monografia final
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SEMINÁRIO EVANGÉLICO DA IGREJA DE DEUS
THIAGO DEZEMBRE BUENO
A INSPIRAÇÃO E SUFICIÊNCIA DA ESCRITURA: UMA ABORDAGEM DE 2
TIMÓTEO 3:16, 17.
GOIÂNIA-GO
2013
THIAGO DEZEMBRE BUENO
A INSPIRAÇÃO E SUFICIÊNCIA DA ESCRITURA: UMA ABORDAGEM DE 2
TIMÓTEO 3:16, 17.
Trabalho de Conclusão do Curso de Formação
Eclesiástica Plena em Teologia para obtenção
do título de Bacharel em Teologia do
Seminário Evangélico da Igreja de Deus.
Orientador: Paulo Freitas
GOIÂNIA-GO
2013
Dedico este trabalho a todos os meus amigos e
irmãos na fé principalmente aqueles que
sempre estiveram ao meu lado tanto em
momentos difíceis como em momentos alegres.
Dedico especialmente à minha esposa
(Camila) companheira, amiga, que tanto
confio e amo.
AGRADECIMENTOS
A construção deste trabalho só foi possível com a colaboração do professor e orientador
Paulo Freitas, que, demonstrou ser um profissional responsável e interessado com a
qualidade da formação dos seminaristas que por ele são orientados.
A todos os professores que contribuíram para a minha formação.
À minha querida esposa que sempre esteve presente nas leituras e correções deste trabalho.
RESUMO
A presente pesquisa tem como tema a “Inspiração e Suficiência da Escritura: uma abordagem
de 2 Timóteo 3:16, 17”. A pesquisa ressalta os principais conceitos sobre a “inspiração” da
Escritura, como: inspiração plenária; dinâmica; verbal; mecânica ou ditada; parcial ou
fracionada. Analisa o termo “inspiração” presente na segunda epístola de Paulo a Timóteo,
desde sua origem até o seu emprego na Bíblia e possíveis problemas quanto à tradução literal
do termo a partir do grego theópneustos. Esclarece qual a crença da Igreja a respeito da
“inspiração” desde sua fundação. Faz uma abordagem sobre a principal definição a respeito
de “suficiência da Escritura” principalmente na pregação, ressaltando os principais métodos
de interpretação bíblica que são: gramático-histórico, histórico-crítico e fundamentalista.
Algumas diferentes teologias que influenciam na forma como se interpreta a Bíblia, que são:
teologia da libertação, feminista, negra, liberal e reformada. A pesquisa se encerra mostrando
como o cristão e a igreja podem ser edificados através da utilização da Escritura, conforme
abordado em 2 Timóteo 3:16,17.
Palavras chave: Inspiração. Suficiência. Escritura. Interpretação. Teologia.
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO .................................................................................................................... 6
2. A INSPIRAÇÃO DA ESCRITURA .................................................................................... 7
2.1 A Natureza da Inspiração .................................................................................................. 8
2.1.1 Inspiração Plenária ............................................................................................................ 8
2.1.2 Inspiração Dinâmica .......................................................................................................... 9
2.1.3 Inspiração Verbal ............................................................................................................. 10
2.1.4 Inspiração Mecânica ou ditada ........................................................................................ 10
2.1.5 Inspiração Parcial ou Fracionada ..................................................................................... 11
2.2 Evidências bíblicas a respeito da inspiração .................................................................. 12
2.3 A doutrina de inspiração da Igreja ................................................................................. 17
3. A SUFICIÊNCIA DA ESCRITURA ................................................................................ 21
3.1 Conceito ............................................................................................................................. 22
3.2 A Suficiência da Escritura na Pregação ......................................................................... 24
3.3 Interpretação das Escrituras ........................................................................................... 26
3.4 Métodos de Interpretação ................................................................................................ 31
2.4.1 Gramático-histórico ......................................................................................................... 31
3.4.2 Histórico-crítico ............................................................................................................... 31
3.4.3 Fundamentalista ............................................................................................................... 33
3.5 Pressupostos teológicos..................................................................................................... 34
3.5.1 Teologia da Libertação .................................................................................................... 35
3.5.2 Teologia feminista ........................................................................................................... 36
3.5.3 Teologia negra ................................................................................................................. 38
3.5.4 Teologia Liberal .............................................................................................................. 39
3.5.5 Teologia reformada.......................................................................................................... 40
4. EDIFICAÇÃO PELA ESCRITURA INSPIRADA: ANÁLISE EM SEGUNDA
TIMÓTEO PARA A ATUALIDADE ................................................................................... 43
4.1 2 Timóteo 3:16-17 ............................................................................................................. 44
4.2 Praticando a Escritura ..................................................................................................... 48
4.2.1 A Bíblia e o Cristão ......................................................................................................... 49
4.2.2 A Bíblia e a Igreja ............................................................................................................ 51
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................. 53
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................................. 54
6
1. INTRODUÇÃO1
A presente pesquisa tem como tema A Inspiração e Suficiência da Escritura: Uma
abordagem de 2 Timóteo 3:16, 17. Para a aproximação do objeto de estudo e buscando
alcançar o objetivo proposto, este trabalho foi desenvolvido por meio de pesquisa
bibliográfica que consiste na leitura e análise da produção teórica já existente acerca do
assunto investigado, permitindo a articulação de conceito e o levantamento de novas questões.
A Igreja de Cristo tem passado por grandes dificuldades, no que se refere a sua
edificação, pois a mensagem cristã tem perdido sua essência. Isso mostra que a Igreja tem
considerado a Escritura insuficiente para sua edificação, tratando-a como um livro comum e
menosprezando sua natureza divina. Esta pesquisa surgiu a partir do momento em que se
percebeu que os meios de edificação da Igreja, utilizados atualmente, tem sido em sua maioria
os meios seculares: a ciência em geral, na tentativa de complementar o ensino bíblico;
utilização do senso comum como meio de repreensão; e o amparo da psicologia em questões
que a Bíblia não demonstra clareza dentro do aspecto comportamental do membro ou de uma
comunidade inteira. Estes meios seculares tornam a Igreja menos bíblica, podendo entrar em
um processo de secularização e consequentemente deixar de cumprir seu propósito essencial
que é a glorificação de Deus.
Este trabalho tem como objetivos conhecer os principais conceitos que envolvem o
tema, realizar a análise do termo “inspiração” presente na segunda epístola de Paulo a
Timóteo, desde sua origem até o seu emprego na Bíblia e possíveis problemas quanto à
tradução literal do termo a partir do grego theópneustos. Objetiva também abordar sobre a
suficiência da Escritura, sua pregação, seus diferentes métodos de interpretação que são:
gramático-histórico, histórico-crítico e fundamentalista. As diferentes teologias que
influenciam na forma como se analisa a Bíblia, são elas: teologia da libertação, feminista,
negra, liberal e reformada. A pesquisa se encerra mostrando como o cristão e a igreja podem
ser edificados através da utilização da Escritura, conforme abordado em 2 Timóteo 3:16,17.
1 Todas as passagens bíblicas utilizadas neste trabalho foram extraídas da BÍBLIA, Sagrada. Nova versão
internacional, São Paulo: Vida, 2007.
7
2. A INSPIRAÇÃO DA ESCRITURA
Chegar a uma definição clara e aceitável a respeito da inspiração bíblica tem se
tornado um desafio um tanto complicado. “Pois tem sido alvo de muita confusão em recentes
discussões.”2 O que contribui para isso certamente é a enorme quantidade de teorias que
envolvem o assunto. Sendo que “aquele que, procurando conhecer a verdade sobre este tema
[...], seria imediatamente conduzido por ele para todas as direções possíveis.”3 Mesmo
havendo divergências em alguns pontos, é importante afirmar que a definição sobre a
inspiração bíblica que tem prevalecido desde o nascimento da Igreja “é a constante e
permanente convicção da Igreja sobre a divindade das Escrituras e confiadas a sua guarda”4.
Também é correto afirmar que se trata de um agir sobrenatural da parte de Deus no
intuito de inspirar homens “feitos de carne e osso e dotados de faculdades emocionais e
intelectuais,”5 a produzir documentos fiéis que expressam o caráter de seu autor (Deus), e que
foi autoridade na época em que foram redigidos, e em dias atuais. Trata-se da voz de Deus
expressa em palavras divinamente escolhidas. O material produzido traz consigo marcas ou
expressões humanas, não dos pensamentos e conceitos próprios dos redatores, mas do
pensamento dos redatores cativo ao Espírito Santo. Essas marcas são; “caráter, temperamento,
dons, cultura, educação, vocabulário, estilo, etc., peculiares a cada um deles.”6 Esse é um
ponto que não coloca em descrédito o fator inspiração. Tanto o fato de Deus usar o homem
para transmitir sua mensagem não descaracteriza a plena inspiração da mensagem, como o
fato de que “a encarnação não tornou a pessoa de Cristo pecaminosa.”7 Mas como elaborar
uma obra divina usando o labor humano? Este questionamento também foi feito por Ryle8,
que declara não poder explicar como e de que maneira isso foi feito. O ponto chave é que o
Espirito Santo inspirou o homem habitando dentro dele, o conduzindo com permissões e
restrições, para elaborar seus oráculos.
Segundo Groningen:
O Espírito Santo habitou em certos homens, inspirou-os, e assim dirigiu-os, que eles,
em plena consciência, expressaram-se na sua singular maneira pessoal. O Espírito
2 WARFIELD, Benjamin. A inspiração e autoridade da Bíblia. São Paulo: Cultura Cristã, 2010, p. 84.
3 Ibid.
4 Ibid., p. 85.
5 MIRANDA, Daniel Leite Guanaes de. Calvino e Sola Scriptura: a aplicação deste princípio na cidade de
Genebra e sua Relevância para o Brasil dos dias atuais. Disponível em:
<http://www.monergismo.com/textos/jcalvino/Calvino-Sola-Scriptura_Daniel-Leite.pdf>. Acesso em: 01 de set.
2013. 6 ANGLADA, Paulo. Sola Scriptura. Ananindeua, PA: Knox, 2013, p. 70.
7 SANTOS, João Alves dos. Bibliologia: revelação, inspiração e cânon, A Natureza da Inspiração, parte II.
Centro Presbiteriano de Pós-Graduação, Universidade Mackenzie, São Paulo, 2009, p. 3. 8 RYLE, J. C. A Inspiração das Escrituras. São Paulo: Pes, s.d, p. 9.
8
capacitou homens a conhecer e expressar a verdade de Deus. Ele impediu-os de
incluir qualquer coisa que fosse contrária a essa verdade de Deus. Ele também os
impediu de escrever coisas verdadeiras que não eram necessárias. Assim, homens
escreveram como homens, mas, ao mesmo tempo, comunicaram a mensagem de
Deus, não a do homem.9
2.1 A Natureza da Inspiração
Segundo Bavinck, “a visão correta de inspiração depende [...] de colocar o autor
primário e os autores secundários em relação correta, um para com os outros,”10
para saber
como se relacionam e então explicar a ação do Espírito Santo em inspirá-los. No entanto
muitas teorias sobre a Inspiração Bíblica partiram de “diferentes concepções, tendo variados
graus de legitimidade, dependentemente do ângulo de observação da pessoa que as
formula.”11
Dentre as muitas teorias, “algumas delas não se coadunam com o ensino bíblico
sobre o assunto.”12
No entanto, grande parte das definições nasceram embasadas em três
movimentos ao longo da história da Igreja: ortodoxia, modernismo e neo-ortodoxia.13
Dentre
as principais teorias estão: inspiração plenária, inspiração dinâmica, inspiração verbal,
inspiração mecânica ou ditada e inspiração parcial ou fracionada.
2.1.1 Inspiração Plenária
Sobre esse tema entende-se que toda a Bíblia é inspirada e não somente algumas
partes. A Escritura é vista como um “corpo de revelação formado de partes, mas
indivisível,”14
onde cada parte foi divinamente inspirada. “A inspiração pressupõe o controle
do Espírito Santo,”15
esse controle se estende para a totalidade da Escritura, mas “não
significa necessariamente que todas as partes têm a mesma importância e o mesmo peso em
relação a qualquer doutrina em particular.”16
É importante também enfatizar os aspectos que
compõem a Escritura e que também recebeu inspiração como “os diferentes tipos de literatura
9 GRONINGEN, apud COSTA, Hermisten Maia P. A Inspiração e Inerrãncia das Escrituras. São Paulo: Cultura
Cristã, 2008, p. 66-67. 10
BAVINCK, apud ANGLADA, Paulo. Sola Scriptura. Ananindeua, PA: Knox, 2013, p. 68. 11
GEISLER, Norman; WILLIAM, Nix. Introdução Bíblica: como a Bíblia chegou até nós. São Paulo: Vida,
2006, p. 19. 12
Ibid., p. 15. 13
“Na maior parte dessa história, prevaleceu a visão ortodoxa, a saber: a Bíblia é a Palavra de Deus. Com o
surgimento do modernismo, muitas pessoas vieram a crer que a Bíblia meramente contém a Palavra de Deus.
Mais recentemente, sob a influência do existencialismo contemporâneo, os teólogos neo-ortodoxos têm ensinado
que a Bíblia torna-se a Palavra de Deus quando a pessoa tem um encontro pessoal com Deus em suas páginas”.
GEISLER, Norman; NIX, William. Introdução a Bíblia: como a bíblia chegou até nós. São Paulo: Vida, 2006,
p. 15. Conferir mais detalhes desses movimentos, p.15-18. 14
SANTOS, João Alves dos. Bibliologia: Revelação, Inspiração e Cânon, A Natureza da Inspiração, parte II.
Centro Presbiteriano de Pós-Graduação, Universidade Mackenzie, São Paulo, 2009, p. 5. 15
Ibid. 16
Ibid., p. 6
9
que apresenta; história, poesia, cartas, profecias [...], as questões de ciência, biologia, [...] e
geografia [...], e em todas as questões que envolvem a vida do homem.”17
De Gênesis ao
Apocalipse, tudo o que foi registrado, o foi pela vontade de Deus (2Tm 3.16; 2Pe 1.20,21).18
2.1.2 Inspiração Dinâmica
Essa teoria “destaca a combinação dos elementos divino e humano no processo de
inspiração da escrita da Bíblia.”19
Tal pensamento não reparte a autoridade da Escritura entre
um livro metade humano e metade divino, mas sim em um livro inteiramente divino com
elementos humanos não desprezados, de acordo com a soberana vontade de Deus. O termo,
inspiração dinâmica, também é chamado de inspiração orgânica, este termo;
Serve para acentuar o fato de que Deus não empregou os escritores mecanicamente,
mas atuou neles de maneira orgânica, em harmonia com as leis de seu próprio
íntimo. Usou-os precisamente como eram [...], iluminando-lhes a mente, incitou-os a
escrever; reprimiu a influência do pecado sobre sua atividade literária, e os guiou na
escolha de suas palavras e nas expressões de seus pensamentos.20
Também é visto como “uma interação harmoniosa de forças. Deus preparou os seus
servos desde a eternidade, tornando-os órgãos de inspiração,”21
“o Espírito os capacitou a
conhecer e expressar a verdade de Deus. Ele impediu-os de incluir qualquer coisa que fosse
contrária a essa verdade.”22
Uma forte afirmação conclui esse pensamento, onde “Deus se
valeu livre e soberanamente de seus conhecimentos e personalidades.”23
Esse conceito foi
duramente criticado por causa da prevalência do fator humano que reduziria o seu caráter
autoritativo e consequentemente tornaria a Bíblia um livro falível. Segundo Anglada, o termo
inspiração dinâmica nada mais é que um;
17
HANKO, Ronald. A Inspiração Plenária da Escritura. Disponível em:
<http://www.monergismo.com/textos/bibliologia/a-inspiracao-plenaria-escritura_dag_r-hanko.pdf>. Acesso em:
03 de set. 2013. 18
“Toda a Escritura é Inspirada por Deus e útil para o ensino, para a repreensão, para a correção e para a
instrução na justiça”. 2Pe 1:21,22. “Pois jamais a profecia teve origem na vontade humana, mas homens falaram
da parte de Deus, impelidos pelo Espírito Santo”. BÍBLIA Sagrada. Nova Versão Internacional. São Paulo: Vida,
2007. 2Tm 3:16. 19
ERICKSON, Millard. Introdução a teologia sistemática. São Paulo: Vida Nova, 2007, p. 71. 20
BERKHOF, Louis. Manual de Doutrina Cristã. 1992 apud SANTOS, João Alves dos. Bibliologia. Centro
Presbiteriano de Pós-Graduação, Universidade Mackenzie, São Paulo, 2009, p. 3. 21
HOEKSEMA, Homer C. The Doctrine of Scripture. s.n.t. p. 78ss apud COSTA, Hermisten Maia P. A
Inspiração e Inerrãncia das Escrituras. São Paulo: Cultura Cristã, 2008, p. 67. 22
COSTA, Hermisten Maia P. A Inspiração e Inerrãncia das Escrituras. São Paulo: Cultura Cristã, 2008, p. 68. 23
Ibid.
10
Conceito racionalista que influenciou o método histórico-crítico24
de interpretação, e
que reduz a inspiração a mera iluminação [...], os autores bíblicos foram apenas
homens iluminados. A excelência dos seus escritos deve ser atribuída à influência
santificadora no caráter, mente e palavras deles, devido à comunhão profunda com
Deus ou pela convivência com Jesus, e não a uma ação ímpar do Espírito Santo.25
2.1.3 Inspiração Verbal
Tanto a inspiração verbal como a plenária defende a divina inspiração da Escritura em
sua totalidade, porém a inspiração verbal afirma que cada palavra da Escritura é inspirada,
pois “Deus dirigiu até a própria escolha das palavras no Santo Volume, de maneira que pode
ser dito verdadeiramente que a Palavra de Deus é sem mistura de erro humano.”26
É
impossível que existam partes ou expressões inteiras da Escritura que sejam inspiradas sem
que as palavras que as compõem também sejam inspiradas, são elas que vão dar uma
autoridade divina a cada parte ou expressão. “Não é possível expressar ideias sem palavras.
Não é possível nem mesmo pensar sem palavras.”27
Segundo Harris o termo verbal passou a
ser usado;
Para preservar o mesmo sentido e evitar deturpações daqueles que querem usar o
termo plenária significando apenas que todas as partes da Bíblia, de Gênesis a
Apocalipse, foram de algum modo produzidas por Deus, sem que, contudo, sejam
necessariamente de origem divina.”28
Sobre inspiração verbal Geisler afirma que;
Não se tratava simplesmente de uma mensagem de Deus sobre a qual os homens
tinham a liberdade para transmitir nas suas próprias palavras, mas cada uma das
palavras era escolhida por Deus [...], até mesmo os tempos verbais são enfatizados
por Deus.29
2.1.4 Inspiração Mecânica ou ditada
Logo acima foi dito através de pequenas e simples definições, algumas teorias a
respeito da inspiração bíblica, não foram citadas todas elas, mas, as principais, coerentes e
dignas de serem citadas. Foi averiguado o que a Escritura poderia ser, no que diz respeito aos
seus escritos como inspirados, mas também é importante ressaltar o que a Escritura não é de
24
[Foi um método de interpretação] “que surgiu com o Iluminismo, ao adotar os pressupostos racionalistas
quanto às Escrituras, contrários à sua origem divina. Ao tratar a Bíblia como qualquer outro livro de religião,
deixando de levar em conta sua inspiração e divina autoridade. [...], como resultado, a Bíblia passou a ser vista,
não como Palavra de Deus em sua inteireza, mas como registro de fé de comunidades religiosas, primeiro a
judaica e depois a cristã”. LOPES, Augustus Nicodemos. A Bíblia e seus intérpretes: uma breve história da
interpretação, São Paulo: Cultura Cristã, 2007, p. 26. 25
ANGLADA, Paulo. Sola Scriptura. Ananindeua, PA: Knox, 2013, p. 69. 26
HARRIS, Laird. Inspiração e Canonicidade da Bíblia. São Paulo: Cultura Cristã, 2004, p. 17. 27
SANTOS, João Alves dos. Bibliologia: Revelação, Inspiração e Cânon: A Natureza da Inspiração, parte II.
