fileortodoxia neoliberal e uma esperança para uma região ávida de oportunidades e de igualdade”...

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Este é o título da matéria de capa da revista Domingo do jornal espanhol El País do dia 3 de novembro de 2002. A ampla matéria analisa o significado das eleições presidenciais brasileiras, especialmente para a América Latina. Para o jornal, a vitória de Lula significa a primeira mudança significativa, nas duas últimas décadas, na América Latina. O seu triunfo “numa das principais economias do mundo em desenvolvimento, significa um desafio à ortodoxia neoliberal e uma esperança para uma região ávida de oportunidades e de igualdade” No Brasil, análises e debates animaram a semana pós- eleitoral. Por exemplo, na Unisinos, no IHU Idéias do dia 31 de outubro, a profa. Suzana Kilpp analisou a exposição midiática de Lula, especialmente a presença exclusiva na TV Globo. No próximo IHU Idéias, no dia 7 de novembro, Raul Pont, sociólogo, já professor da Unisinos, recém-eleito deputado estadual fará uma análise das recentes eleições brasileiras. Neste número do IHU On-line, na tentativa de entender melhor o fenômeno eleitoral, publicamos a entrevista Raul Pont e, buscando aprofundar o debate sobre o assim chamado ‘mito’ Lula, reproduzimos o artigo de Marilena Chauí, filósofa e a entrevista de José de Souza Martins, sociólogo. São textos que suscitam uma interessante discussão sobre o momento político atual. Ainda neste número a leitura dos dois artigos de José Luís Fiori e Cesar Benjamin, contribuem para entender melhor o fascinante e desafiador momento brasileiro. AS ELEIÇÕES NO BRASIL: UMA ANÁLISE ENTREVISTA COM DEP. RAUL PONT No próximo dia 7 de novembro, no IHU Idéias, será abordado o tema. Panorama atual das eleições no Brasil com o recém-eleito deputado estadual Raul Pont. Raul Pont é graduado em História pela UFRGS, é especialista em Ciências Políticas pela

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AASS EELLEEIIÇÇÕÕEESS NNOO BBRRAASSIILL:: UUMMAA AANNÁÁLLIISSEE EENNTTRREEVVIISSTTAA CCOOMM DDEEPP.. RRAAUULL PPOONNTT No próximo dia 7 de novembro, no IHU Idéias, será abordado o tema. Panorama atual

das eleições no Brasil com o recém-eleito deputado estadual Raul Pont. Raul Pont é graduado em História pela UFRGS, é especialista em Ciências Políticas pela

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Unicamp, foi professor na Unisinos entre 1977 e 1991, vice-prefeito de Porto Alegre de 1993 a 1996, prefeito de Porto Alegre de 1997 a 2000, Deputado Estadual de 1987 a 1990, Deputado Federal de 1991 a 1992, e é atualmente professor do curso de Especialização em Gestão Pública Participativa na UERGS, em Porto Alegre.

IHU On-Line- Como o Sr. descreveria o Brasil destas últimas semanas? Raul Pont- Eu vejo que estamos num momento de mudanças. A resposta da sociedade nas urnas pode ser lida como um esgotamento do modelo que marcou o Brasil em todo este período. Um período que não foi exclusivo do Brasil, foi de todo o continente americano que teve políticas muito parecidas. O comprometimento com os direitos e conquistas sociais foi substituído por um processo em que o Estado tentou uma retomada do crescimento econômico por uma política de privatização que não funcionou como elemento de desenvolvimento econômico. O processo eleitoral apontou a reivindicação de outro rumo, outra orientação. A vitória de Lula e o crescimento da bancada do PT no parlamento expressa um processo de mudança no quadro político. É um projeto que não está muito definido para onde vai, mas que será uma mudança significativa IHU On-Line- Em que aspectos poderiam ser marcadas as principais mudanças a partir de janeiro de 2003? Raul Pont- Lula vai apostar mais no mercado interno, na soberania nacional, na distribuição de renda, na reforma agrária. O governo FHC estava encaminhando, por exemplo, a questão da ALCA de uma maneira que, direta ou indiretamente, conforme o demonstrado, não estava de acordo com as expectativas do povo. Enfrentar os interesses internacionais vai ser muito difícil e é uma interrogação. Vamos ter uma dificuldade muito grande, porque o projeto Bush de "integração" implica um grande controle dos EUA e submissão de nossa parte. Mas, não sei se, consciente ou não, a população escolheu outro caminho, outro projeto. IHU On-Line- E internamente, no Brasil, como o Sr. vê que será possível a governabilidade? Raul Pont- A oposição é grande, somos minoria no Congresso Nacional. Eu acho que o Governo deve buscar um apoio maior nos movimentos sociais e uma relação mais direta com os municípios. Penso que ter possíveis aliados no Congresso para garantir a governabilidade é algo utópico. Não sei se vai ser esse o caminho de Lula. Eu apostaria numa democracia mais direta; criar outra relação de forças. Se, em terreno onde somos minorias, apostássemos na governabilidade, ficaríamos um pouco como reféns IHU On-Line- A que o Sr. atribui a derrota do PT no Estado do RS? Raul Pont- A um somatório de variáveis. Por um lado, a composição de forças em torno de Rigotto foi muito poderosa. Também acho que ele vai ter que pagar um preço muito alto por isso. Os partidos de maior consolidação no RS estão em torno dessa candidatura, por isso acho que ele vai ficar um pouco imobilizado. Por outro lado, houve alguns erros nossos. O governo atual foi apresentado ou defendido de maneira equívoca, insuficiente. No primeiro turno, nossa candidatura foi muito personificada. Não houve um bom diálogo com o eleitor em relação ao que o governo fez. E, por sua vez, o grupo RBS teve uma postura muito dura conosco, formando um preconceito muito grande. Foi criada uma postura de negação não a medidas concretas, e sim ao PT como tal. Eu notei isso, porque eu fiz uma

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campanha muito corpo a corpo e encontrei em muita gente rejeição ao PT, mas as pessoas não conseguiam identificar que políticas do governo as prejudicaram. Em síntese, nós não soubemos expressar o que o governo fez, e o nosso governo foi muito combatido pelo grupo RBS. Desde o início, ele tentou não criticar, e sim desestabilizar o nosso governo. Há uma série de processos na justiça que envolvem o governo Simon ou que poderiam envolver Rigotto, porque estão relacionados a seu irmão, casos de abusos de dinheiro etc, mas esses são silenciados, e conosco fizeram uma massacre como no caso da CPI. IHU On-Line- O PT, em âmbito nacional, sai desta eleição mais dividido, fragmentado com muitas insatisfações internas? Raul Pont- Acho que não. Há uma fragmentação que não é real, é criada pela mídia. Como se o partido estivesse numa guerra de vida ou morte. Não temos, por exemplo, as rupturas que tem o PMDB. Só que a mídia de nós cobra muito mais uma coerência interna que não cobra de outros. Aqui, no RS, por exemplo, o partido foi muito mais unitário nesta eleição que na anterior.

CCOONNFFIIRRAA AA PPRROOGGRRAAMMAAÇÇÃÃOO DDOO IIHHUU IIDDÉÉIIAASS NNOO MMÊÊSS DDEE NNOOVVEEMMBBRROO 07/11/02 – Apresentação do tema: "Panorama atual das eleições no Brasil". Prof.

Raul Pont - Deputado Estadual

14/11/02 – Apresentação do tema: Victor Hugo e "Os Miseráveis” - Profa. MS

Mônica Kalil Pires.

21/11/02 – Apresentação do tema: “O amor e suas vicissitudes: as concepções de

crianças e adolescentes” - Profa. Dra. Vera Regina Ramires.

28/11/02 – Apresentação do livro: “Lógica do Niilismo: Dialética, Diferença,

Recursividade” de Franca D´Agostini. Prof. Dr. Marcelo Fernandes

de Aquino.

O evento IHU Idéias se realiza sempre na sala 1C103 das 17h30min às 19h. Sempre é servido um café e um suco de laranja. Quando da apresentação de um livro, como no próximo dia 28, a Editora Unisinos oferece um desconto de 40% na compra do mesmo.

Recebemos de César Benjamin o texto, com o título acima, que será publicado no

próximo número da revista Caros Amigos. César Benjamin é autor de A opção brasileira Rio de Janeiro: Contraponto, 1998, nona edição, e integra a coordenação nacional do Movimento Consulta Popular. Os subtítulos são nossos.

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TTOOMMAARRAA QQUUEE TTUUDDOO DDÊÊ CCEERRTTOO

“Creio que ninguém está habilitado a fazer previsões sobre como será o Brasil na nova fase que se inicia. As incógnitas são grandes demais. Precisaremos de tempo para poder começar a decifrar aquilo que denominei, em artigo recente, o “enigma Lula”. Não pode haver dúvida, no entanto, de que temos o dever de ajudar o novo governo a dar certo. Lula é o primeiro filho do povo pobre a ascender à Presidência. É verdade que conseguiu este notável êxito equilibrando-se na corda bamba, prometendo omelete para todos sem quebrar ovo nenhum. Mas nunca rompeu com a base social ligada à sua história de vida e sua trajetória política. Suas primeiras declarações, enfatizando o problema da fome – face mais dramática da nossa questão social –, renovam esperanças.

""MMEENNOOSS DDOO QQUUEE AANNAALLIISSTTAASS NNEEUUTTRROOSS,, PPRREECCIISSAAMMOOSS,, MMAAIISS DDOO QQUUEE NNUUNNCCAA,, SSEERR MMIILLIITTAANNTTEESS ""

Um eventual fracasso do novo governo será um fracasso de todos nós, um

fracasso do Brasil. Menos do que analistas neutros, precisamos, mais do que nunca, ser militantes claramente posicionados ao lado da esperança que nosso povo manifestou. Nenhum negativismo gratuito deve prosperar: o futuro está em aberto para ser construído. Tampouco deve prosperar a bajulação: os desafios são enormes, seja pela complexidade, seja pelo ineditismo da situação criada.

Passada a ressaca das comemorações, faço aos dirigentes do PT um apelo para que não cometam um erro fatal. Refiro-me às notícias de que eles concordariam, ou até mesmo patrocinariam, uma alteração constitucional que abriria caminho para uma regulamentação parcial e casuística, ainda neste ano, do artigo 192 da Constituição. O objetivo explícito dessa manobra seria permitir a edição, antes da posse do novo governo, de uma lei complementar que concederia autonomia legal ao Banco Central. A crer no que sai na imprensa, dirigentes do peso de José Dirceu, Guido Mantega e Antônio Palocci vêm se posicionando a favor da medida, considerada por este último como “uma sinalização importante para o mercado [financeiro] da seriedade com que o PT pretende conduzir a economia”. Entre todos os erros que podem vir a ser cometidos nessa fase de transição, este é, de longe, o mais importante, por seu alcance e por seu caráter irreversível. Precisa ser evitado, nem que seja por simples prudência, para ampliar o debate e amadurecer melhor a questão. Conceder autonomia legal ao Banco Central de forma açodada, em vez de seriedade, será uma demonstração de incompetência e fraqueza.

A linha de argumentação dos que defendem essa medida é a seguinte: o Banco

Central deve trabalhar com metas (de inflação e de câmbio) definidas com participação do governo, mas suas decisões operacionais devem ser preservadas de qualquer interferência política indevida; por isso, seus dirigentes passariam a receber um mandato de quatro anos, sancionado pelo Senado, tornando-se independentes do próprio presidente da República. O argumento, à primeira vista, é apenas simplório. Pois poderia ser usado para defender autonomia legal para todos os órgãos governamentais. Afinal, qual deles não deve ter metas? Qual não deve ser preservado de interferências indevidas? A educação, a saúde, a previdência, o Incra, o BNDES, as empresas de energia e as demais – em qual desses setores a politicagem deve ser tolerada? Em nenhum, é claro. Logo, a mesma lógica deveria conduzir à proposta de que, depois de definidas as metas setoriais, todos os

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ministérios, órgãos e empresas públicas fossem declarados entes autônomos, por força de lei, restando ao presidente recolher-se a uma casa de praia, para não mais interferir na racionalidade (supostamente) técnica que a partir de então presidiria as decisões dos gestores...

