mudanÇas climÁticas e credito de carbono
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MUDANÇAS CLIMÁTICAS E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL:
O MERCADO DE CARBONO
Marcus Vinicius Magalhães de Pinho
Monografia de Especialização
Brasília – DF, Março/2008
Mudanças Climáticas e Desenvolvimento Sustentável: O Mercado de Carbono Marcus Vinicius Magalhães de Pinho
UnB/CDS
2008
UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA CENTRO DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL
MUDANÇAS CLIMÁTICAS E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL:
O MERCADO DE CARBONO
Marcus Vinicius Magalhães de Pinho
Orientador: Marcelo Dias Varella
Monografia de Especialização
Brasília – DF, Março 2008
Ficha Catalográfica
Pinho, Marcus Vinicius
Mudanças Climáticas e Desenvolvimento Sustentável: O Mercado
de Carbono. Brasília, 2008. 89 p. Monografia de Especialização. Centro de Desenvolvimento Sustentável. Universidade de Brasília, Brasília. 1. Mudanças Climáticas. 2. Desenvolvimento Sustentável. 3. Mercado de Carbono. I - Título
É concedida à Universidade de Brasília permissão para reproduzir cópias desta monografia e emprestar ou vender tais cópias somente para propósitos acadêmicos e científicos. O autor reserva outros direitos de publicação e nenhuma parte desta monografia de especialização pode ser reproduzida sem a autorização por escrito do autor.
______________________________
Marcus Vinicius Magalhães de Pinho
UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA CENTRO DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL
MUDANÇAS CLIMÁTICAS E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL:
O MERCADO DE CARBONO
Marcus Vinicius Magalhães de Pinho
Monografia de Especialização submetida ao Centro de Desenvolvimento Sustentável da Universidade de Brasília, como parte dos requisitos necessários para a obtenção do Grau de Especialista em Desenvolvimento Sustentável e Direito Ambiental, opção lato sensu.
Aprovada por:
_________________________________________________________
Marcelo Dias Varella, Doutor (Université de Paris, Panthéon-Sorbonne)
(Orientador)
________________________________________________________________________
Márcia Dieguez Leuzinger, Doutora (Centro de Desenvolvimento Sustentável – CDS/UnB)
(Examinador Interno)
___________________________________________________________
Jorge Thierry Calasans, Doutor (Université de Paris, Panthéon-Sorbonne)
(Examinador Externo)
Brasília-DF, 14 de março de 2008
AGRADECIMENTOS
Agradeço a Deus, por seu amor e bondade incondicionais; aos meus pais, pela
educação e princípios a mim transmitidos; aos meus filhos, razão do meu viver; à minha namorada, pela inspiração, paciência e confiança. Agradeço também aos colegas Patrícia Moura (grupo Plantar), José Luiz Maia (grupo Duratex) e Guilherme Fagundes (Bolsa de Mercadorias e Futuros – BMF), pelo apoio técnico e valiosas indicações e referências.
RESUMO
As ações humanas voltadas à maximização do crescimento econômico sem a observância de um adequado manejo ambiental têm trazido sérias conseqüências para a estabilidade climática do planeta. O efeito estufa, causado pela emissão desordenada de Gases do Efeito Estufa (GEE), é tema recorrente nas negociações mundiais relacionadas à sustentabilidade da vida na terra. O desenvolvimento sustentável tornou-se um conceito e um princípio de suma importância em todos os foros e negociações transnacionais. Considerado tema de interesse geral da humanidade, é regulado, no âmbito do Direito Internacional, por meio de Tratados. Os principais Tratados sobre mudanças climáticas e desenvolvimento sustentável são a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, instituída quando da realização da Conferência Rio 92, e o Protocolo de Quioto, formalizado em 1997 quando da realização da terceira Conferência das Partes (COP 3) em Quioto, Japão. O protocolo de Quioto estabeleceu, em seu Art. 3, que as economias desenvolvidas ou em transição têm a obrigação vinculante de reduzir suas emissões de GEE em pelo menos 5% frente às concentrações desses gases verificadas no ano de 1990, durante o primeiro período de compromisso (2008 a 2012). Além dessa meta, o Protocolo de Quioto criou mecanismos de mercado com o objetivo de auxiliar as Partes a cumprirem suas metas de redução de emissões. Os mecanismos formais de mercado são: o Comércio de Emissões (CE), a Implementação Conjunta (IC) e o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL). Este último é o único que permite a participação de países em desenvolvimento. O MDL trabalha com o duplo objetivo de auxiliar as economias desenvolvidas a atingirem suas metas de redução de GEE ao menor custo possível e de promover o desenvolvimento sustentável nos países em desenvolvimento hospedeiros dos projetos. A essência dos mecanismos de mercado está na possibilidade de transferência, via comércio, dos excedentes de redução de carbono, alcançados pelas nações que conseguirem avançar em seus projetos dentro dos períodos de compromisso estabelecidos, para os países que, por motivos tecnológicos ou econômicos, não atingirem suas metas de redução de emissões. Esses excedentes são representados por créditos de carbono, quantificados e expressos em termos de toneladas de CO2 equivalente. A negociação desses créditos entre as Partes forma o proeminente mercado de carbono, que vem crescendo e se desenvolvendo de maneira significativa a cada ano. Além dos mecanismos formais, existem também os mecanismos voluntários de redução de emissões de GEE, criados por países que não se comprometeram com os compromissos vinculantes estabelecido por Quioto. Os créditos de carbono transacionados no âmbito do mercado de carbono podem ser gerados a partir de permissões de emissões (allowance based market) ou de projetos de redução ou captura de carbono (project based market). Diante do expressivo crescimento dos volumes de créditos de carbono negociados desde a instituição desses regimes e da demanda crescente por reduções de emissões, conclui-se que o mercado de carbono constitui-se em uma ferramenta eficaz de auxílio à mitigação das mudanças climáticas e de promoção do desenvolvimento sustentável mundial.
Palavras chave: Mudanças Climáticas; Desenvolvimento Sustentável; Mercado de Carbono.
ABSTRACT
Human activities adopted in order to maximize economic growth without proper environmental management have brought serious consequences to climate stability in the planet. The greenhouse effect, caused by uncontrolled greenhouse gas emissions, is frequently addressed in global negotiations related to the sustainability of life in the Earth. Sustainable Development became an important concept and principle in all of the international meetings. It is considered a global interest and is regulated, in terms of International Law, by Treaties. The main Treaties on climate changes and sustainable development are the United Nations Framework Convention on Climate Changes, adopted during the Rio 92 Conference, and the Kyoto Protocol, adopted in 1997 during the Third Conference of the Parties (COP 3), which took place in Kyoto, Japan. In consistence with the provisions of Article 3 of the Kyoto Protocol, developed or transitioning countries have a formal commitment to reduce their greenhouse gas emissions in at least 5% in accordance with the real emissions verified in the base year (1990), during the first commitment period (2008-2012). Besides this target, the Kyoto Protocol created market mechanisms with the purpose of helping the Parties to comply with their emission reductions goals. The formal mechanisms established by Kyoto are: the Emission Trading (ET), the Joint Implementation (JI) and the Clean Development Mechanism (CDM). The CDM works with a double purpose: to help developed economies to achieve their emission caps at the lowest possible cost and to promote sustainable development in developing countries where the projects take place. The essence of the market mechanisms is the possibility of transferring, by trading, the surplus of carbon emission reductions achieved by nations that could advance in their projects during the commitment period to the countries that, due to technological or economic restrictions, could not meet their emission reductions targets. These surpluses are represented by carbon credits, quantified and expressed in terms of tons CO2-equivalent. The trading of these credits among the Parties forms the prominent carbon market, which has been growing and developing significantly every year. In addition to the formal mechanisms, there are voluntary mechanisms to reduce greenhouse gas emissions created by countries that did not accept the formal commitments established by the Kyoto Protocol. Market-tradable carbon credits (units) could be generated by allowances (allowance-based market) or by projects or carbon sinks (project-based market). In view of the expressive growth of carbon transactions and of the demand for emission reductions, we can conclude that the carbon market is an efficient tool to mitigate climate changes and promote the world’s sustainable development.
Key words: Climate Changes; Sustainable Development; Carbon Market.
LISTA DE FIGURAS
1 Ciclo de um projeto de MDL...............................................................................................45
2 Reduções de emissões de GEE para o primeiro período de compromisso.......................56
3 Número de projetos de MDL registrados no Brasil.............................................................57
4 Projetos de MDL por metodologia utilizada........................................................................58
5 Distribuição geográfica de projetos de MDL no Brasil........................................................59
6 Geração de CERs a partir de projetos de MDL..................................................................76
LISTA DE QUADROS
1 Possíveis impactos decorrentes do aquecimento global....................................................23
2 Gases do Efeito Estufa (GEE)............................................................................................36
3 Setores e categorias de fontes de emissão de GEE – Anexo A Prot. Quioto....................36
4 Metas de redução de GEE – Anexo B Prot. Quioto............................................................37
5 Ranking de emissores de GEE em 1990 e 2005................................................................38
6 Valores da taxa de registro de projetos de MDL................................................................52
7 Distribuição das atividades de projetos de MDL no Brasil..................................................57
8 Resultado da redução de emissões de GEE sem o Comércio de Emissões.....................69
9 Resultado da redução de emissões de GEE com o Comércio de Emissões.....................69
10 Mercado Global de Carbono. Volumes e valores 2005-2006...........................................79
11 Resumo dos principais regimes do Mercado Global de Carbono....................................82
LISTA DE SIGLAS
AAU Assigned Amount Units
AND Autoridade Nacional Designada
CCX Chicago Climate Exchange
CDM Clean Development Mechanism
CE Comércio de Emissões
CER Certified Emission Reductions
l-CER Long term CER
t-CER Temporary CER
CIMGC Comissão Interministerial para Mudanças Globais do Clima
COP Conferência das Partes
CQNUMC Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas
EOD Entidade Operacional Designada
ERU Emission Reductions Units
ET Emission Trading
EU ETS European Union Emission Trading Scheme
GEE Gases do Efeito Estufa
IC Implementação Conjunta
IPCC International Panel on Climate Change
LULUCF Land Use, Land Use Change and Forestry
MBRE Mercado Brasileiro de Redução de Emissões
MDL Mecanismo de Desenvolvimento Limpo
NSW GGAS Australia’s New South Wales Greenhouse Gas Abatement Scheme
ONU Organização das Nações Unidas
PDD Project Design Document
UK ETS United Kingdom Emission Trading Scheme
UNFCCC United Nations Framework Convention on Climate Changes
SUMÁRIO
RESUMO..................................................................................................................................4
ABSTRACT...............................................................................................................................5
LISTA DE FIGURAS.................................................................................................................6
LISTA DE QUADROS...............................................................................................................7
LISTA DE SIGLAS....................................................................................................................8
INTRODUÇÃO .................................................................................................................... 10
1 O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL E OS TRATADOS SOBRE MUDANÇAS CLIMÁTICAS......................................... .............................................................................. 16
1.1 A CONVENÇÃO-QUADRO DAS NAÇÕES UNIDAS SOBRE MUDANÇAS CLIMÁTICAS ................................................................................................................... 20
1.2 AS CONFERÊNCIAS DAS PARTES - COPS ............................................................ 24
1.3 O PROTOCOLO DE QUIOTO E OS MECANISMOS DE FLEXIBILIZAÇÃO .............. 30
2 O MECANISMO DE DESENVOLVIMENTO LIMPO - MDL ...... ........................................ 41
2.1 ETAPAS PROCESSUAIS: DA CONCEPÇÃO E CERTIFICAÇÃO DOS PROJETOS À EMISSÃO DOS CERs...................................................................................................... 45
2.1.1 Planejamento e elaboração do Documento de Concepção do Projeto (em inglês Project Design Document) ........................................................................................... 47
2.1.2 Validação do PDD pela Entidade Operacional Designada ................................... 48
2.1.3 Aprovação do PDD pela Autoridade Nacional Designada ................................... 49
2.1.4 Registro do Projeto pelo Conselho Executivo do MDL ........................................ 51
2.1.5 Monitoramento do Projeto ................................................................................... 52
2.1.6 Verificação/Certificação das reduções de emissões de GEE .............................. 53
2.1.7 Emissão dos CERs pelo Conselho Executivo do MDL ........................................ 54
2.2 O MDL NO BRASIL E NO MUNDO ............................................................................ 55
2.3 O CASO “PLANTAR” ................................................................................................. 60
3 O MERCADO DE CRÉDITOS DE CARBONO: UM GIGANTE EM F ORMAÇÃO............. 64
3.1 OS PRINCIPAIS REGIMES DE NEGOCIAÇÃO DE CARBONO ................................ 68
3.1.1 Regimes baseados em permissões de emissões (allowance based market - cap and trade regime) ......................................................................................................... 68
3.1.2 Regimes baseados em projetos de redução de emissões (project based market) ..................................................................................................................................... 74
3.2 PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS E ESTATÍSTICAS DO MERCADO GLOBAL DE CARBONO ....................................................................................................................... 76
CONCLUSÃO.......................................... ............................................................................ 83
BIBLIOGRAFIA ...................................... ............................................................................. 88
10
INTRODUÇÃO
Os graves efeitos da ação exploratória desordenada do homem sobre o meio
ambiente têm assumido importância cada vez maior nos debates transnacionais sobre o
aquecimento global e mudanças climáticas. Nas últimas três décadas do século XX, muito
se avançou em termos de institucionalização de uma nova configuração política mundial
voltada à responsabilidade ambiental e ao desenvolvimento sustentável.
O efeito estufa, causado pela emissão, acima dos limites toleráveis, de Gases do
Efeito Estufa – GEE1, é o principal agente desencadeador das severas mudanças climáticas
ocorridas nas últimas décadas. A percepção é que se ações globais concretas e
organizadas não forem iniciadas desde já, os danos ao meio ambiente serão amplificados e
diversificados a um ponto irreversível que poderá, inclusive, inviabilizar a vida das futuras
gerações no planeta.
Nesse contexto de acaloradas discussões, emerge um importante mercado de ativos
ambientais, criado a partir das principais negociações internacionais sobre mudanças
climáticas, com a ambição de viabilizar e consolidar, a nível global, os resultados das
diversas iniciativas regionais de redução de emissões de GEE: O mercado de carbono.
A evolução do direito internacional voltado à consciência ambiental coletiva teve como
um importante ponto de inflexão a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente
Humano, realizada em Estocolmo, no ano de 1972.
As discussões e os estudos científicos têm evoluído desde aquela época, no âmbito
das convenções, conferências e painéis das Organizações das Nações Unidas (ONU), com
o objetivo de identificar as principais causas do efeito estufa, bem como os efeitos climáticos
imediatos e futuros dele advindos, a serem sentidos de maneira diferenciada nas diversas
regiões da Terra. A queima desenfreada de combustíveis fósseis (petróleo e carvão mineral)
é apontada como o principal agente causador do aquecimento global.
Em 1988, com a criação do Painel Inter-Governamental de Mudanças Climáticas (em
inglês International Panel on Climate Change - IPCC), órgão técnico da ONU, milhares de
cientistas de diversas nacionalidades passaram a se dedicar exaustivamente a estudar os
impactos das atividades do homem sobre o clima da Terra, cujos resultados e relatórios
1 São considerados Gases do Efeito Estufa segundo a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre mudanças Climáticas (CQNUMC): dióxido de carbono (CO2); metano (CH4); óxido nitroso (N2O); hexafluoreto de enxofre (SF2); hidrofluorcarbonos (HFCs) e perfluorcarbonos (CFCs).
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permitiram a agregação de necessário respaldo científico às várias hipóteses tratadas até
então no campo das suposições.
A temática ambiental permaneceu como foco das discussões durante vários encontros
supranacionais ocorridos na década seguinte, atingindo seu aprimoramento mais relevante
com a realização, no Rio de Janeiro, da Conferência das Nações Unidas sobre Meio
Ambiente e Desenvolvimento.
Na ocasião da Conferência Rio 92, foi estabelecida a Convenção Quadro das Nações
Unidas sobre Mudanças Climáticas (em inglês, United Nations Framework Convention on
Climate Change – UNFCCC), durante a qual foram propostas ações para que os países
industrializados (listados no Anexo I da Convenção) estabilizem as concentrações
atmosféricas dos GEE, de forma a impedir que as atividades antrópicas desordenadas
levem a uma “interferência perigosa” no clima do planeta.
Desde então, os países participantes, denominados Partes, têm se reunido em
Conferências Internacionais (Conferências das Partes – COP), que se realizam anualmente
desde a adoção da Convenção Quadro, para discutir o assunto e tentar encontrar soluções
conjuntas para o problema do aquecimento global. Dentre as soluções apontadas, discutiu-
se a criação de mecanismos de mercado, que se traduzem em esquemas ou programas de
flexibilização de emissões, instituídos entre as Partes com o objetivo de auxiliar no
cumprimento das metas de redução de emissões de GEE ao menor custo possível.
A terceira Conferência das Partes realizada em Quioto – Japão, em 1997, destaca-se
como uma das mais importantes, visto que, durante a sua realização, foi estabelecido um
acordo que define as metas quantitativas de emissões de GEE para os países
industrializados ou em transição para o status de desenvolvidos, além de critérios e
diretrizes para a utilização dos chamados mecanismos de mercado. Por esse acordo,
conhecido como Protocolo de Quioto, ficou estabelecido que os países industrializados
devem ter como meta reduzir suas emissões, no período de 2008 a 2012, em no mínimo 5
% abaixo dos níveis de concentração de GEE observados em 1990.
A partir desse diagnóstico, que vem sendo melhorado e aperfeiçoado a cada rodada
mundial de estudos, tem sido possível definir metas de redução de emissões de GEE
diferenciadas entre os diversos países e nações, de acordo com suas capacidades
financeiras e níveis de desenvolvimento econômico-social. Essa linha de raciocínio adota
como variável chave a quantificação da participação de cada país no volume histórico, atual
e potencial de emissões de gases tóxicos, expressos em termos equivalentes a toneladas
de dióxido de carbono lançadas na atmosfera.
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Para que possam ser atingidas as metas de redução de emissões de GEE, o
Protocolo de Quioto determina que os países estabeleçam programas de redução da
poluição dentro de seus territórios e define, também, mecanismos de flexibilização para
minimizar os custos das iniciativas de redução de emissões. Os três mecanismos de
flexibilização são conhecidos como: (i) Implementação Conjunta - IC; (ii) Comércio de
Emissões – CE, e; (iii) Mecanismo de Desenvolvimento Limpo – MDL.
O Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (em inglês Clean Development Mechanism -
CDM), único mecanismo de flexibilização que permite a participação voluntária de países
em desenvolvimento, trabalha, em síntese, com o duplo objetivo de promover o
desenvolvimento sustentável nos países hospedeiros dos projetos e de auxiliar os países
desenvolvidos a atingirem suas metas de redução de emissões. Todo projeto que permitir a
redução de emissões ou a captura líquida de GEE, quando comparado ao cenário de não
realização deste, tem potencial para a geração de créditos de carbono, denominados
Certificados de Emissões Reduzidas (em inglês Certified Emission Reductions – CER),
passíveis de serem vendidos aos países que necessitem de complementos externos para
atingirem suas metas de redução de emissões. O MDL foi instituído pelo Art. 12 do
Protocolo de Quioto.
O ponto comum entre o MDL e a IC é a origem dos créditos de carbono, que nesses
mecanismos são gerados a partir do desenvolvimento de projetos industriais ou de
mudanças do uso do solo, cuja implementação permite a redução adicional de emissões de
GEE ou o seqüestro de carbono da atmosfera (Project-Based Market).
Em função das diferenças econômicas, políticas e culturais dos diversos atores
envolvidos, o debate sobre a participação e a responsabilidade de cada país ou continente
no processo de “despoluição” ambiental, assim como a eficiência dos mecanismos de
flexibilização vigentes, têm sido direcionados por interesses particulares e corporativos,
muitas das vezes dissociados de soluções globais, o que torna a efetividade das normas
jurídicas internacionais um fator de extrema relevância para a proteção do meio ambiente e
a viabilização do desenvolvimento sustentável mundial.
O Direito Internacional Ambiental regula, por meio de Tratados, os principais temas
relacionados ao meio ambiente global. Sua efetividade, contudo, nem sempre é alcançada,
na medida em que depende de um somatório de fatores, sejam eles políticos, sociais ou
econômicos, os quais, na prática, levam os Estados a não cumprir integralmente ou
imediatamente com o que está proposto nos Tratados ambientais.
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O reconhecimento de que as mudanças climáticas atuais são causadas por fatores
antrópicos e a percepção sobre a necessidade de ações imediatas visando à redução de
emissões de GEE são posições consumadas entre os principais atores internacionais.
Verifica-se, entretanto, diferenças significativas na forma de aceitação de compromissos
formais de redução de emissões, sobretudo por parte de alguns dos principais
representantes de nações desenvolvidas. A exceção mais relevante são os Estados Unidos,
que sob o argumento de que metas compulsórias poderiam comprometer suas expectativas
de crescimento econômico, não ratificaram o principal instrumento jurídico derivado das
negociações internacionais sobre mudanças climáticas – o Protocolo de Quioto.
Para o bem comum, e nada obstante a não aceitação, desde o início das negociações
Onusianas, de ingresso ao chamado Mercado Formal de Carbono (Quioto), os Estados
Unidos, por força de leis estaduais (destaque para o estado da Califórnia), além de outras
nações desenvolvidas (Canadá, Austrália e outros), partiram para o desenvolvimento de
iniciativas regionais ou setoriais de redução de emissões de GEE, não compulsórias, o que
fez surgir, desde o início do século atual, um promissor mercado “paralelo” de créditos de
carbono, criado a partir de iniciativas domésticas, cujas permissões de emissões ou
reduções de emissões são igualmente transacionadas para cumprimento de metas setoriais
ou regionais de redução da concentração de GEE, num esquema de flexibilização similar
aos mecanismos estabelecidos pelo Protocolo de Quioto.
Os principais mercados voluntários de carbono, que se relacionam em maior ou menor
escala entre eles e/ou com o mercado formal de carbono, derivam de experiências iniciadas
desde a década de 1970, sobretudo por países desenvolvidos em busca do cumprimento de
compromissos locais de redução de emissões de GEE ou outros gases poluentes. A
experiência americana voltada à redução do impacto dos gases Clorofluorcarbonados (CFC)
na camada de ozônio é o melhor exemplo e o ponto de partida para as iniciativas globais
relacionadas à redução das emissões de dióxido de carbono (CO2).
Com base nessas experiências, e mesmo antes da vigência do primeiro período de
compromisso do Protocolo de Quioto, diversos governos e empresas já vêm adotando
medidas de redução de emissões de GEE e implementando mecanismos de flexibilização e
comércio de permissões de emissões. Merecem destaque: (i) o Esquema de Comércio de
Emissões do Reino Unido (United Kingdom Emissions Trading Scheme - UK ETS), regime
voluntário do tipo Cap and Trade, criado em 2002, que estabelece um teto máximo para
fontes de emissão de larga escala, voltado às empresas do setor de energia situadas na Grã
Bretanha; e (ii) o Esquema de Comércio de Emissões da União Européia (European Union
Emissions Trading Scheme – EU ETS), iniciado em janeiro de 2005, e tido hoje como um
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dos mais atuantes esquemas de comércio de créditos de carbono em termos de volumes e
valores negociados, cujo desenvolvimento, apesar de ter se antecipado à vigência do
Protocolo de Quioto, baseou-se nas metas de redução de emissões estabelecidas no âmbito
desse importante Tratado.
