notícias da sbhe | sbhe€¦ · web viewa vinculação de recursos para a educação se apresentou...

103
COMUNICAÇÃO COORDENADA: POLÍTICAS EDUCACIONAIS NO BRASIL: GENEALOGIA E PERSPECTIVAS EIXO 6 PROPONENTES: Lia Ciomar Macedo de Faria (Coordenadora) – Universidade do Estado do Rio de Janeiro - UERJ / Programa de Pós-Graduação em Educação – ProPEd. Janaína Meneses – Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro - Uni-Rio / Programa de Pós-Graduação em Educação – PPG-Edu. Maria Celi Chaves Vasconcelos – Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ; Universidade Católica de Petrópolis – UCP / Mestrado em Educação. Roberto Faria – Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ / Programa de Pós-Graduação em Políticas Públicas e Formação Humana – PPFH (Doutorando). RESUMO: A comunicação coordenada Políticas Educacionais no Brasil: Genealogia e Perspectivas, pretende analisar alguns aspectos do panorama da educação nacional, especialmente aqueles que se referem às origens históricas dos programas de ensino propagados como “novas” propostas para a educação, a trajetória de financiamento das políticas educacionais culminando com a implantação e consolidação do FUNDEB e, ainda, as perspectivas educacionais diante das novas tecnologias e as possibilidades dos espaços domésticos de educação e de ensino. Ao mesmo tempo, discute a gestão dos recursos no contexto das políticas para a educação no Brasil, encaminhadas a partir da Lei nº 9.394/96, quando os municípios assumem um importante papel no cenário nacional, delineando-se o projeto de descentralização que, ao longo de inúmeros recuos, tem estado na pauta dos debates desde a constituição dos sistemas públicos de educação no país. Atualmente, as diretrizes emanadas dos órgãos da administração central, como o Ministério da Educação (MEC), assinalam “o desafio de educar o Brasil”. O governo federal, em discurso

Upload: others

Post on 14-Aug-2020

0 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

COMUNICAÇÃO COORDENADA:POLÍTICAS EDUCACIONAIS NO BRASIL: GENEALOGIA E

PERSPECTIVAS

EIXO 6

PROPONENTES:

Lia Ciomar Macedo de Faria (Coordenadora) – Universidade do Estado do Rio de Janeiro - UERJ / Programa de Pós-Graduação em Educação – ProPEd.Janaína Meneses – Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro - Uni-Rio / Programa de Pós-Graduação em Educação – PPG-Edu.Maria Celi Chaves Vasconcelos – Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ; Universidade Católica de Petrópolis – UCP / Mestrado em Educação.Roberto Faria – Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ / Programa de Pós-Graduação em Políticas Públicas e Formação Humana – PPFH (Doutorando).

RESUMO:

A comunicação coordenada Políticas Educacionais no Brasil: Genealogia e Perspectivas, pretende analisar alguns aspectos do panorama da educação nacional, especialmente aqueles que se referem às origens históricas dos programas de ensino propagados como “novas” propostas para a educação, a trajetória de financiamento das políticas educacionais culminando com a implantação e consolidação do FUNDEB e, ainda, as perspectivas educacionais diante das novas tecnologias e as possibilidades dos espaços domésticos de educação e de ensino. Ao mesmo tempo, discute a gestão dos recursos no contexto das políticas para a educação no Brasil, encaminhadas a partir da Lei nº 9.394/96, quando os municípios assumem um importante papel no cenário nacional, delineando-se o projeto de descentralização que, ao longo de inúmeros recuos, tem estado na pauta dos debates desde a constituição dos sistemas públicos de educação no país. Atualmente, as diretrizes emanadas dos órgãos da administração central, como o Ministério da Educação (MEC), assinalam “o desafio de educar o Brasil”. O governo federal, em discurso oficial, aponta a educação como uma de suas prioridades: “educação para todos e em todos os níveis com qualidade e democracia no acesso”. Nesse sentido, foram implantados inúmeros programas, que vão “desde a alfabetização de jovens e adultos até a excelência na pós-graduação, promovendo repasses de recursos às escolas brasileiras e garantindo aos estudantes o livro didático, a merenda e o transporte escolar”. Embora entre as prioridades do MEC se destaque o acesso a educação básica, torna-se importante o percurso histórico percorrido pelas políticas educacionais ao longo das últimas décadas, identificando necessidades e demandas específicas em cada região, e como as mesmas vem sendo atendidas. Deste modo, a discussão proposta pretende refletir até que ponto tem sido observado a abrangência das políticas educacionais que emanam dos órgãos públicos da educação, que se trata, em última instância, do gerenciados dos recursos disponíveis para a implantação de programas criados e viabilizados por esses mesmos órgãos. Por fim, a comunicação coordenada apresenta uma análise dos processos históricos de implantação das políticas públicas e os seus efeitos na realidade educacional a partir de investigações que vem sendo desenvolvidas pelos quatro pesquisadores.

Palavras-chave: Rio de Janeiro, Políticas Públicas, Gênero e História da Educação

Page 2: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

A ARQUEOLOGIA DA ESCOLA FLUMINENSE

Lia Ciomar Macedo de FariaUniversidade do Estado do Rio de Janeiro - UERJ /

Programa de Pós-Graduação em Educação – [email protected]

O foco deste estudo investiga os impactos produzidos pelo 1° Programa Especial de Educação (I PEE) no comportamento político da sociedade fluminense, durante o período de redemocratização, pós-ditadura, na década de 80. Diante das circunstâncias que caracterizavam o cenário político fluminense, a questão que se destaca é: Como a cultura autoritária e as práticas político-clientelistas historicamente construídas afetaram as relações Estado - Sociedade Civil no embate travado entre o professorado fluminense e as concepções político-pedagógicas do novo governo? Ao mesmo tempo, há que se assinalar a herança e os impasses do processo ainda incluso da Fusão (1975) dos estados da Guanabara (GB) e do antigo Rio de Janeiro. Logo, discutir a importância das políticas educacionais empreendidas pelo PEE, tendo à frente Darcy Ribeiro, exige um esforço de recuperação teórica e memorialística, em busca da gênese das diferentes concepções político-pedagógicas que irão travar um duelo, nos palcos do sistema público estadual de ensino. Neste contexto de um passado ainda recente, lançamos um novo olhar sobre as percepções ideológicas e posições dos principais atores sociais no teatro partidário do Rio de Janeiro, que irão nos possibilitar um redesenho do quadro histórico-cultural daquele momento, de retomada do processo democrático em âmbito nacional. O objetivo da pesquisa foi desvelar o processo histórico de implantação dos CIEPs em meio às contradições políticas que irão caracterizar os últimos anos do Estado de exceção. Torna-se ainda importante identificar os diferentes discursos que permeavam o meio acadêmico, visando analisar o pensamento educacional produzido pelas correntes político-ideológicas, que apoiaram ou rejeitaram o I PEE, buscando assim um entendimento mais amplo da gênese de tal rejeição. Portanto, o que ainda está em jogo são visões ideológicas bastante distintas, a respeito do papel e da função da escola pública / republicana. Tais concepções do pensamento político-pedagógico nos remetem à pertinência e importância de pesquisas acerca da história das idéias e das práticas republicanas, intentando examinar e identificar as referências conceituais, que irão originar o atual modelo de escola pública no Brasil e em particular, a “arqueologia” da escola fluminense pós-Fusão (1975). Analisa ainda como se estabelecem as relações - sindicato, governo e escolas, naquele momento de abertura democrática, em que, de forma inédita, se reúnem os professores públicos da capital e do interior das redes escolares, municipal e estadual. Na oportunidade, destacamos a contribuição das investigações acerca das políticas educacionais no sentido de recuperar a gênese da escola pública fluminense pós-Fusão.

Palavra-chave: Escola fluminense; Fusão; 1º Programa Especial de Educação.

Page 3: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

INTRODUÇÂO

O presente artigo refere-se a pesquisa que desenvolvi no pós-doutoramento em Ciências Políticas pelo Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (IUPERJ), tendo como orientador o pesquisador Jairo Nicolau. Tal estudo foi motivado pela experiência1 profissional e atuação política, enquanto integrante da geração2 de professores públicos do sistema estadual de ensino do Rio de Janeiro (RJ). Deste modo, o foco deste estudo investiga os impactos produzidos, pelo I PEE, no comportamento político da sociedade fluminense, durante o período de redemocratização, pós – ditadura militar, na década de 80.

Em 1982 se realizam as eleições diretas para governadores em todo o país, sendo que no Rio de Janeiro foi eleito pelo voto direto, Leonel Brizola, pelo Partido Democrático Trabalhista (PDT)3, tendo como vice-governador Darcy Ribeiro, atuando concomitantemente como secretário estadual de cultura e presidente do I PEE.

Diante das circunstancias específicas que então caracterizavam o cenário político fluminense, durante aquelas eleições4 a questão que se destaca é a seguinte:

Como a cultura autoritária e as práticas político-clientelistas historicamente construídas, afetaram as relações Estado–Sociedade Civil no embate travado entre o professorado fluminense e as concepções políticos - pedagógicas do novo governo?

Portanto, os objetivos desta investigação pretendem assinalar as tensões que permeavam a tessitura política que cercava o governador Brizola, no momento de sua posse em março de 1983. Por outro lado, o próprio escândalo eleitoral ocorrido com o caso Proconsult, sinaliza para as dificuldades que viriam a ser enfrentadas por aquela administração, resultantes da montagem de uma bem engendrada máquina política chaguista.

Segundo Amorim (2004),Em 1982, no Rio, quase tomaram a eleição para governador de Leonel Brizola. Os militares, o SNI e a Policia Federal escolheram a empresa Proconsult para apurar os votos e dar a vitória a Moreira Franco, candidato

1 Nos anos 60, me formei professora primária do antigo Estado da Guanabara (Escola Normal Inácio Azevedo do Amaral), atuando nas séries iniciais do ensino fundamental do sistema público. Nos anos 70, graduei-me em História pela UFRJ, assumindo um segundo cargo, já no novo Estado do Rio de Janeiro (pós-Fusão), lecionando no antigo segundo grau (Ensino Médio).

2 Cf. Daniel Aarão Reis (2003), Apud J. F. Sirinelli (1986), a geração é referida a processos, ou a acontecimentos coletivos fundadores, em torno dos quais a memória de um grupo se articula e estrutura sua identidade (p. 637).

3 Na volta ao Brasil, Brizola dedicou-se à reorganização do PTB, no que foi obstado pelo general Golbery, considerado o ideólogo da ditadura, que irá contribuir para entregar a antiga sigla do trabalhismo ao grupo de Ivete Vargas. Brizola criou, então, o Partido Democrático Trabalhista - PDT. Cf. Sistema Político Brasileiro: Uma introdução, 2004.

4 No dia 18 de novembro de 1982, devido à demora na divulgação dos resultados da eleição, em que era tido como vitorioso, Brizola procurou a imprensa internacional para denunciar uma suposta tentativa de fraude, declarando eleito o candidato do PDS, Moreira Franco. Brizola foi à sede da Rede Globo, exigindo espaço para falar. Ele via na emissora o braço direito da conspiração, pelo modo como desconheceu os resultados favoráveis a sua candidatura, veiculados pelo Jornal do Brasil e a Rádio Jornal do Brasil. Como se verificou depois, segundo denúncias que também partiram de funcionários da própria Rede Globo, as Organizações Globo, juntamente com o SNI, estavam envolvidos. Este fato mais tarde se tornou conhecido como a Operação Proconsult. Cf. AMORIM, Paulo Henrique, PASSOS, Maria Helena. Plim-Plim – A peleja de Brizola contra a fraude eleitoral. Editora Conrad: Rio de Janeiro, 2005.

Page 4: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

dos militares. As organizações Globo (...) prepararam a opinião pública para a Fraude.5

Ao mesmo tempo, há que se assinalar a herança e os impasses do processo ainda inconcluso da Fusão (1975) dos estados da Guanabara (GB) e do antigo Rio de Janeiro. Paralelamente, o que se observa, é que o maior partido eleitoral na GB, de 1966 a 1978, será o Movimento Democrático Brasileiro (MDB), legenda de grande apelo popular, que com a ascensão da corrente liderada por Chagas Freitas6, passa a conviver com a supremacia do grupo, a partir das eleições de 1970.

Logo, discutir a importância das políticas educacionais empreendidas pelo I PEE, tendo a frente Darcy Ribeiro, exige um esforço de recuperação teórica e memorialística, em busca da gênese das diferentes concepções político-pedagógicas que irão travar um duelo, nos palcos do sistema público estadual de ensino. De acordo com Ribeiro (1986),

(...) A escolha da educação como prioridade fundamental responde (...) à ideologia social-democrata do Partido Democrático Trabalhista de Leonel Brizola (...) A escolha da educação como meta prioritária decorreu também do fato da maior parte, das áreas de ação governamental estar (sic) na órbita do Poder Federal, enquanto as escolas públicas de 1º e 2º graus estão na jurisdição dos governos estaduais e municipais. (...) Leonel Brizola tomou várias medidas (...) reconstrução da rede escolar (...), a transformação da merenda escolar (...); e, ainda, o transporte gratuito de alunos (...) O grande feito (...) foi elaborar o Programa Especial de Educação com a participação de todo o professorado do Rio de Janeiro (p. 86).

Dentre as metas do I PEE se definia a construção dos CIEPs, que o povo passou a chamar de Brizolões, com previsão de atendimento a 1000 crianças em horário integral. No período noturno,

(...) o Brizolão se abre para 400 jovens de 14 a 20 anos, analfabetos ou insuficientemente instruídos. Cada Brizolão abriga 12 meninos e 12 meninas escolhidos entre crianças abandonadas e que estejam sob a ameaça de cair na delinqüência (Idem, p. 17).

Neste contexto, o olhar teórico sobre as percepções, orientações ideológicas e posições dos principais atores sociais no teatro partidário do Rio de Janeiro, irão nos possibilitar um redesenho do quadro histórico-estrutural daquele momento, de retomada do processo democrático em âmbito nacional. E, paralelamente, de implantação dos CIEPs naquele estado.

Torna-se importante ainda identificar os diferentes discursos que circulavam no meio acadêmico, visando recuperar o pensamento educacional produzido pelas diversas linhas ideológicas, que apoiaram ou rejeitaram o I PEE, buscando um entendimento mais amplo da gênese de tal rejeição.

Ao abrir esse debate Mignot (2004), adverte que os CIEPs teriam sido construídos, (...) desordenada ou deliberadamente, em lugares de visibilidade estratégica, representando assim, de acordo com a autora, monumentos à educação, a um partido político e seus idealizadores (p. 203).

Por outro lado, o educador Luiz Antônio Cunha (1994), em seu artigo Zig-Zag no 1º grau: o Rio de Janeiro nos anos 80, critica o projeto de Brizola/Darcy Ribeiro, alegando que, entre outros fatores, as teses do governo foram prontamente rejeitadas pelos professores, tendo então eclodido, um longo e desgastante conflito entre os 5 Cf Amorim (2004) Apud Cunha (2006, p. 38).6 Antônio de Pádua Chagas Freitas (1914 -1991) foi jornalista e político brasileiro; governador da Guanabara (1971 a 1975) e do Rio de Janeiro (1979 a 1983). Seu nome deu origem ao termo chaguismo, que designou sua forma particular de utilizar a máquina pública estatal, praticamente dominou a política carioca e fluminense de 1970 a 1982. Cf. Chagas Freitas: perfil político, FGV/ALERJ, 1999.

Page 5: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

professores, dirigidos pelo CEP/RJ7 e as administrações estadual e municipal (...) (p. 22).

A seguir, complementa seus argumentos com a seguinte observação:(...) apesar da insuficiência no atendimento das metas educacionais e das fortes críticas recebidas dos educadores e dos movimentos dos professores, os CIEPs provaram seu elevado rendimento eleitoral Brasil a fora. Vários candidatos a governador prometeram fazer o mesmo em seus estados (1994, p. 24).

No campo específico da História da Educação, Xavier (2001) argumenta em Inovações e (des) continuidades na política educacional fluminense (1975-1995), que apesar das críticas e dificuldades encontradas, a proposta educacional do PDT contou com a adesão de vários professores, assim como obteve a simpatia de boa parte da população fluminense (p.137).

Ao mesmo tempo, a pesquisadora detalha alguns aspectos da polêmica que envolve os CIEPs, assinalando para o afto de que o “apelido” de brizolão, só fará acirrar os argumentos da oposição, embora tenha sido automaticamente incorporado ao marketing construído em torno da figura do governador e do principal formulador do PEE, Darcy Ribeiro (Idem, p. 135).

Ainda, segundo Xavier (2001), um outro dado deve ser considerado, (...) a estridente reação contrária às escolas públicas de tempo integral revelava, entre outros aspectos, o preconceito ancestral que as elites brasileiras nutriam para com os setores populares (Idem, p. 134)

Uma outra pesquisa que ajuda a refletir acerca das dificuldades do processo de reconstrução democrática no Rio de Janeiro, são os escritos de Faria (1989) em Política Educacional no Governo Brizola: democracia governante ou democracia governada? – quando analisa alguns dos Encontros de Professores promovidos durante aquele governo, utilizando-se metodologicamente das categorias de José Nun (1983).

A partir da apropriação de dois conceitos de democracia – governada, aquela em que o povo delegue poderes aos governantes para governá-lo e, a democracia governante que busca a participação popular nas decisões, o autor destaca os embates entre o professorado fluminense e as secretarias municipal e estadual naquele período8.

Em meio as contradições daquele periodo, Faria (1989) sinaliza para as falas de um professor acerca do resultado daqueles eventos. Este profissional do município de Cambuci, havia comparecido a quatro ou cinco encontros, alegando que apresentava várias sugestões e que todas eram aceitas, aplaudidas e até publicadas, mas nunca implementadas. Por outro lado, ainda no mesmo estudo, também apresenta a visão do governo, através do pronunciamento da secretária estadual de educação, professora Yara Vargas, ao afirmar que,

(...) consideramos irreversíveis as conquistas do governo Brizola, fundamentalmente porque representam o somatório de propostas do próprio governo, do professorado, dos alunos e da comunidade (...) propostas pelos professores são hoje realidade do currículo, como a implantação das classes de alfabetização, a diversificação das disciplinas de História e Geografia na área de Estudos Sociais (...).

Sobre estes dois pontos – a implantação das classes de alfabetização (CA) e a separação de História e Geografia, considerando seus campos de conhecimento

7 O Centro Estadual de Professores (CEP/RJ), atual SEPE (Sindicato Estadual dos Profissionais da Educação) havia sido fechado no governo Chagas Freitas, durante a greve de professores de 1979, tendo então sido reaberto pelo governador Leonel Brizola.8 Cf. Roberto Faria (1989), mimeo, IESAE/FGV (Mestrado em Educação).

Page 6: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

específicos, devemos tecer algumas considerações. O antigo primário possuia cinco séries e a legislação do regime militar, ao criar o ensino fundamental em oito anos, reduziu as séries iniciais para apenas quatro anos. Tal fato só veio agravar o quadro de exclusão das crianças oriundas das classes populares. Exatamente o processo de alfabetização é bastante prejudicado, pois estas crianças orieundas das classes populares não freqüentam a Educação Infantil, ingressando na escola somente aos sete anos. Com o CA, poderiam entrar aos seis anos. Também a criação da disciplina Estudos Sociais será uma “invenção” da ditadura, reduzindo o espaço de reflexão e discussão teóricas, particulares às áreas de conhecimento da História e da Geografia9.

Portanto, o que está em jogo são visões ideológicas bastante distintas, a respeito do papel e da função da escola pública/republicana. Estas concepções diversas do pensamento político-pedagógico, nos remetem à pertinência e importãncia do objeto do presente pós-doutoramento, acerca da história das idéias e práticas republicanas, intentando examinar e precisar as referências conceituais que irão originar o atual modelo de escola pública no Brasil, em particular, a “arqueologia” da escola fluminense pós-Fusão (1975).

