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Diretora: Paula Franco Reuniões Livres Entrevista a Abílio Sousa, formador «AT deve aceitar e reconhecer papel preventivo do CC» P. 6 P. 28 N.º 219 Ano XVIII • junho 2018 Conselho Jurisdicional: dois novos membros empossados Ordem participou na FIN 2018, na Exponor P. 23 P. 13 Revista Contabilista: Digital ou em papel? Faça a sua escolha Revista Digital com conteúdos extra Novo modelo

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Diretora: Paula Franco

ReuniõesLivres

Entrevista a Abílio Sousa,

formador«AT deve aceitar e reconhecer papel preventivo do CC»

P. 6P. 28

N.º 219

Ano XVIII • junho 2018

N.º 2

19

Conselho Jurisdicional: dois novos membros

empossados

CO

NT

AB

ILIS

TA

JU

NH

O 2

018

Ordem participou na FIN 2018, na Exponor

P. 23

P. 13

Revista Contabilista: Digital ou em papel? Faça a sua escolha

Revista Digital com conteúdos extra

Novo modelo

6 CONTABILISTA 219

ENTREVISTAENTREVISTA

PERFIL

6 CONTABILISTA 219

Abílio Sousa nasceu em Lis-boa a 12 de maio de 1962. Após 30 anos de carreira na Autoridade Tributária, onde desempenhou fun-ções de chefe da divisão de liquidação do IRC, Abílio Sousa abraçou um proje-to na área da formação e consultoria de empresas na área da fiscalidade, percor-rendo o país de norte a sul, sem esquecer as reuniões autónomas, na sequência das múltiplas solicitações que recebe. Experimenta-do formador de diversas entidades, entre as quais da OCC, é licenciado em Economia pelo Instituto Superior de Economia e Gestão da Universidade Técnica de Lisboa. É ainda autor de diversos manuais de formação na área fiscal tendo publicado em 2013 o livro «Estatuto dos Benefí-cios Fiscais – Comentado» e, em 2017, «Código Fiscal do Investimento.» Em ter-mos académicos é profes-sor convidado do ISCTE--INDEG na pós-graduação em Gestão Fiscal e também na Porto Business School na pós-graduação em Análise Financeira.

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ENTREVISTA

Contabilista - Colabora há vários anos com a Ordem no âmbito da formação. Da sua experiência pes-soal, entende que tem havido uma evolução na consciencialização por parte dos contabilistas certifica-dos da necessidade de ter formação permanente e regular?Abílio Sousa - Sim. Da observação que faço ao longo das ações onde tenho participado creio que vai longe o tempo em que os contabi-listas certificados frequentavam a formação por obrigação. Para que este processo seja contínuo, é ne-cessário melhorar a qualidade da formação.

Contabilista - Como se alcança esse objetivo? A. S. - Selecionando temas per-tinentes e oportunos, estabele-cendo calendários e programas de formação equilibrados. Os forma-dores têm também um papel fun-

Abílio Sousa, formador

É necessário simplificaros códigos fiscais

Texto Nuno Dias da Silva Fotos Raquel Wise

damental neste processo. Contabilista - Esta profissão lida com uma multiplicidade cada vez mais abrangente de temas. A área fiscal, pela sua volatilidade legis-lativa, continua a ser a temática em que os contabilistas certifica-dos têm mais questões?A. S. - Sim, sem qualquer dúvida. A nossa legislação fiscal não só muda muitas vezes, mais do que as que seriam desejáveis, como também levanta muitas dúvidas de interpretação. A área fiscal ocupa tanto espaço na formação que, por vezes, considero até que a área contabilística fica um pou-co para trás. Contudo, é aceitável que assim seja porque os contabilistas pro-curam cada vez mais cumprir as obrigações fiscais com qualidade com vista a evitar as inúmeras divergências que gastam inter-mináveis horas de trabalho.

Contabilista - É presença assídua nas reuniões livres das quartas--feiras. Que avaliação faz do novo figurino recentemente introduzido pelo Conselho Diretivo? Quais os ganhos em termos de dinâmica e interatividade para quem assiste?A. S. - Em minha opinião, as reu-niões livres podem ter duas enor-mes valências, por um lado o escla-recimento de dúvidas, por outro, a atualização sobre os mais recentes diplomas e esclarecimentos de na-tureza fiscal e contabilística. Não tenho qualquer dúvida que a nova dinâmica que o Conselho Diretivo implementou nas reuniões livres trouxe-lhes uma nova dimensão e interatividade com os contabilis-tas certificados. Tenho tido o pri-vilégio de participar em reuniões livres em diferentes locais (Lisboa, Porto, Aveiro e Açores) e, por isso, sou testemunha dos elogios que o novo figurino tem sido alvo.