Além das iniciativas voluntárias conduzidas por nações européias, são de especial
relevância os programas em operação desenvolvidos pela Austrália (Australia’s New South
Wales Greenhouse Gas Abatement Scheme – NSW GGAS) e pela Bolsa do Clima de
Chicago (Chicago Climate Exchange - CCX), nos Estados Unidos. Os esquemas e regimes
de negociação de carbono até então citados serão detalhados no Capítulo 3 desta
monografia.
Em resumo, pode-se inferir que a essência dos mecanismos de flexibilização, criados
para auxiliar os países a cumprirem os compromissos de redução de emissões de GEE
firmados no âmbito global ou regional, está na possibilidade de transferência, via comércio,
dos excedentes de redução de carbono alcançados pelas nações que conseguirem avançar
em seus projetos dentro dos períodos de compromisso estabelecidos, para os países que,
por motivos tecnológicos ou econômicos, não atingirem suas metas periódicas de redução
de emissões.
O fator de maior influência na dinâmica do mercado de créditos de carbono, tanto os
derivados de permissões de emissões, quanto os relacionados a reduções de emissões ou
captura de GEE, é o diferencial de custos de implantação dos projetos e atividades
ambientalmente sustentáveis nas diferentes regiões do planeta.
O presente trabalho tem por objetivo principal caracterizar a situação atual e as
tendências do mercado global de carbono em termos de mecanismos ou esquemas de
flexibilização, volumes, preços, principais atores e outras variáveis relevantes, com vistas a
responder à seguinte questão: o mercado de carbono é de fato uma ferramenta eficaz de
auxílio à mitigação das mudanças climáticas e de promoção do desenvolvimento sustentável
mundial?
Para que se possa responder à citada pergunta, serão inicialmente abordados, no
Capítulo 1, os principais conceitos de desenvolvimento sustentável, aprimorados ao longo
das diversas conferências ambientais internacionais, cujo cerne sustenta toda a lógica
jurídica da equidade entre os povos e continuidade da vida na Terra.
A eficácia do mercado de carbono em auxiliar na manutenção de um ambiente global
habitável por todas as nações, sejam elas ricas ou pobres, está intimamente relacionada à
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integridade da ordem jurídica internacional, traduzida na efetividade dos regimes que
regulamentam as ações e limites dos governos, organizações e cidadãos na seara
ambiental. Sob esse prisma, serão detalhados, também no Capítulo 1, os aspectos mais
relevantes dos principais Tratados ambientais sobre mudanças climáticas – a Convenção
Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas e o instrumento jurídico que a
regulamenta – o Protocolo de Quioto, o qual dispõe sobre três dos principais mecanismos
de flexibilização do mercado de carbono.
Por se tratar do único mecanismo de flexibilização que permite a participação
voluntária de países em desenvolvimento, será dedicada atenção especial, no transcorrer do
Capítulo 2, ao Mecanismo de Desenvolvimento Limpo - MDL, do qual serão exploradas as
fases processuais que abrangem desde a propositura dos projetos, até a certificação dos
créditos de carbono deles derivados, bem como a situação atual do MDL no Brasil e no
mundo. O capítulo será encerrado com a apresentação do caso “Plantar”, empresa florestal
sediada em Minas Gerais, voltada à produção sustentável de ferro-gusa via processo
siderúrgico movido a carvão vegetal, e considerada referência em termos de projetos de
MDL no Brasil.
Por fim, e para que se possa avaliar o potencial do mercado global de carbono e as
interfaces dos diversos mecanismos de flexibilização atualmente em operação, serão
apresentadas, no Capítulo 3, as principais características do mercado formal de carbono,
derivado do Protocolo de Quioto, e dos demais mercados regionais de iniciativa voluntária,
com vistas a concluir sobre a importância dos mecanismos de mercado na mitigação das
preocupantes mudanças climáticas em curso.
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1 O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL E OS TRATADOS SOBRE MUDANÇAS
CLIMÁTICAS
Os conceitos de desenvolvimento sustentável e de equidade inter-geracional
sustentam o pensamento de que a preservação do meio ambiente está obrigatoriamente
focalizada no futuro. Segundo Kiss (2004, p. 2), uma decisão consciente para evitar o
esgotamento dos recursos naturais globais, em vez de beneficiarmos ao máximo das
possibilidades que nos são dadas hoje, envolve necessariamente pensar sobre o futuro.
Ainda segundo Kiss op.cit., p. 5, garantir direitos às futuras gerações tem se mostrado
uma missão de extrema complexidade, sobretudo em função das diferenças culturais,
econômicas e de pensamento presentes entre os diversos países. Mesmo internamente, a
história contemporânea ilustra a fragilidade de muitos Estados em impor sua autoridade
sobre a sociedade, no sentido de manter a ordem e garantir a eficácia dos instrumentos
jurídicos voltados à proteção ambiental com justiça social. Assegurar a proteção dos direitos
das futuras gerações supõe uma forma de continuidade, que somente pode ser alcançada
com a participação de instituições internacionais.
Nesse contexto, destaca-se a participação fundamental das Organizações das Nações
Unidas (ONU), em seu importante papel de viabilizar e coordenar a integração de medidas e
regras estabelecidas no âmbito dos Tratados, a serem executadas com base no objetivo
essencial de promover o desenvolvimento eqüitativo em harmonia com a natureza.
Por se tratar da legitimação de garantias e obrigações coletivas e de longo prazo, o
direito inter-geracional está intimamente ligado ao conceito de desenvolvimento sustentável,
o qual vem sendo incluído e aprimorado nos textos de diversos Tratados ambientais.
A primeira grande conferência internacional que tratou do tema foi a Conferência de
Estocolmo, realizada em 1972, que desenvolveu, no âmbito da Convenção das Nações
Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, o seguinte princípio de desenvolvimento
sustentável associado ao direito das gerações futuras:
“O homem tem direito fundamental à liberdade, à igualdade, a condições de
vida adequadas, num ambiente com uma qualidade que permita uma vida
com dignidade e bem estar, e o homem porta uma responsabilidade solene
na proteção e melhoria do meio ambiente para as gerações presentes e
futuras.” (CNUMAH, 1972).
17
Esse princípio foi aprimorado em 1987, com a edição do relatório “Nosso Futuro
Comum” (Relatório Brundtland), formulado pela Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e
Desenvolvimento, que instituiu: “O desenvolvimento sustentável é um desenvolvimento que
responde às necessidades do presente sem comprometer a capacidade das gerações
futuras de satisfazer às suas próprias necessidades.”
O Relatório Brundtland, por sua vez, serviu de base para a segunda grande
conferência internacional realizada no Rio de Janeiro, em 1992 - Conferência das Nações
Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, cuja denominação passou a evidenciar,
com total clareza, a estrita relação entre meio ambiente e desenvolvimento. O Princípio 3 da
Declaração do Rio estabelece: “O direito ao desenvolvimento deve ser realizado de modo a
satisfazer equitativamente as necessidades relativas ao desenvolvimento e ao meio
ambiente das gerações presentes e futuras.”
Segundo Varella (2003, p.7), o conceito de desenvolvimento, antes relacionado
exclusivamente ao crescimento econômico, incorporou novas visões e estratégias de cunho
sócio-ambiental. O desenvolvimento passou a ser medido em função do nível de emprego
decente, da melhora de infra-estruturas de base (esgotos, fornecimento de água potável), da
melhora da educação e do aumento da esperança de vida, sendo esses elementos a base
do conceito e questões de alta relevância para qualquer organização que se preocupe com
o desenvolvimento.
Sachs (1993) defende que as estratégias de desenvolvimento devem levar em
consideração, simultaneamente, as seguintes dimensões de sustentabilidade:
� Sustentabilidade Social: baseada em processos integrados de transferência de
renda através de subsídios e programas sociais voltados à redução dos
desequilíbrios sociais;
� Sustentabilidade Econômica: prevê a quebra dos padrões atuais de viabilidade
econômica, com a inclusão de parâmetros macro-sociais que equilibrem as
relações de troca entre os países, com destaque à redução do protecionismo e
à concessão de melhores condições de crédito;
� Sustentabilidade Ecológica: centrada na redução do consumo de recursos
naturais e de energia não renovável, na maior distribuição e alocação dos
insumos, na redução de resíduos e poluentes e na elevação do investimento
em tecnologias renováveis. Outro item fundamental na estratégia ecológica é
estabelecer e normatizar o arcabouço jurídico-institucional inerente às
18
questões ambientais, por meio de instrumentos econômicos, legais e
administrativos.
� Sustentabilidade Espacial: baseada na redução das áreas metropolitanas
mediante o incentivo à exploração sustentável de áreas agrícolas e florestais e
na criação de unidades de conservação natural e da biodiversidade. Valoriza a
criação de um Plano Diretor de uso sustentável da terra de dos recursos
naturais.
� Sustentabilidade Cultural: valoriza a preservação do ecossistema e da cultura
locais, por meio de incentivos ao desenvolvimento regional.
Com a evolução do pensamento sistêmico, onde se fortaleceram as inter-relações
entre as diversas dimensões do conhecimento humano, as discussões sobre
desenvolvimento sustentável passaram a incorporar conceitos e objetivos oriundos de
diversas áreas e disciplinas.
Segundo Bursztyn (1986, p.117), a nova percepção baseada na transversalidade das
ciências econômicas e ecológicas permitiu que se evoluísse a perspectiva sobre o custo ou
o impacto financeiro das atividades econômicas sobre o meio ambiente. Os efeitos das más
práticas agrícolas, da destruição de florestas e mananciais e da elevada emissão de gases
poluentes na atmosfera, passaram a ficar evidentes aos olhos dos cientistas e economistas
quando se percebeu a elevação dos custos associados às atividades de prevenção e
reparos desses impactos. Esses efeitos, agora mensuráveis, passaram a comprometer a
produtividade e a relação custo/benefício dos projetos voltados ao crescimento econômico,
demonstrando que a variável ambiental está intimamente associada às variáveis
econômicas.
De acordo com Varella, op.cit., p. 3, o agravamento dos problemas relacionados à
ação desordenada do homem sobre o meio ambiente fez emergir um movimento
internacional de proteção da natureza e de fortalecimento das instâncias democráticas, com
a inclusão da proteção ambiental nas agendas políticas e jurídicas dos governos e dos
cidadãos. Essa nova concepção coletiva decorre da interdependência existente entre os
Estados, que compartilham de interesses comuns e gerais da humanidade, reconhecendo
que certos problemas devem ser enfrentados conjuntamente por todos, de forma
coordenada e simultânea.
Bursztyn loc. cit., afirma que o Estado, atuando como agente regulador, assume
importante missão no sentido de neutralizar as imperfeições do mercado como regulador
19
das ações produtivas de forma ecologicamente satisfatória. Tomadas as devidas
precauções, há que se considerar, no âmbito dessas políticas, que os negócios gerados
pelo setor ambiental das atividades econômicas têm mostrado bons resultados e,
inversamente, ações ambientais resultantes de natureza econômica podem se constituir em
importantes fatores de conservação e recuperação do meio ambiente natural.
Calsing (2005, p. 21) defende que cada sociedade local apresenta valores e
desenvolvimento culturais próprios, mas ao mesmo tempo mostra interesses comuns, como
a proteção do meio ambiente global, dos direitos humanos e de um desenvolvimento justo e
sustentável. Esses exemplos podem ser chamados de global commons, que são os
interesses globais que perpassam as agendas dos diversos Estados e da opinião pública
mundial.
Neste novo cenário global, o Direito Internacional aparece como uma forma de
regulamentar a sociedade global, mostrando-se como uma referência para a consistência
das ações dos mais diversos atores internacionais, como os Estados, a sociedade civil, as
empresas transnacionais e os Organismos Internacionais, governamentais ou não. Segundo
Mattos (2003), essa nova sociedade mundial que está se formando encontra nos Tratados,
forma positivada do Direito Internacional, a sua base jurídica de atuação.
Ainda segundo Calsing op.cit., p. 22, a introdução dos Tratados multilaterais, a maior
participação de órgãos descentralizados de governos e a ingerência dos cidadãos no Direito
Internacional fizeram com que os Tratados passassem a representar muito mais do que a
mera justaposição de interesses, transformando-se em uma combinação de esforços –
políticas e ações – para alcançar um objetivo idêntico e comum.
Em se tratando de ações antrópicas de dimensões e impactos transfronteiriços, como
é o caso das emissões de GEE e seus irreversíveis efeitos sobre a estabilidade climática do
planeta, as medidas corretivas e precaucionais devem ser tomadas em conjunto por todos
os países, utilizando, para tanto, os instrumentos jurídicos e fóruns adequados às
discussões globais.
A Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (CQNUMC),
formalizada no âmbito da Conferência Rio 92, e o Protocolo de Quioto, negociado quando
da Terceira Conferência das Partes, realizada em Quioto – Japão, em 1997 (COP3),
destacam-se como os mais importantes instrumentos jurídicos sobre mudanças climáticas e
desenvolvimento sustentável. A menção ao desenvolvimento sustentável se faz presente em
vários dispositivos da CQNUMC e do Protocolo de Quioto, o que demonstra a importância
20
que passou a ser dada ao tema nas negociações internacionais sobre meio ambiente. As
seções a seguir trazem o resumo dos principais aspectos desses importantes Tratados.
1.1 A CONVENÇÃO-QUADRO DAS NAÇÕES UNIDAS SOBRE MUDANÇAS CLIMÁTICAS
A Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (UNFCCC, sigla
em inglês) foi adotada na sede das Nações Unidas, em Nova York, em 9 de maio de 1992.
Seu texto foi apresentado para a assinatura das Partes durante a Conferência do Rio,
realizada em junho de 1992 e entrou em vigor em 21 de março de 1994, noventa dias após
a qüinquagésima ratificação. Assim como os demais documentos discutidos no âmbito da
Rio 92, a Convenção-Quadro é considerada um documento decisivo na instituição de uma
nova ordem internacional voltada ao desenvolvimento sustentável e ao interesse das futuras
gerações.
Por sediar a Conferência do Rio, o Brasil foi o primeiro país a assinar a CQNUMC, em
4 de junho de 1992, e o Congresso Nacional a ratificou em 28 de fevereiro de 1994. A
Convenção entrou em vigor para o Brasil em 29 de maio de 1994, no nonagésimo dia após
a sua ratificação.
Segundo Cenamo (2004, p. 3), os países participantes da CQNUMC, em função de
suas afinidades em termos de objetivos, opiniões e representatividade institucional no
processo de tomada de decisões, dividem-se em grupos ou organizações, sendo os
principais:
� Grupo dos 77 e China: Representa os interesses de 132 países em
desenvolvimento e busca harmonizar as posições de negociação entre seus
membros (o Brasil faz parte deste grupo);
� AOSIS - Aliança de Pequenos Países Insulares: 43 países vulneráveis à
elevação do mar;
� União Européia – Representa os países da Comunidade Européia - votam em
bloco;
� JUSCANNZ - países desenvolvidos não participantes da Comunidade
Européia: Japão, EUA, Suíça, Canadá, Austrália, Noruega e Nova Zelândia.
São convidados deste grupo: Islândia, México e República da Coréia;
21
� Umbrella Group (extinto): Incluía os países do JUSCANNZ, sem Suíça e EUA,
mais Islândia, Rússia e Ucrânia;
� OPEP: organização dos países exportadores de petróleo;
� Grupo dos países Árabes;
� Observadores: organizações internacionais como UNEP, UNCTAD, WMO,
OCDE, IEA3, e cerca de 400 organizações não-governamentais credenciadas,
que podem assistir às reuniões das partes e dos órgãos subsidiários, sem
direito a voto.
Segundo o Ministério da Ciência e Tecnologia (2001a), o objetivo final da Convenção e
dos demais instrumentos jurídicos dela decorrentes é alcançar a estabilização das
concentrações de gases de efeito estufa na atmosfera num nível que impeça uma
interferência antrópica perigosa no sistema climático. Esse nível deverá ser alcançado num
prazo suficiente que permita aos ecossistemas adaptarem-se naturalmente à mudança do
clima, que assegure que a produção de alimentos não seja ameaçada e que permita ao
desenvolvimento econômico prosseguir de maneira sustentável.
Como se vê no objetivo da Convenção, descrito em seu art. 2º, foi literalmente
reconhecido em um documento jurídico formal a real e efetiva participação das atividades
humanas no aumento da concentração dos GEE na atmosfera, do qual decorrem as
mudanças climáticas em curso.
Voltando um pouco no texto da Convenção, o art. 1º traz uma série de conceitos
utilizados em seus dispositivos, dentre os quais vale destacar o conceito de “sumidouro”,
que significa qualquer processo, atividade ou mecanismo que remova GEE, um aerossol ou
um precursor de um gás do efeito estufa na atmosfera. Esse conceito mostrar-se-á
importante quando do detalhamento do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo – MDL,
criado no âmbito do Protocolo de Quioto e que envolve projetos/atividades de seqüestro de
carbono por meio do Uso da Terra, Mudanças do Uso da Terra e Florestas (LULUCF, sigla
em inglês).
Além dessa verdadeira declaração de responsabilidade atribuída à espécie humana
pela elevação do risco de ruptura do equilíbrio climático do planeta, vários princípios da
ordem jurídica internacional foram incorporados e fortalecidos quando da adoção e
ratificação da CQNUMC, dentre eles: (i) o Princípio da Soberania, (ii) o Princípio das
Responsabilidades Comuns mas Diferenciadas e; (iii) o Princípio da Precaução.
22
O Princípio da Soberania dispõe, em poucas palavras, que as Partes são soberanas
em exercer plenamente o direito ao desenvolvimento sustentável e, para tanto, as políticas e
medidas para proteger o sistema climático contra mudanças induzidas pelo homem devem
ser adequadas às condições específicas de cada Parte e devem ser integradas aos
programas nacionais de desenvolvimento, levando em conta que o desenvolvimento
econômico é essencial à adoção de medidas para enfrentar a mudança do clima.
O Princípio das Responsabilidades Comuns mas Diferenciadas fortalece o
reconhecimento de que as mudanças climáticas decorrem diretamente das ações humanas,
mas atribui aos países desenvolvidos a responsabilidade histórica e atual pela origem das
emissões globais de GEE, cabendo a esses países a iniciativa de adoção de ações
imediatas que visem a redução das emissões, com vistas ao controle do aquecimento
global.
Com base nesses dois princípios, os países em desenvolvimento obtiveram, até então,
no âmbito das Conferências da Partes (COPs), a não obrigatoriedade de cumprimento de
metas quantitativas de redução de GEE. Essa inexistência de metas compulsórias tem sido
um constante motivo de críticas dos países desenvolvidos ao critério de diferenciação de
responsabilidades pela poluição ambiental, alegando que muitos países em
desenvolvimento, sobretudo os asiáticos, têm uma forte participação nas emissões atuais e
futuras de GEE e que, por isso, devem também ter metas quantitativas de reduções de
emissões.
O Princípio da Precaução, por sua vez, tem o seu conceito mais aceito trazido da
redação do princípio 15 da Declaração do Rio, que assim dispõe:
“Com o fim de proteger o meio ambiente, o princípio da precaução deverá
ser amplamente observado pelos Estados, de acordo com suas
capacidades. Quando houver ameaça de danos graves ou irreversíveis, a
ausência de certeza científica absoluta não será utilizada como razão para
o adiamento de medidas economicamente viáveis para prevenir a
degradação ambiental.” (CQNUMC, 1992).
Além dos princípios consagrados pela ordem jurídica internacional, a CQNUMC
trouxe, também, em seu texto, a valorização explícita de importantes direitos igualmente
reconhecidos pelo ordenamento global, dentre os quais o Direito ao Desenvolvimento, que
no arcabouço jurídico atual está intimamente relacionado ao conceito de desenvolvimento
sustentável. Segundo o Princípio 3 da Declaração do Rio, 1992, “O direito ao
23
desenvolvimento deve ser realizado de modo a satisfazer equitativamente às necessidades
relativas ao desenvolvimento e ao meio ambiente das gerações presentes e futuras”.
O texto da Convenção consolida, também, a definição de “mudança do clima”, que
significa “mudança climática que possa ser direta ou indiretamente atribuída à atividade
humana, que altere a composição da atmosfera mundial e que se some àquela provocada
pela variabilidade climática natural observada ao longo de períodos comparáveis”. Os
efeitos negativos das mudanças do clima são aqueles que “trazem efeitos deletérios sobre a
composição, resiliência ou produtividade de ecossistemas naturais e administrados, sobre o
funcionamento de sistemas socioeconômicos ou sobre a saúde e o bem estar humanos.”
Segundo Rocha (2003, p. 5), os impactos econômicos, sociais e ambientais
decorrentes do aquecimento global afetarão a todos os países, porém serão sentidos de
maneira diferenciada. O quadro a seguir ilustra as previsões desses impactos nas diversas
regiões do mundo.
REGIÃO IMPACTOS PROVÁVEIS
África - Diminuição da produção agrícola - Diminuição da disponibilidade de água na região do mediterrâneo e países do sul - Aumento dos vetores de diversas doenças - Aumento da desertificação - Extinção de animais e plantas
Ásia - Diminuição da produção agrícola - Diminuição da disponibilidade de água nas regiões árida e semi-árida - Aumento do nível do mar deverá deslocar dezenas de milhões de pessoas
Austrália/N. Zelândia - Diminuição da disponibilidade de água - Extinção de animais e plantas
Europa - Desaparecimento de geleiras nos Alpes - Aumento da produção agrícola em algumas regiões - Impacto no turismo
América Latina - Diminuição da produção agrícola - Aumento de vetores de diversas doenças - Extinção de animais e plantas
América do Norte - Aumento da produção agrícola em algumas regiões - Aumento de vetores de diversas doenças
Região Polar - Diminuição da calota polar - Extinção de animais e plantas
Pequenas Ilhas - Aumento do nível do mar deverá deslocar dezenas de milhões de pessoas - Diminuição da disponibilidade de água - Diminuição da atividade pesqueira - Diminuição do turismo
Quadro 1 – Possíveis impactos decorrentes do aquecimento global Fonte: Rocha, 2003, pg. 5
24
Pode-se notar que, em termos de conceitos, princípios e definições gerais, a
CQNUMC é bastante abrangente e ambiciosa no sentido de regular as ações das Partes no
ambiente jurídico internacional, com vistas ao cumprimento do seu principal objetivo: impedir
que as atividades antrópicas modifiquem o equilíbrio climático do planeta e, com isso,
garantir o desenvolvimento global com equidade e sustentabilidade. Por se tratar de uma
Convenção Quadro, que regula dispositivos gerais, o detalhamento e a regulamentação
desses dispositivos se dá por meio da edição de instrumentos jurídicos específicos,
negociados no âmbito de encontros e conferências anuais, denominadas Conferências das
Partes – COPs, a seguir comentadas.
