mÚsica, linguagem e movimento

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MÚSICA, LINGUAGEM E MOVIMENTO Propostas para Crianças Pequenas a partir da perspectiva da abordagem Orff-Schulwerk Cassiano Lima da Silveira Santos Maria do Carmo Monteiro Kobayashi Maristela de Oliveira Mosca

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Page 1: MÚSICA, LINGUAGEM E MOVIMENTO

MÚSICA, LINGUAGEM E MOVIMENTO

Propostas para Crianças Pequenas a partir da perspectiva da abordagem Orff-Schulwerk

Cassiano Lima da Silveira Santos

Maria do Carmo Monteiro Kobayashi

Maristela de Oliveira Mosca

Page 2: MÚSICA, LINGUAGEM E MOVIMENTO

Departamento de Educação – Faculdade de

Ciências (UNESP/Bauru)

Santos, Cassiano Lima da Silveira Santos Música, linguagem e movimento : propostas para crianças pequenas a partir da perspectiva da abordagem Orff-Schulwerk. / Cassiano Lima da Silveira Santos, Maria do Carmo Monteiro Kobayashi, Maristela de Oliveira Mosca. – Bauru : UNESP, 2020. n. p. ISBN 978-65-86498-08-0 Inclui bibliografia 1. Pré-escola. 2. Educação Musical. 3. Base Nacional Comum Curricular. 4. Orff-Schulwerk. 5. Campos de experiências. I. Santos, Cassiano Lima da Silveira Santos. II. Kobayashi, Maria do Carmo Monteiro. III. Mosca, Maristela de Oliveira. IV. Título.

Page 3: MÚSICA, LINGUAGEM E MOVIMENTO

SOBRE OS AUTORES

Cassiano Lima da Silveira Santos

Licenciado em Música pela Universidade Estadual de Campinas

(UNICAMP) e Mestre em Educação: Docência para a Educação

Básica, pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita

Filho – UNESP/Bauru. Atua como professor de Música no

Ensino Básico (Educação Infantil e Ensino Fundamental) e é

professor certificado em Orff-Schulwerk pelo San Francisco

International Orff Course (EUA). Foi integrante da Orquestra

do Corpo, grupo de Música corporal coordenado por Fernando

Barba e Stênio Mendes (Barbatuques).

Maria do Carmo Monteiro Kobayashi

Professora Associada - Livre Docente (2019) em Ensino de Arte: Linguagens da Criança, pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho - UNESP, Faculdade de Ciências - FC, Departamento de Educação de Bauru. Dedica-se à formação inicial e continuada de professores de Educação Básica, com foco em Ludicidade e Arte. Docente do Programa de Pós-Graduação em "Docência para Educação Básica", Mestrado Profissional, Faculdade de Ciências da UNESP, FC, do Curso de Licenciatura em Artes Visuais da FAAC (UNESP/Bauru) nas disciplinas de “Didática”, “Práticas de Ensino” e “Estágio Supervisionado” e do Curso de Pedagogia da FC/UNESP nas disciplinas “Educação e Ludicidade” e “Literatura na Educação Infantil”. Líder do Grupo de "Estudos da Infância e Educação Infantil: Políticas e Programas" - CNPQ - UNESP. Conselheira da Associação Brasileira de Brinquedotecas 2018-2020.

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Maristela de Oliveira Mosca

Doutora em Ciências da Educação (Desenvolvimento Curricular) pela Universidade do Minho/Portugal, é Mestre em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte/UFRN. Tem como foco de investigação a Interdisciplinaridade, Inclusão, Interculturalidade e Ludicidade nos processos de aprender e ensinar Música na escola de educação básica, a partir das reflexões acerca de um currículo dialógico e improvisacional / um Currículo como Jazz. Autora de diversos artigos sobre currículo e educação musical na escola básica, é Professora do Núcleo de Educação da Infância / Colégio de Aplicação da UFRN - NEI-CAp/UFRN, onde atua na área de Educação Musical com crianças da Educação Infantil e Ensino Fundamental, dedicando-se também a formação inicial de professores, bem como tutora de bolsistas/estagiários do Curso de Licenciatura em Música da UFRN, atuando em Projetos de Pesquisa e Extensão dessa Instituição de Ensino. Professora formadora em cursos de atualização profissional em serviço de professores da rede pública do Rio Grande do Norte em Cursos de Especialização e Capacitação promovidos pelo MEC/UFRN. Possui graduação em Pedagogia pela Faculdade Riopretense de Filosofia, Ciências e Letras/FARFI. Com Especialização em Pedagogia do Movimento pela UFRN e Professora Certificada de Música na abordagem Orff-Schulwerk, pela San Francisco School (San Francisco/CA). Coordena Oficinas de formação de Professores da Educação Infantil e Ensino Fundamental a partir de uma proposta inclusiva e interdisciplinar de Projetos de Estudo que buscam articular os saberes disciplinares, as experiências de vida e os valores socioculturais da comunidade escolar. É coordenadora do Grupo de Estudos Orff Natal, que pretende divulgar, a partir de vivências e estudos musicais, a abordagem de Carl Orff para o ensino de Música.

