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1 Trabalho de Projecto Apresentado à Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, para Cumprimento dos Requisitos Necessários à Obtenção do Grau de Mestre em Gestão do Território, na Área de Especialização de Planeamento e Ordenamento do Território, Realizado sob a Orientação Científica do Professor Doutor Nuno Pires Soares e coorientação da Professora Doutora Maria Júlia Ferreira.

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Trabalho de Projecto Apresentado à Faculdade de Ciências Sociais e

Humanas da Universidade Nova de Lisboa, para Cumprimento dos Requisitos

Necessários à Obtenção do Grau de Mestre em Gestão do Território, na Área

de Especialização de Planeamento e Ordenamento do Território, Realizado

sob a Orientação Científica do Professor Doutor Nuno Pires Soares e

coorientação da Professora Doutora Maria Júlia Ferreira.

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DEDICATÓRIA PESSOAL

A história recente da Guiné-Bissau na procura da consolidação da democracia e os

desencontros neste processo ao longo das últimas 3 décadas levam-me a dedicar este

trabalho a todos os activistas, cidadãos comuns, técnicos e políticos que, honesta e

abnegadamente, continuam a lutar por um país melhor, por um território organizado,

com perspectivas de modernidade, dentro quer do espaço regional em que se insere,

quer do espaço lusófono, como porta para o resto do Mundo.

Dedico aos que já morreram, levando consigo o sonho de um dia poderem respirar o ar

da verdadeira independência, de verem a sua pátria transformada, com uma urbanização

de tipo Ocidental, onde os planos de urbanismo mais formalistas tornem preponderante

o alargamento dos antigos centros, com malha ortogonal ou radial e de forte expressão

geométrica e com todas as infra-estruturas básicas instaladas.

Dedico igualmente aos que continuam a lutar com sentimento e olhar críticos sobre tudo

o que continua a minar o verdadeiro arranque do país em vista do desenvolvimento, que

acreditam que é possível dar o salto e acompanhar os novos tempos dos avanços

tecnológicos e que o desenvolvimento sustentável possa ser uma realidade para um país

que ficou parado precisamente há trinta anos.

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AGRADECIMENTOS

A todos os que, de uma forma directa ou indirecta, contribuíram para este projeto;

Aos Professores Nuno Pires Soares e Maria Júlia Ferreira, orientadores oficiais deste

projecto, muito particularmente às Professoras Maria Júlia Ferreira e Margarida Pereira

pela consolidação da proposta de realizar um trabalho relacionado com o meu país e

aplicando os meus conhecimentos, de quase vinte anos na área da Cartografia e

cadastro, por se tratar de uma ferramenta fundamental para o Planeamento Físico do

Território.

Agradeço igualmente, e sem excepção, a todos os Professores deste departamento de

Geografia e Planeamento regional da Faculdade das Ciências Sociais e Humanas da

Universidade Nova de Lisboa que participaram no meu processo de aprendizagem e

preparação, nesses dois ciclos. Conscientes das minhas dificuldades como trabalhador

estudante, souberam acompanhar-me e sempre me encorajaram a não desistir.

Aos Professores Henrique Souto, Pedro Casimiro e Dulce Pimentel que,

incondicionalmente, se prontificaram a disponibilizarem-me alguns dos seus livros para

consulta e aprendizagem.

A todos os “irmãos”, companheiros e colegas que iniciaram comigo a licenciatura e que

contribuíram bastante para a minha caminhada nesses cinco anos de formação superior.

Uns mais que outros foram colegas muito próximos, contudo a todos devo facilidades

em matéria de inserção, a lealdade, o respeito e a compreensão que sempre

manifestaram.

Ao Instituto Nacional de Estatísticas e Censos (INEC) da Guiné-Bissau, ao Ministério

das Infra-estruturas, com todas as suas Direcções Gerais, à Direcção Geral das

Alfândegas, do Ministério das Finanças, aos delegados regionais pelas áreas de

planeamento, em Gabu e Quebo, aos governadores da região de Bafatá e do Sector de

São Domingos, ao Presidente da Câmara Municipal de Bissau, a todos agradeço os

documentos e informações disponibilizados.

A todos os outros, de quem recolhi disponibilidade, incentivos e apoios pontuais, aos

colegas de trabalho, à minha família, a todos o meu BEM-HAJAM.

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A REESTRUTURAÇÃO DA REDE URBANA E O SEU CONTRIBUTO PARA O

ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO DA GUINÉ-BISSAU

[TRABALHO DE PROJECTO]

VICTOR JOÃO CALI

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RESUMO

O objetivo principal deste projeto consiste em refletir sobre a rede urbana e o seu

contributo para o ordenamento do território da Guiné-Bissau e propor soluções para a

sua reestruturação como forma de facilitar as vias do desenvolvimento do país. É

sobejamente sabido que a Guiné-Bissau se encontra numa posição muito rudimentar em

termos de planeamento físico, ordenamento e urbanização das cidades, tal como muitos

países da região onde se insere e, por isso, são campos onde quase tudo está por fazer.

Em termos de atratividade, no contexto da competitividade inter-regional, a República

da Guiné-Bissau é dominada pelas actividades agro-silvo-pastoris, sendo nos últimos

quinze anos predominante a produção e comercialização da castanha de caju, no sector

primário, continuando o Estado com o controlo do terciário e da economia de mercado.

À luz da integração do país na Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental

(CEDEAO), o objectivo deste trabalho passa também por compreender a situação da

Guiné-Bissau, entre os países membros, em matéria de Ordenamento do Território,

sobretudo do sistema urbano, sabendo que, desde a independência, pouco se fez para o

melhoramento do habitat e das condições de habitabilidade das populações.

Os problemas sociocultural, étnico, religioso, acompanhados por uma alta taxa de

analfabetismo e de pobreza, sobretudo das populações camponesas, são também

abordados neste projecto, como consequências da inércia, por parte dos órgãos de

soberania, em matéria de urbanização; os tradicionais hábitos de viver junto das

explorações agrícolas ainda prevalecem em todos os grupos étnicos do país, em

particular em todo o litoral. É urgente inverter as tendências e iniciar, muito

rapidamente, a reestruturação da nossa rede urbana.

PALAVRAS-CHAVE: Guiné-Bissau, Ordenamento do Território, Rede Urbana,

Reestruturação.

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ABSTRACT

The main objective of this project is to reflect on the urban network and its contribution

to the planning of Guinea-Bissau and propose solutions for their restructuring in order

to facilitate the process of development of the country. It is well known that Guinea-

Bissau is in a position very rudimentary in terms of physical planning, land use and

urbanization of the towns, like many countries in the region where inserts and therefore

are fields where almost everything is done. In terms of attractiveness, in the context of

inter-regional competitiveness, the Republic of Guinea-Bissau is dominated by agro-

silvo-pastoral activities, being predominant in the last fifteen years the production and

commercialization of cashew nuts, in the primary sector, continuing the State with the

tertiary control and the market economy. In the light of the country's integration in the

economic community of West African States (ECOWAS), the objective of this work is

also to understand the situation in Guinea-Bissau, between Member countries in the area

of town planning, especially urban system, knowing that, since independence, little has

been done to improve habitat and the conditions of habitability of populations. The

sociocultural problems, ethnic, religious, accompanied by a high rate of illiteracy and

poverty, especially peasant populations, are also addressed in this draft, as consequences

of inaction on the part of the organs of sovereignty, in terms of urbanization; the

traditional habits of living together of farms still prevail in all ethnic groups in the

country, particularly around the coast. There is an urgent need to reverse trends and start

very quickly, the restructuring of our urban network.

KEYWORDS: Guinea-Bissau, regional planning, urban network, restructuring.

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Índice

1. INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 10

1.1- O Tema e a pertinência da escolha ...................................................................... 10

1.2- Os objectivos ....................................................................................................... 15

1.3- As metodologias .................................................................................................. 16

2. ENQUADRAMENTO GEOGRÁFICO E SÓCIO-ECONÓMICO ....................... 16

2.1- A Guiné-Bissau no contexto da África Subsariana Ocidental: problemas e

desafios ....................................................................................................................... 16

2.2- As dinâmicas socioeconómicas na Guiné-Bissau: debilidades e potencialidade 30

2.2.1. A diversidade étnica e cultural .......................................................................... 30

2.2.2. Os contrastes interior-litoral na base da diversificação cultural ....................... 34

2.2.3. Impactos da dependência da ajuda externa ....................................................... 38

2.2.4 A macrocefalia de Bissau: a desigual distribuição geográfica da população e das

fontes de riqueza ......................................................................................................... 41

2.3- Efeitos das alterações climáticas na distribuição da população e nos recursos

naturais ........................................................................................................................ 44

3. O SISTEMA URBANO GUINEENSE NOS ÚLTIMOS 50 ANOS ..................... 47

3.1 - Uma breve história sobre o povoamento da Guiné-Bissau................................. 47

3.1.1. O povoamento no território da Guiné-Bissau antes da independência ............. 48

a) O período anterior à “descoberta” pelos portugueses ............................................. 48

b) O povoamento da Guiné-Bissau no tempo dos portugueses .................................. 49

3.1.2. O povoamento da Guiné-Bissau no período após a independência .................. 56

a) Factores da distribuição geográfica da população e mudanças em curso ............... 59

b) A actual fase de crescimento urbano e a (sub) urbanidade..................................... 62

3.2 - O sistema urbano guineense: as principais regiões e aglomerados populacionais

do passado à actualidade ............................................................................................. 65

3.2.1. As regiões e a divisão administrativa actual ..................................................... 65

3.2.2. A hierarquia das aglomerações urbanas guineenses ......................................... 68

a) A capital do país e as capitais das oito regiões ....................................................... 71

b) As outras aglomerações urbanas............................................................................. 83

3.3 – As actividades urbanas e o funcionamento do sistema urbano: o peso da

informalidade .............................................................................................................. 84

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3.4 – Os problemas da gestão urbana: infra-estruturas, equipamentos colectivos, rede

viária e sistema de transportes .................................................................................... 87

4. PERSPECTIVAS E PROPOSTAS DE DESENVOLVIMENTO DO SISTEMA

URBANO GUINEENSE ............................................................................................ 91

4.1- A evolução do modelo de sistema urbano: papel da descentralização e das

acessibilidades ............................................................................................................ 91

4.2 – As necessidades de alojamento e de infra estruturas urbanas básicas nos pólos

do sistema urbano: os recursos financeiros e o reequilíbrio ambiental .................... 100

4.3- A intervenção na Cidade de Bissau, principal pólo do sistema urbano guineense

.................................................................................................................................... 93

4.4. Propostas para a melhoria do ordenamento e da gestão do território guineense,

tendo por base a reestruturação da rede urbana .......................................................... 97

5. CONCLUSÃO: o contributo da reestuturação do sistema urbano guinenense para a

reorganização do território, culturalmente complexo, e para a integração regional da

Guiné-Bissau ............................................................................................................ 110

BIBLIOGRAFIA ...................................................................................................... 110

ANEXOS .................................................................................................................. 118

SIGLAS E ACRÓNIMOS IMPORTANTES

APD - Ajuda Pública para o Desenvolvimento

BCEAO – Banco Central dos Estados da África Ocidental

CEDEAO – Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental

CMB – Câmara Municipal de Bissau

CE – Comunidade Europeia

DENARP – Documento de Estratégia Nacional para Redução da Pobreza

ECOWAS - Economic Community of West African States

FMI – Fundo Monetário Internacional

GUC – Gabinete de Urbanização Colonial

GUU – Gabinete de Urbanização do Ultramar

IDH – Índice de Desenvolvimento Humano

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IHPC – Índice Harmonizado de Preço no Consumido

INEC – Instituto Nacional de Estatísticas e Censos

INEP – Instituto Nacional de Estudos e Pesquisa

IPAD – Instituto Português de Ajuda para o Desenvolvimento

MOPCU – Ministério das Obras Públicas Construções e Urbanismo

MU – Ministério do Ultramar

NEPAD – Nova Parceria para o Desenvolvimento em África

OHADA – Organização para a Harmonização do Direito dos Negócios em África

ONG – Organismo Não Governamental

ONU – Organização das Nações Unidas

PAIGC – Partido Africano da Independência da Guiné e Cabo Verde

PALOP – Países Africanos da Língua Oficial Portuguesa

PASI – Programa de Ação Social e Infraestrutura

PRS – Partido de Renovação Social

PIB – Produto Interno Bruto

PIC – Programa Indicativo da Cooperação

PMBB – Projeto de Melhoramento de Bairros de Bissau

PNUD – Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento

POS – Planos de Ocupação do Solo

SIDA – Swedish International Development Authority

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1. INTRDUÇÃO

1.1- O Tema e a pertinência da escolha;

O tema “REESTRUTURAÇÃO DA REDE URBANA E O SEU

CONTRIBUTO PARA O ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO DA GUINÉ-

BISSAU” implica, por um lado, um trabalho vasto e complexo por incidir sobre um país

com profundos problemas em matéria de Urbanismo e Ordenamento, mas por outro, um

grande desafio, exatamente por esses motivos. As principais palavras-chave estão

contidas no próprio título: Reestruturação, Rede Urbana, Ordenamento do Território e

Guiné-Bissau. Na utilização dos conceitos centrais reportar-nos-emos sobretudo ao

projeto PROVINCIA DA GUINÉ, 1973, MENDY, 2006 e BALDÉ, 2008. A escolha da

temática do projecto resultou de incentivos feitos por alguns professores e vem na

sequência de alguns trabalhos práticos levados a cabo ao longo da licenciatura, que

proporcionaram uma reflexão sobre vários problemas que dificultaram o arranque do

Ordenamento do Território guineense e da urbanização integrada em figuras de

planeamento definidas e reconhecidas oficialmente

Da pesquisa feita sobre a Guiné-Bissau, sobretudo online, nomeadamente em

repertórios de teses e dissertações e documentação de Centros de Estudos Africanos,

concluímos que as publicações versam, quase sempre, questões políticas, sociais e

económicas (a governação, a pobreza, os níveis de desenvolvimento, a saúde e a

educação) e que as preocupações do ordenamento estavam praticamente ausentes.

Assim, a temática que nos propomos estudar parecia ser de inquestionável pertinência.

Nas instituições oficiais e respetivos programas de ação (nomeadamente, ONU,

NEPAD, Parceria Europa-União africana, CEDEAO, INEC-Guiné, INEP) encontramos

documentos interessantes para enquadrar esta reflexão.

Esta reflexão foi inspirada, em 1º lugar, na obra, ainda do período colonial,

PROVÍNCIA DA GUINÉ, 1973, Ordenamento Rural e Urbano na Guiné Portuguesa,

que manifesta um esforço interessante no sentido da reorganização territorial deste

território (apresentava 61 centros populacionais com plano de zonamento aprovados e

21 por aprovar, como forma de elevar o nível de vida e o bem-estar das pessoas). Em 2º

lugar, na tese de doutoramento de François Mendy, 2006, La Ville de Bissau:

Amenagemnet et Gestion Urbaine, que abordou a problemática de planeamento e das

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carências em Bissau e, em 3º lugar, na dissertação de mestrado de Saico Baldé, 2008,

Buba-Quebo: Corredor de Desenvolvimento no Sul da Guiné-Bissau, que estudou uma

área específica mas enquadrando-a no conjunto do país.

A urbanização intensiva, devida ao grande aumento dos quantitativos da

população, em curso nos países em desenvolvimento, nomeadamente nos que

constituem a África Ocidental, onde se situa a Guiné-Bissau, torna ainda mais pertinente

esta abordagem sobre o sistema urbano.

Esta urbanização, acelerada e intensiva, tem vindo a exercer uma pressão muito

forte sobre os recursos naturais ainda disponíveis, apelando à intervenção no sentido de

inverter situações que podem comprometer a nossa sobrevivência. Segundo um relatório

divulgado a 13 de Março de 2007 pela ONU (Organização das Nações Unidas), o

Mundo terá um aumento de 2,5 mil milhões de habitantes nos próximos 43 anos,

passando dos 6,7 mil milhões, em 2007, para alcançar os 9,2 mil milhões em 2050,

passando os países em desenvolvimento dos 5,4, em 2007, para 7,9 mil milhões de

habitantes, em 2050. Os motivos apresentados para esse aumento são os saldos

fisiológicos e a longevidade (aumento da esperança de vida) que traduz um conjunto de

condições em que se destaca a melhoria no acesso à saúde, nomeadamente ao

tratamento do VIH/SIDA. (http://www1.folha.uol.com.br, 20-09-2010).

O êxodo do campo para a cidade, sem que esta oferecesse condições de

acolhimento e de emprego, exerceu grande pressão sobre a organização urbanística dos

centros populacionais desenvolvidos já no período colonial. Nos arredores dos “centros

asfaltados” da época colonial, todos os dias surgem bairros sobrelotados, sem condições

de habitabilidade, ou estendem-se progressivamente os existentes. No entanto, segundo

Augusto Trindade (2000: 164), estas “migrações são indiscutivelmente um fenómeno

muito importante na vida como nas relações entre os povos. Por serem o resultado da

articulação entre vários factores, onde as desigualdades de desenvolvimento e as

perturbações políticas endémicas de certas regiões sobrepõem, repercutindo-se muitas

vezes de forma negativa no desenvolvimento”.

Nos países de forte aumento demográfico e com fracos recursos financeiros, a

situação tenderá a piorar porque os governos não conseguirão garantir uma necessária

equidade na gestão urbana e na distribuição dos recursos, podendo-se agudizar ainda

mais as diferenças socioeconómicas existentes. Por isso, muitos países em

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desenvolvimento, principalmente os de descolonização ainda recente, têm vindo a

adotar novas políticas em matéria da organização e planeamento do território (ou

pretendem fazê-lo), como forma de ultrapassar alguns constrangimentos e

irracionalidades na ocupação e transformação de uso do solo e apostar na preservação

do meio ambiental.

Acreditamos que a definição de uma rede urbana adequada ajudará a programar

as outras redes que fazem parte de um território estruturado, como sejam as dos

transportes e dos equipamentos colectivos e, por isso, decidimos fazer esta reflexão em

torno do sistema urbano tendo em vista o ordenamento do território guineense.

Desde a independência, a expansão das povoações na Guiné-Bissau tem sido

dominada pela informalidade, levando à “luta pela urbanização”; esta luta tornou-se

uma das principais apostas em quase todos os países do Terceiro Mundo nos últimos

tempos, particularmente em toda a África subsariana, como uma das medidas para a

redução da pobreza, controlo de doenças endémicas, como a malária, e de outros

factores que comprometem o seu desenvolvimento sustentável; por esse facto, iremos

abordar a temática da “informalidade urbana” num dos subcapítulos deste trabalho.

Na Guiné-Bissau os problemas urbanos são muito graves e estão associados a

um dos mais baixos níveis de desenvolvimento humano e, por isso, exigem aos órgãos

de soberania daquele país, uma tomada de consciência e a mudança de paradigma no

que se refere à gestão urbana e à utilização dos recursos naturais não renováveis.

Depois do golpe militar de 14 de Novembro de 1980, o país nunca mais

conheceu um período de paz suficiente para se poder organizar e acompanhar os

parceiros económicos na dinamização da região onde se insere, situando-se hoje nos

últimos três lugares de pobreza no ranking mundial.

No contexto dos países lusófonos a Guiné-Bissau afasta-se negativamente em

relação aos índices de desenvolvimento dos outros: ocupa o 173º lugar no ranking com

um IDH de, apenas, 0.349; Portugal tem o IDH mais elevado, contudo mundialmente

ocupa apenas o 27º lugar, tendo um IDH de 0.904; no 69º lugar está o Brasil com o IDH

de 0.792; no 105º Cabo Verde com 0.722; no 127º São Tomé e Príncipe, 0.607; 142º

Timor-Leste, 0.512; 161º Angola, 0.439; 168º Moçambique, 0.390; (vozdipovo-

online.com; Cabo-Verde, 29-05-2009).

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Nas últimas décadas da era colonial pretendeu-se desenvolver um pouco mais

este território, nomeadamente através do Estatuto dos Indígenas das Províncias da

Guiné, Angola e Moçambique, apresentado “em 20 de Maio de 1954, regulamentado

pelo Decreto-Lei n.º 39.666. No seu Capítulo III, artigo 56, estavam definidas as

condições para que o “indígena” alcançasse a condição de cidadão: ter mais de 18 anos;

falar correctamente a língua portuguesa; exercer profissão, arte ou ofício de que aufira

rendimento necessário para o sustento próprio e das pessoas de família a seu cargo, ou

possuir bens suficientes para o mesmo fim; ter bom comportamento e ter adquirido a

ilustração dos hábitos pressupostos para a integral aplicação do direito público e privado

dos cidadãos portugueses; não ter sido notado como refractário ao serviço militar nem

dado como desertor” (ANDRADE, M. 1976) citado por (FRANCO, 2009, 75) decreto

esse que foi difícil implementar na Guiné porque até a presente data, ainda se regista

uma alta taxa de analfabetismo. Sob olhares de vários especialistas relativamente a

resistência guineense, “René Pélissier considerou a cobrança de impostos como causa

essencial das principais acções militares, no período de 1841 a 1936 e constatou que a

“fiscalidade” vinha em primeiro lugar. Sistematizando para esse período, um total de 89

intervenções, a cobrança de impostos e a pressão administrativa causaram o maior

número de conflitos, com cinquenta e três casos (59,6%). As demais causas estavam

assim distribuídas: defesa dos vassalos contra a repressão (treze ocorrências ou 14,6%);

pirataria ou pilhagem (oito casos ou 9%); a oposição à expansão dos fulas (seis

ocorrências ou 6,6%); hostilidade comercial (cinco casos ou 5,6%); insatisfação dos

grumetes (três ocorrências ou 3,5%); combate ao trabalho forçado (um caso ou 1,1%).

(…) A Guiné, observou-se “um quase contínuo estado de guerra até os anos 20, apenas

interrompido esporadicamente: 1893, 1896, 1898-99, 1905-06, 1910-11, 1916”

(FRANCO, 2009, 50-51). Tudo isso trilhou o que até hoje se constata na Guiné em

termos de urbanismo e da promoção social.

Em toda a extensão do território Guineense, a par da Capital Bissau, apenas

Bolama e Bafatá (dois antigos Centros Administrativos) tiveram um tratamento um

pouco digno de centros urbanos com alguns troços da rede de água canalizada. Apesar

dos esforços que as duas entidades com competências na gestão territorial e urbana têm

estado a despender, Ministério das Obras Públicas Construção e Urbanismo (MOPCU)

e a Câmara Municipal de Bissau (CMB), ainda está quase tudo por fazer em matéria de

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urbanismo, planeamento e ordenamento do território, quer ao nível da definição da rede

urbana nacional quer da urbanização efectiva e da gestão urbana, ao nível local.

“Depois de um Plano Geral Urbanístico de Bissau, ainda da época colonial, que

contemplava um território urbanizado para cerca de 20.000 habitantes, no princípio dos

anos 1970, só nos meados dos anos 1990, ou seja, cerca de 20 anos mais tarde e com

uma população urbana de quase 300.000 habitantes, o governo fez aprovar o novo Plano

Director de Bissau e o respectivo Regulamento Geral da Construção e Habitação, assim

como a Lei do Ordenamento Territorial e Urbano. Relativamente aos principais centros

urbanos, nomeadamente para as Sedes Regionais, o Governo mandou elaborar Planos

de Ocupação do Solo (POS) que deveriam servir como instrumentos de base no uso e

ocupação do solo das respetivas cidades” (RAMOS, 2005, 148).

No entanto, aquele pacote legislativo nunca entrou em vigor, pelo que não se

aproveitou a sua operacionalidade para o processo de gestão urbanística nem para o

desenvolvimento do sistema urbano Guineense em geral. Por isso nos finais dos anos

oitenta e ao longo da década de noventa do século passado, viveu-se na Cidade de

Bissau e nos principais centros urbanos regionais que compõem a rede urbana nacional,

um intenso crescimento urbano e de forma desordenada, um crescimento que aumentou

a pressão sobre os recursos e pôs em causa a capacidade de carga da Capital, levando à

proliferação dos bairros precários nos seus arredores e pondo em risco o equilíbrio

ambiental e o bem-estar das populações.

No capítulo das políticas externas, a Guiné-Bissau tem beneficiado de ajudas

importantes para reverter a situação, nomeadamente de Portugal no contexto da

cooperação bilateral; o Programa Indicativo da Cooperação Portugal/Guiné-Bissau (PIC

2007-2010), que assume os Objectivos de Desenvolvimento do Milénio (ODM) e tendo

em conta o Documento de Estratégia Nacional de Redução da Pobreza (DENARP) e o

Plano de Combate ao Narcotráfico, traduz essas preocupações, concentrando-se

sectorialmente nos seguintes eixos:

a) Boa Governação, Participação e Democracia;

b) Desenvolvimento Sustentável e Luta contra a Pobreza.

Mas a ajuda externa só pode surtir efeitos no desenvolvimento da Guiné-Bissau

se resultar da força de vontade por parte de Bissau, para combater as desigualdades e

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melhor gerir os recursos disponíveis. Este trabalho pretende ser uma pequena ajuda para

a boa governação no que se refere ao território, sobretudo “urbano”, o que envolve

princípios de participação pública e de democracia, e para o desenvolvimento

sustentável, pois se conseguirmos uma rede urbana equilibrada, poderemos controlar

melhor o desgaste dos recursos naturais não renováveis.

1.2- Os objetivos

Atendendo ao estado em que se encontra o sistema urbano guineense, com o

trabalho deste projecto pretende-se:

a) - Dar um contributo para os compromissos que se advinham em matéria de

Planeamento Territorial;

b) – À luz da integração do país na Comunidade Económica dos Estados da

África Ocidental (CEDEAO), compreender a situação da Guiné-Bissau, entre os países

membros, em matéria de Ordenamento do Território, sobretudo do sistema urbano;

c) – Propor ou reformular o modelo de ordenamento do sistema urbano

adequando-o à realidade sociocultural, étnica e religiosa guineense.

Como objetivos específicos do Projecto, pretende-se:

a) - Efectuar um levantamento das potencialidades e debilidades do território,

das oportunidades e ameaças que possam existir, principalmente nos grandes centros

urbanos;

b) - Valorizar a utilização da Cartografia e do Cadastro no processo de gestão

territorial, nomeadamente no conhecimento e controlo, a urbanização anárquica dos

novos bairros (sobretudo em Bissau) e na execução dos instrumentos de gestão

territorial pela Câmara Municipal de Bissau;

c) - Analisar os impactes ambientais em relação à falta de ordenamento de

território, no que se refere sobretudo à gestão urbana e ao sistema de transportes, nas

oito regiões do país;

d) - Propor a reformulação do sistema urbano e a utilização das novas

tecnologias de informação como ferramentas de análise e de controlo dos usos do solo,

potenciando, assim, fatores do desenvolvimento sustentável

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1.3- As metodologias

Da revisão bibliográfica, ao trabalho de campo e ao uso das tecnologias de

informação e cartografia no processo de planeamento territorial e na gestão urbana, a

pesquisa a levar a cabo irá apoiar-se numa metodologia que consistirá em:

a) - Revisão bibliográfica sobre a informação de referência (livros, projectos,

revistas ou outros documentos) sobre os problemas e os modelos de intervenção nos

diferentes tipos de sistemas urbanos na África subsariana e, em particular, o da Guiné-

Bissau, para compreender a situação desta em matéria de Planeamento e Ordenamento

do Território.

b) - Recolha da documentação referente ao último recenseamento geral da

população e habitação, realizado pelo INEC/Guiné-Bissau, em 2008 e os dados sobre a

cartografia em uso para fins cadastrais e como base do processo de Gestão do Território.

c) - Levantamento cartográfico da situação dos principais centros urbanos,

nomeadamente dos perímetros urbanos, avaliando o peso do crescimento informal em

torno deles.

d) - Realização de trabalho de campo com a deslocação ao país, para recolha de

informações indispensáveis para o projecto, junto das entidades e instituições

responsáveis pelo Planeamento e Ordenamento do Território, em matéria sobretudo do

sistema urbano, da sua organização e gestão e dos instrumentos considerados adequados

para uma intervenção eficaz e adequada às condições sociais, económicas, culturais e

políticas do país.