1.2 AS CONFERÊNCIAS DAS PARTES - COPS
Até a presente data, foram realizadas e concluídas treze Conferências das Partes a
partir da adoção da CQNUMC. São tidas como principais a COP 3, onde foi formalizado o
Protocolo de Quioto; a COP 7, que teve como principal documento o Acordo de Marrakesh,
que regulamentou pontos importantes adotados em Quioto; e a última Conferência (COP
13), realizada em Bali, Indonésia, onde foi negociado o Plano de Ação de Bali, no qual foram
traçadas as linhas gerais para a formalização de um novo Tratado mundial sobre mudanças
climáticas, que venha a definir metas quantitativas de redução de GEE pós 2012 (fim do
primeiro período de compromisso definido pelo Protocolo de Quioto). A sexta COP,
inicialmente prevista para os dias 13 a 24 de novembro 2000, em Haia, Holanda, não pôde
ser concluída, em virtude de severas divergências não consensuadas entre as Partes, razão
pela qual a Conferência foi suspensa e retomada em junho de 2001, em Bonn, Alemanha, à
qual ficou conhecida como COP 6 BIS.
A primeira Conferência das Partes – COP 1 foi realizada em Berlin, Alemanha, de 28
de março a 7 de abril de 1995, onde ficou clara a necessidade de se avançar nos
compromissos firmados pelas Partes quando da adoção da CQNUMC (Rio 92). O resultado
prático dessa primeira Conferência foi a edição do Mandato de Berlin, o qual estabelecia as
bases iniciais de um futuro acordo transnacional, onde seriam definidas metas quantitativas
específicas de redução de GEE.
Segundo Cenamo op. cit., p. 6, o Mandato de Berlin, estabelecido com a participação
de representantes de 117 países, teve como consenso a necessidade de se tomar ações
mais enérgicas e práticas com vistas à mitigação do efeito estufa. O mero compromisso dos
25
países desenvolvidos em reduzir suas emissões para os níveis de 1990, até o ano 2000,
não seria suficiente para se atingir os objetivos de longo prazo da CQNUMC. As Partes
consentiram que deveria ser elaborado um protocolo ou instrumento jurídico equivalente que
formalizasse um comprometimento legal entre os signatários, tendo como prazo definido
para a apresentação do documento o ano de 1997. Foi decidido, ainda, que seria adotado o
uso de “atividades implementadas conjuntamente” (activities implemented jointly) em fase
piloto, baseadas em compartilhamento de tecnologias, como alternativa para o cumprimento
dos objetivos de redução de emissões.
Em resposta ao Mandato de Berlim, e com o objetivo de fortalecimento do
compromisso dos países desenvolvidos em reduzir suas emissões, foi então criado o grupo
Ad Hoc sobre o Mandato de Berlim (AGBM), que iniciou o esboço de um protocolo que seria
o embrião para a adoção do principal documento que viria a definir metas quantitativas de
reduções de emissões de GEE – o Protocolo de Quioto.
A segunda Conferência das Partes - COP 2 ocorreu entre 8 e 19 de julho de 1996, na
cidade de Genebra, Suíça. Cenamo op. cit., p. 7, resume que a principal decisão tomada foi
a possibilidade dos países em desenvolvimento (países não Anexo I e, portanto, sem
compromissos de redução de emissões) solicitarem, segundo orientações da CQNUMC,
auxílio financeiro e tecnológico proveniente do Fundo Global para o Meio Ambiente (GEF),
criado especificamente para esta finalidade.
A terceira Conferência das Partes - COP 3 foi realizada entre os dias 1º e 10 de
dezembro 1997, em Quioto, Japão, e é tida até então como a principal Conferência sobre
mudanças climáticas realizadas no âmbito da CQNUMC. Na ocasião, foi adotado o
Protocolo de Quioto, que definiu, em termos quantitativos, os compromissos de cada país ou
bloco de países industrializados (Anexo I) de reduzir, em pelo menos 5%, suas emissões
combinadas de GEE em relação aos níveis de 1990. Segundo a UNFCCC (2007a), a União
Européia assumiu o compromisso de reduzir em 8%, os Estados Unidos sinalizou com uma
redução de 7% e o Japão concordou em reduzir 6%. Alguns países como a Rússia e
Ucrânia não assumiriam compromisso de redução e outros como Islândia, Austrália e
Noruega, por seus históricos de emissões, ainda teriam permissão para aumentar suas
emissões.
Para que o Protocolo de Quioto entrasse em vigor, ficou decidido que seria necessária
a ratificação de pelo menos 55 países, e que juntos deveriam responder por pelo menos
55% das emissões globais de GEE. Ao ser ratificado, o Protocolo passaria a vigorar no
26
prazo de 90 dias da data de ratificação, e se tornaria um compromisso legal, de
cumprimento vinculante para todas as Partes envolvidas.
Para que possam ser atingidas as metas de redução de emissões de GEE, o
Protocolo de Quioto determina que os países estabeleçam programas de redução da
poluição dentro de seus territórios e define, também, mecanismos de flexibilização para
cortar custos das iniciativas de redução de emissões. Os três mecanismos de flexibilização
são conhecidos como: (i) Implementação Conjunta - IC; (ii) Comércio de Emissões – CE, e;
(iii) Mecanismo de Desenvolvimento Limpo – MDL, os quais serão detalhados no item 1.3
deste capítulo.
Da assinatura do Protocolo de Quioto (COP 3) até a formalização do Acordo de
Marrakesh (COP 7) foram realizadas outras quatro Conferências das Partes, uma vez que a
COP 6 (Haia, Holanda) foi suspensa e retomada no ano seguinte em Bonn, Alemanha, a
qual ficou conhecida como COP 6 BIS. Nesse período, foram exaustivamente discutidos os
aspectos operacionais ligados aos mecanismos de flexibilização estabelecidos por Quioto,
notadamente os relacionados ao enquadramento de sumidouros de carbono, derivados de
atividades de Uso da Terra, Mudanças no Uso da Terra e Florestas (em inglês Land Use,
Land Use Change and Forestry - LULUCF) no Mecanismo de Desenvolvimento Limpo –
MDL. Além desses pontos, foram tratadas questões relacionadas à transferência de
tecnologia e aos mecanismos de financiamento de projetos, sobretudo para países em
desenvolvimento, por meio de canais multilaterais de crédito.
A sétima Conferência das Partes – COP 7, realizada de 29 de outubro a 9 de
novembro de 2001, em Marrakesh, Marrocos, destaca-se como o segundo importante ponto
de inflexão no âmbito das negociações sobre mudanças climáticas. A COP 7 foi essencial
no sentido de definição das regras operacionais para tentar colocar em prática os
dispositivos previstos no Acordo de Bonn e no Protocolo de Quioto.
Cenamo op. cit., p. 11, resume que, para se chegar a esse pacote de regras,
novamente foi necessário que os Países da UE e o G77/China cedessem espaço aos
países do Grupo Umbrella. O objetivo destes países era chegar a um acordo no qual o
sistema de cumprimento (compliance) não tivesse vínculo legal; que houvesse poucos
critérios de elegibilidade para a utilização dos mecanismos de flexibilização; que houvesse
pouca participação pública e transparência; e, que não houvesse um detalhamento
específico sobre os sumidouros (sinks). O objetivo do Grupo Umbrella não foi plenamente
atendido, o que levaria à fragilização das regras de Quioto, mas, com concessões de ambos
os lados, um acordo foi fechado.
27
O Acordo de Marrakesh, entre outras definições, estabelece as regras operacionais
para LULUCF, para os mecanismos de flexibilização (MDL, Implementação Conjunta e
Comércio de Emissões) e para o cumprimento dos Artigos 5, 7 e 8 que tratam,
respectivamente, do inventário nacional de emissões, das informações adicionais à
Convenção derivadas do Protocolo, e do processo de revisão das comunicações nacionais.
De maneira geral, foram estabelecidas as seguintes regras:
� Haverá uma limitação para a utilização de créditos oriundos de florestas e
agricultura, e limites de transferência para estas unidades de crédito;
� Existirá fungibilidade entre todas as unidades de crédito (AAUs, CERs e
ERUs);
� Serão permitidos projetos unilaterais de MDL (sem participação de um país do
Anexo I);
� Foram estabelecidos fundos internacionais para ajudarem os países menos
desenvolvidos a se adaptarem aos efeitos das mudanças climáticas.
Outro resultado importante da COP 7 foi a criação do Comitê Executivo do MDL,
responsável pela aprovação de metodologias de linhas de base, planos de monitoramento e
limites para projetos, pela aprovação de Entidades Operacionais Designadas, e por manter
registros dos projetos de MDL.
Rocha op. cit., p. 19 destaca, ainda, como resultado da COP 7, a declaração que foi
enviada à Rio + 10 (World Summit on Sustainable Development, realizada em setembro de
2002 em Joanesburgo, África do Sul), em que foi enfatizada a estreita relação entre
Desenvolvimento Sustentável e Mudanças Climáticas. Nesse documento, são reafirmadas
como prioridades dos países em desenvolvimento a erradicação da pobreza e o
desenvolvimento, além do que foi chamada a atenção dos países para a sinergia que existe
entre as Convenções do Clima, Biodiversidade e Desertificação.
De Marrakesh até a última COP (COP 13), foram realizadas seis Conferências das
Partes, seguindo o cronograma anual de realização das Conferências. Nesse período,
merecem destaque as iniciativas do setor privado e das organizações não governamentais
para a implementação do Protocolo de Quioto e para o funcionamento dos mecanismos de
flexibilização. Foram apresentados diversos projetos no escopo do MDL, evidenciando o
desenvolvimento do mercado formal de créditos de carbono, além de iniciativas voluntárias
de fomento ao mercado de carbono, como o PCF – Prototype Carbon Fund, do Banco
28
Mundial, a CCX - Chicago Climate Exchange - CCX e outros. Dessas iniciativas nasceram
os principais regimes voluntários do mercado de carbono, os quais serão melhor discutidos
e detalhados no Capítulo 3 desta monografia.
Outras questões de destaque evoluídas nesse período relacionam-se ao detalhamento
de metodologias para projetos florestais (COP 9 – Milão, Itália) e à ratificação do Protocolo
de Quioto pela Rússia, em 18 de novembro de 2004 (comemorada durante a realização da
COP 10 - Buenos Aires, Argentina), o que permitiu a sua entrada em vigor no dia 16 de
fevereiro de 2005.
A partir daí, e até a realização da última Conferência das Partes, foi exaustivamente
colocada em pauta a necessidade de se formalizar um novo acordo global de metas
vinculantes, que dê continuidade ao processo de redução de emissões de GEE para o
período pós 2012 (fim do primeiro período de compromisso estabelecido por Quioto). As
discussões avançaram na tentativa de se convencer os Estados Unidos, principal emissor
de GEE, a ratificarem o Protocolo de Quioto, que mais uma vez resultaram no vago
compromisso do principal emissor de GEE de “iniciar um diálogo para troca de experiências
e análise de estratégias para cooperação a longo prazo”.
Com a entrada em vigor do Protocolo de Quioto, prevaleceu a opinião de que, no
período, houve avanços significativos no tocante à simplificação dos procedimentos relativos
ao MDL, que permitiram estimular a implementação de projetos em países em
desenvolvimento. A expectativa das Partes era a de que a elevação do número de projetos
de MDL desse condições de acelerar o processo de desenvolvimento sustentável desses
países e, ao mesmo tempo, de melhorar a dinâmica do mercado de carbono, de forma a
incrementar o auxílio aos países desenvolvidos em atingirem suas metas de redução de
emissões. Essa expectativa tem sido confirmada com as estatísticas do MDL, que ilustram
um crescente aumento do número de projetos e da estimativa de redução das emissões de
GEE.
A décima terceira e até o momento última Conferência das Partes – COP 13 ocorreu
entre os dias 3 e 14 de dezembro de 2007, em Bali, Indonésia. Segundo a UNFCCC
(2007b), mais uma vez, e com base nas estatísticas e simulações apresentadas pelos
últimos relatórios do IPCC, foi reconhecida a urgência de se garantir a continuidade dos
esforços mundiais visando à mitigação dos impactos das mudanças climáticas.
A Conferência foi mais uma vez marcada por fortes divergências entre as Partes,
sobretudo com relação à interpretação do Princípio das Responsabilidades Comuns mas
Diferenciadas. Os Estados Unidos, maiores emissores de GEE, insistiram sobre a
29
necessidade de instituição de metas quantitativas de redução de emissões também para os
países em desenvolvimento, além de um maior controle sobre as emissões provenientes do
desmatamento e da queima de florestas tropicais.
Os países em desenvolvimento, incluindo o Brasil, mantiveram e reiteraram a posição
sobre a responsabilidade dos países desenvolvidos em prover ajuda financeira, científica e
tecnológica para o desenvolvimento de projetos ambientais sustentáveis em seu território,
incluindo incentivos à manutenção de florestas (estoque de carbono) e recuperação de
áreas degradadas.
Em função dos resultados não tão animadores com relação à eficácia das metas
definidas em Quioto para a contenção do aquecimento global, o principal ponto de
discussão no encontro de Bali foi, mais uma vez, a necessidade de criação de uma agenda
mundial efetiva para a instituição de um novo Tratado ou instrumento jurídico equivalente,
que verse sobre ações cooperativas de longo prazo, a vigorar a partir de 2012 – fim do
primeiro período de cumprimento de metas de redução de emissões de GEE estabelecido
pelo Protocolo de Quioto. A novidade de Bali foi o estabelecimento da data limite de 2009
para a conclusão das discussões acerca desse novo e necessário instrumento jurídico.
Nada obstante as históricas divergências, este e outros pontos, assim como o
cronograma das atividades básicas a serem desenvolvidas até a realização da décima
quinta COP (2009), foram formalizados pelas Partes por meio da assinatura do documento
denominado “Plano de Ação de Bali”, que, em resumo, e segundo a UNFCCC (2007c),
contém os seguintes direcionamentos:
� Estabelecimento de metas conjuntas de redução de emissões de GEE que
considerem os horizontes de curto (imediato), médio (até 2012) e longo (pós
2012) prazos, observado o Princípio das Responsabilidades Comuns mas
Diferenciadas e as condições financeiras, sociais e tecnológicas de cada Parte;
� Detalhamento e divulgação, pelos países desenvolvidos, das ações e medidas
a serem adotadas visando o cumprimento das metas de redução de emissões,
estabelecidas com base em informações padronizadas, mensuráveis e
verificáveis, com o registro de situações relevantes específicas;
� Adoção, por parte dos países em desenvolvimento, de ações e medidas
destinadas à redução de emissão de GEE, também estabelecidas com base
em informações padronizadas, mensuráveis e verificáveis, que levem em conta
as condições financeiras e tecnológicas e a capacidade de crescimento de
30
cada país, sempre voltadas ao objetivo de promoção do desenvolvimento
sustentável;
� Incentivo à implementação de medidas de proteção, manutenção e manejo
sustentável de florestas; à recuperação de áreas degradadas; e à formação de
estoques de carbono em países em desenvolvimento;
� Incentivo à transferência tecnológica e à utilização de mecanismos de mercado
visando à redução de custos dos projetos e ações destinados ao cumprimento
das metas globais de redução de emissões;
� Incremento da cooperação internacional e da participação de organizações não
governamentais no processo de mitigação das mudanças climáticas;
� Ajuda financeira internacional para a implementação de medidas de apoio às
populações atingidas por catástrofes climáticas (inundações, secas e
desertificação);
� Cooperação internacional no desenvolvimento de pesquisas voltadas à
inovação tecnológica voltada à equidade sócio-ambiental;
A implementação das ações e medidas previstas no “Plano de Bali” será conduzida
pelo Grupo de Trabalho Ad Hoc para Ações Cooperativas de Longo Prazo, criado na
qualidade de grupo técnico subsidiário à CQNUMC, que deverá concluir e apresentar o
resumo dos trabalhos em 2009, quando da realização da 15ª COP.
Concluído o resumo sobre as principais Conferências das Partes – COP, o tópico a
seguir dedicará atenção especial ao Protocolo de Quioto, adotado pelas Partes quando da
realização da COP 3, e aos mecanismos de flexibilização instituídos por esse importante
instrumento jurídico regulamentador da CQNUMC.
1.3 O PROTOCOLO DE QUIOTO E OS MECANISMOS DE FLEXIBILIZAÇÃO
O Protocolo de Quioto foi adotado em 11 de dezembro de 1997, quando da realização
da terceira Conferência das Partes – COP 3, realizada em Quioto, Japão. O documento foi
inicialmente aberto para assinatura das Partes entre 16 de março de 1998 e 15 de março de
1999, na sede nas Nações Unidas em Nova Iorque, Estados Unidos.
31
A principal inovação do Protocolo, após dois anos e meio de discussões iniciadas
quando da realização da primeira COP, em Berlin, foi o estabelecimento de compromissos
obrigatórios dos países desenvolvidos em reduzir a emissão de GEE, definidos em termos
de metas quantitativas de redução de emissões, considerando como base as emissões
verificadas no ano de 1990. Até então, e partindo das diretrizes e decisões pactuadas
quando da adoção da CQNUMC, as discussões acerca de medidas para conter o
aquecimento global estavam restritas ao campo das intenções.
Outro ponto fundamental do Protocolo foi a instituição, no âmbito das negociações
internacionais sobre mudanças climáticas, dos chamados mecanismos de mercado, criados
com o objetivo de subsidiar as Partes no cumprimento de suas metas de redução de
emissões de GEE, os quais funcionam como esquemas auxiliares e suplementares às
ações domésticas de redução de emissões. Conforme detalhado na seção anterior, as
regras operacionais para a implementação dos mecanismos de flexibilização foram sendo
discutidas e aprimoradas ao longo do tempo e efetivamente detalhadas somente em 2001,
quando da realização da COP 7, em Marrakesh, Marrocos.
Em termos gerais, o Protocolo definiu que os países desenvolvidos ou economias em
estágio de transição, listados no Anexo I da CQNUMC, devem assumir como meta
obrigatória a redução de emissões de GEE em no mínimo 5 % sobre os níveis de
concentração desses gases observados em 1990, meta essa a ser atingida durante o
primeiro período de compromisso do Protocolo, estabelecido entre os anos de 2008 e 2012.
Segundo o Ministério da Ciência e Tecnologia (2001b), o Protocolo de Quioto entrou
em vigor no dia 16 de fevereiro de 2005, nonagésimo dia após pelo menos 55 Partes
incluídas no Anexo I, que representem pelo menos 55% do total das emissões de GEE
verificadas com base em 1990, terem depositado, junto à ONU, seus respectivos
instrumentos de ratificação, aceitação, aprovação ou adesão ao Protocolo. Essa condição
de vigência foi atingida a partir da ratificação do Protocolo pela Rússia, ocorrida em 18 de
novembro de 2004. Os Estados Unidos, principal emissor de GEE, ainda não ratificaram o
Protocolo de Quioto. Até 12 de dezembro de 2007, 176 Partes e a União Européia
depositaram seus respectivos instrumentos junto à ONU, os quais correspondem a 63,7%
do total das emissões.
O texto do Protocolo de Quioto contém 28 Artigos e dois Anexos. Serão apresentados,
no âmbito deste subitem, comentários relevantes acerca dos principais Artigos, que
representam a essência do Tratado, em especial dos que tratam do compromisso
obrigatório de cumprimento de metas quantitativas de redução de emissões de GEE (Art. 3)
32
e dos mecanismos de flexibilização de mercado, quais sejam: Implementação Conjunta (Art.
6), Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (Art. 12) e Comércio de Emissões (Art. 17), além
dos dois Anexos (A e B).
O Art. 1 ratifica os conceitos e termos trazidos pelo Art. 1 da CQNUMC e adiciona
outros inseridos no texto do Protocolo, com destaque para o Painel Intergovernamental de
Mudança do Clima (em inglês International Panel on Climate Change – IPCC), órgão
científico das Nações Unidas estabelecido conjuntamente, em 1988, pela Organização
Meteorológica Mundial - OMM e pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente –
PNUMA. Os relatórios emitidos pelos cientistas do Painel Intergovernamental são
importantes e reconhecidas fontes de informações sobre os impactos atuais e futuros do
efeito estufa na estabilidade climática do planeta, utilizadas pelos diversos órgãos técnicos e
institucionais da Convenção e do Protocolo de Quioto. O dado mais alarmante dos IPCC é
que os eventos climáticos mais severos serão sentidos em maiores proporções nas regiões
mais pobres e mais vulneráveis da terra, o que eleva sobremaneira o risco de conflitos
geográficos e de catástrofes sócio-ambientais, caso não sejam efetivamente adotadas
ações imediatas para a mitigação dos efeitos perigosos das ações antrópicas sobre o clima
do planeta.
O Art. 2 traz, em suma, as políticas e diretrizes a serem adotadas pelas Partes,
individualmente ou em esquemas de cooperação, para fins de cumprimento das metas de
redução de emissão de GEE, objeto principal do Protocolo, às quais envolvem, dentre
outras, as seguintes linhas de atuação:
� Aumento da eficiência energética em setores relevantes da economia, por meio
da pesquisa, promoção, desenvolvimento e aumento do uso: de formas novas
e renováveis de energia; de tecnologia de seqüestro de dióxido de carbono; de
tecnologias ambientalmente seguras no tratamento e disposição de resíduos e;
da eficiência no setor de transportes;
� Proteção e o aumento de reservatórios ou sumidouros de carbono, mediante
práticas sustentáveis de manejo florestal e agronômico;
� Eliminação ou correção das imperfeições de mercado quando da aplicação dos
mecanismos de flexibilização.
O Art. 3, por sua vez, é tido como um dos principais dispositivos do Protocolo de
Quioto. Da essência de sua redação, extrai-se o compromisso formal das Partes signatárias
do Protocolo em cumprir as metas quantitativas de redução de emissões de GEE, de acordo
33
com os percentuais estabelecidos em seu Anexo B. Maiores considerações sobre as metas
individuais de redução de emissões serão a seguir apresentadas, quando dos comentários
sobre os Anexos do Protocolo.
O Art. 4 regulamenta a possibilidade das Partes estabelecerem, previamente, quando
da ratificação do Protocolo, metas conjuntas de cumprimento dos compromissos de redução
de emissão. Tal dispositivo não se mostra atrativo às Partes, uma vez que os demais
mecanismos de flexibilização não impõem compromissos conjuntos prévios.
O Art. 5 dispõe sobre o estabelecimento, pelas Partes, em no máximo um ano antes
do início do primeiro período de compromisso (2008), de sistemas nacionais de
acompanhamento das emissões de GEE, assim como da metodologia a ser utilizada para a
respectiva mensuração, às quais devem ser submetidas e aceitas pelo Painel Internacional
de Mudanças Climáticas – IPCC. Essa metodologia é utilizada para a mensuração do
potencial de aquecimento global de cada Parte, estando prevista a sua revisão periódica
sempre que necessária.
O Art. 6 define o primeiro dos três mecanismos de mercado criados pelo Protocolo de
Quioto: A Implementação Conjunta (em inglês Joint Implementation – JI). Por esse
mecanismo, é permitido aos Países participarem conjuntamente de projetos ou atividades
que tenham potencial de redução de GEE, a serem implementados em seu território ou em
território de outros países parceiros. As respectivas Unidades de Redução de Emissões (em
inglês Emission Reductions Units – ERU) geradas a partir dessas atividades podem ser
transferidas entre os países que os mesmos compartilhem entre si os projetos para fins de
cumprimento conjunto de suas metas individuais de redução de emissões. É uma
possibilidade de flexibilização restrita aos países desenvolvidos incluídos no Anexo I da
CQNUMC, com a condição de que a aquisição/venda de ERUs deve ser suplementar às
ações domésticas adotadas para fins de cumprimento das metas estabelecidas pelo Art 3. O
grande atrativo desse mecanismo está na possibilidade de redução dos custos inerentes às
medidas a serem adotadas para redução de emissões de GEE, uma vez que a
implementação dos projetos pode se dar além das fronteiras de cada país.
