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IAESB – INSTITUTO AVANÇADO DE ENSINO SUPERIOR DE BARREIRAS FACULDADE SÃO FRANCISCO DE BARREIRAS IDAAM – AC – ATIVIDADES EDUCACIONAIS LIBRAS – LÍNGUA BRASILEIRA DE SINAIS KATIÚCIA CRISPIM DE OLIVEIRA A FORMAÇÃO DA IDENTIDADE CULTURAL NO PROCESSO DE INCLUSÃO ESCOLAR DO SUJEITO SURDO QUE FREQÜENTA A ESCOLA NEUTEL MAIA SOB A PERSPECTIVA DA TEORIA DE GÊNERO

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IAESB – INSTITUTO AVANÇADO DE ENSINO SUPERIOR DE BARREIRAS

FACULDADE SÃO FRANCISCO DE BARREIRAS

IDAAM – AC – ATIVIDADES EDUCACIONAIS

LIBRAS – LÍNGUA BRASILEIRA DE SINAIS

KATIÚCIA CRISPIM DE OLIVEIRA

A FORMAÇÃO DA IDENTIDADE CULTURAL NO PROCESSO DE INCLUSÃO

ESCOLAR DO SUJEITO SURDO QUE FREQÜENTA A ESCOLA NEUTEL MAIA

SOB A PERSPECTIVA DA TEORIA DE GÊNERO

Rio Branco - AC

2010

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KATIÚCIA CRISPIM DE OLIVEIRA

A FORMAÇÃO DA IDENTIDADE CULTURAL NO PROCESSO DE INCLUSÃO

ESCOLAR DO SUJEITO SURDO QUE FREQÜENTA A ESCOLA NEUTEL MAIA

SOB A PERSPECTIVA DA TEORIA DE GÊNERO

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de pós-graduação em Libras da Faculdade São Francisco de Barreiras, como requisito parcial para obtenção do título em Curso Lato Sensu.Orientador: ................................................

Rio Branco - AC

2010

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RESUMO

A escola constitui um grupo social no qual o sujeito é inserido logo na infância e tem suas primeiras experiências e relacionamentos interpessoais com sujeitos de culturas e identidades diferentes. É nela que se iniciam as relações sociais e onde os indivíduos organizam conceitos e buscam maturidade por meio de trocas e, assim formam a sua própria identidade, a partir da convivência com o outro. Como a família, a escola é responsável por futuros comportamentos no meio social, permitindo ou não adaptações, contribuindo para que a criança tenha relacionamentos e aprendizagens mais humanas, forme uma Identidade única e desenvolva a sua auto-imagem. Ao descobrir a surdez em uma criança, a família toma um choque, se desespera, surge a angustia devido à falta de comunicação com uma “pessoa diferente”. Esse Choque não é diferente no âmbito escolar, Pois ao deparar-se com um aluno Surdo, geralmente o primeiro impulso que essa comunidade tem é o de rejeição, sentimento que causa, no sujeito angustias e sofrimentos que podem ser irreversíveis, mesmo ao longo do tempo. Dessa forma é importante a realização de pesquisas para identificar a situação identitária vivida pelo Surdo com o objetivo de revelar à humanidade que a crise identitária do sujeito adolescente não é um discurso exclusivo do ouvinte. Pois também essa crise influência diretamente no comportamento do educando Surdo, uma vez que este é um ser humano como qualquer outro e que se diferencia dos demais apenas pelo fato de captar as informações que o mundo lhe transmite de um modo diferente, o gesto-visual e não o oral-auditivo.

PALAVRAS-CHAVE: Surdo, inclusão escolar, identidade, gênero

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ABSTRACT

The school forms a social group in which the person is inserted soon during the childhood and has his first interpersonal experiences and relationships with people from different cultures and identities. It’s there where social relations start and where people organize concepts and look for maturity by the exchanges and so they form their own identity, from the close contact with others. Like the family, the school is responsible for future kinds of behavior in the social environment, permitting or not adaptations, helping the child to maintain relationships and more human apprenticeship, to form a unique identity and develop his self-image. Discovering the deafness in a child, the family gets shocked and desperate; the anguish comes due to the lack of communication with a “different person”. This shock is not different in the school range, because when the school community comes across a deaf student; its first impulse is the rejection, generally. No doubt, this feeling causes anguish and suffering to this kind of student, and these feelings can be irreversible, even after a long period of time. This way, it’s important the creation of researches to identify the identity crisis for the which the deaf student goes through, whose the goal is to reveal to the mankind that this crisis, which is of a teenager, is not an exclusive discuss of the listener. For this crisis also influences directly in the deaf student behavior, since this is a human being as any other and that is different from the others just by the fact of capture the information which the world transmits to him in an unusual way, the gesture – the visual one not the oral one.

Key words: deaf, social inclusion, identity, type

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SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO....................................................................................................6

2. TEORIAS EXPLICATIVAS DAS RELAÇÕES ENTRE SUJEITOS...................10

2.1. PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO......................................................................11

2.2. TEORIA DE GÊNERO.....................................................................................15

2.3. TEORIA DA IDENTIDADE CULTURAL NA PÓS-MODERNIDADE...............19

2.3.1. IDENTIDADE CULTURAL DO SURDO........................................................24

3. CONCEPÇÕES DE LINGUAGEM NO SISTEMA DE ENSINO DO BRASIL.............................................................................................................26

3.1. CULTURA E IDENTIDADE NA AQUISIÇÃO DA LINGUAGEM DO SURDO.............................................................................................................29

3.1.1. SER SURDO PARA A MEDICINA................................................................29

3.1.2. O SURDO E AS CORRENTES PEDAGÓGICAS.........................................31

4. LEIS SOBRE EQUALIZAÇÃO DE OPORTUNIDADES PARA

PESSOAS COM DEFICIÊNCIAS............................................................................33

4.1. LEI Nº 9394/96 – LEI DE DIRETRIZES E BASES DA EDUCAÇÃO NACIONAL – 1996..................................................................................................33

4.2. LEI N.º 10.436 DE 24 DE ABRIL DE 2002......................................................35

5. ANÁLISE DAS RESPOSTAS DO QUESTIONÁRIO.........................................37

5.1. ANÁLISE DAS RESPOSTAS DO QUESTIONÁRIO DIRIGIDO PARA ALUNOS SURDOS......................................................................................38

5.2. QUESTIONÁRIO PARA ALUNOS OUVINTES E ANÁLISE DAS RESPOSTAS..................................................................................................42

6. CONCLUSÃO.....................................................................................................45

7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS...................................................................47

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1. INTRODUÇÃO

A escola Neutel Maia é um espaço que atende a crianças e jovens de uma

comunidade carente e, em sua maioria, o público da escola não tem condições de

freqüentar um espaço cultural que valorize seus talentos e seus conhecimentos.

Grande parte desses alunos se encontra na fase caracterizada como

adolescência, na qual o jovem está em processo de formação de identidade,

passando por conflitos consigo mesmo e com a sociedade; essa mesma sociedade

que oprime e discrimina o sujeito de acordo com sua raça, cor e posição social, ou

necessidades especiais. Durante a adolescência, idade em que o caráter esta sendo

formado, é necessária uma abordagem que possibilite ao sujeito uma visão crítica e

uma postura diferenciada ante as imposições sociais.

De acordo com os direitos humanos, da criança e o do adolescente não pode

haver dominadores nem dominados, pessoas que vivam na opulência e pessoas

condenadas a “viver” na miséria e na marginalidade, luta-se por um mundo largo e

aberto, sem fronteiras nem cercas, cimentado sobre o amor e justiça, sobre o

respeito à vida e ao direito. Um mundo em que a solidariedade fraterna e a justiça

triunfem sobre toda forma de dominação. Dessa forma, cabe-nos proporcionar-lhes

o conhecimento pleno acerca de seus direitos e deveres, visando contribuir para a

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formação de um sujeito livre de preconceitos, de estereótipos e capaz de defender-

se da violência (não praticá-la e não sofrê-la).

Quando nos referimos ao aluno surdo essa realidade se agrava, pois os

mesmos pertencem a uma minoria social que ao longo da história tem sofrido muito

com o preconceito e o desrespeito por parte daqueles que se consideram seres

perfeitos e superiores simplesmente por não sofrerem com nenhuma deficiência

física ou mental.