Isso não é sério. Por trás do caráter aparentemente simplório da proposta, nela só há esperteza. É o Banco Central quem estabelece as regras de operação do sistema financeiro, gerencia as dívidas interna e externa, cuida das reservas internacionais, fixa a taxa de juros, conduz a política de câmbio, acompanha a remessa de recursos para o exterior e emite (ou deixa de emitir) dinheiro, entre outras atribuições. Tudo isso define quais serão as taxas de crescimento esperado da economia, o nível do emprego, o montante dos gastos públicos e o volume de crédito disponível para o setor produtivo real. Ou seja, o Banco Central conduz o “núcleo duro” da política econômica. Talvez por isso, todos os presidentes brasileiros, incluindo Fernando Henrique, recusaram-se a aceitar esse tipo de autonomia que agora se pretende estabelecer.

""OO PPTT TTEEMM TTOODDAASS AASS CCOONNDDIIÇÇÕÕEESS PPAARRAA NNÃÃOO CCEEDDEERR"" O PT tem todas as condições – legais, políticas e morais – para não ceder. Um

Congresso em fim de mandato não pode alterar, a toque de caixa, a Constituição do país. E não custa lembrar que foi a bancada federal do PT quem tentou regulamentar o artigo 192, apresentando na época adequada um bom projeto de lei que, entre outras coisas, pretendia submeter as decisões do Banco Central (considerado independente demais!) a uma avaliação periódica por parte de instâncias representativas da sociedade. Exatamente o oposto do que se defende agora. O projeto está parado na Câmara há onze anos, barrado pela maioria conservadora. Por que aceitar que se faça em pouco mais de um mês, em sentido oposto à posição histórica do PT, uma regulamentação que os conservadores vêm se recusando a fazer há catorze anos, desde a promulgação da Constituição de 1988?

O que está em jogo não é pouco. Em primeiro lugar, como disse acima, está a capacidade controlar a operação do sistema financeiro. Bancos são empresas especiais, que por definição não podem honrar seus compromissos em nenhum momento específico. Pois, em uma ponta, recebem depósitos que, em tese, seus clientes podem sacar a qualquer momento; na outra ponta, usam esses depósitos para conceder créditos, que só podem ser cobrados depois de cumpridos os prazos contratuais. Assim, os bancos estão sempre em desequilíbrio. Interessa à sociedade que eles corram esse risco, pois as operações de crédito são essenciais ao desenvolvimento econômico. Por outro lado, também interessa à sociedade que eles sejam empreendimentos seguros, pois uma crise bancária sempre é muito grave. Para compensar o risco inerente à sua atividade e garantir solidez ao sistema, os bancos – ao contrário das empresas comuns – podem recorrer a um emprestador de última instância, que lhes dá cobertura. É o Banco Central, a quem, como vimos, a sociedade concede a especialíssima prerrogativa de emitir dinheiro.

Ora, se o Banco Central (um órgão público) tem a obrigação de garantir a solvência do sistema bancário privado, usando para isso a faculdade de emitir a moeda nacional, é claro que ele precisa deter poderosos mecanismos de controle de todo o sistema. Por isso, os bancos estão sujeitos a regras muito mais estritas que aquelas vigentes para os demais setores da economia. No Brasil e em outros países, os bancos centrais dispõem de instrumentos bastante fortes de regulação do sistema financeiro, que aqui vêm sendo subutilizados por falta de vontade política. É por

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isso, por exemplo, que os bancos especulam abertamente contra a moeda nacional, com toda impunidade, e ganham bilhões. Aceitar a autonomia legal do Banco Central, nas condições atuais, é radicalizar essa situação. É legalizar a criação, para os bancos, de uma espécie de “território liberado”, que o governo brasileiro desistiu de submeter às suas próprias decisões. Em situação de crise – situação mais do que provável –, o presidente da República estará legalmente privado de poderes para intervir, alterando a política monetária e cambial, se assim achar necessário.

""OO MMOODDEELLOO AATTUUAALL JJÁÁ FFAALLIIUU"" Sem o controle do Banco Central também não se consegue mudar o modelo

econômico. E, como sempre disse o PT, é exatamente isso que precisa ser feito, sem demora. Pois o modelo atual já faliu. Por indução externa, mas com forte apoio interno das nossas elites, realizou-se na economia brasileira uma abertura irresponsável, pois – ao contrário, por exemplo, das economias asiáticas – não contávamos com grandes empresas nacionais (capazes de conduzir uma inserção ativa no sistema internacional) nem tínhamos condições, nesse novo contexto, de gerar superávits na conta-corrente do balanço de pagamentos. Ficamos expostos a crises recorrentes, neutralizadas no curto prazo pela atração de vultosos recursos externos, em um contexto de liquidez internacional abundante. A manutenção de elevadas taxas de juros, a venda do patrimônio público e a indução à desnacionalização do sistema produtivo e dos recursos naturais do país foram os principais expedientes usados. Esse modelo de gestão se esgotou, por motivos internos e externos, e o Brasil submergiu em uma crise cambial que já se instalou. Ela ainda não nos desarticulou completamente por causa dos sucessivos aportes de recursos do FMI. Esses aportes vêm acompanhados de exigências que fragilizam ainda mais a nossa economia e preparam novas rodadas de concessões, num processo semelhante ao que levou a Argentina ao colapso.

AA GGRRAANNDDEE DDEECCIISSÃÃOO DDOO GGOOVVEERRNNOO LLUULLAA

A decisão fundamental do governo Lula, na área econômica, será entre prosseguir nesse caminho ou ter coragem para mudar. Nos dois casos, há dificuldades à vista. Lula não deve hesitar em dizer isso ao povo. Mas deve deixar claro uma diferença fundamental: os sacrifícios exigidos pelo caminho atual são inúteis, pois neste caso a crise reaparecerá logo mais adiante, agravada; a alternativa progressista, ao contrário, contém em si as condições para superar dinamicamente suas dificuldades iniciais.

A luta pelo controle do Banco Central é a mais importante arena atual desse debate. Infelizmente, porém, não é a única. Associado à defesa dessa medida estapafúrdia, e de forma coerente com ela, porta-vozes do PT vêm se propondo a manter – e até aumentar – o chamado superávit primário. Isso é tecnicamente indefensável. Superávit primário é um conceito espúrio, desprovido de consistência. É uma construção ideológica do Consenso de Washington.

Do ponto de vista macroeconômico, é indiferente se o Estado emite R$ 1,00 para remunerar professores ou para remunerar milionários que vivem de rendas. Mas, pela contabilidade do FMI e do governo brasileiro, que o PT está se propondo a perpetuar, a remuneração de professores (ou a compra de merenda escolar, o investimento em sistemas de água e esgoto, a construção de hidrelétricas, etc) ameaça as metas dessa anomalia chamada superávit primário; como tal, está enquadrada nos estreitíssimos limites da chamada Lei de Responsabilidade Fiscal. Já a remuneração de rentistas está liberada, pois simplesmente não entra nessa

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contabilidade oportunista, inventada sob medida. Desafio qualquer economista a me apresentar uma alegação técnica para justificar essa diferença de tratamento.

Dependendo das circunstâncias, Estados nacionais podem optar, legitimamente, por ter déficits, supervávits ou equilíbrio fiscal. Ter “superávit primário”, no entanto, não tem sentido nenhum. Ou melhor, serve para justificar o injustificável: em uma economia em recessão, o Estado continua retirando grandes quantidades de recursos da sociedade para continuar emitindo moeda financeira, ou moeda que rende juros (hoje de 21% ao ano), que só os bancos administram e só os ricos possuem, na maior parte entesourada. Este é o mais importante mecanismo de concentração de renda em operação no Brasil nos últimos anos. E cria a pior forma de déficit público, aquele que aprofunda a recessão. Insistir nesse caminho, em um contexto de 20% de desemprego, isso sim é uma enorme irresponsabilidade.

""OO NNOOVVOO GGOOVVEERRNNOO PPRREECCIISSAA LLIIBBEERRTTAARR--SSEE DDEESSSSAASS CCAAMMIISSAASS--DDEE--FFOORRÇÇAA""

O novo governo precisa libertar-se dessas camisas-de-força, e não criar novas. Em vez de se tornar autônomo, o Banco Central precisará trabalhar de forma intimamente articulada com o Tesouro Nacional, ambos perseguindo metas combinadas não só para a inflação e o câmbio, mas também para o emprego e o volume de crédito ofertado à economia real. Essa ação articulada deve assegurar que a economia seja irrigada com os fluxos monetários e financeiros necessários para conduzi-la, com relativa estabilidade de preços, a uma posição cada vez mais próxima do pleno emprego, ou seja, ao nível em que a produção efetivamente realizada coincida com o uso do potencial produtivo existente. Só aí deve o Estado operar em equilíbrio fiscal.

Estamos longe disso. Há muito a fazer. Em vez de ficar no atoleiro, gerenciando um modelo que já faliu, uma agenda progressista – verdadeiramente séria e responsável – deveria articular um conjunto de medidas que convergissem rapidamente para três grandes metas macroeconômicas: obter equilíbrio na conta-corrente do balanço de pagamentos (sem ilusões de que conseguiremos isso mediante um choque de exportações), remontar um sistema interno de financiamento do desenvolvimento (capaz de oferecer um choque de crédito, graças a uma ação coordenada do Banco do Brasil, da Caixa, do BNDES, do Banco do Nordeste, dos fundos de pensão e do sistema bancário privado, devidamente enquadrado pela ação do Banco Central) e começar desde logo a alterar dramaticamente as condições do mercado de trabalho (pois com 20% de desemprego aberto e 50% de informalidade nenhuma justiça social é possível).

Em paralelo, a nova política econômica deveria preparar um novo ciclo de desenvolvimento, orientado para a criação do mercado interno de massas, que exigirá pelo menos quatro precondições, de maturação mais lenta: um significativo barateamento nos custos da alimentação (para liberar poder de compra do povo para outros produtos), um enorme programa de habitação popular (para estimular não só a construção civil, mas também as variadíssimas indústrias de equipamentos domésticos), uma ampliação e retomada dos serviços públicos essenciais (altamente geradores de emprego) e a generalização do acesso a energia segura e barata. Todas essas frentes estratégicas – que no mundo inteiro formaram a base dos processos de desenvolvimento baseados no consumo de massas – apresentam baixíssimo coeficiente de importações.

Se a operação montada para promover a autonomia legal do Banco Central se completar, estará eliminada a possibilidade de mudar o modelo nessa direção, ou

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em outra qualquer, igualmente progressista. Neste caso, o governo Lula não se constituirá de fato. Todo o esforço para viabilizá-lo política e eleitoralmente culminará em uma espécie de Batalha de Itararé – a grande batalha da história do Brasil, que não chegou a ocorrer. Esperemos que Lula não aceite ser o presidente que foi, sem ter sido. Tomara que tudo dê certo”.

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O Auditório Maurício Berni, no Centro de Ciências Jurídicas, foi palco, no último dia 28, de um debate atual: Psicanálise e Religião foi o assunto em pauta. Francês e psicanalista, Roland Chemama abordou O discurso da ciência e as novas formas de expressão religiosa. Chemama é organizador do Dicionário de Psicanálise Larousse, e autor do livro Elementos lacanianos para uma psicanálise do cotidiano, Editora CMC, 347 páginas, 2002, R$ 45,00 na Livraria Kiesel, no Centro de Ciências da Saúde. A promoção do evento foi uma parceria do Laboratório de Filosofia e Psicanálise, inserido no PPG em Filosofia, e do Instituto Humanitas Unisinos. IHU On-Line conversou com Chemama sobre as mudanças instituídas pelas novas religiões e a relação com a psicanálise. Leia, a seguir, trechos da entrevista concedida a nós. Os subtítulos são nossos. IHU On-Line - Como o senhor vê a multiplicação de grupos religiosos nas últimas décadas? Roland Chemama - A psicanálise está confrontada com a evolução do mundo contemporâneo, pela Pós-Modernidade. Estamos num mundo em que o homem perde as possibilidades de encontrar referências. Um discurso comum para a humanidade é o que, ao mesmo tempo, seja racional, mas que lhe dê possibilidade de se orientar na sua ação. Qualquer um pode se dar conta da falta desse discurso hoje. Nós constatamos que, quando esse discurso falha, um certo número de novas religiões vem responder a essa questão do sentido, mas de um modo que nos parece problemático. Ou seja, no lugar de uma autoridade com um certo valor, há um discurso, muitas vezes, claramente irracional que compreende uma ligação a personalidades carismáticas, com um verdadeiro poder pessoal. Isso só pode nos inquietar. Os psicanalistas, como outros, mas com os seus meios, refletem sobre isso.

