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Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro Centro de Ciências e Tecnologias Agropecuárias - Laboratório de Engenharia Agrícola EAG 03204 Mecânica Aplicada Prof. Ricardo Ferreira Garcia [email protected] Motores de Combustão Interna 1. Introdução O motor de combustão interna é uma máquina que obtém energia mecânica diretamente do consumo de energia química de combustível queimado em uma câmara de combustão que é uma parte integral de um motor. Em 1867 na Alemanha, foi desenvolvido o motor com pistão livre, por Nicolaus August Otto (1832- 1891) e Eugen Langen (1833-1895), baseado na queima de uma mistura de ar e combustível por uma chama de gás dentro de um cilindro (Figura 1). Tal motor atingia uma eficiência térmica de 11%. Após evoluções no aspecto funcional visando maior eficiência térmica, Otto, em 1876, conseguiu desenvolver o motor baseado nos quatro tempos admissão, compressão, expansão ou potência e descarga. Foi obtido um motor com peso e volume reduzidos e grande eficiência térmica. Este foi o avanço que efetivamente fundou a indústria de motores de combustão interna. Figura 1. Motor criado por Otto e Langen em 1867.

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Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro Centro de Ciências e Tecnologias Agropecuárias - Laboratório de Engenharia Agrícola

EAG 03204 – Mecânica Aplicada Prof. Ricardo Ferreira Garcia – [email protected]

Motores de Combustão Interna

1. Introdução

O motor de combustão interna é uma máquina que obtém energia mecânica diretamente do consumo

de energia química de combustível queimado em uma câmara de combustão que é uma parte integral de

um motor.

Em 1867 na Alemanha, foi desenvolvido o motor com pistão livre, por Nicolaus August Otto (1832-

1891) e Eugen Langen (1833-1895), baseado na queima de uma mistura de ar e combustível por uma

chama de gás dentro de um cilindro (Figura 1). Tal motor atingia uma eficiência térmica de 11%. Após

evoluções no aspecto funcional visando maior eficiência térmica, Otto, em 1876, conseguiu desenvolver o

motor baseado nos quatro tempos – admissão, compressão, expansão ou potência e descarga. Foi obtido

um motor com peso e volume reduzidos e grande eficiência térmica. Este foi o avanço que efetivamente

fundou a indústria de motores de combustão interna.

Figura 1. Motor criado por Otto e Langen em 1867.

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Em 1892, Rudolf Diesel (1858-1913) desenvolveu um motor diferente onde a alta taxa de compressão

era utilizada na queima do combustível (Figura 2). O combustível era injetado próximo ao final da fase de

compressão onde era então queimado pelo ar comprimido altamente aquecido. A eficiência deste motor era

aumentada devido à alta taxa de compressão e relações de expansão. O motor Diesel atual é projetado no

mesmo princípio de funcionamento e é desenvolvido em quatro tempos e dois tempos.

No setor agrícola, os principais motores utilizados são de ciclo Otto de quatro tempos e dois tempos, e

ciclo Diesel de quatro tempos.

Figura 2. Motor criado por Diesel em 1892.

2. Componentes dos motores

As partes essenciais dos motores de ciclo Otto e Diesel de quatro tempos são praticamente as

mesmas e são classificadas da seguinte forma: - estacionários: bloco, cárter e cabeçote; móveis: pistão,

biela, eixo virabrequim, eixo de comando de válvulas, válvulas, conjunto de acionamento de válvulas

(tuchos, balancins, varetas), e engrenagens e polias diversas; bombas: bomba de óleo e bomba de água;

mancais: de escorregamento e de rolamento; e componentes de vedação: juntas, anéis e retentores.

A particularidade do motor Otto é que possui sistema de ignição com distribuidor, ou central eletrônica

de ignição, e vela de ignição, além do sistema de alimentação, que pode ser um sistema mecânico como o

carburador, ou sistema de injeção eletrônico composto pela central eletrônica e bico injetor de combustível.

No motor Diesel, a alimentação é realizada por uma bomba injetora de combustível e o bico injetor,

sem contar com a presença de sistema de ignição. Além destes detalhes construtivos, existem vários

detalhes funcionais, como aspiração de ar e combustível dentro do cilindro no Otto e apenas ar no Diesel.

