o conceito de meio interior é de alguma forma a...

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Engenharia Biomédica – 3º ano, 1º semestre Mecanismos Gerais da Doença (2006/2007) Professor Afonso Fernandes Aula desgravada por Nuno Santos Aula 1 (20 de Setembro de 2006) Desgravado por Nuno Santos para o curso de Engenharia Biomédica no âmbito da disciplina de Mecanismos Gerais de Doença Nota : queria só referir que esta desgravação tem partes de completa transcrição do que foi dito pelo professor, assim como partes de rearranjos e resumos para não enfatizar o texto e não repetir a mesma palavra meia dúzia de vezes na mesma frase. Já agora, os acetatos visualizados são os seguintes (apesar de aparecerem na altura devida ao longo do texto): 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10, 13, 14, 16, 17, 23, 24 e 26. O conceito de Meio Interior é de alguma forma a designação que podemos dar ao estado de equilíbrio que provavelmente vivemos, mas na sua concepção inicial o meio interior eram os líquidos orgânicos em que se banham todas as células e cuja composição tem de ser devidamente regulada para garantir o estado de saúde. De alguma forma o que Bernard enunciou é que, a estabilidade (e não imutabilidade, isto é que tem qualquer coisa de fixo, que não muda) é qualquer coisa que é estável porque é procurado o equilíbrio, está em permanente mudança mas tende a manter o equilíbrio e portanto a estabilidade desse meio interior é uma condição essencial ao estado de saúde, à sobrevivência e à liberdade, pois uma doença pode levar a que o doente fique dependente. 1 Aula 1 – 20 de Setembro de 2006

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Engenharia Biomédica – 3º ano, 1º semestreMecanismos Gerais da Doença (2006/2007)

Professor Afonso Fernandes

Aula desgravada por Nuno Santos

Aula 1 (20 de Setembro de 2006)Desgravado por Nuno Santos para o curso de Engenharia Biomédica no âmbito da

disciplina de Mecanismos Gerais de Doença

Nota: queria só referir que esta desgravação tem partes de completa transcrição do que foi dito pelo professor, assim como partes de rearranjos e resumos para não enfatizar o texto e não repetir a mesma palavra meia dúzia de vezes na mesma frase. Já agora, os acetatos visualizados são os seguintes (apesar de aparecerem na altura devida ao longo do texto): 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10, 13, 14, 16, 17, 23, 24 e 26.

O conceito de Meio Interior é de alguma forma a designação que podemos dar ao estado de equilíbrio que provavelmente vivemos, mas na sua concepção inicial o meio interior eram os líquidos orgânicos em que se banham todas as células e cuja composição tem de ser devidamente regulada para garantir o estado de saúde. De alguma forma o que Bernard enunciou é que, a estabilidade (e não imutabilidade, isto é que tem qualquer coisa de fixo, que não muda) é qualquer coisa que é estável porque é procurado o equilíbrio, está em permanente mudança mas tende a manter o equilíbrio e portanto a estabilidade desse meio interior é uma condição essencial ao estado de saúde, à sobrevivência e à liberdade, pois uma doença pode levar a que o doente fique dependente.

Os mecanismos homeostáticos são os mecanismos que permitem repor o equilíbrio perdido. Se há alterações do meio interior nós possuímos um conjunto de mecanismos, ditos de auto-regulação, que são os mecanismos homeostáticos que tendem a repor o equilíbrio perdido, tendem a repor o estado de pleno equilíbrio de saúde. Naturalmente que as alterações infligidas no meio interior em relação com a nossa relação com o ambiente podem ser tão marcadas que os mecanismos homeostáticos sejam incapazes de repor o equilíbrio perdido e nessa situação caímos num estado de doença, uma doença que nos concentra uma incapacidade de adaptação. Se existe um desequilíbrio que atinge graus para além dos compensáveis, então entramos numa rampa que leva inevitavelmente à morte. Portanto estes conceitos de meio interior, estabilidade do meio interior, mecanismos homeostáticos são conceitos fundamentais para perceber a patologia. Estes conceitos estão de certa forma relacionados com o conceito de sobrevivência do mais forte (Darwin), pois aquele que sobrevive é aquele que tem a capacidade de repor os equilíbrios perdidos.

(4º slide do powerpoint) Descrição dos vários passos do mecanismo homeostático e exemplo: ao nível do sistema nervoso se vocês têm hipoxia (condição de

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Aula 1 – 20 de Setembro de 2006

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falta de oxigénio no sangue), a maneira de sobreviver é ter um mecanismo que reponha a normoxia (estado normal). Então, face à hipoxia vamos ter uma hipoxemia (diminuição da concentração de oxigénio no sangue, vem de glicémia, hipo – menos, emia - concentração). Esta diminuição vai ser percebida pelos chamados quimioreceptores, localizados por exemplo no corpo carotídeo que são sensíveis às alterações das concentrações de oxigénio no sangue. Isto gera impulsos nervosos que seguem uma via conhecida que é o nervo de Hering, que atinge o centro respiratório. Este ao ser estimulado pela variação da frequência de impulsos nervosos, envia impulsos nervosos através das vias motoras que vão enervar e estimular os músculos respiratórios a fazerem hiperventilação (aumentarem a frequência respiratória) e a possibilidade dos movimentos respiratórios, permitindo assim um aumento da entrada do oxigénio no sangue. Assim este mecanismo homeostático de feedback negativo vai disponibilizar em princípio mais oxigénio.

(Esquema que explica como surge a doença – 5º slide) É necessário considerar sempre um agente e um organismo (por exemplo o homem) que tem uma susceptibilidade e é capaz de reagir e pode ou não ter defeitos próprios. Face à interacção do agente com o organismo, que tem uma determinada susceptibilidade podem actuar os mecanismos homeostáticos (que são estudados pela fisiologia) e o resultado, se eles forem eficazes é a persistência do estado de saúde. Mas um agente ao actuar sobre um organismo com uma determinada susceptibilidade pode desencadear uma reacção que não é suficiente para manter o estado de equilíbrio e então as “coisas correm mal”. As coisas podem correr mal porque o agente é demasiado virulento (“mau”) ou é demasiado agressivo ou porque o organismo é demasiado susceptível (até pode ter um defeito) ou porque o processo reaccional é, ele próprio muito intenso. Nesta situação é impossível manter o estado de equilíbrio e cai-se num estado de doença (que é estudado pela patologia).

A Etiologia é o estudo das causas das doenças, dos agentes. Por exemplo: a causa da tubercolose é um bacilo “mico bacterio tuberculosis”, assim como a causa da fractura da tíbia devido a um choque com um carro é a energia cinética proveniente do carro. Há muitas doenças, provavelmente a maioria do qual não se conhecem as causas. A estas doenças dão-se o nome ediopáticas ou essenciais ou primárias. A Patogénese é o estudo da forma como a causa provoca a doença (é um mecanismo, pato – doença, génese – origem). A Fisiopatologia é o estudo da forma como se passa do estado fisiológico para o estado patológico, ou ainda o estudo da repercussão da doença no resto do organismo. Quando o coração falha todo o organismo sofre, pois apesar de a doença ser do coração há uma alteração do funcionamento normal dos outros órgãos. A Anatomia Patológica é o estudo das manifestações morfológicas das doenças, isto é do aspecto dos órgãos, dos tecidos e das células passam a ter quando estão doentes.

Os agentes são dos mais variados (a água, por exemplo apesar do seu bem essencial à vida pode também causar doenças). Assim é possível considerar os seguintes tipos de agentes:

Físicos – o calor e o frio, as vibrações, a electricidade, as radiações (ionizantes e não ionizantes), o silêncio, o vento, o espaço confinado (claustrofobia), a energia cinética...

Químicos – ácidos e bases fortes, venenos tóxicos (ex.: cianeto – bloqueia a citocromoxidase (enzima da cadeia respiratória a nível celular))...

Biológicos – vírus, bactérias, parasitas (causas de doenças infecciosas)... Nutricionais – quer por carência (ex.: carência de vitaminas, proteínas),

quer por excesso de nutrientes (ex.: hipervitaminoses, obesidade).

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Psicológicas e sociais – prendem-se por exemplo pelos vícios (ex.: tabagismo, alcoolismo), comportamentos sociais...

Causa Genética – alterações genéticas que comprometem a eficácia duma via metabólica(ex: falta de uma enzima), de mecanismos de defesa (ex.: imunitária).

A Susceptibilidade é outro conceito fundamental, os agentes provocam doença face uma determinada susceptibilidade, susceptibilidade essa que depende da idade (ex.: os extremos de idade são mais susceptíveis de ter doença), do sexo (ex.: só o homem tem cancro da próstata – existem doenças que são preferenciais a um determinado sexo), do património genético (como já foi referido).

A Biografia Fisiológica e Biografia Patológica podem condicionar o aparecimento de doenças, por exemplo, sabe-se que o número de vezes que a mulher está grávida ou o facto de ela amamentar ou não tem repercussões na incidência de algumas formas de cancro, nomeadamente no cancro da mama ou do útero, portanto trata-se de uma biografia fisiológica (engravidar, amamentar claro que é fisiológico) mas esses aspectos fisiológicos podem condicionar a susceptibilidade à doença (ex.: à menarca1 precoce e à menopausa tardia associa-se um cancro da mama). Há, assim aspectos fisiológicos que podem influenciar a susceptibilidade às doenças. A Biografia Patologica tem a ver com o facto de certas doenças se predisporem a outras. Por exemplo, doentes com cirrose hepática, associado ao alcoolismo têm maior probabilidade de vir a ter cancro do fígado. Um doente que tenha artrite reumatóide, problemas nas articulações tem uma maior tendência a cair e a fazer uma fractura.

As Respostas (que vão ser abordadas mais a finco nas aulas seguintes) são de vários tipos:

Reguladoras gerais ou Neuro-endócrinas – pois todos os nossos sistemas são controlados pelo sistema nervoso ou pelo sistema endócrino.

Termorreguladora – ex.: febre. Metabólica – as vias metabólicas sofrem uma alteração. Hematológica – dos elementos do sangue (ex.: glóbulos brancos) Imunológica – resposta defensiva. Inflamatória – ex.: amigdalite, corte da mão. Regenerativa – há uma regeneração dos tecidos após uma ferida. (não há

grande diferença entre regenerativa e reparadora – irá ser falado noutra aula)

Hemostática – (vem de hemostase) capacidade de coagular o sangue. Circulatórias – ex.: taquicardia (aumento do fluxo de sangue) após um

esforço.Num resumo: A causa, através de uma via patogénica pode levar a lesões. As

lesões podem ser estruturais se houver uma alteração estrutural e lesões funcionais se não for possível visualizar nenhuma alteração mas apesar disso o organismo funciona mal. A morte por cianeto, por exemplo é uma morte funcional. Isto leva-nos a manifestações da doença que são os sinais e/ou sintomas que é o que o médico tem de saber para perceber que o indivíduo está doente.

(Exemplos do que acaba de ser dito – acetato 10 – próximos parágrafos são descrições deste mesmo acetato)

No primeiro tem-se o chamado furúnculo, que se manifesta sobre a forma de uma borbulha cheia de pus. A Etiologia será o próprio furúnculo (“Staphylococcus aureus”) que se apresenta à superfície da pele e é especialmente agressiva e pode levar a uma infecção local da pele. A Patogénese é a resposta do nosso organismo, a

1 Data do primeiro período menstrual

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inflamação. A anatomia patológica ou alteração morfológica é a elevação da pele com formação do pus e da borbulha. No entanto pode haver uma contaminação, através do sangue desta bactéria ás outras partes do corpo (pulmão, coração...): Septicémia (generalização do agente infeccioso no organismo).

Outro exemplo é o cancro do pulmão, em que a causa é o tabaco, mais correctamente os constituintes carcinógenos do mesmo, que são os hidrocarbonetos aromáticos policíclicos. Estes agentes, como o benzendo ligam-se às bases do ADN, normalmente adenina e guanina (neste caso a guanina), provocando alterações nos genes. E algumas destas alterações causam a transformação das células em células neoplásicas, podendo levar à morte devido à proliferação destas células para outros órgãos do corpo (metastisação).

A cirrose é o terceiro exemplo. A cirrose pode ser provocada por um vírus, o da hepatite, e esta é a etiologia. No entanto a patogénese, ou a causa da doença (a cirrose) não é o vírus mas sim a própria defesa do organismo, isto é, quando o vírus infecta o fígado o organismo reage e monta uma resposta imunológica contra o vírus, mas ao mesmo tempo destrói as células hepáticas do fígado. Portanto a patogénese é imunológica. Este ataque (a cirrose) causa assim insuficiência hepática levando à falência do fígado.

O último caso é sobre a hipertensão arterial, que é essencial (não se conhece a causa). A renina pode estar ligada ou causar a hipertensão arterial. Uma das complicações é a hemorragia cerebral, pois quando os vasos cerebrais estão sujeitos a pressões altas podem rebentar.

(Acetato 13) É importante agora poder relacionar a probabilidade da doença (PD) com a quantidade do agente (QA). No primeiro gráfico existe uma relação de proporcionalidade directa entre a PD e a QA. Um exemplo claro é o tabagismo, pois quanto mais se fuma mais probabilidade se tem de ter cancro do pulmão, podendo no entanto haver algumas excepções, uma vez que à pessoas que fumam muito e nunca têm cancro e o caso contrário também acontece, isto devido à susceptibilidade. Outro caso muito simples e sem problemas de susceptibilidade é a martelada num osso qualquer do corpo, quanto maior a pancada maior a dor e a fractura também será pior. No segundo gráfico (esquerda, baixo) existe um crescimento elevado da PD para baixa QA. Um exemplo disso é a hipersensibilidade a determinados medicamentos, como o choque anafilático à penicilina. O gráfico em cima à direita com baixa PD para baixa QA e depois com uma subida abrupta pode ser exemplificado com as doenças infecciosas. Para um pequeno número de bactérias ou vírus, o nosso corpo reage e consegue lidar sozinho com o agente. No entanto há-de chegar um momento em que o número de agentes é muito elevado e portanto a pessoa adoece. Relativamente ao último gráfico, em que o gráfico descreve de modo aproximado uma parábola. Um exemplo possível é o álcool, pequenas quantidades de álcool podem prevenir determinadas doenças (doenças coronárias), mas tomado em excesso causa muitas outras doenças (a cirrose hepática) – apesar de ser um assunto delicado de abordar.

(Acetato 14) Os Mecanismos Patogénicos são vários, mas os principais são: imunológicos (cirrose hepática, penicilina), genéticos, radicalares, (bio)químicos, inflamatórios, físicos, nutricionais e hipóxicos/isquémicos.

(Acetato 16) Numa relação de causa-efeito tem de se:1. perceber que A precede sempre B, porque se A não precede B, então

aquele nunca pode ser causa de B.2. demonstrar que na ausência de A não há B.3. demonstrar que não há outro factor que causa A e B. (Nota: por vezes

demonstra-se ou considera-se de modo errado uma associação, ou seja

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que se A costuma aparecer associado a B, que A precede B então A é causa de B. No entanto isso pode estar errado uma vez que A pode estar associado a B por meio de um outro elemento C).

É importante salientar que não é fácil determinar as causas das doenças, sendo preciso ser bastante rigoroso na sua análise. Existe no entanto critérios de causalidade determinados por Bradford Hill. (Acetato 17)

Existem alguns conceitos avulso que vale a pena destacar nomeadamente os factores de risco, pois existem factores que predispõem a outros (ex.: obesidade e tabaco são factores de risco para a hipertensão arterial e a arteriosclerose) e os factores permissivos, que facilitam que aconteça as doenças (ex.: a relação entre o bacilo da tuberculose e a tuberculose são bastantes complexas, uma vez que nem todas as pessoas adoecem com tuberculose expostas ao seu bacilo assim como existem meios sociais em que é mais favorável a sua propagação).

Já foi referido o conceito de predisposição genética e de doença predisponente (“não sei onde, mas pronto!”), portanto não vai ser referido.

É normal dividir as doenças em dois grandes grupos: as doenças determinadas por factores genéticos, as doenças genéticas, e as doenças determinadas pela interacção do indivíduo com o meio, as doenças ambientais. Sabe-se actualmente que muitas das doenças são multifacturiais, ou seja são determinados quer pelos factores genéticos quer pelos factores ambientais. Um exemplo deste último factor é a aterosclerose.

(Acetato 23) Falemos agora sobre a Dualidade de efeitos dos mecanismos adaptativos, isto é, dos mecanismos do nosso organismo que têm quer um lado positivo quer um negativo. A coagulação é um mecanismo excepcional essencial à nossa vida, uma vez que nos permite coagular o sangue (hemostase) e estancar hemorragias que nos podiam levar a perdas abismais de sangue até à morte. No entanto, este mecanismo, que é adaptativo, é também a causa de umas das doenças mais frequentes no mundo ocidental, que são as doenças cardiovasculares, uma vez que o sangue pode coagular dentro dos próprios vasos e obstruir essas vias, dando origem por exemplo à obstrução vascular cerebral, trombose. Outro sistema dual é a resposta imunológica. Que este sistema actua a nosso favor todos nós sabemos, indispensável à vida, no entanto como já foi referido, o indivíduo que for alérgico à penicilina a resposta imunológica é activada e o sujeito pode mesmo morrer. De modo geral todas as doenças auto-imunes (doenças em que o sistema imunitário ataca o próprio indivíduo) são um exemplo disso. Relativamente à regeneração é também evidente o seu carácter essencial à vida. Uma vez mais, se a multiplicação das células que originam a regeneração dos tecidos for feita de modo descontrolado então pode levar a aparecimentos de cancros. Existem também no nosso organismo sistemas que permitem nos livrar das toxinas, quer as que entram, quer outras produzida por nós: são os sistemas desentoxicantes. No entanto as enzimas responsáveis pela metabolização dos produtos tóxicos são também responsáveis pela transformação de certas substâncias inofensivas que circulam no ar em substâncias altamente tóxicas ao nosso organismo (exemplo disso são muitos dos carcinógenos, o benzeno na sua forma natural é inofensivo, mas no tabaco ele é transformado e torna-se muito perigoso). A resposta inflamatória é outro caso de dualidade. Esta resposta tanto é essencial à reacção do nosso organismo aos agentes agressores, à defesa, à reparação das feridas cutâneas, como também é responsável por nos queixarmos dessas mesmas respostas que nos incomodam (febre, dor, incómodo). Há também respostas inflamatórias que são despropositadas, porque aparecem não se sabe porquê: são chamadas as doenças inflamatórias (ex.: artrite reumatóide – a inflamação destrói os tecidos das articulações sem motivo).

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(Acetato 24) As interferências iatrogénicas são as doenças causadas pela intervenção da equipa de saúde, (ex.: o médico pode esquecer-se de um bisturi e causar doença). O médico tem de conhecer os mecanismos homeoestáticos para poder controlar e não causar as referidas interferências. Relativamente aos outros pontos considerados no slide “são óbvios” a sua interpretação.

(Acetato 26) Existem assim algumas regras fundamentais de Patologia que é necessário saber:

A doença resulta muitas vezes da perversão dos mecanismos de sobrevivência, é a tal dualidade existente nos vários mecanismos referidos anteriormente.

As falências de adaptação tendem a agravar-se em ciclos viciosos, quer dizer que quando à falência de um mecanismo depois, em geral à uma cadeia de mecanismos que falham.

As respostas do organismo são às vezes excessivas, exemplo disso são as inflamações. Muitas vezes somos obrigados a consumir anti-inflamatórios para inibir parcialmente as inflamações uma vez que elas são em geral excessivas.

Finalmente nos “duelos” patogénicos (ex.: homem vs bactéria) tendem a terminar num empate, porque assim como os mecanismos da sobrevivência do mais forte se aplicam ao homem também se aplicam ao agente que o ataca.

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Engenharia Biomédica – 3º ano, 1º semestreMecanismos Gerais da Doença (2006/2007)

Professora Cecília Monteiro

Aula desgravada por Luís Rosado e José Carlos Cardoso

Aterosclerose é a doença inflamatória crônica na qual ocorre a formação de ateromas dentro dos vasos sanguíneos.

Ateromas são placas, compostas especialmente de lipídos e tecido fibroso, que se formam na parede dos vasos. Levam progressivamente a diminuição do diâmetro do vaso, podendo chegar a obstrução total do mesmo.

A aterosclerose em geral é fatal quando afecta as artérias do coração ou do cérebro, órgãos que resistem apenas poucos minutos sem oxigénio.A formação do ateroma é complexa. Lipoproteínas de baixa densidade (LDL)penetram na parede do vaso, atravessando o endotélio, chegando à camada íntima da parede. Neste local são fagocitados A aterosclerose agride essencialmente a camada íntima da artéria.A lesão (AE) típica das formas avançadas da doença é a placa fibrosa- formação esbranquiçada que protunde na luz do vaso.

Ela é coberta por uma capa fibrosa que consiste em várias camadas de células achatadas embebidas numa matriz extracelular de tecido conjuntivo denso, ao lado de lamínulas de material amorfo, proteoglicanos, fibras colágenas e células musculares lisas.No interior da placa, abaixo da capa fibrosa, há um acúmulo das células espumosas, íntegras ou rotas, e de tecido conjuntivo.As células espumosas são derivadas dos macrófagos (macrócitos e linfócitos sanguíneos, e células musculares lisas da parede arterial) que contêm gotículas de gordura, principalmente sob a forma de colesterol livre e esterificado. Este colesterol é derivado do sangue e não produzido no local.No centro da placa fibrosa há uma área de tecido necrótico, debris, cristais de colesterol extracelular, e de cálcio.

Com evolução do processo ateromatoso ocorrem diversos eventos:

1) vindos da adventícia nascem vasos que fazem intensa vascularização da média e da íntima;2) aumenta a deposição de cálcio e de células necróticas;3) surgem ruturas, fissuras e hemorragias da placa;4) a placa pode ulcerar e/ou se desprender;5) a exposição da subíntima ulcerada gera a deposição de plaquetas, coagulação sanguínea, trombose e eventual oclusão do vaso, etc.

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Aula 2 – 29 de Setembro de 2006

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Nas sociedades ocidentais é uma doença quase universal. Mesmo universal, a doença pode ter sua velocidade acelerada ou diminuida, conforme a interação entre os vários fatores de risco cardiovascular e a predisposição genética da pessoa.

Arteriosclerose é o processo de endurecimento das artérias, entre outras possibilidades por aterosclerose, mas as palavras não são sinônimos.

Uma das possíveis consequências para esta doença é o enfarte do coração ou enfarte cerebral, mais conhecido por acidente vascular cerebral (AVC), ou Acidente vascular encefálico (AVE), vulgarmente chamado de "derrame cerebral", é uma doença de início súbito, caracterizada pela falta de irrigação sanguínea num determinado território cerebral, causando morte de tecido cerebral. Um enfarte é definido como uma lesão isquémica irreversível, isto é, devida à falta de oxigénio e nutrientes (vinculado geralmente a um defeito de perfusão sanguínea). Esta situação vai levar a à morte celular (Necrose), a qual vai despertar uma reacção de Inflamação no local. O enfarte pode ser arterial (isquémico) ou hemorrágico.

O sistema imunitário existe apenas com uma função que é defender-se de invasores internos, como bactérias, vírus ou parasitas. Existem dois tipos de mecanismos de defesa: os inatos ou não específicos, como a proteção da pele, a acidez gástrica, as células fagocitárias ou a segregação de lágrimas; e o sistema imunitário adaptativo, como a ação direccionada dos linfócitos e a sua produção de anticorpos específicos.

Quanto a doenças metabólicas, algum exemplo? “Alguem responde” : Diabetes. Este tipo de doenças surgem devido á ocorrência de defeitos numa via metabólica, ou então sao doenças adquiridas. O tipo mais conhecido da diabetes é uma doença metabólica adquirida, nao é genética mas tem factores de susceptibilidade genética...vocês já falaram de factores de susceptibilidade genética na 1ªAula ? Compreendem esse conceito? Ou seja, existem um conjunto de individuos que têm um património genético que lhes confere uma maior propensão para ter a diabetes, é por isso que a diabetes mostra um factor “familiar” nesta doença, se o pai tem diabetes, existe uma probabilidade de o filho também ter diabetes, mas não é condição suficiente...existe um factor desconhecido, provavelmente de origem ambiental que provoca a doença.

As doenças degenerativas são doenças em que se vai verificando uma perda da função nervosa. As doenças degenerativas do sistema nervoso central são caracterizadas por morte neuronal de evolução gradual, mas progressiva e irreversível. Na grande maioria dos casos os factores desencadeantes são ainda desconhecidos.

Finalmente, as doenças heterogénicas, alguém sabe o que é que é? “resposta imperceptível”- exactamente, são doenças provocadas pela acção médica, o exemplo mais comum será por exemplo um efeito secundário de um fármaco. A heterogenia nao resulta só de actos terapêuticos, pode resultar de actos de diagnóstico. Por exemplo uma endoscopia pode dar problemas. Outro exemplo - uma TAC : tomografia axial computorizada, ou seja, um raio-x complexo, implica uma dose enorme de radiação e por isso pensa-se 2 vezes antes de aplicar este meio.

A epidemiologia é um dos capítulos do estudo da doença, é uma ciência que estuda quantativamente a distribuição dos fenómenos de saúde/doença, e seus factores condicionantes, nas populações humanas. Apoia-se sobretudo na estatística. Isto aplica-

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se de duas maneiras: uma é saber a probabilidade de uma doença ou seja, a probabilidade de uma mulher de 50 ano ter cancro da mama é maior do que a probabilidade de um homem de 50 anos ter a mesma doença, e isso ajuda a chegar ao diagnóstico. A distribuição em termos etários também é muito importante, uma vez que existem doenças que são muito mais frequentes em determinada idade. A distribuição geográfica também é importante, ajuda nos também a tomar acções terapêuticas pois, por exemplo, se viajarmos para um pais onde haja malária, somos aconselhados a tomar fármacos para prevenir o contágio dessa doença. A malária é uma doença que existe apenas em paises com temperaturas mais elevadas, já existiu em Portugal mas foi erradicada

Ok, falámos então da parte mais clínica, o que o médico faz é tentar chegar um diagnóstico, perguntar os sintomas, observar o doente anotando os sinais e com base nesta informação elaborar um diagnóstico provável. Muitas vezes apenas se consegue ter uma lista de possiveis doenças não se sabendo qual delas é a responsável por aquele diagnóstico. Quando isto acontece tem de se recorrer a exames complementares.

Também nos é útil saber a fase da doença em que se está, e algumas doenças tem uma evolução no tempo mais ou menos conhecida. Por exemplo, uma gripe é uma doença que tem um tempo relativamente curto. Pelo contrário, a tuberculose arrasta-se muito no tempo; existem alguma doenças que se manifestam em surtos ou seja, há alturas em que existem muitos sintomas destas doenças e outras em que não existe praticamente nenhum. As maioria das doenças inflamatórias são deste tipo. Quando conhecemos bem a evolução da doença temos presente mais um item que pode ajudar a ter um melhor diagnóstico e um melhor e mais preciso tratamento. Geralmente isto só se aplica a doenças infecciosas. Os médicos intervêm na fase clínica da doença, quando o doente os procuram, a acção é terapêutica. Na fase ante-clínica, só podemos fazer prevenção se não existir doença, no momento em que a doença já existe podemos fazer o rastreio, onde nos socorremos de exames complementares de diagnóstico. Um exemplo são os testes de rastreio para o VIH. A vantagem do rastreio é sobretudo conseguir-se apanhar a doença na fase inicial e deste modo poder usar uma terapêutica que será muito mais eficaz. Finalmente, na ( fase de cronicidade ou recuperação ? ) a reabilitação é obviamente a parte importante, porque trata-se de tentar restituir o mais possivel á pessoa as capacidades/funções entretanto perdidas. Por exemplo, para uma pessoa que tenha sofrido um AVC e que tenha deixado de mexer o braço, é fundamental que recupere a força muscular bem como reaprenda os movimentos do braço, para que tenha uma vida o mais normal possível. Mortalidade e Morbilidade sao dois critérios estatisticos que ajudam a definir doença. A mortalidade é o número de mortes causada pela doença. A morbilidade é doença associada ao doente, ou seja as consequências de determinada doença. Por exemplo, o número de enfartes associados a uma ateroesclerose. Estes 2 conceitos servem para avaliar a capacidade médica de resolver os problemas ou seja, se temos um tratamento que dimua muito a mortalidade é um tratamento muito eficaz, se temos um que não diminui a mortalidade não valerá a pena apostar nele. Para testarmos a eficácia de um tratamento que se habitualmente se faz é pegar em 2 grupos, a um damos o tratamento e a outro não, esperamos algum tempo e observamos os resultados. Se no grupo ao qual se aplicou o tratamento a mortalidade foi mais reduzida que no outro grupo entao o tratamento é eficaz e poderá ser utilizado.

Entao, o médico para se inteirar da situação, em primeiro lugar pergunta ao doente do que é que este se queixa, alguma dor ou qualquer outro sintoma, para tentar perceber

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algumas características que podemos usar para estabelecer um diagnóstico. Por exemplo, a dor da isquémia do miocárdio é muito característica: é uma dor que se situa na região precordial, ou seja, a zona onde se projecta anteriormente o coração, e é uma dor opressiva, os doentes sentem um peso nesta zona, doendo também o braço esquerdo. Por isso se chegar um doente e manifestar estes sintomas, quase de certeza que será um enfarte ou pelo menos uma isquémia. É muito importante definir a causa (através dos sintomas) e também o estado de (imperceptivel) do doente ou seja, se uma doença qualquer pode ter apresentações diferentes no doente conforme os seus antecedentes fisiológicos e fisiopatológicos. As doenças que atingem uma mulher grávida são diferentes das que atingem uma não grávida etc.. Portanto, nos temos de conhecer muito bem o estado prévio á doença e para isso teremos de fazer algumas perguntas, por exemplo se já teve filhos, se já teve outras doenças etc... por exemplo há uma linfoma que se trata muito bem com um fármaco e radioterapia, mas se a pessoa tiver de 10 a 20 anos tem um risco maior de vir a ter leucemia ou outro tipo de doenças, consequencias do tratamento utilizado. A radiação ionizante tem consequências nas células. Quando nós usamos a radioterapia, nós usamos essa radiação ionizante para ter consequências nas células malignas, mas infelizmente a radiação afecta todas as células e poderá significar, por exemplo, a formação de um novo cancro. Obviamente a exposição ao tabaco é um factor de risco para determinadas doenças...aquela sigla (penso que se está a referir á AINE’s – slide 16 ) sabem o que são ? são anti inflamatórios nao esteródes, fármacos muito eficazes no tratamento de algumas doenºas do dia a a dia...por exemplo, o vírus da gripe não nos causa muito incómodo, todo aquele mal estar que sentimos resulta da resposta inflamatória do nosso corpo ao vírus..por isso nao há nenhum medicamento especifico para o vírus da gripe, o que nós temos é fármacos para diminuir o estado inflamatório, o que conduz a uma melhoria do bem estar do doente..simplesmente as mesmas vias metabólicas que permitem a inflamação tem outras opções, nomeadamante proteger o epitélio que reveste o estômago do ácido gástrico que está lá dentro, e o que acontece quando tomamos estes medicamentos permitimos que se abram feridas na parede do estomago e depois ainda por cima estes anti-inflamatórios tem efeito nas plaquetas ou seja, impedem que estas efectuem a coagulação sanguínea.

Temos aqui esta representação gráfica, um genograma, vocês terão a próxima aula sobre genética. Procurar saber se há alguma transmissão genética de alguma doença pode ser importante. O que o médico faz a seguir é fazer perguntas detalhadas sobre o funcionamento dos outros orgãos dos sistemas que a pessoa não se queixa, porque por vezes a pessoa pode não valorizar e serem factores importantes na descoberta do diagnóstico. Eu vou agora explicar alguns conceitos (sinais), úteis para se entender o que se passa com o doente: alterações de peso e febre vocês sabem o que é, anorexia alguem sabe ? (imperceptível) – Então é assim, anorexia enquanto sintoma traduz-se apenas por falta de apetite..a anorexia nervosa é uma doença em que há uma recusa da pessoa em alimentar-se...é uma doença psiquiátrica. Precordialgia já vos falei há pouco, dor precordio, é uma característica de causa cardíaca; dispneia é a dificuldade em respirar, a causa pode ser cardíaca e geralmente tem estas características: quando nós corremos para apanhar o autocarro ficamos com falta de ar, o que significa que nós ultrapassámos a nossa capacidade cárdio-vascular e pulmonar – se é normal ficarmos com falta de ar quando corremos para o autocarro, o mesmo já não se pode dizer se for quando subimos uma escada ou quando dá um passo, significa que a função cardíaca ou pulmonar está muito diminuída; a ortopneia é uma forma particular de falta de ar – acontece quando a pessoa está deitada; a dispneia paroxística nocturna é uma forma de

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falta de ar que surge algum tempo após o adormecer, com a pessoa acordando bruscamente com forte sensação de sufoco; síncope significa perda de consciência – porque é que uma patologia cardíaca pode provocar um desmaio? Qual é a função do sistema cárdio-vascular? É levar sangue com oxigénio e nutrientes aos vários tecidos...se parar, os tecidos não têm o suporte energético para funcionar. É uma técnica do sistema nervoso central, que é um dos orgãos mais exigentes em termos metabólicos e portanto energéticos, dando “o sinal” se o débito sanguíneo não for o suficiente. Pode ser uma manifestação de insuficiência cardíaca; edema é um aumento de líquido no espaço intersticial ou nas cavidades. Basicamente se a “bomba” o líquido não circula e portanto transvasa a parede do endotélio, indo para os intersticios, ficando estes inchados.

No sistema respiratório, temos a Hemoptise; é a expectoração sanguínea ou através da tosse. É comum a várias doenças cardíacas e pulmonares; a pieira que consiste na na obstrução do fluxo aéreo , respiração sibilante na auscultação durante respiração normal ou. forçada; dor pleurítica , dor aguda provocada pela irritação do revestimento dos pulmões – torna- se mais intensa com a respiração profunda e com a tosse.

Aqui, temos a Disfagia – dificuldade em engolir, sensação consciente da passagem dos alimentos através do esófago. Pode estar associado a doenças motoras, inflamatórias ou tumorais deste órgão. A disfagia é definida como uma dificuldade em deglutir ou uma sensação de comida "presa" na garganta ou no esófago. As causas incluem a obstrução mecânica e os distúrbios na motilidade dos músculos da cavidade oral, da faringe ou esófago; regurgitação é o fluxo involuntário de conteúdo estomacal dentro do esófago e da boca. É um processo expontâneo, ao contrário do vómito, que é um complexo reflexo; pirose - A azia é observada devido à acidez do estômago que reflui para dentro do esófago. Isto ocorre sempre quando a junção do esófago como estômago não funciona adequadamente; a sialorreia é o aumento da salivação que serve para 2 coisas: uma para vencer um obstáculo (obstrução) ou para neutralizar algum ph vindo do estômago; Azia, também conhecida como refluxo gastroesofágico, ou simplesmente refluxo, é a sensação de queimação causada pelo retorno do suco gástrico para o esófago; dispepsia é um conjunto de sinais e sintomas que resultam de doenças como, úlceras gástricas, e portanto os sintomas podem ser vários: pirose, azia a dor na zona do estômago, e isto tudo nós incluimos num grande “bolo” que é a dispepsia; hematemese, que é o vómito de conteúdo hemático (hemorragia digestiva alta); melenas: hemorragias do tubo digestivo, sendo que o sangue sai pelo ânus com as fezes. O sangue vem acastanhado porque foi sujeito aos sucos digestivo - foi digerido; rectorragia - emissão de sangue vermelho pelo ânus, não misturado com as fezes, habitualmento no acto da defecação; acolia é a perda de pigmento nas fezes – o que dá a cor ás fezes é bilirrubina, que é um pigmento que nós eliminamos com a bílis, se a bílis não chega ao intestino as fezez são mais claras; esta bilirrubina acaba por ser eliminada pela urina torna a urina mais escura, e isso chama-se de colúria; esteatorreia - é a formação de fezes volumosas, acinzentadas ou claras, que geralmente são mal cheirosas, flutuam na água e têm aparência oleosa, ou são acompanhadas de gordura que flutua no vaso sanitário. Ocorre por aumento na quantidade de gordura nas fezes, geralmente definida acima de 6 mas por dia, causada por má absorção de diferentes etiologias; disúria – dificuldade em urinar, sensação de ardor a urinar; polaquiúria é quando uma pessoa urina muitas vezes, em pequena quantidade – pode significar uma doença urinária ou de um problema na próstata; noctúria – urinar mais durante a noite que durante o dia; hematúria – sangue na urina; incontinência urinária é a incapacidade de controlar a emissão de urina;

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Agora a professora está a analisar alguns slides com imagens

Basicamente o que esta pessoa têm é ictericia, que é a deposição de bilirrubina na pele e escleróticas, devido a aumento de produção de bilirrubinas (como nas hemólises), falha de metabolização ou falhas de excreção (obstrução mecânica das vias biliares). A produção excessiva de bílis está relacionada com a destruição de glóbulos vermelhos que são usados pelo fígado para este fim. Na segunda parte da aula, vocês vao ter de fazer um exercicio onde se identificam as causas do aumento da bilirrubina no sangue.

A artrite reumatóide é uma inflamação das articulações, que provoca a alteração das estruturas ósseas e das cartilagens. O ponto de partida da doença é a inflamação da membrana sinovial, uma estrutura que reveste a parede interna da cápsula fibrosa que envolve a articulação e cuja função é produzir o líquido sinovial, que nutre a cartilagem e lubrifica a sua superfície, permitindo o movimento normal da articulação. Quando, porém, a membrana inflama, torna-se mais espessa, aumenta de volume e deixa de produzir o líquido sinovial normal, para produzir um líquido inflamatório que destrói progressivamente as cartilagens que revestem as articulações, prejudicando a sua função, limitando os movimentos articulares e causando dor, causando deformação e destruição das articulações.

Cianose - É uma coloração azulada da pele ou das mucosas. Significa que naquele local, a pessoa tem mais quantidade de hemoglobina desoxigenada. Nma pessoa anémica é mais complicado acontecer uma cianose. A cianose está associada a problemas nas trocas gasosas a nivel pulmonar, o que indicia problemas de ordem ou respiratória ou cardíaca

Bócio – Corresponde a um conjunto de doenças da glândula tiróide que se caracterizam por um aumento perceptível no tamanho desta glândula. Como a tireóide se localiza na parte anterior e inferior do pescoço, é nesta região que as pessoas irão observar este aumento, que pode envolver toda a tireóide (aumento difuso, bócio difuso) ou provocar a formação de um ou mais nódulos (caroços). O aumento da tiróide pode se acompanhar de excesso (hipertireoidismo) ou redução de seu funcionamento (hipotireoidismo). Estas alterações podem ser decorrentes de doenças hereditárias (herdadas da família), auto-imunes, carência de iodo, ou tumores benignos e malignos. Predominam em mulheres dos 20 aos 40 anos e, em geral, necessitam de investigação diagnóstica e tratamento adequados.

Edema – já referido em cima

(Outro slide) – isto é um gesto que nos permite perceber se o sangue que passa naqueles vasos é (fetal?), pela sensação táctil da pulsação, dá para perceber também a que frequência o coração está a bater, e se nós não conseguirmos palpar o pulso é porque o sangue não passa ali e portanto significa isquémia e necrose desses tecidos.

Os edemas nas cavidades tem nomes diferentes conforme os sítios – quando a água se acumula na cavidade peritoneal, o edema tem o nome de ascite, quando o edema é na cavidade pleural toma o nome de derrame pleural, que ainda pode ter outros nomes consoante a causa e a origem.

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Os exames complementares podem ser divididos em 2 grupos principais: invasivos e não-invasivos.

Alguns exemplos de exames complementares de diagnóstico

- análises laboratoriais são um processo utilizado para estudar a função dos orgãos; por exemplo, a análise á urina, através das quantidades excretadas de certas substâncias.

- exames microbiológicos, para detectar a presença de microorganismos

- exames para medir a actividade eléctrica de alguns orgãos do nosso corpo

- podemos também administrar substâncias radioactivas que tem uma ligação preferencial a determinados elementos. Por exemplo nesta imagem, administrou-se uma substância com afinidade para metástases ósseas e verificou-se que este indivíduo tem metástases na calote craniana, na pelvis, na coluna.

- Endoscopia - é o exame das estruturas internas utilizando um tubo de observação de fibra óptica (endoscópio).Quando se introduz um endoscópio através da boca, este permite examinar o esófago (esofagoscopia), o estômago (gastroscopia) e o intestino delgado (endoscopia gastrointestinal alta). Quando se passa através do ânus, ele permite examinar o recto e a porção inferior do intestino grosso (sigmoidoscopia) ou a totalidade do intestino grosso (colonoscopia).O diâmetro dos endoscópios varia entre 0,5 cm e 1,30 cm e o seu comprimento entre 30 cm e 1,5 m. Os sistemas de vídeo de fibra óptica permitem que o endoscópio seja flexível e que se tenha ao mesmo tempo uma fonte de luz e um sistema de visualização. Muitos endoscópios estão também equipados com pequenos instrumentos que permitem recolher amostras de tecido e com uma sonda eléctrica para destruir tecidos anormais.Com um endoscópio pode-se obter uma boa visão do interior do aparelho digestivo. Podem-se ver áreas de irritação, úlceras, inflamação e tumores. Normalmente, podem-se obter amostras para exames. Os endoscópios também podem ser úteis para fazer diversos tratamentos. O médico pode fazer passar diferentes tipos de instrumentos através dum pequeno canal que o próprio endoscópio possui. A cauterização eléctrica pode fechar um vaso sanguíneo e deter uma hemorragia. Outros podem extrair pequenas massas. Com uma agulha podem ser injectados medicamentos dentro das varizes esofágicas e deter assim a sua hemorragia.

Ecografia - é um método diagnóstico que aproveita o eco produzido pelo som para ver em tempo real as sombras produzidas pelas estruturas e órgãos do organismo. Os aparelhos de ultra-som em geral utilizam uma freqüência próxima de 1 MHz, emitindo através de uma fonte de cristal piezoelétrico que fica em contato com a pele e recebendo os ecos gerados, que são interpretados através da computação gráfica. Conforme a densidade e composição das estruturas a atenuação e mudança de fase dos sinais emitidos varia, sendo possível a tradução em uma escala de cinza, que formará a imagem dos órgãos internos. A ecografia permite também, através do efeito doppler, se conhecer o sentido e a velocidade de fluxos sanguíneos. Por não utilizar radiação ionizante e por ser não-invasivo, como na radiografia e na tomrografia computadorizada, é um método inócuo, barato e ideal para avaliar gestantes e mulheres em idade procriativa.

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(Outro slide) – para aproveitarmos melhor a radiografia podemos administrar um fármaco rádio-opaco para melhorar a qualidade da imagem. Esta técnica tem o nome de angiografia. Aqui neste slide (45) permite-nos ver uma obstrução na carótida, provavelmente devido a ateroesclerose

TAC – já falámos

A RMN não utiliza radiação ionizante mas sim um campo electromagnético, para alinhar os protões das moléculas de água segundo esse campo e depois intersectam os protões com ondas de (radiofrequência?) e depois quando os protões estão excitados emitem um sinal que é captado pela máquina, e depois a identidade do sinal é diferente consoante a quantidade de água do tecido, e portanto cada tecido vai ter uma imagem (de alta definição) diferente. A vantagem desta técnica é que nao usa radiação ionizante, mas é um exame muito caro e não tem todas as funcionalidades que têm, por exemplo, a Tomografia.

O exame anátomo-patológico – é uma maneira de nós também complementarmos a informação que temos, tirando um pedacinho de (imperceptível). Aqui em baixo o que nós temos é um coração que está cortado ao meio e visto de baixo, aquilo é o ventrículo, aquilo é tudo a massa muscular do ventrículo. Nota-se que este individuo teve um enfarte e a zona a preto é uma zona de necrose, ou seja, de morte celular.

Segunda parte – aula “prática” sobre icterícia

P: O glóbulo vermelho é uma célula com uma membrana polar, um citoplasma com hemoglobina, já sem núcleo, já sem maquinaria para produzir proteínas e só com as proteínas que vêm de origem. Estas proteínas são meia dúzia de enzimas para produzir energia para as bombas iónicas da membrana funcionarem, para ela conseguir manter o equilíbrio iónico com o meio em que está, porque a partir do momento em que não conseguir manter o sódio dentro da célula o que acontecia é que célula inchava até rebentar. A função essencial para a qual também existem algumas enzimas é produzir potencial redutor, porque o problema do glóbulo vermelho é que está sempre a fazer ligações com o oxigénio, logo há reacções em que há oxidação de determinadas estruturas essenciais, nomeadamente proteínas do citoesqueleto que tem de ser recuperadas com o potencial redutor que é produzido. Portanto temos uma membrana, um citoplasma com hemoglina, a via glicolítica a produzir o mínimo de energia essencial e uma via para produzir potencial redutor.

O que os GV tem diferentes das outras células do organismos é que não têm núcleo, não têm DNA e portanto não conseguem produzir proteínas novas. Como não consegue produzir novas proteínas, quando aquelas deixarem de ser úteis, o glóbulo vermelho morre. Isso acontece ao fim e 120 dias, nessa altura o organismo tem um filtro muito eficaz que é maioritariamente o baço, mas também outros macrófagos noutros sítios, onde as células que já não são capazes de formar gradiente iónico ficam retidas, são fagocitadas e digeridas. O nosso organismo é muito eficiente e portanto aquilo é

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tudo digerido até aos seus componentes essenciais e é tudo recuperado, excepto o anel de porfirina que faz parte do hemo, o qual é um pigmento que não só é inútil como tóxico, e portanto tem de ser eliminado. Dentro do próprio magrófago é metabolizado a bilirrubina, que vai pelo o sangue até ao fígado, que é captado pelos hepatócitos, aí é metabolizada em conjugação com uma molécula derivada da glicose, para formar uma molécula mais hidrossoluvel permitindo assim ser excretada pelas vias biliares até ao intestino, e assim ser eliminada.

Já vimos que a anemia significa uma quantidade insuficiente de hemoglobina, ou GV ou de ambas as coisas em circulação, e portanto uma incapacidade de fornecer oxigénio aos tecidos. Quais podem ser as causas?

A: Por um lado pode ser uma deficiência na medula óssea, já que é aí que GV são produzidos, e uma deficiência pode conduzir à diminuição do número de GV e levar a uma anemia.

P: E o que é que pode causar essa deficiência?

A: Um tumor.

P: Um tumor. O que acontece é que há algumas neoplasias que invadem a medula óssea com células estranhas e praticamente ocupam o lugar das células produtoras de sangue, as quais não vão ser capaz de produzir sangue. Isso ocorre com tumores sólidos. Mais?

A: …

P: Ok. Por um lado pode haver um defeito de produção, por outro lado a destruição pode estar aumentada em relação ao normal. A destruição normal é ao fim de 120 dias e o ritmo de produção da medula óssea é exactamente o mesmo para compensar essa destruição. Se a destruição for acelerada…

A: Vai haver mais bilirrubina.

P: É exactamente aqui que as coisas se interligam. E porque é que pode haver destruição acelerada?

A: …

P: Teoricamente isso é possível, mas isso prende-se mais com o facto de o GV ter uma capacidade de se renovar. O que acontece é que há pessoas que tem doenças genéticas e que não são capazes de produzir energia ou potencial redutor. O que acontece é que o GV vai envelhecer mais rapidamente precisamente por não ter essa capacidade de se regenerar que é conferida pela energia fornecida por estes sistemas. Estas são anemia de causa genética e dizem-se anemias hemolíticas, o que acontece é que se o GV não é regenerado, envelhece mais rapidamente e é degradado mais cedo. De facto hemo, destruição das hemácias. Nas anemias hemolíticas, como há uma destruição aumentada de GV, produzem mais bilirrubina portanto é uma das características e uma das causas da icterícia.

Outras causas da destruição? Ah queria falar em fármacos. O que acontece é que há alguns fármacos que aceleram a oxidação dos GV e se isso acontecer numa pessoa

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que tenha um desses defeitos nas vias hemáticas é que há riscos de danos graves. Isso acontece por exemplo com alguns anit-maláricos que tem esse efeito de oxidação. É precisamente em zonas de malária que existem mais pessoas com estes defeitos genéticos, e não é tão raro quanto isso administrar um destes fármacos e dar origem a uma crise hemolítica. Que outras razões existem para os GV serem destruídos mais depressa?

A: Parasitas que se desenvolvem dentro do eritrócio.

P: O exemplo mais comum são os parasitas da malária que tem fases do ciclo de desenvolvimento dentro do GV, que por sua vez vão rebentar o GV para infectar outras células. Por outro lado o nosso sistema imunitário ao tentar destruir o parasita, pode destruir também o GV. Mais?

A: Deficiências no funcionamento no baço. Já que o baço é um dos maiores órgãos hemolíticos, se tiver a fazer hemólise em excesso pode diminuir significativamente o número de GV.

P: Esse aumento da função do baço chama-se hiperesplenismo e o aumento do tamanho do baço chama-se esplenomegalia. Por exemplo em doentes com cirrose, esses doentes tem um aumento no baço e isso pode ser uma causa de anemia. Mais causas?

A: Problemas nos rins.

P: A função dos GV e da hemoglobina é conseguir transportar oxigénio até aos tecidos. A maneira que o organismo tem de regular a quantidade de hemoglobina que precisa é um detector da hipoxia que existe no rim. O rim tem um sensor que detecta a quantidade de oxigénio que nos chega, e se essa quantidade for insuficiente, na resposta é produzida eritropoietina que é um factor de crescimento que faz com que as células produtoras de GV da medula aumentem o seu ritmo de produção, para assim aumentar a quantidade de hemoglobina e a capacidade de transporte de oxigénio. Se o rim deixar de produzir eritropoietina, a medula deixa de produzir GV não por uma causa estritamente da medula, mas sim por ausência de uma hormona que induz a sua produção. Nos atletas que utilizam eritropoietina para fazer doping, a medula deles vai produzir mais GV, portanto em situações de esforço tem maior capacidade de fazer chegar aos tecidos uma maior quantidade de oxigénio. A maneira legal de fazer doping é treinar a alta altitude. O que acontece é que em altitude o ar é mais rarefeito e as concentrações de oxigénio são menores, o que acontece é que chega menos oxigénio aos rins e o rim percebe que está em situação de hipoxia, o que leva à produção de mais eritropoietina. Claro que quando as pessoas deixem à altitude normal rapidamente o organismo volta à situação normal. Mais causas de destruição?

A: Uma hemorragia interna.

P: Hemorragia interna ou externa. Uma fractura numa perna por exemplo. Se for controlada deixa de sangrar, e a nossa medula desde que tenha material suficiente, vai produzir novos GV para repor aqueles que foram perdidos. Isto é verdade para hemorragias para fora, não se esqueçam que uma hemorragia para dentro do tubo digestivo é também uma hemorragia para fora porque o interior do tubo digestivo é exterior ao nosso organismo. E se a hemorragia for por exemplo uma pancada e um

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hematoma muscular? È uma hemorragia para dentro. Qual a principal diferença entre uma hemorragia para fora e uma hemorragia para dentro? … Exactamente da mesma maneira que os GV são eliminados pelos macrófagos, esses mesmos macrófagos vão reabsorver aqueles GV. Portanto é outra forma de hemólise só que não lhe damos esse nome.

A: Por isso é que as nódoas negras depois ficam amareladas?

P: A evolução das nódoas negras tem a ver com a evolução do pigmento. Primeiro ficam azuladas, a seguir ficam verdes e depois amarelas. Isto deve-se à transformação em biliverdina e depois em bilirrubina.

Vamos voltar um bocadinho atrás. A medula óssea para produzir precisa de substrato e há substâncias que são essenciais para produzir glóbulos vermelhos. Sabem quais são? Ferro, vitamina B-12 e ácido fólico. O ferro é um metal que, apesar de muito abundante na terra, nós não temos grande facilidade em absorver. Agora há uma pequena subtileza nisto. O ferro é necessário para produzir o quê?

A: O grupo heme.

P: O heme, a molécula de hemoglobina. Se o organismo estiver com falta de ferro, há produção de GV com menor quantidade de hemoglobina. Estas são anemias microcíticas porque os GV são mais pequenos (porque têm menos hemoglobina no citoplasma) e são mais pálidos do que habitual.

Se o ácido fólico e a vitamina B-12 estiverem em falta, a produção de citoplasma e hemoglobina dá-se ao ritmo normal, mas a maturação dos glóbulos demora mais tempo. O que acontece é que vai haver mais tempo para se formar mais hemoblogina entre cada divisão celular e portanto vão-se formar células maiores. Este tipo de anemia é chamada anemia macrocítica (células grandes).

Agora o que eu vos queria falar era o seguinte. Quando nós temos uma hemorragia para fora ou uma hemorragia para dentro qual é a principal diferença? O que é que nós perdemos e que podemos reaproveitar? … Nós temos este esquema todo para aproveitar essencialmente o ferro porque é realmente precioso. Nós não conseguimos absorver facilmente o ferro do nosso meio ambiente, portanto temos que aproveitar todo o ferro que temos disponível. Se perdemos o ferro para fora ele está irremediavelmente perdido, temos de esperar que o nosso organismo absorva gradualmente mais ferro de forma a recuperar.

Portanto numa hemorragia para o interior, o GV destruído aumenta a produção de bilirrubina, e com o ferro reaproveitado a medula óssea pode produzir novos GV. Se a hemorragia for para o exterior, a medula óssea não tem material para repor, e assim uma hemorragia por perdas, uma hemorragia aguda ou uma hemorragia crónica pode levar ao aparecimento de anemias. Por outro lado pessoas que não ingerem alimentos ricos em ferro estão também sujeitas ao aparecimento de anemias, como é o caso de pessoas com dietas vegetarianas, o que dá origem a anemias microcíticas.

(A professora mostrou um esquema com uma fábrica relacionado com a produção de GV)

Para a fábrica funcionar precisamos dos materiais (os substratos), sobretudo a vitamina B-12, o ácido fólico e o ferro, e temos de ter uma fábrica em condições a

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funcionar, uma medula perfeita. A produção pode decrescer se houver carência de alguns substratos ou se houver problemas com a fábrica.

Quanto às causas de hemólise para as anemias hemolíticas, que são hereditárias na sua grande maioria, nós falámos de doenças das enzimas, mas também há doenças comuns que não são propriamente por falta de proteínas, mas a enzima que sintetiza a parte proteica da hemoglobina pode estar alterada por uma causa genética, e portanto a capacidade de produzir de forma correcta a hemoglobina está comprometida.

Por outro lado há doenças que produzem cadeias anormais de hemoglobina, como é o caso da drepanocitose. A hemoglobina tem umas propriedades tais que, em vez de estar em suspensão no citoplasma da célula, estica e deforma a célula. Como o glóbulo vermelho precisa do seu formato para passar pelos capilares, eles vão ter dificuldades em passar. Então, por um lado destruído mais depressa, por outro lado vai impedir a circulação nos capilares, o que pode causar isquémia nos órgãos. Assim as consequências da drepanocitose são as seguintes: por um lado dá origem a anemias hemolítica, e por outro a isquémia nesses órgãos.

Também há doenças hemolíticas que causam a destruição dos GV por causas adquiridas, nomeadamente por anticorpos. Vocês sabem o que é uma reacção transfusional? Quando nós damos sangue a um paciente com um grupo incompatível, há uma reacção hemolítica, ou seja, o nosso sistema imune cuja função é reconhecer o que nos é estranho, reconhece que aquelas células são diferentes do organismo e destrói-as. No caso dos GV, extraordinariamente nós já temos de raiz anticorpos para os restantes grupos, e portanto não precisamos sermos alguma vez transfundidos com sangue de alguma pessoa para destruirmos essas células sanguíneas.

Agora vamos para a parte da bilirrubina.

A bilirrubina é o produto do metabolismo do heme que nós temos forçosamente de eliminar. O mecanismo funciona da seguinte maneira: levamos até ao fígado, onde é transformada numa molécula mais estável e mais hidrossolúvel e portanto pode ser facilmente excretada. Então como é que se acumula bilirrubina no sangue? Já falámos há pouco das anemias hemolíticas, onde aumentava o ritmo de destruição dos GV e portanto a quantidade de bilirrubina que era produzida era tão grande que excedia a capacidade de replicação, e portanto acumulava-se. Já agora que tipo de bilirrubina seria esta? Conhecem 2 tipos de bilirrubina, não conhecem?

(Silêncio…)

Nós temos em circulação em quantidade ínfimas em condições normais 2 tipos de bilirrubina: a bilirrubina não conjugada e conjugada. A principal diferença entre uma e outra é que uma já foi metabolizada e a outra não. Que tipo de bilirrubina esperam encontrar em circulação numa anemia hemolítica? A não conjugada. Sempre que um doente tiver uma hiperbilirrubinémia não conjugada, a causa é sempre ou quase sempre hemólise. Qual pode ser a outra causa? Pode haver uma insuficiência no fígado. O mais importante provavelmente é a enzima que faz a conjugação, a qual pode estar alterada por várias razões, entre elas causas genéticas (efeito hereditário).

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Por outro lado existe uma proteína transportadora que exporta a bilirrubina conjugada para os canais, e este facto parece pouco importante mas não é, porque é uma reacção que precisa de mais energia que a própria conjugação. Por isso, se houver lesão no fígado, o tipo de bilirrubina que se acumula em maior quantidade é a conjugada. Numa hepatite banal predominantemente aumenta a conjugada, excepto se a destruição do fígado for tal que já não há hepatócitos suficientes para fazer a conjugação, os quais são casos terminais.

Se houver um excesso de colesterol, ou eventualmente dos próprios pigmentos de bilirrubina, em que situações é que pode haver excesso de bilirrubina conjugada? Há mais bilirrubina conjugada se houver mais hemólise. Nas anemias hemolíticas apesar da hemólise exceder a capacidade de conjugação, acumula-se bilirrubina não conjugada. Mas também há conjugação, só que não dá é vazão. Produz-se tanta bilirrubina, que o que pode acontecer a estas pessoas é que a bilirrubina precipita e forma cálculos, podendo obstruir as vias biliares.