Centro Presbiteriano de Pós-Graduação, Universidade Mackenzie, São Paulo, 2009, p. 1. 28
HARRIS, R. L. Inspiration and Canonicity of the Bible: An Historical and Exegetical Study. Grand Rapids:
Zondervan, 1957, p. 19-20 apud ANGLADA, Paulo. Sola Scriptura. Ananindeua, PA: Knox, 2013, p. 73 29
GEISLER, Norman. Teologia Sistemática. Rio de Janeiro: Cpad, 2010, p. 219.
11
maneira alguma. O primeiro ponto é a Inspiração mecânica, que afirma que Deus não se valeu
da personalidade, estilo ou cultura, de seus autores secundários, anulando completamente suas
mentes, para que fosse produzida a Escritura de Deus.
Se opondo a essa teoria Champlin afirma que;
A inspiração divina não suprimiu ou abafou a individualidade de qualquer escritor
sagrado; pelo contrário, utilizou-se dela. A Palavra de Deus veio à existência através
de muitos e diferentes canais humanos e a evidência das variações de estilo dá
testemunho da realidade desse fator humano.30
A preparação desses autores teve início desde o nascimento e cada um deles sabia
exatamente o que estava fazendo, pois, talvez pelo fato de serem secundários transmita a ideia
de que eles foram completamente passivos, pelo contrário, existia uma razão lógica para
produzirem esses escritos. E o que foi produzido de Escritura, algumas partes, talvez eles nem
soubessem que estavam sendo inspirados pelo Espirito Santo. Em outras partes “os autores
bíblicos não foram muito mais do que copistas, visto que apenas transcreveram as palavras de
Deus,”31
(como por exemplo, em Genesis 22:15-18; Êxodo 20:1-17)32
.
2.1.5 Inspiração Parcial ou Fracionada
Essa ideia defende o fato de que a Bíblia não é em seu todo inspirada e sim algumas
partes. “Os defensores dessa ideia entendem que doutrinariamente a Bíblia contém a Palavra
de Deus.”33
Sendo que a tarefa de encontrar nela o que é inspirado (tentando separar o que é
inseparável) está a cargo do labor humano, correndo um risco nocivo por se colocar superior
30
CHAMPLIN, Russel. N. Enciclopédia de Bíblia teologia e filosofia. 2.v. s.l, s.d. p. 475. 31
ANGLADA, Paulo. Sola Scriptura. Ananindeua, PA: Knox, 2013, p. 68. 32 “Pela segunda vez o Anjo do Senhor chamou do céu a Abraão e disse: ‘juro por mim mesmo’, declara o
Senhor, ‘que por ter feito o que fez, não me negando seu filho, o seu único filho, esteja certo de que o abençoarei
e farei seus descendentes tão numerosos como as estrelas do céu e como a areia das praias do mar. Sua
descendência conquistará as cidades dos que lhe forem inimigos e, por meio dela, todos os povos da terra serão
abençoados, porque você me obedeceu’. Êx 20: 1-17 “E Deus falou todas estas palavras: ‘Eu sou o Senhor, o teu
Deus, que te tirou do Egito, da terra da escravidão. Não terás outros deuses além de mim. Não farás para ti
nenhum ídolo, nenhuma imagem de qualquer coisa no céu, na terra, ou nas águas debaixo da terra. Não te
prostrarás diante deles nem lhes prestarás culto, porque eu, o Senhor teu Deus, sou Deus zeloso, que castigo os
filhos pelos pecados de seus pais até a terceira e quarta geração daqueles que me desprezam, mas trato com
bondade até mil gerações aos que me amam e guardam os meus mandamentos. Não tomarás em vão o nome do
Senhor teu Deus, pois o Senhor não deixará impune quem tomar o seu nome em vão. Lembra-te do dia de
sábado, para santificá-lo. Trabalharás seis dias e neles farás todos os teus trabalhos, mas o sétimo dia é o sábado
dedicado ao Senhor teu Deus. Nesse dia não farás trabalho algum, nem tu, nem teus filhos ou filhas, nem teus
servos ou servas, nem teus animais, nem os estrangeiros que morarem em tuas cidades. Pois em seis dias o
Senhor fez os céus e a terra, o mar e tudo o que neles existe, mas no sétimo dia descansou. Portanto, o Senhor
abençoou o sétimo dia e o santificou. Honra teu pai e tua mãe, a fim de que tenhas vida longa na terra que o
Senhor teu Deus te dá. Não matarás. Não adulterarás. Não furtarás. Não darás falso testemunho contra o teu
próximo. Não cobiçarás a casa do teu próximo. Não cobiçarás a mulher do teu próximo, nem seus servos ou
servas, nem seu boi ou jumento, nem coisa alguma que lhe pertença.’” 33
COSTA, Hermisten Maia P. A Inspiração e Inerrãncia das Escrituras. São Paulo: Cultura Cristã, 2008, p. 63.
12
(colocar-se superior a Palavra de Deus é um erro) ao objeto estudado como se fizesse uma
pesquisa em qualquer obra literária comum. Não somente como parcial, mas alegam também
que a Bíblia “contém erros de história, cronologia, arqueologia, geografia e etc. [Sendo que a
ideia comum é de que a Escritura] só teria autoridade em matérias morais e espirituais.”34
A Bíblia é fruto do trabalho de homens que foram inspirados por Deus a escrever
decretos eternos completamente relevantes em qualquer época. Pois somente o Espírito Santo
poderia produzir um documento tão fiel capaz de alcançar valores morais, éticos, sociais e
espirituais tanto de um homem como de um país inteiro tornando-os totalmente cativos a ele.
Nada supera seu alcance e nada pode produzir resultados semelhantes ao que a Escritura
produz. Mesmo que seu conteúdo tenha partes que são enigmáticas e até incompreensíveis ao
homem, ela também é composta de pontos claros e coerentes com abordagens atuais. Essa é a
Palavra de Deus, onde cada expressão que a compõe é fruto do labor harmonioso do Criador e
sua criação.
2.2 Evidências bíblicas a respeito da inspiração
Antes de entrar na questão da reivindicação que a Bíblia faz de si mesma como obra
divina, é importante tratar do emprego do termo “inspiração”35
, que tem sua origem no “latim
e é a tradução do termo grego ‘theópneustos’36
de 2Tm 3:16.”37
Esta “palavra e suas variantes
parecem ter entrado no inglês médio a partir do francês e tem sido empregada desde então (já
no início do século 14).”38
Essas variantes foram multiplicadas e o emprego do termo ganhou
mais amplitude e variações com;
Um número considerável de significados, físicos e metafóricos, seculares e
religiosos [...]. O substantivo “inspiração” embora já estivesse em uso no século 14,
não parece ocorrer em nenhum outro sentido, a não ser o teológico, até o final do
século 16. O sentido especificamente teológico de todos esses termos é regulado, é
claro, por seu uso na teologia latina e isto se deve, em última instância, ao seu
emprego na Bíblia latina. Na Bíblia latina Vulgata, o verbo inspiro (Gn. 2.7; Sab
15.11; Ec 4.12; 2Tm 3.16; 2 Pe 1.21) e o substantivo inspiratio (2Sm 22.16; Jó 32.8;
Sl 17.16; At 17.25) ocorrem quatro ou cinco vezes em aplicações um pouco
diferentes. No desenvolvimento de uma nomenclatura teológica, porém, eles
adquiriram [...] um sentido técnico como referência aos escritores da Bíblia ou aos
livros bíblicos.39
34
COSTA, Hermisten Maia P. A Inspiração e Inerrãncia das Escrituras. São Paulo: Cultura Cristã, 2008, p. 63. 35
“Lat. Inspiratione, 1. Ato de inspirar (-se) ou de ser inspirado. 2. Qualquer estímulo ao pensamento ou à
atividade criadora. 3. Entusiasmo poético; estro. Pl.: - ções. FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Mini
Aurélio: o dicionário da língua portuguesa. 8. ed. Curitiba: Positivo, 2010, p. 430. 36
Este termo será abordado com mais detalhes no terceiro capítulo. 37
PACKER, J. I; COMFORT, Philip Wesley (Org.). A Origem da Bíblia. Rio de Janeiro: Cpad, 1998, p. 49. 38
WARFIELD, Benjamin. A inspiração e autoridade da Bíblia. São Paulo: Cultura Cristã, 2010, p. 106,
parêntese do autor. 39
WARFIELD, Benjamin. A inspiração e autoridade da Bíblia. São Paulo: Cultura Cristã, 2010, p. 106.
13
O termo então é basicamente definido como o agir sobrenatural de Deus sobre os
escritores bíblicos, “de modo que o produto de suas atividades transcende os poderes
humanos e se torna divinamente autoritativo.”40
A Escritura é vista como um produto divino
desenvolvido por homens inspirados, e o seu propósito “é assegurar a ‘infalibilidade’41
do
registro daquilo que foi revelado.”42
Quando se questiona a autenticidade e utilidade da Bíblia, a defesa mais contundente
está nela mesma, expressada em muitos versículos sendo que os mais utilizados são os de 2
Timóteo 3:16 “Toda a Escritura é inspirada por Deus e útil para o ensino, para a repreensão,
para a correção e para a instrução na justiça” e 2Pedro 1:21 “Pois jamais a profecia teve
origem na vontade humana, mas homens falaram da parte de Deus, impelidos pelo Espírito
Santo”. Citar os versículos não configura um erro, até porque eles expressam toda a verdade a
respeito da origem e utilidade da Escritura. “Mas essa citação dá margem à acusação de
‘raciocínio circular’43
: Prova-se a Bíblia citando a Bíblia.”44
Essa acusação feita pelos críticos
pode não ser tão relevante quando se analisa o patamar em que a Igreja primitiva colocava as
Escrituras, pois tanto o Antigo Testamento quanto o Novo Testamento eram tidos como
Palavra de Deus infalível. A Palavra testemunhando da própria Palavra e a única capaz disso,
validando-a e autenticando-a dando a si própria autoridade. Contudo é extremamente
importante conferir o que Jesus diz em Mateus 15:17,1845
se referindo,
Claramente aos sagrados escritos dos judeus como uma unidade, e exatamente uma
unidade sagrada bem definida. Ele diz positivamente que esse livro é perfeito até o
menor detalhe. Não é mera inspiração verbal que ele ensina [...], mas inspiração das
próprias letras! A menor letra era o ‘Yodh’ hebraico, a menor letra do alfabeto
hebraico. Exatamente o que significa o ‘menor traço da pena’ é menos claro. A
maioria considera como se referindo às pequenas partes de letras hebraicas que as
40
WARFIELD, Benjamin. A inspiração e autoridade da Bíblia. São Paulo: Cultura Cristã, 2010, p. 106. 41
“A Escritura é a Palavra de Deus, ela é perfeita também. Encontrar erro na Escritura é encontrar erro em Deus.
Receber a Escritura como algo menos que infalível, é negar a imutabilidade e soberania de Deus.” HANKO,
Ronald. A Infalibilidade da Escritura 2008, p. 1. Disponível em
<http://www.monergismo.com/textos/bibliologia/a-infalibilidade-escritura_dag_r-hanko.pdf>. 42
ANGLADA, Paulo. Sola Scriptura. Ananindeua, PA: Knox, 2013, p. 63, aspas simples nossa. 43
“A Bíblia alega ser a Palavra de Deus. Esse é o nosso ponto de partida. Com certeza, simplesmente porque um
livro diz ser a Palavra de Deus não o torna tal coisa. Mas se um livro é a Palavra de Deus, ele certamente alegará
ser a Palavra de Deus. Se um livro é a Palavra de Deus, então o que ele diz será verdade. Pode parecer estranho
que citemos a Bíblia para provar que a Bíblia é a Palavra de Deus. Isso é o que os filósofos chamam de
“argumento circular”. Quando provamos a autoridade da Bíblia citando a Bíblia, assumimos desde o princípio
que a Bíblia é autoritativa. Isso é apenas um círculo vicioso de raciocínio, que não nos levará a nenhum lugar?
Pode parecer que precisamos provar a verdade da Bíblia por algum outro padrão “neutro” externo. Certamente,
se fizermos isso, teríamos que responder o que torna esse padrão autoritativo. Apenas criaríamos outro círculo
que necessitaria ser defendido” DEMAR, Gary. Raciocínio Circular. Disponível em
<http://www.monergismo.com/textos/apologetica/raciocinio-circular_demar.pdf>. 44
HARRIS, Laird. Inspiração e Canonicidade da Bíblia. São Paulo: Cultura Cristã, 2004, p. 39. 45
“Não pensem que vim abolir a Lei ou os Profetas; não vim abolir, mas cumprir. Digo-lhes a verdade:
Enquanto existirem céus e terra, de forma alguma desaparecerá da Lei a menor letra ou o menor traço, até que
tudo se cumpra.” BÍBLIA Sagrada. Nova Versão Internacional. São Paulo: Vida, 2007.
14
distinguem uma da outra, como nosso pingo no ‘i’ e o traço que cruza o ‘t’. Outros
acham que pode ser uma referência à letra hebraica ‘Waw’, que muitas vezes servia
só para distinguir uma vogal longa de uma vogal breve. Em todo caso, o ponto
principal está claro. Jesus declarou que as Escrituras eram perfeitas até na letra. 46
A Bíblia está repleta de afirmações do tipo “assim diz o Senhor” ou “está escrito”.
Trata-se de uma evidência interna47
conhecida como “autoridade [bíblica] que se
autoconfirma.”48
Isso só pode ocorrer quando existem ouvintes para essas palavras. Um
exemplo disso foi quando Deus veio ao profeta Ageu dizendo: “assim diz o Senhor dos
Exércitos: ‘Ainda não chegou o tempo de reconstruir a casa do Senhor...” (Ag 1:2). Na época
os ouvintes eram o governador de Judá, Zorobabel, filho de Sealtiel, e o sumo sacerdote
Josué, filho de Joazadaque, essas palavras vinham cheias de autoridade, pois, a expressão
“assim diz o Senhor” qualifica a afirmação como autoridade máxima. Para o ouvinte hoje em
dia, essas afirmações antes desconhecidas depois de captadas passa para o status de
autoridade suprema e guia, palavras que se resumiam em tinta no papel ganha vida em seu
coração com apenas uma atitude, a de ouvir, ouvir palavras que soam “semelhantes a um
rugido de um leão [...]. [E] o modo mais convincente de demonstrar a autoridade de um leão é
soltá-lo,”49
assim será visto do que ele é capaz. A Escritura não pode ser domesticada,
semelhante ao leão não pode ser domada ou controlada, ela exerce a autoridade que lhe foi
atribuída por natureza. Sendo assim, a Escritura toma o único posto que lhe é devido, que é
sujeitar o ouvinte por inteiro a ela.
O testemunho da mensagem bíblica também é rico em seu propósito transformador. E
como pré-requisito para isso o mesmo Espírito que inspirou a escrita convence o ouvinte em
seu espírito de que a própria escrita é palavra inspirada por Deus “iluminando a mente e o
coração em trevas [...], permitindo que [o indivíduo] reconheça a [natureza] divina das
Escrituras.”50
Apóstolo Paulo afirma que essa palavra é “poder de Deus para a salvação de
todo aquele que crê” (Rm 1: 16)51
. “Relaciona-se àquilo que o crente vê ou sente em sua
46
HARRIS, Laird. Inspiração e Canonicidade da Bíblia. São Paulo: Cultura Cristã, 2004, p. 40. 47
“Há duas espécies de evidências que se devem levar em conta no que diz respeito à inspiração da Bíblia: a
evidência que brota da própria Bíblia (chamada de evidência interna), e a que surge de fora da Bíblia (conhecida
como evidência externa).” GEISLER, Norman; NIX, William. Introdução a Bíblia: como a Bíblia chegou até
nós. São Paulo: Vida, 2006, p. 53-54. 48
GEISLER, Norman; WILLIAM, Nix. Introdução Bíblica: como a Bíblia chegou até nós. São Paulo: Vida,
2006, p. 54. 49
Ibid. 50
ANGLADA, Paulo. Sola Scriptura. Ananindeua, PA: Knox, 2013, p. 87, colchete nosso. 51
“Não me envergonho do evangelho, porque é o poder de Deus para a salvação de todo aquele que crê:
primeiro do judeu, depois do grego.”
15
experiência pessoal com a Bíblia. [Isso acontece apenas] para os que se acham dentro do
cristianismo.”52
Sem dúvida que essas evidências brotam da própria Bíblia.
A Escritura não somente faz reivindicações através de afirmações explicitas, mas
também se evidencia na observância do conteúdo bíblico como um todo, tendo em vista a
harmonia dos livros, a profundidade da mensagem e o seu testemunho de poder. Mesmo
levando em consideração alguns problemas que “estudiosos tem chamado de
distanciamento,”53
que são de ordem temporal, contextual, cultural, linguístico e autoral54
todos esses livros tomam uma só direção, que é Cristo. Da criação até as coisas futuras o
enredo é o mesmo, trata-se de uma progressão ininterrupta em parte alguma. Geisler trata o
conjunto de livros como;
66 livros escritos ao longo de 1500 anos, por cerca de 40 autores, em diversas
línguas, com centenas de tópicos, é muito mais que mero acidente que a Bíblia
apresente espantosa unidade temática – Jesus Cristo. Um problema – o pecado – e
uma solução – o Salvador Jesus – unificam as páginas da Bíblia, do Gênesis ao
Apocalipse.55
Nos ensinos de Jesus as Escrituras eram autoridade. Em momento algum Ele negou o
Antigo Testamento ou fez menção de que apenas algumas partes é que mereciam crédito. Nas
palavras de Jesus existe uma grande evidência que está em Mateus 5:1856
, onde ele afirma que
de maneira alguma desaparecerá da Lei a menor letra ou o menor traço até que tudo se
cumpra. Em João 10:3557
, Jesus diz que a Escritura não pode ser anulada. Em alguns
versículos Jesus utiliza a afirmação “está escrito” (Mt 4:4; Mt 11:10; Lc 10:26; Jo 6:45)58
. Em
outros versículos ele atribui a autoria divina para as Escrituras como sendo palavras
52
GEISLER, Norman; WILLIAM, Nix. Introdução Bíblica: como a Bíblia chegou até nós. São Paulo: Vida,
2006, p. 55, colchete nosso. 53
LOPES, Augustus Nicodemus. A Bíblia e seus intérpretes. São Paulo: Cultura Cristã, 2007, p. 23. 54
Encontra-se tal abordagem de forma esclarecedora e útil em LOPES, Augustus Nicodemus. A Bíblia e seus
intérpretes. São Paulo: Cultura Cristã, 2007, p. 23-27. 55
GEISLER, Norman; WILLIAM, Nix. Introdução Bíblica: como a Bíblia chegou até nós. São Paulo: Vida,
2006, p. 55. 56
“Digo-lhes a verdade: Enquanto existirem céus e terra, de forma alguma desaparecerá da Lei a menor letra ou
o menor traço, até que tudo se cumpra.” 57
“Se ele chamou ‘deuses’ àqueles a quem veio a palavra de Deus (e a Escritura não pode ser anulada)”. 58
Mt 4:4 “Jesus respondeu: Está escrito: ‘Nem só de pão viverá o homem, mas de toda palavra que procede da
boca de Deus’". Mt 11:10 “Este é aquele a respeito de quem está escrito: ‘Enviarei o meu mensageiro à tua
frente; ele preparará o teu caminho diante de ti’. Lc 10:26 “‘O que está escrito na Lei?’, respondeu Jesus. ‘Como
você a lê?’” Jo 6:45 “Está escrito nos Profetas: ‘Todos serão ensinados por Deus’. Todos os que ouvem o Pai e
dele aprendem vêm a mim.”
