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de Economia Comunhão Comunhão uma nova cultura 17 «Se o grão de trigo não morre...» E d C C C

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Cartas do mundo

Dialogando com todos

Chiara em Genebra

A novidade das empresas EdC

Princípios para a gestão de uma empresa

O Pólo Spartaco no Brasil da esperança

Entrevista com Rodolfo Leibholz

As empresas do Pólo Spartaco

«Se o grão de trigo não morre...»

Entre os New Global

EdC e globalização

A experiência da Unitrat

Carla Bozzani

Benedetto Gui

Chiara Lubich

Bureau Internacionalde Economia e Trabalho

Norma Curtie Corrado Martino

Fernanda Pompermayer

Mª do Carmo Gaspar

Vera Araújo

Luigino Bruni

3 4 5 7 91011151920212224252627

Franco Caradonna

Leo AndringaO dado de Chiara

As novas teses sobre a EdC

A economia da gratuidade

Diálogo com os leitores

ECONOMIA DE COMUNHÃOuma nova culturaAno IX – nº 2 – maio 2003Suplemento da Revista Cidade Nova

Diretor responsável: Alberto Ferrucci

Endereço para correspondência:R. Igino Giordani, 17606730-000 – Vargem Grande Paulista – SPFone (+11) [email protected]

Impressão:Paulus Gráfica

Ed

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Alberto Ferrucci

Antonella Ferrucci

Vittorio Pelligra

Fernanda Pompermayer

Alberto Ferrucci

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O cêntuplo para quem participa da EdC

Uma avó

O salário atrasado

Doar o que tenho

Uma lição de amor

Gotas de amor

Estudo por amor

Carla Bozzanie-mail: [email protected]

A netinha

Publicamos trechos de cartas enviadas de várias partes do mundo, por algumas das 12 milpessoas e famílias que participam do projeto EdC. Como todos nós, elas fazem parte dacomunhão mundial da EdC e comunicam suas necessidades financeiras com uma aberturatão preciosa quanto a generosidade de quem partilha os próprios bens.Procuramos responder a essas necessidades com o lucro das empresas EdC e – por não serainda suficiente – com a contribuição extraordinária «para os 12 mil», atualmente solicita-da a todos os membros do Movimento dos Focolares.

Mônica, Deus a ama!

Quatro crianças

O período pós-guerra

Diariamente agradeço a Deus por este grande dom doSeu amor por mim e peço a ele que faça chegar ocêntuplo a todas as pessoas que contribuem e levamem frente o projeto da Economia de Comunhão.

(Brasil)

A quantia que recebo é muito importante, principalmen-te depois que fiquei viúva. Sinto-me feliz e muito grata.Utilizo o dinheiro que recebo para ajudar minha filha,que tem problemas cardíacos e agora também para umanetinha recém-nascida, que está morando comigo, poisos pais dela, muito jovens, estão em dificuldade.

(Filipinas)

A ajuda que recebo me permite cuidar de sete netinhos.Assim consigo garantir a alimentação e a educação deles.

(Filipinas)

Os meus pais, que são agricultores, sempre enfrentaramdificuldades financeiras. A ajuda que recebo da Economiade Comunhão me constrói como pessoa, pois me lembrasempre: “Mônica, Deus a ama imensamente!”.

(Brasil)

Agradeço, de todo o coração, pelo amor concreto decada um, que me dá a possibilidade de me tratar. Noinício não foi fácil aceitar ajuda, pois pensava na neces-sidade dos outros. Agora, depois de anos, minha saúdeestá melhorando, estou terminando os estudos e eu emeu noivo decidimos nos casar. Eu também quero aju-dar os outros, pois recebi “uma lição de amor”.

(Argentina)

O custo de vida aumentou muito e estávamos com astaxas de condomínio e calefação atrasadas. A ajuda eco-nômica que recebemos é muito importante para nós,pois nos dá a força para prosseguirmos.

(Romênia)

Quando meu pai perdeu o emprego, para não ter quedeixar a faculdade, eu vendi doces, digitei textos no com-putador, fiz trabalhos domésticos, mas tudo isso nãoteria sido suficiente sem a inesperada ajuda da EdC.Agora estudo não só porque gosto, mas principalmentepara responder ao amor de quem me ajuda. Sinto que aminha formatura, que está se aproximando, é fruto doamor de muitas pessoas.

(Argentina)

O meu salário, além de ter sido reduzido, estava atrasa-do. No dia em que vencia o pagamento de um tratamen-to de saúde não iríamos conseguir cobrí-lo se a Provi-dência não tivesse se manifestado com uma quantia emdinheiro. Toda a minha família está muito grata, poisconseguimos pagar as contas, além de comprar alimen-tos e remédios urgentes.

(Argentina)

Não sei se por orgulho ou pela educação que recebi,sempre considerei toda ajuda como um empréstimo aser devolvido. O que recebemos nos ajuda a superarmomentos de dificuldades na nossa família, que, paranós, seriam insolúveis. Eu também quero doar o quetenho, nem que seja um simples sorriso.

(Romênia)

Estamos vivendo os momentos difíceis do pós-guerra.Obrigado pela ajuda que recebemos, de mil maneiras!Esperemos que a situação melhore, pois nós tambémgostaríamos de ajudar quem passa por dificuldades, paraque muitas pessoas possam experimentar a alegria quesentimos.

(Bósnia- Herzegóvina)

A nossa família, de seis pessoas, recebe a preciosa aju-da. Esse dinheiro é realmente sagrado, fruto de renúnci-as, de gotas de amor. Por isso procuramos usá-lo bem,diante de Deus.

(Romênia)

Somos um casal com quatro crianças e de todo o cora-ção agradecemos pela ajuda que nos sustentou. Sentimo-nos parte de uma verdadeira família, na qual cada cabe-lo da nossa cabeça é contado e a Providência cobre asnecessidades de todos.

(Romênia)

A força para prosseguirmos

A coragem para irmos em frenteUma das nossas três filhas está gravemente doente e otratamento é muito caro. A ajuda que recebemos é umaresposta do amor de Deus, que nos dá coragem parairmos em frente com um amor sempre novo. Todos osdias agradecemos a Deus. (Brasil)

Já estávamos precisando refazer o piso de madeira e alareira quando a chuva contínua fez com que desabasseuma parte do teto da nossa casa. O trabalho nós mes-mos fizemos, mas só pudemos comprar o material, muitocaro no nosso país, porque recebemos a ajuda. Tive-mos a possibilidade também de providenciar um trata-mento para o nosso filho, que sofre de epilepsia.

(Sérvia)

O material para o telhado

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Nos últimos meses, na Europa, falou-se muito sobre o Fórum SocialEuropeu, pelo fato de que a sua última edição aconteceu em Florença.No início do ano, em muitas partes do mundo – e especialmente noBrasil – falou-se do Fórum Social Mundial, de Porto Alegre. Foram doismomentos de encontro e de debate que envolveram uma numerosasérie de organizações, grupos e pequenas agremiações interessadosno futuro da economia do planeta e atuantes no campo cultural, polí-tico ou da colaboração ao desenvolvimento. Em ambos os fóruns, umadas vozes que ecoaram nas salas de reuniões e que encontraram muitareceptividade foi a da Economia de Comunhão (p. 20-21).Alguém poderia questionar: que sentido tem participar de eventos comoesses, duramente criticados por uma parte da opinião pública?Antes de tudo porque estamos interessados em dialogar com todos oscomponentes da sociedade – e isso significa falar e escutar –, sempreferências ou preconceitos excludentes causados pela orientaçãopolítica dos interlocutores. A variedade dos contextos nos quais o pro-jeto Economia de Comunhão foi proposto nesses anos testemunhaessa posição (nas páginas seguintes encontraremos informações dedois eventos recentes: em Genebra, no Conselho Mundial de Igrejas,p. 5-6; em Cracóvia, na Conferência Européia da Renovação CarismáticaCatólica, p. 24).Em segundo lugar – e este me parece o aspecto mais importante –

Benedetto [email protected]

porque nos sentimos parte da sociedade civil, ou seja, do complexo conjunto (muitas vezes atécontraditório) de corpos sociais que se sentem questionados pelas situações em que estão imersos,e livremente assumem uma parte da responsabilidade de difundir determinadas idéias ao favore-cerem uma ou outra resposta para um problema em questão, ao promoverem novas iniciativas,ao assumirem necessidades desconsideradas por outros.Percebo que a perspectiva de um diálogo tão comprometedor pode nos assustar. Será que já nãotínhamos assumido um compromisso suficientemente sério, de suscitar e sustentar empresas“especiais” que, com sua existência, oferecem uma contribuição decisiva à sociedade? Não estamoscorrendo o risco de acrescentar novos objetivos que não nos competem diretamente, com operigo de não conseguir fazer frente à nossa tarefa primordial?Olhemos para trás por um momento. O objetivo proposto por Chiara Lubich a quem desejaaventurar-se com ela na busca de realizar uma economia por um mundo unido é, acima de tudo,fazer com que não exista mais nenhum necessitado. Ao mesmo tempo, é também a difusão deuma cultura em que as relações econômicas não sejam só um frio encontro de interesses (ou,pior ainda, uma ocasião de conflito ou uma forma de dominação), mas, pelo contrário, sejamoportunidades de encontro respeitoso e de crescimento em conjunto, segundo o chamado dirigi-do a cada homem para a comunhão com os seus semelhantes e com Deus, na totalidade daprópria vida, portanto também na esfera do trabalho, do consumo, dos negócios.Nessa perspectiva, o papel das empresas que aderem ao projeto é de ponta de lança, de porta-bandeira, pois a empresa é o emblema da economia de hoje. Isso significa, para quem nelatrabalha (partindo dos vértices empresariais), um compromisso de coerência e de testemunho.Para ressaltar esse centralismo, nas páginas 7 a 9, estão sendo publicadas novamente os “Prin-cípios para a gestão de uma empresa EdC” (já propostos neste noticiário alguns anos atrás, a fimde que empresários e funcionários possam se espelhar neles).

Mas a economia é composta também por outras instituições (sistemas finan-ceiros nacionais e internacionais, autoridades que regulamentam os merca-dos, institutos de previdência social, normas e agências para a tutela do meioambiente...) e de outros atores, por exemplo, as famílias, enquanto consumi-doras, poupadoras, eleitores de organismos que têm também funções econô-micas, além de suas associações. É normal pensar que cada um deles tenhaalgo a dizer ou contribui na busca de uma economia marcada pela comunhão,na qual a atividade das empresas dedicadas ao bem comum poderá dar osseus melhores frutos.Esta simples observação atribui plena cidadania, dentro do nosso projeto, àsinúmeras pessoas a quem não falta a paixão de vê-lo realizado e a disponibi-lidade de oferecer a própria contribuição, mas que talvez não atuem e nematuarão numa das empresas que aderem à EdC, nem tampouco administrarãoempresas com esse objetivo.Qual será a função deles? A primeira que emerge é uma contribuição no planocultural, de apropriação e de difusão em todos os níveis (a partir do diálogo

com colegas e amigos) de uma visão da economia na comunhão e para a comunhão.O segundo é a ação, uma ação individual, segundo as próprias responsabilidades (profissionais, políticas, de associa-ção...) e ações coordenadas, antes de tudo no nosso âmbito e, mais tarde, com muitos outros que atuam em ONGs,associações empresariais ou instituições públicas em função de objetivos semelhantes aos nossos, e que cada vezmais nos convidam a uma trajetória em comum (p. 5, 20, 24), respeitando a identidade de cada um.

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Dr. Rogate MshanaConheço o Movimento dos Focolares, principalmente o seu projeto econômi-co, que se baseia na Economia de Comunhão. Gostaria de ouvir falar maissobre esse projeto. Obrigado.

ChiaraNeste momento posso dizer alguma coisa, sinteticamente.No início do Movimento nós ficamos fascinados com as primeiras comunida-des cristãs; por isso, o amor recíproco que tínhamos estabelecido entre nós,teve como conseqüência também uma certa comunhão de bens: se alguémtinha dois casacos, dava um a quem não tinha; se alguém tinha dois paresde luvas, dava um a quem não tinha. Fazíamos uma comunhão de tudo oque possuíamos, ficando apenas com o necessário para cada um, logicamente.Essa comunhão se estendia também aos necessitados. Por isso, sempre,durante anos, décadas, no nosso Movimento pratica-se também a comu-nhão de bens materiais.Para as pessoas que se doaram totalmente à nossa causa, os focolarinos,que permanecem virgens para o Reino, como diz Jesus, essa comunhão debens é completa. Todos nós trabalhamos e levamos o salário completo parao focolare, para satisfazer as necessidades da comunidade. Todos nós faze-mos um testamento, para que a nossa herança, presente ou futura, sejausada na comunhão de bens no Movimento.Nós damos tudo. Depois, existem outras pessoas, pais e mães de família,que dão o que têm a mais, o supérfluo.Com essa comunhão de bens, o Movimento estava indo bem, pois conseguía-mos cobrir as despesas das pessoas que dele faziam parte. Até que, em1991, eu estive no Brasil, em São Paulo. Passei muitas vezes por São Paulo,mas naquela ocasião fiquei impressionada com os arranha-céus: é uma sel-va de arranha-céus! E ao redor de São Paulo havia uma espécie de “coroa deespinhos” – como dizia o Cardeal Paulo Evaristo Arns –, isto é, favelas,barracos. Existe a mais extrema miséria. Eu sabia que a nossa espiritualidadehavia chegado até lá, que também os pobres haviam entendido que Jesus osama e também eles queriam amar, procurando viver segundo esse nossoespírito. Porém, o que nós colocávamos em comum não era suficiente parasuprir também as necessidades deles.Eu estava muito preocupada, pois no Brasil contamos com cerca de 250 milpessoas, das quais uma certa parte passava por necessidades.Encontrando-me numa das nossas Mariápolis Permanentes, próximo a SãoPaulo, com cerca de 400 brasileiros do nosso Movimento, comuniquei a elesuma idéia que tive: por que não iniciamos empresas, verdadeiras empresas,

Publicamos uma resposta deChiara ao Dr. Rogate Mshana,responsável por economia ejustiça no departamento “Jus-tiça, Paz e Criação” do Conse-lho Mundial de Igrejas, duran-te o seu encontro em Gene-bra, em 28.11.2002. Na oca-sião, a pedido do próprio Con-selho Mundial de Igrejas, fo-ram apresentados o Movimen-to Político pela Unidade e aEconomia de Comunhão.