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Engenharia Biomédica – 3º ano, 1º semestreMecanismos Gerais da Doença (2006/2007)

Professor Manuel Bicho

Aula desgravada por Gustavo Lopes

[?] denota a omissão de termos que não percebi ou incerteza na transcrição. Alguém: Posso pendurar?Prof: Eu depois não traduzo, hein? Pode ser? É da vossa responsabilidade – é como as teses, são da responsabilidade do autor.Bem, eu vou tentar andar rápido demais, porque isto é uma aula que dá para 1h30. As nossas aulas teóricas, em Medicina, da Genética, são de 1h30 e aqui damo-vos apenas uma parte que interessa para vocês fazerem a parte prática.Eu sou o Prof. Manuel Bicho, sou professor catedrático, regente da disciplina de Genética e coordenador da Genética clínica e da Genética médica que é uma disciplina do 3º ano, uma disciplina pré-clínica e aqui quem vai dar a maior parte da aula é a professora Ângela [?], que é investigadora no Ricardo Jorge, a minha professora auxiliar, [?], doutorada e a Dra. Ana Ferreira, que é minha colaboradora a 100% aqui na investigação e que é licenciada em Biotecnologia pela Universidade Nova de Lisboa. Elas não são médicas, o único médico aqui sou eu..., mas pronto, como já trabalham há muitos anos em Medicinas elas vão fazer uma introdução a este tipo de patologias.Isto são quadros baseados num livro de 1976 e, portanto, temos de dar o devido desconto – já lá vão 30 anos. A tendência é esta – de o conhecimento das doenças genéticas ser cada vez maior. Imaginem agora qual é a proporção de conhecimento que nós temos sobre as doenças genéticas [creio que se referia à incidência das doenças genéticas; é disso que trata o quadro].Isto são as entradas de crianças num hospital pediátrico. Em 1914, 83.5% dos casos devia-se a doenças não genética. Era uma altura em que as doenças infecciosas dominavam – as pessoas morriam com doenças infecciosas. Quando se descobriu a penicilina, antes da 2ª guerra mundial, a evolução da quimioterapia foi tal que hoje em dia – as vacinas também – conseguimos prevenir grande parte das doenças. Quer dizer que começaram a aparecer as doenças genéticas, que as doenças não genéticas estão cada vez mais debeladas.Em 1976, só 50% dos casos entrados nesse ano é que eram doenças não genéticas e as doenças genéticas começaram a crescer. Principalmente, as que cresceram mais num determinado período foram as doenças monogénicas, que geralmente designados de erros congénitos do metabolismo, que é o caso de [nomes de doenças que desconheço].Isto nos hospitais pediátricos. Porquê? Isto porque as doenças genéticas aparecem muito, muito cedo. Quanto mais cedo uma doença aparecer, mais probabilidades de que uma boa parte dos factores envolvidos sejam factores genéticos. Por isso é que a maior parte dos geneticistas clínicos (eu não sou geneticista clínico, mas no meu [?] uma

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Aula 3 – 4 Outubro de 2006Bases genéticas da patologia

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pessoa que é geneticista clínico, é a professora [?]) – 90% -- são pediatras. São aqueles que vêem mais doenças genéticas, porque se manifestam. Aqueles erros grandes, as doenças chamadas monogénicas, as doenças a que nós chamávamos doenças genéticas, doenças mendelianas, que têm transmissão segundo as leis de Mendel. Eu parto do princípio que vocês, no liceu, falaram das leis de Mendel -- [?].As doenças cromossómicas, cresceram muito depois de 1954, quando se descobriu a técnica para visualizar os cromossomas em mitose (que em mitose os cromossomas já são duplicados). Foi por volta de 1956, que as doenças cromossómicas passaram ser conhecidas. Até aí não eram conhecidas. Daí que até 1954, não fossem conhecidas as doenças cromosómicas. O síndrome de Dowm, a trissomia 21 só foi designado trissomia 21 depois – antes pensava-se que era uma doença devida a defeitos pré-natais. A maior parte de casos de trissomia 21 não são herdados. Há uma percentagem que o é, mas a maior parte são esporádicos. Isto não significa que não sejam genéticos – o facto de ser uma doença esporádica não significa que não tenha componente genética – já vamos ver porquê.Havia outras a que chamávamos doenças parcialmente genéticas – que já se sabia [terem componente genética?]. As leis de Mendel só foram redescobertas, no início do século em 1908 graças a dois investigadores alemães e um holandês, citologistas. Já se sabia que havia doenças que não tinham um padrão de transmissão muito característico, mas que se sabia serem herdadas – havia famílias em que essas doenças apareciam mais frequentemente. Entre elas, a esquizofrenia – doenças mentais – e a susceptibilidade à tuberculose – havia famílias de tuberculosos. Pensou-se então que haveria alguma coisa transmitida, mesmo não conhecendo as leis de Mendel, já eram descritas como doenças parcialmente genéticas.Hoje em dia, [completa incoerência] são as doenças multifactoriais – da criança e do adulto. Da criança, as mais frequentes são o [nome de doença], os defeitos do tubo neural – são a espinha bífida, a estenose do piloro (o piloro é um canal que faz a ligação entre o estômago e o intestino). Há uma série de doenças que são congénitas e que são multifactoriais – descobriu-se que factores genéticos estavam parcialmente envolvidos.Dentro das doenças genéticas, temos que considerar três grandes grupos – isto já é para saber – as doenças monogénicas (aquelas em que só um gene está envolvido), em que a mais paradigmática [] é a drepanocitose, a anemia de células falciformes. É uma doença em que nas cadeias beta de hemoglobina, que são codificadas no cromossoma 11, há uma substituição dum ácido glutâmico por uma valina. A valina, como é um aminoácido hidrofóbico, introduz ligações de Van der Waals, ligações hidrofóbicas em que condições de oxigenação parcial. Quando há baixa da pressão parcial de oxigénio, os globolos vermelhos desse individuo tendem a ficar com forma de foice, não passando nos capilares mais apertados e havendo tendência para haver hemólise intravascular, fundamentalmente ao nível do baço porque é aí que os capilares são mais estreitinhos, já que o baço é um órgão preparado para destruir os glóbulos vermelhos antigos. Os glóbulos vermelhos, como sabem, têm uma vida média de 120 dias, ao fim dos quais são destruídos pelo sistema [?]. Esta doença é uma doença monogénica, que é transmitida de uma forma autossómica recessiva. Há muitas outras; há milhares delas.Depois, as doenças cromossómicas, que são as de que já vos falei. São doenças raras (raridade em genética é tudo abaixo dos 10%, acima disso já é uma frequência bastante elevada). [supresso] A frequência do síndrome de Down é 1:600, o que, para doença genética, é uma frequência elevada. Por isso, como sabem, o diagnóstico pré-natal é baseado no diagnóstico desta doença. Essa e os defeitos do tubo neural, os quais são multifactoriais. Enquanto o diagnostico do síndrome de Down é o diagnostico de uma doença cromossómica – sabemos que há uma trissomia, uma triplicação do cromossoma

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21. No caso dos defeitos do tubo neural, não detectamos a doença geneticamente, fazemo-lo através de marcadores bioquímicos que se sabe estarem alterados nesta situação.Falando nas doenças mutifactoriais, estas são as que eram chamadas de doenças parcialmente genéticas. São doenças cuja frequência vai aumentando à medida que o indivíduo vai envelhecendo. Isto dvee-se ao factod e serem doenças que aparecem muito mais frequentemente na idade adulta. É o caso, por exemplo, da doença coronária, que dá origem aos enfartes do miocárdio. Temos os acidentes vasculares cerebrais, cuja causa é a mesma que a da doença coronária, e muitas outras – a esquizofrenia, a psicose maníaco-depressiva, a tendência para ter até apendicites agudas – há até aí uma base genética. A base genética é muito variável, porque nós não conseguimos prever, como prevemos em relação às doenças monogénicas, que são transmitidas segundo as leis de Mendel, qual é o risco de repetição. Por outro lado, nas doenças de Mendel, conseguimos dizer “A sua família tem ¼ de probabilidade de aparecer...” se tiver uma doença autossómica recessiva. Já vamos ver o que significa esse termo.Depois, temos as doenças somáticas. São doenças que não são genéticas, que não são herdadas. São doenças que aparecem por alteração do gene no próprio indivíduo. O caso mais paradigmático é o cancro. O cancro também pode ser hereditário e ter uma base hereditária. Mas muitas das alterações secundárias que se dão nas neoplasias somáticas – são do próprio indivíduo; não são germinativas. Nós dizemos que uma doença é transmissível quando as mutações se dão nos espermatozóides ou nos óvulos. Aquelas que se dão nas células somáticas (as outras células) não são transmissíveis às gerações seguintes, nós chamamos de doenças somáticas – o que não quer dizer que não seja genética [ter-se-á enganado no início do parágrafo?].Temos portanto, quatro tipos – doenças cromosómicas, doenças monogénicas, doenças multifactoriais e doenças somáticas. Ainda há um quinto tipo, que são as doenças mitocondriais – mas pronto, essas cabem aqui, nas doenças monogénicas. Já vamos ver porque não encaixam perfeitamente nas doenças monogénicas.Depois, nestas doenças monogénicas, existem as autossómicas dominantes, as autossómicas recessivas – quando são transmitidas pelos autossomas. A espécie humana – como sabem ou como não sabem – 25 cromossomas diferentes. Cada indivíduo tem 46 cromossomas – tem uma dose dupla de 22 cromossomas com mais XY no caso dos homens e XX no caso das mulheres. Temos 46 porque recebemos metade do pai e metade da mãe. Se recebemos o chamado número haplóide [?] – número haplóide é o número 23, que são os 22 cromossomas [incoerente] (autossomas, os autossomas são 22) e depois o 23º cromossoma nos homens é o Y e nas mulheres o X, o que faz a diferença.Depois, existe o 25º cromossoma da espécie humana, que é o cromossoma mitocondrial. É um cromossoma circular, semelhante ao cromossoma bacteriano, porque – como sabem ou não sabem – as mitocôndrias foram em tempos seres que colonizaram que células anaeróbias. Eram seres muito mais eficiente porque tinham uma cadeia de oxidação-redução na sua membrana, enquanto que as células anaeróbias não tinham. Hoje em dia sabe-se que anaeróbias, por exemplo o glóbulo vermelho, que não tem núcleo nem tem mitocôndrias, tem uma cadeia de oxidação-redução na membrana. Não é muito em eficiente em termos de formação de energia, mas funciona. Era, portanto, um ser que tinha uma cadeia de oxidação-redução muito mais eficiente e que colonizou outro. O cromossoma é semelhante ao cromossoma bacteriano e é transmitido pelas mães – só pelas mães – aos filhos. O óvulo é muito maior que o espermatozóide e este possui as mitocôndrias na cauda para fazerem andar o flagelo. Ora essas mitocôndrias

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são expelidas ou reabsorvidas, portanto só ficam os cromossomas do óvulo, da mãe. Isso põe aspectos muito interessantes. Imaginemos que fazemos um clone e os clones sabem como se fazem. Não sabem como se faz um clone? Um clone, portanto... como é que se fez a ovelha Dolly? Foi-se buscar uma célula somática, tirou-se-lhe o núcleo, tirou-se o núcleo ao óvulo da ovelha e mete-se o núcleo da célula somática que tem o conjunto inteiro de genes – ela própria [pouco claro]. Isso tem um problema porque o óvulo dador tem lá as mitocôndrias; os cromossomas mitocondriais são os mesmos. Portanto, aquela ovelha que foi a receptora também tem algum direito a chamar filho ao clone a que deu origem. Até havia aí uma telenovela, que foi O Clone, que se baseava o pouco nisso, porque aconselhavam a pessoa a dizer “Não, não, ele também é seu filho porque você deu o genoma mitocondrial”. O genoma nuclear era dele, mas o mitocondrial era dela. Isso põe outros problemas de viabilidade. Como sabem, a Dolly já foi à vida, já morreu. Já estava envelhecida, porque o DNA sofre mutações por acumulação. Não é um DNA protegido. O DNA dos espermatozóides e dos óvulos é um DNA que está protegido. Os espermatozóides, quando são formados nos testículos, são muito protegidos e os óvulos também, no ovário. Portanto, há ali uma certa protecção para não deixar que as células germinativas, que são mais sensíveis, sejam afectadas e que a descendência seja afectada. Mesmo assim, há sempre umas mutações que passam.Eu vou tentar andar mais rápido.Aqui têm uma lista das doenças monogénicas. Como vêem, há frequência que vão de 1:6000, há frequências de 1:500, que é [nome de doença], que é uma doença que está ssociada ao enfarte do miocárdio. É muito frequente o enfarte do miocárdio nestas doenças porque se formam placas [?]. Depois, hemofilia A, a qual é transmitida pelo cromossoma X. É uma doença histórica. O primeiro mutante de hemofilia A sabem quem foi? Nunca viram a fotografia da família da raínha Vitória? A rainha Vitória foi o primeiro mutante. Porque há sempre uma mutação [?], uma primeira mutação. Então transmitiu esse X aos descendentes masculinos, porque o homem só tem um X e então exprime a doença. As mulheres também pode ser afectadas, mas é mais raro. É preciso que uma portadora case com um indivíduo doente. É azar demais. Além disso há uma selecção natural. As mulheres doentes são menos porque têm menos viabilidade antes de nascerem.Depois têm a anemia falciforme. Vejam que a frequência da anemia falciforme é muito variável. Em certas zonas da África Central, na África sub-sariana, África equatorial, chega a haver 1 para 50 de indivíduos afectados, o que é uma frequência muito alta em genética; muito alta para uma doença monogénica. Por outro lado, nos Estados Unidos, a frequência é 10 vezes menor. Há uma razão para haver uma grande frequência em África. Sabem qual é? A selecção natural, porque estes indivíduos com drepanocitose, com anemia falciforme, são muito menos susceptíveis à malária.A talassemia é muito frequente no Mediterrâneo – também é muito frequente, a Prof. Ângela é especialista na análise genética da talassemia.Depois, existem doenças multifactoriais da criança e do adulto. Da criança, é o pé [?]. Sabem o que é o pé [?]? São os indivíduos que têm o pé nesta posição. Os defeitos congénitos do coração -- as cardiopatias congénitas são relativamente frequentes, principalmente a [nome de doença], que é uma doença em que há alteração das posições das cavidades do coração. [?].As doenças mais frequentes em termos multifactoriais, mais estudadas em termos genéticos, são as doenças cardiovasculares, nomeadamente, a doença coronária. Vejam: frequências multifactoriais: 1:3 a 1:5. As diabetes também têm muitos factores genéticos envolvidos – 1:10. Os cancros todos juntos não chegam a ser tanto como as doenças cardiovasculares. Os cancros todos juntos, quanto muito, têm a mesma

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frequência da doença coronária. E as doenças mitocondriais são rarísisimas; aqui nem põem a frequência porque são doenças que afectam de tal maneira a viabilidade celular, a produção de energia, que é fundamental que os indivíduos... E mesmo assim, aqueles que resistem é porque há factores do genoma nuclear que protegem esses indivíduos. Mas mesmo assim, são muito raras.Depois, têm aqui a doença coronária...Então vamos fazer o seguinte, agora eu agora vou partir de uma doença conhecida.Há três paradigmas aqui – a causalidade genética das doenças, a que níveis é que nós estudamos os genes – desde os genes até ao fenotipo, porque nós inicialmente a genética estudávamos o fenotipo, que é o resultado da interacção entre os genes e o ambiente. Agora é que se vai ao pormenor de saber qual é a mutação que causa aquela doença, mas antigamente, nós estudávamos o fenotipo, assim como o Mendel estudou o fenotipo – as ervilhas lisas e rugosas e a cor das pétalas. O fenotipo acaba, na maior parte dos casos, de ser dependente de muitos genes. Mesmo a cor das ervilhas depende de... Mas ele teve a sorte, não, a sagacidade, para tentar descobrir características que fossem sempre iguais ao longo das gerações, mas que tivessem depois uma proporção diferente nos descendentes. Só assim é que se chegou às leis. Só mais tarde, nos primeiros anos do século XX, é que uns investigadores em Chicago que estudavam a mosca do vinagre, a drosófila. A drosófila foi um ser importante para o desenvolvimento da genética--porque a drosófila a vantagem é que só tinha dois cromossomas. Tem 4-4; o número haplóide é 4. Tem cromossomas muito interessantes; tem cromossomas politénicos. São cromossomas que são constituídos por várias cadeias de DNA duplicadas todas juntas. Por isso é que são observáveis sem estimular o crescimento das células. O que fazemos nos careotipos, que é a disposição, digamos, numa folha de papel os cromossomas segundo os tamanhos e a posição do centrómero, que é a parte que as duas cromátides.Nós temos de fazer crescer as células. Estimulamos as células com [?], que é uma lectina, [supresso] e depois vamos [?] as células em mitose, na metáfase. É na metáfase que vamos [?] os cromossomas, que é quando eles já são duplicados, porque na profase são eles a começar a duplicar e depois na metáfase eles já estão todos juntos na placa equatorial. Nós vamos [?] ali, depois fotografamos e depois [?]. É assim que se faz careotipo.Aqui nós temos a doença coronária, numa primeira fase. Depois, quando ela rompe e quando dá origem ao enfarte do miocárdio, quando esta placa da [?] é destacada e vai entupir os vasos, dando então a isquémia, a angina de peito e quando é enfarte do miocárdio dá mesmo necrose. [supresso]Portanto, causalidade genética. O exemplo que eu dou é o da doença cardiovascular porque o meu laboratório estuda fundamentalmente a genética das doenças cardiovasculares. [supresso]Vocês têm aqui as causas da hipertensão arterial. Causalidade: dum lado, qualquer doença – portanto, hipertensão arterial, doença coronária, [?], asma – tem esta disposição. Dum lado, temos as doenças monogénicas e do outro lado temos as doenças poligénicas e multifactoriai – aquelas que são chamadas parcialmente genéticas. Desde lado, temos situações que são autossómicas recessivas, autossómicas dominantes, recessivas ligadas ao X, dominantes ligadas ao X, que têm padrões de trasmissao típicos. Há aqui uma situação muito interessante, que é esta – esta doença aqui, a deficiência de uma enzima que transforma o cortisol em cortisona (o cortisol é uma hormona produzida pelo [?], que é importante para a resposta ao stress. Aqui temos uma doença monogénica que tem a sua correspondente ambiental. Chama-se a isso uma fenocópia. Há uma substância, o [?], que existe nuns rebuçados que os alemães gostam de chupar, mas tem um azar – se chupam muito aqueles rebuçados ficam com

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hipertensão arterial. Porquê? Porque a substância que eles ingerem em excesso vai inibir uma enzima, que é esta enzima, e dá origem a como se fosse uma mutação e dá origem a uma doença semelhante a uma doença resultante de uma mutação genética [surpreendente articulação, dado o discurso até agora]. Chama-se a isso uma fenocópia – uma cópia fenotípica de uma doença genética.Depois existe uma série de situações com vários tipos de transmissão. Isto é uma arvore genealógica típica de uma doença autossómica recessiva. Olhando para um quadro destes, vocês conseguem, groso modo – isto são os padrões de transmissão: mulher, homem, consanguinidade, quando está ali uma bolinha significa estado portador (o estado portador também pode ser um estado metade da bolinha ou do quadrado ser preenchido, não é). Estes indivíduos são os indivíduos doentes, homozigóticos.Transmissão autossómica recessiva: a característica é doença transversal, i.e., casos todos na mesma geração. Não há casos para trás porque aqui para trás o que é que acontece? São portadores. Este casal que deu origem a dois indivíduos afectados, uma rapariga e um rapaz, eram primos direitos, ... consaguinidade. Quanto maior for – os irmãos, tios e sobrinhos, primos direitos, têm muito maior probabilidade de terem genes em comum. Portanto, a frequência de doenças autossómicas recessivas é muito maior. Daí que se tenha chegado, do ponto de vista moral, à conclusão de que os irmãos não devem casar, os primos direitos não devem casar... Tem uma lógica -- a lógica é que, pela história, se sabia que não dava certo. Morriam mais, tinham doenças que ninguém conseguia, na altura, explicar como apareciam. Se vocês forem ver a árvore genealógica do Ptolomeu, portanto, da rainha Cleópatra. Lembram-se da rainha Cleópatra? Foi aquela que namorou com o Marco António, que andava às lutas com o Júlio César – há uns livros de Astérix que falam nisso... Ela era casada com um irmão. Vendo a árvore genealógica dela, aquilo era só... o cruzamento era tudo consanguinidade. Tentavam manter tudo na família. Em Portugal, a taxa de consanguinidade nas Beiras também era bastante elevada. Dizia-se que quanto mais frio, mais [?] – havia essa lógica.Nas ilhas, as doenças genéticas são muito mais frequentes? Porquê? Porque existe maior probabilidade de indivíduos aparentados se casarem. No Pico, nos Açores, há muitas doenças genéticas.Doenças autossómicas recessivas – transmissão horizontal. É o caso da [nome de doença], que é aquela doença que é testada no pezinho quando as criancinhas nascem.Estas são as chamadas autossómicas dominantes. Porquê? Nas outras, o indivíduo tinha de ter o mesmo gene afectado com mutações iguais ou diferentes – pode haver duas mutações diferentes do mesmo gene que dêem a mesma doença. Chama-se a isso heterogeneidade genética. Portanto, o indíviduo para ter as doenças autossómicas recessivas tem de receber um gene semelhante ou igual ao gene que é recebido da parte da mãe. Teve o azar – daí a probabilidade é de ¼, é 25%. Aqui assim, basta um indivíduo ter um gene – um gene só, uma versão do gene – e tem a doença. Quer dizer que aquele gene afectado domina sobre o gene normal. E aí a transmissão é vertical, é fácil de perceber. Aqui assim este transmitiu àquela, aquela transmitiu a estes dois. A probabilidade de aparecimento neste caso é de 50%. E, portanto, é o tipo de transmissão. Estas doenças autossómicas dominantes, a maior parte delas, necessita muito... há saltos muitas vezes de gerações. Há gerações em que não há casos afectados. É que muitas vezes, é necessário haver outros genes (embora genes que, digamos, não são muito afectados, que têm os chamados polimorfismos – um polimorfismo é quando uma determinada variação genética, uma determinada mutação, atinge uma frequência superior a 1%). Não é uma variante rara, não é uma mutação rara, é uma mutação polimórfica, i.e., uma mutação que tem algum significado. Ela se existe naquela frequência tão elevada, é porque ela tem alguma vantagem. São as chamadas variações

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polimórficas. O que acontece é que muitas vezes estas doenças dominantes quando há um ambiente genético, digamos, um ambiente de vários polimorfismos, favorável. E muitas vezes elas não se manifestam porque necessitam desses genes para se manifestarem, o fenotipo aparecer. Chama-se a isto variação de penetrância. Nem sempre o indivíduo que recebe o gene tem a doença. Uma doença que tem este tipo de transmissão é aquela doença dos pezinhos, da Póvoa de Varzim, não sei se já ouviram falar. Na amiloidose familiar portuguesa. É uma doença portuguesa, que existe na Póvoa de Varzim e que se pensa que tenha sido trazida por Vikings, ou ao contrário – que nasceu na Póvoa de Varzim e que nós é que levámos para a Suécia. Nas idade média, havia uma grande interpenetração, os portugueses faziam muitas viagens daqui para a Suécia. Nunca se sabe se fomos nós que levámos a doença para lá ou se foi a doença que veio de lá. A verdade é esta – a doença apareceu no Japão, aí fomos nós que a levámos. No Japão, na América do Sul, na América do Norte, a amiloidose familiar portuguesa. Existe uma outra doença nos Açores, a doença de Machado José. Também tem este tipo, é uma ataxia, o indivíduo tem falta de coordenação dos movimentos. Também nasceu nos Açores – ilhas, lá está – e foi levado pelos açorianos na viagem. Portanto, transmissão vertical: autossómica dominante. Autossómica porque é nos autossomas.Depois, temos a recessiva ligada ao X – estas são as três mais importantes, também dominantes ligadas ao X. Vocês têm mulheres portadoras, que não têm a doença, porque têm o outro X e equilibra e têm indivíduos afectados – homens. Esta aqui, por exemplo, casou com uma portadora e apareceram mulheres afectadas – é aquilo que eu vos dizia. É aquilo a que eles chamam uma doença que muitas vezes tem saltos de gerações, nem sempre as gerações são todas afectadas. Aqui, por acaso estão, por uma questão didática.Depois, há vários mecanismos para produzir mutações – eu não vou entrar em pormenores. Este é um deles, é uma daquelas doenças que causam hipertensão arterial. Aqui o que é que aconteceu? Vocês têm aqui dois genes de dois indivíduos, mas que [?] na produção de aldosterona. A aldosterona é uma hormona que é produzida pelo córtex da supra-renal e que é importante para a manutenção do volume sanguíneo. O que acontece é que estes genes estão muito próximos um do outro. Quando se faz a meiose, sabem que durante a produção dos gâmetas, há uma redução do numero de cromossomas para metade. Numa determinada fase, os cromossomas associam-se a dois a dois, os cromossomas homólogos, [supresso] e trocam material entre si. Por isso é que os cromossomas que se resultam dessas meioses não são bem iguais aos cromossomas iniciais. [supresso] Às tantas, há uma troca de material entre os crossomas. Só que muitas vezes, há um desalinhamento na troca e há muitas vezes genes que saem duplicados. Há um deslizamento dos genes e os genes saem duplicados quando [?]. E então ficam genes que são metade de um e metade de outro. Este gene aqui, que resulta desta alteração – há um que perde, que não aparece aqui, e há outro que forma um chamado gene quimérico, que passa a ter um controle diferente, daí esses indivíduos terem a doença. É um dos mecanismos de produção de mutações. Depois há muitos outros mecanismos, que agora não vão estudar.Sabia-se que havia doença parcialmente genéticas, que não tinham um padrão bem definido de transmissão, mas que agregavam em famílias. Nós para sabermos se uma doença é genética ou não, fazemos os chamados estudos familiares. Então, qual é o estudo familiar por excelência? É arranjarmos gémeos idênticos (que são aí 99% idênticos, o que não quer dizer que os gémeos monozigóticos sejam completamente iguais; não são, porque os cromossomas mitocondriais são divididos aleatoriamente e um dos gémeos pode receber um tipo de cromossoma mitocondrial e o outro, outro tipo

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diferente – portanto eles não são completamente iguais, mas aí 99% são iguais – não são clones; os gémeos não são clones, são indivíduos muito semelhantes, os genes nucleares são partilhados, os mitocondriais nem sempre). Porquê gémeos? Porque são indivíduos que foram gerados na mesma altura e têm 99,9% de genes em comum. Se nós quisermos saber se uma doença é transmitida geneticamente, nós comparamos a frequência dessa doença em gémeos monozigóticos e gémeos dizigóticos – não são idênticos, é como se fossem dois irmãos. Têm a vantagem em relação aos irmãos que nasceram de gestações diferentes de terem o mesmo ambiente. Portanto, o que nós queremos é ter o ambiente igual e saber se as diferenças que existem têm que ver com os genes, tem que ver com a transmissão dos cromossomas. Se nós tivermos um concordância de uma determinada doença aí de 80%, nós dizemos “esta doença tem uma base genética” – mesmo sendo multifactorial, não sei se estão a ver. [?] para comparar a frequência da doença entre casais que tinham filhos adoptivos e tinham filhos biológicos. Isto é outro tipo de estudo – gémeos é difícil de arranjar, não é. Há serviços de genética que para terem aí 100 pares de gémeos não é bom ano. Tem andar a caçá-los. Agora é mais fácil por causa da fertilização in vitro; pela fertilização medicamente assistida é mais fácil encontrar gémeos, nascem muitos gémeos das fertilizações. Portanto o que eles fazem é comparar, [?] pais e mães; têm metade de gémeos em comum mas nasceram de tempos diferentes. Não são nada aparentados, mas que apenas têm metade de genes em comum os seus filhos naturais. O que nós fazemos é um estudo de correlação. Outro dia estive a ler um livro de Estatística, [?] às vezes ajuda muito. Vocês já ouviram falar dos testes de correlação, da Bioestatística. Já deram Bioestatística? Deram? Não? Testes de correlação – é quando se faz a correlação entre uma determinada característica entre um indivíduo e o outro. [?] Esse teste de correlação foi estudado pelo Galton. O Galton era primo do Darwin. Foi o primeiro geneticista que estudou doenças multifactoriais. Só que ele tinha umas ideias assim um bocado sui generis. Ele estudava parâmetros como a inteligência, a cor da pele, ... estão a imaginar onde é que ele caiu, não é? Foi banido durante muitos anos. A Genética, aliás, foi uma ciência maldita. Até pouco depois da Guerra, ninguém estudava genética. Aquele trauma dos alemães andarem a tentar fazer a eugenia, ninguém se [?]. Um indivíduo que estudava genética – “aquele tipo é nazi”. Era logo. De maneira que só a partir dos anos 50 é que se começou a ensinar Genética assim, apesar de tudo, com muito medo, não é. Eu quando estudei Genética nos anos 60, ainda era um olhar assim de soslaio – “o que é que este anda a fazer?...”. De maneira que, aquilo que nós verificamos é que , por exemplo, a correlação da pressão arterial entre mãe e pai é muito baixa; entre mães e filhos naturais, entre pais e filhos naturais, com quem têm 50% de genes em comum, já é muito maior. Nunca chega a atingir os 50%. Mas reparem a correlação da pressão arterial entre a mãe e os filhos é superior à entre os pais e os filhos biológicos. Isto quer dizer que aquilo que aconteceu é que a criança está mais sempre em contacto com o ambiente materno do que com o ambiente partilhado por pai e filho. O ambiente materno inclui o ambiente intra-uterino e por isso a correlação da pressão arterial entre mãe e filho é muito superior à entre os pais e os filhos. Esta é uma das maneiras de nós sabermos. [supresso] Uma doença é muito mais frequentemente genética quando aparece com uma frequência muito superior àquela da população em geral. Por exemplo, a hipertensão arterial segrega em famílias. 60% da variabilidade da pressão arterial normal depende dos genes. O peso dos genes na géneses do nível pressão arterial é, em 60%, dos genes. Quando nós vemos que determinada doença segrega em família, nós desconfiamos logo... não quer dizer que seja genética, muitas vezes ha famílias que têm doenças em comum. Mas pronto, a maior parte das vezes são os genes é que ditam. Podemos em relação à aterosclerose fazer o mesmo raciocínio –

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monogénicas deste lado, poligénicas deste. Isto depois é muito complexo – por exemplo, a hipertensão é um factor de risco para a aterosclerose. Mas a aterosclerose não depende de o indivíduo ter ou não, anteriormente, hipertensão arterial. As diabetes são um factor de risco para a hipertensão arterial. A hipertensão arterial é um factor de risco para as diabetes. Mas nem todos os indivíduos diabéticos têm hipertensão arterial. O que isto quer dizer, é que há factores comuns a estas varias doenças. Genes, constelações de genes, agrupamentos de genes que são comuns às duas – por isso é que na mesma família – isto é uma família grande, é uma maneira de representar famílias muito grandes, faz-se assim um gráfico... às vezes até vão a 180º. Portanto e depois são as várias gerações. Reparem, nesta família, nós temos tudo – temos diabetes tipo II, hiperlipidémias, indivíduos com hiperlipidémia e diabetes, indivíduos só com diabetes e às vezes aparecem aqui indivíduos com hipertensão arterial. Diga? Aqui? São os indivíduos que morreram. O 10... isto aqui são gémeos... Portanto nasceram da mesma gestação. A susceptibilidade para uma doença poligénica depende [?]. Depois, só aparece a hipertensão arterial se houver um meio ambiente favorável. [incoerente] O indivíduo pode ter só hiperlipedémia familiar e não ter hipertensão arterial, mas um indivíduo pode ter genes destes que sejam em comum com os daquele e com um ambiente comum o indivíduo... está feito. Muitas coincidências de genes. E aparece a doença de certeza – o indivíduo tem um ambiente carregado [?]. Aquilo de que estivemos agora a falar foi a causalidade. E do tipo de transmissão? Quais é a participação dos factores genéticos nas doenças? Monogénicas, poligénicas e multifactoriais, cromossómicas, somáticas. Como é que nós estudamos genética? Além de estudarmos as famílias, o que nos dá o tipo de transmissão e permite que digamos “o seu risco de ter a doença é tal”, “o seu risco de ter a doença é tanto” . Isso é geralmente trabalho dos geneticistas clínicos. Os geneticista clínicos geralmente trabalham com doenças monOgénicas. Eventualmente, esses médicos são pediatras porque essas doenças aparecem fundamentalmente nas primeiras idades. Apesar de haver uma licenciatura, nalgumas universidades estrangeiras, de aconselhador genético. É uma licenciatura que não tem nada que ver com Medicina. Eles só estudam genética. Nos EUA, existem profissionais que só fazem aconselhamento genético – não são médicos. Depois, existe a análise da participação aos vários níveis dos genes. Vocês aqui têm o genótipo, que é o conjunto dos genes, por exemplo, causador da hipertensão arterial. Nós aqui só temos um, dois, três, quatro, cinco, seis genes. Pensa-se que a hipertensão arterial tenha os chamados genes candidatos – são os tais genes que, agrupados segundo vias metabólicas muito precisas dão origem à hipertensão arterial. O conjunto de genes que dão origem à hipertensão arterial na Europa pode ser completamente diferente do conjunto de genes que dão origem à hipertensão arterial em África e no Japão. São precisamente... está génese, está na base das doenças poligénicas. Vocês têm aqui os genes todos que são estudados para a hipertensão arterial em 1998 – já iam em 300. Neste momento, já devem ser 600 os genes causadores. Nem todos... Portanto, em grupos, eles podem causar a hipertensão. Vocês estudam depois a expressão genética destes genes ao nível [?], ao nível fisiológico e ao nível [?] – que é a pressão arterial, a imagiologia – as imagens raios-x, etc. Isto é a parte como é que nós estudamos. [supresso] Isto são as vias implicadas na hipertensão arterial. A quantidade de mecanismos envolvidos – sistema nervoso simpático, sistema nervoso parassimpático, sistemas hormonais muito complexos... o que nós... a expressão de um gene, para chegar à célula, ... vocês imaginem a quantidade de passos. Vocês já deram biologia molecular, não é? Deram, portanto. Transcrição.. Muitas vezes os genes são transcritos, a maior parte deles... tem de haver splicing. O splicing é [?] por os vários outros genes, que podem variar. Também há variação no splicing. Há variação na estabilidade do

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RNA mensageiro, há variação na síntese proteica, há variação... muitas vezes as proteínas não são constituídas só por aminoácidos; tem de haver enzimas transferases de lípidos para a proteína, que por sua vez são enzimas e também sofrem o mesmo processo de transcrição – portanto estão a ver a quantidade de variação que pode haver na produção de uma simples enzima liberta para o plasma. A variação genética é imensa. Isto numa célula – agora imaginem tecidos, órgãos, sistemas, em contacto com o meio ambiente, hormonas – também elas são muitas vezes... a maior parte delas são [?] por factores deste tipo. Portanto, a complexidade é grande. Ainda a procissão vai no adro, isto aqui é uma lista dos genes que podem estar envolvidos, cuja variação genética [supresso]. Alguns destes genes têm muitas variantes polimórficas funcionais. O que é que é uma variante polimórfica funcional? É uma variante cuja alteração – mutação – dá origem a maior alteração da actividade enzimática. Alguma são silenciosas – não aquecem nem arrefecem, ficam na mesma, a mutação não dá origem a qualquer alteração. Quando uma mutação se traduz por alteração funcional – essa é que tem interesse, não é? Em termos de doença tem interesse um enzima funcionar mais ou menos. Depois isto é que faz com que haja variação na expressão fenotípica. [?] uma lista enorme. [fast forward nos slides]Isto aqui é o gene do angiotensinogénio – tem três variantes. Vocês vejam a quantidade de mutações que podem existir neste gene. Algumas delas são funcionais, outras não se traduzem por alteração da função. As que são funcionais traduzem-se por maior ou menor produção do angiotensinogénio, que produzem mais angiotensina II, que é mais vasoconstritora, [donde resulta maior] hipertensão arterial. Portanto nós podemos associar determinada variante – neste caso é esta, isto é um PCR [polymerase chain reaction] em que houve uma mutação da metionina por uma trionina. Os indivíduos que têm a proteína em dupla dose tipo trionina têm maior actividade, logo, estes indivíduos, os TTs [slide 26] são os mais predispostos para a hipertensão arterial. “Predispostos” porque para eu ter hipternsão arterial, não basta esta mutação, são necessárias muitas outras, noutros genes.Foi o que aconteceu aqui num estudo que nós fizemos em crianças normais. Os indivíduos TTs têm a pressão arterial mais elevada – o que não quer dizer que sejam hipertensos. [supresso]Isto é outro gene, é uma técnica diferente da outra anterior, que é um PCR-RSLP (depois a Profª Ângela e a Profª Joana mostravam-vos), em que nós usamos um enzima de restrição para detectar a variação genética. Esta aqui é uma sequência [?], que é uma sequência repetitiva introduzida aqui e aparece em indivíduos que têm inserção (os Is) e os indivíduos que não tiveram inserção dessa sequência, que são os Ds (chamados deleção). Os indivíduos que são DDs (que são homozigóticos sem inserção) são indivíduos que têm actividades enzimáticas mais elevadas. Por isso chama-se um polimorfismo funcional. Esses indivíduos têm mais propensão para a hipertensão arterial – o enzima funciona mais, produza mais vaso constritor, logo, produz mais hipertensão arterial. [supresso]Uma outra maneira de estudar os genes é estudar a variação genética da proteína por electroforese simples [?]. A proteína, no plasma, tem duas formas: uma, que tem [?] inserção – neste caso até surgiu uma duplicação, foi aquele mecanismo que vos mostrei no [?] (houve um desalinhamento e surgiu uma proteína maior que a outra). Aqui nos estudamos a proteína – sito é uma electroforese de proteína. Antes do estudo do DNA era assim que nós fazíamos.Esta variação genética está associada a dois fenotipos diferentes – quer dizer, um indivíduo tem hipertensão arterial, mas as hipertensões não são todas iguais. Há hipertensões sensíveis ao sódio e não sensíveis ao sódio. Nós, estudando os genes,

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conseguimos saber qual é o tipo de hipertensão. Isto tem muitas implicações práticas. Qual é o medicamente que nós damos? Damos um medicamente para este que é diferente do medicamento resistente ao sódio? Os médicos já sabiam – por exemplo, os africanos, que são sensíveis ao sódio, não havia medicamentos que não... que era água... Nós dávamos o medicamento e aquilo não fazia nada. [supresso] No futuro nós vamos fazer isso – com base nestes polimorfismos genéticos, nós sabemos qual é o tipo de medicamento que vamos dar aos sensíveis ao sódio e aos não sensíveis.Este foi o paradigma níveis de estudo. O último paradigma é o paradigma história natural da doença. A influencia dos genes não é igual em toda a vida do indivíduo. Um gene pode funcionar como predisposição para determinado... por exemplo, predisposição para a obesidade – um gene pode ser importante na predisposição para a obesidade até à adolescência e depois, uma vez atingida a obesidade, esse gene [supresso] já não vai ter qualquer tipo de influência. Quando muito pode influenciar a progressão da obesidade para a doença cardiovascular ou não. As doenças começam logo durante a gestação. Há mutações que começam a fazer o seu efeito quando a criancinha está ainda no útero.Isto aqui assim foi um estudo que foi feito do enfarte do miocárdio em criancinhas que foram seguidas durante 20 e tal anos [supresso]. Fizeram autópsias em criancinhas que morreram em acidentes de automóvel [?]. A aorta dessas criancinhas já aparecia com estrias lipídicas, que são o resultado da acumulação de lípidos complexos dentro das células, que é o precursor da ateroesclerose. Se a criancinha foi estudada ao ano de idade é porque isso já tinha começado durante a gestação – daí a importância de estudar o ambiente materno.Nós temos é de caçar as doenças – desculpem o termo – antes que atinjam aquela fase que vos mostrei logo no princípio – as placas rompem a [?]. É o objectivo da Genética estudar factores de risco baseados nos genes – conseguimos com esses genes saber até onde é que... mesmo antes da criança nascer, nós já podemos saber a probabilidade que determinada família tem de ter doença cardiovascular e muito mais quando as crianças nascem. Portanto, podemos prevenir as doenças sem medicamentos – com medidas higiénicas, com vitaminas, etc. E isso é possível. [supresso/?]Eu agora não entraria mais em pormenores. Eu depois dou-vos estes esquemas, porque senão... Demorei já um bocadinho demais do que devia ter demorado.

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Engenharia Biomédica – 3º ano, 1º semestreMecanismos Gerais da Doença (2006/2007)

Professor Afonso Fernandes

Aula desgravada por Jorge Beira e Marisa Oliveira

A medicina durantes muitos séculos não passou de uma arte. Só se tornou ciência quando foi definida a sua unidade, o que foi feito por um alemão, Rodolph Virchow, em pleno século XIX com a publicação de um tratado sobre patologia celular em 1858. Neste tratado podemos encontrar como conclusão fundamental o que está traduzido no slide (“Todas as doenças se resumem a perturbações geradas ou sofridas por grandes grupos de unidades vivas, cuja capacidade funcional depende do estado da sua composição molecular e portanto das alterações químicas e físicas dos seus constituintes”).

Como sabem, a teoria atómica e molecular de Dalton e Avogrado já tinham sido anunciadas no início do século XIX, 1804 e 1811 respectivamente e portanto Virchow já se pode socorrer desses conceitos, que foram de alguma forma inaugurais nas ciências da Química e da Física para fazer esta extrapolação e levantar esta hipótese. De facto, nesta altura, isto não passava de uma hipótese porque Virchow, em meados do século XIX, ainda estava muito longe de poder afirmar baseado no método experimental que todas as doenças eram resultantes deste tipo de alterações.

Com isto nasce a patologia celular. No entanto a patologia molecular, que é a explicação directa das doenças pela alterações das moléculas, só vem a nascer muito tempo depois em 1949, com Pauling. Pauling deu um contributo muito importante para a Química e foi prémio Nobel da Química e mais tarde prémio Nobel da Paz.

Nós podemos estudar as doenças a vários níveis e hoje vamos preocupar-nos com a doença da célula que, pelos vistos, pode explicar a doença do organismo como um todo.

O primeiro aspecto que vamos focar é o que é que pode causar lesão celular.Com certeza que não se admiram que as causas da lesão celular se sobreponham às causas de doenças que falámos na primeira aula.

As causas da lesão celular podem ser:- Agentes físicos;- Agentes químicos;- Agentes biológicos;- Alterações das células;- Desiquilíbrios nutricionais;- Alterações genéticas;- Envelhecimento;- Reacções Imunológicas;- Radicais Livres;- Isquémia e Hipóxia.

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Aula 4 – 11 de Outubro de 2006Tema: Patologia Celular

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A isquémia e a hipóxia são das principais causas de lesão celular do mundo ocidental em que vivemos. A mortalidade ocidental ocorre predominantemente devido às doenças cardiovasculares entre as quais se inclui a doença coronária.

Por outro lado, mesmo outros agentes, quando actuam sobre os tecidos acabam directa ou indirectamente, com frequência, por determinar lesões de isquémia e hipóxia porque o mecanismo pode não ser directo mas muitos destes agentes podem lesar as paredes dos vasos, podem lesar os endotélios comprometendo o fluxo circulatório causando isquémia e hipóxia.

Importará ter uma ideia deste conjunto face a um estímulo que actua sobre uma célula com uma determinada susceptibilidade, é possível uma resposta funcional, a célula passa a funcionar de uma forma diferente, adaptada perante a esta situação de um estímulo ter actuado sobre ela própria - falamos então numa adaptação funcional – ou pode acontecer a lesão mas essa lesão ser reversível e portanto possibilitar à celula uma adaptação. Mas a célula pode sofrer perturbações de tal maneira que a lesão celular seja irreversível. Isso conduz à morte da célula.(Ver slide 4)

A célula pode morrer por vários processos:- Necrose;- Apoptose.

Quais são os alvos, na célula, dos estímulos (dos agentes, das causas) da patologia celular?

1 - membrana (que contribui até para a própria definição de célula);2 - formação de ATP (produção de energia);3 - síntese proteica;4 - genoma.

Quais são os mecanismos envolvidos na lesão?I - privação de oxigénio (mecanismo básico fundamental, não é entregue oxigénio

às células);II - produção de espécies reactivas de oxigénio (algumas são radicais livres* - que

são representados por R. – nem todas as ERO*2 são radicalares (têm o tal electrão desemparelhado));

III - mecanismo relacionado com a mitocôndria e formação de energia;IV - concentração intracelular de cálcio;V - mecanismos relacionados com a disrupção ou disfunção da membrana, com a

perda de função das ATPases, a alteração dos lípidos, dos ácidos gordos polinsaturados que são susceptíveis de sofrerem peroxidação pelas espécies radicalares, antes a chamada lipoperoxidação.

Neste ramo, que contempla a adaptação celular, podemos então falar de uma adaptação funcional, sem alterações morfológicas (não reconhecível morfologicamente quando submetido ao microscópio), condicionamento, hipertrofia, hiperplasia, atrofia e metaplasia (que são tudo formas morfologicamente reconhecíveis de adaptação celular). Como estamos no domínio da adaptação, todas estas formas são reversíveis ao contrário da morte, da necrose e da apotose.

Dedicamos agora especial atenção à isquémia. Isquémia: desiquilíbrio entre o fornecimento de oxigénio e o consumo de

oxigénio. *Radical Livre é qualquer espécie molecular que tem um electrão livre desemparelhado numa orbital externa.*2 ERO - Espécies Reactivas de Oxigénio

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O desequilíbrio pode acontecer devido a uma diminuição do fornecimento ou aumento do consumo. Isto pode conduzir a uma lesão reversível, mas pode também, ultrapassando determinados limites quer de intensidade quer no tempo, conduzir a uma morte celular (exemplo:enfarte do miocárdio).

A isquémia não pode de ser entendida como sinónimo de hipóxia (sendo hipóxia como um insuficiente fornecimento de oxigénio aos tecidos). A isquémia não é só o fornecimento de menos oxigénio mas também carência de outros substratos importantes para o metabolismo da célula. Quando é interrompida a circulação (que é o que acontece na isquémia) há acumulação de produtos do metabolismo e alguns deles são lesivos para as próprias células como o peróxido de hidrogénio e o dióxido de carbono.

Em relação à hipóxia vamos tentar com a ajuda do significado destes vários tipos dar exemplos de causas de hipóxia que se possam enquadrar dentro destes grandes grupos:

Hipóxia Hipoxémica. Hipoxémica significa que há menos oxigénio no sangue (está relacionado com a concentração de oxigénio no sangue). Pode ser causada por:

- insuficiência respiratória. Se o pulmão não é capaz de fazer as trocas gasosas, logo não é capaz de meter oxigénio no sangue. - ambientes naturais de montanha (alta altitude) em que há rarefacção do oxigénio inspirado.- shunt direito-esquerdo, que é uma mistura de sangue venoso com sangue arterial por uma anomalia anatómica. Direito/esquerdo pois as cavidades direitas do coração têm sangue venoso e as cavidades esquerdas têm sangue arterial. Se houver mistura do sangue venoso com o sangue arterial então o sangue arterial vai ter menos oxigénio.

Hipóxia Anémica. Alterações quantitativas ou qualitativas da hemoglobina. Agora trata-se de problemas não na oxigenação mas sim no transportador de oxigénio, a hemoglobina. Pode ser causada por:

- Intoxicação por CO. O monóxido de carbono tem uma afinidade 240 vezes superior que o oxigénio para a hemoglobina. Logo provoca uma capacidade inferior de transporte de oxigénio pois a hemoglobina está ligada ao CO.- Anemia. Que é uma menor concentração de hemoglobina, logo uma menor concentração de transporte de oxigénio.- Drepanocitose - doença em que há alteração da hemoglobina, e esta precipita nos glóbulos vermelhos devido à diferente composição em aa. Há uma mutação pontual que leva à substituição de 1 aa ácido glutâmico por valina na posição 6 da cadeia β. Trata-se de uma alteração genética.

Revisão: Nem todas as doenças genéticas são hereditárias: por exemplo o cancro(que é uma doença genética adquirida).

A drepanocitose tem outro nome: anemia das células falciformes. É por isso mesmo uma anemia que leva à hipóxia anémica devido à diminuição da concentração da hemoglobina. Os doentes com anemia das células falciformes têm anemia devido a um rearranjo da estrutura da molécula nomeadamente da estrutura terciária e quaternária, que leva a que determinados aa passem a estar próximos, que não estavam na molécula normal, e a que se estabeleçam ligações hidrofóbicas havendo precipitação da hemoglobina. No entanto só precipita a hemoglobina

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desoxigenada, formando fibras longas de polímeros de moléculas de hemoglobina alterada, fibras rígidas que distorcem a forma do glóbulo levando à destruição dos glóbulos pelos macrófagos. Pode ocorrer também o entupimento da microcirculação provocando dores agudas nos doentes devido a episódios de isquémia em vários orgãos causados pelo entupimento. Um glóbulo vermelho tem cerca de 8 μm e os vasos mais finos têm cerca de 3 μm por isso o glóbulo tem de ser muito maleável.Estes doentes só começam a ter sintomas a partir dos 6 meses de idade devido à hemoglobina F (fetal) que inibe a polimerização da hemoglobina anormal (hemoglobina S). A hemoglobina normal do adulto chama-se hemoglobina A.- Hemoglobina com demasiada afinidade para o oxigénio que não liberta o oxigénio para os vasos.

Hipóxia Isquémica. Pode ser causada por:- Enfarte do miocárdio. Obstrução de uma coronária por uma trombose que provoca isquémia, interrupção da circulação que provoca hipóxia.

Hipóxia Histotóxica. Incapacidade da célula de aproveitar o oxigénio disponível. Há uma acção tóxica do tecido (“histo”-tóxica). O oxigénio está lá mas se a célula não tem capacidade para o aproveitar então é como se não existisse oxigénio disponível. Pode ser causada por:

- Intoxicação por cianeto. Leva à hipóxia histotóxica devido à inibição da citocromoxidase pelo cianeto. Esta é uma enzima da cadeia respiratória logo a cadeira respiratória não funciona.- Choque térmico. O estado de choque circulatório relacionado com uma infecção generalizada, as células ficam incapazes de utilizar o oxigénio disponível levando a uma mortalidade muito elevada.

Hipóxia por aumento da necessidade de oxigénio.- Claudicação intermitente. Claudicar é a falha por coxear e acontece a que tem aterosclerose nas artérias dos membros inferiores, estreitamento do lúmen das artérias logo incapacidade de receber tanto sangue como numa situação normal aos músculos da perna. Portanto se ando, e ando mais os músculos precisam de mais oxigénio para continuarem a contrair. Se não tenho maneira de fornecer mais oxigénio o músculo entra em sofrimento, entra em isquémia e liberta certas substâncias que vão estimular as terminações nervosas e há dor.

Face a uma situação de hipoxia há maneira de compensar esta situação com mecanismos de compensação:

Ventilação pulmonar. Ventilar mais vai colocar mais oxigénio no sangue compensando a situação.Débito cardíaco. Aumentando a quantidade de sangue que é enviada para os tecidos por unidade de tempo, aumenta a quantidade de oxigénio que chega aos mesmos.Redistribuição circulatória. Se houver forma de conduzir mais sangue para os tecidos que mais precisam dele, estamos a compensar a hipóxia.Produção de eritrócitos. Produzindo mais glóbulos vermelhos, temos mais hemoglobina e consequentemente mais oxigénio. Habitualmente a

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medula óssea tem essa capacidade, responde a um estímulo para a produção de eritrócitos que depende da produção de uma hormona, a eritropoetina.Dissociação da hemoglobina. Se pudermos deslocar a curva de dissociação da hemoglobina para a direita no sentido de haver menor afinidade da hemoglobina para o oxigénio, logo vai haver maior libertação de oxigénio. Há certas variáveis que alteram esta curva, que a deslocam para a direita como o aumento da temperatura, aumento da pressão parcial de CO2, 2,3-difosfoglicerato, e o pH – quanto baixa o pH aumenta a dissociação. Quando o pH baixa aumenta a concentração de H+, isto acontece como consequência da glicólise anaeróbia em que o produto final é o ácido láctico. Este desloca a curva de dissociação da hemoglobina no sentido de dar mais oxigénio para que a glicólise seja aeróbia.

Muitos destes mecanismos de compensação têm eles próprios efeitos secundários, efeitos que contrariam a compensação.

Por exemplo a produção de eritrócitos pode ter como desvantagem o aumento da viscosidade sanguínea dificultando a microcirculação.

Consequências para a célula da isquémia:

Se não há oxigénio vai haver inibição da cadeia respiratória e inibição da fosforilação oxidativa da produção de ATP. Portanto diminui o ATP. Vai haver também aumento do cálcio intracelular. E sabe-se hoje bem que estes dois factores são decisivos para conduzir a célula para a morte por necrose, o aumento do cálcio intracelular e a diminuição do ATP. A necrose acontece sobretudo por lesão irreversível da membrana sendo o mecanismo mais significativo da morte da célula.

Consequências da perda de ATP:Glicogenólise - degradação do glicogénio (molécula de reserva de glisose) – aumentando assim a glicose. Como a eficácia energética da glicose anaeróbia é inferior à da glicólise aeróbia, temos de ir buscar glicose ao glicogénio. Aumenta assim o ácido láctico e diminui o pH. Isto provoca uma destabilização das membranas lisossómicas – os lisossomas são sacos de enzimas que hidrolizam as moléculas - e isso leva à digestão celular.Inibição da síntese proteíca.Inibição da síntese de fosfolípidos.Inibição das ATPases – as ATPases são fundamentais para garantir um gradiente de concentração de iões entre o meio intracelular e o meio extracelular. Se inibirmos as ATPases vamos ter problemas na manutenção deste gradiente. Uma situação que acontece às celulas nesta situação é incharem porque entra água, dá-se um edema celular, e vê-se ao microscópio as células mais claras devido à diluição. Há também aumento do cálcio intracelular. Este aumento do cálcio no interior da célula veio a revelar-se muito importante para a causa da lesão isquémia. A concentração de Ca2+ extracelular é cerca de 10-3 molar e no interior da célula é de cerca de 10-7 molar. Isto representa uma diferença bastante significativa. Esta é a situação normal. Devido à inibição das ATPases e doutros mecanismos que não vamos falar, e porque a sequestração de

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cálcio no retículo endoplasmático e na mitocôndrica fica inibida, aumenta muito o cálcio no citosol. Acontece então a activação de muitas proteínas na célula que vão ter um efeito muito negativo na mesma principalmente na hidrolização das macromoléculas. Aumentam as proteínas cinases, proteases que hidrolizam as proteínas, fosfolipases que hidrolizam os fosfolípidos, ATPases, endonucleases, etc. Acontecem também outras alterações que agravam ainda mais a lesão:. Inibição da síntese proteíca;. Alterações da expressão dos genes;. Libertação de neurotransmissores;. Vasoconstrição – a lesão é já por falta de sangue e o Ca2+ provoca a contracção muscular e os vasos ainda apertam mais.

Mecanismos da irreversibilidade da lesão isquémica

Os últimos estudos feitos indicam a lesão da membrana como o factor determinante na morte celular. Por métodos bioquímicos demonstrou-se que há uma perda de fosfolípidos na membrana celular. Ocorre pois há menos síntese, porque há menos energia. Há aumento da degradação enzimática porque há activação pelo cálcio de fosfolipases. E há aumento da degradação não enzimática pelas espécies reactivas do oxigénio, que fazem a chamada peroxidação - oxidação dos lípidos dos ácido gordos polinsaturados que constituem os fosfolípidos da membrana. Tudo isto leva a perda de fosfolípidos e acumulação de produtos tóxicos que são derivados da degradação dos mesmos; alguns têm uma função detergente da membrana como os lisofosfolípidos, outros são aldeídos que estabelecem ligações cruzadas. O próprio citoesqueleto sofre alterações. Se a célula incha, as proteínas do citoesqueleto são como que arrancadas dos locais onde têm a sua ancoragem e portanto há também lesão da membrana devido a esses aspectos mêcanicos. É portanto a lesão da membrana que leva à morte celular, à lesão irreversível.

No sistema nervoso central verificou-se que havia ainda um outro mecanismo que ajudava à lesão dos neurónios – a excitotoxicidade. Existem neurotransmissores estimuladores e inibidores. O ácido glutâmico é um neuro-transmissor estimulador que tem a propriedade de provocar a abertura de canais (quando se liga a determinados receptores de membrana), através dos quais entra cálcio (é um dos mecanismos de lesão celular). Definiu-se então a excitotoxicidade: a toxicidade devida à libertação de neurotransmissores estimulantes – isto acontece na isquéma, embora ainda não se saiba muito bem porquê.

As mitocôndrias também têm uma acção renovante neste contexto; Têm-na devido a poderem sofrer este tipo de alteração, que se chama transição da permeabilidade mitocondrial; isto significa que, face a determinados estímulos e agentes tóxicos (espécies radicalares, espécies reactivas de oxigénio, cálcio, fosfolipases, ceramidas que resultam da degradação de esfingolípidos), há uma degradação da membrana mitocondrial que provocam saída de cálcio das mitocôndrias que perturba s gradientes fundamentais para manter a cadeia respiratória em funcionamento; o citocrómio C também sai da mitocôndria por este processo, o que leva à menor formação de ATP, e que pode levar à lesão celular por necrose. A saída de citocrómio C pode conduzir a outro tipo de morte celular (a apoptose), que iremos falar mais à frente.

A viabilidade das células depende também da sua susceptibilidade – nem todas as células são igualmente susceptíveis à falta de oxigénio (como sabemos, as células

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nervosas sofrem com a falta de oxigénio num intervalo de tempo muito curto). As células do miocárdio resistem mais à isquémia (felizmente). Diferentes células têm diferentes susceptibilidades à lesão isquémica.

O conceito de zona de penumbra é também importante: quando há um foco isquémico, há uma zona central que sofre muito e há uma zona à volta que sofre um bocadinho menos. Um dos objectivos da intervenção médica é tentar salvas as células da zona de penumbra, porque as células do foco isquémico estão geralmente “condenadas”.

Vamos agora ser um pouco mais concisos na apresentação de alguns conceitos.Reperfusão – voltar a fazer chegar sangue a uma zona que esteve em

isquémia. Depois deste período de isquémia (quando há reperfusão) pode haver agravamento da lesão celular. Aparentemente, é contraditório. Ainda assim, devemos tentar reperfundir a zona que sofreu lesão isquémica. Por exemplo, quando há um ataque de coração, deve fazer-se a reperfusão através de cuidados coronários; deve desobstruir-se a coronária para haver de novo fluxo de sangue nessa zona. Resumindo, a reperfusão também se acompanha de lesão celular. Temos então de desenvolver estratégias para evitar a lesão de reperfusão. Esta lesão está muito ligada à produção de espécies reactivas de oxigénio.