16
relacionadas a afirmações do próprio Deus (Mt 15:4; Mt 22:44)59
. “Para Jesus [a Escritura] é
fundamento da doutrina, a fonte de solução, e o fim do argumento.”60
Já no Antigo Testamento os profetas escolhidos de Deus para intermediar sua
mensagem tinham convicção da origem da mesma (Êx 4:12; Dt 18:18; 2Sm 23:1-2; Os 1:2;
Hc 2:1; Zc 1:9; etc)61
. O chamado dos profetas era para que suas anunciações ao povo
tivessem uma fonte exclusiva de autoridade, no entanto, antes de cada afirmação eles diziam
sempre “‘assim diz o Senhor’, ‘ouvi a palavra do Senhor’ ou palavra que ‘veio da parte do
Senhor’. Muitas vezes, o que eles falam é explicitamente atribuído ao próprio Deus”62
(Js
24:2; Is 1:2; Is 8:1; Jr 1:2; Ez 1:3; Ez 2:1; etc).63
Em relação aos Apóstolos as afirmações sobre a inspiração foram bem explícitas,
como por exemplo 2Tm 3:16 e 2Pe 1:21, versículos já citados anteriormente. Existem vários
outros versículos que auxiliam no sentido de comprovar a inspiração divina da Escritura, mas
os que aqui foram citados elucidam bem essa verdade. Jesus, os Apóstolos e os Profetas em
nenhum momento deixaram escapar nenhuma ideia, a menor que seja, a respeito de alguma
falha, ou discordância entre eles ou entre as partes desse Livro, “mas o aceitam totalmente
[...], sem reservas [e] incondicionalmente [...] como verdadeiro e divino em todas as suas
partes.”64
59
Mt 15:4 “Pois Deus disse: ‘Honra teu pai e tua mãe’ e ‘quem amaldiçoar seu pai ou sua mãe terá que ser
executado.’” Mt 22:44 “O Senhor disse ao meu Senhor: ‘Senta-te à minha direita, até que eu ponha os teus
inimigos debaixo de teus pés.’” 60
BAVINCK, Herman. Reformed Dogmatics. Vol. 1, Prolegomena, ed. John Bolt, trans. John Friend. Grand
Rapids: Baker Academic, 2003, p. 395 aped ANGLADA, Paulo. Sola Scriptura. Ananindeua, PA: Knox, 2013,
p. 66, colchete nosso. 61
Êx 4:12 “Agora, pois, vá; eu estarei com você, ensinando-lhe o que dizer” 2 Sm 23:1-2 “Estas são as últimas
palavras de Davi: ‘Palavras de Davi, filho de Jessé; palavras do homem que foi exaltado, do ungido pelo Deus de
Jacó, do cantor dos cânticos de Israel: O Espírito do Senhor falou por meu intermédio; sua palavra esteve em
minha língua.’” Dt 18:18 “Levantarei do meio dos seus irmãos um profeta como você; porei minhas palavras na
sua boca, e ele lhes dirá tudo o que eu lhe ordenar.” Os 1:2 “Quando o Senhor começou a falar por meio de
Oséias, o Senhor lhe disse: ‘Vá, tome uma mulher adúltera e filhos da infidelidade, porque a nação é culpada do
mais vergonhoso adultério por afastar-se do Senhor.’” Hc 2:1 “Ficarei no meu posto de sentinela e tomarei
posição sobre a muralha; aguardarei para ver o que ele me dirá e que resposta terei à minha queixa.” Zc 1:9
“Então perguntei: Quem são estes, meu senhor? O anjo que estava falando comigo respondeu: ‘Eu lhe mostrarei
quem são.’” 62
ANGLADA, Paulo. Sola Scriptura. Ananindeua, PA: Knox, 2013, p. 67. 63
Js 24:2 “Josué disse a todo o povo: ‘Assim diz o Senhor, o Deus de Israel: Há muito tempo, os seus
antepassados, inclusive Terá, pai de Abraão e de Naor, viviam além do Eufrates e prestavam culto a outros
deuses.’” Is 1:2 “Ouçam, ó céus! Escute, ó terra! Pois o Senhor falou: ‘Criei filhos e os fiz crescer, mas eles se
revoltaram contra mim.’” Jr 1:2 “A palavra do Senhor veio a ele no décimo terceiro ano do reinado de Josias,
filho de Amom, rei de Judá,” Ez 1:3 “A palavra do Senhor veio ao sacerdote Ezequiel, filho de Buzi, junto ao rio
Quebar, na terra dos caldeus. Ali a mão do Senhor esteve sobre ele.” Ez 2:1 “Ele me disse: ‘Filho do homem,
fique de pé, que eu vou falar com você.’” 64
BAVINCK apud ANGLADA, op. cit. p., 66.
17
2.3 A doutrina de inspiração da Igreja65
Depois de discorrer acerca de algumas (principais) teorias da inspiração Bíblica, é
importante ressaltar qual é a posição da Igreja, desde seu início, em relação a essa doutrina.
Para a Igreja a convicção na divina inspiração da Escritura prevalecia por meio da fé, talvez
esse assunto não tenha sido uma pauta tão importante na época, à preocupação estava mais em
disseminar a verdade do que averiguar se o que eles pregavam era verdade inspirada e
infalível. Esse testemunho de fé prevaleceu por 18 séculos, denominado “como visão
ortodoxa da inspiração divina. Os pais da Igreja em geral [...], ensinaram firmemente que a
Bíblia é a Palavra de Deus escrita.”66
Essa visão serviu como base, não somente para os pais
da Igreja do primeiro século, mas também aos reformadores a partir do século 16 e ainda é
sustentada em dias atuais. Só com o surgimento do “modernismo ou liberalismo teológico,”67
no século 19, foi que a visão ortodoxa da Escritura começou a ser questionada e
consequentemente surgiram vários conceitos sobre a inspiração bíblica. Trata-se de um
período conturbado, pois foi quando “todas as teorias de inspiração que a energia incansável
dos incrédulos e a especulação dos meio-crentes foram capazes de inventar.”68
No meio de inúmeras teorias, existe uma muito bem estabelecida pela Igreja, que
Warfield esclarece como sendo uma doutrina que;
Difere das teorias que de bom grado a substituíram, no fato de que ela não é
invenção nem propriedade de um indivíduo, mas a fé constante da Igreja universal
de Deus; no fato de que ela não surgiu ontem, mas é a segura persuasão do povo de
Deus desde a primeira plantação da Igreja até o dia de hoje; no fato de que ela não é
uma elaboração multiforme que varia suas afirmações para se encaixar em cada
nova mudança do pensamento inconstante dos homens, mas desde o início, é a
constante e permanente convicção da Igreja sobre a divindade das Escrituras.69
Não é necessário um desenvolvimento minucioso para esclarecer essa doutrina, pois
para a Igreja, desde a sua plantação, a Escritura é “um livro oracular – como a Palavra de
Deus de tal modo que tudo o que ela diz Deus diz.”70
Essa doutrina está embasada na fé, que é
uma herança natural do crente, este pode recorrer a essa palavra sem medo de encontrar nela
algo que não seja a Palavra de Deus, ou talvez, não encontrar auxílio necessário para seus
infortúnios, curvando-se diante “das suas enunciações de direito [e] de suas ameaças, [mas
65
Da Biblioteca Sacra, v. 51, 1894, p. 614-640. Publ. Em Revelation and Inspiration sob o título “The
inspiration of the Bible” apud WARFIELD, Benjamin. A inspiração e autoridade da Bíblia. São Paulo: Cultura
Cristã, 2010, p. 84. 66
GEISLER, Norman; WILLIAM, Nix. Introdução Bíblica: como a Bíblia chegou até nós. São Paulo: Vida,
2006, p. 16. 67
Ibid., p. 20. 68
WARFIELD, Benjamin. A inspiração e autoridade da Bíblia. São Paulo: Cultura Cristã, 2010, p. 85. 69
Ibid. 70
Ibid.
18
também descansando] em suas promessas.”71
Essa fé é uma grande ponte para a Igreja, se
caso as dúvidas que brotam com a modernidade, sobre a Escritura, ecoarem no meio do povo
de Deus, ela fará com que o cristão;
Facilmente se [recorde] daqueles dias mais felizes [quando] no colo de nossa mãe
cristã, com um cicio nos lábios seguindo palavras que o dedo lento traçava sobre
uma página aberta – palavras que foram o seu apoio em cada prova e, como ela
carinhosamente confiava [tornaram] guia durante toda a vida.72
A Igreja sempre repousou na confiança de que cada palavra da Bíblia é a voz de Deus
e “todo corpo de literatura cristã da testemunho desse fato [...], [traçando uma trajetória] até
sua fonte e em toda parte a cristandade é harmoniosa com uma fé viva na fidelidade divina
das Escrituras.”73
Já foi citado o testemunho de alguns escritores bíblicos, como Apóstolo Paulo e
Apóstolo Pedro, que declaram serem os escritos bíblicos inspirados por Deus. Todavia é
importante ressaltar os testemunhos dos pais da Igreja, que após a era apostólica também
defendiam o caráter divino das Escrituras, ainda que, essas afirmações não possuam o mesmo
peso que possui o testemunho apostólico. Eles não tinham outra definição a não ser a
completa inspiração divina das Escrituras clara e convicta em seus corações e registrada em
seus escritos. Orígenes74
, teólogo do primeiro século, “afirma que o Espírito Santo foi
cooperador com os evangelistas na composição do Evangelho [...], portanto, lapsos de
memória, erros ou falsidades eram impossíveis para eles.”75
Irineu de Lyon76
, discípulo de
Policarpo77
“reivindica para os cristãos a consciência clara de que as Escrituras são perfeitas,
visto que são faladas pela Palavra de Deus e do seu Espírito.”78
Policarpo por sua vez
71
WARFIELD, Benjamin. A inspiração e autoridade da Bíblia. São Paulo: Cultura Cristã, 2010, p. 85, colchete
nosso. 72
Ibid., colchetes nosso. 73
Ibid., p. 86, colchete nosso. 74
“(185-254) Nascido no Egito, esse mártir foi um importante e controvertido teólogo da cristandade primitiva.
Foi um dos principais promotores de uma exegese alegórica das Escrituras, enfatizando três níveis de leitura do
texto bíblico, o literal, o moral e o espiritual. Lecionou na escola de teologia (Didaskaleion) de Alexandria. Seus
ensinos sobre a preexistência da alma e da restauração de todas as coisas (apokatástasis) foram condenados no
Segundo Concílio de Constantinopla (553), por serem contrários às Escrituras. Sua principal obra é uma apologia
ao cristianismo: Contra Celso.” FERREIRA, Franklin. Teologia Cristã. São Paulo: Vida Nova, 2011, p. 263. 75
WARFIELD, op. cit., p. 86. 76
“(130-202) Provavelmente nascido na Turquia, foi bispo na França sendo um dos mais importantes escritores
da cristandade antiga. Por meio de seus escritos, não apenas refutou completamente o gnosticismo, como
também legou à cristandade o primeiro protótipo de uma teologia bíblica. Provavelmente foi martirizado. Sua
mais importante obra foi: Contra as Heresias” FERREIRA, Franklin. Teologia Cristã. São Paulo: Vida Nova,
2011, p. 261. 77
“Segundo Tertuliano, um importante teólogo cristão do século 3.°, Policarpo, teria sido ordenado bispo de
Esmirna pelas mãos do próprio apóstolo João. FERREIRA, Franklin. Gigantes da Fé. São Paulo: Vida, 2006, p.
25. 78
WARFIELD, op. cit., p.86.
19
considerou a Escritura como a “voz do altíssimo, e anunciou como primogênito de Satanás
[aquele que corrompe seus escritos].”79
Para os últimos pais da Igreja essa doutrina não se
diferenciava em nada, um exemplo disso são as palavras de Agostinho de Hipona80
que
“afirma que considera as Escrituras canônicas entre os livros com tal reverência e honra [e
que seus autores foram isentos de erros].”81
Entre os reformadores, também não é encontrada
uma teoria diferente em relação a doutrina da inspiração bíblica. Um exemplo disso é Lutero
que faz uso das mesmas palavras de Agostinho e ainda “declara que o conjunto das Escrituras
deve ser atribuído ao Espírito Santo e, portanto, não pode errar.”82
Para Calvino83
as
Escrituras “eram o verbum Dei – a Palavra de Deus [...], competente, inspirada, inerrante, e
infalível.”84
Poderiam ser citados inúmeros autores que marcaram suas épocas com seus
posicionamentos, mas para encerrar essa pequena lista é importante citar o que diz Richard
Baxter (1615-1691), um importante ministro em sua época que levou para dentro das casas
“em sua paróquia no interior da Inglaterra,”85
o ensino bíblico que ele mesmo considerou
como sagrado e verdadeiro afirmando que “não há falsidade nas Escrituras.”86
Neste capítulo foi abordado o tema “inspiração bíblica” com ênfase em suas principais
teorias. Dentre elas estão: inspiração plenária que evidencia o fator divino na totalidade da
Escritura considerando assim cada parte como inspirada, mas não com o mesmo grau de
importância entre essas partes; Inspiração dinâmica que valoriza o labor harmonioso do
divino e humano, onde Deus se valeu dos conhecimentos e personalidade humana para
produzir a Escritura; Inspiração verbal que semelhante a plenária defende a completa
inspiração bíblica, no entanto, na verbal não somente as partes são inspiradas, mas cada
palavra. Existem outras definições menos aceitas, entre elas estão: a inspiração mecânica ou
79
WARFIELD, Benjamin. A inspiração e autoridade da Bíblia. São Paulo: Cultura Cristã, 2010, p. 86, colchete
nosso. 80
“(354-430) Um dos mais importantes influentes pensadores cristãos. Originário da Argélia, no norte da África,
foi bispo na pequena cidade de Hipona e o mais prolífico escritor da cristandade antiga. Quase todos os grandes
temas cristãos foram tratados nos escritos desse bispo latino, tais como: hermenêutica, Trindade, graça,
predestinação, igreja, casamento, sacramentos e escatologia. Entre suas principais obras, estão: O livre-arbítrio,
A doutrina cristã, A Trindade, Confissões e Cidade de Deus.” FERREIRA, Franklin. Teologia Cristã. São Paulo:
Vida Nova, 2011, p. 257. 81
WARFIELD, op. cit., p. 87, colchete nosso. 82
Ibid. 83
“Um dos mais destacados pensadores da cristandade. Esse francês desenvolveu seu ministério na cidade de
Genebra, na Suíça, onde exerceu influência sobre grande parte da Europa em sua época. [...]. Pregador, exegeta,
polemista, é mais conhecido pelas Institutas da Religião Cristã, uma teologia bíblica que serve de introdução aos
principais temas dogmáticos das Escrituras.” FERREIRA, Franklin. Teologia Cristã. São Paulo: Vida Nova,
2011, p. 261. 84
LAWSON, Steven. A arte expositiva de Calvino. São José dos Campo, Sp: Fiel, 2010. p. 34. 85
FERREIRA, Franklin. Teologia Cristã. São Paulo: Vida Nova, 2011, p. 263. 86
WORKS, 15.65 apud WARFIELD, Benjamin. A inspiração e autoridade da Bíblia. São Paulo: Cultura Cristã,
2010, p. 87.
20
ditada que defende a anulação completa da mente humana, não se valendo do conhecimento e
nem da personalidade humana e Inspiração parcial ou fracionada que não tem a Bíblia como
inspirada em sua totalidade, mas parcialmente.
Em outro ponto foi enfatizado o emprego, origem e as variações do termo “inspiração”
como sua definição dentro da ideia bíblica que se resume no agir sobrenatural de Deus que
transcende a capacidade humana. Outro ponto são as evidências bíblicas que comprovam sua
inspiração presente nos ensinos de Jesus, nos testemunhos dos apóstolos e nas mensagens
proféticas do Antigo Testamento, também como a transformação que se evidencia na vida
daquele que se dispõe a ouvir essa mensagem. A inspiração é também evidenciada na questão
harmônica dos livros, que estão distantes em autoria, estilo, contexto e que mesmo assim
transmitem uma mesma ideia.
Finalizando o capítulo, foi descrito a ideia bíblica da inspiração que a igreja defende
desde sua plantação, uma crença fundamentada nos escritos, mas principalmente na fé que
sempre foi uma herança natural da igreja, essa crença é transmitida até hoje e conhecida como
visão ortodoxa da Escritura, onde toda ela é obra do Espírito Santo, que inspirou homens para
escrevê-la. Se opondo a essa visão em um período conhecido como modernismo ou
liberalismo teológico, outras definições surgiram, algumas coerentes com a Bíblia e com
maior aceitação pela igreja e outras que, defendida pelos críticos, não se coadunam com o
ensino bíblico.
Alguns podem questionar o fato da convicção da Igreja na inspiração divina da
Escritura ser por meio da fé, e não através de uma declaração formal e bem esclarecida do
assunto, mas “a fé simples do povo cristão é também doutrina confessional das igrejas
cristãs,”87
e “foi por meio dela que os antigos receberam bom testemunho.”88
É pela fé que a
Escritura é recebida como um livro divino escrito por homens inspirados pelo Espírito Santo.
Portanto é necessário rejeitar qualquer teoria de que a Bíblia possua somente algumas partes
inspiradas ou que ela seja mecânica não se valendo de fatores humanos e contextos da época,
ou seja, qualquer ideia que despreze o divino ou o humano no que diz respeito a Escritura,
deve ser rejeitado.
No próximo capítulo será tratado a respeito da suficiência da Escritura tal como seus
principais conceitos, história e aplicações práticas que semelhante a inspiração bíblica sempre
foi a regra de fé da Igreja, mas que passou e ainda passa por manifestações de incredulidade.
87
WARFIELD, Benjamin. A inspiração e autoridade da Bíblia. São Paulo: Cultura Cristã, 2010, p. 88. 88
Hebreus 11:2. Cf. também Hebreus 11:1-40.
21
3. A SUFICIÊNCIA DA ESCRITURA
A Igreja de Cristo desde o seu nascimento confiou nas Escrituras, pois ela tinha uma fé
viva e convicta de que esses escritos eram inspirados e consequentemente suficientes para
direcioná-la. Essa realidade mudou, pois “os púlpitos não mais podem ser identificados com
os de outrora” 89
, um dos fatores que colaboram para isso é “o evangelicalismo moderno [que]
parece manifestar uma crescente incredulidade nas Escrituras como regra suficiente de fé e
prática.”90
Fato é que, algumas Igrejas tem buscado, fora da Bíblia, complementos para sua
doutrina desviando-se do caminho proposto por Deus.
A Bíblia é extremamente adequada para governar a Igreja, pois “tudo o que aprouve a
Deus revelar [...] em matéria de fé e prática,”91
foi registrado nela, sem faltar ou passar
qualquer tipo de informação, e como um leme preciso direciona um barco a Escritura
direciona a Igreja e até mesmo a sociedade. Um exemplo disso foi quando João Calvino,
teólogo francês, retornou a Genebra depois de dois anos após ser expulso da cidade por causa
de discussões sobre “disciplina cristã, adesão à confissão de fé e práticas litúrgicas.”92
Esse
retorno, tão aclamado pelos genebrinos, foi para que Calvino pudesse tirar da Bíblia,
Os princípios que deveriam reger a vida dos cidadãos daquela cidade, tanto no que
se referia às questões eclesiásticas, quanto às demais questões que envolviam a
administração e ordem na cidade. Por esta razão, Calvino fez da pregação baseada
nas Escrituras seu principal instrumento de trabalho.93
Para o homem, a Escritura é o seu guia, sendo a voz de Deus, ela governa cada área de
sua vida. Nela o homem “encontra tudo o que deve saber e tudo o que deve fazer a fim de que
venha a ser salvo [e], viva de modo agradável a Deus, [o servindo e o adorando].”94
No Salmo
19:7-13,95
algumas afirmações elucidam bem o propósito e capacidade da Escritura, nela esta
explicito que “a lei do Senhor é perfeita” os “preceitos do Senhor são justos” e seus
89
ANGLADA, Paulo. Sola Scriptura. Ananindeua, PA: Knox, 2013, p. 2 90
Ibid., p. 91. 91
Ibid., p. 93. 92
FERREIRA, Franklin, Gigantes da fé. São Paulo: Vida, 2006, p. 162 93
MIRANDA, Daniel Leite Guanaes de. Calvino e Sola Scriptura: A aplicação deste princípio na cidade de
Genebra e sua Relevância para o Brasil dos dias atuais. Disponível em:
<http://www.monergismo.com/textos/jcalvino/Calvino-Sola-Scriptura_Daniel-Leite.pdf>. p. 8. 94
ANGLADA, op. cit., p. 93 95
“A lei do Senhor é perfeita, e revigora a alma. Os testemunhos do Senhor são dignos de confiança, e tornam
sábios os inexperientes. Os preceitos do Senhor são justos, e dão alegria ao coração. Os mandamentos do Senhor
são límpidos, e trazem luz aos olhos. O temor do Senhor é puro, e dura para sempre. As ordenanças do Senhor
são verdadeiras, são todas elas justas. São mais desejáveis do que o ouro, do que muito ouro puro; são mais
doces do que o mel, do que as gotas do favo. Por elas o teu servo é advertido; há grande recompensa em
obedecer-lhes. Quem pode discernir os próprios erros? Absolve-me dos que desconheço! Também guarda o teu
servo dos pecados intencionais; que eles não me dominem! Então serei íntegro, inocente de grande transgressão.
