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Não Violência

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Mark Kurlansky

Não Violência

A história de uma ideia perigosa

Prefácio de Sua Santidade o Dalai Lama

TraduçãoOtacílio Nunes

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Copyright © Mark Kurlansky 2006Todos os direitos reservados. Publicado mediante acordo com Modern Library, um selo de Random House Publishing Group, uma divisão de Random House, Inc.

Todos os direitos desta edição reservados àEDITORA OBJETIVA LTDA.Rua Cosme Velho, 103Rio de Janeiro – RJ – CEP: 22241-090Tel.: (21) 2199 -7824 – Fax: (21) 2199 -7825www.objetiva.com.br

Título originalNon-violence – the history of a dangerous idea

CapaMateus Valadares

RevisãoJuliana SantanaTamara Sender

Editoração eletrônicaFiligrana

CIP -BRASIL. CATALOGAÇÃO -NA -FONTESINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ

K98n

Kurlansky, Mark Não violência : a história de uma ideia perigosa / Mark Kurlansky ; prefácio de Sua Santidade o Dalai Lama ; tradução Otacílio Nunes. - Rio de Janeiro : Objetiva, 2013.

Tradução de: Non-violence: the history of a dangerous idea

240p. ISBN 978-85-390-0428-7

1. Não violência. I. Dalai-Lama, 1935-. II. Título.

12-7869. CDD: 303.61 CDU: 316.48

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À bela Talia Feiga ea toda a sua geração milenar –

espero que vocês toquem o terror.De forma não violenta, é claro.

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Matar um homem é ser culpado de um crime capital, matar dez homens é multiplicar a culpa por dez, matar cem homens é multiplicá-la por cem. Isso todos os governan-tes da Terra reconhecem e, no entanto, quando se trata do maior crime – travar a guerra contra outro Estado –, eles o louvam!

É claro que eles não sabem que isso é errado, pois re-gistram tais feitos para serem legados à posteridade; se sou-bessem que estavam errados, por que desejariam registrá-los e legá-los à posteridade?

Se um homem, ao ver um pouco de preto, dissesse que aquilo é preto, mas ao ver grande quantidade de preto dis-sesse que é branco, estaria claro que esse homem não podia distinguir preto e branco. Ou, se esse homem provasse algu-mas coisas amargas e as declarasse doces, ele seria claramen-te incapaz de distinguir entre doçura e amargor. Portanto, aqueles que reconhecem um pequeno crime como tal, mas não reconhecem a perversidade do maior crime de todos – a guerra contra outro Estado – mas na verdade o elogiam –, não podem distinguir o certo e o errado. Logo, quanto a certo ou errado, os governantes do mundo estão confusos.

– Mozi, China, c. 470-391 a.C.

Acho muito difícil não odiar; e quando não odeio sin-to que os poucos que o fazemos estamos muito solitários no mundo.

– Bertrand Russell, carta a Colette, 1918

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Sumário

Prefácio de Sua Santidade o Dalai Lama 11

. Seres imperfeitos

. O problema dos estados

. O matador movimento pela paz

. Criadores de problemas

. O dilema do povo não natural

. Revolução natural

. Paz e escravidão

. A maldição das nações

. Uma guerra justa favorita

. O domínio dos truculentos e a lei da gravidade

. Surtos aleatórios de esperança

As 25 lições 218

Agradecimentos 220

Bibliografi a 221

Índice 232

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prefácioDalai Lama

Venho trabalhando há muitos anos para promover a paz e a não violência porque acredito que em última instância é só por meio da gentileza e da não violência que nós, seres humanos, podemos criar uma atmosfera mais tranquila e feliz que nos permitirá viver em harmonia e paz. Portanto, estou feliz de ver que Mark Kurlansky tratou com entusias-mo desses temas neste livro.

Considero o cultivo da não violência e da compaixão parte de minha prática diária. Não penso nele como algo que é santo ou sagrado, mas como um benefício prático para mim mesmo. Ele me dá satisfação, me dá uma sensa-ção de paz que é muito útil para manter relacionamentos genuínos e sinceros com outras pessoas.

