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O amor em múltiplas leituras: na literatura, na música (MPB, Pop rock), na pintura – uma trajetória ao longo dos séculos Autor: Nery Apolinário de Oliveira 1 Co-autora: Luciane Fracasse 2 Resumo: Partindo do princípio de que existe uma certa dificuldade em interpretar textos verbais, e dificuldades ainda maiores quando o texto é não-verbal. Escolheu-se um dos grandes temas universais; o amor. Trabalhou-se, nesta temática, com alunos de Ensino Médio (3º ano). O ambiente escolar é um dos meios de acesso do conhecimento, contou-se com os professores de Língua Portuguesa, para atingir o principal objetivo: como a temática amorosa interfere no cotidiano dos seus educandos. Foram propostas atividades que despertassem o interesse dos alunos por meio de interpretações de textos literários e letras de música MPB e Pop Rock, bem como pinturas. A arte é uma possibilidade de reflexões e esclarecimentos do amor. A arte é universal, mesmo particular, convive com núcleo comum partilhado por todos os seres humanos. Foram evidenciadas as diferentes formas de conceber o amor. Na literatura, em prosa, a temática amorosa através dos clássicos da literatura universal como: Tristão e Isolda, Abelardo e Heloísa, Romeu e Julieta, Dom Quixote, Werther e Carlota. Nas músicas: MPB - Se Quiser de Tânia Mara, no Pop Rock Amor Maior de Jota Quest, Amor e Sexo de Rita Lee. Na pintura O nascimento de Vênus de Sandro Botticelli. Obteve-se um resultado satisfatório, pois notou-se que a arte, em especial a imagem estática ou dinâmica, está presente no cotidiano dos estudantes, facilitando a interpretação, desde que mostre um caminho para ser trilhado. Palavras-chave: Arte. Amor. Clássicos. Músicas. Pintura. 1 1986 – 1990 Graduação em Letras Português Literatura. Fundação Faculdade Estadual de Filosofia, Ciências e Letras de Guarapuava (UNICENTRO), Brasil. 1996 - 1997 Especialização em Ensino de Língua Portuguesa. Universidade Estadual do Centro-oeste - UNICENTRO, Brasil. 2 1997 -1999 Graduação em Letras Português-Inglês e suas Literaturas, Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Jandaia do Sul, FAFIJAN. 2002-2004 Mestrado em estudos da Linguagem, Universidade Estadual de Londrina, UEL 1

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O amor em múltiplas leituras: na literatura, na música (MPB, Pop rock), na pintura – uma trajetória ao longo dos séculos

Autor: Nery Apolinário de Oliveira1 Co-autora: Luciane Fracasse2

Resumo: Partindo do princípio de que existe uma certa dificuldade em

interpretar textos verbais, e dificuldades ainda maiores quando o texto é

não-verbal. Escolheu-se um dos grandes temas universais; o amor.

Trabalhou-se, nesta temática, com alunos de Ensino Médio (3º ano). O

ambiente escolar é um dos meios de acesso do conhecimento, contou-se

com os professores de Língua Portuguesa, para atingir o principal objetivo:

como a temática amorosa interfere no cotidiano dos seus educandos. Foram

propostas atividades que despertassem o interesse dos alunos por meio de

interpretações de textos literários e letras de música MPB e Pop Rock, bem

como pinturas. A arte é uma possibilidade de reflexões e esclarecimentos do

amor. A arte é universal, mesmo particular, convive com núcleo comum

partilhado por todos os seres humanos. Foram evidenciadas as diferentes

formas de conceber o amor. Na literatura, em prosa, a temática amorosa

através dos clássicos da literatura universal como: Tristão e Isolda, Abelardo

e Heloísa, Romeu e Julieta, Dom Quixote, Werther e Carlota. Nas músicas:

MPB - Se Quiser de Tânia Mara, no Pop Rock Amor Maior de Jota Quest, Amor

e Sexo de Rita Lee. Na pintura O nascimento de Vênus de Sandro Botticelli.

Obteve-se um resultado satisfatório, pois notou-se que a arte, em especial a

imagem estática ou dinâmica, está presente no cotidiano dos estudantes,

facilitando a interpretação, desde que mostre um caminho para ser trilhado.

Palavras-chave: Arte. Amor. Clássicos. Músicas. Pintura.

1 1986 – 1990 Graduação em Letras Português Literatura. Fundação Faculdade Estadual de Filosofia, Ciências e Letras de Guarapuava (UNICENTRO), Brasil. 1996 - 1997 Especialização em Ensino de Língua Portuguesa. Universidade Estadual do Centro-oeste - UNICENTRO, Brasil.

2 1997 -1999 Graduação em Letras Português-Inglês e suas Literaturas, Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Jandaia do Sul, FAFIJAN. 2002-2004 Mestrado em estudos da Linguagem, Universidade Estadual de Londrina, UEL

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Abstract: Assuming that there is some difficulty in interpreting verbal texts,

and even greater difficulties when the text is non-verbal. Chose one of major

themes universal; love. Worked in case that , in this thematic, with students

from high school (3 years). The school environment is one means of access to

knowledge, told with the Portuguese-speaking teachers, to achieve the main

goal: like the thematic loving interferes at the cotidiano their students. Were

proposed activities that arouse the interest of students through

interpretations of literary texts and song lyrics from MPB and Pop Rock, as

well as paintings. The art is an opportunity for reflection and clarification of

love. The art is universal, even particular, live with common core shared by

all human beings. Have been evidenciadas the different figures of designing

the love. In literature, in prose, the love theme through the classics of

literature universal as: Tristan and Iseult, Abelard and Heloisa, Romeo and

Juliet, Don Quixote, Werther and Charlotte. In music: MPB - If you want to

Tania Mara, in the Pop Rock Jota Quest of Greater Love, Love and Sex of Rita

Lee. In painting The Birth of Venus de Sandro Botticelli. Obtained a

satisfactory result because realize that art, in particular the static or dynamic

image, is present in the daily lives of students by facilitating the

interpretation, since that shows a path to be pursued.

