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III SIMPÓSIO SOBRE A BIODIVERSIDADE DA MATA ATLÂNTICA. 2014 223 223 Morfologia dos Órgãos Vegetativos de Quatro Espécies Conhecidas como Quebra- Pedra L. O. da Conceição¹* & E. M. Aoyama¹ 1 Universidade Federal do Espírito Santo/Ceunes *Email para correspondência: [email protected] Introdução O emprego de plantas medicinais na recuperação da saúde tem evoluído ao longo dos tempos desde as formas mais simples de tratamento local, provavelmente utilizada pelo homem das cavernas, até as formas tecnologicamente sofisticadas da fabricação industrial utilizada pelo homem moderno. Desde os tempos imemoráveis, os homens buscam na natureza recursos para melhorar suas próprias condições de vida, aumentando suas chances de sobrevivência (Lorenzi et al., 2008). No Brasil, a utilização de produtos à base de plantas, vem sendo estimulada, mas fatores como a enorme variedade de espécies vegetais disponíveis, a grande desinformação relacionada ao tema e o fraco desenvolvimento tecnológico desta área no país, vêm comprometendo a real eficácia e segurança dos produtos utilizados (Brandão et al., 2002). Cada vez mais a população brasileira busca alternativas para o tratamento de doenças. A maioria das pessoas não busca atendimento médico, consumindo produtos que podem colocar em risco sua saúde (Aita et al., 2009). As famílias Euphorbiaceae e Phyllanthaceae são amplamente distribuídas, porém mais diversas em regiões tropicais. A Euphorbiaceae possui 222 gêneros e 6.100 espécies, entre os gêneros desta família se encontra Euphorbia. A Phyllanthaceae possui 55 gêneros e 1.745 espécies, sendo Phyllanthus o gênero com maior número de espécies (1.270), e muitas dessas espécies são utilizadas na medicina ou como veneno para capturar peixes (Judd et al., 2009). O nome popular quebra-pedra designa tanto espécies do gênero Phyllanthus quanto espécies do gênero Euphorbia (Aita et al., 2009). Diferentes espécies conhecidas como quebra-pedras são utilizadas popularmente para problemas renais, muitas comercializadas fragmentadas, dificultando a identificação correta das espécies (Aita et al., 2009).

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III SIMPÓSIO SOBRE A BIODIVERSIDADE DA MATA ATLÂNTICA. 2014 223

223

Morfologia dos Órgãos Vegetativos de Quatro Espécies Conhecidas como Quebra-Pedra

L. O. da Conceição¹* & E. M. Aoyama¹

1Universidade Federal do Espírito Santo/Ceunes *Email para correspondência: [email protected]

Introdução

O emprego de plantas medicinais na recuperação da saúde tem evoluído ao longo dos

tempos desde as formas mais simples de tratamento local, provavelmente utilizada pelo

homem das cavernas, até as formas tecnologicamente sofisticadas da fabricação industrial

utilizada pelo homem moderno. Desde os tempos imemoráveis, os homens buscam na

natureza recursos para melhorar suas próprias condições de vida, aumentando suas chances

de sobrevivência (Lorenzi et al., 2008).

No Brasil, a utilização de produtos à base de plantas, vem sendo estimulada, mas fatores

como a enorme variedade de espécies vegetais disponíveis, a grande desinformação

relacionada ao tema e o fraco desenvolvimento tecnológico desta área no país, vêm

comprometendo a real eficácia e segurança dos produtos utilizados (Brandão et al., 2002).

Cada vez mais a população brasileira busca alternativas para o tratamento de doenças. A

maioria das pessoas não busca atendimento médico, consumindo produtos que podem

colocar em risco sua saúde (Aita et al., 2009).

As famílias Euphorbiaceae e Phyllanthaceae são amplamente distribuídas, porém mais

diversas em regiões tropicais. A Euphorbiaceae possui 222 gêneros e 6.100 espécies, entre

os gêneros desta família se encontra Euphorbia. A Phyllanthaceae possui 55 gêneros e

1.745 espécies, sendo Phyllanthus o gênero com maior número de espécies (1.270), e

muitas dessas espécies são utilizadas na medicina ou como veneno para capturar peixes

(Judd et al., 2009).

O nome popular quebra-pedra designa tanto espécies do gênero Phyllanthus quanto

espécies do gênero Euphorbia (Aita et al., 2009).

Diferentes espécies conhecidas como quebra-pedras são utilizadas popularmente para

problemas renais, muitas comercializadas fragmentadas, dificultando a identificação

correta das espécies (Aita et al., 2009).

