o assunto é vinho

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O ASSUNTO VINHOUMA CONVERSA COM CARLOS ALBERTO SARDENBERG E RENATO MACHADO

Carlos Alberto Sardenberg Renato MachadoContato com os autores: [email protected]

ISBN 978-85-02-06438-6 CIP-BRASIL CATALOGAO NA FONTE SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ Sardenberg, Carlos Alberto /Renato Machado O assunto vinho: uma conversa com Carlos Alberto Sardenberg e Renato Machado. So Paulo: Saraiva: Letras & Lucros, 2007. Inclui bibliografia ISBN 978-85-02-06438-6 1. Vinho e vinificao. 2. Vinho Degustao. I. Machado, Renato. II. Ttulo. 07-1473. CDD 641.22 CDU 641.87:663.2

Copyright Carlos Alberto Sardenberg/Renato Machado 2007 Editora Saraiva e Letras e Lucros Todos os direitos reservados. Editora Saraiva Diretora editorial: Flvia Helena Dante Alves Bravin Editores: Marcio Coelho Rita de Cssia da Silva Frederico Marchiori Produo editorial: Viviane Rodrigues Nepomuceno Juliana Nogueira Luiz Aquisies: Eduardo Viegas Meirelles Villela Editora Letras & Lucros Edio: Andrea Assef Coordenao Editorial: Mara Luquet Produo Editorial: Patrcia Estorino Capa e Projeto Grfico: Betto Vaz Editorao: Dagmar Rizzolo/Ivan Eric Szulc Ilustraes: Wagner Penteado Reviso: Mrcia Melo Telefone: (11) 3813-8464 E-mail: [email protected] Site: www.letraselucros.com.br Nenhuma parte desta publicao poder ser reproduzida por qualquer meio ou forma sem a prvia autorizao da Editora Saraiva. A violao dos direitos autorais crime estabelecido na Lei n. 9.610/98 e punido pelo artigo 184 do Cdigo Penal.

CONTRA CAPADifcil afirmar se Renato Machado o mais radical dos classicistas ou o mais clssico dos radicais. Sua profunda cultura que, afortunadamente, se estende muito alm do vinho e do ceticismo, e cultivada ao longo de 30 anos como jornalista poltico e correspondente estrangeiro, d a ele uma base invejada pelos mais notveis comentaristas europeus de vinhos. Todavia, a irrepreensvel busca de Renato pelo romance e pelo prazer e, acima de tudo, sua irreverente ironia carioca (e auto-ironia) colocam-no em categoria inteiramente prpria. O certo que ele no apenas o mais civilizado como tambm o mais independente dos crticos de vinhos no Brasil. Jonathan Nossiter Diretor de Mondovino, um dos mais comentados documentrios sobre a globalizao do vinho

ORELHA DO LIVROCarlos Alberto Sardenberg ncora do programa CBN Brasil e colunista da revista Exame e do jornal O Estado de S. Paulo. Teve uma passagem pelo governo, como assessor do ento ministro do Planejamento Joo Sayad, no mandato Sarney, durante a elaborao e implementao do Plano Cruzado. Renato Machado integra a equipe da TV Globo desde 1982. Comeou no rdio, em 1970. Apreciador de gastronomia, foi reconhecido como crtico de vinhos a partir da publicao de artigos sobre o tema no jornal O Globo e, mais tarde, na CBN. Atualmente, apresenta, ao lado do chef Claude Troisgros, o programa Menu Confiana, na GNT.

Apresentao

Jonathan Nossiter

Difcil afirmar se Renato Machado o mais radical dos classicistas ou o mais clssico dos radicais. Sua profunda cultura que, afortunadamente, se estende muito alm do vinho e seu ceticismo cultivado ao longo de 30 anos como jornalista poltico e correspondente estrangeiro, do a ele uma base invejada pelos mais notveis comentaristas europeus de vinhos. Todavia, a irrepreensvel busca de Renato por romance e por prazer e, acima de tudo, sua irreverente ironia carioca (e auto-ironia) colocam-no numa categoria prpria. O certo que ele no apenas o mais civilizado mas tambm o mais independente dos crticos de vinhos no Brasil. Vivemos numa era em que o vinho discutido por chamados profissionais, de So Paulo a Nova York e Paris, como se fosse um veculo de ascenso social ou, pior ainda, um objeto inanimado que pudesse ser cientificamente avaliado e matematicamente determinado. Muitas vezes essas opinies so proferidas por crticos totalmente comprometidos por suas ligaes com a indstria que deveriam estar observando de forma crtica. Renato Machado o contrrio. Mesmo num comentrio informal, ele capaz de passar o contexto cultural e histrico sobre a bebida mais venerada da historia ocidental e em seguida explicar por que esse lendrio agente do prazer e da seduo (refiro-me ao vinho, e no a Renato) consegue reviver, num s gole, um jantar a dois luz de vela ameaado de fracasso.

O que particularmente charmoso e cativante sobre esta coletnea de conversas o fato de o ponto de partida de cada assunto ser voc, caro leitor... ou seja, aquele ouvinte alerta e curioso das transmisses radiofnicas semanais do Renato e do Sardenberg. O resultado uma cartilha despretensiosa e descontrada para os novos e os confirmados amantes do vinho. Livre do sufocante autoritarismo que est na moda, este livro proporciona ao leitor inmeras opes para encontrar o prazer. Voc pode ler do comeo ao fim e terminar com uma boa idia sobre algumas importantes questes para escolher seus vinhos de preferncia. Ou pode folhe-lo ao acaso, encontrando o sempre afvel Renato como numa conversa com um velho amigo num barzinho e escolher um assunto to querido para ele quanto para outros o ltimo Fla-Flu. Ou melhor, ele tem o dom de encontrar mritos em temas que nem sempre so o objeto principal de sua paixo, como a discusso sobre a revoluo dos vinhos artesanais no Brasil, liderada por vincolas como a Vallontano e a Angheben. O que fica claro que a vivacidade, inteligncia e bom humor de Renato Machado so uma tnica bem-vinda aos murmrios indiferentes de outros profissionais que acabam, na verdade, impedindo que tantas outras pessoas apreciem ou mesmo se aproximem da beleza e do prazer visceral do vinho. Meu nico conselho, enquanto voc aprecia este agradvel volume : seja to ctico com ele quanto ele com os outros. Especialmente quanto aos comentrios dele, por exemplo, sobre o filme chamado Mondovino. Ele no aceitaria que fosse de outra forma. Cineasta, autor do filme Mondovino

Sumrio

Vinho portugus vista Vida fcil Pizza com vinho A ditadura do gosto Queijo e vinho branco, o par ideal Paris nem sempre uma festa Rolha estragada No frio, vale tudo Espumante made in Brasil No caminho certo Xi! A rolha partiu-se ao meio na hora de abrir a garrafa Vinhos do Novo Mundo O presidente francs que tomava refrigerante Robert Parker no fala para quem gosta de vinho Qual o teor alcolico de um bom vinho? Tinto ou branco? A socialite e o decantador O bacalhau em boa companhia A vez dos espumantes brasileiros O sucesso dos vinhos verdes Vinho de uma uva s ou misturado? Vinho fantasia Como montar uma adega O Vinho e o mar Vinho desacompanhado Vai bem com feijoada

Beba at o fim Para abrir daqui a 18 anos A Taa das Belas Vinho bom e barato em Paris? A temperatura ideal do vinho branco Leitura obrigatria Grand crux premier cru Vinho tinto com frutos do mar O turismo do vinho Vinhos da frica do Sul Vinho inflacionado Baco e a felicidade As videiras de Santorini O segredo das velhas famlias Para iniciantes O que falta indstria brasileira de vinhos? Que vinho se deve beber primeiro? Beaujolais nouveau com gosto de banana Os vinhos mais importados no Brasil A bebida do Czar O limite entre o prazer e o excesso Para os sem-adega Copos coloridos, nem pensar A longevidade dos vinhos Vinhos para um jantar ecltico Vinhos para combinar com sopa Os lucros do vinho Dor de cabea para viagem Uva difcil Chablis fora da Frana, nem pensar

A felicidade o limite! Vinhos canadenses Os romnticos alemes Comida japonesa com vinho branco? Californianos em crise Consumo aumenta nos EUA e diminui na Frana O que no combina com vinho Vinho com moqueca A qualidade internacional do Sauvignon Blanc Santa Rita Um chileno mais caro que um francs? Almoo regado a champanhe Quanto menos lcool, melhor Casamentos mltiplos

Vinho portugus vista

SARDENBERG: Vamos falar sobre os vinhos da regio do Alentejo? RENATO MACHADO: Olha, os vinhos do Alentejo j foram muito bemfalados, depois passaram a ser mal-falados porque eram caros. Continuavam bons, mas eram caros. Hoje o preo continua mais ou menos salgado, porm os vinhos tm melhorado muito de qualidade. Realmente so vinhos que encontraram um caminho. O que houve no Alentejo, e em Portugal, foi aquela moda de fazer as uvas internacionais, de fazer os vinhos internacionais, de competir com o Novo Mundo. Agora est havendo um refluxo, os portugueses felizmente redescobriram ou se voltaram para suas uvas nativas. Abandonaram um pouco essa globalizao uniforme, essa coisa massificante que existe no mundo do vinho que fazer tudo com muita madeira, muito aucarado, com muita baunilha , e resolveram voltar s suas razes. E tm tido resultados excelentes, Sardenberg. Hoje no almoo eu provei um vinho do Alentejo da uva touriga nacional. preciso que o consumidor brasileiro conhea a touriga nacional, uma uva surpreendente, que pode dar vinhos esplndidos. SARDENBERG: Agora h outras uvas portuguesas, no ? RENATO MACHADO: Sim, h outras uvas portuguesas, como a tinta roriz, uma uva branca muito perfumada chamada arinto, h a

alvarinho, do norte de Portugal, que d brancos cidos mais perfumados. E tambm uma uva nativa do Alentejo chamada trincadeira, que se mistura muito bem com a touriga nacional, dando vinhos muito interessantes. Acho que o mercado internacional ainda vai descobrir os vinhos alentejanos, alis, portugueses, porque so uvas que do vinhos esplndidos desde que sejam vinificadas como devem ser. SARDENBERG: Quando voc fala em internacionalizao so aquelas uvas tradicionais... RENATO MACHADO: Sim, porque se plantaram em Portugal uvas do tipo Cabernet Sauvignon, chardonnay, planta-se ainda

sauvignon blanc, esta, alis, com bons resultados. No estou dizendo que esses vinhos sejam maus, mas est se perdendo a capacidade, o potencial que essas duas uvas nativas tm. o mesmo que est acontecendo na Itlia. No se trata de uma revolta contra a globalizao, nada disso, trata-se de poder somar, e no uniformizar. SARDENBERG: Globalizar a uva local. RENATO MACHADO: Exatamente. Ou seja, descobrir o que a uva local pode dar de bom, porque s adotar as tcnicas modernas. A globalizao tem um bom efeito, que a modernizao da viticultura e da vinicultura. SARDENBERG: Sem contar que os nomes so melhores, n? Trincadeira um nome timo. RENATO MACHADO: Trincadeira uma maravilha! Touriga nacional tambm, e tem ainda a tinta roriz.

Vida fcil

SARDENBERG: Renato Machado, produtores brasileiros de vinhos esto incomodados com o crescimento da importao da bebida da Argentina. Eles dizem que os vinhos argentinos levam muita vantagem sobre os brasileiros. O que voc sabe sobre isso? RENATO MACHADO: Na verdade, essa invaso do vinho argentino de garrafo, esse que nem vem engarrafado, mas em continer. Esse vinho , digamos, o da faixa de mercado barata, e vem em grandes quantidades. Ele se beneficia de favorecimento fiscal dos acordos do Mercosul. Realmente, isso gera uma competio muito desleal em relao ao vinho de garrafo gacho, que significa 70% da produo da regio do Rio Grande do Sul. So vinhos produzidos em grande volume, que no so caros, e esses argentinos que entram aqui com benefcios tarifrios fazem um estrago na produo nacional. O sistema fiscal brasileiro injusto porque castiga o vinho de qualidade, que representa muito pouco em termos de consumo e arrecadao para o governo. Esse sistema tributrio poderia mudar se o governo, se o Ministrio da Agricultura e da Fazenda tivessem vontade poltica para fazer um sistema mais justo, que punisse o vinho de m qualidade que entra sem pagar quase nada, o chamado vinho de um dlar, sobre o qual o imposto muito pequeno. Agora, punese o vinho acima de 18 dlares a caixa, que j de um segmento de qualidade, mas representa muito pouco em consumo e arrecadao e no tem competio nacional. Esse

movimento dos produtores mais do que justificado, existe um acordo com os importadores e com associaes de hotelaria em defesa da qualidade e de um sistema fiscal mais justo.