O tema inclusão social e cultural de pessoas com deficiências tem se tornado

cada vez mais discutido, principalmente no sistema de ensino público. Uma escola

que, verdadeiramente, se preocupe com o ensino e reabilitação das pessoas com

deficiência deve promover no centro escolar, e durante os seus planejamentos,

condições reais para a efetiva participação do aluno nas atividades escolares, pois é

certo que a integração social do sujeito começa na escola.

Partindo do princípio de que a educação inclusiva é um campo de

conhecimento e que enquanto modalidade transversal de ensino perpassa todos os

níveis, etapas e modalidades que realiza atendimento educacional especializado

disponibilizando um conjunto de serviços, recursos e estratégias específicas que

favorecem o processo de escolarização dos alunos com necessidades educacionais

especiais, transtorno globais do desenvolvimento e altas habilidades nas turmas

comuns do ensino regular e a sua interação no contexto educacional, familiar, social

e cultural o foco do presente trabalho é o sujeito que dela necessita e que freqüenta

a escola Neutel Maia.

Assim, no intuito de contribuir para um melhor entendimento do sujeito o

presente trabalho tem como objetivo geral analisar a condição social vivida pelo

aluno surdo que freqüenta a referida escola observando a construção da sua

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identidade cultural e o seu olhar, sobre si mesmo enquanto ser social, em meio a

uma sociedade preconceituosa. Além de promover reflexões sobre os papéis sociais

destinados ao surdo difundindo imagens não-discriminatórias e não-estereotipadas

destes, proporcionando-lhes atividades que elevem a auto-estima e um espaço no

qual eles discutirão, sobre os direitos adquiridos por eles a partir do século XX,

avaliarão as relações de gêneros, a cultura machista e a violência social, revisando

valores e promovendo o diálogo e a negociação nas relações.

Toda a análise apresentada neste trabalho está relacionada à seguinte

indagação que norteia nosso problema de pesquisa: Qual o porquê da

discriminação social vivida por alunos surdos na escola Neutel Maia?

Esta análise é relevante e justifica-se pelas constantes transformações que

mundo contemporâneo tem sofrido, responsáveis pelas características pós-

modernas do sujeito, repleto de ansiedade e solidão, obrigado a assumir

comportamentos mecanicistas diante do progresso desenfreado que o transforma

em um ser desterritorializado que passa a pertencer a um entrelugar.

Este estudo compromete-se a verificar a hipótese de que o surdo encontrará

dentro da escola Neutel Maia o preconceito social e a mesma rejeição do mundo lá

fora sendo vítimas de violência ou algum tipo de exploração por parte do gênero

masculino, aquele que domina a sociedade, e ainda de que o processo de

comunicação entre ele e os ouvintes nos momentos e interação social e frágil ou

inexistente.

Em termos metodológicos o trabalho de pesquisa baseou-se na reunião e

análise de uma parte da vasta bibliografia sobre os assuntos abordados ao longo do

texto, além disso, utilizou-se de pesquisas que abordavam o tema estudado,

prevalecendo uma estratégia de investigação baseada no método de pesquisa

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quantitativa, pois se pretende traduzir em resultados estatísticos as informações

obtidas durante a apresentação do mesmo. Classifica-se também como estudo de

caso, visto que será realizado um estudo profundo para atingir um amplo e

detalhado conhecimento sobre os objetivos que se pretende atingir.

A respeito dos objetivos, o estudo classifica-se como pesquisa descritiva, uma

vez que tem como objetivo essencial à descrição das características da população

em estudo, com a finalidade de gerar resultados que possam ser utilizados de forma

prática e subjetiva pela coordenação da referida escola. A população deste projeto

engloba os alunos surdos que freqüentam a escola Neutel Maia. Tomando como

base esta população e perante a facilidade de encontrá-los, delimitou-se a amostra

através da seleção de cem por cento (100%) do público mencionados.

Com a finalidade de alcançar o objetivo proposto, este trabalho se apresenta

estruturado em quatro capítulos, além da introdução e considerações finais do

estudo. O primeiro capítulo apresenta aos leitores uma breve revisão sobre a

abordagem teórica dos principais estudos que tratam sobre o tema da identidade

cultural do sujeito e o gênero a que ele pertence.

O segundo capítulo faz um breve relato sobre o que é cultura e identidade

surda. Após, faz-se uma análise da evolução da comunidade surda ao longo dos

anos no Brasil.

O terceiro capítulo destaca as Leis que regem as regras padrões sobre

equalização de oportunidades para pessoas com deficiências.

Finalmente, no quarto capítulo é apresentada uma análise detalhada dos dados

obtidos por meio da pesquisa realizada com o público alvo do presente trabalho.

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3. TEORIAS EXPLICATIVAS DAS RELAÇÕES ENTRE SUJEITOS

Na atualidade o conceito de identidade cultural esta sendo bastante discutido

pelas mais diversas áreas de estudo como, por exemplo, antropologia, sociologia,

história e literatura, os estudiosos dessas várias ciências sociais tem como objetivo

conhecer e interpretar as mudanças ocorridas nas sociedades por meio de

interações sócio comunicativas entre culturas diversas. Devido ao grande interesse

no estudo da identidade dos mais variados povos, fez-se um levantamento de

informações acerca da formação identitária do Surdo objetivando primeiramente a

representação da sua identidade.

Nas relações sociais modernas um ser sempre aparece como objeto e outro

como sujeito. Nas sociedades pós-coloniais o sujeito e o objeto pertencem a uma

hierarquia em que o oprimido é fixado pela superioridade do moral do dominador.

Assim, por meio da compreensão do ser-objeto deve-se compreender a existência

de um ser sujeito. Críticos tentam expor os processos que transformam o colonizado

numa pessoa muda e suas estratégias para sair dessa posição, para eles o

colonizado fala quando se conscientiza politicamente e é capaz de enfrentar seu

opressor antagonicamente. O sujeito é alguém que tem muitas facetas, o eu e outro.

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A procura desse eu composto é a nova identidade pós-colonial. A violência (o

desmembramento do sujeito) é seguida pela fragmentação e pela reconstrução do

vazio a partir do qual as culturas são liberadas da dialética destrutiva da história.

As relações entre colonialismo e feminino envolvem em primeiro lugar a

possível analogia entre patriarcalismo/feminismo e metrópole /colônia na qual a

mulher é comparada à colônia e o homem é comparado à metrópole. E ainda é

possível perceber que se no sistema colonial o homem é colonizado a mulher é

duplamente colonizada.

Desse modo, ao longo dos estudos observa-se, ainda, a construção do sujeito

como ser social em meio a uma sociedade preconceituosa, abordando os diversos

tipos de violência: psicológica, moral, física e patrimonial sob a luz da teoria de

Gêneros, na versão de Tarciana Gouveia e Silvia Camurça (2000), em O Que é

Gênero. Partindo do princípio de que gênero não está relacionado com questões

biológicas, mas com as relações sociais estabelecidas entre homens e mulheres,

mulheres e mulheres, homens e homens criando assim, relações de poder, onde um

indivíduo exerce domínio sobre o outro.

3.1. PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO

Nos primórdios, a mitologia era responsável pelas explicações da natureza

humana e dos fenômenos naturais. Era um tipo de conhecimento irracional que

surgiu antes da filosofia. Devido a diversos conflitos sociais, políticos e religiosos

ocorrem transformações, na sociedade como um todo e consequentemente, o

homem sente a necessidade de buscar respostas racionais para novos

questionamentos. Surge então a filosofia (séc. VI a.C.), que teve como principais

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representantes: Platão (429-343 a.C.), com a teoria idealista, defendendo que o

conhecimento está na alma e que quando a alma se liga à matéria há o

esquecimento esse é o conhecimento pré-existente ao homem onde a alma é

considerada a mente humana; Aristóteles (384-322 a.C.), com a teoria empírica de

que ao nascer o homem tem a mente em branco e o conhecimento será impresso

através das experiências humanas.

Com a queda do império Romano houve uma brusca mudança comportamental

de forma que na idade média, o conhecimento passa a ser submetido à fé. O

pensamento humano mantinha-se preocupado com a alma e sua salvação,

enquanto os gregos deram ênfase à razão, a idade média “submete a razão a fé”.

Por volta de 1500 a 1600 o homem torna-se o centro do saber em contra

posição a visão Teocêntrica de mundo, iniciando uma nova valorização de saber –

mais prático e naturalista, do qual uma das maiores expressões da época é Galileu

Galilei (1564-1642), que fundamenta o conhecimento na experiência construindo o

método cientifico baseado na observação, formulação de hipóteses e na

experimentação. Sua obra é continuada por Descartes (1596 – 1649), considerado o

fundador da filosofia moderna e do racionalismo. Descartes instaura a dúvida

metódica, eliminando os “a priores” e destruindo os dogmas, segundo o qual o

pensamento é a essência da natureza humana.

