o “15” e o “23” políticos e políticas kaingang

Upload: milton-parana

Post on 19-Jul-2015

46 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

2I0 "I5" e o "21": po||t|cos e po||t|cas ka|ngang15LFDUGR&LG)HUQDQGHV8)35Canpos 7|2):27-47, 2006.No cehtro geogrfico do estado do Farah as eleies muhicipais tomaram cohta dapequehacidadedeMahoelFibas.Acidadeficoudivididadurahteadisputa eleitoral de 2004. Em jogo estavam o comahdo da Frefeitura Muhicipal e as hove cadeirashaCmaradeVereadores.Ehtreosmoradores-eleitoreshohouve ihdifereha. Como em outras pequehas cidades do Brasil, a vivacidade do processo eleitoral foi cohtagiahte. Mais do que colocar em ceha a oposio ehtre partidos polticos, a areha eleitoral em Mahoel Fibas ops a coligao do 15", comahdada peloFMDB/FF/FT/FL,coligaodo23",formadaporFTB/FFS/FDT/FFL/FHS/FSDB. Coligaes partidrias que expressaram arrahjos e fidelidades polticas de grahde alcahce, ahuhciahdo riscos e possibilidades para eleitores e cahdidatos: pequehos ou grahdes favores; acesso a programas de goverho; direciohamehto de ihvestimehtos pblicos; cargos etc. Neste cehrio as eleies ho foram percebidas como mero exerccio da cidadahia, foram vistas como uma oportuhidade direta de ihfluehciar os processos de tomada de decises e o acesso a behs materiais e imateriais. O alvo da disputa, evidehtemehte, foram os 8.800 votos que compem aquele colgio eleitoral. Estaumasituaocomumamilharesdemuhicpiosbrasileiros.Oque torhaaseleiesemMahoelFibasdistihtasdamaioriadasoutrassoos396 eleitores ihdgehas que residem haquele muhicpio. Votos preciosos. Afihal, estes eleitores somam, aproximadamehte, 5 do total de votos. Se em outros cohtextos a cidadahia ihdgeha questiohada, ho processo eleitoral os hdios so percebidos como cidados-eleitores: voto ora cobiado, ora temido. Em outros muhicpios h casos registrados de cahdidatos que distribuem cachaa para os hdios hos dias de eleio. Embriagados, os hdios ho votam, o que pode represehtar vahtagem para alguhs2. Mas este ho o caso de Mahoel Fibas. L o voto ihdgeha foi cobiado, valorizado. A imagem habitual do hdio 'vagabuhdo', 'preguioso' e 'bbado' ho foi reproduzida hos discursos polticos daquelas eleies. Felo cohtrrio, ha voz 28Ficardo Cid FerhahdesAk1100Sdos polticos locais hovos atributos foram projetados aos hdios: verdadeiros brasileiros", hossos irmos hdios", herdeiros da hossa maior dvida histrica".Ehtreoscidados-eleitoreshoihdgehasesta estratgiadiscursivaestdiludaemmeioaocohjuhto de promessas e programas que compem as campahhas eleitorais.Form,ehtreos(agoracidados)ihdgehas, osdiscursospoltico-eleitoraisproduzemefeitosho cohtroladosehocohhecidospelapolticadosb|ancos: expulses,trahsferhcias,fugas,prises,destituio decaciqueeliderahas,brigas,exclusodebehefcios ihstituciohais,afastamehtodeprofessoresihdgehas repercusseshocompreehdidaspelohumahitarismo oportuhistadocehrioeleitoral.Oshdios,afihal,ho passam de 5 da estatstica eleitoral. Cohtudo, a estatstica ho revela que em Mahoel Fibas ho vivem hdios gehricos, l vivem os Kaihgahg da Terra lhdgeha lva. Mais do que um atraehte percehtual de votos, haquelas eleies os /a/nan do/va/represehtaramumatradiopolticadotadade arrahjossociolgicosprprios,quearticuladiscursose acioha sighificados culturalmehte especficos3.Ahalisar esta trama eleitoral implica compreehder o trhsito ehtre a poltica dos b|ancos e a poltica dos /nd/os, implica cohhecer frohteiras que dividem e cohectam modos e muhdos, implica cohhecer os sighificados muito particulares do 15" e do 23". O passaporte para cruzar esta frohteira a teoria ahtropolgica. A bagagem permitida? A ethografia.Figura!:Localizaaodaslerrasindigenaskaingang. apa baseado en Ficardo 200!: 770.$17 5 23 2/ 2*, $ 3 2/ 7 , & $ 7 5 2& $ ('20 1, 2 3 % / , & 2Embora a ahtropologia poltica tehha fama de ser uma especializao tardia da discipliha (...), os debates sobre a questo do poder ehcohtram-se ho cerhe da prpria cohstituio do pehsamehto ahtropolgico" (Goldmah e Stolze de Lima 2003:11). As ahlises sobre as orgahizaes, estruturas, regimes e processos polticos cohstituem, de fato, um eixo da teoria ahtropolgica. Os estudos sobre direito comparado de Maihe (1861) cohferem a estes temas um carter ihaugural ha histria da discipliha4. Ao demarcar as divises clssicas ehtre sociedades de sanoe 29Ak1100SO 15" e o 23": polticos e polticas kaihgahge sociedades de so/o, sociedades de s|a|os e sociedade de con||a|o, a obra de Maihe estabelece que o estudo do direito pressupe a compreehso das relaes cohcebidas e realizadas ehtre a poltica e os demais domhios da vida scio-cultural. Este um dos legados mais duradouros da ahtropologia do sculo XlX. A ahtropologia poltica se cohstituiu plehamehte apehas em 1940, com a publicao da colethea $/s|emas Po//|/cos A/|/canos, orgahizada por Evahs-Fritchard e Meyer Fortes5. At aquela data o desehvolvimehto da discipliha esteve relaciohado, hotadamehte, aos estudos dos sistemas religiosos e de parehtesco. Nesta obra expoehte do estrutural-fuhciohalismobrithico,osautorespropuseramqueassociedadesafricahassodivididasemdois tipos: as sociedades dotadas de autoridade cehtral, mquiha admihistrativa e ihstituies judiciais; e as sociedades desprovidas destas ihsthcias, em suas palavras, soc/edades com e sem ove|no. Trs grahdes cohtribuies teoria ahtropolgica podem ser creditadas a este estudo:(i)adefihiodosistemadelihhagehssegmehtriascomoomecahismopeloqualassoc/edadessem ove|no articulam os processos de fisso e de fuso de uhidades scio-territoriais;(ii) a cohstatao de que a uhidade e a coeso das sociedades africahas esto fuhdadas ho recohhecimehto de smbolos e valores comuhs represehtados pelos mitos, ritos, dogmas, lugares e pessoas sagrados; e(iii) a abertura das ahlises ahtropolgicas ha direo da ihfluhcia dos Estados colohiais sobre as orgahizaes sociais primitivas. Asahlisesarticuladasatravsdestastrscohtribuies(lihhagehs,simbolismoecohtato)setorharam o cehtro dos debates da ahtropologia poltica, desde ehto6. Como em outros temas de pesquisa (hotadamehte os estudos de parehtesco), as ahlises baseadas ho estrutural-fuhciohalismo brithico ehfocaram as hoes de uhidade e de coeso social. A ahtropologia poltica, para esta escola terica, defihida pelo estudo dos mecahismos de mahuteho da ordem social. Fadcliffe-Browh, em Es||o|o|a e /onao na $oc/edade P|/m/|/va (1952), defihe: ahtropologiapolticaserefereaoestudodamahutehodaordemsocialatravsdaahlisedasfuhes,dos cohtextos e dos meios empregados para o exerccio do poder (Lucy Mair 1962). As crticas aos estudos desehvolvidos pelo estrutural-fuhciohalismo brithico questioharam tahto a ihadequao ethogrfica quahto os limites tericos deste modelo de ahlise. O exemplo clssico da ihadequao ethogrfica deste modelo terico est relaciohado ethologia dos grupos ihdgehas das Terras Baixas da Amrica do Sul7. As crticas tericas, por sua vez, podem ser divididas em duas grahdes correhtes: por um lado, a ahtropologia estrutural de Lvi-Strauss e, por outro, a ahtropologia simblica desehvolvida, prihcipalmehte, pela escola horte-americaha. EmboraLvi-Strausshuhcatehhasedirigidoespecificamehtepolticacomofocodeahlise,suaobra desafia as hoes de uhidade e coeso social desehvolvidas pelo estrutural-fuhciohalismo. Com efeito, a teoria lvi-straussiaha ho parte da hoo de uhidade social, mas da hoo de reciprocidade tributria da teoria de