2. ENQUADRAMENTO GEOGRÁFICO E SÓCIO-ECONÓMICO

2.1- A Guiné-Bissau no contexto da África Subsariana Ocidental: problemas e

desafios;

A reflexão sobre a questão urbanística das principais cidades que compõem a

rede urbana guineense neste trabalho, implica antes de mais, apresentar algumas notas

de enquadramento da situação geográfica desse país Guiné-Bissau, conceitos e teorias;

para tal, é sugestiva uma citação das Nações Unidas. “A Guiné-Bissau encontra-se

situada na costa ocidental de África (coordenadas geográficas: 11º 51´N, 15º 35´W),

com uma área de 36.120 Km2 (13.946 milhas quadradas) sendo que 10% do território é

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periodicamente submerso por águas pluviais. Em frente á parte continental encontra-se

o Arquipélago dos Bijagós e várias outras ilhas costeiras, incluindo Jeta, Bolama e

Melo. Estende-se por 336 km (209 mi) N-S e 203 km (126 mi) E-W. A Guiné-Bissau

faz fronteira ao Norte com o Senegal, a Este e Sudeste com a Guiné-Conacri e Oeste e

Sudoeste pelo Oceano Atlântico, com uma extensão fronteiriça de 1,074 km (667 mi) ”

(http://www.onu-guineebissau.org/profil.htm, 21-09-2010). Ainda sobre a localização

geográfica, uma outra nota diz que “A atual Guiné-Bissau corresponde a um pequeno

território, afinal o remanescente das antigas áreas de influência portuguesa, muito mais

vastas antes do século XIX. Da Gorea e Casamansa, no Senegal e Gâmbia, e ao Golfo

da Guiné com as suas ilhas, inúmeras possessões lusas se foram perdendo até

Oitocentos. Os núcleos urbanos com significado neste último período serão pois apenas

os incluídos no actual território da Guiné-Bissau”, (Fernandes e Janeiro, 2005, 30).

Quanto aos conceitos e teorias, poderão encontrar ao longo deste trabalho,

conceitos como “reestruturação”, “rede urbana” e “ordenamento do território” que

servirão de suporte teórico por aquilo que se pretende desenvolver. A “reestruturação” é

um termo que segundo o dicionário da língua portuguesa da Porto Editora, significa

restruturação, sendo esta por sua vez, o ato ou efeito de restruturar; tornar a estruturar;

dar nova estrutura a; remodelar; reformar etc.; Ainda segundo o dicionário online de

Português, é sinónimo de reforma, regeneração, renovação, reorganização e

restruturação, podendo ter outro significado noutras áreas do saber. Ou seja, o que se

pretende levar concretizar neste trabalho.

A “rede urbana” antes de mais nada, o termo “rede” que segundo o dicionário da

língua portuguesa da Porto Editora, e, entre muitos outros significados, (…) é totalidade

dos circuitos e dispositivos de comunicação que permitem a ligação entre equipamentos

terminais de dados. Rede urbana é um conceito muito explorado dentro das ciências

sociais e humana, arquitetura e urbanismo, podendo designar segundo Teresa Barata

Salgueiro, 1992, “ao conjunto de lugares e respetivos territórios adjacentes ligados por

relações de ordem hierárquica a um centro urbano principal”. Um artigo brasileiro sobre

a geografia acrescenta que “a rede urbana é formada pelo sistema de cidades, quer

dentro do território de uma região ou de cada país, interligadas umas às outras através

dos sistemas de transportes e de comunicações, pelos quais fluem pessoas, mercadorias,

informações etc.” (http://www.frigoletto.com.br, 19-3-2012).

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Por fim, “ordenamento do território”, um outro termo que tem vinda a ganhar

espaço na problemática de planeamento territorial, muito embora, “não existem grandes

reflexões sobre o que abrange este conceito” (ALVES, 2007, 48). De seguida, entende

que “ordenamento do território é um neologismo, cujo significado etimológico tem a

ver com todas as temáticas que dizem respeito à evolução, conceção e gestão da

organização do território” (Idem). Muitas outras obras se seguiram com a de Merlin e

Choay (1996) citado em, (ALVES, 2007, 48), que considera ordenamento do território

“um processo que tem em vista a disposição no espaço e no tempo dos homens e das

suas atividades, dos equipamentos, as infraestruturas e os meios de comunicação que

eles podem utilizar, numa visão prospetava e dinâmica, tendo em conta as

condicionantes naturais, humanas e económicas”.

Jorge Gaspar, 1995, p.5 citado em (http://www.igeo.pt/conceito_ot.org.pdf, 19-

03-2012), sublinha que “o ordenamento do território é a arte de adequar as gentes e a

produção de riqueza ao território numa despectiva de desenvolvimento”. Mas ainda

sobre este tema, um documento oficial muito relevante, a Carta Europeia do

Ordenamento do Território (Conselho da Europa, 1988, p. 9 e 10) citado pelo mesmo

artigo, diz que o ordenamento do território “ é a tradução espacial das políticas:

económica, social, cultural e ecológica da sociedade. (…) É, simultaneamente, uma

disciplina científica, uma técnica administrativa e uma política que se desenvolve numa

perspetival interdisciplinar e integrada tendente ao desenvolvimento equilibrado das

regiões e à organização física do espaço segundo uma estratégia de conjunto”. De

acordo com estes pressupostos, entende que “o ordenamento do território deve ter em

consideração a existência de múltiplos poderes de decisão, individuais e institucionais

que influenciem a organização do espaço, o caracter aleatório de todo o estudo

prospetivo, os constrangimentos do mercado, as particularidades dos sistemas

administrativos, a diversidade das condições socioeconómicas e ambientais”.

Com base nestas teorias apresentadas, a rede urbana guineense apresenta ainda

muitas lacunas na sua conectividade e definição hierárquica. Sabemos que no contexto

africano, a Guiné-Bissau insere-se numa região de África que até meados dos anos 50

do século passado ainda fazia parte das regiões mais pobres do mundo, onde se pode

naturalmente encontrar um número de “cidades urbanizadas” muito reduzido. Esta

tendência só começa a inverter-se a partir de 1990, altura em que a região passa por um

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acentuado aumento da população urbana, o que fez com que em 2000, já contava com

muitas cidades onde vivem mais de 50.000 habitantes cada, conforme os estudos das

Nações Unidas, ver a figura-1. Qualquer país daquela comunidade da sub-região

conserva as características próprias, problemas e desafios, sendo alguns mais similares

conforme as políticas herdadas dos seus colonizadores. Relativamente aos costumes e

modo de vida, quase, se não todos eles, comungam da mesma realidade; muitos

apresentam ainda altas taxas de analfabetismo, pobreza profunda, falta de segurança,

equidade e bem-estar social.

No capítulo da hierarquia das cidades no sistema urbano, nesta região de África,

nota-se a existência de um considerável número de Cidades onde vivem entre 2.000.000

a 4.500.000 habitantes, mais do que em qualquer outra sub-região do continente.

Existem três Cidades com 4.500.000 a 10.000.000 habitantes e uma Mega Cidade de

Lagos que alberga entre 10.000.000 a 18.500.000 habitantes. Essa dinâmica

demográfica pode ser reflexo de muitas situações desde a viragem no capítulo das

estruturas familiares, do saldo migratório por um lado e por outro, o acesso às novas

tecnologias no controlo dos efeitos da degradação climática e do melhoramento das

condições básicas da vida das populações.

Apesar das alterações climáticas a nível global e em particular, do ameaçador

avanço do clima saheliano, que já afeta alguns países da sub-região, particularmente os

situados mais a norte (Mauritânia, Mali, Níger tal como as regiões norte do Senegal e

Burkina Faso), no cômputo geral, trata-se de uma região geograficamente bem situada.

Ou seja, para além da influência e das mais-valias que se pode obter com o Rio Níger, a

região ainda apresenta muitos países com o índice de pluviosidade muito significativo.

Possui grandes extensões de reservas florestais, solos férteis para a agricultura e é

detentora de muitos recursos endógenos pelo que as grandes e médias cidades podem

funcionar como importantes polos de atracção para o Investimento Estrangeiro a fim de

beneficiar as populações residentes.

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Fig.1: Cidades africanas com população acima dos 50.000 habitantes em 2000

Fonte: UNHABITAT, 2010

A Guiné-Bissau é um país da sub-região da África Ocidental constituída esta por

um conjunto de 17 países incluindo Santa Helena: Benim, Burkina Faso, Cabo Verde,

Costa de Marfim, Guiné Conakry, Guiné-Bissau, Gambia, Gana, Libéria, Mali,

Mauritânia, Níger, Nigéria, Santa Helena, Senegal, Serra Leoa e Togo. O Mesmo

documento das Nações Unidas sobre a África, declara que em 1950, aquela sub-região

apenas contava com 6,6 milhões de indivíduos a viverem nas Cidades. Alguns anos

mais tarde tudo mudou, obrigando a taxa de crescimento da população urbana

aproximar-se da média continental, situando-se em 92,1 milhões de habitantes em 2000,

prevendo que tenha atingido 137,2 milhões em 2010. Sobre esse assunto, podemos

afirmar que “a África Ocidental constitui um espaço imenso, de cerca de 6,7 milhões de

km2, com uma população estimada em quase 200 milhões de habitantes. O incremento

demográfico é rápido em função de taxas de crescimento anual situadas acima dos2,5%

que fazem prever a população, em condições normais, duplique nos próximos 20 anos,

passando os 400 milhões” (NÓBREGA, 2003: 37).

Prevê-se um aumento da população urbana na ordem dos 6.24% para um período

de dez anos (2020 a 2030), caso mantenha aquele ritmo de crescimento. Ainda com base

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nas estimativas do Observatório das Nações Unidas para a África, aquela região, da

África Ocidental, poderá tornar-se predominantemente urbana, podendo atingir 195.3

milhões de citadinos até 2020, sendo que até 2050, essa cifra poderá atingir os 427.7

milhões, equivalente 68,36% do total da população. A figura-2 mostra os Estados que

compõem a região da África Ocidental sem Santa Helena.

Fig. 2: Estados da África Ocidental (2011)

Fonte: http://www.google.pt/imgres?q=afrique+de+l%27ouest (24-10-2011)

No contexto da África Subsaariana Ocidental, a Guiné-Bissau é membro da

Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO), uma organização

de integração económica regional que engloba quinze países de África Ocidental:

Benim, Burkina Fasso, Cabo Verde, Costa de Marfim, Gâmbia, Gana, Guine Conakry,

Guiné-Bissau, Libéria, Mali, Níger, Nigéria, Senegal, Serra Leoa e Togo.

Dizer que essa comunidade desempenha hoje um papel muito importante na

economia internacional, uma vez que oito dos seus países membros (Benim, Burquina

Faso, Costa do Marfim, Guiné-Bissau, Mali, Níger, Senegal e Togo) integram por sua

vez a União Económica e Monetária do Oeste Africano (UEMOA) partilhando em

comum a mesma moeda (franco CFA) com a indexação ao euro, também a moeda de

uma economia hoje em dia mais integrada entre Estados independentes, a União

Europeia e a sua zona do euro. Esta é, no entanto, uma realidade que mostra que “ao

nível do relacionamento externo, a Guiné-Bissau privilegia as relações com os países da

África Ocidental, quer a nível bilateral, nomeadamente com o Senegal, Guiné-Conakry

e Nigéria, quer a nível multilateral, através de múltiplas organizações como a UEMOA

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e a Comunidade Económica de Desenvolvimento da África Ocidental (CEDEAO).

Desde a adesão à UEMOA, a Guiné-Bissau tem desenvolvido esforços com vista à

efectiva implementação de leis adotadas pelos vários órgãos da União nos capítulos

monetário, institucional e económico. Estas medidas são complementadas por outras no

âmbito da estrutura da Organização para a Harmonização do Direito dos Negócios em

África (OHADA) e da Nova Parceria para o Desenvolvimento de África (NEPAD) “

(PIC 2007-2010).

Sobre as tendências da população urbana Quadro-1, a África Ocidental detinha

em 1950, 6.629.000 habitantes nas Cidades, correspondentes a 9,79% da população

total, sendo esse valor de 14,40%, no total do continente Africano. Cinquenta anos mais

tarde, ou seja, em 2000, a população urbana passou dos 6.629.000 habitantes para

92.162.000 habitantes, equivalente a 38,76 %, ultrapassando os 35,95% verificados no

total do continente para o mesmo período. A variação aritmética da população é, em

média, de 5.79%, de dez em dez anos, prevendo-se que esse valor aumente para 6,09 %,

até 2010. Caso se mantenha as tendências apresentadas, a população desta sub-região

poderá atingir os 427.675.000 habitantes, em 2050. O estudo mostra ainda, em termos

percentuais, a tendência para o aumento populacional na sub-região, situando-se acima

do esperado para toda África, desde 1990.

Quadro-1: Tendências da População Urbana na África Ocidental, 1950-2050.

Fonte: UNHABITAT, 2010, 61.

Quanto á tendência de urbanização por países da sub-região, a Guiné-Bissau

posiciona-se no grupo dos que têm as mais baixas percentagens da população urbana

ver o Quadro-2. Segundo os dados, a Guiné-Bissau contava com mais de 10% da sua

população a viver nos centros urbanos, posicionando-se abaixo de oito países e acima de

outros oito; vinte anos mais tarde, em 1970, ou seja quatro anos antes da sua

independência, já perdia o nono lugar, posicionando abaixo de doze países e acima de

apenas quatro (Burkina Faso, Mali, Mauritânia e Níger). Em 2000 apenas supera

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Burkina Faso e Níger, sendo ultrapassada por catorze países, tendência que se previa

manter até 2010. Para o ano 2050, a tendência mostra que a Guiné-Bissau será

ultrapassada por Burkina Faso, passando para a penúltima posição apenas acima de

Níger que atingirá os 36,81%, mas mesmo assim, a sua população urbana ficará nos

52,74 % no total.

Atendendo as desproporcionalidades territoriais e populacionais existentes entre

os países da região, essas tendências analisadas reflectem a realidade que se vive pelo

menos na Guiné-Bissau do pós independência, quanto a matéria de urbanização e do

planeamento das cidades. Pelo facto de ser um país territorialmente pequeno,

teoricamente poder-se-ia supor que seja de fácil urbanização, desde que se possa contar

com a boa vontade dos seus governantes. Porém, não foi o que se viu, porque outras

estratégias mereceram mais atenção dos sucessivos governos em detrimento da

implementação de uma política de cidades que passe pelo desenvolvimento sustentável.

Quadro - 2: Tendência da Urbanização nos países da África Ocidental, 1950-2050

(%)

Fonte: UNHABITAT, 2010, 100.

No âmbito da hierarquia das Cidades, como se pode ver ao analisar o Quadro-3,

a Guiné-Bissau tinha apenas duas delas com mais de 10.000 habitante, relativamente ao

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ano 2000, todavia, segundo os últimos dados do Instituto Nacional de Estatísticas e

Censos (INEC) sobre o recenseamento geral da população e habitação em 2009, a

Guiné-Bissau já ultrapassou o valor previsto para 2020 pela ONU, passando a contar

com nove das suas cidades com mais de 10.000 habitantes cada.

Quadro - 3: Número de Cidades com a população acima de 10.000 (1960-2020)

Fonte: UNHABITAT, 2010, 103.

A Nigéria foi sempre o país mais populoso da sub-região. Já contava com 133

Cidades com mais 10.000 habitantes em 1960; vinte anos depois, quase que duplicou a

cifra, chegando a 438, em 2000. A previsão para esse país aponta para 574 Cidades com

mais de 10 mil habitantes, até ao ano 2020. Aliás, a Nigéria é o país mais populoso de

África e o oitavo mais populoso do Mundo. O Gana e Costa de Marfim são outros dois

países mais homogéneos quanto ao número de cidades com a população acima dos

10.000 habitantes, posicionando-se em segundo e terceiro lugar respectivamente.

Seguem-se Benim e Burkina Faso que também ocupam a quarta e quinta posição

respectivamente. Cabo Verde, Gâmbia, Guiné-Bissau e Mauritânia continuam a

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constituir o grupo dos países com menos cidades com população acima dos 10.000

habitantes.

Os estudos realizados sobre as dinâmicas da população urbana dessa sub-região

apontavam para uma possível duplicação até 2020. No entanto, essa previsão poderá ser

antecipada graças ao rápido crescimento populacional na região junto ao golfo da

Guiné, com tendência para seguir o ritmo de crescimento das cidades de Lagos

(Nigéria) e Kinshasa (República Democrática de Congo, que embora pertença a sub-

região da África Central, é uma cidade com um crescimento populacional muito forte).

Ou seja, as conurbações junto ao golfo da Guiné constituem uma sub-região com

potencialidades de, em breve tornar-se anfitriã de duas maiores aglomerações urbanas

em África, caso se mantiver as intensas concentrações demográficas já referidas de

Lagos e Kinshasa. Esta é uma realidade subjacente, porque com a rápida subida destas

duas grandes aglomerações ao topo da hierarquia urbana africana, as pequenas ações de

crescimento demográfico das cidades abaixo de um milhão de habitantes em primeiro

lugar, acabarão por serem absorvidas e em seguida as de 500.000, onde se situam cerca

de três quartos do total daquelas que preveem algum crescimento, conforme o relatório

das Nações Unidas.

Não se esquecer que dependendo das potencialidades históricas, políticas,

culturais e das oportunidades de desenvolvimento, as grandes cidades da África

Ocidental manifestam tipos de urbanização bem diferentes ver a figura-3. Exceptuando

as regiões desérticas do Mali, Mauritânia e Níger, o estudo mostra ainda que, em termos

gerais, a sub-região tem vindo a crescer de uma forma muito acelerada a partir dos

últimos trinta anos. O mapa mostra igualmente quatro subgrupos ou sub-regiões com

cidades relativamente homogéneas entre si, em termos de urbanização. A área número

um, na legenda, corresponde àquela cuja mais alta densidade populacional da África

Ocidental, sendo a Nigéria o principal país com mais centros urbanos que constituem a

rede de cidades dessa área. Em segundo lugar, a região que se estende ao longo do golfo

da Guiné, a área número dois na legenda, com uma densidade populacional urbana

inferior a primeira área, apresentando no entanto uma razoável rede de cidades

importantes na hierarquia urbana da sub-região.

A área número três na legenda onde a Guiné-Bissau é abrangida, corresponde a

uma região caracterizada pela perda de pequenas e médias cidades, baixa densidade

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populacional, estagnação dos espaços urbanos e da ausência das grandes cidades. Níger

é um dos demais países com as mais baixas taxas de urbanização dessa área, o que torna

a sua rede de cidades mais fraca em relação à segunda área. Por último, temos a área

número quatro na legenda, como a mais pobre de todas, em termos de urbanização.

“Esta é uma área particularmente inóspita onde as cidades são escassas. Os

assentamentos ali existentes como Zouerate, Chinguetti e Taoudeni (Noroeste de

Sahara) experimentam novo tipo de desenvolvimento devido às condições climáticas,

falta de conexões funcionais e ausência de um reservatório demográfico rural para

alimentar as cidades” (UNHABITAT, 2010, 103). Realmente trata-se de uma região

desértica situada numa faixa climaticamente muito hostil a vida humana e que se

estende desde o mar vermelho a Este, até ao Oceano Atlântico, a Oeste, funcionando

como zona geográfica de transição entre o Magreb e a região subsariana. O clima muito

árido, para além das tensões políticas, económicas e a insegurança que se vive em

muitos países dessa área, são acima de tudo, os entraves para a urbanização e ao

crescimento da rede de cidades com algum peso funcional que garanta a integração da

sub-região.

Fig. 3: Tipologia da Urbanização na África Ocidental (2010)

Fonte: UNHABITAT, 2010, 103.

Como conclusão da análise dos problemas e desafios com que a sub-região da

África Ocidental se depara, em termos da urbanização e dos efeitos das alterações

climáticas na região em que a Guiné-Bissau se insere, apresentamos a figura-4, que

mostra uma possível prospectiva para a Rede e Clusters Urbanos assim como

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Regionais, para ano 2020, como forma de ajudar a compreender como Bissau se

distancia do resto das principais “cidades económicas” da sub-região.

Do ponto de vista do importante papel que uma cidade desempenha no

desenvolvimento local ou regional, os Clusters regionais merecem uma especial

atenção, principalmente quando resultam de espontâneos processos espaciais ou

geográficos. De salientar que a par dos Clusters regionais, “os Clusters urbanos são

importantes centros principalmente de actividades económicas mas também da tomada

de decisões por parte dos stakeholders locais e de mais agentes com cargos públicos”

(UNHABITAT, 2010, 102-106). Por isso, a concentração das cidades, pessoas e das

actividades económicas pode ser benéfica e deve ser promovida levando em linha de

conta que essa concentração cria ou poderá criar confiança nos agentes de produção, ou

seja, “uma economia de aglomeração onde os problemas com as ligações entre os

mercados e as deslocações às grandes distâncias dos centros não se colocam, a

proximidade da logística assim como boas acessibilidades aos nós das infra-estruturas

de transportes tais como portos, estações de caminhos-de-ferro, aeroportos etc., tornam

por assim dizer, um Cluster num grande polo de atracção” (idem).

Fig. 4 - Prospectiva para a Rede Urbana e Clusters Regionais (2020)

Fonte: UNHABITAT, 2010, 105.

No contexto desses Clusters urbanos, na África ocidental, e situando-se muito

afastado da região do golfo da Guiné, onde se concentram importantes Clusters urbanos

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com potencialidades económicas tanto nos mercados formais e informais locais ou

regionais, a Guiné-Bissau só pode contar com a relativa vizinhança do mercado

senegalês, cuja grande região de Dakar desenvolveu um Cluster local de atracção

regional. Por outro lado, apresentando uma profunda falta de infraestruturas de

transportes, uma fraca capacidade organizativa na economia de mercado, a conurbação

urbana da ilha de Bissau constitui per si, o único Cluster regional, do país. Este vai ser

um grande desafio para os próximos governos até 2020, uma vez que até à data

presente, a Guiné-Bissau não possui nenhum terminal portuário com as características

normais exigidas internacionalmente. Vai precisar de apostar rapidamente nessa

infraestrutura para consolidar esse Cluster. Ainda faltam autoestradas e vias rápidas de

interligações regionais, tendo atualmente quase 75% da sua rede viária por asfaltar. Daí,

a urgência na reestruturação da rede urbana com base no que já existe, melhoramento de

conectividade intrarregionais para que haja condições aceitáveis ou indispensáveis para

um desejável desenvolvimento sustentável na sub-região.

O êxodo rural tem contribuído para o aumento da população urbana nas

principais cidades guineenses, cerca de 39,6% da população do país nos últimos trinta

anos, onde 60,4% ainda representa o contingente rural, segundo os dados dos últimos

censos de 2009. Em todos os países da África Ocidental predomina o sector primário,

reflectindo um conjunto de constrangimentos que não foram ultrapassados pelos

governantes, talvez por falta de visão ou de interesse pelos problemas de urbanismo.

Muitos dos países desta região, incluindo a Guiné-Bissau, caso não mudem de

paradigmas em matéria de urbanização sustentável rumo ao desenvolvimento, poderão

comprometer as obrigações do milénio assumidas junto das Nações Unidas para o

horizonte de 2015, com destaque a redução da pobreza urbana e a melhoria das

condições de vida das populações.

Apesar das melhorias verificadas em alguns indicadores, a proporção da

população urbana que vive em bairros degradados entre 1990 e 2010 na África

subsariana ainda apresenta valores muito preocupantes como se pode constatar no

Gráfico-1. Para além da difícil situação dos países que estão a sair dos conflitos, a

região subsariana apresenta 70% da população em condições de pobreza em 1990 e só

melhorou em 8% dez anos depois.

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Gráfico:1- Proporção da População Urbana que vive em Bairros Degradados (1990-2010;

%)

Fonte: ONU, Relatório sobre os Objectivos de Desenvolvimento do Milénio, 2010: 64

De salientar que numa acção conjunta entre UEMOA, que exorta a todos os

países membros para implementação de acções mais importantes em favor de uma

melhor gestão ambiental e de recursos disponíveis, através de uma política de

Ordenamento do Território comunitário e PDM (Partenariat pour le Développement

Municipal) que por seu lado implementa um programa de renovação das políticas de

Ordenamento do Território á escala da África Ocidental e Central, onde propõe aos

agentes promotores locais, nacionais e da sub-região em geral, a motivação para aquele

desafio no âmbito da descentralização e da integração regional, foi realizada pela

primeira vez um seminário internacional de Ministros responsáveis pelo Ordenamento

do Território nos países membros a 19 de Outubro de 2004 em Ouagadougou (Burkina

Faso). Na declaração final desse seminário, para além do objectivo principal que passa

pela elaboração e implementação das políticas do Ordenamento Territorial regional que

favoreça a integração económica, a coesão social e um desenvolvimento sustentável da

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sub-região e a definição de estratégias para cada país e conjuntas sobre as políticas

sectoriais e espaciais coerentes com os projectos de NEPAD baseados em mais

integração, foram ainda definidos os seguintes “objectivos específicos:

a) Gestão da população e da sub-região;

b) Organização do sistema de transportes e suas transformações;

c) Desenvolvimento das Cidades secundárias e dos territórios produtivos;

d) A promoção das Metrópoles competitivas á escala da economia regional e

mundial;

e) Definição e implementação de programas de cooperação transfronteiriça;

f) Gestão de recursos no quadro de um desenvolvimento sustentável”

(Ouagadougou, 2004).

Apesar de todo esse esforço, as fragilidades políticas e socioeconómicas, a falta

da cultura de tolerância e o abuso do poder prevalecem em alguns desses países, o que

torna cada vez mais necessária a conjugação dos esforços para o melhoramento das

condições de vida das populações, pautada pela política de habitação na defesa da

habitabilidade condigna para todos, com o recurso às matérias-primas locais. A Guiné-

Bissau pode servir de porta de entrada dos PALOP nos mercados da vasta região

económica da África Ocidental. Este assunto merecerá mais detalhes no ponto seguinte,

principalmente no que se refere às debilidades e potencialidades.

2.2- As dinâmicas socioeconómicas na Guiné-Bissau: debilidades e potencialidade.

2.2.1. A diversidade étnica e cultural;

Para compreendermos a forma desajustada de como a rede urbana guineense no

contexto das dinâmicas socioeconómicas da atualidade, atendendo por outro lado as

próprias especificidades do país por ser “um território pequeno em área mas “enorme”

na sua riqueza humana” (SOEIRO de Brito,1997, 106), vamos fazer algumas referências

às origens e ao povoamento dessas terras, pelo facto de terem sido alvo da ocupação e

domínio de sucessivos grandes impérios e reinos africanos e por fim de europeus. Não

obstante, como resultado dessas dominações, surgiu uma rica diversidade étnica

singular na sub-região, mas que por outro lado também, tem vindo a fragilizar a

consciência e a identidade nacional dos guineenses, com reflexos na fraca interação

social dentro da rede urbana, quer no litoral como no interior.

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Na figura-5, podemos ver como é formado o mosaico da localização espacial

das principais etnias que habitam o território guineense e além-fronteiras.

Fig. 5- Localização Espacial das principais Etnias Transfronteiriças

Fonte: Atlas da Lusofonia, 2001, 53.

Nota-se que o litoral é densamente habitado pelas comunidades hierarquizadas,

destacando entre elas os Manjacos, Papeis e Brames ou Mancanhas. Segundo

(NOBREGA, 2003), São grupos organizados tradicionalmente sob a forma de regulados

que podem ser entendidos como pequenas unidades políticas independentes em

território limitado pela tradição e pela história. Nestes tipos de organização é tradicional

o poder dos chefes de família submeter-se ao dos chefes de tabancas e destes, ao dos

régulos que são normalmente coadjuvados por um grupo de anciãos, vulgos homens-

grandes. Há no entanto outros grupos do litoral com o tipo da organização social

horizontal, como os Balantas, Felupes, Nalús etc., cuja resolução dos problemas cabe

aos homens-grandes. Na figura-6, podemos igualmente encontrar as etnias interiores,

ou seja, aquelas que não se projetam para lá das fronteiras. Todas elas fazem parte das

consideradas etnias tradicionais quer pela organização social, quer pelas atividades

costumeiras.

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Fig. 6 - Localização Espacial das principais Etnias Interiores

Fonte: Atlas da Lusofonia, 2001, 54.

