o breviário da confiança - monsenhor ascanio brandao
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7/26/2019 O Breviário Da Confiança - Monsenhor Ascanio Brandao
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Monsenhor Ascânio Brandão
O Breviário da Confiança
Pensamentos para cada dia doano
5ª edição
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Brandão, Monsenhor Ascânio, Falecido em 1956
Breviário da Confiança / Monsenhor Ascânio Brandão - Lorena: Cléofas, 2015
360 páginas
ISBN 978-85-88158-89-4
1a edição: 20135a edição: 2015
Capa, diagramação e versão digital: Jeferson Rocha
© 2015 - EDITORA CLÉOFAS - Todos os direitos reservados
Caixa Postal 100 - Lorena - SP
CEP 12600-970
Tel/Fax: (12) 3152-6566
www.cleofas.com.br
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Apresentação
Já dei este livro de presente para muitas pessoas, e sempre o propaguei por onde
passei pregando a Palavra de Deus; e nunca encontrei uma pessoa que não
ficasse encantada com ele depois de meditar com ele.
O BREVIÁRIO DA CONFIANÇA, de Mons. Ascânio Brandão é uma dessas obras
de espiritualidade que nunca perdem seu valor; excelente para aquele que deseja
viver conforme a vontade de Deus e se conformar a ela. Sobretudo ensina às
almas a confiança na Misericórdia Infinita de Jesus.
É um livro que foi publicado pela Editora Rosário, do Pe. Afonso de Santa Cruz, e
que deu muitos frutos em muitas edições. Consolou muitas almas aflitas,
despertou belas vocações religiosas, e esclareceu a muitos que pensavam ser a
nossa fé algo triste e pesado de se viver. Agora Pe. Afonso autorizou que a
Editora Cléofas o publique para continuar a ajudar muitas almas que sofrem. Por
isso, sou imensamente grato ao Pe. Afonso de Santa Cruz por esse seu gesto de
generosidade.
Como Sacerdote e diretor de almas, Mons. Ascânio, um sacerdote que morreu
com fama de santidade, autor desta obra imortal, esteve sempre em contato
direto com todo tipo de sofrimentos e de almas. Ele diz: “o sei por experiência: – A confiança faz milagres! Sinto e vejo quanto é verdade o que escreveu Santa
Teresinha: – “à confiança e tão só a confiança nos há de levar ao amor! nunca se
tem confiança demais! Ela repete muitas vezes: confiança! sim, muita confiança!
nunca se tem confiança demais no bom Deus sempre tão bom e misericordioso,
como dizia Santa Terezinha, a missionária da confiança”.
Ele prega a confiança que abre o coração e vê em Nosso Senhor um doce Pai
Misericordioso. Mons. Ascânio mostra com ímpar sabedoria que “a confiançanão é uma virtude passiva”. Não basta confiar e cruzar os braços. “A Confiança
não exclui, antes, supõe o esforço, a luta, o sacrifício. A paz de Nosso Senhor se
conquista na guerra. Guerra às más paixões, guerra ao nosso EU”. Mas não se
confunde esta consoladora doutrina da confiança com um “semiquietismo”
perigoso. O autor diz palavras de sabedoria, sobretudo o que vivemos e sofremos
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neste “vale de lágrimas”, e dá conforto às almas heroicas e generosas, sujeitas às
provações das “noites místicas” tão angustiantes; essas almas sofrem um tipo de
martírio, pois são objeto das predileções divinas.
Espero que a publicação desta obra de imenso valor pela Editora Cléofas – o bom
discípulo de Emaús – possa dar consolo e trazer a salvação aos que a usarem no
dia a dia. Consagro-o aos Sagrados Corações de Jesus e da Virgem Maria.
Prof. Felipe Aquino
Lorena, 07 de junho de 2013.
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PREFÁCIO
O “BREVIÁRIO DA CONFIANÇA”, leitores queridos, aí está em nova edição. Vai
continuar a missão que desempenhou tão bem até hoje: – a de pregar às almas a
confiança na Misericórdia Infinita do Sagrado Coração de Jesus. Graças a Deusforam consoladores os frutos colhidos na primeira edição. Consolou muitas
almas aflitas, despertou belas vocações religiosas, e esclareceu a tantos que
olhavam a nossa fé sob o aspecto terrível de uma piedade jansenista1 que estreita
os horizontes e aperta o coração.
CONFIANÇA! Sim, muita confiança! NUNCA SE TEM CONFIANÇA DEMAIS
NO BOM DEUS SEMPRE TÃO BOM E MISERICORDIOSO, dizia Santa
Terezinha, a Missionária incomparável da confiança.
Quero pregar a confiança, esta confiança que abre o coração e vê em Nosso
Senhor um doce Pai Misericordioso. Há um Temor de Deus, princípio da
sabedoria. Este temor é necessário e é salutar.
E há um temor que é MEDO DE DEUS, um terror da Justiça Divina, que apavora
muitas almas e desconhece as ternuras do Amor Misericordioso. Oh! Como este
terror jansenista, da Justiça Divina, acabrunha as almas, aperta o coração e limita
os horizontes tão vastos e encantadores da verdadeira e sólida piedadeevangélica!
A CONFIANÇA NÃO É UMA VIRTUDE PASSIVA. Não basta confiar e cruzar os
braços. NÃO EXISTE E NÃO PODE EXISTIR, disse Leão XIII, virtude passiva. A
Confiança não exclui, antes, supõe o esforço, a luta, o sacrifício. A paz de Nosso
Senhor se conquista na guerra. Guerra às más paixões, guerra ao nosso EU.
Condição essencial da santidade é o Amor. E o amor é o fruto e a conquista de
uma vida espiritual de uma ascese forte, viril, enérgica, e toda impregnada deabnegação e de sacrifício. Que ninguém confunda esta consoladora doutrina da
confiança com um SEMIQUIETISMO2 perigoso que parece inculcar às almas, até
mesmo às pouco adiantadas, disposições de PASSIVIDADE que não convêm
realmente a todos, e pretende chegar cedo demais a SIMPLIFICAR a vida
espiritual, esquecendo que, para a maior parte das almas, esta simplificação só se
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fará utilmente, depois dos longos exercícios da meditação discursiva, do exame, e
da prática das virtudes morais.
Quis também dizer aqui uma palavra de conforto a estas almas heroicas e
generosas, sujeitas às provações destas NOITES MÍSTICAS tão desoladoras e
angustiosas. Quem mais do que estas almas têm necessidade de um conforto
nestas purificações passivas, tão dolorosas?
Não poderia calar este gênero de martírio e deixar, sem uma palavra, estas almas
generosas, objeto das predileções divinas.
O “Breviário da Confiança” varia de página a página, porque variadas são as dores
e as amarguras desta pobre vida. Dirige-se a quantos sofrem as torturas de uma
dor física, ou de uma angústia moral, até o ignorado martírio dos que passam
aquelas NOITES, tão bem descritas por São João da Cruz. Os meses de Maio,
Junho, Agosto e Setembro estudam respectivamente quatro fontes da verdadeira
Confiança: – Maria Santíssima, O Evangelho, a Imitação e o Pequenino
Caminho da Infância Espiritual da grande Missionária da Confiança, Santa
Teresa do Menino Jesus. O mês de Novembro consagrei-o à saudade de nossos
mortos queridos.
Sacerdote e diretor de almas, a Divina Providência me pôs sempre em contato
direto com todo gênero de sofrimentos e de almas. E o sei por experiência: – A
confiança faz milagres! Sinto e vejo quanto é verdade o que escreveu Santa
Teresinha: – A CONFIANÇA E TÃO SÓ A CONFIANÇA NOS HÁ DE LEVAR AO
AMOR! NUNCA SE TEM CONFIANÇA DEMAIS! Aí está, meus leitores, o
“Breviário da Confiança”.
Não tem absolutamente pretensões literárias, nem se apresenta com a
autoridade de um TRATADO SOBRE A CONFIANÇA.
É uma palavrinha amiga para cada dia, uma gota de bálsamo para as feridas que a
vida nos vai abrindo também cada dia no pobre coração.
Mons. Ascânio Brandão
1 - O Jansenismo foi uma heresia de Jansen, bispo de Ypres, na França, condenada em 1653 pelo papa
Inocêncio X. Era rigorista, combatia a recepção frequente dos sacramentos e gerava medo de Deus.
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2 - Quietismo é uma heresia de Níquel Molinos que ensinava a passividade absoluta no trabalho da
própria perfeição. Foi condenada pelo papa Inocêncio XI e Inocêncio XII, em 1699.
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1 DE JANEIRO
MAIS UM ANO!
Sem a cruz não podemos viver. Sem ela não nos salvaremos. Nosso Senhor disse:“Quem não recebe a minha cruz e não me segue não é digno de mim” 1.Nosso
Divino Rei Crucificado abriu-nos a estrada real da santa cruz, a única que vai dar
ao Céu.
Como custa, Senhor, carregar o fardo tão pesado das amarguras da vida! Bem
dizia Jó: “A vida do homem na terra é um combate”. Dias há em que nos
sentimos desfalecer! E hoje começa mais um ano de lutas, mais um ano de
sofrimentos... Que nos reservam os dias que se vão suceder? O que for, ó meuDeus, da Vossa Santíssima Vontade! Os dias passam e a eternidade se aproxima.
Aproveitemos o tempo! Não pode ser este o último ano de nossa existência? Por
que não o aproveitamos para juntar tesouros para o Céu? E a minha mina desses
tesouros é a cruz. Dai-nos, Senhor, o conhecimento e o amor da cruz. Coragem!
Digamos do fundo de nossos corações: “Eis-nos aqui, Senhor, para fazermos o
que a Vós aprouver. Mais um ano de vida nos concede a Vossa Misericórdia! Que
saibamos aproveitar o tempo. Ensinai-nos a trabalhar para o Céu e fazer a Vossa
Santíssima Vontade!”
2 DE JANEIRO
O CORTEJO DO MENINO JESUS
Hoje a Santa Igreja festeja o Santíssimo Nome de Jesus e adora a Jesus Menino
nos braços de Maria. O nome de Jesus! Bálsamo suave para as feridas de nossoscorações! Quando nas horas de dor nos sentirmos levados a murmurar e à
irritação, digamos muitas vezes, até que passe a tempestade e se acalme nosso
espírito: “Jesus! Jesus! meu doce Jesus!” Muita devoção, almas que sofreis,
muita devoção ao nome de Jesus! Aceitai a sua cruz. Ei-lo, tão pequenino, a
chorar na manjedoura de Belém, e a derramar seu sangue na circuncisão! O
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nome de Jesus foi gravado em sangue.
É uma lição para nossas almas tão fracas, tão delicadas, que não querem sofrer.
Aceitemos o cortejo de Jesus. Sabeis qual é? Ouvi. Um dia, durante a Santa
Missa, o Menino Jesus apresentou-se a uma religiosa, alma simples, humilde,
com tal quantidade de cruzes na mão que mal as podia segurar. Grandes e
pequenas cruzes. Estas mais numerosas. Graciosamente lhe perguntou:
“Queres-me com todo o meu cortejo?” Ela respondeu: “Sim, eu te quero com
todo o Teu cortejo, ó meu querido Menino Jesus!”
Aceitemos corajosamente, amorosamente, o Pequenino e Divino Infante do
Presépio e dos braços de Maria, mas com todo o seu cortejo inseparável: as
cruzes grandes e, principalmente, as inumeráveis e pequenas cruzes de cada dia.
3 DE JANEIRO
O REPOUSO NO CÉU
A vida é para a luta. No Céu é que há repouso. Aqui somos soldados em combate,
só podendo descansar depois de alcançada a vitória. Nada de covardia nem de
desânimo! É preciso que a morte nos venha encontrar com as armas na mão. A
nossa peleja é pela conquista do Céu, onde encontraremos o repouso eterno,
esse mesmo repouso que imploramos na prece pelos nossos defuntos quando
dizemos: “Dai-lhes, Senhor, o descanso eterno”.
O sofrimento é o nosso purgatório na terra. Dura pouco, pois tudo passa
depressa no mundo. É rica mina de que, se soubermos aproveitar o ouro,
ganharemos um tesouro de paz, na terra, e aquele eterno repouso que Nosso
Senhor nos reserva no Céu. Paciência! Coragem! Vale a pena sofrer tão pouco
para ganhar tanto!
“Um eterno repouso, dizia Santo Agostinho, deveria ser comprado por um
trabalho eterno. Mas como é grande a Misericórdia Divina! Deus não nos diz:
“trabalhai um milhão de anos, nem – mil anos, mas sim – trabalhai, sofrei
durante o pouco tempo que viveis na terra e adquirireis um repouso sem fim.”
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Por um repouso eterno não vale, pois, sofrer um pouco nesta vida tão fugaz?
4 DE JANEIRO
SEJA FEITA A VOSSA VONTADE!Toda santidade consiste em fazer a vontade de Deus. “Não acreditemos, dizia
Santa Teresa, que o nosso adiantamento na perfeição depende de algum meio
desconhecido e extraordinário. Não, todo nosso bem consiste na conformidade
da nossa vontade com a vontade de Deus.2 É o que assim diz Nosso Senhor no
Evangelho: “Nem todo o que Me diz: “Senhor! Senhor! – entrará no reino dos
Céus, mas o que faz a vontade de meu Pai, que está no Céu, esse entrará no reino
dos Céus.3 “Fazer a vontade de Deus! Eis aí a perfeição, a santidade, a justiça.”“Quem se une à vontade de Deus, diz Santo Afonso, vive e se salva; quem dela se
separa, morre e se perde.”4 Não tenhamos ilusões sobre a perfeição cristã.
Façamos o que Deus quer, resignados à Sua Santíssima Vontade. FAÇA-SE A
VOSSA VONTADE! No Pai Nosso, rezamos todos os dias: “Seja feita a vossa
vontade assim na terra como no Céu”, Não é isso um ato de resignação à Vontade
de Deus? Por que mentir, rezando assim, quando tivermos o coração revoltado
contra a Santíssima Vontade de Deus? Convençamo-nos de que Nosso Senhor é
Pai, é o Pai das Misericórdias, Deus de Toda Consolação, e que só quer o nosso
bem, a nossa salvação eterna. As cruzes que Ele nos envia são para o bem de
nossa alma. Só Ele sabe o que precisamos. Não podemos compreender os seus
desígnios, nem conhecer os seus caminhos. Curvemos a cabeça. Seja feita a
Vossa vontade, ó Senhor!
5 DE JANEIRO
FAZER O QUE DEUS QUER, QUERER O QUEDEUS FAZ
Eis a síntese da perfeição, o meio seguro de se chegar à santidade. Fora disso, a
ilusão, o risco da perdição! Toda a perfeição consiste em que executemos o que
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Deus quer de nós. “Se nos queremos santificar, diz o Padre Saint Omer C.SS.R.,
basta que, renegando a nossa própria vontade, façamos sempre a de Deus,
porque todos os preceitos e todos os conselhos Divinos se resumem, em
substância, em que devemos sofrer tudo o que Deus quer e como Deus quer.”5
Não é tão simples?
A uniformidade da nossa vontade com a vontade de Deus é o auge da perfeição.
“A vontade Divina, diz Santo Afonso, é a única regra do justo e do perfeito, e o
seu cumprimento dá a medida do nosso adiantamento.”
Guardemos bem esses princípios. Deus faz conhecer a sua vontade pelas regras
que nos traçou e pelos acontecimentos que nos envia, donde a vontade de Deus
significada e a vontade do bel-prazer Divino. A vontade de Deus significada, a
encontramos nos Mandamentos de Deus e da Igreja, nos Conselhos,Inspirações, Regras e Constituições. A do bel-prazer, nos acontecimentos de
nossa vida. Não é, pois, tão difícil conhecer a vontade de Deus. Um coração reto a
descobre logo. Em síntese: com a vontade de Deus significada e com a vontade
do bel-prazer Divino, façamos tudo o que Deus quer, e queiramos, de coração, o
que Deus faz! Nisto consiste a inteira perfeição, a santidade.
6 DE JANEIRO
OS DESÍGNIOS DE DEUS
Deus tem desígnios insondáveis sobre nós. Só ele sabe o que necessitamos. O
sofrimento que, às vezes, tanto nos revolta, é, podemos crê-lo, misericórdia, pura
misericórdia Divina. Na Eternidade louvaremos mil vezes a mão que nos feriu.
Dor bendita! Digamos com Santo André: “Ó boa cruz!” Peçamos a Nosso Senhor
que se cumpra a Sua Santíssima Vontade.“Oh! Se compreendêssemos os desígnios de Deus e os nossos verdadeiros
interesses, não poderíamos ter outro desejo senão o de Lhe obedecer, outro
temor senão o de não Lhe ser bastante obediente. Suplicaríamos e haveríamos de
importunar a Deus com as nossas orações para que se faça a Sua vontade e não a
nossa, porque abandonar a sábia e tão poderosa mão de Deus para seguirmos as
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nossas luzes tão pobres, e vivermos ao gosto de nossas fantasias, seria verdadeira
loucura e supremo infortúnio”.6 É loucura desprezar as luzes do Alto. Somos tão
cegos, e ainda queremos contrariar os desígnios de Deus sobre nós, claramente
manifestados na obediência e nos acontecimentos da vida! Cavamos assim a
nossa ruína e arriscamos a salvação eterna!
7 DE JANEIRO
OS TRÊS GRAUS DA CONFORMIDADE
São três os graus da conformidade com a vontade de Deus. No primeiro grau, a
alma sofre com paciência; mas preferiria não sofrer. Não é isento de queixa,
embora acompanhada sempre do estribilho: Não pode ser!... Paciência! Deusassim quis! Seja feita a Vontade de Deus! Já é agradável a Nosso Senhor a alma
assim resignada, mas ela se acha ainda na via do temor e da imperfeição. No
segundo grau, o sofrimento é acolhido como um hóspede do Céu, sendo
reconhecido o seu valor e as vantagens que traz para o nosso adiantamento. Mas
há ainda alguma queixa. A natureza não pode ainda dominar-se inteiramente.
Entretanto, a alma se conserva em paz e bendiz a Mão Divina que a fere. Já se
apresenta mais perfeita. No terceiro grau é alcançado o ideal da perfeição, que
consiste na santidade. Procura-se, ama-se o sofrimento. A alma se alegra porque
sofre e pode dizer, como Santa Teresa: Sofro, porque não sofro. O anjo do
Carmelo de Lisieux escrevia à sua irmã:
“Tenho necessidade de esquecer a terra. Aqui tudo me aborrece e só encontro
uma alegria, a de sofrer, e essa alegria ultrapassa a toda alegria”.7 É o ideal da
perfeição. Os principiantes têm a resignação que vem do temor; os adiantados, a
conformidade que vem da esperança; os perfeitos, o amor à cruz, que abraçam
com ardor. Ah! Sejamos generosos e abracemos a cruz na perfeição do amor.
8 DE JANEIRO
SENHOR! PENSAI EM NÓS!
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A adversidade é uma lembrança de Deus. Quando Ele a dá, Deus nos cumula de
graças escolhidas. É ela o caminho mais rápido seguro do Céu. A prosperidade é
para temer. “A ciência dos santos, escreveu Santo Afonso, consiste em sofrer
constantemente por Jesus Cristo. É pelo sofrimento que mais prontamente nos
santificamos. Às grandes almas reserva Deus grandes obras, em grandesprovações. Todas as obras Divinas têm o selo da cruz. As provações eram para os
santos o sinal mais certo das predileções Divinas”. O Bem-aventurado Henrique
Suzo teve, excepcionalmente, uma trégua nas provações que tanto sofria.
Queixou-se então às religiosas, suas filhas espirituais: “Tenho muito medo de ir
mal, disse ele, porque há quatro semanas que não sofro ataques de ninguém.
Tenho medo de que Deus não pense em mim”. Mal acabara de falar, vieram
dizer-lhe que poderosos perseguidores juraram matá-lo. Sentiu um momento de
horror. “Quisera saber por que mereci a morte”, disse ele. – “Por causa das
conversões que fazeis”, responderam-lhe. – “Oh! Então, louvado seja Deus!” E
voltou-se para as irmãs: “Vamos, minhas irmãs! Coragem! Deus pensou em
mim! Ele não me abandonou!”8
Verdade é que, quando sofremos, Deus pensa em nós. O sofrimento é um
pensamento de amor, de misericórdia, do Pai Celeste que nos quer salvar!
Senhor! Senhor! Pensai em nós!
9 DE JANEIRO
A MÃE E A MADRASTA
A adversidade nos assusta. Somos tão pusilânimes! Ela é um remédio amargo
que o Médico Celeste nos prescreve para curar-nos dos males que acompanham
a prosperidade. “A prosperidade, diz São Francisco de Sales, tem atrativos que
encantam os sentidos e adormecem a razão. Ela nos faz mudar
imperceptivelmente de vida, de tal sorte que nos apegamos aos dons e nos
esquecemos do Benfeitor”.9 Correr-nos tudo bem na vida nem sempre é bom
sinal. Cuidado! O Padre Jerônimo perguntou um dia a Santo Inácio como
alcançar caminho mais curto da perfeição e do Céu. Respondeu o Santo que era
sofrendo muitas e grandes adversidades por amor de Jesus Cristo. Não foi a
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senda das adversidades a trilhada pelos santos? Não há virtude sólida sem
provação. A adversidade é uma mina de ouro da qual se podem tirar as mais altas
virtudes e méritos inesgotáveis. “A prosperidade, dizia ainda São Francisco de
Sales, é madrasta da virtude, cuja mãe é a adversidade.” É nos braços de tão boa
mãe que nos salvaremos. Temos que sofrer a pena do pecado, ou aqui ou noPurgatório. A adversidade é um purgatório antecipado, menos terrível e mais
eficaz. Deus não castiga duas vezes a mesma falta. Depois de nos ter purificado
no crisol do sofrimento, como o ouro na fornalha, Ele nos achará dignos d’Ele, e
nos receberá como vítimas de holocausto. Ó adversidade, mãe boa, ainda que
austera, tomai-nos, salvai-nos! Quanto à prosperidade... Cuidado com a
madrasta!
10 DE JANEIRO
MARTÍRIO DE ALFINETADAS
As contrariedades e pequenos aborrecimentos de cada dia constituem o que
Santa Teresinha chamava martírio de alfinetadas. Custam mais, às vezes, do que
os grandes golpes. Ah! mas são tão preciosas essas pequeninas cruzes! Nem
sempre teremos ocasião de sofrer grandes provações e o martírio, mas teremos,
todos os dias, a cada momento, os pequenos sacrifícios. Constantemente
renovados, estes nos fornecerão quotidianamente muitas ocasiões para a prática
das mais raras e sólidas virtudes, tais como a caridade, a paciência, a doçura, a
humildade de coração, a benignidade, a renúncia ao nosso humor, etc. E essas
pequenas virtudes quotidianas praticadas fielmente nos farão uma rica messe de
graças e de méritos para a eternidade. “É por esse meio, diz Padre Caussade10,
que melhor do que por todas as práticas e todos os outros meios, podemos obter
o grande dom da oração interior, a paz do coração, o recolhimento, a presençacontínua de Deus e seu puro e perfeito amor”. Só essa cruz carregada
pacientemente nos dará uma infinidade de graças e nos servirá, mais eficazmente
do que as provações mais dolorosas, para nos levar à união com Deus e nos
desapegar de nós mesmos.
Muitas e pequeninas cruzes e provações, suportadas pacientemente, a todo
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momento, constituem tão precioso tesouro para o Céu! Custa sofrê-las, é
verdade, mas como são pequeninas, passam logo. Quanto mais ocultas, tanto
mais preciosas. Terá a glória do martírio quem aproveitar esse martírio de
alfinetadas!
11 DE JANEIRO
O TRIGO E A PALHA
Muita gente pensa ter a bênção de Deus só quando prospera, goza a vida e não
tem ocasião de sofrer. “É um engano, diz Santo Afonso de Ligório, porque é na
adversidade e não na prosperidade que Deus prova a fidelidade de seus servos e
separa o trigo da palha. Quem nas penas se humilha e se resigna à vontade deDeus, é o trigo destinado ao Paraíso. O que se orgulha e se impacienta, depois
abandona a Deus, é a palha destinada ao inferno. Quem traz a sua cruz com
paciência, acrescenta o santo, salva-se; quem a leva com impaciência, perde-se.
Sejamos o trigo bom e não a palha inútil. Temos todos a nossa cruz. Por que
iremos arrastá-la, murmurando contra o Senhor? Ele nô-la dá por misericórdia.
O tempo das provações é o tempo em que, longe de sermos esquecidos, somos
lembrados e muito bem lembrados por Deus. É o tempo da separação do trigo da
palha. A palha voa a qualquer sopro do capricho e do menor sofrimento. O trigo,
o bom trigo da alma resignada e paciente vai para o Celeiro Eterno. Não sejamos
tão leves como a palha. Saibamos sofrer e dominar o nosso orgulho, que se
revolta tão facilmente contra o Senhor. Deus nem sempre abençoa a
prosperidade, e não é gozando a vida que se chega à Vida. A palha vai para o fogo,
e o trigo, para o celeiro. Que no dia da separação do trigo da palha sejamos o bom
trigo, Senhor!
12 DE JANEIRO
COMO A VIDA É TRISTE!
O santo Cura d’Ars, pouco tempo antes de morrer, exclamou: “Como a vida é
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triste! Quando vim para a paróquia d’Ars, se tivesse previsto os sofrimentos que
me esperavam, morreria de apreensão”.
Há muita gente que pode dizer como o santo, depois de ter abraçado um estado
de vida penoso, como, por exemplo, o dos casados. E há momentos, Senhor, em
que o fardo da vida é tão pesado! Sentimos necessidade de desabafar o coração,
suspirando: “Como a vida é triste!” Soframos cada dia o que cada dia nos vem.
Não estejamos a dar rédeas à nossa imaginação, pensando no futuro, que nem
sempre nos é sorridente. “O futuro a Deus pertence”, diz o povo. Abandonemo-
nos cegamente nas mãos da Divina Providência. Tudo quanto nos vem do Alto é
bom. É para nosso bem. Tudo é bom para o Céu! Santa Teresinha não queria que
se chamasse vida a esta vida terrena, mas sim à vida eterna. Sua enfermeira,
vendo-a sofrer tanto nos seus últimos dias, suspirou: “Ah! Como a vida é triste!”– “A vida não é triste, minha irmã, exclamou Teresinha; é, ao contrário, muito
alegre. Se dissésseis que a terra, exílio, é triste, eu vos compreenderia. É um erro
dar o nome de vida ao que deve acabar logo. Só as causas do Céu merecem o
nome de vida. E por isso a vida não é triste; é alegre, muito alegre”.11 Vida do Céu!
Só ela é verdadeira vida! Vida da terra! Como és triste! Triste como a morte!
13 DE JANEIRO
TÃO POUCO, SENHOR, O QUE SOFRI!
Aqui achamos horroroso o pouco que sofremos. Gememos, e tanta blasfêmia nos
vem ao pensamento, e quase nos brota dos lábios, na hora das provações! E é tão
pouco o que sofremos, tão pouco! Que nos reserva, entretanto, Nosso Senhor,
no Paraíso? A felicidade eterna! Isto será, porventura, pouco? Somos, na
verdade, insensatos e injustos, quando nos queixamos demais do sofrimento.
Não sabemos medir a desproporção entre a recompensa que nos está reservada
no Céu e o trabalho que, para merecê-la, somos chamados a realizar nesta vida.
Os santos, já neste exílio abrasados no amor Divino, tão bem compreendiam esta
verdade que se apaixonavam pelo sofrimento. Quando deixarmos o desterro
penoso desta vida efêmera e, talvez, após o martírio das chamas expiatórias,
chegarmos ao Céu, à Pátria, e lá ouvirmos a doce melodia dos Anjos, o cântico
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eterno, e a felicidade que Deus preparou para seus eleitos, e extasiarmos diante
daquilo que os olhos nunca viram, os ouvidos nunca ouviram, haveremos de
bradar: “Ah! Senhor! Senhor! Tão pouco o que sofremos e tão grande a
recompensa! Jesus! Por que não sofremos ainda mais por Vosso Amor?...”
Se no Céu se pudesse sofrer e chorar, ah! sofreríamos, sim, choraríamos de
arrependimento, por não termos sofrido mais aqui na terra! Só temos esta vida
para sofrer e, por isso, se os santos a ela pudessem voltar, um único objetivo os
absorveria aqui: a posse e gozo do inestimável tesouro da cruz, dessa cruz pesada
que arrastamos, talvez revoltados e a blasfemar. Oh! Se soubéssemos aproveitar
bem a vida!
14 DE JANEIRO
QUE DIAS SOMBRIOS!
Há certos dias em que tudo parece estar conjurado contra nós, fazendo-nos
sofrer. Desde cedo, os espinhos! Esquecimentos, desprezos, indiferença dos
amigos, repreensões imerecidas, contratempos, dores físicas, mal-estar, cansaço!
Ai, Jesus, que tédio, que dia triste e sombrio!
Nessas ocasiões precisamos ter coragem e abraçar a cruz com generosidade. Não
queremos penitências. Horrorizam-nos os cilícios, disciplinas e jejuns. Haverá
ejum mais difícil do que se impõe à língua, quando ela quer queixar-se e até
blasfemar? E, mais doloroso do que qualquer disciplina ou cilício, não é o
martírio lento da monotonia de uma vida pesada e cheia de pequeninos
sacrifícios, contratempos e mil outros sofrimentos cotidianos? Ninguém vive
sem cruz, seja rei ou papa. Ninguém escapa às vicissitudes e dores inevitáveis.
Um bom meio de tranquilizar o espírito, acalmar o coração agitado, nesses diassombrios, é entregar tudo, sem reserva, nas mãos de Nossa Senhora. Uma Ave-
Maria, rezada com fervor e pausadamente, um olhar a uma imagem querida da
Mãe do Céu, um terço, principalmente, um terço bem rezado. Que bálsamo! Não
digais: “Não posso rezar”. Podeis, sim, podeis! Com um pouco de boa vontade se
acalma o coração. Não é Maria a Consoladora dos aflitos?
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15 DE JANEIRO
É DEMAIS...!
Não sejamos tão impacientes no sofrimento. A impaciência duplica-nos a dor. Oferido necessita de repouso. Quanto mais o enfermo se agita, arranha, coça e
mexe as feridas, tanto pior. Sofre mais e até se arrisca a uma infecção, que pode
ser fatal. Dá-se o mesmo com as feridas da alma, as feridas do coração. Quando
elas aparecem, vamos logo ao Médico Divino e Ele, tão misericordioso, há de
pensá-Ias carinhosamente, derramando sobre as mesmas o bálsamo suavíssimo
do seu Amor.
“Vinde a Mim, diz-nos Ele. Eu vos aliviarei.” Jesus, tão bom, ouve toda queixa,cura todas as feridas do coração. Na ordem da graça, porém, como na da
natureza, o processo da cura, se bem que seguro, é lento. Por que tanta
impaciência? O remédio queima, arde, mas é eficaz. Os doentes irascíveis e
impacientes arrancam o curativo e metem na ferida as unhas venenosas. É
perigoso. Não façamos assim, oh! não. Poderia ser fatal.
Convençamo-nos desta verdade, já tantas vezes experimentada; a impaciência
agrava o sofrimento, rouba-nos o mérito da cruz, torna-a mais pesada einsuportável!
Não digamos, portanto: “É demais! É demais!” – Santa Teresinha! dizia o
contrário: “Ainda mais, ainda mais, Senhor!” – Se não pudermos chegar a tanto,
resignemo-nos a dizer: Nunca é demais, Senhor, nunca é demais o que
sofremos, mas ajudai-nos a tudo suportar!”
16 DE JANEIRO
NÃO SABEIS O QUE PEDIS
Nosso Senhor prometeu ouvir todas as nossas orações. “Pedi e recebereis”; batei
e se vos abrirá. Que belas promessas e parábolas sobre a oração, as quais tanto
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nos animam e nos excitam à confiança! Entretanto, como Deus é Pai e melhor do
que nós sabe o que é bom para a nossa salvação eterna, nem sempre atende às
nossas preces. Por quê? Onde estão as suas promessas Divinas? Ah! Não
sabemos o que pedimos. Um pai extremoso dará ao filhinho travesso, para
brincar, um revólver carregado, uma faca, uma navalha? A criança chora, teima,mas não pode ser atendida. Seria uma crueldade atendê-la. Que pede muita
gente a Deus? A prosperidade temporal, bons negócios, saúde, honras, triunfos
que excitam a vaidade. E Nosso Senhor bem vê que tudo será mal aproveitado,
que a prosperidade, como péssima madrasta, será a ruína daquela pobre alma tão
fraca e tão leviana! E, deixando de atendê-la, manda-lhe cruzes e revezes.
Deixará Nosso Senhor de cumprir suas promessas? Não, mil vezes não! Muitas
vezes é melhor graça negar do que conceder o que pedimos.
Quando certa mãe pediu ao Mestre Divino dois lugares no Reino Eterno para
seus filhos, um à direita e outro à esquerda, disse-lhe Jesus: “Não sabeis o que
pedis!” O mesmo se pode repetir a quantos pedem a Deus os bens temporais e se
esquecem dos bens eternos. Ah! É bem verdade isto: Deus nega por misericórdia
o que concederia por justiça e por castigo. Oh! se soubéssemos!...
17 DE JANEIRO
O ACASO!
O acaso não existe. É uma palavra sem sentido, vazia, a laicização da Providência,
para uso dos corações maus, que querem livrar-se da submissão, da oração e do
reconhecimento. Uma alma cristã não usa esta linguagem bárbara: “É o
destino!... um acaso!... a fatalidade inevitável!” E a Providência? A Divina
Providência! Oh! Tanta gente que se diz devota e piedosa e, contudo, crê, como
os pagãos, num destino cego! O homem admite a fatalidade, porque desconhece
as combinações e planos Divinos, em que tudo, tudo, foi providencialmente
preparado. Como muito bem disse Joseph de Maistre, o acaso é o incógnito da
Providência. “Convençamo-nos, escreveu Mgr. Gay, de que, se no meio de tantos
acidentes de todo gênero de que a vida está cheia, soubéssemos reconhecer a
vontade de Deus, não condenaríamos nossos Anjos a verem em nós tantas
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admirações pouco respeitosas, tantos escândalos sem fundamento, tantas
cóleras injustas, tantos desânimos injuriosos a Deus, ai! e tantos desesperos que
muitas vezes nos põem em risco de perder-nos.”12 Divina Providência! Divina
Providência! Vossos caminhos, Senhor, são ocultos, e vossos desígnios,
misteriosos!
18 DE JANEIRO
A DOENÇA
A doença, olhada pelo prisma da fé, não é um mal. Deus a permite para nosso
bem, para a salvação de nossa alma. Fere o corpo para que não morra a alma. Ela
nos oferece grandes vantagens. Separa-nos dos loucos e pecaminosos prazeresdo mundo. Abate o corpo, que é sempre instrumento do pecado. Afasta-nos das
criaturas, da dissipação e de muitas faltas graves.
Faz-nos pensar na eternidade e na loucura das vaidades humanas. Quantas
desilusões do mundo num leito de dores! Saber aproveitar as lições da
enfermidade é receber uma multidão de graças escolhidas do Céu. São Francisco
de Assis, em vez de se queixar na doença, exclamava, cheio de gratidão: “Senhor,
os sofrimentos que me enviais são, aos meus olhos, incomparáveis tesouros. Agradeço a Vossa Misericórdia Infinita, que me castiga neste mundo para me
poupar na eternidade”.
A doença é um purgatório antecipado, e mais eficaz e proveitoso do que o outro
pelo qual teremos de passar, porque os méritos do sofrimento, neste mundo,
pelos do sangue de Jesus Cristo, são de um valor incomparável para resgate de
nossa dívida. “Neste mundo, disse Santa Catarina de Gênova, as pessoas doentes
acham o Purgatório no seu próprio corpo”. Por que não aproveitar a doença paraa expiação, menos dolorosa e mais fácil e eficaz, de nossos pecados, tão grandes e
numerosos?
19 DE JANEIRO
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PICADAS DE ABELHAS
Sofrermos da parte dos maus, sermos perseguidos, maltratados pelos inimigos,
por quem odeia a nossa fé, é doloroso, na verdade, mas suportável, e o
pensamento de que nada podemos esperar deles senão isso mesmo, leva-nosfacilmente à resignação. Nosso Senhor não foi saciado de opróbios pelos seus
inimigos? E pode o discípulo ser melhor que o Mestre? Há, porém, uma cruz
que, por ser mais pesada que muitas outras, é inevitável: o sofrimento que nos
vem da parte dos bons. Há tanto mal-entendido, tanta suspeita infundada, de
resultados fatais, em certas circunstâncias da vida! São Francisco de Sales chama
a esse sofrimento de picadas de abelhas. As abelhas não são tão boas? Dão-nos o
mel, a cera, trabalham tanto para nós! Há muita gente boa e generosa como as
abelhas, e que às vezes nos fere e nos magoa, talvez com boa intenção, por um
zelo amargo, um preconceito, ou qualquer outro motivo. Abracemos essa cruz,
que é de ouro! “Ser desprezado e acusado pelos maus, diz, na “VIDA DEVOTA”, o
melífluo Doutor, é até doce para um homem de coragem; mas, ser repreendido,
acusado, maltratado pelas pessoas de bem, pelos amigos, pelos parentes... como
é doloroso! Como as picadas das abelhas ardem mais que as das moscas, assim o
mal que se recebe das pessoas de bem, e as contradições que estas nos fazem, são
bem mais insuportáveis que as outras.”
Aceitemos as picadas das abelhas e não nos admiremos. Há tanta vespa neste
mundo, meu Deus!...
20 DE JANEIRO
OS BONS CARRASCOS
Bons carrascos são os indivíduos que, embora bons, virtuosos, de boas
intenções, mas levados, talvez, pela intriga, por uma excitação nervosa, por
excesso de mal-entendido e amargo zelo, maltratam-nos, perseguem-nos e nos
fazem sofrer. E não é raro isto. São Pedro de Alcântara, cheio de compaixão para
com Santa Teresa, disse-lhe que uma das maiores penas deste exílio era a que ela
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havia sofrido, isto é, a contradição das pessoas de bem. Vede quantos exemplos
desse martírio tão cruel para um coração sensível: São João da Cruz foi lançado
numa prisão pelos Padres da Observância, privado da Santa Missa, em rigorosa
abstinência, disciplina e insultos; Leão IX esteve prevenido contra São Pedro
Damião, por causa das más línguas; Santo Afonso teve como um dos seusgrandes perseguidores o Pe. Francisco de Paula, um homem de Deus,
virtuosíssimo, de uma vida exemplar. Disse o Pe. Luiz de La Puente, na Vida do
Padre Baltazar Álvares: – “...Os mais santos, enfim, podem-se fazer sofrer
mutuamente, ou porque se enganem, ou porque não compreendam as coisas do
mesmo modo. Haverá sempre entre os homens diversidade de vida e de
humores. Tenhamos paciência com os bons carrascos. Neste mundo não somos
todos da mesma forma. Há tanta variedade de gênio, educação, temperamento e
caráter! Os bons carrascos são inevitáveis!
21 DE JANEIRO
QUE BOA COMPANHIA!
Quando somos caluniados, nosso amor-próprio se revolta, porque nos sentimos
rebaixados e humilhados pelos que anteriormente nos admiravam e não seriam
capazes, sequer, de uma suspeita sobre o que se nos atribuem, com injustiça,
numa calúnia. Tenhamos paciência! Caluniado, perseguido, foi Nosso Divino
Redentor, e se calou. E os santos? O que sofreram! Santo Atanásio, perseguido,
caluniado, viveu longos anos escondido e tratado como feiticeiro. São João
Crisóstomo foi acusado como homem de maus costumes. A. S. Romualdo
atribuíram um crime tão horroroso e bárbaro que chegaram a procurá-lo para
queimá-lo vivo na praça pública. Tal a indignação causada pela calúnia! São
Francisco de Sales gemeu durante três anos sob calúnia de ter relaçõescriminosas com certa pessoa, e o santo tudo sofreu em silêncio. Santa Teresa e
São João da Cruz chegaram a ser presos. E Santo Afonso? Sofreu tanto, a ponto
de ser expulso da própria Congregação por ele fundada! E São Claret não foi
chamado “o grande caluniado do século XIX?
Que boa companhia! Não queremos, pois, suportar uma leve suspeita, uma
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palavrinha pouco verdadeira sobre a nossa reputação? Ai! Como somos
delicados! Quando formos caluniados, lembremo-nos, para nosso consolo, de
que estamos em boa companhia!
22 DE JANEIRO
QUE MAL FIZ EU?
Exprimem estas palavras, queixa injusta e irrefletida de muitas pessoas, quando
sentem o golpe das adversidades: “Que mal fiz eu para sofrer tanto?” O
sofrimento é consequência do pecado, e todo filho de Adão está sujeito à lei
divina que o decretou. Quando Jesus veio à terra para nos remir, tomou a cruz e
nela morreu, num oceano de dores. Teria feito algum mal Aquele que é a própriaJustiça, o Santo por excelência? Maria, concebida sem pecado, não teve, em
amarguras e cruéis angústias, toda a sua vida? E os santos? Há, porventura,
alguém que não tenha sofrido, e muito? Quão injusta, inepta e, ainda mais
blasfema, a expressão: “Que mal fiz eu para que Deus me castigue?” Que mal?
Um mal imenso; o pecado! Um só pecado grave nos faz merecer o inferno. E
quantos já cometemos!... O sofrimento é como o sol: nasce para todos.
Aceitemo-lo resignados e como discípulos de um Deus crucificado. É lícito que
nos queixemos, sem injustiça e blasfêmia, diante de Nosso Senhor, saciado de
opróbios? São Pedro Mártir, tendo sido lançado injustamente numa prisão,
queixou-se a Nosso Senhor: “Mas que crime fiz eu Senhor, para ser assim
castigado?” – “E eu, respondeu o Crucificado, por que crime fui pregado na
cruz?”
23 DE JANEIRO
A HUMILHAÇÃO!
A humilhação revolta. É o que fere mais dolorosamente o nosso amor-próprio.
Esmaga-nos e, quando nos bate, precisamos coragem e muita virtude para sofrê-
la em silêncio. E, sem a humilhação, ninguém pode saber se é realmente
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humilde. “A humilhação, diz São Bernardo, leva-nos à humildade, assim como a
paciência, à paz, e o estudo à ciência. Quereis experimentar se a vossa humildade
é verdadeira, até onde vai, se adianta ou recua? As humilhações vos fornecerão o
meio.”13 Quem deseja a virtude não pode fugir da via da humilhação, porque não
será levado pela humildade quem não suporta a humilhação. Diz São Franciscode Sales que muitas pessoas consentem em se humilhar, mas não querem ser
humilhadas. Estão erradas. Só se conhece bem o humilde verdadeiro na
humilhação. Que humilhações não sofrem os santos! E tinham sede, uma sede
insaciável de humilhações e desprezos! Se nos conhecêssemos bem à luz da fé, se
pudéssemos ver o que realmente somos, com aquele penetrante olhar dos
santos, saberíamos o que valemos, o que temos, o que podemos. E nos
capacitaríamos então de que, na verdade, só merecemos desprezos,
humilhações! Paciência nas humilhações, porque as merecemos!
24 DE JANEIRO
POR QUE A DOENÇA?
Primeiro, porque Deus a permitiu, e tudo que Deus permite, estejamos bem
certos disto, é para nosso bem. Depois, como a saúde, a doença e também um
dom de Deus. Nosso Senhor nô-la dá para provar nossa virtude e corrigir-nos de
nossos defeitos; para mostrar-nos a nossa fraqueza e os desabusar; para
desapegar-nos do amor às coisas terrenas e dos prazeres sensuais; para
amortecer o ardor impetuoso e diminuir as forças da carne, nosso grande
inimigo; para nos lembrar que estamos aqui no exílio e que o Céu é a nossa
verdadeira pátria; para dar-nos, enfim, todas as vantagens que se recolhem dessa
provação, quando se aceita com gratidão, como um favor especial.14 Quantas
vantagens! E ainda há quem pergunte, com desespero: “Por que a doença, meuDeus? Por que sofrer?”
“Bem santificada, escreve o Pe. Saint Jure, a doença é um dos momentos mais
preciosos da vida. Muitas vezes, num dia de doença, suportada como é preciso,
adiantamos mais na virtude, pagamos mais à justiça Divina pelos nossos pecados
passados, juntamos mais tesouros para o Céu, tornamo-nos mais agradáveis a
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Deus e Lhe damos mais glória do que numa semana ou num mês de saúde”.15
E ainda perguntais: “Por que a doença?”
25 DE JANEIRO
O APÓSTOLO DE JESUS CRUCIFICADO
São Paulo é o Apóstolo da Cruz. Só quis conhecer e pregar Jesus Cristo
crucificado. Por isso foi o Vaso de eleição para levar o nome de Jesus aos gentios.
“E eu lhe farei ver, disse o Senhor a Ananias, como é preciso sofrer pelo meu
nome”.16 O grande Apóstolo se gloriava nas suas dores, nas suas fraquezas, para
ter a força Divina. E não temia nem os ultrajes, nem as injúrias, perseguições,
desprezos, açoites, por amor de Jesus Cristo, com quem vivia tão estreitamente
unido, até à identificação, essa sublime identificação de que ele se fez o arauto.
“Vivo, escreveu ele, mas já não sou eu que vivo, vive em mim Cristo”. Eis o
segredo de todos os prodígios do seu apostolado, da conversão de tantos gentios
e de sua pregação eficaz e maravilhosa. São Paulo foi saciado de amarguras desde
que conheceu Jesus Cristo e resolveu pregar a loucura da cruz. Ele nos ensina a
pagar o mal com o bem, a ser pequeno, humilde, a padecer afrontas e desprezar
as frivolidades do século. Prega Jesus crucificado. Ó doce e preciosa doutrina!Que riqueza! As epístolas de São Paulo consolam o coração aflito! Quando Saulo
caiu na estrada de Damasco, perguntou a Deus: “Senhor, que quereis que eu
faça?” E foi fiel à graça, à vontade de Deus! Na estrada de nossa vida, quando nos
fulminar algum desses raios de dor, voltemo-nos para o Céu e consultemos a
vontade Divina: “Meu Deus, que quereis que eu faça?” E aceitemos o que vier do
Céu!
26 DE JANEIRO
TRABALHAR, SOFRER, MORRER!
Nas horas de angústia, nos momentos tristes e amargos da vida, quando as
tribulações e a adversidade nos visitam com todo o seu doloroso cortejo, ah!
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extraordinárias”:
“Quanto a mim, conclui o santo, não sei nem conheço outra perfeição senão
amar a Deus de todo o coração e ao próximo como a si mesmo.”
Há devotos fervorosos, anjos na Igreja, a rezar e a comungar, quando em casa,longe estão de se conformarem com a vontade de Deus, e se fazem demônios de
ira e impaciência! Rezam piedosa e docemente, de cabecinha torta: “Faça-se a
vossa vontade assim na terra como no céu”.
Em casa levantam a cabeça, blasfemam contra a Providência e se queixam da
vida, como não o faria um pagão. Seria melhor que assim corrigissem o “Pai
Nosso”: “Seja feita a vossa vontade, contanto... que se faça a minha!”
É falsa toda a piedade que não se basear no cumprimento da vontade de Deus.Portanto, meus amigos, paciência! paciência! Se é vontade de Deus que
soframos, resignemo-nos. “Faça-se a vossa vontade.” Isto é a perfeição, a
santidade.
28 DE JANEIRO
NA ADVERSIDADE SE PROVA A DEVOÇÃO
Há muitas almas cristãs que vivem e pensam como pagãos. Escandalizam-se com
a cruz. Não se conquista o prêmio sem luta, sem sacrifício. Descanso, paz, gozo
perfeito, só no Céu.
A terra é lugar de combate. Disse-o o profeta Jó: “A vida do homem neste mundo
é um combate”.
Aqui na terra não haverá descanso completo. Adoremos os desígnios de Deus,
que assim permitiu para que mais meritória se tornasse a nossa conquista do
Céu! Na adversidade é que se conhece quem tem verdadeira ou falsa devoção.
Ser devoto fervoroso, quando tudo nos corre bem na vida, quando a fortuna nos
sorri, quando as honras e a glória nos seguem, não é tão meritório nem pode dar
bem a conhecer se a devoção é realmente sólida e sincera. Disse com razão Santo
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Afonso, que é na provação que se conhece a virtude de uma alma.
Muitas almas mimosas, delicadas e suscetíveis, só fazem a vontade de Deus
enquanto Deus lhes faz a própria, quando tudo lhes corre bem na vida. No
sofrimento, na adversidade, abandonam a Deus, queixam-se da Providência,
blasfemam contra a Bondade Divina.
Falsa piedade! Falsos devotos! Se, à luz da fé, olharmos as coisas deste mundo,
chegaremos à conclusão de que aqui, muitas vezes os males não são males, os
bens não são bens, e de que há desgraças que são golpes da Providência, e
sucessos que são castigos.
29 DE JANEIRO
UM MESTRE ADMIRÁVEL
São Francisco de Sales é um mestre admirável na arte de curar e aliviar as feridas
da alma. É o santo da doçura e da paciência. Que riqueza de ensinamentos
contêm os seus escritos! Consolam e desafogam tanto o coração oprimido! Fazei,
nas aflições, uma boa leitura de São Francisco de Sales. Que alívio tereis! O
grande e melífluo Doutor não nos aconselha as penitências corporais, duras em
excesso e que assustam a nossa fraqueza.
Quer ele, de preferência, que aprendamos a mortificar a nossa vontade, abater o
nosso orgulho e amar o próximo, aceitando o que Deus nos envia com resignação
e doçura.
“Os que procuram as mortificações voluntárias, escreve o santo, caminham a pé
sob o estandarte de Cristo. Aceitar, porém, as cruzes que Deus nos envia e
pacientemente suportá-las, é andar a cavalo”. Hoje diria o santo: “... é voar deavião”.
“Lembremo-nos, escreve ele, da coroa celeste, que não se concede sem vitória,
não se obtém sem combate. É bom, pois, que achemos agradáveis os combates
das tribulações. Ah! se pudéssemos contemplar a glória, veríamos que nada são
as aflições e perturbações contínuas. Por que nos hão, pois, de afligir as
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pequenas dificuldades que Deus nos envia? E por que nos impacientaremos com
tão pouco, se uma só gota de humildade bastaria para nos fazer suportar, com
paciência, o que justamente nos sucede em castigo de nossos pecados? Ó São
Francisco de Sales, ensinai-nos a sofrer!”
30 DE JANEIRO
SEJAMOS RESIGNADOS NA DOENÇA
Esta resignação é tão agradável a Deus que, em pouco tempo de doença,
enriquece a alma de mais tesouros de graças do que, em saúde, mil obras de zelo
e caridade.
“O que glorifica a Deus, diz Santo Afonso, não são as nossas obras, mas a nossa
resignação e conformidade da nossa vontade com a do Senhor!”
Sofrer como Jesus Cristo não é sofrer, dizia outro santo.
A doença nos abate e leva ao desânimo. Almas piedosas se sentem como que
abandonadas por Deus, acabrunhadas, tristes. Tudo na vida lhes parece tão
diferente, tão doloroso, tão cheio de tédio e amargura! Oh! A monotonia de um
quarto de doente! Longas horas de silêncio, de abandono e sofrimento!Paciência, alma cristã! Procura um crucifixo, uma imagem de Nossa Senhora e
reza ao menos uma breve jaculatória: “Faça-se a Vossa Vontade, meu Deus!”
“Não digamos a Deus senão esta jaculatória, dizia o citado Santo Afonso: Faça-se
a Vossa Vontade! Repitamo-la, do fundo do coração, cem vezes, mil vezes,
sempre. Daremos mais prazer a Deus só com esta palavra do que com todas as
mortificações e devoções possíveis.”
A fé é um bálsamo consolador para nossas almas em todas as vicissitudes da
vida. Se tivéssemos mais fé sofreríamos muito menos.
31 DE JANEIRO
AS MISERICÓRDIAS DO SENHOR
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Na doença como na saúde, a alma cristã deve exclamar: Senhor! Faça-se a Vossa
Vontade!
Santo Afonso dizia nas enfermidades: “Senhor! Eu nem desejo sarar nem
permanecer doente. Somente quero o que Vós quereis”.
“Por isso, acrescentava, o melhor e mais perfeito é não pedir nem a saúde nem a
doença, mas abandonar-se à Vontade de Deus, a fim de que Ele determine o que
Lhe aprouver”.
São Camilo de Lelis teve cinco longas e dolorosas enfermidades, que ele chamava
de “misericórdias do Senhor”.
A doença, se fere o corpo, cura muitas vezes a pobre alma enferma.
Salviano costumava dizer que a doença é um meio tão comum de santificação
para as almas, que muitas pessoas nunca chegariam à santidade se gozassem de
uma boa saúde.
Resignai-vos, almas que sofreis! Nessa enfermidade que vos acabrunha e abate,
nessas horas penosas e longas de tantas dores, está a Vontade de Deus, a Mão
misericordiosa de Deus a vos amparar e livrar de tantos males, pecados e
desgraças! Um dia tudo isso veremos claramente no Céu e abençoaremos a Mão
de Deus, que nos fez sofrer! Bendigamos a Mão de Deus que nos fere!
Louvemos as doenças, porque são elas as misericórdias do Senhor!
1 - Mt 10,38.
2 - Castelo interior 11 – Morada 1.
3 - Mt 7,21.
4 - Cam. Salvação – 1 – par. med. 77.
5 - Prat. de La perf. C. 1 , § 2 – Saint Omer C. SS. R.
6 - D. Lehodey – Le Saint Abandon (O Santo Abandono) – p. 1. cap. 1.
7 - Lettres – Sainte Therèse de L’Enfant Jesus – 5.e lettre à Céline, (Cartas – Santa Teresa do Menino
Jesus, Cartas à Celina).
8 - Beato Henrique Suzo – Exempl. c. XXX.
9 - Esprit de Saint François de Salles – c. X – 2.
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10 - Pe. Caussade – Abandon – 1-c. V.
11 - “Conseils et souvenirs. Sainte Therèse de L’Enfant Jesus” (Conselhos e Lembranças - Santa Teresa
do Menino Jesus).
12 - Mgr. Gay - Abandon .1 (Bispo Gay)
13 - D. Lehodey - Le Saint Abondon (O Santo Abandono)14 - Pe. Rodrigues - Perf. Christ, 80. tact. c. XVI.
15 - Pe. Saint jure - Com. et. am. N. S. C. I - III - c. XXIV.
16 - Atos 9,15-16.
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1 DE FEVEREIRO
BENDITO SEJA O NOME DO SENHOR!
O príncipe poderoso e rico, que era Jó, viu-se batido pelas maiores adversidades.No mesmo dia lhe deram a infausta notícia da morte de todos os filhos e da perda
de todos os seus haveres. Para completar o doloroso quadro, viu-se ele coberto
de lepra e desprezado por todos, até pelos mais caros amigos e pela própria
esposa. Calmo, sereno, em paz, o pobrezinho não proferiu uma só blasfêmia.
Limitou-se a pronunciar estas palavras que se tornaram célebres: “O Senhor me
deu, o Senhor me tirou. Seja bendito o seu santo nome!” E o Senhor, depois de
longa e cruciante prova, recompensou generosamente a paciência do seu servo.Jó recuperou tudo quanto perdera e morreu feliz e rico de bens do Céu e dos
bens da terra.
Deus nos fere para salvar-nos. Quanto maior for a adversidade, tanto maior será
a recompensa. E o Céu está reservado para os que sofrem e sabem dizer como Jó:
“O Senhor me deu, o Senhor me tirou. Bendito seja o nome do Senhor”.
O Céu, dizia o Pe. Baltazar Álvares, é o reino dos tentados, dos aflitos, dos
desprezados, dos indigentes. Lá não se entra sem provações”.
Longe de lamentar a nossa sorte e de nos queixarmos da Bondade Divina,
deveríamos, nas aflições da vida, olhar para o Alto, imitar o profeta da Iduméa e
glorificar o nome do Senhor. Oh! Como é agradável a Deus a alma que, na
adversidade, ainda com lágrimas nos olhos, sabe dizer: Bendito seja o nome de
Jesus!
2 DE FEVEREIRO
A ETERNIDADE, O MUNDO, A VONTADE DEDEUS
A uma jovem que ia deixar o mundo para receber, num convento, o hábito
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religioso, disse Santa Catarina de Gênova: “Que a eternidade esteja em vosso
espírito, o mundo sob vossos pés, a Vontade de Deus em todas as vossas ações e
que o Amor Divino brilhe em vosso coração!” A meditação destas palavras não
será para nós grande incentivo, poderoso estímulo no sofrimento e tribulações
da vida? Quem pensa na eternidade não vive de ilusões e compreende o queBossuet chamava a pavorosa seriedade da vida humana. Quem tem, no espírito,
a eternidade, sabe desprezar o que é caduco e efêmero.
Sob nossos pés esteja o mundo. A iconografia representa São Francisco de Assis
pisando o mundo e abraçado a Jesus Cristo na cruz. Façamos também assim.
Esteja o mundo sob nossos pés, para que possamos sentir a doçura, a unção
Divina das ternuras do abraço de Nosso Senhor na cruz. Não fomos criados
senão para isto: fazer a Vontade de Deus. A ela obedeçamos, pois, em todas asações de nossa vida.
“Ó Vontade de meu Deus, toda santa, toda amável, dizia Santo Afonso, quero
abraçar-vos!” Caros leitores, só com a prática desse desejo é que seremos felizes e
teremos segura a salvação.
Seja ela o nosso programa de vida!
3 DE FEVEREIROAQUI SE FAZ A VONTADE DE DEUS!
Quando vem a doença, ah! como custa a virtude da paciência! Pois é esse o
tempo mais precioso da vida durante o qual se enriquece a alma cristã com a
colheita de benefícios para o Céu.
Descuidamo-nos de fazer penitência voluntária pelos nossos pecados, e Deus, naSua Misericórdia, envia-nos a doença para purificar-nos e nos fazer
experimentar, desde já, um pouco do fogo expiatório do Purgatório. Com
pequeno sofrimento pagamos aqui uma grande parte da dívida que contraímos
com a Divina Justiça. Feliz o que sabe sofrer com paciência, pois amontoa
riquezas para o Céu!
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A perfeição consiste em fazer a Vontade de Deus, e esta tanto se faz com a oração,
assistindo à Santa Missa, com as obras de caridade, ou retido, crucificado, a
padecer, num leito de dores.
Um só ato de conformidade, com a Santíssima Vontade de Deus vale mais, na
doença, para a glória de Deus, do que mil trabalhos na saúde.
Tal é a doutrina dos santos, havendo a experiência comprovado o valor e a
fecundidade do sofrimento na Igreja. Durante a última doença de Santo Geraldo
Magela, mandou ele escrever o seguinte na porta da sua cela:
“Aqui se faz a Vontade de Deus!” E o santo dizia, sorrindo: “Penso que meu leito
é para mim a Vontade de Deus. Esta Santa Vontade e a minha se unem aqui.”
Perguntando-lhe o médico se preferia a vida ou a morte, disse: “Não quero vivernem morrer, quero o que Deus quer!”
Sublime resposta! Pedi a Nosso Senhor que vos dê a conformidade com a Sua
Santíssima Vontade.
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4 DE FEVEREIRO
O OURO DA PACIÊNCIA NA BOLSA DASTRIBULAÇÕES
Nas tribulações, quando nos impacientamos, perdemos um rico tesouro de
graças que, aproveitadas, dariam um aumento de glória no Céu e um bom
desconto nas dívidas de nossos enormes pecados.
Vai esclarecer-nos uma parábola. Um rei mandou prender dois súditos que lhe
deviam grandes somas e nada possuíam para resgate das dívidas. Sua Majestade
foi à prisão, levando duas bolsas cheias de ouro, que atirou com força às cabeças
dos seus devedores. Um deles, indignado, com a cabeça a latejar de dor,arremessou para um canto, sem ter querido saber de seu conteúdo, a bolsa que
lhe fora destinada. O outro, apanhando a bolsa, agradeceu ao rei, resgatou a
dívida com o dinheiro recebido, e saiu da prisão. Estamos no caso dos dois
prisioneiros. Temos dívidas enormes contraídas para com Deus. Dívidas de
pecados, de abusos da graça, etc. Nosso Senhor tem piedade de nossa miséria e,
para nos livrar da triste escravidão do pecado, manda-nos o ouro da paciência na
bolsa das tribulações, a fim de resgatarmos as nossas dívidas com esse tesouro. Aos que suportam com paciência o golpe dessas tribulações e, apanhando a
bolsa, aproveitam o ouro para o pagamento de suas dívidas, a graça em
abundância, o perdão, a misericórdia! Aos que, com orgulho, revoltam-se contra
o Rei dos Céus que, para salvá-los, feriu-os com a bolsa de ouro das tribulações –
a prisão do pecado, aqui, a prisão do inferno, na eternidade.
Dai-nos, Senhor, o ouro da paciência na bolsa das tribulações!
5 DE FEVEREIRO
A VARA E A SERPENTE
São Francisco de Sales, admirável nas suas comparações geniais, referindo-se à
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vara de Moisés, que se transformava em serpente quando no chão, e voltava a ser
vara na mão do profeta, escreveu:
“Se olhais para a terra, a vara, de que se serviu Moisés diante do Faraó, é
medonha serpente, mas, se a vedes na mão de Moisés, é uma varinha com a qual
ele opera milagres. São assim as tribulações. Consideradas em si, na verdade, são
horríveis e intoleráveis; consideradas na mão de Deus, são amáveis e deliciosas”.
E a vara, na mão de Moisés, não fez tantos prodígios? Acostumemo-nos a olhar
as adversidades com mais espírito de fé, nunca isoladas, separadas da Mão de
Deus. Na Mão de Deus, a vara das tribulações é vara e nada mais. Não assusta, e
é capaz de fender o rochedo de nossos corações para fazer brotar neles fontes de
graças e lágrimas suaves e redentoras da Contrição. Fora nos horroriza, é
medonha serpente e venenosa demais...Meu Deus, não permitais que eu considere o meu sofrimento deste mundo fora
das vossas Mãos! Livrai-me da serpente venenosa! Estejam meus sofrimentos
em vossas mãos!
6 DE FEVEREIRO
“OS CRUCIFICADOS”
Crucificados são os que, como São Paulo, completam em si a paixão de Jesus
Cristo, os que não querem outra ciência a não ser a da cruz do Mestre e os que
podem dizer, como o Apóstolo: “O meu viver, a minha vida é Cristo”. E se poderia
acrescentar: Cristo crucificado! – Nosso Senhor quer almas reparadoras, almas
crucificadas para a salvação do mundo. No diálogo II de Santa Catarina de Sena,
disse o Pai Eterno: “Os perfeitos devem tornar-se mediadores entre Mim e os
homens caídos no abismo do pecado, porque é pela mediação de meus amigosque eu hei de conceder misericórdia ao mundo. Podem ser chamados de outros
“Jesus crucificados”. Meu filho único veio como Mediador para curar o homem
da miséria e reconciliá-lo Comigo, sofrendo com paciência até a morte
ignominiosa da cruz. Assim fazem os que estão crucificados pelos seus santos
desejos. Tornam-se mediadores por suas humildes orações, exortações e vida
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santa, que os tornam modelos de todos. Brilham eles como pedras preciosas de
virtude, suportando pacientemente os defeitos do próximo”.1
Graças a Deus há na Igreja muitos “crucificados”, talvez ocultos, ignorados no
silêncio do claustro e até no bulício do mundo, nos hospitais, nos conventos. São
as almas pacientes, que se sacrificam pela conversão dos pecadores, almas
reparadoras. Não havemos de querer para nós a honra dos “crucificados”?
7 DE FEVEREIRO
A CHUVA DE OURO
Um lavrador, dizia o célebre jesuíta Pe. Baltazar Álvares, um lavrador plantou
bela e extensa vinha. Um temporal com granizo devastou-lhe as plantações.
Que prejuízo, dir-se-á, que desgraça!
Porém... Oh milagre! Os granizos eram de ouro e de pedras preciosas. Colheu-os
todos o lavrador com lucro incomparável em relação ao prejuízo sofrido com a
devastação do vinhedo.
Pois bem! São de ouro os desprezos, sofrimentos, adversidades e aflições que
caem, como granizo, sobre uma alma verdadeiramente paciente. O que ela ganha vale infinitamente mais do que o que perde.
Almas cristãs, vamos acalmar os nossos corações tão perturbados pela
impaciência!
Adoremos em tudo os desígnios da Divina Providência! Se nos quiser Deus no
sofrimento, na contradição, na doença, nas amarguras... Paciência!
Quanta tribulação na vida! Aceitemos tudo com resignação, como granizo caídodo Céu. Granizo que mata nosso amor- -próprio, destrói a erva daninha de nosso
orgulho, arrasa a nossa vinha da vaidade, de prazeres e riqueza, os granizos de
ouro que foram as tribulações da vida, sofridas por amor de Deus. Bendita chuva
de ouro!
8 DE FEVEREIRO
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O PEREGRINO LOUCO
Tudo nos indica que aqui não temos moradia permanente. No dizer do Apóstolo:
Somos peregrinos, viajores, com destino ao porto da Eternidade e à morada doCéu.
A Igreja nos chama “viator”, viajante, caminhante. À Sagrada Eucaristia dá a São
Tomás de Aquino o nome de “Pão dos Anjos” e “Pão dos Viajantes”.
Peregrinos em terra estranha, no exílio, longe da verdadeira pátria, que podemos
esperar senão amarguras, desprezos e lágrimas? Pode alguém ser feliz no exílio?
Na – “Salve-Rainha” – gememos: “A Vós bradamos os degredados filhos de Eva”.
Só depois do exílio é que Maria nos há de mostrar a Jesus, bendito fruto de seu
ventre. Já que somos peregrinos, por que procurar loucamente, na terra, uma
felicidade que não existe? Se um peregrino, em viagem para a sua pátria, onde o
esperam os pais ricos e carinhosos, os amigos, a paz e a fortuna, se deixasse ficar
pelas estradas e se metesse por estradas tortuosas, em busca de aventuras e
tesouros fantásticos que só existem na imaginação e na lenda, não seria louco e
não se perderia? Ah! Somos também assim. E nossa loucura é maior, porque se
trata da verdadeira pátria e dos tesouros imperecíveis da Vida Eterna!
9 DE FEVEREIRO
TUDO QUE ME ACONTECE É PARA MEU BEM!
Deus não é Pai? E um pai deseja mal a seu filho? Vós, que sois maus, disse Nosso
Senhor, se vosso filho pede um pão lhe dais pedra, ou, se quer um peixe lhe dais
um escorpião?”
Quanto mais vosso Pai que está nos Céus! E essas graças, esses golpes doloridos
e revezes da fortuna e calamidades, é tudo, tudo para nosso bem! Nem sempre
para o bem temporal, mas sempre para o bem eterno! Podemos dizer, cheios de
confiança, e resignados, em todos os sofrimentos: Tudo que me acontece é para
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meu bem! A Divina Providência vela por nós. Deus é Eterno e Misericordioso.
Eterno, quer que desprezemos as coisas temporais e não nos esqueçamos dos
bens eternos. Misericordioso, inclina-se até a fragilidade, a miséria de nossa vida,
para nos socorrer, não caindo um fio de cabelo de nossas cabeças sem a sua
Vontade Divina.
Um piedoso fidalgo, conta o Pe. Huguet2, tinha o costume de dizer sempre, em
todos os acontecimentos da vida: “Tudo que me acontece é para meu bem!” Um
dia, no momento de embarcar em viagem para a Inglaterra, caiu e fraturou as
pernas. Não deixou de exclamar: Tudo que me acontece é para meu bem”. Os
amigos, admirados dessa linguagem, disseram-lhe: “Então será para teu bem
quebrarem-se as duas pernas, além de ficar prejudicada a tua viagem de negócios
sérios e importantes?” – “Sim, replicou ele, Deus sabe o que faz! Creio que tudoaconteceu para meu bem”. Poucos dias depois se soube que naufragara o navio
em que o piedoso fidalgo deveria viajar.
10 DE FEVEREIRO
PARTIRAM ANTES...
Não choremos os nossos mortos como quem não crê na ressurreição da carne,como os que não têm esperança. A saudade é amarga e dolorosa, e as lágrimas
não podem deixar de correr quando o golpe da morte nos vem arrebatar os que
tanto amamos. Chorar os nossos mortos não é um mal. Nosso Senhor não
chorou sobre a sepultura de Lázaro? A fé não nos condena à insensibilidade, à
dureza de coração. Sim, deixemos que corram essas lágrimas saudosas e
irreprimíveis. Choremos, sim, os nossos mortos, mas choremos como quem tem
fé. Um dia os veremos na verdadeira Pátria, onde não haverá mais luto nem
dores. Olhemos para o Céu e enchamos o coração de esperanças. Também nós
partiremos, um dia, e tornaremos a ver aqueles que tanto amamos neste mundo.
Os que partiram, não os que perdemos para sempre. São Cipriano escreveu,
numa bela carta de consolação, este pensamento:
“Não choreis desesperadamente os que o Senhor livrou deste mundo. Eles
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partiram antes, numa viagem que também havemos de fazer”. Entre os que
viajam neste mundo, por terra ou por mar, uns chegam antes, e outros, depois.
Uns vêm adiante, e outros, atrás. Os que morreram, meus caros, partiram antes,
apenas. Consolemo-nos! Não iremos também depois e não veremos os nossos
que já chegaram?
11 DE FEVEREIRO
SERÁS FELIZ NO CÉU!
À humilde Bernadete, na gruta de Lourdes, disse Nossa Senhora: “Não te
prometo felicidade aqui na terra, mas a felicidade do Céu”.
Os olhos inocentes da Pastorinha, que contemplaram a visão níveo-azul da gruta
de Mosabielle, nunca mais se puderam encantar pelas belezas da terra. “Depois
que se viu Nossa Senhora, dizia a Santa, só se deseja morrer, para Vê-la de novo
no Céu”. Nem as imagens mais belas, nem as festas mais brilhantes consolavam
o coração de Santa Bernadete. Deste mundo, ela só queria o sofrimento e o
Amor. Não tivemos a ventura de, com estes olhos mortais, contemplar, como
Bernadete, a beleza de Maria. Mas a fé não nos ensina que um dia A veremos na
Eternidade, no Céu? Que as belezas caducas não nos seduzam. E que aesperança do Céu nos conforme. No Céu, com Maria! Que felicidade! Soframos
um pouco neste exílio, com resignação. Nossa Senhora vela por nós. E, se
amarmos e invocarmos com carinho e devoção tão boa e terna mãe, oh! é certo,
bem certo que nos salvaremos. O servo de Maria não pode perecer, diz São
Bernardo. E, neste exílio tão triste, console-nos o pensamento de que veremos
um dia, no Céu, a Mãe, Refúgio dos pecadores.
No Céu! No Céu!Com minha Mãe estarei.
12 DE FEVEREIRO
O SOFRIMENTO VEM DE DEUS
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Sim, vem de Deus o sofrimento. Será possível?!... Tudo o que existe no mundo,
exceto o pecado, é verdade certa que vem de Deus, Criador de todas as coisas. As
trevas e o mal não se produzem por criação divina, mas por subtração da luz e do
bem. Diz a Sagrada Escritura: o Senhor, na sua munificência, nos dá a luz.
Retirando-se esta, vêm as trevas. O Senhor nos dá a paz, a sua graça. Abusamosda graça e ela se retrai, vindo o pecado. Só o pecado não vem de Deus. Tudo mais
que nos sucede é pela vontade do Senhor. E o sofrimento? Deus o sabe! Só
podemos garantir que ele é para nosso bem. Deus só faz o bem. Se alguém nos
dissesse que vira uma luz que produzia trevas, uma brancura que enegrecia, um
calor que gelava, não o acreditaríamos. E por quê? Porque os contrastes fazem
ressaltar logo o absurdo da afirmação. Pois é ainda mais absurdo, contrário à
natureza Divina, deixar Deus de fazer o bem. Portanto, nos sofrimentos, acima
das criaturas que nos ferem, olhemos para o Alto e adoremos os desígnios
Eternos, cheios de confiança, e certos de que, vindo, como vem, de Deus, todo
sofrimento é para nós um bem, um grande bem!
