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análise do discurso

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    Revista do Programa de Ps-Graduao em Letras da Universidade de Passo Fundo - v. 10 - n. 2 - p. 475-487 - jul./dez. 2014

    Neste artigo, discutimos prticas discursivas multimodais encontradas no aplicativo WhatsApp com o prop-sito de refletir a relao entre o texto verbal e a imagem. Respaldamo-nos na perspectiva da multimodalidade, principalmente nos fundamentos da Semitica Social, fundamentando--nos nos trabalhos de Kress (1998) e Kress; Leeuwen (1996, 2011) para anlise do discurso multimodal e do papel da imagem utilizada nesse meio digital. Os enunciados multimodais presentes nas prticas discursivas do WhatsApp revelam a imagem como modo semitico privilegiado para a construo de sentido na tessitura discursiva na tela de dispositivos m-veis smartphones.

    Palavras-chave: Multimodalidade. Se-mitica Social. Prticas discursivas. WhatsApp.

    Resumo

    Data de submisso: jul. 2014 Data de aceite: ago. 2014

    http://dx.doi.org/10.5335/rdes.v10i2.4147

    * Doutora em Lingustica. Professora e pesquisadora do Programa de Ps-Graduao da Universidade Catlica de Pernambuco. rea de atuao: Linguagem e Multi-modalidade. E-mail: [email protected]

    ** Doutora em Educao. Professora pesquisadora da Universidade Catlica de Pernambuco. rea de atuao: Linguagem e Tecnologias. E-mail: [email protected]

    Prticas discursivas multimodais no WhatsApp: uma anlise verbo-visual

    Renata da Fonte* Roberta Caiado**

    IntroduoEste artigo prope discutir os aspec-

    tos multimodais encontrados em prticas discursivas presentes em dispositivos mveis - smartphones - mais especifica-mente no aplicativo WhatsApp, de forma a refletir sobre a relao entre texto ver-bal e visual e sobre os papis da imagem na constituio multimodal do discurso na tela. Para isso, as reflexes sero respaldadas na perspectiva da semitica social, proposta por Kress e Van Leeween (2001), na qual o discurso multimodal, uma vez que constitudo por modos se-miticos, que se articulam na construo de sentido da teia discursiva.

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    Na contemporaneidade, o avano tecnolgico da mdia digital, em especial das tecnologias mveis, promove o sur-gimento de diversos aplicativos e novos acessrios que possibilitam a leitura e a produo discursiva na tela. Exemplo dessas tecnologias mveis so os smar-tphones, que contribuem para o surgi-mento de novas prticas discursivas mediadas por textos verbais e visuais.

    Logo, o discurso constitudo com o auxlio das tecnologias digitais da infor-mao e comunicao , em sua essncia, multimodal. O bate papo no WhatsApp multimodal, pois os recursos disponibili-zados no aplicativo possibilitam mesclar diferentes modos semiticos, como som, imagem, vdeo, texto verbal na tela.

    O WhatsApp Messenger um aplica-tivo que permite trocar mensagens pelo celular/smartphone. Est disponvel para telefones iPhone, BlachBerry, Android, Windows Phone e Nokia com acesso internet (3G ou WI-FI, quando dispo-nvel). O WhatsApp possibilita enviar mensagens escritas, de udio e de vdeo e imagens. O aplicativo foi criado em 2009 pelo norte-americano Brian Acton e pelo ucraniano Jan Koum, que foram funcionrios do Yahoo. A ideia de criar esse aplicativo, que possibilita a troca de mensagens, foi de Jan Koum e surgiu no momento em que a academia que fre-quentava proibiu o uso de celulares. As ligaes perdidas, enquanto praticava esportes, o incomodavam e o mobilizaram a pensar em uma alternativa para essa questo, da a ideia de criar o WhatsApp.1

    Segundo Ferro (2014), esse aplicativo considerado um dos projetos de maior sucesso no meio digital, pois conta com elevada adeso de usurios de disposi-tivos mveis. Nos primeiros quatro anos de vigncia, o crescimento do WhatsApp superior ao do Facebook.

