10/2007;RESP785.472/DF,SegundaTurma,MinistraElianaCalmon,DJ31/08/2007;RESP565.445/PR,SegundaTurma,MinistroJoãoOtaviodeNoronha,DJ07/02/2007;videtambém:TRF, AC 2002.41.00.002200-9/RO, Sexta Turma, Desembargador Federal Souza Prudente,DJ13/08/2007;AC2000.41.00.002013-6/RO,SextaTurma,JuizFederalconvocado Leão Aparecido Alves, DJ 28/06/2006.).2. Apelação provida. Recurso adesivo prejudicado.(AC 2005.32.00.002781-5/AM, Rel. Juiz Federal João Carlos Costa Mayer Soares (conv), Sexta Turma, e-DJF1 p. 141 de 31/03/2008).

Deste modo, está garantido a tais mutuários a regularização da transferência e todos os efeitos dela decorrentes. Daí,serilegítimaanegativadosagentesfinanceirosemconcederaoscessionáriososmes-mos direitos do mutuário originário ao vago argumento de que consta outro devedor no contrato de mútuo hipotecário. Corroborando este entendimento, colaciona-se o acórdão a seguir:

CIVIL. SISTEMA FINANCEIRO DE HABITAÇÃO. QUITAÇÃO DO SALDO DEVEDOR, NOSTERMOSDALEINº.10.105/2000.LEGITIMIDADEPASSIVAADCAUSAMDACEF E ILEGITIMIDADE DA UNIÃO FEDERAL. CESSÃO DE DIREITOS. LEGITI-MIDADE ATIVA DO CESSIONÁRIO. DUPLICIDADE DE FINANCIAMENTO DE IM-ÓVEIS ADQUIRIDOS PELO SISTEMA FINANCEIRO DE HABITAÇÃO, COM CO-BERTURADOFCVS.CONTRATOSCELEBRADOSANTESDALEINº.8.100/90.POSSIBILIDADE. I-NostermosdajurisprudênciapacíficadesteegrégioTribunaledocolendoSupe-riorTribunaldeJustiça,aUniãoFederaléparteilegítimaparafigurarnasrelaçõesprocessuais,queenvolvemcontratodemútuofirmadocombasenasregrasdoSis-tema Financeiro da Habitação, ainda que com comprometimento do FCVS, cabendo àCaixaEconômica Federal figurar no pólo passivo de tais demandas, por ser agestora do Fundo, em referência.II -ACaixaEconômicaFederaléparte legítimaparafigurarnas relaçõesproces-suais,queenvolvemcontratodemútuocomelafirmado,mesmocomatransferênciadasoperaçõesdecréditoimobiliárioeseusacessóriosàEMGEA.Ocessionáriosópoderá ingressar em Juízo, substituindo o cedente, com a expressa concordância domutuário(art.42,§1º,doCPC),oquenãorestoudemonstradonaespéciedosautos.III -O terceiroqueadquiriu imóvelfinanciadopelaCaixaEconômicaFederalcomrecursos do Sistema Financeiro da Habitação, por meio do denominado “contrato de gaveta”, ostenta legitimidade ativa para postular, em juízo, a quitação do saldo devedornos termosdaLei 10.150/2000, afigurando-se, pois, ilegítimaanegativada Caixa Econômica Federal, na espécie, em proceder à quitação do saldo deve-dor,sobofundamentodeexistênciadeoutrofinanciamentoemnomedomutuáriooriginário, uma vez que a norma que limitou a quitação pelo FCVS a um único saldo devedorsósobreveiocomaLeinº.8.100/90,nãoalcançandoocontratoemreferên-cia, celebrado em 1987.IV - Não tendo a União Federal integrado a relação processual instaurada nos autos, afigura-seincabívelaextinçãodofeito,semjulgamentodomérito,emrelaçãoaela,bem como a respectiva condenação das demais promovidas no pagamento de hon-orários advocatícios em seu favor.V - Apelação parcialmente provida.(AC 2001.32.00.006935-8/AM, Rel. Desembargador Federal Souza Prudente, Sexta Turma,DJ p.124 de 12/02/2007)

No entanto, o entendimento acima transcrito refere-se exclusivamente a contratos de as-sunção de dívida celebrados até a data mencionada na Lei 10.150/2000. Os pactos assinados antes de 25 de outubro de 1996, ainda que sem anuência da instituição financeira,têmdireitoaregularizaçãodatransferência,gozandodetodososbenefíciosdeladecor-rentes. JáoscontratosfirmadosdepoisdestadataficamásmargensdopoderJudiciário,nãosendoreconhecidasuavalidade,àalegaçãodequenãosepodecompeliroagentefinanceiroaanuircomo negócio jurídico quando não demonstrado o preenchimento dos requisitos legais. O seguinte acórdão demonstra de maneira cristalina como a questão é tratada perante a Justiça Federal:

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. SFH. RECONHECIMENTO DA VALIDADE DA CESSÃO DE DIREITOS REALIZADA APÓS OUTUBRO DE 1996, SEM ANUÊNCIA DO AGENTE FINANCEIRO. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DO PREENCHI-MENTO DOS REQUISITOS LEGAIS. IMPOSSIBILIDADE. ILEGITIMIDADE ATIVA DO CESSIONÁRIO PARA QUESTIONAR AS CLÁUSULAS DO MÚTUO HABITA-CIONAL.I -ALeinº10.150/2000,assegurouaocessionáriodefinanciamento, regidopeloSistemaFinanceirodeHabitação,cujacessãodedireitoseobrigaçõestenhasidocelebradaaté25deoutubrode1996,aindaquesemanuênciadainstituiçãofinan-ceira, a regularização da transferência e todos os efeitos dela decorrentes.

II - Tratando-se de cessão de direitos referentes a mútuo habitacional realizada após outubrode1996,nãocabeaoJudiciáriocompeliroagentefinanceiroaanuircomo negócio jurídico, quando não demonstrado pelo cessionário o preenchimento dos requisitoslegais,ou,aomenos,queaCaixaEconômicaFederalforacientificadadaaludidacessãoecontraelanãoseopôs,aconfigurarsuaconcordânciatácita.III - A improcedência do pedido de reconhecimento da validade do chamado “contrato de gaveta”, nos moldes em que pleiteado, na espécie, dá ensejo à carência de ação objetivandoarevisãodocontratodefinanciamento,emvirtudedailegitimidadeativados cessionários, que se caracteriza, em casos que tais, nos termos da jurisprudên-ciapacíficadesteegrégioTribunaledocolendoSuperiorTribunaldeJustiça.IV - Apelação desprovida.(AC 2002.41.00.002200-9/RO, Rel. Desembargador Federal Souza Prudente, Sexta Turma,DJ p.60 de 13/08/2007)

E,nestescasos,sendonecessáriooingressodeaçõesjudiciaisquebusquemosdireitosdos mutuários, os “gaveteiros” terão que se conformar com as injustiças sofridas, pois não gozam de legitimidade para postular. Neste sentido, o seguinte entendimento:

PROCESSUAL CIVIL. SFH. ARREMATAÇÃO DO IMÓVEL. TRANSFERÊNCIA IR-REGULAR. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO.1.OterceiroqueadquireimóvelfinanciadopelaCEF,comrecursosdoSistemaFi-nanceiro da Habitação, por meio do denominado “contrato de gaveta”, não ostenta legitimidade ativa para postular, em juízo, a anulação de procedimento de execução extrajudicial de contrato de mútuo habitacional, salvo se demonstrada a anuência do agentefinanceiroàcessãodedireitoseobrigações.Precedentes.2.Portanto,confirma-sesentençaqueextinguiuoprocessosemresoluçãodomérito,por ilegitimidade, pois, no caso, o contrato foi “transferido” sem a necessária inter-vençãodainstituiçãofinanceira.3. Apelação a que se nega provimento.(AC 2006.37.00.000557-4/MA, Rel. Desembargadora Federal Maria Isabel Gallotti Rodrigues, Conv. Juiz Federal David Wilson De Abreu Pardo (conv.), Sexta Turma,e-DJF1 p.73 de 16/06/2008)

Temos, portanto, que a jurisprudência do TRF1 profere entendimentos restritos à letra seca da lei. Ora, em nenhum momento a legislação apresenta qualquer razão plausível para a delimi-tação da já citada data, o que deixa inequívoco que o objetivo do legislador sempre foi regularizar a situação dos “cointratos de gaveta” como um todo, impedindo que os cidadãos que optam por essaformadecontrataçãoficassemsemodireitoaoreconhecimentoperanteocredoreoPoderJudiciário. 1.3.3. Posicionamento do Superior Tribunal de Justiça

O Superior Tribunal de Justiça, a despeito dos Tribunais acima, apresenta entendimento quevaiaoencontrodosprincípiosconstitucionaisqueregemodireitodasobrigações,direitodoscontratos e, principalmente, o Sistema Financeiro da Habitação. Nassuasmaisrecentesdecisões,oEgrégioTribunalvementendendoqueemboraaLei8.009/90 tenha estabelecido como requisito para a validade da alienação a anuência do credor hipotecário, a Lei 10.150/2000 previu a possibilidade de regularização das transferências que ocor-reramsemestainterveniênciaparacontratosfirmadosaté25/10/1996. Assim, caracterizada está a intenção do legislador de possibilitar a regularização dos “con-tratos de gaveta”. De acordo com o STJ, o princípio da força obrigatória dos contratos, porquanto sustentáculo do postulado da segurança jurídica é princípio mitigado, tendo sua aplicação condicionada a outros princípios como a função social do contrato e da propriedade.

Ademais, considera a existência de uma nova feição do direito obrigacional após o Código Civil de 2002. Isto porque o Código Civil de 1916 privilegiava o princípio da força obrigatória dos contratos e da autonomia da vontade, em razão de sua feição individualista. Ao contrário, o Novo CódigoCivilsobrepõeosvaloressociaisemfacedosindividuais. Em razão disso, deverá prevalecer na interpretação dos contratos o elemento objetivo e não mais o subjetivo. Deste modo, o intérprete não considerará o desejo das partes no momento da contratação,esimospadrõessocialmentereconhecíveisparadeterminadamodalidadedenegó-cio, no caso, aquisição da moradia própria. O STJ entende, ainda, que deve ser considerada nula a cláusula que proíbe a alienação do imóvel face ao artigo 1.475 do CC/02, admitindo, entretanto, o vencimento antecipado da dívida. No entanto, essa regra não alcança as hipóteses do SFH, posto que para estas há lei es-pecial-n.º8.004/90–queexigea interveniênciadocredorhipotecárioeaassunçãopelonovoadquirente do saldo devedor na data da venda, não vedando a alienação. Assim, manifesta-se o STJ no seguinte julgado:

PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL INTERPRETAÇÃO DE MATÉRIA CONSTITUCIONAL. IMPROPRIEDADE DA VIA ELEITA. SISTEMA FI-NANCEIRO DE HABITAÇÃO. FCVS. CESSÃO DE OBRIGAÇÕES E DIREITOS.“CONTRATO DE GAVETA”. TRANSFERÊNCIA DE FINANCIAMENTO. AUSÊNCIA DE CONCORDÂNCIA DA MUTUANTE. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES DO STJ.1.Açãoordináriaajuizadaporcessionário,emfacedoagentefinanceiro,objetivandoarevisãodecláusulacontratualededébito,referenteacontratodefinanciamentoimobiliário com cobertura pelo FCVS.2. A pretensão de exame de dispositivo constitucional é inviável em sede de re-curso especial, uma vez que a competência traçada para este Tribunal restringe-se unicamente à uniformização da legislação infraconstitucional (Precedentes: REsp n.º705.744/RS,Rel.Min.ArnaldoEstevesLima,DJUde05/12/2005;eREspn.º686.724/RS, Rel. Min. Eliana Calmon, DJU de 03/10/2005).3.ALein.º8.004/90estabelececomorequisitoparaaalienaçãoainterveniênciadocredor hipotecário e a assunção, pelo novo adquirente, do saldo devedor existente na data da venda.4.Nadaobstante,aLeinº10.150/2000prevêapossibilidadederegularizaçãodastransferênciasefetuadassemaanuênciadainstituiçãofinanceiraaté25/10/96,àex-ceção daquelas que envolvam contratos enquadrados nos planos de reajustamento definidospelaLein.º8.692/93,oquerevelaaintençãodolegisladordepossibilitararegularização dos cognominados “contratos de gaveta”, originários da celeridade do comércioimobiliárioedanegativadoagentefinanceiroemaceitartransferênciasdetitularidade do mútuo sem renegociar o saldo devedor.5. Deveras, consoante cediço, o princípio pacta sunt servanda, a força obrigatória dos contratos, porquanto sustentáculo do postulado da segurança jurídica, é princípio mitigado, posto sua aplicação prática estar condicionada a outros fatores, como, por v.g.,afunçãosocial,asregrasquebeneficiamoaderentenoscontratosdeadesãoe a onerosidade excessiva.6. O Código Civil de 1916, de feição individualista, privilegiava a autonomia da von-tade e o princípio da força obrigatória dos vínculos. Por seu turno, o Código Civil de 2002 inverteu os valores e sobrepôs o social em face do individual. Desta sorte, por força do Código de 1916, prevalecia o elemento subjetivo, o que obrigava o juiz a identificaraintençãodaspartesparainterpretarocontrato.Hodiernamente,preva-lece na interpretação o elemento objetivo, vale dizer, o contrato deve ser interpretado segundoospadrõessocialmentereconhecíveisparaaquelamodalidadedenegó-cio.7. Sob esse enfoque, o art. 1.475 do diploma civil vigente considera nula a cláusula que veda a alienação do imóvel hipotecado, admitindo, entretanto, que a referida transmissão importe no vencimento antecipado da dívida. Dispensa-se, assim, a anuência do credor para alienação do imóvel hipotecado em enunciação explícita de um princípio fundamental dos direitos reais.

8. Deveras, jamais houve vedação de alienação do imóvel hipotecado, ou gravado comqualqueroutragarantiareal,porquantofunçãodaseqüela,otitulardodireitoreal tem o direito de seguir o imóvel em poder de quem quer que o detenha, podendo excuti-lo mesmo que tenha sido transferido para o patrimônio de outrem distinto da pessoa do devedor.9. Dessarte, referida regra não alcança as hipotecas vinculadas ao Sistema Finan-ceirodaHabitação–SFH,postoqueparaessefimháleiespecial–Lein°8.004/90–, a qual não veda a alienação, mas apenas estabelece como requisito a interveniên-cia do credor hipotecário e a assunção, pelo novo adquirente, do saldo devedor existente na data da venda, em sintonia com a regra do art. 303, do Código Civil de 2002.10. Com efeito associada à questão da dispensa de anuência do credor hipotecário estáanotificaçãodirigidaaocredor,relativamenteàalienaçãodoimóvelhipotecadoe à assunção da respectiva dívida pelo novo titular do imóvel. A matéria está regu-lada nos arts. 299 a 303 do Novel Código Civil – da assunção de dívida –, dispondo o art.303 que “o adquirente do imóvel hipotecado pode tomar a seu cargo o pagamento do créditogarantido;seocredor,notificado,nãoimpugnarem30(trinta)diasatransfer-ência do débito, entender-se-á dado o assentimento.” 11. Ad argumentadum tantum, aLein.º10.150/2000permitea regularizaçãoda transferência imóvel,alémdeaaceitação dos pagamentos por parte da Caixa Econômica Federal revelar verda-deiraaceitaçãotácita.Precedentes:EDclnoREspn.º573.059/RS,destarelatoria,DJUde30/05/2005eREspn.º189.350/SP,Rel.Min.CesarAsforRocha,DJUde14/10/2002).12.Consectariamente,ocessionáriodeimóvelfinanciadopeloSFHépartelegítimaparadiscutiredemandaremjuízoquestõespertinentesàsobrigaçõesassumidaseaos direitos adquiridos através dos cognominados “contratos de gaveta”, porquanto comoadventodaLein.º10.150/2000,omesmotevereconhecidoodireitoàsub-rogaçãodosdireitoseobrigaçõesdocontratoprimitivo(REspn.º705.231/RS,Rel.Min.ElianaCalmon,DJUde16/05/2005;eREspn.º753.098/RS,Rel.Min.FernandoGonçalves, DJU de 03/10/2005) 13. Recurso especial desprovido.(REsp 627424/PR, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 06/03/2007, DJ 28/05/2007, p. 287)

Inovando no tratamento dado à questão, o Superior Tribunal de Justiça entende por aplicável aosfinanciamentoshabitacionaisoartigo303doCC/02,queassimdispõe:

Art. 303. O adquirente do imóvel hipotecado pode tomar a seu cargo o pagamento do créditogarantido;seocredor,notificado,nãoimpugnarem30(trinta)diasatransfer-ência do débito, entender-se-á dado assentimento.

Igualmente,aceita-sequeospagamentosrealizadospelo“gaveteiro”àinstituiçãofinanceirarevelaverdadeira aceitação tácita por parte desta. Neste sentido, o seguinte entendimento:

ALIENAÇÃO DE IMÓVEL FINANCIADO PELO SFH. MÚTUO HIPOTECÁRIO. CON-HECIMENTO DO AGENTE FINANCEIRO - PRESUNÇÃO DE CONSENTIMENTO TÁCITO.1.ÉcediçonaCorteque“passandooagentefinanceiroareceberdocessionárioasprestaçõesamortizadorasdofinanciamento,apóstomarconhecimentodatransfer-ênciadoimóvelfinanciadoatermo,presume-sequeeleconsentiutacitamentecomaalienação.” (EREsp 70.684, Rel. Min. Garcia Vieira, DJ de 14/02/2000) 2. A alienação do imóvel objeto do contrato de mútuo operou-se em 1989, quando ainda inexistia exigêncialegaldequeoagentefinanceiroparticipassedatransferênciadoimóvel,não estando a mesma vedada por nenhum dispositivo legal. Consequentemente, inaplicáveis as regras contidas na lei 8.004/90, que obriga a interveniência do credor hipotecário e a assunção, pelo novo adquirente, do saldo devedor existente na data da venda.

3.Situaçãofáticaemqueocredor(BancoItaú)foinotificadoemtrêsocasiõesso-bre a transferência do contrato. Embora tenha manifestado sua discordância com o negóciorealizado,permaneceurecebendoasprestaçõesatéomêsdeabrilde1995,ensejando a anuência tácita da transferência do mútuo.4. Consoante o princípio pacta sunt servanda, a força obrigatória dos contratos há de prevalecer, porquanto é a base de sustentação da segurança jurídica, segundo o vetusto Código Civil de 1916, de feição individualista, que privilegiava a autonomia da vontadeea forçaobrigatória dasmanifestações volitivas.Nãoobstante, esseprincípio sofre mitigação, uma vez que sua aplicação prática está condicionada a outrosfatores,comov.g.,afunçãosocial,asregrasquebeneficiamoaderentenoscontratos de adesão e a onerosidade excessiva.5. Embargos de declaração rejeitados.(EDcl no REsp 573059/RS, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 03/05/2005, DJ 30/05/2005, p. 216)

Emconseqüênciadosentendimentosacimatranscritos,éocessionáriocujatransferênciadoimóvelocorreusemaanuênciadainstituiçãofinanceira,partelegítimaparapleitearseusdireitosem juízo. Importante salientar que essa legitimidade estendendo-se aos “gaveteiros” que adquiriram o imóvel depois de 25 de outubro de 1996, tendo em vista que o entendimento do STJ engloba questõesmuitomaisabrangentesquealiteralidadedalei. Com relação à legitimidade ativa dos assuntores, transcreve-se os seguintes entendimentos jurisprudenciais:

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. SFH. “CONTRATO DE GAVETA”. LE-GITIMIDADE ATIVA DO CESSIONÁRIO. PRECEDENTES DO STJ.1. Acórdão recorrido em conformidade com o entendimento desta Corte quanto à legitimidade ativa do cessionário, detentor de ‘contrato de gaveta’, para discutir as condiçõesdaavençademútuohipotecário.2. Recurso especial a que se nega provimento.(REsp 710805/RS, Rel. Ministro FRANCISCO PEÇANHA MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 06/12/2005, DJ 13/02/2006, p. 759)

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. SISTEMA FINANCEIRO DA HAB-ITAÇÃO. MÚTUO. TERCEIRO ADQUIRENTE. LEGITIMIDADE. PREQUESTIONA-MENTO. FALTA. SÚMULAS 282 E 356/STF. DEFICIÊNCIA RECURSAL. SÚMULA 284/STF. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL. AUSÊNCIA. COMPROVAÇÃO.1-Édeficienteafundamentaçãorecursalseorecorrentelimita-seaafirmarqueodispositivo legal teria sido violado, sem, no entanto, indicar, clara e precisamente, em que constituiu a apontada ofensa, incidindo, portanto, a censura da súmula 284 do Supremo Tribunal Federal.2 - Se a matéria referente ao dispositivo tido por violado não foi decidida pelo Tribunal de origem, ressente-se o especial do necessário prequestionamento. Aplicação das súmulas 282 e 356 do STF.3-OterceiroadquirentedeimóvelfinanciadopeloSistemaFinanceirodaHabitaçãopossui legitimidade ativa para ajuizar ação de consignação em pagamento com o intuitodepagarasprestaçõesreferentesaoaludidomútuo.4 - Malgrado a tese de dissídio jurisprudencial, há necessidade, diante das nor-mas legais regentes da matéria (art. 541, parágrafo único, do CPC c/c o art. 255 do RISTJ), de confronto - o qual não se satisfaz com a simples transcrição de ementas - entreoacórdão recorridoe trechosdasdecisõesapontadas comodivergentes,mencionando-seascircunstânciasqueidentifiquemouassemelhemoscasoscon-frontados, ausente, na espécie, incidindo o óbice da súmula 284 do Supremo Tribu-nal Federal.5 - Recurso especial não conhecido.(REsp 753098/RS, Rel. Ministro FERNANDO GONÇALVES, QUARTA TURMA, jul-gado em 20/09/2005, DJ 03/10/2005, p. 282)

Por todo exposto, tem-se que o Supremo anda bem ao reconhecer a validade das transfer-ênciasdefinanciamentosfirmadassemaanuênciadainstituiçãofinanceiranoscontratosregidospelas regras do Sistema Financeiro da Habitação, pois é o entendimento que melhor se coaduna comaConstituiçãodaRepúblicaeosprincípiosgeraisdodireitodasobrigaçõesedoscontratos.

2. DA VALIDADE DA TRANSMISSÃO DO FINANCIAMENTO SEM A NUÊNCIA DA IN-STITUIÇÃO FINANCEIRA

1.1. Do Direito de Propriedade

O direito de propriedade é direito real por excelência, sendo o mais amplo entre todos eles, o que constitui a sua qualidade fundamental, o traço típico que o caracteriza. Tem dois caracteres essenciais: ser absoluto e exclusivo. Absoluto, pois a pessoa tem sobre a coisa poder ilimitado e poder fazer dela aquilo que melhor lhe apraz. E, exclusivo, pois o propri-etário tem o poder privativo, em virtude do qual pode impedir que outrem goze e disponha de sua coisa, podendo reivindicá-la a terceiro possuidor, repelindo qualquer ofensa ao seu direito. O direito de propriedade encontra respaldo na Constituição da República, especialmente no artigo5º,incisoXXII,quediz:“égarantidoodireitodepropriedade”. Ademais, o Código Civil de 2002, artigo 1.228, é objetivo quando giza que “o proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha”. Comojáditoanteriormente,oscontratosdefinanciamentosimobiliáriossãocontratosatípi-cos, que na prática constituem em dois, uma compra e venda e um mútuo com garantia hipo-tecária. O contrato de compra e venda transmite a propriedade do imóvel do vendedor – que é o mutuáriooriginárionocontratodefinanciamento–aocomprador,popularmentedesignadocomo“gaveteiro”. Ainstituiçãofinanceira,queconcedeovalordoimóvelmediantemútuo,nãorecebeapro-priedadedoimóvel,apenastemahipotecadomesmo,comogarantiadopagamentodofinancia-mento. Assim, o agente financeiro detém tão-somente a hipoteca, naqualidadedemero credorhipotecário,jamaisdeproprietário,nãopodendoimporrestriçõesàpropriedadedocessionário. O gravame hipotecário adere à coisa, sem, no entanto, trazer limitação ao direito de proprie-dade.Nãoseautorizaassim,aocredorobstaculizaravendadoimóvel,emflagranteafrontaaoart.5º,XXIIdaCR/88eaoart.1.228doCC/02. Portanto, não se pode abrir ao credor hipotecário a possibilidade de interferir no destino do bem. OsimóveisadquiridosmediantefinanciamentosbaseadosnaLei4.380/64sãodeproprie-dade dos mutuários, embora o ônus real existente, e podem ser repassados a quem lhes aprouver, permanecendo a hipoteca como garantia ao credor. Poressasrazões,combasenodireitoàpropriedade,deve-seentenderporválidaatransfer-ênciaefetuadaseminterveniênciadainstituiçãofinanceira,inobstanteadatadatransação,poden-doomutuáriodispordoimóvel,semrestrições.

1.2. Da função social da propriedade e do contrato

Tradicionalmente, a propriedade é conceituada como o poder de usar, gozar e dispor da coisa. Por essa conceituação pode-se concluir que a o proprietário pode fazer uso do bem de acordo com a sua conveniência, tendo, inclusive, poder de destruí-lo ou torná-lo improdutivo, pouco se importando com os interesses coletivos que aquele bem por ventura tenha. No entanto, o desfrute do bem deve ser feito de acordo com a conveniência social da utiliza-

ção da coisa. O direito do dono deve se ajustar aos interesses da sociedade. IstoporqueaConstituiçãodaRepúblicanoartigo5º,XXIII,estabeleceque“apropriedadeatenderá a sua função social”, elevando a propriedade privada e a sua função social a princípios da ordem econômica (art. 170, II e III). (BRASIL, 1988). Nessa linha de raciocínio, o Código Civil de 2002 proclama nos parágrafos primeiro e seg-undo do art. 1.228:

§1ºOdireitodepropriedadedeveserexercidoemconsonânciacomassuasfinali-dades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade comoestabelecidoemleiespecial,aflora,afauna,asbelezasnaturais,oequilíbrioecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas.§2ºSãodefesososatosquenãotrazemaoproprietárioqualquercomodidade,ouutilidade, e sejam animados pela intenção de prejudicar outrem.

O Princípio da Função Social da Propriedade transforma a propriedade capitalista, sem so-cializá-la, condiciona-a como um todo, não apenas seu exercício, e constitui o fundamento do re-gime jurídico de propriedade. Leciona o Professor Lucas Abreu Barroso, com muita propriedade que:

Há muito que o relativo à função social logra relevância na seara jurídica, por en-volver a questão aspectos políticos, econômicos e sociais, notadamente no que con-cerne à propriedade. As desigualdades latentes no convívio em sociedade ao longo dahistóriapassaramarequerersoluçõesquefossemcapazesdereduziroquadrode injustiças existentes em cada época, principalmente em virtude da distãncia entre oquepreceituavaaleieoqueseverificavanarealidadesocial.(DireitoContratual:estudos, Apostila Curso de Especialização em Direito Civil, TAMG – 2000)

Nesse passo a lição de Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka:

Os reclamos emergentes do meio social requerem a adoção de medidas que sejam capazesdemodificaroatualestadodeincertezasefaltadeeqüidadenasrelaçõesentreos indivíduos, refazendo-se,dealgumaforma,asmatrizesfilosóficasdoDi-reito. A doutrina da função social emerge, assim, como uma dessas matrizes, im-portando em limitar institutos de conformação nitidamente individualista, de modo a atender aos ditames do interesse coletivo, acima daqueles do interesse particular, e importando, ainda, em igualar os sujeitos de direito, de modo que a liberdade que a cada um deles cabe seja igual para todos. (Direito Civil: estudos, Belo Horizonte, Del Rey, 2000, p.101/102).

Temos, então, que toda propriedade deverá ter uma destinação social, e embora o pro-prietário tenha a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem injustamente a possua ou detenha, essa faculdade deverá ser exercida dentro dos limites da função social a que o bem se destina. De outra banda, temos a Função Social do Contrato, prevista no artigo 421 do Código Civil, como um fator limitativo da liberdade de contratar, inclusive no que se refere ao próprio conteúdo contratual. A comissão elaboradora e revisora do Novo Código Civil, quando a lei ainda estava em tramitação no Congresso Nacional, estabeleceu, no artigo 420, o princípio da função social do con-trato, ao dizer que “a liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato, manifestando o professor Miguel Reale, na qualidade de supervisor dos trabalhos, e o Ministro Armando Falcão, na exposição de motivos, que:

Poroutro lado,firmeconsciênciaéticadarealidadesócio-econômicanorteiaare-visão das regras gerais sobre a formação dos contratos e a garantia de sua ex-ecuçãoeqüitativa,bemcomoasregrassobreresoluçãodosnegóciosjurídicosem

virtude de onerosidade excessiva, às quais vários dispositivos expressamente se re-portam,dandoamedidadopropósitodeconferiraoscontratosestruturaefinalidadesociais. É um dos tantos exemplos de atendimento da “socialidade” do Direito ... Nesse contexto, bastará, por conseguinte, lembrar alguns outros pontos fundamen-tais, a saber: ... c) Tornar explícito, como princípio condicionador de todo o processo hermenêutico, que a liberdade de contratar só pode ser exercida em consonância comosfinssociaisdocontrato,implicandoosvaloresprimordiaisdaboaféedapro-bidade. Trata-se de preceito fundamental, dispensável talvez sob o enfoque de uma estreita compreensão positivista do Direito, mas essencial à adequação das normas particulares à concreção ética da experiência jurídica.

O Código de Defesa do Consumidor, Lei 8.078/90, inspirado nos parâmetros enunciados, estabeleceu,noartigo1º,quesuasnormasvisamaprotegeraordempúblicaeointeressesocial. Assim, através da função social do contrato, o magistrado deverá observar se existe atendi-mento ao bem comum no pacto, fazendo duas análises. Em uma primeira análise, interna, o juiz examina o comportamento das partes, se elas agem com boa-fé, solidariedade, probidade, liber-dade,etc.,conformepreceituaoart.422daLei10.409-02;emumasegundaanálise,soboaspectoexterno, examina-se qual a repercussão do contrato no âmbito da sociedade. Por ser a função social do contrato um conceito jurídico indeterminado, dá ao magistrado o poderdeinvalidarocontratoou,atendendoaoprincípiodamanutençãodasrelaçõescontratuais,negarvigênciaoueficáciaàcláusulaqueconsiderarnãoatendenteadisposiçãoemcomento. Diferentemente da visão que se tinha do contrato sob a ótica da teoria individualista, a teoria contemporânea, adotada pelo Novo Código, corrobora com as idéias preceituadas na Constituição de 1988, especialmente a dignidade da pessoa humana, bem como, a função social da proprie-dade, citada anteriormente. Com relação ao tema, leciona o professor Roberto Senise Lisboa:

Uma nova fase despontou no horizonte contratual, quando o interesse do hipossu-ficienteaderentepassouasertuteladoviadirigismoeconômico,embasando-setalproteção em princípio de ordem pública intrinsecamente ligado a interesses de toda a comunidade.

(Contratos Difusos e Coletivos, São Paulo, Revista dos Tribunais, 1997, p. 107)

A nova concepção de contrato enfatiza o papel da lei. É a lei que reserva um espaço para a autonomia da vontade, para a auto-regulamentação dos interesses privados. Logo, é ela que vai legitimar o vínculo contratual e protegê-lo. A vontade continua essencial à formação dos negócios jurídicos, mas sua importância e força diminuíram, levando à relativização da noção de força obrigatória e intangibilidade do con-teúdo do contrato. Portanto, a questão do “contrato de gaveta” deve ser examinada em face da função social do contrato, e sob o enfoque constitucional, diante de todo o contexto dos princípios ali contidos, como a função social da propriedade, não podendo ser interpretados isoladamente, mas em consonân-cia com os demais preceitos constitucionais, como a dignidade da pessoa humana, repressão ao abuso do poder econômico e a construção de uma sociedade livre, justa e solidária. OSistemaFinanceirodaHabitaçãoéinteiramentevoltadoàfinalidadesocial,buscandodi-minuirogravedéficithabitacionalexistenteemnossopaís. Nesse sentido, podemos dizer que os contratos de cessão de direitos realizados sem a inter-veniênciadainstituiçãofinanceiracredora,sãoválidossobaóticadafunçãosocialdocontratoedapropriedade, uma vez que transmitem os imóveis que serão utilizados para a moradia de milhares de famílias, sem que haja prejuízo para o cendente ou para o credor hipotecário. Também,poressarazão,nãosepodeaceitarqueosagentesfinanceirostomemoimóvelde quem justamente os possua, pelo simples fato de não ter anuído com a transferência. O ces-sionário dá ao imóvel destinação voltada à função social da propriedade, uma vez que o utiliza para amoradia.Jáoagentefinanceiro,aoexecutarocontratoagregaoimóvelaoseupatrimônio,não

dandoaomesmoqualquerfinalidadesocialduranteanos. E, em razão da função social da propriedade e do contrato, deve ser declarada nula a cláu-sulaquevedeatransferênciadofinanciamentoaterceiro,semquehajaainterveniênciadainstitu-içãofinanceira. Do mesmo modo, a função social do contrato exige uma interpretação favorável dos contra-tos de gaveta, entendendo-se por sua validade.

1.3. Da cláusula potestativa de vencimento antecipado da dívida

NoscontratosfirmadoscombasenaLein.º4.380/64,doSistemaFinanceirodaHabitação,há cláusula potestativa segundo a qual é proibida a alienação do bem imóvel hipotecado. Tal cláusula vem, de modo geral, redigida da seguinte forma:

VENCIMENTO ANTECIPADO DA DÍVIDA E EXECUÇÃO DO CONTRATO: - A dívida seráconsideradaantecipadamentevencida,independentementedequalquernotifi-cação judicial ou extrajudicial, ensejando a execução do contrato, para efeito de ser exigida de imediato na sua totalidade, com todos os seus acessórios, reajustados de acordo com a cláusula correspondente, por quaisquer dos motivos previstos em lei, e, ainda: I – se o devedor: ceder ou transferir a terceiros, no todo ou em parte, os seusdireitoseobrigações,venderouprometeràvendaoimóvelhipotecado,semprévio e expresso consentimento da credora.

