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NÍVEIS DE RESÍDUOS DE PRAGUICIDAS ORGANOCLORADOS EM PRODUTOS CÁRNEOS SOB INSPEÇÃO FEDERAL João Pessoa de Paula Carvalho * Amélia Mitico Nishikawa ** Elisabeth Francisconi Fay ** RSPUB9/519 CARVALHO, J. P. de P. et al. Níveis de resíduos de praguicidas organoclorados em produtos cárneos sob inspeção federal. Rev. Saúde públ., S. Paulo, 14: 408-19, 1980. RESUMO: Com objetivo de evidenciar a freqüência e os níveis de resíduos de praguiddas organoclorados, foram analisadas 445 unidades amostrais de matéria prima (gordura bovina) provenientes de carcaças de bovinos de frigo- ríficos e 132 unidades amostrais de carne bovina processada (enlatados, tais como "corned beef" e "roast beef"). Apresentaram-se com resíduos de pra- guicidas acima dos limites de tolerância estipulados, 77 unidades amostrais de gordura bovina e 5 de produto processado. Resíduos de praguiddas, sem contudo ultrapassar os limites de tolerância, foram identificados em, praticamente, todas as amostras, sendo que 27% das unidades amostrais de gordura bovina e 10,6% de produto processado apresentaram resíduos de praguicidas em violação aos limites estabelecidos na legislação. Heptacloro, BHC e Dieldrin foram os praguiddas mais freqüentes e Lindane e DDT os menos evidenciados. UNITERMOS: Alimentos, contaminação. Pesticidas. Inseticidas organoclorados. * Do Departamento de Prática de Saúde Pública da Faculdade de Saúde Pública da USP Av. Dr. Arnaldo, 715 — 01255 — São Paulo, SP — Brasil. ** Do Laboratório de Referência Animal (LARA) do Ministério da Agricultura Av. Francisco Matarazo, 101 — 05001 — São Paulo, SP — Brasil. INTRODUÇÃO Os praguicidas trouxeram consideráveis benefícios à humanidade como auxiliares valiosos à agricultura, possibilitando colhei- tas mais abundantes, e à saúde pública, na profilaxia das doenças veiculadas por artrópodes 4,14 . Todavia, tem sido cres- cente a preocupação pelos efeitos prejudi- ciais que essas substâncias podem ocasionar ao homem, aos animais e ao meio ambiente, quando não usadas sábia e corretamente 14 . O equilíbrio ecológico pode sofrer alterações pelo uso inadequado de praguicidas organo- clorados, com o desaparecimento, principal- mente, da fauna de invertebrados aquáticos, de peixes e algumas espécies de aves 3 , A presença de resíduos contaminantes em produtos animais, tais como carne, leite e ovos, pode ocorrer como conseqüência da aplicação direta de praguicida no animal ou quando estes ingerem alimentos (pasta- gens, forragens e rações) que os conte- nham. Tais resíduos podem atingir pro- porções bem acima dos níveis admitidos

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NÍVEIS DE RESÍDUOS DE PRAGUICIDAS ORGANOCLORADOSEM PRODUTOS CÁRNEOS SOB INSPEÇÃO FEDERAL

João Pessoa de Paula Carvalho *Amélia Mitico Nishikawa **Elisabeth Francisconi Fay **

RSPUB9/519

CARVALHO, J. P. de P. et al. Níveis de resíduos de praguicidas organoclorados emprodutos cárneos sob inspeção federal. Rev. Saúde públ., S. Paulo, 14:408-19, 1980.