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Sumário

• Apresentação

• Música e Educação Infantil

• A abordagem Orff-Schulwerk

• Propostas e brincadeiras

• Caderno de partituras

• Acesso ao material sonoro

• Referências

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Apresentação

Este produto educacional foi desenvolvido como requisito do Programa de Pós-Graduação

“Docência para a Educação Básica” da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”

(UNESP/Bauru).

A partir da perspectiva da abordagem Orff-Schulwerk, este produto objetiva apresentar

propostas de atividades musicais destinadas a alunos de 5 anos da Educação Infantil, sendo este

um conjunto de partituras e ideias de ações pedagógicas por meio de composições e dinâmicas

com música, movimento, linguagem, interação e criação. Não deve ser encarado como método

ou conjunto de passos a serem seguidos por professores em sala de aula, e modificações

condizentes com realidades e culturas distintas são plenamente encorajadas.

Ele baseia-se no arcabouço prático-teórico desenvolvido na dissertação “MÚSICA E

MOVIMENTO NA EDUCAÇÃO INFANTIL: DIÁLOGOS POSSÍVEIS E CONEXÕES

ENTRE A BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS

COM CRIANÇAS DE 5 ANOS A PARTIR DA PERSPECTIVA DA ABORDAGEM ORFF-

SCHULWERK”, do Departamento de Educação da Faculdade de Ciências da UNESP/Bauru, e

apresenta uma breve revisão da literatura sobre a abordagem Orff-Schulwerk e seus diferentes

campos, como Ritmo e Linguagem, Música e Movimento, Expressão Vocal e processos

didáticos.

Para informações, dúvidas, compartilhamentos e sugestões, entre em contato:

Cassiano Lima da Silveira Santos

[email protected]

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Música e Educação Infantil

A Música é, segundo Brasil (1998, p. 45): “[...] a linguagem que se traduz em formas sonoras capazes de

expressar e comunicar sensações, sentimentos e pensamentos, por meio da organização e relacionamento

expressivo entre o som e o silêncio”, e tem presença massiva nas diferentes sociedades humanas, considerando

que ela não é basicamente uma propriedade física, mas sim, produto da relação do homem com o som. Ela pode

ser parte do processo educacional básico da criança, mas seu valor, dentre outros, é atribuído à vivência tão natural

que lhe é intrínseca. A distância de certa objetividade, a transgressão das ideais lógicas, o jogo, a brincadeira e

competição, imprimem a ela um caráter lúdico inerente (HUIZINGA, 2018).

A “musicalização”, termo referente aos processos de educação em Música, caracteriza-se pelo

desenvolvimento de instrumentos de percepção e sensibilização significativa dessa linguagem artística (PENNA,

2012). Dessa forma, a musicalização não é um fenômeno exclusivo da Educação Básica, mas quando inserida

neste contexto pode representar: “[...] um processo educacional orientado que se destina a todos que, na situação

escolar, necessitam desenvolver ou aprimorar seus esquemas de apreensão da linguagem musical” (PENNA,

2012, p. 44).

A Educação Musical assumiu diferentes papeis durante a história da sociedade ocidental, seja na Educação

Básica, no conservatório, na rua ou espaço público, sofrendo constantes modificações culturais e de aproximação.

Sua relevância, hoje em dia, se perpetua por meio da exaltação das tradições culturais e pela promoção de

possibilidades expressivas e interativas da vivência musical (FONTERRADA, 2008). Assim, educadores de

diferentes partes do mundo vêm se dedicando ao desenvolvimento de abordagens que propiciam uma formação

mais holística aos seus educandos.

