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IAESB – INSTITUTO AVANÇADO DE ENSINO SUPERIOR DE BARREIRAS
FACULDADE SÃO FRANCISCO DE BARREIRAS
IDAAM – AC – ATIVIDADES EDUCACIONAIS
LIBRAS – LÍNGUA BRASILEIRA DE SINAIS
KATIÚCIA CRISPIM DE OLIVEIRA
A FORMAÇÃO DA IDENTIDADE CULTURAL NO PROCESSO DE INCLUSÃO
ESCOLAR DO SUJEITO SURDO QUE FREQÜENTA A ESCOLA NEUTEL MAIA
SOB A PERSPECTIVA DA TEORIA DE GÊNERO
Rio Branco - AC
2010
KATIÚCIA CRISPIM DE OLIVEIRA
A FORMAÇÃO DA IDENTIDADE CULTURAL NO PROCESSO DE INCLUSÃO
ESCOLAR DO SUJEITO SURDO QUE FREQÜENTA A ESCOLA NEUTEL MAIA
SOB A PERSPECTIVA DA TEORIA DE GÊNERO
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de pós-graduação em Libras da Faculdade São Francisco de Barreiras, como requisito parcial para obtenção do título em Curso Lato Sensu.Orientador: ................................................
Rio Branco - AC
2010
RESUMO
A escola constitui um grupo social no qual o sujeito é inserido logo na infância e tem suas primeiras experiências e relacionamentos interpessoais com sujeitos de culturas e identidades diferentes. É nela que se iniciam as relações sociais e onde os indivíduos organizam conceitos e buscam maturidade por meio de trocas e, assim formam a sua própria identidade, a partir da convivência com o outro. Como a família, a escola é responsável por futuros comportamentos no meio social, permitindo ou não adaptações, contribuindo para que a criança tenha relacionamentos e aprendizagens mais humanas, forme uma Identidade única e desenvolva a sua auto-imagem. Ao descobrir a surdez em uma criança, a família toma um choque, se desespera, surge a angustia devido à falta de comunicação com uma “pessoa diferente”. Esse Choque não é diferente no âmbito escolar, Pois ao deparar-se com um aluno Surdo, geralmente o primeiro impulso que essa comunidade tem é o de rejeição, sentimento que causa, no sujeito angustias e sofrimentos que podem ser irreversíveis, mesmo ao longo do tempo. Dessa forma é importante a realização de pesquisas para identificar a situação identitária vivida pelo Surdo com o objetivo de revelar à humanidade que a crise identitária do sujeito adolescente não é um discurso exclusivo do ouvinte. Pois também essa crise influência diretamente no comportamento do educando Surdo, uma vez que este é um ser humano como qualquer outro e que se diferencia dos demais apenas pelo fato de captar as informações que o mundo lhe transmite de um modo diferente, o gesto-visual e não o oral-auditivo.
PALAVRAS-CHAVE: Surdo, inclusão escolar, identidade, gênero
ABSTRACT
The school forms a social group in which the person is inserted soon during the childhood and has his first interpersonal experiences and relationships with people from different cultures and identities. It’s there where social relations start and where people organize concepts and look for maturity by the exchanges and so they form their own identity, from the close contact with others. Like the family, the school is responsible for future kinds of behavior in the social environment, permitting or not adaptations, helping the child to maintain relationships and more human apprenticeship, to form a unique identity and develop his self-image. Discovering the deafness in a child, the family gets shocked and desperate; the anguish comes due to the lack of communication with a “different person”. This shock is not different in the school range, because when the school community comes across a deaf student; its first impulse is the rejection, generally. No doubt, this feeling causes anguish and suffering to this kind of student, and these feelings can be irreversible, even after a long period of time. This way, it’s important the creation of researches to identify the identity crisis for the which the deaf student goes through, whose the goal is to reveal to the mankind that this crisis, which is of a teenager, is not an exclusive discuss of the listener. For this crisis also influences directly in the deaf student behavior, since this is a human being as any other and that is different from the others just by the fact of capture the information which the world transmits to him in an unusual way, the gesture – the visual one not the oral one.
Key words: deaf, social inclusion, identity, type
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO....................................................................................................6
2. TEORIAS EXPLICATIVAS DAS RELAÇÕES ENTRE SUJEITOS...................10
2.1. PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO......................................................................11
2.2. TEORIA DE GÊNERO.....................................................................................15
2.3. TEORIA DA IDENTIDADE CULTURAL NA PÓS-MODERNIDADE...............19
2.3.1. IDENTIDADE CULTURAL DO SURDO........................................................24
3. CONCEPÇÕES DE LINGUAGEM NO SISTEMA DE ENSINO DO BRASIL.............................................................................................................26
3.1. CULTURA E IDENTIDADE NA AQUISIÇÃO DA LINGUAGEM DO SURDO.............................................................................................................29
3.1.1. SER SURDO PARA A MEDICINA................................................................29
3.1.2. O SURDO E AS CORRENTES PEDAGÓGICAS.........................................31
4. LEIS SOBRE EQUALIZAÇÃO DE OPORTUNIDADES PARA
PESSOAS COM DEFICIÊNCIAS............................................................................33
4.1. LEI Nº 9394/96 – LEI DE DIRETRIZES E BASES DA EDUCAÇÃO NACIONAL – 1996..................................................................................................33
4.2. LEI N.º 10.436 DE 24 DE ABRIL DE 2002......................................................35
5. ANÁLISE DAS RESPOSTAS DO QUESTIONÁRIO.........................................37
5.1. ANÁLISE DAS RESPOSTAS DO QUESTIONÁRIO DIRIGIDO PARA ALUNOS SURDOS......................................................................................38
5.2. QUESTIONÁRIO PARA ALUNOS OUVINTES E ANÁLISE DAS RESPOSTAS..................................................................................................42
6. CONCLUSÃO.....................................................................................................45
7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS...................................................................47
1. INTRODUÇÃO
A escola Neutel Maia é um espaço que atende a crianças e jovens de uma
comunidade carente e, em sua maioria, o público da escola não tem condições de
freqüentar um espaço cultural que valorize seus talentos e seus conhecimentos.