RESUMO: Com objetivo de evidenciar a freqüência e os níveis de resíduosde praguiddas organoclorados, foram analisadas 445 unidades amostrais dematéria prima (gordura bovina) provenientes de carcaças de bovinos de frigo-ríficos e 132 unidades amostrais de carne bovina já processada (enlatados, taiscomo "corned beef" e "roast beef"). Apresentaram-se com resíduos de pra-guicidas acima dos limites de tolerância estipulados, 77 unidades amostrais degordura bovina e 5 de produto processado. Resíduos de praguiddas, sem contudoultrapassar os limites de tolerância, foram identificados em, praticamente, todasas amostras, sendo que 27% das unidades amostrais de gordura bovina e 10,6%de produto processado apresentaram resíduos de praguicidas em violação aoslimites estabelecidos na legislação. Heptacloro, BHC e Dieldrin foram ospraguiddas mais freqüentes e Lindane e DDT os menos evidenciados.

UNITERMOS: Alimentos, contaminação. Pesticidas. Inseticidas organoclorados.

* Do Departamento de Prática de Saúde Pública da Faculdade de Saúde Pública da USP— Av. Dr. Arnaldo, 715 — 01255 — São Paulo, SP — Brasil.

** Do Laboratório de Referência Animal (LARA) do Ministério da Agricultura — Av. FranciscoMatarazo, 101 — 05001 — São Paulo, SP — Brasil.

INTRODUÇÃO

Os praguicidas trouxeram consideráveisbenefícios à humanidade como auxiliaresvaliosos à agricultura, possibilitando colhei-tas mais abundantes, e à saúde pública,na profi laxia das doenças veiculadas porartrópodes4,14. Todavia, tem sido cres-cente a preocupação pelos efeitos prejudi-ciais que essas substâncias podem ocasionarao homem, aos animais e ao meio ambiente,quando não usadas sábia e corretamente 14.O equi l íbr io ecológico pode sofrer alteraçõespelo uso inadequado de praguicidas organo-

clorados, com o desaparecimento, principal-mente, da fauna de invertebrados aquáticos,de peixes e algumas espécies de aves3 ,

A presença de resíduos contaminantes emprodutos animais, tais como carne, leite eovos, pode ocorrer como conseqüência daaplicação direta de praguicida no animalou quando estes ingerem alimentos (pasta-gens, forragens e rações) que os conte-nham. Tais resíduos podem atingir pro-porções bem acima dos níveis admitidos

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como "tolerância" e "seguros", com impli-cações toxicológicas para o homem, que éo último elo da cadeia alimentar 7,9,16.

Os praguicidas organoclorados, tais comoDDT, BHC, Dieldrin, Aldrin e Lindane,embora eficientes, contribuem fortementepara o depósito de seus resíduos, princi-palmente na fração l ipídica do alimentohumano 7. São considerados os mais per-sistentes e de sua degradação originam-semetabólitos também persistente e de efeitosnocivos 8.

Essas e outras implicações têm conduzidoà busca de praguicidas que sejam eficazese de degradação rápida, conseqüemente deefeitos inócuos para o homem e o meioambiente, isto é, que não deixem mais queo mínimo de resíduo necessário para efeti-vo rendimento 13.

Infelizmente, ainda não são bem conhe-cidos os efeitos tóxicos dos praguicidas nohomem e os níveis de segurança não estãoclaramente definidos. Sabe-se, contudo, queos hidrocarbonetos clorados podem causardano ao sistema nervoso central e peri-férico, aumento dos níveis de enzimas hepá-ticas e perturbações na biossíntese deesteróides. Ao DDT e alguns outros pra-guicidas é imputada a capacidade de exer-cer atividade teratogênica e carcinogênica.7

Análises de resíduos de praguicidas emdiversos tipos de amostras alimentares per-mitem supor a ingestão diária desses resí-duos nos diferentes centros populacionais,além de contribuir para assinalar sua per-sistência e possíveis efeitos nocivos 9,12,13.Possibilitam, ainda, estimar o emprego ounão de métodos agrícolas, sanitários ezootécnicos aprovados l5.

Precisamos acumular sistematicamentemaiores e melhores informações sobre odestino dos praguicidas após sua aplicação,o que viria faci l i tar uma tomada de posiçãoefetiva f rente ao problema, com vistas aminimizá-lo, isto é, a reduzir a níveis bembaixos os seus efeitos sobre os organismosque não são objeto da ação13.

