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O confl ito guarani-brasileiro (1864–1870) sob a ótica educacional: o ensino de história na regiao fronteiriça

Cleber de Araujo Arantes1

RESUMO

Este artigo é parte integrante do projeto de Mestrado “Fronteira e Guerra nos livros didáticos de História do Brasil e Paraguai: a educação no pós-guerra” e procura analisar as diferentes visões do episódio e suas conseqüências nos livros didáticos de História brasileiros e paraguaios, focando principalmente questões como o período em que foram produzidos, os objetivos propostos pelos organizadores e o público que visava atingir, além de apresentar as principais mudanças e continuidades no tocante à estruturação e à divisão do conteúdo dos referidos manuais.

PALAVRAS CHAVE

Educação. Livros didáticos. História. Fronteira.

ABSTRACT

This article is part of the Master’s project “Frontier and War in textbooks and history of Brazil and Paraguay: a education in post-war” and analyzes the different views of episode and its consequences in the history books, Brazil and Paraguay, focusing mainly on issues such as the period they were produced, the objectives proposed by the organizers and public and aiming, and present the main changes and continuities in terms of structuring and division of the contents of those manuals.

KEYWORDS

Education. Textbooks. History. Frontier

O cantor Almir Satter em trecho de sua música Sonhos Guaranis2, afi rma, mesmo que através de uma metáfora, que: Mato Grosso espera, esquecer quisera, O som dos fuzis, Se não fosse a guerra, Quem sabe hoje era, um outro país. Podemos perceber então que a Guerra contra o Paraguai (1864-1870) é um assunto não esquecido por ter sido de tão relevante importância, é algo que permeia o imaginário regional e tem gerado desde o seu término uma imensa discussão, ainda que por limites geográfi cos ou os reais motivos do bélico acontecimento descritos pormenorizadamente nos livros de história, e esse debate muito interessa, pois é sabido que a elaboração dos livros didáticos deriva, em sua grande maioria, dos paradidáticos já existentes.

O próprio nome do confl ito, que chamado por nós brasileiros de: A Guerra do Paraguai por nossos vizinhos recebe nomenclatura diferenciada como: La Gran Guerra ou Guerra de La Triplice Alianza, mostrando que existem muito mais diferenças que possam ser apontadas em uma análise preliminar, gerando tema para um trabalho exclusivo. Outro

1 Mestrando em Educação no Programa de Pós-Graduação FAED/UFGD (Universidade Federal da Grande Dourados – MS). [email protected].

2 Música de Almir Satter e Paulo Simões que retrata poeticamente a Guerra do Paraguai e suas conseqüências.

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fator que chamou a atenção foi o fato de os manuais didáticos de História utilizados no Mato Grosso do Sul, principalmente na rede pública, trazer pouca referência ao confl ito, pode-se dizer, que contém apenas breves referências e a própria Guerra em questão é tratada sumariamente em um pouco mais que meia página.

O tema por si só se justifi ca, por ser marcado em sua produção pela construção tanto da identidade3 nacional brasileira como da relação histórica do Brasil com os países vizinhos. Em análise semelhante, vemos Vaz (2002) afi rma que as representações dos valores e crenças, próprias de uma comunidade imaginada, estão inseridas em uma cultura nacional defi nida por processos históricos na qual, além dela, vemos que:

O processo educativo é propriamente um processo de ‘passagem’ e conhecimento de valores de uma cultura, contribuinte para a formação do sujeito. Interessante notar que a própria disciplina ‘História’ começou a fi gurar como ciência a partir do período de formação dos estados nacionais, quando se pretendia disseminar a idéia de um passado comum e, com isso, estabelecer uma identidade nacional. (VAZ, 2002, p. 48)

Sendo esse um tema de diversos trabalhos nas áreas de história, na educação não seria diferente, pensando nisso, procura-se analisar aqui as diferentes visões do episódio e suas conseqüências nos livros didáticos de História brasileiros e paraguaios, para tanto a fonte principal de pesquisa do mesmo serão os referidos manuais e entrevistas com professores de escolas dos dois países. Pois segundo Centeno (2006), o manual é o instrumento que impõe certo grau de objetivação ao trabalho didático e, na mesma medida, estabelece o domínio sobre as operações realizadas pelo professor em sala de aula.