13 DE FEVEREIRO
O DIVINO CIRURGIÃO
A prosperidade gera muitas enfermidades graves. E não é possível curá-las sem
remédio amargo, sem regime, e, quando o perigo é iminente, sem operação. Há
de intervir hábil e sábio cirurgião. E é Nosso Senhor, o Cirurgião Divino da
Misericórdia. Médico e Pai de nossas almas, quem nos vem salvar. Pode uma
criança chorar, revoltar-se, gritar desesperada, quando, enferma, necessita de
uma operação dolorosa. Não importa! A operação há de ser feita e quem vai levar
à mesa operatória esse entezinho, objeto de todo o seu amor e ternura, é a
própria mãe carinhosa. Eventualmente, o pai, sendo médico, poderá ver-seobrigado a efetuar, ele mesmo a intervenção dolorosa, a cortar um braço, uma
perna do amado doentinho, a fim de evitar que, por exemplo, se generalize uma
gangrena, que seria fatal. Isto não é doloroso para o coração delicado e sensível
de um pai? Corta, fere, com lágrimas nos olhos. Nosso Senhor é o mais terno, o
mais delicado e o mais amável dos pais. A gangrena do pecado, gerada na
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ESCOLHE UMA CRUZ
Há duas cruzes ao lado de Nosso Senhor, no Calvário: a do bom e a do mau
ladrão. Sem cruz não se vive na terra. O sofrimento é condição de nossa vida.
Uma das cruzes nos há de pertencer. A do Bom Ladrão é a cruz do penitente.Dimas viu-se miserável, e pobre, carregado de crimes, pregado no madeiro
infame. Contemplou ao seu lado a Misericórdia, resignou-se ao sofrimento e
pediu a Nosso Senhor: “Senhor, lembrai-Vos de mim em Vosso Reino”. E ouviu
a doce voz da Misericórdia: “Hoje estarás comigo no Paraíso”. Valeu-lhe o Céu
um ato de conformidade à vontade de Deus, um olhar de confiança em Jesus
Crucificado. O mau ladrão amaldiçoa o seu destino, blasfema, renega a sua cruz e
se une aos que insultam a cruz de Jesus Cristo. Morre condenado.
Ambos na cruz, um se salva e outro se perde. Se não é possível evitar a cruz,
roubemos também o Céu, como o Bom Ladrão, pela resignação à vontade de
Deus, pela meditação da cruz de Nosso Divino Redentor. É o caminho mais curto
do Céu. Vede o que disse Nosso Senhor a Dimas: “Hoje estarás Comigo no
Paraíso”. Hoje! Como Nosso Senhor tem pressa em dar o Paraíso às almas
conformadas com a Sua Vontade Santíssima!
Lá está o Calvário, com as duas cruzes ao lado de Nosso Divino Redentor.Escolhe a tua cruz!
16 DE FEVEREIRO
QUEM DEVE MAIS?
Vivemos contando, medindo cuidadosamente os sofrimentos que nos afligem.
De nada nos esquecemos. Costumamos até exagerar as nossas dores. Trazemos
pesado e medido o sofrimento, e diante de Deus, nas orações, queremos ser
atendidos e não admitimos delongas.
São de São João Crisóstomo estas palavras: “Sois muito exatos em contar os
sofrimentos. E o sois, porventura, em contar os pecados que os provocam?
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Pensais, tão só, nos pecados que cometeis durante um dia, sem contar os
inumeráveis pecados de toda a vida, que não quereis conhecer. E vereis quanta
injustiça, quanta ofensa a Deus vos hão de chegar à memória!”
E temos coragem de medir, pesar as ofensas, os crimes que cometemos?
“Se Vós, Senhor, medirdes as nossas iniquidades, que será de nós?”
Examinemos cuidadosamente nossas consciências. Um olhar sobre a vida
passada, sobre a multidão de nossos pecados. E depois calculemos o que
havemos sofrido neste mundo. Não temos mais pecados do que sofrimentos? E
se um só pecado mortal merece um castigo eterno, que merecemos com tanto
pecado?
Quem deve mais?
17 DE FEVEREIRO
BENDITO SEJA DEUS!
Santa Teresa se oferecia a Deus cinquenta vezes por dia, para que o Senhor
dispusesse dela como quisesse, e se propunha a abraçar o que Nosso Senhor lhe
enviasse, fosse a prosperidade ou a adversidade. Eis o que é importante na vidade perfeição. Só isso basta para santificar em pouco tempo uma alma. Na
prosperidade, todo o mundo está disposto a conformar-se com a Vontade Divina.
Na adversidade, bem poucos.
Demos graças a Deus quando a sua misericórdia nos cumula de favores e bens
temporais. É muito bela a gratidão e atrai novas bênçãos do Céu! Mas... Não nos
esqueçamos de que a adversidade é também uma graça, e das maiores. Se
dissermos, na prosperidade, “Bendito seja Deus, por que não o fazermos tambémnas adversidades? Imitemos o Santo Profeta Jó e seremos agradáveis ao Senhor.
“Um só Bendito seja Deus, nas contrariedades, dizia o Pe. João D’Ávila, vale mais
do que mil orações de graças quando estamos na prosperidade e tudo nos corre
bem.”
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Nas alegrias e consolações? Bendito seja Deus!
Na doença ou na saúde? Bendito seja Deus!
Nas trevas ou na luz? Bendito seja Deus!
Como é agradável a Nosso Senhor uma criatura assim resignada, humilde,paciente! É uma pérola do Coração de Jesus!
18 DE FEVEREIRO
O VERME E O SERAFIM
Se a perfeição está em fazer a vontade de Deus, pouco importa, neste mundo ou
no outro, o lugar que a Providência nos reservou. Os Santos, no Céu, amam a
Deus com amor perfeito. E em que consiste esse amor?
Na conformidade com a Vontade Divina. Nosso Senhor nos ensinou a pedir o
cumprimento da Sua Santíssima Vontade na terra como no Céu. Não o dizemos
todos os dias no “Pai Nosso?” Aceitemos, neste mundo, o que Deus quiser, o
último ou o primeiro lugar. Quando se cumpre a Vontade de Deus, não há lugar,
nem ofício, nem condição desprezíveis neste mundo. Na cozinha dum Mosteiro
como na direção geral da Ordem, pode uma alma santificar-se e enriquecer-se deméritos para o Céu. Basta para isso a sua conformidade com a Vontade de Deus.
Só disso depende a nossa perfeição. Disse Santa Teresa: “O que nesta prática for
bem fiel receberá do Céu maiores dons e fará mais progresso na vida interior”.
Tinha razão o Bem-aventurado Henrique Suzo, quando, ao meditar essas
verdades, dizia: “Prefiro ser neste mundo o verme mais miserável da terra, pela
Vontade de Deus, do que um serafim no Céu, pela minha própria vontade!”
19 DE FEVEREIRO
O MONGE SANTO
Não há necessidade, para a perfeição, de austeridades espantosas nem de obras
maravilhosas. É muito simples a virtude e nada tem de complicado. Um ato de
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conformidade, um sim perene ou renovado a cada instante ao que Deus quiser.
Nada perturba a alma verdadeiramente abandonada à vontade de Deus. Tem o
paraíso da terra! Cesário conta de um monge simples, de uma vida nada mais
austera do que a de qualquer de seus irmãos, e que não obstante, operava
milagres estupendos. O abade não sabia explicar o fato, que causava admiração atodo o Mosteiro. O religioso, na sua vida monástica em nada se distinguia dos
seus irmãos. “Que devoções práticas, perguntou-lhe o abade, para que o Senhor
te dê a graça de operar tantos prodígios?” O pobre monge respondeu: “Sou o mais
imperfeito de meus irmãos e só procuro fazer uma coisa: conformar-me em tudo
com a Vontade de Deus”. E tornou a perguntar o abade: Quando puseram fogo
em nossas plantações e nos prejudicaram as terras, não te causaram tristeza a
nossa penúria e tantas outras desgraças que nos sucederam?” – “Oh! não, meu
Pai, replicou o monge, eu louvei a Deus e até fiquei contente. Deus tudo permitiu
para nosso bem. Louvado seja Deus!” O abade compreendeu logo que a
santidade daquele monge estava no seu heroísmo em aceitar os males e golpes
adversos e na sua conformidade, em tudo, com a Vontade de Deus!
20 DE FEVEREIRO
O SOL E A LUA“O homem santo, diz a Escritura, permanece na sabedoria como o Sol, mas o
insensato muda como a lua.”
O pecador insensato se distingue pela inconstância e impaciência em todos os
seus atos. Ora crê, ora descrê. Hoje ri, ditoso na prosperidade, regozija-se com
seus amigos, goza a felicidade até a embriaguez, até a loucura. Amanhã vem o
golpe da adversidade. Uma desgraça, uma doença, uma calamidade qualquer.
Chora até o desespero, revolta-se contra o Senhor, grita e se exaspera. Ora é
humilde, ora soberbo até a insensatez. Enfim, o pecador muda conforme a sua
situação de adversidade ou de prosperidade. E, do mesmo modo que a nossa vida
muda, como a lua, do gozo para a dor, da alegria para o luto, o pecador insensato
muda da felicidade para o desespero. Já não é assim o justo. Calmo, sereno,
permanece sempre igual, como o Sol, escondido entre nuvens ou a brilhar no
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zênite. Na fraqueza da sua natureza humana, sente, é verdade, mas se conserva
sereno, resignado, humilde. A prosperidade não o ensoberbece, a adversidade
não o abate. Se o exterior é, às vezes, sombrio e triste, como um dia sem sol, o
interior está calmo e sempre iluminado pelo Sol Divino, porque, atrás das nuvens
espessas de tantas amarguras, o sol de seu coração se conserva sempre brilhantee esplendoroso.
21 DE FEVEREIRO
ACIMA DAS NUVENS
Quem repousa tranquilamente no seio da vontade de Deus, eleva-se bem alto,
acima de todas as nuvens que toldam o céu de nossa vida e a enchem detempestades e relâmpagos. E quem, acima das nuvens, percebe a tempestade a
rugir, furiosa, a seus pés, e não pode ser atingido pelos raios, permanece calmo,
não teme. Quando só se deseja fazer, neste mundo, a vontade de Deus, o coração
não sofre as agitações e abalos tremendos como em dias de horrorosa
tempestade. Paira tranquilo, acima daquelas nuvens sombrias, resignado e todo
cheio da Vontade de Deus. Dessas almas resignadas disse Salviano: “Se estão em
baixa condição, assim querem ficar. Se na pobreza, querem ser pobres. No
sofrimento querem sofrer. Querem enfim, o que Deus quer. E sempre estão
contentes. Vem o calor, o vento, o frio, a chuva: Deus assim quis! Seja Deus
louvado! Vem a perseguição, a doença, a morte dos entes mais queridos? Deus
assim quis! Louvado seja Deus! Santa Madalena de Pazzi, chegada a esse grau de
abandono, ao pronunciar as palavras: “Vontade de Deus! Vontade de meu Deus!
– entrava em êxtase”.
Ó meu Deus! Meu Deus! Ensinai-me a fazer a vossa Santa Vontade. E que, nas
asas de Vosso Amor, eu paire acima das nuvens de minha vida, pejadas de raios e
tempestades, de tantas dores e aflições!
22 DE FEVEREIRO
A FILHA DE SÃO PEDRO
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São Pedro era casado antes do chamamento Divino e da sua vida apostólica.
Tinha uma filha, Santa Petronilha, que vivia sempre enferma e, na flor da idade,
gemia num leito, paralítica de todos os membros e a sofrer dores agudas e
cruciantes. O Príncipe dos Apóstolos fazia, em toda parte, estupendos milagres e
inúmeras curas maravilhosas. Perguntaram-lhe um dia: “Ó Apóstolo Pedro,operais tantas curas e até a vossa sombra realiza prodígios entre os enfermos; por
que, pois, a vossa presença em casa e o vosso amor paterno não curam
Petronilha, que tanto padece?” Propositadamente, respondeu o Apóstolo, deixo
minha filha enferma. Ela tem necessidade de ser doente para se salvar.
Entretanto, para vos provar que a posso curar, vou ordenar-lhe que se levante. –
“Levanta-te, Pretonilha, e serve a mesa”. A menina se levantou curada, serviu a
mesa e voltou depois para o leito, com as mesmas enfermidades. Petronilha era
bela, cheia de encantos, e poderia perder-se nas seduções do mundo. Deus a fez
enferma para livrá-la dos perigos, dar-lhe méritos para o Céu e santificá-Ia, até
que, do martírio do leito, fosse ao martírio glorioso dos primeiros dias do
Cristianismo. Quando Nosso Senhor, apesar de nossas orações, não nos ouve na
enfermidade, é porque nos trata com misericórdia, como São Pedro à sua filha.
Resignemo-nos!
23 DE FEVEREIRO
GRANDE PENA VIVER SEM PENA!
Esta era a máxima de Santo Agostinho. Os santos mais unidos a Nosso Senhor,
do alto da Montanha do Amor, divisam mais largos horizontes do que nós. Eles
sabem o que é Eternidade e o quanto vale sofrer por amor de Deus e para
salvação de nossa alma, destinada à felicidade eterna. Todos os santos foram,
não só pacientes e conformados no sofrimento, como apaixonados pela cruz: “Ousofrer ou morrer!” – exclama Santa Teresa. “Sofrer e ser desprezado por Vós!” –
dizia São João da Cruz.
Compreende o mundo essa linguagem? A nossa delicadeza e sensualidade não
acham exagero nessas expressões? Ah! Somos ainda grosseiros demais! A cruz
de Jesus Cristo nos escandaliza como escandalizava aos pagãos no tempo de São
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Pedro. Santo Agostinho, depois de tantos e tão funestos erros em busca da
felicidade, achou-a, finalmente, na cruz de Jesus Cristo. E ele podia dizer:
“Grande pena é viver sem pena!” Sim, porque, sem sofrimento, sem cruz, não há
méritos, não há virtude sólida, não há salvação garantida. Desde que Nosso
Divino Mestre nos remiu pela cruz, não pode haver salvação fora da cruz! E, se étão necessário sofrer, é também, na verdade, grande pena viver sem pena!
24 DE FEVEREIRO
O PÃO SEM AÇÚCAR E O AÇÚCAR SEM PÃO
Muita gente procura mais, na devoção, as consolações de Deus do que o Deus
das consolações – diz o autor da “Imitação”. Como as crianças que não procuramum alimento substancial, contentando-se com as guloseimas, confeitos e doces,
querem certas almas um fervor sensível, as doçuras da oração. Se Deus lhes
retira as consolações, queixam-se, abatem-se e murmuram. E não é raro que
cheguem até a deixar os exercícios de piedade. O amor Divino traz uma doçura
infinita, enche e transborda o coração, mas nem sempre é todo de alegrias e
consolações. Jesus Cristo é um Esposo Crucificado. E ninguém O pode amar
verdadeiramente sem a cruz. O pão da dor – de que fala o Salmista, deve ser o
alimento preferido das almas que aspiram a uma piedade sólida e seguem o
Divino Mestre até o Calvário. Santa Catarina de Sena experimentou tantas
securas na devoção que se julgou abandonada por Deus. Santa Teresinha,
durante longos anos, provou a mais cruciante aridez espiritual. E estas Santas
foram duas almas seráficas! Muitas almas preferem, como diz São Francisco de
Sales, o pão sem açúcar de uma devoção bem sólida e, mesmo sem consolações,
provam, até o sacrifício, o seu verdadeiro amor a Jesus Cristo. Outras querem
apenas açúcar das consolações e rejeitam o pão do sacrifício, pão substancial dador. Ó meu Jesus, prefiro o Vosso pão sem açúcar ao Vosso açúcar sem pão!
25 DE FEVEREIRO
UM SORRISO NA DOR
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Aceitar a dor sem queixa é virtude e virtude sólida. Aceitá-la com sorriso, é
heroísmo. Conheceis o clássico sorriso de Santa Teresinha? É um sorriso entre
rosas, mas rosas de espinhos duros e penetrantes. Quando vem o sofrimento, é
preciso recebê-lo bem, como quem recebe um hóspede querido. Pois assim fazia
o Anjo do Carmelo. Uma noviça quis ter uma prova da virtude heroica da Santa.“Dois meses antes da sua morte – diz a irmãzinha – fui fazer uma visita à Irmã
Teresa e, como tinha ouvido elogiar muito a sua paciência, veio-me a vontade de
a observar num momento de crise. E vejo logo o seu rosto revestir-se de um ar de
alegria e repontar de seus lábios um sorriso celeste. Perguntando-lhe então a
razão daquela mudança, respondeu: “Por isso mesmo que sinto dores fortes,
preciso amar o sofrimento e mostrar-lhe sempre boa cara”.3 Custa muito um
sorriso, quando se apresenta à nossa fraqueza a Irmã Dor. Custa, mas não é
impossível.
Havemos de recebê-la. É uma necessidade fazê-lo. Nosso Senhor a mandou. É
mensageira do Céu. É a Vontade de Deus. Se, como Santa Teresinha, não
pudermos recebê-la com sorriso doce e amável, sejamos delicados. Ela é boa,
veio do Céu, veio curar-nos. Que entre sossegada a Irmã Dor e não repare a
nossa grosseria se, por acaso, a recebermos sem um gesto amável e um bom
sorriso!
26 DE FEVEREIRO
PASSAI POR BAIXO!
É ainda o Anjo do Carmelo quem nos vai dar uma lição para as dificuldades da
vida. Há certas almas que acham tudo difícil. Se se lhes apresenta um embaraço,
abatem-se, querem vencer e não podem, querem passar sobre as dificuldades e o
acham impossível... E como sofrem! Numa grave tentação e sério embaraço na
vida espiritual, disse uma noviça a Santa Teresinha: “Não posso passar por cima
deste obstáculo!” – Respondeu a Santa: “Por que há de querer passar por cima?
Passe por baixo! É próprio das almas grandes voar lá por cima das nuvens,
quando cá por baixo ruge o trovão e se desencadeia a tempestade. Quanto a nós,
contentemo-nos em passar por baixo, com humildade e paciência. A propósito,
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lembro-me disto, que me aconteceu quando era criança: um dia estava um
cavalo à entrada do jardim, impedindo a passagem. Enquanto os circunstantes,
com cuidado em mim, discutiam o meio de desviar o animal, eu passei
sossegadamente por baixo deste. Eis aí como é bom ser pequenina e se conservar
cada um no seu tamanhozinho”.4
Com a paciência e a humildade, ficai semprepequeninos, como as criancinhas, e, quando algum cavalo das dificuldades da
vida vos ameaçar ou vos impedir a porta da paz de vossa alma, como Teresinha,
depressa!... Passai por baixo!
27 DE FEVEREIRO
OS MÁRTIRES
Quereríamos a glória do martírio. Que inveja nos causam os heróis cristãos na
arena do anfiteatro, nas prisões, nos cavaletes, na cruz! E podemos ter a glória do
martírio e de um martírio não menos glorioso do que o daqueles que
derramaram seu sangue pela causa de Cristo. Diz Santo Agostinho que o martírio
não consiste na pena, mas na causa ou fim por que se morre. E o Angélico
Doutor ensina que se pode ser verdadeiro mártir, morrendo no exercício de um
ato de virtude. Aceitarmos o que o Céu nos envia de sofrimento e de cruzes,
assim como, e principalmente, a morte, para agradar a Deus e nos conformar à
Sua Santíssima Vontade, – é, pois, martírio, e tem o mérito do martírio. E quem
faz esse ato, diz, com autoridade, Santo Afonso, ainda que não morra em mãos
do carrasco, tem o mérito do martírio.
As vozes autorizadas de três Doutores da Igreja afirmam que podemos ter a glória
do martírio sem derramar o nosso sangue, com a simples aceitação heroica da
vontade de Deus.
Não temos, porventura, em nossa vida tantas ocasiões de exercer heroicamente a
virtude da paciência? E o dever a cumprir cada dia, monótono, duro, quase
insuportável!... E o que sofremos dos que nos molestam? E a doença cruciante,
longa, talvez incurável? Não quereis, pois, a glória dos mártires? Por que não
aproveitais o martírio que Nosso Senhor vos envia? Que bela coroa reserva o Rei
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dos Mártires aos heróis e mártires da Santíssima vontade de Deus.
28 DE FEVEREIRO
INÚTIL...“Sou inútil” – geme alguém no leito de dores, reduzido a uma inação dolorosa.
Quer trabalhar, quer lutar como antes, e se vê amarrado, de mãos e pés, num
leito, preso à monotonia de um quarto de enfermo. Sou inútil! Que pensamento
cruciante, por exemplo, para um coração de apóstolo, sedento de lutar pela
salvação das almas, ao contemplar a seara amadurecida e..., sem operários. Ah!
Não digamos – sou inútil –, quando é vontade de Deus que soframos. Inútil era,
talvez, o nosso trabalho todo, sem vida interior, sem pureza de intenção. Deusnão precisa de nós. Somos puros instrumentos nas Suas Mãos Divinas. E o
instrumento pode ser robusto ou enfermo, grande ou pequeno. A salvação das
almas é Obra Divina. No leito de dores, o apóstolo pode salvar mais almas pela
paciência do que pelas mais brilhantes pregações. “O que glorifica a Deus – diz
Santo Afonso – não são as nossas obras, mas a nossa resignação e a
conformidade da nossa vontade com a Vontade de Deus”. O apostolado do
sofrimento, por ser o mais oculto e penoso, é também o mais eficaz. Escrevia
Santa Teresinha a um missionário: “Meu irmão, Deus quer firmar o Seu Reino
nas almas; muito mais pelo sofrimento e a perseguição do que por brilhantes
pregações”.5
Não és inútil na cruz da enfermidade, oh! não, bom apóstolo; estás firmando o
Reino de Deus nas almas!
29 DE FEVEREIRO
(Nos anos bissextos)
A VIDA DA GRAÇA E A VIDA DA GLÓRIA
A vida da graça é o gérmen do qual a vida da glória é o desabrochar. Passamos
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uma a lutar, na prova e a outra, na felicidade em triunfo. Quanto ao fundo,
porém, consistem na mesma vida sobrenatural e divina, que começa aqui na
terra e se consuma no Céu. Aliás, a vida da graça é a condição indispensável da
vida da glória, da qual determina e marca a medida. Deve-se pois, desejar uma
como se deseja a outra. Deus assim o quer, porque este é o fim supremo de nossaexistência. Nosso Senhor se ocupa em nô-lo fazer atingir, assim como o demônio
se ocupa em nos perder. As almas que compreendem o sentido do seu destino,
não têm outro objetivo, no meio dos trabalhos e vicissitudes da terra, senão o de
conservar a vida da graça, tão preciosa e tão disputada, em todo seu
desenvolvimento. Mas Nosso Senhor disse que, se o grão de semente não cai na
terra e não morre, não há germinação. Morramos, pois, na terra úmida e fria das
provações deste mundo, e deixemos que a semente de nossa vida, saciada de
amarguras e contradições, apodreça e morra, para que dela germine e brote a
vida da glória que esperamos gozar um dia no Céu!
1 - Diálogos. II - p. 1 29.
2 - Huguet - La perfection Chrétienne en exemples, S. C. V.
3 - “Conseils et souvenirs”.
4 - “Conseils et souvenirs”.
5 - “Lettres de Sainte Therèse de L’Enfant jesus à des missionaires” - 6.mer lettre.
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1 DE MARÇO
A CRUZ E A EUCARISTIA
Quereis a perfeição? Buscai-a nestas duas fontes: a Cruz e a Eucaristia. “Sealguém quer ser perfeito” – diz Nosso Senhor – tome “a cruz de cada dia”.
E não é a Eucaristia o pão da vida eterna, a memória da paixão de Jesus Cristo? A
ideia do sacrifício da cruz é inseparável a do sacrifício do Altar. Não se vive neste
mundo sem cruz, mas para nos ajudar a carregá-la, deu-nos o Senhor a
Eucaristia. Ó bondade, ó misericórdia do Coração de Jesus! Sempre nos convida
ao seu banquete de amor: “Vinde a mim, vós que estais sobrecarregados e que
tanto sofreis, vinde, Eu vos aliviarei”. Se a cruz é de todos os dias, todos os dias vamos também à Eucaristia. Quando se padece, alivia-se o coração com uma
visitinha ao Sacrário, com uma comunhão bem feita! “Os homens – dizia Jó –
são consoladores importunos”. Tomemos o hábito de correr logo ao Sacrário, à
mesa da comunhão, quando o sofrimento nos acabrunha, quando o coração está
sobrecarregado e ferido. Só Ele, só Jesus pode suavizar a nossa dor. Disse Nosso
Senhor a uma alma: “Quando quero conduzir uma alma ao cume da perfeição,
Eu lhe dou a cruz e a Eucaristia. A Eucaristia faz, primeiro aceitar, depois, amar
e, afinal, desejar a cruz. A cruz purifica a alma e a dispõe e prepara para o
Banquete Eucarístico. A Eucaristia nutre, fortifica a alma, ajuda a levar a cruz e
sustenta-a no caminho do Calvário”.
Haverá dons mais preciosos do que a cruz e a Eucaristia?
2 DE MARÇO
O AMOR DE DEUS E O AMOR DO BEM
Há sofrimentos inevitáveis aos que lutam no campo do apostolado: contradições,
ciúmes, perseguições. Quem tem a pureza de intenção e trabalha com os olhos
fitos em Deus, tudo vence e não se abate. O apóstolo imperfeito, de uma virtude
medíocre, desanima. “Há uma confusão – diz o Pe. Dosda1 – entre o amor de
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Deus e o amor do bem. Sofreríamos menos, se compreendêssemos melhor essa
distinção. Há circunstâncias em que precisamos deixar o bem que Deus não pede
de nós, para nos apegar só a Ele e entregar-nos inteiramente à Sua Divina
Providência. A procura do bem não é verdadeira caridade, quando se quer o bem
com uma intenção má ou até mesmo quando se quer o bem pelo bem. A Divinacaridade quer, sem dúvida, o bem, mas Ela o quer por Deus. Quantos desânimos,
quanta inveja e ciúmes, quanta pequenez entre homens menos amigos de Nosso
Senhor do que do bem! Seus esforços para o bem muitas vezes não adiantam e
eles ficam desapontados. Vêm outros participar dos mesmos trabalhos que eles e
ficam invejosos e ciumentos. Para realizar suas empresas, não receiam
desacreditar ou contrariar outros operários da mesma obra, tão grande, a de
Redenção. Amam-se a si próprios e querem mais o bem humano do que o bem
Divino. Fazem que vão a Jesus Cristo e não fazem mais do que uma habilíssima
e, muitas vezes, inconveniente volta sobre si mesmos. Ignoram a diferença que
há entre um homem do bem e um homem de Deus. Quantas obras brilhantes na
aparência são estéreis na realidade, porque o amor próprio, mais do que o amor
Divino, presidiu a sua formação e direção! Eis aí porque sofrem e se afadigam e
se aborrecem tantos que trabalham na seara do Senhor!”
3 DE MARÇO
DIVINA PROVIDÊNCIA!DIVINA PROVIDÊNCIA!
Quem sofre deve, a cada golpe, olhar para o Céu. Tudo vem do Alto. Não
compreendemos os desígnios de Deus. Mistério dos mistérios é o da Divina
Providência! Há ocasiões em que o enigma se nos apresenta espantoso,
torturante. Passamos por uma das provas mais difíceis de nossa fé quando aProvidência, por estradas tortuosas, leva-nos ao cumprimento dos seus eternos
desígnios. Os juízos da Providência são incompreensíveis. Deus começa
reduzindo ao nada aqueles que Ele encarrega de alguma missão. A morte é o
caminho pelo qual nos conduz ordinariamente à Vida. “Ninguém compreende
por onde Ele passa” – diz Mgr. Gay. Sim, meu Deus, ninguém compreende por
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onde passais nem o que quereis de nós nesta aflição, neste golpe, nesta morte,
neste fracasso de uma obra! Tudo foi preparado no Céu. Mas de uma coisa
podemos ter certeza, embora nos levem as aparências a negá-lo: foi para o bem
de nossas almas! Nosso Senhor revelou a Santa Madalena Postel que ela seria
fundadora de uma comunidade, mais tarde bem numerosa. Entretanto, durantetrinta anos, parecia Deus empenhado em impedir a obra, que passou pelas mais
duras provas, por insucessos e fracassos repetidos. Conheceis a história
edificante e dolorosa da fundação de tantas ordens e institutos que são hoje a
glória da Igreja? Insondáveis desígnios de Deus, mas, estejamos certos, desígnios
de misericórdia e de amor! Dizia a Madre Maria do Santíssimo Sacramento,
fundadora das Irmãs Franciscanas Missionárias: “Uma das nossas grandes
alegrias no Céu será ver, nos planos Divinos, como fomos conduzidos, nos
longos caminhos da vida, pelos cuidados da Divina Providência, que sem que o
soubéssemos, afastou de nós tantos perigos e colocou em nosso caminho tudo
de que tínhamos necessidade para servir aos seus desígnios”. Ó Divina
Providência! É para se chorar de amor! Só o pensar em vós comove tanto, meu
Deus!
4 DE MARÇO
DEUS NÃO O QUIS!
Deus quer de nós uma só e única coisa: o cumprimento da Sua Vontade
Santíssima. O mais é acessório e até inútil e perigoso para nossa salvação. O
dever cumprido nos assegura também o cumprimento da Vontade de Deus.
Quem fez o que deve, fez o que pôde, fez o que Deus quis, podendo ficar
tranquilo e abandonar-se inteiramente nas mãos da Divina Providência. O
sucesso? A vitória? O êxito? Pouco importam. Se Deus os quis? Insucessos,fracassos, humilhações? Deus os permitiu? Louvado seja Deus! Temos certeza
de haver cumprido o dever e a consciência está sossegada? Tudo vai bem. Deus
não o quis! A pureza de intenção é que vale em nossas obras. Vigiemos a nossa
pureza de intenção e nunca ficaremos dolorosamente surpreendidos com os
fracassos de nossas boas obras. Apeguemo-nos unicamente à vontade de Deus e
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fiquemos indiferentes ao sucesso ou insucesso, à vitória ou ao fracasso. Disse o
Pe. Lehody 2: “Sabemos que Deus quer de nós esta boa obra, mas desconhecemos
as Suas ulteriores intenções. Muitas vezes, para nos exercitar na virtude da santa
indiferença, Deus nos inspira desígnios muito elevados, cujo sucesso, entretanto,
não quer”.
Queixarmo-nos, lamentarmo-nos, descrermos da Providência? Seria orgulho e
loucura. Deus sabe o que faz! Se o fracasso nos humilhou e purificou nossa
intenção, bendigamos a Deus! Pereceu esta obra de zelo para o nosso bem! Deus
não a quis!
5 DE MARÇO
DEIXA-ME PLANTAR A CRUZ
Nosso Senhor quer salvar-nos pela cruz – já muitas vezes o tenho dito e repetido
aqui. Ele parece dizer-nos quando se nos apresenta com a cruz: “Alma querida,
deixa-me plantar a minha cruz no teu coração”. Sejamos generosos, vamos!
Plante-a Ele onde e como quiser, e deixe-a bem firme. Que a tempestade de
minhas ingratidões e os ventos furiosos das tentações não a possam nunca
arrancar! Só Nosso Senhor sabe onde vai plantar sua cruz na terra árida de meucoração. É preciso cavar a terra, e as enxadas das provações, em mãos de bons
operários – as criaturas que nos perseguem e humilham – preparam a cova.
Depois a cruz é levantada. É mais um sofrimento. Quando a cruz não está nos
ombros, mas penetra numa chaga aberta e a sangrar, custa suportá-la, meu
Deus!... Quantas vezes, justamente quando a terra de nosso coração sofreu
tantos golpes, foi cavada e batida pelos operários da dor, chega-nos a cruz pesada
do Calvário! Deixemos que Nosso Senhor plante essa cruz bendita! Morremos de
dor, numa agonia triste! Não importa! Ressuscitaremos no Amor! Feliz, mil
vezes feliz a alma que compreendeu o mistério da cruz! No deserto desta vida, só
há um abrigo seguro: é a sombra da árvore frondosa da cruz. Não tenhamos
medo da cruz. Deixemos que Nosso Senhor venha, sim, deixemos que Ele venha
quando e com a cruz que quiser. Ele nos dirá, cheio de amor: “Deixa-me plantar a
cruz!” Plantai-a, sim, meu Jesus, neste deserto do meu coração ingrato, aqui bem
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no centro, ou melhor, onde quiserdes; mas plantai-a bem, porque a tempestade
aqui é forte!
6 DE MARÇO
ENTRE OS SERAFINS!
Toda santidade consiste em fazer a vontade de Deus. A santidade é a perfeição.
Amar a Deus quer dizer: cumprir em tudo a Sua Santíssima Vontade. Já o
provamos e é de fé. Portanto, fazer tudo o que Deus quer e querer tudo o que
Deus faz, é viver como os anjos, que executam sempre, e com perfeição, as
ordens do Senhor. Nas trevas, em que se agita a nossa existência, temos um
mérito superior ao dos anjos, porque executamos a vontade de Deus na luta,entre inimigos terríveis, que a combatem a cada instante. “Às vezes – dizia Santa
Teresinha – custa à nossa fraqueza dar a Nosso Senhor aquilo que Ele pede. E,
porque custa, é meritório e precioso o nosso sacrifício. No Céu, é bem
recompensada a alma que, neste mundo, lutou para abraçar e cumprir em tudo a
Vontade Santíssima de Deus. Um dia, a Bem-aventurada Estefania de Soncino,
dominicana, foi levada ao Céu, em êxtase, e viu diversas pessoas que conheceu
na terra colocadas entre os serafins. Foi-lhe revelado que elas estavam em grau
tão sublime de glória pela perfeita união de suas vontades com a de Deus!” A vida
dos serafins é a vida do Amor, na glória. A vida das almas abandonadas à Vontade
de Deus e a vida do amor, na terra. Vida seráfica. Não quereis pertencer ao coro
dos serafins da terra?
7 DE MARÇO
“LOGO TEREI TUDO!”Há sempre um vácuo no meu coração. Um abismo! Nada o pode preencher, nem
a glória, nem o prazer, nem a ciência, nem a riqueza! No auge da glória, do
prazer, da ciência, e da riqueza, ouço o pobre Salomão a gemer: “Vaidade das
vaidades, tudo é vaidade”. Nada pode saciar um coração de ânsias infinitas, a não
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ser o Infinito, que sois Vós, só o Infinito, só Vós, meu Deus, que sois Tudo!
Compreende-se porque o Poverello de Assis transbordava de alegria, quando
suspirava, dia e noite: “Meu Deus e meu tudo!” Compreende-se também a
nostalgia de nossos corações, quando buscam felicidade neste mundo e voltam
desolados e tristes. Não achamos tudo o que desejamos fora Daquele que só Eleé Tudo. A vida dos Santos é o desprezo de tudo por Aquele que é o “Tudo”. Só
nisso se acha a paz, a felicidade, o paraíso na terra. E será alguém, neste mundo,
mais feliz do que um santo? Um pouco antes de sua morte, perguntaram a São
Tomás de Aquino se não tinha necessidade de alguma coisa. – “Não tenho
necessidade de nada – respondeu o santo – logo terei tudo, gozarei o Bem
supremo!”
Meu Deus e meu Tudo! Meu Deus, quero amar-Vos! Meu tudo, quero possuir- Vos!
8 DE MARÇO
ATÉ QUANDO?
Sabeis o que é uma Eternidade? Imaginai um pouco. Se um beija-flor viesse, de
cem em cem anos, beijar uma flor e só voltar um século depois. E assim de séculoem século. Quantos milhões de séculos seriam necessários para que beijasse
todas as flores que há na face da terra e as que hão de sorrir, em todos os jardins
e montanhas e vales deste mundo, até a consumação dos séculos? É possível
calculá-lo? E se o absurdo desta hipótese se realizasse? A Eternidade teria
acabado ou, sequer, sofrido qualquer pequenina modificação? Oh! não!...
Continuaria sempre a mesma e imutável Eternidade!... Assim, o condenado ao
Inferno estará sempre, eternamente, a sofrer!... E quem mereceu o prêmio do
Céu, será sempre, eternamente, feliz!... Uma alma, um Deus, uma Eternidade!
Santa Teresa sofria a meditação destas palavras, vendo a loucura dos pecadores e
o nosso pouco zelo pela salvação das almas. Passam-se os séculos e os
condenados bradam no Abismo: Até quando este penar? Respondem as vozes
eternas: “Não findará jamais! Durará perpetuamente!” E para evitar o tamanho
horror desse inferno, para salvar nossa alma, não queremos gemer um pouco
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neste mundo, sob o golpe da dor? Vem o sofrimento, vêm as cruzes e, revoltado
contra o Senhor, há quem diga: “Sofrer, padecer tanto... Ó meu Deus, basta de
dores! Até quando, até quando?” Nosso Senhor dirá: “Apenas até chegar ao Céu,
meu filho! E no Inferno, até quando? Por toda a eternidade!”...
9 DE MARÇO
OLHAI OS “PASSARINHOS!...”
Nosso Senhor nos manda olhar os passarinhos.3 Ei-los, tão mimosos, a voar
descuidados, pela amplidão, a cantar, sempre felizes, glorificando o nome do
Senhor. Vem a tempestade e derruba-lhes os ninhos. Eles constroem novos
ninhos em outros galhos e cantam sempre quando a madrugada sorri. A mão deum perverso rouba-lhes os filhotes. No dia seguinte, ao romper da aurora,
cantam de novo, esquecidos da mágoa que os fez pipilar na véspera, saudosos, de
galho em galho, à procura dos filhotes. O frio chega. Fogem para distantes plagas.
E cantam no exílio também. Nossos irmãos, os passarinhos, são mestres de
abandono e confiança na Divina Providência. Por isso, dizia Nosso Senhor:
“Olhai os passarinhos”. A serva de Deus Madre Maria Teresa dos Anjos,
carmelita, morta em odor de santidade, no Carmelo de Cristo Rei de “Nogent sur
Marne”, na França, em 1931, era uma dessas almas de abandono heroico à Divina
Providência. Diversas vezes foi exilada por perseguições religiosas e conheceu
duras provações com a sua comunidade, errante e perseguida pela Bélgica, Suíça
e França. “Recebi do Céu uma lição – escreveu ela – e uma lição que me fez bem.
Expulsei de minha cela uma andorinha, que lá fizera o seu ninho, e a este
também destruí. Pois ela voltou, cantou alegremente e desapareceu, voando pelo
Céu azul. Jesus destruiu todos os ninhos que procurei construir. Tirou-me todo
o apoio humano. E que farei? Cantarei seus louvores. É minha missão cantar. A Providência nutre os passarinhos ao sol e pelos céus azuis”. Meu Jesus, que eu
seja como os passarinhos! Que eu nunca me queixe de Vossa Providência e saiba
cantar nas provações!
10 DE MARÇO
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O MEU CARRASCO
O meu carrasco de cada momento, tirano que não me dá sossego, é meu amor-
próprio. Não somos felizes, porque não somos livres. Andamos presos,
acorrentados aos caprichos do nosso eu, despótico, cruel inimigo de Deus,inimigo de nossa salvação. “A vontade própria – diz Santo Afonso – é a ruína das
virtudes, a fonte de todos os males, a única porta do pecado e da imperfeição,
arma favorita do tentador contra os religiosos, o carrasco de seus escravos, um
inferno antecipado.” A paz vem da obediência, porque a obediência é a Vontade
de Deus, a Vontade de Deus é o Amor e só o Amor Divino enche e pacifica o
nosso coração. O Demônio persegue a obediência e com furor, porque só ela
basta para a perfeição de uma alma. E o Diabo se reveste de nossa vontade
própria e nos tiraniza. Por que sofrem tantas almas consagradas a Deus? O
carrasco não as deixa em paz! A obediência custa, exige sacrifícios, imolações e
até martírios. O carrasco protesta e obriga a sua vítima à revolta. É uma
escravidão penosa! Justo castigo do Céu para quem renega o leve jugo de Nosso
Senhor, que é o jugo suave da obediência. Que doce alívio a obediência traz!
Obedecer com simplicidade, como uma criancinha, que doce paraíso! A
consciência tranquila dirá, talvez no meio de duros sacrifícios: “Obedeço, faço a
vontade de Deus. Meu sacrifício a fazer é este. Deus o exige. Bendito seja Deus!”E o carrasco, humilhado, foge!
Não quereis humilhar um pouco o vosso carrasco, já que é quase impossível
matá-lo?
11 DE MARÇO
BOM SINAL Bom sinal nas obras de Deus é o sinal da Cruz. Basta dizer que é este o sinal do
cristão. Não o aprendemos na primeira lição do catecismo?
Para se conhecer se uma obra é verdadeiramente de Deus, é mister verificar se
traz o selo da contradição, das perseguições, dos reveses. Carta sem selo não
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segue ou chega com multa ao destino. Nossa alma também não chegará ao seu
destino, à Bem-aventurança, à posse de Deus sem que esteja selada pela
penitência ou pela inocência. O selo inviolável da inocência, bem poucos o levam,
mas o da penitência é indispensável, sob pena de condenação ou da multa
terrível do Purgatório. Nem todos nós podemos abraçar as austeridades dosanacoretas ou a vida monástica, mas podemos, todos, fazer a penitência que
Deus nos envia nas amarguras e reveses da vida, na contradição, na luta contra o
nosso eu. E, quando empreendermos alguma obra de puro interesse da glória de
Deus, estejamos convencidos de que, sem a cruz, ela não poderá prosperar. O
selo da cruz é que dá valor a tudo. Nas obras de Deus e das almas, dizia São
Vicente de Paulo: “O sinal de que Deus tem grandes desígnios sobre elas é
enviar-lhes penas sobre penas, desolações sobre desolações”.
Não é, pois, bom sinal o selo da contradição e das perseguições nas obras de
Deus?
12 DE MARÇO
AMÉM! SEMPRE AMÉM!
É fácil e doce rezar o Amém depois das orações. Difícil e duro é, porém, fazê-lonas amarguras e reveses e mil sofrimentos da vida. É a mais curta das orações,
mas, também, a que mais custa rezar! Amém! Assim seja! Veio a doença com
todo seu cortejo de dores? Amém! Assim seja! Faça-se a Vossa Vontade, meu
Deus! Veio a perseguição? Amém! Assim seja! Uma separação que nos fere tanto
e nos é tão penosa? Amém! Assim seja! Golpes da ingratidão, do desprezo, de
humilhações? Amém! Assim seja! Visitou-nos a pobreza? Amém! Assim seja!
Desolações interiores, trevas em nossas almas, o martírio de tentações
pavorosas? Meu Deus! Amém! Assim seja!
O amém e o sim são as palavras mais belas que podemos dizer a Nosso Senhor.
Significam elas o abandono cego, total, de nossa vontade à Vontade Divina, o que
é a perfeição, a santidade.
Guido de Fontgallant, aos 11 anos, morre como um santo, todo abrasado do amor
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realizássemos perfeitamente o ideal do abandono: nada desejando, nada
pedindo, nada recusando...
14 DE MARÇO
APRENDE COMO SE AMA
Um dia Nosso Senhor, mostrando à Santa Gema Galgani as suas chagas, disse-
lhe: “Vê, minha filha, e aprende como se ama!” Não é essa a linguagem do
Crucifixo? Assim, Deus amou o mundo até lhe dar Seu Filho Unigênito! Como
não amar um Deus tão bom? Ó abismo da Misericórdia Divina! Não se
compreende a miséria humana, o abismo da ingratidão dos homens! Jesus
crucificado é a eterna lição de amor! É no Calvário que se aprende a amar o Amor, na expressão de Santa Teresinha. Jesus nos mostra suas cinco chagas.
Cinco bocas abertas, pedindo o nosso coração, pedindo o nosso amor. Santo
Afonso, para satisfazer o seu ardente e apaixonado amor a Jesus Crucificado,
pintou uma imagem que lança das chagas dos pés, das mãos e dos lados, setas de
amor, para ferir os nossos corações. O quadro não é obra-prima de arte, mas
comove, porque nos faz lembrar que o martírio do Calvário foi um martírio de
Amor. Sim, meu Jesus crucificado, dai-me a graça de amar-Vos! Vossas chagas
pedem meu amor e eu me arrependo de minha ingratidão! Quero ouvir a Vossa
Voz da Cruz: “Vê, meu filho, aprende como se ama!” Quero aprender a Vos amar!
15 DE MARÇO
O SONHO, A REALIDADE
Sonhadores, temo-los e muito. Há quem não seja amigo do bom senso e, em vezde se apegar à realidade das coisas, sonha e sonha doidamente. Na vida
espiritual, sobretudo, é bem desastrado sonhar, abandonando a realidade da vida
cristã. Os sonhadores não querem aceitar a penitência do cumprimento dos
deveres de estado, monótonos, cheios de pequeninos sacrifícios e exigindo, por
vezes, uma contínua abnegação. Entretanto, pensam em trapas, em conventos,
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em vida mística, em prodígios de apostolado, em uma santidade original, exótica,
fora do comum.
Certas almas sonhadoras, quando contrariadas, não atendem aos seus diretores
espirituais. Desprezam os pequeninos sacrifícios quotidianos, sonham e têm a
presunção de aspirar à penitência dos anacoretas. Dessas almas, escreveu São
Francisco de Sales: “Fazem grandes projetos de servir a Deus, por ações
eminentes e sofrimentos extraordinários, para cuja execução talvez nunca se
apresentem ocasiões. E, enquanto abraçam, na imaginação, cruzes que não
existem, fogem, ardentemente, das que, bem menores, envia-lhes hoje a Divina
Providência. Não é, pois, lamentável tentação ser tão valoroso em espírito e tão
fraco diante da realidade? Livrai-nos, Deus, desses ardores de imaginação, que
nutrem, muitas vezes, a secreta estima de nós mesmos”.5
Deixemos o sonho de nossa presunção e abracemos as cruzes que, na realidade,
achamos cada dia!
Nada de sonhos!
16 DE MARÇO
A LAMA E O AÇÚCAR As tentações são uma prova dura, penosa, porém, necessária. Deus permite que
sejamos tentados para que, na fornalha das tentações, retempere-se o aço de
nossa lama, e nesse crisol se purifique o ouro da virtude. Paciência, calma,
confiança! As tentações impuras são as mais terríveis! Almas generosas sentem-
se horrorizadas quando o Monstro da Impureza, em formas espantosas e
variadas, aparece-lhes com mil tentações contra a bela virtude. Oh! Essas provas,
que parecem afastar nossa alma de Nosso Senhor, que é a Pureza Infinita eessencial, unem-na ainda mais a Ele. As tentações contra a castidade nos tornam
mais castos, se a elas resistimos corajosamente. São vantajosas, porque nos
ensinam a combater, mostram a nossa miséria, os pontos fracos de nossa alma,
dão-nos ocasiões de mortificações e nos avisam de que estejamos alertas,
porque, a cada passo, nossa miséria nos pode levar ao abismo. As tentações de
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impureza tornam as almas mais puras, mais belas e queridas de Nosso Senhor.
Como é possível? – pergunta a pobre alma que se julga maculada pelas imundas
tentações. Sim. Para que o açúcar fique bem puro e brilhante, cobre-se-o de
lama, e esta, absorvendo toda a impureza nele contida, deixa-o bem limpo. As
tentações de impureza, nos planos Divinos, vêm sobre nós como a lama noaçúcar, não para nos manchar, mas purificar-nos cada vez mais!
17 DE MARÇO
“A ALMA PRIMEIRO, O CORPO DEPOIS”
O corpo é exigente e insaciável. O cristão deve tratá-Io como escravo e não como
senhor. Sob pretexto de saúde, muita gente se sujeita aos caprichos despóticos dacarne. Usando de uma expressão franciscana – havemos de tratar o nosso
umentinho com prudência. Nem o sacrificar a ponto de não poder trabalhar,
nem lhe dar tudo quanto exige e deixá-lo indômito e perigoso. A fórmula de
Santa Gema Galgani diz tudo: “A alma primeiro, o corpo depois...”.
Há muito exagero de cuidados com a saúde corporal, com prejuízo da alma! –
“Temei – dizia Santo Afonso – que, tomando muito a peito o cuidado com vossa
saúde corporal, ponhais em perigo a saúde de vossa alma, ao menos, a obra da vossa santiticação. Pensai que, se os santos tivessem, como vós, tanto cuidado
com a saúde, nunca se teriam santificado”.6 Santa Teresa, falando às suas filhas
sobre o exagero da preocupação com a saúde, dizia: “Desde que me trato com
menos cuidado e delicadeza, passo muito melhor”. E assim é. O corpo bem
tratado, tratado com extrema delicadeza, vai-se tornando cada vez mais exigente,
com sério prejuízo para a vida espiritual. Desde que dele nos despreocupamos,
abrandam-se seus ardentes desejos. Prega Nosso Senhor que, em caso de
necessidade, deve-se perder o corpo para se salvar a alma. A carne mortificada
acha a paz, vindo todo o nosso desassossego de não estabelecermos em nós esta
ordem: “a alma primeiro, o corpo depois”.
18 DE MARÇO
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“UM GRANDE OPERÁRIO”
Ninguém se queixe de pouca inteligência ou pouca aptidão para isto ou aquilo,
principalmente no serviço de Deus. Considerar-se assim é uma fonte de muita
tristeza para quem não crê firmemente nos desígnios da Divina Providência. SeNosso Senhor nos chama, pela obediência, para alguma obra ou trabalho
superior às nossas forças, não desanimemos. O operário faz os seus
instrumentos de tamanho, grossura e forma apropriados à obra que quer
executar. Do mesmo modo, Deus nos distribui o espírito e os talentos segundo os
desígnios que tem a nosso respeito, para o seu serviço, na medida da glória que
daí quer tirar. Para que nos queixarmos de que não possuímos esta ou aquela
aptidão, este ou aquele talento? O Divino Operário sabe o que faz! Para as obras
Divinas, qualquer instrumento serve. E, em geral, o Senhor aproveita os piores,
os mais miseráveis, para mostrar que a obra é toda Sua e não humana. “Crede-
me – dizia São Francisco de Sales – Deus é um grande Operário. Com pobres
instrumentos, faz excelentes obras. Ele escolhe ordinariamente as coisas fracas
para confundir os fortes, a ignorância para confundir a ciência e que nada é para
destruir o que parece ser alguma coisa. Que não fez Ele com uma varinha na mão
de Moisés e com uma caveira de burro na de Sansão? Por que venceu Holofernes
senão pela mão de uma mulher?”
O operário bate, corta, aplaina, ajusta, ferindo a madeira, a pedra, o mármore.
Deixemos que o Divino Operário trabalhe em nós. Que corte, fira, bata! Será para
fazer-nos obras-primas da Sua Misericórdia.
19 DE MARÇO
SÃO JOSÉ, MODELO DE PACIÊNCIADa vida de São José nada consta de extraordinário. Tudo simples. Não foi um
taumaturgo, não fez milagres em vida, não profetizou, não consta fenômeno
algum, a seu respeito, da natureza daqueles que, à leitura da vida de alguns
santos, arrebatam-nos a admiração. O milagre maior do Santo Patriarca foi o do
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seu abandono e conformidade à Vontade de Deus. Que modelo de paciência!
Pensa em abandonar a Esposa após a encarnação do Verbo. É avisado pelo Anjo
e sem demora obedece. Nasce Jesus na pobre manjedoura, e ali está São José,
cheio de amor e confiança, adorando o Verbo feito Homem. Que paciência ante
os desprezos de Belém, quando procurava uma hospedagem! O Anjo de novo oavisa. Foge para o Egito com Maria e o Deus pequenino. Sofre no exílio
privações, insultos e mil reveses. Sempre paciente, abandonado e confiante.
Recebe nova ordem do Céu. Volta para Nazaré e ali vive no silêncio, na
simplicidade, na mais profunda humildade, a vida comum de um operário pobre.
Morre nos braços de Jesus e Maria. Vida tão simples! A virtude heroica de São
José foi o abandono, que é a perfeição do amor. O coração de São José foi, por
certo, o coração de um serafim, todo abrasado de Amor Divino. E como o
abandono é o fruto mais belo do Amor, pode-se imaginar qual seria a vida de
confiança e abandono de São José!
20 DE MARÇO
UMA VIRTUDE ANTIPÁTICA
Simpática aos outros e antipática ao nosso amor-próprio, é a virtude da
humildade. A nossa natureza dificilmente a suporta e, sempre revoltada, vive a
maltratá-la. Nessa revolta, só a humilhação nos ajudará eficazmente a abater o
nosso orgulho, inclinando-nos à humildade. – “A humilhação leva à humildade
– diz São Bernardo7 – assim como a paciência à luz e o estudo à ciência”. Quereis
provar se vossa humildade é verdadeira, até onde vai, se adianta ou recua? As
humilhações vos fornecerão o meio. Sem humilhação não se pode conhecer bem
o verdadeiro humilde. Muitos, diante dos outros, humilham-se até o pó da terra,
com expressões exageradas e até ridículas. Ai! porém, de quem quiser humilhá-los! Revoltam-se logo. – “As palavras de humilhação que não partem do coração
e não são bem sinceras – diz São Francisco de Sales – radicam fino e sublime
orgulho de quem só deseja ter a glória de ser julgado humilde, jazendo como o
remador que chega ao seu fim, voltando-lhe as costas e, sem pensar, atira-se a
velas pandas, pelo mar da vaidade.8 Não é assim que se conhece o verdadeiro
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humilde, mas sim na humilhação pura penosa, que vem dos outros. E essa é a
que ninguém deseja, porque, na verdade, é antipática, aborrecida e repugnante.
Eis porque dizia D. Lehodey 9 – “A virtude da humildade é de todas a mais
antipática”.
21 DE MARÇO
O “RÁDIUM”
Para o “câncer” a medicina emprega com efeitos maravilhosos, em muitos casos,
o “rádium”. Expor a úlcera ao “rádium” é soberano remédio. Na vida espiritual há
um “câncer” terrível e perigoso: a impureza. Parece incurável e, se não há
cuidado em tratá-lo, deita raízes, envenena toda a alma, arrasta-a ao abismo e àmorte. Que fazer quando a ferida perigosa está minando o organismo? Procurar
sem demora um bom médico e um instituto de “rádium”. O bom médico, no caso
da impureza espiritual, é Nosso Senhor, Médico Divino de nossas almas. A sua
Misericórdia Infinita é o “Rádium”, Soberano, que tudo cura. Vamos ao Instituto
de “Rádium” que se encontra em toda parte e nada custa: a capela, onde se acha
Nosso Senhor Sacramentado, a Hóstia Imaculada da Santa Comunhão.
O “rádium” nem sempre cura a ferida maligna do corpo, principalmente se o malse complicar, deitando muitas e profundas raízes. Mas o Vosso “Rádium”
Soberano da Eucaristia é sempre eficaz, ó meu Jesus-Hóstia! Por mais extenso e
profundo que seja o “câncer” da impureza, tenhamos confiança! Seremos
curados! Procuremos o Médico Divino, o “Rádium” Celeste e esperemos... A luta
é grande, é terrível. Sem a mortificação dos sentidos e a fuga das ocasiões, sem
aquela guerra de que nos fala Nosso Senhor no Evangelho, não chegaremos à
paz a doce paz das almas puras. Nenhum combate mais duro que o combate pela
pureza. Mas, confiança! O “Rádium Celeste, o Divino Rádium” da Santa
Eucaristia, já curou tantas almas! E há de curar sempre o câncer da impureza,
contando que a pobre vítima tenha generosidade na luta, tenha confiança e
nunca desanime na peleja, que é tremenda.
22 DE MARÇO
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FANTASMAS DO CREPÚSCULO
Há um sofrimento reservado às almas interiores, aos amigos de Jesus: o da
secura ou aridez, que se costuma chamar desolação.
Jesus, na conversão das almas para o Seu Amor, enche o coração fiel de
consolações sensíveis. É uma doçura rezar, meditar, estar bem junto do Sacrário.
As comunhões são tão doces! Estaríamos horas inteiras nas doçuras de uma
meditação, de uma visita ao Santíssimo, de um terço aos pés de Nossa Senhora!
É o Tabor! Faríamos o nosso tabernáculo ao pé do Sacrário e lá permaneceríamos
uma eternidade. Para nos desapegar das doçuras terrenas, enche-nos Nosso
Senhor das doçuras do Céu. Trata-nos como criancinhas, que precisam de
carinho e ternura. Depois... Ah! tudo se transforma. Vêm, as desolações. Umaaridez impressionante sucede ao fervor sensível. Nosso coração já não sente mais
aquelas palpitações de amor. A meditação é penosa, a oração difícil, cheia de
distrações. O que antes era doçura, até parece aborrecer-nos. Que monotonia!
Tem-se uma impressão de abandono Divino. É a noite que se aproxima, noite de
trevas, noite das provações espirituais, que nos desapegam e purificam. Silêncio!
Abandono! Esperai. O Esposo voltará logo. Depois da noite há de raiar a aurora
do Amor. Agora é o crepúsculo, as sombras se alongam e qualquer coisa toma as
proporções de fantasmas. Não vos assusteis. Tudo passa. Fechai os olhos.
Abandono e confiança! Esperai a noite que se aproxima!
23 DE MARÇO
O LABIRINTO
As provações espirituais, preciosas, na verdade, porém duras, Deus só as enviaaos seus amigos prediletos. A santidade é o mais difícil e o mais penoso dos
trabalhos. A vida contemplativa só é fecunda e bela porque se passa num
verdadeiro calvário. Às alegrias sensíveis e consolações sem par dos primeiros
dias de fervor, sucede-se uma aridez penosa. Meu coração é de gelo – dizem as
pobres almas – sinto que não tenho amor a Jesus, perdi minha piedade, estou
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condenada! Que desolação! Vêm logo as alternativas de fervor e aridez. Nas
consolações, no fervor sensível, compreende-se tudo, caminha-se com
segurança, em pleno dia, à luz do sol radiante e belo. Depois, entra-se numa
floresta espessa e já não se pode ver mais a estrada certa. É a desorientação. Nem
a palavra do diretor espiritual já nos conforta. Uma desoladora confusão! Quer apobre alma guiar-se, achar o caminho e, a cada passo, encontra uma dificuldade,
um obstáculo, uma dúvida cruel, uma tentação. Verdadeiro labirinto! Que fazer?
Nesse transe penoso da vida espiritual, só há um remédio: a confiança, até ao
abandono, nas mãos de Deus. Fechai os olhos, almas piedosas, dai a mão a Jesus
e deixai que Ele vos conduza para onde quiser. Esse “fechar os olhos” e esse “dar
a mão a Jesus” são a confiança e o abandono. Não vos perturbeis. Se não
conheceis o caminho, por que procurá-Io em vão? O Vosso Guia é seguro, mas é
preciso que fecheis os olhos e Lhe deis a mão. O abandono e a confiança,
entretanto, não excluem o esforço. Enganar-se-ia quem julgasse ser necessário
apenas o gesto de abandonar-se e confiar em Nosso Senhor, sem mais. O
abandono é o cume da Montanha do amor, dizia Mgr. Gay, e o amor se conquista
na luta e no sacrifício.
24 DE MARÇO
A BOLINHA DO MENINO JESUS
Que faz uma criança quando ganha uma bolinha nova e graciosa? Alegra-se,
toma-a, cheia de carinho, sorri, feliz brinca com seu pequenino tesouro. Depois,
atira-a para um canto, onde fica muito tempo esquecida. Um belo dia toma de
novo a sua bolinha e com ela brinca e se diverte. E, quando dela se farta, se
encontra um alfinete, fura-a toda e acaba por despedaçá-la, curiosa. Fica assim o
destino da bolinha sujeito aos caprichos da criança! Santa Teresinha, no seuadorável espírito infantil, acha isso uma das mais belas imagens da vida
espiritual. A alma, como a bolinha, se faz o brinquedo do Menino Jesus. Eu sou a
bolinha do Menino Jesus – dizia a Santa da confiança e do abandono – que Ele
faça de mim o que quiser. Brinque à vontade com a sua bolinha. Se me quiser
atirar a um canto, abandonada, serei feliz, contanto que Ele o queira. Eu me
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ofereço ao Menino Jesus para ser o seu brinquedo, uma bolinha que Ele pode
pisar, ferir, atirar ao canto ou apertar contra o coração. Enfim, eu quisera divertir
o Menino Jesus e entregar-me aos seus caprichos infantis.10 Como isso é belo e
heroico! Não quereis também, a exemplo de Santa Teresinha, ser a bolinha do
Menino Jesus?
25 DE MARÇO
SIM! “FIAT!”
A mais bela palavra que disse Nossa Senhora foi o “Fiat”, o sim da Anunciação. E
dessa palavra nos veio a Redenção, com Jesus, e Jesus Crucificado. Como é
poderoso o Sim! Como ele opera maravilhas! O Anjo manifesta a Vontade do Altíssimo e Nossa Senhora, sem hesitar, responde: Eis a escrava do Senhor, faça-
se em mim segundo a Sua palavra. E toda a vida de Maria foi um sim, um “fiat”,
um ato de abandono perfeito, total, à Vontade do Pai Celeste. Anuncia-lhe
Simeão a espada da dor. Responde, humilde: “fiat.” “Sim”. Vem o Pretório, a
Cruz, o Calvário. “Sim”, sempre “sim”. Depois, a dolorosa saudade, a paz, a
Ascensão, as amarguras do exílio... E Nossa Senhora diz sempre: “fiat,” “fiat”;
sim, sempre sim, ó meu Deus! Não há mais perfeito modelo de abandono. Se o
abandono é a expressão mais alta do amor, é o auge da perfeição possível neste
mundo, o que não era o abandono de Nossa Senhora, sendo Ela a Rainha dos
Serafins?
Não há dúvida, a mais bela palavra de Nossa Senhora foi o “sim”, o “fiat” da
Anunciação. Sem esse “fiat”, que seria de nós? Nossa perfeição também virá do
“sim”, do “fiat”, que soubermos dizer a Nosso Senhor a cada passo de nossa vida
e, principalmente, no sofrimento.
26 DE MARÇO
CONFIANÇA OBSTINADA
Podem-se pôr limites ao que é infinito? Pois não é infinita a misericórdia Divina,
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não é um Oceano Infinito de Misericórdia? Se o Senhor é infinitamente justo, é
também infinitamente Misericordioso. E, neste mundo, vivemos no tempo da
Misericórdia. Abri o Evangelho. Tudo ali vos inspira confiança e enche o coração.
Por que duvidar, se empenhamos da nossa parte todos os nossos esforços, por
que desconfiar de um Pai tão bom e poderoso? Nosso Senhor é o Pai do filhopródigo, e o Bom Pastor. Por que nos deixou Ele, no Evangelho, parábolas tão
belas, tão comovedoras? Não foi para a manifestação da Sua bondade infinita?
Ah! não compreendo as almas que têm medo de Deus! Como é doloroso e triste
ao coração de um pai estender ao filho os braços cheios de ternura e se ver
repelido! É preciso que confiemos. A medida da confiança é confiar sem medida.
A confiança, somente ela nos leva ao Amor! O temor leva à justiça severa, tal
como a representam os pecadores. Mas não é essa justiça que Jesus terá paracom os que O amam – escreve Santa Teresinha à irmã11: Nossa confiança é
combatida obstinadamente pelo Inferno, porque ela é a vida, a salvação. A
obstinação de Satã, oporemos a obstinação de nossa confiança. E seremos
salvos!
Meu Jesus, ajudai-me a vencer-me, e dai-me esta confiança obstinada que
arrebatava o vosso Coração!
27 DE MARÇO
AS NOITES
Para a contemplação, exige Deus uma grande pureza de coração, um desapego
total das criaturas e de nós mesmos. Ora, até as almas adiantadas na perfeição
estão sujeitas a imperfeições e sentem renascer, embora atenuadas, as misérias
dos vícios capitais. A fim de preparar essas almas fiéis e generosas ao mais altograu de contemplação, Deus lhes envia provas, chamadas passivas, porque é Ele
quem as produz, não tendo a alma senão que as aceitar pacientemente. Ninguém
descreve melhor essas provações do que São João da Cruz, na sua “Noite
Obscura”. Chama-se noite essa prova, porque a alma fica como que em trevas,
sem poder discorrer ou meditar, e a luz da contemplação que recebe é tão fraca
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que dá a impressão de uma noite escura. O Santo distingue duas noites. A
primeira nos desapega de todas as coisas sensíveis. Tira-nos a parte sensível da
piedade. Deixa-nos num deserto de aridez, onde caminhamos penosamente, sob
a ardência do sol de mil provações. É a noite dos sentidos. Desapega-nos do que é
sensível. A segunda tira-nos até as consolações espirituais. É o entendimento nastrevas, a vontade na aridez, a memória sem lembranças, e as afeições perdidas na
dor e na angústia. Ninguém pode fazer ideia desse martírio sem o experimentar.
Que fazer? Contra ele só há estes remédios: a confiança, o abandono e coragem!
Deus vos prepara grandes coisas! Amar a Deus na contemplação é ser milionário
da graça. Consolai-vos, pobres almas. Dizei, como Santa Teresinha: Pouco
importa que não sinta o meu amor, contanto que seja sensível a Jesus! Nas
trevas dessas noites, fechai os olhos, deixai que ruja a tempestade. Confiança!
Confiança! Abandono!
28 DE MARÇO
O CARVÃO E A BRASA
Ninguém melhor do que São João da Cruz falou das noites do sentido e do
espírito. Uma comparação do grande Doutor nos ajuda a compreendê-las. Elas
são provações do Amor Divino. O Amor Divino é fogo e o fogo acende, ilumina,
purifica. Que faz na madeira o fogo material? Começa por secá-la violentamente
e, enquanto seca, ela chora toda a seiva. Depois a enegrece, suja-a, fá-Ia exalar
mau cheiro, extraindo assim e tornando visíveis todos os elementos grosseiros e
ocultos que embaraçavam a sua ação. Ei-Ia, finalmente, inflamada, brilhante,
luminosa e quente, convertida em brasa. O fogo transformou pois a madeira em
fogo também. Não fica aí traçada uma bela imagem da contemplação amorosa?
Nosso Senhor, quando nos escolhe e chama à vida contemplativa, é o FogoDivino que procura a madeira verde, cheia de impurezas e seiva de amor-próprio
de nossa alma. E logo o fogo do Amor queima. Efeito: as provações. Ao queimar,
seca a madeira e a faz chorar. Daí, a aridez espiritual, que tanto nos faz sofrer.
Que secura e que deserto é então a pobre alma! Todas as nossas misérias exalam
mau odor, aparecendo-nos em toda sua hediondez. E nos sentimos fracos,
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pobres, miseráveis, humilhados. Vem o desapego de tudo e de todos. Agora,
purificada a madeira, o fogo a transforma em brasa vermelha e luminosa, isto é,
em fogo.
Nas provações, almas piedosas, confiança! Lembrai-vos do carvão e da brasa.
Deixai que o fogo do Amor Divino vos devore e vos faça uma brasa viva de amor.
29 DE MARÇO
TENTAÇÕES
Entre as provações das almas generosas, as tentações são das mais duras,
constituindo verdadeiro martírio. Elas são variadas e terríveis. E mais hoje do
que em tempo algum. Tentações contra a fé, produzidas pelo demônio ou
sugeridos pela atmosfera materialista que nos cerca, tentações contra a
esperança, tentações de desânimo. Tentações contra a caridade.
Que luta, meu Deus! O Inferno parece, às vezes, todo contra nós!... Dolorosas
provas! Como vencê-las? Quando a veemência da tentação nos assalta, é
imperiosa, domina-nos, fazendo-nos sentir como que abandonados do Céu!
Principalmente nas tentações impuras. Então é que a confiança e a coragem nos
são absolutamente necessárias. Nosso Senhor não nos abandona. Deixa-nos
lutar para que seja provada nossa virtude. Não nos perturbe o horror das
tentações. Santa Catarina de Sena e Santa Ângela de Foligno, duas almas virgens
e seráficas, foram provadas pelas mais horríveis tentações de impureza. Depois
da tempestade de uma tentação impura, queixou-se Santa Catarina de Sena a
Jesus: Onde estavas, meu Jesus, durante essa tempestade? E Jesus lhe disse
com amor: No meio de teu coração! Assim vos responderá também Nosso
Senhor, ó almas tentadas, depois de cada provação. Coragem!São Vicente de Paulo e Santa Teresinha sofreram, durante longos anos, as mais
terríveis tentações contra a fé, tentações de materialismo e descrença. E
venceram. Receberam as tentações com paciência e calma, porém, sempre
dispostos a resisti-las. A inquietação é pior. Confiança e Amor! Combatamos
cheios de coragem o inimigo, porém sempre calmos e confiantes!
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30 DE MARÇO
MINHAS MISÉRIAS
São Paulo tem uma palavra consoladora em relação à nossa miséria: “Aos queamam a Deus, tudo coopera para o bem”. E Santo Agostinho acrescenta: “Até os
pecados”. Sim, porque os pecados nos humilham e nossas misérias nos obrigam
a tocar o fundo de nossa abjeção e desconfiar de nós. Os santos mestres da vida
espiritual nos dizem, com São Francisco de Sales: Quanto mais nos sentimos
miseráveis, tanto mais devemos confiar na Misericórdia de Deus. Porque, entre a
Misericórdia e a miséria, há uma ligação tão grande que uma não pode se exercer
sem a outra. E por quê? Mgr. Gay nos dá a razão: O pecado atinge a Deus nosentido de que O ofende, nunca no de que O modifica. Modifica os seus atos, mas
não a sua essência, nem muda o seu amor para conosco. Assim como, em face do
nada, sua bondade se torna amor, assim também, para com o pecador, seu amor
se torna misericórdia. Deus só exige uma coisa: que tenhamos confiança Nele.
Que consolação! Nossos pecados, que ofenderam a Majestade Infinita de Deus,
nossas misérias tão grandes, vão servir de lenha para um Incêndio de Amor!
Longe de nos entristecer, devemos regozijar-nos, com Santa Teresinha, por nos
vermos tão miseráveis e tão necessitados de misericórdia! Abençoadas misérias!Talvez que, sem elas, não experimentássemos, ó Clementíssimo Jesus, as
doçuras do Vosso Amor Misericordioso!
31 DE MARÇO
UM MILHÃO DE EXPERIÊNCIAS
Caímos tantas vezes! Senhor, quanta miséria! Por que nos admirarmos de ser a
enfermidade enferma, a fraqueza fraca, a miséria miserável? Que somos diante
de Deus, que é o Divino Forte, senão fraqueza? Paciência! Nossa miséria é uma
doença que não tem cura neste mundo. Nosso Senhor quer a nossa vontade. Ele
faz o resto! A santidade não é obra de um dia. Enquanto não tocarmos a nossa
miséria com o dedo e não nos convencermos do nada que somos, ainda nos resta
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muito a caminhar. As quedas têm esta vantagem: ajudam-nos a desprezar-nos, a
desconfiar de nossas próprias forças e a só confiar em Deus. Essa é a razão por
que caímos tanto. Estejamos bem convencidos – diz o Padre Caussada12 – de que
nossa miséria é a causa de todas as nossas fraquezas e de que estas, Deus as
permite por misericórdia. Sem isso, nunca nos curaríamos de uma presunção ede uma orgulhosa confiança em nós mesmos. Jamais compreenderíamos, como
é preciso, que todo mal vem de nós e todo o bem somente de Deus. Só com “um
milhão de experiências pessoais” é que se pode adquirir o hábito desse duplo
sentimento...
Por que o desânimo quando nos achamos fracos e cobertos de miséria, caindo a
cada passo? Que podemos nós? Humilhemo-nos! Paciência! Aspiremos à
perfeição, à santidade, com e apesar de nossas misérias. Já temos um milhão deexperiências pessoais?