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Enquanto isto, o motor dois tempos possui menos partes móveis, não apresentando válvulas de

admissão e descarga e seu respectivo comando. Apresenta ainda como diferencial as janelas de admissão,

descarga e transferência.

A Figura 3 apresenta os componentes de um motor de ciclo Otto de quatro tempos, no exemplo um

modelo Chrysler 2,2 L de quatro cilindros.

Figura 3. Motor de ciclo Otto de quatro tempos modelo Chrysler 2,2 L de quatro cilindros.

No bloco do motor estão localizados os cilindros. Na sua parte superior, está o cabeçote e na parte

inferior o cárter. O bloco normalmente é construído por ferro fundido cinzento, por apresentar grande

resistência ao desgaste, resistência à compressão e baixo custo de fabricação. Motores de veículos mais

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modernos, que buscam leveza, já são construídos em alumínio. O bloco possui dutos internos para

passagem de água para seu arrefecimento. Em alguns modelos, os cilindros são revestidos com uma

camisa de liga de aço e níquel ou revestido de cromo duro, normalmente mais resistentes que o bloco, para

permitir maior vida útil ao bloco, pois as camisas podem ser trocadas quando apresentam desgaste.

O pistão, normalmente fabricado em alumínio, trabalha em movimento alternado no cilindro

transmitindo a força do gás de expansão à biela e então ao ressalto do eixo virabrequim, que gira

fornecendo a potência do motor aos demais setores. No pistão, estão localizados anéis de compressão e

raspadores de óleo. Três anéis em aço são responsáveis pela compressão do motor, podendo ser

cromados ou nitretados. Os anéis de óleo de duas peças são produzidos tanto em ferro fundido cinzento ou

nodular e também em aço. O primeiro anel que fica quase na cabeça do pistão tem a função de conter a

pressão gerada pela explosão e evitando a perda de pressão na compressão. O segundo e terceiro anel

têm funções de ajudar a reter a compressão como o primeiro e de criar uma película de óleo quando o

mesmo raspa as paredes internas do cilindro. O anel de óleo tem a função de raspar o excesso de óleo e

criar uma fina película de lubrificação para que os outros anéis tenham o mínimo de atrito evitando o

desgaste entre anéis e cilindro.

A biela e o ressalto do eixo virabrequim transmitem o movimento linear do pistão em movimento

circular do virabrequim. A extremidade menor da biela trabalha em movimento alternado junto ao pistão e a

parte maior realiza o movimento rotacional com o virabrequim. A biela é normalmente fabricada em aço

forjado, possuindo uma bucha e pino em liga de aço que a fixa ao pistão. Na parte oposta, possui

casquilhos ou bronzinas de chumbo e estanho ou bronze (Figura 4).

Figura 4. Partes de um conjunto pistão e biela.

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O cabeçote é a tampa dos cilindros e é feito em alumínio ou ferro fundido (Figura 5). Nos motores Otto,

ele contém as velas de ignição e nos motores Diesel, possui bicos injetores. O cabeçote contém o sistema

de acionamento das válvulas de admissão e descarga. Normalmente, há duas válvulas por cilindro – uma

de admissão para permitir a entrada da carga no cilindro e uma de descarga para a saída dos gases

queimados do cilindro. A válvula de admissão possui maior diâmetro que a de descarga e são fabricadas

em liga de aço. Como trabalham no ambiente de queima de combustível, estão expostas a temperatura de

aproximadamente 700oC. As válvulas são acionadas através de um sistema de comando de válvulas e

balancins. Normalmente estão fechadas por meio da pressão de molas. São abertas quando o ressalto do

eixo de comando de válvulas aciona cada balancim. O eixo de comando de válvulas é acionado pelo eixo

virabrequim por engrenagens, correia ou corrente dentada. Duas voltas do virabrequim fornecem uma volta

ao comando de válvulas. A imagem do virabrequim e comando de válvulas está na Figura 6.

Figura 5. Partes de um cabeçote.