RREELLIIGGIIÕÕEESS SSEEMM TTEEOOLLOOGGIIAA IHU On-Line - Quais as causas das mudanças na forma de propor a religião? Roland Chemama - Eu creio que, para compreender o que se passa, é preciso remontar há muito tempo atrás, isto é, no momento em que se constituiu a ciência moderna. Antes de Descartes, por exemplo, a racionalidade científica e uma certa

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racionalidade teológica não se opunham. Elas se completavam para as pessoas. Havia teólogos que pensavam os problemas do ser humano. A partir da introdução do discurso da ciência, ocorreu uma ruptura entre o discurso científico de um lado, que se tornou cada vez mais abstrato, com um agenciamento de pequenas letras na Física, por exemplo, e uma religião do outro lado, onde a parte da Teologia, isto é, a tentativa de pensar a coisa, diminuiu. As novas religiões são, de certo modo, religiões sem Teologia. Unem uma certa forma de adesão a um apelo sentimental em relação ao encontro de uma divindade, com eventuais práticas corporais de dança e de todas essas formas que se conhecem. Talvez as religiões tradicionais vão ter necessidade de se parecer com as novas religiões. Quando se reúnem dois milhões de pessoas em nome da fé católica e se as faz dançar, isso está muito próximo das novas religiões.

DDEEUUSS EE OO MMUUNNDDOO EESSTTÃÃOO NNOO MMEESSMMOO PPLLAANNOO IHU On-Line - Esse aspecto de irracionalidade das novas religiões pode ser considerado como perigoso para a psicanálise? Roland Chemama - Certamente colocamos problemas em termos de perigo, mas creio que um psicanalista não se apressa em denunciar um perigo, sem antes compreender o que se passa. Há uma nova situação. Igualmente os homens políticos se dão conta dessa situação. E há alguns que fazem aliança com os grupos religiosos. O psicanalista tem que se dar conta dessa situação, porque o discurso que eles escutam hoje não é mais o mesmo de 50, 60 anos atrás. IHU On-Line - Que características tem a divindade à qual fazem referência as novas religiões? Roland Chemama - Para Lacan, os deuses eram pensados como radicalmente "outros". Eles não estariam na nossa realidade, mas no que Lacan chama o real, isto é, aquilo que não se pode completamente singularizar ou imaginar. As novas religiões partem da ilusão de que Deus e o mundo estão no mesmo plano. Nesse sentido, isso lhes faz perder as referências, porque nós temos necessidade de uma ordem "outra". Não é necessariamente a ordem religiosa, mas as religiões podem dar um sentido a esse caráter, e talvez isso hoje se perca.

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Apresentamos a seguir uma nota sobre o VI Congresso Mundial de Bioética, realizado em Brasília, na semana passada. Da Unisinos, participaram o Prof. Dr. José Roque Junges e a Profa. Dra. Lucilda Selli. Ambos são professores e pesquisadores do Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva do Centro de Ciências da Saúde. Pedimos ao Prof. José Roque Junges, que é também articulador do grupo temático bioética do IHU, um relato sobre o evento e o publicamos abaixo. “Nos dias 30 de outubro a 03 de novembro aconteceu em Brasília o Sexto Congresso Mundial de Bioética convocado pela International Association of Bioethics e organizado pela Sociedade Brasileira de Bioética e o Núcleo de Estudos e Pesquisas em Bioética da Universidade de Brasília, tendo à frente o Prof. Volnei Garrafa. O fato de o Brasil ter sido a sede de um evento com tal

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magnitude e importância, aponta para a maturidade do pensamento bioético brasileiro. Sediar o Congresso abriu a possibilidade da escolha do tema por parte do grupo organizador no Brasil, definido como "Bioética, poder e injustiça". Essa escolha foi muito feliz, porque possibilitou tratar os desafios da vida na perspectiva dos excluídos e dos países periféricos. Os professores Giovanni Berlinguer (Itália), Volnei Garrafa (Brasil) e José Maria Cantú (México) entre outros usaram a palavra de uma maneira profética e interpeladora, denunciando a insensibilidade dos países ricos e apontando para a situação de não vida em que estão reduzidas as populações dos países pobres. Daí surgiu a proposta de construir uma hard bioethics ou de politizar a bioética, tornando-a mais efetiva e engajada na denúncia de situações de injustiça que atentam contra a vida humana e a sobrevivência do planeta. O tema central perpassou todo o congresso, desafiando a pensar as questões da bioética na perspectiva do poder e da injustiça(1). Concomitantemente com o congresso mundial aconteciam dois outros encontros: o Quarto Congresso brasileiro de Bioética, discutindo a partir do tema geral questões específicas da realidade brasileira e a Quarta Conferência da Feminist Approaches to Bioethics (FAB) com tema "Poder, injustiça e gênero". Com isso é possível dar-se conta da magnitude do encontro pois estavam presentes 1.350 pessoas de 62 países. O mega-congresso oferecia de manhã conferências conjuntas sobre o tema central e à tarde a escolha de uma variedade de encontros e discussões sobre desafios e questões de bioética acontecendo simultaneamente. A grande contribuição do congresso foi a de fazer repercutir no cenário mundial da bioética a voz dos excluídos do banquete da vida, porque injustiçados e sem poder para reivindicar seus direitos de participação nos bens gerados pela humanidade. Assim, a fome precisa ser uma das questões centrais da bioética dos países periféricos, como a injusta distribuição das riquezas um contínuo reto e desafio posto à consciência dos bioeticistas do primeiro mundo.

Outro tema bastante presente nas discussões foi a questão da pesquisa com células tronco embrionárias. Trata-se de uma típica discussão dos países do primeiro mundo, especialmente Estados Unidos e Grã- Bretanha. Pode parecer, à primeira vista, que é uma temática que não interessaria aos bioeticistas brasileiros, porque os problemas básicos de saúde não resolvidos e persistentes no Brasil devem ser o objeto primordial de nossa reflexão ética e preocupação social. Contudo é bom ter presente que os resultados dessas pesquisas mais dia ou menos dia nos atingirão, provocando conseqüências positivas ou negativas e abrindo espaço para inclusão ou exclusão.

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Acompanhando a discussão dos temas de fronteira da bioética do primeiro mundo (células tronco, genoma etc) constata-se que existem duas nítidas tendências éticas, presentes também no congresso: uma anglo-saxônica de cunho utilitarista e pragmático (pergunta pelas conseqüências) e outra continental européia de cunho mais filosófico, hermenêutico e antropológico (pergunta pelos pressupostos). A perspectiva anglo-saxônica tenta justificar as novas biotecnologias pelas suas conseqüências, enquanto que a continental européia é mais crítica, porque vai aos pressupostos da compreensão que sustenta as biotecnologias. Fica a pergunta: a bioética serve apenas para justificar ou o seu papel é ser sadiamente crítica de pressupostos epistemológicos e antropológicos e de interesses econômicos em jogo

1 .- Sobre a hard bioethics confira o artigo de Volnei Garrafa, ‘Por uma ética periférica”, reproduzido no IHU On-line, no 40, 28-10-02, p. 29-31.

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na pesquisa e no uso das biotecnologias? Deve o bioeticista levantar questões de fundo que o pragmatista evita e retém como dispensáveis? Se o utilitarismo pode ser válido para resolver certos problemas concretos de beneficência e justiça, para outras questões em que estão implicadas questões de fundo como, por exemplo, o uso de células tronco embrionárias é necessário recorrer a um pensamento mais consistente que pergunta pelos pressupostos. A falta de uma maior consistência de embasamento filosófico é em geral a crítica que os europeus fazem à bioética utilitarista norte-americana”.

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Realizar-se-á no dia 8 de novembro de 2002, das 9h às 18h, no Auditório Central da Unisinos, o Seminário Economia Solidária: Teoria e Prática. O evento tem por objetivo proporcionar discussões e estudos para a elaboração e divulgação de um dicionário que visa à sistematização teórica e conceitual sobre as múltiplas manifestações da Economia Solidária, com a constituição de catálogo informativo sobre experiências nacionais e internacionais do assunto. Para as conferências e coordenação dos Grupos de Trabalho, o Seminário contará com a participação de autores nacionalmente reconhecidos nas áreas de Economia, Ciências Sociais e Filosofia, como: Paul Singer, Luiz Inácio Gaiger, Euclides Mance e Marcos Arruda. O evento terá sua conferência de abertura realizada pelo economista com trajetória internacional e Presidente da Finansol – França (entidade coordenadora de ONGs de finanças solidárias) e da Federação Francesa de Organizações de Solidariedade Internacional, o francês Henri Rouillé d’Orfeuil.

"�������������� Na última quinta-feira, dia 31, ocorreu a formatura da primeira turma do Curso de Introdução à Informática para Surdos, organizado pelo Programa de Ação Social na Zona Sul de São Leopoldo do Instituto Humanitas Unisinos. Doze alunos entre 15 e 25 anos das escolas Kelli Meise Machado, de Novo Hamburgo, e Pe. Reus, de Esteio, assistiram a 60 horas/aula sobre o histórico da informática, sua importância, noções de Windows, Word, Excel, Power Point, Internet e Correio Eletrônico. A idéia de realizar um curso para surdos partiu do formando em Informática e funcionário da Unisinos, Vinícius Souza, que foi, voluntariamente, o professor ministrante. Essa iniciativa faz parte do Projeto Inclusão Digital que conta com mais 14 turmas, que atende uma população heterogênea da nossa cidade e cidades vizinhas. As aulas aconteceram de junho a outubro, no laboratório de informática do IHU. Também prestaram apoio voluntário as monitoras Maria Helena Pilengui e Márcia Aguiar. Na "cerimônia" de formatura, o ministrante exibiu uma apresentação em Power Point do conteúdo do curso, uma foto da turma e uma reflexão sobre a surdez. O evento culminou com uma integração festiva entre alunos, monitores, coordenadores, familiares e convidados.

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Confira os depoimentos de alunos e monitores. "Fui muito bom. No início foi difícil até aprender a linguagem dos sinais, mas depois foi ótimo. Eu poderia ter ministrado esse curso nas escolas deles, mas preferi trazê-los aqui, para que a Universidade se contagiasse com o clima do voluntariado. A idéia agora é de organizar uma nova turma para 2003".

Vinícius Souza, ministrante do curso

"Foi a primeira vez que trabalhei com surdos e a experiência foi fascinante. No início, não havia comunicação, mas ajudou muito o fato de duas alunas serem oralizadas. Aprendi muito com eles. Ouve o envolvimento dos alunos entre eles mesmos e deles conosco, que foi compensador. Eles se afeiçoam à gente. A única dificuldade era para chamar a atenção. Não adiantava gritar ou bater palmas. A saída era apelar para o interruptor de luz. Acendendo e apagando a lâmpada, eles sabiam que era hora de prestar atenção às explicações do monitor".

Maria Helena Pilengui, monitora do curso

"Foi tudo muito bom, bem espontâneo. Ficamos admiradas com o professor Vinícius pela ajuda que ele nos deu, abrindo um curso para surdos. Ele mostrou que os surdos também têm valor".