Diversos países têm adotado medidas vi-sando restringir o uso do DDT, com af ina l idade de d iminu i r a poluição do meioambiente e a conseqüente contaminação dosalimentos 3.

Segundo Almeida e Svetlicic5 "ao con-trário do que ocorre nas campanhas desaúde pública, a aplicação de praguicidasnas lavouras é freqüentemente feita porindivíduos mal treinados e muitas vezesanalfabetos, portanto, incapazes de ler, nosrótulos, as instruções de uso e as precau-ções necessárias para a aplicação".

No Brasil, por ano, são utilizadas cercade 100 mil toneladas de praguicidas parafins agrícolas5. Estão licenciados 400compostos químicos, que aparecem em cercade 8 mil formulações, compreendendovários níveis de toxicidade para o homeme que têm provocado intoxicações relativa-mente freqüentes. Além das intoxicaçõesagudas, que permitem uma comprovaçãocom maior rapidez e segurança, há que seconsiderar os casos de envenenamento oca-sionados pela ingestão diária de alimentoscorn resíduos de praguicidas, que passamdespercebidos, uma vez que não apresentamefeitos imediatos 4.

Tendo em vista a grande possibilidadede produtos cárneos apresentarem-se comresíduos de praguicidas, fez-se necessárioum controle oficial em tais produtos, o quemotivou o Ministério da Agricul tura a ela-borar e implantar o Programa Nacional deControle de Resíduos Biológicos1 1 , que vemsendo desenvolvido com o apoio de seusLaboratórios Regionais de Referência Ani-mal (LARA).

Este trabalho tem por objetivo eviden-ciar a f reqüência e os níveis de resíduosde praguicidas organoclorados em produ-tos cárneos sob inspeção federal, analisa-dos no Laboratório Regional de Referên-cia Animal de São Paulo (LARA-SP).

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MATERIAL E MÉTODOS

Durante o período de outubro de 1978a outubro de 1979, foram analisadas noLARA-SP, 577 unidades amostrais, com-preendendo 445 de gordura bovina decarcaças procedentes de f r igor í f icos , aquidenominadas de "matéria prima" e 132 decarne bovina processada (enlatados, taiscomo ''corned beef" e "'roast beef") . Asanálises buscaram evidenciar níveis de resí-duos de BHC, Aldrin , Dieldrin, Lindane,DDT e Heptacloro em cada unidadeamostral.

Nas amostras de matéria prima, resíduosde BHC foram pesquisados nas 445 amos-tras; Lindane, Aldr in e Dieldrin em 425;DDT em 417; e Heptacloro em apenas 25.Nas amostras de produto processado forampesquisados resíduos de BHC nas 132amostras; Lindane, Aldrin, Dieldrin e DDTem 129; e Heptacloro em apenas 22 amos-tras. A variação no número de análises,por amostra, para pesquisa dos diversoscompostos químicos, foi devida, principal-mente, aos problemas da implantação darotina no laboratório.

Das 445 amostras de matéria prima, 117foram provenientes do Estado de MatoGrosso do Sul e 113 do Estado de SãoPaulo; os Estados de Minas Gerais e Goiásparticiparam com 71 amostras cada um, oEstado de Mato Grosso com 64 e o Estadodo Paraná com 6. Houve 3 amostras semdeclaração de procedência.

Todas as 132 amostras de carne bovinaprocessada eram procedentes do Estado deSão Paulo. A matéria prima util izada noprocessamento originou-se dos diversos Es-tados mencionados.

As análises para determinação de resíduosde praguicidas dorados foram executadascom base no método de "Woodson Tenent",comumente uti l izado no laboratório ameri-cano do mesmo nome, que é o método deescolha não só de laboratórios oficiais, co-mo também de laboratórios de frigoríficosbrasileiros.