Os sistemas filosóficos que se desenvolveram a partir de Descartes –

Racionalismo (todo conhecimento é proveniente da razão), e Empirismo (todo

conhecimento se dá através da experiência), serviriam de pressupostos para muitas

teorias psicológicas, como: Teoria Maturacional, Teoria Comportamentista e Teoria

de Campo.

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Kant (1724-1804), que surge posteriormente a Descartes faz a “síntese critica”

do racionalismo e do empirismo em que segundo ele a “inteligência percebe os

objetos por meio do entendimento a priori que se manifesta no momento exato da

experiência”.

Os sistemas filosóficos pós-Kantianos influenciaram diretamente para a

constituição da psicologia contemporânea, dentre eles o que mais se destaca é o

positivismo, pois é a partir da influência do positivismo sobre o conhecimento

psicológico no séc. XIX que a psicologia se constitui num ramo do conhecimento

definido, por meio de um objeto de estudo delimitado ―as atividades psíquicas ou a

consciência, ou o comportamento― e por uma metodologia voltada para a

observação cuidadosa e sistematizada. Deixa de ser a psicologia da alma e do

espírito e se constitui numa psicologia fundada em dados.

“Seu status de ciência é obtido na medida em que se ‘liberta’ da Filosofia, que marcou sua história até aqui, e atrai novos estudiosos e pesquisadores, que sob os novos padrões de produção de conhecimento, passam a: definir seu objeto de estudo (o comportamento, a vida psíquica, a consciência); delimitar seu campo de estudo, diferenciando-o de outras áreas de conhecimento, como a Filosofia e a Fisiologia; formular métodos de estudo deste objeto; formular teorias enquanto um corpo consistente de conhecimentos na área ”1.

A partir de então surgem às primeiras escolas da psicológica que são: o

funcionalismo de William James (1842-1910), que estuda a dinâmica funcionalista

da mente; o estruturalismo de Wundt (1832-1920), e seus seguidores que estuda a

estrutura da mente; e a psicologia condutista de Eduard L. Thornidike (1874 – 1949),

para a qual as condutas posteriores são as que satisfazem um determinado impulso

positivo ou negativo.

As teorias psicológicas contemporâneas são: as Teorias Maturacionais, de

base epistemológica e o racionalista em cuja premissa básica implica na 1 Psicologias dos autores Ana M. Bahia Bock, Odair Furtado e Maria de Lurdes T. Teixeira pg. 37

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constatação de que as características fundamentais de qualquer organismo vivo

estão programadas em sua constituição genética e enraizadas em processos

biológicos, seus representantes são Arnold Gesell (1880 – 1961), Francis Galton

(1822 – 1911), Cattell (1860 – 1944), Stanley Hall (1845 – 1924) e Alfred Binet (1857

– 1911); Teorias Comportamentistas, Berravionismo, que tem como base

epistemológica o empirismo aliado ao positivismo, que tem por sua vez como objeto

de estudo o comportamento humano ou as reações observáveis de um organismo

pelas respostas a estímulos do meio ambiente, seus representantes principais são:

John Watson (1878 -1958) e Skinner (1904 – 1990); Teorias de Campo para as

quais as bases epistemológicas são o racionalismo e o idealismo, nessa perspectiva

os comportamentos e experiências humanas não são fracionáveis; Teorias

Psicanalíticas e Neopsicanalíticas

“que recupera para a psicologia a importância da afetividade e postula o inconsciente como objeto de estudo, quebrando as tradições da psicologia como ciência da consciência e da razão” 2,

fundadas pelo médico Sigmund Freud (1856 – 1939); Teorias Fenomenológica e

humanistas, segundo a qual o homem sendo inerentemente bom tende à

manutenção de si mesmo e à sua auto realização e tem como representantes

Maslov (1972), Rogers (1975), e Combs (1975); Teorias psicogenéticas que tem

como principais representantes Piaget (1896 – 1980), Vygotisk (1896 – 1934),

Leontiev (1903 – 1979), Luria (1902 – 1977) Wallon (1879 – 1962), segundo a qual o

sujeito e objeto interagem em um processo que resulta na construção e

reconstrução da estrutura cognitiva.

“No século XVIII e, sobretudo no século XIX a legislação de diversos países revela o interesse do estado em assumir a educação, tornando-a leiga e gratuita. No entanto, nessa época a escola tradicional passa a ser alvo de diversas criticas. Muitas delas resultam de descobertas científicas,

2 psicologias, Ana M. Bahia Bock, Odair Furtado e M. de Lurdes T. Teixeira pg.39

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sobretudo nas áreas de biologias e ciências humanas – como a psicologia e a sociologia -, que trouxeram subsídios para uma análise mais rigorosa da educação. A partir de então, é dada uma maior atenção às diferenças individuais buscando-se também técnicas mais eficazes de aprendizagem” 3.

Surge então a psicologia da educação que tem como objetivo melhorar as

práticas educativas em geral e planejar o desenvolvimento delas baseado na

argumentação de que a educação e o ensino sofrem grandes melhorias com a

utilização correta dos conhecimentos psicológicos. A psicologia da educação

assume trabalhos e pesquisas sobre aprendizagem, testes mentais, medida do

comportamento, psicologia e clínica infantil, tudo referido direta e indiretamente à

problemática educativa e escolar e teve como precursores J. M. Kattell (1860 –

1944), um dos impulsores do testing moviment, no qual colabora na construção de

diversos testes mentais; Willians James (1842 – 1910), precursor do ensino ativo

onde o aluno é o centro do interesse e a aprendizagem tem que ser significativa; G.

Stanley Hall (1844 – 1924) deve-se a ele a popularização do questionário para

explorar o pensamento infantil.

2.2. TEORIA DE GÊNERO

Segundo Gouveia e Camurça (2000), as relações de gênero são iniciadas no

convívio familiar e justificadas afetivamente. Nestas relações, geralmente o homem

tem mais poder que a mulher, de forma que, através da observação a criança já

aprende desde cedo que o pai detém o controle sobre a família. Além disso, existem

ainda normas sociais que, direta ou indiretamente agem como determinantes nos

valores que diferenciam os gêneros. Desse modo, valores masculinos e femininos

3 Filosofia da educação, Maria Lúcia de Arruda Aranha pg.157.

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são impostos pela sociedade atribuindo-lhes funções diferentes. Por isso, para

homens e mulheres não existe uma forma única de ver e viver a vida e, estas várias

formas sofrem modificações no decorrer da história.

É importante salientar que o termo gênero não deve ser confundido com sexo,

pois gênero está relacionado com questões sociais e identitárias, enquanto sexo se

refere aos “aspectos físicos e biológicos, macho e fêmeo”. Mesmo consciente de

que a sexualidade faz parte da natureza humana, pode-se dizer que ela está

intimamente ligada com a forma de como as relações de gênero se organizam na

sociedade. Pois, desde a infância as meninas são instruídas a se comportarem

“adequadamente”, e neste padrão comportamental estão incluídos desde a omissão

de informações sobre sexualidade até a submissão a um futuro marido, que deverá

ser o único homem a conhecer seu corpo. O mesmo não acontece com os garotos

que por sua vez são incentivados desde cedo a se relacionar sexualmente com o

máximo possível de mulheres, antes e depois do casamento e, dessa maneira as

desigualdades de gênero tendem a evoluir. Quando se fala em desigualdade de

gênero, isto inclui desigualdades na divisão de tarefas, de salários e oportunidades.

Assim, o gênero feminino é também nesta relação de desigualdade o ser-objeto, ou

seja, todo aquele numa relação social está numa posição de inferioridade em

relação ao outro.

A política, por exemplo, ainda é um espaço considerado difícil de ser

conquistado pelas mulheres ou por pessoas economicamente desfavorável, porque

elas não foram criadas para falar em público nem tampouco para lutar pelos seus

direitos, mas receberam instruções voltadas para a vida privada. Portanto, “a

timidez, o medo, o nervosismo desses seres-objeto nas atividades políticas (e outras

também) não são um problema de sexo, mas questões de gênero”. (G. & C. p. 26).

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Ao se tratar de gênero é importante considerar fatores sociais e biológicos.