Giana Oliveira e Carla Suzana Müller, alunas do curso

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O Grupo Interdisciplinar de Estudos sobre Relações de Gênero e História das Mulheres na América Latina – NUIEG - do Instituto Humanitas Unisinos acaba de lançar seu primeiro evento. Trata-se da Jornada Pensando e Fazendo Gênero, a ser realizada no próximo dia 22 de novembro, na sala 1C110, no Centro de Ciências Humanas, das 8h30min às 17h. O evento pretende possibilitar o conhecimento entre as pessoas que trabalham com a questão de gênero na Universidade e fazer com que o trabalho desenvolvido sobre a temática seja conhecido pela comunidade acadêmica. A programação se constitui de comunicações acadêmicas que envolvem a questão de gênero. As inscrições para a apresentação de trabalhos podem ser feitas pela Internet, no endereço eletrônico: http://www.grupos.com.br/grupos/grupogenero. Podem inscrever-se projetos de pesquisa, grupos de estudo e núcleos, trabalhos monográficos de conclusão de curso de graduação, dissertações de mestrado, teses de doutoramento, publicações, eventos e produtos que proporcionem uma aproximação e discussão em torno do tema gênero, seja prático, seja teórico. Ao inscrever-se, a pessoa deve informar o tema do trabalho, o título, o nome de quem vai apresentá-lo e o grupo que representa, se for o caso. Após a recepção e a abertura dos trabalhos, a Profa. Marita Konzen, do Centro de Ciências Jurídicas e integrante do NUIEG, ministrará a palestra "As mulheres na Mitologia". A partir daí iniciam-se as apresentações de comunicações. Ao final da jornada, será dedicado um espaço para as conclusões e apresentações das propostas do NUIEG para 2003. Será estudado como operacionalizar a programação para o mês de março do próximo ano, em virtude da comemoração do Dia Internacional da Mulher, dia 8. A idéia é a de que haja programação para o mês todo, dentro e fora da Unisinos.

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Começa hoje e vai até quinta-feira a Semana Sociedade e Ambiente, promovida pelo Setor Ética, Cultura e Cidadania do Instituto Humanitas Unisinos. As atividades de hoje e amanhã acontecem no Auditório Central, no Centro de Ciências Humanas. Na quarta e na quinta-feira, os participantes devem dirigir-se ao Auditório Maurício Berni, no Centro de Ciências Jurídicas. Durante o evento, o Espaço Cultural, do Centro de Ciências Humanas, será palco da Exposição: Sociedade e Ambiente, com painéis, mapas, cartazes e vídeos sobre o tema. Das 17h às 19h, acontecem discussões técnico-científicas, trabalhos apresentados por professores e professoras e bolsistas no local.

Agende-se com a programação completa do evento: Hoje - segunda-feira Auditório Central Das 19h45min às 21h - Conferências: - Conclusões da Rio + 10 - Cláudio Langoni (Secretário Estadual do Meio

Ambiente); - Aplicação da Agenda 21 no Estado do Rio Grande do Sul - Nilvo Luís Alves da

Silva (Presidente da Fepam). Das 21 às 22 horas - Debate dos conferencistas com o plenário. Coordenador da mesa: Prof. Dr. Inácio Neutzling. Espaço Cultural Das 17h às 18h30min - Apresentações de trabalhos: 1. O cenário físico e paisagens da Bacia do Camaquã - Prof. Henrique

Fensterseifer 2. Imagens e técnicas de filmagem na Bacia do Rio Camaquã - Prof. Liceo

Piovesan e Acad. Antônio Bitencourt (bolsista) 3. Técnicas e elaboração de mapas temáticos - Márcia Gomes, Sabrina Fetter,

Fernanda Basso e Tiara Alves.

Amanhã - terça-feira Auditório Central Das 19h45min às 20h30min - Conferência: - Aplicação da Agenda 21 nas prefeituras do Estado do Rio Grande do Sul - Prof.

MS Jackson Müller. Das 20h30min às 21h30min - Apresentação de relatos locais sobre experiências de preservação do ambiente: - Questão ambiental couro e calçado - Adolfo Antonio Klein (Aecsul -

Associação das Indústrias de Curtumes do Rio Grande do Sul). Das 21h30min às 22h - Debate do conferencista e dos relatores de experiência com o plenário. Coordenador da mesa: Prof. Sérgio Trombeta. Espaço Cultural Das 17h30min às 18h15min - Apresentações de trabalhos: 1. A Vila Minas do Camaquã: Uma visão da Arquitetura - Profa. Eneida Stöher. 2. A ocupação, a história e o ambiente na região da Bacia do Rio Camaquã -

Profa. Dra. Marluza Harres.

Dia 06.11 - quarta-feira Auditório Maurício Berni (Centro 4)

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Das 19h45min às 22h - Depoimentos e relatos da Unisinos sobre preservação do meio ambiente: - Unidades de preservação e o projeto Camaquã - Prof. MS Henrique

Fensterseifer; - Educação ambiental - Prof. MS Paulo Saul, Prof. MS Carlos Nowatski, Prof.

MS Ronaldo Wasum; - Experiência Verde Campus - Profa. Dra. Luciana Gomes. Das 21h30min às 22h - Debate com o plenário. Coordenador da mesa: Prof. MS Solon Viola. Espaço Cultural Das 17h às 18h30min - Apresentações de trabalhos: 1. A vegetação rupestre na Bacia Hidrográfica do Camaquã - Prof. João Laroca. 2. A flora da Bacia do Camaquã - Gilda Goulart, Luciana Baretta e Maria Cristina

da Silva. 3. Contribuição ao estudo da fauna na Bacia do Rio Camaquã - Sandra Cardoso e

Ivanice Magalhães da Silva (bolsista). Dia 07.11 - quinta-feira Auditório Maurício Berni Das 19h45min às 21h - Conferência: - Sociedade sustentável - Prof. Dr. Demétrio Luis Guadagnin e Prof. MS Alcido

Anildo Arnhold. Das 21h às 21h30min - Debate dos conferencistas com o plenário. Das 21h30min às 22h - Homenagem a José Lutzenberger pela filha Lara Lutzenberger. - Coordenador da mesa: Prof. MS Henrique Fensterseifer. Espaço Cultural Das 17h às 18h30min - Apresentações de trabalhos: 1. O Direito Ambiental em Áreas Especialmente Protegidas - Anderson Lobato. 2. Unidades de Conservação e a Questão Indígena - Aritânia Lasania Girelli

(bolsista). 3. Estudo Jurídico para a adequação e implantação de Unidades de Conservação

na Bacia do Camaquã, RS - Carla Adriane Rossi e Tatiana Giacomet (bolsista).

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Ao longo da 48ª feira do livro, que está acontecendo em Porto Alegre, desde o dia 1º até o dia 17 de novembro, na Praça da Alfândega, está previsto para o dia 10 de novembro, o chamado "Dia Lutzenberger da Feira do Livro". O evento foi idealizado para homenagear e resgatar o trabalho e a filosofia do ambientalista, falecido neste ano. Durante esse dia, serão promovidas atividades com o objetivo de reintegrar o homem ao meio ambiente e o aproximar dos outros homens. A ordem do dia será meio ambiente, harmonia e paz do homem com os recursos naturais do planeta. Haverá palestras e oficinas em vários lugares próximos à Praça da Alfândega. Essa homenagem está sendo promovida pela Feira do Livro em parceria com uma série de Instituições, entre as quais está o Instituto Humanitas Unisinos. O professor Heraldo Campos fará uma palestra às 15h sobre Aqüífero

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Guarani - Reservatórios de águas subterrâneas, no salão de Bridge do Clube do Comércio. Veja, a seguir, a programação completa do Dia Lutzenberger da Feira do Livro. Dia 10-11-02 – Feira do Livro – Dia Lutzenberger 14h30 - Receitas culinárias alternativas - Cleo Amaral. Sala Leste do Santander Cultural. 15h - Aqüífero Guarani - Reservatórios de águas subterrâneas - Heraldo Campos. Salão de Bridge do Clube do Comércio. 16h - Cartilha Ambiental da Cultura Kaingang - Roberto P. dos Santos, Dieter Wartchw, Augusto O. da Silva e Valdemar Tógfi Vicente. Mediação de Mara Pohlmann. Auditório do Memorial do RS. 17h - Ecocidadania - Alexandre de Freitas. Salão de Bridge do Clube do Comércio. 17h30 - Em harmonia - Kaká Wera e Felipe Brisoela. Mediação Paula Caleffi. Sala Oeste do Santander Cultural. 18h - Atlas ambiental de Porto Alegre - Rualdo Menegat. Salão dos Espelhos do Clube do Comércio. Além das palestras, haverá oficinas sobre Métodos alternativos de controle de pragas em hortas e jardins (Valdir Secchi), Tai Chi Chuan na praça (Centro Cultural Tao), Passeio árvores urbanas (João Larocca), Oficina de tsurus (Alunos do CMET Paulo Freire), Plantas medicinais (Caroline Velloso e Karin Peglow), Alimentação integral e orgânica (Adir Kettenhuber), Tai Chi Chuan no entardecer (Centro Cultural Tao) e Biofertilizantes e fermentados (Glaci Campos Alves).

&� ����������� ���� � Um Brasil sem fome. O projeto que foi lançado pela CNBB à sociedade civil está ganhando cada vez mais adeptos. De maneira especial, a esperança cobra mais fundamentos diante de fatos como a insistência do Presidente eleito em priorizar o combate à fome. No dia 8 de novembro, o Estado do RS dará um importante passo nesse sentido com a realização do Seminário Estadual do Mutirão para a superação da Miséria e da Fome. O seminário, que acontecerá na PUCRS, terá a participação de Dom Paulo Moretto, Bispo de Caxias do Sul. O Prof. Dr. Antônio Davi Cattani apresentará um Diagnóstico da Miséria e da Fome no RS e o Dr. Paulo Leivas, Procurador do Ministério Público Federal no RS, fará a apresentação do Alimento como direito humano transformado em política pública. Segundo o Pe. Tarcísio Rech, Secretário Executivo da Comissão Regional do Mutirão, em entrevista telefônica a IHU On-Line, o Seminário vai chamar entidades da sociedade civil para dialogar, ver as necessidades no Estado e identificar suas causas e possibilidades. O Secretário salienta a urgência de articular os diversos setores da sociedade: Igreja, setores governamentais e privados, empresas, para que, realmente, se possa atingir, no Estado, o objetivo de acabar com a fome."A CNBB deu o chute inicial, mas o Mutirão já não é mais dela. A idéia é que, em cada município, se constitua algum grupo ou comitê que articule o Mutirão e dessa forma se abra para toda a sociedade civil", explicou o padre. Segundo ele, o Seminário deixará bem claro que

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o Mutirão não é uma grande Campanha de Alimentos, mas que pretende também inserir políticas públicas. A comissão regional do Mutirão olha com expectativa para o aporte que a Universidade possa dar para essa finalidade. "Convidamos as universidades para participar do Comitê, porque pensamos que ela tem um papel importante no sentido de iluminar a caminhada, para abrir frentes, trazer luz ao problema, nos orientar nas possíveis soluções. Eu vejo com preocupação, quando a universidade fica numa ação pontual numa Vila. O papel dela está muito acima disso", afirmou Pe. Tarcísio Rech.

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A Lealdade nas atuais relações de trabalho foi o tema discutido pelo Núcleo do Unitrabalho, do Setor Trabalho, Solidariedade e Sustentabilidade, no dia 30 de outubro, na sala 1C 111. Na ocasião, o Prof. Lauro Dávila, coordenador do Curso de Relações Públicas da Unisinos e membro do Unitrabalho, apresentou fragmentos de sua dissertação de Mestrado em Administração que deu título ao debate. No estudo, o autor buscou avaliar a importância atribuída à lealdade institucional no contrato psicológico que se estabelece entre as empresas que passaram por processos de redução de postos de trabalho, representadas pelos seus dirigentes e os seus empregados. O professor localizou as principais relações de trabalho que o homem vem estabelecendo ao longo de sua história, o surgimento e o ocaso da instituição emprego e a caracterização dos tipos humanos descritos na Teoria Geral da Administração, findando com a tentativa de distinguir um tipo humano contemporâneo - o homem da empregabilidade. Na pesquisa de campo, foram ouvidos diretores, gerentes, empregados e ex-empregados de empresas que passaram por processos de redução de postos de trabalho. Partindo dessas informações, chegou-se à mensuração desta redução, no ambiente de mudança, onde os sujeitos foram ouvidos, e um melhor conhecimento sobre como esse valor moral influencia os contratos psicológicos por eles estabelecidos. Como conclusão, a pesquisa mostra a importância atribuída à lealdade na ética do trabalhador contemporâneo, não mais leal a quem o emprega, mas às suas condições de ser empregável. Ainda no debate, o núcleo do Unitrabalho abordou a entrevista com o sociólogo alemão Ulrich Beck Terceira via de esquerda perde força, publicada na Folha de São Paulo, do dia 27 de outubro de 2002. O sociólogo chama a atenção para o fim do emprego. "Não existe trabalho para todos, e não voltará a existir ou, pelo menos, não na forma como o conhecemos agora", diz. Segundo ele, os Estados querem desmontar as redes de segurança que eles próprios ergueram, com grande esforço, no século passado, deixando para o cidadão sozinho arcar com suas responsabilidades. A partir desse contexto teórico, o grupo levantou a questão de como trabalhar a lealdade numa cooperativa de trabalho.