Porcher (1982) diz que a concepção e utilização dessas abordagens implicam em um certo número de

princípios em comum, com a constante solicitação da criação e improvisação por parte da criança, e a concepção

“aberta” da música como função gestual e corporal. Teriam como metodologia um ensino que promove a

expressão livre, o jogo, a espontaneidade: “sob forma lúdica-expressiva-criativa, de modo livre, num clima que

proporcione a inspiração, motive a expressão dos sentimentos e estimule a criatividade” (READ apud SOUSA,

2003, p. 24).

São sob essas perspectivas que orientamos o desenvolvimento deste trabalho e de nossa prática

pedagógica: a Música e a criança em caráter intrínseco-natural, e a Educação Musical no Ensino Básico como

possível provedora de esquemas de apreensão e desenvolvimento da linguagem musical por meio da criação,

movimento e brincadeira. Por isso, no âmbito da Educação Infantil, indagamos como Aristóteles: “não contribuirá

ela [a Música] para a recreação mental e para a aquisição de conhecimentos?” (1399 apud HUIZINGA, 2018, p.

180).

Page 8: MÚSICA, LINGUAGEM E MOVIMENTO

Abordagem Orff-Schulwerk

Apesar de fazer parte dos denominados “Métodos Ativos” , surgidos na primeira metade do século XX, é

mais apropriado chamar este trabalho educacional de proposta ou abordagem, uma vez que a Educação Musical

sob perspectiva da Orff-Schulwerk tem como intenção expandir a musicalidade humana, sem a rigidez de um

método ou técnica específica. Trata-se de uma abordagem com peculiaridades e sequência lógico-didática, porém,

não há sentido em utilizar suas ideias e conceitos sem a devida contextualização à uma realidade particular

(FONTERRADA, 2008; CUNHA; CARVALHO; MASCHAT, 2015).

A abordagem Orff-Schulwerk é pensada como agente de educação coletiva e desenvolve competências

individuais, em um movimento integrado que reúne capacidades psicomotoras, sensíveis e mentais. É uma

pedagogia ativa que apela à invenção, à criatividade, e é comandada pela expressividade da criança (PORCHER,

1982; FONTERRADA, 2008).

Essa proposta visa um ensino-aprendizagem a partir do fazer música, no qual elementos são

experimentados, investigados e apresentados de forma ativa e expressiva, tendo como pressupostos pedagógicos

o trabalho prático e a vivência. Carl Orff e Gunild Keetman resgataram uma maneira de ensinar e aprender Música

por meio de propostas interativas, nas quais os aspectos da linguagem, movimento, brincadeira, improvisação,

experimentação e ludicidade, têm papeis centrais (BONA, 2011; MASCHAT, 1999 apud CUNHA;

CARVALHO; MASCHAT, 2015).

A partir de uma educação centrada no conceito de “Música Elementar”, a abordagem Orff-Schulwerk

oferece experiências básicas e variadas a todos que buscam uma via de acesso à Música e ao Movimento, sendo

ponto de partida para formas criativas de trabalho dentro de qualquer tipo de prática musical. A palavra

“Elementar” possui dois significados: o de ser indivisível, fundamental e o de ser central e nuclear, com uma

matéria prima que é primeiro plano, tanto por efeito próprio, quanto em função de possíveis desdobramentos

musicais, intuitivos e emocionais (JUNGMAIR, 2011; KELLER, 2011).

Ao reconhecerem a criança como ser criativo e brincante, Orff e Keetman apoiaram processos de ensino-

aprendizagem a partir dos fundamentos da rítmica, da fala, da dança e do movimento. Defenderam uma educação

que partisse da origem e da matéria bruta, compreendendo e desenvolvendo, intuitivamente, uma abordagem

entrelaçada pela conexão inata entre Música, Linguagem e Movimento. (FONTERRADA, 2008; GOODKIN,

2013; CUNHA; CARVALHO; MASCHAT, 2015).

Page 9: MÚSICA, LINGUAGEM E MOVIMENTO

Ritmo e linguagem

Por meio da busca e pesquisa das nuances de sua língua materna, Carl Orff passou a reconhecer a força

rítmica e elementar da linguagem e seu papel imprescindível e natural na aproximação da criança com a Música.

Bona (2011) destaca que a obra composicional de Orff foi desenhada a partir de uma concepção artística na qual

a Música deixa de ser o elemento mais

importante e fica à serviço da cena e da palavra:

A partir da conexão inata entre ritmo e

linguagem, Orff e Keetman constituíram bases

e princípios da abordagem Orff-Schulwerk

compreendendo que: “a linguagem das

palavras poderia ser uma ferramenta útil na

construção de uma linguagem significativa de

ritmos e sons, e que esta linguagem poderia se

tornar uma música inteiramente separada de

seu sentido” (GOODKIN, 2013, p. 19, tradução

própria1).