Keywords: art. Love. Classic. Music. Painting

1- Introdução

Levando em conta a quantidade de imagens, músicas e filmes

que os estudantes recebem diariamente via Internet, TV, no cinema, no

vídeo. Surgiu o interesse desta pesquisa de interpretar o verbal e o não-

verbal. O tema escolhido foi O amor em múltiplas leituras pois sabe-se que

uma das grandes preocupações, entre tantas, aos professores de Língua

Portuguesa é a interpretação de textos pelos educandos. Tão desafiantes

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são os textos verbais quanto os não-verbais, no caso os textos literários,

letras de música MPB e Pop rock e pictóricos.

Partindo do princípio de que o sentimento humano baseia-se nas

relações amorosas, e o amor é um sentimento universal, a pesquisa

justificou-se na intencionalidade de evidenciar as diferentes formas de

conceber o amor, a qual se apresenta, de maneira estereotipada, a visão do

amor, sedução, relações íntimas.

A arte será uma possibilidade de reflexões e esclarecimentos do

amor. A arte sendo, em sua essência, transformadora, é utilizada com o

intuito de interação e apreciação de experiências anteriores; percepção;

habilidades comunicativas; visuais e espaciais; informações; sensibilidade;

imaginação. Os estímulos artísticos influenciam o indivíduo de forma

particular e especial, levando em conta sua faixa etária, experiência,

sensibilidade, cultura e informação. Ela é um exercício de liberdade porque

joga perguntas ao mundo não existindo uma única resposta, mas várias

possibilidades de respostas. Segundo Beckett (1997, p.5 ):

Olhar, realmente olhar, continua a ser uma responsabilidade pessoal, e a reação de mais ninguém (...) servirá de substituta. Mas é do mundo exterior que o conhecimento precisa vir a nós, pela leitura, audição e contemplação. (...) O amor e o conhecimento andam de mãos dadas...

E ainda Hughs (2007) afirma: “Seria um exagero dizer que se pode

educar alguém por meio da arte. Mas ela é capaz de fazer de nós pessoas

melhores”.

A arte é uma necessidade do ser humano.

2 . Fundamentação teórica

2.1- História e literatura

Quando se pensa em literatura, em música contemporânea e pintura,

na temática amorosa, faz-se, necessariamente, um retrospecto histórico da

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forma como tal sentimento fora concebido na antiguidade e como evoluiu,

se é que evoluiu, até o presente momento nas mais diversificadas

manifestações artísticas.

Há um número grande de pesquisas voltadas para os problemas que

envolvem ensino de literatura no país. Apresentando resultados não

satisfatórios, ou seja, segundo Limoli ( 2001):

A maioria delas apresenta uma situação caótica do ensino, paralela e concomitante à crise maior da escola como um todo. Numa época em que a supremacia do texto, sobretudo escrito, desmorona face à penetração progressiva e inexorável dos meios de comunicação de massa. As deficiências e dificuldades apontadas no ensino de literatura devem ser entendidas no contexto de uma problematização maior que envolve as relações literatura-leitura nas escolas.

“Os nossos jovens”, uma grande parte, “lêem pouco e entendem

menos ainda”, poderia ser só um jargão, mas infelizmente é uma realidade.

Mesmo estando inseridos na chamada “Era da Comunicação”,

“Globalização”, eles vão depender de uma dose imensa de responsabilidade

salutar dos professores para amenizar tal realidade. O desafio é trabalhar

com uma temática para interpretação que desperte o aluno, trazendo

informações e esclarecimentos que contribuam para sua formação, não só

como leitor, mas também como crítico da realidade a sua volta, melhorando

como ser social.

Essa dificuldade complica ainda mais quando o texto é o não-verbal.

Nota-se por parte do professor, salvo raras exceções, uma insegurança

quando está diante de um quadro de arte. Para Martins (1993, p.97):

O fato de, especialmente na escola, ainda se restringir à noção de leitura a uma processo racional de atribuição de significado à palavra escrita talvez seja a primeira dificuldade a enfrentar, se a proposta for a de ler uma expressão visual. Esta, por sua natureza, pode parecer “ilegível”. Em sua formação letrada, os professores de Português, talvez mais que quaisquer outros, estão imbuídos de que os textos são “para ler”, enquanto, por exemplo, cinema e quadros são “para ver”. (...) Ela continua vigente, mesmo quando não propalada, enquanto se deixa de explorar a legibilidade da imagem.

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Uma das ironias é que a duras penas mal se dá conta do be-a-bá,

então, como acrescentar à linguagem visual com toda sua complexidade

que se apresenta no mundo contemporâneo? Martins (1993, p.101)

questiona: “Como ler desvendando o invisível nas imagens e ultrapassando

o evidente nas palavras?”

Segundo Dondis (2002, p. 17):

Uma das tragédias do avassalador potencial do alfabetismo visual em todos os seus níveis da educação é a função irracional, de depositário da recreação, que as artes visuais desempenham nos currículos escolares, e a situação parecida que se verifica no uso dos meios de comunicação, câmeras, cinema, televisão. Por que herdamos, nas artes visuais, uma devoção tácita ao não – intelectualismo? O exame dos sistemas de educação revela que o desenvolvimento de métodos construtivos de aprendizagem visual são ignorados a não ser por alunos especialmente interessados e talentosos.

2.2- Contribuição da teoria semiótica

O texto verbal e o não-verbal serão interpretados pela semiótica.

Esta objetiva elaborar uma teoria da significação, com uma abrangência

maior, que possa dar conta não só das línguas, mas também de todas as

linguagens.