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Na última edição do IHU Idéias, ocorrida quinta-feira, dia 31, a Profa. Dra. Suzana Kilpp, do Centro de Ciências da Comunicação abordou o tema Sentidos identitários na TV. A professora explicou as diferenças entre identidade televisiva e sentidos identitários na tevê, considerando como televisivo os seres, identidades e acontecimentos veiculados na TV. Ao final da explanação, foram levantadas algumas questões sobre as técnicas televisivas utilizadas na cobertura da vitória do candidato à presidência da república, Luís Inácio Lula da Silva. "Achei o debate interessante porque nos leva a questionar e passar a selecionar o que vamos assistir na televisão. A gente não se dá conta de certas coisas, às vezes".

Marlise Becker, aluna do curso de Ciências Sociais

"A Universidade e o Instituto Humanitas Unisinos estão de parabéns pela realização do IHU Idéias. Ele oferece uma oportunidade de inter-relação das diversas áreas da Universidade. Achei a palestra da Suzana interessante porque sou da área e fiquei curiosa para ouvir a abordagem".

Profa. Lara Espinosa, professora do Centro de Ciências da Comunicação

"O momento de discussão foi muito bom, porque o assunto é atual. Esse tipo de debate é importante para a construção do conhecimento".

Marlon Engel, funcionário da TV Unisinos

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GÓMEZ DE SOUZA, Luiz Alberto – ALVES FERNANDES, Sílvia Regina (orgs.), Desafios do catolicismo na cidade. - CERIS – São Paulo: Paulus, 2002.

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O livro Desafios do catolicismo na cidade é uma produção do Centro de Estatística Religiosa e Investigações Sociais (CERIS). Trata-se de uma pesquisa sobre o Catolicismo no Brasil, realizada nas regiões metropolitanas de Porto Alegre, São Paulo, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, Salvador e Recife. O livro, com textos organizados por Luiz Alberto Gómez de Souza e Silvia Regina Alves Fernandes, apresenta os resultados da pesquisa, de acordo com os temas analisados. O universo utilizado foi de 5.218 adultos das classes E (60%), D (31%) e C (9%) entrevistados entre março e setembro de 1999. A Unisinos colaborou nesta pesquisa, por meio do Centro de Ciências Humanas, que aplicou o formulário com a colaboração de diversos estudantes do mesmo Centro. Eles são citados na página 7 do livro. Leia, a seguir, a resenha do livro escrita por Waldo César, sociólogo e jornalista, publicada no Jornal do Brasil 5-10-02 e posteriormente uma entrevista com o Prof. Dr. José Ivo Follmann, Diretor do Centro de Ciências Humanas, explicando a participação da Unsisinos na pesquisa, assim como o depoimento de Márcio Hoff, estudante de Ciências Sociais e um dos estudantes que colaboraram na pesquisa.

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“O fenômeno religioso no Brasil parece dominar o noticiário cotidiano. Neste ano, em especial, os resultados do Censo 2000 e as eleições presidenciais ampliaram os espaços públicos e acadêmicos de pesquisas, análises e projeções sobre avanços e retrocessos nos vários segmentos das muitas formas de crença - ou descrença - da população brasileira. Um cenário inimaginável há poucas décadas, embora a diversidade religiosa brasileira sempre tenha chamado a atenção de estudiosos e cronistas. João do Rio, que, em 1904, publicou As religiões do Rio, dizendo que ''a cidade pulula de religiões'', estaria outra vez fascinado com as manifestações daquele novo começo de século. Os censos anteriores, é pertinente que se lembre, já indicavam mudanças significativas no quadro religioso brasileiro, tanto no declínio do catolicismo quanto na adesão às religiões que se introduziram no país desde o período final da colonização, mas principalmente após a Independência e durante a República. Mas a escassez dos quesitos pesquisados no campo religioso não permitia uma leitura mais global do que se passava na sociedade brasileira. O censo de 1872, o primeiro, registrou apenas católicos e acatólicos; o de 1890 dividiu a população, um tanto arbitrariamente, em cinco grupos: católicos (romanos e ortodoxos), protestantes (evangélicos, presbiterianos e outras seitas), islamitas, positivistas e sem culto; a estes, em 1900, foram acrescentados israelitas, outras religiões e religiões ignoradas. Em 1920, não se computou o item religião, diz-se que por influência da Igreja Católica, já então preocupada com o crescimento de outras crenças. Daí em diante, o quesito religião está sempre presente (1940, 50 e 60), com novos acréscimos (budistas, xintoístas, espíritas). Mas, em 1970, se restringe a católicos, protestantes e espíritas (incluindo cultos da umbanda), outras religiões e sem-religião. A partir de 1980, o crescimento de evangélicos se acelera (6,6% da população), passando para 9% em 1991 e 15,4% em 2000. Nos mesmos períodos, os fiéis católicos decaem para 88,9%, 83,8% e 73,8%.

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Esta longa introdução tem como objetivo situar, de modo mais abrangente, uma nova pesquisa, de 1999, concluída antes da publicação oficial do Censo 2000, cujos resultados, em linhas gerais, confirmam determinadas conclusões indicadas pelo IBGE. O livro Desafios do catolicismo na cidade é resultado de projeto do Centro de Estatística e Investigações Sociais, sem pretensões de abarcar todo o país, mas atingindo seis das mais importantes capitais brasileiras: Rio de Janeiro, São Paulo, Recife, Salvador, Belo Horizonte e Porto Alegre. A cuidadosa metodologia escolhida atingiu a 5.218 pessoas com 18 anos ou mais de idade. As questões levantadas abrangem um amplo universo, das crenças e motivações religiosas às práticas sociais e orientações ético-religiosas dos pesquisados, assim como as opiniões sobre o uso dos meios de comunicação, seja a missa na TV ou a programação dos canais televisivos e radiofônicos dos católicos e evangélicos. Outras questões expandem ainda mais o campo da pesquisa e mostram sua abertura à conjuntura religiosa em geral: a escolaridade, estado civil, chefia de família, classe social e religião. Diante da repercussão dos dados do Censo 2000, é esclarecedor ressaltar este último item. A pesquisa, realizada nas ruas das cidades mencionadas, encontrou o total de 65% de católicos, porcentagem que, no Rio de Janeiro, atinge apenas a 56,8% de pessoas (43,2% de outras religiões). Esse dado confirma o censo, que indica a taxa de 57,2% de católicos no Rio de Janeiro. (Essa redução do universo católico a pouco mais de 50% de fiéis, também acontece em Rondônia e em Goiás.) Mas a pesquisa, procurando orientar a Igreja Católica nos próximos anos, diante de acontecimentos ''ao mesmo tempo violentos e criativos'', ''na procura de uma fraternidade universal'', vai mais longe. Investiga a posição dos entrevistados quanto ao sincretismo, ao trânsito religioso, à emoção, à tradição, à própria experiência religiosa. São elementos de sua vida interior, de sua missão, que evidentemente não pertencem ao censo oficial. A expectativa dos resultados, até certo ponto bastante contraditórios - marcas de um tempo de ''mutações constantes'' -, procura ''encontrar caminhos de profecia, numa nova e fecunda evangelização libertadora.'' Desta forma, a pesquisa, reconhecendo a diversidade religiosa de um país pluralista, cujo quadro de transformação afeta sua própria identidade, revela um catolicismo ecumênico, aberto às alternativas de crenças, tanto dos seus fiéis quanto dos afiliados a outras religiões. Uns e outros (63,3% dos entrevistados) consideram a religião como uma fonte de sentido e de significação para a vida, um instrumento para a justiça e a paz. Mesmo os que se declaram sem filiação religiosa (15%) afirmam sua crença em Deus ou em uma Força Superior. O declínio do número de católicos preocupa a Igreja, assim como o aumento dos sem religião (cerca de 8% contra 7,3 do censo), porém a pesquisa valoriza o qualitativo, talvez associado à porcentagem dos que se declaram assíduos (cerca de 44%) contra 36% sem essa prática. A rigorosa documentação do livro certamente permite outras leituras e cruzamentos, que deveriam ser mais sistemáticos, sobretudo no que se refere à vida religiosa diante da secularidade do mundo urbano. A expressiva capa de Desafios do catolicismo na cidade parece simbolizar essa relação: num primeiro plano, na verticalidade de um penhasco, o isolamento da igreja da Penha, imagem da supremacia tradicional do catolicismo na cultura brasileira, perante o infindável aglomerado urbano - horizontal, compacto, promíscuo, violento, anônimo. Grande metáfora da nossa realidade diante de uma Igreja diariamente desafiada. JB 5-10-02

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AA UUNNIISSIINNOOSS EE OO CCEERRIISS Entrevista com Prof. Dr. José Ivo Follmann, Diretor do Centro de Ciências Humanas

IHU On-Line- Como surgiu a parceria da Unisinos com o Ceris na realização da pesquisa? José Ivo Follmann- O nosso relacionamento com o CERIS (Centro de Estatística Religiosa e Investigações Sociais) é antigo, contribuindo, também, para isso, os permanentes contatos que o Pe Inácio Neutzling veio tendo com o Prof. Luiz Alberto Gomez de Souza e sua equipe. Devido aos nossos trabalhos de pesquisa na linha de "Religiões e Sociedade" e também a nossa participação, por vários anos, nas atividades do ISER (Instituto de Estudos da Religião), RJ e, mais especificamente, devido ao Projeto do Cadastro dos Locais de Culto Religioso e Templos na Região Metropolitana de Porto Alegre, do GDIREC (Programa Gestando o Diálogo Inter-religioso e o Ecumenismo), fomos procurados pela Direção do CERIS para colaborar com a pesquisa sobre o catolicismo, nas cinco maiores Regiões Metropolitanas do Brasil. IHU On-Line- Qual foi o envolvimento da Universidade na pesquisa? José Ivo Follmann- A nossa tarefa foi a de coordenar a execução do levantamento de dados por meio da aplicação de 897 questionários aqui na nossa Região Metropolitana. Apelamos ao Curso de Ciências Sociais, e o Prof. Dárnis Corbellini não mediu esforços em desempenhar esta função com o melhor profissionalismo possível. Um grande número de alunos do Curso de Ciências Sociais e de outros Cursos (em torno de 20), foi envolvido nesse trabalho. Também colaboraram alguns alunos da disciplina de Sociologia das Religiões, do Curso de Pastoral Catequética, do Unilassale. IHU On-Line- Qual a avaliação dos estudantes que aplicaram a pesquisa? José Ivo Follmann- Creio que, assim como para nós, da coordenação, foi uma participação muito gratificante, também para os alunos, foi uma experiência importante, na medida em que puderam lidar concretamente com uma amostra cientificamente calculada e, sobretudo, entrar em contato com uma dimensão da realidade social, muitas vezes não considerada, como deveria, nos Cursos de Ciências Sociais. Os resultados da pesquisa foram amplamente trabalhados e publicados no livro "Desafios do Catolicismo na Cidade: Pesquisa em Regiões Metropolitanas Brasileiras", que é, sem dúvida, um texto imprescindível para a leitura de todos os que estão voltados para a temática em questão aqui no Brasil. A pesquisa complementa muito bem os recentes dados que o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) nos trouxe, aprofundando alguns aspectos, que são fundamentais para um conhecimento das religiões e das religiosidades, nos grandes centros urbanos. Disponibilizamos, de forma eletrônica, junto ao GDIREC, no IHU, os dados completos da pesquisa, que podem ser mais trabalhados por quem tiver interesse. IHU On-Line-Haverá outras parcerias com o Ceris? José Ivo Follmann- Hoje estamos com uma nova solicitação do CERIS, que aceitamos, para participar, da mesma forma, em uma nova pesquisa a realizar-se, também, nas Regiões Metropolitanas, centrando-se em três importantes formas de manifestação religiosa, em nossos tempos. Ainda não existem prazos definidos para a execução do trabalho, mas certamente será uma grande pesquisa. Dela poderemos falar em uma outra oportunidade.