É um dos formadores mais reconhecidos pelos profissionais. Abílio Sousa elogia a nova dimensão e interatividade das reuniões livres, defende que os contabilistas certificados

deviam apostar mais na contabilidade como instrumento de gestão e, no âmbito da justiça tributária, mostra-se apreensivo com o império da informática sobre a lei.

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ENTREVISTA

Contabilista - É frequente ouvir os contabilistas certificados dizerem que não têm o devido reconheci-mento por parte de certos agen-tes, nomeadamente por parte dos empresários. O que sugere para aumentar a sintonia e a parceria entre ambos?A. S. - Tenho afirmado, em di-versas intervenções, a necessi-dade de envolver os empresários nas nossas temáticas. Concordo plenamente que o trabalho do contabilista certificado não tem sido devidamente valorizado pe-los vários agentes que com ele se relacionam. Os empresários têm de ter um maior conhecimento do trabalho do contabilista para que o possam valorizar de outra for-ma e isso só vai acontecer quando eles forem envolvidos nas confe-rências, temáticas e até peque-nas formações. Por outro lado, os contabilistas também têm de demonstrar que a contabilidade não serve só para prestar contas à Autoridade Tributária, expli-cando o valor desta como instru-mento de gestão. Por vezes, sinto que os contabilistas acham que não vale a pena investir muito nesta parte. É verdade que muitos empresários não estão prepara-dos para olharem para a sua con-tabilidade desta forma, mas aos poucos, começamos a sentir que esta mentalidade está a mudar e nós temos um papel importante nesta mudança.

Contabilista - Após 30 anos de carreira na Autoridade Tributária (AT), nomeadamente na divisão do IRC, dedicou-se em exclusivo à formação. Conhece, por isso, como a palma das suas mãos, a máqui-na tributária. A AT, por via dos constrangimentos orçamentais,

transformou-se numa insaciável máquina de arrecadar receitas. Em que medida é que esta prática colide com os direitos e garantias dos contribuintes?A. S. - Registei o termo “insa-ciável”. Vivemos tempos difíceis nesta matéria. Assisto quase to-dos os dias a correções inspetivas e procedimentos que atropelam os direitos dos contribuintes. As receitas são importantes para o cumprimento dos objetivos or-çamentais, mas quando essas receitas aumentam à custa de procedimentos que geram con-flitualidade extrema, não esta-mos verdadeiramente a aumentar receitas, mas sim a congestionar tribunais. A eficácia da inspeção tributária não deve ser medida pelas correções que faz, mas sim pelo resultado efetivo dessas cor-reções. De que adianta fazer re-latórios onde aparecem milhões de euros de correções se estas foram anuladas uns anos mais tarde pela Justiça Tributária? Por outro lado, faço sempre questão de notar que a missão da AT não é apenas cobrar impostos. A Au-

toridade Tributária desempenha um papel importante na distri-buição da receita e como agente indutor de não distorção de con-corrência.

Contabilista - Qual o papel da ar-bitragem tributária, como forma alternativa de resolução de confli-tos, para reduzir o elevado grau de litigiosidade?A. S. - A arbitragem tributária pode ter um papel muito impor-tante como forma alternativa de resolução de conflitos, mas infe-lizmente ainda não o tem. A re-dução da litigiosidade passa em primeiro lugar pela clarificação do texto legal e pela transpa-rência de procedimentos. Não se pode continuar a permitir a pro-dução de circulares e outra dou-trina administrativa que de for-ma mais ou menos subtil, alteram o texto legal.

Contabilista - Que papel pode de-sempenhar o contabilista certifi-cado numa lógica preventiva para evitar os conflitos entre fisco e contribuinte?

«As reuniões livres podem ter duas enormes valências,

por um lado o esclarecimento de dúvidas, por outro,

a atualização sobre os mais recentes diplomas e

esclarecimentos de natureza fiscal e contabilística.

Não tenho qualquer dúvida que a nova dinâmica que

o Conselho Diretivo implementou nas reuniões livres

trouxe-lhes uma nova dimensão e interatividade com os

contabilistas certificados.»

