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Nota Técnica n° 89/2014-SRE/ANEEL Em 21 de março de 2014. Processo n.º 48500.003164/2013-15 Assunto: Metodologia e critérios gerais para definição do custo de capital a ser utilizado no cálculo da remuneração das instalações de geração de energia elétrica em regime de cotas. I. DO OBJETIVO 1. O objetivo da presente Nota Técnica é apresentar a metodologia e os critérios finais a serem adotados pela ANEEL para determinação do custo de capital a ser utilizado no cálculo da remuneração das instalações de geração de energia elétrica em regime de cotas. 2. Ao longo da Nota Técnica, também serão respondidas as contribuições apresentadas durante a Audiência Pública nº 2/2014, nos tópicos específicos que abordarem o tema de cada contribuição. II. DOS FATOS 3. Nas empresas que prestam serviços de infraestrutura, como é o caso da geração hidrelétrica no Brasil, constata-se um alto nível de alavancagem operativa, o que significa que o capital imobilizado é elevado comparado com os ganhos anuais. Isto implica que a remuneração ao capital é relevante. 4. A remuneração total ao capital dependerá da definição da base de capital e da taxa de rentabilidade aplicada sobre essa base. A taxa de rentabilidade representa o custo de oportunidade dos recursos, compatível com o risco associado ao empreendimento a ser realizado. A questão de como é medido o risco, como é recompensado e quanto risco assumir são fundamentais em cada decisão de investimento, desde a alocação de ativos até a avaliação. Essa questão define o retorno esperado de um investimento e por isso é de extrema importância o seu correto tratamento. 5. Em um negócio regulado, a determinação da taxa de retorno é de especial importância, pois decorre não só do forte impacto que tem o valor da taxa nos fluxos de recursos como também do fato de que discrepâncias na determinação desse valor podem implicar que os investimentos não se mostrem atrativos ou não seja produzido um negócio sustentável, fazendo com que o investidor mantenha seus investimentos em

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Nota Técnica n° 89/2014-SRE/ANEEL

Em 21 de março de 2014.

Processo n.º 48500.003164/2013-15 Assunto: Metodologia e critérios gerais para definição do custo de capital a ser utilizado no cálculo da remuneração das instalações de geração de energia elétrica em regime de cotas.

I. DO OBJETIVO

1. O objetivo da presente Nota Técnica é apresentar a metodologia e os critérios finais a serem adotados pela ANEEL para determinação do custo de capital a ser utilizado no cálculo da remuneração das instalações de geração de energia elétrica em regime de cotas. 2. Ao longo da Nota Técnica, também serão respondidas as contribuições apresentadas durante a Audiência Pública nº 2/2014, nos tópicos específicos que abordarem o tema de cada contribuição.

II. DOS FATOS

3. Nas empresas que prestam serviços de infraestrutura, como é o caso da geração hidrelétrica no Brasil, constata-se um alto nível de alavancagem operativa, o que significa que o capital imobilizado é elevado comparado com os ganhos anuais. Isto implica que a remuneração ao capital é relevante. 4. A remuneração total ao capital dependerá da definição da base de capital e da taxa de rentabilidade aplicada sobre essa base. A taxa de rentabilidade representa o custo de oportunidade dos recursos, compatível com o risco associado ao empreendimento a ser realizado. A questão de como é medido o risco, como é recompensado e quanto risco assumir são fundamentais em cada decisão de investimento, desde a alocação de ativos até a avaliação. Essa questão define o retorno esperado de um investimento e por isso é de extrema importância o seu correto tratamento. 5. Em um negócio regulado, a determinação da taxa de retorno é de especial importância, pois decorre não só do forte impacto que tem o valor da taxa nos fluxos de recursos como também do fato de que discrepâncias na determinação desse valor podem implicar que os investimentos não se mostrem atrativos ou não seja produzido um negócio sustentável, fazendo com que o investidor mantenha seus investimentos em

(Fls. 2 da Nota Técnica no 89/2014-SRE/ANEEL, de 21/03/2014.)

* A Nota Técnica é um documento emitido pelas Unidades Organizacionais e destina-se a subsidiar as decisões da Agência.

um nível inferior ao do ponto ótimo, com o consequente impacto na qualidade do serviço prestado. Pelo contrário, se a taxa é fixada em níveis altos, superiores ao ponto ótimo, o negócio regulado ganhará acima do que obteria em uma atividade com relação risco/retorno semelhante, gerando uma distorção de preços. Isto representa uma má alocação de recursos, que prejudica os consumidores do serviço e, indiretamente, toda a economia. 6. Assim, em uma indústria regulada, a definição da taxa de retorno sobre o capital constitui um elemento fundamental para o seu funcionamento, pois é o sinal econômico que orienta, mediante os incentivos adequados, a direção do investimento produtivo, como também produz redistribuição de riqueza entre os agentes afetados (consumidor; acionista). 7. A definição do custo de capital a ser adotado nas indústrias reguladas deve ter como premissa que o custo do capital é o retorno mínimo esperado pelos investidores para angariar recursos para a consecução de um projeto. A complexidade associada à estimação do custo de capital advém da dificuldade em calcular, de forma objetiva, a expectativa dos investidores, principalmente o relacionado ao capital próprio – acionistas. Em razão da ausência de indicadores de mercado para valorar a expectativa de retorno dos acionistas, torna-se necessário o uso de modelos de valoração de ativos que buscam estimar o risco e retorno exigido para o empreendimento. 8. Cabe destacar que a alocação de risco do serviço de geração regulada nos termos da Lei 12.783/2013 apresenta características que o fazem se desvincular da percepção de risco da economia como um todo. O modelo de regulação econômica das concessões de serviço público de geração em regime de cotas é próximo ao revenue cap, o qual fornece incentivos concretos às empresas para a redução de custos. Cabe à concessionária gerir sua operação e manutenção de modo a garantir o bom desempenho de suas instalações, pois o principal risco que corre a geradora é a perda de parte da receita por desempenho médio abaixo do esperado. 9. Pelo lado do custo do investimento, o maior componente é o investimento inicial, que para essas usinas já foi realizado. O custo incremental refere-se à substituição de equipamentos e modernizações com vistas a ganhos de produtividade. 10. Além disso, a outra parcela de custo de interesse, os custos de O&M (operação e manutenção), é praticamente fixa e bastante previsível, envolvendo basicamente custo de pessoal para operação e manutenção das instalações de geração. Também praticamente não existe o risco de inadimplência, pois as operações são liquidadas de forma centralizada pela Câmara de Comercialização de Energia Elétrica – CCEE e os compradores são as distribuidoras. Dessa forma, reduz-se o risco do negócio. Por esses motivos, ainda que a modalidade de geração com receita regulada seja uma novidade, suas características apontam um baixo risco.

III. DA ANÁLISE

III.1. METODOLOGIA PARA O CÁLCULO DO CUSTO DE CAPITAL

(Fls. 3 da Nota Técnica no 89/2014-SRE/ANEEL, de 21/03/2014.)