conduzidas por pessoas competentes, que produzamlucros segundo a concepção moderna de uma em-presa? Esses lucros seriam repartidos em três partes:uma para levar em frente a empresa; outra para osnossos necessitados e uma outra para criar estrutu-ras: escolas, cursos, etc., promovidos por nós, paraformar as pessoas segundo o que chamamos de “cul-tura da partilha”, que é Evangelho.A idéia pareceu logo maravilhosa e as pessoas queme ouviram tiveram uma reação muito positiva. Elescomeçaram e nasceram essas empresas no Brasil,inclusive empresas de um certo porte. Depois na Ar-gentina, na Europa, na Ásia. Atualmente temos ape-nas 800 empresas, porém elas existem!O melhor de tudo é que essas empresas são todasalicerçadas no Evangelho. As relações entre os em-presários e os funcionários é evangélica: amor recí-

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proco; o relacionamento com os fornecedores é evangélico: amor recí-proco; o relacionamento com os consumidores é evangélico: amor recí-proco. Em relação ao Estado, existe lealdade total, logicamente, com aobservância de todas as leis.Acontece que essas empresas são bem sucedidas, pois os empresáriosbuscam, acima de tudo, o reino de Deus, e depois o interesse da empre-sa. E Deus abençoa, com “o cêntuplo nesta vida e a vida eterna”. Porisso, quando existem dificuldades, o Eterno Pai intervém com uma graçaou com a idéia de um produto de sucesso ou através de dinheiro quechega por meio de alguém. Assim essas empresas têm caminhado bem.Já se fala delas nas universidades, realizam-se congressos na Itália e emoutros países. Até mesmo em Estrasburgo, no Conselho Europeu, convi-daram a mim, que entendo muito pouco de economia, para falar sobre aEconomia de Comunhão num congresso de alto nível.Antes que eu falasse, tomaram a palavra pessoas importantes, prêmiosNobel, que fizeram uma análise da situação econômica do mundo: catas-trófica! Eu falei sobre a Economia de Comunhão, dando alguns exem-plos. Quando o congresso terminou, um dos organizadores veio até mime disse: “A senhora ouviu a análise sobre a situação mundial? A esperan-ça está naquilo que a senhora falou”.Eu fiquei impressionada, pois era a menor experiência, porém era evan-gélica. A esperança está realmente em Jesus.

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Os empresários que aderiram à Economia de Comunhãologo perceberam que o aspecto que parecia ser o maisimportante – a decisão de repartir o lucro segundo asfinalidades do projeto – era apenas o primeiro passo, aponta do iceberg de um modo completamente novo deviver a economia, segundo uma norma extremamentesimples: amar a todos.Portanto, rever, segundo essa luz, todos os relacionamen-tos da empresa – com os funcionários, os fornecedores,os clientes, os concorrentes, as instituições públicas, asociedade civil e a humanidade inteira – numa verdadeira“vocação civil”: um chamado a colocar em jogo talentos erecursos financeiros para experimentar na pele uma novaeconomia em função do bem comum, que não é somen-te o bem dos outros, mas também o próprio.Cinco anos após o lançamento do projeto, as pessoasque haviam aceitado esse desafio se reuniram num con-gresso internacional para um intercâmbio de experiênciase reflexões. Na ocasião, emergiu a exigência de delinearjuntos as principais características desse novo tipo deempresa.Surgiram assim os “Princípios para a gestão de uma em-presa de Economia de Comunhão”, publicados no noticiá-rio nº 6, de 1997. Princípios estes que publicamos nova-mente na pág. 9, para as pessoas que não os conhecem.Nos anos sucessivos, eles foram incluídos nos estatutossocietários das empresas cujos sócios decidiram assumirpublicamente a própria escolha.Tais princípios conjugam o empenho de amar a todos sobos vários aspectos da atividade da empresa e da organi-zação do trabalho: nos relacionamentos com clientes,fornecedores e concorrentes; na definição da postura éti-ca diante da administração pública; no cuidado com aharmonia dos relacionamentos na comunidade empresa-rial; com a saúde dos funcionários; com a salubridade doambiente de trabalho; com o enriquecimento profissionalde cada um e com a comunicação dentro da empresa.Quanto aos objetivos econômicos e da organização pro-dutiva, os Princípios logo esclarecem que a finalidadeempresarial não se limita à busca do lucro monetário,mas também ao aumento do número de empregos pro-dutivos, colocando no centro a pessoa humana, e não ocapital. Além disso, definem a novidade de que o lucro«será destinado com igual atenção para o crescimento daempresa, para pessoas em dificuldade econômica – co-meçando por quem comunga a opção pela “cultura dapartilha” – e para a difusão dessa cultura».Apresenta-se um destino preciso e, ao mesmo tempo,plenamente livre, pois quem melhor do que o empresáriopara poder decidir, diante da própria consciência, o que

significa, no seu caso, dar “igual atenção” ao cresci-mento da empresa, às necessidades dos pobres e à di-fusão da cultura de amar a todos?Os Princípios abordam “como produzir” e “como relacio-nar-se” com os interlocutores da empresa, começandopor aqueles que irão usufruir dos produtos ou dos ser-viços fornecidos por ela. Cada empresa EdC faz a expe-riência de constatar quanto seus funcionários – a partirdo momento em que se tornam conscientes do projetoao qual a empresa adere – passam a se esforçar paraque os destinatários do trabalho deles possam consu-mir alimentos sadios, ter roupas harmoniosas e dura-douras, ter acesso a programas de computador de fácilutilização e que sejam realmente úteis; ou para forne-cer a eles serviços com a mesma atenção que teriamcaso estivessem fornecendo a um amigo ou parente.Destaca-se, portanto, que também nas empresas con-correntes trabalham pessoas que são igualmente ama-das. Delineia-se uma economia não mais concebida comouma luta para que prevaleça alguém ou alguma coisa,mas como um empenho de todos para crescer juntos.Uma virada radical, na qual os concorrentes não sãomais inimigos e sim pessoas que também têm o direitode trabalhar com sucesso. Considerando assim a con-corrência, podem ser descobertas formas de colabora-ção que reduzam o custo de produção de ambas aspartes e, às vezes, chega-se a entender que em certasocasiões convém retirar-se. Obviamente deve-se evitaracordos entre produtores em detrimento dos clientesque, com certeza, desse modo não seriam amados.Uma postura que a mentalidade corrente poderia consi-derar irracional, mas muitos exemplos de empresas EdCdemonstram que existe uma racionalidade maior: osúltimos estudos de aprofundamento da teoria econômi-ca sobre as verdadeiras motivações das escolhas e so-bre o capital social da empresa estão caminhando nestadireção.Quanto mais uma empresa se demonstra realmentedesinteressada no lucro pelo lucro e atenta ao clienteou ao concorrente, mais aumenta neles uma propensãopositiva em relação à empresa, com desdobramentos epotencialidades de desenvolvimento surpreendentes eaté então inexplorados. É o exemplo do ConsórcioTassano que, colocando em prática este desinteresse,sem fazer cálculos, em poucos anos passou de umadezena de cooperados para uma dimensão que, atual-mente, oferece emprego para mais de mil pessoas.As pessoas que têm fé identificam nessas circunstânci-as a intervenção da Providência e a realização da pro-messa do cêntuplo evangélico, mas geralmente o mila-gre consiste em conseguir amar as pessoas e suscitarnelas a reciprocidade do amor, levando em considera-ção que, no mero respeito à liberdade, isso pode nãoacontecer.Um outro aspecto muito importante na EdC é a ética, o

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“modo de trabalhar”. Muitas pessoas, principalmente jo-vens, preferem renunciar a salários mais altos para traba-lharem em empresas nas quais se sentem mais realizadas,onde sabem que são respeitadas e que trabalham por umafinalidade social.Assume-se também a postura de trabalhar na plena legali-dade: nos países em que, para ganhar uma concorrência,é comum a corrupção, essas regras são utopia; no entan-to, experiências de trabalho em ambientes desse tipo con-firmam que é possível atuar de modo correto. Trata-se deaceitar percursos mais árduos, justamente porque não sãocomuns em nações onde a prática das receitas não decla-radas é quase institucionalizada em razão de salários insu-ficientes para uma vida digna. É necessário aceitar quecada funcionário tenha o direito de criar obstáculos, senão por outros motivos, ao menos para demonstrar quenão concedeu favores. Há, porém, desdobramentos positi-vos: nasce uma grande consideração pela empresa e sãoconstruídos relacionamentos duradouros justamente comquem, inicialmente, constituía um obstáculo.Os Princípios frisam que é preciso “transformar a empresanuma verdadeira comunidade”, na qual todos se sintamrealizados: todos – do empresário ao trabalhador mais sim-ples – no íntimo desejam sair do trabalho, no final da tar-de, sabendo que não desperdiçaram um dia de suas vidas,o que é possível sobretudo se conviveram com pessoasigualmente satisfeitas com o trabalho.Isto comporta uma atenção ao bem-estar, físico e moraldos trabalhadores, para o qual contribuem o cuidado como ambiente de trabalho e a comunicação entre as pessoas.Nesse processo é importante também a certeza que ostrabalhadores devem ter de que produzem bens positivospara quem vai usufruir deles.A comunicação empresarial é importante para os sócios epara os funcionários, que devem sempre ser informadosdos acontecimentos, mas também para as pessoas quemanifestam interesse pela empresa, porque apreciam oseu valor social: a empresa EdC gera postos de trabalho edestina o lucro para fins sociais, tornando-se, de uma cer-ta maneira, um “bem público”.São princípios para uma economia utópica? Há 12 anos dolançamento, quase 800 empresas participam do projeto,conseguindo não só sobreviver, mas também partilhar oseu lucro com mais de 12 mil famílias na África, na Améri-ca Latina, na Ásia, no Oriente Médio e no Leste Europeu.Nesses últimos anos, também as multinacionais têm fala-do de responsabilidade social da empresa e investem mui-to para informar que querem trabalhar por um desenvolvi-mento sustentável, especialmente depois da tragédia de11 de setembro.Pode-se acreditar numa conversão dessas empresas a ummodo diferente de fazer economia? Depôs a desfavor de-las o fato de alguns dos seus diretores de maior prestígioterem se revelado pessoas ávidas, capazes de queimar odinheiro de quem economizou, com sacrifício às vezes, etambém de deixar sem trabalho e sem pensão os seuspróprios colaboradores.

Com certeza, porém, nessas grandes empresas trabalhampessoas de bom senso e de boa vontade, muitas vezesbloqueadas por processos indiferentes ao bem comum,construídos por elas mesmas.Fica claro que alguns comportamentos éticos são incon-testáveis: não tanto por uma repentina iluminação, masporque, vendo dissipar-se o mercado de um país inteiropor causa de uma simples atitude de desrespeito à culturalocal, entende-se que o futuro comercial mundial da em-presa não depende tanto de exércitos ou mísseis, mas deuma generalizada simpatia e consenso.Pensar que, na atual anarquia financeira internacional, sejapossível realizar nessas empresas um estilo de gestão so-cialmente sustentável, requer um longo caminho; porém éum caminho que se sabe, mais cedo ou mais tarde, deve-rão percorrer, pois necessitam do oxigênio oferecido pelosconsumidores e pelos investidores do mundo inteiro queescolhem os produtos e as ações deles.Caso aumentasse a consciência da força da economia e doconsumo, que pela própria natureza são flexíveis, tais ele-mentos se adequariam facilmente, mas é necessário apre-sentar modelos econômicos alternativos que permitam umarevisão dos paradigmas que norteiam todas as ações.Além da ajuda que podem dar a um número limitado depobres, o verdadeiro lucro buscado por todos os que tra-balham numa empresa de Economia de Comunhão é apossibilidade de oferecer um modelo alternativo que nãoreduza, mas aumente o bem-estar, a felicidade do homem,de todos os homens.

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A Economia de Comunhão pretende favorecer a concepçãodo agir econômico como um compromisso que abrange idéi-as e ação (não só lucrativo), que visa a promoção integrale solidária do homem e da sociedade. Portanto, no quadroda economia de mercado, apesar de mirar a justa satisfa-ção das exigências materiais, próprias e dos outros, o agireconômico se insere num contexto antropológico comple-to, direcionando suas capacidades ao constante respeito evalorização da dignidade da pessoa, seja dos funcionáriosda empresa – incluindo a rede de produção e de distribui-ção – seja dos destinatários.A Economia de Comunhão trabalha para estimular a passa-gem da economia e de toda a sociedade, da cultura do terà cultura da partilha.

1. Empresários, trabalhadores e empresaOs empresários que aderem à Economia de Comunhão for-mulam estratégias, objetivos e planos econômicos, consi-derando os critérios típicos de uma correta gestão e envol-vendo, nessa atividade, os membros da empresa. Eles in-vestem com prudência e com uma atenção especial para acriação de novas atividades geradoras de empregos.No centro da empresa encontra-se a pessoa humana, enão o capital. Os responsáveis por ela procuram utilizar ostalentos dos funcionários do melhor modo possível, favo-recendo a criatividade, a responsabilidade e a participaçãonas decisões dos objetivos empresariais. Adotam determi-nadas medidas para ajudar os funcionários que passampor dificuldades.A empresa é administrada com a finalidade de aumentar aprodução do lucro, destinado, com a mesma atenção: parao desenvolvimento da empresa; para pessoas que passampor dificuldades econômicas, começando por quem adereà “cultura da partilha” e para a difusão dessa cultura.

2. O relacionamento com clientes, com fornecedores, com a sociedade civil e com terceirosA empresa se esforça, do melhor modo possível, para ofe-recer bens e serviços úteis, de qualidade e a preços justos.Os membros da empresa trabalham com profissionalismo,para construir e reforçar boas e sinceras relações com osclientes, com os fornecedores e com a comunidade, orgu-lhosos de servirem a todos.Estabelecem um relacionamento leal com os seus concor-rentes, apresentando a efetiva qualidade dos seus produ-tos ou serviços, e evitando ressaltar os defeitos dos produ-tos e serviços dos outros.Tudo isso enriquece a empresa de um capital não material,constituído de relações de estima e de confiança com dire-tores de empresas fornecedoras ou clientes, ou com a ad-ministração pública, produzindo um desenvolvimento eco-nômico menos sujeito à variação de mercado.