Esse método vem sendo empregado satis-fator iamente em análises desse tipo, princi-palmente por permitir o exame de umgrande número de amostras diariamente, acustos reduzidos e com bom nível de segu-rança.

Em linhas gerais, podemos dizer que ométodo consiste na preparação e homogei-nização da amostra, na extração dos pra-guicidas, mediante a purificação em colunade alumina, na concentração do eluato, naressuspensão em solvente e na determina-ção por cromatografía em fase gasosa comdetector de captura de elétrons.

A cromatografia em fase gasosa foi rea-lizada em aparelho CG, modelo 370 D, comcolunas de vidro, OV 17 1,5% e QF1 1,95%em forma espiral, de 1/4 de diâmetrointerno, de 6 pés de comprimento.

As análises se processaram sob as se-guintes temperaturas: — coluna 190°C;detector 200°C e vaporização 200°C. Gásde arraste: nitogênio tipo U com fluxoigual a 30ml/min., sensibilidade 3 x 109.

A identificação dos picos encontradosnos cromatogramas foi feita por compara-ção dos tempos de retenção relativos aoAldrin e outros padrões submetidos às mes-mas condições e calculados quantitativamentepelo método de comparação de áreas.

Os resultados foram expressos em partespor milhão (ppm) e calculados para a gor-dura da amostra.

Como os hidrocarbonetos clorados depo-sitam-se particularmente na porção gordu-rosa, as amostras deste tecido foramcoletadas de cada lote de animais (bovi-nos) abatidos no mesmo dia ou em diaimediatamente anterior.

Cada lote possuia, em média, 150 animais.Os animais de cada lote abatido nos frigo-r í f icos foram identificados segundo o mu-nicípio e estado de procedência, nome doproprietário e data de coleta da amostra.Entendemos por lote um grupo de animaisprovenientes de um mesmo proprietário,numa determinada data e de onde era reti-

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rada a unidade amostral para análise cor-respondente de praguicidas.

As amostras foram selecionadas ao acasoe preparadas, colhendo-se aproximadamente200 g de gordura de várias partes docorpo do animal (peito, cauda, região peri-renal e cavitária), evitando-se misturar

gorduras de lotes diferentes.

Reunia-se amostras representativas de nomáximo 5 animais. Tais amostras sofreramfusão em becker, não ultrapassando a 100°Ce foram misturadas até f icarem homoge-neizadas. Posteriormente, foram filtradasatravés de lã de vidro e uma camada desulfato de sódio anidro. Deste fi l trado,foram recolhidas cerca de 100 g de gordurapara um frasco perfei tamente limpo e seco.

Do fi l t rado obtido, destinou-se uma parte(metade) ao laboratório da indústria e aoutra ao laboratório oficial (LARA-SP). Asremessas processaram-se semanalmente, se-gundo cronograma estipulado.

Com relação aos produtos processados(enlatados), uma unidade amostral de cadapartida, cujo número era bastante variável,foi selecionada ao acaso, coletada e identi-f icada. Desta amostra procedeu-se à ex-tração da gordura por meio de solventese a qual foi f i l t r ada através de lã de vidroe uma camada de sulfato de sódio anidro.Conforme descrito para a matéria prima, aamostra assim preparada destinava-se aolaboratório da indústria e ao laboratóriooficial (LARA-SP).

Após a realização das análises, os resul-tados foram confrontados com os dos labo-ratórios das indústr ias e quando observadasdivergências, foram tomadas medidas paradetectar possíveis causas e saná-las. Cum-pre assinalar que foram raras as diver-gências havidas entre os resultados obtidospelo laboratório of icial e os das indústrias,o que nos leva a crer, uma vez mais, noelevado grau de confiabil idade do métodoempregado.