Sociais porque são as normas impostas pela sociedade que determinam o

comportamento masculino e feminino. Biológicos, pois mesmo não sendo um fator

determinante, a biologia influencia diretamente para a criação de normas de gênero.

E que mesmo a mulher, o negro ou pessoas com necessidades educacionais

especiais já tenham conquistado e assumido funções diferentes no transcorrer da

história, ainda hoje existem, em alguns setores de trabalho, desigualdades salariais

e discriminação contra eles, principalmente quando exercem atividades

consideradas pela sociedade como próprias dos sujeitos dominadores.

Conforme o estudo do MEC (2000) sobre a visão histórica no mundo ocidental

há poucos registros no período da Antigüidade sobre as relações sociais com as

pessoas com necessidades educacionais especiais ou que apresentavam

necessidade de cuidados diferenciados, como os idosos doentes, órfãos, loucos,

surdos, dentre outros. A sociedade baseava sua organização sociopolítica em duas

classes: os nobres, que eram minoria, mas detinham o poder absoluto sobre as

decisões sociais, econômicas e políticas e o populacho. Estes eram os

trabalhadores de produção agrícola, pecuária, artesanato e comércio, classe

considerada sub-humana, recebendo as sobras da nobreza. Assim, o homem só era

valorizado se pertencesse à nobreza por qualidades pessoais ou por atender a

algum interesse daquele grupo. Na literatura grega e romana ou mesmo na bíblia as

deficiências eram tratadas como fenômenos metafísicos, castigos ou bênçãos

divinas. No texto bíblico, as referências ao cego, ao manco e ao leproso os

caracterizam como pedintes, excluídos sociais. O mesmo documento (MEC, 2000, p.

8) cita o estudo de Kanner (1964), no qual o deficiente mental aparece em alguns

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registros como o bobo ou o palhaço em situações comemorativas para divertir os

senhores e seus convidados.

Com relação às mulheres, por exemplo, nas primeiras décadas do século XX,

era considerada como objeto, fraca e subordinada ao homem. O que dominava era a

idéia de que à mulher cabia a função de esposa e mãe. Para os homens, as

escolhas eram mais variadas e não era prioridade o casamento e a paternidade.

Eles não tinham que casar virgens, nem tampouco ser fiéis, enquanto que a mulher

tinha uma imagem a preservar, e pelo fato de ser menos esclarecidas e dificilmente

ter acesso à escrita, resignavam-se a condição de mulher comportada por achar que

era o único caminho a seguir. Na verdade, aqueles considerados geneticamente

inferiores sempre estiveram na condição de objeto, porém nas últimas décadas, eles

estão engajados em lutas sociais e vêm aos poucos, conquistando a função de

sujeito buscando igualdade de valor. O que se quer construir e sancionar não é o

direito de ser igual, pois não existem pessoas e seres idênticos, nem física nem

psicologicamente. Na verdade, o que os seres-objeto querem conquistar é o direito

de falar, questionar e ser ouvidos.

Mesmo com os avanços dos direitos conquistados pelas mulheres, ainda são

propagados, mesmo que inconscientemente, os valores machistas de que a mulher

é o sexo frágil e o homem é quem domina, quem sustenta a família. Existe ainda um

número considerável de mulheres que se calam diante de agressões por se

considerarem impotentes, Isto é submissão. Há também, infelizmente, profissões

específicas para homens e para mulheres, mesmo a mulher tendo conquistado o

direito de trabalhar fora, ela ainda continua sendo escrava do lar, como o principal

responsável pela organização da casa e a educação dos filhos. Isso é desigualdade

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de gênero. Portanto, quando se fala em gênero, não existe uma prioridade em

privilegiar este ou aquele.

É importante que nas relações Sujeito X Objeto haja a consciência de que não

existe troca de papeis quando se exige que um tenha seu espaço no setor público e

o outro exerça sua função no privado (lar). Todos os sujeitos envolvidos nas

relações interpessoais devem despir-se de símbolos, valores e normas que

inferiorizam um ou outro, seja por fatores sociais ou biológicos, que vêm sendo

utilizados desde séculos passados e começar a respeitar o outro considerando suas

particularidades, desejos e sonhos e construir uma parceria baseada no respeito,

igualdade e verdade.

2.3. TEORIA DA IDENTIDADE CULTURAL NA PÓS-MODERNIDADE

A teoria de Identidade Cultural na Pós Modernidade, de Stuart Hall aborda a

crise identitária do sujeito pós-moderno. Segundo Hall, as velhas identidades, que

por tanto tempo estabilizaram o mundo social, estão em declínio, fazendo surgir

novas identidades e fragmentando o indivíduo unificado. (2004: p.7). Dentro dessa

abordagem o sujeito pós-moderno é visto como um indivíduo descentrado,

fragmentado e instável, portanto possuidor de uma identidade híbrida.

As constantes transformações pelas quais o mundo contemporâneo vem

passando são responsáveis por essa característica pós-moderna do sujeito. Repleto

de ansiedade e solidão por ser obrigado a assumir comportamentos mecanicistas

diante do progresso desenfreado que o transforma em um ser desterritorializado

passa a pertencer a lugar nenhum, o tempo nenhum, e a amor nenhum.

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Pode-se dizer que há no sujeito surdo traços da pós-modernidade, pois para

muitos ele é um individuo que deve agir em função do outro, incapaz de assumir

atitudes próprias, resignando-se a condição que a sociedade lhe impõe.

O sujeito pós-moderno encontra-se em um “entrelugar”, situando-se num

espaço transitório entre a partida e a chegada, num vazio profundo pelo fato de estar

constantemente em contato com outros sujeitos, de diferentes culturas e

consequentemente com identidades diferentes. Esse múltiplo contato cultural do

indivíduo faz com que ele perca noção de si e dessa forma acabe por se tornar um

estranho para si mesmo.

“Muita gente julga o valor de suas ações não baseada em sua essência e sim na maneira como é recebida. É como se adiasse o próprio juízo até consultar o público. O sujeito passivo, para quem o ato é praticado tem o poder eficaz ou ineficaz em lugar de quem o praticou. Assim tendemos a ser intérpretes na vida, e não pessoas que vivem e agem como selves”. (MAY: 1984, p.50).

O Surdo pode ser visto como um sujeito descentrado, estrangeiro de si mesmo.

Pois, ao longo da história sua imagem foi composta por humilhações, lutas,

conquistas e descobertas que a levaram a uma evolução existencial.

A evolução do sujeito Surdo é perceptível a partir da observação da sua

história. Durante muito tempo, foram discriminados absolutamente incapazes para a

convivência em meio à sociedade, portanto não podia ser educado, e segundo a

igreja católica suas almas não tinham salvação, já que não podiam participar dos

sacramentos. Neste período ele é governado por um membro da família que detém

total poder sobre os seus bens e vontades, ou até mesmo poderia ser condenado à

morte por se considerado um ser sem alma. Assim ele apenas pode se mostrar

resignado a sua condição medíocre de inferioridade e se considerar um sujeito sem

virtudes.

Page 35: Monografia correã§ã£o

A resignação do Surdo é uma máscara usada para disfarçar a fragmentação de

sua identidade, camuflando assim, as diferenças individuais necessárias à existência

do ser. Na realidade, no século XVIII houve uma grande transformação social, e

D’Epée criou uma linguagem de sinais manual denominada “método silencioso”. E

posteriormente, desenvolveu o “método oral”, baseado no emprego da palavra e da

leitura labial, dessa forma surdo também ser transformou e deixou fluir a essência

daquilo que ela realmente sentia ser.

Julia Kristeva em Estrangeiros para nós mesmos analisa o processo de

descentramento do sujeito e afirma que: o estrangeiro, não tem um si e sua

insegurança é levada ao extremo de questionar-se sobre sua própria existência.

(KRISTEVA; 1994, p.16). A afirmativa de Kristeva é confirmada por Stuart Hall

quando ele afirma que o sujeito é capaz de assumir identidades diferentes em

situações diversas, tornando-se assim, um “eu” incoerente. Identificamos essa

capacidade de transformação do sujeito no surdo quando ele mostra-se capaz de

usar uma máscara em cada situação diferente. Atualmente o sujeito surdo é

estudante, professor, instrutor, pai, filho, homem, entre outros. Assim ele mostra que

tem capacidade de desempenhar vários papéis.