O interior, ou seja as regiões a montante dos limites das marés, é mais habitado

pelos Fulas e Mandinga, comunidades étnicas islamizadas, resultado da difusão do Islão

na antiga Senegâmbia e na faixa Sul do Sahel, desde o século VII. Sabe-se que esses

povos pertenciam a uma sociedade altamente estratificada de nobres e aristocratas,

homens livres e escravos, pastores, ferreiros, ourives, tecelões, griô etc., todos fiéis e

praticantes dos ensinamentos do alcorão. Normalmente organizados em torno dos

chefes religiosos coadjuvados pelos anciãos, ou seja, também possuíam uma política

centralizada e caracterizada por uma forte hierarquia social. Em termos de acumulação

de riquezas, os Fulas e Mandingas têm por hábito apoderarem-se de terras para a criação

de gados, com destaque ao bovino, ovino e caprino.

Também são excelentes produtores de cereais para o consumo interno mas

devido a alterações climáticas sentidas na Guiné-Bissau nos últimos trinta anos,

alteraram-se também alguns hábitos no uso e na transformação do solo. Devido às

carências de vária ordem nas tradicionais localidades, um considerável contingente da

população ativa abandona anualmente a sua propriedade agrícola para se dedicar ao

comércio nos pequenos centros urbanos mais próximos com algumas infraestruturas e

serviços, sendo uma boa parte migra sazonalmente para Capital Bissau. São práticas que

atrasam a criação de polos locais de atração, mas a pobreza assim o determina.

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Recuando um pouco na história da ocupação estrangeira, vale a pena lembrar

que antes da chegada dos Portugueses à costa Ocidental africana, em 1446, o litoral das

terras da Guiné-Bissau já tinha sido habitado por grandes grupos étnicos vindos do

interior do continente, mais concretamente do Vale do Níger. “A população do litoral da

Guiné compõe-se de numerosos grupos étnicos. Estes estavam já todos estabelecidos

nesta região, quando os Portugueses chegaram a estas terras (século XV). Foram

empurrados para o litoral numa época antiga (sem dúvida, séculos XIII e XIV) com a

chegada dos Mandingas. As suas tradições dizem frequentemente que vieram do interior

do continente onde ocuparam antigamente, territórios mais ou menos vastos. (…) A

maior parte eram animistas (não muçulmanos). São em geral, excelentes agricultores

(de arroz). Uns viviam e vivem ainda em comunidades independentes, sem classe

dominante ou chefes dominadores, outros tinham uma organização hierarquizada e

estavam organizados em Estados, como os Mandingas” (PAIGC, 1974, 48). São assim

quatro, os grandes grupos que habitam o litoral, subdivididos da seguinte forma:

a)- Grupo Diola (Felupes, Baiotes) Balantas

São excelentes cultivadores de arroz, especialistas de cultura irrigada de arroz

nas zonas marítimas, estavam em geral organizados em comunidades familiares livres,

sem a dominação de classe. Os Felupes e os Baiotes constituem os ramos do povo

Diola, que ocupa as duas margens da baixa Casamansa, e estão instalados sobretudo na

margem esquerda, entre Casamansa e o rio Cacheu.

Os Balantas (160.000 indivíduos no recenseamento de 1950) compõem o grupo

étnico mais numeroso do litoral; ocupam a região central e florestal do litoral e dividem-

se em vários ramos, alguns dos quais são estreitamente aparentados aos Mandingas.

Encontram-se também ao Sul e ao Norte do rio Geba.

b)- O Grupo Manjaco (Brame, Papel) e Banhum (Cassangas, Cobianas)

São também agricultores e animistas, mas tinham uma organização social

hierarquizada no modelo Mandinga (nobres, homens de culto, artesões). Manjacos,

Brames e Papeis são estreitamente aparentados pela língua. (12.000 indivíduos no

recenseamento de 1950; 71.000 Manjacos, 36.000 Papeis, 16.000 Brames). Os Brames

criaram, no litoral norte, uma agricultura aperfeiçoada, permanente, baseada no sistema

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de substituição das culturas todos os três anos e na utilização do estrume. Os Papeis

ocupam a ilha de Bissau. Os Banhuns (na sua língua, lágar), os Cassangas (na sua

língua, lhadjá), os Cobianas, estabelecidos entre Foghy e o rio Cacheu, que são hoje

muito pouco numerosos, desempenharam no entanto, no passado um papel importante.

c)- O Grupo Beafadas e Nalús

Estes povos são muito marcados pela influência dos Mandinga, com os quais,

provavelmente, são aparentados. Os Beafadas estão estabelecidos no sul do rio Geba.

Os Nalús, que se encontram também na República da Guiné Conakry, vivem no

extremo sul, no litoral. São excelentes cultivadores de arroz.

e) - O Grupo de Bijagós, Cocoli, Padjadincas

Os Bijagós vivem no arquipélago com o mesmo nome. Ocupavam-se

principalmente de palmeiras e da pesca, não conheciam a cultura de arroz. São

igualmente aparentados aos Nalús, Cocoli e Padjadincas que se encontram também na

República da Guiné Conakry, vivem isolados, em pequenos grupos, no interior. Os

Cocoli viviam antigamente no litoral” (PAIGC, 1974, 48-51).

Esta análise mostra como não é fácil estruturar a população guineense através de

um ordenamento do território de tipo europeu porque este “procura determinar as

condições de equilíbrio dinâmico na estrutura biofísica de território tendo em conta

aspetos económicos, sociais, culturais e políticos, no sentido de as entender com pré-

condições ao processo de planeamento de território” (ALVES, 2007, 49), o que vai

levar muito tempo até que o cidadão comum consiga entender e aceitar qualquer que

seja mudança na s estruturas do seu habitat. Por causa de contrastes ainda prevalecentes,

vai continuar a existir por muito tempo as pequenas tabancas dispersas por todo

território, tanto no litoral como no interior, o que só vai fragilizar a hierarquização no

sistema urbano.

2.2.2. Os contrastes interior-litoral na base da diversificação cultural;

No caso da dicotomia interior/litoral trata-se apenas das características

geomorfológicas do país, que condicionam em parte, alguns hábitos das populações

residentes. Por isso se diz que “o estudo étnico de qualquer país ou região não conduz a

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uma linha de acção estratégica clara, pelo que se torna necessário associar ao factor

étnico o elemento linguístico, procurando as línguas nativas de raiz comum. (...) Deve

também avaliar-se a projecção de alguns grupos étnicos-linguísticos para além e para

aquém-fronteiras” (Atlas da Lusofonia, 2001, 51). O caso da Guiné-Bissau, nessa

matéria, precisa de uma abordagem diferente, uma vez que mesmo dentro da região do

litoral existe um mosaico etnográfico muito complexo e que consiste na diferença

étnolinguistica claramente perceptível seja por qualquer visitante. Para exemplificar,

temos “os grupos Diolas e Balantas que aparecem como aparentados em termos de usos

e costumes, são por outro lado muito diferentes linguisticamente. Os Manjacos, Papeis e

Brames linguisticamente aparentados, são diferentes nas técnicas de construção de

habitações, práticas agrícolas” (SIDA,1981, 165) e de alguns ritos cerimoniais etc.. A

figura-7 pode ajudar a compreender melhor a origem da designação “litoral/interior” a

partir da compreensão dos fenómenos das marés, uma vez que, o limite superior da sua

influência divide nitidamente o território.

Fig. 7 - Limite Interior das Marés

Fonte: Atlas da Lusofonia, 2001, 48.

O interior predominantemente habitado pelos Fulas e Mandingas, é mais ou

menos homogéneo em termos de hábitos, usos e costumes desses povos. Apesar das

pequenas rivalidades muito antigas entre eles, são no entanto muito aparentados em

muitas coisas, a religião muçulmana por exemplo, embora em diferentes confrarias

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(Cadjiria e a Tidjania). A formação de aglomerados populacionais de forma orgânica,

construção típica de casas baixas por parte dos Fulas que os mandingas também já

imitam, o fabrico de idênticos instrumentos para cultivar a terra, etc., são alguns dos

exemplos.

Todos estes pormenores caracterizam o contraste interior/litoral. O litoral

guineense alberga grupos étnicos na sua maioria animistas, que ainda acreditam na

feitiçaria e obedecem aos tradicionais responsáveis religiosos, ou aqueles que se

encarregam da realização das cerimónias e ritos sagrados. O fanado (circuncisão) que,

para além do seu carácter meramente de higiene e cultural, praticado há vários Séculos,

passou a ser encarado por muitos como cerimónia da iniciação de jovens para a vida

adulta. Tornou-se num acto de pura especulação e subserviência por parte dos

candidatos a favor dos responsáveis organizadores. Outra prática prende-se com o ritual

pagão conhecido em crioulo por Toca-Tchur, como forma de reconhecer e dignificar um

familiar falecido perante a sociedade. É entendido como um dever, onde cada membro

da família em idade adulta, sente a obrigação de tomar parte nela, podendo sacrificar

entre uma ou mais cabras ou vacas, para além de outros gastos com a alimentação de

bebidas alcoólicas que por regra, devem fazer-se acompanhar.

São práticas deste tipo que, em meu entender, contribuem para a alta taxa de

mortalidade no país, baixo índice de esperança de vida principalmente nos homens,

promove o atraso no desenvolvimento, porque em muitas etnias só trabalha-se para o

cumprimento dessas obrigações, mesmo vivendo em mais desumanas condições de

vida.

No interior, ou chão de Mandingas e Fulas como se diz na Guiné-Bissau, não há

dessas práticas mas em contrapartida, generalizou-se a prática da mutilação genital

feminina, um fenómeno bem enraizado e que há muito, tenta contra a saúde e a

dignidade da mulher como ser humano. Todas essas diferenças comportamentais entre

os povos do litoral e do interior, refletem bastante na forma como são encarados os

problemas da ocupação e transformação do uso do solo.

Foi sempre assim, levando o país a não encontrar até a presente data, caminhos

para superar as suas debilidades económicas, continuando a depender

fundamentalmente do sector primário e das ajudas externas como se afirma,

nomeadamente, no (PICGB, 2007-2010) que fazemos menção de transcrever

Fonte: foto do Google

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longamente. “Ao longo da sua história como país independente, a Guiné-Bissau tem

tido grande dificuldade em alterar substancialmente o tecido produtivo assente no sector

primário. A economia guineense vem apresentando, cada vez mais, sinais de

fragilidade, com destaque para uma balança comercial muito deteriorada e para os

elevados valores da dívida externa. Na década de 80, por pressão da Comunidade

Internacional, foram implementadas uma série de reformas no sentido da liberalização

da economia, da promoção da estabilização financeira e monetária, reforço da

administração fiscal e da melhoria da gestão dos recursos públicos.

Esta estratégia culminou, em 1997, com a adesão da Guiné-Bissau à União

Económica e Monetária da África Ocidental (UEMOA), encontrando-se a sua política

económica e monetária sob a chancela de um Banco Comum dos países membros. A

adesão à UEMOA veio favorecer uma maior estabilidade cambial permitindo,

simultaneamente, a sua melhor integração no mercado regional da África Ocidental. O

conflito político-militar de 1998-1999 e as crises políticas que se lhe seguiram,

afectaram negativamente o crescimento do PNB. A partir de 2003, começou a ser

visível uma lenta recuperação da economia nacional, a qual acabou por não se revelar

sustentável.

Devida a muitas práticas que conduzem á pobreza, o crescimento económico na

Guiné-Bissau desceu de 3.5% de 2005 para 1.8% em 2006. No contexto africano, onde

a média de crescimento se situa nos 5.7%, a Guiné-Bissau é um dos países com menor

crescimento. As causas do fraco desempenho económico prendem-se com factores

internos, instabilidade política e redução do preço da castanha de caju, produto

responsável por 30% do RNB, e de factores externos, como a subida do preço do

petróleo. A situação do atraso dos pagamentos à função pública é um problema

repetente que provoca tensões sociais permanentes.

Com vista a estabelecer as suas prioridades, o Governo guineense elaborou o

Documento de Estratégia Nacional de Redução da Pobreza (DENARP), o qual define a

estratégia de acção do Governo para o período 2007-2010, sendo considerado uma peça

indispensável para a retoma de iniciativas de apoio ao seu desenvolvimento por parte

das agências especializadas do Sistema das Nações Unidas, que Portugal tem procurado

acompanhar como doador. (…) A economia guineense está muito dependente da ajuda

externa, sendo particularmente problemática a situação da dívida externa, a qual é

bastante elevada para as capacidades financeiras do país.

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Os sectores económicos mais importantes são a agricultura, onde se destacam a

exportação da castanha de caju e a pesca, feita essencialmente por navios estrangeiros

que actuam através da concessão de licenças de pesca. O subsolo guineense é rico em

minerais, sendo uma área com um elevado potencial e que começa a ser estudado com

mais atenção, sendo de destacar, os depósitos de fosfatos em Farim, as reservas de

bauxite no Boé e as potencialidades petrolíferas no off-shore. O sector industrial é muito

limitado” (PICGB- 2007- 2010, 16-17).

2.2.3. Impactos da dependência da ajuda externa;

A Guiné-Bissau continua a depender muito do exterior por “fazer parte dos vinte

países mais pobres do mundo. As frequentes crises políticas que têm afectado o país

desde 1998 destabilizaram o Estado e reduziram muito a sua capacidade de governação.

Acresce que, nos últimos anos, surgiu outro factor de instabilidade política e social: o

narcotráfico. A economia guineense é bastante frágil, caracterizando-se por fracos

recursos internos e por depender fortemente do sector primário” (Avaliação do PIC 208-

2010, 13). Desta forma condiciona o cumprimento das estratégias destacadas no

(PICGB-2007-2010) sobre os Objectivos de Desenvolvimento do Milénio saídos da

declaração de Paris sobre a eficácia da ajuda ao desenvolvimento e da Conferência

Internacional de Lisboa (2007).

O Quadro-4 demonstra essa dependência e, de alguma forma, testemunha os

momentos de instabilidade já referidos. Os dois momentos negativos verificados na

balança comercial dos anos 2001 e 2004, de 15,9 e 9,8 mil milhões de Fcfa (moeda

local) respectivamente, reflectem claramente as crises provocadas pela guerra civil de

1998-1999 que derrubou o Presidente Nino Vieira e pelo levantamento militar que

também culminou com o afastamento do Presidente Kumba Yalá a 14 de Setembro de

2003.

Quadro: 4- Comercio externo - Balança comercial (em mil milhões de FCFA)

GUINÉ-BISSAU 2001 2002 2003 2004 2005 2006

Exportação FOB 27,09 29,2624 34,8704 28,109 39,9158 45,2623

Importação CAF 42,945 28,9311 29,2095 37,8832 33,9411 29,21

Balança comercial -15,9 0,3 5,7 -9,8 6,0 16,1

Fonte: Instituto Nacional de Estatística e Censos (INEC, Bissau)

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Ainda segundo os dados do último Recenseamento Geral da População e

Habitação de 2009, a Importação para esse ano foi de 54,9 mil milhões de Fcfa, sendo a

Exportação ficou em 34,5 mil milhões de Fcfa. No ano de 2010, o PIB foi de 418,8 mil

milhões de Fcfa, com a taxa de Crescimento real em 3,5%, e a taxa de Inflação anual a

situar-se em 1,9%. O país cria poucas riquezas a partir das suas potencialidades

internas; Importa muito mais do que consegue Exportar, o que é negativo para o

desenvolvimento que se pretende levar a cabo. Vale a pena lembrar que entre muitos

parceiros de cooperação internacional com a Guiné-Bissau, Portugal ocupa o primeiro

lugar no quadro do Comité da Ajuda Bilateral, fruto “de um encontro de vontades

centrado, por um lado, nas mais-valias (língua, matriz jurídica e passado comuns) e na

estratégia da cooperação portuguesa (CP) e, por outro, nas prioridades de

desenvolvimento da Guiné-Bissau” (Aval. PICGB 2008-2010, 25), como se pode ver no

quadro-5 que se segue.

Quadro: 5 - Síntese da Ajuda à Guiné-Bissau (2010)

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De 1999 a 2008, a Ajuda Pública para o Desenvolvimento (APD) de Portugal,

através do IPAD, tem disponibilizado anualmente Milhares de Dólares Americanos para

no âmbito da cooperação ajudar no desenvolvimento da Guiné-Bissau. Apesar do

quadro-5 contemplar apenas três anos (2006, 2007 e 2008), apenas a União Europeia

no âmbito da ajuda multilateral ultrapassa a participação portuguesa num universo de

dezoito parceiros entre Estados e Organismos não-governamentais. A Espanha ocupa o

terceiro lugar no cômputo geral de doadores e o segundo no âmbito bilateral. A França

que em 2006 contribuiu com 9,9 Milhões de Dólares, baixou muito em 2007 para 3,4

milões e com uma ligeira subida no ano seguinte. Contrariamente a ajuda da França,

IDA, que em 2006 participou com 1,7 Milhões, teve um aumento exponencial nos dois

anos que se seguiram. O FMI, que claramente deixou de acreditar na consistência fiscal

da economia guineense, tem, no entanto, continuado a ajudar, uma vez que diminuiu de

-3,8 Milhões em 2006 para -2,0 Milhões de Dólares em 2008.

Mesmo em diferentes níveis de contribuição entre parceiros, o total de 334,7

Milhões de Dólares durante esses três anos ou seja, uma média de mais ou menos 111,5

Milhões de Dólares por ano, constituem um forte impacte na manutenção e na

credibilização da economia guineense na sub-região.

Quadro: 6- Distribuição Sectorial da APD bilateral Portuguesa

Quanto à distribuição sectorial da ajuda para o desenvolvimento bilateral

portuguesa entre 2007 a 2009, para além dos sublinhados no Quadro-6, com o sector

das Infra-estruturas e Serviços Sociais no topo, seguido dos Sectores de Produção e

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Infra-estruturas e Serviços Económicos por serem talvez os mais considerados

prioritários, a Educação tem absorvido importantes somas, uma média de 30% durante

os três anos referidos. O Governo e Sociedade Civil assim como Outras Infra-estruturas

e Serviços Sociais foram outras áreas que mais beneficiaram. A Ajuda aos Refugiados

(no País Doador) assim como a Ajuda Humanitária foram as áreas que menos

beneficiaram das verbas da APD bilateral portuguesa, ficando em 0,01% e 0,03%

respectivamente do total doado em três anos referenciados.

Após esta análise sobre o grau de dependência do país das ajudas externas, não

deixa dúvidas de que ainda está tudo por fazer. Alguns dos antigos centros urbanos

estão a perder o tradicional peso funcional, pelas reduzidas condições de conectividade

com Capital, o que faz deslocar as suas atratividades para vizinhos centros mais

acessíveis. É imperativo revitalizar as redes de comunicações, a equidade regional com

a ajuda do poder central, para que essas cidades voltem a ter uma expressão condigna na

coesão do sistema urbano nacional. A Cidade de Bissau foi sempre a mais beneficiada

de todas as ajudas pela sua macrocefalia e onde muitos organismos internacionais estão

sediados como se poderá constatar no próximo ponto.

2.2.4 A macrocefalia de Bissau: a desigual distribuição geográfica da população e

das fontes de riqueza;

Segundo os últimos censos gerais da população e habitação de 2009, conforme o

Gráfico-2, os dados finais mostram que o Sector Autónomo de Bissau (SAB) continua

a ser a preferência de muita gente para habitar. Em termos populacionais, conta

actualmente com 387.909 habitantes ou seja, 25,5 % do contingente nacional. É claro

que esse resultado seria de outra dimensão caso fosse em relação à população urbana

nas principais povoações. Seguem-se as regiões de Oio com 224.644 habitantes ou

14,77%, Gabu com 215.530 habitantes ou 14,17%, Bafatá com 210.007 habitantes ou

14,80% e Cacheu com 192.508 habitantes ou 12,76%. As regiões de Tombali, Quinara,

Bolama Bijagós e Biombo, ainda se situam abaixo dos 100.000 habitantes cada, contudo

os dados mostram indícios de crescimento e de abertura ao mercado nacional.

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Gráfico: 2 - Distribuição da População por Regiões Administrativas (%)

Fonte: Autoria própria, com dados do INEC, (Junho de 2011)

A questão da macrocefalia do Sector Autónomo de Bissau, já enfatizada, não

obsta a análise de outras tendências que começam a manifestar-se. A preferência pelas

regiões de Oio, Gabu, Bafatá e Cacheu para a fixação de residência, podem estar

associadas às questões da mobilidade, levando à emergência das suas Cidades Capitais

na dinâmica da economia nacional, nestes últimos anos. A construção das duas pontes

regionais sobre os rios Cacheu e Mansoa, em substituição das antigas travessias por

jangadas em S. Vicente e João Landim respectivamente, assim como o melhoramento

das suas estradas, foram fundamentais para o desenvolvimento da região de Cacheu e

em particular, uma mais-valia para as pequenas povoações emergentes de Ingoré e S.

Domingos, na fronteira com a República do Senegal a norte do país.

A região de Oio, actualmente a segunda mais populosa do país, talvez por razões

históricas em termos da distribuição étnica, continua a deparar-se com a profunda falta

de estradas alcatroadas, em particular os eixos rodoviários Farim-Ingoré e Bissorã-

Barro. A construção de uma ponte regional sobre o Rio Farim podia impulsionar a

economia local, atraindo mais pessoas para a cidade de Farim. É por esta e por outras

razões que o sector de Mansoa está cada vez mais dinâmico, com mais infraestruturas

do que a própria Capital regional.

Bafatá e Gabú são duas regiões que beneficiam de um importante eixo

rodoviário que as liga à Capital, Bissau. Aliás, como fontes de receitas, Gabú e Bafatá

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detêm as três principais portas de entrada das mercadorias vindas do Senegal e Guiné

Conakry, para o abastecimento do mercado nacional, através de Pirada, Buruntuma e

Cambaju, seguidos de Jeguê em S. Domingos, região de Cacheu, também a porta mais

procurada em termos da travessia de pessoas e bens para o Senegal. De salientar que

todas estas portas fronteiriças têm o controlo permanente das delegações regionais

desconcentradas dos serviços alfandegários de Bissau.

No que toca a distribuição geográfica das fontes de riqueza, sabe-se que o setor

primário ocupa o primeiro lugar, contudo, apenas as cidades de Bissau, Bafatá e Bolama

possuem algumas pequenas-indústrias transformadoras, ainda que em estado de

degradação. O serviço bancário só abrange o SAB, regiões de Cacheu, Bafatá e Gabú. O

fluxo de mercadorias no mercado guineense, é garantido por três meios de transporte

(marítimo, terrestre/rodoviário e aéreo), pois, ainda não existem caminhos-de-ferro.

Sobre esta matéria, o Sr. António Vaz, Técnico Aduaneiro da Direção Geral das

Alfândegas, nosso entrevistado em Bissau, recorreu aos dados estatísticos dos Serviços

Alfandegários de Bissau para o ano de 2009, para melhor se posicionar. Das 81.000

toneladas importadas nesse ano, o transporte por via marítima representou 68% do total;

o transporte por via terrestre (rodoviário) atingiu os 21%, e o transporte por via aérea

apenas 1%. As exportações no valor de 41.000 toneladas, o transporte por via marítima

representou 92%, o transporte por via terrestre (rodoviário) 7% e o transporte por via

aérea também 1% apenas. Em 2008, as importações atingiram cerca de 70.000 toneladas

contra 26.000 toneladas de produtos exportados, ainda com o transporte marítimo a

ocupar o primeiro lugar.

A Cidade de Bissau continua a concentrar as actividades de importação e

exportação por ser detentora do único porto marítimo do país; há, por isso, um grande

desequilíbrio em matéria de infra-estruturas de transporte, em relação ao resto das

regiões que compõem a rede urbana nacional. Como se sabe, ”as infra-estruturas de

transporte marítimo e fluvial na Guiné-Bissau são particularmente condicionadas pela

existência de diversas rias muito para o interior, permitindo assim a circulação de navios

de longo curso em muitos locais do litoral, mas quando cessa a navegabilidade destes,

as lanchas asseguram a continuidade do transporte fluvial. Existem diversos portos

rudimentares, dos quais se destacam os de Cacheu, Bolama, Bubaque e Buba; cinco

portos fluviais, mais destacados são os de Binta, Bambadinca e Cacine com capacidade

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até 300 toneladas, todavia estes portos não dispõem sobretudo de uma elevada

capacidade de armazenamento” (Atlas da Lusofonia, 2001, 45-46).

Perante tudo isso, e sabendo que a população da Guiné-Bissau maioritariamente

rural, quer agrícola ou pastoril, depende muito da terra que “por não ser fertilizada tem

vindo progressivamente a empobrecer, além de que não lhe tem assegurada a desejada

produtividade por carência de técnicas actualizadas de trabalho, de selecção de

sementes, de ensilagem de pastos, de implantação de novas culturas”, etc. (A. Spínola in

PROVINCIA DA GUINÉ,1973), o que obrigou as actividades agrícola e pastorícia

tornarem-se itinerantes e consequentemente a dispersão dos aglomerados populacionais.

Daí que, os Fulas e Mandingas habitantes em maior número das regiões de Gabú e

Bafatá, especializaram-se na criação do gado ovino, caprino e bovino por possuírem

terras com boas condições para pastagem.

Quando assim é, as questões culturais acabam por deixar as suas marcas. Por

isso, o caprino e ovino fazem parte não só da fonte de riqueza para as famílias, mas de

grandes valores para as práticas religiosas e culturais como dotes em casamentos ou

para as cerimónias do fanado (circuncisão), festas do calendário muçulmano ou

Tabasqui, conhecida como (festa do carneiro). A questão climática deve ser tida em

conta nesta macrocefalia de Bissau, por ser responsável em parte, pelo acentuado êxodo

rural para as grandes cidades com poderemos ver no próximo ponto.

2.3- Efeitos das alterações climáticas na distribuição da população e nos recursos

naturais;

Os efeitos das alterações climáticas constituem hoje uma preocupação de índole

internacional contudo desde a assinatura do Protocolo de Quioto a 11 de Dezembro de

1997 (Japão) em que “foram fixadas metas concretas que estabelecem onde as emissões

devem ser reduzidas e o volume de tal redução: até 2012, os países da União Europeia

devem diminuir suas emissões em 8% em comparação ao ano-base de 1990; os Estados

Unidos, em 7% e o Japão, em 6%” (http://www.dw-world.de/dw/article; 05-10-2011).

Segundo o mesmo artigo, muitas outras conferências que se seguiram sobre este

tema foram marcadas pela busca de como fugir das metas estabelecidas em 1997 por

parte de muitos países industrializados com os Estados Unidos da América em primeiro

lugar. Para confirmar aquela pretensão, lembrar de que a Administração dos EUA

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recusou-se a ratificar o documento que entrou em vigor em 2005, condicionando desta

forma a não concretização do estabelecido em Quioto, segundo a mesma fonte.

Partindo desta realidade, importa salientar que os países mais pobres e em

particular os da sub-região em que a Guiné-Bissau se insere, são os mais atingidos uma

vez que os seus recursos naturais endógenos ou exógenos não estão a ser bem

explorados nem bem geridos para o benefício de todos, tudo por falta de equipamentos e

conhecimentos tecnológicos. Sendo os recursos naturais os bens que a própria natureza

disponibiliza ao homem para a satisfação das suas necessidades e que podem ser

agrupados em endógenos e exógenos, nem sempre foram bem tratados de forma a

garantir a saúde ambiental desses países. É bom lembrar que a intervenção do homem

na transformação daquilo que a natureza lhe proporciona, entra inevitavelmente os

fatores vivência, cultura, sociedade e sua história que também diferem de país para país.

Falando de países pobres como a Guiné-Bissau, a mitigação desse tipo de

fenómenos naturais, requer custos insuportáveis para os cofres dos Estados, o que pode

dificultar ainda mais os orçamentos desses países do terceiro mundo, com profundos

problemas financeiros. Os valores do volume da precipitação expressos na figura-8,

mostram o grau da vulnerabilidade e riscos com a seca que cada um desses países da

África Ocidental pode vir a enfrentar.

Fig. 8- Volume da Precipitação Anual na África Ocidental e Central em mm, 2003.