Pizza com vinho

SARDENBERG: Renato Machado, voc gosta de pizza? RENATO MACHADO: No sou um f, mas sou um participante ocasional. SARDENBERG: Ocasional est bom. E a gente toma vinho com pizza? RENATO MACHADO: Sim. Dependendo da vestimenta da pizza, acho que com vinho ela vai ficar melhor. Eu sugiro qualquer tinto, da Itlia, alguns do Brasil, alguns da Argentina, do Chile. E os vinhos italianos do Sul, da regio de Npoles. No so muito dispendiosos. Mas, sobre os tintos brasileiros no conheo todos , alguns eu posso dizer que vo muito bem com pizza. Tem um que eu gostaria de sugerir, o Dal Pizzol 2002, da uva tannat. Ele vai escoltar e fazer bonito ao lado de outros vinhos simples, pois no um vinho complexo. bemfeito, no tem madeira, tem fruta na medida certa, no muito persistente, assim como a pizza, a menos que seja de alho e leo. Nesse caso, preciso pensar melhor, pois o alho muito agressivo. Agora, com os outros molhos, esse vinho uma bela opo. SARDENBERG: Com que freqncia, ou melhor, com que pouca freqncia voc come pizza? RENATO MACHADO: Eu como com pouqussima freqncia porque o carboidrato um perigo para quem profissional da rea de

gastronomia e bebida. Por isso, no pode ser uma coisa semanal. Voc sabe a que estou me referindo, no , Sardenberg? SARDENBERG: Exatamente. Vamos fazer aquela nossa combinao aqui: a gente corta a comida, mas no corta o vinho.

A ditadura do gosto

SARDENBERG: Voc entrevistou o Jonathan Nossiter, diretor do filme Mondovino. O que acha do filme? RENATO MACHADO: O filme altamente polmico, destinado a causar polmica, porque o diretor uma pessoa que tem uma viso muito definida, romntica, lrica, no s do mundo do vinho como do mundo em geral. uma pessoa que valoriza a simplicidade, as relaes pessoais, a honestidade a toda prova, sntese de um pensamento ingls e americano tambm: Small is beautiful. Ou seja, o que pequeno bonito, bom. O que faz, muitas vezes, voc pensar que o que grande ser necessariamente mau e destruidor. O filme ope essas duas verdades, o pequeno produtor diante da onda dominadora da globalizao, seja l o que isso queira dizer. E os personagens confirmam essas duas vertentes, sem que o diretor os tenha induzido a isso, o que d uma viso muito dividida do mundo do vinho. SARDENBERG: uma viso antiglobalizao? RENATO MACHADO: Totalmente, o que s vezes pode at parecer um pouco simplista afinal o acesso de largas camadas da populao ao vinho, antes voltadas para as bebidas destiladas e cerveja, s foi possvel graas a esforos de investimento, industriais etc. Agora, o filme no contempla isso dessa forma, de maneira que est destinado a causar muita polmica, como j causou nos Estados Unidos.

SARDENBERG: Voc acha que essa globalizao realmente negativa? RENATO MACHADO: No, no acho que seja negativa. A globalizao tem efeitos muito positivos na conquista de novos espaos. evidente que ela no pode ser deletria nem destruidora. Ela est a para permitir que as pessoas possam ter o direito de escolha. claro que a globalizao no pode significar a concorrncia desleal, a ao devastadora, nem a cartelizao, o monoplio. Enfim, h vrios efeitos que necessitam de regulao. Agora, no se pode dizer que h 20 ou 30 anos o que se fazia de vinho no mundo talvez desse para o consumo de hoje. SARDENBERG: H vinhos melhores hoje? RENATO MACHADO: Sem dvida. O nvel de produo, at mesmo um dos demnios do filme, o Robert Parker, depois que ele entrou em cena, o nvel de qualidade dos vinhos europeus aumentou muito, na Itlia, na Espanha, em Portugal e, sobretudo, em Bordeaux, que foi o primeiro alvo de Parker. Agora, dizer que todos os vinhos tenham de estar ao gosto do crtico Robert Parker, isso no se pode admitir. De fato, a o filme tem at razo, ao afirmar que a uniformizao leva a um outro tipo de ditadura do gosto.

Queijo e vinho branco, o par ideal

SARDENBERG: Vamos falar de combinaes de queijos e vinhos. Quais so as orientaes? RENATO MACHADO: A primeira sugesto nessa rea que, ao contrrio do que se pensa, o par ideal para o queijo no o vinho tinto, e sim o vinho branco. E quando digo isso as pessoas se espantam muito, porque se fixou aquela imagem de que o queijo combina com o tinto. Em alguns casos, sim, quando um queijo de massa cozida ou de casca muito fermentada, aos quais alguns tintos robustos fazem bela companhia, porque nesse caso o queijo est ajudando o vinho. Mas, quando o queijo e o vinho dividem as atenes e se completam como um casal deve se completar, o vinho branco o parceiro ideal de 70% dos queijos. SARDENBERG: Nossa, 70%? RENATO MACHADO: . At um bom camembert vai muito bem com determinados vinhos brancos da Borgonha. Todos os queijos tm a ver com terreno e so aromticos; os vinhos que tm a ver com terreno e so aromticos so os muito jovens. Ento, se for abrir um vinho muito caro, muito querido, que lhe custou esforo para ter na adega, voc no pode ofusc-lo com queijo forte, da mesma forma que um grande queijo no pode ser desafiado por nenhum vinho forte. No h papis principais no queijo e no vinho.

SARDENBERG: Ento, todo mundo faz errado, porque a maioria vai no tinto? RENATO MACHADO: No, h queijos de massa cozida ou massa prensada, os mais amarelos, que so parceiros ideais do vinho tinto. Um deles o parmeggiano, mas tambm vai bem com o branco. O consumidor deve testar as combinaes.

Paris nem sempre uma festa

SARDENBERG: Temos a pergunta do Jos Eduardo Barbosa: A partir de que valor, aqui no Brasil, possvel comprar um bom Bordeaux? RENATO MACHADO: Bem, um bom Bordeaux complicado porque o valor alto. Os Bordeaux tm um problema. Os Bordeaux modernos tm de esperar um pouco na adega. Mesmo assim, so caros, a no ser os pequenos Bordeaux, os pequenos chteaux, que ficam em US$ 27, US$ 30 num cmbio a R$ 2,50, em torno R$ 80, isso se conseguir a preo de importador. Agora, eu recomendaria a safra de 1997. SARDENBERG: Outra dvida, agora do Fernando Rabelo. Ele vai receber uns amigos europeus e quer oferecer um vinho nacional. Pede uma indicao para fazer bonito. RENATO MACHADO: Olha, depende de que vinhos os amigos esto acostumados a beber. SARDENBERG: Porque o europeu pode ser um francs bemacostumado ou um sueco. RENATO MACHADO: Ou pode ser um francs mal-acostumado. Os franceses, por exemplo, no so grandes conhecedores de vinho. H os conhecedores de vinho em qualquer pas e h as pessoas que no conhecem vinho em qualquer pas, e sobretudo na Frana. Paris, por exemplo, no uma cidade

grande conhecedora de vinhos, no um lugar para tomar bons vinhos. Mas, retomando a conversa, eu tomei o tannat do Dal Pizzol, se no me engano 2002, numa mesa em que havia franceses. E um francs, que um grande conhecedor porque um produtor de vinhos da Borgonha e um dos personagens do filme Mondovino, o Ettiene de Monti, aprovou o vinho tannat do Antonio Dal Pizzol. um vinho feito com toda a honestidade, tem uma bela cor, uma boa estrutura e pode ser um vinho gastronmico, acompanhar perfeitamente uma entrada e um prato.

Rolha estragada

SARDENBERG: Renato, vamos falar sobre rolhas que s vezes esto estragadas. RENATO MACHADO: Muitas vezes. SARDENBERG: E a, o vinho danou? RENATO MACHADO: Completamente. uma vulnerabilidade, que aqui no Brasil chega a ser um risco, com uma incidncia grande, pois uma constante. Dos vinhos de 2000 para trs, a mdia de uma garrafa em cada 12 estar estragada por problemas de rolha. SARDENBERG: E por qu? RENATO MACHADO: Desenvolve-se na cortia uma bactria. s vezes no ar ou em garagens, galpes, portos ou at em residncias, a rolha desenvolve uma bactria que provoca um cido chamado tricloroanisol, o TCA. Essa substncia faz a rolha apodrecer e lhe confere um odor repulsivo. Quando voc tira a rolha, sente imediatamente. Da vem a tradio de cheirar o vinho e examinar a rolha cada vez que se abre uma garrafa. SARDENBERG: Agora, a regra : quando a rolha est muito molhada sinal de que o vinho no est bom? RENATO MACHADO: No, sinal de que o vinho amadureceu alm da conta, ou seja, acelerou-se o processo de evoluo. No quer dizer que esteja estragado. Se a rolha ficou umedecida

na parte de fora significa que o vinho correu at ali, e a via contrria est aberta ou seja, o oxignio entrou na garrafa , o que pode ter apenas acelerado a maturao do vinho, mas no quer dizer que esteja estragado. No das melhores indicaes. Em geral, a rolha est muito mida quando o vinho j est evoludo demais, mas no quer dizer que esteja com TCA.

No frio, vale tudo

SARDENBERG: Existe alguma coisa especial para os perodos de frio? RENATO MACHADO: Olha, qualquer vinho vai combinar com o inverno. No podemos nos esquecer que os vinhos servidos frios tambm so uma marca do inverno, como os

espumantes em todas as ocasies, por exemplo. Mas evidente que o aconchego do vinho associado ao tinto, lareira, ao fondue de queijo, aos molhos muito espessos, aos jantares mais opulentos. Claro que um vinho tinto com uma gradao alcolica um pouco maior (pelos 14 graus), grandes vinhos que eu chamo de mais carnudos, do Chile, da Califrnia, de Portugal, sem esquecer que Itlia e Espanha tm contribuies a fazer. Qualquer vinho bem-estruturado, com gradao alcolica de 14 graus, indicado para o inverno. SARDENBERG: Mas se quiser pode tomar os outros vinhos tambm? RENATO MACHADO: Sem dvida. O vinho associado ao inverno porque voc dissipa melhor as calorias. O vinho ajuda a enfrentar o frio. SARDENBERG: A gente tem sempre um motivo para tomar um vinho, no , Renato?

RENATO MACHADO: Ah, claro, Sardenberg. Sobretudo voc, que todo dia tem uma sugesto e um pretexto.

Espumante made in Brasil

SARDENBERG: Uma pergunta do Cristiano Borba: o que esperar dos vinhos brasileiros? RENATO MACHADO: Ainda muito cedo para dizer. So resultados de um grande investimento de uma associao de empresas de Portugal e do Brasil na regio do Vale do So Francisco. Eu experimentei apenas um vinho da uva touriga nacional, uma variedade da portuguesa que est sendo plantada no Vale do So Francisco com duas colheitas anuais e mtodos de irrigao modernos. Ainda cedo para dizer qual ser o resultado da touriga nacional, plantada nessas condies e suportando a umidade e o calor da regio, sobretudo a alta insolao. O vinho que provei ainda estava verde, era uma primeira experincia. SARDENBERG: Mas um empreendimento srio? RENATO MACHADO: Sim. um empreendimento srio de vinhos, digamos, simples. No so vinhos de caractersticas muito pronunciadas. SARDENBERG: Bom, e o Alexandre, que mora em Braslia, vai dar uma recepo para 80 pessoas e quer fazer o tradicional bolo e champanhe. Pode? RENATO MACHADO: Eu no aconselharia. Seria melhor separar a hora do champanhe e a hora do bolo e servir o bolo acompanhado por um vinho mais doce. Porque o bolo vai ser

muito spero, muito injusto com o champanhe no momento da combinao. Eu aconselharia fazer o champanhe antes e depois partir para o bolo. SARDENBERG: Agora, quanto ao espumante, d para ir tranqilo no nacional, no ? RENATO MACHADO: Sem dvida. aconselhvel que se v para o espumante brasileiro que a esta altura melhor do que o prosecco e do que vrios espumantes europeus. Os

investimentos esto dando resultado e as casas brasileiras esto fazendo espumantes muito bons. SARDENBERG: Voc sabe calcular vinho para 80 pessoas? RENATO MACHADO: preciso saber qual o propsito do evento. No caso de uma festa, por exemplo, pode-se calcular cerca de 30 garrafas. SARDENBERG: Se no for um pessoal que bebe muito vinho, certo? RENATO MACHADO: Sim, at porque, com certeza, h pessoas neste grupo de 80 que no bebero vinho.