Cláusula potestativa é aquela em que existe absoluta ausência de consentimento de uma das partes, predominando, exclusivamente, a vontade da outra, devendo ser considerada nula, sendo também nulo o ato jurídico ou o que nele se dispuser. A vedação contratual que impede a alienação do imóvel sob pena de vencimento antecipado da dívida fere o artigo 122 do CC/02, que estabelece:

Art.122.Sãolícitas,emgeral,todasascondiçõesnãocontráriasàlei,àordempúbli-caouaosbonscostumes;entreascondiçõesdefesasseincluemasqueprivaremdetodo efeito o negócio jurídico, ou o sujeitarem ao puro arbítrio de uma das partes.(BRASIL, Código Civil, 2002, Vade Mecum, Saraiva: 2008)

O teor do Código Civil pátrio, em seu artigo 1.911, só é permitida a cláusula de inaliena-bilidadeatestamentosedoações,nãohavendoqualquerrestriçãolegalàalienaçãodeimóveis.(BRASIL, 2002). Deste modo, um imóvel, afora os casos acima discriminados, não pode ser transformado em inalienável por força de convenção, em atos inter vivos a título oneroso. A cláusula da inalienabili-dadesópodeseradmitidaemcontratosgratuitos,sejamdoaçõesoutestamentos. Logo,porserpotestativa,deve talcláusulaser repelidadoscontratosdefinanciamentoshabitacionais. Soma-se a isso os direitos e princípios do Código de Defesa do Consumidor, com aplicação aos mútuos do Sistema Financeiro da Habitação. Nestesentido,acláusulainseridanoscontratosdefinanciamentoshabitacionais,queim-possibilita a transferência a terceiro, sema anuência do agente financeiro, apresenta flagranteabusividadeeilicitude,e,porconseqüência,devesertidacomonãoescrita. Na interpretação de tal cláusula o intérprete não pode se apegar a literalidade do pactuado e sim prestigiar a vontade da lei. Quando o sistema jurídico e político do estado se direcionam no sentido de favorecer e in-centivar a aquisição da casa própria, com recursos captados em todos os segmentos da sociedade, avontadedaleiemergedemaneiraevidente,indicandoqueoagentefinanceiro,queexecutaapolítica nacional, só pode rescindir o contrato e considerar antecipadamente vencida a dívida, se a alienação do imóvel, por alguma forma vier a frustrar os objetivos da referida política. A respeito do tema, o recente entendimento do Tribunal Regional Federal da 3 ª Região:

(...) 2. Através da presente demanda, discute-se o direito do autor/consignante Valter Luna Alves de assumir a posição de novel devedor perante a ré/consignada Caixa Econômica Federal, em razão da alienação de bem imóvel, celebrada entre o autor desta demanda e o mutuário original - Marcos Roberto de Oliveira -, cuja aquisição inicial operou-se com recursos provenientes do Sistema Financeiro da Habitação, com a manutenção dos pagamentos mensais devidos pela amortização do mútuo habitacionalpactuadoentreomutuáriooriginaleainstituiçãofinanceiraqueoraseencontranaposiçãoderédapresentedemanda.Aapelanteafirmainexistirdireitodeconsignar tais pagamentos em juízo, uma vez que se recusa a reconhecer o autor/consignantecomodevedordofinanciamentoimobiliárioemquestão,jáquenãoteriaanuídocomaalienaçãooperada.Aduz,ainda,queofato justificariaasuarecusanorecebimentodetaisvalores;namedidaemqueaquilooferecidopeloautornãoseriasuficienteaquitarodébito,postoqueaalienaçãodoimóvelfinanciado,semoseu consentimento, implicaria no vencimento antecipado e total da dívida, razão pela qual deveria o autor, para se ver livre da obrigação assumida, ofertar em pagamento ovalortotaldosaldodevedoremaberto.3.Verifica-sedaescriturapúblicajuntadaafls.07/08dosautos,quearé/apelanteCEFfoidevidamentenotificadadaalienaçãooperada-“PelosvendedoresmefoiditoquenostermosdoArtigo292daLeinº6.015de31/12/1973,alteradapelaLeinº6.941de14/09/1981efetuaramacomunicaçãoa Credora Hipotecária, CAIXA ECONÔMICA FEDERAL-CEF, de venda do imóvel, conformenotificaçãodatadade25deabrilde1989,registradasobonº55804,noCartóriodeTítuloseDocumentoslocal,cujanotificaçãofoientregueadestinatária,na pessoa de MARLENE LOURDES KISIK DONZELIN, no dia 27 de abril de 1989”. 4.Dispõe,porsuavez,oartigo293,parágrafoúnico,damencionadaLeideReg-istros públicos, incluído pela Lei nº 6.941/81, que a ciência da comunicação nãoimplicará no consentimento tácito do credor hipotecário. Impende frisar, também, que o Sistema Financeiro da Habitação, à época da alienação combatida, era inte-gralmenteregidopelaLeinº4.380/64,quenadadispunhaarespeitodestaprerroga-tivaconferidaàCEF.JáocontratopadrãodefinanciamentocelebradopelaCaixaEconômica Federal, como bem lembrado pela apelante, dispunha, em sua cláusula vigésima terceira, sobre a impossibilidade de alienação do imóvel hipotecado sem a sua expressa anuência, implicando o desrespeito contratual no vencimento anteci-pado da dívida. Esta cláusula, entretanto, não poderia ser interpretada literalmente, como, inclusive, pretende a apelante, na medida em que isto implicaria necessari-amente na sua nulidade, diante da sua patente potestatividade. Sim, pois não seria razoável à CEF a mera discordância em relação à alienação, sem que fossem arrola-dasassuasjustificativas,namedidaemqueistoimpossibilitariaaoscontratantesav-aliar a legitimidade desta recusa. Interpretar-se de outra forma, permitindo ao agente financiadorrecusar-seaanuircomatransferênciapormerocapricho,semdeleseexigir deixasse estampado, de formas clara e evidente, porque entende que a nego-ciação em questão implicaria em prejuízo para a sua posição de credor hipotecário, significariaadmitiraproduçãodeefeitosdecláusulacontratualquesesujeitariaàvontade exclusiva - arbítrio - de um dos contratantes, o que era (artigo 115 do Código Civil de 1.916) - e continua sendo (artigo 122 do Código civil de 2.002) - vedado por lei. 5.Nãosevêdosautosqualquer justificativaporparteda instituiçãofinancia-dora que autorize concluir pela irradiação de prejuízos à sua posição de credora, decorrente da alienação do imóvel hipotecado, com a conseqüente transferênciade dívida, razão pela qual salta aos olhos que a recusa da CEF no recebimento das prestaçõesdevidaspelaamortizaçãodomútuohabitacionalpactuadodeu-se,únicae exclusivamente, em razão da simples transferência de dívida sem a sua anuência expressa, situação, aliás, bastante corriqueira à época, o que acaba por fulminar a suapretensão.6.NemsealeguequeaLeinº8.004,de14demarçode1.990,quepassouaexigira intervençãoobrigatóriada instituiçãofinanciadoraneste tipodetransferência, alterou esta situação, na medida em que, não demonstrando o credor hipotecário quais os prejuízos efetivos à sua posição, não se há de considerar a al-ienaçãoineficazsimplesmenteporquenãohouveparticipaçãosuananegociação.Além do mais, tendo em vista que a alienação em questão se operou em 30/05/89,

inaplicável à solução do caso a norma em epígrafe. 7. Além do mais, por disposição expressa do artigo 462 do Código de Processo civil, deverá o juiz levar em consider-ação,nasoluçãodalide,todososfatosconstitutivos,modificativosouextintivosdosdireitos das partes, ainda que supervenientes ao ajuizamento da ação, desde que, é claro, sejam respeitados os limites conferidos pelas causas de pedir e pelos pedidos deduzidos na inicial. Neste esteio, aplicável ao caso dos autos o disposto no artigo 20daLeinº10.150,de21dedezembrode2.000,quepreviuapossibilidadederegularização das transferências operadas no âmbito do Sistema Financeiro da Hab-itação,semaanuênciadoagentefinanciador-oschamados“contratosdegaveta”-desdequeofinanciamentoinicialnãotivessesidopactuadosobosauspíciosdo“PlanodeComprometimentodeRenda”,reguladopelaLeinº8.692,de28dejulhode 1.993, criando, em favor do adquirente, direito subjetivo de prosseguir no contrato definanciamentosegundoassuascondiçõesoriginais,conformedisposiçãoexpres-sa do artigo 21 da norma em comento. Fartos precedentes jurisprudenciais neste sentido.8.Apelaçãodarédesprovida.Sentençade1ºgraumantida,comacréscimode fundamentos.(TRF3ACSP57551.Processo:9103039806;d.:18/06/2008;Rel.Des.JuizCarlosDelgado)

Corroborando este entendimento, o mesmo posicionamento do citado Tribunal:

CIVIL: CONTRATO DE MÚTUO FIRMADO ENTRE A CEF E O MUTUÁRIO. TRANS-FERÊNCIA DO IMÓVEL OBJETO DO CONTRATO DE MÚTUO. SUBROGAÇÃO DO TERCEIRO CONSIGNATÁRIO. EXISTÊNCIA DE CLÁUSULA CONTRATUAL QUE VEDA ALIENAÇÃO DO IMÓVEL. NATUREZA JURÍDICA DO CONTRATO. CONTRATO DE ADESÃO. PACTA SUNT SERVANDA. MITIGAÇÃO DO PRINCÍPIO. CLAÚSULA POTESTATIVA. NULIDADE. I-Emse tratandodecontratodemútuofirmadoentreaCEFeomutuário, tendohavidoatransferênciadapropriedadedoimóvelobjetodocontratodefinanciamento,é de se reconhecer que houve a sub-rogação do terceiro adquirente nos direitos do mutuário originário, possuindo pois este legitimidade para a demanda consig-natória. II- O contrato de mútuo avençado entre as partes tem natureza jurídica de contrato de adesão. III- Nos contratos de adesão, em face da posição mais fraca do aderente, ora mu-tuário, toda cláusula que sujeite o seu cumprimento ao arbítrio de apenas uma das partes, denominada cláusula potestativa, é nula de pleno direito. IV- A cláusula que proíbe a alienação do imóvel hipotecado, adquirido pelo sistema financeirodahabitação,semoconsentimentodainstituiçãofinanceiracredora,sobpenadevencimentoantecipadododébito,enquadra-seentreaquelasdisposiçõesde vontade potestativas, em face de implicar em cerceamento no que tange à livre circulação dos bens, afetando o direito de propriedade, e redundando num completo desequilíbrio entre as partes. V- Apelo da CEF improvido.(TRF3 AC 295775, Processo: 96030003450, d.: 23/05/2000, Rel. Juiz Arice Amaral, DJU: 26/07/2000, p. 176)

CIVIL - SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO - CLÁUSULA PREVENDO VEN-CIMENTO ANTECIPADO DO DÉBITO NA HIPÓTESE DE ALIENAÇÃO DO IMÓVEL SEM ANUÊNCIA DA CREDORA. CONDIÇÃO POTESTATIVA, VEDADA PELO ART. 115,DOCÓDIGOCIVIL.LEINº6.941/81,QUEDEUNOVAREDAÇÃOAOSARTI-GOS292E293,DALEINº6.015/73(LEIDOSREGISTROSPÚBLICOS).1.OSistemaFinanceirodaHabitaçãofoiinstituídopelaLeinº4.380/64,inspiradoemuma política nacional de habitação e de planejamento territorial, e objetivando me-didasdeestímuloàconstruçãoeaofinanciamentodacasaprópria,destinando-seespecialmente à população de baixa renda.2.Oscontratosdemútuofirmadoscomosagentesfinanceirossãodeadesão,comcláusulas-padrão, no qual o mutuário adere ou não o celebra.

3.O juiz “a quo” entendeu que não houve conhecimento do embargante da discordân-cia da credora hipotecária acerca da transação, pois esta “enviou correspondência para endereço que sabia não ser mais o do embargante, tanto que não rebateu a alegação neste sentido feita na inicial dos embargos, em sua impugnação aos em-bargos,comotambémaquiemsuasrazõesdeapelação.4.A questão da condição resolutiva, não foi aduzida na impugnação aos embargos, no momento da defesa. 5.O crédito continua garantido, mesmo havendo alienação do imóvel objeto do con-trato, pois a garantia está no imóvel e não na pessoa do devedor. A hipoteca não limita ou impede o direito de propriedade, mas garante o credor hipotecário através da vinculação do imóvel ao débito assumido, seja quem for o proprietário 6.Cláusula que considera antecipadamente vencida a dívida, estabelece uma venda sujeita ao arbítrio de somente uma das partes, constituindo verdadeira condição pot-estativa, vedada pelo art. 115, do Código Civil. 7.SomenteosrequisitosexigidospelaLeinº6.941/81,quedeunovaredaçãoaosartigos292e293,daLeinº6.015/73(LeidosRegistrosPúblicos)podemimpediradisponibilidadedobemhipotecado.Taisrestriçõesconsistemnaobrigatoriedadedese incluir na escritura a expressa menção da existência do ônus real e o nome do respectivo credor, bem como a comunicação prévia, com trinta dias de antecedência, feita pelo alienante ao credor, o que foi observado pelo apelado. 8.Sentença mantida. Apelação improvida.(AC 9102099365, Desembargador Federal JOSE FERREIRA NEVES NETO, TRF2 - SEXTA TURMA, 21/10/2002)

Assim, a cláusula que proíbe a alienação do imóvel hipotecado sem a anuência da institu-içãofinanceiracredorasobpenadevencimentoantecipadododébito,enquadra-seentreasdis-posiçõesdevontadepotestativa,implicandoemcerceamentoàlivrecirculaçãodebens,afetandoo direito de propriedade. O Superior Tribunal de Justiça também já se pronunciou a respeito do tema:

CIVIL. “CONTRATO DE GAVETA”. SISTEMA FINANCEIRO DE HABITAÇÃO.A Caixa Econômica não pode recusar a alienação de bem que lhe esteja hipotecado emgarantiadefinanciamentoefetuadopeloSistemaFinanceirodaHabitação,pelosó e só fato de existir cláusula contratual que vede essa transferência.Recurso não conhecido.(REsp 189350/SP, Rel. Ministro BARROS MONTEIRO, Rel. p/ Acórdão Ministro CE-SAR ASFOR ROCHA, QUARTA TURMA, julgado em 18/12/2001, DJ 14/10/2002, p. 232)

Esseposicionamentoganhaapoio,também,noCódigodeDefesadoConsumidor(Lein.º8078/90), o qual estabelece aos contratos de adesão, a mitigação do princípio da pacta sunt serv-anda. Os pactos do Sistema Financeiro da Habitação têm natureza jurídica de contrato de adesão, e nestes, em face da posição mais fraca do aderente, no caso, do mutuário, toda cláusula que su-jeite o seu cumprimento ao arbítrio de apenas uma das partes, é nula de pleno direito. Com efeito, temos que o Poder Judiciário não pode dar guarida a ato que afronte por via oblíqua a lei e o direito, devendo o magistrado reprimir atitudes que contrariam a dignidade da Justiça. Ademais,váriassituaçõesjustificamavendadoimóvelfinanciado. Tomemos por exemplo o fato do mutuário original ter a necessidade de mudar de determi-nadalocalidade,sejaporquestõesprofissionaisoupessoais,nadajustificandoamanutençãodeum imóvel em localidade onde o mesmo não mantém mais vínculos. Outro exemplo seria o aumento da família do mutuário, sendo necessária a aquisição de um imóvel maior, ou mesmo diminuição dos membros familiares, necessitando-se de uma habitação menor. Porém, o fato mais corriqueiro que leva o mutuário a repassar seu imóvel a terceiro, medi-ante “contrato de gaveta” é a queda de sua renda.

Destemodo,seomutuáriooriginárionãotemmaiscondiçõesdearcarcomoscustosdosencargos mensais, é muito mais plausível a venda do imóvel a quem possa manter o pagamento, do que forçar o mutuário a amargar indesejável inadimplência. Portanto, deverá ser considerada nula a cláusula contratual que implica em crescimento antecipado da dívida, a alienação do imóvel a terceiro, não tendo o mutuário a obrigação de pagar integralmenteosaldodevedor.Permanecerá,assim,ocontratodefinanciamentoatéoseutermoregular, em que pese a alienação ter ocorrido sem a anuência do credor.

1.4. Do artigo 303 do Código Civil de 2002

Emregra,aassunçãodedívidaexigeaanuênciadocredor,comodispõeoartigo299doCódigo Civil:

Art. 299. É facultado a terceiro assumir a obrigação do devedor, com o consenti-mentoexpressodocredor,ficandoexoneradoodevedorprimitivo,salvoseaquele,ao tempo da assunção, era insolvente e o credor o ignorava.Parágrafo único. Qualquer das partes pode assinar prazo ao credor para que con-sinta na assunção da dívida, interpretando-se o seu silêncio como recusa.

Esta anuência é de tão grande relevância que se interpreta o silêncio do credor como recu-sa. No entanto, o Código Civil traz uma exceção a esta regra no artigo 303:

Art. 303. O adquirente de imóvel hipotecado pode tomar a seu cargo o pagamento do créditogarantido;seocredor,notificado,nãoimpugnaremtrintadiasatransferênciado débito, entender-se-á dado o assentimento.

Sendoassim,seoadquirentedoimóvel,ouocedente,comunicaremàinstituiçãofinanceirada cessão ocorrida e esta não se manifestar, a lei determina que seu silêncio implicará em con-cordânciacomamodificaçãosubjetiva. A respeito do tema, bem se coloca Sílvio Salvo Venosa (2004, p. 356) que “a situação é bem diversa daquela descrita no art. 299, porque aqui a obrigação está garantida por bem hipotecado e assim permanecerá até a extinção da obrigação”. Ricardo Fiuzza, a comentar o artigo 303 do Código Civil, preceitua:

O dispositivo, excetuando a regra geral de que o consentimento do credor há de ser expresso,admiteahipótesedeconcordânciatácitadocredorhipotecárioque,notifi-cado da assunção, não a impugna no prazo de trinta dias. A hipótese, segundo Silvio Rodrigues, deveria ser até mesmo de dispensa da anuência do credor, sobretudo se o valor da hipoteca for superior ao do débito, devendo “a lei permitir a cessão por mero acordo entre devedor e cessionário, pois a oposição do credor não encontra outro esteio que não seu capricho, visto que seu interesse não sofre ameaça, por força da excelência da garantia” (Direito civil, 24 ed. São Paulo, Saraiva, 1996, v.2, p. 310). De fato, em hipóteses tais, a segurança do credor reside muito mais na garantia em si do que na pessoa do devedor. Se a assunção de débito pelo terceiro adquirente do imóvel possibilita a permanência da garantia real, pouca ou nenhuma diferença fará ao credor se o devedor será A ou B. Daí a mitigação da exigência de que o consentimento do credor seja expresso, sobretudo nessas hipóteses em que a garantia é superior ao débito. (FIUZZA, Ricardo. Novo Código Civil comentado. São Paulo: Saraiva, 2002. P. 285 e 286)

Assim,bastaqueanotificaçãonãosejarespondidadentrodoprazoparaqueaassunçãodadívida seja aceita pelo credor. Do mesmo modo, entende Arnold Wald:

Comoaplicaçõesespecíficasdaassunçãodedívida,onovoCódigose refereaocaso do adquirente do imóvel hipotecado que se responsabiliza pelo pagamento do débito hipotecário. Neste caso, o banco não é obrigado a aceitar qualquer devedor, pois concede crédito a alguém que, em princípio, poderá pagar, dependendo dos rendimentos, emprego e outros fatores. O novo Código diz que o credor, sendo no-tificado,deveimpugnaratransferênciaemtrintadias;senãoofaz,“entender-se-ádado assentimento”, conforme o seu art. 303.(WALD,Arold. Curso de Direito Civil Brasileiro, Obrigações e Contratos. 16 ed.,Saraiva: 2004. P.186)

No entanto, ainda que o credor se oponha no prazo de 30 dias, essa negativa deverá ser analisadapeloPoderJudiciário,afimdequesejaverificadaseadiscordânciaencontraalgumarazão de ser ou constituiu mero capricho do credor. Istoporque,paraoagentefinanceiro,nãoexistequalquerdiferençasequempagaofinan-ciamento é o mutuário primitivo ou o “gaveteiro”, além do que, não existe interesse de agir por parte docredorhipotecárioemdeixardereceberasprestaçõesdonovomutuárioqueassumiuadívidagarantida, pois a garantia persiste acrescida da responsabilidade subsidiária do mutuário primitivo, bem como, é nula a cláusula que objetiva um pacto non alienado. Ademais, não se enquadra no Sistema Financeiro da Habitação a situação em que o credor recusa,dentrodoprazode30dias,atransferênciadofinanciamento,aoargumentodequeobemhipotecadonãoésuficienteparaaquitaçãodadívida. OSuperiorTribunaldeJustiçajáfirmouentendimentonosentidodeque,havendoaperdado imóvel em razão da execução judicial ou extrajudicial, quitam-se todos os débitos do contrato, nãosendoomutuáriodevedordequalqueroutraquantiaaoagentefinanceiro. Nesse sentido, a seguinte posição do Superior Tribunal de Justiça:

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. SISTEMA FINANCEIRO DE HABIT-AÇÃO. FCVS. ARREMATAÇÃO/ADJUDICAÇÃO DO IMÓVEL FINANCIADO, POR DESCUMPRIMENTO DE CLÁUSULA CONTRATUAL - ALIENAÇÃO A TERCEIROS. DESONERAÇÃODOEXECUTADOQUANTOAORESTANTEDADÍVIDA.ART.7ºDA LEI 5.741/71. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO DOS DEMAIS DISPOSI-TIVOS LEGAIS DITOS VIOLADOS.1.AjurisprudênciadestaCorteépacíficanosentidodaplenaaplicabilidadedanormacontidanoart.7ºdaLei5.741/71,oqualprevêadesoneraçãodoexecutadoquantoà obrigação de pagar o restante da dívida na hipótese de arrematação/adjudicação de imóvel adquirido pelo Sistema Financeiro de Habitação, independentemente do procedimento de execução adotado. Precedentes: REsp 542.459/PR, 1ª Turma, Rel. Min. JoséDelgado,DJde2.10.2006;REsp605.357/MG,1ªTurma,Rel.Min.Te-oriAlbinoZavascki,DJde2.5.2005;REsp605.456/MG,2ªTurma,Rel.Min.ElianaCalmon, DJ de 19.9.2005.2. A ausência de prequestionamento dos dispositivos legais cuja violação foi apon-tada atrai o óbice das Súmulas 282 e 356/STF.3. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, desprovido.(REsp 906095/PR, Rel. Ministra DENISE ARRUDA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 18/03/2008, DJe 28/04/2008)

ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. FINANCIAMENTO HABITACIONAL. SFH. ADJUDICAÇÃO DO IMÓVEL OBJETO DO FINANCIAMENTO. QUITAÇÃO DO DÉBITO.EXONERAÇÃODAOBRIGAÇÃO(ART.7ºDALEINº5.741/71).1.AçãodecobrançaemqueaCEF,apósadjudicarimóvelobjetodofinanciamentopelo SFH, pleiteia o pagamento do saldo devedor remanescente. Sentença e acórdão das instâncias ordinárias que julgam o pedido improcedente sob o fundamento de que, com a adjudicação do imóvel pela própria ré, não há como se negar a liquidação da dívida que o particular tinha com a CEF, nos termos do art. 1499 da Legislação Civil,edoart.7º,daLeinº5.741/71.Recursoespecialquealegaviolaçãodoart.29,parágrafoúnico,doDecreto-leinº70/66, bem como divergência jurisprudencial.2. Divergência não demonstrada nos moldes regimentais, vez que a recorrente se

limitouaapenas transcreverementasdos julgadosqueafirmateremdivergidodoacórdão recorrido.3. Deve prevalecer entendimento de que, no âmbito do SFH, independentemente doprocedimentodeexecuçãoadotado(questãodenaturezaprocessual),oart.7ºda Lei 5.741/71, norma de direito material, confere expressamente a extinção da obrigaçãododevedornoscasosdeadjudicaçãodoimóvelpeloexeqüente,nãohav-endo que se falar, nestes casos, em posterior cobrança de saldo remanescente.4.. Precedente: RESP 605357/MG, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, DJ 02.05.2005 p. 170.5. Recurso especial parcialmente conhecido e, na parte conhecida, não provido.(REsp 734080/PB, Rel. Ministro JOSÉ DELGADO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 02/06/2005, DJ 27/06/2005, p. 291)

Assim,épacificadooentendimentosegundooqualaadjudicaçãoouarremataçãodoimóvelhipotecadoquitaadívidadomutuárioporinteiro,emrazãodanormacontidanoartigo7ºdaLei5.741/71, desonerando-se o mutuário do pagamento do restante da dívida. De outro lado, não se diga que o artigo 303 não pode ser aplicado ao Sistema Financeiro da Habitação,porseraquelanormageraleesteregidoporlegislaçãoespecífica. OSuperiorTribunaldeJustiça,noResp.n.º627.424/PR,derelatorianoMinistroLuizFux,em julgado proferido em 06/03/2007, entende que o artigo 303 está em sintonia com a lei especial n.º8.004/90,aqualestabeleceainterveniênciadocredorcomaassunção. Assim,anotificaçãodirigidaaocredor,nãoimpugnada,garanteoassentimentodessecoma assunção de dívida.

1.5. Da hipoteca como garantia real imobiliária

A hipoteca é um direito real em que o devedor confere ao credor, sobre determinado bem de sua propriedade, para que este responda pelo pagamento do débito. NoscontratosdoSistemaFinanceirodaHabitação,omutuáriodáaoagentefinanceirooimóvel em garantia do pagamento do mútuo habitacional. Porém, como já demonstrado anterior-mente, o domínio e a posse permanecem com o mutuário. Logo,ogravamenãotorna inalienávelobemhipotecado,nempermitemodificaçõesuni-laterais referentes ao contrato de mútuo, a despeito de o mutuário ter transferido o imóvel sem a anuênciaexpressadocredor,eisqueaesteéconferidoodireitodeseqüela. O proprietário só perde o direito de alienar se proposta a execução pelo credor em face do inadimplemento do devedor. Isto porque o ato de alienação presume-se feito em fraude a execução. Oagentefinanceironãopodeinterferirnocontratoanãosernaquelasquestõesquedizemrespeitoá garantia instituída em seu favor. Ademais, jamais se admitiu a interferência do credor hipotecário nos negócios de seu deve-dor. Se a garantia não sofre prejuízo com a venda do bem, é contrário aos demais princípios do Direitopermitirainterferênciadoagentefinanceironosdestinosquesedáaoimóvel. Portanto,odireitodeseqüelanãoimpedeasalienações,aocontrário,constituioprincipalargumento em favor da validade dos “contratos de gaveta”. Nãohá razãoparaqueoagentefinanceiroqueconcedeuomútuohabitacionalnegueatransferênciadofinanciamento,isto,porque,ocréditocontinuagarantido,mesmohavendoalien-ação do imóvel objeto do contrato, pois a garantia está no imóvel e não na pessoa do devedor. Assim, a hipoteca garante o credor hipotecário através da vinculação do imóvel ao débito assumido, seja quem for o proprietário. Com relação ao tema, discorre o doutrinador Arnaldo Rizzardo:

Aliás, não se exprime sentido a discordância, porquanto o direito do credor não sof-rerá qualquer abalo com a transferência da obrigação para a pessoa que adquire o imóvel.Équeodireitodeseqüelafazacompanharagarantianastransmissõesdepropriedade. Diante dessa realidade, não sofrendo ameaça no crédito, não se vê interessenaposição,queseverificaapenascasoovalordobemhipotecadoéinsig-

nificante,nãocobrindoatotalidadedadívida.(RIZZARDO, 2004, p. 281 e 282)

Destemodo,nãohárazãoquejustifiqueadiscordânciadocredorcomaassunçãodedívidaocorrida, posto que este não sofrerá qualquer forma de abalo em seu crédito. Concordando com o entendimento acima esboçado, está à disposição dos ilustres doutrina-dores Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald:

(...) Dispensa-se a aceitação expressa, pois a aquisição do imóvel hipotecado pelo terceiro não envolve qualquer risco ao credor, em face da excelência da garantia real eseusatributosdeseqüelaepreferência.(ROSENVALD,2008.,p.242)

Portanto,emrazãododireitodeseqüela,nãoháqualquerrazãoquejustifiqueanegativadacredorahipotecáriaemtercomoválidaatransferênciadefinanciamentorealizadasemasuaanuência nos contratos do Sistema Financeiro da Habitação.

CONCLUSÃO Portudoquefoiexposto,conclui-sequeoteordoart.5ºdaLeideIntroduçãodoCódigoCivil,ojuiz,aointerpretarastransmissõesdefinanciamentoocorridasnoâmbitodoSistemaFi-nanceiro da Habitação, deverá levar em consideração o objetivo primordial do SFH, que clama por facilitar a aquisição da moradia. Tal entendimento está em consonância com o direito social à moradia,inseridonoartigo6ºdaConstituiçãodaRepública. No entanto, pelo estudo da jurisprudência do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, percebe-se que não é esse o entendimento aplicado na Justiça Estadual, não conferindo legitimidade ativa ao adquirente do imóvel por meio do “contrato de gaveta”. Porém, existem entendimentos em sen-tido contrário, ainda que escassos, que conferem ao cessionário, inclusive, todas as prerrogativas do mutuário original, no que tange aos seguros obrigatórios deste sistema. Ao analisar a questão sob a ótica do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, tem-se que a questão passa a ter um tratamento mais aprimorado, porém, este ainda se apega à letra fria da Lei 10.150/2000,conferindovalidadeàstransmissõesocorridassomenteaté25deagostode1996,não sendo aplicada uma interpretação sistemática constitucional ao tema, e sim, mera interpre-tação literal do dispositivo legal. Este entendimento leva em consideração exclusivamente a data da ocorrência da cessão do contrato, desconsiderando a mensagem da Lei 10.150/2000, em con-junto com a Lei 4.380/64. Porém,diantedasúltimasdecisõesdoSuperiorTribunaldeJustiça,umanovaperspectivaabre-seaoscessionários,umavezqueomesmoentendepelavalidadedastransmissõesocorridasaté a data estipulada na Lei 10.150/2000, mas também às posteriores. Isto porque a Lei 8004/90 exigeainterveniênciadainstituiçãofinanceiracomatransferência,podendoessaanuênciaocor-rerdemaneiratácita,seocredor,notificadopelomutuáriooriginário,oupelocessionário,nãoseopuser expressamente em 30 dias, de acordo com o artigo 3030 do Código Civil. Portanto, para o STJ, a exigência da Lei 8004/90, pode ser suprida por meio do cumprimento do artigo 303 do CC. Buscando analisar o caso dos “contratos de gaveta” sob a ótica do direito da propriedade, tem-se que por ser o mutuário o detentor dos poderes inerentes ao domínio, pode dispor do bem da maneira como melhor lhe aprouver, não cabendo ao credor hipotecário limitar esse direito ao im-pediracessãododébito.Istoporqueainstituiçãofinanceiracredoradetémapenasumdireitorealde garantia, constituído pela hipoteca do imóvel, objeto do contrato de mútuo cedido e não poderes como se dono fosse. Ademais, pelo princípio da função social da propriedade, não pode o credor hipotecário opor-se à transmissão do pacto, uma vez que, ao fazer com que o bem seja destinado à moradia, o cessionário cumpre com a função social do imóvel. Do mesmo modo, em razão da função so-cial do contrato, deve-se interpretar a cessão de modo a potencializar o direito social à moradia, interpretando-se o “contrato de gaveta” favoravelmente ao cessionário e vedando a ocorrência de cláusulas abusivas.

Analisando o aspecto da possibilidade de vencimento antecipado do mútuo em caso de transmissão não anuída pela credora, cláusula que está inserida em todos os contratos adesivos regidos pelo Sistema Financeiro da Habitação, tem-se esse por nula, ante sua potestividade, não havendo a necessidade do cedente responder pela integralidade da dívida, representada pelo sal-dodevedordofinanciamento,nomomentodacessão. Por outro lado, não se deve desconsiderar o objetivo do legislador ao editar a Lei 10.150/2000, sendo claro o interesse em regularizar a situação dos “contratos de venda de chaves”, não apenas os contemplados pelo seu texto, e sim toda uma situação social que estava à margem da legis-lação. Porfim,nãorestamdúvidasqueoartigo303doCódigoCiviléaplicávelaoscontratosregi-dospeloSistemaFinanceirodahabitação,umavezquetalexceçãolegalàsassunçõesdedívidavai ao encontro dos objetivos sociais do SFH e do direito constitucional à moradia, facilitando e agilizando o processo de anuência do credor hipotecário que, por mero descaso, não atende aos anseiosdosmutuáriosquepelasmaisvariadasrazões,têmanecessidadedeprocederàcessão. Noentanto,sobessamesmaótica,acasooagentefinanceiro respondaànotificaçãonoprazo legal, negando a possibilidade de cessão de forma expressa, essa negativa deverá ser anal-isada pelo Poder Judiciário, pois não é razoável a mera discordância em relação à alienação, sem quesejamarroladasjustificativasplausíveis,sobpenadeanegativaconstituirmerocaprichodocredor, devendo neste caso, entender-se por válida a cessão. Eoutronãopoderiaseroentendimento,umavezqueestandoocontratodefinanciamentogarantidopelodireitodeseqüelainerenteàhipoteca,agarantiadocredorresidemuitomaisnestaque na pessoa do devedor, podendo o mesmo em caso de inadimplemento contratual, executar o contratodefinanciamento,atépelaviaadministrativa. Temos, portanto, que sob todos os ângulos aqui analisados, deve-se entender por válida a cessão da dívida, sub-rogando-se o adquirente em todos os direitos e deveres do mutuário original, possuindovalidadea transferênciadofinanciamentohabitacionalsemaanuênciada instituiçãofinanceiracredora,realizadapelomutuárioaterceiroestranhoaocontrato,nospactosregidospeloSistema Financeiro da Habitação, possuindo, deste modo, o cessionário legitimidade ativa para postular em juízo.

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FATORES DETERMINANTES DO CUSTO DA CESTA BÁSICA DE ALIMENTOS NO MUNICÍPIO DE DIVINÓPOLIS NO PERÍODO DE 2009 – 2010

Leandro Maia Fernandes1

Guilherme Henrique Dias2

RESUMO

Oobjetivodestapesquisafoideterminarosfatoresqueinfluenciaramnocustodacestadealimentos no município de Divinópolis nos anos 2009 e 2010, bem como comparar o custo desta cesta com o custo das principais capitais do Brasil. Os resultados mostraram que o custo da cesta registrou queda entre janeiro de 2009 e dezembro de 2010. Também pode-se notar que o principal fatorqueinfluenciouocustodacestabásicaemDivinópolisfoioclima,quecontribuiuparaoau-mento da oferta do tomate, feijão, batata e arroz. A análise dos dados permitiu concluir que o açúcar sofreufortesvariaçõespositivasnoperíodoanalisado,porcausadoaumentodademandaexterna,aumentodasexportaçõesesazonalidade.Apesquisatambémconstatouqueocustodacestaémenor que a média nacional e que o tomate foi o produto que apresentou as maiores volatilidades em seu preço e que o leite registrou a menor dispersão em torno do valor médio.

Palavras-chave: Cesta Básica, Divinópolis, Determinantes

ABSTRACT

Theobjectiveofthisresearchwastodeterminethebehaviorandthefactorsthatinfluencethecost of food basket in the city of Divinópolis the years 2009 and 2010 and compare the cost of this basket with the main capitals of Brazil. The results showed that the cost of the basket felt between January 2009 and December 2010. Also it can be noted that the main factor affecting the cost of the basic Divinópolis was the weather, which contributed to the increased supply of tomatoes, beans, potatoes and rice. Data analysis showed that the sugar was subjected to strong positive growth over this period, because of increase foreign demand, increase exports and seasonality. The survey also found that the tomato was the product that showed the greatest volatility in its price and that the milk had the lowest dispersion around the mean value.