    Podemos encontrar na interao via WhatsApp diversos gneros discursivos, que variam quanto ao estilo, ao forma-to e ao contedo. Esses gneros podem permear prticas discursivas formais ou informais. Essas prticas multimodais integram palavras, sons, imagens e movi-mentos, sincronicamente, em um meio ca-racterizado por noes de multilinearidade e exigem dos sujeitos dialgicos atitudes ativamente responsivas, conforme prope a perspectiva dialgica bakthiniana.

    Discutir a multimodalidade atrelada tecnologia digital mvel e refletir sobre a inter-relao entre texto verbal e ima-gem em prticas discursivas ocorridas no aplicativo WhatsApp torna-se neces-srio frente aos desafios impostos pela cultura digital, que envolvem prticas diferenciadas de leitura e escrita na tela.

    A multimodalidade em dispositivos digitais

    mveis As novas tecnologias digitais da infor-

    mao e comunicao permitem mesclar diferentes modos de representao: a imagem pode ser combinada ao texto es-crito, o som e o movimento adicionado imagem (KRESS, 1998). Tais tecnologias

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    so capazes de reunir simultaneamente mltiplas semioses (texto, som e imagem) em gneros discursivos no meio digital (MARCUSCHI, 2010), favorecendo a bricolagem de vrias linguagens amalga-madas em um mesmo suporte (XAVIER, 2009) e as diversas possibilidades de significao do texto eletrnico nas inte-raes on-line (ROJO, 2009).

    Kress (1998) ressalta que o discurso sempre teve natureza multissemitica, apesar disso, privilegiava-se o papel do texto escrito, deixando-se de considerar o potencial representacional e comu-nicacional do texto visual. Segundo o autor, os aspectos visuais nas tecnologias contemporneas, como no computador, podem estar relacionados aos tipos e tamanhos de fontes e layout, que confi-guram o texto.

    Conceber o discurso como constituio multimodal essencial para compre-ender os vrios modos semiticos que esto integrados nas prticas discursivas presentes no meio digital, pois a forma como a linguagem verbal relaciona-se visual contribui para a construo de sentido na interao dialgica.

    A multimodalidade no discurso im-plica o uso de vrios modos semiticos. A maneira como esses modos so com-binados pode reforar a mesma ideia, desempenhar papis complementares ou hierrquicos, nos quais um determinado modo semitico predomina em relao ao outro (KRESS; LEEUWEN, 2011). Nesse caso, o contedo do discurso pode ser expresso, principalmente, pelo texto verbal ou pela imagem. O aplicativo para

    dispositivos mveis WhatsApp favorece a mescla de diversos modos semiticos, sejam de natureza verbal, por meio de sons ou da escrita, sejam de constituio visual, como o caso da imagem.

    Para o estudo das imagens, Kress e Leeuwen (1996) propem a Gramtica do Design Visual, advogando que a linguagem visual possui uma sintaxe prpria, uma vez que seus elementos es-to organizados entre si para expressar significados coerentes.

    A seleo de determinado modo semi-tico depende do objetivo do sujeito na prtica discursiva e indica o contedo do que pretende expressar. Segundo Barros e Meira (2010), na perspectiva da Semi-tica Social, o autor e o leitor selecionam um modo semitico para destac-lo em um momento especfico da interao.

    A respeito da relao da imagem com texto escrito, Santanella e Nth (2008 [1997], p. 54) retomam consideraes de Barthes (1964) e de Kalverkmper (1993). Os autores ressaltam o questio-namento de Barthes (1964, p. 38):

    Ser que a imagem simplesmente uma duplicata de certas informaes que um texto contm, e portanto, um fenmeno de redundncia, ou ser que o texto acrescenta novas informaes imagem?