A identidade surge mediante as expectativas que o sujeito tem sobre o

pensamento do outro em relação a si mesmo, dessa forma pode-se dizer que o

indivíduo se faz em função do outro. Nesse processo, ocorre uma perda, pois

tentando rejeitar-se e agradar o outro, o ser acaba perdendo sua essência e

tornando-se vazio.

Infelizmente, na vida do surdo é muito comum a auto-rejeição, por exemplo,

existem muitos deles que deixam as salas de aula para cuidar de filhos ou da casa,

por pensarem que são incapazes de aprender os conteúdos ensinados nas escolas

Page 36: Monografia correã§ã£o

ou por se sentirem descriminados por ouvintes no convívio escolar. Geralmente,

quando isso acontece, eles se tornam subordinados a sujeitos que nem sempre

conseguem manter um padrão de vida adequado para as mínimas condições de

sobrevivência moral e social.

É uma característica comum do ser-objeto a dedicação às causas do outro. No

entanto, quando a mulher surda se deixa manipular pelo outro (homem) que a

transforma objeto sexual, ela deixa de ser o sujeito da situação e é reduzida à

condição de animal, percebe-se aí, um descentramento total da sua condição de ser

humano, de forma que já não há certeza da condição do próprio “eu”.

Diante de uma sociedade manipuladora que não aceita a multiplicidade do ser

e tende transformá-lo num ser uno percebemos a existência de um conflito entre a

sociedade e o “eu” o que desencadeia o descentramento racional do surdo, fazendo

com que ele perca o foco de valores sociais. Esse conflito pode culminar ainda na

perda do senso trágico, que segundo May (1984), é simplesmente o reverso da

crença na importância do indivíduo.

A perda do senso trágico acontece quando o surdo percebe-se numa condição

subumana de desemprego, sem o apoio da família, com filhos para criar. Por este

motivo ele passa aceitar as agressões físicas, psicológicas e morais do sujeito

dominador, que deveria protegê-lo e amá-lo. Geralmente ele entrega-se a essas

agressões por sentir-se inferior a achar que não merece desfrutar da felicidade de

ser livre e bem tratado. Muitas vezes chega a desejar a morte para abafar sua dor

ao sentir-se humilhado e rejeitado por uma sociedade preconceituosa e impiedosa.

E característico do sujeito pós moderno o não pertencimento a nenhum lugar, a

nenhum tempo, a nenhum amor. E atualmente observamos isto sujeito que é um ser

transitório, que está sempre correndo a procura de algo que ele próprio desconhece.

Page 37: Monografia correã§ã£o

O surdo que é provedor, pai, profissional, estudante, filho acaba por se tornar

instável física e psicologicamente. E torna-se uma fusão de tudo o que é, e essa

fusão a aniquila.

O fato de o sujeito não ter a noção de si, impede que ele obtenha algum

sucesso em sua relação com o outro, pois tudo começa no “si”; se o individuo não é

capaz de realizar-se consigo mesmo e não tem consciência de sua essência, jamais

poderá realizar-se com o outro, e ser inteiramente verdadeiro.

Todo comportamento humano é baseado naquilo que ele conhece da realidade,

a que Laplantine chama de real, que ele define como sendo "a interpretação que os

homens atribuem à realidade." (1997, p.12). Em seu livro O que é imaginário,

Laplantine identifica o diferencial entre o processo representativo imaginário e o

intelectual: no imaginário é possível criar "uma imagem e uma relação que não são

dadas diretamente na percepção" (1997, p.24).

O imaginário permite assim uma construção que não necessariamente

corresponda em todos os aspectos à realidade, mas que tenha alguma conexão com

ela. A estratégia do imaginário é tão somente deslocar o "estímulo perceptual", ou

seja, a apreensão da realidade de tal maneira a criar "novas relações inexistentes no

real." (Laplantine, 1997, p. 25).

Por ser uma representação simbólica, o imaginário trabalha com construção de

símbolos, que é a atribuição de significados, a idéia representativa de um dado da

realidade. Entretanto, por serem fruto da imaginação, os símbolos construídos pelo

imaginário não exigem comprovação, comparação ou verificação com o real.

Os símbolos evocam também diferentes olhares e entendimentos diversos, pois

mobilizam a subjetividade das emoções. Um mesmo símbolo pode suscitar orgulho

Page 38: Monografia correã§ã£o

em um e desprezo em outro, mas ambos estarão amparados por uma realidade

comum representada.

Na sociedade hodierna temos símbolos que representam o Surdo, de forma

benéfica ou maléfica (pejorativa). O exemplo mais comum pode ser dado pela forma

de comunicação utilizada por ele. Para algumas pessoas os surdos são

simplesmente “mudinhos” que se comunicam usando as mãos de forma “tão

bonitinha” essas palavras geralmente são usadas por aqueles que não se esforçam

realmente para entender as diferenças existentes entre surdos e ouvintes. A imagem

simbólica do Surdo como “coitadinho” está impregnada na sociedade. De forma

subjetiva podemos observar o fato supracitado sempre que paramos conversar com

pessoas que não têm em seu convívio um sujeito surdo.

A personalidade do individuo é formada desde a infância. O imaginário é

composto sempre dessa simbologia que envolve a sociedade dividindo-a. Muitas

vezes, as leis de proteção ao sujeito com necessidades educacionais especiais são

insuficientes para romper com a simbologia no decorrer da História, culminando na

criação de uma imagem deturpada de sua condição de ser-objeto.

2.3.1. IDENTIDADE CULTURAL DO SURDO

O sujeito surdo possui uma forma peculiar de apreender e se identificar com o

meio no qual está inserido. Dessa forma é possível afirmar que a cultura surda esta

intimamente relacionada à identidade Surda, uma vez que cultura é um conjunto de

comportamentos aprendidos de um grupo de pessoas que possuem sua própria

língua, valores, regras de comportamento e tradições.

Page 39: Monografia correã§ã£o

Mas ser uma pessoa surda não equivale a dizer que esta possua identidade

Surda porque sendo a maioria dos surdos, aproximadamente 95%, são filhos de pais

ouvintes, e muitos destes não aprendem a Libras ou não conhecem as Associações

de Surdos ou Comunidades Surdas, podendo tornar-se somente pessoas com

necessidades auditivas especiais.

As pessoas Surdas, que estão politicamente atuando para terem seus direitos

de cidadania e lingüísticos respeitados, fazem uma distinção entre “ser Surdo” e ser

“deficiente auditivo”. Ser Surdo é saber que pode falar com mãos e aprender uma

língua oral-auditiva através dessa, é conviver com pessoas que, em um universo de

barulhos, deparam-se com pessoas que estão percebendo o mundo, principalmente,

pela visão, e isso faz com que elas sejam diferentes e não necessariamente

deficientes.

A diferença está no modo de apreender o mundo, que gera valores,

comportamento comum compartilhado e tradições sócio-interativas, a este modus

vivendi está sendo denominado de Cultura ou Identidade Surda.

Page 40: Monografia correã§ã£o

3. CONCEPÇÕES DE LINGUAGEM NO SISTEMA DE ENSINO DO BRASIL

O estudo de língua portuguesa como disciplina escolar passou a existir no

Brasil a partir das ultimas décadas do século XIX. Contudo somente a partir das

primeiras décadas do século XX é que o professor de língua passa a ser formado

exclusivamente com o objetivo de tornar-se professor de língua portuguesa, até

aquele momento ele é autodidata em língua e formado em outras áreas.

Até a metade do século XVIII no sistema de ensino do Brasil o ensino de língua

acontecia apenas na alfabetização, nas séries seguintes o aluno passava a

aprofundar seus conhecimentos em língua latina, pois se julgava que a língua

materna era adquirida no ambiente extra-escolar, portanto não seria necessário para

o aluno perder tempo em aprender algo de que já tinha conhecimento. Após a

Reforma Pombalina em 1759 torna-se obrigatório o ensino da língua materna nas

escolas portuguesas e brasileiras, no entanto este ensino ainda mantinha

características do ensino do latim no qual se ensinava não a gramática propriamente

dita, mas sim a retórica e a poética.

Os fatores externos e internos da língua foram responsáveis durante muito

tempo por manter no ensino da língua as tradições advindas do latim. Tendo em

vista o fato de essas tradições servirem para que grupos social e economicamente

Page 41: Monografia correã§ã£o

privilegiados se mantivessem como tal, e ainda por que até aquele momento

histórico o único conhecimento que se tinha de língua era obtido por meio da

gramática normativa, da retórica e do latim. Assim a gramática vigorou por muito

tempo como o ensino sobre a língua materna nas escolas tendo com a função

principal levar o aluno ao conhecimento do funcionamento da norma culta.

