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179 Mudanças climáticas: potencial impacto na sustentabilidade da cafeicultura Waldir Cintra de Jesus Júnior Lima Deleon Martins Wagner Nunes Rodrigues Wanderson Bucker Moraes José Francisco Teixeira do Amaral Marcelo Antonio Tomaz Fábio Ramos Alves Capítulo 10

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Mudanças climáticas: potencial impacto na sustentabilidade da cafeicultura

Waldir Cintra de Jesus Júnior

Lima Deleon Martins

Wagner Nunes Rodrigues

Wanderson Bucker Moraes

José Francisco Teixeira do Amaral

Marcelo Antonio Tomaz

Fábio Ramos Alves

Capítulo 10

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1. INTRODUÇÃO Dentre todas as atividades econômicas, a agricultura é a que apresenta maior

dependência das condições ambientais, especialmente as climáticas (JESUS JUNIOR et al., 2008). Assim, estima-se que qualquer mudança no clima poderá afetar o zoneamento agrícola, a produtividade das culturas e as técnicas de manejo, alterando desta forma o atual cenário da agricultura brasileira.

Portanto, as mudanças climáticas provavelmente afetarão o sistema produtivo do cafeeiro, remodelando o zoneamento agrícola da cultura caso se confirmem as previsões de aumento da temperatura, podendo haver redução em cerca de 15% da área apta à cafeicultura no mundo, nos próximos 50 anos (LANE & JARVIS, 2007). Estudos apontam o deslocamento da área produtiva brasileira de café arábica para as regiões de maior altitude e de difícil manejo, bem como para locais mais frios como o Sul do Brasil (ASSAD et al., 2004).

As regiões cafeeiras que atualmente são altamente produtivas dentro do manejo convencional, provavelmente sofrerão os impactos negativos das MCG, e, consequentemente, o citado deslocamento afetará a economia de vários municípios, onde atualmente o café é uma cultura de grande expressão econômica.

Neste capítulo serão abordados os potenciais impactos das mudanças climáticas sobre a ecofisiologia e problemas fitossanitários do cafeeiro, bem como adoção de técnicas mitigadoras visando garantir a sustentabilidade da cafeicultura.

2. POTENCIAL IMPACTO DAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS SOBRE O DESENVOLVIMENTO DO CAFEEIRO

Os fatores climáticos exercem papel fundamental nos processos fisiológicos

do cafeeiro, influenciando o excesso ou déficit hídrico do sistema água-solo-planta, a absorção de nutrientes pela planta, bem como outras características relacionadas com distúrbios fisiológicos e bioquímicos (AGRIOS, 2005). As fases de crescimento e frutificação do cafeeiro são extremamente afetadas pelas condições climáticas, sendo que estas interferem diretamente na fenologia da cultura e consequentemente, na produtividade e na qualidade do café produzido. Portanto, as MCG provavelmente atuarão sobre o desenvolvimento do cafeeiro, podendo alterar o zoneamento da cultura, as práticas de manejo, bem como os distúrbios fisiológicos e as doenças e pragas que incidem na cultura.

2.1. Temperatura O cultivo do café arábica (Coffea arabica L.) a pleno sol requer temperaturas

médias anuais entre 18 °C e 23 °C. Por sua vez, o café conilon (Coffea canephora

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Pierre ex Froehner), é menos sensível às mudanças de clima, sendo originário de regiões equatoriais baixas, quentes e úmidas da bacia do Congo, se adaptando a temperaturas bem mais elevadas, com médias anuais entre 22 °C e 26 °C. Portanto, é importante ressaltar que as mudanças climáticas certamente afetarão estas espécies de forma diferente, dada as distintas características ecofisiológicas das mesmas.

O cafeeiro, de modo geral, é pouco tolerante ao frio, assim, temperaturas de -3,5 °C provocam danos nos tecidos foliares e no tronco. A cultura fica mais sujeita às geadas quando está localizada em fundos de vales, onde o ar se acumula durante as noites frias. Até o paralelo 22° de latitude sul, são observadas geadas esporádicas e entre as latitudes 22° e 25°, a frequência das geadas aumenta consideravelmente, principalmente nas regiões mais continentais de São Paulo e do Paraná, com altitudes a partir de 400 m, e nas áreas serranas paulistas. Áreas planas, espigões côncavos, terrenos de baixada ou de meia encosta com pequena declividade também são desaconselháveis para plantio.

Este problema, no entanto, diminuiu ao longo do último século, em que se vivenciou forte elevação das temperaturas mínimas e, junto, redução gradual das geadas. Por outro lado, nas regiões onde as temperaturas médias anuais ficam acima de 30°C, a produção do C. arabica a pleno sol é prejudicada. Calor intenso na fase do florescimento faz com que os botões florais abortem (formando as estruturas denominadas “estrelinhas”) e a planta não produza frutos. Além disso, a exposição contínua do café arábica a temperaturas superiores a 30 ºC pode causar retardamento do seu crescimento e anormalidades, tais como, amarelecimento de folhas (DaMATTA & RAMALHO, 2006). Regiões próximas ao Trópico de Capricórnio, com médias de temperatura anual de 23°C (o limite para a cultura), costumam apresentar vários dias com temperatura acima dos 30°C, e caso haja coincidência com a fase de florescimento, a frutificação estará prejudicada. Contrariamente, em regiões que atualmente estão na faixa de 23°C e são consideradas aptas ao cultivo do café arábica, caso ocorra o aumento de 3°C da temperatura do ar passarão a torna-se aptas ao cultivo do café conilon nas décadas futuras (ASSAD et al., 2008).