    Partindo desse questionamento, Santanella e Nth (1997) afirmam que a relao imagem-texto ocorre em um contnuo que vai da redundncia infor-matividade. Com base nas observaes de Kalverkmper (1993), nesse contnuo, h trs formas distintas de relao da imagem com o texto. A imagem pode

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    ser inferior ao texto, sendo, portanto, redundante, caso em que podemos citar as ilustraes cuja presena da imagem no essencial para a compreenso do texto, logo se excludas do texto no com-prometem sua compreenso; a imagem pode ser superior ao texto quando mais informativa em relao a ele, situando--se, portanto, na escala da informativi-dade. Neste tipo de composio textual sem a imagem, uma concepo do objeto muito difcil de ser obtida (SANTA-NELLA e NTH, p. 56-57); ou a imagem pode ser equivalente palavra, quando a imagem integrada ao texto, tendo a mesma importncia, sugerindo que a relao entre imagem e texto encontra-se no meio do contnuo, entre a redundn-cia e a informatividade, essa relao de equivalncia entre texto e imagem.

    Martinec e Salway (2005) mencionam que o status de equivalncia ou igualda-de entre imagem e texto pode caracteri-zar uma relao de independncia ou de complementariedade.

    Segundo os autores, imagem e texto so independentes e de igual status quan-do se combinam, mas um no modifica o outro. Quando ambos se modificam, seu status considerado complementar.

    No status de igualdade, seja inde-pendente ou complementar, a imagem inteira relaciona-se a um texto inteiro. Quando a imagem relaciona-se a apenas uma parte do texto ou quando o texto est relacionado parte da imagem, o status de subordinao, caracterizan-do uma relao desigual (MARTINEC; SALWAY, 2005).

    Martinec e Salway (2005) sintetizam os diferentes status da relao entre imagem e texto por meio do diagrama a seguir:

    Figura 1: Status do sistema de relao imagem--texto

    Fonte: Martinec; Salway, 2005, p. 349 (traduo nossa).

    Ao refletir sobre as relaes entre imagem e texto, Barthes (1977) prope duas formas principais de inter-relao: ancoragem e relay. Na primeira, o texto direciona o leitor para o significado da imagem, ajudando-o a identificar os elementos dela. O texto faz referncia imagem. Nessa forma de relao, o texto tem a funo de elucidar parte da men-sagem icnica. A relao de ancoragem pode ser encontrada em fotografias de imprensa e anncios. J na inter-relao denominada relay, texto e imagem so complementares. As palavras e as ima-gens so fragmentos de um sintagma mais geral, como acontece nos desenhos animados e nas histrias em quadrinhos.

    A relao imagem-texto de ancoragem nos faz pensar no texto que funciona como legenda da imagem, guiando o leitor para o sentido dela. Logo, o texto serve de base para a leitura da imagem.

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    J na relao entre imagem e texto co-nhecida como relay, o leitor necessita observar a imagem e o texto para cap-tar o sentido do discurso multimodal, lembrando o status de igualdade entre imagem-texto, defendido por Martinec e Salway (2005).

    Segundo Kress e Van Leeuwen (1996), a imagem, como parte integrante do texto escrito, contribui para o observador compreender a semitica da composio textual e a ideologia do produtor do texto.

    As tecnologias digitais mveis favore-cem a construo de textos multissemi-ticos sem que para isso seus usurios necessitem de expertise, porm, ser letrado digital contribui para integrar diferentes modos semiticos disponveis no meio digital.

    Xavier (2005, p. 135) afirma que:

    Ser letrado digital pressupe assumir mudanas nos modos de ler e escrever os cdigos e sinais verbais e no-verbais, como imagens e desenhos, se compararmos s formas de leitura e escrita feitas no livro, at porque o suporte sobre o qual esto os textos digitais a tela, tambm digital.

    As prticas discursivas no WhatsApp so permeadas por discursos multimo-dais e exigem sujeitos autnomos, ativos, intencionais, na medida em que devero selecionar os modos semiticos para a constituio da tessitura discursiva.

    No prximo tpico, refletiremos sobre a maneira que os sujeitos relacionam texto verbal/escrito e imagem no apli-cativo WhatsApp, a partir da anlise de fragmentos de prticas discursivas ocorridas nesse aplicativo.

