o contrato de comissão no cÓdigo civil de 2002
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Uma apresentação breve do contrato de comissão, trazendo uma curta apresentação histórica e em seguida comentando os diversos aspectos deste contrato à luz da doutrina e do próprio Código Civil, em um texto fluído e consiso.TRANSCRIPT
COMISSÃO
Segundo Maria Helena Diniz (apud SILVA, 2012), comissão “é o contrato
pelo qual uma pessoa (comissário) adquire ou vende bens, em seu próprio nome e
responsabilidade, mas por ordem e por conta de outrem (comitente), em troca de
certa remuneração, obrigando-se para com terceiros, com quem contrata” (Vide art.
693, CC/02). Complementarmente a este conceito, interessante a observação de
Arnold Wald (apud GONÇALVES, 2012) sobre a espécie de bem que pode ser
objeto do contrato de comissão: “só se tornam passíveis de alienação por atuação
do comissário os bens móveis, jamais os imóveis”, pois “não se poderia se poderia
manter sigilo sobre o comitente proprietário do imóvel, nem se prescindir de sua
intervenção direta ou mediante procurador no ato da outorga da escritura definitiva”.
O Contrato de comissão. Está disciplinado nos artigos 693 a 709 do Código Civil
Brasileiro de 2002.
O contrato de comissão, de acordo com Carlos Roberto Gonçalves (2012),
ganhou força durante a Idade Média, provendo solução para alguns inconvenientes
do contrato de mandato, reduzindo as despesas do comitente, dispensando o modo
de operação pela representação e permitindo ao comitente alcançar o mercado no
qual o comissário está inserido com mais facilidade e segurança. No Brasil, foi muito
utilizado na época expansão da cultura e comércio cafeeiro, venda de automóveis,
máquinas agrícolas e aparelhos de uso doméstico (THEODORO JR. apud
GONÇALVES, 2012).
A comissão chegou a ser considerada como uma espécie de mandato sem
representação. Assim era o posicionamento do Código Comercial Brasileiro, que
disciplinava a comissão nos arts. 165 a 190. Hoje tais disposições foram revogadas
expressamente pelo artigo 2.045 do Código Civil de 2002, que considera a comissão
como um tipo contratual autônomo. Em que pese, no art. 709 do referido código, a
ordenança de aplicação, no que couber, das regras do mandato ao contrato de
comissão, este conta com normas próprias e um capítulo do Código Civil Dedicado
exclusivamente a ele.
Diferem, de fato, os institutos do mandato e da comissão, pois no primeiro o
mandatário age em nome do mandante, mediante representação por procuração,
enquanto no segundo o comissário age em nome próprio, mas a conta do comitente.
Tanto é que, na maioria das vezes, o que contrata com o comissário nem toma
conhecimento do comitente, e seu nome não consta do contrato. Nada impede,
porém, segundo Gonçalves (2012), que o nome do comitente conste do contrato,
para fins de dar maior credibilidade e vantagem publicitária na divulgação do
produto. Resultado prático de tudo o que foi dito é que o comissário “fica diretamente
obrigado com as pessoas com quem contratar, sem que estas tenham ação contra o
comitente, nem este contra elas, salvo se o comissário ceder seu direito a qualquer
das partes” (TARTUCE, 2014). É o que está disposto no art. 694 do Código Civil.
Quanto à sua classificação, o contrato de comissão é bilateral, pois tanto
comitente quanto comissário têm obrigações a cumprir; oneroso, pois implica
vantagem econômica para ambas as partes; consensual, pois conclui-se tão
somente com o acordo de vontades; comutativo, pois as prestações são certas e
conhecida pelas partes; não solene, pois a lei não regula sua forma (informal) e
personalíssimo, pois é baseado em uma relação de confiança do comitente em
relação ao comissário.