As rimas e outros tipos de textos são

importantes fontes e recursos para explorações e criações com Música e Movimento, possibilitando a vivência e

experimentação por meio de diferentes tempos, métricas, rítmicas, dinâmicas, estruturas e formas (LÓPEZ-ÍBOR,

2005). Os elementos da linguagem proveem combinações rítmicas, texturas sobrepostas, timbres, nuances e

caminham para uma aproximação natural da criança com a audição e prática polifônica.

A relação evidente da criança com a linguagem é caracterizada por um conjunto de sonoridades e nuances

cativantes a partir das brincadeiras, movimentos, dramatizações, danças, fantasias e propostas desafiadoras.

Desde a investigação e expressão primitiva dos bebês por meio do canto espontâneo, até as brincadeiras

convencionadas e interativas das rimas, charadas, trava-línguas, poesias e danças de roda, o universo linguístico

caracteriza-se como um dos eixos mais importantes e naturais de aproximação da criança com a Música, sendo

explorado corriqueiramente em práticas pedagógicas a partir da perspectiva da abordagem Orff-Schulwerk

(GARVEY, 2015).

1 Orff understood that the language of words could be a useful tool in constructing a meaningful language of tones and rhythms and that language could be a music in itself entirely separate from its sense”

Page 10: MÚSICA, LINGUAGEM E MOVIMENTO

Movimento O processo “Elementar” da Orff-Schulwerk, relacionado à expressividade bruta e inerente, encontra seu

espaço nas mais diversas práticas e linguagens artísticas, imprimindo como base dessa educação corporal o desejo

natural da criança em se movimentar, brincar e explorar. Assim, a Dança Elementar parte do princípio rítmico e

é orientada por meio da experiência e aprendizagem prática, encorajando a expressividade individual e o

desenvolvimento social (HASELBACH, 2009; HASELBACH, 2011).

Apesar de muitas culturas possuírem o movimento e a dança como elementos naturais, as sociedades mais

civilizadas parecem ter descartado essa realidade e criado uma quebra na característica infantil de se movimentar

e se expressar corporalmente. A abordagem

Orff-Schulwerk retoma essas práticas e

explorações como vias para o

desenvolvimento de caminhos criativos,

emocionais, expressivos e reflexivos sobre os

fenômenos musicais. A partir da mediação em

Dança Elementar, a criança está imersa em

conceitos como o pulso, métrica, rítmica e

forma, fazendo com que o corpo seja o local no

qual estes elementos, muitas vezes abstratos,

possam ser sentidos e mapeados (GOODKIN,

2013; COOGAN, 2014).

Dentre outras experiências no campo

da Dança Elementar, Haselbach (2009) elenca o desenvolvimento dos aspectos físico, emocional, criativo e

experimental a partir da improvisação e composição de coreografias. Consequentemente, a criança teria a

possibilidade de explorar habilidades criativas e cooperativas por meio da integração do corpo com objetos,

instrumentos de pequena percussão, pequenas peças instrumentais, canções, literatura e poesia, todas inseridas,

apresentadas e investigadas a partir de discursos significativos.

Outro aspecto bastante presente nas práticas pedagógico-corporais infantis, é a aprendizagem e

investigação de danças e passos tradicionais, possibilitando o reconhecimento e entendimento de diferentes

formas, culturas, lugares e épocas. Assim, a criança teria a possibilidade de analisar e compreender os elementos

da dança e do corpo por meio da prática e observação dessas diferentes manifestações.

Page 11: MÚSICA, LINGUAGEM E MOVIMENTO

Expressão vocal No âmbito da Educação Musical, Carl Orff e Gunild Keetman não propuseram especificamente uma

iniciação no campo da percepção melódica. Entretanto, por meio de suas práticas, é possível perceber um processo

que normalmente se inicia na exploração das nuances da fala, parte para as primeiras ações de discriminação de

sons, e então definem-se os intervalos melódicos (WARNER, 1991).

O desenvolvimento do senso e percepção melódica, assim como em outros aspectos da abordagem da

Orff-Schulwerk, parte de um processo irrestrito e sem progressividade, considerando as características ativas,

criativas, reflexivas e participativas da aula, aliadas à expressão vocal da criança e ao material proveniente das

canções e brincadeiras tradicionais da cultura infantil.