Sobre a gênese da República Brasileira, Vianna & Carvalho (2002) analisam que: “(..) o tema da república remete a uma construção histórico-processual, sendo percebida como resultado de um longo caminho de redemocratização da esfera pública, que a tornou permeável à vontade dos indivíduos (...)” (p. 129).

Enfim, como se dá essa construção histórico-processual em relação às identidades da Guanabara e do estado do Rio, no momento da Fusão (1975) e, em seguida, com a eleição de Brizola, em 1982?

E mais, como se estabelecem as relações políticas - sindicato, governo e escolas – naqueles momentos de abertura democrática, em que historicamente, pela primeira vez, se reúnem os professores públicos10 da capital e do interior?

Para Godofredo Pinto, presidente do CEP, durante o primeiro governo Brizola, o Encontro de Mendes foi um marco relevante para o professorado fluminense, apesar de suas possíveis contradições, avaliando que,

(...) o saldo do Encontro foi positivo e relevante, porque abriu um espaço maior para a classe. A participação dos professores no debate, criado por iniciativa do governo, contribuirá para que a política a ser encaminhada possa vir a refletir mais de perto os anseios do magistério (Faria, 1989).11

Na oportunidade, queremos destacar a contribuição dos estudos que nosso grupo de pesquisa vem empreendendo, acerca das políticas educacionais fluminenses, no

9 A princípio um dos aspectos relevantes diz respeito à importância histórica da população negra enquanto elemento constituinte do povo e da nação brasileira. A Lei 10.639 de 2003 – que torna obrigatória a inclusão da cultura e história africanas nos currículos oficiais, por si só não é capaz de romper resistências e preconceitos arraigados ao cotidiano escolar. E de que forma essa discussão se insere em nossa análise sobre o I PEE e os CIEPs? Para a professora de História da UERJ, Edna Maria dos Santos?, o ensino e a pesquisa de África tem longa vigência no Brasil, ainda que sob a forma de ações pontuais. Lembrando a Secretaria Extraordinária Para Defesa e Promoção Das Populações Afro-Brasileiras, tendo como secretário Abdias do Nascimento, no segundo governo Brizola, em 1991. Também destacou que, Nessa época, os CIEPs davam conteúdo de história da África e literatura africana em seus currículos (Jornal da UFRJ, dez/jan, p. 9, 2008). 10 Cf. O Livro dos CIEPs, o movimento Escola Viva – Viva a Escola, convocou os professores do 1º grau para uma consulta acerca das teses do governo. Com a participação de 52.000 professores, a reunião final dos delegados realizou-se no município de Mendes (25-26/11/1983), originando o Encontro de Mendes, como ficou conhecido.11 Cf. Faria, apud Escola Viva, ano 2, nº 2, p. 22.

Page 7: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

PROPEd/UERJ12, com o projeto Ideário Republicano e Escola Fluminense, no sentido de recuperar a gênese da escola pública pós-Fusão.

Assim sendo, a obra em tela dá continuidade àqueles estudos, ao abordar as influências do chaguismo na cultura política do Rio de Janeiro, na capital e no interior, identificando o envolvimento da instituição-escola como parte importante desta máquina chaguista, o que certamente ocasionou conflitos e dificuldades para a nova administração, que sucedia o então governador Chagas Freitas.

Diniz (1982), em competente análise a respeito do fenômeno do chaguismo, alerta para o fato de que,

(...) O clientelismo adquire, assim, legitimidade para todos os atores envolvidos na relação, uma vez que o atendimento às necessidades em termos de serviços públicos não é encarado como um direito e uma prerrogativa da cidadania (p. 123).

A partir desta visão, a simples matrícula numa escola pública torna-se fator de barganha política, na medida em que a precariedade da ação governamental, facilita e estimula até os dias de hoje o esquema de troca de favores. Tais práticas vieram cristalizar ainda mais a alta estabilidade da elite parlamentar chaguista,(...) o papel do político inserido no legislativo municipal ou estadual torna-se tanto mais visível e valorizado, quanto maior a lacuna da administração local em termos de prestação de serviços básicos à população (Idem, p. 122).

Durante o processo de revisão de literatura, nos utilizamos como fonte teórica privilegiada, no que se refere ao fenômeno do chaguismo, da pesquisa empreendida por Eli Diniz (1982), cujos resultados foram publicados no livro Voto e Máquina Política: patronagem e clientelismo no Rio de Janeiro. A partir da leitura atenta das considerações desenvolvidas, dentre os pontos levantados iremos demarcar impasses e possibilidades, que oportunizem o registro de uma memória coletiva de recorte regional, objetivando o desvelamento da história oficial da educação fluminense, no período recortado em nosso objeto de estudo.

ENSINO PÚBLICO FLIMINENSE: O DISCURSO FUNDADOR

Desta forma, embora com mais dúvidas do que certezas, intentei recuperar a memória coletiva de uma geração13 de professores, ainda profundamente inspirada num viés utópico e nacionalista. Por outro lado, como veremos, essa mesma juventude é atravessada pelo projeto militar- autoritário, que atinge em particular, os anseios dos meios educacionais e acadêmicos.

Ao longo do período de exceção autoritária, inúmeras legislações fragmentam o projeto da reforma universitária14 dos anos 60, esvaziando conseqüentemente o forte movimento estudantil daquela década. Por outro lado, também fragilizam a organização do professorado, ao conferir à educação básica (antigos 1º e 2º graus) um viés

12 Programa de Pós-graduação em Educação (PROPEd/EDU/UERJ).13 Os estudos empreendidos ao longo do meu doutorado analisam o papel político daquela geração, em especial da juventude universitária. Cf. Olhar Feminino Sobre Ideologias e Utopias nos Anos 60: Discurso Fundador de uma Geração, EdUERJ, 1997.14 Dois documentos registram a concepção de Reforma Universitária que a geração de 60 reivindicava: as cartas da Bahia e do Paraná, documentos finais de congressos realizados pela UNE. Em 1961, em Salvador, o I Seminário Nacional da Reforma Universitária, com três eixos – A realidade brasileira, A Universidade no Brasil e A Reforma Universitária. A partir da análise da conjuntura das universidades brasileiras, feita neste seminário, a UNE promove no ano seguinte, em Curitiba, o II Seminário de Reforma Universitária.

Page 8: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

tecnocrático e profissionalizante, como contraponto a disciplinas mais reflexivas ou humanistas.

Torna-se importante, portanto, observar o corpo de leis emanadas pelo MEC15, durante o período militar (anos 70) acerca dos sistemas públicos de ensino, em seus diferentes níveis e modalidades, relacionando-o às políticas implantadas, no mesmo período, pelo governo Chagas Freitas em âmbito estadual.

Logo, discutir e analisar as novas políticas públicas educacionais, consideradas a principal prioridade do governo Brizola (1983-1986), demarcam um objetivo teórico no sentido de recuperar aquele cenário político estadual, nacional, estabelecendo um fio condutor entre os fatos tão próximos de uma história ainda do tempo presente.

O desejo de “retomar” um processo inconcluso, dos anos 60, desvela-se nesta declaração de Brizola ao Jornal do Brasil (JB, 04/11/1982): Não fiz nada para ser candidato, mas criou-se uma situação falha no Estado do Rio de Janeiro e tínhamos que abrir um caminho limpo. Quero continuar o trabalho de Vargas, Goulart e Roberto Silveira.

Paralelamente, intentamos identificar as diferentes mensagens e valores afirmados pelo movimento sindical do professorado, como contraponto às produções discursivas dos governos Chagas Freitas e Leonel Brizola. E, ainda examinar dentro de um contexto mais amplo de negação do regime militar, como se dão as condições sociais da produção deste educador fluminense, numa sociedade fragmentada, produto de múltiplas determinações.

Segundo Luciano Martins16, com o Ato Institucional nº 5 nasce a geração AI – 5, e o domínio hegemônico da ideologia do autoritarismo, ao longo dos anos 70, privando aquela geração, não só de seus direitos, mas o mais grave, alienando-os também da própria lógica desta privação.

Tudo somado, o que se revela é a negação de sujeitos e de cidadãos, espoliando a possibilidade de construção de uma memória coletiva, o que justifica a necessidade do cruzamento de duas conjunturas políticas, a dos anos 60 e a dos anos 80, quando o processo de redemocratização se intensifica. Desta forma, buscando sinalizar permanências e rupturas no comportamento político da sociedade fluminense e, em particular, de seu professorado.

Logo, esses aspectos do campo político carioca/guanabarino apontam para um cenário marcado, de fato, pela polarização e nacionalização. O futuro governador da GB, Carlos Lacerda, também irá incentivar o componente nacionalizador da política carioca.

Ao tratar especificamente dos anos 80, devemos buscar no passado, os sentidos históricos e políticos que vão construindo a escola fluminense, objetivando identificar o que restou da tradição do ensino público imaginado por Anísio Teixeira.

Não se pode negar, que a trajetória política do trabalhismo brasileiro, assim como da própria personagem política – Leonel Brizola – vem inspirada e projetada, todo o tempo pelo, espectro nacional/nacionalista.

Portanto, o recorte teórico aqui desenvolvido recupera o inventario político herdado pelo governador Brizola, ressaltando três momentos: durante o processo eleitoral (1982); no ato da posse em 1983 e, nos futuros embates ocorridos ao longo do seu primeiro mandato (1983-1986).

15 Tratam-se das leis nº 5540/68; DL. 464/69; 5.692/71 e, os DLs. 200/77 e 1422/75 que redefinem as bases legais da estrutura e funcionamento do ensino no Brasil, durante o regime militar. Cf Educação no Brasil: Legislação Mínima, Schuch, Vitor. 1983.16 MARTINS, Luciano. A geração AI-5 - um ensaio sobre autoritarismo e alienação. In: ARAÚJO, Braz J. de (org.), Ensaios de Opinião - vol. II. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1979, p.73/105.

Page 9: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

A pesquisadora Libânia Xavier (2001), por ocasião dos 25 anos da Fusão, publica um artigo destacando o documento-base que norteou as principais políticas desenvolvidas pelo governo Brizola, no que tange as relações com a sociedade. A seguir, pinçamos alguns trechos,

(...) Há que se percorrer um longo caminho de conscientização para que a população organizada seja ouvida a respeito dos problemas que a aflige e das soluções a serem encaminhadas. (...) Os órgãos fluminenses do governo e seus titulares franquearão suas portas à população fluminense, como condição para atingirmos as metas com as quais nos comprometemos (p. 131).

Aos poucos, é a “reativação do diálogo”, que acompanha o processo de redemocratização naqueles anos 80, o que também se observa nos textos do O Livro dos CIEPs (1986), conforme sinalizamos abaixo:

A melhoria da qualidade do ensino público que está sendo promovida pelo Governo Leonel Brizola requer a participação efetiva de todas as pessoas envolvidas no processo, não apenas no plano pedagógico, mas também na gestão do sistema educacional (...) A própria entidade representativa dos trabalhadores da educação, o CEP – Centro Estadual de Professores, encontrava-se fechado desde 1979 (...) Além de reabrir o CEP e estabelecer um canal permanente de comunicação entre a classe dos professores e as Secretarias de Educação, o Governo tratou de colocar em contato os profissionais de educação com as entidades da sociedade civil organizada, tais como associações de moradores, de favelas ou sindicatos (p. 29).

Assim sendo, apesar das críticas à idéia dos CIEPs, não se pode negar segundo apontam os estudos de Xavier (2001), que as práticas políticas do governo Brizola vinham confrontar as ações chaguistas. A tônica brizolista se voltava para o lento processo de restauração dos direitos democráticos da população, sinalizando ainda para a (...) precária integração da escola (e de outras agências sociais) com a comunidade, em virtude da acomodação e da auto-suficiência que acabavam dando lugar ao tráfico de influência, ao clientelismo e à corrupção (p. 131).

Nesse contexto, levantamos três hipóteses tendo como horizonte identificar o inventario republicano da escola pública fluminense: a escola pública brasileira / fluminense enquanto um dos pressupostos e pilares do Estado Republicano, o embate da grande política ideológica e filosófica, em detrimento da pequena política do cotidiano: “a prática do favor” e, o modelo de federalismo brasileiro como fomentador das relações de clientela: o papel dos chefes locais.

Dentro deste espírito, quais os sentidos das práticas políticas e profissionais do professorado daqueles anos 80? E quais as condições sociais que vieram a influenciar a produção política daqueles educadores? Por fim, em meio a tantas contradições, quais as marcas do legado brizolista à educação fluminense?

Apesar de acreditar que o registro desta história, ainda recente, com suas tensões e dubiedades, contribuíram para o entendimento da atual crise da escola pública fluminense, na medida em que a memória coletiva se efetiva tanto como instrumento de poder, como enquanto invenção e identidade humana, ao mesmo tempo, o olhar teórico sobre as percepções, orientações ideológicas e posições dos principais atores da política partidária fluminense, irão nos possibilitar a recuperação crítica daquele quadro histórico-estrutural dos anos 80, assinalando as principais influências presentes no imaginário do cotidiano das escolas públicas daquele estado.

Por fim, quero poder estar investigando outros pesquisadores acerca da construção da identidade da Educação Fluminense, não só pela análise e disponibilização de dados e documentações do passado, mas também pelo registro de ecos e vestígios, enquanto

Page 10: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

permanências/resistências que sobrevivem, ainda hoje, no comportamento político da comunidade escolar.

Ao selecionei parte da literatura, que vem aprofundando a discussão sobre o pensamento republicano, construído historicamente no Brasil e, em especial, as obras que enfocavam a gênese do novo estado do Rio de Janeiro pós-Fusão (1975), aprofundei o foco sobre a complexidade do quadro político que cercava os espaços possíveis para a implantação do brizolismo.

Paralelamente estabeleci um contraponto com o legado brizolista, na passagem daquele governador pelo Rio Grande do Sul (RS), nos anos 50, destacando a prioridade dedicada à escola pública. Abaixo, alguns trechos da obra de Claudemir de Quadros, a respeito das idéias que inspiraram as políticas públicas educacionais gaúchas naquele período.

Segundo Quadros (2003),(...) a instrução e educação do trabalhador, e do povo em geral, é outra importante questão para o trabalhismo, pois enquanto o trabalhador não atingir um certo nível de cultura, será sempre vítima de demagogos, aventureiros e charlatões (p. 140).

Neste mesmo viés, nosso olhar intentou localizar a gênese desse ideário trabalhista em Alberto Pasqualini, o principal teórico nos anos formativos do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB). Mais uma vez, Quadros (2003), acrescenta à discussão ao ressaltar que cabia ao PTB, num primeiro plano, desempenhar um papel educador, com vistas à criação da mentalidade social necessária para implantar a nova ordem social.

Contudo, o que tentamos desvelar neste trabalho, ora apresentado, é que ao examinar os dois momentos históricos, o início dos anos 60 e a retomada democrática nos anos 80, nos deparamos com as singularidades fluminenses que irão dificultar, em larga medida, as possibilidades da implementação de um projeto educativo “ambicioso”, conforme determinavam as diretrizes do I PEE/RJ, diferentemente do cenário político favorável no Rio Grande do Sul, dos anos 50/60.

Darcy Ribeiro, o principal idealizador do I PEE, em O Livro dos CIEPs (1986), afirma que seria “A revolução educacional brasileira”17. No entanto, a questão que queremos aprofundar é, como realizar uma mudança estrutural em uma sociedade marcada/deformada por práticas conservadoras e, ainda, em meio ao processo de redemocratização nacional?

Para Quadros (2003), (...) há duas questões que perpassam o discurso de Brizola: o desenvolvimento e a educação, confirmando tal posição, cita entrevista de Brizola, em que o governador reafirma queremos e procuramos o desenvolvimento econômico e só teremos através da educação.18

A análise do projeto educacional Nenhuma criança sem escola no Rio Grande do Sul, (1959/1963), revela três aspectos: a doutrina do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB); a trajetória do político Brizola e, a influencia fundamental sobre os dois, partido e político, das idéias de Alberto Pasqualini.

Por fim, os traços que ficam daquele projeto no Rio Grande do Sul, estão gravados na construção de 1.045 prédios19 escolares, com 3.360 salas de aula e capacidade para 235.200 matrículas (Quadros, 2003).

17 Cf. O Livro dos CIEPs (1986).18 Entrevista ao Jornal O Nacional, 03/02/1959, p. 01 – apud Quadros, p. 92, 2003.19 Cf. Gomes (2002) em artigo que rememora o processo da construção da escola pública no Brasil, assinala que os prédios escolares se tornaram os templos da civilização republicana, eram a materialização mais visível do que a república queria oferecer em matéria de educação (p. 393).

Page 11: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

Mais adiante passamos a enfocar mais aprofundadamente, como se deu o processo histórico de tessitura das relações de compadrio e do favor, no território fluminense, minando assim as bases políticas necessárias à consolidação do processo democrático, como um todo e, solapando especificamente os alicerces do I PEE. .

À GUISA DE UMA CONCLUSÃO

Ao analisar as conseqüências do processo político da Fusão (1975) dos estados da Guanabara (GB) e do antigo Rio de Janeiro, nos deparamos passa obrigatoriamente por outro lado, pelos efeitos da montagem de uma máquina política pelo chaguismo, a que seria incorporado o MDB, com o advento do pluripartidarismo20.

De certo, o maior partido em expressão eleitoral na GB, de 1966 a 1978, será o MDB, que com a ascensão do grupo chefiado por Chagas Freitas, nas eleições de 1970, passa a ser dominado hegemonicamente por essa facção.

A obra de Eli Diniz (1982) - Voto e máquina política: patronagem e clientelismo no Rio de Janeiro, ao problematizar o modelo político implantado por Chagas Freitas na antiga GB, revela o imenso poder do único governador do MDB no país naquele momento. Chagas era visto por seus correligionários e adversários, como “imperador da Guanabara”, ou ainda, um “coronel urbano”.

Em estudos anteriores de nosso grupo de pesquisa, analisamos as ações desenvolvidas durante o governo Chagas (1979-1983), pelo secretário de educação e cultura, professor Arnaldo Niskier21 e, uma de suas principais colaboradoras, Fátima Cunha, que será futuramente secretária do governo Moreira Franco (1987-1990), os dois professores, se mantém ainda em atividade profissional, sempre próximos ao PMDB.

Cabe refletir na oportunidade, sobre o longo período em que estes profissionais tem permanecido ocupando funções nos meios educacionais fluminenses e, em alguns momentos, no plano nacional. Enquanto o professor Niskier é identificado com a ala carioca chaguista, sob a hegemonia de Moreira Franco22.

Na história da educação fluminense, as ondulações do campo político impõem movimentos de avanço e recuo de grupos e idéias inovadoras (Xavier, 2001). 20 O Movimento Democrático Brasileiro (MDB), partido político de âmbito nacional, é fundado em 4 de abril de 1966, dentro do sistema de bipartidarismo instaurado após a edição do Ato Institucional nº. 2 (27/10/1965). A nova legislação extinguiu os partidos existentes e o Ato Complementar nº. 4 estabeleceu as condições para a formação de novos partidos. O MDB desapareceu em 29 de novembro de 1979, quando o Congresso decretou o fim do bipartidarismo, abrindo espaço para a reorganização de um novo sistema multipartidário, surgindo então o PMDB. Cf Sistema Político Brasileiro, UNESP, 2004.

21 O professor Arnaldo Niskier era genro de Adolpho Bloch, dono do grupo Manchete e amigo pessoal do presidente Juscelino Kubistcheck, o que talvez justifique sua ascensão e prestígio políticos. O professor é atualmente membro da Academia Brasileira de Letras, tendo sido secretario de Cultura e, depois de Educação no governo de Rosinha Garotinho (2003-2006).