Grande parte desses alunos se encontra na fase caracterizada como
adolescência, na qual o jovem está em processo de formação de identidade,
passando por conflitos consigo mesmo e com a sociedade; essa mesma sociedade
que oprime e discrimina o sujeito de acordo com sua raça, cor e posição social, ou
necessidades especiais. Durante a adolescência, idade em que o caráter esta sendo
formado, é necessária uma abordagem que possibilite ao sujeito uma visão crítica e
uma postura diferenciada ante as imposições sociais.
De acordo com os direitos humanos, da criança e o do adolescente não pode
haver dominadores nem dominados, pessoas que vivam na opulência e pessoas
condenadas a “viver” na miséria e na marginalidade, luta-se por um mundo largo e
aberto, sem fronteiras nem cercas, cimentado sobre o amor e justiça, sobre o
respeito à vida e ao direito. Um mundo em que a solidariedade fraterna e a justiça
triunfem sobre toda forma de dominação. Dessa forma, cabe-nos proporcionar-lhes
o conhecimento pleno acerca de seus direitos e deveres, visando contribuir para a
formação de um sujeito livre de preconceitos, de estereótipos e capaz de defender-
se da violência (não praticá-la e não sofrê-la).
Quando nos referimos ao aluno surdo essa realidade se agrava, pois os
mesmos pertencem a uma minoria social que ao longo da história tem sofrido muito
com o preconceito e o desrespeito por parte daqueles que se consideram seres
perfeitos e superiores simplesmente por não sofrerem com nenhuma deficiência
física ou mental.
O tema inclusão social e cultural de pessoas com deficiências tem se tornado
cada vez mais discutido, principalmente no sistema de ensino público. Uma escola
que, verdadeiramente, se preocupe com o ensino e reabilitação das pessoas com
deficiência deve promover no centro escolar, e durante os seus planejamentos,
condições reais para a efetiva participação do aluno nas atividades escolares, pois é
certo que a integração social do sujeito começa na escola.
Partindo do princípio de que a educação inclusiva é um campo de
conhecimento e que enquanto modalidade transversal de ensino perpassa todos os
níveis, etapas e modalidades que realiza atendimento educacional especializado
disponibilizando um conjunto de serviços, recursos e estratégias específicas que
favorecem o processo de escolarização dos alunos com necessidades educacionais
especiais, transtorno globais do desenvolvimento e altas habilidades nas turmas
comuns do ensino regular e a sua interação no contexto educacional, familiar, social
e cultural o foco do presente trabalho é o sujeito que dela necessita e que freqüenta
a escola Neutel Maia.
Assim, no intuito de contribuir para um melhor entendimento do sujeito o
presente trabalho tem como objetivo geral analisar a condição social vivida pelo
aluno surdo que freqüenta a referida escola observando a construção da sua
identidade cultural e o seu olhar, sobre si mesmo enquanto ser social, em meio a
uma sociedade preconceituosa. Além de promover reflexões sobre os papéis sociais
destinados ao surdo difundindo imagens não-discriminatórias e não-estereotipadas
destes, proporcionando-lhes atividades que elevem a auto-estima e um espaço no
qual eles discutirão, sobre os direitos adquiridos por eles a partir do século XX,
avaliarão as relações de gêneros, a cultura machista e a violência social, revisando
valores e promovendo o diálogo e a negociação nas relações.
Toda a análise apresentada neste trabalho está relacionada à seguinte
indagação que norteia nosso problema de pesquisa: Qual o porquê da
discriminação social vivida por alunos surdos na escola Neutel Maia?
Esta análise é relevante e justifica-se pelas constantes transformações que
mundo contemporâneo tem sofrido, responsáveis pelas características pós-
modernas do sujeito, repleto de ansiedade e solidão, obrigado a assumir
comportamentos mecanicistas diante do progresso desenfreado que o transforma
em um ser desterritorializado que passa a pertencer a um entrelugar.
Este estudo compromete-se a verificar a hipótese de que o surdo encontrará
dentro da escola Neutel Maia o preconceito social e a mesma rejeição do mundo lá
fora sendo vítimas de violência ou algum tipo de exploração por parte do gênero
masculino, aquele que domina a sociedade, e ainda de que o processo de
comunicação entre ele e os ouvintes nos momentos e interação social e frágil ou
inexistente.