MarcelMausssobreaddiva.Faraelessoastrocasqueihstituemasuhidades,soasrelaesqueesto origem dos grupos. Assim, a coeso social ho seria uma cohdio, seria, sobretudo, um resultado possvel dos 30Ficardo Cid FerhahdesAk1100Sarrahjos gerados pelo imperativo da troca. De outra parte, os estudos de ahtropologia simblica criticam a hoo de coeso social destacahdo que a defihio de b//co pr-existe defihio de coeso. Sehdo assim, a poltica est relaciohada ho apehas s fuhes, aos cohtextos e aos meios de exerccio do poder, mas aos processos de determihao e de implemehtao de defihies pblicas. Em outras palavras, a perspectiva terica ihdicada pela ahtropologia simblica ehfatiza que a poltica cohstruda a partir de hoes culturalmehte especficas de b//co8. Afihal, como cada grupo defihe o que e o que ho b//co? A resposta ahtropolgica para esta questo passa, hecessariamehte, pela ethografia. Se o questiohamehto sobreadefihiodeb//cofossedirigidoaalgumfilsofoouciehtistapoltico,outrasrespostassurgiriam. Fespostas que certamehte valorizariam as tehses cohceituais que balizam o dilogo ehtre a uhiversalidade dos direitos humahos e a cohstituio scio-histrica dos Estados-Nao. A ahtropologia poltica, diferehtemehte, busca respostas aciohahdo cohtedos culturalmehte especficos. A poltica ehtre os grupos ihdgehas (heste caso, a poltica ehtre os Kaihgahg da Terra lhdgeha lva) exige uma resposta ahtropolgica teoricamehte cohtida e ethograficamehte aberta. Uma resposta capaz de lahar hipteses sobre as dimehses locais da poltica e sobre as defihies kaihgahg de b//co. Uma resposta capaz de acompahhar a perspectiva kaihgahg sobre o 15" e o 23".$ & $03$1+$ 2 0, / +2 (2 ) ( , - 2Sete quilmetros separam o cehtro da cidade de Mahoel Fibas da Aldeia da Sede da Terra lhdgeha lva. Ou melhor, quarehtamihutosdecamihhadaseparam(oucohectam,pormelhordizer)aresidhciadoeleitor-ihdgehadaurha eleitoral.Nas eleies de 2004 a cidade e a aldeia estiveram ligadas por polticas e polticos, por discursos e disputas. O prefeito do 23" tehtava a reeleio e cohtava com o apoio declarado do cacique e de um cahdidato ihdgeha Cmara de Vereadores. J o cahdidato do 15", em oposio ao ehto prefeito, tambm cohtava com o apoio de alguhs kaihgahg. Form, ehtre seus aliados (meus irmos hdios") ho estavam as liderahas ihdgehas. Felo cohtrrio, estavam os opositores do cacique, represehtados por um /nd/o cand/da|o a vereador. A vitria foi apertada. Com uma difereha de 92 votos (pouco mais de 1) o cahdidato do 15" gahhou as eleies. Com isso foi desfeito o alihhamehto que uhia polticos kaihgahg e polticas muhicipais. Afihal, o cacique apoiara o cahdidato perdedor, o 23", ao passo que o opositor do cacique havia apoiado o cahdidato vehcedor, o 15". No perodo compreehdido ehtre a campahha eleitoral de 2004 e a posse do hovo prefeito e dos hovos vereadores (jaheiro de 2005) os /a/nan do/va/viveramtehsespolticasihtehsas.Naqueleperodo,acoesoeamahutehodaordemsocialforam ehuhciados presehtes hos discursos de agehtes da Folcia e da Justia Federal e ho hos discursos kaihgahg. Fara estes, como veremos, a prpria hoo de comuhidade estava ehglobada pela disputa ehtre o 15" e o 23". To logo teve ihcio a campahha eleitoral ho muhicpio de Mahoel Fibas (em agosto de 2004) os Kaihgahg realizaram uma eleio para cacique. Frocesso hoje comum a muitas terras ihdgehas, as eleies kaihgahg so, 31Ak1100SO 15" e o 23": polticos e polticas kaihgahgem geral, realizadas atravs do s/s|ema do m//ho e do /e//ao, em que cada cahdidato idehtificado com um tipo de semehte. Os fiscais de cada um dos cahdidatos permahecem ao lado das urhas cohtabilizahdo os votos-semehtes recebidos. Em agosto de 2004 vehceu o m//ho. Com a eleio do hovo cacique, o cahdidato perdedor (/e//ao) passou a ihvestir has eleies muhicipais, cohcorrehdo como cahdidato a vereador o /nd/o cand/da|o do 15". O vehcedor das eleies para cacique, por sua vez, cohtihuou apoiahdo as cahdidaturas muhicipais do 23". Surgiram, assim, ha poltica dos ka/nan do /va/, os grupos do 15" e do 23".For deciso da lideraha ihdgeha a disputa eleitoral dos b|ancos ho deveria atihgir a comuhidade. Assim, todaformadepropagahdaeleitoralhoihteriordestaTerralhdgehafoiproibida9.Asrazesalegadasparatal impedimehto fazem referhcia pouca experihcia dos ihdgehas hos processos eleitorais. Diz um ex-cacique: O hdio ho ehtehde de eleio. Vocs ha cidade j esto quietos, hs ho" (ehtrevista realizada em outubro de 2004). Cohtudo, esta proibio ho foi respeitada. A coligao do 23" (apoiada pelo cacique) realizou um comcio ha Aldeia da Sede. J a coligao do 15" (apoiada pelo opositor do cacique) foi impedida de realizar comcios e reuhies. A desigualdade has cohdies da campahha eleitoral acirrou a rivalidade ehtre os grupos, cohsolidahdo o carter facciohal da poltica kaihgahg. Neste processo, o alcahce das decises polticas do cacique ultrapassou qualquer defihio estreita de comuhidade. For um lado, as decises do cacique atihgiam os polticos b|ancos do 15", por outro, legitimavam a diviso ehtre o 15" e o 23". $ 9 , 7 5 , $ 81, '$'( 6'(7 5 2& $ ( 0 ; ( 48(Sedefihirmoso//|/cacomoumaefetivaopossveldoimperativodatroca,ehtoosarrahjospolticosdos /a/nando/va/haquelaeleio,hosrevelamumcarterhegativodareciprocidade:cohflito.Se,poroutro lado, ahalisarmos o//|/ca como um processo de implemehtao de defihies pblicas, ehto o 15" e o 23" hos revelam que para os /a/nan do /va/ 'domhio pblico' pressupe, simultaheamehte, ihcluso e excluso, ou seja, facciohalismo.A eleio cohtabilizou 155 votos para o 15", 165 para o 23", 50 abstehes, 24 votos hulos e 2 votos em brahco. Embora o 23" tehha recebido mais votos ihdgehas, o cahdidato do 15" gahhou as eleies muhicipais. Esteshmerosapresehtamoaspectoestatsticodadivisopolticaehtreos/a/nando/va/.Os396votos ihdgehasestavam,defato,divididosequilibradamehte.Form,esteshmeroshoexpressamadimehso culturalmehte especfica atribuda ao processo eleitoral. Uma das prihcipais implicaes da projeo da disputa eleitoral sobre os arrahjos polticos kaihgahg foi a ihterferhcia sobre servios pblicos essehciais. Nesta terra ihdgeha, ohde vivem 1085 ihdivduos distribudos em 287 famlias10, os servios pblicos so fuhdamehtais. Como em outros cohtextos ihdgehas ho sul do Brasil, os dados cehsitrios sobre a T.l. lva ihdicam que esta uma populao jovem11 que apresehta um elevado hdice de crescimehto demogrfico. Sehdo assim, grahde parte desta populao ou est em idade escolar, ou usuria ihtehsiva dos servios pblicos de sade. O cohtrole 32Ficardo Cid FerhahdesAk1100Sdo, ou melhor, a disputa pelo acesso a servios pblicos cohstituiu, portahto, um ihstrumehto poltico estratgico em tempos de eleio. Aescola,aehfermariaemesmoadistribuiodoleite(promovidapelaprefeitura)foramafetadaspela violhcia do facciohalismo poltico atualizado com a disputa ehtre os grupos do 15" e do 23". Ao comehtar sobre estes cohflitos, um dos ihdgehas cahdidato a vereador atribuiu s mulheres o papel de protagohistas. Diz ele:As mulheres diziam: 'hosso goverho mahda o leite'. Ehto elas diziam: 'o 23 ho tem goverho, ehto ho vamos receber. Esse leite do 15'.A me do 23 j respohdia. Ouahdo eles vo pegar o leite eles j vo gritahdo. So 20 mulheres cohtra 20. Elas vo gritahdo e os homehs diziam: 'Fula hela! Fula hela! Se voc pular eu estou aqui tambm' o leite eles pegam ha frehte da igreja."Este tipo de cohflito tomou cohta da comuhidade. Na escola a disputa foi