Keywords: Food Basket, Divinópolis, Determinants

1. INTRODUÇÃO

A cesta básica de alimentos é o conjunto básico de produtos de uso generalizado, considera-dos essenciais à reprodução de um padrão alimentar, aceito como expressão da cultura popular, e que teriam pouco ou nenhum grau de elaboração ou transformação. No caso do Brasil ilustram bem este fato o arroz, o feijão e a farinha de mandioca (MALUF,2000). Pode-se dizer que a cesta básica de alimentos considera um conjunto de produtos essências que dãoaotrabalhadorumarelativaqualidadedevida,porémsuacomposiçãosofremodificaçõesdeacordo com as características de cada região do país. Segundo o Dieese, a Cesta Básica Nacional segue a metodologia determinada pelo, o Decreto-Lei 399de1938,querecomendaosseguintesprodutos:carne(6kg);arroz(3kg);feijão(4,5kg);leitetipoC(15,0L);açúcargranulado(3kg);óleo/banha(1,5kg.);Pãofrancês(6kg);frutas/banana(90un-idades);batata(6kg);manteiga(900g);caféempó(600g);legumes/tomate(9kg)efarinha(1,5kg). De acordo com Martins et al (2003), cesta básica é um termo utilizado para designar um conjuntodebens,englobandoosgênerosalimentíciossuficientesparadeterminadafamíliapeloperíodo de um mês. A partir do cálculo do custo da cesta básica, também é possível estimar o valor do salário 1 CoordenadordoNúcleodePesquisasEconômicasdaFaced,professordeeconomiadaFadiveFaced2 GraduandodocursodeAdministraçãodaFacedeBolsistadoNúcleodePesqusiasEconômicasdaFaced

mínimonecessárioparacumpriroestabelecidopelaConstituiçãode1988.Aconstituiçãodefineosaláriomínimocomoaquelefixadoemlei,nacionalmenteunificado,capazdeatenderàssuasnecessidades vitais básicas (do trabalhador) e às de sua família com moradia, alimentação, edu-cação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social, com reajustes periódicos que lhe preservem o poder aquisitivo. Maluf (2000), sinaliza a necessidade de se rever a noção de produtos básicos e aponta para aredefiniçãodetrêsdimensõesassociadasànoçãodeprodutobásico:a)ascircunstânciasdavidacontemporâneaeosimpactosdosmecanismosdepropagandatêmmodificadoasformasdeaquisiçãoedeconsumodosalimentoseaprópriacomposiçãodacestadecompras;b)ascres-centespreocupaçõesquantoàadequaçãonutricionaldoconsumodecertosalimentos levamaquestionamentos sobre a essencialidade de produtos presentes nos hábitos de consumo dos vári-ossetoressociaise;c)aidentificaçãoentreprodutosbásicosenão-elaboradosaplica-seapenasàs estatísticas que visam diferenciar os produtos de origem agropecuária, segundo os diferentes graus de elaboração. De acordo com a Pesquisa de Orçamento Familiar (POF), realizada pelo Instituto de Brasilei-rodeEstatísticaeGeografiaoIBGE,para15,6milhõesdefamíliasaaquisiçãodomiciliarpercapitadealimentosfoivistacomoàsvezesinsuficientee,para6,6milhões,normalmenteinsuficiente.Amesmapesquisaapontaqueemmédiaosbrasileirosgastamcercade20%darendafamiliarap-enas com a aquisição de alimentos básicos. Em Divinópolis, o trabalhador gasta por mês em media 40%dosaláriomínimocomacestabásica(FERNANDES,2007). Desta maneira, saber como a cesta básica de alimentos se comporta ao longo do tempo e conhecerosprincipaisfatoresqueinfluenciamemseucomportamentoédeextremaimportânciapara determinar maneiras que visam minimizar o peso dos alimentos essenciais no orçamento das famílias e elaborar políticas de combate a fome e aumento do poder aquisitivo da população. Apesquisapretendedeterminarosprincipais fatoresque influenciaramnasvariaçõesdacestabásicaemDivinópolis,nosanosde2009e2010.Especificamenteapesquisabuscouanal-isar o comportamento dos 13 produtos que formam a cesta básica e os seus respectivos preços, comparando-os com mercado nacional.

2. METODOLOGIA

Os dados utilizados para essa pesquisa foram obtidos através do Núcleo de Pesquisas Econômicas – Nupec da Faculdade de Ciências Econômicas, Administrativas e Contábeis de Di-vinópolis–FACED.Abasededadosadotadarepresentaobservaçõesmensaisdejaneirode2009adezembrode2010eéformadapor24sériesquecompõemoCustodaCestaBásicaparaomu-nicípio de Divinópolis, MG. Ospreçosnovarejoparaos13produtosquecompõemacestabásicaeocustomensaldacesta são preços médios praticados em Divinópolis. Como instrumental básico para alcançar os objetivos propostos foram utilizadas as análises tabular,gráfica,númerosíndicesemedidasdedispersão.

2.1 Números índices

Um número-índice é um quociente que expressa uma determinada quantidade, quando comparada à uma quantidade base. Pode-se dizer que o índice ou número índice é um quociente que expressa a variação relativa entre os valores de qualquer medida. Os“númerosíndice”,ou,simplesmente,“índices”“sãoproporçõesestatísticas,geralmenteexpressasempercentagensconcebidasparacompararassituaçõesdeumconjuntodevariáveisem épocas e localidades diversas” (HOFFMANN, 2006). Deacordocom.Stevenson(1981),osnúmeros-índicessãousadosparaindicarvariaçõesrelativas em quantidades, preços ou valores de um artigo, durante dado período de tempo. Há três classificaçõesdenúmeros-índicesadministrativoseeconômicos: índicedepreço,quantidadeevalor.

- De preço:

- De quantidade:

- De valor:

Neste trabalho foi utilizado o índice preço, denotando por Po e Pt como sendo os preços na épocabaseenaépocaatual,define-seorelativodepreçocomoP0,t

2.2 Medidas de Dispersão

2.2.1 Desvio Padrão

Um aspecto importante no estudo descritivo de um conjunto de dados, é o da determinação da variabilidade ou dispersão desses dados, relativamente à medida de localização do centro da amostra (VIEIRA,2003). As medidas de dispersão servem para avaliar o quanto os dados são semelhantes, descreve então o quanto os dados distam do valor central. Desse modo, as medidas de dispersão servem também para avaliar qual o grau de representação da média. Supondo ser a média, a medida de localização mais importante, será relativamente a ela que sedefineaprincipalmedidadedispersão–odesviopadrão,apresentadaaseguir Uma vez que a variância envolve a soma de quadrados, a unidade em que se exprime não é a mesma que a dos dados. Assim, para obter uma medida da variabilidade ou dispersão com as mesmas unidades que os dados, tomamos a raiz quadrada da variância e obtemos o desvio pa-drão. O desvio padrão é uma medida que só pode assumir valores não negativos e quanto maior for, maior será a dispersão dos dados. Algumas propriedades do desvio padrão, que resultam im-ediatamentedadefinição,são:odesviopadrãoserámaior,quantomaisvariabilidadehouverentreos dados.

2.2.2Coeficientedevariação

TambémchamadodecoeficientedevariaçãodePearson,ousimplesmentecoeficientedevariabilidadeoucoeficientedevariação.Medeadispersãoemtornodamédiaaritméticaemtermosrelativos Ocoeficientedevariação(CV),éutilizadoquandosedesejacompararavariaçãodeconjun-tosdeobservaçõesquediferemnamédiaousãomedidosemgrandezasdiferentes.Ocoeficientede variação é o desvio padrão expresso como uma porcentagem média. Como medida de dispersão, a principal qualidade do CV é a capacidade de comparar re-sultadosdediferentestrabalhosqueenvolvemamesmavariável-resposta,permitindoquantificaraprecisão das pesquisas (GARCIA, 1989). Ocoeficientedevariação,queéigualaodesvio-padrãodivididopelamédia:

3. RESULTADOS

3.1 Análise econômica dos preços da cesta básica

Os produtos de origem agrícola apresentam uma característica bastante peculiar que são ciclosdefinidosdeproduçãoduranteoano.Essesciclossãochamadosdevariaçõessazonais,ousazonalidade,quesãomovimentosperiódicosprovocadospelascondiçõesclimáticasecalendáriode safras ou institucionais, como, por exemplo, inverno e verão. Noentanto,nãosãoapenasfatoresclimáticosenaturaisqueinfluenciamaproduçãoagrí-cola e seus preços consecutivamente. Deve-se considerar que esses produtos são comercializa-dosnomercadoexternoesofreminfluênciadascondiçõesdessemercado.Acotaçãointernacionaldascommodities,eascondiçõesdeconsumonoexteriortambémsãoimpactantesnocomércioavarejo no mercado local. No período de 2009 e 2010 os itens que formam a cesta básica de alimentos de Divinópo-lis foram diretamente afetados não somente por fatores sazonais e climáticos como também por variáveis externas como a variação da demanda internacional, quebra de safra de alguns países e valorização dos preços no mercado externo. Após apresentar aumentos expressivos em seu preço no ano de 2008, o tomate foi o produto que apresentou a maior queda em janeiro de 2009. Tal queda pode ser explicada pelo fato de o preço da fruta ter aumentado muito nos meses passados. Deve-se destacar que, em janeiro de 2007 o preço médio do tomate em Divinópolis era de R$2,7 contra R$2,3 em janeiro de 2009. Mesmo com a grande incidência de chuvas, janeiro de 2009 foi um período em que muitas frutas estavam em plena safra e apresentam boa oferta no atacado. É o caso da banana que estava em plenasafraecomoconseqüênciatevequedanopreço. Nomêsdemarço,ocustodacestabásicadeDivinópolisregistrouumaquedade(3,97%)emrelação ao mês de fevereiro, com isso a cesta passou a custar R$181,6. A retração observada em marçofoiconseqüênciadavariaçãonospreçosdofeijão,bananacaturra,carneepãofrancês. Maisumavez,aquedasignificativanopreçodotomatefoicausadapeloaumentoofertadoproduto proveniente de Minas Gerais e também pela excelente participação do produto capixaba, onde o clima também não interferiu na produção nem na qualidade.

Fonte: Nupec

Pormeiodafigura1,pode-severificarqueocustomédiodacestadealimentosdeDivinópo-lis acompanhou o comportamento sazonal das principais capitais do país, porém observa-se que seus valores são sempre inferiores que a média das capitais selecionadas. Além disso, percebe-se que o custo da cesta não possui forte tendência de crescimento, demonstrando estacionaridade. O aumento expressivo no preço da batata causado pela queda da oferta do produto proven-ientedeMinasGerais,quefinalizouoperíododesafranomêsdeabril,gerouaumentodocustodacesta em maio.

De acordo com o Dieese, o preço do tomate aumentou em quase todo o Brasil no mês de maiode2009,emsetecapitaisopreçosubiuacimade(12%).OsmaioresaumentosforamemNatal(53,89%)eRecife(53,80%).DentreassetecidadesondehouvereduçãoestãoGoiânia(-10,57%)eBrasília(10,55%).EmDivinópolisoprodutoaumentouemmédia(34,9%),contudo,nomunicípiootomateestava(26%)maisbaratoqueemigualmêsdoanoanterior. Omêsdejunhoregistrouumaelevaçãonovalordacestabásicade(2,37%)emrelaçãoamêsdemaio,noprimeirosemestreacestaacumulouumleveaumentode(0,97%).OvalordacestapassoudeR$181,29paraR$185,58.Estaelevaçãofoireflexodoaumentodospreçosdoleite,óleo de soja e feijão. A pressão para cima no preço do leite foi gerada pelo período de entressafra e pela grande pressão por parte dos produtores e intermediários pela recomposição do preço do leite que, de fato, aconteceu no mês de junho. Oóleodesojaregistrouvariaçõespositivasemquasetodasasgrandescapitaisdopaísnodecorrerdomêsdejunhode2009.Masseforemanalisadosasvariaçõesanuaisnota-sequeopreçodoproduto,emDivinópolis,apresentouumaquedade(19%).Areduçãodopreçodamatéria-prima,asoja,nomercadointernacional,principalmenteapartirdofinalde2008,provocadapelacrise econômica mundial com forte redução do crédito no comércio internacional, foi a causa prin-cipal do barateamento do óleo. A retração expressiva do tomate em julho foi causada pelo o clima propício e a diminuição daschuvasnasprincipais regiõesprodutorasdeMinasGerais, refletindonopreçodacestadejulho. De acordo com o Dieese, o preço do tomate teve recuo em 16 capitais e apresentou vari-açõesexpressivasnamaioriadelas.OsprincipaisdestaquesforamGoiânia(-32,76%),Fortaleza(-23,15%),RiodeJaneiro(-21,15%)eVitória(-20,09%). O comportamento do preço do café foi afetado pelo ritmo satisfatório da colheita nas princi-pais áreas produtoras do estado e do país ( Figura 5). As chuvas no mês de agosto foram a principal causa da elevação do custo da cesta básica de alimentos na cidade de Divinópolis e em grande parte do Brasil, no mês o tomate elevou-se 72% Após registrar uma forte majoração em agosto, o preço do tomate demonstrou a maior queda entreositensquecompõemacestabásicadealimentos.Oquilotomateiniciouomêsdesetembrovalendo em média R$1,9 e terminou a última semana de setembro custando em média R$2,00. Durante o mês, o menor valor registrado para o quilo da fruta foi R$ 0,99 e o maior preço R$3,79. Depois de uma expressiva queda em setembro o tomate voltou a apresentar forte majoração em outubro. O quilo tomate que em setembro estava valendo em média R$2,00, em outubro o preço médio era de R$2,8 (Figura 3).O tomate é tradicionalmente o produto que apresenta a maior volatilidade de preços entre os meses do ano. Durante o mês de outubro, o preço médio do açúcar, em Divinópolis, apresentou um com-portamento estável, mas se observarmos sua tendência ao longo do ano, nota-se a expressiva el-evação do preço. Em janeiro, o preço médio do açúcar em Divinópolis era de R$0,98 e em outubro opreçomédioregistradoeradeR$1,49,umavariaçãode52%.Noiníciode2010nota-sequeatrajetória de queda do preço do açúcar até meados junho quando o preço volta a registrar aumentos importantes. Emnovembro,registrou-seumaelevaçãode(2,16%)novalordacestabásicadeDivinóp-olis, o valor da cesta passou de R$174,8 para R$178,36. A elevação medida em novembro foi causadapelamajoraçãonospreçosdabatata(33,2%),óleodesoja(4,23%),caféempó(2,41%)earroz(2,5%).Apesardaaltanocustodacestabásica,ospreçosdosalimentosbásicosnãoap-resentaramvariaçõesmuitogeneralizadas.Oóleodesoja,devidoàmaiordemandadasojanomercadointernacional,queapresentavasinaisderecuperaçãodacrisefinanceirainternacional,foioprodutoquedemonstrouelevaçõesemtodasasregiõesdoBrasil.Abatatainglesaregistrouex-pressivo aumento nas principais praças consumidoras do Brasil, em Divinópolis não foi diferente, a majoraçãode(33%)emrelaçãoaomêsdeoutubrofoicausadapeloexcessodechuvasnasáreasprodutoras. Oanode2009encerrou-secomumaquedade(2,86%)novalordacestabásica,ovalorda cesta passou de R$178,36 para R$173,29. A queda registrada em dezembro foi causada por retraçõesnospreçosdeseteprodutos,sendoasmaissignificativas:banana(22%),batata(16,6%),

tomate(11,4%),caféempó(3,3%) Entre dezembro de 2008 e dezembro de 2009, os produtos alimentícios de mais importância dopontodevistadapopulação,comoarrozefeijão,ficarammaisbaratosemtodasasprincipaiscapitais , segundo o DIEESE. Em Divinópolis não foi diferente, em dezembro de 2008 o quilo do ar-roz custava, em média, R$1,86 e em dezembro de 2009, estava valendo R$1,65. O feijão, por sua vez,custavaR$2,86efechouoanode2009valendoR$1,66,umaretraçãode(42%). No ano de 2009, ocorreu uma super safra do feijão motivada pelos preços recordes alcança-dos pelo produto no ano de 2008 no mercado internacional. O grande volume de produção de feijão teveimplicaçõesnomercadointerno(CEPEA,2011). De acordo com dados do IBGE, a quantidade de feijão estocado em toneladas teve um au-mentosignificativoaolongodesseperíodo.Noprimeirosemestrede2008haviaemestoque6.838toneladas de feijão de cor, e no mesmo período de 2009 já havia em estoque 36.807 toneladas no EstadodoParaná,oquerepresentouumaumentoem438%. Durante o ano de 2009 o item da cesta básica que registrou maior elevação na cidade de Divinópolis foi o açúcar. Em janeiro, o quilo valia R$0,98, em dezembro o produto registrou um valor médiodeR$1,45,resultandonumamajoraçãode(47%).Opreçodoaçúcarnomercadointernac-ional estava favorável à exportação e com isso, a oferta interna diminui, pressionando o preço para cima.

Fonte: Dados da pesquisa

Fonte: Dados da pesquisa

ApredominânciadaquedanospreçosdosprodutosbásicosemtodasasregiõesdoBrasil,tanto no comportamento mensal como no ano de 2009, fez com que o tempo de trabalho necessário

para a aquisição da cesta básica, fosse, em dezembro, menor que em novembro e que em dezem-bro de 2008.

Fonte: Dados da pesquisa

Fonte: Dados da pesquisa

Em janeiro de 2010, cesta passou de R$173,29 para R$172,5.A leve retração registrada em janeirofoicausadaporvariaçõesnegativasnospreçosdafarinhadetrigo(8%),óleodesoja(9,9%)emanteiga(1,16%).Nosentidooposto,oaçúcarcontinuouapresentandofortesmajoraçõesemquasetodasasregiõesdoBrasil,emDivinópolisavariaçãofoide(23,4%)emrelaçãoaomêsdedezembro. Em fevereiro, a cesta básica registrou uma inversão na tendência de queda dos últimos me-seseregistrouumaalta(2,56%),ovalordacestapassoudeR$172,5paraR$176,92.Amajoraçãoregistradaemfevereirofoicausada,principalmente,porvariaçõesnospreçosdafarinhadetrigo(8,3%),tomate(7%),banana(5.9%)eaçúcar(3%). OaçúcarcontinuouapresentandoforteselevaçõesemquasetodasasregiõesdoBrasil,noinício de 2010.Em fevereiro o produto alcançou seu maior valor, R$1,84. As fortes altas da deman-dainternacionaleaentressafradacanaforamasprincipaiscausasdaselevaçõesobservadas. A diminuição das chuvas e aumento do calor provocou o amadurecimento mais rápido do tomate, com perdas na colheita e redução da oferta, causando elevação no preço. A elevação do custo da cesta emmarço foi causada, principalmente, por variações nospreçosdotomate(43,5%),feijão(33,2%)eleite(16,94%). Comopode-severificarnaFigura4,oprincipalresponsávelpelaaltadocustodacestaemmarçode2010foiotomate,cujopreçosubiuemtodasascapitaisdoBrasil.Ascondiçõesclimáti-

casdesfavoráveisafetaramaofertadetomate,causandooreplantionasprincipaisregiõesprodu-toras do país, elevando o preço. Depoisdeumlongotemporegistrandoretraçõesemseupreço,ofeijãoreverteusuatra-jetóriaeapresentouelevaçõesempartedasgrandes regiõesprodutoras.Abaixaqualidadedasafrade2009pressionouopreçodofeijãonovoparacima,refletindonopreçodomercadocomoum todo. Oaumentodademanda,oclimasecoemalgumasregiõesmineiraseoexcessodecalornosul do país afetaram diretamente na oferta do leite, gerando a menor captação de leite no período o que elevou o preço médio do litro pago ao produtor. Aquedadacolheitadasafraplantadanofinalde2009provocouaelevaçãodospreçosdofeijão, no mês de abril de 2010, de forma generalizada em todo o país. Além disso, o clima des-favorável com excesso de chuva e calor, atrasou o plantio da batata no início do ano, tal fato fez a cotação do produto disparar nos dois principais estados produtores, Minas Gerais e São Paulo.Estesfatoresprovocaramumaelevaçãodocustodacestaem(3,4%). O auge da colheita da cana de açúcar e a forte queda do preço do tomate, proporcionaram redução de preço, o que refletiu no preço da cesta nomês deMaio de 2010.Esses produtosacrescidos da batata e feijão também foram os grandes responsáveis pela retração do custo da cesta nos meses de junho, julho e agosto de 2010. Ao contrário da trajetória de queda dos preços observados nos últimos quatro meses, o mês de setembro apresentou elevação no custo da cesta básica. Em setembro, o valor da cesta básica dealimentosdeDivinópolissofreuumamajoraçãode(3,6%)emrelaçãoaomêsdeagosto. O clima foi o fator determinante para o aumento dos alimentos não só em Divinópolis mais em todo o Brasil, no mês de setembro. A colheita de feijão foi prejudicada pela forte estiagem dos meses passados nas principais praças produtoras do país. A seca também tem afetado a produção de arroz no sul, gerando escassez dos produtos no mercado. O Brasil não consegue produzir trigo suficienteparasuprirtodaacrescentedemandainterna,comissohouveanecessidadedeimpor-tarmos trigo. Comafaltadechuva,ospastosnãoapresentamcondiçõesadequadasparaaengordadogado, assim a produção bovina foi afetada e os produtores tiveram expressivos aumentos no custo deproduçãoquerefletindodeformadiretanopreçodacarnenomercadointerno. A majoração do custo da cesta básica em outubro foi causada, principalmente pela entres-safra na produção de batata foi a causa para a forte elevação do preço do produto no país como um todo. Em Divinópolis, o preço aumentou de R$1,04 em setembro para R$1,50 em outubro, a perspectivaédeelevaçãodopreçonospróximosmeses.Tambémforamobservadaselevaçõesnopreçodoaçúcar,explicadaspeloaumentodasexportaçõesbrasileirasimpulsionadaspelafortedemanda pelo produto no mercado internacional que pressionaram para cima os preços praticados internamenteepelasexpressivaselevaçõesdopreçodofeijãoporcausadoclimaedasafrade2009, quando houve grandes incrementos na oferta do produto no mercado interno causando que-dadopreço,assimasatuaismajoraçõesdopreçodofeijãotambémpodemserencaradascomouma recuperação das perdas por parte dos produtores. O aumento nas demandas interna e externa juntamente com a forte seca no meio do ano foram os principais motivos para a elevação do preço da carne em Divinópolis e no Brasil de forma geral. Em 2009 o quilo da carne em Divinópolis custava, em média, R$7,61 e em novembro de 2010 o quilo estava valendo R$ 9,63. De acordo com dados do Dieese, em Belo Horizonte o quilo da carneaumentou,emnovembro,(9,79%),emSãoPaulo(12,33%)enoRiodeJaneiro(12,71%). O preço do óleo de soja subiu de forma vigorosa desde maio quando o preço médio era de R$1,99alatade900ml,emnovembroopreçomédioeradeR$2,63,umamajoraçãode(32%). Em dezembro, o valor da cesta básica de alimentos de Divinópolis sofreu uma retração de (6,5%)emrelaçãoaomêsdenovembro.OpreçomédiodacestadealimentoscaiudeR$178,55para R$ 166,9. De modo geral, nota-se que o açúcar e o óleo de soja foram produtos que apresentaram as maioresvariaçõesnosdoisanosdeanálise,nosdoiscasosessasvariaçõespositivaspodemser

atribuídas à elevação da demanda internacional que gerou uma valorização do produto e estimulou asexportações,gerandoescassezeelevaçãodospreçosnomercadointerno. Do outro lado, os produtos que registraram as maiores quedas no período estudado foram o tomate, a batata e o feijão. A retração do preço do feijão foi gerada pela superprodução em 2008 emparalelocomaquedadademandanomercadointernacionaljogouascotaçõesdoprodutoparabaixo,jáabatataeotomateforambeneficiadospeloclimafavorável.

Tabela 1: Produtos que apresentaram aumento de preço no período de jan/09 até dez/10

Fonte: Dados da pesquisa

Tabela 2: Produtos que apresentaram queda de preço no período de jan/09 até dez/10

Fonte: Dados da pesquisa

3.2 Análise estatística dos preços da cesta básica

Duranteosdoisanosdeanálisedospreçosdosprodutosdacesta,pode-seafirmarque,dos13produtosqueacompõem,grandepartedelestiveramoscilaçõescomalgumasignificânciaestatística, considerando-se a proporção entre a média geométrica e o desvio-padrão dos preços observados(CoeficientedeVariação-CV).Dos13produtosdacestabásica,ofeijão,otomateeabatatativeramCVacimade20%,denotandosignificativadispersãonospreços,tomadosemre-laçãoàmédiageométrica.Oaçúcareabananativeramcoeficientedevariaçãoentre10%e20%.CaberessaltarquequantomaioréoCVmenoréasignificânciadosdados,ouseja,indicaelevadadispersão dos valores relativamente à média, e consequentemente será reduzida a sua representa-tividade como medida estatística.

Tabela 3: Resumo estatístico da série histórica da cesta básica de Divinópolis – Jan/09 – dez/10

Fonte: Dados da pesquisa Por meio da tabela 3, pode-se notar o comportamento estatístico dos preços dos produtos quecompõemacestabásicanacidadedeDivinópolisnoperíododejaneirode2009atédezembrode 2010 em relação ao desvio padrão. Nota-se que o preço do tomate foi a variável que apresentou a maior volatilidade, com uma desvio padrão de 0,7, seguido pelo preço do feijão com 0,66 de des-vio padrão. O leite, a farinha de trigo e o arroz foram os itens que registraram a maior estabilidade em seus preços, com desvio padrão de 0,13,0,13 e 0,15, respectivamente.

4.CONCLUSÃO

Os resultados mostraram que no período de janeiro de 2009 a dezembro de 2010, o custo da cesta de alimentos básicos na cidade de Divinópolis sofreu uma retração. Os produtos que con-tribuíram para esta queda foram: tomate, feijão, batata, arroz, pão e margarina. Os principais fatores que influenciaram neste resultado, foram: o clima favorável para aoferta do tomate, aumento considerável da oferta da batata, feijão e arroz no mercado interno, aumentodaconcorrêncianomunicípiotambéminfluenciounopreçodopãofrancêseaquedanocusto de produção da margarina. Porém deve-se salientar que o preço do feijão, tomate e batata apresentaramaltoscoeficientesdevariação,sendoassim,nãopodemserconsideradoscomobomgraudesignificânciaestatística,paraexplicarocomportamentodacesta. Aanálisedosdadostambémpermitiuconcluirqueoaçúcarsofreuexpressivasvariaçõespositivasnoperíodoanalisado,porcausadoclimadesfavoráveleaumentodasexportações. Também pode-se inferir que a cesta básica de alimentos de Divinópolis apresenta valores inferiores aos observados nas principais capitais do Brasil Diantedetaisfatospode-severificarqueaquedadacestabásicadealimentosfoicausadapor fatores que afetam o lado da oferta e não pela retração por parte da demanda. O aumento da capacidade de compra causada pelo aumento do salário real, do crédito ao consumidor e da implementação de políticas de rendas têm incrementado a demanda por alimen-tos,taisaçõespoderãopressionarparacimaocustodacestadealimentosnofuturo.Diantedetaissuposições,édefundamentalimportânciaaimplementaçãodeprogramasdeincentivoaagricul-tura familiar, políticas de criação de hortas nos grandes centros urbanos e diminuição de impostos sobre produtos de alimentação básica. Se tais programas não forem implementados pode-se ter num futuro próximo uma maior pressão por parte da demanda que irá contribuir para a elevação ainda maior dos custos dos alimentos básicos. De acordo com Belk,Silva e Tagasi (2001), uma iniciativa importante para o barateamento dos produtosalimentíciosbásicoséadoscanaisalternativosdecomercialização,comovarejões,feiraslivres,sacolões,feiradoprodutor,comprascomunitáriasquefornecemalimentosdequalidadeedebaixo custo, pela redução da intermediação. A formação de centrais de compras nas periferias em

parcerias com o poder público, agregando pequenos supermercados para racionalizar a logística e diminuirseuscustos,visandoàreduçãodospreçosfinais,éalternativaaserincentivada.

5. BIBLIOGRAFIA

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Índice de concentração de renda no Estado de Minas Gerais: um ensaio teórico

Leandro Maia Fernandes1

Resumo

Nas últimas décadas o Brasil apresentou resultados positivos em relação à maioria dos indicadores referentes à situação social e econômica, pode-se dizer que a composição sócio - econômicadoBrasilatualemcomparaçãoaoBrasildecinqüentaanosatrásésignificativamentediferente.Entretanto,opaísvemapresentandonasúltimasdécadasumsignificativocrescimentonas índices de concentração de renda, caracterizando-se como um dos piores países em dis-tribuição de renda do mundo. Neste contexto, o estudo de índices que mostram a evolução de indi-cadores como a concentração de renda não somente no âmbito nacional mais também num âmbito mais regionalizado é de fundamental importância para elaboração de estratégias governamentais que visam minorar as desigualdades sociais no Brasil. Assim o presente estudo tem como objetivo determinar o índice de concentração de renda no Estado de Minas Gerais, utilizando o índice de Gini e a Curva de Lorenz. Por meio da análise dos dados pôde-se inferir que o estado de Minas Gerais tem uma distribuição de renda semelhante à média nacional.

Palavras-Chave: Concentração de renda, Minas Gerais, Índice de Gini, Curva de Lorenz

1- Introdução

Nas últimas décadas o Brasil apresentou resultados positivos em relação à maioria dos indicadores referentes à situação social e econômica, pode-se dizer que a composição sócio - econômicadoBrasilatualemcomparaçãoaoBrasildecinqüentaanosatrásésignificativamentediferente. NasegundametadedoséculoXXaproduçãointernacresceuaumataxade5,2%aoano,refletindonumaumentode21vezesdoPIB,nestecontexto,nota-seumcrescimentoimportantedonível de consumo, do nível de investimentos tanto internos quanto externos e uma maior inserção do Brasil no comércio internacional, entretanto na última década observou-se uma tendência de desaceleração econômica e aumento da dívida externa. No âmbito social o crescimento apresentado pelo Brasil nas últimas décadas do século pas-sado traduziu-se numa melhoria do bem estar social. Pode-se inferir que os indicadores sociais em suamaioriamelhoraram,apesardeaindaestaremaquémdascondiçõesdospaísesdesenvolvi-dos. Indicadores como, por exemplo, a taxa de analfabetismo e esperança de vida mostraram uma evolução positiva ao longo do século XX. A característica perversa do crescimento econômico brasileiro do século que passou foi o crescimento baseado na concentração de renda, fazendo com que o Brasil apresentasse as maiores taxas de desigualdades de renda do mundo, ou seja, tem-se a grande maioria da renda nas mãos de uma minoria e a grande massa da população tem que repartir uma pequena parcela da renda nacional. Tal situação pode ser explicada por dois condicionantes, um histórico, relativo ao tipo de colonização pela qual passou o Brasil, e outro referente ao processo de crescimento dual adotado pelo país nas últimas décadas do século XX. A alta concentração também pode ser observada quando seus números são comparados com o resto do mundo, o Brasil apresenta a segunda maior concentração de renda. (BANCO MUN-DIAL,2000)

1 Mestre em Economia Aplicada – UFV - ProfessordeEconomiadaFaculdadedeciênciascontábeis,econômicaseadmin-istrativas de Divinópolis

Fonte: Banco Mundial

Afigura1,mostraaparticipaçãodos20%maisricosdospaísescomaspioresdistribuiçõesde renda do mundo, quanto maior é a participação da minoria na renda agregada maior é a con-centração.Ospaísescomasmaioresconcentraçõesde rendasão respectivamente:RepúblicaCentro Africana, Brasil, África do Sul, Guatemala, Quênia e Colômbia. O Brasil juntamente com a República Centro Africana apresenta um dos piores indicadores do concentração, no país o seg-mentodemaiorrenda,constituídopelo1%dapopulaçãomaisrica,possui13,3%detodaarenda,aproximadamente3,3%dototaldarendaérepartidapelos20%maispobreseos20%maisricosdetêmcercade65%detodarendanacional.

Fonte: Banco Mundial

Afigura2mostraospaísescomasmenoresconcentraçõesderenda,Suécia,Finlândia,Polônia,Alemanha,eHungria.Observa-sequeexisteumasignificativaassociaçãoinversaentreníveldeconcentraçãoerendanacional,ouseja,nota-sequeospaísesdemaioresconcentraçõessão países com baixa renda per capita. Tomando-se como referência os dados relativos à participação dos mais pobres na riqueza dopaís,pode-seafirmarqueograndedesafioparaasociedadebrasileira,nospróximosanos,éo alcance do desenvolvimento sustentável e participativo, ou seja, obter um crescimento guiado pordecisõesqueagregamtodaacomunidade,garantindoparaasgeraçõespresentesefuturasaoportunidade de usufruir do mesmo nível de bem-estar social e econômico. Para isso é de funda-mental importância a diminuição dos níveis de concentração de renda, por meio de maior acesso à educação,maiorestabilidadeeconômicaepolíticasdistributivasmaiseficientes. Partindo-sedesseprincípio,averificaçãocientíficadosíndicesdeconcentraçãoderenda,tanto na esfera mundial, quanto nas esferas nacional e estadual é fator de grande relevância, pois a partir do momento em que todas as autoridades e governantes em seus mais diversos níveis tomam consciência desses indicadores, torna-se possível a viabilização e estruturação de estraté-gias políticas que visam diminuir as injustiças sociais causadas pelas diferenças na distribuição de renda.

1.2. Objetivos da Pesquisa

O presente trabalho tem como objetivo geral determinar e analisar os indicadores de con-centração de renda no Estado de Minas Gerais Especificamentepretende-se: a) Estimar o Índice de Gini para Minas Gerais b) Construir a Curva de Lorenz para Minas Gerais

2. Metodologia

Inicialmente, estudou-se, o grau de concentração de renda no Estado de Minas Gerais. Para tantoforamutilizadoscomoinstrumentosdeaferiçãocientífica,ocoeficientedeGinieaCurvadeLorenz. ParadeterminarocoeficientedeGinieCurvadeLorenzforamutilizadosdadossecundários,sendo os seguintes dados: estratos de salários e percentual de famílias que representam cada faixa de renda e total da renda de cada estrato. Os dados, necessários para o cálculo dos dois in-dicadores foram coletados do Censo Sócio – Econômico de 2000, feito pelo Instituto Brasileiro de GeografiaeEstatística(IBGE).

2.1. Modelo Empírico UmmétodomuitoutilizadoparaverificarosdiferentesgrausdeconcentraçãoéaCurvadeLorenz, que foi desenvolvida por um estatístico americano chamado Lorenz no começo do século passado. A Curva de Lorenz é um instrumento que permite uma boa visualização da distribuição derendadeumadeterminadapopulação.Parataltorna-senecessáriorepresentargraficamentenoeixodasabcissasasproporçõesacumuladasdapopulação,porordemcrescentederenda.Noeixodasordenadasoscorrespondentesvaloresdasproporçõesacumuladasdarendatotal. Segundo SABÓIA (1980), no caso de uma distribuição perfeitamente igualitária, a curva de LORENZ se reduz a uma reta de 45o, visto que a cada fração acumulada da população corresponde a mesma fração acumulada da renda. No caso de uma distribuição totalmente concentrada em um único indivíduo, a curva se transforma na linha denominada linha de perfeita desigualdade. A Curva de Lorenz representa o percentual da renda total obtido pelos percentuais acumu-lados de famílias. É uma maneira conveniente de se visualizar o grau de desigualdade de renda, em geral os estudiosos utilizam tal curva para comparar a distribuição de renda de forma temporal, ouseja,verificarocomportamentodadistribuiçãoderendaaolongodotempo.ACurvadeLorenztambém pode ser utilizada para efeito de comparação de distribuição de renda de diferentes país-es,regiões,estados,eantesedepoisdetributaçõesetransferênciasgovernamentaisteremsidorealizadas ( McCONNELL & BRUCE,2001). Observando-se a Figura 3, a primeira área, OAC, representa uma situação de desigualdade intermediária entre a perfeita igualdade e a máxima desigualdade. A segunda área OAB representa a máxima desigualdade, ao passo que OA é a linha de perfeita distribuição (TROSTER & MO-CHÓN,2002).