BÍBLIA, Sagrada. Nova versão internacional. São Paulo: Vida, 2007.
22
“mandamentos são límpidos” e ainda “mais desejáveis do que o ouro” e “mais desejáveis do
que o mel”, e por ela o “servo [do Senhor] é advertido” e essa lei guarda o homem dos
“pecados intencionais” de maneira que eles não o dominam. Uma vez dominado pelo pecado,
a Escritura é o único meio suficiente capaz de iluminá-lo conscientizando-o e libertando-o de
suas práticas reprovadas por Deus em sua Palavra. Assim, a suficiência da Escritura só poderá
ser comprovada à medida que o homem se torna, por completo, cativo a ela.
Alguns podem perguntar, se outros livros poderiam ajudar o homem e a Igreja a
desenvolver seu crescimento, a resposta é não! Segundo Ryle;
Há um abismo entre este [Bíblia] e qualquer outro livro que tenha sido escrito. Ele
ilumina um vasto número de assuntos dos mais importantes de forma melhor do que
todos os outros livros no mundo. Ele ousadamente trata de assuntos que vão além do
alcance humano, quando o homem é deixado por conta própria. Trata de coisas que
são misteriosas e invisíveis: a alma, o mundo vindouro e a eternidade, profundidades
essas que nenhum homem pode sondar. 96
Por mais que seja impossível desconsiderar o avanço da ciência, da arte e da erudição
a Bíblia ainda é um livro exclusivo, incomparável e insubstituível. Não se trata de um livro
com pontos fortes e fracos, assuntos relevantes e irrelevantes. Tudo o que foi escrito, é, e
sempre será relevante em seu todo. E ainda “é o único livro que conserva frescor, perenidade
e novidade.”97
3.1 Conceito
Crer na suficiência bíblica significa crer em sua inspiração. Para Paul Washer essa
ideia pode não ser tão obvia assim, pois quando a Igreja tem a Bíblia como inspirada ganha
“somente metade da batalha [...]. A maior questão que acompanha isso [...], é: a Bíblia é
suficiente?”98
Na definição de Grudem;
As Escrituras são suficientes [que] significa dizer que [ela] contém todas as palavras
divinas que Deus quis dar ao seu povo em cada estágio da história da redenção e que
hoje contém todas as palavras de Deus que precisamos para salvação, para que, de
maneira perfeita, nele possamos confiar e a ele obedecer. 99
É impossível definir a suficiência da Bíblia sem incluir o fator inspiração, pois dizer
que a Bíblia não é inspirada e afirmar sua suficiência, não passa de um conceito de opinião.
Da mesma forma crer na sua inspiração sem obedecer as palavras que contém no livro, não
quer dizer nada, nenhuma mudança ocorre, pois a suficiência da Escritura é comprovada
96
RYLE, J. C. A Inspiração das Escrituras. São Paulo: Pes, s.d. p. 1. 97
Ibid., p. 5. 98
WASHER, Paul. 10 Acusações contra Igreja Moderna. São José dos Campos, Sp: 2011, p. 16. 99
GRUDEM, Wayne. Teologia Sistemática. São Paulo: Vida Nova, 1999, p. 86.
23
quando ocorrem mudanças invisíveis que refletem visivelmente, operadas pela Palavra de
Deus.
Um grande apoio bíblico para o conceito de suficiência está em 2Tm 3:15,100
onde
Paulo confirma o grande apreço de Timóteo pela Escritura desde sua infância,101
mostrando o
poder de seus escritos que poderia “torná-lo sábio para a salvação mediante a fé em Cristo
Jesus”, no verso seguinte Paulo descreve porque a Escritura tem esse poder. Um detalhe
importante é, para que ela seja proveitosa ou suficiente é necessário fazer o uso correto da
mesma. Pois que proveito a Escritura teria quando o leitor “se interessa apenas por
especulações curiosas? [...], [ou] se porventura ele perverte o significado natural com as
interpretações estranhas à fé,”102
descaracterizando seu ponto central que é Cristo.
A suficiência bíblica é compreendida no sentido de que tudo o que é relacionado com
a vida do cristão, seu chamado e vocação está presente nas Escrituras. Apóstolo Paulo afirma
a utilidade dos escritos no sentido de tornar o homem “apto e plenamente preparado para toda
boa obra” (2Tm 3:17).103
Assuntos relacionados a: casamento, divórcio, criação de filhos,
relacionamento entre cristãos e governo, bem como doutrinárias relacionadas a: “expiação, ou
a pessoa de Cristo, ou a obra do Espirito Santo na vida do crente hoje,”104
fazem parte da
gama de assuntos que a Escritura aborda, não somente na busca de respostas a cerca de um
determinado assunto, mas na preparação do cristão para servir a Deus dentro do seu próprio
contexto. No entanto Deus não cobra do crente aquilo que Ele não registrou no Livro, ou seja,
“Deus não pode acrescentar mais palavras àquelas que ele já falou ao seu povo.”105
De igual
modo “o homem, não pode por conta própria, acrescentar nenhuma palavra àquelas que Deus
já falou.”106
Alguns podem questionar a suficiência da Escritura na época de Moisés por exemplo,
ou em períodos posteriores, em que o povo hebreu não tinha os 66 livros fechados a sua
disposição. Talvez tal compreensão reflete na ideia de que o povo não tinha a vontade de
100
“Porque desde criança você conhece as sagradas letras, que são capazes de torná-lo sábio para a salvação
mediante a fé em Cristo Jesus.” BÍBLIA Sagrada. Nova Versão Internacional. São Paulo: Vida, 2007. 101
“Era um sábio cuidado que nos tempos antigos se tomava em assegurar-se de que aqueles que eram
destinados ao ministério da palavra fossem desde a infância instruídos na sólida doutrina da piedade e
houvessem bebido as profundas águas dos escritos sagrados, para que, ao assumirem o desempenho de seu
ofício, não se revelassem aprendizes inexperientes. CALVINO, João. As Pastorais. São José dos Campo, Sp:
Fiel, 2009, p. 262. 102
CALVINO, João. As Pastorais. São José dos Campo, Sp: Fiel, 2009, p. 262. 103
BÍBLIA Sagrada. Nova Versão Internacional. São Paulo: Vida, 2007. 104
GRUDEM, Wayne. Teologia Sistemática. São Paulo: Vida Nova, 1999, p. 87 105
Ibid., p. 88. 106
Ibid., p. 88.
24
Deus por inteiro, no entanto, não poderiam agradar a Deus fazendo sua vontade, pois lhes
faltavam revelações. Mas Deus se valeu daquilo que já tinha sido revelado, por exemplo;
No tempo da morte de Moisés, os cinco livros do [...] Antigo Testamento eram
suficientes para o povo de Deus da época. Mas Deus ordenou que autores
posteriores acrescentassem novos ensinos, para que as escrituras fossem também
suficientes para os crentes de épocas posteriores. Para os cristãos de hoje, as
palavras de Deus [...], [do] Antigo e [do] Novo Testamento [...] são suficientes
durante a era da Igreja. Depois da morte, ressurreição e ascensão de Cristo, da
fundação da Igreja primitiva [...], não ocorreram na história ações divinas redentoras
importantes (ações que tenham relevância direta para todo o povo de Deus e para
todo o tempo subsequente).107
No entanto todas as palavras que foram citadas no Antigo Testamento serviram não
somente para sua época, mas são extremamente relevantes para o contexto atual. Isso quer
dizer que tanto a Igreja como o membro podem ser instruídos, exortados e edificados com os
textos do Antigo Testamento que, mesmo sendo antigos e de uma época completamente
diferente de hoje, principalmente em relação a cultura, são textos atuais e competentes, que
podem ser aplicados atualmente, (Dt 4:2; 12:32; Pv 30:5-6).108
3.2 A Suficiência da Escritura na Pregação
O estudo da homilética109
traz várias técnicas com o intuito de aperfeiçoar o orador
para apresentar sua exposição com qualidade, a evolução desses métodos tem crescido muito
ultimamente com o propósito de dar maior compreensão àquilo que esta sendo dito. Na
pregação do evangelho não tem sido diferente, as técnicas invadiram os púlpitos, os oradores
tem conseguido atingir resultados cada vez mais expressivos no quesito compreensão e
contextualização de suas mensagens. A impressão que se dá é que isso nunca foi tão
importante como tem sido nos últimos anos. O aperfeiçoamento das técnicas de expor a
mensagem bíblica tem se tornado mais importante do que a própria mensagem, prioridades
como: extrair da Bíblia princípios norteadores para a vida do homem, princípios estes que
conduz a um viver agradável a Deus tem ficado em segundo plano. Quando se inverte
107
GRUDEM, Wayne. Teologia Sistemática. São Paulo: Vida Nova, 1999, p. 89 108
Dt 4:2 “Nada acrescentem às palavras que eu lhes ordeno e delas nada retirem, mas obedeçam aos
mandamentos do Senhor, o seu Deus, que eu lhes ordeno. Mt 12:32 “Apliquem-se a fazer tudo o que eu lhes
ordeno; não acrescentem nem tirem coisa alguma. Pv 30:5-6 “Cada palavra de Deus é comprovadamente pura;
ele é um escudo pra quem nele se refugia. Nada acrescente às palavras dele, do contrário, ele os repreenderá e
mostrará que você é mentiroso” (BÍBLIA Sagrada. Nova Versão Internacional. São Paulo: Vida, 2007). 109
“Essa palavra portuguesa vem do grego, omiletikós, «sociável». O verbo omileein, significa «estar em
companhia de»; e o substantivo omilos significa «assembléia». Visto que a sociabilidade está, intimamente,
associada à linguagem, esse título, homilética, veio a se referir àquele ramo da retórica que trata da composição e
entrega de sermões. Em outras palavras, a homilética é a arte de compor e entregar sermões. Uma homilia, por
sua vez, é um discurso ou sermão. As homilias originais, dos pais da Igreja, eram comentários sobre as
Escrituras, envolvendo também os trechos bíblicos que eram lidos durante os cultos religiosos” CHAMPLIN,
Russel. N. Enciclopédia de Bíblia teologia e filosofia. 3.v. s.l, s.d. p. 154.
25
priorizando a técnica mais do que a mensagem, o risco pode ser enorme e a consequência
disso é a descaracterização do real sentido bíblico, ensinos moralistas, desconstrução da
doutrina bíblica e cultos antropocêntricos. Nesse sentido, a Escritura é insuficiente tanto para
o pregador quando para o ouvinte. Pois o pregador estaria perdendo a oportunidade de falar da
parte de Deus e agradá-lo e os ouvintes estariam perdendo seu tempo com palavras
meramente humanas, cheias de requinte, porém humanas.
O entendimento acerca do que é uma pregação ganha sentido quando analisamos o
seus respectivos empregos no Novo testamento. Será feito o uso de quatro palavras, que no
grego expressam essa ideia, são elas;
Kerusso (“pregar”). Significa ‘declarar, como faz um arauto’. Refere-se à mensagem
de um rei. Quando um soberano tinha uma mensagem para seus súditos, ele
entregava aos arautos. Este transmitia às pessoas sem mudá-la ou corrigi-la [...]. O
Novo Testamento usa este verbo para enfatizar que o pregador não deve anunciar
sua própria mensagem. Ele fala como porta-voz de outrem. A ênfase desta palavra
está na transmissão exata da mensagem. [Outra palavra é] euangelizo [que significa]
‘trazer boas notícias’. Martureo, este verbo significa dar ‘testemunho dos fatos’. [E
por último] didasko, esta palavra significa ‘pronunciar em termos concretos o que a
mensagem significa em referência ao viver’. [...] Quando alguém prega, não importa
o lugar em que esteja ou para quem está falando, está fazendo todas as quatro coisas
[mencionadas].110
Os profetas do Antigo Testamento tinham a incumbência de transmitir ao povo somente
aquilo que Deus revelasse como em Jr 1:17 “E você, prepare-se! Vá dizer-lhes tudo o que eu
ordenar”. O Deus da mensagem também é o Deus do povo que vai receber a mensagem, e
para esse Deus a sua palavra é o suficiente, pois “o que Deus tem a dizer ao homem é
infinitamente mais importante do que as coisas que o homem tem a dizer a Deus.”111
A
Escritura possui somente uma interpretação que abrange várias áreas da vida dos ouvintes, por
essa razão é que o rigor para sua transmissão é tão importante, e aqui o rigor não tem a ver
com técnica mas sim em dizer somente o que Deus disse, pois o “Espírito Santo age nos
ouvintes por meio de um pregador só até o ponto em que a Palavra é ensinada com exatidão e
clareza.”112
João Calvino se assemelha aos profetas do Antigo Testamento por crer que a pura
transmissão das Palavras de Deus sem mistura humana é que surtirá efeito, para ele “a igreja
de Deus será educada pela pregação autêntica de sua Palavra e não pelas invenções dos
homens [as quais são madeira, feno e palha].”113
E ainda acrescenta: “mesmo em nossa
110
OLYOT, Stuart. A pregação pura e simples. São José do Campo, Sp: Fiel, 2008, p. 14-18. 111
STEVEN, Lawson. A arte expositiva de João Calvino. São Jose dos Campos, Sp: Fiel, 2010, p. 38 112
Ibid., p. 38. 113
CALVINO, João. Comentário em 1 Coríntios. São Bernardo do Campo, SP: Paracletos, 2003 apud
LAWSON, Steven. A arte expositiva de João Calvino. São José dos Campos, Sp: Fiel, 2010, p. 40.
26
própria época há muitos que, a fim de exibir sua habilidade em compendiar a Palavra de
Deus, se permitem jogar com ela como se fosse filosofia profana”.114
Para Calvino, na
pregação, a Palavra sai da boca de Deus tal como sai da boca de homens, pois Deus não fala
diretamente do céu, mas usa homens para falar por seu intermédio.115
Para Agostinho de
Hipona116
o pregador é quem interpreta e ensina as verdades divinas com base na fé,
interpretando as Escrituras e não dando sentido ao texto, mas resgatando-o do próprio texto,117
enquanto isso acontecer o caminho que o pregador e os ouvintes trilham é o do propósito
divino e o cumprimento das promessas ali encontradas.
3.3 Interpretação das Escrituras
Para dar mais clareza ao assunto da suficiência na pregação que foi abordado no tópico
anterior, faz-se necessário a abertura de um assunto muito importante em relação à Escritura,
que é a sua interpretação, pois, a potencialidade das informações bíblicas depende
exclusivamente disso, assim como os escritos de um jornal, revista e etc. Se não houver uma
interpretação precisa e correta é impossível alcançar o propósito pelo qual tal escrito foi
confeccionado, ocorrendo então uma deturpação de informações. Como afirma Nicodemus;
“Cada vez que abrimos e lemos, buscando entender a mensagem de Deus para nós, engajamo-
nos num processo de interpretação.”118
Lembrando que o processo de interpretação utilizado
para as Escrituras se difere das fontes de informações que temos hoje, por causa da época em
que foi escrita e a língua que foi utilizada, e também pelo fato de que todos os escritores da
Bíblia já morreram, tornando a interpretação mais complicada e importante.
Para Anglada a necessidade de interpretação:
Decorre do fato de que ler não implica necessariamente em entender. [...], as
Escrituras são substancialmente, mas não completamente claras. As verdades
básicas necessárias à salvação, serviço e vida cristã são evidentes em uma ou outra
passagem bíblica, mas nem todas as passagens das Escrituras são igualmente claras.
Daí a necessidade de interpretação consciente da Palavra de Deus.119
114
CALVINO, João. As pastorais. São José dos Campos, Sp: Fiel, 2009, p. 18 115
FERREIRA, Franklin. Calvino e a pregação. In: Conferência Fiel, 2008. Pregação poderosa. Portugal.
Disponível em: <http://www.ministeriofiel.com.br/conferencias/mensagem/391/Joao_Calvino_e_a_Pregacao>.
Acesso em 24 out. 2013. 116
(354-430) Natural da Argélia, norte da África, foi Bispo em uma pequena cidade chamada Hipona, foi autor
de grandes obras, dentre as principais estão: O livre-arbítrio, A doutrina cristã, A Trindade, Confissões e Cidade
de Deus. FERREIRA, Franklin. Teologia Cristã. São Paulo: Vida Nova, 2011, p. 257. 117
FERREIRA, Franklin. Agostinho e a pregação. In: Conferência Fiel, 2008. Pregação poderosa. Portugal.
Disponível em: <http://www.ministeriofiel.com.br/conferencias/mensagem/390/Agostinho_e_a_Pregacao>.
Acesso em 24 out. 2013. 118
LOPES, Augustus Nicodemus. A Bíblia e seus interpretes. São Paulo: Cultura Cristã, 2007. p. 21. 119
ANGLADA, Paulo. Sola Scriptura. Ananindeua, PA: Knox, 2013, p. 150.
27
O processo de interpretação da Escritura começa com os autores do Antigo
Testamento e “continua até os dias de hoje, fecundado e amadurecido pela chegada do
Cristianismo e qualificado em diversos aspectos pelos limites da inspiração impostos pela
história da salvação.”120
Mesmo tendo acesso a documentos mais atuais e fiéis, em relação ao
que se tem hoje, os primeiros intérpretes não estiveram isentos de problemas de interpretação
como afirma Virkler:
Os escribas tiveram grande cuidado em copiar as Escrituras crendo que cada letra do
texto era a Palavra de Deus inspirada [...]. Essa reverência tinha vantagens e
desvantagens. Uma grande vantagem estava em que os textos foram cuidadosamente
preservados através dos séculos. Uma grande desvantagem foi que os rabinos logo
começaram a interpretar a Escritura por outros métodos121
que não [são] os meios
pelos quais a comunicação é normalmente interpretada.122
Apóstolo Pedro reconhece a dificuldade para se interpretar o texto sagrado, quando em
2Pe 3:16, ele afirma que nas cartas de Paulo “contêm algumas coisas difíceis de entender...”.