Os Arts. 7 a 9 tratam, essencialmente, da obrigatoriedade de prestação e
encaminhamento periódico, pelas Partes, de informações suplementares relevantes, que
digam respeito a aspectos técnicos, científicos, econômicos, sociais e outros, que auxiliem o
corpo técnico da CQNUMC na revisão de parâmetros utilizados na mensuração e
monitoramento das emissões e concentrações de GEE na atmosfera.
34
O Art. 10, por seu turno, trata do compromisso de cooperação técnica, financeira e
científica entre as Partes para a implementação de ações e políticas nacionais ou regionais
voltadas à mitigação dos efeitos do aquecimento global, que devem sempre se basear nos
inventários e sistemas nacionais de informações. O Art. 11 detalha a forma pela qual
deverão ser cumpridas as orientações do Art. 10, sobretudo com relação às
responsabilidades dos países desenvolvidos como provedores de recursos financeiros e
tecnológicos para a implementação dos projetos, ações e políticas sócio-ambientalmente
responsáveis.
O Art. 12 cria, conceitua e institucionaliza o segundo mecanismo de mercado instituído
pelo Protocolo de Quioto – o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo – MDL. O MDL
trabalha com o duplo objetivo de contribuir para o desenvolvimento sustentável das Partes
não incluídas no Anexo I da CQNUMC, e de auxiliar as Partes incluídas no Anexo I em
atingir as metas de redução de emissões de GEE, definidas no Anexo B do Protocolo, que
se constituem no cerne deste importante Tratado. O inciso 10 do Artigo 12 dispõe que
podem ser utilizados para fins de cumprimento dos compromissos de redução de emissões
os créditos (CER) gerados a partir do ano 2000.
Segundo Araújo (2006, p. 25), por ser o único dos mecanismos de flexibilização que
permite a participação (voluntária) de países em desenvolvimento, o MDL é de extrema
importância para o Brasil e demais economias emergentes, que anseiam em atingir
patamares sustentáveis de desenvolvimento econômico e social. Para as empresas
brasileiras, o MDL se constitui numa grande oportunidade para o desenvolvimento de
programas de redução de emissões ou seqüestro de carbono, principalmente no que se
refere a projetos de geração de energia renovável e de aumento de eficiência energética. Na
implementação desses programas e ações, conta-se com a possibilidade de transferência
de tecnologia e de recursos externos de empresas de países incluídos no Anexo I,
interessadas na obtenção dos créditos de carbono gerados a partir dos projetos de MDL.
Os Arts. 11 ao 16 dispõem sobre aspectos institucionais do Protocolo de Quioto, que
por analogia apresentam estrita relação com as regras institucionais da CQNUMC.
Encontram-se disciplinados nesses dispositivos o formato e os objetivos das reuniões das
Partes, institucionalizadas por meio da realização das Conferências das Partes; as funções
e competências dos órgãos técnicos e científicos subsidiários à Convenção e ao Protocolo;
as regras de participação de observadores nas reuniões e Conferências; dentre outros.
O Art. 17 trata do terceiro e último mecanismo de mercado instituído pelo Protocolo de
Quioto: O Comércio de Emissões (em inglês Emission Trading - ET). Por este mecanismo,
35
as Partes incluídas no Anexo B podem participar de esquemas ou regimes nacionais ou
regionais de comércio de emissões, com o objetivo de cumprir, ao menor custo possível, os
compromissos de redução de emissões assumidos no âmbito do Art. 3, expressos de forma
quantificada nos termos do Anexo B do Protocolo.
O Comércio de Emissões é um mecanismo de flexibilização baseado num esquema
especial de negociação por meio do qual as Partes estabelecem, inicialmente, limites ou
permissões de emissões de GEE, expressos em termos de ton CO2, calculados a partir das
metas quantitativas definidas pelo Protocolo para cada Parte.
Após a definição desses limites, a cargo dos governos ou autoridades designadas, e
com base nas emissões verificadas periodicamente, é permitido o comércio das unidades de
emissões entre as Partes, com base na seguinte regra: os países que excederem suas
metas de redução de emissões a partir das ações adotadas nacionalmente (emissões totais
aquém dos limites), podem vender esses excedentes (em inglês Assigned Amount Units -
AAU) para os países que, por motivos econômicos ou tecnológicos, não conseguirem atingir
suas metas de redução de emissões fixadas para um dado período de compromisso
(emissões além dos limites). Esse regime de limitação de emissões e posterior negociação
dos excedentes de permissões de emissões é conhecido internacionalmente como Cap and
Trade regime, e será detalhado e ilustrado, juntamente com os demais esquemas de
geração e negociação de créditos de carbono, no capítulo 3 desta monografia.
Os Arts. 18 a 28 do Protocolo de Quioto regulamentam dispositivos relacionados às
penalidades em caso de descumprimento das regras do Tratado; emendas ao Protocolo,
foro de discussão de controvérsias, forma e prazo para ratificação; condições de vigência e
outros de cunho jurídico/institucional.
A partir do resumo dos principais Artigos do Protocolo de Quioto, passemos a seguir
às considerações relevantes sobre seus Anexos A e B. O Anexo A do Protocolo traz uma
lista dos elementos químicos considerados Gases de Efeito Estufa – GEE cujas
concentrações, expressas em termos de toneladas equivalentes de dióxido de carbono, são
periodicamente verificadas e monitoradas para fins do cumprimento das metas quantitativas
de redução de emissões.
O quadro a seguir mostra os gases considerados como de defeito estufa, suas
fórmulas químicas e seus respectivos potenciais de aquecimento global (em inglês Global
Warming Potencial – GWP), expressos em termos de CO2 equivalente (CO2 = 1).
36
GE E Fórm ula G W P *Dió xido de ca rb ono CO 2 1 Meta no CH4 21 Óxido Nitroso N2 O 310 Hexafluoreto de E nxofre SF2 23 .900 Hid ro fluo rcarbo nos HFCs 1 50 - 11 .700Perfluorcarbon os CFCs 7.400 - 9 .200
Quadro 2 – Gases do Efeito Estufa – GEE Fonte: Adaptado de CDM in Charts – IGES novembro 2007
Esse primeiro Anexo traz, também, uma lista de setores e respectivas categorias de
fontes de emissão de GEE sobre as quais deverão ser estabelecidas metodologias
específicas de formatação, verificação e monitoramento de projetos ou ações que permitam
a efetiva redução ou captura de GEE, os quais resumem-se no quadro a seguir.
Setores Categorias de Fontes Queima de Combustível Setor Energético Indústrias de transformação e contrução Transporte
Energia Outros setoresEmissões fugit ivas de combustível Combustíveis sólidos Petróleo e Gás Natural OutrosProdutos mineraisIndústria químicaProdução de metais
Processos industriais Outras produçõesProdução de halocarbonos e hexafluereto de enxofreConsumo de halocarbonos e hexafluoreto de enxofreOutros
Uso de solventes ou outros produtosFermentação entéricaTratamento de dejetosCultivo de arroz
Agricultura Solos agrícolasQueimadas prescritas de savanasQueima de resíduos agrícolasOutrosDisposição de resíduos sólidos na terra
Resíduos Tratamento de esgotoIncineração de resíduosOutros
Quadro 3 – Setores e categorias de fontes de emissão de GEE. Anexo A Protocolo de Quioto Fonte: Adaptado do Protocolo de Quioto. Ministério da Ciência e Tecnologia.
O Anexo B do Protocolo, por sua vez, traz uma lista de 39 países (incluída a União
Européia) participantes no Anexo I da CQNUMC e os respectivos compromissos de redução
37
ou limitação quantificada de emissões, expressos em termos de percentuais de emissões
calculadas sobre o ano base (1990) ou período equivalente, a serem atingidos durante o
primeiro período de compromisso (2008 a 2012). Dessa lista, pode-se observar que a
maioria dos países tem o compromisso de reduzir suas emissões (percentuais inferiores a
100%). Alguns países estão autorizados a manter seus níveis de emissões (percentuais
iguais a 100%), como é o caso da Rússia e Ucrânia, consideradas economias em processo
de transição, além da Nova Zelândia. Três países, em razão do seu histórico de baixas
emissões de GEE, têm autorização para elevar os seus níveis de emissões observados em
1990 (percentuais superiores a 100%). São eles: Austrália (108%), Islândia (110%) e
Noruega (101%).
Os quinze membros da União Européia - UE tinham, em princípio, uma meta única de
redução de emissões, estabelecida em 8% frente aos níveis de 1990 (92% segundo o
Anexo B). A Comunidade Européia, entretanto, com o objetivo de flexibilizar e adequar a
meta geral à capacidade e ao histórico de emissão de cada membro, ajustou internamente
as metas de redução de emissões definidas pelo Protocolo de Quioto.
O quadro a seguir traz a relação dos países incluídos no Anexo B do Protocolo de
Quioto, suas respectivas metas de redução de emissões e as concentrações de GEE,
tomadas como base para a apuração das metas, expressas em termos de milhões de
toneladas de CO2 equivalentes, apuradas no ano de 1990 ou período eleito:
União Européia Economias em transição Outras Partes
Parte Meta
m-ton CO2 1990 Parte Meta
m-ton CO2 1990 Parte Meta
m-ton CO2 1990
Portugal 27,0% 59,3 Russia 0,0% 3.046,6 Islândia 10,0% 3,3 Grécia 25,0% 109,4 Ucrânia 0,0% 978,9 Austrália 8,0% 417,9 Espanha 15,0% 283,9 Croácia -5,0% 31,8 Noruega 1,0% 50,1 Irlanda 13,0% 53,8 Polônia -6,0% 564,4 N.Zelândia 0,0% 61,5 Suécia 4,0% 72,2 Romênia -8,0% 265,1 Canadá -6,0% 595,9 Finlândia 0,0% 70,4 Rep. Tcheca -8,0% 192,0 Japão -6,0% 1.187,2 França 0,0% 568,0 Bulgária -8,0% 138,4 EUA -7,0% 6.082,5 Holanda -6,0% 211,7 Hungria -8,0% 122,2 Suíça -8,0% 52,4 Itália -6,5% 511,2 Eslováquia -8,0% 72,1 Liechestein -8,0% 0,3 Bélgica -7,5% 145,7 Lituânia -8,0% 50,9 Monaco -8,0% 0,1 Reino Unido -12,5% 748,0 Estônia -8,0% 43,5 Áustria -13,0% 78,6 Letônia -8,0% 25,4 Dinamarca -21,0% 70,7 Eslovênia -8,0% 20,2 Alemanha -21,0% 1.243,7 Bielorússia -8,0% 129,2 Luxemburgo -28,0% 13,4 Total U.E -8,0% 4.240,0
Quadro 4 – Metas de redução de GEE, segundo Anexo B do Protocolo de Quioto Fonte: Adaptado de CDM in Charts – IGES – novembro 2007
38
Com relação às estatísticas relacionadas às reduções de emissões de GEE frente às
emissões verificadas no ano base de 1990, observa-se uma situação diferenciada entre as
Partes incluídas no Anexo B do Protocolo de Quioto. Dos 39 países, 16 tiveram emissões
em 2005 maiores que em 1990 e 23 conseguiram reduzir suas emissões de GEE neste
período.
Os países que aumentaram suas emissões frente ao ano-base são: Austrália, Áustria,
Canadá, Grécia, Islândia, Irlanda, Itália, Japão, Liechestein, Luxemburgo, Nova Zelândia,
Noruega, Portugal, Eslovênia, Espanha, Suíça, Turquia e Estados Unidos (não ratificaram o
Protocolo de Quioto).
As Partes que conseguiram reduzir suas emissões de GEE no período são:
Bielorrússia, Bélgica, Bulgária, Croácia, República Tcheca, Dinamarca, Estônia, Finlândia,
França, Alemanha, Hungria, Letônia, Lituânia, Mônaco, Holanda, Polônia, Romênia, Rússia,
Eslováquia, Suécia, Ucrânia e Reino Unido.
Segundo a UNFCCC (2008a), os inventários nacionais de emissões de GEE ilustram,
para o conjunto das Partes incluídas no Anexo I da Convenção, que as emissões agregadas
reduziram-se em 2,8% de 1990 a 2005, excluindo as atividades de LULUCF. Incluindo essas
atividades, que atuam como sumidouros de carbono, as reduções decresceram 4,6%.
Considerando exclusivamente as Partes que representam as economias em transição
(países do leste europeu), as reduções foram de 35,2% (36,2% incluindo LULUCF). Por
outro lado, se tomadas somente as Partes desenvolvidas, houve um incremento de 11,0%
nas emissões de GEE de 1990 a 2005 (10,0% incluindo LULUCF).
O quadro a seguir traz o ranking dos dez maiores emissores de GEE em 1990 e em
2005, excluídas as atividades de LULUFC.
1990 2005Ranking Parte Anexo I Emissões GEE Ranking Parte Anexo I Emissões GEE ∆ 1990-2005
1º Estados Unidos 6.229.041 1º Estados Unidos 7.241.482 16,3%2º Rússia 2.989.833 2º Rússia 2.832.518 -28,7%3º Japão 1.272.043 3º Japão 1.359.914 6,9%4º Alemanha 1.227.860 4º Alemanha 1.001.476 -18,4%5º Ucrânia 923.844 5º Canadá 746.889 25,3%6º Reino Unido 771.415 6º Reino Unido 657.396 -14,8%7º Canadá 595.954 7º Itália 579.548 12,1%8º Polônia 586.903 8º França 558.392 -1,6%9º França 567.303 9º Austrália 525.408 25,6%
10º Itália 516.581 10º Espanha 440.649 53,3%Obs: emissões de GEE expressas em Gg CO2 e
Quadro 5 – Ranking de emissores de GEE em 1990 e em 2005. Partes Anexo I Fonte: Adaptado de UNFCCC. Disponível em http://unfccc.int/ghg_emissions_data /items/4133.php. Pesquisa realizada em 12.2.2008.
39
O quadro anterior ilustra que o ranking de emissores de GEE relativo às Partes Anexo
I sofreu algumas alterações desde 1990 até 2005, último ano em que se encontram
disponíveis informações sobre os inventários de emissões de GEE. As quatro primeiras
posições permaneceram inalteradas, sendo ocupadas por Estados Unidos, Rússia, Japão e
Alemanha. Desses, Estados Unidos e Japão elevaram suas emissões e Rússia e Alemanha
reduziram suas emissões com base em 1990. A partir da quinta posição, houve algumas
alterações no ranking, com destaque para a Ucrânia, que reduziu suas emissões em 54,7%
frente à 1990 e saiu do ranking dos dez maiores emissores. Por outro lado, a Austrália, que
estava fora da lista, passou a ocupar a 9ª posição, com elevação de suas emissões de GEE
em 25,6% no mesmo período.
A forte redução das emissões de GEE obtida pelos países do leste europeu está
associada ao período de retração econômica pelo qual passaram a partir da dissolução da
antiga União Soviética. A performance da Alemanha e da Inglaterra, que conseguiram
reduzir suas emissões em 18,4% e 14,8%, respectivamente, é fruto do forte engajamento
desses países em programas de eficiência energética e substituição de fontes fósseis por
fontes renováveis de energia.
Com relação às Partes não incluídas no Anexo I da CQNUMC, às quais representam
as economias em desenvolvimento, o fato das mesmas não terem se comprometido com
metas obrigatórias de reduções de emissões de GEE, aliado às limitações de cunho
tecnológico, político e econômico, dificultam a obtenção de dados históricos relativos às
emissões verificadas de GEE. Em razão disso, não há uma série histórica completa
disponível desde o ano base 1990, o que inviabiliza uma análise mais acurada das
emissões reais de GEE desses países. Para se ter uma idéia, para a maioria dos países não
Anexo I, as últimas informações disponíveis no sítio oficial da Convenção reporta dados do
inventário anual de emissões relativos a 1994.
A título ilustrativo, e com base nos dados informados pela UNFCCC (2008b), o Brasil
vem sistematicamente aumentando suas emissões agregadas de GEE. Desde o ano base
de 1990 até 1994, as emissões de GEE brasileiras passaram de 593.000 GgCO2e para
658.649 GgCO2e, excluindo as atividades de LULUCF. Se incluídas as remoções de CO2
por sumidouros, as emissões passaram de 1.388.637 GgCO2e para 1.476.729 GgCO2e no
mesmo período.
Também segundo a UNFCCC, a China, tida como um dos maiores emissores de GEE
da atualidade, registrou no âmbito das Nações Unidas apenas as informações relativas ao
ano de 1994, que mostram emissões agregadas de GEE da ordem de 4.057.617 GgCO2e
40
excluídas as atividades de LULUCF e de 3.650.138 GgCO2e se incluídas as remoções por
sumidouros de CO2.
Além das dificuldades de obtenção e padronização das informações conforme os
critérios definidos pela CQNUMC há muita controvérsia na análise das informações
disponibilizadas por institutos privados ou por organizações não governamentais dedicadas
ao acompanhamento das mudanças climáticas, às quais divulgam as estatísticas (não
oficiais) relativas às Partes não Anexo I de diversas maneiras e conveniências, tais como:
emissões absolutas, emissões por fontes, emissões per capta e outras. Em razão disso, o
presente trabalho se restringiu a analisar as estatísticas oficiais divulgadas pela CQNUMC
para os países incluídos no Anexo I da Convenção.
Os resultados definitivos em termos de cumprimento das metas estabelecidas pelo Art.
3 do Protocolo de Quioto serão conhecidos quando do encerramento do primeiro período de
compromisso estabelecido pelo Protocolo, que finda em 31.12.2012. Até lá, os resultados
preliminares servirão de balisadores para as Partes adequarem suas atividades e projetos
domésticos voltados à redução de emissões de GEE. Além disso, os inventários anuais de
emissões têm influência significativa nos preços dos diferentes créditos (units) negociados
no âmbito do mercado global de carbono, uma vez que os volumes de emissões verificadas
interferem diretamente na demanda por créditos de carbono a serem utilizados de forma
complementar para o cumprimento das metas voluntárias e obrigatórias de reduções de
emissões.
Conhecidos os principais dispositivos institucionalizados pelo Protocolo de Quioto,
sobretudo os artigos que tratam dos mecanismos de flexibilização, e as estatísticas em
termos de reduções ou aumento de emissões de GEE frente ao ano base de 1990,
passemos, a seguir, para o detalhamento do único dos três mecanismos de mercado que
permite a participação voluntária de países em desenvolvimento (Partes não Anexo I da
CQNUMC): O Mecanismo de Desenvolvimento Limpo - MDL.
41
2 O MECANISMO DE DESENVOLVIMENTO LIMPO - MDL
O Mecanismo de Desenvolvimento Limpo – MDL encontra-se formalmente instituído
pelo Art. 12 do Protocolo de Quioto. A criação e aceitação desse importante mecanismo de
flexibilização foi aprimorada a partir de proposta brasileira, apresentada quando das
reuniões preparatórias da COP 3, que previa a criação de um fundo global – Fundo de
Desenvolvimento Limpo – FDL, formado mediante aporte de recursos provenientes dos
países incluídos no Anexo I. Segundo Araújo op.cit., p. 23, esses aportes seriam calculados
em função do histórico e do potencial e emissão de GEE de cada Parte desenvolvida, e os
recursos do Fundo utilizados na implementação de projetos ambientalmente sustentáveis
em países em desenvolvimento.
A idéia era que os países desenvolvidos se responsabilizassem financeiramente pelo
dano causado pelo seu histórico de atuação como agentes poluidores do planeta. Após
muitas discussões, a proposta de criação do FDL evoluiu para o formato atual do MDL,
mecanismo de mercado de relevante interesse para o Brasil e para as demais economias
emergentes.
O MDL, em síntese, trabalha com o duplo objetivo de promover o desenvolvimento
sustentável nos países hospedeiros dos projetos e d e auxiliar os países
desenvolvidos a atingirem suas metas de redução de emissões . Todo projeto que
permitir a redução de emissões ou a captura líquida de GEE, quando comparado ao cenário
de não realização deste, tem potencial para a geração dos chamados créditos de carbono,
passíveis de serem vendidos aos países que necessitem de complementos externos para
atingirem suas metas de redução de emissões.
Rocha op.cit., p. 9, afirma que para cada tonelada de GEE equivalente a uma tonelada
de dióxido de carbono (CO2) retirada da atmosfera ou deixada de ser emitida em
decorrência dos projetos de MDL, é emitido um certificado denominado Redução Certificada
de Emissão – RCE (em inglês Certified Emission Reductions – CER), comumente
denominados “créditos de carbono”, que se constituem em ativos escriturais, negociáveis
entre os países em desenvolvimento hospedeiros dos projetos de MDL e as nações
desenvolvidas, que por motivos econômicos ou tecnológicos não conseguirem atingir as
metas de emissões de GEE definidas no âmbito do Protocolo de Quioto.
Segundo Araújo op. cit., p. 29, os diversos segmentos de mercado que podem se
beneficiar do comércio desses créditos são:
42
� Projetos de recuperação de gases de aterros sanitários, de auto-fornos,
biodigestores e outros gases;
� Projetos de produção de energia limpa (biomassa, energia eólica, solar,
Pequenas Centrais Hidrelétricas etc;
� Projetos de troca de combustíveis (óleo x gás, biomassa e outros);
� Projetos de logística que elevem a eficiência de sistemas de transporte;
� Evolução tecnológica de processos industriais (cimento, petroquímica,
fertilizantes etc);
� Projetos Florestais (manejo sustentável de florestas nativas e plantadas)
Os projetos florestais, assim como outros que envolvam alterações na composição ou
no uso do solo estão relacionados a atividades denominadas “Uso do Solo, Mudanças do
Uso do Solo e Florestas (em inglês Land Use, Land Use Change and Forestry – LULUCF) e
recebem tratamento especial no âmbito do Protocolo de Quioto e do MDL. Por sua
capacidade de absorção de carbono durante o crescimento das espécies agro-florestais,
são consideradas tecnicamente como atividades de seqüestro de carbono, que ao longo de
sua implantação funcionam como verdadeiros sumidouros (sinks) de CO2. Os CERs gerados
a partir de projetos de LULUCF são denominados t’CERs (temporary CERs) e l’CERS (long
term CERs).
Rocha op. cit., p. 21, argumenta que essas atividades sempre foram motivo de
controvérsias no âmbito das Conferências das Partes, sobretudo quando relacionadas a
projetos associados a plantios comerciais, que segundo os críticos perderiam a capacidade
de funcionar como sumidouros de carbono quando do corte raso dos maciços florestais e
conseqüente destinação da madeira para uso industrial. Diante dessa e de outras críticas,
as Partes acordaram, quando da assinatura do Acordo de Marrakesh – COP 7, que projetos
de seqüestro de carbono relacionados a LULUCF devem ser elaborados de acordo com os
seguintes princípios:
� As atividades de LULUCF devem ser baseadas em sólido conhecimento
científico;
� Metodologias consistentes devem ser utilizadas ao longo do tempo para
determinação das estimativas (de seqüestro de carbono) e do monitoramento
das atividades de LULUCF;
43
� A Meta estabelecida pelo Art. 3 do Protocolo de Quioto não deve ser alterada
pela contabilização das atividades de LULUCF;
� A simples presença de estoques de carbono deve ser excluída da
contabilidade;
� A implementação de atividades de LULUCF deve contribuir para a conservação
da biodiversidade e para o uso sustentável dos recursos naturais;
� A contabilização de atividades de LULUCF não implica na transferência de
compromissos para períodos futuros;
� A reversão das atividades de LULUCF deve ser contabilizada em um
determinado período de tempo;
� A contabilização exclui a remoção (seqüestro) proveniente de: i) concentrações
elevadas de CO2 acima do seu nível pré-industrial; ii) deposição indireta de
nitrogênio; e iii) efeitos dinâmicos resultantes do crescimento decorrente de
atividades e práticas anteriores ao ano de referência;
� Somente serão elegíveis para projetos de MDL as atividades de florestamento
e reflorestamento e que, para o primeiro período de compromisso (2008-2012),
o total de CER resultante desses projetos utilizados por uma Parte para
contabilizar suas reduções não pode ser superior a 1% das emissões do ano
base multiplicado por cinco.