Figura 3 – Curva de Lorenz

ApartirdascurvasdeLorenzpode-secalcularumcoeficientedeconcentraçãoderendachamadodeíndicedeGini,definidoapartirdaáreaqueseestabeleceentreacurvadedesigual-dade e a reta de perfeita desigualdade (ROSSETTI ,2000). Deste modo, pode-se ter uma idéia do que se entende por Razão de Concentração. Com-parando-se a área de concentração OAC com a área de máxima concentração OAB obtém-se uma medida do grau de desigualdade da distribuição de renda (G).

Por meio da razão existente entre a área de concentração e área de máxima concentração pode-sedeterminaroíndiceoucoeficientedeGini.Talcoeficientepodevariarde0a1.Quantomaispróximoocoeficienteestiverdeumarendaémaisconcentrada. SegundoROSSETTI(2000),nacomputaçãodocoeficientedeGinitambémpode-seutilizara seguinte fórmula:

G=1-∑(Vi+Vi-1)(Ui-Ui-1) em que: Vi=Fraçõesacumuladasdasrendasrecebidas;Ui=Fraçõesacumuladasdonúmerodepessoas.

Deve-se ressaltar que o índice de Gini, calculado pela última equação, é uma metodologia bastanteutilizadaparaverificaçãodedistribuiçãoderendaepodefornecerdeformaprecisaaes-timativa da desigualdade real. Segundo SÁBÓIA (1980), o índice de Gini nunca deve ser utilizado isoladamente, mas sim acompanhado da curva de LORENZ, pois um mesmo valor do índice pode corresponder a situação bastante distinta da distribuição de renda.

3. Discussão dos Resultados

OíndicedeGinifoicalculadoparaverificaroníveldeconcentraçãoderendadoestadodeMinas Gerais. Para a apuração dos rendimentos segundo as classes de renda, considerou-se o valor que vigorava no ano de 2000, quando o salário mínimo era de R$ 151,00. Observando-se o quadro 1, notam-se os estratos de renda por classe de rendimento, o per-centualeapopulaçãoacumuladaquecompõemcadaestratoderenda,alémdopercentualquecada estrato de renda participa no rendimento total dos residentes do Estado. Pode-severificarqueaparcelados33%maispobresdoestadopossuemapenas5,3%dototaldarenda,equeos8%dapopulaçãoqueganhammaisde10saláriosmínimosdetêm40%do total da renda no estado.

Quadro1: Classes de rendimento e percentual da população por estrato de renda em Minas Gerais

Fonte: dados da pesquisa

Por meio os valores contidos no quadro 1, pôde-se estimar o valor do grau de concentração da renda no estado. Cabe ressaltar que o índice de Gini foi calculado para a distribuição de renda nominal mensal das pessoas de 10 anos ou mais de idade, com rendimento, responsáveis pelos domicíliosonderesidem.OvalorencontradoparaoíndicedeGinifoide0,58,umvalorsignificati-vamente alto, levando-se em conta que o valor de máxima concentração de renda é 1. Observando-se os valores doGini para o Brasil nos últimos anos verifica-se queMinasGeraisencontra-sedentrodamédianacional.Afigura4,mostraocomportamentodo ÍndicedeGini para o Brasil em três décadas, tem-se nesse período uma certa tendência de estabilidade do índice,fincadoemmédiaigualà0,59nosúltimos20anos.

Fonte: IBGE

Afigura5mostraocomparativoentreumasituaçãodeperfeitadistribuiçãoderenda,dadapela reta tracejada em diagonal, e a situação onde há concentração de renda.

Fonte: Dados da pesquisa

A área entre a reta diagonal e a curva de concentração mostra o grau de injustiça na dis-tribuição da renda, quanto maior a distância elas, maior é o grau de concentração de renda. Neste contexto,nota-sequeacurvadeLorenzparaMinasGeraisexibidanafigura5,refleteumsignifica-tivo grau de concentração de renda..

4 - Conclusão

Por meio dos resultados apresentados pode-se inferir que Minas Gerais apresenta um

desempenho semelhante aos números nacionais referentes à concentração de renda. O Brasil vêm apresentando um valor médio nos últimos anos para o índice de Gini de aproximadamente 0,59 e verifica-sequeMinasGeriastemumcoeficientede0,58. EssevalordocoeficientedeGinirefleteacomposiçãosócio-econômicadoEstadodeMi-nasGerias,noestadoos20%maisricossãopossuidoresdecercade61%detodarenda,eos5%maispobresficamcomapenas5%darendanoEstado.Talcomportamentopodeserexplicadopelofatodeoestadopossuirregiõescomcaracterísticaseconômicasbemdiscrepantes.Algumasregiões,comooSuldeMinasGeraiseoTriânguloMineiro,detêmumadasmelhoresqualidadesdevidadopaíseasmaioresrendaspercapitadoEstado.Naoutrapontaoestadopossuiregiõesextremamente pobres como o Vale do Jequitinhonha, que apresenta indicadores sócio - econômi-cos semelhantes a muitos países do continente africano. Neste contextonota-sequeograndedesafioparaa sociedademineira e brasileira, nospróximosanosédiminuirdeformasignificativatalgraudeconcentraçãoderenda.Umadasalter-nativas é aplicar uma política distributiva efetiva. A política distributiva compreende uma gama de medidascujoobjetivoprincipalémodificaradistribuiçãoderendaentreosindivíduos.Dentreessasmedidas estão: a melhoria do sistema tributário, que resultará num aumento de arrecadação gov-ernamental, outro ponto são as obras governamentais voltadas para a educação, pois a educação é requisito fundamental para que as pessoas tenham maiores oportunidades de emprego e conse-quentemente tenham uma renda maior. Além disso é importante que se tenha uma política salarial mais condizente com a realidade brasileira, mas para que isso aconteça torna-se necessário um crescimento econômico apoiado em uma estabilidade econômica sustentável.

5-Bibliografia

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TROSTER.R.L & MOCHÓN.F. Introdução à economia. São Paulo: MakronBooks, 2002.

O Direito Comunitário e os Fundamentos de uma Sociedade Democrática: O equilíbrio de Nash como fundamento da limitação do princípio da maioria

face aos direitos fundamentais em Kelsen

Alexandre Lopes Rocha Lima

Resumo

Apresentemonografiavisademonstraraconstruçãodalegitimidadedosdireitoshumanosna sociedade democrática atual, por intermédio da teoria pura do direito de Kelsen através de consideraçõesdestesobreoprincípiodamaioria,liberdadeeigualdadecomofundamentodeumasociedadedemocrática,livreeplural,utilizandoparaconfirmarsuasidéiasdoequilíbriodeNashcomo fundamento matemático de tal assertiva.

Abstract

The present monographic work searches for showing the construction of the legitimacy of hu-man rights in the modern democratic society, using the Kelsen’s theory of Law throughout his con-siderations regarding majority rule, liberty and equality as the basis of a plural, free and democratic society,andinordertoconfirmthisassertion,wegoingtoutilizethemathematicNashequilibrium.

Introdução

Estetrabalhomonográficovisabuscarospilaresjurídicoselógicosnosquaissejustificame se fundamentam a democracia representativa moderna, abalizada na visão de dois cientistas de pretensõesuniversalistas,eracionais:HansKelseneJohnF.NashJr. A metodologia adotada vincula-se ao método lógico-dedutivo, com observância à historici-dadeeacientificidadedofenômenojurídico,emtermosderepresentação,votomajoritárioedireitodas minorias na obra Democracia de Kelsen, e a idéia da cooperação racional de agentes na obra Non-cooperative Games apresentada por Nash ao programa de Pós-Graduação de Princeton por ocasiãodeseudoutoramento,bemcomoutilizandoparatantodeamplapesquisabibliográfica. Tem, portanto, este trabalho, o objetivo de buscar explicar, hodiernamente, a construção da legitimidade dos direitos humanos na sociedade política atual, por intermédio, de pelo menos em parte, de uma teoria positivista, de um lado e uma visão utilitarista, de outro. O primeiro capítulo apresenta os dois autores mencionados e cogita sobre o desenvolvi-mento de suas teorias, uma que explique o Direito como expressão de uma teoria pura e a outra acerca da escolha racional que conduz a uma cooperação por parte de qualquer tipo de agente que tenha que fazer a eleição de escolhas estratégicas levando em consideração os outros jogadores envolvidos. O segundo capítulo descreve a visão de Hans Kelsen no tocante a democracia, liberdade, igualdade e direitos fundamentais. É preciso resgatar alguns valores, que a teoria do discurso ob-literou, e que nem por isso deixaram de contribuir para a consolidação da sociedade política atual. Para isso, não só foi abordada a visão de Kelsen, mas também nomes de peso da ciência política, tais como Hobbes, Locke e Rosseau, vem contribuir para a formação dos conceitos kelsenianos. Prosseguindo, o terceiro capítulo apresenta o delineamento da teoria minimax de Von Neu-man e a elegante e mais abrangente teoria do equilíbrio apresentada por Nash que vêm oferecendo contribuiçõessignificativasparavariadoscamposdaciência.Bemcomoapresenta,umcomple-mentoquejustifiqueaidéiadedireitoshumanosdefendidaporkelsen. Finalizando, a conclusão pretende apresentar um panorama geral dos argumentos apresen-tados da solução apresentada por Kelsen e Nash como a escolha da solução apropriada, com ên-fase naquela que constitui o escopo do presente trabalho, qual seja, a da democracia e dos direitos fundamentais. 1. HansKenlsen,JohnNashesuascontribuições

O austríaco (naturalizado norte-americano) Hans Kelsen nasceu em Praga em 11 de outubro de1881.Dentreinúmerascontribuiçõesnoscamposdapolítica,sociologiaereligião,seutrabalhomais destacado deu-se no campo jurídico com a publicação em 19XX da obra Reine Rechtslehre (Teoria Pura do Direito), o que lhe tornou o maior expoente da escola positivista do direito. O positivismo jurídico entende que as normas jurídicas são válidas somente quando são oriundas de uma autoridade ou aceita como obrigatórias em determinada sociedade, não havendo nenhuma correlação da norma jurídica com moralidade ou jusnaturalismo1.

“The legal positivist concentrates his attention on Law at the point where it emerges fromtheinstitutionalprocessthatbroughtitintobeing.Itisthefinallymadelawitselfthat furnishes the subject of his inquiries. How it was made and what directions of hu-man effort went into its creation are for him irrelevancies”2

O jurista austro-americano procurou lançar os fundamentos de uma teoria pura do direito ao afastarquaisquerelementosestranhosaoSollentaiscomoasvisõessociológicas,antropológicas,éticas, morais, históricas e qualquer outra pertencente ao Sein. Em sua obra, traduz-se a noção de direito como atividade estatal e estabelece como fundamento de validade do direito a grundnorm, ou a norma fundamental, criando-se assim uma hierarquia piramidal.

“Uma norma, isto é, o devermo-nos conduzir tal como a norma determina, não deve confundir-secomaeficáciadanorma,istoe,comofatodequeaspessoasefetiva-menteassimseconduzem.Mastambémfizemosnotarquepodeexistirumarelaçãoessencial entre estas duas coisas - que uma ordem coercitiva que se apresenta comoDireitosóseráconsideradaválidaquandoforglobalmenteeficaz.Querdizer:anorma fundamental que representa o fundamento de validade de uma ordem jurídica refere-seapenasaumaConstituiçãoqueéabasedeumaordemdecoerçãoeficaz.Somente quando a conduta real (efetiva) dos indivíduos corresponda, globalmente considerada, ao sentido subjetivo dos atos dirigidos a essa conduta é que este sen-tido subjetivo é reconhecido como sendo também o seu sentido objetivo, e esses atos são considerados ou interpretados como atos jurídicos.”3

Assim, Kelsen busca através de uma linguagem precisa e lógica, abstrair todos os valores eimprecisõesqueamoraleoutroselementosestranhosaomundojurídicoapresentam,estabele-cendo um conceito de ciência e direito universalmente válidos. É justamente com precisão e lógica que John Forbes Nash Jr. matemático norte-americano nascido em 13 de junho de 1928 procurou lidar em seus trabalhos com geometria diferencial4, equação de derivadas5ecomteoriadosjogos;quelherendeuumprêmiodeCiênciaseconômicasem memória de Alfred Nobel em 1994 com Reinhard Selten e John Harsanyi. A teoria dos jogos surgiu no século XVIII quando o matemático James Waldegrave propôs em uma carta uma solução de estratégia mista para um jogo, então popular à época, chamado Le Her. Entretanto, somente um século mais tarde, Antoine Augustin Cournot propôs em seu trabalho Recherches sur les principes mathématiques de la théorie des richesses os princípios matemáticos queseriamdefinidoscomoteoriados jogos.Em1944,JohnVonNeumaneOskarMorgensternpublicaram the theory of games and economic behavior, onde aprofundaram o estudo de jogos de soma-zero para duas pessoas que resultam em ótimos de pareto6. Os jogos de Neuman e Mor-genstern são de oposição dos atores, sendo sempre de soma-zero. A elegância da obra que Nash publicou em Pricenton para a obtenção do título de doutor em 1950 resulta do encontro de um

1 C.f.: GARNER, Bryan A. Black’s Law Dictionary. Saint Paul: Thomson West, 2004. p. 915.2 FULLER, Lon L. Anatomy of the law. Harvard Law Review, Vol. 83, No. 6 (Apr., 1970), p. 1474-1480.3 KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. 6.ed. Trad. João Batista Machado. São Paulo: Martins Fontes, 1999. p.52.4 Nota do Autor: é o uso do cálculo para o estudo da geometria, muito utilizado na teoria da relatividade. Nash inclusive utilizouemsoluçõespropostasaopróprioAlbertEinstein.5 Notadoautor:equaçãodederivadaséumaequaçãoqueenvolveumafunçãoincógnitade inúmerasvariáveisesuasderivadas.6 Nota do Autor: ótimo de pareto (nome em homenagem ao economista criador do conceito, Vilfredo Pareto) dado a uma situaçãoemqueamelhoraparaalguémnãoresulteemperdaparaoutrosjogadores.

equilíbrio em um jogo onde ainda não tenha sido encontrado nenhum ótimo de pareto7.

2. A idéia de representação e voto majoritário e direito das minorias na obra Democracia de Hans Kelsen.

Kelsen trata a idéia de liberdade e igualdade como elementos fundamentais do relativismo político e da democracia. Chegando a tratá-los como instintos primitivos mais básicos do “homem social”. A liberdade e a igualdade parecem contraditórias: Se a liberdade é absoluta, poderei fazer o que desejo, contudo, não poderei submeter ninguém a minha vontade. Logo, não sou livre complet-amente, ou não sou igual completamente. Como solução ao dilema apresentado, nos é oferecido uma solução contratualista. Para sermos iguais temos que anuir alguma forma de dominação. O contratualismo surgiu com a obra o leviatã de Thomas Hobbes, como alternativa, ao próp-rio conceito de igualdade. Hobbes via na igualdade dos homens a origem da guerra de todos con-tra todos no estado de natureza8. Para Hobbes havia um estado primordial onde imperava o jus naturale, chamado de Estado de Natureza9. Nele, a discórdia nasce porque os homens agem por competição,desconfiançaouaglória10. Para pôr termo a essa situação é necessário que exista um Estado pleno e desigual que imponha a paz social a todos. Isso se dá, quando a sociedade pactua acriaçãodeumcontratodetotalsubmissãoaopoderreal.Eledeveserfirmadoentreossúditosaodelegarem toda autoridade ao príncipe, que em virtude da sua desigualdade – que deve ser abso-luta–impõeapazpelaforçadeseupoderdesigual11. Sem esse poder desigual a que chamamos de Estado, não existe a real possibilidade de existência de uma sociedade como a entendemos12. Mais tarde, John Locke em dois tratados sobre o governo civil adota a idéia contratualista iniciada pelo seu compatriota no tocante ao Estado de natureza e o contrato social, apesar de dar-lhessignificadosdistintos.Osdireitosdevida, liberdadee frutodopróprio trabalhosãodireitosnaturais que permanecem, e não podem ser proscritos em virtude do contrato social celebrado pe-los súditos. Locke, então, aponta o direito sobre o corpo e sobre a propriedade – fruto do trabalho – como direitos individuais que limitam a atuação do poder estatal13. Estes direitos originam o direito de resistência ao soberano, caso este viole estes direitos inalienáveis dos súditos. Porfim,opróprioKelsenapresentaumasoluçãoaosproblemasapresentadospeloúltimocontratualistaclássico:JeanJaquesRosseau,quandoesteafirmaainexistênciadeumarepresen-taçãopolíticadasoberaniadoindivíduo.Apesardeafirmaraexistênciadanecessidadedarepre-sentação,Rosseauavêcomoabdicaçãodaliberdadeindividual,poisavontadegeralsesobrepõea vontade individual, não sendo mais essa se encontra dominada pela geral14. Kelsen afirma que é dominação, quando democrática é válida, dando prosseguimento anoçãodecontratualismooriginadapelosprimeiroserespondendoaoterceiro,Kelsenafirmaque:

“Com base no pressuposto da igualdade dos homens, poder-se-ia deduzir o princípio 7 NotadoAutor:Entretanto,hásituaçõesemqueumequilíbriodeNashpodesertambémumótimodepareto.8 “Naturehathmademansoequall,inthefacultyofbodyandmind,asthatthoughtherebeefoundonemansometimesmanifestlystrongerinbody(…)asthatonemancanthereuponclaimtohimselfanybenefit,towhichanothermaynotpretend,aswell as he. For as to the strong of body, the weakest has strength enough to kill the strongest, either by secret machination, or by confederacy with others, that are in the same danger with himselfe.” HOBBES, Thomas. Leviathan. London: Penguin books, 1985.p.183.9 “Therightofnature,whichwriterscommonlycalljusnatural,isthelibertyeachmanhath,tousehisownpower,ashwwill himselfe, for the preservation of his own power, as he will himselfe, for the preservation of his own nature; that is to say, of his ownlife;andconsequently,ofdoinganything,whichinhisownjudgement,andreason,heeshallconceivetobetheaptestmeansthereunto. HOBBES, Thomas. Leviathan. op.cit. p.189.10 “Sothatinthenatureofman,wefindthreeprincipallcausesofaquarrel.First,competition;Secondly,diffidence;Thirdly,Glory.” Thomas. Leviathan. idem. p.189.11 “A common-wealth is Said to be instituted, when a multitude of mem do agree, and convenant, every one, with every one, that to whatsoever.” Thomas. Leviathan. idem. p.228.12 C.f.:WEFFORT,FranciscoC.OsclássicosdaPolítica:Maquiavel,Hobbes,Locke,Montesquieu,RosseaueoFederalista.1.vol. São Paulo: Ática, 2005.p.63.13 C.f.:WEFFORT,FranciscoC.OsclássicosdaPolítica:Maquiavel,Hobbes,Locke,Montesquieu,RosseaueoFederalista.1.vol. São Paulo: Ática, 2005.p.63.14 C.f.:WEFFORT,FranciscoC.OsclássicosdaPolítica:Maquiavel,Hobbes,Locke,Montesquieu,RosseaueoFederalista.idem. p.197-198.

de que ninguém tem o direito de dominar a outrem. A experiência, porém ensina que se quisermos ser iguais na realidade social deveremos consentir com nossa dominação. Contudo,aindaquealiberdadeeaigualdadenãopareçamexeqüíveisaomesmotempo, a ideologia política consiste em combiná-las na idéia de democracia.”15

Primeiro, Kelsen é um contratualista que abdica da idéia jus natural dos autores menciona-dos. O direito está imbricado do conceito de Estado, bem característico da obra positivista kelseni-nana . Em segundo lugar, Kelsen aceita a idéia do problema da dominação da vontade geral sobre a particular para que a sociedade seja viável: é necessária a dominação do homem sobre o homem para se instituir uma ordem duradoura. Liberdade para kelsen, não é agir anarquicamente, ser livre do ponto de vista político implica sujeitar-se a uma vontade comum, distinta da particular. O que torna a submissão de nossa vontade a uma ordem normativa é o princípio democ-rático.

“Se a sociedade em geral e o Estado em particular devem ser possíveis, uma or-dem normativa que regule o comportamento mútuo dos homens deve ser válida e, conseqüentemente,adominaçãodohomemsobreohomematravésdetalordemdeve ser aceita. Contudo, se a dominação for inevitável, se não podemos deixar de ser dominados, queremos ser dominados por nós mesmos. A liberdade natural é transformada em liberdade social ou política. Ser social ou politicamente livre sig-nifica,éverdade,sujeitar-seaumaordemnormativa;significa liberdadesobumaordemsocial.Massignifica:submeter-sesomenteaprópriavontadeenãoaumavontadealheia;aumaordemnormativa,umaleidecujoestabelecimentoosujeitodela participe.”16

A mudança do conceito de uma liberdade natural para o conceito de liberdade política se traduznaidéiademocrática.Elecreditaaoabsolutismofilosóficoejusnaturalistaauniãodaidéiade natureza e da sociedade (bem como realidade e valor, causalidade e normatividade) Elementos que a Teoria pura do Direito distingue. A liberdade é vista, assim, como causal quando originada da natureza e normativa quando é social. Comoéafirmadoemsuaobra:

“Se seguirmos por esse caminho, veremos que o homem é responsável por seus atos não por ser livre no sentido metafísico de sua isenção do princípio de causalidade, mas que é livre – em um sentido racional – pelo fato de ser responsável pelos seus atos.Poisserresponsávelporseusatossignificaqueeleépunidoourecompensadopelos mesmos, e é punido e recompensado se as normas(...) jurídicas atribuírem a esses atos uma punição ou recompensa.”17

Ou seja, assim como o princípio fundamental da natureza é a causalidade (que no Trilema deMünchausenreputa-seoregressoaoinfinitooucírculovicioso,dadoonúmeroinfinitosdeelosentre causa e efeito na natureza) não podendo imputar ao homem responsabilidade pelo agir, o princípio fundamental da normatividade apresenta – pela natureza da responsabilização pelo agir – uma interrupção dogmática, na existência de dois elos: Crime e Castigo, como diria Dostoieviski. E a responsabilização da ação do homem implica no abandono “da idéia de liberdade metafísica como ponto de partida da causalidade tem que ser transformada na idéia de uma liberdade racional comopontofinaldaimputação.”18 A razão atribui a si mesma e não a natureza a responsabilidade pelos seus atos, se estes fossem oriundos da natureza de alguém, como seria possível imputá-lo uma pena ou recompensa, se ele não deu origem ao comportamento apresentado como lícito ou ilícito.AcríticaaRosseau,portanto,partedopressupostoqueofilósofodeGenebra,erroneamenteadota a idéia de liberdade natural absoluta e não social. Entretanto, se quisermos aceitar a noção de ordem social como já visto, o ideal é que ela 15 KELSEN, HANS. A Democracia. São Paulo: Martis Fontes, 2000. p.168.16 KELSEN, HANS. A Democracia. Op. Cit. p.168.17 KELSEN, HANS. A Democracia. idem. p.170.18 KELSEN, HANS. A Democracia. idem. p.171.

seja democrática, para que os cidadãos sejam senhores de si mesmo, e, portanto, dentro da ordem social, livres. O princípio do voto majoritário (sendo a maioria simples o necessário para assegurar uma ordem justa do ponto de vista social) é o leitmotiv da expressão da vontade geral e, portanto, democrática. A maioria simples é para Kelsen “a máxima aproximação possível à idéia de liberdade na realidade política.”19 A liberdade política por sua vez repousa na idéia de que se os indivíduos são livres socialmente, estes por sua vez tem valor político idêntico (a mesma pretensão a liber-dade). A idéia de igualdade. Nosso problema se apresenta uma vez que, em geral, para Kelsen a unanimidade política (ouseja,avontadedetodos)ouumamaioriaqualificada(avontadedovotomajoritário)implicaemum pequeno número de indivíduos obstaculizando a vontade dos indivíduos – que por serem maio-ria – a vontade geral estaria em conformidade. UmavezqueKelsenrejeitaajustificativajusnaturalista,apresentadoporJohnLockeàlimi-tação da atuação do poder estatal deve-se encontrar outro fundamento que impeça da maioria destituir a minoria de direitos mínimos. Kelsenrespondetalproblemacomoprincípiodatolerância.Aoafirmarqueapesardaregrada maioria democrática reduzir a idéia de dominação originada na representatividade da democra-cia moderna, esta não pode e nem deve ser uma dominação absoluta da maioria.

“Pois a dominação pela maioria do povo distingue-se de qualquer outra dominação pelofatodequeelanãoapenaspressupõe,pordefinição,umaoposição(istoé,aminoria), mas também porque, politicamente, reconhece sua existência e protege seus direitos.”20

Kelsenafirmaqueosocialismoaosuprimiraminoriapelaviolência,nãopodeseatribuir,como alguns países socialistas como a República Popular Democrática da Coréia (Coréia do Norte) e a República Democrática da Alemanha (Alemanha oriental) a característica de democracia. A transformação da idéia de liberdade natural, comum na ausência de Estado constituído, na liber-dade política não sugere o completo abandono da primeira.

“A democracia moderna não pode estar desvinculada do liberalismo político. Seu princípio é o de que o governo não deve interferir em certas esferas de interesse do indivíduo, que devem ser protegidas por lei como direitos ou liberdades humanas fundamentais. E através do respeito a esses direitos que as minorias são protegidas contra o domínio arbitrário das maiorias.”21

Oproblemaé,apesardeafirmaro caráter racional dademocracia, demonstrar racional-mente uma discussão entre maioria e minoria resulte em cooperação no sentido de resguardar os direitos básicos de uma minoria. A teoria dos jogos moderna assenta-se sobre a teoria de Neuman que aborda o procedi-mento para tornar mínima uma perda o máximo possível, ou seja, a maximização do mínimo, ou hodiernamente chamada maxmin. E a teoria de Nash aplica de modo mais geral e cooperativo as teorias de Neuman. A solução de Nash aponta para dois paradigmas: os jogos com importância real são majori-tariamente cooperativos, enquanto que Neuman se concentrou em jogos de soma zero. Mesmo emconflitosdenaturezainternacional,existe,emalgumnívelestruturalumacooperação(teorica-mente, por exemplo, a utilização do direito humanitário). Em seus jogos cooperativos, os jogadores (minoriaemaioria)podemfabricarracionalmentecooperaçõesautocoagidasporforçadarazãounscomosoutros,comprometendo-secomogrupocomestratégiasespecíficas,assoluçõesdeNeuman não previam tais acordos.

“As vezes a melhor escolha de uma pessoa é a mesma, não importa o que os outros façam. Isso é chamado de estratégia dominante para esse jogador. Outras vezes,

19 KELSEN, HANS. A Democracia. idem. p.179.20 KELSEN, HANS. A Democracia. idem. p.182-183.21 KELSEN, HANS. A Democracia. idem. p.183.

um jogador tem uniformemente uma escolha ruim – uma estratégia dominada – no sentido de que a outra escolha é melhor para ele independentemente do que os outros façam. A busca do equilíbrio deve começar pela procura de estratégias domi-nantes e eliminação das dominadas. Mas esses casos são relativamente raros. Na maioria dos jogos, a melhor escolha de cada jogador depende realmente do que os outros fazem, e devemos então nos voltar para o conceito de Nash.”22

Paraexemplificarumjogosimultâneo23 de informação completa24 que resulte em estratégias dominantes, vamos ilustrar um exemplo de uma eleição dos candidatos dos partidos A e B e suas estratégias. Vou apresentá-lo, bem como os seguintes, no modo estratégia, ou seja através de uma matriz que mostra os jogadores (neste caso abaixo os partidos políticos), estratégias, e payoffs. Onde existem dois jogadores, um escolherá as linhas e o outro escolherá as colunas. Os payoffs são registrados no seu interior. O primeiro número é o payoff recebido pelo jogador da linha (Joga-dorAemnossoexemplo);eosegundoéopagamentoparaojogadordacoluna(JogadorBemnosso exemplo).

Tabela 1

Como se pode destacar da Tabela 1, não importa se o partido B decida aumentar seu gasto compublicidadeounão.ÉsempremelhorparaopartidoAlançarseucandidatodeperfilnovo.Apesquisa demonstra que pelo número de votos conseguidos, a estratégia de {lançar o candidato novo} é dominante, enquanto a de {não lançar candidato novo} é dominada. Jogos de dominância clara como esse acima descrito na tabela 1 são dados algebricamente pela fórmula: πi(s’i,s-i)>π(si,s-i),paratodosietodos-i=>fortementedominante25

ou (usando as siglas das estratégias):

πa(lnc’a,agpb)>π(nlnca,nagcpb),paratodosietodos-i=>fortementedominante 3. O equilíbrio de Nash como fundamento à sustentação kelseniana da limitação da atuação do poder da maioria pelo princípio da tolerância.

Comojáfoiafirmadonosjogosondenãoépossívelidentificarasestratégiasdominadas.Deacordo com Ronaldo Fiani: “Diz-se que uma combinação de estratégias constitui um equilíbrio de Nash quando cada estratégia é a melhor resposta possível às estratégias dos demais jogadores, e isso é verdade para todos os jogadores.”26 Oconceitodemelhorrespostasósejustificaaquipelalógica,vezquecomosãojogossimul-tâneos,emqueojogadoréobrigadoadecidirdesconhecedoasdecisõesdosdemaisjogadores.Para isso, precisamos sempre considerar que todos os nossos ditos jogadores sejam racionais. Neste caso, cada jogador deve decidir pela melhor estratégia pessoal às estratégias dos de-mais, isto é, levando em conta o que seria a melhor estratégia para os outros jogadores. A escolha 22 KELSEN, HANS. A Democracia. idem. p.183.23 NotadoAutor:Nosjogossimultâneos,ojogadornãosabeadecisãodosoutrosatomarasua.24 NotadoAutor:Paraseremdeinformaçãocompletaasrecompensasdevemserdeconhecimentodetodososjogadores.25 Notadoautor:Ondeafunçãoderecompensadojogadorπi,assuasjogadassãoapresentadascomosi,easestratégiasdeoutrosjogadoresquenãoisão–i.Alinha(‘)ésinaldedominância.26 FIANI, Ronaldo. Teoria dos Jogos. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004. p.61.

desse jogador não será necessariamente a melhor de todas as estratégias, mas a melhor, dado o conjuntodemelhoresdecisõesdosoutrosemrelaçãoàdojogadormencionado. Para sairmos de um conceito neumiano e caminhar para o equilíbrio de Nash de modo a justificarminhaassertivaconvêmdemonstrarmaisumavezumjogodesomazero.Considereumasituação que não há fungibilidade entre a maioria e a minoria, ou seja, os cidadãos de determinado país são aritmeticamente herméticos em suas categorias A=Maioria e B=minoria. Se alguém que é da categoria minoria, aqui somente {d}, não poder vir a se tornar maioria com {a,b e c}, o primeiro acaba sendo condenado, por força de critério de dominância, a aceitar a maioria impor sua vontade sobre algo(x). Vez que a maioria não corre o risco de tornar-se minoria algum dia e sofrer “o algo” (x) que está sendo imposto. Note que se atribui valores absolutos para indicar a vantagem que, dada a perspectiva teórica, carece de comprovação empírica.

Tabela 2 Como se pode perceber, a tabela dois, a exemplo da primeira, apresenta o jogo não-coop-erativoesimultâneodeinformaçãocompletaqueresultaemestratégiasdominantesM{a,b,c}>m(d)tx+1=>M(a,b,c)>m(d)–tx+2=>M(a,b,c)>m(d)–tx+3éinteressanteparaM={a,b,c}impor sua vontade em razão da sua permanência em relação a m ={d}, não havendo respeito ao mínimo jurídico, uma vez que estes podem estar tanto em M é sempre M e m é sempre m.

Comojáfoiafirmada,asoluçãoacima,sópodeserapresentadaemjogosnão-cooperativos.A solução de Nash, busca encontrar uma solução onde não haja estratégias dominadas (apesar de poder ser utilizada nos dois casos). Ideal para ser utilizado em circunstâncias em que é necessária a colaboração dos jogadores em certo nível: em sociedades democráticas. Logo,emumadadasituaçãoM{a,b,c}>m{d}–tx+1=>M{a,b,d}>m{c}–tx+2=>M{b,c,d}>m{a}–tx+327 ou seja, onde há uma fungibilidade das classes {a}, {b}, {c} e {d} entre as categorias M = Maioria e m = Minoria, é conveniente que, em virtude da alternância destas ao pas-sar do tempo entre as categorias apresentadas, respeitem o direito da minoria de quem quer que seja que esteja ocupando a categoria minoria, vez que as classes que ocuparem recentemente a categoria maioria poderão futuramente ocupar a categoria minoria. Assim sendo é racional o respeito a direitos mínimos exercidos pela categoria m, vez que em dado momento tanto {a ... d} poderá ocupar tal lugar. É do interesse de todos, o respeito aos direitos fundamentais. Para confirmar tal afirmação, procuro demonstrar tal solução abaixo, apresentando umequilíbrio de Nash.

Tabela 3

27 Notadoautor:ondeM=Maioriae{a},{b}e{c}sãosubguposdeclassesdepessoasquecompõeamaioria,m=amino-riae{d}éoúnicosubgrupodeclassesdepessoasquecompõeaminoria,sendoporfimtx+notempo,quenessecaso,mesmosealterando, a situação permanece a mesma.

Onde:

πi(s*i,s*-i)>π(si,s*-i),paratodosietodos-i=>EquilíbriodeNash28

Ou seja, é interessante para M adotar 1/1, ou seja cooperarem para o caso de os seus re-spectivossubgrupos{a,...d}alteremsuasposições. Perceba que nossos exemplos acima foram representados somente pela categoria de jogos simultâneos.Issosedeveanecessidadeimperativadeanalisarsituaçõesondeamaioriaeami-noriadevemtomarsuasdecisõesaomesmotempo.Entretanto,arealidadenumasituaçãopolíticaé de uma interação repetida desses jogos, e não apenas a existência de um único jogo de estraté-gias: ao contrário, na vida política tais jogos resultam, em etapas que se repetem. Levando, os joga-dores (M, m) a apreciarem o resultado da etapa antecedente, mas ignorarem as etapas seguintes, onde serão chamados a decidir novamente29. Conforme já compreendido, certos jogos infinitamente repetidos,aose levaremcontaarecompensa dos jogadores, e tomando por certo o fator de desconto30 como elevado, a cooperação pode ser sustentada em longo prazo. Caso M e m adotem uma estratégia gatilho31, isto pode ser perfeitamente viável.

Conclusão

Hans Kelsen procurou em sua obra a democracia, aplicar o desenvolvimento de sua teoria que explique o fenômeno democrático em consonância com sua teoria pura, adotando um relativ-ismo político como fundamento. Aolongodesuaobrapressupõesolucionarafalsadicotomiaentreliberdadeeigualdade,para ele pressupostos fundamentais do homem político. Para solucionar tal dicotomia, ele vai con-struindo através de um diálogo ainda que velado com os grandes contratualistas do passado: Hob-bes, Locke e Rosseau. E quanto ao último faz ceder não só a crítica que este fez a dominação, mas também à ausência de representação da vontade do particular pela vontade geral. Quanto à dominação, Kelsen sustenta que a dominação democrática é válida. Se formos dominados – ele sustenta – deveremos ser por nós mesmos, através da regra da maioria para que haja um contrato social estável e duradouro. Quantoàidéiadeliberdade,estenãoconcordacomaafirmaçãoquealiberdadesejacausale natural. Para a obtenção da paz social almejada, temos que traduzir a liberdade como um con-ceito relativo e político. Conforme já observado, o princípio do voto majoritário é a chave não só da vontade geral (e liberdade política) como também o fundamento da democracia. Entretanto, a limitação da atuação do princípio democrático da maioria deve se assentar no respeito aos direitos fundamentais das minorias resultantes do processo democrático, instituídos em uma carta constitucional. OequilíbriodeNash,conformeapresentado,vêmconfirmarnãosóemjogosdeestratégiassimultâneos, mas também em sua modalidade de repetição a sustentabilidade do respeito aos di-reitos humanos no projeto democrático da teoria pura.