aihda mais violehta, haja visto que a diretora da Escola lhdgeha Salvador Vahhy era esposa de um cahdidato a vereador pelo 23". A ihtehsidade dos cohflitos em torho da escola e do posto de sade est relaciohada s fidelidades polticas que defihem as cohtrataes de ihdgehas e ho ihdgehas. As palavras do cacique, proferidas aps os resultados das eleies, so esclarecedoras:Na ehfermaria pega a poltica. Eles vo falahdo 15 e 23, eles dizem: 'quahdo hosso prefeito comear a trabalhar hs vamos tirar aqueles 23 que esto trabalhahdo. Na escola pega poltica. (Aihda bem que tu veio cohversar aqui em casa, por que ha escola ruim). A Diretora do 23 ela ho quer vir mais por medo do grupihho do 15. O marido dela gahhou de vereador. Se ela vem, a aparece o grupihho e ihcomodam ela. Oueriam expulsar os fuhciohrios que eu coloquei: a zeladora da escola e do posto de sade. Mas s que o fuhciohrio comigo. Se eles fazem baguha comigo. S eu que tiro. Hoje ho tem vigia ha escola."Na escola, ha ehfermaria, e mesmo ha distribuio do leite, a o//|/ca ea. Nestes ambiehtes ho houve, ehoh,espaoparaheutralidade.Esighificativoqueestessoespaosemqueasfamliasoperamcomo articuladoras. Tahto para a escola como para a ehfermaria, a famlia a uhidade de cadastro e de atuao. Excluir alguhs sighifica excluir algumas famlias destes servios. Este dado relevahte se cohsiderarmos que hos bailes e ho futebol evehtos e ambiehtes de socializao cohstahte ho havia cohflitos, ou melhor, os cohflitos ho eram percebidos como expresses da disputa ehtre o 15" e o 23". O fato de ho haver brigas polticas hestes evehtos hos permite supor que a disputa ehtre os ihdgehas ehvolve os ambiehtes que elevam as uhidades sociais qualidade de uhidades de trocas, fuhdamehto da orgahizao social kaihgahg. Ou seja, ohde a troca regulada politicamehte, a disputa eclode.Os Kaihgahg so um grupo J Meridiohal cuja orgahizao social, como j demohstrado em outros estudos, resulta da articulao ehtre grupos domsticos que operaciohalizam prihcpios scio-cosmolgicos dualistas atravs da prescrio da troca ritual e matrimohial ehtre as metades exogmicas Kam e Kairu12. Os grupos domsticos kaihgahg so uhidades sociais idealmehte cohstitudas em torho de um casal de velhos ehglobahdo os grupos familiaresdesuasfilhasegehros.Afrmulageraldesuacohstituioestabeleceaafihidadeehtrehomehs pertehcehtes a metades opostas e a cohsahgihidade ehtre mulheres tambm pertehcehtes a metades opostas. 33Ak1100SO 15" e o 23": polticos e polticas kaihgahgCohtudo, os grupos domsticos diferem quahto a sua capacidade de articular redes de relaes sociais. Fertehcer a um grupo domstico sighifica pertehcer a uma uhidade social dotada de idehtidade hica.Os traos de idehtidade dos grupos domsticos ho so os mesmos que idehtificam os grupos familiares. Uso ihclusivo das terras, padres de heraha e relao com a lideraha ihdgeha estes so traos que idehtificam apehas grupos domsticos. Ao cohtrrio do grupo familiar, o grupo domstico ho dotado de um s/|/o ou de qualquer terra para seu uso exclusivo. Suas terras so de uso ihclusivo. Nelas so realizados os a/o|o|/os (trabalho coletivo has roas) pelos membros da a|en|aem (afihs e cohsahgheos reais ou putativos filhos, gehros, compadres...). O padro de heraha ehtre os Kaihgahg segue o ordehamehto scio-cosmolgico da patrilihearidade, cabehdo aos grupos familiares a trahsmisso de behs como terras, ihstrumehtos e saberes, dehtre outros. O grupo domstico, por seu turho, ho trahsmite behs, trahsmite relaes. Seu legado ho a terra, mas suas relaes polticas. A saho da //de|ana ihdgeha legitima a cohstituio dos grupos familiares. Os casamehtos, de fato, devem ser expressamehte autorizados pelas liderahas. Diferehtemehte, tal saho ho se aplica ao grupo domstico, j que ele prprio uma uhidade poltica. Os grupos domsticos so, ehfim, uhidades de troca kaihgahg. Atravs destas sooperaciohalizadastrocasmatrimohiais(ocasamehto,queratificaaliahasehtregruposemetades),trocas simblicas (fidelidades rituais, religiosas e polticas) e trocas ecohmicas (cadeias de solidariedade que garahtem o cultivo/produo da terra).Nas eleies muhicipais de Mahoel Fibas a desigualdade dos privilgios e das privaes direciohadas aos gruposdo15"edo23"atihgiramfrohtalmehteosgruposdomsticos,abalahdoohcleoorgahizaciohalda poltica ehtre os /a/nan do /va/ e colocahdo em xeque o cohvvio ehtre uhidades de troca. Tradiciohalmehte as relaes de troca ehtre os grupos domsticos kaihgahg eram efetivadas em domhios territoriais extehsos, que cobriam grahde parte das terras altas do sul do Brasil. Esta, defihitivamehte, ho a realidade cohtemporhea da territorialidadekaihgahg13.Os/a/nando/va/,comomuitosoutros,vivematualmehtecohcehtradosemuma hica aldeia. Form, at o fihal da dcada de cihqehta esta populao vivia distribuda em cihco aldeias: Passo //so, Ma||eqo/nha, 0a/sa ve/ha, $e||/nha e 0o|bo/e|a. Tal distribuio expressava, exemplarmehte, a territorialidade de grupos domsticos articulados. Cada aldeia cohfigurava uma uhidade local composta por grupos domsticos que detihham direito explorao dos recursos de seus subterritrios. Neste cohtexto os cohflitos eram relaxados postoqueastehsessociaispodiamsercohtorhadascomoestabelecimehtodehovosgruposlocais.Como em outros cohtextos ihdgehas, a territorialidade tradiciohal kaihgahg cohfigura-se como uma rede que articula diferehtes uhidades sociais. Nadcadadeoitehtahouveummovimehtodefihitivodecohcehtraopopulaciohalqueresultouha trahsferhcia de algumas famlias das ahtigas aldeias $e||/nha e 0o|bo/e|a para a Aldeia da Sede. A cohcehtrao das famlias teve como razes ihstituciohais alegadas o oferecimehto de mais cohforto" aos ihdgehas, ou seja: a reuhio das famlias ho ehtorho de equipamehtos sociais e civilizatrios" represehtados pela escola, posto de sade, ehergia eltrica, gua ehcahada, habitaes padrohizadas cohstrudas pelo poder pblico e proximidade do comrcio da cidade de Mahoel Fibas. Seguhdo a percepo dos Kaihgahg, h vahtagehs e desvahtagehs ha 34Ficardo Cid FerhahdesAk1100Scohcehtrao populaciohal. For um lado todos recohhecem que a proximidade dos equipamehtos civilizatrios" vahtajosa, especialmehte ho que diz respeito proximidade da escola14. For outro, ao viverem amon|oados (como dizem), ehfrehtam problemas com a disthcia ehtre seus locais de moradia e suas roas e lavouras. Sehdo assim, os behefcios dispohibilizados pelas polticas pblicas torharam-se fuhdamehtais para as famlias kaihgahg15. Figura 2: Croqui da T.. vai que idenlilica residncias e inslalaes publicas, elaborado a parlir dos originais da FUASA/Londrina |ola 200!).Esta ilustrao da Aldeia da Sede apresehta a distribuio, ou melhor, a cohcehtrao de casas ihdgehas hoehtorhodosequipamehtoscivilizatrios":escola,postodesade,escritriodaFUNAl,igreja,campode futebol. Basta, porm, ihvertermos a perspectiva de ahlise e cohcluiremos que as casas ihdgehas ehvolvem os 35Ak1100SO 15" e o 23": polticos e polticas kaihgahgequipamehtos dos b|ancos, ao ihvs de gravitar em torho destes. Amon|oados ha Aldeia da Sede, a territorialidade em rede dos grupos domsticos assume a forma de articulaes em torho da ihfluhcia sobre a distribuio e sobre o cohtrole do acesso aos servios pblicos. Os behefcios, afihal, circulam ehtre uhidades de troca. As palavras do cacique do 23" claramehte expressam este cohtrole poltico das trocas: fuhciohrio comigo". A ihterferhcia das disputas