De acordo com o Programa Nacional deControle de Resíduos Biológicos em Car-nes1 1 , foram estabelecidos os seguintes

limites de tolerância para praguicidas orga-noclorados, com base nos padrões de legis-lação internacional: Lindane 7,00 ppm; DDT5,00 ppm; B H C ( a + b ) , Aldr in , Dieldrine Heptacloro 0,30 ppm.

Como margem de segurança nos resul-tados das análises, todos os lotes que acu-saram a presença de resíduos igual ousuperior a 80% dos níveis de tolerânciamencionados, foram considerados em viola-ção aos limites estabelecidos na legislação,isto é, 5,60 ppm para Lindane; DDT 4,00ppm e 0,24 ppm para BHC, Aldrin, Dieldrine Heptacloro.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Quase todas as unidades amostrais ana-lisadas apresentaram-se com resíduos de umou mais praguicidas (Tabela 1).

De acordo com os níveis de tolerânciaestipulados, 77 (17,3%) amostras de maté-ria pr ima e 8 (6,1%) de produto processadose apresentaram com resíduos acima doslimites (Tabela 1). Com base na margemde segurança estabelecida, isto é, 80% dosníveis de tolerância, 120 (27,0%) amostrasde matéria prima e 14 (10,67o) de produtoprocessado foram consideradas em violaçãoaos limites da legislação (Tabela 1). Con-siderando que o produto processado éelaborado a partir de matéria pr ima que jáfoi analisada e liberada, explicaria a menorf reqüência de resíduos acima dos níveis detolerância em tais produtos (Tabela 1).

Os resíduos de praguicidas mais f reqüen-tes nas amostras de matéria pr ima foram,em primeiro lugar o Heptacloro, seguidopelo BHC, Aldr in e Dieldrin. Os menosfreqüentes foram Lindane e DDT. Nasamostras de produto processado a ordemfoi praticamente a mesma, com exceção doAldr in e Dieldr in , que trocam de posiçãoentre si, e do DDT que não foi detectado(Tabela 2).

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Nas amostras de matéria prima o Dieldrinfoi o praguicida que se apresentou maiornúmero de vezes acima dos níveis de tole-rância (12,7%), seguidos pelo BHC (5,9%)e Aldrin com apenas 0,3%. Nas amos-tras de produto processado, o BHC seapresentou maior número de vezes acimados níveis de tolerância, seguido pelo Al-drin e Dieldrin. O Heptacloro, DDT eLindane em nenhuma oportunidade, tantopara matéria prima como para produtoprocessado, se apresentaram acima dosníveis de tolerância, mesmo considerando o80% dos níveis de segurança (Tabela 2).

Com base nos valores de segurança,Dieldrin foi o praguicida mais freqüente,seguido pelo BHC e Aldrin, nas amostrasde matéria prima. Já nas amostras deproduto processado o BHC foi mais fre-qüente, seguido pelo Dieldrin e Aldrin(Tabela 2).

Quanto à freqüência de resíduos de pra-guicidas organoclorados por Unidades daFederação de procedência da amostra, veri-ficaram-se resíduos em 100,0% das amos-tras analisadas, com exceção do Estado deMato Grosso que apresentou resíduos em96,9% (Tabela 3).

O Estado do Paraná apresentou um nú-mero elevado de amostras com resíduosacima dos níveis de tolerância (50,0%).Todavia, todas as cifras relativas a esseEstado devem ser vistas com ressalva, tendoem vista o pequeno número de amostras (6)enviadas pelo mesmo (Tabela 3).

Após o Paraná, as freqüências maioresde amostras com resíduos acima dos níveisde tolerância foram relativas aos Estadosde São Paulo (34,5%), Mato Grosso(18,8%), Mato Grosso do Sul (12,0%),Minas Gerais (8,5%) e Goiás (2,8%). Estaseqüência permanece praticamente inaltera-da em relação aos níveis de segurança, comexceção dos Estados de Goiás e Mato Gros-so que trocam de posição entre si, tendoem vista os valores encontrados (Tabela 3).