No caminho certo

SARDENBERG: Hoje vamos falar sobre vinhos brasileiros bemsucedidos. RENATO MACHADO: Bem, no so muitos, vamos pr as coisas em devida perspectiva. H alguns vinhos bem-sucedidos para o que se pretende, que so vinhos de pequenas vincolas. Eu j citei aqui o Dal Pizzol, um ou dois vinhos do Dal Pizzol, e cito de novo o espumante, que no um espumante com grandes aromas, mas pode ficar mais aromtico se continuar nessa linha. E ontem eu testei dois vinhos de uma vincola boutique, quer dizer pequena, Ldio Carraro, de Bento Gonalves, que faz vinhos sem passagem pela madeira, mas com muito estudo de solo, muito estudo de viticultura, a cargo de uma enloga chamada Mnica Rossetti. o Assemblage 2002, que uma combinao de quatro uvas. um vinho bastante estruturado e com uma coisa que os vinhos brasileiros normalmente no tm que aroma. Agora estou experimentando o Vindima 2004. Os aromas so menos intensos, porque, evidentemente, o vinho muito novo, mas tem muito cuidado na parte de viticultura. Ento, eu acho que tem um mercado para eles. SARDENBERG: E com relao a preo? RENATO MACHADO: Eu acho que o preo um pouco alto para a competio. Em se tratando de uma vincola boutique, deve sair por volta de R$ 60. Acho um pouco caro, levando-se em

considerao que um vinho brasileiro, embora de qualidade. SARDENBERG: O que os analistas dizem que tem esse problema do preo, para competir com os vinhos argentinos e chilenos. RENATO MACHADO: Sem dvida, e no caso dos argentinos muito difcil, j que tm vantagens graas aos benefcios dos acordos do Mercosul, uma carga tributria pequena, e l esto todas as companhias internacionais investindo em Mendoza, com aportes da ordem de trs bilhes de dlares, quatro bilhes de dlares.

Xi! A rolha partiu-se ao meio na hora de abrir a garrafa

SARDENBERG: Uma questo prosaica do Ronald Granjeiro, de Braslia, que acontece: aquela hora que voc abre a garrafa e a rolha se parte e no sai de jeito nenhum. Ele pergunta: Eu jogo fora a garrafa ou empurro para dentro? RENATO MACHADO: Isso complicado, porque se a rolha estiver muito velha, se esfarelando, que o caso de garrafas de 30 anos, por exemplo, a uma operao que tem de ser confiada a um sommelier, porque ele pode extrair a rolha. No convm empurrar para dentro. No caso da rolha que se parte e nova, ela tem como sair, sim. preciso alavancar bem. O sacarolhas tem de ser bem pontudo e apropriado, de qualidade, caso ela se parta na primeira tentativa. D trabalho, mas no conveniente empurrar a rolha para dentro, pois a rolha pode misturar microrganismos e perturbar o vinho. SARDENBERG: O Kirk Douglas, de Braslia, pergunta sobre aquele comentrio que voc fez de que preciso abrir a garrafa e deixar descansar por um tempo. Como fazer quando a gente vai ao restaurante, o garom vem com a garrafa, abre, a gente experimenta? RENATO MACHADO: Normalmente, se o restaurante tiver uma pessoa encarregada de vinhos, ela leva a garrafa para uma mesa onde esto os outros vinhos das vrias mesas. Caso no haja, se for um vinho branco, pode ficar ao lado no balde e, se

for um tinto, pode ficar na mesa, no h problema algum em esperar um pouco.

Vinhos do Novo Mundo

SARDENBERG: O Jferson esteve no evento Tour Mistral Os Melhores Vinhos do Novo Mundo e experimentou e gostou do Caro e do Amancaya. Agora ele quer saber sua opinio sobre esses vinhos. RENATO MACHADO: Olha, eu estive com a responsvel pelos dois vinhos, que so de um empreendimento conjunto da vincola Nicols Catena com o Chteau Lafite-Rothschild. Estive com a Stela, a enloga responsvel. O Caro um vinho mais especial, com produo limitada, mas caro demais. O Amancaya mais ou menos do mesmo estilo, no to redondo quanto o Caro, mas mais acessvel. So sem dvida dois bons vinhos argentinos. Convm sublinhar, porm, que so vinhos do Novo Mundo, no so de estilo europeu. SARDENBERG: Ento o Jferson estava certo. Agora o Edson Csar, de Americana, interior de So Paulo, tem duas perguntas. Primeiro ele quer saber se vinhos chilenos e argentinos podem ser guardados por cinco anos. RENATO MACHADO: Podem. Mas os chilenos no esperam muito e os argentinos tambm no. O fenmeno do vinho est muito badalado nesses dois pases, ento o mercado est com sede e no est esperando para ver. Por isso, h dvidas sobre quais podem ser guardados, pois no se faz muito o teste do tempo no Chile e na Argentina. Mas eu acredito que um malbec, um Cabernet sauvignon podem ser guardados por cinco anos.

SARDENBERG: H outra questo do ouvinte: na regio em que ele mora faz muito calor, 35 graus sombra, e ele pergunta: Como que a gente pede um vinho no restaurante? RENATO MACHADO: Bem, preciso que o vinho chegue ao restaurante em boas condies, que a origem e a provenincia sejam garantidas e que o transporte, caso no seja em continer refrigerado, seja ao menos num isopor. difcil, e essa realmente uma boa pergunta. Mas eu cheguei a tomar vinhos em cidades do interior em bons estados. Agora, todos os cuidados so necessrios quando o vinho chega. Ele tem de ser colocado em uma adega resfriada a pelo menos 15 graus.

O presidente francs que tomava refrigerante

SARDENBERG:

A

adega

do

ex-presidente

francs

Franois

Mitterrand foi a leilo e venderam tudo por 14.683 euros 46 lotes. Disseram que o pessoal comprou mais pelo valor sentimental do que pela qualidade dos vinhos. RENATO MACHADO: Parece que sim, porque ele no era um apreciador de vinhos. Era muito austero nos seus costumes e frugal at. SARDENBERG: Dizem que nas refeies ele disfarava para tomar refrigerante. RENATO MACHADO: Exatamente. Curioso como havia franceses da poca da Segunda Guerra, como ele que foi um resistente, que mantiveram os hbitos simples de escassez daquele perodo e sobretudo do tempo do ps-guerra, que foi um perodo muito duro. Naquela poca, no era s vinho que eles no tinham. Eles no tinham o que comer, e a principal atividade deles era garantir o chamado po de cada dia. Esses hbitos se refletiram talvez nos gostos do ex-presidente, e a adega dele no era nada de sensacional, embora ela tenha recebido muitos presentes. SARDENBERG: Dizem que o lote mais precioso continha seis garrafas de Chteau Mouton-Rothschild. RENATO MACHADO: Sim. O Mouton anterior a 1973 no era um

primeiro grand cru, era um segundo. S a partir de 1973, quando o ministro da Agricultura era Jacques Chirac, justamente no governo Pompidou, que o Mouton se transformou em primeiro grand cru. Mas todos os chteaux de Bordeaux muito antigos, anteriores aos anos 70, com algumas excees, so vinhos que nem sempre so muito bons. SARDENBERG: E, por falar em consumo, o pessoal da redao me passou uma pesquisa da Target Group Index, do Ibope Mdia, que diz o seguinte: dois em cada cinco entrevistados responderam sim quando perguntados se pagariam mais por uma boa bebida. E, nessa pesquisa feita em So Paulo, 48% se declararam consumidores de vinho, 23% de usque, 22% de vodca e 16% de cachaa. RENATO MACHADO: O que me chama a ateno como elevado o numero de pessoas que consomem bebidas destiladas. O vinho majoritrio, mas no muito. SARDENBERG: Pois . D 23%, 22% e 16% na cachaa. muito, no ? RENATO MACHADO: muito. Eu acho que o vinho ainda tem um longo caminho a percorrer, embora ainda precise consolidar essa liderana.

Robert Parker no fala para quem gosta de vinho

SARDENBERG: Temos novidades sobre o Robert Parker. RENATO MACHADO: Acabo de ler as consideraes do Robert Parker sobre a safra de 2004 na regio de Bordeaux, na Frana. Agora, todo mundo fala mal dele, e eu acho que todo mundo tem razo, mas chega na hora de avaliar a safra em Bordeaux os produtores franceses se curvam ao Robert Parker e at as revistas inglesas, a mdia especializada, d espao ao que ele vai dizer sobre determinada safra. Ento, ele est dizendo aos compradores futuros para no arriscarem dinheiro na safra 2004. Com isso, ele d um sinal ao mercado. Agora, um crtico de vinhos que fala para investidores no um crtico de vinhos a ser levado a srio por quem gosta de vinhos. Esse o ponto. Ele est dando conselhos a futuro. SARDENBERG: Como uma anlise financeira... RENATO MACHADO: Pois . Ele est dizendo aos produtores de Bordeaux que ele devem pr a safra no mercado a preo 30% menor. Ele est dizendo, inclusive, como a safra deve chegar ao mercado. Ou seja, ele est sinalizando, como diz o pessoal do mercado, para o investidor, jamais para o amador de vinhos. SARDENBERG: E ns aqui somos amadores de vinhos, e no investidores, certo?

RENATO MACHADO: Exatamente.

Qual o teor alcolico de um bom vinho?

SARDENBERG: E a questo da gradao alcolica do vinho. H vinhos de 12, 13, 14 graus. Como que a gente deve buscar o equilbrio nesse aspecto? RENATO MACHADO: Depende do vinho. Outro dia eu vi um vinho tinto do Novo Mundo com gradao 15,6 graus, praticamente 16 graus, o que o tornaria equivalente a um vinho de Xerez, do Porto e da Ilha da Madeira, fortificados com aguardente. Normalmente, um vinho do Porto tem 18 ou 20 graus. Ento, um vinho tinto com 16 graus um desequilbrio total. SARDENBERG: Existe um padro em relao gradao ou varia conforme a uva? RENATO MACHADO: Varia conforme a uva e conforme a maturidade do vinho na hora da colheita e h vinhos com muito mais cor, como os Californianos e argentinos, porque recebem muito sol. A gente compreende que um vinho desses tenha at 14 graus ou acima disso, mas a insistncia nesses vinhos pode prejudicar a degustao. Falando isso lembro o enlogo Michel Roland, que responsvel por grande parte desses supervinhos turbinados, de alto poder alcolico, Californianos e argentinos, provenientes de regies desrticas, onde no chove, a insolao muito longa, e a gradao alcolica sobe porque a quantidade de acar maior. Agora, respondendo sua primeira pergunta, o equilbrio fica entre 12,5 e 13 graus.

SARDENBERG: Quer dizer que os melhores vinhos do mundo esto nessa faixa? RENATO MACHADO: Sem dvida, os grandes Bordeaux so a 12,5 graus; os Borgonhas so a 13 graus, ocasionalmente alguns Borgonhas e Ctes du Rhne vo a 13,5 graus. Mas estamos falando de vinhos com muita fruta e potncia para comer com gastronomia farta, cheia de molho. Eu no acredito que acima de 13,5 exista equilbrio e muito menos refinamento. SARDENBERG: Vinho com teor alcolico de 16 graus coisa de cachaceiro, isso? RENATO MACHADO: Veja bem, h vinhos assim, no Alentejo, na Argentina, como o clebre Yacochuya, que acima de 16 graus.