A semiótica estudada será a proposta por Greimas, a qual concebe o

sentido como um processo gerativo (vai do mais simples e abstrato ao mais

complexo e concreto) indo da semiótica literária à semiótica da arquitetura,

da pintura, da música, à teologia, direito e ciências humanas em geral.

Etimologicamente a palavra semiótica (e a semiologia) vem do grego

semion: significa “signo”. Há três grandes teorias semióticas: uma que se

elabora nos Estados Unidos e se constitui em torno da obra de Charles

Sanders Pirce; uma que se organiza na França e se constrói a partir da obra

de Algirdas Julien Greimas; uma que se desenvolve na Rússia e se

estabelece a partir da obra de Iuri Lotman.

O presente estudo estará referindo-se à Semiótica francesa. Para Greimas (1976, apud FIORIN, 1995 p.164):

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Que embora não ignore que o texto seja um objeto histórico dá ênfase ao conceito de texto como objeto de significação e, por conseguinte, preocupa-se fundamentalmente em estudar os mecanismos,que engendram o texto, que o constituem como uma totalidade de sentido.

O estruturalismo lingüístico de Hjelmslev, a antropologia estrutural de

Lévi-Struss, a teoria formalista do conto de Propp e a teoria das situações

dramáticas de Etienne Souriau são as fontes da semiótica de Greimas... A

lingüística greimasiana tem as suas raízes no conceito saussureano de

estrutura como diferença, nos princípios de oposições binárias e da

pertinência. Segundo Pietroforte (2004, p.11):

Para a semiótica, o sentido resulta da reunião de dois planos que toda linguagem possui. Toda linguagem possui o plano da expressão e o plano de conteúdo. Para a semiótica o sentido resulta da reunião desses planos. Podemos definir o texto relacionando entre um plano de expressão e conteúdo. O plano de conteúdo é o significado do texto. Uma afirmação semiótica: “o texto diz e como ele faz para dizer o que diz”. O plano de expressão refere-se à manifestação desse conteúdo em um sistema de significação verbal, não-verbal ou sincrético.Os sistemas verbais são as línguas naturais e os não-verbais, os demais sistemas, como a música e as artes plásticas. O sistema sincrético é quando temos a manifestação tanto verbal quanto não-verbal. Exemplo nas canções e nas histórias em quadrinhos.

Ainda de acordo com o autor,

Um mesmo conteúdo pode utilizar-se de expressão de ordens diferentes como verbal, não-verbal ou sincrético. Exemplo: Um romance, tendo o conteúdo que se manifesta no sistema verbal, pode ser adaptado para o cinema, em um plano de expressão sincrético, ou inspirar uma sinfonia ou uma tela em planos de expressão não-verbal.

O sentido de um texto está em seu plano de conteúdo.

A semiótica pode estudar os fatos da linguagem sem depender de

uma outra ciência da “realidade” quer seja a física, a sociologia, a

antropologia, filosofia. Para a semiótica as linguagens não se sobrepõem às

outras. Exemplo: as linguagens visuais não são mais fiéis à “realidade” que

outras: um desenho, mesmo figurativo, é tão arbitrário quanto uma palavra.

A partir daí, a semiótica está empenhada em analisar as crenças, os

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sentimentos e as atitudes que cada sociedade adota frente às suas

linguagens. Para a semiótica segundo Floch, (2001, p.10):

O universo da significação não pode se reduzir no fenômeno da comunicação. A produção de sentido deve ser o objeto de uma análise estrutural que tem por horizonte a organização que o homem social faz de sua experiência. Os códigos são apenas perspectivas sobre este horizonte, oferecidos pela sociedade ao analista, que não deve deles depender.

A semiótica foi fundada pela necessidade de não se limitar a estudar

apenas a significação lingüística. A substância é a matéria, o suporte

variável que a forma articula. A substância é, pois, a realização, num

determinado momento, da forma. Hjelmslev considera que a substância é

como “o conjunto dos hábitos de uma sociedade”.

O objeto de estudo da semiótica é a relação de pressuposição

recíproca (porque só há expressão se houver conteúdo, e não há conteúdo

se não houver expressão) entre as duas formas, sendo elas que produzem

essas diferenças sem as quais não haveria sentido.

Na semiótica, o referente não tem pertinência, pois é a sociedade

que adota as atitudes frente à linguagem. Quando apoderar-se de uma

linguagem é expor-se ao julgamento individual ou coletivo dos outros.

Temos aí, o fenômeno da conotação. Para Floch, (2001, p. 12 ): “As

unidades de expressão, como de conteúdo, de forma como de expressão de

uma linguagem segunda, cujo conteúdo será esses julgamentos e essas

atitudes, essas práticas lingüísticas próprias a cada época, à cada grupo, e

até a cada indivíduo.”

3. Metodologia

3.1- Após a escolha do tema “O amor em múltiplas leituras: na pintura, na

literatura, na música (MPB e Pop rock) – uma trajetória ao longo dos

séculos”, buscou-se a interação com os mais variados tipos de textos:

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Selecionou-se Clássicos da Literatura Universal em ordem cronológica

de acordo com o nível de pertinência ao tema. O primeiro clássico foi:

Tristão e Isolda – é de origem céltica, a primeira versão do francês Chrétien

de Troyes, restando apenas fragmentos. Eilhart von Oberge deu versão

alemã à tragédia, mas a versão do alemão Gottfried von Strassburg entre

1202 e 1210, deu um caráter eminentemente moderno à obra. Seguindo

partiu-se para Abelardo e Heloísa – a correspondência de Abelardo e

Heloísa, datada do século XII. A independência da mulher. Recusa o

casamento para não sufocar o seu amado o que causa a tragédia. A

terceira obra foi Romeu e Julieta – publicado em 1595 por W. Shakespeare.