Por meio do corpo, canto, escuta,

brincadeira e interação, a criança passa a

desenvolver a percepção melódica a partir da

discriminação de alturas, reconhecendo o

simples fato de dois sons serem diferentes.

Com a exploração e reflexão, o professor

apresenta e nomeia os registros de grave e

agudo, levando a criança a perceber aquilo que,

segundo Warner (1991, p. 77), normalmente

são reconhecidos como sons mais “suaves” (o

grave) e sons mais “intensos” (o agudo).

Uma vez percebidas alturas diferentes,

o processo natural no desenvolvimento da percepção melódica parte para a introdução de intervalos específicos.

A expressão natural da criança por meio do canto e da voz deve englobar o repertório tradicional da

realidade cultural na qual ela está inserida. Dessa forma, para este contexto educacional, considero os elementos

da música tradicional da infância brasileira, gênero cancioneiro que imprime a realidade infantil a partir das

dramatizações, brincadeiras e danças, relacionando-se com as ações de criar, jogar, pular, esconder e correr.

Este repertório caracteriza-se pela promoção de aspectos fundamentais para o desenvolvimento da criança

e para a transmissão e aproximação com a cultura a partir da voz, do movimento, das brincadeiras e dos desafios.

Page 12: MÚSICA, LINGUAGEM E MOVIMENTO

Processos didáticos

Os processos em Orff-Schulwerk referem-se às possibilidades de facilitação, desenvolvimento e

desdobramentos para atingir os mais variados objetivos elencados pelo grupo. A tarefa do professor em sala de

aula, consiste em mediar algumas dessas possíveis sequências de eventos com um certo de grau de autoconfiança,

conhecimento, imprevisibilidade e liberdade, abordando-as com atitudes positivas e ativas (SHAMROCK, 1990;

SOUSA, 2003).

Estas possibilidades e entendimentos a respeito dos processos de ensino/aprendizagem perpassam pelos

os elementos da abordagem Orff-Schulwerk e caminham entrelaçados às características da criança em suas

diferentes fases do desenvolvimento corporal, emocional, expressivo, criativo, imaginativo e interativo

(SHAMROCK, 1990).

Page 13: MÚSICA, LINGUAGEM E MOVIMENTO

PROPOSTAS E BRINCADEIRAS Este pequeno caderno de propostas e brincadeiras surge como um conjunto de possibilidades para inspirações, modificações e adequações às diferentes necessidades cultural e social da criança. É por meio da brincadeira que florescemos os eixos mais naturais de aproximação com a Música e o Movimento, partindo do pressusposto de uma aprendizagem fruitiva, livre, espontânea, ativa e criativa. Este livro eletrônico não deve ser encarado como uma “receita de bolo”, mas como um dispositivo para utilização das brincadeiras em sala de aula. São canções, parlendas e brincadeiras de domínio público e autoria própria que envolvem música corporal, interatividade, criação coletiva, movimento, literatura, dentre outras áreas. Os processos adotados para desenvolvimento das práticas são particulares aos mediadores. Entretanto, a partir da perspectiva da abordagem Orff-Schulwerk, consideramos estratégias de aproximação e revisitação das dinâmicas por meio da contação de histórias, representação, estímulos visuais, dança, brincadeiras, sendo estas canções e atividades “abertas” à criatividade e espontaneidade da sala de aula.

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Fui à China(Domínio público)

O que é? “Fui à China” é um jogo de mão tradicional, no qual, originalmente, os participantes realizam movimentos específicos aos recitarem determinadas palavras. A letra se repete, sempre utilizando as sentenças “fui à”, “saber o que era”, “todos eram” e “ligue-ligue”.

Letra

Fui à China-na Saber o que era China-na Todos eram China-na Ligue-ligue, ligue, China-na Fui ao Halley Saber o que era Halley Todos eram Halley Ligue-ligue, ligue, Halley Fui ao clips Saber o que era clips Todos eram clips Ligue-ligue, ligue, clips Fui ao dancê-cê Saber o que era dancê-cê Todos eram dancê-cê Ligue-ligue, ligue, dancê-cê

Propostas para brincar • Pense e ensine movimentos ou sons corporais específicos que

sigam ritmicamente as palavras que finalizam as sentenças.