3. ÉticaO trabalho da empresa é um meio para promover o cresci-mento espiritual de todos os seus membros.A empresa respeita as leis e mantém um comportamentoeticamente correto perante as autoridades fiscais, os sindi-catos e as organizações institucionais.Age da mesma forma com os seus funcionários, dos quaisespera semelhante comportamento.No que se refere à qualidade dos seus produtos e serviços,a empresa se esforça não só para respeitar os própriosdeveres de contrato, mas também para avaliar os reflexosobjetivos da qualidade da sua produção no bem-estar dosconsumidores.

4. Qualidade de vida e de produçãoUm dos principais objetivos dos empresários da Economiade Comunhão é transformar a empresa numa verdadeira

comunidade. Eles se reúnem periodicamente com os dire-tores e com os gerentes para avaliar a qualidade dos rela-cionamentos interpessoais. Esforçam-se para resolver assituações difíceis, conscientes de que o empenho parasolucionar essas dificuldades pode ter efeitos positivos nosmembros da empresa, estimulando inovações eincrementando a maturidade e a produtividade.A saúde e o bem-estar de cada funcionário são objeto deatenção, principalmente diante de necessidades especiais.As condições de trabalho são adequadas ao tipo de ativi-dade exercida: respeito às normas de segurança, ventila-ção e iluminação adequadas, nível tolerável de ruído.Procura-se evitar uma carga horária excedente, de modoque ninguém fique sobrecarregado, e são previstas as fé-rias devidas.O ambiente de trabalho torna-se tranqüilo, constróem-serelacionamentos de amizade, reina o respeito, a confiançae a estima recíproca.A empresa produz bens e serviços garantidos, toma asdevidas providências para não danificar o meio ambiente eprocura economizar energia e reservas naturais, não sódurante a produção, mas durante todo o ciclo de vida doproduto.

5. Harmonia no local de trabalhoA empresa adota sistemas de gerência e estruturasorganizacionais capazes de promover tanto o trabalho emgrupo quanto o crescimento individual.Os funcionários fazem o máximo para manter os locais detrabalho organizados, limpos e agradáveis. Assim, patrões,empregados, fornecedores e clientes, encontrando-se numambiente harmonioso, sentem-se em casa, assumem esteestilo como próprio e passam a difundi-lo.

6. Formação e instruçãoA empresa favorece a criação de uma atmosfera de ajudarecíproca, de respeito e de confiança, em que se tornanatural colocar à disposição, livremente, os próprios ta-lentos, idéias e capacidades, em beneficio do crescimentoprofissional dos colegas e para o progresso da empresa.O empresário estabelecerá critérios de seleção de pessoale de programação do desenvolvimento profissional paraos funcionários, com a finalidade de criar esta atmosfera.Para que todos possam conquistar os objetivos de interes-se da empresa ou de crescimento profissional pessoal, aempresa promoverá freqüentemente cursos de reciclageme de aprendizado.

7. ComunicaçãoA empresa que adere à Economia de Comunhão estabele-ce uma comunicação aberta e sincera que favorece o in-tercâmbio entre diretores e funcionários.Esta comunicação se estende a todas as pessoas que, cons-cientes da importância social deste projeto, se prontificama contribuir com o seu desenvolvimento. É aberta, ainda,àqueles que se interessam pela cultura da partilha e dese-jam aprofundar os vários aspectos dessa experiência con-creta.As empresas que aderem à Economia de Comunhão utili-zam os mais modernos meios de comunicação, com a fi-nalidade de desenvolver relacionamentos econômicos re-ciprocamente úteis e produtivos, para se manterem liga-dos, tanto em nível local, quanto em nível internacional.Alegram-se com o sucesso e valorizam as dificuldades, asprovações e até mesmo o insucesso dos outros, num espí-rito de colaboração e de solidariedade.

Bureau Internacional de Economia e TrabalhoMovimento Humanidade Nova

21 de março de 1997

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Oito anos atrás, em Vargem Grande Paulista (SP), a 51 km de São Paulo, surgiu, próximoà Mariápolis permanente do Movimento dos Focolares, o primeiro Pólo empresarial da EdC.Recebeu o nome de Spartaco Lucarini, escritor e jornalista econômico, atento aos proble-mas mundiais, um dos primeiros companheiros de Chiara Lubich.O Pólo Spartaco hoje é constituído por nove empresas, que oferecem cerca de 300 empre-gos diretos e indiretos: seis delas estão inseridas na área do Pólo e as outras três atuam apoucos quilômetros de distância.“Somos pobres, mas muitos” foi a fórmula que Chiara indicou aos brasileiros comoencorajamento para iniciar um projeto tão arrojado, num Brasil afligido por uma série deproblemas econômicos e sociais. Hoje, a ESPRI S/A, que foi constituída para oferecer infra-estrutura e serviços às empresas do Pólo, conta com 3.650 acionistas e tornou-se a primei-ra empresa de participação no Brasil.

Em 1998, visitando o Pólo Spartaco, Chiara escreveu: “... Fiquei encantada. Paira no ar algonovo, que revela “o futuro”. Pedi a Spartaco que o proteja e o incremente, a fim de que,com a bênção do Céu e com o ardor e a audácia dos nossos “pioneiros”, se realize odesígnio que Deus tem para ele, como modelo e incentivo de toda a Economia de Comu-nhão no mundo”.

Os “pioneiros” do Pólo não foram só empresários: Ginetta Calliari, uma das primeirascompanheiras de Chiara, que viveu no Brasil por mais de 40 anos, acompanhou e susten-tou cada passo. Pode-se dizer que ela deu a vida pela Economia de Comunhão. Poucoantes de concluir a sua aventura terrena, no dia 8 de março de 2001, a quem lhe pergun-tava como havia nascido um Pólo como aquele, ela respondia: “É sangue da alma”.Em Brasília, numa Sessão Solene da Câmara dos Deputados em homenagem a Ginetta, aEconomia de Comunhão foi apresentada nas mais altas esferas políticas do país. O projetocontinua atraindo a atenção de senadores, deputados, prefeitos, políticos de todos osníveis, que desejam conhecer essa experiência-piloto. A visita ao Pólo Spartaco foi umaetapa do programa oficial da Comissão Mista para o Combate e a Erradicação da Pobreza.O Pólo já foi visitado por pessoas de 50 países e tornou-se meta de estudantes e professo-res universitários. A nova cultura que nasce do projeto está penetrando em muitas univer-sidades brasileiras e, em algumas delas, a EdC foi incluída como disciplina curricular.O prof. Stefano Zamagni, da Universidade de Bolonha, afirma que o Pólo Spartaco é um«verdadeiro “escândalo” para o pensamento comum e principalmente para a ciência eco-nômica, pois demonstra com fatos que é possível conjugar a eficiência com a eficácia, coma plena realização do aspecto humano. É um desafio teórico e prático que está se saindovencedor, e tem condições de enviar mensagens a todo o país».

Neste momento histórico de grandes transformações no nosso país e na conjuntura inter-nacional, o Pólo Spartaco oferece o seu testemunho ao mundo: uma experiência modestaquanto às suas dimensões econômicas, mas luminosa e sintonizada com este nosso tem-po, tão sensível às exigências sociais e que tem evidenciado provavelmente uma das maisbelas característica dos brasileiros: a esperança.

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Norma Curti e Corrado [email protected]@uol.com.br

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Você pode traçar, sintetica-mente, a caminhada doPólo Spartaco nestes oitoanos de existência?

Quando você pinta um qua-dro, primeiro faz um esbo-ço, depois aprimora os de-talhes. Iniciamos acreditan-do no projeto, constituindoa ESPRI, adquirindo o ter-reno do Pólo e captando re-

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Entrevistamos Rodolfo Leibholz,presidente do Conselhode Administração da ESPRI,a Sociedade Anônimaque administra o Pólo Spartaco.

cursos através da subscrição de ações. Chegamos aimplantar seis das dez empresas previstas pelo planodiretor, todas elas produzindo, por amor, bens e servi-ços de qualidade de que a sociedade necessita.Percebemos que chegou a hora de aprimorar os deta-lhes e atuar plenamente os «Princípios para a gestãode uma empresa da Economia de Comunhão». Daísurgiu a idéia do Projeto ESPRI 2010.

Em que consiste esse Projeto?Partimos da consideração da evolução da ciência. Porvolta de 1500, Copérnico introduziu o conceito de quea Terra não é o centro do Universo, revolucionando omodo de pensar da época. Cemanos depois, Galileu deu fundamen-tação científica à tese de Copérnico.Houve uma mudança de paradigmae de todas as conceituações. No sé-culo XVIII, Newton começou a de-senvolver as leis da física, revelan-do que o mundo é como um “me-canismo de relógio”. Mas em 1905,quando Einstein lançou a teoria darelatividade, a física foi novamentequestionada. Com a física quântica,a teoria da relatividade foi colocadacontra a parede e nos deixou en-voltos em mistérios até hoje.As mesmas transformações ocorre-ram na organização do trabalho, ini-cialmente com a revolução indus-trial e depois quando, por volta de1900, Henry Ford inaugurou a pro-dução de automóveis em série. Es-ses novos princípios foram transfor-mados por Frederich Taylor em prin-

cípios de organização que levaram ao extremo a idéiade que cada operário é encarregado de uma funçãoespecífica, sem ter uma visão de conjunto do que estásendo produzido, pois o processo se expandiu e sefragmentou.Hoje, passadas várias décadas o nosso sistema de pro-dução ainda sofre os efeitos dessa organização, naqual o homem é deixado à margem, perdendo o sen-tido do que faz.Nesse contexto, em 1991, Chiara Lubich lança a Eco-nomia de Comunhão, um novo paradigma que pode-rá transformar radicalmente a vida das empresas e assuas relações com a sociedade.

Dentro desse quadro, qual é a novidade da EdC?A EdC traz valores, valores cristãos, em contraste como atual modelo de empresa. Como combinar valoreséticos, morais, de respeito à pessoa humana, com umaempresa concebida como máquina? Esse é o desafiodo projeto, que traz uma forma nova de ver a empre-sa, como uma realidade viva, um organismo vivo. Éum novo paradigma.A ESPRI e as empresas da EdC devem ser considera-das como organismos vivos, cujos componentes têmfunções próprias, diferentes entre si, mas trabalham

numa interdependência recíprocaque é serviço, comunhão.Se analisarmos todas as áreas daatividade humana, constataremosque as soluções tradicionais nãoestão funcionando e é urgente en-contrar novos caminhos, que ofe-reçam soluções aos grandes desa-fios atuais.

Quais são os novos caminhos pro-postos pela EdC?A unidade – proposta pelaespiritualidade do Movimento dosFocolares – traz ao mundo uma novavisão que transforma a nossa for-ma de pensar, de decidir e de agir.Se analisarmos as organizações comessa nova visão, chegaremos à con-clusão de que as propriedades daspartes só podem ser entendidas apartir da consideração do todo. Essenovo paradigma apresenta um con-junto de conceitos, de valores e depercepção que tem por raiz a parti-lha, a comunhão entre as pessoasque compõem a comunidade da or-

Fernanda [email protected]

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ganização. Esses conceitos e valores são muito dife-rentes da mera soma das soluções individuais, e assuperam.Quando o amor recíproco é colocado como base dorelacionamento entre as pessoas, descobrimos mudan-ças profundas em termos de pensamento e de valores.Ele gera a unidade, gera sabedoria para toda a empre-sa: uma sabedoria tecnológica, administrativa, que nãodeixa o homem de fora. Desse modo, ao abordar pro-blemas como poluição, danos ambientais, corrupção,etc., que a teoria econômica tradicional não leva emconta, teremos uma nova visão e uma nova posturapara encontrar soluções.

De que modo esse novo paradigma influi na organiza-ção de uma empresa?Ele nos leva, antes de tudo a otimizar e não a maximizar.O objetivo da ESPRI e das empresas do Pólo está embuscar o lucro mantendo a visão do objetivo a que sedestina. É importante ressaltar esse ponto porque podeacontecer que, na tentativa de maximizar um determi-nado aspecto da empresa, inevitavelmente, causemoso prejuízo do todo, comprometendo o equilíbrio e aharmonia da mesma.Outro ponto: a essência da empresa é a cooperação.Não podemos ter a atitude do “nós contra eles”, típicodo sistema atual, pois fazemos parte de um todo mai-or, através da comunhão. Os dirigentes das empresasda EdC, devem, cada vez mais, adotar uma estratégiade integração, como parte de um organismo maior,tanto em nível local quanto mundial.O reconhecimento dessa realidade (da unidade) suge-re que não podemos ter divisão dentro da empresa,nem entre a empresa e os fornecedores ou clientes.

Em lugar do confronto, que provoca divisões, devemsurgir equipes de trabalho, alianças e parcerias.Consequentemente, a adesão à proposta da unidadeno agir econômico e a aceitação dessa missão devemsempre nos levar a questionar como melhorar.Temos que considerar também o que eu chamaria de“estabilidade dinâmica”. A estabilidade de um sistemavivo não é imobilidade nem rigidez. Num sistema vivo,manter-se estável significa estar em equilíbrio, em har-monia entre as partes. Portanto, para ser saudável, umsistema vivo deve ser flexível e dinâmico. A EdC temcomo princípio a solidariedade. Logo, as empresas deEdC devem auto-organizar-se segundo esse princípio,devem ter um alto grau de liberdade e interagirem como ambiente e o meio cultural no qual estão imersas.Isso sem perder a autonomia.

Então, o que muda na empresa?Muda muita coisa. Muda o perfil de liderança: os exe-cutivos deixam de ser controladores e passam a sercultivadores e catalisadores do processo. Muda a hie-rarquia, que não é rígida, do tipo piramidal, mas quecede lugar a uma organização do tipo rede neural, maisflexível e funcional. Altera-se o equilíbrio empresarial,que não é mais mantido por meio da força entre os“pólos opostos”, mas reconhecendo e somando as par-

Spartaco Lucarini, juntamente com IginoGiordani, foi um dos primeiros que compreendeua dimensão universal do Carisma da Unidade ededicou a ele os seus inúmeros talentos.Jornalista político e econômico, escritor com umavasta produção literária sobre temas sociais efamiliares, dirigiu durante muitos anos a revistaCittà Nuova.