Durante esse período os professores de português se utilizavam de gramáticas

que não apresentavam características didáticas, estas eram apenas antologias de

autores consagrados. Neste período a concepção que se mantinha sobre a língua

era a de que a mesma funcionava como sistema.

A partir dos anos 50 a concepção de ensino de língua se modifica e a

linguagem passa a ser vista como instrumento de comunicação e como expressão

da cultura brasileira. Na qual o ensino-aprendizagem da gramática e do texto perde

lugar para o desenvolvimento das habilidades de expressão e comunicação do

aluno. Por meio desta concepção busca-se levar o aluno a usar a língua de acordo

com as necessidades estabelecidas.

Dentro desta nova concepção de linguagem surgem os livros didáticos

carregados de exercícios com o objetivo de auxiliar o professor a desenvolver no

aluno a habilidade de linguagem oral em seus usos. De certa forma a presença do

livro didático suscita uma critica sobre o papel do professor, pois tendo ele formação

superior em cursos específicos na área de ensino, por que ele precisa de um escritor

de livro didático para auxiliá-lo em sua profissão? Certamente a resposta está no

fato de que os professores são em sua maioria são originários de grupos sociais

menos letrados e por isso não dominam a nora padrão de forma satisfatória ao

ensino. E que os alunos vão à escola buscando apenas o conhecimento da norma

padrão com o único objetivo de conquistar bons empregos e vagas em boas

Page 42: Monografia correã§ã£o

universidades e não de aprender a se comunica e se expressar tendo em vista que

ele inconscientemente sabe que já possui esta habilidade. Portanto pode se

considerar que as condições do sistema de ensino-aprendizagem não se

modificaram muito dentro desta concepção com relação à concepção anterior.

No final dos anos 80 e início dos anos 90 novas áreas de estudo começam a

surgir como a lingüística e a psicologia da educação que tiveram grande importância

para o surgimento de uma nova concepção de linguagem, a de linguagem como ato

de interação, segundo essa concepção é na linguagem que acontecem as

interações humanas.

Dentro desta nova concepção a linguagem passa a ser vista como enunciação,

discurso e comunicação. Desta forma a análise lingüística passa a considerar as

relações da língua com aqueles que a utilizam e com o contexto, condições

históricas e sociais em que ela é utilizada. Baseada ainda nesta última concepção o

ensino de língua passa a ser percebido como processo de interação autor – texto -

leitor, no qual os sentidos da linguagem oral são produzidos por e para uma situação

especifica de comunicação. O aluno agora é visto como sujeito ativo capaz de

construir suas habilidades e conhecimentos da linguagem em constante integração

com o outro e com a própria língua.

Com base nas novas ciências, lingüísticas e psicológicas, percebe-se que o

aluno é um sujeito autônomo e crítico. Por isso faz-se urgente a formação de

professores conscientes e habilitados, de fato, para o ensino da língua, tendo em

vista que cada vez mais cabe ao professor a função de formar não apenas futuros

profissionais, mas sim cidadãos críticos e conhecedores de sua importância para a

melhoria do sistema social vigente.

Page 43: Monografia correã§ã£o

3.1. CULTURA E IDENTIDADE NA AQUISIÇÃO DA LINGUAGEM DO SURDO

Quando um professor se vê diante se um aluno surdo, certamente, se faz

vários questionamentos, tendo em vista o fato de que o processo de aquisição da

linguagem desse aluno ser diferente dos demais. Além disso, os pontos de vista

sobre a surdez variam de acordo com as diferentes épocas e os grupos sociais no

qual são produzidos.

A história de educação de surdos é repleta de controvérsias e

descontinuidades. Como qualquer outro grupo minoritário, os surdos constituíram-se

objeto de discriminação em relação à maioria ouvinte.

Estudiosos, surdos e professores ouvintes, ao longo do tempo vêm divergindo

quanto ao método mais indicado para ser adotado no ensino de surdos. Uns

acreditam que deveriam priorizar a língua falada, outros a língua de sinais e outros,

ainda, o método combinado. No entanto, propor um modelo educacional para os

surdos implica uma visão particularizada da concepção do ser surdo.

Com esse princípio temos duas correntes bem distintas: a surdez na concepção

clínico-terapêutica e a surdez na perspectiva pedagógica e social

3.1.1. SER SURDO PARA A MEDICINA

Para a medicina a surdez é uma diminuição ou perda da capacidade normal

auditiva, que traz ao indivíduo uma série de conseqüências ao seu desenvolvimento,

principalmente no que diz respeito à linguagem oral. Desse modo, surdo é o

Page 44: Monografia correã§ã£o

indivíduo cuja audição não é funcional na vida comum e, parcialmente surdo, aquele

cuja audição, ainda que deficiente, é funcional.

A competência auditiva é classificada como: normal, leve, moderada, severa e

profunda. A surdez severa ou profunda impede que o aluno adquira naturalmente, a

linguagem oral. Devido a esse fato os indivíduos surdos podem apresentar um

atraso intelectual de dois a cinco anos, dificuldades de abstração, generalização,

raciocínio lógico, simbolização, entre outros.

Essa incapacidade de se comunicar, da mesma forma que as demais pessoas,

atua de modo significativo em sua personalidade, fazendo com que manifeste

tendências de introspecção, imaturidade emocional, rigidez de juízos e opiniões,

prejudicando o desenvolvimento do sujeito em sua globalidade.

Afim de que estes problemas sejam evitados é aconselhável que a criança

surda seja encaminhada o mais cedo possível a uma escola especializada, para que

possa receber estimulação auditiva e oral adequada, adquirindo um

desenvolvimento próximo aos padrões de normalidade.

O domínio da linguagem oral permite a plena integração do individuo na

sociedade, uma vez que essa é a forma usual de comunicação entre as pessoas. No

entanto, quando o desenvolvimento do processo ensino-aprendizagem está

subordinado ao aprendizado da linguagem oral há uma exclusão do sujeito surdo

desse processo.

Contudo essa concepção de surdez foi e ainda é dominante no sistema de

ensino atual o que trouxe a prevalência de um modelo de educação que visava à

cura ou a reabilitação do surdo. Pois, supunha-se que ao oralizar o surdo, sua

alfabetização (leitura e escrita) ocorreria de forma mais natural e próxima ao modelo

apresentado pelas demais pessoas, favorecendo sua integração social.

Page 45: Monografia correã§ã£o

Desse modo os objetivos da educação dos surdos reduziam-se a práticas

corretivas e de estimulação oral-auditiva, em um encaminhamento metodológico que

se convencionou chamar de oralismo.

Infelizmente, o sucesso desse modelo vai além das limitações naturais da

surdez, exige uma estrutura familiar envolvida com o processo e sistema público de

saúde e educação acessível, o que chega a ser praticamente impossível.

3.1.2. O SURDO E AS CORRENTES PEDAGÓGICAS

Ser surdo é uma experiência visual que traz aos sujeitos a possibilidade de

constituir sua subjetividade por meio de experiências congnitivo-linguísticas

diversas, mediadas por formas alternativas de comunicação simbólica, que

encontram na língua de sinais, seu principal meio de concretização. A realidade

heterogênea e multifacetada de cada sujeito surdo o torna único, pois sua identidade

se constituirá a depender das experiências socioculturais que compartilhou ao longo

de sua vida.

No que diz respeito ao processo de aquisição de conhecimento escolar os

surdos têm direito a uma educação bilíngüe, pois essa prioriza a LIBRAS como

língua natural e, portanto a primeira, bem como o aprendizado da língua portuguesa,

segunda língua, facilitando sua integração com o meio social no qual está inserido.

Além disso, o desenvolvimento de uma educação bilíngue de qualidade é

fundamental ao exercício de cidadania do sujeito surdo, tendo em vista que o acesso

aos conteúdos curriculares, leitura e escrita não dependerá do domínio da oralidade.

Por esse motivo, a língua portuguesa precisa ser viabilizada: Enquanto linguagem

Page 46: Monografia correã§ã£o

dialógica/ funcional/ instrumental e enquanto área do conhecimento (disciplina

curricular).

A presença de educadores surdos é imprescindível no processo educacional,

pois atuam como modelos de identificação lingüístico-cultural e exercem funções e

papéis significativos dentro desse processo. São muitas as pesquisas que

demonstram que crianças surdas expostas desde cedo à língua de sinais

apresentam melhores resultados acadêmicos.