* A Nota Técnica é um documento emitido pelas Unidades Organizacionais e destina-se a subsidiar as decisões da Agência.

III.1.1 – Escolha do Modelo 11. A opção feita pela ANEEL para o cálculo do custo de capital é o Custo Médio Ponderado de Capital (WACC) em combinação com o “Capital Asset Pricing Model” (CAPM). De acordo com esse modelo, a taxa de retorno de um empreendimento é uma média ponderada dos custos dos diversos tipos de capital, com pesos iguais à participação de cada tipo de capital no valor total dos ativos do empreendimento. 12. Assim, o método WACC procura refletir o custo médio das diferentes alternativas de financiamento (capital próprio e de terceiros) disponíveis para o empreendimento. Observa-se que, para determinar o WACC, é necessário conhecer ou determinar, a estrutura de capital, os custos de capital próprio e de terceiros e alíquotas dos impostos aplicáveis. 13. Quanto ao CAPM, usado no cálculo do capital próprio, é construído sobre a premissa de que a variância de retornos é a medida de risco apropriada, mas apenas aquela porção de variação que é não-diversificável é recompensada, ou seja, parte do risco em qualquer ativo individual pode ser eliminado através da diversificação. 14. O método assume que o prêmio de risco requerido pela ação é proporcional ao seu coeficiente beta, o qual mede a volatilidade e indica a variação dos retornos da ação de uma determinada empresa em relação ao comportamento do mercado acionário. Portanto, o beta de um título nada mais é do que uma medida de risco de um título em uma carteira ampla e significa o quanto esse título deverá variar quando o mercado variar de uma unidade percentual, ou seja, é a sensibilidade das ações às variações percentuais do valor da carteira de mercado. 15. Nesse modelo, o retorno esperado sobre o ativo será a soma de uma taxa livre de risco e um retorno associado a um risco não-diversificável, o que faz com que o retorno esperado varie linearmente com relação ao beta do ativo.

16. Existem diversas dificuldades no uso do CAPM para calcular o custo de capital próprio, em razão das hipóteses bastante fortes sobre os agentes econômicos e as características dos mercados de capitais. 17. Entretanto, acreditamos que algumas especificidades encontradas no mercado acionário local, ainda impedem que o CAPM local possua robustez.

18. O gráfico abaixo ilustra a valorização obtida pelo Ibovespa, principal índice acionário brasileiro e a valorização acumulada da taxa SELIC, principal taxa de juros do mercado brasileiro.

(Fls. 4 da Nota Técnica no 89/2014-SRE/ANEEL, de 21/03/2014.)

* A Nota Técnica é um documento emitido pelas Unidades Organizacionais e destina-se a subsidiar as decisões da Agência.

Gráfico 1: Valorização Acumulada SELIC x Ibovespa

19. Embora em alguns períodos de tempo a linha azul representada pelo Ibovespa esteja mais inclinada que a linha vermelha representada pela SELIC, podemos perceber que o prêmio de risco do mercado acionário brasileiro é, na maior parte do tempo, negativo. 20. Embora esse fato, por si só, já seja suficiente para distorcer completamente as premissas do CAPM, soma-se a isso o constante uso da taxa Selic para política monetária e ainda o fato de termos um índice acionário extremamente concentrado. As tabelas abaixo ilustram a participação das principais empresas pertencentes ao Ibovespa, e ao IBRX-100, dois dos principais índices acionários brasileiros.

Tabela 1: Participação conjunta das 6 empresas com maior representatividade no IBOVESPA. Principais Empresas - IBOVESPA

Petrobrás 12,08% Vale 11,78% Itaú 9,27%

Bradesco 5,33% Ambev 3,81%

Banco do Brasil 2,72% Total 44,98%

Tabela 2: Participação conjunta das 7 empresas com maior representatividade no IBRX 100. Principais Empresas - IBRX 100 Petrobrás 9,73%

Vale 9,92% Itaú 8,19%

Ambev 8,33% Bradesco 6,17% BR Foods 4,10%

(Fls. 5 da Nota Técnica no 89/2014-SRE/ANEEL, de 21/03/2014.)

* A Nota Técnica é um documento emitido pelas Unidades Organizacionais e destina-se a subsidiar as decisões da Agência.

Ultrapar 3,06% Total 49,49%

21. Como se pode perceber, os índices acionários locais são extremamente concentrados, podendo causar distorções no beta das empresas, além de não representarem corretamente o risco de mercado. 22. Portanto, a utilização do CAPM local além de não resolver os problemas implícitos no modelo, poderia trazer ainda mais inconsistências, tornando o seu resultado ainda mais frágil, volátil e contestável. 23. Assim a SRE mantém o cálculo do custo de capital próprio para empreendimentos de geração de energia elétrica no mercado brasileiro a partir do CAPM aplicado aos Estados Unidos, com a adaptação de risco associado às especificidades do mercado local. Desse modo, ao CAPM padrão adicionam-se o prêmio de risco Brasil (rB) e adapta-se o beta calculado para o mercado norte-americano com a estrutura de capital e carga tributária brasileiros. 24. Adiante será demonstrado o cálculo realizado para cada um dos componentes do WACC, qual seja a Estrutura de Capital, Custo de Capital Próprio e Custo de Capital de Terceiros. III.1.2 – Estrutura de Capital 25. A estrutura de capital diz respeito às participações de capital próprio e de capital de terceiros no capital total investido por uma empresa. A definição de uma estrutura ótima de capital tem por objetivo estabelecer uma estrutura de capital consistente com os fins da regulação econômica por incentivos e não necessariamente se confunde com a estrutura de capital efetiva da empresa. 26. De um modo geral, a estrutura ótima de capital é definida como aquela estrutura que, dado o grau de risco envolvido no negócio e a existência de proteções fiscais para pagamentos de juros incidentes sobre dívida, apresenta participações de capital (próprio e de terceiros) que conduzem ao mínimo custo de capital, representando, assim, uma alocação de capital eficiente.

27. A determinação da estrutura ótima de capital é essencial para o uso do modelo de Custo Médio Ponderado de Capital (WACC) e, consequentemente, para o cálculo da taxa de retorno do ativo de geração.

28. Diversas contribuições foram recebidas em relação á estrutura de capital. Enquanto algumas contribuições sugeriam a utilização da média ponderada no cálculo da estrutura média do setor, o que tornaria a estrutura menos alavancada, outras contribuições solicitavam o uso de uma estrutura de capital mais alavancada, mais próxima à estrutura média do setor de transmissão. Também houveram contribuições questionando a viabilidade de uma estrutura regulatória com base no comprometimento do fluxo de caixa,a partir de parâmetros de endividamento utilizados no mercado.