22 O antigo Estado do Rio de Janeiro tinha como principal líder político, Amaral Peixoto (genro do presidente Getúlio Vargas). Moreira Franco será seu sucessor e, também seu genro, derrotando Darcy Ribeiro nas eleições ao governo estadual, em 1986. Fátima Cunha será o último dos três secretários de educação em sua administração, alternadamente: Carlos Alberto Direito, Rafael de Almeida Magalhães e, por fim, a professora Fátima Cunha.

Page 12: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

Certamente neste contexto de descontinuidade político–administrativa, uma experiência educativa que merece atenção dos pesquisadores da história da educação é a referente ao LC, cuja matriz teórica foi inspirada na epistemologia genética de Jean Piaget. Segundo o professor Nilton Nascimento, diretor do departamento de educação da SEEC naquela época, a expectativa da equipe que formulou a proposta era que o LC cobrisse o vazio deixado na área de pesquisas educacionais desde o fechamento do Instituto de Pesquisa da Guanabara – órgão criado por Anísio Teixeira, porém extinto com a fusão (Idem, p. 122).

Ao fim e ao cabo, analisar o pensamento educacional chaguista produzido no período de 1979 a 1982, pode desocultar vestígios de um passado ainda recente, considerando que os esquecimentos e os silêncios da História são reveladores desses mecanismos de manipulação da memória coletiva (Le Goff, 1982, p. 426).

Logo, discutir a importância e o impacto do I PEE (1983-1987), contribui com a recuperação da memória da cultura política do campo educacional, não só no espaço do sistema público do ensino fluminense, como também em âmbito nacional23.

O que se constata, no entanto, após a Fusão, é que ocorre não o enfraquecimento, mas o fortalecimento do MDB do Rio de Janeiro. Mais adiante, Chagas vai controlar não só a cidade, mas também o novo estado do Rio de Janeiro.

Nesta direção, o pesquisador Jairo Nicolau24, ao comparar o quadro político fluminense com o de outros estados, destaca o fato de que no Rio, os grandes partidos nacionais25 não são as forças dominantes, avaliando que embora se faça “muita política”, os partidos são frágeis, organizando pouco, o voto do eleitor e a própria sociedade. Deste modo, o jogo político gira em torno de grandes lideranças, independentes do partido, todavia, contrariando essa marca da política carioca, apontou que Brizola manteve-se fiel ao seu partido, o PDT, tendo sido uma liderança importante na política estadual fluminense.

Naquela oportunidade também ressaltou um dos aspectos do pensamento de Brizola e de seus seguidores, que “batizaram” de socialismo moreno uma possível social-democracia no país, com contornos mais populares e, menos uma social-democracia da organização e muito mais da mobilização social.

Jairo alertou ainda para o uso indiscriminado do termo populismo, o que considera pouco analítico e muito acusatório. Portanto, reduzir e pensar a política carioca como uma política populista, sem assumir uma postura mais crítica, considerando uma dimensão teórico-conceitual sobre o termo populismo, pode se estar incorrendo no equivoco de um mero “julgamento”, em lugar de seguir uma perspectiva política melhor fundamentada.

Ao concluir, analisou que de 1982 para cá, houve duas fases muito marcante da política fluminense, em termos de organização da sua elite política. O primeiro ciclo, de 1982 a 1992, teria sido a década brizolista, com a hegemonia do PDT, sem outras alianças expressivas. Deste período, sinalizou ter sido uma década interessante em termos de urbanização e que o PDT teria mobilizado a sociedade fluminense, apesar de ser um partido basicamente concentrado na capital.

23 Sobre a reorganização do campo educacional, destaca-se a importância da IV Conferência Brasileira de Educação (IV CBE, 1986), cujos princípios são afirmados na Carta de Goiânia Cf GONDRA, José Gonçalves. A Reorganização do Campo educacional no Brasil. Rio de Janeiro: Sette Letras, 2003.24 Na ocasião também afirmou que acredita ser o PSDB o partido que mais atinge à classe média, através de um discurso modernizante, contudo, tal fato não teria ocorrido no Rio de Janeiro, aonde o partido até os dias atuais não ocupa um espaço significativo.25 Cf. Jairo Nicolau, se referindo ao Partido dos Trabalhadores (PT) e ao Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB).

Page 13: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

Por outro lado, destacou que o brizolismo, confirmando o teor personalista da política fluminense, se expande, sobretudo para a Baixada, tendo dificuldades para chegar no interior do estado. O que só ocorre já no fim de seu ciclo, quando fará alianças geralmente com setores mais tradicionais, como, por exemplo, com a ala sobrevivente do chaguismo. Assim sendo, o brizolismo não se caracterizou como um fenômeno dos pequenos municípios, mas sim da região metropolitana.

Por fim, Jairo Nicolau, quando revisita aqueles anos 8026 destaca um cenário político acirrado, entre o brizolismo e o anti-brizolismo, reiterando ser impossível pensar o Rio sem essa clivagem. O que nos levar a suspeitar de que este acirramento contribuiu para dificultar a implantação das políticas educacionais daquele governo.

Logo, ao retornar ao objeto deste estudo - a identidade da escola pública fluminense e os impasses entre Estado-Sociedade Civil durante o I PEE (1983-1987) – torna-se relevante observar que o brizolismo terá que fazer concessões a alguns setores do chaguismo, ainda presentes nas políticas locais do interior fluminense. Tal fato reforça a nossa hipótese quanto à permanência de modelos e concepções político-pedagógicas historicamente construídas, que estavam na contra-mão das idéias de Darcy Ribeiro.

Nesta perspectiva, no plano da historiografia fluminense é necessário que exploremos as múltiplas dimensões do cenário político em que será erigido o I PEE. Ao mesmo tempo, a questão da memória local e regional deve ser confrontada à questão nacional, ressurgindo portanto, para o historiador da educação, um campo aberto no qual o imaginário e o simbólico assumem um papel fundamental (Santos, p. 94, 2007).

Paralelamente às reflexões anteriores queremos igualmente discutir o processo de des-republicanização da escola pública, na medida que o mito da escola pública para todos, não foi ainda alcançado. Logo, recuperar o caráter instituinte da política seria um primeiro passo, no sentido de firmar os princípios republicanos, dentre eles o do direito à educação.

Enfim, investigar qual o caráter instituinte27 originário da constituição política da sociedade fluminense pós-Fusão pode apontar indícios de como se configurou a dimensão fundante do sistema público estadual de ensino daquele novo estado. Mais adiante, damos continuidade ao desvelamento das relações políticas no momento da posse de Brizola, intentando mais uma vez, vislumbrar no horizonte, os indícios das resistências que irão minar as ações do I PEE.

REFERÊNCIAS

AMORIM, Paulo Henrique, PASSOS, Maria Helena. Plim-Plim: A peleja de Brizola contra a fraude eleitoral. Editora Conrad: Rio de Janeiro, 2005.

AVELAR, Lúcia; CINTRA, Antônio Octávio (org). Sistema Político Brasileiro – uma introdução. Rio de Janeiro/São Paulo: Fundação Editora da Unesp, 2004.

BIGNOTTO, N. Pensar a República. Editora UFMG: MG, 2002.

BOTO, Carlota. Na Revolução Francesa, princípios democráticos da escola pública, laica: o relatório Condorcet. In: Contemporaneidade e Educação. nº10, 2001.

26 Cf. Jairo Nicolau, nos anos 90 essa clivagem irá se deslocar para duas lideranças, Anthony Garotinho (PDT/PSB) e César Maia (DEM), ambos oriundos do PDT. Atualmente Garotinho está filiado ao PMDB.

27 Ver Claude Lefort, apud Bignotto (p. 29) sobre o caráter instituinte da política.

Page 14: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

CARDOSO, Ciro Flamarion. Um historiador fala de teoria e metodologia. Bauru, SP: EDUC, 2005.

CARVALHO. J. M. A formação das almas: o imaginário da república no Brasil. Cia. Das Letras: São Paulo, 1990.

Centro de Referência de Educação Pública da cidade do Rio de Janeiro, 2007. SME: Memórias da Educação Pública: depoimentos de secretários de educação vol. I - 2007. RJ

DINIZ, Eli. Voto e máquina política: patronagem e clientelismo no Rio de Janeiro. Ed. Paz e Terra, SP, 1982.

FERREIRA, M. de M, ROCHA, D. e FREIRE, Américo, Vozes da oposição – FGV/ALERJ, RJ, 2001.

FERREIRA. M de M. Crônica política do Rio de Janeiro. FGV/ALERJ/RJ, 1998.

FRANCO. M. Antes que seja tarde: ainda é tempo de um Brasil menos desigual. Topbooks Editora: RJ, 2002.GOMES, A C., PANDOLLI, D. ALBERTI, V. A República no Brasil. Nova Fronteira/FGV, RJ, 2002.GONDRA, J. G. (org). Pesquisa em história da Educação no Brasil. DP&A Editora. FAPERL/RJ, 2005.

GONDRA, José Gonçalves. A Reorganização do Campo educacional no Brasil. Rio de Janeiro: Sette Letras, 2003.

LEONELLI, D. e OLIVEIRA, D. Diretas já: 15 meses que abalaram a ditadura. RJ: Editora Record, 2004.

MARTINS, Luciano. A geração AI-5: um ensaio sobre autoritarismo e alienação. In: ARAÚJO, Braz J. de (org.), Ensaios de Opinião - vol. II. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1979.

MOTTA, M. Rio de Janeiro: de cidade capital a Estado da Guanabara. FGV/ALERJ/RJ, 2001.

QUADROS, Claudemir de. As Brizoletas cobrindo o Rio Grande: a educação pública no Rio Grande do Sul durante o governo de Leonel de moura Brizola (1959-1963).Santa Maria: Ed. UFSM, 2003.

QUADROS, Claudemir de. Marcas do tempo: imagem e memória das brizoletas. UNIFRA, Santa Maria (RS), 2005.

SANTOS. A. C. A invenção do Brasil: ensaios de história e cultura. Editora RJ: UFRJ, 2007.

SARMENTO, Carlos Eduardo. Chagas Freitas: perfil político. Rio de Janeiro: ALERJ/FGV, 1999.

Page 15: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

SCHUCH, Vitor Francisco. Educação no Brasil: legislação mínima – Ensino de 1º, 2º e 3º Graus. Porto Alegre: Sulina, 1983.

SILVA. W. A deformação da história ou para não esquecer. Jorge Zahar Editora: Rio de Janeiro, 1985.

OS (DES)CAMINHOS DO FINANCIAMENTO DA EDUCAÇÃO NO BRASIL:

UM OLHAR SOBRE SUA HISTÓRIA.

Janaina S. S. Menezes/UNIRIO

Page 16: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

Introdução

Este estudo - que objetiva delinear, de forma panorâmica, o perfil histórico do

financiamento da educação pública do País - emergiu da concepção de que a justiça

social deve ser buscada, também, no âmbito do sistema tributário e, por conseguinte,

no financiamento de políticas públicas, as quais têm no financiamento da educação

um de seus desafios históricos.

Os pressupostos deste trabalho repousam na perspectiva de que o dever do

Estado para com a educação é inócuo se não for acompanhado da respectiva

provisão de recursos públicos para sua efetivação (Oliveira, 1998, p.123). Mais

especificamente, a discussão em torno da educação, como direito de todos e dever do

Estado (art.205 da Constituição Federal de 1988), tem como suporte o adequado

equacionamento das fontes de recursos para seu financiamento, fazendo com que os

debates sobre a educação de qualidade, uma das metas das políticas públicas atuais,

passe, necessariamente, por uma definição clara das suas fontes de recursos e pelo

estudo dos custos do processo de escolarização que darão origem à mesma.

Por perceber que muitos dos ordenamentos direcionados ao financiamento da

educação tomaram como referência antigos (des)caminhos, buscou-se por meio de

uma retrospectiva histórica - que focalizasse desde o modo como a educação estava

inserida no sistema de tributação da Coroa, até as ordenações constantes nas

diferentes Cartas Constitucionais promulgadas (ou decretadas) no decorrer dos dois

últimos séculos - referências para o entendimento da atual configuração do

financiamento da educação (mais especificamente do ensino fundamental) no Brasil.

Page 17: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

De maneira mais específica, tomando como base a análise da legislação, este

estudo busca demonstrar que, ao longo dos últimos 500 anos, o governo central,

comparativamente às demais instâncias federadas, pouco avançou na sua

responsabilidade para com o financiamento da educação pública do país,

evidenciando, em vários momentos tentativas de refreamento para com tal atribuição.

O financiamento da educação no contexto das receitas públicas no Brasil: um breve

relato histórico.

Partindo da perspectiva de que o conhecimento do referencial histórico constitui

um importante instrumento para o entendimento da atual formatação do

financiamento da educação, este texto, a exemplo dos estudos do prof. Marcelino

Pinto (2000), dividiu a história daquele financiamento em três períodos a seguir

especificados. Esta segmentação, de objetivo didático, espera - ao realçar as grandes

linhas que nortearam o financiamento da educação no Brasil - fornecer uma visão

geral de um contexto permeado por múltiplas especificidades.

- O 1º período decorreu do ano em que os jesuítas chegaram ao País (1549) até sua

expulsão (1759); nessa época foi delegada aos membros daquela ordem religiosa

a exclusividade do magistério público, assinalando o total afastamento do Estado

em relação ao financiamento da educação nacional.

- O 2º período, compreendido da expulsão dos jesuítas até o fim da República Velha

foi caracterizado: a) pela busca de fontes autônomas de financiamento para a

educação e, b) por deixar a educação por conta das dotações orçamentárias dos

governos dos estados e das câmaras municipais.

- Já o 3º período, que se estende da homologação da Constituição Federal de 1934

até os dias de hoje, tem sido marcado pela busca da vinculação constitucional de

um percentual mínimo de recursos tributários para a educação.

Page 18: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

A discussão referente ao terceiro período será conduzida até a legislação que

antecede a Carta Constitucional vigente.

Passa-se, agora, a assinalar, de modo mais detalhado, esses três períodos.

1.1) 1º Período

A fim de evidenciar que o período compreendido de 1549 a 1759 foi marcado pela

omissão absoluta do Estado no que tange ao financiamento da educação pública no

País, este estudo mostrará que a educação no Brasil Colônia não foi beneficiada pela

estruturação do sistema de receitas públicas, tendo permanecido, naquela época, sob

a tutela dos jesuítas. A estruturação do sistema de finanças da Colônia estava voltada,

prioritariamente, para o atendimento das necessidades da Corte, sendo marcada por

um grande número de impostos que, segundo Pinto (2000), ultrapassavam 150.

Tendo em vista o número excessivo e o pequeno retorno financeiro da maioria

desses tributos, este estudo abordará apenas os considerados de maior importância

para a Corte, a saber: o dízimo, os direitos de entrada e o quinto.

O dízimo, com sustentação na Bíblia, Todos os dízimos do campo, seja produto

da terra, seja fruto das árvores, pertencem ao Senhor (Levítico 27,30), em sua

origem era um tributo eclesiástico. No entanto, o rei de Portugal, como grão-mestre

da Ordem de Cristo e do Padroado de Tomar, arrogou-se o direito de cobrá-lo. Em

contrapartida, a Coroa comprometeu-se a conceder uma espécie de pensão aos

ministros do culto, denominada côngrua, teoricamente suficiente para a manutenção

da Igreja, em Portugal e no Reino. O dízimo, do latim decimu, destinado ao erário

real, correspondia a dez por cento de qualquer produção, com exceção dos minérios.

Page 19: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

Os direitos de entrada eram tributos associados à circulação de mercadorias

entre as diferentes províncias e incidiam basicamente sobre os animais de carga que

vinham do Sul para trabalhar nas minas de ouro e sobre o gado que vinha da Bahia

(região do rio São Francisco), destinado também basicamente aos mineiros

(Vasconcelos e Prado Jr. apud Pinto, 2000).

Já o quinto, considerado o imposto real de maior importância, teve sua cobrança

instituída em Portugal, antes mesmo da descoberta do Brasil e de suas riquezas. Sua

arrecadação baseava-se no princípio de que os direitos reais se estendiam aos veeiros

e às minas de ouro e prata e qualquer outro metal descobertos em Portugal ou no

Reino. A administração portuguesa, por não ter condições de levar a efeito tarefa de

tal dimensão, viu-se na contingência de abrir a exploração de “seus” minérios à

iniciativa privada, passando o quinto a corresponder a 20% de todos os metais já

fundidos e livres de todos os custos. Mais especificamente, no caso do ouro, o mesmo

só poderia ser comercializado após fundido, quintado e apresentar certificado das

Casas de Fundição.

É interessante salientar que, antes da descoberta das riquezas minerais de nosso

País, aqueles que deixassem de pagar o quinto em Portugal, como pena, perderiam

sua fazenda e seriam degradados, por dez anos, para o Brasil (Antonil apud Pinto,

2000, p.9), demonstrando o tipo de consideração que Portugal tinha para com o

Brasil na época.

Afora os múltiplos tributos destinados ao Erário Real, o mesmo fazia jus a um

terço das rendas auferidas pelas câmaras, incluindo-se aí os impostos de natureza

local, a citar, as taxas sobre as balanças onde se pesavam os gêneros de primeira

necessidade, taxas do celeiro público (mercado) e de aferição de pesos e medidas,

tributos que incidiam sobre as reses entradas nos açougues e carne abatida, sobre a

Page 20: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

fabricação e venda de aguardente, entre muitos outros (Pinto, 2000). Embora os

tributos de natureza local fossem em grande número, o seu retorno financeiro era

muito pequeno, sujeitando as câmaras municipais a uma situação de pobreza que as

obrigava a lançar mão das fintas, uma espécie de coleta especial destinada ao

pagamento de algumas despesas específicas, a citar: construção de pontes, fontes e

prédios públicos, entre outras.

Vale ressaltar que, à exceção do quinto, a cobrança dos tributos, tanto de caráter

geral quanto local, era feita de maneira terceirizada, a qual, devido aos seus vícios

estruturais e aos abusos dos contratantes, segundo Caio Prado Jr., citado por Pinto,

constituiu-se numa das mais maléficas práticas do governo colonial (2000, p.10),

resultando sérios prejuízos, tanto para os agricultores (que muitas vezes acabavam

por terem suas terras confiscadas), quanto para as câmaras e províncias que não

usufruíam de um fluxo estável e seguro de recursos. A cobrança do dízimo, por

exemplo, apresentava dois grandes problemas: a) era cobrado em espécie, sendo que

os agricultores tinham grande dificuldade de vender seus produtos e; b) os dizimeiros

calculavam o rendimento da terra muito acima do valor real (Saint Hilaire apud

Pinto, 2000), fazendo com que os agricultores, acuados em seu isolamento e pobreza,

mesmo com o prazo de três anos para pagá-lo, tivessem grande dificuldade de honrar

aquela dívida. Muitos deles, após terem suas terras confiscadas, com a intenção de se

isentar do pagamento do dízimo, iam morar em locais distantes. Outros acabavam por

produzir ou somente o necessário para a subsistência de sua família, ou produtos que

possuíssem demanda certa de mercado.

Também a cobrança do quinto, grande mantenedor da abastança portuguesa,

encontrava sérias dificuldades: primeiro, porque os grandes proprietários de minas

não demonstravam o menor interesse em colaborar com o Erário real; segundo

Page 21: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

porque os administradores locais, responsáveis pela cobrança e fiscalização dos

tributos, eram selecionados pela própria elite local e, por último, porque a Coroa,

devido, principalmente, ao escasso número de soldados da Cia. dos Dragões

disponibilizados na Província, não possuía condições de impor sua vontade (Pinto,

2000).