Uma das obras mais popular dentre as literaturas, dispensando quaisquer

outros comentários pela abrangência de artes que já representaram a

tragédia Shakespeareana. A quarta obra foi Dom Quixote – Miguel de

Cervantes Saavedra, 1615. O amor de Dom Quixote pela sua “casta

Dulcinéia”. Finalizando a parte dos clássicos com Werther e Carlota de

Johann Wolfgang Von Goethe, 1774. Pela comoção causada pela sua leitura

(desmaios) e a primeira grande jogada de marketing (xícaras com o nome

de Werther e Carlota).

Na seqüência partiu-se para filmes com a temática amorosa e

que dialogassem com esses clássicos como: “Romeu + Julieta” do diretor

Baz Luhrmann (1996). Baseado na obra clássica de Shakespeare, uma

versão moderna, passada nos dias de hoje, da tragédia de amor entre

Romeu (Leonardo DiCaprio e Lulieta (Claire Danes). Depois “Tristão e

Isolda” do diretor Kevin Reynolds (2006). O filme é baseado na milenar

lenda Celta de paixão jurada, que virou uma famosa ópera de Richard

Wagner e inspirou William Shakespeare a escrever "Romeu e Julieta". E por

fim o filme “Em nome de Deus” de Cline Donner (1988). O amor de Abelardo

e Heloísa, resumido e ilustrado, o que torna interessante a leitura para uma

primeira aproximação.

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A música foi trabalhada pela presentidade do momento,

contextualiza mais do que a poesia, não perdendo o foco da temática

amorosa. As músicas foram da MPB Se você Quiser – Tânia Mara e Pop rock

como: Amor maior – Jota Quest, Amor e Sexo – Rita Lee;

A abordagem das pinturas e esculturas, a leitura do não-verbal, das

mais variadas épocas e autores como: Botticelli, Todalini, Munch, Steilen,

Hermann-paul, Klimt, Mölier, Picasso e Rodin que enfocaram tal temática.

3.2- Aplicação em sala:

No primeiro momento, foram apresentados os filmes: “Tristão e

Isolda”, “Romeu+Julieta”, “Em nome de Deus” como princípio incentivador

para discussão introdutória e feito a seguinte pergunta: “Você morreria de

amor?”

No segundo momento, apresentou-se as pinturas e esculturas com o

tema amor. E também uma cronologia das principais obras literária

mundiais, em prosa, que abordaram tal temática com o intuito de mostrar a

beleza interior existente na humanidade, diferentemente, dos modelos de

beleza única, veiculados pela mídia.

Em última instância interpretou-se as seguintes músicas: da MPB

– “Se você Quiser” -Tania Mara; Pop rock “Amor Maior” – Jota Quest; “Amor

e Sexo” – Rita Lee.

4. Análise do corpus

4.1-Breve Panorama das Obras.

Etimologicamente paixão significa sofrimento (coisa sofrida,

preponderância do destino sobre a pessoa livre e responsável). Desde o

amabam amare de Santo Agostinho até o romantismo moderno, amor é

procurar o sofrimento.

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Através da apresentação dos clássicos da literatura mundial

procuramos, dar possibilidades para nossos alunos, refletir a temática

amorosa. O amar, não tem como nós, pobres mortais, nos protegermos de

tal sentimento, quando chega é arrebatador como relata o poeta ,do

romantismo, Álvaro de Azevedo (1825):

“Oh! o amor! E por que não se morre de amor! Como uma estrela que se apaga pouco a pouco entre perfumes e nuvens cor-de-rosa, porque a vida não desmaia e morre num beijo de mulher! Seria tão doce inanir e morrer sobre o seio da amante enlanguescida! No respirar indolente de seu colo confundir um último suspiro!”

O sentimento amoroso é universal, atemporal sendo a paixão que se

sente por uma pessoa entre tantas outras: de objeto erótico, ela se torna

sujeito único e livre, em nossa imaginação e vontade. Ambrose Bierce, no

século XIX, descreveu o amor como: “insanidade temporária, curada pelo

matrimônio ou pelo afastamento do paciente das influências que lhe

infligiram o mal.”

A tradição literária ocidental que encanta leitores, apesar de

desfecho infeliz, define o padrão amoroso, inspirando obras em todas as

artes. Essas histórias, desde a Idade Média, povoaram o imaginário do

ocidente. As representações do amor dizem muito sobre a sociedade e sua

época.

4.2 - Análise dos clássicos

4.2.1 Tristão e Isolda

O casal Tristão e Isolda é uma conhecida história amorosa da Idade

Média, mostra uma relação entre o homem e a mulher, a sociedade cortês,

impregnada de cavalaria dos séculos XII e XIII, baseada na tradição oral.

Tendo uma importância literária comparável com as narrativas do Graal e

do Rei Artur.

Tristão nasce no infortúnio. Seu pai acaba de morrer, e sua mãe,

Bancaflor, não sobrevive ao seu nascimento. Daí o nome do herói, o matiz

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sombrio de sua vida e o céu tempestuoso que envolve a lenda. O rei Marke

da Cornualha, irmão de Brancaflor, adota o órfão em sua corte e o educa.

Tristão está incumbido de levar Isolda, princesa da Irlanda, ao seu

futuro esposo Marke. Durante a viagem apaixonam-se, pois acidentalmente

bebem de um elixir do amor o qual fora destinado a Isolda e Marke.

Os amantes rompem as convenções tanto sociais quanto as leis

religiosas. Esse amor é responsável por inúmeras desgraças aos dois e as

pessoas a sua volta. A tragédia final culmina com a morte dos amantes.

“Chegada a manhã, Tristão diz: ‘Meu amor, se o rei me

surpreendesse contigo neste quarto, mandarnos-ia matar aos dois.

Para tal salvação, embora me custe, tenho de me afastar de ti uma

vez mais!’ ‘Ah, Tristão, belo e doce amigo, sei que, em verdade,

nunca mais te verei neste mundo.’ Tristão respondeu-lhe: ‘Não sei o

que nos reserva o futuro, mas estou certo de que nunca cessarei de

te amar.’ “ (Tristão e Isolda,1987).