Mahatma Gandhi adotou a ideia antiga, mas pode-rosa, de ahimsa, ou não violência, e a tornou conhecida no mundo inteiro. Martin Luther King Jr. seguiu seus passos. O autor está correto em observar que eles dois eram vistos com suspeita pelas autoridades a que se opunham, mas no fi m ambos conquistaram mudanças signifi cativas e de longo alcance nas sociedades em que viviam. Considero impor-tante reconhecer aqui que a não violência não é a mera au-sência de violência. É algo mais positivo, mais signifi cativo que isso. A verdadeira expressão da não violência é a com-paixão, que não é apenas uma reação emocional passiva, mas um estímulo racional para a ação. Experimentar com-paixão genuína é desenvolver um sentimento de proximida-de com outros, combinado a um senso de responsabilidade

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pelo bem-estar deles. Isso se desenvolve quando aceitamos que as outras pessoas são exatamente como nós em querer felicidade e não querer sofrimento.

Tenho a crença fi rme de que, se adotarmos a abordagem correta e fi zermos esforços determinados, mesmo em circuns-tâncias em que tenha ocorrido grande hostilidade ao longo do tempo, a confi ança e o entendimento podem ser restau-rados. Essa é a abordagem que adotei também em relação às autoridades chinesas no que diz respeito à questão do Tibete. Reagir à violência com mais violência raramente é uma ati-tude adequada. Todavia, é irrelevante discutir a não violência quando as coisas transcorrem com tranquilidade. É precisa-mente quando as coisas se tornam realmente difíceis, urgen-tes e críticas que devemos pensar e agir com não violência.

A grandiosa realização de Mahatma Gandhi foi revi-ver e implementar nos tempos modernos o antigo conceito indiano de não violência, não só na política, mas também na vida cotidiana. Outro aspecto importante de seu lega-do é que ele conquistou a independência para a Índia sim-plesmente dizendo a verdade. Sua prática de não violência dependia inteiramente do poder da verdade. A recente e inédita queda de regimes opressivos em várias partes do mundo demonstrou mais uma vez que mesmo décadas de repressão não conseguem esmagar a determinação das pes-soas para viver em liberdade e com dignidade.

Minha esperança e minhas preces são de que este livro não só atraia a atenção daqueles que o leiam como tenha um efeito profundo sobre eles. Um sinal de sucesso seria que, sempre que surjam confl itos e desacordos, nossa pri-meira reação seja nos perguntarmos como podemos resolvê--los por meio do diálogo e da discussão, e não da força.

Sua Santidade o Dalai Lama

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1 seres imperfeitosEsperamos prevalecer por meio da tolice da pregação.

– William Lloyd Garrison,Declaração de Sentimentos adotada pela

Convenção de Paz de Boston, 1838

A primeira pista, a lição número um da história humana sobre o tema da não violência, é que não existe palavra para ela. O conceito foi louvado por todas as principais religiões. Ao longo da história houve praticantes da não violência. Mas, apesar de todas as principais línguas terem uma pala-vra para violência, não há nenhuma palavra para expressar a ideia de não violência, exceto que ela não é outra ideia, não é violência. Em sânscrito, a palavra para violência é himsa, dano, e a negação da himsa, exatamente como a não violên-cia é a negação da violência, é ahimsa – não causar dano. Mas se ahimsa é “não causar dano”, é fazer o quê?

A única explicação possível para a ausência de uma palavra proativa para expressar a não violência é que não só os establishments políticos como os establishments culturais e intelectuais de todas as sociedades viam a não violência como um ponto de vista marginal, uma rejeição fantasiosa de um dos componentes principais da sociedade, um re-púdio a algo importante, mas não uma força séria por si só. Ela não é um conceito autêntico, mas simplesmente a negação de outra coisa. Foi marginalizada porque é uma das raras ideias verdadeiramente revolucionárias, uma ideia que

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busca mudar completamente a natureza da sociedade, uma ameaça à ordem estabelecida. E sempre foi tratada como algo profundamente perigoso.

Os defensores da não violência – pessoas perigosas – estiveram presentes ao longo da história, questionando a grandeza de César e Napoleão, dos Pais Fundadores dos Estados Unidos, de Roosevelt e Churchill. Para cada cruza-da, revolução e guerra civil houve sempre aqueles que argu-mentavam, com grande clareza, que a violência não só era imoral, mas era um meio até menos efi caz de atingir objeti-vos louváveis. Pode-se argumentar que não foi a Revolução Americana que permitiu que os Estados Unidos fossem in-dependentes da Grã-Bretanha; não foi a Guerra de Secessão que libertou os escravos; e que a Segunda Guerra Mundial não salvou os judeus. Mas essa possibilidade raramente foi considerada, porque os Césares e Napoleões da história sempre usaram seu poder para abafar as vozes daqueles que contestavam a necessidade da guerra – e são esses Césares, como observou Napoleão, que escrevem a história. E assim aqueles que mataram se tornam os que são reverenciados. Mas há outra história que consegue sobreviver.