Fonte: http://www.amenagement-afrique.com/article.php, (10-10-2011)

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Neste âmbito, a Guiné-Bissau ainda resiste à falta de água graças ao recurso

“água-doce” que abunda no litoral e da pluviosidade que se situa entre os 1500 a 2000

mm por ano. Nos países onde existem secas intensas que levam à escassez da comida e

de outros bens da primeira necessidade, a tendência sempre foi no sentido do abandono

do campo, onde já não existem condições para garantir a sobrevivência, rumo à cidade,

à procura de melhores condições de vida. Essas migrações podem piorar os locais de

acolhimento, porque quando falham as expectativas, começam as frustrações que podem

traduzir-se na exclusão social e às formas de comportamento marginal (delinquência,

prostituição, assaltos ou outras práticas não recomendáveis). Muitas cidades da nossa

sub-região já enfrentam esta realidade onde, em cada dia que passa, se assiste à

proliferação dos sem-abrigo, ao aumento de ilhas de pobreza extrema, à criminalidade e

ao crescimento descontrolável dos Bairros de lata etc.

A forma natural como foi feita a distribuição da população em todo território

guineense é ainda bem visível, porque baseou-se na constante busca de boas terras que

garantam a produtividade. Para além de muitos outros fatores, já se notam algumas

alterações no coberto florestal em certas regiões do interior, alguns rios secam por

completo durante a estação seca do ano. As migrações sazonais aumentaram

abrangendo muitas etnias, para além do tradicional nomadismo do grupo fula. Contudo,

assim que começa a estação das chuvas, muitos tendem a voltar para os lugares de

origem a fim de se ocuparem das suas terras. Sabe-se no entanto, que muitos acabam

por fixar a sua residência na cidade com espectativas de ali encontrar novas e melhores

condições de vida. Esta prática fez disparar a taxa da população urbana em Bissau,

Bafatá e Gabu nos últimos anos, para além das repercuções sentidas com a liberalização

do comércio e a integração do país na UEMOA em 1997, que aumentou a invasão

estrangeira no cumprimento das obrigações de um espaço comunitário. Como exemplo

disso, é bom lembrar que o aumento da delinquência juvenil que as principais cidades

da Guiné-Bissau têm estado a enfrentar nos últimos dez anos, não resulta das alterações

climáticas mas sim da introdução da utilização do território nacional pela rede

internacional de tráfico de droga, como porta de saída para o mercado europeu, das

drogas vindas da América latina.

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3. O SISTEMA URBANO GUINEENSE NOS ÚLTIMOS 50 ANOS

3.1 - Uma breve história sobre o povoamento da Guiné-Bissau;

Sem querer tornar repetitiva esta análise sobre a história do povoamento

guineense, voltamos a falar nele apenas para reafirmar que muito antes da chegada dos

portugueses àquelas terras em 1446, toda esta costa ocidental africana já tinha sido

habitada pelos povos vindos de vários pontos do interior do mesmo continente,

principalmente do vale do Níger. Não passava de apenas um território descoberto pelos

navegadores europeus, portugueses em particular, que ao longo dos tempos descobriram

e transformaram os problemas encontrados em excelentes oportunidades para a

realização de comércio, como se pode constatar no atlas da lusofonia.

De uma forma muito natural, os “indígenas” como eram tratados, foram

desenvolvendo os seus assentamentos em grupos de indivíduos consoante as parecenças

linguísticas e de vivências cotidianas. Já se falou sobre os hábitos alimentares, usos e

costumes dos povos do litoral e do interior, que em função do tipo da organização social

de cada grupo, também a escolha de cada sítio era objecto da decisão dos anciões de

cada clã. Por isso, encontram-se ainda hoje, pequenos agrupamentos populacionais com

apenas cinco a sete palhotas, em muitos casos com menos de vinte pessoas,

principalmente em regiões com boas condições para a agricultura.

Segundo o atlas da lusofonia, a sã coabitação entre nativos e comerciantes

portugueses começa a ter novos contornos, a partir de 1588 com a construção do forte

de Cacheu, altura em que os portugueses começam a mostrar intenções de afirmar a sua

soberania e permanecer naquelas paragens. Os nativos começam a resistir contra a

presença dos brancos que já não viam como meros comerciantes mas sim, inimigos. Ao

longo desse tempo, muitas fortificações foram erguidas no actual território guineense

para a guarnição das importantes feitorias ali existentes, sendo muitos destes locais

constituem hoje grandes polos do sistema urbano nacional. Aliás, “em 1830 as

conquistas ao longo da costa estendiam desde os 10º,0’ aos 13º,0’ Norte, numa área

dominada por (Guiné de Cabo Verde) que se dividia em dois Distritos: Distrito de

Bissau que compreendia as fortificações de Bissau (praça de S. José de Bissau), Geba,

Fá e as ilhas de Bolama e das Galinhas; o Distrito de Cacheu que compreendia as

fortificações de Cacheu, Ziguinchor, Farim e Bolor” (Atlas da lusofonia, 2001, 13). Para

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concluir, urge lembrar que todas as fortificações aqui referidas situam-se no actual

território da Guiné-Bissau, com a excepção do Ziguinchor que fica na embocadura do

Rio Casamansa, dentro da actual República do Senegal ou seja, desde há muito tempo

que o território guineense coabita com as marcas da presença e da influência

portuguesa. Os pontos que se seguem vão enfatizar com mais detalhe a cada período da

ocupação e influência estrangeira na história do povoamento guineense.

3.1.1. O povoamento no território da Guiné-Bissau antes da independência.

a) O período anterior à “descoberta” pelos portugueses;

Os conhecimentos sobre a antiga história dos países da África ao sul do deserto

do Sara, foram sempre limitados por falta de documentos e registos para a investigação.

Sabe-se, no entanto, tratar-se de uma região por onde passaram consecutivamente três

grandes impérios naquela costa africana: Gana, Mali e Songhay, tal como se pode ver

na figura-9, contudo todas as histórias relacionadas com esses impérios ou a maior

parte delas eram contadas oralmente ou através dos cantos griô.

Segundo os relatos, o Império de Gana foi provavelmente fundado durante os

anos 300, onde até 770, os seus governantes pertenciam a dinastia dos Magas, uma

família berbere, apesar de, o povo ser constituído por negros das tribos Soninkés. Em

770 os Magas foram derrubados pelos Soninkés, e o império expandiu-se grandemente

sob o domínio de Kaya Maghan Sissé, que foi rei por volta de 790.

Depois de muitos anos de luta, a dinastia dos Almorávidas berberes subiu ao

poder, que no entanto não conseguiu conservar por muito tempo. O império entrou em

declínio e, em 1240 foi absorvido pelo Império de Mali sob o comando de Sundiata

Keita. A chegada e invasão dos Almorávidas do norte mudou tudo, porque estes

submeteram e converteram os nativos à religião muçulmana, dissolvendo desta forma, a

anterior estrutura social tradicional e criaram uma sociedade de hierarquias rígidas,

sobretudo dentro das etnias convertidas. O rei Sundiata era mandinga, um dos grupos

étnicos de povos negros que ainda vivem no Mali dos nossos dias, na Guiné-Bissau e no

vizinho Senegal. Muito tempo depois, entre o séc. XV e XVI, ergue-se o império de

Songhay, um dos três maiores impérios africanos da história.

Antes do império Songhay, a região tinha sido dominada pelo império de Mali,

que no início do séc. XV, começou a declinar. O império de Songhay cresceu e

dominou uma vasta área na costa ocidental africana, incluindo a actual Guiné-Bissau.

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Invadido pelos guerreiros marroquinos vindos do Norte no final do séc. XVI, o império

de Songhay ficou arrasado, política e economicamente, dando lugar a fragmentados

estados independentes, sendo o mais importante desses estados, o reino de Gabu. Esta

região de Gabu ocupa hoje o terceiro lugar na hierarquia das regiões administrativas da

Guiné-Bissau, em termos do número da população residente. Desde então, sucederam-

se períodos de guerras tribais, invasões, perdas ou conquistas de terras, como sucedeu

com o último estado fula de Futa-djalon que se estabeleceu em meados do séc. XVIII,

nas fronteiras das acuais regiões de Tombali e Quinara no sul da Guiné-Bissau. Todas

essas ocupações não só deixaram as marcas religiosas mas também ao nível da

organização das estruturas sociais que ainda refletem na forma da fixação desses povos.

O monopólio dos mercadores norte-africanos naquela sub-região só terminou nos finais

do séc. XVI com o início do mercado marítimo entre a África ocidental e alguns países

europeus.

Fig. 9- Antigos Grandes Impérios Africanos na Região de África Ocidental

Fonte: pt.wikipedia.org/wiki/Imp%C3%A9rio_Gana (15/5/2009)

b) O povoamento da Guiné-Bissau no tempo dos portugueses;

Sabendo que o propósito deste trabalho consistia em analisar a situação do

Sistema Urbano guineense apenas nos últimos cinquenta anos, ou seja, começar a partir

de 1960, há no entanto, uma necessidade de recuar um pouco no tempo, para que se

possa avaliar bem a Guiné no quadro do império português. Importa lembrar que muito

antes da Guiné do séc. XX, a presença e a afirmação da soberania portuguesa nestas

paragens com consequente edificação dos fortes nas margens dos importantes rios, o

povoamento guineense nunca mais ficou como antes.

A título de exemplo e segundo o Atlas da lusofonia, Cacheu foi o primeiro ponto

de contacto dos portugueses com a terra firme desta costa africana; Farim foi uma

povoação fundada por um Capitão-mor de Cacheu, Gonçalo de Gamboa em 1641, tal

como Ziguinchor, um presídio levantado e artilhado pelo mesmo Capitão-mor; Bissau,

praça de guerra edificada em 1776; Geba, um grande mercado aonde concorre muita

Gana Mali Songhay

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courama, marfim, bastante cera e algum ouro; Fá, uma aldeia de Mandingas onde um

negociante português fundou em 1820 uma feitoria mercantil que o governo de Portugal

conserva etc.

O final do séc. XIX foi muito importante na história da viragem da actual Guiné-

Bissau, porque “a 18 de Março de 1879, o território é proclamado (província da Guiné)

passando a sua administração a ser independente da de Cabo Verde e sendo Capital da

nova província estabelecida em Bolama” (Atlas de Lusofonia, 2001, 18). Nesta altura os

limites fronteiriços ainda não tinham sido demarcados. A partir de 1936, ano em que se

deu por terminada a campanha de pacificação em Canhabaque (Arquipélago dos

Bijagós), considerado último bastião da resistência dos indígenas da Guiné, a soberania

portuguesa sobre todo território jamais foi ignorada.

O imposto de palhota criado desde 1903, passou a ser cobrado em todo território.

Para que essa operação se possa efetivar, houve a necessidade da realização de um

recenseamento geral, pelo que “Os censos coloniais realizados em 1928, 1929, 1936,

1940, 1949 e 1950 tiveram como unidade estatística a “palhota” que vigorou em quase

toda a Guiné” (Franco, 2009,13). A palhota ficou por muito tempo como a principal

unidade estatística para o pagamento dos impostos, uma vez que as estruturas sociais

que os portugueses encontraram eram muito complicadas, fruto de um habitat disperso.

A nível da escolaridade, poucos eram os negros guineenses com o segundo ciclo feito,

facto que na generalidade pesava na falta de noção sobre os benefícios de uma cidade

para os seus habitantes, a começar pela satisfação das necessidades básicas até a

formação de intelectuais para liderar os destinos de uma nação.

Por tratar-se de uma época de viragem com importantes registos históricos quer

para Portugal quer para colónias, achamos por bem definir dois grandes períodos na

história de desenvolvimento do urbanismo guineense. O primeiro período que começa

com o final da campanha de pacificação em 1936 até 1950, sendo o segundo período

entre 1950 e 1973, com a saída do General António Spínola, uma vez que o seu

sucessor mal teve tempo para dar seguimento da política traçada. Momentos altos que

marcaram o arranque ao desenvolvimento urbano na Guiné portuguesa foram talvez

quando se criou em Lisboa, o Gabinete de Urbanização Colonial (GUC) através do

Decreto nº 34173, por Marcelo Caetano, no seu primeiro ano em exercício das funções

de Ministro das Colónias, cargo onde permaneceu até 1947. “O diploma destinava-se a

centralizar num só organismo público, com sede em Lisboa, toda a prática projectural

de arquitectura e urbanismo de promoção oficial, destinada às "colónias de África"

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(Diário do Governo, 1944, 1167), incluindo-se aqui naturalmente a então Guiné

Portuguesa” (Milheiro e Dias, 2009, 82).

Segundo Milheiro e Dias, a criação do referido gabinete tinha como propósito

uma necessidade urgente de “estudar e acompanhar a formação e o desenvolvimento

dos aglomerados populacionais nas colónias de modo a aproveitar os ensinamentos da

urbanística, evitando os erros por vezes irremediáveis, de um crescimento ao acaso”

(Diário do Governo, 1944, 1167) citado por Milheiro e Dias, (2009, 82). Apesar de

tratar-se de um diploma que constitui uma oportunidade para satisfazer as encomendas

públicas ou privadas nas colónias portuguesas em matéria de arquitectura e urbanismo

no início dos anos quarenta, a Guiné portuguesa continuava com os problemas de

sempre. Falta das iniciativas locais, e de pouco interesse por parte dos anteriores

governadores. Nessa primeira fase de arranque até finais dos anos 50, a governação de

Manuel Maria Sarmento Rodrigues entre (1945 a 1948) deu um grande impulso nas

actividades de urbanismo e na infra-estruturação em todo território nacional e em

particular na cidade de Bissau. Graças aos serviços do (GUC), o governador Sarmento

Rodrigues executa importantes obras, tal como iniciou e idealizou muitas outras que

foram concluídas pelo seu sucessor Raimundo Serrão entre (1948 a 1954).

Alguns anos depois, procedeu-se a alteração do nome do Ministério das

Colónias para Ministério do Ultramar (MU) e do Gabinete da Urbanização Colonial por

Gabinete de Urbanização do Ultramar (GUU). Estas alterações aconteceram porque

“com a revisão constitucional de Maio de 1951, desaparecem dos discursos oficiais os

termos “Império” e “Colónias”, substituídos por “Ultramar” e “Províncias”, sugerindo

uma integração mais pacífica destes territórios e contornando a crítica internacional

então frontalmente contrária à existência de regiões colonizadas. Deste modo sai

reforçado o princípio da unidade nacional de um Estado português pluricontinental”

(SILVA, 2006, 147) ” citado em Milheiro e Dias, (2009, 85). Segundo a mesma fonte,

foi nesse período entre (1950 e 1955) que o antigo governador da província da Guiné,

Sarmento Rodrigues ocupa o cargo de Ministro do Ultramar, continuando deste modo a

seguir de perto o desenvolvimento dos projectos por ele deixados para a acção

urbanística na província. As actividades de urbanização, construção e infra-estruturação

já tinham iniciado antes, com as brigadas e missões para ultramar, ou mesmo com os

serviços das Obras Públicas locais, contudo considera-se 1945, o ano de arranque das

obras estruturantes, com a adaptação do Palácio de Governo e a transformação da Sé

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Catedral de Bissau. O então governo local soube estreitar ligações com Lisboa nessa

matéria de construção para a integração social, como o próprio Governador afirmava,

segundo as citações de (Milheiro e Dias, 2009, 90), de que “no primeiro plano das

realizações, como mais visível, o trabalho de obras públicas”, adiantando possuir “uma

vasta lista de obras projectadas para um período… bastante curto” (RODRIGUES,

1949, 37). Desta lista fazem parte construções em andamento, como o “Palácio, Sé,

capelas de Catió, Bafatá, Canchungo, Mansoa e Gabu, moradias projectadas para os

funcionários em Bissau, o monumento ao Esforço da Raça, edifício da Praça do

Império… e outras tentativas dispersas pela Colónia” (Idem).

Sabe-se que os técnicos do Gabinete de Urbanização do Ultramar com sede em

Lisboa, deslocavam-se ao local, sempre que tal se justificasse para se inteirarem do

andamento das obras e da situação em geral, muitas das vezes, no quadro do imediato.

O caso guineense não se esgota apenas em urbanizar Bissau e os antigos assentamentos

populacionais, houve no entanto projetos para o resto da província e para diversos

setores, como foi o caso do Estudo de Urbanização da Praia de Varela em 1947 e 1959.

Muito empenhado com a causa guineense, o governador Sarmento Rodrigues

orgulhava-se das suas realizações, chegando a afirmar em termos de um desabafo que

“Fizeram-se os levantamentos topográficos de Bissau, Bafatá, Varela, Canchungo,

Mansoa, Farim, Gabú, bem como esboços para os planos de urbanização de Varela,

Canchungo, Farim, Mansoa e sobretudo o de Bissau, que me parece não ter merecido o

carinho devido por parte da população. Vieram projectos para enfermarias, postos

sanitários, escolas, moradias, igrejas, postos administrativos, mercados e tantos outros

edifícios” (Milheiro e Dias, 2009, 92).

O governador tinha consciência da indiferença da população guineense em

relação ao trabalho que desenvolvera, mas nem por isso deixou de prosseguir com a sua

determinação em alargar os pequenos centros urbanos existentes, dotando-os de boas

condições de habitabilidade, contando para isso com a participação de agentes privados

interessados. Ganhou a aposta, o território também, porque quase 90% dos edifícios

emblemáticos que hoje caracterizam a rede urbana guineense, fazem parte das grandes

obras herdadas (ver anexo-4), das importantes obras realizadas na Província da Guiné

entre (1945-1974). As imagens de figura-10 são exemplo de muitos edifícios sociais

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projetados pelos técnicos da Agência de Habitação e Urbanismo do então Ministério do

Ultramar.

Fig. 10- Escola Prof. António José de Sousa e a Residência das Irmãs em Bissau

Fonte: MILHEIRO e DIAS, 2009, 94.

Relativamente ao levantamento topográfico na Guiné atrás mencionado, urge

enfatizar acima de tudo, sobre a divisão Administrativa do território durante a era

colonial. Segundo o Diário do Governo de 22 de Abril de 1942, I Série nº 92, foi

promulgado o Decreto nº 31:976 da Direcção Geral da Administração Política e Civil

do Ministério das Colónias para a modificação da divisão administrativa nos seguintes

termos: “ (…) Artigo 1.º A divisão administrativa da colónia da Guiné, constante do

artigo 1.º do decreto n.º 29:257, de 13 de Dezembro de 1938, fica modificada conforme

foi determinado, nos termos das alíneas a) e b) do artigo 6.º de Reforma Administrativa

Ultramarina, pelo governador da colónia em diploma legislativo n.º 1:146, de 24 de

Janeiro do corrente ano. No Art.º 2.º referia-se que o quadro do pessoal administrativo

estabelecido pelo artigo 4.º do referido decreto é aumentado de dois administradores de

circunscrição de 3.ª classe, dois secretários de circunscrição e dois aspirantes

administrativos, lugares que serão providos nos termos das disposições legais

aplicáveis. Ou seja, dos nove Concelhos e uma Circunscrição existentes, foram

acrescidas mais duas novas circunscrições a pedido do governador.

No que se refere a um planeamento regional, é consensual entre os técnicos que

os espaços sejam agrupados atendendo às distâncias e aos graus de semelhanças e

homogeneidade. Ou seja, “as áreas geográficas contíguas tendem a realizar entre si,

relações de troca mais intensas e melhor hierarquizadas” (Lopes, 2001, 30). Querendo

com isso dizer que, têm maior proximidade de interesses que possam justificar a

realização de acções conjuntas, de modo a rentabilizar os recursos e aumentar a sua

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eficácia. Entende que estes espaços devem ser vistos não só na sua dimensão

geográfica, mas também como espaços económicos e sociais.

De qualquer forma no caso guineense, isso não foi levado em consideração, uma

vez que os interesses da soberania sobrepuseram-se ao respeito pelas fronteiras étnicas,

realizando traçados que dividem claramente grupos aparentados e famílias para

diferentes concelhos administrativos, como é o caso de Gabú e Bafatá, conforme a

Figura-11. Sendo um período muito antes dos teatros das lutas de libertação dos anos

sessenta, a organização administrativa ajustada às necessidades de então, justificou

apenas a constituição de nove Concelhos e três Circunscrições Civis para província.

Fig. 11- Divisão Administrativa da Guiné Portuguesa em 1942 (2003)

Fonte: MARQUES e DIAS, 2003, 580.

Em termos gerais, muitos projectos foram pensados para estruturar o urbanismo

na Guiné, até finais dos anos cinquenta. Porém, conscientes da difícil situação

económica que Portugal enfrentara logo após a II Grande Guerra (1939-1945), esse

processo de urbanização e projectos de promoção social viram-se obrigados á uma

desaceleração gradual no tempo. Por estes e por outros motivos, a década de sessenta

ficou marcada por muitos cortes no financiamento para importantes obras públicas nas

colónias e na Guiné em particular.

É bom lembrar ainda de que tudo o que viria afectar as colónias africanas

começou com o colapso do Estado da Índia que lesou bastante “as imagens das

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instituições militares portuguesas pelo modus faciendi da guerra” (Atlas da Lusofonia,

2001, 26). Fazendo com que, segundo a mesma fonte, quando eclodiram as guerras de

libertação nas colónias africanas, o “pesadelo” da queda do Poder Português em Goa,

Damão e Diu induziram as Forças Armadas à perspectivação convencional de “ganhar”

ou “perder”, subestimando o poder e a capacidade combativa dos guerrilheiros do

PAIGC. Sem surtir efeitos, essa posição arrogante foi corrigida e “as Forças Armadas

passaram do conceito ganhar ou perder para o de “aguentar” para ganhar tempo e

melhores condições para adopção de uma solução política” (Idem).

Foi nessa condição de ganhar tempo é que muitas oportunidades foram perdidas.

Mas o General Spínola combinou a sua larga experiência militar com a capacidade de

liderança para reestruturar toda a política governativa e militar na província, alegando

ser urgente reajustar as directivas sobre o reordenamento e autodefesa. Para tal, começa

pela “tentativa de retirar á subversão o substrato dinâmico de carácter social em que esta

se apoiava, colocando-o ao serviço da contra-subversão” (Atlas da Lusofonia, 2001,

27). Esta estratégia do General visava os sectores da manobra militar, promoção

socioeconómica e da manobra psicológica. Ou seja, criar condições de fomento e

segurança no meio rural, com vista a ganhar confiança das populações para poder

infligir pesados golpes ao inimigo, o que culminou com o desenvolvimento do seu

célebre plano “Uma Guiné Melhor” (Idem).

Apesar das vicissitudes da guerra, foram realizadas muitas actividades de campo

nos domínios de topografia e cadastro, trabalho esse que culminou na edição da obra

“Ordenamento Rural e Urbana na Guiné Portuguesa”. Nela constam sessenta e um

planos de zonamento com as respectivas memórias descritivas para os assentamentos

que considerava de fácil acesso por parte dos homens do PAIGC. Foi tudo por uma

questão de segurança e de melhoramento das condições de vida das populações. Antes

de prosseguir com outras decisões, politicamente, achou por bem reajustar a divisão

administrativa do território para garantir o bom funcionamento das estruturas do poder

local, como forma de responder às necessidades que se impunha ver a figura-12.

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Fig. 12- Divisão Administrativa da Guiné Portuguesa em 1971.

Fonte: BALDÉ, 2008, 20

Dos nove Concelhos e três Circunscrições Civis definidos anteriormente, com as

alterações de 1942, no ano de 1971, a província passou a contar com uma Capital

Provincial, doze Sedes de Concelho ou Circunscrição e trinta e duas Sedes de Posto

Administrativo. Após ter seguido de perto as preocupações das populações do interior, o

General resolveu avançar numa primeira fase com o processo de aldeamento que

consistia em agrupar os pequenos grupos populacionais dispersos, em vários pontos ver

a figura-13.

Fig. 13 – Processo de Aldeamento na Guiné Portuguesa, Concluído em 1972

Fonte: Atlas da Lusofonia, 2001, 28.

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Não pode haver um desenvolvimento económico sem o correspondente apoio do

substrato social e não é possível elevar os padrões de vida e de bem-estar, nem do nível

cultural sem que haja disponibilidade de recursos propiciados pela produção de

rendimentos. Foi com base nisto que o governo provincial iniciou o ordenamento demo-

geográfico a fim de promover um povoamento consentâneo para garantir a promoção

social. Daí que deu prioridade ao substrato social de desenvolvimento, à custa dos

recursos disponibilizados pelo governo central para satisfazer as necessidades básicas

das populações.

Decidido em mudar o rumo dos acontecimentos, Spínola afirmou que “tem-se

vivido a Província, sob o signo do improviso, ao sabor de rasgos de génio, de golpes de

fortunas e de necessidades de circunstâncias. Os imperativos de previsão, planeamento e

programação têm cedido quase sempre a preocupação muito nossa de personalizar as

obras, sem cuidar que estas só são verdadeiramente úteis quando integradas numa linha

determinante e consequente, visando finalidades que ultrapassam os estreitos horizontes

pessoais” (Spínola in PROVINCIA DA GUINÉ, 1973, 8-9). Foi uma preocupação do

general, considerar nobre a missão de continuar o que outros antes com capacidade,

senso e visão previram e planearam, como ele mesmo dizia.

Sabe-se que ao longo dos anos sessenta, com o desenrolar da guerra de

libertação, muitas famílias tiveram de abandonar as suas terras, refugiando-se no

Senegal e Guiné Conakry, principalmente as que viviam junto das fronteiras com

aqueles países vizinhos. Houve uma acentuada redução populacional na província,

motivando a reacção do General Spínola em concentrar o habitat rural muito disperso

em aldeamentos, com o melhoramento das condições de vida das pessoas como forma

de impedir o constante relacionamento com os terroristas. Com a independência, muitos

refugiados animados pelo entusiasmo e espectativas, regressaram às terras de origem,

regresso esse que acabou por criar ao jovem governo, alguns problemas de difícil

resolução. Foram problemas que se prendiam com a falta de experiência governativa,

dificuldades financeiras e falta de habitações para acolher os regressados da guerra.

Como se não bastasse, a política desacertada seguida pelo regime do Partido-Estado,

não tardou a manifestação de descontentamento generalizado. É um assunto a

desenvolver no ponto a seguir.

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3.1.2. O povoamento da Guiné-Bissau no período após a independência;

Pelo menos até 1980, ou seja sete anos após a independência, o povoamento da

Guiné-Bissau não sofreu nenhuma transformação a assinalar. Apesar de tudo o que

aconteceu ao longo dos onze anos da guerra, os muitos guineenses guardam lembranças

muitas coisas boas que tiveram antes da independência. A par da língua portuguesa

vista como o ex-líbris de todas as heranças, Portugal deixou igualmente obras em

matéria de urbanismo, muitos edifícios públicos com adaptação dos da metrópole,

unidades hospitalares, e escolas espalhados por diferentes cidades do país, tal como

habitações para os funcionários públicos. Foram construídos edifícios imponentes,

símbolo de autoridade e do poder, principalmente nas cidades mais destacadas naquele

tempo como Bissau, Bolama, Bafatá e Canchungo. É imprescindível realçar a

importância que a influência portuguesa teve na Guiné-Bissau em matéria de

planeamento e urbanização de tipo europeu.

Em vários pontos das capitais regionais guineenses aparecem células urbanas,

características de uma cidade colonial que “é geralmente abordada segundo uma

perspectiva histórica e patrimonial, contribuindo para a construção da história do

urbanismo e da arquitectura portuguesa em África” (Morais e Raposo, 2005, 90).

Territorialmente demarcado como uma parte integrante do império luso de então, o país

hoje conhecido por Guiné-Bissau, deveu muito mais à ocupação portuguesa do que a de

muitos outros impérios e reinos africanos que como se sabe, também chegaram a ter o

domínio dessas terras. É salutar reconhece-lo, não obstante um passado repugnante com

marcas profundas naquela região longo das gerações, desde os tempos da escravatura

até as guerras de pacificação, que culminaram com sangrenta luta armada que durante

onze anos para as duas partes sacrificarem muitos dos seus filhos.

As ambições demonstradas pelo primeiro presidente Luís Cabral em matéria da

criação de pequena e médias indústrias transformadoras para Capital Bissau, Cidades de

Bolama e Bafatá para além do início das obras da via rápida que liga o Aeroporto de

Bissalanca ao centro da Capital, convenciam a qualquer cidadão das possíveis mudanças

para o desenvolvimento nacional. A rede urbana herdada continuou a mesma, todavia,

com alguns sinais de melhoria, até que o primeiro levantamento militar de 14 de

Novembro de 1980 que afastou o presidente Luís Cabral tivesse lugar, trazendo novas

orientações, porque o novo governo rompeu com vários programas herdados e do

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executivo deposto, em detrimento de outros eixos de orientação que acabaram por

destruir por completo o trabalho realizado em muitos anos para a elevação do nível

social e do bem-estar das pessoas.