No caso do ensino de História, sobre a Guerra do Paraguai, o papel do historiador deve ser o mais parecido com a verdade possível, visto que em história trabalhamos com hipóteses e não devemos incorrer no erro da verdade absoluta, deve-se sempre perceber a importância do fazer historiográfi co para a sociedade no sentido de ampliar o debate sobre questões referentes ao seu passado.

Nas palavras de Santos (2007) “O livro didático é considerado um instrumento muito importante para a construção de ideologias e memórias, perpassando o imaginário das pessoas que adquirem saber através dele”. Afi rma ainda que existe uma preocupação com sua utilização, bem como sua elaboração e escolha está ligada a preocupação que se tem com essas ideologias e memórias criadas ao longo do enorme contato que se tem com esse material, neste caso os alunos que utilizam o material didático para estudar a disciplina de história.

Vaz (2002) afi rma que alguns professores seguem fi elmente livros didáticos que: transmitem um saber ‘legítimo’ que se faz útil por si só, visto ser considerado como fi m e não como meio passível de questionamento. No caso dos livros didáticos brasileiros, a força desse discurso é corroborada e reforçada pelo aval do próprio MEC4.

Daí a importância de o professor estimular a consciência crítica dos alunos e a sua própria, já que ele também tem conhecimento a aprender vindo dos mesmos, lembrando que a escola é, nas palavras de Pierre Nora, um “lugar de memória” por excelência, um espaço privilegiado para a informação e difusão do passado e sua refl exão. Acerca disso Farias (2002) diz que o que se vê é que além da maioria dos professores, não darem tanta importância ao que precisam ensinar aos alunos, os mesmos, também, se utilizam de uma duvidosa apresentação de conteúdos históricos como “verdadeiros” e

3 Ministério da Educação e Cultura (Brasil)4 Alfredo Stroessner Matiauda governou o Paraguai entre 1954 e 1989, com um cunho nacionalista

num sistema de governo ditatorial.

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“insuperáveis”, fazendo com que o aluno não se sinta produtor da História, levando-o a crer que apenas os grandes heróis, personagens e fatos estão contidos no discurso histórico. E isto é claro nas palavras de Bezerra:

O livro deve partir do princípio de que o aluno não é uma cabeça vazia que precisa ser preenchida com algum conteúdo, assimilado de qualquer forma. Como ser humano, já vivenciou experiências com as quais poderá trabalhar para adquirir novos conhecimentos, através de leituras, discussões e do empenho do professor. (BEZERRA, 1999, p. 198)

Fertig (2010) complementa que na historiografi a, podemos identifi car várias vertentes de análise sobre a Guerra do Paraguai. Mas a mais conhecida é a versão tradicional, centrada na ideia de que o confl ito teria sido resultado da megalomania e dos planos expansionistas do ditador Solano López. O exemplo maior dessa vertente é a historiografi a militar, ou positivista, que exalta os feitos dos seus “heróis”, não levando em conta os anônimos e a destruição causada pelas batalhas, somente o engajamento heróico dos seus “soldados”.

Doratioto, ao enfocar os motivos da guerra na insanidade do ditador, restaura a propaganda ofi cial do império brasileiro, de que a guerra era contra o ditador e bastaria derrubá-lo e não responde sobre o que teria mobilizado a população paraguaia para uma guerra longa em seu território.

Houve, por parte do Brasil, uma intensa utilização da propaganda para desmoralizar o Paraguai ou enfraquecê-lo perante o mundo, exemplo disso é a veiculação na Europa, através da Agência de Notícias Reuters com sede em Lisboa, que difundia essas ideias de um Paraguai dominado por um tirano, e exaltava a luta da “civilização” contra a “barbárie”. Para os estudiosos desse tema uma das características básicas da historiografi a ofi cial é negar ao povo qualquer participação profunda nas mudanças da sociedade.

Em alguns manuais didáticos brasileiros há certa tendência em ver a guerra a partir da ótica dos vitoriosos, explicando-a, no plano das causas imediatas, como uma reação do império luso-brasileiro a agressão paraguaia e no plano geral, como uma luta da legitimidade contra a ambição representada pelo “tirano” Lopez.