29. Quanto à utilização da média ponderada, esta não foi acatada, pois a amostra das 133 empresas é composta de empresas com escalas muito diferentes, de forma que ponderar a amostra poderia

(Fls. 6 da Nota Técnica no 89/2014-SRE/ANEEL, de 21/03/2014.)

* A Nota Técnica é um documento emitido pelas Unidades Organizacionais e destina-se a subsidiar as decisões da Agência.

gerar resultados distorcidos pelo excesso de peso que teriam as maiores empresas da amostra, e do pouco peso que teriam as menores empresas.

30. Já quanto à utilização de uma estrutura de capital mais alavancada, supostamente justificada pelo menor risco da geração regulada frente ao regime praticado pelas empresas consideradas na amostra entende-se que a capacidade de alavancagem de um negócio está relacionada à qualidade e previsibilidade dos recebíveis e à natureza do ativo financiado, itens que podem ser dados em garantia ao financiador. No setor elétrico essas garantias são robustas, independentemente do segmento.

31. No que diz respeito a viabilidade da estrutura regulatória a partir de indicadores de mercado, a ANEEL discorda dessa abordagem. Para tornar o cálculo da estrutura aderente à realidade de mercado são utilizados dados reais de diversas geradoras. A estipulação de uma alavancagem regulatória exige a adoção de premissas sobre o financiamento dos ativos que deverão ser objeto de discussão e, ao invés de se aproximar dos parâmetros de mercado, pode afastar-se desses parâmetros, que são refletidos implicitamente na média da estrutura praticada pelas empresas do segmento.

32. Todavia, observa-se que a alavancagem média de cada segmento varia. Essa variação pode ser fruto de uma percepção de risco do financiador associada ao regime econômico-financeiro das receitas do financiado ou à natureza dos ativos financiados, como valor unitário ou possibilidade de revenda. Entretanto, não é possível inferir qual a razão que prevalece para os geradores em regime de cotas, dada a inexistência de dados de alavancagem para investimentos já realizados sob a vigência do regime. Em função dessa incerteza, a ANEEL optou por um perfil de alavancagem mais conservador, com a hipótese de que a natureza dos ativos é mais relevante na avaliação do financiador.

33. Desta forma, decidiu-se por manter a estrutura de capital proposta inicialmente, na Nota Técnica nº 361/2013, no valor de 50,00%.

III.2. CUSTO DO CAPITAL PRÓPRIO III.2.1 – Aspectos Gerais 34. A opção feita pela ANEEL para o cálculo do custo de capital próprio é o modelo do CAPM (Capital Asset Pricing Model). O CAPM assume que o prêmio de risco requerido pela ação é proporcional ao seu coeficiente beta, que mede a volatilidade e indica a variação do retorno da ação de uma determinada empresa em relação ao comportamento do mercado acionário. 35. Para a aplicação do modelo CAPM é necessário calcular o custo de capital próprio de maneira construtiva, começando pela taxa livre de risco, que representa o prêmio de liquidez, adicionando-se os prêmios referentes a cada risco associado ao capital próprio aplicado em um empreendimento de geração de energia elétrica (prêmios de risco do negócio, financeiro e risco país). 36. Uma questão básica da metodologia diz respeito ao objetivo que se almeja com o cálculo do custo de capital. O que se pretende no estudo apresentado nesta Nota Técnica é obter um taxa de retorno que será aplicada no próximo ciclo tarifário, de modo a remunerar, pelos próximos anos, o aporte de recursos realizado na empresa. Não se deseja apenas demonstrar qual o valor do custo de capital obtido pelo investidor no passado, ou o exigido na data mais recente, mas sim estimar a expectativa de retorno exigida

(Fls. 7 da Nota Técnica no 89/2014-SRE/ANEEL, de 21/03/2014.)

* A Nota Técnica é um documento emitido pelas Unidades Organizacionais e destina-se a subsidiar as decisões da Agência.

pelo investidor para o aporte de recursos na atividade de geração de energia elétrica nos termos da Lei n° 12.783/2013.

37. Exceto para o caso de se estimar o custo de financiamento de terceiros, não há dados suficientes disponíveis no mercado que informem com clareza as expectativas dos investidores quanto ao custo do capital3. Existem basicamente três abordagens para a determinação do custo de capital: Determinação através de dados históricos, determinação através de projeções (foward-looking) e a determinação através de pesquisas realizadas junto aos agentes. 38. Cada uma dessas abordagens possui pontos fortes e fracos distintos e conduziram a resultados diferentes, sendo que diferenças ainda poderão ocorrer em decorrência dos períodos utilizados, séries utilizadas, etc. O cálculo realizado pela ANEEL adota como estimativa das expectativas dos agentes indicadores baseados em dados históricos, a partir da premissa de que as informações do passado consistem em confiável indicador do comportamento futuro.

39. A discussão a respeito do período da série para os componentes de risco do cálculo do WACC (custo de capital próprio e de terceiros) envolve necessariamente uma escolha técnica. O objetivo da metodologia do custo de capital é estimar o custo de oportunidade do capital para empreendimentos de risco semelhante à atividade de geração regulada de energia no Brasil. O objetivo da ANEEL ao estabelecer o período para as séries históricas é alcançar um equilíbrio entre a atualidade e estabilidade, tendo em conta a perspectiva para os próximos anos. III.2.2 – Taxa Livre de Risco 40. A taxa livre de risco é a remuneração referente ao custo do tempo, isto é, a remuneração exigida pelo investidor por abrir mão da liquidez corrente em troca de liquidez futura: é o retorno esperado pelo investidor em manter um ativo que não apresenta qualquer risco associado. 41. Ao longo da Audiência Pública 002/2013 foram recebidas algumas contribuições referente a esse componente de risco. Basicamente, as contribuições sugeriam a redução do prazo considerado para 5 ou para 10 anos neste componente.

42. Tais contribuições não foram acatadas pois verifica-se que a consideração de períodos de tempo implica em aumento indesejado na volatilidade da série além que se correr o risco de, por exemplo, tal consideração levar a valores que não sejam interessantes pelo objetivo almejado pela ANEEL.

43. Cita-se como exemplo para ilustrar tal fato, a recente crise subprime iniciada em 2008 nos EUA onde as taxas de juros desde então foram mantidas artificialmente baixas com o propósito de estimular a economia americana. Portanto, a utilização de períodos de tempo muito curtos faria com que a política monetária americana tivesse uma influência excessiva e indesejada no valor final desse componente, destorcendo o seu valor para mais, ou para menos.

3 JENKINSON, Tim. Regulation and the Cost of Capital. Said Business School, Oxford University and CEPR. In: International Handbook on Economic Regulation. ed. CREW, Michael; PARKER, David.; Edward Elgar. 2006.

(Fls. 8 da Nota Técnica no 89/2014-SRE/ANEEL, de 21/03/2014.)

* A Nota Técnica é um documento emitido pelas Unidades Organizacionais e destina-se a subsidiar as decisões da Agência.