    Procedimentos metodolgicos para a

    anlise verbo-visual de discursos multimodais no

    WhatsAppA realizao desta pesquisa envolveu

    uma anlise verbo-visual de discursos multimodais no aplicativo WhatsApp. Para essa anlise, selecionamos trs fragmentos de prticas discursivas de diferentes usurios desse aplicativo.

    O WhatsApp contribui para a consti-tuio do discurso multimodal, no qual h possibilidade de mesclar palavras e emoji, anteriormente denominado emoticons, que tem origem japonesa. Shigetaka Kurita foi o criador dos emoji orientais. A ideia de sua criao surgiu nos anos de 1990, diante da necessidade de ferramentas e tcnicas rpidas de comunicao, principalmente, do pblico adolescente japons. Inicialmente, Ku-rita e uma equipe de designers criaram 176 carinhas, capazes de expressar va-riadas emoes. Mais tarde, essa ideia foi difundida por outras empresas, que elaboraram outros conjuntos de emoji.2 Os cones passaram a ser usados no texto digital, elegendo desenhos com a funo de expressar ideias especficas ou um estado de humor.3

    No WhatsApp h diversos cones ou emoji, que incluem carinhas com expres-ses faciais diferenciadas, gestos manu-ais, smbolos relacionados s profisses, e que expressam sentimentos, pessoas,

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    relgio com a marcao da hora, objetos variados, animais, nmeros, frutas, par-tes do corpo, placas, entre outros. Abaixo apresentamos alguns exemplos desses emoji disponveis no aplicativo.

    Figura 2 Exemplos de Emoji para smartphones

    Fonte: Dispnvel em: .

    Analisaremos, a seguir, qualitati-vamente, trs fragmentos de prticas discursivas extradas do aplicativo What-sApp, na tentativa de refletir, a partir da classificao proposta por Martinec e Salway (2005), os usos que os sujeitos fazem dos aspectos multimodais na re-lao entre texto verbal e visual e sobre os papis da imagem na constituio multimodal do discurso na tela.

    Anlise e discusso dos discursos multimodais no

    WhatsAppAo analisar as prticas discursivas

    no aplicativo WhatsApp, realaremos a relao entre palavra e imagem, e o papel desta ltima em trs contextos de interao distintos.

    CONTEXTO 1: WhatsApp de uma famlia. Participam deste grupo 10 (dez) pessoas.PERFIL DOS SUJEITOS IDADE FORMAO TEMPO QUE USA O APLICATIVO: No contexto abaixo 02 (dois) sujeitos interagem. Com idades prximas: 62 anos, 60 anos; ambos os sujeitos utilizam o aplicativo h mais de dois anos.

    Figura 3 Prtica discursiva I

    Fonte: elaborada pelas autoras a partir da captura de telas do aplicativo WhatsApp em smartphone.

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    Na prtica discursiva acima, parti-ciparam dois sujeitos pertencentes ao grupo familiar, um sujeito de 62 anos e outro sujeito de 60 anos. O contexto temtico envolvido foi o feriado do dia do trabalhador, que comemorado no dia primeiro de maio.

    Para iniciar o bate papo no aplicativo, o sujeito 1 utiliza um recurso do aplica-tivo WhatsApp, que foi o de inserir um cartaz, que continha uma mensagem verbal caracterizada pelo texto escrito: Vai comear tudo de novo. Ento... Boa Semana pra voc!! acompanhada da ima-gem ilustrativa do personagem Garfield.

    Ao ocupar o turno discursivo, o sujei-to 2 interage utilizando, apenas, emoji, inserindo quatro deles em sequncia temporal na sua enunciao digital. O primeiro emoji utilizado pelo sujeito 2 representa o gesto manual que expe o dedo polegar para cima, sinalizando o gesto emblemtico de positivo. No contexto dessa interao, esse tipo de imagem pode ter sido utilizada como for-ma de compreenso acerca do que foi dito por Garfield ou como introduo da sua resposta que tinha a inteno de relem-brar ao sujeito 1 que o prximo feriado (parada obrigatria) estava prximo. Os gestos emblemticos so construdos so-cialmente e determinados culturalmente e podem ser realizados na presena ou na ausncia da fala (MCNEILL, 2000). Na interao dialgica do fragmento I, o cone que representa o gesto emble-mtico foi apresentado na ausncia do texto escrito.