O cultivo de café a pleno sol é uma prática habitual no Brasil, ocorrendo a exposição da folha de café à elevada irradiação solar, acarretando a absorção de muito mais energia do que a utilizada na fotossíntese (CAMARGO, 2010). Tais condições podem causar sobrecarga de energia e, consequentemente, aquecimento das folhas que em casos extremos, pode alcançar temperaturas de 40 °C ou mesmo acima, especialmente se os estômatos estão fechados, como ocorre em dias de sol em culturas não sombreadas (MAESTRI et al., 2001). Portanto, o cultivo de café a pleno sol deverá ser reduzido nas décadas futuras. Visando mitigar tais efeitos poderá ser empregado o cultivo do café consorciado com outras espécies.

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Segundo Fioravanti (2012) as pesquisas do Doutor Hilton Silveira Pinto e seus colaboradores apontam que a área plantada de café reduziu drasticamente ou até mesmo desapareceu no noroeste paulista e no sul de Minas Gerais, isto devido a um aumento de temperatura nas últimas décadas nestas regiões. Estudos anteriores já haviam indicado uma redução próxima a 90% nas áreas favoráveis ao plantio em Goiás, Minas e São Paulo e de 75% no Paraná até 2020, em resposta ao aumento de temperatura (ASSAD et al., 2008).

Além desses fatores, temperaturas elevadas poderão condicionar frutos com desenvolvimento e maturação bastante precoces, provocando assim perdas no rendimento e qualidade dos grãos, uma vez que a colheita e a secagem dos frutos coincidirão com o período chuvoso. Caso a colheita, secagem e beneficiamento do cafeeiro coincidam com a época chuvosa, poderá haver maior incidência de fungos que produzem toxinas no café beneficiado.

Vale ressaltar que temperaturas elevadas podem aumentar a evapotranspiração e o uso/perda de água, podendo acarretar injúrias fisiológicas que provocarão modificações nos constituintes das plantas, alterando assim negativamente a atividade bioquímica e fisiológica das mesmas, e consequentemente a qualidade dos frutos. Qualquer fator que reduza a taxa fotossintética, tais como, estresse hídrico e/ou extremos de temperatura, podem diminuir e até inviabilizar a produção cafeeira do ano seguinte (CHAVES FILHO & OLIVEIRA, 2008). Entretanto, estes impactos poderão ser atenuados caso haja disponibilidade hídrica ao cafeeiro, pois a transpiração atua como regulador térmico das plantas, reduzindo assim a temperatura das folhas, o que permite a manutenção da atividade fotossintética do cafeeiro mesmo em condições de alta temperatura (ALVES, 2010).

2.2. Precipitação O déficit hídrico é fator limitante que pode comprometer a produtividade das

lavouras cafeeiras. Uma condição hídrica favorável para produção de café pode ser encontrada em regiões onde a precipitação é acima de 150 mm por mês no período de florescimento, formação e maturação dos frutos. Este período coincide também com a época de renovação da lavoura onde a mesma está emitindo ramos e folhas e, portanto, o cafeeiro necessita de maior umidade no solo. Na fase de colheita, que coincide com o repouso, onde o crescimento da planta é reduzido, a necessidade de umidade no solo é pequena (MATIELLO, 1991; MARTINEZ et al., 2007).

Com base em dados obtidos de modelos de circulação global (GCM) há previsão de maiores irregularidades na distribuição e intensidade das chuvas, bem como sua alteração temporal, o que poderá ocasionar sérios danos ao cafeeiro, pois a ocorrência de chuvas excessivas no inverno pode contribuir para que o

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cafeeiro se mantenha em estado de vegetação ativa, sendo que nesta época o mesmo deveria estar em repouso. Nestas condições as folhas e as extremidades verdes dos ramos são muito suscetíveis ao frio, e mesmo sem geada, toda a parte aérea do cafeeiro pode manifestar sintomas de clorose em folhas novas, queda das folhas, queima das margens das folhas e dos brotos terminais, bem como manchas escuras em diversos pontos da extremidade dos ramos (BITANCOURT & PINHEIRO, 1956). Com o possível aumento do cultivo do cafeeiro em altas altitudes (como estratégia de mitigação aos impactos das MCG), a ocorrência de ventos frios e constantes nas partes mais expostas dos cafezais agravará a ocorrência de tais sintomas. Portanto, nessas regiões devem ser adotadas práticas de manejo como a construção de quebra-ventos, de modo a minimizar tais problemas.