A Tabela 4 apresenta a freqüência deBHC, segundo as Unidades da Federaçãode origem das amostras de matéria primapara análises. Das 445 amostras analisa-das, 431 (96,9%) possuiam resíduos deBHC. Três Estados enviaram amostrascontendo em todas (100,0%) resíduos deBHC (Mato Grosso do Sul, São Paulo eMinas Gerais). Nos demais Estados afreqüência foi menor mas não longe dos100,0%.

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Quanto aos níveis de resíduos acima datolerância para BHC, o Estado do Paranáfoi o mais freqüente (16,7%), seguido peloEstado de Mato Grosso (15,6%). Menoresfreqüências foram assinaladas para os Es-tados do Mato Grosso do Sul, São Paulo,Minas Gerais e Goiás (Tabela 4).

Ainda analisando a Tabela 4, verifica-seque em relação à margem de segurança, oEstado do Paraná desponta em primeiroplano com 33,3% de amostras, seguido pelosEstados de Mato Grosso (18,8%) e SãoPaulo (13,3%).

Em amostras de matéria prima, resíduosde Dieldrin estavam presentes em 59,6%das amostras analisadas. O Estado de SãoPaulo foi o que participou com maior nú-mero de amostras com resíduos de Dieldrin,seguido pelo Estado do Paraná, Mato Gros-so, Mato Grosso do Sul, Goiás e MinasGerais (Tabela 5).

Do Estado do Paraná foi de onde se ori-ginou o maior número de amostras comresíduos acima dos níveis de tolerância paraDieldrin, seguido pelos Estados de São

Paulo, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais,Mato Grosso e Goiás. Quanto aos níveis desegurança, as primeiras posições continuamcom o Paraná e São Paulo (Tabela 5).

Aldrin foi detectado em 385 amostras das425 analisadas para matéria prima, ou seja,90,6% de freqüência (Tabela 2). MinasGerais figurou em primeiro lugar com95,7% de amostras positivas, seguido deGoiás (93,5%), São Paulo (92,7%), MatoGrosso (86,9%), Mato Grosso do Sul(86,2%) e Paraná (80,0%).

A única amostra com Aldrin, acima doslimites de tolerância, proveio de São Paulo.Quatro ultrapassaram a margem de segu-rança e foram provenientes de Minas Gerais(2), Mato Grosso do Sul e Goiás.

O nível mais elevado de resíduos, acimados limites de tolerância, entre todos ospraguicidas pesquisados foi de Dieldrincom 5,464 ppm, em uma amostra de matériaprima proveniente do Estado de MatoGrosso do Sul. A cifra imediatamenteinferior encontrada foi 2,852 ppm para

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BHC, em uma amostra de matéria primaproveniente de São Paulo.

A média aritmética dos valores encontra-dos nas 26 unidades amostrais de matériaprima, que se achavam acima dos limitesde tolerância para BHC, foi 0,693 ppm eo valor mais próximo do limite de tolerânciafoi 0,308 ppm.

Nas 54 unidades amostrais de matériaprima com resíduos de Dieldrin acima doslimites de tolerância, o valor da médiaaritmética foi de 0,718 ppm e o valor maispróximo do limite de tolerância 0,305 ppm.Aldrin apresentou-se em uma única amostrade matéria prima, com cifra superior aonível de tolerância (1,028 ppm), procedentedo Estado de São Paulo.

Nas amostras de produto processado, omaior valor encontrado foi 2,764 ppm paraBHC. A média aritmética dos valores dascinco amostras com resíduos acima doslimites de tolerância foi 1,228 ppm e o valormais próximo do referido limite 0,308 ppmpara BHC.

Aldrin foi detectado duas vezes fora doslimites de tolerância nas amostras de pro-duto processado (0,360 ppm e 0,399 ppm)e Dieldrin apenas uma vez (0,335 ppm).