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tes positivas desses “pólos”. Passa a ser um equilíbrio dinâmico entreos grupos de interesses e tendências. Além disso, é preservada aessência da empresa de EdC. Enquanto as estruturas estão em per-manente transformação (funcionários, equipamentos, clientes, etc.),as intenções, os valores, os princípios da empresa da EdC, a sua es-sência, devem permanecer imutáveis.

O pensamento econômico atual não tem sido capaz de lidar com asquestões essenciais da vida em sociedade. Quais são os pensamen-tos novos nos quais a EdC se baseia?Podemos dizer que, na sociedade atual, o crescimento da atividadeeconômica é o objetivo máximo. Em nível microeconômico, os indiví-duos e as empresas sempre objetivam maximizar vendas, mercadose lucros, com a meta de garantir o futuro, acumulando bens.Em nível macroeconômico, os países buscam maximizar o crescimen-to do seu PIB com o pretexto de assegurar o bem-estar da popula-ção.Toda atividade econômica trabalha com a “premissa” de que qual-quer crescimento é bom, portanto, quanto mais crescimento, melhor.Nós estamos vendo que essa afirmação não é verdadeira. Os teóricosjá deviam ter percebido que o modelo está errado, porque a pobrezarelativa está aumentando. Portanto, o desenvolvimento é ilusório.Na EdC, e portanto na experiência que queremos fazer no PóloSpartaco, partimos da premissa de que o desenvolvimento não devepromover apenas o crescimento dos índices de economia. Adotandoo conceito de que as empresas e a economia não funcionam comomáquinas, antes de buscar o crescimento, procuraremos avaliar seele será benéfico para todos os níveis sociais e não apenas para al-guns privilegiados. O individualismo e o acúmulo de bens não condu-zem a esse novo conceito de evolução.Hoje chamamos de países “desenvolvidos” aqueles que possuem ín-dices econômicos altos, ou seja, sucesso econômico. Na EdC, essesindicadores também são importantes, mas devem estar em equilíbrioe harmonia com as pessoas como um todo. Assim, o conceito de

desenvolvimento está ligado ao sucesso econômico, maseste deve estar direcionado à satisfação das necessida-des humanas. O mais importante é que esta nova no-ção de desenvolvimento traz um esclarecimento do queé riqueza e pobreza.

Como você enunciaria o conceito de “pobreza” e de“riqueza”?Atualmente, considera-se pobre a pessoa que não pos-sui condições econômicas satisfatórias; e rica, a quepossui condições econômicas privilegiadas. O novo con-ceito é: qualquer necessidade humana não satisfeita éuma forma de pobreza e qualquer necessidade huma-na satisfeita é uma forma de riqueza. Isso porque seconsidera o homem como um todo e não só o lado eco-nômico e individualista.Na EdC, riqueza passa a ser tudo aquilo que se acres-centa ao ser humano, não só dinheiro, mas cultura,participação, realização, confiança, ambiente.Pobreza é aquilo que diminui o homem. Nesse concei-to, podemos enquadrar o excesso de riqueza material,de dinheiro, porque a pessoa que acumula e não parti-lha empobrece interiormente.Cada empresa ou comunidade deve determinar para si,livremente, a sua referência padrão de pobreza e rique-za em função de suas necessidades específicas. Paraque o crescimento econômico possa atingir a sua finali-dade, elas não podem crescer somente quantitati-vamente, mas também na qualidade das relações pro-dutivas, administrativas e de serviços.Esse novo agir econômico sugere um crescimento equi-librado e harmonioso, como se processa num organis-mo sadio e maduro. Tal crescimento deve atender àsnecessidades materiais e espirituais da sociedade, sem

prejudicar as oportunidades das ge-rações futuras. Quem tem sucessonão é quem ganha mais, e sim quemse realiza e realiza a sociedade na qualestá inserido, inclusive financeiramen-te.A EdC sugere um “padrão de organi-zação” nas empresas e na economiaque se baseia numa rede de relacio-namentos, na vivência da solidarie-dade e do amor recíproco. Esse pa-drão, característico das pessoas quevivem no amor, voltadas umas paraas outras, é uma das riquezas da vidae gera a unidade. Logo, o crescimentoeconômico só é aceitável se houvero enriquecimento da vida da popula-ção como um todo.É dentro desse novo paradigma quedevemos definir uma nova visão dedesenvolvimento para as empresas da

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EdC, que se baseia na experiência do Movimento dosFocolares. E é justamente esta a experiência que pro-curamos fazer no Pólo Spartaco.

Em termos organizacionais, existe algum elemento ino-vador?Sem dúvida. Uma das técnicas administrativas inova-doras que estamos utilizando na administração do Póloconsiste em considerar cada atividade sob sete pontosde vista, sob sete aspectos que costumamos relacio-nar com as cores do arco-íris.Fazemos isso com um enfoque especial para os bensrelacionais, que são tão importantes – se não mais –do que os próprios bens produzidos. Cada membro doConselho de Administração foi incumbido de promovera aplicação de um aspecto na vida empresarial do PóloSpartaco: a comunhão, que gera produtividade e apartilha do lucro – que associamos à cor vermelha; airradiação do modus vivendi do Pólo – que associamosao alaranjado; a garantia da nobreza da missão pro-posta – que associamos ao amarelo; a saúde comobem-estar dos membros da empresa e o respeito pelomeio ambiente – associada ao verde; a harmonia noambiente de trabalho – associada ao azul; a formaçãoe o desenvolvimento, além da pesquisa – associada àcor anil; o intercâmbio de experiências – associada aovioleta.Queremos provar, testemunhar que não só é possívelfazer essa profunda experiência espiritual dentro dasempresas, mas é indispensável, imprescindível.

Quais são os próximos passos?Efetivar o crescimento na direção dos bens relacionais.Este é o diferencial do Pólo em relação a outros con-domínios industriais: os bens relacionais, o equilíbrioque o suporte espiritual confere às relações tambémem nível empresarial.Portanto, tendo por base esse substrato de “vida”, es-tabelecemos objetivos e metas a serem atingidos emprazos determinados. A consecução dessas metas ébuscada por todos os membros da Diretoria e do Con-selho, mas foi confiada de um modo especial a cadaconselheiro e/ou diretor:• projetar financeiramente a ESPRI após completar oPólo;• continuar buscando empresas adequadas ao Pólo;estudar o desenvolvimento de um Centro comercialadjacente;• fomentar o interesse pelas ações da ESPRI, identifi-car e capacitar os seus “polarizadores” em cada re-gião do país;• aumentar a comunicação entre os acionistas;• estabelecer um plano de crescimento e estratégiado negócio para as empresas existentes e para o Pólono seu conjunto nos próximos dez anos; estudar acriação de um grupo para assessorar as empresas daEdC em termos culturais e técnicos;• estudar a constituição de uma Associação das Em-presas do Pólo Spartaco.

Todas essas metas têm como objetivo organizar as ati-vidades para dar apoio às empresas do Pólo e atingir ogrande objetivo de ser um “farol”, um laboratório ondeé destilado um novo estilo de atuação econômica.

Plano Diretor do Pólo Spartaco

AVN

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Fernanda Pompermayer (org.)[email protected]

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La tunica“Lembra a túnica de Jesus”: foi assim que Chiara “bati-zou”, em 1991, a primeira empresa da EdC do mundo,cujas instalações ela visitou pessoalmente logo após olançamento do projeto. A La tunica, iniciada por um grupode moradoras da Mariápolis permanente, foi também aprimeira empresa que se transferiu para o Pólo Spartaco,ocupando um galpão de 300 m2: tem 15 funcionários edez colaboradores externos.Com produtos de qualidade, confeccionados segundoas tendências da moda, possui duas marcas: La Tunica,com uma linha feminina, e roupas para crianças e jo-vens com a marca exclusiva PP&JB, além de uniformesescolares e empresariais.O aspecto que sempre norteou a vida da empresa é acomunhão. Mesmo os mais recentes funcionários per-cebem que a presença de Deus entre pessoas que seamam faz parte da vida empresarial. Para merecer essaPresença, procura-se dar ao outro total atenção: o tra-balho iniciado por uma pessoa será finalizado por outra,até chegar a um próximo desconhecido que vestirá aquelaroupa.A La tunica é uma grande família, na qual alegrias esofrimentos são compartilhados e todos se sentem sus-tentados pelo amor concreto dos irmãos. Floriza, casa-da, com um filho de dois anos, começou a trabalhar naLa tunica cinco anos atrás, como costureira. Aprendeu aoperar em todas as máquinas e hoje é responsável pelosetor de costura. Floriza conta que compreendeu a im-portância do amor recíproco diante de uma dificuldadeencontrada na confecção de uma peça nova. Apenasuma das costureiras sabia como executar determinadaoperação, o que ocasionava um gargalo na produção,prejudicando o ritmo do trabalho. Por outro lado, elanão podia parar para ensinar as outras. Resolveram sereunir e analisar juntas o problema. Uma costureira, hápouco integrada no setor, deu uma sugestão: “Por quenós, que não dominamos esta operação, não nos senta-mos ao lado da colega que tem prática para aprender?

Assim ela não precisa parar seu trabalho para nos expli-car”. Todas aceitaram. Em pouco tempo dominavamperfeitamente aquela operação e o novo sistema mos-trou-se válido também em outras dificuldades.

ProdietHá 13 anos a Prodiet atua em Curitiba na distribuiçãode medicamentos e, desde 1998, tem uma filial no PóloSpartaco.Os seus proprietários, Armando e Roseli Tortelli encon-traram na EdC um sentido maior para a sua atividadeempresarial. «A empresa passou a ser não só fonte desustento para a nossa família, mas adquiriu uma finali-dade muito maior: tornou-se patrimônio da humanida-de», comentam.Ao destinar a primeira parcela do lucro da empresa paraa EdC, o funcionário que preparou o cheque calculouquantas cestas básicas poderiam ser compradas, paraalimentar um número correspondente de famílias, e fi-cou entusiasmado! Assim, como muitos outros funcio-nários da Prodiet, ele encontrou na EdC uma realizaçãomais plena no trabalho. Enquanto isso ia amadurecen-do, ocorreu uma verdadeira mudança cultural nas rela-ções entre os funcionários e a administração da nossaempresa.Neste setor do mercado, as práticas ilegais de paga-mento são freqüentes, mas a opção por um comporta-mento ético contra a corrente não impediu o desenvol-vimento da Prodiet. Pelo contrário, atraiu atenção e res-peito, inclusive de vários consultores de gestão empre-sarial, que a apontam como um modelo.Um jovem executivo, com um futuro promissor numagrande multinacional, renunciou à carreira para traba-lhar conosco, pela metade do salário, porque diz que naProdiet ele se realiza como pessoa.«Procuramos ser competitivos e modernos – diz ArmandoTortelli – mas sem esquecer que lidamos com pessoas:o cliente, o fornecedor, o funcionário, o concorrente». Eé justamente com os concorrentes que as experiênciasda Prodiet são abundantes e ousadas. Houve casos emque um “inimigo” tornou-se parceiro; outro, depois deuma longa batalha, procurou os Tortelli para pedir con-selhos que não pediria nem aos familiares mais íntimos.E encontrou o amor que sana todas as feridas.

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Eco-arSurgiu em 1995, com sete sócios, para responder ao de-safio da EdC. No início, numa sala de 40 m2, eram fabrica-dos mil litros/mês de produtos de limpeza, vendidos deporta em porta ou em pequenos mercados. Depois de umano, a Eco-ar se transferiu para o Pólo, conquistando,pouco a pouco, uma fatia de um mercado controlado porindústrias multinacionais.Hoje a Eco-ar ocupa uma área de 700 m2, com uma pro-dução de 600 mil litros/mês. Conta com duas linha deprodução automatizadas e abastece, inclusive, grandessupermercados, com um faturamento anual de aproxima-damente 1 milhão de dólares.«O segredo de um desenvolvimento tão rápido – afirmaErcília Fiorelli – está no compromisso de permanecer fiéisao projeto e na confiança na intervenção de Deus, que serevelou no momento em que um importante centro depesquisa analisou aleatoriamente os nossos produtos eos qualificou como excelentes. Isso facilitou o nosso acessoao mercado.Trata-se de um mercado que oferece margens de lucromínimas, dado este que é usado para “legitimar” um tipode produção danosa ao consumidor e ao meio ambiente.Usando, pelo contrário, matéria-prima de origem contro-lada e ecologicamente aceitável, nos encontramos muitasvezes numa posição de desvantagem em relação a quemnão tem essa preocupação e, por isso, oferece preçosmais baixos. No entanto, a nossa seriedade e a qualidadedos produtos abriu novos espaços no mercado».«Em nome da nossa opção ética – continua Ercília – soli-citamos a uma multinacional, que fornecia um compo-nente químico, que nos garantisse uma qualidade contro-lada. Esse nosso pedido levou a empresa fornecedora aaprimorar a sua qualidade. Três grandes redes de super-mercados, satisfeitas com a nossa qualidade, solicitarama fabricação de produtos com marca própria.Atualmente estamos nos programando para aumentar aprodução para 1,2 milhão de litros/mês: além da linhadomiciliar, passaremos a produzir uma linha institucional».