28 Notadoautor:Ondeafunçãoderecompensadojogadorπi,assuasjogadassãoapresentadascomosi,easestratégiasdeoutrosjogadoresquenãoisão–i.Oasterisco(*)ésinaldeequilíbrionashiano.29 Notadoautor:Sugerimosaleituradocapítulo“aregradojogo”sobreaadoçãodaestratégiatit-for-tat. SAGAN, Carl. BilhõeseBilhões:reflexõessobrevidaemortenaviradadomilênio.SãoPaulo:Companhiadasletras,1998.p.197-209.30 “Contudo,conformetivemosoportunidadedeveraoanalisarnegociaçõesdebarganha,nocapítuloanterior,receberumrealhojeéalgodiferentedereceberumrealamanhã.Naverdade,receber$1hojeémelhorquereceber$1amanhã,nosentidopre-cisodeque$1amanhãvaleumpoucomenosdoquehoje.Emoutraspalavras,precisamosdescontarumvalorfuturo(orecebimentode um real amanhã), para atualizarmos esse valor futuro, isto é, para trazê-lo ao valor presente. Para isso, precisamos aplicar ao recebimento futuro, ou futura recompensa, um fator de desconto.” FIANI, Ronaldo. Teoria dos Jogos. idem. p.160.31 “Umaestratégiagatilhoéumaestratégiaquedetermina,paraojogadorqueaadota,seguirumcursodeaçãoenquantoumadeterminadacondiçãoésatisfeitae,casoessacondiçãoemqualquermomentodeixedesersatisfeita,seguirumoutrocursodeaçãopelorestodojogo.”FIANI,Ronaldo.TeoriadosJogos.idem.p.163.

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O SISTEMA PRISIONAL BRASILEIRO: UMA ANÁLISE CRÍTICA ACERCA DA FINALIDADE DA PENA

FERNANDA CÂNDIDA DIAS1

Orientadora: SIMONE MATOS RIOS PINTO

Resumo:Estetrabalhotemporfinalidadediscutirosistemacarceráriobrasileirodentrododireito penal em face das teorias que fundamentam a pena e da lei 7210/84 - LEP (Lei de Execução Penal).

Abstract: This paper aims to discuss the Brazilian prison system within the criminal law. Upon the theories behind the pen and the law 7210/84 of LPE (Law of Penal Execution).

INTRODUÇÃO

Este artigo visa a análise do sistema prisional brasileiro em face das teorias que fundamen-tamapena.“Arealidadedosistemapenalbrasileiroédegradante”,afirmaçãofundamentadapeloconhecimentopúblicosobreascondiçõesestruturaisdospresídios,epelafaltadeprogramasderessocialização dos presos. Deve-se sempre atentar ao fato de que nenhum réu pode perder seus direitos, o que, a grosso modo, acontece com os detentos em nosso país, o que fere diretamente o fundamento da Constituição Federal: Dignidade da Pessoa Humana e os Direitos Humanos as-segurados pela convenção do Pacto de São José da Costa Rica.

1 – TEORIAS QUE FUNDAMENTAM A PENA

Na antiguidade, as penas eram tratadas de forma sórdida e sem proporcionalidade. Relatos históricos comprovam que crimes como roubo, inadimplência ou adultério podiam ser penalizados com a morte, sem direito a júri, apuração dos fatos ou penas mais leves. Cesare Beccaria, escri-tor italiano, é um dos primeiros a criticar o modo de punição e almejar uma legislação uniforme que atendessem a todos de maneira racional. Todos que praticassem certos delitos teriam uma mesma resposta de punição. É o interlocutor contra os julgamentos secretos, a tortura, as penas infames, estabelecendo limite entre a justiça divina e a justiça humana. Segundo ele, as leis seriam estabelecidas pela pessoa do legislador e elas indicariam as penas de cada delito e não deixariam ao arbítrio de tiranos. Seus questionamentos embasam vários princípios penais, principalmente princípios ligados a legitimar as penas aplicadas. Posteriormente, criaram-se outros fundamentos da pena formando outras correntes doutrinárias. A solução dos problemas da criminalidade, na sociedade, tem sido tratada diferente com o passar do tempo.A cada delito comina-se uma pena abstrata que para ser aplicada, leva em conta váriospostuladospenais,comafinalidadedeajustarapenademaneiracertaeproporcionalacadadelitoeacadainfrator.Apenadevecumprirumafunçãoejustificação.Atualmente,nodireitopenal,trêsteoriastentamjustificarapena:ateoriaabsoluta,ateoriarelativaeateoriamista.

1.1 – Teoria Absoluta ou da Retribuição

Estateoriaconsideraapenacomoumfimemsimesma,ouseja,comoumcastigo.Apenaé pura retribuição, respondendo o mal contra o mal. Kant, defensor da Moral até mesmo acima do direito,exemplifica:mesmoquefiquesomenteocondenadonumailha,eledevecumprirapena.Apenaéreação,justificadaporseuintrínsecovaloraxiológico,nãocomoummeioouumcusto,massim, um dever ser que possui em si mesmo o seu fundamento. Já de acordo com os ensinamentos de Hegel: o crime é a negação do direito e a pena a negação do crime, sendo a pena é o restabelecimento do direito.

1 Aluna do 3º período de Direito da FACED

Como ensina Capez:

“Afinalidadedapenaépuniroautordeumainfraçãopenal.Apenaéaretribuiçãodo mal injusto, praticado pelo criminoso, pelo mal justo previsto no ordenamento ju-rídico.” (punitur quia peccatum est.). (CAPEZ, 2010, p. 601)

1.2 – Teoria Relativa, Finalista, Utilitária ou da Prevenção

Estateoriatrabalhadiferenteajustificativadapena.Apenatemumfimpráticoeimediato,de prevenção geral ou especial do crime. A razão da pena está na segurança social a que ela serve comoinstrumentodeprevençãodocrime,erealizafunçõesúteisàsociedade.Suasfinalidadesdividem-se em Geral e Especial. AprevençãoGeraldestina-senapossibilidadedasociedade refletir sobreocrimeenãocometer mais algo do tipo. Ela é representada pela intimidação dirigida ao ambiente social, para que não ocorra o mesmo delito, com receio da punição. Sendo dividida em Geral Positiva e Nega-tiva. •TeoriaGeralPositiva-tambémchamadadeintegradora.Temcomoobjetivoconscientizarasociedadesobreafidelidadeaodireito,promovendoemúltimaanáliseaintegraçãosocial.Funda-mentaapenananecessidadedereafirmarorespeitoeaconsciênciasocialdasnormas. •TeoriaGeralNegativa-tambémconhecidacomoprevençãoporintimidação,fazendocomqueasociedade reflitaantesdepraticarqualquer infraçãopenal.Seus fundamentos tentamal-cançaraquelespropensosaocrime,paraquereflitamantesdepraticaremqualquerinfraçãopenal.Foucaultobservaestafinalidadenascerimôniasdosuplicio,ondeopersonagemprincipaleranaverdade o povo que assistia. Na atualidade, o interesse pela prevenção geral positiva renasce na teoria funcionalista da penadesenvolvidaporJakobseRoxin.Paraoprimeiro,odelitoquebraafidelidadeaoDireito,merecendo o infrator, que não obedece o sistema, ser punido de maneira mais severa. Para o se-gundo funcionalista, para se castigar um infrator, deve haver necessidade e proporcionalidade, ou seja, baseia-se no direito penal mínimo enfocando o caráter subsidiário e fragmentário deste ramo do Direito. AprevençãoEspecialtemcomofinalidadeareadaptaçãoeasegregaçãosocialdocrimino-so,comomeiodeimpedi-lodevoltaradelinqüir,sedividindoemdoistiposdeprevençãoEspeciala Positiva e Negativa. •Prevençãoespecialnegativa– intimidaçãoaoautordodelitoparaquenãotorneaagirdeste modo, visa sua neutralização.A retirada do autor do delito impede de provocar novas in-fraçõespenais,pelomenosjuntodasociedadeemquefoiretirado. •PrevençãoEspecialPositiva-apenatemamissãodefazercomqueoautordesistadecometer futuros delitos. Denota-se o caráter ressocializador da pena, fazendo com que o agente meditesobreocrime,inibindoapráticadeoutrasinfrações.Cárcereseriaparaapessoacomoumtratamentoondehouvessereflexõesacercadomalcausadopelodelito,impedindoassimquereit-erasse a conduta criminosa. Esta prevenção é a mais discutida na atualidade.

Nos ensinamentos de Capez:

Apenatemumfimpráticoeimediatodeprevençãogeralouespecialdocrime(pu-nitur ne peccetur). A prevenção é especial porque a pena objetiva a readaptação easegregaçãosocialdocriminosocomomeiosdeimpedi-lodevoltaradelinqüir.A prevenção geral é representada pela intimidação dirigida ao ambiente social (as pessoasnãodelinqüemporquetemmedodereceberapunição).(CAPEZ,2010.p.601)

1.3 – Teoria Mista, Eclética, Intermediária ou Conciliatória

Nestateoriaapenatemduasfinalidadesaderetribuireprevenir,éajunçãodaabsoluta(passado) com a relativa (futuro). A pena tem a dupla função de punir o criminoso e prevenir a prática do crime, pela reeducação e intimidação coletiva. Capez, observa que “A pena tem a du-pla função de punir o criminoso e prevenir a prática do crime, pela reeducação e pela intimidação coletiva (punitur quia peccatum est et ne peccetur). (CAPEZ, 2010 p. 601)” 1.4 – Teoria que Vigora no Sistema Brasileiro

AteoriaqueéadotadapeloCódigoPenalBrasileiroéamistaporunificarasduasteorias,punindo e prevenindo o crime de acordo com o artigo 59 do Código Penal:

Art. 59 - O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidadedoagente,aosmotivos,àscircunstânciaseconseqüênciasdocrime,bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e suficienteparareprovaçãoeprevençãodocrime.

2 – O SISTEMA PENAL BRASILERO

Os problemas encontrados nas penitenciárias brasileiras não é um fato novo. Rotineira-mentetemosnotícias,documentáriosoufilmesdeficçãosobresuperlotações,máscondiçõesdehabitação,faltadesaneamentobásico,aescassaestruturafísica,comfiaçõesexpostas,semma-nutenção,sobforteriscodealgumacidenteoupaneelétrica,celasalagadasporinfiltrações,mofo,máscondiçõesdehigieneentreoutros.Apesardeosdetentosestaremcumprindopenaportereminfringidoalei,emmenoroumaiorgrau,nãoéjustificativaparaquevivamemcondiçõessub-hu-manas. Não estamos diante de um campo de concentração nazista. Quando olhamos a história e percebemos os erros cometidos em épocas passadas nos chocamos com as cenas exibidas, e nos esquecemos de um olhar crítico ao sistema prisional brasileiro e das semelhanças que nos traz cenas reais da atualidade. A fundamentação da pena sob a ótica da prevenção geral negativa , merece críticas porque fazdoapenadoumexemplo,paramostraràpopulaçãoqueaindanãodelinqüiuquesenãoforemobservadasnormas,estetambémseráoseufim.Estacoisificaçãodapessoahumana,doinfrator,nosremeteàbarbáriedeoutrora,comaexposiçãovexatóriadocumpridordepenas.Impressõesretiradasdevisita“Inloco”aumpresídio,sãodequeosdelinqüentesseassemelhamaanimaisem jaula, que são observados pelo agentes penitenciários e pelos visitantes . A fundamentação sob a ótica da prevenção especial positiva, em que pretende reeducar e ressocializar um infrator , dentro do sistema penal falido, tem se mostrado utópica. Como faremos reinserir o condenado na sociedade, se a pena não cumpre a missão ressocializadora, ao contra-rio, corrompe a personalidade do agente. De acordo com a lei 7210/84 da LEP, onde elenca os direitos dos condenados, no artigo 40,percebemos, em visita a uma penitenciária, que vários deles não são cumpridos, não passando de letras mortas que não conseguem garantir vida digna, principalmente pelo número excessivo de condenados em cada cela. A saída do presidiário para a vida social é realizada sem nenhum amparo do Estado, o único caminho que ele encontra é de cometer novos delitos haja vista aos inúmeros casos de reincidência.

CONCLUSÃO

Aspenasaplicadasnoatualsistemabrasileiroestãolongedecumpriremasfinalidadesado-tadasporela.Existeumabismoentrearealidadeeaverdadeirafinalidadedosistemacarcerário.Mudançasdevemserfeitas;ogoverno,porpossuiraresponsabilidadedaspenitenciárias,deveserabordado e cobrado sobre o problema social em que está. Os direitos dos condenados, que são garantidosemlei,passamdespercebidos.Asobrigaçõesnãosãocumpridasetantoogovernoquanto o poder carcerário são omissos quanto ao presidiário. Como ressocializar um presidiário

recém chegado com um preso revoltoso que está cumprindo pena há anos? Na maioria dos presí-dios, não há separação de presos. A idéia de que a maioria dos ex-presidiários saem piores do que entram é verídico. Os egressos enfrentam outros problemas sociais, sendo o desemprego um de-les. Eles não são preparados para a sociedade, e a sociedade não os acolhe. Na aplicação da pena deveserobservadoegarantidoosdireitosdospresos.Afinal,apesardeseremtransgressoresdalei, não perderam seus direitos humanos e não perderam a dignidade. E, como seres humanos, mesmo falhos, têm o direito de errar, e devem ter uma nova chance.O sistema prisional deve ser aumaferramentadepuniçãoetambémderessocialização,enãoumfimemsimesmo.

BIBLIOGRAFIA

BECCARIA, Cesare. Dos Delitos e das Penas. 2° ed. Martin Claret Ltda, 2008.

CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal – Parte geral. vol. 1, 11ª ed. São Paulo: Saraiva, 2006.

FERRAJOLI,Luigi. Direito e razão: teoria do garantismo penal.São Paulo:Editora Revista dos Tribu-nais,2002.

FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir. 14ª ed. Trad. Raquel Ramalhete. Petrópolis: Vozes, 1996.

HASSEMER, Wilfried. Perspectivas de uma moderna política criminal. Revista Brasileira de Ciên-cias Criminais. n. 8, out./dez., p. 41 – 51, 1994.

JAKOBS,Günter.DireitoPenaldoInimigo:NoçõeseCríticas/GünterJakobs,ManuelCancioMeliá;Organização e tradução: André Luis Callegari, Nereu José Giacomolli. Porto Alegre: Livraria do Ad-vogado, 2007

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ROXIN, Claus. Funcionalismo e Imputação Objetiva no Direito Penal. Rio de Janeiro e São Paulo: Renovar, 2002.

TOLEDO, Francisco de Assis. Princípios Básicos de Direito Penal. 5ª ed. São Paulo: Saraiva, 1994.

ZAFFARONI, Eugenio Raúl. O inimigo no Direito Penal. Trad. Sérgio Lamarão. Rio de Janeiro: Revan, 2007.

PARADIGMA E EPISTEMOLOGIA

Márcio Zacarias Lara

RESUMO

Quando vamos tratar dos princípios éticos que norteiam a construção de teorias e práticas científicas,falamosdeparadigmasedeepistemologia.Oconceitodeparadigmafoidesenvolvidopor Thomas Khun, físico e historiador das ciências. Segundo o próprio Khun, o conceito é o ponto mais obscuro e mais importante de sua obra. A exemplo do conceito de paradigma, o conceito de epistemologiatambémcarregaconsigoalgumasdificuldadesdedefinição.Referindo-seaessasdificuldades,HiltonJapiassudizque“sabemosmuitodoqueelanãoé,epoucosobreoqueelaé.”Portanto,éporconsiderarmosos termospolêmicosnoâmbitodafilosofiaedaciênciacon-temporânea,équededicaremosalgumasreflexões,nosentidodecompreendê-los,bemcomoarelação entre eles, antes de, em um segundo momento de escrevermos sobre a sua aplicação.

Palavras-chaves: Paradigma, Epistemologia.

Dentreostermospolêmicosnoâmbitodafilosofiaedaciênciacontemporânea,osconcei-tosdeparadigmaeepistemologiaocupamlugardedestaque;sãomuitoutilizados,mas,muitasvezes, com sentidos divergentes. Em decorrência dessa importância, é que dedicaremos algumas reflexões,nosentidodecompreenderarelaçãoentreeles. Oconceitodeparadigma,queéamplamenteutilizadoemtodaaliteraturacientíficaefilosó-ficaatual, foidesenvolvidopelo físicoehistoriadordaciênciaThomasKhun,emsuaconhecidaobraAEstruturadasRevoluçõesCientíficas,editadaeml962.Tãoamplamentetrabalhadofoioconceito de paradigma pelo físico, que a partir dessa data passou a ser referência para todos os que trabalham o conceito. Khun(1978)consideraparadigmas“asrealizaçõescientíficasuniversalmentereconhecidasquedurantealgumtempofornecemproblemasesoluçõesmodelaresparaumacomunidadedepraticantes de uma ciência” (KHUN, 1978, p. 13). Para ele paradigma não é sinônimo de teoria ou de um conjunto de teorias, é mais do que isto. Ele considera apropriado referir-se a paradigmas comoumconjuntodecrençasevaloressubjacentesàpráticacientífica.Emborapareçamuitoclaraadefiniçãodoconceito,elefoiobjetodegrandepolêmica,desencadeadapelapublicaçãodaobrade Khun. Adefiniçãodoconceitodeparadigma,segundoopróprioKhun (1978)afirma,éopontomaisobscuroemaisimportantedeseutextooriginal.Parailustraradificuldade,elerelataocasodeumaleitoraquelheescreveudizendoque,naobraAEstruturadasRevoluçõesCientíficas,ob-servou que o termo é utilizado “em pelo menos vinte e sete maneiras diferentes” (KHUN, 1978, p. 226).Eleentãojustificaque,emsuamaioria,essasdiferençassãoocasionadaspor“incongruên-cias estilísticas”. Por exemplo, diz ele: “(...) algumas vezes as leis de Newton são um paradigma, em outras, partes de um paradigma, ou, em ainda outras, paradigmáticas” (KHUN, 1978, p. 226). Propõe,então,falardeparadigmaemumsentidoglobal,sugerindoaexpressão“matrizdisciplinar”,quepossuicomocomponentes:generalizaçõessimbólicas,queseassemelhamempartea leisdanaturezae,emparte,adefiniçõesdesímbolosqueelasempregam;crençasemdeterminadosmodelosheurísticos,parainterpretaçãodarealidade;evaloresqueemgeralsãomaisamplamentepartilhadospordiferentescomunidadesdoqueasgeneralizaçõessimbólicasoumodelos.Éfunda-mental,acrescentaele,queumparadigmacontribuasignificativamenteparaqueoscientistassesintam pertencentes a uma comunidade global. Em seguida, faz uma síntese, colocando um ponto finalnapolêmicadesencadeada.Dizele,noposfáciodaediçãodel969,seteanosapósapubli-caçãodaprimeiraediçãodeAEstruturadasRevoluçõesCientíficas:

Percebe-se rapidamente que na maior parte do livro o termo paradigma é usado em dois sentidos diferentes. De um lado indica toda a constelação de crenças, valores e técnicas etc. (...) compartilhados pelos membros de uma comunidade determinada.

Deoutro,denotaumtipodeelementodessaconstelação:assoluçõesconcretasdequebra-cabeças que, empregados como modelos ou exemplos, podem substituir re-gras explícitas como base para a solução dos restantes quebra-cabeças da ciência normal. (KHUN, 1978, p. 218).

Embora cercado de muita polêmica, Khun (1978), cientista físico, em um primeiro momento, e historiador das ciências posteriormente, concebeu um conceito de paradigma, que, transcenden-doasfronteirasdisciplinares,éhojeamplamenteutilizadoemtodaliteraturacientíficaefilosófica. O pensamento sistêmico, conforme foi exposto por Capra, possui o status de paradigma, tal qual foi concebido por Khun (1978), em razão de consistir de uma nova visão da realidade, que nos fornece um novo modelo interpretativo, pelo qual podemos compreender a realidade e resolver osquebra-cabeçasquedesafiamaciência,noatualmomentohistórico.Esteparadigmajáépartil-hadoporgrandeparceladacomunidadecientífica,emtodasaspartesdomundo. O termo “paradigma” é distinto de epistemologia, ao contrário da opinião de alguns autores, como Esteves de Vasconcellos (2002), que considera os termos como equivalentes. Para Esteves de Vasconcellos o novo pensamento sistêmico é o novo paradigma ou a nova epistemologia:

Quandoafirmoqueopensamentosistêmicoéonovoparadigmaouanovaepiste-mologia da ciência, é o sentido de paradigma como crenças e valores dos cientistas que tomo como equivalentes de epistemologia ou de quadro de referência episte-mológico, no sentido de visão ou concepção de mundo implícita na atividade cientí-fica.Naverdade,oscritériosdecientificidadecompartilhadospeloscientistas,ouseja,osprincípiosdiretoresdainvestigaçãocientífica,refletemseuparadigma,suaepistemologia, sua visão de mundo, as crenças e os valores com que estão compro-metidos. (ESTEVES DE VASCONCELLOS, 2002, p. 43.)

A exemplo do conceito de paradigma, o conceito de epistemologia também carrega consigo algumasdificuldadesdedefinição.Referindo-seàsdificuldadesdedefinir “epistemologia”,Japi-assu(1991,p.25)diz:“(...)sabemosmuitodoqueelanãoé,epoucosobreoqueelaé”,ejustificaasdificuldades,dizendotratar-sedeumadisciplinamuitorecente.Seuestatutoestálongedepoderserbemdefinido,tantoemrelaçãoàsciências,entreasquaispretendeinstalar-secomodisciplinaautônoma,quantoemrelaçãoàfilosofia,daqualintencionaseparar-se.Referindo-seaessasdi-ficuldadesafirmaque:

Definiroestatutodaepistemologiaatualétarefadelicada,poisoslimitesdodomíniodeinvestigaçãodessadisciplinasãomuitoflutuantes.Alémdisso,nãoexistesequerum acordo quanto à natureza dos problemas que ela deve abordar. (JAPIASSU, 1991, p. 25.)

Dianteda indefiniçãodequese revesteo termo,Japiassuaconselhacomeçarmosaes-clarecê-lo a partir de seu sentido etimológico, o que considero uma boa iniciativa. Epistemologia significaetimologicamente,discurso(logos)sobreaciência(episteme).ÉumtermoquesurgiuapartirdoséculoXIX,novocabuláriofilosófico.Surgiutardiamente,segundoJapiassu(1991,p.25),paradesignarumaantigaformadeconhecimento,aindanafilosofiaclássica.Podemosdizerqueoprocedimento epistemológico está posto desde a tradição grega, quando dos diálogos entre Platão, Sócrateseossofistas,queconstituíramasfontesdetodoopensamentorelativistanaciênciaenafilosofia.Já,emTeeteto,Platão(1990)discuteanoçãodeciênciaeoproblemadaverdadepormeio de uma discussão entre Sócrates, o geômetra Teodoro, amigo de Protágoras e o jovem Tee-teto. ÉdouardSchuréfazasseguintesconsideraçõessobreessediálogo:

Trata-se nesse diálogo da noção de ciência. Platão refuta aqueles que colocam as origens da ciência nos sentidos. Explica a possibilidade do erro, distingue a opinião justadaopiniãoerrôneae,semchegaradefiniraciênciamostraqueelaédiferenteda opinião justa, mesmo que esta seja acompanhada da razão”. (...) discorre sobre

asnoçõesabstratasegeraisqueaalmadiscernenosobjetossensíveis,paraquepossa ter dúvida sobre a conclusão e o alcance do diálogo. (SCHOURÉ, 1987, p. 74–75.)

Nesse diálogo, Platão contesta, como podemos observar, aqueles que atribuem a origem da ciênciaaossentidosenumaóticauniversalista,emqueprocuratranscenderalinguagem,opõe-seaorelativismosofista,emrelaçãoaoconhecimento.Estacondutaplatônicainfluenciouaconsider-açãodaepistemologiacomoumadisciplinaespecialdentrodafilosofia,atribuindoaosfilósofosatarefa de discutir criticamente a ciência, e nunca propriamente os cientistas. As reflexões epistemológicas sobre a ciência tinham como objetivo investigar os camin-hos para se chegar ao conhecimento pelas vias da ciência e para estudar a natureza dos objetos aosquaisosconhecimentoscientíficosseaplicam. Issosignificavaperguntar-sesobreoqueéaverdade;seépossívelalcançá-la,absolutaourelativamente,equaisascondiçõesdevemserpreenchidas para que se possa alcançá-la total ou parcialmente. Esta concepção da epistemologia, comofilosofiadaciência,estáregistradanoVocabulárioTécnicoeCríticodaFilosofia,deAndréLalande:

Estapalavradesignaafilosofiadasciências,mascomumsentidomaispreciso(...)É essencialmente o estudo crítico dos princípios, das hipóteses e dos resultados das diversas ciências, destinado a determinar sua origem lógica (não psicológica), o seu valor e a sua importância objetiva. (LALANDE, 1993, p. 313.

Nestaótica,aepistemologianãoéoestudodosmétodoscientíficos,queéobjetodees-tudo da metodologia. É essencialmente um estudo crítico com vistas a determinar a origem lógica daciência,seuvaloreseualcance.Assimsendo,dizJapiassu(1991,p.13)queafilosofiausariaaciênciacomopretextoparafilosofar.Oqueparanósficacomprovado,quandoresgatamosasfunçõesquecostumeiramenteseatribuemàfilosofiadaciência:situaro lugardoconhecimentocientíficodentrododomíniodosaber;estabeleceroslimitesdoconhecimentocientífico,“poisestenãopodetudoconhecer”;buscaranaturezadaciência.Astrêsfunçõespornósexpostaspossuemquestõesfundamentais,subjacentes,sobreoqueéoconhecimentoequaisaspossibilidadesdealcançá-lo. Impossívelseriaconcebermosotermo“paradigma”equivalentea“epistemologia”,porrazõesumtantoóbvias.Oparadigma,naciência,compõem-sedeumconjuntodecrençasevaloressub-jacentesàpráticacientífica.Essesvaloresecrenças,partilhadosporumacomunidadecientífica,fornecem os princípios que norteiam a construção das teorias que, naquele momento histórico, fornecemexplicaçãoeapontampistasdesoluçõesparaosquebra-cabeçascomosquaisasocie-dadesedepara.Porexemplo,noperíodomedieval,oparadigmaeradenaturezaracional-teológica;portanto,todasasteoriasconsideradasválidascientificamentedeveriamobedeceraesseprincípiofundamental.Noperíodomoderno,oparadigmahegemônicoeradenaturezaempírico-analítica;portanto, o conhecimento que fosse produzido fora desses pressupostos não seria considerado válidocientificamente.Jáentãoaepistemologia,tendocomotarefaexercerumavigilânciacríticasobre esses princípios paradigmáticos, orientou a construção de modelos “epistemológicos”, que, contendoemsiessesprincípios,nortearamaconstruçãodoconhecimento,noâmbitoespecíficoda ciência. O paradigma é o modelo pronto e acabado, a epistemologia, “o grilo falante, companheiro do Pinóquio”, que o persegue com advertências, para que não fuja dos princípios morais funda-mentais.Todaciência,regidaporumparadigma,trazemsuaspegadasamarcadareflexãoepis-temológica, que conduz o cientista a um constante transitar entre a certeza e a incerteza, advindas das limitaçõescognitivasque fazempartedesuanatureza.EstacondiçãoédefendidaporKarlPopper,emsuaobraLógicadaPesquisaCientífica.AcondutacientíficadePopper(1989)émar-cadaporumapreocupaçãoepistemológica,queconsisteemtornarclaroograudeconfiançaquepodemosdepositarnumateoriacientífica.SegundoPopper,umenunciadoterávalidadecientíficaquando sua forma lógica for aberta à possibilidade de falseação. Com isso deseja dizer que todos os enunciados considerados legítimos estão abertos a críticas, e que tudo o que não esteja aberto

atenta contra o compromisso que a ciência possui com a processualidade da verdade. A crítica a que se refere Popper (1989) necessariamente deve estar perpassada pela clareza que o fenômeno deve possuir para os órgãos dos sentidos. Com esta atitude Popper (1989) coloca-se em defesa da ciência experimental, que para ele “é uma defesa da condição humana contra o risco de se tornar refém do invisível” (POPPER, apud TEIXEIRA, 2001, p. 37). Denotando uma grande preocupação epistemológica, segundo Japiassu, a preocupação epistemológica essencial de Popper diz respeito “àelucidaçãodovalordasteoriascientíficas,ouseja,aograudeconfiançaquepodemosdeposi-tar nelas, em função dos dados empíricos de que podemos dispor” (JAPIASSU, 1991, p. 85). A conduta epistemológica, pois, conduz o cientista à compreensão de como está sendo construído o conhecimento, em seus princípios mais gerais e nos mais particulares, que acompanham a prática quotidiana do pesquisador. Asrevoluçõescientíficasacontecemquando“episódiosextraordinários,transformamaim-aginaçãocientífica(...)seapresentandocomocomplementosdesintegradoresdatradiçãoàquala ciência normal está ligada” (KHUN, 1978, p. 25). Tais mudanças, segundo Khun, são acompan-hadasdecontrovérsias,“quequasesempresãocaracterísticasdefinidorasdasrevoluçõescientífi-cas”.Quandoasrevoluçõesacontecem,osprincípiosparadigmáticos,nãoresistindoaoprocesso,desfazem-se, e com eles, também o modelo ou os modelos epistemológicos gestados em seu âmbito. É exatamente esta a história que Capra nos conta: de como um paradigma, em razão de sua crise, cedeu lugar a outro. E como os modelos epistemológicos vigentes no período tradicional da ciência estão sendo gradualmente substituídos.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ESTEVES DE VASCONCELLOS, Maria José. O novo paradigma da ciência. Campinas: Papirus, 2002.

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SCHOURÉ,Edouard.Osgrandesiniciados–Platão–esboçodahistóriasecretadasreligiões.SãoPaulo: Martin Claret, 1987.

QUAL GRAMÁTICA ENSINAR NO ENSINO MÉDIONORMATIVA OU TEXTUAL?

Jurandir Marques Silva Júnior

O uso da gramática no ensino da Língua Portuguesa nas escolas, em geral, vem gerando acirradas polêmicas ao longo dos anos. Pretendemos, assim, à luz da razão, mostrar as incoerên-cias gramaticais quanto ao ensino posto em prática em nossas escolas sejam elas particulares ou públicas. Analisando essas incoerências, vejamos como Bechara conceitua período: “chama-se perío-do o conjunto oracional cuja enunciação termina por silêncio ou pausa mais apreciável, indicada normalmente na escrita por ponto”. (BECHARA, 1982, p. 199) Notando a falta de clareza, redime-se no parágrafo seguinte, dizendo ser período simples o constituído por uma só oração. O que se entende por conjunto oracional? É a reunião das partes que constituem um todo. Andréafirmaque“Períodoéoenunciadoqueseconstituideduasoumaisorações”.(AN-DRÉ,1997, p. 274) Confrontando Bechara com André, nota-se uma semelhança entre ambos parecendo-nos estemaisconflitanteemrelaçãoàquele,vistoacitaçãoacima. Como pode o aluno assimilar esses conceitos falaciosos e que procedimentos tomará ao enfrentarconcursospúblicos,emespecialoVestibular?Senósprofessores,nãofizermosumaavaliação prévia do livro didático, antes de adotá-lo, estaremos nos acomodando funcionalmente e permitindo ao aluno acreditar em tudo quanto o livro contiver. Essasaberraçõesnãopararamporaqui.Aoperceberesse“festival”,oestudantevolta-separa o lado crítico, inquirindo o professor para explicar esses absurdos.Às vezes, o professor é tão radical quanto o gramático e não aceita a participação do discente, pois também não domina a GN, classificando-ocomoperturbadorougracejador.Essaposturadodiscentecomprometeo rendi-mentodaaprendizagem,dedeixandoseqüelasnodiscenteapontodeseincompatibilizarcomamatéria e também com o professor. Assim, transmite-se essa visão distorcida sobre o ensino da línguacomosendoo“decoreba”deumainfinidadederegrasedeexceções,complicandomaisavida do aluno, principalmente daquele oriundo de camada social menos privilegiada. Oquesevêdentrodesaladeaulaétentar-seanulardiversidadeslingüísticasqueexpres-samdiferençaseconflitosexistentesentregruposetárioseétnicose,sobremaneira,entreclassessociais.Podemos entender que a gramática tem sido o objeto do ensino de português no Brasil e não a língua como deveria ser. Em consequência, estão sendo transmitidos aos alunos do Ensino FundamentaleemespecialdoensinoMédioconceitos lingüísticosfalhos.Refletindosobreesseensinopostoempráticapelasescolaspúblicaseparticulares,verifica-seumaprática lastimávelque é encher a cabeça do estudante com algo inútil, confuso, incompleto - o conhecimento teórico nãocontribuisignificativamenteparaodomíniodalíngua. Considerando a inutilidade desse conhecimento imposto pelo aluno como verdadeiro crime. Geraldiafirmaque“Oensinodalínguafoidesviadoparaoensinodateoriagramatical”.(GERALDI,1987, p. 21) Ora, se a função da escola é o ensino da língua padrão, não é com teoria gramatical que ela concretizará seu objetivo. Esses contrastes levam o estudante ao desinteresse pelo estudo da língua, pois quando pensa haver entendido conteúdo trabalhado em sala de aula,amargura-se ao sedepararcomdeterminadasconstruções,poisnãoconsegueentenderoenunciado,daíresul-tamasfrustrações,reprovações,recriminaçõesquecomeçampelaprópriaescolaeopreconceitolingüísticodequenãosabeportuguês. Isso é o resultado de um ensino centrado na Gramática Tradicional - o conhecimento se esvaiporfaltadesustentaçãocientífica;écomocaminharporsobreolodo;nãoháfirmezanospassos dados e a queda é inevitável. Toda essa parafernália gramatical tradicional é fruto de uma preocupação da escola em mostrar ao estudante a língua considerada padrão pela elite cultural que insiste em se pautar por

modelos clássicos do século III aC. Sabe-se que, através da história, a cidade de Alexandria, no Egito, foi considerada, naquela época, importante centro da cultura grega. Assim, a grande literatura clássica da Grécia despertou o interesse dos estudiosos desse campo, pois estavam preocupados na preservação da pureza da língua grega. Dessa forma nas-ceuagramáticaqueemgregosignifica“aartedeescrever”.Comopodemosobservar,asregrasgramaticais foram criadas voltadas para o uso literário dos considerados grandes escritores do pas-sado, recebendo o nome de gramática Tradicional. Analisando esses fenômenos linguísticos, podemos ressaltar dois equívocos fatais: o pri-meiro,consisteemsepararrigidamentealínguaescritadafalada;osegundonaformadeencarara mudança das línguas que eles acreditavam ser uma corrupção, “decadência”, também conce-bida por muita gente até hoje.Em função desses equívocos, formou-se o “erro clássico”no estudo dalinguagemque,apesardedoismilêniosdereinado,sófoienxergadonofinaldoséculoXIXeno início do século XX com o surgimento da linguística. Logo, enquanto não houver uma proposta pedagógica capaz de eliminar esses equívocos ocorridos no ensino da língua e uma mudança sub-stancialdasmotivaçõesideológicasquesustentamesseensinomutilado,castrador,agramáticaTradicional permanecerá como alvo crítico preferido, embora se reconheça ser ela o principal ponto de referência para o ensino Fundamental e o Médio. Tudo isso resulta na submissão da língua à gramática. Como?Com o passar dos séculos, a Gramática Tradicional mudou de roupagem, mas o conteúdo continuou o mesmo, isto é, passou a ser denominada de Gramática Normativa.Assim, a GT transformou-se numa ferramenta ideológica easgramáticasescritasparadescreverefixarcomoregrasepadrõesasmanifestaçõeslingüís-ticas usadas espontaneamente pelos escritores considerados dignos de admiração, modelos a serem imitados. Segundo Bagno:

Com a instrumentalização da Gramática Normativa em mecanismo ideológico de poder e de controle de uma camada social sobre as demais, formou-se essa “falsa consciência” coletiva de que os usuários de uma língua necessitam da Gramática Normativa como se ela fosse uma espécie de fonte mística da qual emana a língua “pura”.Foi assim que a língua subordinou-se à gramática. (BAGNO, 2000, p. 87)

Finalmente, devemos ou não utilizar a gramática no ensino da Língua Portuguesa?Não há dúvida que sim, embora saibamos perfeitamente que ela em si não ensina ninguém a falar, contudo ajuda na medida em que saibamos separar o útil. Bagno é de opinião que:

A gramática deve conter uma boa quantidade de atividades de pesquisa, que pos-sibilitemaoalunoaproduçãodeseupróprioconhecimento lingüístico,comoumaarmaeficazcontraareproduçãoirrefletidaeacríticadadoutrinagramaticalnorma-tiva. (BAGNO, 2000, p. 87)

Através do conceito de Bagno o professor de português deixaria o comodismo, a ser dinâmi-co, deixando de ser apenas um repetidor da doutrina gramatical normativista que ele mesmo não domina integralmente. Àvistadasconsideraçõesfeitas,conclui-sequeagramáticanãojustificaseupapeldeúnicafonte para o ensino da língua nas escolas, tanto do ponto de vista teórico quanto prático, bem como o título de código normativo da linguagem tomada no geral. Os gramáticos levam ao último estágio do desespero tanto o professor quanto o estudante no estudo gramatical em virtude das divergên-cias existentes entre eles. Assim, no momento em que o aluno entender que as regras da norma culta são variáveis e queoempregodeumaformapodesernormalnumamodalidadelingüística.Tambéménecessárioquegramáticoselingüistasformemumaverdadeirasimbiose,paraquehajaespaçodentrodesalade aula para o ensino de “gramáticas” e que a elite cultural se conscientize de que houve mudanças profundas na língua padrão concebida pela GT e que no Brasil já não se fala o português de Por-

tugal, e sim, o português brasileiro. Aí não tenhamos dúvida quanto à extinção da discriminação rígidaqueaescolapõeemprática. Vejamos a seguir uma pesquisa de campo, onde foram entrevistados 10 professores de Lín-gua portuguesa do ensino médio, de duas escolas, sendo uma particular e outra pública:

1) Você leciona Língua Portuguesa utilizando qual gramática? a) Normativa b) tradicional c) textual

Podemos observar que os próprios docentes de língua portuguesa não sabem diferenciar oqueégramáticanormativaoutradicional,sendomaisgraveousodaGTpor46%dosdocentesentrevistados.Assim,somando89%dapreferênciadosprofissionaisdelínguaportuguesa,atual-mente a GTN é o referencial de ensino de língua materna em nossas escolas.Para não fazer uma “radiografiadocaos”-naqualseretratassemsomentecontextosdeensinoaprendizagemnosquaissepraticasseumensino“tradicional”degramática,busqueientendernos11%dosprofis-sionais que lidam com a gramática textual, o porque da razão desse ensino? Pude observar que todasosdocentespriorizamemsaladeaulaaleituraeproduçãodetextosdiversificados,criandoum trabalho inovador, esse que gera: pesquisa, dedicação e amor ao ensino de língua materna. Vejamos a seguir uma pesquisa de campo, onde foram entrevistados 130 alunos, das mes-mas escolas, sendo uma particular e outra pública. Utilizei a seguinte pergunta:

2) Qual gramática é aplicada no ensino de Língua Portuguesa na sua classe? a) Normativa b) tradicional c) textual d) não sei qual gramática é aplicada

Podemosobservarque38%dosentrevistadosnãosabiamqualgramáticaéaplicadaemsua classe, sendo que todo o discente tem pavor do ensino de português, pois o mais questionado é o famoso “repeteco” tudo que é lecionado no ensino fundamental é repetido no ensino médio. Isso gera pavor aos educandos criando a famosa “decoreba” aplicada a GTN em nossas escolas. Oquequeremosdestacaréaimportânciadaassimilaçãocriticadosestudoslingüísticoseanecessidade premente de se estabelecer um maior contato do professor de língua materna com a propostadalingüística.Observandoqueagramáticanãodevesertomadacomoumaverdadeab-soluta, pronta, acabada e imutável, antes, porém, seus conceitos precisam ser relativizados, para que alcance o aluno do século XXI.REFERÊNCIAS:

ANDRÉ, H. A . Gramática Ilustrada. São Paulo: Moderna, 1997.