    Na sequncia, o sujeito 2 expe o segundo cone, que de uma placa de trnsito, com o significado de parada obrigatria e depois introduz o cone do nmero 1, que representa, pela ima-gem, o dia de um calendrio. Esse cone indica o dia que ocorrer a parada obrigatria, dia primeiro de maio, dia do trabalhador. Para encerrar seu turno, o sujeito 1 sorri, por meio da carinha que representa sorriso, acrescenta outro cone de positivo, inferimos que con-cordando com a afirmao do sujeito 2 e sentindo-se satisfeito, e introduz o emoji da carinha que solta um beijo de corao, como forma de despedida. As imagens substituram o texto verbal, garantindo a construo coesa, coerente e com sentido do texto visual.

    O sujeito 1, quando volta a ocupar o turno discursivo, aps o primeiro car-taz enviado, tambm faz uso, apenas, da imagem - de emoji - na construo do seu discurso. Incialmente, introduz uma carinha com sorriso, expressando satisfao com o feriado. Essa ideia de contentamento tambm reforada pelo gesto emblemtico que sinaliza legal. Por fim, o sujeito encerra a interao dialgica com a carinha, que solta um beijo, retribuindo o mesmo ato de seu interlocutor a partir da mesma imagem.

    Nesse fragmento, os emoji substituem o texto verbal, sendo realados na cons-tituio dos discursos dos sujeitos, que so formados apenas pelas imagens que significam e contextualizam a prtica discursiva. Logo, o discurso na tela, na Prtica Discursiva I de natureza essen-

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    cialmente visual. Consideramos que as imagens possuem status de independn-cia absoluta, uma vez, que foram usadas na interao sem a presena do texto ver-bal e com coerncia semntica, situando--se no contnuo da informatividade.

    Esse tipo de status da imagem tem sido encontrado em outras prticas discursivas de sujeitos considerados le-trados digitais, que utilizam o aplicativo WhatsApp.

    Em um contexto interativo diferente, observamos o uso de texto visual e de texto verbal na constituio do discurso dos sujeitos.

    CONTEXTO 2: WhatsApp de um casal.PERFIL DOS SUJEITOS IDADE FORMAO - TEMPO QUE USA O APLICATIVO: Os 02 (dois) sujeitos possuem ensino superior completo e tem 51 anos; utilizam o aplicativo h trs anos.

    Figura 4 Prtica discursiva II

    Fonte: elaborada pelas autoras a partir da captura de telas do aplicativo WhatsApp em smartphone.

    A prtica discursiva II mostra dois contextos de interaes distintos: convite e comunicado de chegada a um determi-nado destino.

    No primeiro contexto, o sujeito 1 inicia a interao dialgica na tela com o intui-to de convidar o sujeito 2 para andar de bicicleta. Para isso, o sujeito 1 combina quatro emoji (figura de casal + bicicleta + sol + relgio, que marca o horrio das 7h30) seguido do ponto de interrogao; inferimos que o significado desse texto visual seja: Vamos andar de bicicleta s 7h30 ?. No contexto dialgico, as imagens articulam-se de forma coesa e coerente na constituio do discurso do sujeito 1. Logo, dispensam palavras para seu entendimento, ocupando o status de independncia absoluta e situando-se na escala da informatividade.

    A compreenso do sujeito 2 clara quando esse ocupa o turno discursivo, enfaticamente, por meio do texto verbal Topooo ao aceitar o convite do sujei-to 1 expresso no discurso de natureza imagtica. Em seguida, confirma o horrio da atividade fsica por meio do questionamento: 7h30??? e encerra seu turno discursivo com as letras Kkkk, que significam gargalhadas no meio di-gital, representando sua sonoridade em interaes face a face e, tambm, o fato de o sujeito 1 ter conhecimento de que o sujeito 2 no gostava de acordar cedo para prtica de esportes. No contexto dialgico, os textos verbais representam o status de independncia absoluta, sen-do informativos.