Nas amostras de produtos processadosnão foi constatada a presença de resíduosde DDT. Nas amostras de matéria prima,12 amostras (2,9%) se apresentaram comresíduos de DDT (Tabela 2), sem contudoultrapassar o limite de tolerância ou mes-mo o nível de segurança. O nível maisalto presenciado foi de 3,900 ppm em umaamostra proveniente do Estado de MatoGrosso do Sul. O Estado de São Pauloparticipou com 7 amostras de matéria primacom resíduos de DDT, cujo valor da médiaaritmética foi 1,017 ppm. Mato Grosso doSul apresentou duas amostras com resíduosde DDT (0,226 e 3,900 ppm), Minas Geraistambém com duas (0,230 e 0,249 ppm) eGoiás com uma amostra (0,450 ppm).

Em relação às 52 amostras de produtoprocessado com presença de resíduos deLindane (Tabela 2) encontramos como

valor da média aritmética 0,018 ppm e omais elevado 0,441 ppm. Quanto às amos-tras de matéria prima, relativas a Lindane,em 89 (20,9%) foi verificada sua presença(Tabela 2), correspondendo a um valormédio de 0,16 ppm, sendo o valor maiselevado 0,489 ppm em uma amostra prove-niente do Estado de Mato Grosso do Sul.Este Estado foi o que contribuiu commaior número de amostras com resíduos deLindane (29 amostras, ou seja 6,8%), se-guido pelos Estados de São Paulo e MatoGrosso com 21 amostras cada (5,0%),Goiás 9 (2,1%), Minas Gerais 6 (1,4%) eParaná l (0,2%). Em duas amostras nãoconstava o Estado de sua procedência.

Com exceção do trabalho de Lara10,não encontramos publicações que buscassemevidenciar níveis de resíduos organocloradosem gordura bovina e produto processado(enlatados) em nosso meio e que, efetiva-mente, permitissem uma análise comparati-va com os nossos dados.

Lara10 analisando 120 amostras de con-servas de carne bovina produzidas por umfrigorífico de São Paulo, detectou BHC(total) em todas as amostras, com teoresque variaram de 0,02 ppm a 1,69 ppm euma média aritmética de 0,39 ppm. Comovemos, o valor máximo encontrado peloreferido autor é inferior ao obtido por nós(2,764 ppm) para o mesmo praguicida.

Almeida2 pesquisou resíduos organoclo-rados em 17 amostras de leite consumidoem São Paulo e verificou que todas asamostras apresentavam teores de BHC (to-tal) que variavam de 0,007 a 0,055 ppm.

Lara 9 analisando 5 amostras de ovos(gema) de granja de São Paulo, encontroupresença de resíduos de BHC (total) emtodas, sendo os valores extremos 0,200 ppme 0,018 ppm.

Akamine 1 analisou amostras de sardinhasadquiridas em feiras livres e peixarias deSão Paulo e evidenciou a presença depraguicidas organoclorados em todas asamostras, embora não tenha podido quanti-ficar os resíduos devidamente.

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Conforme podemos verificar, resíduos depraguicidas organoclorados têm sido umaconstante em certos alimentos consumidospor nossa população.

Estudos sobre a freqüência de resíduosorganoclorados em tecidos de animaiscoletados em 1969, provenientes de produ-ção norte-americana, que envolveu 3.169amostras de bovinos, novilhos, suínos,carneiros e cabras6, demonstraram a pre-sença de resíduos em 92,9% das amostras,sendo que 1,2% excediam os limites detolerância. As amostras de novilhos foramas que se apresentaram com maior freqüên-cia de resíduos (99,2%) e com maior nú-mero de amostras excedendo os limites detolerância. Contudo, essas cifras são infe-riores as nossas, conforme pode serobservado na Tabela l, onde as amostrascom resíduos têm uma freqüência de 96,9%e é de 17,3% as que se apresentaram acimados limites de tolerância. Nesse mesmotrabalho, ficou evidenciado que os pragui-cidas mais freqüentes foram DDT e meta-bólitos com 84,2% e Dieldrin com 42,1%em carnes vermelhas. Os praguicidas me-nos freqüentes foram Heptacloro, BHC eLindane respectivamente com as freqüên-cias de 23,2%; 16,5% e 15,9%. Com exceçãodos valores para DDT, os demais estãoabaixo daqueles obtidos por nós.