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CCRREEDDIIBBIILLIIDDAADDEE EE SSIINNCCRREETTIISSMMOO-- "Eu apliquei entre 15 e 20 formulários. Foi complicado, porque precisávamos ir até a localidade e encontrar a pessoa específica que o questionário pedia: daquele lugar e daquela idade. Mas, foi muito bom. Eu estava bem no início do curso, e isso me inseriu no mundo da pesquisa e também na área das religiões que, particularmente, me parece muito importante. Na aplicação dos formulários, me chamaram a atenção duas coisas: o número de pessoas que se disseram ateus, eu encontrei vários, e como a crença das pessoas está baseada no sincretismo. Em relação à credibilidade das instituições, as pessoas não foram nada otimistas. Especialmente a polícia e o governo têm muito pouca credibilidade".

Márcio Hoff Estudante de Ciências Sociais da Unisinos e participante da pesquisa

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Reproduzimos dois artigos. Um, com o título, ‘A mudança a caminho’ é de Marilena Chaui, professora de filosofia política e história da filosofia moderna da USP, é autora, entre outras obras, de "A Nervura do Real" (Companhia das Letras) e publicado na Folha de S. Paulo de 3-11-02. Este artigo é interessante ser lido com a entrevista de José de Souza Martins, também publicada neste número. O segundo artigo é ‘Adeus aos moedeiros falsos’, de José Luís Fiori, professor de Economia Política Internacional nas universidades Federal e Estadual do Rio de Janeiro. É autor de muitos livros, entre os quais Moedeiros Falsos e Estados e Moedas no desenvolvimento das nações, Petrópolis: Vozes, 1999. O artigo foi publicado na revista Carta Capital, 30-10-02. Os subtítulos são nossos.

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Em política há ações e acontecimentos com força para se tornarem simbólicos. É assim que podemos contrapor dois momentos simbólicos que marcam a política brasileira entre 1990 e 2002: o primeiro nos leva de volta ao "Bolo de Noiva", que inaugurou a era Collor; o segundo, à pergunta singela do presidente eleito da República aos âncoras do "Jornal Nacional", da Rede Globo, na noite de 28 de outubro de 2002. No final da campanha presidencial de 1989 e na fase de transição entre novembro de 89 e janeiro de 90, um fato novo marcou a política brasileira: em primeiro plano, tanto no discurso como nos debates e na prática, veio a economista Zélia Cardoso de Mello com sua equipe técnica. As decisões fundamentais partiam desse grupo,

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que se reunia em Brasília num edifício apelidado Bolo de Noiva, e de lá vieram as medidas econômicas que definiram o governo Collor, no qual o discurso político foi suplantado pelo técnico-econômico. Neste, surgia, imperial, uma nova figura, o mercado, cuja fantasmagoria só entraria em pleno funcionamento no período 1994-2002, quando os brasileiros passaram a ouvir curiosas expressões, tais como "os mercados estão nervosos", "os mercados se acalmaram"; como se "os mercados" fossem alguém! Na noite de 28 de outubro de 2002, no "Jornal Nacional", no momento final, quando os âncoras falaram das cotações das Bolsas de Valores, do dólar e do real, e sobre a agitação e calmaria d" "os mercados", o presidente da República eleito, que estava sendo entrevistado, perguntou com um sorriso levemente irônico: "Vocês não têm outros assuntos? Cadê a fome, o desemprego, a miséria, a desigualdade social?". Essa indagação singela, unida ao pronunciamento feito algumas horas antes, anunciando a criação da Secretaria de Emergência Social, cuja prioridade é o combate à fome, demarcou simbolicamente o novo campo da política no Brasil: os direitos civis e sociais são prioritários e comandam as ações técnico-econômicas, pois a democracia é a única forma política em cujo núcleo está a idéia de direitos; tanto de sua criação pela sociedade, como de sua garantia e conservação pelo Estado.

AA SSAAÍÍDDAA DDOO MMOODDEELLOO NNEEOOLLIIBBEERRAALL O Bolo de Noiva simbolizou a entrada do país no modelo neoliberal. O pronunciamento e a pergunta do novo presidente simbolizam a saída desse modelo. Entre esses dois momentos intercalam-se os governos de Fernando Henrique Cardoso, que tornaram esse modelo hegemônico. Para tanto, foram mobilizadas as duas grandes ideologias contemporâneas: a da competência e a da racionalidade do mercado. A ideologia da competência afirma que aqueles que possuem determinados conhecimentos têm o direito natural de mandar e comandar os que supostamente são ignorantes, de tal maneira que a divisão social das classes aparece como divisão entre dirigentes competentes e executantes que apenas cumprem ordens. Essa ideologia, dando enorme destaque à figura do "técnico competente", tem a peculiaridade de esquecer a essência mesma da democracia, qual seja, a idéia de que os cidadãos têm direito a todas as informações que lhes permitam tomar decisões políticas, porque são todos politicamente competentes para opinar e deliberar, e que somente após a tomada de decisão política há de se recorrer aos técnicos, cuja função não é deliberar nem decidir, mas implementar da melhor maneira as decisões políticas tomadas pelos cidadãos e por seus representantes. Por sua vez, a ideologia neoliberal afirma que o espaço público deve ser encolhido ao mínimo, enquanto o espaço privado dos interesses de mercado deve ser alargado, pois considera o mercado portador de racionalidade para o funcionamento da sociedade. Ela se consolidou no Brasil com o discurso da modernização, no qual modernidade significava apenas três coisas: enxugar o Estado (com as privatizações e a redução dos gastos públicos com os direitos sociais), importar tecnologias de ponta e gerir os interesses da finança nacional e internacional. Essa ideologia propagou-se pela vida cotidiana brasileira, bastando observar o que aconteceu nos noticiários. As cotações das Bolsas de Valores do mundo inteiro -assim como as das moedas-, o comportamento do FMI e dos bancos privados

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passaram para as primeiras páginas dos jornais, para o momento nobre dos noticiários de rádio e televisão, alguns canais chegando a manter na tela faixas com as cotações das Bolsas e das moedas minuto por minuto. A subida ou descida do valor do dólar, do euro e do real, o "risco Brasil", as falas dos dirigentes do FMI, do Banco Central norte-americano, dos economistas ingleses, franceses e alemães passaram a ocupar o lugar de honra e, nos noticiários matinais, assumiram a aparência de uma espécie de oração ou de missa, equivalentes ao que se passa nas rádios e canais de televisão religiosos. Na verdade, porém, o neoliberalismo não é, de maneira nenhuma, a crença na racionalidade do mercado e o enxugamento do Estado, mas é a decisão de cortar o fundo público no pólo de financiamento dos bens e serviços públicos (isto é, dos direitos sociais) e maximizar o uso da riqueza pública nos investimentos exigidos pelo capital, fazendo o Estado assegurar-lhe recursos em detrimento dos direitos sociais. Assim sendo, torna-se claro (como tão bem compreenderam os eleitores) que a prática democrática está demarcada como luta por uma nova gestão do fundo público, na qual a bússola é a defesa dos direitos sociais. Eis por que o presidente eleito começou a convocar corações e mentes de toda a sociedade para um pacto de luta contra as desigualdades e exclusões sociais, em nome da justiça e da dignidade humana.

RRIISSCCOO DDEE PPOOPPUULLIISSMMOO?? Poder-se-ia conjeturar que há nessa convocação risco de populismo. Não há. E por um motivo muito simples: o populista (via de regra pertencente à classe dominante) pretende tutelar o povo, que não é percebido como cidadão e ao qual são feitos favores. Lula foi formado numa política sindical nova, na qual não há lugar para a relação de tutela e de favor, mas de verdadeira representação entre os iguais. Precisamente essa igualdade impede um outro risco, qual seja, o messianismo, pois o líder messiânico é visto pelos liderados como um escolhido divino que não está no mesmo nível que eles, porque participa dos desígnios da divindade, realizando uma missão definida pelo "Alto" como batalha final entre o bem e o mal. A formação e a história políticas do presidente eleito, pautadas pelo valor conferido à cidadania, vão na direção exatamente contrária à das tradições populista e messiânica. Hoje, portanto, a mudança não está apenas no fato historicamente gigantesco de um operário de esquerda ter sido democraticamente eleito, com uma maioria esmagadora e sem precedentes, para a Presidência da República do Brasil, na primeira e verdadeira alternância de poder em nosso país; mas também na afirmação de uma outra perspectiva política, simbolicamente anunciada no pronunciamento do novo presidente e na mensagem contida em sua pergunta aos âncoras da Rede Globo.

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"O ponto de partida de qualquer novo projeto alternativo de nação terá que ser, inevitavelmente, o aumento da participação e do poder do povo nos centros de decisão do país”. Celso Furtado, “Brasil, a construção interrompida, 1992”

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Uma coisa deve ser reconhecida em José Serra: ele deu uma contribuição decisiva à vitória da oposição. Aceitou representar sem convicção um governo impopular, impôs seu nome onde não era querido, não entendeu o foco central da disputa e confundiu a campanha eleitoral com um concurso para mestre-escola de economia. Por isto muitas vezes parecia um trapalhão, numa festa em que não foi convidado. Mas a favor de José Serra se deve dizer que o núcleo duro do governo tucano tampouco conseguiu dar as cartas, nem definir a agenda e os termos da corrida presidencial de 2002. Primeiro, tentou e fracassou na tentativa de restringir a disputa a um debate técnico-econômico, em que a oposição fosse obrigada a reconhecer a inevitabilidade da política do governo, mesmo depois dele haver recorrido – em oito anos – três vezes ao FMI, terminando assim mesmo, de joelhos e quase falido.

AA MMOODDEERRNNIIDDAADDEE DDOOSS TTUUCCAANNOOSS Como esta estratégia não funcionou, nem tampouco a do medo econômico, o núcleo ideológico da coalizão tucana tentou repor, no centro da discussão, sua velha cantilena sobre a modernidade dos tucanos e o anacronismo dos seus adversários. Foi quando Dona Ruth saiu do seu habitual silêncio e acusou a oposição de defender um “estatismo ultrapassado”. Logo depois foi a vez do ministro Malan se dizer preocupado com a volta à cena das “velhas teses desenvolvimentistas dos anos 50”, no que foi imediatamente respaldado pelo presidente Fernando Henrique Cardoso, que acusou seus opositores de não conseguir sair dos anos 60, nem compreender os caminhos abertos pela modernidade e os desafios do século XXI. Alguém já disse que o PSDB é um partido que só tem duas idéias ou obsessões em comum: sua antiga ojeriza a Orestes Quércia e seu permanente horror ao nacional-desenvolvimentismo. Pode ser que seja uma definição muito estreita e limitada a São Paulo, mas contém uma semente de verdade que ficou escondida pelo discurso da modernidade, e que agora foi desenterrada pela campanha presidencial de 2002, mas particularmente pela ousadia estratégica dos dois últimos meses da campanha de Lula. E o que se viu depois que se desfez a neblina ideológica foi que o verdadeiro enfrentamento não era entre a modernidade dos que conseguem olhar para frente e para fora, e o atraso dos que só conseguem olhar para trás e para dentro. O que de fato estava em jogo, uma vez mais, nestas eleições de 2002, era um velho conflito que atravessa a história brasileira, entre três projetos para o Brasil, que conviveram e lutaram entre si durante todo o século XX. O primeiro destes projetos foi o berço da estratégia econômica do governo Cardoso. Suas raízes foram plantadas pelo liberalismo econômico do Império, mas sua formulação mais consistente e moderna foi dada pela política monetária ortodoxa e pela defesa intransigente do equilibro fiscal e do padrão-ouro, dos governos paulistas de Prudente de Morais, Campos Sales e Rodriguez Alves. Idéias, objetivos e políticas que atuaram no início do século XX, como a expressão mais coerente e eficaz do projeto liberal de inserção da burguesia cafeeira, dentro da divisão internacional do trabalho, liderada pela Inglaterra. Seus objetivos e políticas se mantiveram praticamente intocados até a crise econômica de 1930, mas suas idéias fundamentais se mantiveram vivas e atuantes mesmo depois da crise, reaparecendo em vários momentos, no plano político, econômico ou cultural, como na Revolução paulista de 1932 e na luta anti-varguista do Estado de São Paulo e de Armando Salles de Oliveira; na pregação de Eugenio Gudin, na primeira metade dos anos 40, e na concepção econômica da UDN, depois de 1945; na política econômica inicial do governo Dutra e do seu ministro da Fazenda, C. Castro; na política do governo transitório de Café Filho e do seu