Atualmente, a Lingüística da Língua de Sinais é uma disciplina em expansão no

mundo todo e suas pesquisas demonstram a importância dessa língua na

constituição identitária do sujeito surdo.

Page 47: Monografia correã§ã£o

4. LEIS SOBRE EQUALIZAÇÃO DE OPORTUNIDADES PARA PESSOAS COM

DEFICIÊNCIAS

4.1. LEI Nº 9394/96 – LEI DE DIRETRIZES E BASES DA EDUCAÇÃO NACIONAL

– 1996

LEI Nº 9.394 de 20 de dezembro de 1996

Capítulo V

Da educação especial

Art. 58. Entende-se por educação especial, para os efeitos desta Lei, a

modalidade de educação escolar, oferecida preferencialmente na rede regular de

ensino, para educandos portadores de necessidades especiais.

§1º Haverá, quando necessário, serviços de apoio especializado, na escola

regular, para atender as peculiaridades da clientela de educação especial.

§2º O atendimento educacional será feito em classes, escolas ou serviços

especializados, sempre que, em função das condições específicas dos alunos, não

for possível a sua integração nas classes comuns do ensino regular.

Page 48: Monografia correã§ã£o

§3º A oferta da educação especial, dever constitucional do Estado, tem início

na faixa etária de zero a seis anos, durante a educação infantil.

Art. 59. Os sistemas de ensino assegurarão aos educandos com necessidades

especiais:

I – currículos, métodos, técnicas, recursos educativos e organização

específicos para atender às suas necessidades;

II – terminalidade específica para aqueles que não puderem atingir o nível

exigido para a conclusão do ensino fundamental, em virtude de suas deficiências, e

aceleração para concluir em menor tempo o programa escolar para os

superdotados;

III – professores com especialização adequada em nível médio ou superior,

para atendimento especializado, bem como professores do ensino regular

capacitados para a integração desses educandos nas classes comuns;

IV – educação especial para o trabalho, visando a sua efetiva integração na

vida em sociedade, inclusive condições adequadas para os que não revelarem

capacidade de inserção no trabalho competitivo, mediante articulação com os

órgãos oficiais afins, bem como para aqueles que apresentam uma habilidade

superior nas áreas artística, intelectual ou psicomotora;

V – acesso igualitário aos benefícios dos programas sociais suplementares

disponíveis para o respectivo nível do ensino regular.

Art. 60. Os órgãos normativos dos sistemas de ensino estabelecerão critérios

de caracterização das instituições privadas sem fins lucrativos, especializadas e com

atuação exclusiva em educação especial, para fins de apoio técnico e financeiro pelo

Poder público.

Page 49: Monografia correã§ã£o

Parágrafo único. O poder Público adotará, como alternativa preferencial, a

ampliação do atendimento aos educandos com necessidades especiais na própria

rede pública regular de ensino, independentemente do apoio às instituições

previstas neste artigo.

4.2. LEI N.º 10.436 DE 24 DE ABRIL DE 2002

Dispõe sobre a Língua Brasileira de Sinais - Libras e dá outras providências.

O presidente da república

Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

Art. 1º É reconhecida como meio legal de comunicação e expressão a Língua

Brasileira de Sinais - Libras e outros recursos de expressão a ela associados.

Parágrafo único. Entende-se como Língua Brasileira de Sinais - Libras a forma

de comunicação e expressão, em que o sistema lingüístico de natureza visual-

motora, com estrutura gramatical própria, constituem um sistema lingüístico de

transmissão de idéias e fatos, oriundos de comunidades de pessoas surdas do

Brasil.

Art. 2º Deve ser garantido, por parte do poder público em geral e empresas

concessionárias de serviços públicos, formas institucionalizadas de apoiar o uso e

difusão da Língua Brasileira de Sinais - Libras como meio de comunicação objetiva e

de utilização corrente das comunidades surdas do Brasil.

Art. 3º As instituições públicas e empresas concessionárias de serviços

públicos de assistência à saúde devem garantir atendimento e tratamento adequado

aos portadores de deficiência auditiva, de acordo com as normas legais em vigor.

Page 50: Monografia correã§ã£o

Art. 4º O sistema educacional federal e os sistemas educacionais estaduais,

municipais e do Distrito Federal devem garantir a inclusão nos cursos de formação

de Educação Especial, de Fonoaudiologia e de Magistério, em seus níveis médio e

superior, do ensino da Língua Brasileira de Sinais - Libras, como parte integrante

dos Parâmetros Curriculares Nacionais - PCNs, conforme legislação vigente.

Parágrafo único. A Língua Brasileira de Sinais - Libras não poderá substituir a

modalidade escrita da língua portuguesa.

Art. 5º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Brasília, 24 de abril de 2002; 181º da Independência e 114º da República. Fernando Henrique Cardoso Paulo Renato Souza

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5. ANÁLISE DAS RESPOSTAS DO QUESTIONÁRIO

A fim de analisar, de fato, a construção da identidade cultural do aluno Surdo

que freqüenta a escola Neutel Maia e o seu olhar, sobre si mesmo enquanto ser

social, em meio a uma sociedade preconceituosa. Além de buscar a confirmação ou

a negação do problema levantado no início do presente trabalho, coletaram-se

dados na referida escola e os resultados alcançados na pesquisa foram comparados

aos pensamentos dos autores estudados e apresentados com precisão. A partir da

análise do corpus, foi feita a comparação entre as informações obtidas com os

Surdos para saber se os dados revelam, realmente, a identidade cultural e a

condição social desse sujeito. Além disso, foi feita a observação dos sujeitos

entrevistados durante o seu convívio escolar.

O público entrevistado é formado por alunos do 7º e 9º anos do ensino

fundamental da escola alvo. Dentre eles há duas meninas, uma do 7º ano e outra

do 9º, e seis meninos, três no 7° e três no 9º ano, todos com idade entre 15 e 20

anos. Dessa maneira temos 100% do público de Surdos. Os questionários

realizados tiveram perguntas diferentes e fechadas.

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5.1. ANÁLISE DAS RESPOSTAS DO QUESTIONÁRIO DIRIGIDO PARA ALUNOS

SURDOS

Questão 1

Diante da primeira pergunta dirigida para o público Surdo, Se você pudesse

escolher, estudaria em uma escola inclusiva ou no CEES? 100% dos entrevistados

respondeu que prefere a escola inclusiva. Essa resposta é a demonstração de que

realmente a identidade surge mediante as expectativas que o sujeito tem sobre o

pensamento do outro em relação a si mesmo, pode-se dizer que o indivíduo se faz

em função do outro. Sendo assim é importante para o aluno surdo está próximo do

ouvinte para entender melhor o “mundo ouvinte” e perceber como ele visto pelos

sujeitos que pertencem a esse mundo “diferente”.

Questão 2

Ao perguntamos: Se o seu professor soubesse Libras, você acha que o

compreenderia melhor? 100% dos entrevistados revelaram que certamente

aprenderiam bem mais sem intermediários. Quando comparamos as respostas

apresentadas neste item às do item anterior temos o reforço de que a idéia

defendida por Stuart Hall de que o sujeito é capaz de assumir identidades diferentes

em situações diversas, tornando-se assim, um “eu” incoerente. Pois percebemos a

incoerência do sujeito Surdo quando afirmam preferir estudar em uma escola

inclusiva, mas ao mesmo tempo consideram que seria melhor se tivessem

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professores que se comunicassem com eles em LIBRAS – Língua Brasileira de

Sinais, o que só ocorre em escolas especiais para Surdos.

Questão 3

Quando perguntamos o que os alunos pensavam sobre a preocupação por

parte do professor para com o aluno Surdo na sala de aula 50% deles acredita que

sim, os professores se preocupam com o aprendizado do Surdo. Na verdade isso

reforça a ideia de que o Surdo é um sujeito capaz de ser crítico assim como

qualquer ouvinte pode ser, quando bem orientado desde a infância são capazes de

perceber se as pessoas com as quais se relacionam realmente estão envolvidos

com o seu bem ou se apenas estão interessados em usá-los socialmente.

Questão 4

Você acredita que teria mais amigos na escola se fosse ouvinte? No momento

em que metade dos entrevistados, de ambos os sexos, responderam que teriam

mais amigos se fossem ouvintes, observamos que pelo menos 50% dos sujeitos

Surdos são conscientes de que sua forma “diferente” de perceber o mundo e de se

relacionar como outro dificulta a relação deles com os outros alunos da escola.