Além dos projetos de LULUCF, outro tipo de tratamento diferenciado é dispensado a
certas Atividades de Projeto concebidas no âmbito do MDL, não pela sua diferenciação
quanto à forma de atuação (redução ou captura de carbono), mas pelo seu porte ou
potencial de redução de GEE. São as denominadas Atividades de Projetos de Pequena
Escala. Para essas atividades, de menor potencial de redução de GEE, a concepção,
análise e certificação dos projetos obedecem a um rito processual simplificado e
metodologias específicas, dada a menor complexidade destas quando comparadas a
Atividades de Projeto de Grande Escala. Segundo a Fundação Getúlio Vargas (2002), as
Atividades de Projeto que se enquadram na categoria de Pequena Escala são as seguintes:
� Atividades de Projeto de energia renovável, com capacidade máxima de
produção equivalente a até 15 MW;
44
� Atividades de Projeto de melhoria da eficiência energética, que reduzam o
consumo de energia pelo lado da oferta e da demanda em até 15GWh/ano;
� Outras Atividades de Projeto que reduzam emissões antrópicas por fontes que,
simultaneamente, emitam diretamente menos do que 15 Mton equivalente
CO2/ano.
Nos termos do Art.12 do Protocolo de Quioto pode-se inferir, em linhas gerais, que
para que um projeto seja considerado elegível para o MDL, é necessário que cumpra o
requisito básico de contribuir para o desenvolvimento sustentável do país hospedeiro.
Além disso, a participação em um projeto de MDL deve ser voluntária, ou seja, não são
aceitos projetos induzidos ou desenvolvidos em decorrência de legislação governamental
que retire a natureza espontânea do empreendimento.
É necessário, também, que o proponente (Participante do Projeto – PP) estabeleça a
adicionalidade e a linha de base do projeto. Com relação à adicionalidade, as atividades de
um projeto de MDL serão consideradas adicionais se as emissões antropogênicas de CO2
forem menores do que as que ocorreriam na ausência do projeto de MDL e/ou se a remoção
de CO2 (da atmosfera) for superior àquela que ocorreria na ausência do projeto de MDL. Por
sua vez, a linha de base de um projeto de MDL constitui o cenário representativo das
emissões/remoções antropogênicas de CO2 que ocorreriam na ausência do projeto.
Segundo Motta et al (2000, p. 4), a análise comparativa dos cenários representativos
da linha de base e o de implantação de projetos concebidos no âmbito do MDL evidencia
que, além dos resultados advindos da redução de emissões de GEE, outros benefícios de
caráter ambiental e social têm elevado potencial de ocorrência, sendo esses relacionados à
redução da poluição do ar e da água por meio de um menor uso de combustíveis fósseis,
aumento da disponibilidade de água, redução da erosão do solo, proteção da
biodiversidade, aumento do emprego e renda, dentre outros. Essas evidências sugerem que
a redução das emissões de carbono e os objetivos do desenvolvimento sustentável podem
ser perseguidos simultaneamente.
Dada a complexidade de procedimentos e metodologias envolvidos na certificação de
projetos formatados no âmbito do MDL, é recomendável aos proponentes dos Projetos uma
análise detalhada das etapas a serem cumpridas e seus respectivos modelos e requisitos,
sendo aconselhável contar, já na fase de planejamento do projeto, com assessoria técnica
especializada e de reconhecida experiência em projetos de MDL. A seção seguinte traz o
roteiro de etapas processuais a serem seguidas desde a concepção dos projetos até a
emissão dos créditos de carbono oriundos das reduções de emissões de GEE.
45
2.1 ETAPAS PROCESSUAIS: DA CONCEPÇÃO E CERTIFICAÇÃO DOS PROJETOS À
EMISSÃO DOS CERs
Os projetos que se habilitam à condição de projeto de MDL devem cumprir uma série
de procedimentos até receber a chancela da ONU, concedida por intermédio do Conselho
Executivo do MDL, instância máxima de avaliação e aprovação de projetos.
O diagrama a seguir, elaborado pela Bolsa de Mercadorias e Futuros (2007) mostra,
em termos gerais, as diferentes etapas que um projeto desenvolvido no território nacional
deve cumprir para receber os CERs no âmbito do MDL, assim como as instituições ou
órgãos responsáveis por cada fase da certificação.
Figura 1- Ciclo de um projeto de MDL Fonte: Bolsa de Mercadoria e Futuros - BMF
As etapas ilustradas na figura anterior envolvem uma série de procedimentos e
requisitos, os quais agregam custos relativamente elevados ao longo do processo de
certificação de projetos, que no âmbito do MDL são denominados “Atividades de Projetos”
(em inglês Project Activities - PA). Muitas das vezes, o tamanho e a categoria à qual se
enquadra o projeto, variáveis que determinam o potencial de redução de GEE e, por
46
consequência, a quantidade de CERs a serem emitidas, são fatores fundamentais para a
definição da viabilidade econômico-financeira das Atividades de Projetos.
As principais instituições e entidades formalmente envolvidas no processo de
certificação de Atividades de Projetos no âmbito do MDL são:
� Participantes dos Projetos (em inglês Project Participants - PP): empresas,
governos locais ou companhias interessadas no desenvolvimento e
implantação de projetos com potencial de redução ou seqüestro de GEE;
� Autoridade Nacional Designada (em inglês Designated National Authority -
DNA): entidade formalmente designada pelos governos para representar as
Partes no âmbito do MDL. No caso do Brasil, a Autoridade Nacional Designada
é a Comissão Interministerial para Mudanças Globais do Clima, presidida pelo
Ministério de Ciência e Tecnologia;
� Entidade Operacional Designada (em inglês Designated Operacional Entity):
organização independente responsável pelos aspectos técnicos das Atividades
de Projetos;
� Painel de Metodologia do MDL (em inglês Methodologies Panel – MP): órgão
subsidiário ao Comitê Executivo responsável pela análise e validação das
metodologias de linha de base, adicionalidade e monitoramento das Atividades
de Projetos;
� Conselho Executivo do MDL (em inglês Executive Board - EB): autoridade
máxima da ONU responsável pela aprovação das metodologias, assim como
pelo registro e validação dos projetos e emissão dos respectivos CERs.
Definidas as principais entidades relacionadas ao processo de certificação dos
projetos de MDL, passamos, a seguir, ao detalhamento das etapas a serem cumpridas pelos
Participantes dos Projetos, desde a sua concepção até a conseqüente emissão dos CERs.
47
2.1.1 Planejamento e elaboração do Documento de Concepção do Projeto (em inglês
Project Design Document)
A primeira etapa é a elaboração, pelos Participantes dos Projetos - PP, do Documento
de Concepção do Projeto (PDD), concebido para cada Atividade de Projeto segundo o
modelo oficial disponibilizado pelo Conselho Executivo do MDL. Segundo o IGES (2007a, p.
64), os PDD são documentos formais a serem submetidos às autoridades competentes, os
quais devem conter uma série de informações institucionais e técnicas, subdivididos em
cinco seções, a saber:
� Seção A – Descrição Geral da Atividade do Projeto, que deverá conter: o
título do projeto; a qualificação dos Participantes do Projeto; a descrição geral
e a localização da área onde será desenvolvido o projeto; a categoria da
Atividade de Projeto; a tecnologia a ser utilizada; a estimativa de redução de
GEE e; a identificação sobre a eventual utilização de recursos públicos no
projeto;
� Seção B – Requerimento de submissão da metodologia de linha de base e
monitoramento, com as seguintes informações: título e referência da
aprovação, pelo Conselho Executivo, da metodologia de linha de base e
monitoramento aplicáveis à Atividade de Projeto; justificativa para a escolha
da metodologia de linha de base e monitoramento; descrição das fontes e
categorias de GEE envolvidos nos limites geográficos de implementação das
Atividades de Projetos; descrição do cenário relacionado à determinação da
linha de base da Atividade de Projeto; análise e demonstração da
adicionalidade da Atividade de Projeto; cálculo da redução de emissões de
GEE, com definição da metodologia utilizada na mensuração das emissões e
fugas de emissões além da fronteira dos projetos; registros e parâmetros
utilizados; estimativas de redução de emissões ao longo da maturação do
projeto; definição e descrição da metodologia e do plano de monitoramento,
emissões e fugas de emissões; data de encerramento e nome do responsável
pela definição da linha de base e implantação do plano de monitoramento;
� Seção C – Duração da Atividade de Projeto/Período de Crédito: data inicial e
período de operação do projeto/geração de créditos (fixos ou renováveis);
48
� Seção D – Impactos Ambientais: Relatórios de Impacto Ambiental, incluindo
possíveis impactos trans-fronteiriços;
� Seção E – Comentários das partes interessadas (stakeholders) -
comunidades e governos locais, povos indígenas, associações, empresas etc
- sobre a implantação das Atividades de Projetos.
2.1.2 Validação do PDD pela Entidade Operacional Designada
A etapa seguinte (etapa 2) é o encaminhamento do PDD à apreciação da Entidade
Operacional Designada – EOD, responsável por sua validação, cuja relação institucional a
ser firmada com os Participantes dos Projetos deve ser dar por meio de instrumento
contratual específico. A EOD, com base no Documento de Concepção do Projeto, realiza a
análise técnica do documento, para checagem de sua aderência aos requisitos do MDL,
conforme a seguir:
� Comprovação da efetiva ratificação do Protocolo de Quioto pela Parte
hospedeira do projeto;
� Participação voluntária aos projetos de MDL e atendimento ao objetivo de
promoção do desenvolvimento sustentável, a serem formalmente comprovados
pela respectiva Autoridade Nacional Designada, por solicitação também formal
dos Participantes dos Projetos;
� Comprovação da manifestação das partes interessadas, mediante checagem
dos convites formais enviados aos stakeholders2 e respectivas respostas, com
posterior apresentação de relatório contendo um resumo das manifestações e
comentários;
� Apresentação de relatórios de impactos ambientais a serem observados a
partir da implementação do projeto;
2 Stakeholders é o termo utilizado para fazer referência às “partes interessadas” no projeto, que são: governo, comunidades locais, empresas, associações de moradores, comunidades indígenas e outras que sofram influência direta ou indireta do projeto.
49
� Aderência da metodologia de linha de base e do plano de monitoramento
apresentados pelo Participante do Projeto às metodologias aprovadas pelo
Painel de Metodologia do MDL/Conselho Executivo;
� Comprovação da adicionalidade no cálculo do potencial de redução de
emissões de GEE, segundo metodologia aprovada pelo Conselho Executivo do
MDL;
� Comprovação da existência de provisões necessárias ao cumprimento das
fases de monitoramento, verificação e elaboração de relatórios, segundo os
critérios definidos pelo Painel de Metodologia e pelas decisões das
Conferências das Partes/Encontro das Partes (COP/MOP);
Ao final da análise, a EOD deve dar publicidade ao PDD e ao respectivo Relatório de
Validação, com devido resguardo das informações julgadas confidenciais, concomitante ao
encaminhamento de toda a documentação ao Conselho Executivo do MDL, procedimento
que encerra a fase de validação.
2.1.3 Aprovação do PDD pela Autoridade Nacional Designada
A próxima etapa (etapa 3) consiste no encaminhamento do PDD, juntamente com a
manifestação (Relatório de Validação) da EOD à aprovação da Autoridade Nacional
Designada, que no caso do Brasil é a Comissão Interministerial para Mudanças Globais do
Clima – CIMGC, responsável, dentre outras atribuições, pelo credenciamento e
reconhecimento oficial das EOD.
A CIMGC foi criada com a edição do Decreto de 7 de julho de 1999, alterado pelo
Decreto de 10 de janeiro de 2006 e é composta por representantes dos seguintes
Ministérios: Ciência e Tecnologia; Meio Ambiente; Relações Exteriores; Agricultura,
Pecuária e Abastecimento; Transportes; Planejamento, Orçamento e Gestão;
Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior; Cidades; Fazenda e Casa Civil da
Presidência da República. A presidência e a vice-presidência da Comissão cabem aos
Ministérios de Ciência e Tecnologia e Meio Ambiente, respectivamente.
A Comissão, na qualidade de Autoridade Nacional Designada, assume um papel de
extrema relevância na aprovação de projetos de MDL, uma vez que representa formalmente
50
o Brasil junto à ONU em assuntos relacionados a mudanças climáticas e desenvolvimento
sustentável. As Atribuições da Comissão estão descritas no Art. 3º do Decreto de 10 de
janeiro de 2006, às quais envolvem:
� Emitir parecer, sempre que demandado, sobre propostas de políticas setoriais,
instrumentos legais e normas que contenham componente relevante para a
mitigação das mudanças globais do clima e para a adaptação do país aos seus
impactos;
� Fornecer subsídios às proposições do Governo nas negociações sob a égide
da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas e
instrumentos subsidiários de que o Brasil seja Parte;
� Definir critérios de elegibilidade adicionais àqueles considerados pelos
Organismos da Convenção, encarregados do Mecanismo de Desenvolvimento
Limpo (MDL), previsto no Artigo 12 do protocolo de Quioto da Convenção-
Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, conforme estratégias
nacionais de desenvolvimento sustentável;
� Apreciar pareceres sobre projetos que resultem em redução de emissões e que
sejam considerados elegíveis para o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo
(MDL) e aprová-los, se for o caso;
� Realizar articulação com entidades representativas da sociedade civil, no
sentido de promover as ações dos órgãos governamentais e privados, em
cumprimento aos compromissos assumidos pelo Brasil perante a Convenção-
Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas e instrumentos
subsidiários de que o Brasil seja parte;
� Aprovar seu regimento interno.
A manifestação formal da Comissão no processo de aprovação dos PDD deve conter,
ainda, declarações expressas de que o projeto sob análise:
� É originário de uma Parte que tenha ratificado o Protocolo de Quioto;
� É de iniciativa voluntária do proponente;
� Contribui para o desenvolvimento sustentável da Parte hospedeira.
51
A Comissão, para cumprimento de sua atribuição de atestar a contribuição do projeto
para o desenvolvimento sustentável do país, se utiliza, em sua manifestação, de cinco
critérios básicos:
� Distribuição de renda;
� Sustentabilidade ambiental local;
� Desenvolvimento das condições de trabalho e geração líquida de emprego;
� Capacitação e desenvolvimento tecnológico;
� Integração regional e articulação com outros setores.
Cumpridos os requisitos inerentes à aprovação pela Autoridade Nacional Designada, o
PDD segue para registro pelo Conselho Executivo do MDL.
2.1.4 Registro do Projeto pelo Conselho Executivo do MDL
O registro da Atividade de Projeto (etapa 4) é a aceitação formal, pelo Conselho
Executivo do MDL, do projeto validado e aprovado pelas autoridades competentes como
projeto de MDL. É pré-requisito para as etapas de verificação, certificação e emissão dos
CERs.
Para fins de registro do PDD, o Conselho Executivo recebe o apoio institucional da
Secretaria Executiva da Convenção-Quadro, que se responsabiliza pela análise da
documentação quanto ao cumprimento dos requisitos impostos pelas regras vigentes, assim
como da comprovação de recebimento da taxa de registro de projetos, paga pelos
Participantes dos Projetos, cujos montantes são utilizados para cobertura dos custos
administrativos do Comitê. Segundo o IGES op. cit., p. 35, a taxa de registro (registration
fee) é calculada em função da expectativa de redução de emissões de GEE durante o
período de obtenção de créditos, conforme quadro a seguir:
52
Expectativa média anual de redução de emissões (t-CO 2)
Taxa de registro (USD)
10.000 -- 15.000 1.500,00 30.000 4.500,00 100.000 18.500,00
1.000.000 198.500,00 1.757.500 350.000,00 3.000.000 350.000,00
Quadro 6 – Valores da taxa de registro de projetos de MDL Fonte: Adaptado de CDM in Charts – IGES – novembro 2007
2.1.5 Monitoramento do Projeto
O monitoramento (etapa 5) é a fase em que os Participantes do Projeto implementam
o plano de monitoramento de emissões de GEE contido no PDD, que deve estar de acordo
com a metodologia previamente validada e aprovada ou, se utilizada nova metodologia, a
mesma deverá ser justificada e submetida novamente para validação.
O plano de monitoramento inclui a forma de coleta e armazenamento de todos os
dados necessários para calcular a redução das emissões de GEE observadas dentro do
período de obtenção de créditos (ciclo do projeto), apuradas de acordo com a metodologia
de linha de base estabelecida no PDD, e que tenham ocorrido dentro dos limites do projeto
(Project Boundary) ou fora desses limites, desde que sejam atribuíveis à atividade de projeto
(fuga de emissões). Os termos colocados entre parênteses nesse parágrafo, considerados
relevantes para fins de melhor compreensão do plano de monitoramento, serão
conceituados a seguir.
Fugas de emissões ou emissões fugitivas (leakages) são aquelas relacionadas ao
aumento de emissões de GEE decorrentes da implantação das Atividades de Projetos e que
ocorram fora dos limites físicos dos projetos. Por serem emissões adicionais (e
mensuráveis), são consideradas como impactos negativos advindos das Atividades de
Projetos às quais, segundo a regra do MDL, devem ser deduzidas da quantidade total de
CERs a ser calculada ao longo dos períodos de obtenção de créditos do projeto.
O limite do projeto corresponde à área onde a Atividade de Projeto será implantada e
onde devem ser mensuradas todas as emissões de GEE significativas e atribuíveis ao
projeto, segundo as metodologias adotadas no PDD.
53
O ciclo das Atividades de Projetos, por sua vez, refere-se aos períodos de obtenção
dos créditos de carbono associados às reduções de emissões de GEE. Pode ser flexível,
com período inicial de sete anos, sujeito a no máximo duas renovações (total de 21 anos),
desde que a linha de base ainda seja válida ou tenha sido revista e atualizada, ou fixo, com
período único de dez anos.
A etapa de monitoramento é encerrada com o cumprimento de todas as fases do
plano de monitoramento proposto pelos Participantes dos Projetos quando da submissão do
PDD.
2.1.6 Verificação/Certificação das reduções de emissões de GEE
A verificação (etapa 6) é a revisão independente e periódica e a apuração ex post,
efetuada pela EOD, das reduções monitoradas das emissões antrópicas de GEE que
ocorreram em conseqüência da Atividade de Projeto.
A certificação, por sua vez, é a garantia, dada por escrito pela EOD de que, durante o
período de obtenção de créditos, a Atividade de Projeto em operação atingiu efetivamente
as reduções de emissões antrópicas de GEE, conforme previsto no PDD e verificado
quando da implantação do plano de monitoramento.
A EOD verificará se as reduções de emissões de GEE monitoradas realmente
ocorreram como resultado da Atividade de Projeto do MDL. A certificação formal será
baseada no relatório de verificação e será considerada definitiva 15 (quinze) dias após ter
sido recebida pelo Conselho Executivo. Esta certificação garante que as reduções de
emissões de GEE foram de fato adicionais às que ocorreriam na ausência da atividade de
projeto. A declaração da certificação é enviada aos participantes da Atividade de Projeto, às
Partes envolvidas e ao Conselho Executivo e, posteriormente, tornada pública.
Para fins de verificação e certificação das Atividades de Projetos, a EOD deverá:
promover a checagem da metodologia e dos demais documentos que integram o PDD;
apurar quantitativamente as reduções de emissões de GEE; providenciar e disponibilizar o
Relatório de Verificação para os participantes; realizar inspeções de campo; entrevistar os
Participantes do Projeto e os atores locais; coletar dados e medições; observar práticas
estabelecidas; testar a acurácia dos equipamentos de monitoramento; dentre outros.
54
Com a certificação, torna-se possível requerer ao Conselho Executivo a emissão dos
CERs relativos à quantidade de GEE reduzida e/ou removida, última etapa do processo.
2.1.7 Emissão dos CERs pelo Conselho Executivo do MDL
A solicitação para emissão dos CERs equivalentes ao volume de redução de emissões
apurado durante o período de geração de créditos da Atividade de Projeto é encaminhado
ao Conselho Executivo do MDL juntamente com o Relatório de Certificação elaborado pela
EOD.
A emissão dos CERs ocorrerá 15 (quinze) dias após o recebimento da solicitação,
podendo esse prazo ser interrompido caso uma das Partes envolvidas na Atividade de
Projeto ou pelo menos três membros do Conselho Executivo requisitem a revisão dos
documentos, por motivos ou suspeitas de fraude, mau procedimento ou equívocos técnicos
no Relatório da EOD. Nesse caso, o Conselho Executivo tem um prazo adicional de 30
(trinta) dias para efetuar as eventuais revisões e propor os ajustes necessários, quando e se
for o caso.
O registro e a movimentação de todos os CERs emitidos pelo Conselho Executivo do
MDL são realizados e acompanhados por um órgão subsidiário ao Conselho, denominado
Administrador do Registro do MDL. O registro inicial da totalidade dos CERs gerados a partir
das Atividades de Projeto é realizado em uma conta de custódia provisória mantida junto ao
Sistema de Registros do MDL. A distribuição dos CERs para as contas específicas das
Partes e respectivos Participantes dos Projetos indicados no documento “Acordo de
Distribuição”, integrante do PDD, se dá somente após a dedução da parcela equivalente a
2% do total dos CERs emitidos, que será integralizada em um fundo de adaptação
destinado a ajudar os países mais vulneráveis a se adaptarem aos efeitos adversos das
mudanças do clima.
Segundo o IGES op. cit., p. 41, além dessa dedução, é também pré-requisito para a
distribuição dos CERs o pagamento de uma taxa para cobertura de despesas
administrativas do MDL, estabelecida pelo Conselho Executivo, nos seguintes valores:
� USD 0.10 por CER emitido, para as primeiras 15 mil tCO2 equivalentes de
reduções anuais de emissões;
55
� USD 0.20 por CER emitido, para o volume anual de redução de emissões que
exceder 15 mil tCO2 equivalentes.
Os CERs distribuídos originalmente para os Participantes de Projetos autorizados
pelas Partes não incluídas no Anexo I da CQNUMC (developing countries) permanecem
registrados no Sistema de Registro do MDL. As Partes incluídas no Anexo I (developed
countries) podem requerer a transferência dos CERs recebidos para os respectivos
Sistemas Nacionais de Registro (p.ex: União Européia e Reino Unido), caso sua operação
esteja autorizada pela Convenção. Em ambos os casos, os CERs emitidos passam a
compor o rol de ativos ambientais negociáveis no promissor Mercado de Carbono, a ser
melhor explorado e detalhado no Capítulo 3 desta monografia.