CONCLUSÕES

Tendo em vista os resultados das análisesefetuadas, parece ser lícito concluir:

1. Resíduos de um ou mais praguicidasforam encontrados em cerca de 97%das amostras, tanto de matéria prima,como de produto processado.

2. Resíduos organoclorados foram encon-trados em 27% das amostras de ma-téria prima e em cerca de 11% das deproduto processado em violação aoslimites estabelecidos pela legislação.

3. Heptacloro, BHC, Aldrin e Dieldrin fo-ram os compostos químicos que seapresentaram com maior freqüência.

4. Lindane e DDT foram os menos fre-qüentes e seus resíduos em nenhumaoportunidade ultrapassaram os níveisde tolerância.

5. Praticamente todas as amostras, inde-pendente de sua procedência, continhamresíduos de um ou mais praguicidas.

6. Os Estados do Paraná e de São Pauloforam os que contribuiram com maiornúmero de amostras acima dos níveisde tolerância, em que pese o pequenonúmero de análises referentes ao pri-meiro.

7. Os teores de resíduos de praguicidasmais elevados, encontrados acima doslimites de tolerância, foram 5,464 ppmpara Dieldrin e 2,852 ppm de BHC,em amostras de matéria prima (gor-dura bovina) procedentes, respectiva-mente, dos Estados de Mato Grosso doSul e de São Paulo.

8. A média aritmética dos valores encon-trados relativa a resíduos de BHC eDieldrin, em amostras de matéria primaacima dos limites de tolerância, foram,respectivamente, 0,693 ppm e 0,718ppm.

AGRADECIMENTOS

Aos Drs. Domingos Isoldi Pinkoski, Di-retor do Laboratório Nacional de Referên-cia Animal do Ministério da Agricultura(LANARA) e Cláudio Roberto Tavares deAlmeida, Assistente do LANARA, pelascriteriosas orientações; Ao Dr. Ícaro Da-másio Alves, Chefe do Serviço de Inspeçãode Produtos de Origem Animal/SP doMinistério da Agricultura (SERPA/SP)pelas facilidades proporcionadas. Aos Drs.Schubert Aranha e Luiz Carlos Hermes,Farmacêutico-Bioquímico do Laboratório deReferência Animal/SP do Ministério daAgricultura (LARA/SP), pela valiosacooperação. Ao Prof. Dr. Armando Pio-vesan, da Faculdade de Saúde Pública daUSP, pelas oportunas sugestões.

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RSPUB9/519

CARVALHO, J. P. de P. et al. [Levels of organochlorine pesticide residue in meatproducts inspected by the federal government] Rev. Saúde públ., S. Paulo,14:408-19, 1980.

ABSTRACT: To bring attention to the frequency and the levels of organochlo-rine pesticide residue in meat, 445 samples of raw material (bovine f a t ) frombovine carcasses collected from meat packing plants and 132 samples of preservedmeat (canned, such as corned or roast beef) were analyzed. Seventy-seven samplesof bovine fat and 8 of preserved meat were discovered to have pesticide residueabove the maximum acceptable limits. Pesticide residue was found in practicallyall the samples without, however, exceeding the acceptable limits. Twenty-sevenpercent of the bovine fat samples and 10.6% of the preserved meat containedresidue above the legal tolerance levels. Heptachlor, BHC, and Dieldrin werethe most frequent; Lindane and DDT, the least.

UNITERMS: Food contamination. Pestecides. Inseticides, organochlorine.

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Recebido para publicação em 10/04/1980

Aprovado para publicação em 23/06/1980