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ministro da Fazenda, E. Gudin; na política do governo militar de Castelo Branco e de seus ministros econômicos O. Bulhões e R. Campos. As mesmíssimas idéias que reapareceriam, 30 anos depois, no liberalismo anti-varguista e anti-estatista do governo Cardoso-Malan. Este projeto estratégico teve algum fôlego sempre que contou com o aval do capital financeiro, o inglês nos primeiros tempos, e norte-americano, agora no fim do século XX. Mas se mostrou insustentável nos momentos de crise, como no caso de 1930, e agora, mais recentemente, no fim da administração Clinton e na retração financeira deste início do século XXI. O segundo grande projeto estratégico que participou desta luta em torno do futuro do Brasil já aparece esboçado nas teses dos “industrialistas”, presentes na Constituinte de 1891. Mas sua verdadeira história começa na década de 1930 e responde pelo nome de “nacional-desenvolvimentismo” ou “desenvolvimentismo conservador”. Primeiro foi uma reação defensiva e pragmática frente à crise econômica de 1929, mas esta reação inicial foi se transformando aos poucos – durante o Estado Novo – num projeto de construção de uma economia nacional, apoiado por uma parte da intelectualidade modernista, por amplos segmentos das burocracias civis e militares e por um grupo de empresários industriais, dentre os quais se destacavam as idéias de Roberto Simonsen. Programa desenvolvimentista e industrializante que adquiriu maior consistência e velocidade nos anos 50, durante os governos de Vargas e JK, prolongando-se depois durante o regime militar, em particular na gestão do General Geisel e do seu II Plano Nacional de Desenvolvimento. Durante este período, o Estado brasileiro teve um papel decisivo para o sucesso econômico do desenvolvimentismo conservador. Primeiro quando se viu isolado da economia internacional pela crise de 30 e pela II Guerra Mundial. E, depois, porque contou com uma margem de manobra e de iniciativa que lhe foi viabilizada pelos Acordos de Bretton Woods e pelo apoio norte-americano às políticas desenvolvimentistas. O terceiro e último destes projetos nunca ocupou o poder estatal, nem comandou a política econômica de nenhum governo republicano, mas teve enorme presença no campo da luta ideológico-cultural e das mobilizações sociais e democráticas. Esteve presente nas lutas sindicais e no movimento tenentista das primeiras décadas do século XX. Mas foi a partir da década de 30, e sobretudo nos anos 50/60, que estas mobilizações e lutas sociais começaram a se identificar com um projeto de desenvolvimento econômico nacional e popular que tangenciou, no campo das idéias e das alianças políticas, com o “desenvolvimentismo conservador”, dos anos 50. No início da década de 60, esta vertente nacional, popular e democrática do desenvolvimentismo chegou a propor uma reforma do projeto, incluindo ao lado da industrialização e do crescimento econômico acelerado o objetivo da democratização da terra, da renda, da riqueza, do sistema educacional e do sistema político. Uma alternativa que foi sintetizada, em parte, pelo Plano Trienal de Celso Furtado de 1963, mas que foi vetada pelos conservadores e impedida pelo golpe militar de 1964.

IIDDÉÉIIAASS RREEFFOORRMMIISSTTAASS Depois disto, estas idéias reformistas se confundiram com o movimento da resistência democrática, somando-se mais tarde às mobilizações sindicais que se intensificaram na luta final contra o regime militar e que estiveram na origem do Partido dos Trabalhadores. De uma forma ou outra, este projeto de democratização social e política do desenvolvimentismo esteve presente nas intenções e ações reformistas de algumas áreas e políticas governamentais, logo depois da redemocratização. E acabou ocupando um lugar importante no texto da

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Constituição de 1988, sobretudo nos capítulos relacionados com os direitos civis, sociais, políticos e econômicos da cidadania brasileira. Essa foi a grande e verdadeira luta política e econômica que dividiu a sociedade brasileira durante todo o século XX. Deste ponto de vista, é verdade que o discurso e a estratégia política de Lula, nos dois últimos meses de sua campanha, apontaram claramente para uma retomada dos objetivos estratégicos reformistas dos anos 50 e 60, e para uma rediscussão conjunta de alguns pontos comuns, que este reformismo sempre teve com o “desenvolvimentismo conservador”. Mas deste ponto de vista, também existe uma linha direta de comunicação entre as idéias do presidente Cardoso, de sua esposa e do seu bom e fiel ministro da Fazenda com a República Velha e com as idéias de Joaquim Murtinho, Eugenio Gudin, Roberto Campos e tantos outros brasileiros que sonharam, antes que eles, com a possibilidade de um Brasil aberto, liberal e integrado harmoniosamente com a comunidade financeira internacional.

AA FFÉÉ CCEEGGAA DDOOSS EECCOONNOOMMIISSTTAASS OORRTTOODDOOXXOOSS FFOOII SSEEMMPPRREE AA MMEESSMMAA Nada disto implica em desconhecer o óbvio: que o mundo de Murtinho não é o mesmo mundo de Malan, apesar de suas mesmas convicções econômicas. Mas neste ponto não há com o que se espantar: a fé cega dos economistas ortodoxos e dos Tesouros Nacionais, no rigor fiscal e monetário, foi sempre a mesma, desde o século XVII, assim como suas teses e políticas imobilistas. A verdade é que se a economia mundial tivesse sido governada pelos economistas, não teria havido capitalismo e o Brasil jamais teria deixado um engenho de açúcar. Foi esta falta de imaginação e de coragem inovadora que custou muito caro a vários partidos sociais-democratas europeus, que chegaram ao poder na primeira metade do século XX. Na maioria dos casos, ficaram paralisados e foram derrotados pelo que se poderia chamar de “síndrome de Hilferding”, o grande economista marxista e social-democrata austríaco, que ao assumir o Ministério da Fazenda da Alemanha, em 1928, apostou todas suas fichas numa política ortodoxa e monetarista de estabilização, que acabou aumentando a recessão e o desemprego sem conseguir controlar a inflação alemã. Como conseqüência, foi expelido do Ministério e seu partido perdeu o governo, que foi entregue logo depois a Hitler. Algo análogo – ainda que com efeitos menos trágicos – ao que passou com o Partido Laborista inglês, ao assumir o governo em 1929 e optar pela “visão do Tesouro” para enfrentar a recessão e o desemprego, contra a opinião na época de John M. Keynes, David L. George e tantos outros laboristas e liberais mais inventivos. Fizeram as mesmas políticas e colheram os mesmos resultados de Hilferding, como viria a ser o caso também do governo social-democrata de Leon Blum, na França de 1936/37. O que não se pode esquecer, entretanto, é que foi neste mesmo período que os sociais-democratas suecos tiveram a coragem de inventar um caminho heterodoxo. Constituíram um governo de coalizão com o Partido Agrário e conseguiram tirar a Suécia da recessão e do desemprego entre 1933 e 1938, inventando o que mais tarde se transformaria num consenso quase universal até o início da Era Neoliberal: o Welfare State e as políticas que os ingleses vieram a chamar de keynesianas. Não é sensato pensar que a história e as fórmulas possam ser repetidas. Mas não é nenhum anacronismo retomar velhos objetivos frustrados e reprimidos através da história para reencontrar seus novos caminhos. Quem sabe não chegou finalmente para o Brasil a hora de um projeto de desenvolvimento nacional e de uma sociedade mais democrática e inclusiva, dirigida e protegida por um Estado que se aproxime progressivamente do Welfare State dos europeus? Exigirá dos novos governantes uma manobra fina e atilada dentro do novo contexto internacional inaugurado pela

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administração Bush, mas não é impossível. Seja lá como for, uma coisa é totalmente certa: chegou a hora de dizer adeus aos “moedeiros falsos".

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A entrevista da semana: José de Souza Martins, professor do Departamento de Sociologia da USP, vê "origens messiânicas" em Lula, ligadas à influência da Igreja progressista na definição do movimento operário nos anos 70. Ele concedeu uma entrevista à Folha de S. Paulo, 3-11-02 que reproduzimos na íntegra. José de Souza Martins foi durante muitos anos assessor da Comissão Pastoral da Terra – CPT – e acaba de publicar o livro A Sociedade vista do abismo. Novos estudos sobre exclusão, pobreza e classes sociais, Petrópolis: Vozes, 2002. O livro é dedicado “para Dom Moacyr Grechi, servo de Deus na Amazônia”.

LLUULLAA RREEAAVVIIVVAA SSEEBBAASSTTIIAANNIISSMMOO,, DDIIZZ SSOOCCIIÓÓLLOOGGOO A avaliação é de José de Souza Martins, 64, Autor de livros como "Os Camponeses e a Política no Brasil" (ed. Vozes), Martins é um dos maiores estudiosos da questão agrária no país. É também membro da Junta de Curadores do Fundo Voluntário da ONU contra as Formas Contemporâneas de Escravidão. Folha - Lula se referiu aos pobres como "nossos filhos" e se apresentou à população como o primeiro "presidente companheiro" do país. Isso configura uma tendência populista do presidente eleito? José de Souza Martins - Lula é um político intensamente interativo, diferente do PT corporativo que o apresentou como candidato, muito refratário às expectativas populistas de uma boa parcela do eleitorado. Por isso, Lula aceitou bem o roteiro de conduta populista que estava diluído nas expectativas do eleitorado, roteiro que ele consegue identificar e interpretar. Mas, muito depressa, terá que conhecer e reconhecer a liturgia própria do cargo e com ela identificar-se. Não há "presidente companheiro" nem pode haver, pois o único companheiro do presidente é o poder. Folha - É possível identificar tendências messiânicas na expectativa popular em torno do governo Lula? O presidente eleito tem alimentado voluntariamente isso? Martins - Somos um país messiânico e milenarista ainda hoje. A candidatura de Lula foi gestada muito antes de ele saber que era o escolhido e sem que se soubesse que seria ele o eleito dos filhos da promessa. Tem, portanto, uma origem messiânica. Tudo começa com a designação de dom Jorge Marcos de Oliveira, bispo de Santo André. Ele era um homem extraordinário, uma das primeiras figuras verdadeiramente progressistas da Igreja Católica no Brasil. Dom Jorge foi para o ABC para estabelecer ali a presença política da Igreja Católica entre os operários, numa região dominada pelos comunistas. Aproximou-se deles, foi para a porta das fábricas, apoiou e liderou greves e começou a estimular o aparecimento de uma liderança sindical de esquerda, mas não comunista. Foi nesse quadro de uma esquerda alternativa que se preparou o cenário para o aparecimento de uma liderança operária, de algum modo católica, que fosse além