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1 DE ABRIL
UM BOM DOENTE
Não vos queixeis, desesperados, dessa enfermidade que vos prende ao leito diase dias, e nem sequer vos permite rezar como quereis. Paciência! O leito de um
enfermo, como disse São Francisco de Sales, é um altar de sacrifício. Feliz o justo
que não perturba esse sacrifício com seus gritos e murmúrios e, adorando essa
Mão benfazeja que se oculta nos instrumentos que emprega, dá os seus golpes
salutares, adora também esses golpes e sente todo o mérito da distinção que com
eles recebe. Como sua alma sairá brilhante do cadinho das tribulações! Como
ouro experimentado sete vezes. Não podeis rezar? Contentai-vos com sofrerpacientemente a moléstia e oferecer vossos sofrimentos a Nosso Senhor, em
piedosas jaculatórias, embora entrecortadas pelos gemidos. Na doença, um ato
de conformidade com a Vontade de Deus vale por mil orações e penitências no
tempo da saúde. Poupai o vosso organismo durante a enfermidade. Se vos cansa
uma oração longa, fazei uma oração curta. Se não podeis rezar de joelhos, rezai
sentado e, se até sentado vos cansais, rezai deitado. Obedecei ao médico que vos
ordena repouso. Nosso Senhor bem sabe que a vossa fraqueza não permite
esforço penoso. As jaculatórias devem ser a oração preferida dos enfermos. Sãocurtas e, brotada da alma, agradam tanto ao coração de Jesus! Portanto, obedecei
ao médico e aos enfermeiros e contentai-vos em ser um bom doente... É só isso
que Nosso Senhor deseja de vós!
2 DE ABRIL
TUDO TEM SEU TEMPO!
A divina Providência nos prepara de tal forma os dias e horas e acontecimentos
de nossa vida, que tudo vem a seu tempo, já marcado nos desígnios eternos. E
estejamos bem certos disso – para nosso bem ou em mira do nosso bem eterno.
Se soubermos aproveitar as ocasiões, se não abusarmos de nossa liberdade,
podemos ganhar, a cada instante, ricos tesouros de graças e méritos para o Céu.
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A doença, como a saúde, vem a seu tempo. Há tempo de gozar e tempo de sofrer,
tempo de rir e tempo de chorar. Veio a doença? Resignemo-nos. Agora Nosso
Senhor me quer sofrendo com Ele na cruz. Quisera trabalhar, realizar tantos
projetos para a glória de Deus e o bem das almas! Por que me crucifica Deus em
um leito, justamente agora, quando ia realizar meus projetos? – Assim dizemmuitos, desolados. E se queixam e quase blasfemam da Divina Providência! Que
insensatez! Deus não precisa de nós! Qualquer instrumento Lhe serve para
realizar os seus desígnios e salvar as almas. Não sejamos tão presunçosos.
Resignemo-nos. Quando Deus nos convida ao sofrimento, dispensa-nos da ação
– diz São Francisco de Sales. – Por isso – acrescenta o Santo – uma hora de
sofrimento por amor e submissão à Vontade de Deus vale mais do que muitos
dias de trabalhos, feitos com menos amor. Tudo tem seu tempo! Agora é tempo
de sofrer? Aceito, Jesus! Seja o que Vós quiserdes!
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3 DE ABRIL
CALVÁRIO E TABOR
Muitos querem servir a Deus no Tabor e bem poucos o querem no Calvário. NoTabor da saúde, que diligência, que zelo, que boa vontade! As orações se
prolongam por longos minutos, e até por horas, ao pé do Sacrário. Louvam,
bendizem ao Senhor como o Profeta-Rei em todas as maravilhas da criação.
Cantam o “Magnificat” e o “Te-Deum”. Veio o calvário da doença, com a cruz do
leito, os cravos e feridas, dores por todo o corpo, o fel das amarguras e desgostos
da vida. Aí desaparece a piedade! Ao “Te-Deum”, sucede um “Miserere” sem
contrição, e ao “Magnificat”, um “De profundis” queixoso e desolado. Selouvamos a Deus na saúde, por que não O bendizer na doença? É que só
queremos fazer a Vontade de Deus quando essa Santa Vontade está conforme a
nossa. Quando Deus quer que estejamos doentes, queremos estar sãos. Quando
Ele quer que exerçamos a paciência, queremos exercer a humildade, a devoção, a
oração ou outra qualquer virtude, não por ser mais da Vontade de Deus, mas por
O ser da nossa. É um erro e de consequências lamentáveis na vida espiritual.
Acostumemos a nossa pobre e rebelde natureza à paciência e à resignação,
principalmente na doença. No Tabor da saúde façamos, sim, a nossa tenda aospés do Senhor, mas não nos esqueçamos de que precisamos, também como
Nossa Senhora, ficar ao pé da cruz, resignados e humildemente submissos à
Vontade de Deus!
4 DE ABRIL
“UM TEMPO PRECIOSO”
A doença, dizia São Vicente de Paulo, é um estado quase insuportável à natureza.
E, contudo, é ela um dos mais poderosos meios de que Deus se serve para nos
fazer entrar no cumprimento de nossos deveres, para desligar-nos dos afetos ao
pecado e para nos encher com os dons de Sua graça. É pela doença que as almas
se purificam e as que não são virtuosas encontram um meio eficaz de o ser.
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Nenhum estado há mais próprio do que este para a prática do bem. E por que é
assim tão precioso o tempo da doença? Porque na enfermidade se exercita
maravilhosamente a fé, brilha a esperança com mais esplendor, a resignação, o
amor de Deus, todas as virtudes aí encontram matéria ampla para se exercer. O
verdadeiro tempo de expiar os pecados e de experimentar a graça do perdão é oda doença, diz Bossuet. Enquanto esse espinho nos fere e incomoda, pesa sobre
nós a Mão de Deus e Ele próprio nos impõe a penitência, segundo a medida da
Sua infinita Misericórdia.
Para que não percamos um tesouro tão grande do Céu, como o que nos vem pela
doença, Nosso Senhor só nos impõe uma condição: a que aceitemos
conformados e resignados a Sua Santíssima Vontade. Então, por que não
aproveitar bem a doença, já que a temos de sofrer de qualquer modo?
5 DE ABRIL
VANTAGENS DE MINHAS MISÉRIAS
Uma das artes mais belas é a de aproveitar as nossas misérias para o nosso
progresso espiritual, assim como se aproveita o esterco, nos jardins, para
florescimento das rosas e açucenas de esquisito e delicado perfume. Quanto maisfracos e miseráveis nos sentimos, tanto mais nos regozijemos, porque nossas
caras misérias, como dizia uma alma santa, fazem-nos humildes, desconfiados
de nós próprios, matam nossa suficiência e, por isso mesmo, unem-nos mais a
Nosso Senhor, se, num gesto de amor e arrependimento, voltamo-nos logo para
Ele. Nossas misérias têm suas vantagens, e grandes. Fazem-nos pacientes e
cheios de indulgência para com as misérias alheias, causam-nos uma como
desconfiança de nós mesmos e nos obrigam a recorrer, a cada passo, à
Misericórdia Divina.
Como é bom sentir-se a gente pobre, fraco, miserável, incapaz de todo bem! Isso,
que levaria ao desespero certas almas orgulhosas, deve encher-nos de confiança
cega, bem obstinada, no Coração de Jesus.
Sou fraco? Vós sois o Divino Forte, ó Jesus! Sustentai-me! Sou pobre? Vós sois a
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Riqueza infinita. Valei-me! Nada posso, nada tenho, nada sou? Que fazer?
Humilhar-me, abater meu orgulho e tudo esperar da Misericórdia Divina.
Só nossas misérias nos podem dar tais sentimentos, e só um milhão de
experiências pessoais no campo da fraqueza nos levarão a crer nas vantagens de
nossas misérias...
6 DE ABRIL
SE NÃO TIVESSE CAÍDO...
Se caímos numa falta, devemos levantar-nos depressa, correr a Nosso Senhor e
pedir-Lhe perdão, cheios de confiança. Não custa o perdão desde que nosso
arrependimento seja bem humilde, sincero e firme o nosso propósito de emenda.
Oh! Se compreendêssemos o Coração de Jesus! É todo misericórdia, doçura e
perdão! Ah! – dizia Santa Teresinha – Como a misericórdia e a bondade do
Coração de Jesus são pouco conhecidas!1
Caímos? Pois bem, levantemo-nos, e depressa! Quando o Filho Pródigo, do
abismo de sua miséria, resolveu sair da abjeção em que vivia, disse: Eu me
levantarei! E logo em seguida: E irei ao meu Pai! Sabemos como foi recebido.
Façamos também assim depois de cada uma de nossas misérias. Um gesto de
confiança no Coração de Jesus faz milagres. Talvez – diz piedoso autor – que
nem Madalena, nem Agostinho, nem Margarida de Cortona se houvessem
santificado, se não tivessem caído. Os grandes no pecado costumam ser também
grandes na santidade.
Ó meu Deus, como é bom sentir-se a gente miserável. E depois de uma queda,
tocar o chão duro da própria miséria, e chorar, arrependido, e experimentar a
doçura de Vossa Misericórdia!... Se não tivesse caído, não seria tão feliz! Oh!Feliz culpa! Oh! Culpa feliz! Dizia Santo Agostinho.
7 DE ABRIL
UM BEIJO DE MISERICÓRDIA E AMOR
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Um dia – conta a Irmã Benigna Consolata – eu pus ao lado da folha de papel em
que escrevia uma estatueta do Menino Jesus. Um pequeno movimento que fiz a
derrubou. Levantei-a do chão, sem demora, e dei um beijo em Nosso Senhor,
dizendo: “Se não tivesses caído, não terias este beijo”. Ele respondeu: “É assim,
minha Benigna, quando cometes uma falta involuntária. Não me ofendes, mas oato da humildade e de amor que fazes depois, é o beijo que me dás, e eu não o
teria recebido se não tivesses cometido essa imperfeição.2
Pode-se imaginar um símbolo mais comovedor da alegria que causamos ao
Coração de Jesus quando, depois de nossas misérias quotidianas, voltamo-nos
para Ele, cheios de confiança? Nossas faltas – diz o Pe. Paul de Jaegher, S. J.3 –
têm como missão principal fazer-nos conhecer experimentalmente e tocar com
os dedos nossa imensa miséria e total impotência. Centenas, milhares deimitações não nos poderiam dar essa humildade sentida e vivida que,
unicamente com a graça de Deus, a experiência, mil vezes repetida, de nossa
miséria, pode dar-nos.
Abençoadas misérias que nos alcançam tanta misericórdia!
8 DE ABRIL
CEGO DE MISERICÓRDIA
Estará Nosso Senhor descontente com as nossas misérias? E com os nossos
defeitos? São inquirições angustiosas de certas almas que desejam amar a Nosso
Senhor e se sentem fracas e desconfiadas. A uma pergunta destas, respondeu
Santa Teresinha a uma de suas noviças: “Sossegue. O Esposo que escolheu
possui, certamente, todas as perfeições imagináveis, mas – se assim me é
permitido falar – tem, ao mesmo tempo, dois grandes defeitos: é cego e ignora aciência do cálculo”. Essas falhas que seriam lastimáveis num esposo terreno,
tornam infinitamente mais belo e amável o nosso Esposo celeste. Se Ele quisesse
olhar-nos com olhos de ver, se soubesse calcular, bastaria a vista de nossos
pecados para nos aniquilar. Mas não é assim: o grande amor que nos tem Lhe
veda os olhos para não ver nossas imperfeições. Pense nisto: se o maior de todos
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os pecadores se arrepender na hora da morte e expirar num ato de amor a Deus –
Nosso Senhor, imediatamente, sem atender às graças inumeráveis de que esse
infeliz abusou, nem aos crimes que praticou, mas olhando só o seu
arrependimento, abre-lhe sem demora os braços da sua misericórdia. Mas, para
que Nosso Senhor se haja para conosco à maneira de um cego e não nos peçacontas, necessário é Levá-lo pelo coração. É este o seu fraco”.4
Por que o desalento em nossas fraquezas e misérias? Nosso Divino Esposo ficou
cego de misericórdia!
9 DE ABRIL
NEM UM PEIXE!
São Pedro e os companheiros passaram toda a noite a pescar, mas as redes se
conservaram vazias. Nenhum peixe! Veio a manhã. Apareceu um Personagem
Desconhecido e lhes pergunta se haviam pescado alguma coisa. “Não”,
respondem secamente e desconfiados. Então lhes diz o Personagem Misterioso:
“Lançai a rede à direita”. E que pesca maravilhosa!
Nosso Senhor ainda faz assim conosco. Deixa-nos a lutar uma noite toda, de
meses e anos, com tantas misérias, tantos defeitos a corrigir, tantos pecados. Em
vão lançamos, à direita e à esquerda, a rede de nossos esforços... Nada! Nenhum
peixe! Só depois é que Jesus aparece e ordena que lancemos mais uma vez a rede
de um ato de confiança. E... Que pesca maravilhosa! Em poucos dias ganhamos
mais do que em longos anos. Nunca nos desalentem as nossas misérias. Dum
momento para outro Nosso Senhor retira os obstáculos, enche-nos de coragem e
nos santifica, recompensando assim nossos esforços. Mas é preciso que, como
São Pedro, não desanimemos e passemos a noite toda das provações a lançar arede da boa vontade e dos esforços. Logo pela manhã virá Jesus, e a pesca será
maravilhosa.
Santa Teresa conta que lutou durante longos anos para se corrigir dum defeito e
que, num dia apenas, por uma graça infusa, viu-se livre dele. Desejemos a
Santidade e façamos esforços para alcançá-la. Um dia seremos santos. Depende
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isso de nós, de nossa confiança e amor, e sobretudo de nossos esforços, da luta.
1O DE ABRIL
TEM PACIÊNCIA CONTIGO!É preciso que tenhamos muita paciência conosco e ainda mais do que com
outros. Somos, às vezes, insuportáveis a nós mesmos. Tanta miséria, quedas
repetidas, defeitos incorrigíveis, fraquezas vergonhosas, covardia, desânimos,
pecados sobre pecados! Oh! Que desolação! Não nos perturbemos. Calma e
paciência. Quanto mais perturbação tanto pior. É orgulho não nos
conformarmos com a nossa fraqueza e a nossa miséria. Às vezes é mais fácil
termos paciência com os outros do que conosco. Com a natureza rebelde,atrevida, grosseira que possuímos, perdemos a calma!
Não maltratemos o nosso jumentinho a pancadas de impaciência. É pior. Será
preferível que lhe demos boa ração de calma e tranquilidade e confiança. Um dia
Nosso Senhor disse a uma dessas almas já quase desesperadas com a sua má
natureza, sempre rebelde e recalcitrante: “Minha filha, fui tão paciente contigo,
pois é preciso que também tenhas paciência contigo mesma.5
Tenhamos então muita paciência conosco. Se Nosso Senhor, que é a Infinita
Justiça, a própria Santidade, se Ele que tanto odeia o pecado nos suporta por
misericórdia, – por que não nos havemos de suportar na miséria?
11 DE ABRIL
HORA SOLENE!
Soror Elisabete da Trindade dizia na hora da morte: “Como é solene a hora em
que me acho!” Solene, sim, porque era a de sua passagem para a Eternidade, era
a hora de se apresentar à Justiça Divina. Experimento – acrescentou ela – um
sentimento indefinível, algo da Justiça e da Santidade de Deus. Acho-me tão
pequenina e desprovida de méritos! Como é preciso dar confiança aos
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agonizantes!6
Sim, as horas solenes fazem tremer. A natureza, no momento decisivo da partida
do exílio, apavora-se e treme. Mais do que nunca, a confiança é necessária.
Quem viveu no Coração de Jesus há de morrer nesse Divino Coração. A
Misericórdia Divina jamais será tão pródiga como nos últimos instantes. Um ato
de confiança, resignação e amor, nesses momentos, pode fazer do pecador
miserável um justo, um santo. Precisamos aceitar a morte conformados com a
vontade de Deus. “Aceitarmos a morte que Deus nos apresenta e conformarmo-
nos com a Vontade Divina – diz Santo Afonso – é merecermos uma recompensa
semelhante à dos mártires”. E o Pe. Luiz de Blois assegura-nos “que, na morte,
um ato de perfeita conformidade com a Vontade de Deus nos preserva, não
somente do Inferno, mas até do Purgatório”.7
Também há de chegar para nós a hora solene. Seja solene pelo amor e a
confiança a nossa entrada na vida eterna!
12 DE ABRIL
ONDE CAI A ÁRVORE, AÍ FICA!
Quando se vive na casa de Deus e ao lado de Nosso Senhor, é preciso ter
confiança, principalmente na hora da morte. Das almas devotas do seu Coração,
disse Nosso Senhor a Santa Margarida Maria: “Serei, na hora da morte, seu
Refúgio seguro”. Por que tremer? Nossos pecados? Oh! Basta um olhar de amor
e de arrependimento e firme propósito. E o Bom Ladrão e Madalena, e o
Publicano, e o Filho Pródigo? A hora da morte é a última hora do tempo da
misericórdia. Não seremos abandonados. Confiança! Da família abençoada de
Santa Teresinha saíram, para a vida religiosa, muitas almas santas. Uma delas foia sua tia materna Soror Maria Dositéa da Visitação de Santa Maria. Pouco antes
de sua morte, após uma vida santa, recebeu ela a visita de Mgr. Outremont, bispo
de Mans. Disse-lhe o prelado: “Nada de receios, minha filha. Onde cai a árvore, aí
fica. Brevemente há de tombar no Coração de Jesus, para n’Ele permanecer
eternamente”. Essas palavras encheram de confiança e amor o coração da santa
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visitandina, que morreu toda abandonada no Coração de Jesus, aos 24 de
fevereiro de 1877.
Ah! Façamos com que a árvore de nossa vida se carregue de frutos de confiança,
abandono e amor! E que, vergada ao peso desses frutos, incline-se para o
Coração de Jesus e, com a morte, nele caia e permaneça para sempre!
13 DE ABRIL
O ESCULTOR DIVINO
Para construir a Jerusalém celeste, quer o Senhor, pedras bem talhadas, obras-
primas de arte e estátuas belas e vivas de amor. E Ele, o Divino Escultor, é quem
prepara, talha e aperfeiçoa, com o cinzel das criaturas, as pedras vivas da Pátria
celeste. O escultor, ante o bloco de mármore, sente palpitar a chama do seu ideal
de artista. E bate, corta, desbasta, até que apareça aos seus olhos a estátua que
idealizou. Assim faz Nosso Senhor conosco. Somos pedras vivas, destinadas à
construção da Jerusalém celeste. “O mundo – diz São Francisco de Sales – é uma
oficina, na qual são batidas e talhadas as pedras vivas que devem servir na
construção da Jerusalém celeste”. Que belo destino é o nosso! Se o mármore
pudesse sentir como nós, que honra e glória não teria em ser trabalhado nasmãos de um Miguel Ângelo, de um Cellini, e admirado nos templos e museus!
Haverá maior e mais genial artista do que Deus? E não havemos de querer que
Ele trabalhe em nós? Deixemos, sim, que, com o cinzel da enfermidade, do
martírio quotidiano de mil contrariedades, Ele, o Divino Escultor, bata, corte,
desbarate e faça da pedra dura e fria de nossa pobre alma uma estátua viva do seu
Amor misericordioso!
14 DE ABRIL
O BRAÇO DA MISERICÓRDIA
Conta-se, na vida prodigiosa de Santa Catarina de Racconigi, da Ordem Terceira
de São Domingos, morta em 1547, que a Santa vira Nosso Senhor de tal modo
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crucificado, que um braço estava mais longo do que o outro. Jesus lhe disse
então que o braço mais curto representava a Sua Justiça e o mais longo a Sua
Misericórdia. “Eles são iguais, minha filha, disse o Crucificado – mas neste
século corrompido, a misericórdia se estende mais do que a justiça”. Sim,
vivemos no tempo da misericórdia. Quanto maior é a ingratidão dos homens,maior é a Misericórdia Divina. Nosso Senhor quer vencer-nos nesta batalha
terrível da nossa maldade contra a Sua bondade, da nossa miséria contra a Sua
misericórdia. Ah! Não desça sobre nós o braço terrível da Justiça Divina! Quem
poderia subsistir ante o rigor dessa Justiça Eterna? Desça, sim, o braço da
Misericórdia. Ele é bem longo, alcança a terra, chega até as profundezas do
abismo insondável de nossa miséria.
Mais ainda do que no século de Santa Catarina de Racconigi, o Vosso braço deMisericórdia, ó Jesus, deve socorrer-nos e sustentar. Mistério de Amor! Quanto
maior é o pecado dos homens, quanto mais Vos fere a nossa ingratidão, tanto
mais nos amais e nos cumulais dos tesouros de Vossas misericórdias!
Braço Divino da misericórdia, descei sobre nós!
15 DE ABRIL
EM LIBERDADE
Ninguém é mais livre do que a alma inteiramente abandonada à Vontade de
Deus. Nada a perturba e embaraça. Luta, sofre, trabalha, sempre feliz, numa paz
inalterável. As almas imperfeitas sofrem muito. Uma palavrinha as perturba,
qualquer moléstia ou contrariedade as atira num mar de aflições e queixas
desesperadas. A alma abandonada, confiante, só tem um ideal: fazer a vontade
de Deus. Passará da saúde para a doença, da secura para as consolações, dacalma para a tentação, dos reveses da sorte para a prosperidade, sempre
conformada, humilde, feliz por cumprir a Vontade Daquele que tudo dispõe,
neste mundo, para nosso bem.
É a santa liberdade dos filhos de Deus, dos discípulos fiéis da cruz. “Se há alguma
coisa – diz Bossuet8 – capaz de tornar livre um coração, é o perfeito abandono a
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Deus, à Sua Santíssima vontade.” A mortificação, o espírito de sacrifício, a
humildade provada das humilhações, ajudam-nos muito na conquista dessa
liberdade do coração. Vamos romper as cadeias que nos prendem a este eu
orgulhoso e tirano, que nos escraviza. E cantaremos então como o salmista:
“Quebrai, Senhor, minhas cadeias. Eu Vos sacrificarei uma hóstia de louvor!”
16 DE ABRIL
MINHA COROA DE ESPINHOS
Há pessoas que são vítimas de um mal intolerável: a dor de cabeça. Dor como a
do martírio de uma coroa de espinhos. Outras, esgotadas pelo trabalho
intelectual ou por preocupações e desgostos sérios, sentem-se enlouquecer dedor. Oh! Como é preciso ter paciência! A agitação aumenta o sofrimento. Para se
poder suportá-lo, é mister que se encha a cabeça de pensamentos bons e
consoladores! “Não nos admiremos – dizia o mártir Santo Agapito – se a cabeça
que deve ser coroada no Céu, sofra aqui na terra”. Unamo-nos a Jesus Cristo no
Pretório coroado de agudos e penetrantes espinhos, e contemplemos um quadro
do “Ecce Homo”. Quão doloroso foi o suplício da coroação de espinhos!
Ofereçamos os espinhos de nossa coroa de dores a Jesus, coroado de espinhos.
Que tesouro de graças não podemos obter por esse sofrimento bem suportado,
em união com Deus Nosso Senhor! Santa Margarida Maria sofreu, sem cessar,
durante longos dias e noites, uma terrível dor de cabeça, a cujo propósito disse:
“Devo ao meu Salvador mais reconhecimento por esta coroa, que ninguém pode
tirar de minha fronte, do que a que lhe deveria pela dádiva de todos os diademas
do Universo. Esta coroa me põe muitas vezes na feliz necessidade de passar
noites sem sono e, assim, poder pensar mais no meu Doce Jesus”.
17 DE ABRIL
NOITES SANTAS
É terrível uma noite de insônia! É quando uma enfermidade nos faz passar
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noites de angústia e sofrimento, a velar, sem que tenhamos um minuto de
repouso!...
É horroroso esse martírio! Mais uma razão para que o suportemos
pacientemente. Insônia e impaciência serão dois martírios em vez de um. Não há
remédio? Calma, seja o que Deus quiser! Muitas vezes a paciência sossega os
nervos e vem o sono. Quando o relógio, no seu tic-tac importuno, aborrecer-vos,
lembrai-vos de que cada minuto aqui, principalmente no sofrimento, pode valer-
nos um grau a mais de felicidade no Céu! Ouvis bater as horas? Fazei o que
aconselha Santo Afonso: lembrai-vos de Nossa Senhora, tão boa Mãe,
consoladora dos aflitos, saúde dos enfermos, e rezai uma Ave Maria. De
momento em momento oferecei vossos padecimentos e incômodos ao Coração
de Jesus, que vela a noite toda e não dorme, por amor! Adorai-O no Seu sofrerem todos os Sacrários do mundo. E, quando raiar a aurora, depois de sete, oito
horas de insônia e martírio, sentir-vos-ei felizes oferecendo a Jesus os tesouros
de paciência e conformidade, adquiridos durante a noite. É a nossa hora santa,
em união com as agonias da noite santa de Getsêmani!
Não podeis rezar no leito de dores? Oferecei a Nosso Senhor as vossas noites
santas.
18 DE ABRIL
A GRAÇA E A CRUZ
Perguntaram ao santo Cura d’Ars o que era preciso para alcançar o Céu. “A graça
e a cruz”, respondeu o santo. Que precisamos mais? A graça faz-nos dignos do
Céu pela Misericórdia Divina; a cruz nos enriquece de méritos, desapega-nos da
terra e nos ajuda a morrer para nós e a ressuscitar para a vida do Amor, que aquicomeça e se consuma na glória. Deus nos promete a sua graça, mas, para que a
conservemos, são-nos necessários o sofrimento, a mortificação, a paciência, a
conformidade com a vontade de Deus, o que, tudo, só na cruz podemos
encontrar. A graça é o diamante que o Divino Rico nos dá e que a cruz lapida,
tornando-a uma joia brilhante e bela aos olhos Divinos. Ah! Como será bela, no
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Céu, a coroa de graças, toda cravada de diamantes lapidados nas amarguras, nas
doenças, nas contradições, calúnias, perseguições e reveses!
Sofrer é uma riqueza! “Não lamentemos a sorte dos que padecem – dizia o Pe.
Ravignan – mas sim a dos que padecem sem mérito”.
É lamentável, sim, que se deixe perder tanta riqueza da graça, porque se rejeita a
cruz. A graça e a cruz são irmãs. A graça é a riqueza que o Rico por excelência nos
dá, e que, neste mundo, precisamos colocar no Banco da Cruz, para que nos
renda juros de cem por um, garantindo-nos a Vida Eterna!
19 DE ABRIL
DEUS TARDA MAS NÃO FALHA Assim diz o povo, cheio de confiança na Divina Providência. De fato,
experimentamos, a cada passo, os efeitos da Misericórdia Divina, sempre solícita
em nos Socorrer. Deus tem a sua hora e é mister esperá-la. Nossa oração deve ser
perseverante e humilde. A impaciência e a revolta afastam-nos a graça. “Não vos
desespereis – diz o Pe. Luiz Dupont – quando Vosso Pai Celeste demora em vos
atender”. Quando Deus tarda é porque nos prepara surpresas de Sua bondade e
misericórdia. Ele não é só Pai, mas é o mais solícito e carinhoso dos pais.
Esperemos. Tudo quanto Ele faz tenho-o repetido mil vezes – é para nosso bem;
se nem sempre para o bem temporal, sempre, sempre, para o bem eterno. Por
que nos desesperarmos? Seria loucura. Santa Mônica, cheia de dor, rezou
durante quase vinte anos, pedindo uma graça exclusivamente de interesse da
glória de Deus: a conversão de Agostinho, seu filho. E não desanimou. Que bela
recompensa de tão longa espera! Teve o filho batizado, bom cristão, sacerdote,
bispo, doutor da Igreja e santo. Deus tardou mas foi generoso. Tantos anos delágrimas e orações foram generosamente, superabundantemente pagos!
Quando se trata com Deus, não se perde em esperar. Ao contrário, lucra-se tanto
quanto mais se espera, porque – diz o povo, com sabedoria, “Deus tarda mas não
falha”.
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20 DE ABRIL
ESCOLHO TUDO!
Não estejamos a medir os nossos sofrimentos, a compará-los com os dos outros,a desejar este, rejeitar aquele e pedir a Nosso Senhor que deles nos poupe. O
melhor e mais perfeito é não escolher, deixando que se cumpra inteiramente a
Vontade Divina. “As melhores mortificações – dizia São Francisco de Sales – não
são as que escolhemos, mas as que Deus escolhe”. A cruz que Ele talha nos vem
coberta de preciosas graças, que não seriam concedidas se nós tivéssemos
escolhido nossa cruz. Ou nada escolher, ou escolher tudo que Ele quiser, tudo,
com generosidade, como o fez Santa Teresinha. Leônia, irmã da santa,apresentando a esta e a Celina uma cesta cheia de retalhos, fitas e galões, disse-
lhes: “Tomem lá e escolham”. Celina escolheu um novelo de cordão. Teresinha,
porém, refletiu e exclamou:
“Eu cá escolho tudo”. Ao lembrar esse episódio de sua infância, na História de
uma alma, comenta o Anjo do Carmelo: “Neste episódio vejo resumida a minha
vida. Quando, mais tarde, descobri os caminhos da perfeição, compreendi que,
para se chegar a ser santa, é necessário sofrer muito, ambicionar sempre o que
há de mais perfeito e esquecer-se de si mesma. Entendi que há numerosos graus
na escola da santidade, e que cada alma é livre de fazer pouco ou muito por seu
amor, de escolher, numa palavra, entre os diversos sacrifícios que lhe pede.
Exclamei, então, como autora, na quadra infantil: “Escolho tudo!” Não me
amedronta ter que sofrer por Vós! Escolho tudo O que Vós quereis!”9
Que generosidade! Não quereis escolher tudo que Nosso Senhor vos mandar do
Céu com a cruz?
21 DE ABRIL
LARGURA, COMPRIMENTO E ALTURA DA CRUZ
A piedosa autora dos “Avisos espirituais” escreve, no seu livro de consolações,
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que devemos aceitar a cruz que Nosso Senhor nos envia, sem a diminuir em
largura, nem em comprimento ou em altura. Tal como a recebemos, devemos
levá-la até ao calvário, como o fez o nosso Divino Redentor. Aceitai vossa cruz na
sua largura, que abraça todas as coisas e circunstâncias capazes de vos fazerem
sofrer, todas as penas, tudo o que vier! Aceitai-a no seu comprimento, isto é, naduração. Dizei assim: “Quanto tempo Nosso Senhor me quiser no sofrimento,
sofrerei por seu amor, até à morte, se for de Sua Vontade!” Aceitai a vossa cruz na
sua altura, isto é, na grandeza dos tormentos que vos acabrunham. Às vezes a
cruz é muito alta. Que fazer? Por ser maior, será mais preciosa. A medida de
nossa felicidade e glória no Céu será a medida da nossa cruz. Esperai a cruz que
Nosso Senhor vos mandar e não procureis cortá-la para diminuí-la no
cumprimento. Sofrei quanto tempo Ele quiser! A cruz que vem do Céu é uma
obra de arte bem talhada e bela. Foi preparada pelo Artista Divino. Por que
estragar, com a nossa ignorância, o trabalho tão rico do Divino Carpinteiro da
Judeia? É ridículo e estúpido um operário boçal mutilar o trabalho de um artista.
Não estraguemos a obra-prima do Divino Artista que talhou nossa cruz!
22 DE ABRIL
O MEDO DA CRUZNosso Senhor abraçou amorosamente a cruz, levou-a até o Calvário e nela
morreu por amor de nós. Por que ter medo da cruz? Santo André, ao vê-la, não
pôde conter os transportes de júbilo de sua alma e exclamou: “Ó boa cruz!” – Ó
boa cruz!” Boa cruz, diz o Apóstolo. E nós a achamos sempre tão má quando vem
a hora de abraçá-la! Como somos fracos e imperfeitos!
E o medo da cruz, diz o santo Cura d’Ars, é a nossa maior cruz. O sofrimento,quando acha almas decididas e corajosas que o enfrentem, fica sempre reduzido
à metade. Nossos nervos e imaginação costumam exagerar muito o peso e o
tamanho da cruz. Se soubéssemos o valor desta, andaríamos à sua procura como
o avarento à procura do ouro. Quem menos sofre é quem não teme a cruz. Para
fugir dela, atiram-se almas, como loucas mariposas, ao fogo de tanto falso brilho
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do mundo e dos prazeres e, pobrezinhas, sofrem mais. A cruz de Nosso Senhor é
pesada, mas temos quem nos ajude a carregá-la. Ele mesmo, o nosso doce Jesus,
transformado em Cirineu da Misericórdia depois de Sua paixão, vem carregar a
nossa cruz ou, melhor, ajudar-nos a carregá-la até ao Calvário. E não quereis
carregar, com o Vosso Pai Celeste, a cruz que Ele vos oferece com tanto amor epara o vosso bem, ajudando-vos, ainda, a carregá-la, como Divino Cirineu da
Misericórdia?
Por que tanto medo da cruz?...
23 DE ABRIL
JUIZ E PAI
Deus nos há de julgar! Este pensamento, que aterroriza tantas almas, deveria
consolar-nos. Como poderemos pensar sem tremer no juízo Divino, quando
santos como São Bernardo e São Jerônimo tremiam só à meditação dessa
verdade eterna? Quem nos vai julgar? Um Deus, sim, um Deus de justiça, que
encontra imperfeições até nos seus Anjos! Mas esse Deus é nosso Pai e Pai por
toda a eternidade, Pai das misericórdias. Deus é justo, sim, e por isso mesmo é
que devemos ter confiança. Sendo justo, saberá levar em conta a nossa fraqueza,a nossa ignorância e miséria, verá a nossa boa vontade, a pureza de nossas
intenções. Temê-Lo, por quê? Ele bem sabe de que barro somos feitos. Portanto,
confiança!
Perguntaram a Santo Ambrósio, quando moribundo, se não temia os juízos de
Deus. “Ah! – respondeu o santo – temos um mestre tão bom!”... “Tenha
confiança em Nosso Senhor”, dizia o sacerdote a Frederico Ozanan. “Ó meu
padre – respondeu o servo de Deus, em agonia – como ter medo de NossoSenhor? Amo-O tanto!” Amemos o Coração de Jesus, fonte de misericórdia e
perdão. É nosso Juiz, sim, mas também é nosso Pai.
“Como é doce morrer – dizia Santa Margarida Maria – para ser julgada por
Aquele em cujo Coração vivemos!”
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24 DE ABRIL
MIGALHAS E IGUARIAS
Da mesa do Senhor, preparada para os seus eleitos, caem migalhas, que são asriquezas, a prosperidade, as honras e prazeres deste mundo. Há, porém, na
mesa, iguarias finas, alimento substancial, que Deus só concede aos amigos mais
íntimos e queridos, aos que, dedicadamente e cheios de gratidão, aceitam o seu
convite. Essas iguarias finas da mesa Divina são as cruzes e provações da vida.
Elas sustentam admiravelmente nossa vida espiritual. E Nosso Senhor convida
todos ao Seu Banquete substancial de Amor, onde cada alma encontra a iguaria
do sofrimento que a deve sustentar e robustecer para a luta. Só os amigos deJesus, e amigos generosos, aceitam o amoroso convite. Muitos se contentam
com as migalhas. Mas, de migalhas, não pode viver nossa pobre alma. Ela precisa
de bom alimento. O amigo senta-se à mesa do amigo e, saboreando as iguarias,
entretém-se com ele em doces palestras, firmando os laços de recíproca amizade.
Por que havemos de viver, como os cães, a esperar as migalhas da mesa de Nosso
Senhor e a disputa, vergonhosamente, com aqueles que as procuram, na avidez
de honras, prazeres e riquezas? Não prefiramos roer o osso duro de tantas
desilusões e prazeres loucos do mundo, alimentar-nos de migalhas, a sentarmo-nos, felizes e confiantes, à mesa saborosa e substancial de Nosso Senhor!
25 DE ABRIL
CRUZES PEQUENINAS
As cruzes grandes assustam, mas são raras. As pequeninas acompanham-nos
por toda parte. Não damos um passo sem as encontrar. Uma palavrinha seca, um
olhar indiferente, uma pequenina dor, um contratempo, uma pessoa importuna,
a chuva, o vento, a falta de qualquer objeto, são tantas pequeninas cruzes e
aborrecimentos no curto espaço de um dia! Por que havemos de nos impacientar
com isso e aspirar a sofrimentos, grandes perseguições etc., que talvez nunca
teremos que experimentar? Contentemo-nos com as cruzes pequeninas. Elas
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são preciosas. Santa Teresinha as amava tanto! “Longe de me querer igualar às
grandes almas que, desde a sua infância, praticam toda espécie de macerações –
escreve a Santinha – fiz consistir minhas penitências em quebrar minha vontade,
reter uma palavra de réplica, prestar pequenos serviços sem dar a entender que o
faço, e mil outras coisas deste gênero”. Não é um meio eficaz de santificação?Talvez custem mais essas cruzes pequeninas do que muitas das grandes. Desde o
amanhecer até o repouso da noite, encontramos as pequeninas. Aproveitemos
essa riqueza. Sejamos avaros das coisas celestes. Quanta abnegação e espírito de
sacrifício na prática da aceitação quotidiana das cruzes pequeninas.
26 DE ABRIL
PALAVRAS DE CONFORTO
O bem-aventurado Henrique Suzo era um apaixonado amante da cruz. Sua vida
foi um martírio contínuo. Eis as palavras de conforto que o Beato dirigia sempre
aos que sofriam:
“Se estais doentes, regozijai-vos, porque o Senhor está pensando em vós”.
“Cada enfermo se julga o mais enfermo, cada pobre, o mais indigente. E nem um
nem outro pensa em encher as mãos com os tesouros da graça que nos vêm pelo
sofrimento.”
“O sofrimento é o exercício mais salutar que Deus impõe à nossa alma e ao nosso
corpo. E é mais difícil sofrer com paciência e em silêncio do que fazer milagres,
mesmo o de ressuscitar os mortos.”
“Quando Jesus Cristo vos deixa sofrer sem consolação, como Ele sofreu no
Jardim das Oliveiras, não a procureis fora do Seu coração cheio de dor. Quereisgozar, quando Jesus sua sangue, para expiar os nossos prazeres culpáveis?”
“Para o enfermo, a mais bela das ocupações e das artes deve ser a dos atos de
resignação, enquanto espera pacientemente o socorro do Céu.”
Guardemos sempre tão belos pensamentos, que tanto nos podem ajudar no
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tempo das provações, isto é, quando Nosso Senhor pensa em nós e nos acha
dignos de sofrer alguma coisa por seu amor. Na verdade, é tão grande e preciosa
a graça de sofrer, que não a merecemos!
27 DE ABRIL
DIAS PERDIDOS
O Imperador Tito, quando passava o dia sem fazer algum bem, costumava dizer:
“Perdi o meu dia”. Para nós, o dia perdido é o que passamos sem sofrer. “A cruz –
diz a Autora dos Avisos Espirituais – preserva os nossos dias da esterilidade”.
Portanto, receemos inutilizar nossa vida, tão preciosa, desprezando a cruz. O
sofrimento enche nossos dias de bênçãos e graças do Céu. Que boa escola a emque se aprende a ver o que é caduco! “Quem não sofre, que é que pode saber?”,
pergunta o Espírito Santo. Se somos tão ignorantes do mistério da cruz, é porque
temos preguiça de frequentar a nossa escola Divina do Calvário! Que vida inútil a
nossa! Oh! Aproveitemos o tempo. Temos só esta vida para sofrer e dar a Nosso
Senhor as provas de um amor generoso. “O sofrimento, unido ao amor – dizia
Santa Teresinha – é a única coisa que me parece desejável neste vale de
lágrimas”.10
Na hora da morte, as alegrias efêmeras desta vida, os loucos prazeres que nos
seduziram, hão de nos atormentar horrorosamente. O sofrimento, ao contrário,
há de consolar-nos. Veremos dias cheios de méritos, dias passados no Calvário,
bem junto à cruz. Oh! sim, ao deixarmos este mundo, só uma coisa nos há de
consolar imensamente: termos sofrido por amor de Deus!
28 DE ABRIL
REFÚGIO SEGURO
Onde haverá um refúgio seguro para nossa pobre alma, quando abatida pelo
sofrimento? E, nas tentações e perigos, onde nos abrigaremos? Santo Agostinho
responde: “Nas chagas de meu Jesus e, principalmente, na chaga do Seu
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coração”.
São Boaventura estava bem certo de que as Santas Chagas de Nosso Senhor são
o melhor refúgio na vida e na morte, quando dizia: “Se eu nada mais puder fazer,
meu Jesus, procurarei vossas chagas e aí permanecerei”.
Beijemos, em nossos crucifixos, as Chagas Divinas das mãos. Elas nos ensinam a
aceitar as amarguras, as contradições que encontramos com o trabalho de nossas
mãos. As Chagas dos pés nos ensinarão a caminhar corajosamente na via
dolorosa do Calvário. A chaga do Coração nos dirá o amor infinito com que
somos amados e a nossa ingratidão sem par. Olhemos, sim, Nosso Deus cravado
na cruz e aprendamos a amá-lo com generosidade. Aos devotos das Chagas do
seu Coração, prometeu Nosso Senhor a Margarida Maria: “Eu serei seu refúgio
seguro na vida e, principalmente, na hora da morte”. A uma alma provada, diziaNosso Senhor: “Minha filha, molha no sangue de minhas Chagas o pão duro de
tuas amarguras e sofrimentos, e serás feliz”.
Ó doce e terno Coração, morada e refúgio de nossas almas! Tende piedade de
nós!
29 DE ABRIL
BEM-AVENTURADOS OS QUE CHORAM
“Bem-aventurados, isto é, felizes – diz Nosso Senhor – “os que choram.” Este
mundo é o vale das lágrimas. Nosso Senhor também chorou. Chorou a
ingratidão de Jerusalém, chorou na sepultura de Lázaro, no Horto das Oliveiras
e, antes, havia chorado nas palhinhas da manjedoura de Belém. Oh lágrimas
Divinas e redentoras, sois nosso conforto! E, para santificar nossa dor, Jesus
abençoa nossas lágrimas do alto da Montanha. “Felizes...” Então será feliz quemchora? Sim, porque a lágrima salva, desafoga o coração. Lembremo-nos das
lágrimas de Madalena e das do filho pródigo.
Como é bom chorar de amor e de arrependimento! Santifiquemos nossas
lágrimas na paciência e na resignação. Deus não nos proíbe chorar; quer, porém,
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que o nosso pranto seja, não como o de quem não tem esperança, mas o que
suaviza, desafoga o coração, paga o tributo à natureza e se transforma depois em
pérolas de abandono à Vontade Santíssima de Deus. No Céu, onde não haverá
mais dores nem gemidos, Ele, Nosso Divino Consolador, enxugará nossas
lágrimas.
“Como eu tenho sede do Céu – dizia Santa Teresinha, – dessa mansão bem-
aventurada, onde amarei para sempre a Jesus! Mas... para chegar até lá, é preciso
sofrer e chorar”.11
Soframos, pois, choremos, resignados, nas trevas dessa noite da vida. Paciência!
Logo há de raiar a madrugada do Céu!
30 DE ABRIL AS DUAS COROAS
Nosso Senhor apareceu a Santa Catarina de Sena com duas coroas nas mãos,
uma de espinhos e outra de flores. Minha filha – disse Jesus, – terás de receber,
necessariamente, uma destas coroas e depois a outra. Se quiseres receber nesta
vida a coroa de espinhos, eu te reservarei a outra, a de flores, para a vida eterna.
Se ao contrário, quiseres agora a de flores, eu te reservarei a de espinhos para
depois de tua morte”. Respondeu a santa: “Senhor, de há muito renunciei minha
vontade, mas se quereis minha resposta, digo-Vos que, acima de tudo, quero
viver toda a minha vida com a Vossa Paixão e achar minha consolação em sofrer
por Vós.12
Esta é a lei: uma coroa de espinhos, e depois outra de rosas. Primeiro a Cruz,
depois a Luz. Felizes os que, na vida, podem sofrer um pouco por amor de Deus.
A Santa escreveu numa de suas cartas: “Devemos suportar tudo, porque osofrimento é pequeno e a recompensa é grande. O servo do mundo traz a sua
cruz, a cruz do demônio. E nós não queremos a cruz de Jesus Cristo?”13
“Minha filha – disse Nosso Senhor a Santa Catarina – o justo é capaz de sofrer e
eu o privo dos bens da terra para lhe dar maior abundância dos bens do Céu”. 14 Ó
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grande santa, dai-nos a vossa inteligência da cruz!
1 - Sainte Therèse de L ‘Enfant Jesus. 7º lettre à des Missionaires.
2 - Souer Begne Consolata Ferrere - Vie.
3 - Pe. Paul de Jaegher. S. J. - Confiance - II vol. - c. IV .
4 - “Saint Therèse - Conseils et souvenirs”..
5 - Pe. Poullain, B.J. - “Journal de Lucie-Christine”.
6 - Elisabeth de la Trinité - “souvenirs” c. XVII.
7 - Santo Afonso - Preparação para a morte 10º.
8 - “Bossuet” - “Parfait abandon”.
9 - História de uma Alma - c.I.
10 - Saint Therèse - “9.e lettre à des missionaires”.
11 - 5me. lettre à Sr. Marie du Sacré Coeur.12 - “Vie de Saint Catharine - Sem. par St. raymond de Capp.”.
13 - “Lettres - III - p.215”.
14 - Diálogos - p.279.
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1 DE MAIO
MÃE! MINHA MÃE!
Maio, primavera de nossas almas, doce mês de Nossa Senhora! “Temos umsagrado instinto – diz o Apóstolo São Paulo que nos leva a chamar pelo Senhor e
dizer-Lhe: Pai! Pai!
Na mais bela das preces, Nosso Senhor quer ser chamado Pai: “Pai Nosso, que
estais no Céu”. Uma noviça, encontrando Santa Teresinha na cela, absorvida
numa meditação profunda, perguntou-lhe: “Em que pensa?” Respondeu-lhe a
santa, docemente: “Ah! minha irmã, medito o Pai Nosso! É tão doce chamar
Nosso Senhor de Pai!”
Há também em nós um instinto que nos constrange suavemente a bradar à
Maria, do abismo de nossas misérias: “Mãe! Minha Mãe!”
“Mamãe!” É o grito espontâneo do filhinho que padece. E como é triste sofrer
sem um olhar, sem um carinho de mãe! Deus teve misericórdia de nós e deu-nos
mãe. Não nos deixou órfãos neste exílio. “Eis a Vossa Mãe!” – diz-nos Jesus na
hora suprema das suas amarguras. E agora sentimos a doçura de invocar Maria e
Lhe bradamos, cheios de confiança: “Mãe! minha Mãe!” E “quem tem mãe não
perece”, diz o povo. Vi uma cena que me comoveu. Um moço enfermo, na flor
dos seus dezessete anos, quase em agonia. Sofria tanto! Sua mãe velava-lhe à
cabeceira havia mais de um ano, sempre carinhosa. O sofrimento chega ao
paroxismo. “Mamãe! – diz o pobrezinho, a chorar, aconchegado ao seio materno,
– e não fosse você, minha mãezinha, eu não poderia sofrer tanto neste mundo!”
Ah! Olhemos também para o Céu nas horas sombrias deste exílio e brademos:
Maria! Mãe do Céu! Sem o vosso doce e carinhoso olhar materno, quem poderiasuportar a noite horrorosa de tantas provações?
2 DE MAIO
MACHUCOU-SE, MEU FILHO?
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Há uma lenda que traduz a delicadeza do coração materno. Um moço,
apaixonado por uma criatura perversa e má, sujeitava-se a todos os seus
caprichos, à custa dos maiores sacrifícios. Um dia, fez-lhe ela a monstruosa
exigência de arrancar o coração materno e lho levar. “Impossível”, diz, com
desespero, o jovem. “Pois não terás o meu amor! Retira-te!” O pobre e infelizapaixonado, desvairado e cego, acaba por satisfazer o criminoso desejo do
viperino objeto de seu louco amor. Mata a desventurada mãe, arranca-lhe o
coração e o envolve, quente e palpitante, numa toalha. Foge desesperado e, ao
atravessar uma montanha, tropeça e cai violentamente sobre o solo pedregoso.
Uma voz se ouviu, saindo do coração materno em sangue, voz carinhosa e
mansa: “Machucou-se, meu filho?” É assim o coração materno. Nenhuma
ingratidão o vence.
Assim é o coração de Nossa Senhora Mãe do Céu. Pela criatura que nos seduz e
tiraniza, consumamos um crime: ferimos o coração de Maria pelo pecado, pela
multidão de nossos crimes, arrancamo-lhe o coração, com tanta maldade. Vem o
sofrimento e, nas pedras do caminho agreste da vida, tropeçamos e caímos
violentamente. Quedas de reveses e doenças e perseguições e desprezos e
calúnias. Vendo-nos em terra, feridos, pergunta-nos carinhosamente o Coração
de Maria: “Machucou-se, meu filho? Oh! Quero salvar-te, quero curar-te das
feridas do caminho, meu filho, meu ingrato filho!”
3 DE MAIO
VIVA A CRUZ!
Santa Verônica Juliana, apaixonada pelo martírio, dizia em transportes de júbilo:
“Viva a cruz isolada, nua, e viva o sofrimento!”
A Igreja também, na sua liturgia, convida-nos a saudar a cruz: “Ó cruz, eu te
saúdo, minha única esperança!” Sim, neste mundo, no exílio em que vivemos, se
quisermos salvar a nossa alma, só teremos um meio de que lançar mão: o
madeiro da Cruz. É duro, aterroriza a nossa fraqueza, mas não há remédio. Só
pela estrada real da Santa Cruz, chegaremos ao Céu. É a lei. Inocência ou
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penitência! Somos, porventura, inocentes? Ai! Lá se foi, há tantos anos, a túnica
imaculada da Pia batismal. Resta-nos a cruz. Por que rejeitar, então, ou aceitá-la
blasfemando, revoltado contra o Céu? Santa Catarina de Sena nos aconselha:
“Esteja a árvore da cruz plantada no nosso coração e na nossa alma; sede
semelhantes a Jesus Crucificado; escondei-vos nas chagas de Jesus Crucificado, banhai-vos no sangue de Jesus Crucificado, inebriai-vos e revesti-vos de
opróbrios, sofrendo por amor de Jesus Crucificado”.
São Paulo não queria pregar outra coisa senão Jesus Cristo e Jesus Cristo
Crucificado. Quem não sofre, que pode saber?
Ó ciência da Cruz, iluminai minha inteligência, abrasai meu coração!
4 DE MAIONÃO HÁ VINHO!
Nossa Senhora é sempre mãe solícita e carinhosa. Vede nas bodas de Caná.
Faltou vinho. Os noivos ficariam confusos e envergonhados com a situação. Não
era chegada a hora de Jesus. Sabia-o Nossa Senhora, mas não se pôde conter na
bondade do seu coração materno. Volta-se para o Filho: “Não há mais vinho!”
Não obstante a resposta de Jesus, de que ainda não havia chegado a Sua hora,
Ela dá ordem aos criados: “Fazei o que Ele vos ordenar”. E o milagre se realiza.
Em toda situação angustiosa de nossa vida, vamos à Maria. Seremos atendidos.
“Lembrai-vos – diz São Bernardo – que nunca se ouviu dizer que alguém jamais
recorreu à Vossa proteção e foi por Vós desamparado.” Falta, no banquete de
nossa vida, o vinho do Divino Amor, do abandono, da confiança, da paciência nas
tribulações? Vamos a Nossa Senhora. Não seremos confundidos. Ela pedirá a
Jesus que faça de novo o prodígio das bodas de Caná. E, voltando-se para ascriaturas que nos rodeiam e de que a Providência se utiliza para nossa
santificação, há de dizer-lhes: “Fazei o que Ele vos ordenar”. Elas talvez nos
firam e nos façam sofrer bastante, mas... Paciência! Enchem-se de água das
tribulações as hidras de pedra de nosso coração. Jesus fará o milagre de
transformá-las no vinho generoso e bom do Seu Divino Amor!
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5 DE MAIO
RAINHA DOS MÁRTIRES
Não se pode contestar, afirma Santo Afonso, que Maria tenha sido mártir.Provam-no Dionísio Cartusiano, Perbalto, Catarino e muitos outros. Para o
martírio, basta uma dor suficiente para dar a morte, ainda que, na realidade, não
se venha a morrer. São João Evangelista tem as honras do martírio, embora não
tenha morrido na caldeira de azeite fervente. A obediência faz mártires. Maria foi
mártir, sem que tocassem os algozes em seu corpo virginal. Ela teve um martírio
dos mais cruéis: o do coração. O nome de Maria tem, entre outras significações, a
de mar, oceano. Toda a vida de Nossa Senhora foi um oceano de dores e Elaprópria, uma Rosa de martírio. À semelhança da rosa que cresce entre os
espinhos a Mãe de Deus – revelou o Anjo a Santa Brígida – crescia em anos no
meio dos sofrimentos. E assim como, à medida que cresce a rosa, crescem os
espinhos, assim também, quanto mais a Virgem, Rosa eleita do Senhor, crescia
em idade, mais cresciam, para atormentá-la, os espinhos de seu martírio cruel.
Nossa vida pode ser um martírio, martírio lento de pequeninos aborrecimentos
quotidianos, martírio de enfermidades e reveses.
Um olhar à Rainha dos mártires! Coragem! Que o doce perfume da Rosa Mística
suavize a dor das feridas que cada dia nos fazem os espinhos da vida!
6 DE MAIO
O OCEANO DE AMARGURAS
O Profeta não sabia a que comparar a dor imensa, o doloroso martírio de NossaSenhora. Só a imensidade e as agitações do oceano lhe podem servir de pálida
imagem. Comentando as palavras do profeta, exclama um Autor piedoso:
“Virgem bendita, assim como a amargura do mar excede a todas as amarguras,
assim a tua dor excede a todas as dores”. Por isso, disse Santo Anselmo que, se
Deus não tivesse conservado a vida a Maria por um milagre singular, a dor
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imensa que Ela sofria poderia matá-la a todo instante. Para compreender o
martírio da Mãe de Deus, seria preciso meditar a imensidade do seu amor a
Jesus. “Onde está o nosso tesouro – diz o Evangelho – aí está nosso coração”, o
tesouro de Maria era Jesus, e quanto mais o amava, mais sofria. Ele, a riqueza
dos Céus e da terra, viu-O, pobrezinho e nu, deitado sobre as palhinhas de umaestrebaria. Ele, a Santidade Infinita, viu-O, contado entre os celerados, e viu
Barrabás a Ele preferido. Viu-O descarnado e nu, banhado em sangue, poeira e
escarros, insultado, blasfemado, no patíbulo infame da cruz. Teria alguém
sofrido mais do que Nossa Senhora, tão inocente, imaculada e bela? E eu, pobre
e indigno pecador, não quero sofrer! O frágil batel de minha vida, quero atirá-lo,
ó Maria, a velas pandas, no oceano imenso da meditação de vossas dores. Salvai-
me!
7 DE MAIO
NO EXÍLIO
Estamos exilados na terra. Nossa pátria é o Céu. Eva, mãe dos homens, legou-
lhes a morte, o pecado, a perdição e as amarguras do desterro. “Degredados filhos
de Eva.” É de degredos a nossa condição aqui! Maria, a quem o Anjo saudou:
“Ave.” “Deus te salve.” – Veio consolar-nos no exílio, veio salvar-nos e ajudar-
nos a chegar à Pátria, ao Céu. Em terra estranha, nem conhecemos o caminho
nem temos sossego. Façamo-nos pequeninos pela humildade, resignação e
abandono. Roguemos a Nossa Senhora que nos guie e nos venha adoçar, com o
seu carinho materno, os dissabores e a saudade amarga da Pátria. Sem Maria, o
exílio da terra é muito duro. Não A vemos ainda, é verdade, mas sentimos a sua
doce proteção, a influência do seu carinhoso amor. Longe da pátria, o filho se
sente feliz quando recebe uma carta da mamãe querida. Beija-a e a lê comovido. As suas expressões ternas, que lhe despertam tão doces recordações e lhe
excitam as saudades do lar, o carinho e solicitude maternais que nelas
transparecem, tudo, tudo lhe fala ao coração. Sofre, sim, mas consola-o e
conforta-o o pensamento de que um anjo reza por ele e o acompanha, dia e noite,
carinhosamente, a pensar, a chorar, preparando agradáveis surpresas para a
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volta, do exílio, de seu filho amado.
Oh! Quando, no triste exílio desta vida, sentirmos o coração oprimido de tristeza
e saudades, olhemos para o Céu. Maria lá nos espera. Beijemos o seu terço. É a
carta do seu carinhoso amor materno, escrita por Ela mesma, para consolar-nos.
8 DE MAIO
CONVERTEI-ME EM AMARGURAS ASCONSOLAÇÕES DA TERRA
Um desejo ardente abrasou o virginal coraçãozinho de Santa Teresinha do
Menino Jesus no dia de sua primeira comunhão: o de sofrer e sofrer muito porJesus. Heroico e belo ideal para uma criança de 11 anos!
“Ao receber Jesus-Hóstia, meu Divino Amor – escreve ela – senti-me atraída
para o sofrimento, achando-lhe encantos que me arrebatavam, a despeito de não
ter ainda claro e perfeito conhecimento deles. Tive também outro ardente desejo:
o de amar unicamente a Deus e só Nele achar alegria. Enquanto me entretinha
em dar ação de graças, ia repetindo amiudadas vezes: Ó meu Jesus, doçura
inefável, convertei-me em amarguras todas as consolações da terra”.1 E esta
heroica e bela prece da Imitação vinha espontaneamente aos lábios da criança,
saída bem do fundo da alma.
Naquela fusão de amor em que estava o serafim do Carmelo, deu-lhe Nosso
Senhor a graça que a levaria ao grau de santidade a que chegou, a graça de
compreender e amar o sofrimento.
A florzinha de Maria Imaculada deveria sentir ainda na terra o inverno de muitas
e dolorosas provações! Não importa! Ela só queria o que de melhor temos nomundo: a riqueza de sofrer e amar por Jesus!
9 DE MAIO
ESTRELA DO MAR
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Os navegantes, em eras remotas, não tinham a bússola. Atiravam-se à
imensidade dos oceanos confiantes no brilho das estrelas. Os Fenícios, por
exemplo, quanto fizeram pela conquista do mundo conhecido! E com que arrojos
de seus marujos! Guiavam-se pela estrela do mar.
No mar deste mundo fomos lançados pela Divina Providência. Bem frágil e
pequenina, quase em ruínas, é a embarcação em que lhe vamos enfrentar os
rigores. Nela teremos que fazer a longa e penosa viagem da vida. E havemos de
chegar ao porto do Céu, ao porto da Eternidade. Como nos parece ainda tão
longe a hora feliz da chegada, de aportarmos à Pátria, de vermos nossa Mãe!
A estrela que guiava os Fenícios e navegantes de outrora, não os livraria do
perigo na hora terrível das tempestades e das agitações medonhas do oceano.
Entretanto, a nossa Estrela do Mar, por efeito de uma Astrologia miraculosa,protege, ampara e livra dos perigos os que caminham a fitá-la, entre o refúgio das
ondas agitadas pelas imensas angústias e amarguras desta vida. Diz São
Bernardo: “Olha para a estrela, invoca Maria!”
E cantemos sempre:
Estrela dos Mares, guiai-me! Mãe querida de meu Jesus, sede minha Mãe!
Virgem e Porta feliz do Céu, ajudai-me!
10 DE MAIO
SOFRER COM MARIA
A mãe não abandona o filho no sofrimento. Fica ao seu lado, carinhosa, solícita;
empregando todo o esforço para lhe mitigar a dor e enxugar-lhe o pranto. O
coração materno sofre quando sofrem os filhos. A criancinha, quando ferida,grita, instintivamente: “Mamãe!” Filhos de Nossa Senhora, eternas crianças, à
caça das borboletas de nossas ilusões, tantas vezes caímos e nos ferimos nas
pedras do caminho da vida! Nessas ocasiões, façamos como as criancinhas e
gritemos: “Mamãe, Mãe do Céu, meu Refúgio, valei-me!”
Soframos com Maria, como a criancinha machucada, no regaço materno. Se a
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nossa amargura vem do pecado, Ela é Refúgio dos pecadores! É o pecador
miserável e pobre quem tem mais direito à proteção Daquela que é o refúgio dos
pecadores! Se nos acabrunha a doença, um olhar para o Céu: Nossa Senhora é
saúde dos enfermos! Nas aflições que nos atormentam, a Consoladora dos aflitos
será nosso conforto. Não há sofrimento que Maria não possa aliviar. Bastarecorrer a Ela com amor, confiança e abandono de criancinha ferida, no regaço
materno. Sofrer com Maria é consolo sem igual.
Um doente me dizia, chorando: “Ah! meu padre, se eu, ao menos, tivesse minha
mãe aqui comigo! Mas sou órfão!...” – Meu filho – disse-lhe eu – temos Nossa
Senhora, que é Mãe, e que não nos abandona, não morre, não nos deixa órfãos!”
– Ah! – respondeu-me – que Nossa Senhora venha então me amparar, seja
minha Mãe e me ajude a sofrer!”Digamos também assim nas amarguras da vida!
11 DE MAIO
NO CÉU VEREI MARIA!
É a mais consoladora esperança. No Céu, lá na pátria bem-aventurada, onde não
haverá mais luto, nem prantos, nem dores, nem enfermidades: lá onde a
felicidade é eterna, verei Maria, minha Mãe, meu doce refúgio! Consoladora
verdadeira! Oh! Tenhamos paciência no exílio. A vida passa tão depressa!
Suportemos pacientemente as trevas desta noite, em péssima hospedaria, no
dizer de Santa Teresa. Logo, no dia eterno e esplendoroso do Céu, veremos
Nossa Senhora, a beleza e o encanto do Paraíso!
Santa Bernadete sofria ao pensar no Céu. Tinha uma saudade imensa de Nossa
Senhora! Ouviram-na murmurar na agonia: “O Céu! O Céu! Trabalhemos para oCéu! Soframos pelo Céu! O resto nada vale!” E acrescentava: “Oh! Nossa
Senhora é tão bela que, depois que a vimos uma vez, custa suportar a vida até de
novo a rever no Céu!” Sim, a Virgem Santíssima, ideal de beleza e de amor, beleza
imaterial e sublime, é o Paraíso no Paraíso! Vale sofrer um pouco neste mundo,
para poder contemplá-la no Céu! Se soubéssemos! Cantemos com o povo:
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“Com minha Mãe estarei,
Em seu coração terno!
Em seu colo materno,
Sem fim, descansarei!
Quando, minha Mãe, terei essa ventura e poderei cantar eternamente vossas
misericórdias? Quando?!...
12 DE MAIO
SORRISO QUE CONFORTA
“Na época em que se realizavam as aparições de Lourdes, conta o Conde de
Broussard, eu me encontrava em Cauterets. Nenhuma crença tinha nessas
aparições, nem acreditava na existência de Deus. Era um devasso e ateu
declarado. Lendo num jornal a notícia de que Bernadete tivera mais uma
aparição, em 16 de junho, na qual a Virgem lhe sorria, tomei a resolução de ir a
Lourdes para convencer a menina de que era uma embusteira.
Fui à casa dos Soubirous, onde encontrei Bernadete sentada à porta, cerzindomeias. Ela me parecia bastante vulgar, mas, nos traços do semblante sofredor,
espalhava-se uma grande doçura.
A pedido meu, fez o histórico das aparições, com uma simplicidade e firmeza que
me comoviam. – Então, disse-lhe eu, como é que sorria a bela Senhora? A
pastorinha olhou-me espantada e, após uns momentos de silêncio, respondeu:
Ah! senhor, só alguém que viesse do Céu poderia imitar aquele sorriso.
– Não me fará o favor de experimentá-lo para mim? Eu sou um incrédulo. Nãoacredito nas suas visões. Nublou-se o semblante da menina, tomando uma
expressão de severidade.
– Então pensa o senhor que sou uma mentirosa? Senti-me desarmado. Não!
Bernadete não poderia ser uma embusteira. E experimentei o desejo de lhe pedir
perdão de joelhos.
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– Visto que é um pecador, retornou ela, vou imitar para o senhor o sorriso da
Santíssima Virgem.
Levantou-se com muita dignidade, juntou as mãos e o seu rosto se iluminou com
um sorriso tão angelicamente belo, que não me pude conter. Caí de joelhos,
convencido de que estava vendo no semblante da visionária o doce sorriso da
própria Virgem.
Desde então, no mais fundo de minha alma, conservo aquele sorriso indefinível
do Céu. Muitas lágrimas já me tem ele enxugado! Perdi a esposa. Perdi as duas
filhas, que eram o meu encanto. Sinto, porém, que não estou só no mundo, pois
me acompanha sempre o sorriso da Santíssima Virgem, que me anima a vida.”
13 DE MAIOO SORRISO DA VIRGEM
Aos 13 de maio, a florzinha delicada de Nossa Senhora, Santa Teresinha do
Menino Jesus, foi agraciada pelo sorriso da Virgem. Uma doença estranha
acabrunhava a pobre criança. O pai e as irmãs recorreram à Santíssima Virgem.
“E eu – escreve Teresinha – já não encontrando nenhum socorro neste mundo,
quase a morrer de dor, voltara-me para minha Mãe do Céu, suplicando-Lhe que
tivesse compaixão de sua filhinha. Animou-se de súbito a estátua.2 A Virgem
tomou um aspecto tão belo que nunca achei expressão para descrever essa
formosura Divina. Ressumbravam do seu semblante uma doçura, uma bondade
e ternura inefáveis, mas o que se me gravou nas profundezas da alma foi o seu
sorriso arrebatador! Desvaneceram-se minhas mágoas, brotaram-se-me dos
olhos duas grossas lágrimas, que me rolaram silenciosamente pela face. Ah!
Eram lágrimas de alegria celeste e sem mistura! A Virgem Santíssima adiantou-se para mim! Sorriu-me!... Que ventura a minha!”3
E o sorriso de Maria curou Teresinha. E nos cura também de todas as
enfermidades, de nossas misérias e pecados. Sorriso de Maria é esse convite da
consciência para que deixemos o pecado e façamos uma boa confissão. Sorriso de
Maria é essa inspiração da graça para nossa santificação. Sorriso de Maria são as
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misericórdias Divinas que Ela faz chover sobre nós, eternos réus da justiça
Divina, sempre isentos do castigo pela proteção Materna Daquela que é o
Refúgio dos pecadores!
Ó Maria! Vós que sorristes ao inocente anjo do Carmelo, dai-me o Vosso sorriso
de misericórdia. Sofro tanto e sou tão pecador!
14 DE MAIO
STABAT MATER!
Maria, ao pé da cruz, é a imagem mais perfeita do sofrimento heroico e
resignado, é modelo de paciência, exemplo para nossa alma tão fraca e tão avessa
à dor. “Stabat”, “De pé” – diz o Evangelho.
Eis o lastimoso estado de Jesus Cristo moribundo, descrito por Nossa Senhora,
nas revelações de Santa Brígida: “Estava – diz a Virgem – o meu querido Jesus
pregado ao madeiro, saturado de tormentos e agonizante. Seus olhos encovados,
semicerrados e sem brilho. Os lábios pendentes e a boca aberta. As faces,
descarnadas e pregadas aos dentes. Triste o rosto. A cabeça pendia-lhe sobre o
peito e os cabelos, negros de sangue já coagulado e sujo. O ventre unido aos rins,
braços e pernas esticados e o corpo coalhado de sangue”.
E todo esse martírio de Jesus se refletia em Maria. “Quem estivesse no Calvário –
diz São João Crisóstomo – veria dois altares, onde se consumavam dois grandes
sacrifícios; um era o corpo de Jesus, o outro o coração de Maria.” “Ou melhor –
diz São Boaventura – só havia um altar, a cruz, onde a Mãe era sacrificada com o
Cordeiro Divino.” O consolo das mães, na doença dos filhos, é poder ajudá-los,
socorrê-los com todo o carinho e mil indústrias e remédios, até a morte. Ah! Que
alívio Nossa Senhora podia dar a Jesus? Ouvia blasfêmia, insultos. Seu DivinoFilho morre desolado, num oceano de dores! Dizei-me se poderá haver uma dor
igual? E Maria a dar-nos o exemplo, heroica, firme, sempre de pé, “Stabat”!...
15 DE MAIO
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SAÚDE DOS ENFERMOS
“Saúde dos enfermos” é o título consolador que a Igreja dá a Nossa Senhora. Não
há miséria da criatura humana sem a misericórdia de Maria. “Não há quem se
possa esconder aos raios benéficos da luz e calor do sol ardente do seio materno.“A doença – diz a Imitação – torna poucas pessoas melhores.” É que não se faz
bom uso dessa graça. Um tempo precioso como esse não se deveria perder
inutilmente. A resignação, a conformidade com a vontade de Deus, enriquecem-
nos de méritos num leito de dores. Entretanto, como somos fracos e
impacientes! Nossa Senhora se compadeça de nós! Quando vier a doença,
corramos logo a seus pés. Ela é mãe, e a mãe é a mais solícita e carinhosa das
enfermeiras. Os santuários da Virgem, em todo o mundo, estão repletos de ex-
votos, atestando curas, milagres estupendos. Em Lourdes, a Saúde dos enfermos
abre os tesouros da sua bondade. Haverá espetáculo mais comovedor do que o
dessas multidões de padecentes a chorar e a bradar: “Saúde dos enfermos, rogai
por nós, Jesus, filho de Davi, tende piedade de nós?”
Não consta, nos Evangelhos, nenhuma cura operada por Nossa Senhora;
estejamos certos, entretanto, de que nenhum daqueles estupendos milagres de
Nosso Senhor se realizou sem a influência de um terno olhar de Maria. Jesus
reservou a sua Mãe o poder de curar e consolar os enfermos através dos séculos,
a fim de que todas as gerações, que a chamam “Bem-aventurada”, também a
pudessem chamar “Saúde dos enfermos”.
16 DE MAIO
DOCE CORAÇÃO DE MARIA, SEDE A NOSSA
SALVAÇÃOSempre me encheu de suave emoção e terna piedade esta popularíssima
invocação, que tão repetidamente ouvimos ressoar, tanto nas catedrais, como
nas modestas capelinhas das estradas: “Doce Coração de Maria, sede a nossa
Salvação!”
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Nesta vida tão fugaz, tão cheia de ilusões e desenganos, de amarguras e reveses,
de flores de alegrias e venturas que, passando, deixam apenas duros espinhos;
nesta vida tão triste, no exílio deste mundo – o coração de nossa Mãe do Céu é,
ao mesmo tempo, nosso refúgio, nossa consolação e nossa alegria.
“Doce Coração de Maria, sede a nossa Salvação!” Maria nos salvará. “O servo de
Maria – disse São Bernardo – não pode perecer”.
Invoquemos sempre a nossa Mãe do Céu. Não deixemos passar um só dia de
nossa vida sem um obséquio, uma prática de piedade, ainda que uma simples
“Ave-Maria”, em louvor à nossa Mãe do Céu. Tudo será, um dia, recompensado.
Um piedoso exemplo: Uma tarde, “Mgr. Dupanloup”, o ilustre e santo bispo de
Orleans, foi chamado para ministrar os últimos sacramentos a uma pobre
tuberculosa. Ao vê-la martirizada de dores, num leito de miséria, conrrangeu-se-
lhe o coração, do qual brotaram estas confortadoras palavras: “Tenha coragem,
minha filha, coragem e confiança em Nossa Senhora! Ela não a abandonará!...
Em resposta, disse- lhe, sorrindo, a moribunda, com uma expressão de doçura,
calma e suave resignação: “Ah! meu prelado, estou conformada. Não tenho
medo da morte. Há vinte e dois anos que recito o meu terço repetindo tantas
vezes esta súplica: SANTA MARIA, MÃE DE DEUS, ROGAI POR NÓS
PECADORES, AGORA E NA HORA DE NOSSA MORTE! Como posso, pois,
duvidar de que me não ajude agora a Santíssima Virgem? Hei de morrer com
Maria e Ela me há de levar ao Céu. Ó doce esperança! Seja-nos permitida a
felicidade de assim nos acharmos em nossa hora extrema! DOCE CORAÇÃO DE
MARIA, SEDE A NOSSA SALVAÇÃO!
17 DE MAIO
AO DESPERTAR
O primeiro pensamento que ordinariamente nos assalta, pela manhã, ao
despertar, é, o que nos possa estar reservado, no correr do dia, de alegrias ou de
trabalhos e cruzes. Quando o peso da vida se nos faz sentir quase esmagador,
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basta esse pensamento para nos amargurar o coração.
Coragem, almas cristãs! Nosso Senhor não nos manda carregar a cruz de cada dia
e segui-lo? “Tome a sua cruz de cada dia”, diz o Evangelho. Feliz o que a encontra
logo ao despertar.