Concretamente, em relação ao miocárdio, a reperfusão pode levar à recuperação (é o ideal), mas também pode levar ao atordoamento do miocárdio (isto é, ele funciona pior durante algum tempo), a arritmias (que podem ser mortais), lesão vascular e morte celular na zona de penumbra.

Há então lesão de isquémia e lesão de reperfusão.Outro conceito importante está relacionado com a destruição das membranas das

células quando estas morrem; nesse caso, o meio intracelular passa para o meio extracelular, e daí para o sangue. Portanto, podemos ter como marcador de necrose o doseamento de determinadas substâncias no sangue periférico – saem para o sangue enzimas que podemos dosear. Se por exemplo existem enzimas que existem no miocárdio, e se a sua concentração no sangue aumenta, significa que teve uma necrose do miocárdio. O mesmo acontece para outros tecidos; por exemplo, no caso do pâncreas (que produz uma enzima, a amilase), pode medir-se a amilacémia e se esta for elevada traduz uma necrose no pâncreas.

Outro dos conceitos que vale a pena referir é o de condicionamento celular. Se imaginarmos uma célula no estado basal, e se a célula sofrer um primeiro ataque (pode ser um tóxico, ou um período de isquémia), ela fica num estado condicionado que vai fazer com que (durante um certo tempo), ela responda de forma diferente a um segundo ataque. Este condicionamento pode ser defensivo (há uma resisténcia melhor ao segundo ataque, havendo um período de protecção) ou destrutivo (em que a célula se torna mais vulnerável). No caso o coração, só se conhece um condicionamento protectivo. Este conceito é importante porque após o primeiro ataque (que não tem intensidade suficiente para matar a célula, ou então a história acaba), se esta estiver num período de protecção, ela pode não morrer se estiver em condicionamento mesmo que a intensidade do segundo ataque pudesse ser letal. O condicionamento permite uma maior viabilidade, uma melhor contracção, etc. Pode haver uma adaptação rápida ou lenta. Os ataques podem ser de natureza diferente. Pode haver uma isquémia ou pode submeter-se a célula a uma endotoxina (produzidas por bactérias gram negativas). Um determinado tipo de agente agressor deixa a célula condicionada para esse tipo.

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Há proteínas (produzidas em resposta a um choque térmico) que são constitutivas (existem normalmente na célula em concentrações baixas), e outras cuja síntese é induzida, que aumentam muito quando a célula é agredida. Por exemplo a ubiquitina é uma proteína que marca as proteínas para a destruição (nos proteossomas). Isto é muito importante depois de uma lesão, pois a célula tem de se ver livre das proteínas desnaturadas para poder sobreviver. As chaperoninas são muito importantes no enrolamento (durante a síntese das proteínas). Estas também refazem as estrutura terciária e quaternária de proteínas que sofreram uma lesão (por choque térmico ou por outros factores). Outro grupo importante é o das enzimas anti-oxidantes. Há uma sobrecarga oxidante quando há formação de muitos radicais de oxigénio; estas enzimas degradam espécies reactivas de oxigénio. Exemplos: superóxido dismutase, catalase (é a enzima mais rápida do nosso organismo, que degrada o peróxido de hidrogénio em água).

Mais um conceito: a morte celular. Esta pode ser acidental (necrose) ou programada (apoptose). Pode acontecer por acidente (se deixarem de receber oxigénio ou nutrientes), e dá-se a necrose – pode acontecer devido a tóxicos, a efeitos de energia cinética que esmaga a célula, a variações de temperatura, etc. As células também podem ser programadas para morrer (apoptose) ou podem ser eliminadas por células imunitárias do corpo (o que acontece também por apoptose). Por exemplo, no embrião formam-se membranas entre os dedos, que desaparecem porque as células sofrem apoptose. No caso do coração embrionário, as cavidades cardíacas estão cheias de células que sofrem apoptose e abrem a cavidade. A apoptose é então fundamental para a morfogénese.

A apoptose pode ser induzida pelas células do sistema imune ou por estímulos como temperatura, radiação, etc. Assim se prova que há factores comuns à apoptose e à necrose, sendo que efeitos mais fracos provocam geralmente apoptose.

Duas diferenças fundamentais entre necrose e apoptose: na necrose, a membrana rompe-se e o conteúdo da célula sai para o meio extracelular. Na apoptose, as células ficam engelhadas e formam-se corpos apoptóticos que têm membrana e que no seu interior contêm o que fazia parte da célula; estes corpos apoptóticos são depois fagocitados; assim, não se gera resposta imune em relação à apoptose, mas já há resposta à necrose. Para além disto, a necrose ocorre quando a célula não tem energia, a apoptose requer energia, e depende de enzimas proteolíticas (as caspases, enzimas específicas deste processo), de ligações cruzadas, da degradação do DNA e do reconhecimento para a fagocitose (o macrófago é responsável pelo reconhecimento de determinadas proteínas da membrana). O processo apoptótico é muito complexo.

A apoptose também está implicada em vias patogénicas: a inibição da apoptose explica parcialmente determinadas doenças, como as doenças auto-imunes (há células do sistema imune que atacam as nossas próprias células, porque não conseguimos fazer com que haja apoptose destas células), e do cancro (há proliferação celular, mas se houvesse apoptose, não havia formação de uma grande massa celular – se a apoptose estiver inibida, há descompensação e grande proliferação). O excesso de apoptose também pode ser mau: no caso da SIDA, os linfócitos TD4 são destruídos; doenças neurodegenerativas (Alzheimer, Parkinson) também podem ser devidas à morte celular em excesso, por apoptose descontrolada.

Vários mecanismos que levam à produção de espécies reactivas de oxigénio (hipóxia, radiações ionizantes, xenobióticos) levam à lesão do DNA, das proteínas, dos lípidos, e à perda de ATP. Outros factores (como o sistema do complemento, o trauma) podem levar ao aumento da permeabilidade, que leva ao aumento do cálcio, que activa

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proteases, que inibem bombas iónicas (tal como a perda de ATP), que levam de novo ao aumento da permeabilidade – processos cíclicos interligados que contribuem no seu conjunto para a produção de radicais livres.

Resumo de conceitos/terminologia:Quando as células são submetidas a uma sobrecarga de trabalho (ou estimulações

hormonais), podem adaptar-se a esta nova situação (temporariamente), sofrendo hipertrofia – aumento do volume das células em resposta aos estímulos. Estes podem, em determinadas condições, levar à proliferação celular – hiperplasia (pode ou não ser patológico). O oposto é a atrofia , por exemplo os músculos de uma pessoa acamada vão atrofiar (também muito comum no envelhecimento). A involução é a diminuição do número de células.

A metaplasia é a mudança do tipo de célula (aspecto), que é determinada por alterações do ambiente em torno da célula, ou por uma irritação crónica. Por exemplo, a porção terminal do esófago é revestido por um epitélio pavimentoso estratificado (parecido com o da epiderme), e em consequência do contacto com o refluxo gastro-esofágico (azia), há tendência para uma alteração do epitélio. Este muda (porque é pouco resistente ao ácido) e passa a ser parecido ao epitélio que reveste o estômago e o intestino – epitélio colunar. Há uma adaptação ao ácido. Há metaplasias que levam à formação de cancros; no entanto, metaplasia apenas significa alteração do tipo celular.

Agenésia e hiperplasia aplicam-se a alterações do desenvolvimento (quem nasce sem um rim tem agenésia ou aplasia do rim; não tem uma hipoplasia – nasceu logo sem ele, não é uma adaptação. Quando há uma adaptação, devido por exemplo a uma doença, diz-se que há uma atrofia do rim. Se já nasce com o rim mal formado, diz-se que tem uma hipoplasia do rim).

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Engenharia Biomédica – 3º ano, 1º semestreMecanismos Gerais da Doença (2006/2007)

Professores Mário Ramirez, Pedro Simas, Thomas Hanscheid

Aula desgravada por Ângela Pisco, Rita Malcata e Teresa Cardoso

1ª parte – Professor Mário Ramirez

Existem dois tipos de microscopia electrónica: varrimento e transmissão. Estamos a ver uma imagem por microscopia de varrimento da superfície de bactérias, a cor não é natural, é artificial.

Antes de falarmos de microbiologia é importante definir o que é um microrganismo.

Recorrendo ao dicionário de português da Porto Editora na sua versão on-line a definição de um microrganismo é que é um substantivo masculino, biologia, organismo animal ou vegetal de dimensões microscópicas.

Esta definição da Porto Editora é uma definição vasta, é uma definição que é manifestamente insuficiente.

Os microrganismos não são animais nem vegetais, classificam-se em domínios da vida completamente diferentes dos animais e vegetais e portanto são muito diferentes. Essa definição de microrganismos não nos serve de todo.

Para perceber melhor o que é um microrganismo, nós temos que perceber o que é uma célula, uma vez que todos os microrganismos são células, mas como são células de um tamanho muito pequeno são umas células um bocadinho diferentes daquelas que estão no nosso próprio organismo.

No entanto as células têm características especiais: uma das características importantes das células é que é distinta do meio ambiente e efectua trocas com esse meio ambiente, há coisas que entram na célula, há coisas que saem da célula e há coisas que são transformadas pela célula.

Uma das características essenciais é a célula ser capaz de se reproduzir, ao fim de algum tempo uma célula tem que ser capaz de se reproduzir, de dar duas células filhas idênticas

É também uma característica importante não só das nossas células, mas também das células bacterianas a capacidade de se diferenciarem, ou seja de existir um tipo de célula que pode dar um tipo diferente de célula.

(na imagem uma diferenciação celular por esporolação, diferenciação num tipo celular diferente que é o esporo)

As células são capaz de comunicar entre si, como é obvio que acontece com os nossos neurónios, mas as bactérias também comunicam entre si.

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Aula 5 – 18 de Outubro de 2006Tema: Microbiologia

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E finalmente (talvez) chegámos aquilo que levou à definição da Porto Editora a dizer que há células, que há microrganismos animais e vegetais: algumas células são capazes de se moverem! E essa qualidade do movimento é uma qualidade que está desde sempre associada aos animais. Aquilo que distingue um animal de uma planta, se eu perguntar a qualquer um de vós, se calhar é que as plantas não se mexem e que os animais mexem.

Não? Está um colega ali a dizer que as plantas também se mexem. E que plantas é que mexem? As plantas carnívoras. De facto têm um movimento, mas estão enraizadas naquele espaço. Eu não conheço nenhuma planta (também não sou botânico) que seja capaz de arrancar as raízes e ir com as raízes às costas para outro sítio qualquer.

É essa qualidade de movimento que os animais têm e que levou a essa tal classificação original de que algumas células seriam animais. Aliás vocês já ouviram de certeza a história do Leeuwenhoek (o Leeuwenhoek foi aquele senhor que inventou o microscópio): aquilo que mais o impressionou quando olhou para a gotinha de água foi que algumas células se mexiam, e portanto essas células eram indubitavelmente vivas e ele chamou-lhes animalcus e foi daí que aquele erro de classificação se propagou até ao dicionário da Porto Editora

E finalmente, e é uma característica que nós poucas vezes pensamos nela mas que é essencial a todas as células, é a capacidade de evoluírem, ou seja de nós termos uma célula ancestral que ao fim de milhares de anos de adaptação vai dar origem a células cujas propriedades diferem das propriedades daquela célula ancestral, portanto são células que se vão especializar e diferenciar em novas espécies.

Podemos pensar nessas funções ou nestas propriedades da célula como dependentes de duas funções: uma função de codificação de informação, e essa função de codificação como vocês sabem está contida no DNA, que é replicado, transcrito em RNA e que será depois traduzido em proteínas de modo a que essa informação possa ser transmitida às células filhas. São essas proteínas que na maior parte dos casos são os efectores dessa informação, aquilo que vai realizar as funções na célula e as funções são funções que os anglo-saxónicos chamam “machine functions” que são por um lado a obtenção de energia na forma de ATP e por outro a transformação de percursores em macromoléculas, o que leva a que se consigam produzir novas células. São estes os dois tipos de função.

Nós na microbiologia clínica tratamos não só de organismos que são microscópicos, como de organismos que são bastante macroscópicos, como vocês vêem ali pela fotografia do meio (ténia – parasita humano)

A microbiologia clínica também se debruça sobre o estudo destes organismos, que são parasitas humanos.

Outras fotografias:Fungos – podia ser o fungo do pão lá de casa, vocês vêem as hinfas e os esporos

(estruturas reprodutoras do fungo)BactériasLeveduras – são células eucariotas, a imagem é de microscopia de Luhmann,

em que o que se vê é o núcleo, porque tem um índice de refracção diferente do resto da célula

Vírus – Corona vírus – vírus da gripe

Estes microrganismos são por um lado microrganismos procariotas e por outro, tal como as leveduras e os fungos, organismos eucariotas.

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Qual é a diferença fundamental entre os organismos procariotas e os organismos eucariotas?

Os eucariotas têm um núcleo individualizado separado do resto da célula enquanto que os procariotas não têm, têm uma região onde se vai localizar o DNA que se chama nucleóide, mas não têm um núcleo individualizado, mas para além disso vocês vêem aqui, existem várias estruturas membranares internas à membrana nos eucariotas e que não existem nos procariotas e vocês identificam aqui os cloroplastos, as mitocôndrias e eventualmente o complexo de Golgi.

As mitocôndrias descendem das bactérias; e há uma teoria, que é a teoria mais aceite neste momento (Teoria Endossimbiótica) que é a que havia uma célula que teria uma morfologia mais ou menos procariota e que engoliu uma outra célula; essa célula mais pequena transformou-se na mitocôndria e a célula grande desenvolveu uma membrana interna que deu origem ao núcleo, e o mesmo aconteceu com o cloroplasto. Inicialmente pensava-se que os procariotas não tinham membranas internas e hoje sabe-se que existem procariotas com membrana interna, mas não têm organelos distintos.

A mitocôndria tem o seu próprio DNA, existe DNA mitocondrial. Até há uma teoria engraçada, sobre estes genes: estes genes são os genes Eva – até à bem pouco tempo pensava-se (hoje sabe-se que não é totalmente verdade) que as mitocôndrias só nos são transmitidas pelo lado feminino!

O que vocês se calhar nunca pensaram foi que esta distinção que todos tomamos por evidente entre procariotas e eucariotas é uma distinção muito recente, foi só em 1940/1950 que de facto esta distinção se fez e eu gostaria de perguntar se alguém tem alguma ideia de porque é que foi nesta altura que se fez esta distinção? Porque foi nesta altura com estudos de microscopia electrónica que de facto se puderam estudar todas estas estruturas e ver que a diferença que existia entre os microrganismos procariotas e eucariotas justificava a sua separação em dois ramos completamente diferentes da vida.

Portanto os eucariotas e os procariotas distinguem-se pela existência de um núcleo contra um nucleóide (não é uma estrutura individualizada) mas também se distinguem por outras características, por exemplo nos eucariotas os cromossomas são lineares enquanto que nos procariotas os cromossomas são circulares.

Vocês todos já viram os nossos cromossomas, que forma é que têm os nossos cromossomas? Têm um aspecto em grande na forma de X e os das bactérias parecem uma bolinha, é circular.

Mas existem outras diferenças entre estas duas classes de microrganismos, nós somos diplóides, sabem o que é que é ser diplóide? É ter um par de cada cromossoma, ter dois cromossomas, ou seja, fazer com que nós tenhamos para cada gene, que estão localizados em cada cromossoma, duas cópias, ao passo que as bactérias são haplóides, apenas têm um cromossoma e apenas uma cópia de cada gene.

E finalmente, uma questão que levantou ou que tem levantado muitas perguntas é a quantidade de DNA. Os eucariotas têm mais DNA e inicialmente pensava-se que teriam muitos mais genes mas como ficou evidente desde a sequenciação do genoma humano a relação que existe entre a quantidade de DNA e o número de genes não é uma relação directa. O número de genes que se identificou no genoma humano é muito mais pequeno do que aquele que se estava à espera; no entanto continua a ser verdade que em relação às bactérias nós temos muitos mais genes, porque as bactérias tendo menos DNA têm menos genes.

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Outra questão importante (e também introdutória) é o tamanho dos microrganismos. Os microrganismos como o seu próprio nome indica são pequeninos e o tamanho normal de uma bactéria varia entre 0.5 a 2m.

O que vocês vêem é uma fotografia de microscopia electrónica, colorida artificialmente, em que vêm as bactérias (bastonetes cor-de-laranja), um eritrócito (a vermelho) e um macrófago (célula fagocitária do nosso sistema imunológico) e como vêm as diferenças de tamanho são notórias: a bactéria é claramente mais pequena. Os vírus se tivessem representados seriam um pixel, menos do que 0,1m. Estamos a falar de coisas muito pequenas.

Porque é que as bactérias são pequenas?Quando nós aumentamos o raio de uma esfera de 1m a 2m a relação entre a

superfície e o volume passa de 3 para 1,5. À medida que nós aumentamos o volume da célula diminuímos a razão entre superfície e volume e portanto dificultamos as trocas com o meio exterior; e é por isso que as bactérias são pequenas. As nossas células evitam isso à custa dos organitos intracelulares, porque ao terem organismos intracelulares deixa de ser só o contacto com o meio extracelular e passamos a criar lúmens internos à célula, que podem funcionar como se fossem o meio exterior.

Aquilo que se separa o interior da célula do exterior é a membrana citoplasmática. A membrana citoplasmática é a principal barreira entre o que é externo e o que é célula e também é um local onde estão ancoradas outras estruturas e eu tentei representar aqui nesta figura 3 estruturas possíveis:1. proteína que funciona como um sensor, está a sentir a quantidade daqueles

quadradinhos amarelos no meio exterior;2. temos um conjunto de proteínas que faz um canal que deixa passar selectivamente

uma substância qualquer para o interior da célula;3. e temos aquilo que pretende ser um transportador que agarra nas bolinhas azuis e as

exporta para o meio exterior.

E vamos ver outras estruturas que também estão ancoradas na membrana. Como vocês sabem a membrana é uma camada bilipidica, tem dois folhetos, o folheto externo e o folheto interno que se organizam assim naturalmente uma vez que estas cabeças são hidrofílicas e esta região é hidrofóbica. E vocês vêem aqui um fosfolípido complexo, que é um constituinte habitual das membranas citoplasmáticas, é feito à base de glicerol substituído com ligações éster e ácidos gordos e vêem aqui um grupo fosfato e a etanolamina que constituem esta cabeça e que vão torná-la ainda mais polar. Portanto como vocês vêem aqui do lado esquerdo, vêem duas membranas em que existe uma região a preto separada por uma coisinha branca e depois outra região a preto que são as cabeças dos fosfolípidos, que são densas electronicamente, e portanto aparecem a preto na microscopia electrónica e a região branca que corresponde às caudas dos fosfolípidos, que deixam passar os electrões.

Quando se pensava em membranas bilipidicas pensava-se que eram estruturas rígidas e não foi senão dos anos 60/70 que os senhores Singer e Nicolson propuseram o modelo do mosaico fluído.

Neste modelo não só a membrana se formava facilmente como também se vocês olharem e pensarem que este é o plano da membrana as proteínas que estão inseridas na membrana não estão fixas num local mas deslocam-se livre e aleatoriamente na membrana de modo a irem ocupar novas posições; portanto as proteínas deslocam-se naquele plano bidimensional livremente.

O modelo da superfície bacteriana tal como visto por um artista é aquele. Temos proteínas que são transmembranares, que atravessam a membrana de um lado ao

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outro, temos proteínas periféricas que se associam à membrana mas não estão directamente inseridas e temos proteínas integrais que não atravessam a membrana mas que estão associadas a ela de algum modo e aqui então vêem a representação artística.

Os receptores, aquilo que sente as coisas para a célula, normalmente são proteínas.

As arvorezinhas são açúcares, são polímeros de açúcares, ou então são outras estruturas que também são constituídas à base de hidrocarbonetos.

Este modelo fluído, ou o entendimento de que a membrana era fluida, levou a estudos que vissem como é que nós poderíamos reduzir a fluidez da membrana e de facto descobriu-se que as nossas células, por exemplo, utilizam um composto para reduzir essa fluidez e esse composto é nada mais nada menos que o colesterol, portanto o colesterol é um nutriente essencial. Nós sem colesterol morríamos e com excesso de colesterol também morremos!

As bactérias não têm colesteróis, não usam o colesterol para reduzir a fluidez, a fluidez dos seus lípidos, mas usam opanóides ou esteróides, que têm exactamente a mesma função, são moléculas com anéis aromáticos.

E o que é que o colesterol faz? O colesterol insere-se na membrana e vai fazer com que as cadeias de ácidos gordos saturados que nós víamos no slide anterior se organizem e ao organizarem vai diminuir a energia vibracional destas cadeias e portanto vai diminuir a fluidez da membrana. Vamos passar de um estado cristalino, que seria a baixas temperaturas, para um estado líquido-cristalino, um estado fluído, a temperaturas normais e o que vamos conseguir com o colesterol é à mesma temperatura vamos reverter para um estado mais cristalino ou menos fluído da membrana.

A forma que a bactéria tem quando observada em microscopia óptica foi uma das primeiras coisas que o homem observou acerca das bactérias e desde cedo as pessoas se aperceberam que existem várias formas celulares e essas formas celulares têm a vantagem de nos permitir olhando pura e simplesmente para uma preparação saber (ou pelo menos ter um a ideia) de que tipo de bactérias é que nós temos nessa preparação.

Imagens de microscopia óptica:1. Cocos – são bolinhas (como o próprio nome indica) e o arranjo espacial desses

cocos também nos pode ajudar a classificar as bactérias, portanto dois cocos juntos chamamos diplococos, se tivermos uma cadeia de cocos todos juntinhos temos os estreptococos (conjunto de cocos), tetrados – conjuntos de quatro cocos (e isto tem a ver com os planos de divisão das células) e finalmente têm os estafilococos, estafilo é uma palavra grega que quer dizer cacho, é quando os cocos se organizam em cachos ou molhos mais ou menos irregulares. Esta apresentação das células é de tal maneira importante que existem alguns géneros bacterianos que obtiveram o seu nome a partir desta organização. Por exemplo existe um género bacteriano que é o género Streptococcus ou o género Staphylococcus.

2. Bastonetes ou bacilos – são células alongadas, não são cocos, e vocês vêem aqui naqueles bastonetes uma coisa esquisita. Qual é a coisa esquisita que está ali? Há uma espécie de uma coisa aqui dentro, um corpo refringente ali no meio, e esse corpo refringente é um esporo, as espécies do género Bacilos são muitas vezes esporoladas.

3. Espiroquetas ou espirilos – são células com forma ondulada;4. Vibriões – têm a forma de ¼ de lua.

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Existem células/bactérias de espécies patogénicas com todas estas formas. Temos os Streptococcus pyogenes, que são a causa bacteriana mais importante de faringite ou amigdalite; temos o Bacillus anthracis – alguém se lembra? – o Bacillus anthracis andou na boca no Mundo por causa do antrax, o antrax é uma palavra que não existe em português, foi inventada agora pelos jornais, a doença causada pelo Bacillus anthracis chama-se carbúnculo em português. Temos uma bactéria com a forma de um espirilo, chamado o Treponema pallidum, causa a sífilis (DST); temos os vibriões, dos quais o mais famoso é o Vibrio cholerae, toda a gente já ouviu falar na cólera certamente. Em tudo há microrganismos patogénicos.

O que é que mantém a forma celular? O que mantém a forma celular é a parede celular. A parede celular é uma estrutura semi-rígida que sustenta uma pressão intracelular de várias atmosferas de vida à pressão osmótica, e é a parede celular que suporta essa pressão osmótica, portanto se nós retirássemos a parede celular – o que é que acham que acontecia à célula? – a célula rebentava.

As nossas células têm parede celular? As nossas não! Então, como é que é?A pressão extracelular a que as nossas células estão sujeitas não tem nada a ver,

porque as bactérias estão em ambientes que não têm praticamente nutrientes, portanto os nutrientes estão todos concentrados aqui dentro, temos uma pressão osmótica enorme; as nossas células estão em contacto com uma solução que está no nosso corpo e que está ela própria controlada, mas mesmo assim as nossas membranas precisam de estar rígidas e o que confere essa rigidez é exactamente o colesterol.

Alguém já ouviu falar do método de coloração de Gram?O método de coloração de Gram distingue as bactérias em quantos grupos?Dois. As Gram positivas e as Gram negativas. As Gram positivas são roxas

(azuis ou violetas) e as Gram negativas são vermelhas. Isto tem a ver exactamente com a estrutura da superfície bacteriana.

As bactérias Gram positivas têm como camada mais externa uma camada muito espessa de peptidoglicano, portanto a camada mais externa que a célula está a oferecer ao meio exterior é o peptidoglicano e abaixo do peptidoglicano está então a membrana citoplasmática e vê-se numa fotografia de microscopia electrónica a camada espessa de peptidoglicano e a membrana citoplasmática.

As bactérias Gram negativas são cor-de-rosa ou vermelhas ou o que for e têm uma estrutura de superfície substancialmente diferente. Também têm peptidoglicano (o peptidoglicano como eu vos disse é essencial para suportar a pressão extracelular), mas exteriormente ao peptidoglicano (e o peptidoglicano como vocês vêem aqui facilmente é uma camada muito mais fina do que no caso das bactérias Gram positivas) têm uma membrana externa.

Esquematicamente têm a membrana externa, uma região interna onde está o peptidoglicano (que é uma linha muito fininha) e a membrana interna ou membrana citoplasmática.

Então gera-se um problema, como é que nós deixamos passar as coisas para este espaço, para esta zona aqui chamada o periplasma, como é que as coisas passam para puderem chegar a esta zona e interagir com a membrana e serem depois transportadas para o citoplasma?

A maneira como as bactérias resolveram isso foi criando estruturas chamadas purinas, que são canais proteicos que se localizam na membrana externa e que permitem a passagem da maior parte das substâncias ou pelo menos da maior parte das substâncias até aos 600daltons (bastante grande).

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Qual é a estrutura desta tal malha que faz a retenção da pressão osmótica? É constituída por peptidoglicano, que como o próprio nome diz é uma cadeia peptídica constituída por dois oligossacáridos, o ácido N-acetilmurâmico e a N-acetilglucosamina, ligados entre si por uma ligação -1,4 e essa ligação é importante porque existem enzimas no nosso organismo que fazem parte do nosso sistema imunitário inato, portanto aquele que já nasce connosco, que vão atacar aquela ligação, vão partir isto e ao partir isto fazem buracos naquela malha e matam as células. A enzima chama-se lisozima e existe em grandes quantidades nas lágrimas, saliva e em todos os fluidos corporais que nós mandamos cá para fora.

Ligado ao ácido N-acetilmurâmico temos um péptido, e daí chamar-se peptidoglicano, constituído por 5 aminoácidos que também tem uma particularidade, esses aminoácidos são aminoácidos D (os que existem no nosso corpo e nas proteínas das bactérias são aminoácidos L), estes aminoácidos são aminoácidos especiais que só vêm aqui para a parede ok?

E depois têm, no caso deste peptidoglicano em particular, que é o peptidoglicano do Staphylococcus aureus, uma ponte de glicinas que faz então a ligação entre cadeias adjacentes de glicano e que conferem rigidez àquela malha.

Uma característica importante da membrana externa (e é importante porque é um contaminante habitual do meio ambiente, existe em grande quantidade no meio ambiente) é que o folheto externo e o folheto interno, ao contrário do que acontece com a membrana citoplasmática, não são simétricos, a composição do folheto externo é diferente da composição do folheto interno.

O folheto externo contém para além dos fosfolípidos uma substância chamada LPS; o LPS ou lipopolissacárido, também conhecido como endotoxina, é um potente activador do nosso sistema imunológico; o nosso sistema imunológico reconhece o núcleo polissacárido e esta fracção do LPS, o lípido A, é altamente citotóxico, mata as nossas células.

Se eu injectasse em algum de vós uma preparação de endotoxina essa pessoa rapidamente entraria em choque anafilático gerado pela resposta imunológica a esta substâncias e poderia até morrer. Portanto é uma substância que se evita que esteja presente em todos os tipos de compostos que nós utilizamos na saúde.

Até aqui falámos de morfologia das bactérias, falámos de estruturas comuns, da membrana citoplasmática e da parede celular e das funções e falámos da coloração de Gram e da organização da superfície bacteriana.

Alguém tem dúvidas? Não? Então eu vou prosseguir!

Os vírus! Os vírus não são células! Têm material genético mas não têm ribossomas, portanto não são eles próprios capazes de executar essa informação genética ou no fundo de actuar sobre essa informação e fazer qualquer coisa. São parasitas celulares obrigatórios. E como parasitas celulares obrigatórios que são classificam-se de uma maneira diferente da classificação das células.

O glicocálix é todo o material externo à parede celular (e entenda-se por parede celular o peptidoglicano e os compostos associados e a membrana externa).

Porque é que o glicocálix é importante? Porque é a primeira camada a interagir com o meio ambiente e com outros organismos, sejam microrganismos, seja o nosso sistema imunitário. Nas bactérias que têm ou que produzem um glicocálix é contra esse glicocálix que muitas vezes o nosso sistema imunológico monta a resposta imunológica. Como o nosso sistema imunológico vê superfície, se existe aqui um polissacárido é contra esse polissacárido que o nosso sistema imunológico vai montar a sua resposta.

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A cápsula é o nome que o glicocálix tem quando é abundante. Quando o glicocálix é muito espesso chamamos cápsula, se fosse menos espesso

chamar-lhe-íamos camada mucilaginosa. A razão porque sabemos que ela lá está, apesar de não a conseguirmos ver ou de a vermos com muita dificuldade é que podemos identificar os anticorpos que a reconhecem, portanto sabemos que ela está lá apesar de termos dificuldade em vê-la.

(descrição de uma imagem de microscopia electrónica ilustrativa do que está acima explicado)

Vocês sabem que para fazer microscopia electrónica temos de retirar a água toda da amostra. A cápsula é muitíssimo maior do que as células, é uma coisa volumosa que envolve as células.

A cápsula é constituída por polissacáridos, normalmente são extremamente diversos, por exemplo em Streptococcus pneumonia existem 90 tipos diferentes, 90 estruturas polissacáridas diferentes, o que obviamente tem vantagem para a bactéria. E que vantagem é que vocês acham que tem ter muitas cápsulas diferentes? Se vocês imaginarem uma população de bactérias em que têm dois tipos de bactérias, as bactérias vermelhas e as bactérias azuis, que vão infectar uma população humana, como o que nosso sistema imunológico vê é o exterior, depois de esta bactéria (vermelha) infectar estes indivíduos, estes indivíduos vão ficar protegidos contra essa infecção, portanto esta bactéria não vai ser capaz de infectar novamente estes indivíduos; mas a outra (azul) vai, portanto é vantajoso para a célula, para as bactérias enquanto população, terem várias cápsulas. A cápsula é também um factor de virulência, protege contra o nosso sistema imunológico e pode promover a adesão das células bacterianas às nossas próprias células. Também protege contra a secura e é uma reserva de nutrientes, o que obviamente é útil para a bactéria.

Mas existem outros apêndices procariotas, alguém sabe dizer algum?Flagelos – são de facto apêndices procariotas, são essenciais para a mobilidade.Mas existem outros apêndices procariotas como as fímbrias, ou pili, e os pilis

sexuais, já vamos ver o que é que é cada uma destas estruturas. Portanto os flagelos são usados para a movimentação, as fímbrias na adesão e os

pili sexuais para promover trocas genéticas uma vez que as bactérias (assumo que vocês sabem) não se reproduzem da mesma maneira que nós, a bactéria divide-se por fissão binária, não é preciso haver duas bactérias para darem uma bactéria mais pequenina, elas reproduzem-se sozinhas, mas de facto têm uma forma de troca genética ou de sexualidade particular.

Vamos falar primeiro em flagelos.Os flagelos pode ser apenas um ou vários, podem se localizar de maneiras

diferentes e portanto têm nomes diferentes de acordo com a sua localização ou número. Já agora trico, esta terminação trico vem de uma palavra grega e quer dizer pêlo. Portanto monotrico quer dizer só um pêlo.

(agora era a altura em que iríamos ver um filme que mostra a diferença entre movimento browniano e mobilidade)

No movimento browniano conseguimos ver as partículas, se forem suficientemente pequenas, a moverem-se de acordo com o movimento browniano, o que é claramente diferente da mobilidade normal das bactérias. O que provoca o movimento

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browniano é que a água não está parada e portanto se as partículas forem suficientemente pequenas andam com os movimentos da água, há fluxos na água e como as preparações são de fresco, as células estão em suspensão e as partículas andam. Quando se observa há umas que andam assim lentamente a mover-se de acordo com o movimento browniano e depois há outras que fazem assim “vuuu” (passam muito depressa), essas são as que andam mesmo com flagelo.

A mobilidade é dada pelos flagelos. O flagelo é uma estrutura que tem assim este tipo de forma e o que acontece é que na ponta do flagelo existe uma estrutura proteica que é no fundo um motor, é um motor que não funciona a gasolina, funciona a protões. E ao deixar entrar protões todo este conjunto de proteínas vai rodar e ao rodar o que é que vocês acham que vai acontecer ao flagelo? Roda como aquelas máquinas de bater bolos lá de casa, portanto o flagelo não é flexível (vocês podiam imaginar que ele ondulava mas não) e ao rodar sobre este eixo funciona como a batedeira e a célula move-se de acordo com essa batedeira.

Portanto a mobilidade por acção do flagelo é 0,00017km/h, vocês acham que isto é muito ou que isto é pouco? É muito rápido ou muito lento aquele movimento? São 60 comprimentos celulares por segundo! Alguém sabe qual é o animal mais rápido à face da terra? É a chita! Qual é a velocidade a que a chita corre, alguém sabe? De facto a chita move-se a 110Km/h mas isso corresponde a apenas 25 comprimentos corporais por segundo. As bactérias movem-se muito mais depressa do que as chitas!

Isto não interessa! Vamos saltar isto tudo!

Vamos só falar nas fímbrias, as fímbrias são estruturas curtas, finas e rectas que estão frequentemente envolvidas na parte da osmicidade e nós vemos ali uma bactéria com fímbrias à volta. As fímbrias são constituídas por duas proteínas, uma proteína que se repete ao longo de toda a fímbria chamada pilina e na ponta da fímbria estão expressas adesinas, que pode ser uma ou várias. Promove a adesão específica das bactérias principalmente a oligossacáridos e eventualmente a glicoproteínas e glicolípidos e nós sabemos isso porque podemos inibir competitivamente aquela ligação, se nós dermos os oligossacáridos solúveis vamos inibir a ligação das bactérias. Em que bactérias é que isso é importante? Por exemplo nas bactérias que colonizam a nossa uretra. Vocês sabem que cada vez que vão à casa de banho esvaziarem a vossa bexiga faz com que todas as bactérias que estão na uretra vão com aquela corrente, é um arrastamento físico das bactérias. O que é que acontece quando nós temos uma infecção urinária? Temos uma infecção urinária porque as bactérias que vão causar essa infecção urinária produzem fímbrias específicas que vão promover uma adesão muito mais forte das células às células epiteliais da uretra e portanto quando nós passamos a urina já não há o arrastamento físico das células mas as células ficam agarradas e assim vão progredir até atingir a nossa bexiga onde irão causar uma infecção urinária.

Os pílis sexuais são usados para promover trocas genéticas, vocês vêem ali o que acontece, vêem ali uma célula que é uma célula que produz píli, é uma célula cabeluda que basicamente o que faz é agarra uma célula careca e transfere o DNA para essa célula careca. No fim de um destes processos de conjugação o que acontece é vocês vêem ali um bocadinho de DNA vermelho na célula cabeluda, o que acontece é que esse bocadinho de DNA vermelho passou para esta célula careca.

Os esporos são importantes porque os esporos exibem uma grande resistência à temperatura, aos agentes químicos, ao pH e à pressão osmótica. Portanto as bactérias esporoladas vão conseguir resistir aos processos de desinfecção que nós aplicamos com muito mais eficiência que as células vegetativas, as células normais, no entanto o esporo

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não está metabolicamente activo mas está dormente e pode germinar, ou seja, produzir células vegetativas quando as condições sejam favoráveis.

Isto foi o que falámos! Falámos de morfologia celular variada, de estruturas comuns, da coloração de Gram e depois falámos um bocadinho das estruturas específicas das bactérias e da sua função

Apenas para terminar… Não! Vamos falar disto…

Vamos falar um bocadinho de metabolismo bacteriano.Existem alguns elementos essenciais de crescimento das bactérias, um deles é o

ferro e o ferro é um elemento que nosso corpo – vocês acham que existem muito ferro no nosso corpo? – no nosso corpo existe bastante ferro, na hemoglobina, o que não há no nosso corpo é ferro livre e a razão porque não há ferro livre vai ser obvia dentro de pouco de tempo.

A obtenção de energia faz-se ou por respiração, como é o nosso caso, ou por fermentação e a necessidade de haver oxigénio no meio para o crescimento permite-nos classificar os microrganismos em aeróbios ou anaeróbios (aqueles que crescem na ausência de oxigénio) e os aeróbios que podem ser obrigatórios (apenas crescem se houver oxigénio) e os anaeróbios obrigatórios (só crescem quando não há oxigénio) e depois temos os anaeróbios facultativos que podem crescer tanto na ausência como na presença de oxigénio.

Como vocês sabem a respiração começa com a degradação da glicose e depois termina com uma via de transporte electrónico e vocês sabem quanta energia é que conseguem tirar de uma glicose por respiração? 30 e muitas moléculas de ATP e quantas é que nós conseguimos por fermentação? 4 (se for o lactato), mas pode variar consoante o produto final. Portanto o rendimento energético é muito inferior na fermentação do que na respiração.

Se nós semearmos a mesma caixa de Petri com quatro microrganismos e incubarmos uma em aerobiose, uma em microaerofilia (pouco oxigénio) e uma em anaerobiose podemos classificar os microrganismos. Por exemplo o Micrococcus luteus é aeróbio obrigatório, só cresce quando há oxigénio. O Clostridium sporogenes é anaeróbio obrigatório. A Escherichia coli cresce em todas as placas

Porque é que os microrganismos são anaeróbios ou aeróbios e porque é que no nosso corpo não existe ferro livre? O ferro ajuda a gerar radicais de oxigénio e os radicais de oxigénio reagem com tudo e mais alguma coisa e portanto nós não gostamos de ter radicais de oxigénio no nosso corpo e também não gostam as bactérias. Portanto as bactérias que são anaeróbias obrigatórias não têm as enzimas necessárias para destoxificar esses radicais de oxigénio e que enzimas são estas?

É a catalase, que transforma o peróxido de hidrogénio em oxigénio e água, e a peroxidase, que pega nos radicais de oxigénio e transforma-os em oxigénio molecular. As bactérias vão utilizar estes radicais de oxigénio contra nós próprios. O nosso próprio sistema imunitário também tem um sistema face às bactérias em que é a produção destes radicais de oxigénio localizada contra a bactéria que é usada como arma. O oxigénio é uma substância essencial à vida, sobretudo à nossa vida, mas é também uma substância tóxica!

E eu ficava-me por aqui…Desgravada por Ângela Pisco

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2ª parte – Professor Pedro Simas

Vamos falar de descontaminação, são todos conceitos super intuitivos.

Podemos definir descontaminação como redução de microorganismos para um nível aceitável. Existem duas formas ou dois métodos de descontaminação: desinfecção e esterilização. A esterilização é a eliminação total dos microorganismo a partir de uma superfície, pode ser conseguida através de altas temperaturas e outros processos( como veremos mais a frente). A desinfecção é a redução do número de microorganismos para um nível que não cause doença.

A antisépsis desinfeção de um tecido vivo.A sanitição é a desinfecção associada ao conceito de saúde pública.

O que vos vou falar são as várias formas para se chegar à esterilização e à desinfecção.

A esterilização é a remoção, ausência de microorganismo, quando se esteriliza um instrumento cirurgico não existem qualquer microorganismo, mas obviamente não podemos esterilizar uma ferida.

O desinfectante ideal seria o que matava os microorganismo e não matava as células vivas, mas isto não existe, tem-se sempre um compromissso. A primeira pessoa ("agora não me lembro do nome"), no sec. XIX, quando se começou a operar, começou por usar fenol (pois ja existia esta ideia de microorganismo e de infecção) para fazer spray nas féridas cirurgicas evitando a infecção. O fenol, promove a desnaturação das proteinas (utilizado na preparação de DNA), mas é tão agressivo que os cirurgiões tiveram que começar a usar luvas, ja viram coitados dos doentes!!

Nas folhas que eu vos dei existem uns conceitos interessantes o de agente bacteriostático, que significa para e o de agente bactericida significa que mata. Um agente bactericida pode ser um antibiótico, o calor, quando se aplica, eliminamos a populção microbiónica, ao remover esse agente a população não volta a crescer. Pelo contrário, quando se aplica um agente bacteriostático, a população para de crescer, e o crescimento continua parado enquanto se mantem o agente e, quando se remove o agente a população começa a crescer a partir da plataforma onde estava.

O desinfectante é o líquido que promove a desinfecção. Atenção não confundir o termo desinfectante com o de desinfeccção.

O mercurio é um metal pesado (tóxico), um agente bacteriostático, que era muito utilizado em sífilis, existe uma frase muito famosa "uma visita a venus leva a uma premanência em mercúrio".

(Descreve o slide )Temos aqui a esterilização, a desinfecção, alguns exemplos:

descontaminação de instrumentos neurocirúrgicos por esterilização em autoclave- tem que estar esterilizado, não pode estar desinfectado

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descontaminação de bancadas de laboratório com um desinfectante- por exemplo a nossa sala esta infectada, está colonizada, neste caso a infecção significa invasão.

Eu disse-vos que a esterilização era a destruição completa de todos os microorganismos presentes, enquanto que a desinfecção era a redução dos microorganismo para niveis aceitaveis e insuficientes de causarem doença, porque a infecção está relacionada mais uma vez com esta noção de virulência, doença para o Homem. Enquanto a descontaminação está mais relacionada com o meio ambiente, não se diz que se vai desinfectar o meio ambiente, quanto muito desinfecta-se um bloco operatório, em termos gerais, descontamina-se porque houve um cargueiro a largar fuel oleo ou houve descarga de qulquer coisa ou por radiação... A infecção geralmente é um termo médico.

Quais são os métodos de descontaminação?Há por calor, radiação, gases e líquidos químicos.Vocês vão ver que todos eles podem ser usados ou para desinfecção ou para

esterilização.Vocês podem usar o calor como meio desinfectante, não é muito eficente, só o

calor húmido o é. Quando pasturizam o leite, inibem e matam algumas bactérias mas não o esterilizam, porque se o fizessem aquilo ficava em caramelo. O calor pode ser usado como meio de pasturização ou como desinfecção; todos eles, a radiação, gases e líquidos químicos... Se vocês puserem um líquido químico, por exemplo uma solução de cloro pouco concentrada pode ser utilizada para desinfectar, mas se for muito concentrada e a deixarem por algum tempo ela esteriliza.

Vamos ver agora o calor, que pode ser húmido ou seco. O húmido é muito mais efectivo do que o seco porque conduz melhor, por exemplo 120ºC durante 30-40 min. com pressão é suficiente para atingir o mesmo nivel de descontaminaçaão do calor seco a 160ºC durante 2-4h. É óbvio que vocês muitas vezes podem preferir calor seco a calor húmido (por exemplo, eu quando estava em cambridge,tinha a paranoia de por as pontas no forno seco, mas ao fim de 4 ou 5 vezes aquilo desintegrava-se, depois deixe de fazer isso, hoje em dia as pontas não tem contacto humano...mais o resto da historia de que existem pessoas que infectam as culturas...).

RadiaçãoPor exemplo a radiação ultravioleta é obvia, vocês sabem que estes raios são

toxicos, causam cancro, isto porque causam mutações nas bases pirimidinas, promovendo a formação de dimeros, deixando de haver a funcionabilidade de determinados genes, o nosso mecanismo de defesa para isso: há uma mutação no gene que codifica uma proteina, que em quase 100% dos tumores humanos esta alterada, esta proteina é o P53 (enzima que quando detecta uma alteração a nivel genomico induz apotose na célula). È óbvio se os raios ultravioletas fazem isto, destroem microorganismos. Nós usamos raios ultravioleta por rotina, em termos de descontaminação, nas salas de cultura de tecidos, nas hotes, porque é muito mais prático ter uma luz muito abrangente do que andar a limpar aquilo com desinfectante ou estar a fumigar com gás e, atinge-se um nivel de desinfecção aceitável, necessário para garantir a não contaminação das culturas.

Os raios gama e os raios x já são muito mais invasios. Ao excitarmos um electrão à volta de um núcleo, há emissão dos fotões, logo o raio x ou gama são

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radiações com determinados comprimentos de onda e certas frequências, podendo ser mais ou menos energéticas, percorrendo distâncias menor ou maiores, sendo mais ou menos penetrantes. Os raios x são muito erráticos e perigosos, por isso não são muito utilizados em descontaminação, mas os raios gama já o são em determinados instrumentos cirúrgicos ("o resto das coisas são básicas e depois vocês completam com os slides")...

Gases e vapores têm uma desvantagem são carcinogénicos porque no fundo, muito dos compostos actuam por interferência com DNA. O óxido de etilieno é usado em situações muito particulares em câmaras de esterilização, porque é muito inflamável e muito caro, e geralmente utiliza-se misturas com 90% de dióxido de carbono, logo é um risco, no entanto é dos poucos gases que tem efeito microcida (que elimina os microorganismos). De facto, é usado muito pouco e não tanto com descontaminante mas na industria dos frigoríficos e se forem a net está mais relacionado com situações de intoxicação.

O formaldeido pode ser utilizado como gás ou como líquido, o que se utiliza muito são as bombas de fumigação. O formaldeído também é uma substância que promove a ligação cruzada das proteínas, inactiva tudo, fixa as coisas, é um preservativo. Por exemplo, temos uma sala com imensos aparelhos que queremos descontaminar, temos duas hipóteses ou limpamos tudo com desinfectante e pintamos com uma tinta à base de óleo ou mandamos uma bomba de formaldeído, mas temos que ter a certeza que está tudo bem fechado, para que o formaldeído não possa sair, e que depois o consigámos eliminar, pois o formaldeído é carcinogénico.Com um gás temos uma maior probabilidade de efectivamente descontaminar, esterilizar um quarto, uma câmara.

Líquidos químicos são os tais chamados por desinfectantes, em senso comum. Os líquidos químicos são aplicados segundo quatro critérios: tipo de superfície, os microrganismos que se querem desactivar, a presença ou não de tecidos vivos e a duração e temperatura do tratamento. Digam dois tipos de superfície: liso e rugoso. O mais díficil de descontaminar é o rugoso, por razões óbvias, porque com tem mais superfície é necassária maior quantidade para chegar a todo o lado. Existem microorganismos mais fáceis de inactivar do que outros, por exemplo, o esporo é muito mais díficil de inactivar do uma forma vegetativa; Um prião, que é um agente infeccioso não convencional, é ainda mais díficil (sendo mesmo resistente a radiações muito altas).

Agora temos aqui uma escala simplificada, o virus com involucro lipo-proteico são mais fáceis de inactivar porque o virus para infectar a célula tem que interagir com ela (por meio dos receptores celulares), logo se o virus tem uma membrana qualquer detergente lipossolúvel destroi essa cavidade do virus, um alcool destroi a maioria dos virus com involucro, por outro lado, um virus nu já não é destruido por um alcool é preciso ser um cloro, de modo a desnaturar a cápsula de modo que aquilo deixe de estar ligado ao receptor.

A presença de material orgânico torna mais díficil de inactivar o microorganismo, pois é necessário mais desinfectante.

O factor duração é óbvio quanto mais logo mais eficiente é o tratamento; quanto maior a temperatura maior a probabilidade de colisão, aumenta-se a cinética. Mas, depois também é interassente porque é que um alcool a 70% é melhor descontaminate do que um a 90%, pois este último evapora mais depressa, o tal compromisso. O éter é um péssimo desinfectante pois evapora logo.

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Os compostos de Amónio Quaternáriosão os mais usados nos detergentes de casa porque são pouco agressivo mas também são pouco eficientes.

Os melhores são Clorino e Iodino, principalmente o iodino e os seus derivados.

Queria acabar por esclarecer: regral geral a desinfecção está relacionada com líquidos químicos, e esterilazação são mais as outras coisas. Na descontaminação é importantíssimo na escolha do método ter em conta o tipo de agente biológico, concentração e o risco de exposição, e os riscos físicos e químicos para produtos, materiais, ambiente e pessoal.

Desgravada por Rita Malcata

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3ª parte – Professor Thomas Hänscheid

Para começar, vamos tentar fazer uma ponte entre microbiologia e a bioengenharia.

- Quais os empregos que vocês, futuros bioengenheiros, podem ter? Vêm-se confrontados com, por exemplo, pessoas que necessitam de colocar próteses. Vamos ver um caso específico: os velhotes. De que morriam dantes muitos velhotes? De quedas! E as quedas conduziam a quê? A fracturas nos ossos, mais especificamente, no fémur. Depois, estes velhotes nunca mais se conseguiam levantar e andar, pois precisavam de meses e meses de recuperação, ficando, consequentemente, acamados. E agora, o que acontece a pessoas que ficam acamadas durante tanto tempo? Morrem! E morrem porquê? Morrem com pneumonia! E morrem de pneumonia porque não conseguem respirar como uma pessoa normal e porque não fazem exercício. Mas isto tudo verificava-se à uns 30, 40 anos atrás, altura essa em que não havia medicação para curar a pneumonia. Daí que muitos velhotes que se encontrassem acamados morressem com pneumonia. Mas hoje em dia muitos velhotes sobrevivem após sofrerem estas fracturas. E porquê? Porque se colocam próteses! E a colocação de uma prótese é uma operação bastante grande, que implica uma grande abertura a nível das ancas e da coxa! Depois, é necessário cortar-se o osso todo para se colocar a prótese. Então, e onde entram vocês, futuros engenheiros biomédicos? Bem, nós, médicos, sabemos, com certeza, fazer a operação. Mas o que nós vamos colocar, a dita prótese, tem de ter diversas características, e não pode haver falhas que possam por em risco a saúde dos doentes. Por exemplo, uma das características é a estabilidade! A prótese tem que durar vários anos, para que o doente só tenha que voltar a sofrer nova intervenção daí a vários anos. Há uma outra característica muito importante, que está relacionada com microorganismos! Então e porquê? A prótese que se está a colocar é um corpo estranho. Se esta prótese não tiver as características necessárias, pode, após a sua colocação, conduzir a uma infecção, tendo que ser, depois, retirada! Isto é só para terem uma ideia do vosso papel daqui para a frente. Outro exemplo. Se vocês colocarem um cateter para realizar um exame qualquer, constituído por um material qualquer, o que irá acontecer? As bactérias levadas para dentro do organismo por esse material vão desencadear uma resposta inflamatória! Então o vosso papel é proporcionar-nos material que nós,

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médicos, possamos utilizar nos exames e operações. Têm, por exemplo, que nos proporcionar material com iões de prata incorporados. E qual a acção dos iões de prata? Os iões de prata vão sendo libertados, eliminando as bactérias que aí existam. Assim, a infecção e consequente inflamação, são prevenidas.

- Outro assunto importante: esterilização. Como se esteriliza um cateter de plástico, por exemplo? Elevando a temperatura! Mas agora, eu não sei o que acontece na vossa casa, mas quando eu coloco plástico no fogo, este derrete, e quando se fala em esterilização está-se a falar em temperaturas de 130º. Vocês conhecem algum conjunto de plásticos que aguentem 20 a 30 minutos perante temperaturas assim tão elevadas? Aqui está uma tarefa para vocês: descobrir que plásticos são esses que aguentam tais temperaturas, e que depois previnem infecções! E para isso vocês têm que ter diversos conhecimentos acerca de microorganismos! Que outra forma vocês têm para esterilizar estes cateteres? Utilizando gases! E que gases? Isso vai depender do material em questão, pois ao colocar-se o gás é necessário que o material só permita a passagem do gás e não das bactérias!

- E uma algália... vocês sabem o que é uma algália? A colocação de uma algália permite ao doentes fazer as suas necessidades sem se mexerem. E onde se colocam as algalias? Na uretra! Coloca-se um tubo na uretra! No homem não é assim tão simples como isso, pois a distância a percorrer é muito superior à distância a percorrer na mulher. E o tubo vai aí permanecer durante quanto tempo? O tempo que for necessário! Dias, semanas, ou até meses! E este tubo tem que respeitar várias restrições. Deve ser de plástico, mas que plástico? Deve ser um plástico fácil de esterilizar, que impossibilite a colonização de bactérias. Se a uretra ficar infectada por bactérias, pode-se desenvolver uma infecção urinária, muito comum nas mulheres. Tive conhecimento de um caso, em que uma rapariga foi hospitalizada por ter sofrido um AVC, tendo acabado por morrer devido a uma infecção urinária, por causa da colocação de uma algália. Outra característica a ter em conta é as dimensões da algália que não devem ser muito finas. Isto porque a urina tem cristais e muitas outras coisas, que, se cristalizarem na algália, podem causar o seu entupimento. Para evitar tais situações, deve-se estudar qual o melhor diâmetro possível. Contudo, o tubo que se coloca na uretra não fica todo no interior do corpo. Uma ponta fica no exterior, de forma a conduzir a urina para o exterior. E para onde se vai conduzir a urina? Para um saco? Deve-se ter a noção que a urina é um óptimo meio de cultura de bactérias e o que se colocar em contacto com o tubo da algália terá, igualmente, de respeitar diversas condições. Isto porque, se se desenvolver uma colónia de bactérias na urina, esta vai ascender até à algália, provocando uma infecção urinária. Formas de evitar essas situações é a colocação de válvulas de anti-refluxo, assim como se colocar o saco onde se concentra a urina a um nível mais baixo que o doente, para não haver refluxo de urina do saco para a uretra.

Vamos agora começar com a aula de microbiologia em si.Que tipos de microorganismos existem? Existem 4 grandes grupos: Bactérias,

vírus, fungos e parasitas. Vamos agora ver alguns dos aspectos mais importantes relacionados com os 2 primeiros grupos: bactérias e vírus.

Relativamente às bactérias, deve-se saber que elas se multiplicam. A bactéria mais perigosa que existe em Portugal é a bactéria que provoca a tuberculose. Esta bactéria é muito resistente ao ácido do estômago. Agora uma coisa muito interessante: em Portugal existem muitas pessoas com tuberculose, e cada vez que cada uma dessas pessoas tosse ou espirra milhões de bactérias são expelidas para o ar. Então como é que se pode explicar que o nível de bactérias na atmosfera seja muito reduzido? O nível de bactérias na atmosfera é muito reduzido derivado às radiações ultravioletas! As

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bactérias não gostam dessas radiações, e morrem rapidamente quando expostas a essas radiações! E agora... existem bactérias na pele? Existem, e em grandes quantidades! E mesmo após sucessivas lavagens, a quantidade de bactérias na pele não sofre uma diminuição considerável. Então para que serve a lavagem das mãos? Serve para eliminar as bactérias que não pertencem a flora característica da nossa pele e que podem causar doenças. Isto porque as imensas bactérias que se encontram na nossa pele fazem parte da flora característica da nossa pele, e não necessitam de ser eliminadas. Uma das bactérias que pode causar doenças e que não faz parte da nossa flora normal são as salmonelas. Uma outra noção importante a se reter é que existem milhões de tipos diferentes de bactérias, vírus, fungos e parasitas, mas apenas uma pequena parte, à volta dos 200, é que constituem o grupo de bactérias que realmente causam infecções. Agora, será que existem bactérias nos olhos? Os olhos não têm bactérias. Daí que as lágrimas tenham uma substância anti bacteriana. E na boca? Existem bactérias na boca? Existem! E é dai que surgem as cáries. Por alguma razão se usam pastas dentárias com substâncias anti-bacterianas. No estômago também existem bactérias, derivadas do baixo pH presente no estômago. E no intestino, será que existem bactérias? Só para se ter uma ideia, as fezes que nós expelimos são, na sua maioria, compostas de bactérias. Quase 90% da constituição das fezes consiste em bactérias. Mas estas bactérias, presentes nas fezes, não são, nem poderiam ser, muito patogénicas. Contudo, se estas bactérias, por algum motivo, entrarem em contacto com o resto do organismo, que não o intestino, podem causar uma infecção muito grave, podendo conduzir à morte da pessoa em questão. E nos pulmões? Se existissem bactérias nos pulmões, então estar-se-ia na presença de uma pneumonia! As bactérias que se encontram na boca não passam para os pulmões. Relativamente à vagina das mulheres, existem varias bactérias. Como se pode ver, agora, por este slide, apenas 10% no nosso corpo é “humano”, sendo que os restantes 90% é composto por bactérias.

Uma nota final acerca das bactérias: As bactérias podem-se dividir em 3 grandes grupos - um tipo de bactérias que quase nunca causam doenças, outro tipo que causam sempre doenças, e um outro grupo de bactérias que fazem parte da nossa flora indígena, mas que em certas circunstâncias podem causar doenças.

Vamos agora ver quais as características mais importantes dos vírus. Existem muitos tipos de vírus diferentes e muitas infecções podem ser causadas por esses vírus. Existem varias “portas de entrada” que permitem a entrada dos vírus para o interior do nosso corpo, como é o exemplo da boca. Um vírus muito importante, conhecido de todos nós, é o vírus do HIV, cuja “porta de entrada” é a via sexual. Este vírus encontra-se no sangue e em todas as secreções do corpo e é muito contagioso. Mas existe, ainda, outro vírus que, quanto presente, se encontra também no sangue, e que é mais contagioso que o HIV: o vírus da Hepatite, sendo o vírus da Hepatite B o mais infeccioso.

Fazendo agora comparação entre as bactérias e os vírus: as bactérias e os vírus são iguais? Não! As bactérias e os vírus têm tamanhos diferentes, tendo as bactérias dimensões muito pequenas, da ordem dos 2 ou 3 micrómetros.

Agora um aspecto prático. No bloco operatório, os fatos que se usam são feitos de que material? Bem, esse material tem que suportar temperaturas elevadas, pois tem que ser esterilizado antes de se entrar no bloco, e o processo de esterilização é, como já se viu, levado a cabo a altas temperaturas. Que material aguenta essas temperaturas? O algodão! Mas o algodão apresenta uma grande limitação: deixa passar as bactérias. Ora, o ideal seria ter material descartável, mas os hospitais não querem, nem podem, andar a

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comprar sempre toneladas de materiais descartáveis. Portanto, estamos perante uma outra tarefa para os bio engenheiros.