Ainda confi rma Fertig (2010), que outro enfoque acerca da guerra surgiu com a visão revisionista, nas décadas de 1960 e 1970, que ao analisar com uma forte infl uência marxista, passou a explicar o confl ito como resultado do imperialismo inglês na região platina. A Inglaterra teria utilizado o Império brasileiro para destruir o modelo de desenvolvimento paraguaio, industrializante, autônomo, onde a economia crescia sem a interferência de empréstimos estrangeiros, e que não se submetia aos mandos e desmandos da potência de então. A guerra teria sido um ataque a um Paraguai em fase de desenvolvimento, mas essa visão é pouco aceita atualmente, segundo salienta Bethell (1995) que a Grã-Bretanha e suas “supostas ambições imperialistas” não podem mais ser utilizadas como “bode expiatório para a guerra do Paraguai”. A responsabilidade primordial dessa guerra, segundo ele, cabe à Argentina, ao Brasil e, em escala menor, ao Uruguai e, naturalmente, ao Paraguai. A guerra do Paraguai foi “uma guerra civil regional, muito embora com uma dimensão internacional muito interessante e digna de nota”.

Mas para alguns (que não são raros) que analisam por uma visão mais apaixonada não bastava refutar a versão ofi cial de glória do Exército e mostrar o massacre cometido na população do Paraguai, era preciso compreender que o exemplo do Paraguai precisava ser

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extirpado, afi nal era um país que tentava se desenvolver por vias próprias, fora da bolha econômica da Inglaterra. Nesta visão se pintou a imagem de um ditador, mostrando suas crueldades e a formação de uma aliança internacional para promover a ordem e interferir em um país que, supostamente, “invadiu fronteiras”. O castigo: extermínio da população, quebra das indústrias, envenenamento da água, destruição das plantações, entre outras versões mais radicais que permearam os manuais durante as décadas 1980 e 1990, mas que ainda sobrevivem em algumas obras.

Para historiadores como Ricardo Salles, os revisionistas superdimensionam a infl uência inglesa na região e ignora as motivações específi cas dos países diretamente envolvidos, amplia essa visão de que a guerra teria sido provocada pelo projeto de expansão territorial paraguaia, para ele uma visão errônea, podemos aqui citar Michel de Certeau, quando afi rma que é impossível eliminar do trabalho historiográfi co as ideologias que nele habitam. Já para Ferraz (2000) sobre os revisionistas diz que:

Além dessa razão, existia uma clara rejeição política, que considerava esses eventos militares como meios de glorifi car os ditadores fardados de plantão. Não é, portanto, mera coincidência que o revisionismo historiográfi co da Guerra do Paraguai tenha investido nas tradições e mitos mais caros ao Exército Brasileiro: ao mirar nos seus heróis-patronos, intencionava-se alvejar o próprio regime. (FERRAZ, 2000, p. 04)

Mário Maestri (2003) analisa o episódio por uma ótica diferenciada, dizendo que a rejeição das “narrativas totalizantes” valorizou a proposta das novas histórias política e cultural que terminou restaurando as velhas interpretações idealistas e subjetivistas do passado. Diz ainda que a história voltou a ser lida prioritariamente como produto da ação errática de protagonistas excelentes e os fenômenos sociais, como produto de determinações ideológico-culturais. No tocante à guerra contra o Paraguai, novas narrativas críticas do revisionismo dos anos 1960-70, defi nido como autoritário e populista, empreenderam a restauração das grandes propostas interpretativas nacional-patrióticas imperiais e republicanas. Lembrando o que diz Maestri (2003):

A marcialidade paraguaia seguiu como enigma sem resolução. Ela difi cultou que a guerra galvanizasse o imaginário popular brasileiro, que se manteve em geral infenso à retórica nacional-patriótica, alimentado por lembranças tênues das tristezas conhecidas pelos combatentes naquele confl ito e pela população, devido a ele. Jamais foi escrita história da participação popular brasileira na Guerra, que continua sendo cultuada, sobretudo pelo Estado e pelas forças armadas. Ultimamente, ensaia-se com difi culdade a construção de legenda da história regional do confronto e da participação popular no mesmo. (MAESTRI, 2003, p. 03)

A historiografi a recente, como via de análise, a escrita da história produzida a partir da década de 1980/90, explica o confl ito a partir das relações estabelecidas entre os países da Região do Prata, ao longo do século XIX, durante o processo de formação dos Estados Nacionais. Segundo esta historiografi a, a Bacia do rio da Prata era uma região estratégica