Em termos metodológicos o trabalho de pesquisa baseou-se na reunião e
análise de uma parte da vasta bibliografia sobre os assuntos abordados ao longo do
texto, além disso, utilizou-se de pesquisas que abordavam o tema estudado,
prevalecendo uma estratégia de investigação baseada no método de pesquisa
quantitativa, pois se pretende traduzir em resultados estatísticos as informações
obtidas durante a apresentação do mesmo. Classifica-se também como estudo de
caso, visto que será realizado um estudo profundo para atingir um amplo e
detalhado conhecimento sobre os objetivos que se pretende atingir.
A respeito dos objetivos, o estudo classifica-se como pesquisa descritiva, uma
vez que tem como objetivo essencial à descrição das características da população
em estudo, com a finalidade de gerar resultados que possam ser utilizados de forma
prática e subjetiva pela coordenação da referida escola. A população deste projeto
engloba os alunos surdos que freqüentam a escola Neutel Maia. Tomando como
base esta população e perante a facilidade de encontrá-los, delimitou-se a amostra
através da seleção de cem por cento (100%) do público mencionados.
Com a finalidade de alcançar o objetivo proposto, este trabalho se apresenta
estruturado em quatro capítulos, além da introdução e considerações finais do
estudo. O primeiro capítulo apresenta aos leitores uma breve revisão sobre a
abordagem teórica dos principais estudos que tratam sobre o tema da identidade
cultural do sujeito e o gênero a que ele pertence.
O segundo capítulo faz um breve relato sobre o que é cultura e identidade
surda. Após, faz-se uma análise da evolução da comunidade surda ao longo dos
anos no Brasil.
O terceiro capítulo destaca as Leis que regem as regras padrões sobre
equalização de oportunidades para pessoas com deficiências.
Finalmente, no quarto capítulo é apresentada uma análise detalhada dos dados
obtidos por meio da pesquisa realizada com o público alvo do presente trabalho.
3. TEORIAS EXPLICATIVAS DAS RELAÇÕES ENTRE SUJEITOS
Na atualidade o conceito de identidade cultural esta sendo bastante discutido
pelas mais diversas áreas de estudo como, por exemplo, antropologia, sociologia,
história e literatura, os estudiosos dessas várias ciências sociais tem como objetivo
conhecer e interpretar as mudanças ocorridas nas sociedades por meio de
interações sócio comunicativas entre culturas diversas. Devido ao grande interesse
no estudo da identidade dos mais variados povos, fez-se um levantamento de
informações acerca da formação identitária do Surdo objetivando primeiramente a
representação da sua identidade.
Nas relações sociais modernas um ser sempre aparece como objeto e outro
como sujeito. Nas sociedades pós-coloniais o sujeito e o objeto pertencem a uma
hierarquia em que o oprimido é fixado pela superioridade do moral do dominador.
Assim, por meio da compreensão do ser-objeto deve-se compreender a existência
de um ser sujeito. Críticos tentam expor os processos que transformam o colonizado
numa pessoa muda e suas estratégias para sair dessa posição, para eles o
colonizado fala quando se conscientiza politicamente e é capaz de enfrentar seu
opressor antagonicamente. O sujeito é alguém que tem muitas facetas, o eu e outro.
A procura desse eu composto é a nova identidade pós-colonial. A violência (o
desmembramento do sujeito) é seguida pela fragmentação e pela reconstrução do
vazio a partir do qual as culturas são liberadas da dialética destrutiva da história.
As relações entre colonialismo e feminino envolvem em primeiro lugar a
possível analogia entre patriarcalismo/feminismo e metrópole /colônia na qual a
mulher é comparada à colônia e o homem é comparado à metrópole. E ainda é
possível perceber que se no sistema colonial o homem é colonizado a mulher é
duplamente colonizada.
Desse modo, ao longo dos estudos observa-se, ainda, a construção do sujeito
como ser social em meio a uma sociedade preconceituosa, abordando os diversos
tipos de violência: psicológica, moral, física e patrimonial sob a luz da teoria de
Gêneros, na versão de Tarciana Gouveia e Silvia Camurça (2000), em O Que é
Gênero. Partindo do princípio de que gênero não está relacionado com questões
biológicas, mas com as relações sociais estabelecidas entre homens e mulheres,
mulheres e mulheres, homens e homens criando assim, relações de poder, onde um
indivíduo exerce domínio sobre o outro.
3.1. PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO
Nos primórdios, a mitologia era responsável pelas explicações da natureza
humana e dos fenômenos naturais. Era um tipo de conhecimento irracional que
surgiu antes da filosofia. Devido a diversos conflitos sociais, políticos e religiosos
ocorrem transformações, na sociedade como um todo e consequentemente, o
homem sente a necessidade de buscar respostas racionais para novos
questionamentos. Surge então a filosofia (séc. VI a.C.), que teve como principais
representantes: Platão (429-343 a.C.), com a teoria idealista, defendendo que o
conhecimento está na alma e que quando a alma se liga à matéria há o
esquecimento esse é o conhecimento pré-existente ao homem onde a alma é
considerada a mente humana; Aristóteles (384-322 a.C.), com a teoria empírica de
que ao nascer o homem tem a mente em branco e o conhecimento será impresso
através das experiências humanas.