Os obstáculos que se apresentavam à cobrança do quinto fizeram com que, em

acordo firmado em 1750, a Coroa acolhesse uma proposta formulada pelos

proprietários de minas, garantindo-lhe, por meio da cotização entre câmaras

municipais, uma quantidade mínima de 100 arrobas (1.465 kg) de ouro ao ano.

Em não sendo atingida tal quantia, estas mesmas câmaras se compromissavam a lançar um tributo de natureza local e que incidiria sobre todos os habitantes (per capita), mineradores ou não, até suprir a quantia faltante (Idem, p.14).

Esta forma de socialização do pagamento de uma tributação que deveria incidir

exclusivamente sobre os proprietários de minas configurou-se na célebre derrama

que causou muita aflição àqueles que deveriam pagar por uma conta que não era

sua, tornando-se o motivo de diversos motins populares.

Com a descoberta das minas no Brasil, o quinto ampliou sua importância para a

Coroa, que viu neste tributo uma forma de dar continuidade à sua abundância.

Durante um século quase, não haverá outra preocupação séria e de conseqüência que a cobrança dos direitos régios, o quinto; a história administrativa do Brasil se contará em função dela. (Prado Jr. apud Pinto, 2000, p. 9)

O ouro e os diamantes enviados do Brasil para Portugal criaram a sensação de

que a crise que o Reino vivera anteriormente estava superada.

Page 22: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

Mas e a educação, como se encontrava frente à política tributária do Brasil

Colônia?

Pode-se perceber que a educação não encontrava sustentação financeira junto

àquela administração, que não lhe destinava nenhum de seus tributos (mesmo os

menos significantes). Esse período, conforme assinalado anteriormente,

compreendeu os 210 anos de ingerência dos jesuítas na educação do País. Teve seu

início marcado pela chegada do Pe. Manoel da Nóbrega que junto com mais cinco

membros da Companhia de Jesus, logo depois de instalados, fundaram, já em 1550,

um colégio em Salvador. Por ocasião da expulsão dos membros daquela ordem

religiosa do Reino e de suas colônias, a mando do Marquês de Pombal, quase todas

as vilas dispunham de escolas de primeiras letras e o País contava com cerca de 17

colégios jesuítas que forneciam ensino de nível médio, preparando a elite local para

o ensino superior em Portugal e formando quadros, em nível superior, para a

própria Cia. de Jesus (Romanelli apud Pinto, 2000, p.46).

Os motivos oficiais para a expulsão dos jesuítas, conforme consta no Alvará

Régio de 1759, citado por Pinto (2000), alegam causas de natureza pedagógica,

enfatizando que o ensino das “letras humanas”, base de todas as ciências, havia

decaído no período em que fora confiado àqueles religiosos. E mais, afirmava que os

alunos, após terem sido conduzidos por oito ou mais anos sob a responsabilidade

daqueles religiosos se achavam:

...tão ilaqueados nas miudezas da Gramática como destituídos das verdadeiras noções das línguas latina e grega para nelas falarem sem um tão extraordinário desperdício de

Page 23: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

tempo, com a mesma facilidade e pureza que se têm feito familiares a todas as outras nações da Europa que aboliram aquele pernicioso método...(p.47).

Longe dos alegados motivos pedagógicos, os sustentáculos de tal decisão

imbricavam-se nos terrenos político, econômico e ideológico .

Vale lembrar o acordo firmado entre a Coroa e os jesuítas, definindo que em

troca da transferência do recebimento do dízimo para a Coroa, os jesuítas receberiam

côngruas. Na prática o que ocorreu - e que se tornou uma das principais causas da

expulsão dos jesuítas, concepção esta fortalecida por alguns autores (Monlevade,

1997; Pinto, 2000) -, foi que, longe de ficarem à mercê dos inconstantes pagamentos

das côngruas, necessárias à manutenção da Igreja em Portugal e no Reino, os

jesuítas buscaram obter concessões de terras e privilégios no comércio, decorrendo,

daí, significativo avanço do seu poderio econômico.

Esta aliança entre a Coroa e os jesuítas - que, durante sua permanência no

Brasil, ministraram um ensino gratuito -, tendo como cenário a insatisfação dos

comerciantes portugueses que viam nos privilégios conquistados pela Companhia de

Jesus uma ameaça aos seus negócios, foi rompida quando da ascensão do Marquês

de Pombal ao cargo de primeiro-ministro, o qual, na tentativa de enfrentar as

dificuldades que novamente assombravam o Reino (incluindo aí o esgotamento do

ouro das Minas Gerais), voltou seus olhos para o Brasil, procurando reformar as

relações entre a Metrópole e a Colônia, de modo a propiciar o reerguimento do

Reino28 (Rio, 2002, p.2).

O projeto sistemático de fortalecimento e modernização da Coroa, desenvolvido

por Pombal, não encontrou sustentação entre os jesuítas - considerados principais

28 www.rio.rj.gov.br/multirio/historia/modulo01/adm_pombalina.html

Page 24: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

incentivadores da resistência dos nativos àqueles projetos - que foram acusados de

conspiração política e, com isto, tiveram seus bens, em sua maior parte propriedades

rurais e urbanas, confiscados e leiloados, sendo arrematados por comerciantes e

fazendeiros (Idem, p.3). Suas escolas religiosas foram substituídas por leigas.

Pombal justificou a expulsão, dizendo que a Igreja era um “Estado dentro do

Estado” e que os jesuítas tinham muito poder de influência e de manipulação,

atrapalhando o Estado. Vale ressaltar que, na época, a Coroa Portuguesa sofria

grande influência de alguns aspectos das concepções iluministas29, que propunham

pensar o mundo:

A partir de um centro que não é Deus, bem como, defendiam a laicização do saber, da moral e da política. [...] Sendo assim, rompendo com o jesuitismo e defendendo a concepção iluminista, o governo português, tomando como referencial as idéias dos reformadores setecentistas (nome dado aos pombalistas) afirmavam ser os jesuítas responsáveis pelo atraso cultural e pelo empobrecimento econômico...(Ferreira, 2000, p. 02)30.

Pombal, conhecido no Brasil como um dos “déspotas esclarecidos”, de formação

francesa, era um grande defensor dessas concepções.

Este estudo chega, aqui, à verificação da primeira tese que, para o período

compreendido de 1549 a 1759, defendeu ter ocorrido um total afastamento da Coroa

no que tange ao financiamento da educação no País. Percebeu-se, por meio do estudo

histórico do sistema de receitas públicas do Brasil Colônia que, em momento algum,

aquela administração destinou qualquer recurso financeiro à manutenção e

desenvolvimento da educação no Brasil. Apesar do grande número de impostos

29 Segundo Ferreira, a concepção iluminista não era uniforme, nem homogênea e sofria alterações conforme as condições culturais dos países, sendo que alguns se caracterizavam por ser anticristãos e anti-religioso e, em outros, por ser católico. Em Portugal o catolicismo estava muito enraizado e, embora reformado, limitava o poder jurisdicional da Igreja (2002, p.2).

30 http://www.ufpel.tche.br/fae/siteshospedados/8FERREIRA.htm

Page 25: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

presentes no nosso país, nenhum deles direcionava-se ao financiamento da educação

pública, a qual, por mais de 200 anos, ficou a cargo dos jesuítas que, por motivos de

cunho essencialmente políticos e econômicos, para além das alegadas causas

pedagógicas, foram daqui expulsos.

As concepções iluministas que permeavam o pensamento do grande reformador

nacional, Marques de Pombal - cuja administração foi execrada por uns, exaltada

por outros -, e que traduzia o espírito crítico das Luzes e dos princípios do

despotismo iluminado, defendia a renovação da atividade científica e a propagação

da instrução pública para os seus cidadãos (Ibidem), certamente não estavam

orientadas para os índios e escravos que constituíam a grande maioria dos habitantes

deste País e que, na época, sequer eram considerados cidadãos.

Passa-se, agora, para o segundo período da história do financiamento da

educação.

1.2) 2º Período:

Este período estende-se desde a expulsão dos jesuítas de Portugal e de suas

colônias até o final da República Velha (1892) e tem na Independência do País

(1822) um marco de uma pequena reorientação da trajetória educacional que vinha

se delineando. No que tange ao financiamento da educação, a tese a ser defendida

para esse período é que foi caracterizado, ora pela busca de fontes autônomas de

financiamento para a educação, ora por deixar a educação por conta das dotações

orçamentárias dos governos estaduais e das câmaras municipais.

A expulsão dos jesuítas do Brasil - que, por meio de seus colégios e das “aulas de

ler, escrever e contar”, por mais de 200 anos monopolizaram o sistema de ensino do

Page 26: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

país, deixando profundas marcas na cultura e na sua civilização - abriu uma enorme

lacuna no sistema de ensino da Colônia que não seria preenchida nas décadas

subseqüentes.

Para substituir o ensino ministrado pelos religiosos foram instituídas, já em 1759,

as “Aulas Régias”31, um sistema de ensino não-seriado, constituído de unidades

isoladas, em que os professores eram nomeados diretamente pelo rei, em cargo

vitalício (Pinto, 2000). Este sistema de aulas, que perdurou até 1834, correspondia ao

ensino primário e secundário, tendo como características o caráter centralizador, a

falta de autonomia pedagógica e o acesso à educação de uma parcela reduzida da

população (Ferreira, 2002, p.2).

Devido à falta de respaldo financeiro e de professores, cuja remuneração era

muito baixa, poucas foram as aulas instaladas.

Em 1772, surge um indício de que a Coroa passaria a se preocupar um pouco

mais com a educação pública: com a intenção de criar um aporte financeiro

específico capaz de sustentar as aulas régias foi instituído o Subsídio Literário. Este

tributo, com características diferenciadas para os diferentes reinos, foi definido pela

Carta Régia de 10 de novembro de 1772, para a América e África, como:

Mando que para a útil aplicação, do mesmo ensino público, em lugar das sobreditas coletas até agora lançadas a cargo dos povos, se estabeleça, como estabeleço o único imposto, a saber: [...]na América e na África: de um real em cada arratel [arratel = 429 g] de carne que se cortar no açougue; e nelas e na Ásia, de dez réis em cada canada [2.622 litros] de aguardente das que se fazem nas terras, debaixo de qualquer que se lhe dê ou venha a dar (Almeida apud Pinto, 2000, p.8).

31 Segundo Ferreira (2002) as aulas régias foram assim denominadas por significarem aulas que pertenciam ao Estado. A denominação Aulas Régias perdurou de 1759 a 1822, quando passaram a ser chamadas de Aulas Públicas, passando a chamarem-se Escolas Nacionais, em 1827 (p.3).

Page 27: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

Era de se esperar que o Subsídio Literário, imposto criado para financiar o

ensino primário, que incidia sobre a carne cortada em açougue e sobre a aguardente,

não fornecesse um aporte financeiro capaz de surtir efeitos positivos sobre a

educação da Colônia. Afora a questão do pequeno montante de recursos, segundo

dados levantados por Almeida e apresentados por Pinto (2000), o Subsídio Literário,

que perdurou até 1816, sofreu os reveses de constantes fraudes e malversações, de tal

forma que, nos últimos anos de sua existência, no Rio de Janeiro, capital da Colônia,

seu numerário mal cobria o salário de trinta professores.

A vinda da família real para o Brasil, em 1808, impulsionou a cultura e a

educação nacional, propiciando, por exemplo, o surgimento dos primeiros cursos

superiores (como os de Medicina nos estados da Bahia e do Rio de Janeiro). No

entanto, a obra de D. João VI, meritória em muitos aspectos, estava voltada,

principalmente, para o atendimento das demandas da corte, dando continuidade, de

certa forma, à marginalização do ensino primário (BRASIL..., 2002)32.

Mudanças um pouco mais significativas no cenário da política educacional

advieram do movimento de idéias ligadas à Constituinte de 1823 que, em função do

projeto de criação das universidades, teve o projeto de um plano geral ou de um

tratado de educação relegado a um segundo nível, sem qualquer diretriz oficial da

Constituinte (Chizzotti, 2001, p.43). O único dispositivo legal para a instrução

primária constatado foi a lei de 20 de setembro de 1823, que permitia a qualquer

cidadão abrir escola elementar, vindo a contribuir para que a educação básica ficasse

relegada à iniciativa privada até o Ato Adicional de 1834 (Idem, p.50).

Foi com a Constituição de 1824, pós-Independência do País, que o Império se

comprometeu em assegurar a instrução primária e gratuita a todos os cidadãos

32 http://www.vol.eti.br/geo/EducacaoBra.Asp

Page 28: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

(art.179, §32). Esta determinação constitucional foi reforçada pela lei de 15 de

outubro de 1827 que estabelecia a criação de escolas de

primeiras letras em todas as cidades, vilas e vilarejos, envolvendo as três

instâncias do poder público (BRASIL..., 2002, p.1). Segundo o texto anteriormente

citado, caso tivesse sido implementada, esta teria se tornado a “Lei Áurea” da

educação básica.

Torna-se importante ressaltar que a instrução primária gratuita a todos os

cidadãos, presente no texto constitucional, teve sua determinação alicerçada

principalmente na baixíssima taxa de escolarização que, em 1886, correspondia a

apenas 1,8% da população (incluindo negros e índios), vindo a contribuir para o

aumento das dificuldades de contratação de funcionários por parte da Coroa. Este

fato era agravado pelo grande número de negociantes ricos que necessitavam

contratar jovens capazes de servir de caixeiro e guarda-livros (Almeida apud Pinto,

2000, p.49).

O Ato Adicional de 1834, lei que reformou a Constituição do Império, constituiu-

se numa das primeiras tentativas de descentralizar a instrução pública no Brasil, de

certa forma transferiu a pressão33 pela expansão do número de escolas exercida à

administração imperial para as províncias, delegando a essas a prerrogativa de

legislar e, por conseguinte, a obrigação de manter o ensino primário e secundário,

ficando o governo central com a competência normativa apenas nas escolas da

capital do Império e sobre o ensino superior (Pinto, 2000, p.50). Neste sentido, a

política imperial de educação, comprometida pela falta de um centro de unidade e

ação, no afã de transferir para as províncias principalmente o ônus financeiro de tal

gestão fez com que:

33 Esta pressão decorria, principalmente: a) da baixíssima taxa de escolarização da população; b) da determinação constitucional e; c) da Lei de 15 de outubro de 1827.

Page 29: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

...a descentralização da educação básica, instituída em 1834, mantida pela República, impedisse o governo central de assumir uma posição estratégica de formulação e coordenação da política de universalização do ensino fundamental, a exemplo do que então se passava nas nações européias, nos Estados Unidos e no Japão (BRASIL..., 2002, p.1)34.

A Constituição da República, promulgada em 1891, manteve a linha do Ato

Adicional de 1834, tornando quase natural a concepção da educação como instrução

pública, na esfera das unidades federadas (Cury, 2001).

Se a Carta de 1891 avançou ao evidenciar uma nova ordem jurídica que

contemplava o federalismo, a divisão dos poderes, ampliação dos direitos políticos e o

laicismo, em contrapartida, nada havia nela que explicitasse os direitos sociais

(Ibidem). A educação foi apresentada muito mais de forma indireta do que direta. A

exigência do saber ler e escrever como condição para se tornar eleitor constituiu-se

num exemplo dessa forma indireta de apresentar a educação naquela legislação que,

após promulgada, apresentou o perfil do liberalismo e do “Estado mínimo” (Ibidem).

A obrigatoriedade da educação - por ir de encontro ao princípio do liberalismo

oligárquico que percebia a oportunidade educacional como uma demanda individual

inerente à virtuosidade do indivíduo - não foi determinada pela Carta de 1891. A

omissão da Constituição Republicana relativa à educação primária e à gratuidade do

ensino foi questionada por Cury, Horta e Fávero (2001), que aventaram a

possibilidade de aquele mutismo estar relacionado à aproximação entre

descentralização, omissão e elitismo, já que a educação popular era considerada

tarefa de menor importância pela elite governante.

O quadro a seguir tem por objetivo apresentar de forma resumida as diretrizes legais que tiveram por objetivo encaminhar a educação neste segundo período da história do seu financiamento.

34 http://www.vol.eti.br/geo/EducacaoBra.Asp

Page 30: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

Denominação DescriçãoAulas régias Com vigência de 1759 a 1834, a Corte tinha competência sobre todas as escolas,

incluindo-se as autorizações para ensinar e as nomeações dos docentes. Devido à baixa remuneração dos professores poucas foram as aulas instaladas.

Subsídio literário Subsídio que incidia sobre a carne cortada em açougue e sobre a aguardente que, além de expor à educação ao seu pequeno retorno financeiro, ainda era compelido por freqüentes fraudes e malversações. Durou de 1772 a 1816.

Assembléia Nacional Constituinte de 1823

Rica em discursos esfuziantes, não apresentou nenhuma diretriz oficial para a educação nacional.

Lei de 20 de setembro de 1823

Ampliava as possibilidades da educação primária privada, permitindo a todo cidadão abrir uma escola elementar sem os trâmites legais de autorização prévia e sem licença e exame do requerente (Chizzotti, 2001, p.44), os liberais brasileiros erroneamente pensavam que esta lei possibilitaria a difusão da necessária educação primária.

Constituição de 1824 A instrução primária gratuita a todos os cidadãos, posta no texto constitucional, não derivou de interesses articulados e reclamos sociais organizados, sendo inserido no texto como um reconhecimento formal de um direito subjetivo dos cidadãos que uma obrigação efetiva do Estado (Idem, p.53).

Lei de 15 de outubro de 1827

Determinava a criação de escolas de primeiras letras em todas as cidades, vilas e lugares mais populosos. As dificuldades de aplicação dessa lei relacionavam-se à difícil situação financeira a que estavam compelidas tais instâncias.

Ato Adicional de 1824

Afasta o governo central da obrigação de garantir a educação elementar para todos, passando para as províncias tal responsabilidade.

Constituição de 1891 Apresentou a educação de forma muito mais indireta do que direta. Silenciou em relação à educação primária e à gratuidade do ensino.

Fechando o 2º período e retomando algumas de suas idéias, percebemos que a tentativa, por parte do governo central, de determinar uma fonte de recursos específica para a educação teve como marco inicial o Subsídio Literário, o qual, por incidir sobre impostos pouco significativos e por carecer de controle e fiscalização, não resultou num aporte significativo de recursos para a educação.

O movimento de Independência do País, que consistiu na substituição do grupo

de portugueses nascidos em Portugal pelo grupo de portugueses nascidos no Brasil e

que por isso conservou a monarquia, o rei, a aristocracia e a escravidão, o sistema

administrativo e fiscal e a mesma estrutura de poder e de educação de elite 35,

manteve limitadas as oportunidades educativas da população da nação independente

que passou a contar, como resultado do Ato Adicional de 1834 apenas com as parcas

dotações orçamentárias da províncias para atender às suas demandas educacionais.

O Ato constituiu-se num exemplo das primeiras tentativas do governo central de

transferir para as províncias a obrigação para com a manutenção e desenvolvimento

do ensino elementar e, por conseguinte, para com o seu financiamento.

35 http://www.prossiga.cnpq.br/anisioteixeira/livros/capitulo4.html

Page 31: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

A Carta Constitucional de 1891, que valorizou a concepção do “Estado mínimo”,

seguiu a linha do Ato Adicional de 1834, enfatizando a relação da educação pública

com os entes federados.

E, aqui, chega-se à comprovação da tese para o 2º período da história do

financiamento da educação no Brasil para o qual se confirmou ter sido intercalado

por duas linhas: uma que tentou buscar fontes autônomas para aquele financiamento

(como por exemplo, o subsídio literário) e outra que, de certa forma, dirigiu o

atendimento educacional para as províncias e teve no Ato Adicional de 1834 o seu

principal legislador. A Constituição Federal de 1891, manteve-se nesta mesma linha.