“Isso significa que a compreensão da Escritura Sagrada nem sempre é automática e
espontânea.”123
É justamente pelo fato dessa compreensão não ser espontânea que o faz
necessário ser interpretado conscientemente, “neste caso, existe um vazio entre o texto a ser
compreendido e o leitor, que ‘necessita da formulação de normas para preencher esse
vazio.’”124
É necessário enfatizar dois aspectos a respeito da interpretação da Escritura: O
primeiro aspecto é a ação iluminadora do Espírito Santo na vida do intérprete, pois “a
cegueira espiritual do homem em decorrência da queda havia afetado inclusive a capacidade
[do homem] de conhecer as coisas de Deus e recebê-las.” Neste sentido, é preciso que o
“coração [não esteja] embotado, como o dos Judeus descrentes; nem seu entendimento
[esteja] obscurecido, como dos gentios incrédulos.”125
Por isso Apóstolo Paulo orava
constantemente para a Igreja em Éfeso;
Não deixo de dar graças por vocês, mencionando-os em minhas orações. Peço que o
Deus de nosso Senhor Jesus Cristo, o glorioso Pai, lhes dê espírito de sabedoria e de
revelação, no pleno conhecimento dele. Oro também para que os olhos do coração
de vocês sejam iluminados, a fim de que vocês conheçam a esperança para a qual ele
os chamou, as riquezas da gloriosa herança dele nos santos e a incomparável
120
LOPES, Augustus Nicodemus. A Bíblia e seus interpretes. São Paulo: Cultura Cristã, 2007. p. 36. 121
Por causa da autoria divina das Escrituras, era atribuído pelos rabinos muitos significados para um único
texto. cf. em: VIRKLER, Henry, Hermenêutica avançada. São Paulo: Vida Nova, 2007, p. 36-37. 122
VIRKLER, Henry, Hermenêutica avançada. São Paulo: Vida Nova, 2007, p. 36. 123
ANGLADA, Paulo. Sola Scriptura. Ananindeua, PA: Knox, 2013, p. 150. 124
Ibid. 125
Ibid., p. 151.
28
grandeza do seu poder para conosco, os que cremos, conforme a atuação da sua
poderosa força (Ef 1:16-19).
Em Efésios 4:17-18 existem outras recomendações do Apóstolo em relação a questão
espiritual: “Portanto, não sejam insensatos, mas procurem compreender qual é a vontade do
Senhor. Não se embriaguem com vinho, que leva à libertinagem, mas deixem-se encher pelo
Espírito,”. Em Efésio 3:14-19;
Por essa razão, ajoelho-me diante do Pai, do qual recebe o nome toda a família nos
céus e na terra. Oro para que, com as suas gloriosas riquezas, ele os fortaleça no
íntimo do seu ser com poder, por meio do seu Espírito, para que Cristo habite em
seus corações mediante a fé; e oro para que vocês, arraigados e alicerçados em amor,
possam, juntamente com todos os santos, compreender a largura, o comprimento, a
altura e a profundidade, e conhecer o amor de Cristo que excede todo conhecimento,
para que vocês sejam cheios de toda a plenitude de Deus.
Passagens como estas mencionadas e inúmeras outras revelam o papel do Espírito
Santo em revelar a vontade de Deus. A Interpretação bíblica não esta pautada somente em
habilidades humanas, mas também na oração, pois somente o Espírito Santo pode iluminar a
verdade, como diz a promessa de Jesus em João 16:13: “Mas quando o Espírito da verdade
vier, ele os guiará a toda a verdade. Não falará de si mesmo; falará apenas o que ouvir, e lhes
anunciará o que está por vir.” O coração do homem é um poço de engano tornando-se incapaz
de encontrar por si mesmo a vontade de Deus como afirma Jeremias “O coração [do homem]
é mais enganoso que qualquer outra coisa e sua doença é incurável... .” Isso comprova a
incapacidade do homem em interpretar a Bíblia a partir de recursos próprios pois facilmente
daria margem para o espírito do erro como diz em 1 Jo 4:16: “Nós viemos de Deus, e todo
aquele que conhece a Deus nos ouve; mas quem não vem de Deus não nos ouve. Dessa forma
reconhecemos o Espírito da verdade e o espírito do erro.”
O segundo aspecto é a importância do conhecimento para a interpretação das
Escrituras. Anglada126
afirma que;
Por haver sido escrita em idiomas humanos, em contextos históricos, sociais,
políticos e religiosos específicos, o conhecimento da língua e do contexto histórico
também é necessário para uma melhor interpretação e compreensão das Escrituras.
Por essa razão, o ministro da Palavra é, por definição, aquele que se afadiga na
Palavra (1Tm 5:17).127
Portanto com o propósito de se garantir uma interpretação
correta das Escrituras, alguns princípios, normas e práticas foram buscados,
126
ANGLADA, Paulo. Sola Scriptura. Ananindeua, PA: Knox, 2013, p. 152-153. 127
“Os presbíteros que lideram bem a igreja são dignos de dupla honra, especialmente aqueles cujo trabalho é a
pregação e o ensino.”
29
descobertos e sistematizados pela igreja. A esses princípios e normas chama-se
hermenêutica;128
à sua prática, exegese.129
Dentro desses dois aspectos pode-se entender o lema de João Calvino, “‘orar e
labutar’: orar por iluminação do Espírito e labutar estudando as Escrituras, usando todos os
recursos disponíveis.”130
Prosseguir com esse ideal sugerido por Calvino expressa uma grande
confiança na Escritura, quando a exposição correta do sentido bíblico juntamente com o poder
iluminador do Espírito Santo gera fé nos ouvintes.
Ao longo da história da Igreja, foram dadas diferentes ênfases em relação a
interpretação da Bíblia. Três diferentes correntes hermenêuticas foram responsáveis por essas
ênfases, entre elas estão: corrente espiritualista, racionalista e reformada.
A corrente espiritualista com base na insatisfação pelo sentido natural ou literal do
texto enfatiza exageradamente o caráter espiritual e místico da Bíblia,131
esta corrente está
subdividida entre a hermenêutica alegórica, que é de origem da escola alexandrina no Egito,
influenciada pelo platonismo e judaísmo alegórico e defende a atribuição de vários sentidos
ao texto bíblico.132
Seus principais defensores são: Clemente de Alexandria133
e Orígenes.134
Nessa mesma corrente encontra-se a hermenêutica intuitiva onde a interpretação é de acordo
com o pensamento que vêm à mente ao ler o texto bíblico valorizando a iluminação interior,
escolha de textos específicos para ocasiões especificas sem um estudo devido nem
considerações de contexto.135
E a hermenêutica existencialista que valoriza o sentido do texto
para os dias atuais desprezando o sentido que os autores bíblicos atribuíram, essa
interpretação defende que a Escritura não é a Palavra de Deus, mas ela se torna a Palavra de
Deus.136
128
“Origina-se do verbo grego ermvneuein / hermeneuein, cujo significado é igual ao da palavra exegese, ou
seja, interpretar. Hermenêutica significa, pois, interpretação” WEGNER, Uwe. Exegese do novo testamento. São
Leopoldo: Sinodal, 1998. p. 11. 129
“Comentário ou dissertação para esclarecimento ou minuciosa interpretação de um texto ou de uma palavra.
O termo deriva-se da palavra grega ecvgvsij / exegeses, que tanto pode significar apresentação, descrição ou
narração como explicação e interpretação” WEGNER, Uwe. Exegese do novo testamento. São Leopoldo:
Sinodal, 1998. p. 11. 130
LOPES, Augustus Nicodemus. Princípios de interpretação da bíblia. Disponível em:
<http://www.monergismo.com/textos/hermeneuticas/hermA_02.pdf> Acesso em: 04 de nov. 2013. 131
ANGLADA, Paulo. Sola Scriptura. Ananindeua, PA: Knox, 2013, p. 153. 132
Ibid. 133
“Clemente identificava cinco sentidos para um dado texto das Escrituras: (1) sentido histórico; (2)
doutrinário; (3) profético; (4) filosófico e (5) místico”, ANGLADA, Paulo. Sola Scriptura. Ananindeua, PA:
Knox, 2013, p. 153. 134
“[Orígenes defende] três níveis de sentido: (1) literal, ao nível do corpo; (2) o moral, ao nível da alma; e (3) o
alegórico, ao nível do espírito” ANGLADA, Paulo. Sola Scriptura. Ananindeua, PA: Knox, 2013, p. 153,
colchete nosso. 135
ANGLADA, op. cit., p. 154. 136
Ibid.
30
A segunda corrente de interpretação é a racionalista, completamente oposta a corrente
espiritualista, pois valoriza mais o caráter humano das Escrituras, tal como seus métodos e
técnicas de interpretação nos aspectos literários e históricos da Escritura.137
Um dos seus
principais precursores são os “saduceus”138
que eram descrentes na ressurreição de Cristo e na
existência de anjos.139
“Ao negarem verdades básicas da Escritura, os saduceus podem ser
considerados como os modernistas ou liberais da época.”140
Entre os defensores dessa
corrente também estão os humanistas renascentistas cujos “interesses [eram] meramente
acadêmico, linguísticos, literário e histórico, estavam interessados na Bíblia mais por sua
antiguidade do que por ser a Palavra de Deus.”141
Outra defensora dessa corrente é a Escola
Crítica que deu origem ao método histórico-crítico142
de interpretação, trata-se de uma
hermenêutica racionalista que valoriza o intelecto como sem margem para erro, e
desconsidera tudo que não se harmoniza com a razão, além de rejeitar a doutrina reformada da
Escritura tal como a inspiração, inerrância, autoridade e preservação da Escritura143
.
Já a terceira corrente é conhecida como reformada, ela mantém o equilíbrio em relação
às outras duas, por acreditar no caráter divino-humano da Escritura e por rejeitar tanto o
alegorismo de Alexandria quanto o literalismo judaico e a postura da escola crítica em relação
à Escritura. Seu método utilizado é conhecido como gramático-histórico144
“fundamentado em
pressupostos teológicos confessionais, que emprega princípios gerais definidos decorrentes
desses pressupostos, levando em consideração a natureza divino-humana das Escrituras.”145
Seus principais precursores são: Theodoro de Mopsuéstia e João Crisóstomo que
“estabeleceram estes princípios de interpretação considerando o próprio ensino bíblico e a
prática apostólica.”146
Os principais representantes são: Lutero, Calvino, reformadores
alemães, suíços, franceses e ingleses. Esse método foi adotado no século 18, na Europa e
América do Norte, por Whitefield e Jonathan Edwards, na Inglaterra, por J. C. Ryle e Charles
Spurgeon entre muitos outros pregadores da Palavra e interpretes até os dias de hoje.
137
ANGLADA, Paulo. Sola Scriptura. Ananindeua, PA: Knox, 2013, p. 154. 138
“Naquele mesmo dia, os saduceus, que dizem que não há ressurreição, aproximaram-se dele com a seguinte
questão...” Mateus 22:23. 139
ANGLADA, op. cit., p. 154. 140
B. J. van der Walt, Anatomy of Reformation (Potchefstroom: Potchefstroom University fo Christian Higher
Education, 1981), 10 e 26 apud ANGLADA, Paulo. Sola Scriptura. Ananindeua, PA: Knox, 2013, p. 155. 141
ANGLADA, Paulo. Sola Scriptura. Ananindeua, PA: Knox, 2013, p. 155. 142
Entre os principais defensores estão “Bultman, com o seu programa de desmitologização das Escrituras,
Harnack, com a sua humanização de Jesus, e muitos outros” ANGLADA, Paulo. Sola Scriptura. Ananindeua,
PA: Knox, 2013, p. 155. 143
ANGLADA, op. cit. p. 156. 144
Ibid. 145
Ibid., p. 158. 146
Ibid., p. 157.
31
3.4 Métodos de Interpretação
Quando se fala em interpretação bíblica o que vem à mente é como isso pode ser feito
ou que métodos poderiam ser usados para tal fim? A partir de que pressuposto a Bíblia
poderia ser interpretada? Neste sentido serão abordados os três principais métodos de
interpretação bíblica que são: Gramático-histórico, histórico-crítico e fundamentalista.
3.4.1 Gramático-histórico
O método gramático-histórico de interpretação foi adotado pelos reformadores e
“representou um rompimento radical com a hermenêutica alegórica medieval.”147
Sua
principal intenção é “chegar ao sentido óbvio, claro e simples de cada passagem das
Escrituras.”148
Os Reformadores ensinavam que:
Cada texto tem um só sentido, que é o literal – a não ser que o próprio contexto ou
outro texto das Escrituras requeriam claramente uma interpretação figurada ou
metafórica. [...]. [Esse método enfatizava]; a natureza divina das Escrituras [que],
era a principal barreira à sua compreensão por parte de pessoas que não tinham o
Espírito; a necessidade de estudar a Escritura, pois os reformadores reconheciam a
Bíblia como um livro humano.149
Eles acreditavam que “achar o sentido humano [original] era achar o sentido
pretendido por Deus,” 150
pois “como intérpretes bíblicos, eles se preocuparam em determinar
a intenção do autor, que era geralmente o sentido literal de uma passagem, a não ser que o
próprio autor indicasse o contrário.”151
Defendiam também que a Escritura só poderia ser
interpretada pela própria Escritura, pois podem existir passagens “obscuras num lugar, [e que]
são claras em outros.152
” De acordo com Lutero:
O sentido das Escrituras não poderia mais ser determinado por tradição, nem por
decisão eclesiástica, nem por argumento filosófico, nem por intuição espiritual, mas
sim, unicamente, por outras partes das mesmas que explicam e esclarecem o seu
sentido.153
3.4.2 Histórico-crítico
Outro método de interpretação da Escritura muito utilizado é o histórico-crítico. É
histórico porque “lida com fontes históricas [Bíblicas], dentro de uma perspectiva de evolução
histórica, procurando determinar os diversos estágios de sua formação e crescimento, até
147
LOPES, Augustus N. A Bíblia e seus intérpretes. São Paulo: Cultura Cristã, 2007, p. 161-162. 148
Ibid., p. 161. 149
Ibid., p. 161-162. 150
Ibid., p. 164. 151
Ibid. 152
Ibid., p. 163. 153
Ibid.
32
terem adquirido sua forma atual.”154
É crítico porque “necessita emitir uma série de juízos
sobre as fontes que tem por objeto de estudo.”155
Esse método de interpretação foi
desenvolvido a partir do iluminismo156
em oposição ao método alegórico da Idade Média, e
ficou conhecido por ser racional e muito questionador pois:
Na época do Iluminismo, a crítica bíblica dirigiu-se preponderantemente contra os
condicionamentos da interpretação bíblica determinados por postulados dogmáticos
defendidos pelas igrejas. Para o iluminismo, verdadeiro era o que estava de acordo
com a razão e o que podia ser deduzido e explicado racionalmente.157
No final do século 19 esse método ganha corpo como ciência histórica através do
teólogo Ernst Troeltsch, que julgava ser necessário o uso de alguns pressupostos para reger as
análises históricas, os quais são: a crítica, a analogia e a correlação. A crítica sustenta a
existência de juízos prováveis e desconsidera a existência de juízos absolutos no campo
histórico, por isso toda pesquisa resultaria em dúvidas metódicas. E se tratando das tradições
bíblicas o seu conteúdo e suas formas seriam “submetidos a juízos de maior ou menor
probabilidade histórica”; A analogia propõe explicar acontecimentos do passado através de
fatos semelhantes, normais, corriqueiros, atestados e conhecidos, ou seja, é a probabilidade de
explicar o que é desconhecido num lugar pelo que é conhecido em outro lugar; E por último a
correlação que entende que todos os acontecimentos se encontram em relação mútua de
dependência, cada acontecimento esta relacionado ao outro.158
Para Troeltsch a aplicação desses pressupostos representa uma evolução do modo de
pensar em relação à Idade Média. Para a “ciência bíblico-teológica explica-se [outra]
característica atual do método histórico-crítico, ou seja, a sua atitude de dúvida e
questionamento frente às tradições e aos conteúdos [bíblicos] a serem analisados.”159
Sobre a
aplicação desses pressupostos Wegner afirma que:
[Sua] aplicação rígida [...], logrou alguns avanços indiscutíveis
160 no melhor
conhecimento das tradições e dos textos bíblicos, bem como de sua gênese histórica
e condicionamentos culturais. Sem essa crítica aplicada de maneira sistemática à
Bíblia, dificilmente teríamos hoje em dia os inestimáveis avanços em áreas com a da
154
WEGNER, Uwe. Exegese do Novo Testamento. São Leopoldo: Sinodal, 1998, p. 17. 155
Ibid. 156
“Movimento intelectual dos sécs. XVII e XVIII, em países europeus e em suas colônias, que tem como base a
crença na razão e nas ciências como motores do progresso.” FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Mini
Aurélio: o dicionário da língua portuguesa. 8. ed. Curitiba: Positivo, 2010, p. 408. 157
WEGNER, op. cit., p. 18. 158
Ibid., p. 19. 159
Ibid. 160
“Apesar desses e outros inestimáveis avanços alcançados pela crítica histórica, os seus pressupostos, quando
usados de forma absolutizada, evidenciam-se com incompatíveis com o caráter da revelação bíblica.”
(WEGNER, Uwe. Exegese do Novo Testamento. São Leopoldo: Sinodal, 1998, p. 19)
33
critica textual,161
critica literária162
e crítica redacional.163
A sistemática aplicação do
critério da analogia desvendou, a um só tempo, a proximidade e o distanciamento da
religião e fé cristãs de outras crenças do Oriente e Ocidente na época de Jesus. A
crítica histórica também conseguiu caracterizar o cristianismo primitivo como um
conjunto bem mais pluralista do que se supunha; mostrou, dessa forma, que o
cristianismo, nas origens, era teologicamente mais rico que [se imaginava].164
O método histórico-crítico também sofre muita rejeição, isso ocorre por inúmeras
razões, são elas: excesso de academicidade dentro das comunidades causando separação entre
os teólogos e os leigos; parcialidade nas análises bíblicas, muitas vezes sem segurança em
seus resultados; autonomia do intérprete frente ao texto bíblico impedindo o texto de falar por
si somente; falta de prática na aplicação da mensagem bíblica, pois alegam que a
aplicabilidade da mensagem é papel da homilética e esclarecer o sentido original do texto é
papel da exegese crítica e por fim o historicismo exagerado.165
3.4.3 Fundamentalista
Este movimento surgiu nos Estados Unidos depois da Primeira Guerra Mundial, seu
propósito era defender a fé cristã ortodoxa da crítica e do ceticismo do liberalismo teológico,
revitalizando conceitos ou crenças que estavam ameaçadas como a inerrância e a
infalibilidade das Escrituras. Este método “parte do pressuposto de que cada detalhe da Bíblia
é divinamente inspirado, não podendo, em decorrência apresentar erros ou incongruências.
Este método tende a absolutizar o sentido literal da Bíblia.”166
Assim pretende-se defender a
Escritura afirmando que ela é o único meio pelo qual pode-se desenvolver doutrina e ética
cristã.167
Porém seu posicionamento em relação à Escritura pouco valoriza o fator humano
muito menos seus autores, e segundo Wegner esse “método corre o perigo da ‘bibliolatria’, ou
seja, de uma idolatria à letra dos textos.” Além de desprezarem a análise crítica dos textos,
eles possuem uma conduta separatista como afirma Nicodemus:
161
“Passo exegético que examina criticamente os vários textos apresentados sobre um versículo pelos
manuscritos antigos, com o objetivo de determinar qual deles tem, com a maior probabilidade, a leitura original”
WEGNER, Uwe. Exegese do Novo Testamento. São Leopoldo: Sinodal, 1998, p. 338. 162
“À crítica literária [deve-se], entre outras coisas, a descoberta de uma multiplicidade de fontes usadas pelos
escritores bíblicos, em especial as fontes relacionadas com o Pentateuco e com os três primeiros evangelhos,
denominados sinóticos” WEGNER, Uwe. Exegese do Novo Testamento. São Leopoldo: Sinodal, 1998, p. 345. 163
“Pela crítica redacional [aprende-se], por exemplo, a captar melhor os evangelistas como teólogos autônomos
e sensibilizados com os problemas das comunidades para as quais escreveram. A crítica redacional possibilita
identificar, em cada um dos evangelistas, um estilo característico, uma teologia singular e um propósito bem
particular.” WEGNER, Uwe. Exegese do Novo Testamento. São Leopoldo: Sinodal, 1998, p. 345. 164
WEGNER, Uwe. Exegese do Novo Testamento. São Leopoldo: Sinodal, 1998, p. 19. 165
Ibid., p. 20. 166
Ibid., p. 15. 167
Ibid.