Santa Teresinha experimentou, como nós, dias pesados e sombrios, manhãs sem
sol e de tempestades. Ela nos vai ensinar como proceder em semelhantes dias. –
Outrora, disse ela às suas noviças, quando ainda estava no mundo, costumava
pensar, ao acordar, no que de triste ou de agradável me poderia acontecer
durante o dia e, se algo triste pressentia, triste me levantava. Agora é tudo ao
contrário: apenas me levanto, penso logo nas contrariedades e trabalhos que me
esperam e fico cheia de alegria e de coragem, meditando nas venturosas ocasiões
em que terei de dar provas do meu amor a Jesus, ganhando assim o pão de meusfilhos, pois como tais considero todas as almas. Beijo, a seguir, o meu crucifixo,
docemente o coloco sobre o travesseiro enquanto me visto, e lhe digo: Meu doce
Jesus, quanto trabalhastes e chorastes durante os trinta e três anos de Vossa vida
mortal! Pois bem, descansai agora. Toca-me a mim a vez de trabalhar e de
sofrer!”4
Façamos também assim! Um olhar à Mãe do Céu e coragem!
18 DE MAIO
CAUSA DA NOSSA ALEGRIA
Alegremo-nos, sim, mas em Deus, como Nossa Senhora. “E me alegrei em Deus,
meu Salvador”.5 O Apóstolo nos aconselha a alegria santa, no Senhor. É a alegria
que nos vem da meditação da misericórdia Divina, do Céu que esperamos, das
magníficas recompensas que Nosso Senhor reserva aos eleitos. É a única verdadeira alegria que podemos gozar neste vale de lágrimas em que vivemos.
Afastemos de nós tanto a má tristeza quanto a alegria vã. “A má tristeza sucede à
alegria vã”, diz o Espírito Santo.6 Quando nos sentirmos levados à tristeza
acabrunhadora, que desespera e irrita, faz-nos desconfiados, desagradáveis ao
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próximo e a nós mesmos, lembremo-nos da santa alegria de Nossa Senhora em
casa de sua prima Santa Isabel. Procuremos consolar-nos no Senhor. Confiantes,
rezemos um terço, uma jaculatória à Mãe do Céu, e Ela nos sorrirá e encher-nos-
á de alegria o coração. Se ao contrário, uma alegria vã nos arrebata o peito e nos
arrasta do recolhimento de espírito para as loucuras de mil fantasias perigosas,lembremo-nos de Maria ao pé da cruz. Fugiremos assim da má tristeza e da
alegria vã. Nosso coração encher-se-á de paz, dessa doce paz que Nosso Senhor
nos prometeu.
Ó Virgem, sois, na verdade, causa de nossa alegria. Que seria de nós sem o vosso
amparo no triste exílio deste mundo!
19 DE MAIO
A ESPERANÇA DOS DESESPERADOS
“É Maria Santíssima a esperança até dos desesperados” disse Santo Anselmo.
Quem a Ela se entregou não se há de perder. Confiança! “O servo de Maria não
pode perecer”, exclama São Bernardo.
Nunca se ouviu dizer que quem recorreu à sua proteção fosse por Ela
desamparado.
O Pe. Hermann, célebre artista judeu, cuja conversão tanto abalou a Europa em
meados do século passado, deixando o mundo, abraçou a Regra da Ordem dos
Carmelitas descalços. Tinha um desgosto profundo vendo sua mãe fanática no
udaísmo. Rezava muito por ela; jejuava, fazia penitência. Aos 13 de dezembro de
1855, morreu ela sem os sacramentos. O pobre filho, acabrunhado de dor, foi
procurar o santo, Cura D’Ars. E este, que bem penetrava o segredo dos corações,
lhe disse: “Tenha esperança. Receberá um dia, na Festa da Imaculada Conceição,uma carta que o há de consolar”.
Passaram-se seis anos. E no dia 8 de dezembro de 1864, o Pe. Hermann, já
esquecido do que disse o Cura D’Ars, recebe uma carta que o comove
profundamente. Essa carta lhe dizia que pessoa piedosa, morta em odor de
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santidade, ousou interrogar a Nosso Senhor sobre a morte da mãe do Pe.
Hermann e o Bom Mestre lhe revelou: “Não devo minha graça a ninguém, mas
não falto às promessas que fiz sobre a oração. Toda oração que tem por objeto a
glória de Deus e a salvação das almas, é ouvida, se é bem feita”. E acrescentou
que a oração do Pe. Hermann, tão devoto de Nossa Senhora, foi ouvida. Suamãe, ao morrer, alcançou miraculosamente a graça da conversão. Suas últimas
palavras foram: “Ó Jesus, eu creio, espero em Vós, tende piedade de mim!” Ah!
Não desesperemos da salvação de ninguém! Nem presunção, nem desespero!
Onde acharmos devoção em Nossa Senhora, confiança, muita confiança! Nunca
se perde o servo de Maria! Ninguém a invoca sem ser atendido. Ó Misericórdia de
Maria!
20 DE MAIO
ELA PERDEU MAIS!
Quando sentimos o coração imerso num oceano de amarguras, cruentamente
ferido pela saudade de um ente desaparecido, precisamos contemplar Nossa
Senhora ao pé da cruz. É junto Dela, a consoladora dos aflitos, que
encontraremos consolação.
Uma senhora piedosa teve a desventura de perder um filho em pleno viço da
mocidade. Era filho único, o raio de sol de sua existência. A pobre mãe ficou
inconsolável. Quase em desespero, chorava desoladamente e definhava de
amargura e cruéis saudades. Um artista genial, reproduzindo numa tela as
feições do saudoso e chorado filho, e pintando noutra Nossa Senhora da Piedade,
com Jesus nos braços, lívido, ensanguentado, morto, escreveu o seguinte sob a
última: “Ela perdeu mais do que vós!” A vista do retrato do filho exacerbounaturalmente a dor da inconsolável mãe, mas, contemplando atentamente o
outro quadro e meditando as palavras nele escritas, murmurou: “Sim, Ela perdeu
mais do que eu”. E não se desesperou! Ergueu-se, cheia de coragem, enxugou as
lágrimas e ofereceu a Nossa Senhora toda a imensa dor que a acabrunhava.
Mães acabrunhadas de saudades, quando tiverdes o coração partido de dor pela
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morte de um filho querido, contemplai Nossa Senhora das Dores ao pé da cruz.
Ela perdeu mais do que vós e não se desesperou!
21 DE MAIO
CONFIANÇA EM MARIA
Estejamos confiantes, sempre confiantes, quando invocarmos a Maria. “Ó
Virgem fidelíssima – diz Santo Efrém – não temos, nem podemos ter confiança
senão em Vós. Se nos abandonardes, que será de nós?” E São Germano põe as
seguintes palavras nos lábios de Nossa Senhora: “Eu sou o grande hospital para
os enfermos do pecado. Sou a fonte perene da saúde, a ruína do demônio, cidade
do refúgio para os que a mim recorrem. Chegai-vos, hauri em mim, com fé, todaabundância das graças”.
Santo Ildefonso, outra voz autorizada, assim se dirige à Virgem: “A Divina
Majestade resolveu confiar às tuas mãos, ó Maria, todas as graças que
determinou conceder-nos”.
Não é, pois, Maria a mediadora de todas as graças? Confiemos muito na sua
proteção. Nas tristezas do exílio, desamparados das criaturas que nos desprezam,
de nós se esquecem e nos ferem o coração, só Maria Santíssima, só Ela, Mãe
carinhosa, não nos abandona! Confiança, confiança em Maria!
“Por que recearmos – escreve São Bernardo – de nos aproximar de Maria?
Somos fracos? Ela se mostra doce e suave aos mais pobres e miseráveis. A todos
abre o seio de sua Misericórdia. Ao prisioneiro dá liberdade, ao doente, saúde, ao
pecador, perdão, ao justo a graça. Ninguém se pode subtrair ao império da sua
Misericórdia. Podemos desconfiar ainda, sem a ofender?”
Oh! Hei de bradar sempre: “Maria! Maria! Confio em Vós!”
22 DE MAIO
O MENINO DO SIM
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Guido de Fontgallant é o modelo mais tocante para a nossa confiança e terno
amor filial a Nossa Senhora. Aos 22 de maio fez a sua Primeira Comunhão. Jesus
pediu-lhe um “sim” generoso e heroico, o sacrifício do seu ideal de sacerdócio e
da vida. Na gruta de Lourdes, ouve o chamado de Nossa Senhora: “Meu querido
Guido, eu te virei buscar logo. Será num sábado. Arrebatar-te-ei dos braços detua mamãe para te levar direitinho ao Céu”. E a Virgem veio buscá-lo. Era um
sábado, 24 de janeiro de 1925. “Que dia é hoje, mamãe? – pergunta o
enfermozinho. – “É sábado, meu filhinho”. – “Oh, é sábado?! Então é hoje que
vou morrer. É o dia de Nossa Senhora. Ela me vai tirar dos braços de mamãe”. A
mãe desata a chorar. “Não chore, mamãe. Há de ser suave. Quando eu já não
puder falar, diga a Jesus que O amo, que gosto muito Dele. Encoste-O aos meus
lábios para que eu O beije”. Recebeu a Unção dos enfermos. Caiu em agonia.
Depois, parecendo fitar uma visão, abre os bracinhos e murmura: “Jesus, eu Vos
amo”. Em seguida, mais baixo: “Mamãe!” Essa “Mamãe” não era, por certo, a
Condessa de Fontgallant, mas sim a Mamãe do Céu, que o anjinho contemplava
no êxtase da agonia.
Viveu essa criança num heroico martírio de sete anos, e sempre a murmurar
aquele “sim” a Jesus. Na idade em que as crianças ainda não pensam nas coisas
graves e eternas, já estava Guido familiarizado com o pensamento da morte e, a
cada sacrifício oculto, pequenino, porém heroico, repetia a mais bela palavra quese pode dizer a Jesus: “Sim”.
Que belo modelo de resignação e confiança! Ó Maria, fazei que o imitemos no
sim e no amor que Vos dedicou!
23 DE MAIO
DIREITO DE CONFIARO Profeta Davi cantou ao Senhor: “Usarás de indulgência para com meu pecado,
pois ele é grande”. Pois não deveria dizer ele o contrário?, observa um
comentador das Escrituras. Se é grande o pecado, como há de ser isso motivo de
perdão? Mas é que a Misericórdia se exercita e brilha tanto mais, quanto maior
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for a miséria. A minha miséria me confere um direito, e direito sagrado: o de
confiar na Misericórdia. E, ou uso deste direito e me salvo, ou desprezo-o e me
condeno. Tem mais direito quem mais necessita. Entre vinte ou mais enfermos,
qual deve ser o primeiro socorrido? O que mais sofre, qual deve merecer a minha
esmola em primeiro lugar? O mais necessitado, o que está a morrer de fome. Aplico ao caso o exemplo. Sou pecador, enfermo, leproso de tantos e tão graves
pecados? Tenho ainda mais direito à Misericórdia Daquela que é a Saúde dos
enfermos, o Refúgio dos pecadores! Sou pobre, fiquei na miséria de um filho
pródigo, reduzido às condições de um guardador de porcos, ou de um mendigo
das estradas? Devo e tenho direito de confiar na Tesoureira das Graças. Ah! O
que espanta ao pecador, isto é, a Justiça Divina, deve consolar-me, porque Deus
é Justo, sim, mas é também Misericordioso e tem pena de nossa miséria. E a
prova mais bela é que nos entregou à misericórdia, dando-nos o direito sagrado e
inviolável de confiar em Maria.
24 DE MAIO
AUXÍLIO DOS CRISTÃOS
Em nossa fraqueza, na miséria desta vida, precisamos de poderoso auxílio para
as lutas pela salvação eterna. O título confortador de “Auxílio dos Cristãos” nos
enche de confiança. Na batalha de Lepanto, enquanto as hostes cristãs davam
combate aos inimigos da cruz, Pio V suscita a Cristandade a orar e entregar a
Nossa Senhora a causa da Igreja e da civilização. E a vitória foi brilhante. Mais
duros são os combates de nossa alma, vítima dos assaltos de mil tentações,
reveses e dores cruéis. “A nossa vida é um combate”, gemia o profeta Jó. E que
combate difícil, renhido, sem tréguas! Há dias em que o desânimo parece
invadir-nos! Coragem, alma cristã, Maria é nosso doce e poderoso Auxílio.Quando o soldado entrou na luta, recuar é covardia, tremer é arriscar-se mais
ainda. Avante! No combate pela salvação de nossa alma, podemos ter a certeza da
vitória, porque só se perde quem quer, só morre na luta quem não empregou as
armas de segurança e eficácia que lhe estavam às mãos. Quem tem Maria
Santíssima por Auxílio no combate, pode perecer? Não! Confiança, confiança!
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Maria nos salvará! Todo o inferno, todo o furor de nossas loucas paixões, todos
os inimigos de nossa pobre alma, nada poderão contra nós, se nos abrigarmos
sob o cetro de Maria Auxiliadora!
25 DE MAIO
AGORA E NA HORA DE NOSSA MORTE!
A mãe não assiste indiferente à agonia de um filho. Nossa Senhora, a melhor e
mais santa e perfeita das mães, há de ser indiferente para conosco nos últimos e
terríveis momentos de nossa vida? São João de Deus, nas lutas de uma agonia
dolorosa, queixou-se à Virgem Santíssima: “Ó minha Mãe, não Vos sinto ao meu
lado para amparar-me!” – “Oh! meu filho, responde Maria, não é meu costumeabandonar, em tal hora, os meus servos fiéis. Quem todos os dias repetiu na
“Ave-Maria”: Rogai por nós, pecadores, agora e na hora de nossa morte, poderá
morrer sem a proteção da Mãe de Deus?” Oh! Não! Tenhamos confiança! Se o
pensamento da morte nos horroriza, se temos receio dos últimos combates da
agonia, confiança em Nossa Senhora! Não seremos desamparados.
O Menológio cistercense conta de um monge que, na hora da morte, cercado de
seus irmãos, sorria feliz e tranquilo, enquanto os monges oravam junto ao leitode agonia, cheios de terror ao espetáculo da morte que iam contemplar. E,
pensando na Eterna Justiça, que vê faltas e imperfeições até nos seus Anjos,
pediram todos a misericórdia Divina para o agonizante. Admirado por ver sorrir o
monge naquela hora tão grave e solene, pergunta-lhe um dos irmãos: “Que é
isto, meu irmão? Nosso Padre São Bernardo, em igual momento extremo, tremia
apavorado, e tu ris?” – “Ah! meu irmão, responde o moribundo, como não me
hei de alegrar? Tenho aqui presente Nossa Senhora, que me dá força e vence o
demônio”, E expirou com doce sorriso. Ó Maria, livrai-nos do inimigo e, na hora
da morte, recebei-nos!
26 DE MAIO
E EU TENHO MARIA!
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Conta-se, na história do processo da beatificação de São Francisco de Sales, que
em Chablais, um moço possesso havia mais de cinco anos, foi levado ao sepulcro
do grande santo. Ali, submetido a um grande interrogatório, o demônio, furioso,
uivava desesperado, e não deixava a sua pobre vítima. Então, a venerável Madre
de Chaugy exclamou, com a sua proverbial e edificante piedade: “Ó Santa Mãe deDeus, rogai por nós! Maria, Mãe de Jesus, ajudai-nos!” Ouvido o nome de Maria,
o espírito infernal uivou, gritou horrorosamente: “Maria... Maria... Ah! eu não
tenho Maria... Não digas este nome, que me espanta e estremece! Ah! se eu
tivesse Maria, uma Maria como tendes, não seria o que sou!... Mas eu não tenho
Maria!” Os assistentes choravam. O demônio ainda exclamou: “Se tivesse um
desses momentos tão numerosos que perdeis, e Maria, já não seria demônio!”
E eu mil vezes feliz, embora neste exílio tão perigoso da vida, e nas trevas de milsofrimentos, tenho Maria e tenho tempo para me salvar! Não sou feliz? Oh! Não
haverá dor, nem desgraça, nem amargura neste mundo que me façam
desgraçado, se me conservo fiel e devoto fervoroso da Mãe de Deus. Eu tenho
Maria! Que consolação! Que ventura!
27 DE MAIO
SOIS MINHA MÃE!Santa Teresinha, a encantadora florzinha do Carmelo, foi a missionária da
confiança e do Amor Misericordioso. Na sua doce via da infância espiritual, vai
conduzindo a Nosso Senhor legiões de almazinhas do seu Pequenino Caminho.
Ela nos ensina a confiar em Maria, e eis como fala de Nossa Senhora:
“Surpreendo-me, às vezes, a dizer à Santíssima Virgem – Ó minha Mãe querida,
sabeis que me julgo mais feliz do que Vós? Eu Vos tenho por Mãe, e Vós não
tendes uma Santíssima Virgem para amar! ...Verdade é que sois a Mãe de Jesus,
mas Vós me destes Jesus e Ele, na cruz, Vos deu a nós como nossa Mãe. E por
isso somos mais ricos do que Vós! Outrora, na Vossa humildade, queríeis ser a
pequenina escrava da Mãe de Deus. E eu, pobre criaturinha, sou, não vossa
escrava, mas vossa filha! Sois a Mãe de Jesus e sois minha Mãe!”7
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Sois minha Mãe! Que pensamento confortador! E quem tem mãe não perece,
não sofre, ou, se chora, tem consolo, tem o seio materno, quente e amoroso,
onde desabafar o coração. Nem sempre Deus nos conserva neste exílio da vida o
coração de nossa mãe da terra. Quantos de nós têm no peito a ferida da saudade
materna, ainda aberta e a sangrar. Mas, oh! Maria, sois a Mãe terna, Mãe cujoamor não desfalece, Mãe cujo coração é tão grande, tão belo, tão misericordioso e
bom, que só no Céu o poderemos um dia saber. E sois minha Mãe! Sois minha
Mãe! Que felicidade!
28 DE MAIO
UM BRADO DE CONFIANÇA
O seráfico doutor São Boaventura é incomparável quando fala do Amor Divino e
de Nossa Senhora. É dele este brado de confiança. O pecador miserável e pobre
amais poderá desesperar da salvação, se, penetrado de sentimentos de
confiança, repetir, cheio de confiança e amor, o que diz o santo: “Ainda que o
Senhor me tivesse condenado, eu teria a certeza de que não recusaria a salvação
a quem O ama e busca de coração. Eu O estreitaria em meus braços, cheio de
amor, e enquanto não me abençoasse, não O deixaria. Se se retirasse, teria de
levar-me consigo. Se outra coisa não pudesse fazer, esconder-me-ia nas suas
Chagas e, nesse Asilo Sagrado, Ele não se há de separar de mim. Enfim, se o meu
Redentor, por causa de meus pecados, atirasse-me longe de Si, lançar-me-ia aos
pés de Sua Mãe e, prostrado, não me levantaria enquanto Ela não me obtivesse o
perdão. Pois essa Mãe de Misericórdia não pode ser insensível às misérias de
seus filhos, nem recusará atender aos infelizes que a Ela recorrem. E, se não por
obrigação, ao menos por compaixão, Ela não deixaria de fazer violência ao
Coração de Jesus para que me perdoe”.
Que brado de confiança! É a linguagem autorizada de um teólogo e doutor da
Igreja. Assim se exprimem São Pedro Damião, Santo Anselmo e, mil vezes, Santo
Afonso, o apóstolo da confiança em Maria! Ó Maria, perpétuo socorro de minha
perpétua miséria, tenho confiança em Vós!
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29 DE MAIO
O CRUCIFIXO
Santa Maria Madalena de Pazzi sofria horrorosamente numa enfermidade cruel. As dores atrozes não a deixavam um só instante. E ela, calma e sorridente. –
“Donde vos vem tanta força para suportardes tantos sofrimentos sem uma
queixa? – perguntam-lhe. “Vede, responde a santa, mostrando um crucifixo na
parede, – vede o que o Amor infinito de Deus fez pela minha salvação. Isto é que
me sustenta!”
O crucifixo é um bom companheiro e melhor dos mestres no sofrimento. Muito
se aprende no Calvário. São Tomás de Aquino perguntou a São Boaventura ondeia buscar os tesouros de doutrina que difundia em seus escritos. E São
Boaventura mostrou-lhe o crucifixo. Outro santo e doutor, Afonso de Ligório,
nos instantes de agonia, abraçava e beijava amorosamente o crucifixo. “Oh! –
Exclamava ele, como é bom morrer abraçado à cruz!”
Tenhamos o hábito piedoso de trazer conosco um crucifixo e contemplar e
meditar as Chagas Divinas, ouvindo as lições da cruz.
Na cruz, a paz e a salvação! São Francisco Xavier teve notícia, nas índias, de que
um vulcão enorme em erupção ameaçava o povo das missões. – “Levem a cruz
ao vulcão”, ordena o santo. Assim fizeram. Apagaram-se maravilhosamente as
chamas. Extinguiu-se o vulcão.
No vulcão de nossa alma, agitada pelas paixões e pela revolta contra a dor,
lancemos o Crucifixo. Ele tudo acalma! Ele nos salvará!
30 DE MAIOPERPÉTUO SOCORRO DE PERPÉTUA MISÉRIA
A Santa Igreja nos ensina em sua Liturgia da Missa, na festa de Maria
Auxiliadora, 24 de maio, que Deus constituiu na Bem-aventurada Virgem Maria
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“um perpétuo socorro para defesa do povo cristão”. Por que profetizara a Virgem
que todas as gerações haviam de chamá-la Bem-aventurada? Porque seria Ela,
para todas as gerações, um perpétuo socorro. O título de “Perpétuo Socorro”
inspira confiança. Nossa Senhora, no quadro miraculoso de Roma, quis mostrar
ao povo cristão que é sempre Mãe solícita e carinhosa. Perpétuo socorro de nossaperpétua miséria! Pelos meados do século XV, um negociante piedoso embarca
na ilha de Creta para a Itália. Leva consigo um tesouro precioso, belo quadro de
Nossa Senhora. Em pleno mar se desencadeia horrorosa tempestade. Já
desesperada, a tripulação, a convite do piedoso negociante, prostra-se diante da
imagem da Virgem. Rapidamente cessa o furor das ondas e o Céu torna-se claro e
sereno. O quadro miraculoso foi a Roma e, por ordem da Virgem, exposto e
venerado na Igreja de São Mateus, faz milagres, confirmando o título que trazia
de “Perpétuo Socorro”. Afinal, depois de longo esquecimento, veio a imagem
miraculosa aos filhos de Santo Afonso. Em 26 de abril de 1866, foi levada em
triunfo para a Igreja de Santo Afonso, em Roma, onde é venerada até hoje.
“Nossa Senhora do Perpétuo Socorro” é um título de Maria que enche o coração
e o faz transbordar de confiança. Ó Maria, na enfermidade, nas aflições, na dor e
na tristeza, nas provas e reveses, na vida e na morte, vinde, vinde em meu
socorro, ó Mãe carinhosa!
31 DE MAIO
ONIPOTÊNCIA SUPLICANTE
“Maria, diz São Bernardo, é a Onipotência Suplicante.” “Virgem Poderosa”,
chama-a a Igreja nas Ladainhas Lauretanas. Por quê? Responde-nos o Anjo da
Anunciação: “Porque achaste graça junto de Deus”. E a graça que Maria recebeu
foi com tal abundância, para nos socorrer, que não há favor nem misericórdia
que não nos possa obter. É a Tesoureira das Graças. Nenhuma graça nos vem do
Céu sem que passe pelas suas mãos. Mãos abençoadas e carinhosas de Maria,
como sois belas, na imagem da Vossa aparição à Santa Catarina Labouré! Mãos
abertas, distribuindo graças sobre a terra, iluminando as trevas deste mundo! E o
que consola é que a “Onipotência Suplicante” é nossa Mãe! Ó Maria, quando
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nossa cabeça atormentada, dolorida e cansada de sofrer no exílio, quiser um
repouso, um alívio, deixai-nos repousá-la no Vosso seio materno, doce e
carinhoso abrigo. “Virgem Santíssima, repitamos, na bela prece do Pe. Perreyve,
nos vossos dias gloriosos, não Vos esqueçais das tristezas da terra. Lançai um
olhar de bondade sobre os que sofrem, lutam contra as dificuldades e não cessamde temperar seus lábios nas amarguras da vida. Mãe, tende piedade dos que se
amam e estão separados!
Piedade do isolamento do coração!
Piedade da fraqueza de nossa fé!
Piedade dos objetos de nossa ternura!
Piedade dos que choram, dos que rezam, dos que tremem!
Dai a todos a esperança e a paz! Assim seja!”
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1 - História de uma alma, c. IV e Imitação - I - III - XXVI - 3.
2 - Uma estátua de Nossa Senhora das Graças, que Teresa tinha à cabeçeira.
3 - História de uma alma - c.III.
4 - “Conseils et Souvenirs”.
5 - São Lucas 1,47 .
6 - Provérbios, 14,13.
7 - Sainte Therèse de L’ Enfant Jesus. Vie - Lettres 13.e à Céline.
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1 DE JUNHO
VINDE A MIM!
Um dia, Nosso Senhor, cheio de ternura e de compaixão pelos sofrimentos quenos acabrunham, abriu seus braços, num gesto de amor, e exclamou: “Vinde a
mim, vós que sofreis e estais sobrecarregados, e Eu vos aliviarei”.1
Que bondade do coração de Jesus! Quer consolar-nos a aliviar-nos das
amarguras da vida. E são tantas! Que nos há de consolar neste mundo? “Os
homens diz Jó – são consoladores importunos. Só Nosso Senhor, só Ele,
Bondade Infinita, Abismo insondável de misericórdia, pode aliviar-nos do peso
quase insuportável dos sofrimentos da vida!” Nas nossas aflições, vamos aoSacrário. Acharemos ali o coração misericordioso de Jesus, tão amável e tão
amante, à nossa espera, para nos aliviar. É o mesmo Jesus que outrora enxugou,
na Judeia, as lágrimas de dor e saudades da viúva de Naim, e de Jairo, e das
irmãs de Lázaro; Jesus, que consolou e perdoou a Madalena; que ouviu as
queixas e gemidos dos enfermos, dos leprosos e dos miseráveis que O seguiam à
beira das estradas; Jesus do Evangelho, o Filho de Maria, real e verdadeiramente
presente como está no Céu. Não estamos acostumados a ouvir falar na presença
real de Nosso Senhor Jesus Cristo no Sacrário e no Altar? Ah! Se tivéssemos fé, ó
doce Jesus, sofreríamos muito menos. Só o pensamento da Vossa presença real
no Sacrário a nos dizer – “vinde a Mim!” – só isto nos consolaria de todos os
sofrimentos e penas desta vida!
2 DE JUNHO
QUERO, SÊ LIMPO!“E aconteceu que, estando em uma daquelas cidades, eis que um homem, cheio
de lepra, vendo a Jesus, veio para Ele e, lançando-se com o rosto em terra,
adorava-O suplicando-Lhe, e posto de joelhos, rogou-Lhe, dizendo: Senhor, se
queres, bem me podes limpar. Jesus, compadecido dele, estendeu a sua Mão e,
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estava com eles? Por que temer? Recebemos Nosso Senhor tantas vezes na
Comunhão! Pela graça, vive Ele conosco, sabemo-lo pela fé. E aí vêm as ondas
agitadas de tentações horrorosas. E o mar de nossa vida espiritual é um caos
tenebroso. Agita-o violenta tempestade! Escuridão profunda, trevas espessas!
E Jesus dorme! Rezamos, pedimos, choramos. E Ele dorme! Ah! Confiança,
alma cristã! Não há perigo! Ele se levantará antes do naufrágio e nos dirá: “Por
que temeis?” E há de seguir-se uma grande tranquilidade!...
4 DE JUNHO
TEM CONFIANÇA, FILHO...
“Eis que vieram ter com Ele uns homens, trazendo no leito um homem que era
paralítico, o qual era introduzido por quatro homens e procuravam introduzi-lo e
pô-lo diante Dele. E, como não pudessem apresentá-lo, não achando por onde o
passar por causa de muita gente, subiram sobre o telhado e descobriram o
telhado da casa onde estava; e, tendo feito uma abertura pelas telhas, arriaram o
leito em que o paralítico jazia, pondo-o no meio da casa, diante de Jesus. E,
vendo Jesus a sua fé, disse ao paralítico: – tem confiança, filho; homem, os teus
pecados te são perdoados.”4
Que confiança a do paralítico! Levado caridosamente por quatro homens,
sujeita-se a todo sacrifício para chegar à presença de Jesus. E é conduzido no
próprio leito em que jazia, talvez há muitos anos. Atravessa a multidão, sobe ao
telhado e chega até Nosso Senhor. Que bons amigos os quatro homens que o
conduziram! Quando a paralisia do pecado, da tibieza, dos maus hábitos nos
impedir os passos no caminho da salvação, aceitemos os bons amigos que nos
levem ao Médico Divino. São eles as boas leituras, o confessor, os sofrimentos, adoença, os golpes da vida. Esses amigos nos farão subir pela confiança,
descobrirão o telhado de nosso pobre coração, fechado pelo egoísmo, e nos farão
descer pela humildade, talvez pelas humilhações, até a presença tão doce de
Jesus. Ouviremos, então, a palavra que nos há de encher o coração: “Tem
confiança, filho, teus pecados te são perdoados”.
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5 DE JUNHO
NÃO VIM PARA CHAMAR OS JUSTOS, MAS OSPECADORES
“Vendo, porém, os fariseus e os escribas, que comiam com os publicanos e
pecadores, murmuraram, dizendo aos discípulos de Jesus: Por que razão comeis
vós e bebeis com os publicanos e pecadores? Por que razão vosso Mestre come e
bebe com os publicanos e pecadores? Ouvindo isto, Jesus, respondendo-lhes,
disse: Não têm os sãos necessidade de médico, mas sim os que estão enfermos.
Ide-vos, pois, e aprendei o que quer dizer: Misericórdia quero e não sacrifício,
porque não vim chamar os justos, mas os pecadores, à penitência.”5
Vede a misericórdia do Coração de Jesus! Come e bebe com os publicanos e
pecadores, procura-os como o faz o Bom Pastor à ovelha desgarrada, e o Pai, ao
Filho pródigo! E, quando os fariseus murmuram, responde: “Não têm os sãos
necessidade de médico, mas sim os que estão enfermos. Vim chamar os
pecadores à penitência”. Por que ter medo de Nosso Senhor e tratá-Lo como um
Juiz severo e duro, que só castiga? Oh! A Misericórdia do Coração de Jesus não é
bem conhecida! Há o temor de Deus, que é o princípio da sabedoria, naexpressão da Escritura, e o medo de Deus. Este é injusto e seca a fonte da
Misericórdia. Medo de um Pai, de um Amigo, de um Irmão! Nosso Senhor se
queixou a Santa Margarida e a Soror Benigna de que os homens o tratam como
carrasco e desconhecem o seu Coração! “O que mais ofende a Jesus, disse Santa
Teresinha, e O fere no coração, é a falta de confiança. Não desconfiemos jamais
da Misericórdia de Jesus!
6 DE JUNHOQUERES FICAR SÃO?
“Ora, há em Jerusalém uma piscina probática, que, em hebreu, chama-se
Betsaida, a qual tem cinco alpendres. Ora, estava aí um homem que havia trinta e
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oito anos se achava enfermo. A este, vendo-o Jesus deitado e sabendo que já de
há muito tempo estava enfermo lhe disse: Quereis ficar são? Respondeu-Lhe o
enfermo: Senhor, não tenho ninguém que me lance na piscina quando a água
estiver revolta, porque, enquanto vou, outro entra antes de mim. Disse-lhe
Jesus: Levanta-te, toma o teu leito e anda.”6
Havia trinta e oito anos que o enfermo esperava à beira da piscina probática. E
não desanimou! Viu tantos que dali saíram curados e esperava... Veio um dia
Nosso Senhor e com duas palavras o levantou curado: “Levanta-te, toma o teu
leito e anda!” Tem confiança, pobre alma. Há muitos anos talvez, que estás
enferma de pecados e defeitos, imperfeições e misérias. Espera, persevera, até
que venha a hora de Jesus, até que soe a hora da Misericórdia. Luta, sofre,
humilha-te! Quando Jesus vier, há de se compadecer de tua miséria e Lhe dirás,talvez, que te falta um homem, um Diretor espiritual, alguém que te dirija nos
caminhos do Céu, da perfeição, que te lance na piscina do Amor Divino, onde se
purificam as almas. E Jesus te dirá: “Queres ficar sã?” E a tua alma sentirá, num
instante, o efeito da graça, que cura e salva, e desse Amor que abrasa e faz correr
nas vias da salvação.
7 DE JUNHO
EU IREI E O CURAREI
“Ora, estava ali muito mal, quase a morrer, o criado de um centurião, que muito
o estimava. Tendo ouvido falar de Jesus, enviou-lhe uns anciãos dos judeus,
rogando-Lhe que viesse curar o seu criado, dizendo: Senhor, um meu criado jaz
em casa paralítico e é fortemente atormentado. Mas eles, havendo chegado a
Jesus, Lhe rogavam insistentemente, dizendo-Lhe: É digno de que lhe faças este
favor, porque ama a nossa nação e ele mesmo edificou uma sinagoga. E Jesus
disse: Eu irei e o curarei.”7
Mal acabaram os anciãos de falar e Jesus foi logo dizendo: “Eu irei e o curarei”.
Que desejo de fazer o bem, de curar e de salvar tem o Coração de Jesus! E vai
sem demora à casa do Centurião. Este veio prestar-se humildemente aos pés do
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Senhor, exclamando: Eu não sou digno de que entreis em minha casa. “Uma
palavra e meu criado estará salvo!” E Jesus, para recompensar tanta confiança,
diz a palavra que salva e cura. Humildade e confiança foram as virtudes da
súplica do centurião. E foi ele sem demora atendido e louvado por Nosso Senhor.
Sim, Jesus tem pressa de nos curar do pecado. E Ele diz aos santos Anjos quepedem nossa salvação: “Eu irei e o curarei”. Mas, quando Deus vem, quer
encontrar-nos humildes e confiantes, depois de nossos sinceros esforços. E uma
palavra Sua há de curar este criado, há tantos anos enfermo: o nosso pobre
coração!
8 DE JUNHO
NÃO CHORES!
“Aconteceu que ia depois para uma cidade chamada Naim e iam com ele os seus
discípulos e uma grande multidão de povo. E, chegando perto da porta da cidade,
eis que era levado um defunto, filho único de sua mãe, e esta era viúva, e vinha
com ela muita gente da cidade. Logo que o Senhor a viu, movido de compaixão
para com ela, disse-lhe: Não chores. E aproximou-se e tocou o esquife (pararam
logo os que o levavam) e lhe disse: Moço, eu te ordeno, levanta-te. Então se
assentou o que estava morto e começou a falar, e Jesus o entregou à sua mãe.”8
Nosso Senhor, que, no Sermão da Montanha, diz: “Bem-aventurados os que
choram”, pede à viúva de Naim que não chore: “Não chores!” Bem-aventurados
os que choram seus pecados. Essas lágrimas de arrependimento e amor
redimem, purificam nosso coração e nos enchem de felicidade e de paz. Mas ai!
Como são amargas as lágrimas de uma piedosa mãe que chora a morte espiritual
de um filho transviado, no vício e no pecado, e já o vê caminhando para a
sepultura da eterna perdição! Pobre mãe, tem confiança! Ainda que vejas teu
filho perdido, em estado desesperador, endurecido no vício, cadáver sem a vida
cristã da graça, confia, espera! Jesus há de passar logo, e tuas lágrimas, assim
como tuas orações, não serão perdidas. Ele te há de consolar como à viúva de
Naim, ressuscitando teu filho, pela conversão, para uma vida melhor. Não te
lembras de Santa Mônica? Chorou quase vinte anos por Agostinho! Ah! Não
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chores! Tem confiança!
9 DE JUNHO
VAI EM PAZ....”Pelo que digo a ti: muitos pecados lhe são perdoados, porque muito amou;
mas, a quem menos perdoa, menos ama. E os que estavam junto à mesa
começaram a dizer consigo mesmo: Quem é este que também perdoa pecados? E
disse à mulher: A tua fé te salvou. Vai em paz.”9
A desordem de Madalena foi ter amado loucamente as criaturas, e a salvação da
pecadora foi ter amado, e muito, a Nosso Senhor. Este amor de Madalena era o
amor confiante, penitente, que atrai o Amor misericordioso. As almas grandes no
pecado costumam também ser grandes no Amor Divino. Vede Agostinho,
Margarida de Cortona, Maria Egipcíaca. Que almas seráficas! O amor das
criaturas, que mancha e perde, transforma-se, purifica e salva, quando voltado
para o Criador. Eis porque Nosso Senhor assim pode falar de Madalena: “Muitos
pecados lhe são perdoados porque muito amou”.
Tua alma está coberta de iniquidades, de crimes, de pecados vergonhosos? Ah!
Não tenhas receio!... Corre depressa a Jesus e pede-Lhe perdão, como fez
Madalena, num gesto de confiança e de amor penitente. E serás perdoado! O
amor e a confiança ressuscitam as almas que buscam o Salvador com todas as
forças. É só isto que pede o Coração misericordioso de Jesus. Amor e confiança!
– dizia uma alma arrependida. O resto... não existe para mim!10
10 DE JUNHO
TEM CONFIANÇA, VAI EM PAZ E FICA SÃ
“E disse Jesus: Alguém me tocou, porque conheci que uma virtude saíra de mim.
E olhava em roda para ver aquela que isto havia feito. Porém a mulher, vendo
que não esteve oculta, temendo e tremendo, bem certa do que lhe tinha
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acontecido, veio e se prostrou diante Dele e Lhe disse toda a verdade e declarou
diante de todo povo por que causa O tocara e de que modo ficara logo curada.
Então, vendo-a, disse-lhe: Tem confiança, filha, a tua fé te salvou, vai em paz e
fica sã de tua enfermidade. E ficou sã a mulher desde aquela hora.”11
“Temendo e tremendo”, diz o Evangelho, a pobre mulher se aproximou de Jesus
e declarou por que O tocara. E, vendo-a assim, naquele temor, como se tivesse
faltado ao respeito devido ao Mestre, Jesus lhe disse: “Tem confiança”. Nosso
Senhor não quer que O tratemos cheios de medo, de escrúpulos, de receios e
desconfianças, como certas almas tímidas, acanhadas demais, por uma doutrina
de fundo jansenista, que, infelizmente, ainda se vê, hoje, bem propagada. Ele nos
repete, como à pobre enferma do Evangelho, quando O tocamos, e tão de perto,
na Eucaristia: “Tem confiança. Tua fé te salvou”. E nossos pecados? E aenfermidade de nossos vícios? “Vai em paz e fica sã de tua enfermidade”, repete
Jesus à nossa alma, sempre enferma, sempre cheia de misérias. Aproximemo-
nos de Jesus, não temendo nem tremendo, mas amando e confiando...
11 DE JUNHO
NÃO ESTÁ MORTA, MAS DORME!
“Falando-lhe ainda, veio um príncipe da sinagoga, dizendo-lhe: Morreu a tua
filha, para que afadigas mais o Mestre? Não queiras incomodá-lO. Mas Jesus,
tendo ouvido o que diziam, disse ao príncipe da sinagoga, ao pai da menina: Não
temas; crê somente e será salva. E não consentiu que alguém O seguisse senão
Pedro, Tiago e João, irmão de Tiago. Chegando, pois, à casa do príncipe da
sinagoga, vê os tocadores de flauta e uma turba de povo fazendo barulho, e todos
chorando e fazendo grandes prantos. Havendo, pois, entrado, disse-lhes: Para
que vos turbais e estais chorando? Não choreis, retirai-vos, porque não está
morta a menina, mas dorme.”12
“Morreu, diziam, para que afadigas mais o Mestre?” Assim nos fala o demônio do
Desespero, quando pecamos. “Morreu a tua alma! Está perdida e condenada...
Para que ainda procuras e afadigas a Jesus com tuas orações?” Não demos
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ouvidos a mais terrível das tentações, a desconfiança da misericórdia Divina.
Pecamos! Morreu a nossa pobre alma! Como Jairo, o piedoso príncipe da
sinagoga, vamos a Jesus. Ninguém nos tire a convicção de que nossa alma
ressuscitará pela graça. Jesus dirá ao nosso coração, que chora, arrependido:
“Por que vos turbais e estais chorando? Não está morta, mas dorme”. Edespertará do sono do pecado, isto é, da morte, a nossa pobre alma.
12 DE JUNHO
TENDE CONFIANÇA, SOU EU, NÃO TEMAIS
“Mas eles tanto que viram a Jesus, que, andando sobre o mar se aproxima da
barca, pensaram que era um fantasma, turbaram-se e temeram, dizendo: É umfantasma! E possuídos de medo, gritaram, porque todos O viram e conturbaram-
se. Mas logo Jesus lhes falou dizendo: Tende confiança, sou Eu, não temais.”13
“É um fantasma!” gritaram, apavorados e a tremer, os apóstolos, nas trevas do
mar, quando Jesus se aproximava, caminhando sobre as ondas. Os escrúpulos, o
medo da Justiça Divina lançam algumas almas num estado horrível de
perturbação. Jesus delas se aproxima, quer socorrê-las, vem sobre as ondas
agitadas de mil provações e reveses e, vendo-O, não O reconhecem. Gritam,porque não reconhecem o Coração de Jesus! Percebem apenas esse Jesus
fantasma, desfigurado pelo Jansenismo, e gritam, perturbam-se e tremem num
oceano escuro de mil dúvidas e tentações, de desespero e desconfiança. E Nosso
Senhor, misericordioso, aproxima-se. E que consolação quando O reconhecem e
ouvem a Sua voz: “Tende confiança, sou Eu, não temais”. Guardemos as palavras
de Jesus no coração. “Tende confiança! Por que desesperar? Sou Eu”. E com
Jesus quem perece? “Não temais”. Medo de um Amigo, de um Pai onipotente e
misericordioso?!...
13 DE JUNHO
NEM EU TE CONDENAREI
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“Eu sou o Bom Pastor”, diz Jesus, com infinita doçura. Tão bom que não só vigia,
mas conhece e ama as suas ovelhas. Dá por elas a vida. Alimenta-as com a Sua
própria substância, no Sacramento do Altar. A mais tocante de todas as imagens,
em que Jesus se apresenta para arrebatar o nosso coração e nos encher de
confiança é, sem dúvida, a do Bom Pastor. “Conheço as minhas ovelhas, diz Ele,e as minhas ovelhas me conhecem”. Esse conhecimento mútuo entre pastor e
ovelhas se dá na confiança, no abandono e no amor. O lobo rodeia o aprisco,
voraz espreitando as ovelhinhas. Mas o Bom Pastor vigia e não teme. As
tentações do demônio, alma cristã, perseguem-vos, e o Inferno emprega,
desesperado, todos os esforços para vos arrebatar do rebanho do Bom Pastor, do
Aprisco do Coração de Jesus! Não tenhais medo! O Bom Pastor vigia e o lobo não
vos há de arrebatar. Mas é necessário ficar no Aprisco de Jesus e dentro dos
muros da confiança que o cercam e vos livram do perigo.
15 DE JUNHO
O FILHO DO HOMEM NÃO VEIO PARA PERDERAS ALMAS
“Enviou diante de Si mensageiros, que, caminhando, entraram numa cidade dossamaritanos para Lhe preparar pousada. E não O receberam, por ter aparência de
que ia para Jerusalém. Vendo isto, Seus discípulos Tiago e João disseram:
Senhor, queres que digamos que desça fogo do Céu e os consuma? Porém,
voltando-se para eles, repreendeu-os dizendo: Não sabeis de que espírito sois! O
Filho do homem não veio para perder as almas, mas para salvá-las”.16
Jesus, diz o Evangelho, voltando-se para os discípulos que pediam fogo e
castigos para a cidade, repreendeu-os: “Não sabeis de que espírito sois?” É que o
espírito de doçura, perdão e misericórdia, caracteriza a doutrina de Nosso
Senhor, em seu Evangelho. “Não veio o Filho do homem para perder as almas,
mas para salvá-las”. Fogem do espírito evangélico o rigor e dureza com que
alguns cristãos tratam o próximo sob pretexto de combater pela fé, e chamar a
vingança Divina sobre o pecado. Fazem de Deus um Deus vingativo e terrível.
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Assustam as pobres almas e irritam ainda mais os inimigos de Nosso Senhor e da
Igreja. Ah! Não conhecem o espírito do Evangelho esses apóstolos imprudentes,
irritadiços e intolerantes. Tenhamos paciência e doçura com os pecadores, como
Jesus tem paciência e misericórdia conosco. Para longe de nós esse zelo amargo.
Havemos então de perder as almas que o Filho do homem veio salvar?
16 DE JUNHO
VENDO-O, O SAMARITANO MOVEU-SE DECOMPAIXÃO
“Um homem descia de Jerusalém para Jericó e caiu nas mãos de ladrões que o
despojaram; e, depois de o haverem ferido, retiraram-se deixando-o semimorto.Sucedeu, porém que passasse pelo mesmo caminho um sacerdote, que, depois
de o ver, passou adiante. Passou igualmente, de largo, depois de o ver, um levita,
que se achava perto. Mas um samaritano, que seguia seu caminho chegou junto
dele e, vendo-o moveu-se de compaixão.”17
O nosso Bom Samaritano é Jesus. Feridos pelo pecado, despojados de toda
riqueza da graça, fomos atirados à beira da estrada deste mundo. Nem o
sacerdote, nem o levita que passaram nos socorreram. Passaram de longe. Sim,porque há sacerdotes e levitas que não nos falam da Misericórdia Divina, dos
tesouros infinitos do Coração de Jesus. Passam de longe e nos deixam a gemer
com as feridas do pecado, do medo e dos escrúpulos, sempre doloridos e a
sangrar. Há de vir, porém, Jesus, o Bom Samaritano, numa inspiração da graça,
numa boa leitura, numa meditação e, melhor ainda, num bom sacerdote e
confessor experimentado nos segredos do Amor misericordioso. E nossas feridas
serão ungidas com o óleo da confiança. E seremos levados à Hospedaria do
Amor, porque passou Jesus, Bom Samaritano de nossas almas, que, vendo-nos,
chegou-se junto a nós e moveu-se de compaixão.
17 DE JUNHO
ACHEI A MINHA OVELHA
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“Qual de vós o homem que tendo cem ovelhas, se perder uma delas, porventura
não deixa as noventa e nove no deserto e não vai em busca da que tinha perdido
até que a encontre? E quando a tiver encontrado a põe sobre os ombros, cheio de
gosto, e, vindo para casa, convoca os amigos e vizinhos, dizendo-lhes:
congratulai-vos comigo, porque achei a minha ovelha que se tinha perdido?”18
Quanto faz o bom pastor pela ovelha perdida! Sai a procurá-la, deixando noventa
e nove no deserto. Quando sentirdes, almas santas e amorosas, o coração num
deserto de aridez cruciante, não vos perturbeis. Jesus, o Bom Pastor, saiu à
procura das ovelhinhas perdidas, os pecadores, e vos deixou no deserto.
Regozijai-vos com isso e sofrei com paciência a vossa provação pelo bem dos
pecadores. Depois o Bom Pastor encontra a sua ovelhinha. Não a maltrata
porque fugiu do rebanho. Alegra-se porque a achou e a põe sobre os ombros,cheio de gosto, di-lo o Evangelho. Que misericórdia! Quando o pecador se
converte, sente uma doçura inexprimível, chora de felicidade, experimenta uma
paz suave e confortadora. É o delicioso repouso nos ombros do Bom Pastor. Não
é assim, pecador arrependido, não é assim que Nosso Senhor vos trata? Que
festa no Céu quando Jesus convoca os santos e anjos, seus amigos e vizinhos, e
lhes diz: “Congratulai-vos comigo, porque achei a minha ovelha que tinha
perdido, o meu pecador querido, aquela pobre alma que salvei da condenação
eterna!” Jesus, Bom Pastor, meu coração não pode mais resistir às ternuras do Vosso Amor misericordioso!...
18 DE JUNHO
“TEU IRMÃO HÁ DE RESSUSCITAR”
“Ora, Marta, tanto que ouviu que vinha Jesus saiu a recebê-lO. Maria, porém,
ficara sentada em casa. Disse então Marta a Jesus: Senhor, se tivesses estado
aqui, meu irmão não teria morrido; mas também agora sei que tudo o que
pedires a Deus, Deus te concederá. Respondeu-lhe Jesus: Teu irmão há de
ressuscitar.”19
Por que Maria fica sentada em casa, no dizer do Evangelista e Marta sai, aflita, ao
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encontro de Jesus e lhe expõe a razão por que chora, por que sofre? Maria é o
modelo das almas abandonadas à vontade santíssima de Deus. Espera, calma,
em paz, que o Mestre venha. Lázaro morreu. O irmão querido partiu para a vida
eterna, deixando-a saudosa e triste – é verdade – mas resignada e confiante. Nos
golpes da vida, imitai a calma e doce resignação de Maria. Marta é a prece dasalmas aflitas. Maria, a oração do abandono e da confiança. Ambas agradam a
Nosso Senhor e são ouvidas. No entanto, a oração de Maria é mais perfeita e
mais bela.
Nas aflições da vida, vamos a Jesus, depressa e confiantes como o fizeram as
irmãs de Lázaro. Ou correndo ao encontro de Jesus, suplicante e em pranto, ou
no silêncio de um ato de conformidade à Vontade santíssima de Deus. Juntemos,
nas aflições, a oração fervorosa de Marta à calma resignação e a doce confiançade Maria, porque arribas mereceram a ressurreição de Lázaro. “Teu irmão há de
ressuscitar!” Notai que Maria fica sentada em casa, mas quando chega o Senhor,
levanta-se depressa, diz o Evangelho e corre ao encontro de Jesus. Espera, vai ao
encontro de Jesus. Sempre o abandono, mas também sempre o esforço, a
diligência em correr ao encontro do Mestre. O abandono não dispensa o esforço.
19 DE JUNHO
QUE QUERES QUE TE FAÇA?
“Ora, aconteceu, quando ia chegando a Jericó, que um cego estava sentado à
borda do caminho, pedindo esmola; e, ouvindo o tropel da gente que passava
perguntou que era aquilo. Disseram-lhe, porém, que era Jesus Nazareno que
passava. Exclamou logo, dizendo: Jesus filho de Davi, tem piedade de mim! E os
que iam adiante repreendiam-no para que se calasse, mas ele cada vez gritava
mais: Filho de Davi, tem piedade de mim! Então Jesus, parando, mandou que
Lho trouxessem e, quando se aproximou perguntou-lhe, dizendo: Que queres
que te faça? Ele, porém, respondeu: Senhor, que eu veja! E Jesus lhe disse: “Vê!
Tua fé te salvou.”20
Ouvindo o tropel da gente que passava, pergunta o cego o que era. Disseram-lhe
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que passava Jesus de Nazaré. Não se pôde conter. Encheu-se-lhe o coração de
confiança e ele logo exclamou: “Jesus, filho de Davi, tem piedade de mim!” E o
repreenderam para que se calasse. Mas, diz o evangelista, ele gritava mais: “Filho
de Davi, tem piedade de mim!” Que confiança! Quando, nas trevas da cegueira de
tantos pecados e tentações, queremos recorrer a Jesus que passa e implorar a suaDivina Misericórdia, somos repreendidos e o demônio do desespero e da
desconfiança no-lo quer impedir, ah! como o cego de Jericó, gritemos ainda mais
alto: “Jesus, filho de Davi, tem piedade de mim!” E Ele dirá: “Que queres que te
faça, meu filho?” – “Que eu veja meu Jesus, que eu veja o Vosso Amor, a Vossa
misericórdia!” E Ele dirá: “Vê! Tua fé te salvou”. E veremos a Jesus como Ele é
realmente: doce e cheio de misericórdia!
20 DE JUNHO
“ENTROU HOJE A SALVAÇÃO EM TUA CASA”
“Quando Jesus chegou àquele lugar, levantando os olhos, viu-o e lhe disse:
Zaqueu, desce depressa, porque importa que eu fique hoje em tua casa. E desceu
a toda pressa e recebeu-O com gosto. Mas, vendo isto, todos murmuraram,
dizendo que se tinha ido hospedar em casa de um homem pecador. Entretanto
Zaqueu, posto na presença do Senhor disse-Lhe: Senhor, eu estou para dar aos
pobres a metade dos meus bens e naquilo em que eu tiver defraudado a alguém,
pagar-lhe-ei quadruplicado. Jesus lhe disse: Pois então entrou hoje a salvação
nesta casa porque também este é um filho de Abraão. Na verdade, o filho do
homem veio buscar e salvar o que tinha perdido.”21
Zaqueu nada pediu. Curioso, desejou ver a Jesus que passava, e subiu, porque
era de baixa estatura, a um sicômoro. Jesus o descobre. Levanta os olhos e lhe
diz: “Zaqueu, desce depressa, porque importa que Eu fique hoje em tua casa”. E
Jesus entrou na casa do pecador, a quem converteu, fazendo entrar ali a
salvação. Quanta misericórdia! Como Zaqueu, somos também pecadores e,
também como ele, de pequena estatura na virtude e no amor. No sicômoro da
confiança, esperemos Nosso Senhor. Vê-Lo-emos passar, distribuindo o perdão
e fazendo o bem. E Ele nos dirá, com um olhar cheio de doçura: “Desce depressa,
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importa que Eu fique em tua casa”. E, ainda como Zaqueu, sejamos generosos
em reparar as nossas faltas e em pagar quadruplicado o que devemos pelos
nossos pecados. Temos os méritos de Jesus Crucificado. E na casa de nossa
pobre alma há de entrar a salvação!
21 DE JUNHO
MINHA ALMA ESTÁ TRISTE ATÉ A MORTE
“E tendo tomado Consigo a Pedro e aos dois filhos de Zebedeu, Tiago e João,
começou a entristecer-se a apavorar-se, a angustiar-se e ficar abatido. Disse-lhes
então; Minha alma está triste até a morte; demorai-vos aqui e velai Comigo.”22
Notai nas expressões do Evangelista o horror da agonia de Jesus no Horto;
começou a entristecer-se a apavorar-se, a angustiar-se e a ficar abatido. Não é
assim que nossa alma às vezes fica? Que agonia dolorosa! Há provações na vida
espiritual que lembram os horrores do Getsêmani. Tristeza, pavor, angústia,
abatimento...
Entre os seus amigos escolhe Nosso Senhor alguns para que participem das suas
amarguras do Horto. Pedro, Tiago e João dormiram, não obstante o gemido
angustioso do Coração de Jesus: “Minha alma está triste até a morte!”
Alma generosa e fiel, repara a ingratidão do mundo nesta agonia eterna de Jesus
em face das iniquidades que cobrem a face da terra! Sê reparadora. Aceita
pacientemente, pelos pecados do mundo, essas agonias horrorosas de tuas
provações na vida espiritual. Contempla Jesus pálido, a suar sangue, triste,
abatido, como que esmagado, no Jardim das Oliveiras. Sofre também com Ele!
Ele te pede com amor: “Vela Comigo, fica, demora-te aqui. Eu sofro. Chora,
padece, agoniza Comigo pelos pecados do mundo!”
22 DE JUNHO
PAI, SE É POSSÍVEL, PASSA DE MIM ESTECÁLICE
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“E tendo-se adiantado um pouco apartou-se deles cerca de um tiro de pedra e,
caindo de joelhos prostrou-se sobre a terra, com o rosto no chão, e orava para
que, se fosse possível passasse dele aquela hora. E disse: Pai, se é possível, passa
de mim este cálice! Pai, todas as coisas são possíveis; se é do teu agrado, aparta
de mim este cálice; contudo, não se faça a minha vontade, mas sim a tua, nãoseja como eu quero mas sim como tu queres.”23
Viu todo o suplício que O esperava. Viu suas carnes despedaçadas no Pretório, a
face esbofeteada e coberta de escarros nojentos. Viu Pedro negando-O e
blasfemando-O, os Apóstolos fugindo. A cruz e o Calvário. Maria chorando. Os
insultos da plebe. O desamparo do Céu, o abandono horroroso de seu pai. E,
prostrado em terra, banhado em sangue, Jesus só teve esta prece, o mais perfeito
e sublime ato de abandono: “Pai, se é possível, passa de mim este cálice.Contudo, não se faça a minha vontade, mas sim a tua. Não seja como eu quero,
mas sim como tu queres!”
Nosso pobre coração espera talvez um golpe, o martírio de uma provação! É da
vontade de Deus que soframos! Aos pés de Nosso Senhor podemos dizer: “Meu
Deus se é possível, afaste-se de mim tamanha desgraça, este cálice tão amargo!”
Mas saibamos acrescentar com o nosso Divino Modelo do Getsêmani: “Contudo,
faça- se a Vossa vontade, Senhor, e não a minha!”23 DE JUNHO
HOJE ESTARÁS COMIGO NO PARAÍSO
“Ora, um daqueles ladrões, que estavam dependurados, blasfemava contra Ele,
dizendo: Se tu és o Cristo, salva-te a ti mesmo e a nós. Mas o outro, respondendo
o repreendia, dizendo: Nem ainda tu temes a Deus estando no mesmo suplício?E nós temos o castigo que merecem as nossas obras; mas este nenhum mal fez.
E dizia a Jesus: Senhor, lembra-te de mim quando entrares no teu reino. E Jesus
lhe respondeu: Em verdade te digo que hoje estarás comigo no paraíso.”24
O Bom Ladrão é o mais tocante modelo das almas confiantes. Viu Jesus no
patíbulo entre criminosos. Ouviu as acusações, os insultos e blasfêmias do povo.
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E, naquele homem desfigurado, ali na cruz, reconhece o Messias prometido, o
Senhor que lhe pode abrir as portas do reino do Céu. “Senhor, lembra-te de mim
quando entrares no teu reino!”
Belo ato de confiança! Um criminoso, um infeliz salteador, um condenado e com
ustiça, por tantos crimes, tem confiança em Jesus e Lhe pede uma lembrança
apenas, quando chegar ao Reino Eterno. E, como não é pequeno o mérito da
confiança, responde Jesus ao ladrão: “Em verdade te digo que hoje estarás
comigo no paraíso!” Dois pecadores no Calvário. Um é o Desespero que
blasfema. O outro, a Confiança, a pedir Misericórdia. Gestas se perde. Dimas se
salva. O Bom Ladrão é o grande, talvez o maior dos missionários da Confiança!
Imitemo-lo!
24 DE JUNHO
EIS A TUA MÃE!
“Entretanto estavam em pé, junto da cruz de Jesus, sua Mãe e a irmã de sua Mãe,
Maria, mulher de Cléofas, e Maria Madalena. Jesus, pois tendo visto sua Mãe e o
discípulo que Ele amava, de pé, junto Dela, disse à Sua Mãe: Mulher, eis aí o teu
filho. Depois disse ao discípulo: Eis a tua Mãe.”25
Eis a tua Mãe! Queria dizer Jesus: “Eis a misericórdia, o perdão, a vossa riqueza,
a salvação do mundo”. Era o testamento da misericórdia. No Cenáculo, deu-nos
o testamento do Amor, a Eucaristia. Na cruz o testamento da Misericórdia. Sua
Mãe para nossa Mãe! Ó Maria, não nos podeis desamparar! Fomos entregues à
vossa proteção num testamento de sangue e de lágrimas. Sangue de um Deus e
lágrimas da Mãe de Deus! “Mulher, eis aí o teu filho!” Desde aquela hora até hoje
nunca foi desmentida a proteção materna de Nossa Senhora. “Quem recorreu à vossa proteção e foi por vós desamparado ó Maria?” – pergunta São Bernardo.
Custamos o sangue de um Deus e foram bem amargas as lágrimas da Virgem ao
pé da cruz. A alma do pecador, banhada no sangue de Jesus e orvalhada no
pranto de Nossa Senhora, deve ter confiança no perdão, deve esperar
misericórdia. Esperar contra toda esperança, porque fomos entregues no
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Calvário Àquela que foi chamada: Esperança até dos desesperados!
25 DE JUNHO
MEU DEUS, POR QUE ME DESAMPARASTES?“Era então, quase a hora sexta, e toda a terra se cobriu de trevas até a hora nona,
e escureceu-se o sol. E, perto da hora nona, exclamou Jesus: “Meu Deus, meu
Deus, por que me desamparastes?”
Deus permite que nossa alma fique, às vezes, como que abandonada. Nenhuma
consolação, nenhuma luz. Provações de todo gênero e de todo lado. Tentações,
angústias. Parece que vamos perecer, e o Braço forte e Divino que nos
sustentava, já nem O percebemos. Que fazer então? Dizer como Jesus: “Meu
Deus, meu Deus, por que me abandonastes?” E ficar em paz. É um exercício
penoso o que faz então a pobre alma. Parece fria, insensível, como num túmulo.
Não possui mais aquela doçura da presença de Jesus. Sente-se tão mal! É a
agonia e o desamparo da cruz. “Meu Jesus, Meu Deus, por que me
abandonastes?” Oh! Como é preciosa esta agonia! Suportada humilde e
pacientemente, é uma fonte de graças escolhidas do Céu. É preciso que soframos
e sejamos conformes a Jesus, e Jesus Crucificado, para que se complete em nós omistério da salvação. E, nestas trevas horrorosas do Calvário, na provação dura e
quase desesperadora do abandono aparente do Céu, quando nossa pobre alma se
vê crucificada e batida pelo sofrimento, ficamos, como Jesus, a clamar: “Meu
Deus, meu Deus, por que me abandonastes?” Nessas horas repitamos também:
“Sim meu Pai, aceito o cálice que me ofereceis!” E hão de vir sobre nossa alma
torrentes de graças, para nós e os pecadores, porque as trevas do Calvário, disse
Elisabete Leseur, são fecundas.
26 DE JUNHO
EU TENHO SEDE
“Depois sabendo Jesus que tudo estava cumprido para se acabar de cumprir a
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Escritura, disse: Tenho sede! Tinha, porém, ali perto um vaso cheio de vinagre.
Então, correndo logo um deles, tomando uma esponja, a ensopou em vinagre e a
pôs sobre uma cana e Lhe dava de beber.”26
Jesus, agonizante, na cruz! Tem sede! “Sitio!” “Eu tenho sede!” De suplícios mais
horrorosos não se queixou e nem pediu alívio. E clama: “Tenho sede!” Ah! É a
sede de nossas almas, sede de amor, que O devora. Jesus quer na linfa cristalina
das almas remidas, água pura, de puro amor de nossos corações. Corações cheios
de confiança, de abandono, que O amem e Lhe deem almas, muitas almas. E,
quando na tortura horrorosa dessa sede de Amor, Jesus nos pede o coração pela
confiança, chegamos-Lhe aos lábios em brasa e ressequidos a esponja ensopada
em vinagre de desespero, de dúvida e desconfiança da sua Misericórdia. E como
não a rejeitar, triste e amargurado? Ah! Demos a Jesus agonizante e sequioso,todo o amor de nosso coração, e que esse amor seja um amor confiante na sua
Misericórdia infinita. Aliviemos a sede abrasadora de Nosso Divino Redentor, a
nos pedir almas, muitas almas que podemos salvar pregando a Sua Bondade e o
Seu Amor Misericordioso! Afastai dos lábios do Divino agonizante o fel do
desespero e o vinagre da desconfiança, que perdem tantas almas!
27 DE JUNHO
TUDO ESTÁ CONSUMADO!
“Jesus, havendo tomado o vinagre, disse: Tudo está consumado. Clamando
então, segunda vez, com grande voz disse: Pai, nas Tuas Mãos encomendo o meu
espírito. E, dizendo isto, abaixando a cabeça, rendeu o espírito.”27
Sim, estava consumada a obra do Amor Misericordioso. “Assim amou Deus o
mundo até dar por ele a vida de seu Filho Unigênito.” E, cumprida a sua missão,cumprida a Vontade de seu Pai Celeste, entregou-Lhe Jesus o Seu Espírito: “Pai,
em Tuas Mãos encomendo o meu espírito”. Tudo estava consumado, porque
estava cumprida a vontade do Pai, até o horror das agonias do Calvário e a morte
no patíbulo da cruz. Jesus morre num ato de abandono e conformidade à
vontade de Seu Pai. Naquela última hora, quando se aproximar o momento
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decisivo em que nossa pobre alma, no tormento da agonia, há de lutar nas trevas
de um calvário de tentações e sofrimentos, vinde Jesus, vinde socorrer-nos! Que
a lembrança de Vossa agonia na cruz venha confortar-nos. E possamos, naquela
hora derradeira, ter a consciência de que cumprimos a Vossa Santíssima
Vontade. Queremos também dizer: “Tudo está consumado!” Sim, consumada aobra do Vosso Amor Misericordioso em nossa pobre alma. E, sossegados,
diremos ao Senhor: “Pai, em Vossas Mãos encomendo o meu espírito”.
28 DE JUNHO
MULHER, POR QUE CHORAS?
“Ditas estas palavras, olhou para trás e viu a Jesus em pé, sem saber que eraJesus. Disse-lhe Jesus: Mulher, por que choras?”28
Maria viu Jesus e não O reconheceu. Continua a chorar. E a voz consoladora
pergunta: “Mulher, por que choras?” Depois, que alegria! Maria! – “Rabboni!”
Uma só palavra e se dissipam as trevas, abre-se o coração da pecadora
arrependida.
Em certas provações da vida espiritual, Jesus se oculta ou fica desconhecido a
certas almas que Lhe choram a ausência aparente. Tão perto de Jesus, falando e
tratando com Ele no Sacrário, na Comunhão, e não O reconhecem, não O
sentem! É um martírio! Só quem ama O pode compreender! Tratar com Jesus e
não O reconhecer, adorá-Lo na Eucaristia, no Sacrário, no Altar, na Mesa Santa,
e tudo no suplício de uma aridez, de uma frieza, de uma indiferença aterradora!
Como não há de chorar a pobre alma? Como Madalena, ela interroga a quem
encontra nos caminhos: “Onde O puseram?” Como a Esposa dos Cantares
suspira, desolada, pelo seu Amado. Esperai com paciência, almas escolhidas.Logo virá o Amado, e O vereis, e em transportes do Amor O reconhecereis. –
Maria! – “Rabboni!” Esperai! Por que chorais?
29 DE JUNHO
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A PAZ ESTEJA CONVOSCO!
“Ora, estando ainda falando nisto, chegada, porém, a tarde daquele dia, o
primeiro imediato ao sábado, e estando fechadas as portas onde se achavam os
discípulos, por medo dos judeus, apareceu aos onze, estando eles à mesa, edisse-lhes: A paz esteja convosco. Sou eu, não temais.”29
Diversas vezes se encontram no Evangelho estas palavras de Jesus: “Sou eu, não
temais”. Ao surgir maravilhosamente entre os discípulos, estando eles de portas
fechadas e medrosos dos judeus, Nosso Senhor repete a senha da confiança:
“Sou eu, não temais”. Vem trazer a paz: “A paz esteja conosco!” Paz e confiança!
Deus da paz, Deus de misericórdia e Pai de toda a consolação, Jesus não quer ser
temido. O Amor misericordioso há de vencer tudo. “A paz esteja convosco!” Nãoé a paz que o mundo promete, mas a doce paz que se conquista na luta, no
sacrifício, quando se conseguiu abafar a voz das paixões, fazer um silêncio
interior no cenáculo do coração. O mar é agitado e terrível na superfície. Diz-se,
porém, que nas profundezas dos oceanos reinam calma e silêncio eternos. Assim
as almas verdadeiramente amantes de Jesus. Sofrem mil provações! Que
martírios e que cruzes! A natureza chora clama e se agita. Mas lá, bem nas
profundezas da alma, que paz, que doce paz!
30 DE JUNHO
OLHAI PARA MINHAS MÃOS E PÉS
“Mas eles, perturbados e espantados, cuidavam que viam algum espírito. E disse-
lhes: Por que estais vós turbados e que pensamentos são estes que vos sobem
aos corações? Olhai para as minhas mãos e pés, porque sou eu mesmo. E,dizendo isto, mostrou-lhes suas mãos, os pés e o lado.”30
Não há outro recurso quando a gente se vê pobre, miserável e coberto de
pecados: olhar as mãos, os pés e o lado de Jesus, isto é, as suas Chagas Sagradas!
Meus méritos são as Vossas Chagas”, dizia São Boaventura. “Perturbados e
espantados, diz o Evangelista, os discípulos receberam o Mestre. “Por que estais
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perturbados e que pensamentos são esses que vos sobem aos corações?” Assim
fala Nosso Senhor às almas tímidas e desconfiadas, e atormentadas de
pensamentos tristes e desesperadores. E, para lhes dar confiança, mostra-lhes as
Chagas: “Olhai para minhas mãos e pés e o lado”.
Quando o desespero de Caim e de Judas me tentar dizendo: “Teu pecado é
grande demais para que tenhas perdão”, meu Jesus Crucificado, lançarei, cheio
de confiança, um olhar às Vossas Santas Chagas e, principalmente, às Chagas de
Vosso Coração aberto pela lança. Tenho certeza do perdão, com a firmeza do meu
bom propósito. Meu Jesus, ainda que a minha alma se cubra de todos os pecados
que, por desgraça, podem se cometer, nunca permitais cometa eu o monstruoso
pecado de Caim e de Judas: a desconfiança de Vossa Misericórdia!
1 - São Mateus 11,28.2 - São Marcos 1,40-45; São Mateus 8,2-4; São Lucas 5,12-15.
3 - São Mateus 8,23-27; São Lucas 8,22-25.
4 - São Marcos 2,1-5; São Mateus 9.
5 - Mc 2,15-22; Mt 9,10-17.
6 - São João 5,1-18.
7 - São Lucas 7,2-10; São Mateus 8,5-13.
8 - Lc 7,1 1-18.
9 - Lc 7,36-50.
10 - Eva lavalliére.
11 - São Lucas, 8,45-47; São Mateus 9,18-26.
12 - São Marcos 5,35-43. - São Mateus 9,18-19.23-26; São Lucas 8, 49-50.
13 - São João 6,16-21; São Marcos 6,49-50.
14 - São João 8,1-11 .
15 - São João 10,1-21.
16 - São Lucas, 9,51-56.
17 - São Lucas 10,25-37.
18 - São Lucas, 15,1 -10.
19 - São João 11,1-44.
20 - São Lucas 18,35-43; São marcos 10,46-52.
21 - São Lucas, 19,1-10.
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22 - São Marcos 14,32-34.
23 - São Mateus 26,36-38; Marcos 14,32-34; Lucas 22,39-46.
24 - São Lucas 23,39-43.
25 - São João 19,25-27.
26 - São Mateus 27,48; São Marcos 15,36.
27 - São Mateus 27,50; São Lucas, 23,46.
28 - São Mateus 28,5-7; São Marcos 1 6,5-7; São Lucas, 24,5-6.
29 - São João 20,19-20; São Marcos 16,12-14; São Lucas, 24, 36-38.
30 - São João 20, 26-29; São Marcos 16,14; São Lucas 24,36-39.
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1 DE JULHO
MEU CRUCIFIXO
Encontramos Jesus no Evangelho. Saboreamos toda a infinita doçura da suapalavra. Quando o coração, este nosso pobre coração, sentir-se mal, desconfiado
e triste, vamos ao Evangelho. Uma página do Evangelho consola mais do que os
mais belos e sublimes tratados saídos das mãos dos homens. E um olhar ao
Crucifixo, o livro querido dos santos. À Santa Teresa disse Jesus: “Eu te darei um
livro vivo”, era a cruz. “Dai-me o meu livro”, dizia São Felipe Benício.
Apresentaram-lhe um Breviário e uma Imitação. Faz ele um gesto e mostra o
Crucifixo. Era o seu livro querido. Com meu Evangelho e meu Crucifixo, que nãosuportarei? Dois livros inseparáveis. O Evangelho contém a lição do sofrimento e
o Crucifixo nos mostra a prática do sofrimento. Bom amigo, bom conselheiro e
bom mestre é meu Crucifixo. “A Cruz é uma escola”, dizia Santo Agostinho. E
que se aprende nessa escola? A sofrer pacientemente, a perdoar e a suportar o
peso da vida. Olhando a Cruz, minha alma reza, perdoa, espera, confia,
abandona-se. A um pobre leigo de convento, humilde e analfabeto, perguntou-se
onde aprendera tanta ciência das coisas espirituais, incrível num ignorante como
ele. Respondeu: “Aprendi num livro de cinco letras vermelhas”. Referia-se aoCrucifixo, com suas Chagas abertas. Meu Crucifixo! Nunca te deixarei, mestre
querido de minha alma!