Tinto ou branco?

SARDENBERG: Pergunta de Nilson Cunha, de Braslia: o vinho tinto pode ser considerado, do ponto de vista de suas qualidades fsico-qumicas e nutricionais, superior ao vinho branco? RENATO MACHADO: Essa uma boa pergunta. O vinho tinto, em alguns aspectos, pode at ser considerado melhor que o branco. Por exemplo, em relao presena de taninos e polifenis que, como dizem os cardiologistas, combatem os radicais livres. O tinto tem resveratrol na casca da uva, essa substncia que a maioria dos mdicos diz que pode combater os radicais livres, e o vinho branco j no teria tanto. E do ponto de vista de conservao tambm, porque o tinto suporta mais o tempo e as mudanas de temperatura e geogrficas. O vinho branco mais frgil. Agora, em relao elegncia, a discusso pode se eternizar. SARDENBERG: uma questo de opinio? RENATO MACHADO: Sim, e vai depender do que se pretende com o vinho. Se fazer um vinho aromtico, ou encantador, ou se fazer um vinho para ficar antigo, para ser comemorado dali 20 anos. Ou seja, h variveis que vo determinar o gosto do consumidor. No se pode dizer que um seja melhor que o outro, mas o vinho tinto talvez tenha mais qualidades de permanncia, de coleo, do que o branco. O vinho branco, com dois, trs anos, j deu o que tinha de dar. SARDENBERG: O vinho sofre muito quando a garrafa passa por

intensa movimentao? RENATO MACHADO: Sem dvida. H, inclusive, algumas teorias que dizem que o vinho feito no Hemisfrio Norte sofre muito quando cruza o Equador para o Hemisfrio Sul. No sei se isso pode ser comprovado cientificamente, mas outro dia eu estava falando com o diretor Jonathan Nossiter, do filme Mondovino, e ele contou que os vinhos dele que vieram para c tiveram um ritmo de envelhecimento muito mais rpido do que tinham no Hemisfrio Norte. Ou seja, no momento em que esto em contato com o clima tropical, seu

amadurecimento muito mais veloz.

A socialite e o decantador

SARDENBERG: Tiago Costa quer saber se o decantador mesmo eficaz. RENATO MACHADO: O decantador aquela garrafa de cristal ou transparente na qual se verte o vinho da garrafa original para que respire. Isso se faz com vinhos com um pouco mais de idade, quando se cria um depsito na garrafa e, para filtrar isso, passa-se no decantador. Agora, o decantador um objeto bonito, que impressiona na coleo do enfilo, mas no era muito usado na Frana para vinhos jovens, tampouco na Itlia ou na Espanha. Evidentemente, ele melhora muito os vinhos tintos, inclusive os novos. Para o vinho branco no acho necessrio, porque em geral ele fresco e no precisa amadurecer. utenslio que se pode passar sem ele, mas passa-se melhor com ele. SARDENBERG: Voc conhece a histria daquela socialite que ficava chateada com o uso do decantador porque no dava para os participantes do jantar saberem qual era o vinho que estava sendo servido? Sabe o que ela fazia? Ela retirava o rtulo da garrafa e colava no decantador. RENATO MACHADO: Essa uma das histrias que se contam do decantador. claro que quando se usa o decantador se pe a garrafa original ao lado para o convidado saber o que est tomando. Isso mais fcil do que toda a operao da socialite.

O bacalhau em boa companhia

SARDENBERG: Ronaldo Vilela, do Rio de Janeiro, vai preparar um bacalhau moda portuguesa, com postas altas, batatas, cebola. Ele tem trs opes de vinhos portugueses e pede para voc escolher: um branco Pra Manca 2002 ou os tintos Quinta do Meandro 2001 ou Quinta do Crato Reserva 2000. RENATO MACHADO: Difcil a escolha, pois os trs vinhos so excelentes. O Pra Manca branco um vinho mais fresco e talvez no seja indicado para esse bacalhau, com todos esses molhos e farturas. Acho que o mais indicado o Meandro 2001, embora o Quinta do Crato seja um excelente vinho e poderia ser a segunda garrafa a ser aberta.

A vez dos espumantes brasileiros

RENATO MACHADO: Acabei de experimentar alguns espumantes brasileiros. Volto a dizer que os espumantes brasileiros tm qualidade internacional. Esto cada vez melhores. Acabei de provar o Dal Pizzol Brut e o Chandon Excelence, e

evidentemente achei a cor dos dois bem diferentes. E este o ponto em que quero insistir: a cor dos vinhos j d a idia do que eles vo ser. Ou seja, um amarelo muito claro, muito plido, significa um vinho branco jovem, o caso do Dal Pizzol que acabei de provar. E um vinho amarelo mais escuro, mais bronzeado, mais denso, significa um espumante mais complexo, de mais idade, que j desenvolveu outros aromas. Qual deles o melhor? uma questo de gosto pessoal. Ambos so excelentes.

O sucesso dos vinhos verdes

SARDENBERG: O que so vinhos verdes? RENATO MACHADO: So vinhos de baixa maturao, no so amadurecidos e a primeira fermentao logo engarrafada. Tradicionalmente, consumido em Portugal, e levemente alcolico, com 9 graus. Hoje mudou tudo: j se fazem vinhos verdes com 12,5% de lcool, que o que o mercado internacional exige. Os vinhos tm a pretenso de ser aromticos. Jovens, mas aromticos. Nada a ver com os vinhos verdes de antigamente. SARDENBERG: O que macerao carbnica? RENATO MACHADO: um tipo de primeira fermentao junto com as cascas de uva, o que d algum acar ao primeiro caldo que se forma. E esses vinhos verdes de antigamente tinham muito acar residual na uva e baixa gradao alcolica, que era do gosto dos portugueses da poca e no do gosto do mercado internacional de agora. Mas os vinhos verdes atuais ganharam denominao de origem e hoje em dia se fazem vinhos aromticos. SARDENBERG: E ns gostamos? RENATO MACHADO: Ns gostamos do vinho verde atual, e achamos que o vinho verde tradicional tem apenas a poesia da tradio, e mais nada.

Vinho de uma uva s ou misturado?

SARDENBERG: O que d mais certo, o vinho de uma uva s ou essas misturas? RENATO MACHADO: Esta uma resposta que no pode ser absoluta, ela relativa. Depende da regio, depende do que se pretende fazer com o vinho, porque o vinicultor parte j com uma idia definida se ele vai fazer uma mistura. A questo fazer isso se for possvel. Na Borgonha, por exemplo, no se pode fazer vinho de mistura. Tem de ser de varietal, de uma uva s, no caso a pinot noir para os tintos e a chardonnay para os brancos. Em outros locais, quando sai fora de uma

denominao por exemplo, na Toscana, quando no se chama uma denominao toscana, permitido. Ento, os vinicultores tentam modificar um pouco o terreno ou a natureza para obter um resultado com assinatura prpria. A mistura mais famosa a de Bordeaux, claro, que varia ano a ano. SARDENBERG: uma mistura do qu? RENATO MACHADO: Na regio de Pauillac, na margem esquerda do rio, predominncia de Cabernet sauvignon com um pouco de merlot, um pouco de petit verdot e, s vezes, de cabernet franc. Na margem direita do rio, predominncia de merlot e Cabernet franc. E no sul de Bordeaux varia, meio a meio. Agora, nunca se sabe exatamente o que foi acrescentado, s vezes

5% de um determinado tipo para dar aquele trao que caracteriza uma safra especial. SARDENBERG: E isso mantido em segredo? RENATO MACHADO: Sim, e se voc for perguntar nas vincolas eles dizem que tantos por cento disso e daquilo, mas exatamente nunca se saber. Como no vinho do Porto, alis. SARDENBERG: Que para ningum ficar copiando. RENATO MACHADO: Exatamente. Como as casas de champanhe, que fazem vinhos de mistura.

Vinho fantasia

SARDENBERG: Afinal, o que so vinhos modernos? RENATO MACHADO: So vinhos que no trazem no rtulo

necessariamente a regio, a denominao de origem deles. Eles tm um nome fantasia que o proprietrio inventa pretendendo que no supermercado ou na importadora o cliente grave esse nome, em vez de gravar a geografia, a regio etc. Ento, vinho moderno porque no h a indicao da uva nem da origem, e sim um nome de marketing. Ele pode ser bom, mdio ou ruim, mas normalmente ele de mdio para bom, e em geral custa caro. SARDENBERG: Por que custa caro? RENATO MACHADO: Como so nomes inventados, o proprietrio no teve de seguir determinada legislao e pode escolher uvas especiais, e por isso so mais dispendiosos. SARDENBERG: Mas pode ter picaretagem? RENATO MACHADO: Sim, afinal a gente nunca sabe por que no tem a origem no rtulo, se uma armao de marketing ou se um vinho resultado de uma mistura de grandes uvas. A gente tem de abrir para provar.

Como montar uma adega

SARDENBERG: Como se faz para montar uma adega de vinhos? RENATO MACHADO: So tantos vinhos no mundo inteiro que eu acho que uma miniadega deveria ter 24 garrafas, porque voc teria oito brancos, oito tintos com representantes da Itlia, Portugal, Chile e Argentina em ambos os casos. Alm disso, deveria ter um exemplar da Espanha e quatro representantes da Frana, um de cada regio. Como temos de reservar duas garrafas na adega para os espumantes, ento estamos falando de 23 vinhos no total. A escolha desafiadora. SARDENBERG: Ento, vamos resumir, voc fala em ter dois espumantes, oito brancos e treze tintos, sendo quatro franceses. RENATO MACHADO: Ou poderamos ter trs franceses tintos e um branco.

O Vinho e o mar

SARDENBERG: Assunto: vinho ideal para camares e crustceos. Imagino que ns vamos para os brancos, no ? RENATO MACHADO: Sem dvida. Os brancos so ideais com camares, crustceos e todos os pratos do mar que, no vero, so uma soluo mais leve. E os camares sempre ajudam alguns brancos e alguns brancos ajudam muitssimo os crustceos em saladas, por exemplo. O nico problema a maionese, que no pode ser usada em excesso, porque pode ser inimiga de alguns vinhos brancos delicados, que de outra forma estariam maravilhosos com os camares. Os vinhos brancos da uva chardonnay so ideais com os frutos do mar. SARDENBERG: Chardonnays e crustceos? RENATO MACHADO: Sim, eu estou pensando em chardonnays franceses mesmo, mas podem ser italianos, argentinos, australianos, Californianos, que so muito interessantes com esse tipo de fruto do mar. A lagosta e os camares tm uma gordura natural, que vai combinar muito bem com esses vinhos.

Vinho desacompanhado

SARDENBERG: Quais so os vinhos indicados quando a gente quer tomar algumas taas, sem comer nada? RENATO MACHADO: Olha, a resposta no to difcil, mas talvez seja difcil para o bolso dos consumidores. Para voc no comer nada junto, so os grandes vinhos, que podem ser tintos, brancos ou alguns poucos rosados. Mas tem de ser um vinho que encha a boca, o paladar, o olfato, ele tem de seduzir e dispensar qualquer acompanhamento, por isso estamos falando de vinhos que custam um pouco mais. Vale lembrar que alguns champanhes mais envelhecidos fazem esse papel perfeitamente, j que se trata de uma introduo e no h harmonizao. Mas, de qualquer forma, os grandes Bordeaux, os grandes Borgonhas, os grandes vinhos da Califrnia, um ou outro do Chile, que so grandiosos, podem prescindir, e devem at, de harmonizao. SARDENBERG: No caso desses grandes vinhos, talvez um pedacinho de po, diz a lenda. RENATO MACHADO: Voc est totalmente certo. Um pedacinho de po para diferenciar, porque normalmente, quando se trata desses grandes vinhos, h mais de um. Ento, para separar um e outro, basta uma pequena fatia de po.