BAGNO, Marcos. Moderna Gramática Portuguesa. São Paulo: Nacional, 1982.

------. Dramática da Língua Portuguesa. São Paulo: Loyola, 2000.

------. Preconceito linguístico: o que é, como se faz. 2. ed. São Paulo: Loyola, 1999. 148 p.

BECHARA, E. Dramática da Língua Portuguesa. São Paulo: Loyola, 2000.

BRITO, Luiz Percival Leme. A sombra do caos: Ensino de língua x tradição gramatical. Campinas: ALB - Mercado de Letras, 1997.

GERALDI, J. W. O texto na sala de aula. Cascavel: Assoeste, 1987.

PERINI, A . Mário. Sofrendo a gramática. São Paulo: Ática, 1997.

------. Para uma nova gramática do português. 3. ed. São Paulo: Ática, 1986.

POSSETI, Sírio. Por que (não) ensinar gramática na escola. Campinas: Mercado das Letras: 1997.

VAL, Maria da Graça. Redação e textualidade. São Paulo: Martins Fontes, 1999.

RESPONSABILIDADE SOCIOAMBIENTAL: ONDE COMEÇAM AS MUDANÇAS?

Adriana Nunes Lacerda e Prestupa 1

Quandosepensaemgestãoambientaldeve-selevaremconsideraçãoquemsãoosbenefi-ciados com esta postura. Umaempresaquepreservaumaflorestaestábeneficiandoseusclientes,funcionários,for-necedores e comunidade em geral. Não é mais uma questão de pensar no lucro ou no compor-tamentodecompra,éumaquestãodesobrevivênciaededarcondiçõesdevidaaosnossosde-scendentes. A medida que nos conscientizamos dos impactos que a emissão de gases tóxicos, o des-matamento e a poluição dos rios causam em nosso planeta nos questionamos: por que os govern-antes não tomam medidas mais enérgicas diante da situação? Diante da pergunta podemos traçar algumas hipóteses: seria para não causar o pânico na população ou porque uma postura ecológica não rende votos? HojenoBrasil,osgovernantestêmsuascampanhasfinanciadasporempresáriosquenemsempre estão preocupados com o meio ambiente. Muitas vezes o lucro e a preservação ambiental não encontram um equilíbrio. Os ambientalistas acabam sempre batendo de frente com uma ou outra empresa, são agre-didos e até ameaçados de morte. Portanto a preservação da natureza tem um preço e muitos não querem pagar por ela. Quem pensa nos prejuízos imediatos e reage a mudanças está deixando de ver a dimensão do problema e os benefícios futuros que terão com essa nova postura. Vivemosnumasociedadeimediatistaealienada.Quandosefalaemrepercussõesnospróxi-moscinqüentaanos,muitosrespondemquesimplesmentenãoviverãoatélá.Oproblemaéquenossascrianças,asmaioresvitimasdestaganância,nãotempoderdeevitarasconseqüênciasdosatentados praticados contra nosso planeta. Muitos se sentem sós nessa luta e se perguntam sobre o que podem fazer para evitar o pior. Questionam-sesobreapequenaproporçãoqueamudançadeseusatosirásignificar. Cadaindividuoquetomaumaposturaecológicapodeinfluenciarmuitosaoseuredor,suafamília, seu grupo de amigos, seus colegas de trabalho e assim multiplicar os resultados de seus atos. Ações simples como separar o lixo para reciclagem, consumirmenosenergia, optar porprodutos que não agridam o meio ambiente e por empresas com uma postura socioambiental é um grande passo para mudar nossa sociedade. Quanto a questão política, nada mudará sem a pressão popular. Enquanto os eleitores não questionarem sobre os projetos ecológicos de seus candidatos, eles nem se preocuparão em apre-sentar propostas nesta área. Fala-se do combate a fome, no investimento na saúde. Sempre pensando no imediato. Re-mediam o que está errado porque governantes passados também foram imediatistas. O grande problema hoje não é simplesmente evitar o pior. Vivemos na sociedade do imediatismo, da busca das vantagens acima de tudo e de todos. Numa cultura baseada em tais valores, sobra muito poucoespaçoparaaçõesgrandiosascomopreservaroplaneta.

1 Adriana Nunes Lacerda e Prestupa - Professora universitária - Mestre em administração - Especialista em Marketing - Administradora de Empresas - Consultora Empresarial. Habilitaçãoparaministrarasdisciplinas:GestãodePessoas,TeoriaOrganizacional,PesquisaemAdministração,Mar-keting,ProduçãoeOperações,ComportamentoHumanonasOrganizações,GlobalizaçãoeNegociaçõesInternacionais(NovosHorizontes),PolíticaeEstratégiaEmpresarialePesquisadeMarketing(UFMG). Atuanaslinhasdepesquisa:Marketing,GestãoEstratégica,EstudosOrganizacionaiseGestãoSocioambiental.(pesquisae elaboração de artigos) Professora das disciplinas: Administração Mercadológica, Administração de Marketing, Teoria Geral da Administração, Orientaçãodeprojetos,VivênciasEmpresariaiseAdministraçãodeVendasMercadologia,GestãoemComunicação(CursodeComunicação Social), Princípios de Administração (Curso de Engenharia), Mídia e Administração em Publicidade e Propaganda (Curso de Comunicação Social).

TORNOZELEIRA ELETRÔNICA - CONSIDERAÇÕES SOBRE A LEI 12.258/10

Sandro de Oliveira Sousa1 Simone Matos Rios Pinto2

RESUMO

O presente artigo tem o propósito de analisar e criticar os pontos positivos e negativos da recente lei número 12.258/10 que veio regular o uso da tornozeleira eletrônica como meio de moni-toramentodepresosàdistância.Paratantofaz-seconsideraçõessobrealeiesobreosprincípiosque informam tal procedimento.

ABSTRACT

This article aims to analyze and critique the strengths and weaknesses of the recent Law number 12.258/10 that came to regulate the use of electronic ankle bracelet as a means of monitor-ing the prisoners away. To this end some considerations are made on the law and the principles that inform such a procedure.

1. INTRODUÇÃO

Em 15 de junho de 2010, o Presidente da República sancionou a Lei 12.258, que altera pon-tos do Código Penal e da Lei de Execução Penal, prevendo, nesse último diploma, a possibilidade da utilização do sistema de monitoramento eletrônico de presos (tornozeleira eletrônica). O sistema consiste da implantação no corpo do apenado de uma tornozeleira ou bracelete com dispositivo eletrônico que possibilita o monitoramento por satélite, via GPS (Global Position System),possibilitandoidentificarsualocalizaçãoemqualquerlugardoplaneta,casoaindaestejacom o equipamento instalado em seu corpo. Sistemas como esse já são utilizados em vários países, inclusive já vinham sendo testados no Brasil por alguns estados da federação, como São Paulo e Minas Gerais. Mas somente agora o legisladorordináriocolocouoBrasilnoroldospaísesqueoficialmenteadotarãoosistema. Em que pese a intenção do legislador de aprimorar o funcionamento do Direito Penal, mor-mentenoquetocaàexecuçãodapenaprivativadeliberdade,areflexãosobrealgunspontosdamencionada iniciativa se faz necessária. De início, não se pode olvidar que a inclusão de lei nova ao ordenamento jurídico de um país deve oferecer um benefício prático, visível e mensurável à sociedade. Sendo assim, vejamos. Emsededeanáliseperfunctóriasobreanovidade,cabeafirmarqueumsistemademonito-ramento de presos via satélite, oferece inúmeras vantagens a partir do momento em que se tem em vista garantir a segurança da sociedade, a efetiva aplicação da lei penal e redução da densidade demográficacarcerária,contudo,semferirdireitosconstitucionais individuaisdocidadão,como,por exemplo, o da intimidade e o da dignidade da pessoa humana. Analisando pelo prisma das garantias constitucionais, o sistema em questão deve ser usado com parcimônia, pois não se pode tratar o ser humano como um automóvel, no qual se instala sistema de monitoramento à distância via satélite que, se roubado, poderá ser achado no lugar em que se encontra, seja ele onde for. Não estamos tratando com objetos, mas sim com pessoas. Vale frisar que o direcionamento correto da técnica poderá levar a um real benefício para a sociedade, bem como otimizar a persecutio criminis por parte do Estado-juiz. A título de exemplo, um benefício prático da aplicação da nova técnica seria o monitoramen-to eletrônico de presos provisórios, por motivo de instrução criminal, na fase de formação da culpa, aguardando julgamento ou recurso. Por incrível que pareça, essa hipótese não foi contemplada pela novel lei. Em prol da efetividade da lei penal e mesmo do garantismo penal, ao invés de abarrotar 1 Acadêmico do 9º período do Curso de Direito da FACED 2 Professora da FACED

os presídios com pessoas que talvez nem sejam condenadas, no intuito de fazer valer o disposto no art. 312 do Código de Processo Penal, poder-se-ia deixá-los livres, mas monitorados. Procedi-mento que não violaria, pelos menos de forma tão ampla, o princípio da liberdade e presunção da inocência. Aleiemcomentoteveointuitodemodificararedaçãodealgunsartigosdalegislaçãopenale incluir outros tantos. O estatuto alcançado não seria somente a Lei de Execução Penal, mas tam-bém no próprio Código Penal, quando do tratamento dispensado ao cumprimento de pena privativa de liberdade em regime aberto, previsto no art. 36 e seus parágrafos.

2. CONSIDERAÇÕES SOBRE A NOVEL LEI

A primeira observação que se faz é que andou bem a Presidência da República ao vetar otextosugeridoparasubstituiro§1ºdoart.36doCódigoPenal.Issoporqueaatualredaçãodoreferido parágrafo prevê que o apenado deverá cumprir sua pena em regime aberto “sem vigilân-cia”, levando-se em consideração sua autodisciplina e senso de responsabilidade. A proposta do legislador, no PL 175/07, que deu origem à indigitada lei, foi de excluir a “não vigilância”, retirando do condenado o direito de não ser vigiado. Isso seria um retrocesso legal, pois tal dispositivo retira direitos do apenado, agravando sua condição, dando ao Estado mais poderes sobre sua liberdade, já mitigada pela persecução penal. Dessa forma, abrir-se-ia precedentes para que o Estado vigiasse o apenado que iniciasse o cumprimento de sua pena em regime aberto, o que hoje não se admite. Ora,seumadasintençõesdaimplantaçãodoregimeabertoédesonerar,emparte,oEstadoda vigilância sobre o preso, não haveria sentido em prever tal retrocesso. Outra observação que deve ser feita versa sobre a proposta, no projeto de lei, de se incluir no art. 66, V, da LEP, a alínea “i”, que concederia ao juiz da execução a competência para deter-minar o uso do monitoramento eletrônico pelo preso quando julgasse necessário. O referido inciso foi vetado pelo Presidente da República, assim como foi vetada, também, a inclusão, na esfera de competência do juiz da execução, a possibilidade de se incluir o monitoramento eletrônico no rol dascondiçõesexigidasparaocumprimentodepenaemregimeaberto,ocasodeprogressãoderegime, previstas no art. 115 da LEP. O art. 66 da LEP trata da competência do juiz da execução, muito ampla, diga-se de pas-sagem.Essaafirmaçãopodeseraferidapelaporçãodomencionadodispositivotranscritaabaixo:

Art. 66. Compete ao juiz da execução:I – aplicar aos casos julgados lei posterior que de qualquer modo favorecer o con-denado;II–declararextintaapunibilidade;III – decidir sobre:a)somaouunificaçãodepenas;b)progressãoouregressãonosregimes;c)detraçãoeremiçãodapena;d)suspensãocondicionaldapena;e)livramentocondicional;f)incidentesdaexecução;IV–autorizarsaídastemporárias;V – determinar:a)aformadecumprimentodapenarestritivadedireitosefiscalizarsuaexecução;b)aconversãodapenarestritivadedireitosedemultaemprivativadeliberdade;c)aconversãodapenaprivativadeliberdadeemrestritivadedireitos;d) a aplicação da medida de segurança, bem como a substituição da pena por me-didadesegurança;e)arevogaçãodamedidadesegurança;f)adesinternaçãoeorestabelecimentodasituaçãoanterior;g)ocumprimentodepenaoumedidadesegurançaemoutracomarca;h)aremoçãodocondenadonahipóteseprevistano§1odoartigo86destaLei;

Nessa ordem de idéias, parece incoerente não conceder ao juiz o poder para aplicar a mod-erna medida em casos que achar convenientes, como os que citamos alhures a título de exemplo. Se o juiz detém os poderes arrolados no artigo supra, porque não pode, então, o magistrado da execução decidir sobre o uso do monitoramento eletrônico quando achar conveniente? É de se convir que isso retira do juiz da execução a liberdade de julgar a situação conforme sua mais íntima convicção. Da mesma forma, indaga-se porque o juiz da execução não poderá impor, como condição para concessão de progressão para o regime aberto, o uso do monitoramento eletrônico, se a iniciativaébenéficaepodeatémesmosubstituirasdemaiscondiçõesprevistasemlei(art.115,LEP). A nova Lei 12.258/10 trouxe a inclusão do parágrafo único do art. 122 da LEP, prevendo que a ausência de vigilância direta nas saídas temporárias permitidas ao condenado que cumpre pena em regime semiaberto não impede o uso do sistema de monitoramento eletrônico. No ponto, entende-se que a medida, que corresponde à vigilância indireta, poderá diminuir a incidência dos casos em que os apenado não retorna da saída temporária. Foi vetada, também, a proposta que permitiria ao juiz da execução impor ao condenado a utilizaçãodeequipamentodemonitoraçãoeletrônica,comoumadasobrigaçõesaquesesubordi-namoapenadobeneficiadocomolivramentocondicional,condiçõesestasprevistasno§2ºdoart.132 da LEP. Essa foi outra atitude contraproducente do Presidente da República, pois o livramento condicionalpoderiaserconcedidoamaispresosdoqueoéhoje,dadaaeficáciadosistemadelocalização do condenado, o que desafogaria sobremaneira o sistema prisional brasileiro. A nova lei incluiu na LEP a Seção VI, que trata da Monitoração Eletrônica, incluída no Capí-tulo I, do Título V do referido diploma legal. O PL 175/07, por sua vez previa a inclusão do art. 146-A, que tinha a seguinte redação:

Art.146-A.Ojuizpodedeterminaravigilânciaindiretaparaafiscalizaçãodasde-cisõesjudiciais,desdequehajadisponibilidadedemeios.Parágrafo único. A vigilância indireta de que trata o caput deste artigo será realizada pormeiodaafixaçãoaocorpodoapenadodedispositivonãoostensivodemoni-toração eletrônica que, a distância, indique o horário e a localização do usuário, além deoutrasinformaçõesúteisàfiscalizaçãojudicial.

Infelizmente o texto foi vetado. Dessa forma, além de mais uma vez, não conceder ao mag-istrado poder de decisão sobre o objeto da lei, vê-se escorrer pelo ralo do poder de veto presiden-cialadefiniçãodoqueseriaavigilância indireta,contidanoparágrafoúnicodoartigoproposto.Oquepodedarmargemainterpretaçõesdúbias,nofuturo,doquevemaseravigilânciaindiretamencionada na LEP. Na senda da delimitação dos poderes do juiz da execução na LEP, a nova lei trouxe a pro-posta do art. 146-B, que limita os casos em que o juiz da execução poderá aplicar o monitoramento eletrônico. Assim sendo, o juiz somente poderá aplicar o novo sistema quando autorizar a saída temporária no regime semi-aberto e quando determinar a prisão domiciliar. Arespeitodasduasúnicashipótesesemqueojuizpoderádefinirafiscalizaçãopormeiodemonitoramento eletrônico, quanto à primeira, entende-se que quando a lei prevê que o juiz poderá autorizaramonitoraçãoeletrônicanassaídastemporáriasnoregimesemi-aberto,ficamprejudica-dos os presos em regime fechado que receberem autorização de saída temporária. Mesmo que tal hipótesesemostreremota,jáexistemdecisõesnessesentido,assimcomoaquecolacionamosabaixo:

RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO PENAL. APENADO EM REGIME FECHADO. CONCESSÃO DE SAÍDAS TEMPORÁRIAS. BENEFÍCIO USUFRUÍDO. DECISÃO JUDICIAL. AUSÊNCIA DE EFEITO SUSPENSIVO. RECURSO POSTERIOR. DE-CISÃO VÁLIDA E EFICAZ. 1. O Juízo da Execução Criminal concedeu saídas tem-porárias para o ora recorrido, que encontrava-se cumprindo pena em regime fechado,

muitoemboraoart.122daLein.º7.210/84,disponhaserpossívelaconcessãodetal benefício somente aos condenados que cumpram pena em regime semi-aberto. O agravo em execução do Ministério Público, visando atacar tal decisão, somente foi interposto após o gozo do benefício. 2. Não obstante o reconhecimento da ilegali-dadedadecisão,verifica-sequetantooEstabelecimentoPrisionalcomoosentenci-ado cumpriram decisão judicial que, naquele momento, diante da ausência de efeito suspensivo,eraválidaeeficaz.3.Osentenciado,portanto,agiudeacordocomosprincípiosdalegalidade,boa-féesegurançajurídica,afigurando-seinaceitávelumsuposto acréscimo de sua pena pelos dias de saída temporária. 4. Recurso especial desprovido. REsp 686636/SC – Min. Laurita Vaz – 5ª Turma STJ – 14/06/2007.

PENAL. PROCESSUAL. ROUBO. RECEPTAÇÃO. REGIME CARCERARIO. PRO-GRESSÃO. “HABEAS CORPUS”. RECURSO. 1. O SENTENCIADO QUE TIVER CUMPRIDO 1/6 (UM SEXTO) DA PENA EM REGIME FECHADO PODERA PEDIR SAIDA TEMPORARIA, DISPENSADA A EXIGENCIA DE MAIS 1/6 (UM SEXTO) NO REGIME SEMI-ABERTO. 2. CABE AO JUIZO DAS EXECUÇÕES APRECIAR E DECIDIR, FUNDAMENTADAMENTE O PEDIDO. 3. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. RHC 1720/RJ – Min. Edson Vidigal – 5ª Turma STJ – 11/03/1992.

Quanto à segunda hipótese de uso de monitoramento eletrônico, a medida é louvável, pois significariamaiorsegurançaegarantiaaoEstadodaefetividadedaprisãodomiciliar,podendoes-tendê-la a outros detentos. É o caso do que aconteceu em Porto Alegre/RS, quando a justiça colo-cou presos que cumpriam pena no regime aberto em prisão domiciliar, conforme matéria veiculada nosítiodojornalEstadodeSãoPauloem08/12/2010;

Os 612 presos do regime aberto do Rio Grande do Sul estão sendo colocados pro-gressivamente em prisão domiciliar desde que cumpridos uma série de requisitos, anunciaramosmagistradosdaVaradeExecuçõesCriminais(VEC)dePortoAlegre.[...] As medidas têm validade até que existam casas adequadas para o cumprimento da pena em regime aberto, segundo o Tribunal de Justiça (TJ).Os presos atingidos são pessoas que já estão convivendo com a sociedade, apenas pernoitando no albergue, e foram condenados por crimes de menor periculosidade ou progrediram de regime, sendo constatado bom comportamento. De acordo com o comunicado emitido ontem, entre os detentos há alguns passíveis de recuperação, sendo desvantajoso mantê-los com presos mais perigosos, uma vez que as casas prisionais têm se convertido em escolas do crime. (Jornal Estado de São Paulo, 2010)

Ademais, restou prejudicada, na redação original do mesmo art. 146-B, a proposta que in-cluía o uso do sistema de monitoramento eletrônico no cumprimento da pena restritiva de liberdade nos regimes aberto ou semiaberto ou na concessão de progressão para tais regimes. Também não poderá ser aplicado o novo método no caso de pena restritiva de direitos que estabeleça limitação de horários ou de frequência a determinados lugares, nem nos casos de concessão de livramento condicional ou de suspensão condicional da pena. Propostas estas que integravam o texto do PL 175/07. Um outro grande avanço que poderia ter sido registrado consistia na proposta de o preso em regime aberto não precisar voltar ao estabelecimento prisional durante a noite e nos dias de folga, caso fosse incluído no monitoramento eletrônico, mas a proposta também não vingou. Oart.146-CdaLEP,incluídopelanovalei,dispõesobreoscuidadoseasobrigaçõesdoapenado com o mecanismo de monitoração. Foi vetado, nesse artigo, o inciso que previa que o apenado deveria avisar à entidade responsável pela monitoração eletrônica sobre eventuais falhas no equipamento. Veto acertado, pois somente a empresa responsável poderia detectar tais falhas, na medida da ocorrência de oscilação ou interrupção do sinal emitido via satélite. Cainhando pela análise da lei, mais uma vez o contrasenso se instala quando o parágrafo único do art. 146-C prevê que o juiz decidirá sobre a revogação dos benefícios concedidos se o apenado violar os deveres a ele impostos em virtude da aplicação da monitoração eletrônica. Per-

gunta-se: se o juiz pode decidir pela perda ou não de direitos no correr da execução, tendo como objeto a monitoração eletrônica, porque não pode o mesmo julgador ter poderes para conceder outrasbenessesrelativasàvigilânciaindiretaqueosistemapropõe? Oart.3ºdanovaleiprevêqueopoderexecutivoregulamentaráamonitoraçãoeletrônica.PorsermatériaafetaaoDireitoPenal,maisespecificamenteàexecuçãopenal,nãodeveriaserojudiciário o Poder competente para regular a implementação do novo sistema? Porfim,doispontosrelevantessaltamaosolhos.Primeiro:alguémquesevejaandandoporaícomumapulseiraouumatornozeleira,querevelamserosgrilhõeseletrônicosqueoprendem,será vítima certa do preconceito e da discriminação de uma sociedade amedrontada pela crimi-nalidade. O que fere de morte o princípio da dignidade da pessoa humana. Segundo: vivemos na chamada era da tecnologia, em que não há limite para os hackers, que invadem bancos com in-espugnáveis sistemas de software. Por ser um sistema que funciona usando elementos eletrônicos esinaisdefreqüência,quemgarantequeessenovomodelonãoserátambémcorrompidopelosexperts em informática e eletrônica? A essa segunda, pergunta somente o tempo poderá apresen-tar resposta.

3. CONCLUSÃO

Dadaanaturezaconflituosadoserhumano,manterapazsocialnuncafoienemserátarefadas mais fáceis. Mais uma vez a iniciativa do legislador ordinário no sentido de dar efetividade à manutenção de uma sociedade livre da criminalidade esbarra em alguns problemas. O mais em-blemáticodeleséodoconflitodeprincípios. Tem-se de um lado a iniciativa de desafogar o sistema prisional, mas impondo ao preso o uso de uma marca indelével (a tornozeleira), que carregará consigo por onde for, correndo sério risco de ser discriminado pela sociedade. Por outro lado, não se pode manter na prisão (escola do crime) pessoas que cometeram erros sociais sem tanta gravidade, mas que, por uma medida de justiça,nãopodemficarsemsanção.Esseéograndeparadoxo. Não se deve deixar de punir, mas deve-se punir com razoabilidade e proporcionalidade. Nesse passo, entendemos que o uso da tornozeleira é medida salutar, mesmo tendo sua aplicação mitigada pela lei, pois o que deve ser levado em conta é o benefício gerado, tanto ao preso quanto à sociedade. Quantoàsociedade,elasebeneficia,poisoscrimesnãodeixamdeserpunidoseapazso-cialsetornamaistangível,poisousodomonitoramentoeletrônicoimpõeumacertalimitaçãoaosânimos daqueles (apenados) que pensam em uma recaída. Quantoaopreso,seporumladopodeserdiscriminado,poroutrosebeneficiapornãoterque conviver com criminosos de alta periculosidade, colocando sua vida em risco ou aprendendo como ser bandido. Infelizmente, o período que tiver que passar com o equipamento até a extinção da punibilidade é preço razoável a se pagar pelo desvio da conduta social.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

SPIGLIATTI, Solange. Justiça do RS coloca detentos em prisão domiciliar. São Paulo, 2010. Dis-ponível em: www.estadao.com.br.com.br/noticias/geral,justica-do-rs-coloca-detentos-em-prisao-domiciliar,651227,0.htm. Acesso em 10/12/2010.

UMA VISÃO DA INTERDISCIPLINARIDADE

Eliana Martins

RESUMO

O presente artigo trata da função da interdisciplinaridade, com uma nova visão que busca criar nas salas e escolas a perspectiva da constituição de um homem mais humano e livre para o próximo milênio. Vez que o processo interdisciplinar desempenha um papel decisivo no sentido de dar corpo ao sonho de fundar uma obra de educação a luz da sabedoria, da coragem e da hu-mildade. Sua ação é ser promotora de uma metamorfose de seres e de sociedades na busca da educação holística na interação do conhecimento.

PALAVRASCHAVE:Atitude,Conhecimento;Disciplina;Holismo;Interdisciplinaridade.

ABSTRACT

This article discusses the role of interdisciplinarity, with a new vision seeking after create in the schools one view the man more humane and free for the next millennium. Because the process interdisciplinary plays a decisive role in order to give out educating, wisdom, courage and humility. Its action promotes a metamorphosis of human beings in society serching for universal education, and knowledge. KEYWORDS:Attitude;Knowledge;Discipline;universally;Interdisciplinarity.

INTRODUÇÃO

Ao dissertar sobre esse tema, uma visão da interdisciplinaridade, temos que tocar a fundo numaquestãoimportante,queéainfluênciadoPositivismopresentenonossomeio,apesardainfluênciapositivistatersidorefutadatantonaFrança,seupaísdeorigem,quantoemoutrosdemaior desenvolvimento. No Brasil, o positivismo tem ranço profundo na estrutura socio-político-econômica, universidades, currículos e grade (o próprio termo “grade curricular” tem influênciapositivista), apontando a necessidade de sua crítica e superação. O pensamento interdisciplinar tem por tarefa elucidar a unidade das ciências humanas. Tal unidade designa ao mesmo tempo a unidade de cada disciplina e a unidade, entre si, de todas as disciplinas. O processo interdisciplinar desempenha um papel decisivo no sentido de dar corpo ao sonho de aprofundar-se na obra da educação à luz da sabedoria, da coragem e da humanidade.

OBJETIVO

Cada disciplina é chavão pessoal singular, esquecendo de que todas as disciplinas são importantes dentro do contexto interdisciplinar, colocadas num micro objetivo primordial e também com um projeto pedagógico, onde assim possa ocorrer a verdadeira construção do conhecimento. DESENVOLVIMENTO

O caminho da interdisciplinaridade leva à aproximação entre as Ciências Humanas e as Ciências Exatas, ensejando um grande esforço de diálogo entre ambos e colocando em questão o que alguns especialistas das Ciências Exatas pensam sobre essas ciências – que são exatas – e oquepensamosespecialistasdasCiênciasHumanasqueconfirmam–asuainexatidão. Surge um novo horizonte do saber, despontando para uma nova era da interdisciplinaridade, dentrodeumanovarealidadenomododeconhecer.Atualmente,aninguémocorreriaafirmarque“sabe-seosuficientesobretudoqueépossívelsaber”.

Para se ter uma mudança holística em termos de qualidade de ensino, é necessário que exista um conteúdo interdisciplinar, pois a vivência do curso superior não pode continuar a se ba-searemconhecimentosfundamentadosnacolchaderetalhos,dajustaposiçãodeinformaçõesdeespecializações.Dificilmenteelesencontramainteraçãoentreasdisciplinasquecompreendemumconjuntodeconhecimentosespecíficos. Todo o conjunto de conhecimentos, por sua vez, gera métodos, materiais e planos de ensino. É nesse momento que a interdisciplinaridade entra, com a interação entre duas ou mais disciplinas, partindo da comunicação até à integração mútua de conceitos, terminologias, procedimentos e me-todologias. Ainterdisciplinaridadeétambémumaformadecompreenderemodificaromundo. Sabe-se que o termo interdisciplinaridade ainda não possui um sentido único e estável, em-boraasdistinçõeseterminologiassejammuitas,oprincípioésempreomesmo. Segundo Hilton Japiassú (1975) “A interdisciplinaridade caracteriza-se pela intensidade das trocas entre especialistas e pelo grau de integração real das disciplinas no interior de um mesmo projeto de pesquisa” GeorgesGusdorf, desenvolvendo uma filosofia da história, apresenta umaevolução daspreocupaçõesinterdisciplinares,ressaltandoaimportânciadeumanovavisão,desdeossofistaseos romanos até a atualidade, a mais de 30 anos anteviu a possibilidade da criação de uma teoria interdisciplinar que desse conta da “abertura de olhar”, quando as ciências humanas timidamente iniciavam e ousavam criar essa perspectiva de constituição de um homem mais humano e livre para o próximo milênio. Acrisequeatravessaacivilizaçãocontemporânea,buscandoumavoltaaosaberunificado,denota a existência, conforme Hilton Japiassú (1976), de uma “Patologia do Saber”, efeito e causa da dissociação e fragmentação das existências humanas no mundo em que vivemos. Éimportantesalientar,aodissertarsobreainterdisciplinaridade,ainfluênciadoPositivismopresentenonossomeio.SegundoLück(1994),“Omodelopositivistatemporobjetivoexplicarosfenômenos, com vistas a redizê-los e contá-los em razão do quê sua orientação é conservadora. Conseqüentementegeneralizainformaçõesdesuarealidade”. Érelevanteque,anteriorà influênciadopositivismo,voltamosaos tempospré-socráticose encontramos o saber como unidade. Na metafísica também existia essa modalidade que se perde quando o universo é visto como pluriverso. Depois do processo de industrialização, avanço tecnológico,homemversusmáquina,conseqüentemente,ocorreoquevivemoshojequesãoasespecializações. Então o saber é fragmentado pelo processo social da competitividade. Processo hoje dentro dasuniversidades,masacrescidodeauto-afirmaçãonãosóprofissional,mastambémpessoalepolítica, onde é negada a verdadeira ética. Cada disciplina é chavão pessoal singular, não esque-cendo de que todas as disciplinas são importantes dentro do contexto interdisciplinar, colocadas num micro objetivo primordial e também com um projeto pedagógico, onde assim possa ocorrer a verdadeira construção do conhecimento. Sabemosquenossanaturezamicro-socio-culturaldissimulaessainteração.Afinal,todasasciências são humanas. Tais equívocos multiplicam-se quando o prestígio de algumas ciências e oualgumasdisciplinasseimpõemaodeoutras. Parece relevante relembrar que as disciplinas surgiram da necessidade de se sistematizar e organizar o conhecimento de forma a produzi-lo e utilizá-lo melhor, mas também da preocupação emmanterumaunidadesignificativadoconhecimento.Parecequeaprópria idéiadeinterdisci-plinaridade é baseada na procura de uma unidade do conhecimento, buscada fundamentalmente pelo critério de utilização prática das especialidades já existentes. Em fevereiro de 1970, um grupo de especialistas veio aprofundar na pesquisa e educação, conformedocumentodeGuyMichand;tentandoestabeleceropapeldainterdisciplinaridadeesuasvinculaçõescomauniversidade,estabelecendoalgunspontosdepartidaàelucidaçãodealgunsconceitosondeatéentãosetemprocuradodefinirainterdisciplinaridadeque,àsvezes,perdenadiferenciaçãodeaspectosqueessetermomantémcomdeterminadosprefixosusadosantesdapalavra disciplina com: MULTI, PLURI, TRANSdisciplinaridade, conforme defendido por Japiassú

(1979):

DISCIPLINA

Disciplinacomopalavranúcleo,tomadanosentidodeciência,significaoconjuntosistema-tizadoeorganizadodoconhecimento.Pordisciplinaridade,entende-seaexploraçãocientíficadedeterminado domínio homogêneo de estudo de métodos, matérias e ensino próprios, com o intuito de atingir novos conhecimentos.