Tratava-se realmente de uma atitude corajosa por parte do Presidente Luís

Cabral com a sua visão futurista, contudo subsistiam os problemas de fundo que mais

afetavam a população, a começar pelo saneamento de base, melhoria das condições de

sobrevivência, habitação e habitabilidade, mobilidade e a garantia da segurança pública.

Houve quem dissesse que foi uma fragilidade muito bem aproveitada pelos” irmãos de

armas” mas sequiosos do poder para interesses pessoais. O golpe de estado teve

consequências negativas, a começar logo pela suspensão da Constituição Nacional da

República vigente, e ao abandono das práticas de Planeamento e urbanização já

iniciados na era colonial.

Com o continuar da instabilidade político-militar que se traduz numa total

inércia na tomada de decisões chaves para um verdadeiro desenvolvimento desejado, os

primeiros sinais de pobreza começa a surgir nos primeiros anos da década de 80,

originando o maior êxodo rural no país. Mantinha-se a insuficiência de habitações

sociais, por falta da política social de arrendamento. Foram todas estas situações que

acabaram por originar o crescimento desordenado dos Bairros periféricos em Bissau,

Bafatá e Gabú. Para concluir, é dizer que a independência da Guiné-Bissau, em nada

contribuiu para uma regeneração do povoamento existente, nem para a edificação de

outros novos aglomerados populacionais com condições básicas aceitáveis ou

necessárias para o bem-estar comum. O povoamento guineense foi espontâneo ou

natural, dentro de uma harmoniosa e interação com base na resiliência dos recursos

naturais e do potencial humano existente, na sua luta pela sobrevivência. Ou seja, o

atual povoamento que constitui o sistema urbano guineense tem por base a estrutura

herdada, ainda que com muitos problemas por resolver. É uma matéria a desenvolver na

alínea a seguir com alguns detalhes sobre os factores da distribuição geográfica da

população e mudanças que possam estar a acontecer.

a) Factores da distribuição geográfica da população e mudanças em curso;

Muitas investigações e estudos científicos sobre esta temática concluíram que

em geral, a distribuição geográfica da população sobre um determinado território

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depende muito de factores naturais como o clima, relevo, solos, subsolos, rios,

vegetação, litoralização etc., e factores humanos, quando se refere às cidades, vias de

comunicação, dinamismo económico, passado histórico, áreas de agricultura intensiva,

áreas de indústria e turismo. Os dados do último recenseamento geral da população e

habitação de 2009, permitiram fazer uma análise mais aproximada da realidade; no

Quadro-7 pode ver-se que a atual densidade populacional do país situa-se em cerca de

42,10 hab/km2. É um valor muito baixo, mesmo para um pequeno como a Guiné-

Bissau. A distribuição geográfica da população de pouco mais de 1.500.000 habitantes

em todo território não apresenta grandes diferenças, embora com a evidência do

fenómeno da litoralização e da macrocefalia de Bissau.

Em termos gerais, os factores atractivos sejam naturais ou humanos, podem ser

muito determinantes neste caso guineense, porque como se sabe, o país é caracterizado

por um clima tropical húmido, possui bons solos para a agricultura, muitos rios e

riachos, algum coberto florestal de grande importância para o ecossistema nacional, sem

no entanto mencionar a riqueza do subsolo. As grandes concentrações populacionais

verificam-se no litoral e ao longo das três importantes bacias (Cacheu, Geba e Corubal),

não obstante as questões históricas e culturais.

A cultura, os usos e costumes enraizados na Guiné-Bissau ao longo dos tempos,

por um lado condicionaram a distribuição da população por grupos étnicos, quando

estes sentem a legitimidade de posse de qualquer (chão) ou parcela territorial que

estejam a ocupar. É muito habitual ouvir-se na Guiné-Bissau as expressões como estas:

chão Manjacos no Norte, chão Balanta no Centro e Sul, chão Mandinga e Fula no

Nordeste, chão Nalú e Beafada no Sul etc., o que vem confirmar o tal sentimento

generalizado de pertença. Geralmente, esses chãos eram habitados de uma forma

casuísta e dispersa pelos pseudo donos, essencialmente como forma de proteger e evitar

a sua ocupação por outros grupos considerados estranhos.

A discrepância dos valores referentes à densidade populacional por região deve

ser entendida como resultado das diferenças territoriais. As campanhas para a

organização territorial levadas a cabo na era colonial ajudaram na concentração de

pequenos povoados ao longo das principais vias de comunicação e nos arredores das

Sedes de Concelhos ou Circunscrições. É uma tendência que ainda se apercebe nesta

nova fase de crescimento urbano e de ordenamento rural.

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Quadro: 7- Densidade Populacional por Regiões Administrativas (2009)

Região População Sup. Km2

Hab/km2

Bafatá 210.007 5.981,1 35,11

Biombo 97.120 838,8 115,78

B. Bijagós 34.563 2.624,4 13,17

Cacheu 192.508 5.174,9 37,20

Gabú 215.530 9.150,0 23,55

Oio 224.644 5.403,4 42,58

Quinara 63.610 3.138,4 20,28

SAB 387.909 77,5 5005,27

Tombali 94.939 3.736,5 25,40

G. Bissau 1.520.830 36.125,0 42,10

Fonte: Autoria Própria com dados do INEC. (19-04-2011)

Os elevados valores da densidade populacional, de 5005,27 hab/Km2

para o

Sector Autónomo de Bissau, assim como 115,78 hab/ Km

2 para a região de Biombo,

podem ter duas leituras. Primeiro, pelas razões territoriais já referenciadas; segundo, a

forte influência que Bissau exerce sobre Biombo. Em termos demográficos, Bissau hoje

já não suporta a capacidade de carga a que está a ser submetida e com tendência a

aumentar, caso não se teme medidas correctivas. A região de Gabú aparece com apenas

23,55 hab/Km2, por ser a mais extensa de todas e, em termos populacionais, está nos

primeiros lugares. A região de Bolama Bijagós ocupa o último lugar, pela sua

especificidade de insularidade.

Dos trinta e sete Sectores Administrativos existentes no país, apenas Caravela e

Uno na região de Bolama Bijagós possuem 4.662 e 7.627 habitantes respectivamente,

sendo que todos os restantes Sectores se situam acima dos 10.000 habitantes cada. Daí

que, teoricamente, podemos concluir que pelo facto de existirem mais factores

atractivos em relação a factores repulsivos, a distribuição geográfica da população na

Guiné-Bissau tende para uma distribuição homogénea, sem no entanto ignorar a falta de

emprego e das vias de comunicação nas regiões rurais. Em termos gerais, não se

vislumbram nenhumas mudanças significativas nos centros urbanos do interior, talvez

por falta de equipamentos e serviços. A questão da infraestruturação, levada a cabo nos

últimos tempos em algumas grandes cidades, será realçada na alínea a seguir.

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b) A actual fase de crescimento urbano e a (sub) urbanidade;

“Os habitantes das favelas encontraram a sua própria técnica, os seus próprios

recursos, sem qualquer assistência de quem quer que fosse, e resolveram os seus

problemas de habitação” (Gameiro, 2005:140). Servimo-nos desta citação apenas para

tecer uma pequena comparação. Sabe-se que existem similaridades entre uma franja da

população brasileira que vive nas favelas e quase a maioria da população guineense em

matéria de habitação. Durante a fase de crescimento, as dificuldades em conseguir uma

habitação condigna são muitas, “a pobreza, a falta de planeamento, de assistência

técnica, de financiamento para comprar materiais de construção, a falta de

equipamentos urbanos” (Idem), constituem o principal problema. Não é nada fácil

reflectir sobre estas situações porque “falando em termos gerais, sem ir ao encontro das

necessidades básicas do ser humano, a preocupação com o ambiente tem que ser

secundária. O homem tem de viver, de atender primeiro as suas necessidades básicas de

sobrevivência – comida, habitação, saúde – e só depois ao ambiente” (Idem).

O Arquiteto António Gameiro no seu artigo sobre O desafio urbano em Angola

viria a reflectir sobre a crise ecológica e sanitária, tema que urge analisar quando se

pretendem encontrar explicações para um defeituoso processo de desenvolvimento

sustentável como aquele que se vive na Guiné-Bissau. A rede urbana, constituída por

Cidades Capitais regionais, vilas e aldeias tabancas, congrega todas as interacções

políticas, económicas e sociais da sociedade guineense onde, na ausência de Planos

Directores, as periferias das cidades não param de crescer à custa da informalidade. As

redes viárias e fluviais de conecção regional, tornaram-se muito fundamentais para a

mobilidade das populações nos últimos anos. Os pequenos campos de aviação e

aeródromos espalhados pelo país durante a era colonial, encontram-se desactivados

alguns anos após o golpe de estado de 1980. A saga de regresso dos refugiados de

guerra que fez disparar o crescimento populacional nas aldeias fronteiriças

principalmente com o Senegal nos primeiros cinco anos após a independência, só

chegaria a Bissau no princípio da década de oitenta, trazendo uma enorme pressão na

ocupação e na transformação do uso do solo.

Num período de apenas dez anos, a consequência da desarticulação das

estruturas produtivas e da falta de emprego no meio rural, a instabilidade político-

militar, o fenómeno de êxodo rural muito intenso, deixaram em particular o município

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de Bissau sem resposta, porque o tecido habitacional existente já não suportava a

demanda. Entendemos que devido a falta de vontade política capaz de promover a

governança no país, surgiram a especulação, o facilitismo e a falta de rigor na

observância da lei sobre a coisa pública, ocupação e transformação do uso do solo, que

por sua vez criaram graves problemas ambientais em Bissau e em algumas cidades

médias do país.

Segundo o entrevistado durante o trabalho de campo realizado no país, Sr. Rui

de Carvalho Administrador em S. Domingos, a falta de controlo na ocupação horizontal,

levada a cabo principalmente em grandes centros, com habitações precárias feitas a

partir de materiais de ocasião em áreas inadequadas e vulneráveis, pode pôr em perigos

muitas vidas e comprometer as heranças das próximas gerações. As imagens da figura-

14 são exemplo disso, quer se trate de Capitais Regionais ou não. Ultimamente, temos

Mansoa, Bissorã na região de Oio, Ingoré e S. Domingos na região de Cacheu, pelo

facto de estarem apoiadas por uma estrutura de estradas que facilitam a mobilidade

interna.

Fig. 14- Manchas Urbanas das Cidades de Bissau e Gabú

Fonte: Imagens tiradas do Google Earth em 10-06-2011

Surgiram grandes manchas suburbanas sem infra-estruturas técnicas, de

mobilidade, segurança, e serviços de base, marcadas pela falta de espaços verdes para o

recreio e lazer. O problema da pobreza é transversal a todos os países daquela costa

africana mas a Guiné-Bissau parece ser um caso à parte, porque desde a sua

independência nunca se encontrou, como um Estado-providência que garanta o bem-

estar das populações. Isso não ajuda em dana, no equilíbrio do sistema urbano e no

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melhoramento do nível de vida das pessoas, contudo a guerra civil de Julho de 1998

despertou um novo sentimento de nacionalismo e do espírito de entreajuda entre as

pessoas. Tudo passa-se pela criação de micro cooperativas agrícolas, ONG nacionais e

outros associativismos sem pendor étnico. Esta nova realidade suscitou uma onda de

regresso às aldeias nos últimos anos, com aposta no empreendedorismo e adesão ao

microcrédito. Apesar das dificuldades económicas, a sociedade do conhecimento e a

globalização vão marcando passos na vida urbana, onde uma larga maioria de pais que

apenas vivem do mercado informal, apostam na formação dos filhos no estrangeiro.

A (sub) urbanidade atrás referida é um novo conceito que, na sua acepção actual,

significa “qualidade do urbano” Matias Ferreira (2004) citado por (Raposo e Henriques,

2005, 114), e tem vindo a tornar-se uma realidade nas periferias das cidades-capitais na

Guiné-Bissau. A realização das feiras tradicionais vulgas lumo, em diferentes Setores

Administrativos no interior, tem ajudado bastante na acumulação de riquezas dentro do

mundo rural. Com isso, muitos até conseguem construir habitação coberta com folha de

zinco. É uma forma de incentivar a suburbanização, porque a partir dos pequenos

antigos centros urbanos com comércio e serviços, alastram as periferias sem áreas

físicas de transição no complexo imobiliário. Em termos da degradação ambiental, a

agricultura urbana, que contribuía para o fornecimento de frescos para as cidades, está a

desaparecer em favor das edificações casuístas que afetam a saúde pública. Cada região

cresce ao seu ritmo de acordo com as suas potencialidades naturais e humanas, onde as

tipologias europeias misturam-se com o que é típico das tradições locais, gerando

modelos de fácil concretização pelas camadas mais desfavorecidas.

O elevado crescimento da população por região ver o Quadro-8 reflecte a

suburbanidade que ocorreu em grande escala ao longo dos últimos trinta anos no SAB,

onde a população aumentou 278.695 habitantes e principalmente nas Cidades Capitais

das regiões de Gabú e Bafatá. No ranking das regiões, Oio sempre situou-se em

segundo lugar depois de Bissau, contudo apenas os Sectores de Bissorã e Mansabá

albergam mais pessoas e não Farim. O mesmo acontece com a região de Cacheu, onde a

Cidade de Cacheu tem menos habitantes em relação aos Sectores de Bigene, Canchungo

e S. Domingos. A região de Biombo registou algum aumento desde a realização do

primeiro Recenseamento Geral da População e Habitação de Abril de 1979, talvez pela

proximidade com Bissau, onde a questão de transporte não é muito preocupante. Já não

se pode dizer o mesmo relativamente às regiões de Quinara, Tombali e Bolama/Bijagós,

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onde esta última nunca ultrapassou 50.000 habitantes pela sua insularidade; as outras

duas nunca chegam a 100.000 habitantes cada, pela especificidade territorial e da

debilidade das suas redes viárias.

Quadro: 8 – População por Regiões Administrativas entre (RGPH 1979-2009)

Fonte: Dados do INEC. (19-04-2011)

3.2 - O SISTEMA URBANO GUINEENSE: AS PRINCIPAIS REGIÕES E

AGLOMERADOS POPULACIONAIS DO PASSADO À ACTUALIDADE.

3.2.1. As regiões e a divisão administrativa atual;

Constitucionalmente, a Guiné-Bissau foi alvo de mais um reajustamento na sua

divisão político-administrativa em 1996, passando a apresentar um figurino territorial

bem diferente daquele que vigorava entre 1971 até a tomada da independência em 1973.

O país passou a contar com oito regiões administrativas a saber: Bafatá, Biombo,

Bolama Bijagós, Cacheu, Gabú, Oio, Quinara e Tombali, mais um Sector Autónomo de

Bissau (SAB), que corresponde a própria Capital como se pode constatar na figura-15.

Apesar das diferenças entre os dois mapas (o colonial e o atual), não se sabe no

entanto os critérios utilizados para determinar e delimitar os polígonos das regiões, não

obstante o mapa colonial tende a aproximar-se do critério étnico em algumas áreas,

muito embora não existem fundamentos oficiais que o possam provar. Quanto ao catual

mapa, poder-se-ia avançar com motivações meramente formais ou políticas, porque era

bem compreensível que depois da independência a nova administração queira

reorganizar o território para o ajustar às suas necessidades.

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Fig. 15 – Atual Divisão Político-Administrativa (2011)

Fonte: Atlas da Lusofonia, 2001, 38.

Aliás, a nova redação dada pela Lei Constitucional nº1/96 refere no seu

ARTIGO 107°, ponto1, de que “ Para os efeitos político-administrativos, o território

nacional divide-se em regiões, subdividindo-se estas em sectores e secções, podendo a

lei estabelecer outras formas de subdivisões nas comunidades cuja especificidade isso

requerer” (CRGB, 1996).O actual sistema urbano guineense apresenta um grande

desequilíbrio em vários aspectos. Cada região enfrenta carências de várias ordens tendo

em conta as próprias especificidades locais, contudo existem outras preocupações que

são transversais a todas elas.

Trata-se da falta de instrumentos cartográficos a nível nacional como elementos

indispensáveis na tomada de decisões sobre todas as políticas, em particular, a de

planeamento e Ordenamento do território. É verdade que com o desenvolvimento da

informática, novas formas de detecção remota e armazenamento de dados, existem

inúmeras vias para se obter elementos cartográficos, desde a observação das imagens de

satélite até a obtenção do produto final através de métodos numéricos. Mas mesmo

assim, para um país atrasado como a Guiné-Bissau, urge actualizar toda a cartografia

existente, para potenciar a monitorização das contínuas mudanças físicas em meios

rurais e urbanos.

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A título de exemplo, as 72 folhas da série na Escala 1:50.000 elaborada e

publicada pela Junta de Investigação do Ultramar entre 1953 a1963, já não se encontram

na Direcção Geral de Cadastro no Ministério das Infra-estruturas em Bissau, devido ao

longo período de uso sem novas edições. Da mesma forma, a única folha na Escala 1:

500.000 que cobre todo território nacional, publicada em 1961 pelo mesmo organismo

português, também encontra-se esgotada. Nunca existiram ortofotomapas, outra peça

fundamental de informação cartográfica ao público, para além das fotografias aéreas

que segundo os processos cartográficos antigos, são imprescindíveis para a foto-

interpretação. Achou-se por bem mencionar estas carências porque na ausência de

instrumentos gestão do território na política das cidades, o poder local pode se servir

desses elementos na elaboração de planos de pormenor ou no acompanhamento das

pequenas obras públicas.

As oito regiões administrativas mais o SAB que compõem o sistema urbano

guineense subdividem-se em trina e oito sectores administrativos também subdivididos

em secções e tabancas, constituem uma estrutura de forte interdependência baseada num

modelo policentrista tipicamente africano. Um sistema urbano onde os valores

tradicionais, hábitos e costumes étnicos ainda se misturam, sobrepondo o modelo

urbano europeu. É bom lembrar que, o actual modelo de organização da estrutura

urbana deve muito à consolidação das antigas aldeias (tabancas) fundadas

maioritariamente pelas populações agrícolas de diferentes grupos étnicos, em torno de

terras sobretudo quando apresentam várias aptidões para uso, excepto aquelas

anteriormente referenciadas que foram fundadas pelos comerciantes portugueses. A

especificidade, as características dos solos, a diversidade das práticas agrícolas etc., são

valores que os poderes regionais ou locais não souberam aproveitar, na medida em que

os seus eixos estratégicos pela vertente urbanística não reflectem uma abordagem

integrada suportada nas dimensões demográfica e funcional e nas orientações dos seus

Instrumentos de Ordenamento, onde se pode destacar uma estrutura polinucleada e

fortemente interdependente em cada região. Numa escala mais alargada, não é fácil

definir um sistema polarizado por centros urbanos com uma dimensão social e

dinamismo económico capazes de estruturar um novo modelo territorial.

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3.2.2. A hierarquia das aglomerações urbanas guineenses

O estudo sobre a hierarquia das aglomerações urbanas para qualquer sistema ou

subsistema urbano, seja ao nível concelhio, regional ou mesmo nacional, tem de partir

da reflexão sobre o conceito de “Cidade” e das redes e sistemas que estão associados a

esta. Sobre este conceito, vimos que “O estudo da cidade é um tema tão sugestivo como

amplo e difuso; a sua abordagem por um só homem é impossível se tivermos em conta a

massa de conhecimento que ele teria de acumular. Pode estudar-se uma cidade sob um

número infinito de ângulos. O da história: «a história universal é feita de cidades» disse

Spengler; o da geografia: «a natureza prepara o local e o homem organiza-o de forma a

satisfazer as suas necessidades e desejos» afirma Vidal de la Blache; o da economia:

«em nenhuma civilização a vida das cidades se desenvolveu independentemente do

comércio e da indústria» (Pirenne); o da política: «a cidade segundo Aristóteles, é um

certo número de cidadãos; o da sociologia: «a cidade é a forma e o símbolo de uma

relação integrada» (Mumford); o da arte e arquitectura: «a grandeza da arquitectura está

ligada á da cidade, e a solidez das instituições costuma avaliar-se pela dos muros que as

protegem» (Alberti) ” (Goitia, 2003: 9).

Com base nesta reflecção, uma cidade pode ser vista e compreendida de várias

formas e interpretada igualmente sob diferentes pontos de vista, conforme o estrato

social, vivência, a cultura etc.. O caso da Guiné-Bissau é muito particular, uma vez que

em termos de génese de uma cidade segundo a tipologia ocidental, talvez seja apenas a

retícula de Bissau-Velho a reunir essas condições. Porque todos os assentamentos hoje

consideradas cidades capitais das regiões administrativas funcionaram em tempos como

entrepostos comerciais, erguidos e guarnecidos pelos brancos, com a exceção de

Quinhamel, Capital da região de Biombo. Prova disso, todos esses assentamentos

localizam-se nas margens dos rios ou nas suas embocaduras excetuando Gabu, porque

outrora eram servidos pelo transporte fluvial a partir de Bolama, antiga Capital da

colónia, até 1941. Infelizmente não houve tempo para desenvolver urbanisticamente as

cidades de Bafatá, Gabu, Catió, Bolama, Mansoa, Farim, Canchungo e S. Domingos tal

como se fez em Bissau, por causa da luta armada que durou onze anos. Por esta falta de

grandes ou médias cidades de referência, o atual Sistema Urbano Guineense continua a

ser um dos mais pobres a nível da arquitetura moderna. É um sistema urbano

constituído segundo a escala e o peso do país, por cidades em avançado estado de

degradação sobretudo nas malhas urbanas dos antigos centros coloniais, que pelo menos

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ainda apresentam alguma “linguagem arquitectónica dos centros administrativos,

económicos, culturais, de serviços e residenciais das elites nacionais ou internacionais e

da pequena burguesia local” (MORAIS e RAPOSO, 2005, 90). Uma rede urbana onde

aparecem aglomerações populacionais dispersa, predominantemente rurais e com

profundas carências sociais. Um sistema urbano onde as redes de comunicação são

deficitárias, onde a distribuição da energia elétrica ainda com fraca, onde existem

problemas com saneamento de base, com a distribuição da água potável canalizada,

prolemas ambientais, com a saúde, educação etc.

Perante esta situação, podemos concordar com a seguinte tese: “São poucas as

administrações urbanas dos países em vias de desenvolvimento (PVD) que têm o poder,

os recursos e o pessoal treinado para disponibilizar à população em rápido crescimento,

espaço e serviços necessários a uma vida humana digna; sistema de saúde, escolas, água

limpa, saneamento e transportes” (Gameiro,2005:141). Em termos de Normativas de

carácter social, o actual sistema urbano guineense carece de uma estrutura urbana

propriamente dita, com equipamentos de carácter social e interdependência funcional.

O turismo e lazer com todo sistema a ele associado, ainda se encontram numa

fase muito incipiente. Quanto às normas específicas para o ordenamento do território,

não se pode enfatizar sobre o policentrismo uma vez que só Bissau tem a função do

único polo de atracção e responsável pela integração territorial como aspecto

fundamental. Como ainda não aconteceram as eleições autárquicas que possam permitir

para que cada Município garanta a gestão do seu território, os aspetos como a contenção

do edificado, proporcionalidade e programação das áreas urbanas, qualidade urbanística

etc., são da inteira responsabilidade da Câmara Municipal de Bissau quanto a SAB e do

Ministério das Infra-estruturas, quanto ao resto do país. Com o atual quadro desajustado

de desenvolvimento do país, não é fácil proceder a uma análise da hierarquia urbana,

porque o peso da ruralidade ainda é maior, o que requereria um trabalho de campo

muito profundo e demorado. Daí que, uma das formas encontrada foi considerar cada

região administrativa no seu todo, como uma unidade territorial a depender totalmente

de Bissau, não obstante, cada Capital Regional exerce simultaneamente a sua influência

sobre todos os seus Sectores Administrativos.

No que se refere à hierarquia urbana, na Guiné-Bissau podemos identificar três

grandes Sedes Regionais (Bissau, Bafatá e Gabu), onde pelo menos a economia de

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mercado tem alguma expressão, devido a uma maior concentração da população ao

redor dos antigos centros coloniais detentores de algumas infraestruturas comerciais e

de serviços. As restantes Sedes estão confrontadas mais com a dispersão em pequenas

aldeias sem condições para qualquer competitividade interna pelo facto de serem

pequenas, limitando-se a sobreviver com total dependência na agricultura, pesca ou

economia informal. Quanto à funcionalidade, sabe-se que os sectores da saúde,

comércio, turismo, transporte e ensino são fundamentais para o bem-estar e a promoção

social. Porém, são os que apresentam mais fragilidades no atual sistema, contudo

existem alguns subsistemas regionais que, de uma forma tímida vão ajudando na criação

de postos de trabalho e na acumulação de riquezas no plano micro.

Em termos gerais, apenas a Capital Bissau e o Centro Urbano de Gabú sentem

forte pressão demográfica, motivada pelo papel que ambas desempenham como

importantes Centros de polarização económica a nível local e regional, principalmente

Bissau, como se pode ver na figura-16, sabendo que os restantes continuam a viver o

drama da degradação das antigas áreas urbanas herdadas do poder colonial.

Fig. 16 – Área de Influência de Bissau no Sistema Urbano Guineense

Fonte: Atlas de lusofonia, 2001, 38 (adaptação do autor)

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Esta matéria vai ser recuperada e desenvolvida no capítulo das conclusões e

reestruturação do sistema urbano nacional. Iremos agora falar sobre as principais

cidades, seguindo a sua posição na hierarquia urbana.

a) A capital do país e as capitais das oito regiões

Bissau

Situado no tradicional (Chão de papel) numa área já frequentada pelos

portugueses desde 1446 na embocadura do rio Geba, “a então vila de Bissau, fundada

em 1776, como fortificação militar e entreposto de tráfico de negros, funcionou como

centro de comércio de muitos produtos autóctones durante muito tempo e como a sede

da Capitania Geral para a administração do território, fundada em 1630. Bissau era

Capital do distrito de Bissau que compreendia as fortificações de Bissau, Geba, Fá,

Ilhas de Bolama e das Galinhas, no arquipélago do mesmo nome” (Atlas da lusofonia,

2001:13-14).

Foi elevada à categoria de Cidade em 1914, sendo atualmente, e com base na

Constituição da República guineense e no quadro da administração do território,

designado Sector Autónomo Bissau (SAB) ver a foto-1 em baixo.

Foto 1- Vista Aérea do Centro da Cidade Capital da Guiné-Bissau (1966)

Fonte: Adrião Mateus; http://www.cart1525.com/aereas.html, 19-06-2011

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Quanto ao enquadramento físico, o SAB é limitado a Este pelo grande canal do

Geba que o separa da região de Quinara, a Oeste pela região de Biombo, a Norte pela

região de Oio e a Sul pela região de Bolama Bijagós. Bissau ascendeu à categoria de

Capital da Guiné Portuguesa a 9 de Dezembro de 1941, tendo mantido esse título até 26

de Agosto de 1974, data em que foi reconhecido o Estado da Guiné-Bissau por

Portugal, “no acordo de Argel entre o Governo português e o PAIGC, que agendava a

independência da Guiné-Bissau para 10 de Setembro de 1974” (Atlas da lusofonia,

2001: 31).

A partir dessa data, a Cidade de Bissau tornou-se definitivamente Capital da

República da Guiné-Bissau, herdando um centro com uma estrutura funcional aceitável

para a sua escala de urbanidade. Segundo (Mendy, 2006), depois de construída a praça

de S. José em 1776, seguiu-se em meados de 1844 a construção do primeiro burgo,

guarnecido por uma muralha de pedras com cerca de quatro metros de altura nos

arredores onde todo tipo de comércio se desenvolvia, ver na figura-17. Essa

configuração não difere muito da dos actuais quarteirões que constituem o conhecido

Bairro de Bissau Bedjo (Bissau Velho, em crioulo). Muito tempo depois, o Porto Cais e

Pidjiguiti trouxeram novas dinâmicas á Baixa, em substituição de um antigo

desembarcadouro ali construído sob olhar atento dos Régulos Papeis, e que servia

apenas para abastecer a Praça.