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224 CONCEIÇÃO & AOYAMA: MORFOLOGIA DOS ÓRGÃOS VEGETATIVOS DE QUEBRA-PEDRA

Pelo fato de plantas medicinais serem usadas erroneamente por muitos, pela má

identificação de espécies, este trabalho tem como intuito estudar quatro espécies

conhecidas popularmente como quebra-pedra, para que estas possam ser diferenciadas por

padrões morfológicos dos órgãos vegetativos (raiz, caule e folha), e assim contribuir com

informações para identificação das espécies.

Material e Métodos

Foram realizadas coletas de quatro espécies de plantas conhecidas como quebra-pedra:

Phyllanthus tenellus Roxb., Phyllanthus amarus Schumach. & Thonn. e Euphorbia

hyssopifolia L., Euphorbia prostrata Aiton. no Campus da Universidade Federal do

Espírito Santo, São Mateus, entre os meses de janeiro e fevereiro. O material coletado foi

colocado em prensas, desidratado em estufa e posteriormente identificado. As exsicatas

foram depositadas no herbário do Centro Universitário Norte do Espírito Santo (CEUNES)

sob os números 24526, 24754 para Phyllanthus tenellus; 23547, 29095 para Phyllanthus

amarus 24638, 29060 para Euphorbia hyssopifolia e 24640, 28330 para Euphorbia

prostrata. A análise morfológica das partes vegetativas (raiz, caule e folha) foi realizada no

laboratório de Botânica da UFES, Campus São Mateus, com base na terminologia das

obras de Souza et al. (2013) e Vidal & Vidal (2003).

Resultados e Discussão

Phyllanthus tenellus Roxb. (Figura 1A)

Raiz subterrânea pivotante, caule aéreo ereto do tipo haste com cor verde avermelhado,

porte herbáceo. Folhas simples, alternas dísticas com pecíolo muito curto (figura 2), lâmina

obovada, ápice obtuso, base obtusa a aguda, margem inteira, nervação peninérvea.

Phyllanthus amarus Schumach. &Thonn. (Figura 1B)

Raiz subterrânea pivotante, caule aéreo ereto do tipo haste de cor verde, porte herbáceo.

Folhas simples, alternas dísticas com pecíolo muito curto (figura 3), lâmina oblonga, ápice

arredondado, base arredondada, margem inteira, nervação peninérvea.

Euphorbia hyssopifolia L. (Figura 1C)

Raiz subterrânea pivotante, caule aéreo ereto do tipo haste de cor avermelhada, porte

herbáceo. Folhas simples, opostas (figura 4), de lâmina oval a lanceolada, ápice obtuso a

agudo, base obtusa, margem serreada, nervação triplinérvea.

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III SIMPÓSIO SOBRE A BIODIVERSIDADE DA MATA ATLÂNTICA. 2014 225

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Euphorbia prostrata Aiton (Figura 1D)

Raiz subterrânea pivotante, caule aéreo rastejante do tipo prostrado com cor avermelhada,

folhas simples, opostas com pecíolo muito curto (figura 5), lâmina oblonga a obovada,

ápice obtuso a arredondado, base assimétrica, margem aparentemente inteira, porém

levemente denteada se observada em lupa, nervação triplinérvea.

Figuras 1-5. 1) Aspecto geral das quatro espécies de quebra-pedra: A) Phyllanthus tenellus Roxb. B) Phyllanthus amarus Schumach. & Thonn. C) Euphorbia hyssopifolia L. D) Euphorbia prostrata Aiton. 2) Phyllanthus tenellus: evidenciando a filotaxia alterna dística. 3) Phyllanthus niruri: evidenciando a filotaxia alterna dística. 4) Euphorbia hyssophifolia: evidenciando a filotaxia oposta. 5) Euphorbia prostrata: evidenciando a filotaxia oposta.

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226 CONCEIÇÃO & AOYAMA: MORFOLOGIA DOS ÓRGÃOS VEGETATIVOS DE QUEBRA-PEDRA

Figuras 6-13. Folhas das quatro espécies de quebra-pedras. 6-9) Face adaxial. 10-13) Face abaxial. 6 e 10) Phyllanthus tenellus Roxb. 7 e 11) Phyllanthus amarus Schumach. & Thonn. 8 e 12) Euphorbia hyssopifolia L. 9 e 13) Euphorbia prostrata Aiton.