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    Diferentemente do discurso do sujeito 1, que teve constituio visual, o discurso do sujeito 2 foi de natureza verbal de forma a aproximar a interao na tela da interao face a face. No discurso desse sujeito, observamos marcas signi-ficativas como o alongamento da palavra Topo, que foi grafada Topooo. Essa estratgia de triplicar a letra modifica o layout do texto escrito tradicional e tem a funo de substituir o alongamento da durao da palavra falada nas interaes face a face e pode ter sido utilizada para enfatizar seu aceite e expressar grande interesse pelo convite.

    Diante do aceite do sujeito 2, o sujeito 1 usa dois cones que representam o ges-to emblemtico de legal; o primeiro pode ter significado sua satisfao do aceite do convite e o segundo pode ter sido usado para confirmar o horrio do passeio de bicicleta. Aps o uso desses cones em-blemticos, seu discurso apresenta dois emoji da carinha sorridente, demostran-do seu estado de alegria e para fechar seu turno expe duas carinhas que soltam um beijo de corao, caracterizando um contexto de despedida com afeto. O dis-curso do sujeito 1 foi de natureza visual com status de independncia absoluta em relao ao texto verbal ausente. Logo, a imagem est situada no contnuo da informatividade.

    No segundo contexto, o sujeito 2 ocu-pa o turno discursivo para comunicar sua chegada. Para isso, usou apenas o texto verbal Cheguei amor. O sujeito 1 insere-se na interao por meio do

    discurso multimodal ao integrar imagens e texto verbal em seu enunciado digital. Introduz seu turno com um cone de contexto religioso duas mos unidas em sinal de orao/agradecimento. Nesse contexto dialgico, essa imagem poderia significar a expresso graas a Deus. Em seguida, deseja para o sujeito 2 um bom dia por meio do texto verbal. No fecho do seu enunciado, volta a usar imagem representada pelo emoji da carinha que manda beijo de corao. As imagens e o texto verbal apresentam dados novos, ou seja, expressam diferen-tes significados, que do continuidade ao discurso de forma coesa e coerente. Podemos pensar numa relao entre imagem-texto de complementariedade do discurso multimodal.

    Um terceiro tipo de inter-relao entre imagem e texto verbal no aplica-tivo WhatsApp pode ser evidenciado na interao dialgica abaixo.

    CONTEXTO 3: WhatsApp de uma famlia. Participam deste grupo 10 (dez) pessoas.

    PERFIL DOS SUJEITOS IDADE FORMAO TEMPO QUE USA O APLICATIVO: No contexto abaixo 03 (trs) sujeitos interagem. Todos possuem ensino superior completo e tm respecti-vamente: 62 anos, 60 anos e 49 anos; os sujeitos utilizam o aplicativo h mais de dois anos.

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    Figura 5: Prtica discursiva III

    Fonte: elaborada pelas autoras a partir da captura de telas do aplicativo WhatsApp em smartphone.

    Ao iniciar a interao dialgica, o sujeito 1 insere um cartaz constitudo de texto multimodal, no qual h a imagem da famlia dos Flintstones do lado es-querdo acompanhada de uma mensagem verbal sobre famlia. Nesse caso, com base na classificao de Kalverkmper (1993), a imagem inferior ao texto, sendo redundante, pois sua presena no primordial para construo de sen-tido do texto, seu papel de ilustrao. Neste exemplo, a imagem teve o papel de sintetizar o texto verbal, ou melhor, de realar a palavra-chave, a temtica

    do cartaz. Conforme consideraes de Martinec e Salway (2005), a imagem relaciona-se palavra famlia do texto verbal, indicando uma relao imagem--texto desigual, de subordinao. Esse mesmo status pode ser observado no final do cartaz. Segundo Kress e Leeuwen, (2011 [2001]), a imagem da famlia e a do corao tm o papel de enfatizar as palavras escritas.