Com a queda do império Romano houve uma brusca mudança comportamental
de forma que na idade média, o conhecimento passa a ser submetido à fé. O
pensamento humano mantinha-se preocupado com a alma e sua salvação,
enquanto os gregos deram ênfase à razão, a idade média “submete a razão a fé”.
Por volta de 1500 a 1600 o homem torna-se o centro do saber em contra
posição a visão Teocêntrica de mundo, iniciando uma nova valorização de saber –
mais prático e naturalista, do qual uma das maiores expressões da época é Galileu
Galilei (1564-1642), que fundamenta o conhecimento na experiência construindo o
método cientifico baseado na observação, formulação de hipóteses e na
experimentação. Sua obra é continuada por Descartes (1596 – 1649), considerado o
fundador da filosofia moderna e do racionalismo. Descartes instaura a dúvida
metódica, eliminando os “a priores” e destruindo os dogmas, segundo o qual o
pensamento é a essência da natureza humana.
Os sistemas filosóficos que se desenvolveram a partir de Descartes –
Racionalismo (todo conhecimento é proveniente da razão), e Empirismo (todo
conhecimento se dá através da experiência), serviriam de pressupostos para muitas
teorias psicológicas, como: Teoria Maturacional, Teoria Comportamentista e Teoria
de Campo.
Kant (1724-1804), que surge posteriormente a Descartes faz a “síntese critica”
do racionalismo e do empirismo em que segundo ele a “inteligência percebe os
objetos por meio do entendimento a priori que se manifesta no momento exato da
experiência”.
Os sistemas filosóficos pós-Kantianos influenciaram diretamente para a
constituição da psicologia contemporânea, dentre eles o que mais se destaca é o
positivismo, pois é a partir da influência do positivismo sobre o conhecimento
psicológico no séc. XIX que a psicologia se constitui num ramo do conhecimento
definido, por meio de um objeto de estudo delimitado ―as atividades psíquicas ou a
consciência, ou o comportamento― e por uma metodologia voltada para a
observação cuidadosa e sistematizada. Deixa de ser a psicologia da alma e do
espírito e se constitui numa psicologia fundada em dados.
“Seu status de ciência é obtido na medida em que se ‘liberta’ da Filosofia, que marcou sua história até aqui, e atrai novos estudiosos e pesquisadores, que sob os novos padrões de produção de conhecimento, passam a: definir seu objeto de estudo (o comportamento, a vida psíquica, a consciência); delimitar seu campo de estudo, diferenciando-o de outras áreas de conhecimento, como a Filosofia e a Fisiologia; formular métodos de estudo deste objeto; formular teorias enquanto um corpo consistente de conhecimentos na área ”1.
A partir de então surgem às primeiras escolas da psicológica que são: o
funcionalismo de William James (1842-1910), que estuda a dinâmica funcionalista
da mente; o estruturalismo de Wundt (1832-1920), e seus seguidores que estuda a
estrutura da mente; e a psicologia condutista de Eduard L. Thornidike (1874 – 1949),
para a qual as condutas posteriores são as que satisfazem um determinado impulso
positivo ou negativo.
As teorias psicológicas contemporâneas são: as Teorias Maturacionais, de
base epistemológica e o racionalista em cuja premissa básica implica na 1 Psicologias dos autores Ana M. Bahia Bock, Odair Furtado e Maria de Lurdes T. Teixeira pg. 37
constatação de que as características fundamentais de qualquer organismo vivo
estão programadas em sua constituição genética e enraizadas em processos
biológicos, seus representantes são Arnold Gesell (1880 – 1961), Francis Galton
(1822 – 1911), Cattell (1860 – 1944), Stanley Hall (1845 – 1924) e Alfred Binet (1857
– 1911); Teorias Comportamentistas, Berravionismo, que tem como base
epistemológica o empirismo aliado ao positivismo, que tem por sua vez como objeto
de estudo o comportamento humano ou as reações observáveis de um organismo
pelas respostas a estímulos do meio ambiente, seus representantes principais são:
John Watson (1878 -1958) e Skinner (1904 – 1990); Teorias de Campo para as
quais as bases epistemológicas são o racionalismo e o idealismo, nessa perspectiva
os comportamentos e experiências humanas não são fracionáveis; Teorias
Psicanalíticas e Neopsicanalíticas
“que recupera para a psicologia a importância da afetividade e postula o inconsciente como objeto de estudo, quebrando as tradições da psicologia como ciência da consciência e da razão” 2,
fundadas pelo médico Sigmund Freud (1856 – 1939); Teorias Fenomenológica e
humanistas, segundo a qual o homem sendo inerentemente bom tende à
manutenção de si mesmo e à sua auto realização e tem como representantes
Maslov (1972), Rogers (1975), e Combs (1975); Teorias psicogenéticas que tem
como principais representantes Piaget (1896 – 1980), Vygotisk (1896 – 1934),
Leontiev (1903 – 1979), Luria (1902 – 1977) Wallon (1879 – 1962), segundo a qual o
sujeito e objeto interagem em um processo que resulta na construção e
reconstrução da estrutura cognitiva.