O comissário é obrigado a agir de acordo com o que ordenou e instruiu o
comitente. Na falta de instrução e na impossibilidade de consultar o comitente a
tempo, dada a urgência do negócio, o comissário é autorizado pela lei a agir
segundo os usos e costumes em casos semelhantes. (Art. 695, CC). Baseado nisso,
José Maria Trepat Cases (apud TARTUCE, 2014), divide a comissão em três
espécies:
a) Comissões imperativas – são aquelas que não deixam margem de
manobra para o comissário.
b) Comissões indicativas – são aquelas em que o comissário tem alguma
margem para atuação. Entretanto, o comissário deve, sempre que possível,
comunicar-se com o comitente acerca de sua atuação, o que representa a
aplicação do dever de informação, anexo à boa-fé objetiva.
c) Comissões facultativas – são aquelas em que o comitente transmite ao
comissário as razões de seu interesse no negócio, sem qualquer restrição
ou observação especial para a atuação do último.
Ainda a respeito das instruções do comitente, versa o Código Civil que, não
havendo disposição em contrário, “pode o comitente, a qualquer tempo, alterar as
instruções dadas ao comissário, entendendo-se por elas regidos também os
negócios pendentes” (Art. 704).
Além de estar obrigado a seguir as ordens expressas pelo comitente, tem o
comissário o dever de cuidado e diligência, como o de quem cuida de suas próprias
coisas, com objetivo de evitar prejuízos e assegurar o lucro do comitente,
respondendo este por qualquer prejuízo que ocasionar ao comitente (Art. 696).
No Entanto, assegura o art. 697 que “O comissário não responde pela
insolvência das pessoas com quem tratar, exceto em caso de culpa” ou “se do
contrato de comissão constar a cláusula del cedere” (Art. 698), caso em que
responderá solidariamente com as pessoas em que houver tratado em nome do
comitente. Fará jus, nesta hipótese, a uma remuneração maior, para compensar o
ônus assumido.
Consta ainda, no Código Civil, Art. 699, estar o comissário “autorizado a
conceder dilação do prazo para pagamento, na conformidade dos usos do lugar
onde se realizar o negócio, se não houver instruções diversas do comitente”. Explica
Gonçalves (2012) que “a concessão de prazo é, muitas vezes, necessária para o
sucesso das vendas”, fazendo parte dos costumes de determinado mercado. Por
outro lado, se o comitente proibir a prorrogação do prazo, se o comissário a
conceder de maneira divergente dos usos locais, ou ainda se não comunicar ao
comitente, poderá este exigir daquele o imediato pagamento ou a sua
responsabilização pela dilação concedida. (Art. 700).
Pela atividade que exerce, e pela natureza onerosa do tipo contratual, faz jus
o comissário à devida remuneração (também denominada comissão), que pode ser
livremente estipulada entre ele e o comitente – geralmente fixada em um percentual
sobre o valor da venda, mas é livre fixar um valor invariável, ou ainda conceder ao
comissário participação nos lucros (ASSIS apud TARTUCE, 2014) – ou, não
havendo estipulação anterior ao negócio, deve ser fixada de acordo com os usos e
costumes locais (art. 701). Difere, neste ponto, do mandato, em que a relação
geralmente se presume gratuita.
É tão sério o tratamento dispensado pelo Código Civil à questão da
remuneração pela atividade do comissário, que, mesmo em caso de morte, ou
quando, por motivo de força maior, não puder concluir o negócio, é devida pelo
comitente a remuneração proporcional aos trabalhos realizados (art 702). E ainda
que seja dispensado por justa causa, tem direito de perceber a sua remuneração
pelos serviços úteis que houver prestado ao comitente, devendo-se entender, de
acordo com Gonçalves (2012), serviço útil como qualquer vantagem ou benefício ao
comitente, advindo da atividade do comissário (art. 703). Ressalva, porém, o
dispositivo, o direito do comitente de exigir, neste caso, o ressarcimento pelos
prejuízos sofridos.
Se for despedido sem justa causa, além da remuneração pelos serviços
prestados, tem o comissário o direito a ser ressarcido pelas perdas e danos
resultantes de sua dispensa (Art. 705). Se o comitente retém o pagamento devido,
em qualquer destes casos, resta configurada hipótese de enriquecimento sem causa
(Vide arts. 885 e 886 do Código Civil).
Nos casos de solvência ou falência do comitente, tem o comissário
prioridade diante dos demais credores na satisfação do crédito referente as
comissões e despesas feitas por este no cumprimento de sua função (Art. 707).