Vai bem com feijoada

SARDENBERG: Qual o vinho para acompanhar a feijoada? RENATO MACHADO: Todo mundo acha que difcil casar feijoada com vinho e as pessoas apelam para outras bebidas, como caipirinha e cerveja. Mas isso equivale a perder uma oportunidade de casar um belo prato como a feijoada prato, alis, que tem vrias verses, na Frana, na Espanha e em outras partes do mundo. claro que o vinho precisa estar protegido do sol, caso seja ao ar livre, mas preciso lembrar que a feijoada um prato que existe no sul da Frana, na Espanha, alm do Brasil, e pede vinhos rsticos e com certa acidez, para compensar a gordura desse prato. Um bom malbec da Argentina ou um Cabernet sauvignon chileno bem jovem seriam ideais para acompanhar.

Beba at o fim

SARDENBERG: Como guardar a garrafa que no foi consumida totalmente? RENATO MACHADO: Eu aconselho a consumir toda a garrafa e, se for difcil, chame o vizinho, convide o colega do escritrio. que, uma vez aberto, o vinho perde seus encantos se guardado. J inventaram vrios dispositivos para manter o frescor do vinho, mas, uma vez que o oxignio entra na garrafa, o vinho vai se oxidar. como voc morder uma pra. Dali a dez minutos ela no tem mais a mesma cor. A oxidao age sobre as molculas, ou seja, estamos falando de um problema da natureza. claro que o vinho pode suportar cinco, seis horas aberto. H vinhos que suportam at 24 horas, mas so grandes vinhos de grandes safras.

Normalmente, os vinhos devem ser consumidos em no mximo quatro horas. SARDENBERG: E aquela mquina de vcuo que tem nos

restaurantes? Ela preserva? RENATO MACHADO: Durante algum tempo. Preserva de um dia para o outro, mas na minha experincia no preserva muito bem. Aquilo injeta um gs estril um composto de nitrognio que mantm o oxignio longe da superfcie do vinho, mas no totalmente. Se uma garrafa estiver de meio cheia para cima, ela ser mantida, mas se estiver a menos da metade no vai ser mantida nas condies ideais.

SARDENBERG: Ento a gente tem de ficar com o p atrs nos restaurantes que servem vinho em taa? RENATO MACHADO: Se a garrafa estiver abaixo da metade, a gente deve pedir para abrir outra. SARDENBERG: E aquelas coisas que vendem em lojas de vinhos, como aquela rolhinha de borracha? RENATO MACHADO: Funciona durante algumas horas, mas isso tem um preo: o vinho fica mais estvel, porm perde os aromas. SARDENBERG: Ou seja, vamos tomar, no ? RENATO MACHADO: Exato, como eu disse, convide as pessoas improvveis

Para abrir daqui a 18 anos

SARDENBERG: Marcos Ricardo Germano, de Jundia (So Paulo), diz que nasceu seu primeiro sobrinho e ele quer comprar uma garrafa de vinho 2006 para abrir quando o rapaz fizer 18 anos. O que ele escolhe? RENATO MACHADO: Bem, o que foi a safra 2006 ns no sabemos ainda no Hemisfrio Norte. J os chilenos, argentinos e Californianos eu no recomendaria para 18 anos. Alis, vinhos do Novo Mundo, somente um ou dois da Austrlia que poderiam durar esse tempo. Nesta altura, para 18 anos, teremos de ir para a Frana para esperar que esta safra de 2006, que ningum sabe como vai ser, seja engarrafada daqui a 18 meses, ou daqui a dois anos ou seja, comprar a safra de 2006 em 2008. SARDENBERG: Ento, preciso esperar, mas j sabendo que ser um francs. RENATO MACHADO: Eu acho que sim, a no ser que ele tenha uma possibilidade maior de compra e possa comprar a safra 2006 de um Vega Sicilia, na Espanha, que certamente vai durar 20 anos. Tambm na Itlia, por exemplo, um Brunello di Moltalcino pode ser que dure 20 anos, mas tem de ser um super Brunello di Moltalcino, que so carssimos. Os Brunello di Moltalcino de Biondi-Santi duram 30, 40 anos. H

piemonteses de antigos produtores do Piemonte, que so Barolos e Barbarescos que tambm duram esse tempo. SARDENBERG: E se vai guardar por 18 anos tem de diluir o preo por este perodo. RENATO MACHADO: Exato. Um vinho da bodega Vega Sicilia ou um da bodega Alin, no sei se duram 18 anos, mas certamente vo estar bons com 15 anos de idade. Alguns grandes vinhos da Borgonha vo estar maravilhosos. Agora, resta saber como ser a safra de 2006. SARDENBERG: Outro assunto, agora. O ouvinte Marcelo Coelho vai casar e ofereceram para ele as seguintes possibilidades de vinho para a festa de casamento: um prosecco Brut, um prosecco Extra Dry ou um Tribal Dry, da frica do Sul. RENATO MACHADO: Olha, no conheo o vinho sul-africano, mas imagino que tambm seja um espumante. Eu experimentaria, talvez... Qual o produtor do prosecco? SARDENBERG: Ele no disse. RENATO MACHADO: Bem, a fica difcil, os proseccos so vinhos cidos e leves, que podem ser servidos para um grande nmero de pessoas... SARDENBERG: No melhor ele ir para um espumante brasileiro? RENATO MACHADO: Acho que sim, eu ia sugerir isso. Outro dia experimentei um Dal Pizzol que era muito bom, tambm o Casa Valduga me impressionou bem e tem ainda a linha Chandon, que faz uns vinhos bons. Mas eu preferiria os vinhos mais artesanais, como o Dal Pizzol, um espumante

que pode fazer a festa com muito encanto.

A Taa das Belas

SARDENBERG: A Maria Fernanda Costa Haddad, de Valinhos (So Paulo), tem um grupo de 15 amigas que se rene uma vez por ms para um jantar especial de degustao de vinhos. Sabe como chama o encontro mensal delas? A Taa das Belas. RENATO MACHADO: Que belo nome! SARDENBERG: Este ms, a Maria Fernanda a encarregada do jantar. A idia dela oferecer vinhos do Vale do Loire, especificamente Vouvray. O que voc acha? RENATO MACHADO: Olha, o Vouvray uma das jias da natureza. Todos ficariam espantados com o que significa a expresso qualidade-preo ou custo-benefcio, como se diz no mercado financeiro. Qualidade-preo uma expresso preferida do mestre Armando Nogueira, que acha que o vinho no pode ser comparado a uma mercadoria do mercado financeiro. Mas, enfim, a qualidade-preo se encontra no Vale do Loire e especificamente em Vouvray, que faz vinhos brancos

espetaculares, alguns secos, outros meio doces e alguns licorosos. E so vinhos de uma honestidade, perfeio e qualidade fora do comum. Se a gente olhar para a tabela de preo dos bons vinhos brancos, um descuidado diria que esse vinho no tem qualidade porque o preo baixo. Na verdade, um vinho extraordinrio, uma belssima escolha da ouvinte. SARDENBERG: A ouvinte pergunta onde ela pode comprar no Brasil.

RENATO MACHADO: Olha, existe Vouvray na Mistral, no Club du Taste-Vin no Rio de Janeiro e a World Wine La Pastina tem vinhos do Vale do Loire.

Vinho bom e barato em Paris?

SARDENBERG: Tenho a dvida de um ouvinte que vai viajar para a Frana e quer dicas de vinhos no valor de at 50 euros. Alm disso, ele est tentado a meter a mo no bolso e trazer um Mouton-Rothschild ou algum outro premier grand cru. RENATO MACHADO: Eu acho que ele vai navegar pela safra 2001, que imagino esteja nas lojas de pas, embora as garrafas sejam bem caras. Agora, sobre a sugesto que ele pediu, at 50 euros, quem sabe com uma boa sorte, em uma boa delicatessen, uma boa loja de especiarias, como o Bon March, ele pode conseguir comprar um Pinot Noir, que um clssico da Borgonha. Ele tem a chance de fazer a pesquisa de campo.

A temperatura ideal do vinho branco

SARDENBERG: Pergunta do Mauro Marquior Junior, de Campinas (So Paulo): qual a temperatura correta para tomar os brancos e espumantes, e como guard-los? RENATO MACHADO: Para tom-los, varia. O espumante pode ser tomado a oito, nove graus e o branco vai bem a partir dessa faixa e, se for extraordinrio, pode ser tomado em at 11, 12 graus, porque ele vai se beneficiar um pouco da espera no copo. J quanto pior for o vinho, maior dever ser a temperatura, para que seus defeitos sejam disfarados. SARDENBERG: Ento, quanto melhor, mais frio? RENATO MACHADO: No, ao contrrio. Se ele no tiver qualidade, deve ser servido mais frio. SARDENBERG: Quando muito ruim voc congela e no sente gosto nenhum... RENATO MACHADO: Pois . A tendncia de esfriar mascarar os aromas, quando eles no existem. Voc pode descer a temperatura para ficar uma bebida agradvel sem que os defeitos sobressaiam. Porque a temperatura mais alta vai fazer sobressair os aromas, ou os defeitos, se for o caso. SARDENBERG: Mas, no mximo, qual a temperatura dos brancos? RENATO MACHADO: Olha, eu acho que um branco acima de 12

graus j no est na temperatura correta. O ideal manter na faixa de 10 a 12 graus para um vinho branco de qualidade. SARDENBERG: E para guard-los? RENATO MACHADO: Para guard-los, a 14 graus, como se guardam todos os outros, na faixa entre 14 e 17 graus. SARDENBERG: Como se guardam todos os vinhos? Pode-se colocar os tintos e brancos juntos? RENATO MACHADO: Normalmente, os brancos na parte inferior da adega. Em cima os tintos e os brancos embaixo.

Leitura obrigatria

SARDENBERG: AS pessoas esto nos pedindo dicas de livros sobre vinhos. Vamos a elas? RENATO MACHADO: Sim. Olha, as opes esto aumentando cada vez mais. Existem agora nas livrarias aquelas sees de gastronomia com muitos livros de vinho, inclusive em portugus, como o do Saul Galvo, o Tintos e Brancos, que um bom comeo. Existe o Atlas Mundial do Vinho, de Hugh Johnson. a minha primeira indicao, alis. O Atlas fundamental. Assim como o livro Vinho de Jancis Robinson, que tem todas as informaes por regies, por pases, por tipos de uva. Agora, para aqueles curtidores que querem um pouco de literatura, eu recomendo o livro Uma vida desarrolhada, do Hugh Johnson, em ingls (A Life Uncorked). o gesto de abrir a garrafa. a vida do escritor de vinhos desde os 17 anos, e hoje ele tem 66 anos e a referncia mxima no mundo dos vinhos. O livro tem um texto delicioso, parece uma garrafa de um bom Borgonha.

Grand cru x premier cru

SARDENBERG: Nosso velho amigo Marcos Frederico, l da Confraria do Vinho de Bauru, disse que j trabalhou bastante os vinhos do Novo Mundo e est adentrando no universo dos franceses. E ele quer saber a diferena entre um vinho grand cru e de um vinho premier cru. RENATO MACHADO: Essa a chave do segredo. preciso saber isso em relao aos vinhos da Borgonha porque essa diferena comeou a ser feita l depois outras regies francesas passaram a aplicar conceitos parecidos. O vinho tem trs categorias de qualidade e preo na Borgonha. Ele pode ter uma denominao com o nome do vilarejo, a ele no nem premier nem grand cru, tem apenas o nome do vilarejo onde fica o vinhedo. Ou o vinho pode ter uma classificao acima, bem melhor de qualidade, de preo mais alto, que o premier cru, e a ele tem no rtulo o nome desse vinhedo. Cru quer dizer vinhedo, embaixo do nome do vilarejo. Outra forma ter uma classificao acima, o top, o mais caro de todos, que o grand cru, e a no precisa botar o nome do vilarejo, mas apenas o nome do grand cru. Esses vinhos, porm, so muito caros. So 33 grand cru na Borgonha. Mas um premier cru j um vinho de alta qualidade. SARDENBERG: Para os iniciantes como ele, por onde comear? RENATO MACHADO: Pela regio da Cte dOr.