“No século XVIII e, sobretudo no século XIX a legislação de diversos países revela o interesse do estado em assumir a educação, tornando-a leiga e gratuita. No entanto, nessa época a escola tradicional passa a ser alvo de diversas criticas. Muitas delas resultam de descobertas científicas,
2 psicologias, Ana M. Bahia Bock, Odair Furtado e M. de Lurdes T. Teixeira pg.39
sobretudo nas áreas de biologias e ciências humanas – como a psicologia e a sociologia -, que trouxeram subsídios para uma análise mais rigorosa da educação. A partir de então, é dada uma maior atenção às diferenças individuais buscando-se também técnicas mais eficazes de aprendizagem” 3.
Surge então a psicologia da educação que tem como objetivo melhorar as
práticas educativas em geral e planejar o desenvolvimento delas baseado na
argumentação de que a educação e o ensino sofrem grandes melhorias com a
utilização correta dos conhecimentos psicológicos. A psicologia da educação
assume trabalhos e pesquisas sobre aprendizagem, testes mentais, medida do
comportamento, psicologia e clínica infantil, tudo referido direta e indiretamente à
problemática educativa e escolar e teve como precursores J. M. Kattell (1860 –
1944), um dos impulsores do testing moviment, no qual colabora na construção de
diversos testes mentais; Willians James (1842 – 1910), precursor do ensino ativo
onde o aluno é o centro do interesse e a aprendizagem tem que ser significativa; G.
Stanley Hall (1844 – 1924) deve-se a ele a popularização do questionário para
explorar o pensamento infantil.
2.2. TEORIA DE GÊNERO
Segundo Gouveia e Camurça (2000), as relações de gênero são iniciadas no
convívio familiar e justificadas afetivamente. Nestas relações, geralmente o homem
tem mais poder que a mulher, de forma que, através da observação a criança já
aprende desde cedo que o pai detém o controle sobre a família. Além disso, existem
ainda normas sociais que, direta ou indiretamente agem como determinantes nos
valores que diferenciam os gêneros. Desse modo, valores masculinos e femininos
3 Filosofia da educação, Maria Lúcia de Arruda Aranha pg.157.
são impostos pela sociedade atribuindo-lhes funções diferentes. Por isso, para
homens e mulheres não existe uma forma única de ver e viver a vida e, estas várias
formas sofrem modificações no decorrer da história.
É importante salientar que o termo gênero não deve ser confundido com sexo,
pois gênero está relacionado com questões sociais e identitárias, enquanto sexo se
refere aos “aspectos físicos e biológicos, macho e fêmeo”. Mesmo consciente de
que a sexualidade faz parte da natureza humana, pode-se dizer que ela está
intimamente ligada com a forma de como as relações de gênero se organizam na
sociedade. Pois, desde a infância as meninas são instruídas a se comportarem
“adequadamente”, e neste padrão comportamental estão incluídos desde a omissão
de informações sobre sexualidade até a submissão a um futuro marido, que deverá
ser o único homem a conhecer seu corpo. O mesmo não acontece com os garotos
que por sua vez são incentivados desde cedo a se relacionar sexualmente com o
máximo possível de mulheres, antes e depois do casamento e, dessa maneira as
desigualdades de gênero tendem a evoluir. Quando se fala em desigualdade de
gênero, isto inclui desigualdades na divisão de tarefas, de salários e oportunidades.
Assim, o gênero feminino é também nesta relação de desigualdade o ser-objeto, ou
seja, todo aquele numa relação social está numa posição de inferioridade em
relação ao outro.
A política, por exemplo, ainda é um espaço considerado difícil de ser
conquistado pelas mulheres ou por pessoas economicamente desfavorável, porque
elas não foram criadas para falar em público nem tampouco para lutar pelos seus
direitos, mas receberam instruções voltadas para a vida privada. Portanto, “a
timidez, o medo, o nervosismo desses seres-objeto nas atividades políticas (e outras
também) não são um problema de sexo, mas questões de gênero”. (G. & C. p. 26).
Ao se tratar de gênero é importante considerar fatores sociais e biológicos.
Sociais porque são as normas impostas pela sociedade que determinam o
comportamento masculino e feminino. Biológicos, pois mesmo não sendo um fator
determinante, a biologia influencia diretamente para a criação de normas de gênero.
E que mesmo a mulher, o negro ou pessoas com necessidades educacionais
especiais já tenham conquistado e assumido funções diferentes no transcorrer da
história, ainda hoje existem, em alguns setores de trabalho, desigualdades salariais
e discriminação contra eles, principalmente quando exercem atividades
consideradas pela sociedade como próprias dos sujeitos dominadores.
Conforme o estudo do MEC (2000) sobre a visão histórica no mundo ocidental
há poucos registros no período da Antigüidade sobre as relações sociais com as
pessoas com necessidades educacionais especiais ou que apresentavam
necessidade de cuidados diferenciados, como os idosos doentes, órfãos, loucos,
surdos, dentre outros. A sociedade baseava sua organização sociopolítica em duas
classes: os nobres, que eram minoria, mas detinham o poder absoluto sobre as
decisões sociais, econômicas e políticas e o populacho. Estes eram os
trabalhadores de produção agrícola, pecuária, artesanato e comércio, classe
considerada sub-humana, recebendo as sobras da nobreza. Assim, o homem só era
valorizado se pertencesse à nobreza por qualidades pessoais ou por atender a
algum interesse daquele grupo. Na literatura grega e romana ou mesmo na bíblia as
deficiências eram tratadas como fenômenos metafísicos, castigos ou bênçãos
divinas. No texto bíblico, as referências ao cego, ao manco e ao leproso os
caracterizam como pedintes, excluídos sociais. O mesmo documento (MEC, 2000, p.