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do discurso sindical e se transformasse numa liderança política. A rede política das Comunidades Eclesiais de Base, com a criação do PT, foi fundamental para fazer do nome de Lula um nome nacional, de esquerda, mas abençoado pela Igreja. É inestimável essa ação da Igreja para diversificar as esquerdas e, num certo sentido, democratizá-las. Os trabalhadores católicos tiveram assim a oportunidade de se expressar e se organizar politicamente, como agrupamento de esquerda, sem se sentirem numa relação de traição com sua classe social, que era o que acontecia antes, confinados em aparelhos políticos clericais e reacionários. Foi a Igreja, e não as esquerdas, que criou a figura poderosamente simbólica que, na pessoa de Lula, cumpre a promessa do advento do ungido. Na verdade, um reavivamento do sebastianismo, a espera messiânica no retorno do rei d. Sebastião para libertar o reino. As três derrotas eleitorais de Lula para a Presidência não foram compreendidas nem aceitas por esse eleitorado fortemente impregnado de sebastianismo. A perda da eleição para Fernando Henrique, em 1994, foi insuportável e mais insuportável em 1998. Se Fernando Henrique era um homem de esquerda, como podia disputar a eleição com o ungido de Deus e derrotá-lo? Daí um extenso e complicado processo de satanização do presidente, que vem até hoje, baseado em afirmações esdrúxulas a respeito de ter abandonado suas posições de origem, quase um traidor da causa, um usurpador. Um frade, que tem grande responsabilidade na unção de Lula, desde os primeiros dias da eleição de Fernando Henrique encerrava suas mensagens eletrônicas com esta palavra de ordem: "Fora FHC!". Já nas vésperas destas eleições, comecei a observar novas evidências de uma crença messiânica em torno de Lula: pessoas querendo tocá-lo. Mais recentemente, o episódio da visita ao menino Bruno, imobilizado numa cadeira de rodas por uma bala perdida, também vai nessa direção. Menos por uma explícita crença religiosa e mais pela concepção implícita de que Lula é o presidente dos desvalidos, dos injustiçados, dos fisicamente impossibilitados de ser eles próprios. Tudo isso é núcleo de uma crença messiânica. Esse fenômeno traz à mente os reis taumaturgos, da Idade Média, cuja legitimidade estava na capacidade de operar milagres, bastando tocá-los. Só o ungido podia curar, ou redimir os pobres. O substrato medieval do nosso catolicismo popular subsiste e é muito forte. E a ação das igrejas no sentido de construir essa imagem de Lula é mais do que evidente. O aparente populismo de Lula está mobilizando valores e concepções de um passado remoto, mas reconhecidamente persistente. Nossos arcaísmos estão procurando se cristalizar em torno dele, do mesmo modo que nossas frágeis e fragmentárias tradições de esquerda. Uma combinação impossível. Aparentemente, Lula não contribui conscientemente para alimentar essa rede de crenças arcaicas, mas isso, evidentemente, não depende dele. Folha - O PT tradicionalmente se pautou pela recusa do figurino getulista do "pai dos pobres". Essa diferença pode estar se diluindo? Martins - A recusa do getulismo pelo PT é mais dos dirigentes e do ideário do partido do que do seu eleitorado. Chega ao PT através dos intelectuais que um dia foram ligados à UDN, que, no fim de sua história, era um partido de direita. A popularidade original de Lula se deu no ABC, de muitos modos uma região fortemente getulista até hoje. Nessa cultura Lula foi gestado e aprendeu a fazer política. Lula representa o renascimento de muitas proposições do getulismo, especialmente no seu antagonismo ao PSDB e ao presidente Fernando Henrique Cardoso, que se propôs a encerrar a era Vargas.

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De certo modo, Lula conseguiu se tornar herdeiro dos órfãos de Vargas, que são muitos, por exemplo num certo nacionalismo econômico, bastante parecido com o do antigo presidente. Folha - O simbolismo em torno de Lula é uma "compensação" sociopsicológica ao estilo de FHC? Martins - Fernando Henrique tem procurado presidir a República como um magistrado, em face dos ministros que representam o pacto político que o tem sustentado. Portanto, as funções de visibilidade foram transferidas para os ministros. O presidente da República, com Fernando Henrique, recolheu-se à solidão do poder. Foi uma tentativa de modernizar profundamente a função presidencial, torná-la expressão de um modo moderno de exercício do poder, um sinal de opção e respeito pelos direitos do cidadão. Cidadão que deveria se expressar politicamente em função de seus direitos e não em função de ter sido fascinado e enfeitiçado por quem ocupa a Presidência. Tudo indica que, com a eleição de Lula, os eleitores pretenderam um "aquecimento" na figura presidencial, como houve em outros tempos, nem sempre com sucesso. Pretenderam libertar o presidente da frieza litúrgica do cargo. Folha - Que papel forças sociais como o MST e os servidores públicos terão no governo do PT? Martins - Os servidores públicos partidarizados, majoritários na CUT, vão se sentir mais à vontade com Lula do que com Fernando Henrique, e não causarão àquele os problemas que causaram a este: tornaram lenta a execução das decisões governamentais ou dificultaram sua execução. Já o MST tem como problema fundamental o fato de que perde a função política com a eleição de Lula. Em grande parte, a enorme contribuição do MST à ascensão do PT e de Lula consistiu em manter as demandas populares do campo além de seus verdadeiros limites, o que resultou numa imagem negativa do governo. As passeatas, invasões e acampamentos reforçavam continuamente a imagem dessa espécie de déficit falso de política social. Por mais que o governo fizesse, sempre era insuficiente. Com a eleição de Lula, já não poderá manter a mesma luta ou, ao menos, não poderá mantê-la com as mesmas características e a mesma intensidade. Terá que mudar de curso, mesmo que não aceite funções no governo. O registro tonal das ações do MST está num diapasão bem específico: o de desqualificar todas as iniciativas do Estado. Mesmo que o MST abrande sua conduta política, isso será interpretado como recuo e todas as ações praticadas durante o governo FHC revelarão uma face que nem o MST nem o PT podem assumir: a do oportunismo eleitoral que as teria motivado. Mesmo que isso não seja eventualmente verdade, dificilmente as coisas deixarão de ser interpretadas desse modo pelo público.

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“Caso o foro privilegiado se instale no seu governo, os dirigentes petistas terão anos de tormentos, porque a medida é um tapa na face dos que acreditam na democracia; é o fim da esperança de quem votou contra o medo de viver num país onde oligarcas alicerçam desigualdades” - Roberto Romano, filósofo, é professor titular

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de ética e filosofia da Unicamp, Folha de S. Paulo, 1 de novembro de 2002, no artigo ‘Contra o foro privilegiado dos políticos’.

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O Fórum Social Mundial deste ano acontecerá de 23 a 28 de janeiro de 2003 e a Universidade deve se fazer presente. A coordenação do IHU esteve reunida com representantes da Procex, Prodesen e Editora Unisinos no dia 31 de outubro passado para discutir o assunto. Na reunião estiveram presentes Haide Maria Hupffer, da Procex, Denise Avancini Alves e Gilmar Vargas Cardoso, da Prodesen, e Thaís Jardim, da Editora Unisinos. O tema da reunião foi a participação da Universidade no Fórum com um stand institucional. O lugar apresentaria a Universidade, seu trabalho e suas publicações aos participantes do Fórum, além de vender os livros da Editora. Haverá uma nova reunião do grupo em novembro para dar continuidade ao projeto.

OO MMUUTTIIRRÃÃOO CCOONNTTRRAA AA FFOOMMEE DDEEPPOOIISS DDAASS EELLEEIIÇÇÕÕEESS DDEE OOUUTTUUBBRROO No dia 29 de outubro, em Santo Cristo,RS, Inácio Neutzling, coordenador do IHU, assessorou a assembléia geral da diocese de Santo Ângelo. 213 pessoas, padres, religiosas, lideranças leigas, sindicais e políticas, discutiram o tema do Mutirão Nacional contra a Fome e a Miséria à luz da conjuntura pós-eleitoral.

IIHHUU:: RRUUMMOO AA 22000033 Na última sexta-feira, dia 1º de novembro, os coordenadores e coordenadora dos 3 setores do Instituto Humanitas Unisinos - Setor Ética, Cultura e Cidadania, Setor Trabalho, Solidariedade e Sustentabilidade, e Setor Teologia Pública - e os articuladores (as) dos grupos temáticos e coordenadores (as) dos programas dos setores estiveram reunidos com a coordenação do IHU para avaliar e planejar as atividades dos setores. Para a 2003. Seguidamente, os participantes apresentaram as atividades realizadas durante 2002, dando também algumas sugestões para o próximo ano. Como conclusão, o coordenador do IHU, Prof. Dr. Inácio Neutzling, propôs que cada setor se reunisse até dezembro para que o planejamento seja mais específico, a partir dos dados colocados na reunião. O encontro culminou com um almoço de confraternização no Restaurante Fratello, no Centro de Ciências Jurídicas da Unisinos.

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O entrevistado relâmpago desta edição é...

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Jones Quadros da Silva é administrador de redes no Centro de Ciências Humanas. Ele trabalha na Unisinos há três anos. Formou-se em Informática na PUC, em 2000 e atualmente cursa Pós-Graduação na Unisinos em Especialização em Redes de Computadores. Casado com Karen, desde janeiro deste ano, Jones tem planos para o futuro, entre eles ser pai e professor. Um pouca de história - Nasci em Taquari, no dia 2 de maio de 1973. Desde pequeno, vivi em Porto Alegre. Depois de mim, meus pais tiveram mais duas filhas. Sempre prezei muito o convívio com a família. Me casei só aos 28 anos, porque foi difícil sair de casa. Minha família era pobre, não oferecia regalias, mas oferece até hoje muito amor e carinho. Luta na formação profissional - Fiz um curso técnico em eletrônica a nível de Ensino Médio. Ingressei em um financiamento para pagar minha faculdade que estou quitando até hoje. Um pouco antes de me formar, em 2000, vi um anúncio no jornal para a vaga aqui na Unisinos. Na época, eu era funcionário público na CRT. Mandei um currículo, fui chamado para fazer testes e estou aqui até hoje. Centro 1- A vantagem de trabalhar no Centro 1 é que sinto as pessoas com um relacionamento mais humano, mais próximo. Isso facilitou a minha integração com as pessoas do Centro. Casamento - Conheci a Karen no ônibus. Namoramos 8 anos e fomos noivos durante dois. Casamos em janeiro deste ano e viemos morar em São Leopoldo. A Karen é psicóloga, pela PUC e especialista em Recursos Humanos, pela Unisinos. Durante 3 anos trabalhamos juntos em um grupo de jovens da Igreja. Isso fez com que nos conhecêssemos melhor e desenvolvêssemos os mesmos valores. Autor – O nosso colega Marcelo Leandro dos Santos, pela iniciativa e coragem de lançar um livro buscando recursos independentes. Livro - A Bíblia. É o início de tudo. Filme - A Corrente do Bem, de Mimi Leder. Na TV - Jogos de futebol (principalmente se for do Internacional) e filmes. Uma paixão - Viajar.

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Planos pessoais - Ser professor universitário, de preferência aqui na Unisinos. Ministro aulas de informática no projeto de voluntariado e tenho me realizado com isso. Nas horas livres - Ficar em casa, cozinhar, jogar futebol. Um presente - Não sou muito ligado em presentes. Me importo com a presença das pessoas e da lembrança delas quando é meu aniversário. Tenho uma coleção de camisas oficiais de times de futebol. Se alguém me presentear com uma, ficarei feliz. Momentos felizes - A cerimônia do meu casamento, os momentos com a família, a infância e a adolescência. Unisinos - Um ótimo local de trabalho. Tenho orgulho em dizer que trabalho aqui. É um espaço que "cheira" conhecimento, onde as pessoas vão em busca desse conhecimento. Me identifico muito com isso. IHU - É a ligação, o encontro do conhecimento com o lado solidário e cristão do ser humano. Um grande sonho - Ser pai. Também tenho o desejo de trabalhar mais para tentar diminuir a desigualdade social no mundo de hoje.

Cartas do Leitor Sr. Coordenador, Desde agosto venho recebendo esta pérola que é o IHU. Estão de parabéns com este informativo. Precisamos divulgá-lo para mais pessoas. Felicito a iniciativa de formação que nos tem proporcionado.Diante disso, estou enviando alguns e-mails e peço que enviem diretamente este informativo a eles, pois acredito que as pessoas que o receberem também o divulgarão em outros centros. Eu conheci o IHU através da Prof. Rosa Maria Bavaresco no encontro da PdU promovido pela Abesc em Recife no mês de agosto. Eu considero o trabalho de vocês de suma importância, atualizado e profundo, e o tenho divulgado para muitas pessoas da minha caixa de endereço. Sou sacerdote, com nove meses de ordenação, responsável pela Pastoral Educativa de nosso Colégio Integrado Claretiano, trabalho na cidade de Rio Claro-SP no colégio e faculdades e o IHU tem me ajudado muito. Obrigado por este ministério que vocês exercem.

Pe. Nilton César Boni cmf

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Gente amiga: Gostaria de receber o informativo numero 40, e, a partir deste, receber cada semana este material. Muito obrigada. Da aluna de Serviço Social:

Teonila Ivone.

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