Na parte inferior do bloco do motor está o cárter, que fecha o bloco com uma tampa em aço moldado

ou alumínio. O cárter funciona como o reservatório de óleo que lubrifica o sistema. O óleo lubrificante é

succionado por uma bomba de óleo, acionada pelo eixo virabrequim, e é dirigido às partes móveis do motor

através de canais internos. A bomba de água, eixo do ventilador e dínamo são movidos pelo eixo

virabrequim por um sistema de correias e polias.

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Figura 6. Eixo virabrequim e eixo de comando de válvulas.

No motor Otto, um distribuidor é montado na parte posterior do bloco e possui um sistema de avanço

acionado por um mecanismo mecânico ou à vácuo que controla o ponto de ignição da vela. O distribuidor é

acionado por engrenagens pelo eixo do comando de válvulas e trabalha com metade da velocidade do

virabrequim. No motor Diesel, uma bomba injetora, acionada pelo comando de válvulas do motor, e bicos

injetores são utilizados e um bico injetor é montado na parte superior de cada cilindro.

3. Funcionamento dos motores

O cilindro, usualmente fixo, é fechado em uma extremidade e é onde desliza um pistão intimamente

ajustado. O movimento de ida e volta do pistão varia o volume do cilindro entre a face superior do pistão e a

extremidade fechada do cilindro. A face inferior do pistão é ligada ao eixo virabrequim por meio de uma

biela de conexão. O virabrequim transforma o movimento alternativo do pistão em movimento circular. Em

motores com vários cilindros, o virabrequim tem uma parte excêntrica para cada biela, de modo que a

potência de cada cilindro seja aplicada ao virabrequim no ponto apropriado de sua rotação. Os eixos

virabrequins têm volantes pesados e contrapesos, que pelas suas inércias minimizam a irregularidade do

movimento do eixo. Um motor pode ter de um a vários cilindros.

O sistema de fornecimento de combustível de um motor de combustão interna consiste de um tanque,

uma bomba de combustível, e um dispositivo para vaporizar ou atomizar o combustível líquido. Nos motores

de ciclo Otto este dispositivo é o carburador, ou nos modelos mais recentes, um sistema de injeção de

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combustível. Na maioria dos motores com carburador, o combustível vaporizado é conduzido aos cilindros

através dutos de admissão.

O combustível é admitido por cada cilindro e os gases são expelidos através de válvulas operadas

mecanicamente. As válvulas são normalmente mantidas fechadas por meio da pressão de molas e são

abertas no instante apropriado durante o ciclo de operação por ressaltos que são engrenados ao eixo

virabrequim. Por volta dos anos 80, sistemas mais sofisticados de injeção de combustível, também usados

em motores de ciclo Diesel, têm substituído largamente os métodos tradicionais de fornecimento da mistura

apropriada de ar e combustível. Em motores com injeção de combustível, sistemas de monitoramento

controlados mecanicamente ou eletronicamente injetam a quantidade apropriada de mistura diretamente no

cilindro ou na válvula de admissão no instante oportuno. A mistura vaporiza assim que entra no cilindro.

Este sistema é mais eficiente que o carburador gerando maior potência e produz menos poluição.

Em todos os motores deve existir algum meio de ignição do combustível. Por exemplo, o sistema de

ignição do motor de ciclo Otto consiste em uma fonte de baixa voltagem, de corrente contínua que é

conectada ao enrolamento primário de um transformador, chamado de bobina de ignição. A corrente é

interrompida várias vezes por segundo por uma chave automática chamada de platinado. A pulsação da

corrente no primário induz a uma alta voltagem pulsante no enrolamento secundário. A alta voltagem é

distribuída para cada cilindro em seqüência por meio de um mecanismo de rotação chamado de distribuidor.

O dispositivo de ignição é a vela de centelha, ou vela de ignição, um condutor isolado disposto na

parede ou no topo de cada cilindro. Na parte inferior da vela existe uma pequena folga entre dois

condutores. A alta voltagem forma um arco voltaico entre esta folga, formando uma faísca que faz a ignição

da mistura no cilindro.

Figura 7. Conjunto pistão-biela-virabrequim do motor de Ciclo Otto.