2 DE JULHO
A VISITAÇÃO
A dor te veio visitar, como Nossa Senhora à sua prima Santa Isabel, para te fazer
bem e te encher de graças. Que fazer? Recebê-la com muito amor. Entoar um
“Magnificat”. Com ela vem Jesus. O sofrimento é a visitação do Senhor! Não
maltrates o Hóspede Divino. É a Misericórdia que procura a miséria. Recebe a
visita honrosa, se não com alegria ao menos pacientemente. E sabe Deus como te
é necessária! A visita que recebes é de caridade, como a de Maria à Isabel. O anjo
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do Carmelo, Santa Teresa do Menino Jesus, aconselhava sempre as suas noviças
que dessem bom agasalho ao sofrimento, recebendo-o com um sorriso nos
lábios. Custa – é verdade – a princípio. Depois se adquire o hábito, aprende-se a
ser bem polido e amável para a visita inevitável de quase todos os dias. A dor não
é má. Vem visitar-nos em nome do Senhor. Por que não a receber bem? Traznotícias do Céu, fala-nos de Jesus, ensina-nos o desapego dos prazeres e mostra-
nos a realidade da vida. Oh! Não sejas grosseiro! Recebe essa dama celeste com
amabilidade. Ela é a embaixatriz do Céu e nos faz tanto bem!
Sê amável e agradecido ao Senhor, que mandou fazer-te uma visita.
3 DE JULHO
SOFRER AMANDO E SOFRER SEM AMAR
“Há duas maneiras de sofrer – dizia o santo Cura d’Ars: sofrer amando e sofrer
sem amar. Uns sofrem como o Bom Ladrão; outros, como o mau. Ambos
sofreram pena igual, mas só um tornou meritório o seu sofrimento”. Sem Deus
não é possível a um pobre e fraco mortal o peso de tantos sofrimentos! Do berço
ao túmulo, é nossa vida um gemido entrecortado de uns poucos sorrisos. Sofrer,
sempre sofrer, é o destino de todo mortal. Mas é mister aproveitar o sofrimento.Soframos bem, já que não é possível evitar as cruzes. E o amor, só o amor nos
pode consolar e aliviar o coração. Não sejamos quais mercenários que trabalham
com má vontade e a se queixarem. Trabalhemos e soframos alegremente. “No
serviço de Deus – dizia São Francisco de Sales – devem-se considerar mais os
advérbios do que os verbos. Não está o nosso mérito em servir a Deus ou sofrer,
mas em servi-lo BEM e sofrer BEM”. E, para bem servir a Deus e bem sofrer, é
preciso amar. O amor ajuda a sofrer e o sofrimento ajuda o amor. Um não vive
sem o outro. Sofrer bem ajuda a bem amar. E quanto mais se ama ainda mais se
sofre. Há, porém, uma diferença entre sofrer amando e sofrer sem amar: quem
sofre amando, sofre em paz e, quem sofre sem amar, sofre em desespero. Pode-
se dizer com Santo Agostinho: “Quem ama não sofre e, se sofre, ama o
sofrimento”.
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4 DE JULHO
A HORA DAS GRANDES ALMAS
A hora da desgraça e dos grandes sofrimentos, de golpes e reveses, é a hora dasgrandes almas. Quantas, na prosperidade, mostravam-se insignificantes,
mesquinhas, acanhadas. Veio o golpe das adversidades, soou a hora da desgraça,
e que prodígios e transformações! Vede Inácio de Loyola. Simples soldado
iludido, como tantos, pelas vaidades da terra, egoísta, orgulhoso. A ferida o
prostrou num leito. E, ferido o corpo, uma leitura, verdadeiro golpe da graça,
transforma-o e santifica-o. Não foi um golpe assim motivo de conversão para
Margarida de Cortônia e Francisco de Borgia? Quando já tudo parece perdido,quando Nosso Senhor nos reduz ao pó, ao nada que somos, pela humilhação, o
abatimento; quando reveses e, principalmente, grandes calamidades nos ferem,
é então chegada a nossa hora, ou melhor a hora de Deus. Esperemos confiantes!
A Providência vai, talvez, realizar os grandes e eternos desígnios que tem sobre
nós: “Quando tudo está perdido – dizia Lacordaire – então é a hora das grandes
almas”.
Na desgraça, não nos mostremos mesquinhos, espíritos acanhados e eternos
queixosos da Divina Providência. As desgraças são golpes do Artista Divino e dão,
no mármore de nossas almas, uma expressão de beleza encantadora. Não
quereis que, para esse bloco informe de vossa alma egoísta, chegue a hora de ser
obra-prima da graça e enlevo de estetas espirituais, os Anjos do Senhor?
5 DE JULHO
“QUO VADIS?”Contam as tradições de Roma que São Pedro fugia, medroso, da perseguição de
Nero quando encontrou Jesus no caminho, com a cruz às costas. “Para onde
vais, meu Senhor?”, pergunta o apóstolo. “Para Roma, diz Jesus, e para ser de
novo crucificado”. Pedro compreendeu a lição. Voltou e sujeitou-se
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corajosamente ao martírio. Jesus continua ainda a sofrer. E até o fim dos séculos
há de carregar, em seus ombros feridos, o peso enorme de nossos pecados. A
paixão de Jesus continua no Sacrário, no Altar, no seio da Igreja. No Sacrário,
abandonado; o Altar, profanado; nos filhos ingratos da Santa Igreja; nessa legião
de almas tíbias, pusilânimes em face da cruz e da perseguição dos maus. Equando fugis do sofrimento, e não quereis lutar por amor de Deus nesse dever
penoso, nessa obra de apostolado difícil e na vocação a que fostes chamados,
Jesus se vos apresenta no caminho da vida com a sua cruz. E para onde vai? Para
o calvário do vosso coração ingrato, onde será de novo crucificado. Perguntai-
Lhe como São Pedro: “Para onde vais, Senhor?” – “Quo vadis?” E que a resposta
do Senhor, como ao Apóstolo, faça-vos retroceder, corajosamente, lutar pela
vossa salvação eterna e sofrer em união com os méritos do Sangue Divino
derramado na cruz!
6 DE JULHO
AGRICULTURA DE DEUS
Diz o Apóstolo que somos a agricultura de Deus. Nossa alma é o campo. Deus, o
Agricultor Celeste. Na parábola do semeador, Jesus compara também o nosso
coração à terra, onde cai a boa semente da palavra de Deus. Que faz o bom
agricultor? Prepara a terra, cortando-a, revolvendo-a a golpes de enxada e arado.
Depois semeia. E, quando nasce a planta, cuida que não a sufoquem os espinhos
ou a má erva. Vem a poda e são cortados os ramos. Certas árvores, como as
mangueiras, exigem até golpes incisivos no tronco. Outras ficam reduzidas a uns
poucos e bem podados galhos. Aos menos entendidos, o trabalho do agricultor
parece mais obra de destruição que de cultura. Entretanto, vem o outono, vem a
colheita, e que riqueza, que belos frutos, que delícia!
Somos a agricultura de Deus, no expressivo dizer do Apóstolo, e não queremos o
trabalho do Agricultor celeste no campo de nossas almas? Sob a forma de um
agricultor apresentou-se Jesus a Madalena, na madrugada da ressurreição. Que
simbolismo tocante! O Divino e bom Agricultor quer trabalhar. Dai-lhe o campo
de vosso coração. Para a sementeira da graça deixai que a dor, bom arado, rasgue
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nele sulcos profundos. A sementeira da graça e do amor será tanto maior quanto
maior o terreno preparado. E vereis depois, no outono da vida, que rica e bela
colheita para a Eternidade!
7 DE JULHO
IMOBILIDADE PENOSA
Imóvel num leito, a sofrer, horas e horas eternas num quarto, silencioso, a
contemplar as paredes, os móveis, a contar as tábuas do forro! Gemidos a cada
agulhada que fere o corpo, na dor sem alívio! E sempre ali o pobre enfermo,
condenado à imobilidade penosa, que já dura, talvez, meses e até anos. É preciso
ter experimentado o peso dessa cruz para se avaliar como é duro! Com razãoescreveu Lacordaire: “A doença me parece o que, neste mundo, mais virtudes
exige, porque abate as forças justamente quando mais delas precisamos”. São
horríveis a tortura física e a tortura moral que nos vêm particularmente da inação
a que ficamos condenados. Eis porque devemos ter paciência com os enfermos,
que, por sua vez, devem ser pacientes consigo mesmos. Essa inação e
imobilidade irritam, abatem e até desesperam certas almas acostumadas à vida e
à luta. Dizia o apostólico e ardente cardeal Lavigerie: “O inferno, para mim, seria
uma eternidade na imobilidade”. Numa provação tão dura, quanto merecimento!
Ah! se soubéssemos aproveitar o tesouro de graça que acompanha essa cruz!
Nessas horas de penosa imobilidade, precisamos lembrar-nos da imóvel
eternidade do inferno! Sempre! Nunca! Eternamente! Sofrei a imobilidade de
vossa doença, e vos fixareis um dia na Imobilidade Eterna, que é Deus, que é o
Céu!
8 DE JULHOEXÍLIO DO CORAÇÃO
O mais triste dos exílios é o do coração. Faz sofrer mesmo dentro da família e da
pátria. Sofrimento do amor, é inevitável, pois, no dizer do fino psicólogo da
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Imitação, “não se vive sem amar e não se ama sem sofrer”. As almas nobres
sentem no coração um abismo, que nada pode encher. Nem o prazer dos
sentidos, nem as honras, nem as glórias, nem o amor da terra. Daí a melancolia
dos grandes corações, prova evidente de que esta vida é um exílio, no qual quem
mais sofre é o coração. Bendita seja a Misericórdia Divina por nos trazer ocoração sempre inquieto e insatisfeito até que repouse plenamente em Deus.
Esse exílio do coração foi o tormento de Santo Agostinho: “Nosso coração está
sempre inquieto, Senhor, enquanto não descansa em Vós”. Jesus é a pátria do
nosso coração. Só Nele se encontram repouso, alegria e paz. E fora de Jesus, fora
do seu amor, não há sossego, viveremos inquietos, agitados e tristes como o
peregrino cansado, saudoso e faminto, em viagem penosa, à procura da pátria.
Quando o coração experimenta as tristezas do exílio, do abandono das criaturas,
da incompreensão dos amigos, da ingratidão do amor, volte-se depressa para
Jesus, verdadeira pátria dos corações.
Para o exílio do meu coração, ó Jesus, só a pátria de Vosso Coração!
9 DE JULHO
CAMINHO DA CASA PATERNA
Há muitas moradas na casa de meu Pai”, disse Nosso Senhor, mas, segundo
comenta piedoso autor, é um só o caminho para lá chegar: o da Santa Cruz, de
que nos fala a Imitação. O filho pródigo não teria voltado à casa paterna se a dor e
a miséria o não tivessem batido. E tão grande a misericórdia Divina que nos
obriga pelo sofrimento a ter saudades do Céu, desapegando-nos assim de toda
vaidade e ilusão deste mundo. E, quando o coração se desiludiu das criaturas e já
sofreu bastante, toma uma resolução: “Eu me levantarei e irei a meu Pai”. E se
põe sem demora a caminho da casa paterna. A Divina Providência, em Sua
Misericórdia, de tal modo dispõe as coisas neste mundo, que nos coloca na feliz
impossibilidade de nos acostumarmos com a felicidade e o paraíso que a terra
nos promete e oferece. O sofrimento é o nosso caminho para a casa paterna.
“Creio, no fundo de minha alma, e sinto em minha consciência – escreveu De
maistre – que, se o homem pudesse viver neste mundo isento de todo
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A felicidade é um negócio. E os que sabem empregar bem o capital em bancos e
boas transações, gozam os juros de cem por um, aqui e na vida eterna. Que faz o
bom negociante? Coloca o seu capital em negócios seguros e de vantagens certas.
Compra e vende com lucros. Quereis ser felizes? Imitai o negociante. Com a
moeda de vosso conforto, riqueza e saúde, comprai um pouco de felicidade paraos que sofrem. E são tantos! O segredo da felicidade, segundo o Evangelho, está
em fazer os outros felizes. “Bem-aventurados os misericordiosos – disse Nosso
Senhor – porque eles alcançarão misericórdia”.
Vede os que padecem, os que choram, os desgraçados, e sereis menos egoístas, e
o vosso coração se há de abrir, cheio de ternura e de bondade, para com os
pobres e os que trazem também o coração a sangrar. O egoísmo é estéril e duro.
No sofrimento, nos golpes da vida, nas desgraças que nos afligem, há umremédio eficaz e infalível para o alívio do coração: é entregarmo-nos às obras de
misericórdia, visitar os pobres, os enfermos, encarcerados, dar esmolas, proteger
os infelizes. É remédio eficaz nas tentações contra a fé! E, enxugando as lágrimas
alheias, enxugamos também as nossas. Experimentai a boa receita e vereis. São
Vicente de Paulo viu-se livre de uma terrível tentação contra a fé dando-se ao
serviço dos pobres. E quantos e belos exemplos! Quereis ser felizes? Negociai a
felicidade, pondo a vossa esmola no banco da pobreza, e o consolo, no coração
dos que sofrem! É bom negócio! Sereis felizes!
12 DE JULHO
TRÊS CRUZES
Santa Margarida Maria conta, numa das visões do Coração de Jesus que, num
dia de Páscoa, Nosso Senhor lhe apresentara três cruzes. Perguntou-Lhe a santa
a significação de tais cruzes. “Minha filha – responde o Mestre – serás muito
perseguida pelo Demônio, pelo mundo e por ti mesma”. Eis aí as cruzes maiores
de nossa vida. O Demônio, invejoso de nossa felicidade e do tesouro
incomparável da graça que nos foi dada em abundância no Calvário, pelos
méritos de Jesus Crucificado, que são nossos, aquele espírito do mal de tal modo
nos persegue que, no dizer da Escritura, parece um leão furioso a rugir em torno
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de nós. Que martírio o das tentações! O inferno não nos deixa em tréguas. Pobres
almas tentadas, consolai-vos! É a vossa cruz! Aceita-a pacientemente. O mundo é
também uma cruz e bem pesada. Quanta sedução perigosa, quanta mentira e
falsidade! O mundo, chafurdado na lama e embriagado no prazer dos sentidos,
amais há de compreender as almas que se entregam a Nosso Senhor. É justo enatural que as persiga. Não estranheis a perseguição do mundo, disse Jesus. –
“O mundo vos odeia.” Finalmente, a nossa maior cruz talvez seja a terceira, nós
mesmos, esse eu orgulhoso, difícil, rebelde, a arrastar-nos sempre ao pecado e a
ferir-nos. Ah! se não o perseguimos estaremos perdidos. Diz o Evangelho, para
nos inculcar como devemos combater o orgulho e o amor-próprio: “Quem ama a
sua alma, perde-a”.
Meu Jesus, pela vossa cruz, ajudai-me a carregar minhas três cruzes!
13 DE JULHO
VENCEDOR, MESTRE, AMIGO E HERDEIRO
Saber sofrer é das artes a mais bela e a mais difícil. Quem a aprendeu é um herói,
venceu a maior das batalhas. Combater, lutar com outros, bem pouco é em
comparação com a luta que dentro de nós se trava entre o espírito e a carne, ecom o combate às perseguições que, a cada momento, vêm-nos de fora: Lutas
interiores, íntimos martírios cruciantes e perseguições de mil cruzes exteriores,
semeadas pelo caminho de nossa vida. Por isso escreveu a espiritual e suave
escritora russa Mme. Swetchine: “Quem souber sofrer será vencedor de si
próprio neste mundo, amigo de Jesus Cristo e herdeiro do Céu”. Vencedor de si,
do próprio eu abatido pelo sofrimento, eis a vitória! Cortado o mal pela raiz, que é
o orgulho, o eu vivo, está ganha a peleja. Mestre do mundo! Quem tudo
desprezou e tudo soube sofrer, conquistou o mundo. No dizer do Mestre, é o
pacífico que possui a terra. Quem despreza o mundo por amor de Deus é o
senhor do mundo, porque o mundo poderoso e agitador de corações já não vence
o homem verdadeiramente interior! Amigo de Jesus Cristo! Não é Jesus o amigo
dos que sofrem? Nem é mister prová-lo. Basta ler o Evangelho: “Vinde a mim vós
que sofreis, eu vos aliviarei!” Que consoladora promessa! A amizade dos grandes
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se conquista em banquetes e festins; o amor de Jesus, no sofrimento e no
Calvário. Finalmente, o que sabe sofrer é o herdeiro do Céu. Não está cheia a
Escritura de promessas e recompensas aos que padecem? E as bem-
aventuranças? Muitas terminam assim: “porque deles é o reino dos céus...”
Então não vale a pena sofrer um pouco por amor de Deus?
14 DE JULHO
ABISMOS
Diz misteriosamente o salmista que um abismo chama outro abismo. Sim, o
abismo de nosso pecado chamou o abismo do sofrimento. Quando pecaram
nossos primeiros pais, logo se fez sentir o castigo: a dor. Eva daria à luz aos seusfilhos entre gemidos e dores. Adão comeria o pão com o suor do rosto, isto é, com
a dor e o sacrifício. Ali estavam os dois abismos do pecado e da dor. Um terceiro
iria chamar os dois primeiros: o abismo da Misericórdia Divina. E este se abriu
no Calvário. E os outros dois se precipitaram nele, no abismo da Cruz, isto é, no
abismo do Amor Misericordioso. Sempre abismo a chamar abismos!
Muitas vezes, à Santa Margarida Maria e à confidente das suas santas chagas, a
humilde Soror Marta da Visitação, Jesus repete que Seu Coração Divino e suasChagas Divinas são abismo de misericórdia, oceano de misericórdia, de tal modo
profundo e extenso que dá bem uma imagem do Infinito. Abismo cuja
profundidade e vastidão são incomensuráveis! E há ainda quem, desconfiando
sempre da Misericórdia infinita, queira medir as profundezas do abismo do Amor
Misericordioso e julgar o Infinito pelo finito! Que insensatez! Que mesquinharia!
Medir pelo egoísmo de nosso coração o imenso e eterno abismo de Misericórdia
do Coração Sacratíssimo de Jesus! Abismo de miséria, cala-te e adora! Para a
miséria, só a Misericórdia. Para um abismo, só outro abismo.
15 DE JULHO
JESUS SEM A CRUZ
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Não se compreende cristão sem cruz. “Ignorais – diz Bossuet que o nome de
cristão significa homem destinado ao sofrimento?” Os cristãos delicados,
inimigos da dor, quase pagãos, querem Jesus, sim, adoram-no e pretendem amá-
lo, mas... Sem a cruz. Querem o Menino Jesus, sim, nos braços de Maria, cheio
de encantos, porém, longe da gruta de Belém, da pobreza e miséria do estábulo,da companhia dos pobres e dos animais. Querem Jesus, sim, mas transfigurado
no Tabor, resplandecente de glória, a provocar o êxtase e a admiração dos três
discípulos Pedro, Tiago e João. Ah! O Tabor é montanha predileta dos cristãos
delicados. Como lhes horroriza, porém, o Calvário! Como lhes é insuportável a
montanha do martírio! Querem um Cristo de iluminuras, de arte e beleza, um
Cristo resplandecente no Tabor e na Ressurreição! Páginas há do Evangelho que
eles não podem ler, de duras que são, principalmente as que pregam a penitência
e a luta contra as paixões e a tríplice concupiscência!
Jesus não nos vem sem a cruz! Esta é a condição para servi-lo e amá-lo. “Se
alguém quer ser meu discípulo, que se renuncie, tome a sua cruz de cada dia e
me siga...”.
E, para nos dar exemplo, vai Nosso Senhor adiante com a sua cruz. Não, jamais
encontrareis esse Jesus de vossos sonhos e loucas fantasias, ó delicados inimigos
da cruz! Jesus sem cruz não existe! E, pois, também não se compreenderá umcristão sem cruz. Não pode o discípulo ser maior nem melhor que o Mestre!
16 DE JULHO
JUSTIÇA E MISERICÓRDIA
Sofremos por justiça e misericórdia. É de justiça que recebemos o castigo das
ofensas contra Deus, de nossos pecados, tão grandes e já tão numerosos quenem os podemos contar. A dor entrou no mundo com o pecado, e é punição e
castigo desse mesmo pecado. Entretanto, se é justo o castigo, o sofrimento é
também misericórdia. Na dor se realiza o que cantou David: “Beijaram-se a
ustiça e a paz, isto é, a Misericórdia”.
Sofrem neste mundo os bons e os maus. Também por Misericórdia e justiça.
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“Verdade é – escreve Santo Agostinho, na sua Cidade de Deus, verdade é que
tanto os cristãos como os infiéis não foram poupados. A hora do julgamento de
uns e outros ainda não chegou. A paciência de Deus convida os maus à
penitência, com os flagelos, e assim forma também os bons na paciência.
Aprouve à Divina Providência preparar para o futuro bens eternos de que hão degozar os justos, com a exclusão dos culpados, e males que hão de ferir os ímpios,
sem atingir os bons. Quanto, porém, aos bens e males temporais, quis o Senhor
fossem comuns aos bons e aos maus, a fim de que, nem se tivesse pressa e ardor
em procurar os bens de que gozam também os maus, nem houvesse tanto medo
e covardia em fugir dos males a que estão sujeitos os bons, sem nenhuma
exceção”.1 Aí estão a justiça e a misericórdia nesse mistério do sofrimento, que
escandaliza a tantos cristãos, que sempre lamentam a dor e a perseguição dos
ustos e a prosperidade dos maus!
Em tudo, Justiça e Misericórdia!
17 DE JULHO
A CRUZ DE CADA UM
Cada um de nós tem a sua cruz. Dela não podemos fugir. E não se podemcomparar as de uns com as de outros. Todos sofrem, variando a dor de coração
para coração. O que para este é martírio é, para aquele, consolo. Um historiador
de Mgr. Dupanloup conta que o Pe. Bougaud e o Pe. Lagrange, dois futuros
ilustres bispos franceses, discutiam a questão: Quem sofreu mais, Maria
Antonieta ou Maria Stuart? Mgr. Dupanloup os deixou falar um bom quarto de
hora. Disse-lhes depois cheio de bondade: “Meus amigos, meus bons amigos, as
dores não se comparam!...2
Sim, as dores não se comparam. Assim como não há dois homens iguais em
tudo, assim também são diversos e não se podem comparar os sofrimentos e
dores. Cada um tem a sua cruz. Por isso é que Jesus Cristo, o mais profundo
conhecedor do nosso coração, ordena que tomemos a cruz para segui-LO, mas a
cruz de cada um, pessoal. Diz o Evangelho: “Tome a sua cruz”. Essa cruz é a cruz
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de todo dia. Cruz de golpes de coração, a cada passo, em família; cruz de
mortificações e do cumprimento do dever; cruz de ingratidões e olhares
indiferentes, trabalhos pesados; cruzes pequeninas, de todo o mundo ignoradas;
dores íntimas, que nos partem o coração e de que ninguém poderia sequer
suspeitar! Ah! como são preciosas e queridas ao Senhor essas pequeninascruzes! Só elas bastam para nos santificar. São as nossas cruzes. Cada um tem a
sua, a do Evangelho.
18 DE JULHO
ORAÇÃO DOS QUE SOFREM
Do Journal et Pensées de chaque jour, daquela alma escolhida que foi ElizabeteLeseur, aqui reproduzo, sem comentar, a edificante página de 18 de julho de
1912. É a oração dos que sofrem, tão sublime e consoladora. Eis a transcrição:
“Meu Deus, deponho a vossos pés o meu fardo de sofrimentos, de tristezas, de
renúncias; ofereço tudo pelo Coração de Jesus e peço ao Vosso Amor que
transforme estas provas em alegria e santidade para os que amo, em graça para
as almas, em dons preciosos para Vossa Igreja. Neste abismo de
acabrunhamento físico, desgostos e de cansaço moral, de trevas, em que melançastes, deixai passar um raio de Vossa triunfante claridade! Ou melhor –
porque as trevas de Getsêmani e do Calvário são fecundas – fazei que todo este
mal sirva para o bem de todos. Ajudai-me a ocultar o despojamento interior e a
pobreza espiritual sob a riqueza do sorriso e os esplendores da caridade. Quando
a cruz se tornar mais pesada, ponde a Vossa doce Mão sob o fardo que Vós
mesmo colocastes sobre meu corpo dolorido. Senhor, eu Vos adoro e ainda sou e
serei sempre a Vossa devedora, porque, como Divino contrapeso aos meus
sofrimentos, Vós me dais a “Eucaristia do Céu. Aleluia!”
Tão formosa oração, verdadeira oração dos que sofrem, partida de um coração
que tanto sofreu na terra e se fez mestra na arte da cruz, – a Santa Igreja a
enriqueceu com 300 dias de indulgência cada vez – (Ex rescripto S.P.A. 27 Juni
1922). Convém receitá-la nos dias de dor e de trevas. Consola. É a oração dos que
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sofrem.
19 DE JULHO
ENTRE DOIS MUNDOSPor que tanto sofre o homem no mundo? Por quê? É a dolorosa, inquieta e
desesperadora interrogação de toda filosofia, de toda religião, de todo sábio.
Temos sede e fome insaciáveis de uma felicidade que se não encontra em parte
alguma. “Quereis saber – diz Lammenais – por que é o homem a mais sofredora
das criaturas? É porque tem ele um pé no finito e outro no Infinito e está como
que esquartejado, não por quatro cavalos, como nos tempos do horror, mas por
dois mundos.” Esta é a razão última por que sofremos. Dotados de um coração deânsias infinitas, criados à imagem e à semelhança do Eterno, como podem o
finito e o efêmero contentar-nos? E procuramos loucamente uma felicidade
eterna no temporal, a satisfação de um desejo infinito no finito. E como não
sofrer? Ó ânsia eterna que nos devora! Que suplício não padecem o gênio, o
santo, o artista, almas nobres, dotadas com mais perfeição deste senso do
Infinito e do Eterno! O homem animal não é todo o homem. Há em nós a carne e
o espírito. Esta dualidade inimiga foi assim analisada pelo gênio de São Paulo: “A
carne luta contra o espírito e o espírito luta contra a carne”. Temos em nós dois
homens: o animal e espiritual. Pascal diria o Anjo e a Besta. Um tende para
Infinito, outro para o finito, um para o Eterno, outro para o efêmero. E ficamos
entre dois mundos, nesta luta a que nenhuma guerra, nenhum combate se pode
comparar. Como, pois, não sofrer? E, coisa singular! É nessa luta, nessa guerra
feita, como nos ensina o Evangelho, que achamos a paz, a doce paz que Jesus
nos veio trazer!
20 DE JULHO
AGONIAS DO GETSÊMANI
“Quando Jesus está presente – diz o autor da Imitação – tudo é doce e nada
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parece difícil.”
A alma sente-se corajosa no sofrimento, é capaz de sofrer até o martírio pelo seu
Amado. Tudo é fácil e doce no caminho da vida espiritual. É o paraíso! Mas Jesus
quer os seus eleitos no Calvário e raras vezes no Tabor. Retira-se, afasta-se,
depois das consolações do amor sensível. E que desolação para uma pobre alma!
Que deserto árido a oração! Custam os sacrifícios! Tudo se mudou. A fraqueza e a
miséria humana aí estão a esmagá-la. Para as almas verdadeiramente amantes, é
uma agonia de Getsêmani é um desamparo da cruz. Durante quarenta anos tão
horríveis suplícios esmagaram o pobre coração de Santa Joana de Chantal! Viveu
abandonada às penas interiores. Sua pobre alma parecia manchada de horríveis
crimes e nem ousava levantar os olhos para o Céu, envergonhada do que lhe
parecia ingratidão e impureza. Tentações contra os mais adoráveis mistérios defé, dúvidas, maus desejos de blasfemar contra a Misericórdia Divina. Dizia ela
que sua pobre alma era como um bosque onde passeavam os mais hediondos
répteis, os mais nojentos animais e ela não os podia expulsar. Quando lhe
faltavam de provações na vida espiritual, rolavam-lhe pelas faces grossas
lágrimas. As noites, passava-as em verdadeira agonia.
A história das provações interiores da grande santa é um consolo. Foi de agonias
a vida espiritual de Santa Chantal. E agonias do Getsêmani... Vede que exemplo! Almas provadas, consolai-vos com a santa Fundadora da Visitação.
21 DE JULHO
A ARGILA E O VASO
Em diversas passagens da Escritura, o Espírito Santo compara o homem à obra
do oleiro. Não nos formou Deus do barro? O oleiro torneia os vasos e os destinaao uso que lhe apraz. Ora o endurece no fogo, ora o prepara de mil formas,
quebra-o até. E nunca o vaso diz ao oleiro: “Não estou contente. Por que me faz
assim?” Levanta-te – diz o Senhor ao profeta Jeremias – e desce à casa do oleiro.
Nesse momento o artista torneava um de seus vasos. De repente quebra o que
estava preparando com argila. Não o achou a seu gosto. Então disse o Senhor a
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Jeremias: “Ó casa de Israel, não poderia eu fazer de vós o que o oleiro faz com
seu vaso? Não estais na Minha Mão como o barro na mão do oleiro?” Sim,
estamos nas Mãos de Deus como o barro na mão do oleiro. Deixemos que o
Divino Artista faça de nós o que quiser. Cumpra-se a Sua Santíssima Vontade. O
barro não se pode queixar. Passará a pobre argila de nosso corpo, talvez pelo fogodas provações de tantas doenças e o martírio da dor. Seremos quebrados,
sofreremos mil golpes e reveses. Deixemos que este barro vil e pecaminoso seja
amassado e batido. E não nos queixemos da Divina Providência! O barro por
acaso diz ao oleiro: “Não estou contente? Por que me fazes assim?”
Abandonemo-nos nas Mãos de Deus como a argila nas mãos do oleiro. E Ele, o
Divino Artista, fará de nós um belo e rico vaso de eleição!
22 DE JULHO
TEUS PECADOS SERÃO PERDOADOS
À Madalena, arrependida e humilhada a seus pés, disse Nosso Senhor a mais
consoladora palavra do seu Misericordioso Coração: “Teus pecados te serão
perdoados!” Poderíamos dizer, com Santo Agostinho: “Ó feliz culpa”. Ó culpa
feliz, que mereceu tão grande e suave perdão!
Depois de pecar, não deixemos entrar em nosso coração o desespero. Confiança!
Seja o nosso arrependimento forte e grande, porém, tranquilo, nada inquieto,
desanimado e turbulento. Vede Madalena. Pecou, foi o escândalo da cidade,
encheu de luto o coração de Marta e de Lázaro. Mas que confiança na
misericórdia do Coração de Jesus! Sentiu-se tocada pela graça e não hesitou.
Sem demora vai à casa de Simão, chora, arrependida, aos pés de Jesus, ouve a
palavra tão doce do Amor Misericordioso, que perdoa e ama, e se levanta calma,
cheia de paz e de amor. Notai, no Evangelho, o amor ardente da pecadora
arrependida. Aos pés do Mestre, calma, na Betânia, enquanto Marta se agita e se
afadiga. Se a vemos chorando aos pés da cruz e aflita na madrugada da
ressurreição, é por Jesus, só por Jesus. O Amor ferido e o Amor ausente, só isto a
faz chorar e sofrer. O resto é como se não existisse para ela. Grande coração!
Grande amor! Como Nosso Senhor enche de amor o coração que antes, cheio de
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pecado, esvaziou-se para seu Divino Amor!
23 DE JULHO
O FOGO DO AMOR E O LENHO DA CRUZNão há verdadeiro amor sem sacrifício. “Não se ama sem sofrer” diz a Imitação. O
amor de Jesus Cristo alimenta-se de sacrifícios. “O fogo sagrado do amor de
Jesus – escreveu São Francisco de Sales – nutre-se com o lenho da cruz.” – É a
lei do amor desde que o Filho do Homem veio a este mundo. “Deus é o amor”,
diz o Apóstolo. E São Paulo nos prega Jesus, e Jesus crucificado, para nos dar a
entender que só na cruz se acha o Amor. O espírito do Cristianismo – disse Ollé
Laprume – é essencialmente espírito de sacrifício e espírito de amor, porque é oespírito de Cristo, e o Cristo, o verdadeiro Cristo, é o Cristo Crucificado, o Cristo
que sofre porque ama”.3 Amor e sofrimento! Duas sublimes palavras. Produzem
elas dois sentimentos nobres e os mais belos que possam fazer pulsar o nosso
coração e ajudá-lo nas suas ascensões para Deus!4
Por que as almas abrasadas de Amor Divino têm sede de sofrimento e são
amantes apaixonadas da cruz? Porque o Amor tem fome de sacrifícios. E, quanto
mais sofre, mais quer sofrer. Como se explicam as palavras de Santa Teresa: “Ousofrer ou morrer”? E estas de Santa Madalena de Pazzi: “Sofrer sempre, meu
Deus! Nunca morrer!” Compreende-se tanto amor pela cruz sem o Divino Amor?
Sim. Onde há fogo do Divino Amor, é porque aí se queima o lenho da cruz!
24 DE JULHO
TOME A SUA CRUZ E ME SIGA
Somos chamados a subir o Gólgota, acompanhando o Mestre. “Tome a sua cruz e
me siga!” Felizes os que ouviram o convite honroso de Nosso Senhor e se
alistaram entre as almas generosas e reparadoras, sempre fiéis em seguir o
Esposo no caminho do Calvário. Conta-se que o Pe. João d’Ávila, santo homem
de Deus, ilustre filho da Companhia de Jesus, hesitava um dia em prosseguir
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uma caminhada difícil para assistir ao Santo Sacrifício da Missa. E, fatigado e
enfermo, já ia voltar, quando lhe apareceu Nosso Senhor e, mostrando-lhe a
chaga do Coração disse: “A fadiga, o sofrimento, meu filho, não me impediram de
chegar ao alto do Calvário!”
Que nenhum sofrimento nos afaste da via da cruz. É preciso sofrer! Vamos
corajosos até o Calvário! A cruz é pesada e o caminho áspero e difícil. Coragem!
Adiante vai Nosso Senhor com mais pesada Cruz!
“A fadiga e o sofrimento – diz Jesus ao seu servo – não me impediram de chegar
ao alto do Calvário.” Nada de covardia! Não fujamos, horrorizados, do Calvário,
como o fizeram os discípulos naquela triste noite da Paixão. Sejamos os Cirineus
de Jesus, pela nossa vida de reparação e de amor. Vamos! Um pouco mais de
generosidade! Sejamos para Jesus Crucificado, Maria, João e Madalena. Maria,pelo amor. João, pela fidelidade. Madalena, pelo arrependimento.
25 DE JULHO
O PURGATÓRIO DA TERRA
Podemos expiar nossos pecados aqui e pagar vantajosamente a nossa pena pela
penitência. E o sofrimento, suportado pacientemente, ajuda-nos a fazer o
purgatório neste mundo. Diz a Imitação de Cristo: “Aqui tem grande e saudável
purgatório o homem paciente, que, recebendo injúrias, mais se dói da maldade
do injuriador que da sua própria ofensa; que roga a Deus, sinceramente, por seus
inimigos, e de coração perdoa os agravos e, se alguém o ofendeu, não tarda em
pedir-lhe perdão; que mais facilmente se compadece do que se ira; que se faz
violência a si mesmo e trabalha por sujeitar de todo a carne ao espírito. Melhor é
purgar agora os pecados do que deixá-los para os purgar na outra vida”.5
Em outra passagem acrescenta o Autor: “Se disseres que não podes sofrer tanto,
como sofrerás o fogo do purgatório? De dois males se há de escolher o menor.
Para evitares, pois, os tormentos eternos, sofre por Deus, e de bom ânimo, os
males presentes”.6
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Ah! sim, para evitar um eterno e horroroso tormento, não havemos de querer
sofrer um pouco neste mundo? E o Purgatório? Já pensamos, já meditamos
seriamente na intensidade e no horror das suas penas? E podemos evitar o
Purgatório! Basta entrar na fornalha do Divino Amor e alimentar-lhe o fogo com
o lenho da cruz. As almas aqui abrasadas no Amor não sofrerão, por certo, o fogodo Purgatório, porque o Amor é doce Purgatório da terra!
26 DE JULHO
UM GRANDE SACRAMENTO
Quando Maria Antonieta seguiu o caminho do Patíbulo, disse, com muita fé e
resignação: “Vou receber um grande sacramento”.
Ela tinha razão. O sofrimento é, na verdade, um sacramento, que um santo
acrescentava aos sete (sacramentos) da Igreja. O oitavo Sacramento de amor e de
misericórdia! Quantas graças não nos traz do Céu! O que perdeu a graça a
encontra, muitas vezes, na dor. Quantos santos, em gozo da glória, estariam
talvez hoje no Inferno, se não tivessem sofrido, se a Divina Providência não os
houvesse ferido com a adversidade! Com os sacramentos, o sofrimento aumenta
a graça e nos enriquece de méritos para o Céu. Será mister prová-lo? Já não o vimos tantas vezes nestas páginas? O sofrimento é um batismo de regeneração, a
confirmação de nossa miséria, a penitência de nossos pecados, a Eucaristia do
Amor, a Unção dos enfermos, da Misericórdia, a Ordem que nos consagra
vítimas do Amor, o Matrimônio do Celeste Esposo.
Grande Sacramento! E não se pode entrar no Céu sem o receber. Não nos ordena
Jesus a penitência como necessária porta do Céu? “Se não fizeres penitência,
todos perecereis!” Vede o que nos diz o Evangelho sobre a necessidade daPenitência! Podemos salvar-nos sem penitência? E que é a penitência senão o
Sofrimento? Sem o primeiro e o oitavo sacramento, não entrará, quem pecou, no
Reino dos Céus!
27 DE JULHO
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PROSPERIDADE-CASTIGO
“Eu tremo – dizia Santo Ambrósio – quando vejo o pecador feliz.” É a
prosperidade castigo. O homem feliz na terra se esquece do Céu, materializa-se,
nada sabe. “Quem não sofre que é que pode saber?” – pergunta a Escritura. Osprazeres enervam e nos tornam incapazes de pensar nas coisas eternas. Diz São
Paulo, e com razão, que o homem animal não percebe as coisas espirituais. Falai
em Deus, alma e eternidade a um desses gozadores da vida. Ele não vos
entenderá.
Abnegação! Penitência! Espírito de sacrifício! Oh! é linguagem do Céu. Os
bárbaros não a compreendem. A prosperidade cegou muitos homens e nessa
cegueira se condenaram. “Considerai – diz São Jerônimo – que é grande a cólerade Deus quando não castiga os pecadores.” Temei a prosperidade orgulhosa e
infatuada. Os ricos e os grandes do mundo julgam-se dispensados de amar e
servir a Deus na humildade e no sacrifício. “Ai dos ricos – diz Nosso Senhor –
porque eles têm neste mundo a sua consolação.” Não vos lembrais da
prosperidade do rico epulão e da miséria de Lázaro? O rico foi sepultado no
Inferno, diz Nosso Senhor. Eis a desgraça da prosperidade. E Lázaro foi levado ao
seio de Abraão. Eis a recompensa da adversidade.
Não sejamos como os pagãos, que só na prosperidade é que acreditam na
proteção dos deuses. Para o cristão, a prosperidade pode ser e tantas vezes é, um
sinal bem certo de reprovação eterna, principalmente se ela subsiste com a vida
de pecado e de escândalos.
28 DE JULHO
A ESCOLA DOS SANTOS
A escola dos santos foi a escola da cruz. Não se encontrará um só que não tenha
passado por muitas e grandes tribulações para chegar à glória. E todos
abençoaram e amaram apaixonadamente a cruz. Os santos – diz a Imitação7 – e
amigos de Cristo serviram o Senhor em fome, em sede, em frio e nudez, em
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trabalhos e fadigas, em vigílias e jejuns, em orações e santas meditações, em
perseguições e muitos opróbrios. Oh! quantas e quão graves tribulações
padeciam os apóstolos, os mártires. os confessores, as virgens e todos os demais
que quiseram seguir as pisadas de Cristo! Pois aborreceram neste mundo suas
vidas para as possuírem na eternidade.8
A vida dos santos é um poema de Amor e de dor. “A cruz – diz São Francisco de
Sales – é a porta real para a entrada no templo da santidade.” Nenhum santo
aprendeu a amar noutra escola. São Paulo, mestre do Amor, foi também mestre
da cruz. Eis como se exprime: “Eu vos digo a verdade em Cristo e não minto,
exprimo o testemunho que dá minha consciência no Espírito Santo, e é que eu
experimento uma grande tristeza e uma dor contínua em meu coração”. Ah! sim,
a tristeza de São Paulo é a de todos os santos. Ver Deus ofendido e não amado,sentir o coração ferido de Amor e viver nas trevas de uma angustiosa aridez!
Contemplar o mundo no pecado e ver a Paixão de Jesus perpetuar-se, as almas
que se perdem, a indiferença dos bons!
Oh! se soubéssemos o que padece um santo, mesmo sem provações exteriores!
29 DE JULHO
SOFRER E PERDOAR
Como é doce a paciência dos santos! Sabem sofrer e sabem perdoar! Um homem
perverso e cruel atirou com violência uma pedra que foi ferir gravemente o santo
e pobrezinho São Bento Labre. Inclinou-se humildemente o santo, tomou a
pedra, beijou-a e colocou-a respeitosamente num muro do caminho. Prosseguiu
a viagem a rezar todo o tempo pelo seu agressor. Que doçura e paciência! Isto é
ser cristão, é ser verdadeiro discípulo de Jesus Cristo! Quando muitas pedras decontradições, palavras duras e injúrias nos forem atiradas, fiquemos tranquilos.
Oremos pelos que nos perseguirem. É um meio excelente para recuperar a calma
e dominar esses instintos de cólera e orgulho que não nos deixam em paz. Um
dia Santa Isabel recebeu uma afronta. A injúria a foi ferir no âmago do coração.
Sentiu-se perturbada e correu aos pés de Nosso Senhor. Fez violência ao coração
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e começou penosamente a rezar pelos que a insultaram, dizendo: “Meu Jesus,
dai aos que me insultaram um benefício, uma graça que corresponda a cada
injúria”. Quando assim rezava, Nosso Senhor lhe disse: “Nunca me fizeste
orações mais agradáveis e belas do que estas. Penetraram tuas súplicas até o
fundo de meu coração. Perdoo, minha filha, por isso, todos os pecados de todatua vida”. Tenhamos a doce certeza de que assim nos falará Nosso Senhor, se
soubermos, como Ele, sofrer e perdoar!
30 DE JULHO
SENHOR, VOS ME ENGANASTES!
“Deus – escreveu Lacordaire – ocultou no sofrimento um bálsamo reparador emisterioso”. A alegria de sofrer, que experimentaram os verdadeiros amigos de
Nosso Senhor, o mundo jamais será capaz de a entender.” Santa Teresa disse:
“Este sentimento, sentimento simultâneo de alegria e de dor, é uma alegria
apenas nascente, algo de incompreensível para mim. O prazer e a dor que sinto
ao mesmo tempo, são para mim um mistério”.9
São Francisco de Sales escreve admiravelmente sobre esse mistério de dor e
alegria na alma do justo: “Jesus Cristo sofre com quem por Ele sofre... Jesus tirados sofrimentos de seus amigos uma parte. Seu divino Amor faz achar doçura na
dor, semelhantemente a fontes de água doce que se encontrassem em pleno
oceano e às aragens frescas recebidas na fornalha pelos três meninos da
Babilônia. Quando se ama não se sofre, mas, se vem o sofrimento, é recebido
com amor”.10
Em cada amargura, em cada provação, uma gota de bálsamo suave e delicioso de
amor e de paz. Para quem ama a Jesus, a própria dor consola observa Santo Agostinho. Oh! doce mistério de amor e de misericórdia! Sofre-se o tormento, o
exílio, o castigo, a punição do pecado, goza-se desde já a recompensa, a paz, a
suavidade do Amor. Por isso é que um solitário, já no fim de uma vida austera,
dizia: “Senhor, Vós me enganastes! Julgava que, para Vos servir, era preciso
sofrer só e muito para Vós e, entretanto, que doçura e que paz! Vós me
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enganastes, Senhor!”
31 DE JULHO
MOMENTOS PRECIOSOS“Os momentos de sofrimento – diz Bossuet – são momentos preciosos.” É que,
no sofrimento, cumpre-se a Vontade de Deus. Só tem méritos para o Céu o que
fazemos dentro dos limites da Vontade Santíssima de Deus. Ora, se Deus nos
permite a enfermidade, aceitemo-la, assim como tudo o que Ele quiser, e
resignemo-nos. O autor da Imitação diz muitas vezes: “Não há outra esperança
nem outra redenção fora da cruz”. A cruz que nos enviou Nosso Senhor é
doença? Vamos carregá-la pacientemente ao Calvário. Enquanto sofremosestamos ganhando para o Céu e mais do que em tempo de prosperidade e saúde.
Na saúde, quanto trabalho, na aparência, para a glória de Deus, mas realmente,
por vanglória, por atividade natural e por questão de temperamento. Vem a
doença e nos afligimos tanto. Por quê? Por que nos queixamos então da
Providência? Oh! não havia bastante pureza de intenção em nossos trabalhos.
Não estávamos fazendo a vontade de Deus, mas sim a nossa. Todas essas
verdades se esclarecem numa séria meditação, feita num leito de enfermidade.
Sofrer é também trabalhar para Deus, é cumprir a Vontade do Senhor. “Uma
hora de sofrimento – dizia Santo Afonso vale mais do que todos os tesouros da
terra.” E o Pe. Ravignan: “Trabalhar é rezar, mas sofrer ainda é melhor”.
Momentos preciosos os da enfermidade! Se soubéssemos aproveitá-los! Que
riqueza para o Céu!
1 - De Civitate Dei - lib. 1 - ch. I.
2 - Rouzic. - “Douleur et résignation”.3 - Les sources de la paix intellectualle (As fontes da paz intelectual).
4 - Douleur et résignation - Rousic (Dor e resignação).
5 - Imitação de Cristo. Livro I - c. XXIV.
6 - Imitação de Cristo. livro III - c. XII v .2.
7 - São João 12,25.
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8 - Imitação - LXVIII. V - 1-2.
9 - Vida de Santa Teresa, por ela mesma, Caps. XXX e XXXV.
10 - Esprit doe Saint François de Salles - III - part. c. XLVIII.
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1 DE AGOSTO
DO PROVEITO DAS ADVERSIDADES (Imitaçãoc. XII)
Bom é que, de tempos em tempos, sucedam-nos coisas adversas e nos venham
trabalhos, porque fazem recolher o homem dentro do seu coração, para que,
conhecendo que vive em desterro, não ponha a sua esperança em coisa alguma
do mundo.
Bom é que padeçamos algumas vezes contradições e que os homens pensem mal
ou pouco favoravelmente de nós, ainda que façamos o bem e tenhamos boa
intenção. Estas coisas, de ordinário, ajudam-nos a sermos humildes e nosdefendem da vanglória. Porque então buscamos melhor a Deus por testemunha
interior, quando exteriormente somos desprezados pelos homens que pensam
mal de nós. Por isso deveria o homem firmar-se de tal modo em Deus que lhe
não fosse necessário buscar muitas consolações humanas. Quando o homem de
boa vida é atribulado, tentado ou combatido de maus pensamentos, então
conhece ter de Deus necessidade, experimentando que sem Ele não pode fazer
coisa boa. Então se entristece, geme e pede ao Senhor que o livre dos males deque padece.
Então sente que se lhe dilata a vida, deseja que se lhe apresse a morte, para ser
desatado das prisões do corpo e unir-se com Cristo. Então conhece que não há
nem pode haver no mundo perfeita segurança nem paz perfeita.
2 DE AGOSTO
COMO RESISTIR ÀS TENTAÇÕES (Imitação c.XIII – L.1)
Enquanto vivemos no mundo não podemos estar sem trabalhos e tentações. Por
isso está escrito no livro de Jó: “A vida do homem sobre a terra é uma contínua
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tentação”. Ninguém é tão santo e tão perfeito que não tenha, algumas vezes,
tentações, e não podemos viver sem elas. São, contudo as tentações utilíssimas
ao homem, posto que sejam importunas e pesadas; porque nelas é humilhado,
instruído e purificado. Todos os santos passaram por muitas tentações e
trabalhos, e foi assim que aproveitaram. E os que não quiserem sofrer e levarcom ânimo foram tidos por maus e desfaleceram no caminho da salvação. Não
há ordem tão santa nem lugar tão retirado onde não haja tentações e
adversidades. Nenhum homem está inteiramente livre de tentações enquanto
vive, porque em nós mesmos está a causa donde vêm elas, pois nascemos com a
inclinação ao pecado. Passada uma tentação ou tribulação, sobrevém outra, e
sempre teremos que sofrer, porque se perdeu o bem de nossa primeira felicidade.
Muitos querem fugir às tentações e caem nelas mais gravemente. Não as
podemos vencer só com fugir-lhes, mas com paciência e verdadeira humildade
nos fazemos mais fortes que nossos inimigos. O fogo prova o ferro e a tentação, o
usto. Nas tentações e adversidades se vê quanto cada um tem aproveitado, e
nelas consiste o maior merecimento e se conhece melhor a virtude. Não é muito
ser um homem devoto e fervoroso quando nada o penaliza; mas, se no tempo da
adversidade se mantém com paciência, dá esperanças de grande aproveitamento.
3 DE AGOSTO
DO SOFRIMENTO DOS DEFEITOS DOPRÓXIMO (Imitação – L. 1 – c. XVI)
O que o homem não pode emendar em si ou nos outros, deve sofrê-lo com
paciência, até que Deus ordene de outro modo. Considera que assim convém
melhor para tua provação e paciência, sem as quais não são dignos de muita
estimação os nossos merecimentos. Deves pedir a Deus que te ajude para quepossa vencer esses obstáculos ou sofrê-los com resignação. Estuda e aprende a
sofrer com paciência quaisquer defeitos e fraquezas alheias, pois tu também
fazes sofrer muito aos outros. Se todos fossem perfeitos, que teríamos então que
sofrer dos outros por amor de Deus? Porém, assim Deus o permite para que
aprendamos a relevar as faltas dos outros, porque ninguém há sem carga,
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ninguém sem defeito, ninguém é suficiente nem completamente sábio para si:
mas convém que uns e outros nos soframos, e nos consolemos, e
reciprocamente nos ajudemos com instruções e advertências. De quanta virtude
cada um é, melhor se manifesta na oração da adversidade. Porque as ocasiões
não fazem o homem fraco, porém, descobrem o que ele é. Ofendemo-nosfacilmente com os defeitos alheios e não trabalhamos por emendar os nossos.
Queremos que os outros sejam castigados com rigor e não queremos ser
repreendidos.
4 DE AGOSTO
SOLIDÃO E PAZ (Imitação – L. 1 – c. XX)
Oh! quem nunca buscara alegria transitória! Oh! quem nunca se ocupara do
mundo! Quão pura consciência teria! Oh! quem cortara todo vão cuidado e
somente tratara das coisas salutares e divinas e pusera em Deus toda sua
esperança! Que paz e sossego não lograria! Ninguém é digno de consolação
celestial se não se exercitar com diligência na santa compunção. Se queres
compungir-te de coração, entra em teu retiro e desterra de ti todo cuidado do
mundo, segundo está escrito: “Compungi-vos em vossos retiros”. Nele acharás o
que muitas vezes perdes fora. Para que queres ver o que te não é lícito possuir? –
Passa o mundo e sua concupiscência! Os desejos sensuais nos arrastam a
passatempo; mas, passada aquela hora, que te fica senão peso na consciência e
distração no coração? A saída alegre faz muitas vezes a volta triste, e a véspera
deleitosa prepara aflita manhã. E deste modo todo gosto carnal entra
suavemente, mas por fim atormenta e mata. Se visses diante de ti todas as coisas,
que seria isto senão uma visão fantástica? Levanta teus olhos a Deus nas alturas
e pede-Lhe perdão de teus pecados e negligências. Deixa aos vãos as coisas vãs etem cuidado do que Deus te ordena. Fecha-te em teu aposento e chama em teu
auxílio a teu amado Jesus. Vive com Ele na tua cela, que não acharás noutro
lugar tanta paz. Se não saísses fora nem ouvisses novidades, melhor
permanecerias em santa paz. Mas, por isso que folgas em ouvir, algumas vezes,
novidades, terás que sofrer desassossego de coração.
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5 DE AGOSTO
CONSIDERAÇÃO DAS MISÉRIAS HUMANAS(Imitação – c. XXII)
Miserável serás onde quer que estejas e para onde quer que te voltes, se não te
converteres a Deus. Por que te afliges se te não sucede o que queres e desejas?
Quem é que tem todas as coisas à medida dos seus desejos? Por certo, nem eu,
nem tu, nem homem algum sobre a terra. Ninguém vive no mundo sem alguma
tribulação ou angústia, ainda que seja rei ou papa. Pois quem é que está melhor?
Certamente o que pode padecer alguma coisa por amor de Deus. Dizem muitos
fracos e tíbios: “Olhai que bela vida leva aquele homem! Como é rico, nobre,poderoso, elevado!” Levanta, porém, o pensamento aos bens do Céu e verás que
todos os bens temporais nada são! Sempre incertos, são pesados, porque nunca
se possuem sem cuidado e temor. Não consiste a felicidade do homem em ter
abundância de bens temporais. Basta-lhe a mediania. Por certo é miséria grande
viver na terra. Quanto mais um homem quiser ser espiritual tanto mais amarga
se lhe fará a vida presente, pois melhor conhece e mais claramente os defeitos da
corrupção humana. Muito oprimido se sente o homem interior com as
necessidades corporais deste mundo. Mas ai dos que não conhecem esta miséria!
E, ainda mais ai dos que amam esta vida miserável e perecedora!
Ó loucos e duros de coração, os que tão profundamente jazem apegados à terra,
de que nada gostam senão das coisas carnais. Infelizes! Virá o dia em que verão,
muito à sua custa, quão vil e nada era tudo que amavam!
6 DE AGOSTO
TEMPO DE MERECER (Imitação – L. I – c. XX)
Quando estás atribulado e aflito, então é tempo de merecer. “Convém que passes
por fogo e por água antes que chegues ao lugar de descanso”, diz o salmista. Se
não te fizeres violência, não vencerás o vício. Enquanto estamos neste frágil
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corpo, não podemos estar sem pecado, nem viver sem fadiga e dor. De boa
vontade queríamos o descanso sem miséria alguma. Porém, com o pecado,
perdemos a inocência, perdemos também a verdadeira felicidade. Por isto nos
importa ter paciência e esperar a misericórdia de Deus “até que esta maldade se
acabe e seja destruída a mortalidade da vida”. Oh! quão grande é a fraquezahumana, que sempre está inclinada aos vícios! Com muita razão nos devemos
humilhar e não nos ter em grande conta, pois somos tão frágeis e tão
inconstantes. Depressa se perde, por descuido, o que, com muito trabalho,
dificultosamente se ganhou pela graça. Ai de nós se assim queremos buscar o
descanso, como se já tivéramos paz e segurança, quando em nossa vida não
aparece ainda sinal de verdadeira santidade! Bem necessário era ainda que
fôssemos instruídos outra vez, como dóceis noviços, nos bons costumes, se, por
ventura, houvesse esperança de alguma futura emenda e de maior
aproveitamento espiritual.
7 DE AGOSTO
SOFRER COM CRISTO E POR CRISTO PARAREINAR COM CRISTO (Imitação – c. I – Livro II)
Que vês no mundo que possa merecer teus afetos, não sendo ele o lugar de teu
descanso? O Céu deve ser tua morada e, como de passagem, hás de olhar as
coisas terrenas. Tudo acaba e tu, igualmente, virás a ter fim. Olha, não lhe cries
amor para que te não cativem e morras em suas prisões. No Altíssimo põe teu
pensamento, e tua oração, sem cessar, seja dirigida a Cristo Senhor Nosso. Se
não sabes contemplar as coisas celestiais, medita na Paixão do Salvador e habita
gostosamente em suas chagas sagradas. Se devotamente recorreres a esses
preciosos e sanguinolentos sinais de seu amor para conosco, sentirás ânimogrande na tribulação, não farás muito caso do desprezo dos homens e facilmente
sofrerás as palavras dos maldizentes. O mesmo Jesus Cristo foi também no
mundo desprezado dos homens e, no maior aperto, entre grandes afrontas,
desamparado de amigos e conhecidos. Esse Senhor quis padecer e ser
desprezado e tu, à vista de tanta paciência, ousas queixar-te de alguma coisa?
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Jesus Cristo teve inimigos e detratores; e tu queres que todos sejam teus amigos
e benfeitores? Como coroará Deus a tua paciência se, em nenhuma adversidade,
fores provado? Se nada queres sofrer, como serás amigo de Cristo? Sofre com
Cristo e por Cristo, se queres reinar com Cristo.
8 DE AGOSTO
DA HUMILDE SUBMISSÃO (Imitação – Livro II – c. II)
Não te importe muito saber quem é por ti ou contra ti; mas só deseja e procura
que Deus te ajude em tudo o que fizeres. Tem boa consciência e Deus te
defenderá, porque, a quem Deus quiser ajudar, nenhum mal lhe fará a malíciados homens. Se souberes calar e sofrer, sem dúvida verás o auxílio de Deus. Ele
sabe o tempo e o modo de te aliviar; entrega-te, pois, em suas Mãos. A Deus
pertence ajudar-te e aliviar-te de toda confusão. Algumas vezes convém muito,
para guardar maior humildade, que outros saibam e repreendam nossos defeitos.
Quando um homem se humilha por seus defeitos, abranda facilmente os outros
e sem dificuldade satisfaz aos que estão irados contra ele. Deus defende e livra o
humilde, ama-o e dá-lhe consolação, inclina-se para ele, concede-lhe graça e,depois do seu abatimento, levanta-o a grande honra. Ao humilde descobre os
seus segredos e o atrai docemente a si. O humilde, recebida a ofensa, fica em paz:
porque tem sua confiança em Deus e não no mundo. Não cuides que tens
aproveitado se te não avalias inferior a todos.
9 DE AGOSTO
DO HOMEM BOM E PACÍFICO (Imitação – c. III – Livro II)
Procura, para ti primeiro, a paz e depois poderás procurá-la para outros. O
homem pacífico é mais útil que o homem douto. O homem apaixonado até o bem
converte em mal e crê no mal com facilidade. Pelo contrário, o homem bom e
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pacífico todas as coisas leva em bem. Quem está em boa paz, de ninguém
suspeita mal; mas quem vive descontente e inquieto, com diversas suspeitas se
atormenta, nem vive em sossego, nem deixa sossegar os outros. Diz muitas vezes
o que não deveria dizer e deixa de fazer o que mais lhe conviria. Considera as
obrigações alheias e descuida-se de seus próprios deveres. Tem, pois,primeiramente zelo de ti, depois o terás justamente de teu próximo. Tu sabes
desculpar e dissimular bem as tuas faltas e não queres aceitar as desculpas
alheias. Mas justo fora que te acusasses a ti e desculpasses a teu irmão. Sofre os
outros, se queres que eles te sofram. Olha quão longe estás ainda da verdadeira
caridade e da humildade que se não sabe irar senão contra si. Não é ação de
avultado merecimento viver em paz com os bons e mansos. Isto a todos
naturalmente agrada, e cada um, de boa vontade, tem paz e ama os que
concordam com ele. Porém, viver em paz com os ásperos, perversos e de má
condição, ou com aqueles que nos contrariam e combatem, é grande graça e ação
varonil e louvável. Alguns há que têm paz consigo e com os outros. Outros há
que nem a têm consigo nem a deixam ter os demais. São molestos para os outros
e ainda o são mais para si mesmos. E há outros que têm paz consigo e trabalham
para dá-la aos outros.
10 DE AGOSTO
ALEGRIA DA BOA CONSCIÊNCIA (Imitação – Livro II – c. VI)
“A glória do homem virtuoso é o bom testemunho da sua consciência.” Tem boa
consciência e sempre terás alegria. A boa consciência é muito sofredora e
conserva-se alegre nas adversidades. A má consciência está sempre inquieta e
assustada. Gozarás de doce sossego se teu coração de nada te acusa. Não tealegres senão quando fizeres algum bem. Os maus nunca têm alegria verdadeira
nem sentem paz interior, porque disse o Senhor: “Não há paz para o ímpio”. E se
disserem: vivemos em sossego, nenhum mal nos acontece; quem se atreverá a
ofender-nos? Não lhes dês crédito; porque de repente se levantará contra ele a
ira de Deus e se reduzirão a nada suas obras e perecerão seus pensamentos. Não
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é dificultoso ao que ama gloriar-se na tribulação, porque gloriar-se desta sorte é
gloriar-se da cruz do Senhor. Pouco dura a glória que o homem dá e recebe. A
glória do mundo anda sempre acompanhada de tristeza. A glória dos bons está na
sua consciência e não na boca dos homens. A alegria dos justos é de Deus e em
Deus, e sua alegria vem da verdade. Quem deseja a verdadeira e eterna glória nãofaz caso da temporal. Quem a glória temporal procura ou a não despreza de
coração, sinal é que não ama a celestial. Grande sossego de coração tem aquele
que nada se lhe dá dos louvores nem das afrontas. Facilmente estará contente e
sossegado o que tem a consciência limpa. Não és mais santo porque te louvam,
nem mais ruim porque te vituperam. O que és, isso és, e por que te estimem os
homens não podes ser perante Deus maior do que és. Se atenderes ao que és no
teu interior, não se te dará do que te dizem os homens. “O homem vê no rosto e
Deus no coração.” O homem considera as obras e Deus pesa as intenções.
Trabalhar sempre bem e ter-se em pouca conta é o indício duma alma humilde.
11 DE AGOSTO
QUÃO POUCOS SÃO OS QUE AMAM A CRUZ DEJESUS CRISTO (Imitação – c. XI – Livro II)
Jesus Cristo tem agora muitos que amam o seu reino celestial, mas poucos que
levam a sua cruz. Muitos desejam sua consolação e muito poucos desejam a
tribulação. Muitos companheiros acha de sua mesa e poucos de sua abstinência.
Todos querem gozar de sua alegria, mas poucos querem sofrer alguma coisa por
Ele. Muitos seguem a Jesus até o partir do pão, porém poucos até o beber o cálice
da sua paixão. Muitos admiram seus milagres, mas poucos abraçam a ignomínia
da cruz. Muitos amam a Jesus quando não há adversidade. Muitos O louvam e
exaltam enquanto Dele recebem algumas consolações. Porém, se Jesus se lhesesconde e os deixa por algum tempo, logo se queixam ou demasiadamente
desanimam. Aqueles, porém, que amam a Jesus por amor de Jesus e não por
amor de sua própria consolação, tanto O louvam em toda tribulação e angústia de
coração como nas mais doces consolações. E, ainda que nunca mais se lhes
quisesse dar consolação, sempre O louvariam e Lhe dariam graças.
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Oh! quanto é poderoso o amor de Jesus, quanto é puro e sem mistura de
interesse e amor próprio! Não são, porventura, mercenários os que sempre
buscam consolações? Não se amam a si mais do que a Cristo os que de contínuo
pensam em seus proveitos e comodidades? Onde se achará algum homem que
queira servir a Deus de graça? Ainda entre pessoas espirituais raramente seencontra uma que viva inteiramente desapegada de tudo. Quem decobrirá, pois,
o verdadeiro pobre de espírito e desapegado de amor de todas as criaturas?
“Pérola preciosa que é preciso buscar nas extremidades da terra.”
12 DE AGOSTO
O CAMINHO REAL DA SANTA CRUZ (Imitação –
Livro II – c. XII)
A muitos parecem duras estas palavras do Salvador: “Renuncia a ti mesmo, toma
a tua cruz e segue-me”. Porém, muito mais duras parecerão aquelas que Ele
pronunciar no dia de Juízo: “Apartai-vos de Mim, malditos, ide para o fogo
eterno”. Os que agora ouvem e seguem de boa vontade a palavra da cruz, não
temerão então a sentença da eterna condenação. Este sinal da cruz aparecerá no
Céu quando o Senhor vier e julgar. Então todos os servos da cruz que seconformaram na vida com Cristo Crucificado se achegarão a Jesus Cristo Juiz
com grande confiança. Por que temes, pois, tomar a cruz pela qual se vai ao Céu?
Na cruz está a salvação e a vida, na cruz a proteção contra nossos inimigos. Da
cruz emanam as suavidades celestiais; na cruz está a fortaleza da alma, a alegria
do coração, o compêndio da virtude, a perfeição da santidade. Não há salvação da
alma nem esperança da vida eterna senão na cruz. Toma, pois, a tua cruz, segue a
Jesus e chegarás à vida eterna. Este Senhor foi adiante, levando às costas a sua
cruz e nela morreu por ti, para que tu leves também a tua e nela desejes morrer.Porque, se morreres com Ele, também com Ele viverás, e, se fores seu
companheiro no trabalho, o serás também na glória. Verdadeiramente, todo
negócio de nossa salvação consiste em amar a cruz e em morrer nela. Nem há
outro caminho para a vida e para a verdadeira paz do coração senão o da cruz e da
mortificação contínua. Vai aonde quiseres; não acharás caminho mais excelente
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para te elevares, nem mais seguro para te abateres, sem perigo de cair, que o da
santa cruz.
13 DE AGOSTO
LEVA TUA CRUZ DE BOA VONTADE! (Imitação – c. XII – v. 4 – Livro II)
Deus quer que aprendas a sofrer a tribulação sem alívio, sujeitando-te de todo a
Ele e fazendo-te mais humilde com a tribulação. Ninguém sente mais vivamente
a Paixão de Cristo que aquele que padece pelos semelhantes. Assim, sempre a
cruz está preparada e em qualquer lugar te espera. Para qualquer parte que vás,
não lhe podes fugir, porque, para onde quer que fores, levas a ti contigo e sempreacharás a ti mesmo. Ou te eleves ou te abaixes; ou te dês às coisas exteriores ou
às interiores, em tudo acharás cruz. E é necessário que sempre tenhas paciência,
se queres paz interior e merecer a coroa eterna. Se de boa vontade levares a cruz,
ela te levará e te guiará ao termo tão desejado, onde cessarás de sofrer, mas não
será neste mundo. Se de má vontade a levares, aumentar-lhe-ás o peso e mais
carregado irás. Pois, em todo caso, é forçoso que a leves. Se te eximires de uma
cruz, acharás certamente outra e, talvez, mais pesada. Pensas tu poder escapar aoque nenhum mortal pôde evitar? Que santo houve jamais neste mundo sem cruz
e sem tribulação? Nem ainda Jesus Cristo, Nosso Senhor, esteve, enquanto
viveu, uma hora sem padecer. Convinha – disse Ele mesmo – que Cristo
sofresse, que ressuscitasse dos mortos e assim entrasse em sua glória. Como,
pois, buscas tu outro caminho para entrar no Céu que não seja o caminho real da
santa cruz? Toda a vida de Cristo foi cruz e martírio; e tu queres que a tua seja
descanso e alegria?
14 DE AGOSTO
LEVAR A CRUZ E AMAR A CRUZ (Imitação – Livro II – c. XII – vs. 8-9-10-11)
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Quanto mais se debilita a carne pela aflição, tanto mais se fortalece o espírito pela
graça interior. E, às vezes, é tal o seu amor dos sofrimentos e tanto o desejo de
conformar-se a Jesus Cristo Crucificado, que não quer estar um só momento
sem dor e tribulação, pois crê ser tanto mais aceito a Deus quanto forem maiores
os trabalhos que por seu respeito puder sofrer. Não é isto virtude humana, senãograça de Jesus Cristo, que tão poderosamente faz tão grandes coisas na carne
frágil, fazendo-lhe que ame e sofra com afeto intenso aqueles mesmos males a
que naturalmente tem horror e aversão. Não há coisa mais contrária à inclinação
do homem que levar a cruz, amar a cruz, castigar o corpo e pô-lo em servidão,
fugir das honras, sofrer de bom grado as injúrias, desprezar-se a si mesmo e
desejar que o desprezem; suportar as aflições e desgraças e não desejar
prosperidade alguma neste mundo. Se consideras as tuas forças, acharás que
nada disto podes fazer. Porém, se confiares no Senhor do Céu, Ele te enviará
celestial fortaleza e terás poder sobre a carne e o mundo. Se te armares do escudo
da fé e do sinal da cruz de Jesus Cristo, nem o mesmo demônio temerás.
Resolve-te, pois, como bom e fiel servo de Jesus Cristo, a levar varonilmente a
cruz do Homem Deus crucificado por teu amor. Prepara-te para sofrer nesta
miserável vida muitas adversidades e vários incômodos, porque assim estará Ele
contigo onde quer que estiveres e, na verdade, acharás a Jesus em qualquer parte
que te escondas. Assim convém que seja e não há outro remédio para minorar ador e a tribulação dos males senão sofrê-las com resignação.
15 DE AGOSTO
O PARAÍSO NA TERRA (Imitação L. II – c. XII v.11)
Quando chegares ao estado em que a aflição te seja suave e gostosa por amor deJesus Cristo, dá-te então por feliz, porque achaste o paraíso na terra. Mas,
enquanto o padecer te for molesto e buscares evitá-la, crê que te vai mal, e onde
quer que fores, contigo irá a tribulação. Se te resolveres, como deves, a sofrer e
morrer, logo te irá melhor e acharás a paz. E, ainda quando fosses arrebatado,
como São Paulo, ao terceiro Céu, nem por isso estarias isento de padecer. “Eu lhe
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mostrarei – diz Jesus – quando convém que ele sofra por meu nome.” Não te
resta, pois, senão sofrer, se estás resolvido a amar e servir perpetuamente a
Jesus. Prouvera a Deus que fosses digno de padecer alguma coisa pelo nome de
Jesus! Que glória para ti! Que alegria para os santos de Deus! Que edificação para
o próximo! Todos recomendam a paciência, ainda que poucos queiram exercitá-la. Não deverias com razão padecer males por amor de Jesus Cristo, quando
tantos padecem males incomensuravelmente maiores por amor do mundo? Sabe
e tem por certo que tua vida deve ser uma contínua morte e quanto mais morre
cada um para si mesmo, tanto mais começa a viver para Deus. Só é capaz de
contemplar as coisas celestiais o que se resolve a sofrer adversidades por Cristo!
E, se te dessem a escolher, antes deverias desejar padecer trabalhos por amor de
Jesus Cristo que ser recreado com muitas consolações, porque assim serias
conforme ao Salvador e mais semelhante a todos os santos. Não consiste, pois,
nosso merecimento e a perfeição de nosso estado nas muitas suavidades e
consolações, mais sim no sofrimento dos males e tribulações.
16 DE AGOSTO
CONSOLAÇÃO E PERTURBAÇÕES (Imitação –
c. IX – Livro II)Quando Deus te der alguma consolação espiritual, receba-a agradecido,
reconhecendo que é dom de Deus e não merecimento teu. Com ela não te
desvaneças nem te alegres em excesso, nem presumas vãmente de ti, mas
humilha-te pelo dom recebido e sê mais acautelado e timorato em todas as tuas
obras, porque passará aquela hora de alegria e virá a tentação. Quando te for
tirada a consolação, não desesperes logo, mas espera com humildade e paciência
que volte esta alegria celeste, porque todo poderoso é Deus para dá-la de novo eainda maior que a precedente. Isto não é novo nem estranho para os que têm
experiência dos caminhos do Senhor. Os grandes santos e os antigos profetas
experimentaram muitas vezes esta alternativa de paz e de perturbação. Um deles,
David, sentindo a presença da graça, exclamava: – “Disse na minha abundância:
não serei abatido jamais”. Porém, vendo que a graça se ausentava dele,
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acrescentava: – “Apartastes de mim o vosso rosto e para logo fui conturbado”.