ehtre o 15" e o 23" sobre servios pblicos essehciais ihviabilizou a cohvivhcia socialmehtereguladaehtreuhidadesdetroca.lssohosremeteaumaihflexohadefihiodeo//|/cacomo resultado da troca, j que os circuitos de reciprocidade so cohstahtemehte atravessados por decises que pem em xeque a hatureza poltica das famlias e dos grupos domsticos.Em 2004, diahte das ihmeras situaes de cohflito Fula hela! Fula hela! Se voc pular eu estou aqui tambm" o Juiz Federal em Mahoel Fibas proibiu o acesso de ho ihdgehas T. l. lva. Como cohtou o cacique, (...) as escolas fecharam, o juiz da cidade mahdou fechar. Ficou trihta dias sem aula. O juiz fechou at que chegasse a eleio para prefeito". As criahas ficaram sem escola. A comuhidade, sem atehdimehto de sade, sem acesso distribuio de leite e de cestas bsicas. lsto tudo, em home da cohduo do processo eleitoral muhicipal. As frohteirasquesupostamehteseparariamapolticadoshdiosdapolticadosb|ancosforamdesfeitas.Festaa perguhta: afihal, o que e o que ho b//co para os /a/nan do /va/?Severdadequeaihclusodo15"edo23"haarehapolticakaihgahgampliouahoodeb//co, ehglobahdo a poltica e os polticos do muhdo dos b|ancos, tambm verdade que a proibio do acesso de ho ihdgehas aldeia reduziu o domhio pblico de atuao dos polticos kaihgahg. Sem leite, sem escola e sem posto de sade os polticos e as polticas dos ka/nan do /va/ aguardaram as eleies... brigahdo.$ 3 26 6 ( 7 ( 5 5 , 7 25 , $/ , '$'(( 0 & +248(As brigas ho se restrihgiram aos ambiehtes da escola, da fila do leite e da ehfermaria. To logo foi ahuhciada a vitria do 15" has eleies muhicipais, um grupo aliado ao cacique abahdohou a Aldeia da Sede. Este grupo, cohstitudo por aproximadamehte cem pessoas (cerca de 20 famlias), ihstalou-se ha ahtiga aldeia da $e||/nha, local situado ha margem direita do rio Barra Freta, ho muhicpio de Fitahga. Fara o ehto cacique, lder do 23", o temor s possveis represlias por parte do 15" levou o grupo de famlias do 23" a buscar um hovo local para residir. A represlia temida estava relaciohada atuao do grupo do 15" ha poltica muhicipal. Embora o cacique fosse do 23", todos sabiam que com a posse do hovo goverho a poltica muhicipal seria direciohada para os ihdgehas eleitores do 15" esse, afihal, era o cohtedo das freqehtes brigas ehtre as mo/he|es ha fila do leite. Fara o lder do grupo do 15" tal mudaha teve origem poltica. lsto , a mudaha de famlias ligadas ao grupo do 23" para a ahtiga aldeia da Serrihha est relaciohada s eleies ho muhicpio vizihho, Fitahga. O territrio da T.l. lva est dividido hos muhicpios de Mahoel Fibas e Fitahga. A Aldeia da Sede, ohde reside a grahde maioria da populao ihdgeha, est localizada ho muhicpio de Mahoel Fibas. A ahtiga aldeia da Serrihha, porm, est 36Ficardo Cid FerhahdesAk1100Slocalizada ho muhicpio de Fitahga. Como heste muhicpio as eleies muhicipais elegeram o cahdidato do 23", muitos comehtaram que a trahsferhcia de famlias do |oo do 28 para a ahtiga aldeia da Serrihha cohfigurava-se como uma alterhativa dos ihdgehas para ho perderem o acesso s polticas muhicipais. O prprio cacique afirmou que os acampados ha Serrihha iriam trahsferir seus ttulos de eleitor para o muhicpio de Fitahga. Fassadas algumas semahas, sem atehdimehto e em cohdies precrias, as famlias que estavam ha Serrihha voltaram para a Aldeia da Sede, cehtro do redemoihho poltico.AcriaodeumahovaaldeiahaSerrihhapelosapoiadoresdo23"hoprosperou.Noehtahto,o aprofuhdamehto dacriseehtreaoposio eocaciquetomoudimehses ihsustehtveis. Em dezembro de 2004, por ocasio de uma reuhio ha sede da Folcia Federal em Guarapuava (FF), a oposio forou o cacique a aceitar como seu vice-cacique um ihdgeha ligado ao grupo do 15". Em fihs de fevereiro de 2005 acohteceu o ihevitvel. As cohtradies ehtre o grupo do 23" e do 15" chegaram ao seu pohtomximo. Emreuhio ha Fuhai, coma presehade vrias liderahasihdgehas do Farah, o cacique, do 23", acusou as liderahas da oposio, do 15", de amea-lo de morte e de terem cohtratado capahgas para mat-lo. O cacique requereu, ehto, a trahsferhcia de trs hdios que lideravam o grupo do 15" para a Terra lhdgeha Fio das Cobras (FF). Com o apoio da Folcia Federal as liderahas do cacique trahsferiram estas famlias para aquela terra ihdgeha. Comoo ha comuhidade16 as trahsferhcias so recursos puhitivos extremos. A mobilizao cohtra o cacique foi imediata. Fara cohter as presses o cacique mahdou prehder ha cadeia da comuhidade vrias pessoas, ehtre velhos, mulheres e criahas. Essas prises ampliaram a revolta, fazehdo com que um dos lderes do 15" procurasse o Fromotor Fblico de Mahoel Fibas. Este, por sua vez, determihou a imediata abertura das celas da cadeia ihdgeha libertahdo os que l estavam. Alm disso, ordehou a priso do cacique. Essesacohtecimehtosselaramodestihodocaciquedo23".Semapoioihstituciohaldaprefeitura, desmoralizado perahte a comuhidade por ter sido preso pelo Fromotor e pressiohado pela oposio, o cacique rehuhciou e deixou a Terra lhdgeha lva. A rehhcia/destituio/abahdoho do cacique ocorreu ha prihcipal rua de Mahoel Fibas, em frehte ao mercado em que os hdios costumam fazer suas compras. L se ehfrehtaram pela ltima vez os lderes do 15" e do 23". Em fevereiro de 2005 a oposio orgahizou uma hova lideraha, homeahdo como cacique um dos lderes do grupo do 15". A partir daquele momehto as liderahas passaram a evitar falar ha oposio ehtre o 15" e o 23". As eleies, afihal, j haviam acabado. 3 ( 5 6 3 ( & 7 , 9$ 3 2/ 7 , & $ 5 ( / $d ( 6', ) ( 5 ( 1& , $, 6A ihsero dos Kaihgahg ha disputa eleitoral do muhicpio de Mahoel Fibas, ou melhor, as repercusses destas eleies muhicipais ehtre os Kaihgahg da Terra lhdgeha lva ihdicam que a poltica ocupa o cehtro de suas atehes e atuaes. As b|/as das mo/he|es, a desestabilizao dos circuitos de troca, as prises, o deslocamehto de vihte famlias, a destituio do cacique, a participao da Folcia e da Justia Federal ho deixam dvidas: a poltica cohstitui 3IAk1100SO 15" e o 23": polticos e polticas kaihgahgo fio cohdutor do e|hos kaihgahg. A cehtralidade da poltica est marcada ho grahde poder atribudo aos caciques (que ora mahdam prehder e ora buscam suporte ha Folcia Federal), ha ihtehsidade da disputa ehtre defihies de domhio pblico (esse leite do '15'") e, aihda, ho alcahce das trocas simblicas e sociais (Oueriam expulsar os fuhciohrios que eu coloquei, a zeladora da escola e do posto de sade. Mas s que fuhciohrio, comigo"). Fara os /a/nan do /va/, haquelas eleies muhicipais, o//|/ca foi sihhimo da disputa ehtre o 15" e o 23".A hotvel preemihhcia da poltica e dos polticos kaihgahg, registrada por ihmeros estudos histricos e ethogrficos, desafia o paradigma da che//a sem ode|. Este paradigma foi formulado por Fobert Lowie (1948) e Fierre Clastres (1974) para ahalisar a poltica ehtre os grupos ihdgehas das Terras Baixas da Amrica do Sul. Especialmehte desehvolvido por Clastres em sua obra A $oc/edade con||a o Es|ado, o paradigma da che//a sem ode| prope que a chefia ehtre os amerhdios est privada de meios de se exercer (...) desprovida de meios efetivos de coero" (Clastres 1974:26), estahdo baseada hos atributos da oratria, da mediao e da geherosidade. Fara Clastres a chefia amerhdia opera uma ihverso ho circuito da reciprocidade hativa: palavras, objetos e mulheres so trocados, cabehdo aos chefes o lugar de doadores de palavras e objetos, e de recebedores de mulheres (da a prerrogativa da poligamia ehtre os chefes amerhdios).Eevidehtequeestemodelotericoihadequadoparaaahlisedoambiehteethogrficoapresehtado. Cohtudo, a relevhcia dos estudos de Clastres ultrapassa qualquer frmula de idehtificao de atributos da chefia. Clastres, efetivamehte, estabelece uma hova perspectiva para a ahtropologia poltica. No prefcio recehte edio de A $oc/edade con||a o Es|ado, Goldmah e Stolze de Lima (2003) defihem a cohtribuio fuhdamehtal de Clastres como a tehtativa de cehtrar a ahtropologia poltica ho poder, e ho articul-la por meio de uma teoria de tipos sociais, mas de uma reflexo oriehtada pelas relaes diferehciais de cohstituio poltica observveis ho cohjuhto das sociedades humahas" (o c/|.: 15). H heste paradigma, ehtretahto, uma hfase ha cohcepo de poltica como coeso social, derivada da teoria estrutural-fuhciohalista (Descola 1988 e Grahero 1993). Fara estes autores o paradigma da chefia sem poder restrihge o estudo da poltica ahlise dos meios coercitivos de exerccio do poder. Ademais, Descola ehfatiza que o poder poltico ehtre os chefes amerhdios est relaciohado ao poder de hegociao dos xams aspecto ho explorado ha teoria de Clastres. Fara Descola, ho se trata, portahto, da chefia sem poder, mas da realizao poltica de um poder origihado ho uhiverso simblico da atuao xammica. A ihcluso da dimehso xamhica ha defihio da poltica amerhdia ihstitui um sehtido prprio de sociedade, de social e, portahto, de b//co. Como argumehta Bruce Albert, citahdo Sahlihs, ha ihtroduo obra Pac///cando o 0|anco: cosmo/o/as do con|a|o no No||e-Amazn/co: ao ihcluir o uhiverso dehtro do prprio esquema cultural um povo abre um espao defihido ha reproduo de sua comuhidade imediata a seres e coisas que esto alm dela. Deuses ou ihimigos, ahcestrais ou afihs, de vrias formas os Outros represehtam a cohdio hecessria da existhcia de uma sociedade" (Albert 2000:13).O 'outro' ihcludo ou o 'outro' como cohdio de reproduo so temas-chave do 'perspectivismo amazhico'. Alteridadeepodersotemasqueseaproximamhaethologiaamerhdia.Oguerreiroeoxamarawetso emblemticos: ambos derivam seu poder ho simplesmehte da relao com o 'outro', mas da relao com o 'outro' 38Ficardo Cid FerhahdesAk1100Shos domhios da alteridade. Se o foco da ahtropologia poltica o poder, e se o poder derivado das relaes com a alteridade, ehto, a poltica ehtre os amerhdios (e cohseqehtemehte, a poltica ehtre os Kaihgahg) cohstituda a partir das |e/aoes d//e|enc/a/s ehtre categorias que classificam, mahipulam e orgahizam a alteridade. As eleies muhicipais em Mahoel Fibas ho esto, portahto, fora da poltica ihdgeha: o 15" e o 23" atualizaram o modo, o muhdo e a perspectiva poltica kaihgahg, pois haquele momehto cohstituram a cond/ao necessa|/a da ex/s|nc/a de oma soc/edade em sua relao com domhios da alteridade. Assumir que o 15" e o 23" so cohstrues kaihgahg e, portahto, classificar as eleies muhicipais como cohdio para a poltica ihdgeha, implica a cohteho da perspectiva terica fuhdada ho paradigma dos estudos sobre relaes ihterthicas. Os hdios do sul do Brasil cohstituram, de fato, campo privilegiado para este tipo de ahlise. Mesmo Lvi-Strauss, com toda sua vocao para desvehdar esquemas classificatrios hativos, quahdo cohheceu os Kaihgahg de So Jerhimo da Serra (FF), em 1935, escreveu sobre as mudahas culturais e sobre as cohseqhcias do projeto ihtegraciohista do ihdigehismo oficial17 e ho sobre aspectos de sua orgahizao social ou seus esquemas classificatrios, como o fez, por exemplo, com o material ethogrfico sobre os Bororo, ho mesmo perodo. Os estudos sobre os Kaihgahg so, com efeito, marcados pela hfase has mudahas/permahhcias culturais (Baldus 1937; Schadeh 1957) e hos desdobramehtos da poltica ihdigehista (Sahtos 1970; Helm 1974). A ahlise da poltica kaihgahg a partir do estudo das relaes ehtre sociedades ihdgehas e Estado Naciohal certamehte classificaria o 15" e o 23" como aspectos do projeto ihtegraciohista do ihdigehismo oficial esta seria uma abordagem cohtatualista, hos termos defihidos por Viveiros de Castro (1999). Ehtretahto, as ethografias kaihgahg oferecem possibilidades para a ahlise das |e/aoes d//e|enc/a/s ehtre categorias que classificam, mahipulam e orgahizam a alteridade. Po/ e /o/a so duas categorias kaihgahg que desigham, respectivamehte, chefe poltico e xam. Tahto ha vasta bibliografia histrica quahto has ethografias sobre os Kaihgahg esto registradas ihformaes e ahlises sobre os o/ e os ko/a.Compreehder o que h de diferehcial ha relao ehtre estas categorias e a hoo culturalmehte especfica de poder , deste modo, passo fuhdamehtal para compreehder como FMDB/FF/FT/FL (o 15") e FTB/FFS/FDT/FFL/FHS/FSDB (o 23") podem ser cohsiderados como elemehtos da cohstituio poltica dos /a/nan do /va/.3 (. 8, 3 2'( 5($/7 ( 5 , '$'(O paj mahda ho cacique. O cacique abaixo dele porque ele tem mehos sabedoria. O paj, que kui, trabalha com divihha [adivihhao]. Eles lutam com remdio e v. Se eles esto se aprohtahdo assim lohge, assim pula ho cacique. Ehto os kui eles cohtam ho outro dia. Ehto tem s vezes um passarihho, esse sim o kui. A ele vem e vai cohtar para o paj. O paj juhta toda a comuhidade dele para combater aqueles que to aprohtahdo cohtra ele para tirar ele do cargo.O kui defesa da comuhidade. O cacique, o servio dele outro. Marca a hora, ele cohvida e vo pular ho outro. Ehto eles camihham de hoite, para madrugada pular haquela aldeia. Ehto da o outro kui cuida outro. Eles se reparte. Ehto eles ficam assuhtahdo, s eles. Oue hem telefohe" (Vicehte Foke, abril 2001).Tradiciohalmehte havia, em todas as comuhidades kaihgahg, ihdivduos classificados como ko/a. Vicehte Foke era cohsiderado por muitos como ko/a. Ele prprio ho se cohsiderava como tal: se auto-ihtitulava a/e, 39Ak1100SO 15" e o 23": polticos e polticas kaihgahgespecialmehte perahte os aluhos e professores ihdgehas da Terra lhdgeha Xapec esta era sua estratgia para valorizar seu cohhecimehto sobre a 'tradio ihdgeha'; assim ele cohstruiu seu lugar social. As palavras de Vicehte so claras: o paj mahda ho cacique (...) [que] tem mehos sabedoria". Tal defihio est igualmehte presehte em outros relatos. A sabedoria xamhica abarca ho apehas a comuhidade e a relao ehtre os homehs, mas tambm e,sobretudo,osmuhdospossveishosquaisascategoriashoman/dade,an/ma//dadeesob|e-homan/dadese fuhdem, por vezes, perigosamehte. A atuao dos ko/a, hos termos de Descola (1988), expressa o cohtrole sobre recursos materiais e simblicos fuhdamehtais para a reproduo da vida social18.. A sabedoria dos ko/a represehta, para os Kaihgahg, uma cohfirmao da validade de seus prihcpios cosmolgicos ele o relgio da comuhidade" (Wilsoh Moreira, T.l. Nohoai-Fio da Vrzea). Neste sehtido, s a sabedoria do ko/a cohcebida como capaz de ehglobar todos os poderes de uma comuhidade. No por acaso os ko/a foram perseguidos e tiveram suas casas queimadas em diversas terras ihdgehas, ho cohtexto da ihtehsificao da preseha ihstituciohal do Servio de Froteo ao lhdio (SFl), a partir da dcada de quarehta do sculo XX. Tommasiho (1995) apresehta relatos de alguhs Kaihgahg que vivem has terras ihdgehas de Apucaraha e So Jerhimo da Serra (horte do Farah) descrevehdo as perseguies sofridas pelos ko/a e por aqueles que procuravam seus servios os ko/a eram amarrados ho trohco e eram castigados fisicamehte, ou 'surrados', como costumam dizer" (Tommasiho 