Ela sobrevive, mas a não violência é de fato uma re-jeição marginal de um conceito marginalizado. A teórica política Hannah Arendt, em seu estudo Sobre a violência, de 1969, observou que, embora se concorde universalmente que a violência foi um dos motores primários da história, historiadores e cientistas sociais raramente estudam o tema da violência. Ela sugeriu que isso ocorria porque a violência era um pilar tão importante da atividade humana que era “dada como certa e, portanto, negligenciada”. A violência é um fundamento da condição humana, ao passo que a não violência é simplesmente uma reação rarefeita a essa realida-de. O que isso signifi ca? Se vivêssemos em um mundo que

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não tivesse nenhuma palavra para a guerra além de não paz, que tipo de mundo seria esse? Não seria necessariamente um mundo sem guerra, mas seria um mundo que consi-deraria a guerra uma atividade anormal e insignifi cante. O ponto de vista amplamente apoiado e raramente expressado, mas implícito, na maioria das culturas é que a violência é real e a não violência é irreal. Mas, quando a não violência se torna uma realidade, é uma força poderosa.

Não violência não é o mesmo que pacifi smo, para o qual existem muitas palavras. O pacifi smo é tratado quase como uma condição psicológica. É um estado de espírito. O pacifi smo é passivo, mas a não violência é ativa. O pacifi smo é inofensivo e, portanto, mais fácil de aceitar que a não vio-lência, que é perigosa. Quando Jesus Cristo disse que uma vítima devia dar a outra face, estava pregando o pacifi smo. Mas, quando ele disse que um inimigo devia ser vencido por meio do poder do amor, estava pregando a não violência. A não violência, exatamente como a violência, é um meio de persuasão, uma técnica de ativismo político, uma receita para prevalecer. Ela requer muito mais imaginação para pla-nejar meios não violentos – boicotes, protestos passivos de pessoas sentadas, greves, teatro de rua, manifestações – do que usar a força. E nem sempre há um acordo sobre o que constitui violência. Alguns defensores da não violência acre-ditam que boicotes e embargos que causam fome e priva-ção são uma forma de violência. Outros acreditam que usar meios de força menos letais, como o lançamento de pedras ou balas de borracha, é uma forma de não violência. Mas a crença central é que formas de persuasão que não usam força física, não causam sofrimento, são mais efi cazes; e, embora haja com frequência um argumento moral em favor da não violência, o cerne da crença é político: que a não violência é mais efi caz que a violência, que a violência não funciona.

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Mohandas Gandhi inventou uma palavra para isso, satyagraha, de satya, que signifi ca verdade. Satyagraha, de acordo com Gandhi, signifi ca literalmente “ater-se à ver-dade”, ou “força da verdade”. Curiosamente, embora os ensinamentos e a técnica de Gandhi tenham exercido um enorme impacto em ativistas políticos do mundo inteiro, a palavra que ele usou para expressá-los, satyagraha, nunca tornou-se usual.

Todas as religiões discutem o poder da não violência e o mal da violência. O hinduísmo, que afi rma ser a religião mais antiga, embora sua data de fundação seja desconhecida, as-sim como seu fundador, não tem uma posição clara de não violência. Essa ambiguidade não é surpreendente para uma religião antiga que não tem nenhuma crença central, nem sacerdotes ofi ciais, e tem uma pletora de escrituras, deuses, mitologias e cultos. Os hindus costumam repetir o aforismo “Ahimsa paramo dharmah”, a não violência é a lei maior, mas esse não é um princípio inabalável da religião. Na re-ligião hindu a violência é permissível, e Indra é um deus hindu belicoso. Mas há também muitos textos de sábios hindus contra a violência, em especial em um livro conhe-cido como Mahabharata. Os sábios hindus tendiam a ver a não violência como um ideal inatingível. A não violência perfeita signifi caria não causar dano a nenhuma coisa viva. Os sábios encorajavam o vegetarianismo para evitar danos aos animais. Os jainistas, seguidores de uma religião admi-rada por Gandhi, mantinham a boca coberta para assegurar que eles não inalassem acidentalmente um inseto minúscu-lo. Mas o hinduísmo reconhece que mesmo os vegetarianos mais rigorosos causam danos às plantas, matando-as para