Devido ao calor da combustão, todos os motores devem ser equipados com algum tipo de sistema de

refrigeração. Alguns motores de avião e automóveis, pequenos motores estacionários, e motores externos

de barcos são refrigerados pelo ar. Neste sistema, a superfície externa do cilindro tem várias aletas

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dispostas com uma grande área de radiação do calor do cilindro. Outros motores são refrigerados por água

e têm dutos internos no cilindro por onde circula água responsável por roubar o calor do motor. A água

circula pelos dutos forçada por meio de uma bomba de água e é resfriada nas serpentinas finas do radiador.

Diferentes das máquinas a vapor e turbinas, os motores de combustão interna não desenvolvem torque

quando dão partida, e um torque inicial deve ser fornecido para girar o eixo virabrequim por meio de um

motor elétrico ou um motor de arranque que é conectado por meio de engrenagens ao virabrequim com

uma embreagem automática que desengata as engrenagens após a partida do motor. Pequenos motores

podem ter partida manual girando o virabrequim com uma alavanca ou puxando uma corda enrolada várias

vezes no volante do motor. Métodos de partida de grandes motores incluem partida com inércia, que

consiste em um volante que é girado manualmente ou por motor elétrico até a energia cinética ser suficiente

para girar o virabrequim, e partida por explosão, que consiste na explosão de um cartucho que movimenta

uma roda acoplada ao motor. Estes tipos de partida são largamente usados em partidas de motores de

avião.

3.1 Motores de ciclo Otto

Um motor de ciclo Otto típico é um motor de quatro tempos, ou seja, em um ciclo completo, seus

pistões desenvolvem quatro tempos, dois próximos da cabeça do cilindro e dois distantes da cabeça do

cilindro. Os motores de dois tempos combinam em dois cursos as funções dos de quatro tempos, sendo

assim, há um curso motor para cada volta completa do virabrequim. Porém, possuem eficiência menor do

que os de quatro tempos.

A eficiência de um motor de ciclo Otto moderno é limitada por vários fatores, incluindo perdas por

refrigeração e por atrito. Em geral, a eficiência destes tipos de motores é determinada pela taxa de

compressão do motor. A taxa de compressão, relação entre os volumes máximos e mínimos da câmara de

combustão, é usualmente cerca de 8:1 ou 10:1. Maiores taxas de compressão, acima de 15:1, com um

conseqüente incremento de eficiência, são possíveis com o uso de combustíveis antidetonantes de alta

octanagem. A eficiência de um moderno motor Otto varia na faixa de 20 a 25%, em outras palavras,

somente esta porcentagem da energia calorífica do combustível é transformada em energia mecânica.

3.1.1 Funcionamento do motor de ciclo Otto de quatro tempos

Seu ciclo é dividido em quatro tempos a seguir: admissão, compressão, expansão (ou potência), e

descarga. Em cada tempo, o virabrequim gira 180o em torno de seu eixo, sendo necessários 720

o para um

ciclo completo.

Admissão

Durante o primeiro tempo do ciclo, a admissão, o pistão se move do ponto morto superior (PMS) para o

ponto morto inferior (PMI) do cilindro enquanto que simultaneamente a válvula de admissão se abre,

formando-se uma pressão abaixo da atmosférica no interior do cilindro. O movimento do pistão durante este

tempo suga uma quantidade de mistura de ar e combustível para dentro do cilindro devido à diferença de

pressão.

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Figura 8. Fase de admissão.

Compressão

Durante a compressão, o pistão se move do PMI ao PMS do cilindro comprimindo a mistura ar e

combustível na câmara de combustão, espaço vazio no topo do cilindro quando o pistão está no PMS.

Neste tempo as válvulas de admissão e descarga se encontram fechadas.

Figura 9. Fase de compressão.

Expansão

Pouco antes de o pistão atingir o PMS, o sistema de ignição transmite corrente elétrica à vela, fazendo

soltar uma faísca entre seus eletrodos, que inflama a mistura fortemente comprimida, havendo grande

incremento de pressão e temperatura. A combustão ocorre principalmente na condição de volume

constante. Os gases queimados expandem exercendo pressão sobre o pistão, que é movido do PMS para o

PMI no terceiro tempo. A expansão também ocorre com as duas válvulas fechadas. Pouco antes do PMI, a

válvula de descarga se abre. A pressão e temperatura se reduzem durante a expansão. É nesta fase que se

produz energia mecânica.

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Figura 10. Fase de expansão.