34
Cito negativamente o fundamentalismo como movimento separatista do erro
teológico como único meio de preservar a verdade cristã. Sob esse aspecto, o
fundamentalismo crê que não pode haver associação com igrejas, denominações e
indivíduos que neguem os pontos fundamentais do cristianismo. O separatismo nem
sempre é o caminho para batalharmos pela fé histórica.168
Os métodos de interpretação que foram citados podem ser considerados como os
principais dentro de uma gama de métodos existentes menos expressivos. Dentro do método
gramático-histórico destaca-se a firmeza no sentido literal do texto, tanto na sua época como
hoje o sucesso desse método está no “equilíbrio hermenêutico alcançado pelos reformadores
[...], em manter junta a resposta a duas perguntas importantes: o que a Bíblia significou no
passado (exegese) e o que ela significa para [a Igreja] hoje (aplicação).”169
Lembrando que
esse método nunca esteve totalmente isento de desvios de interpretação. Mas trata-se daquilo
que pode ser mais coerente no que se refere a interpretação bíblica.
O método histórico-crítico traz contribuições históricas precisas a respeito da tradição
bíblica demonstrando seu apreço pela análise sistemática da Escritura, até demonstra fazer um
uso de juízo saudável em buscar as raízes do texto sagrado, mas o exagero de se colocar
acima de seu objeto de estudo não permitindo que a literatura faça com o leitor o mesmo que
o leitor faz com a literatura, por ser uma literatura divina, não traz para a comunidade os
valores espirituais que ela realmente precisa. Em resumo, esse método traz informações
bíblicas de um valor inestimável, mas peca no que se refere ao ensino que estimula a fé e a
prática.
O fundamentalismo aparece muito mais como um movimento do que como um
método de interpretação. Seu objetivo é plausível, que é a defesa de rudimentos antigos da fé
cristã, porém utiliza-se de meios separatistas quando divergem em algum assunto, e o apego a
itens menos importantes como se fossem o cerne do evangelho.
3.5 Pressupostos teológicos
Não existe crença sem um pressuposto, o conhecimento não pode ser neutro, pois
sempre parte de algum lugar ou de alguma ideia. Da mesma forma é a interpretação bíblica
que sempre tem como base uma teologia. Toda interpretação bíblica parte de um pressuposto
teológico que define os rumos para sua compreensão. Uma teologia puramente bíblica vai
resultar em uma interpretação saudável da Escritura, o fato de crer ou não na Bíblia inspirada,
168
LOPES, Agustus N. Liberalismo e fundamentalismo teológico. [maio de 2007]. Entrevistador: Elvis
Brassaroto Aleixo. Entrevista concedida ao Instituto Cristão de Pesquisa. Disponível em:
< http://www.icp.com.br/86entrevista.asp>. Acesso em: 13 de nov. 2013. 169
id. A Bíblia e seus intérpretes. São Paulo: Cultura Cristã, 2007, p. 167.
35
a maneira que se concebe a ideia da existência de Deus e outras mais concepções irão
interferir diretamente nessa interpretação.
Nunca existiu uma época em que esses pressupostos teológicos foram tão
diversificados quanto nos séculos 19 e 20, quando muitos desdobramentos e debates deram
origem a diversos movimentos que influenciaram e influenciam até hoje a Igreja [e sua
teologia].170
Tais movimentos surgiram devido a abertura para novas correntes de
pensamentos que surgiram com o “Iluminismo,” que segundo Macgrath causou “um grande
impacto sobre a teologia cristã, provocando uma série de questionamentos críticos relativos à
suas origens, métodos e doutrina.”171
Dentre os vários movimentos, serão citados apenas
cinco deles, que são: teologia da libertação, negra, feminista, reformada e liberal.
3.5.1 Teologia da Libertação
A teologia da libertação surgiu dentro de um contexto latino-americano entre 1960 e
1970, onde bispos da igreja católica passaram a tomar partido dos necessitados acusando a
própria igreja católica de se colocar ao lado dos governos ditatoriais da América Latina. Essa
decisão ganhou reforço tornando o movimento mais sólido com o apoio do teólogo peruano
Gustavo Gutiérrez, do teólogo brasileiro Leonardo Boff , do teólogo uruguaio Juan Luis
Segundo e do teólogo argentino José Miguéz Bonino, entre outros. O tema básico da teologia
da Libertação é a ênfase total a causa dos pobres e oprimidos, pois eles são a fonte teológica
para o entendimento da verdade e da prática cristã. Deus está ao lado dos pobres, toda
teologia cristã parte do menos favorecido o colocando em uma posição especial para
compreensão da fé cristã.172
Por causa dessa teologia construída através dos menos favorecidos, um grande
impacto na interpretação bíblica fica evidente, para Macgrath:
As Escrituras são lidas como narrativas de libertação. Uma ênfase especial é posta
sobre a questão da libertação de Israel da escravidão no Egito, sobre as denúncias
feitas pelos profetas acerca da opressão e a proclamação do evangelho por Jesus aos
pobres e marginalizados. As Escrituras não são lidas a partir de um perspectiva
baseada na disposição de compreender o evangelho, mas a partir de um interesse em
aplicar suas revelações libertadoras à situação da América Latina. [...]. Tendência de
igualar a salvação à libertação, enfatizando os aspectos sociais, políticos e
econômicos da salvação [...], destacando que é a sociedade, e não os indivíduos, que
é corrupta e que necessita ser redimida.173
170
MCGRATH, Alister E. Teologia sistemática, histórica e filosófica. São Paulo: Shedd Publicações, 2005, p.
124. 171
Ibid., p. 132. 172
Ibid., p. 154. 173
Ibid., p. 155.
36
Nessa ideia percebe-se que a construção da interpretação bíblica não depende
unicamente do sentido em que o escritor quis dar ao texto, mas sim de uma análise da
realidade presente. Este tipo de interpretação recebe o nome de “rejeição da intenção autoral”.
Isso acontece principalmente por causa do distanciamento cultural e linguístico dos tempos
bíblicos em relação aos dias atuais, por isso se faz necessário uma mediação através de uma
análise social da realidade. Neste caso os Evangelhos e seus significados seriam válidos
somente como um referencial de como a Igreja compreendeu Jesus, e não como uma verdade
universal.174
3.5.2 Teologia feminista
No mesmo contexto de libertação social surge a teologia feminista que “veio a se
tornar um importante elemento da cultura ocidental moderna. Em sua essência, representa um
movimento global de luta pela emancipação das mulheres.”175
Também conhecido como
movimento da libertação feminina, que visa romper barreiras em relação a crenças e valores
em geral. Esse movimento se contrapôs ao cristianismo por causa de sua abordagem machista
em relação a Deus, a Cristo e as posições de autoridade eclesiástica que favorecem, em sua
maioria, ao homem. Segundo algumas feministas:
O cristianismo com seus símbolos masculinos para Deus, a figura masculina de seu
salvador e sua longa história de líderes e intelectuais do sexo masculino, apresenta
um preconceito contra a mulher, não sendo, portanto, passível de recuperação.
Conforme frisam essas feministas, as mulheres devem abandonar esse ambiente
opressivo do cristianismo.176
Alguns grupos feministas defendem uma reavaliação do passado cristão no sentido de
atribuir honra às servas que contribuíram bastante para a construção da tradição, não só
bíblica, mas também para a tradição cristã ao longo dos séculos. Elas alegam ter passado
despercebidas pela história do cristianismo, ao contrário dos homens que foram reconhecidos
pelos seus atos de fé e bravura.
As maiores contribuições do feminismo são: posicionar frente às teses teológicas
consideradas patriarcais ou machistas, um exemplo é a questão do uso frequente de pronomes
masculinos para se referir a Deus, elas defendiam que o uso do pronome feminino seria tão
lógico quando o uso do pronome masculino, criticavam também o emprego da palavra ‘pai’
174
LOPEZ, Augustus N. A hermenêutica da teologia da libertação. S.l.: Fides Reformata 3.2, 1998. Disponível
em: <http://www.mackenzie.br/fileadmin/Mantenedora/CPAJ/revista/VOLUME_III__1998__2/a_herra....pdf>.
Acesso em: 13 nov. 2013. 175
MCGRATH, Alister E. Teologia sistemática, histórica e filosófica. São Paulo: Shedd Publicações, 2005,
p.148. 176
Ibid.
37
para se referir a Deus por se tratar de uma analogia ao pai humano; A natureza do pecado e
suas noções de orientação masculina principalmente como o orgulho, a ambição e o amor-
próprio. Pois as feministas alegam que tais pecados não correspondem à experiência da
mulher que é tendenciosa em conhecer o pecado ‘como falta de orgulho, falta de ambição e
falta de amor-próprio’ e por último a masculinidade de Jesus que tem sido base para que
somente o homem refletisse a imagem de Deus.177
Tomas de Aquino trata as mulheres “como homens que sofrem de má formação
(aparentemente com base em uma biologia aristoteliana obsoleta).”178
Em resposta a essa
afirmação e à questão da masculinidade de Cristo as escritoras feministas,
Tem alegado que a masculinidade de Cristo é um aspecto contingente de sua
identidade, tão importante quanto o fato dele ser um judeu. Isso representava um
elemento contingente de sua realidade histórica, e não um aspecto essencial de sua
identidade, Portanto, esse aspecto não pode servir de fundamento para a dominação
das mulheres pelos homens, assim como não legitima a dominação dos gentios pelos
judeus, ou dos encanadores pelos carpinteiros.179
Em resumo “o conceito básico da hermenêutica feminista é que existe um controle
patriarcal da teologia ao longo da história.”180
É por isso que “lendo as Escrituras através dos
sofrimentos das mulheres oprimidas que procuram sua libertação e que se faz uma
reinterpretação radical do texto bíblico.”181
Por essa razão Nicodemus afirma que,
Alguns teoristas desconstrucionistas tem procurado eliminar o conceito de “homem”
e “mulher” das traduções da Bíblia. Argumentam que as referências masculinas a
Deus é parte de uma tentativa de oprimir as mulheres por uma hierarquia masculina
que se perpetua através da linguagem e facilita a exploração das mulheres. Eles tem
conseguido influenciar diversas sociedades bíblicas e organizações de tradução e
publicação da Bíblia, para publicarem Bíblias com “linguagem inclusiva”. Este tipo
de tradução omite referências a Deus como “Pai”, chama Jesus de “a criança de
Deus” em vez de “o Filho de Deus”, e evita o uso do masculino em referências
genéricas.182
Fica perceptível como uma simples mudança de contexto (movimento feminista),
torna a abordagem bíblica extremamente sensível e diferenciada em relação ao tradicional, o
que antes eram abordagens “comuns e tranquilas”183
como atribuir pronomes masculinos a
Deus ou a própria masculinidade de Jesus, agora ganham novas interpretações por causa do
177
MCGRATH, Alister E. Teologia sistemática, histórica e filosófica. São Paulo: Shedd Publicações, 2005, p.
150. 178
Ibid., parêntese do autor. 179
Ibid. 180
LOPES, Augustus N. A Bíblia e seus intérpretes. São Paulo: Cultura Cristã, 2007, p. 233. 181
Ibid. 182
Ibid., p. 234. 183
Estas expressões refletem o machismo de outras gerações que são herdados quase que imperceptível nos dias
atuais se não fossem os movimentos pensantes como o feminista.
38
contexto em que são observados, correndo um sério risco de cair no extremismo como foi o
caso do feminismo. Mas diante disso é importante ressaltar que o fato de atribuir gênero
humano a Deus não quer dizer que Ele tenha um sexo, mas sim seria uma melhor forma dEle
ser visto ou compreendido. Deus é conhecido por papéis de pai como disciplinar e proteger,
mas pode ser facilmente visto desempenhando um papel de mãe no sentido de amar e
carregar, mas isso vai depender do contexto no qual o leitor estiver inserido.
3.5.3 Teologia negra
Ainda dentro do contexto de libertação é que nasce a teologia negra nos Estados
Unidos em meados das décadas de 60 e 70. “Ela se concentra na reflexão teológica sobre a
luta dos negros norte-americanos, liderados no princípio pelo pastor batista Martin Luther
King, Jr., para conseguirem a justiça e libertação social, política e econômica numa sociedade
dominada pelos brancos.”184
As características desse movimento,
Encontra na Bíblia uma base para o sentido político da libertação, isto é, o êxodo do
Egito. E ela encontra na experiência religiosa dos escravos negros, manifestada nos
seus cânticos, sermões e orações que destacam a ressurreição de Jesus, a base para o
sentido escatológico ou futurista da libertação. A teologia negra pode ser
classificada como um tipo de teologia de libertação, pois ela se preocupa
basicamente com a libertação de um grupo de oprimidos.185
Os fatores que contribuíram para a teologia negra foram três, são eles: “o movimento
dos direitos civis” que visava à conquista de plenos direitos de cidadão para os negros usando
de meios não violentos; o livro “Religião Negra” de Joseph Washington (1964), que relata a
existência de uma religião negra nos Estados Unidos que se difere do Protestantismo branco e
de qualquer expressão do Cristianismo, pois seu intuito é liberdade e igualdade, surgindo
então à teologia negra com o intuito de corrigir esse mal-entendido; e por último o movimento
“Poder Negro” que nasce da desilusão em relação ao movimento de direitos civis chefiado
pelo Dr. King na tentativa de mudar a atitude dos brancos, e incentiva a busca por parte dos
negros a alcançar controles políticos e econômicos com intenção de autoafirmação.186
A teologia negra começa se encorpar à medida que o movimento parte das ruas para os
círculos acadêmicos. Importantes obras influenciaram esse movimento de libertação, entre
elas estão: O Messias negro de Albert Cleage, ensina que “a Bíblia foi escrita por judeus
negros, ele defendia que o evangelho do Messias negro havia sido distorcido por Paulo, em
184
DUNAWAY, Felipe. A teologia negra. Disponível em: < http://www.teologiaocidental.com/teologica/a-
teologia-negra.pdf>. Acesso em: 15 nov. 2013, p.1. 185
Ibid. 186
DUNAWAY, Felipe. A teologia negra. Disponível em: < http://www.teologiaocidental.com/teologica/a-
teologia-negra.pdf>. Acesso em: 15 nov. 2013, p.4
39
sua tentativa de torná-lo aceitável aos europeus”187
; e o Manifesto dos negros lançado no
encontro Inter-religioso em Detroit, que enfatizou “a questão da experiência negra na agenda
teológica,”188
e o tema libertação como “aspecto central da teologia negra.”189
3.5.4 Teologia Liberal
Existe uma grande dificuldade em entender o liberalismo teológico, tanto para uma
definição clara quanto para entender suas raízes. Como o propósito principal aqui é esclarecer
seus principais pontos hermenêuticos, suas origens não serão abordadas com riqueza de
detalhes, mas apenas para caráter de informação.
Sobre o liberalismo teológico Macgrath afirma que: “fica mais fácil compreendê-lo se
considerarmos como seu ponto de partida a reação ao programa teológico elaborado por F. D.
E. Schleiermacher, particularmente no que diz respeito à sua ênfase sobre o sentimento
humano.”190
Já para Thomas Lang a “obra de René Descartes, um filosofo do século 17 [é o]
ponto de partida [...]. Para Lang, o liberalismo, já desgastado pelo tempo, esmaeceu a partir de
1930.”191
Mas segundo Costanza:
[O liberalismo] se tornou mais evidente durante o Renascimento, quando surgiram
indagações sobre o homem natural e seu espírito, e também durante a Reforma. A
primeira fase do moderno liberalismo teológico, chamado Racionalismo ou
Iluminismo, perdurou até meados do século 18. Os principais filósofos e teólogos
dessa fase foram Baruch Spinoza (judeu holandês), Gottfried Wilhelm Leibniz e
Gotthold Ephraim Lessing (alemães), John Locke (inglês), os escritores e filósofos
ingleses conhecidos como Platonistas de Cambridge e também os deístas.
O segundo estágio do liberalismo teológico, o Romantismo, também chamado de
Modernismo, aconteceu a partir no final do século 18 e perdurou até o final do
século 19. Nele se destacam Jean-Jacques Rousseau e Immanuel Kant, que foram os
arquitetos do liberalismo romântico. Na teologia, o maior destaque coube ao alemão
Friedrich Schleiermacher, chamado de pai da moderna teologia protestante. O
alemão Albrecht Ritschl dominou a teologia liberal protestante após Schleiermacher,
e outro teólogo alemão, Adolf von Harnack, foi o mais proeminente discípulo de
Ritschl.192
187
MCGRATH, Alister E. Teologia sistemática, histórica e filosófica. São Paulo: Shedd Publicações, 2005, p.
156. 188
Ibid. 189
Ibid. 190
MCGRATH, op. cit., p. 138. 191
COSTANZA, José R. da S. As raízes históricas do liberalismo teológico. S.l.: Fides Reformata, 2005.
Disponível em:
<http://www.mackenzie.br/fileadmin/Mantenedora/CPAJ/revista/VOLUME_X__2005__1/jose.pdf>. Acesso
em: 15 nov. 2013. p. 81. 192
COSTANZA, José R. da S. As raízes históricas do liberalismo teológico. S.l.: Fides Reformata, 2005.
Disponível em:
<http://www.mackenzie.br/fileadmin/Mantenedora/CPAJ/revista/VOLUME_X__2005__1/jose.pdf>. Acesso
em: 15 nov. 2013. p. 81.
40
Quanto às posições Teológicas do liberalismo serão desenvolvidas a partir do
pensamento de Schleiermacher que muito contribui na área da teologia dogmática, sendo um
dos teólogos mais influentes do século 19. Schleiermacher utilizava o método histórico-critico
de interpretação, para ele o interprete tinha condição de interpretar o texto bíblico igual ou até
melhor que o próprio autor, por estar em uma situação mais privilegiada em relação ao
escritor. Outro princípio hermenêutico era o de poder compreender o texto bíblico através da
empatia, pois por traz das regras gramaticais existia a intenção do autor que seria pensamentos
comuns, pois o leitor está na mesma situação daquele que fala e compartilha da mesma
natureza humana do autor. Neste caso, a interpretação segue em duas dimensões: a gramatical
e a psicológica.193
Para Schleiermacher o intérprete deve reconstruir a ideia original do texto segundo a
própria intenção do autor, ou seja, “o intérprete se esforça para entrar na mente do autor num
ato imaginativo e empático de compreensão”. Isso pode ser possível porque os intérpretes
compartilham de um mesmo espírito que facilita essa comunicação e não pelo fato de existir
uma verdade absoluta.194
3.5.5 Teologia reformada
A reforma protestante que se iniciou no século 16 teve um grande significado para a
teologia cristã ocidental, pois foi um movimento de retorno da Igreja aos fundamentos
bíblicos em relação aos seus sistemas de crença, moralidade e estrutura.195
Nomes como os de
Martinho Lutero, Ulrico Zuínglio e João Calvino estiveram no ponto central desse
movimento. Na Alemanha precisamente em Wittenberg, Lutero escreveu noventa e cinco
teses em protesto contra a venda de indulgências que objetivava a reconstrução da Basílica de
São Pedro. Essa venda de indulgências encontrava um apoio bíblico um tanto confuso para
Lutero, pois aquele que as comprava também cria que estava comprando o perdão para seus
pecados, sendo que para ele a doação em dinheiro era a consequência do perdão e não a
condição para isso.196
Lutero “era considerado o líder de um movimento reformista de caráter
religioso, social e político que, aos olhos de alguns observadores contemporâneos, parecia
abrir espaço para uma nova ordem social e religiosa na Europa.”197
193
LOPES, Augustus N. A Bíblia e seus intérpretes. São Paulo: Cultura Cristã, 2007, p. 206. 194
Ibid., p. 206-207. 195
MCGRATH, Alister E. Teologia sistemática, histórica e filosófica. São Paulo: Shedd Publicações, 2005, p.
95. 196
MCGRATH, Alister E. Teologia sistemática, histórica e filosófica. São Paulo: Shedd Publicações, 2005, p.
97-98. 197
Ibid. p. 98.