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A. S. - Em matéria fiscal, o con-tabilista certificado desempenha hoje um papel muito importante, particularmente ao nível preven-tivo. Não me refiro só ao cumpri-mento dos prazos e das obrigações legais, mas também, porque não, numa dada arbitragem tributária, concebida de forma diferente da atual. No fundo, esta pergunta que me fez agora, vem na sequência das anteriores. A necessidade de for-mação mais qualificada cria con-dições para que o contabilista cer-tificado possa desempenhar este tal papel preventivo. Mas, para que isto aconteça é também necessário que a Autoridade Tributária aceite e reconheça este papel, o que, clara-mente ainda não acontece.

Contabilista - O Parlamento aprovou o projeto de lei sobre os formulários digitais que obriga o fisco a disponibilizar os docu-mentos com 120 dias de antece-dência. É suficiente ou é possível ir mais além?A. S. - A disponibilização an-tecipada dos formulários é es-sencial para que os contabilistas certificados e os cidadãos em geral possam preparar e cum-prir com qualidade as obrigações declarativas. O prazo de 120 dias parece-me razoável e sensato. Compreendo que possam existir dificuldades na implementação imediata desta regra, mas é im-portante desde já dar passos gra-duais nesse sentido.

Contabilista - O tema impostos, por afetar o bolso de milhões de portugueses, está sempre na or-dem do dia. Como é que qualifica-ria, de uma forma genérica, a lite-racia económica e fiscal dos nossos cidadãos?A. S. - Toda a gente sabe que a literacia económica e fiscal dos nossos cidadãos é baixa. Os fis-calistas trabalham com termi-nologia específica que dificulta a compreensão de grande parte dos cidadãos de vários aspetos que lhe interessam e afetam o seu rendi-mento. A matéria fiscal não pode ser tratada em “conversa de café”, mas é necessário descodificá-la. A Ordem tem também um papel a desempenhar neste processo,

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digo do IRS, no sentido de os ren-dimentos da categoria B ficarem sujeitos a tributação a partir do momento do pagamento ou colo-cação à disposição dos respetivos titulares. A atual redação desta norma legal gera imensos proble-mas de divergência entre as dife-rentes obrigações declarativas. É igualmente importante a propos-ta de aperfeiçoamento legislativo do Regime Geral das Infrações Tributárias, particularmente no que toca à aplicação mais clara e transparente do artigo 32.º deste diploma que permite a aplicação de dispensa de coima, mediante o cumprimento de determinadas condições. A bastonária já afir-mou por diversas vezes que um dos seus objetivos deste mandato é devolver qualidade de vida aos contabilistas certificados. Eu não posso estar mais de acordo com isto. Deste modo, é importante que todos percebam que muitas destas medidas têm esse objetivo e é igualmente importante que percebam que esta causa não en-volve só os contabilistas certifi-cados, mas sim todos os sujeitos passivos em geral e até a própria administração.

Contabilista - Quatro anos depois da reforma do IRC, e com várias reversões de permeio, que balanço é possível fazer? Na sua opinião, que aspetos mereceriam uma re-flexão e alteração prioritária?A. S. - Faço um balanço positi-vo da reforma do IRC, sem dúvi-da. A reforma teve como grandes objetivos: a redefinição de bases tributáveis e da taxa nominal de tributação, a otimização de bene-fícios, a atração de investimento estrangeiro e a redução de custos de contexto. A atração de inves-

mas os poderes públicos não se podem alhear. É necessário des-de logo começar pela escola pri-mária, como acontece em alguns países. Se explicarmos bem para que servem os impostos, todos os cidadãos vão ter uma consciência diferente sobre a importância das receitas fiscais.

Contabilista - E que papel compe-te, nomeadamente, aos políticos?A. S. - É necessário também que os políticos e outros responsáveis sejam cada vez mais criteriosos e transparentes na utilização das receitas públicas. Por outro lado, é igualmente necessário simpli-ficar os códigos fiscais. Já repa-rou o quão complicadas são as regras do IRS? Será que é neces-sária uma tão grande teia legal para atingir os mesmos objetivos de cobrança? As medidas de sim-plificação que foram contempla-das nas reformas do IRC e do IRS foram claramente insuficientes nesta matéria.