2.3. Radiação O café arábica é uma espécie de dias curtos, com fotoperíodo crítico em torno

de 13 a 14 horas (PIRINGER & BORTHWICK, 1955 citado por RENA et al., 2001), entretanto, este papel do fotoperíodo no estímulo da indução floral tem sido questionado, sendo que pesquisas têm evidenciado que o mesmo seja de dias neutros (RENA & MAESTRI, 1987). Segundo Amaral et al. (2006), o padrão sazonal de crescimento de ramos e da área foliar não é modificado quando ocorre o aumento do fotoperíodo para 14 horas. Portanto, estes resultados demonstraram que o padrão de crescimento vegetativo do cafeeiro não sofre influência da duração do fotoperíodo, não existindo assim evidências que possam comprovar a influência do fotoperíodo sobre a transição das fases vegetativa/reprodutiva do cafeeiro. Desta forma, o efeito das mudanças climáticas sobre o fotoperíodo, provavelmente não ocasionará significativas alterações fisiológicas, bioquímicas e consequentemente no ciclo do café.

2.4. Dióxido de carbono (CO2) As previsões do Intergovernamental Panel on Climate Change indicam um

aumento da concentração de CO2 na atmosfera com o passar dos anos (IPCC, 2007), entretanto, ainda existe escassez de informações conclusivas sobre o efeito que o CO2 pode ter no desenvolvimento de muitas culturas agrícolas. Alterações na concentração de CO2 podem causar mudanças na assimilação de carbono, na produção e alocação de biomassa, na atividade estomática e na transpiração de diversas espécies vegetais, mas o volume de informações científicas acerca desses fenômenos na cultura do café ainda é reduzido.

Até mesmo dentro de um mesmo gênero, existem diferenças na resposta de algumas espécies em função da alteração da concentração de CO2. Assim é

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provável que as mudanças climáticas tenham efeitos diferenciados para as espécies do gênero Coffea, em virtude de suas diferenças ecofisiológicas. As respostas de uma espécie à uma condição ambiental diferenciada, como é o caso de uma atmosfera com maior concentração de CO2, são muito variáveis e dependem do genótipo, do ambiente e da interação entre esses fatores (PIMENTEL, 2004).

Existem poucos trabalhos publicados abordando os efeitos do aumento do CO2 e as consequências do mesmo no desenvolvimento e produtividade dos vegetais. Em sua maior parte, as informações disponíveis na literatura foram obtidas através de experimentos conduzidos em ambiente controlado, o que apresenta grande importância para o estudo e entendimento de efeitos isolados, mas apresenta limitações para o entendimento do fenômeno em campo.

De maneira geral, o aumento da concentração de CO2 pode causar benefícios para as espécies vegetais, promovendo o desenvolvimento vegetativo, devido principalmente a influência positiva da assimilação de CO2 na capacidade fotossintética das plantas, no entanto, esse efeito positivo pode não ser mantido a longo prazo (DÍAS, 1995; FARIA et al., 1996; HUNT et al., 1982).

Segundo Fioravanti (2012) em um dos experimentos de campo da Embrapa de Jaguariúna, chamado Face, sigla defree air carbon dioxide enrichment, foi observado que os cafeeiros que receberam níveis extras de CO2 apresentam maior crescimento vegetativo quando comparados com cafeeiros que se estão cultivados com níveis normais de CO2 atmosférico, lavando a prever que o aumento da concentração de CO2 pode ter efeito favorável a cultura.

O aumento da assimilação de CO2 em plantas C3, causada pelo aumento da concentração atmosférica desse gás, é explicado pelo aumento da velocidade de carboxilação da Rubisco, já que esta enzima ainda não atingiu sua atividade de carboxilação máxima nas concentrações atuais de CO2 (PIMENTEL et al., 2007). Além disso, o aumento da concentração de CO2 pode causar inibição competitiva em relação ao O2, reduzindo a velocidade de oxigenação da Rubisco (BERNACCHI et al., 2001).

No entanto, com o aumento da temperatura ambiente, esse efeito benéfico da maior assimilação de CO2 pode ser reduzido ou até mesmo anulado, devido ao aumento de taxa de respiração mitocondrial em função do aumento da temperatura e redução da disponibilidade de água no solo (PIMENTEL et al., 2007; DERMODY et al., 2008).

Outro efeito que pode ser observado com o aumento da concentração de CO2 na atmosfera é o aumento da eficiência de uso da água, devido a redução da abertura dos estômatos, assim como da condutância estomática. Esse processo acarretaria em menor transpiração e, consequentemente, em maior eficiência no uso de água (LEAKEY et al., 2009; LONG et al., 2006).

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Com a maior disponibilidade de CO2 causando o aumento da velocidade de carboxilação da Rubisco, acredita-se que a eficiência de utilização de nitrogênio também seria influenciada, devido a redução do conteúdo total de Rubisco, sendo que menos nitrogênio seria requerido no processo de biossíntese desta enzima (AINSWORTH & ROGERS, 2007; DRAKE et al., 1997).