1995:168). Neste mesmo perodo, ao cohtrrio dos ko/a, os o/, ou melhor, os chefes polticos, redefihiram seus espaos de atuao, por vezes em associao e por vezes em oposio aos agehtes ihstituciohais.Emboraepistemologicamehteasabedoriadoko/aehglobeosdemaispoderes,opoderdoko/aest subordihado sobre a comuhidade" (Wilsoh Moreira, T.l. Nohoai-Fio da Vrzea), ou seja, ho plaho da sua realizao sociolgica tal poder ehglobado pelo domhio poltico, o domhio do o/. As referhcias ao termo o/ esto registradas ha bibliografia desde os trabalhos de Telmaco Borba (1882), Ambrosetti (1894), Koehigswald (1908) e Nimuehdaju (1913). Em seu Peqoeno vocabo/a|/o da //noa Ca/nan oo Co|oado Telmaco Borba defihiu Pa/ como Homem" (Borba 1882:36). Os outros registros ihdicam que o/ defihe uma qualidade poltica, ho obrigatoriamehte relaciohadachefia.Ouahdoquestiohadossobreosighificadodeo/,osKaihgahg,emgeral,associameste termo s posies de autoridade poltica. Como diz Waktuh, um Kaihgahg da Terra lhdgeha de Falmas (FF), o/ pra dizer o mesmo que sehhor, chefe, cabea" (ehtrevista, 2000). Em suas diferehtes dimehses o/ se refere a atributos de represehtao e mediao defihidos pela relao com a alteridade. O poder dos o/ x/n (pequehos chefes), tahto quahto o poder dos o/ mba (grahdes chefes), cohstitudo em relao a expresses da alteridade, sejaestaumarelaodiferehcialehtregruposdomsticosouehtrecomuhidadesdispersasterritorialmehte.A tarefa dos o/ ho outra se ho garahtir a reproduo social atravs da mediao-domesticao da alteridade, celebrada em processos rituais19, ou predada em situaes de cohflito.A categoria o/, como vemos, articula poltica e alteridade ha srie sociolgica, ao passo que a categoria ko/a defihe o domhio xamhico, permitihdo uma aproximao ehtre poltica e alteridade ha srie cosmolgica (ViveirosdeCastro2000).Esighificativoque,aolohgodeaproximadamehteduzehtosahosdecohtatocomo muhdo dos b|ancos, os Kaihgahg tehham desmembrado a categoria poltica Po/ em diferehtes ttulos, tais como: 40Ficardo Cid FerhahdesAk1100Scacique, major, capito, corohel, sargehto, cabo etc. Mesmo assim, aqueles que atualmehte exercem posies de comahdo has liderahas ihdgehas kaihgahg se recohhecem e so recohhecidos, em alguma medida, como Po/. Frocesso absolutamehte ihverso ocorre com a categoria /o/a, i.e., diferehtes saberes e formas de atuao foram ihtegrados hesta categoria (como behzedeira, remedieira, curador, erveiros...). Aqueles que domiham alguma forma de procedimehtos de cura se cohsideram e so cohsiderados, em alguma medida, ko/a. Como vemos, as categorias o/ e ko/a so atualizadas de forma diferehte: a categoria o/ atualizada por desmembramehto; a categoria ko/a atualizada por ihcorporao. A sabedoria e o poder dos ko/a so hicos, ho h traduo que se justifique. H, pelo cohtrrio, uma tradio que se impe e que ehgloba hovas formas. O poder dos o/, ao cohtrrio, ho hico; h tradues possveis, seu desmembramehto ho ehtra em cohflito com sua hatureza: o/ pr dizer o mesmo que sehhor, chefe, cabea", para lembrar as palavras de Waktuh. A relao diferehcial ehtre as hoes culturalmehte especficas de poder e as categorias tradiciohais ko/a e o/ pode ser expressa pela oposio ehtre processos de ihcorporao e de desmembramehto. Frocessos estes que revelam a complemehtaridade de diferehtes estratgias de classificao, mahipulao e orgahizao da alteridade. Nas eleies de Mahoel Fibas os ko/a ho apareceram. Os grupos do 15" e do 23" ho estiveram articulados em torho da atuao xamhica. Os discursos eleitorais tampouco fizeram referhcia sabedoria dos ko/a. Ehquahto categoria social, os ko/a ha T.l. lva esto distribudos por alguhs grupos domsticos l eles ho so o relgio da comuhidade", como defihiu o cacique da T.l. Nohoai-Fio da Vrzea. Ehquahto categoria epistemolgica a sabedoria dos ko/a se mahteve lohge da ceha eleitoral, circulahdo hos saberes e fazeres de alguhs velhos, cohhecedores da tradio, que seguem ihcorporahdo cohhecimehtos sobre plahtas medicihais, rezas, prticas de cura ea[d/v/nha]o. Os o/, ao cohtrrio, estiveram ho cehtro da ceha poltica eleitoral, desmembrahdo posies, projetahdo aliahas e redefihihdo espaos de atuao. & 216 , '( 5 $d ( 6) , 1$, 6 , 1& / 8 '2 12 287 5 2 Durahte as eleies muhicipais em Mahoel Fibas, a Terra lhdgeha lva, sob o comahdo do cacique do 23", cohtava com a atuao de 63 o/: cacique, vice-cacique, seis cohselheiros, corohel, major, capito, tehehte, sargehto e cihqehta policiais uma lideraha para cada 17 ihdivduos, ou uma lideraha para cada quatro famlias20. Muitas liderahas.Muitoso/.Asatribuiesdecadaumadestasposiesdaliderahaihdgehaihcluamocohtrole social, o acohselhamehto aos casa/s novos, o plahejamehto/implemehtao de aes coletivas e a represehtao comuhitria. Os polcias so a seguraha do cacique" (ex-cacique, T.l. lva), cabia a eles a priso de ihfratores e desordeiros, sehdo cohsiderado ihfrao tahto as brigas, geralmehtecausadas pelo cohsumo excessivo de bebidas alcolicas, quahto o ehfrehtamehto s decises da lideraha. Aos cohselheiros cabia acohselhar os casa/s novos, ihterferihdo em desehtehdimehtos familiares. s demais posies (vice-cacique, corohel, major, capito e tehehte) cumpria acompahhar o cacique hos processos de tomada de deciso e has represehtaes comuhitrias21.41Ak1100SO 15" e o 23": polticos e polticas kaihgahgCom a posse da hova lideraha ihdgeha, aps as eleies muhicipais, os /a/nan do /va/ reorgahizaram sua estrutura poltica. O 15" gahhou as eleies. Esta ho era apehas uma cohquista da coligao do FMDB/FF/FT/FL, mas uma importahte vitria dos /a/nan Cihco meses aps a eleio para prefeito em Mahoel Fibas, os /a/nan do 15 assumiam legitimamehte o cohtrole da poltica ihdgeha. A hova lideraha foi formada de maheira a acomodar as fraturas sociais expostas pelo processo eleitoral. Neste cohtexto ho se tratava apehas de restabelecer a ordem social ou os mecahismos de exerccio do poder. Tratava-se, certamehte, de reoriehtar a relao ehtre polticas e polticos, redefihihdo dom/n/os b//cos e recuperahdo as cohdies de troca ehtre uhidades sociais. As eleies muhicipais em Mahoel Fibas expuseram, de fato, a amplitude do dom/n/o b//co kaihgahg, ihtegrahdo, simultaheamehte, as fisses sociais ehtre suas uhidades de troca, as polticas pblicas, a Folcia e a Justia Federal. A hova lideraha (ou seja, os hovos o/) fez surgir, moda tradiciohal, hovas posies que ihtegram atributos polticos cohtemporheos. O diagrama que segue, elaborado em abril de 2005 com a participao dos o/, um hovo recurso de orgahizao poltica utilizado pelos /a/nan do /va/. Ocohvvioehtregruposforarestabelecidoatravsdocohtrolepolticodoshegciosihdgehas"edos assuhtos de famlia": tarefas rduas atribudas ao /nse|o|, ao v/ce-/nse|o| e aos quatro Conse/he/|os. Uma hova lideraha estava formada, redefihihdo, assim, as cohexes ehtre domhio pblico e atuao poltica. Os o/ mais uma vez foram lahados hos domhios da alteridade, desta vez ihcluihdo uma lideraha ihdgeha ho ihterior da poltica muhicipal. Os /a/nan do /va/ ho falam mais sobre o 15" e o 23", agora eles falam sobre a Secretaria Muhicipal para Assuhtos lhdgehas". E se algum falar que a lideraha est favorecehdo o 15"?Bom, a um problema da polcia federal".5LFDUGR&LG)HUQDQGHVGRXWRUHP$QWURSRORJLD6RFLDOSHOD8QLYHUVLGDGHGH6mR3DXORpSURIHVVRUGR'HSDUWDPHQWRGH$QWURSRORJLDGD8QLYHUVLGDGH)HGHUDOGR3DUDQiFigura 3: Organizaao da liderana na Terra ndigena vai, levereiro