44. Assim, no modelo utilizado pela ANEEL, optou-se por utilizar um título de renda fixa do bônus do tesouro americano tipo “USTB10”, para se estimar a taxa livre de risco. Esse título possui prazo de 10 anos e não faz pagamento periódico de cupom (zero-coupom). Utilizou-se uma série de dados anuais da cotação deste título no período de 01/1995-12/2012, conforme mostrado na figura abaixo, obtendo-se, através de média aritmética, uma taxa de juros média anual de 4,59%.

Gráfico 2: Taxa Livre de Risco

III.2.3 – Prêmio de Risco de Mercado 45. O prêmio de risco de mercado mede a diferença entre o retorno esperado no mercado acionário (investimento com risco) e o retorno de títulos livre de risco. Para se estimar o prêmio de risco de mercado, subtrai-se a taxa livre de risco do retorno médio anual da série histórica dos retornos do portfólio do mercado de referência. No caso de se usar os Estados Unidos como mercado de referência uma boa proxy de um portfólio de mercado é o S&P500, que consiste em um índice composto pelas ações das 500 maiores empresas negociadas na Bolsa de Nova York. 46. Para a estimativa do prêmio por risco do mercado devem ser considerados dois aspectos importantes: o período que será tomado como referência e a técnica estatística utilizada para o cálculo das médias. Em razão da volatilidade excessiva existente no mercado acionário, no qual um único evento na economia (choque inflacionário; políticas fiscais e monetárias; condições adversas no mercado de capitais) ocasiona mudanças bruscas na percepção de risco pelo investidor, o uso de períodos muito curtos pode levar a estimativas de retorno do capital erradas. Por esta razão, para este componente de risco deve-se considerar um período o mais extenso possível, havendo disponibilidade de dados, como uma maneira de eliminar estas anomalias, basicamente relacionadas com o ciclo econômico.

47. Em relação a este componente, algumas contribuições foram recebidas sugerindo que se utilizasse no cômputo do prêmio de risco de mercado, a mesma taxa livre de risco utilizada como componente do CAPM, ou seja, uma taxa livre de risco baseada num período mais curto, e mais recente.

(Fls. 9 da Nota Técnica no 89/2014-SRE/ANEEL, de 21/03/2014.)

* A Nota Técnica é um documento emitido pelas Unidades Organizacionais e destina-se a subsidiar as decisões da Agência.

48. Ressaltamos que, o objetivo da ANEEL ao definir o custo de capital é chegar a uma taxa realista com base em premissas que se mostrem bem fundamentadas. Entendemos que a série de retornos de mercado é muito extensa, de modo que a realidade nos EUA em 1928 era completamente diferente do que é hoje.

49. Pode ser observada ao longo das últimas décadas, principalmente nos países desenvolvidos, uma tendência de redução gradual das taxas de juros. Tal redução acaba viabilizando novos investimentos ao longo do tempo, que não eram viáveis no início da série, além do surgimento de outras oportunidades de investimento com o avanço da tecnologia, de forma que, tanto o retorno de mercado, quanto o patamar ideal de taxa livre de risco sofram profundas mutações ao longo do tempo. 50. Dessa forma, com base nas séries históricas de 1928 a 2012, foi determinada a série mensal do retorno do mercado (“excedente”) como resultado da diferença entre a taxa de retorno do mercado acionário (S&P500) e a taxa do bônus do tesouro americano de mesmo período. Obtém-se, dessa forma, uma taxa anual média (aritmética) de prêmio do mercado acionário de 5,79% a.a.

III.2.4 – Prêmios de Risco do Negócio e Financeiro III.2.4.1 – Beta 51. O beta reflete os diversos tipos de risco: o risco do negócio e o risco financeiro. O risco do negócio pode ser definido como o grau de incerteza em relação à projeção do retorno sobre o ativo total inerente ao negócio, que não pode ser eliminado por diversificação. Em linguagem técnica, é o risco sistemático (não diversificável) quando todo o capital da empresa é capital próprio. O risco financeiro é o risco adicional devido ao uso de capital de terceiros no financiamento do projeto, isto é, o risco adicionado ao projeto devido à alavancagem financeira. 52. O cálculo do beta a ser utilizado para a determinação da taxa de retorno envolve o cálculo do beta de empresas pertencentes ao setor regulado de interesse e ao mercado de referência (empresas de transmissão energia elétrica nos Estados Unidos) e a posterior desalavancagem desses betas utilizando o grau de alavancagem das empresas do mercado de referência e a alíquota de imposto aplicável, no mercado de referência.

53. Posteriormente, esse beta é realavancado pela estrutura de capital regulatória definida, considerando a alíquota de impostos aplicável do Brasil, para o setor de interesse, de modo que se obtenha o beta total. O beta total, quando multiplicado pelo prêmio de risco de mercado representa o risco não diversificável, composto pelo risco do negócio e pelo risco adicional decorrente do uso de dívida.

54. A principal dificuldade para se calcular o beta do setor de geração é a busca de empresas americanas com exposição ao risco compatível com o desempenho dessa atividade no Brasil. Essa situação é ainda mais complexa dadas as características do regime de geração definido na Lei 12.783, de 2013 (regime de cotas), em que o risco hidrológico e o risco de mercado são repassados aos consumidores e o preço não pode ser livremente fixado pelos geradores, sendo a contraprestação do serviço arrecadada por meio de uma receita teto fixada pela ANEEL. Também vale notar que eventual ampliação da capacidade

(Fls. 10 da Nota Técnica no 89/2014-SRE/ANEEL, de 21/03/2014.)

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instalada da usina em regime de cotas está sujeita a autorização pelo Poder Concedente e a destinação dessa capacidade adicional está sujeita ao mesmo regime de exploração da capacidade atual.

55. Esse regime tornou a atividade de geração muito semelhante à atividade de transmissão, de modo que optou-se pela mesma amostra utilizada na definição do beta desse segmento. Assim, para se proceder ao cálculo dos betas, foram escolhidas as mesmas empresas americanas selecionadas para o setor de transmissão de energia elétrica, membros do Edison Eletric Institute, representando aproximadamente 70% de toda indústria nacional. Cabe esclarecer que as empresas selecionadas apresentam estruturas verticalizadas, muitas vezes com ativos de geração, transmissão e distribuição, onde os ativos conjuntos de geração, transmissão e distribuição representassem pelo menos 50% dos ativos totais.

56. Algumas contribuições foram recebidas ao longo da Audiência Pública 002/2013 com algumas sugestões em relação ao cálculo do beta. Basicamente as seguintes sugestões foram feitas: Utilização do mesmo beta utilizado para o setor de transmissão, ajuste no beta devido à crise de 2008, ajuste no beta histórico com base em expectativas e considerar a empresa Central Hudson Gas & Eletric Corp novamente na amostra, uma vez que ela foi incorporada após o ano de 2012.