Aliás, deve ainda o comitente pagar os valores corrigidos por tudo o que o
comissário adiantou para o cumprimento das suas ordens. É o que dispõe o art. 706.
Assiste ao comissário inclusive o direito de reter os bens e valores em seu poder
para exigir o reembolso das despesas feitas, bem como as comissões devidas (art.
708). Por outro lado, de acordo ainda com o art. 706, o comissário deve pagar juros
ao comitente pela mora na entrega dos valores devidos a este.
Por fim, importante frisar o que salienta Gonçalves (2012) a respeito do
efeito da morte do comissário para o contrato celebrado: “por se tratar de negócio
personalíssimo, sempre extingue o contrato, se a atividade é exercida de forma
individual”. O mesmo efeito é gerado pela morte do comitente, devendo ser
prestadas as contas ao comissário.
DISTINÇÃO ENTRE A COMISSÃO E OS CONTRATOS DE MANDATO,
AGÊNCIA OU REPRESENTAÇÃO, CORRETAGEM E CONTRATO ESTIMATÓRIO
(talvez seja interessante no final do trabalho)
Quem cuida muito bem de esclarecer-nos os aspectos distintivos entre tais
contratos, é o autor Carlos Roberto Gonçalves (2012), no capítulo em que trata das
características do contrato de comissão.
Entre o mandato e a comissão, a distinção básica é que o mandatário age
sempre em nome do mandante, sendo este conhecido pelo terceiro com quem é
celebrado o negócio, e não poderia ser diferente, já que é o seu nome figura como
parte no referido negócio, e não o do mandatário. O comissário celebra o negócio
em nome próprio, na maioria das vezes, não conhecendo da existência do
comitente, que não figura como parte no negócio celebrado com terceiro. Em
segundo lugar, a comissão tem por objeto negócios determinados; o mandato “pode
versar sobre atos que, apesar de concernentes a um certo fim, ficam sujeitos à
deliberação do mandatário” (GONÇALVES, 2012).
O contrato de agência ou representação comercial, apesar de ter o mesmo
objetivo mercadológico, difere da comissão, posto que “o agente não realiza o
negócio, mas limita-se aos atos preparatórios que lhe foram incumbidos”
(GONÇALVES, 2012). A função do agente é captar e manter a clientela do
fornecedor.
Da corretagem, difere a comissão no sentido que o corretor não faz mais do
que aproximar o negociante da outra parte interessada, funcionando como
mediador. Quando consegue um interessado e este fecha o negócio apresentado,
está concluída com sucesso a função do corretor. É, portanto, uma obrigação de
resultado.
O contrato estimatório, assim como a comissão, tem por objeto a venda de
bens por negociação de outrem, em nome próprio. Difere, porém, nos seguintes
termos:
O consignatário recebe o bem com a finalidade de vendê-lo a terceiro, segundo estimação feita pelo consignante, podendo optar por ficar com o objeto para si, pagando o preço fixado. Se preferir vendê-lo, auferirá lucro no sobrepreço que obtiver. Sua vantagem econômica será alcançada pelo lucro eventualmente obtido na venda das mercadorias a terceiro, pois o consignante não o remunera. No contrato de comissão não há a aludida opção, nem o comissário se propõe a comprar as mercadorias, que ficam apenas em seu poder para procurar um terceiro que possa adquiri-las, sendo remunerado por essa atividade, calculada a retribuição sobre o preço que o produto da venda vier alcançar.
(GONÇALVES, 2012)
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Civil: contratos. 5 ed. São Paulo: Saraiva,
2012, Epub.
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito das obrigações: parte especial. Tomo I,
Contratos. 13 ed. São Paulo: Saraiva, 2011, 225 p.
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro, volume 3: contratos e atos
unilaterais. 9 ed. São Paulo: Saraiva, 2012, Epub.
SILVA, Regina Beatriz Tavares da. Código Civil Comentado. 8 ed. São Paulo:
Saraiva, 2012, Epub.
TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil. 4 ed. rev. atual. ampl. São Paulo:
Método, 2014, Epub.