Agora outra coisa, vocês fazem ideia do que é mais perigoso: o espirro ou a tosse? A diferença tem a ver com a velocidade. O espirro é caracterizado por uma velocidade que ronda os 200km/h e cria partículas pequenas. Agora, falta saber se estas partículas pequenas são mais ou menos perigosas que as partículas maiores: são mais perigosas. Isto porque as partículas mais pequenas, sendo mais leves, ficam a pairar no ar, enquanto as partículas maiores caem e ficam no solo. Por estas razões, pode-se afirmar que o espirro é mais perigoso que a tosse.

Desgravada por Teresa Cardoso

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Engenharia Biomédica – 3º ano, 1º semestreMecanismos Gerais da Doença (2006/2007)

Professores Afonso Fernandes e Cecília Monteiro

Aula desgravada por Rita Simões e Lígia Figueiredo

Face a uma lesão, temos da parte do organismo uma resposta que pode incluir os passos que aqui refiro:- uma resposta hemostática (em que interferem plaquetas e proteínas da cogulação e da fibrinólise) – é fundamental para conter o sangue dentro dos vasos e para reparar as soluções de continuidade na parede dos vasos.- resposta inflamatória – é uma resposta que tende a conter um agente agressor, a mediar a luta do organismo contra esse agressor e depois a preparar a reparação através de uma fase a que chamamos de reparação, em que poderá ser necessária a demolição dos tecidos lesados, depois a proliferação de novos tecidos e, finalmente, se tudo se sucedeu da melhor maneira, maturação dos novos tecidos formados. Toda esta resposta é local, mas pode também ter efeitos sistémicos – efeitos que se fazem sentir à distância e que poderão afectar o organismo como um todo (exemplo: a amigdalite, que é uma resposta inflamatória nas amígdalas, é acompanhada por febre que provoca aumento dos batimentos cardíacos)

Esta ideia de inflamação é já conhecida desde a antiguidade (o prof. nesta parte refere slides, e começa com um que tem um papiro) – o professor aborda a confusão que existia na antiguidade entre inflamação e infecção. Também compara a inflamação a uma braseira, já que esta resposta é acompanhada por calor e vermelhidão.

Só nos finais do século XVIII, um cirurgião escocês escreve uma frase que já traduz uma compreensão diferente do fenómeno inflamatório (até aqui considerava-se a inflamação uma degenerescência do sangue, que se traduzia na expulsão de pus, cujo tratamento habitual era a sangria): “inflamação é uma reacção que tem o objectivo de repor o estado de saúde”

A inflamação é por definição a resposta dos tecidos vascularizados (só estes é que inflamam) à lesão – com base em estudos efectuados na rã

A inflamação é um mecanismo de defesa que também tem contrapartidas negativas, podendo ser também um mecanismo de lesão.

Sinais cardinais da inflamação: rubor com calor e tumor com dor O rubor é a vermelhidão, o calor é o aumento da temperatura, o tumor é o

aumento de volume, inchaço. Mais tarde foi incluído um 5º sinal (não tão importante) que é a perda de função (ex: na amigdalite, é muito difícil de engolir).

Há repostas à resposta local (inflamação, reparação e a hemostase) e uma resposta generalizada.

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Aula 6 – 25 de Outubro de 2006Tema: Inflamação

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Em relação à resposta local, ela pode evoluir de várias maneiras, consoante haja ou não necrose, e consoante o tipo de células que constituem o tecido. De facto, nós podemos dividir as células quanto à sua capacidade de regeneração em 3 grande grupos: células lábeis, células estáveis e células permanentes (ciclo celular).

As células lábeis são aquelas que estão permanentemente em divisão ou permanente renovação (por ex.: células da epiderme, mucosa do tubo intestino, células hematopoiéticas – glóbulos vermelhos, plaquetas, etc. - e os linfócitos). Muitas destas células têm tempo de vida muito curto (por ex.: os neutrófilos têm uma vida média de 8 horas e os glóbulos vermelhos de 120 dias).

Depois, há células estáveis que habitualmente são células que se encontram na fase G0, mas que podem facilmente ser chamadas à fase G1 e aí entram em divisão. Isto é o que se passa com as células do fígado, rim, pâncreas, as glândulas salivares, as células que formam o tecido cartilagíneo, osteoblastos – as células que estão no osso. Habitualmente estas células não estão a dividir-se, já que têm um ritmo de divisão muito lento, mas podem ser chamadas a uma multiplicação mais activa.

Por fim, existem células permanentes, que são as células do sistema nervoso central – os neurónios –, os miócitos cardíacos e os miócitos do músculo estriado. Estas células não têm a capacidade de proliferar. Assim, a consequência na necrose é diferente nos tecidos que são constituídos por células lábeis ou estáveis, em que a rede de suporte do tecido se mantêm intacta, ou nos tecidos que são constituídos por células permanentes.

Quando há demolição, na sequência da necrose, pode haver regeneração nas células labéis e estáveis, ou seja, as células que necrosaram podem ser substituídas por células iguais, que mantêm a mesma função. Pelo contrário, num tecido constituído por células permanentes, não há possibilidade dessa substituição, e a reparação tem que se fazer a partir de um tecido fibroso que não tem as mesmas funções (por ex.: depois de um enfarte do miocárdio do ventrículo esquerdo, aquela zona que sofreu necrose isquémica não é capaz de reconstituir o músculo que lá estava, ficando lá uma cicatriz de tecido fibroso que não tem propriedades contrácteis e que, portanto, prejudica a função contráctil do ventrículo esquerdo; no cérebro acontece a mesma coisa: se um AVC afecta uma zona motora, por exemplo, a pessoa deixa de mexer o braço ou deixa de mexer a perna, e fica assim para sempre porque aqueles neurónios não podem ser substituídos)

Nem sempre esta resposta local inclui necrose e demolição. Se não houver necrose, nessa altura temos a tendência para a resolução do processo inflamatório. Em certos casos, há uma resposta com fibrose e isso pode acontecer, por exemplo, nas cavidades pleurais (por ex.: pleurite – processo inflamatório da pleura, que pode provocar aderência dos dois folhetos pleurais (os folhetos colam por fibrose), o que reveste o pulmão e o que reveste a parede torácica, e, portanto, essa função negativa da cavidade pleural fica comprometida).

A inflamação é subdividida em aguda e crónica. A inflamação aguda é aquela que se inicia em segundos, ou minutos, e pode durar uns dias, enquanto que a inflamação crónica dura de muitos dias a muitos anos (há doentes com doenças inflamatórias crónicas que os acompanham para toda a vida – por ex. os doentes de artrite reumatóide).

Na inflamação crónica, há, em geral, uma agressão ou lesão persistente – o estímulo persiste sempre – ou recorrente, que tem uma resposta inflamatória com uma componente semelhante à da resposta inflamatória aguda. Depois, há sempre demolição

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(ocorre sempre lesão celular) e reparação do tecido demolido; este processo vai-se repetindo sucessivamente e, por isso, o processo inflamatório crónico mantém-se.

Como é evidente, os estímulos para a resposta inflamatória são os mesmos agentes de lesão celular de que já se falou: trauma mecânico; golpe; pancada; esmagamento; calor; frio; tóxicos; radiações – ultravioletas e ionizantes –; reacções imunológicas; isquémia (porque há resposta à necrose; focando no exemplo do enfarte do miocárdio, já referido anteriormente, se a velocidade de reparação não for suficiente, pode haver rotura do miocárdio; se o músculo amolecido pelo processo de necrose não é reparado, gera-se ali uma zona da parede com menos resistência e, como a pressão dentro do ventrículo é muito grande, pode romper, conduzindo à morte); microrganismos; neoplasias em geral.

Os protagonistas para a resposta inflamatória (representados num slide) são: vasos; endotélios – fundamentais para a resposta inflamatória, já que a inflamação é uma resposta dos tecidos vascularizados –; monócitos, linfócitos, plaquetas, neutrófilos, eosinófilos, basófilos, isto é, todos os elementos figurados no sangue; moléculas que estão no plasma (muitas delas são mediadores da inflamação); células dos tecidos, como os mastócitos (estes contêm nos seus grãos substâncias que participam na regulação e mediação da resposta inflamatória), os fibroblastos (que proliferam fazendo fibrose), e depois as proteínas da matriz – os colagénios, a eticolina (?), os proteoglicanos – e os macrófagos, que têm aquela acção fundamental de fazer a fagocitose.

(o prof. referiu um slide que fala da resposta inflamatória aguda)Numa abordagem muito rápida sobre a reacção inflamatória aguda, podemos ver

que esta é dividida em 3 fases: uma fase da alteração do calibre vascular e do fluxo sanguíneo, uma fase do aumento da permeabilidade vascular e uma fase de infiltração dos tecidos por leucócitos.

Objectivos destas 3 fases: neutralizar o agressor; delimitar aquele foco; diluir o agressor, já que com o aumento da permeabilidade dos vasos, sai líquido destes, que vai diluir o agressor – pode ser uma substância química tóxica e pode ser bactérias -; destruição dos tecidos lesados e remoção dos tecidos lesados para preparar a reparação.

Em relação às alterações do calibre vascular, o que se verifica é que, depois de uma muito breve vasoconstrição, há uma prolongada vasodilatação e é esta vasodilatação que vai ser responsável por pelo menos dois dos sinais cardinais da inflamação: o rubor (a vermelhidão mais sangue) e o calor (o professor aproveita esta altura para dizer que o calor só é um sinal cardinal da resposta inflamatória nos órgãos que têm habitualmente uma temperatura inferior à temperatura central – numa pneumonia não ocorre elevação da temperatura do pulmão, porque a temperatura a que este está já é elevada. O mesmo não acontece com, por exemplo, a pele)

Esta vasodilatação provoca, inicialmente, um aumento da velocidade, mas entretanto acontece que há aumento da permeabilidade vascular, que faz com que saia plasma do vaso. Se sai plasma do vaso, ocorre um aumento da viscosidade sanguínea que, por alteração das propriedades reológicas, leva a que as células se distribuam de maneira diferente dentro do vaso. Normalmente, a coluna sanguínea tem os glóbulos vermelhos na periferia e os glóbulos brancos no centro, mas com esta estase (devido ao aumento da viscosidade e diminuição da velocidade), os glóbulos brancos vão passar para a periferia e os vermelhos passam para a coluna central. Então, os glóbulos brancos são atirados para a periferia dos vasos, para os endotélios, possibilitando assim a sua migração, isto é, a sua saída dos vasos para os tecidos, onde se vai travar o combate com o agente agressor.

O aumento da permeabilidade é provocado, por um lado, pelo aumento da pressão hidrostática dentro do vaso (leis de Starling), que causa o aumento da

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quantidade de sangue, conjugado com mediadores químicos. Por outro lado, pode haver lesão directa do endotélio - o calor, por exemplo, pode provocar morte das células endoteliais. Depois, há diminuição da pressão oncótica intravascular e aumento da pressão oncótica intersticial (sai plasma, saem constituintes do plasma – como proteínas – e, portanto, diminui a pressão oncótica dentro e aumenta a pressão oncótica fora).

O aumento da permeabilidade vascular pode ser devido a vários mecanismos (representados num slide). Um é a chamada contracção endotelial; se sobre o endotélio actuarem certos mediadores, como a histamina (principal mediador da resposta inflamatória), verifica-se que as células endoteliais se contraem, ficando engelhadas, e ao contraírem afastam-se uma das outras, abrindo espaço para a passagem de água e constituintes solubilizados do plasma (os espaços não são suficientes para as células passarem). Isto acontece acima tudo nas vénulas (também ocorre nas redes arteriolar e capilar) e aí dá-se a resposta referida, que é uma resposta imediata e transitória. É imediata porque, assim que acontece o estímulo, passados poucos segundos (3-5 seg) já há resposta, e é transitória porque não vão durar mais que 10 min. (por exemplo, se com uma ponta romba fizermos um traço com força numa zona onde a pele é mais fina, vê-se o aparecimento de um traço vermelho, que depois até fica um bocadinho inchado – vai fazer um vergão. O que aconteceu é que a pressão provoca a desgranulação dos mastócitos que estão no tecido conjuntivo; estes libertam histamina, que vai ter aquela acção enunciada anteriormente, e que depois é levada para a circulação durando, então, os 10 min.).

A retracção juncional é um processo ligeiramente diferente, em que a alteração só se dá junto às junções intracelulares e é determinada por várias citocinas (isto também nas vénulas). Neste caso, a resposta é mais demorada a acontecer (o professor referiu um slide que enuncia a existência da resposta retardada e prolongada. Os escaldões da praia são uma resposta retardada, que acontece 4 a 6 horas depois da exposição aos raios ultravioletas, e que se mantêm por alguns dias. Os escaldões acontecem devido à libertação de citocinas, eventualmente devido à apoptose das células endoteliais pelas radiações ultravioleta.).

A lesão directa pode, por vezes, ser mais dramática, como por exemplo numa queimadura, em que há morte dos vasos, não só dos endotélios, mas de toda a parede, e que causa uma resposta imediata e prolongada (é mantida porque só quando houver reconstituição do tecido, reparação, é que deixa de haver problema - e isto dura semanas.)

Os grandes queimados têm perda de volume sanguíneo, podendo entrar em choque circulatório, e essa perda deve-se ao grande aumento da permeabilidade em toda a superfície queimada, que causa uma saída muito grande de plasma e de constituintes do plasma, havendo, portanto, uma diminuição muito grande do volume sanguíneo, da volémia. Por exemplo, quando fazemos uma pequena queimadura nota-se o aparecimento de uma bolha que está cheia de água e produtos dissolvidos na água que vêm do plasma.

Depois ainda existem outros mecanismos. Existe a chamada lesão provocada pelos neutrófilos. Os neutrófilos, que se encostam ao endotélio, podem ser activados e produzir espécies radicalares que vão lesar as células, e isso também leva ao aumento da permeabilidade.

Também existe um mecanismo, talvez menos importante quantativamente, que é o mecanismo da transcitose, em que os constituintes do plasma são transportados através de vacúolos na própria célula (e não nas junções intracelulares).

Finalmente, outra razão para o aumento da permeabilidade tem a ver com a formação de vasos novos. Os vasos imaturos não têm as propriedades de

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permeabilidade que têm os vasos maduros e, portanto, os tecidos imaturos têm mais líquido intersticial.

Os mediadores da inflamação, já enunciados, de que é modelo a histamina, são substâncias que estimulam muitos dos acontecimentos que vemos na resposta inflamatória, e que são muitos, e têm origens muito diversas (os que estão referidos no slide que o professor mostrou são aqueles que aumentam a permeabilidade vascular e, desses, alguns fazem a vasodilatação – por exemplo, a histamina). Eles têm origem nos próprios neutrófilos, nas plaquetas, nos mastócitos, nas próprias células endoteliais, e muitos vêm do plasma, embora não existam no plasma na forma activa.

O líquido que sai dos vasos é rico em proteínas e, por isso, tem a designação de exsudado (o liquido que sai dos vasos pobre em proteínas tem a designação de transudado). Para que serve este exsudado? Para diluir o agressor, para levar ao foco inflamatório uma série de mediadores da inflamação e agentes que conseguem contribuir para a defesa, como por exemplo os anticorpos, e o fibrinogénio, que vai constituir uma rede importante para a reparação. A medicina aproveita este aumento da permeabilidade para fazer lá chegar agentes terapêuticos em concentrações maiores (quando tomamos um antibiótico, este distribui-se por via oral igualmente por todo o corpo, mas se houver um território em que há aumento da permeabilidade, como num caso de pneumonia, é natural que ele ali atinja concentrações maiores, que podem ser importantes para a destruição de bactérias)

Todos estes acontecimentos têm que ter um interruptor para os desligar. Tem que haver limites à formação do exsudado e esses limites são as plaquetas que revestem os vasos, o desaparecimento dos mediadores e o aumento da pressão hidrostática nos tecidos. À medida que o tecido vai ficando cada vez mais tumefacto pelo edema, a pressão hidrostática é maior e isso dificulta a saída de mais líquido. A drenagem linfática é fundamental na remoção deste líquido intersticial, e quando há obstrução linfática, em geral há um grande edema.

A terceira etapa tem a ver com um recrutamento e activação de leucócitos (está esquematizada num slide). Acontece que os leucócitos são lançados para a proximidade do endotélio e aderem, tornam-se pegajosos. Eles tornam-se pegajosos porque vão exprimir determinadas moléculas na superfície (representadas no slide, e que são exemplos de moléculas de aderência). Há estimulação através da produção de alguns mediadores da inflamação, como leucotrieno D4, factor 5A do complemento, o factor da necrose tumoral, interleucina 1, o interferão gama, a endotoxina (ou lipopolissacárido) – a endotoxina é uma substância das bactérias gram negativas que desencadeia a resposta inflamatória, e uma das acções que tem é aumentar a expressão das moléculas de aderência nas células endoteliais – (ver mais exemplos de mediadores nos slides). Depois, as moléculas são complementares. O LFA 1 liga-se ao ICAM 1, o VLA 4 liga-se ao ICAM 1 e assim sucessivamente .

Devido à expressão destas moléculas, e devido à afinidade destes pares de moléculas, as células tornam-se pegajosas. Há várias famílias de células de aderência, e as primeiras a serem expressas são as selectinas que fazem ligações que são pouco firmes e, por isso, a célula fica só um bocadinho mais pegajosa, enrolando-se sobre o endotélio (é uma fase em que o leucócito se junta ao endotélio e se enrola sobre ele – é possível devido ao fluxo sanguíneo que existe). Depois, a aderência torna-se mais firme porque são expressas outras moléculas de aderência, que estabelecem relações mais íntimas, e então fica mesmo pegado à célula endotelial.

Depois, há a activação da chamada transmigração, em que a célula é levada a passar em junções de células endoteliais e passar para o espaço intersticial. Aí ela vai deslocar-se, por um processo que se designa por quimiotaxia, a favor de um gradiente

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de concentração de mediadores (substâncias quimiotáxicas). Há uma comparação quer espacial quer temporal da ligação dos mediadores aos receptores. Por exemplo, a célula migra em direcção aos receptores cuja ligação é mais favorável, onde a ligação de dá primeiro (há uma comparação temporal: liga-se primeiro a uns do que outros). Comparação [Aconselha-se vivamente a audição dos minutos 38 a 40, (já que é de difícil transcrição) em que o professor explica esta parte da matéria baseado nas imagens dos slides.] espacial tem a ver com a saturação dos receptores (os receptores não estão saturados nas zonas onde a concentração de mediadores é menor). Então, estas duas comparações permitem orientar a direcção da migração, que se faz no sentido do gradiente para a zona onde o agente (agente quimiotáxico) que atrai a célula está em maior concentração. Quando a célula fica completamente rodeada de agente quimiotáxico, pára e é activada, e é aí que ela deve exercer a sua acção que pode ser, por exemplo, de fagocitose.

Na etapa a seguir à quimiotaxia, a célula é activada para a fagocitose. Esta requer primeiro uma opsonização das partículas a fagocitar. A opsonização é o revestimento das bactérias que as tornam como que apetitosas para os fagócitos (as opsoninas revestem as partículas a fagocitar). Há um reconhecimento das opsoninas para desencadear a formação do fagosoma, que é o vacúolo onde vai ser incluída a bactéria e, por fim, a destruição da bactéria dentro do vacúolo. Esta destruição ocorre porque há activação da célula, com a libertação de enzimas e de espécies reactivas de oxigénio para dentro do vacúolo (enzimas que lesam a bactéria – proteases, lipases, etc - e espécies radicalares, tal como o peróxido). Depois, a célula morre por apoptose.

O conhecimento das moléculas de aderência veio ainda fazer perceber alguns aspectos da sua importância em algumas doenças. Por exemplo, a malária cerebral é causada por agente chamado plasmodium, que faz com que sejam expressos na membrana do glóbulo vermelho uma proteína da membrana eritrocitária que se liga às moléculas de aderência ICAM 1. Isto faz com que os glóbulos adiram maciçamente aos endotélios. A consequência disso é a obstrução do vaso ao nível dos capilares cerebrais – ocorre então morte cerebral.

(Entretanto o professor responde a uma pergunta em que explica que alguns mediadores estimulam o aparecimento de moléculas de aderência na superfície dos neutrófilos ou na superfícies das moléculas endoteliais só quando há um estímulo para resposta inflamatória. Então, estas moléculas só são expressas nesta altura).

Não se começou a gravar logo no início da segunda parte da aula. Quando se começou a professor estava a acabar de falar de terminadores da resposta.

Dos iniciadores, que se confundem em grande parte com as causas da inflamação e as causas da lesão celular, destacam-se as endotoxinas bacterianas, os venenos, o complexo antigénio-anticorpo, a reacção imunológica que pode depois contribuir para a reacção inflamatória, os produtos de necrose; a própria estimulação nervosa pode ser um iniciador da inflamação.

Em relação à necrose, há que notar que há vários factores que podem contribuir para que, por exemplo, na consequência de um enfarte do miocárdio, vá haver inflamação (factores representados num slide). Por ex.: factor 12 é activado, que é o factor da coagulação, e que vai depois interferir em outras vias de produção de mediadores; o complemento; a libertação de ácido úrico, da degradação do ADN; a activação das plaquetas; os mastócitos; os leucócitos; as próprias enzimas dos lisosomas das células lesadas (todos contribuem para a formação de mediadores).

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É importante salientar a diferença de necrose e inflamação e apoptose e inflamação. Quando a morte celular se faz por necrose, a resposta é pró-inflamatória, que tem a ver também com a produção de citocinas (referido pág. 4), que são mediadores produzidos pelas células, pro-inflamatórios, e diminuem certos mediadores anti-inflamatórios (um destes mediadores anti-inflamatórios é o factor de transformação do crescimento beta 1 - O prof refere mais qq coisa que está no slide.). Depois, pelo contrário, a morte por apoptose não desencadeia resposta inflamatória e leva à libertação pelos macrófagos de mediadores que são anti-inflamatórios – há um aumento do factor de transformação do crescimento beta 1 (professor enunciou slide).

É tradicional dividir os mediadores da inflamação em dois grandes grupos: os chamados mediadores derivados do plasma – os que existem no plasma e saem para o foco da inflamação por aumento da permeabilidade vascular – (dentro deste grupo, há 3 principais sistemas de mediadores) e os mediadores ditos derivados das células, que são aqueles que são libertados pelas células no local da inflamação. Os mediadores derivados do plasma existem neste sobre formas inactivas, isto é, só quando há estímulo para a inflamação é que eles saem do plasma e são activados no espaço intersticial, tornando-se, de facto, mediadores.

(O professor referiu muitos slides, nesta altura, que mostravam a lista dos mediadores derivados dos tecidos, referiam espécies reactivas do oxigénio e davam exemplos de sistemas de mediadores)

O sistema do complemento (um sistema de mediadores) é um sistema de proteínas – C1, C2, C3, C4, C5, C6, C7, C8, C9 – que existem em circulação sob formas inactivas, mas que, depois da acção de determinados activadores (cristais de urato, os agregados de anticorpos, os imunocomplexos anticorpo-antigénio, a endotoxina, polissacáridos bacterianos, o veneno da cobra, meios de contraste radiológico, membranas da diálise, parasitas, etc), é activado através de várias vias que consistem na transformação de vários componentes noutras formas que têm realmente a acção de vasodilatação, ou de aumento da permeabilidade vascular, ou à acção quimiotáxica (por exemplo, o C5A tem uma potente acção quimiotáxica, de atracção dos neutrófilos).

Finalmente, forma-se um complexo C5DC9, através dos componentes C5 b, C6, C7, C8 e C9, que polimeriza e faz canais que se inserem na membrana celular. Esses canais vão alterar a permeabilidade da membrana (formam-se graças a ligações de vários constituintes, que se inserem na membrana e abrem como que um buraco, impedindo a manutenção dos gradientes entre o meio extracelular e o meio intracelular), contribuindo para a morte das bactérias ou das células do próprio organismo (a entrada de cálcio para a célula contribui para este fim), se se inserirem nas células do próprio organismo.

Em relação ao ácido araquidónico, que é um ácido polinsaturado que existe nas biomembranas e que é libertado a partir dos constituintes onde ele existe, vão actuar sobre ele determinadas enzimas (a cicloxigenase ou a lipoxigenase) que vão gerar uma quantidade de mediadores que são muitos activos no contexto da resposta inflamatória. Estes mediadores são as prostaglandinas (Pg), os tromboxanos (Px) ou os leucotrienos (Lt) – por ex.: o leucotrieno D4 tem uma forte acção quimiotáxica e a prostaglandina E2 é um mediador da febre.

No contexto da resposta inflamatória, são activadas as enzimas fosfolipase A2 ou fosfolipase P, que libertam ácido araquidónico, e depois são activadas as enzimas que transformam o ácido araquidónico nestes vários produtos que têm todas estas acções aqui referidas nalguns exemplos, apenas no contexto da resposta inflamatória. Algumas destas moléculas (leucotrienos, prostaglandinas, tromboxanos) têm,

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curiosamente, acções antagónicas. Por exemplo, a prostaglandina I2 é vasodilatadora e também altera (inibe) a agregação plaquetária. Pelo contrário, o tromboxano A2 é vasoconstritor e promove a agregação plaquetária. Portanto, tudo isto são redes muito complexas de regulação; tudo depende da célula em que ocorrem, da produção relativa destes ou destes e tudo isso têm a ver com regulação enzimática, com os estímulos para a resposta, com o ambiente com as outras moléculas presentes e, portanto, todos estes factores vão influenciando – é uma resposta muito complexa.

O NO, o óxido nítrico, também é um mediador da inflamação porque uma das acções que tem é de vasodilatação. Quando foi descoberto, foi designado factor relaxante do endotélio; depois, descobriu-se que essa molécula era o NO, que é um radical com um electrão desemparelhado e que é produzido a partir da L-arginina por enzimas que se designam sintases do NO. O NO tem então este tipo de acções no âmbito da resposta inflamatória. Portanto, faz vasodilatação, inibe a activação plaquetária e tem a acção anti-inflamatória de redução do recrutamento de neutrófilos. No entanto, tem uma outra propriedade fundamental: o NO é ele próprio, por ser um radical, citotóxico, podendo transformar-se num anião, anião peroxinitrito, extraordinariamente lesivo; a produção de NO em grandes quantidades pelos macrófagos, depois com a formação deste anião, é também um mecanismo de destruição de bactérias e de células do próprio organismo. Portanto, o NO, quando presente em pequenas concentrações, pode ser um mediador vasodilatador mas, por outro lado, pode ser, em grandes concentrações, um agente lesivo, que destrói bactérias e mata células.

Alguns outros sistemas mais finos de regulação da resposta inflamatória são ilustrados pelo factor de transcrição nuclear NFKB, que promove a leitura de genes da resposta inflamatória – citocinas (interleucinas 1, 6, 8), quimioxinas (citocinas com acção quimiotáxica), receptores para citocinas, moléculas de adêrencia (que tornam os neutrófilos e os endotélios pegajosos) e enzimas (sintase do NO, citoxigenase, lipoxigenase, fosfolipase A2 – que liberta o ácido araquidónico para fazer prostaglandina e leucotrienos –). Portanto, quando este factor de transcrição é activado, vai ao núcleo e promove a leitura de todos estes genes que codificam produtos que vão ajudar à resposta inflamatória. O NFKB é activado por estímulos, sinais activadores, que desencadeiam a resposta inflamatória. O processo de activação dá-se do seguinte modo: os sinais activadores activam as cinases, que fosforilam o inibidor do NFKB (IKB), sendo este removido para degradação e deixando livre o NFKB, que vai então ao núcleo promover a leitura dos genes da resposta inflamatória, fazendo com que a célula produza todos estes factores pro-inflamatórios.

[Vocês têm apenas que ter uma ideia dos vários sistemas de mediadores da inflamação.]

Resumindo, estes são os principais mediadores que causam:

- vasodilatação (aumento do calibre vascular): - NO- Histamina

- aumento da permeabilidade vascular:- aminas (a histamina é uma amina)

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- quimiotaxia:- C5A- leucotrieno B4- quimioxinas- produtos bacterianos

- febre:- [não foi dito, apenas se referiu o slide onde isto estava]

- dor: - todos que têm a capacidade de estimular os nocirreceptores:

- prostaglandinas - bradicinina- potássio (a concentração de potássio aumenta nos locais de inflamação

porque este é o principal catião intracelular e, quando há destruição de células, sai para o espaço intersticial, estimulando as terminações nervosas.)

- lesão dos tecidos:- enzimas lisosómicos:

- proteases- lipases- DNA-ases

- espécies reactivas de oxigénio:- superóxido- hidroxilo- NO (que se pode transformar no anião peroxinitrito, muito tóxico)

Uma vez resolvido o problema (eliminado o agente invasor, etc.), é desejável que a inflamação termine. A terminação têm a ver com:

- a interrupção dos iniciadores - o desaparecimento dos mediadores (deixa de haver estímulo para a sua produção)- a produção de inibidores (por exemplo, as lipoxinase e as resolvinas, que também derivam do ácido araquidónico)- o factor de transformação de crescimento beta (forte anti-inflamatório produzido pelos macrófagos)- estimulação nervosa- genes protectores que são activados, bloqueando a activação do NFKB

Em relação aos neutrófilos, estamos perante uma faca de dois gumes – há uma série de acções que têm, de facto, uma acção defensiva, mas que podem ter complicações - podem entrar em vias patogénicas. Claro que a aderência e a motilidade são fundamentais para a aderência dos neutrófilos ao endotélio e a saída destes para o espaço onde têm que actuar. Mas, se muitos aderem aos capilares mais finos, podem acabar por obstruí-los, havendo sofrimento isquémico dos tecidos.

Os neutrófilos têm também a capacidade de efectuar fagocitose – são capazes de formar os tais vacúolos fagocíticos, para onde enviam as hidrolases e as espécies

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radicalares para destruírem a substância a ser fagocitada, o microrganismo. No entanto, essas enzimas e as EROs podem sair directamente para o espaço circundante, para os tecidos, destruindo-os. O que acontece é que, se tudo fica retido no vacúolo fagocítico, isso vai contrariar a resposta inflamatória. Como vos disse, os neutrófilos, depois de exercerem a sua acção, morrem por apoptose, processo que não desencadeia mais inflamação, e tudo fica contido nos corpos apoptóticos, posteriormente destruídos por macrófagos. Como tal, tudo fica contido nas células, não devendo sair nada para o espaço extracelular. Isso pode suceder, no entanto, em determinadas circunstâncias:

- vómito durante a alimentação (regurgitação): situação em que o vacúolo fagocítico não fecha, ocorrendo a saída de proteases e de espécies radicalares;

- endocitose invertida: ocorre quando não se formam vacúolos fagocíticos, havendo libertação de substâncias directamente para uma superfície;

- libertação psicotóxica: o próprio neutrófilo é destruído e, em vez de morrer por apoptose, morre por necrose, ocorrendo assim a destruição da membrana e levando a que o que ele contém saia e ataque as outras células. Isto pode acontecer ou porque nessa luta entre o agente e o neutrófilo o agente ganha e destrói o neutrófilo (situação que não é rara), ou porque as partículas fagocitadas são rígidas, como os cristais e as partículas de sílica (ex: mineiros que inalam esta substância), que destroem os macrófagos, libertando-se substâncias nocivas.

Quero ainda que fiquem com a ideia de que existem defeitos da função leucocitária – existem doenças, congénitas ou adquiridas, que perturbam a função dos leucócitos, reduzindo a capacidade de resistência a infecções (a sobrevivência destes doentes pode ser de apenas 10/12 anos). Por exemplo, na LAD tipo I falta a integrina beta II, que é uma molécula de aderência. Assim, perante uma infecção, os doentes respondem produzindo mais neutrófilos. No entanto, estes são incapazes de aderir às paredes do endotélio, não passando para os tecidos e não participando na defesa anti-bacteriana. Os doentes têm neutrofilia, isto é, muitos neutrófilos em circulação, mas estes não saem dos vasos. Uma das formas de se suspeitar desta doença é pela queda tardia do cordão umbilical. Numa situação normal, o cordão cai porque as suas células morrem, desencadeando uma reacção inflamatória na sua base, fazendo com que sejam activadas células produtoras de enzimas que vão destruir aqueles tecidos. Quando estes se tornam muito frágeis, o cordão cai. Se os neutrófilos não chegam lá, não produzem hidrolases que destroem os tecidos e o cordão não cai.

A diabetes influencia negativamente muitos destes mecanismos de defesa porque perturba a aderência, a fagocitose, a locomoção e a própria acção microbicida.

Portanto, há doenças genéticas, congénitas e adquiridas que provocam defeitos da função leucocitária. Por exemplo, na doença granulomatosa crónica, o defeito está na NADPH-oxidase, que é a enzima que produz superóxido. Como é evidente, estes doentes têm também maior susceptibilidade às infecções, porque não conseguem produzir uma espécie radicalar importante na luta anti-bacteriana.

Depois, há as neutropénias – a falta de neutrófilos. Estas doenças são dramáticas porque, se com defeitos imunológicos ainda se consegue viver pelo menos durante algum tempo, com uma neutropénia absoluta a sobrevivência é de dias ou semanas. A pessoa rapidamente se infecta e essas infecções são incontroláveis. É o que acontece, infelizmente, a alguns doentes que estão a ser tratados para doenças neoplásicas, que fazem uma quimioterapia muito pesada (que leva a uma inibição da produção de

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neutrófilos) e que ficam em neutropénia. Apesar de isolados, por vezes sucedem infecções que, mesmo com os antibióticos mais potentes, são muito difíceis de dominar.

A falta de neutrófilos pode depender da sua não produção ou do excesso da sua destruição.

As feridas podem curar por 1ª intenção ou por 2ª intenção. A 1ª ocorre quando os bordos estão juntos. É uma cura muito mais simples, rápida e eficaz do que quando há uma perda grande de substância, situação em que o espaço existente tem que ser preenchido por um tecido de granulação, que é um tecido em que se vai dar a neovascularização (formação de mais vasos) e onde vão proliferar fibroblastos - células do tecido conjuntivo que depositam proteínas da matriz (colagénio, proteoglicanos, etc.). Em geral, estão também presentes monócitos, macrófagos, neutrófilos, eosinófilos, linfócitos, mastócitos. Quando têm uma ferida maior, em que há perda de substância, vêem que prolifera, por baixo da crosta, um tecido esponjoso, cor-de-rosa, clarinho – esse é o tecido de granulação. Trata-se de um tecido muito rico em vasos, edemaciado (porque os vasos são imaturos e, portanto, há muito edema intersticial). É um tecido fundamental para que aconteça a reparação – por ali vão migrar os fibroblastos que vão produzir colagénio e assim se vai formando a cicatriz. Por outro lado, se há tecidos que podem regenerar, começará a regeneração (por exemplo, a substituição de células da pele por células iguais).

A formação de novos vasos designa-se por angiogénese ou neovascularização e é um processo que se faz sobretudo à custa de outros vasos. A partir de um vaso já existente, há a estimulação da produção de células endoteliais que começam a fazer um gominho que se vai desenvolvendo, acabando por abrir um novo volume e formando assim um novo vaso. O principal estímulo para a angiogénese é dado por um factor – factor de crescimento do endotélio vascular (VEGF) -. Outros factores contribuem para este processo, entre os quais a angiopoietina e o factor de crescimento fibroblástico. Por outro lado, há moléculas inibidoras da angiogénese, como é o caso da endostatina.

Como calculam, um dos estímulos para a angiogénese é a hipóxia. Quando há hipóxia, o organismo tenta responder a isso promovendo a formação de mais vasos para o transporte de sangue à zona afectada. Em situação de hipóxia, activa-se um factor de transcrição (HIF) que promove a leitura de genes que codificam moléculas como:

- a eritropoietina (que estimula a eritropoiese – formação de glóbulos vermelhos para o transporte de oxigénio)- os transportadores de glicose (para o metabolismo anaeróbio, que gasta mais oxigénio que o aeróbio)- as enzimas glicolíticas (para a glicólise)- o VEGF (para estimular a formação de mais vasos)

Há também uma regulação complexa da actividade fibroblástica, executada pelo PDGF (factor de crescimento derivado das plaquetas).

Os macrófagos têm também um papel fundamental na reparação, porque :

- fagocitam

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- têm acção antimicrobiana- contribuem para a demolição dos tecidos parcialmente lesados- regulam a síntese de proteínas da matriz- recrutam mais células porque produzem muitos mediadores, muitas citocinas, ...- contribuem para a angiogénese (porque também produzem VEGF)

Disse-vos que determinados tecidos podem regenerar e são exemplo disso (para além da epiderme) órgãos constituídos por células como o parênquima hepático (os hepatócitos). A regeneração hepática foi muito bem estudada porque a experiência, inicialmente, fascinou os investigadores. Quando se abre o abdómen a um ratinho e se retira até 70% da massa do fígado, passados cerca de 8/10 dias verifica-se que o fígado regenera completamente. Os lóbulos do fígado regenerado não têm a mesma forma mas a massa de células é igual à original. A isto nós chamamos capacidade de regeneração. Como sabem, em determinados seres inferiores, é possível a regeneração de órgãos, de partes do corpo, como a cauda, as patas, etc. Nós não temos essa capacidade, como sabem. É pena! Mas há a capacidade regenerativa neste sentido de manter a massa de células e no homem acontece regeneração hepática. Este processo é bastante complexo, exigindo a existência de um sinal para que as células que ficam comecem a proliferar – chamamos a isso uma sensibilização. Admite-se que esse sinal seja a sobrecarga metabólica – às células que ficam vão chegar concentrações muito maiores das substâncias que o fígado normalmente utiliza. Há ainda a produção do factor de crescimento hepatocitário que vai desencadear a proliferação – uma hiperplasia compensadora. Para terminar o processo de proliferação, sabe-se que são produzidas determinadas substâncias, entre as quais se encontra, mais uma vez, o factor de transformação de crescimento beta (que é um importante anti-inflamatório).

A regeneração pode também ser feita através de células multipotenciais. Admite-se que, no adulto, existem células multipotenciais, quer na medula óssea quer nos diferentes órgãos, que podem ser chamadas a reconstituir tecidos. Este é um conceito fundamental que está a ser muito divulgado, hoje em dia, na comunicação social, tendo em conta a possibilidade de se diferenciar células multipotenciais para se substituir células em doenças degenerativas do sistema nervoso, como as doenças de Alzheimer e de Parkinson. Esta possibilidade de conseguir eventualmente substituir as células neuronais ou os miócitos do coração é um assunto em grande efervescência na investigação actual.

Há vários factores que condicionam a resposta local à lesão, que são mais ou menos óbvios: se não temos circulação sanguínea nem linfática, temos perturbação da resposta; se temos corpos estranhos, temos perturbação da resposta; se há tracção (se não deixamos que os tecidos se encostem e reconstituam a morfologia anterior – ex.: feridas nas articulações), há perturbação da resposta.

Existem também factores sistémicos, alguns relacionados com o estado nutricional, que influenciam a reparação. Há certas substâncias fundamentais para a reparação, como por exemplo aminoácidos (destaca-se a metionina) e vitamina C (coenzima da lisiloxidase, responsável pelas ligações cruzadas no colagénio e, como tal, fundamental para a reparação).

Depois, há toda uma resposta sistémica que consiste em:

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- febre, sonolência e anorexia: acções de uma citocina produzida pelos macrófagos e por outras células, que é a interleucina I.

- proteólise muscular

- leucocitose (aumento do número de leucócitos em circulação), que pode acontecer essencialmente de 3 maneiras:

- existem algumas áreas no nosso território venoso em que a circulação é lenta, o que faz com que haja neutrófilos quase parados junto ao endotélio nessas áreas; se houver venoconstrição, aumenta a velocidade circulatória e esses neutrófilos são mobilizados, entrando numa circulação mais activa; este mecanismo é mediado pela adrenalina

- ir buscar mais neutrófilos à medula óssea, fazendo com que passem para o sangue; isso é conseguido pela interleucina I e o fragmento C3

- provocar a produção de mais neutrófilos - é o que fazem os factores estimuladores de colónias

- trombocitose

- activação da resposta imunológica

- produção de proteínas de fase aguda: proteínas que têm importância no contexto de tudo o que foi dito anteriormente:

- as proteínas da coagulação e da fibrinólise, para permitirem a hemostase;

- as proteínas do sistema do complemento, mediadores da inflamação; - um inibidor das proteases (contraria a acção destrutiva das proteases

libertadas pelos neutrófilos sobre os tecidos)- defesa anti-oxidante (limitam a lesão oxidante)- proteína C reactiva, que é um excelente indicador de que existe uma

resposta inflamatória no organismo mas cuja função não é bem compreendida, e proteína SAA - precursor sérico do amilóide - que se pode transformar numa proteína que se deposita nos tecidos e causa uma doença muito grava chamada amiloidose e cujo papel fisiológico é também desconhecido

- lactoferrina, importante na defesa anti-oxidante- fibronexina, responsável pelos contactos entre células e entre células e

matriz

- alteração na concentração plasmática de alguns iões: o ferro e o zinco são indispensáveis à proliferação bacteriana e admite-se que esta redução na concentração destes iões seja um meio de defesa anti-bacteriano.

Gostava finalmente de falar-vos em dois aspectos que têm a ver com respostas gerais à agressão-lesão, nomeadamente a resposta à hemorragia aguda, por um lado, e a resposta dita metabólica à agressão-lesão, por outro.

Em relação à resposta à hemorragia aguda, ela consiste essencialmente em três fases:

- redistribuição do sangue disponível para garantir a sobrevivência a curto prazo, irrigando os órgãos responsáveis por essa sobrevivência – o cérebro, o coração, os

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músculos esqueléticos e os respiratórios -, fazendo vasoconstrição nos outros territórios, para que o pouco sangue que há “sobre” para os órgãos vitais

- reposição da volémia – “encher” novamente os vasos; isto faz-se à custa dos líquidos intersticiais, que são agora “chamados” para dentro dos vasos

- substituição dos eritrócitos, para repor a capacidade de transporte de oxigénio

A resposta a muito, muito curto prazo faz-se aumentando o débito cardíaco através de uma taquicárdia, porque baixa a volémia, baixa a entrada de sangue no coração, baixa o débito cardíaco, baixa a tensão arterial. Tudo isto faz com que haja menos perfusão dos órgãos, levando a uma resposta – a taquicárdia, para que seja enviado mais sangue para os órgãos, e a vasoconstrição electiva acima descrita -.

Finalmente, e com isto terminamos , há também uma resposta dita neuroendocrinometabólica no doente que está muito doente ou no doente sujeito a uma cirurgia. Nessa altura, há toda uma adaptação endocrinometabólica em que se distinguem estas quatro fases:

- crítica, aguda, chamada ebb phase (fase de declínio) – que dura menos de 24h e em que ou se sobrevive ou se morre

- fase de fluxo – flow – metabólico, fase que garante a reparação como prioridade às necessidades energéticas

- fase anabólica, em que começamos novamente a sintetizar tecidos, a reparar, e que dura semanas ou meses

- fase de ganho de gordura, que pode durar meses, em que se repõem as reservas energéticas

Gostava de chamar-vos à atenção para o que acontece na fase de fluxo, fase em que o doente perde uma grande massa muscular. Isto acontece porque as nossas reservas de glicose são muito pequenas – cerca de 70g de glicogénio no fígado e glicogénio no músculo esquelético, que é menos utilizável que o hepático. No entanto, os 70g de glicogénio hepático não cobrem as necessidades, sendo suficientes apenas para menos de 24h. Há certos órgãos que dependem estritamente do fornecimento de glicose para o seu metabolismo energético, como os neurónios. Os tecidos de reparação, como os leucócitos e os linfócitos também dependem da glicose para o metabolismo energético. Portanto, nós rapidamente esgotamos as reservas em glicogénio. Se repararem, em termos de fisiopatologia animal, o animal ferido fica imobilizado e não se alimenta, não havendo, portanto, ingestão de glicose. Esgotando-se o glicogénio, a morte seria inevitável. Não o é, porque nós podemos ir buscar as proteínas musculares para fazermos gluconeogénese que, nesta situação, é indispensável para a sobrevivência. A longo prazo, isto provoca a fusão da massa muscular e o progressivo enfraquecimento da musculatura esquelética, o que também acaba por ser muito negativo porque, entre os músculos esqueléticos, estão os respiratórios.

Lígia e Rita S.

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Engenharia Biomédica – 3º ano, 1º semestreMecanismos Gerais da Doença (2006/2007)

Professora Conceição Coutinho

Aula desgravada por Lina Espinha e Artur Oliveira

1ª Parte – Lina Espinha

Vamos falar de doenças circulatórias e da coagulação. Como sabem o sistema circulatório é constituído pelo coração, que funciona como uma bomba e por um sistema de vasos, que são tubos revestidos pelo endotélio que é considerado a maior glândula do organismo, apesar das suas propriedades terem sido negadas durante alguns anos. O endotélio tem cerca de 1Kg e reveste todos os vasos e reveste também o coração, tem imensas funções mas as principais são segregar e armazenar substâncias, é o transporte activo das substâncias e é a troca dos fluidos. O endotélio segrega colagénio, elastina, factores que se opõem ou que favorecem a coagulação quando há uma hemorragia, as prostaglandinas, as citocinas, substâncias vasodilatadoras e vasoconstritoras, radicais livres de oxigénio e moléculas de adesão. Os vasos são as artérias, as veias e o sistema de microcirculação. É na microcirculação que se dão as trocas de nutrientes, do oxigénio e onde são reabsorvidos os substratos e as substâncias do metabolismo das células são removidas.

A troca dos fluidos entre o sistema intravascular e o sistema extravascular obedece à Lei de Starling, portanto está dependente da pressão do sangue, da pressão hidrostática, da pressão osmótica do plasma, da pressão osmótica extravascular e da pressão hidroestática intersticial, isto está geralmente num equilíbrio. Se há um aumento da pressão hidroestática no sangue há saída de líquidos para o espaço extravascular. Se há uma diminuição da pressão osmótica também há uma saída de líquidos, porque a pressão hidrostática faz com que os líquidos saiam, e a pressão osmótica, por uma questão de osmolaridade, faz com que os líquidos entrem no espaço intravascular. É, portanto, a força relativa destes componentes que vai fazer com que o sangue saia, ou os líquidos saiam dos vasos para os tecidos e vice-versa.

O que é que é hiperémia? É um aumento da quantidade do sangue nos vasos da microcirculação, ou seja, há mais sangue do que é costume.

A hiperémia divide-se em hiperémia activa e passiva. Na hiperémia activa há aumento do fluxo, geralmente provocado por vasodilatação, e na hiperémia passiva ou congestão há diminuição do fluxo, ou seja, há mais sangue mas não circula.

Em que situações é que há hiperémia activa? Quando as pessoas coram, há vasodilatação dos vasos da microcirculação da face o que dá a coloração encarnada da pele. A hiperémia activa é menos prejudicial do que a hiperémia passiva. Portanto, a hiperémia passiva pode desencadear-se por um estímulo nervoso, como no caso de corar, pode dar-se por aumento das necessidades, quando há aumento de sangue nos músculos no exercício físico por exemplo, pode ser um estímulo para o crescimento vascular quando há obstrução num vaso os outros vasos daquela circulação têm

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Aula 7 – 8 de Novembro de 2006Tema: Doenças circulatórias

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aumento da quantidade de sangue, e esse aumento da quantidade de sangue é que vai levar a que se desenvolva uma coisa que se chama circulação colateral, desenvolvem-se pequeninos vasos que vão comunicar entre o vaso normal e o vaso obstruído.

Outro exemplo de hiperémia, ou seja, aumento da quantidade de sangue, é o caso de fístulas arterio-venosas, ou seja é um vaso anormal entre uma artéria e uma veia, pode ser congénito ou pode ser feita pelos médicos, como é o caso dos doentes que fazem hemodiálise. Quando há hiperémia mesmo em crianças que têm fístulas, às vezes há até aumento do volume daquele membro.

Outro caso é as fracturas ósseas, no mecanismo de consolidação da factura, e nas crianças que fazem fracturas quando são pequeninos podem ter um alongamento desse membro provocado por esse aumento da circulação.

A hiperémia passiva ou congestão há aumento da quantidade de sangue mas o sangue não circula, há diminuição de fluxo, ou seja, há uma obstrução a montante. A hiperémia passiva tem duas causas, pode ter uma causa local, quando há uma obstrução de uma veia, no caso de uma trombose, há aumento da pressão hidroestática, da pressão dentro do vaso e há saída do líquido para fora do espaço intersticial. Uma causa geral é uma falência do coração como bomba, é o caso da insuficiência cardíaca congestiva: nessa altura vai haver congestão (hiperémia passiva) em vários órgãos, nos tecidos, etc. O coração não é capaz de bombear a quantidade de sangue necessária, tem diminuição da contracção, tem uma insuficiência cardíaca e portanto fica mais sangue nos vasos, e há diminuição do fluxo.

Como estava a dizer, a dita hiperémia passiva ou congestão tem então diminuição do oxigénio, diminuição do transporte de substratos e diminuição da remoção dos produtos de degradação. Leva ao aumento de volume por edema, dos tecidos que estão para baixo e com o passar do tempo vai a alterações tróficas nos órgãos, vai levar ao desenvolvimento de fibrose.

Quais são então os exemplos de congestão que podemos ter? Congestão no fígado – congestão hepática, que pode ser provocada por insuficiência

cardíaca (falência global ou direita), o coração não consegue bombear ou por obstrução do sistema venoso acima das veias hepáticas e vai levar primeiro a uma infiltração gorda e depois mais tarde leva à fibrose hepática, aquilo a que nós chamamos cirrose, substituição do tecido normal do fígado por um tecido fibroso.

No pulmão pode haver congestão por falência cardíaca esquerda, ou falência global como enfarte do miocárdio em que morrem células e o coração deixa de ter capacidade de bombear e dá-se congestão pulmonar. Esta congestão vai levar à saída do líquido dos capilares pulmonares para os alvéolos, onde se dão as trocas gasosas e provoca edema alveolar. Se a causa for muito prolongada, o edema muito prolongado como acontece em diversas situações cardíacas como por exemplo o aperto da válvula mitral, o doente pode desenvolver fibrose pulmonar.

No baço, ao contrário dos outros órgãos, quando há congestão ele responde aumentando a sua função – hiperesplenismo, em que há diminuição dos glóbulos brancos, vermelhos e das plaquetas.

Ao nível de membros inferiores, vocês já têm visto muitas vezes, as pessoas que têm varizes, as pessoas que têm insuficiência cardíaca, têm as pernas edemaciadas, e se essa insuficiência cardíaca ou essa obstrução venosa for prolongada vai levar, e é o que acontece no caso das pessoas que têm insuficiência venosa, em que as veias não conseguem bombear o sangue para o coração, vão levar alterações tróficas e processos fibróides também com alteração da coloração das pernas e o aparecimento das chamadas úlceras varicosas, que são provocadas então por congestão a nível dos membros inferiores.

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Há, como sabem, várias causas da insuficiência cardíaca, sendo a cardiografia isotérmica (angina de peito, enfartes do miocárdio, lesões provocadas por aterosclerose das artérias coronárias – situações que dão cardiografia isotérmica por diminuição da irrigação do coração) a mais frequente de todas as causas da falência do coração como bomba.

Outra causa da insuficiência cardíaca são as doenças do músculo cardíaco, isto é, as doenças do miocárdio, em que o coração ou tem as paredes muito grossas por infiltração como no caso da amilóides, que é a doença dos pezinhos em que há infiltração do coração por substância amilóide, ou doenças do próprio músculo em que o coração começa a dilatar e há uma diminuição da contracção e portanto não bombeia a quantidade de sangue normal, e o sangue vai-se acumular e vai provocar edema.

As doenças das válvulas que ainda há pouco falei, o aperto da válvula mitral chamada estenose mitral que é provocada por febre reumática, porque as doenças valvulares podem ser provocadas por febre reumática que é consequência de uma infecção das amígdalas. Hoje em dia já quase não se vê febre reumática pois há antibióticos para as amigdalites e também a penicilina, os doentes que se vêm com febre reumática são doentes que vieram ou estiveram em África em que as condições de saúde são mais precárias.

Outra causa é a hipertensão arterial cujo aumento pode levar à falência do coração como bomba.

O coração está envolvido por uma membrana que é o pericárdio e o pericárdio tem um líquido lá dentro.

As doenças do pericárdio e a hipertensão pulmonar são outras causas de insuficiência cardíaca.

Temos então aqui (Slide 11) um coração onde se observam as quatro cavidades e as válvulas que as separam: a válvula mitral (a tal que sofre estenose com febre reumática) e aórtica (ambas do lado esquerdo) e as válvulas pulmonar e a tricúspide (do lado direito).

Aqui (Slide 13) temos um exemplo da estenose da válvula aórtica, cuja causa também pode ser a febre reumática mas também pode ser uma alteração de velhos, chamada a doença fibrocaústica de velhos, em que há fusão das fissuras entre as cúspides que provoca estenose. Quando esta estenose é mais grave, ou seja, quando a pressão acima da válvula e abaixo da válvula está acima dos 50 mm os doentes têm sintomas e têm de fazer substituição destas válvulas.

Existem vários tipos de próteses: há próteses mecânicas e próteses biológicas que são feitas com pericárdio de porco. Nas imagens (Slide 14) podemos ver vários exemplos, uma que tem uma bola, outra que tem várias cúspides, isto é, tem um disco e o disco abre e fecha, outra que tem dois discos. As duas de baixo são próteses mais parecidas com próteses cardíacas, que são revestidas por pericárdio do porco.

Normalmente os doentes com estas próteses aguentam cerca de 10 anos ou mais, depois depende e têm também de ter substâncias que façam o sangue não coagular, porque estas válvulas são diferentes, não têm endotélio e têm uma ligeira tendência para formar pequenos trombos.

Falando agora de edema, o edema é a acumulação de fluido fora das células. O edema existe ou porque existe aumento da pressão hidroestática dentro dos vasos, por falência da bomba, ou porque existe diminuição da pressão oncótica. Este edema – excesso de fluido extracelular, pode preencher espaços que existem no organismo ou formar bolsas e nessa altura já não designamos de edema mas sim de derrame. Pode encontrar-se derrame na pleura que se denomina derrame pleural ou hidrotórax, que acontece quando se acumula líquido no espaço pleural, entre os dois folhetos (visceral e

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parietal); no pericárdio que se denomina derrame pericárdico ou hidropericárdio; no espaço articular que chamamos hidroartrose; se se acumular líquido dentro da cavidade peritoneal chamamos ascite; e quando um doente tem um edema generalizado em todo o organismo (mãos e pernas inchadas, tem líquido de ascite) dizemos que se encontra em anasarca.

No nosso organismo temos cerca de 40 litros de água, dos quais 25L estão dentro das células; 2L fazem parte dos glóbulos vermelhos; 3L fazem parte do plasma e o volume extracelular são 12L. O que regula o volume intracelular é o potássio, as proteínas regulam o plasma e os glóbulos vermelhos e o volume extracelular é regulado pelo sódio.

Se o líquido que sai para fora dos vasos e que preenche espaços é rico em proteínas nós chamamos exsudado, isto normalmente é provocado por um processo inflamatório, porque há alteração da permeabilidade das membranas com saída dos elementos de dentro do sangue e do plasma para dentro dessa cavidade, portanto há saída de proteínas. Se por outro lado este mesmo líquido for pobre em proteínas chamamos transudado, ou seja, é só provocado por aumento da pressão hidroestática, não é um processo inflamatório.

Voltando ao edema, este pode ser localizado num membro que pode ser provocado por uma obstrução venosa (uma trombose numa veia), pode ser provocado por uma inflamação aguda, uma infecção num membro inferior pode provocar edema, quando o edema é provocado por inflamação geralmente está associado a outras manifestações. Como se distingue então uma perna inchada com ou sem inflamação? Calor, tumor, rubor e dor – Virchow – não interessa! )

O edema pode ser também generalizado que pode ser provocado por patologia do coração (insuficiência cardíaca), por insuficiência renal, por cirrose hepática, hipoalbuminémia ou por outras causas.

Aqui (Slide 20) temos um exemplo de uma perna com um edema provocado por uma obstrução venosa, por uma trombose venosa profunda, com um membro profundamente edemaciado.

(Não interessa em pormenor.. O rim pode provocar edemas porque há perda de proteínas, portanto é por

diminuição da pressão oncótica, é porque há constrição das arteríolas do próprio rim que diminui o filtrado e provoca retenção de sódio ou sempre que há libertação de hormonas que provocam a retenção de sódio e água no organismo, ou porque o rim com excretor que é diminui a sua capacidade excretora de água e portanto há edema.

...fim da parte que não interessa em pormenor).Pode haver edema de causa hepática e tem vários mecanismos também, pode ser por

constrição das veias porta e nessa altura há acumulação de líquidos na barriga: a dita ascite; é no fígado que é produzida a albumina, portanto a diminuição da produção da albumina, que é uma proteína do sangue, vai levar a uma diminuição da pressão oncótica no sangue e saída de líquido; pode ser porque há diminuição da inactivação de certas hormonas que provocam retenção de sódio ou porque há aumento da secreção de outras hormonas que provocam também retenção de sódio.

Edema na hipoalbuminémia, na baixa das proteínas, acontece quando os valores das proteínas no sangue descem para valores inferiores a 2,5% do normal até 4,5% a sua concentração. As causas de hipoalbuminémia são várias: uma delas, que não está aqui é a hepática: a diminuição da síntese de albumina; perdas renais ou gastrointestinais; pode ser por má absorção de alimentos e pode ser porque o doente ingere poucas proteínas, isto é, má nutrição. Os meninos de África e os sub nutridos muitas vezes estão inchados (barrigas enormes) é por hipoalbuminémia, por baixa da ingestão de proteínas que

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depois provoca edema.Mais um dos problemas da circulação e da coagulação é a hemorragia, que é uma

perda de sangue. A hemorragia acontece sempre por vasos e pode acontecer em qualquer lado: na pele, por uma ferida; hemorragia dos vasos do estômago, uma úlcera; pode-se também sangrar dos pulmões - hemoptise; do nariz; hemorragia na cabeça, em todo o lado....

As causas de hemorragia são doenças ou traumatismos que lesam as artérias ou as veias, no entanto, as hemorragias podem também ser espontâneas, ou seja, devem-se a alterações do sistema hemoestático, que é o caso da hemofilia, em faltam factores da coagulação como iremos ver mais a frente.

Para estancar o sangue existe aquilo a que se chama hemostase, que é então o mecanismo de controlo da hemorragia, o organismo reage formando um trombo, um rolhão, sendo que um trombo é uma massa composta por plaquetas, fibrina e glóbulos vermelhos e que podem desenvolver-se a partir do sangue e dentro do sistema vascular e podem-se formar trombos também no coração.