• Uma vez que estes sons e movimentos foram utilizados, pense em mais um movimento ou som que represente o pulso das palavras iniciais das sentenças, exceto o trecho “ligue-ligue”.

• Estabeleça um som ou movimento para o trecho “ligue-ligue”. • Peça para seus alunos criarem movimentos, palavras ou sons

corporais que substituam as palavras finais das sentenças. • Brinque em duplas ou grupos, sempre se movimentando pelo

espaço.

Page 15: MÚSICA, LINGUAGEM E MOVIMENTO

Chocolate(Domínio público) O que é? “Chocolate” é uma brincadeira de mão tradicional, que em alguns lugares também é conhecida como “soco-soco, bate-bate”. É possível utilizar outras palavras trissílabas ou polissílabas, substituindo a palavra original chocolate.

Letra

Cho-co Cho-co La-la Cho-co Cho-co Te-te Cho-co La Cho-co Te Cho-co La-te

Propostas para brincar

• Escolha um movimento ou som corporal para as sílabas “cho-co”. De

preferência, siga o pulso da canção, em vez do ritmo das palavras.

• Uma vez compreendidos esses sons e movimentos, pense em mais um

movimento ou som que represente a sílaba “Lá”.

• Estabeleça um som ou movimento para a sílaba “Te”.

• Peça para seus alunos criarem movimentos, palavras ou sons corporais

para essas três sentenças diferentes.

• Brinque em duplas ou grupos e sempre se movimentando pelo espaço.

• Você pode realizar os movimentos e sons corporais sem cantar a letra.

Page 16: MÚSICA, LINGUAGEM E MOVIMENTO

Festa da bicharada(Cassiano Santos)

O que é? “Festa da bicharada” é uma canção e brincadeira cumulativa, gênero textual caracterizado por possuir padrões construídos de forma gradativa e adicional, onde a cada novo momento aparece uma nova personagem ou acontece um novo evento.

Letra

Na festa da bicharada Tinha um macaco Chamado pelo leão, Mas o leão não foi convidado. Na festa da bicharada Tinha uma zebra E tinha um macaco Chamado pelo leão, Mas o leão não foi convidado. Na festa da bicharada Tinha uma girafa E tinha uma zebra E tinha um macaco Chamado pelo leão, Mas o leão não foi convidado. ...

Propostas para brincar

• Escolha um movimento ou som corporal para as sílabas de cada

animal da canção.

• Pense em um número maior de participantes para esta festa. O

desafio é lembrar cada movimento e cada animal no decorrer da letra.

• É possível brincar em silêncio, em uma dinâmica de movimentos

cumulativos.

Page 17: MÚSICA, LINGUAGEM E MOVIMENTO

Arroz com lentilha(Domínio público)

O que é? “Arroz com lentilha” é um texto baseado na rítmica da parlenda norte-americana “Criss, cross, applesauce”. É uma brincadeira que pode ser feita em forma de ditado rítmico, interação com movimentos e/ou percussão corporal (baseado nos ensinamentos de Doug Goodkin).

Letra

Pão, pão, Leite, pão Pão, pão Leite, pão Pão, pão Leite, pão Arroz com lentilha. ...

Propostas para brincar

• Estabeleça um pulso comum para a recitação do texto.

• Você pode transpor essa rítmica para diferentes elementos: percussão

corporal, insturmentos de percussão, movimento, dentre outros.

• É possível brincar com opostos ao recitar o texto: agudo/grave,

legato/staccato, rápido/lento, piano/forte, dentre outras alternativas.

• Brincar com dois grupos também é uma possibilidade. Enquanto um

fica responsável pelo pulso, outro recita o texto e executa percussão

corporal.

• Quais outras palavras podem se encaixar nessa rítmica? Faça um

rearranjo em grupo.

Page 18: MÚSICA, LINGUAGEM E MOVIMENTO

Gelatina colorida(Cassiano Santos)

O que é? “Gelatina colorida” é um desafio de roda que implica em uma brincadeira com movimentos. As crianças escolhem cores para sua gelatina, sem poder repeti-lás. Depois, passam a perceber movimentos elementares como: sentar, derreter, levantar e andar.

Letra

Gelatina colorida Gelatina colorida Gelatina colorida É bom demais! Tem azul, Tem vermelho, Tem amarelo, Gelatina é bom demais! Tem _______ Tem _______ Tem _______ Gelatina é bom demais! ...

Propostas para brincar

• Estabeleça um pulso para a recitação do texto e utilize uma percussão

corporal simples para isso.