MULTIDISCIPLINARIDADE

Multidisciplinaridadeconsistenuma justaposiçãode informações tomadasdeempréstimosem que haja troca (interação) de novos conhecimentos, ou seja, uma justaposição de discipli-nasdiversas(multi),desprovidasderelaçõesaparentesentreelas.Ex.:música+matemática+história.

PLURIDSICIPLINARIDADE

Pluridisciplinaridade também consiste apenas numa justaposição de disciplinas mais ou menosvizinhasnosdomíniosdoconhecimento.Ex:Domíniocientífico:matemática+física.

TRANSDISCIPLINARIDADE

Transdisciplinaridade teria o nívelmais alto das relações iniciadas nos níveismulti, plurie interdisciplinar. Além de se tratar de uma utopia, apresentaria uma incoerência básica, pois a própriaidéiadetranscendênciapressupõeumainstânciacientíficaqueimpõesuaautoridadeàsdemais, e como caráter impositivo da transdisciplinaridade negaria a possibilidade do diálogo, con-dição “sine qua non” para a execução efetiva da interdisciplinaridade.

INTERDISCIPLINARIDADE

Interdisciplinaridadesereconheceatravésdoprefixointer,naidéiadetroca,dereciproci-dadeentreduasoumaisdisciplinas,eatravésdosufixo“dade”(idade),justapostoaosubstantivodisciplina, reconhecendo a idéia de ação, estado ou modo de ser, numa relação de propriedade, de mutualidade, ou melhor dizendo, num regime de co-propriedade, de interação de conhecimentos novos que se fecundam e se enriquecem, que possibilita o diálogo entre os interessados, diferindo basicamente de uma atitude cuja tônica primeira seria o estabelecimento de uma intersubjetivi-dade. Então a interdisciplinaridade depende da atitude perante a problemática do conhecimento, da substituição de uma concepção fragmentária por uma concepção unitária do ser humano. DeacordocomopróprioJapiassú(1979),otermointerdisciplinaridadenãotemsignificadoepistemológico único, mas tem a transparência do conhecimento como um novo paradigma teórico que deverá emergir da ação e do diálogo consciente e crítico. Opensamentointerdisciplinarseriaumpensamentodisciplinado,talcomoeleseafirmanocontexto das disciplinas particulares. Portanto, nota-se que a inteligência humana já é, por essên-cia, interdisciplinar, tendo a qualidade fundamental de um grande pensamento concentrado em sua capacidade, que lhe possibilita perceber os conjuntos. Sendo o ponto de partida, evidente por si mesmo, do pressuposto de unidade. Com o olhar estrangeiro, vemos como o ponto de partida do pensamento disciplinar o que poderíamos chamar de a revelação natural da unidade humana. E no processo do conjunto holístico deduz-se que a interdisciplinaridade é essencial à for-maçãoeconsolidaçãodasequipes,porqueela requer interaçõesquese integrampara levaro“grupo”aalcançar,comprazer,consciência;satisfaçãopessoalemútuaaprendizagem;oobjetivovisado, com a certeza de que o trabalho em equipe leva a um caminho para a excelência na edu-

cação universitária. Salientamosqueainterdisciplinaridadepressupõebasicamenteumaintersubjetividadequenão pretende a construção de uma superciência, mas uma mudança de comportamento, de ati-tudefrenteaoconhecimento,umasubstituiçãodeconcepçõesfragmentáriasparaumaconcepçãoholística e unitária do ser humano de construção efetiva. O pensamento interdisciplinar tem por tarefa elucidar a unidade das ciências humanas. Tal unidade designa ao mesmo tempo a unidade de cada disciplina e a unidade, entre si, de todas as disciplinas. SegundoLück (1994,pág.26): “Busca-seestabelecerosentidodeunidade na diversi-dade, mediante uma visão de conjunto, que permite ao homem tirar sentido dos conhecimentos einformaçõesdissociadoseatémesmoantagônicosquevemrecebendo,detalmodoquepossaencontrar a identidade do saber na multiplicidade de conhecimentos”. Todavia, refere-se também à unidade de cada homem, em particular, e à unidade comum da humanidade que congrega os homens. O conhecimento do homem e do mundo constitui a tarefa do homem. Toda questão do homem sobre o homem é, ao mesmo tempo, uma questão do homem ao homem. A exigência interdisciplinar que a educação indica reveste-se, sobretudo, de aspectos plu-ridisciplinares e transdisciplinares que permitirão novas formas de cooperação, principalmente o caminho no sentido de uma policompetência. Sabemos que assumir uma atitude interdisciplinar é viver cada instante da vida sob ques-tionamentosereflexões,cuidandoparanãoprecipitarconclusõessobrerealidades,poisdiscutirrealidadesexigeforçadevontade,pesquisa,reflexão,quenecessitadeousadiaparaconquistar.Aatitude interdisciplinar é um estímulo para tal procedimento, que enfatiza intrinsecamente a recon-strução, o refazer e a desconstrução ou desmaterialização. Osestudos,numavisãointerdisciplinar,impõem-senãosóemfacedeumatrocadeexper-iências, que se faz necessária e imprescindível para aprofundar o conhecimento do homem e da sociedadeepararemoverbarreirasque,apretextodedefenderaespecificidadedecadacampodo conhecimento, deixaram de considerar a unidade e a diversidade das ciências do homem. Fi-nalmente, se a interdisciplinaridade for assumida com esse empenho em contrapor-se ao esfacela-mento do saber, ao mesmo tempo em que investimos na liberdade, dando voz ao múltiplo, porque não admitir uma porosidade entre ela e a transdisciplinaridade? Esse argumento parece adequado, considerando que, para autores como Fazenda, um dos focos modais da interdisciplinaridade é um tipo instituinte de relação entre sujeito e objeto permeado por intermináveis intercâmbios. Bemsabemosquesãonasprincipaisinstituiçõessociaiscomoafamília,religião,política,educação, economia e no lazer, que a atitude interdisciplinar motiva-nos a um plantão permanente em todos nossos “quefazeres”. Portanto como investigador que se situa convictamente na atitude interdisciplinar que abrange o pensar, intuir, sentir e praticar o compromisso com os “eus” on-tológicos, transcendental e social consciente promovendo o resgate histórico da vida, da ética e do profissionalismodocotidianoacadêmico.

CONCLUSÃO

Após esse estudo, concluímos que qualquer proposta de construção de projetos coletivos no processo acadêmico, necessariamente, passa por abordagens ou estratégias democrático-par-ticipativas no interior das universidades e para além delas, como premissa de possibilidade futura deumtrabalhointerdisciplinarqueintegreoscontextosdeensinoeformaçãoprofissionalaodepesquisa, interpretando, que a interdisciplinaridade verdadeira começa dentro de toda disciplina específica(nãosepararosocialdopolítico,doeconômico,etc.);éumarevoluçãoqueseoperadedentroparaforaequelançasuasraízesnoobjetohumanorealemsuasmúltiplasmanipulações,terreno onde surge toda teoria e para onde deve retornar, enriquecida pela contribuição de práti-cas, métodos, técnicas e disciplinas que por vezes se afastam e enriquecem-se reciprocamente, intercambiam conceitos que fundem e sintetizam experiências e tendências de uma realidade em transformação e fazem avançar o conhecimento. Devemos estar atentos para que nossa fundamentação teórica possa resultar numa con-

tribuiçãoprática,nãoficandorestritaaodiscurso,poisaaçãointerdisciplinarapontaanecessidadedeumdesvelamento,evitando-seavisãomecanicistadequemaceitaconclusõesbaseadasemfragmentos.Humildadeealegriasãocondimentosessenciaisparasuplantaretapasreflexivaseagir, dedicar-nos e oferecer-nos para extrair do nosso pouco o máximo em benefício de outros, sejam quais forem as diversas realidades dos seus e do nosso cotidiano. Seria muita pretensão almejarmos dar conta dessa realidade sem olhar para além dos muros que delimitam o campo do conhecimento que elegemos e até para além dos modelos de análise que utilizamos e que julgamos capazes de responder às perguntas que o tempo faz. REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

CAPRA, Fritjof. O Ponto de Mutação. São Paulo: Cultrix, 1991.

FAZENDA, Ivani Catarina Arantes. Integração e Interdisciplinaridade no Ensino Brasileiro – Efetivi-dade ou Ideologia. São Paulo: Loyola, 1979.

Interdisciplinaridade: Um projeto em parceria. São Paulo: Loyola, 1991

GUSDORF, Georges. La Verter de Force. Paris: PUF, 1976.

JAPIASSÚ, Hilton. Interdisciplinaridade e Patologia do Saber. São Paulo: Imago, 1976.

Introdução ao Pensamento Epistemológico. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1972.

LÜCK, Heloísa. Fundamentos Teóricos – Metodológicos da Pedagogia Interdisciplinar. Petrópolis: Vozes, 1971.

Verificaçãodoriscodeinvestimentonaculturadagoiabairrigadana região do Centro Oeste Mineiro

Leandro Maia Fernandes1

Helbert Silva Batista2

Resumo: A cultura da goiaba vem ganhando expressão econômica no Estado de Minas Gerais, pois tem se tornado uma das alternativas de renda das mais promissoras, por apresentar uma grande versatilidade no seu uso e uma crescente demanda para o consumo “in natura”. Um fator de grande relevância para o aumento da produtividade dessa cultura é emprego de técnicas deirrigação,airrigaçãotemcontribuídodeformasignificativaparaoaumentodaprodutividadedaculturadagoiaba,comincrementosdeaté200%emseusrendimentos.Destemodo,airrigaçãoé considerada fator atenuante do risco climático na agricultura, entretanto, os altos investimentos nasuaimplementaçãotornaaproduçãodagoiabairrigadapassívelaosriscosfinanceiros.Assim,este trabalho tevecomoobjetivoanalisaroretornofinanceiroeograuderiscode investimentona produção da goiaba irrigada na região do Centro-Oeste Mineiro. Como metodologia utilizou-se aanálisedecoeficientesderentabilidade,aanálisedesensibilidadeeanálisedeprobabilidade,tendo como instrumento básico o método de Monte Carlo. Concluiu-se que o projeto é viável para astaxasdejurosdeutilizadas,queexisteumpequenograuderiscofinanceiroequeopreçodemercadodagoiabaeosinvestimentosemirrigaçãosãoasvariáveisquemaisinfluenciamnore-sultadofinanceirodoprojeto.

Palavras-chave:Irrigação,produçãodegoiaba,retornofinanceiro,análisederisco

1. INTRODUÇÃO

A agricultura é uma atividade produtiva que possui algumas peculiaridades que a diferen-ciam das demais atividades econômicas. Dentro dessas peculiaridades residem os fatores de in-certeza que fazem da agricultura uma atividade de risco, e, dentre eles, alguns são menos ou mais previsíveisdoqueoutros.Damesmaforma,existemmeioseficientesdeproteçãocontraalgunsfatores,enquanto,emfacedeoutros,oprodutorficasendo,emúltimainstância,otomadorexclu-sivo do risco. Nesse sentido, o entendimento do que é risco e de seus diferentes efeitos sobre a rentabilidade e rendimento da atividade agrícola constitui-se num aspecto de grande importância natomadadedecisõesdosprodutores. Desse modo, na administração de uma atividade agrícola deve-se considerar os principais tipos de riscos. Os riscos mais comuns são: risco de produção e risco de mercado. O risco relacionado com a oscilação da produtividade agrícola é o risco de produção. Os principais fatores responsáveis pelo risco de produção são os problemas climáticos, as pragas e doenças e a disponibilidade de fatores de produção, que podem alterar o nível de produção dos diversos empreendimentos. Oriscodemercadorefere-seàvariaçãodarendadoprodutor,emconseqüênciadasvari-açõesnospreçosdemercadodosprodutos,osquaissemodificamcomrelativafreqüêncianoanoagrícola.Comoaproduçãoagrícolanãoéinstantânea,écomumocorreremalteraçõesnasexpec-tativasdepreçose,consequentemente,noretornofinanceirodaatividade.Ospreçosdosprodutosdo setor agrícola, ao contrário do que acontece com os preços dos produtos de outros setores da economia, sofrem variação acentuada de janeiro a dezembro de cada ano. Asvariaçõesoriginadaspelascondiçõesclimáticaspassaramaseramenizadascomomel-horamento técnico dos implementos agrícolas, e um fator fundamental para que isso ocorresse foi o desenvolvimento dos sistemas de irrigação. A irrigação, juntamente com boas práticas de mane-jo, tem potencial para estabelecer a produção em altos níveis de produtividade. Pode-se, assim, reduziroriscoassociadoàsflutuaçõesdeprodução,garantindomaiorprodutividade,diminuindoas1 MestreemEconomiaRuralpelaUniversidadeFederaldeViçosaeProfdeEconomiadaFaculdadedeCiênciasEconômi-cas, Contábeis e Administrativas de Divinópolis ([email protected])2 Mestre em Engenharia Agrícola pela Unicamp ([email protected])

oscilaçõesdeofertaeatuando,deformapositiva,paraumamaiorestabilidadedospreços. A irrigação da goiaba, entretanto, introduz altos custos variáveis relacionados à mão-de-obra,àenergia,àágua,bemcomocustosfixosadicionaisparaequipamentoseconstruçãocivil,contribuindo,deformasignificativa,paraaumentonocustototaldaprodução.Consequentemente,a irrigação tem potencial para aumentar o risco na obtenção de lucros, em razão dos custos dos equipamentos, do mau dimensionamento e dos custos de manutenção dos equipamentos de irri-gação. Assim, na produção sob irrigação o produtor deve estar sempre atento para realizar um dimensionamento exato do projeto e adotar métodos de irrigação mais adequados para a sua cul-tura.Alémdisso,omanejoeficientedosistemadeirrigação,quevaidesdeoajustedosistemadeirrigaçãoatéautilizaçãodeinformaçõesclimáticaseprevisõesdeprodutividade,nuncadeveserdesconsiderado, pois contribui para o aumento da produtividade e otimização do uso de mão de obra, energia elétrica, nutrientes e outros insumos, diminuindo, por conseguinte os riscos da ativi-dade. Desse modo, diante dos riscos, o produtor de goiaba, como qualquer outro empreendedor, preocupa-se com o rendimento de sua produção e busca os investimentos que apresentam os melhoresdesempenhostantoemtermosdeprodutividadequantoderendimentosfinanceiros.Por-tanto,édegranderelevânciaparaosagricultoreseogovernoaverificaçãodorendimentofinan-ceiro da cultura da goiaba irrigada, cultura esta que vem ganhando expressão econômica, como uma alternativa de renda das mais promissoras para os fruticultores do estado de Minas Gerais. Tal expressão decorre de fatores peculiares à fruta, como: a grande versatilidade de uso –polpa,doce,geleiasesucos,instalaçãodeagroindústriaseconseqüentegeraçãodeempregono campo. Neste contexto, o município de Carmo do Cajuru vem apresentando uma vocação para a fru-ticultura, especialmente para a cultura da goiaba, pois a região apresenta características climáticas favoráveisepossuiumademandasignificativapelafruta,devidoaonúmerodeindústriasdepolpae doces além dos grandes supermercados e feiras localizados na região Centro Oeste de Minas Gerais. Por meio dessa análise de rentabilidade e risco, torna-se possível a elaboração de futuras estratégiasdeplantio,abrangendoquestõescomo:onde,quandoequantoinvestirnaculturadagoiaba no estado. Essas estratégias podem servir de suporte para estudos tanto do lado privado quanto do governamental. Doladoprivado,aavaliaçãodoriscoedoretornofinanceiro,dadapeloretornopositivoounegativo, permite ao produtor rural selecionar os seus empreendimentos, dimensionar sua produção e suas vendas e diminuir as incertezas e os riscos de sua atividade. Do lado do governo, tal análise contribui para tratamento adequado dos aspectos de desenvolvimento agrícola das áreas irrigadas, adequando-seoscréditosde investimentoecusteioàsespecificidadesdaagricultura irrigadaeincentivando aquelas culturas irrigadas que apresentarem as maiores produtividades e melhores rentabilidades, esse tipo de estudo também pode servir de subsídio para determinação de seguros agrícolas baseados nos retornos apresentados pelas culturas irrigadas (FERNANDES,2001). . 1.2. Objetivos

A presente pesquisa tem por objetivo central analisar as estimativas dos indicadores de rentabilidadefinanceiraeograuderiscodeimplantaçãodaculturadagoiabairrigadanomunicípiode Carmo do Cajuru, região Centro Oeste de Minas Gerais. Especificamente,pretendeu-seoseguinte: a)Analisarosindicadoresfinanceirosdoprojetodeinstalaçãodaculturadagoiabairrigadavia micro-aspersão. b)Verificarasensibilidadedasprincipaisvariáveisdosistemadeproduçãodaculturadagoiaba irrigada em relação ao valor presente líquido. d)Verificarasdistribuiçõesdefreqüênciadovalorpresentelíquido,bemcomodeterminarascurvas de distribuição acumuladas da produção da goiaba irrigada.2. REFERENCIAL TEÓRICO

A função primordial de um projeto de irrigação é suprir a água necessária às plantas, em quantidade e no momento adequado, de forma a eliminar ou minimizar os efeitos climáticos . Para BERNARDO (1989), o planejamento e a operação de um projeto de irrigação devem serbaseadosnosconhecimentosdasinter-relaçõesdosistemaágua-solo-planta-atmosferaenomanejo racional da irrigação, devendo ainda considerar os seus efeitos sobre os aspectos sociais efinanceirosdecadaregião. Para Ritchie (1990), citado por GEDANKEN (1998), num empreendimento irrigado a maioria dasdecisõesaseremtomadaspeloprodutorapresentaumasériedeincertezasdeordemnatu-raleeconômica,principalmentecomrelaçãoàsinformaçõesrelativasaoclimadecadaregiãoeaospreçosdemercadodoproduto.Namaioriadasvezes,asinformaçõesdisponíveisparaaux-iliaroprodutornaexecuçãodetaisdecisões,sãoprovenientes,principalmente,deexperimentosacadêmicos voltados para o planejamento e operação de sistemas de irrigação. Emtaiscondições,ousodemodelosdesimulaçãotemapresentadoumpapelrelevante,permitindobaixoscustosemaioragilidadenaelaboraçãodeestudosquetêmafinalidadedeotimi-zar o uso da irrigação e melhorar o rendimento das culturas (GEDANKEN, 1998). JONESeRITCHIE(1990)afirmamqueosmodelosdesimulaçãoqueenvolvemobjetivosre-lacionadostantocomapartedefisiologiaquantoaspectoseconômico-financeiros,sãoferramentasimportantes no estudo de culturas irrigadas. Os mesmos autores relatam que um modelo matemáti-co e estatístico incorporado a um programa computacional de fácil utilização é uma excelente ma-neiradedisponibilizaroconhecimentonosentidodedirecionarefacilitaraçõesmultidiciplinares.Comosmodelosdesimulaçãopode-semodificarestratégiasdeirrigaçãoparapredizermudançasnorendimentofinanceiroeemoutrasvariáveisdasculturasanalisadas. Utilizando um modelo de simulação, GEDANKEN (1998) determinou, entre outras coisas, o rendimentofinanceirodaculturadomilho,emtrêsépocasdiferentesdeplantio,paraduasregiõesdo Estado de Minas, Sete Lagoas e Janaúba. Utilizando a curva acumulativa de probabilidades, ob-servou que, apesar da irrigação ter elevada participação nos custos de produção do milho, existem probabilidadesdoretornofinanceiroserpositivoparadeterminadaépocadeplantio.GEDANKEN(1998)tambémafirmaqueosresultadosencontradoscomprovamaimportânciadautilizaçãodemodelos de simulação como ferramenta complementar à experimentação convencional, servindo debaseparaestudosfuturosqueenvolvamassuntosrelacionadosaoretornofinanceirodaculturado milho irrigado. FRANKE e DORFMAN (1998) elaboraram um trabalho, por meio de simulação, com o ob-jetivodeestimaraviabilidadeeconômica,sobcondiçõesderisco,da irrigaçãoporaspersãonacultura do milho no Estado do Rio Grande do Sul. Os autores concluíram que a irrigação, para as condiçõesdoPlanaltoMédiodoRioGrandedoSul,éeconomicamenteviável,entretantofatorescomoaáguaeaenergiaelétricapodemaumentaroriscofinanceiro,quandoapresentaremescas-sez. FERNANDES(2001)utilizouametodologiadeMontedeCarlo,pormeiodosoftware@risk,paradeterminaroriscofinanceirodeimplementaçãodosistemadeirrigaçãoviaPivôCentralparaa cultura do milho no Triângulo Mineiro. Além disso, o mesmo comparou o grau de risco de implan-taçãodaculturadomilhoirrigadocomomilhonosequeiro.Verificouqueaculturadomilhoquandoirrigadademonstraumgraudeinviabilidadefinanceirabeminferioraodaculturanãoirrigada.Masadvertiuparaquestãodoscustosoperacionaisdosistemadeirrigação,queinfluenciamsignificati-vamentenocustofinaldoempreendimento.ConcluiutambémqueoempreendimentoésensívelàvariaçõesnasvariáveispreçodemercadodomilhoeocustodeaquisiçãodoPivôCentral,ouseja,qualquervariaçãonestedoisfatoreshaveráumasignificativavariaçãonarentabilidadedoprojeto. PEREIRA (1999) também utilizou o recurso da simulação para determinar as curvas de probabilidadeacumulativasdosindicaresfinanceirosdosistemadeirrigaçãodoprojetoJaíba,nonortedeMinasGerais.Oautorutilizouosoftware@Riskparafazerassimulações,utilizandoométododeMonteCarlocomdistribuiçãodeprobabilidadesestratificadas,chamadodeLatinHir-percube.Concluiuqueoprojetopossuipequenoriscofinanceiroequeavariávelpreçodemercadodasfruticulturaséavariáveldemaiorriscoparaosrendimentosfinanceirosdoprojeto.Oautor

ressalta a importância de se elaborar estudos com simulação envolvendo análise de risco que pos-samcontribuirparamelhoramentodaeficiênciadossistemasdeirrigaçãonopaís. Outros autores como ALMEIDA (1981), AZEVEDO FILHO (1988), BISERRA (1994), NEVES (1984), NEVES et al. (1990) e CLARK e LOW (1993) também utilizaram a análise de risco por meio dedistribuiçõesdeprobabilidadesemseustrabalhos,ressaltandoanecessidadeeimportânciadepesquisas que usam simulação para análise de risco de empreendimentos agrícolas.

3. MATERIAL E MÉTODOS

Para o desenvolvimento desta pesquisa, os dados, de característica secundária, e infor-maçõesforamobtidosdasseguintesinstituições:EmpresaBrasileiradePesquisasAgropecuárias(Embrapa), Empresa Mineira de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater-MG), empresas especializadas em sistemas de irrigação e revistas especializadas em agropecuária entre os quais encontram-se a Agrianual e Agroanalisys. A metodologia utilizada, refere-se primeiramente às técnicas de desconto para o estudo de viabilidade.Ofluxodecaixadosinvestimentosnaculturadagoiabairrigadaforamformuladosparadeterminar o valor presente líquido do projeto. O orçamento relativo ao item micro-aspersão en-globa os custos de um sistema de 2 hectares. A vida útil do sistema de irrigação via micro-aspersão foi estabelecido considerando uma expectativa de 10 anos, funcionando, em média, durante um período de 4 horas por dia. Paraanalisarosriscosfinanceirosdoprojetoutilizou-seduasopções.Aprimeira,consistenaanálisedesensibilidadedoprojetoàvariaçõesnosparâmetrosevariáveisdofluxodecaixadoprojeto de irrigação do tipo micro-aspersão. A outra alternativa, consiste na utilização da análise de probabilidade. Por conseguinte, explicou-se o funcionamento do processo de simulação utilizando-se da técnica de Monte Carlo, que é a metodologia básica empregada nesta pesquisa.

3.1. Avaliação Financeira

Na avaliação econômica as técnicas mais utilizadas são aquelas que consideram a dimen-sãodotemposobreosvaloresmonetários,sãoelas:valorpresentedosfluxoslíquidosdoprojeto,a Taxa Interna de Retorno e tempo de retorno do capital investido. Chama-seValorPresentedofluxolíquidodeumprojetoagrícoladehorizonteN,emqualqueranot,deLt,(t=0,1,2,3,...<N).EmgeralL0<0,quandot=0eLt>0parat≥1,ouseja,oinves-timento(L0)éfeitonoprimeiroanoeosretornoslíquidos(Lt),t≥1começamapartirdosegundoano. SegundoNORONHA(1987),ovalorpresentedeumprojetoédefinidopelaseguinte fór-mula:

VP =

Onde:ρ=taxadedescontorelevanteparaaempresa t = anos

O termo Valor Presente Líquido, às vezes, é usado com o intuito de chamar a atenção para ofatodequeosfluxosmonetáriosmedemasdiferençasentreasreceitasoperacionaislíquidaseos investimentos adicionais feitos no projeto. Se o projeto for avaliado independente de outras alternativas de investimentos, o critério de decisãoconsisteemaceita-loseoVP>0.Ouseja,deve-seaceitaroprojetopoisoseuvalorhoje,calculado com base no custo de capital da empresa, é maior do que seu valor de investimento ini-cial (NORONHA,1987). TambémfoiutilizadoocritériodaTaxaInternadeRetorno(TIR),combasenosfluxoslíqui-dosdecaixadoprojeto.Pordefinição,aTaxaInternadeRetornoéaquelevalor(i),quetornaao

Valor Presente (VP) dos benefícios ao valor presente dos custos de um projeto.

Ou seja, se VP = = 0

Em que : N = horizonte do projeto t = anos i = taxa interna de retorno Então p é a taxa de retorno. O projeto é aceito se apresentar uma TIR igual ou maior o custo do capital da empresa. O período de retorno do capital, o Payback Period, é o método que considera como elemento de decisão o número de anos necessários para que a empresa recupere o capital inicial investido no projeto.SejaL0o investimento inicialeLtofluxoanualdoprojeto.SegundoNORONHA(1987)define-seoperíododerecuperaçãodocapitaln,pelarelação:

∑Lt=0t=0,1,2,3,....,NondeN>n

3.2. Análise de Sensibilidade

Umavezfeitaaanálisederentabilidadefinanceiraatravésdaestimativadovalorpresenteoudataxainternaderetorno,usandoosvaloressimuladosdosfluxosdecaixa,torna-senecessárioavaliar as principais variáveis envolvidas na produção da goiaba irrigada. Para que se tenha um levantamento mais seguro da viabilidade do projeto, não é válido ba-sear o processo de escolha somente na TIR ou no VPL, pois os mesmos não consideram o nível de risco do empreendimento. Para que o risco seja considerado numa tomada de decisão normal-mente fazem-se duas análises. Uma é a análise de sensibilidade e outra é a análise de probabili-dade ( FERNANDES, 2001). SegundoBUARQUE(1991),aanálisedesensibilidadeconsisteemdefinirarentabilidadedo projeto em função de cada uma de suas variáveis, e observar a variação que ocorrerá na renta-bilidadeparacadaalteraçãonasvariáveis.Eletambémafirmaque,atravésdaanálisedesensi-bilidade,determina-seemquemedidaumerrooumodificaçãodeumadasvariáveis incidenosresultadosfinaisdoprojeto.Alémdisso,talanáliseéuminstrumentodegrandeutilidadenaadmin-istração futura, já que permite conhecer a importância de cada insumo e de cada variável sobre o desempenho da empresa. Comaanálisedesensibilidadepode-severificaravariaçãonoValorPresenteLíquidoounaTaxaInternadeRetornoquandosevariaumelementodofluxodecaixadoprojeto,ouseja,pormeio da análise de sensibilidade é possível deixar variar a estimativa dos parâmetros considerados mais importantes ou mais susceptíveis às incertezas, tais como: o preço de mercado, custo com a mão-de-obra,custocomenergiaesistemasdeirrigação,paraverificarseoprojetotornou-seviávelou inviável. Aosefazeraanálisedesensibilidade,normalmentemodifica-seapenasumavariáveldecadavez,deixandoasdemaisnosníveisoriginais.Assim,pressupõe-sequecadavariávelafetao resultado do projeto independentemente das demais. Quando há uma correlação positiva entre duas variáveis deve-se examinar o efeito total das duas no valor da taxa de retorno do capital in-vestido (BUARQUE ,1991). NORONHA (1987), relata que a análise de sensibilidade consiste em determinar o ponto críticodedeterminadasvariáveis.Istoé,aquelevalordavariáveldependentequemodificaade-cisãodeaceitarparaaderejeitaroprojeto,ouvice-versa.Talmodificaçãoocorrequandocertovalorde uma variável X torna o valor presente do projeto igual a zero, considerando a taxa de desconto relevante. Ou quando certo valor da variável torna a TIR exatamente igual ao custo do capital. Para BUARQUE (1991), a análise de sensibilidade deve ser feita da seguinte forma: a) primeiramentedeve-seescolherocoeficienteasensibilizar,nocasodeumaanálisedopontodevista do empresário, é importante a rentabilidade em relação ao capital próprio, medido num ano

de funcionamento normal, ou taxa interna de retorno. b) escolhido o indicador a ser sensibilizado, determina-se a sua expressão em função dos parâmetros e variáveis escolhidas. c) prepara-se um programadecomputação,sendoquenesteestudoutilizou-seosoftware@RISK,quepermiteaobtenção dos resultados a partir da introdução de valores nos parâmetros das variáveis. d) dessa forma,pode-seintroduzirvariaçõesnumoumaisparâmetroseverificardequeformaeemquepro-porçõesessasvariaçõesafetamosresultadosfinais.e)comopontodereferência,devem-setomarosvaloresnormaisdeterminadosnoestudodoprojeto.Deve-secalcularoresultadofinalescolhido,tomando por base os valores normais do projeto, depois altera-se o valor de um ou mais parâmet-ros. Deve-se dar preferência aos valores pessimistas em relação à rentabilidade. f) introduzem-se os novos valores na expressão, mantidos constantes os demais parâmetros. g) o novo resultado é então comparado com o seu valor normal. O@RISKconsideraasvariáveisdeestudocomoaTIRouVPLcomosendovariáveis“out-put” e as variáveis aleatórias como “inputs”. Esta sensibilidade é mostrada por dois métodos, análise deregressãoouanálise“Rank”decorrelação.Oresultadoédadoapartirdeumgráficonoestilotornado.Nestegráfico,asvariáveislocalizadasnapartesuperiorexercemmaiorinfluêncianasvar-iáveis de estudo do que as localizadas na parte inferior. Os índices de sensibilidade se encontram dentrodointervalo–1e1.Quantomaispróximode1ou–1,maiorainfluênciadavariável“input”sobreavariável“output”Ossinais(+)e(-)indicamsearelaçãoentreasduasvariáveisédiretaouinversa, respectivamente.

3.3. Análise de risco

Após a análise de sensibilidade faz-se a análise de risco, tal análise deve ser fundamentada no estudo de distribuição de probabilidades. Entre os métodos de simulação que utilizam probabi-lidade na análise de riscos o método de Monte Carlo é o mais prático e um dos mais usados. Este métodoébaseadonofatodequeafreqüênciarelativadeocorrênciadeumcertofenômenoaproxi-ma-se da probabilidade matemática do mesmo, quando a experiência é repetida várias vezes. AseqüênciadoscálculospropostanométododesimulaçãodeMonteCarloconstadequa-tro etapas que são: a) Identificaradistribuiçãodeprobabilidadedecadaumadasvariáveisrelevantesdofluxodecaixadoprojeto. b) Simulação de valores aleatórios- esta etapa consiste em utilizar o computador para gerar,aoacaso,umvalorparacadavariável,apartirdasdistribuiçõesdeprobabilidadeanterior-menteidentificadas. c) Calcular o valor das variáveis de estudo no caso o VPL , cada vez que for feito a se-leção ao acaso como indicado no item b. d) Simulação dos valores – repetindo-se as etapas “b” e “c” algumas centenas de vezes, gera-se igual número de valores para os indicadores de rentabilidade, a partir dos quais estima-se a distribuição acumulativa de probabilidade para cada indicador econômico.

4. RESULTADOS

4.1. Fluxo de caixa da goiaba irrigada

Oquadro1mostraofluxodeentradasesaídasdoprojetodeimplementaçãodaculturadagoiabacomirrigaçãoviasistemademicro-asperção.Paraestruturarofluxodecaixadoprojeto,definiram-seasentradas,assaídaseofluxolíquido.Asentradasoureceitasforamcaracterizadascomo o valor da produção, constituída pela produção multiplicada pelo preço médio da caixa de goiaba paga ao produtor na região do Centro Oeste Mineiro. O preço médio pago ao produtor foi obtido por meio dos preços médios mensais pagos ao produtor na região, apresentados pela série histórica dos dois últimos anos registrados pela Ceasa de Belo Horizonte, sendo o preço médio pago por caixa de três quilos igual à R$ 2,5 . A produtividade utilizada foi a produtividade média compatível com as características da

região e com as características do sistema de produção. Com isso, a produtividade média da goi-aba irrigada foi de 1.300 caixas por ano, sendo que o segundo ano apresenta uma produção de 500 caixas e no último ano podendo chegar à uma produtividade de 6.000 caixas por hectare.

Quadro 1: Fluxo de caixa para a cultura da goiaba irrigada – 2 ha

Fonte: Dados da pesquisa

As saídas foram estruturadas de acordo com os investimentos iniciais referentes ao sistema de irrigação, mudas, e insumos, custos operacionais e custos de serviços. Os insumos são os uti-lizados para recuperação do solo, preparo do solo, plantio e manutenção. Os serviços compreen-dem a recuperação, o preparo e plantio desde tratos culturais até a colheita e o transporte interno. Com relação à participação no custo total da produção, no primeiro ano de atividades, o gasto com o investimento na implementação do sistema de irrigação foi o item de maior custo, participandocom58%dosgastos,emseguidaaparecemosgastoscomacompradasmudasquerepresentaram13%dosgastosiniciais,osdispêndioscomserviçosdetratosculturais6%egastoscomaduboseenergiaelétricacomparticipação,cadaum,de5%aproximadamentedoscustosiniciais do projeto. Ofluxolíquidoéadiferençaentreofluxodeentradaeofluxodesaídaderecursos,efoisobreofluxolíquidoqueseaplicaramastécnicasdedescontosparacalculararentabilidadedosin-vestimentos.Nota-sequenoano1ovalordofluxolíquidoapresentou-senegativo,R$-10.387,06,isso se deve ao fato dos investimentos inicias com o sistema de irrigação e insumos além dos gas-tos com serviços necessários para iniciar a produção de goiaba, e cabe ressaltar também, que no ano1aproduçãoézero.Apartirdoano2,ofluxolíquidoapresentaumcomportamentocrescente,issopodeserexplicadopelosignificativocrescimentodeprodutividadeapresentadapelagoiabairrigada do decorrer do período analisado e pelo preço pago ao produtor.