Nesta perturbação, porém, não desesperes, antes, com maior instância, roga ao
Senhor, dizendo: – “A Vós, Senhor, clamarei e ao meu Deus invocarei”. Por fim,
alcança o fruto da sua oração e dá testemunho de ter sido ouvido, dizendo: –
“Ouviu-me o Senhor e teve compaixão de mim, o Senhor declarou-se meuprotetor”. Mas em quê “Convertestes, diz, o meu pranto em gozo e cercastes-me
de alegria”. Ora, se Deus assim faz com os grandes santos, nós, fracos e pobres,
não devemos desconfiar por nos sentirmos já fervorosos, já tíbios, porque o
espírito de Deus vem e retira-se segundo lhe apraz? Por isso disse o bem-
aventurado Jó: – “Visitais o homem pela manhã e logo o provais”. Em quem
posso eu esperar ou em quem devo pôr minha confiança senão na infinita
misericórdia de Deus e na esperança da graça celestial? Não encontrei nunca um
homem tão devoto que alguma vez se não visse privado da consolação Divina ou
não sentisse diminuição de fervor. Nenhum santo foi tão altamente arrebatado e
da luz divina esclarecido, que antes ou depois, não fosse tentado. Não é, pois,
digno da alta contemplação de Deus quem por Ele não sofreu alguma tribulação.
17 DE AGOSTO
POR QUE BUSCAS DESCANSO? (Imitação – c. X – L. II)
Para que buscas descanso se nasceste para o trabalho? Dispõe-te à paciência,
mais do que à consolação, e a levar a cruz antes do que ter alegria. Que homem
mundano não receberia de boa vontade a consolação e alegria espiritual se delas
sempre pudesse gozar? As consolações espirituais excedem a todos os prazeres
do mundo e os deleites da carne. Porque todas as delícias do mundo ou são
torpes ou vãs, e só as espirituais são alegres e honestas, geradas pelas virtudes einfundidas por Deus nos corações puros. Mas ninguém pode lograr
continuamente estas consolações divinas à medida do seu desejo, porque breve é
o tempo em que não há tentação. Um grande obstáculo às consolações celestes é
a falsa liberdade da alma e a presunçosa confiança em si mesmo. Deus faz bem
ao homem dando-lhe a graça da consolação; o homem faz mal não atribuindo
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tudo a Deus e não Lhe dando graças. E, se em nós não abundam os dons da
graça, é porque somos ingratos a seu Autor, não Lhos atribuindo como à fonte de
todo o bem. Porque nunca recusa Deus a graça a quem dignamente é agradecido,
e nega ordinariamente ao soberbo o que costuma dar ao humilde. Não quero
consolação que me tire a compunção, nem contemplação que me faça cair emdesvanecimento. Pois nem tudo o que é elevado é santo, nem tudo o que é doce é
bom, nem todo desejo é puro, nem tudo o que nos agrada, agrada a Deus. De boa
mente aceito a graça que me faz humilde e timorato e que melhor me dispõe para
renunciar a mim mesmo. O homem instruído pela graça e escarmentado em tê-la
perdido, não ousará atribuir-se a si bem algum, antes se confessará pobre e sem
merecimento. Dá a Deus o que é de Deus e atribui a ti o que é teu; isto é, dá
graças a Deus pelos auxílios que te concede e só a ti atribui à culpa e reconhece
que, não havendo em ti senão pecado, nada te é devido senão a pena do pecado.
Põe-te, pois, no último lugar e alcançarás o primeiro, porque o que é mais alto se
apoia sobre o que é mais baixo.
18 DE AGOSTO
PACIÊNCIA E LUTA CONTRA AS PAIXÕES
(Imitação – c. XII – Livro III) A alma: Deus e Senhor meu, vejo quão necessária me é a paciência, porque nesta
vida acontecem muitas adversidades. Faça eu o que fizer para ter paz, nunca
minha vida estará sem batalha e sem dor.
Jesus Cristo: Assim é, filho meu, mas não quero que faças consistir a paz na
isenção de tentações ou em não encontrar coisa alguma que te aflija. Antes,
quando tiveres padecido muitas tribulações e experimentado muitas
adversidades, então crê que achaste a paz. Se disseres que não podes sofrer
tanto, como sofrerás o fogo do purgatório? De dois males sempre se há de
escolher o menor. Para evitares, pois, os tormentos eternos, sofre por Deus – e
de bom ânimo – os males presentes. Pensas tu que os mundanos têm pouco ou
nada que sofrer? Ainda os que vivem nas maiores delícias não estão livres de
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padecer. Dirás, talvez, que têm muitos divertimentos e seguem seus apetites e,
por isso, se lhes dá pouco de algumas tribulações. Seja, embora, assim e tenham
eles quanto desejam, dize-me quanto tempo lhes durará esta felicidade
imaginária? Olha que os mais ricos e abastados do século desaparecerão como o
fumo e não ficará memória de suas alegrias passadas. E, ainda enquanto vivem,não descansam sem amargura, sem aborrecimento e temor. Porque, da mesma
causa donde recebem deleites lhes vêm ordinariamente pena e dor. A minha
ustiça é que os castiga desta sorte. Já que, desordenadamente, buscam e seguem
os deleites, é bem que não os gozem sem confusão e sem amargura. Oh! quão
breves, quão falsos, quão desordenados e torpes são todos estes prazeres! Tu,
pois, meu filho, não sigas teus apetites e quebranta tua vontade, DELEITA-TE
NO SENHOR E ELE TE DARÁ O QUE PEDIR O TEU CORAÇÃO. Se, pois,
queres gozar uma verdadeira alegria e abundantes consolações, despreza todas
as coisas do mundo, corta todos os seus prazeres, e Eu te abençoarei e
derramarei em teu peito inefável doçura.
19 DE AGOSTO
SOFRIMENTO DAS INJÚRIAS E VERDADEIRA
PACIÊNCIA (Imitação – c. XIX – Livro III)Jesus: Que dizes, filho? Cessa de queixar-te, considerando minha paixão e os
sofrimentos dos santos. AINDA NÃO RESISTISTE ATÉ DERRAMAR SANGUE.
Pouco é o que padeces em comparação com o que padeceram meus servos, tão
fortemente tentados, provados e exercitados por tão diversos modos. Traze à
memória as mui graves penas por que passaram, para que facilmente sofras teus
pequenos trabalhos. E, se não te parecem pequenos, olha, não seja a tua
impaciência que os figure pesados. Sejam, porém, grandes ou pequenos, procuralevá-los todos com paciência. Quanto mais te dispuseres a sofrer, tanto mais
cordato serás e maior será teu merecimento. A firme resolução e o hábito de
sofrer te tornarão até mais suave o sofrimento. Nunca digas: “Não posso sofrer
isto, ou tal homem, nem devo aturar tais insultos. Injuriou-me gravemente e
levanta-me coisas que nem ao pensamento me vieram. Eu sofreria facilmente
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outras pessoas e outras ofensas que me fossem menos sensíveis”. Este discurso é
indiscreto e vão, pois nele não se considera o que é a virtude da paciência nem
quem há de recompensar; mas... a pessoa que ofende e a ofensa recebida. Não é
verdadeiro sofredor quem sofre só o que lhe parece. Quem possui a virtude da
paciência não olha se aquele que maltrata é superior, igualou inferior, se éhomem bom e santo ou perverso e indigno. Mas, indiferente para com as
criaturas, recebe todo o mal que lhe fazem como se viera das mãos de Deus e
ulga isto por uma causa de grande utilidade. Pois vive persuadido de que o mal,
por leve que seja, sofrido por amor de Deus, não pode ficar sem recompensa.
Prepara-te, pois, para a batalha, se queres conseguir a vitória. Sem peleja não
podes alcançar o prêmio da paciência. Se não queres padecer, não esperes ser
coroado, porém, se o desejas ser, peleja valorosamente e sofre com paciência.
Sem trabalho não se chega ao descanso, sem peleja não se consegue a vitória.
20 DE AGOSTO
TRIBULAÇÕES E MISÉRIAS (Imitação – c. XX – L. III)
Ai! Que vida esta, cercada, de todos os lados, de tribulações e misérias, onde tudoestá cheio de laços e de inimigos! Ainda uma tribulação ou tentação não é
passada já outra está conosco. Ainda não saímos de uma batalha, já outras
muitas estão sobre nós sem as esperarmos. E como se pode amar uma vida cheia
de tantas amarguras, sujeita a tantas calamidades e misérias? Como se pode até
chamar vida o que gera tantas dores e mortes? Contudo, muitos a amam e
trabalham para nela descobrir sua felicidade. Muitas vezes nos queixamos de que
o mundo é enganoso e vão, mas nem por isso o deixamos facilmente, porque os
apetites sensuais têm em nós grande domínio. Umas coisas nos inclinam a amaro mundo e outras a desprezá-lo. Inclinam-nos a amá-lo a sensualidade, a cobiça
e soberba da vida. Porém, as penas e misérias que seguem estas, causam-nos
tédio e aversão ao mundo. Mas ai! O deleite leva de vencida as almas dos que
estão entregues ao mundo e têm por gosto viver na escravidão dos sentidos,
porque não conhecem nem gostaram da suavidade de Deus, nem da beleza
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interior da virtude. Pelo contrário, os que desprezam perfeitamente o mundo e
trabalham por viver para Deus em santa vigilância, não ignoram a Divina doçura
que é concedida a quem deveras se renuncia a si mesmo, e conhece claramente
quão errado vai o mundo e quão perigosamente se engana quem o ama.
21 DE AGOSTO
PARA CONSERVAR A PAZ (Imitação – c. XXIII – Livro III)
Jesus Cristo: Filho, vou agora ensinar-te o caminho da paz e da verdadeira
felicidade.
Alma: Fazei-me, Senhor, esta graça, que me alegro muito de Vos ouvir.
Jesus Cristo: Procura, Filho, fazer antes a vontade de outrem que a tua.
Contenta-te com o pouco e estima sempre o último lugar e gosta de ser inferior a
todos. Deseja e pede sempre a Deus que se cumpra em ti inteiramente a Sua
Vontade. Quem assim faz, está no caminho da paz e do descanso.
Alma: Senhor, estes curtos preceitos que me dais encerram uma grande
perfeição. Contam poucas palavras, porém, estão cheias de sentido e de copiosofruto. Se eu fosse fiel em guardá-los, não entraria em mim tão facilmente a
perturbação. Porque todas as vezes que me acontece perder a paz e o sossego,
reconheço ter-me apartado destas máximas. Mas Vós, que podeis tudo e desejais
sempre o proveito das almas, aumentai em mim Vossa graça, para que,
obedecendo a Vossos preceitos possa alcançar a minha salvação.
22 DE AGOSTO
CONTRA A LÍNGUA DOS MURMURADORES(Imitação – c. XXVIII – Livro III)
Jesus Cristo: Filho, não te escandalizes se alguns tiverem má opinião e disserem
o que não quiseres ouvir. Tu deves pensar mais mal de ti e crer que és o mais
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imperfeito de todos os homens. Se andares recolhido dentre de ti, que te
importarão as palavras que o vento leva? Não é pouca prudência saber calar no
tempo adverso e voltar-se para mim de coração, sem se inquietar do que dirão os
homens. Não faças consistir a tua paz na boca dos homens. Se pensarem de ti
bem ou mal, não serás por isto homem diferente. Onde está a verdadeira paz e aglória verdadeira? Não é, porventura, em Mim? O que não deseja agradar aos
homens nem teme desagradar-lhes, esse gozará de muita paz.
Do amor desordenado e do vão temor nasce todo o desassossego do coração e
distração dos sentidos.
23 DE AGOSTO
COMO DEVEMOS INVOCAR A DEUS NATRIBULAÇÃO (Imitação – c. XXIV – Livro III)
Alma: Seja Vosso nome para sempre bendito, Senhor, pois quisestes provar-me
com esta tribulação. E, porque não posso evitá-la, que outra coisa farei senão
acolher-me a Vós, para que me auxilieis e a convertais em proveito meu? Senhor,
sinto-me atribulado, meu coração está desassossegado por causa desta paixão
que me atormenta vivamente. Que vos direi agora, ó Pai amantíssimo? Rodeadoestou de angústias. Salvai-me nesta hora! Vós permitistes que eu chegasse a este
aperto, para que sejais glorificado quando eu estiver muito abatido e for por Vós
livre. Dignai-Vos, Senhor, socorrer-me, porque, pobre criatura, que posso eu
fazer e onde irei sem Vós? Dai-me paciência, Senhor, ainda desta vez. Estendei-
me a Vossa Mão, Deus meu, e não temerei, por mais forte que seja a tribulação.
Que posso eu dizer-Vos neste estado? Senhor, faça-se a Vossa vontade! Bem
merecido tenho eu as angústias e tribulações em que me vejo. Convém que as
sofra e oxalá seja com paciência, até que passe a tempestade e venha a bonança.
Poderosa é a Vossa Mão onipotente para afastar de mim esta tentação e moderar
sua violência, para que não sucumba de todo, como tantas vezes tendes feito
para comigo, Deus meu, misericórdia minha. E, quanto mais para mim é
dificultosa esta mudança, tanto mais fácil é ela para Vós. PORQUE É OBRA DA
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DESTRA DO ALTÍSSIMO.
24 DE AGOSTO
NESTA VIDA NINGUÉM ESTÁ LIVRE DETENTAÇÕES (Imitação – c. XXXV – Livro III)
Jesus Cristo: Filho, nunca estarás seguro nesta vida, por isso, enquanto viveres,
sempre te serão necessárias as armas espirituais. Andas cercado de inimigos: à
direita e à esquerda te acometem, Se, pois, não te cobrires por todos os lados,
com o escudo da paciência, não estarás por muito tempo sem feridas. Além disto,
se teu coração não se fixar irrevogavelmente em Mim, com a firme vontade de
sofrer tudo por Meu Amor, não poderás aguentar tão renhida batalha nemalcançar a palma dos bem-aventurados. Convém-te, pois, arrostar varonilmente
todos os obstáculos e pelejar com muito esforço contra tudo o que se te opuser.
PORQUE O MANÁ SÓ É CONCEDIDO AO VENCEDOR; E AO PREGUIÇOSO
MUITA MISÉRIA O ESPERA. Se nesta vida buscas descanso, como chegarás
depois à bem-aventurança? Não esperes ter aqui muito descanso, mas arma-te
de paciência para sofrer tudo. Procura a verdadeira paz, não na terra, mas no
Céu; não nos homens, nem em criatura alguma, mas em Deus só. Pelo amor deDeus deves sofrer de bom grado todas as adversidades, como os trabalhos, dores,
tentações, vexames, angústias, perseguições, necessidades, doenças, injúrias,
maledicências, repreensões, censuras, humilhações, afrontas, desprezos e
vilipêndios. Estes são os degraus por onde se sobe à perfeição da virtude. Estes
são os exercícios do novo soldado de Cristo, estes os diamantes e as pérolas que
ornam a sua coroa celestial. Eu darei eterno galardão por breve trabalho e glória
infinita por contusão passageira. Os meus santos sofreram tudo com paciência e
confiaram mais em Deus que em si, porque sabiam que todos os sofrimentos da vida presente não têm proporção com a glória com que devem ser
recompensados no futuro.
25 DE AGOSTO
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CONTRA OS VÃOS JUÍZOS DOS HOMENS(Imitação – c. XXXVI – Livro III)
Jesus Cristo: Filho, põe o teu coração firme em Deus e não temas os juízos dos
homens quando a consciência te não acusa. Bom e ditoso é também padecerdesta sorte, e isto não é duro ao coração humilde que confia mais em Deus que
em si mesmo. A maior parte dos homens fala demasiadamente e por isso se deve
dar pouco crédito ao que diz. Além do que, não é possível contentar a todos.
Ainda que Paulo trabalhasse por agradar a todos no Senhor, FAZENDO-SE
TUDO PARA TODOS, nem por isso deixava de ser muito indiferente aos juízos
dos homens. Fez quanto estava de sua parte pela salvação dos outros, porém,
não pôde livrar-se de que os homens o julgassem, e por vezes o desprezassem.Por isso pôs tudo nas Mãos de Deus, que tudo conhece, e, com paciência e
humildade, defendia-se das más línguas, dos juízos temerários dos que
discorrem como sugere a paixão. Algumas vezes, porém, respondeu às acusações
para que seu silêncio não causasse escândalo aos fracos. Que tens tu que temer
de um homem mortal? Do homem que hoje está vivo e amanhã já não existe!
Teme a Deus e não temerás as ameaças dos homens. Que te pode fazer aquele
que te desonra com ameaças e injúrias? Mais dano faz a si mesmo que a ti e, seja
ele quem for, não poderá fugir do juízo de Deus. Põe os olhos em Deus e nãocontendas com queixas e disputas. E, se agora pareces sucumbir e sofrer
confusão que não mereceste, não murmures por isso, nem pela impaciência
diminuas a vitória. Levanta, antes, teus olhos ao Céu, para Mim, que sou
bastante poderoso para livrar do opróbrio e da injúria e PARA DAR A CADA UM
SEGUNDO SUAS OBRAS...
26 DE AGOSTO
SOFRER NA ESPERANÇA DOS BENS ETERNOS(Imitação – c. XLVII – Livro III)
Jesus Cristo: Filho, não esmoreças nos trabalhos que por Mim empreendeste,
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nem te desanimes com as tribulações, mas, em tudo que te acontecer, minhas
promessas te consolem e fortifiquem. Eu sou bastante poderoso para te dar uma
recompensa sem limites e sem medida. Os trabalhos que agora padeces não
serão dilatados, nem sempre viverás oprimido de dores. Espera um pouco e verás
quão depressa passam os males. Virá uma hora em que cessará todo o trabalho einquietação. Sempre é breve tudo o que passa com o tempo. Faze com cuidado o
que tens que fazer, trabalha fielmente na minha vinha, e Eu mesmo serei a tua
recompensa. Escreve, lê, canta, suspira, guarda silêncio, ora, sofre varonilmente
a adversidade: a vida eterna merece ser comprada por estas maiores pelejas. Virá
a paz um dia que o Senhor sabe, e não haverá mais noite nem dia, como na terra,
mas luz perpétua, claridade infinita, paz inalterável e descanso eterno. Não dirás
então: QUEM ME LIVRARÁ DESTE CORPO MORTAL? Nem clamarás: AI DE
MIM, QUE SE PROLONGOU O MEU DESTERRO. Porque a NOITE SERÁ
DESTRUÍDA e a salvação será eterna, não haverá angústia alguma, mas bem-
aventurada alegria, doçura da sociedade celeste e da formosura do Paraíso. Oh!
se visses as coroas imortais que meus santos possuem no Céu e a glória de que
gozam agora aqueles que neste mundo eram desprezados e tidos como indignos
da mesma vida! Certamente te humilharias até a terra e mais quererias obedecer
a todos que mandar a um só! E não desejarias os passatempos desta vida, mas
antes te alegrarias de ser atribulado por amor de Deus e terias por grandíssimolucro ser avaliado por nada entre os homens. Oh! Se gostasses destas verdades e
elas penetrassem até o fundo do teu coração, como ousarias queixar-te uma só
vez? Que coisa há tão penosa que não se deva fazer pela vida eterna? Será coisa
sem importância ganhar ou perder o reino de Deus?
27 DE AGOSTO
O CÉU E AS MISÉRIAS DESTA VIDA (Imitação – c. XLVIII – Livro III)
A alma: Ó bem-aventurada mansão da cidade celestial! Ó dia claríssimo da
eternidade, que nenhuma noite escurece, mas que sempre brilha com os raios da
soberana verdade! Dia sempre alegre, sempre seguro, cuja felicidade não terá
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mudança. Oh! quem me dera ver amanhecer este dia e passarem já as sombras
das coisas perecedoras! Este ditoso dia já luz para os santos com seu eterno
resplendor, porém, para nós, viajantes no deserto deste mundo, só de longe
vislumbra e, como entre sombras, nos aparece. Os cidadãos do Céu sabem quão
alegre seja aquele dia, mas os degradados filhos de Eva gemem de ver quãoamarga e fastidiosa seja a vida presente. Os dias deste mundo são poucos e maus,
cheios de dores e misérias. Neles o homem se mancha com muitos pecados,
molesta-se com muitos temores, ocupa-se com muitos cuidados, distrai-se com
muitas curiosidades e se embaraça com muitas vaidades, é cercado de erros,
quebrantado de trabalhos, perseguido de tentações, afeminado pelos prazeres,
atormentado pela pobreza. Oh! quando virá o fim de todos estes males? Quando
me lembrarei, Senhor, de Vós só? Quando me alegrarei plenamente em Vós?
Quando gozarei da verdadeira liberdade sem impedimento nem embaraço de
corpo e de espírito? Quando possuirei essa paz sólida, essa paz imperturbável e
segura, essa paz interior e exterior, paz de todo permanente e invariável? Ó bom
Jesus, quando me será dado vê-lo? Quando contemplarei a glória de vosso reino?
Quando me sereis tudo em todas as coisas? Quando estarei convosco no reino
que preparastes desde toda eternidade para os que Vos amam? Ai! Pobre e
desterrado me vejo em terra inimiga, onde há guerra contínua e grandes
infortúnios. Consolai o meu desterro, mitigai a dor de meu coração, que por Vóssuspira com todo o ardor de seus desejos. Todo prazer do mundo é para mim
penoso e tormentoso.
28 DE AGOSTO
ENTREGUE-SE NAS MÃOS DE DEUS OATRIBULADO (Imitação – c. L – Livro III)
A alma: Senhor, Deus Pai Santo, agora e para sempre sede bendito, porque se faz
como Vós quereis e é bom o que fazeis. Alegre-se o vosso servo em Vós, não em
si nem em algum outro, porque Vós só sois a verdadeira alegria, Vós só, Senhor,
sois a minha esperança, minha coroa, meu gozo e minha glória. Que tem o vosso
servo senão o que de Vós recebeu? E, ainda, sem o ter merecido! Tudo é vosso
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quanto me destes e por mim fizestes. Pobre sou e cheio de trabalhos desde a
minha infância. E minha alma se entristece algumas vezes por derramar
lágrimas, outras vezes se perturba consigo pelas paixões que a oprimem. Eu
desejo e suplico a alegria dessa paz que concedeis aos vossos filhos, a quem
alimentais com a luz de vossas consolações. Se Vós me derdes a paz, sederramardes em mim vossa santa alegria, ficará a alma de vosso servo cheia
duma doce melodia e, transportado de amor, cantará vossos louvores. Porém, se
Vos apartais dele, como muitas vezes fazeis, não poderá correr pelo caminho de
vossos mandamentos, só lhe restará pôr-se de joelhos e bater no peito, porque
não lhe vai como dantes, quando vossa luz resplandecia sobre sua cabeça e, à
sombra de vossas asas, se achava defendido da violência das tentações. Pai justo
e sempre digno de louvor, é chegada a hora em que o vosso servo deve ser
provado. Pai amoroso, justo é que vosso servo sofra alguma coisa, nesta hora,
por vosso amor. Pai soberanamente adorável, chegada é a hora que havíeis
previsto desde a eternidade, na qual cumpre que vosso servo seja abatido no
exterior por um pouco de tempo, para viver sempre Convosco espiritualmente. É
necessário que, por um pouco de tempo, seja abatido, humilhado, aniquilado
diante dos homens, consumido de sofrimentos e enfermidades, a fim de que
ressuscite convosco na aurora da nova luz e entre na posse da glória do Paraíso.
29 DE AGOSTO
QUANDO NOS DISSEREM PALAVRAS DEAFRONTAS (Imitação – c. XLVII)
Jesus Cristo: Filho, está firme e espera em mim. Que são as palavras dos homens
senão palavras? Ferem o ar, mas não ofendem a quem está firme e sólido como o
rochedo. Se, com efeito, és culpado, serve-te do que disserem contra ti para teemendares. Se a tua consciência de nada te acusa, lembra-te de que deves sofrer
com alegria esta ligeira pena, por amor de Deus. Bem é que sofras, às vezes ao
menos, más palavras, já que não podes sofrer mais pesados golpes. Por que
motivo tão ligeiras palavras te chegam ao coração, senão porque és ainda carnal e
demasiadamente te preocupas com os juízos dos homens? Porque temes ser
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desprezado, por isso não queres ser repreendido de tuas faltas e buscas escusas
para as ocultar. Examina melhor teu coração e acharás que ainda vive em ti o
amor do mundo e o desejo vão de agradar aos homens. Porque a repugnância
que tens em ser humilhado e confundido por tuas fraquezas prova que não tens
humildade sincera, que não estás verdadeiramente morto ao mundo e que omundo não está crucificado para ti.
Ouve as minhas palavras e não farás caso do que os homens disserem! Quando
eles disserem contra ti tudo quanto inventar a mais negra malícia, que dano
receberias destas injúrias se as desprezasses inteiramente como a palha que o
vento leva? Poderiam, porventura, fazer cair-te da cabeça um só cabelo? Quem
não anda recolhido interiormente e não traz a Deus diante dos olhos facilmente
se comove com a menor palavra que o ofende. Mas quem confia em Mim e nãose apega ao seu próprio parecer, não terá nada que temer dos homens. Porque
Eu sou o juiz e conheço todos os segredos do coração humano. Eu sei como as
coisas passam, eu conheço perfeitamente quem faz a injúria e quem a sofre. De
mim saiu esta palavra: EU PERMITI ESTE SUCESSO PARA QUE DESCUBRA O
QUE HÁ OCULTO EM MUITOS CORAÇÕES.
30 DE AGOSTO
O TESTEMUNHO DOS HOMENS E O DE DEUS(Imitação – c. XLVI – Livro III)
Jesus Cristo: O testemunho dos homens muitas vezes é falso, mas o meu Juízo é
sempre verdadeiro, ele subsistirá e não será revogado. A maior parte das vezes é
oculto e poucas pessoas descobrem suas particularidades, porém nunca erra,
nem pode errar, ainda que aos olhos dos néscios nem sempre pareça justo. A
Mim, pois, deves recorrer em todos os juízos que se formam sobre a terra e não
confiar no teu próprio. O justo não se turbará com qualquer coisa que lhe
aconteça por ordem de Deus. Pouco lhe importará que o acusem injustamente.
Nem se encherá de vanglória se outros o defenderem com razão, porque sabe
que Eu sou perscrutador dos corações e dos pensamentos e não julgo segundo o
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exterior e as aparências. O que parece louvável ao juízo dos homens muitas vezes
é criminoso aos meus Olhos.
A alma: Senhor, Deus, justo Juiz, forte e paciente que conheceis a fraqueza do
homem e sua propensão para o mal, sede minha fortaleza e toda a minha
confiança, pois basta que a minha consciência não me acuse. Vós conheceis em
mim ainda aquilo que eu não conheço e por isso devo humilhar-me todas as
vezes que sou repreendido e devo sofrer este tratamento com mansidão. Perdoai-
me, Senhor piedoso, as vezes que assim não procedi e dai-me a graça de um
maior sofrimento para o futuro. Porque mais confiança devo ter em Vossa
grande Misericórdia para alcançar o perdão do que em minha presumida virtude
ulgo ter para justificar o que a consciência mal conhece. Ainda que eu não tenha
nada de que me acuse, nem por isso devo julgar-me justificado, porque, se Vósulgardes com rigor e sem misericórdia, não se achará quem seja justo aos vossos
Olhos.
31 DE AGOSTO
NÃO DESANIMAR QUANDO CAI (Imitação)
Jesus Cristo: Filho, muito mais me agradam a humildade e a paciência nostrabalhos que muita devoção e fervor na prosperidade. Por que te entristeces
tanto com te imputarem alguma falta leve? Ainda que ela fosse grave, nem por
isso deverias inquietar-se. Deixa-a passar, porque não é a primeira, nem nova,
nem será a última, se continuares a viver. Por esforçado te deves ter se não caíres
em culpa grave. Aconselhas bem aos outros e sabes dar-lhes ânimo com
palavras, porém, quando vem à tua porta alguma repentina tribulação, logo te
falta conselho e valor. Considera tua grande fragilidade, que experimentas a cada
passo, em pequenas ocasiões, e, todavia Deus o permite assim para tua salvação.
Desterra de teu coração, quanto puderes, tudo o que perturba e, se a tribulação
chegar a te tocar, não permitas que te abata e que embarace por muito tempo o
teu espírito. Sofre, ao menos, com paciência, já que não podes sofrer com alegria.
Quando ouvires coisas que te não agradam e te sentires indignado, reprime-te e
não deixes sair de tua boca alguma palavra ofensiva, que escandalize os fracos.
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Em breve se aquietará o ímpeto excitado em teu coração e a dor interna se
adoçará com a volta da minha graça. Eu ainda vivo, diz o Senhor, e sempre
disposto a socorrer-te e consolar-te mais do que nunca, se puseres em Mim a tua
confiança e Me invocares com fervor. Toma ânimo e prepara-te para transes
maiores. Ainda que te vejas muitas vezes atribulado e gravemente tentado, nempor isso te julgues perdido. Homem és e não Deus, carne, e não anjo. Como
poderias tu estar sempre num mesmo estado de virtude, quando esta
perseverança faltou ao anjo, no Céu, e ao primeiro homem, no Paraíso? Eu sou
quem sustenta e livra aos que choram e faz subir à participação de minha
Divindade os que conhecem sua fraqueza.
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1 DE SETEMBRO
A FÉ NA VIA DA INFÂNCIA ESPIRITUAL
A primeira virtude teologal, na pequenina via da infância, tem o encanto e asimplicidade que caracterizam o espírito de Santa Teresinha. Essa virtude é a fé
pura, ardente e heroica: pura, simples e sem ilusões, como a da criancinha, que
crê sempre, sem hesitação, em tudo o que lhe dizem os pais; ardente, viva, capaz
de fazer dar o sangue e a vida por um só artigo de fé; e, sobretudo, heroica. As
tentações contra a fé constituem uma provação dolorosa, um verdadeiro
martírio. Como sofre a pobre alma que se vê submersa em tão horríveis trevas! O
anjo do Carmelo experimentou essas angústias durante longos anos. A cadatentação, respondia ela com um ato de fé, podendo-se avaliar o que sofreu pelo
seguinte, que deixou escrito na História de uma Alma: “Pronunciei mais atos de
fé no espaço de um ano do que em toda a minha vida passada”. Ocorriam-lhe os
pensamentos mais grosseiros e do mais estúpido materialismo. O Céu lhe parecia
fechado em trevas. Eis como ela nos ensina a combatê-los1: “A cada nova ocasião
de combate, quando o inimigo me quer provocar, procedo com valor. Como sei
que o duelo é uma covardia, não enfrento o adversário, dou-lhe sempre as costas
e corro, pressurosa para Jesus, a assegurar-Lhe que estou pronta a derramartodo o meu sangue pela afirmação de que há um Céu, a dizer-Lhe que me
considero feliz por me ser dado contemplar, desde esta terra, com os olhos da
alma, esse mesmo Céu, tão belo, que me espera, a fim de que se sirva ELE
franqueá-lo, por toda eternidade, aos pobres pecadores”. Amar a Nosso Senhor,
amá-Lo da profundeza da alma, e sentir-se nas trevas de horríveis tentações
contra a fé, privado de todo consolo, vivendo num deserto de aridez cruciante, –
tal foi o martírio de Santa Teresinha, que tanto consola as almas provadas na fé“É tão doce – dizia ela2 – servir ao bom Deus, na noite e na prova! Só temos esta
vida para viver de fé!” Se a fé só existe nesta vida, por que não há de ser provada
para que se torne mais firme e cheia de méritos?
2 DE SETEMBRO
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A HUMILDADE NA VIA DA INFÂNCIAESPIRITUAL
Dizia Santa Teresa que a humildade consiste na verdade. E a santa de Lisieux
pôde confessar3: – “Parece-me que a humildade é a verdade. Não, sei se souhumilde, mas vejo a verdade em todas as coisas”. É uma graça – e das maiores –
ver em todas as coisas a verdade, banir as ilusões do amor próprio, conhecer-se a
si mesmo e a Deus. Por isso rogava Santo Agostinho ao Senhor: – “Senhor, que
eu me conheça e Vos conheça”. Disse Mgr. Gay que nada mata o orgulho como o
espírito de infância. Fazer-se criancinha, e criancinha humilde, fraca, escondida e
tímida; julgar-se incapaz de dar um passo firme sem o apoio de um braço
estranho; retrair-se; não desejar aparecer, nem brilhar, ah! bem poucoscompreendem toda essa simplicidade na vida espiritual. – “O que em minha alma
agrada ao bom Deus – escreve Santa Teresinha4 – é ver o amor que tenho à
minha pequenez e à minha pobreza, é a minha esperança cega em Sua
Misericórdia.” Muita gente sofre quando considera sua fraqueza e miséria. Pois,
na via da infância, quem se vê miserável e muito necessitado de misericórdia,
chega até a se alegrar! – “De nada mais me admiro, diz a santinha5, nem me aflijo
por ver que sou a própria fraqueza; pelo contrário, dela me glorifico e espero cada
dia descobrir em mim novas imperfeições. Confesso que as luzes sobre o meunada me fazem maior bem do que as luzes sobre a fé”. A humildade não consiste
nos belos pensamentos sobre a virtude, nem em nos confessarmos perante os
homens, mas em certa disposição do coração, que se julga sempre pequenino
diante de Deus; em ser como uma criancinha incapaz de tudo; em ver, conhecer
e amar a sua pequenez e pobreza a, por isso mesmo, não desanimar, mas
abandonar-se, cegamente, nos braços da Misericórdia!
3 DE SETEMBRO
QUE É SE FAZER PEQUENINO?
As noviças do Mosteiro de Lisieux, ouvindo Santa Teresinha falar sempre no seu
pequenino caminho da infância espiritual, perguntaram-lhe um dia: – “Que é
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preciso fazer para se ter o espírito de infância? Que é se fazer pequenino, ficar
pequenino?” Responde a santa6: – “Ficar pequeno é reconhecer o próprio nada,
tudo esperar de Deus, não se afligir com as suas faltas, porque as criancinhas, se
caem muitas vezes, por serem pequenas, pouco se molestam; é desprender-se da
riqueza e com coisa alguma se inquietar. Entre os pobres, o pai dá ao filho,enquanto, pequeno tudo que lhe é necessário, mas, quando este cresce, não quer
mais sustentar e lhe diz: – Já te podes manter agora com teu trabalho. Pois bem,
é para não ouvir essa linguagem que não quero crescer, de modo a me julgar
sempre incapaz de ganhar a minha vida eterna! Ficar pequeno é, ainda, não se
atribuir o mérito das virtudes praticadas, mas reconhecê-Ias como retiradas de
um tesouro posto por Deus nas mãos de seu filhinho, para dele se utilizar
quando tiver necessidade”. Como isso simplifica a vida espiritual, evitando
complicações desesperadoras e angústias, nas quais se debatem tantas pobres
almas, sequiosas de perfeição, mas amedrontadas com o rigor da Eterna Justiça.
Não nos ordena Nosso Senhor que nos façamos pequenos para entrar no Reino
dos Céus? E uma criancinha pode ter medo de um Pai tão Misericordioso? Ah!
matemos esse orgulho de julgar-nos sempre grandes e que, até na prática da
virtude, infiltra-se com sutileza, fazendo com que nos julguemos capazes de
muito, ou já adiantados, quando somos, na realidade, ainda tão pobres e
miseráveis! Façamo-nos pequeninos, bem criancinhas, humildes, pobres,abandonados à Misericórdia Divina! É tão bom ser pequeno e humilde! Como se
inunda o coração de paz quando se vive assim, como criancinha, na vida
espiritual!
4 DE SETEMBRO
NUNCA É DEMAIS A CONFIANÇA!
Nunca – dizia Santa Teresinha – nunca é demais a confiança no bom Deus, tão
poderoso e tão misericordioso! Que belas consoladoras palavras da incomparável
missionária da confiança! Sim, a confiança na Misericórdia Divina nunca é
demais. Pode-se limitar o que não tem limites, o que é infinito? Para nos incutir
confiança, Nosso Senhor se fez menino, em Belém, nosso irmão, nosso amigo.
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Pregou na Judeia, comparando-se ao bom pastor e ao bom samaritano
acariciando as criancinhas, comendo e bebendo com os pecadores. Deixou-se
ficar reduzido, aniquilado, sob as espécies Eucarísticas, no Cenáculo, e morreu,
pregado a uma cruz, perdoando e amando. E, depois disso, encontram-se ainda
almas desesperadas da sua salvação!... Não se compreende como se possa termedo de um Pai tão misericordioso e terno! Essa desconfiança fere e ofende
tanto o coração de Jesus! “Ó Jesus – escreve Santa Teresinha7 – deixai-me dizer
que vosso amor vai até a loucura. Como queres que meu coração não se atire
para Vós? Como poderá ter limites a minha confiança?” Por que temer? A um
missionário, seu irmão espiritual, escrevia a santinha8: – “Desde que me foi dado
compreender o amor do Coração de Jesus, confesso que expulsei todo temor de
meu coração! A lembrança de minhas faltas me humilha e me leva a, não me
apoiar em minha força, que é fraqueza; porém, mais do que isso, ela me fala, da
misericórdia e do amor. Pois as faltas, quando lançadas com confiança no
braseiro devorante do Amor, não serão sem demora consumidas?”
Almas tímidas e desconfiadas, se com sinceridade vos quereis dar à emenda de
vossa vida, bani de vossos corações todo esse medo de Deus, que vos acabrunha,
e abri as asas da confiança. Voai sem receio na amplidão infinita do céu do Amor!
Amor e confiança! E nada mais vos será necessário!
5 DE SETEMBRO
SOFRER E AMAR
Sofrer e amar!... É o que tem valor neste mundo. Nada mais subsiste fora disto.
No sofrimento se ama, e o amor é tudo. São João da Cruz disse: – “Sem o amor
nada são todas as obras reunidas”. E o amor só se encontra na cruz. “O
sofrimento unido ao amor, escreve Santa Teresinha9, é a única coisa que me
parece desejável neste vale de lágrimas”.
Para consolo das almas na vida da infância, escreve a santa a uma de suas irmãs 10
– “Não acreditemos que se encontre o amor sem o sofrimento. Isso é peculiar à
nossa natureza. Mas que tesouros nos faz adquirir o sofrimento! É o nosso
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ganha-pão, e de tal modo precioso, que Jesus desceu à terra para possuí-lo.
Quiséramos sofrer generosamente, imensamente; quiséramos não cair nunca.
Que ilusão! Mas que me importa cair a todo instante. Sinto a minha fraqueza e
tiro daí grande proveito. Meu Deus, vede o que posso eu fazer se não me tomais
em Vossos braços Se entretanto me deixais só, ah! é que Vos apraz ver-mederrubada, e, então, por que me inquietar?”
A natureza rebelde e sedenta de prazer repugna o sofrimento, contra ele se
insurge, sendo um tormento a luta que dentro de nós se trava. O amor, porém,
tudo vence e, dominada a natureza rebelde, resplandece no coração, dissipando
as trevas do medo e do horror à cruz. Como sabemos, não se ama sem sofrer nem
se sofre bem sem amar. Na via da infância, é ilusão amar sem sofrer. Mas que
alegria sofrer por Jesus! “Haverá alegria maior, diz a santinha, do que sofrer por Vosso amor? Quanto mais intenso é o sofrimento e menos aparece aos olhos das
Criaturas, tanto mais ele Vos faz sorrir, ó meu Deus!”11
6 DE SETEMBRO
SACRIFÍCIO E RECOMPENSA
É tão pequeno o sacrifício e tão grande a recompensa! Uma felicidade eternadeveria custar – se isso fosse possível – um trabalho eterno. Entretanto, Nosso
Senhor só nos pede um pouco de sacrifício, e este mesmo aligeirado no seu peso
pelo amor! Ó misericórdia infinita! Era considerando essas verdades que o
Apóstolo das gentes, apaixonado pela cruz, não achava bastante todo sofrimento
pela glória eterna. “Ao ver as recompensas eternas em tamanha desproporção
com os ligeiros sacrifícios desta vida – escreve Santa Terezinha – quisera amar a
Jesus, amá-Lo apaixonadamente, e dar-Lhe mil provas de minha ternura,
enquanto me era dado fazê-lo.”12
Todo sacrifício é pouco na conquista do Céu! E, se nesta vida, já é tão doce amar
sofrendo, que não será então, na glória, amar o Amor? A vida passa e a
eternidade se aproxima. Logo veremos a Deus e viveremos a verdadeira vida.
Depois das amarguras deste mundo, mitigaremos a nossa sede ardente de
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felicidade na fonte eterna da doçura. “Sim, minha irmã – escrevia Santa
Teresinha a Celina13 – a imagem deste mundo passa e não tardará que vejamos
novos céus, um sol mais brilhante e esplendoroso, mares eternos e horizontes
infinitos. Não seremos mais prisioneiros numa terra de exílio. Tudo se acabará!”
Ó meu Deus! Tão grande, a eterna recompensa, não será ainda bastante para tãopequeno sacrifício?! Oh! Sejamos um pouco mais generosos e não nos
queixemos tanto na dor!
7 DE SETEMBRO
QUE É O REINO DO AMOR?
O reino do Amor é o Céu, é a pátria querida de nosso coração, ora exilado, triste esaudoso neste vale de lágrimas. A nossa Santinha o descreve com intuição genial
das coisas celestes. “Lá – diz Santa Teresinha14 – não encontraremos olhares
indiferentes nem invejosos, porque a felicidade de cada um será a de todos. Entre
os mártires nos assemelharemos aos mártires; entre os doutores, aos doutores;
entre as virgens, às virgens. Assim como numa família, todos, sem inveja,
confiam uns aos outros, assim nos haveremos no Céu com os nossos irmãos.
Julgais que os grandes santos, conhecendo quanto devem às almas pequeninas,
ao vê-las no Céu não as amarão com um amor sem igual? Haverá lá, certamente,
muitas simpatias deliciosas e surpreendentes. O privilegiado de um apóstolo, de
um grande doutor, será talvez um pequenino selvagem; o amigo íntimo de um
patriarca, uma simples criancinha. Oh! como eu quisera estar nesse reino de
amor.”
Ah! Mas como, para a conquista desse reino do Amor, é preciso sofrer e chorar!
Coragem! Tudo passa depressa neste mundo. Amemos o Amor e soframos pelo
Amor. “Como tenho sede dessa mansão bem-aventurada! – escrevia Santa
Teresinha à Madre Maria do Sagrado Coração, sua irmã15 – Mas... é preciso
sofrer e chorar para se chegar lá. Pois bem, quero sofrer tudo quanto aprouver ao
meu Bem-Amado. Quero deixar que Ele faça o que quiser da sua bolinha.” Para
diante, pois! Coragem! Confiança! Abandono! É tudo tão pouco pela conquista
do Reino Eterno, do Eterno Amor!
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9 DE SETEMBRO
COMO A GALINHA E OS PINTAINHOS...
Que ternura da Misericórdia do Coração de Jesus! Compara-se à galinha,acolhendo amorosamente os pintinhos sob as asas! Quando viu a ingratidão de
Jerusalém, chorou. E lembrou-se um dia do quanto fizera para salvá-la!
“Jerusalém! Jerusalém! Quantas vezes quis Eu ajuntar teus filhos, como a
galinha ajunta os seus pintainhos sob as asas; e não quiseste”. Observai bem a
solicitude, o carinho e tudo quanto faz uma galinha aos seus pintinhos. E não é
para chorar de amor e reconhecimento, sabermos que assim nos trata a
Misericórdia de Nosso Senhor? Santa Teresinha, já nos seus últimos dias,passeava, muito enfraquecida, pelo jardim do Mosteiro, encostada a uma de suas
irmãs. De repente parou a contemplar a cena encantadora de uma galinha
branca, abrigando, sob as asas, seus pintainhos. Encheram-se de lágrimas os
olhos da santinha, que, voltando-se para a irmã, disse: – “Entremos logo, minha
irmã, não posso ficar mais aqui”. E chorou, por muito tempo, na cela, sem poder
articular uma sílaba. Olhando, afinal, para a irmã, com expressão toda celestial
assim continuou: – “Eu pensava em Nosso Senhor, minha irmã, naquela amável
comparação de que Ele se serviu para nos fazer crer na sua ternura. Quanto fezEle por mim em toda a minha vida! Ocultou-me inteiramente sob suas asas! Não
posso dizer o que se passou no meu coração! Ah! O bom Deus faz muito bem em
se ocultar aos meus olhares e me mostrar raras vezes como que os efeitos da Sua
misericórdia! Sinto que eu não poderia suportar doçura tamanha!”17
Olhemos um pouco para a nossa vida! Quanta misericórdia e amor de Jesus no
gesto de nos querer abrigar sob suas asas!
Jerusalém ingrata de minha alma, converte-te e chora de arrependimento e de
amor!
10 DE SETEMBRO
O SOFRIMENTO, CÉU DA TERRA
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médico, tropeçando numa pedra que encontra em seu caminho, caia, fraturando,
por exemplo, uma perna. Vem prontamente o pai, levanta-o com amor, trata com
cuidado o ferimento, empregando todos os recursos da cirurgia. Em pouco
tempo, o paciente, completamente curado, manifesta ao pai o seu
reconhecimento. Indubitavelmente, esse filho tem muita razão de amar o pai!Outra suposição. O pai, prevenido da existência de uma pedra no caminho do
filho, adianta-se a este e a retira sem ter sido visto por ninguém. Decerto esse
filho, objeto de tão previdente ternura, ignorando a desgraça de que o preservou
a mão paterna, não testemunhará reconhecimento algum ao pai, e não o ficará
amando tanto como se lhe devesse a cura de um ferimento mortal. Mas não
passará a amá-lo mais, se de tudo vier a saber? Pois bem, eu sou esse filho,
objeto do amor previdente de um Pai que não enviou seu Verbo para resgatar os
ustos, mas os pecadores. Ele quer que eu O ame porque me perdoou, não muito,
mas tudo. Sem esperar que eu O ame tanto quanto Santa Madalena, faz-me
saber como me tinha amado com um amor de inefável providência, a fim de que
agora O ame eu até a loucura.”
Em toda a nossa vida, esse Amor atua, curando-nos as feridas do coração, ou,
cheio de prudente desvelo, afastando de nossos caminhos todo perigo, todo
tropeço, todo abismo!
Ó Amor de inefável providência!
12 DE SETEMBRO
PAI MISERICORDIOSO
Diz o Apóstolo que ninguém é tão pai como Deus. Que bela e consoladora
expressão! “Ninguém é tão pai!” E pai Misericordioso! Para obter a misericórdia émister uma só coisa: ter confiança ilimitada. No Pai Nosso Jesus nos ordena que
chamemos pai a Deus. Embora numa desoladora e cruel aridez, Santa Teresinha
rezava sempre. Uma noviça, entrando-lhe um dia na cela, sentiu-se arrebatada
com a expressão toda celestial do rosto da santinha. Esta costurava com certa
atividade, parecendo, entretanto, toda perdida numa contemplação profunda.
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Perguntando-lhe a irmã em que estava a pensar, respondeu-lhe: – “Estou
meditando o Pai Nosso. Consola tanto chamar a Deus de NOSSO PAI!”20. E lhe
tremeluziam lágrimas nos olhos. Se nosso Deus é Pai, por que O tratar como juiz
severo e duro? Por que O tratar como carrasco? Depois das faltas, principalmente
depois de nossas quedas, precisamos abrir o coração à confiança filial e voltarpara o Pai, com o arrependimento e propósito do Filho Pródigo. Santa Teresinha
escreve: – “Um pai tem dois filhos peraltas e desobedientes. Indo castigá-los,
foge-lhe um, tremendo e cheio de terror, ao passo que o outro se lhe atira nos
braços, arrependido, prometendo tornar-se bom, emendar-se e pedindo-lhe que
o castigue com um beijo. Seria possível resistir esse pai feliz à confiança, filial da
criança? Bem sabe ele que o filho há de reincidir nas suas faltas, mas a sua
disposição é para perdoá-lo sempre e assim o tomar pelo coração. Nada digo a
respeito do outro filho, mas é dever que seu pai não poderá amá-lo e tratá-lo com
a mesma indulgência que ao irmão.21
Deus é Pai! Como este pensamento nos abre o coração e o enche de confiança!
13 DE SETEMBRO
ATÉ ONDE VAI MINHA ESPERANÇA!
Quando a alma chega à perfeição do abandono, desse abandono filial e heroico
da via da infância espiritual, não há mais desânimo possível, ainda que as
provações cheguem ao extremo do martírio mais cruel. Santa Teresinha, no meio
dos horrorosos sofrimentos dos seus últimos dias, pedia às suas irmãzinhas:
“Rezai por mim... Quando suplico ao Céu que venha em meu auxílio, é que me
sinto mais desamparada”. E como faz para não desanimar nesse desamparo?
perguntaram-lhe. Volto-me para o bom Deus e todos os santos e ainda lhes
agradeço. Creio que eles querem ver até onde vai chegar minha esperança”. Oh!
não foi em vão que me entraram no coração estas palavras de Jó22: Mesmo que o
Senhor me matasse, eu esperaria ainda Nele”. Confiança heroica! Não
desanimemos quando, após tantos sofrimentos, promessas e penitências, parece
fechado o Céu às nossas súplicas e sentimos, cada vez mais, a impressão do
desamparo. A provação é dura... Faça Nosso Senhor de nós o que quiser! Ele
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MÃE DAS LÁGRIMAS
Diz o canto litúrgico que aos pés da cruz estava a MÃE DOLOROSA. Lágrimas
benditas de Maria! Lágrimas redentoras, que, com o sangue de Jesus, livraram-
nos da culpa e nos abriram as portas do Céu! Quanto é bela a suave invocação deNOSSA SENHORA DAS DORES! Consola saber que Jesus e Maria choraram
como choramos nós, pobres mortais, neste mundo de exilados. Hoje nos convida
a Santa Igreja a honrar as dores de Maria, Mãe querida, aos pés da cruz,
lacrimosa. Jesus sofreu no corpo, e Maria, no coração. Enquanto das feridas
abertas do Redentor corria o sangue que nos remiu, dos angustiosos olhos de
Maria jorravam lágrimas, sangue do coração, essas pérolas riquíssimas e
preciosas que nos foram dadas como penhor de salvação eterna. Sangue de Jesus
e lágrimas de Maria, sois nosso tesouro, nossa vida, nossa redenção! Digamos as
aculatórias que são mais caras a Nossa Senhora: “Jesus, ouvi nossas preces!
Pelas lágrimas de Vossa Mãe Santíssima!” Que nos poderá negar o mais Santo e
Amoroso dos Filhos quando lhe apresentamos a nossa súplica invocando o que
há de mais precioso e santo, as lágrimas de Sua Mãe Maria Santíssima? Quando
nos fizer chorar a vida triste, amarga e penosa, olhemos para o Céu ou, melhor,
dirijamo-nos ao Calvário e, aos pés de Jesus Crucificado, digamos, cheios de
amor, desabafando o coração: “Vede Jesus, que são as lágrimas Daquela quemais Vos amou na terra e mais Vos ama no Céu! Sangue de Jesus, lavai-nos da
culpa! Lágrimas de Maria, alcançai-nos perdão e misericórdia!”
16 DE SETEMBRO
ALAVANCA DO MUNDO
A alavanca do mundo é a oração, a oração confiante. Disse um sábio: “Dai-meum ponto de apoio e levantarei o mundo”. O que Arquimedes não pôde alcançar,
foi plenamente alcançado pelos santos. O Todo Poderoso lhes deu um ponto de
apoio: Ele próprio, e só Ele. Por alavanca, deu-lhes a oração, abrasada no fogo do
Amor. E, assim providos, eles conseguiram levantar o mundo, do mesmo modo
que os santos militantes o levantam hoje e continuarão a levantá-lo até a
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consumação dos séculos”.23 Tenhamos confiança, porque só a confiança, e mais
nada senão ela nos levará ao Amor. Rezemos depois e peçamos o que quisermos,
procurando, para a alavanca da oração, o ponto de apoio único, forte, inabalável,
onipotente, eterno: o Coração de Jesus, esse Coração que só respira amor e
confiança. Digamos sempre como jaculatória predileta: “Sagrado Coração deJesus, tenho confiança em Vós!” A oração confiante faz milagres. Não só levanta,
mas cria novos mundos da graça e do amor. Quantas vezes repetiu Nosso Senhor
aos que Dele se aproximavam: “Tem confiança! Tem confiança!” Depois que Ele
nos deu Seu Coração Divino como apoio, confiante, não há criatura, por mais
fraca, miserável e pobre, que não seja capaz de levantar mundos com a alavanca
poderosa da oração!
17 DE SETEMBRO
CORAÇÃO GRANDE E PEQUENINO
Uma santa indiferença para com tudo que não seja Deus é o ideal da perfeição,
que os autores da vida espiritual preconizam e nos incitam a conseguir. Santa
Teresinha bem cedo o alcançou. Escrevia ela à Madre Inês: “Se soubésseis até
que ponto quero ser indiferente às coisas da terra! Que me importam as belezas
criadas? Ter-me-ia como bem desgraçada se as possuísse! Ah! Como me parece
grande, o coração em, relação aos bens deste mundo, pois todos juntos são para
mim sem valia; mas como me parece ele pequenino quando considero a
Imensidade de Jesus”.24
Nosso coração padece por ser grande, por ter proporções infinitas, criado como
foi para o que é grande, imenso, infinito... Não haverá neste mundo o que o
possa encher. No auge da glória, da riqueza, do prazer, o homem se sentirá
sempre uma criatura infeliz. Salomão e Creso, porventura acharam paz na
riqueza? Criados como fomos para Deus, fora de Deus seremos eternamente
desgraçados. Só um caminho nos conduz à felicidade: Jesus! Ele é caminho,
verdade e vida. Como, diante de Jesus, é pequenino e humilde o nosso coração,
esse mesmo coração que foi criado para Ele, com tamanhas proporções que não
o podem alegrar nem encher todas as ilusões do mundo e do pecado!
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18 DE SETEMBRO
QUEM BATEU?
São José de Cupertino, em sua doce simplicidade, dizia, numa comparação feliz:
“Deus, no seu poder e na sua bondade, parece brincar conosco aquele jogo de
criança em que, vendando-se os olhos a uma delas, batem-lhe as outras e lhe
perguntam: quem bateu? A adivinhação é, muitas vezes, demorada”.
Deus, enviando-nos contradições, reveses da fortuna, perseguições, doenças etc.,
pergunta-nos depois: “Quem bateu?” Em nossa ignorância, respondemos: “Foi
tal indivíduo que me ofendeu, um superior, que me persegue, o vento que me
resfriou, um mau negócio etc.” Ah! Como nos enganamos! Não adivinhamos que
quem bateu foi Ele próprio, foi Nosso Senhor! Os que nos fazem sofrer são
meros instrumentos de sua misericórdia, destinados a nos ajudar a fazer
penitência e a conhecer a nossa miséria. O Profeta Jó adivinhou logo, desde o
primeiro momento, donde lhe provieram os golpes da desventura: Deus me deu
– exclama ele – e Deus me tirou”. Ele não os atribuiu aos Sabeus, nem ao fogo,
nem aos homens... “É mister essa perspicácia do santo Jó – diz a piedosa autora
dos Avisos Espirituais – para descobrirmos a Mão de Deus em tudo,principalmente nos reveses, nas desgraças”. Quem bateu? Neste mundo temos
os olhos vendados, mas, como bons cristãos, podemos adivinhar quem nos bateu
e para que nos bateu: foi Ele, o Senhor, não para brincar, mas para salvar...
19 DE SETEMBRO
COM JESUS NO DESERTO
A vida espiritual, após as consolações dos primeiros dias, transforma-se, às
vezes, num deserto árido. Desaparece o amor sensível. É uma provação e das
mais angustiosas. A Divina Providência nos prepara o Purgatório doce do Amor
aqui na terra, nas trevas e no deserto. Santa Teresinha amou a Jesus,
desinteressadamente, neste deserto. Ela só queria Jesus. Era o amor levado ao
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heroísmo. “Amemos a Jesus, escreve à Celina, a ponto de sofrermos tudo o que
Ele quiser, mesmo a aridez e frieza aparentes. É sublime o amor a Jesus sem o
gozo das doçuras desse amor. É um martírio!... Pois bem, morramos mártires!
Oh! minha irmãzinha, desprendamo-nos da terra e voemos para a montanha do
Amor, onde encontraremos o belo lírio de nossas almas. Desapeguemo-nos dasconsolações de Jesus para só a Ele nos unirmos.”25
Consolai-vos na aridez, almas piedosas e verdadeiramente amantes de Nosso
Senhor. Estar com Jesus e amá-Lo, é tudo e é só o que vale neste mundo. Se
Jesus está conosco nas delícias, encantos e consolações do amor, alegrai-vos,
chorai de amor e reconhecimento. Se, porém, Ele vos convida para o deserto,
obriga-vos a segui-Lo, a queimar os pés nos areiais adustos e a suar e padecer,
sem alívio e descanso, à beira de uma fonte ou à sombra de uma palmeira,coragem! Segui Vosso Esposo! Basta que O ameis! Não importa sentir o amor.
Oh! Bem poucos são os corações generosos que seguem a Jesus no deserto!
20 DE SETEMBRO
CHORAR DIANTE DE DEUS
Santa Teresinha desejava a perfeição de suas noviças no amor desinteressado aJesus. Dizendo-lhe certo dia uma delas que, quando sofria, costumava ir sem
demora confiar suas mágoas a Jesus, no Tabernáculo, desabafando-Lhe, a
chorar, o coração, ponderou-lhe a santa: “Derramar lágrimas diante de Jesus!
Ah! não faças mais isto! Muito menos nos devemos mostrar tristes perante Ele
do que perante as criaturas. Pois se é apenas com os nossos Mosteiros que Esse
bom Mestre conta para o regozijo e alegria de Seu Coração, se Ele vem a nós para
repousar e se esquecer das contínuas lamentações dos seus amigos do mundo –
e neste exílio todos choram e gemem – como, em vez de reconhecer o preço da
cruz, havemos nós de entristecê-Lo também com as nossas mágoas e queixas,
como o comum dos mortais? Francamente, tal proceder não é de quem Lhe tem
um amor desinteressado. Nós é que O devemos consolar e não Ele a nós. Com o
Seu Coração tão compassivo, Ele nos enxugará as lágrimas, mas se retirará triste
por não ter podido repousar em nossa alma”.26
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Não se devem entender as palavras de Santa Teresinha como uma censura a
quem vai desabafar o seu coração ante Jesus, chorar e pedir consolação ao
Divino, Verdadeiro e Único Consolador! Não! Podemos chorar, sim, diante de
Jesus, mas saibamos ser generosos, quando já tivermos aprendido a sofrer e
amar. Santa Teresinha se refere às almas já adiantadas na via do amor e não aos
pobres mortais que ainda ensaiam os primeiros passos nessa via e tanto precisam
chorar diante de Jesus!
21 DE SETEMBRO
VIVER DE AMOR NO CALVÁRIO
Cantava, numa de suas poesias,27 o Serafim de Lisieux:
“Viver de amor não é, neste degredo,
Fixar-se no Tabor: é, com Jesus,
Subir pelo Calvário, sem ter medo,
E olhar, como o maior tesouro, a Cruz.
Hei de viver, hei de gozar lá no Empíreo,
Então terá fugido, enfim, a dor,
Mas, cá na terra, quero, em meu martírio,
Viver de amor.”
Teresa, que sempre viveu de amor, jamais se afastou do Calvário. Dois meses
antes de morrer, escreveu a certo sacerdote, um de seus irmãos espirituais: –
“Não aspiro libertar-me das penas do exílio, porque a única coisa que me aprazneste vale de lágrimas é o sofrimento, unido ao amor. Amar ao pé da cruz é mais
belo e heroico do que amar nos esplendores do Tabor. É ali que se prova o
verdadeiro amor”. E a Santinha, sentindo a nossa fraqueza, ensina-nos a sofrer,
até mesmo quando, para tanto, falta-nos coragem. “Soframos – diz ela – ainda
que com amargura e sem coragem. Também Jesus sofreu com tristeza. Por acaso
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FELICIDADE DE SOFRER
A felicidade de sofrer transparece em todas as fases da vida de Santa Teresinha.
Ela realizou praticamente a sua admirável doutrina sobre o valor e o alcance do
sofrimento. Sofrer com resignação é virtude, mas sofrer com alegria é heroísmo.Desde pequenina, Teresa sentiu irresistível atrativo para o sofrimento. – “A cruz,
diz ela, acompanhou-me desde o berço, e Jesus fez-me amá-la
apaixonadamente”. Ela achava que nenhuma tribulação é demais para conquista
da palma, pelo que chamava perdido o dia passado sem sofrimento. Eram, para
ela, de festa os dias em que sofria. Eis as palavras suas28: – “Sabeis quais são os
meus domingos e feriados? São os dias em que o bom Deus me envia mais
provações”.
Mais, ainda29:
“Se um sofrimento amargo um dia
O coração vos vier conter,
Dele fazei vossa alegria,
Sofrer por Deus! Oh! Que prazer!”
Sofrer por Deus era a sua ventura. Numa das maiores tribulações de sua vida,
quando o coração se lhe partia de dor, vendo enfermo o pai tão querido, vítima de
um insulto cerebral, escreveu a uma das irmãs30: “Que privilégio de Jesus! Como
é preciso que Ele nos ame para enviar-nos tamanha dor! A eternidade não nos
será bastante para bendizê-Lo. Cumula-nos de favores como cumulava aos
maiores santos!”
Que perfume suave exala a humilde violeta do Calvário, que, com o seu
pequenino caminho, ensina-nos a chegar ao heroísmo da santidade só peloamor, aproveitando as provações da vida!
24 DE SETEMBRO
O PEQUENO CAMINHO
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Disse Bento XV, em memorável discurso sobre a heroicidade das virtudes de
Santa Teresinha: – “A Infância espiritual é condição necessária para obter a vida
eterna: os fiéis de todas as nações devem generosamente entrar no caminho pelo
qual a Irmã Teresa do Menino Jesus atingiu o heroísmo da virtude”. As palavras
do pontífice nada mais são do que o eco do Evangelho: – “Se não vos fizerdespequeninos, não podereis entrar no Reino dos Céus.”
A infância espiritual, segundo Bento XV, é caminho necessário da salvação e
condição necessária para se chegar ao Céu. Tudo é simples no pequenino
caminho preconizado por Teresinha. Basta humilhar-se e amar o Amor! Nem
todos podem chegar à perfeição pelos caminhos difíceis, duros e assustadores
dos anacoretas e dos gigantes da penitência e da santidade, como Santo Hilário,
Margarida de Cortona ou Simão Estilita. Impossível é imitar esses heróis. Paratanto seria necessária uma graça especialíssima do Alto, a qual mui dificilmente
se poderia impetrar sem presunção. Certo é que somos todos chamados por
Jesus à perfeição: – “Sede perfeitos como vosso Pai Celeste é perfeito”. Deve,
pois, existir outro caminho, acessível às almas fracas, pobres, pequeninas, como
as nossas, as quais também poderão amar a Deus e chegar à santidade, à
perfeição.
Teresinha disse: – “Felizmente há muitas moradas no Reino do Céu. Se nãohouvesse senão aquelas com acesso por caminhos para mim incompreensíveis,
eu lá não entraria, certamente... Mas, se há a morada das grandes almas, a dos
Padres do deserto e a dos mártires da penitência, não deixará de haver também a
das criancinhas, e nosso lugar está guardado entre estas”.
25 DE SETEMBRO
O AMOR NA VIA DA INFÂNCIA ESPIRITUAL O amor é tudo na vida da infância. A confiança também. Teresa leva-nos à pátria
das virtudes pelo amor e não, ao invés, ao amor pela prática das virtudes.
Escrevia Ela à sua prima Maria Guerin31: “Desejais saber como chegar à
perfeição? Só conheço um meio: o amor”. Segundo comenta o autor de O Espírito
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de Santa Teresinha, essa resposta lembra a réplica de São Francisco de Sales ao
seguinte conceito de certa religiosa: “Quero adquirir o amor pela humildade”.
Replicou o Santo: “Pois eu quero adquirir a humildade pelo amor”. O amor é um
incentivo poderoso e eficaz para a virtude. Ele suaviza a aspereza dos trabalhos e
torna doce todo sacrifício no caminho da perfeição. Na via da infância, Teresinhanos quer levar ao amor, ao puro amor, bem certa de que dessa fonte riquíssima
brotam a perfeição e as virtudes mais heroicas. Nosso Senhor não precisa de
nossos atos brilhantes, nem de nossas obras. Ele só quer o amor de nossos
corações. Por isso dizia São João da Cruz: “O mais leve movimento de uma alma
animada de puro amor é mais proveitoso à Igreja do que todas as demais obras
reunidas”. Como isto consola as almas fracas e pequeninas! Quem pode amar
pode tudo. Ou nas lutas do Apostolado, pregando, ensinando, catequizando em
missões, ou na obscuridade e no silêncio do mosteiro, sempre se pode amar, e só
esse amor é o que vale. Os enfermos, os pobres, os infelizes, as almazinhas
pequeninas e fracas, as crianças, todos, todos podem santificar-se, porque todos
podem amar e o Amor é tudo! Como isto consola e simplifica a vida espiritual!
26 DE SETEMBRO
A ESPERANÇA NA VIA DA INFÂNCIAESPIRITUAL
A esperança é doce alívio e bálsamo suavíssimo nas agruras do exílio da terra. “O
tempo passa como um sonho, dizia Teresinha, mas Deus já nos vê na glória e se
regozija com a nossa eterna felicidade! Como este pensamento faz bem à minha
alma! Compreendo porque Ele nos deixa sofrer!...”32
Quem pensa no Céu acha pouco e leve todo sofrimento deste exílio. Era em
transportes de amor e de alegria que o Anjo do Carmelo pensava no Céu.
“Amanhã dizia, estaremos no porto! Meu Deus, que veremos então? O Senhor
será a alma de nossa alma, Mistério insondável! Os olhos humanos nunca viram
a luz incriada, os ouvidos humanos nunca ouviram as incomparáveis melodias
dos céus, nem jamais pôde o coração humano compreender o que reserva o
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futuro. E tudo isso virá logo, logo sim, se amarmos a Jesus apaixonadamente.”33
A esperança é o bálsamo suave que Nosso Senhor nos deu para as feridas tão
dolorosas do coração. E não nos iludimos, como diz a impiedade, oh! Não! O Céu
é uma realidade! E virá logo! Mais depressa talvez do que pensamos. Todo
sofrimento é suportável quando se medita bem na recompensa que o Senhor
prometeu aos eleitos. A figura deste mundo passa. E por que nos apegarmos ao
que só nos faz desgraçados? Seremos saciados plenamente de todo desejo e
sonho de felicidade. E nossa alegria será eterna! Ó Paraíso! Façamo-nos aqui
pequenos, porque é estreita a porta do Céu, e só entram lá as almas
pequeninas!...
27 DE SETEMBRO
A PENITÊNCIA NA VIA DA INFÂNCIAESPIRITUAL
A penitência, na via da infância, não contém as macerações e prodígios de
mortificação, mais admiráveis que imitáveis, dos grandes anacoretas e grandes
santos penitentes. Não. É simples, oculta e, por isso mesmo, heroica. Escreve
Teresa, na História de uma alma34:
“Longe de me querer assemelhar às belas almas que, desde a infância, praticam
toda espécie de macerações, fiz consistir as minhas penitências, unicamente, em
quebrar a minha vontade, reter uma palavra de réplica, prestar pequenos
serviços em torno de mim, sem lhes dar importância, e mil outras coisas do
mesmo gênero.”
Essas mortificações, que parecem pequeninas, insignificantes, são mais duras
que as grandes macerações voluntárias. Vencer e sacrificar a vontade, o amor
próprio, o orgulho enfim, é penoso e difícil. O martírio das pequeninas cruzes e
das alfinetadas é mais longo e necessita uma virtude heroica. Aprendamos a
sofrer, aproveitando as pequeninas cruzes de cada dia santificando nossas dores.
Depois do pecado, para quem ofendeu a Nosso Senhor, só uma porta no Céu: a
da penitência. Esta só palavra já assusta a nossa fraqueza. Que fazer? Se não
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podemos todos com as macerações dos grandes santos, entremos no pequenino
caminho e aproveitemos tudo o que o Céu nos manda cada dia: contrariedades,
privações, doenças e tropeços sem conta que topamos no caminho da vida!
Soframos, com sorriso heroico, o que for da vontade de Deus!
28 DE SETEMBRO
A CONFIANÇA NA VIA DA INFÂNCIAESPIRITUAL
A confiança é tudo na vida de Teresa. A confiança e o abandono. A criancinha
não desconfia, um só momento, do amor materno. Entrega-se à mãe, não pensa
em si. Seu único ideal é este: amar. E que mais resta a quem se fez criança poramor de Deus senão confiar, e confiar cega e obstinadamente? Oh! Não é
bastante a nossa confiança no Coração de Jesus! Há muitos que rezam o CREDO
e não creem na Misericórdia! Infelizes! Jesus não há de usar toda a severidade de
sua justiça eterna para os que O amam. Por que desconfiar? “É a confiança e só
ela que nos há de levar ao amor”, dizia Teresinha35. A criança tem medo e foge,
espavorida, de sua mãe? Oh! Não... Almas que por aí viveis atormentadas e
oprimidas pelo temor, imitai a confiança da criancinha, nas vossas relações paracom Nosso Senhor! Libertai-vos do jugo de ferro desse medo de Deus, desse
mesquinho e vil jansenismo. Eia! Avante! Confiança! Pôr limites à confiança é
ousadia, é como querer diminuir a Misericórdia Divina. Se Teresinha se tornou a
grande santa que hoje admiramos e contamos nas honras dos altares, deve-o à
confiança e ao Amor. A confiança e o Amor foram a senda luminosa de sua vida.
Esse caminho pequenino, simples, belo, será o prêmio de nossa generosidade no
combate aos nossos pecados, e nos levará ao Coração de Jesus. “Na verdade, a
confiança de Teresinha desentulhou o caminho do Céu.”36
29 DE SETEMBRO
A JUSTIÇA DIVINA E A VIA DA INFÂNCIA
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A Justiça Divina, que amedronta as grandes almas, é motivo de alegria e
confiança para as almas pequeninas. Deus é justo e, porque é justo, conhecendo
profundamente nossa fraqueza, sabe avaliar com precisão o que somos e
podemos. Como, pois, não há de usar de misericórdia para conosco? Não é justo
também que, já que Nosso Senhor nos deu a sua misericórdia, manifeste-se estaonde há maiores e mais tristes misérias? Fiquemos sempre pequeninos e não
temamos. “Os pequeninos – diz o Espírito Santo37 – serão julgados com extrema
doçura.” Santa Teresinha fala o que segue:38 “É possível ficar pequenino, mesmo
nos cargos mais elevados e de maiores responsabilidades. Não está escrito que o
Senhor se levantará para salvar os mansos e humildes da terra?” – “Notai –
esclarece a Santa – que Ele não diz JULGAR, mas, sim SALVAR!”
É essa a Justiça Divina que amedronta e faz tremer tantas almas desconfiadas echeias de escrúpulos. Justiça Misericordiosa do Coração de Jesus, vede o que
sou: fraco e miserável. É justo que o pobre do meu coração receba a esmola do
Vosso Amor e se agasalhe no asilo da Vossa Misericórdia!
30 DE SETEMBRO
MEU DEUS... EU VOS AMO!
Depois de ter passado a vida no Amor, ia morrer, num ato de amor, o serafim do
Carmelo! Era 30 de setembro de 1897. Estava a raiar para ela a aurora do dia
eterno. Pela manhã, a vitimazinha lançou um olhar de amor para a estátua da
Virgem, exclamando: “Oh! como Lhe rezei com fervor!...” Mas era a agonia pura,
sem a menor mistura de consolação... E depois, sufocada: “Oh! falta-me o ar da
terra! Quando me será dado respirar o do Céu?... Às duas horas e meia, dando
mostra de que o sofrimento havia chegado ao extremo, disse: “Minha Madre, o
cálice está a transbordar! Jamais poderia imaginar que me fosse possível sofrer
tanto! Não posso explicar isso senão pelo meu ardente desejo de salvar almas”. E
depois: “É bem verdade, tudo quanto escrevi sobre o meu desejo de sofrer! Não
me arrependo de me haver entregue ao amor”. E repetiu essas palavras diversas
vezes. Tamanha a sede de amar e de sofrer consumia o Serafim da montanha
santa do Carmelo! Quando, ao cair da tarde, soaram as tristes badaladas das Ave-
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Marias, contemplou ela meigamente à Maria e, voltando-se para a Madre Priora:
“É a agonia, minha Madre?” – “Sim, minha filha, é a agonia, mas Jesus a quer
prolongar ainda algumas horas”. E ela, resignada: “Pois bem... Vamos... Eu não
quisera sofrer menos... “ E, fixando o crucifixo: “Meu Deus... eu... vos amo!” E
sua bela alma voou para o Céu. Morreu de amor! Realizaram-se todos os seussonhos.