• Em roda, os alunos gradativamente acrescentam e escolhem uma cor

para a sua gelatina. Não pode repetir, e cada aluno fala uma cor.

• A cada três alunos, todos do grupo falam: “gelatina é bom demais”.

• Há uma melodia para exploração de movimentos elementares, como

sentar, derreter, levantar e andar. Dê um enfoque para o derreter,

baseado na consistência da sobremesa “gelatina”.

Page 19: MÚSICA, LINGUAGEM E MOVIMENTO

Bum, bum ti-á(Cassiano Santos)

O que é? “Bum, bum ti-á” é uma brincadeira de exploração de timbres, com enfoque na percussão corporal. É possível transpor os rítmos e sons para diferentes instrumentais e dinâmicas com movimentos e objetos.

Letra

Bum, bum Ti-á Bum, bum Ti-ê Mão no nariz, Outra mão na orelha Se prepare “pra” mexer (2x) Bum, bum, ti Bum, bum, à Bum, bum, ti-à Bum, bum, ti-à Bum, bum, ti Bum, bum, ê Bum, bum, ti-ê Bum, bum, ti-ê. ...

Propostas para brincar

• Cada sílaba da canção corresponde a um som corporal, que acompanha

as diferentes rítmicas das seções.

• Faça a percepção de sons grave, médio e agudo. Normalmente

utilizamos “Bum (grave)”; Ti (agudo); Á/Ê (médio).

• Você pode transpor essa rítmica e timbres para instrumentos de

percussão, movimentos e objetos.

• É possível rearranjar os tímbres com diferentes rítmicas. Os alunos

podem sequenciá-los e explorá-los da maneira que julgarem mais

criativa.

Page 20: MÚSICA, LINGUAGEM E MOVIMENTO

Auaiu-aiapé(Cassiano Santos)

O que é? “Auaiu-aiapé” é uma canção que estimula poéticamente a realização de movimentos, que podem ser rearranjados no decorrer da atividade. Cada trecho da canção significa um movimento específico da língua tupi-guarani (o material musical não é caractertísico do universo ritualístico e artístico da etnia Tupi-Guarani).

Letra

Auaiu-aiapé Peteca, peteca, peteca Auaiu-aiapé Peteca, peteca, peteca Cupe, Iandê Cupe, Iandê Apamorana Jaçanã Hu! ...

Propostas para brincar

• Cada palavra representa um movimento, que pode ser executado em

diferentes formações e interações (individualmente, em grupo, em

duplas, em roda, em filas).

• Aiaiu-aiapé (bater o pé) / Peteca (bater palma) / Cupe (virar) /

Apamorana (remexer) / Jaçanã (gritar).

• O grupo pode rearranjar novos movimentos ou uma nova letra para a

melodia da canção.

Page 21: MÚSICA, LINGUAGEM E MOVIMENTO

Mazu(Domínio público)

O que é? “Mazu” é uma brincadeira brasileira de roda. Entretanto, as formações e interações podem ser distintas, seguindo os movimentos propostos pela letra da canção.

Letra

Para dentro e para fora Mazu, mazu Para dentro e para fora Mazu, mazu, mazu Eu limpo essa janela Mazu, mazu Eu limpo essa janela Mazu, mazu, mazu Eu tiro um companheiro Mazu, mazu Eu tiro um companheiro Mazu, mazu, mazu Eu danço engraçadinho Mazu, mazu Eu danço engraçadinho Mazu, mazu, mazu. ...

Propostas para brincar

• Pense na formação e interação para a atividade. Pode ser em roda,

fileiras, individual ou em duplas.

• Basta seguir os movimentos propostos pela letra, e interagir sempre

que requisitado.

• É também uma brincadeira de escolha, principalmente quando dito “eu

tiro um companheiro”.

• As crianças podem rearranjar e reorganizar os movimentos propostos

pela letra, por meio da composição de uma nova.

Page 22: MÚSICA, LINGUAGEM E MOVIMENTO

Caderno de partituras Este caderno de partituras é um referencial para as abordagens em sala de aula. Entretanto, não necessita ser estritamente seguido, uma vez que consideramos modificações melódicas, rítmicas e harmônicas provenientes das criações coletivas ou necessidades de adequação às realidades cultural e social das crianças. .

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Page 24: MÚSICA, LINGUAGEM E MOVIMENTO
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ACESSO AO MATERIAL SONORO

NÃO RECOMENDAMOS O USO DIRETO DESTES AÚDIOS EM SALA DE AULA. Estes exemplos são referências para o professor.