Leakey et al. (2009) e Pimentel (2011) citam os principais efeitos do aumento de CO2 no metabolismo vegetal, a saber:

1. aumento da assimilação de CO2 e da produção de biomassa; 2. aumento da eficiência de uso de nitrogênio, devido a menor produção de Rubisco; 3. menor condutância estomática, com consequente maior eficiência de uso de água; 4. estímulo da taxa de respiração mitocondrial; 5. aumento da produtividade agrícola.

Não se deve, no entanto, avaliar o impacto de alterações na concentração de

CO2 atmosférica apenas sobre o metabolismo vegetal. Mudanças na composição atmosférica podem provocar modificação de etapas do ciclo de pragas, influenciar a taxa de desenvolvimento de patógenos, e até mesmo modificar a resistência das plantas aos mesmos, causando alterações no agroecossistema. Essas alterações atmosféricas podem modificar a eficiência das estratégias atualmente utilizadas no manejo fitossanitário (COAKLEY et al., 1999).

3. POTENCIAL IMPACTO DAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS SOBRE OS PROBLEMAS FITOSSANITÁRIOS DO CAFEEIRO

As doenças do cafeeiro são responsáveis por perdas significativas na

produção. Entre as doenças fúngicas, destacam-se a ferrugem (Hemileia vastatrix), a cercosporiose ou mancha de olho pardo (Cercospora coffeicola) e a mancha de phoma (Phoma sp.). O aparecimento e desenvolvimento de uma doença é resultante da interação de três fatores, conhecidos por triângulo de doença (planta suscetível, agente patogênico e fatores ambientais favoráveis. O ambiente é um componente relevante nesta interação, podendo inclusive impedir a ocorrência da doença mesmo na presença de hospedeiro suscetível e patógeno virulento. Portanto, a distribuição espacial das doenças de plantas é extremamente influenciada pelas condições climáticas. Importantes doenças podem se tornar secundárias caso as condições ambientais não sejam favoráveis. Contrariamente, doenças secundárias podem se tornar importantes caso o ambiente seja extremamente favorável.

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Analisando os impactos das mudanças climáticas sobre a ferrugem do cafeeiro no Brasil, Moraes et al. (2011) verificaram que nas décadas futuras haverá a redução das áreas favoráveis ao desenvolvimento desta doença no país. Tal redução será mais acentuada no cenário A2 (pessimista) do que as preditas no B2 (otimista). O cenário A2 prevê maiores reduções de umidade relativa do ar quando comparada as preditas em B2, resultando assim em condições menos favoráveis à ferrugem do cafeeiro. Apesar disso, extensas áreas ainda continuarão favoráveis ao desenvolvimento da doença, principalmente nas principais regiões produtoras de café do Brasil. Entretanto, a duração do período de maior favorabilidade climática à doença tenderá a ser reduzida nas décadas futuras. Adicionalmente, na região Sul a importância relativa desta doença irá aumentar, uma vez que a elevação da temperatura durante as estações de inverno-primavera proporcionarão o aumento da favorabilidade climática a ocorrência desta doença. Vale ressaltar, que Assad et al. (2004) relatam que se mantidas as atuais características genéticas e fisiológicas das cultivares de café arábica utilizadas no Brasil, o cultivo do cafeeiro irá deslocar para estas regiões.

Além disso, alterações em algumas fases do ciclo da ferrugem do cafeeiro poderão ocorrer devido às novas condições ambientais futuras. Sob condições ambientais desfavoráveis, o patógeno pode produzir estruturas de resistência denominadas “teliosporos”. Desta forma, com a produção destas estruturas reprodutivas ainda ocorrerão epidemias desta doença em algumas regiões do país. Aliado a este fator, a produção destas estruturas é realizada de forma sexuada. Assim, o aumento das condições ambientais adversas ao desenvolvimento desta doença em várias regiões do país, provavelmente intensificará a reprodução deste patógeno via reprodução sexuada. Portanto, com o aumento da reprodução sexuada, haverá uma maior variabilidade genética do patógeno e consequentemente o aumento da probabilidade de seleção de linhagens adaptadas às condições ambientais futuras, bem como da ocorrência de mutações genéticas.

Adicionalmente, com base em trabalho realizado por Moraes et al. (2009) verifica-se que haverá redução nas áreas classificadas como altamente favoráveis, favoráveis e relativamente favoráveis ao desenvolvimento da mancha de olho pardo do cafeeiro (Cercospora coffeicola) nos próximos 71 anos no país. Estas reduções provavelmente ocorrerão de forma lenta nas próximas décadas (2020, 2050 e 2080), e terá variações espaciais no Brasil. Tais alterações preditas pelos modelos serão mais acentuadas no cenário A2 que no B2. Os autores também observaram um aumento significativo da área desfavorável à doença nos cenários futuros, o que se deve ao fenômeno do aquecimento global, uma vez que este compreende o aumento da temperatura e reduções da umidade relativa. É oportuno lembrar que os modelos utilizados na elaboração dos mapas de distribuição da doença não levaram em consideração efeitos da insolação, nutrição e déficit hídrico, os quais afetam a predisposição do cafeeiro a doença.