Vencidas as considerações acerca das fases processuais de concepção e aprovação
dos projetos formatados à luz dos requisitos e procedimentos exigidos pela CQNUMC, que
ao final do processo de certificação possibilitam a emissão dos CERs, passemos a discorrer,
na seção a seguir, sobre a situação atual e as estatísticas do MDL no Brasil e no mundo.
2.2 O MDL NO BRASIL E NO MUNDO
Numa visão global, e segundo dados do Ministério da Ciência e Tecnologia - MCT
(2008), o Brasil ocupa a terceira posição em termos de estimativas de reduções de
emissões de GEE decorrentes da implantação de projetos de MDL, sendo atribuível ao país
a redução de 271,4 milhões de toneladas de CO2, o que corresponde a 6% do total mundial,
para o primeiro período de obtenção de créditos, que pode ser de no máximo 10 anos para
projetos de período fixo ou de 7 anos para projetos de período renovável (por no máximo
três períodos de 7 anos, totalizando 21 anos). A China ocupa o primeiro lugar, com redução
de 2.149,2 milhões de toneladas de CO2 (50%), seguida pela Índia, com 966,9 milhões de
toneladas de CO2 (22%) projetadas para o primeiro período de obtenção de créditos. A
quarta posição é ocupada pela Coréia do Sul, responsável por 3% das reduções de
emissões projetadas.
A grande participação desses países asiáticos no potencial de redução de emissões
de GEE está relacionada a ajustes estruturais em sua matriz energética, baseada na queima
de combustíveis fósseis, cuja substituição por fontes renováveis possibilita a redução de
volumes substanciais de emissões. A figura a seguir ilustra a participação dos principais
56
países, expressa em termos percentuais sobre o total de emissões projetadas para o
primeiro período de compromisso.
Reduções de Emissões (4.314 milhões de t CO2 eq)
China 50%
Índia 22%
Brasil 6%
Coréia do Sul 3%
Outros 19%
China Índia Brasil Coréia do Sul Outros
Figura 2 – Reduções de emissões de GEE para o primeiro período de compromisso Fonte: Ministério da Ciência e Tecnologia. Dados de 13.1.2008.
Em termos de número de projetos já formalmente registrados no Conselho Executivo
do MDL, as estatísticas colhidas até 13 de janeiro de 2008 apontam para um total de 833
projetos, cabendo à Índia a maior participação, com 276 projetos, seguida pelo Brasil, com
140 projetos e logo após a China, com 109. A quarta e quinta posições são ocupadas pelo
México (92 projetos) e Malásia (25 projetos).
A liderança da Índia sobre a China nesse quesito está associada ao menor porte e
maior dispersão dos projetos de geração de energia a partir de fontes renováveis. A figura a
seguir mostra a participação percentual dos principais países em termos do total de projetos
de MDL registrados.
57
Número de Projetos Registrados no MDL (833)
Índia 33%
Brasil 17%China 13%
México 11%
Malásia 3%
Outros 23%
Índia Brasil China México Malásia Outros
Figura 3 – Número de projetos de MDL registrados no Brasil Fonte: Ministério da Ciência e Tecnologia. Dados de 13.1.2008
Com relação ao Brasil, as principais estatísticas relacionadas à situação do país em
projetos de MDL permitem ilustrar diversas abordagens, dentre as quais: a distribuição das
Atividades de Projetos por segmento de mercado; por tipo de metodologia utilizada ou porte
do projeto (larga ou pequena escala) e; por unidade da federação onde encontram-se
situadas.
Segundo o MCT (2008), em se tratando de segmentos de mercado, as Atividades de
Projetos em desenvolvimento no Brasil apresentam-se na seguinte distribuição, expressa
em termos de quantidade de projetos e potencial de redução de GEE:
Projetos em validação/aprovação
Nº de projetos
Redução anual de emissão (ton CO2)
Redução de emissão no 1º período
de obtenção do crédito (ton CO2)
% no total de projetos
% no total de
redução de
emissão
% no 1º período de obtenção de crédito
Geração Elétrica 163 17.475.306 125.010.350 62% 48% 46%
Suinocultura 40 2.035.369 19.859.509 15% 6% 7%
Aterro sanitário 28 8.788.633 66.079.247 11% 24% 24%
Indústria manufatureira 12 1.861.603 14.205.216 5% 5% 5%
Eficiência energética 10 68.730 548.526 4% 0% 0%
Resíduos 2 82.300 576.100 1% 0% 0%
N2O 4 6.315.167 44.206.169 2% 17% 16%
Indústria química 1 17.137 119.960 0% 0% 0%
Produção de metais 1 80.286 802.862 0% 0% 0%
TOTAL 261 36.724.531 271.407.939 100% 100% 100%
Quadro 7 – Distribuição das Atividades de Projetos de MDL em desenvolvimento no Brasil Fonte: Ministério da Ciência e Tecnologia. Dados de 13.1.2008.
58
O quadro anterior demonstra que o maior número de projetos brasileiros é
desenvolvido na área de geração elétrica e, em seguida, suinocultura, os quais representam
a maioria das Atividades de Projetos (77%). Os segmentos com maior poder de redução de
toneladas de carbono são os de aterros sanitários, geração elétrica e de redução de N2O os
quais, juntos, representam 89% do total de redução de emissões das Atividades de Projetos
brasileiras. Vale destacar que o número de projetos submetidos à validação da CIMGC tem
aumentado consideravelmente ao longo dos anos, passando de cerca de 100 projetos ao
final de 2005 para quase 250 projetos em outubro de 2007.
Com relação ao tipo de metodologia utilizada, definida em razão do porte do projeto e
do seu potencial de redução de emissões de GEE, temos, no Brasil, uma maior participação
de Atividades de Projeto enquadradas na metodologia de Larga Escala, associadas, em
maior proporção, a iniciativas de natureza privada em projetos industriais e de geração de
energia a partir de biomassa ou público/privada em projetos de recuperação de metano em
aterros sanitários. A metodologia de pequena escala está associada a Atividades de
Projetos de geração de energia a partir de Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCH) e de
recuperação de metano em suinocultura.
A figura a seguir ilustra a distribuição de projetos em função da metodologia utilizada.
Projetos no Brasil - Metodologia Utilizada
Larga Escala 56%
Pequena Escala 44%
Larga Escala Pequena Escala
Figura 4 – Projetos de MDL por metodologia utilizada Fonte: Ministério da Ciência e Tecnologia. Dados de 13.1.2008
59
A distribuição geográfica das Atividades de Projetos em desenvolvimento no Brasil
mostra que a maioria delas está situada nas regiões sudeste e sul, com destaque para os
estados de São Paulo, Minas Gerais e Rio Grande do Sul, que, juntos, concentram quase a
metade do total de projetos. Não por coincidência, os estados mais representativos em
termos de projetos de MDL são os que também apresentam os melhores indicadores
econômicos e índices de desenvolvimento.
Essa relação entre projetos de MDL e nível de renda e desenvolvimento explica-se,
em parte, pela alta complexidade e elevado custo de implantação dos projetos, assim como
pelo maior enforcement3 desses estados no cumprimento de exigências legais, associado a
um maior nível de restrições impostas pelo mercado consumidor no tocante à certificação de
produtos e serviços ambientais. As participações dos principais estados, expressas em
termos de percentuais da quantidade total de projetos de MDL em desenvolvimento no
Brasil são ilustradas na figura a seguir:
Distribuição geográfica projetos MDL no Brasil
SP; 24%
MG; 14%
RS; 10%MT; 9%SC; 7%
PR; 6%
GO; 6%
RJ; 4%
Outros; 20%
SP MG RS MT SC PR GO RJ Outros
Figura 5 – Distribuição geográfica de projetos de MDL no Brasil Fonte: Ministério da Ciência e Tecnologia. Dados de 13.1.2008
Apresentadas as principais estatísticas sobre a situação do MDL no Brasil e no
mundo, passemos a seguir à exposição do caso “Plantar”, empresa florestal sediada em
Minas Gerais, voltada à produção sustentável de ferro-gusa via processo siderúrgico movido
a carvão vegetal, e considerada referência em termos de projetos brasileiros de MDL.
3 O termo enforcement não tem um equivalente na língua portuguesa e se refere aos meios de imposição ou de
ajuda para que os Estados cumpram com suas obrigações para com os Tratados.
60
2.3 O CASO “PLANTAR”
O grupo Plantar4 iniciou suas operações no ano de 1967, na região de Curvelo, Minas
Gerais, com a criação da Plantar S/A Reflorestamentos, que tem como foco de negócios a
Gestão de Florestas, incluindo todas as práticas silviculturais, desde a administração de
viveiro de mudas, passando pelo plantio e manutenção das árvores, até a formação
completa das florestas de eucalipto e de pinus. Tem como clientes as principais indústrias
nacionais de celulose, de painéis de madeira, indústrias siderúrgicas e de lápis.
Em 1985, entrou em operação a Plantar Siderúrgica S.A., empresa do grupo Plantar
destinada à produção de ferro gusa de qualidade e de alta aplicabilidade, com atuação nos
mercados brasileiro e internacional. Os investimentos em tecnologias limpas de produção e
na auto-sustentabilidade fazem hoje da marca Plantar uma referência nacional como modelo
de siderurgia a carvão vegetal, baseado nos mais modernos conceitos de proteção ao meio
ambiente.
Com a adoção e ratificação, pelo Brasil, do Protocolo e Quioto, que instituiu o MDL
como mecanismo de flexibilização passível de utilização por economias em
desenvolvimento, a Plantar, em parceria com o Fundo Protótipo de Carbono (em inglês
Prototip Carbon Fund – PCF) do Banco Mundial, criou e vem implementando o Projeto
Plantar de Carbono.
O objetivo geral do Projeto é reduzir as emissões de GEE por meio do
estabelecimento de plantios sustentáveis de florestas de eucalipto para suprir o uso de
carvão vegetal na produção de ferro primário, ao invés de coque de carvão mineral ou
biomassa não-renovável. Ao longo de 28 anos, o Projeto diminuirá a concentração de CO2
na atmosfera em aproximadamente 12,8 milhões de toneladas equivalentes. O PCF já
comprou parte desses créditos da Plantar numa operação pioneira que contou com o apoio
financeiro do Rabobank International.
O Projeto Plantar proporciona a redução e remoções de emissões de carbono por
meio de quatro atividades de projeto, parcialmente integradas. Conforme uma das decisões
do Protocolo de Quioto (Decisão 19/CP.9 - instituída após a data de início do Projeto), os
créditos da atividade florestal devem ser contabilizados separadamente dos créditos das
atividades industriais. A maior parte dos créditos é produzida pelas atividades industriais e
4 Informações e dados extraídos de www.plantar.com.br. Pesquisa realizada em 8.2.2008.
61
uma parte menor é proveniente do carbono estocado nas florestas plantadas, durante toda a
vida útil do Projeto. As Atividades de Projetos são as seguintes:
� Atividade Florestal : remoção e estoque de CO2 em 23.100 hectares de
plantios sustentáveis de eucalipto, estabelecidos em áreas que estariam
ocupadas por pastagem na ausência do projeto (conforme provisões de não-
permanência da Decisão 19/CP.9 – t’CERs ou l’CERs);
� Atividade de Carbonização: mitigação das emissões de CH4 no processo de
produção do carvão vegetal (carbonização da madeira). Uma pesquisa
científica, especialmente desenvolvida para o Projeto, permitiu a mitigação de
metano através de melhorias na eficiência do processo de produção;
� Atividade de Produção de Ferro Gusa: emissões evitadas de CO2 no
processo de produção do ferro gusa, usando carvão vegetal renovável (carbo-
neutro) ao invés de coque (carvão mineral) ou biomassa não-renovável
(florestas nativas);
� Atividade de Regeneração do Cerrado: regeneração induzida de
aproximadamente 400 hectares de vegetação nativa de cerrado em terras não-
florestadas, acima das exigências legais (esta é uma atividade-piloto, na qual
t’CERs ou l’CERs podem não ser reivindicados, conforme fatores
operacionais).
O Projeto é pautado pelos mais altos padrões de sustentabilidade, contando com
diversos indicadores, como o monitoramento da biodiversidade nas áreas de plantios e
reservas. A siderurgia a carvão vegetal é uma excelente fonte de geração de empregos no
meio rural. No Projeto Plantar, mais de 1200 empregos diretos são gerados na região de
Curvelo, Minas Gerais. Os plantios de eucalipto e a produção de carvão vegetal são objeto
de um rígido controle sócio-ambiental, por meio de sistemas de certificação florestal e do
monitoramento do Banco Mundial. Na visão da empresa, o Projeto Plantar Carbono, além de
promover a siderurgia a carvão vegetal como uma alternativa de vanguarda na proteção do
clima, também possibilita, mediante a geração de créditos de carbono, a internalização de
variáveis sócio-ambientais de suma importância para a evolução do processo produtivo. O
Projeto é auditado por entidades independentes, que realizam rigorosas verificações
periódicas.
Uma vez que foi iniciado antecipadamente (“early started” – 2000/2001), o Projeto
Plantar já foi submetido à validação pela Comissão Interministerial para Mudanças Globais
62
do Clima, Autoridade Nacional Designada para projetos de MDL. Na época do relatório de
validação (junho 2002), as regulamentações do MDL para atividades florestais ainda não
estavam estabelecidas, motivo pelo qual a Comissão não pode emitir uma recomendação
final sobre uma das atividades do projeto (Atividade Florestal). Uma vez que as
regulamentações do MDL para uso da terra, mudança no uso da terra e florestas só foram
concluídas em 2003/2004, os documentos de concepção do Projeto, bem como as
metodologias relacionadas, foram adaptados e atualizados para submissão ao Conselho
Executivo do MDL, com o objetivo de completar o processo de validação.
Os plantios no âmbito da atividade florestal têm sido implementados desde 2000, e a
mitigação das emissões de metano na atividade de carbonização começaram em 2004. As
primeiras reduções de emissões na produção de ferro primário devem ocorrer em
2007/2008.
O grupo Plantar identifica uma série de externalidades positivas advindas da
implementação do Projeto Carbono, relacionadas a variáveis ambientais e sociais, sendo as
principais:
� Os reflorestamentos industriais manejados e monitorados segundo os
princípios e critérios do Conselho de Manejo Florestal (em inglês Forest
Stewardship Council – FSC), contribuem para a conservação da
biodiversidade, proteção da fauna, dos solos e das águas;
� O Projeto Plantar também segue um rigoroso plano de monitoramento,
elaborado pelo Banco Mundial, que contempla diversos indicadores de
sustentabilidade ambiental e social, especificamente voltados para o projeto.
Dentre os diversos aspectos ambientais monitorados pelo FSC ou pelo Banco
Mundial, destacam-se: o monitoramento de espécies de fauna local
ameaçadas de extinção; a identificação e preservação de áreas de alto valor
de conservação; o monitoramento trimestral dos aspectos físicos, químicos e
biológicos das águas que correm pelas propriedades da Plantar;
� A empresa realiza campanhas de educação ambiental em parceria com as
escolas públicas locais e comunidades vizinhas;
� Também aplica medidas intensas de prevenção a incêndios, como a
construção de torres de vigilância, realização de campanhas de
conscientização, manutenção e treinamento de brigadas anti-incêndio;
63
� A empresa adota práticas de manejo sustentável de áreas de plantio, reservas
legais e áreas de preservação permanente (cultivo mínimo, proteção do solo,
aceiros, corredores ecológicos, controle de nutrientes para o solo etc).
Os principais indicadores do Projeto Plantar são:
� Área total reflorestada: 23.100 ha;
� Área total de preservação (nativas): 8.000 ha;
� Duração do projeto: 28 anos (2001-2029);
� Carvão vegetal produzido: 10 milhões de m3;
� Total de reduções de emissões de GEE: 8,5 MtCO2e (28 anos);
� Total de remoções de CO2: 4,5 MtCO2e (28 anos);
� Redução líquida de emissões de CO2 na atividade de produção de ferro-gusa
com carvão vegetal: 3 tCO2e/tonelada de ferro-gusa;
� Geração de empregos diretos: 1200
Os benefícios quantitativos e qualitativos advindos do Projeto Plantar de Carbono
permitem-nos concluir que a iniciativa da empresa, pioneira em projetos de MDL no Brasil,
tem apresentado excelentes resultados, tanto na redução líquida das emissões de GEE,
quanto na promoção do desenvolvimento sustentável na região onde atua. Felizmente, e
para o bem de toda a sociedade, esse exemplo de atuação empresarial com forte aderência
aos princípios de responsabilidade sócio-ambiental vem sendo seguido por várias outras
empresas brasileiras, o que evidencia o grande potencial de crescimento do MDL no Brasil.
Os conceitos, processos, estatísticas e o exemplo prático (caso Plantar) vistos no
decorrer deste capítulo e do anterior foram ordenados ao longo do texto de forma a permitir
um melhor encadeamento de idéias e preparação do leitor para o conteúdo do próximo
capítulo, que tratará da estrutura e das formas de operação dos principais regimes de
negociação de créditos de carbono em vigor, que serão detalhados nos seus aspectos mais
relevantes, com vistas a subsidiar a resposta do autor à pergunta formulada quando da
apresentação do objetivo principal deste trabalho: o mercado de carbono é de fato uma
ferramenta eficaz de auxílio à mitigação das mudanças climáticas e de promoção do
desenvolvimento sustentável mundial?
64
3 O MERCADO DE CRÉDITOS DE CARBONO: UM GIGANTE EM F ORMAÇÃO
Conhecer o mercado de carbono requer, de início, uma análise sobre os interesses
gerais que nortearam a sua criação a qual passa, necessariamente, pela caracterização dos
principais atores envolvidos. Requer, também, que se conheça a dinâmica por meio da qual
o mercado se movimenta e se desenvolve, suas estruturas de preços, formas e ambientes
de negociação e, sobretudo, a caracterização dos ativos transacionados entre os
participantes do mercado que, no caso, são os conhecidos e cada dia mais cobiçados
“créditos de carbono”.
Em linhas gerais, a dinâmica do mercado de qualquer bem, serviço ou mercadoria
depende, essencialmente, dos interesses particulares ou coletivos dos diversos atores
envolvidos, que no caso do mercado de ativos ambientais são: (i) os governos, que atuam
como agentes reguladores e fiscalizadores das ações públicas e privadas em prol do bem
estar comum; (ii) as empresas e corporações, que são os entes responsáveis pela geração
de ativos e passivos ambientais quando do desenvolvimento de suas operações e; em
última análise, (iii) todos os cidadãos do planeta, que percebem, em seu dia a dia, os
benefícios, os custos e as conseqüências da atuação dos governos e das corporações.
O mercado de carbono surgiu a partir do interesse geral da humanidade em garantir a
sustentabilidade da vida na Terra. Os efeitos danosos da ação antrópica desordenada sobre
o meio ambiente, agora cientificamente comprovados, alcançaram níveis alarmantes a partir
do final do século passado, fazendo com que os governos, as organizações e os cidadãos
passassem a priorizar as discussões e ações concretas voltadas ao controle e à mitigação
do chamado efeito estufa, responsável pelo desencadeamento das severas e preocupantes
mudanças climáticas em curso, e causado pela emissão descontrolada de carbono na
atmosfera.
Os principais mercados voluntários de carbono derivam de experiências iniciadas
desde a década de 1970, sobretudo por países desenvolvidos em busca do cumprimento de
compromissos locais de redução de emissões de GEE ou outros gases poluentes. A
experiência americana voltada à redução do impacto dos gases Clorofluorcarbonados (CFC)
na camada de ozônio é o melhor exemplo e o ponto de partida para as iniciativas globais
relacionadas à redução das emissões de dióxido de carbono (CO2).
A partir desse interesse geral, e com base nas metas de redução de emissões de GEE
instituídas pelo principal instrumento jurídico sobre mudanças climáticas – o Protocolo de
65
Quioto, foram criados, formalmente, e também no âmbito desse importante Tratado,
mecanismos e esquemas de mercado voltados a auxiliar as Partes a cumprirem os
compromissos obrigatórios assumidos.
Numa sociedade global, onde as economias dominantes adotam o capitalismo como
modelo econômico hegemônico, a busca da sustentabilidade ambiental se pautou, por
conseqüência, na criação de mecanismos de mercado baseados numa das principais
características desse modelo: a geração de “lucro” ou vantagens financeiras, que, no caso
do mercado de carbono, advém do diferencial de preços dos ativos ambientais, ou, em
outras palavras, do diferencial de custos de implantação das ações voltadas à redução de
emissões de Gases do Efeito Estufa.
Segundo Rocha op. cit., p. 38, a idéia básica é de que a redução, estabilização e/ou
eliminação de um determinado poluente pode ser alcançada através da comercialização de
créditos de redução e/ou permissões de emissões entre as empresas poluidoras. Esse
comércio faz com que as empresas tenham maior flexibilidade no cumprimento das metas
ambientais estabelecidas pela legislação vigente. Outra vantagem desse modelo é que, com
a sua utilização, o poder público fica apenas encarregado de definir os objetivos ambientais
a serem alcançados, monitorar e penalizar os infratores; enquanto que a escolha dos
melhores meios para se atingir os objetivos fica a cargo das próprias empresas, que irão
sempre buscar a melhor relação custo/benefício.
Capoor & Ambrosi (2007, p. 8), afirmam que as transações no mercado de carbono
são realizadas por meio de contratos, devidamente registrados e reconhecidos, onde uma
determinada parte paga a uma outra parte pelo crédito proveniente da redução de emissões
de GEE ou pelo direito de emitir um determinado volume de GEE, ambos gerados a partir
dos excedentes obtidos pela parte vendedora vis a vis seus próprios compromissos de
redução de emissões. O comprador, por sua vez, utiliza os créditos adquiridos para
cumprimento de parte de seus compromissos de redução de emissões, em complemento
aos resultados obtidos a partir da implementação de medidas domésticas. Os meios de
pagamento utilizados nas transações de carbono são os mais variados: dinheiro, ações,
dívida, investimento/transferência de tecnologia e outros.
Em função das origens dos créditos negociáveis entre os países e empresas, as
operações do mercado de carbono podem ser segmentadas em dois grandes grupos: (i)
transações baseadas em permissões de emissões de GEE (allowance based transactions)
e; (ii) transações baseadas em projetos de redução de emissões de GEE (project based
transactions).
66
Permissões de emissões são créditos de carbono criados e emitidos por governos
(Partes), sob a forma escritural, via colocação direta ou por leilões, em favor de empresas,
setores ou outras Partes, que negociam esses créditos entre si para fins de cumprimento de
seus compromissos de redução de emissões. O volume de permissões emitidas é calculado
a partir das metas ou limites de emissões estabelecidos em acordos firmados entre as
Partes, os quais são mensurados, avaliados e revistos periodicamente.
Créditos de carbono relacionados a projetos de redução de emissões são aqueles
originários de Atividades de Projetos, cuja implementação possibilite a redução comprovada
e mensurável de reduções de emissões, quando comparada a um cenário de não
implementação desses projetos. Requer, portanto, que seja verificável a adicionalidade do
projeto frente ao cenário atual (ou cenário base) em termos de redução de emissões de
GEE, para que só então seja autorizada a emissão dos créditos pelas autoridades
competentes.