KNE-RotogineFrançois Neveux, empresário francês, visitou, em 1995,o Pólo Spartaco, com a intenção de oferecer aos empre-sários brasileiros a tecnologia que ele havia desenvolvidona produção de grandes manufaturados plásticos. Vendoo segundo galpão do Pólo em fase final de construção,sem que houvesse ainda uma definição da empresa a serinstalada, decidiu implantar pessoalmente, no Pólo, umafilial da sua empresa francesa.Assim surgiu a Rotogine, que, em maio de 2000, com aentrada de duas outras empresas brasileiras como sócias,passou a se chamar KNE Plast, consolidando-se no mer-cado.Hoje, através do processo de rotomoldagem de plásticos,a KNE fabrica produtos para as áreas de saneamentobásico, construção civil, lazer, armazenamento de líqui-dos, etc.A vantagem competitiva da empresa está na constantetroca de experiências entre os sócios para o desenvolvi-mento de novos produtos ou para a sua adaptação amercados diferentes, para o desenvolvimento de máqui-nas e equipamentos e para a importação/exportação.Recentemente a KNE definiu novos objetivos para gerarmais empregos, especialmente para os jovens que parti-cipam das escolas de formação na Mariápolis Ginetta,visando também aumentar o lucro a ser partilhado. Deci-diu crescer com amplo foco no mercado de saneamentobásico, buscando, inclusive, a terceirização dos produtos.A ação do “sócio invisível” no dia-a-dia da empresa éperceptível de mil maneiras: especialistas na área de sa-neamento que atestam a eficiência e recomendam osprodutos; clientes que, pelo relacionamento estabelecidocom a empresa permanecem “fiéis”; fornecedores que seesforçam ao máximo para atender uma necessidade ur-gente de matéria-prima.Mensalmente são discutidos com os funcionários os re-sultados obtidos e os próximos passos, com sugestõesdeles sobre mudanças nos equipamentos, a fim de au-mentar a produtividade. É dada uma atenção especial às

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dificuldades de cada um, chegando a uma partilha espon-tânea de bens entre os funcionários e também à interven-ção da empresa em caso de necessidades mais urgentes.Em julho de 2002 foram concluídas as obras de expansãodo galpão da KNE, duplicando a área construída. No ano2000, houve um crescimento de 15%; em 2001, de 40% eem 2002, um crescimento de 84% em relação ao ano an-terior.Novas possibilidades de exportação e novos trabalhos defabricação de produtos para terceiros mostram o potencialde crescimento para 2003. A KNE está em contato comempresas da EdC na Argentina, na Colômbia e nos EUA,com a disposição de ceder sua teconologia e seus conheci-mentos de mercado no setor.

AVNA AVN iniciou suas atividades no Pólo há quase três anos,num moderno galpão de 700 m2. Conta com 20 funcionári-os e produz mensalmente 400 mil embalagens plásticaspara produtos químicos e de limpeza.Augusto A. Lima Neto decidiu iniciar a empresa durante oCongresso do Bureau Internacional da Economia e Traba-lho, em 1999, quando Ginetta Calliari recordou que a difu-são do projeto EdC depende de pessoas dispostas a segui-lo até as últimas conseqüências. Augusto, que dispunha demeios econômicos e de competência, se sentiu “chama-do”: «Eu precisava de um empurrão final, e Ginetta medeu esse impulso» – conta ele.As atividades começaram com entusiasmo, empenho e boasperspectivas, mas, pouco tempo depois, um ótimo clientefaliu, deixando uma grande dívida por saldar. «Seguiram-semomentos de questionamento, de hesitação e de desâni-mo, mas o projeto EdC não é nosso – diz Augusto –, éObra de Deus e Ele tem seus caminhos, seus métodos etambém suas soluções». Quando parecia não haver maissaída, chegou uma pedido inesperado, um novo fornece-dor de matéria prima com um custo mais baixo, uma novaidéia para aumentar a produção, novos clientes e tambémpessoas dispostas a conceder empréstimos sem juros: foi

uma experiência de comunhão e de verdadeira solidarie-dade entre as empresas do Pólo e com a ESPRI.Depois dessa experiência, que envolveu de modo positi-vo sócios e funcionários, a AVN está retomando forçascom uma maturidade maior e com a perspectiva de no-vos produtos que ampliarão o seu mercado.

Uniben«... levar a idéia da comunhão à atividade financeira...seria o maior de todos os escândalos...», afirmou umprofessor de economia que visitou o Pólo Spartaco. AUniben atua no mercado financeiro: nasceu como umafactoring justamente para favorecer o projeto EdC, ofere-cendo crédito principalmente às empresas da EdC queestão se constituindo ou se expandindo. A atividade nãoé orientada exclusivamente ao lucro – mesmo se umaparte do lucro da Uniben também é destinado à EdC –mas é conduzida num espírito de ajuda recíproca, procu-rando compreender as necessidades reais dos clientes.Os proprietários de uma pizzaria coligada ao projeto, porexemplo, tiveram o suporte da Uniben para abrir umafilial.A empresa está buscando novos setores de atividade e jáampliou a própria gama de serviços por meio de um acor-do com um grande banco. Atualmente trabalha tambémcom seguros, consórcios e passagens aéreas.

Policlínica ÁgapeOnze anos atrás, pouco depois do lançamento da EdC,um gesto rico de fé e de entusiasmo, representou o im-pulso inicial para o surgimento da Policlínica Ágape: Paula,uma jovem médica recém formada, colocou à disposição2 mil dólares, fruto da venda de jóias herdadas de suamãe, recentemente falecida. Depois, algumas famílias eoutros profissionais mudaram-se para Vargem GrandePaulista a fim de constituir a Policlínica Ágape.Atualmente a Policlínica conta com um arquivo de maisde 15 mil clientes, com um quadro de 35 médicos e pro-fissionais de várias áreas, um laboratório de análises clí-

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nicas, fisioterapia, odontologia e diagnóstico por imagem.A cada mês presta seus serviços, em média, a 130 novosclientes.Uma forte experiência vivida em 2002 foi a transferênciapara a nova sede. Parecia um sonho… e se realizou! Umacasa adequada, com todos os requisitos: só pode ser obrado “sócio invisível”!Durante o ano os reflexos da crise econômica mundialforam sentidos, causando preocupações e suspensões,mas a comunhão que caracteriza a experiência profissio-nal da Ágape foi fonte de toda solução. Multiplicaram-seas forças, as idéias e a ação da Providência!O relacionamento com os médicos e profissionais se in-tensifica correspondendo aos princípios da Economia deComunhão. Muitos não possuem um referencial religioso,mas aderem e vibram com o projeto. Recentemente, umdeles disse publicamente: «Esta não é uma Policlínica,não tem nada a ver com uma clínica… aqui eu encontreiuma família».Uma psicóloga muito competente, mora e trabalha emSão Paulo, com a agenda cheia. Parecia impossível podercontar com ela no quadro de profissionais da Ágape! Nes-se ano, porém, após a inauguração da nova sede, os con-tatos se tornaram mais freqüentes, ela conheceu melhora EdC, até que um dia, disse: «Eu também quero serprotagonista deste projeto revolucionário». Agora já estáentre os profissionais da Policlínica!O relacionamento com os funcionários é de máxima aber-tura, com a consciência de cada um deles é importante eexerce um papel de protagonista na EdC. Uma das funci-onárias, que trabalha há anos conosco, quando foi admi-tida era tímida e sem projetos para o futuro. Foi estimula-da a estudar e concluiu o curso técnico de enfermagem.Nesse ano ela decidiu continuar os estudos, ingressandona Faculdade de enfermagem.O conceito da centralidade do homem na atividade econô-mica leva a considerá-lo antes de tomar qualquer decisão,influindo de forma decisiva na administração da empresa.O crescimento da Ágape é progressivo. Neste ano foi ad-quirido um colposcópio e um mamógrafo, este último emparceria com o médico radiologista. Na cidade de VargemGrande não havia este serviço, quase indispensável. Nosegundo mês de funcionamento as entradas já haviamcoberto o investimento inicial e a mensalidade. Foi monta-do um ambulatório para pequenas cirurgias, uma sala parainalação e foram introduzidos exames cardiológicos, comoo sistema Holter e o teste ergométrico.Em 8 de setembro de 2002, a Policlínica completou dezanos: uma década de lutas, de vitórias, mas principal-mente de uma alegria ímpar, a alegria de ver, dia após dia,a concretização da idéia da EdC também da área da saú-de, com uma válida contribuição.

Comunione – contabilidade e assessoriaAbrir um escritório de contabilidade para atender às ne-cessidades das empresas EdC: esta foi a idéia de trêscontadoras, duas delas recém-formadas, que deu inícioao Comunione, contabilidade e assessoria.Com a consolidação do escritório, graças principalmente àqualidade do trabalho e ao testemunho dado no âmbitoda legalidade, começaram a prestar serviços também paraoutras empresas de Vargem Grande e de São Paulo.Para ajudar os pequenos empresários, muitas vezes es-magados pela carga tributária, juntamente com outrasempresas da EdC, o Comunione procurou fazer um estu-do detalhado da legislação tributária conseguindoenquadrá-las numa categoria que reduziu consideravel-mente os seus impostos e sem recorrer à sonegação.«Ao contrário de outras empresas que produzem bens“visíveis”, – explica Hérica Salvador , do Comunione – onosso trabalho se alicerça nos bens relacionais: atravésde um serviço competente, procuramos instaurar um re-lacionamento de fraternidade que permite que Deus setorne presente em meio a nós».A postura ética do Comunione está contagiando e atrain-do a admiração e o respeito seja por parte dos clientesque dos órgãos públicos... e os clientes aumentam!

Escola AuroraA Escola nasceu em Vargem Grande Paulista (SP), em1991, no dia em que Chiara lançou o projeto da EdC. Assócias eram professoras, com diferentes experiências, umpequeno capital e uma grande fé. As atividades iniciaramcom cinco salas da educação infantil. Hoje a Aurora tem194 alunos, em 17 classes, até o ensino médio.A prática educacional da Escola Aurora, inspirada nocarisma da unidade, através da comunhão entre educa-dores das mais variadas linhas teóricas, suscitou uma prá-tica pedagógica própria. Uma “linha” de trabalho que nas-ceu do diálogo, da partilha e do questionamento de váriaspráticas, tem demonstrado bons resultados na formaçãointegral de crianças e adolescentes.A Providência manifesta-se sempre, seja através da dis-ponibilidade de professores competentes, seja com a che-gada de novos alunos num momento em que se faziamnecessárias novas entradas e até mesmo através de so-mas em dinheiro, inesperadas. O “sócio invisível” sempreestá em ação! «Quando chegou a hora de destinar partedo lucro para a EdC – conta Ana Maria do NascimentoCorrêa, diretora da Aurora, tendo que suprir necessidadesurgentes, não teríamos condições de disponibilizar o lu-cro... mas, por uma alteração da legislação, justamentenaqueles dias, o governo restituiu à nossa escola umaparte dos impostos recolhidos: uma quantia equivalenteao dobro do que havíamos pensado em destinar à EdC!».

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Maria do Carmo [email protected]

«Diariamente, há anos, quando cruzo o portão de acessoao Pólo, tenho a impressão de que se abre à minha frentea “porta do Paraíso”. Em contato com aquelas pessoas,mas também com as construções, com a infra-estrutu-ra... sinto que devo trabalhar, falar, agir sob a orientaçãodo Espírito Santo, pois naquele lugar é palpável a ação deDeus», comenta uma funcionária do Pólo.

No dia 14 de setembro, porém, ao dirigirem-se ao PóloSpartaco, nenhuma das pessoas que trabalhavam no Pólopodiam imaginar o que esperava por elas.«Naquele dia, ao chegar ao trabalho, aproximou-se demim um homem bem vestido que, gentilmente, chaman-do-me pelo nome, convidou-me a ir até o prédio da Latunica. Lá fui recebida por um outro homem que apontoupara mim uma metralhadora. Numa fração de segundo,percorro com o olhar aquela sala e me deparo com achefe da sessão, que me tranquiliza: “Fique calma”, fa-zendo-me, com o dedo, o sinal de unidade. Era um assal-to».A cena era totalmente incomum. Na medida em que osfuncionários e diretores das empresas do Pólo iam che-gando, eram rendidos por 30 homens armados da quadri-lha que, há uma hora, ocupava o Pólo, invadindo todas asempresas à procura de dinheiro.A Prodiet, distribuidora de medicamentos, foi a mais atin-gida. Levaram todo o estoque, num valor de 55 mil dóla-res. Em março do mesmo ano, os mesmos funcionáriosda Prodiet haviam sido feitos reféns de outros 15 assal-tantes, que também roubaram todo o estoque.Muitas impressões marcaram os corações de todos na-quelas duas horas intermináveis de suspensão... «Foi umencontro imediato com Jesus na cruz... Senti o meu cora-ção ser tomado por uma grande paz, por uma luz, nacerteza de ter um Pai que nos ama e que conta até oscabelos da nossa cabeça».«Pensei que poderiam ser os meus últimos momentos...Fiz um ato de contrição e me entreguei a Deus, comoChiara nos ensina. Pensando que a caridade cobre a mul-tidão de pecados, rezei pelos assaltantes: “Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem”».«Lembrei-me das palavras de Chiara: “Um ato de amorpode parar a mão de um terrorista”. Experimentei de ummodo muito forte que Jesus em meio é uma pessoa e,naquele momento, Ele se tornava vivo, presente».«Um dos assaltantes estava nervoso, agressivo. Rezei porele, procurando ir além da aparência e identificar Jesusnaquele homem. A um certo ponto ele se dirigiu a nós epediu desculpas por aquilo que “devia fazer”...».Naqueles momentos dramáticos a força da unidade ven-ceu, criando uma atmosfera de serenidade. Constatamos,mesmo entre os funcionários que não participam do Mo-

vimento dos Focolares, quanto este estilo de vida pene-trou, transformando-se em fatos.

Quando tudo terminou, juntamente com a sensação de“profanação” de algo sagrado, o encontro entre as pesso-as das várias empresas foi comovente: os olhares nãoconseguiam exprimir o que se passava nos corações. Osofrimento vivido juntos gerou um relacionamento maisprofundo. Nas várias empresas, espontaneamente, todosse reuniram ao meio-dia para fazerem uma oração pelapaz e decidiram perdoar. Falou-se mais abertamente deamor e de fraternidade, da cultura da partilha, que é oalicerce do Pólo empresarial, e todos se sentiram convida-dos a se tornarem atores de uma nova sociedade.Não foi fácil vencer o medo, continuar correndo riscos,aceitar os danos materiais... Para todos, principalmentepara os empresários, foi um momento crítico, de decisão,para reafirmar que a Obra de Deus se fundamenta na doramada, na fidelidade a Jesus crucificado e abandonadoque se apresenta no absurdo.

Recebemos um enorme conforto por meio da mensagemque Chiara enviou:

«Só hoje fiquei sabendo do que aconteceu. “Se o grão detrigo não morre...”.Estas foram as palavras de Jesus que logo vieram à mi-nha mente enquanto lia, comovida, a experiência de 14de setembro, o dia da Exaltação da Santa Cruz. Sim, por-que o Pólo Spartaco é o magnífico grão de trigo evangé-lico que, com o seu sofrimento, contribui para o nasci-mento de outros pólos no mundo, como o atual emLoppiano (Itália): o Pólo Lionello.Mas, também nessa circunstância o Ideal triunfou. Vocêssouberam amar, souberam perdoar... e certamente a ati-tude de vocês tocou seus agressores. E o grande Acionis-ta, silencioso mas presente, não deixará de fazer a suaparte por meio da Providência.Agradeço-lhes, caríssimos Armando, Roseli, Maria doCarmo, Augusto, Ercília, François e todos tudo o que vocêsfazem, por aquilo que são, em nome de Maria, Condutoradesta Obra para a qual vocês estão doando a vida.Com todo o coração, Chiara».