Fig. 17- Plano do Burgo de S. José, protegido por Muralhas

Fonte: MENDY, 2006, 67.

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Sendo uma Cidade que já apresentava algumas condições de habitabilidade para

a comunidade residente branca, não seria de estranhar que em 1923 fosse elaborado o

seu primeiro plano urbanístico, procedendo-se com a demolição dos bairros grumetes da

periferia para o alargamento do núcleo urbano existente. Foi igualmente demolido o

muro de guarnição do antigo burgo, rasgando novas ruas que definem os quarteirões do

centro da estrutura funcional e a chamada zona residencial da cidade, onde criaram

novas acessibilidades consoante os novos planos de zonamento. Ainda segundo Mendy,

2006, 15 de Junho de 1948, através do Decreto-Lei nº 1416, aprovou-se o Plano Diretor

de urbanização da cidade de Bissau, com novos alargamentos e definição de novos

limites. Até 1955, muitas alterações na ocupação de solo tiveram lugar na Cidade de

Bissau, com o surgimento da primeira coroa de bairros para a população assimilada e

para os funcionários da função pública. Mesmo sabendo que a ilha de Bissau apresenta

um péssimo ambiente orográfico devido a existência de variadíssimas linhas de água e

áreas de inundação com mais aptidão para agricultura cerealífera do que para ocupação

habitacional, a projecção dos Bairros de Santa Luzia a par de Cupelum, Sintra-Nema,

Reno, Gambiafada, Chão-de-papel Varela e Bandim, que já constituíam a primeira

coroa de alargamento do antigo núcleo, é sem dúvida, um pronuncio para um futuro

caótico na urbanização. Sabe-se que não foi fácil criar condições para urbanizar a baixa

de Bissau pelos motivos já invocados, a administração colonial teve de realizar um

grande trabalho técnico de drenagem dessas áreas pantanosas. Este primeiro passo

indispensável, não está acontecer nas áreas invadidas por uma nova onda de edificação

imobiliária nos últimos anos. Na ausência de instrumentos de planeamento e de

equipamentos técnicos, vagas de suburbanização que se seguiram estão a comprometer

o ambiente, a segurança e a saúde pública.

Houve um ligeiro abrandamento na expansão de Bissau, nos anos sessenta por

causa da guerra, mas logo após a independência tudo mudou, com a destruição das áreas

agrícolas urbanas que garantiam o fornecimento de hortofrutícolas á cidade. A

população não pára de aumentar em Bissau; segundo os dados do último

Recenseamento Geral, já habitavam nessa cidade 387.909 almas, numa pequena

superfície de apenas 77,5 km2. Ou seja, uma densidade populacional bastante elevada,

na ordem dos 5.005 hab/km2. Isso prova que Bissau ultrapassou e muito, a sua

capacidade de carga, tornando cada vez mais complicada a tarefa de ordenamento e da

sua gestão territorial.

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Esta preferência por Bissau não é de todo uma novidade porque logo após as

investidas urbanísticas dos anos cinquenta, “Bissau passou de 22.000 habitantes antes

do eclodir da guerra para 30.000 habitantes ainda nos finais dos anos 60, uma situação

que mina um desenvolvimento harmonioso e progressivo para qualquer cidade negra e

que foi muito bem aproveitada pela Administração Portuguesa para dar soluções e

condições que não permita o regresso dessa gente para os seus ambientes anteriores.

Bissau, com 30.000 habitantes aglomerados em condições deploráveis, construções

erguidas arbitrariamente com materiais de ocasião sem grande fisionomia construtiva,

uma população de assalariados com vencimentos fracos num grande regime de

sublocação por falta de alojamento e muita procura. (...) ” (VARANDA,1965, 22-43).

Procurou-se este contributo para mostrar o tipo de impacte que a pobreza tem,

principalmente nas sociedades africanas onde quase falta tudo. A leitura que se pode

fazer da figura-18 pode resumir a preocupação a ter a com urbanização da cidade de

Bissau. Apenas o antigo núcleo residencial erigido na era colonial (em tom mais

carregado) cidade de alcatrão, apresenta as características de tipo ocidental. Apesar de

começarem a existir alguns pequenos núcleos legais, de morfologia homogénea, a

maioria dos bairros são de construção precária e sem rede de saneamento de base.

Alguns beneficiaram de pequenos projectos de melhoramento co-financiados pelos

parceiros bilaterais, o que é de louvar, não obstante, só serviram para adiar os

problemas.

Fig. 18- Cidade de Alcatrão e o 1º Anel de Expansão com construção precária

Fonte: Luís Graça, 2005,1

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Na figura-19, pode-se ver que desde a independência até 2004, a Cidade de

Bissau já tinha perdido uma vasta área de terrenos agrícolas em favor do crescimento do

parque habitacional. Esses Terrenos, outrora potenciavam o cultivo de arroz e

hortofrutícolas para o abastecimento dos seus habitantes. Nos dias de hoje, praticamente

já não existem os terrenos inundáveis.

Fig.19 – Carta de Ocupação de solo, o Alargamento dos Bairros de Bissau em 2004

Fonte: MENDY, 2006, 135.

Gabú

É a maior cidade do Leste do país, capital da região com o mesmo nome. Gabu

já desempenhara um papel fundamental ao serviço dos impérios de Gana, Mali e

Songhay. Foi um grande centro de estudos corânicos durante o poderio mandinga do

império de Mali e Capital do estado independente de Futa Djalon e igualmente capital

de um pequeno Império Kaabu até ao século XIX, quando os Fulas dominaram e

estabeleceram a sua supremacia naquela região, após o desmoronamento do império de

Songhay. A cidade de Gabú chamava-se Nova Lamego, durante o período colonial e foi

muito crucial para as movimentações das tropas portuguesas naquela região.

Geograficamente, a região de Gabú fica no leste do país, limitada a Este pela fronteira

com a República da Guiné Conacri, a Oeste pelas regiões de Bafatá e Tombali, a Norte

pela fronteira com o Senegal e a Sul ainda pela fronteira com a Guiné Conakry. Tem

uma superfície de 9.150 km2

e habitada por pouco mais ou menos de 215.530

habitantes.

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Orograficamente é a região que apresenta alguns planaltos mais a leste (colinas

do Boé), contudo não chegam a ultrapassar os 300 metros de altitude. Como recursos

naturais, a região de Gabu depende fundamentalmente da agricultura, pecuária,

comercio e da emigração. A Cidade de Gabú funciona actualmente como segundo maior

centro financeiro da Guiné-Bissau, onde muitos milhares de Fcfa são movimentados por

dia, graças ao controlo das importações vindas do Senegal e Guiné Conacri por via

terrestre. Urbanisticamente Gabú aposta fortemente na construção de habitações e na

recuperação dos imóveis públicos da herança colonial ainda preservados no centro da

cidade embora em avançado estado de degradação. Segundo nosso entrevistado durante

o trabalho de campo (30-03-2011), Laurindo Lassana Daramé, Delegado Regional de

Planeamento em Gabú, entre muitas outras declarações, destacou a importância de um

contrato de quatro anos que o governador da região Sr. Pedro Moreira Embaló, assinou

com a empresa Eléctro Solar SA, (propriedade de um jovem empresário natural de

Gabú mas que há muitos anos emigrado na Holanda) para o fornecimento da energia

elétrica. Alega que o projeto tornou a Cidade de Gabú a primeira do país depois da

independência, a ser fornecida eletricamente 24 horas por dia. Concluiu dizendo que a

contribuição como aquela, por parte dos emigrantes de Gabú, tornara a cidade mais

atrativa e com um grande peso na hierarquia da rede urbana nacional.

Bafatá

Bafatá, é Cidade Capital da região com o mesmo nome, situada no centro do

país. Geograficamente a região de Bafatá é limitada a Este pela região de Gabú, Oeste

pela região de Oio, a Norte pela fronteira com o Senegal e a Sul pela região de Quinara.

Orograficamente a região de Bafatá também apresenta um vasto planalto com algumas

elevações resultantes do prolongamento dos planaltos da região leste.

Territorialmente tem uma superfície de 5.981,1Km2 onde habita uma população

de pouco mais ou menos 210.007 habitantes. Tal como Gabú, a Cidade de Bafatá tem

grande peso na história da Guiné-Bissau, possui marcas da influência Árabe, mesquitas

e escolas corânicas, contudo, também tem uma das mais antigas comunidades católica

na Guiné-Bissau depois de Cacheu e Geba. Foi lugar onde nasceu a 12 de Setembro de

1924, o fundador da nacionalidade guineense, Amílcar Lopes Cabral. Foi palco de

muitos e sangrentos confrontos entre Fulas e Mandingas na época da queda do Império

do Mali, mesmo durante a ocupação do Império de Songhay devido ao aparecimento

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dos pequenos reinos rivais que se afirmavam um pouco por toda a região de moriá, à

revelia do controlo do reino de Futa Djalon.

Segundo o Sr. Adriano Pereira (Atchutchi), Administrador da região de Bafatá,

também nosso entrevistado durante o trabalho de campo em Março de 2011, a cidade de

Bafatá enfrenta graves problemas ligados com a degradação do antigo tecido urbano tal

como muitas outras cidades do país. Realçou no entanto a importância que a bacia do

Geba representa para a cidade, na disponibilização de boas terras para o cultivo

cerealífero e para a criação de gado, atividades de que toda região depende, para além

da pesca que ali se pratica e do para além do comércio. Disse que graças às valências

dessas terras, a Cidade de Bafatá continua a beneficiar de Projecto agrários e outros que

as ONG através de assinaturas de acordos com o poder local, desenvolvem, o que é uma

mais-valia para a criação de postos de trabalho e para a manutenção da fixação das

pessoas, sobretudo os técnicos profissionais. A Cidade de Bafatá acompanha

economicamente os ritmos de Gabú, beneficiando da boa estrada que liga as duas

cidades e do posto alfandegário de Cambadju na fronteira com o Senegal. Daí, o alastrar

do tecido suburbano ao longo das principais vias fora do antigo núcleo urbano colonial.

Cacheu

Cacheu, é Cidade Capital da região com o mesmo nome. A região de Cacheu

situa-se no norte do país, limitada a Este pela região de Oio, a Oeste pelo Oceano

Atlântico, a Norte pela fronteira com o Senegal e a Sul pela região de Biombo e pelo

mar. A região de Cacheu compreende 5.174,9Km2, onde habita uma população de

192.508 habitantes, ou seja uma densidade populacional de 37,20 hab/Km2. A cidade de

Cacheu goza de grandes privilégios históricos por ser o primeiro ponto de contacto dos

navegadores portugueses com a costa ocidental africana, em 1446, consequentemente o

atual território da Guiné-Bissau.

Foi a primeira povoação na Guiné-Bissau a ter construções com traços europeus,

desde a construção do primeiro forte em 1588. Torna-se mais tarde numa sede das

primeiras autoridades coloniais de nomeação régia, “ os capitães-mor”. Sabe-se que

depois da Cidade Velha na ilha de Santiago em Cabo-Verde, Cacheu possui a mais

antiga igreja católica do continente Africano e um dos importantes centros onde se

desenvolvia o comércio de diversos produtos. Situa-se na margem sul do Rio com o

mesmo nome que se prolonga até Farim. Segundo o atlas da lusofonia, Cacheu chegou a

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ser capital do Distrito que compreendia as fortificações de Bolor, Cacheu, Ziguinchor e

Farim.

A Região de Cacheu, é habitada predominantemente pelos Manjacos, Brames e

Felupes, dependendo basicamente da agricultura e pesca. A própria Cidade de Cacheu é

muito visitada pelos turistas por questões históricas, no entanto, ainda depara com uma

profunda falta de boas acessibilidades. A única estrada regional de ligação com o sector

de Canchungo, quando por algum motivo torna intransitável, a Cidade fica isolada do

resto do país. Localiza-se na margem sul da embocadura de um rio com uma razoável

profundidade para a navegação, no entanto nunca se desenvolveu meio de transporte

aquático de pessoas e bens, que pudesse garantir a ligação entre as suas margens, ou

melhor continuar a navegação até a cidade de Farim como antigamente.

Por todos estes constrangimentos, para além do palácio do Governo, o porto, um

forte histórico e alguns edifícios da antiga urbe colonial que ainda fazem de Cacheu

uma cidade a escala da Guiné-Bissau, Canchungo está muito bem posicionado para

dominar na hierarquia das cidades na região, por estar munido de um Hospital Regional

e de muitas infraestruturas de comércio e serviços.

Farim

É a cidade Capital da região de Oio, localizada no centro do país.

Geograficamente, a região de Oio encontra-se limitada a Este pela região de Bafatá, o

Oeste pelas regiões de Cacheu, Biombo e pelo SAB, a Norte pela fronteira com o

Senegal e a Sul, banhada pelo grande canal do Geba. É uma região relativamente plana,

atravessada por dois importantes rios, o Rio de Cacheu e de Mansoa, compreende uma

superfície de 5.403,4 Km2 com uma população de pouco mais ou menos 224.644

habitantes. Tal como Cacheu, a cidade de Farim tem um enorme peso na história do

nacionalismo guineense. Segundo Atlas da lusofonia, Farim foi uma povoação fundada

na margem norte do Rio Farim em pleno chão mandinga, pelo Capitão-mor de Cacheu,

Gonçalo de Gambôa em 1641, onde mais tarde no ano 1692 viria edificar um forte.

Funcionou durante muito tempo como entreposto comercial controlando todas as

actividades a montante do Rio Candjambari.

Os nativos dessa região nunca suportaram a presença de brancos, pelo que uma

casa francesa (ex-alemã), Soller, dentro do “triângulo Farim-Bissorã-Carenque Cunda”

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(PÉLISSIER, 2001: 144) chegou a ser alvo da cobrança de imposto a favor de Oincas

ou seja, Soninquês animistas de Oio e Balantas. Desde as campanhas de Francisco

António Marques Geraldes em 1886 até Júdice Biker em 1902 em Oio, (…) esta sempre

foi uma “região considerada a mais hostil a ocupação portuguesa, que na história da

Guiné é o coração duro por excelência anticolonial” (idem). Esta prepotência viria a ter

o seu fim apenas em 14 de Maio de 1913 com as investidas do então chefe de estado-

maior António Teixeira Pinto coadjuvado pelos chefes de mercenários Abdul Injai

(Uolof senegalês), Mamadu Cissé (mandinga) e seus homens.

Da mesma forma, foi uma das regiões que causaram pesadas baixas aos

portugueses durante a luta de libertação nacional de 1963 a 1974. Trata-se de uma

região muito pobres, predominantemente rural e com poucas acessibilidades na margem

norte do rio Farim. A Cidade de Farim apresente actualmente dois importantes núcleos

urbanos separados por um rio, o antigo centro e o Bairro Nema, com algumas estruturas

funcionais á escala local para garantir a procura. Os outros centros como Mansoa e

Bissorã estão a crescer sem grandes ligações económicas com Farim, uma vez que estão

mais polarizados por Bissau.

Bolama

Desde 1892 que a Cidade de Bolama já era vista como aquela que transmite “um

certo ar citadino com um wharf de 70m e, pelo menos, seis grandes casas comerciais,

entre as quais as de Aimé Olivier Cidade de Sanderval, Blanchard et Cie, Gouveia etc.”

(PÉLISSIER, 2001: 25). Bolama foi igualmente Capital da província Portuguesa da

Guiné por muitos anos, com toda estrutura funcional bem assistida por Lisboa e dotada

de algumas infra-estruturas e equipamentos estruturantes. O porto, Tribunal, Hospital,

Alfândegas e imprensa nacional. É hoje a Capital da Região Administrativa de

Bolama/Bijagós, a mais insular de todo país, com mais de oitenta ilhas e ilhéus que

compõem o arquipélago dos Bijagós. Limitada a Este pelas regiões de Quinara e

Tombali, a Oeste e Sul pelo Oceano Atlântico e separada da parte continental a Norte

pelo grande canal do Geba. Tem uma superfície de 34.563Km2 onde reside uma

população de 2.624,4 habitantes da etnia bijagó na sua maioria.

Bolama foi uma cidade mítica guineense, com histórias riquíssimas do passado.

Sabe-se que após a consolidação dos portugueses no território, os Ingleses em 1800

começaram a fazer sentir a sua influência na região, em particular na ilha de Bolama.

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Isto originou algum mau estar e fricção entre as chancelarias Inglesas e Portuguesas,

provocou em 1870 a intervenção do antigo presidente dos EUA, Ulysses Grent que viria

dar razão a Portugal, obrigando a Inglaterra desistir das suas intenções.

Bolama esteve durante séculos sob olhar de vários “interesses imperialistas

africanos, europeus, euro-africanos e americanos” (BROOKS, 1991), não se esquecer

que “só na década de 1830 é que os comerciantes franceses começaram a conquistar a

margem superior do Casamansa e os Oficiais navais franceses recuperaram a confiança

no Sul ao longo da Costa da Alta Guiné” (ESTEVES, 1988: 49-65) citado por

(BROOKS,1991), entretanto Caetano Mussolini e Mãe Aurélia tinham-se tornado nos

comerciantes que dominavam nos rios Geba e Grande e tinham iniciado as plantações

ao longo da costa Oeste de Bolama, segundo a mesma fonte.

A região de Bolama foi onde se introduziu pele primeira vez o cultivo de

amendoim em toda Guiné quer para o consumo interno ou para exportação (ver anexo-

2), graças a força produtiva de escravos. Pela sua insularidade, Bolama tem vindo a

degradar-se ao longo dos anos, desde a transferência da Capital para Bissau a 9 de

Dezembro de 1941, apesar de inúmeras iniciativas de melhoramento funcional levadas

acabo pelo antigo e primeiro presidente do pós guerra, Luís de Almeida Cabral, com a

instalação da Escola Piloto, Liceu, escola de formação de professores, construção e

desenvolvimento de algumas pequenas indústrias transformadoras. Bolama tornou-se

hoje numa cidade degradada com vários edifícios devolutos.

Quinhamel

É uma pequena aldeia no centro do (chão papel), ascendeu a categoria de Capital

da Região de Biombo com a última divisão político-administrativa de 1996. A região de

Biombo é limitada a Este pelo Sector Autónomo de Bissau (SAB) e região de Oio, a

Norte e Oeste pela região de Cacheu e a Sul, banhada pelo Oceano Atlântico onde se

encontra o Arquipélago dos Bijagós a algumas milhas da costa. Ocupa uma área de

pouco mais ou menos de 838,8 Km2 onde vivem cerca de 97.120 habitantes, o que faz

com que apresente uma alta densidade populacional na ordem dos 115,78 hab./Km2. É

uma região maiortariamente rural, possui algumas praias muito frequntuadas pela

juventude de Bissau e por turistas.

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Em termos urbanístico, Biombo é uma das regiões com mais carências, não

possui equipamentos e infra-estruturas. Durante a era colonial, Quinhamel chegou a

categoria da Sede de Posto Administrativo a par de Prabis, em toda área da actual região

de Biombo. Funcionalmente essa região contava apenas com dois centros animados por

organismos religiosos e de solidariedade social a saber: Centro de Leprosaria de

Cumura, a cargo das Missões Franciscanas e a própria Missão Católica de Quinhamel

que por várias vezes acolheu a mocidade portuguesa para juramento de bandeira.

Em termos económicos, tanto Quinhamel como toda região de Biombo ainda

dependem exclusivamente da vizinha Bissau. Existem algumas tabernas espalhadas por

alguns aglomerados populacionais com a função de espaços de convívio, todavia sem

capacidades para garantir a procura. Aliás a maioria dos produtos frescos ali cultivados

são diariamente escoados para o mercado de Bissau. A mobilidade de pessoas e bens,

educação e serviços de saúde constituem maiores problemas com que os governantes de

Quinhamel se deparam.

Buba

A Cidade de Buba já foi a Sede de Posto Administrativo na Circunscrição de

Tite até ao 25 de Abril de 1974, sendo actualmente a Capital da Região de Quinara. Não

se esquecer que foi em Tite que “o primeiro ataque armado eclodiu a 23 de Janeiro de

1963, contra as instalações de um aquartelamento das Forças Armadas Portuguesas”

(Atlas da lusofonia, 2001: 25). A região de Quinara localiza-se no interior do país,

recortada por muitos rios e ribeiros, limitada a Este pela região de Bafatá, a Oeste pela

região de Bolama Bijagós, a Norte banhada pelo grande canal do Rio Geba, que a

separa da região de Oio e a Sul pela região de Tombali. Trata-se de uma região com

uma superfície de pouco mais ou menos 3.138,4 Km2 e onde habitam 63.610 habitantes.

É uma região com potencialidades para a prática da caça e do turismo de campo.

Localizada numa área muito fustigada pela guerra dos anos sessenta e princípio

dos anos setenta, a cidade de Buba cresceu sem nenhum plano urbanístico, com a

excepção do quartel e do edifício da Sede de Posto Administrativo. Tinha um porto

rudimentar actualmente em ruína, mas que durante a guerra colonial foi muito

fundamental para as movimentações das tropas portuguesas. No capítulo da economia

local, Buba não possui grandes infraestruturas nem equipamentos para assegurar muitos

postos de trabalho na sua estrutura funcional, se não a única Fábrica de Contraplacados

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FOLBI que funcionou até primeira metade dos anos noventa e o Projecto de

abastecimento de água. A grande maioria da população ativa sempre viveu da

agricultura, pesca e de pequenos comércios que muito timidamente tentavam rivalizar as

lojas do Armazém do Povo e SOCOMI, que se podiam entender como monopólio do

Estado antes do multipartidarismo e liberalização do comércio.

Segundo o entrevistado Sr. Jaime Teixeira, Delegado de Urbanismo em Buba, a

cidade está a ganhar vida com as instalações do estabelecimento escolar para o terceiro

ciclo assim como da casa de acolhimento da Missão Católica de Buba participa

ativamente na formação e acompanhamento de crianças e jovens da cidade e da região.

Falou ainda das preocupações como a Cidade de Buba está a tornar nos últimos anos,

alvo de uma grande especulação fundiária para construção habitações, motivada pela

anunciada construção do Porto das Águas Profundas e uma linha de caminho-de-ferro

que o ligará á rede ferroviária internacional daquela sub-região africana.

Catió

Catió desempenha atualmente a função de Cidade Capital da Região de Tombali,

embora já tenha sido Sede de Circunscrição por muito tempo durante a era colonial. A

região de Tombali localiza-se no sul do país, sendo limitado a Este pela fronteira com a

Guiné Conakry, a Oeste pelas regiões de Quínara e Bola Bijagós, a Norte pelas regiões

de Bafatá e Gabú e a Sul, banhada pelo Oceano Atlântico. A região de Tombali tem

uma extensão de 94.939 Km2 com 3.736,5 habitantes espalhados em pequenas

povoações por toda região. Toda região é suportada pela agricultura e pesca. Aliás, por

causa dessa ruralidade, possui boas condições para a prática de turismo de lazer, através

dos seus rios que se estendem por interior dentro.

A cidade de Catió funcionou como um importante centro económico que

abastecia e controlava toda sua área de influência, tinha alguns equipamentos

estrururantes tais como a Sede da Circunscrição, o quartel, o Mercado Central Santa

Maria da Feria de Catió e alguns edifícios comerciais de particulares, numa região

muito estuarina e de dificil mobilidade. Com o eclodir da guerra tudo mudou, porque

toda essa região transformou-se num perigoso palco de sucessivos combates, daí que a

pista de Cufar crucial para o estabelecimento de ligação aérea com Bissau. Não se

esquecer que Catió e Cacine ficam no coração da primeira zona libertada, cujos dois

bem conhecidos corredores da morte (Guileje-Gadamael e Cacoca-Cacine) de má

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memória para as tropas portuguesas que por lá passaram. Basta recordar que o 1º

Congresso do PAIGC realizado de 13 a 17 de Fevereiro de 1964 aconteceu em Cassacá,

a uns escassos 15 Km a sul de Cacine para avaliar o à-vontade com que os guerrilheiros

de Cabral já se movimentavam naquelas matas do Cantanhez, junto da fronteira com

Conacri. A não existência hoje de mais centros urbanos importantes nesta região para a

rede nacional, foi em parte, a permanente instabilidade que ali se vivia por causa da

guerra.

b) As outras aglomerações urbanas

Por questões muito mais históricas e culturais do que de peso funcional de cada

uma, muitas outras aglomerações urbanas mereciam ser referenciadas nesse trabalho,

porque muitas apresentam uma estrutura funcional completamente de tipo rural.

Começando pela região de Gabú, as aldeias de Pirada e Piche são fundamentais

para o controlo dos fluxos comerciais nas fronteiras com o Senegal e Guiné Conakry

respectivamente. Madina do Boé a sul da cidade de Gabú, foi onde o PAIGC

proclamou unilateralmente a independência da Guiné-Bissau a 19 de Setembro de 1973.

É atualmente uma povoação em profundo abandono. Por último Sonaco que já foi sede

de posto administrativo, é hoje sede de sector. Todas estas aldeias só dependem da

agricultura, pequenas tabernas e das atividades dos djilas (vendedores ambulantes) que

através de bicicletas ou de outros meios rudimentares fazem a ligação comercial entre

os centros urbanos com o mundo rural.

Na região de Bafatá, destacam-se as povoações de Contuboel que sempre

funcionou como posto de controlo dos fluxos comerciais via Sare Bácar e Cambajú na

fronteira com o Senegal, e ainda a aldeia de Bambadinca que se situa num importante

nó rodoviário na bacia do Geba. Qualquer uma destas duas povoações está a crescer

ultimamente, tirando partido das funções que desempenham como pontos de ligação

entre algumas cidades importantes no sistema urbano nacional. As duas já têm algumas

infraestruturas para o desenvolvimento das atividades comerciais e de serviços.

Na região de Oio destacamos as aldeias de Mansoa, Bissorã e Mansabá gozam

do mesmo favoritismo, situam-se em importantes nós rodoviários, apresentando fortes

potencialidades para no futuro tornarem em grandes polos de influência na rede urbana

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regional. De salientar que Mansoa já possui um Hospital com equipamentos modernos,

para além do tão falado Quartel de Mansoa como segundo baluarte da Defesa Nacional.

Na região de Cacheu por outro lado, destacam-se as aldeias de Canchungo

(antigo Teixeira Pinto), Bula, Ingoré e S. Domingos que, com a construção das duas

pontes regionais sobre o Rio Mansoa e Rio Cacheu, têm estado a crescer

urbanisticamente. Aliás, a aldeia de S. Domingos na fronteira com a região de

Casamansa (Senegal), há muito que funciona como centro de polarização naquele

Sector Administrativo. Por fim, destaca-se a povoação de Bubaque na região de

Bolama Bijagós, que tem sido um polo de influência no centro do arquipélago. Possui

um porto rudimentar, uma pista de aviação e boas praias, ou seja, boas condições para

desenvolver o turismo.

3.3 – As actividades urbanas e o funcionamento do sistema urbano: o peso da

informalidade;

Com todas as instabilidades que sempre acompanharam a emancipação do povo

guineense ao longo da sua história, as atividades urbanas e o funcionamento do sistema

urbano têm passado por vários atropelos, o que pode levar a considerar a tese de que “ O

comércio e as indústrias não podem desenvolver-se em regiões que não dominamos,

onde tratamos de potência para potência com régulos sempre prontos a humilhar-nos,

lutando contra raças que nos são hostis na quase totalidade dos casos e que se

habituaram a considerar-nos como incapazes de os submeter… O prestígio do Francês

invade o nosso território e a comparação entre ele e nós cobre-nos de vergonha” Alfredo

Cardoso Soveral Martins (1893), in (PÉLISSIER, 2001:19).

Trata-se de uma análise que pode traduzir na íntegra o atraso motivado pelo

choque entre o cruzamento de vários grupos étnicos diferentes, que sempre gladiaram

pela posse das terras, choque entre diferentes culturas (europeus e nativos), choque entre

diferentes religiões (animista, muçulmana e Cristã). É um pormenor muito importante

que deve ser bem analisado no contexto de desenvolvimento da Guiné-Bissau como um

país. A arrogância e intolerância, as guerras interétnicas e as rivalidades entre regulados,

sempre minaram o sentimento da unidade nacional, facilitando a infiltração das forças

estrangeiras cujo objectivo principal passa pela exploração dos recursos.