4.2.Análisefinanceira

Apósconstruirosfluxosdecaixadoprojetodaproduçãodagoiaba,pôde-seobteraTIR,

os VPLs correspondentes e o tempo de retorno do capital investido. Para o projeto estudado utili-zou-seastaxasdejurosanuaisdemercadoiguaisa30%,15%,12%,quesãoasestimativasmaisprováveis, dos valores máximos e mínimos das taxas de juros para o período de análise, deste modo pôde-se determinar três VPL,s diferentes para projeto. O projeto obteve os seguintes resultados: R$8.833,00 para o VPL com uma taxa de desconto de30%aoano,R$21.497,00paraoVPLcomtaxade15%aoanoeR$25.508,00paraoVPLcom12%detaxadedescontoaoano,comissopodeinferirqueoprojetoapresentaumcomportamentoesperado,poisàmedidaqueocapitalficamaiscaro,ouseja,àmedidaqueataxadedescontodo mercado aumenta, o rendimento do investimento diminui, mesmo assim o projeto apresenta-se viável pois não apresentou sinal negativo para nenhuma das taxas de juros adotadas. ATIRobtidafoiigualà58%,comoaTIRrepresentaexatamenteataxaderetornosobreo saldo do capital empatado no projeto durante sua vida útil, enquanto o capital inicial está sendo recuperado,pode-seafirmarqueaTIRdoprojetoirrigadoiguala58%representaataxaderetornoque recupera todo o capital empatado no projeto. Em suma, pode-se dizer que o investimento pos-sui uma excelente taxa de recuperação do investido, pois todo investimento inicial é recuperado comumrendimentode58%aoano,duranteosseisanosdevidaútildoprojetoemanálise. O tempo de retorno do capital considera como elemento de decisão o número de anos necessáriosparaqueoempreendedor recupereomontantefinanceiro inicialmente investidonoprojeto.Afigura1mostraovalordofluxodecaixaacumuladoemfunçãodotempo,pormeiodestemétodoépossívelverificardeformaprecisaotempoderetornodetodoocapitalinvestido.Quandoacurvaquerepresentaofluxodecaixa tocaoeixohorizontal, tem-seopayback ,ou tempoderetorno,poiséexatamentenesteponto,ondeovalordofluxodecaixaacumuladomudadesinal.Nesteprojetoofluxoacumuladomudadesinalnegativoparapositivoapartirdovalorde2,45,issoquer dizer que o capital investido é totalmente recuperado em dois anos e quatro meses.

Figura 1: Tempo de retorno do capital

Quadro 2 - Taxa interna de retorno (TIR) e valor presente líquido (VPL) e tempo de retorno, corre-spondentesaosfluxosdecaixadossistemasdeproduçãodagoiabairrigada.

Fonte: dados da pesquisa 4.3.Análise de sensibilidade

Para análise de sensibilidade do projeto da cultura da goiaba foram utilizadas as variáveis comasmaioresparticipaçõespercentuaisnocusto total doprojetodeplantio;asvariáveisdeentrada, também chamadas de “inputs”, foram as seguintes: investimento no sistema de micro-aspersão, custo com energia elétrica para o funcionamento do sistema, preço do adubo, mudas ecustocomtratosculturais;taisvariáveisjuntascontribuemcommaisde70%docustototaldoprojeto. Com base na Figura 2, pode-se notar que, a variável preço de mercado da goiaba aparece comoavariávelquemaisafetaoVPL.Quandohávariaçãode10%novalordopreçodemercadoda goiaba, oVPL da cultura irrigada sofre uma variação de aproximadamente 80%.A variávelquemaisinflui,deformanegativasãoinvestimentoscomainstalaçãodairrigação,seguidopeloscustos com tratos culturais, compra de mudas, adubo e energia elétrica. Quando há variação de 10%novalordo investimento inicialcommicro-asperção, oVPLapresentavariaçãode–12%;essavariaçãotãosignificativapodeserexplicadapelofatodeosinvestimentosiniciaiscommicro-asperçãorepresentaremmaisde60%docustototaldoempreendimentonoseuprimeiroanodevida.Outropontoéocustocomtratosculturais;esteitemcontribuiucom1%paraasvariaçõesdoVPL,seguidopelocustocommudas,aduboseenergiaelétrica,responsáveispor0.7%e0,5%dasvariaçõesdoVPL.

Figura2-ClassificaçãodasvariáveismaissensíveisemrelaçãoaoVPLdoprojeto.

4.4. Análise de probabilidade

Considerando que as variáveis mais relevantes, obtidas por meio da análise de sensibi-lidade, foram: preço da goiaba, preço do sistema de irrigação, tratos com a cultura, compra de mudas,aduboseenergia, tem-sequesuasdistribuiçõesdeprobabilidade foramassociadasaoindicadorderentabilidadedoprojeto,oVPL.FeitascincomiliteraçõespelométododeMonteCarlo,encontraram-se os percentuais de probabilidade do VPL do empreendimento. Desse modo, a simu-lação apresentou valores mínimos, médios e máximos, que foram comparados com a probabilidade de ocorrência do real valor da VPL. Comasdistribuiçõesdeprobabilidade,pôde-severificarquaisaschancesdeocorrênciadosVPLs, mínimo, médio e máximo. Na Figura 3, mostra-se, de forma clara, a distribuição de probabili-dade para os valores simulados do VPL, considerando como referência a taxa de remuneração de mercadodocapitaliguala15%aoano. Tomando como base os valor médio obtido pela simulação igual a R$ 21.502,91 para o VPL de15%pode-seaferirqueestevalordeprobabilidadedeocorrênciaigualàaproximadamente55%,alémdissopode-severificarqueoprojetoapresentouumvalormínimosimuladodeR$16.500,00e valor máximo simulado de aproximadamente R$27.500,00.

Figura3-DistribuiçãodefreqüênciadoVPLdoprojeto

Deumaformageral,pode-seconcluir,pelográficodedistribuiçãodefreqüênciaderivadodassimulaçõesdo@RISK,queoVPLpossui90%deprobabilidadeestarpresentenointervaloquevai de R$ 20.207,91 até R$ 22.825,28. Aanálisefeitapormeiodacurvaacumulativapermite-nostirarconclusõesmaisdetalhadassobre a probabilidade de ocorrência dos valores do VPL. A análise feita com a curva acumulativa de probabilidades também leva em consideração os valores mínimos, médio, máximos e o valor originaldoVPL,tomandocomomedidadeprobabilidadeafreqüênciarelativadomesmo.

Figura 4 - Distribuição de probabilidade acumulativa para o VPL do projeto.

CombasenasinformaçõesmostradasnaFigura4,verifica-sequeaprobabilidadedoVPLserigualoumenorqueR$19.803,33emaiorqueR$22.825,78éde5%,ouseja,aprobabilidadeérelativamentepequena,porémexiste.Apósas5000simulaçõesfeitas,VPLapresentouumvalormédiodeR$21.502,00,echancedeocorrênciadeaproximadamente55%. O Quadro 3 mostra, de forma sintetizada, as probabilidades de ocorrência do VPL de valor mínimo, máximo e médio do projeto.

Quadro 3 - Probabilidade de ocorrência do VPL original, VPL mínimo,

máximo e médio para o projeto de goiaba irrigado.

Fonte: dados da pesquisa

5. CONCLUSÃO

Pormeiodoscoeficientesdeanáliseeconômica,VPL,daTIRedoperíododeretornodocapital, pôde-se concluir que o projeto é viável para o período em questão. O projeto apresentou os maioresretornosquandoataxadedescontofoiiguala12%aoanoeapresentouomenorretornoparaumataxadedescontode30%aoano.ATIRde58%aoanoconfirmaaexcelenterentabili-dade do projeto, pois tal rendimento é superior à taxa de remuneração do capital existente no mer-cado. Com a análise do tempo de retorno do capital o projeto apresentou tempo de recuperação do capital investido, igual a 2,5 anos. Na análise de sensibilidade, o indicador econômico observado foi o VPL. Pôde-se concluir que as variáveis mais passíveis de risco são: preço de mercado da goiaba, preço do sistema de irrigação, energia elétrica e adubo, respectivamente. Notou-se que o preço de mercado da goiaba éavariávelmaissensívelnoprojeto,umavezqueapresentavariaçõesnoVPLsuperioresà80%,quandoamesmaésubmetidaavariaçõesiguaisa10%. Selecionadas as principais variáveis de risco, realizou-se a simulação por intermédio do método de Monte Carlo, que permitiu a análise de probabilidades. Após serem feitas cinco mil simu-laçõespôde-seconcluirqueovalormaisprováveldovalorpresentelíquidoéR$21.502,00. Conclui-se que o produtor deve estar atento aos custos de implementação do sistema e aos preçosdemercado.Elesedeveateraofatodequeasoscilaçõesnosníveisdepreçoacontecem,em grande parte, pelo lado da oferta, causadas por fatores climáticos. Nesse contexto, recomenda-se que os produtores façam maior utilização de instrumentos que atuam na diminuição dos riscos de preços, como por exemplo o mercado de futuros.

6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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LA VALIDAD DE LAS CLÁUSULAS PÉTREAS AL FRENTE DEL DESEO SOCIAL

Roberto Franklin de Sousa1

ABSTRACT

The present work aims to explore the legitimacy of entrenchment clauses in front of the social desire. The text exposes and ask, therefore, one of the most deep subject in law studies nowadays. For how long can it take in consideration as unchangeable an constitucional center, nucleus in detri-ment of social desire? Although an certain rigidity must to be, to make possible obtains order and normality on social development, the popular will cannot stay forgotten or limited to few instruments with doubtful democratic charecter. The people is the titular of the power, says the Brazilian’s Re-public Constitution. And there is nothing to stop the power rather itself, saw Montesquieu. The theme of this work, in this sense, is to investigate how can be possible to conciliate the two aphorisms, in benefitofallsociety.

En principio, para que si tenga un horizonte más abierto acerca de la temática puesta en comento, es imprescindible traer a la lumbre parámetros referientes a las limitaciones materiales del legislador, para que se pueda adoptar un u otro camino conforme esboze coherencia jurídica. En esta linea, el pilar para la inteligencia de la materia en examen, consigue densidad cuan-doseverificaquelascláusulaspétreassonunaverdaderalimitaciónsubstancialdelPoderConsti-tuinte Derivado, que se ve obstado en alterar el texto constitucional en razón del Poder Constituinte Originário terle impuesto limites. Impresioso, en esto punto, trae la óptica dada por el professor Marcelo Novelino:

“Ao destacar a importância da análise do conteúdo constitucionalmente resguarda-do,OscarVilhenaVIEIRAadvertequeafinalidadedestaproteçãoespecialdeveseassegurar“direitos,princípioseinstituiçõesque,alémdeessenciaisàformaçãodeuma vontade democrática, constituem verdadeira reserva constitucional de justiça”, demodoaevitarqueaslimitaçõesmateriaissetransformemsimplesmenteemumabarreiraàsdeliberaçõesmajoritárias,violandoumprincípiobásicodademocracia:a vontade da maioria. A legitimidade de uma decisão passada para vincular a limitar amaioria futuranãose restringeapenasàproduçãodas limitaçõesporumaAs-sembleia Constituinte eleita democraticamente. Associa-se também ao conteúdo das deliberações,asquaisdevemserjustificadasracionalmente.”2

Existen,pues,cientistasjurídicosqueafirmaninexistirenlimitacionesmaterialesalasemen-das, y lo hacen a partir del presupuesto de que la soberanía popular existe no sólo al tiempo de la producción del texto constitucional, sino tambíen en el período en que la Consitución es aplicada. Así, los Poderes Constituintes Originário y Derivado estarían en la misma forma, sin que existise curvatura de un sobre otro, lo que, en última análise, refuerzaría su simetria, en fuerza y legitimidad, porlaimposicióndelimitacionesaqualquierunodeellosporlootrosignificaríaunaefectivasus-tracción“dopovoodireitodereversuasposiçõesedeaceitarastransformaçõesdevaloresqueseprocesam no tempo”.3

1 Procurador Geral do Legislativo Municipal de Divinópolis - Doutorando em Direito pela Universidade Católica de Santa Fe2 “Al destacarse la importancia de la analise del contenido constitucionalmente garantizado, Oscar Vilhena Vieira advierte quelafinalidaddeestaproteciónespecialdebeserasegurarse‘derechos,princípiosyinstituicionesque,alládeesencialesalaformacióndeunavoluntaddemocrática,constituenverdaderareservaconstitucionaldejusticia’,demodoaevitarquelaslimita-cionesmaterialessetransformensencillamenteenunobstaculoalasdeliberacionesmajoritárias,violandounprincípiobásicodela democracia: la voluntad de la mayoría. La legitimidad de una decisión pasada para vincular a limitar la mayoría futura no se restringe sólo a la producción de las limitaciones por una Assembleia Constituinte electa democraticamente. Asociase tambíen al contenidodelasdeliberaciones,lascualesdebenserjustificadasracionalmente.”NOVELINO,Marcelo.DireitoConstitucional.5.ed. São Paulo: Método, 2011, p. 84.3 “delpueblo loderechode rever susposicionesydeaceptar las transmformacionesdevaloresque seprocesanen lotiempo”.FRANCISCO,JoséCarlos.Emendasconstitucionaiselimitesflexíveis.RiodeJaneiro:Forense,2003,p.6-7.

Com todo, el péndulo del problema permanece de eso lado, por cuanto hay otra corriente de juristasquesostienenunaclasificacióndicotómicaquetrazaunalíneaadividirelPoderConstitu-inte en Originário y Derivado. Ese conjunto si abre en el sentido del Poder Constituinte Derivado ver defronte a las limitaciones lógicas expresas o implícitas cuya ignorancia, por ello mismo, el Poder ConstituinteDerivado,fragilizatodalaidentidadmaterialdelaConstitución,cuandonodesfigura,encuantotendríaodescaracterizaenvirtuddeunaexpresivamodificaciónensunúcleoesencial.4 Enunaterceravia,existeunaclasificacióntricotómicadelPoderConstituinte,lacualfijadoslíneas a separar las suyas especies en Originário, Derivado y Misto (o Intermediário). Esa perspec-tiva sostiene que las limitaciones materiales encuentran su razón de existéncia en cirtunstâncias históricas,deformaquesunecesidadyjustificativasedansóloenundeterminadomomento.Así,tales limitaciones no se inclinarían a la manifestación democrática de la contemporaneidad o a unouotromediojurídicoylegítimoenelsentidodesusuperación.Habla,enunaflexibilizacióndelas limitaciones materiales que, a uno sólo tiempo, permitiria la perseveranza de valores sociales manifestados en el contexto de expresión del Poder Constituinte Originário, al paso que las nuevas generaciones, bajo la égida del Poder Constituinte Derivado, estarían agraciadas por la posiblidad de ver sus deseos por mudanza contemplados en ley en el propio texto constitucional. Esa tercera vía revela un realismo, que en términos más profundos, haría con que el Dere-cho ajustase a las necesidades sociales por la concilición entre una forma de evitar sacrifícios so-ciales con la instabilidad decorriente de procesos constituyentes generales en que hay una quiebra institucional y, portanto, con esmero y primazia pela contituidad de la Constitución. Luego, el texto constitucional podría ser adaptado a las transformaciones sociales por medio de un procedimento prestablecido, sin la necesidad de fratura del órden jurídica anterior. Ese Poder, lo Misto (Intermediário), se veria entre el Originário y el Derivado, y tendría la capacidad para modi-ficar,inclusolapropiaidentidaddeltextoconstitucional,conformeacontecenlasmodificacionesenel seno de la sociedad. No puediese conceber la idea de opacidad constitucional, de modo que la lectura de la Con-stitución, poco a poco, con el pasar de los años, se queda ofuscada por la ausencia de corelación entre lo que en ella hay, en términos normativos, con lo que efectivamente hay en los sujetos que son destinatários de sus normas. Eso, incluso, podría comprometer la propia legitimidad de la Ley Major y, por consecuencia, la suya aplicabilidad que, por no se conchabar a los deseos sociales, no sedaríadeformallenayfirme. Para tanto, el coraje de eso Poder Intermediário está en la cosecha de la voluntad social através de mecanismos de consulta y participación popular, democraticamente conocidos, tales comoelplebicito(conunafisionomiadeconsultaprévia)yelreferendo(conunaspectodeconsultaposterior). Con efecto, esa línea de comprensión tricotómica del Poder Constituinte revela un primor por la soberanía popular, através de aparatos que esbozan un alejamiento de refración del deseo popular por los representantes del pueblo, característica típica de la democracia representativa. Debuenasuertequelaalteraciónconstitucional,porlomediodeesosistemaflexívelsedadeunaformaquereflita,demaneramásfidedignaquelarepresentaciónpopular,lasoberanavoluntaddelpueblo. Alcontrario,nosemuestrarazonableyprudentelamodificacióndecláusulaspétreasporlosrepresentantesdelpueblo,que,alejadadelavoluntadpopular,podríanimprimirnaspropiasmodifi-caciones que pretenden inserir en el texto constitucional intereses anómalos, cuando no estranhos a la fracción popular que representan. En eso punto, puede reconocerse la falta de necesidad de una nueva Constitución, con lo rompimientodelórdenjurídicaanterior,paraalterarpuntosconstitucionalestanespecíficos,queestán amparados por las cláusulas pétreas. Pudiese decir, por eso, que la prudencia se aleja de esa via contrária. Si el pueblo, titular de la soberanía popular, se regozija del poder de dar vida a una nueva Ley Major, por medio de una constituinte, y lo que es mejor, con una libertad de manejar livremente el Derecho dentro del propio Estado de lo cuál hace parte no si muestra aceptable y razonable privarle del poder de, por si mismo, introducir directamente nuevos elementos en el cuerpo constitucional, conforme sus 4 FRANCISCO,JoséCarlos.Emendasconstitucionaiselimitesflexíveis.RiodeJaneiro:Forense,2003,p.4-5.

deseosynecesidadeso,aún,unpoder,bienmenosexpresivoqueelconstituinte,perosuficientepara transformar la composición jurídica de su propia Constitución, en aquello que no contradice sus derechos y garantías fundamentales. En términos bien sencillos, quien puede lo más, puede lo menos. Laexperiéncia constitucional brasileña, tuvounadiscusión respectoa la clasificación tri-cotômica, pero no se fue llevada adelante. Entretanto, no hay un espectro de fundamento que puedajustificarlaprivacióndelpoderdereformadirectadelaConstituiciónporelpueblo,comlaedificacióndeunsistemaconstitucionalcompletamenteherméticoenlocualelrepresentrantedelpueblo puede escabullirse de los limites que ese propio pueblo esboza a través de deseos, necesi-dades y características que les son peculiares. Poreso,setieneclarificadoquelaConstitución,irradiandosusefectossobreelpueblo,tieneen ello su fuente de validad. Es el pueblo quien da calor a la letra fría del texto contitucional y haz con que ese sistema tenga legitimidad. Tanprontosepuedeafirmarquelarealizacióndelademocraciarepresentativa,comoex-presión indirecta de soberanía popular, se dá cuándo el representante del pueblo no se porta ajeno a las posiblidades que naturalmente debería tener observado cuando de la consubstanciación de dispositivos normativos constitucionales que han de promover la tutela del pueblo. En tiempos sencillos, el representante del pueblo no puede emborracharse por el poder que de fuerma aparente tiene, por cuanto la titularidad de ese poder adviene del pueblo, aunque su ejercício, por una questión de organización de las clases y grupos de determinada sociedad, tenga sido democraticamente transferido al representante. En una concepción más decantada, no si puede dejar de traer a la lumbre, la digresión del constitucionalista brasileño Kildare Gonçalves Carvalho respecto a referirse a la Teoría Constituci-onal de Konrad Hesse:

“... como a ordem jurídica fundamental e aberta da comunidade. A função da Con-stituição é buscar a unidade política do Estado e da ordem jurídica. Trata-se de uma unidade de atuação (e não preexistente), que se torna possível e se realiza medi-ante acordo e compromisso, a concordância tácita ou a simples aceitação. Somente pormeiodacooperaçãoplanificadae,portanto,organizada,podesurgiraunidadepolítica. A qualidade da Constituição é a de constituir, estabilizar, racionalizar e limitar o poder e, desse modo, assegurar a liberdade individual”.5

Con efecto, en el extremo de esa linea de entendimento de la Constitución, como funda-mento abierto de la unidad política, puede decirse que una eventual distorción entre los intereses del representante del pueblo con los intereses de ese mismo pueblo, promueve una ruptura en la legtitimidaddelrepresentanteycualifica,representanteysupueblo,comodosgruposdistinctos,dentro de lo mismo cenário político de lo Estado. Por razones de cuño democrático, el interese público debe, de toda fuerma, prevalecer sobre lavoluntadíntimadelrepresentantepues,afinal,lacondiciónqueostentouhastaconstruirunotrogrupo con intereses apartados al deseo popular no se da de fuerma gratuita y incondicionada. Además, la formatación de una nueva Ley Básica podría dar márgen, por medio de una nue-vaAsembleiaNacionalConstituinte,amodificacionesdeotrosdispositivosnormativosolagénesisde nuevas normas que eventualmente podrían se distanciar del foco de los cambios y, en última análisis, semblar inseguridad jurídica y instabilidad social. También, no existe fundamento que pueda conferir perseverancia a la realización de una nueva Assembleia Nacional Constituinte, imbuída del Poder Constituinte Originário y de las cara-cterísticasqueenelplanointernodedeterminadoEstado,locualificam,enprejuiciodeunareformaconstitucionalque,porexhibirunadisposiciónenmodificardispositivosconstitucionalesdetermina-5 “Comoelórdenjurídicafundamentalyabiertadelacomunidad.LafuncióndelaConstituciónesbuscarlaunidadpolíti-caelEstadoydelórdenjurídica.Tratasedeunaunidaddebuscaratuación(ynopreexistente),quesitornaposibleyserealizamedianteacuerdoycompromiso,laconcordánciatácitaolasencillaaceptación.Sólopormediodelacooperaciónplanificaday,por eso, organizada, puede surgir la unidad política. La cualidad de la Constitución es la de constuir, establizar, razonabilizar y limitar el poder y, de ese modo, asegurar la libertad individual.” CARVALHO, Kildare Gonçalves. Direito constitucional. 15. ed. rev. e atual. Belo Horizonte: Del Rey, 2009, p. 61.

dos, no revela en si, el deseo de se promover toda a ruptura formal y material de la Constitución, como evidentemente se hace con la invocación del Poder Constituinte Originário. A respecto de eso, en razón de su consistencia son pedagógicas las palabras del profesor Marcelo Novelino:

A concepção tricotômica é adotada pela Constituição de alguns países, como Áus-tria, Espanha e Argentina. No Brasil, há quem defenda a possibilidade de uma emen-daconstitucionalalteraras limitaçõesmateriaisexistentesnotextosconstitucionalcom fundamento no princípio da soberania popular (CF, art. 14). Entendemos que para isso seria necessária a existência de previsão constitucional expressa, o que nãoocorrenocasodaConstituiçãode1988.Apropostadeadoçãodeclassificaçãotricotômica chegou a ser feita perante a Assembleia Constituinte de 1987/1988, mas foi rejeitada.O entendimento amplamente majoritário é no sentido de que a Constituição de 1988 adotouaclassificaçãodicotômica.6

Entretanto,lacomprensióndeesaaberturalasmodificacionesconstitucionalesconsagradapor la vía del Poder Constituinte Intermediário, debe ser ajustada a una otra linea de ideias que pue-da traer en su sentido la posiblidad de alteración de la Constitución, en una cristralina primazia por la soberanía popular, mas que no pueda dejar el desvelo por el conjunto de derechos y garantías fundamentalespetrificadoseneltextoconstitucional. A una situación de esa magnitude, el operador del Derecho estaría presenciando el declínio de los esfuerzos que historicamente conduziran al reconocimiento de los derechos y de las ga-rantías del indivíduo y que advieran de una lucha de intereses hasta seren positivados y ostentaren la condición de norma constitucional. Por esas razones, el Poder Constituinte Intermediário, aún que exprese, como ningún otro lo hace,lasoberaníapopularensusentidomáspuro,nopuedesercapazdemodificarlosderechosy garantías fundamentales, de modo a renuncialos o a retiralos del suelo constitucional, bajo peña de esterilidad de ese mismo suelo. Pero aquella que tiene intimidad con derechos y garantías fundamentales no se entrega de cuerpoyalmaaesaposiblidad.Ylasrazonessonvarias. A comenzar por la irrenunciabilidad de los derechos y garantías fundamentales. Esa faceta de los derechos y garantías individuales aleja la posiblidad de admisión de renúincia al nucleo sub-stancial de un derecho fundamental, mismo en la hipotese de la limitación voluntaria ser válida so-bre ciertas condiciones, de modo que es imprescindible observar en la analise de la validad del ato lafinalidaddelarenúncia,loderechofundamentalconcretoaserpreservadoylaposiciónjurídicadel titular (libre y autodeterminada). En ese punto, preciosas son las lecciones de Marcelo Novelino, que sostiene sus fundamen-tos en las palabras de Canotilho:

A autolimitação voluntária está sujeita, a qualquer tempo, à revogação. O não exer-cício ou o uso negativo de um direito (não participar de uma manifestação, não se filiaraumpartidopolítico,nãointerporumrecurso...)nãosignificaumarenúnciaporparte de seu titular. 7

La prosperidad de una vertiente descontida y demasiadamente abierta para alteración de 6 La concepción tricotómica es adoptada por la Constitucíon de algunos países, como Austria, España y Argentina. En Brasil, hayquiendefienda laposibilidaddeunaemendaconstitucionalalterar las limitaciónesmateriales existentes en textosconstitucionalconfundamentoenelprincipiodelasoberaníapopular(CF,art.147).Entendemosqueparaesoseríanecesarialaexistênciadeprevisiónconstitucionalexpresa,loquenoocurreenelcasodelaConstituciónde1998.LapropuestadeadopcióndeclasificacióntricotómicallegóaserhechaperanteaAsembleiaConstituintede1987/1988,perofuerechazada.ElentendimientoamplamentemajoritárioesenlosentidodequelaConstituciónde1988adoptoulaclasificacióndicotómica.NOVELINO,Marcelo.Direito Constitucional. 5. ed. São Paulo: Método, 2011, p. 84.7 Laautolimitaciónvoluntáriaestásometidaacualquiertiempo,alarevogación.Elnoejercícioousonegativodeundere-cho(noparticipardeunamanifestación,nosefiliaraunpartidopolítico,nointerponerunrecurso...)nosignificaunarenúnciapor parte de su titular. NOVELINO, Marcelo. Direito Constitucional. 5. ed. São Paulo: Método, 2011, p. 386.

los derechos y garantias fundamentales, com aceso ilimitado al núcleo substancial, aunque pelo própio pueblo, titular de la soberanía del Estado, podría implicar una pierda de identidad, de suerte que tales derechos se consolidaran en un proceso histórico, en una lenta sedimentación. Eso permite decir que la positivaçión de un derecho fundamental por el Poder Constituinte Originário aunque pueda parecer revolucionária, y su radicalidade esboze un carácter inovador a la face del órden jurídica anterior, es cristalino que tal derecho fundamental ya existia, pero su reconocimiento y possibilidade de su ejercício sólo fueran posibles con el advento de una nueva Constitución. Es ese un otro aspecto de los derechos fundamentales, matizado por Marcelo Novelino cuándoserefiereaelilustreJoséAfonsodaSilva8:

A historicidade também é uma característica dos direitos fundamentais, porquanto surgem e se desenvolvem conforme o momento histórico. A possibilidade de alter-ação de seu sentido e conteúdo com o passar do tempo afasta a fundamentação jusnaturalista.9

Ese punto, que se asenta en el carácter asuntivo de identidad de un pueblo muestra dos per-spectivas, aparentemente distinctas y antagónicas. Una consistente en la elaboración de una nueva Constitución, cuando el pueblo expresa de forma legítima a su voluntad soberana, sus valores y la fisionomiadeEstadoquealmejatenerafirmadoenlaLeyFundamental.Esunaconformacióndeun espejo constitucional que tenga una nitidez hábil permitiendo en ello, perceberse y contemplarse por lo que hay en ese espejo, sin que haya ninguna refración. Otra perspectiva, que podría tender a revelar el antagonismo con la anterior, bajo el punto delahistoricidaddelosderechosygarantíasfundamentales,sidefineenloscambiosdeidentidaddel pueblo con el pasar de los años, ese fenómeno en vía contrária a la perseverança del espejo constitucional a mando de las cláusulas pétreas. Pero ese antagonismo es apariente porque las cláusulaspétreasyquedefinenelespejocomotal,noobstanteasumoldurayformataciónpuedanser,conformeelcaso,alteradasparapermitiralpueblounreflejomásfidedigno. A ese respecto, si hace mister traer a la luz el magistério de Konrad Hesse, cuando sostiene que“oconteúdoconcretoeasignificaçãodosdireitosfundamentaisparaumEstadodependemde numerosos fatores extrajurídicos, especialmente da idiosincrasia, da cultura e da história dos povos”.10 Aún, con sabiduría Paulo Bonavides traciona esa misma linea de ideias, a enfatizar el mag-istério de Carl Schmitt:

Já do ponto de vista material,os direitos fundamentais, segundo Schmitt, variam con-forme a ideologia,a modalidade de Estado, a espécie de valores e princípios que a Constituição consagra. Em suma, cada Estado tem seus direitos fundamentais específicos.11

YesarazóneselpuntomáximodelPrincípiodeVedaciónalRetroceso,enlamedidaenqueconsagraalafirmezadelasconquistasjurídicasdeunpuebloyleconfiereunaimpermeabilidadtalque, la contemporaneidad no conseguiría imprimir su deseo inovador, por vía de un proceso que, pormásdificultosoquepuedaparecer,comoeslodereformadelaConstitución,sitranscorreríaenun período relativamente corto si puesto al período de sedimentación de los derechos fundamen-8 La historicidad también es una característica de los derechos fundamentales, por cuanto surgen y se desarollan confuerme elmomentohistórico.Laposiblidaddealteracióndesusenoycontenidoconelpasodeltiempoalejalafundamentaciónjusnatu-ralista. SILVA, José Afonso. Curso de direito constitucional positivo. 14. ed. São Paulo: Malheiros, 1997, p. 179-180.9 NOVELINO, Marcelo. Direito Constitucional. 5. ed. São Paulo: Método, 2011, p. 386.10 “elcontenidoconcretoylasignificacióndelosderechosfundamentalesparaunEstadodependendenumerososfatoresextrajurídicos,especialmentedelaidiosincrasia,delaculturaydelahistóriadelospueblos.”HESSE,Konrad.“Significadodelos derechos fundamentales”. Manual de derecho constitucional. Ernst Benda, Werner Maihofer, Hans-Jochen Vogel et alii. 2. ed. Madrid: Marcial Pons, 2001, p. 85.11 Ya del punto de vista material, los derechos fundamentales, según Schmitt, varian conforme a la ideología, a la modalidad deEstado,laespéciedevaloresyprincípiosquelaConstituciónconsagra.Ensuma,cadaEstadotienesusderechosfundamentalesespecíficos.BONAVIDES,Paulo.CursodeDireitoConstitucional.15.ed.SãoPaulo:Malheiros,2004,p.561.

tales. En términos más claros, lo que se quiere decir es que los derechos fundamentales, fructo de un proceso histórico, no pueden verse libremente entregue al arbítrio del pueblo, aunque soberano. Eso porque en el momento del procesamento legislativo de la Emenda Constitucional y, porque no decir, de una Assembleia Nacional Constituinte, ocasión en que hay intereses diversos, no hay comosimensurarlaintensidadyextensióndelasmodificacionesasereninseridasyquepuedenrechazartodalaconquistagradativadeunpueblo,enelprocesohistóricoqueeslodeafirmaciónde los derechos fundamentales. Entiempo,simuestraoportunodecirqueelreceloqueenvuelvetalesmodificacionessolotienenfluénciacuándopersibieseuna transformacióndelnúcleosubstancialdelderecho funda-mental veiculado en determinado dispositivo constitucional, de forma a perverter la su aplicabili-dad. Porotrolado,lamodificacióndelaLeyMajorconlaadicióndenuevosderechosfundamen-tales,no loesuntrabasuficientedeesoquepueda justificarcualquierrecelo.Hastaporque, laextensióndelosderechosygarantíasfundamentales,significaunaaberturadelconjuntoconstitu-cional, sea ella de procedéncia del pueblo o de sus representantes, ostenta prestígio por el pueblo y se conforta en el Derecho. Sobre el Princípio de la Vedación al Retroceso, es prudente realzar el ensinamento de Marcelo Novelino:

A necessidade de observância e respeito por parte do poder constituinte aos direitos fundamentais conquistados por uma sociedade e sobre os quais haja um consenso profundo é conhecida como princípio da proibição de retrocesso (“efeito cliquet”).12

Puedieseafirmarqueesa limitacióna laatuacióndel legisladorsealojaen lasegurançajurídica necesária a la estabilización de las relaciones jurídicas constituídas y consolidadas en un determinadocenário,bajolaincidénciadecircunstánciasespecíficasysobretodoenuncontextohistórico impermeable por si sólo, por una norma jurídica ajena a las conquistas jurídicas de deter-minado pueblo. De todo modo, la presencia de las cláusulas pétreas en un cuerpo constitucional no puede sercomprendidacomounaparatodeenyesamientodelórden jurídicadispuestoasacrificar lasnecesidades actuales a dar primazia pues los valores que historicamente se quedarán sedimen-tados por aquello pueblo. No si trata, por lo tanto, de llevar a efecto la condición de los muertos legislaren para los vivos, pero de traer vida a legislación actual, por medio de la garantía de que esas normas jurídicas no piercan su identidad y sobretodo todo su fundamento de validad. En un contexto de volatilidad del poder, no se muestra razonable la entrega del ordenami-ento al arbítrio del legislador que, una u otra vez, puede esquivarse de los propósitos de los cuales no debería olvidarse, en el ejercício de su munus, por lo que las cláusulas pétreas un verdadero escudofrenteaeventualesarbitrariedadesintencionalmentedeflagradasatítulodecámbioenelórden jurídica.

Bibliografia

BONAVIDES,Paulo.CursodeDireitoConstitucional.15.ed.SãoPaulo:Malheiros,2004;

CARVALHO, Kildare Gonçalves. Direito constitucional. 15. ed. rev. e atual. Belo Horizonte: Del Rey, 2009;

FRANCISCO,JoséCarlos.Emendasconstitucionaiselimitesflexíveis.RiodeJaneiro:Forense,2003

12 Lanecesidaddeobservanciayrespectoporpartedelpoderconstituintealosderechosfundamentalesconquistadosporunasociedadysobreloscualeshayaunconsensoprofundoesconocidacomoprincípiodelaprohibiciónderetroceso(‘efectocliquet’).NOVELINO,Marcelo.DireitoConstitucional.5.ed.SãoPaulo:Método,2011,p.75.

HESSE,Konrad.“Significadodelosderechosfundamentales”.Manualdederechoconstitucional.Ernst Benda, Werner Maihofer, Hans-Jochen Vogel et alii. 2. ed. Madrid: Marcial Pons, 2001, p. 85

NOVELINO, Marcelo. Direito Constitucional. 5. ed. São Paulo: Método, 2011SILVA, José Afonso. Curso de direito constitucional positivo. 14. ed. São Paulo: Malheiros, 1997

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