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Vera Araú[email protected]

De 6 a 10 de novembro de 2002 realizou-se, em Floren-ça, o Fórum Social Europeu, em preparação para o FórumSocial Mundial (Porto Alegre, janeiro de 2003).Um encontro importante e que, sob alguns aspectos, tor-nou-se até extraordinário: pelo conteúdo, pela organiza-ção, pelo estilo pacífico, pela enorme participação de jo-vens e pela grande manifestação em favor da paz queencerrou o evento.

Foram três dias de intenso debate nas 18 conferências,nos 140 seminários, nos 250 workshops sobre temascandentes: guerra e paz, direitos humanos e direitos so-ciais, pobreza e dívida externa, democracia e participa-ção, desenvolvimento e comércio justo e solidário.Muitas críticas ao neoliberalismo que se difunde, mas tam-bém propostas alternativas, desafios, busca de novos ca-minhos. Em síntese: análise pertinente, moções e suges-tões, pois “Uma outra Europa é possível”, como afirmavao slogan do Fórum.Logicamente nem tudo podia ser compartilhado e apluralidade das vozes, das posições, das perspectivas,também das ideologias, podia dar a impressão de umacerta “confusão”, mas, no seu conjunto, o Fórum SocialEuropeu (FSE) afirmou, com força e com fatos, que hojeexiste um grande “movimento” que busca mais igualda-de, justiça, paz e solidariedade. Isso significa um amadu-recimento, passando de uma posição de mera contesta-ção a proposições: de no-global a new-global.Através de associações e Movimentos, os cristãos partici-param em grande número, oferecendo a própria contri-buição por meio de idéias, de ideais e também de teste-munho quanto a tudo o que crêem.Nesse contexto, os Movimentos Humanidade Nova e Jo-vens por um Mundo Unido, de Florença, organizaram umseminário sobre a Economia de Comunhão, realizado natarde do dia 8 de novembro, numa grande sala da Fortezzada Basso (sede do FSE).Mais de 800 pessoas ocuparam todos os lugares disponí-veis e os jovens se acomodaram no chão. Três horas deuma programação intensa e estimulante. Na primeira partefoi apresentado o projeto EdC: história e cultura (VeraAraújo), a vida das empresas (Alberto Ferrucci), uma ex-periência de uma empresa de Bari, Itália (FrancoCaradonna), o surgimento do Pólo Lionello, em Loppiano(Cecilia Mazzei e Piero Tessieri).Na segunda parte, houve uma mesa-redonda com perso-nalidades que deram uma contribuição analisando as vá-rias dimensões do projeto. Pe. Alex Zanotelli, missionário

comboniano, ressaltou que “Deus sonha com uma econo-mia de igualdade, na qual os bens sejam partilhados. AEconomia de Comunhão é este sonho de Deus na atuali-dade”. O Prof. Riccardo Moro, diretor da Fundação Justiçae Solidariedade, da Conferência Episcopal Italiana, deuimportantes estímulos para o futuro da EdC. O Prof. MarioPrimicerio – que foi colaborador de Giorgio La Pira, ex-prefeito de Florença e atualmente professor de MecânicaRacional da Faculdade de Ciências matemáticas, físicas enaturais de Florença – salientou que “a EdC é uma experi-ência que ajuda a compreender a medida do homem: defato, a economia deve criar uma roupa para a criatura hu-mana que cresce, e não uma couraça, uma jaula paraprendê-la e deixá-la morrer”. Muito apreciada a participa-ção do Dr. Walter Baier, presidente do Partido ComunistaAustríaco, que há anos tem contato com o Movimento dosFocolares. Embora tendo posições diferentes, ele frisou aimportância de um diálogo construtivo para a construçãodo desenvolvimento, da paz e da democracia. Preciosa esignificativa a contribuição da Dra. Lorna Gold, da Univer-sidade de York, e da Dra. Eva Gullo, consultora empresarialde Bolonha.A mesa-redonda foi encerrada com uma entrevista em vídeocom o Prof. Stefano Zamagni que, com a sua costumeiracompetência e clareza, evidenciou que a EdC é possível e éuma experiência original justamente porque se fundamen-ta no valor da reciprocidade, no fato de que “Chiara colo-cou como base a fraternidade e a reciprocidade entre quemdá e quem recebe, e por isso que supera o assistencialismo,a filantropia, e é uma idéia que tem um grande futuro”.

A presença de autoridades civis, como o Presidente daRegião Toscana, Cláudio Martini, e vários assessores regi-onais e provinciais (cargos que correspondem aos de de-putados estaduais – N.d.T.) demonstram o interesse pelonosso seminário.Nessa ocasião a Economia de Comunhão foi proposta comoum laboratório de idéias, de valores e de concretizações;uma realização que traz esperanças que penetram na his-tória para indicar caminhos a serem percorridos rumo aum mundo mais unido.A presença de inúmeros jovens nos deu a certeza de quenessa direção existe um futuro promissor.

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Luigino [email protected]

Hoje estão se confrontando e, em certos casos, se en-frentando, duas visões diferentes quanto à concepção decomo deveria ser a relação entre a esfera econômica (mer-cado) e a esfera social (solidariedade). De um lado, temosos que vêem na expansão dos mercados e da lógica daeficiência a solução para todos os males sociais. De outro,os que vêem o avanço dos mercados como uma“desertificação” da sociedade, e, portanto, os combate ese protege. As duas visões podem ser sintetizadas da se-guinte forma:

a) A situação é considerada “A-SOCIAL”: nesse modelo,que se fundamenta em algumas tradições da ideologialiberal, o “social” é distinto da mecânica do mercado, quese apresenta como um mecanismo etica e socialmenteneutro. Ao mercado é pedida a eficiência e, portanto, ageração de riqueza; a solidariedade, pelo contrário, iniciajustamente onde termina o mercado.

b) A situação é “ANTI-SOCIAL”: a outra visão, que conta,entre os seus teóricos clássicos, com Marx e K. Polanyi, ecomo expressão mais visível alguns dos componentes do“povo de Seattle”, caracteriza-se por conceber o mercadocomo espaço da exploração e do aniquilamento dos fracospelos fortes. Disso parte a reação deles em “proteger asociedade” do mercado e das empresas, afirmando que asrelações realmente humanas (como a amizade, a confian-ça), são destruídas pelo crescimento dos mercados. Tam-bém essa visão – que capta algumas dinâmicas reais –tem aspectos problemáticos e não compartilháveis, poistende a ver a economia e o mercado como realidades porsi só desumanas, como mecanismos destruidores do “ca-pital social” indispensável a qualquer convivência autenti-camente humana.

A experiência e a elaboração cultural da EdC se apresen-tam, pelo contrário, como algo diferente das visões hojedominantes. Com efeito, a EdC propõe que seja vivida aexperiência da comunhão dentro da vida econômica nor-mal. A proposta da EdC é, portanto, a de uma economiacom “várias dimensões”: a eficiência tem o seu lugar, masela é apenas uma dimensão vivida pelas empresas. Junta-mente com a eficiência, a EdC insere na atividade econô-mica outras dimensões que também são co-essenciais,como a “doação”, a “reciprocidade”, a “espiritualidade”, a“gratuidade” e a “comunhão”.A proposta da EdC é que estes princípios, que diferem dolucro e da troca instrumental, encontrem lugar dentro da

atividade econômica. Supera-se a visão quevê o aspecto econômico (os mercados),orientado unicamente pelo princípio da tro-ca instrumental, e que considera a doaçãoe a reciprocidade como privilégio de ou-tros momentos ou esferas da vida civil.Essa visão – enraizada também em certasexpressões do assim chamado TerceiroSetor – não é mais sustentável. Por duasrazões, pelo menos:

a) Em mercados globalizados a lógica dos“dois tempos” (antes as empresas produ-zem e depois o Estado se ocupa do “soci-al”), segundo a qual se organiza a relaçãoeconomia-sociedade, não funciona mais,pois veio a faltar o elemento básico dessa

visão, isto é, a relação riqueza/território. Todo o sistemasocial do Ocidente, especialmente da Europa, havia sidoconcebido em base a essa relação. Hoje esse mecanismofoi rompido pelo avanço da globalização dos mercados. Aempresa é solocitada a tornar-se social na normalidade dasua atividade econômica. Muitas pessoas hoje sentem essaexigência e começa-se a falar de balanço social, de res-ponsabilidade social da empresa, contudo parece-me queainda não se sabe bem como realizar, concretamente, es-sas empresas “sociais”, como levá-las a ultrapassar a meralógica do lucro, abrindo-se a outros horizontes.

b) O efeito “aniquilamento”. Se o mercado, se a economiase torna somente uma troca instrumental, entramos numdos paradoxos mais preocupantes da atualidade. «A moe-da ruim afasta a boa”: é uma das leis mais antigas daeconomia (aplicada às moedas). Este é um mecanismoque tem um significado mais amplo e se aplica, por exem-plo, todas as vezes que motivos intrínsecos (como agratuidade) se defrontam com motivos extrínsecos (mo-netários): os ruins afastam os bons. A troca instrumental,baseada unicamente nos preços, afasta outras formas derelações humanas: se eu sou pago para sorrir, sorrirei menosgratuitamente; se um garoto começa a receber uma me-sada para cortar a grama, não fará mais nada gratuita-mente em casa. O mesmo acontece com o mercado: seele se reduz apenas a uma troca interessada, ao se desen-volver irá “corroer” a condição da sua própria existência (aconfiança).A aldeia global, como todas as aldeias, precisa de maisprincípios autônomos para se desenvolver: não só o con-trato, mas também a gratuidade, a doação. Na história,conhecemos aldeias sem mercados, mas, ao mesmo tem-po, sabemos que não sobreviveram as aldeias que nãocontavam com alguma forma de doação. Hoje, aglobalização – totalmente centralizada no princípio do con-trato – tem uma necessidade enorme de potencializar o“princípio da gratuidade” que, infelizmente, é sempre “afas-tado” pela expansão dos mercados.

Como enfrentar esses efeitos? Vejo dois caminhos: porum lado, “proteger e potencializar” a verdadeira gratuidade.Por exemplo, voluntariado, ONGs, família, Movimentoseclesiais... são experiências sustentadas pelo princípio degratuidade. Por outro lado, é necessário quebrar o “ferrão”do mercado, transformando-o a partir de dentro, inserindonele a gratuidade. O Movimento dos Focolares atua nessasduas frentes. A EdC, ressalta acima de tudo a exigência deque também a atividade econômica, também os merca-dos, dêem espaço, internamente, à doação, ao amor e atémesmo à comunhão.O desafio é grande... mas não podemos deixar de aceitá-lo.

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Franco [email protected]

As origensA Unitrat, empresa que teveinício em 1976, atualmenteconta com um capital socialde 1,4 milhões de euros, 50funcionários e um fatura-mento anual de 3 milhões deeuros.

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Uma empresa aberta a todos

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CCCCCO nosso trabalho consiste em modelar produtos me-cânicos, utilizando um processo termoquímico quetransforma a estrutura interna dos mesmos, ressal-tando, desse modo, as características mecânicas ne-cessárias à finalidade para a qual foram construídos.É um processo utilizado nos mais variados setores damecânica: automobilístico, aeronáutico, de equipamen-to agrícola e para o transporte industrial. Temos cercade mil clientes distribuídos num raio de 600 km.

Nasci na Puglia, mas estudei, comecei a trabalhar eme casei em Turim, cidade para onde havia me trans-ferido com a minha família, ainda na infância. Depoisde ter vivido muitas experiências como empregado ede ter montado uma pequena empresa mecânica jun-to com outros sócios, decidi lançar-me numa aventu-ra maior, com seis amigos, juntando as nossas econo-mias, as capacidades profissionais, as idéias e o tem-po livre.Alguns dos sócios são do Sul do país, por isso opta-mos por implantar uma empresa nas nossas terras,com o nosso povo, próximo a Bari, com a participaçãode uma financeira pública que posteriormente cedes-se suas cotas aos sócios privados.Durante muitos anos, vivemos imersos nas dificulda-des, seja pela cultura essencialmente individualista dolugar, seja pela carência de infra-estrutura; mas, ape-sar de tudo, nesses 25 anos sempre crescemos.

Amar os fornecedoresDesde o início, nos inspiramos no imperativo do amor.Quando foi lançado o projeto da Economia de Comu-nhão, aderimos imediatamente e foram construídosrelacionamentos de amizade, num clima de colabora-ção entre todos: funcionários, clientes, fornecedorese concorrentes.Quando uma das empresas que nos fornecia materialviveu um período crítico, por causa de um enfartesofrido pelo proprietário, ao invés de procurar outrosfornecedores – o que poderia parecer mais prudente– continuamos a trabalhar com eles, antecipando os

pagamentos, para que pudessem garantir os salários esaldar as dívidas mais urgentes.O consultor administrativo da empresa pediu demissãode um momento para o outro e um colaborador nossoofereceu-se para reconstruir e atualizar a contabilidade,que estava atrasada. Apesar de tudo, não foi possívelevitar a falência, então, admitimos dois funcionários eajudamos um outro a começar a trabalhar como autô-nomo.Não tivemos prejuízo com esta operação, pois aceita-mos, como sugestão do proprietário, os equipamentosda empresa dele ao preço da avaliação pericial. Uma vezrevendidos, recuperamos mais do que gastamos.

Amar os concorrentesUm dos nossos concorrentes começou a enfrentar séri-as dificuldades. Pensamos nas conseqüências que a suaeventual falência poderia provocar, como o desempregoe o fechamento de uma empresa cujo serviço é útil parauma região – Nápoles – carente de indústrias. Ofereci aminha ajuda gratuitamente.Ele precisava de vendas imediatas, então propusemosaos nossos clientes que parte dos pedidos feitos a nósfossem transferidos àquela empresa, e nós garantiría-mos a qualidade do produto final. A proposta foi aceitae nasceu, assim, um intercâmbio de experiências técni-cas e uma colaboração recíproca, como se fôssemosuma única empresa.