Após a emissão, os créditos derivados de projetos passam a estar disponíveis para
negociações secundárias e, nesse momento, assumem as mesmas condições de
negociabilidade que os créditos originários de permissões de emissões. A diferença entre
eles está associada aos riscos inerentes ao processo de certificação e emissão dos créditos
derivados de projetos (riscos institucionais, metodológicos, de monitoramento e outros),
além dos custos relacionados às respectivas etapas do processo, que necessariamente
geram impactos nos retornos financeiros das transações e diferenças nos preços de
mercado desses ativos.
Além dessa segregação, relacionada à origem dos créditos, pode-se analisar o
mercado de carbono segundo a aderência ou não dos mecanismos de flexibilização,
também chamados de regimes de negociação, aos Tratados que versam sobre o
aquecimento global e mudanças climáticas, especificamente à Convenção-Quadro das
Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas e ao Protocolo de Quioto. Os regimes de
negociação de créditos de carbono previstos no Protocolo de Quioto são: A Implementação
Conjunta (Joint Implementation), o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (Clean
Development Mechanism) e o Comércio de Emissões (Emission Trading).
Os regimes de negociação de carbono não incluídos no Protocolo de Quioto formam o
grupo de regimes que integram o chamado mercado voluntário de carbono, assim
denominado em razão da não vinculação dos participantes aos critérios, exigências, metas
compulsórias e metodologias impostas às Partes que ratificaram o referido Tratado. As
67
regras de funcionamento do mercado voluntário são definidas a partir de acordos regionais,
normalmente mais flexíveis que aquelas estabelecidas por Quioto.
Pode-se colocar como ponto comum a informação de que todos os regimes de
negociação de carbono, sejam eles voluntários ou formais (Quioto), surgiram a partir da
necessidade de redução de emissões de GEE. Conforme já colocado anteriormente, as
experiências regionais nesse sentido foram iniciadas desde a década de 1970, sobretudo
por países desenvolvidos em busca do cumprimento de compromissos locais de redução de
emissões de GEE ou outros gases poluentes, e atingiram maiores níveis de
desenvolvimento e importância a partir da comprovação científica dos efeitos da emissão
desordenada de GEE na estabilidade climática, consensuada e mais difundida globalmente
a partir da instauração, em 1988, do painel Inter-Governamental sobre Mudanças Climáticas
– IPCC.
No mercado voluntário de carbono, as permissões de emissões ou reduções de
emissões são igualmente transacionadas para cumprimento de metas setoriais ou regionais
de redução da concentração de GEE. Esse mercado, representado por importantes regimes
de negociação de carbono, começou a se instaurar mesmo antes da vigência do primeiro
período de compromisso do Protocolo de Quioto. Por meio desses mecanismos, diversos
governos e empresas vêm adotando medidas de redução de emissões de GEE e
implementando mecanismos de flexibilização e comércio de permissões de emissões, só
que de natureza não vinculante.
Merecem destaque: (i) o Esquema de Comércio de Emissões do Reino Unido (United
Kingdom Emissions Trading Scheme - UK ETS), regime voluntário do tipo Cap and Trade,
criado em 2002, que estabelece um teto máximo para fontes de emissão de larga escala,
sobretudo entre empresas do setor de energia situadas na Grã Bretanha; e (ii) o Esquema
de Comércio de Emissões da União Européia (European Union Emissions Trade Scheme –
EU ETS), iniciado em janeiro de 2005, e tido hoje como um dos mais atuantes esquemas de
comércio de créditos de carbono em termos de volumes e valores negociados, cujo
desenvolvimento, apesar de ter se antecipado à vigência do Protocolo de Quioto, baseou-se
nas metas de redução de emissões estabelecidas no âmbito desse importante Tratado.
Além das iniciativas voluntárias conduzidas por nações européias, são de especial
relevância os programas em operação desenvolvidos pela Austrália (Australia’s New South
Wales Greenhouse Gas Abatement Scheme – NSW GGAS) e pela Bolsa do Clima de
Chicago (Chicago Climate Exchange), nos Estados Unidos.
68
Os conceitos e características mais relevantes dos regimes formais e voluntários de
negociação de créditos de carbono, assim como as estatísticas dos negócios em termos de
preços e volumes serão apresentados nas seções 3.1 e 3.2, respectivamente.
3.1 OS PRINCIPAIS REGIMES DE NEGOCIAÇÃO DE CARBONO
A seção anterior trouxe à tona duas formas de segregação dos regimes de
flexibilização e negociação que compõem o mercado de carbono. Esses regimes podem ser
segregados em função da origem dos créditos de carbono, os quais são gerados a partir de
permissões de emissões – allowance based market ou de projetos de reduções de emissões
– project based market ou; em função da vinculação formal dos mecanismos de
flexibilização ao Protocolo de Quioto (mercado formal – Quioto ou mercado voluntário).
Nesta seção serão apresentadas as principais características de cada regime ou esquema
de negociação, agrupados em razão da origem dos créditos de carbono.
3.1.1 Regimes baseados em permissões de emissões (allowance based market - cap and
trade regime)
O único regime formal de negociação de créditos de carbono originários de
permissões de emissões é o Comércio de Emissões (Emissions Trading), instituído pelo
Art. 17 do Protocolo de Quioto.
O Comércio de Emissões, assim como os demais regimes de negociação de
permissões de emissões, é um mecanismo de flexibilização por meio do qual as Partes
estabelecem, inicialmente, limites ou permissões de emissões de GEE, expressos em
termos de tCO2e, calculados a partir das metas quantitativas estabelecidas em acordos
entre as Partes.
Após a definição desses limites, a cargo dos governos ou autoridades designadas, e
com base nas emissões reais verificadas periodicamente, é permitido o comércio das
unidades de emissões entre as Partes, com base na seguinte regra: os países que
excederem suas metas de redução de emissões a partir das ações adotadas nacionalmente
(emissões totais aquém dos limites), podem vender esses excedentes para os países que,
69
por motivos econômicos ou tecnológicos, não conseguirem atingir suas metas de redução
de emissões fixadas para um dado período de compromisso (emissões além dos limites).
Os créditos de carbono negociáveis no âmbito do Comércio de Emissões são denominados
Unidades de Emissões Designadas (em inglês Assigned Amount Units – AAU) que
correspondem, na prática, ao limite de emissões (meta) atribuído a cada Parte.
Esse regime de limitação de emissões e posterior negociação dos excedentes de
permissões de emissões é conhecido internacionalmente como Cap and Trade regime.
Todos os regimes de negociação dessa natureza são exclusivos para países desenvolvidos,
incluídos no Anexo I da CQNUMC.
Vele destacar que o Comércio de Emissões permite também a negociação, entre as
Partes incluídas no Anexo B, de outros créditos de carbono originários do Protocolo de
Quioto, mesmo que derivados de projetos de redução ou captura de GEE (CER-RMU/CDM
e ERU/JI), desde que observados certos limites e condições.
A vantagem de utilização do Comércio de Emissões, expressa em termos de menores
custos de redução de emissões de GEE, pode ser comprovada pelos quadros a seguir, que
ilustram uma situação hipotética simulada entre duas Partes Anexo I.
Variáveis Parte X Parte Y Total Antes do CE: Limite de emissões 10 8 18 Negociação de AAU -- -- -- Depois do CE: Limite de emissões 10 8 18 Emissão real de GEE 12 10 22 Necessidade de redução de emissões 2 2 4 Custo unitário de redução de emissões $ 200 $ 100 -- Custo total de redução de emissões $ 400 $ 200 $ 600 Custo do Comércio de Emissões -- -- -- Custo total de cumprimento das metas $ 400 $ 200 $ 600
Quadro 8 - Resultado da redução de emissões de GEE sem o Comércio de Emissões Fonte: adaptado de CDM in Charts ver.4.0 novembro 2007
Variáveis Parte X Parte Y Total Antes do CE: Limite de emissões 10 8 18 Negociação de AAU 1 -1 0 Depois do CE: Limite de emissões 11 7 18 Emissão real de GEE 12 10 22 Necessidade de redução de emissões 1 3 4 Custo unitário de redução de emissões $ 200 $ 100 -- Custo total de redução de emissões $ 200 $ 300 $ 500 Custo do Comércio de Emissões $ 150 $ -150 0 Custo total de cumprimento das metas $ 350 $ 150 $ 500
Quadro 9 - Resultado da redução de emissões de GEE com o Comércio de Emissões Fonte: adaptado de CDM in Charts ver.4.0 novembro 2007
70
Além do Comércio de Emissões (Quioto), existem outros regimes de negociação
baseados no comércio de permissões de emissões (allowance based market), que, por não
estarem diretamente vinculados às regras do Protocolo, são classificados como regimes
voluntários de carbono.
O principal e mais representativo regime voluntário de comércio de permissões de
emissões é o Esquema de Comércio de Emissões da União Européia ( European Union
Emissions Trading Scheme – EU ETS), iniciado em janeiro de 2005 e tido hoje como um
dos mais atuantes esquemas de comércio de créditos de carbono em termos de volumes e
valores negociados. Apesar de ter sido lançado antes da vigência do primeiro período de
compromisso do Protocolo de Quioto (2008-2012), e por isso estar enquadrado como
regime voluntário de comércio de carbono, baseou-se nas metas de redução de emissões
estabelecidas no âmbito do referido Tratado, e vem atuando estrategicamente como
mecanismo de antecipação das ações européias para cumprimento das metas formais de
redução de emissões. Os créditos de carbono negociados no âmbito do EU ETS são
denominados Permissões de Emissões da União Européia (em inglês European Union
Allowances – EUA).
O EU ETS foi lançado em 1º de janeiro de 2005 como a pedra fundamental da política
ambiental européia em direção aos compromissos de redução de emissões de GEE
estabelecidos no âmbito do Protocolo de Quioto. Foram definidas três fases ou períodos de
compromisso para o EU ETS, sendo: Fase I - de 1º de janeiro de 2005 a 31 de dezembro de
2007; Fase II - de 1º de janeiro de 2008 a 31 de dezembro de 2012 e; Fase III – a partir de
1º de janeiro de 2013.
Segundo Capoor & Ambrosi op. cit., p. 11, na primeira fase (Fase I), foram incluídas as
permissões de emissões relacionadas a 40% do total das instalações industriais e unidades
de geração de energia reguladas pela União Européia. O limite total de emissões para essa
fase foi fixado em 6.600 MtCO2e, sendo 25% desse total alocado na Alemanha; 10% na
Inglaterra; 10% na Polônia, 10% na Itália e restante pulverizado entre os demais países da
União Européia. Os setores de energia e aquecimento receberam cerca de 55% das
permissões; 12% foram alocadas em indústrias de processamento de minerais (cimento,
vidro e cerâmica); 12% em fábricas de aço e metais; 10% em indústrias de petróleo e gás e
o restante nos demais setores menos significativos.
Os limites de emissões das Fases II e III dependerão de decisões da Comissão
Européia, que serão tomadas com base nos resultados definitivos da Fase I, atribuídos
individualmente à cada Parte e no âmbito da União Européia, a serem apurados com base
71
no inventário de emissões reais de GEE verificadas na Fase I vis a vis os limites
estabelecidos para essa fase. A análise histórica dos preços e volumes de EUA negociados
na Fase I do EU ETS será apresentada na próxima e última seção deste capítulo.
Ainda em solo europeu, outro importante regime voluntário de permissão de emissões
é o Esquema de Comércio de Emissões do Reino Unido ( United Kingdom Emissions
Trading Scheme - UK ETS), regime voluntário do tipo Cap and Trade, criado em março de
2002, que estabelece um teto máximo para fontes de emissão de larga escala, sobretudo
entre empresas do setor de energia situadas na Grã Bretanha.
O UK ETS foi o primeiro esquema doméstico de comércio de permissões de emissões
de GEE a entrar em operação. Por esse esquema, o governo britânico definiu metas de
redução de emissões de GEE, no volume de 11 MtCO2e, a serem atingidas ao longo de
quatro anos, e, como mecanismo auxiliar, negociou a emissão de permissões de emissões
de carbono, representadas por Contratos de Mudanças Climáticas (em inglês Climate
Change Agreements - CCA) em favor de companhias e indústrias exclusivamente
domésticas, que, em contrapartida a esses compromissos, recebiam desconto de até 80%
na taxa cobrada pelo governo britânico sobre o uso comercial de energia (Climate Change
Levy - CCL). Os excedentes de reduções de emissões obtidos frente às metas assumidas
poderiam ser vendidos às companhias com dificuldades de cumprimento das metas. O
descumprimento dos compromissos de redução de emissões era punido com o
cancelamento das permissões de emissões e do desconto sobre a citada taxa. Por envolver
vantagens tributárias, o UK ETS é considerado como um esquema fiscal de redução de
emissões.
Segundo Rocha op. cit., p. 50, a emissão primária no UK ETS, ocorrida por meio de
leilão, direcionou as permissões de emissões (CCA) equivalentes a 4 MtCO2e para 33
participantes, denominados Participantes Diretos, que se comprometeram a aplicar os
recursos originários do desconto da CCL (£ 215 milhões ou £ 53,37/tCO2e) em melhorias
tecnológicas voltadas à redução do consumo de energia originária de matrizes sujas
(carvão, petróleo e gás).
O período de vigência do UK ETS foi de 2002 a 2006, durante o qual os trinta e três
maiores participantes, chamados Participantes Diretos (33 Direct Participants) conseguiram
reduzir suas emissões de GEE em 7 MtCO2e por meio de iniciativas próprias, às quais,
adicionadas ao volume de permissões de emissões (CCA), permitiram o cumprimento das
metas de redução de emissões assumidas perante o governo (all in compliance).
72
Vale destacar que algumas das empresas participantes do UK ETS também se
credenciaram a participar do EU ETS, o que demonstra o elevado interesse das empresas e
países em utilizar os diversos regimes de negociação de carbono como instrumentos de
auxílio ao cumprimento das metas regionais e globais de redução de GEE.
Saindo do continente europeu, merecem destaque os esquemas de negociação de
permissões de emissões desenvolvidos pela Austrália (Australia’s New South Wales
Greenhouse Gas Abatement Scheme – NSW GGAS) e pela Bolsa do Clima de Chicago
(Chicago Climate Exchange), nos Estados Unidos.
O NSW GGAS iniciou suas operações em janeiro de 2005, com enfoque na redução
das emissões de GEE por meio da otimização do consumo e da geração de energia, a ser
alcançada a partir da implantação de atividades de geração energética de baixa emissão de
gases, redução do consumo por melhorias estruturais ou logísticas, produção de energia a
partir da queima de biomassa e outros.
Segundo Capoor & Ambrosi p. cit., p. 17. o resultado dessas atividades em termos de
redução ou estabilização de emissões de GEE frente às metas assumidas habilita as
empresas de energia a receberem créditos de carbono denominados NSW Greenhouse
Abatement Certificates (NGAC), que podem ser negociados entre participantes do programa
para fins de cumprimento de suas metas.
O período de vigência do programa é de 2005 a 2012 e as atividades a serem
implementadas com vistas ao cumprimento das metas de redução de emissões devem estar
situadas no território da capital australiana (iniciativa regional).
O NSW GGAS é o segundo mercado de créditos de carbono em termos de volumes e
valores transacionados, superado apenas pelo European Union Emissions Trading Scheme
(EU ETS).
Por fim, e para que passemos às considerações sobre os esquemas baseados em
créditos originários de projetos (project based market), apresenta-se a seguir o programa de
negociação de créditos de carbono desenvolvido pela Bolsa do Clima de Chicago
(Chicago Climate Exchange - CCX).
O CCX Program é um programa privado de redução de emissões de GEE, de iniciativa
dos membros da Bolsa do Clima de Chicago, voltado à participação de empresas
americanas e de outros países, inclusive de economias emergentes, que desenvolvam
73
atividades que comprovadamente reduzam a emissão ou promovam a captura de GEE da
atmosfera.
As metas de redução de GEE, que segundo os criadores e membros da CCX são
voluntárias, porém cogentes entre as partes (voluntary but legally binding commitment),
foram estabelecidas de forma crescente para as duas fases do programa. Na Fase I, que foi
de 2003 a 2006, as metas foram: 1% em 2003, 2% em 2004, 3% em 2005 e 4% em 2006,
calculadas sempre sobre o período base (1998 a 2001). A Fase II, que se estenderá até
dezembro de 2010, terá uma meta de 6% de redução, também frente ao período base, a ser
atingida no último ano da fase.
Rocha op. cit., p. 54, argumenta que os principais objetivos do programa CCX são
provar que o conceito de emission trading pode ser aplicado eficientemente para reduzir
emissões de GEE e identificar quais os preços associados a essas emissões.
Segundo a Fundação Brasileira para o Desenvolvimento Sustentável - FBDS (2008),
as reduções de emissões podem ser realizadas de três maneiras:
� através de investimentos nos próprios processos produtivos;
� comprando créditos de carbono de outras empresas participantes do CCX;
� comprando créditos de carbono de projetos no Brasil.
As regras para aceitação de novos membros e definição de metodologia de verificação
de créditos originários de projetos de redução de GEE são estabelecidas pelo Conselho
Executivo da CCX. A Fundação Brasileira para o Desenvolvimento Sustentável (FBDS) é a
única instituição credenciada a apresentar projetos brasileiros.
Para as empresas brasileiras, sobretudo as ligadas ao setor florestal, as diferenças em
termos de procedimentos e exigências entre os mecanismos instituídos pelo Protocolo de
Quioto e o programa de redução de emissões da CCX são:
� por ser um mecanismo voluntário entre empresas privadas norte-americanas e
brasileiras, independe de qualquer tipo de aprovação governamental;
� a metodologia de apresentação para os projetos de base florestal foi
estabelecida pela FBDS e a burocracia do CCX é bastante reduzida, o que
74
significa um processo muito ágil (cerca de 90 dias, entre a data de contratação
da FBDS e a aprovação final do projeto pelo CCX);
� o CCX aceita a inclusão de projetos já implantados, desde que as áreas
florestais tenham sido implantadas após 1990 (em áreas não florestadas
anteriormente) e ainda estejam em fase de crescimento, ou seja, absorvendo
carbono da atmosfera.
Ainda segundo a FBDS (2008), as principais empresas florestais brasileiras que têm
projetos inseridos no âmbito da CCX são: Duratex; Arcelor – CAF; Klabin; Cenibra; Suzano;
Votorantim e Aracruz.
Por permitir, além de negócios com permissões de emissões, transações de créditos
de carbono originários de projetos de redução de emissão ou captura de GEE, o programa
CCX pode ser considerado um regime misto de negociação de carbono, com grande
potencial de expansão, num cenário de demanda crescente de reduções de emissões de
GEE para cumprimento dos compromissos e metas assumidos.
3.1.2 Regimes baseados em projetos de redução de emissões (project based market)
São dois os mecanismos formais de flexibilização baseados em projetos de redução
de emissões ou captura de GEE: A Implementação Conjunta, instituída pelo Art. 6 do
Protocolo de Quioto, e o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo – MDL, regulamentado pelo
Art. 12 do citado Tratado.
A Implementação Conjunta (em inglês Joint Implementation – JI) é um mecanismo
que permite aos Países incluídos no Anexo I da CQNUMC participarem conjuntamente de
projetos ou atividades que tenham potencial de redução de GEE, a serem implementados
em seu território ou em território de outros países parceiros, com vistas à minimização dos
custos de implantação dos projetos de redução de emissões de GEE. As respectivas
Unidades de Redução Emissões (em inglês Emission Reductions Units – ERU) geradas a
partir dessas atividades podem ser transferidas entre os países para fins de cumprimento
conjunto de suas metas individuais de redução de emissões. É uma possibilidade de
flexibilização restrita aos países desenvolvidos (Anexo I), a ser utilizada com a condição de
75
que a aquisição/venda de ERUs deve ser suplementar às ações domésticas adotadas para
fins de cumprimento das metas estabelecidas pelo Art. 3 do Protocolo.
O MDL, por sua vez, é o único mecanismo de flexibilização que permite a participação
de países em desenvolvimento (não Anexo I). Em razão disso, o MDL trabalha, em síntese,
com o duplo objetivo de promover o desenvolvimento sustentável nos países
hospedeiros dos projetos e de auxiliar os países de senvolvidos a atingirem suas
metas de redução de emissões . Todo projeto que permitir a redução de emissões ou a
captura líquida de GEE, quando comparado ao cenário de não realização deste, tem
potencial para a geração de Certificados de Redução de Emissões – CER, passíveis de
serem vendidos aos países que necessitem de complementos externos para atingirem suas
metas de redução de emissões.
Nos termos do Art.12 do Protocolo de Quioto pode-se inferir, em linhas gerais, que
para que um projeto seja considerado elegível para o MDL, é necessário que cumpra o
requisito básico de contribuir para o desenvolvimento sustentável do país hospedeiro.
Além disso, a participação em um projeto de MDL deve ser voluntária, ou seja, não são
aceitos projetos induzidos ou desenvolvidos em decorrência de legislação governamental
que retire a natureza espontânea do empreendimento.
É necessário, também, que o proponente (Participante do Projeto – PP) estabeleça a
adicionalidade e a linha de base do projeto. Com relação à adicionalidade, as atividades de
um projeto de MDL serão consideradas adicionais se as emissões antropogênicas de CO2
forem menores do que as que ocorreriam na ausência do projeto de MDL e/ou se a remoção
de CO2 (da atmosfera) for superior àquela que ocorreria na ausência do projeto de MDL. Por
sua vez, a linha de base de um projeto de MDL constitui o cenário representativo das
emissões/remoções antropogênicas de CO2 que ocorreriam na ausência do projeto.
A figura a seguir ilustra o esquema de geração de créditos de carbono originários de
projetos de MDL. A diferença entre as emissões projetadas pelo cenário base (cenário 1) e
as emissões verificadas com a implantação do projeto (cenário 2) equivale à quantidade de
CERs gerada pela Atividade de Projeto.
76
Geração de CERs - MDL
0
20
40
60
80
100
120
1 2
cenários
Mt C
O2
e
Emissão GEE CER
Figura 6 – Geração de CERs a partir de projeto de MDL Fonte: adaptado de CDM in Charts ver.4.0 novembro 2007
Por se tratar de mecanismo de relevante interesse para o Brasil, foi dedicada atenção
especial ao Mecanismo de Desenvolvimento Limpo no Capítulo 2 desta monografia, onde
foram discutidos os conceitos, as fases processuais de certificação dos créditos e
conseqüente emissão dos CERs, a situação do MDL no Brasil e no mundo e o caso
“Plantar”, empresa considerada referência nacional em projetos de MDL. A seção a seguir
apresenta as principais estatísticas e características do mercado global de carbono,
envolvendo todos os mecanismos/regimes até então comentados.
3.2 PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS E ESTATÍSTICAS DO MERCADO GLOBAL DE
CARBONO
O mercado de carbono pode ser considerado uma importante ferramenta de auxílio à
mitigação das mudanças climáticas e do aquecimento global. As estatísticas a serem
apresentadas ao longo desta seção demonstram que as negociações formais e voluntárias
de créditos de carbono têm alcançado resultados cada vez mais promissores em termos de
volumes de créditos transacionados, os quais são originários de iniciativas voltadas ao
objetivo comum de redução de emissões de GEE ao menor custo possível.
Previamente à demonstração dos principais indicadores do mercado de carbono, e
para fins de melhor compreensão das informações, serão apresentados alguns conceitos
77
relacionados à caracterização desse importante mercado de ativos ambientais, trazidos de
estudos gerais sobre o mercado de ativos financeiros.