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viver. Um santo, diz-se, viveria do ar, mas o hinduísmo re-conhece que isso é impossível. A ahimsa completa não é atingível. Gandhi escreveu: “A não violência é um estágio perfeito. É uma meta para a qual toda a humanidade se move naturalmente, embora inconscientemente.” Ele acre-ditava que os seres humanos trabalhavam na direção da per-feição. A violência era um traço de retrocesso bárbaro que ainda não havia sido descartado. O ser humano que alcan-çasse a não violência completa, segundo Gandhi, não seria um santo. “Ele só se torna verdadeiramente um homem”, ele disse.

Esse conceito de homem como um ser imperfeito que é obrigado a se empenhar por uma perfeição inatingível ocorre na maior parte do pensamento humano. O fran-cês do século XIX que fundou o movimento anarquista, Pierre-Joseph Proudhon, escreveu em seu livro Philosophie du progrès (Filosofi a do progresso), de 1853: “Nascemos aperfeiçoáveis, mas nunca seremos perfeitos.” O argumento muitas vezes repetido contra a não violência, de que está em nossa natureza ser violento – sem dúvida, o motivo pelo qual a violência merece sua própria palavra –, carece de va-lidade à luz do argumento moral ubíquo de que é nossa obrigação tentar ser melhores do que somos.

O hinduísmo e Gandhi insistem em que a não vio-lência nunca deve vir da fraqueza, mas da força, e que só as pessoas mais fortes e mais disciplinadas podem esperar alcançá-la. Aqueles que são incapazes de se defender sem violência, os que carecem da força espiritual para se contra-por à brutalidade física de seu adversário, por causa ou de sua própria fraqueza ou da brutalidade decidida do inimigo, são obrigados a usar a violência física como defesa. No hin-duísmo, a submissão passiva à brutalidade é normalmente considerada um pecado.

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Sempre que os chineses denunciam as tendências pacifi stas em sua cultura, normalmente atribuem a culpa por elas ao budismo. Isso ocorre porque o budismo é a única religião oriental importante na China que tem origem estrangeira. Buda, o fundador, do século VI a.C, nasceu perto da fron-teira indo-nepalesa. Se o pacifi smo é uma fraqueza nacional, argumentaram muitos chineses, certamente isso é culpa de estrangeiros. E assim Hu Shi (1891-1962), erudito chinês educado na Universidade de Columbia, disse: “O budismo, que dominou a vida religiosa chinesa por vinte séculos, re-forçou as tendências pacífi cas de um povo que já era muito pacífi co.” Ele insinuava que a rejeição da violência torna as pessoas passivas, e muitos chineses do começo do século XX acreditavam que seu povo tinha se tornado pacífi co demais. Essa crença ignorava o fato de que a maioria das religiões e das fi losofi as que rejeitam a violência não encoraja a passi-vidade, mas o ativismo por outros meios – a não violência.

O budismo proíbe que se tire a vida, mas parece haver uma ampla gama de interpretações para essa posição. Em alguns países, ela signifi ca vegetarianismo, mas no Tibete, talvez por causa da falta de vegetais, ela signifi ca que os ani-mais devem ser mortos “humanamente”. Para um budis-ta tibetano, porém, isso signifi ca o oposto do que signifi ca para um judeu. Para os judeus, a forma humana de morte é o corte limpo da garganta do animal e a remoção de todo o sangue, ao passo que no Tibete signifi ca morte por sufoca-ção, para evitar o derramamento de sangue.

Embora a interdição budista de tirar a vida fosse fre-quentemente interpretada na China como uma condena-ção do militarismo, não foi esse o caso no Japão medieval. No Japão o budismo desenvolveu a “escola de meditação”

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comumente conhecida como Zen. Na Idade Média, mon-ges zen tornaram-se guerreiros, e mosteiros tornaram-se fortalezas militares. A ideia original de Zen era a supressão do corpo para atingir um nível superior de meditação. No século XIV, a técnica era aplicada não só à meditação, mas à habilidade de usar a espada e o arco e fl echa. Três sécu-los depois, o Zen se tornara uma parte essencial do código guerreiro no Japão. Esse não foi o primeiro nem o último caso de uma religião ser pervertida para fi ns militares.