Quando um grande incêndio atingiu o equipamento deum dos setores da nossa empresa, continuamos a acre-ditar que “tudo o que nos acontece é para o nossobem”. Este fato gerou uma competição de solidariedadeentre os funcionários, os clientes e os fornecedores.Durante os dois meses necessários para reformar asinstalações, os trabalhos foram transferidos para outrasduas empresas situadas a centenas de quilômetros dedistância, que renunciaram a uma parte do lucro paraque pudéssemos compensar as despesas de transporte.Um agricultor, que produz também máquinas agrícolas,disse que estava encontrando dificuldade com o tempoe o custo do transporte. Sugerimos que ele passasse atrabalhar com uma outra empresa, mais próxima da suacidade, e lhe demos a garantia de que informaríamos ociclo correto do processo de trabalho. Ele ficou muitoadmirado e, além de decidir continuar trabalhandoconosco, aproveitando o caminhão vazio para outrostransportes no retorno, mandou-nos 900 quilos de me-lancias, que distribuímos entre todos.

Solidariedade entre os trabalhadoresEm meados dos anos 90, começamos a enfrentar pro-blemas decorrentes da pouca oferta de trabalho. De-pois de esgotar todas as possibilidades, foi necessário

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optar entre demitir um quinto dos funcionários ou firmar um con-trato de solidariedade, segundo o qual todos reduziriam a jornadade trabalho e, com uma contribuição da Previdência, seria cobertaa metade das horas não trabalhadas. De comum acordo, escolhe-mos esta alternativa, embora todos perderiam 20% de seu salário.Analisando a situação, percebemos que não seria possível reduziras horas de trabalho de sete pessoas que ocupavam cargos deresponsabilidade, mas, a idéia de que nem todos participariam domesmo sacrifício, não nos deixava tranqüilos. Assim, nós sete,decidimos livremente redistribuir 6% dos nossos salários segundoas necessidades familiares dos demais funcionários, de acordo como número de filhos e do trabalho realizado pela esposa de cada umdeles. Este acordo – o único deste tipo em toda a região – foifirmado com a Secretaria Estadual do Trabalho e com o Sindicato.Convencidos de que os resultados não dependem exclusivamentedos investimentos, mas acima de tudo das pessoas que traba-lham, sempre procuramos envolver todos os funcionários na cola-boração, na participação acionária e na distribuição extra contratualde uma parte dos lucros; uma outra parte é destinada anualmenteà Economia de Comunhão.

Solidariedade com os últimosUm dia percebemos que um funcionário se drogava, não conse-guia mais exercer suas funções e causava muitos problemas. Em-bora o primeiro pensamento tenha sido mandá-lo embora, decidi-mos aceitá-lo com seus limites.Tivemos a oportunidade de conhecer o ambiente em que vivia e asua família. Passamos a estar com ele também fora do horário detrabalho, para mantê-lo ocupado o dia inteiro, até que ele mesmonos pediu ajuda para deixar a droga.De comum acordo, retivemos o seu salário e, diariamente, com-právamos para ele apenas o necessário. Quando estava para en-trar numa comunidade de reabilitação, teve uma grave crise deabstinência e nos obrigou a liberar todo o seu salário retido, quegastou com drogas em apenas dois meses. Num domingo, foipreso em flagrante, roubando a nossa empresa. Estava muito male não podíamos abandoná-lo. Assim, o levamos para uma comuni-dade da região de Marche. Depois de ter passado por um ciclo derecuperação de três anos, voltou a trabalhar conosco.

A serviço da sociedadeTendo conhecido o mundo da droga e colaborado com agentes eassistentes sociais do tribunal, nos foi pedido para ajudarmos umrapaz com um passado de toxicodependência, furtos, assaltos evárias prisões, que tinha um filho de cinco anos, o qual estava sobcustódia temporária de uma família.Para recuperar o filho – que lhe seria tirado definitivamente – eledeveria ter um emprego, mas, além do seu estado físico debilita-do, ele não tinha nenhuma experiência. Todas as vezes que tentourecomeçar, fracassou. Propusemos, então, aos nossos colabora-dores, que o introduzíssemos no trabalho paulatinamente, come-çando a confiar a ele trabalhos mais leves e não muito comprome-tedores. Assim, ele foi admitido por uma empresa de logística quetrabalha conosco.

Com esta experiência, sentimos a necessidade de nos especializar-mos na ajuda a pessoas marginalizadas. Depois de termos feitoum curso de formação, resolvemos abrir uma Cooperativa Socialde Inserção no Trabalho. Atualmente, a Cooperativa presta servi-ços a várias empresas e conta com 28 cooperados, dos quais dezsão voluntários e 18 trabalhadores; 40% deles são pessoas margi-nalizadas. Os cooperados voluntários são especialistas, entre osquais há um sacerdote ortodoxo romeno e um pastor evangélicoholandês que, com a própria experiência profissional e humana,ajudam os trabalhadores.No ano passado, junto com alguns amigos deficientes, decidimosabrir uma cooperativa cujo objetivo seria favorecer a inserção nocampo do trabalho, de acordo com a nova legislação para deficien-tes neste âmbito. Abrimos um centro diurno para acolher essaspessoas e uma agência de empregos para mediar os contatosentre a Secretaria do Trabalho e as empresas que desejam assu-mir pessoas deficientes de acordo com a nova legislação.

A serviço do territórioNesses anos, o relacionamento construído entre as empresas le-vou-nos a voltar a nossa atenção aos problemas da nossa região.Somente trabalhando juntos seria possível enfrentar a questão dodesemprego e da exclusão juvenil. Por meio de uma associação depequenas e médias empresas, dialogamos com as instituições econseguimos concretizar alguns projetos.Atualmente, cerca de dez empresas da região ligadas ao projetoEdC, firmaram um convênio com o município de Bari para admitir,nas nossas fábricas, menores que estão em situação de risco.Além disso, apresentamos nossa experiência às escolas. Admiti-mos em nossas empresas alguns alunos do ensino médio comoestagiários e instituímos prêmios e bolsas de estudo para alunosuniversitários da Escola Politécnica, interessados em fazer seustrabalhos de conclusão de curso analisando as nossas empresas.No segundo semestre do ano passado, recebemos um financia-mento da União Européia – de três anos – para desenvolvermos,na cidade de Bari, um projeto de assistência a mulheres de umbairro em situação de risco, com o objetivo de promover a recupe-ração sócio-cultural e a inserção no campo de trabalho. Para admi-nistrar este projeto, formamos uma associação temporária comalgumas empresas que aderiram à idéia: a nossa empresa, a coo-perativa social, uma entidade de formação, uma associação, aSecretaria Municipal de Saúde, a Prefeitura de Bari, a Vara Distrital,a Secretaria de Educação, a Faculdade de Ciências da Educação, oDepartamento de Serviço Social e os sindicatos.

Em dezembro de 1998, a A.C.L.I. (Associação Católica de Traba-lhadores Italianos) de Bari, por ocasião da festa de São Nicolau,instituiu um prêmio que foi conferido a seis pessoas, dos maisvariados setores da sociedade. No âmbito do trabalho, eu fui opremiado, com a seguinte motivação:«O espírito empresarial exercido de maneira evangélica e uma cla-ra capacidade de organizar e promover ações de solidariedade naesfera industrial, no respeito aos valores éticos e sociais da própriacomunidade de trabalho».

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De 24 a 29 de setembro, 640 representantes de 22países europeus reuniram-se em Czestochowa, naPolônia, para a Primeira Conferência organizada pelaRenovação Carismática Católica Internacional.O vice-presidente, Sr. Calisi, é um dos líderes do diálo-go entre os Movimentos católicos. Nutrindo uma gran-de estima por Chiara Lubich, ele nos convidou para dara palestra principal do último dia, com o tema: «Desa-fios éticos e sociais europeus».Num país em que é difícil encontrar um lugar na igrejaaos domingos, junto com minha esposa, escutei a BoaNova anunciada por bispos, sacerdotes e muitos leigosdesde as primeiras horas da manhã até o entardecer,numa cripta próxima à igreja de Nossa Senhora deCzestochowa.Encontrar tantas pessoas, de toda a Europa, que vi-vem a própria fé, nos dá muita esperança. Passamosuma semana com eles: rezamos, cantamos, professa-mos a nossa fé, adoramos, participamos da Missa eassistimos à manifestação do dom das línguas.Eu despertei e compreendi a importância da Renova-ção Carismática e dos grupos ecumênicos de oraçãopara o diálogo entre as Igrejas.Muitos cristãos que haviam perdido o elo com as Igre-jas oficiais, encontram acolhida nesses grupos, queajudam a reforçar a vitalidade e a unidade das Igrejasem todos os níveis.O noticiário da Renovação Carismática comentou a mi-nha palestra com essas palavras: «O capitalismo quedomina o mundo desde 1900, causa vítimas e está emcrise. Mas com a cultura da Economia (de Comunhão)podemos renovar o nosso mundo com empresas ori-entadas por princípios do Evangelho. Leo Andringa, doMovimento dos Focolares, deu um grande testemunhode que isto é possível».Dom Dembowski, bispo de Varsóvia, ficou muito felizao escutar a nossa experiência sobre a Economia deComunhão: «É o que nós precisamos» – disse ele. Pe-diu que o meu discurso fosse traduzido em polonês,para ser distribuído em toda a sua diocese. Ele é o líderdo Movimento Carismático na Polônia.Neste ambiente religioso, a nossa experiência teve umarepercussão especial. Fiquei impressionado com o im-pacto que provoca o “dado de Chiara”, como foi cha-mado aqui o “Dado do Amor” das nossas crianças, osgen 4. Em cada um dos seus lados, o dado nos convidaa amar de uma maneira diferente, em cada momento:«Tomar a iniciativa no amor», «Amar a todos», «Amaro inimigo», «“Fazer-se um” com o outro», «Amar Je-sus no irmão», «Amar-se reciprocamente».Todos consideraram o Dado do Amor como a chave paraentender o coração da nova experiência econômica.

A Polônia encontra dificuldades para discernir se deveingressar na Comunidade Européia ou não. Este era umdos temas da Conferência sobre o qual pediram o meuparecer. Os poloneses temem perder a própria identida-de e a própria cultura, têm medo – caso ingressem naComunidade Européia – de serem governados por um“Novo Kremlim de Bruxelas”.Defendi o ingresso na Comunidade Européia, porque,na minha opinião, o enorme movimento de capital –cem vezes maior do que o necessário ao comércio debens reais – torna muito vulnerável, no aspecto finan-ceiro, um país isolado, embora a moeda nacional, o zloty,no momento, seja forte.Nos dias que se seguiram, reuni-me com o professorAdam Biela, ex-decano da Faculdade de Economia daUniversidade de Lublin e, atualmente, senador: segun-do o parecer dele, o governo polonês não está prepara-do para entrar na Comunidade Européia e está pedindoà comunidade um período de transição mais longo, poisconsidera que agora o choque seria muito grande.O problema da Polônia é que 60% da economia do paísé controlada pelo capital estrangeiro e precisa, assim,de novas empresas. Como suscitá-las diante da carên-cia de capital próprio?Esta mesma pergunta vale para as empresas da Econo-mia de Comunhão. Como garantir a primazia da pessoanas “nossas” empresas se o capital é fornecido por ter-ceiros? Podemos ter ótimas idéias sobre como dar no-vamente ao homem o lugar central na economia, massem capital próprio é muito difícil ter sucesso.Este questionamento me remeteu à experiência da Eco-nomia de Comunhão no Brasil. Para criar as novas em-presas não foram buscar capital estrangeiro, mas bus-caram a solidariedade de muitas pessoas que se tor-nam acionistas com o pouco que têm. Dessa maneiraforam capazes de obter o capital necessário para finan-ciar boa parte do Pólo empresarial e das empresas.Eu e o professor Biela ficamos perplexos ao ver comoeste simples exemplo pode ser um modelo para qual-quer país do mundo. Criar um Fundo Comum, um ban-co, ou tornar-se acionistas, abriria um caminho viável,talvez a longo prazo, para neutralizar o poder supremodo dinheiro, que poderia voltar a exercer o seu papel deservo e não de patrão da humanidade.

No nosso último dia na Polônia, estivemos com AndrzejMilkowiski e sua esposa. Ele é um empresário da Eco-nomia de Comunhão, diretor de uma empresa de proje-tos, com 60 funcionários, em Katowice (ver NoticiárioEdC nº 16). Recentemente, a sua empresa projetou asnovas estradas que circundam a cidade de Cracóvia.Levamos a eles um arranjo de flores, em sinal do res-peito e do agradecimento que gostaríamos de expres-sar a todos os empresários poloneses que doam a pró-pria vida para que esta nova economia esteja presentetambém na Polônia.

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Diploma em Economiae ComércioCampo de estudo: SociologiaUniversidade dos Estudosde Nápoles “Frederico II”

Economia de Comunhão:uma pesquisa empíricana ItáliaOrientador:Prof. Raffaele Sibilio

Vanna Coppola

[email protected]ério em CiênciasReligiosasTeologia Moral e SocialInstituto Superiorde Ciências Religiosas“Odegitria”

A comunhão dos bens:da primitiva comunida-de cristã ao mercadoeconômico e à Economiade ComunhãoOrientador:Prof. Corrado Germinario

Francesco Tortorella

Ponto de referênciamundial para as teses:Antonella [email protected]

A tese destaca a dimensão relacional na esfera econômica, apre-sentando o nascimento e a evolução da Economia de Comu-nhão, em que, num âmbito estritamente econômico, volta a tersentido falar de valores, de virtude e de relacionamentos.Após ter acenado sobre a relação entre a ética e a economia aolongo dos séculos, é analisada a função da empresa na socie-dade moderna e a sua responsabilidade social que cresce cadavez mais; é aprofundado o tema da cultura empresarial, comum breve apêndice sobre a evolução do conceito de trabalho nahistória e sobre a sua repercussão na pessoa humana.É abordada, enfim, a globalização, analisando a função do mer-cado nesse contexto, apresentando os seus protagonistas e asresponsabilidades econômicas e sociais que recaem sobre ele.Fala-se sobre a função do consumo, reservando uma atençãoespecial às suas dimensões comunicativas e relacionais, e àsimplicações com a felicidade.São apresentados os resultados de uma pesquisa de camporealizada por meio de um questionário dirigido a empresários,com o objetivo de verificar o que foi exposto teoricamente e deidentificar as dinâmicas segundo as quais as empresas da EdCconseguem valorizar os relacionamentos que nascem da ade-são do empresário ao Projeto.Mediante o questionário, foi possível captar a experiência vitaldessas empresas. Ela nos levou a compreender que a mensa-gem do Projeto – cultural e rica de propostas – é comunicada atodas as pessoas que se relacionam com a empresa na experi-ência concreta de cada dia; tal mensagem é persuasiva e, ge-ralmente, envolvente.