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Até 1936, ano em que se deu por terminada as campanhas de pacificação em

todo o território guineense, as fronteiras entre regulados encontravam-se ainda muito

evidentes, bem respeitadas e fortemente guarnecidas pelos nativos, razão pela qual os

portugueses tiveram dificuldades acrescidas em vingar e fazer respeitar as suas políticas

que podia contribuir para o desenvolvimento. O antigo modo de vida teve raízes

profundos nas populações e, a cada chefe tribal cabia-lhe defender a todo custo todas as

tabancas do seu território sem nenhuma noção de complementaridade e de coesão. Não

foi nada fácil o reconhecimento do traçado da divisão político-administrativa imposta

pela administração colonial por parte dos nativos, sem que se recorresse ao uso da força.

A par de tudo isso, as pretensões de controlar o mercantilismo em toda região

norte do território guineense por parte dos presídios franceses no Senegal, ajudou ainda

mais a complicar as coisas, uma vez que segundo Pélissier, e, como forma de

desestabilização, sempre apoiaram o temível Mussa Molo da região de firdu com a sua

máquina de guerra no domínio de todos os regulados inimigos junto da fronteira com

Casamansa. Firdu era uma região sob o controlo de um régulo fula-preto Mussa Molo e

que se estendia desde alto Gambia, Casamansa até ao norte da região de Bafatá e Farim.

Era uma região de muito interesse por parte dos comerciantes franceses no sertão. Não

se esquecer que as actividades da delimitação da fronteira oriental iniciada em 1888

decorriam com muitas dificuldades e tiveram de parar pelas razões já invocadas, mas

também por falta de segurança nas terras inimigas que mal se conhecia. Todos esses

episódios dificultaram bastante as autoridades portuguesas na organização territorial,

social e funcional da Guiné, fazendo com que o sistema urbano continuasse cada vez

mais debilitado e fragmentado. Actualmente apenas existem dois grandes corredores ou

eixos geradores de rendimentos e de conexão do sistema com Bissau, onde mais ou

menos se estabelecem as relações entre os centros urbanos, interacções e

interdependências. O eixo que vai de Bissau a Gabú e o de Bissau a S. Domingos, sendo

o resto do país permanece disperso e predominantemente rural com fraca articulação ao

sistema.

Relativamente às atividades, sabe-se que o sector terciário sempre empregou

uma pequena franja da população guineense, embora durante muitas décadas esteve sob

o controlo da Metrópole e da Companhia de Comércio e Exportação da Guiné (antiga

Casa Gouveia) até a independência em 1974. A maioria da população é analfabeta e

ligada a agricultura e pesca. Existiam pequenos e poucos centros urbanos mais ou

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menos estruturados com alguns serviços básicos que funcionavam como polos de

atração nas suas áreas de influência. Muitos desses centros ainda existem, constituindo

as chamadas Capitais das Regiões, porém, Bissau continua a monopolizar o sistema na

sua generalidade.

No que diz respeito ao desenvolvimento da economia de mercado, pouco se tem

feito, ou seja, “Guiné-Bissau está fortemente dependente da exportação da castanha de

caju, como principal fonte de divisas. A diversificação dos produtos agrícolas - uma

consequência da diversificação económica, torna-se essencial para a redução de riscos

económicos relacionados com as mudanças climáticas ou desastres naturais quando se

depende de um só produto. É também importante que o país comece a processar

internamente a sua castanha como forma de lhe agregar valor acrescentado e criar

empregos para a sua população, considerando a enorme taxa de desemprego na camada

juvenil” (http://www.onu-guineebissau.org/profil.htm, consultado em 21-09-2010).

Tal como em qualquer país do terceiro mundo ou em vias de desenvolvimento, a

informalidade joga hoje na Guiné-Bissau um papel preponderante na economia das

populações. Vítimas de cíclicas sublevações político-militares, as populações da Guiné-

Bissau viram-se obrigadas a fazer face à vida, na ausência das responsabilidades do

Estado como o único maior empregador. Influenciada pelos países vizinhos e dominada

pela pobreza extrema, a Guiné tornou-se refém de si própria, com profunda crise social

caracterizada pela perda de valores morais e de respeito pela pessoa humana.

O desemprego, a insegurança, a corrupção, a impunidade etc., sustentaram a

prática das actividades ilícitas na informalidade que á pouco e pouco, vai minando o

espaço do comércio formal e da economia de mercado. Longe do controlo das

autoridades do comércio, tudo é comercializado muitas vezes em deploráveis condições

de higiene, quanto aos produtos alimentares. Daí que, no quadro regional, o cálculo do

Índice Harmonizado de Preços no Consumidor (IHPC), que se trata de “um indicador de

inflação mais apropriado para comparações entre os diferentes Países da União

Económica Oeste Africana UEMOA” (INE, 2011) a Guiné-Bissau continua com

instabilidade na sua balança comercial como se pode ver no quadro-9. Aliás, “o

desenvolvimento do IHPC recorre da necessidade expressa no tratado da UEMOA em

relação aos critérios de convergência, medir a inflação numa base comparável em todos

Estados Membros”( INE, 2011). Segundo a mesma fonte, o Banco Central dos Estados

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da África Ocidental (BCEAO) utiliza este indicador desde Janeiro 2003, como

instrumento para aferir a estabilidade dos preços dentro da área do Franco CFA (XOF).

Quadro 9-Evolução geral do IHPC nos Estados Membros da UEMOA – Agosto 2010

Fonte: Instituto Nacional de Estatística “INE / Gabinete do IHPC / 10 Fevereiro 2011

N° 11

Relativamente a Guiné-Bissau, mesmo com a inflação anual de 0,3% prevista

para 2011 segundo o índice harmonizado de preços no consumidor, espera-se uma

variação de preços na ordem de 0,6% no primeiro mês principalmente nos produtos

importados, e de 5,6% para os três meses (Setembro, Outubro e Novembro) onde a

procura é mais acentuada, acima da Costa de Marfim, Senegal, e Benim. O fraco poder

de compra das famílias fez recuar a corrida aos tradicionais mercados municipais, uma

vez que nos últimos anos, pode-se encontrar de tudo em qualquer varanda, passeio, beco

ou rua de Bissau. O sector primário e a informalidade continuam a dificultar as

estratégias do governo assim como a concretização da política de urbanidade, porque

muitos sectores na função pública continuam por reformar, condição indispensável para

uma rápida retoma na economia nacional face às exigências dos parceiros de

desenvolvimento na região. Nunca poderá haver uma boa gestão da coisa pública na

Guiné-Bissau enquanto persista a corrupção, peculato e prepotência no seio dos titulares

de órgãos de soberania.

3.4 – Os problemas da gestão urbana: infra-estruturas, equipamentos colectivos,

rede viária e sistema de transportes;

O problema da gestão urbana na Guiné-Bissau constitui um caso paradigmático

porque a dicotomia urbano/rural ainda representa um grande fosso, atendendo a uma

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democracia representativa que se vive no país desde 1994. Continuou a ser o próprio

Estado a assumir a governação do território de modo totalmente centralizado e

desconcentrado para as regiões, onde os problemas da gestão urbana permanecem muito

preocupantes. Segundo a Constituição Nacional da República no capítulo VI (poder

local) da lei constitucional nº1 de 1996, no primeiro ponto do artigo 105º, diz-se que a

organização do poder político do Estado compreende a existência das autarquias locais

que gozam de autonomia administrativa e financeira. No segundo ponto do mesmo

artigo encontramos que as autarquias locais são pessoas colectivas territoriais de

órgãos representativos que visam a prossecução de interesses próprios das

comunidades locais, não se subtraindo á estrutura unitária do Estado. O paradoxo de

tudo isso, é que não se compreende o que estará nas origens de constantes convulsões

político-militar que continuam a dificultar a criação das referidas autarquias até a

presente data. Os actuais governadores regionais estão sem autonomia técnica e

financeira para fazerem face a inúmeros problemas que minam o desenvolvimento

sustentado local.

A gestão urbana é um exercício multidisciplinar contínuo, difícil mas necessário

em qualquer território, pelo que se exige a participação exemplar dos órgãos de

soberania em colaboração com os agentes privados com algum interesse e boa vontade,

para assegurar as dinâmicas urbanas e socioeconómicas como forma de melhorar o

padrão de vida das populações. Sempre que possível, é necessário avaliar a própria

qualidade de vida e o equilíbrio do município ou do país em geral, no domínio do

espaço urbanizado, o seu ambiente, as acessibilidades, assim como a oferta de

equipamentos e serviços públicos, o que não se verifica na Guiné-Bissau por falta de

condições financeiras como sempre alegam os sucessivos governos.

No que diz respeito às infra-estruturas, a Guiné-Bissau continua a deparar com

profunda carência no seu todo. Apenas um Aeroporto Internacional, um Porto Marítimo

com capacidade para atracar dois navios de longo curso e dois Estádios de futebol com

o relvado. Quanto aos Equipamentos Colectivos, quer sejam Desportivos, de Educação,

Saúde, Segurança Pública e de Solidariedade e Segurança Social, dos pouco que a

independência herdou, muitos encontram-se em avançado estado de degradação ou já

não têm capacidade para responder a procura. A grande maioria que constitui a

propriedade do Estado e do Governo, concretamente os Quartéis, Instalações prisionais,

Hospitais, Centros e Postos de Saúde, Escolas etc., espalhados por todo país, necessitam

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de uma reabilitação séria e urgente. O Hospital Nacional Simão Mendes por exemplo,

assim como os regionais de Bafatá, Gabú, Canchungo e Mansoa, necessitam igualmente

de profundas obras de reabilitação e de novos equipamentos técnicos. O 3 de Agosto ou

antigo Hospital Militar nos arredores de Bissau, muito conhecido e prestigiado na era

colonial, não teve a mesma sorte e acabou devoluto, estando hoje em avançado estado

de ruína.

A questão da rede viária já referida anteriormente e o sistema de transporte,

continuam a ser um entrave para o desenvolvimento da Guiné-Bissau quanto a sua

conectividade com os países fronteiriços da sub-região. STECK, Benjamin em

(Questions de Géographie, 2003) afirmara que, para que os Estados africanos em geral

e os da África d Oeste em particular, possam desenvolver as suas potencialidades

naturais, económicas e humanas, é necessário confrontarem-se com o imperativo da

circulação. Disse ainda que as redes de transporte são os vectores territoriais que

comandam logicamente as sociedades humanas e condicionam o seu futuro enquanto

revelam as heranças que devem assumir. Eles são “às vezes, o suporte, a condição e a

concreta manifestação das mudanças de toda natureza que possa gerar”, citando (Jean

Marc Offner e Denise Pumain, 1996).

Concordo plenamente com o STECK Benjamin, porque a rede viária guineense

ficou muito tempo esquecida, logo após o golpe de estado de 1980. A única empresa

pública de transportes «Silô Diata» que operava de Bissau para as regiões de Cacheu,

Oio, Bafatá e Gabú entrou na insolvência, acabando por abater toda a sua frota. Os

barcos que garantiam o transporte marítimo entre Bissau e a região de Bolama-Bijagós,

pararam por falta de manutenção. Em termos gerais, a Guiné-Bissau continua com mais

ou menos 30% das suas estradas alcatroadas, com apenas uma faixa de rodagem para

cada sentido na sua maioria, onde o perfil transversal nunca ultrapassa os 7 metros.

Existem muitas pontes e pontões danificados, o que dificulta a mobilidade de pessoa,

bens e materiais. Apesar da construção das pontes regionais sobre os rios Mansoa e

Cacheu, respectivamente a ponte Amílcar Cabral em João Landim, inaugurada a 9 de

Maio de 2005 e da ponte Euro-africana em S. Vicente, igualmente inaugurada a 19 de

Julho de 2009, ver as fotos 2 e 3, para além dos demais equipamentos públicos

construídos de raiz ou reabilitados pelo atual executivo, os problemas com as

acessibilidades ainda são muito preocupantes.

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Não é segredo nenhum, a Guiné-Bissau depende fortemente do exterior. Por

isso, perante a velocidade com que as sociedades estão hoje confrontadas quanto ao

crescimento e desenvolvimento, é urgente que os organismos de tutela comecem a ter

outra postura e um papel proactivo no Planeamento e Ordenamento do Território como

forma de melhorar as condições de vida das pessoas.

Fotos 2 e 3 – Ponte Amílcar Cabral e Ponte Euro-africana

Fonte: Fotos de Google Earth, (24-02-2012) adaptado pelo autor

No atual contexto da sociedade de conhecimento, o desenvolvimento é

indispensável. Assim sendo, não se compreende porquê é que a Guiné-Bissau não

consegue libertar-se dos últimos lugares dos países mais pobres no ranking mundial em

que se encontra há muitos anos, com mais população rural do que urbana? O

patriotismo e a vontade dos seus filhos deviam estar acima de todas as diferenças

étnicas e pessoais, sob pena de se transformar num país falhado. São tantas as

espectativas do cidadão comum em ver o país modernizado para acompanhar a

globalização, numa política coerente e corajosa de gestão territorial, alicerçada numa

visão estratégica e integralista no âmbito da nossa sub-região.

Até esta data em que está a ser feito o trabalho, muitas estradas e ruas de Bissau

apresentam péssimas condições de praticabilidade mas a luta pela vida obriga a

constantes cenários como este da foto-4, onde tudo se mistura, pessoas, Táxis, Toca-

toca, veículos particulares etc., num clima de caos com extrema poluição sonora e

ambiental, onde se perder muito tempo com engarrafamentos e acidentes nas horas de

ponta ou fora delas, em percursos relativamente curtos. O sistema de transportes assim

como o serviço de inspeção periódica obrigatória são ainda deficitários em todo país,

faltam infraestruturas e algumas leis quadro para pôr cobro a anarquia que se vive nos

grandes centros a nível de transporte rodoviário como modo mais utilizado. O

Ministério das Infraestruturas através das suas representações regionais tem vindo a

Ponte Amílcar

Cabral

Ponte Euro-

africana

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realizar pequenas obras pontuais de manutenção por todo país, apesar de pouca

autonomia financeira para o efeito. As estradas asfaltadas da era colonial já não resistem

à intensidade do trafego com o passar do tempo, originando buracos por todo lado,

troços intransitáveis, com Bissau no topo da lista. Tudo isso constitui situações

desagradáveis para o país, mas por outro lado serviu para catalisar as sinergias do

Governo, principalmente nos últimos dois anos com muitas concretizações levadas

acabo.

Foto 4- Mercado de Bandim - Bissau e a informalidade na mobilidade de pessoas

Fonte:http://missaodulombi.blogspot.com/2011/04/guine-bissau-chegada-parte-ii.html,

19-08-2011.

4. PERSPECTIVAS E PROPOSTAS DE DESENVOLVIMENTO DO SISTEMA

URBANO GUINEENSE

4.1- A evolução do modelo de sistema urbano: papel da descentralização e das

acessibilidades;

É bom não se esquecer de que, depois das antigas e sangrentas guerras

protagonizadas pelos sucessivos impérios que prosperaram naquela sub-região, seguidas

de perseguições pelo proselitismo religioso levado acabo pelos Fulas, o atual território

da Guiné-Bissau, passou por um sistema de assentamento humano com base numa

estrutura étnica. Um sistema de moranças e tabancas (Crioulo), subentendida como uma

comunidade rural africana muito frequente naquela sub-região, correspondente a uma

aldeia. Como se trata de um povo predominantemente rural, a cultura, usos e costumes,

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a adaptação e apropriação dos recursos naturais encontrados, acabaram por ser

determinantes na delimitação e posse de territórios com proporções variadas

denominados Tchon (Chão) por cada grupo ou vários grupos étnicos com laços de

parentesco. A esse propósito, um estudo diz que “ Cada tabanca tem laços de

relacionamento com as tabancas vizinhas que pertencem o mesmo Tchon, sendo este, a

propriedade de uma etnia ou povo que, desde antiguidade, exerce um certo poder sobre

todos os indivíduos e grupos que sucessivamente vierem morar neste Tchon, mesmo os

de outras etnias. Por isso este povo “primeiro ocupante” chama-se duno di Tchon (dono

do chão) ”, (BICARI, 2004, 135). Este factor cultural que constitui o equilíbrio interno

dessas sociedades é muito determinante, para que cada Tchon renda mais na produção

daquilo em que o grupo é naturalmente especializado tendo em conta os costumes,

confissão religiosa e hábitos alimentares dos seus habitantes. Porém, quanto às “práticas

rituais, as comunidades islamizadas também obtinham o consentimento para a

apropriação de terras, a protecção para as suas culturas agrícolas e a criação do gado.

Sobre este assunto, A. Carreira, ao enfatizar a importância da criação do gado bovino,

chegou mesmo a citar uma “bovonia” dos fulas e, em menor grau, dos mandingas”

(FRANCO, 2009, 33). Realçamos estas reflecções para mostrar quão determinante são

os aspetos social, cultural, político e económico de uma população na evolução de

qualquer sistema urbano.

Um outro pensador contemporâneo citado por Bacari, dizia que “A cultura de

um grupo humano não morre senão com a liquidação física desse grupo humano …

nenhuma imposição, nenhuma dispersão, nenhum processo de assimilação pode fazer

morrer a cultura de um povo” (A. Cabral, “Resistência Cultural”); que esses povos,

mesmo através da história das imposições sofridas, acumularam experiências suficientes

para saberem discriminar na tradição o que devem conservar do que devem abandonar

para poderem entrar na modernidade” (BICARI, 2004, 140). Por isso, a criação dos

grandes centros urbanos pelos portugueses que hoje constituem pólos de atracção no

sistema urbano do território guineense, devia ser entendida como forma de fortificar as

relações que se estabelecem entre diferentes tabancas em torno de um centro dotado de

certo poder administrativo local. Infelizmente isso não aconteceu, fazendo com que em

termos genéricos não houvesse nenhuma evolução palpável do modelo de sistema

urbano guineense até esta data.

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Segundo as perspetivas de desenvolvimento que se pretende preconizar, a

resposta para essa inércia na evolução do modelo de sistema urbano até aqui seguido,

deve passar impreterivelmente pelo processo da descentralização. Já foi uma prática

materializada durante a era colonial, onde as Sedes de Concelhos e Sedes de Postos

Administrativos tiveram um desempenho muito exemplar na gestão das regiões em

consonância com o poder central. Ainda se pensou na possibilidade de continuar com

sessa política depois da independência, mais precisamente nos anos 80, com o objectivo

de reforçar as capacidades das iniciativas nas estruturas administrativas locais mas

como se viu, não houve consenso no novo Governo, entre diferentes setores de gestão.

Sobre essas diferentes opiniões, um estudo confirma ter havido uma corrente que

defendia uma descentralização progressiva e uma outra que defendia a formação de

concelhos municipais com pendor desconcentrado. Sabe-se que ainda existem os textos

então aprovados sobre este assunto. Para que alguma coisa se faça, precisam de uma

nova apreciação no parlamento antes da promulgação. Ver (http://www.amenagement-

afrique.com//IMG/pdf/guinee_bissau.pdf, consultado em 10-10-2011). Devido a não

promulgação de tais Decretos, as cidades capitais das Regiões Administrativas no seu

todo e seus Comités de Sectores, passaram a perder o seu direito discricionário pelo fato

de continuarem a depender do poder central, que se resume a Bissau.

É muito importante a descentralização das políticas administrativas do país,

melhorar as acessibilidades, eliminar as assimetrias ainda existentes para que o atual

modelo urbano possa evoluir a fim de corresponder as despectivas e demandas em pé de

igualdade com os parceiros de desenvolvimento na sub-região.

4.2- As necessidades de alojamento e de infra estruturas urbanas básicas nos polos

do sistema urbano: os recursos financeiros e o reequilíbrio ambiental;

A Guiné-Bissau conheceu dois momentos marcantes sobre esta matéria de

alojamento, ao longo da sua história como uma nação livre e independente. Sendo um

exercício de uma política democrática que se traduz num reconhecimento de valores e

dignidade da pessoa humana, o direito a um habitat e sua habitabilidade, os primeiros

cinco anos que precederam a independência, constituíram o período que marcou o

regresso em massa dos refugiados de guerra ao país, obrigando o então incipiente

Governo do PAIGC a providenciar o realojamento das pessoas.

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Após ao Golpe de Estado de 14 de Novembro de 1980, as políticas mudaram e

começa o segundo grande período sobre o alojamento. Com a degradação do parque

habitacional herdado por falta de manutenção, a medida que os anos vão passando, a

carência habitacional e das infraestruturas urbanas básicas acentuava-se tornando

patente a preocupação da governação em solucionar o problema que parece afetar todos

os polos do sistema urbano. “Com a ajuda dos países parceiros de desenvolvimento e de

cooperação bilateral, ensaiou-se diferentes projetos de produção de casas e a

incorporação até a presente data, nos diferentes projetos da componente habitacional

para alojar os técnicos e funcionários públicos. Como exemplo disso, os casos dos

complexos de edifícios multifamiliares (ASDI, SANDINO TAIWAN, TRANSPORTE),

e outros pequenos bairros: (Bairro Internacional, Cooperativa de Plano, Cooperativa dos

Trabalhadores do MOP etc.)” (FERREIRA, 2010). De salientar que, todos esses

empreendimentos desenvolveram-se apenas na Cidade de Bissau. Segundo a mesma

fonte, as estratégias iniciais de construção por iniciativa do Estado obtiveram resultados

desencorajadores, sobretudo na recuperação dos custos, por parte do Estado.

O baixo salário, a heterogeneidade dos inquilinos com alguns hábitos

tradicionais que conflituam com a tipologia dos imóveis, principalmente as

multifamiliares e o meio onde esses complexos foram inseridos, contribuíram para a

falta de conservação e manutenção, sobretudo nos edifícios multifamiliares,

impossibilitando a implementação do sistema de condomínio. Como consequência,

todos os edifícios resultantes daqueles projetos levados a cabo, ficaram degradados

devido a má utilização e sobretudo a falta de manutenção. Após a experiência em

relação a falta de zelo pela coisa pública e degradação ambiental, como se pode

constatar no (anexo-3) do património da arquitetura portuguesa assim como nas fotos 5

e 6, no período entre 1986 e 1992, início do multipartidarismo, o executivo adota novas

políticas para fazer face às necessidades de realojamento das pessoas.

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Fotos 5 e 6 – Estado de Degradação do Bloco de Apartamentos TAIWAN

Fonte: Fotos do Arq.º Estanislau da Silva Ferreira.

Sempre com o recurso às ajudas internacionais, o executivo beneficiou de algum

financiamento “no quadro de alguns projetos-piloto a saber: Projecto de Melhoramento

de Bairros de Bissau (PMBB), outros no quadro da definição de novos projetos,

Programa de Acção Social e Infraestrutural (PASI) e ainda outro no contexto da

definição da política habitacional, Projecto de Reabilitação de Infraestruturas (PRI) ”

(FERREIRA, 2010). Tendo como principal objetivo a resolução da problemática de

realojamento e intervir na redução da brutal degradação ambiental com as construções

precárias e clandestinas, de entre os três projetos-piloto apresentados, o segundo, projeto

(PASI) foi o mais emblemático pela robustez espacial e pelos agentes financeiros

internacionais envolvidos.

Com o início ainda na Cidade de Bissau, a construção de raiz, de um Bairro

Social Antula Bono, num terreno com cerca de 50 hectares cedidos pelo Estado no

Bairro de Antula a norte e a uns escassos quatro quilómetros do Centro de Bissau, conta

com o aval dos sistemas das Nações Unidas nomeadamente o PNUD/FENU o

cofinanciamento do Projecto de Melhoramento de Condições de Habitat, para a

Cidade de Bissau e no interior do País. O projeto trouxe uma nova esperança á

população, em particular a do estrato mais carenciado, todavia, tudo ficou parado

até hoje, desde o eclodir do conflito armado de 17 de Junho de 1998. Segundo a

mesma fonte o projeto é constituído por duas componentes, sendo a primeira previa a

viabilização para produzir 717 parcelas de terrenos para a construção de moradias

económicas e a segunda para a construção de alojamentos, ver a figura-20.

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Fig. 20- Planta de Loteamento de Antula Bono, do Projecto PASI (1997)

Fonte: Arq.º Estanislau da Silva Ferreira.

Foi introduzido pela primeira vez na história de urbanização na Guiné-Bissau,

um parcelamento de quatro tipos de lotes dimensionados da seguinte forma: 150m2

(10x15), 250m2 (10x25), 300m

2 (15x20) e 500m

2 (20x25), para que haja justiça na

atribuição de lotes. Desta forma, poder-se-á beneficiar todas as classes com diferentes

possibilidades financeiras. Foram ainda programadas áreas para parques e zonas verdes,

equipamentos coletivos para Serviços Sociais, Desporto, Educação, Saúde e para o

maior Mercado a construir na Cidade de Bissau. Estas intervenções de contenção

acontecem no país, por falta de autarquias e normas para o Ordenamento do Território

pelos princípios “Democrático, Integrado, Funcional e Prospetivo” (Conselho da

Europa, 1988, p. 10) citado in (http://www.igeo.pt/conceito_ot.org.pdf, consultado em

19-2-2012).

A questão ambiental e financeira são outras necessidades que engrossam a lista

das necessidades e preocupações das entidades de tutela, sobretudo nas sedes regionais

mas também nos centros urbanos com a concentração de serviços e pessoas. Nesses

centros surgem depósitos de lixo a céu aberto por todo lado e adensa a rede de latrinas

por falta de saneamento de base. Nas áreas rurais, a prática das queimadas nos terrenos

agrícolas, contribuem para um acentuado desequilíbrio ambiental. Além de Bissau,

muitos outros centros atualmente emergentes são grande exemplo desse fenómeno

ambiental, como veremos no próximo ponto.

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4.3 - A intervenção na Cidade de Bissau, principal Pólo do sistema urbano

guineense;

O importante papel que a Cidade de Bissau desempenha como principal polo do

sistema urbano guineense, ajudou em termos de Ordenamento do Território e

Urbanismo por parte de sucessivos governos que por ali passaram, desde a “Revisão

Constitucional em Maio de 1951” (RAMOS, 2005, 148).

Segundo (MENDY, 2006), o crescimento demográfico da Cidade de Bissau em

desproporção com as infraestruturas e equipamentos para a satisfação das necessidades

dos residentes, provocou o alargamento do parque habitacional através de um plano

urbanístico da cidade, aprovado em Junho de 1948.

Devido ao intenso êxodo rural, dos anos 60 por causa da luta armada no interior,

foi elaborado um novo instrumento de gestão, o Plano Geral Urbanístico de Bissau em

1970. 20 Anos mais tarde, ou seja, em 1990, o Município de Bissau em colaboração

com o Ministério das Obras Públicas elaborou o primeiro Plano Diretor Municipal para

a Cidade de Bissau depois da independência, designado por Plano Geral de Urbanismo.

Visa melhorar a gestão do sistema urbano da Capital, para além dos chamados Planos

de Ocupação do Solo (POS) a nível nacional, elaborados pelo Ministério das Obras

Públicas, juntamente com o da Administração do Território, em 1995.

Esta preocupação com a intervenção urbanística em Bissau, abrandou entre 1974

e 1992, porque a Câmara Municipal de Bissau, foi paulatinamente perdendo espaço em

matéria da tomada de decisões, face aos inúmeros problemas que afetam diretamente os

seus munícipes. As competências técnicas foram transferidas para o Ministério das

Obras Públicas e as competências políticas passaram para o Ministério do Interior,

ficando apenas com as responsabilidades administrativas. Como resultado, assistiu-se a

deterioração da Baixa de Bissau colonial, por falta da manutenção de imóveis públicos e

ruas despavimentadas, uma vez que o MOP, entidade responsável pela área a nível

nacional, não consegue responder á tudo.

Apenas em 1992 com o multipartidarismo, tudo volta a normalidade, com a

Câmara Municipal de Bissau recuperou algumas das suas competências. Considerando

que o crescimento da população em Bissau continuará conforme o quadro-10, a

intervenção a levar a cabo deverá ser mais ambiciosa, ir para além da implementação da

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rede pública de saneamento de base, capacitação e alargamento da rede elétrica e da

distribuição da água potável e passar pela eliminação das fronteiras administrativas com

a Região de Biombo. Em meu entender, isso poderá ser uma solução que permitirá a

legisladores e responsáveis pelo processo de Planeamento e Ordenamento do Território,

a adoção de mecanismos de gestão racional do uso e transformação do uso do solo.