8) cita o estudo de Kanner (1964), no qual o deficiente mental aparece em alguns
registros como o bobo ou o palhaço em situações comemorativas para divertir os
senhores e seus convidados.
Com relação às mulheres, por exemplo, nas primeiras décadas do século XX,
era considerada como objeto, fraca e subordinada ao homem. O que dominava era a
idéia de que à mulher cabia a função de esposa e mãe. Para os homens, as
escolhas eram mais variadas e não era prioridade o casamento e a paternidade.
Eles não tinham que casar virgens, nem tampouco ser fiéis, enquanto que a mulher
tinha uma imagem a preservar, e pelo fato de ser menos esclarecidas e dificilmente
ter acesso à escrita, resignavam-se a condição de mulher comportada por achar que
era o único caminho a seguir. Na verdade, aqueles considerados geneticamente
inferiores sempre estiveram na condição de objeto, porém nas últimas décadas, eles
estão engajados em lutas sociais e vêm aos poucos, conquistando a função de
sujeito buscando igualdade de valor. O que se quer construir e sancionar não é o
direito de ser igual, pois não existem pessoas e seres idênticos, nem física nem
psicologicamente. Na verdade, o que os seres-objeto querem conquistar é o direito
de falar, questionar e ser ouvidos.
Mesmo com os avanços dos direitos conquistados pelas mulheres, ainda são
propagados, mesmo que inconscientemente, os valores machistas de que a mulher
é o sexo frágil e o homem é quem domina, quem sustenta a família. Existe ainda um
número considerável de mulheres que se calam diante de agressões por se
considerarem impotentes, Isto é submissão. Há também, infelizmente, profissões
específicas para homens e para mulheres, mesmo a mulher tendo conquistado o
direito de trabalhar fora, ela ainda continua sendo escrava do lar, como o principal
responsável pela organização da casa e a educação dos filhos. Isso é desigualdade
de gênero. Portanto, quando se fala em gênero, não existe uma prioridade em
privilegiar este ou aquele.
É importante que nas relações Sujeito X Objeto haja a consciência de que não
existe troca de papeis quando se exige que um tenha seu espaço no setor público e
o outro exerça sua função no privado (lar). Todos os sujeitos envolvidos nas
relações interpessoais devem despir-se de símbolos, valores e normas que
inferiorizam um ou outro, seja por fatores sociais ou biológicos, que vêm sendo
utilizados desde séculos passados e começar a respeitar o outro considerando suas
particularidades, desejos e sonhos e construir uma parceria baseada no respeito,
igualdade e verdade.
2.3. TEORIA DA IDENTIDADE CULTURAL NA PÓS-MODERNIDADE
A teoria de Identidade Cultural na Pós Modernidade, de Stuart Hall aborda a
crise identitária do sujeito pós-moderno. Segundo Hall, as velhas identidades, que
por tanto tempo estabilizaram o mundo social, estão em declínio, fazendo surgir
novas identidades e fragmentando o indivíduo unificado. (2004: p.7). Dentro dessa
abordagem o sujeito pós-moderno é visto como um indivíduo descentrado,
fragmentado e instável, portanto possuidor de uma identidade híbrida.
As constantes transformações pelas quais o mundo contemporâneo vem
passando são responsáveis por essa característica pós-moderna do sujeito. Repleto
de ansiedade e solidão por ser obrigado a assumir comportamentos mecanicistas
diante do progresso desenfreado que o transforma em um ser desterritorializado
passa a pertencer a lugar nenhum, o tempo nenhum, e a amor nenhum.
Pode-se dizer que há no sujeito surdo traços da pós-modernidade, pois para
muitos ele é um individuo que deve agir em função do outro, incapaz de assumir
atitudes próprias, resignando-se a condição que a sociedade lhe impõe.
O sujeito pós-moderno encontra-se em um “entrelugar”, situando-se num
espaço transitório entre a partida e a chegada, num vazio profundo pelo fato de estar
constantemente em contato com outros sujeitos, de diferentes culturas e
consequentemente com identidades diferentes. Esse múltiplo contato cultural do
indivíduo faz com que ele perca noção de si e dessa forma acabe por se tornar um
estranho para si mesmo.
“Muita gente julga o valor de suas ações não baseada em sua essência e sim na maneira como é recebida. É como se adiasse o próprio juízo até consultar o público. O sujeito passivo, para quem o ato é praticado tem o poder eficaz ou ineficaz em lugar de quem o praticou. Assim tendemos a ser intérpretes na vida, e não pessoas que vivem e agem como selves”. (MAY: 1984, p.50).
O Surdo pode ser visto como um sujeito descentrado, estrangeiro de si mesmo.
Pois, ao longo da história sua imagem foi composta por humilhações, lutas,
conquistas e descobertas que a levaram a uma evolução existencial.