57. Não enxergamos como correta a utilização de exatamente o mesmo beta realavancado utilizado no setor de transmissão, uma vez que o beta realavancado observa a estrutura específica estimada para a geração, sendo por esta razão, diferente do beta estimado para a transmissão. 58. Também não julgamos correto o procedimento de expurgo dos efeitos da crise de 2008 da série. É inegável que houve um aumento da volatilidade do mercado americano como um todo em decorrência da crise, o que pode ter tido influência na redução do beta do setor de interesse. Porém, é praticamente impossível definir com precisão, quais foram esses efeitos decorrentes da crise, e quais os dados deveriam ser expurgados da série, contendo o procedimento uma grande dose de subjetividade. Além disso, acreditamos que o período considerado é suficientemente longo para que tais efeitos (se realmente ocorreram) não distorçam significativamente os resultados obtidos. 59. Quanto ao ajuste no beta por expectativas, a ANEEL optou por realizar seus cálculos com dados históricos para todas as séries. Qualquer projeção ou previsão é dotada de incerteza, pois assume premissas para o comportamento de variáveis dinâmicas. Ainda que a utilização de dados históricos apresente limitações, a ANEEL considera essa prática mais prudente do que projetar todas as variáveis do modelo multiplicando, exigindo a discussão das premissas envolvidas em cada projeção. 60. A respeito da retirada da empresa Central Hudson Gas & Eletric Corp da amostra, compreendemos que as séries de dados finalizavam em dezembro de 2012, e a incorporação da empresa (razão da retirada da amostra) deu-se apenas após essa data. Portanto, a empresa será mantida na amostra para o cálculo do beta. 61. Desse modo, foram selecionadas 15 empresas para as quais se obteve o beta médio das ações, calculado para o período de 250 semanas, obtendo-se o valor de 0,65. A partir da estrutura de capital dessas empresas e utilizando-se a alíquota de imposto de 39,30%4, obteve-se o beta desalavancado médio igual a 0,44. Os resultados são apresentados na tabela a seguir:

4 Tax Foundation. Disponível em: www.taxfoundation.org

(Fls. 11 da Nota Técnica no 89/2014-SRE/ANEEL, de 21/03/2014.)

* A Nota Técnica é um documento emitido pelas Unidades Organizacionais e destina-se a subsidiar as decisões da Agência.

Tabela 3: Empresas, Estrutura e Beta

Empresa Beta Estrutura de Capital Beta DesalavancadoAmeren Corp. 0,79 0,46 0,52

American Eletric Power Service Corp. 0,64 0,44 0,43 Avista Corp. 0,62 0,46 0,41

Central Hudson Gas & Electric Corp. 0,53 0,34 0,40 Duke Energy 0,53 0,44 0,36

Exelon Corporation 0,78 0,41 0,55 FirstEnergy Service Company 0,66 0,53 0,39

ITC Transmission 0,76 0,42 0,53 Nextera 0,66 0,47 0,43

Northeast Utilities System 0,59 0,41 0,41 Pepco Holdings, Inc. 0,86 0,54 0,50

PG&E 0,40 0,42 0,28 Public Service Enterprise Group 0,63 0,33 0,49

Portland General Electric Co. 0,62 0,41 0,43 Westar Energy, Inc. 0,65 0,46 0,43

0,65 0,44 0,44

III.2.4.2 – Prêmio de Risco do Negócio e Financeiro 62. Através da realavancagem do beta calculado acima pela estrutura de capital definida no valor de 50%, chega-se a um beta realavancado no valor de 0,73 que multiplicado pelo prêmio de risco de mercado resulta num prêmio de risco do negócio e financeiro no valor de 4,23%. III.2.5 – Prêmio de Risco País 63. O risco país pode ser entendido como o risco adicional que um projeto incorre ao ser desenvolvido em um determinado país de economia emergente e instável ao invés de em um país com economia desenvolvida, estável e de risco zero (ou o mais próximo de zero possível). No jargão financeiro, é entendido como o diferencial da paridade coberta das taxas de juros, que afeta os rendimentos de todos os ativos financeiros emitidos em um dado país. 64. O risco país procura medir a desconfiança dos investidores quanto ao cumprimento ou não do reembolso prometido pelo devedor soberano na data de vencimento dos títulos por ele emitidos, ou seja, o investidor está interessado em quanto deveria ser recompensado por aplicar em papéis que embutem certa possibilidade de default (não recebimento). Considerando-se o risco dos Estados Unidos como “zero”, a taxa paga pelo governo desse país será a base comparativa de cálculo utilizada pelo investidor. 65. O risco país deve captar todas as barreiras à integração dos mercados financeiros e os fatores que influenciam a capacidade de um país em honrar seus compromissos externos (risco de moratória): como custos de transação, custos de informação, controle de capitais, leis sobre tributação que discriminam por país de residência, risco de futuros controles cambiais, ataques especulativos sobre a

(Fls. 12 da Nota Técnica no 89/2014-SRE/ANEEL, de 21/03/2014.)

* A Nota Técnica é um documento emitido pelas Unidades Organizacionais e destina-se a subsidiar as decisões da Agência.

economia, estabilidade econômica e institucional, equilíbrio fiscal, etc. É o entendimento que o prêmio de risco exigido para o aporte de recursos em um empreendimento está relacionado ao risco de default do país no qual o investimento será realizado5. 66. Para representar o componente de risco país, a ANEEL optou por utilizar o EMBI+BR. As vantagens da utilização desse índice são inúmeras, destacando-se: reflete de forma mais fidedigna o risco país do que um só “papel”, já que é uma média de diversos títulos; é resultado de critérios transparentes e objetivos de mensuração; tem uma série consistente, que deve perdurar; e é muito utilizado pelo mercado como o indicador do prêmio de risco país. Esse índice já é cotado como o spread sobre a taxa de juros de títulos do governo dos EUA com mesma duration. 67. Em relação ao uso da mediana para o risco país, cabe ressaltar que o objetivo é dar pesos iguais a todos os dados da série, em razão da existência de pontos extremos no passado. Tendo em vista que ao utilizar a média o peso de cada evento no resultado é proporcional ao desvio em relação à média, os eventos relacionados aos pontos extremos seriam potencializados, em detrimento dos demais, que inclusive são os mais recentes.

68. Diversas contribuições foram recebidas ao longo da Audiência Pública 002/2013 contendo sugestões alternativas para o cálculo do componente de risco país. As contribuições solicitavam principalmente a redução da extensão da série de risco país e alteração da medida de tendência central a ser utilizada. A ANEEL entende que o assunto já foi profundamente discutido ao longo de diversas audiências públicas, na definição das metodologias referentes ao setor de distribuição, de forma que temos convicção de que o tratamento adotado é coerente com as características da série deste componente de risco.