No budismo, como no hinduísmo, há a noção de seres humanos atingirem níveis mais elevados, e um dos meios pelos quais isso se realiza é prestando ajuda a todos os seres. Mas o budismo não é a única fonte de pensamento não violento na China. A posição sobre a guerra e a não violên-cia no confucionismo, um sistema de crença desenvolvido na China de 722 a 484 a.C., é ainda mais vaga que a do hinduísmo. Não é claro sequer se o confucionismo é uma religião. Muitos preferem descrevê-lo como uma fi losofi a moral. E também não há acordo sobre a extensão do pa-pel de Confúcio, cujo nome verdadeiro era Kong Fuzi, um contemporâneo de Buda que viveu entre 551 e 479 a.C. Os analectos, uma compilação dos ditos de Confúcio que foi feita muito depois de sua morte, defi niam a função do governo como prover alimento e soldados e conquistar a confi ança do povo. Perguntado sobre qual deles poderia ser suspenso em momentos de difi culdade, ele respondeu: “Dispensem os soldados.” Essa ideia de que os militares são essenciais para o governo, mas menos essenciais que outras funções, aparece ao longo dos Analectos.

Confúcio não era um pacifi sta, nem ensinou o poder da não violência. Mas Os analectos por vezes também rejei-tam a noção de violência estatal, dizendo: “Se os homens bons administrassem o governo por cem anos, a violência

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poderia ser superada e a punição capital, dispensada.” E quando surge a pergunta de como lidar com bárbaros vi-zinhos, a justifi cativa-padrão para campanhas militares na China, a resposta nos Analectos é: “Se os povos distantes não se submeterem, acumulem cultura e caráter e assim os vençam, e quando eles tiverem sido vencidos deem a eles segurança.” Essa é uma declaração sucinta da abordagem não violenta do ativismo político.

Mas a posição chinesa mais forte sobre não violência surgiu em oposição a Confúcio, de um homem chamado Mozi, que viveu de cerca de 470 a 390 a.C. Mozi atacava com frequência os confucionistas por serem aristocratas, o que levou alguns estudiosos a concluírem que ele vinha de uma classe de escravos. Mas, como outros rebeldes, entre eles Jesus e Gandhi, ele pode ter escolhido se juntar à classe mais pobre como um protesto contra o tratamento injusto que ela recebia. Enquanto Confúcio era uma voz do establishment, Mozi era um rebelde. Enquanto Confúcio imaginava uma hierarquia de amor na qual o maior afeto era dado à família, Mozi conclamava o amor universal, chien ai, e enfatizava a ajuda aos pobres. Mozi descreveu o conceito de chien ai: “Ele me joga um pêssego, eu devolvo a ele uma ameixa.”

Mozi via esse conceito de amor mútuo, chien ai, como a chave para corrigir os males do mundo.

De onde vêm as desordens? Elas surgem da falta de amor mútuo. O fi lho ama a si mesmo e não ama seu pai, e portanto engana o pai em seu proprio proveito; o irmão mais novo ama a si mesmo e não ama o pai, e portanto engana o irmão mais velho em seu próprio proveito. O mesmo se aplica aos funcionários do Esta-do e a seus chefes supremos. É isso que o mundo chama de desordem. Do mesmo modo, o pai ama a si mesmo

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e não a seu fi lho e engana o fi lho para obter seu próprio lucro, e assim igualmente com o irmão mais velho e o chefe supremo. Tudo isso vem da falta de amor mútuo. O caso deles é o mesmo que o dos ladrões e salteadores que igualmente amam suas próprias famílias, mas não os lares de outros, e portanto roubam os lares de ou-tros em seu próprio benefício. Como esses, também há funcionários do Estado e príncipes que travam a guerra contra outros países – porque eles amam seu próprio país, mas não outros países, e portanto buscam lucro para seu país à custa de outros. A causa última de todas as desordens no mundo é a falta de amor mútuo.

Em seguida, Mozi apresenta um argumento expresso mais tarde no judaísmo pelo rabino Hillel, do século I, e reiterado por seu contemporâneo, Jesus, que o chamava de Regra de Ouro. Escreveu Mozi:

Pois se cada homem considerasse as pessoas dos ou-tros como a sua própria pessoa, quem infl igiria dor e ferimento a outros? Se eles considerassem os lares de outros como os seus próprios lares, quem roubaria os lares de outros? Portanto, nesse caso não haveria nenhum salteador nem ladrão. Se os príncipes consi-derassem outros países como os seus próprios, quem travaria a guerra contra outros países? Portanto, nesse caso, não haveria mais guerra.