Tanto essa as respostas desta questão quanto as do item anterior os coloca em um

“entrelugar” situando-os num espaço transitório entre a partida e a chegada, num

vazio profundo pelo fato de estar constantemente em contato com outros sujeitos, de

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diferentes culturas e consequentemente com identidades diferentes. Esse múltiplo

contato cultural do indivíduo faz com que ele perca noção de si e dessa forma acabe

por se tornar um estranho para si mesmo.

Questão 5

Ao perguntarmos se na escola existe preconceito dos ouvintes em relação aos

Surdos? Observou-se que a maioria dos meninos entrevistados (66%) acredita que

há preconceito dos ouvintes em relação aos surdos. E apenas 34% dos

entrevistados já superaram esta barreira, pois não vêem preconceito nos ouvintes

em relação a eles. Quanto às meninas metade delas acredita que sim. Muitos

Surdos se sentem vítimas de preconceitos na escola Neutel Maia. Isso fica bem

mais evidente entres os alunos que têm maior potencial crítico e, por isso, observam

o que acontece ao seu redor, porém devemos ter em mente que eles estão em uma

fase da vida em que todas as relações e sentimentos se sobressaem e ganham

dimensões gigantescas. Dessa forma, há a possibilidade que ao se sentirem

contrariados atribuam isso a uma possível rejeição a sua condição de Surdo.

Questão 6

Nesse item a pergunta foi: Você acha que o aluno ouvinte se comunica com

você só por curiosidade ou porque realmente quer ser seu amigo? 100% dos alunos

surdos acreditam que quando os ouvintes resolvem se comunicar com eles é porque

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realmente desejam ser amigos deles esse item mostra a necessidade de o sujeito

acreditar que o outro

Questão 7

Neste item a pergunta foi: Você se acha inferior ao ouvinte com relação ao

aprendizado? Quanto às respostas houve um equilíbrio, pois 50% responderam que

sim e 50% que não. Novamente vemos sujeitos cuja identidade mostra-se

fragmentada, pois pelo menos metade dos entrevistados tem consciência de que na

escola Neutel Maia seu aprendizado é inferior ao dos ouvintes, no entanto insistem

em permanecer estudando naquela escola.

Questão 8

Na hora do recreio, você se comunica com os alunos ouvintes ou só com os

Surdos? Aqui, 100% das meninas entrevistadas, na hora do recreio, só se

comunicam com os alunos surdos, enquanto os meninos, 17% se comunicam com

ouvintes e 83% se comunicam somente com os alunos surdos. Neste item, pode se

observar que o Surdo realmente se encontra em um “entrelugar” entre a comunidade

Surda e a ouvinte. A maioria deles não tem boa comunicação com o ouvinte, e

mesmo assim, sendo a minoria numa sociedade oral – auditiva, ainda insiste em

participar de uma comunidade que não é a sua, mas que infelizmente comanda e

rege todas as leis, sejam elas voltadas para o ouvinte ou para o Surdo. Isso

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acontece porque eles ainda não têm, de fato, sua identidade formada e se

relacionam com um mundo múltiplo e preconceituoso.

5.2. QUESTIONÁRIO PARA ALUNOS OUVINTES E ANÁLISE DAS RESPOSTAS

Questão 1

Ao questionarmos os alunos ouvintes se eles acreditam que ter Surdos e

ouvintes na mesma sala atrapalha o aprendizado do aluno ouvinte 100% dos

entrevistados acreditam que estudar com surdos na mesma sala de aula não causa

nenhum prejuízo em seu aprendizado, mostrando que o ouvinte não tem problema

em estudar com o surdo.

Questão 2

Nesta questão, Se a escola oferecesse um curso de Libras você faria? Fica

claro o interesse dos alunos ouvintes em estabelecerem comunicação como os

Surdos, tendo em vista que 90% dos entrevistados responderam que SIM.

Questão 3

Page 57: Monografia correã§ã£o

Todos os alunos responderam que SIM ao serem questionados se

concordavam que o aluno Surdo deve frequentar a escola regular de ensino normal.

Isso prova que os ouvintes não têm preconceito contra os Surdos.

Questão 4

Neste item perguntou-se: Quando você faz uma pergunta para um Surdo é

porque você realmente quer aprender a Libras para ser amigo dele ou para apenas

matar a curiosidade? Como resposta 90% das meninas e 70% dos meninos

responderam que buscam aprender a Libras para ser amigo dos surdos. Assim

percebe-se que apesar de serem maioria lingüística e representarem o gênero

masculino, ou seja, o dominador na sociedade o ouvinte tentar manter a

comunicação com o Surdo mostrando que não discrimina o outro por achá-lo

diferente ou anormal.

Questão 5

A questão anterior é reforçada quando perguntamos se o aluno ouvinte vê um

Surdo como uma pessoa igual a ele ou como um “deficiente”, todos os entrevistados

responderam que o surdo é uma pessoa igual a eles. Com isso, comprovamos que

não há preconceito do ouvinte em relação ao surdo, uma vez que aquele é

consciente que o esse é um ser humano como qualquer outro e que se difere

apenas pelo modo de perceber o mundo ao seu redor.

Page 58: Monografia correã§ã£o

Questão 6

Neste item a pergunta foi: A maioria dos seus amigos tenta se comunicar com

os Surdos ou evita essa aproximação? E de acordo com as reposta 90% dos

entrevistados responderam que seus amigos tentam se aproximar dos Surdos

mostrando que realmente há um interesse do ouvinte pela amizade com o outro sem

se importar com as diferenças existentes entre eles.

Page 59: Monografia correã§ã£o

6. CONCLUSÃO

No espaço escolar é comum a existência de sujeitos com identidades e culturas

diferentes. Essa realidade não é diferente na escola Neutel Maia, voltada para o

ensino fundamental, ela é considerada escola inclusiva, dessa forma agrega em seu

quadro de alunos 8 Surdos adolescentes em processo de formação identitária.

Esses alunos passam por conflitos consigo mesmo e com a sociedade ouvinte,

vivem um choque com um mundo diferente, que é maioria e percebe o “mundo" por

meio da audição e se comunica usando a fala – enquanto o Surdo percebe o mesmo

“mundo” por meio da visão e se comunica por meio de sinais.

Dentro desse universo ouvinte o Surdo é obrigado a controlar seus impulsos,

reprimir a própria felicidade em prol das aparências, uma vez que é consciente de

que para seu crescimento, enquanto estudante, o melhor seria frequentar uma

escolar de ensino especial, que buscasse suprir, de fato, suas necessidades. No

entanto ele prefere participar de um ambiente que não contempla suas

necessidades e que os obriga a viver na opulência, repleto de ansiedade e solidão

por ser obrigado a assumir comportamentos mecanicistas diante de uma

comunidade cultural que o transforma em um ser desterritorializado.

Page 60: Monografia correã§ã£o

Durante a pesquisa percebeu-se que o conhecimento acerca de seus direitos e

deveres, leva o sujeito Surdo a exigir querer estar em um ambiente multicultural,

mesmo que não se sinta totalmente inserido nele, visando tornar-se um sujeito livre

de preconceitos, de estereótipos e capaz de defender-se da violência. No que diz

respeito ao Surdo que freqüenta a escola Neutel Maia essa realidade se agrava,

pois os mesmos pertencem a uma minoria social que ao longo da história sofreu

muito com o preconceito e o desrespeito por parte daqueles que se consideram

seres perfeitos e superiores e esse sofrimento ainda está inserido na identidade

cultural desse sujeito. Levando-o a acreditar que o outro tem preconceito contra ele,

o que durante a entrevista verificou-se ser um engano, pois o ouvinte revelou grande

interesse em se comunicar com o Surdo além de demonstrar respeito pela diferença

cultural do outro. Sendo assim verificamos que na realidade não há, na escola

Neutel Maia, preconceito social, rejeição ou violência por parte do gênero dominador

– ouvinte – contra o gênero dominado – Surdo. Porém, infelizmente a comunicação

entre os gêneros analisados na escola é muito frágil, tendo em vista que o dominado

se sente vítima de preconceito e inferiorizado pelo outro, o que pode ser

considerado fruto da imaginação de um sujeito possuidor de uma identidade

fragmentada e inacabada.

Page 61: Monografia correã§ã£o

7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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