de 2005.42Ficardo Cid FerhahdesAk1100S127$6! ArligoelaboradoaparlirdepesquisaelnogrlicadesenvolvidajunloaoLaboralriodeArqueologia,ElnologiaeElnohislria |Universidade Esladual de aring, PF) duranle a inplanlaao do Projelo: "Plano de Ceslao Anbienlal na T.. vai" |2003-2005), coordenadopeloProlessorLucioTadeuola.Aelaboraaodeslearligosloipossiveldevidoconlribuiaodoprolessor Lucio Tadeu que, aln de viabilizar ninha eslada en canpo, oporlunizou neu enconlro con lideranas indigenas, disponibilizou inlornaes e disculiu aspeclos lericos. Una versao do lexlo loi apresenlada no CT !4 "Os Fegines de Subjelivaao Anerindios e a Objelivaao da Cullura", no 30' Enconlro Anual da Anpocs |24 a 23 de oulubro de 2006, Caxanbu, C).2 Sobre a relaao enlre eleies e alcoolisno enlre os Kaingang ver relalrio inlilulado "Alcoolisno enlre os Kaingang da Terra ndigena onoai/Fio da Vrzea" |Fernandes 200!).3 Alualnenle os Kaingang enconlran-se dislribuidos en 34 lerras indigenas localizadas nos eslados de Sao Paulo, Paran, Sanla Calarina e Fio Crande do Sul. H, ainda, aqueles que viven lora das lerras indigenas, nas perilerias de cenlros urbanos ou en zonas rurais desles eslados. Eslina-se que hoje a populaao kaingang ullrapasse vinle e cinco nil individuos, dislribuidos en una exlensao lerrilorial desconlinua, de aproxinadanenle cenlo e selenla e lrs nil heclares. Os nuneros sao expressivos: lrala-se de una das nais nunerosas populaes indigenas no Brasil ocupando exlenses de lerras en una regiao densanenle colonizada. 4Sua obra clssica, $QFLHQW/DZ|!36!), apresenla una crilica ao direilo nalural, relulando as lices especulalivas criadas pela lilosolia polilica dos sculos XV e XV acerca do (VWDGRGH1DWXUH]D e do &RQWUDWR6RFLDO.5 "Foi en !940, quando a prineira geraao de anlroplogos que havia esludado con alinowski e Fadclille-Brown colaboraran con a elaboraao de $IULFDQ3ROLWLFDO6\VWHPV, que conearan os esludos conparados sobre polilica e governo" |Snilh !935:!4). "A anlropologia polilica nao se consliluiu cono cincia anles de !940" |Balandier !972:!!). "Para propsilos prlicos, o canpo da anlropologia polilica len inicio con a publicaao de $IULFDQ3ROLWLFDO6\VWHPV |Kurlz !979:34).6 Clucknan |!954) denonslrou a indissociabilidade enlre os lundanenlos polilicos e religiosos dos riluais de rebeliao Zulu e Swazi. iddlelon |!960) analisou a relaao enlre o cullo aos anceslrais e a lissao polilica Lugbara. Balandier, en sua elnogralia sobre os yoro |!962), denonslrou que os lernos que qualilican o poder polilico perlencen lanbn ao vocabulrio religioso. Lan |!936) descreve a associaao enlre guerrilheiros e ndiuns no Zinbabwe.7J en !977, no Congresso dos Anericanislas, Joanna Overing, Peler Fivire e Sinone Dreylus coordenaran un debale no qual loran apresenladas severas crilicas aplicaao dos nodelos de anlise alricanislas ao cenrio elnogrlico anerindio. O desenvolvinenlo das idias l apresenladas resullou na elaboraao de inuneras publicaes que conlronlaran con base elnogrlica os parnelros lericosdoeslrulural-luncionalisno.ConodeliniuanoelaCarneirodaCunha,loi,de cerlalorna, unnonenlode crise dos nodelos da Anlropologia Social Brilnica aplicados s sociedades que eslavan coneando a ser descrilas |%ROHWLP$%$ n' 23, enlrevisla con anuela Carneiro da Cunha Anoroso e Peixolo !997|)3A prpria lornulaao desla queslao revela lorle inlluncia lerica weberiana. veber nao assune o principio da coesao. Ao conlrrio, polilica, para ele, resulla da dispula enlre grupos de VWDWXV que lulan por inlluenciar a dislribuiao do poder.9conunenoulraslerrasindigenasainslalaaodebandeirasdeparlidospolilicosennaslrosdisposlosnalrenledas residncias.!0Dados da FUASA |ola - LAEE/UE 200!).!!Segundo dados conpilados pelo Diagnslico Elnoanbienlal da T vai |ola - LAEE/UE 200!), 60 da populaao desla T.. conposla por jovens con nenos de 20 anos de idade.!2Sobre organizaaosocial lradicional e sobre aspeclos scio-cosnolgicos dodualisnokaingang ver Veiga |2000) e Fernandes |2003).!3Sobre os processos de denarcaao e conlinanenlo lerrilorial kaingang, ver Sanlos |!970) e ola |200!).!4A inlroduao do ensino lornal en lerras indigenas lena de anplo debale. esla conunidade nao dilerenle. A escola, con eleilo, sinleliza as conlradies que cercan a experincia scio-hislrica desles Kaingang.43Ak1100SO 15" e o 23": polticos e polticas kaihgahg!5Segundo levanlanenlo realizado duranle a realizaao do Diagnslico Anbienlal da T.. vai, en 200!, as lonles de renda daquela populaao eslavan assin divididas: 92 sen renda lixa, ! assalariados, 7 aposenlados |ola, LAEE/UE 200!).!6As lranslerncias sao recursos punilivos exlrenos, geralnenle enpregados pelas lideranas kaingang nos casos de honicidio enlre indios. Sobre o sislena punilivo kaingang ver Fernandes |!993).!7En una passagen de 7ULVWHV7UySLFRV Lvi-Slrauss conenla: "Chegou a haver, na aldeia de Sao Jernino, que eu ulilizava cono base, una serralharia, una serraao, una escola e una larncia. O poslo recebia regularnenle lerranenlas nachados, lacas, pregos dislribuian-se veslurio e coberlores. Vinle anos nais larde eslas lenlalivas linhan sido abandonadas. O Servio de Proleao rellelia, ao deixar os indios enlregues aos seus prprios recursos, a indilerena dos poderes publicos de que se lornara objelo." |Lvi-Slrauss !955:!94).!3 Aspalavrasdevilsonoreira,caciquedaTerrandigenaonoai-FiodaVrzea|FS),saoiluslralivas:"olrabalhodekuia lundanenlal para a conunidade. Ele len un lrabalho aprolundado a capacidade de| ver e saber o conhecinenlo. A visao dele do kuia| loda noile lodo o dia ele esl apalpando a conunidade inleira, ele un relgio, ele esl subordinado sobre a conunidade, ele una visao, ele un relgio" |enlrevisla cedida en naio de 200!). Sobre a inlerlace p'i-kuia h inuneros depoinenlos. En una publicaao da APBKC |Associaao dos Prolessores Bilingues Kaingang e Cuarani), un lexlo de !997, o prolessor kaingang Arnndio Kankr Benlo, da T..Cuarila, descreve a inporlncia do Kuia: "A principio, o kuja linha un poder nuilo grande sobre seu povo. Tinha cuidados para con sua aldeia, lornecendo inlornaes lgicas para seus sudilos |...) o kuja linha nais poder do que o prprio chele sobre o povo" |Kankr !997:45).!9Descries e anlises sobre o rilual do Kiki poden ser consulladas en Crepeau |!995, !997), Oliveira |!996), Veiga |!992, !994, 2000) e Kurlz de Alneida |!993).20 A anlise da conposiao da liderana polilica en qualorze lerras indigenas kaingang desenvolvida en ninha pesquisa de doulorado revelou que, en ndia, os Kaingang reconhecen una liderana para cada 3! individuos ou una liderana para cada seis lanilias |Fernandes 2003).2!Esla divisao de posies e de alribuies de auloridade no inlerior da Terra ndigena vai aconpanha, en grande nedida, a conposiao de lideranas polilicas en oulras lerras kaingang. Con eleilo, desde o sculo XX os Kaingang passaran a incorporar posies da hierarquia nililar en sua organizaao polilica.44Ficardo Cid FerhahdesAk1100S5 ( ) ( 5 1& , $6% , % / , 2*5 ) , & $6 ALBEFT, Bruce. 2002. Cosmologias do Cohtato Norte-Amazhico". lh Pac///cando o 0|anco: cosmo/o/as do con|a|o No||e-Amazn/co. So Faulo: Ed. UNESFAMBFOSETTl, J.B. 1894. Los lhdios Kaihghgues de Sah Fedro de Missiohes"Rev/s|a de/ !a|d/n Zoo/o/co de 0oenos A/|es. Buehos Aires.AMOFOSO, Marta 8 Ferhahda Feixoto. 1997. Ehtrevista com Mahuela Carheiro da Cuhha". 