Descarga

Durante o último tempo, a descarga, o pistão se desloca do PMI para o PMS, encaminhando os gases

queimados para fora do cilindro por meio da válvula de descarga, que é aberta, deixando assim o cilindro

pronto para repetir um novo ciclo. A válvula de admissão permanece fechada. A pressão durante esta fase

é pouco superior à pressão atmosférica. A válvula de descarga se fecha próxima do fim da fase. Parte dos

gases ainda permanece no volume da câmara de combustão. A nova carga de ar e combustível que será

admitida no próximo ciclo é misturada a estes gases residuais.

Figura 11. Fase de descarga.

3.1.2 Funcionamento do motor de ciclo Otto de dois tempos

O princípio geral de um motor dois tempos é encurtar o período em que o combustível é introduzido à

câmara de combustão e em que os gases liberados são expelidos em uma pequena fração da duração do

tempo ao invés de permitir que cada uma destas operações ocupe um tempo inteiro. Nos motores de dois

tempos mais simples, as válvulas do cabeçote são substituídas por válvulas tubulares ou janelas de

transferências – aberturas na parede do cilindro que são cobertas pelo pistão no final de seu percurso para

cima.

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A lubrificação do conjunto pistão-biela-virabrequim é feita adicionando-se óleo ao combustível, e ocorre

no momento em que a mistura de ar, combustível e óleo é introduzida no cilindro para posterior queima.

No primeiro tempo do ciclo, quando ocorrem a admissão e compressão simultaneamente, durante o

movimento ascendente do pistão, do PMI ao PMS, a janela de transferência e as janelas de admissão e

descarga permanecem fechadas, devido à geometria de posição das mesmas em relação ao curso do

pistão. Nessas condições, origina-se vácuo parcial na parte inferior do motor, ao mesmo tempo em que

ocorre compressão da mistura na câmara de compressão acima do pistão. Próximo ao PMS, a saia do

pistão permite a abertura da janela de admissão e o vácuo succiona a mistura para a parte inferior do motor.

Figura 12. Fase de admissão e compressão do motor de ciclo Otto de dois tempos.

Quando o pistão aproxima-se do PMS, o sistema de ignição transmite corrente elétrica à vela, fazendo

soltar uma faísca entre seus eletrodos, que inflama a mistura fortemente comprimida na parte superior do

pistão. A pressão de expansão dos gases provenientes da combustão atua sobre o pistão, empurrando-o

em direção ao PMI. Ocorrem então o segundo tempo, a expansão e descarga. Durante o curso

descendente do pistão, a janela de transferência e o canal de admissão permanecem fechados,

comprimindo-se assim a mistura admitida na parte inferior do motor. Próximo ao PMI, a cabeça do pistão

permite a abertura da janela de transferência e o canal de descarga, permitindo que os gases queimados

sejam expelidos, ao mesmo tempo em que a nova mistura é injetada para a câmara do cilindro, através da

janela de transferência. Desta forma, a nova mistura, ao entrar no cilindro, ajuda a expelir os gases

queimados pela janela de descarga.

Figura 13. Fase de expansão e descarga do motor de ciclo Otto de dois tempos.

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3.2 Motores de ciclo Diesel

Teoricamente, o motor de ciclo Diesel difere do ciclo Otto por ter sua combustão a volume constante ao

invés de ocorrer à pressão constante e utiliza alta taxa de compressão.

A eficiência do motor tipo Diesel, que é geralmente determinada pelos mesmos fatores que do ciclo

Otto, é maior que de qualquer motor do ciclo Otto e atualmente atingem mais que 40%. Motores tipo Diesel

são, geralmente, motores de baixa rotação, com a velocidade do virabrequim entre 100 a 750 rpm quando

comparados aos 2.500 a 5.000 rpm de um motor típico de ciclo Otto. Alguns tipos de Diesel, porém,

trabalham em velocidades até 2.000 rpm. Devido ao fato de motores de ciclo Diesel usarem taxas de

compressão de 14:1 ou mais, estes são geralmente mais pesados, e esta desvantagem é compensada pela

sua grande eficiência e pelo fato de poderem ser operados com óleos combustíveis mais baratos.