69. Entendemos, portanto, que utilizar a mediana é o tratamento estatístico correto para a série do risco país. Além dos argumentos acima apresentados, entendemos que o valor mediano proposto pela ANEEL, 3,52% referentes ao EMBI+BR de janeiro de 2000 a dezembro 2012, é bastante consistente. 70. O gráfico a seguir apresenta a série de spread soberano Brasil representada pelo EMBI+ BR, no período de 2000-2012.

5 CAMACHO, Fernando. Custo de Capital de Indústrias Reguladas no Brasil. Revista do BNDES. Rio de Janeiro. v.11,n.21, p.139-164, jun.2004. e GRANDES; PANIGO; PASQUINI. The Cost of Corporate Bond Financing in Latin América. LACEA-LAMES 2008 annual meeting. Rio de Janeiro. 2008.

(Fls. 13 da Nota Técnica no 89/2014-SRE/ANEEL, de 21/03/2014.)

* A Nota Técnica é um documento emitido pelas Unidades Organizacionais e destina-se a subsidiar as decisões da Agência.

Gráfico 3: Risco País

III.2.6 – Prêmio de Risco Cambial 71. No modelo considerado, a ANEEL entende que não deve ser incluído um prêmio adicional de risco cambial. Diversas contribuições foram recebidas argumentando existir evidencias da existência de um prêmio de risco cambial adicional ao se comparar títulos brasileiros denominados em dólar e em reais. 72. Entende-se que o prêmio de risco cambial observado nesses títulos de longo prazo decorre basicamente da incerteza em relação ao comportamento da inflação brasileira ao longo da existência do título, uma vez que a desvalorização do real frente ao dólar devido à deterioração de fundamentos macroeconômicos, desajustes fiscais, saldo do balanço de pagamentos, possibilidade de ataques especulativos, dentre outros, deve ser compensada pelo diferencial da paridade coberta das taxas de juros, já considerado no componente de risco país.

73. Uma vez que o custo de capital representa uma taxa real, e a inflação brasileira é repassada integralmente, todo o risco cambial de longo prazo (não considerado no diferencial de paridade coberta) é eliminado.

74. Quanto à cobertura do risco cambial de curto prazo, esta só faz sentido para componentes de custo que impactem o fluxo de caixa da empresa, entendimento que não se estende ao patrimônio líquido ou ao passivo atrelado ao real, de modo que não existe justificativa para inserir tal cobertura no WACC.

75. Dessa forma, entendemos que não deve ser incluído nenhum componente de prêmio de risco cambial no WACC.

(Fls. 14 da Nota Técnica no 89/2014-SRE/ANEEL, de 21/03/2014.)

* A Nota Técnica é um documento emitido pelas Unidades Organizacionais e destina-se a subsidiar as decisões da Agência.

III.2.7 – Prêmio de Risco Regulatório 76. Ao longo da Audiência Pública 002/2013 foram enviadas algumas contribuições no sentido de se considerar no modelo CAPM utilizado para a determinação do custo de capital, um componente de prêmio de risco regulatório. 77. Entendemos que toda atividade econômica é exercida sob um maior ou menor grau de regulação do Estado. O exercício dessa regulação afeta a percepção de risco das atividades desenvolvidas no país, alterando a precificação dos ativos e as taxas de juros implícitas nessas precificações. A ANEEL reitera o argumento de que essa percepção de risco regulatório em nível nacional já está refletida no risco país, ajustando a relação entre o mercado americano e o mercado brasileiro.

78. A inclusão de um adicional de risco regulatório no setor elétrico parte do princípio de que a exposição a risco nesse setor é diferente da exposição a risco do restante da economia, em função de as atividades do setor elétrico serem mais intensivamente reguladas que as demais. Ou seja, trata-se de uma exposição relacionada à regulação num nível microeconômico. Assumindo que todos os ativos partem de um mesmo patamar de risco regulatório nacional ajustado pelo risco país, o que se procura saber é se o setor elétrico teria pior desempenho na relação de risco e retorno que o restante do mercado.

79. As dificuldades emergem exatamente ao se buscar uma mensuração desse desempenho e se essa mensuração resulta num componente positivo ou negativo na definição do custo de capital próprio. Para tanto, é preciso identificar um comportamento sistemático que torne o setor elétrico brasileiro mais (ou menos) arriscado e mais (ou menos) rentável que o restante das atividades econômicas desempenhadas no país. O que se observa, entretanto, utilizando-se dados do mercado acionário brasileiro, é uma convalidação da hipótese de suavização de efeitos (hipótese Peltzmann) e até comportamento contracíclico em alguns momentos para as ações do setor elétrico.

80. Observa-se também que mesmo eventos substanciais de intervenção regulatória no setor elétrico, tais como a edição da Medida Provisória nº 579, tem seus efeitos mitigados em curto espaço de tempo. É sabido que a previsibilidade de receitas e os diversos mecanismos de proteção ao equilíbrio econômico e financeiro das atividades do setor elétrico são considerados vantagens para obtenção de crédito junto às instituições financeiras, indicando que exercício do negócio regulado é menos arriscado pela natureza da atividade e pelas garantias do aparato regulatório.

81. Em relação às diferenças de regimes regulatórios, como custo do serviço, preço teto e receita teto, um boletim de 31 de março de 2009, emitido pela Lazard Asset Mangement, gestora internacional de fundos investidos em ações de empresas que prestam serviços públicos em países desenvolvidos, apresenta a visão de mercado a respeito do regime regulatório praticado nos Estados Unidos (custo do serviço e regulação por Estado Federado) vis-à-vis ao regime praticado em outros países com regulação por incentivos centralizada (similar ao Brasil).

82. Segundo a Lazard a regulação nos Estados Unidos é menos amigável aos investidores, exigindo maior margem de segurança nas operações com ações nesse país. Isso porque o regime de custo do serviço implica num processo quase judicial, sem regras predefinidas, cujos resultados estão sujeitos a fortes interferências políticas, sujeitos a alto grau de subjetividade e com resultados historicamente prejudiciais as empresas em termos de remuneração do capital e recomposição de inflação.

(Fls. 15 da Nota Técnica no 89/2014-SRE/ANEEL, de 21/03/2014.)

* A Nota Técnica é um documento emitido pelas Unidades Organizacionais e destina-se a subsidiar as decisões da Agência.

83. Além dos argumentos citados, verifica-se que, ao se analisar o comportamento do principal índice setorial brasileiro, o IEE, que não existem evidências da presença de um risco adicional, relacionado ao setor elétrico. 84. O gráfico abaixo mostra o desempenho do IEE e o desempenho do Ibovespa ao longo da última década. Pode-se verificar que a valorização do IEE, ao longo do tempo, foi superior a valorização do Ibovespa, principal índice acionário brasileiro.

Gráfico 4: Valorização IEE x IBOVESPA

85. Quanto ao risco associado ao IEE, verifica-se pelo comportamento do desvio padrão dos retornos, calculado para 252 dias úteis, que este se manteve na maior parte do tempo em patamares inferiores ao do desvio padrão do Ibovespa, indicando que, além de uma maior rentabilidade, o risco medido no IEE se mostrou menor. O gráfico abaixo ilustra tal comportamento.