Vinho tinto com frutos do mar

SARDENBERG: Lus, da Confraria do Vinho de Bauru (So Paulo), pergunta: na impossibilidade de tomar um vinho branco com frutos do mar, possvel tomar um vinho tinto? RENATO MACHADO: A resposta difcil, porque vai depender da consistncia e dos temperos do prato. Por exemplo, se for uma paella, que tem frutos do mar, mas no deixa de ser um risoto que tem aafro, especiarias e outros condimentos, a pode ser tomado um vinho tinto fresco, a 12 graus. Agora, quando o fruto do mar vem sozinho, no caso de uma lagosta, ou crustceos, ou mexilhes, ou vngole, fica mais

complicado casar com o vinho tinto. Eu acho que a o sinal amarelo aparece, e o sinal vermelho aparece no caso de ostras, que absolutamente no vo combinar com o tinto. SARDENBERG: Nessas cantinas italianas tem o prato de espaguete com frutos do mar e, s vezes, ele vem com tomate, no ? RENATO MACHADO: Ainda assim eu acho que o molho de tomate italiano pede muitas vezes, como no caso da salada caprese, vinhos brancos. Existem vinhos brancos na ilha de Capri, de onde, alis, saiu a salada caprese. A mussarela e o tomate se harmonizam maravilhosamente com vinhos brancos. No caso de frutos do mar que levem tomate, possvel conciliar com vinho tinto que no seja envelhecido, que no tenha muita madeira, muita baunilha.

SARDENBERG: D um exemplo desse tinto. RENATO MACHADO: H alguns tintos rsticos da Toscana, da Umbria. So vinhos camponeses e combinam muito bem com pratos com molho de tomate.

O turismo do vinho

SARDENBERG: Hoje o tema vinho e turismo? RENATO MACHADO: , porque vemos muito nas propagandas os governos tambm se interessando em mostrar destinaes tursticas de regies vincolas. Essa mistura sempre agradvel, porque vinho e turismo so uma frmula perfeita, embora muitos desses passeios tursticos de vinho sejam mais passeios tursticos do que degustao de vinho. Se a gente puser isso na cabea, acho que fica bem mais fcil, porque eventualmente algumas decepes podero ser

contornadas. Quando um grupo muito grande que vai ao Chile, Argentina, a Portugal, evidente que no vai ter a apreciao de vinhos nem se vai conhecer grandes vinhos, mas vai certamente conhecer grandes lugares. Eu estava lendo uma reportagem sobre as destinaes tursticas do Chile, que um pas de paisagens extremas, como tambm o sul da Argentina. So paisagens de rusticidade e de aparente pobreza do solo, mas, de repente, h aquela erupo da riqueza do vinho, que sai de onde voc menos espera.

Vinhos da frica do Sul

SARDENBERG: Tm aparecido por aqui vinhos da frica do Sul. O que podemos dizer sobre esses vinhos? RENATO MACHADO: So honestos, bem-feitos, alguns so melhores que outros. Mas a frica do Sul est numa encruzilhada, porque optou por uvas internacionais, que fazem sucesso no mercado externo, embora eles tenham algumas experincias boas com o chardonnay de l e com o sauvignon blanc. Infelizmente vemos poucos sauvignons blancs por aqui. Temos visto mais chardonnay e cabernet sauvignon. So mais ou menos o que so os vinhos chilenos de qualidade, a preo um pouco maior, porque tm de viajar muito para chegar aqui, os custos so mais altos. Eu acho que cada caso um caso. Devem ser examinados. Trata-se de uma terra com tradio vincola, pois tem muito sol e noites frias. SARDENBERG: Desde quando a frica do Sul faz vinhos? RENATO MACHADO: H muito tempo. A frica do Sul tem uma bela tradio vincola. Eles dizem que comeou com os holandeses que foram para l no sculo 18. As fazendas da frica do Sul se dedicam ao vinho h muito tempo estamos falando de mais de 50 anos , e eles se aperfeioaram nos ltimos 20 anos. SARDENBERG: E se aperfeioaram pela internacionalizao? RENATO MACHADO: Exatamente. Com bons investimentos e se

internacionalizando, com uma mo-de-obra barata. SARDENBERG: Perguntei isso porque a frica do Sul citada como um pas emergente com chances de se tornar pas

desenvolvido. RENATO MACHADO: Sem dvida. E nessa parte de agricultura eles esto fazendo belssimas experincias.

Vinho inflacionado

SARDENBERG: O assunto agora o preo de vinho em restaurante... sempre complicado saber se o preo justo ou no. RENATO MACHADO: Olha, est cada vez mais complicado. Estou aqui com uma edio da revista Decanter. A matria principal, Um pelo preo de quatro, uma reportagem sobre os restaurantes de Londres. Todos os restaurantes visitados pela equipe de reportagem tm uma garrafa que custa no mesmo bairro 15 libras e na mesa do restaurante tem o preo quadruplicado. Ento, numa garrafa de 20 libras numa loja, no mesmo bairro, o restaurante vai cobrar 80 libras. E os donos de restaurantes tanto de l como de c dizem que preciso cobrir custos que so outros que no os das lojas de vinhos, e sim com pessoal, com a decorao etc., mas eles carregam justamente no preo da garrafa. SARDENBERG: Bem, est certo que tem de ser mais caro do que a do revendedor, mas tem custos e custos, no ? RENATO MACHADO: Exato. Se tomarmos como mdia quatro vezes mais e aqui no Brasil tambm assim , eu acho um pouco inflado. Afinal so garrafas que poderiam acompanhar grandes pratos, e a o cliente poderia gastar um pouco mais, mas ele fica assustado com esse sobrepreo. SARDENBERG: Eles querem ganhar dinheiro na bebida. RENATO MACHADO: Exato, porque normalmente quem escolhe

bebida est comemorando alguma coisa ou um conhecedor disposto a pagar mais. Porm, deve haver um limite para esse raciocnio. SARDENBERG: O cara chega l animado, com o esprito aberto. RENATO MACHADO: E, j que estou aqui, pedi esse prato, por que no pedir uma garrafa...? A no quer recuar quando a carta de vinhos aberta na frente dele. SARDENBERG: A toma um, j fica animado e manda vir outra garrafa. Vai ver que os donos de restaurante esto certos. RENATO MACHADO: fator psicolgico. SARDENBERG: Mas continua caro, vamos reclamar porque continua caro. RENATO MACHADO: isso mesmo.

Baco e a felicidade

SARDENBERG: Estava conversando com a Mara Luquet sobre alguns estudos de economistas dos Estados Unidos e da Inglaterra sobre felicidade se voc compra ou no compra felicidade. Ento, l pelas tantas, um desses estudos diz o seguinte: Comprar um vinho de 250 dlares no compra felicidade. E sabe por qu? O estudo diz assim: Porque voc no vai saber distinguir um vinho de 250 dlares de um de 50 dlares. RENATO MACHADO: Olha, se voc souber distinguir o de 250 dlares, isso pode torn-lo mais feliz do que o de 50 dlares, sem dvida. SARDENBERG: Exatamente. Ento, a interpretao do estudo a seguinte: as pessoas no entendem, no sabem apreciar e mandam bala num vinho de 250 dlares, e a perder dinheiro. RENATO MACHADO: No, no vai comprar felicidade. Agora, eu queria acrescentar que, para um vinho de mil dlares, mesmo quem entende no vai ficar feliz. SARDENBERG: E por qu? RENATO MACHADO: Mesmo gente que sabe distinguir, como voc e eu, se tiver de gastar mil dlares, garanto que no vai ficar feliz nem que seja um vinho famoso, bacana. Acho que, no vinho de 250 dlares, tudo bem, pode ser que na hora a gente

fique feliz, mas talvez no dia seguinte fique arrependido. Acho que um vinho de 50 dlares pode perfeitamente trazer felicidade. H outros componentes da felicidade que esto na mo inversa, no vm de fora para dentro, vm de dentro para fora. SARDENBERG: Exatamente. O bom de tomar um vinho de mil dlares voc tomar de graa. Ganho. RENATO MACHADO: Outro dia provei um vinho de 900 reais. E confesso a voc que ningum falou de felicidade na mesa. SARDENBERG: Ento os economistas esto certos nos estudos que vm fazendo. RENATO MACHADO: isso mesmo.

As videiras de Santorini

SARDENBERG: A loja de uma amiga minha, a Jane, da Toque de Vinho, de S. Paulo, est fazendo uma degustao dos vinhos australianos. australianos? RENATO MACHADO: Eu tambm estou fazendo uma degustao de vinhos australianos. Os vinhos da Austrlia tm de ser separados em duas categorias: os de grande distribuio, que so vinhos corretos, mas sem grande atrativo, e os bons, que tm um problema para ns, o preo. Como eles viajam muito, chegam aqui muito caros, alm de ser vinhos muito bemfeitos. Cada casa australiana tem vinhos para todas as faixas de preo. Agora, quando chega nos bons, eles so excelentes. Mas so feitos para um determinado tipo de paladar, que o paladar moderno. So vinhos quase doces, polpudos, cheios de seiva, tensos, s vezes at escuros, mas com uma caracterstica: ficam prontos antes dos europeus. Ou seja, um australiano de trs, quatro anos j est completamente pronto para ser tomado. SARDENBERG: Vamos falar de um vinho muito bom e um mdio. Primeiro, um vinho muito bom. RENATO MACHADO: Um muito bom o legendrio Grange, da uva shiraz, mas ningum tem esse vinho. Existem outros vinhos muito bons da vincola Petaluma. Eu tomei agora um sauvignon blanc excelente, chamava srie Y. A Petaluma O que ns podemos falar dos vinhos

tambm faz excelentes cabernets sauvignons e excelentes vinhos da uva shiraz. Alis, a uva shiraz uma campe na Austrlia. uma uva francesa doce, que faz vinhos densos, e muito prpria para o consumidor que est se iniciando no mundo do vinho. SARDENBERG: Mudando da Austrlia para a Grcia, o nosso ouvinte Pedro Abujamra disse que esteve na ilha de Santorini e ficou impressionado com as videiras de l, no cho, que de pedra. Ele queria saber se voc conhece algum vinho branco de Santorini. RENATO MACHADO: Sim, eu conheo. Alis, olha que luxo: eu conheci um branco de Santorini com o sommelier do hotel Plaza Athne, em Paris. Ele abriu duas garrafas de um vinho branco de Santorini. Agora, se voc me perguntar o nome da uva, confesso que esqueci. Mas era um branco mineral, fresco, com acidez equilibrada, e dava para notar a pedra do solo da ilha de Santorini, uma ilha grega que fica no Mar Egeu. SARDENBERG: Gostei da descrio do Abujamra, olha s: Fiquei impressionado com as videiras de Santorini. Elas esto no cho, que tem muita pedra num clima seco e com muito sol. So como mudas de uva plantadas nos terrenos da ilha. RENATO MACHADO: Isso uma descrio paradisaca para os vinhos de uva branca. SARDENBERG: E ns gostamos? RENATO MACHADO: Adoramos. SARDENBERG: Tambm, n? No Plaza Athne..

RENATO MACHADO: Mas em Santorini, Sardenberg, talvez seja muito melhor.

O segredo das velhas famlias

SARDENBERG: Hoje vamos falar dos vinhos chilenos. RENATO MACHADO: Olha, voc sabe que o Chile tem uma histria moderna e uma histria antiga. SARDENBERG: E de qual ns gostamos mais? RENATO MACHADO: Ns gostamos muito da histria antiga do Chile e da tradio que o Chile tem da busca de um vinho possvel. Temos de lembrar que na dcada de 50 e 60 a gente no dava muita bola para o vinho. E os chilenos j davam muita ateno ao vinho. Ento, os chilenos sempre fizeram vinho, desde o final do sculo XIX. Na dcada de 70, quando eu comecei a me interessar por vinhos, os que existiam no Brasil eram muito limitados. Havia o Cousio Macul. Tinha o Cousio Macul comum e o reserva. Mas o Cousio Macul era feito de cabernet sauvignon. Hoje, o vinhedo, que pertence mesma famlia, continua fazendo cabernet sauvignon,

chardonnay etc. Estou aqui provando um cabernet sauvignon que vai fazer um lanamento da Cousio Macul, chamado Lota. Para mim ainda muito jovem e tem de ser mais refinado ao longo do tempo, mas mantm aquela tradio de plantar cabernet sauvignon no Chile, porque hoje em dia se plantam vrios tipos de uva no Chile. Eu acho que essas velhas famlias tm que ser observadas com ateno. SARDENBERG: Olha, ns acabamos respondendo a ouvinte Gisela.