1.3) 3º Período

Conforme apresentado anteriormente, este estudo buscará demonstrar que a configuração do 3º período, no qual foi segmentado o financiamento da educação no País - delimitado pelo continuum que se iniciou com a Carta Constitucional de 1934 e se estende até a época atual - foi marcada pela busca da vinculação de um percentual mínimo de recursos tributários para a educação.

Tendo em vista que a vinculação se constitui na determinação constitucional de aplicação de índices orçamentários de recursos tributários na educação (também preferencialmente pública) pelas diferentes esferas administrativas, serão apresentadas aqui algumas das nuances que se interpuseram àqueles índices nas diferentes Cartas Constitucionais - CF/34, CF/37, CF/46 e CF/67 - que marcaram o cenário nacional pós-Revolução de 1930.

Um olhar preliminar sobre a Constituição de 1934 mostra que trouxe consigo muitas das questões defendidas pelos então denominados renovadores que tinham como substrato político da sua ação no campo educacional a busca de uma educação universal, tanto no acesso como na capacidade de seleção e qualificação do ensino. Portanto, na crítica a incapacidade da República em realizar o seu fundamento jurídico-político de Estado laico, neutro e universal aos seus cidadãos (Rocha, 2001, p.122).

Dois temas tratados naquela legislação que retratam questões educacionais, defendidas pelos renovadores e do interesse deste estudo foram: o direito à educação e a aplicação dos recursos públicos em educação. A Carta mostrou-se inovadora quando, para além da enunciação do direito à educação, apresentou meios financeiros para efetivá-lo já que não basta a afirmação do direito. Requer-se o estabelecimento dos meios garantidores do direito público através dos fundos especiais e de índices orçamentários fixos destinados à educação (Idem, p.125). A efetivação do direito público à educação - aspecto discutido e proposto pelos renovadores e pela maioria das Constituintes que se seguiram - requer a efetivação de mecanismos constitucionais que

Page 32: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

viabilizem esses direitos, pela universalização e gratuidade do ensino público, os quais têm na vinculação constitucional de recursos um dos alicerces de sustentação dessa política educacional.

Por outro lado, segundo o mesmo autor, o princípio do direito à educação, apresentado na Carta de 1934, não se fez de pleno direito, pois não fez incidir coativamente o Estado no cumprimento desta norma constitucional. Naquela legislatura, o princípio da obrigatoriedade estava relacionado à freqüência do público matriculado e não à oferta de vagas por parte do Estado que, como tal, correspondia ao fornecedor de tal direito.

A concepção de que o Estado não podia mais se imiscuir da aplicação de recursos públicos em educação norteou os debates e as reivindicações dos renovadores, fazendo com que a Carta de 1934, em seu artigo 156, apresentasse, pela primeira vez, a vinculação constitucional de recursos para a educação.

A União e os Municípios aplicarão nunca menos de dez por cento, e os Estados e o Distrito Federal nunca menos de vinte por cento, da renda resultante dos impostos na manutenção e no desenvolvimento dos sistemas educativos.

É importante ressaltar que, apesar da aplicação de recursos do governo federal no ensino elementar ter se mantido em níveis irrelevantes durante a vigência da Carta de 1934 (Rocha, 2001), o princípio da vinculação foi suficientemente persuasivo para voltar a vigorar na política educacional da maioria das cartas que se seguiram, estando presente na atual Constituição de 1988, tendo sido, inclusive, estendido para a política pública de saúde36, a partir do ano 2000.

Outro ponto que merece destaque no que tange ao financiamento da educação, presente na Constituição de 1934, foi a brecha deixada para a aplicação dos recursos públicos no ensino privado, pois se no momento da constituinte, conforme Anísio Teixeira, citado por Rocha (2001, p.129), as escolas privadas resistiam vivamente a qualquer intromissão do Estado... (Elas) pensariam em tudo, menos em pedir recursos para o Estado, em momentos subseqüentes o sistema de bolsas de ensino destinadas a alunos carentes e os empréstimos subsidiados tornaram-se exemplos de atrativos que fizeram com que as instituições particulares deixassem de se preocupar com a interferência do Estado para, afoitamente, buscar pela verba pública.

Se a Constituição da ditadura do Estado Novo, decretada em 1937, revogou a vinculação constitucional de recursos financeiros para a educação, a Carta de 1946 retomou a deliberação da Constituição de 1934, mantendo os índices ali apresentados para a União, Estados e Distrito Federal e ampliando a participação dos municípios para nunca menos de 20% da renda resultante dos impostos na manutenção e desenvolvimento do ensino (Art. 169).

Esteve presente na Constituinte de 1946 a discussão referente à necessidade de se estipular um quantum que possibilitasse o efetivo cumprimento da vinculação por parte dos entes federados. Inicialmente, a vinculação estipulada para as três esferas administrativas foi de 20%; no entanto, ante a impossibilidade de a União cumprir tal preceito, sua participação financeira para com a educação foi estipulada em pelo menos 10%. Neste sentido, Gustavo Capanema, citado por Oliveira, ressalta:

Se estabelecermos para a União o limite ideal, isto é, o de 20%, veremos que não será executado e teremos, [...] a desmoralização do preceito [...]. Agora se, cautelosamente, para

36 Até o ano 2000 a educação era a única política pública com vinculação constitucional de recursos. A partir da Emenda Constitucional n.º 29, de 2000, os serviços públicos de saúde passaram a ter, também, assegurados recursos mínimos para o financiamento de suas ações.

Page 33: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

evitarmos que a Constituição se desrespeite, estabelecermos um limite pequeno, nesse caso, estaremos trabalhando contra a educação nacional. Esse limite baixo poderia ser visto sempre como uma espécie de teto obrigatório. (2001, p.183)

A determinação deste quantum, por parte do governo federal não apresentou critérios definidos e claros e, muito menos, foi discutida com a comunidade. Entretanto, apesar desse critério ter sido mais ou menos arbitrário e não se sustentar em análise das necessidades da educação nacional (Oliveira, 2001), constituiu-se num preceito que obrigava os governantes a investirem um percentual mínimo na educação da instância sob sua responsabilidade. Este pensamento pode ser estendido para a vinculação constitucional de recursos, posta na legislação atual.

Este corte temporal que vai da Carta de 1934 até fins da década de 50, passando pela Constituição de 1946, representou um período de qualidade do ensino público nacional, qualidade esta circunscrita a poucos, uma vez que a escola excluía, principalmente, os segmentos mais pobres e a maioria da população que se encontrava na zona rural (Pinto, 2000). Foi durante esse período que a classe média e a elite descobriram a escola pública - quer como alunos, quer como profissionais; verificou-se a expansão de imponentes prédios de grupos escolares e ginásios e os professores do Estado de São Paulo, egressos da USP, lutavam para equiparar sua remuneração aos dos magistrados (Ibidem).

Se a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, de n.º 4024/61 ampliou a vinculação de recursos da União para 12%, já no Congresso Constituinte de 1966-67, pós-golpe militar de 64, esvaziado e tolhido pelo regime militar e autoritário, a educação teve difícil acesso. Apesar de ter sido nomeada uma comissão de juristas para elaborar o anteprojeto da nova Constituição - a qual manteve praticamente inalterados os dispositivos inerentes à educação37, presentes na Carta de 1946 – um novo projeto originário do Executivo abandonou, no que tange à educação, totalmente o anteprojeto daquela comissão. Este último – que contemplava as “contribuições pessoais” do ministro da Justiça, Carlos Medeiros Silva, e sugestões do Conselho de Segurança Nacional – foi encaminhado ao Congresso (Horta, 2001). Tal projeto provocou a reação de alguns educadores e integrantes do próprio governo, desencadeando propostas de emendas, sendo que foram rejeitadas as que reclamavam dos diferentes entes federados um percentual mínimo de investimento em educação.

O financiamento da educação e, mais especificamente, a vinculação constitucional de recursos para a área educacional foi defendida por alguns congressistas com argumentos respaldados na teoria do “capital humano”, tendo como cenário a correlação entre educação e desenvolvimento. No entanto, apesar das tentativas de manutenção de uma sustentação financeira constitucional para a educação, a Carta de 1967, teve revogada a vinculação de recursos para a educação sob a alegação de que a mesma era incompatível com a sistemática orçamentária introduzida pela nova Constituição (Idem, p.219) que proibia, na parte relativa ao orçamento, qualquer vinculação entre receita de impostos e despesa.

Melchior, citado por Fávero, mostra algumas conseqüências da supressão da vinculação:

1. A política de vinculação de percentuais mínimos sempre teve um sentido discricionário-idealizante: toda vez que o investimento em educação se aproximava do quantum estabelecido, surgia a tendência de elevá-lo. Buscava-se através dessa medida,

37 A comissão propôs apenas três modificações: 1º) a gratuidade do ensino oficial deveria ser estendida ao ensino secundário; 2º) a gratuidade do ensino superior estaria condicionada tanto à insuficiência de recursos dos alunos, quanto ao seu “excepcional merecimento” e; 3º) os professores de religião poderiam ser remunerados pelo Estado.

Page 34: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

investir cada vez mais, assegurando, porém, um mínimo discricionário, mas altamente educativo - que demarcava uma meta a ser cumprida e incentivava os esforços para atingi-la ou ultrapassá-la. Por outro lado, garantia, por seu fundamento legal, uma prioridade permanente para o setor educacional, protegendo-o das mudanças de políticas adotadas, principalmente, pelos representantes do poder executivo.

2. A política de supressão da vinculação da receita tem sentido no plano administrativo puramente técnico: permite aos governantes maior liberdade na alocação dos recursos para os setores mais convenientes, tornando mais flexível a elaboração do orçamento. No entanto, quando consideramos o aspecto político da tomada de decisão, ainda que se tenha a subsidiá-la todos os dados técnicos, devemos ter em mente que, na prática, muitas distorções poderão ocorrer. (2001, p. 250-251)

A supressão da vinculação deixa a educação à mercê das mudanças políticas implementadas pelos seus dirigentes que, com a intenção de direcionar o orçamento para as rubricas que estejam em melhor acordo com suas concepções e projetos, poderão deixar de priorizar a destinação de recursos financeiros para a área educacional.

Este último continuum de tempo foi marcado por grandes dificuldades no setor educacional. A expansão das matrículas - desencadeada pela migração campo-cidade e pela Lei n.º 5.692/71, que determinava a ampliação da escolaridade obrigatória de quatro para oito anos - relacionou-se de forma inversa aos gastos com educação, especialmente por parte da União (Melchior apud Pinto, 2000). Neste período, chegou-se a ter cinco turnos escolares (alguns com jornadas inferiores a três horas) e o achatamento salarial dos professores foi contundente, enquanto leis draconianas proibiam greves e manifestações (Pinto, 2000, p.55).

O período sucedâneo, marcado pelo processo de redemocratização do País,

trouxe consigo a luta pela melhoria da escola pública. Neste sentido, a aprovação da

Emenda Constitucional n.º 24, de 1983, de autoria do senador João Calmon, resgatou

a vinculação constitucional, determinando que a União aplicasse pelo menos 13% e

os Estados, Distrito Federal e municípios 25%, da receita resultante de impostos, na

manutenção e desenvolvimento do ensino - MDE.

Com o objetivo de propiciar uma visão resumida dos percentuais mínimos

investidos em educação pelos diferentes entes federados, o quadro a seguir traz as

determinações das diferentes Cartas Constitucionais relativas a essa vinculação.

Vinculação Constitucional de recursos para a educação, presente nas diferentes Cartas Constitucionais, Brasil – 1934/88

Vinculação Constitucional (%)

Entes Federados CF/34 CF/37 CF/46 CF/67 EC n.º 24/83

CF/88

Page 35: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

(Art.139) (Art.169) (Art. 212)

União 10 Revogou 10 Revogou 13 18

Estados e DF 20 a 20 a 25 25

Municípios 10 vinculação 20 Vinculação 25 25

A vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada

nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição da ditadura do

Estado Novo (decretada em 1937) e na Carta de 1967 que sucedeu ao golpe militar de

1964 (CF/67). É importante ressaltar que, não obstante algumas Constituições

posteriores deixarem de determinar um percentual de investimento mínimo na

educação, nos momentos em que a vinculação foi desprezada, ocorreu a maior

escassez de recursos para a área (Ibidem).

O terceiro período do financiamento da educação foi marcado pela busca da

vinculação constitucional de recursos visto que a União, comparativamente aos

estados e municípios, apesar de deter a maior parte dos tributos arrecadados, tem

para si a responsabilidade de investir em educação sempre o menor percentual. A

observação da vinculação, presente nas diferentes cartas constitucionais, permitiu

perceber que, dentre os entes federados, os municípios foram os que mais

aumentaram a assunção financeira para com a educação. Curiosamente a vinculação

aparece e é afirmada nas constituições federais promulgadas no Brasil após 1930. Já

nas constituições outorgadas ou o dispositivo desaparece ou é reduzido às

administrações municipais, como pode ser conferido nas Constituições de 1937 e

1967 (Idem, p.16). Vale evidenciar que a supressão da vinculação constitucional de

recursos para a educação representou um atraso na expansão do ensino.

A concepção de que existe uma correlação direta entre o volume de recursos

destinados à educação e qualidade do ensino tem estimulado, ainda hoje, os

Page 36: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

movimentos sociais a continuarem lutando pela manutenção da vinculação, como

forma de tentar garantir que os governantes destinem um volume mínimo de recursos

para educação,

Ainda observando o quadro anterior, percebe-se que, afora os momentos de descontinuidade, a vinculação assumiu percentuais crescentes, apresentando seu maior valor quando da promulgação da atual Carta Constitucional, em 5 de outubro de 1988, a qual será objeto de estudo a parte.

Considerações finais

A idéia geral que ficou do estudo do “macroperíodo”...

A observação do período que incide sobre o decorrer dos 500 anos pós-

descobrimento do Brasil até a época atual, conduziu a inegável constatação de que o

Estado, em todos os seus níveis, foi se tornando cada vez mais presente no campo

educacional (Cury, Horta e Fávero, 2001) e, o financiamento da educação pública

não foi excluído desse contexto. Todavia, ao mesmo tempo em que se evidenciou - por

meio do estudo do referencial histórico e de alguns aspectos da legislação atual - o

aumento da responsabilidade dos estados e municípios para com a manutenção e

desenvolvimento do ensino e, em particular, para com seu financiamento, em

contraposição perceberam-se tentativas de refreamento das determinações voltadas

para uma maior responsabilidade financeira da União para com a educação. Neste

sentido, este trabalho aponta para o desafio de resgatar a função financiadora do

governo federal como ente federado co-partícipe do financiamento do ensino público.

E, este estudo, com certeza, ainda tem uma longa jornada a percorrer pelos

(des)caminhos do financiamento da educação no Brasil ...

Page 37: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

Referências Bibliográficas

ALMEIDA, José Ricardo P. História de instrução pública no Brasil, 1500 a 1889. São Paulo: Educ; Brasília: INEP-MEC, 1989 apud PINTO, José Marcelino de Rezende. Os recursos para Educação no Brasil no contexto das finanças públicas. Brasília: Editora Plano, 2000.

ANTONIL, André João. Cultura e opulência no Brasil. São Paulo: Melhoramentos, 1976 apud PINTO, José Marcelino de Rezende. Os recursos para Educação no Brasil no contexto das finanças públicas. Brasília: Editora Plano, 2000.

CURY, Carlos Roberto Jamil. A educação e a primeira constituinte republicana. In: FÁVERO, Osmar (org.). A educação nas Constituintes brasileiras 1823-1988. 2.ed. Campinas, SP; Autores associados, 2001. p.69-80.

CURY, Carlos Roberto Jamil; HORTA, José Silvério Baía; FÁVERO, Osmar. A relação Educação-Sociedade-Estado pela mediação jurídico-constitucional. In: FÁVERO, Osmar (org.). A educação nas Constituintes brasileiras 1823-1988. 2.ed. Campinas, SP; Autores associados, 2001. p. 5-30.

HORTA, José Silvério Baía. A educação no Congresso Constituinte de 1966-67. In: FÁVERO, Osmar (org.). A educação nas Constituintes brasileiras 1823-1988. 2.ed. Campinas, SP; Autores associados, 2001. p. 201-240.

FÁVERO, Osmar (org.). A educação nas Constituintes brasileiras 1823-1988. 2.ed. Campinas, SP; Autores associados, 2001. 321p.

FERREIRA, Lenira W. A formação, os modelos pedagógicos e as instituições educacionais rio-grandense no século XVII.<http://www.ufpel.tche.br/fae/siteshospedados/8FERREIRA.htm> Acesso em: 22/01/2002.

MELCHIOR, José Carlos de Araújo. Mudanças no financiamento da educação no Brasil. Campinas- SP: Autores Associados, 1997. 92 p. (Coleção Polêmicas do nosso tempo, 6).

OLIVEIRA, Romualdo Portela. O financiamento público da educação e seus problemas. In: OLIVEIRA, Romualdo Portela. Política educacional: Impasses e alternativas.2. ed. São Paulo: Cortez, 1998. P.123-143.

OLIVEIRA, Romualdo Portela. A educação na assembléia constituinte de 1946. In: FÁVERO, Osmar (org.). A educação nas Constituintes brasileiras 1823-1988. 2.ed. Campinas, SP; Autores associados, 2001. p. 153-190.

PRADO Jr., Formação do Brasil Contemporâneo. Colonia. São Paulo: Brasiliense, 1977 apud PINTO, José Marcelino de Rezende. Os recursos para Educação no Brasil no contexto das finanças públicas. Brasília: Editora Plano, 2000.

Page 38: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

PINTO, José Marcelino de Rezende. Um fundinho chamado “fundão”. In: DOURADO, Luiz Fernandes. Financiamento da educação básica. Campinas, SP: Autores Associados, 1999. p.85-99. (Coleção Polêmicas do nosso tempo)

PINTO, José Marcelino de Rezende. Os recursos para Educação no Brasil no contexto das finanças públicas. Brasília: Editora Plano, 2000. 160 p.

ROCHA, Marlos Bessa Mendes. Tradição e modernidade na educação: o processo constituinte de 1933-34. In: FÁVERO, Osmar (org.). A educação nas Constituintes brasileiras 1823-1988. 2.ed. Campinas, SP; Autores associados, 2001. p. 119-138.

ROMANELLI, Otaíza O. História da educação no Brasil (1933-1973).Petrópolis: Vozes, 1985 apud PINTO, José Marcelino de Rezende. Os recursos para Educação no Brasil no contexto das finanças públicas. Brasília: Editora Plano, 2000.

SAINT HILAIRE, Auguste de. Viagem às nascentes do Rio São Francisco. Belo Horizonte; Itatiaia; São Paulo: EDUSP, 1975 (1. ed Paris, 1847) apud PINTO, José Marcelino de Rezende. Os recursos para Educação no Brasil no contexto das finanças públicas. Brasília: Editora Plano, 2000.

VASCONCELOS, Diogo. História antiga das Minas Gerais. Belo Horizonte: Itatiaia-MEC, 1974. V2 apud PINTO, José Marcelino de Rezende. Os recursos para Educação no Brasil no contexto das finanças públicas. Brasília: Editora Plano, 2000.

EDUCAÇÃO DOMÉSTICA: DE VOLTA A CASA

Maria Celi Chaves Vasconcelos1

RESUMO

1 Doutora em Educação pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro - PUC-Rio, Mestre em Educação pela Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ, Professora da Faculdade de Educação - UERJ, Professora do Programa de Mestrado da Faculdade de Educação da Universidade Católica de Petrópolis - UCP, pesquisadora nas áreas de políticas públicas e história da educação.