41
Ulrico Zuínglio também iniciou um programa de reforma do púlpito da cidade de
Zurique, leste da Suíça. Estudou nas Universidades de Viena e Basiléia, despertou profundo
interesse pelo “programa do humanismo cristão” e em especial pelos escritos de Erasmo. Seu
programa de reforma era mais de caráter ético e que posteriormente incluiria uma crítica à
teologia da época. Não com a mesma intensidade como foi na Alemanha com Lutero, mas
Zuínglio teve grande importância na propagação da reforma em especial no leste da Suíça.198
Sobre Zuínglio foi afirmado o seguinte:
Compôs todos os seus escritos reformados apressadamente, em menos de uma
década. Foi ofuscado durante sua vida pelo grande Lutero e sucedido pelo mais
eficaz Calvino, que impeliu um estudioso a conferir-lhe o título de ‘terceiro homem’
da Reforma. Zuínglio nunca escreveu nada comparável às Institutas.199
“A reforma de Zurique, por meio de uma série de complexos desdobramentos, passou
por diversas modificações de ordem política e teológica, vindo, no futuro, a ser associada
principalmente a cidade de Genebra.”200
Foi nesta cidade que João Calvino, francês, fez o uso
do púlpito por toda sua vida, pregando quase toda a Bíblia para os genebrinos. O caráter de
sua reforma era voltado para ética e o culto da Igreja fundamentado em padrões mais bíblicos.
É óbvio que a teologia da reforma possui características bem mais complexas e dignas
de serem analisadas com maior rigor, que não é o caso deste trabalho, no entanto precisa ser
ressaltada a principal mudança ocorrida na Igreja devido a reforma, que é a hermenêutica. A
partir daí a Bíblia passa a ser interpretada como autoridade máxima, infalível e inerrante da
Igreja. Nicodemus afirma que “a reforma protestante foi, em muitos sentidos, um movimento
hermenêutico. Representa um momento crucial na história da interpretação cristã das
Escrituras.”201
Antes da reforma a Igreja era a autoridade em todas as discussões teológicas,
após a reforma a Bíblia passa a ser o juiz maior e a ocupar uma posição central na fé e prática
da Igreja. Antes a hierarquia da Igreja era encabeçada pelo papa que era juiz das
controvérsias, mas agora a Escritura toma esse posto, pois a busca pelo Espírito Santo e sua
resposta na Palavra era que podia decidir as questões mais complexas da Igreja.202
O Espírito Santo passa a ter papel fundamental na interpretação da Bíblia, é como diz
Calvino: “o conhecimento de Deus nos chega através das Escrituras, pela iluminação do
198
MCGRATH, Alister E. Teologia sistemática, histórica e filosófica. São Paulo: Shedd Publicações, 2005, p.
104. 199
GEORGE, Tymothy. Teologia dos reformadores. São Paulo: Vida Nova, 1993, p. 119. 200
MCGRATH, op. cit., p. 95. 201
LOPES, Augustus N. A Bíblia e seus intérpretes. São Paulo: Cultura Cristã, 2007, p. 159. 202
Ibid., p. 159-160.
42
Espírito [Santo], e esse conhecimento é seguro e certo.”203
Mas isso não quer dizer que os
reformadores só fizeram uso das Escrituras para interpretar a Bíblia, como eles entendiam que
a Bíblia também era um livro humano, era importante fazer uso do aparato gramatical para
uma melhor compreensão de sentido, e também “não desprezaram o que o Espírito Santo já
havia revelado a outros antes deles,”204
não negaram a história e seu desenvolvimento, mas
com muita cautela “fizeram uso abundante de erudição antiga, citando comentaristas
medievais, as obras dos pais apostólicos e obras de contemporâneos.”205
Os princípios hermenêuticos da Escritura no período da Reforma serviram de base
para o desenvolvimento do método gramático-histórico de interpretação que foi
“desenvolvido e adotado pelo protestantismo ortodoxo em geral.”206
Neste capítulo foi abordado a suficiência da Escritura e seus principais conceitos. Foi
apresentado a sua suficiência na pregação, onde o ministro se faz valer somente da Escritura
para edificação da Igreja e a si próprio, desprezando os métodos meramente humanos, porém
essa pregação só surtirá efeito mediante uma correta interpretação da mesma. Três correntes
englobam uma miríade de métodos de interpretação que são: corrente espiritualista que
abrange o método fundamentalista; o racionalista que abrange o método histórico-crítico e a
reformada que abrange o método gramático-histórico, utilizado pelos reformadores a partir do
século 16.
Foi abordado também os pressupostos teológicos que viabilizam os diferentes tipos de
interpretação, neste sentido foram citados alguns movimentos como: teologia da libertação,
negra, feminista e reformada. Essas teologias influenciam a Igreja até hoje moldando a
maneira de pensar, de ver o mundo, e principalmente de interpretar a Bíblia.
No próximo capítulo será feito uma abordagem da segunda epístola a Timóteo com
referência ao texto de 2 Timóteo 3:16-17, e suas implicações para a Igreja hoje.
203
LOPES, Augustus N. A Bíblia e seus intérpretes. São Paulo: Cultura Cristã, 2007, p. 181. 204
Ibid., p. 165. 205
Ibid. 206
Ibid., p. 167.
43
4. EDIFICAÇÃO PELA ESCRITURA INSPIRADA: ANÁLISE EM SEGUNDA TIMÓTEO
PARA A ATUALIDADE
Depois de enaltecer a inspiração e a suficiência da Escritura, o caminho a ser seguido é
na epístola de Paulo a Timóteo, um jovem pastor colocado à frente de uma comunidade com o
intuito de edificá-la na doutrina cristã através dos ensinamentos de Paulo. A carta escrita pelo
Apóstolo tinha por objetivo instruir Timóteo e a Igreja estabelecida em Éfeso.207
O propósito
central da Epístola era a confirmação de Timóteo na fé do evangelho como também sua
pregação de maneira que as circunstâncias não viessem tirá-lo do propósito por hipótese
alguma. Até mesmo por causa da iminente, mas próxima morte de Paulo, pois segundo
Calvino “Paulo tinha a morte ante seus olhos, e ele estava pronto para enfrentá-la pelo
testemunho do Evangelho.”208
É importante ressaltar que o apóstolo escreveu a carta “não meramente por causa de
um homem – Timóteo –, mas para estabelecer, através de um só homem, um ensino de
aplicação geral, o qual Timóteo pudesse mais tarde transmitir a outros.”209
Hendriksen em seu
comentário define a principal linha de pensamento que percorre a epístola com respeito à sã
doutrina: retenha-a (capítulo 1); ensine-a (capítulo 2); persevere nela (capítulo 3) e pregue-a
(capítulo 4). Dessa forma não existem divisões marcantes, o apóstolo muda de um assunto
para o outro sem abandonar o assunto anterior de maneira que as ênfases vão se encaixando
gradativamente, nada se perde ao longo da carta.210
Uma passagem dominante em relação ao
propósito paulino está no capítulo 1 e versículo 8, que diz: “Portanto[Timóteo], não se
envergonhe de testemunhar do Senhor, nem de mim, que sou prisioneiro dele, mas suporte
comigo os sofrimentos pelo evangelho, segundo o poder de Deus.”211
Paulo faz referência à educação que Timóteo recebeu, que desde a infância tinha um
profundo apreço pelas Sagradas Escrituras e pela fé, sendo assim, Paulo o exorta a perseverar
fielmente tanto na doutrina que lhe havia sido ensinada quanto no ofício que lhe foi
confiado.212
Em seguida Paulo “apresenta um breve sumário de seu evangelho, e ordena a
Timóteo a transmiti-lo a outros e cuidar para que o mesmo fosse transmitido à posteridade
207
“É fácil concluir-se que Timóteo estava ainda em Éfeso quando esta carta lhe foi escrita, porque, [no final da
epístola], Paulo envia saudações a Priscila, Áquila e Onesíforo. Este último era de Éfeso, e Lucas nos conta que
os outros dois permaneceram ali ao tempo em que Paulo velejou para a Judéia [At 18: 18-19]” CALVINO, João.
As Pastorais. São José dos Campos, Sp: Fiel, 2009, p. 189, colchetes do autor. 208
CALVINO, João. As Pastorais. São José dos Campos, Sp: Fiel, 2009, p. 189. 209
Ibid., p. 190. 210
HENDRIKSEN, William. Comentário do Novo Testamento: 1 e 2 Timóteo e Tito. São Paulo: Cultura Cristã,
2011, p. 271-272. 211
Ibid.. 212
CALVINO, op. Cit., p. 190.
44
[...], ordena a Timóteo a abster-se de polêmicas contenciosas e questionamentos fúteis,”213
enfatizando ainda a necessidade de um demasiado zelo pela edificação da Igreja, e predizendo
“os tempos perigosos que aguardam os bons e piedosos [Paulo] também anuncia que se
levantariam contra eles homens terrivelmente destrutivos,”214
Nesse sentido o Apóstolo volta
a exortar Timóteo “a fim de que ele perseverasse fielmente no desempenho de seu ministério
para torná-lo ainda mais fiel.”215
Um destaque precisa ser feito em relação ao teor da carta, Paulo recomenda Timóteo a
se envolver constantemente com a sã doutrina, destacando a maneira de utilizar a Escritura e o
reconhecimento que, não só a Igreja, mas também Timóteo precisava ter a respeito da
Inspiração divina da Escritura e, “para que Timóteo soubesse que por meio dela [Escritura]
ele estaria plenamente equipado para a sólida edificação da Igreja.”216
Após essa ressalva a
respeito da Escritura e sua inspiração, o Apóstolo destaca a suficiência dela na edificação da
Igreja e sua capacidade plena em aperfeiçoar o cristão para toda boa obra, e ainda recorda a
Timóteo que sua morte estava próxima e solicita que fosse ter com ele o mais breve possível.
4.1 2 Timóteo 3:16-17
Quando Paulo fala que “Toda a Escritura”217
é inspirada, ele está se referindo a todo
corpo de literatura que, ao longo do desenvolvimento da Igreja foi inspirado pelo Espírito
Santo. Toda essa literatura compreendia na época pouco mais que o Antigo Testamento, mas
que ao final do primeiro século já havia sido escrita em sua totalidade. O processo de
fechamento do cânon em 66 livros aconteceu em um período bem posterior dentro de
processo um tanto complexo.218
Antes de dizer o quanto a Escritura é proveitosa ou útil o Apóstolo faz referência a sua
inspiração divina que assegura seu fator autoritativo. O termo grego utilizado para se referir à
expressão “inspirado por Deus” é “qeopneustoj (theopneustos), [que significa] soprado por
213
Id. As Pastorais. São José dos Campos, Sp: Fiel, 2009, p. 190. 214
Ibid., p. 191. 215
CALVINO, João. As Pastorais. São José dos Campos, Sp: Fiel, 2009, p. 191. 216
Ibid., colchete nosso. 217
Há algum debate sobre a tradução correta de “Toda Escritura”. Certamente, devemos sempre aspirar a
tradução mais precisa, mas os perigos de outras traduções para a frase têm algumas vezes sido exagerados. Que
traduzamo-la como “toda Escritura” ou “cada Escritura” não faz nenhuma diferença essencial — a primeira
declara que a Escritura como um todo é inspirada, e a última declara que cada parte da Escritura é inspirada. De
qualquer maneira, tudo da Escritura e cada parte dela é o sopro de Deus. CHEUNG, Vincent. O ministério da
Palavra. S.l.: Vida, 2001, p. 6. 218
HENDRIKSEN, William. Comentário do Novo Testamento: 1 e 2 Timóteo e Tito. São Paulo: Cultura Cristã,
2011, p. 371.
45
Deus, “Inspirado por Deus”219
.”220
Embora “a terminação –tos indica um significado passivo,
uma tradução ainda mais precisa seria ‘soprada [ou expirada] por Deus.”221
Segundo
Warfield:
A palavra grega representada por ela [inspirado ou soprada por Deus] e que aparece
nesta passagem [2 Tm 3:16] como um epíteto222
ou predicado de ‘Escritura’ –
qeopneustoj – embora ocorrendo somente no Novo Testamento e não encontrada
antes em nenhum ponto em toda a literatura grega [...], não pareceu ser de
interpretação duvidosa. Sua forma, seu uso posterior, as implicações dos termos
paralelos e a analogia da fé se combinaram com as sugestões do contexto para
atribuir-lhe um significado que tem sido constantemente atribuído a ela a partir do
primeiro registro de interpretação cristã até estes dias.223
Para Cheung a palavra “inspiração”, “se tornou há muito tempo um termo teológico
amplo para o que a Escritura realmente ensina sobre sua origem — que ela é o ‘sopro de
Deus’ — e assim também infalível, inerrante e carrega autoridade absoluta”224
Contudo é
questionável o fato de que o emprego do termo seja uma tradução, pois se configura mais
como uma dedução ou interpretação do que o versículo está querendo dizer. Cheung não se
opõe ao uso do termo, até por que ele é teologicamente reconhecido e aceito, mas ressalta o
perigo de se afirmar a partir dessa tradução que a “Escritura é um produto meramente humano
para o qual Deus soprou em seu espírito,” permanecendo primariamente humano em sua
origem, sendo que a tradução “soprada ou expirada” não permitiria esse mau entendimento.225
Warfield226
afirma que de maneira alguma a palavra grega usada em 2 Tm 3:16 como
theópneustos significa “inspirado por Deus”, o termo grego nada quer dizer sobre inspiração
ou inspirar, mas fala apenas de respirar ou respiração. A utilização do termo por “inspiração”
nada mais é do que uma tradução do latim divinitus inspirata da Vulgata, isso quer dizer que
o termo não passa de uma “paráfrase rude”, mas não mentirosa. A ideia transmitida então do
219
O termo “inspirado por Deus”, é encontrado somente em 2Tm 3:16, mas sua ideia esta presente em várias
partes da Escritura com em: Êx 20.1; 2Sm 23.2; Is 8.20; Ml 4.4; Mt 1.22; Lc 24.44; Jo 1.23; 5.39; 10.34, 35;
14.26; 16.13; 19.36, 37; 20.9; At 1.16; 7.38; 13.34; Rm 1.2; 3.2; 4.23; 9.17; 15.4; 1Co 2.4-10; 6.16; 9.10; 14.37;
Gl 1.11, 12; 3.8, 16,22; 4.30; 1Ts 1.5; 2.13; Hb 1.1,2; 3.7; 9.8; 10.15; 2Pe 1.21; 3.16; lIo 4.6; e Ap 22.19. 220
COENEN, Lothar; BROWN, Colin. Dicionário internacional de teologia. São Paulo: Vida Nova, 2009, p.
713. 221
CHEUNG, Vincent. O ministério da Palavra. S.l.: Vida, 2001, p. 5, colchete do autor. 222
“Palavra ou frase que qualifica alguma coisa” FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Mini Aurélio: o
dicionário da língua portuguesa. 8. ed. Curitiba: Positivo, 2010, p. 297. 223
WARFIELD, Benjamin. A inspiração e autoridade da Bíblia. São Paulo: Cultura Cristã, 2010, p. 196,
colchetes nosso. 224
CHEUNG, op. cit., p. 6 225
Ibid., p. 5 226
Ibid. Sobre o emprego do termo qeopneustoj, B. B. Warfeild faz uma defesa da inspiração da Escritura
com base na história e nos debates que ocorreram para confirmar a Escritura como “inspirada” por Deus, cf.
WARFIELD, Benjamin. A inspiração e autoridade da Bíblia. São Paulo: Cultura Cristã, 2010, p. 196-236.
46
termo corretamente traduzido seria que a Escritura é fruto do “sopro criador de Deus”, um
produto divino sem indicação da maneira como foi produzido.227
Nem Cheung muito menos Warfield consideram a interpretação do termo
theópneustos como “inspiração” incorreta, pois transmite a ideia bíblica do que é a Escritura,
mas a tradução literal do termo grego para “inspiração” é incorreta, pois “seu uso baseia-se,
em última análise, no seu emprego na Bíblia Latina (Vulgata) [...], e não significa de maneira
alguma ‘inspirado por Deus,’” 228
utilizá-lo dessa forma pode dar margem para possíveis
equívocos. Cheung analisa a tradução do termo theópneustos por “inspiração” afirmando que:
“mesmo que concordemos que a palavra não signifique “inspirar” quando usada no sentido
teológico — mas amplamente se refira ao que a Escritura ensina sobre sua própria origem.”229
Para Warfield a utilização do termo é correta, pois:
Os livros bíblicos são chamados inspirados por serem o produto, divinamente
determinado, de homens inspirados; os escritores bíblicos são chamados inspirados
por terem recebido o sopro do Espírito Santo, de maneira que o produto de suas
atividades transcende a capacidade humana e recebe autoridade divina. A inspiração é,
pois, definida, em geral, como sendo uma influência sobrenatural exercida nos escritos
sagrados, pelo Espírito de Deus, em virtude da qual os seus escritos recebem
fidedignidade divina.230
Ao considerar o fator inspiração da Escritura, Paulo estava “empenhado em explicar a
grandeza das vantagens que Timóteo havia desfrutado por aprender a verdade salvadora de
Deus,”231
até porque Timóteo foi instruído desde a sua infância nas “sagradas letras”232
como
é relatado no verso 15 do mesmo capítulo. Segundo Warfield, Timóteo “não apenas teve bons
instrutores, mas também tinha sempre ‘uma bíblia’ aberta, como diríamos, na mão. Para
reforçar ainda mais a grande vantagem da posse dessas Sagradas Escrituras,”233
Paulo afirma
fortemente que a Escritura é de natureza divina, “portanto, do mais elevado valor para todos
os santos propósitos.”234
227
WARFIELD, Benjamin. O conceito bíblico da inspiração. Disponivel em:
< http://www.monergismo.com/textos/bibliologia/conceito-biblico-inspiracao_warfield.pdf>, Acesso em: 28 dez.
2013, p. 1. 228
WARFIELD, Benjamin. O conceito bíblico da inspiração. Disponivel em:
< http://www.monergismo.com/textos/bibliologia/conceito-biblico-inspiracao_warfield.pdf>, Acesso em: 28 dez.
2013, p. 1. 229
CHEUNG, Vincent. O ministério da Palavra. S.l.: Vida, 2001, p. 6 230
WARFIELD, op. cit., p. 1. 231
id. A inspiração e autoridade da Bíblia. São Paulo: Cultura Cristã, 2010, p. 108. 232
“[Trata-se] de uma expressão técnica que não é encontrada em outras partes do Novo Testamento, é verdade,
mas que ocorre normalmente em Filo e Josefo para designar este conjunto de livros autoritativos que constituía a
‘Lei’ judaica” (WARFIELD, Benjamin. A inspiração e autoridade da Bíblia. São Paulo: Cultura Cristã, 2010, p.
108, colchete nosso). 233
WARFIELD, op. cit., p. 108. 234
Ibid.