Para se dar essa hemostase a primeira coisa e o mecanismo mais eficaz é uma contracção dos vasos, uma vaso constrição arterial, depois forma-se um rolhão de plaquetas e depois desse rolhão estar feito, esse rolhão é cimentado com filamentos de fibrina que existe em circulação, não existe activa pois tal como os outros factores da coagulação existem em profactores que têm de ser activados porque se não o sangue andava sempre a coagular dentro dos vasos, portanto têm de haver algo que dê o sinal para que se dê a coagulação e esta não ocorra quando não é necessária. Há doentes que têm problemas e que fazem coágulos espontâneos porque lhes falta um destes factores, ou seja, tem de haver um equilíbrio entre estes factores, pois há tendência para formar e para não formar coágulos.

Os principais componentes da coagulação são as plaquetas e os ditos factores da coagulação. Os factores da coagulação são de 1 a 13 e não têm a ver com a maneira como são activados, isto é, o primeiro não activa o segundo e o segundo não activa o terceiro, estão sim pela ordem pela qual foram descobertos.

Quando se forma um coágulo na hemostase, primeiro forma-se um rolhão de plaquetas no local da lesão, aliás vocês sabem quando fazem uma ferida forma-se logo um coágulo e depois passado um tempo esse coágulo fica organizado e nessa altura entra em acção o sistema da coagulação que forma um coágulo estável. Estas duas fases são designadas hemostase primária e hemostase secundária, e é na secundária que entra a fibrina.

(com base na imagem do slide 31...)Portanto, temos a lesão de um vaso, nessa altura temos produção de colagénio, são

activadas as plaquetas, há substâncias que são libertadas das plaquetas e que vão provocar vasoconstrição que são a seretonina e o tromboxano, depois o tromboxano e o ADP vão provocar uma maior agregação de plaquetas e forma-se então aquilo a que se chama hemostase primária. Depois, entram em acção os factores da coagulação que têm como função a produção de fibrina que forma a dita rede e que torna o coágulo mais estável. É então este o processo da hemostase de formação de um trombo.

Nesta que se chama a cascata da coagulação existem duas vias de activação, a parte final é a formação de fibrina, vêm aqui (Slide 32) os ditos factores da coagulação, que quando têm um A no fim, são os factores da coagulação activados, eles existem no organismo em formas proactivas, não são activas e são então activados em cascata até se formar a fibrina. Como eu tinha dito existem duas vias para esta activação, que são denominadas a via intrínseca, que é aquela que se dá sem que haja uma lesão na parede de um vaso, e a via extrínseca que necessita de uma lesão de um vaso. Portanto a via

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intrínseca é aquela que faz com que o sangue possa coagular dentro de um tubo. Como já vimos para que o sangue não esteja sempre a coagular existem formas

proactivas e são activados em cascata e depois também existe um sistema de desfazer os coágulos, chamada a lise de coágulos. Há várias razões para que não se formem coágulos constantemente: uma delas é o facto de haver fluxo sanguíneo, quando o sangue está estável, quando há diminuição da circulação do sangue há uma maior propenção à formação de coágulos. Depois existem no próprio organismo substâncias que são anticoagulantes que evitam a formação de fibrina. As pessoas que não têm estes ditos anticoagulantes naturais no organismo, têm tendência a formar trombos espontaneamente. São substâncias antitrombóticas: a antitrombina III; a proteína C e a proteína S. Depois existe um sistema que provoca a lise do trombo, isto é, destrói a fibrina, que é a plasmina. A maior parte dos coágulos são destruídos espontaneamente pelo organismo através da plasmina. A plasmina também não existe activa, existe na forma de plasminogénio e é o activador do plasminogénio que o transforma em plasmina. O que é preciso reter é que a maior parte destes factores não existem activos e são activados quando é necessário.

O que se passa com o endotélio é como se fosse um balanço por um lado para se formarem trombos no caso de ser preciso, isto é, a parte trombótica, e por outro lado a parte anti-trombótica, sendo esta a que predomina normalmente, tal como seria de esperar, senão estaríamos sempre a formar coágulos que seria uma situação muito grave. É a inibição da agregação das plaquetas e da coagulação e a fibrinólise (lise da fibrina pela plasmina) que inibem a trombose. Por outro lado, temos aqueles factores que favorecem a formação de trombos, quando esta é necessária, como a adesão e agregação das plaquetas, a coagulação e a inibição da fibrinólise.

Portanto na trombose uma das coisas que se forma é um coágulo, um trombo no fundo, ou seja, uma massa sólida que, tal como eu disse à bocado, se desenvolve a partir do sangue e do sistema vascular e é constituído pelas plaquetas, fibrina, glóbulos vermelhos e glóbulos brancos.

A tríade de Virchow que eu há bocado estava a chama a outra coisa, daqui a pouco já me lembro.

Quais as causas para se formarem trombos no organismo? Tem de haver alterações da parede vascular, alterações do fluxo (fluxo mais lento) ou alterações no sangue que o torne mais hipercoagulável, com mais tendência para coagular.

A lesão do endotélio dos vasos pode ser provocada por um traumatismo, pela própria cirurgia, por uma inflamação, por uma resposta imune (quando esta é exagerada e dá-se a formação de um trombo) ou por lesão de uma placa de aterosclerose.

(Slide 40..)Quando se forma um trombo, os trombos podem ser parietais: na parede dos vasos,

podem ser dentro do próprio coração: endocavitários, e os trombos podem obstruir parcialmente o vaso ou podem ser os chamados trombos oclusivos, que interrompem a passagem do sangue completamente. Uma das coisas que pode acontecer aos trombos é partirem-se aos bocados e nessa altura libertam esses bocados e chamam-se êmbolos. A tendência natural do trombo é ser dissolvido, mas pode ser organizado, organização do trombo até ter circulação e dentro do trombo também pode haver a chamada recanalização, deixando passar sangue através do próprio trombo.

Isto (Slide 41) é um exemplo de uma trombose venosa profunda: uma flebotrombose, isto é um vaso e aqui temos dois trombos aderentes à parede.

Aqui (Slide 42) é uma trombose numa coronária que pode originar morte se for fatal, no entanto, pode não dar morte e originar um enfarte que é a morte dos tecidos.

Embolia não tem que ver só com trombos, pois um êmbolo é qualquer objecto

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sólido, líquido ou gasoso, transportado pelo sangue e que não se mistura com ele, portanto os êmbolos podem ter diversas causas, e se for demasiado grande pode obstruir uma artéria ou um capilar. Os êmbolos andam a circular, os trombos estão fixos.

Quando falamos em embolismo falamos do impacto do êmbolo, o êmbolo anda a circular e vai ter de parar em qualquer sítio. Se os êmbolos vêm das veias das pernas ou do lado direito do coração eles vão acabar no pulmão, que é para onde vão todas as veias da circulação sistémica, e provocam a chamada embolia pulmonar. Se os êmbolos se originam do lado esquerdo do coração vão provocar embolias periféricas em qualquer parte do corpo. E então o que é que eles podem provocar? Podem provocar uma embolia cerebral, uma embolia no rim, podem provocar uma embolia numa perna e se for grave o doente tem de ser amputado pois ficar sem circulação nessa perna.

Há vários tipos de embolia mas a mais comum é a chamada tromboembolia, que é provocada por um trombo que fragmenta. A embolia paradoxal também é geralmente provocado por um trombo no entanto chama-se paradoxal porque se origina do lado direito do coração mas em vez de ir para o pulmão passa para a circulação sistémica, através de comunicações dentro do coração ou através do pulmão. Outro tipo de embolia é a provocada por embolia de ateroma, da aterosclerose, formam placas em todas as artérias, e muitas vezes na adolescência já há pequenas placas de aterosclerose formadas. Nas pessoas mais velhas estas placas formadas na aorta ou nas carótidas podem fragmentar-se e provocar os acidentes vasculares cerebrais. A embolia gorda pode ser provocada por uma fractura com exposição da medula do osso, que é uma situação grave. A embolia gasosa pode ocorrer em várias situações, também em fracturas e politraumatizados, com entrada de ar em circulação e pode ser provocada (embora aconteça pouco) por entrada de ar quando se introduzem cateteres dentro do organismo. Este tipo de embolia (gasosa) também pode ocorrer nos mergulhadores, e é uma situação grave. A embolia de líquido amniótico pode ocorrer no parto em que entra líquido amniótico para a mãe, que é uma causa de morte. As embolias terapêuticas somos nós que as provocamos, em situações por exemplo de mal formações artero-venosas, quando existem tipo aneurismas, as pessoas têm mal formações na cabeça ou em alguns sítios e se aquilo rompe tem um enorme acidente vascular cerebral e morrem, e então emboliza-se essa mal formação com um cateter que vai até à artéria, que normalmente são assim uns novelos das mal formações artero-venosas, faz embolia e deixa de haver circulação de sangue aí porque o perigo de ruptura é tal de mal maneira grande e tem de ser feito por pessoas muito experientes que sabem que não vão provocar um AVC, tem que ver com localização, são os chamados neuroradiologistas, que é uma especialidade dentro da radiologia. Há outros tipos de embolias que podem ser causadas porque há coisas que podem entrar por traumatismo em circulação e também pode ser provocada pelos médicos em certo tipo de intervenções que deixam fragmentos de material.

A embolia pulmonar é provocada geralmente por uma trombose nos membros inferiores ou na veia cava e quem tem maior propenção para desenvolver estas embolias pulmonares é um doente que já tenha uma história prévia de embolia pulmonar, doentes que tenham cancro, que tenham falência cardíaca, cirurgia, obesidade e idade avançada. Os doentes que são internados e são submetidos a cirurgia, se forem velhos e se a cirurgia for prolongada e se tiverem acamados devem fazer profilaxia das embolias, isto é uma causa muito frequente de morte dos doentes internados, morte súbita: o doente que se levantou e morreu é isto: uma embolia pulmonar, tinha uma trombose venosa profunda, soltou-se o trombo com uma embolia e obstruiu um dos vasos importantes do pulmão.

O diagnóstico é feito, como viram no artigo por alterações, há suspeita, o doente

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pode provocar um enfarte pulmonar, pode não ter qualquer manifestação, ou seja, a embolia pode passar despercebida, pode provocar um enfarte pulmonar, que é isso que se vê aqui: obstruiu uma artéria e provocou um enfarte pulmonar. A opacificação enorme que se vê é um enfarte no pulmão (Slide 48 - esquerda). O rx ao tórax pode dar para ver mas também pode não dar para ver nada. Um dos melhores métodos para diagnóstico hoje em dia são as TAC’s, que com cortes pequeninos conseguem detectar as várias embolias pulmonares ou então a cintigrafia com isótopos que se estuda por um lado as zonas que são ventiladas (o ar) e as zonas perfundidas, através de uma cintigrafia pulmonar de ventilação-perfusão. Também se vê na imagem de cintigrafia (na perfusão) que tem um defeito na base do pulmão direito.

As causas de embolia da circulação sistémica pode ser um enfarte agudo do miocárdio, do ventrículo esquerdo, o enfarte leva à necrose do miocárdio, leva a alterações da motilidade daquele segmento do coração, o sangue fica estagnado, forma-se um trombo e daí liberta-se um êmbolo. Pode também ter como causa as válvulas e as próteses como falei há pouco, pode ser um doente que tenha um ritmo irregular. A fibrilhação auricular é uma arritmia muito frequente, a aurícula não contrai normalmente e há uma tendência para o sangue estagnar, não há uma contracção rigorosa dos mecanismos. Para que não haja a formação de trombos é exactamente a corrente sanguínea (a contracção e o fluxo fazem com que o sangue não coagule), quando há uma lesão no endotélio é que há uma tendência para se formarem trombos. Portanto na fibrilhação auricular (arritmia), a aurícula não contrai e formam-se trombos e esses trombos soltam-se e provocam embolias. A dilatação da própria aurícula esquerda, que já é provocada por má contracção, faz também com que se formem trombos que vão provocar embolias sistémicas.

Aqui (Slide 50) temos um ecocardiograma onde se vê um trombo, porque os trombos podem ser visíveis no ecocardiograma. Isto geralmente acontece na sequência de um enfarte, em que esta parede não contrai. Vemos também uma aurícula esquerda que está grande também com um trombo. A válvula mitral também não está normal, está com aspecto de estenose mitral.

A embolia paradoxal era aquilo que estava a dizer que são êmbolos que se originam nas veias sistémicas, mas em vez de terminarem nos pulmões, embolizam para artérias, passam através de anastomoses no pulmão, isto também é um bocado de embolização dessas artérias, dessas mal formações, ou através de orifícios cardíacos e então passam do lado direito para o lado esquerdo, ou seja, o êmbolo em vez de ir para o pulmão vem por aqui, onde há este orifício (Slide 52) e passa pela aurícula esquerda, ventrículo esquerdo e depois vai pela aorta para a circulação sistémica. É a isto que se chama a dita embolia paradoxal e geralmente ou é uma mal formação no pulmão ou é uma comunicação nas aurículas. Isto é encerrado com uns dispositivos através de um cateterismo, os dispositivos são aplicados aqui e encerram estes orifícios.

O êmbolo de ateroma que é também uma das causas frequentes de acidentes vasculares e de isquémia na libertação de uma placa de aterosclerose, pode ser espontânea que é muito frequente (como os AVC’s dos velhos) mas também pode ser provocada por manipulação e vão para qualquer órgão: cérebro, que é das coisas mais graves e provoca os acidentes vasculares cerebrais que deixa sequelas, que se chama acidente isquémico transitório (AIT).

Isquémia é a diminuição da irrigação de um órgão, portanto diminuição do aporte de oxigénio, além disto há uma diminuição do aporte de substratos e a diminuição da remoção dos produtos do metabolismo.

As causas de isquémia pode ser um trombo ou um êmbolo na circulação que provoca diminuição da irrigação, pode ser uma placa de aterosclerose que limita

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parcialmente o lúmen do vaso, pode ser por compressão do vaso e também por diminuição da irrigação porque o coração falhou como bomba.

Isquémia é portanto diminuição da irrigação e as causas podem ser por fora do lúmen ou por dentro do lúmen ou pode ser só por uma grande aperto: vasoconstrição.

Quando há isquémia (diminuição da irrigação) há, como já tinha dito, desenvolvimento de circulação colateral, há um vaso obstruído e forma-se pequenos vasinhos que vão tentar levar o sangue onde há obstrução, portanto a partir de vasos ao lado vai-se desenvolvendo a circulação colateral.

Por outro lado, as consequências da isquémia crónica, de uma isquémia prolongada vai levar à diminuição da função do órgão. Uma isquémia aguda se for grave com oclusão total do vaso leva ao chamado enfarte, com necrose dos tecidos. A atrofia é diminuição da função.

O que é que leva uma coisa a outra? Depende, então, da gravidade e da duração, quanto maior e mais prolongada for a obstrução maior a tendência para fazer necrose; o tipo de tecido, há tecidos que são mais susceptíveis como os nervos; da temperatura do tecido, a temperaturas mais baixas preservam-se os tecidos, diminui a isquémia (é por isso que se transportam os corações em gelo: para diminuir a isquémia) e depende também da viscosidade do sangue.

Circulação coronária, coronárias são três vasos que irrigam o coração, temos o tronco comum que do lado esquerdo divide-se na circunflexa e na descendente anterior e do lado direito temos a coronária direita.

A nível do coração a isquémia conforme a gravidade pode provocar todas estas variantes (Slide 60). Se for um aperto provocado por uma lesão por aterosclerose, um aperto fixo que está ali sempre, provoca a angina de peito (isquémia crónica). Se for provocado por uma fissura de uma placa de aterosclerose essa fissura vai levar à formação de um trombo, se o trombo não obstruir o vaso provoca uma angina cada vez mais grave que se chama instável. Se por outro lado, essa fissura da placa e a formação do trombo obstruir completamente o vaso provoca enfarte, e a necrose dos tecidos. Se a isquémia dor provocada apenas por espasmo do coração (vasoconstrição inapropriada) chama-se angina de Prinzmetal, quando não há lesões nas artérias.

Isto (Slide 61) é um exemplo de uma obstrução que preencher cerca de 60% do lúmen do vaso e provoca isquémia apenas quando o doente faz esforço, pois durante o repouso a quantidade de sangue que passa é suficiente para irrigar o coração, durante o esforço há aumento das necessidades e então o doente tem dor no peito – angina de peito.

Aqui (Slide 62) temos uma placa de aterosclerose, que tem uma aparência completamente diferente de um trombo. Quando esta placa preencher cerca de 90% do lúmen do vaso o doente tem queixas mesmo em repouso, tem baixa de irrigação em repouso.

Na angina instável, temos aqui (Slide 63) um trombo, temos aqui uma placa de aterosclerose e fissura da placa com um trombo que não obstrói completamente o vaso e provoca a angina para esforços menores e até muitas vezes em repouso.

A obstrução completa do vaso (Slide 64) com o enfarte do miocárdio, ou seja, tem um trombo que ocupa todo o lúmen do vaso.

Os enfartes podem ter diversas localizações, portanto obstrução dos vasos quando se liberta um êmbolo, para onde é que ele pode ir? É para todos estes sítios (slide 65) e provocar coisas que são graves, as mais graves no fundo acabam por ser do miocárdio, que pode ser fatal, e o cérebro com as sequelas que tem no acidente vascular cerebral e de um doente poder ficar sem se mexer e sem falar.

Aqui (Slide 66) é um exemplo de um enfarte agudo do miocárdio, com obstrução, e

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este vaso que é a descendente anterior com formação de necrose. Coronariografia é a introdução de um cateter que vai directamente ao coração, os

cateteres hoje em dia têm a particularidade de serem desenhados de tal forma que vão direitos à artéria que se quer estudar, tal é a curvatura do cateter na ponta (ou vão para a coronária esquerda ou para a direita). Aqui temos um exemplo de uma coronariografia esquerda (Slide 68), a substância que se introduz é radio-opaca. Além da coronariografia o que se faz nos cateterismos, além de visualizar as artérias faz-se dilatação que é angioplastia com um balão que é insuflado, desentope o vaso. Um doente com um enfarte agudo do miocárdio, com uma obstrução, uma dor horrível no peito chega à urgência deve ser logo encaminhado para um laboratório de cateterismo cardíaco para fazer a desobstrução do vaso através de um balão.

Além desta angioplastia existem os stents que são redes metálicas, e são revestidos por substâncias anti-trombóticas para que a tendência para haver obstrução diminua e coloca-se então uma malha destas (stent) que permanece para o resto da vida do doente.

As complicações do enfarte do miocárdio (Slide 70), complicações mecânicas que acontece quando há morte que são formações de dilatação do coração e rupturas cardíacas.

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Aula de 08-11-2006 (2ª Parte)Desgravada por Artur OliveiraEstão sublinhadas as palavras que eu não consegui entender, ou não tenho a certeza que estejam correctas.

A gravação não começa no início da aula…

…radionuclitos são partículas que têm um núcleo instável, e que adquirem estabilidade através da desintegração do núcleo e emitem fotões, esses fotões são captados, essas partículas, por uma gama câmara, a gama câmara é constituída por… isto é muita confusão para mim… ponteiro, óculos, a gama câmara é constituída por um climador, por um sistema de multiplicação e por um computador. O climador funciona como se fosse, parece um favo de mel, só deixa, só capta as radiações que vão numa determinada direcção, depois o tubo, estes tubos fotomultiplicadores transformam a energia emitida, é inicialmente transmitida em luz, e depois num sinal eléctrico. Depois é armazenado numa matriz, correspondente ás cintilações, numa matriz onde os pixeis são todos arquivados. Os isótopos que se utilizam emitem radiações gama, tem uma energia entre 100 e 200 KeV, e devem um tempo de semi-vida curto, porque no fundo nós tamos a injectar radiações dentro do organismo. Quais são as técnicas, nós injectamos os radionuclitos, depois os doentes vão para as ditas gama câmara onde são feitos a aquisição de imagens. O que é que nos podemos estudar? A perfusão miocardica, portanto o fluxo através das coronárias, podemos estudar a função cardíaca através das angiografias de radinucitos, podemos estudar a necrose das células miocardicas, utilizando substancias, neste caso são os anticorpos anti-miosina, que é uma das proteínas contrácteis do miocárdio, anticorpos específicos contra a miosina, quando há necrose há interrupção da membrana das células e os anticorpos tem acesso á miosina dentro das células miocardicas, podemos estudar trombos, podemos estudar a enervação cardíaca, os nervos simpáticos, a enervação simpática e é possível também estudar o metabolismo, utilizando a tomografia de emissão de positrões. Os positrões precisam de

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um ciclotrão de produção local, eu acho que o IPO já tem, não sei que positrões é que eles usam, mas já tem um PET Scan, Tomografia de Emissão de Positrões, são utilizados não só em, isto tem as aplicações à radiologia nuclear mas os, a medicina nuclear é muito utilizada nesse campo, a nível do coração o que nós estudamos a é o metabolismo, através da Tomografia de Emissão de Positrões estudamos a viabilidade, se as células estão vivas ou estão mortas. São utilizados vários isótopos, antigamente aquele que se utilizava mais, este slide é velho como o raio, como podem ver, antigamente o que se utilizava mais era o tálio, hoje em dia os que são mais utilizados são os derivados do técnezio, porque têm um tempo de semi-vida mais curto que o tálio, e tem uma energia de radiações que é muito melhor portanto, alem de tudo mais permitem também estudar também a função cardíaca, estes novos compostos com tecnezio. Portanto qual é as vantagens destes compostos marcados com tecnezio? Tem uma energia de 140 KeV, que é ideal para as gama câmaras, tem um tempo de semi-vida mais curto, permitem a aquisição de imagens síncronas com o electrocardiograma, e portanto estudar a função cardíaca, é um acesso mais fácil… longo período de conversa com o publico… ahh e tal ainda não pus isto como deve ser….e recomeça: Como é que são feitos estes estudos, os estudos da avaliação da perfusão miocardica, à bocadinho fizeram me a pergunta, o doente faz uma prova de esforço, e no pico do exercício o doente é injectado o isótopo, depois o doente vai para a gama câmara fazer a aquisição dessas imagens, e o que fizer, com o tálio tem que ser feito imediatamente após, com os derivados do tecnezio pode ser uma hora depois, porque é como se ficassem congeladas aquela aquisição, o que é que se passa normalmente, normalmente, durante o exercício, há aumento das necessidades miocardicas de oxigénio, e há aumento do fluxo coronário, nos doentes que têm isquemia o fluxo não aumenta nesse vaso e portanto vai haver um defeito nas imagens, vai haver uma imagem negativa, as imagens com isótopos, dão imagens coloridas que vocês já vão ver. Isto são as clássicas imagens, são as chamadas aquisições planares, são imagens bidimensionais em que a aquisição era feita em anterior, obliqua anterior esquerda, perdão, e superior esquerdo. Não expliquei bem como é que é uma gama câmara, a gama câmara pode ter, hoje em dia tem mais do que uma cabeça, de aquisição, aquelas… onde tem os ditos climadores, pode ter mais do que uma cabeça, pode ter só uma cabeça, ou mais de uma cabeça qué pra dar a rotação toda à volta do corpo, antigamente tinham só uma cabeça e faziam as imagens em aquisição anterior, obliqua anterior esquerda e perfil, e agora elas todas rodam, e então, pra ser mais rápido tem duas, vão fazendo duas aquisições depois há essas imagens que são arquivadas na dita matriz e depois são reconstruídas para darem cortes do coração, reconstrução tumografica, que é o chamado SFECT, Single Foton Emition Computed Tomografie. Nas imagens planares a distribuição das coronárias é visível, nestas projecções, na projecção anterior essa parte do ventrículo, portanto o que nos vemos, são imagens semelhantes a isto, esta projecção…tá aqui também o equivalente disto, hoje em dia mais bonitas as imagens e tudo, anterior, obliqua anterior esquerda, isto é a cavidade e o resto é a distribuição dos isótopos, esta técnica não tem uma grande revolução, não tem nada a ver com a eco, nem tem nada a ver agora comparativamente com as (???) nem com a ressonância magnética, mas também o que se estuda não é a válvula, não se está a estudar as cavidades nem nada disso, o que se está a estudar é a perfusão. Portanto isto corresponde, ao território da descendente anterior, isto é a parede inferior, isto é apex, septo parede lateral e apex, parede anterior e parede inferior. E aqui estão as mesmas, a que é que corresponde as coronárias… pergunta do publico… Resposta: Obliqua anterior esquerda, e este é um perfil de esquerdo…são as projecções…isto já não se faz a maior parte das vezes, o que se faz são as reconstruções tumograficas que já vou

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explicar. E depois é assim, o que é que nos fazemos comparamos essas imagens que são feitas durante o esforço com uma aquisição de imagens umas horas mais tarde, em repouso, se um doente tiver umas coronárias normais há a distribuição homogénea do isótopo em todo o coraçao, se o doente tiver um defeito, uma doença coronária, vai aparecer um defeito (10:49) durante o exercício, se esse defeito do exercício desaparecer, nas imagens em repouso, quer dizer que era isquémia, quando aumentamos as necessidades, a quantidade de sangue que chegou a esse vaso coronário não era suficiente, portanto aparece um defeito, aparece como que um buraco, tão a perceber. Comparamos as imagens durante o esforço, com as imagens durante o repouso, tão a acompanhar isto, se aparece um buraco nas duas imagens é porque o doente teve um enfarte, é porque aquilo não é provocado por uma lesão isquemica só, é provocado por uma necrose, não chegou o isótopo as células miocardicas, tabem? Sem defeito é normal, sem doença coronária, se tiver um defeito nas imagens iniciais e um defeito nas imagens tardias, esse defeito chama-se fixo, e é um enfarte, se tiver um defeito nas imagens iniciais que desaparece nas imagens tardias, ouve redistribuição do isótopo, e é isquemia, se houver um defeito, por menor o defeito, é um enfarte mais isquemia ou uma isquemia muito grave…e vemos também a dimensão da cavidade, vemos se há captação do pulmão dos isótopos, e hoje em estudamos também a função ventricular esquerda, com os ditos derivados de técnezio que permitem avaliar a função global e segmentar da contracção daquelas paredes, estes estudos são feitos síncronos com o electrocardiograma…. E aqui temos as ditas imagens planares se olharem pra aqui, onde esta a seta, vêm que esta zona está mais branca e que aqui esta mais esbatida, portanto há aqui um defeito de perfusão que desaparece das imagens 4 horas depois, portanto isto é, equivalente a quê? Isquemia. Efeito que desaparece das imagens tardias é porque o doente tinha isquemia, senão as imagens tinham um defeito persistente. Ahh temos aqui um doente que entrou com uma dor precordial, que apareceu com uma dor precordial e tem aqui também uma diminuição da captação e depois foi submetido a lise do trombo, um doente que entrou com enfarte do miocárdio, e vêm que desapareceu, estava com isquemia grave, e que essa isquemia desapareceu e que isto corresponde ao septo… mas já vão ver imagens melhores. Aqui a mesma coisa, um doente antes de ser submetido a cirurgia cardíaca e depois de ser submetido a cirurgia cardíaca, o estudo em exercício, tem aqui um defeito de perfusão que desaparece pouco a pouco, que era equivalente a isquemia, no pós operatório depois de ter sido submetido a by-pass coronário, sabem o que um by-pass coronário, as imagens tem uma distribuição homogénea do isótopo, sabem o que é bipass coronário, não sabem como é que se faz os by-passes, tira-se uma veia dum outro sitio, geralmente da perna da sassena, pode-se utilizar a mamaria interna que é melhor, e é feita uma revascularizaçâo, um by-pass, uma pontagem. Aqui um doente antes de ser submetido a angioplastia coronária temos aqui uma menor distribuição do isótopo na projecção anterior, prova de esforço positiva, que é dada por este infra-desnivelamento de segmento SP, com alterações de isquemia, em obliqua anterior esquerda também lhe falta aqui um bocado do coração, e depois de ser submetido a PCCA, que foi aquilo que eu já falei à bocadinho, Angioplastia Coronária Pré Cutânea, faz numa angina de peito, acho que no enfarte agudo do miocárdio, e na angina crónica, o doente aqui em uma distribuição homogénea do isótopo. Quanto maior o numero de defeitos, quanto mais extensos, se houver dilatação ventricular, nas imagens logo após o esforço, tudo isto, são sinais de mau prognostico quer dizer que o doente tem doença, multi-vaso, de mais do que um vaso coronário, efeitos reversíveis, efeitos extensos, aumento da captação pulmonar do tálio ou dos tecnezios, e dilatação ventricular transitória. Alem das imagens planares, daquelas aquisições, alem das imagens planares, estas camaas vão fazer múltiplas aquisições e depois é como se

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tivesse o coroação todo, depois são feitas chamadas reconstruções tumograficas, é um processo computorizado, em que se consgue cortar depois o coração em cortes, e temos um estudo tumografico do coração, um bocadinho à semelhança das imagens que obtemos com a eco. E que cortes é que nos podemos ter? Podemos ter, um corte longitudinal assim, podemos ter o equivalente a 4 camaras do apex assim, e os cortes do ventrículo eixo curto, temos dois cortes longitudinais, este este, e temos os cortes transversais do ventrículo, e a partir daqui estudamos a distribuição dos isótopos em todos as coronárias, com os cortes transversais do ventrículo esquerdo, esta parede, corresponde tudo isto à descendente anterior, a parte lateral à circunflexa e a parte inferior à coronária direita, portanto (ela começou a mexer no gravador e não percebi esta parte, falha de 3 segundos) e aqui temos como se fossem as aquisições todas que nos obtemos, os cortes todos transversais do apex até à base, durante o esforço e no repouso os cortes longitudinais, e aqui os outros, como se fossem, vertical e estes são os longitudinais longuecsis, eixos longos verticais, eixos longos longitudinais. E aqui temos como as imagens nos aparecem hoje em dia através da reconstrução tumografica, isto é no exercício, comparamos o exercício com o repouso e as imagens são equivalentes e tem uma distribuição homogénea do isótopo, nas imagens em exercício e em repouso, portanto isto é um coração normal, aqui é o apex e aqui é a base, portanto 4 cortes do ventrículo esquerdo, estão a seguir isto… e aqui temos uma semelhante num outro doente e como podem ver as imagens durante o esforço, têm aqui uma zona que não tem captação de isótopo, e a parede inferior também não tem, e depois nas imagens tardias em repouso há uma melhoria, há uma distribuição quase homogénea do ventrículo, este doente tinha doença da descendente anterior, isquemia, aqui, desaparecia depois com as imagens em repouso, e também relativamente à parede inferior havia diminuição, havia melhoria nas imagens em repouso, portanto isto é doença coronária de dois vasos, com isquemia em dois territórios, tão a seguir isto… um outro exemplo, e aqui o que é? As imagens em repouso, as imagens durante o exercício e aqui as imagens em repouso, a comparação, dos eixos curtos, o que é que acham disto? É um enfarte inferior, de parede inferior, estão fixos muito bem… ai que ta de pernas para o ar!!!! Não faz mal… imaginem há outra maneira de ver isto, que é o chamado bullzai em que todos aqueles cortes (20:22) são condensados como copos, que antigamente se levavam para os acampamentos, os copos de água que fazem assim, então é a mesma coisa que se fez ao coração, do apex para a base foram todos postos em em… os copos dos campistas, são os copos que se abrem assim ou que se poêm deste tamanho, são todos feitos com anéis e depois põe-se assim, é o que se fez ao coração, imaginem, o coração é o copo aberto, todos anéis foram os diferentes cortes que se fez e a aquisição, as aquisições, as reconstruções tumograficas, depois fazemos assim ao copo, e temos aqui a distribuição dos diferentes, do apex prá base, todas as paredes do ventrículo, tabem, e olhando para aqui a olho nu, vemos logo onde é que são os defeitos e a extensão, e possível quantificar a extensão dos defeitos de perfusão… E aqui estão as imagens dos cortes do apex para a base, isto é uma distribuição considerada homogénea, alem disto é possível estudar também a função, a contracção destes diferentes segmentos, porque é feito síncrono com o electrocardiograma, e fazer também a distribuição, o mapa polar, outro nome disto, da contracção do ventrículo. Aqui a mesma coisa, a preto é o defeito de perfusão, este defeito de perfusão, isto é o apex esta zona central, isto é do apex prá base, as reconstruções, e este doente tem, isto é as imagens de esforço, e estas em repouso tem um defeito fixo, que apanha o apex e quase toda a parede inferior, estão a perceber isto? E comparam-se estes dois, e vêm aqui, olhem o defeito fixo, que apanha a parede inferior, e aqui está a distribuição no mapa polar. Aqui temos um outro defeito, também em imagem bipolar, é um defeito da

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parede lateral, que olhando para aqui num corte, isto é um corte exemplo significativo no meio do ventrículo, tem isquemia, vêm aqui o defeito e o desaparecimento quase completo deste defeito de perfusão, tá aqui codificado a azul, portanto isto é isquemia, tabem? Outra forma de estudar, outra aplicação dos isótopos é no estudo da função ventricular, e a maneira de fazer, chama-se as angiografias de radionuclitos de equilíbrio, são marcados os glóbulos vermelhos do doente isto são imagens em repouso, também se podem fazer durante o exercício estudar a função ventricular durante o exercício, mas os glóbulos vermelhos do doente estão marcados com isótopo, portanto temos o pu todo intravascular marcado, depois a aquisição é feita síncrona também com o electrocardiograma, chamado gaystit e o que é que isto quer dizer, o ciclo cardíaco que vai desde uma sístole até outra, intervalo RF é dividido numa série de segmentos, e as imagens correspondentes a cada parte dessa, do ciclo cardíaco, são adquiridas, as correspondestes a essa parte da sístole, há a primeira parte, há a segunda, há a terceira nhenhenhe… vão todas armazenadas para o mesmo sitio, o que é que nos temos, duma aquisição de imensos ciclos cardíacos temos um que é representativo, um só que é representativo de todos os ciclos cardíacos, mas que representa a função cardíaca, estão a perceber? Portanto é, é a… isto tem todas as coisas que são feitas síncronas com o electrocardiograma é feito assim, portanto aqui as imagens correspondentes, o ciclo cardíaco é dividido em múltiplos segmentos e as correspondestes a cada um são armazenadas olha aqui esta, o ciclo cardíaco RR dividido em vários segmentos (25:05) a aquisição da primeira, do coiso vai pró numero um, a segunda porção vai pró numero dois, a terceira, e assim consecutivamente. E temos no final, a soma de todos estes ciclos cardíacos é armazenado num só, que dá a função ventricular que é representativa do coração… (o ficheiro está danificado daqui para a frente…acaba aqui a tradução)

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Engenharia Biomédica – 3º ano, 1º semestreMecanismos Gerais da Doença (2006/2007)

Professor Luís Costa

Aula desgravada por Ângela Chan, Bruna Mota e Nuno Santos

Parte 1 – Ângela Chan

Vamos falar de uma doença que é muito frequente. Muito provavelmente vão lidar com uma situação destas, dum familiar (que mórbido…!).

Vamos falar de um tema importante em que é fundamental haver avanços, e todas as pessoas têm responsabilidades nisto, todas! Há investigação na área de nutrição e do cancro, importante. Eu vou dar-vos alguns elementos desta doença, que podem ser mais importantes para um grupo ou para outro, mas que são importantes.

(acetato 2) Vamos falar brevemente sobre a importância epidemiológica, que vocês sabem

que é frequente mas não fazem ideia do quão frequente é. Depois vamos propriamente entrar no conceito da aula aula, o que é a neoplasia:

o conceito como é que se caracteriza como é que o classificamos como é que surge como é que comporta que proporções tem em pessoas que sofrem de cancro como é que se faz o diagnóstico quais as perspectivas terapêuticas

(acetato 3/4) Homens, década de 90: estatística de mortalidade nos Estados Unidos. Em

Portugal também há estatísticas de mortalidade, mas em relação à incidência e prevalência as estatísticas não são tão boas.

Em Portugal a proporção dos diferentes cancros vai ser muito semelhante a estas (do slide 3) excepto numa doença, que já vos vou dizer qual é.

Como se vê, o cancro do pulmão é líder da mortalidade. Mas pensam que há mais cancro do pulmão do que há cancro do cólon ou da próstata? Não! Muito pelo contrário. No entanto podemos fazer muito mais em termos de diagnóstico precoce e tratamento pelos outros dois do que por este. E infelizmente, 80% dos casos do cancro do pulmão deve-se àquilo que vocês sabem (tabaco). É por isso que vai haver uma lei extremamente rigorosa que proíba as pessoas de fumar nos cafés.

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Aula 8 – 15 de Novembro de 2006Tema: Neoplasia

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Se nós conseguíssemos eliminar o tabaco, 25 a 30% das mortes por cancro desapareciam. Por mês morre no mundo inteiro um tsunami de pessoas com cancro. Claro que essa luta no k diz respeito ao tabaco está a ser ganha nos Estados Unidos, está a ser ganha em Espanha, está a ser ganha na Irlanda e em Portugal vai começar também essa luta. Mas não na China.

Quando comparamos incidência com mortalidade, reparamos que o cancro do pulmão não é tão importante como o cancro da próstata como um problema de saúde pública, mas mata mais pessoas. Então o cancro que é mais difícil de diagnosticar precocemente é um cancro do ponto de vista biológico mais impossível. Nas mulheres, o cancro da mama é sem dúvida o mais frequente. No entanto, como as raparigas/mulheres começaram a fumar, a mortalidade do cancro do pulmão é maior que o cancro da mama.

(acetato 5/6)Eu não tenho pena de uma pessoa que aos 70 anos fuma. Tenho pena de uma

rapariga que aos 15 ou 16 anos começa a fumar, porque tenho mulheres com 30/40 anos de idade que não vão viver para ver os filhos crescer por causa do cancro do pulmão. As pessoas quando têm 15/16 anos não fazem ideia que quando tiverem 30/40 anos ainda vão ter muitos sonhos para a vida e que não vão poder concretizá-los devido a um hábito que adquiriram naquela idade. Mortalidade do cancro da mama também muito importante.

É importante que a nossa luta contra o cancro está a dar resultados. E não apenas por causa do tabaco. São outros factores. O cancro da mama é tão frequente que no mundo ocidental, uma em cada oito mulheres que viver até aos 80 anos tem, teve ou terá cancro da mama. De qualquer das formas, apesar do cancro da mama estar a aumentar de incidência, a mortalidade do cancro da mama está reduzir. E está a reduzir porque nós diagnosticamos mais cedo e tratamos melhor mais cedo. Estamos a ser mais eficazes no tratamento do cancro da mama. Grosso modo, houve uma redução nos últimos 10/15 anos de cerca de 30% da mortalidade do cancro da mama. Esta redução de mortalidade, 50% deve-se ao diagnóstico mais precoce, 50% deve-se a um tratamento melhor e mais precoce.

Isso é válido para vários países do mundo ocidental.

Depois de este pequeno approach epidemiológico, vamos aos conceitos mais teóricos, sobre como é que esta doença é, como é que surge, repercussões, etc.

Primeiro, vamos entender qual o significado dos termos que utilizamos no mundo científico.

(acetato 9)Neoplasia significa crescimento ou proliferação celular anormal. Mas atenção

que há outras situações em que há crescimento ou proliferação celular anormal sem que haja propriamente neoplasia.

Neoplasia também significa tumor. Mas às vezes também se usa a expressão tumor para uma tumefacção de origem inflamatória.

Quando usamos a palavra cancro significa neoplasia, mas uma neoplasia maligna, um tumor maligno. Há neoplasias benignas.

(acetato 10)

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Talvez a melhor definição de neoplasia seja esta, do Willis, de 1952: “Neoplasia é uma massa anormal de tecido, em que o crescimento das células excede aquilo que seria previsto e que não é coordenado e dentro do possível ordenado, e que persiste mesmo que o estímulo original que levou à origem desta massa não esteja presente.”

Isto parece complicado, mas a partir do momento que se conseguiu activar os genes que permitem a formação da neoplasia, já não é preciso continuar a fumar para que a neoplasia se desenvolva. É autónoma. Portanto, jogou-se à roleta russa e o tiro disparou. Então qual a diferença entre benigno e maligno?

Há algumas diferenças que nós diferimos a partir de observação clínica e há outras diferenças apenas possíveis de observar a partir de exames anatomo-patológico microscópico daquele tecido, daquela proliferação anormal de células. Então, as neoplasias benignas normalmente têm um crescimento lento e as malignas têm um crescimento rápido. É claro que há neoplasias benignas que degeneram de malignas. Às vezes a partir de uma neoplasia que tinha crescimento lento e que adquire crescimento rápido, nós dizemos que malignizou. As neoplasias benignas têm semelhanças com o tecido de origem.

(acetato 11)Por exemplo, uma neoplasia benigna da mama tem semelhança com o tecido

mamário normal. Uma neoplasia maligna tende a fugir do aspecto normal. E quando eu digo que tende, é porque há diferentes graus nesta dissemelhança. E esses graus são fundamentais até no prognóstico da doença. Quando nós utilizamos grau G1, G2 e G3, G1 quer dizer próximo do tecido de origem, G2 quer dizer que é medianamente diferenciado e G3 quer dizer que é altamente diferenciado, muito distante do tecido normal em que teve origem. Os limites são bem definidos nas neoplasias benignas e indefinidos nas neoplasias malignas. Nas neoplasias malignas há invasão (as células rompem os limites de onde cresceram e passam a invadir os tecidos vizinhos) e há metastização (uma neoplasia maligna é uma neoplasia que tem potencial de formar novos corpos tumorais num órgão à distância) e é por isso que o cancro mata.

O cancro tem uma semelhança espantosa com o desenvolvimento embrionário. Se nós formos olhar do ponto de vista técnico meramente biológico, parecendo de alguma forma simplista, vocês poderão concordar que todos nós viemos de uma só célula, que em poucos meses se formaram 3 quilos de células, mas essas células correspondem à perfeição humana, a um bebé que nasce. Mas em nove meses, a partir de uma célula multiplicaram-se milhões de células e as células migraram para fazer órgãos, diferenciaram-se para fazer diferentes órgãos. Agora, os genes que vocês têm numa célula do estômago são os mesmos genes da primeira célula. Muitos deles estão silenciados, mas os genes que permitiram à primeira célula migrar para constituir novos órgãos estão lá. Vão perceber que oncogenes são no fundo a activação destes genes que são fundamentais no processo embrionário de desenvolvimento e que depois na vida adulta só entram em actividade quando é preciso reparar tecidos.

(acetato 12/13/14)Aqui está um exemplo microscópico, a imagem de um carcinoma intraducto que

utiliza o termo carcinoma mas que de facto não é uma neoplasia maligna. Isto é uma lesão pré-maligna. É uma proliferação de células num ducto mamário mas reparem que os limites do ducto estão intactos. Não há nenhuma célula a ultrapassar os limites do

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ducto. Isto é uma neoplasia benigna. Claro que pode evoluir para uma neoplasia maligna.

(acetato 15)Características dos tumores malignos: têm um crescimento autónomo. A partir

do momento que adquiriu as mutações genéticas que lhe permitem se constituir como neoplasia, é autónomo. Ela própria adquire no futuro outras mutações que lhe permitem maior probabilidade de sobrevivência (por exemplo: resistência a tratamentos). Quando as neoplasias não são controladas, a sensação que o paciente tem é que está a conviver com alguma coisa alienígena, não controla.

É claro que sabemos que estas neoplasias dependem de factores de crescimento para evoluírem e para se manterem vivas. Portanto, têm crescimento autónomo, são indiferenciadas (apesar de haver diferentes graus), invadem os tecidos e metastizam.

O tumor maligno, se não for tratado, mata o hospedeiro. É uma doença de tudo ou nada. Ou eliminamos a população tumoral e salvamos o hospedeiro, ou não eliminamos a população tumoral e mais cedo ou mais tarde esta elimina o hospedeiro.

(acetato 16)Como é que o classificamos, que nomenclaturas utilizamos?Se a célula maligna é uma célula epitelial, se tem origem no epitélio, nós

designamos de carcinoma. Se o cancro tem origem numa célula do tecido conjuntivo, nós designamos de sarcoma. Se o tumor tem origem no tecido linfóide, nós designamos de linfoma. Se tem origem numa célula hematopoiática, nomeadamente numa célula progenitora dos leucócitos, é uma leucemia (aguda ou crónica). Em todos os casos estamos a falar numa neoplasia.

(acetato 17)São tudo designações para neoplasias que têm origens diferentes e tratamentos

diferentes, mas que são potencialmente fatais. Os carcinomas são as neoplasias mais frequentes e podem-se dividir pelo aspecto etológico em adenocarcinoma, carcinoma do epitélio de transição e carcinoma pavimento celular. Isso é um detalhe que suponho que não seja tão importante para vocês.

(acetato 18)Vamos agora abordar um bocadinho a oncogénese: como é que surge a célula

neoplásica. Em muitas das situações há uma evolução de alterações celulares não neoplásicas para um carcinoma evasivo através de diferentes estádios. Há por exemplo alterações de diferenciação celular que são reversíveis, que são obviamente causadas por agentes exógenos e que nós designamos por displasia. Uma pessoa que seja fumadora antes de ter cancro do pulmão ter displasia brônquica. Esta displasia por evoluir para um carcinoma in situ sem características de invasibilidade na microscopia. E depois o carcinoma in situ evolui para o carcinoma invasivo.

(acetato 19)Este switch entre o in situ e o invasivo é objecto de investigação intensa, há

dados que tentam explicar a diferença, nós conseguimos ter uma comparação interessante entre uma alteração e outra.

Os tumores têm origem monoclonal, numa célula.

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A maioria dos cancros, embora sejam doenças que requeiram alterações genéticas, são de causa exógena. Exigem a participação durante muito tempo de agentes cancerígenos, sejam eles químicos, físicos, virais.

Alguns carcinogéneos podem ser identificados a partir de estudos etiológicos. Por exemplo, cancro da mama: é mais frequente em mulheres que tenham uma menarca precoce (menarca – primeira menstruação) e menopausa tardia, o que quer dizer que as pessoas têm um maior tempo de exposição aos estrogénios. Há uma relação entre exposição a estrogénios endógenos ou exógenos e o risco do cancro da mama.

Muitos carcinogéneos dependem de co-factores, que pode ser o caso do tabaco e do álcool.

Existe um intervalo longo entre a exposição ao carcinogéneo e a detecção clínica do cancro. Desde que a pessoa começou a fumar aos 15 anos e até que aos 40 anos lhe apareça o cancro, são muitos anos. São muitos anos a induzir alterações.

Por exemplo o cancro da próstata (provavelmente devido aos androgéneos), é muito mais frequente a partir de uma certa idade, a terceira idade. Tem a ver com o tempo de exposição aos androgéneos.

(acetato 20)Os carcinogéneos podem ser detectados a partir de estudos epidemiológicos mas

também a partir de avaliação de risco ocupacional (um empregado num bar corre o risco de contrair cancro do pulmão devido à exposição ao fumo).

As pessoas com exposição acidental estão sujeitas a determinados tipos de cancros. Tenho uma senhora com cancro da mama controlado com hormono-terapia (…abreviando a história, porque ninguém quer saber da vida dela nem do marido que morreu de leucemia :p …) e que esteve na Rússia quando se deu o acidente de Chernobyl. O tempo que medeia entre a exposição a radiações ionizantes e o desenvolvimento de leucemia são +/- 15 anos. Portanto: exposição directa acidental.

Pode-se detectar carcinogéneos através do efeito transformador de culturas celulares, testes sobre o efeito mutagénico nas bactérias, efeitos carcinogénicos em animais, etc.

Um dos aspectos que se põe sempre como muito pertinente é: qual o papel da alimentação/nutrição no desenvolvimento do cancro. Para algumas neoplasias, como o cancro do cólon, há uma relação muito próxima entre o conteúdo em gordura da alimentação e cancro do cólon. Há uma relação muito próxima entre obesidade e cancro do cólon. E também há essa relação para o cancro da mama.

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Parte 2 – Bruna Mota

Agora, isto é difícil de obter a partir de estudos prospectivos controlados. Nós não conseguimos ter milhares e milhares de pessoas a comer só até ali e outros milhares e milhares de pessoas a comer só até ali, segui-las prospectivamente e depois comparar.

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E ter um factor que é controlado no meio de todos os outros factores: álcool, actividade física, background genético familiar…É muito difícil fazer do ponto de vista nutricional estudos prospectivos controlados em que nós para já conseguimos induzir nos grupos de estudo um determinado tipo de comportamento, que é observado estritamente neste sentido, e que aquele é o único factor que entra como variação entre os dois grupos e em tudo o resto são homogéneos e que, portanto, no fim permitiria dizer “é por isto que isto acontece”. O que nós temos é muitos estudos observacionais, olhar para trás...

(acetato 21) E nós podemos fazer isto para a população em geral, para populações em risco (como é que é para as pessoas que tem história familiar de cancro do cólon ou a quem já foram detectadas lesões pré-malignas, por exemplo pólipos no cólon ou que estão sujeitas a uma dieta tal…). Isto como prevenção primária ou podemos também abordar isto como prevenção secundária como no caso de um doente que já teve cancro do cólon e que passa a deter determinados tipos de hábitos de vida. Obviamente que nos preocupa o risco de ele voltar a contrair cancro do cólon mas para além disso ele tem o resto do cólon e pode desenvolver outra neoplasia no cólon e nós queremos tentar perceber numa pessoa que já foi doente, que está mais sensível, como é que a interferência dum determinado episódio de vida, como é que isso vai interferir no risco. Ou ainda como é que a dieta pode interferir na terapêutica. E há estudos sobre como é que a dieta pode interferir na qualidade de vida e no outcome de doentes por exemplo que tinham cancro do recto e que foram submetidos a radioterapia. Porque a radioterapia afecta também como efeito secundário a mucosa intestinal do intestino delgado.

(acetato 22) Para vocês verem que há diferentes âmbitos de intervenção nós queremos olhar por exemplo para a nutrição como um factor etiológico e obviamente de prevenção de cancro. Dou-vos aqui só um exemplo de um tratado de oncologia em que vocês vêm que se nós compararmos o risco de cancro colo-rectal em emigrantes chineses, portanto, foram para os Estados Unidos… na China há muito menos cancro do cólon, havia porque agora há MacDonald’s e essas coisas…portanto, quando os chineses migravam para os EU verificava-se à 2ª ou 3ª geração que a incidência de cancro do cólon começa a aumentar e a ser semelhante à dos caucasianos residentes nos EU. E há uma relação entre duas coisas que é o conteúdo de gordura na dieta e o sedentarismo ou actividade física. Como é que o sedentarismo ou a actividade física pode diminuir a actividade do cancro? Podemos tentar entrar em explicações interessantes do ponto de vista metabólico, nomeadamente de situações que levam ao aumento do IGF-1 que é um factor de crescimento para diferentes tecidos e também para as neoplasias e que está a aumentar nos casos de insulino-deficiência e nas pessoas que são obesas…Há investigação nesse sentido. Só para vocês perceberem que nós podemos depois tentar descer ao nível bioquímico e molecular para tentar explicar como é que certos dados numa observação epidemiológica podem ser justificados. Mas por exemplo neste mesmo estudo, para vocês verem como não é fácil controlar os diferentes factores, nós podemos saber que o álcool aumenta per si o risco de cancro do cólon e do recto. E se nós usarmos suplemento de folatos e metionina, isso mitiga o efeito do álcool no aumento da existência de cancro do cólon e do recto, o que leva a pensar que se calhar o álcool provoca modificação dos grupos metil do DNA e que essas modificações são prevenidas pela adição de folatos e metionina.

Só para vos dar um exemplo de como é que nós podemos, a partir de uma investigação epidemiológica pura e dura, avançar em termos de investigação, criando

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depois modelos laboratoriais para tentar perceber como é que determinados factores podem ser agentes cancerígenos ou carcinogeneos.

(acetato 23) Aquilo que hoje em dia é aceite como mensagens universais verdadeiras é que é importante que as pessoas comam fruta e vegetais todos os dias; que tenham um consumo controlado de gorduras; que controlem o seu peso; que façam actividade física; álcool, se beberem, de uma forma limitada (pois também tem benefícios cardio-vasculares) …Não há duvida que uma pessoa que seja fumadora e bebedora tem alto risco para um carcinoma da laringe. Provavelmente não é necessário fazer suplementos dietéticos. Por exemplo a vitamina C que obtêm na fruta é suficiente para obter uma porção anti-oxidante, se quiserem porque é provável que alguns dos agentes carcinogeneos tenham, dentro dos seus mecanismos de lesão, o desenvolvimento de espécies reactivas de oxigénio que se pensa que sejam geno-tóxicas. Os próprios catecol-estrogénios da metabolização errónea de estrogenios têm uma forma que leva à lipoperoxidação.

(acetato 24) Ok, têm aqui uma lista, grupos de agentes carcinogénicos: Químicos…As anilinas por exemplo que estão nas tintas e que são

absorvidas, ficando em circulação e que causam cancro da bexiga. Hoje em dia já não há tantas anilinas nos corantes.

Virais: vírus da hepatite B e C para o cancro hepatocelular (???), papiloma vírus humano (HPV) para o cancro do colo do útero

Radiações ionizantes, demos o exemplo das radiações UV para os melanomas

Hormonas: estrogenios Fungos das aflatoxinas para o cancro…isto sobretudo em África para

pessoas que ingerem mais facilmente a aflatoxina. Mas as aflatoxinas são carcinogénicas porque também levam a modificações no gene oncosupressor TP53

A H.Pylori para o cancro do estômago, alguns genótipos A Shistosomíase para o cancro da bexiga, é um parasita. Por exemplo,

quando a gente diz que os asbestos para o cancro do pulmão e para o cancro da pleura, para o mesmo carcinoma.

(acetato 25) Frequentemente a acção dos agentes carcinogeneos é multifactorial. Por exemplo, tabaco e álcool para o carcinoma da laringe ou do esófago. O tabaco contém vários compostos carcinogeneos. Têm aqui uma lista enorme. Alguns deles são substâncias radioactivas (polónio 210). E o álcool pode aumentar o efeito carcinogéneo deste composto e leva à formação de acetaldeído. Por exemplo, uma das formas pelas quais o álcool aumenta a acção carcinogénica de certos compostos é porque faz induções qq coisa ??? no citocromo TP53. Quer dizer, há certos compostos que não são tão carcinogéneos até que sejam metabolizados no nosso fígado em compostos mais carcinogeneos. E perante induções qq coisa ?? o álcool…as pessoas terão em maior concentração na circulação os compostos carcinogeneos.

(acetato 26) Estes processos são processos complicados, morosos, envolvem várias etapas desde a iniciação que é quando se começa a fazer a mutação genética até que haja a propagação, a expansão clonal. Se vocês quiserem, há uma célula que sofre um número de mutações suficientes para se constituir como célula neoplásica mas tem de ser capaz de transmitir isso às células filhas. Isto até que haja o fenómeno da progressão, ou sejam aquela célula adquiriu a capacidade invasiva, já não é um

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carcinoma intraducto, é um carcinoma invasivo. Mas, até que de carcinoma invasivo passe a ser carcinoma metastático tem de adquirir outras particularidades genéticas. Isto é o fenómeno de progressão.

(acetato 27) A célula tumoral resulta de modificações genéticas. Aliás, o professor Afonso Fernandes costuma dar uma definição que eu acho muito interessante que é “o cancro é uma doença genética adquirida”. O que não quer dizer que não possa haver predisposição genética para estas alterações. Mas o cancro é uma doença genética adquirida porque leva à activação de oncogenes e à perda de função de genes oncosupressores.

(acetato 28) Então voltamos à tal história de desenvolvimento embrionário. Aqueles genes que permitem, a partir de uma célula, formar tecidos espantosos em diferentes orgãos, em diferentes locais, são genes que quando têm de ser silenciados são controlados por genes que são supressores. Esses genes nós chamamos hoje em dia “proto-oncogenes”, os genes normais que controlam a diferencianção celular. E estes, quando são sujeitos à acção de agentes químicos, virais (aquela lista que vimos) é que se transformam em oncogenes. Se quiserem, os oncogenes são proto-oncogenes com mutações que estão sempre ON. E aqueles agentes químicos, físicos e virais, fazem não só a activação de proto-oncogenes em oncogenes como também fazem a perda de função dos genes oncosupressores. Porque é que chamamos proto-oncogenes a genes normais? Porque foram descobertos assim, porque alguém impôs uma pergunta tão simples como esta “como é que uma célula neoplásica transmite às células filhas que se hão de comportar como neoplásicas?”. Tem de haver um conjunto de genes que expliquem isto. E quando foram à procura destes genes classificaram como oncogenes e depois foram ver que haviam parentes normais nos tecidos normais. Então chamaram-lhes proto-oncogenes.

Em resposta a uma pergunta que não se percebe: 5 a 10% dos cancros ocorrem em pessoas herdeiras de genes oncosupressores mutados, têm maus vigilantes e então têm grande susceptibilidade para desenvolvimento de cancro. Portanto, o factor hereditário não tem tanto a ver com a activação da oncogénese mas com a perda de genes oncosupressores.

Em resposta a uma outra pergunta que também não se percebe: Sim, agentes electrofílicos por exemplo levam à lesão do DNA.

Agora vocês percebem que na oncogénese há proto-oncogenes que são genes que regulam o crescimento e diferenciação celular e há genes oncosupressores. Os carcinogéneos activam os proto-oncogenes em oncogenes e inactivam genes oncosupressores.

(acetato 29) A célula que é exposta a determinados agentes… Por exemplo, uma pessoa que esteja infectada pelo vírus da hepatite B e que coma muitas aflatoxinas (amendoins que come lá em África) tem maior risco de um cancro hepatocelular, logo dois. E depois na célula neoplásica temos um crescimento não controlado, por aí fora. É autónoma.

(acetato 30) Então o que é isto de oncogenes? Ok, nós temos aqui alguma coisa específica do cancro. Porque é que não aproveitamos isso para tratar o cancro? Nós sabemos que estes oncogenes codificam oncoproteínas que podem ter várias funções: factor de transcrição; activadores de tirosinacinase – enzima importantíssima para o crescimento celular; constituir factor de crescimento por exemplo Platelet-derived

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growth factor (PDGF); receptor à superfície da célula para os factores de crescimento; ou pode activar a GTPase, como o oncogene ras que é muito importante no cancro do pâncreas. E isso que nós sabemos da oncogenese para ai há 30 anos, só nos últimos 5 anos é que nós estamos a conseguir ter terapêuticas que são target para estes oncogenes.

(acetato 31) O grupo, por exemplo, das localizações de produtos de alguns oncogenes. Vamos por o caso do ras-oncogene aqui, mesmo por baixo da membrana celular que depois leva à condução da via CerbB e mas quinase (???). Por exemplo o CerbB para o qual não conhecemos o ligando que é uma proteína transmembranar mas também podemos ver por exemplo o C-kit, que é uma proteína transmembranar e que é activada por diferentes factores de crescimento mas que, quando sofre uma mutação, não precisa de factores de crescimento para ser activada, está consecutivamente activa.