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Com relação aos impactos das mudanças climáticas sobre a mancha de phoma do cafeeiro (Phoma sp.), Moraes et al. (2012) relatam que haverá redução da favorabilidade climática a ocorrência desta doença no país, em ambos cenários analisados (A2 e B2). Entretanto, segundo estes autores tal redução será mais acentuada no cenário A2 quando comparada as previsões preditas no cenário B2. Este fato deve-se ao maior aumento da temperatura e redução da umidade relativa predita pelo cenário A2 nas décadas futuras. Com relação à distribuição temporal da doença nas décadas futuras, verifica-se que provavelmente haverá a redução do período de favorabilidade a ocorrência da doença no país. Em 2080, o período de maior favorabilidade a doença estará compreendido entre os meses de abril a junho. Contudo, apesar da redução da favorabilidade a mancha de phoma no Brasil, na região Sul e em alguns locais do Estado de São Paulo, Minas Gerais e Espírito Santo ainda apresentarão potencial de risco a ocorrência da doença. Adicionalmente, vale ressaltar que a elevação da temperatura irá propiciar o aumento das tempestades tropicais, como ventos fortes. Esta alteração da velocidade do vento poderá aumentar os ferimentos nas folhas do cafeeiro, favorecendo assim o desenvolvimento da doença na parte aérea do cafeeiro em algumas regiões.

O comportamento das principais doenças do cafeeiro será modificado nos cenários climáticos futuros. Vale ressaltar que as projeções dos potenciais impactos das MCG sobre estas doenças foram baseadas somente nas condições de favorabilidade ao desenvolvimento do patógeno. Entretanto, tanto o patógeno quanto o hospedeiro poderão sofrer alterações devido às mudanças climáticas. A obtenção de cultivares com maior tolerância a condições ambientais extremas poderá afetar diretamente este quadro previsto. Outro possível efeito das mudanças climáticas sobre o hospedeiro é a possibilidade de alteração da efetividade da resistência genética das atuais cultivares utilizadas. Com relação ao patógeno, o mesmo poderá se adaptar às novas condições ambientais, tendo em vista que as alterações climáticas previstas ocorrerão de forma lenta ao longo dos anos. A pressão de seleção sobre raças fisiológicas adaptadas as novas condições poderá selecionar novas linhagens mais adaptadas às mudanças climáticas prevista nos cenários futuros. Além disso, mutações genéticas poderão ocorrer e novas raças adaptadas as condições futuras poderão ser selecionadas. Assim, a implantação de práticas mitigadoras, dentre estas o cultivo sob o sistema agroflorestal, promoverá a modificação do microclima no interior do dossel, influenciando assim o desenvolvimento das doenças.

No tocante ao potencial impacto das mudanças climáticas sobre o bicho mineiro em plantas de cafeeiro no Brasil, Hamada et al. (2006) elaboraram mapas em relação às condições climáticas atuais, prevendo ocorrência de maior infestação desta praga devido ao maior número de ciclos mensais da mesma. Estes autores verificaram que no cenário de clima atual ocorrem de 1,0 a 1,5

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ciclos/mês em todos os meses do ano, exceto em outubro quando ocorrem entre 1,5 a 2,0 ciclos. Nos cenários futuros, obtidos com incrementos constantes de temperatura, existem previsões de áreas com número de ciclos superiores a 2,0 no período de julho a dezembro. Além desta diferença temporal também houve diferença espacial em relação à ocorrência do bicho mineiro no Brasil. Ghini et al. (2008) observaram tendência de aumento na porcentagem de infestação de bicho mineiro face às mudanças climáticas previstas para o futuro.

4. EMPREGO DE TECNOLOGIAS AGRONÔMICAS DE MITIGAÇÃO E ADAPTAÇÃO NA CAFEICULTURA

Para minimizar os possíveis impactos das mudanças climáticas sobre a cafeicultura serão fundamentais o uso tecnologias que permitem viabilizar o cultivo comercial do café em regiões que poderão torna-se inaptas, sendo que, algumas atualmente já são utilizadas na agricultura na forma de práticas agrícolas. Assim, dentre as práticas disponíveis que podem amenizar tais impactos, citam-se: sistemas de cultivos consorciados/agroflorestais, adensamento de plantas, manejo de plantas espontâneas, irrigação e melhoramento genético.

As quatro primeiras práticas (sistemas de cultivos consorciados/agroflorestais, adensamento de plantas, manejo de plantas indesejáveis e irrigação) são de caráter mitigador, ou seja, têm por objetivo influenciar o microclima do dossel, desencadeando uma influência secundária a cultura do café. A última prática, o melhoramento genético, é uma ferramenta direta que será empregada para proporcionar adaptabilidade de cultivo às espécies do gênero Coffea face às mudanças climáticas futuras.

Para que as medidas mitigadoras e adaptativas possam eficientemente contornar os possíveis impactos das mudanças climáticas na cafeicultura, é essencial um empenho multidisciplinar, com objetivo de desenvolver e integrar, aos cenários das mudanças climáticas, políticas abrangentes de adaptações agro-meteorológicas, proporcionando uma visão holística, contribuindo para sustentabilidade do agronegócio café.