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para o comércio internacional no século XIX. Levando em consideração a importância da navegação marítima na época, os países em questão tinham o interesse de assegurar a livre navegação pela Bacia do Prata e garantir o controle sobre os rios da região. Conforme reforça Fertig (2010), as disputas territoriais em áreas fronteiriças alimentavam os confl itos em uma região importante do ponto de vista geopolítico,

Por classifi carmos as interpretações da Guerra da Tríplice Aliança com uma percepção em aqueles que identifi cam o “Projeto Paraguai Maior” de Solano López como causa principal do confl ito, temos em outro, os que afi rmam que o confl ito foi causado pelo rompimento da estrutura dominante do imperialismo inglês, e ainda, como intermediário entre os outros dois pensamentos, os historiadores que combinam em suas explicações os interesses de todos os países envolvidos e não apontam uma causa principal.

Além das baixas, o confl ito teve um profundo impacto sobre as sociedades dos países envolvidos. No caso do Paraguai, que passava por um grande desenvolvimento até o momento do confl ito, foi aniquilado pelas tropas contrárias ao fi nal da guerra. Para o Brasil, além de ter acumulado altas dívidas com os ingleses, o confl ito teve repercussão nas questões abolicionistas e republicanas.

Surge então o interesse em realizar um estudo que comparasse as interpretações da Guerra da Tríplice Aliança contra o Paraguai apresentadas pelos livros didáticos paraguaios com as interpretações apresentadas pelos livros didáticos brasileiros. Isto ajudará a compreender a infl uência do sentimento nacionalista e do etnocentrismo na elaboração dos textos dos historiadores.

Na historiografi a didática paraguaia, são inúmeras as contradições em relação ao discurso brasileiro sobre a Guerra, mostram ainda elementos reveladores para entender o movimento tanto de mudança de discursos em relação a fatos e personagens históricos, quanto de resistência às mudanças que colocam em cheque algumas partes históricas, construídas a partir das relações de poder, exercidas por governos que dependem da construção de um saber histórico na sociedade que os legitime no poder.

Em parte, alguns manuais paraguaios apresentam uma visão diferente para o fato, e que o Paraguai serviria aos interesses de expansão de Brasil e Argentina no contexto de território. Mas numa analise preliminar, explicada pelo pouco material até então coletado, pode-se perceber que alguns manuais produzidos em um período após o fi m da ditadura de Stroessner houve no Paraguai também uma escrita revisionista com uma visão de López como tirano e que levou seu país à ruína, mas são pouquíssimos os que se aventuram nessa linha, pois alguns foram considerados traidores e inimigos da pátria e nos poucos manuais pesquisados não aparece essa interpretação por isso mesmo não se pode afi rmar com veemência tal fato.

Na analise de livros de ambos os países serão focadas principalmente as questões referentes ao período em que foram produzidos, as relações que mantiveram com o mercado, a publicidade, os objetivos propostos pelos organizadores e o público que visava atingir, além de apresentar as principais mudanças e continuidades no tocante à estruturação e à divisão do conteúdo. Considerando as implicações dessas mudanças no aprendizado e na formação cultural/educacional dos alunos, a pesquisa busca o aprimoramento dos manuais didáticos, para que possam apresentar as diferentes versões sobre o acontecimento em estudo, chamando a atenção para a preservação das fontes e documentos dentro das instituições escolares no Brasil e no Paraguai.

O princípio norteador é a avaliação de como alguns livros didáticos de história do Brasil abordaram a Guerra do Paraguai e esta verifi cação buscará responder algumas questões:

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qual o enfoque que livros didáticos apresentam acerca da guerra, quais as inspirações teóricas que os autores de livros didáticos explicitam em suas obras, que tipo de visão da história produziam autores brasileiros e paraguaios. Neste sentido, pretende-se identifi car as infl uências teóricas e também a produção didática e historiográfi ca, avaliando a proximidade entre as narrativas distintas da história. Interessante salientar o que diz Brandt:

Considerando que o analfabetismo cultural é como um instrumento ideológico utilizado como estratégia, principalmente nas escolas públicas, que supostamente são destinadas à socialização dos saberes, mas que encerram em si, rituais das palavras dos grupos doutrinários, das apropriações sociais, para o saber mínimo, saber básico, sufi ciente apenas para o entender dos ledores acríticos, conformados, e pouco conscientes, incapazes de perceber a História como experiência e prática de cidadania. (BRANDT, 2009: p. 04)

As limitações da pesquisa se restringem somente pelo fato de o Brasil ser um país de proporções continentais e como o livro didático da rede pública é elaborado e distribuído por um órgão máximo que é o MEC, não será necessário a análise de manuais do país todo. Já o trabalho no Paraguai será mais árduo, tendo em vista que em 2002 o país passou a não mais produzir material didático e existem diversos livros ainda utilizados pelos professores de História, quando houve também uma atribuição a elaboração e confecção do material pelo próprio profi ssional da área fazendo assim com que haja um sem número de material a ser analisado, demandando assim, tempo e dedicação a pesquisa no processo de separação, catalogação e estudo do referido material didático e em alguns casos paradidático.