Silva & Sales (2004) descreveram que P. tenellus e P. amarus possuem ramificação

filantóide com ramos pinatiformes (por apresentar folhas dispostas disticamente,

assemelhando-se a uma folha composta pinada) assim como outras espécies do gênero: P.

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III SIMPÓSIO SOBRE A BIODIVERSIDADE DA MATA ATLÂNTICA. 2014 227

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minutulus, P.niruri, e P. stipulatus. Segundo (Aita et al., 2009), P. tenellus possui folhas

dispostas opostamente, diferente do que foi descrito neste estudo e por (Silva e Sales,

2007) que confirmam que as folhas em Phyllanthus são alternas. Os caracteres aqui

descritos para E. prostrata se assemelham a descrição feita por (Aita et al., 2009), na qual

acrescenta que as folhas são glabras, com bordo serrado ou esparsamente dentado.

A falta de identificação botânica ou incorreta pode anular todo um trabalho. Além disso,

pode gerar informações incorretas, levar a conclusões errôneas e uso indevido de uma

espécie. Muitos são os casos de intoxicação com plantas, pois as semelhanças morfológicas

levam as pessoas ao consumo de uma espécie acreditando ser outra. A despeito do seu

potencial, produtos preparados com plantas nativas vêm sendo progressivamente excluídos

da medicina oficial devido à ausência de estudos que confirmem suas eficácias, segurança e

qualidade (Verdam & Silva 2010).

Conclusão

Conclui-se que as espécies descritas, tanto as do gênero Phyllanthus quanto do gênero

Euphorbia são bastante semelhantes, porém podem se diferenciar pelas folhas, mais

precisamente pelo ápice, base ou bordo foliar e também pela filotaxia, na qual as espécies

de Phylanthus possuem folhas alternas dísticas e as espécies de Euphorbia possuem folhas

opostas.

Literatura Citada

Aita, A. M.; Matsuura, H. N. Machado, C. A. & Ritter, M. R. 2009. Espécies medicinais

comercializadas como “quebra-pedras” em Porto Alegre, Rio Grande do Sul,

Brasil. Revista Brasileira de Farmacognosia Brazilian Journal of Pharmacognosy,

Porto Alegre, 19(2A): 471-477.

Brandão, M.G.L.; Alves, R.M.S.; Moreira, R.A.; Oliveira, P.; Vieira, M.T. & Moreira-

Campos, L.M. 2002. Qualidade de amostras comerciais de chás de plantas

medicinais. Revista Brasileira de Plantas Medicinais, Botucatu, 5(1): 56-9.

Da Silva, M.J. & Sales, M.F. 2007. Phyllanthus L. (Phyllanthaceae) em Pernambuco,

Brasil.. Acta bot. bras. 21(1): 79-98.

Da Silva, M.J. & Sales, M.F. 2004. O gênero Phyllanthus L. (Phyllantheae –

Euphorbiaceae Juss.) no bioma Caatinga do estado de Pernambuco – Brasil.

Rodriguésia 55 (84): 101-126.

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228 CONCEIÇÃO & AOYAMA: MORFOLOGIA DOS ÓRGÃOS VEGETATIVOS DE QUEBRA-PEDRA

Garcia, C.M.; Zanetti G.D.; Zago, A.M.; Bittencourt, C.F. & Heinzmann, B.M. 2004.

Estudo Morfo-Anatômico de Phyllanthus niruri L. e Phyllanthus tenellus Roxb.

Acta Farm. Bonaerense. 23 (1): 67-70.

Judd, W.S.; Campbell, C. S.; Kellogg, E. A.; Stevens, P. F. S. & Donoghu, M. J. 2009.

Sistemática vegetal: um enfoque filogenético. 3 ed. Porto Alegre: Artmed. 632p.

Lorenzi, H. & Matos, F.J.A. 2008. Plantas medicinais no Brasil: nativas e exóticas. 2.ed.

Nova Odessa, São Paulo: Instituto Plantarum. 512p.

Souza, V.C.; Flores, T.B. & Lorenzi, H. 2013. Introdução à botânica: morfologia. Nova

Odessa, São Paulo: Instituto Plantarum de Estudos da Flora. 224p.

Verdam, M. C. S. & da Silva, C. B. 2010. O Estudo de Plantas Medicinais e a Correta

Identificação Botânica. Visão Acadêmica, Curitiba, 11(1): 7-13

Vidal, V. N. & Vidal, M. R. R. 2006. Botânica - organografia: quadros sinóticos ilustrados

de fanerógamos. 4.ed. Viçosa, Minas Gerais: UFV.