Page 39: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

Na maior parte dos países ocidentais, o século XIX marca o início da escolaridade obrigatória aliada à estruturação e organização dos sistemas de ensino sob o domínio do estado, que interferindo na educação, vai, progressivamente, tornando-se o condutor das políticas educacionais. Tal processo, tem seu ápice no século XX, quando, em alguns países, é consagrada a escolaridade obrigatória e o estado, direta ou indiretamente, torna-se o mantenedor e o regulador, respectivamente, das redes públicas e privadas de escolarização. Neste caso, encontra-se o Brasil que, a partir da Constituição Federal de 1934 tem decretada a escolaridade obrigatória para todos os cidadãos, ainda que apenas a escolaridade primária. No entanto, ao consolidar a demanda estatal, outras formas de educação, praticadas ao longo da história e identificadas como adequadas à formação de crianças e jovens, foram destituídas deste lugar, anteriormente, ocupado. A presente sessão pretende refletir, em uma perspectiva histórica, acerca das possibilidades que se apresentam, na atualidade, ao retorno dos espaços privados, como a casa, à categoria de lugar apropriado e reconhecido de educação e de ensino, através das novas tecnologias disponíveis, que rompem com os limites físicos e estruturais presentes na escola. Nesse sentido, toma-se como exemplo Portugal, onde o ensino doméstico é legal e onde já existem algumas famílias que optaram por ensinar os seus filhos na casa, exercendo o direito de escolher o gênero de educação que querem dar às crianças e jovens. Ainda que as Leis em vigor não permitam, no caso do Brasil, a página oficial do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), órgão pertencente ao Ministério da Educação do Brasil (MEC), contém o conceito de desescolarização como sendo “Supressão da instituição escola. Movimento que combate à educação formal, atribuindo-lhe funções repressivas, e que preconiza a educação por meios livres e não-convencionais”. Tomando como referência Ivan Illich, o sistema educacional atual, seria fruto da revolução industrial do século XIX, e, portanto, baseado em seus modelos de fábricas, compulsórias, hierarquizadas, e orientadas para medidas, que além de fragmentar o conhecimento, separava os alunos apenas de acordo com a idade. Embora o conceito apresentado refira-se, especialmente, as características da escola que, supostamente, a fariam atuar como uma instituição repressora e reprodutora da ordem social vigente, trazendo mais problemas do que soluções, o sentido da palavra desescolarização pode estar, hoje, mais afeito à idéia de que a sociedade desescolarizada poderá ser alcançada com redes de aprendizado, por meio das ferramentas da web, além das inúmeras possibilidades tecnológicas já existentes.

Palavras-chave: Educação doméstica; escolaridade na casa; gênese dos sistemas de ensino; desescolarização; novas tecnologias.

1. Introdução

Na maior parte dos países ocidentais, o século XIX marca o início da

escolaridade obrigatória aliada à estruturação e organização dos sistemas de ensino

Page 40: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

sob o domínio do estado, que interferindo na educação, vai, progressivamente,

tornando-se o condutor das políticas educacionais. Tal processo, tem seu ápice no

século XX, quando é consagrada a escolaridade obrigatória e o estado, direta ou

indiretamente, torna-se o mantenedor e o regulador, respectivamente, das redes

públicas e privadas de escolarização.

No entanto, ao consolidar a demanda estatal, outras formas de educação,

praticadas ao longo da história e identificadas como adequadas à formação de crianças

e jovens, foram destituídas deste lugar, anteriormente, ocupado.

Entre as práticas de educação que antecederam a escolaridade e que eram

reconhecidas, o presente estudo vai enfocar a educação doméstica, sistema muito

utilizado pelas elites para a educação de seus filhos no século XIX, e que, como ocorria

no ambiente privado, está conceituado como educação na casa.

A partir da localização do sistema de educação doméstica como o espaço de

educação, por vezes, majoritário, no Brasil, durante o século XIX, o estudo pretende

refletir, em uma perspectiva histórica, acerca das possibilidades que se apresentam, na

atualidade, ao retorno dos espaços privados, como a casa, à categoria de lugar

apropriado e reconhecido de educação e de ensino, através das novas tecnologias

disponíveis, que rompem com os limites físicos e estruturais presentes na escola.

2. A educação na casa: prática recorrente no Brasil Oitocentista

A educação doméstica, ou seja, a educação que se dava na casa para os seus senhores, no Brasil Oitocentista, refletia não só o temor que os pais tinham de colocar os seus filhos nas escolas existentes, por preconceito, questões de saúde, emulação ou disciplina, mas também a representação existente de que a educação na casa afirmava um estatuto de diferenciação social.

Dessa forma, a educação doméstica para as elites no Oitocentos era amplamente reconhecida como a modalidade mais adequada para o ensinamento dos filhos, principalmente das meninas e dos meninos até uma certa idade. Tais práticas, tornavam a educação dirigida pelo poder privado e sob sua estrita responsabilidade, estruturação e vigilância.

Apesar de aceita, a educação doméstica era acessível a poucos, descentralizada em suas ações, métodos, conteúdos e procedimentos, fazendo com que cada família fosse exclusivamente a responsável pela educação de seus filhos, parentes ou agregados.

Tendo em vista a importância que a questão educacional assume no Brasil, principalmente, na segunda metade de Oitocentos, influenciada pelas idéias européias, a

Page 41: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

classe dirigente do país concebe que a constituição e a afirmação do estado Imperial têm que priorizar a centralização das decisões e ações, entre elas as educacionais.

Nessa perspectiva, o estado inicia um processo de interferência nas práticas educacionais existentes, como uma estratégia do projeto centralizador, inaugurando medidas intervencionistas ao poder que até então era exclusivamente da casa: decidir, contratar, fiscalizar e deliberar sobre a educação de seus filhos.

Enquanto o estado Imperial lutava pela centralização, a elite dominante inaugurava o processo de resistência a essa interferência, transformando o século XIX em palco de discussões entre o governo da casa e o governo do estado, as quais têm como tema central a disputa na condução da educação entre essas duas esferas de poder.

Os Governantes da casa não podiam supor, até então, a educação de seus filhos

como responsabilidade de outra instância que não a do poder privado, ou seja, sob a

escolha, vigilância, observância e espaço da própria casa.

A educação havia estado até aquele momento constantemente submetida ao

poder privado e ao governo da casa e romper com essas relações implicava estabelecer

outras, aceitas e dignas de crédito. Passar ao governo do estado parte das atribuições do

governo da casa era entendido como a forma do poder público interferir no poder

privado, coibindo e fiscalizando suas ações. A disputa entre esses dois espaços refletia a

própria disputa pela centralização, unificação e concentração das políticas do estado.

Nessa perspectiva, para efetivar o projeto centralizador do estado, a forma

encontrada consistiu tanto na constituição de um corpo de funcionários, quanto na

redefinição das relações do estado com outras instituições sociais, entre elas a casa. Era

preciso reeditar as relações entre a casa e o estado, nas quais, sem romper com os

limites contextuais impostos, a casa aceitasse e reconhecesse a interferência do estado.

Nesse processo de centralização, a educação é um dos focos principais, não só nos discursos das autoridades representativas do poder central, mas nas práticas que começam a ser pensadas e adotadas. A centralização era a garantia da unidade do Império e a unidade constituía-se na garantia de uma continuidade na ordem das coisas. Para isso, era necessária a construção de espaços destinados à educação que, diferentes da casa, tivessem autonomia em relação ao poder das famílias e também garantissem a unidade das ações educacionais, entre elas, os conteúdos, métodos de ensino e a normatização do sistema de educação.

No jogo de distanciamento e aproximação entre o governo da casa e o governo

do estado, eram, ainda, peças fundamentais os agentes da administração pública, entre

eles os professores.

Aos professores também cabia um papel principal. Como agentes do estado, eles

deveriam diferenciar-se daqueles que se ocupavam da educação doméstica e

constituírem-se num quadro especializado e diferenciado. Para isso, são estabelecidas

diversas regras, que davam a direção dessa atividade, sendo que o princípio de todas era

que o professor, sob a responsabilidade do governo do estado, não mais podendo contar

Page 42: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

com a vigilância da casa, deveria ser fiscalizado para que cumprisse com os deveres

estatuídos.

O desafio com relação aos professores não se fazia apenas na fiscalização, mas

partia da própria carência existente de pessoas dispostas ao exercício dessa atividade

sob o governo do estado. Nesse sentido, a fim de preparar pessoas para o magistério, é

instituída a escola normal, que, regida por um diretor, estava sob a inspeção direta do

presidente da Província.

Nem todos aqueles que eram os mestres da casa podiam candidatar-se ao lugar de professores do estado. Havia exigências que, provavelmente, já eram uma forma de conter os exageros da casa e dar um outro enfoque à educação sob a responsabilidade do estado. Um exemplo disso é a proibição aos estrangeiros, comumente usados como professores particulares e preceptores nas casas. Para matricular-se na escola normal, era necessário ser cidadão brasileiro, maior de dezoito anos, saber ler e escrever e provar “boa morigeração”. Nessas normas, estava clara a intenção do projeto Imperial de educação, interditando o acesso a todos aqueles que pudessem comprometê-lo ou torná-lo semelhante ao enfoque da casa.

A uniformidade e regularidade também visavam à difusão de compêndios,

traduzidos e impressos para a educação dos futuros cidadãos brasileiros, aprovados e

recomendados pelo estado, diferentemente daqueles usados na casa, que eram

escolhidos seguindo a formação e a opção dos mestres. Na verdade, tanto a interferência

nos manuais, tornando-os diferenciados, quanto a inspeção que é criada e ganha um

quadro próprio de funcionários e regulamentos para esse fim, têm como finalidade

imediata dar credibilidade e fazer com que os pais compreendessem a importância de

mandar seus filhos à escola pública estatal.

Todavia, o processo de reconhecimento e aceitação da escola é lento, bem como,

também, são cuidadosas as medidas de estabelecimento de sua obrigatoriedade. Era

preciso, inicialmente, identificá-la como adequada à educação de crianças e jovens para,

posteriormente, impô-la como oficial e hegemônica. Nesse sentido, casa e estado

permanecem ainda, durante muitos anos, convivendo como espaços aceitos de

educação.

No entanto, quando algumas medidas legais com intuito de unificar e fiscalizar a

educação começam a ser tomadas pelo governo Imperial, interferindo na educação

doméstica, estabelecem-se relações diversas, muitas vezes, ocorrendo que a própria

casa, incapaz de conter os movimentos pela escolarização, venha a subsidiar as medidas

estatais, seja cedendo espaços destinados às escolas, seja pagando ou complementando

o salário dos professores.

Page 43: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

Essas circunstâncias constituíam-se num obstáculo à ação do projeto

centralizador, pois a instrução pública era vista como instrumento de ação na

implementação do monopólio do estado Imperial sobre a educação.

Na tentativa de reverter esse quadro, os partidários do projeto do governo do

estado reivindicavam a construção de prédios públicos, como cadeias, câmaras

municipais e escolas, ou propunham a ocupação dos espaços existentes, para esses fins.

No entanto, a lentidão na concretização de tais medidas, acabou por retardar a afirmação

da escola como o único espaço apropriado à educação.

A escola pública estatal, todavia, possibilitava a inclusão na sociedade apenas

daqueles que já eram pensados como futuros cidadãos do Império. Havia o claro

objetivo de unificação dos conteúdos e dos métodos da educação doméstica, “quebrando

o excessivo individualismo dos mestres, expressão última do poder da casa”38, muito

mais do que qualquer possibilidade ou finalidade de inclusão dos excluídos. Ou seja, na

perspectiva política, a escola pública estatal emerge como afirmação do governo do

estado sobre o governo da casa, mudando o conteúdo e o método de ensino, porém a

essência permanece a mesma, ampliando-se, em termos de acesso, apenas aquilo que

não ameaçava o lugar dos privilegiados.

Assim, a instrução cumpria o papel de permitir que o Império se colocasse ao

lado das “Nações Civilizadas”, mesmo que fosse apenas por compartilhar as mesmas

intenções quanto à instrução da população. Era a forma de ultrapassar as tendências

localistas representadas pela casa, rompendo com as concepções mágicas e

supersticiosas, inserindo os indivíduos num universo bem mais ampliado.

Na redefinição das relações entre o governo da casa e o governo do estado, a

educação doméstica resiste ainda por algumas décadas, não permitindo ao monopólio do

Soberano quebrar completamente o monopólio que os pais exerciam sobre as famílias.

Aos poucos, no processo de delimitação dos espaços, o governo da casa vai

percebendo que a escola pública estatal pode também se constituir em espaço reservado

aos privilegiados, atendendo às perspectivas da elite, mas com os encargos e as

responsabilidades, como, por exemplo, a contratação e pagamento dos professores e a

construção de locais adequados, sendo assumidos pelo governo do estado. Essa

constatação vai, progressivamente, fazendo com que a casa “renda-se” ao estado,

estabelecendo com ele negociações e deixando que ele se encarregasse da instrução ou

38 MATTOS, Ilmar R. Tempo saquarema. Rio de Janeiro: ACCESS, 1994.

Page 44: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

da seleção, inspeção e fiscalização da educação, constantemente vigiando, contudo, o

acesso e os fins para os quais a escola estatal estava destinada.

Apesar dessa ascensão do governo do estado em relação ao governo da casa,

efetivamente as medidas de centralização simbolizadas na educação pela escolarização

da população não surtem efeito imediato.

No final da década de 80 de Oitocentos, especificamente em 1888, para uma

população de 1.200.000 habitantes havia na Província do Rio de Janeiro 838

estabelecimentos de educação, entre escolas públicas, colégios particulares, colégios

secundários, classes noturnas e diurnas, escolas militares, confessionais, liceus e asilos.

Destes, 552 eram para meninos, 292 para meninas e 14 mistos39. A rede de educação

doméstica, por sua vez, tinha em alguns locais uma proporção equilibrada e até maior

do que a dos estabelecimentos de educação, atingindo um número significativo de casas.

Para a resistência e permanência da casa como espaço de educação também

colaboraram alguns fatores da desestrutura do estado, como o número muito pequeno de

professores e sua formação muito longe do desejado; mas o fator principal foi, sem

dúvida, o fato de que os alunos tinham uma freqüência extremamente irregular à escola,

o que, entre tantas outras dificuldades, como a própria locomoção, devia-se

provavelmente à falta de hábito da educação fora da casa. Com situações diferenciadas e

diante dos inúmeros obstáculos, considerando as regiões da Província, em alguns

momentos a casa acaba provindo o estado dos recursos, das instalações e do pagamento

dos mestres, ou seja, garantindo a própria existência de uma Instrução Pública.

A aceitação da interferência do estado na educação é, no entanto, um movimento

lento e dialético, que ora avança e ora recua, fazendo com que as formas de educação

doméstica e de educação escolar permaneçam concomitantes durante todo o Brasil

Imperial.

Dessa forma, podemos afirmar que o século XIX foi aquele em que a escola formal instituída, seja ela estatal ou particular, afirmou seu estatuto de posturas e possibilidades, destituindo do lugar ocupado a educação na casa, apropriando-se dele e mudando suas concepções e tal mudança encaminhou o que iria ocorrer no devir, caracterizando o século XX como o cenário em que a escola, enquanto instituição de educação e de ensino, foi vitoriosa e hegemônica.

3. A educação na casa hoje: perspectivas diante das novas tecnologias

39 Cf. ALMEIDA, José Ricardo Pires de. Instrução pública no Brasil (1500-1889) História e legislação. 2 ed. rev.- São Paulo: EDUC, 2000, p. 279.

Page 45: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

Um século depois da supremacia incontestável da escola na legitimidade de

educar e ensinar, diante das inovações tecnológicas que se fazem velozes e radicalmente

transformadoras, com as informações sendo levadas a qualquer ponto e não havendo

mais necessidade de espaços que concentrem essas informações fisicamente, com a

virtualidade do conhecimento e a possibilidade de se apropriar dele a qualquer

momento, algumas questões exigem uma reflexão, entre elas, as perspectivas que se

abrem à casa, neste novo contexto, como espaço de educação.

Segundo Rogério Fernandes (In VASCONCELOS, 2005) o reconhecimento da escola se instituiu, sobretudo a partir da II Guerra Mundial, como fator de desenvolvimento econômico através da formação de recursos humanos. A atribuição dessa função levou à sua categorização como obrigação do estado–Providência e como direito social individual.

Desde então, a escola, enquanto instância formal de educação, é vista “ora com

grande otimismo ora com descrença relativa”. Em qualquer das hipóteses, porém, ela

continuou a preencher a maior parte das preocupações no plano da investigação e da

reflexão teóricas. Fernandes (Ibidem) acrescenta que:

Os problemas relativos às políticas educativas – quanto à oferta e à procura sociais da escola, às questões decorrentes da democratização do ensino e do funcionamento das instituições educativas, públicas ou privadas, às dificuldades de adaptação dos jovens à escola, à busca de respostas para o que se chamou a “crise” ou o “questionamento” da escola –, a indagação de estratégias de solução para estas e outras dificuldades através da formulação de novas propostas pedagógico-didácticas ou da procura de novas lideranças institucionais, entre muitos temas que poderíamos evocar, têm girado sempre em torno da instituição escolar em estabelecimento. Nas últimas décadas , contudo, a instituição escolar, pública ou privada, parece ter perdido o seu papel preponderante, senão mesmo sua exclusividade nessa discussão. O caso especial dos Estados Unidos é a este respeito bastante significativo. As crises das políticas educativas delineadas e as dificuldades com que se debatem as escolas parecem conduzir à revalorização de modalidades de ensino que tinham perdido a sua vigência histórica, tais como o ensino doméstico. O desejo, por parte das famílias, de eficiência pedagógica, de permanência de valores e de segurança física, leva a que se recorra ao ensino no interior do lar, o que é reforçado pela disposição actual de fontes informáticas de informação (p.4).

O otimismo que esteve sustentando a crença na escolaridade, tem, nas últimas

décadas dado lugar a severas críticas ao modelo escolar, cujas disfunções, inviabilidade

de acesso, produção de fracassos, reestruturações inócuas, entre outros, fazem

Page 46: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

questionar seus propósitos e levam a intelectuais de diversas nacionalidades voltarem-se

para a discussão acerca do futuro da escola.

Descrentes das propagadas reformas que se propõem a corrigir as deficiências do

sistema escolar, cada vez mais, o modelo da escolaridade obrigatória é colocado em

questão e surgem formulações alternativas que, baseadas nas possibilidades decorrentes

do avanço e do domínio de novas tecnologias, permitem se pensar na educação fora da

escola, ou seja, as inúmeras perspectivas que se impõem, entre elas a de se reconhecer a

casa, novamente, como espaço de educação.

Em um mundo constantemente assolado por crises, nas quais o temor da

violência nos espaços coletivos é cada vez maior, muitos aspectos contribuem para a

desmistificação da escola como o mais adequado lugar de aprendizagem. Além disso,

os sucessos constantes que têm ocorrido em experiências de educação à distância, cujo

espaço privado, da casa ou do trabalho passa a ser o locus da ação educativa, contestam

o monopólio dos ambientes escolares como também reforçam a necessidade de se

articular, efetivamente, as possibilidades surgidas com as novas tecnologias para o

ensino formal.

Não se trata apenas de um conflito metodológico, mas de um processo que já

ocorreu anteriormente e no qual, o contexto de uma época, foi fundamental para a

sobrevivência de um sistema de educação em detrimento do outro. Da mesma forma,

hoje, é possível que, mais uma vez as mudanças sociais, exijam que também sejam

revistos os espaços coletivos de educação, em mais uma periódica estruturação de

adaptação da escola ao complexo social.