Durante o período ditatorial de Stroessner a disciplina de História foi compilada com outras afi ns, tendo a partir de então a preocupação com o mito do herói nacional em Solano López, o ensino de História nas escolas estatais passou a ser chamado de Estudios Sociales, trabalhado, na maioria das vezes, por professores de História.

O recorte espacial desta pesquisa limita-se aos municípios fronteiriços entre Brasil e Paraguai, mais propriamente no Mato Grosso do Sul, tendo sido escolhidas as cidades para a análise de forma aleatória, tais como Paranhos, Cel. Sapucaia e Ponta Porã no Mato Grosso do Sul / Brasil e suas vizinhas limítrofes respectivamente: YpêHú, Capitan Bado e Pedro Juan Caballero todas localizadas no distrito de Amambay / Paraguay, levando em conta que no Paraguai não há um ensino administrado por municípios ou estado, o Estado lá é representado pelo governo do país, diferente do Brasil, onde vigora um sistema federativo, então procuraremos fazer a pesquisa também em escolas públicas e privadas que, por ventura, encontrem-se nas cidades escolhidas para a amostragem, este não é um trabalho com perfi l de estudo comparativo, mas de verifi cação de elaboração, veiculação e utilização dos materiais didáticos de História em ambos os países.

No caso dos manuais brasileiros será feita uma análise nos manuais em uso atualmente, que são fornecidos pelo governo federal através do Plano Nacional do Livro Didático em acordo com estados e municípios sul-matogrossenses e brasileiros, também serão observados os que estão em utilização nas escolas privadas que se encontrem nas cidades escolhidas para a pesquisa.

Este trabalho estará também ampliando o conhecimento sobre temas ainda pouco estudados na historiografi a educacional, mesmo tanto tempo após o fi nal dos embates

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e do confl ito realizado na fronteira5, mas não pelos ‘da’ fronteira, e é praticamente impossível escrever uma história, mesmo no caso de um único país, ou até de uma única região, sem utilizar a noção de “fronteira”. Deixando de ser literalmente periférica, no que tange aos historiadores da cultura a noção de fronteira é, ou pelo menos se tornou, absolutamente central.

No tocante ao estudo sobre esse importante confl ito na América do Sul, o resultado desta pesquisa pode representar uma relevante ampliação de pesquisa em História e educação. Dentro dessa perspectiva, pretende-se expor delineamentos que contribuam de forma satisfatória para a compreensão desse período e dos aspectos de elaboração de tais manuais didáticos. Podemos perceber também que após o confl ito foram publicados inúmeros livros didáticos, por isso a preocupação em fazer uma análise mais profunda para ver até onde os discursos político-ideológicos tem sido sistematicamente revistos, se chegaram até a historiografi a didática utilizada atualmente nas escolas dos países envolvidos.

REFERÊNCIAS

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5 Originária do latim frontaria, a expressão fronteira signifi ca “território que fi cava em frente ou nas margens” (MULLER, 2005, P 576). Os conceitos são múltiplos, mas a idéia que normalmente se tem sobre o termo fronteira é de uma linha divisória entre dois países. Entende-se, porém, que a fronteira não pode ser limitada a uma linha, pois ela é muito mais que isso. As linhas demarcatórias muitas vezes correspondem a limites fi rmados entre representantes políticos das nações em questão, não correspondendo a divisões naturais. Por isso o termo denota uma atenção especial, desde a sua origem aos diferentes conceitos. Na atualidade, fronteira vem absorvendo uma dimensão antropológica que resgata as relações interétnicas e a multiplicidade de horizontes culturais que existem em determinados espaços. Aplicada à história política e cultural, vem lançando uma perspectiva histórica que assume o jogo das relações de poder e da dinâmica da expansão fronteiriça.

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