3.2.1 Funcionamento do motor de ciclo Diesel de quatro tempos

Na admissão, só ocorre entrada de ar pela válvula de admissão, quando o pistão percorre o cilindro do

PMS ao PMI. Nesta fase, apenas a válvula de admissão está aberta.

No segundo tempo, a compressão, com as válvulas fechadas, o ar é comprimido a uma pequena

fração de seu volume inicial e é aquecido a aproximadamente 440oC devido a esta compressão, com a

pressão também sofrendo elevação. Quando o pistão quase atinge o PMS, o combustível é injetado na

câmara de combustão e se queima instantaneamente devido à alta temperatura do ar na câmara. A ignição

ocorre depois de curto atraso e a pressão aumenta rapidamente ocorrendo uma onda de pressão.

Esta combustão movimenta o pistão para baixo no terceiro tempo, ou expansão. O trabalho é realizado

pela pressão do gás sobre o pistão. Durante a fase de expansão, a temperatura e pressão do gás queimado

se reduzem. Quando o pistão se aproxima do PMI, a válvula de descarga se abre.

O quarto tempo, a descarga, ocorre com o pistão expulsando os gases queimados pela válvula de

descarga. Próximo ao PMS, a válvula de admissão se abre novamente e o ciclo é repetido.

Figura 14. Fases do motor ciclo Diesel de quatro tempos: admissão; compressão; expansão; e descarga.

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4. Comparativo entre motores Otto e Diesel de quatro tempos

Motor Otto Motor Diesel

É desejável um combustível com maior temperatura de autoignição, como a gasolina e etanol.

É desejável um combustível com baixa temperatura de autoignição, como o óleo diesel.

Uma mistura de ar e combustível em forma de gás é induzida no cilindro na fase de admissão através do carburador ou sistema de injeção com bomba e bico injetor.

A quantidade de ar induzida é fixa, mas a quantidade de combustível injetada varia de acordo com a bomba. A relação ar-combustível é variada de acordo com a variação da carga.

Uma faísca é requerida para queimar o combustível, sendo necessário um sistema de ignição.

A combustão ocorre devido à autoignição do combustível, não sendo necessário um sistema de ignição.

É aplicada uma taxa de compressão de 6 a 10,5:1. O limite superior é definido pela qualidade antidetonante do combustível. O motor tende a ter pré-ignição com alta taxa de compressão.

Taxa de 14 a 22:1 é aplicada. O limite superior da taxa é definido pela alto aumento de peso do motor. O motor tende a ter pré-ignição com baixa taxa de compressão do motor.

A eficiência em carga parcial é baixa, uma vez que a relação ar/combustível não sofre muita variação. Um sistema de injeção de combustível multi ponto (MPFI) é utilizado para aumentar a eficiência.

A eficiência em carga parcial é boa. Assim que a carga se reduz, o fornecimento de combustível pode ser reduzido e uma mistura pobre pode ser utilizada.

O custo do combustível é mais alto. O custo do diesel é mais baixo. Além disto, como possui maior densidade e é vendido em base de volume, maior massa é obtida com 1 L.

O ruído e vibração do motor são inferiores. Maior vibração e ruído devido a componentes mais pesados devido à maior taxa de compressão.

Os principais poluentes são monóxido de carbono (CO), óxidos de nitrogêncio (NOx) e hidrocarbonetos (HC)

Além de CO, NOx e HC, fuligem e fumaça também são expelidos na atmosfera.

6. Comparativo entre motores dois tempos e quatro tempos

Motor dois tempos Motor quatro tempos

Uma fase de potência e um ciclo completo são obtidos a cada volta do virabrequim.

Uma fase de potência e um ciclo são obtidos a cada duas voltas do virabrequim.

O movimento circular do virabrequim é mais uniforme e portanto um volante de inércia mais leve é exigido pra girar o eixo uniformemente.

O movimento do virabrequim é mais desuniforme por existir apenas uma fase de potência a cada duas revoluções do eixo. Portanto um volante de inércia mais pesado é exigido pra girar o eixo uniformemente.

A potência gerada para um mesmo tamanho de motor quatro tempos é maior, e para a mesma potência gerada, o motor é menor em tamanho, pois uma fase de potência ocorre a cada revolução.