Durkheim (2001) nas primeiras décadas do século XX já apontava que:

Com efeito, a educação, em uso numa sociedade determinada e considerada num momento determinado na sua evolução, é um conjunto de práticas, de maneiras de fazer, de costumes que constituem fatos perfeitamente definidos e que têm a mesma realidade que os outros fatos sociais. Não são, como acreditamos durante muito tempo, combinações mais ou menos arbitrárias e artificiais, que apenas devem a sua existência à influência caprichosa de vontades sempre contingentes. Constituem, pelo contrário, verdadeiras instituições sociais. É impossível fazer com que uma sociedade tenha, num dado momento, um outro sistema de educação que não aquele que está implicado na sua estrutura, da mesma forma que é impossível a um organismo vivo ter outros órgãos e outras funções que não aquelas que estão implicadas na sua constituição (p.73).

O modelo de educação praticado hoje, não pode ser afirmado mais como aquele

que está implicado na estrutura social vigente. A própria sociedade sofre mudanças

Page 47: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

vertiginosas com o advento das novas tecnologias, transformando não só

comportamentos cotidianos, como também uma série de princípios e rituais que pouco a

pouco tornaram-se desnecessários e obsoletos. O mesmo ocorre dentro dos ambientes

escolares, por vezes, completamente defasados diante do seu entorno social.

Nessa perspectiva, é bem provável que a educação na casa constitua uma das

formas de educação alternativa a que as famílias, sob a influência de condições

específicas, recorrem quando a escola não alcança as expectativas de suas demandas.

Nestas condições, o problema a enfrentar por uma política educativa atual não consiste

em estabelecer ou restabelecer condições de competição entre essas diferentes

modalidades mas sim a possibilidade de revalorizar as instâncias formativas como a

casa, que podem através de diversas metodologias, entre elas a educação à distância,

colocar-se em termos de igualdade e de nível qualitativo, entre as opções que se

colocam às famílias e às comunidades.

A análise do presente e a tentativa de ler nas “sombras” do futuro não é tarefa fácil e muito menos que possa ser feita sem um grau bastante elevado de risco. No entanto, por ora é possível seguinte reflexão: se o século XIX pode ser considerado o século da casa e de seus mestres pela ocupação majoritária do tempo em que estiveram presentes na educação, o século XX foi, sem dúvida, o século da escola instituída para a educação. No entanto, será que se pode afirmar que o mesmo ocorrerá no século que se inicia? Não poderá a casa reabilitar seu lugar de educação e instrução através da tecnologia já disponível?

Referências Bibliográficas

ALENCASTRO, L. F. (org.) História da vida privada no Brasil. Império: a corte e a modernidade nacional. São Paulo: Companhia das Letras, 1997.

ALMEIDA, José Ricardo Pires de. Instrução pública no Brasil (1500-1889). 2. ed. rev. São Paulo: EDUC, 2000.

BARROSO, J. O século da escola: do mito da reforma à reforma de um mito. In O século da escola. Entre a utopia e a burocracia. Porto: Edições ASA, Coleção Perspectivas Atuais, 2001.

BRASIL. MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO (MEC). Página oficial. www.mec.gov.br

Page 48: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

DURKHEIM, E. Educação e sociologia. Lisboa: Edições 70, Coleção Ciências do Homem, 2001.

MATTOS, Ilmar R. Tempo saquarema. Rio de Janeiro: ACCESS, 1994.

VASCONCELOS, M. C. A casa e os seus mestres. A educação no Brasil de Oitocentos. Rio de Janeiro: Gryphus, 2005.

As políticas públicas federais de educação nos municípios de Santa Maria

Madalena, Trajano de Moraes, São Sebastião do Alto: valores proclamados e

valores reais

Quem pretende se aproximar do próprio passado soterrado deve agir como homem que escava (...) “fatos” nada são alem de camadas que apenas à exploração mais cuidadosa entregam aquilo que recompensa a escavação (...). E se ilude, privando-se do melhor, quem só faz o inventário dos achados e não sabe assinalar no terreno de hoje o lugar no qual é conservado o velho. (Walter Benjamim, 1979).

Procurando interpretar o sistema educacional brasileira a partir de valores

ideais, ou proclamados e, em oposição a estes os valores e propósitos reais, Anísio

Teixeira chama atenção para o dualismo na nossa sociedade. Este dualismo teria surgido

Page 49: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

com a importação de uma cultura estrangeira que desconsiderava a ricas experiências

nacionais, sobre a pecha de selvagem.

Anísio em 1962 examina a evolução do sistema educacional brasileiro

comparando-a com a de outros países e encontra, no nosso país, uma tendência à

conservação de normas e padrões abandonados e como obsoletos e anacrônicos nos

países de onde foram importados. Também identifica a existência de dois tipos de

escola, um para elite, e outra para as classes subalternas e uma progressiva

simplificação da escola primária em detrimento de sua qualidade. Atribui este fato a

dois conceitos ainda conservados na política educacional brasileiros. Estes, dizem

respeito à escola como valor absoluto e à educação formal como um meio automático de

ascensão social. Estes conceitos explicam a substituição dos valores ideais e

proclamados por valores reais bastante diferentes daqueles. O autor nos adverte que:

(...) A educação é um fenômeno de civilização com a arte, a literatura e a filosofia. Não se fazem essas coisas com receitas. Elas nascem de condições sociais determinadas, e ao homem não é mais dado, que redigi-las. Neste sentido, não há povos deseducados, há povos com diferentes educações. (Teixeira, 1962, P.20)

A falta de vontade política, sempre usou como desculpa, a falta de recursos

capazes de permitir a construção de um sistema educativo de qualidade para todos. O

Brasil no final do século XX tornou-se signatário de inúmeros documentos

internacionais que fixavam compromissos educativos que estabeleciam dispositivos

legais que determinavam, com valores proclamados, um sistema público de educação da

qualidade para todos.

Os anos 90 foram, extremamente, significativos na transformação das políticas

educacionais do país, principalmente no interior. A partir de 1988, com a constituição

Federal, surgiram uma série de leis, decretos, projetos e programas que vêm sendo

instituídos, modificados e adaptados até os dias de hoje. Dentre os mais importantes

destacam-se, a LDB (lei nº 9394/96), a lei do FUNDEF (lei nº 9424/96), esta substituída

em 2007 pela lei do FUNDEB (lei nº 11494/2007) e Leis de Responsabilidade Civil (EC

nº 101/2000) que, embora não trate, especificamente, de educação, veio regular a

aplicação de recursos na área. Também devemos destacar os programas do FNDE,

notadamente, o Programa Nacional do Livro Didático (PNLD), o Programa Nacional de

Alimentação Escolar (PNAE),o Programa Nacional de Transporte Escolar (PNATE) e o

Programa Nacional de Dinheiro Direto na Escola (PDDE).

Page 50: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

A idéia de vincular recursos para um segmento da educação é antiga. A

Constituição Federal de 1934 obrigava a União e os municípios a aplicarem no mínimo

10% da receita de impostos em educação e os estados e o Distrito Federal, 20%.

Também estipulou que 20% dos 10% (ou seja, 2%) de impostos federais vinculados à

educação, deveriam ser aplicados à educação rural.

Por outro lado, falava de fundos especiais, constituídos por sobras das dotações

orçamentárias, doações, porcentagens sobre o produto de venda de terras públicas, taxas

especiais, destinadas a obras educativas e auxílio a alunos necessitados, “mediante

fornecimento gratuito de material escolar, bolsas de estudo, assistência alimentar,

dentária e médica e para vilegiaturas”. Entretanto, foi suprimida pela ditadura do Estado

Novo em 1937, e só foi restabelecida pela CF de 1946, que repetiu os percentuais

mínimos da CF 1934, com exceção do percentual dos municípios, que passaram para

20%.

Em 1961, a primeira LDB (lei nº 4024/1961) determinava a formação de fundos

nacionais, um do ensino primário, outro de ensino médio e o terceiro, do ensino

superior. Dos 12% vinculados à MDE em âmbito federal pela LDB, 90% seriam

divididos em três parcelas de 30% cada, para constituir tais fundos. No entanto o golpe

militar de 1964 suprimiu novamente obrigatoriedade.

Entretanto, o salário educação foi criado em outubro de 1964 pela lei nº 4440,

com a intenção de suplementar as despesas públicas com o então ensino primário de

quatro anos. É uma contribuição social, calculada inicialmente com base na alíquota de

2% sobre o salário mínimo local por empregado, e atualmente, 2,5% da folha mensal de

contribuição das empresas para fins previdenciários,

Tendo durante longo tempo (1964 a 1997), um caráter legalmente privatizante, pois a empresa, em vez de fazer o recolhimento aos órgãos responsáveis, podia usar os recursos devidos para adquirir bolsas de estudo em escolas particulares para filhos dos seus empregados, ou no caso de empresas com mais de 100 funcionários, montar sua própria escola (Davies, 2007, p. 21)

Em 1983, a Emenda Constitucional do Senador João Calmon, fixou o percentual

mínimo de 13% para a União e 25% para os Estados, Municípios e Distrito Federal.

Com a CF de 1988, além de manter o percentual de 25% da receita de impostos e

transferências para estados, municípios e Distrito Federal, se ampliou o percentual da

União de 13 para 18%. Algumas constituições estaduais e leis orgânicas municipais

Page 51: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

também ampliaram estes percentuais, como por exemplo, 35% para o estado do Rio de

Janeiro

Entretanto, alguns procedimentos como a renúncia fiscal, a sonegação fiscal e a

corrupção, costumam retirar da educação pública uma quantia significativa. O episódio

recente de desconto no valor do IPI (imposto sobre produtos industrializados) no preço

dos automóveis e alguns eletrodomésticos serve como exemplo, pois este imposto

compõe a quota do FPM (Fundo de Participação dos Municípios) e FPE (Fundo de

Participação dos Estados) e estes, por sua vez, fazem parte do atual FUNDEB. As

perdas também são causadas por artifícios, como as criações de contribuições que, por

não serem definidas juridicamente como impostos, não entram no computam de

recursos vinculados à MDE. Um exemplo é a já extinta CPMF, que permaneceu vigente

durante todo o período do FUNDEF e, seu faturamento previsto para 2007, era superior

a 35 bilhões de Reais.

Outro exemplo foi o Fundo Social de Emergência, criado por EC em 1994 e,

posteriormente, transformado em Fundo de Estabilização Fiscal (FEF), que

“subtraiu bilhões da educação pela desvinculação de 20% da receita de alguns impostos federais e também do salário-educação. A conseqüência do FEF é que o governo federal só foi obrigado a aplicar 14,4% da receita dos impostos em MDE, pois 20% dos 18% (= 3,6%) foram retidos automaticamente no FEF, para uso livre desvinculado, pelo Governo Federal.” (Davies, 2007, p.13)

Embora o FEF tenha acabado em dezembro de 1999, em março de 2000, foi

aprovada a EC 27, criando a Desvinculação da Receita da União (DRU), que reproduziu

parte da emenda do FEF e desvinculou 20% dos impostos federais, significando que o

governo federal continuou a aplicar somente 14,4% da receita. Por outro lado, Estados,

Municípios e Distrito Federal também continuaram a ser prejudicados tanto pelo FEF

como pela DRU, em virtude da retenção de 20% de impostos que compõem a receita de

FPE e FPM.

Além destes prejuízos, o financiamento foi e é prejudicado pelo fato de muitos

governos não cumprirem a exigência da aplicação da receita vinculada. De 1999 a 2005,

mais de R$1,9 bilhão da cota federal do salário-educação não teria sido aplicado,

segundo o relatório de atividades de 2005 do FNDE (Brasil, MEC, FNDE, 2006, p.68),

que não informa se tais rendimentos resultam apenas da receita da cota federal ou parte

das cotas estaduais e municipais. (Davies, 2007)

Page 52: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

Os órgãos fiscalizadores da aplicação destas receitas em MDE são os Tribunais de

Conta (TCU, TCE e alguns TCM). Os TCs são órgãos auxiliares do poder legislativo e

são nomeados segundo critérios políticos, a partir de acordos entre o executivo e os

representantes do povo (deputados e vereadores). Segundo Davies, “isso significa que

as contas dos governos, tendem a ser avaliadas principalmente por critérios de

‘afinidade’ entre esses TCs e os governos, não necessariamente de acordo com a lei ou

normas técnicas.” (Davies, 2007, p.15)

Apesar da pormenorização dos gastos admissíveis em MDE pela LDB (art. 70 e

71) existe um problema, aparentemente, insolúvel que é a continuidade de maquiagem

contábil. Um governo pode lançar na documentação outro setor, ou então, na prestação

de contas declarar como gasto o montante empenhado em MDE, e no exercício seguinte

cancelar uma parte destes empenhos. Segundo Davies, “isto ocorreu no Estado do Rio

de Janeiro nas contas de 1995 a 1998 quando quase R$ 1 bilhão empenhado na

educação foi contabilizado como aplicado e cancelado no exercício seguinte”. (Davies,

2007, p.17)

Logo, a presente pesquisa sinaliza tais ocorrências como a maquiagem contábil e

desvio de função orçamentária, que ocorreram também em todo o interior do estado do

Rio de Janeiro e, com o advento da Lei de Responsabilidade Fiscal foram amenizados,

embora não de todo eliminados.

Com relação ao controle das despesas em MDE, a secretária Municipal de

Educação, no cargo a 24 anos, de São Sebastião do Alto nos revela que:

“A gente controla aqui. Não se utiliza nada sem o nosso controle aqui (...) aqui a gente só aplica em educação; eles [Secretaria da Fazenda] fazem lá, recebem todo recurso, mas quem faz os aceites e faz todo o controle e tudo é a Secretaria [de educação]. Eles só pagam. É até bom, que a gente não trabalha com dinheiro. Mas a gente prepara toda a papelada para que eles efetuem o pagamento, mas tudo aplicado dentro da educação. Isso aí é uma grande conquista. Antigamente não era assim não. Eu já trabalhei... no início foi muito difícil. Aplicava-se o recurso em outras coisas e não poderia... maquiavam... mas hoje não, tudo é passado pela secretaria.” (Profº Dioneia Latini Daflon – Secretaria Municipal de Educação em São Sebastião do Alto – entrevista em 23/08/2010)

Mesmo quando os TCs adotam procedimentos corretos da verificação das receitas

e despesas vinculadas a MDE, os seus pareceres, na prática, podem ser derrubados pelas

câmaras de vereadores, pois, pela Constituição Federal de 1988, segundo o art. 31, as

contas municipais podem ser aprovadas por 2/3 dos vereadores.

Page 53: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

Considerado pelo governo federal como o principal veículo de redistribuição de

recursos para a educação, o FUNDEF, apesar de prometer desenvolver o ensino

fundamental e valorizar o magistério brasileiro, apenas redistribuiu em âmbito estadual,

um percentual (15% dos 25%) de impostos que já eram vinculados à MDE, com base no

número de alunos do ensino fundamental regular, das redes de ensino estadual e

municipais. A idéia básica era disponibilizar um valor anual mínimo por aluno, por

matrícula no ensino fundamental de cada rede escolar, que garantisse o que seria

definido pelo governo federal, como um padrão mínimo de qualidade educacional.

Embora o FUNDEF tenha sido uma iniciativa do governo federal, foi minúscula e decrescente (em termos porcentuais reais) sua complementação para os FUNDEFs, que formados por 15% de alguns impostos (ICMS, FPE, FPM, IPI – exportação e compensação financeira- lei complementar nº 97/96) do governo estadual e dos municipais existentes em cada Estado, não conseguiram alcançar este valor mínimo. (Davies, 2007 p. 24)

Outro aspecto do cálculo do valor do FUNDEF restituído às prefeituras é

que, com base no número de matrículas no ensino fundamental regular, aparentemente

progressista, se trouxe ganhos para muitos municípios, mas por outro lado, provocou

também perdas para municípios com menor número de habitantes e, consequentemente,

pequeno número de matrículas no ensino fundamental regular e menor receita.

No estado do Rio de Janeiro, podemos citar como exemplo de município que

ganhava com o FUNDEF, o município do Rio de Janeiro, e dentre os que perdiam, os

três municípios em estudo, Santa Maria Madalena, São Sebastião do Alto e Trajano de

Moraes.

A título de exemplo, do cálculo de valores previstos em 2005 para aplicação em

MDE, descontos para o FUNDEF e receita municipal advinda do mesmo fundo,

apresentamos as tabelas a seguir:

Page 54: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

Tabela 1Estimativa das Receitas Aplicadas em MDE

Trajano Moraes2005

Imposto Receita Bruta % para MDE Recursos para MDEA) Próprios

IPTU 29.200,00 25% 7.300,00ITBI 37.000,00 25% 9.250,00ISS 120.000,00 25% 30.000,00IRRF 186.000,00 25% 46.500,00Dívida Ativa de Impostos

64.000,00 25% 16.000,00

Multas e Juros de Mora de Impostos

5.000,00 25% 1.250,00

Subtotal (a) 441.200,00 25% 110.300,00B) Transferências

FPM* 2.420.000,00 10% 242.000,00ITR 6.600,00 25% 1.650,00IPI-Exp* 156.000,00 10% 15.600,00IOF/Ouro 0,00 25% 0.00Lei complementar 87/96(Lei Kandir)*

170.000,00 10% 17.000,00

ICMS* 9.780.000,00 10% 978.000,00IPVA 80.000,00 25% 20.000,00Subtotal (b) 12.612.600,00 1.334.250,00

C) Mínimo a ser aplicado em MDE (A+B) 1.444.550,00D)Transferência de Recursos do FUNDEF 100% 1.878.900,00E) Receitas de Valores Mobiliários - FUNDEF 100% 4.000,00

Page 55: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

F) Mínimo total a ser aplicado em MDE= (C+D+E) 3.327.450,00

(*) Descontados os 15% do FUNDEF Fonte: Orçamento Municipal

Tabela 2Contribuição do Município para o FUNDEF

Trajano Moraes2005

Origem dos Recursos RecursosFPM 2.420.000,00IPI – Exp 156.000,00Lei Complementar n.87/96 (Lei Kandir) 170.000,00ICMS 9.780.000,00Total 12.525.000,00Contribuição para o FUNDEF(15% do total) 1.878.900,00

Fonte: Orçamento Municipal para 2005

Tabela 3Estimativa da Receita do FUNDEF

Trajano de Moraes2005

A) Nº de alunos B) Valor por aluno

C= AxB

1ªa4ª urbana 49 1.136,47 55.687,031ª a 4ª rural 440 1.159,20 510.048,00Total 981 565.735,03

Fonte: Pesquisa do autor

A análise das três tabelas acima no permitem observar que Trajano de Moraes

previa perder em 2005, R$ 1.313.165,00 em contribuições para o FUNDEF (descontaria

R$ 1.878.900,00 e receberia apenas 565.735,00). Tal resultado é fruto do reduzido nº de

alunos no ensino fundamental regular da rede municipal, o que apontava para uma

Page 56: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

política de incremento do número de matrículas, seja na busca de alunos evadidos, seja

através da municipalização de escolas estaduais.

Também é importante analisar que com a política de redistribuição de receitas,

Trajano de Moraes perderia R$ 1.313.165,00 do pacote para MDE, o que representaria

mais de 10% da sua receita anual, ou seja, mais do que a receita de um mês por ano! E

este dinheiro seria redistribuído para municípios do estado como o Rio de Janeiro, ou

Duque de Caxias, por exemplo.

Embora Trajano de Moraes já viesse municipalizando escolas estaduais no meio

rural há mais tempo, foi em 2005 que foram municipalizados a quase totalidade dos

alunos de 1ª a 4ª série, praticamente dobrando o nº de matrículas. O quadro abaixo de

estimativa de receita do FUNDEF para 2006 demonstra que, com essa política, o

município conseguiu dobrar a receita do FUNDEF para aquele ano. Entretanto

continuava perdendo cerca de R$ 500.000,00, considerando-se os valores de 2005.