Estão inseridas no site as95 monografias, disserta-ções e teses de doutora-do, que abordam o projetoEdC, concluídas até no-vembro de 2002. As duasúltimas, que apresentamosneste número, com temassócio-econômicos e deanálise histórica do cristia-nismo, são fruto da ampli-ação progressiva das pes-quisas sobre o projeto Eco-nomia de Comunhão.

Todas as teses estãodisponíveis no site:http://tesi.ecodicom.com

O objetivo da tese é demonstrar que o princípio da comunhãodos bens, que emergiu de uma experiência de fé, tem valoruniversal no espaço e no tempo; além de ser um modelo nãoapenas para as relações sociais em nível pessoal, mas tambémpara relações econômicas, e pode inspirar a gestão e os relaci-onamentos entre empresas no mundo contemporâneo, inclusi-ve numa economia liberal e globalizada.Após apresentar uma análise do pensamento de Jesus sobre ouso dos bens e da aplicação da comunhão dos bens nas primi-tivas comunidades cristãs, percorre-se a “doutrina” sobre estetema, desenvolvida pela Igreja ao longo dos séculos, de modoespecial o pensamento dos Padres da Igreja e do MagistérioSocial da Igreja do século XX; enfim, é analisada a espiritualidadedo Movimento dos Focolares e a prática da comunhão dos bensentre seus membros. São analisados também a finalidade, osmétodos, os resultados e as implicações do Projeto da Econo-mia de Comunhão que emergiu desta espiritualidade.Desde a origem da Igreja, o amor evangélico levou à comunhãodos bens de maneiras bem diferentes, mas sempre com a mes-ma intensidade. Esta comunhão percorreu os séculos até che-gar ao mundo contemporâneo, com o seu mercado livre eglobalizado.Os cristãos podem viver também hoje o espírito dos primórdios,com modos e formas adequadas à nossa época. Um dessesmodos é a Economia de Comunhão, “sinal dos tempos” queutiliza métodos complementares à comunhão dos bens, tor-nando-a mais moderna e aplicada ao âmbito produtivo, do qualela era excluída.Na EdC revivem-se os princípios propostos por Jesus, amplia-dos por São Paulo e vividos por pessoas de todos os lugares ede todas as épocas. Ela propõe novamente ao mundo a eternaatualidade do Evangelho e a sua capacidade de resolver os pro-blemas mais dramáticos da humanidade.

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Vittorio [email protected]

Associar economia e gratuidade pode parecer tão estranhoquanto associar vida e ficção. Assim como tudo o que éficção não é vida, tudo o que é gratuidade pode dar aimpressão de não ser economia. De fato, a economia tratada troca de equivalentes, desde o primitivo escambo atéos mais modernos mercados telemáticos; se recebo algu-ma coisa de alguém, devo dar algo em troca. Este é, tradi-cionalmente, o cerne da questão.Ao longo dos anos, os economistas se questionaram, den-tro desse contexto, quais seriam as condições que tornari-am essas trocas eficientes (a concorrência) e quais seriamas qualidades que as tornariam ineficientes (oligopólio emonopólio); quiseram identificar também quais os casosem que uma série de trocas leva ao máximo da utilidade,seja individual, seja social; e, ainda, que tipo de bens po-dem ser trocados e quais, pelo contrário, o mercado nãoconsegue destinar (bens públicos).Partindo desses pressupostos, compreende-se como é pos-sível pensar que, quando há troca de equivalentes, há eco-nomia e, ao contrário, quando há gratuidade não é possí-vel haver um espaço para uma reflexão econômica. Agratuidade, o dom, parece negar o econômico, a troca.Mas, na verdade, se analisarmos bem, se ampliarmos oshorizontes teóricos e nos deixarmos questionar pela di-mensão econômica mais profundamente, percebemos quea economia não só tem algo importante a dizer a respeitodo dom e da gratuidade, mas que essas duas categoriastêm muito a dizer à economia, à teoria econômica. Bastaconsiderar o fato de que a economia é uma ciência social,social no sentido de que trata da sociedade e, para isso,deve procurar explicar a socialidade, isto é, a vida associa-da. Portanto, não pode menosprezar os elementos queestão na base dos vínculos sociais, ou seja, o dom e aconfiança.É preciso, primeiramente, distinguir o que é uma atividadede troca de presentes e o que é doar gratuitamente. En-quanto a primeira atividade pode ser inserida no âmbito datroca, quer ocorra ao longo do tempo, quer seja relativa abens não materiais, a segunda foge completamente destalógica mercantil.Há tempos se discute como é que a prática da troca depresentes, já em uso na pré-história (muitas tribos primiti-vas da Polinésia e da América do Sul têm rituais semelhan-tes, como por exemplo, os Kula e os Potlach) tenha sobre-vivido nos séculos até plasmar inclusive os nossos com-portamentos. Podemos intuir a importância econômica destaprática se pensarmos que, nos Estados Unidos, só no Na-tal de 2001, o comércio de artigos para presente movimen-tou um capital de 40 milhões de dólares!Por que, então, no Natal ou no aniversário de alguém,damos presentes ou quando somos convidados para jan-tar com alguém a boa educação nos diz que não devemos

chegar com as mãos vazias? Por que geralmente não se dádinheiro de presente, aliás, esse gesto não é muito bemvisto? Algumas explicações de vanguarda afirmam que opresente tem a capacidade de caracterizar as nossas qua-lidades e as nossas intenções. Por exemplo, se eu dou depresente algo que você gosta, estou dizendo também queeu conheço o seu gosto. Relacionar-me com alguém queme conhece e que me entende é bem melhor do queinteragir com uma pessoa que ignora os meus desejos.Receber um presente personalizado, que exigiu tempo paraser encontrado, me diz que a pessoa que me presenteoudeseja que o nosso relacionamento seja duradouro. O temponecessário para a aquisição é um investimento em confi-ança. Se eu sei que você considera importante que o nos-so relacionamento cresça no tempo, sei que posso confiarem você, que não serei traído na primeira chance por umapostura oportunista. Um presente que eu dou num eventopúblico me confere status e aprovação social; por esta ra-zão, no dia do casamento, os noivos costumam expor ospresentes recebidos.Esses exemplos se referem ao que chamamos de troca depresentes. Nesses casos, a economia nos sugere explica-ções potenciais para comportamentos que, num primeiromomento, poderiam parecer anti-econômicos.Mas, como eu dizia anteriormente, existe um outro aspec-to do presente, o da doação pura, gratuita, isto é, a ativi-dade que nos leva a transferir livremente e sem esperarnada em troca, um bem ou um serviço para uma outrapessoa. Podemos pensar em quem, por exemplo, doa san-gue. A pessoa o faz livremente, gratuitamente, anonima-mente, pois não conhecemos a identidade da pessoa quereceberá o nosso presente.Refletindo sobre este segundo tipo de doação, percebi que,bem longe de não ter nenhuma ligação com a teoria eco-nômica, a gratuidade nos ajuda a compreender alguns as-pectos mais importantes da teoria econômica. Dou trêsexemplos.O dom no mercado. Ao mesmo tempo em que renuncia-mos às hiper-simplificações dos modelos dos livros didáti-cos, percebe-se que a atividade mercantil propõe uma ques-tão que é chamada de “questão fundamental da troca”. Éo fato de que, na maioria absoluta dos casos, um contrato,por razões que aqui seria muito longo explicar, não dá ga-rantias suficientes até que o comprador pague pelo bemque o vendedor deseja vender. Esta possibilidade, por sisó, seria suficiente para desencorajar o vendedor até mes-mo para contactar um potencial comprador. Quanto maisaumenta a distância no tempo e no espaço entre os sujei-tos, mais este fato se torna verdadeiro. Por exemplo, comofoi possível desenvolver o comércio transnacional, quandoos vários protagonistas – mercadores, marinheiros, agen-tes, compradores – estavam ligados por vínculos não coer-citivos? No parecer de algumas pessoas, isto foi possívelgraças ao espírito de doação que, mais do que um contra-to escrito, cria um vínculo entre as pessoas. Como o domchama à reciprocidade, então foi possível se instaurar umsistema que se tornou auto-sustentável.

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Alberto [email protected]

Encontramos um outro exemplo deste tipo no caso dosbens públicos. Esses bens, pelas suas característicasintrínsecas, não podem ser trocados no mercado. Ge-ralmente a produção e a distribuição deles são garanti-das pelo Estado. Trata-se de bens como a administra-ção da Justiça, a defesa da nação, a segurança pública,a garantia dos direitos e outros bens similares. Existem,porém, casos relevantes nos quais esses bens não sãoproduzidos pelo Estado, mas por cidadãos, voluntaria-mente. Basta pensar nas eleições, no padrão televisivo,na doação de sangue, no voluntariado, nas ações emfavor do meio ambiente, nos efeitos públicos das ativi-dades de empresas sociais… Consideremos o caso daseleições: votar tem um custo de oportunidade, isto é, ofato de que, para poder votar eu devo renunciar a fazeralguma outra coisa, por exemplo, a passar um dia ma-ravilhoso na praia. Qual é a probabilidade de que o meuvoto influencie decididamente o êxito das eleições? Umaem um milhão! Por que, então, não vou à praia? Tam-bém neste caso, como no caso de todos os bens públi-cos produzidos, tendo por base ações voluntárias, oespírito do dom e o valor social da gratuidade podemajudar a ressaltar este fenômeno.Terceiro exemplo. Vamos considerar que entre quemadquire um bem ou um serviço e quem o fornece existauma situação de assimetria. O comprador não tem con-dições de avaliar plenamente as qualidades do bem oudo serviço que vai adquirir. Consideremos uma consultacom o dentista. Quem me garante que o meu dentistausa realmente o melhor material, dá tudo de si pararestaurar o meu dente ou esteriliza todos os seus ins-trumentos? Impossível saber.Se raciocinássemos somente em termos de troca entreequivalentes, esta assimetria seria suficiente para fazercom que desaparecessem todos os consultóriosodontológicos da face da terra. Por que isso não acon-tece?Porque geralmente essas assimetrias não são aprovei-tadas de maneira oportunista. Também esta renúncia aum possível lucro (mesmo quando correto), pode serinterpretada como um dom.Se analisarmos bem, veremos que mercado, contratos,trocas e grande parte da atividade econômica se funda-mentam em normas sociais nas quais encontramos comoraiz justamente o dom e a gratuidade.Quando, então, nos perguntamos qual pode ser o futu-ro da experiência da Economia de Comunhão, a respos-ta pode ser iluminada pela consciência de que, se na-quele âmbito o dom e a gratuidade são explícitos, emmuitas outras facetas da esfera econômica “tradicio-nal”, o dom e a gratuidade constituem a razão profundadas ações econômicas. Considerar este fato nos ajudaa conceber a Economia de Comunhão não como umaexperiência de nicho, mas como proposta que ativa etorna explícitas razões e motivações profundas, o dese-jo de doar e de estabelecer vínculos sociais constitutivosde cada homem.

Publicamos duas mensagens recebidas após a apre-sentação da EdC no Fórum Social de Florença.

Olá, professor! Que surpresa escutar a sua voz noFórum Social. Para ser sincero, foi um sopro deoxigênio, uma esperança a mais ver que tambémestudiosos inseridos no sistema, como o senhor,numa posição aparentemente cômoda, têm a co-ragem – que no seu caso, parece-me brotar dasua fé e, de modo especial, da experiência de co-munidade vivida com os focolarinos – de reavaliar,de modo radical e autocrítico, o conjunto dos valo-res, nem sempre positivos, que parecem conduzira nossa vida, sem que ninguém possa dizer algo,sem que se possa mudar a escala ou, pelo menos,propor uma perspectiva diferente.Obrigado também em nome de muitas pessoas que,assim como eu, acreditam na possibilidade de me-lhorar sem que, para isso, seja necessário rejeitartudo o que já foi feito até hoje… Obrigado pelo seutestemunho e por apoiar de modo bastante direto,inclusive com a sua presença... Obrigado, obriga-do! Espero revê-lo à frente de acontecimentos comoeste. Até breve, nas próximas provas.

Giovanni U.

Sou um engenheiro de 64 anos que se recusa a seconsiderar um velho. Quero congratulá-los pelonovo impulso que me deram com os seus teste-munhos, há uma semana, na Fortezza da Basso.O mesmo efeito teve o encontro com aquela mul-tidão de jovens que desfez as vozes correntes queos classificavam como pessoas sem expressão eapáticas.Os testemunhos que deram no campo da econo-mia alternativa, que hoje se diria revolucionária,remeteu-me a 40 anos atrás, às palavras do Pe.Balducci ou de La Pira; palavras das quais, maistarde, perdi toda e qualquer pista.Portanto, além de agradecer a vocês e a todos osamigos que vocês souberam envolver, senti-me nodever de questionar a mim mesmo. No passado,por puro jogo intelectual – reciclando máquinasmecânicas obsoletas, como impressoras velhas –dediquei-me a construir pequenas máquinas decorte e prensa, controladas por um simples com-putador. São equipamentos adequados para traba-lhar com materiais leves como compensados, plás-ticos e papelão, mas poderiam ser adaptadas paramaterial metálico. É um sistema já utilizado poramadores exigentes, como os aeromodelistas.Nas economias emergentes, este sistema poderiaser utilizado para produzir, pois daria também aosjovens a possibilidade de uma profissão artesanal,nos mais variados setores, passando diretamentedo desenho informatizado, trabalho para o qual elestêm facilidade, à produção de componentes de umacadeia de montagens, com tempo de trabalho re-duzido e reprodução garantida.Se alguma empresa se interessar por este produtoeu ficaria feliz por dar a minha contribuição, se-gundo a proposta de vocês, fornecendo software,treinamento, projeto e assistência para a instala-ção, in loco, dessas máquinas.

Piero Nessi , Como (Itália)

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