Porque só assim é que o sistema urbano do Sector Autónomo de Bissau (SAB) poderá

equilibrar-se.

Quadro 10- Crescimento Populacional no SAB, na Década de 2000

REGIÃO 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2009

PAÍS 1.210.911 1.238.314 1.266.612 1.295.841 1.326.039 1.357.240 1.389.497 1.520.830

SAB 309.291 323.827 339.047 354.983 371.667 389.135 407.424 387.909

SAB (%) 25.54 26,15 26,76 27,39 28,02 28,67 29,32 25,5

Fonte: Autoria Própria com dados do INEC (25-02-2012)

Analisando bem os dados do quadro-10, conclui-se que houve um aumento da

população na Cidade de Bissau durante a década de 2000, apesar de ter sido o epicentro

de várias convulsões político-militar. No período entre 2001 e 2007, registou-se um

aumento médio anual de 16.355 habitantes. Os valores relativos ao ano 2009, resultaram

do Recenseamento Geral da População e Habitação desse mesmo ano. São valores que

transparecem um paradoxo, atendendo ao aumento da população que tem vindo a

registar-se, mas a verdade é que notou-se uma pequena retração da população em

termos absolutos, sendo muito acentuada em termos percentuais, ficando nos 25,50%,

um pouco abaixo dos valores registados no ano 2001.

Trata-se de uma situação atípica em meu entender, e que só pode ter uma justificação

política, porque o que acontece na realidade, a população continua a crescer nos bairros

com construção precária na periferia de Bissau, como se pode ver na figura-21. É bom

lembrar que esse crescimento populacional trouxe por arrastamento problemas graves

para o ambiente, saúde pública e o bem-estar das pessoas. Ainda a elevada taxa da

mendiguidade e da delinquência juvenil motivada pela proliferação de drogas e

estupefacientes de que se fala em Bissau advém desta situação.

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Fig. 21 – Densidade das Habitações Precárias nos Bairros de Bissau (2003)

Fonte: MENDY, 2006, 145.

Olhando para esta figura 18, nota-se que, com apenas a exceção do antigo centro

de Bissau e do Bairro de Santa Luzia, poucos são os Bairros habitações precárias entre

50,1 á 60%. Por outro lado, sem contar com a Ilha do Rei, que é predominantemente

industrial, os Bairros que mais alargaram na década de 80 de século passado, são os que

apresentam maior percentagem das habitações precárias, onde não existem centros de

serviços e é onde há pouca sustentabilidade.

Na outra abordagem de MENDY (2006, 146) 3/4 dos Bairros em Bissau tem

mais de 80% das suas habitações em construção precária, concluindo que na

generalidade, a Cidade de Bissau conta com 87,4% do edificado precário.

Já existem alguns sinais positivos no quadro da infraestruturação e melhoria das

condições de vida das pessoas nos últimos tempos a começar por Bissau, com a

conclusão da reabilitação de duas importantes vias dotadas de equipamentos modernos

para a segurança dos transeuntes, ver as imagens da foto 7 em baixo.

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Foto 7- Infraestruturação da Cidade de Bissau, Dezembro 2011

Fonte: http://4.bp.blogspot.com; (14-12-2011)

Mas apesar desta e de outros empreendimentos públicos já concluídos, é urgente

uma intervenção exemplar com a desativação do Quartel da Marinha na baixa para

outro lugar, a fim de ligar o corredor ribeirinho entre Porto de Pijiguiti e instalações da

DICOL em Bandim, dotando-o de instalações comerciais e de hotelaria com parques de

diversões e de lazer.

A revitalização de Bissau-Velho, a modernização do Porto Cais assim como o

desenvolvimento de um eixo comercial e de serviços ao longo da marginal é muito

fundamental para a robustez da economia do país. A mudança de uso dos solos nos

quarteirões dos antigos armazéns da casa do estivador, Blola e arredores, para um

Mercado Abastecedor e Logística de Bissau, poderá trazer uma mais-valia no

desempenho comercial na Capital e do investimento externo.

4.4 – Propostas para a melhoria do ordenamento e da gestão do território

guineense tendo por base a reestruturação da rede urbana;

Sabemos que desde a independência até à realização das suas primeiras eleições

gerais em 1994, a política de ordenamento do território nunca constituiu um tema de

debate honesto e sério no parlamento guineense, com o pretexto de que as condições

ainda não estavam reunidas. Por esta razão e de acordo com a atual conjuntura de

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profundo atraso na infraestruturação, achamos imperativo a elaboração de um

instrumento normativo e de orientação para a tomada de decisões, em substituição da

Lei de Ordenamento Territorial e Urbanismo de 1990 nunca posta em prática.

Segundo o artigo do gabinete de planeamento no espaço comunitário

(http://www.amenagement-afrique.com//IMG/pdf/guinee_bissau.pdf; consultado em 10-

12-2011), o país tem sobrevivido em termos económicos até aqui, com o recurso á três

planos, como forma de captar as ajudas externas, sendo um bienal e dois quadrienais:

1) – Carta da Política de Desenvolvimento Agrário (CPDA);

1) – Plano Nacional de Desenvolvimento Sanitário (PNDS);

2) – Plano Diretor para Água e Saneamento (PDAS);

3) – Plano Diretor da Pesca (PDP);

Os chamados Planos de Estabelecimento Económico, através de acordos na

política de reajustamento estrutural assinados com as instituições de Bretton Woods,

correndo riscos de se afundar ainda mais por causa das imposições de austeridade nas

finanças públicas. As populações nunca são ouvidas nem chamadas a participarem nos

debates públicos conforme os procedimentos normais. Tudo era definido e decidido

pelas instituições governamentais, que são a Secretaria de Estado de Plano e

Cooperação Internacional e suas Comissões Sectoriais de Planeamento. Estas são

algumas das práticas antidemocráticas que precisam de alterações, para permitir uma

harmonização nas políticas sectoriais com objetivos macroeconómicos.

Ainda no plano económico, a agricultura foi definida desde os anos 70, como

sector prioritário para o desenvolvimento, levando a uma divisão administrativa do país

em quatro zonas agro económicas a saber:

Zona I - que contempla as regiões de Biombo, Cacheu e Oio;

Zona II – que contempla as regiões de Bafatá e Gabú;

Zona III – que contempla as regiões de Quínara e Tombalí;

Zona IV – que contempla apenas a região de Bolama/Bijagós.

Segundo a mesma fonte, os seus projectos de desenvolvimento integrado

estavam bem equipados com condições materiais, humanos, infra-estruturais e

financeiras para serem bem-sucedidos. Acontece que, a má gestão deitou tudo a perder,

sem que houvesse nenhum resultado palpável.

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Com a necessidade da integração regional do país no espaço CEDEAO e

UEMOA, impunha-se uma política de desenvolvimento a ser inserida num quadro de

coordenação e harmonização de intervenções internas e externas, quando se pretendia

situar cada sector de actividade, dentro das suas áreas de potencialidades. Era uma

política que passasse por um ordenamento urbano moderno, em paralelo com as

políticas da regionalização a nível do espaço comunitário, que se inscrevem no quadro

das reformas administrativas e da valorização dos recursos humanos. Portanto, a

participação efectiva das populações nas fases de auscultação e debates públicos dos

processos de desenvolvimento que lhes assistem, torna cada vez mais imprescindível.

Depois de analisados os aspetos geográficos, socioculturais, político-

organizacionais e ambientais, que se prendem com o atual estado de desequilíbrio da

rede urbana guineense, no âmbito da descentralização, conectividade e

complementaridade, eis que avançamos com as seguintes propostas como contributo no

processo de planeamento e Ordenamento do Território.

- Primeira Proposta: definição e consolidação dos polos do sistema urbano;

Atendendo as especificidades físicas do país, o estado da rede viária,

considerando ainda a emergência de alguns Sectores e Secções Administrativos no

equilíbrio das dinâmicas socioecónomicas nos últimos anos, achamos por bem

reestruturar o habitual figurino das áreas de influência do atual sistema urbano

guineense, promovendo os Sectores de Canchungo, S. Domingos, Mansoa,

Bambadinca, Pitche e Bubaque para centros de polarização, com a extinção da

influência de Quinhamel, uma vez que passará a depender totalmente do SAB. Será uma

atitude de reconhecimento e de justiça por tudo quanto se procurou desenvolver nessas

localidades, como forma de colmatar as debilidades das Capitais Regionais no capítulo

de gestão territorial e equidade social.

A figura-22 representa o atual modelo territorial no âmbito das áreas de

influência, onde para além da macrocefalia de Bissau, as Capitais Regionais também

influenciam os sectores que compõem a região.

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Fig. 22 – Áreas de Influência do Sistema Urbano Guineense

Fonte: Atlas da Lusofonia; (adaptação do autor, Dezembro de 2011)

A figura-23 mostra a reestruturação que se propõe.

Fig. 23 – Proposta para Novas Áreas de Influência do Sistema Urbano Guineense

Fonte: Atlas da Lusofonia; adaptação do autor.

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- Segunda Proposta: definição e consolidação dos eixos do sistema urbano: o sistema

viário;

Dada a importância de uma boa rede viária no processo de desenvolvimento para

qualquer região ou país, e atendendo toda problemática levantada neste trabalho em

matéria de deploráveis condições de acessibilidades na rede viária guineense,

entendemos que certos troços com categoria de Estradas Secundárias na atual rede,

devem passar para a categoria de Estradas Principais tendo em conta o crescimento e ao

aumento de volume de tráfego rodoviário que se espera para as regiões onde se

encontram. Nesta proposta, pensamos ainda na reestruturação de todas as estradas que

ligam o país com o resto do espaço comunitário (ver anexo-1), das infraestruturas de

transportes previstas no quadro de NEPAD, num estreito cumprimento de acordos

rubricado sobre a livre circulação e eliminação das fronteiras. Por isso, foi elaborada a

figura-24, com o recurso às ferramentas do ArcGiS, ArcMap10, mais as shapes sobre a

Guiné-Bissau, recolhidas na internet (http://www.diva-gis.org/gdata, consultado em 19-

05-2011).

Fig. 24 - Proposta para a Futura Rede Viária Nacional com ligações Internacionais

Fonte: Autoria Própria (Dezembro de 2011)

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Com base nesta proposta da rede viária, a esquematização dos corredores de

desenvolvimento apresentada na figura-25, pretende reforçar o ensejo de ver a rede

urbana guineense bem estruturada. O corredor Bissau-Norte, beneficiou das Pontes

Amílcar Cabral e Euro-Africana, para se tornar num importante eixo comercial entre

Bissau e Casamansa, com impulso ao desenvolvimento de Canchungo, Bula, Ingoré e S.

Domingos, contudo ainda falta alcatroar a estrada Ingoré Farim.

O corredor Bissau-Farim, é muito populoso, tem recursos e está a desenvolver.

Só lhe falta a ponte em Farim e de boas estradas para se ligar a Senegal via centro. O

corredor Bissau-Gabú, é o mais consistente, contudo, a partir das Cidades de Bafatá e

Gabú, padecem de estradas alcatroadas para as ligações internacionais com o Senegal e

Guiné Conacri. O corredor Bambadinca-Catió, apesar de ter potencialidades naturais e

humanas, está economicamente esquecido.

Fig. 25- Esquema dos Corredores de Desenvolvimento da Guiné-Bissau

Fonte: Atlas da Lusofonia, (adaptação do autor, Abril de 2012)

Devido ao seu aspeto morfológico, o corredor Cacine-Gabú, é simplesmente

ignorado. Trata-se de um corredor estratégico na salvaguarda das matas de Cantanhez

Dulombi e Boé, da integridade da fronteira com Guiné Conacri, para além das mais-

valias que se lhe espera com a construção do Porto de Buba. É urgente a sua

infraestruturação. A par do corredor Cacine-Gabú, o corredor Bissau-Litoral, precisa

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de infraestruturas e equipamentos de transporte para se desenvolver, pela exuberância

das praias e a biodiversidade para o turismo, além de facilitar as ligações marítimas

entre Bissau, Conacri, Ziguinchor e ao resto do mundo.

- Terceira Proposta: a redefinição da divisão administrativa assente nas dinâmicas

económicas e sociais e na proposta de sistema urbano;

Atendendo as reduzidas dimensões físicas da Guiné-Bissau, o grau de pobreza, a

constante dependência ao exterior e o próprio crescimento demográfico da Cidade de

Bissau motivado pelo êxodo rural com tendência a aumentar nos próximos anos,

achamos sensato avançar com a proposta para o emagrecimento das despesas públicas,

alterando a atual divisão administrativa. Eliminar a Região de Biombo, devido ao seu

reduzido tamanho e com poucas infraestruturas. Assim sendo, o Sector Autónomo de

Bissau passará a englobar todo território da atual Região de Biombo, com a manutenção

dos três Sectores (Biombo, Quinhamel e Prabis) tal como estão, ver a figura-26. Com

esta alteração, o Estado fica a ganhar na sua gestão orçamental e em termos de

planeamento e ordenamento do território, o Sector Autónomo de Bissau passará a dispor

de mais espaço físico para uma boa organização funcional. Feitas as contas, a SAB

passará a contar com uma densidade populacional de mais ou menos 523,62 hab/Km2

contra os atuais 5.037 hab/Km2 ou seja, 31,892% de habitantes do universo nacional.

Fig. 26 – Proposta de divisão Político-Administrativa da Guiné-Bissau (sem a

Região de Biombo)

Fonte: Autoria Própria (Dezembro 2011)

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Se olharmos para a figura-27, aperceber-nos-emos de que em todas as regiões

do Sul, Quinara, Tombali mais a insular Bolama/Bijagós, não há nenhuma aglomeração

populacional com 50.000 habitantes. Por isso, no seguimento das políticas de

reestruturação urbana pretendida, torna indispensável a infraestruturação nestas regiões,

como forma de criar condições para o crescimento e desenvolvimento em pé de

igualdade com o resto do país, atendendo as potencialidades em recursos naturais que

essas regiões têm.

Fig. 27 - População por Sectores Administrativos na Atual Rede Urbana

Fonte: Autoria Própria (Dezembro de 2011)

- Quarta Proposta: o modelo de ordenamento do território;

a) – Propor ao parlamento guineense no sentido de criar o mais rápido possível,

uma Lei de Bases de Ordenamento do Território e do Urbanismo (LBOTU),

adoção de um modelo muito próximo do atual modelo português, embora

adequado às especificidades do território guineense, como forma de consagrar os

preceitos do planeamento territorial e urbanístico moderno herdado, com

inspiração nas políticas territoriais do espaço comunitário, respectivamente

CEDEAO e UEMOA, em que o país está inserido.

b) – Perante os avanços e recuos a nível do planeamento, ordenamento do território

e urbanismo, por falta de leis e instrumentos apropriados, pedimos a quem de

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direito, a promoção de uma cultura democrática a nível nacional, mudança de

paradigmas sociais, como condição sine qua non, rumo ao desenvolvimento.

Logo após a realização das eleições autárquicas, tornará urgente criar

mecanismos que permitam explorar as vantagens do orçamento participativo na

eficácia dos instrumentos e medidas de intervenção. Não há nada como uma

gestão democrática transparente e honesta das políticas públicas, onde a opinião

de todos os munícipes sem excepção, conta para o orçamento geral. O povo é

quem sabe melhor das necessidades locais, por isso cabe-lhe a ele definir

prioridades e esperar que a administração faça uso dos seus impostos e mostre

resultados.

c) – Ainda em termos de funcionalidade da Cidade de Bissau, a única via de acesso

e ligação com o resto do país já está para além da sua capacidade de carga, a

partir do Sector de Safim até ao Centro de Bissau. Por isso, para evitar os

congestionamentos, perda de tempo e acidentes naquela artéria, propomos a

construção de uma outra via rápida como alternativa, a partir das instalações das

Alfândegas na Baixa de Bissau e que passará pela povoação de Cumeré, para

ligar a Nhacra.

d) – Atendendo a importância que a mata do Cantanhez, futuro parque natural e

património da humanidade, aguardando pelo reconhecimento da UNESCO,

representa para o país em termos turístico e sociocultural, assim como a

localização estratégica de um Porto Internacional nas águas profundas do Rio

Grande de Buba, ao serviço da Guiné-Bissau, Guiné Conakry e Mali, achamos

que constituem importantes oportunidades para a revitalização do corredor

Cacine, Quebo, Madina do Boé e Gabú. Trata-se de um corredor histórico desde

a fundação da nacionalidade guineense, mas sempre legado ao mundo rural, sem

boas vias de comunicação nem centros para um comércio organizado.

Como medidas de intervenção a levar acabo, em termos políticos, a

concretização de uma profunda reforma na função pública, nas forças de Segurança e da

Defesa Nacional seria um bom ponto de partida, porque o atraso com que a Guiné-

Bissau se depara hoje, deve-se em parte, à impunidade pelo desrespeito a lei, por parte

desses sectores chaves. A cultura de diálogo e de respeito pela separação de poderes

deve ser uma realidade a materializar, passando pela educação, ao combate ao

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analfabetismo e pela imergência na sociedade do conhecimento. Em termos

económicos, o desenvolvimento do sector privado como agente aglutinador na

acumulação de receitas para o Estado através da criação de postos de trabalho, deve ser

igualmente uma outra prioridade do Executivo, como forma de minimizar as assimetrias

regionais. No ponto a seguir, falaremos da necessidade de realojamento, que também

deve merecer a atenção do Governo.

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5. CONCLUSÃO: o contributo da reestruturação do sistema urbano guineense para a

reorganização do território, culturalmente complexo, e para a integração regional da

Guiné-Bissau;

Este trabalho teve como propósito realizar um estudo abrangente sobre o

processo de transformação por que passa a República da Guiné-Bissau nos últimos

anos, destacando a importância da redefinição da rede urbana como fator do

desenvolvimento nacional, regional e local, e o seu contributo para a (re) organização

espacial dos territórios.

O regresso ao passado ao longo da realização deste Projecto, não podia ser mais

que um privilégio, ou seja, uma experiência única e enriquecedor em todos os aspectos.

A orientação recebida, os documentos lidos, as conversas com os demais sobre o

passado para além das entrevistas realizadas no terreno, foram aspetos chave e que

particularmente me levam às seguintes conclusões:

1. O território de atual Guiné-Bissau teve a presença humana há milhares de anos.

Foi um espaço muito influenciado pela presença estrangeira, daí, a existência do

mosaico multiétnico que ainda hoje existe como parte da sua riqueza cultural,

todavia no plano urbanístico, esta multietnicidade dificultou o desenvolvimento

das cidades de origem portuguesa, de uma matriz comum, espalhadas por todo

país. Trata-se de um país muito pequeno, politicamente instável,

economicamente pobre e com uma alta taxa de analfabetismo. No plano

administrativo, existe um forte desequilíbrio por falta de boas infraestruturas de

transporte, acabando por deixar certas regiões num total abandono. Quinara e

Tombali são exemplos disso, onde não existe nenhum centro urbano com 50.000

habitantes. A falta da descentralização e das eleições autárquicas, são outros

aspetos que contribuem para o atraso.

2. Bissau foi sempre vista como polarizadora de todas as capitais regionais, não

pela sua infraestruturação, nem por ser o centro do poder nacional, mas sim, pela

acentuada pobreza que se vive no resto do país. A falta de recursos humanos,

quadros técnicos com qualificações multidisciplinares, é outra das preocupações

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patentes tanto na área da educação como na saúde. O Hospital Nacional Simão

Mendes em Bissau, é o único com mais serviços de especialidade, mais número

de camas em do país. A rede nacional de Centros de Saúde ainda não consegue

suprir todas as necessidades e poucas são as regiões com farmácias.

O sector agrícola não é digno de ser o motor para o desenvolvimento económico

guineense como se diz, porque ainda se encontra em sistema artesanal até hoje.

O sector energético, o pilar para o desenvolvimento da ciência e tecnologia de

um país, está numa situação catastrófica que compromete a atração de

investidores internacionais. O fornecimento da energia elétrica da rede pública é

insuficiente e alternado entre zonas pré-estabelecidas, gerando prolongados

períodos de “apagões”, que, para além dos transtornos domésticos, é uma

situação que a nível da telecomunicação, isola o país ao resto do mundo várias

vezes por dia.

3. Assiste-se a uma galopante deterioração do património arquitetónico nos centros

urbanos herdados, consequência da falta de planeamento e política de atracção

de investimentos privados nacionais ou internacionais para uma acção de

regeneração urbana necessária. O equilíbrio ambiental e a erradicação das

doenças infecciosas, continuam a merecer uma atenção redobrada, porque os

serviços públicos de saneamento de base e da distribuição da água potável

canalizada são deficitários.

4. No plano geopolítico, a Guiné-Bissau faz parte de um vasta região da África

Subsariana que apesar de desequilíbrio económico entre países membros,

constitui uma comunidade com potencialidades para mitigar a pobreza que

flagela as suas populações. É membro da CEDEAO e da UEMOA, espaços de

integração económica regional que albergam cerca de 250 milhões e 80 milhões

de habitantes respectivamente, podendo servir da porta de entrada dos mercados

dos parceiros dos (CPLP) para aquelas comunidades económicas da áfrica

Ocidental. Aliás, o tão falado Porto das Águas Profundas a construir no Rio

Grande de Buba, serve para catalisar o corredor de desenvolvimento económico

(Guiné-Bissau, Guiné Conacri e Mali) com estradas e caminho-de-ferro de

ligação internacional.

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5. As constantes perturbações político-militar e a falta de uma consistente política

de cooperação, têm dificultado as oportunidades de canalizar as ajudas externas

através dos parceiros bilaterais, para a infraestruturação que reforce o equilíbrio

do sistema urbano, nomeadamente nos setores de transportes, energia e

telecomunicações. Porque para além das Pontes Amílcar Cabral e Euro-Africana

em João Landim e São Vicente respectivamente, financiados a partir da parceria

EU-África, ainda faltam duas no Norte, de ligação regional e internacional em

Barro e Farim, as que serão precisos no sentido Catió-Cacine no Sul, para além

dos portos fluviais e rudimentares a reabilitar.

6. No contexto atual, é imperativo criar condições para estreitar ligações entre os

Ministérios da Administração do Território, das Infraestruturas com as Câmaras

Municipais a saírem das próximas eleições autárquicas, como forma de agilizar

as tarefas ligadas ao planeamento urbano, sobretudo as de definição da posse da

terra, capacidade de infraestruturação e gestão urbanas.

Com este trabalho, espera-se ter contribuído, em conjunto com outros do mesmo

género, para uma reflexão sobre a importância da rede urbana na organização do

território e a vantagem de implementar um modelo, simples mas eficaz, de Planeamento

e Ordenamento do Território (que ajudaria a corrigir desequilíbrios existentes na rede

urbana), tendo uma perspetiva de consolidação do território nacional e de integração

regional, nomeadamente nas vias transafricanas.

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LISTA DE FIGURAS

Fig. 1- Cidades africanas com população acima dos 50.000 habitantes em (2000) ---- 20

Fig. 2- Estados da África Ocidental (2011) -------------------------------------------------- 21

Fig. 3- Tipologia da Urbanização na África Ocidental (2010) ---------------------------- 26

Fig. 4- Prospetava para a Rede Urbana e Clusters Regionais (2020) -------------------- 27

Fig. 5- Localização Espacial das principais Etnias Transfronteiriças -------------------- 31

Fig. 6- Localização Espacial das Etnias Interiores ------------------------------------------ 32

Fig. 7- Limite Interior das Marés -------------------------------------------------------------- 35

Fig. 8- Volume da Precipitação Anual na África Ocidental e Central em mm (2003) - 45

Fig. 9- Antigos Grandes Impérios Africanos na Região de África Ocidental ----------- 49

Fig. 10- Escola Prof. António José de Sousa e a Residência das Irmãs em Bissau ----- 53

Fig. 11- Divisão Administrativa da Guiné Portuguesa em 1942 (2003) ----------------- 54

Fig. 12- Divisão Administrativa da Guiné Portuguesa em 1971 -------------------------- 56

Fig. 13- Processo de Aldeamento na Guiné Portuguesa, Concluído em 1972 --------- 56

Fig. 14- Manchas Urbanas das Cidades de Bissau e Gabu --------------------------------- 63

Fig. 15- Atual Divisão Político-Administrativa (2011) ------------------------------------- 66

Fig. 16- Influência de Bissau no Sistema Urbano Guineense ----------------------------- 70

Fig. 17- Plano do Burgo de S. José, protegido por Muralhas ----------------------------- 72

Fig. 18- Cidade de Alcatrão e o 1º Anel de Expansão com construção precária ------- 74

Fig. 19 - Carta de Ocupação de solo, o Alargamento dos Bairros de Bissau em 2004- 75

Fig. 20- Planta de Loteamento de Antula Bono, do Projecto PASI (1997) -------------- 96

Fig. 21- Densidade das Habitações Precárias nos Bairros de Bissau (2003) ------------ 99

Fig. 22- Áreas de Influência do Sistema Urbano Guineense ----------------------------- 103

Fig. 23- Proposta para Novas Áreas de Influência do Sistema Urbano Guineense --- 103

Fig. 24- Proposta para a Futura Rede Viária Nacional com Ligações Internacionais - 104

Fig. 25- Esquema dos Corredores de Desenvolvimento da Guiné-Bissau ------------- 105

Fig. 26- Proposta de divisão Político-Administrativa da Guiné-Bissau (sem a Região de

Biombo) ----------------------------------------------------------------------------------------- 106

Fig. 27- População por Sectores Administrativos na Atual Rede Urbana -------------- 107

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LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico1- Proporção da População Urbana que vive em Bairros Degradados 1990-2010,

(%) ------------------------------------------------------------------------------------------------- 29

Gráfico 2- Distribuição da População por Regiões Administrativas (%) --------------- 42

LISTA DE QUADROS

Quadro 1- Tendências da População Urbana na África Ocidental, (1950-2050) ------- 22

Quadro 2- Tendência da Urbanização nos países da África Ocidental, 1950-2050 (%) ---

------------------------------------------------------------------------------------------------------ 23

Quadro 3- Número de Cidades com a população acima de 10.000 (1960-2020) ------- 24

Quadro 4- Comercio externo - Balança comercial (em mil milhões de FCFA) --------- 38

Quadro 5- Síntese da Ajuda à Guiné-Bissau (2010) ---------------------------------------- 39

Quadro 6- Distribuição Sectorial da APD bilateral Portuguesa --------------------------- 40

Quadro 7- Densidade Populacional por Regiões Administrativas (2009) --------------- 61

Quadro 8- População por Regiões Administrativas entre (RGPH 1979-2009) -------- 65

Quadro 9- Evolução geral do IHPC nos Estados Membros da UEMOA – Agosto 2010 --

------------------------------------------------------------------------------------------------------ 87

Quadro 10- Crescimento Populacional no SAB, na Década de 2000 --------------------- 97

LISTA DE FOTOGRAFIAS

Foto 1- Vista Aérea do Centro da Cidade Capital da Guiné-Bissau (1966) ------------- 71

Fotos 2 e 3- Ponte Amílcar Cabral e Ponte Euro-africana --------------------------------- 90

Foto 4- Mercado de Bandim - Bissau e a informalidade na mobilidade de pessoas --- 91

Fotos 5 e 6- Estado de Degradação do Bloco de Apartamentos TAIWAN -------------- 95

Foto 7- Infraestruturação da Cidade de Bissau, (Dezembro 2011) ---------------------- 100

LISTA DE ANEXOS

Anexo 1 - Infraestruturas de Transportes Previstas no Quadro de NEPAD para África

Ocidental ---------------------------------------------------------------------------------------- 119

Anexo 2 - Principais Culturas de Exportação na África Ocidental, em 2004---------- 120

Anexo 3 - Património da Arquitetura Portuguesa na Cidade de Bolama --------------- 120

Anexo 4 - As Importantes Obras Realizadas na Província da Guiné (1945-1974) ---- 121

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ANEXOS

Anexo1- Infraestruturas de Transportes Previstas no Quadro de NEPAD para

África Ocidental.

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Anexo 2 - Principais Culturas de Exportação na África Ocidental, em 2004

Anexo 3 - Património da Arquitetura Portuguesa na Cidade de Bolama

Tribunal

Casa Colonial

Casa do Governador

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Anexo 4 - As Importantes Obras Realizadas na Província da Guiné (1945-1974)