4.1. Melhoramento Genético A forma mais adequada para compensar as perdas previstas na agricultura

devido às mudanças climáticas globais seria a de incentivo ao melhoramento genético com a geração de variedades tolerantes à seca e ao calor (PINTO et al., 2011).

O melhoramento genético do cafeeiro com objetivo de geração de cultivares tolerantes ao estresse climático é considerado a medida de mitigação mais eficaz às MCG, isto por prever que as novas cultivares quando associadas a um manejo

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baseado em premissas mitigatórias atenuarão os efeitos das mudanças climáticas sobre a cafeicultura de forma sustentável.

O melhoramento e a adaptação de cultivares superiores de café às MCG preconiza o desenvolvimento de genótipos termotolerantes, resistentes a pragas e doenças, tolerantes a seca, com sistemas radiculares bem desenvolvidos e eficientes na absorção e utilização de nutrientes com alta longevidade e produtividade.

Entretanto, a medida mais eficaz a tolerância às MCG é a que possui maior custo de desenvolvimento, pois segundo Pinto et al. (2011) os custos dessa atividade para a obtenção de uma única variedade de qualquer cultura custa cerca de R$1 milhão por ano, com prazo de 10 anos para entrega aos agricultores, ou seja, cerca de R$10 milhões de custo total. Especificamente para a obtenção de uma cultivar de café com as características citadas acima estima-se que sejam gastos cerca de 57,8 milhões de dólares, até o ano de 2020, desta forma, torna-se extremamente necessário estudar e adaptar estratégias de adaptação às mudanças climáticas.

4.2. Sistemas de cultivos consorciados/agroflorestais/arborização

No centro de origem das principais espécies de interesse econômico (regiões tropicais da África), os cafezais são cultivados sob sombras de florestas nativas ou com árvores introduzidas para tal fim (PEZZOPANE, 2008) e no Brasil, o cultivo de café é essencialmente realizado a pleno sol.

Segundo DaMatta & Rena (2002), o uso de cultivos consorciados, agroflorestais e a arborização na cafeicultura pode interferir positivamente em vários aspectos, destacando-se: i) disponibilidade de luz no dossel da copa do cafeeiro; ii) manutenção da umidade relativa do ar, iii) efeito tampão na disponibilidade hídrica do solo; iv) redução da velocidade dos ventos.

No cultivo sombreado alterações climáticas diminuem o déficit de pressão de vapor nas folhas e permite a abertura dos estômatos, favorecendo a absorção de CO2, sem elevar a taxa de transpiração (LARCHER, 1995). Além disso, neste sistema o cafeeiro apresenta maior taxa fotossintética e redução da fotoxidação e a fotoinibição, o que influencia em maior crescimento e produção (LIMA et al., 2010).

Desta forma, o uso de sistemas agroflorestais/arborização e os cultivos consorciados na cafeicultura poderão ser utilizados para diminuir os impactos causados pelas MCG amenizando os efeitos destas alterações principalmente em áreas marginais. Ressalta-se que além de reduzir os efeitos de condições climáticas extremas, estas técnicas de cultivo agregam valor ao sistema produtivo, proporcionando fonte extra de renda principalmente para a agricultura familiar.

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4.3. Adensamento O sistema de cultivo de café adensado diminui o potencial produtivo por

unidade vegetativa e aumenta a produção no stand de plantas, assim o manejo de adensamento apresenta a atratividade de reduzir o esgotamento individual das plantas de café (RENA & MAESTRI, 1986), reduzindo assim o depauperamento das lavouras.

Desta forma, a contribuição da técnica de adensamento de plantas de café à atenuação dos impactos causados pelas possíveis mudanças no clima, promove menor esgotamento e depauperamento das plantas (diminuição da bienalidade produtiva) devido a produção dar-se de forma igual entre plantas sem elevar a máxima capacidade produtiva individual. A outra forma de contribuição é a diminuição de variação climática dentro do stand, devido ao aumento da cobertura vegetal o que produz um microclima proporcionando estabilidade térmica e hídrica à lavoura, capaz de reduzir o estresse causado ao cafeeiro e mitigar os efeitos das MCG.

Adicionalmente, a técnica de plantio adensado possibilita maior aprofundamento das raízes principais, permitindo elevação da eficiência de uso da água e dos nutrientes (RENA & CARVALHO, 2003), ressaltando-se também que a técnica proporciona otimização do aproveitamento da radiação solar e do gás carbônico (ANDROCIOLI, 1996).

4.4. Manejo da vegetação espontânea A recomendação da manutenção da vegetação espontânea de forma

controlada nas entrelinhas de plantio de cafezais já existe pela recomendação de uso das práticas agrícolas sustentáveis, isso devido a inúmeros resultados de pesquisa mostrarem que em períodos de elevada pluviosidade a cobertura vegetal do solo, entre as linhas de plantio dos cafeeiros, proporciona aumento da capacidade de retenção e diminuição do escoamento superficial, o que minimiza as perdas de solo e de insumos e maximiza a infiltração da água.