ACESSO TAMBÉM PODE SER FEITO PELO QR CODE.

1. Fui à China YouTube: https://youtu.be/aSGMSBm6UkA

2. Chocolate YouTube: https://youtu.be/SiBrVr9EsNM

3. Festa da Bicharada YouTube: https://youtu.be/e9Od5FXsSrY

4. Arroz com lentilha YouTube: https://youtu.be/Mb-gsjEWhKg

5. Gelatina colorida YouTube: https://youtu.be/lKR96u-EpQQ

Page 28: MÚSICA, LINGUAGEM E MOVIMENTO

6. Bum bum ti-á YouTube: https://youtu.be/ef0UUtOQh9I

7. Auaiu-aiapé YouTube: https://youtu.be/_dK8bsWjIeI

8. Mazu YouTube: https://youtu.be/Xy-GzGONZBY

PALAVRAS FINAIS

Prezados professores,

Esperamos que este produto educacional seja útil em suas práticas pedagógico-musicais, servindo como incentivo

para o uso extensivo da brincadeira, coletividade, expressividade e criatividade em sala de aula. Além deste livro

eletrônico, boas referências a respeito do tema “Música e Movimento na Educação Infantil” são primordiais para

o desenvolvimento das dinâmicas com as crianças.

Também recomendamos a leitura da dissertação “MÚSICA E MOVIMENTO NA EDUCAÇÃO INFANTIL:

DIÁLOGOS POSSÍVEIS E CONEXÕES ENTRE A BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR E

PRÁTICAS PEDAGÓGICAS COM CRIANÇAS DE 5 ANOS A PARTIR DA PERSPECTIVA DA

ABORDAGEM ORFF-SCHULWERK”, na qual alguns processos metodológicos são descritos. Eles podem ser

úteis para suas práticas.

BOM TRABALHO!

Page 29: MÚSICA, LINGUAGEM E MOVIMENTO

Referências BONA, M. Carl Orff: um compositor em cena. In: MATEIRO, T.; ILARI, B. (Org.). Pedagogias em Educação Musical. Curitiba: InterSaberes, 2011. p. 125-156. BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Brasília, 2017. COOGAN, C. Movement – Level I. Orff-Schulwerk Certification Program – The San Francisco

International Orff Course. Carmel Valley Village, p. 1-9, ago. de 2014.

CUNHA, J.; CARVALHO, S.; MASCHAT, V. Abordagem Orff-Schulwerk: história, filosofia e princípios pedagógicos. Aveiro: UA Editora, 2015. FONTERRADA, M. De tramas e fios: um ensaio sobre música e educação. 2ª ed. São Paulo: Editora UNESP, 2008. GOODKIN, D. Play, sing and dance: an introduction to Orff-Schulwerk. 3ª ed. Nova Iorque: Schott Music, 2013. HASELBACH, B. Reflexiones sobre los aspectos educativos de la danza em el Orff-Schulwerk. In: HASELBACH, B.; MASCHAT, V.; SASTRE, F. (Org.) Textos sobre teoria y práctica del Orff Schulwerk. Vitoria Gasteiz: AgrupArte, 2011. p. 71-78. HASELBACH, B. Thoughts about movement and dance in Orff-Schulwerk and Elemental Music and Dance Education. Orff-Schulwerk Informationen. Salzburg, n. 82, p. 10-12, 2009. Disponível em: <http://www.orff-schulwerk-forum-salzburg.org/deutsch/orff_schulwerk_informationen/pdf/Heft_Nr_82.pdf>. Acesso em: 25 de abr. de 2020. HUIZINGA, Johan. Homo ludens: o jogo como elemento da cultura. 8ª ed. Tradução de João Paulo Monteiro. São Paulo: Perspectiva, 2018. PORCHER, L. Educação Artística: luxo ou necessidade? Tradução de Yan Michalski. 7ª ed. São Paulo: Summus, 1982. SHAMROCK, M. Process and improvisation in Orff-Schulwerk. In: CARDER, Polly. The Eclectic curriculum in American Music Education. Reston: Ed. MENC, 1990. 19-21. SOUSA, A. B. Educação pela Arte e Artes na Educação: bases psicopedagógicas. Lisboa: Edições Piaget, 2003 WARNER, B. Orff-Schulwerk: applications for the classroom. Upper Saddle River: Prentice-Hall, 1991.