Ela vai para o Chile e quer saber quais vincolas deve visitar. RENATO MACHADO: A vincola Cousio Macul, no Vale do Maipo, bem perto de Santiago, e a vincola Santa Rita, dona de uma propriedade muito bonita. So duas vincolas que tm um vnculo com a histria. Mas h vincolas modernas no Vale de Casablanca, no prprio Vale do Maipo. Ao visitar a vincola, a gente tem de pedir o vinho turstico, mas tambm o bom vinho da casa. A vai depender do charme de cada pessoa em fazer o proprietrio mostrar os tesouros escondidos.

Para iniciantes

SARDENBERG: Ana Cristina Cruz e Silva, de Braslia, diz que o pai apreciador de vinhos, escuta seus programas, mas ela no costumava beber vinho e agora quer se iniciar. E a pergunta dela a que todo mundo faz: Existe um vinho mais fcil para iniciantes? RENATO MACHADO: Olha, todo vinho bom para iniciantes e escolados. Agora, eu sugeriria um vinho tinto que no tivesse muita acidez, um bom cabernet sauvignon do Chile. O vinho que custa muito pouco no bom, pode dar uma m impresso a quem est chegando. Tem de gastar um pouquinho mais e comprar um bom vinho do Chile, um cabernet sauvignon moderno. SARDENBERG: Pois , porque, se comear com um vinho meia-boca, a de cara no vai gostar. RENATO MACHADO: Exatamente. Se for, por exemplo, um vinho de muita acidez, lembrando um vinagre, ou um vinho pouco espesso, bem cido, acho que a impresso no vai ser boa. H determinados vinhos que s l na frente ela vai apreciar, como o caso de alguns brancos. Por isso que acho que um tinto deve ser maduro, por isso um reserva, e o reserva custa mais caro. SARDENBERG: E qual prato para acompanhar?

RENATO MACHADO: Com um bom bife, com sal grosso.

O que falta indstria brasileira de vinhos?

SARDENBERG: Nosso ouvinte Osvaldo Miranda pergunta por que a nossa indstria de vinhos no consegue concorrer nem com o Chile nem com a Argentina. Afinal, diz ele, temos clima, cepas podem ser importadas, profissionais podem ser treinados e somos um grande mercado consumidor. RENATO MACHADO: Na verdade, so premissas que o ouvinte alinha que no so necessariamente aceitas pelo mercado

consumidor porque o nosso clima muito diferente do clima de Chile e Argentina. Na Argentina, por exemplo, eles plantam vinhedos h mais de 1.000 metros, onde no h chuva nem umidade. No Chile, as noites so muito frias. Ento, na parte de clima, ns temos uma diferena marcante. Quanto s cepas importadas, verdade que as cepas foram importadas por vrios pases ao longo dos tempos, o ouvinte tem razo. Mas as uvas precisam de algumas condies especiais, como o caso da Austrlia e da frica do Sul, e no Brasil o que se escolheu importar teve algum problema com o clima e o solo da Serra Gacha, o que no quer dizer necessariamente que isso ocorra em toda a regio do Rio Grande do Sul. H zonas que esto entre o paralelo 30 e o paralelo 50, onde as condies so diferentes e podem favorecer determinados tipos de uva. O problema achar quais tipos de uva so adequados para cada terreno. E tambm o problema traduzir o terreno, que

o que todo vinicultor quer fazer, e ns ainda no conseguimos chegar a esse estgio de compreenso do solo e as uvas tm resultados variveis no caso dos tintos e dos brancos.

Que vinho se deve beber primeiro?

SARDENBERG: A nossa ouvinte de So Paulo Sandra Regina, que uma f incondicional sua, est lendo seu livro Em Volta do Vinho. E ela quer uma listinha bsica, com indicaes, para saber o que pedir nos restaurantes ou comprar em So Paulo. RENATO MACHADO: Podemos fazer de forma genrica, pois uma lista muito extensa. Existem mais de 100 importadoras de vinhos no Brasil. Agora, a ouvinte j entrou em contato comigo e eu respondi a ela por e-mail e pedi um tempo para poder fazer a lista. Ela visitou o Vale do Loire e ficou muito impressionada com a cultura ligada ao vinho de l, que algo muito simples, no uma coisa de demonstrao de posses, nada disso, pois l isso faz parte do dia-a-dia deles. Eu diria que o Sancerre, do Loire, um vinho bom para comear qualquer almoo ou jantar. Existem alguns cabernets

sauvignons do Chile que podem continuar uma boa refeio. A pessoa tem de ter um bom vinho branco, um bom vinho tinto. Ateno: bom no significa caro e no necessariamente um vinho de sobremesa, um vinho do Porto. Isso pode ficar para depois. O comeo mais importante do que o fim. Ento, um bom branco, um bom tinto e terminar em um bom queijo, por exemplo. SARDENBERG: Quando voc est num jantar e vai tomar dois vinhos: um muito bom e um no to bom. Qual vai primeiro? O pior ou o melhor?

RENATO MACHADO: o pior, dependendo do nmero de pessoas do jantar, porque se o pior acabar rpido vai-se logo direto ao assunto, ou seja, para o vinho melhor, em seguida. Agora, se forem duas pessoas, acho que se deve comear pelo melhor.

Beaujolais nouveau com gosto de banana

SARDENBERG: Estamos de novo diante do caso do beaujolais nouveau. Agora, dia 21 de novembro de 2006, o lanamento mundial do beaujolais nouveau e ns no gostamos, no ? RENATO MACHADO: Ns no gostamos. E acho que grande parte dos consumidores tambm no gosta mais. J se gostou muito quando, nos anos 80, 90, o vinho novo fez sua entrada no mercado, era uma novidade. O importante no beaujolais nouveau a festa, a possibilidade de reunir as pessoas em volta de uma mesa e comear com o beaujolais nouveau, mas quem sabe continuar por outro caminho, ou seja, evoluir ao longo do encontro. SARDENBERG: De onde veio essa idia de fazer um lanamento mundial, Renato? A safra chega no mundo inteiro no dia 21 e na Frana tem de fazer reserva. De onde veio isso? RENATO MACHADO: A idia veio dos negociantes da regio de Lion, regio do Beaujolais, que tem uma uva muito fecunda, ou seja, uma uva que faz grandes quantidades de vinho. Ento, em vez de armazenarem, porque no tinham nem lugar, eles lanaram o vinho antes de envelhecer, ou seja, assim que feito, depois da macerao a que submetido. Em poucos dias ele engarrafado e vendido como vinho novo. Mais ou menos como era antigamente o vinho verde de Portugal. Eles lanaram na dcada de 70, 80, com grande marketing, porque

o consumo na Frana na poca era muito grande e o vinho novo no era to diferente do vinho envelhecido, porque no havia a preocupao com a qualidade que h hoje, e com isso eles descarregaram boa parte da produo nos ltimos 20 anos. SARDENBERG: Tem algum assim que seja melhorzinho? RENATO MACHADO: Eles so muito parecidos. Os produtores no tm tempo sequer de imprimir a prpria marca no beaujolais que engarrafado logo depois da macerao. Ento, eu acho que o beaujolais nouveau tem um gosto muito parecido e, para dizer a verdade, um sabor de banana.

Os vinhos mais importados no BrasilSARDENBERG: OS vinhos importados consumidos no Brasil, qual a ordem? RENATO MACHADO: Primeiro, Chile; segundo, Argentina; terceiro, Portugal, quarto, Itlia; quinto, Frana. SARDENBERG: E os Estados Unidos? RENATO MACHADO: Os Estados Unidos tm uma presena muito pequena no Brasil, alis, em todo o mundo. A razo muito simples. Os americanos consomem tudo l, os americanos preferem os vinhos americanos. No estou falando de Nova York, e sim de outros lugares como Ohio, Califrnia, Massachusetts, at porque no conhecem o vinho europeu. O fascnio do mundo dos vinhos voc ter as quatro esquinas, os quatro cantos do mundo na mesa. E os americanos podem ter isso, alis, os brasileiros tambm, porque somos um pas aberto a outras influncias. Os vinhos so um conhecimento geogrfico. E, a propsito, o guia ilustrado da editora Zahar, Vinhos do Mundo Todo, d a medida geogrfica e cultural do vinho no mundo inteiro.

A bebida do Czar

SARDENBERG: Ento quer dizer que existe vinho da Ucrnia? RENATO MACHADO: Sim, e eu estou prestes a iniciar uma degustao de vinhos ucranianos. SARDENBERG: Qual a histria desses vinhos? RENATO MACHADO: Os vinhos da Ucrnia so muito raros e doces, de sobremesa, e tm nome mgico: Massandra. A Massandra foi uma vincola fundada pelo czar Alexandre III no final do sculo XIX. Ele queria fazer vinhos doces melhores que os Sauternes e que os Tocays e, durante algum tempo, conseguiu. Esses Massandras foram leiloados em 1991, quando acabou o regime sovitico. Foram postos em leilo dcadas e dcadas de Massandras. So vinhos de alto valor e de especialistas. Mas so muito raros e muito doces, ento so vinhos de sobremesa. O difcil harmonizar todo um almoo com os Massandras.

O limite entre o prazer e o excesso

SARDENBERG: Um casal num jantar toma uma garrafa de vinho ou menos? RENATO MACHADO: Toma. Eu acho que, dependendo do jantar, deve tomar at mais do que uma. SARDENBERG: A pergunta do nosso ouvinte Sidnei : Qual o limite entre o prazer e o excesso? RENATO MACHADO: uma boa pergunta, porque cada pessoa, cada casal tem seu limite. Uma garrafa para duas pessoas o ideal para um almoo. Num jantar, se houver, por exemplo, uma entrada, tenho a impresso que a conta certa seria uma garrafa e meia para duas pessoas. Estaramos falando a de um pouquinho mais de um litro. Ento algo como 500 mililitros por pessoa para um jantar longo, de duas horas ou mais. E isso daria a oportunidade de provarem dois vinhos, no caso de um jantar especial.

Para os sem-adega

SARDENBERG: O ideal ter uma adega, certo? Mas o Ivan Ribeiro diz que ele no tem. E quer saber como faz quando tem um vinho para servir. Se ele pe no freezer para chegar rapidamente na temperatura ideal ou na geladeira, e por quanto tempo? RENATO MACHADO: Olha, nem uma coisa nem outra. Pega a garrafa como ela est, no estado natural, abre a garrafa antes, mergulha num balde de gelo e deixa ficar por dez minutos. Evidente que a parte debaixo da garrafa vai esfriar primeiro e o gargalo no. Ento, sugiro que, depois de dez minutos, o anfitrio derrube o gargalo no prprio copo e volte a garrafa para o balde, esperando mais um ou dois minutos, para depois comear a servir. O vinho estar na temperatura. SARDENBERG: Ento est perfeito. Est bem explicado: o anfitrio abre a garrafa, coloca no gelo por dez minutos, toma a parte de cima, e a pronto. RENATO MACHADO: Exatamente.

Copos coloridos, nem pensar

SARDENBERG: A questo a seguinte: aqueles copos coloridos so muito bonitinhos, mas no servem, no ? RENATO MACHADO: Essa questo me foi levantada por uma pessoa de muito bom gosto que estava comprando copos coloridos em um antiqurio em So Paulo. Copos coloridos, de cristal antigo. E ela dizia que sabia que para vinho tinto no daria, mas talvez para o vinho branco... E eu tive de dizer para ela: nem para o tinto nem para o branco. Esses copos coloridos lindssimos so para gua. obrigatrio que se veja o vinho na luz e ele precisa de um copo transparente, cristalino, no precisa ser de cristal, mas bastante transparente, que possa deixar que o exame visual seja feito com toda a ateno. Portanto, esses copos coloridos, trabalhados, so para gua.