O êxito prodigioso do romance de Tristão revela em nós uma

preferência íntima pela infelicidade pois para o homem ocidental ou melhor

o romântico ocidental a dor amorosa é um meio privilegiado de

conhecimento. Infelizmente poucos preocupam- se em conhecer-se. Quando

desejamos o amor mais intenso, desejamos o obstáculo. Se não tiver

obstáculo nós o imaginamos. Sem entraves ao amor , não há “romance”. O

que amamos é o romance ou seja a consciência, a intensidade, as variações

e os adiamentos da paixão, seu crescente até a catástrofe, e não sua chama

fugaz.

Na literatura, a felicidade dos amantes só nos comove pela

expectativa da infelicidade que os ronda. Não somos comovidos pela

presença, mas sim pela saudade, pela lembrança. A presença só pode ser

um instante de graça, inexprimível, efêmero.

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Você já leu uma história, na literatura ocidental, de amor feliz? Não,

porque não tem. O amor só é considerado um verdadeiro amor se for

recíproco.

Uma das distinções da literatura européia é a obsessão pela dor,

donde bebemos na fonte, querendo ou não.

O romance e também o filme (Tristão e Isolda - nascido do romance)

mostram o entusiasmo, erotismo idealizado, difundido em nossa cultura, em

nossa educação.

O poema, Tristão e Isolda, na versão de Gottfried von Strassburg,

contendo 20 mil versos, inspirou outros escritores alemães como: Hans

Sachs, A.W. Schlegel, August von Platen, Karl Immermann e Thomas Mann.

A história amorosa e trágica de Tristão e Isolda fundamentou a ópera

homônima de Wagner.

O terceiro ato do drama de Wagner descreve bem mais do que uma

catástrofe romanesca: descreve a catástrofe essencial de nosso gênio

sádico, esse gosto reprimido da morte, o gosto de nos conhecermos ao

máximo, do impacto revelador que é sem dúvida a mais inextirpável das

raízes do instinto da guerra em nós. Os dois amantes influenciaram de

Voltaire aos românticos. Depois de Rousseau ter escrito A nova Heloísa.

Gottfried Bürger com Heloísa e Abelardo, Nikolaus Lenau Heloísa – ambas

obras em versos. Jean Paul, autor alemão da época romântica, nas suas

primeiras tentativas romanescas, também tratava da história dos dois

amantes.

4.2.2 - Abelardo e Heloísa

Abelardo e Heloísa são um casal do século XII que se correspondem

por cartas românticas. Sendo um dos casais mais conhecidos da Idade

Média.

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A História é do famoso professor de Teologia, Abelardo, com 40 anos

de idade que apaixona-se pela sua pupila Heloísa, de 16 anos. Ambos vivem

em Paris.

Apaixonado, Abelardo escreve canções de amor. O amor por Heloísa é

correspondido. “Trocamos mais beijos do que palavras de sabedoria e cada

vez mais minhas mãos buscavam seus seios em vez das páginas dos livros.

E bem mais do que a escrita, nós líamos nossos olhos”.

Heloísa fica grávida, Abelardo a seqüestra, à noite, vestida de freira,

levando-a para a casa da irmã dele, na Bretanha. Tendo o filho chamado

Astrolábio. O tio de Heloísa que a havia deixado sobre os cuidados de

Abelardo, exige o casamento. Abelardo aceita se casar. Entretanto o

casamento não se realiza pois Heloísa não quer atrapalhar a filosofia do

professor e sobrecarregá-lo com o matrimônio. Fulberto, o tio de Heloísa,

furioso com a não realização das núpcias manda castrar Abelardo. Após o

fato Heloísa é convencida pelo amado a adotar o hábito, tornando-se

abadessa.

Abelardo aumenta a correspondência melhorando como pessoa e

sendo influenciado por Heloísa disse: “só o amor diferencia os filhos de Deus

dos filhos do diabo”.

“Sabes a quantas indignidades minha imoderada libido arrastou nossos corpos, de modo que, sem nenhum pudor nem respeito a Deus, ela não me afaste de seu lamaçal imundo, nem mesmo nos dias da Paixão do Senhor, ou das outras solenidades religiosas. (...) De fato, estava tão unido a ti pelo ardor da concupiscência, que preferia aqueles míseros e obscenos prazeres”. (Abelardo-Heloísa – as cinco primeiras cartas,1996).

4.2.3 - Romeu e Julieta

A peça Romeu e Julieta publicada em 1595, pertence ao primeiro ciclo

das tragédias Shakespearanas. São ícones da literatura ocidental.

Shakespeare escreveu uma das maiores celebração do amor. A obra

Romeu e Julieta contém drama e romantismo, mostrando também humor.

A peça foi, com o tempo, abrangendo todas as artes. Romeu e Julieta,

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inspirado em fatos que realmente aconteceram na cidade de Verona,

viveram na Itália do século XVI, Romeu e Julieta apaixonam-se. Desafiando

leis e costumes para viver essa grande paixão. Nada é capaz de

vencer a ousadia dos amantes, no entanto as famílias são inimigas.

Esse amor na visão dos jovens não se realizaria em núpcias, optam

pelo suicídio. A tragédia que faz com que os pais inimigos se reconciliem

apenas diante dos cadáveres dos filhos amantes.

A peça teatral Romeu e Julieta inspirou inúmeras pinturas e foi

também musicadas. Em balé por Sérgio Prokofiev e no musical West side

story por Leonard Bernstein. A Sinfonia dramática de Hector Berliz, o coro

de Carl Maria von Weber e uma abertura de Tchaikovski. Os filmes de Ugo

Falena (1912), Ernst Lubitsch (1920), os de Castellani, Zeffirelli e Baz

Luhrmann entre tantos outros... que usam o tema.