(acetato 32) Agora passando a um caso concreto. Uma mulher com cancro da mama cujo tumor na membrana celular exprime esta coloração castanha que tem a ver com anticorpos dirigidos ao CerbB. Portanto, o anatomopatologista, quando vê isto diz “este cancro da mama é fortemente positivo para a oncoproteína CerbB”. E isto para nós tem vários significados: o tumor é mais sensível a uns agentes de quimioterapia do que a outros e pode ser tratado com um anticorpo monoclonal dirigido a esta proteína. E nós sabemos isso desde 1995.

(acetato 33) E desses oncogenes, exemplos de tumores em que estão activados e alguns destes oncogenes são targets de terapêuticas actuais. Ora bem, o CerbB-2 que acabei de falar ou por exemplo estes dois: BCR-ABL e C-kit.

(acetato 34) Exemplos de genes oncosupressores: o principal é o TP 53, muito importante em todas as células. Uma pessoa que seja portadora de uma mutação do TP 53 grave, chama-se a isto o sindroma de Li-Fraumeni, muito raro. Mas há genes oncosupressores que são predominantes para certos órgãos. Uma pessoa que tenha uma mutação no BRCA 1 e/ou BRCA 2 têm uma predisposição muito forte para cancros da mama e dos ovários. O teste genético que permite dizer se a pessoa tem risco para cancro da mama é isto. Claro que isto é uma falácia porque isto só corresponde a 5 a 10% dos cancros da mama. Além de que isto não se faz por solicitação inconsequente, ou seja, nós quando pedimos uma análise genética a uma doente…Vamos supor que eu tenho uma mulher com 30 anos, com cancro na mama, que a mãe tinha cancro na mama e que tem uma irmã com cancro da mama. É muito provável que ela tenha uma mutação num desses genes. Eu oriento-a a uma consulta de genética clínica onde é observada por uma geneticista clínica, onde há uma psicóloga, onde se decide se ela quer ou não quer fazer pesquisa mutacional e, se ela for positiva, se foi operada a uma mama com cancro na mama, nós sabemos que tem a outra mama com 70% de risco de desenvolver outro cancro. Então podemos propô-la para uma mastectomia profilática. E quando se põe a questão: ela tem uma filha de 3 anos, como é que vai ser quando a filha tiver 20 anos? Ok? Estas coisas não se fazem de ânimo leve.

(acetato 35) Factores de crescimento que são importantíssimos para as células neoplásicas, alguns deles são resultantes da oncogenese mas há outros que não: os estrogénios para o cancro da mama, os androgénios para o cancro da prostata.

(acetato 36 e 37) Para todos os cancros da mama se faz obrigatoriamente a pesquisa de receptores de estrogénios.

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(acetato 38) Agora avançando um pouco mais sobre a biologia tumoral. Uma vez transformada a primeira célula, esta gera as células-filhas que herdam as alterações genéticas da mãe.

(acetato 39) Já vos expliquei que esta população é autónoma. Anaplásica quer dizer que não é diferenciada (em comparação com os tecidos normais mas é muito diferenciada para si própria, cada vez mais adquirem a capacidade de se alojar em órgãos – é um bocado estranho tentar perceber como é que uma célula que nasce na mama consegue crescer no osso).

(acetato 40) Nós sabemos que há alterações metabólicas, bioquímicas e biológicas da célula que são determinantes na transformação das células neoplásicas. Por exemplo, as células têm um aumento da actividade glicolítica, aumenta o consumo da glicose…e nós podemos utilizar isto para descobrir novos exames complementares. Por exemplo, o PET scan é baseado nisto, no facto da célula ter uma actividade glicolítica aumentada. O que nós damos é um substrato análogo à glicose e o que nós vemos é um aumento de captação, o que corresponde em princípio a uma neoplasia. Perda da inibição por contacto – enquanto que há uma proliferação dum tecido para reparar uma ferida, a partir do momento em que as células se encontram lado a lado pára de crescer, aqui continua. Estimulação autócrina do crescimento, quer dizer as células são capazes de produzir factores de crescimento para si próprias. Por exemplo, os cancros da mama produzem os seus próprios estrogénios. E as células tumorais produzem também muitas vezes substâncias que andam em circulação e que nós utilizamos como marcadores tumorais – o PSA, por exemplo, da próstata -, substâncias produzidas pelos tecidos em pequena quantidade mas que quando se trata de um tecido neoplasico essa produção é aumentada.

(acetato 41) Aqui um exemplo de um PET scan com hipercaptação. Focos no fígado, metástases peritoneais. No caso dum tumor giste (???), dum sarcoma giste que é um tumor que tem origem nas células pacemaker do intestino e que é muito sensível às terapêuticas de inibição da terasinacinase associada ao C-kit.

(acetato 42) Vou passar isto um pouco à frente mas não posso deixar de vos falar de duas coisas importantes. Primeiro, os cancros têm, todos eles, alterações do TP 53. E agora vocês dizem “ok mas o TP 53 foi importante para a formação do tumor”. Não só. O TP 53 uma das funções que tem é programar as células para a apoptose. Portanto, se o TP 53 está mutado, quando eu faço quimioterapia que causa lesões celulares, eu tenho mais dificuldade em programar a apoptose. Também tem um significado na versão terapêutica. E é por isso que nós pensamos que os cancros do testículo, mesmo que mestatizados são altamente curáveis com quimioterapia. Tem uma grande sensibilidade à quimioterapia, não tem mutações no TP 53. Os cancros têm telómeros enormes. Tem uma estimulação mitogénica própria, dependem menos de factores de crescimento…ou melhor, os mesmos factores de crescimento que têm determinado efeito numa célula normal, têm esse efeito amplificado numa célula neoplásica porque eles têm detectores à superfície que amplificam o sinal. Têm a capacidade de produção dos seus próprios vasos. Portanto, uma célula tumoral quando se está a reproduzir precisa de formar novos vasos. (acetato 43) A partir de um certo diâmetro ou de um certo tamanho (2mm3), um tumor tem de começar a formar novos vasos – angiogénese. (acetato 44 e 45) Fazem-no através da produção de factores, por exemplo o VEGF e outros que actuam em

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diferentes sectores, em células endoteliais do próprio tumor e levam à proliferação de novos vasos. E às vezes até conseguem recrutar células endoteliais progenitoras que andam em circulação. E uma das terapêuticas que nós hoje em dia temos é utilizar por exemplo anticorpos que impedem a formação de novos vasos.

Em resposta a uma pergunta: A anóxia leva à formação de metabolitos que estimulam a angiogénese.

(acetato 46) Exemplo de neoplasias nas quais está demonstrado que estes factores da angiogenese são importantes, do ponto de vista prognostico – mama, colo-rectal, pulmonar. A questão da metastização do ponto de vista biológico é um enigma completo. Para dar o exemplo da mama: tem de sair da mama, tem de entrar em circulação, tem de sobreviver à vigilância imunológica, ao stress mecânico. Os tumores da mama quando metastizam, 70% metastizam no osso, portanto, seleccionam o órgão que vai metastizar. Tem alguma forma de reconhecer o endotélio…É capaz de falar com as células do osso para criar o seu ambiente próprio para crescer. (acetato 47) O fenómeno da metastização não é um fenómeno embolígeno. Quer dizer saiu daqui, vai por ali, como o sangue vai neste sentido, pára ali e cresce acolá – não.

(acetato 48) Algumas das coisas que nós pensamos ser importantes para o processo de metastização estão aqui: angiogénese, perda de moléculas de aderência (caderinas) – uma célula, quando está a crescer na mama e que depois é capaz de entrar em circulação para invadir, tem de perder a adesividade entre elas, as caderinas. E ao ver num ratinho, quando elas voltam a formar um clone no osso ou num pulmão voltam a re-expressar caderinas para se juntarem. E, por exemplo, reconhecem moléculas de adesão em certos órgãos. Sabe-se que as células da mama e da próstata, que têm uma grande predilecção para o osso, se nós lhes pusermos as células da medula óssea aderem, se lhes pusermos as células endoteliais do cordão umbilical não aderem.

(acetato 49) E depois têm uma capacidade de degradar a matriz daquele órgão. Portanto, não só conseguem ter cross-talk com as células do órgão-alvo. Por exemplo, no caso da metástase óssea, nós temos um modelo construído a partir de investigação animal e já bastante solicitada no processo clínico em que sabemos que a célula tumoral no osso, para degradar o osso, utiliza os osteoclastos (células normais do osso que reabsorvem osso). Então produzem uma hormona semelhante à PTA que é a PTA qq coisa que estimula os osteoclastos, os osteoclastos cavitam o osso, a degradação da matriz liberta factores de crescimento entre os quais o TGF-β, o TGF-β que no tecido normal é indutor da apoptose porque nas células tumorais faz o contrário, estimula o crescimento. E então isto parece um ciclo vicioso. Degrada o osso, o osso ao ser degradado liberta factores de crescimento para a célula. E o que sugerem é que fazer o mesmo também pela simulação dos osteoblastos.

(acetato 50) E portanto vão dizer assim “ok, mas isso é modelo nos animais mas nós temos alguma evidência clínica que isso é verdade?”. Há. Vocês têm aqui uma cintigrafia óssea que eu vou passar à frente.

(acetato 51 e 52) Vocês aqui vêem buraquinhos escuros que são metástases ósseas osteolíticas. Isto são metástases ósseas num cancro da próstata num homem que era escultor nas caldas da rainha. Em ambos os casos é cancro, em ambos os casos está no osso, em ambos os casos degradou o osso, em ambos os casos o tumor está a crescer. Mas é uma doença de tecido, já não é simplesmente uma doença de crescimento celular descontrolado. Portanto não só vamos conseguir actuar de uma forma eficaz na

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metastização quando conseguirmos entender toda a linguagem que a célula tumoral consegue estabelecer com o órgão-alvo e fazemos terapêuticas que não são só dirigidas a oncoprotéinas, não só são dirigidas ao crescimento celular, a factores de crescimento mas também terão de ser dirigidas à capacidade que a célula tem de falar com as células do órgão-alvo. Bom, eu não estou a imaginar porque nós neste momento temos ensaios clínicos com produtos que aquilo que fazem é inibir os osteoclastos para impedir o crescimento das metástases ósseas. Desde que tudo começou há 20 anos atrás, seja um vírus, seja o tabaco, até que a pessoa entra aqui na urgência com convulsões cerebrais e a sua primeira manifestação dum cancro do pulmão…A partir do momento que a pessoa entra neste estadio é uma história de vida curta. Para ganhar esta luta temos de saber antecipar – sempre que for possível detectar quais são os carcinogéneos, evitar que as pessoas se exponham a elas. Se tiver genotipos de risco, vacinação. Controlo do peso, fazer exercício físico. Evitar o tabaco. Não é possível fazer tudo em todas as circunstâncias, é possível diagnosticar precocemente.

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Parte 3 – Nuno Santos

Nota: queria só referir que esta desgravação tem partes de completa transcrição do que foi dito pelo professor, assim como partes de rearranjos e resumos para não enfatizar o texto. A itálico estão as palavras ou expressões de difícil compreensão, mas que eu tentei decifrar, quer por inúmeros rewinds quer por consulta dos acetatos, ou até mesmo por investigação na internet, ou ainda por fazer ou não mais sentido a frase. Os (?!) representam passagem do discurso no qual se referiam locais específicos dos acetatos. Já agora, os acetatos visualizados são os seguintes (apesar de aparecerem na altura devida ao longo do texto): 54 a 84, 86 a 90, 92.

Então nós, como vocês começam a perceber se queremos ter hipótese de ganhar esta luta temos de saber antecipar, e antecipar é sempre que seja possível detectar quais os carcinógenos e evitar que as pessoas se exponham a elas (Ex.: vacinação contra a hepatite B, controlo do peso, fazer exercício físico...). Por vezes não é possível fazer isto tudo mas talvez seja possível detectar precocemente. Muitas destas doenças metastisam precocemente, isto é, se nós queremos curar temos de actuar por via sistémica precocemente para evitar que as células cresçam nos órgãos alvo: e a isto chamamos terapêutica adjuvante. Muitas mulheres que fazem quimioterapia após uma cirurgia de um cancro da mama, não o fazem porque estão destinadas a morrer, mas fazem-no para se curar, com o objectivo de eliminar potenciais micrometastases que estejam noutro órgão qualquer.

(Acetato 54) Biologia da célula tumoral / crescimento das neoplasias: A cinética da população neoplásica: é muito importante; Tempo de duplicação; Fracção que está em proliferação; Balanço multiplicação / morte celular.

(acetato 55) Vou-vos dar um exemplo que foi inferido a partir do estudo de células leucémicas. Por exemplo: um tumor com 1 cm, como já se viu tem 109 células

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tumorais (mil milhões). Um dos erros que nós cometemos do ponto de vista histórico foi pensar que, uma mulher que é operada a um tumor com 1 cm, como é pequeno não lhe acontecia nada. Na verdade, pode haver uma célula que tenha escapado e que tenha metastisado. Estas células são impossíveis de ver... o máximo que se consegue detectar são tumores com pouco menos de 1 cm, uma vez que não métodos de imagem que o permitam. Portanto é necessário antecipar cada “jogada”. É importante compreender que um cancro com 1 cm não é o mesmo que um com 1012 células, pois este é incompatível com a vida, não do ponto de vista físico mas sim do ponto de vista biológico.

(acetato 56) Nós sabemos que a curva do crescimento dos tumores não é igual para todos os tumores, mas em geral podemos assumir isto (suponho, o gráfico) como um protótipo. Quando os tumores são pequenos a sua multiplicação é muito elevada ao contrário dos tumores grandes, em que grande parte do tumor não está em multiplicação. Esta é uma das razões pela qual é difícil tratar tumores muito grandes, uma vez que em quimioterapia só se matam as células que estão em multiplicação. Como esta terapia não pode ser feita todos os dias, com risco de morte do doente, tem de haver um intervalo. Neste intervalo o resto das células tumorais entram em proliferação, fazendo o repovoamento.

(acetato 57)(acetato 58) Houve 3 senhores que tentaram desenvolver leis que são

importantes para entender a cinética da população tumoral. (acetato 59) Skipper disse que a sobrevida do doente está em função do volume tumoral (fácil de compreender!!!) e disse que um citostático administrado na mesma dose e com a mesma regularidade leva à morte de uma fracção constante da população tumoral, isto é os citostatos matam segundo uma escala logarítmica, se tiver 109 passa a 108. Ter uma fracção constante da população tumoral significa matar a população que é sensível e que estava em ciclo naquele momento.

(acetato 60) O nosso objectivo é ir diminuindo o número de células tumorais até à sua eliminação, senão pode acontecer o caso de se ficar com apenas mil células e os exames mostrarem tudo bem, mas passados alguns meses o tumor volta a ficar repovoado. Isto aconteceu porque as células que restaram eram resistentes.

Se estamos numa estratégia adjuvante isto é se houve uma doente que foi operada ao cancro da mama e achamos que é de risco para estar aqui (?!) e queremos começar a tratá-la hipoteticamente aqui (?!), não vemos o tumor mas assumimos que ele está aqui (?!). Não se pode atrasar o ciclo de quimioterapia. Os exercícios de quimioterapia têm de ser feitos no tempo mais curto possível, que é a hipótese que se tem de curar o doente. No caso de se estar a tratar uma doente que não se pode curar, diz-se avaliar (paliar).

(acetato 61) Biologia da célula tumoral / crescimento das neoplasias:Hipótese de Norton e Simon:

Os tumores pequenos têm a maior fracção de células em crescimento. Nos tumores muito volumosos a fracção em replicação é menor. No meio da curva (Gompertziana) o crescimento é mais acelerado, por isso, nesta fase testa-se melhor os efeitos dos citostáticos.

Relembrando, os tumores quando são pequenos crescem mais depressa. (acetato 60, suponho) Se há um tumor aqui (?!) que foi excisado (excerado ?!) e há risco de o doente ter micrometastases, portanto ele pode estar aqui (?!) e eu tenho um intervalo de tempo limitado para começar a quimioterapia. Porque senão arriscam-se a que haja uma maior população tumoral e quanto maior for a população tumoral maior será a probabilidade de que já não possam dar assistência no hospital. (acetato 61) Logo como

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foi dito: a redução, inicial, da população tumoral por cirurgia, radioterapia ou fármacos não específicos de ciclo, levam a que as células residuais entrem em ciclo, em multiplicação.

Goldie, Coldman e Schimke: Os tumores são heterogéneos também no que respeita às características bioquímicas isto é ocorrem mutações espontâneas, ou se quiserem 1 em cada 100 milhões de células. Portanto é necessário reduzir a população tumoral, o mais eficaz e rapidamente possível. Se a deixarmos em convívio com um hospedeiro ela pode adquirir resistência aos nossos tratamentos e pretende-se exactamente o contrário.

Se se faz uma quimioterapia adjuvante em que se trata um doente sem cirurgia que está potencialmente curado, mas em que há riscos de haver micrometastases, a duração da quimioterapia tem a ver com os estudos feitos. (acetato 63) Portanto sabe-se que se forem feitos 6 meses de quimioterapia a um cancro da mama isto pode ser suficiente, como naquele esquema. Mas por exemplo, noutros casos de cancro da mama em que se tenha Fe3+, sabe-se que temos de juntar o tratamento com anticorpos (monoclaustros) durante 1 ano, pois é assim que é eficaz. Depende do que os estudos clínicos demonstraram para cada caso.

É também importante saber o estado clínico de um doente. Se dois cancros, ambos com 1 cm, mas em que um tenha metastases ganglionares e outro não diferem muito um do outro. O primeiro é um tumor com um mau comportamento. (acetato 64 e 65) Como é o caso desta mamografia (65), detectada uma lesão do cancro da mama.

(acetato 67) Existem três grupos de efeitos clínicos provocados pelo cancro num hospedeiro, são eles: o efeito de um tumor primário (primário no sentido de onde ele cresceu, ex.: cancro da mama direita), o efeito dos secundários – metastases (ex.: metastase óssea) e os efeitos paraneoplásicos, isto é, o tumor leva o hospedeiro a produzir substâncias que causam sintomas clínicos (ex.: os doentes com um cancro em estado muito avançado perdem o apetite, ficam magros, podem ganhar aversão à carne, não lhes apetece sair de casa...). O TNF, formado no pâncreas (tumor necrosis factor) ao actuar nas membranas celulares de todo o corpo actuam no ácido araquidónico, que leva à formação de vários metabolitos, dos quais os PG’s (prostaglandinas – PGE2, PGD2, PGF2, PGI2), etc., que fazem a sinalização para os proteossomas das fibras musculares (redução das massas musculares) e a amplificação total de sintomas (do lumatório do RMKD). O que acontece por exemplo, é o cancro induzir num doente sintomas de gripe (mas sem febre) durante meses. Isto acontece por causa do cancro, este leva o hospedeiro a produzir isso, chama-se a isto competição biológica. No caso de um cancro do cólon com hemorragia, o tumor cresce mais do que os vasos que consegue produzir, causando colisão e sangra.

(acetato 69) O Cancro em estádio avançado manifesta-se sobretudo pelas localizações metastáticas (o local para onde vão), por exemplo sabe-se que os ossos são o local preferido das metastases do cancro da mama e da próstata, mas também de muitos outros cancros, o fígado é o local predilecto das metastases do cancro do cólon (acetato 70). Existem mulheres que durante, por exemplo 16 anos têm metastases em circulação, e não se sabe bem porque, mas essas metastases só se manifestam nos ossos, a que se chama propismo, não sendo capazes de aderirem a outros órgãos (acetato 71). (acetato 72) As metastases cerebrais podem dar convulsões, dores de cabeça (uma vez que a cabeça é inextensível). (acetato 73) Como podem ver nesta imagem, esta metastase, apesar de pequena causa um grande edema à volta. No osso, as metastases podem causar dor, fractura patológica, compressão medular e hipercalcemia (mobilização em massa de cálcio para o sangue). (acetato 74) No caso desta metastase na corpo vertebral, é possível visualizar uma lesão, suponho que seja a mancha mais

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escura em baixo), apesar de a de cima ser mais perigosa uma vez que destrói o pedículo e invade o canal medular, podendo causar compressão medular e a pessoa fica paraplégica. (76) No pulmão / pleura pode causar falta de ar (dispneia), tosse e hemoptise (sangramento nos brônquios), (77) como neste caso em que se vê uma infiltração pulmonar e pleural, (78) um derrame pleura no TAC, (79) o caso de um TAC de metastases hepáticas (vista transversal).

(80) Manifestações sistémicas do cancro: anemia, emagrecimento, anorexia, adinamia (falta de força), febre, imunodepressão, hipercalcemia e alteração do nosso estado clínico. (81) As armas terapêuticas que estão disponíveis são: cirurgia, radioterapia, quimioterapia, hormonoterapia e “targeted therapy” (com oncoproteínas). A cirurgia e a radioterapia são muito importantes mas são locoregionais, actuam onde é feita. Já a quimioterapia e a hormonoterapia actuam em locais menos específicos.

(82) Existem intuitos curativos isto é, há doenças em que é possível curar e outras em que não, podendo no entanto conseguir-se controlar a doença durante muito tempo. (83) Chamamos a isto intuito paliativo. Existem formas de controlar o cancro, mas apenas temporariamente. Isto só é possível até o cancro ganhar resistência, e aí já não se pode fazer nada.

(84) A cirurgia é muito importante, não só porque remove o tumor primário mas também informa locoregionalmente o que deve ser feito. Por exemplo, quando as mulheres removem o tumor da mama ficam também com uma cicatriz por baixo da axila que significa que foram também retirados os gânglios locoregionais. Assim é possível concluir se os gânglios foram invadidos ou não. A informação disponível é importante.

(86) A radioterapia pode ser feita também para completar (adjuvante) ou permitir (neoadjuvante) a cirurgia, ou pode ser paliativa. (87) Ex.: no caso de se ter uma metastase cerebral a quimioterapia não pode ser feita, porque as radiações não ultrapassam a massa encefálica. Nesse sentido usa-se a radioterapia como método paliativo. (88) A radioterapia actua directamente causando lesões no DNA (chamados single-strand break e double-strand break). Actua muitas das vezes de forma prolongada porque faz a ionização da água presente no meio, levando à libertação contínua de radicais livres de oxigénio. (89) Esta é uma área de investigação importantíssima uma vez que é possível determinar as curvas de sensibilidade do tumor e do tecido normal. Sabe-se que por exemplo que para aumentar uma dose se ganha pouca (acção) anti-tumoral para muita toxicidade. Isto é importante no medida em que se deve saber quais as doses limite que se pode dar aos órgãos, porque cada órgão tem o seu grau de sensibilidade à radioterapia. (90) É possível hoje em dia concentrar a radiação a determinados níveis de modo a proteger órgãos sãos.

(92) Muitas vezes associam-se os citostáticos aos fármacos para aumentar o espectro de actividade, porque há citostáticos que actuam em fase S, G1. Mas é necessário ter um cuidado: os citostáticos não são específicos do cancro, matam células normais em divisão. Não se pode juntar citostáticos que tenham toxicidade cumulativa. Ex.: se se tiver dois citostáticos que baixam muito o número de plaquetas do doente, coloca-se este em risco de hemorragia.

(95) Tumores que podem ter indicação para Quimioterapia adjuvante: cancro da mama, cancro do colo-rectal, cancro ovário, sarcomas (ossos), etc. (alista está a aumentar, o que é um bom sinal).

(96) A decisão de fazer ou não a quimioterapia adjuvante depende da forma como o cirurgião operou e como são os gânglios regionais. É necessário haver uma multidisciplinearidade.

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(97) Há tumores em estado avançado que podem ser curados com quimioterapia, ou seja, mesmo que os tumores tenham sido metastisados, no entanto estes são altamente quimiosensíveis (apesar de serem raros estes casos). (98) Como já foi referido existem, no entanto outros tumores que não se conseguem curar, mas que podem ser controlados prolongando a vida do doente (ex.: cancro do cólon com metastases hepáticas e pulmonares, cancro da mama com metastases ósseas e hepáticas). Este tempo de prolongamento da vida depende se o tumor é susceptível de ter sido actuado do ponto de vista terapêutico, com várias armas ou não. Se for só com citostáticos é complicado. Mas por exemplo, no caso do cancro da mama, se este depende de estrogénios para crescer, então este é também um método de retraí-lo.

(99) A hormonoterapia é importantíssima no tratamento do cancro da mama, da próstata e do endométrio (este último menos frequente). (100) Para tratamento do cancro da mama são necessários estrogénios e na pré-menopausa à que contar com os ovários (muitas vezes essas mulheres são castradas, não cirúrgica, mas quimicamente). O processo é o seguinte: é injectado subcutâneamente para ser levado ao hipótalamo para bloquear a produção de LH/RH e FSH/LH e os ovários deixam de funcionar.

(101) Os Modificadores de resposta biológica ou targeted therapy (terapia alvo) é uma terapêutica molecular muito importante. (102) Ex.: GIST (gastroinstestinal stromal tumor) – é um sarcoma que (pensa-se) tem origem nas células pace-maker do intestino (células Cajal). Para tratar este tumor usa-se um fármaco: imatinib. Este impede que a tripsinacinase leve à fosforilação do substracto e portanto impede a função que o produto desse substrato teria nesse tumor e que é uma função vital (para essa mutação). Este fármaco resulta, porque essas células são dependentes dessa enzima para sobreviver. (104) Aqui têm uma grande captação (PET scan) que ao fim de 4 semanas desapareceu. Este é outro conceito a reter, avaliar o tumor pela sua função bioquímica. (105)

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Engenharia Biomédica – 3º ano, 1º semestreMecanismos Gerais da Doença (2006/2007)

Professores José Barbas e Afonso Fernandes

Aula desgravada por Ana Carapeto e Ricardo Aires

1ª Parte - Ana Carapeto

Falência dos principais sistemas IInsuficiência hepática. (Prof. José Barbas)

Vou-vos falar sobre fisiopatologia hepática. O que vos interessa é saber como é

que o fígado funciona, onde é que pode estar alterado esse funcionamento e as

consequências dessa alteração de funcionamento.

Interessa perceberem primeiro a substituição por um fígado biológico, se calhar

não é preciso saberem nada disso em especial a não ser em particular saber fazer cultura

de células, mas há por exemplo fígados artificiais, tal e qual como há máquinas de rins

artificiais, há fígados artificiais em que todos esses mecanismos alterados são

cuidadosamente compensados. Um fígado mecânico digamos assim, como uma

máquina de hemodiálise, portanto há todas essas tecnologias e é preciso que cada um de

vocês saiba como é que um fígado funciona e quando tem falência o que é que falha.

Devem lembrar-se como é que o fígado está estruturado macroscopicamente e

microscopicamente. O fígado tem algumas características. É um órgão grande, é um dos

maiores órgãos do organismo. Por outro lado, é um órgão que tem a peculiaridade de

receber não só sangue arterial (a todos os órgãos tirando o fígado chega sangue arterial e

sai sangue venoso), mas também sangue venoso.

(slide 1) Ao fígado chega sangue arterial (sangue nutritivo para o fígado) e chega

sangue venoso (que provém da drenagem do intestino, do estômago e do pâncreas). E

esse sangue arterial e esse sangue venoso vão chegando pela artéria hepática ou veia

porta e juntam-se nos chamados sinusóides hepáticos e misturam-se, e depois saem do

fígado através da veia hepática que vai drenar na veia cava. Assim, o fígado recebe

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Aula 9 – 22 de Novembro de 2006Tema: Falência de sistemas IRadicais Livres em Medicina

Page 102: O conceito de Meio Interior é de alguma forma a …web.ist.utl.pt/~jorgebeira/anotres/mgd/MGD0607... · Web viewPor exemplo, no embrião formam-se membranas entre os dedos, que desaparecem

sangue arterial e sangue venoso, o sangue venoso recebe de órgãos que ou produzem

hormonas (pâncreas) ou absorvem produtos de vários nutritivos (intestino). Estas coisas

todas vão passar através do sangue da veia porta, pelo fígado, para ser metabolizadas,

nas células dos hepatócitos.

(slide 2) A estrutura funcional do fígado é o hepatócito. Podemos dizer que cada

hepatócito é um fígado: cada um tem todas as funções do fígado, é uma pequena fábrica

com uma actividade metabólica espantosa, cada um faz todas as funções do fígado e

tem para isso a necessidade de que o sangue que passa pelo fígado junto às células,

portanto chamados sinusóides hepáticos, que como já vos disse é a junção de sangue

arterial e sangue venoso da artéria hepática e da veia porta, têm de estar e devem estar

num contacto íntimo com as células dos hepatócitos para que as trocas sejam as

máximas possíveis, isto é mais ou menos uma zona onde as barreiras alfandegárias

acabaram. Todos os capilares têm uma parede constituída por endotélio, pela membrana

do vaso - a média, e depois a camada exterior onde o vaso é irrigado, etc. Portanto as

células de qualquer órgão estão separadas do sangue por esta estrutura complicada que é

a parede do capilar. Aqui não há parede. Não há membrana basal, de maneira que a

parede dos hepatócitos na sua superfície androbasal está imediatamente em contacto

com o sangue. Portanto o sangue está em contacto directo com a parede dos hepatócitos.

As trocas são tão intensas que não podem ter qualquer barreira, portanto todas as

substâncias dissolvidas no sangue entram em contacto com as células hepáticas. As

células hepáticas quando segregam ou excretam alguma substância para o sangue, basta

esta passar a parede celular, isto é extremamente importante - é uma fábrica, o fígado.

Portanto, tem de ser tudo facilitado, para que as células, que são pequenas fábricas que

estão em contacto íntimo com o sangue para poderem receber directamente e excretar

directamente para a corrente sanguínea sem membrana basal, sem endotélio, sem nada a

aborrecer. Como as células têm de estar em contacto directo com o sangue, estão

organizadas numa placa unicelular, não pode estar uma célula atrás de outra célula,

estão todas elas em contacto com o sangue e separadas entre si por espaços chamados

sinusóides, há ausência de membrana basal, membrana do capilar. Não tem membrana

capilar. Estas células têm de ter uma estrutura para se manter, se não caíam, estavam um

amontoado de células. Elas têm um esqueleto que as mantém, que é formada pelas

chamadas células retículo - endoteliais – fazem funções espantosas, células onde o lixo

do organismo é destruído, é metabolizado, são células extremamente activas mas

também mantêm aquela estranha estrutura das sinusóides quase sem parede e dos

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Page 103: O conceito de Meio Interior é de alguma forma a …web.ist.utl.pt/~jorgebeira/anotres/mgd/MGD0607... · Web viewPor exemplo, no embrião formam-se membranas entre os dedos, que desaparecem

hepatócitos em camada unicelular sempre numa determinada estrutura. É um esqueleto,

uma armação sob o ponto de vista metabólico.

Os hepatócitos têm uma função virada para a reabsorção, a absorção de

substâncias e metabolititos que existem no sangue periférico, no sangue circulante e a

excreção para ele de variadas coisas que vamos ver mas também têm a função de formar

bílis, portanto que têm dois pólos, um pólo voltado para o sangue e um pólo voltado

para o canalículo biliar, portanto sinusóide de um lado, canalículo biliar de outro.

O que é a bílis? É um detergente – transforma o hidrofóbico em mais hidrofílico

para permitir que determinadas substâncias hidrofóbicas sejam facilmente eliminadas e

permite que quando chegam ao intestino substâncias hidrofóbicas (como gorduras)

sejam envolvidas pelos sais biliares e tornam-se mais hidrofilicas facilitando a absorção.

Quando vai para o intestino leva lixo do organismo, leva produtos de excreção

hidrofóbicos que são transformados em hidrofílicos, quando faz o ciclo entero-

hepático, a parte da bílis que chega ao intestino volta pela veia porta ao fígado, traz

substâncias alimentares nutritivas que são hidrofóbicas que passaram a hidrofílicas,

temos as gorduras, as vitaminas lipossolúveis etc.

(slide 3) Têm de se perceber a filosofia geral de funcionamento dos órgãos. Têm

aqui uma célula. Há assim dois pólos, de um lado existe sangue, pólo hemático e pólo

biliar.

(slide 4) Vamos falando agora de cada uma das funções do fígado normal e

acompanhando depois o que é que acontece quando ela está alterada. O fígado tem uma

função fundamental da gluconeogénese e da glicogenólise. Tem outra de sintetizar

colesterol (80% do colesterol) e a maioria dos triglicéridos. Por outro lado o excesso de

colesterol e triglicéridos metaboliza e excreta-os na bílis, lá está o detergente,

metaboliza aminoácidos e converte a amónia em ureia. Se o azoto fosse eliminado sob a

forma de amónia, ela era extremamente tóxica e entravamos todos em coma hepático. A

vantagem dessa metabolização, transforma /metaboliza o azoto, e excreta-o como um

produto pouco tóxico em vez de um produto muito tóxico.

(slide 5) Sintetiza praticamente todas as proteínas com excepção das

hemoglobinas. Albumina, factores de coagulação, apoliproteínas (transportam lípidos

para serem solúveis no sangue), transferina (…)

(slide 7) Aquela pequena célula é capaz de produzir todas estas proteínas,

sintetiza, excreta e recircula a bílis, cataliza e excreta fármacos e tóxicos – a maioria dos

fármacos e tóxicos que ingerimos têm que ser metabolizados, transformados em

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Page 104: O conceito de Meio Interior é de alguma forma a …web.ist.utl.pt/~jorgebeira/anotres/mgd/MGD0607... · Web viewPor exemplo, no embrião formam-se membranas entre os dedos, que desaparecem

produtos menos tóxicos, e solubilizados e excretados e aquelas células de Kupffer são

fundamentais na depuração das bactérias e antigénios da circulação portal. Uma das

zonas mais infectadas no nosso organismo é o intestino, até porque é absolutamente

necessário que ele tenha bactérias que colaborem na digestão. Bom, algumas bactérias e

alguns antigénios entram/são absorvidos na circulação portal. O fígado é um filtro. Eles

passam pelo fígado e são fixados e destruídos nas células retículo-endoteliais, fazem

também aquele esqueleto do fígado.

(slide 8) O que se passa com os glúcidos? Quando se ingere glucose, numa

refeição, há absorção intestinal da glucose, veia porta e das duas uma, se não houvesse

fígado, por exemplo quando o fígado não está a funcionar, quando há uma insuficiência

hepática, o que é que se segue a uma refeição moderada? Hiperglicémia. Um fígado

normal, impede que haja uma hiperglicémia. Há gluconeogénese, que é guardada a

glicose, armazenada na própria célula hepática, e a glicémia após as refeições altera-se,

mas pouco. Uma das razões é a gliconeogénese. Em jejum, a glicose é consumida e vai

ter de ser fornecida permanentemente ao sangue circulante, se não o doente tinha

hipoglicémia.

(slide 9) Quando há uma doença hepática, há hipoglicémia na medida em que

como não há glicogénio na fase de jejum, sob o ponto de vista nutritivo é importante

porque quem tem uma insuficiência hepática não pode estar muito tempo sem comer.

Há medida que a insuficiência hepática avança é preciso ter infusões permanentes de

glicose, por outro lado, o equivalente da eficiência hepática é o shunt porto-cava

(método cirúrgico). Se há uma alteração da circulação hepática, com cirrose hepática, o

sangue é derivado directamente da porta para a cava - há hiperglicémia.

(slide 10) Quanto aos lípidos, o fígado é o órgão central do metabolismo dos

lípidos, produz quase 80% do colesterol sintetizado no organismo. O colesterol das

pessoas, só uma pequena parte é alimentar, a maior parte do colestrol elevado é por um

aumento da síntese e produção no fígado, dai que as dietas mesmo rígidas baixem pouco

o colestrol e seja necessário bloquear a síntese do colestrol no fígado, com as famosas

estatinas que hoje toda a gente toma. Por outro lado sintetiza, armazena e metaboliza

triglicéridos, produz cetoácidos e corpos cetónicos por oxidação dos ácidos gordos. Sem

fígado funcionante não há uma ácido-cetose diabética porque é ele que fabrica o

cetoácido que é um acompanhante da ceto-acidose diabética.

Produz, segrega e remove da circulação várias proteínas (apolipoproteínas) de

transporte de lípidos. Se o fígado não existisse e não produzisse as apolipoproteínas que

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Page 105: O conceito de Meio Interior é de alguma forma a …web.ist.utl.pt/~jorgebeira/anotres/mgd/MGD0607... · Web viewPor exemplo, no embrião formam-se membranas entre os dedos, que desaparecem

envolvem o colesterol e os triglicéridos para permitir que uma substância hidrofóbica se

torne hidrofílica e circule na água do plasma,… é ele que fabrica as apolipoproteínas – é

fundamental na manutenção de níveis normais, elevados ou baixos do colesterol e de

triglicéridos circulantes.

(slide 11) Por exemplo vêm aqui, só por curiosidade como se forma triglicéridos

e como se forma colesterol. Vêm que é a partir do glicogénio e da glicose do piruvato

acetil-CoA. Todo este ciclo chega à placa giratória central do acetil-CoA. Umas das vias

da sua metabolização são os corpos cetónicos. É a célula hepática que faz tudo isto, é

um espanto mas é verdade. Outra via é transformada em citrato, acetil-CoA novamente,

malonil coenzima A e HMg CoA que leva à formação de colestrol. Quando o indivíduo

tem uma hipercolestrolémia, tentamos reduzir a ingestão de ácidos gordos, mas o que

bloqueamos é o HMg CoA. Tudo aquilo que se toma para o colesterol bloqueia esta

enzima. São eles que, depois fabricam triglicéridos, os ligam às apolipoprotrínas mais a

baixa densidade que entram em circulação e depois veremos, vão à célula ceder

colesterol e triglicéridos. E voltam ao fígado, não sob a forma de lipoproteínas de muito

baixo peso molecular mas de baixo peso molecular porque perderam uma parte das

iniciais do colesterol para a periferia.

(slide 12) Aqui têm, para perceberem, intestino chylomicrons chegam ao fígado,

o fígado tem um receptor, ai fabrica triglicéridos e colesterol, que são transportados em

circulação sob a forma de VLDL – as apolipoproteinas envolvem-nas e elas conseguem

circular envolvidas pelas apolipoproteinas, que são hidrofílicas e podem circular em

ambiente de água. Chegam à periferia, há uma parte dos triglicéridos e colesterol que

entram na célula para se aproveitarem sob o ponto de vista de fuel, de metabolismo, de

energia, ficam as chamadas lipoproteínas de peso molecular intermédio que se

transformam rapidamente em lipoproteínas de baixo peso molecular, elas chegam ao

fígado, o fígado recarrega as LDL’s com colesterol e triglicéridos e volta a lança-las em

circulação sob a forma de LDL. Também faz outra coisa curiosa, como o excesso de

colesterol nos tecidos periféricos é uma causa de doença - há arteriosclerose. O fígado

tem uma espécie de homem da limpeza – produz uma lipoproteína de alto peso

molecular que põe em circulação, se ele passar pelos tecidos periféricos, fixa o excesso

de colesterol dos tecidos e o faz regressar ao fígado onde ele se necessário é

catabolizado. Não só cede colesterol e triglicéridos aos tecidos periféricos, como vai lá

buscar o excesso. A camioneta do lixo vai lá buscar o excesso. Por isso é que se diz que

o VLDL são os mau colesterol e o HDL quanto mais alto melhor, que é o bom

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Page 106: O conceito de Meio Interior é de alguma forma a …web.ist.utl.pt/~jorgebeira/anotres/mgd/MGD0607... · Web viewPor exemplo, no embrião formam-se membranas entre os dedos, que desaparecem

colesterol, na medida em que protege da arteriosclerose, porque limpa as células

periféricas do excesso desse colesterol.

(slide 13) Quando há uma lesão celular moderada ou grave, a acumulação de

lípidos no fígado, o transporte de lípidos diminui. Quando há uma lesão celular muito

grave, há uma hipocolestrolemia. Não há nada pior prognóstico num doente com doença

hepática, do que ter o colesterol muito baixo. Isto representa uma gravíssima lesão

celular. Ou seja uma situação em que (diz-se que o colesterol baixo é muito bom para a

arteriosclerose) há uma gravíssima lesão hepática, é um sinal de muito mau prognóstico.

(slide 14) Quando também não consegue produzir uma quantidade adequada de

bílis, a excreção de colesterol para o intestino diminui e vai-se acumular, e é mais uma

causa de hipercolestrolémia.

(slide 15) Nos aminoácidos, tudo o que é grupos com azoto, grupos aminados,

têm que ser metabolizados, quando não são aproveitados na síntese proteica, o que vai

acontecer é que a amónia é extremamente tóxica e o fígado tem a capacidade da

metabolização dos produtos com azoto através da amónia, para um metabolito final

pouco tóxico que é a ureia. São precisos níveis muito altos de ureia para se entrar em

coma urémico. O coma urémico tem muitas outras causas além da ureia. Mas, se houver

uma falência do ciclo da ureia por deficiência da célula hepática, retém-se amónia, e o

doente entra rapidamente em coma hepático. A amónia é extremamente tóxica. Quando

se perde este metabolismo, o ciclo metabólico que produz ureia, produz-se NH3, e

pequenas quantidades de amoníaco põe as pessoas em coma.

(slide 17) Cá está – acumulação de amónia no organismo – encefalopatia

hepática, coma.

Também produz uma grande quantidade de proteínas, a falência dessa produção

tem variadíssimas consequências. Se for falência grave de transporte de hormonas

tiroideias vocês podem ter um quadro metabólico e clínico de hipotiroidismo sem terem

hipotiroidismo. A produção dessas hormonas é normal, o seu transporte para a periferia

é que vai diminuir quando não há transportadores. Haver muita comida num sítio, haver

fome na outra, porque não há camionetas de transporte.

(slide 18) Por exemplo a Albumina, é importante porque tem duas funções.

Transporta conjugando várias substâncias endógenas e exógenas. Algumas delas são

tóxicos e são fármacos. As quantidades normais que nós administramos de fármacos

tornam-se tóxicas. Portanto vocês quando medicam um doente podem ter a noção se ele

tem uma albumina normal.

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Page 107: O conceito de Meio Interior é de alguma forma a …web.ist.utl.pt/~jorgebeira/anotres/mgd/MGD0607... · Web viewPor exemplo, no embrião formam-se membranas entre os dedos, que desaparecem

Faz a manutenção da força oncótica do plasma. O plasma mantém-se com

determinado volume, volume sanguíneo, o que depende muito da permeabilidade dos

vasos (permite que passem água e electrólitos do plasma para o tecido intersticial) e da

força oncótica (fundamentalmente devido à albumina). Daí que quando há

hipoalbuliménia, por exemplo numa doença renal que leva a uma grande perda de

albumina, o que vai acontecer é que diminuindo a força oncótica do plasma, o doente

tem edema – há uma passagem de quantidades anormais de água e electrólitos para o

espaço intersticial e a pessoa tem edemas (fica inchada). A manutenção da volémia

depende dos níveis de albumina, para manter uma força oncótica normal.

(slide 19) Lesão hepatocelular -> hipoalbuminémia:

1. Aumento da circulação livre de várias substâncias endógenas e exógenas.

Exemplo: maior toxicidade de alguns fármacos ou tóxicos. Nós temos de saber que

albumina o doente tem antes de o medicar.

2. Diminuição da força oncótica do plasma com formação de edema e derrames

nas serosas - pleura.

(slide 20) Também sintetiza tudo o que é factores da coagulação:

Anti-trombina III

Fibrinógénio

Proteína C, não é a reactiva da inflamação, é a da coagulação

Factores II, VII, IX, X

Quando há uma lesão hepatocelular grave, há uma diminuição da síntese de

proteínas da coagulação originando discrasias hemorrágicas. A fase final, nas

hepatopatias graves, eles sangram por tudo o que é sitio, não têm coagulação.

(slide 21) Bílis:

1. É sintetizada pelos hepatócitos.

2. É constituída por sais biliares e tem propriedades detergentes e

solubilizantes.

3. Permite a dissolução em meio aquoso de várias substâncias lipossolúveis e

o seu transporte para o interior e exterior do organismo.

4. Os sais biliares são recirculados entre o intestino e o fígado e quando

voltam têm uma função de duas. Quando vão, levam lixo e produtos tóxicos

para serem eliminados. Quando voltam ao fígado, uma parte da bílis que

chega ao intestino, enviada pelos canais biliares é recirculada sendo

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Page 108: O conceito de Meio Interior é de alguma forma a …web.ist.utl.pt/~jorgebeira/anotres/mgd/MGD0607... · Web viewPor exemplo, no embrião formam-se membranas entre os dedos, que desaparecem

reabsorvida para o fígado, traz de volta determinadas substâncias nutritivas

fundamentais que são lipossolúveis.

(slide 22) Portanto, com insuficiência hepática, quando não há bílis no intestino,

há por exemplo graves deficiências de tudo o que são substâncias gordas, digamos

assim, e de tudo o que são vitaminas lipossolúveis, uma série de vitaminas

lipossolúveis, que não são distribuídas.

Quando o fígado é incapaz de produzir ou excretar bílis, há má absorção -isto na

volta. Na ida, há uma diminuição da excreção de bilirubina. Diminuição da excreção de

colesterol, quer por menor transformação em sais biliares quer por menor formação de

complexos sais biliares hipercolestrolémia - icterícia, hipercolestrolémia, síndrome de

má-absorção com todas as deficiências em vitaminas, não têm lá o detergente bílis para

o fazer.

Cada célula hepática faz isto tudo. Tem em si todos os mecanismos bioquímicos

capazes de fazer isto. No rim não é assim, cada zona tem uma função. Cada célula tem

duas ou três actividades, o hepatócito, cada um deles, é capaz de fazer tudo isto. Cada

um faz a milionésima parte da quantidade, mas a qualidade do que faz é igual em todos.

Portanto o fígado é igual a uma multiplicação de milhões de hepatócitos.

Portanto há entrada de várias substâncias exógenas e algumas são mesmo muito

tóxicas e umas são eliminadas por exemplo por filtração renal, etc. Mas a maioria delas

são primeiramente modificadas pelo fígado, porque uma das características de muitas

dessas substâncias é não serem hidrossolúveis. O outro problema deste mecanismo é

que uma substância para entrar e funcionar dentro de uma célula funciona melhor se for

lipossolúvel, para ser sempre transportada pela água de um lado para o outro tem de ser

hidrosolúvel. Portanto ela tem que se manter lipossolúvel quando é metabolicamente

activa sem ser transformada em hidrosolúvel quando é preciso levá-la, transporta-la à

periferia, andar circulante no plasma. É um contra senso, mas é isso que se faz.

(slide 23) A maioria das enzimas envolvidas neste metabolismo, localizam-se no

retículo endoplasmático dos hepatócitos. Metabolizam e excretam fármacos exógenos e

substâncias endógenas lipofilicas (ex: bilirrubina e colesterol - temos de os excretar).

Modificam as substâncias lipofilicas (hidrofobicas) tornando-as mais hidrofilicas

(Biotransformação), permitindo assim a sua excreção pela urina (o rim elimina muitos

tóxicos, mas só hidrossolúveis) ou pelas fezes por intermédio da bílis.

Este metabolismo é muito engraçado, é um mecanismo bioquímico apaixonante.

(slide 24) A biotransformação tem duas fases.

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A biotransformação tem primeiro de transformar a substância exógena ou endógena

que queremos eliminar numa substância mais activa e para isso há reacções de oxi-

redução com adição de um grupo funcional contendo oxigénio livre. Lá estão os tais

radicais livres, que é uma substância mais reactiva. Para permitir que se processe a fase

II que facilmente faz uma ligação covalente dessa substância mais activa a uma

molécula transportadora hidrosolúvel, geralmente ácido glucorónico ou peptideo

glutationa. O problema é que nesta fase em que há uma substância mais reactiva

enquanto ela não é ligada covalentemente com a substância transportadora é

extremamente perigosa. Se era tóxica antes, nesta fase é muitíssimo mais tóxica. Mas

por exemplo há um desacoplamento entre esta capacidade de fazer com que essa

substância fique mais activa e a capacidade de fazer as ligações covalentes pode

aumentar a quantidade de substâncias muito tóxicas. E este desacoplamento, esta fase é

extremamente perigosa.

Se há um fígado biológico há um fígado mecânico. Isto é, há um fígado artificial

como existe um rim artificial. Nesse, estes mecanismos todos, cada um deles tem de

transformar a amónia em ureia. As funções fundamentais que levam à doença e à morte

da pessoa podem ser substituídas por métodos de filtração, diálise, absorção e reacções

químicas. Há uma solução para cada uma das coisas que eu disse, quer dizer, ele não vai

produzir proteínas. A hemodiálise também não resolve a produção de hormonas pelo

rim, mas aqui aquilo que é fundamental, que são os níveis de colesterol, a produção de

amónia, etc. está resolvido de maneira a que o doente se possa manter vivo com outras

terapêuticas adjuvantes, até ter um transplante de fígado ou até a insuficiência hepática

se resolver e desaparecer. Se o doente for mantido vivo, até dá tempo para recuperar. O

fígado recupera. Há uma coisa que o fígado tem espantosa, que é a capacidade de

regeneração. Portanto a partir de uma célula hepática é capaz de se fazer um fígado (é

um pouco exagero isto).

A mitose daquelas células está praticamente silenciosa, está parada. A função das

células não é dividirem-se. É funcionarem fabricando coisas como vimos. Mas se o

fígado tem uma perda, e se sobrar um número suficiente de células, essas células

durante um tempo perdem praticamente a sua capacidade metabólica, e adquirem uma

capacidade mitótica de reprodução como não há outra célula no organismo. Pode tirar-

se um bocado do fígado de um pai e pô-lo num filho. Passados uns dias tem o fígado do

tamanho que teria normalmente. Tem uma capacidade espantosa de regeneração, talvez

por isso a cultura celular tenha alguma facilidade.

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Pergunta: Há anemias relacionadas com o fígado?

Resposta: Não. O fígado não tem nada a ver com a anemia. Não há anemia hepática.

Há algumas pequenas alterações que o fígado pode condicionar, uma delas por exemplo

é que se o fígado, o sistema retículo endotelial, está muito activo, todo, ou grande parte

do ferro que nós ingerimos ou que tentamos reaproveitar, a partir da destruição normal

dos glóbulos vermelhos é fixado sob a forma de Ferroxina e não é libertado.

Por outro lado, a não absorção de determinadas substâncias pode fazer uma anemia

macrocitica macrocronica. O número de glóbulos vermelhos é menor mas a quantidade

de hemoglubina não é muito abaixo do normal. Os glóbulos é que são maiores. Aquilo

que controla a produção dos eritrócitos é a eritropoeitina, e na idade adulta o fígado não

produz eritroproeitina. Em criança é o principal órgão produtor mas perde importância.

Quando o indivíduo tem uma insuficiência renal, tem uma anemia e faz uma hepatite

aguda, a anemia melhora porque com a inflamação viral, as células readquirem a

capacidade exprimem o gene da produção da eritropoeitina e ficam bons, ficam com a

anemia controlada.

Porque é que é no rim que se produz a hormona que controla a produção de

eritrócitos? Porque avalia o oxigénio. A zona do tubo contornado proximal do rim é o

que mais consome oxigénio no corpo. Logo é ai que está o sensor.

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Aula 9 – 2ª Parte – Ricardo AiresProfessor Afonso FernandesImportância de Radicais livres em Medicina/Sobrecarga Oxidante

É das peças mais recentes que conhecemos para construir os puzzles que conduzem a percebermos os mecanismos da doença.

Já vos falei de várias vias patogénicas, já vos falamos de formas de lesão celular por vários mecanismos, da inflamação, da isquémia, mas de facto a participação de radicais livres em vias patogénicas é relativamente recente e o assunto chegou à divulgação pelo grande público, através da ideia de que é possível combater o envelhecimento através da utilização de radicais livres, nomeadamente seria possível prevenir o envelhecimento cutâneo através da aplicação de tónicos com antioxidantes e naturalmente isso foi aproveitado pela industria de cosméticos, para a produção de substancias que previnem o envelhecimento da pele.

O conceito, sobrecarga oxidante, é um conceito que anda a par do conceito do paradoxo do oxigénio, que foi desenvolvido, no sentido da lesão isquemia-reperfusão e verificou-se que quando a isquemia não é suficiente para levar à necrose, a reperfusão, embora possa ser a única estratégia para recuperar o tecido isquémico, introduz ela própria um factor de lesão, ou seja aparentemente, ao fornecermos oxigénio a um tecido carente dele estamos a beneficiá-lo, mas isso só por si, também provoca algum grau de lesão.

Quando se estuda a evolução da atmosfera terrestre, e do aparecimento da vida, como sabem o oxigénio foi imprescindível ao aparecimento de formas mais complexas, porque essas requerem mais energia e a respiração é uma forma de obter maiores quantidades de energia, mas o oxigénio só por si, precisamente devido ao facto de poder levar ao aparecimento de espécies químicas muito reactivas, capazes de destruir macromoléculas, não é muito óbvio como a sua introdução fora possível na evolução dos seres vivos, sem o desenvolvimento concomitante de sistemas antioxidantes eficazes. Discute-se então, o que apareceu primeiro, se o oxigénio, para permitir a evolução da vida ou se foram os sistemas antioxidantes, mas como é que os sistemas antioxidantes apareceram antes do oxigénio? Por outro lado, se foi o oxigénio, como é que os seres antigos resistiram ao oxigénio? É um assunto que evidentemente, não está resolvido, nem se sabe se existirão evidências científicas para o resolver… [O que apareceu primeiro, o ovo, ou a galinha?]

É claro que viver com o oxigénio é previsivelmente inseguro, como vamos ver daqui a pouco. Admitimos que no estado de saúde ou no estado de equilíbrio existe um equilibrio entre carga pró-oxidante (também representada, por vários espécies radicalares, que representamos aqui por R•, o ponto é o electrão desemparelhado; radical livre é qualquer espécie química, com um electrão desemparelhado numa orbital externa, que lhe confere elevada reactividade) e defesa antioxidante.

O conceito de sobrecarga oxidante consiste no desequilíbrio neste balanço, com predomínio da carga sobre os mecanismos de defesa, desequilíbrio este, que é causa de doenças em circunstâncias muito diversas. [ver slides 3/4],

A participação de radicais livres em biologia e medicina, foi considerado durante muitos anos como uma heresia, sobretudo para os bioquímicos, que admitem que as

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reacções são controladas enzimaticamente, e há um controlo muito fino, das reacções através de enzimas mais ou menos específicas.

Portanto, era herético admitir a existência de reacções em cadeia nos seres vivos, não controladas enzimaticamente que são as reacções já conhecidas da indústria química (polimerização dos plásticos, p.e.).

Leonor Michaelis, em 1940, foi a primeira a admitir a existência deste tipo de reacções ao estudar ciclos de oxidação-redução de quinona.

Gershman, em 1954 admitiu que a toxicidade do oxigénio podia depender da formação de espécies radicalares

Harman, em 1956, constrói uma teoria em que tenta explicar o envelhecimento pela formação biológica de radicais livres, sem qualquer espécie de bases científicas.

Babior, em 1973, descreve a produção de espécies radicalares pelos neutrófilos, que durante o processo da fagocitose, produzem radicais livres através de enzimas que produzem superóxido.

Claro que, entretanto se soube que os efeitos das radiações ionizantes nos seres vivos não dependiam tanto de um efeito directo, como também da hidrólise da água, onde se produzem espécies radicalares que se podem revelar letais. [ver slide 6]

Já há muitos anos que se conhecia uma proteína, que era a eritrocupreina que como o próprio nome indica é uma proteína do glóbulo vermelho, com cobre. Sendo, esta a segunda proteína do eritrocito, em termos quantitativos. Mas não se fazia ideia do que fazia aquela proteína, o mérito de Fridovich foi descrever que esta proteína tinha como única acção catalisar a dismutação do superóxido e ao demonstrar que o nosso organismo tinha uma enzima com essa acção e ao demonstrar que estas enzimas estão bem conservadas ao longo da evolução das espécies, verifica-se que ela é necessária à sobrevivência, e se ela é necessária, conclui-se naturalmente a participação de radicais livres nos sistemas biológicos. [ver slide 7]

Portanto, a todos os outros mecanismos patogénicos, veio-se juntar este módulo radicalar para a compreensão das doenças. Com isto, veio-se a descobrir que determinados agentes, físicos, químicos, nutricionais, disfunções metabólicas, inflamação, reaccção imunológica, hipoxia/isquema, alterações genéticas, podiam levar a uma patologia que se podia designar por Radicalar. [ver slides 8/9]

É verdade que, já antes se tinha admitido que a produção de radicais, podia explicar alguns fenómenos tóxicos, por exemplo em 1966, um autor londrino, associou a toxicidade do tetracloreto de carbono (CCl4) à presença de um radical livre, neste caso o triclorometilo (•CCl3). A mais importante patologia associada ao tetracloreto de carbono é a necrose hepática, com insuficiência hepática. Contudo, verificou-se que o CCl4, não é tóxico propriamente dito, mas sim depois de metabolizado por enzimas que existem nos hepatócitos, as monoxigenazes, que dependem do citocromo P450, que transformam o CCl4, num radical livre, o •CCl3, que ataca os ácidos gordos polisaturados das biomembranas, o que resulta num processo denominado por lipoperoxidaçao ou peroxidação dos ácidos gordos polisaturados das biomembranas. A lipoperoxidação produzirá aldeídos muito reactivos que afectam as proteínas da membrana, o que causa uma perturbação funcional e estrutural, que pode causar morte celular, devido a alterações da sua permeabilidade. [ver slides 10/20/21/33]

Também muito precocemente, Luzio levantou a hipótese, e encontrou evidência experimental para isso, que o etanol também pode lesar o fígado através do aumento de produção de espécies radicalares. [ver slide 11]

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McCord em 1974, demonstra que, se se produzir enzimaticamente superóxido, essa produção leva à despolimerização do ácido ialorónico, responsável pela viscosidade do líquido sinovial e importante para a lubrificação das articulações. McCord revela também que a presença de neutrófilos no líquido sinovial (produtores de superóxido), devido a inflamações, pode contribuir para a doença articular crónica. Diz ainda que a superoxidodismutase e a catalase protegem o líquido sinovial desta despolimerização, donde se conclui que o peróxido de hidrogénio, também contribui para esta despolimerização, por ser substrato da catalase. [ver slide 12]

McCord participa ainda nas experiências que demonstram a produção de radicais na isquémia/reperfusão, [ver aula sobre lesão isquémica]. Na isquémia há degradação de ATP, portanto forma-se hipoxantina. Por outro lado, durante a re-oxigenação, introduz-se oxigénio no sistema. A combinação de hipoxantina com o oxigénio, executa uma reacção que forma superóxido, reacção esta catalisada pela xantinaoxidase, formada a partir da xantinadesidro-genase na presença de cálcio. [ver slides 13/25/26]

Neste gráfico de barras, verifica-se que o assunto dos radicais livres é relativamente recente, e que as referências em artigos sobre o assunto tem crescido exponencialmente ao longo das últimas décadas, [ver slide 14]

Os radicais livres não explicam exclusivamente a patologia, de facto demonstra-se também que tem funções fisiológicas imprescindíveis para o funcionamento do nosso organismo, nomeadamente a função de sinalização, e uma das moléculas melhor caracterizadas a esse respeito como mediador ou sinalizador é o NO• (óxido nítrico), que funciona como dilatador vascular derivado do endotélio.