Em relação à redução dos efeitos ambientais adversos, consequentes dos impactos das mudanças climáticas na cafeicultura, o principal objetivo da manutenção da vegetação entre as linhas dos cafezais é a atenuação da incidência da radiação solar direta e difusa na superfície do solo, pois esta é a variável ambiental que exerce maior influência na temperatura do solo (AMADO et al., 1990).

Com a manutenção da cobertura vegetal, o saldo de radiação absorvida é reduzido, o que consequentemente reduz a temperatura do solo (AMADO et al., 1990). De forma prática, a implicação desta medida de mitigação proporciona melhor desenvolvimento do sistema radicular, com distribuição homogênea das

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raízes, tornando o sistema mais vigoroso, profundo e eficiente na absorção de água e nutrientes e menos vulneráveis às altas temperaturas do solo.

Além desses fatores positivos, este manejo promove o aumento dos teores de matéria orgânica no solo, o que indiretamente proporciona aumento da capacidade de retenção de água, possibilitando assim o cultivo mais tolerante às condições climáticas adversas (FAZUOLI et al., 2007).

É importante ressaltar que a grande contribuição da manutenção da vegetação espontânea é a atenuação da temperatura na superfície do solo o que proporciona o sistema radicular se desenvolver em profundidade (aumenta a absorção de água) e em superfície (aumenta a absorção de nutrientes), todavia se o manejo de manutenção não for correto, ou seja, se não for respeitado o nível crítico de interferência, a prática pode torna-se ineficiente podendo até acelerar os danos causados pelas MCG, devido à concorrência por água e nutrientes no solo.

4.5. Irrigação O uso do manejo de irrigação na agricultura como medida de mitigação às

MCG será nos próximos anos o tema mais investigado pela comunidade científica; atualmente já se encontra entre os cinco temas direcionados em relação à demanda de pesquisa pelas agências e órgãos de fomento, o que se deve a íntima ligação com a temática de uso eficiente dos recursos hídricos e também da possibilidade de expansão das fronteiras agrícolas.

Na cafeicultura o uso do manejo de irrigação como medida de atenuação dos impactos advindos pelas MCG está inserido em dois contextos. O primeiro visa o fornecimento de água às plantas de café em regiões com temperaturas médias acima do tolerável para a cultura, e o segundo objetiva a possibilidade de cultivo em regiões inaptas com impedimento hídrico e também térmico, uma vez que o aquecimento global poderá alterar o regime de chuvas.

O processo fotossintético do cafeeiro é reduzido em temperaturas acima de 24°C (DaMATTA & RENA, 2002), sendo possível contornar parcialmente esta redução com o manejo da irrigação preconizando a presença constante de água disponível no solo (ALVES, 2010). Atualmente existe necessidade de expansão dos cultivos de café para novas áreas potenciais no Brasil, as quais reúnem inúmeras vantagens que torna o negócio sustentável. Entretanto, a principal característica é a restrição térmica e hídrica, e neste aspecto, a irrigação tem sido o principal fator que permite o estabelecimento da cultura nestas áreas marginais ao cultivo habitual do café (CAMARGO, 2010).

Esta medida mitigadora é amplamente utilizada pelos produtores de café conilon no Estado do Espírito Santo, devido à sazonalidade das chuvas, aos períodos prolongados de seca e às altas temperaturas registradas nos locais,

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colocando o Estado na condição de maior área de lavouras irrigadas de café no Brasil (FERRÃO et al., 2000).

4.6. Mercado de carbono na cafeicultura De forma direcionada, surgiu a necessidade de uma discussão multidisciplinar

com intuito de promover a mitigação de todos os possíveis efeitos das mudanças climáticas globais e também da ação antrópica relacionada ao problema. Com isso na RIO-92 (marco histórico) foi estabelecida a Convenção das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (UNFCCC), onde efetuam-se reuniões anuais desde a criação, sendo a mais notável (COP3) realizada em 1997 em Quioto no Japão. A notoriedade da COP3 aconteceu devido à criação de metas de redução da emissão de gases do efeito estufa (GEE) pelos países membros da UNFCCC, as quais geraram um documento denominado Protocolo de Quioto (PQ) (SILVEIRA et al., 2008).

O PQ “recomenda” que os países industrializados reduzam os índices de emissões anuais. Entretanto, as exigências para que as metas possam ser batidas, são demasiadamente rigorosas o que levou a necessidade de criação de mecanismos de flexibilização, sendo três possibilidades: i) o Comércio de Emissões (ET); ii) a Implantação conjunta (JI) e o iii) Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL). Esta flexibilização proporcionou a venda da redução de emissões entre países, criando assim o chamado Mercado de Créditos de Carbono (SANQUETTA et al., 2011).