O amor de Romeu e Julieta influenciou, na literatura, a novela realista

do alemão Gottfried Keller Romeu e Julieta na aldeia. Influenciou o drama

A família Schroffenstein, de Heinrich von Kleist, e o Best-seller Foi a cotovia,

de Ephraim kishon.

4.2.4 - Dom Quixote e Dulcinéia

Dom Quixote - Miguel de Cervantes, escrito em 1615, representa o

mito Hispânico em si, sendo o texto mais importante da literatura

espanhola. Obra concebida como novela curta, inspirada num caso real de

loucura, destinava-se a combater a cavalaria andante. Opondo-se à

realidade das novelas de cavalaria. Cervantes teria pretendido fazer uma

sátira dessa “propaganda” cavaleiresca e dos que se armavam cavaleiros

às cegas. Mas a caricatura de um estilo fantasioso se transformou no retrato

da aventura humana, no perfil do homem dividido entre o sonho e a

realidade. Dom Quixote e Sancho Pança, surgidos da fantasia do artista,

aparecem vivos como se fossem personagens históricas.

Cervantes de cara pinta Dulcinéia em cores duvidosas:

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“-Eu a conheço muito bem – disse Sancho – e sei dizer que atira tão bem uma barra como o mais forçudo pastor de todo o povoado. Juro pelo Dador que é moça de primeira plana, cheia das prendas e forte feito um touro, e que pode tirar de qualquer apuro qualquer cavaleiro andante ou por andar que a tenha por senhora. Ah, fidaputa, que corpaço que tem, e que voz! (...) E o melhor dela é que não é nada melindrosa, porque tem muito de cortesã: com todos brinca e a tudo faz careta e gracejo.” (Dom Quixote,1993, p.179).

A relação entre Quixote e Dulcinéia abranda-se diante da relação do

cavaleiro e Sancho Pança. Ainda assim, Quixote proclama seu amor aos

quatro ventos, e sai ao mundo enfrentando moinho de vento e inúmeras

peripécias em honra de Deus e da amada, a fim de defender virgens e

órfãos.

O relacionamento amigável entre Quixote e Sancho Pança é modelo

para a literatura universa como: Jacques, o fatalista, e seu mestre; Don Juan

e Leporello; Lorde Byron e Fletcher; o senhor Puntila e seu criado Matti ou

Lucky e Pozzo.

O que pode-se notar na obra é a predominância do amor entre Dom

Quixote e Sancho Pança, ou melhor, Dulcinéia.

4.2.5 - Werther e Carlota

Werther e Carlota - Johann Wolfgang von Goethe, 1774. Goethe tinha

apenas 23 anos quando o publicou. Os sofrimentos do jovem Werther pode

ter sido o mais famoso desses clássicos. Era um romance epistolar sobre um

fracasso amoroso, levando o jovem ao suicídio. Não passa de uma história

de amor contrariado. O romance causou uma comoção com os seus leitores.

Há relatos de choros convulsivos, desmaios e suicídios. Tornou-se Best-seller

na Europa no final do século XVIII. Para a contemporaneidade, momento de

internet e TV por satélite, tendo uma facilidade de recursos e imagens, é

difícil imaginarmos a força dessa paixão desvairada provocada pela leitura.

Goethe pertenceu ao Romantismo e assim como outros, não inauguraram o

romance epistolar, pois já havia sido publicado romances de sucessos mas

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sim, a carta introspectiva, com liberdade não só sentimental como na forma

relacionada a escrita.

O “eu” de Werther é dominante, vigoroso no romance, não permitindo

a aparição escrita dos correspondentes, tendo uma visão unilateral. O herói

escreve as cartas para Guilherme, suposto editor, o qual faz o papel de

leitor.

“Quando a imagem da adorável Carlota me persegue! Ou eu vele ou sonho, sempre está presente à minha alma agitada. Quando fecho os meus olhos, retratam-se os seus belos olhos pretos no meu cérebro escandecido; ali onde se reúne a força visual... não posso exprimir. Sei somente que no momento em que cerro os meus olhos os dela se me apresentam como um mar, como um precipício diante de mim, e ocupam todas as fibras do meu cérebro.” (Os sofrimentos do Jovem Werther, 2007).

O livro tem o episódio das “pedras de Bolonha”, um dos mais belos da

literatura universal. A certa altura do livro, Werther pede ao seu criado para

ir à casa de Carlota, não existindo nenhum motivo especial para a visita, só

para vê-la. “Com que impaciência o esperei, com que alegria tornei a vê-lo!”

E uma das mais belas metáfora:

“Falam que a pedra de Bolonha, quando exposta ao sol, absorve os seus raios e reluz por algum tempo durante à noite. Dava-se o mesmo comigo e aquele rapaz. A lembrança de que os olhos de Carlota haviam pousado em seu rosto, em suas faces, nos botões de sua casaca e na gola de seu sobretudo, tornava-o tão querido, tão sagrado para mim! Naquele momento, não daria aquele rapaz nem por mil tálares! Me sentia tão bem em sua presença.” (2007, p. 30)

Segundo Marcelo Backes (2007, p.33)

“A ‘pedra de Bolonha’ simboliza, pois, o fulcro irradiante de um amor que toca sem estar presente, que dói no fundo em cada lembrança ao se fazer ausente. Mais que isso, a ‘pedra de Bolonha’ representa a intensidade plena de dor que marca não penas o amor de Werther por Carlota, mas qualquer dos grandes amores da literatura universal.”

Werther é o romance que contribuiu para a transformação da

carta em pretexto para a compulsiva auto-revelação. Ou alinhando Werther

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à paródias e versões cômicas que fervilharam depois da primeira

publicação. Sendo a mais conhecida dessas cômicas publicações a de

William Thackeray, que descreveu dessa forma a cena do encontro dos

amantes: “Werther amou Carlota assim que a viu, /Tomando de indescritível

paixão./Sabem como ele a conheceu?/Ela passava manteiga no pão”.

