mussiene no oje

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S empre que pensamos em Algarve, vem-nos à memória as praias, o sol, as bebidas frescas e, para quem vai em Agosto, um irritante e desconcertante trânsito veraneante. Mas a verdade é que a costa é apenas parte de uma região imensa em que há mais terra que areia, e é pelo interior que andei a passear na demanda dos sabores regionais. Lanço-me à estrada e, depois de alguns quiló- metros da “125”, apanho a já chamada estrada antiga para Lisboa. Depois de passar a bomba de gasolina da BP, na saudosa estrada nacional, (bomba que, para muitos da minha geração, era o prelúdio de mais alguns minutos para chegar ao “Algarve das praias”), viro no cruza- mento que indica Messines e, ao chegar à ro- tunda que tem Messines à direita, viro à es- querda e ,alguns centos de metros após, vejo a placa que anuncia: Restaurante Mussiene. Parque privativo com sombra debaixo da la- tada, esplanada montada, mas a minha opção recai no interior - o calor do dia obriga ao acon- chego fresco do ar condicionado, mas, com o fresco das estrelas, este promete ser um local mais apetecível e romântico. Lá dentro, a decoração simples, mas não cho- cante, é acolhedora, com alguns pormenores interessantes, como a garrafeira que ocupa a parede de fundo, um bar com várias garrafas expostas e uma sazonal exposição fotográfica. Hoje a artista era da terra e o tema são imagens locais. Sento-me à mesa e inicio logo os meus tra- balhos com uns carapaus alimados sobre umas migas, tapenade de azeitonas e tomate - boa combinação, apenas uma pequena distracção no alho, que por vezes se sobrepunha aos ou- tros sabores. A seguir, a espetada de polvo com batata de Aljezur - mais uma vez, tudo bem confeciona- do, havendo uma boa combinação entre o doce da batata e o salgado do polvo, dispensava a pi- menta rosa fresca, mas acredito que muita gente gostará. Numa combinação mais séria, veio o robalo com espargos verdes e batata sauté. Quando os produtos são bons, dificilmente se consegue es- tragar e, neste caso, até enalteceu as qualida- des frescas do robalo à linha. Ainda houve espaço para umas costeletas de borrego (carré) com um ratatui de legumes da região e fundo de carne! Carne rosada, saboro- sa e exactamente no ponto em que foi pedida - nada a apontar, a não ser uma salva de palmas. Não sei como, mas ainda dei umas dentadas nas bochechas de porco preto com puré de ba- tata e brócolos, carne macia bem confeciona- da, mais uma vez, sem remates negativos - tal- vez fosse importante cuidar um pouco mais a apresentação deste prato. Terminei com duas sobremesas: um bolo quente de chocolate com gelado e coulis de fru- tos silvestres e uma pêra bêbada com cama de baunilha. O primeiro estava demasiado doce e o choco- late era banal, não elevando nada para as me- mórias; a segunda já era o oposto: a pêra esta- va bem cozinhada os sabores fortes do vinho e da canela não abafavam o “doce” da pêra - pelo contrário, harmonizavam muito bem e a bau- nilha dava um toque exótico ao prato. Fiquei fascinado com a cozinha simples do chefe David Coelho: sem grandes pretensões, honesta nos produtos, simples na apresentação (por vezes demasiado simples) e forte em tradi- ções e aromas. O Algarve e o seu interior ganham por ter lo- cais como estes e, quem por lá passa, ganha uma recordação do que melhor a região tem para oferecer. A boa comida por um bom preço, nunca se nega uma visita. Por Vicente Themudo de Castro Crítica restaurante Restaurante Mussiene Monte de São José 8375-052 São Bartolomeu de Messines N 37º14’52.9, W 8º17’04.98 +351 282 339 357 / 918 831 456 [email protected] Horário: Terça a Domingo 12h00 às 15h00 e das 19h30 às 22h30 Preço médio: €25 Tipo de Cozinha: Regional Algarvia Contemporânea Cartões: Todos DETALHES SABOREAR AS TRADIÇÕES ALGARVIAS LIFESTYLE 14 QUARTA-FEIRA 29 de Junho de 2011 PUB

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Junho 2011

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Page 1: Mussiene no OJE

S empre que pensamos em Algarve,vem-nos à memória as praias, o sol, asbebidas frescas e, para quem vai emAgosto, um irritante e desconcertante

trânsito veraneante.Mas a verdade é que a costa é apenas parte

de uma região imensa em que há mais terraque areia, e é pelo interior que andei a passearna demanda dos sabores regionais.