De facto, os radicais livres em fisiologia participam em reacções enzimáticas, na fagocitose, na regulação do tónus vascular, na proliferação e diferenciação de celular, na regulação da expressão genética e na apoptose, todos estes papéis fisiológicos importantes acerca dos radicais livres.

Especificando um pouco mais, os radicais livres podem ser de oxigénio ou não:

Radicais Livres Espécies não radicalares

de oxigénio outrosO2• (superóxido)

HO2• (perihidroxilo)HO• (hidroxilo)

NO• (óxido nítrico)

Derivados dos lipidos:LOO• (peroxilo)

LO•(alcoxilo)

H• •CC3

RS•C6H5N=N•

Cu•(II)

O2

H2O2

(também muito reactivas, apesar de não terem

electrões desemparelhados)

[ver slide 15]

E estas são algumas das reacções radicalares mais importantes

Reacção de dismutação: O2• + O2• + 2 H → H2O2 +O2,Reacção catalisada pela superoxidodismutase. Existem também outras

formas de superoxidodismutase com zinco, magnésio, ferro, etc. Certas

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bactérias que não possuem esta enzima, tem elevadas quantidades de magnésio, que os protege dos radicais livres.

Reacção de Fenton: Fe2+ +H2O2 → Fe3+ + OH• + OHOs metais de transição têm um papel fundamental na génese de espécies

radicalares, neste caso, na formação do radical hidroxilo, a partir do peróxido de hidrogénio. Reacção de Haber-Weiss: H2O2 + O2• → OH• + OH + O2

Também catalisada por metais de transição, o radical hidroxilo é extremamente reactivo, com vida média de 10-6 segundos.

Formação de ião peroxinitrito: NO• + O2• → ONOOO peroxinitrito, não é um radical, mas é um anião muito reactivo, com

potencial lesivo para as macromoléculas.

É importante resalientar, a importância dos metais de transição na catálise da geração de radicais livres, por exemplo o Fe2+ e o Cu+, não se verificando catálise, com outras formas deste metais. [ver slides 16/18]

Vejamos agora, as diferentes fontes de radicais livres:

Fontes de Radicais LivresAmbientais Endógenas

Radiações ionizantesPoluentes

Fumo do tabacoAgentes Químicos

Medicamentos

Cadeia respiratória mitocondrialMacrófagos (enzima NADPH oxidase/superoxidosintetase)

Sistema citocromo P450[ver slide 17]

E depois, a sobrecarga oxidante [rever conceito na página 1], leva ao ataque por parte de macromoléculas, como os lípidos (ácido ialorónico), enzimas, proteínas, ácidos nucleicos (os radicais livres podem provocar mutações nas bases púricas e pirimídicas), admite-se também que o cancro relacionado à exposição de radiações pode-se gerar através de mutações provocadas por radicais livres formados a partir da hidrólise da água, neurotransmissores, inibidores de proteases e até os próprios sistemas antioxidantes podem ser atacados pelos radicais livres. [ver slide 19]

Por acção das espécies radicalares, a célula pode reagir através de mecanismos antioxidantes, mas se este é ultrapassado, a célula morrerá, ou por apoptose ou por necrose… [ver slides 22/23/24]

Como já foi dito atrás, a lesão isquémia-reperfusão no miocárdio, pode ser provocada pelos radicais livres, produzidos, quer a partir das mitocôndrias, dos fagócitos (que também produzem radicais), a partir do mecanismo catalisado pela hipoxantina ou até a partir do mecanismo do ácido araquidónico. [ver slides 25/26]

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Agora, quais são as fontes de ferro/metais de transição para a catálise da reacção Haber-Weiss, que produz hidroxilo? Vêm de moléculas que têm ferro, como por exemplo a hemoglobina, transferrina e ferritina, que o libertam em situação de acidose. Na ausência de oxigénio (no contexto isquemia-reperfusão), o metabolismo torna-se anaeróbio, cujo produto é o ácido láctico, que vai baixar o pH e permitir a libertação de ferro para catalisar a reacção. [ver slide 27]

Saliente-se agora, que os indicadores de sobrecarga oxidante, podem ser detectáveis através de medições de certos produtos, e por exemplo, na artitre reumatóide, temos evidência de sobrecarga oxidante, através do doseamento de produtos da lipoperoxidação e de degradação do ácido ialorónico e de ferro catalítico no líquido sinovial, e de oxidação de anti-oxidantes…tudo isto é a evidência da existência de sobrecarga oxidante! [rever o que já foi visto nas páginas iniciais; ver slides 29/30/31]

De resto, têm sido muitas as doenças, em que a sobrecarga oxidante tem sido descrita como factor patogénico: artrite reumatóide, SIDA, doença hepática alcoólica, cancro, aterosclerose, doenças neuro-degenerativas, etc… [ver slide 35]

Face, a estes verdadeiros cavaleiros do Apocalipse, como foram descritos os radicais livre, é necessário premiar o encontrar de defesas para este problema, e então temos um sistema muito complexo de moléculas antioxidates para fazer face a esta eventual sobrecarga oxidante. [ver slides 41/42]. Moléculas antioxidantes como enzimas: catalase, superoxido-dismutase, peroxidase do glutatião; outras moléculas que mantém o ferro ligado, impedindo-o de participar nas reacções acima descritas; ainda vitaminas como vit.A,C,E; e ainda alguns metais, como o selénio, manganésio, zinco, etc…

Há vários níveis de organização para a defesa antioxidante, como por exemplo, factores estruturais, captação de radicais, sequestração de metais de transição e reparação de tecidos. [ver slide 43].

Como estratégias terapêuticas para este problema, podemos considerar, o aumento da capacidade oxidante, a inibição de produção de radicais, a captação desses mesmos radicais, ou por fim, estimular a capacidade de regeneração de tecidos lesados pelos radicais livres. [ver slide 45] Uma última estratégia pode ser fornecer radicais aos tecidos para destruir tecidos anormais como o cancro, dado o seu poder destrutivo. [ver slide 48]

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Engenharia Biomédica – 3º ano, 1º semestreMecanismos Gerais da Doença (2006/2007)

Professor José Barbas

Aula desgravada por Rúben Pereira e André Gomes

Foram-me pedidos para dar três assuntos:1. Mecanismos gerais da lesão renal, dizer quais são os mecanismos pelos quais o rim se lesa;2. Fisiopatologia da insuficiência renal;3. Equilíbrio ácido básico;

(blá blá blá)

(3:16) Nos mecanismos gerais da doença renal há vários mecanismos pelos quais se pode processar a lesão renal:- Metabólicos;- Isquémicos;- Imunológicos;- etc.Vamos mais ou menos dar uma vista de olhos por estes mecanismos. Alguns dos quais são muito rápidos, vocês ficarão com uma ideia. Vão para casa, olham para eles, mas enfim, com uma ideia geral devem ficar.

Mecanismos metabólicos de lesão renal:- O principal, o mais frequente, o mais paradigmático, é aquele que é desencadeado pela alteração do metabolismo dos glícidos. Pela hiperglicémia, portanto, pela diabetes.A diabetes é responsável, em Portugal, por cerca de 15% a 20% dos doentes com insuficiência renal crónica que fazem diálise. Mas, por exemplo nos estados Unidos, onde a raça negra tem uma expressão bastante grande cerca de 40% dos indivíduos que estão em hemodiálise, estão por serem diabéticos. E no norte da Europa, raça caucasiana, por qualquer razão, alimentar ou não, há mais diabéticos, e é uma diabetes mais agressiva que na Europa do sul. Cerca de 20-30% dos indivíduos, e às vezes mais, que estão em hemodiálise, portanto insuficiência renal terminal, estão nessa situação por causa de um distúrbio metabólico da sua diabetes, que é a hiperglicémia.A diabetes lesa o rim por dois mecanismos:1. Os mecanismos metabólicos;2. Mecanismos hemodinâmicos;

(4:58) (ordem dos slides trocada…está a dar desculpas…=P)

(5:04) Nos metabólicos: (slide 2)A hiperglicémia altera três vias importantes:- Via da aldose-reductase;

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Aula 10 – 28 de Novembro de 2006Tema: Falência de sistemas II

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- Via do poliol;- Via da glicosilação não-enzimática;Estas alterações levam a uma lesão celular.Levam a um aumento da osmolalidade no interior das células e a uma alteração de toda a sua funcionalidade enzimática celular, e levam assim à lesão e morte da célula.Esta célula passa a funcionar de uma maneira anormal.(ler o slide)Para saber:Dentro das alterações metabólicas a hiperglicémia é uma das mais importantes que leva à lesão renal.

(7:20) (tudo mal formatado…está a dar desculpas…=P)

(7:27) Outra causa de lesão renal é a isquémia.Sempre que um órgão não tem circulação entra em isquémia (referiu a aula em que se falou da lesão celular).

(8:05) (tudo mal formatado…está a dar desculpas…=P)

(slide 4)Por vezes acontece, quando há lesão celular, que a célula não morre e passa a produzir, por exemplo, factores de crescimento por exemplo para as (vesitocinas?), agentes inflamatórios e pode progressivamente levar a um aumento da fibrose e da esclerose do órgão.(ler o slide)

(slide 5)Lesão isquémica do glomérulo diminui a pressão de filtração e entra em (oligomulia?).Quando o indivíduo tem uma grande perda de sangue tem uma insuficiência cardíaca, entra em choque, tem hipotensão, hipovolémia se for uma hemorragia, que leva à isquémia renal e a uma lesão isquémica do glomérulo ou a uma necrose do túbulo renal e pode-se transformar em insuficiência renal aguda. Causa choque de várias etiologias.

(slide 6)Oclusão da artéria leva a uma diminuição da quantidade de sangue leva à isquémia relativa do rim (uma das causas da nefropatia isquémica e que desenvolve insuficiência renal crónica)Outras causas:- Fibroplastia;- Aterosclerose;- Embolia;

(slide 8)Sempre que um órgão está isquémico entra em sofrimento ou as células entram em necrose ou passam a funcionar anormalmente.Hipertensão/hiperfiltração glomerular:(ler slide)Glomérulo – capilares de filtração (não de nutrição).

(slide 9)

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(ler slide)

(slide 12)(ver slide)

(slide 9)O glomérulo nas arteríolas aferente e eferente uma espécie de “almofadas musculares” que permitem contrair ou dilatar permitindo variações de calibre, regulando assim as pressões no glomérulo.(ler slide)

(slide 10)(ler slide)Se uma parte do nefrónio fica lesada o nefrónio perde-se em conjunto. Não há nefrónios que funcionem “um bocadinho”.Os que não ficaram lesados, que funcionam, aumentam a sua actividade, para compensar a perda (mecanismo de auto-regulação). Ocorre a vasodilatação da arteríola aferente e uma ligeira vasoconstrição da eferente (aumenta o fluxo e a pressão nos capilares glomerulares).

(slide 11)(ler slide)

(slide 13)(ler slide)

(slide 14)Na resposta imune pode haver lesão das estruturas renais por alterações da imunidade humoral (antigénio e anticorpo) ou imunidade celular.(ler slide)Não nos preocuparmos com os antigénios.

(slide 15)

(slide 16)Mecanismo de auto-anticorpos: por várias razões, por vezes, determinado corpo do rim torna-se imunogénico e há desenvolvimento de anticorpo contra esses antigénios, e podem desenvolver glomerulonefrites. Exemplo, é o caso da doença do lúpus (vejam Dr. House =P) em que por exemplo no caso de uma amigdalite que leva à produção de anticorpos contra antigénios do (Estetococcos?) que lesa o rim.Temos aqui várias doenças que lesam o rim por alterações imunológicas.(ler slide)

(slides 17 a 28)Mecanismos de recrutamento da (nuclease?), mecanismos de adesão, etc.Ver apenas, etc. (não disse nada).

(slide 29)Algumas doenças renais são provocadas por alterações dos mecanismos de coagulação, por quadros de hipercoagulação e trombose das artérias por essa hipercoagulação.

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(slide 30)(ler slide)Há a formação de trombos e obstrução das artérias e isso leva a uma lesão isquémica do rim.

(slides 31,32)

(slide 33)Ficar com a ideia de que também as alterações do complemento podem lesar o rim.Complemento – é um conjunto de proteínas que actuam em cascata (activação de uma leva à activação da outra, etc.). É um mecanismo de defesa do organismos e como todos os mecanismos de defesa, pode agredir o organismo.Sempre que um antigénio e um anticorpo se juntam pode agredir o organismo, é a estimulação da cascata do complemento.(ler slide)Complemento C5 estimulo o complexo de ataque da membrana, complexo terminal (C6, C7, C8, C9, uma vez ligados à membrana da célula destroem-na – morte celular).Por exemplo, se uma parte do rim se torna antigénico, uma parte da lesão do rim e desencadeada pela estimulação do complemento.

(slides 34, 35, 36)

(slide 37)Há doenças renais que são congénitas, geneticamente determinadas.(ler slide)Poliquistose renal – alteração genética da constituição de algumas proteínas leva a uma doença em que o rim desenvolve quistos que vão aumentando progressivamente e vão destruindo a função renal.

(slide 38, 39, 40, 41)

Tentar resumir:O rim pode ser lesado por:- Mecanismos metabólicos (ex.: diabetes);- Isquémia, como qualquer órgão (ex.: obstrução de uma artéria renal por aterosclerose, vasculites inflamatórias que levam a uma obstrução das artérias);- Alteração do mecanismo de auto-regulação (muito específico do rim);- Mecanismos imunológicos, como qualquer órgão;- Doenças genéticas;Estas são as grandes causas da lesão renal.

(31: 03) 2ª parte: Fisiopatologia da insuficiência renal

(slide 1)(ler slide)Renina – é uma enzima produzida pelo aparelho justa glomerular que transforma o angiotensinogénio em angiotensina I, que depois se transforma em angiotensina II. Essa angiotensina II aumenta a produção de aldosterona e leva à retenção de sal e água, e por

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outro lado é um poderosíssimo vasoconstritor. Há mesmo quem diga que sem rim não há hipertensão arterial.Eritropoietina – hormona produzida pelo rim que controla a produção de glóbulos vermelhos. Quando o rim está doente há uma anemia por falta de eritropoietina.Em caso de hipertensão arterial tratamos com diuréticos, substâncias inibidoras da acção de angiotensina II.

(slide 3)(ler slide)Glomérulo é envolvido pela cápsula de Bowman. O filtrado passa primeiro para o espaço de Bowman e depois para dentro da cápsula e posteriormente para o túbulo renal onde sofre variadas alterações.Nefrónio – conjunto do glomérulo e do túbulo renal (unidade funcional do rim).Cada nefrónio “é” o rim (como os hepatócitos). O trabalho do rim é o somatório do trabalho quantitativo dos 2.000.000 milhões de nefrónios.O nefrónio é a estrutura funcional. Depois o excretor é o ureter, a bexiga e a uretra.Algumas substâncias têm de ser excretadas e não são metabolizadas, têm de ser excretadas tal e qual estão. Seria o fígado a metabolizar. A ureia por exemplo, não é lipossolúvel, é hidrossolúvel, mas têm as dimensões para ser excretada por um filtro, e o filtro é o rim.Existem outras substâncias muito tóxicas cuja concentração não pode exceder níveis relativamente baixos. Se nós produzimos muito de uma substância para o sangue, temos de a excretar no rim, de modo a manter os níveis baixos. Assim o filtrado glomerular terá caracteristicamente um grande volume.Por exemplo a creatinina, que é talvez um paradigma porque é uma substância química, produto do metabolismo muscular normal, que todos produzimos só pelo facto de estarmos vivos, mesmo que não se coma nada, mesmo que não se produza praticamente ureia. Produzimos cerca de 20-25 mg de creatinina por kg, por dia. No entanto esta concentração não deve exceder 1 mg/dl.São filtrados cerca de 180 l diários de água. A perda de todas as substâncias filtradas é compensada pelos túbulos renais, pela reabsorção (tal como a água).

(slide 4)(ler slide)

(slide 5)(ler slide)

(slide 6)(ler slide)

(slide 7)Por qualquer causa das já referidas há lesão renal.(ler slide)

(43:18) (atende o telemóvel…=P)

Cada nefrónio sobrevivente passa filtrar mais, daí a não proporcionalidade entre a diminuição do número de nefrónios e a diminuição da quantidade de filtrado.

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No entanto, como dissemos, os mecanismos de hiperfiltração e hipertensão renal são causas da lesão renal.Esta compensação imediata é uma das causas da lesão renal progressiva e da insuficiência renal progressiva, vai aumentar a esclerose e a progressão da doença.

(slide 8)(ler slide)Insuficiência renal terminal é também denominada falência renal.

(slide 9)O nefrónio ou não funciona, ou funciona em excesso para compensar os que se perderam.Não há nefrónios “de reserva”, todos eles estão a funcionar, só que num nível basal. Há a capacidade de aumentar essa função entre 30% a 50%.

(53:09) (slide 10)(ler slide)

(slide 11)Cerca de 99% da água e sódio são reabsorvidos. Praticamente 100% do bicarbonato, que não se pode perder.

(1:01:17) (slides 12 a 20)(ler slide)

(slides 20 a 24)(ler slides)Potássio é tóxico. O excesso pode provocar paragem cardíaca.

(slide 25)Há equilíbrios que são fundamentais para o organismo:- Eléctrico;- Ácido – básico;- Etc.A regulação da quantidade de cada substância em circulação depende da filtração e da reabsorção.

2ª Parte (1:40:45)

Equilíbrio Ácido – base (slide1)(ler slide)

(slide 2)(ler slide)O organismo tenta manter uma concentração de hidrogeniões livres entre 35 e 45 nmol, é uma quantidade infinitesimal. Vêm o cuidado que o rim tem de não depender de um mecanismo físico de filtração e reabsorção, mas reabsorvendo todo e depois numa determinada zona extremamente especializada e com um controlo extremamente apurado por sistemas hormonais que respondem à situação do organismo, sabemos

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exactamente quantos hidrogeniões tem de eliminar. Elimina como? Por troca com o sódio. Porque? Porque quando elimina uma valência positiva, tem de reabsorver uma valência positiva ou perder uma valência negativa. Porque o somatório das cargas positivas e negativas no organismo se mantenha estabilizada. O controlo dos ácidos voláteis é feito pela função pulmonar. Se houver uma insuficiência respiratória há uma acidose respiratória.Ácidos fixos são ácidos clorídricos, sulfídricos, fosfóricos que tem que ser eliminados pelo rim.

(slide 3)(ler slideÁcido carbónico é um ácido fraco, acido sulfúrico e fosfóricos são ácidos fortesÁcido láctico é transformado em bicarbonato no fígado, este tem uma grande capacidade metabolizar o acido láctico e só nas insuficiências hepáticas extremamente grave é que há acidose láctica

(slide 4 e 5)(ler slide)O sistema tampão fundamental é o sistema bicarbonato

(slide 6 e7)(ver slide)K - constaste de dissociação do ácido carbónico. Os dois últimos pontos são concentraçõesPCO2 pressão parcial de CO2

(slide 8 e 9)(ler slides)A tese fundamental nesta explicação é que o tampão fundamental do organismo é o bicarbonato e é ele com que trabalhamos, é ele com que avaliamos o equilíbrio ácido – base no organismo, o bicarbonato faz parte daquela eq. chamada de Henderson-Hasselbach, em que nos chega a conclusão se for resolvida que o pH é igual ao pK que é uma constante mais o log do bicarbonato sobre o ácido carbónico que é igual PCO2 x 0,03.

(slide 10)(ler slide)O pH varia com o valor do numerador e denominador. Depende da relação entre ambos.CO3H- componente metabólico, PCO2 componente respiratório Se o rim retiver hidrogeniões, o bicarbonato baixa, porque o bicarbonato é consumido no tamponamento dos ácidos fixos Se um indivíduo tiver uma insuficiência respiratória, o CO2 aumenta

(slide 11 a 13)(ver slide)Alcalémia – pH alto, acidémia – pH baixo. Bicarbonato alto – alcalose metabólica, porque se não houver alterações do PCO2 o valor da fracção sobe; baixo acidose metabólica, por exemplo, retenção de hidrogeniões numa insuficiência renal ou perda de bicarbonato numa diarreia. PCO2 alto, por exemplo, numa insuficiência respiratória há uma acidose respiratória; baixo, por exemplo, numa situação de stress onde há hiper ventilação há uma alcalose respiratória.

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Compensações:Pode haver uma acidose metabólica, por exemplo, e não haver variação do pH, se houver retenção de hidrogeniões e baixar o bicarbonato, enquanto não há reposição da situação anormal à que manter a todo o custo um pH normal, o organismo manda fora CO2, hiper ventilando, por outro lado vai buscar bicarbonato ao osso, transformando o carbonato de cálcio em bicarbonato. Agora supondo ao contrário, que o indivíduo vomitou, que é uma causa de alcalose metabólica, o organismo ventila menos, retendo CO2. Mas tudo tem um limite, estas compensações não são infinitas.

(slide15) (ler slide)O rim filtra uma grande quantidade de bicarbonato, porque tem que fazer grandes filtrações de água para filtrar e eliminar todo o que são produtos do catabolismo proteico. O bicarbonato é uma pequena molécula e passa livremente a barreira juntamente com a água, isto é, a concentração de bicarbonato no filtrado é igual a concentração de bicarbonato no plasma. O rim não pode perder bicarbonato, por isso, reabsorve todo o bicarbonato que filtra, se houver uma ingestão de grande quantidade de bicarbonato, então aumenta a eliminação. Mas para manter o bicarbonato em 24, em situação normal, todo o bicarbonato que é filtrado é reabsorvido.Por cada hidrogenião que o rim elimina, regenera e aumenta para circulação um ião de bicarbonato, mas ao fim do dia, ele eliminou toda a valência ácida que produziu e regenerou todo o bicarbonato que tinha sido consumido para a tamponar

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Engenharia Biomédica – 3º ano, 1º semestreMecanismos Gerais da Doença (2006/2007)

Professores Conceição Coutinho e Cecília Monteiro

Aula desgravada por Joana Baptista e Diana Nunes

Então,para terminar a discussão das diferentes insuficiências de órgãos, hoje vamos falar de insuficiência respiratória.Mais uma vez, se vocês tiverem minimamente presentes os conhecimentos de fisiologia, isso não é nada de complicado. Complicado é saber usar um computador.Ok. Função do aparelho respiratório, a principal função do aparelho respiratório, é garantir a entrega de oxigénio às diferentes células do organismo e garantir a remoção do produto do metabolismo das células do dióxido de carbono. O aparelho respiratório tem obviamente outras funções, por exemplo, a eliminação do dióxido de carbono, tem um papel na regulação do equilíbrio do pH. Vocês falaram nisso na aula passada. Portanto, o pulmão é um dos órgãos reguladores do pH sanguíneo. Depois como todo o sangue é filtrado pela rede arterial..err… rede venosa pulmonar, isso faz daquela rede venosa um sítio óptimo para, por exemplo, inactivar uma data de substâncias ou activar uma data de substâncias. Tá bem? Mas tudo isso são, digamos, não são funções secundárias, mas não são a função principal que nós vamos falar hoje. Nós vamos falar da função de trocas gasosas.Em termos esquemáticos nós podemos pensar no aparelho respiratório em dois componentes: um componente que é a bomba ventilatória, que é constituída pela caixa toráxica e os músculos respiratórios e pelo seu controlo nervoso, no sistema nervoso central. E por outro lado, a parte parenquimatosa onde se dão as trocas propriamente ditas do pulmão, que é um conjunto de unidades funcionais, a unidade alvéolo-capilar. E essa distinção entre estas duas funções é importante porque nós sabemos que podemos ter insuficiências ou falências do aparelho respiratório por falências primárias do parênquima ou por falências primárias da bomba ventilatória. E as consequências vão ser diferentes. Vocês ainda têm isso vagamente presente isso da fisiologia, penso eu, os volumes e as capacidades ventilatórias, os volumes, para rever, são primários, as capacidades resultam da adição de vários volumes, o volume corrente é o volume que é mobilizável numa respiração normal, não forçada, o volume de reserva funcional é aquele que não pode ser mobilizado, aquele que fica no pulmão mesmo depois duma expiração forçada. A capacidade pulmonar total é a capacidade intra-toráxica no fim de uma inspiração forçada. Então, falando de ventilação:a ventilação e o trabalho ventilatório depende de propridades estáticas e de propriedades dinâmicas do aparelho respiratório. Esta curva, a curva da compliance, ou curva da capacidade pulmonar, descreve, como o termo define, a variação do volume em função das variações de pressão aplicadas. O pulmão tem uma certa distensabilidade e uma certa elasticidade, e a sua distensabilidade é máxima

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Aula 11 – 6 de Dezembro de 2006Tema: Falência de Sistemas III

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quando ele está completamente [ ? ], ou seja, o volume residual, e é mínima na expansão máxima, capacidade total. Obviamente que a parte da curva onde se desenvolve menos trabalho, para insuflar o pulmão é na parte mais próxima do volume residual, e o trabalho, quando já estamos próximos da capacidade total é imenso. Se vocês inspirarem, façam uma inspiração profunda e depois a seguir a isso tentem inspirar mais e percebem que têm de desenvolver um esforço enorme e não conseguem fazer variar mais o volume de gás intra-toráxico. A elasticidade do pulmão depende de, para além das fibras que constituem o parênquima do colagénio, da elastina, que lhe conferem essa elasticidade, depende também, em grande parte, do surfactante. O surfactante é um constituinte que reveste a membrana alveolar, que é constituído por fosfolípidos e por proteínas, e cuja função é separar a interface entre a água e o ar e portanto diminui a tensão superficial. As vantagens são, para já, impede o colapso dos alvéolos, obviamente a tensão superficial tenderia a fechar os alvéolos, diminui a força que é necessária para expandir os alvéolos cada vez que há insuflação pulmonar. Porque diminui a tensão que contraria essa expansão. E impede, na prática, que os alvéolos sejam inundados por líquido a partir do espaço intersticial, segundo esse gradiente de tensão na mesma. Depois, o trabalho ventilatório, para além do trabalho necessário desenvolver para vencer a elasticidade pulmonar, é o que consiste também no trabalho necessário para vencer a resistência ao fluxo nas vias aéreas. E o fluxo é habitualmente, ou melhor, a resistência depende sobretudo do diâmetro das vias aéreas, do calibre das vias aéreas, com uma pequenina nuance. É que a resistência é máxima não nos bronquíolos mais distais mas nos brônquios de médio calibre. Por uma razão muito simples, nessa zona o fluxo deixa de ser laminar e passa a ser um fluxo turbulento e portanto a resistência é proporcional ao débito nessa zona, nos bronquíolos mais distais, como a área de secção é muito grande, o débito é muito menor e portanto a resistência volta a diminuir um bocadinho. E retenham esta imagem porque daqui a bocadinho, quando falarmos de patologias das vias aéreas, vão perceber porque é que a resistência neste ponto é tão importante. Falámos da parte da ventilação e agora a parte das trocas gasosas propriamente ditas. As trocas gasosas dão-se por difusão simples dos gases. Para isso o que é preciso? Têm, em corte, a unidade alvéolo-capilar.Então o que é que têm? Deste lado o alvéolo, com pneumócitos que preenchem, que revestem o alvéolo, e encostado ao alvéolo um capilar sanguíneo. Para que as trocas se dêem, têm entre estes dois espaços um capilar sanguíneo. Para que as trocas se dêem entre estes dois espaços é preciso ter ar entre o alvéolo, sangue dentro do capilar e uma membrana que permita ser atravessada pelos gases por difusão simples. O dióxido de carbono apesar de ter um peso molecular muito mais elevado que o do oxigénio, difunde muito mais prontamente naquela membrana do que o oxigénio, por ser muito mais solúvel do que o oxigénio. O que significa na prática que nós conseguimos, quando ventilamos mais, quando respiramos mais depressa, quando fazemos ventilações mais profundas, nós conseguimos «melhorar muito melhor»(???) as trocas de dióxido de carbono do que de oxigénio. Está bem? As trocas do oxigénio são muito mais dependentes das diferenças de pressão e menos desse efeito de lavagem alveolar. Como para que as trocas gasosas se dêem nós precisamos de reunir essas mesmas condições, alvéolos ventilados, capilares profundidos, nós sabemos que ao longo do pulmão todo as condições não são exactamente iguais. Os alvéolos mais apicais tendem a estar mais ventilados porque a pressão pleural é mais negativa nesta zona mas, para contrabalançar isto, como as bases pulmonares são mais compliance, são mais distensíveis, em cada inspiração há uma maior distribuição de volume às bases do que propriamente aos ápices pulmonares. A distribuição do sangue

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também obedece à lei da gravidade e portanto também é maior nas bases. A importância disto é que nós temos de ter um equilíbrio, digamos um match entre a ventilação e a profusão. Se isso não acontece vamos ter isto. Então, duas situações limite: numa situação limite ao alvéolo não chega ar nenhum, o álveolo não está sequer ventilado mas é adequadamente profundido. O que é que acontece? Todo o sangue que chega aquele alvéolo que não está ventilado passa e sai do pulmão exactamente com a mesma constituição em termos gasosos com que entrou, ou seja, não trocou oxigénio, não trocou dióxido de carbono e isto nós chamamos efeito de Shunt. A situação limite oposta é uma coisa deste tipo em que o alvéolo é adequadamente ventilado mas não há perfusão capilar desse alveolo. É exactamente a mesma coisa, não há possibilidade de ocorrer trocas gasosas, e portanto, há trabalho ventilatorio que é gasto, para ventilar um espaço morto capilar, que não é útil para trocas gasosas. Em qualquer uma destas situações, o que acontece é que estas alterações, a consequência é que vai haver uma diminuição na pressão do oxigénio no sangue periférico e um aumento na pressão do dióxido de carbono, e há quimiosensores no sistema arterial distribuídos pelo corpo todo que denotam essas alterações e que estimulam os centros respiratórios, para aumentar a frequência respiratória para promover uma mais eficaz troca gasosa. Dai resulta, habitualmente conseguimos com o dióxido de carbono efectivamente elimina-lo bem, aumentando a frequência respiratória, mas para o oxigénio isso já não é assim tão linear. Como apesar de tudo em circunstancias nós temos algum volume de reserva respiratório, podemos aumentar um bocadinho a oxigenação do sangue aumentando a nossa frequência e amplitude dos movimentos respiratórios, mas só ate determinado ponto. Na partica, se esse limite de compensação for ultrapassado qualquer uma destas situações se irá traduzir por hipoxémia. Está bem?Ou seja, alterações parenquimatosas quer dos alvéolos, quer dos vasos, e se calhar vocês conseguem pensar numa situação para cada uma destas coisas, imaginem porque é que um alvéolo poderia não estar ventilado?Alguem: “…”.Professora: “Por exemplo, porque?”.Alguém: “…”.Professora: “Ou grandes… Por exemplo, uma criança que mete um berlinde pelo nariz dentro. E este, vai pela arvore e pela traqueia, pelo brônquio direito habitualmente, e impacta num brônquio de médio calibre. O que acontece é que rapidamente o ar que está para além desse brônquio obstruído vai ser absorvido e os brônquios colapsam! Por exemplo, pode ser isso! Mas pode não ser um corpo estranho, pode ser por exemplo um tumor a crescer dentro do brônquio, ou pode ser uma patologia não da via aérea mas mesmodo alvéolo porque por exemplo, uma pneumonia, tal como um processo inflamatório noutro sitio qualquer, desencadeia um (…) inflamatório. E se esse (…) inflamatório, aquela mistura de bactérias, de proteínas, de neutrófilos, todo aquele caos da resposta inflamatória ocupar precisamente o alvéolo, está a ocupar a zona onde deveria existir ar, que não existe não é? Portanto uma pneumonia pode funcionar como um mecanismo deste tipo, criar um efeito de shunt.”Professora: “E um exemplo deste tipo? Um exemplo de espaço morto alveolar? Isto têm a obrigação de me dizer! Já pensaram nisto noutras aulas.”Alguém: “(…)”Professora: “hm..? Sim sim sim sim! Quem é que disse? Pode ser um trombo! Por exemplo, um trombo embolismo pulmonar causa precisamente isto, não é? Há um bloqueio na circulação, o que significa que todos os capilares dependentes desse ramo que foi ocluido, não vão ter sangue. E portanto todas as unidades desse ramo, não vão

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ser profundidas e, portanto, há uma grande quantidade de espaço morto alveolar que não é útil para as trocas gasosas. Ok?”.Claro que na prática, para já é assim… dificilmente nós temos as situações limite, o que nós temos é desequilíbrios que tendem num sentido ou noutro, ou seja, desequilíbrios em que há uma hipoventilação, ou desiquilibrios em que temos uma hipoperfusão, mas as situações limite não são propriamente habituais. E de qualquer das maneiras podem ate coexistir diferentes processos patológicos que podem causar uma ou duas coisas. A consequência final é habitualmente a mesma, que é a hipoxémia. Esta bem?A hiper(…, ou seja,a retenção de dióxido de carbono, geralmente so acontece, e este processo é muito extenso, se intersecta(?) tantas unidades alvéolo capilares que ate as trocas do dióxido de carbono são comprometidas, ou se não há capacidade de fazer a tal resposta compensadores por exemplo, por fadiga muscular. Por exemplo, um doente entra com uma pneumonia, tem uma situação deste tipo constante(?) numa porção significativa do seu pulmão, o que ele faz é respirar mais depressa e mais fundo (está com falta de ar) para tentar compensar as trocas gasosas, mas ao fim de algum tempo esse esforço físico esgota-se e a pessoa deixa de ser capaz de manter esse esforço físico e deixa de ser capaz d manter essa ventilação tão elevada e começaa falhar a própria bomba ventilatoria. Já estamos a falar de uma falência diferente. Não é falência parenquimatosa, não é falência das trocas gasosas é uma falência da própria bomba ventilatoria. Ok?Quando as alterações da relação ventiçação/perfusão são mais subtis nos podemos não notar, não conseguir medir, quando medimos os gases, a pressão parcial dos gases no sangue periférico, nos podemos não notar alterações absolutas muito grandes, mas se nos medirmos o gradiente alvéolo arterial, ou seja, a diferença entre a pressão de oxigénio no alvéolo, que é aquela do ar inspirado (pode ser o ar ambiente, ou qualquer outra mistura de gases que nos administremos ao doente), e a pressão de oxigénio que nos determinamos, porque podemos medir, no sangue arterial do doente. Nos sabemos que existe sempre uma diferença muito pequenina, por causa do shunt que existe fisiologicamente, por causa das veias brônquicas, mas se esta diferença estiver alargada isso implica que há um processo qualquer que esta a alterar a difusibilidade dos gases. Ok? Um dos mecanismos de adaptação que o organismo já tem programado para responder a isto é este mecanismo da vasoconstrição pulmonar hipoxica, ou seja, o nosso organismo é capaz d detectar alvéolos que são hipoventilados, e detectar essa hipoxia alveolar e fazer a compensação adequada. Para que as trocas sejam adequadas, o que interessa é que em cada unidade haja um equilíbrio da relação ventilação e perfusão, esta bem? Alvéolo – vaso… Vocês conseguem ver?Mais ou menos? Alvéolo e vaso, o que interessa é o equilíbrio, se isto diminuir, a resposta adequada aqui diminuir também e portanto a relação entre os dois fica constante. Ou seja, não há desperdício de sangue que passa por um alvéolo que está pouco ventilado. E se este capilar levar menos sangue significa que os outros capilares que passam por alvéolos não adequadamente ventilados levam mais sangue e as trocas são optimizadas em cada unidade funcional, certo? Portanto a resposta é esta: quando diminui a pressão de oxigénio dentro deste alvéolo, este capilar ou arteriola pré-capilar, sofre uma vasoconstrição para diminuir a quantidade de sangue que passa aqui que é a tal vaso-constrição pulmonar hipóxica, tende a equilibrar a relação ventilação - profusão. Isto é, funciona muito bem desde que não seja generalizada a uma parte muito importante do pulmão. Se isto ocorrer com uma percentagem que acho que é da ordem dos 30-40% do parênquima pulmonar, qual é que é a consequênica?Imaginem a vaso-constrição duma área de secção enorme duma quantidade de arteríolas… exactamente, a pressão na artéria pulmonar sofre, e essa hipertensão

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pulmonar depois vai ter consequências para trás. Reflecte-se onde, a hipertensão na artéria pulmonar? No ventrículo direito. E a consequência duma hipertensão pulmonar crónica é um aumento duma sobrecarga de pressão crónica sobre o ventrículo direito, que ao fim de algum tempo deixa de conseguir responder a esse aumento de pressão e entra em falência. Pode dar uma insuficiência do coração direito. Tem um nome, [????pulmonal]. Na prática é isto, isto é uma das consequências de insuficiências do aparelho respiratório crónicas, como habitualmente este mecanismo demora tempo a desenvolver-se, pessoas que tenham insuficiências respiratórias crónicas,por causa deste meanismo, eventualmente podem haver outros, nomeadamente destruição dos próprios capilares, ou obstrução por trombos, mas predominantemente por causa deste mecanismo da vaso-constrição hipóxica desenvolvem hipertensõe s pulmonares que se reflectem sobre o coração direito e acabam por desenvolver insuficiências cardíacas do coração direito, ou seja, [?? Pulmonal].Tá bem? Então, em termos de classificação nós podemos falar de insuficiências respiratórias parciais em que apenas há hipoxémia e nós referimos hipoxémia para valores de pressão de oxigénio no sangue arterial inferiores a60mmHg ou insuficiências respiratórias globais em que para além da hipoxémia temos retenção do dióxido de carbono, ou hipercapnia(??), ou seja, pressões de dióxido de carbono superiores a 50 mmHg. Na prática era aquilo que eu vos dizia, como doenças do parênquima que estejam relativamente localizadas nós podemos compensar ventilando mais e conseguimos dessa maneira eliminar o dióxido de carbono, geralmente esse tipo de doenças dão insuficiências respiratórias do tipo I, quando temos insuficiências respiratórias do tipo II, ou globais, quando também temos retenção de dióxido de carbono, é porque há falência da bomba ventilatória. Há sempre falência de bomba quando a insuficiência é global.Tá bem? Ok.Então vamos falar de algumas causas, alguns exemplos típicos de patologias respiratórias. Então, já falámos um bocadinho disto. Pneumonias. O processo inflamatório no pulmão é exactamente como um processo inflamatório noutro sítio qualquer. Há uma resposta inflamatória do organismo para eliminar o agente agressor, forma-se um esxudado(??) inflamatório, só que com a pequenina nuance que um esxudado inflamatório dentro dum alvéolo impede as trocas alveolares. Tem outra consequência, o facto de o pulmão estar preenchido por este esxudado inflamatório, por líquido na prática e não por ar, significa que a compliance do pulmão diminui, e portanto o trabalho ventilatório para conseguir ventilar mesmo [as áreas que não são poupadas(?????) isso aumenta muito, ok?A imagem de raios-X traduz precisamente os espaços alveolares preenchidos por líquido e que por isso aparecem menos transparentes no raio-X, aparecem brancas, zonas de condensação, ou seja, zonas em que há líquido em vez de haver ar. Naquela imagem é um corte histológico em que o alvéolo está preenchido por esxudado [não percebo nda desta merda], aqueles pontinhos são neutrófilos e restos necróticos.Disto falaram há bocadinho, sim?Então…mais uma vez isto é um raciocínio hidraúlico, não é? Um raciocínio mecânico…Se há uma falência do coração esquerdo, há congestão e há congestão a montante e o que fica a montante do coração esquerdo é a circulação pulmonar. Há congestão venosa pulmonar e há saída de líquido por aumento da pressão hidroestática para os espaços alveolares. Na prática num raio-X vemos exactamente a mesma coisa, zonas de hipotransparência são as zonas em que há edema alveolar, os alvéolos estão inundados por líquido, tá bem? Aqui a distribuição obedece à gravidade, não é? Nas zonas mais basais do pulmão são as zonas que estão mais inundadas porque as zonas onde passam na gravidade a pressão hidroestática é maior. Nesta imagem também vêm

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o coração alargado. Lá está, é um coração insuficiente que nesta fase já está muito dilatado e que causa este edema que é um edema que ocupa quase a superfície pulmonar toda. Mas isto tem graus, por exemplo, os doentes mais bem compensados com uma insuficiência cardíaca relativamente pouco simpática(?) podem ter edema só na parte de baixo, nas bases. E por exemplo quando nós ouvimos esses doentes conseguimos ouvir um ruído característico que são fervores de (???) 24.23 estase/espase (?) que é precisamente o liquido a borbulhar, mais ou menos, que isto é uma imagem, dentro dos alvéolos e conseguimos ver só no () da base e à medida que a gravidade da doença aumenta vão progredindo para cima. Este doente estaria sempre com dificuldade respiratória em qualquer posição mas um doente que tivesse inundação das bases só estaria confortável sentado. Se se deitasse a distribuição do edema ocupava muito mais a área do pulmão e por isso a pessoa teria mais dificuldade em respirar. E isso é um dos sinais de insuficiência cardíaca. Falaram disto há bocado, a ortopneia. Mas podem haver muitas outras causas de edema alveolar que não cardiogénico. Cardiogénico já falámos, depois podem haver outras causas para que haja saída de líquido dos capilares para dentro dos alvéolos. Pode acontecer por exemplo porque há perda de pressão oncótica que tende a manter o líquido dentro dos vasos. Isto acontece comumente quando há perda de proteínas do plasma, isto pode ser por exemplo por uma insuficiência hepática, há menos produção d albumina pelo fígado, ou por doenças renais em que ou há perda de proteínas ou há retenção de líquido e duma maneira ou de outra o que acontece é que há um desiquilíbrio e a pressão oncótica é insuficiente para manter a água dentro dos vasos, ou pode haver por exemplo lesões que não atingem o pulmão, ou melhor, pode haver um conjunto de agentes de lesão que atingem o pulmão quer por via inalatória quer por via da circulação sanguínea, e quer dum lado ou do outro da barreira alvéolo-capilar, lesar essa barreira e impedir essa função de barreira, portanto o líquido que consegue sair do capilar para dentro do alvéolo. Todas essas causas por contraposição com as causas cardíacas nós chamamos edema pulmonar não cardiogénico. Precisamente porque nós tratamos de maneira muito diferente, enquanto num edema agudo do pulmão de causa cardiogénica o que nós vamos tratar é o coração, nas outras causas nós vamos tratar o pulmão, em princípio o coração está bem.Já conhecem esta sigla? A.R.D.S., significa síndrome de dificuldade respiratória aguda. Antigamente, e se calhar também vão encontrar nalguns livros, vão encontrar esta sigla como síndrome de dificuldade respiratória do adulto, porque é um síndrome muito parecido com o que os bébés prematuros apresentam. E portanto por contraponto com o síndrome de dificuldade respiratória num recém-nascido chamávamos síndrome de dificuldade respiratória do adulto. Mas como nos agora percebemos melhor a fisiopatologia de um e de outro, já não chamamos do adulto, chamamos só agudo. Na prática o que é que acontece? Por diferentes causas, qualquer uma das diferentes causas de edema não cardiogénico, nós podemos ter basicamente isto, os alvéolos inundados, tá bem? No fundo são todas as possíveis causas de edema, só que num grau extremo em que os pulmões estão quase totalemente preenchidos por líquido dentro dos alvéolos, o que significa que há uma insuficiência respiratória grave como uma hipoxémia muito grave e refractária, e que mesmo fazendo ventilação mecânica a estes doentes nós temos muita dificuldade em conseguir assegurar as trocas ventilatórias. Precisamente porque os pulmões estão completamente cheios de líquido, os pulmões são muito rígidos e muito difíceis de ventilar. Um das coisas que é determinante não é só mas é uma das coisas que contribui para esta situação, é precisamente a destruição do surfactante. Recordam-se? As funções do surfactante eram, entre outras, diminuir a tensão superficial dentro dos alvéolos, e portanto facilitar a expansibilidade dos alvéolos, diminuir o trabalho que era necessário fazer para expandir os alvéolos e impedir que os

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alvéolos ficassem inundados por liquido. Por isso qualquer mecanismo de lesão que destrua o surfactante contribui para uma progressão para uma coisa deste tipo em que os alvéolos estão totalemente inundados. O que acontece nos recém nascidos muito prematuros é que ainda não têm maturidade pulmonar suficiente e portanto não produzem a quantidade de surfactante suficiente. E então têm uma coisa deste tipo, porque não têm surfactante para assegurar que os pulmões fiquem secos. ~No tromboembolismo pulmonar também já falámos, aqui também conseguem perceber o que é que falha. Habitualmente o trombo vem doutra zona qualquer da circulação, habitualmente não se forma ali in situ, é um trombo que é formado habitualmente numa veia distal, tipicamente do membro inferior ou da bacia, que se solta, se desprende, e vai alojar-se,vai passar a veia cava, vai passar o coração direito e depois aloja-se num sítio que tenha um calibre menor do que o trombo, que é algures na árvore arterial pulmonar. E as consequências dependem do tamanho do trombo e da percentagem da árvore arterial pulmonar que fica ocluida. Se um trombo ocluir a artéria pulmonar, o resultado é a morte por falência pulmonar? (vozes) É morte definitivamente. Mas é assim, para além de que o sangue não consegue ser oxigenado, o sangue não circula de todo, todo o sangue tem que passar sempre pela artéria pulmonar, prossegue do nosso coração da artéria pulmonar (*pop*), instantâneo. Isso é relativamente raro. Mas se tiveres um êmbolo alojado numa artéria não na pulmonar mas numa das de grande calibre, ou muitas de pequeno calibre, o que acontece é, para além das consequências respiratórias, ou seja, para além de não haver sangue suficiente a ventilar os alvéolos e portanto terem aquele fenómeno de ventilação de espaço morto, recordam-se? Cuja consequência era… (vozes) Professora: hum, hum, hum. Então, não chega sangue, portanto temos um mecanismo de ventilação de espaço morto, não era? As trocas não se dão eficientemente, mas há um dos gases que é mais afectado que o outro. É o oxigénio, os doentes apresentam-se com hipoxémia, tá bem? Nas situações intermédias entra um trombo muito periférico em que apenas afecta as trocas gasosas mas o débito cardíaco está relativamente conservado porque apesar de tudo há sangue suficiente a circular através do pulmão para chegar ao coração esquerdo, isso é o único sinal, a única manifestação é a hipoxémia, mas nos casos intermédios o que pode acontecer é que haja uma obstrução suficientemente significativa ao sangue que circula pela artéria pulmonar para haver também uma insuficiência cardíaca por obstrução. Porque não há sangue suficiente a chegar ao ventrículo esquerdo e portanto o débito cardíaco também baixa, porque não há retorno ao ventrículo esquerdo.Agora já não estamos a falar do parênquima, vamos falar das vias aéreas. Doenças das vias aéreas. A asma é uma doença inflamatória das vias aéreas, que resulta dum mecanismo de hipersensibilidade a alguns alergenos, ou seja a substâncias estranhas que quando são inaladas desencadeiam uma resposta inflamatória por parte do hospedeiro e esta resposta é habitualmente desadequada porque, por definição, essas substâncias não são nocivas por si, simplesmente o organismo monta uma resposta que é totalmente desadequada e por isso nós dizemos que é uma resposta de hipersensibilidade. E as consequências da resposta inflamatória vão ser, imaginem que aquelas partículas que são inaladas seriam mesmo nocivas, que é assim que o organismo hipersensível as vê, a cena nociva da defesa adequada é impedir que elas cheguem mais longe, e portanto a nível das vias aéreas de médio e pequeno calibre, o que acontece é, para já uma constrição do musculo liso que envolve essas vias aéreas, para impedir que o ar que leva estas partículas chegue mais longe, depois um aumento da secreção da mucosa brônquica que retém essas partículas e que depois as expele com a tosse. Na prática o que é que acontece? Quer pela bronco constrição, quer pelo edema e pelas secreções, o

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calibre desses brônquios diminui significativamente, e isto não está a acontecer apenas num bronquíolo, está a acontecer em toda a árvore respiratória ao mesmo tempo. E o que é que isto significa? O que é que acontece à resistência das vias aéreas? Aumenta muito, muito. O que significa que o trabalho ventilatório é imenso. E depois uma coisa que tem a ver com as propriedades elásticas do próprio pulmão, enquanto que a inspiração é um processo activo em que os músculos ventilatórios contraem para expandir a caixa toráxica e as forças elásticas expandem o pulmão, e portanto na prática o que acontece é que isto tende a abrir um bocadinho as vias aéreas, na inspiração, a expiração é um fenómeno que é totalmente passivo, depende da elasticidade na mesma, do recoil(?) elástico do pulmão para haver a exalação, para haver a expiração. Se houver uma obstrução deste tipo quando se perde o suporte elástico, ou seja, na expiraçao perde-se o suporte elástico e as vias aéreas colapsam e portanto o ar fica preso. Esta bem? E isto, imaginem vários ciclos em que isto acontece, os pulmões ficam hiperinsuflados com o ar ficar sempre preso distalmente a esta obstrução. E o que é q acontece? Recordam-se do primeiro gráfico da compliance pulmonar? Quanto mais próximo da capacidade vital, maior era a resistência, portanto, menor era a compliance e portanto maior era o trabalho que era preciso desenvolver para conseguir insuflar mais o pulmão, ou seja, já era preciso vencer a resistência das vias aéreas para ventilar, depois era preciso tabalhar a partir de uma fase m que o pulmão está tão insuflado, em que o próprio trabalho ventilatorio aumenta so por essa razão. Na practica é preciso desenvolver imenso trabalho ventilatorio para conseguir ventilar. E o que acontece é que quando estes doentes entram em fadiga (e entram rapidamente em fadiga porque este trabalho não se consegue manter durante muito tempo) entram em falência de bomba e entram em insuficiência respiratória elevada, e se não forem apanhados a tempo ou não se derem medidas para inverter esta resposta inflamatória, por exemplo com fármacos que inibem a resposta inflamatória, tipo o dos corticoides, ou com fármacos que actuam sobre o próprio musculo liso e permitem a broncodilataçao e muitas vezes é preciso para alem disso entubar os doentes e fazer uma ventilação mecânica para eles sobreviverem. DPOC. DPOC significa doença pulmonar obstrutiva crónica, mais uma vez é uma doença das vias aéreas sobretudo, mais uma vez a obstrução é o que domina. Em mais de 90% dos casos a DPOC é causada pelo fumo do tabaco e tem duas grandes consequências: as consequências nas vias aéreas e as consequências nos alvéolos. Nalguns doentes predomina uma, noutros doentes predomina outra mas na pratica quase todos os doentes têm um bocadinho de cada coisa. A bronquite crónica que se calhar é um nome que já vos diz alguma coisa, no fundo é consequência nas vias aéreas de ter um irritante crónico em que a mucosa se tenta defender produzindo mais muco, então há uma hipertrofia da mucosa, há uma hipertrofia das glândulas mucosas que produz mais muco para tentar eliminar esse agente agressor, só que ainda por cima como o fumo do tabaco é para o próprio epitelio ciliar e para os próprios cílios do epitelio que promovem a libertação do muco, o muco tende a ficar retido, e portanto têm obstrução quer por edema, por estas alterações, por este espessamento da mucosa, quer porque o próprio muco tende a ficar retido la dentro. E Nos definimos a bronquite crónica clinicamente, ou seja, um doente é um bronquite crónico se tem uma tosse produtiva?, portanto com expectoração, durante mais de três meses durante dois anos seguidos. É um diagnostico clínico. A outra fase da DPOC é o efisema. Quer porque as partículas do tabaco são directamente lesivas para os pneumocitos, quer porque a activação dos neutrófilos, os macrofagos alveolares liberta substancias (vocês recordam-se quando falaram na inflamação) dentro do armamentario(?) das nossas células imunitárias existem susbtancias que são lesivas para as próprias células do organismo e o que mantém isto

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em balanço são as nossas defesas, nomeadamente defesas antioxidantes e defesas antiproteoliticas recordam-se? Só que o problema, é que o tabaco não so activa os neutrófilos e promove a drenadulaçao(?) do seu arsenal lesivo, como ao mesmo tempo inactiva as nossas defesas antioxidantes e antiproteoliticas e portanto há um desiquilibrio entre a agressão proteolitica e as defesas antiproteoliticas, então o que acontece é que há uma digestão das proteínas nos alvéolos, nomeadamente da elastina que constitui a parede dos alvéolos, e a consequência é essa, os ceptos alveolares são destruídos. Vocês deviam olhar para aqui e ver vários favozinhos, tipo uma colmeia, vários favozinhos pequeninos, num corte do pulmão o que veriam, os diferentes alvéolos seriam isto mas uma rede muito mais fina. O que acontece é que estes espaços foram todos alargados porque estes ceptozinhos alveolares foram todos destruídos. Isto na pratica significa que a superfície para haver trocas gasosas diminui muito. E portanto há insuficiência respiratória porque não há zona para se dar as trocas. Por outro lado, recordam-se do mecanismo que vos falei há bocado, na expiração, é a elasticidade deste parenquima ligados as vias aéreas que mantem as vias aéreas abertas durante a expiração e portanto, quando deixa de haver este suporte porque (riso irónico) as fibras foram cortadas, o que acontece é que as vias aéreas tendem a colapsar também na expiração e portanto os doentes com enfisema também têm hiperinsuflaçao, também têm ar a mais dentro do tórax. Depois menos frequentemente, também podemos ter falências respiratórias causadas não por problemas no parenquima propriamente dito, mas problemas por exemplo dos controladores, dos reguladores, por exemplo podemos ter doenças dos músculos respiratórios, por exemplo a miaestenia gravis que é uma miopatia dá uma fraqueza dos músculos respiratórios e pode haver uma insuficiência respiratória por falência dos músculos. Ou por exemplo, nos temos dois centros reguladores da respiração, um voluntário e um involuntário. Habitualmente o involuntário comanda, vocês não têm uma noção consciente da vossa respiração, mas vocês conseguem controlar conscientemente a vossa respiração, se vocês agora quiserem respirar fundo, vocês conseguem fazer isso, não é? Por exemplo, uma overdose de opioides, por exemplo de heroína, inibe o centro automático, e numa overdose de heroína os doentes podem morrer por isso, porque param de respirar. Mas se nos chegarmos ao pe dos doentes e lhes dissermos para respirar, se lhes lembrarmos que eles têm de respirar, se lhes dissermos “agora inspire fundo!!!!!!” (barulho da professora a inspirar), eles inspiram, porque eles ainda têm o controlo voluntário. E depois também pode haver doenças da própria parede e da caixa traxica, pode haver doenças da pleura, por exemplo ar dentro da pleura. Como é que pode la chegar o ar? A cavidade pleurar é um espaço virtual, funciona precisamente para transmitir a pressão negativa gerada pela caixa toraxica ao parenquima pulmonar, não é? ~Alguém: “furar!”Professora: “Furar? Como?” Professora: “Por exemplo por fora, por uma ferida penetrante do tórax, exactamente, e o ar vem de fora, mas também pode ser por dentro, por exemplo…” Alguém: (…)Professora: “Tipicamente isso acontece nos doentes com enfisema, porque eles têm bolhas, zonas onde o parenquima esta destruído onde a pressão é relativamente alta, e pode rebentar, pode o ar vir dos próprios brônquios. Ok?”De uma maneira ou de outra, o que acontece se houver ar dentro da cavidade pleural, a transmissão das pressões não é igual e a expansão pulmonar esta comprometida e portanto dessa maneira a mecânica ventilatoria esta comprometida. Falamos de ar mas podemos falar de outra coisa, de sangue, de liquido ou de tumores que ocupem aquele espaço. Muito resumidamente, em termos de consequências de falência respiratória, as

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manifestações dividem-se em dois tipos: uma são as consequências da hipoxemia e da hipercatnia(?) e outra os mecanismos de compensação ou os sinais dos mecanismos de compensação. Na pratica todos os mecanismos de compensação tentam compensar a baixa de oxigénio no sangue aumentando a entrega por unidade de tempo. Aumentar a frequência respiratória e a amplitude dos movimentos respiratórios, tenta recrutar mais unidades funcionais para optimizar as trocas, aumentar o debito cardíaco significa que, mesmo que cada unidade esteja menos oxigenada, chega mais sangue a casa célula e portanto isso é uma das maneiras de compensar. A hipertensão pulmonar justifica-se por aquele mecanismo que vos expliquei há bocado, e a poliglobulia? (??) O que é que é a poliglobulia? Ou eritrocitose? É um aumento de glóbulos vermelhos no sangue. Se a unidade transportadores do oxigénio, a hemoglobina, que esta contida dentro dos glóbulos vermelhos, se nos tivermos mais glóbulos vermelhos, em condições de hipoxemia relativa nos conseguimos tranportar mais oxigénio certo? É por isso que os atletas vão fazer treinos em altitude, também já falámos disto ou não? Se calhar não foi aqui. Foi? A ideia é mesmo essa, os insuficientes respiratórios crónicos não estão em ambientes de baixo oxigénio como num treino de altitude mas cronicamente têm uma hipoxemia porque tem uma insuficiência respiratória crónica. E a compensação também passa por isso, ter mais glóbulos vermelhos para ter mais oxigénio para entregar as células. Depois as manifestações de hipoxemia são as manifestações de sofrimento hipoxico dos diferentes orgaos e obviamente os orgaos que sofrem mais são aqueles que são metabolicamente mais activos. Nomeadamente o sistema nervoso central, ok?As manifestações da hipercatnia, da retenção de dióxido de carbono são também muito parecidas, simplesmente o dióxido de carbono tem so algumas alterações um bocadinho particulares, ou seja, causa vasodilatação intracraniana e por isso manifesta-se por cefaleias, e se, numa fase inicial , ou seja, para níveis moderados de hipercatnia dá irritabilidade, para níveis elevados dá uma sedação, uma inibição progressiva do sistema nervoso central ate ao coma hipercatnico.Na sequencia do que falaram na primeira parte da aula, vamos falar de choque. A definição está ali. O choque é.. é isto, pronto, por definição é isto, é a incapacidade do sistema cardiocirculatorio de assegurar uma entrega adequada de sangue aos tecidos que precisam desse sangue para o seu metabolismo. Visces conseguem imaginar porque é que isto pode acontecer? Alguém diz qualquer coisa relacionada com choque térmico.Choque é igual a falência circulatória. Alguém volta a dizer qualquer coisa. ~Professora: “Até poderia mas é um bocadinho rebuscado.”(…) Conversa imperceptível (…)O choque anafilático, o que é que acontece no choque anafilático? É uma reacção alérgica sistémica, exagerada. Mas sabem quem é a consequência? Porque é que, essa reacção inflamatória exagerada resulta em falência circulatória, ou seja, a incapacidade do sistema circulatório fazer com que o sangue chegue aos tecidos? O que acontece é uma vasodilatação, porque os mediadores inflamatórios… Pensem em termos locais, quando há um processo inflamatório localmente o que interessa é conseguir fazer chegar à zona da inflamação sangue sufienciente, sangue que leve neutrófilos, que leve anticorpos, que leve as proteínas do plasma que são da coagulação e todo o armamentario para combater a infecção que circula habitualmente no sangue. E portanto a maior parte dos mediadores circulatorios que actuam sobre o sistema circulatório, actuam para produzir vasodilatação e aumento da permeabilidade. Precisamente para que o sangue chegue la e que estes mediadores solúveis do sangue possam sair de la, para o interstício, para montar a resposta inflamatória no local. Isso faz tudo sentido em

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termos locais, agora imaginem que isto escapa do controlo e acontece de maneira sistémica, ou seja, em todos os vasos do organismo, o que é que acontece? Uma vasodilatação brutal, o que é que acontece às resistências, à resistencia? A resistência diminui abruptamente. E o que é que à pressão arterial? A pressão arterial baixa abruptamente. Portanto, a perfusão depende da pressão arterial. Se há uma vasodilatação que é perfeitamente desadequada, ou seja, vocês podem ate ter muito sangue a chegar a sítios onde não é absolutamente necessário e depois têm tecidos que é preciso e não chega la sangue nenhum. Portanto têm sofrimentos esquemicos dos outros orgaos. Ok? No caso de choque anafilatico ainda há mais umas quantas nuances, por exemplo o aumento da permeabilidade o que é que acontece se há aumento da permeabilidade? Há saída de liquido. Então o que é que acontece ao volume circulante? À volémia circulante? Diminui. E para que é que isso contribui também ainda? Se há menos volume circulante também há uma diminuição da pressão arterial, também há menos sangue para fazer chegar aos outros tecidos. Isto é uma das formas de choque. A essas formas de choque, nos chamamos choque distributivo. O nome é ilustrativa. Há uma forma muito mais comum de choque distributivo, que não é por uma reacção anafilatica, mas é também por uma reacção inflamatória sistémica fora do controlo que é o choque ceptico. Em que o iniciador é uma infecção, em que a resposta inflamatória é adequada à inflamação inicialmente, mas que depois escapa de controlo quer porque a infecção é mt grave, quer porque há uma susceptibilidade maior do hospedeiro, há uma progressão dessa infecção que deixa de ser um processo localizado, passa a ser um processo sistémico, e que a dada altura entra numa espiral que nos já não conseguimos agarrar. E o que acontece é uma coisa desse tipo, precisamente porque esses mediadores inflamatórios que estão em circulação entre outras coisas, comprometem a capacidade do sistema circulatório de manter uma perfusão e uma pressão adequadas nos tecidos que precisam.