O chinês chega mais perto do que a maioria das línguas de uma palavra para a não violência. No taoismo há um con-ceito incorporado na palavra teh. Sem ser exatamente não violência, que é uma força ativa, teh é a virtude de não lutar – a não violência é o caminho para o teh.

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O taoismo é centrado nos ensinamentos do século V a.C. de Lao Tsu, que é tido como o autor do Tao te ching, Os cânones do caminho e da virtude. Tao em si é uma palavra intraduzível, muitas vezes mencionada em Os analectos. É uma força equilibradora que às vezes se diz ser o que impede a natureza de cair no caos. Diz o Tao te ching: “O governante imbuído com o Tao não usará a força das armas para sub-jugar outros países.” Mas ele acrescenta que um país deve ter uma força militar para defesa e que sua prontidão será um meio de dissuasão. Os militares devem estar “prontos, mas não se jactar”. Esse caminho intermediário para a não violência não é de forma alguma a não violência, já que toda a história mostra que nações que constroem forças militares como meios de dissuasão acabam usando-as – uma lição per-turbadora em uma época de “meios de dissuasão nucleares”.

Mas no Tao, como no hinduísmo, há a noção de que os seres humanos evoluem, e de que os seres humanos mais evoluídos não precisam da violência física. “O cavaleiro ca-pacitado não é belicoso. O estrategista capacitado nunca se irrita. Aquele que tem capacidade de superar seus inimigos não se envolve na batalha.”

No taoismo, o teh é um aperfeiçoamento da natureza, e, como no hinduísmo, é algo que poucas pessoas têm a força e o caráter para atingir. O conceito é ecoado no cristia-nismo por noções como a de os mansos serem abençoados e a de os últimos serem os primeiros. O teh sustenta que:

Na natureza o mais fraco supera o mais forte. Não há nada no mundo tão mole quanto a água. Mas nada pode ser mais capaz de atacar o duro e forte; não há nenhuma maneira de alterá-la. Portanto, a fraque-za sobrepuja a força, a moleza sobrepuja a dureza. O mundo sabe disso, mas é incapaz de praticar.

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As religiões orientais, que os ocidentais tendem a considerar etéreas e só viáveis para os idealistas mais sonhadores, na verdade têm um lado pragmático. Elas reconhecem que a violência está errada, que a não violência é o caminho que deve ser tomado, mas também reconhecem que os seres hu-manos são fracos e imperfeitos e que só uns poucos entre os mais evoluídos e extraordinários entre nós escolherão esse caminho e permanecerão nele.

O judaísmo, uma religião que existe há mais de 5.700 anos, tem muitas camadas de leis e comentários sobre essas leis. É cheio de contradições aparentes, inclusive sobre o tema da violência. Os rabinos tentam resolver as contradições atri-buindo prioridades – certos textos são mais importantes que outros, algumas doutrinas, algumas práticas, algumas crenças têm precedência sobre outras. É claro que as discussões sobre quais textos têm precedência são infi ndáveis. No judaísmo há normalmente espaço para discussões, mas algumas leis são invioláveis. O monoteísmo é o princípio central da religião, e não há exceções nem variações, e nenhuma forma de ido-latria é tolerada. É também aceito universalmente que os dez mandamentos que teriam sido entregues a Moisés por Deus no monte Sinai são um conjunto central e principal de leis não negociáveis. O primeiro desses mandamentos é o mono-teísmo e o segundo proíbe a idolatria. O sexto mandamento é “Não matarás”. É um dos mandamentos mais curtos e não oferece nenhum comentário, explicação ou variação. Ele não diz, como afi rmam muitos judeus: “exceto em autodefesa”, nem diz “exceto quando absolutamente necessário”. É uma das sentenças simplesmente declarativas na Bíblia. Mas aque-les que desejam matar podem se refugiar em textos menores. O Antigo Testamento é cheio de relatos de guerra e até de

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justifi cativas para eles. Isso não muda o fato de que a lei central declara “não matar”. Em todo o restante da Bíblia, entre todas as batalhas e derramamentos de sangue, há outras mensagens. O ditado no livro de Levítico, “Ama teu próximo como a ti mesmo”, é também considerado central para a religião.