47
O fato de a Bíblia ser “inspirada por Deus” é tratado por Calvino como um princípio
que leva o cristão a recebê-la com extrema reverência, não uma reverência das letras, mas no
precioso teor da mensagem. Calvino afirma:
Eis aqui o princípio que distingue nossa religião de todas as demais, ou seja:
sabemos que Deus nos falou e estamos plenamente convencidos de que os profetas
não falaram de si próprios, mas que, como órgãos do Espírito Santo, pronunciaram
somente aquilo para o qual foram do céu comissionados a declarar. Todos quantos
desejam beneficiar-se das Escrituras devem antes aceitar isto como um princípio
estabelecido, a saber: que a lei e os profetas não são ensinos passados adiante ao bel-
prazer dos homens ou produzidos pelas mentes humanas como sua fonte, senão que
foram ditados pelo Espírito Santo.235
Além de afirmar a natureza divina das Escrituras o Apóstolo Paulo faz uma nova
recomendação da Escritura como “útil” ou “proveitosa”. O que o Apóstolo esta dizendo é
“que a Escritura contém a perfeita norma de uma vida saudável e feliz,”236
que segundo
Calvino se configura em uma utilização saudável, e só pode ser “corrompida por um mau uso
quando este propósito de utilidade não é buscado nela.”237
E assim “[pode-se] condenar a
todos aqueles que, sem nenhuma preocupação pela edificação, comovem com muita arte, sim,
porém com questões sem qualquer proveito. Sempre que engenhosas mesquinharias desse
gênero forem introduzidas, [deve-se repeli-las].”238
Ainda sobre a utilidade da Escritura
Calvino faz um afirmação que resume praticamente esse ponto:
Quem é que por natureza não ansiaria por sua felicidade e salvação? E onde
poderíamos achá-las senão na Santa Escritura, pela qual nos são comunicadas? Ai de
nós se não ouvirmos a Deus quando Ele nos fala. Ele não busca seu próprio ganho,
afinal que necessidade tem Ele de ganho? Somos igualmente lembrados de ler a
Santa Escritura não para gratificar nossas fantasias, ou extrair delas questões sem
proveito. Por que? Porque lê-la corretamente será proveitoso para a salvação, diz
Paulo. Assim, quando exponho a Santa Escritura, devo deixar-me guiar por esta
consideração: que aqueles que me ouvem recebam proveito da doutrina que ensino,
para que sejam edificados para a salvação. Se não nutro este desejo, e não almejo à
edificação dos que me ouvem, sou um sacrílego, profanando a Palavra de Deus. Em
contra partida, quem lê a Santa Escritura, ou quem busca ouvir o sermão, caso esteja
em busca de alguma tola especulação, se vem aqui para seu entretenimento pessoal,
é culpado de haver profanado algo tão santo.239
Quando Paulo fala da utilidade da Escritura ele cita quatro pontos que são: ensino,
repreensão, correção e instrução na justiça. É importante lembrar que o Apóstolo não esgota
nesses quatro pontos toda a utilidade da Escritura, mas faz o uso deles por causa da
necessidade do momento em que a Igreja, sob o pastoreio de Timóteo, estava vivendo. Neste
235
CALVINO, João. As Pastorais. São José dos Campos, Sp: Fiel, 2009, p. 262. 236
Ibid., p. 263. 237
Ibid. 238
Ibid. 239
Ibid., p. 264
48
caso as outras importâncias ou critérios de utilização da Escritura podem ser encontrados nas
outras epístolas do Apóstolo tal como em toda a Escritura. Mas somente os pontos citados por
Paulo já tornaria Timóteo um mestre altamente habilitado para aquela comunidade como que
também para tudo aquilo que Deus viesse confiar em suas mãos.
Ao enumerar as quatro utilidades da Escritura, Paulo inicia com a palavra “ensino”
que para Calvino “ele mantem a precedência acima de todos os mais. Visto, porém, que a
doutrina por sua natureza, é às vezes fria e inanimada, ele adiciona a [repreensão] e a
correção,”240
e que entre essas duas existe uma única diferença “é que a segunda é resultante
da primeira. Reconhecer nossa iniquidade e encher-nos de convicção do juízo divino sobre ela
é o principio do arrependimento. Instrução na justiça significa instrução numa vida piedosa e
santa”241
No verso 17 (“Para que o homem de Deus seja apto e plenamente preparado para
toda boa obra”) Paulo justifica os fatores que o levaram a descrever a natureza da Escritura
como também sua utilidade, que é tornar o cristão plenamente apto para realização de
qualquer oficio cristão. Pra Hendriksen o cristão que se considera pertencente a Deus está
investido de um “tríplice oficio”: profeta, sacerdote e rei. Este só poderá desempenhar com
louvor este “tríplice oficio” se estiver bem equipado com a Escritura que é totalmente
suficiente,242
no entanto o cristão que não fica satisfeito com ela “busca saber mais do que
convém e mais do que lhe é bom saber.”243
4.2 Praticando a Escritura
Todo o caminho desenvolvido nesse trabalho teve por objetivo chegar a este último
ponto. Pode-se pensar na simplicidade deste tópico em relação aos demais, mas o trajeto não
foi desenvolvido inutilmente. Essa caminhada não encontraria sentido sem que fosse feita
uma aplicação de tudo que foi abordado, da mesma forma uma aplicação direta sem passar
pela história que a fundamenta a tornaria extremamente rasa igualando este trabalho aos
muitos outros conceitos que são ensinados hoje em dia.
Se hoje a prática da Escritura está mais clara, isso é graças ao empenho de alguns
pensadores cristãos que gastaram uma vida inteira para traduzi-la e interpretá-la. Reduziram
os distanciamentos e esclareceram muitos pontos da Escritura que antes eram totalmente
240
CALVINO, João. As Pastorais. São José dos Campos, Sp: Fiel, 2009, p. 264. 241
Ibid. 242
HENDRIKSEN, William. Comentário do Novo Testamento: 1 e 2 Timóteo e Tito. São Paulo: Cultura Cristã,
2011, p. 373. 243
CALVINO, op. cit., p. 265.
49
obscuros. Ainda existem muitas questões da Escritura que geram muitas dúvidas, e grande
parte delas não encontraram respostas neste tempo. Mas tudo o que já foi interpretado ao
longo da história já é o bastante para conduzir um indivíduo e uma comunidade inteira para o
caminho da salvação, orientando sobre as adversidades que fazem parte da longa, árdua,
porém agradável caminhada.
Essa caminhada primeiramente se fundamenta na crença que é a causa para todos os
efeitos que a Escritura proporciona. Crer na inspiração divina e suficiência da Bíblia é um
fator determinante para esses efeitos. A fé na Escritura “é vitalmente importante para todos os
cristãos, [pois através dela] (pregada e lida) [é] que Deus nos salva e faz com que cresçamos
na graça que há em Cristo Jesus.”244
Considera-se que, se o Antigo Testamento é falso, o
Novo Testamento também será (Hb 1:1-2245
). Se a Bíblia é falível, Deus também será falível,
se a Palavra escrita de Deus é uma farsa, assim também será a Palavra encarnada de Deus e
finalmente, se a fé na Escritura é ilegítima, com certeza aquele que a exerce também é um
cristão ilegítimo.246
Se uma Igreja tem esse posicionamento em relação à Escritura ela se
encontra longe dos propósitos divinos não podendo jamais ser chamada Igreja do Senhor
Jesus.
4.2.1 A Bíblia e o Cristão
Infelizmente, os cristãos da atualidade se caracterizam pela sua pouca leitura bíblica.
Isso os torna ignorantes em relação ao conhecimento de Deus e a adoração a Ele. O resultado
disso é desastroso, pois esses cristãos vivem a vida toda nutrindo pensamentos mesquinhos e
insignificantes em relação a Deus e pensamentos elevados a respeito do homem.247
Negociam
aquilo que é divino pelo humano, enfatizam a criatura e deixam o criador de lado. Da mesma
forma trocam a Bíblia inspirada e suficiente por outras literaturas que se dizem sábias e de
fundamento bíblico. Segundo Ryle “há um abismo total entre este (Bíblia) e qualquer outro
livro que tenha sido escrito. [...] [É como trocar] ouro por simples metal; alguém que trocou o
céu pela terra.”248
244
STEWART, Angus. A doutrina da Escritura. Disponível em:
<http://www.monergismo.com/textos/bibliologia/a-doutrina-escritura_angus-stewart.pdf>, Acesso em: 02 dez.
2013, p. 1, colchetes nosso, parêntese do autor. 245
“Há muito tempo Deus falou muitas vezes e de várias maneiras aos nossos antepassados por meio dos
profetas, mas nestes últimos dias falou-nos por meio do Filho, a quem constituiu herdeiro de todas as coisas e
por meio de quem fez o universo.” 246
STEWART, op. cit., p. 1. 247
ANYABWILE, Thabiti. O que é um membro de Igreja saudável? São José do Campos, Sp: Fiel, 2010, p. 27. 248
RYLE, J. C. A Inspiração das Escrituras. São Paulo: Pes, s.d. p. 1-4, parêntese do autor, colchete nosso.
50
Apóstolo Paulo afirma que os meios para tornar um cristão apto para a realização da
obra de Deus estariam fundamentados na Escritura (2 Tm 3:17). Ele está se referindo a uma
saúde espiritual, um cristão bem nutrido, saturado pela doutrina bíblica, plenamente cativo a
Bíblia em vontade e sentimentos, alguém que reconheceu que nela possui as vitaminas
essenciais da fé cristã. Não se trata de um livro onde se encontra resposta para todas as
dúvidas do homem e nem faz afirmações diretas relacionadas há humanidade, pois não é o seu
propósito. Mas, se o Cristão deseja conhecer Deus, “a Bíblia é o lugar em que Deus nos fala a
respeito de si mesmo.”249
Conhecer uma obra implica em conhecer pelo menos um pouco do seu autor, com a
Bíblia não é diferente conhece-la implica em conhecer Deus ou apenas aquilo que Ele próprio
permitiu ser conhecido. Packer em sua obra “O conhecimento de Deus” desenvolve cinco
princípios básicos sobre o conhecimento de Deus, são eles:
(1) Deus falou aos homens, e a Bíblia é sua Palavra, que nos foi dada a fim de nos
tornar sábios para a salvação. (2) Deus é Senhor e Rei deste mundo; ele governa
todas as coisas para sua glória, mostrando sua perfeição em tudo o que faz, a fim de
que homens e anjos possam louvá-lo e adorá-lo. (3) Deus é Salvador, ativo em amor
soberano mediante o Senhor Jesus Cristo para salvar os crentes da culpa e do poder
do pecado, adotá-los como filhos e assim abençoá-los.(4) Deus é triúno. Há em Deus
três pessoas: o Pai, o Filho e o Espírito Santo; e a obra da salvação é operada pelos
três ao mesmo tempo: o Pai propõe a redenção, o Filho a assegura e o Espírito a
aplica. (5). Piedade significa responder à revelação de Deus com confiança,
obediência, fé, adoração, oração, louvor, submissão e serviço. A vida deve ser vista
e vivida à luz da Palavra de Deus. Isto, e nada mais, é a verdadeira religião.250
Estes princípios correspondem aos inegáveis fundamentos da fé que devem ser
profundamente arraigados na vida do cristão através de uma relação intima com a Escritura.
Fundamentos que refletem em atitudes e palavras. Um cristão direcionado pela Escritura: ora
biblicamente; evangeliza biblicamente; ensina a Bíblia; exorta usando a Bíblia não se prende a
versículos favoritos, mas explora todo seu conteúdo se preocupando com a harmonia dos
versos; fala quando a Bíblia fala e se silencia quando a Bíblia se silencia; nada a acrescenta.
Para esse cristão a Escritura: se autoafirma; se autocompleta e se autointerpreta.
249
ANYABWILE, Thabiti. O que é um membro de Igreja saudável? São José do Campos, Sp: Fiel, 2010, p. 27. 250
PACKER J. I. O conhecimento de Deus. São Paulo: Mundo Cristão, 1996, p. 20-21.
51
4.2.2 A Bíblia e a Igreja
Deus edifica sua Igreja através da sua Palavra (Mt 16:18; Rm 1:16; 10:17251
), como
cabeça (Ef 4:15252
) e noivo dessa Igreja ele a prepara para seu retorno triunfal (Ap 21:2
21:9253
). Essa Palavra tem sido o “princípio regulador”254
da Igreja, pois somente por causa
dela é que a Igreja se diferencia do mundo. Pois no mundo o ponto central é o próprio homem
com suas vontades e anseios praticados deliberadamente sem nenhum princípio que regula
essas ações. Porém a Igreja nasceu para fazer a vontade de Deus que é expressa em sua
Palavra e testificada pelo Espírito Santo. Na Igreja a Bíblia é autoridade máxima, questões
difíceis de solucionar são tratadas mediante a Escritura, o papel do homem é somente de
obediência a Ela.
No livro de Dever e Alexander “Deliberadamente Igreja”, é estabelecido para a Igreja
um princípio regulador com base em cinco elementos que são: “Leia a Bíblia”255
nas reuniões
da Igreja e como Igreja, isso representa sua dependência em relação à Escritura. Paulo
recomenda a leitura da Bíblia, “Até a minha chegada, dedique-se à leitura pública da
Escritura, à exortação e ao ensino.” (1 Tm 4:13). Pois mesmo uma simples leitura pode surtir
grandes efeitos, como diz Jeremias, “Não é a minha palavra como o fogo”, pergunta o Senhor,
“e como um martelo que despedaça a rocha?” (Jr 23:29); “Pregue a Bíblia”256
, “esteja
preparado a tempo e fora de tempo, repreenda, corrija, exorte com toda a paciência e
doutrina” (2 Tm 4:2). “A pregação da Palavra de Deus é o método que Ele ordenou para a
comunicação do evangelho aos pecadores.”257
A falta da pregação comprometerá a Igreja em
se manter viva e atuante; “Ore a Bíblia”258
, isso implica em “falar com Deus citando-lhe sua
própria Palavra [...], transmite a ideia de que desejamos nos aproximar de Deus em seus
termos (não nos nossos), de acordo com o que Ele revelou acerca de Si mesmo, e não de
acordo com que preferimos que Ele seja, pois a Escritura ensina a orar.”259
; “Cante a
251
Mt 16:18 “E eu lhe digo que você é Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha igreja, e as portas do Hades
não poderão vencê-la.” Rm 1:16 “Não me envergonho do evangelho, porque é o poder de Deus para a salvação
de todo aquele que crê: primeiro do judeu, depois do grego.” Rm 10:17 “Consequentemente, a fé vem por ouvir
a mensagem, e a mensagem é ouvida mediante a palavra de Cristo.” 252
Ef 4:15 “Antes, seguindo a verdade em amor, cresçamos em tudo naquele que é a cabeça, Cristo.” 253
Ap 21:2 “Vi a cidade santa, a nova Jerusalém, que descia do céu, da parte de Deus, preparada como uma
noiva adornada para o seu marido.” Ap 21:9 “Um dos sete anjos que tinham as sete taças cheias das últimas sete
pragas aproximou-se e me disse: ‘Venha, eu lhe mostrarei a noiva, a esposa do Cordeiro’.” 254
DEVER, Mark; ALEXANDER, Paul. Deliberadamente Igreja. São José dos Campos, Sp: Fiel, 2008, p. 97. 255
DEVER, Mark; ALEXANDER, Paul. Deliberadamente Igreja. São José dos Campos, Sp: Fiel, 2008, p. 97,
itálico nosso. 256
Ibid., p. 98, itálico nosso. 257
Ibid. 258
Ibid, itálico nosso. 259
Ibid., p. 99, parêntese do autor.
52
Bíblia,”260
canções que expressam o caráter de Deus, que aplicam “corretamente a teologia, as
frases e assuntos bíblicos [...], porque a Palavra de Deus edifica a Igreja, e a música nos ajuda
a rememorar a Palavra.”261
; E por último “Veja a Palavra,”262
trata-se de observar as
ordenanças de Jesus em relação aos meio da graça como Santa Ceia e Batismo. A Santa Ceia
retrata o corpo e o sangue de Jesus “partido e derramado em favor da remissão de nossos
pecados”263
representados pelo pão e o vinho. O batismo que é a representação física da
conversão espiritual. Tais ordenanças “são selos visíveis da participação na Nova Aliança.”264
Essas atitudes têm por objetivo regular e instruir a forma de como se deve aproximar
de Deus no momento em que os cristãos se reúnem para adorá-Lo.265
A prática desses cinco
elementos evitam alguns males que tem assolado a Igreja moderna que Washer descreve
como:
Uma negação da suficiência da Escritura; uma ignorância a respeito de Deus; um
fracasso em abordar o mal do homem; uma ignorância quanto ao evangelho de Jesus
Cristo; um convite antibíblico ao evangelho; uma ignorância quanto a natureza da
Igreja; uma falta de disciplina eclesiástica amorosa e compassiva; um silêncio a
respeito da separação; uma substituição da Escritura referente a família por
psicologia e sociologia e pastores mal nutridos na Palavra de Deus.266
Todos esses problemas ocorrem pela ausência da Bíblia pura, suficiente e
corretamente interpretada na Igreja. Neste sentido, o princípio regulador de Dever e
Alexander surge para devolver a saúde espiritual da Igreja e mantê-la saudável. “Líderes
eclesiásticos comprometidos com a reforma da Igreja por meio da Palavra de Deus, através
dos séculos, têm usado o mesmo método.”267
Neste capítulo foi feito um breve comentário sobre a segunda epístola a Timóteo com
referência ao terceiro capítulo e versos dezesseis e dezessete. Foi tratado a respeito do termo
“inspiração” e as suas divergências que estão entre a sua tradução e sua interpretação, mas
que não altera o sentido bíblico que é o de afirmar que a Escritura é um produto divino. Em
seguida foi feita uma pequena exposição da prática da Escritura pelo cristão e pela Igreja, bem
como as vantagens de tê-la como inspirada e suficiente e as desvantagens de considera-la
como insuficiente para a edificação pessoal e da Igreja.
260
DEVER, Mark; ALEXANDER, Paul. Deliberadamente Igreja. São José dos Campos, Sp: Fiel, 2008, p. 100. 261
Ibid., p. 100, itálico nosso. 262
Ibid., p. 101, itálico nosso. 263
Ibid., p. 102. 264
Ibid. 265
DEVER, Mark; ALEXANDER, Paul. Deliberadamente Igreja. São José dos Campos, Sp: Fiel, 2008, p. 102. 266
São pontos extraídos do próprio índice da obra de (WASHER, Paul. 10 Acusações contra Igreja Moderna.
São José dos Campos, Sp: 2011, p. 7-95). 267
DEVER; ALEXANDER, op. cit., p. 97.
53
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O objetivo principal desse trabalho foi apresentar como a inspiração e suficiência da
Escritura são ferramentas fundamentais para a edificação do cristão e da igreja. Dentre os
muitos conceitos e teologias que evolvem o tema, foram citados apenas os principais, que
moldam a forma como se interpreta a Bíblia. Foi abordado também aquilo que a Igreja tem
crido desde sua fundação, e os benefícios que ela terá quando receber as Escrituras como
inspirada por Deus e suficiente para sua edificação.
As muitas teorias que envolvem o tema inspiração são pensamentos diferentes acerca
do mesmo assunto podendo conduzir em várias direções até mesmo contraditórias. Sendo
assim, por essa divergência e complexidade é que torna importante construir uma
compreensão de qual conceito de inspiração bíblica pode servir como base para todo cristão
maduro na fé ou não. Se existir dúvida acerca da inspiração bíblica, também gera dúvida se
ela é suficiente ou não para conduzir alguém à salvação.
Toda a Escritura é inspirada por Deus, cada capítulo e verso colocados em seu devido
lugar segundo a vontade dEle, que inspirou homens piedosos a se entregarem totalmente a sua
vontade para determinado fim. Cada escritor escreveu acerca daquilo que viu e daquilo que
foi revelado por Deus. Portanto, a Bíblia não contém e nem se torna a Palavra de Deus, ela é a
Palavra de Deus e autoridade máxima na vida do cristão desde quando foi escrita e
atualmente.
Se a Escritura é inspirada por Deus, consequentemente ela é suficiente para a
edificação da igreja, pois o maior interessado no sucesso da igreja é o próprio Deus, por se
tratar de um projeto Divino. Os sessenta e seis livros entregues à humanidade e sua
organização são o manual para a transformação de uma comunidade e seus respectivos
indivíduos, ou seja, tudo o que a igreja precisa esta nas Escrituras, seja no ensino, na
repreensão de um grupo ou de um membro, na correção e em todo tipo de instrução no que
tange a formação de um membro dentro da comunidade. Razão pela qual foi abordado o texto
de 2 Timóteo 3:16,17, pois nele engloba alguns aspectos essenciais que são: o ensino, a
repreensão, a correção, instrução na justiça e o preparo do membro para a vida cristã.
É necessário saber que se deve falar quando a Bíblia fala e calar quando a Bíblia cala,
quando se trata de Igreja e seus conceitos, a origem e destino da humanidade suas obrigações
e deveres enquanto viver em sociedade. A Bíblia é a formula ideal para um destino promissor
com Deus e a dosagem correta para manter a saúde espiritual do individuo e de uma igreja
inteira.
54
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