Contabilista - A bastonária da Or-dem lamentou em recente entre-vista a dificuldade que existe para dialogar com a AT. A administra-ção fiscal permanece muito fecha-da face ao exterior e resistente a mudanças?A. S. - Creio que temos de analisar esta questão sobre duas perspeti-vas. Se olharmos para aquilo que é hoje o Portal das Finanças, vemos a imagem de uma administração moderna. Mas quando tentamos alterar procedimentos ou quando nos relacionamos com os deciso-res, sentimos aquilo que a basto-nária referiu. Há duas coisas que me preocupam seriamente neste domínio. A primeira é aquilo a que eu chamo o império da infor-

mática sobre a lei. Sabe quantas vezes eu já ouvi esta expressão: “é assim porque o sistema diz que é assim…”?. O sistema informáti-co serve para agilizar a aplicação da lei e não mais do que isto. Tudo aquilo que o sistema informáti-co fizer tem que ter base legal. Na área da Justiça Tributária, há muito por fazer neste domínio. Os sujeitos passivos apresentam muitos requerimentos que não têm resposta. O segundo aspe-to que me preocupa é quando me respondem que se faz assim, por-que sempre se fez assim. Na ver-tente declarativa, este aspeto é muito importante. Não devemos exigir ao contribuinte mais in-formação do que a necessária nem devemos duplicar obrigações, como ainda hoje acontece, parti-cularmente com o conjunto de in-formação que é solicitada na IES.

Contabilista - Colaborou, no âm-bito do IRC, com um pacote de al-terações legislativas que a Ordem vai apresentar à tutela. Que pro-postas destacaria?A. S. - Penso que as propostas valem sobretudo pelo seu todo. É uma proposta equilibrada e coe-rente. Destaco a revisão do ca-lendário fiscal. Existem sobre-tudo dois meses onde se verifica uma excessiva concentração de obrigações declarativas: janeiro e maio. A disponibilização dos formulários com a antecipação necessária é também uma medi-da muito importante, conforme já referi antes. No âmbito legis-lativo, as propostas visaram, so-bretudo ao nível do IRC, diminuir litigiosidade e aproximar os nor-mativos contabilístico e fiscal. Destaco ainda a proposta de alte-ração do n.º 6 do artigo 3.º do Có-

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«Não devemos exigir

ao contribuinte

mais informação

do que a necessária

nem devemos duplicar

obrigações, como

ainda hoje acontece,

particularmente

com o conjunto

de informação

que é solicitada

na IES.»

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timento estrangeiro assentou so-bretudo na adoção do regime de participation exemption e na pro-gressiva redução da taxa do IRC.

Contabilista - Na sua opinião, que aspetos mereceriam uma reflexão e alteração prioritária?A. S. - Em relação ao regime há que avaliar os resultados, o que me parece ainda não ter sido fei-to e quanto à progressiva redução da taxa do IRC, todos sabemos que conheceu um processo de trava-gem. Como aspetos mais positi-vos destaco a aproximação entre a esfera contabilística e fiscal e a redução de alguns custos de con-texto. Como propostas de reflexão e alteração, propunha: a criação de uma secção específica na área da determinação do lucro tribu-tável para a microentidades (com um volume de negócios a definir), a redução do célebre Quadro 07 para metade, ou seja, a elimina-

ção de muitas das regras fiscais que divergem dos procedimentos contabilísticos, a eliminação dos pagamentos especiais por conta e uma redefinição e restrição das tributações autónomas. As tribu-tações autónomas são uma clara distorção dos princípios da tribu-tação direta e uma forma fácil de cobrar receitas.

Contabilista - O Estatuto dos Be-nefícios Fiscais nunca está isento de polémica e debate. Justifica-se a despesa fiscal com estes benefícios tendo em consideração os fins que pretendem alcançar?A. S. - Os benefícios fiscais têm sido o parente pobre da nossa legislação fiscal. O recente pro-cesso legislativo de revisão do Estatuto é bem demonstrativo disso. Os incentivos ao investi-mento, ou seja, os benefícios que constam do Código Fiscal do In-vestimento, têm um claro retor-

no e são boa despesa fiscal. Os benefícios do Estatuto são mais heterogéneos e, por isso, mais difíceis de avaliar. Não tenho dú-vidas quanto à manutenção dos benefícios à criação de emprego e à poupança, tendo em conta os fins que pretendem alcançar mas tenho algumas dúvidas em mui-tos outros, designadamente os li-gados ao mecenato.

Contabilista -Na sua análise, que esclarecimentos mais pertinentes é que têm de ser feitos?A. S. - O Código do IRC tem que clarificar o que é uma entida-de sem fins lucrativos para efei-tos fiscais. A natureza jurídica de uma instituição não é suficiente. É necessário clarificar a lei e de-pois aperfeiçoar os dados de ca-dastro do sujeito passivo para que tudo funcione de uma forma mais transparente para quem recebe donativos e para quem os atribui.z

«Os contabilistas também

têm de demonstrar que a

contabilidade não serve

só para prestar contas

à Autoridade Tributária,

explicando o valor desta

como instrumento de gestão.

Por vezes, sinto que os

contabilistas acham que não

vale a pena investir muito

nesta parte.»