Lanço-me à estrada e, depois de alguns quiló-metros da “125”, apanho a já chamada estradaantiga para Lisboa. Depois de passar a bombade gasolina da BP, na saudosa estrada nacional,(bomba que, para muitos da minha geração,era o prelúdio de mais alguns minutos parachegar ao “Algarve das praias”), viro no cruza-mento que indica Messines e, ao chegar à ro-tunda que tem Messines à direita, viro à es-querda e ,alguns centos de metros após, vejo aplaca que anuncia: Restaurante Mussiene.

Parque privativo com sombra debaixo da la-tada, esplanada montada, mas a minha opçãorecai no interior - o calor do dia obriga ao acon-chego fresco do ar condicionado, mas, com ofresco das estrelas, este promete ser um localmais apetecível e romântico.

Lá dentro, a decoração simples, mas não cho-cante, é acolhedora, com alguns pormenoresinteressantes, como a garrafeira que ocupa aparede de fundo, um bar com várias garrafasexpostas e uma sazonal exposição fotográfica.Hoje a artista era da terra e o tema são imagenslocais.

Sento-me à mesa e inicio logo os meus tra-

balhos com uns carapaus alimados sobre umasmigas, tapenade de azeitonas e tomate - boacombinação, apenas uma pequena distracçãono alho, que por vezes se sobrepunha aos ou-tros sabores.

A seguir, a espetada de polvo com batata deAljezur - mais uma vez, tudo bem confeciona-do, havendo uma boa combinação entre o doceda batata e o salgado do polvo, dispensava a pi-menta rosa fresca, mas acredito que muitagente gostará.

Numa combinação mais séria, veio o robalocom espargos verdes e batata sauté. Quando osprodutos são bons, dificilmente se consegue es-tragar e, neste caso, até enalteceu as qualida-des frescas do robalo à linha.

Ainda houve espaço para umas costeletas deborrego (carré) com um ratatui de legumes daregião e fundo de carne! Carne rosada, saboro-sa e exactamente no ponto em que foi pedida -nada a apontar, a não ser uma salva de palmas.

Não sei como, mas ainda dei umas dentadasnas bochechas de porco preto com puré de ba-tata e brócolos, carne macia bem confeciona-da, mais uma vez, sem remates negativos - tal-vez fosse importante cuidar um pouco mais aapresentação deste prato.

Terminei com duas sobremesas: um boloquente de chocolate com gelado e coulis de fru-tos silvestres e uma pêra bêbada com cama debaunilha.

O primeiro estava demasiado doce e o choco-

late era banal, não elevando nada para as me-mórias; a segunda já era o oposto: a pêra esta-va bem cozinhada os sabores fortes do vinho eda canela não abafavam o “doce” da pêra - pelocontrário, harmonizavam muito bem e a bau-nilha dava um toque exótico ao prato.

Fiquei fascinado com a cozinha simples dochefe David Coelho: sem grandes pretensões,honesta nos produtos, simples na apresentação(por vezes demasiado simples) e forte em tradi-ções e aromas.

O Algarve e o seu interior ganham por ter lo-cais como estes e, quem por lá passa, ganhauma recordação do que melhor a região tempara oferecer.

A boa comida por um bom preço, nunca senega uma visita.

Por Vicente Themudo de Castro

Crítica restaurante

RReessttaauurraannttee MMuussssiieenneeMonte de São José8375-052São Bartolomeu de MessinesN 37º14’52.9, W 8º17’04.98+351 282 339 357 / 918 831 [email protected]ário: Terça a Domingo 12h00 às 15h00 e das 19h30 às22h30 Preço médio: €25 Tipo de Cozinha: Regional AlgarviaContemporânea Cartões: Todos

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SABOREAR AS TRADIÇÕES ALGARVIAS

LIFESTYLE 14 QUARTA-FEIRA29 de Junho de 2011

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