A evolução do sujeito Surdo é perceptível a partir da observação da sua
história. Durante muito tempo, foram discriminados absolutamente incapazes para a
convivência em meio à sociedade, portanto não podia ser educado, e segundo a
igreja católica suas almas não tinham salvação, já que não podiam participar dos
sacramentos. Neste período ele é governado por um membro da família que detém
total poder sobre os seus bens e vontades, ou até mesmo poderia ser condenado à
morte por se considerado um ser sem alma. Assim ele apenas pode se mostrar
resignado a sua condição medíocre de inferioridade e se considerar um sujeito sem
virtudes.
A resignação do Surdo é uma máscara usada para disfarçar a fragmentação de
sua identidade, camuflando assim, as diferenças individuais necessárias à existência
do ser. Na realidade, no século XVIII houve uma grande transformação social, e
D’Epée criou uma linguagem de sinais manual denominada “método silencioso”. E
posteriormente, desenvolveu o “método oral”, baseado no emprego da palavra e da
leitura labial, dessa forma surdo também ser transformou e deixou fluir a essência
daquilo que ela realmente sentia ser.
Julia Kristeva em Estrangeiros para nós mesmos analisa o processo de
descentramento do sujeito e afirma que: o estrangeiro, não tem um si e sua
insegurança é levada ao extremo de questionar-se sobre sua própria existência.
(KRISTEVA; 1994, p.16). A afirmativa de Kristeva é confirmada por Stuart Hall
quando ele afirma que o sujeito é capaz de assumir identidades diferentes em
situações diversas, tornando-se assim, um “eu” incoerente. Identificamos essa
capacidade de transformação do sujeito no surdo quando ele mostra-se capaz de
usar uma máscara em cada situação diferente. Atualmente o sujeito surdo é
estudante, professor, instrutor, pai, filho, homem, entre outros. Assim ele mostra que
tem capacidade de desempenhar vários papéis.
A identidade surge mediante as expectativas que o sujeito tem sobre o
pensamento do outro em relação a si mesmo, dessa forma pode-se dizer que o
indivíduo se faz em função do outro. Nesse processo, ocorre uma perda, pois
tentando rejeitar-se e agradar o outro, o ser acaba perdendo sua essência e
tornando-se vazio.
Infelizmente, na vida do surdo é muito comum a auto-rejeição, por exemplo,
existem muitos deles que deixam as salas de aula para cuidar de filhos ou da casa,
por pensarem que são incapazes de aprender os conteúdos ensinados nas escolas
ou por se sentirem descriminados por ouvintes no convívio escolar. Geralmente,
quando isso acontece, eles se tornam subordinados a sujeitos que nem sempre
conseguem manter um padrão de vida adequado para as mínimas condições de
sobrevivência moral e social.
É uma característica comum do ser-objeto a dedicação às causas do outro. No
entanto, quando a mulher surda se deixa manipular pelo outro (homem) que a
transforma objeto sexual, ela deixa de ser o sujeito da situação e é reduzida à
condição de animal, percebe-se aí, um descentramento total da sua condição de ser
humano, de forma que já não há certeza da condição do próprio “eu”.
Diante de uma sociedade manipuladora que não aceita a multiplicidade do ser
e tende transformá-lo num ser uno percebemos a existência de um conflito entre a
sociedade e o “eu” o que desencadeia o descentramento racional do surdo, fazendo
com que ele perca o foco de valores sociais. Esse conflito pode culminar ainda na
perda do senso trágico, que segundo May (1984), é simplesmente o reverso da
crença na importância do indivíduo.
A perda do senso trágico acontece quando o surdo percebe-se numa condição
subumana de desemprego, sem o apoio da família, com filhos para criar. Por este
motivo ele passa aceitar as agressões físicas, psicológicas e morais do sujeito
dominador, que deveria protegê-lo e amá-lo. Geralmente ele entrega-se a essas
agressões por sentir-se inferior a achar que não merece desfrutar da felicidade de
ser livre e bem tratado. Muitas vezes chega a desejar a morte para abafar sua dor
ao sentir-se humilhado e rejeitado por uma sociedade preconceituosa e impiedosa.
E característico do sujeito pós moderno o não pertencimento a nenhum lugar, a
nenhum tempo, a nenhum amor. E atualmente observamos isto sujeito que é um ser
transitório, que está sempre correndo a procura de algo que ele próprio desconhece.
O surdo que é provedor, pai, profissional, estudante, filho acaba por se tornar
instável física e psicologicamente. E torna-se uma fusão de tudo o que é, e essa
fusão a aniquila.
O fato de o sujeito não ter a noção de si, impede que ele obtenha algum
sucesso em sua relação com o outro, pois tudo começa no “si”; se o individuo não é
capaz de realizar-se consigo mesmo e não tem consciência de sua essência, jamais
poderá realizar-se com o outro, e ser inteiramente verdadeiro.
Todo comportamento humano é baseado naquilo que ele conhece da realidade,
a que Laplantine chama de real, que ele define como sendo "a interpretação que os
homens atribuem à realidade." (1997, p.12). Em seu livro O que é imaginário,
Laplantine identifica o diferencial entre o processo representativo imaginário e o
intelectual: no imaginário é possível criar "uma imagem e uma relação que não são
dadas diretamente na percepção" (1997, p.24).