A longevidade dos vinhos

SARDENBERG: Nosso ouvinte Jos Magalhes, de Vitria (Esprito Santo), tem uma coleo de trs vinhos e quer saber quanto longevidade, quando que ele abre as referidas garrafas. Eu vou ler para voc: O primeiro o Santa Rita Casa Real Cabernet Sauvignon 2002. RENATO MACHADO: Olha, este Santa Rita Casa Real 2002 um vinho to bom eu considero o melhor vinho chileno. Acho que certamente vai ficar muito bom nos prximos dois anos, mas j est bom agora. Ele feito de uma maneira que, com quatro anos de idade, j pode ser aberto tranqilamente. O problema que esses grandes vinhos chilenos so

consumidos e vendidos e no se guardam, e este seria um bom teste para fazer, mas de qualquer maneira j est no ponto de ser aberto. SARDENBERG: Por via das dvidas, melhor j tomar, no ? RENATO MACHADO: Pois . SARDENBERG: Depois tem Luis Pato Vinha Barrosa 1999. RENATO MACHADO: um belo vinho. Pode abrir. SARDENBERG: Depois vem o Alin Ribera del Duero 2000. RENATO MACHADO: Este uma obra-prima. um luxo. Acho que ele pode esperar. o segundo vinho da Espanha depois do Vega Siclia, que da mesma casa. muito bem vinificado.

uma propriedade modelar, parece a Califrnia, no meio do planalto castelhano, em Castela, SARDENBERG: E ele guarda at quando? RENATO MACHADO: Ele pode guardar por mais seis anos. SARDENBERG: Mas pode tomar agora? J est pronto? RENATO MACHADO: Sim, pode. SARDENBERG: Ento, ele pode tomar os trs vinhos. RENATO MACHADO: Acho que ele fez uma bela escolha. No so vinhos muito acessveis, so vinhos de festa, e todos eles vo fazer uma boa figura.

Vinhos para um jantar ecltico

SARDENBERG: O Leonardo, do Rio de Janeiro, vai oferecer um jantar para festejar o noivado da filha e pede a sua colaborao para os espumantes e os vinhos. Sero servidos canaps e depois um jantar base de peixe, carne vermelha e aves. Ficou meio bagunado isso aqui ou d para levar, Renato? RENATO MACHADO: Olha, ficou bagunado, aparentemente, mas ele pode ordenar isso, caso se disponha a dividir em estgios essa questo. Bem, ele j escolheu o prosecco eu ia at sugerir um espumante brasileiro que, na minha opinio, ganha dos proseccos na grande maioria das vezes. Mas, para continuar, como tem peixe, aves e carnes vermelhas, eu acho que ele tem de oferecer dois vinhos. Um branco, da uva chardonnay, para o peixe, e um vinho tinto, um merlot do Chile, cuja gradao um pouco mais alta, mas, como uma festa, todo mundo fica meio animado mesmo. Ento, um merlot chileno das casas tradicionais Santa Rita, Montes, Carmen, enfim, h vrias opes. Em resumo, eu sugeriria um espumante prosecco ou um brasileiro, com preferncia para o brasileiro, um

chardonnay chileno no-embarricado e um merlot chileno de uma das casas tradicionais. SARDENBERG: E a ordem esta: serve primeiro o peixe e depois as carnes e aves.

RENATO MACHADO: Sem dvida. Quem passar por cima do peixe e for direto para as carnes no tem direito ao chardonnay.

Vinhos para combinar com sopa

SARDENBERG: O nosso Joo Carlos Santana, apresentador do Reprter CBN, tomou ontem de noite uma sopa de gro-debico, bem temperada, com carne etc., e mandou ver um tinto chileno. Ele quer saber se fez besteira ou se se saiu mais ou menos... RENATO MACHADO: Olha, no fez besteira. Mas preciso saber qual era o tinto chileno que ele escolheu, de que uva. SARDENBERG: Era um malbec. Fez besteira, um malbec chileno no est com nada. RENATO MACHADO: Bem, enfim, eu acho que um tinto chileno poderia cumprir bem o papel, mas, com uma sopa de gro-debico cheia de temperos, eu iria para Portugal. A uva touriga nacional e as uvas do Do so excelentes com uma sopa de gro-de-bico, tm um pouco de rabe, um trao rstico. Aquela rusticidade com uma certa acidez vai muito bem com essa sopa. SARDENBERG: Agora, no caso das sopas em geral, vai depender dos ingredientes, no ? RENATO MACHADO: Sim, dos aromas, das ervas e dos temperos. De qualquer maneira, eu insistiria em um vinho da Pennsula Ibrica, seja de Portugal, seja da Espanha. A gente no pode esquecer que gro-de-bico um elemento do Mediterrneo.

SARDENBERG: E a tradicional canja de galinha? RENATO MACHADO: Bem, a canja fluida, rala e vai precisar de um vinho simples. At eu arriscaria com o vinho branco por causa da carne de frango, que vai muito bem com o vinho branco.

Os lucros do vinho

SARDENBERG: A Mara Luquet, a nossa colunista do jornal Valor Econmico, descobriu um fundo de investimento em vinhos: The Wine Investment Fund. A sede dele em Londres. O fundo compra garrafas de vinhos desde 2003, faz um portflio e depois vende as garrafas e realiza o lucro, e s vinho Bordeaux. Olha s o que eles compraram no comeo de 2006: Angelus 1995, 1998 e 2000. RENATO MACHADO: um bom ativo, sem dvida. Agora, sobre esse tipo de fundo, curioso que tenha sido criado to tarde, porque o boom dos vinhos ocorreu na dcada de 90 at 2002. Ento, quem investiu nesse perodo, ou mesmo antes, realizou um lucro extraordinrio. Mas muito mesmo, estamos falando de uma valorizao de 200% at 2002. Estou almoando com um amigo que gestor de fundos, e ele est dizendo o seguinte: com os valores das garrafas de 2005 ser muito difcil fazer um portflio que v ter um resultado parecido com o anterior, porque os de 2005 j esto precificados em relao aos fundos de investimento, ou seja, j se incorporou ao preo a rentabilidade desses fundos. Ento, j no a mesma coisa. SARDENBERG: Agora eles esto dizendo aqui que as garrafas adquiridas em janeiro de 2003 at 30 de setembro de 2006 tiveram uma valorizao de 75%.

RENATO MACHADO: Tudo bem, em 2003 aconteceu isso e essa valorizao em Bordeaux pode ter ocorrido. Agora, com os preos de 2005, fica mais complicado para o investidor, porque j se previram garrafas para sada com 600 dlares e 700 dlares chegando a mil dlares. Bordeaux passou a ser um pouco moda nos pases emergentes. Um portflio que era interessante em 2000 pode no ser to interessante em 2006. SARDENBERG: No portflio de 2006 tem, por exemplo, o Cheval Blanc 1989, 1995, 1996 e 1990. RENATO MACHADO: A estamos falando de blue chips,

principalmente as de 1990 e 1989. Evidente que haver uma valorizao, mas no na velocidade que houve anteriormente.

Dor de cabea para viagem

SARDENBERG: O ouvinte Caio Ribeiro, de So Paulo, diz que depois de tomar um vinho argentino, mesmo um bom argentino, ele se sente um pouco pesado e, s vezes, com um pouco de dor de cabea, o que no acontece com um francs. Disseram a ele que isso pode estar relacionado quantidade de sulfite presente no vinho. Pode ser? RENATO MACHADO: Pode, mas na verdade os franceses tambm usam a mesma quantidade de sulfito, que um conservante adotado por toda a indstria porque, quando o vinho viaja, ele precisa de uma dose de sulfito. Ou seja, tem uma dosagem industrial aceita no mundo inteiro para que ele possa viajar sem estragar. SARDENBERG: Todos os vinhos tm sulfito? RENATO MACHADO: Todos tm. Agora, isso no necessariamente a causa da dor de cabea do ouvinte. Eu imagino que talvez a gradao alcolica o seja ou tambm uma percepo pessoal, uma idiossincrasia. Normalmente, isso devido gradao alcolica, e os vinhos argentinos tm uma gradao mais alta. preciso saber a tolerncia de cada um ao vinho.

Uva difcil

SARDENBERG: O paulista Marcos Jos Rampone, do Esprito Santo do Pinhal, pergunta se voc poderia indicar vinhos pinot noir que no sejam franceses e tenham boa relao custobenefcio. RENATO MACHADO: Boa pergunta a do Marcos, porque pinot noir sinnimo de vinho elegante. uma uva que no aceita muito estgio em madeira porque perde suas caractersticas e at muda de cor. Na verdade, pinot noir uma uva muito difcil, que no d resultados bvios, fceis imediatos, de mercado. Exige uma vinificao paciente, uma uva de climas frios, e existem fora da Frana terrenos em que se pode plant-la, como nos Estados Unidos, por exemplo, ao norte da Califrnia, no estado de Oregon. L faz muito frio. Porm, esses vinhos do Oregon no so muito baratos. H pinot noir na Nova Zelndia, na regio da ilha sul, existe no Brasil, e agora tem pinot noir no Chile, na regio mais alta, em vincolas como a Morandes. uma questo de investigao que pode dar resultados excelentes.

Chablis fora da Frana, nem pensar

SARDENBERG: O Jferson, nosso ouvinte de So Bernardo do Campo, de So Paulo, quer saber se vinhos chablis que no so produzidos na Frana so confiveis. RENATO MACHADO: No, no so porque o nome, a denominao exclusiva. Voc s pode chamar de chablis os vinhos produzidos na regio de Chablis, no norte da Frana. Esse nome foi registrado, foi objeto de disputas internacionais. Eu me lembro at que na dcada de 70 havia chablis que no eram da Frana. Mas s pode ser chamado de chablis o vinho cultivado naquela regio. da uva chardonnay, plantada em solo calcrio e em condies muito frias. SARDENBERG: Agora, h bons vinhos chardonnays feitos fora da Frana? RENATO MACHADO: Sem dvida. H chardonnays magnficos, que ou tm o nome do produtor e da uva no rtulo, que a frmula americana, ou tm o nome da regio. H

chardonnays da Borgonha, dos Estados Unidos, do Chile, da Austrlia que so famosos, mas no tm nada a ver com chablis. No d para comparar chardonnay do Novo Mundo com o chardonnay de Chablis. com O chablis tem uma para

caracterstica

mineral,

acidez

pronunciada,

combinar com determinadas comidas.

A felicidade o limite!

SARDENBERG: Wagner Pinheiro, de Niteri (Rio de Janeiro), pede uma sugesto para comemorar o seu noivado. Ainda tem gente que fica noivo, Renato? RENATO MACHADO: Pois . Se j quer comemorar no noivado, imagine no casamento. Bem, o noivado pode ser comemorado, claro, com um espumante ou com um bom champanhe. Se for uma festa muito grande, eu sugiro um espumante mais acessvel; se for uma festa mais ntima, por que no um champanhe para ver se d sorte e se o casamento j pode ser pr-comemorado? claro que a bebida do casamento e do noivado sempre foi o espumante de qualquer nacionalidade, preferencialmente francesa, mas outras nacionalidades

tambm podem disputar essa competio. Porm, no jantar de noivado, por que no tentar brancos e tintos de boa qualidade? Eu aconselho aos noivos fixar um piso de gastos e, da para cima, a felicidade o limite. SARDENBERG: Ah, gostei disso... A felicidade o limite! Tem de comear bem, n? RENATO MACHADO: Lgico, pois, se se trata de um noivado, vamos comear com o p direito, porque quem sabe o casamento ser bem melhor e vai durar muito tempo.

Vinhos canadenses

SARDENBERG: Fernando nosso ouvinte l no Canad e diz que sempre acompanha as nossas conversas sobre vinhos. Ele foi visitar a regio vincola do Canad e pergunta por que no ouvimos falar de bons vinhos canadenses? RENATO MACHADO: Olha, existem vinhos canadenses de destaque, basicamente os doces, de sobremesa. So uvas chardonnays, brancas, que do vinhos licorosos. E o que coloca o Canad no mapa mundial do vinho so os icewines, os vinhos de gelo. Com a geada natural, voc conserva a uva e o acar da uva e colhe a uva congelada. No momento em que colhe a uva congelada, voc a coloca em uma barrica e espera descongelar ali. E a que est o grande segredo do Canad, que so os vinhos licorosos, um dos mais famosos o Inniskillin. SARDENBE