O cenário para o mercado de créditos de carbono é promissor, onde estima-se que é possível mitigar com a agricultura, em todo o mundo, com medidas de sequestro de carbono associadas a menores emissões de GEE, 6 bilhões de toneladas de CO2-equivalente, com a possibilidade de negociação de aproximadamente 70% a preços de US$ 100 a tonelada no mercado de carbono, com isso espera-se que o sequestro de carbono possa mitigar praticamente toda as emissões diretas do setor agropecuário (SILVEIRA et al., 2008).

Diversas práticas agrícolas já conhecidas são capazes de diminuir as emissões de carbono do setor e ainda aumentar o sequestro do gás da atmosfera, todavia as pesquisas e aplicações técnicas destas práticas obtiveram uma tendência para culturas que possuem maior capacidade de acúmulo de carbono em suas partes ou que permaneça maior tempo em cultivo como as florestas (plantadas e nativas) e para atividades que proporcionam um maior aporte de carbono ao sistema, como o plantio direto e a integração lavoura-pecuária (MIRANDA et al., 2011).

Especificamente o sequestro de carbono por florestas tornou-se uma atividade economicamente atrativa, desde que correta do ponto de vista ambiental (SOARES et al., 2005), devido a possibilidade de comercialização do acúmulo de elementos poluentes na biomassa das árvores como forma de crédito.

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O estoque de carbono pelas florestas é acumulado tanto na biomassa acima como abaixo do solo, representando uma fração maior de carbono do que existe no estoque atmosférico, assim ao se atentarem pelo fato que as florestas cobrem aproximadamente 30% da superfície do planeta Terra e fixa em torno de 85% do carbono orgânico (HOUGHTON et al., 1994; SILVEIRA et al., 2008).) iniciou-se uma busca por metodologias de estimativa de fixação de carbono.

Desde então, a quantificação do carbono na biomassa das floretas tropicais tem recebido mais atenção (SANQUETTA et al., 2011) devido à grande relevância da possibilidade de mitigação dos efeitos das MCG.

De forma didática pode-se afirmar que a quantificação de carbono da biomassa divide-se em métodos diretos e indiretos. Na determinação pelo método direto as árvores são cortadas e seus componentes separados e pesados, para posterior quantificação em laboratório, tendo como vantagem a precisão e a geração de parâmetros que podem ser utilizados de forma indireta (SALATI, 1994). Como exemplos de métodos diretos de determinação de carbono podem-se citar Schumacher et al. (2002), Watzlawick (2003) e Vogel et al. (2006).

Os métodos indiretos são feitos por meio de estimativas baseadas em dados advindos dessas determinações (método direto), assim como de dados originados de inventários florestais (SALATI, 1994), sendo sua principal vantagem a redução de custo e tempo na obtenção da quantidade de carbono fixado na biomassa. As estimativas têm sido feitas utilizando-se parâmetros de volume e biomassa e também diversas variáveis morfológicas de diferentes partes das árvores (COOPER, 1983; MIRANDA et al., 2011).

Com isso tem-se a possibilidade de quantificar o carbono fixado na biomassa dos cultivos florestais e posteriormente destinação a comercialização no mercado de créditos de carbono.

O exemplo do que é feito em estudos florestais pode ser externado para os cultivos do cafeeiro, pois ao equacionar a área plantada de café no Brasil, que é em torno de 2,289 milhões de hectares (CONAB, 2012), e o “tempo de permanência” da planta de café no campo tem-se a evidência de que as lavouras de café do Brasil apresentam potencial elevado para acúmulo de carbono. Mesmo que os resultados das pesquisas no futuro apresentem que o cafeeiro possui baixa capacidade de acúmulo de CO2 em sua biomassa, quando comparado com as florestas a área plantada com a cultura recompensaria, tornado o balanço de acúmulo de CO2 viável.

Assim, além de gerar uma nova fonte de renda para o cafeicultor, o mercado de carbono advindo da cafeicultura poderá ser uma medida de mitigação dos efeitos da MCG, com base no exemplo do que é feito com os cultivos florestais. Adicionalmente, as práticas de cultivo adensado, sombreado, consorciado, o manejo da vegetação espontânea e a irrigação além de mitigar os impactos

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causados pelas mudanças climáticas na cafeicultura, poderão aumentar a manutenção do carbono no sistema produtivo.

Desta forma, para tornar realidade o comércio de carbono fixado pelo cafeeiro é necessário investimento em pesquisas que procurem discriminar aspectos que poderão trazer validação a hipótese levantada, levando em consideração variáveis como genótipos, localização geográfica dos plantios, índices de crescimento vegetativos, condições climáticas influenciáveis, diferentes formas de manejo, dentre outras. Relata-se que já existem projetos de pesquisas no Brasil com objetivo de iniciar o levantamento destas informações.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS Com base em análises dos possíveis cenários futuros torna-se evidente a

necessidade de aprimoramento do conhecimento técnico-científico atual da cafeicultura, o qual contribuirá para a manutenção da sustentabilidade da atividade. Assim, além de aumentar e estimular pesquisas com o intuito de antever os possíveis impactos das MCG sobre a cafeicultura, devemos também propor soluções para suas consequencias através do desenvolvimento de tecnologias que irão contribuir para a garantia da sustentabilidade do agronegócio café.

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