Gráfico 5: Volatilidade IEE x IBOVESPA

86. Finalmente ao analisar o Beta, verifica-se que este se manteve na maior parte do tempo em patamares abaixo de 1,00 indicando também um menor risco, quando comparado ao risco de mercado brasileiro.

(Fls. 16 da Nota Técnica no 89/2014-SRE/ANEEL, de 21/03/2014.)

* A Nota Técnica é um documento emitido pelas Unidades Organizacionais e destina-se a subsidiar as decisões da Agência.

Gráfico 6: Beta IEE x IBOVESPA

III.2.7 – Resultados sobre o Custo de Capital Próprio 87. Como as tarifas são reajustadas por um índice de inflação, interessa-nos ter o custo de capital expresso em termos reais. 88. Algumas contribuições sugeriram a adoção da expectativa de inflação do FED no lugar da inflação histórica considerada. Tais contribuições não foram acatadas, pois não consideramos prudente determinar alguns componentes do modelo CAPM através de valores históricos e outros através de expectativas, pois isso poderia gerar resultados não realistas.

89. Caso se opte pela utilização de um modelo baseado em expectativas, acreditamos que todos os componentes (ou, ao menos, todos os que forem possíveis) deveriam ser determinados dessa forma. 90. Dessa forma, a taxa de inflação foi determinada pela média anual dos EUA no período de 1995-2012, chegando-se ao valor de 2,47%, o que resulta em um custo de capital próprio real de 9,63%. O período considerado para o cálculo da inflação média é o mesmo adotado para o ativo livre de risco e risco de crédito.

Tabela 4: Custo do Capital Próprio Componente Prêmio

Taxa livre de risco 4,59% Prêmio de risco do negócio 4,23% Prêmio de risco Brasil 3,52% Custo de Capital (nominal) 12,34% Custo de Capital (real) 9,63%

(Fls. 17 da Nota Técnica no 89/2014-SRE/ANEEL, de 21/03/2014.)

* A Nota Técnica é um documento emitido pelas Unidades Organizacionais e destina-se a subsidiar as decisões da Agência.

III.3. CUSTO DO CAPITAL DE TERCEIROS 91. O custo do capital de terceiros é o retorno que os credores da dívida da empresa demandam ao realizar novos empréstimos a esta. Pode-se calcular o custo de capital de terceiros nominal a partir das últimas emissões de dívida feitas por empresas do setor de interesse. Uma forma alternativa de estimá-lo, caso não haja um número suficiente e regular de emissões, seria a partir da taxa livre de risco mais os prêmios associados aos diversos riscos de empréstimos ao setor regulado de interesse: risco de crédito e risco país. 92. Para o custo de capital de terceiros propõe-se uma abordagem similar à do capital próprio, ou seja, trata-se de adicionar à taxa livre de risco os prêmios de risco adicionais exigidos para se emprestar recursos a uma concessionária de geração no Brasil. Esse enfoque impede que as tarifas sejam afetadas por uma gestão financeira imprudente na captação de recursos de terceiros ou por decisões de captação de dívidas vinculadas a outros interesses, contrários à eficiência máxima. 93. A estimação do custo de capital de terceiros tem como componentes a taxa livre de risco, o prêmio de Risco de Crédito e o prêmio de Risco Brasil. Os critérios para o cálculo da taxa livre de risco e do prêmio de Risco Brasil já foram apresentados. Resta apresentar como apurar o prêmio de Risco de Crédito. 94. O prêmio de Risco de Crédito deve representar o spread sobre a taxa livre de risco que pagam as empresas com a mesma classificação de risco das geradoras de energia elétrica brasileiras. Para isso, a tabela abaixo apresenta os ratings em maio de 2013 para as empresas de energia elétrica do Brasil que possuem classificação na agência de risco Moody´s.

Tabela 5: Ratings de Empresas Brasileiras do Setor Elétrico que atuam no Setor de Geração Empresa RatingAESTiete Baa3Cemig GT Baa3

Duke Energy Paranapanema Baa3Energest Baa3

Alupar Ba1CESP Ba1

Light Energia Ba1CPFL Energias Renováveis Ba2

Desenvix Energias Renováveis Ba3 Fonte: Lista de Ratings da Moody´s Para o Brasil – maio de 2013

*Escala Global Moeda Local 95. A tabela anterior mostra os ratings obtidos pelas empresas de geração que servirão de base para o cálculo do risco de crédito. 96. A partir da média, de janeiro de 1995 a dezembro de 2012, dos spreads relacionados aos ratings de cada empresa foi calculada uma média global. O risco de crédito resultante foi de 2,93%.

97. Portanto, foram acatadas as contribuições que solicitavam a consideração da média global, uma vez que a exclusão do quartil superior poderia nesse caso, subestimar a média de captação do setor.

(Fls. 18 da Nota Técnica no 89/2014-SRE/ANEEL, de 21/03/2014.)

* A Nota Técnica é um documento emitido pelas Unidades Organizacionais e destina-se a subsidiar as decisões da Agência.

98. Por fim, obtém-se um custo de capital de terceiros em termos nominais igual a 11,03% que utilizando a taxa de inflação média anual dos EUA no período de 1995-2012 (2,47%), resulta em um custo de capital de terceiros real de 8,36%, conforme a tabela abaixo.

Tabela 6: Custo do Capital de Terceiros Componente Prêmio

Taxa livre de risco 4,59% Prêmio de risco Brasil 3,52% Prêmio de risco de crédito 2,93% Custo de Capital (nominal) 11,03% Custo de Capital (real) 8,36%

III.4. TAXA DE DESCONTO PARA CONCESSIONÁRIAS DE GERAÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA NO BRASIL 99. A partir dos resultados apresentados anteriormente, pode-se enfim calcular a taxa de retorno adequada para os serviços de geração de energia elétrica no Brasil através do Custo Médio Ponderado de Capital (WACC), dado por:

)1( TrDP

DrDP

Pr DPWACC

(1)

Aplicando à equação acima a alíquota de imposto (T) igual a 34%, obtém-se o custo de capital para a estrutura de capital sugerida. Deflacionando-se o custo nominal (equação 10) pela taxa de inflação média anual dos EUA no período de 1995-2012 de 2,47%, obtém-se enfim o WACC em termos reais depois de impostos de 7,16%, cujos resultados detalhados são mostrados na tabela abaixo.

(Fls. 19 da Nota Técnica no 89/2014-SRE/ANEEL, de 21/03/2014.)

* A Nota Técnica é um documento emitido pelas Unidades Organizacionais e destina-se a subsidiar as decisões da Agência.