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Engenharia Biomédica – 3º ano, 1º semestreMecanismos Gerais da Doença (2006/2007)

Professor Afonso Fernandes

Aula desgravada por Susana Ramalho e André Pereira

Passando a cumprir então o nosso programa vamos falar primeiro de

aterosclerose.

[Slide 1] E para vos dar uma ideia mais concreta de como as coisas se passam

temos ali uma pequeníssima história clínica, digamos assim, que fala de um homem de

56 anos que teve uma dor muito intensa na região precordial com irradiação para o

braço. Portanto, doía-lhe o precórdio e braço esquerdo e faleceu um pouco antes de

chegar ao hospital, portanto, já não foi possível fazer nada por este homem de 56 anos

que teve este episódio agudo de dor. A filha contudo contava que o senhor Pedro

fumava, tinha hipertensão arterial e teve vários episódios de dor precordial

(precordialgia) nos últimos meses. Este doente, como é habitual quando se entra no

hospital sem se conhecer a causa de morte, deve ser submetido a uma autópsia para

esclarecimento do que é que se passa e na autópsia, no exame do cadáver, verificou-se

que ele tinha lesões de aterosclerose intensa com lesões obstrutivas, portanto com

obstrução, no território coronário, portanto as artérias coronárias têm aterosclerose com

obstrução nos três ramos. Recordam-se que existe uma coronária direita e uma

coronária esquerda, e que a coronária esquerda depois tem dois ramos, uma

interventricular anterior e uma circunflexa. Portanto, quando falamos em doença dos

três ramos é da coronária direita, da circunflexa e da interventricular anterior. Portanto

com trombose….

O que é uma trombose? É um coágulo intravascular, portanto a trombose

corresponde à coagulação do sangue dentro do vaso, que forma um trombo.

Portanto, com trombose no segmento inicial da artéria interventricular anterior.

E depois também se viu que tinha um enfarte do miocárdio.

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Aula 12 – 13 de Dezembro de 2006Tema: Envelhecimento

Page 136: O conceito de Meio Interior é de alguma forma a …web.ist.utl.pt/~jorgebeira/anotres/mgd/MGD0607... · Web viewPor exemplo, no embrião formam-se membranas entre os dedos, que desaparecem

O que é enfarte? Quando há enfarte há necrose. Necrose significa morte celular,

portanto há uma zona de morte do miocárdio, dos miófitos – células que constituem o

miocárdio. Falámos logo num dos primeiros módulos sobre a necrose isquémica (a

necrose por falta de sangue), e é o que acontece aqui porque há obstrução de uma

artéria. Havendo a obstrução de uma artéria há a necrose por falta de sangue.

Portanto, enfarte antero-septal – parede anterior e septo do ventrículo – muito

extenso.

[Slide 3] Aqui têm o que poderia ser a trombose coronária, reparem isto é um

vaso aberto longitudinalmente, portanto isto é uma estrutura tubular, como são os vasos.

Aqui têm um ramo, reparem há lesões de aterosclerose porque vêm que há aqui lesões

elevadas amarelas, comparem o que está aqui com o que está aqui. E depois não vemos

o resto porque está tapado por um trombo, o tal trombo sanguíneo, o tal coágulo

intravascular que causa obstrução ao fluxo sanguíneo. Portanto o sangue não passa e o

território que está irrigado pelo sangue morre.

Este é o aspecto de um corte transversal de um ventrículo esquerdo com um

enfarte do miocárdio. Portanto, isto é um corte transversal do ventrículo, isto é a

cavidade, isto são os pilares, isto é o miocárdio, isto é o epicárdio. Este é o aspecto

normal do miocárdio e este é o miocárdio necrosado.

Em histologia podemos ver os miócitos necrosados, reparem que não vêm os

núcleos das células, há aqui um núcleo há aqui outro núcleo, mas há muitas destas tiras,

que são as células miocárdicas, que não têm núcleos porque já desapareceram, faz parte

do processo pós-sofrimento isquémico.

E depois há uma infiltração. O que é que acham que são estas células azuis todas

que estão aqui entre as células necrosadas? No miocárdio normal só vêm estas células

grandes em fita que aqui aparecem cor-de-rosa todas juntinhas, com núcleos. São

neutrófilos e/ou macrófagos, o quer dizer que estamos sob um processo de inflamação.

Portanto estas células necrosadas libertam produtos que desencadeiam processos

que levam ao aparecimento de mediadores da inflamação [revejam o módulo sobre

inflamação], que depois chamam os neutrófilos. E o que é que este processo

inflamatório vai ali fazer? Porque que é que há ali um processo inflamatório? Porque há

necrose, portanto há que fazer ali uma reparação. O processo de reparação envolve uma

etapa de inflamação, em geral, na maior parte dos tecidos. Portanto o que há depois é

que remover estas células necrosadas e fazer aqui uma cicatriz porque infelizmente nós

não temos capacidade de renovar as células miocárdicas. Que dizer, não vai haver

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substituição dessas células necrosadas por outras células com função de miócitos. O

miocárdio não tem capacidade regeneradora. Hoje em dia é um desafio para a ciência

encontrar maneira de conseguir a regeneração do miocárdio e admite-se que células da

medula óssea possam ir localizar-se nos tecidos e diferenciar-se nas células desses

mesmos tecidos.

Portanto estas foram as consequências daquela obstrução.

O que nós vamos falar então é de etiopatogénese da aterosclerose, de uma

maneira não muito detalhada.

Aqui têm um aspecto do que são lesões de aterosclerose. Isto é uma aorta aberta

longitudinalmente, portanto estamos a ver o interior da aorta. Isto é a intima e reparem

que esta íntima em vez de ser lisa como seria este bocadinho aqui, é quase normal. Se

toda a aorta tivesse este aspecto era uma aorta quase normal, mas não tem... tem este

ponteado amarelo, tem estas linhas amarelas, tem estas zonas mais elevadas, tem aqui,

pelo contrário, uma zona elevada mas que tem um buraco ao meio. Isto são lesões de

aterosclerose, quando se fala em aterosclerose é isto que estão aqui a ver. É uma doença

da íntima das artérias que causa esta irregularidade da superfície intimal. A estas lesões

amarelas nós chamamos manchas lipídicas (lipídicas de lípidos, daí a cor amarela) e às

lesões elevadas nós chamamos placas. As placas podem-se complicar, por exemplo,

perdendo substância, uma espécie de úlcera, “ferida da placa”, e o problema é que este

material que sai daqui vai circular com o sangue e pode ir entupir artérias pequeninas lá

longe. Em relação à aorta, por exemplo, pode ir entupir artérias do pé.

Aqui vêm cortes transversais de uma artéria coronária com lesões de

aterosclerose, reparem aqui há uma redução muito acentuada do calibre do lúmen.

Quando a redução é superior a 75% não há capacidade de compensar esta redução,

aumentando o fluxo coronário, e então a pessoa tem sintomas e tem sofrimento por isso,

e o sofrimento no miocárdio leva àquela dor que a filha dizia que o senhor tinha,

aqueles episódios dolorosos precordiais, que ele provavelmente tinha quando se

esforçava mais, quando andava mais, porque isso obrigava o coração a mandar mais

sangue para os tecidos periféricos e isso obriga o coração a contrair-se mais, a gastar

mais oxigénio, portanto em princípio tem que ser entregue mais sangue, mas se não é

entregue mais sangue o coração sofre por falta de oxigénio. Esse sofrimento leva à

libertação de mediadores que causam dor, que estimulam as terminações nervosas.

Sabe-se que um desses mediadores é um bem vosso conhecido, é a adenosina. O que é

que a adenosina tem a ver com isto? Porque é que se liberta adenosina? A adenosina

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pode aparecer em concentrações aumentadas na célula na sequência da isquémia.

Porquê? De que é que é feito o ATP? É de adenosina! Quando há a degradação, quando

há falta de energia, o ATP –> ADP –> AMP –> adenosina, e a adenosina passa à

membrana celular, contrariamente ao ATP. Portanto a adenosina sai das células e

estimula as terminações nervosas. E sai das células porquê? Porque houve falta de

energia. E portanto há a tal dor precordial que o doente de que falámos sentia em

episódios quando andava mais ou quando corria, etc. De facto não consegue passar aqui

sangue suficiente para evitar a isquémia.

Aqui a situação ainda é mais grave. Os bons observadores já viram que aqui

além de haver as lesões de aterosclerose, (que é este espessamento brutal da íntima com

depósitos de lípidos, amarelos naturalmente) há um trombo, que causa a obstrução da

artéria.

Toda a gente sabe que a aterosclerose é a principal causa de morte nos países

ocidentais, ditos de maior civilização, através do enfarte do miocárdio, através do AVC.

A aterosclerose é exemplo de uma doença crónica multifactorial e podemos ser curiosos

em relação à forma como se formam estas lesões, como é que aparecem as manchas e as

placas e depois também queremos naturalmente saber o que é que está entre o

aparecimento dessas manchas, placas e trombos e as manifestações clínicas.

E o tudo isto para quê? Para tentarmos delinear estratégias para a prevenção para

a aterosclerose ou para o tratamento dessas complicações.

A aterosclerose dá então enfartes do miocárdio, dá AVCs, dá gangrena dos

membros, a necrose do pé por exemplo, e depois há manifestações doutro tipo que é o

chamado aneurisma. O que é um aneurisma? É uma dilatação sacular, parecem sacos, de

uma artéria. O problema dos aneurismas é que podem rebentar e imaginam que se um

aneurisma da aorta abdominal, que é o que está aqui representado, rebentar, a

probabilidade de um indivíduo morrer é muito grande. É necessário que haja uma

intervenção cirúrgica muito rápida para o salvar. Depois pode também haver enfarte

intestinal, pode haver uma série de doenças crónicas, sofrimento crónico dos órgãos,

tudo isso são complicações da aterosclerose.

Estas placas podem calcificar.

Lesões remanejadas significam lesões complicadas, são complicações das

placas. As placas podem calcificar, ficar com depósitos de cálcio, podem sangrar dentro

da própria placa (o problema é que se há uma hemorragia para dentro da placa esta

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aumenta subitamente de volume e pode levar à obstrução do vaso), podem ulcerar (e

isso liberta êmbolos) e podem ter uma trombose suprajacente.

A aterosclerose é um desafio em termos de compreensão por várias razões. Por

um lado por causa da distribuição electiva quer geográfica quer no próprio indivíduo.

Geográfica porque a aterosclerose é muito mais grave nos países ditos civilizados do

que em África, por exemplo. Isso pode ter a ver com o aumento esperança média de

vida da população? É evidente que se um individuo morre com tuberculose ou cólera ou

febre tifóide aos 20 anos não tem tempo para acumular as lesões da aterosclerose. Mas

mesmo fazendo essa correcção a aterosclerose é mais frequente no ocidente.

Por outro lado há também uma distribuição electiva em termos da árvore

circulatória, de facto a aterosclerose é mais frequente e mais grave na aorta abdominal,

nas coronárias, nos vasos do polígono de Wíllis. É mais grave nesses vasos do que nas

artérias dos membros inferiores e dos membros superiores, por exemplo.

Depois as consequências podem ser diversas, pode causar obstrução mas

também pode causar dilatação (o aneurisma). Tem uma evolução descontínua, há

períodos em que se formam muitas lesões e depois períodos em que se formam poucas

lesões, também não sabemos porquê. E a expressão clínica é muito diversa, isto é, há

quem morra aos 40 anos de enfarte do miocárdio por aterosclerose, e também há quem

morra aos 95 por uma pneumonia, nós fazemos a autópsia e até tem a aterosclerose

muito grave mas não morreu disso, morreu da pneumonia.

[Slide 8] Aqui têm agora a composição das estrias e das placas e vamos

sobretudo preocuparmo-nos como é que elas se foram, sem grandes pormenores. As

estrias e manchas amarelas são constituídas sobretudo por estas células que aqui estão

representadas com pintinhas amarelas, representam células esponjosas que são células

carregadas de lípidos. Estas células ficam com um aspecto esponjoso porque quando se

faz a técnica histológica, incluem-se os fragmentos naqueles blocos de parafina e ao

fazer-se essa inclusão em blocos de parafina usam-se solventes dos lípidos e então tudo

o que é lípido acumulado no citoplasma da célula é dissolvido e quando depois vemos

ao microscópio não vemos os lípidos vemos buracos que correspondem ao sítio onde

estiveram os lípidos. Então as células foram chamadas de esponjosas porque têm os

buracos que estão aqui representadas a azul e a verde porque podem ser de facto de dois

tipos, podem ter origem em macrófagos (a verde) ou podem ter origem em células

muscular lisas (a azul). As células muscular lisas vêm da muscular das artérias para a

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íntima, para captar lípidos na íntima, isto já é a doença aterosclerótida não é a situação

normal.

E depois há um pouco de proteínas, depositam-se algumas proteínas extra

celulares, isto ocupa espaço e faz aquela mancha amarela.

[Slide 9] A placa é isto em maior, claro que há mais células muscular lisas que

foram chamadas aqui da média, agora aqui já vemos toda a estrutura da parede da

artéria, que fazem mesmo uma espécie de carapaça na placa. E depois há mais células

claro, há algumas células inflamatórias, macrófagos, linfócitos, pode haver depósitos de

cálcio (aqui a preto), e depois no centro da placa com muita frequência as células

morrem e os lípidos ficam extra celulares então forma-se ali uma papa amarela que já

não tem uma estrutura celular e que se designa por atere, que era o nome que os gregos

usavam para a papa de cereais. Daí o nome de aterosclerose, esclorose de dureza, de

facto a parede das artérias é dura, e depois tem a papa de cereais. Tudo tem uma

explicação

A aterogénese é a formação das placas, génese dos ateromas. Qual é a hipótese

hoje em dia para a aterogénese? É a hipótese da resposta à lesão que foi enunciada por

estes autores, já tem uns aninhos. Então admite-se que há agressores que podem ser

circulantes, que há alterações do endotélio, que aqui está representado a azul, e que há

uma resposta da parede arterial à lesão. Esta é a teoria que hoje é aceite para a

aterogénese. Portanto, alguns factores lesam o endotélio, a parede da artéria responde e

ao responder gera estas lesões. Esta resposta é do tipo inflamatório e por isso hoje a

aterosclerose é considerada uma doença inflamatória crónica.

Quais são os tais agentes que podem lesar o endotélio? Mais lípidos no sangue

(concentrações elevadas de colesterol no sangue faz aterosclerose), hipertensão arterial,

o fumo do tabaco, concentrações mais elevadas do aminoácido homocisteína, factores

hemodinâmicos (a aterosclerose não tem igual intensidade nas zonas em que o fluxo é

laminar, onde não há estimulação do endotélio. O fluxo pode ser laminar ou turbulento.

Nas zonas em que é turbulento há estimulação do endotélio com lesão endotelial.

Quando há uma bifurcação de uma artéria, um ramo de uma artéria aligeira-se, pode-se

gerar um fluxo diferente o que pode gerar uma tensão de cisalhamento diferente sobre o

endotélio e portanto essa diferença de pressão sobre o endotélio pode lesa-lo e fazer

com que ele passe a expressar outras moléculas), toxinas, vírus e até respostas

imonulógicas.

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O que é que acontece ao endotélio? É essencialmente este tipo de disfunção. O

aumento da permeabilidade deixa passar mais constituintes do sangue para a parede da

artéria, a expressão de moléculas de aderência (as moléculas de aderência são moléculas

que as células expressam para se tornarem pegajosas, que fazem com que os leucócitos

adiram ao endotélio e saiam para os tecidos no âmbito da resposta inflamatória, ou seja

o endotélio fica pegajoso) e uma superfície pró-trombótica com tendência para que o

sangue coagule sobre este endotélio alterado. O aumento da permeabilidade leva à

acumulação de lípidos e depois há uma resposta com a formação das células esponjosas,

com mais linfócitos, é uma resposta inflamatória, com a tal migração e proliferação das

células muscular lisas e depois estas células uma vez estimuladas produzem proteínas da

matriz, por exemplo colagénio. Tudo isto vai contribuir para a formação da placa.

Vamos seguir os vários passos que estão elucidados em relação à génese. [Slide

14 até 20] Portanto, há mais lipoproteínas circulantes que podem causar lesão

endotelial, passar o endotélio e acumular-se no espaço sob o endotélio, na íntima da

artéria; há uma grande afinidade destas lipoproteínas (sobretudo das LDL –

lipoproteínas de baixa densidade) para com as proteínas da matriz, é difícil tirar as

lipoproteínas desta ligação aos proteoglicanos da íntima; além disso acontece um

fenómeno que hoje em dia se conhece muito bem que é a modificação das LDL.

Quando inicialmente se tentou mostrar como é que se formavam as células esponjosas

os investigadores tiveram uma grande dificuldade em fazê-lo porque quando punham

LDL e macrófagos numa cultura de células os macrófagos não captavam as LDL. Como

é que os macrófagos se transformam em células esponjosas se eles não captam as LDL?

Era um mistério… Manipulações clínicas diversas das LDL, entre as quais a acetilação

– ligar um grupo acetil, mostraram aos investigadores que se colocassem macrófagos na

presença de LDL acetiladas, os macrófagos comiam as LDL acetiladas a grande

velocidade e faziam células esponjosas. Só que a acetilação não é um fenómeno que

ocorra in vivo nas LDL. Portanto o problema ainda não estava resolvido. Finalmente

descobriu-se que a oxidação das LDL, quer da parte lipidica quer da parte proteica, fazia

com que elas passassem a ser captadas pelas células da parede arterial e a formarem

células esponjosas. Uma das formas de modificar as LDL é oxidá-las. Outra é ligar

resíduos de glicose, isso acontece numa doença em que a aterosclerose é mais grave, ou

seja, a diabetes. Portanto, nos diabéticos há hiperglicémia, há aumento da concentração

de glicose e há a tendência para os resíduos de glicose se ligarem às proteínas fazendo a

chamada glicação das proteínas. Essas LDL modificadas por glicação também passam

141

Page 142: O conceito de Meio Interior é de alguma forma a …web.ist.utl.pt/~jorgebeira/anotres/mgd/MGD0607... · Web viewPor exemplo, no embrião formam-se membranas entre os dedos, que desaparecem

para a parede da artéria e ligam-se ao proteoglicanos. Continuando a seguir o

processo…

As LDL modificadas têm uma série de acções de pró-aterogénicas e formam

então as células esponjosas.

Depois outra das alterações endoteliais era a expressão de aderência. Moléculas

de aderência que permitem a aderência dos monócitos circulantes ao endotélio e depois

a passagem pelas junções inter-celulares com transformação em macrófagos no espaço

sub-intimal, é daqui que vêm os macrófagos. Os macrófagos captam as LDL

modificadas.

O que é que estimula a expressão das células de aderência? Uma série de

substâncias, como as LDL modificadas propriamente, e várias citocinas que se libertam

no contexto do processo inflamatório. Entretanto também aparecem os linfócitos T.

depois formam-se as células esponjosas de que já falámos.

[Slide 21 a 29] Esta formação das células esponjosas requer a presença nos

macrófagos de receptores especiais chamados receptores captadores, o mais importante

é este CD36. São os receptores que captam avidamente as LDL e as metem dentro da

célula. Isto é muito diferente com o que se passa com o receptor para as LDL que

também capta o colesterol para as células, mas há um mecanismo de regulação que

impede que a célula capte colesterol a mais porque à medida que o colesterol vai

aumentando na célula há uma hipoexpressão do receptor das LDL na superfície e

portanto às tantas já não há receptores das LDL para captarem mais colesterol e por isso

a célula não se enche de colesterol. Mas os macrófagos com estes receptores que não

são os receptores normais das LDL, os tais receptores captadores, enche-se mesmo de

colesterol porque nestes receptores não há esse mecanismo de feedback, portanto as

células transformam-se mesmo em células esponjosas.

Depois há a tal chamada de células muscular lisas da camada muscular das

artérias para a íntima, há uma série de factores, factor de crescimento derivado das

plaquetas, cá estão as plaquetas a aderir ao endotélio lesado, inicialmente descobriu-se

que as plaquetas produziam este factor de crescimento derivado das plaquetas mas hoje

sabe-se que este factor é também produzido pelo endotélio, pelos macrófagos e até pelas

células muscular lisas. Uma série de mediadores da inflamação (factor de crescimento

fibroblástico, trombina, endotelina, interlocina 1, factor de necrose tumoral) que

provocam a chamada das células muscular lisas para a íntima. De facto, nós dizemos

que há uma alteração fenotípica, que dizer, a célula muscular lisa está na média para se

142

Page 143: O conceito de Meio Interior é de alguma forma a …web.ist.utl.pt/~jorgebeira/anotres/mgd/MGD0607... · Web viewPor exemplo, no embrião formam-se membranas entre os dedos, que desaparecem

contrair e relaxar, só que aqui ela muda de fenótipo, em vez de ter este fenótipo

contráctil passa a ter um fenótipo que chamamos por elaborador, porque vai deixar de

servir para contracção e vai captar lípidos, transformar-se também em células

esponjosas, e vai produzir substâncias, como por exemplo, proteínas da matriz (o

colagénio que se encontra nas placas é produzido por estas células). É o fenótipo

elaborador, não contraem, migram, mexem-se, dividem-se, produzem todas estas

substâncias e captam lípidos.

Então formam-se também células esponjosas a partir das células muscular lisas,

cá temos os dois tipos de células esponjosas de que falámos.

Depois estas células muscular alteradas produzem proteínas da matriz que vão

também ser um componente das placas e um dos factores que estimula essa produção é

o factor de transformação de crescimento beta.

Depois as células necrosam e forma-se o tal núcleo, a tal papa de cereais no

centro da placa, e entretanto começa também uma neovascularização que é a formação

de novos vasos na parede da artéria. Esta neovascularização vai ser um problema porque

estes vasos são vasos formados de novo, são frágeis e podem rebentar. Se um vaso

destes rebenta há hemorragia dentro da placa então a placa pode subitamente aumentar

de tamanho e causar obstrução da artéria. Cá está a hemorragia.

Finalmente, sabe-se que estas placas tendem a calcificar, ficar duras. Há uma

série de proteínas nessas placas que explicam essa chamada de cálcio e a deposição

deste. Quando se vêm radiografias do toráx de doentes idosos é muito frequente ver-se a

parede da aorta desenhada na radiografia porque a parede está calcificada por causa da

aterosclerose (na radiografia os ossos são opacos).

[Slide 30] Vamos então ver os factores de risco. Quais são? É a dislipidémia, o

colesterol a mais, os triglicéridos a mais, a hipertensão arterial, o tabagismo e a diabetes

mellitus. Estes são os mais importantes, mas há mais que para o nosso estudo não têm

grande importância [Slide 31].

[Slide 32] É claro que existem alguns factores protectores. A remoção das

células esponjosas é um facto, mas em geral é um factor quantitativamente pouco

significativo senão as placas não se formavam. Há o chamado transporte reverso do

colesterol que sabe-se que as HLD (lipoproteinas de alta densidade) transportam o

colesterol das placas para o fígado, portanto fazem o oposto, isso é um mecanismo de

protecção naturalmente.

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Page 144: O conceito de Meio Interior é de alguma forma a …web.ist.utl.pt/~jorgebeira/anotres/mgd/MGD0607... · Web viewPor exemplo, no embrião formam-se membranas entre os dedos, que desaparecem

[Slide 33] E depois há uma série de factores anti-trombóticos e trombolíticos,

contra a formação do trombo ou para degradar o trombo já formado, que também são

factores de protecção uma vez que impedem o trombo obstrutivo. As HDL sabe-se que

são diminuídas numa série de situações que pré-dispõem a tuberculose e que estão

aumentadas numa série de situações que contrariam a aterosclerose (o fumo do cigarro e

a diabetes). As lesões de aterosclerose são muito mais importantes no sexo masculino

do que no feminino até à menopausa, a partir da menopausa a mulher começa a ter uma

tendência crescente para ter lesões maiores de aterosclerose e por volta dos 70-80 anos

já tem um risco aproximadamente semelhante ao do homem. Isto porque os estrogéneos

femininos aumentam a concentração das HDL, este é um dos factores protectores. Toda

a gente ouviu dizer que o exercício físico faz bem e que é contra a aterosclerose e

também aumenta as HDL e o consumo moderado de bebidas alcoólicas é também anti-

aterogénico. Até duas bebidas por dia na mulher e três no homem isso poderá ter

alguma acção protectora da aterosclerose. Uma bebida 10g de álcool 1 copo de

vinho, 1 caneca de cerveja ou uma bebida de whisky, etc. [Já sabem!]

[Slide 34] Este quadro é um resumo de tudo o que vos disse.

[Slide 35] Além disso, as lesões da aterosclerose importam também ser

analisadas em termos de evolução das placas porque isso é que vai determinar no fundo

as complicações clínicas. Entram e saem lipoproteinas, entram e saem leucócitos,

proliferam-se células, morrem células, produz-se matriz extracelular, calcificam-se,

neovascularizam-se.

[Slide 36] E do balanço entre tudo isto podem resultar as complicações e sabe-se

que há placas estáveis que são menos “perigosas”, são placas que têm uma carapaça

fibrosa espessa e pelo contrário há placas que até podem ser mais finas mas que são

instáveis, têm uma carapaça fibrosa mais fina ou quase inexistente, têm mais

macrófagos, são mais moles, têm mais linfócitos T, têm um núcleo de necrose maior,

têm mais proteases, menos proteínas da matriz, o factor dos tecidos é um factor da

coagulação, e portanto são estas placas são mais perigosas do que as outras, são estas

que levam à trombose que depois leva ao enfarte do miocárdio e a outras complicações.

Para além desta diferença entre placas há também este balanço entre factores que

levam à trombose e factores que evitam a trombose. Este balanço também é importante

para determinar o risco que um individuo tem em fazer um acidente isquémico agudo.

Por outro lado, em relação as localizações, que predominam nas bifurcações,

isso tem a ver com a tal tensão de cisalhamento. De facto há diferenças quando se

144

Page 145: O conceito de Meio Interior é de alguma forma a …web.ist.utl.pt/~jorgebeira/anotres/mgd/MGD0607... · Web viewPor exemplo, no embrião formam-se membranas entre os dedos, que desaparecem

estuda o fluxo elevado e regular ou quando se estuda um fluxo oscilatório e turbulento.

Essa variação de fluxo faz com que haja ou a expressão de um fenótipo endotelial anti-

aterogénico ou um fenótipo aterogénico.

[Slide 41] Aqui deixo-vos uma lista dos mecanismos gerais implicados na

aterogénese, que foram todos aqui falados.

Envelhecimento

Ora bem, vamos agora falar de envelhecimento. É um tema que decidimos incluir nestes

cursos porque a compreensão fisiopatológica do envelhecimento é relevante, quer para a

Engenharia Biomédica, quer para a Dietética e Nutrição, por razões que, eu diria, são

óbvias. Quero eu dizer que as alterações que ocorrem durante este período da vida

podem condicionar determinadas limitações que é importante serem conhecidas e serem

compreendidas para se tenham em conta quer na actividade da Engenharia Biomédica,

quer na actividade da Dietética e Nutrição. E penso que este primeiro gráfico que trago

fala por si e mostra bem como é importante o que vos acabei de dizer. Vocês têm aqui

uma análise num número muito grande de queimados, são 11883 doentes (portanto não

é um pequeno estudo, é um grande estudo), em que se estuda a relação entre a área total

queimada (aqui 10%, 60%, 100% da superfície corporal) e a percentagem de

sobreviventes, em função da idade. Reparem que esta linha (a amarelo) representa o

grupo dos 5 aos 34 anos, e esta linha contínua (a vermelho) representa o grupo dos 75

aos 100 anos, e reparem que para uma mesma área total queimada, a percentagem de

sobreviventes varia muito com o grupo etário. Vamos pegar aqui nos 70% de área total

queimada, significa que no grupo dos 5 aos 34 anos existe 60% de sobreviventes, mas

no grupo dos 60 aos 74 anos não praticamente sobreviventes e no grupo dos 75 aos 100

anos não há sobreviventes. Portanto reparem como é importante considerarem este

factor e como, de facto, a idade limita, neste caso concreto, a capacidade de

sobrevivência a uma agressão. Esta ideia é a ideia central da compreensão

fisiopatológica do envelhecimento.

Recordam-se, provavelmente, que, logo no primeiro módulo, eu vos mostrei um

esquema muito parecido com este, em que vos falava precisamente da manutenção do

145

Page 146: O conceito de Meio Interior é de alguma forma a …web.ist.utl.pt/~jorgebeira/anotres/mgd/MGD0607... · Web viewPor exemplo, no embrião formam-se membranas entre os dedos, que desaparecem

equilíbrio do meio interior, da sua alteração e dos mecanismos que nós tínhamos para

repor o equilíbrio perdido. Isto representava o estado de saúde e isto representa o estado

de doença. Naturalmente, o que falta no idoso, é a capacidade para repor o equilíbrio

perdido para níveis menores da alteração desse mesmo equilíbrio. Alguns autores,

utilizando a base da palavra “homeostase”, usam o termo “homeostenose” para designar

esta situação fisiopatológica do envelhecimento. Vocês sabem que “estenose” significa

aperto, e portanto a ideia é uma espécie de afunilamento da capacidade de resposta que

caracteriza este período da vida. E é esta ideia que é fundamental para lidar com este

grupo etário em termos de balança saúde/doença.

Aqui, nestes esquemas que vos deixo, dou-vos no fundo uma lista de alterações que se

encontram no idoso, mas é sempre importante ter em conta que uma coisa é a alteração

ainda de âmbito fisiológico que se sabe que acompanha a idade avançada (é esta coluna

do meio em relação com estas características), e outra coisa é as doenças. Portanto, nem

sempre é muito fácil, na prática, delimitar a alteração que ainda cabe no âmbito do

fisiológico da alteração que já cabe no âmbito da doença (e que, portanto, merece uma

atenção médica adicional e específica, no âmbito do diagnóstico de uma patologia).

Sabe-se que, com a idade, aumenta a gordura corporal e diminui a água corporal, por

exemplo. Isto tem importâncias práticas. Calculam que os fármacos podem ser mais ou

menos lipo ou hidrosolúveis. E portanto, com esta alteração da composição corporal, as

mesmas doses de medicamentos lipo ou hidrosolúveis têm uma distribuição diferente

nos vários compartimentos do nosso corpo, e isso tem que ser tido em conta. Mas é

claro que ser obeso já cai no âmbito da doença, não é o simples aumento da gordura

corporal descrita como uma alteração fisiológica ligada ao envelhecimento, e o ser

anoréxico também cai no campo da doença. Há alterações visuais relacionadas com o

envelhecimento, mas que nunca atingem o nível da cegueira ou, no caso do aparelho

auditivo, da surdez. Essas já são perturbações que caiem no âmbito da doença. Portanto,

reparem, aqui percorrem-se, mais ou menos, todos os sistemas. Por exemplo, em relação

ao aparelho respiratório há uma diminuição da elasticidade pulmonar e o aumento da

rigidez da parede torácica. Há uma rigidez progressiva das articulações condroesternais

e condrovertebrais. Isso causa uma certa rigidez e, portanto, o idoso tem mais

dificuldade em aumentar a capacidade torácica. Portanto, isso pode de facto determinar

alterações da relação ventilação/perfusão, que vocês falaram no módulo sobre

insuficiência respiratória com o Professor Barbas, mas não significa que leva à dispneia

ou à hipoxia, isso já é no âmbito da doença. E assim sucessivamente.

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Page 147: O conceito de Meio Interior é de alguma forma a …web.ist.utl.pt/~jorgebeira/anotres/mgd/MGD0607... · Web viewPor exemplo, no embrião formam-se membranas entre os dedos, que desaparecem

Em relação ao nível do rim, também há alterações da capacidade de concentração da

urina que podem determinar alterações na resposta à restrição ou sobrecarga salina, etc.

Portanto, tudo isto são alterações que importa ter uma ideiam que ocorrem na idade

avançada, e que impõem determinados cuidados.

Em relação ao envelhecimento, há duas ideias que também são fulcrais. Uma delas é

que as curvas de sobrevivência têm sofrido uma evolução ao longo dos tempos e com a

civilização. Toda a gente tem ideia que o Homem Neolítico, provavelmente, tinha uma

esperança média de vida de 20 anos, e que ainda hoje a esperança de vida das tribos

“selvagens” da Amazónia ou africanas é de 30 ou 40 anos, ao passo que, entre nós,

como sabem, a esperança de vida é à volta dos 76 anos. Reparem que temos aqui países

com índices diferentes de evolução, temos vários períodos, e há claramente uma

tendência para nos aproximarmos nesta curva, que é a curva em que, na espécie

humana, a maior parte dos elementos chegarão aos 90 anos, e depois morrerão entre os

90 ou 100. Admite-se que, de facto, o limiar de vida, para a espécie humana, anda à

volta dos 120 anos, mas são poucos os que chegam a essa idade, mas há claramente uma

tendência para cada vez mais chegarem a esse limite, como vêm aqui.

Por outro lado, também é um facto que o fenómeno do envelhecimento é um fenómeno

dos ambientes protegidos. Se pensarmos agora em vida animal no geral, de facto o

envelhecimento praticamente não existe nos animais que vivem em ambiente natural. O

envelhecimento existe é nos animais que estão no jardim zoológico. Portanto, o

envelhecimento não é um fenómeno natural neste sentido que eu agora estou a falar.

Têm aqui as curvas de sobrevivência nos ambientes naturais e nos jardins zoológicos,

são completamente diferentes. A predação, as doenças, levam a que, em ambientes

naturais, a curva de sobrevivência seja completamente diferente.

Por outro lado importa também ter ideia que a esperança de vida num homem e numa

mulher é substancialmente diferente, nomeadamente até determinados grupos etários.

Reparem que a esperança de vida de uma mulher com 65 a 79 anos era, nesta altura,

quando foi feito este estudo, 20 anos, mas no homem era de 13. E de facto, nós sabemos

que as viúvas são muito mais numerosas que os viúvos e quando nós fazemos, aqui no

hospital, autópsias a indivíduos idosos, em geral são mulheres, não são homens, porque

há uma esperança de vida diferente nos dois sexos. Aqui também se comparam aquilo a

que nós chamamos os anos capazes de existência independente. Vocês sabem que com a

idade as pessoas podem perder a independência da existência, pode começar a depender

147

Page 148: O conceito de Meio Interior é de alguma forma a …web.ist.utl.pt/~jorgebeira/anotres/mgd/MGD0607... · Web viewPor exemplo, no embrião formam-se membranas entre os dedos, que desaparecem

de terceiros, e aqui também é contabilizada esta diferença, mas ambas as diferenças se

vão atenuando à medida que nos vamos aproximando dos grupos etários mais elevados.

Admitimos em geral que nos organismos multicelulares se podem distinguir duas fases

da vida. Uma primeira fase, corresponde à fase de diferenciação e crescimento, que

culmina com a maturação sexual e a reprodução. Depois, entramos claramente numa

segunda fase, do tal declínio progressivo da eficiência fisiológica, a tal perda de

eficácias dos mecanismos homeostáticos, que acaba por levar à morte. É claro que

aquela discussão de “quando é que começa o envelhecimento?” é uma questão um

pouco académica. Há aqueles que defendem que o envelhecimento começa ainda

durante a vida embrionária ou na vida fetal, quando começa a diminuir a capacidade de

formar matéria viva. De facto há uma fase do embrião em que esta capacidade é

enorme, depois vai diminuindo logo a partir do nascimento. Estas discussões podem

percorrer a literatura científica médica, e não só, mas em termos gerais será razoável a

divisão da vida nestas duas fases.

Para explicar o envelhecimento, nós ainda hoje não conseguimos compreender muito

bem este fenómeno, até porque, em relação a tudo o que vos disse até agora, têm sido

levantadas essencialmente dois tipos de teorias: As do envelhecimento geneticamente

programado e as do envelhecimento por causas ambientais, envelhecimento epigenético.

Em relação ao geneticamente programado, têm-se procurado os genes da vitalidade.

Existirão os genes da vitalidade que, ao deixarem de funcionar, determinarão o

envelhecimento genético? Ou existirão gerontogenes, ou seja, genes que passam a

funcionar a partir de certa altura da vida, determinando as alterações do envelhecimento.

De facto, nós não temos ainda hoje respostas claras a estas perguntas, se estes genes

existem, mas o que não há dúvida, e depois já voltamos outra vez ao envelhecimento

secundário à acumulação passiva de alterações, por razões exteriores à própria célula.

Em relação às teorias genéticas, o que sabemos é que sabemos é que existem síndromes

genéticos, relacionados com alterações genicas bem demonstradas de envelhecimento

precoce. Têm ali aquela fotografia dum teenager que têm aquele aspecto. Perdeu o

cabelo, tem artroses tão graves que já tem que andar de muletas, tem um aspecto de um

velho, mas só tem 12 ou 13 anos. Estes indivíduos, com estes síndromes de

envelhecimento precoce, morrem de enfarte do miocárdio aos 15 anos, ou têm um

acidente vascular cerebral aos 20. Há características fenotípicas de envelhecimento

precoce e há patologia que só se vê nos mais idosos. E estão identificados esses

síndromes, eu trago-vos aqui dois exemplos, sabem-se até os genes alterados, embora se

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Page 149: O conceito de Meio Interior é de alguma forma a …web.ist.utl.pt/~jorgebeira/anotres/mgd/MGD0607... · Web viewPor exemplo, no embrião formam-se membranas entre os dedos, que desaparecem

saiba mal a relação, eu diria que praticamente se desconhece, entre estas mutações

nestes genes e todas as alterações que acontecem nestes indivíduos, quer dizer, não

sabemos muito bem o que é que liga a mutação destes gene a todas as alterações que

acontecem nestes indivíduos (queda precoce do cabelo, o cabelo ficar branco mais cedo,

a pele perder a elasticidade, as articulações se deformarem, a artrosclerose ser uma

artrosclerose acelerada, estes indivíduos têm uma artrosclerose aos 10 anos como tem

um idoso de 60 ou 70). Mas de facto, isto mostra que há genes que interferem com o

envelhecimento, claramente. Por outro lado, sabe-se também que, quando procuramos

cultivar células, e vocês provavelmente já viram culturas de células, existe um limiar

para a replicação das células (estamos a falar em células normais). O Professor Luís

Costa, no módulo de neoplasia, deve ter-vos dito que as culturas de células neoplásicas

são praticamente eternas, é possível manter estas culturas durante anos e anos e anos…

Mas em relação às células normais, estas têm um potencial de replicação limitado, mais

ou menos 50 replicações. A partir daí não há mais divisão celular e a cultura entra em

cenescência, envelhece, não se reproduz mais. Inicialmente, não se tinha a ideia deste

fenómeno e até se pensava que isto não era assim. O autor que descreveu que as culturas

de células normais eram eternas, caiu num erro. É que ele manteve uma cultura de

células aparentemente normais durante 30 anos e escreveu sobre isso. Só que depois,

quando foi rever os trabalhos dele, quando Hayflick descreveu este fenómeno, foram-se

rever os trabalhos de [Carel] e verificou-se que ele juntava ao meio de cultura extractos

de embrião e não tinha o cuidado de garantir que esse extracto de embrião, que ele

juntava ao meio de cultura para alimentar as células, fossem extractos acelulares (sem

celulares). O que ele estava a fazer era juntar ao meio de cultura extractos com células e,

portanto, estavam sempre a entrar novas células na cultura e haviam sempre novas

células na cultura para se replicarem. Assim, manteram-se durante trinta e tal anos e as

pessoas convencidas as células se podiam cultivar indefinidamente.

Não é assim. Existe o chamado fenómeno de Hayflick que é isto que está aqui descrito.

Paragem em G1-S do ciclo celular ao fim de 40 a 60 duplicações. Quando foi descrito

este fenómeno, alguns reclamaram ter descoberto a causa do envelhecimento: As nossas

células têm uma capacidade replicativa limitada e, por isso, envelhecemos. Que

remédio… Mas também alguns, e vocês serão capazes de usar o argumento que eles

usaram, e dizer “Ah, isso não me convence!”.

Vocês sabem que existem órgãos que são constituídos por células sem capacidade

replicativa. Ainda há bocadinho falámos do miocárdio. Com o cérebro e o músculo

149

Page 150: O conceito de Meio Interior é de alguma forma a …web.ist.utl.pt/~jorgebeira/anotres/mgd/MGD0607... · Web viewPor exemplo, no embrião formam-se membranas entre os dedos, que desaparecem

estriado passa-se o mesmo, e toda a gente sabe que há envelhecimento cardíaco,

muscular e cerebral. Por isso, existem células pós-mitóticas, que já não se dividem mais

durante toda a vida, e esses órgãos também envelhecem. Portanto, não é a multiplicação

das células que determina o envelhecimento, pelo menos a explicação global. Contudo,

houve também muitos dados colhidos da experimentação e da observação que levaram a

valorizar-se muito este fenómeno de Hayflick para explicar o envelhecimento. É que

quando se procura cultivar células de indivíduos mais novos, se eu colher fibroblastos

da pele de um indivíduo com 5 anos ou os meus, o potencial de replicação em cultura

das células do indivíduo de 5 anos é superior ao dos meus fibroblastos.

Por outro lado, o potencial replicativo (o número de divisões) das células de diferentes

espécies (e sabem que as espécies têm diferentes esperanças de vida) varia consoante a

esperança máxima de vida de cada uma.

Em relação à razão desta limitação para a duplicação, esta provavelmente está no

encurtamento telomérico. Sabem que a cada divisão celular há um encurtamento do

telómero. Os telómeros, de alguma forma, garantem a divisão celular certa porque

protegem as extremidades dos cromossomas e evitam alterações nos genes destas

extremidades e, por outro lado, evitam que os cromossomas se fundam e que hajam

alterações cromossómicas que tornariam as células inviáveis. O que acontece é que a

cada divisão celular há um encurtamento do telómero e admite-se que essa seja a razão

para que depois haja um limite para a duplicação. É que às tantas os telómeros são tão

curtos que deixam de garantir isto que vos disse e a célula passa a não se conseguir

dividir. As células cancerígenas, que o Professor Luís Costa no módulo de Cancro, têm

uma enzima activada que é a telomerase, que é uma enzima que garante a reposição do

telómero. Tudo isto parece jogar certo, aquelas células conseguem-se dividir

indefinidamente. Admite-se, como vocês já entenderam, com certeza, que uma das

estratégias de combater o cancro possa ser inibir a telomerase (e já há inibidores da

telomerase a serem ensaiados). Os telómero estão aqui representados, são estas

sequências nas extremidades dos cromossomas.

Ainda a favor da importância dos genes na cenescência celular, verificou-se que há

genes no cromossoma 1 que são dominantes em relação à característica da cenescência,

quer dizer, se vocês fundirem (e podem-se fazer experiências de fusão celular), células

cenescentes com células imortais (células transformadas, de cancro) vocês podem

verificar que a característica da cenescência é dominante em relação à característica da

imortalidade.

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Depois há trabalhos, que já têm alguns anos, mas aqui trago-vos sobretudo os mais

recentes, que mostram que de facto há influência genética na longevidade da espécie

humana. Aqui é feito um estudo curioso entre irmãos monozigóticos e bizigóticos, são

os estudos a que se recorre para se saber a influência dos genes, e chega-se à conclusão

que a esperança de vida dos monozigóticos é semelhante entre si e é diferente dos

bizigóticos, porque tem os mesmos genes.

Também já se identificaram vários genes. Por vezes acorda-se com a notícia na TSF ou

na Antena 1: “Ah! Descoberto o gene do envelhecimento…”. É mais um… Já ouvimos

isto não sei quantas vezes. São vários genes que foram relacionados com o

envelhecimento, um destes foi o Sir2 que, de facto, tem esta acção de desacetilase, é um

gene modulador da resposta ao stress e, embora não se entenda muito bem a relação,

tem, de facto, a ver com o envelhecimento.

Falei-vos que além das teorias genéticas, existem as teorias epigenéticas. Estas partem

do princípio que o envelhecimento não está geneticamente programado, o que há são

factores do ambiente que determinam uma deterioração progressiva da estrutura e das

funções das células, que levam inevitavelmente às alterações do envelhecimento e à

morte.

E muitas teorias têm sido feitas à volta destas hipotéticas alterações epigenéticas. Uma

das mais aceites hoje em dia é a dos radicais livres aplicado ao envelhecimento. Eu já

vos falei sobre radicais livres, lembram-se que tivemos um pequeno módulo acerca

deste tema. A hipótese de Harman, já dos anos 50, mas é hoje uma das hipóteses com

defensores que podem usar argumentos mais sólidos do ponto de vista científico e

vamos já ver dois ou três desses argumentos. Mas outras teorias foram levantadas: As

alterações pós-tradução (que a alteração não estaria na produção de proteínas, mas nas

alterações das proteínas após a tradução), a Teoria do Erro-Catástrofe (admite que existe

erros na transcrição e tradução. Esta teoria não foi de todo comprovada), a acumulação

de resíduos nas células (também não há qualquer confirmação que seja esta uma causa

do envelhecimento), é verdade que com o envelhecimento há alteração, não na

qualidade da síntese proteica, mas sim na velocidade da renovação das proteínas, mas,

como vos disse a teoria dos radicais livres é a teoria epigenética mais relevante

provavelmente.

Mas está bem demonstrado a glicação das proteínas – eu já vos falei da glicação das

proteínas há bocadinho, recordam-se quando falei da modificação das LDL. De facto,

nos diabéticos, em que há um envelhecimento precoce, também há glicação das

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Page 152: O conceito de Meio Interior é de alguma forma a …web.ist.utl.pt/~jorgebeira/anotres/mgd/MGD0607... · Web viewPor exemplo, no embrião formam-se membranas entre os dedos, que desaparecem

proteínas, claro, esta é a doença em que a glicação por excelência está mais estimulada,

e sabemos que da glicação das proteínas resultam alterações, aqui esquematizadas pelas

fórmulas químicas, que levam depois às alterações das proteínas que podem explicar,

por exemplo, as cataratas senis (alterações das cristalinas, das proteínas que constituem

o cristalino) e essas alterações podem ser devidas precisamente à alteração destes

produtos de [Amazori], que resultam da glicação das proteínas (glicose + proteínas) e

que depois formam estes compostos [SSI] que têm tendência a formar ligações

cruzadas, as quais vão levar à opacificação do cristalino, por exemplo. Aqui têm

precisamente a formação destas ligações cruzadas entre proteínas, formando os

chamados “produtos finais da glicosilação (glicação) avançada das proteínas” (em

inglês AGE).

Mas o desequilibro entre factores oxidantes e factores desoxidantes é, de facto, a base

desta teoria, em que se admite que existe uma diminuição das capacidades de defesa

antioxidante (de que já vos falei na aula de radicais livres) e um aumento na produção

de radicais. [Heinz] criou o chamado Teste de [Heinz] para a detecção de substâncias

químicas que provocam o cancro. Vocês hoje ouviram falar, com certeza para quem

ouviu as notícias, que a Comissão Europeia definiu novas regras para o lançamento de

substâncias químicas, porque agora a indústria química tem que provar que as

substâncias não fazem mal à saúde, ao passo que, na regra anterior, eram os governos

que tinham que provar que as substâncias faziam mal à saúde, era o oposto. Ora bem,

[Heinz] criou um teste extremamente simples que partia de culturas de salmonelas e

estas eram expostas a determinada substância e uma determinada alteração que aparecia

nessas culturas permitia inferir que essa substância tinha a possibilidade de causar

mutações. Mas [Heinz] também descreveu que é possível dosear na urina produtos da

oxidação do ADN, pelos radicais livres, e de facto ele assim demonstrou que, todos os

dias, existe um número (que não está ali escrito e eu agora também não me lembro) de

alterações de oxidação de bases oxidadas, porque depois estas dão certos produtos que

são excretados na urina e isto serve como uma medida para o número de bases oxidadas,

e as bases oxidadas vão corresponder a mutações. A quantidade de produtos oxidados

na urina varia consoante a esperança de vida da espécie animal (o ratinho que vive 2 ou

3 anos oxida mais que o homem que vive 100 ou 120 anos), portanto há aqui relações

curiosas.

Por outro lado, existe uma relação directa entre a concentração da SOD (superoxide

dismutase), que provoca a dismutação do superóxido (um radical livre), e o tempo

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Page 153: O conceito de Meio Interior é de alguma forma a …web.ist.utl.pt/~jorgebeira/anotres/mgd/MGD0607... · Web viewPor exemplo, no embrião formam-se membranas entre os dedos, que desaparecem

máximo de vida – o ratinho tem menos, vive menos, e o chimpanzé tem mais, vive

mais, e o homem tem muito mais. Também é curioso, a defesa antioxidante é mais

eficaz nos que vivem mais tempo, uma relação que joga a favor desta teoria dos radicais

livres para razão para o envelhecimento.

Por outro lado, e, já agora, pensando ter uma intervenção neste fenómeno, alguns

autores procuraram prolongar a vida deste nematoda (o primeiro do qual se soube toda a

sequência genética, muito usado em laboratório) e o que eles verificaram é que se

administrassem substancias, com uma acção que imitam a acção SOD e caralase

(enzimas antioxidantes) conseguiam prolongar a vida destes bichinhos 44%. Não há

dúvida que o aumento da eficácia antioxidante pode prolongar o tempo de vida. Aqui

têm o mesmo, mas aplicado a um mamífero, a ratinhos.

E depois há observações muito curiosas, como esta que está aqui descrita. São capazes

de me ler o que está ali descrito naquele gráfico? Quanto mais come, menos tempo vive.

Isto demonstrado para a aranha, que se alimenta de moscas, como está ali bem descrito.

Dependendo do número de moscas que possibilitamos que a aranha coma, assim ela

vive mais ou menos.

E estas experiências já decorreram com roedores, mais uma vez os ratinhos, são sempre

uns infelizes nisto. E então, reparem que uma restrição calórica de aproximadamente 30

a 40% das calorias ingeridas por dias, que não interfere com os alimentos ditos

essenciais (estão lá as vitaminas, as proteínas, os aminoácidos essenciais, os ácidos

gordos essenciais), tem uma clara influência no tempo máximo de vida deste mamífero.

Então mas podemos inferir alguma coisa daí para a espécie humana? Não sei… Claro

que não se fazem estas experiências com humanos, mas estão-se a fazer experiências

com chimpanzés, mas estas demoram um bocado mais de tempo do que as feitas com

ratinhos, os chimpanzés duram 50 anos. Só daqui a uns aninhos é que se vai poder dizer

o que é que deram as experiências com chimpanzés. Mas o que é um facto é que a

restrição calórica parece ser um factor determinante da esperança de vida. E isto, claro,

não é alheio a aquela questão da produção de radicais livres, porque quanto mais

substratos houver para oxidar (cadeia respiratória) mais radicais livres se produzem.

Portanto admite-se que possa haver uma ligação entre as duas coisas.

Também se sabe que uma mosca sem asas vive mais que uma mosca com asas. Claro

que aqui se pode perguntar “Então, mas uma mosca sem asas é uma mosca?”. Pois, se

calhar não é, mas se se fizer esta experiência verifica-se isto, provavelmente, porque a

cadeia respiratória funciona muito menos (não tem que gastar a energia correspondente

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Page 154: O conceito de Meio Interior é de alguma forma a …web.ist.utl.pt/~jorgebeira/anotres/mgd/MGD0607... · Web viewPor exemplo, no embrião formam-se membranas entre os dedos, que desaparecem

ao exercício de voar), produz menos radicais e, então, vive mais. Os autores que

começaram por fazer esta experiência também verificaram que a restrição calórica

provocava um atraso na perda de uma série de funções importantes. Com esta controla-

se mais tempo a glicemia, a capacidade reprodutora feminina é mais longa, há mais

reparação do ADN, etc. Portanto, há uma série de funções que são poupadas durante

mais tempo. Por outro lado, há um atraso no aumento das ligações cruzadas das

proteínas (aquela glicação não-enzimática que eu já vos falei) e há também um atraso no

aumento nas lesões por oxidação não reparadas nos tecidos. Aqueles ratinhos com

restrição calórica têm menos doenças auto-imunes, menos cataratas, menos cancro,

menos hipertensão arterial, e menos insuficiência renal. Há uma série de doenças que se

tornam menos frequentes no grupo sujeito à restrição calórica.

As razões pelas quais a restrição calórica tem estes efeitos não estão perfeitamente

esclarecidas, mas admite-se que tem a ver com a diminuição da sobrecarga oxidante, a

diminuição dos níveis deste factor de crescimento insulínico, que se demonstrou estar,

de facto, diminuído. E há uma resposta adaptativa com modulação da expressão

genética, que tem a ver com aquele gene Sir2, e que se admite que, nas células sujeitas a

um certo grau de restrição calórica, há uma adaptação à sobrevivência com aquela

restrição, e que essa adaptação passa por gastar menos energia e, por isso, produzir

menos radicais. Aqui têm, precisamente, esta relação que acabei de estabelecer. Lá estão

os genes Sir2 de que vos disse que se admite que fazem a ponte entre esta capacidade de

adaptação celular à restrição calórica e a sobrevivência. Esta é uma revista de nutrição.

Depois, e na espécie humana, existe alguma evidência de que haja alguma influência da

restrição calórica? Não sabemos bem, mas temos aqui estes dados, desta ilha do Japão,

em que a alimentação tem cerca de 30% menos de calorias, e aqui nesta ilha existe 40%

mais de idosos centenários do que no resto do Japão e as doenças diabéticas também são

menos frequentes.

Admitimos então que há factores genéticos que podem depender da existência de genes

[?], de mecanismos de reparação de ADN, desta resposta ao stress, das defesas

antioxidantes (das quais algumas delas também são determinadas geneticamente), e

factores ambientas que têm a ver com a dieta, com as doenças e com o stress exógeno

(as radiações, as substâncias químicas) que podem alterar o metabolismo, levanto a uma

maior ou menor carga oxidativa, de que pode depender a lesão celular, o

envelhecimento e a morte.

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Perguntas?

Aluno: [Inaudível] (Tem a ver com a limitação da replicação das células)

Professor: Sim, mas repare, o facto de ter esta limitação não implica um impedimento

da regeneração, porque, para que a regeneração seja possível, têm que ficar células e

quando essas células entram em replicação, cada vez que há uma replicação, duplica o

volume e repare que 50 vezes é muita vez. Isto é um crescimento exponencial não é?

Houveram alguns autores que fizeram contas e modelos matemáticos, para estudar se

esta limitação de “50 vezes” seria uma limitação aos 100 anos de vida. O que eles

criaram foram modelos em que apreciaram essa replicação, mas com divisão assíncrona

das células. Repare que todas as células não se têm que dividir todas ao mesmo tempo.

Hoje pode um fibroblasto começar-se a dividir, e são 50, mas amanhã é outro, e, no

outro dia, outro, e cada um 50 vezes. E como estamos a falar em muitos milhares de

células, fazendo o modelo com divisão assíncrona (é claro que se a divisão fosse ao

mesmo tempo, o tempo total era menor) chegaram à conclusão que isso não era de todo

uma limitação. Com a divisão assíncrona de células de reserva, estas 50 duplicações

chegam e sobram para garantirem os 100 anos.

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