Tabela 4Estimativa da Receita do FUNDEF

Trajano Moraes2006

A) nº de alunos B) valor por aluno C = A x B1ª a 4ª urbana 453 1.136,47 514.820,911ª a 4ª rural 258 1.159,20 612.057,60Ed. Especial ─ 1.216,03 0,00Total 981 1.126.878,51

Fonte: Pesquisa do autorAo projetar para o FUNDEB 2007 baseando-se no Censo Escolar de 2006 e,

respeitando-se os diversos percentuais e frações do número de alunos e

etapas/modalidades de ensino, teríamos aproximadamente uma contribuição para o

FUNDEB de R$ 2.107.892,00 e uma receita de R$ 1.374.903, o que acarretaria uma

perda anual de cerca de R$ 750.000,00, conforme a tabela abaixo:

Tabela 5Previsão da Receita do FUNDEB para 2007

Trajano de Moraes

Etapa/Modalidade Número de alunos

Índice Total

Creche 118/3 = 39,3 992,28 39.204,12Educação Infantil 297/3 = 99 1.117,10 110.592,90Educação Especial 13 1.489,47 19.363,11

Page 57: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

Séries Iniciais Urbanas 342 1.241,23 424.500,66Séries Iniciais Rurais 604 1.303,29 787.187,16EJA 114/3 = 38 868,86 33.016,68Total Anual 1.488 ─ 1.374.903,63

Fonte:MEC

Apesar do esforço no sentido de aumentar o número de alunos, inclusive de

Educação Infantil e de Educação de Jovens e Adultos (EJA), o município de Trajano

Moraes continuaria perdendo, agora com o FUNDEB, a receita de quase um mês de sua

receita de impostos. O mesmo ocorre com São Sebastião do Alto e Santa Maria

Madalena. Como Trajano de Moraes, algumas municipalizações de escolas rurais

vinham acontecendo, mas a maior parte foi realizada em 2008 por São Sebastião do

Alto e em 2005, por Santa Maria Madalena, o processo mais abrangente dos três

municípios. Neste ano, Madalena completou a municipalização de toda a rede estadual

de ensino fundamental até a 8ª série. O Profº. Marcelo Freixo Lima, ex-secretário de

Santa Maria Madalena, nos períodos de 1997 a 2000 e, de 2005 a 2008, nos relata como

foi sendo realizada a municipalização do ensino em seu município:

“A prefeitura, na sede do município, só tinha creche (jardim de infância) e o restante das escolas era do estado e o município tinha, na área rural, umas 20 escolas. (...) Na época só tínhamos duzentos e poucos alunos, sendo que praticamente todos os restantes estavam matriculados na rede estadual. (...) Então destes 200 e poucos, mais de 100 estavam em creches. De 1ª a 4ª série eram 100 alunos. Iniciamos uma primeira fase de municipalização. Naquela época pegamos o que chamamos de fundo... tinha escola que o Estado não queria mesmo – a escola tinha 20 alunos e ficava na roça... Os professores já eram do município. Dizia-se que a municipalização já era de fato, não de direito. Essas escolas nós municipalizamos em 1998 e começamos a aglutinar, a fechar algumas escolinhas municipais. (...) Então foi só articular um transporte para trazer todas as crianças para cá (escolas pólo). Foi só ter um diretor, um orientador pedagógico e um professor para cada turma para melhorar a qualidade. Com essa medida passou de 200 para 500 alunos. (...) Com a lógica do FUNDEF, todo mundo passou a ter interesse em municipalizar, porque ficou mais clara a regra da partilha de recursos. (...) Quando em 2005, eu já como vice-prefeito, assumi a secretaria de educação, com a idéia de municipalizar o restante pensando assim: as vantagens serão muito grandes, porque o município estava bancando o transporte, transportando os alunos da rede municipal e estadual. Então ao municipalizar, este recurso ficaria todo com a gente. (...) Então, eu fiz um cálculo.... vai aumentar três milhões na receita da secretaria de educação e eu projetei, em 10 anos, num plano decenal, seriam 30 milhões. Portanto 30 milhões a mais de investimentos, daria para fazer alguma coisa boa em Madalena. Aí, eu mostrei a idéia para o prefeito e ele achou legal!(...) Esse município já perdia com o FUNDEF, e continua perdendo com o FUNDEB. Mesmo depois da municipalização um dos argumentos meus para municipalizar – e que convencia o prefeito – é de que nós iríamos mitigar, minimizar, ao máximo, estas perdas. E isso foi feito, Madalena reduziu as perdas. Ela perdia um absurdo. Por exemplo, com 500 alunos, fica um

Page 58: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

orçamento alto. Com 500 alunos, você perdia recursos aos montes. Aumentar a massa de alunos reduziu a perda, mas ainda continua!! (Profº Marcelo Freixo Lima, entrevista em 5 de julho de 2010)

Outro problema advindo, tanto do FUNDEF quanto do FUNDEB, é instituir o

conceito do aluno-cifrão, ou seja, a lógica da receita, de acordo com o número de

matrículas, criando uma lógica mercantil. Alguns defensores do FUNDEF e do

FUNDEB, no entanto, no discurso, criticam os valores neoliberais. O fato também é

que, muitos defensores destes fundos acreditam que esta tem sido uma das únicas

maneiras de obrigar prefeitos e secretários de fazenda a investir em educação as verbas

(pelo menos a maior parte) a ela destinadas pela Constituição Federal. Da mesma forma,

obriga o município (e seus dirigentes) a arcar com suas obrigações e, atender,

integralmente, à legislação que o responsabiliza pelo atendimento da educação infantil

e, em parceria com os estados, do ensino fundamental.

Se os dirigentes municipais se comprometessem, efetivamente, a gastar a

totalidade de 25% dos impostos e transferências especificamente, em educação,

respeitando os diferentes níveis e modalidades de ensino, não haveria a necessidade da

existência de tais fundos. Neste sentido o que os seus defensores alegam, com razão, é

que somente a partir do FUNDEF e do FUNDEB e, da sua fiscalização, é que centenas

de municípios passaram a cumprir à legislação, no que se refere ao orçamento da

educação.

Os gráficos a seguir, assinalam a evolução do número de matrículas, nos três

municípios, a partir da vigência do FUNDEF, conforme a explicitação que se encontra

abaixo nas tabelas correspondentes:

Page 59: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

Tabela 6Evolução do número de matrículas

Ensino Fundamental Regular - Trajano de Moraes1997-2009

Ano Rede Municipal Rede Estadual Total1997 343 1772 21151998 398 1876 22741999 555 1879 24342004 489 1453 19422005 982 936 19182007 969 811 17802008 885 774 16592009 849 767 1615 Fonte: Censo EscolarA seguir, o panorama destes mesmos dados em Santa Maria Madalena:

Page 60: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

Tabela 7Evolução do número de matrículas

Ensino Fundamental Regular – Sta. M. Madalena1997-2008

Ano Rede Municipal Rede Estadual Total1997 369 1423 17921998 544 1376 19201999 564 1358 19222004 478 1395 18732005 1813 0 18132007 1611 0 16112008 1532 0 1532

Fonte:Censo Escolar

Por fim , quanto ao terceiro municipio no cenário que se revela em

apresenta ro gráfico 3 acompanhado da tabela 8:

Page 61: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

Tabela 8Evolução do número de Matrículas

Ensino Fundamental Regular – São Sebastião do Alto1997-2009

Ano Rede Municipal Rede Estadual Total1997 213 1156 13691998 302 1383 16851999 403 1389 17922004 483 1138 16212005 494 1094 15882007 681 697 13782008 700 710 14102009 752 563 1315

Fonte: Censo Escolar

Nos gráficos acima, podemos observar alguns movimentos: em primeiro lugar o

crescimento do número de matrículas da rede municipal, inicialmente discreto, nos anos

noventa e pico em 2005 para Santa Maria Madalena e Trajano de Moraes, e em 2007,

Page 62: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

para São Sebastião do Alto. Em segundo lugar nota-se o decréscimo no número de

matrículas da rede estadual que, em Madalena chega a zerar a partir de 2005. Em

terceiro lugar podemos observar que a relação entre o número de matrículas da rede

estadual e do da rede municipal vai modificando-se para menor até o ponto de invertê-

la.

Tais movimentos se dão devido à municipalização, que, paulatinamente foi

crescendo até medidas mais radicais, como a de Santa Maria Madalena em 2005.

Um quarto fator a ser ainda destacado se refere à oscilação para mais no final

dos anos 90 e para menos no final da primeira década dos 2000, no número total de

matrículas (estadual + municipal). Uma possível explicação para o fenômeno é que,

com o surgimento de FUNDEF e o aumento da fiscalização, as prefeituras buscaram o

acréscimo destas, não só através da municipalização, como do retorno de alunos

evadidos. Por seu lado, a população, pressionada pelos programas de políticas

compensatórias, que exigiam a presença dos filhos na escola, também procurou

matricular nas escolas estaduais e municipais. No entanto, este número chegou a um

valor máximo, e a partir do início dos anos 2000, foi diminuindo a medida que o êxodo

para outros centros urbanos (Nova Friburgo, Macaé ou Grande Rio) foi se tornando

mais ativo. Se o número máximo de matrículas no ensino fundamental das redes

municipais já foi atingido e a tendência a partir daí é diminuir, então, o prejuízo com o

FUNDEF nos três municípios tende a aumentar. E aí cabe a pergunta: Com o FUNDEB,

e a possibilidade de incluir as matrículas de outras modalidades, há chance de se

inverter essa incidência?

Nossos estudos revelam que não. Inicialmente, com maiores entradas em função

da inclusão de novas matrículas, os municípios perderam um pouco menos. No entanto,

a partir de certo ponto, o número de matrículas, em função do êxodo, começa a cair em

todas as etapas e modalidades, o que acarreta um aumento das perdas com o FUNDEB.

Em segundo momento da investigação acerca dos dados, levantados os quadros

que se seguem nos dão uma idéia do que afirmamos:

Page 63: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

Tabela 9Perdas com FUNDEF/FUNDEB

Trajano de Moraes2005-2009

Ano Perdas Fundo2005 1.257.936,97 FUNDEF2006 787.614,39 FUNDEF2007 967.925,98 FUNDEB2008 1.197.959,76 FUNDEB2009 1.471.648,27 FUNDEB

Fonte: MEC – SIOPE

Dando prosseguimento:

Page 64: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

Tabela10Perdas com FUNDEF/FUNDEB

Santa Maria Madalena2005-2009

Ano Perdas Fundo2005 1.661.491,80 FUNDEF2006 154.582,65 FUNDEF2007 539.359,42 FUNDEB2008 648.254,36 FUNDEB2009 960.755,33 FUNDEB

Fonte: MEC – SIOPE

E, por fim :

Page 65: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

Tabela11Perdas com FUNDEF/FUNDEB

São Sebastião do Alto2005-2009

Ano Perdas Fundo2005 1.110.743,33 FUNDEF2006 1.174.488,79 FUNDEF2007 1.295.214,60 FUNDEB2008 1.282.467,90 FUNDEB2009 1.350.270,11 FUNDEB

Fonte: MEC – SIOPE

Considerando o exposto anteriormente, sugem mais indagações: Os municípios

pequenos que perdem dinheiro com o FUNDEF/FUNDEB estão fadados a perder cada

vez mais, indefinidamente? O que pode ser feito para que estes três municípios (e no

Brasil, mais de 2000) deixem de perder, anualmente, mais de 10% de sua receita de

impostos e transferências?

A resposta à primeira pergunta é positivo, já que a lógica do FUNDEF/FUNDEB

é baseada no desconto fixo da receita e no retorno baseado no mínimo de alunos

matriculados que tende a diminuir, a não ser que haja algum fenômeno que produza a

inversão do êxodo. A resposta à segunda pergunta, aponta para a necessidade da

modificação das políticas, de caráter neoliberal de financiamento da educação, de

maneira que estes municípios possam receber integralmente os 25% para MDE e, se

Page 66: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

possível, uma complementação, via governo federal. É importante, também, que tanto o

governo federal, quanto os governos estaduais, desenvolvam políticas sociais e de

geração de emprego e renda aplicáveis nestes municípios, no sentido de sustar ou

mesmo inverter o êxodo de sua população para os grandes centros. Todas estas

propostas amparadas em uma fiscalização permanente, com efetiva participação, da

população, através dos conselhos de acompanhamento e controle.

A titulo de conclusão

O que nós vimos, ao longo desta pesquisa é que os fantasmas dos barões e

coronéis ainda assustam os moradores dos três municípios estudados. De um lado,

detendores do poder local continuam desenvolvendo práticas clientelistas e

paternalistas. De outro, os trabalhadores em educação, acostumados a estas práticas,

buscam as soluções particulares através do famoso “jeitinho”. Mas o ocorre em Santa

Maria Madalena, Trajano de Moraes e São Sebastião do Alto, não é exclusivo destes

três municípios. Neste Brasil de capitalismo depedente, no ambito político,

administrativo e intelectual, a marca dominante é a mudança pelo alto e a dependência

aos centros hegemônicos do capitalismo internacional.

O que nos preocupa é que a adoção de politícas neoliberais em educação

ditadas pelo Banco Mundial, trouxe para estes três municípios, a evasão de parte

importante de sua receita e o êxodo de seus jovens para outras regiões. O que se observa

é um circulo vicioso e malvado: o município, porque tem poucos habitantes, tem poucos

alunos matriculados e recebem menos para aplicar em educação.Isto resulta em poucos

investimentos em educação básica e , sem um regime de colaboração eficiente , o

município não possui escolas de ensino médio com formação tecnológica e

politécnica,nem geração de renda. Como consequencia, seus jovens são obrigados a se

mudar para outra região para estudar e trabalhar, diminuindo o número de habitantes. O

que é mais triste é que isso tudo se passa no Estado do Rio de Janeiro. O que dizer dos

municípios do Norte e Nordeste?

Anisio Teixeira, há 50 anos atrás dizia – e eu concordo hoje com ele- que

educação (escolar) “Precisa ser, tanto no país subdesenvolvido, quanto nos país

desenvolvidos,eficiente, adequada e bem distribuída, significando nesses atributos: que

deve ser eficaz, isto é , ensine o que se proponha ensinar e ensine bem; que ensine o que

o indivíduo precisa aprender e mais , que seja devidamente distribuída,isto é, ensine às

Page 67: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

pessoas algo suficientemente diversificado, nos seus objetivos para poder cobrir as

necessidades do trabalho diversificado e vário da vida moderna e dar a todos os

educandos reais oportunidades de trabalho.”

Referências Bibliograficas:

ARROYO, Miguel G. Educação e exclusão da cidadania. In: BUFFA, Ester et all

Educação e Cidadania. São Paulo, Cortez. 1988.

______. Escola e movimento social: relativizando a escola. ANDE – Revista da

Associação Nacional de Educação, São Paulo, 1987.

______. Por um Tratamento Público de Educação do Campo. Por uma educação do

campo, nº 5. Brasília, 2004.

BRASIL. Lei nº 9.424 de 24/12/1996. Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do

Ensino Fundamental e da valorização do Magistério. Brasília: MEC, 1996.

______. Lei nº 9.394 de 23/12/1996. Diretrizes e Bases da Educação Nacional.

Brasília: MEC, 1996.

______. Congresso Nacional. Emenda Constitucional nº 14 de 13-09-1996.

______. Educação Integral: Texto Referência para o Debate Nacional. Brasília:

MEC, SECAD, 2009.

______. Diretrizes Operacionais para a Educação Básica nas Escolas do Campo.

Resolução CNE nº 1 de 3 de abril de 2002. Brasília: MEC, SECAD, 2002.

______. Resolução nº 2, de 28 de abril de 2008, Estabelece Diretrizes

Complementares, Normas e Princípios para o Desenvolvimento de Políticas

Públicas de Atendimento da Educação Básica do Campo. Brasília: CNE,

Câmara de Educação Básica, 2008.

______. Programa de Apoio aos dirigentes municipais de educação. Caderno de

textos 1, 2, e 3. Brasília: MEC, 2006.

COUTINHO, Carlos Nelson. A democracia na batalha das idéias e nas lutas políticas do

Brasil de hoje. In: FAVERO, Osmar e SEMERARO, Giovani. Democracia e

construção do público no pensamento educacional brasileiro. Petrópolis, RJ:

Vozes, 2002, p. 11-41.

Page 68: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

______. O Estado Brasileiro: gênese, crise, alternativas. In: LIMA, Julio; NEVES,

Lúcia. Fundamentos da educação escolar no Brasil contemporâneo. Rio de

Janeiro: EPSJV, Editora FioCruz, 2006.

DAVIES, Nicholas. O FUNDEF e as verbas da educação. São Paulo: Xamã, 2001.

______. Recursos públicos em educação: Preal Debate, Rio de Janeiro, nº9, junho

2002.

______. FUNDEB: A Redenção da Educação Básica? Niterói, RJ, ed. do autor, 2007.

FRIGOTTO, Gaudêncio. Fundamentos científicos e tecnológicos da relação trabalho e

educação no Brasil de hoje. In: LIMA, Julio; NEVES, Lúcia. Fundamentos da

educação escolar no Brasil contemporâneo. Rio de Janeiro: EPSJV: Editora: Fio

Cruz, 2006.

______. Projeto societário contra-hegemônico em educação do campo: desafios de

conteúdo, método e forma. In: MUNARIM, Antonio; BELTRAME, Sonia;

CONTE, Soraya Franzoni; PEIXER, Zilma Izabel (orgs.). Educação do

Campo: reflexões e perspectivas. Florianópolis: Insular, 2010a.

LEHER, Roberto. Da ideologia do desenvolvimento à idéia de globalização: a

educação como estratégia do Banco Mundial para “alívio” da pobreza. Tese de

doutorado apresentada à Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo

(USP). São Paulo, 1998.

LOSURDO, Domenico. Contra História do Liberalismo. São Paulo: Idéias e Letras,

2006.

MACHADO, Geraldo José. Santa Maria Madalena: ontem e hoje. Rio de Janeiro:

Editora Cátedra, 1996.

MARX, Karl. Obras escolhidas. São Paulo: Alfa Omega, 1985.

MATTA, Roberto da. Carnavais, Malandros e Heróis. Para uma sociologia do dilema

brasileiro. 4ª edição. Rio de Janeiro. Zahar Editora, 1983.

Page 69: Notícias da SBHE | SBHE€¦ · Web viewA vinculação de recursos para a educação se apresentou de forma intercalada nas Cartas Constitucionais, tendo sido revogada na Constituição

MONLEVADE, J; FERREIRA, E. O FUNDEF e seus Pecados Capitais. Brasília:

Idéia Editora, 1998.

MUNICÍPIOS EM REVISTA. Santa Maria Madalena: uma cidade que se estrutura.

J.E.F. Editora Cultural LTDA. Rio de Janeiro. nº. 83 - julho/1998.

REVISTA MUNICÍPIOS. Trajano de Moraes. Edição Especial: 114 anos de

História. Número 118, março/2005.

RODRIGUES, Maristela Marques; GIGIO, Mônica (orgs) Guia de consulta para o

Programa de Apoio aos Secretários Municipais de Educação. PRASEM III. :

Brasília: Fundescola / MEC,2001.

ROSAR, Maria de Fátima Felix. Da globalização à descentralização. O processo

desestruturação do sistema educacional pela via da municipalização. Tese de

doutoramento. Campinas: Unicamp, 1995.

SOUZA, Donaldo Bello; FARIA, Lia Ciomar Macedo de (orgs). Desafios da Educação

Municipal, Rio de Janeiro: DP&A, 2003.

TEIXEIRA, Anísio, Educação é um direito. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 1996.