A potência gerada para um mesmo tamanho de motor dois tempos é menor, e para a mesma potência gerada, o motor é maior em tamanho, pois uma fase de potência ocorre a cada revolução.

O motor é leve em peso e não possui sistema de válvulas. Desta forma, seu custo inicial é menor.

Devido ao maior peso e presença de mecanismo de válvulas, o custo inicial é maior.

Possui menor eficiência térmica e volumétrica. Parte dos gases não queimados escapa durante a fase de descarga.

Devido ao fato da descarga ocorrer numa fase separada e maior tempo de indução, possui maior eficiência.

Usado onde é importante o baixo custo, baixo peso e compacidade, como motores costais, scooters, ciclomotores, cortadores de grama, barcos, motocicletas, etc. Motores diesel dois tempos são utilizados em navios grandes e locomotivas.

Utilizado onde a alta eficiência é exigida como automóveis, geradores e aviões.

Normalmente, são arrefecidos a ar e o desgaste é maior. Usualmente, o óleo é misturado ao combustível.

Normalmente, são arrefecidos a água, com menor desgaste. Consome menor quantidade de lubrificante e este é colocado no cárter, não sendo misturado ao combustível.

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5. Sistemas complementares do motor

O motor exige sistemas complementares para seu funcionamento, destacando os sistemas de

combustível, admissão e descarga, lubrificação, refrigeração, elétrico e governador.

6. Terminologia básica

Diâmetro do cilindro (d) – é o diâmetro interno do cilindro do motor.

Curso do pistão (L) – durante o percurso do pistão, existem limites

superiores e inferiores onde o movimento do pistão é revertido.

A distância linear entre estes limites é o curso do pistão. É igual a

duas vezes o tamanho do ressalto, L = 2a, onde a é o raio do ressalto.

Ponto morto superior (PMS) – é a posição que o pistão atinge na parte

superior do cilindro de seu curso.

Ponto morto inferior (PMI) – é a posição que o pistão atinge na parte

inferior do cilindro de seu curso.

Câmara de compressão (Vc) – é o volume contido no cilindro na parte superior do pistão quando este se

encontra no PMS.

Volume do curso do pistão (Vp) – é o volume varrido pelo pistão quando este se desloca do PMI ao PMS.

4

2 LdVp

eq. 1

A cilindrada do motor é calculada multiplicando-se o volume do curso Vp pelo número de cilindros do

motor, e se refere a capacidade que um motor tem de absorver, em volume, uma quantidade de mistura ar e

combustível para dentro do cilindro do motor.

Volume do cilindro (V) – é o volume total do cilindro, incluindo o volume do curso do pistão e o volume da

câmara de compressão.

cp VVV eq. 2

Taxa de compressão (TC) – é a relação entre o volume quando o pistão está no PMI pelo volume quando

o pistão está no PMS. Portanto, é a relação do volume total do cilindro (V) pelo volume da câmara (Vc).

c

cp

V

VVTC

eq. 3

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7. Exercícios

1) Um motor ciclo Otto 4T de quatro cilindros tem o diâmetro do cilindro de 8,3 cm e curso do pistão de 6,9

cm. Calcule sua cilindrada. (4T = quatro tempos).

(R: 1.492,6 cm3).

2) Considerando o motor acima, calcule a taxa de compressão (TC) se o volume de cada câmara de

compressão mede 54 cm3.

(R: 7,9:1 ou 7,9 para 1).

3) Um motor 3.0 L de seis cilindros ciclo Otto trabalha no ciclo de quatro tempos. O motor tem taxa de

compressão de 9:1 e é quadrado (o diâmetro do cilindro tem a mesma medida do curso do pistão).

Determine o diâmetro do cilindro (d), curso do pistão (L) e a câmara de compressão (Vc).

(R: 8,6 cm, 8,6 cm e 62,5 cm3).

4) Considere um motor de quatro cilindros 4T com diâmetro de 8,5 cm e curso do pistão de 8,8 cm e taxa de

compressão de 9:1. Calcule o volume do curso do pistão (Vp), volume do cilindro (V), cilindrada e câmara de

compressão (Vc). (R: 499 cm3, 561,4 cm

3, 1996 cm

3, 62,4 cm

3).