É importante a republicação de Werther do início do século XIX,

porque serviu de base para a maioria das edições no Brasil, chegando,

provavelmente, a ser lida pelos românticos brasileiros, influenciando no

romantismo, especialmente da segunda geração ultra-romântica como

“escola de morrer cedo”.

4.3- Contribuição da música

Hoje a música está mais presente na vida dos jovens do que a

poesia, pois vive-se em um mercado em que se consome muita cultura de

massa. Pode-se aproveitar essa preferência para mostrarmos textos

musicais de qualidade.

4.3.1 - Se Quiser

Tânia Mara

Composição: Cláudio Rabello / Louis Biancaniello / Sam Watters

Sempre que quiser um beijo

Eu vou te dar

Hei! Hei! Hei! Hei!

Sua boca vai ter tanta sede

De me tomar

Se quiser!

Sempre que quiser ir as estrelas

Me dê a mão!

Deixa eu te levar...

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A música Se Quiser, de Tânia Mara, é uma das revelações da nova

cara da MPB, mostra a presentidade do tema amoroso na atualidade.

Apresenta profundidade, não é piegas e não está preso ao exagero. Na

relação homem-mulher o beijo é ponto inicial para um relacionamento de

sucesso.

4.3.2 - Amor Maior Jota Quest Composição: Rogério Flausino

Eu quero ficar só

Mas comigo só

Eu não consigo

Eu quero ficar junto

Mas sozinho só

Não é possível...

É preciso amar direito

Um amor de qualquer jeito

Ser amor a qualquer hora

Ser amor de corpo inteiro

Amor de dentro prá fora

Amor que eu desconheço...

Quero um amor maior

Um amor maior que eu

Quero um amor maior, hié!

Na música Amor Maior, de Jota Quest , o paradoxo no início da música

quando afirma que “Eu quero ficar só / Mas sozinho só / Não é possível...”

nota-se o comportamento comum para quem está apaixonado e não sabe

ainda administrar tal sentimento, e possivelmente uma primeira paixão

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quando afirma, após uma idolatria ao amor, “Amor que eu desconheço...” e

pedindo um amor maior do que ele, podendo ser um exagero ou maior em

intensidade, curtição, vida.

4.3.3 - Amor e Sexo

Rita Lee

Composição: Cilze Mariane Costa Honório, Rita Lee, Roberto de

Carvalho e Arnaldo Jabor

Amor é um livro

Sexo é esporte

Sexo é escolha

Amor é sorte...

Amor é pensamento

Teorema

Amor é novela

Sexo é cinema..

Sexo é imaginação

Fantasia

Amor é prosa

Sexo é poesia...

O amor nos torna

Patéticos

Sexo é uma selva

De epiléticos...

Na música Amor e sexo, de Rita Lee percebemos um amor não

platônico, real, “pé-no-chão”. As metáforas “ Amor é ...”, “Sexo é...”

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parecem leituras ingênuas, simples. Mas a complementação das metáforas

é que torna a letra interessante e criativa, dando um significado que nos

remete ao cotidiano como livro, esporte, novela, cinema, prosa, poesia, etc.

Mostra que o sexo deverá ser uma complementação do amor ou vice-versa,

fazendo parte do dia-a-dia como uma necessidade da natureza, sem o peso

conotativo, que a sociedade impõe na palavra sexo.

4.4-Uma leitura do não-verbal

O quadro “O Nascimento de Vênus” de Sandro Botticelli, foi pintado

em 1485 para um membro da família Medici,os influentes mecenas de

Florença. Corresponde ao período do Renascimento. Utilizando a técnica de

têmpera sobre tela, nas dimensões de 172,5 x 278,5 cm. Essa obra está na

galeria dos Uffizi, Florença. Segundo a mitologia grega, Vênus/Afrodite é a

deusa do amor, a qual nasce das espumas do mar. Essa espuma é a mistura

do sêmen e do sangue de Urano(o céu), pois seu filho Cronos/Saturno o

castrou numa luta de poder. Os genitais cortados caíram no mar e

concebeu-se a deusa do amor. “O nascimento de Vênus” é uma alegoria. O

momento retratado pela pintura é quando a deusa chega a Pafo, em Chipre

e está para sair da gigantesca concha dourada de vieira. Vênus foi levada

para a praia pelo vento oeste (zephyros), personificado o vento por um casal

de amantes Zéfiro e Clóris. Os ventos sopram o espírito da paixão,

materializado em rosas, cada rosa tem um coração dourado, Zéfiro sopra

vigorosamente, já Clóris exala o hálito quente. No lado direito da tela, vindo

do continente está uma das três Horas (as deusas gregas das estações que

eram acompanhantes de Vênus) cujo nome é Pomona, a qual traz um manto

florido para cobrir a nudez da deusa e a perfuma para conduzi-la ao monte

Olimpo, junto dos deuses imortais. O Manto e a roupa sintuosa da ninfa

Pomona é bordado com margaridas, prímulas amarelas e centáureas azuis.

Alusão a primavera, estação onde a sensualidade de “Vênus” está no ápice.

Pomona usa um colar de mirto ( a árvore de Vênus) e um cinto de rosas.

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Sabe-se que a rosa simboliza o sexo feminino. Atrás da ninfa percebe-se o

jardim sagrado Hespérides com laranjal em flores. As folhas têm pecíolos e

contornos dourados. O toque dourado está também nos objetos e nas flores,

onde representa a condição divina de Vênus. A imagem de Vênus foi tirada

de uma antiga estátua, contudo seu estilo é linear. A postura sintetiza a

natureza dual do amor, ao mesmo tempo sensual e casto, especialmente no

rosto da deusa pode-se perceber certa tristeza e um desejo forte, pois é um

nu, na visão neoplatônica. A água é geradora de todas as coisas, fluxo

contínuo e Vênus é a beleza que toma forma na água informe. A pintura

afirma que não se pode contemplar o amor despido, não se suporta a

beleza, talvez o ser humano é fraco para tal apreciação.