Como é bom viver sofrendo e amando até morrer de amor!
1 - História de uma alma - c.IX.
2 - Conseils et Souvenirs.
3 - Conseils et Souvenirs.
4 - 6me.lettre 11. Soeur Marie du Sacré Coeur.
5 - História de uma alma. - c.IX.
6 - Conseils et Souvenirs
7 - História de uma alma. - c.XI.
8 - 5me. lettre é des Missionaires
9 - 9me. lettre à des Missionaires.
10 - 5me. lettre à sa soeur Céline.
11 - História de uma alma. - c.IX.
12 - História de uma alma - c.V.
13 - 5me. lettre à sa soeur Céline.
14 - “Conseils et Souvenirs”.
15 - 5me. lettre à Soeur Marie du Sacré Coeur.
16 - 13me. lettre à Céline.
17 - História de uma alma - c.XII.
18 - História de uma alma. - c.VIII.
19 - Idem - c.XII.20 - História de uma alma - c.XII.
21 - 8e. lettre à des Missionaires.
22 - Jó, 13,15.
23 - História de uma alma. - c.X.
24 - “Conseils et Souvenirs”.
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25 - Lettres - 14 de Julho de 1889 e Maio de 1980.
26 - “Conseils et Souvenirs”.
27 - “Saint Therèse de L’Enfant Jesus - Poésies”.
28 - “Conseils et Souvenirs”.
29 - Poésies.
30 - Carta à Celina - janeiro de 1889.
31 - Lettres à Marie Guerim - 1894.
32 - 8me. lettre à Céline.
33 - 6me. lettre à Céline.
34 - História de uma alma. - c. LV.
35 - 6e. lettre à Sn. Marie du Sacre Coeur.
36 - Expressão do saudoso Cardeal Bourne.37 - Sap - VI 7 .
38 - Psalm. - LXXV - 9.
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1 DE OUTUBRO
O ABANDONO NA VIA DA INFÂNCIAESPIRITUAL
O abandono está muito longe desse quietismo perigoso e estúpido, que consiste
em cruzar os braços indolentemente, deixando a Nosso Senhor todo o encargo de
nossa santificação, sem a cooperação da nossa vontade, do nosso sacrifício, e
daquilo, diz o Pe. Mateo, a que chamamos abandono e que é, afinal, a expressão
do amor perfeito. No dizer de Mgr. Gay, o abandono é o cume da montanha do
amor, é a perfeição do amor. Na via da infância, é o gesto da criatura que,
sentindo-se fraca e incapaz de dar, por si só, um passo no caminho da virtude,atira-se, como uma débil criança, aos braços paternos e adormece,
tranquilamente reclinada sobre o Coração Divino, certa, bem certa de que assim
não correrá perigo e percorrerá com segurança o seu caminho, sem temor da
trevas que o obscurecem em noites tenebrosas de cruéis provações! Sabe
alguém, porventura, se a saúde ou a doença, a fortuna ou a pobreza lhe são hoje
um bem ou um mal? Não... Mas não o ignora Deus. As crianças nada sabem...,
entregam-se à vontade paterna e ficam confiantes.
Faça também assim a minha pobre alma, que tanto se agita e se perturba. Outro
posto não deve ambicionar senão o do repouso no Coração de Jesus, na luta
como na paz... Na vida como na morte. O resto... rir ou chorar, viver ou morrer, a
doçura ou a amargura das coisas da vida – que me seja tudo isso indiferente,
ainda que a minha natureza humana grite e se revolte! Tal é o abandono na doce
via de Teresinha!
2 DE OUTUBROO SOFRIMENTO NA VIA DA INFÂNCIA
ESPIRITUAL
“Deus não fez a dor – escreve Mgr. Laveille1. – A dor é fruto do pecado.
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Entretanto, uma disposição misericordiosa da Bondade Divina a transforma em
preservativo e remédio. O sofrimento purifica”.
Teresinha compreendeu admiravelmente a missão Divina do sofrimento e
sempre o acolheu com o mais doce e belo sorriso. Aos quatorze anos escrevia ela
à Irmã Inês2: – “É bem verdade que o fel está sempre de mistura nos cálices que
sorvemos. Para mim, os espinhos nos facilitam o desapego da terra, e fazem que
elevemos os olhos muito para cima deste mundo”. Nosso Senhor nos manda o
sofrimento a fim de que nos desiludamos do mundo e das criaturas e contemos
só com Ele. No seu pequenino caminho, Teresinha nos ensina a arte de sofrer.
Consiste ela em aceitar todas as pequeninas cruzes que nos aparecem cada dia, a
cada hora, a cada momento, e fazê-lo sempre pacientemente, humildemente,
com sorriso acolhedor. Disse ela: – “Sofro de instante a instante... É por sepensar no passado e no futuro que costuma vir o desânimo”. Em outra ocasião,
torturada por horrorosos e incríveis sofrimentos, murmurou docemente3: – “O
bom Deus não me fez pressentir a morte próxima, mas me dá ainda mais e muito
maiores sofrimentos... Entretanto, não me atormento por isso. Só quero pensar
no momento presente”.
E é nisto que está o segredo do sofrimento na via da infância: sofrer com um
sorriso tudo o que vem das mãos de Deus, as grandes e as pequenas cruzes, eisso cada dia, a cada hora, a cada instante, sem olhar o passado nem o futuro.
3 DE OUTUBRO
O AMOR MISERICORDIOSO
Amor misericordioso é o que se inclina para a miséria, procurando-a, para
transformá-la em ardente chama de amor. Santa Teresinha dizia que, quantomais pobre e miserável é uma alma, tanto mais apta está para as operações do
Amor que consome e transforma. Estas palavras são de Jesus: Vim trazer o fogo
à terra. E que desejo Eu senão que ele acenda e arda?” Neste mundo somos
todos pobres, fracos, miseráveis. Que fazer então? Fugir, por indignos, do Amor?
Não. Mesmo por isso devemos correr pressurosos para a fornalha ardente do
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Amor Misericordioso. Foi para a miséria que a Misericórdia baixou à terra. Sobre
os escombros de nossa miséria, levanta o Senhor o seu trono de Misericórdia.
Tão poucas são as almas que compreendem o Coração de Jesus! Quanto nos
consola saber que, não obstante os abismos e o horror de nossa miséria, somos
amados, e amados com um amor infinito, pelo Amor Misericordioso! Há muitasalmas desconfiadas, timoratas e revoltadas contra Deus, porque não acreditam
na Misericórdia, não conhecem o Amor Misericordioso. É a essas almas que o
Anjo do Carmelo quer que se fale muito da Misericórdia, que se pregue o Amor, o
Amor Misericordioso.
Ó Santa Teresinha, anseio a graça de amar o Amor, e essa graça eu a imploro à
missionária que vos fizestes, com estas palavras: “Voltarei à terra para fazer amar
o Amor!”
4 DE OUTUBRO
PEQUENO SERMÃO DE SÃO FRANCISCO
O Seráfico São Francisco de Assis fazia, no Alverne, esta profunda meditação: “O
Céu aberto em cima de minha cabeça. O Inferno aberto sob meus pés. E o
cristão, no meio! Assim estou no mundo, sob um Céu que me espera e cujopensamento me conforta e estimula na luta”. Quando a cruz pesar demais sobre
nossos ombros doloridos, olhemos para o Céu. Certo dia, ouvindo São Francisco
o tanger de uma corda da lira celeste nas mãos de um anjo, desfaleceu. Sua pobre
natureza sentiu-se aniquilada ante a estupenda maravilha de tão deliciosa
melodia. Que não será, ó meu Deus, ouvir os cânticos eternos! Santo Inácio
dizia: “Como me parece pequena e vil esta terra, quando contemplo o Céu!” O
Céu aberto! Eia! Confiança! Todo sofrimento é pouco para tamanha felicidade! O
Inferno aberto! Meditemos um pouco. Pode-se comparar todo nosso martírio,
toda a amargura da terra, a uma só das penas eternas? Então, por que não
suportarmos hoje um castigo tão leve em reparação de nossos pecados, que, mil
vezes, já mereceram a condenação eterna? O cristão, no meio... Para a luta, para
a escolha livre do seu destino! Oh! Como a vida é séria e cheia de
responsabilidades! No meio, entre o Céu e a terra, o cristão em luta! Oh!
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Saibamos sofrer e, com o pobrezinho de Assis, meditemos o que somos, onde
estamos e o que nos espera na Eternidade!
5 DE OUTUBRO
O PÃO DA DOR E O PÃO DOS ANJOS
Só o Pão dos Anjos nos sustenta e nos dá força quando nos chega o pão da dor. A
Eucaristia e a cruz vivem unidas. A Eucaristia é o sacramento do amor e sem a
cruz não se vive no amor. Não se ama sem sofrer. Ninguém precisa tanto da
comunhão como o que padece. Dizia uma santa carmelita que a comunhão de
tudo consola o penitente. Na primitiva Igreja, os primeiros cristãos comungavam
cotidianamente nas catacumbas e, com o sorriso nos lábios, ofereciamgenerosamente a Deus todo sacrifício, todas as dores, o próprio sangue. A
Eucaristia lembra-nos o Grande Sacrifício do Calvário e nos fala com eloquência
da cruz, do sofrimento. É tão suave padecer, e até morrer, com Jesus no coração,
como São Tarcísio! Quando nos sentirmos abatidos com o pobre coração ferido,
dilacerado, nos embates da vida, precisados de conforto, consolação e alívio,
procuremos a santa Eucaristia. No Altar, no Sacrário, na Santa Mesa,
encontraremos o Mestre, o Amigo, o Pai, o Irmão, que enxugará nossas lágrimas
e nos ajudará a levar a cruz. Oh! se tivéssemos bastante fé, sempre que nos
atormentasse o sofrimento, que nos ferisse qualquer golpe, haveríamos de
desoprimir-nos no Calvário, saberíamos ocultar as nossas dores, com toda a
generosidade, na chaga do Coração Eucarístico de Jesus. A Eucaristia e a dor são
asas do Amor Divino, com as quais voaremos, como as águias, sobre o vale triste
das amarguras da vida, até poder fitar, sem receio, o eterno e esplendoroso Sol do
Amor!
Dai-me, Senhor, o Vosso PÃO DOS ANJOS, e com ele podeis enviar-me o PÃO
DA DOR!
6 DE OUTUBRO
O ALIMENTO DO AMOR NA TERRA
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“O sofrimento – diz Lehodey 4 – é o alimento necessário, substancial, do santo
amor.” O Amor Divino cresce na dor. Quanto mais pungente é a dor, tanto mais
vivas são as chamas do amor. É no Calvário que se ama verdadeiramente! Para se
compreenderem bem certos segredos do amor, é necessário sofrer e sofrer
muito. Os santos tinham fome do sofrimento e podiam dizer, com SantaTeresinha: “Eu não poderia viver neste mundo sem o Amor e o sofrimento”.
Pode-se, porventura, viver sem alimento? E pode, quem ama, viver sem padecer,
se o seu alimento é o pão do sofrimento? Quando se ama, dizia Santa Maria
Madalena Postel5: “Nada se padece, porque é muito grande a felicidade de sofrer
pelo objeto amado”. No festim das almas abrasadas, realiza-se o banquete do
Amor, em que o Mestre parte com elas o pão da dor. Essas almas, quanto mais
sofrem, mais querem sofrer, porque, também, quanto mais se ama, mais se
deseja amar. Elas sofrem para mais amar e amam para mais sofrer. Amam
porque sofrem e sofrem porque amam. Tirai o sofrimento a uma alma abrasada
no Divino Amor e ela vos dirá, como Santa Teresa, QUE SOFRE, PORQUE NÃO
SOFRE! Tão identificada fica com seu Divino Amor que, como São Paulo, não
ama e nada quer amar nem conhecer senão Jesus e Jesus Crucificado! Não pode
viver longe do Calvário!
Ó vida preciosa e rica de méritos!
7 DE OUTUBRO
ROSÁRIO, MINHA ALEGRIA!
Nossa Senhora, dizem as ladainhas lauretanas, é causa de nossa alegria. O
Rosário trouxe alegria ao mundo convulsionado e triste, nos dias de São
Domingos. Hoje, quando tanto se padece neste exílio, precisamos, mais do que
em tempo algum, recorrer a Maria. E o Rosário é a mais bela e consoladora das
preces. Quanto conforta um terço bem rezado nas nossas aflições! “Um terço aos
pés do Sacrário – dizia uma santa alma – me consola mais do que tudo neste
mundo.” Oh! quando as amarguras da vida estiverem a transbordar no cálice de
nosso coração, não nos deixemos levar ao desespero. Vamos a Maria! Lancemos-
Lhe, um olhar de terno afeto e confiança e, de joelhos, recitemos-Lhe um terço,
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Soror Elizabete da Trindade se oferece a Jesus “como uma humanidade de
acréscimo, na qual possa Ele ainda sofrer para glória de Seu Pai e as necessidades
de Sua Igreja e perpetuar no mundo Sua, vida de reparação, de sacrifício, de
louvor e de adoração”.7 Que vítima de amor e de reparação! Que sublimes
páginas nos deixou ela sobre a cruz e o sofrimento!
À Gema Galgani, o terceiro, delicado lírio do Calvário, que teve em seu corpo os
estigmas sagrados, disse Nosso Senhor8: – “Queres amar? Aprende primeiro a
sofrer. O sofrimento ensina a amar. Os únicos adornos e joias de uma esposa de
Jesus Cristo Crucificado são os espinhos da cruz. Que martírio padeceu Ele!
Viveu amando e agonizando no Calvário!”
Se quereis fazer ideia das belezas da vida interior passada no Calvário, lede a vida
e os escritos dos três lírios e anjos da cruz!
9 DE OUTUBRO
UM “FIAT” E UM “GLORIA-PATRI”
O “Fiat” é uma palavra maravilhosa. Fez surgir do nada tudo o que existe.
Pronunciou-a a Santíssima Virgem, no dia da Anunciação, e baixou do Céu o
Filho de Deus. Nas agonias do Horto, quando foi apresentado a Jesus o cálice das
amarguras, é ainda um “Fiat” generoso que nos traz a Redenção. Faça-se a Vossa
Vontade! Sem essa palavra tão pequenina e tão bela, não enviaria Deus ao
mundo o Seu Divino Filho nem aceitaria o sacrifício da nossa Redenção.
Alma cristã, sem um “Fiat” generoso de teu coração, Jesus não virá identificar-se
contigo no Amor, e realizar essa sublime encarnação do Verbo na alma, como no
seio da Virgem, bem nas profundezas e no silêncio de uma vida de recolhimento
e de amor. Sem um “Fiat” no sofrimento, nas penas interiores e exteriores, nãohaverá redenção para teus pecados, tão numerosos e tão grandes! Precisamos
viver de expiação e, no dizer de São Paulo – “completar em nosso corpo a Paixão
de Jesus Cristo”. E isto se faz com a aceitação generosa e fiel da Cruz.
“Fiat!” Sim, faça-se a Vossa Vontade, Senhor! Digamos sempre esta palavra tão
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bela e tão poderosa, ainda que isso nos custe uma agonia de Getsêmani! E, como
devemos oferecer o sacrifício que nos pede o Senhor, com generosidade e alegria
de sofrer por Quem sofreu por nós, acrescentemos ao nosso “Fiat” um “Gloria-
Patri!”
É dever nosso sofrer com paciência e beijar, agradecidos, a Mão que nos fere! Oh!
como isto agrada a Nosso Senhor e nos atrai as bênçãos do Céu!
10 DE OUTUBRO
MEU POBRE CORAÇÃO... VAMOS!
Caímos outra vez! Mais um pecado grave... Ou a miséria de uma falta
humilhante! Até quando, meu Deus?! ... E quase desesperados nos revoltamos
contra nós mesmos, num arrependimento agitado, amargo, impetuoso. Não
devemos proceder assim. Precisamos ter paciência. Fomos traídos pelo coração
ingrato e mau. Não o irritemos ainda mais. Quando alguém se fere não deve
arranhar, irritado, a ferida, mas pensá-la cuidadosamente e acalmar-se. O doce
São Francisco de Sales escreveu9:– “Se eu caísse numa grande falta, não
censuraria meu coração com frases como estas: Miserável! Abominável! Depois
de tantas resoluções ainda te deixaste arrastar ao pecado! Morre de vergonha!Não ouses levantar os olhos para o céu, traidor, impudente, desleal, imprudente!
Não, eu não lhe falaria, assim, mas procuraria corrigi-lo racionalmente, pelo
caminho da piedade. dizendo-lhe docemente: Ora, meu pobre coração... Vamos!
Caímos? Pois bem. Levantemo-nos. Deixemos esta miséria, vamos reclamar
infinita misericórdia de Deus. Ela nos há de assistir daqui em diante, para que
sejamos mais fortes, e vivamos no caminho da humildade. Coragem! Deus nos
ajudará. E eu, assim, com a sólida resolução de nunca mais cair, empregaria
todos os meios de não pecar”.
Se uma falta que tivermos a desgraça de cometer nos levar a um ato de
humildade e a um arrependimento sincero, devemos ficar tranquilos. Tenhamos
paciência com o nosso coração! Ele é doente e não tem bastante juízo. Havemos
de curá-lo só com bondade. Pois, meu pobre coração, levanta-te! Vamos! Vamos!
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Vamos para Nosso Senhor, meu pobrezinho!
11 DE OUTUBRO
A ESTÁTUA DO MESTRE DIVINOSanta Joana de Chantal sofria muito por sentir, quando orava, que sua alma
ficava como que insensível, numa desoladora e triste aridez diante de Nosso
Senhor. São Francisco de Sales consolou-a com a bela parábola da estátua.
“Minha filha, diz o santo, se uma estátua colocada dentro dum nicho, num salão,
pudesse falar e se lhe perguntasse: – Por que estás aí? Porque, diria ela, o meu
mestre aqui me colocou. Por que não te moves? – Porque ele quer que eu
permaneça imóvel. – De que te serve isso? Que proveito tiras daí? – Não é parameu proveito nem para me servir que estou aqui, mas para servir e obedecer à
vontade de meu Senhor e Mestre. – Mas tu não o vês! – Pouco importa,
responderia a estátua, ele me vê e fica satisfeito com minha permanência no
lugar em que me pôs. – Mas não desejarias ter movimento, ir para junto dele? –
Não, se ele não o ordenar. – Nada desejas então? – Não, porque estou onde meu
Senhor e Mestre me colocou e sua vontade é a única alegria de meu ser”. –
“Minha filha, termina o santo, não é uma boa oração apegar-se unicamente à
vontade de Deus?
Oh! não vos desanimeis, pobres mortais, se vos sentirdes naquele estado de
alma! Deixai que o Artista e Mestre Divino faça o que quiser da sua estátua. A
oração humilde, submissa, vale mais do que os êxtases. Nosso Senhor disse uma
vez à Santa Margarida Maria: “Minha filha, a oração de submissão e de sacrifício
Me é mais agradáveis do que a contemplação”.
12 DE OUTUBRO
JESUS SÓ E A CRUZ!
A vida de uma alma que chegou a viver de amor, é de abandono amoroso e filial
nos braços do Pai Celeste, no Ascensor Divino, conforme a genial expressão de
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Santa Teresinha. E então ela só tem este pensamento e este desejo: Jesus e a sua
cruz. Quem já não tem, no mundo, outra aspiração, outro amor, realizou o mais
belo e sublime ideal da perfeição. “O amor de Jesus Cristo – escreve Santo
Afonso – põe o indivíduo num estado de absoluta indiferença. Não distingue o
doce do amargo; nada do que lhe agrada lhe é desejável: só lhe apraz o queagrada ao Senhor; encara do mesmo modo as grandes como as pequenas coisas,
tendo como essencial que sejam agradáveis a Deus.”
O amor leva ao abandono e torna a fé mais viva e a confiança inabalável. É bom e
delicioso acompanhar Jesus nos encantos de sua adolescência em Nazaré, nos
esplendores do Tabor, na entrada triunfal em Jerusalém; é, porém, mais
necessário e eficaz vê-Lo e amá-Lo na Cruz!
Bem poucos são os que generosamente seguem o Mestre até ao Calvário epodem dizer, como certas almas seráficas e loucamente apaixonadas da cruz:
“Jesus só e a sua cruz!” E mais não é preciso! A cruz é a salvação, é o amor, a
glória, o remédio, o consolo, a paz! Quanto mais se ama tanto mais se aborrece
tudo o que não seja o objeto amado. Quando se chega a amar verdadeiramente a
Jesus Cristo, outro desejo não se tem senão este: Jesus, Jesus só e a sua cruz!
13 DE OUTUBRO
A VIOLÊNCIA MISERICORDIOSA DE JESUS
É por determinação Divina que sofremos e que nos molesta a dor. Para nos
salvar, violenta-nos assim a Misericórdia do Coração de Jesus. Oh! como
havemos de bendizer um dia, no Céu, essa Mão que nos feriu, que nos fez sofrer!
E é por necessidade, em nosso benefício, que Nosso Senhor nos bate e nos fere.
Para salvar o filhinho querido, Jesus, Médico Celeste, vê-se constrangido a lhepropinar medicamento amargo, a maltratar lhe o corpo, a ferir-lhe a carne.
“Jesus nos fere, diz graciosamente Santa Teresinha, mas, quando o faz, volta o
rosto para não nos ver sofrer.” Ah! Como ofendem o Coração Misericordioso de
Jesus essas queixas injustas, essas revoltas na dor, essas quase blasfêmias dos
seus amigos, escandalizados e, muitas vezes, revoltados contra o sofrimento!
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Pobre Jesus! O bom Cirurgião Divino nos fere por amor, no empenho de curar-
nos e salvar-nos e, em troca, vociferamos queixas, blasfêmias e insultos! Sejamos
delicados. Não estejamos constantemente a gemer e a lamentar-nos do pouco
que sofremos. Soror Benigna Consolata Ferrero, a vitimazinha do Coração de
Jesus, padecia horrivelmente no seu leito de morte, quando uma tarde,repentinamente, sentiu-se tomada de tamanha comoção que se debulhou toda
em pranto. “Por que choras assim? – lhe perguntaram. “Oh! – respondeu, estou
vendo a violência que Jesus se está fazendo para me fazer sofrer! Ele foi a isso
forçado porque me escolheu para vítima, mas ai! Como Lhe custa ocultar-me o
seu Amor!” E olhando, cheia de ternura, uma imagem do Sagrado Coração,
exclamou: – “Meu Jesus, bem sei que me tendes muito amor e nele creio”.
Oh! Jesus de inefável bondade, quanta violência fazeis ao Vosso Coraçãomisericordioso para nos deixar a sofrer neste exílio da terra!
14 DE OUTUBRO
SOFRER DE TODOS E NÃO FAZER NINGUÉMSOFRER
É uma regra de ouro da caridade cristã. Neste mundo nunca estamos semalguma cruz, e cruz que nos vem do próximo. As desigualdades de gênio,
condição, educação e caráter, geram mil aborrecimentos, mal-entendidos,
questiúnculas e muitos outros males torturantes para o nosso espírito e que
tanto nos afligem o coração... Paciência, alma cristã! Não convém acrescentar
nova dor a outra dor. A perturbação, a impaciência, a vingança, aumentam o peso
daquela cruz. Resignemo-nos ao ato heroico de “sofrer de todos e não fazer
ninguém sofrer”. Assim dizia um santo: “Não prejudicar a ninguém e fazer o bem
a todos”. O perdão é um bálsamo suave. Alivia a quem sofre a injúria, consola o
Coração de Jesus e costuma ligar os corações, desunidos pelo ódio com laços de
uma estreita amizade. Soframos do próximo que nos aborrece, tudo o que Nosso
Senhor permitir que ele nos faça, vendo nele o instrumento da Justiça Divina a
castigar-nos de nossos pecados e infidelidades. Suportemos os defeitos alheios,
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porque também os temos, ignorando, talvez, quanto estes custam ao próximo.
São Paulo quer que nos ajudemos mutuamente a carregar o pesado fardo da
vida. Só conseguiremos isto, praticando aquela regra de ouro: “Sofrer de todos e
não fazer sofrer a ninguém”.
15 DE OUTUBRO
PÉSSIMA HOSPEDARIA!
Um dia Nosso Senhor disse a Santa Teresa: “Considera minha viela cheia de
sofrimentos e persuade-te de que aquele que é mais amado de meu Pai é
também o que recebe mais cruzes; a medida do seu amor é também a medida do
sofrimento que Ele envia. Em que poderia Eu melhor testemunhar-te minhapredileção do que desejando para os que amo o que desejei para mim? E a santa,
abrasada nas chamas do Divino amor, soube carregar as cruzes tão pesadas que
Deus lhe enviou. Que grande mestra do Amor e do sofrimento é Santa Teresa! O
Amor é inseparável da cruz. Só quem ama pode saber o valor da cruz! “Ou sofrer
ou morrer”, dizia a Matriarca do Carmelo. Notamos que os santos seráficos
foram os que mais sofreram. Se a dor é a escola onde se aprende a amar, por que
desprezá-la? Que insensatos somos todos os que preferimos um pequenino e
louco prazer à dor tão fecunda, à mortificação, ao sacrifício! Como nos havemos
de arrepender na hora da morte de não ter sofrido com paciência e abraçado
generosamente a cruz! “A vida – dizia Santa Teresa – é apenas uma noite, que se
passa numa péssima hospedaria.” Logo há de raiar a aurora do dia eterno.
Paciência! Por uma noite só não queremos sofrer um pouco? Quanto mais longo
e doloroso é o exílio, tanto mais feliz e agradável será a volta à pátria. Oh!
Veremos logo o Céu, a nossa pátria! Tudo passa! Suportemos apenas por mais
uma noite a péssima hospedaria desta terra de exílio. Amanhã será o dia eterno, aPátria, o Céu!
16 DE OUTUBRO
A CALÚNIA
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Ah! Como dói a calúnia! Como é duro viver sob o peso duma infâmia,
humilhado, abatido, coberto de vergonha! Mas olhemos para a cruz! “Jesus
Crucificado! Eis a verdadeira serpente de bronze que nos cura as mordeduras
elas línguas de áspides maldizentes”, dizia São Francisco de Sales10. Nosso
Senhor, caluniado – diz o Evangelho – calava-se. Quando nos calamos, Deus falapor nós. Que é, afinal, essa reputação pela qual tanto sofremos? Uma opinião,
uma sombra, uma fumaça! Deus sabe tudo e Ele nos há de julgar! Nada valem os
uízos dos homens. Tenhamos confiança e não seremos abandonados. No dia do
Juízo, tudo se há de esclarecer e a recompensa virá. São Geraldo Magela foi
caluniado de um crime horroroso por uma mulher indigna. Santo Afonso,
perturbado, chamou o santo e o fez ciente da acusação. Conservando-se
impassível como o mármore, Geraldo não pronunciou uma palavra. Santo
Afonso proibiu-lhe a comunhão e toda relação fora do convento. O irmão nem
sequer murmurou. Aconselharam-no a defender-se e, ao menos, a pedir licença
para comungar. “Não – respondeu o santo – Morramos esmagados sob a
vontade de Deus!” Cinquenta dias depois, a mulher infame, sob o peso do
remorso, retratou-se da calúnia. Geraldo não se comoveu e, quando Santo
Afonso lhe perguntou o motivo por que se havia calado e não se justificara, ele
respondeu: “Meu Pai, é que a Regra me ordena que não me escuse, mas que
sofra em silêncio toda espécie de mortificação!”Que exemplo para o nosso orgulho, que não suporta nem uma leve suspeita!
17 DE OUTUBRO
GOLPES DE MISERICÓRDIA
Os golpes que sofremos na vida vêm do alto. São golpes de misericórdia, golpes
de Cirurgião, para curar. Ferem, causam dor, provocam gemidos? Não importa.
Deixemos que o Médico Divino faça a operação necessária. Sem ela nos
perderemos. Bendigamos a Mão Divina, que nos fere por misericórdia. É mão de
pai, de amigo, que nos quer salvar. Não há outro remédio para nossa salvação. O
Senhor, na Sua Providência Amorosa, decretou bater-nos, ferir-nos. Faça-se a
vontade Divina, toda santa, toda amável! Um dia, no Céu, compreenderemos
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tudo. Como castigo, Deus, muitas vezes deixa-nos na prosperidade. Felizes os
que são batidos pela Mão Divina! É o sinal mais certo de que caminham para a
salvação. Sofremos, choramos, aflige-nos a dor? Vamos! Coragem! Deixemos
que os golpes nos firam, que nos abram feridas, que as façam sangrar! Tudo será
bom para o Céu! É com sangue e com lágrimas que se argamassa aqui o edifíciodo Amor. São golpes de Misericórdia ou, melhor, do Amor Misericordioso. Nas
nossas aflições, é assim que devemos rezar: “Batei, cortai, feri, meu Deus,
contanto que me salve. Faça-se a Vossa Santíssima e Adorável Vontade!”
Nos golpes que nos vêm do alto, há Justiça e Misericórdia. A Justiça pune e expia
o pecado. A Misericórdia salva, purifica e nos leva ao Amor.
18 DE OUTUBRO
A MELHOR DAS ORAÇÕES
A melhor das orações é o Pai-Nosso e, no Pai-Nosso, o melhor é aquele – “Seja
feita a Vossa Vontade assim na terra como no Céu”. Nesse conceito está o
segredo da santidade. Não basta dizer: “Senhor! Senhor!” É mister acrescentar:
“Seja feita a Vossa Vontade. “Não são os que dizem: “Senhor! Senhor! – diz o
Evangelho – que hão de entrar no Reino dos Céus, mas sim os que fazem a Vontade do Pai Eterno”. Pouco importam mil coroas e devoçõezinhas originais se
não sabemos conformar a nossa vontade com a Vontade de Deus. Já o disse e
repito: “Fazer o que Deus quer e querer o que Deus faz, é a melhor das orações”.
E nisto se resume toda a vida cristã. A oração de conformidade é a mais perfeita e
agradável a Nosso Senhor. Por que nos sobrecarregamos frequentemente com
tantas devoções, até com prejuízo dos deveres mais graves de estado e as
observamos todas tão escrupulosamente, se o essencial, que é o dever, talvez
monótono, fica esquecido e desprezado, e não aceitamos sem revolta o que Deus
Nosso Senhor nos envia de sofrimentos e cruzes? Digamos, sim, o Pai-Nosso,
todos os dias, e com fervor. Não nos esqueçamos, porém, de que, se a prece
dominical é a melhor das orações, é justamente porque, naquele – “Seja feita a
Vossa Vontade assim na terra como no Céu” – resume-se toda a vida cristã!
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19 DE OUTUBRO
FELIZ PENITÊNCIA QUE ME DEU TANTAGLÓRIA!
São Pedro de Alcântara, prodígio de penitência e de oração, viveu sofrendo. É de
apavorar o que dele escreveram os seus biógrafos. Quanto não padeceu de
disciplinas, jejuns, calúnias, perseguições, maus tratos, martírios cruciantes!
Viveu no Calvário, observou toda a austeridade dos anacoretas. Nosso Senhor
não se deixa vencer em generosidade. O Céu é recompensa tão grande e tão
desproporcionada aos maiores sofrimentos desta vida, que tudo é pouco para tão
grande glória! São Pedro de Alcântara, no esplendor da glória, aparecendo aSanta Teresa, disse-lhe, como o vencedor que recebeu a palma do triunfo: “Feliz
penitência! Oh! sim, feliz penitência que me alcançou tamanha glória!” Quando,
nesta vida penosa e triste, certos golpes, reveses e privações nos custarem o
sangue do coração! Coragem! Vamos! Um olhar para o Céu! Seja a nossa
penitência, a penitência que nos mandar Jesus, isto é, a contrariedade, o revés, a
doença, tudo, tudo o que vier das mãos de Deus! Mais vale aceitar
resignadamente a cruz que Nosso Senhor nos põe sobre os ombros do que
procurar voluntariamente outras, cujo peso nossos ombros tão fracos talvez não
possam suportar! Eia! Coragem! Tudo passa! Soframos o dia só desta vida, e
teremos o gozo eterno. No Céu nos alegraremos de ter sofrido aqui. Oh! feliz
penitência que nos dará tanta glória!
20 DE OUTUBRO
BONDADE E JUSTIÇASegundo Bossuet, a bondade e a justiça Divinas são como que os dois braços de
Deus. Destes, é a bondade o direito. Tudo o que de meritório aparece em todas as
obras, é a bondade que faz. Deixem conduzir-se os homens pela bondade e ela os
encherá de benefícios e de munificências. A bondade e a justiça operam em
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campos diferentes. A primeira precede à segunda. O que ela, de princípio,
institui, é perfeito e são. Agrega-se-lhe, porém, depois, o pecado, criando o
terreno para a ação da justiça. Entre a bondade e a justiça há esta diferença: ao
passo que a justiça não invade as atribuições da bondade, esta se antecipa muitas
vezes à ação daquela com a munificência do perdão ao delinquente do pecado.Deus é justo, mas é bom também, é naturalmente bom. Assim como a água corre
naturalmente da fonte e o sol espalha naturalmente os seus raios, assim também
Deus pratica naturalmente o bem e quer naturalmente o bem. Sendo, por
natureza, infinitamente bom e possuidor de riquezas infinitas, deve Ele, também
por natureza, ser benfazejo, liberal, magnífico. Quando a Justiça de Deus castiga
o ímpio, não a move Deus, que não quer a perdição de ninguém, mas sim a
malícia e ingratidão que atraem a indignação e o castigo. Se Deus é naturalmente
bom, por que o temor? E quem teme a Justiça Divina deve, com todo o cuidado,
fugir do pecado, que tanto a provoca.
21 DE OUTUBRO
BONDADE ONIPOTENTE
Deus é Onipotente e, sendo Onipotente, é bom. Já meditamos um pouco essa
verdade e estamos dela persuadidos? Em Deus une-se a bondade ao Poder
Soberano. Não é uma razão, e das maiores, para que tenhamos confiança? A
Liturgia sempre repete: “Oh! Deus, sois bom e todo poderoso!” É mister que
tenhamos a persuasão firme, inabalável, de que Deus é a Bondade Onipotente.
Diz o Padre Ravignan:
“Enquanto a alma não estiver firmemente persuadida da união desta bondade
com o poder de Deus, não tem senão a metade da força e do amor, nem faz uma
ideia perfeita do socorro Divino, do qual tudo devemos esperar. A fé, que nada
teme, é sempre necessária às almas que querem imitar corajosamente a Jesus
Cristo. Tenham elas a esperança de tudo conseguir!”
Deus é meu Pai. É o Pai que está nos Céus. É Pai Onipotente. Nem todo pai
socorre e protege o filho na medida que deseja, por falta de possibilidade. O meu
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mais ofender ao Senhor. Quanta misericórdia! Jesus é SALVADOR. “Vim para
salvar o que estava perdido”, declara-nos Ele, cheio de bondade. O pecador, pois,
não pode nem deve desanimar. Não é Jesus o Cordeiro de Deus que apaga os
pecados do mundo?
Confiança! Confiança!
23 DE OUTUBRO
AS LÁGRIMAS DO PECADOR
A conversão de um pecador é jubilosamente festejada pelos espíritos celestes.
Segundo Bossuet, são tão preciosas as lágrimas dos pecadores que as recolhem,
na terra, para serem levadas ao Céu. E tamanha é a sua virtude, que se estende
até os anjos, sendo para maravilhar que estes têm mais estima pelas lágrimas que
os pecadores derramam do que pelas que chora a própria inocência. Assim, a
amargura da penitência tem, para os anjos, mais doçura que as mesmas doçuras
da devoção. Compreendei, ó pecadores convertidos, que as vossas lágrimas
penetram no Céu porque vão alegrar os anjos. Vede como as lágrimas da
penitência são proveitosas para os que as derramam, pois que também o são para
os espíritos angélicos. Que abundante satisfação produzirá, um dia, também emnós, a aflição de um coração arrependido, se já a produz nos anjos, aos quais o
Filho de Deus, por sua graça promete tornar-nos semelhantes. “Bem-
aventurados os que choram”, disse Nosso Senhor. Não foi BEM-AVENTURADA
aquela pecadora que, sem hesitar um instante, correu à casa de Simão e chorou,
arrependida, aos pés de Jesus? Bem-aventurados são também, e mil vezes
felizes, tantos pecadores que acharam mais consolação e alegria nas lágrimas da
contrição do que em todos os prazeres da terra!
Ó meu Jesus, como é bom chorar arrependido aos vossos pés! Nunca é
desprezada a lágrima do pecador!
24 DE OUTUBRO
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SEJA O QUE DEUS QUISER!
Nada nos acontece sem permissão divina. Só o que Deus quiser, e nada mais. E
isto nos deve encher de consolação, porque Deus só quer o nosso bem. Assim,
devemos aceitar com a mesma indiferença a saúde ou a doença, porque, comotudo, elas nos vêm da misericórdia Eterna. Que podem temer as almas
entregues, em total abandono, nas mãos de Deus? Chega ao cume da perfeição o
que vive abandonado e inteiramente submisso aos decretos da Divina
Providência. Se a essa adorável Providência nos entregarmos, acolheremos com a
mesma indiferença a humilhação ou a glória, a secura, a aridez, a privação ou
toda a unção das Divinas consolações, a vida ou a morte. Em tudo e por tudo
diremos sempre. SEJA O QUE DEUS QUISER! É uma jaculatória semelhante
àquela SEJA FEITA A VOSSA VONTADE do Pai-Nosso e do Jardim das Oliveiras.
Não nos preocupemos com o futuro, com o que nos poderá suceder de bom ou
de mau, com a ideia de nos vir a caber em particular a glória ou a humilhação, a
pobreza ou a riqueza. SEJA O QUE DEUS QUISER! O futuro a Deus pertence!
Quanto ao presente, por que nos aborrecermos a todo instante com as ninharias
que nos absorvem os dias? SEJA O QUE DEUS QUISER! O santo abandono de
uma alma nos braços da Divina Providência inunda-a de paz e a torna
invulnerável. Portanto... Vamos... Em tudo... SEJA O QUE DEUS QUISER!
25 DE OUTUBRO
COMO É BOM ENTREGAR-SE À DIVINAPROVIDÊNCIA!
A Providência de Deus é admirável e infinita. Intervém em tudo, reina em tudo efaz reverter tudo em sua glória. Por que nos inquietarmos? Deus sabe o que faz!
E tudo faz para nosso bem. Por isso dizia Santa Joana de Chantal, a admirável
filha de São Francisco de Sales: “O perfeito abandono de nós mesmos nos braços
da Divina Providência, a aquiescência amorosa a tudo que de nós quiser, o santo
afeto de lhe agradar pelos atos de todas as virtudes, segundo as ocasiões,
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sobretudo a santa caridade e a humildade, – tudo isso é lenha que alimenta o
sagrado fogo do amor celeste”. A entrega total, o perfeito abandono nas Mãos da
Providência, eis o ideal da perfeição, porque a perfeição é o amor e o abandono é
o cume da montanha do Amor. “É fora de dúvida – diz o melífluo Doutor – que
deveríamos contemplar cem vezes por dia essa amorosa Providência de Deus,que, por previdência, tem sempre o seu coração voltado para nós como, pela
confiança, devemos ter o nosso voltado para Ele. E, fundindo os nossos corações
na sua Divina vontade, deveríamos exclamar devotadamente: Ó Bondade de
infinita doçura! Quanto é amável a vossa vontade e quanto são para desejar os
vossos favores! Arme-se o Céu contra mim, contra mim conspirem a terra e os
elementos, declarem-me guerra todas as criaturas... Nada temo! Basta-me saber
que estou com Deus e que Deus está comigo!”
Como é bom entregar-se à Divina Providência!
26 DE OUTUBRO
UM AMOR BRANDO, SOSSEGADO E TERNO
São Francisco de Sales, que é mestre incomparável na arte do Amor Divino, diz
que o Senhor quer que O amemos, mas com um amor brando, sossegado e terno.Nada de inquietações e desespero! Caímos? Não é para admirar uma coisa tão
comum à fragilidade humana. Esforcemo-nos por fazer tudo com perfeição. A
confiança não dispensa o esforço – e um esforço grande – para a perfeição. Se,
entretanto, cairmos, a despeito de nossos esforços e boa vontade, que fazer?
Paciência!
Confiança! Abandono! Inútil é que nos revoltemos contra nós mesmos, em
desesperos e inquietações. Devemos odiar os próprios defeitos, não com um ódiocheio de despeito, mas com um ódio tranquilo. O desespero agrava o mal, abre
novas feridas. O nosso amor-próprio se revolta. Não queremos a humilhação de
ser pobres, pequenos, fracos, miseráveis! E nos revoltamos cheios de orgulho.
São Francisco de Sales assim nos aconselha:
“Esforçai-vos por fazer tudo com perfeição e não vos preocupeis depois com o
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que tiverdes feito, pensando, sim, no que resta a fazer e caminhando com
singeleza na via do Senhor, sem atormentar o espírito. Considerai vossos defeitos
com mais dó que indignação, com mais humildade que severidade, e conservai o
coração cheio de um amor brando, sossegado e terno.”
27 DE OUTUBRO
LÍRIOS ENTRE ESPINHOS
Atormentam-se pobres almas inocentes com as mais horrorosas e imundas
tentações contra a angélica virtude. É um suplício e dos mais dolorosos. O pior e
mais penoso, é que, após o combate, ficam numa desolação de dúvidas cruéis,
sensações desagradáveis e um mal-estar de verdadeira agonia. Os lírios maisformosos são os que florescem entre espinhos. Assim a bela virtude. Nesta vida
mortal, até os maiores santos padeceram terríveis assaltos do Demônio e da
Impureza. Deus quer a virtude provada e bem polida, como pedra rara ou como
ouro, no crisol das tentações. Não vos inquieteis demasiadamente, almas
piedosas, com o horror das tentações impuras. “Como é possível – diz a infeliz
alma tentada – como é possível, a um coração casto, o assédio de tantos maus
desejos? Como pode o meu espírito, a minha imaginação ter pensamentos tão
indignos? Não serei um monstro de impureza?” Oh! não, pobre alma, não és um
monstro de impureza. A tua virtude permanece intacta e bela, como o lírio entre
espinhos tão pungentes das tentações infernais. São Paulo, arrebatado aos céus,
vivia unido a Jesus Cristo, numa identificação de amor. “Vivo – diz ele – mas não
sou eu que vivo. Vive Cristo em mim.” E tão grande santo foi tentado
horrivelmente pela carne. E Deus não o livrou de tais tentações, para conservá-lo
na humildade. Confiai em Jesus e sofrei a tentação. Não sereis vencidos!
28 DE OUTUBRO
TENTAÇÕES DE BLASFÊMIA
Até as almas mais santas sofrem tentações de blasfêmia. O pobre e santo Jó não
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foi cruelmente instigado pelo inferno a blasfemar contra o Céu? Santa Catarina
de Sena e grande número de outras almas santas padeceram esse suplício. O
próprio São Francisco de Sales, tão paciente, tão dócil e resignado à vontade de
Deus, não poucas vezes teve ímpeto de blasfemar. É uma provação horrorosa e
repugnante para um coração que ama ou deseja amar a Nosso Senhor! Como vencê-la? O melífluo Doutor nos dá, de ciência própria, o seguinte ensinamento:
“Não vos aflijais com as tentações de blasfêmia. Deixai que o demônio as
maquine à vontade, mas conservai bem fechadas as portas da alma, pois que lhe
virá o cansaço ou será ele, afinal, obrigado por Deus a levantar o cerco.
Considerai que o tamanho barulho que ele faz em torno da alma é sinal de que
ainda não penetrou nela. Coragem! Enquanto puderdes dizer, resolutamente,
mesmo sem sentir – VIVA JESUS! – nada deveis temer”. Calma na tentação! O
demônio tenta perturbar-nos, contando tirar partido para vencer, na confusão, e
assim se lançar em nosso interior. Quando perturbados pelas horríveis tentações
infernais, devemos voltar a alma para Nosso Senhor, recitar repetidas
aculatórias e atos de fé, e tranquilizar-nos. O inferno que bata e ruja à nossa
porta! Não lhe daremos entrada! E é só. Não teremos depois senão que suportar,
pacientes e tranquilos, o barulho exterior.
29 DE OUTUBRO
AS CRUZES DA PROVIDÊNCIA
As cruzes que nos envia a Divina Providência são melhores do que as que
voluntariamente procuramos na penitência. Diz São Francisco de Sales que as
cruzes que encontramos pelas ruas são excelentes, e que mais o são ainda – e
tanto mais quanto mais importunas – as que se nos deparam em casa. Valem
mais as cruzes do que as disciplinas, os jejuns, e tudo o mais que inventou aausteridade. É entre elas que resplandece a generosidade dos filhos da cruz e dos
habitantes do Calvário. As cruzes que a nós próprios nos impomos são inferiores,
por que, por isso mesmo que são nossas, têm menos merecimento. Humilhemo-
nos e recebamos com alegria as que nos forem impostas contra a nossa vontade.
Com o comprimento da cruz cresce o seu preço. Sejamos fiéis até a morte e
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teremos a coroa de glória. Amemos o crucifixo. Não queremos ser crucificados?
Recebamos com amor as cruzes que sem nossa escolha nos forem dadas por
Deus. Bendigamo-las, pois estão perfumadas com a essência do lugar donde
procedem. Onde houver menos escolha, haverá mais agrado de Deus. Nosso
Senhor nos mostrou bem que não devemos escolher as cruzes, mas tomá-lascomo nos vierem. Quando Ele morreu para nos resgatar e satisfazer a vontade de
seu Pai Celeste, não escolheu a cruz, tendo aceitado humildemente a que lhe fora
preparada pelos judeus. Façamos também assim. Como são meritórias as cruzes
que nos manda a Providência Misericordiosa de Deus!
30 DE OUTUBRO
SERVIR POR AMOR
O filho serve ao pai como filho e não como escravo, sem temer o castigo nem
esperar recompensa. Quer agradar ao pai e dar-lhe prova de amor filial. Amor por
amor! Para o coração verdadeiramente amante, a única recompensa para o amor
é o próprio amor. É com afeto filial que devemos servir a Deus. Para nos provar
que esse dom de piedade filial nos é dado pelo Divino Espírito Santo, diz São
Paulo na epístola aos Romanos: “Não recebemos o espírito de temor e de
escravidão, mas o de adoção de filhos de Deus, em virtude de que O chamamos
de Pai”. Como é doce chamar a Deus de Pai e servi-Lo como filho! É necessário
pregar o amor às almas tímidas, demasiadamente assustadas com os rigores da
Justiça Divina. Um filho só deve ter o receio, principalmente se é pequenino e
fraco, de se afastar dos braços paternos... Façamos como as criancinhas que,
sempre confiantes e abandonadas nos braços dos pais, não têm outra
preocupação senão a de amá-los. Assim nos aconselha São Francisco de Sales; e
a admirável missionária do Amor Misericordioso, Santa Teresinha, mostrando-nos o Evangelho, convida-nos a fazermo-nos criancinhas e entregarmo-nos ao
amor, num abandono filial. Oh! Sirvamos a Deus como filhos. Há tão poucas
almas que O servem por amor!
31 DE OUTUBRO
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A ORAÇÃO DOS ENFERMOS
O enfermo se purifica no sofrimento. Por oração lhe bastam estas palavras,
muitas vezes repetidas: “Meu Deus! Meu Pai! Faça-se a Vossa Santíssima
Vontade!” Basta que as recite mentalmente, se não o puder fazer com os lábios. Oessencial é que saiam do coração. Aliás, o sofrimento já é em si uma oração.
Que fazer a criatura se lhe tirar Deus a saúde e a reduzir a um estado penoso e
difícil de inação? Blasfemar? Não, mas, pelo contrário, recitar esta jaculatória de
amor resignado e confiante: “Bendito seja Deus!” Nosso Pai do Céu sabe, melhor
do que nós, o que faz e só faz o que é necessário. A recitação de uma simples
aculatória basta para santificar a doença e encher o enfermo de méritos para a
vida eterna. “Já que a doença nos faz gemer e suspirar, diz São Francisco deSales, suspiremos por Deus. Entre jaculatórias gemidas e gemidos de
aculatórias, vamos levando a cruz da enfermidade.”
A oração é mais aceita na doença do que em qualquer outro tempo,
principalmente a oração de conformidade. Não nos aflijamos se as dores, o sono,
o cansaço, o abatimento geral não nos permitirem orar nem meditar, na doença.
Se nós, que somos maus, não exigimos esforços grandes aos doentes, como os há
de exigir Nosso Senhor, que é tão bom? O gemido do enfermo já é uma oração. Eele que diga e repita, se não com os lábios, ao menos de coração: “Faça-se a
Vossa Vontade, ó meu Deus”! Por que, pois, a aflição na doença, pelo motivo de
não podermos rezar?
1 - Mgr. Laveille - Sainte Therèse de l’Enfant Jesus - c.XI.
2 - Lettre à Soeur Agnès de Jesus./3 - Novissima Verba - 19 de agosto, 1 987.
3 - Novíssima Verba - 23 agosto, 1987.
4 - D.Vital Lehodey - Saint Abandon - II part. c. V.5 - Sainte Marie M. postel - 2ºvol. - c. XXVII.
6 - História de uma alma - c.XII.
7 - Elizabeth de la Trinité - XII - XIII.
8 - Gema Galgani - Cs. IV e VI.
9 - Vie de Saint François de Salles - I - V.
252
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10 - l’ Esprit de Saint François de Salles - I.
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1 DE NOVEMBRO
O CÉU! O CÉU!
Como nos faz bem o pensamento do Céu! Ajuda-nos a sofrer e nos enche deesperança! Escrevia Santa Teresinha à sua irmã1: “Tenho sede do Céu, dessa
mansão bem-aventurada, onde se amará Jesus sem restrições! Mas, para lá
chegar, é preciso sofrer e chorar; pois bem! Quero sofrer tudo o que aprouver ao
meu Bem-Amado, quero deixar que Ele faça de sua bolinha o que quiser!”
Logo estaremos na eternidade e veremos plenamente realizado, conforme nosso
ardente desejo, o nosso sonho de eterna felicidade! Não nos impacientemos! “A
figura deste mundo passa” – diz o profeta Isaías2 –, e passa depressa. Logochegaremos à Pátria, ao Céu. E lá não haverá lágrimas, nem morte, nem dor,
nem luto, nem gemidos. Santa Maria Egipcíaca, após a sua maravilhosa
conversão, foi viver no deserto, em cuja horrorosa solidão permaneceu mais de
cinquenta anos, na mais dura penitência. Quando a santa estava quase a expirar,
perguntou-lhe São Sózimo como pudera ela suportar, durante tantos anos e
naquele lugar de horrores, uma vida tão austera: “Meu padre, com a esperança
do Céu!”3
Ah! O Céu! O Céu! Que doce consolo para quem sofre! Santos do Paraíso, ajudai-
me na luta pelo Céu!
2 DE NOVEMBRO
PENSAMENTOS CONSOLADORES DOPURGATÓRIO
Segundo um dos biógrafos de São Francisco de Sales, o santo dizia e sempre
repetia que, em sua opinião, devemos tirar mais consolação do que temor do
pensamento do Purgatório. Verdade é que, naquele lugar de expiação, são tão
grandes os tormentos que não se lhes podem comparar as maiores dores desta
vida. Mas também as alegrias interiores são lá de forma tal que não há neste
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mundo prosperidade nem, alegria que as igualem. E quereis saber por que
consola o pensamento do Purgatório? Pois é o próprio São Francisco de Sales
quem o vai mostrar: – “1. As almas ali vivem numa contínua união com Deus. –
2. Estão perfeitamente conformadas com a vontade de Deus. Só querem o que
Deus quer. Se lhes fosse aberto o Paraíso, prefeririam precipitar-se no Inferno aapresentar-se manchadas diante de Deus. – 3. Purificam-se voluntariamente,
amorosamente, porque assim o quer Deus. – 4. Querem permanecer da forma
que agradar a Deus e por todo tempo que for da vontade d’Ele. – 5. São
invencíveis na prova e não podem ter um movimento sequer de impaciência,
nem cometer qualquer imperfeição. – 6. Amam mais a Deus do que a si próprias,
com amor simples, puro e desinteressado. – 7. São consoladas pelos anjos. – 8.
Estão certas de sua salvação, como uma esperança inigualável. – 9. As suas
amarguras são mitigadas por uma paz profunda. – 10. Se é infernal a dor que
sofrem, a caridade derrama-lhes no coração inefável ternura, a caridade que é
mais forte que a morte e mais poderosa que o inferno. – 11. O Purgatório é um
feliz estado, mais desejável que temível, porque as chamas que lá existem são
chamas de amor”.
Na verdade, padece-se muito no Purgatório. Mas como nos consola a certeza de
que o martírio que lá se sofre é o martírio do Amor e de que se tem lá o conforto
da esperança!
3 DE NOVEMBRO
OS ESQUECIDOS
Quando morremos, vamos para aquela região que o salmista denomina “terra do
esquecimento”. Já Santo Agostinho dizia, com mágoa: “Oh! como nos
esquecemos dos nossos mortos!” E São Francisco de Sales acrescentou: “Não
nos lembramos bastante dos nossos mortos; tanto é assim que não falamos
muito deles. Fugimos do assunto como de uma coisa funesta”. Deixamos os
mortos enterrarem seus mortos. Extingue-se em nós a sua memória com os
dobres do sino. Pouca gente se lembra de que a verdadeira amizade não pode
terminar com a morte, porque mais forte do que esta é o amor verdadeiro. Só a
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Religião de Jesus Cristo cultiva, com extremos de ternura, a amizade consoladora
e forte que atravessa os túmulos e vai até o seio da eternidade! Só as almas
verdadeiramente piedosas jamais se esquecem dos entes queridos que a morte
lhes arrebata. O dogma da comunhão dos santos é uma das fontes mais ricas de
consolações da Igreja. Graças a ele não seremos esquecidos para sempre. Todosos dias, no Altar sagrado o ministro do Senhor tem em lembrança os mortos, com
saudades, e implora para eles a misericórdia Divina. O ofício Divino repete
sempre: “E as almas dos fiéis, pela misericórdia de Deus, descansem em paz”.
Como é consoladora a nossa fé! Humilhe-nos o pensamento da morte, que nos
fará esquecidos. Console-nos o dogma da comunhão dos santos. Para a Igreja,
nossa Mãe querida, nunca seremos esquecidos.
4 DE NOVEMBRO
MISERICÓRDIA PARA OS MISERICORDIOSOS
Deus, que julgará “as justiças da terra”, no dizer do salmista, há de, também, usar
de misericórdia para com os misericordiosos. É da Escritura, que a caridade cobre
a multidão dos pecados, isto é, que ela cobre, não alguns pecados, apenas, mas “a
multidão dos pecados” (1Pd 4,8). Que motivo de confiança na misericórdia
Divina terá todo aquele que neste mundo usar de misericórdia para com seu
próximo! A caridade faz milagres. A esmola redime, sobe ao Trono Divino e faz
descer sobre o coração generoso de quem a deu todas as bênçãos do Céu. Ainda
mais: a esmola vai à região dos mortos, levando refrigério às benditas almas do
Purgatório. Podemos socorrer os nossos mortos queridos, ser-lhes ainda úteis,
ajudá-los melhor do que quando, nesta terra de exílio, viviam ao nosso lado.
Tomemos, para isso, o piedoso costume de dar a esmola pedindo orações pelos
nossos parentes e amigos falecidos. “Oh! se nos fosse revelado – escreve SãoJoão Crisóstomo – o bem que a nossos mortos fazem a esmola que damos ao
mendigo e a oração que a este pedimos! Nossa esmola se torna onipotente,
comove o coração de Deus, alcança d’Ele quanto pede. Se quisermos, portanto,
no dia tremendo da Justiça, quando nossa pobre alma pecadora se apresentar
ante o Juiz Supremo, se quisermos misericórdia e perdão, – sejamos desde já
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misericordiosos. BEM-AVENTURADOS OS MISERICORDIOSOS, PORQUE
ALCANÇARÃO MISERICÓRDIA.”
5 DE NOVEMBRO
CHORAR CRISTÃMENTE OS MORTOS
A Religião de Nosso Senhor Jesus Cristo não proíbe que choremos os nossos
mortos queridos. Podemos, pois, render a estes o tributo de nossas lágrimas e de
nossas saudades. Com esta pobre natureza, como ficarmos insensíveis ante a
morte de um ente estremecido? Como nos custa ver arrebatados pela morte os
entes com os quais convivemos, nosso pai, nossa mãe, nosso filho, nosso irmão,
nosso amigo!... A Religião, se bem que nos ensine a ser fortes na dor e a meditarna Paixão de Jesus Cristo, não nos veda aquelas lágrimas e saudades. Ela não
tem o estoicismo pagão, estúpido e antinatural. Pois Jesus não chorou na
sepultura de Lázaro? Não choraram, na Paixão, Maria e Madalena e as Santas
Mulheres? A Religião nos permite chorar do mesmo modo os nossos mortos.
Quer apenas que o façamos, não como os pagãos, desesperados e desiludidos,
mas como quem tem esperança na vida eterna e crê na imortalidade. Choremos a
separação dolorosa, mas com a doce esperança de que, um dia, numa pátria
melhor, onde não haverá luto, nem dor ou sofrimento de qualquer espécie, nem
separação, tornaremos a ver todos aqueles que amamos aqui na terra. Como essa
esperança consola! O cristão não deve dizer, com desespero, ante o cadáver
gelado de um ente querido: “Nunca mais te verei! Adeus para sempre!” Não!
Embora em pranto, suas palavras devem ser estas: “Até ao Céu! Lá nos
tornaremos a ver e seremos para sempre felizes!”
6 DE NOVEMBROSURPRESAS DA MISERICÓRDIA!
Feridos pelo golpe cruel da separação de um ente querido que a morte nos veio
arrebatar, sentimos consolo em vê-lo partir para a vida eterna confortado com os
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últimos sacramentos e entre as orações da Santa Igreja. Mas, ai! como é triste ver
traiçoeiramente surpreendido pela morte, ainda afastado dos sacramentos, por
quem tanto rezáramos! Partir assim, sem se reconciliar com Deus! Que grande
lástima! Cruel pensamento para uma alma verdadeiramente piedosa! Entretanto,
ninguém deve desesperar da salvação de quem quer que seja. A Igreja que, nacanonização dos santos, declara que certo justo que está no Céu, jamais permitiu
que se publicasse um decreto declarando alguém no inferno. São Francisco de
Sales não queria que até o último suspiro dos pecadores se desesperasse da
conversão destes, nem que se julgasse mal dos que morressem após uma vida
má. E dava esta razão: “Nem a primeira graça, nem a última, que é a
perseverança, são méritos nossos. Ambas são gratuitas. Entre o último suspiro
de um moribundo e a eternidade, entre Deus e a alma se passam certos mistérios
de amor que só no Céu conheceremos um dia”. Console-nos, pois, o pensamento
de que no Céu nos esperam muitas SURPRESAS DA MISERICÓRDIA DIVINA!
7 DE NOVEMBRO
MEU ANJINHO!
Que criança encantadora! Era o raio de sol de um lar feliz. De repente, a mão
gelada e inexorável da morte vem ceifar a florzinha ainda não desabrochada de
todo para a vida! Quem pode avaliar a dor imensa de um coração materno, ferido
na sua corda mais sensível e delicada? Chorai, mãe cristã! É tão natural o vosso
pranto e tão necessário para o desafogo do coração! Mas não vos desespereis!
Vosso filhinho, tão belo, tão puro, não deveria ficar mais na terra, porque a
vontade de Deus o queria no Céu. Ora, vamos! Coragem! “Eis o vosso filhinho no
Céu – diz São Francisco de Sales – com os santos e anjos inocentes. Ele conhece
bem agora o trabalho que com ele tivestes durante o pouco tempo em que delecuidastes e se recorda das orações que por ele recitastes. Em troca, roga por vós a
Deus e pede-Lhe que abençoe sua mamãezinha querida, que, no mundo, chora,
saudosa, e que lhe dê bastante conformidade com a vontade do Senhor. Oh!
como foi ele feliz em ter voado para o Céu sem haver conhecido a malícia do
mundo!” Já não tendes sobre os ombros a responsabilidade da educação e da
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salvação eterna de um filho. E como as lágrimas de saudade que verteis pela
morte do anjinho, que roga por vós no Céu, são diferentes das que derramam
tantas mães desventuradas, que por aí assistem à ruína moral de seus filhos!
Deveis agradecer a Nosso Senhor que, livrando-vos de tamanha
responsabilidade, deu-vos um anjinho e um protetor no Céu!
8 DE NOVEMBRO
NÃO DESESPERAR DA SALVAÇÃO DOSSUICIDAS
Suicidou-se! Está perdido e condenado para sempre Oh! Não digamos assim do
infeliz que, num ato de desespero, deu cabo da existência. Verdade é que a Igrejacondena o suicídio como um crime hediondo. Ela quer ensinar-nos o respeito à
vida que não nos pertence, e a resignação à vontade de Deus, sem jamais ter dito
ou ensinado que o suicida esteja condenado e perdido para sempre. Quem pode
saber o que, em tão violento transe, passa-se entre Deus e a pobre alma? Quem
pode penetrar no pensamento do infeliz suicida após o disparo da arma fatal?
Não havia tempo, dir-se-á. Que importa? Uma palavra, um grito, um olhar, um
ato de amor Divino, suscitados pela misericórdia Divina, bastam para a salvação,naquela hora extrema. Além do mais, uma enfermidade mental, uma
neurastenia profunda, uma fraqueza de momento, não são razões de molde a
mover-nos ao perdão do pobre suicida? E, então, Deus, que é Pai, que se inclina,
cheio de misericórdia, sobre nossas misérias, há de ser mais duro de coração do
que nós, que somos tão maus? Oh! O suicídio não se justifica. É, na verdade, um
crime e um crime hediondo. Entretanto, não devemos chorar, desesperados, os
que assim acabam tragicamente a vida, porque não podemos nem devemos
desesperar da salvação de quem quer que seja!
9 DE NOVEMBRO
O PAI DOS QUE NÃO TÊM PAI
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A morte veio arrebatar alguém que era tudo nos teus dias: teu pai, e pai
carinhoso e terno. Olha para o Céu e lembra-te de que Nosso Senhor nos manda
chamar a Deus de pai: “Nosso Pai”. Vem de Deus toda paternidade e, como diz o
Apóstolo, ninguém é tão pai como Ele. É o Senhor Pai de Misericórdias e Deus de
todas as consolações! Na tua aflição, recorre a Ele. “Os homens – diz Jó – sãoconsoladores importunos. Quanto consola a só ideia de que Deus não me
abandona, de que Ele é meu Pai, e o mais carinhoso dos pais!” Mostrando à
família a imagem do Sagrado Coração, exclamava um operário no leito da agonia:
“Meus filhos, vou morrer, mas não vos deixarei sem pai, porque, neste Coração
Divino e misericordioso, achareis sempre o Pai dos que não têm pai! Belo
testamento! Quando o “poverello” de Assis, perseguido pelo pai, deu-lhe tudo
quanto possuía e, só e nu, viu-se despojado de todo laço terreno, levantou as
mãos para o Céu e entregou-se a Deus, podendo exclamar: “Agora sim, posso
dizer em verdade: – Meu Pai que estás no Céu”.
Quando nos fere o golpe da orfandade e a imagem tão doce de nosso pai
desaparece nas sombras da morte, deixando-nos o coração vazio, triste, a
sangrar, Ó meu Deus, como é preciso olhar para o Céu e invocar a vossa doce
Paternidade! Senhor, Pai dos que não têm pai, sede meu Pai, Pai de misericórdia
e Deus de toda consolação!
10 DE NOVEMBRO
A PRESENÇA REAL DE MINHA MÃE!
Nada mais triste – escreveu Frederico Ozanan – nada mais desolador do que o
vácuo aberto pela morte em redor de nós. Conheci esse tormento depois da
morte de minha mãe, porém, durou pouco. Não tardaram a vir outros
momentos, em que cheguei a compreender que não estava só e que algo, de uma
suavidade infinita, passou-se dentro de mim. Era uma confiança que não me
havia abandonado. Era uma presença benfazeja, embora invisível. Era como se
uma alma estremecida me acariciasse, de passagem, com a ponta de suas asas. E,
assim como outrora, eu reconhecia agora os passos, a voz, a respiração de minha
mãe. Quando um bafejo aquecia, reanimava as minhas forças, quando uma ideia
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nobre preponderava em meu espírito, quando um impulso generoso abalava a
minha vontade, logo me vinha o pensamento de que partia dela. Há instantes de
comoção súbita em que me parece ver minha mãe ao meu lado. Há certas horas
em que se estabelece uma espécie de diálogo entre os nossos corações, e então
choro mais, talvez, do que nos primeiros meses, mas a essa melancolia semistura uma paz inefável. Quando pratico o bem, quando faço qualquer coisa
pelo pobre a quem ela tanto socorria, quando estou em paz com Deus, que ela
tão bem serviu, – parece-me que ela me sorri de longe. Às vezes, ao rezar, julgo
ouvi-la rezando comigo. Finalmente, quando comungo, quando o Salvador vem
visitar-me, afigura-se-me que ela O segue até o meu coração, como tantas vezes
o seguia, em viático, à casa dos pobres. E, então sinto A PRESENÇA REAL DE
MINHA MÃE JUNTO DE MIM!”
Oh! Como é consolador chorar com a saudade benfazeja de uma santa mãe já
morta!
11 DE NOVEMBRO
A SAUDADE DE NOSSOS MORTOS
A saudade de nossos mortos é cruciante e amarga. Sentimos um vácuo profundo,quando a morte nos rouba algum ente querido. Abre-se a ferida e parece que
nunca mais se cicatrizará. Só o tempo consegue suavizar um pouco a dor.
Contemplemos Nossa Senhora da Soledade, naquelas horas amargas em que Ela
chorava a ausência cruel do seu Amado Filho. Juntemos nossa saudade a
saudade de Maria. Ela também experimentou as saudades de um filho e a tristeza
da viuvez. Consolemo-nos. Nossos mortos queridos terminaram a sua
peregrinação pelo mundo. Chegaram à Pátria, onde um dia os tornaremos a ver.
A vida passa tão depressa! Não choramos quando alguém que amamos se
ausenta de nós por alguns dias, porque temos certeza de que depressa o veremos
de novo. Que é, afinal, a vida, em comparação com a Eternidade? Um dia, uma
hora, um minuto, um segundo, menos ainda! O tempo passará veloz sobre nós e
não tardará a chegar a hora de nossa partida, a hora de vermos de novo os que
tanto amamos na terra. A saudade cristã, toda feita de esperança, desaparecerá,
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para nunca mais nos torturar, quando, contemplando no Céu a Eterna Beleza,
amarmos, com amor puro, eterno, os que hoje choramos com uma saudade
amarga e cruel, que nos dilacera o peito!
12 DE NOVEMBRO
O CONSOLADOR
“Nosso Senhor Jesus Cristo – escreve o piedoso autor das Palhetas de ouro, –
para nossa consolação, quis experimentar as amarguras que causa ao coração
humano a perda daqueles a quem ama. Lázaro era apenas seu amigo, conforme
diz Mgr. de Segur, e, todavia, Jesus, que ia ressuscitá-lo, quis sofrer, para
santificá-las, as dolorosas emoções da separação. Quis chorar”. Nada santificamais do que as lágrimas, quando elas são vivificadas pelo amor Divino. Como nos
é dolorosa a morte das pessoas que amamos! No seu esquife mortuário vai um
pedaço de nosso coração, se não toda a nossa vida. Alma cristã, coragem! Para
essas torturas, para tais dores, só há uma consolação, a que o Senhor nos dá,
cheio de misericórdia! Na verdade, somente Vós, ó meu Deus, sois o consolador!
Junto de Vós, de Vossa Mão Paternal, que fere e cura, acha o pobre coração
humano a paz e felicidade, não deste mundo, mas do Céu. Que vale ser feliz
neste mundo? Esta vida é toda de ilusão, de desenganos cruéis, traições,
abandono de tudo e de todos! Só não é infeliz quem tem a graça e a fé.
Apeguemo-nos à tábua de salvação que nos oferece a Religião, à doce esperança
cristã. Um olhar para o Céu! Vamos! Coragem! Choremos, como Jesus na
sepultura de Lázaro, mas esperemos, confiantes, o dia da ressurreição e da vida
eterna. Não choremos como os que não creem na imortalidade!
13 DE NOVEMBROMORRER PARA VIVER E VIVER PARA MORRER
“Nesta vida – diz São Francisco de Sales – vivemos morrendo e morremos
vivendo continuamente. Só os que morreram no Senhor são verdadeiramente
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felizes, porque só eles vivem a vida verdadeira.” Não nos aflijamos
desesperadamente quando Nosso Senhor vem chamar para a vida eterna alguns
dos nossos entes queridos. Ele é o Senhor da vida e da morte e só Ele sabe o que
nos convém. Louvemos a misericórdia Divina, quando nos conserva a vida ou
no-la tira. Nas obras de Deus, tudo é bom, tudo é santo. O cristão verdadeiramente avisado e prudente não se apega loucamente à vida. Conforme
o desejo do Apóstolo, ele realiza um “Morro todo dia”, isto é, morre cada dia mais
para as vaidades e loucuras do mundo e do pecado, a fim de viver em Cristo
Senhor Nosso, “Viver para morrer” e morrer para viver a vida verdadeira e eterna.
Que belo ideal! Nossa vida é uma morte contínua e nossa morte é uma vida
infindável. Diz a Igreja dos que morreram no Senhor: natalício, nascimento. Que
bela e tocante expressão de nossa imortalidade! Começamos a viver na morte, e
vivemos na vida sempre a morrer. Sejamos como a semente que, atirada ao chão,
morre, mas, germinando, chega a transformar-se em árvore frondosa e carregada
de frutos.
Senhor, que minha vida se passe nessa morte gloriosa que me há de conduzir à
vida verdadeira e eterna, isto é, a Vós mesmo, que sois a Vida!
14 DE NOVEMBRO
VERDADEIRAS DORES E VERDADEIROSCONSOLADORES
“Se há verdadeiras dores – escreve Joseph de Maistre – muito mais raros são os
verdadeiros consoladores.” O egoísmo, a leviandade do homem moderno
afastam-no do leito dos enfermos e das câmaras mortuárias, e, se acontece
algum aparecer em qualquer desses lugares, orgulhoso, cheio de sensualidade,
saturado de prazer, é para aconselhar distrações. Não pensa em consolar, mas
em distrair. Como pode o materialista grosseiro consolar o que sofre, se lhe falta
a doce esperança cristã? Numa de suas mais belas cartas de consolação cristã,
escreve Joseph de Maistre a uma senhora que perdera um filho querido: –
“Quem mais do que vós, senhora, tem necessidade de se elevar aos altos e
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consoladores pensamentos! O sacrifício de vosso filho morto desaparece diante
do vosso. O dele foi só o da morte, ao passo que o vosso é o de lhe ter
sobrevivido. Todas as consolações humanas são vãs. Tirai os olhos da terra deste
deserto ensanguentado, e devassai o véu da morte: vereis que o vosso filho está
na eternidade”. Sócrates, pouco antes de tomar a cicuta que lhe deu a morte,disse aos seus amigos: – “Quando dispuserem de meu corpo, não digam que é a
Sócrates que se vai incinerar ou sepultar. Não me confundam com o meu
cadáver”. Sócrates falava como pagão e apenas para consolar os seus discípulos.
Quanto a nós, temos a esperança cristã. Vosso filho morto não se confunde com
o seu cadáver. A crisálida grosseira e feia desfez-se em pó e a borboleta imortal,
abrindo suas asas de ouro e azul, voou para a Pátria. Tudo o que amamos e
admiramos em nossos mortos queridos vive, e jamais morrerá. Doce
pensamento e suave esperança! Verdadeira consolação!
15 DE NOVEMBRO
LÁGRIMAS DE UMA VIÚVA CRISTÃ
A uma viúva cristã, São Francisco de Sales escreveu esta carta consoladora: “Meu
Deus, como esta vida é enganadora! E como são breves as suas consolações!