    O sujeito 2 assume o turno discursivo usando apenas emoji, ao incorporar no seu discurso o cone emblemtico de legal, revelando a aprovao da mensa-gem, e na sequncia, a carinha sorrindo, mostrando estado de satisfao.

    J o sujeito 3 mesclou em seu discur-so imagens e texto verbal. Sua entrada no turno discursivo inicia com a exposi-o da carinha com sorriso, sinalizando sua satisfao com a mensagem sobre a famlia. Em seguida, incorpora em seu enunciado a imagem do sol que antecipa e contextualiza o texto verbal posterior, que expressa bom dia. Nesse momento, a inter-relao entre imagem e texto verbal de ancoragem, pois o texto verbal favorece a compreenso da imagem expressa. De outro modo, a compreenso do texto verbal no depende da presena da imagem, logo inferior ao texto, funcionando como ilustrao. Dando continuidade ao seu turno, o sujeito 3 expe, em sequncia, vrios outros emoji. Ressaltamos que a presena da mesclagem entre texto ver-bal e visual foi evidenciada no contexto de fechamento do turno, na despedida, quando grafa Bjs seguido de dois emo-

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    ji, distintos, de beijo. A linguagem visual expressa pelos emoji teve o papel de reforar a palavra escrita. Nesse caso, imagem e texto verbal so equivalentes no significado, apresentam, segundo Martinec e Salway (2005), status igual e independente.

    Nas prticas discursivas analisadas, no aplicativo WhatsApp, os sujeitos dia-lgicos inter-relacionaram texto verbal/escrito e imagem de formas diversas. Logo, esses modos semiticos apresenta-ram status diferenciados: superior, igual ou inferior, conforme representamos no diagrama abaixo.

    Figura 6 Status do sistema de relao Imagem-Texto no WhatsApp

    Fonte: elaborada pelas autoras.

    Consideraes finais

    No aplicativo WhatsApp h uma pre-dominncia do status de independncia absoluta da imagem em relao ao texto verbal nos sujeitos analisados, pois ela exerce papel relevante para a constru-o do enunciado digital com carter informativo no contexto dialgico pesqui-sado. O processo de letramento digital dos sujeitos participantes da pesquisa contribuiu para este uso, garantindo ra-pidez e expresso diferenciada de ideias complexas.

    Em relao aos papis da imagem nas prticas discursivas analisadas, nesse aplicativo, destacam-se:

    i) Imagem substituta do texto verbal;ii) Imagem que enfatiza o sentido do

    texto verbal;iii) Imagem que antecipa o texto ver-

    bal;iv) Imagem que ilustra o texto verbal;v) Imagem que sintetiza o texto verbal.

    No WhatsApp, as prticas discursivas multimodais so favorecidas, tendo em vista os recursos disponveis nesse apli-cativo, o contexto e o propsito da intera-o, assim como o grau de intimidade dos sujeitos e o tempo de uso do WhatsApp.

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    Multimodal discursive practices in WhatsApp: verb-visual

    analysis

    AbstractIn this article, we discuss multi-

    modal discursive practices found in WhatsApp application in order to re-flect the relationship between the ver-bal text and the image. We endorsed in the perspective of multimodality, especially in the fundamentals of So-cial Semiotics, grounding in the work of Kress (1998); Kress and Leeuwen (1996, 2011) for analysis of multimo-dal discourse and the role of the ima-ge used in this digital medium. Mul-timodal utterances present in the dis-cursive practices of WhatsApp reveal the image as a privileged semiotic mode for the construction of meaning in the discursive fabric of the mobile screen devices - smartphones.

    Keywords: Multimodality. Social Semio-tics. Discursive practices. WhatsApp.

    Notas1 Disponvel em: . Acesso em: 6 jun. 2014.

    2 Disponvel em: . Acesso em: 7 jun. 2014.

    3 Disponvel em: . Acesso em: 7 jun. 2014.

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