5. UMA ANÁLISE SEMIÓTICA

Percebe-se, em “Tristão e Isolda”, linearidade dual homem vs. Mulher,

A manipulação ocorre por parte do rei Marke. Ele é manipulador. Já Tristão e

Isolda são manipulados. A performance de Marke é a de ser rei, numa época

em que o poder é absoluto. A sanção ocorre com a morte dos amantes. Nota-

se a presença da veridicção, pois nos passa a idéia de verdade.

Na história amorosa “Abelardo e Heloísa” pode-se fazer uma primeira

interpretação subjetiva, a firmação concomitante do velho vs. novo.

Abelardo tem 40 anos, Heloísa 16. A manipulação ocorre por total, pois ouve

cumplicidade entre manipulador e manipulado. Abelardo manipulador, já

Heloísa é manipulada. A performance de manipulador de Abelardo é a

seguinte: ele é professor, tem mais idade, sedutor, a tentação em pessoa

para uma adolescente. A sanção ocorre na castração de Abelardo, mas ele

continua manipulando, convence Heloísa a ser freira, para viverem um amor

por cartas, “platônico”. Mostra-se com isso todo o seu egoísmo. Também há

veridicção na história..

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Romeu e Julieta, o casal romântico, pode-se perceber a linearidade

dual amigo vs. inimigo. A manipulação ocorre por parte das famílias, elas são

os manipuladores dos jovens amantes. Os dois jovens são manipulados pelas

suas famílias não vendo outra saída, optando pelo suicídio. A sanção é esse

suicídio. A veridicção também está presente.

Dom Quixote, a linearidade dual está em realidade vs. fantasia,

também em conhecimento vs. ignorante. A manipulação ocorre na obra. Dom

Quixote é o manipulador e Sancho Pança é manipulado. A performance do

manipulador Dom Quixote: tem conhecimento, situação financeira invejável,

fantasioso. Cria uma dama que não existe, sendo fruto da imaginação de

Sancho Pança. É muito mais forte a veridicção nesse romance, acredita-se

que são personagens da história.

Em Werther e Carlota pode-se notar linearidade dual em ilusão vs.

desilusão, também em sucesso vs. fracasso. A manipulação está no amor dos

jovens, Werther é manipulado por esse amor. O manipulador de uma certa

forma é Carlota. Werther pela sua timidez sofre e conseqüentemente comete

o suicídio. O suicídio é a sanção.

Nas músicas: Se quiser de Tânia Mara, Amor Maior de Jota Quest,

Amor e Sexo de Rita Lee nota-se o discurso figurativo (autonomia e

abrangência no discurso). A música é um texto poético e também há isotopia

figurativa e temática. A isotopia figurativa é associação de figuras

aparentadas e correlacionadas ao tema amor e isotopia temática é a

repetição de unidades abstratas no mesmo percurso, o tema amor.

Na pintura “O Nascimento de Vênus” de Sandro Botticelli, pode-se

despreender a seguinte análise de linearidade dual da força vs. delicadeza, a

força esta presente na personificação do Zéfiro que contrasta a delicadeza

com sua acompanhante, com a ninfa e principalmente com Vênus. Nota-se

também linearidade dual direito vs. esquerdo. O mar está à esquerda, a

terra está à direita, ou seja, mar vs.terra. Podemos notar também linearidade

dual nu vs. não-nu. Esse nu da deusa contrastante com a ninfa Pomona que

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está vestida completamente. Lembrando que o quadro é um nu feminino, o

objeto é esse nu, a ancoragem está presa ao nascimento da deusa. O

manupulador é o autor do quadro, o manipulado somos nós que observamos

o quadro, apreciamos ou não. Também notamos a veridicção do quadro, pois

interpretamos como verdadeiro, no entanto, é composto de figuras

mitológicas.

Considerações finais:

As presentes leituras e interpretações dos clássicos, músicas e

pinturas foram feitas em sala de aula para alunos do Ensino Médio, 3º série.

Após isso, fizemos os seguintes questionamentos: Existe diferença entre

sexo e amor? O que é mais satisfatório em relação à felicidade. O objetivo

foi instigá-los para um texto argumentativo e também observar como a

juventude está vendo isso. Foi surpreendente as análises, pois notou-se

textos reflexivos, anexos, de conscientização interessante e

posicionamentos responsáveis como exemplos: “Sexo é prazer físico”;

“Sexo está relacionado com corpo, sensações, prazer”; “Sexo vem de

vontade, já o amor são longos suspiros que invade o coração”; “Sexo é

complemento do amor”; “Sexo é um momento físico, sem sentimentos, na

maioria das vezes; quando envolve sentimentos é melhor”; “O amor salva

ou destrói vidas, mundos, civilizações”; “O que os seres humanos têm em

comum é o amor”; “Em uma relação amor e sexo se complementam mas o

que prevalece é o amor”; “Confronto em busca de amor com sexo e sexo

com amor; “O amor e sexo devem ser levados à sério, pois não é

brincadeira”; “O amor é essencial para a felicidade”; “Para se chegar à

felicidade tem que passar por sofrimento”; “Felicidade não dissocia de

amor”; “Felicidade também é fazer as pessoas felizes”.

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6. REFERÊNCIAS BIBIOGRÁFICAS:

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Mário Vilela].

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Ática,1990.

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FLOCH, Jean-Marie. Alguns conceitos fundamentais em semiótica geral.

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MEURER, José Luiz & ROTH, Desiree. Gêneros textuais e práticas discursivas:

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OLIVEIRA, Jô & GARCEZ, Lucília. Explicando a arte: uma iniciação para

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Anexos

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