0o/e|/m A0A h 28. Dispohvel em: http://www.uhicamp.br/aba/boletihs/b28/06.htmBALANDlEF, George. 1972. Po//|/ca/ An|h|oo/oy. Lohdoh: Fehguih Books.BALDUS, Herbert. 1937. Ensa/os de E|no/o/a 0|as//e/|a. So Faulo: Compahhia Editora Naciohal.BOFBA, Telmaco. 1908. Ac|oa//dade /nd/enas. Curitiba: lmpressora Farahaehse.CLASTFES, Fierre. 1974. /a $oc/e|e Con||e /E|a|. Faris: Mihuit. Faris.CFEFEAU, Fobert. 1995. Ecohomie Fituel". /An|h|oo/o/e Econom/qoe Ac|es do Co//oqoe-95 do Dea||men| dAn|h|oo/o/e. Mohtreal: Uhiversit de Mohtreal. Dispohvel em: http://www.ahthro.umohtreal.ca/varia/colloques_1995-1998/coll_1995/4-Crepeau.pdf_____.1997.LeChamaheCroit-llVraimehtSesMahipulatiohsetLeursFohdemehtslhtellectuels?"Reche|cehs Ame|/nd/ennes ao Doebec 27(3).DESCOLA,Fhillipe.1988.LaChefferieAmrihdiehhedahsl'AhthropologieFolitique".Revoe/|ana/sede$c/ence Po//|/qoe 38(5): 818-827.EVANS-FFlTCHAFD, E.E. 8 Meyer Fortes (eds.). 1941. A/|/can Po//|/ca/ $ys|ems. Lohdoh: Ed. KFl.FEFNANDES, Ficardo Cid. 1998. Autoridade Foltica Kaihgahg: um estudo sobre a cohstruo da legitimidade poltica ehtre os Kaihgahg de Falmas (Farah). Dissertao de Mestrado. Floriahpolis: Uhiversidade Federal de Sahta Catariha, Frograma de Fs-Graduao em Ahtropologia Social. _____ . 2001. Alcoolismo ehtre os Kaihgahg da Terra lhdgeha Nohoai/Fio da Vrzea". Felatrio. Mihistrio Fblico Federal / FUNASA Fio Grahde do Sul._____ . 2003. Foltica e Farehtesco ehtre os Kaihgahg: uma ahlise etholgica. Tese de Doutorado. So Faulo: Uhiversidade de So Faulo, Departamehto de Ahtropologia.GLUCKMAN, Max. 1954. R/|oa/s o/ Rebe//on /n $oo|h-Eas| A/|/ca. Mahchester: Mahchester Uhiversity Fress. GOLDMAN, Marcio 8 Thia Stolze de Lima. 2003. Frefcio". lh Fierre Clastres, A $oc/edade Con||a o Es|ado. So Faulo: Cosac 8 Naify.GFANEFO. F.S. 1993. From Frisioher of the Group to Darlihg of the Gods: ah approach to the issue of power ih lowlahd South America. /Homme 126-128: 13-24.HELM, Ceclia. 1974. A lhtegrao do lhdio ha Estrutura Agrria do Farah. Tese de Livre Dochcia. Curitiba: UFFF. KANKOF, Armahdio. 1997. Como um Kaihgahg se torha Kui e Fara Oue". lh E !amen /y Mo: |ex|os ka/nan. Braslia: AFBKG/Dka ustria/MEC/FNUD.45Ak1100SO 15" e o 23": polticos e polticas kaihgahgKUFEF, Adam. 1996. 7he /nven|/on o/ P|/m/|/ve $oc/e|y. Lohdoh: Foutledge.KUFTZ, Dohald V. 1979. Folitical Ahthropology: issues ahd trehds oh the frohtier". lh Po//|/ca/ An|h|oo/oy: |he s|a|e o/ a||. New York: Moutoh.KUFTZ de ALMElDA, Ledsoh. 1998. Dihmica Feligiosa ehtre os Kaihgahg do Fosto lhdgeha Xapec/SC. Dissertao deMestrado.Floriahpolis:UhiversidadeFederaldeSahtaCatariha,FrogramadeFs-GraduaoemAhtropologia Social.LAN,David.1985.GonsandRa/n:oe||///as8s/|/|med/oms/nZ/mbabwe.Berkeley8LosAhgeles:Uhiversityof Califorhia Fress.LEVl-STFAUSS, Claude. 1982 [1949]. As Es||o|o|as E/emen|a|es do Pa|en|escoFetrpolis: Vozes. ____ . 1955. 7|/s|es 7|o/cos. So Faulo: Martihs Fohtes.LOWlE, Fobert. 1948. The Northwesterh ahd Cehtral Ge". lh Julieh Steward (ed.) 7he Handbook o/ $oo|hame|/can /nd/ans. Washihgtoh: Smithsohiah lhstitutioh.MAlF, Lucy. 1962. P|/m/|/ve Gove|nmen|. Harmohdsworth: Fehguih Books.MlDDLETON, Johh. 1981. /oba|a Re///on: |/|oa/ and ao|ho|/|y amon an eas| a/|/can eo/e. Lohdoh: Foutledge 8 Kegah Faul.MOTA, Lcio T. (org.). 2001. Diaghstico Ethoambiehtal da Terra lhdgeha lva. Marihg: Uhiversidade Estadual de Marihg - Laboratrio de Arqueologia, Ethologia e Etho-Histria (Cohvhio UEM/FNMA).NlMUENDAJ, Curt. 1993. E|no|a//a e /nd/en/smo: sob|e os /a/nan os D/a/e-Xavan|e e os /nd/os do Pa|a. Campihas: Ed. Uhicamp.OLlVElFA,MariaCohceio.1996.OsCuradoresKaihgahgeaFecriaodesuasFrticas:estudodecasohaAldeia XapecOestedeSahtaCatariha.DissertaodeMestrado.Floriahpolis:UhiversidadeFederaldeSahtaCatariha, Frograma de Fs-Graduao em Ahtropologia Social.FADCLlFFE-BFOWN, A.F. 1973. Es||o|o|a e /onao na $oc/edade P|/m/|/va Fetrpolis: Vozes.FlCAFDO, Carlos Alberto (ed.). 2001. Povos /nd/enas no 0|as// 1996-2000. So Faulo: lhstituto Socioambiehtal.SAHLlNS, Marshall. 1993. Goodbye to Tristes Tropes: ethhography ih the cohtext of moderh world history". 7he !oo|na/ o/ Mode|n H/s|o|y 65(1): 1-25.SANTOS, Slvio C. dos. 1970. A /n|e|aao do /nd/o na $oc/edade Re/ona/:a /onao dos os|os /nd/enas. Floriahpolis: UFSC/lmprehsa Uhiversitria.SCHADEN, Egoh. 1957. Aco/|o|aao /nd/ena: ensa/o sob|e /a|o|es e |endnc/as da modana co/|o|a/ de ||/bos /nd/as em con|ac|o com o mondo dos b|ancos. So Faulo: Livraria Fioheira Editora/Editora da USF.SMlTH, Michael G. 1979. El Estudio Ahtropologico de la Folitica". lh Jos Llobera (org.) An||oo/o/a Po//|/ca. Barceloha: Editorial Ahagrama.TOMMASlNO, Kimyie. 1995. A Histria dos Kaihgahg da Bacia do Tibagi: uma sociedade J meridiohal em movimehto. Tese de Doutorado. So Faulo: Uhiversidade de So Faulo, Departamehto de Ahtropologia. TUFNEF, Victor e| a///. 1966. Po//|/ca/ An|h|oo/oy. New York: Aldihe Fublishihg Compahy.46Ficardo Cid FerhahdesAk1100SVElGA,Juracilda.1992.FevisoBibliogrficaCrticasobreOrgahizaoSocialKaihgahg".Cade|nosdoCEDNh8. Chapec (SC)._____ . 1994. Orgahizao Social e Cosmoviso Kaihgahg: uma ihtroduo ao parehtesco, casamehto e homihao em uma sociedade j meridiohal. Dissertao de Mestrado. Campihas: Uhicamp. _____ . 2000. Cosmologia e Frticas Fituais Kaihgahg. Tese de Doutorado. Campihas: Uhicamp.VlVElFOS DE CASTFO, E.B. 1986. A|awe|e: os deoses can/ba/s. Fio de Jaheiro: Jorge Zahar/Ahpocs._____ . 2000. Atualizao e Cohtra-Efetuao do Virtual ha Socialidade Amazhica: o processo de parehtesco". //ha 2(1): 9-52._____ . 1999. Ethologia Brasileira". lh Sergio Miceli (org.) O que Ler ha Cihcia Social Brasileira (1970-1995). Volume 1 Ahtropologia. So Faulo: Sumar/Ahpocs.4IAk1100SO 15" e o 23": polticos e polticas kaihgahgO "15" e o "23": poIticos e poIticas kaingang5 ( 6 802Este artigo apresehta a ahlise sobre a participao dos Kaihgahg da Terra lhdgeha lva has eleies de 2004 ho muhicpio de Mahoel Fibas (Farah). Nestas eleies as coligaes partidrias foram represehtadas pela disputa ehtre o 15" e o 23". Ehtre os ihdgehas as tehses facciohais acompahharam todo o processo eleitoral, o que implicou trahsformaes em seu ordehamehto poltico. Acompahhahdo a teoria ahtropolgica, este artigo discute as cohdies culturalmehte especficas ehvolvidas hos regimes de trocas kaihgahg, cohduzihdo a questiohamehtos sobre as defihies hativas de domhio pblico. Fara tahto, so cohfrohtados aspectos da orgahizao social e dimehses classificatrias da experihcia scio-poltica dos Kaihgahg do lva. FALAVFAS-CHAVE: Kaihgahg, facciohalismo, domhio pblico, uhidade de troca.The "15" and the "23": kaingang poIiticians and poIitics$% 6 7 5 $& 7This article ahalyses the participatioh of a Kaihgahg lhdiah group ih the 2004 muhicipal electiohs. These Kaihgahg lhdiahs live ih 7e||a /nd/ena /va/, seveh kilometers distaht from the city of Mahoel Fibas Farah, South Brazil. Throughouttheelectiohperiodthepoliticalpartiesbuiltupalliahcesrepresehtedbythelabels15"ahd23". AmohgtheKaihgahg,factiohaltehsiohsoccurredalohgthewholeelectoralprocess,implyihgihterhalpolitical rearrahgemehts. Followihg the ahthropological theory, this article discusses the culturally specific cohditiohs ihvolved ih the Kaihgahg exchahge system which, ih these electiohs, ehtailed a redefihitioh of their cohceptioh of public domaih. KEY WOFDS: Kaihgahg, politics, factiohalism, exchahge.Fecebido em 07/11/2006Aprovado em 12/12/2006