Os antigos judeus travaram guerras, mas aparentemen-te nunca se sentiram à vontade com isso. Diferentemente de tantas culturas modernas, eles não celebravam vitórias mili-tares. O único feriado no calendário judaico que celebra um triunfo militar é o Chanucá. É um feriado pós-bíblico que celebra a vitória, no ano 166 a.C., de um Exército de guer-rilha liderado pelos macabeus contra os governantes selêuci-das da Palestina, que, com o apoio de alguns judeus, tinham tentado diluir a prática judaica tradicional. Os rabinos nun-ca estiveram à vontade com esse feriado, e os textos que o registram não foram mantidos com o texto sagrado e só sobreviveram em tradução grega, a língua dos derrotados. O Chanucá foi sempre um feriado menor, de signifi cado religioso muito limitado até os tempos modernos, quando duas coisas aconteceram para mudar seu papel. Na década de 1890, com o crescimento do sionismo, o Chanucá foi promovido porque celebrava a conquista militar judaica de Jerusalém. Como os monges zen, os sionistas sabiam como usar a religião na busca do poder político. Hoje, em Israel, ele é praticamente um feriado político.

A popularidade do Chanucá continuou a crescer, em-bora ainda não seja considerado um feriado religioso, e ele ganhou nova importância em tempos modernos por parte de comerciantes varejistas ávidos para vender presentes para judeus durante a época do Natal. No calendário judaico, a época tradicional do ano para dar presentes às crianças costumava ser o Purim, que cai no fi nal do inverno. Em-bora não celebre uma vitória militar, esse feriado é também

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ensanguentado pelo enforcamento do perverso Haman e de seus soldados nos portões da cidade e pela matança de 75 mil persas. Séculos de comentários discutiram o quão im-próprio era o horror dessa história. Mas, enquanto a maio-ria dos feriados judaicos é triste, o Purim pretende ser um momento de tolices, um pouco como o carnaval, anterior à quaresma do catolicismo. Estimula-se a bebedeira, assim como a ridicularização de eruditos reverenciados. A história do livro de Ester é recontada no Purim intencionalmente como um melodrama exagerado e farsesco no qual os mo-cinhos são aplaudidos e os bandidos vaiados. Os eruditos e os rabinos observam que “Deus não está presente” na his-tória do Purim. O livro de Ester é o único do Velho Tes-tamento, afora o poema de amor “Cântico dos cânticos”, no qual Deus nunca aparece. Os personagens não rezam, não pedem a ajuda de Deus. Deus não está envolvido nessa operação sangrenta. Já fi cou claro que Deus não quer que as pessoas matem umas às outras.

Em geral os feriados judaicos rejeitam esse tipo de vio-lência. No Yom Kippur, a violência está entre os pecados que devem ser reparados. No Pessach, que celebra Moisés conduzindo os hebreus para sair da escravidão no Egito, há um momento de pesar pelos egípcios, o inimigo que afun-dou tentando perseguir os hebreus pelo mar Vermelho. Os judeus são instruídos a cada ano a não odiar os egípcios. Um princípio fundamental do judaísmo é que não se deve odiar os inimigos.

O judaísmo ensina também a possibilidade de aperfei-çoamento. Um dia, diz-se, o ser humano perfeito, o Messias, virá e mostrará à humanidade o caminho para a perfeição. Pela tradição, os judeus só deveriam retornar a Israel quan-do o Messias aparecesse, e não depois da Segunda Guerra Mundial. O judaísmo reformista não prevê um Messias,

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mas toda uma era messiânica. De acordo com o irritado profeta Isaías, em algum momento do futuro, quando Deus fi nalmente for ouvido, as nações “baterão suas espadas para transformá-las em relhas de arado e suas lanças em foices, uma nação não deverá levantar espada contra outra nação, nem nunca mais ser treinada para a guerra”.

Embora a maioria das religiões evite a guerra e defenda a não violência como o único caminho moral para a mudança política, a religião e sua linguagem foram cooptadas pelas pessoas violentas que têm governado as sociedades. Se apa-recesse alguém que não fi zesse concessões, ou um rebelde que insistisse em tomar o único caminho moral, rejeitando a violência em todas as suas formas, uma pessoa como essa pareceria tão ameaçadora que seria morta, e depois de sua morte ela seria canonizada ou endeusada, porque um santo é menos perigoso que um rebelde. Isso aconteceu inúmeras vezes, mas um primeiro exemplo ilustre foi o de um judeu chamado Jesus.

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