Num momento aparecem e noutro se dissipam. Se não fora a eternidade para
onde se dirigem nossos dias, com razão lamentaríamos a nossa condição
humana. Escrevo-vos com o coração cheio de desgostos pela perda que tivestes
e, ainda mais, pela ideia do golpe que o vosso deve receber quando lhe for
revelada a infausta notícia de vossa viuvez, tão repentina e lamentável. Deus, que
vos deu esse marido, foi também quem o chamou agora para Si. A nossa
natureza, a cuja condição não podemos escapar, é feita de tal modo que
morreremos em hora imprevista. Eis porque precisamos ter paciência e procuraradoçar o mal que não nos é possível evitar. Além disso, vamos pensar na
Eternidade, onde nos serão reparadas todas as perdas e se restaurará a nossa
sociedade depois de desunida pela morte. Suportemos pacientemente a
separação cruel, a saudade martirizante. Que as lágrimas de uma viúva cristã
sejam lágrimas de saudade e de esperança; saudade do companheiro tão querido,
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que a morte arrebatou, e esperança, a doce esperança de que, um dia, há de
encontrá-lo na vida eterna e feliz do Céu!”
16 DE NOVEMBRO
A VOZ DE MINHA MÃE!
Escuta, filho querido e saudoso, a voz de tua santa mãe, agora no seio da vida
eterna. Ela ainda te ensina a amar e a servir a Deus, ainda te fala da virtude e do
bem. Não queiras manchar a tua alma no pecado nem trair a respeitável memória
de tua santa mãe. Escreveu o Padre Perreupe a um amigo que houvera perdido a
mãe: “Meu caro: A terra é a cidade da ilusão, do sonho, da dúvida. As realidades
verdadeiramente dignas deste nome estão num mundo melhor. Quando os entesque amamos vão dormir no Senhor, não ficam perdidos para nós, e a palavra
“órfão” não me parece cristã. Sei o que são as dores que te afligem. Só o tempo e a
Mão da Providência as podem mitigar. Abraço-te, meu filho, e apraz-me dizer-te
que tua mãe, como um anjo da guarda, protege, por ordem de Deus, a tua
uventude. Ela te fala ainda ao coração. Quando, na tua alma, ouvires o eco de
um bom desejo, de uma boa inspiração, de uma resolução generosa, fica atento:
ele reflete a voz que tanto amavas. Se, quando és tentado pelo pecado ou
seduzido pelas coisas proibidas, ouves, dentro de ti, como que o murmúrio de
uma reprovação, acata-o: é a voz de tua mãe. Se um dia essa voz te convidar a te
chegares com mais ternura a esse Deus que abençoou a tua infância e se te
repreender por te afastares do altar de tua primeira comunhão; se ela avivar em ti
recordações que fazem chorar e que triunfam sempre nos corações nobres, ouve-
a, e te salvarás. É a voz de tua mãe”.
Como é bom ouvir sempre no coração a voz de uma santa mãe!
17 DE NOVEMBRO
LOGO NOS VEREMOS DE NOVO
No Céu tornaremos a ver os nossos mortos queridos e os reconheceremos. Que
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grande felicidade, depois de lhes havermos chorado tanto a ausência cruel de
longos anos, amargurados pela saudade que só se extingue na sepultura! Que
alegria, no fim da vida em tão bela companhia! “Meu Deus – exclama São
Francisco de Sales – se a boa amizade humana é tão agradavelmente amável, que
não será ver a suavidade sagrada do amor recíproco dos bem-aventurados?”
No Céu nos veremos e nos amaremos verdadeiramente. Este pensamento
suaviza muito a chaga aberta no coração, quando vemos partir alguém que muito
amamos, para a vida eterna! Logo nos veremos de novo! Logo, sim, pois que a
vida passa tão depressa! Não nos deixemos arrastar ao desespero. Não somos
pagãos. O que além-túmulo nos espera, se formos fiéis a Deus e à sua santa lei, é
a visão beatífica do Senhor e, nessa visão, que sacia plenamente, veremos
também, à luz do Eterno Sol de nossas almas, os entes que nos precederam namorte. E nunca mais os perderemos, porque lá não haverá mais luto, nem
pranto, nem tristeza, nem dor.
18 DE NOVEMBRO
DEUS O PERMITIU! SILÊNCIO!
Era uma vida tão preciosa, tão necessária para o bem das almas, para a família,para a pátria e para a Igreja! E a morte impiedosa e cruel vem arrebatá-la, quem
sabe, no momento mesmo em que mais útil parecia! Que fazer? Queixar-se de
Deus, maldizer a Providência? Seria loucura. É-nos incompreensível a razão por
que aprouve a Deus o sacrifício de uma vida tão cara. Silêncio! Deus o permitiu!
Louvado seja o Senhor! Ignoramos os planos e desígnios da Providência com
relação às criaturas. Não temos senão que curvar a cabeça e adorar o Senhor em
silêncio. “Deus sabe o que faz”, exclama o povo em sua sabedoria.
Uma excelente mãe de família, modelo exemplar de vida cristã, cheia de filhos
ainda pequeninos e tão necessitados do carinho materno, é arrebatada pela
morte. Chamou-a Deus a Si! Quem pode compreender semelhante decisão da
Providência? Deus o permitiu! Silêncio! Mais tarde, aqui ou no Céu, saberemos
tudo e louvaremos a Misericórdia Divina que assim operou.
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Diante de certos golpes da vida, de certas calamidades e fracassos,
incompreensíveis à nossa razão, só nos resta fazer como Jó: louvar ao Senhor
que assim o permitiu.
Deus o permitiu! Silêncio! Silêncio! Nenhuma blasfêmia!...
19 DE NOVEMBRO
AS AMIZADES DEPOIS DA MORTE
No Céu conheceremos nossos parentes e amigos e haveremos de amá-los mais
do que durante a nossa vida neste mundo. “A contemplação da Essência Divina –
diz Santo Tomás de Aquino – não absorve os santos de maneira a impedir-lhes a
percepção das coisas sensíveis, a contemplação das criaturas e a sua própria ação.
Reciprocamente, essa percepção, essa contemplação e essa ação não os podem
distrair da visão beatífica de Deus. Assim era em relação a Nosso Senhor aqui na
terra.4
Que consolação para nós quando, feridos pela saudade, choramos a morte de
amigos e parentes queridos! É tão difícil, em meio das paixões e vicissitudes
deste mundo, sustentar a amizade aqui na terra contra as ingratidões e tantos
outros contratempos e obstáculos! No Céu, entretanto, nós nos amaremos em
Deus, de uma amizade pura, sublime, como é a dos eleitos. Disse Santo
Agostinho que os bem-aventurados formarão uma cidade onde terão todos uma
só alma e um só coração, de tal sorte que, na perfeição dessa unidade, os
pensamentos de cada um não serão ocultos aos outros. Lá não haverá olhares
indiferentes. Todos serão mutuamente amigos, na harmonia de uma intimidade
deliciosa. “Oh! – exclama São Francisco de Sales – como essa amizade é preciosa
e como é preciso amar, na terra, como se ama no céu!”
20 DE NOVEMBRO
UMA CONSOLAÇÃO
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A esmola corporal e a esmola espiritual nos ajudam a aliviar o sofrimento das
benditas almas do Purgatório. A nossa caridade pode estender-se além-túmulo e
chegar até a Igreja padecente. Consola-nos este pensamento. Tenhamos piedade
de nossos mortos queridos.
Por eles, diz Berlioux, velemos à cabeceira dos agonizantes; por eles, visitemos os
prisioneiros; por eles, protejamos os órfãos; por eles, consolemos as viúvas; por
eles, enxuguemos as lágrimas dos que choram. E que a nossa caridade,
diminuindo os sofrimentos deste mundo, que é um Purgatório também, suavize
e abrevie para os nossos irmãos defuntos o Purgatório da outra vida!
O que nos retém, quando se trata do alívio e livramento destas queridas almas? O
que poderia servir-nos de escusa, se as esquecêssemos, quando nos é tão fácil
irmos em socorro delas? E quem virá, um dia, em nosso auxílio, se nada fizermospelos outros?
21 DE NOVEMBRO
OS AMIGOS NO CÉU
Como há de ser doce a amizade no Céu, se, já neste mundo de misérias e
contradições, é tão suave e confortadora! Aqui, nosso coração sofre para
sustentar a amizade entre reveses e duros sacrifícios. Não choremos com
desespero os nossos amigos que partiram. A morte, já o vimos, não separa os
corações. A verdadeira amizade, a amizade cristã, é eterna. Escrevia São
Francisco Xavier, lá das Índias, a Santo Inácio, seu pai espiritual e seu maior
amigo: “Dizeis, no excesso de vossa amizade por mim, que desejaríeis
ardentemente ver-me ainda uma vez antes de morrer. Ah! só Deus, que vê o
interior dos corações, sabe quão viva e profunda impressão causou em minhaalma este doce testemunho de vosso amor para comigo! Cada vez que me lembro
dele – e isto se dá muitas vezes – involuntariamente me correm lágrimas dos
olhos. Peço a Deus que, se não nos tornarmos a ver na terra, gozemos unidos, na
feliz eternidade, o repouso que não se pode encontrar na vida presente. De fato,
não nos tornaremos a ver, senão por meio de cartas. Mas no céu, ah! sê-lo-á face
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a face! E, então, como nos abraçaremos!”5
Oh! quem poderá descrever os transportes de santa alegria dos amigos, no Céu!
Depois das trevas e lutas do exílio, sempre unidos na provação, dois corações
sinceramente amigos, amigos em Jesus, ei-los agora felizes, no Céu! Realiza-se a
palavra da Escritura: “O amigo fiel é um remédio que dá a vida e a imortalidade, e
os que temem o Senhor encontrarão um tal amigo”.6
22 DE NOVEMBRO
SEMPRE UNIDOS
São Francisco de Sales considera a verdadeira amizade cristã um prelúdio e
antegozo do Céu. “Se a nossa amizade – escreve o santo – transforma-se em
caridade, em devoção, em perfeição cristã, ó Deus! quanto será preciosa! Oh!
como é bom amar, na terra, como se ama no Céu, e aprender a estimar-nos,
nesta vida, como nos havemos de estimar e querer eternamente na outra.” Os
corações unidos aqui pelos laços de uma amizade pura e sobrenatural,
continuarão sempre unidos no Céu. São Vicente de Paulo teve uma consoladora
visão na morte de Santa Chantal, a fundadora da Visitação. Sabendo da grande
enfermidade de Santa Chantal, pôs-se São Vicente a rezar por ela. E viu comopequeno globo de fogo, que se elevava da terra e se ia reunir nas regiões do ar a
outro globo maior e mais luminoso, e ambos reunidos se elevaram mais,
entraram e se derramaram num outro globo, infinitamente maior e mais
luminoso do que os primeiros. Interiormente ouviu o santo a explicação do
mistério. O primeiro globo era a alma de Santa Chantal, o segundo, a de São
Francisco de Sales e o terceiro, a Essência Divina. As duas almas se uniram e
ambas, a Deus, ao seu Soberano Princípio.7
Tal será, no Céu, a união dos corações que se amaram verdadeira e santamente
neste mundo. O laço da amizade cristã é a fé! E, no Amor Divino, na Caridade
Eterna, em Cristo, unem-se aqui as almas. Na morte, essa união será ainda mais
perfeita.
23 DE NOVEMBRO
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DEUS TOMOU O QUE LHE PERTENCIA!
Morreu-nos algum ente querido. Sentimo-lo, e isto é natural. Mas, sem grave
injustiça, não podemos revoltar-nos contra Deus. Cabem-nos, respeitosamente,
nos lábios, um grito de dor, os gemidos que o golpe nos obriga a dar. A blasfêmia,nunca! Deus tem direito ao que lhe pertence. Viemos de Deus e para Ele
voltaremos. É a ordem da criação. Os que morreram voltaram para o seu Senhor.
Por mais que os amássemos aqui, não nos pertenciam. Como chora desolada
esta pobre mãe, amargurada por uma saudade imensa do filhinho querido!
Ah! Se ela soubesse que o anjinho idolatrado de seu coração saiu de seus braços
para o seio de Deus e é tão feliz no Céu! Se meditasse bem no quanto se alegrou o
coração de Deus recebendo uma almazinha inocente no Paraíso! Oh! Por certonão havia de se revoltar contra Deus, e numa blasfêmia, queixar-se do Senhor. –
“Por que tirou Deus meu filhinho? Por quê? Antes não tivesse ele nascido!” A
mãe de Santa Teresinha, na morte de seus filhos, toda resignada, jamais admitia
essa linguagem em seus lábios, linguagem tão comum, infelizmente, disse ela,
nas mães sem uma piedade esclarecida, sem uma fé bem viva. “Deus me deu,
Deus me tirou! Bendito seja Deus! Faça-se a Vossa Vontade, meu Deus! Eu Vos
entrego, meu Deus, eu Vos restituo o que é Vosso! Tende piedade de uma mãe
aflita! Ofereço-Vos, meu Senhor, este sacrifício!” Rezai assim, mães aflitas. E o
consolo de nossa fé há de aliviar a vossa dor.
24 DE NOVEMBRO
O AMANTE DA CRUZ
São João da Cruz foi uma imagem viva de Jesus Crucificado. A Igreja o proclama“exímio amante da cruz”. Sofria ele um contínuo martírio. No corpo, longas e
dolorosas enfermidades. No coração, golpes de desprezo e ingratidões de amigos
e beneficiados seus. Quantas calúnias, insultos e desprezos não suportou em
toda a vida! E, corajoso, alegre, por se assemelhar ao Divino Mestre Crucificado!
Ouvi estas palavras de tão grande mestre: “Desejais gozar neste mundo. Se
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soubésseis como é glorioso para Deus e útil para vós sofrer; nunca havíeis de
procurar em parte alguma o gozo, as alegrias desta vida. Ao invés, olharíeis a cruz
que Deus vos põe aos ombros como de todas as graças a maior”. O grande
amante da cruz vivia todo absorvido na contemplação do mistério do Calvário.
Nosso Senhor, aparecendo-lhe, pergunta o que deseja como recompensa pelomuito que fizera para as almas e para a glória de Deus: “Senhor – responde o
santo – só quero, como recompensa, sofrer e ser desprezado por Vós!”
Que heroísmo! Sublime resposta! Oh! São João da Cruz, não temos o vosso amor
à cruz, mas alcançai-nos, ao menos, a conformidade à vontade de Deus nas
tribulações da vida!
25 DE NOVEMBRO
“SURSUM CORDA!”
Deus separa agora o que Ele uniu, mas para reunir tudo depois numa vida
melhor e eterna. Logo se há de romper o véu que nos encobre a visão Divina, e
no Senhor veremos os que choramos saudosos. Que pensamento consolador! –
“Fico sempre comovido – escreveu Lamenais – quando leio, na Escritura
Sagrada, aquelas histórias ingênuas dos dias antigos, no tempo dos patriarcas.Tempo feliz em que os homens viviam e morriam com tanta calma, como quem
dorme depois de um dia fatigante e laborioso”. “Iam juntar-se aos pais” – e a
morte era só isto. Por que também não fazemos assim? Por que, no dizer do
Apóstolo, afligimo-nos tanto com os que não têm esperança? Veremos depois, na
glória, os nossos mortos, naquele dia que já nos marcou a Divina Providência. E,
naquela região da luz, da paz, do amor e da verdade, veremos também como
Nosso Senhor foi misericordioso conosco, permitindo-nos sofrer neste mundo.
Rezemos e muito, nas aflições. A oração consola e leva o coração para o alto.
“Sursum corda!” “Levantai os corações!” diz-nos a Liturgia Sagrada a cada
instante. Sim. Arranquemos este pobre coração dilacerado pela dor,
arranquemo-lo da terra para o Céu. Quando se sofre e o golpe é profundo e
dolorido, o pobre coração não tem outro recurso, outro alívio senão no Céu.
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“Sursum corda!” Vamos! Elevemos para o Alto, para a atmosfera dos
pensamentos sobrenaturais, este pobre coração ferido!
26 DE NOVEMBRO
A PAZ NA DOR
Nas grandes dores do coração e de nossa alma, nada podem os homens sem
Deus. Só Deus, que envia o sofrimento, é de uma doçura inefável. “O mundo vê a
cruz – diz São Bernardo – mas não vê a unção”. Louis Veuillot, esse homem de
uma fé viva e ardente, consolava-se, na morte de seus filhos, dizendo: “Vejo
meus filhos no Céu, ao lado de sua mãe, como estavam unidos aqui, porém
felizes, imortais. É um grupo de estrelas a brilhar e esclarecer o caminho deminha vida. Vem do além-túmulo, sobre meu coração, uma serenidade Celestial
e Divina. Que milagres faz Deus por nós, que somos tão ingratos! Que
misericórdia fazer-nos achar a paz numa tão grande dor! O sulco que se abriu em
nosso coração se enche de uma semente de fé, de esperança e de amor! Não há
morte; há separação. Houve uma ausência apenas, que amanhã pode terminar”.8
“Sim – exclamava ainda aquele cristão verdadeiro e sincero, Deus me deu, Deus
me tirou! Seja bendito seu santo nome!” Tudo o mais é inútil acrescentar!Esperemos tranquilos o dia da ressurreição. Consolemo-nos em Jesus Cristo, e
Jesus Cristo Crucificado por nós. Com ele morramos agora para a ressurreição
futura!”
27 DE NOVEMBRO
NOSSA ESPERANÇA
Há homens materializados, pagãos, sem esperança alguma além-túmulo. Julgam
encontrar alívio no pensamento de uma aniquilação total da criatura humana
após a morte. É a esperança pagã. A esperança dos gentios, diz Santo Ambrósio, é
que a morte faça acabar todos os males. E, como tiveram uma vida estéril, assim,
dizem, a morte será apenas o fim de uma carreira de sofrimentos a que
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estávamos presos. Quanto a nós, cristãos, mais generosos, pela esperança na
recompensa, somos mais resignados, porque temos motivos de consolação. Não
cremos ter perdido, mas apenas enviado um pouco antes de nós os que
morreram, não como vítimas para a morte, mas como cidadãos para a
Eternidade! Não julgueis assim com tanta crueldade os nossos mortos! Eles nãosão apenas esse barro vil, esse monturo de vermes que ali estão na sepultura. A
bela e grande alma, que o Criador lhes deu, é imortal e vive e espera, talvez, a
vossa piedade, a vossa oração, no Purgatório. Não, mil vezes não! Nem tudo
acaba na morte! A morte nunca foi aquele aniquilamento estúpido que prega o
materialismo. Seria um desespero passar assim pela vida, à espera só de um
túmulo, de um monturo de vermes e um punhado de cinza! Deus não nos criou
para o aniquilamento, mas para a Sua Glória e para o Seu Amor, isto é, para a
felicidade eterna!
28 DE NOVEMBRO
O SOFRIMENTO E O PURGATÓRIO
“Aliviemos as almas do Purgatório – diz São João Crisóstomo – aliviemo-las por
tudo o que nos penaliza, porque Deus tem cuidado em aplicar aos mortos os
méritos dos vivos.” Escreve Berlioux: “O sofrimento é a grande satisfação que o
Senhor pede aos devedores da Justiça”. Logo, soframos pelos nossos mortos, a
fim de que eles sofram menos. Oh! se tivéssemos uma fé mais viva, uma caridade
mais ardente, que mortificações nos imporíamos a nós mesmos para libertar do
Purgatório nossos parentes e amigos, eles que tanto nos amaram, que sofreram,
talvez, por nós, e estão agora sofrendo de maneira tão horrível! Já que não somos
capazes de tamanhas penitências como os santos, tenhamos generosidade para
alguns pequenos sacrifícios. O sacrifício de um prazer, de uma afeição perigosa,de uma leitura má, de uma vaidade, etc. “Escolhei a melhor vítima, aconselha o
P. Félix, S.J., escolhei-a, sobretudo, no fundo de posso coração.” Por aqueles que
amais, sacrificai o que tendes de mais caro. Sacrificai-vos a vós mesmos, e que o
preço do sacrifício pessoal se torne o resgate do sofrimento.” “Ah! vejo,
acrescenta o Pe. Berlioux, vejo essas almas felizes elevarem-se para o Céu nas
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asas de nossos sacrifícios, de nossas austeridades e sofrimentos!” Que objeto de
consolação e de esperança! Ó meu Deus! Ó Jesus Crucificado, fazei-nos
compreender o valor do sofrimento!
29 DE NOVEMBRO
A MÃE DAS ALMAS DO PURGATÓRIO
Maria Santíssima não é só na terra a consoladora dos aflitos. O amor de tão doce
e santa Mãe se estende até as chamas expiatórias do Purgatório. Que mãe ficaria
insensível vendo um filho num braseiro ardente, a sofrer? Nossa Senhora, a mais
terna das mães, não é insensível ao padecimento horroroso de seus filhos. Sobre
o fogo vingador da Justiça Eterna, derrama a Santíssima Virgem a chuva benfazeja do seu carinho Materno. “Oh! como é boa Maria, exclama São Vicente
Ferrer, para os seus filhos que gemem no Purgatório! Por sua intercessão, a todo
momento, são consolados e socorridos.” Disse Nossa Senhora a Santa Brígida:
“Eu sou a Mãe de todos que estão no Purgatório, porque todas as penas infligidas
aos mortos, para expiação de suas culpas, são aliviadas pelas minhas orações”.
Como é bom ser filho de Maria! Socorre-os Ela na triste peregrinação pela vida,
socorre-os naquela derradeira hora, a hora da passagem para a Eternidade. E vai
além o seu amor materno. Desce ao Purgatório, visita seus filhos, consola-os. Ó
Maria, doce estrela de Jacó, que brilhais sobre o Oceano de fogo que se chama
Purgatório, tende compaixão das pobres almas, almas de meus queridos, almas
abandonadas que expiam no Purgatório. Boa Mãe, vinde em meu socorro, doce
alívio de minha alma, doce refrigério do Purgatório!
30 DE NOVEMBRO
SANTO ANDRÉ E A CRUZ
Santo André, cuja festa a Igreja celebra hoje, foi um dos mais apaixonados
amantes da cruz. Após fadigas e mil tribulações sofridas pelo nome de Cristo, no
apostolado tão difícil e duro entre os bárbaros da Citia e da Trácia, o desejo louco
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de sofrer ainda não havia saciado o coração do apóstolo. Em Patras, na Acaia, foi
condenado à morte, e à morte da cruz, como Jesus Cristo, o doce objeto de seu
amor. Nunca se viu ninguém tão apaixonado pelos gozos da terra como André,
pela cruz. Viu-a e delirou de amor. Saudou-a em transportes de alegria. Abraçou-
a. Exclamava ele – ó boa cruz, instrumento mais de felicidade que de tormento,quanto tempo te desejei! É possível conhecer-te e não te amar? O que procurei
sem descanso foi a ti. Afinal te possuo, todos os meus desejos estão satisfeitos.
No delírio de seu amor, ele desejaria que da mesma alegria que o faz estremecer
participasse a cruz. “Que! – exclama São Bernardo – é tanta a alegria que se
possa comunicar ao lenho!”
Tal é a santa loucura da cruz de que fala São Paulo, loucura que salva e consola.
Oh! Como é belo sofrer e carregar a cruz com Nosso Senhor! O mundo nãocompreende esta linguagem! A loucura do pecado faz sofrer no desespero! A
loucura da cruz faz sofrer em transportes de alegria e de amor!
1 - Lettres - 501 e. à Sainte Marie du Sacré Couer - (Hist. d’une âme-app).
2 - Isaías - 64,4.
3 - Apocalipse 11,4.
4 - Sum. 30. part. Questio 84.
5 - Lettres de Saint François Xavier - Lettre XCIII, nº3.6 - Eclesiástico 6,1 6.
7 - Abelly - Vie de Saint Vicent de paul - Tom. II - cap. VI.
8 - Louis Veuillot - Lettre à Monsieur de Pontmartin.
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1 DE DEZEMBRO
COMO SE DEVE SOFRER
Nosso Senhor mesmo ensinou à confidente de Seu Coração, Soror BenignaConsolata Ferrero, como se deve sofrer e santificar a dor. “Quando sofres – diz-
lhe Jesus – quer interna quer externamente, não percas o merecimento da dor.
Sofre unicamente por Mim. Neste ponto é que a maior parte das almas, muitas
até piedosíssimas, perderam muitos merecimentos, contando o que sofrem a
quem as quer ouvir, pois, embora não se queixem, nem por isso deixam de
desejar a compaixão das criaturas. Quando o Meu Divino Coração manda o
sofrimento, quer que seja recebido com paciência e resignação. Essas pessoasimaginam talvez que aliviarão as suas penas, confiando-as à criatura. A natureza
fica satisfeita com esse desabafo, mas a graça se enfraquece e logo há de faltar
coragem para suportar as penas com amor. Quero ditar-te, Eu mesmo – diz
Jesus – os sentimentos que te deverão animar no meio das maiores provações.
Dirás ao teu Esposo: “Jesus, único Amor de meu coração, quero sofrer o que
estou sofrendo e tudo o que quiseres que sofra puramente por Vosso amor e não
pelos merecimentos que possa adquirir, nem pelo galardão que me prometeis,
mas unicamente para Vos agradar, para Vos louvar e bendizer, tanto na dor comona alegria”. Era assim que Jesus instruía a grande privilegiada alma de Soror
Benigna. Por sua vez, dizia ela, num ato de amor e de renúncia: “Meu Jesus, a
Vossa vontade é a minha vontade. Tomai tudo: pais, parentes, bens, afeições,
saúde, honra, tudo!... Contanto que me deixes o coração para Vos amar. É
quanto me basta!”
Oh! Quem nos dera uma legião de almas assim generosas!
2 DE DEZEMBRO
O PODER DA CONFIANÇA
A confiança tem um poder imenso sobre o Coração de Jesus. Nosso Senhor
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revelou a Santa Gertrudes que a confiança de uma alma faz tal violência ao Seu
Coração, que Ele é forçado a favorecê-la em tudo. Era com uma certa liberdade
que Santa Catarina de Sena orava ao Senhor, no excesso de uma grande
confiança. “Senhor, dizia ela uma vez – não me afastarei de junto de Vossos Pés,
da Vossa Presença, enquanto a Vossa Bondade não me tiver concedido o quedesejo, enquanto não Vos aprouver fazer o que Vos peço.” Continuou ela:
“Senhor, eu quero que me prometais a vida eterna para todos aqueles que eu
amo”. Depois com uma santa audácia, estendia a mão para o Tabernáculo:
“Senhor, ponde a Vossa Mão na minha! Sim, dai-me uma prova de que me dareis
o que Vos peço”. Que confiança!
Escreve o Pe. Sauvé no seu admirável Jesus intime: “Teremos posto em nossas
preces uma confiança total, um pouco desse absolutismo da criança que solicitada mãe o objeto que deseja? O absolutismo dos pobres mendigos que nos
perseguem e que, à força de importunações, conseguem ser atendidos?
Principalmente esse absolutismo, ao mesmo tempo respeitoso e tão confiante,
dos santos, em suas súplicas?” Sim, ou temos uma confiança cega, absoluta, no
Coração de Jesus, ou nada conseguiremos na vida espiritual. Que poder não tem
um só suspiro do coração seguido de um – “Confio em Vós, meu Jesus!...
3 DE DEZEMBROMEUS PECADOS E A MISERICÓRDIA
Quantas vezes o inferno não nos vem segredar maliciosamente aos ouvidos:
“Hás de morrer e serás reduzido a pó. Nada existe além-túmulo. Deixa-te de
ilusões e loucas fantasias! Goza as delícias da vida antes que teu corpo seja um
monturo de vermes”. E os pensamentos do mais estúpido materialismo nos
assaltam furiosamente. A pobre alma resiste com um ato de fé. A tentação agora
é outra: “És uma alma condenada – diz-nos Satã – nada fizeste para a vida
eterna. Estás coberta de pecados e misérias que só merecem o inferno. Já não
terás o perdão. Teus pecados e o abuso da graça te hão de condenar
eternamente”. Que suplício o de uma pobre alma sequiosa do amor de Jesus e
mergulhada num oceano de dúvidas, a se debater nas trevas de horrorosa
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tentação de desespero! Só a confiança pode vencer o Inferno, mas uma confiança
heroica, cega, obstinada como a de Jó. Santa Catarina de Sena, vítima das
tentações de desespero, dizia: “Confio em Jesus Cristo, meu Senhor, porque
vejo, não há comparação possível entre a Misericórdia Divina e meus pecados. Se
todos os pecados que se podem cometer se reunissem numa criatura, seriamcomo uma gota de vinagre no meio do mar”.1
Oh! Que são meus pecados ante a Misericórdia Divina? Há em Deus tanta
misericórdia e tanta, que o coração e a língua humanas são incapazes de exprimi-
la ou sequer imaginá-la.
Ó Misericórdia! Ó Misericórdia! Que mais se pode dizer?
4 DE DEZEMBROAMÉM! AMÉM! AMÉM!
Veio a enfermidade, e o apóstolo, sequioso de almas, sonhando arrebatar e
conquistar muitos corações para Jesus Cristo, vê-se reduzido a uma inação
forçada, preso entre as paredes de um quarto de enfermo, numa solidão, quase
abandonado. Deus assim o quis! E quem pode saber os desígnios da
Providência? O Pe. Perreyve, que havia experimentado essa provação difícil,
escrevia a um amigo em idêntica situação: Meu caro, Deus neste momento te faz
uma pergunta estranha, pergunta que sempre repete Ele às almas que O desejam
servir muito: “Meu filho, consentes em ser absolutamente nada? – Sim, Senhor.
Coragem, meu amigo, demos tudo o que Jesus pede. Esta é a condição para a
fecundidade de nosso apostolado e da felicidade no Céu, Amém! Soframos,
Amém! Trabalhemos, ou nada façamos, o silêncio, a palavra, a doença, a força, a
glória, a vergonha, a vida, a morte!... Amém! Amém! Amém!” Nosso Senhor às vezes se contenta só com a generosidade de nosso coração e o sacrifício que
fazemos. A cruz pesada que nos oferece vale mais aos seus Olhos Divinos do que
todos os prodígios do apostolado exterior. Sacrificai, pois, ó apóstolos enfermos,
sacrificai generosamente a Nosso Senhor vossos planos e ideais. É mais precioso
e mais rico o apostolado do sofrimento. E por vossa generosidade quantas almas
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não salvará Nosso Senhor? Oh! na Eternidade, só na Eternidade, veremos
quantas maravilhas operaram os apóstolos enfermos!
5 DE DEZEMBRO
CRER SEM VER E COMPREENDER
Esmagada sob o peso das mais horrorosas tentações contra a fé, Soror Benigna, a
confidente da Misericórdia Divina, ouviu a doce voz de Nosso Senhor: “Coragem,
minha esposa, coragem! Embora não O vejas, embora não O ouças, o teu Deus
está sempre junto de ti. O sentimento, ainda que dê a certeza, diminui a fé. Retiro
a consolação sensível à alma que quero exercitar perfeitamente na virtude da fé.
É preciso crer sem ver, crer sem compreender”. Assim é que se sujeita a razão ese glorifica a Deus. Queres agradar a Deus? Não te metas a perscrutar os seus
desígnios a teu respeito. Deixa que Ele te trate como melhor Lhe apraz. Com um
só ato da Sua Vontade, pode fazer, no espaço de um minuto, o que exigiria longos
anos de trabalhos e esforços. Gostas muito da oração e isto é excelente:
“contudo, julgas talvez, que, rezando tanto tempo quanto desejas e costumas,
satisfazes plenamente aos teus deveres? Vejo melhor e mais longe que tu, e
assim é que, no fundo de teu coração, percebo um verme roedor... Por fora nada
aparece, mas Eu descubro lá, bem no âmago, aquela complacência secreta,
aquele orgulho refinado que se ocultam sob as aparências da piedade e te levam a
escolher certas práticas que, de ordinário, só servem para alimentar o teu amor-
próprio”. Que faz então o Divino Esposo? Corta, retalha sem dó, sem compaixão,
sem atender aos gemidos da pobre natureza ferida. “Atiro para fora tudo que está
gasto e corrompido para atalhar o mal e evitar maiores estragos e prejuízos.”
6 DE DEZEMBROCADA DIA, O QUE DEUS QUISER!
O segredo de sofrer com paciência é não se inquietar nem com o passado, nem
com o presente, e muito menos, com o futuro. Aceitai o que vier cada dia. Nosso
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Senhor nos manda tomar a cruz de cada dia para O seguir. Notai bem: “a cruz de
cada dia...” – “Basta a cada dia a sua malícia.” Um sofrimento, um revés, uma
doença, um golpe de coração. Aceitemos resignadamente tudo, tudo.
Absolutamente tudo. A natureza se revolta e se impacienta numa agitação estéril
e que só agrava a nossa situação. Façamos ouvir logo no primeiro grito danatureza revoltada a voz tão doce de Nosso Senhor:
“Basta a cada dia a sua malícia.” O Pe. Lacordaire comenta2: “Que bela e tocante
palavra! E como é apropriada à nossa miséria! Não nos inquietemos com o
futuro! Carreguemos somente o fardo de cada dia!” A cruz se torna mais leve
quando aceita por amor. É preciso tomá-la, pois, todo dia. Quanto tempo ficará
assim pesando sobre nossos ombros? Se quisermos santificar-nos deveras... A
vida inteira a carregaremos. “Impossível! Não se pode suportar tamanha dor!” –diz a natureza revoltada. A graça, porém, vence a natureza. E, se Nosso Senhor
nos manda carregar a cruz de “cada dia”, é porque nos dá também “o pão de cada
dia”, o pão da Sua Graça, o pão do Seu Amor!
7 DE DEZEMBRO
O MÉRITO DOS BONS DESEJOS
Consolem-se as boas almas, cheias de ardor apostólico, na sua enfermidade. Esta
página Diário da Confidente do Amor Misericordioso há de lhes falar ao coração.
Estava enferma a esposa predileta de Nosso Senhor. – “Minha Benigna – disse-
lhes Jesus – agora estás aqui sem nada fazer e tinhas tanto que escrever!
Entretanto, agora fazes muito mais, porque fazes a Minha Vontade. Que fiz Eu
quando estava oculto no seio de Minha Santíssima Mãe? Vim para salvar o
mundo e fazia a Vontade de Meu Pai. Assim, há muitas almas que desejariam
fazer muito para Minha Glória, quereriam percorrer o mundo para convertê-lo;
entretanto, estão presas a um leito e, ainda entregues nas mãos de outros. Pois
bem! Por um só ato de resignação à Minha Vontade, elas fazem mais do que se
percorressem o mundo para salvar as almas. Escreve isto que me dá prazer,
porque vai fazer muito bem às almas. Minha Benigna, essas almas não devem
perder as suas energias em inúteis e estéreis desejos de ação. Se elas desejassem
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fazer grandes coisas por mim, mas não fossem resignadas à minha Vontade, seus
desejos não teriam valor e não fariam outra coisa além de as fatigar e esgotar,
como fazem os muitos ramos numa planta. Ao invés, quando elas estão
resignadas à minha Vontade, têm o mérito dos desejos e, se Eu quiser, por elas
posso fazer muito bem às almas.”3
Oh! Apóstolos enfermos, lede esta página de ouro e guardai-a no coração!
8 DE DEZEMBRO
A MÃE DA SANTA ESPERANÇA
Mãe da santa esperança, e esperança até dos desesperados, é Maria Santíssima,
cuja Imaculada Conceição celebra hoje, entre os esplendores da Liturgia, a Santa
Igreja de Deus! “Toda bela sois, Maria. E a mancha do pecado não existe em
Vós.” Assim canta hoje a prece litúrgica. E, para consolo nosso, acrescenta: “Vós,
advogada dos pecadores, rogai por nós, intercedei por nós”. É assim que a Igreja
nos ensina a recorrer à Santíssima Virgem. Canta o privilégio único da Imaculada
Conceição, louva em Maria a criatura mais formosa, mais perfeita saída das Mãos
Divinas, e logo implora a materna proteção da Virgem sob o título, de todos o
mais belo e consolador para nós, pobres mortais, de “Advogada dos pecadores”.Maria, sempre que volveu à terra seus olhares de Mãe, em Lourdes, como nas
aparições da medalha milagrosa, em Sallette, em Fátima, sempre se manifestou
solícita e carinhosa para com os seus filhos, os pobres pecadores. Ela, na gruta
maravilhosa de Massabielle, antes de se dar a conhecer – “Eu sou a Imaculada
Conceição” – pede à inocente Bernadete orações pelos pecadores, penitências
pelos pecadores. Oh! Sois, na verdade, toda bela, ó Maria Imaculada, e cheia de
Misericórdia.
9 DE DEZEMBRO
MILAGRES DA CONFIANÇA
O pobre Jó, todo ferido, no auge do sofrimento e da miséria, ainda esperava no
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Senhor. “Ainda que o Senhor me tirasse a vida, ainda assim esperaria Nele.”
Deus recompensou tamanha confiança, e a saúde e a prosperidade voltaram à
casa de Jó. Exemplos sublimes dessa confiança heroica, sempre os encontramos
nas Escrituras e na vida dos santos. Nunca se ouviu dizer deixasse Nosso Senhor
sem recompensa quem Nele confiou. A confiança faz milagres. Numa de suas viagens, São Martinho caiu nas mãos de salteadores, na estrada. Foi roubado e
despojado. Iam já os bandidos matar o santo, quando, repentinamente, cheios de
um pavor misterioso, puseram-no em liberdade, contra toda expectativa.
Perguntaram depois ao santo Bispo se, no tamanho risco de vida por que
passara, não teria sentido medo. “Nenhum – respondeu ele – eu sabia que a
Intervenção Divina era tanto mais certa quanto menos prováveis os recursos
humanos.” Que bela confiança! Na viagem que fazemos para a Eternidade,
quantas vezes não somos assaltados pelos inimigos de nossa pobre alma!
Tentações, combates terríveis do inferno. Confiemos na Providência! Ela nos
ajudará na hora extrema, quando talvez já não houver mais esperança de socorro
humano. “A Providência – diz São Francisco de Sales – só demora o seu socorro
para provocar nossa confiança.”
Confiança, pois. A confiança faz milagres!
10 DE DEZEMBROO TRABALHO DO DIVINO ARTISTA
O pintor, ao começar a sua obra, traça riscos na tela e faz borrões azuis, amarelos,
verdes etc. Quem não entende e jamais viu como se executam as obras-primas,
sorri, talvez incrédulo e sem perceber o que deseja o artista. Mas uns minutos e o
borrão azul é um céu, o verde, uma campina, o amarelo, um canteiro de rosas. O
quadro maravilhoso aí está, chamando a atenção e a provocar as críticas e
exclamações mais lisonjeiras de todos. A obra maravilhosa do Artista Divino, a
que Ele executa nas almas, é também assim. Quem compreende o que de nós
quer Nosso Senhor, quando, na tela de nossa vida, atira esses borrões feios, de
cores berrantes, de tantas e tão cruéis provações? Ah! Só Ele sabe o que há de
fazer de nossa vida. O plano Divino, como o ideal do artista, não se compreende
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logo no início da obra. Deixemo-Lo trabalhar! Não sejamos tão estúpidos como
os que censuram a tela borrada do pintor. Os planos da Divina Providência nos
são ocultos. Os planos de nossa sabedoria – que mais se poderia chamar loucura
– não coincidem com os planos da Sabedoria Divina. Daí tanto desespero, tantas
amarguras e desilusões dos que não confiam em Nosso Senhor e não têmpaciência, não esperam o fim do trabalho do Divino Artista. Oh! deixai que Jesus,
o Divino Mestre, faça o que quiser na tela frágil de nossa vida! Esperai! Confiai! E
as maravilhas do Artista Celeste hão de extasiar-vos.
11 DE DEZEMBRO
NO JARDIM DA MISERICÓRDIA
“Quando tivermos deixado esta terra de exílio – escreve piedoso autor – e nossos
olhos se entreabrirem aos esplendores e encantos do além, tudo nos será
revelado. Como nos havemos de felicitar então pela nossa confiança obstinada
em Nosso Senhor! Como nos alegraremos por ter tido uma confiança tão imensa
como a nossa imensa miséria.” No jardim maravilhoso do Céu, onde
floresceremos por toda a eternidade, descobriremos, admirados, entre
magníficas rosas e delicadas tulipas e graciosos crisântemos, originais e soberbas
orquídeas de Jesus, as flores mais delicadas e ingratas, que reclamaram do
Jardineiro Celeste tantos e duros trabalhos para conservá-las vivas. Oh!
haveremos de estar, talvez, entre essas flores que exigiram de Nosso Senhor
tamanhos esforços e cuidados! O jardineiro se orgulha quando tirou da floresta
uma orquídea rara e a trouxe carinhosamente para o jardim, entre mil cuidados e
sacrifícios. E tratou-a e vigiou-a dia e noite até que a viu salva e toda bela entre as
demais flores. Jesus se regozijará, quando no Céu nos receber, a nós, pobres
flores agrestes que Ele, cheio de amor, veio buscar na floresta tão feia destemundo, para o jardim da Sua Misericórdia.4
12 DE DEZEMBRO
CONFIANÇA-BARÔMETRO
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“Nossa confiança – diz o Pe. Paulo de Jaegher, S.J.5 – é, infelizmente, como um
barômetro: abaixa com a chuva e sobe com o tempo bom.” Sentimos na oração,
na santa comunhão, um fervor delicioso, um recolhimento doce, lágrimas de
ternura: sobe nossa confiança. Depois, vêm logo, muitas vezes, uma aridez
torturante, fadiga, distrações na oração, provações, etc. Que frieza! Julgamo-nostíbios e indiferentes. A tempestade, a chuva, a borrasca, as trevas. Nossa
confiança desce e desce muito. Bradamos como os apóstolos na barca, à hora da
tempestade: Senhor! Senhor! Salvai-nos, que perecemos! Nosso Senhor permite,
em nossa vida espiritual, essas borrascas e trevas, para experimentar nossa
confiança e firmá-la cada vez mais. Quer ver-nos humildes e bem desconfiados
de nossa fraqueza. Quer que por Ele brademos na hora do perigo e sejamos
forçados, por experiência própria, a reconhecer nossa fraqueza, a sondar o
abismo de nossa miséria. Não tenhamos medo das provações. Fazem bem à
nossa pobre alma. Não nos deixemos influenciar pelas securas e misérias e mil
tentações. Seja nossa confiança firme, inabalável. E mais do que nunca, nessas
horas de provação, peçamos ao Coração Misericordioso de Jesus nos livre da
confiança-barômetro.
13 DE DEZEMBRO
CONFIA E ESPERA!
Lucie-Christine é o pseudônimo que oculta o nome de uma grande mística
contemporânea, que viveu em Paris e nos deixou, em seus escritos, luzes
maravilhosas sobre a Bondade Infinita de Nosso Senhor. Ela escreveu em um
diário íntimo, publicado pelo Pe. Poulain, S.J., esta nota breve e tão sugestiva:
“25 de agosto de 1882 – Bondade de Jesus sentida na Comunhão. – Morremos
sem ter conhecido a bondade de Nosso Senhor, mesmo com estas inefáveiscomunicações”. Oh! É bem verdade. Nunca chegaremos nesta vida a conhecer o
fundo destes abismos da bondade infinita de Jesus Eucarístico! Somos
mesquinhos demais quando desconfiamos da Misericórdia Divina. Bem dizia
Santa Teresinha: “A desconfiança é o que mais fere o Coração de Jesus”. E a
medida das graças é a confiança. “Possuireis todas as coisas sobre as quais se
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estender a vossa confiança – diz São Bernardo – Se esperais muito de Deus, Ele
fará muito por vós. Se esperais pouco, Ele fará pouco.” Confia! Espera! Nunca é
demais a confiança! Somos loucos. O receio de pedir muito, o sentimento de uma
falsa humildade deixam-nos sempre miseráveis e pobres. E podíamos
enriquecer-nos imensamente, como tantas almas confiantes!
Meu Jesus, perdão, não quero jamais desconfiar de Vossa Bondade. Creio no
Vosso Amor Misericordioso, espero tudo de Vosso Coração. Senhor, curai o
perigoso “câncer” de minha desconfiança.
14 DE DEZEMBRO
ABISMO SOBRE ABISMO
Meditemos com Santa Margarida Maria os abismos insondáveis do Coração de
Jesus. Eis como ela nos fala, com tanta eloquência, desses abismos: “O Coração
de Jesus é um abismo de amor, onde havemos de abismar todo o amor-próprio
que em nós existe, com todas as suas produções más, isto é, respeitos humanos e
desejos de nos satisfazer. Se estais no abismo da pobreza e desnudados de vós
mesmos, ide abismar-vos no Coração de Jesus. Ele vos enriquecerá. Se vos
achais num abismo de fraqueza e caís a cada instante, ide abismar-vos na forçado Sagrado Coração, que vos fortificará e vos livrará. Se estais no abismo das
misérias, ide abismar-vos no Coração adorável todo cheio de misericórdia. Se vos
achais num abismo de orgulho e de amor-próprio, de vanglória, abismai-vos no
abismo de humildade do Sagrado Coração. Se vos achais num abismo de trevas,
Ele vos revestirá de Sua luz. Quando vos mergulhais num abismo de tristeza, ide
abismar-vos no abrigo da alegria Divina do Sagrado Coração de Jesus e achareis
um tesouro que dissipará todas as tristezas e aflições de vosso espírito. Nas
inquietações, nas dúvidas, ide abismar-vos na paz desse Adorável Coração. Se
vos encontrais num abismo de temor, abismai-vos na Confiança do Coração de
Jesus e o temor há de ceder lugar ao Amor”.6
Abismo sobre abismo! Ó Jesus, dai-me cada vez mais Amor e Confiança na
Onipotência Misericordiosa de Vosso Coração!
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15 DE DEZEMBRO
ALMAS REPARADORAS
Hoje, mais do que em tempo algum, o mundo, para se salvar, tem necessidade dealmas generosas, de almas reparadoras. “A necessidade de reparar – escreve o
admirável Pe. Plus, S. J.7 – não se impõe somente como dedução dos princípios
sobre que assenta a nossa fé católica e, especialmente, a doutrina do Corpo
Místico e o Dogma da Redenção, impõe-se também como consequência forçosa
de um ensinamento formal, constante e muitas vezes repetido de Nosso Senhor!
Não nos soa ao ouvido a palavra de Jesus: – Fazei penitência! Fazei penitência!
Que é a penitência? Reparação. O mundo, chafurdado na lama da sensualidade,saturado de orgulho sacrílego, tem necessidade de almas reparadoras. E são
poucas! Quem nos dera uma legião de almas como Simone Dennriel, cujo brado
é o de todos os corações generosos que hoje se imolam no altar da reparação. –
Tenho necessidade de sofrer – escreve ela8 – quero sofrer, porque Jesus sofreu
por mim, porque Deus o pede em expiação dos crimes do mundo. Quero sofrer,
porque o sofrimento é a mais poderosa das orações... Porque o sofrimento eleva
e purifica... Quero sofrer, porque a felicidade se encontra no sofrimento e a
minha alma, anseia pela verdadeira felicidade. Sofrer, sofrer durante cem anos,se preciso for, para salvar almas e dar glória a Deus... Tenho necessidade de
oração contínua, que é a força da alma e a chave do Céu. A oração une a Jesus e
ajuda a suportar tudo para sua glória. A oração é irmã do sofrimento. Ambos se
unem para se oferecerem a Deus e salvarem o mundo. Jesus não os separou na
sua vida oculta, nem na Paixão, nem na cruz.”
16 DE DEZEMBRO
VANTAGENS DA PACIÊNCIA NASENFERMIDADES
São tantas e tão consoladoras as vantagens da paciência nas enfermidades que
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impossível seria enumerá-las todas. Vejamos algumas. “A paciência – diz o Pe.
Lapuente9 – coloca-nos no auge da vida cristã, porque ela, segundo o apóstolo
São Tiago, é a que faz a obra perfeita e dela, como diz a Glosa, nasce a perfeição, à
qual se chega pelos oito degraus das bem-aveturanças que Cristo Nosso Senhor
pregou na Montanha. E, dessas bem-aventuranças, a última consiste napaciência.” A paciência é, pois, a pedra de toque para conhecer os graus da
santidade, conforme o que diz o sábio: “A doutrina do varão se conhece na
paciência, porque, sabendo sofrer, descobre que tem a verdadeira sabedoria e
conforma a vida com ela”. A paciência é o sinal certo do amor que temos a Deus.
Torna-nos semelhantes a Jesus Cristo Nosso Senhor, cuja vida foi toda um
exercício de paciência. Faz ainda mártires, porque não pequeno martírio é
superior, sem queixas, blasfêmias e ira, tantas dores da enfermidade. “A
paciência – diz Santo Agostinho – vence todas as coisas adversas, não lutando,
não sofrendo, não murmurando, mas dando graças a Deus por tudo!” A paciência
livra dos males eternos, alcança a coroa de glória, fecha a porta do inferno e abre
a do Paraíso. É a doença uma boa escola de santidade, porque, sofrendo, exercita
a alma na paciência e a paciência leva à perfeição do Amor.
17 DE DEZEMBRO
VIDA, MINHA VIDA, POR QUE TE PERTURBAS?
Nos dias que antecederam a vinda do Salvador, contam as tradições, o templo de
Jerusalém se enchia de rumores e sinais estranhos. Um doutor da lei,
testemunha desses prodígios, exclamou: “Templo, ó Templo, que tens? Por que
te perturbas?” – E falando eu de outro templo da vida humana, digo também,
com o mesmo acento melancólico: “Ó vida! Ó vida! por que te perturbas? Não
encontrarás jamais repouso? Não te acalmas?” Nossa vida é um oceano sempreagitado. Não há sossego. Que queremos? Que buscamos? A felicidade! A
felicidade! E a felicidade nos foge! Quem a conhece? Quem a viu? Eis por que se
perturba nosso coração e vive sempre a padecer, insaciável, louco, à procura de
um ideal, de um sonho irrealizável neste mundo. A felicidade, no dizer de Santo
Agostinho, é o fim último do homem.
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É por isso que o homem se atira loucamente à procura do prazer, da glória, da
satisfação dos sentidos. E encontra depois de tudo um vácuo, um abismo no
coração. Nunca se satisfaz. Por quê? Porque, vindos de Deus, criados para o
Eterno e o Infinito, sempre, fora de Deus, havemos de ser desgraçados. E,
enquanto não chegar aquela Visão Eterna de Eterna Beleza e do Eterno Amor noCéu, nossa vida se passará, como o templo de Jerusalém, à espera do Salvador,
sempre em rumores estranhos e agitações assustadoras.
18 DE DEZEMBRO
“VIDEBIMUS!”
Um religioso da Ordem de São Domingos, ao exorcizar um possesso, perguntouao demônio em que lugar queria ele habitar. O demônio respondeu pela boca do
possesso: “Quisera estar no Céu, para gozar a visão de Deus. Eu só vi um instante
a Sua Face Adorável e, para obter segunda vez esse favor e gozar ainda, um
instante só, a mesma felicidade, aceitaria tudo, tudo o que sofreram todos os
demônios reunidos, desde o começo e até o último dia do Juízo”. Pediu o
religioso ao demônio que fizesse uma descrição da Beleza Divina. – “O pedido
que me fazes – responde o espírito infernal – é insensato, porque a Beleza de
Deus não se pode descrever nem representar. Ainda que se reunissem todas as
belezas criadas, tudo o que há de encanto e perfeição na terra e no Céu, todos os
encantos das flores, o brilho dos astros e das pedrarias, as magnificências do sol e
das estrelas, tudo seria nada comparado à Beleza Divina, ou, melhor, seria noite
escura em presença de um sol brilhante”.10
Oh! Essa Beleza Eterna nos é destinada. E a veremos! “Videbimus!” Que
maravilha e que benefício! Que prodígio de Amor! Oh! Bondade de meu Deus!
Imensa e Divina Ternura! Tinha razão o Santo Profeta Davi para cantar
extasiado: “Oh! Senhor, quão grande é a multidão das Vossas Misericórdias, da
Vossa Doçura, que reservais aos que Vos temem!” Paciência, alma sofredora!
Vale a pena sofrer um pouco. “Videbimus!” – Veremos a felicidade!
19 DE DEZEMBRO
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LIVRE!...
Queremos ser livres. É uma das aspirações mais ardentes da Humanidade. O
sonho do mundo. E como sofre o homem em busca do seu ideal, até hoje em vão
procurando, nesta terra vil, neste mundo de injustiças! As revoluções abalam omundo e a liberdade refulge aos olhos dos sonhadores, aos olhos do povo, como
um raio de luz, para desaparecer logo, deixando-nos em trevas. A liberdade
completa, o paraíso terrestre, que uma filosofia materialista prega, é uma utopia,
suprema loucura. Esse anseio de liberdade que agita nosso coração, não
encontrará, na escravidão horrorosa das paixões libertadas, a sua plena
satisfação. Somos grandes demais e nosso coração tem proporções infinitas. Não
há felicidade terrena que o satisfaça. Livres são os que se libertaram da
escravidão das paixões e do pecado, os que gozam a liberdade de nossos sonhos
quando se realizar o que escreveu o Apóstolo na Visão de Pathmos: “E Deus
enxugará toda lágrima de seus olhos, e não haverá mais morte, nem luto, nem
clamor, nem mais haverá dor, porquanto as coisas de outrora desapareceram”.
Só no Céu, sem o peso de um corpo mortal e cheio de miséria, na posse do Bem
Eterno, na satisfação plena de todos os ideais de felicidade que hoje nos agitam,
só no Céu poderemos dizer em verdade: “Livre! Eternamente livre!
20 DE DEZEMBRO
O DESERTO QUE CHORA
Contam os viajantes, que à noite, quando os vendavais sopram furiosamente as
areias do deserto, ouve-se ao longe como que um soluço, um gemido angustiado.
“Escuta – diz o árabe – escuta o deserto! Não ouves como ele chora? Chora,coitado, porque desejaria tanto ser uma campina, um prado verdejante!”
“Eis aí o coração do homem”, diz com felicidade um Autor. O pecado fez do nosso
coração, outrora campo florido e embalsamado, um enorme, árido e triste
deserto. Uma solidão horrorosa. Mas esse deserto vivo tem consciência de sua
enorme desgraça e quer reverdecer e reflorir. E se queixa, e chora desolado. No
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Céu, só no Céu, o Amor fará o milagre da transformação do deserto. Aqui, nosso
pobre coração, ao vento das paixões e desses sonhos de felicidade, que nos
agitam e nos fustigam dolorosamente; nas trevas de uma noite de incertezas,
dúvidas, martírios e dores de toda sorte, aqui neste mundo frágil e miserável, por
certo há de gemer, há de soluçar o triste deserto de nossa vida. É bem verdade:nossa vida vai passando e vai sempre mergulhada numa tristeza imensa de se ver
insatisfeita. Vai, pobrezinha, de flor em flor, de sonho em sonho, à procura, em
toda parte, de um não sei que, que a possa encher, saciar plenamente. E não
encontra em parte alguma do mundo o que procura. É o eterno deserto a soluçar.
Desilude-te, homem sensual, desilude-te! A felicidade, não a encontrarás fora do
Senhor. Só no Céu o deserto de nossa vida será a campina embalsamada de Amor
e de Verdade!
21 DE DEZEMBRO
MELANCOLIA DAS GRANDES ALMAS
“Não há grande homem sem melancolia”, diziam os antigos. A melancolia nos
grandes corações é uma aparição velada, um sentimento do Infinito, a nostalgia
do Céu. O Infinito é fim supremo dos desejos do homem. Fora disto, nada pode
satisfazer suas aspirações e encher o vácuo imenso que a necessidade de ser feliz
cavou em nossa alma. Chateaubriand estuda com fina psicologia essa imensa e
misteriosa vaga de tristeza que nos invade a alma e faz chorar por um nada, por
uma flor, um olhar, uma recordação, um espetáculo da natureza. Ê uma paixão
que não é a glória, uma paixão que não é o amor, nada de carnal ou terrestre.
Algo de estranho, indefinível, que se apodera da alma e a faz chorar e perguntar a
si própria: “Que tenho? que se passa em mim?” Oh! é o Infinito que fala à pobre
alma sob uma forma vaga e natural. Não é a graça nem a natureza, mas algo deintermediário entre uma e outra.
Deus nos criou para amá-Lo e, sempre que O deixamos, nosso pobre coração,
sedento de felicidade, chora pelo Infinito Amor. E, ainda que não tivéssemos
abandonado o Senhor, haverá, um coração nobre sem melancolia ao
experimentar a miséria, a fragilidade, a vaidade de todas as coisas terrenas? E
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poderá satisfazer-se neste mundo um coração finito com uma sede de felicidade
infinita?
22 DE DEZEMBRO
CORAÇÃO-ABISMO
O coração humano é abismo insondável. Nada o satisfaz na terra. A Escritura o
compara às profundezas do oceano.11 Esse coração busca a felicidade e nunca,
ainda que lhe deem tudo que deseja e a que aspira, e tudo que é desejável e
possível neste mundo, nunca estará satisfeito. Há de gemer como Salomão:
“Vaidade das vaidades, tudo é vaidade”. “Há um momento, diz Lacordaire – em
que as potências todas do homem, saciadas, dão-lhe a invencível certeza do Nadado universo.” Esse universo tão grande, sombra do infinito, caindo num coração
que não tem espaço, perde nele o seu próprio espaço. É a razão dessa imensa e
profunda melancolia que invade, por vezes, os corações nobres. Melancolia que
faz chorar nos festins e nos triunfos mais brilhantes, no apogeu da glória
humana, na saciedade de todo prazer terrestre. Era à consideração da fragilidade
de todas as coisas, do nada de tudo que não é Deus, que Agostinho, sondando as
profundezas de seu coração, exclama: “Senhor, há de andar sempre inquieto
nosso coração até que descanse em Vós”.
23 DE DEZEMBRO
A ETERNA FUGITIVA
A felicidade na terra é a eterna fugitiva. Um relâmpago. Brilha no oriente, some
no ocidente. A terra a vê e exulta, mas ela passa. Passa como a juventude, como a beleza, como o talento, como tudo que é bom. E assim vai esta vida, cheia de
dores e mil angústias, entre luzes e trevas. Buscam os homens a Felicidade como
quem persegue a própria sombra. E o homem, saciado de prazer e de glória,
torna-se infeliz, porque chega à triste realidade das coisas, ao conhecimento
experimental da incapacidade de tudo que é finito para lhe saciar o coração. O
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pobre tem uma ilusão. Quer ser rico. Sonha e vive nessa esperança. É feliz com o
pouco que Deus lhe dá. O rico, porém, que viu nas suas mãos o ouro e aproveitou
seus tesouros para satisfazer todos os desejos e caprichos, não tem necessidade
de filosofia para conhecer o que valem o ouro e os sentidos na questão da
felicidade. Basta-lhe um olhar rápido sobre todas as coisas, para que presencie oespetáculo da desolação humana sob a forma mais dramática. O voluptuoso
pobre tem ainda uma ilusão. O voluptuoso rico não a tem mais. Perdeu, na
saciedade, o último bem dos desgraçados. Só Jesus, que é eterno, e só o Amor
Eterno podem consolar-nos, quando, na terra, a eterna fugitiva nos abandona!
24 DE DEZEMBRO
É BOM SOFRER PARA SER BOM
“Quando se deseja saber o que vale uma alma – escreveu Lacordaire –, é mister
tocá-la. E, se ela não dá o som do sacrifício, esteja ela coberta de púrpura, passai,
passai! Não é uma alma!”
A dor é escola das almas, e não parece ter alma quem não sabe sofrer e se imolar.
O sofrimento revela-nos as profundezas de nossa alma com toda a sua
complexidade e mil delicadezas, e com isso nos revela também as profundezas dealma de nossos semelhantes. Saber sofrer é necessário, ao menos para se não
fazer sofrer os outros. Somos todos para com os outros uma fonte de
aborrecimentos e pesares. A dor santifica-nos, ensinando-nos a doçura, a
caridade suave para com o próximo. O sofrimento é a escola da bondade. Uma
alma vulgar é incapaz de perceber e nem pode suspeitar o que se passa num
coração nobre e nas almas delicadas. E certos espíritos grosseiros passam
indiferentes, como os viajantes do caminho de Jericó, ante as dores secretas e as
chagas doloridas desse pobre samaritano atirado à beira do caminho.
O sofrimento repugna, é verdade, aterroriza a nossa fraqueza, mas é tão belo, tão
luminoso! Quando não nos preparasse uma coroa de glória no Céu, bastava
cultivasse ele em nós a flor da bondade!
Como é bom sofrer para ser bom!
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25 DE DEZEMBRO
“GLORIA IN EXCELSIS DEO!”
Os anjos cantaram no presépio de Belém: “Glória a Deus nas alturas e paz naterra aos homens de boa vontade”.
Jesus baixou à terra. O Príncipe da paz veio estabelecer o seu reino de Amor e de
Misericórdia. E nos dirá: “Eu vos dou minha paz!” A paz de Deus não é como a
dos homens. Os homens procuram a paz nos tratados, nos discursos, mas
guardam no coração tanto ódio e tanta maldade! A Vossa paz, doce menino do
Presépio, ó adorável Menino Jesus, é a paz inalterável e doce que penetra nas
profundezas do coração. Ó doce paz do Senhor, como és boa para os que teconhecem! Mas a paz se encontra na luta contra nossa ingrata e pobre natureza,
rebelde à Graça. E só quem, cheio de boa vontade, abraçou a cruz de Jesus Cristo
e aceitou o combate, só esse goza a verdadeira paz dos filhos de Deus. Vem daí a
felicidade incomparável dos santos. Agora, mais do que nunca, o mundo tem
necessidade de santos, porque o mundo tem necessidade de paz! Santos, isto é,
homens de boa vontade! Precisamos de santos que preguem o amor, como São
Francisco de Assis ou Santa Catarina de Sena, que assim bradava: “Paz! Paz!
Paz!... Nada triunfa no coração do homem como a Paz. O ódio do próximo é uma
ofensa contra Deus. Devemos odiar o ódio”. Venha a paz sobre o mundo, ó
Menino Jesus do Presépio, venha a Paz aos nossos corações!
26 DE DEZEMBRO
EXEMPLO DE PACIÊNCIA
O grande São Remígio, arcebispo de Rheims, mostrou-se, numa desgraça,
modelo de heroica paciência. Ameaçava o país uma crise terrível, e a fome seria
fatal. O santo, previdente, juntou para os seus pobres grande quantidade de trigo.
Uns malfeitores invejosos correram a lançar fogo em todos os celeiros. O santo,
mal teve disso notícia, montou a cavalo e sem demora se precipitou para ver se
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continha ainda os criminosos e salvar o trigo dos pobrezinhos. Mas ai! era já
tarde. As chamas se levantavam, devorando tudo. Que fazer? O homem de Deus
parou o cavalo, contemplou uns instantes aquele espetáculo tão desolador,
apeou e adiantou-se para o fogo. Era um dia de inverno. Começou a esfregar as
mãos e foi aquecer-se tranquilamente ao calor das chamas. E, ao verem-no tãocalmo, admiraram-se todos. – “Meus amigos – disse todo afável e sorridente o
Arcebispo –, afinal de contas, sempre é o calor uma coisa muito boa!”
Belo exemplo de paciência! Se caiu sobre nós uma desgraça irremediável, que
fazer? Aproveitar o que tenha ela de bom. E... Paciência, abandono à Santíssima
Vontade de Deus! É inútil perder a paz. “Há males que vêm para o bem”, diz o
povo. E de grandes calamidades saíram grandes santos. Portanto, quando as
chamas de todas as calamidades vierem devorar a pobre casinha de nossossonhos, tenhamos paciência! Há de haver aí fogo de algum bem. E que esse nos
aqueça o pobre coração!
27 DE DEZEMBRO
A VIRTUDE DOS HERÓIS
A paciência é uma virtude heroica. A Escritura diz que é melhor o homempaciente do que o guerreiro conquistador de cidades e que mais vale o homem
paciente do que o forte. Os teólogos classificam as virtudes e as dividem em
grupos caracterizados pelas virtudes cardeais. A paciência deveria estar no grupo
das virtudes da Temperança. E não está. Foi classificada como Fortaleza e como
parte desta virtude. De fato, o homem paciente é o verdadeiro forte. A paciência é
uma virtude oculta, silenciosa, sem brilho. Há virtudes brilhantes e virtudes da
obscuridade. Há virtudes que todos veem e admiram, aclamam, recompensam, e
virtudes ignoradas como a violeta e que só se percebem pelo suave e divino
perfume que exalam. As grandes virtudes, as que aparecem aos olhos humanos,
são mais fáceis e atraentes. As virtudes ocultas, porém, são tão difíceis e pesadas!
Sofrer sem que ninguém o saiba, ter um sorriso na adversidade, um olhar de
doçura para o inimigo ou para quem nos maltrata e persegue, procurar, em tudo,
o mais perfeito e com mais sacrifício. Oh! Meu Deus, só uma fonte inesgotável de
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paciência! Também chamam a isso longanimidade. Realmente, só uma grande
alma pode resistir e perseverar nessa luta. E eis porque a paciência é a virtude
dos heróis!
28 DE DEZEMBRO
TORMENTO DO INFINITO
Um ser é feliz quando tem aquilo para que foi feita a sua natureza. Ora, o homem
foi criado por Deus e para Deus. Logo, o que lhe falta aqui é e será sempre...
Deus. Sim, queira ou não, creia ou não creia, pense n’Ele ou d’Ele se esqueça, o
homem precisa de Deus para ser feliz. E, quanto mais nobre é uma alma, mais
vasto o coração e mais bela a inteligência, mais se faz sentir e atormenta essanecessidade imperiosa do Infinito, do Eterno, do Amor e da Verdade. “As almas
fracas e pouco elevadas – escreveu Lacordaire12 – acham na terra um elemento
que basta à sua inteligência e sacia o seu amor. Não percebem elas o vácuo
imenso das coisas visíveis, porque são incapazes de o sondar muito além. Porém,
uma alma a quem Deus, na criação, fez mais aproximada do Infinito, sente, e
bem depressa, o limite estreito que a encerra. Tem ela tristezas misteriosas, de
que procura a causa e julga que um certo concurso de circunstâncias lhe
perturba, talvez, a vida. Engana-se, porém. Essa perturbação vem de mais alto! É
o tormento de Infinito, de que falava o poeta”.13 Compreendem os espíritos
vulgares esse gênero de sofrimento? Os corações nobres não padecem só a
imensa dor e a nostalgia penosa do Infinito. Um sofrimento ainda maior os
atormenta: a incompreensão, a ignorância, a indiferença com que o mundo passa
ao lado dessas dores secretas.
29 DE DEZEMBROFECUNDIDADE DO SOFRIMENTO
O sofrimento é fecundo. “O sofrimento – escreve a admirável Elizabete Leseur14
– o sofrimento atua de um modo impetuoso em nós, primeiro, por uma espécie
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de renovamento íntimo, em outros também, talvez muito longe e sem que
saibamos neste mundo o trabalho que fazemos por eles. O sofrimento é um ato.
Cristo fez mais na cruz pela humanidade do que falando e trabalhando na
Galileia ou em Jerusalém. O sofrimento faz a vida: ele transforma tudo o que
toca e tudo o que atinge.”
“O sofrimento é um ato.” Que fórmula impressionante! Convém guardá-la.
Trabalha, quem sofre bem. Pode salvar almas como o apóstolo da palavra, como
o sacerdote missionário mais ativo e ardente. A grande missionária dos últimos
tempos, o Anjo do Carmelo de Lisieux, pôde dizer e experimentou o valor do
sofrimento pela salvação das almas. – “Pelo sofrimento e a perseguição – disse
ela15 – muito mais que por brilhantes pregações, Deus quer firmar o Seu Reino
nas almas...” Nossos sacrifícios, nossos esforços e os mais obscuros de nossosatos não estão perdidos, é minha opinião absoluta: todos têm repercussão
longínqua e profunda. Este pensamento não dá lugar ao desânimo e não permite
a covardia. “Somos pobres jornaleiros da vida.” Assim concluiu Elizabete.
Semeemos e Deus fará surgir a colheita. Semeemos o bem na dor e na alegria, no
Tabor e no Calvário, no “Fiat” do Getsêmani e nos Aleluias da Ressurreição.
Porém, é mais fecundo o bem semeado na dor, no sofrimento, enfim, porque o
sofrimento é um ato.30 DE DEZEMBRO
REPARAÇÃO!
Conheceis a palavra de Pascal, impressionante e profundamente verdadeira:
“Jesus Cristo estará agonizante até o fim do mundo. Não se pode dormir durante
esse tempo!”?“Dormir – comenta o Pe. Plus16 – como pensar em tal quando o Mestre está aí
suspenso, a padecer, para muitos, infelizmente em vão?”
– “Pois que – dizia Urias a Davi – o meu general Joab dorme numa tenda de
campanha e eu havia de ir descansar num palácio! Não, não aceito este privilégio
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triste!” À vista do Crucificado perde-se a vontade de viver sem cruz. Os santos,
com o Apóstolo das Gentes, sofrem todos a sublime loucura da cruz. Sofrem,
porque não sofrem ainda mais. É a sede de Amor e essa sede só se pode
satisfazer, aqui no exílio, de cruz, de sofrimento, e martírios. São Felipe Néri
estava à morte, esgotado, sem forças. O médico mandou-lhe que tomasse umcaldo. Trazendo-lhe, começa a tomá-lo. Para de repente e exclama: “Ah! meu
Jesus! que diferença entre nós! Fostes cravado no duro madeiro da cruz e eu
descanso num leito tão cômodo! Deram-vos a beber fel e vinagre e a mim
enchem-me de carinhos. Em torno de Vós havia inimigos, que vos insultavam, e
unto de mim só há amigos, que se esforçam por me consolar!” E o santo se pôs a
chorar. Oh! Como Nosso Senhor Crucificado apaixona os santos!
Saibamos sofrer em espírito de reparação pelos nossos pecados, e olhemos commais fé, com mais amor, o nosso crucifixo!
31 DE DEZEMBRO
“TE DEUM LAUDAMUS”
Mais um ano que se passa. Mais um passo de gigante deu minha vida para a
Eternidade! Fui feliz? Fui desgraçado? Só Vós, ó meu Deus, sabeis se tantashoras amargas, se tantos golpes que me dilaceraram o coração nestes 365 dias,
foram para minha desgraça ou para minha felicidade! Quantos benefícios me
concedeu a Vossa Misericórdia, Senhor! Eu Vos agradeço. E minhas dores e
lágrimas, todas as chagas que os dias sombrios deste ano me abriram no coração,
aceitai-os unidos ao mérito de Vossas Chagas da Cruz, em expiação de meus
inumeráveis pecados. Senhor, Deus dos humildes, dos pobres, dos infelizes, dos
que choram, tende misericórdia de meu pobre coração, tão louco e tão seduzido
pelas belezas criadas, de meu coração que aspira a uma Felicidade, a uma Paz
verdadeira e nunca pode encontrá-la fora de Vós, vivendo, entretanto, como
louca mariposa, a debater-se e queimar as asas na falsa luz das belezas criadas.
Senhor, dai-me um coração todo Vosso. Deus! Ó meu Deus, Solução de todos os
problemas e meu Ideal! Ó Deus, povoai as solidões mais devastadas, consolai as
dores mais pungentes, enchei os vácuos mais profundos, aquecei os corações
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7/26/2019 O Breviário Da Confiança - Monsenhor Ascanio Brandao
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mais frios. Ó Vós, Senhor, que compreendeis todas as aspirações, protegeis todas
as liberdades, respeitais todos os sentimentos, restaurais todas as ruínas e
secundais todos os esforços. Senhor, acalmai as paixões, fortificai as vontades,
sustentai os fracos, dilatai os corações. Dai-nos a paz! Deus da Misericórdia e da
Verdade, meu Deus e meu Tudo!1 - Sainte Catherine de Sienne. Lettre CC., c. XLII - trad. franc.
2 - lettres à des Jeunes gens.
3 - Soeur Benigne - c.v .
4 - Jaeguer - la Confiance.
5 - Opus cit.
6 - Sainte Margarite Marie - Ecrits divers - Tom. II.
7 - A reparação por nós mesmos - c. II.8 - Une âme réparatrice - Simone.
9 - La perfecion en las enfermedades - c. X. p. 142.
10 - Herota “in Promptuario”.
11 - Eclesiástico 42,1 8.
12 - Lacordaire - letre à Mme. de Pravilles.
13 - Musset - “Malgré moi L’Infinit me tourment!”
14 - Jornal e pensamentos de cada dia.
15 - 6me. lettre à des Missionaires.
16 - Pe. Plus, S. J. A reparação por nós mesmos. - Livro II - c. 1 .
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