Em termos gerais, existem diversas maneiras de se classificar os mercados de ativos
ambientais, classe de instrumentos de mercado5 na qual se enquadram os créditos de
carbono.
Segundo Elton & Gruber (1995, p. 32), uma primeira forma de classificação está
associada à natureza das operações em termos de origem/início das emissões dos créditos
de carbono, que define os mercados como primários e secundários. Emissões primárias, ou
mercado primário, são aquelas por meio das quais os créditos são inicialmente ou
originalmente emitidos e colocados à disposição dos atores do mercado, seja por meio de
colocações/vendas diretas ou via processos competitivos (leilões de créditos de carbono). A
partir dessa primeira colocação/emissão de ativos em mercado, todas as demais
negociações de compra e venda são denominadas negociações secundárias, às quais
compõem o mercado secundário de ativos ambientais. Exemplificando, quando o Conselho
Executivo do MDL emite CERs originárias de projetos desenvolvidos por representantes de
países em desenvolvimento (não Anexo I), trata-se de uma emissão primária (mercado
primário). Quando esses mesmos CERs são vendidos a países desenvolvidos (Anexo I) ou
negociados entre eles para fins de cumprimento de seus compromissos de redução de
emissões, trata-se de uma transação secundária (mercado secundário) de ativos
ambientais.
Além dos mercados primário e secundário, existe também o mercado de derivativos,
no qual são transacionados ativos sintéticos derivados dos créditos de carbono já emitidos
no mercado primário e passíveis de negociações via mercado secundário. Os principais
ativos negociados no mercado de derivativos de ativos ambientais são os contratos futuros
de créditos de carbono, negociados a termo entre os agentes do mercado, que assumem
um importante papel na formação das expectativas de preços futuros dos créditos.
Uma segunda forma de caracterização do mercado de carbono relaciona-se aos
diferentes ambientes de negociação. Sobre esse aspecto, as negociações de créditos de
carbono podem se realizar em ambientes ditos organizados, representados por bolsas de
valores, ou em balcões de negócios (over the counter).
5 Segundo ELTON &GRUBER (1995, p. 11), instrumentos de mercado ou securities são contratos amparados por dispositivos legais que representam e garantem o direito a benefícios físicos e/ou financeiros presentes e futuros, de acordo com condições previamente definidas.
78
Um exemplo clássico de ambiente organizado de negócios com créditos de carbono é
a Bolsa do Clima de Chicago (Chicago Climate Exchange - CCX), onde as negociações
atuais e históricas são eletronicamente registradas e disponibilizadas aos participantes do
mercado, para consulta e tomada de decisões sobre seus negócios.
Nas negociações de balcão, os históricos de preços e volumes de negócios nem
sempre se encontram disponíveis de forma organizada e sistemática, tanto por questões
tecnológicas, quanto por falta de interesse dos participantes em dar total transparência às
transações, o que de certa forma dificulta a obtenção de estatísticas de negócios.
Segundo Rocha op.cit., p. 33, a vantagem de comercializar bens ambientais na bolsa
e não no balcão é que a transação ganha transparência e publicidade, podendo atingir um
mercado muito maior e, por tabela, melhores preços.
Elton & Gruber op. cit., p. 33 destacam, além dos conceitos relativos à caracterização
dos mercados de ativos ambientais, o conceito de broker, definido como um agente de
mercado responsável pela intermediação das negociações, sobretudo secundárias, que atua
como entidade facilitadora do encontro entre compradores e vendedores de créditos de
carbono. Brokeragem é a taxa cobrada pelos brokers pelos serviços prestados. As
negociações de balcão (over the counter) normalmente se realizam por intermédio de
brokers.
A partir da caracterização dos mercados de carbono em termos de origem das
emissões (mercados primário e secundário) e dos ambientes de negociação (mercado de
bolsa ou de balcão) passemos, a seguir, às principais estatísticas do mercado global de
carbono.
O quadro a seguir, adaptado de Capoor & Ambrosi op. cit., p. 3, ilustra a evolução dos
volumes e valores negociados no âmbito dos diferentes regimes de mercado, segregados
em mercados de permissões de emissões (allowance based markets) e de créditos
originários de projetos de redução de emissões (project based markets), realizados no
biênio 2005-2006.
79
2005 2006Volume (MtCO2e) Valor (MUS$) Volume (MtCO2e) Valor (MUS$)
Alowance based marketEU ETS 321 7.908 1.101 24.357 New South Wales 6 59 20 225 CCX 1 3 10 38 UK ETS - 1 nd ndSub-total 328 7.971 1.131 24.620
Project Based MarketMDL mercado primário 341 2.417 450 4.813 MDL mercado secundário 10 221 25 444 Implementação Conjunta 11 68 16 141 Outros 20 187 17 79 Sub-total 382 2.893 508 5.477
TOTAL 710 10.864 1.639 30.097
Quadro 10 – Mercado Global de Carbono: Volumes e valores 2005-2006 Fonte: Adaptado de Capoor & Ambrosi. State and Trends of the Carbon Market 2007, pg 3.
As estatísticas demonstram um significativo crescimento do mercado global de
carbono no decorrer do biênio analisado, tanto em termos de volumes de créditos, quanto
de valores negociados, que passaram de US$ 10 bilhões em 2005 para cerca de US$ 30
bilhões em 2006. O maior volume de negócios foi registrado no âmbito do mercado europeu
de permissões de emissões (EU ETS), cujas negociações secundárias alcançaram, em
2006, a cifra de US$ 24,3 bilhões, cerca de três vezes superior a 2005.
O mercado de créditos derivados de projetos de redução de emissões (project based
market), que envolve as transações de CERs (MDL) e de ERUs (JI) também apresentou
crescimento significativo, passando de US$ 2,7 bilhões em 2005 para cerca de US$ 5,4
bilhões em 2006.
Os volumes e valores relacionados ao mercado voluntário de carbono atingiram
recordes históricos em 2006, tanto na Bolsa do Clima de Chicago (CCX), quanto no
programa australiano (NSW GAS) os quais, considerados conjuntamente, registraram
volumes de negócios 324% superiores ao ano anterior.
Segundo Capoor & Ambrosi op. cit., p. 4, em termos de preços, verificou-se uma
grande volatilidade no mercado de permissões de emissões, associada sobretudo ao
esquema europeu (EU ETS), onde os preços dos EUA (European Union Allowances) da
Fase I variaram do patamar de cerca de € 30,0 em março de 2006 para menos de € 10,0 em
maio daquele ano. A partir daí, e em virtude da aproximação do prazo de encerramento da
primeira fase do programa (dezembro de 2006), do efetivo cumprimento das metas de
80
redução de emissões firmadas para o primeiro período de compromisso (excesso de oferta
de EUA Fase I) e da impossibilidade de carregamento dos EUA Fase I para a próxima fase
(Fase II), os preços desses ativos despencaram para valores inferiores a € 1,0.
Os negócios com os EUA Fase II, realizados no âmbito dos mercados futuros de
permissões de emissões, mantiveram os patamares de preços em torno de € 15,0 de
meados de 2006 ao início de 2007, justificados pela intenção da Comissão Européia em
ajustar o volume de permissões de emissões a ser emitido na Fase II para um nível mais
próximo das metas de redução de emissões previstas para a segunda fase do esquema
(stringent caps). A maioria dos negócios no âmbito do EU ETS são realizados entre
empresas européias interessadas em cumprir seus compromissos de redução de emissões
de GEE, seguindo legislação específica e antecipando-se às metas estabelecidas por
Quioto.
Ao contrário do mercado de permissões de emissões (allowance based market), o
mercado derivado de projetos de reduções de emissões (project based market) apresentou
pouca volatilidade de preços ao longo de 2006 e início de 2007, com negócios variando
entre € 6,0 e € 11,0 (média de € 8,4) para o mercado de CERs (MDL) e entre € 5,0 e € 8,0
(média de € 6,7) para negócios com ERUs (JI).
As ofertas de créditos de carbono originários de projetos de reduções de emissões
relacionam-se principalmente à China, que representa cerca de 61% do volume de CERs
(CDM) colocados em emissões primárias, e aos países que compunham a antiga União
Soviética, sobretudo Rússia e Ucrânia, além da Bulgária, dos quais se originaram cerca de
45% do total de ERUs (JI) ofertados em 2006.
Os principais compradores primários de CERs (CDM) e ERUs (JI) são países
europeus, representados por empresas privadas, bancos e fundos de investimento
especialistas em mercado de carbono. Negociações secundárias são demandadas por um
grande número de instituições financeiras internacionais e por empresas também
transnacionais interessadas em adquirir créditos de carbono para fins de cumprimento de
seus compromissos de redução de emissões de GEE.
No Brasil, o mercado de carbono encontra-se em fase inicial de desenvolvimento.
Merece destaque a iniciativa conjunta da Bolsa de Mercadorias e Futuros (BMF) e do
Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), de criação do
Mercado Brasileiro de Reduções de Emissões (MBRE), que objetiva desenvolver sistema
eficiente de negociação de certificados ambientais, em linha com os princípios subjacentes
ao Protocolo de Quioto. O projeto envolve duas etapas: (i) a criação de um banco de
81
projetos de MDL, que manterá o registro de projetos validados por Entidades Operacionais
Designadas, para fins de consulta on line por interessados compradores e vendedores de
CERs e; (ii) o desenvolvimento e a implantação de um sistema eletrônico de leilões de
créditos de carbono, com o objetivo de oferecer aos participantes do mercado de carbono
um canal de negociação atraente, seguro, com baixos custos de transação e que possibilite
o fechamento de negócios por preços competitivos.
Dados da BMF (2007) ilustram que o primeiro negócio realizado no âmbito do MBRE
foi o leilão de CERs ocorrido em 26 de setembro de 2007, por meio do qual a prefeitura do
município de São Paulo ofertou 808.450 CERs originários do Projeto de Recuperação de
Metano e Produção de Energia do Aterro Sanitário Bandeirantes (Bandeirantes Landfill Gas
to Energy Project), a um preço inicial de € 12,70/CER. O preço final de venda foi de €
16,20/CER (ágio de 27,55% sobre o preço inicial) e os CERs foram arrematados pelo banco
holandês Fortis Bank NV/AS. A expectativa da BMF e do MDIC é de estabelecer as bases
para a consolidação, no Brasil, de um mercado ativo para créditos de carbono que venha a
constituir referência mundial para os participantes do mercado global de carbono.
Em termos gerais, os principais fatores de influência sobre os preços de mercado dos
créditos de carbono relacionam-se:
� à demanda atual e futura de créditos vis a vis as metas de redução de
emissões de GEE;
� à oferta potencial de créditos, sobretudo os derivados de projetos (project-
based market);
� aos limites de emissões estabelecidos no âmbito do mercado de permissões
de emissões (allowance based market);
� à possibilidade de carregamento de créditos para períodos futuros de
compromisso e;
� à origem e qualidade dos créditos, sobretudo os relacionados a vendas para
entrega futura (mercado de derivativos).
Além desses fatores, que definem os preços e, por conseqüência, o interesse dos
agentes internacionais no mercado global de carbono, vale destacar a importância do
estabelecimento de padrões e regras sólidas e transparentes relacionadas tanto à
comprovação da qualidade dos créditos gerados, quanto à forma de mensuração das
reduções de emissões de GEE. Pode-se resumir que os fatores-chave para o bom
82
funcionamento do mercado de carbono são: (i) existência de competitividade no mercado de
energia; (ii) interesses comuns dos atores; (iii) segurança jurídica e institucional; (iv)
padronização de medidas e sistematização de relatórios e inventários de emissões de GEE
e; (v) possibilidade de transferência de ativos entre regimes e ambientes de negócios.
Por fim, e tomando por base as premissas e conceitos considerados no âmbito desta
monografia, apresenta-se a seguir o resumo da classificação dos diversos regimes ou
mecanismos de flexibilização que compõem o mercado global de carbono, assim como a
nomenclatura conferida aos créditos de carbono gerados a partir dos mesmos.
Classe Regime Cogência Crédito de carbono
UK ETS voluntário CCAAllowance based market EU ETS voluntário EUA
NSW GGAS voluntário NGACCCX voluntário CFIET formal-Quioto AAU
Project based market CDM formal-Quioto CERJI formal-Quioto ERU
Quadro 11 – Resumo dos principais regimes do mercado global de carbono Fonte: Adaptado de Capoor & Ambrosi. State and Trends of the Carbon Market 2007.
83
CONCLUSÃO
O início do século XXI é, sem dúvida, o momento histórico da era moderna onde estão
presentes as mais alarmantes previsões sobre os efeitos danosos da atividade humana
sobre o meio ambiente. O aquecimento global, causado pela emissão descontrolada de
Gases do Efeito Estufa – GEE, e suas conseqüências sobre a sustentabilidade da vida no
planeta incluem-se no rol dos temas mais discutidos e controversos da atualidade. Tratar da
continuidade da existência humana envolve, necessariamente, pensar em desenvolvimento
sustentável.
O conceito de desenvolvimento sustentável mais comumente aceito e utilizado no
meio científico e institucional é o formulado em 1987 pela Comissão Mundial sobre Meio
Ambiente e Desenvolvimento, a partir da edição do relatório “Nosso Futuro Comum”
(Relatório Brundtland), que instituiu: “O desenvolvimento sustentável é um desenvolvimento
que responde às necessidades do presente sem comprometer a capacidade das gerações
futuras de satisfazer às suas próprias necessidades.”
Adotar a essência desse conceito tem sido um grande desafio a ser transposto pela
sociedade, o qual envolve, necessariamente, revisar e modificar as formas vigentes de
desenvolvimento econômico, fundamentadas em séculos de práticas destruidoras do meio
biofísico. Mudar as práticas tradicionais de desenvolvimento requer que as formas atuais de
atividade produtiva, sustentadas por fortes interesses econômicos, sejam confrontadas.
É fato que cada sociedade local apresenta valores e desenvolvimento culturais
próprios, mas cada uma dessas comunidades diferentes também mostra interesses comuns,
como a proteção do meio ambiente global, dos direitos humanos e de um desenvolvimento
justo e sustentável. Esses exemplos podem ser chamados de global commons, que são os
interesses globais que perpassam as agendas dos diversos Estados e da opinião pública
mundial e são regulamentados por meio de instrumentos jurídicos e fóruns adequados às
discussões globais.
A efetividade de uma norma jurídica pode ser entendida pela sua aceitação pela
comunidade e pelo seu uso contínuo e real. Traduz-se no cumprimento efetivo do Direito por
parte da sociedade, que reconhece as normas e as cumprem, fazendo com que seus
preceitos incidam efetivamente na vida social, além de contribuir de modo significativo para
a solução dos problemas ambientais que demandaram a criação da norma.
84
A Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (CQNUMC),
formalizada no âmbito da Conferência Rio 92, e o Protocolo de Quioto, negociado quando
da Terceira Conferência das Partes, realizada em Quioto – Japão, em 1997 (COP3),
destacam-se como os mais importantes instrumentos jurídicos sobre mudanças climáticas e
desenvolvimento sustentável. A menção ao desenvolvimento sustentável se faz presente em
vários dispositivos da CQNUMC e do Protocolo de Quioto, o que demonstra a importância
que passou a ser dada ao tema nas negociações internacionais sobre meio ambiente.
Em termos gerais, o Protocolo de Quioto definiu que os países desenvolvidos ou
economias em estágio de transição, listados no Anexo I da CQNUMC, devem assumir como
meta obrigatória a redução de emissões de GEE em no mínimo 5 % sobre os níveis de
concentração desses gases observados em 1990, meta essa a ser atingida durante o
primeiro período de compromisso, estabelecido entre os anos de 2008 e 2012.
O Protocolo também instituiu os chamados mecanismos de mercado, criados com o
objetivo de subsidiar as Partes no cumprimento de suas metas de redução de emissões de
GEE, os quais funcionam como esquemas auxiliares e suplementares às ações domésticas
de redução de emissões. Os três mecanismos de flexibilização são conhecidos como: (i)
Implementação Conjunta (Art. 6); (ii) Comércio de Emissões (Art. 17) e; (iii) Mecanismo de
Desenvolvimento Limpo (Art. 12).
Dos três mecanismos formais de flexibilização instituídos por Quioto, o único que
permite a participação voluntária de países em desenvolvimento é o Mecanismo de
Desenvolvimento Limpo – MDL, que trabalha com o duplo objetivo de promover o
desenvolvimento sustentável nos países hospedeiros dos projetos e de auxiliar os países
desenvolvidos a atingirem suas metas de redução de emissões. Todo projeto que permitir a
redução de emissões ou a captura líquida de GEE, quando comparado ao cenário de não
realização deste, tem potencial para a geração de créditos de carbono, denominados
Certificados de Emissões Reduzidas (em inglês Certified Emission Reductions – CER),
passíveis de serem vendidos aos países que necessitem de complementos externos para
atingirem suas metas de redução de emissões.
O potencial de redução de emissões de GEE e de geração de créditos de carbono é
uma das diversas variáveis que determinam e atestam a viabilidade de um determinado
projeto de MDL em promover o desenvolvimento sustentável dos países hospedeiros, sendo
caracterizado como um importante fator de cunho econômico. Vale ressaltar, porém, que
outros fatores devem ser necessariamente observados, sobretudo os de caráter social,
associados à melhoria da qualidade de vida, maior oferta de empregos, distribuição
85
eqüitativa de renda e outros, sem os quais não haveria continuidade e sustentabilidade do
processo de desenvolvimento.
As estatísticas sobre o número de projetos de MDL submetidos à validação pelo
CIMGC ilustram um crescimento significativo nessa variável nos últimos dois anos e refletem
o forte interesse do setor privado brasileiro no desenvolvimento de atividades
ambientalmente sustentáveis. O caso “Plantar” é um exemplo prático de iniciativa de
empresa brasileira de grande sucesso em projetos de MDL. Os indicadores técnicos,
ambientais e sociais do Projeto Plantar de Carbono demonstram o potencial desse
importante mecanismo em promover o desenvolvimento sustentável dos países em
desenvolvimento e de que auxiliar os países desenvolvidos a cumprirem seus
compromissos de redução de emissões de GEE.
Por aliar normas de proteção do meio ambiente com regras de mercado, o Protocolo
de Quioto é considerado um Tratado inovador no ambiente jurídico internacional. A partir de
Quioto, vários Estados vêm se adequando aos meios de produção ambientalmente mais
racionais, o que mostra que o Protocolo tem sido capaz de alterar de maneira significativa
os comportamentos dos atores internacionais, apesar da resistência de alguns poucos
países, sobretudo os desenvolvidos, em aderir ao caráter vinculante de seus dispositivos.
Felizmente, essa resistência em aderir aos mecanismos cogentes de redução de GEE
não inviabilizou a criação de um importante e promissor mercado de ativos ambientais – o
mercado de carbono - desenvolvido a partir do objetivo comum de estabilizar as
concentrações de gases do efeito estufa na atmosfera. Mesmo antes da entrada em vigor do
Protocolo de Quioto, diversas iniciativas regionais com vistas a atingir a esse objetivo tem
sido implementadas, ainda que de forma voluntária. Destarte, pode-se inferir que o mercado
de carbono surgiu a partir do interesse geral da humanidade em garantir a sustentabilidade
da vida na Terra.
Os principais mercados voluntários de carbono são: (i) o Esquema de Comércio de
Emissões do Reino Unido (United Kingdom Emissions Trading Scheme - UK ETS), regime
voluntário do tipo Cap and Trade, criado em 2002, que estabelece um teto máximo para
fontes de emissão de larga escala, sobretudo entre empresas do setor de energia situadas
na Grã Bretanha; e (ii) o Esquema de Comércio de Emissões da União Européia (European
Union Emissions Trade Scheme – EU ETS), iniciado em janeiro de 2005, e tido hoje como
um dos mais atuantes esquemas de comércio de créditos de carbono em termos de
volumes e valores negociados, cujo desenvolvimento, apesar de ter se antecipado à
86
vigência do Protocolo de Quioto, baseou-se nas metas de redução de emissões
estabelecidas no âmbito desse importante Tratado.
Além das iniciativas voluntárias conduzidas por nações européias, são de especial
relevância os programas em operação desenvolvidos pela Austrália (Australia’s New South
Wales Greenhouse Gas Abatement Scheme – NSW GGAS) e pela Bolsa do Clima de
Chicago (Chicago Climate Exchange), nos Estados Unidos.
No decorrer desta monografia, foram apresentadas duas formas de classificação dos
regimes de flexibilização e negociação que compõem o mercado de carbono. Esses regimes
podem ser segregados em função da origem dos créditos de carbono, os quais são gerados
a partir de permissões de emissões – allowance based market ou de projetos de redução de
emissões ou de captura de carbono– project based market ou; em função da vinculação
formal dos mecanismos de flexibilização ao Protocolo de Quioto (mercado formal – Quioto
ou mercado voluntário).
As estatísticas do mercado global de carbono apresentadas no Capítulo 3, expressas
tanto em termos de volumes quanto de valores de créditos negociados, indicam que esse
peculiar e promissor mercado de ativos ambientais vem crescendo de maneira significativa
ao longo dos anos, o que demonstra o interesse cada vez maior dos participantes em utilizar
o mercado de carbono como instrumento auxiliar às ações domésticas voltadas à redução
das emissões de GEE.
Os inventários de emissões verificadas em 2005 (último período disponível) frente ao
ano base de 1990 também demonstram que grande parte dos países incluídos no Anexo I
da CQNUMC tem efetivamente se engajado em iniciativas domésticas de redução das
emissões de GEE, que se traduzem em emissões decrescentes de GEE e perspectivas de
continuidade de implementação das atividades e projetos ambientalmente sustentáveis.
Em termos institucionais, é consenso entre as Partes a necessidade de se avançar na
construção de um novo acordo global de longo prazo, a ser instituído sob a forma de um
novo Tratado (pós Quioto), que formalize o compromisso de continuidade das ações
voltadas à redução de emissões de GEE. A criação desse novo instrumento, fundamental
para que haja segurança jurídica nas relações internacionais sobre mudanças climáticas,
fomentará ainda mais o crescimento e o desenvolvimento do mercado global de carbono.
As diferenças em termos de origens, poder liberatório, duração, preços e outras
verificadas entre os diversos ativos ambientais que compõem o mercado de carbono (CERs,
ERUs, AAUs, CFIs, NGACs, EUAs e CCAs) não permitem que esses créditos sejam
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considerados commodities ambientais. A uniformização desses créditos em ativos fungíveis
seria possível somente com a instituição de um regulamento sólido e universal, devidamente
discutido, aprimorado e aceito entre os participantes do mercado global de carbono.
Por todo o exposto, conclui-se que o mercado de carbono constitui-se em uma
ferramenta eficaz de auxílio à mitigação das mudanças climáticas e de promoção do
desenvolvimento sustentável mundial. Além do constante aprimoramento do mercado de
carbono, a severidade e a abrangência das mudanças climáticas em curso requer dos
líderes mundiais uma profunda e urgente transformação na forma de agir e coordenar as
iniciativas conjuntas, incluindo uma maior destinação de recursos públicos e privados para a
pesquisa e difusão de novas tecnologias, mudanças nas políticas econômica e fiscal, de
forma a eliminar subsídios e distorções de custos e preços e, o mais importante, uma
revisão definitiva dos padrões de produção e consumo.
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