Tabela 7: Custo Médio Ponderado do Capital – WACC

Estrutura Ótima de CapitalCapital Próprio = (P/V) 50,00%

Capital de Terceiros = (D/V) 50,00%

Custo de Capital Próprio

Taxa Livre de Risco = r f 4,59%

Prêmio de risco de Mercado = r m - r f 5,79%

Beta médio desalavancado = β RRDesalav

0,44

Beta médio alavancado = β RRAlav

0,73

Risco do Negócio = β.( r m - r f ) 4,23%

Prêmio de risco país = r B 3,52%

Custo de capital próprio nominal = r P 12,34%

Custo de Capital de TerceirosPrêmio de Risco de Crédito = R c 2,93%

Custo de Dívida Nominal = r D 11,03%

Custo Médio Ponderado (c/ 34% de Impostos)WACC real antes de impostos = r WACC 10,85%

WACC real depois de impostos = r WACC 7,16%

Componente Fórmula Valor

100. Para aplicação tarifária considera-se o WACC real depois do benefício tributário dos impostos, com a posterior inclusão do percentual de impostos a serem pagos. Assim, a equação anterior será aplicada às tarifas dos consumidores como se segue abaixo:

)1/()1( TTrDP

DrDP

Pr DPWACC

(2)

(Fls. 20 da Nota Técnica no 89/2014-SRE/ANEEL, de 21/03/2014.)

* A Nota Técnica é um documento emitido pelas Unidades Organizacionais e destina-se a subsidiar as decisões da Agência.

III.4.1 Análise de Consistência do Resultado 101. Considerando a inflação brasileira projetada para os próximos 12 meses, medida pelo IPCA, no valor de 6,12% a.a.6, o valor da remuneração do capital próprio nominal, antes do pagamento de impostos, que seria comparável a outras taxas de mercado (em termos brutos e nominais), como remuneração de títulos públicos ou SELIC, ficou em 24,75% a.a. O custo nominal da dívida, sem considerar o benefício fiscal, ficou em 14,98% a.a. O custo de captação dos agentes do setor informado no Relatório de Informações Trimestrais – RIT tem se mostrado inferior ao custo regulatório. 102. Cabe destacar ainda que o valor para o custo de capital real depois de impostos, de 7,16%, está coerente com a evolução recente da economia brasileira e com os custos de capital regulatórios estabelecidos em diversas agências reguladoras internacionais. Conforme mostrado na figura abaixo, o custo de capital estabelecido nesta Nota Técnica para o setor de geração de energia regulada no Brasil aproxima-se dos valores calculados para outras atividades reguladas, como distribuição e transmissão, que integram o setor elétrico brasileiro.

0,00%

1,00%

2,00%

3,00%

4,00%

5,00%

6,00%

7,00%

8,00%

WACC Geração WACC Transmissão WACC Distribuição

Gráfico 7: Comparação WACC III.4.2 – Análise das Contribuições 103. No total foram recebidas 39 contribuições, e excluindo as contribuições idênticas, o número foi de 23 contribuições distintas. Destas, 2 (duas) foram consideradas acatadas integralmente, 1 (uma) foi considerada acatada parcialmente e 20 não foram acatadas.

6 Conforme o Relatório Focus do Banco Central do Brasil, de 12 de julho de 2013.

(Fls. 21 da Nota Técnica no 89/2014-SRE/ANEEL, de 21/03/2014.)

* A Nota Técnica é um documento emitido pelas Unidades Organizacionais e destina-se a subsidiar as decisões da Agência.

AP Número de

Contribuições Estrato 17

Número de Contribuições

Aceitas e Parcialmente Aceitas

Estrato 1

Número de Contribuições Estrato

28

Número de Contribuições

Aceitas e Parcialmente Aceitas

Estrato 2

Número de Contribuições

Estrato 39

Número de Contribuições

Aceitas e Parcialmente

Aceitas Estrato 3

002/2014 31 3 8 0 0 0 IV – DO FUNDAMENTO LEGAL 104. O art. 3º da Lei nº 9.427, com redação dada Lei 12.783, de 12 de janeiro de 2013, estabelece a competência da ANEEL para definição da tarifa das concessionárias de geração que entregarem sua energia em regime de cotas, sendo o custo de capital parte integrante dessa definição. 105. O inciso IV do art. 15 da Lei nº 9.427, de 26 de dezembro de 1996, estabelece que as tarifas máximas do serviço público de energia elétrica serão fixadas em ato específico da ANEEL, que autorize a aplicação de novos valores, resultantes de revisão ou de reajuste, nas condições do respectivo contrato. 106. O inciso X do art. 4° do Anexo I do Decreto n° 2.335, de 06 de outubro de 1997, estabelece a competência da ANEEL para atuar nos processos de definição e controle de preços e tarifas. V – DA CONCLUSÃO 107. Apresentou-se, neste trabalho, uma metodologia visando à determinação do custo de capital a ser utilizado no cálculo da remuneração das concessões de instalações de geração de energia elétrica prorrogadas nos termos da Lei nº 12.783/2013. 108. Foram analisados os principais fatores para determinação do retorno do investimento em geração de energia elétrica no Brasil, do ponto de vista de um mercado mundial globalizado, refletindo, assim, a oportunidade do negócio em âmbito internacional. Para tanto, foram utilizados modelos para determinação dos custos de capital próprio e de terceiros, bem como da estrutura de capital, que procuram representar a melhor opção de composição de capitais em um mercado regulado, de modo a minimizar os custos do serviço concedido sem deixar de garantir a remuneração adequada ao prestador do serviço.

109. Também na elaboração da atual metodologia foram analisadas todas as contribuições enviadas a Audiência Pública 002/2013, sendo algumas acatadas.

7 Agentes: concessionários, permissionários e autorizados, comercializadores, associações dos agentes 8 Sociedade: consumidor, associações de classe (moradores, bairros, categorias (donas de casa e etc), órgãos de defesa do consumidor, entidades organizadas (Sindicatos, Federações, Institutos) 9 : Poder Público: órgãos do executivo, judiciário e legislativo - federal, estadual e municipal

(Fls. 22 da Nota Técnica no 89/2014-SRE/ANEEL, de 21/03/2014.)

* A Nota Técnica é um documento emitido pelas Unidades Organizacionais e destina-se a subsidiar as decisões da Agência.

110. Por fim, considera-se que a metodologia apresentada cumpre o seu papel dentro da regulação econômica dos serviços públicos de geração de energia elétrica sem, contudo, pretender esgotar as possibilidades e necessidades de aperfeiçoamento dos instrumentos regulatórios do poder concedente. VI – DA RECOMENDAÇÃO 111. Recomenda-se a submissão ao processo de Audiência Pública da proposta de metodologia de definição do custo de capital a ser aplicado nas empresas de geração de energia elétrica no regime de cotas.

RAFAEL DOS SANTOS GONÇALVES Especialista em Regulação

PAULO FELIX GABARDO Especialista em Regulação

De Acordo:

DAVI ANTUNES LIMA Superintendente de Regulação Econômica