O imaginário permite assim uma construção que não necessariamente
corresponda em todos os aspectos à realidade, mas que tenha alguma conexão com
ela. A estratégia do imaginário é tão somente deslocar o "estímulo perceptual", ou
seja, a apreensão da realidade de tal maneira a criar "novas relações inexistentes no
real." (Laplantine, 1997, p. 25).
Por ser uma representação simbólica, o imaginário trabalha com construção de
símbolos, que é a atribuição de significados, a idéia representativa de um dado da
realidade. Entretanto, por serem fruto da imaginação, os símbolos construídos pelo
imaginário não exigem comprovação, comparação ou verificação com o real.
Os símbolos evocam também diferentes olhares e entendimentos diversos, pois
mobilizam a subjetividade das emoções. Um mesmo símbolo pode suscitar orgulho
em um e desprezo em outro, mas ambos estarão amparados por uma realidade
comum representada.
Na sociedade hodierna temos símbolos que representam o Surdo, de forma
benéfica ou maléfica (pejorativa). O exemplo mais comum pode ser dado pela forma
de comunicação utilizada por ele. Para algumas pessoas os surdos são
simplesmente “mudinhos” que se comunicam usando as mãos de forma “tão
bonitinha” essas palavras geralmente são usadas por aqueles que não se esforçam
realmente para entender as diferenças existentes entre surdos e ouvintes. A imagem
simbólica do Surdo como “coitadinho” está impregnada na sociedade. De forma
subjetiva podemos observar o fato supracitado sempre que paramos conversar com
pessoas que não têm em seu convívio um sujeito surdo.
A personalidade do individuo é formada desde a infância. O imaginário é
composto sempre dessa simbologia que envolve a sociedade dividindo-a. Muitas
vezes, as leis de proteção ao sujeito com necessidades educacionais especiais são
insuficientes para romper com a simbologia no decorrer da História, culminando na
criação de uma imagem deturpada de sua condição de ser-objeto.
2.3.1. IDENTIDADE CULTURAL DO SURDO
O sujeito surdo possui uma forma peculiar de apreender e se identificar com o
meio no qual está inserido. Dessa forma é possível afirmar que a cultura surda esta
intimamente relacionada à identidade Surda, uma vez que cultura é um conjunto de
comportamentos aprendidos de um grupo de pessoas que possuem sua própria
língua, valores, regras de comportamento e tradições.
Mas ser uma pessoa surda não equivale a dizer que esta possua identidade
Surda porque sendo a maioria dos surdos, aproximadamente 95%, são filhos de pais
ouvintes, e muitos destes não aprendem a Libras ou não conhecem as Associações
de Surdos ou Comunidades Surdas, podendo tornar-se somente pessoas com
necessidades auditivas especiais.
As pessoas Surdas, que estão politicamente atuando para terem seus direitos
de cidadania e lingüísticos respeitados, fazem uma distinção entre “ser Surdo” e ser
“deficiente auditivo”. Ser Surdo é saber que pode falar com mãos e aprender uma
língua oral-auditiva através dessa, é conviver com pessoas que, em um universo de
barulhos, deparam-se com pessoas que estão percebendo o mundo, principalmente,
pela visão, e isso faz com que elas sejam diferentes e não necessariamente
deficientes.
A diferença está no modo de apreender o mundo, que gera valores,
comportamento comum compartilhado e tradições sócio-interativas, a este modus
vivendi está sendo denominado de Cultura ou Identidade Surda.
3. CONCEPÇÕES DE LINGUAGEM NO SISTEMA DE ENSINO DO BRASIL
O estudo de língua portuguesa como disciplina escolar passou a existir no
Brasil a partir das ultimas décadas do século XIX. Contudo somente a partir das
primeiras décadas do século XX é que o professor de língua passa a ser formado
exclusivamente com o objetivo de tornar-se professor de língua portuguesa, até
aquele momento ele é autodidata em língua e formado em outras áreas.
Até a metade do século XVIII no sistema de ensino do Brasil o ensino de língua
acontecia apenas na alfabetização, nas séries seguintes o aluno passava a
aprofundar seus conhecimentos em língua latina, pois se julgava que a língua
materna era adquirida no ambiente extra-escolar, portanto não seria necessário para
o aluno perder tempo em aprender algo de que já tinha conhecimento. Após a
Reforma Pombalina em 1759 torna-se obrigatório o ensino da língua materna nas
escolas portuguesas e brasileiras, no entanto este ensino ainda mantinha
características do ensino do latim no qual se ensinava não a gramática propriamente
dita, mas sim a retórica e a poética.
Os fatores externos e internos da língua foram responsáveis durante muito
tempo por manter no ensino da língua as tradições advindas do latim. Tendo em
vista o fato de essas tradições servirem para que grupos social e economicamente
privilegiados se mantivessem como tal, e ainda por que até aquele momento
histórico o único conhecimento que se tinha de língua era obtido por meio da
gramática normativa, da retórica e do latim. Assim a gramática vigorou por muito
tempo como o ensino sobre a língua materna nas escolas tendo com a função
principal levar o aluno ao conhecimento do funcionamento da norma culta.
Durante esse período os professores de português se utilizavam de gramáticas
que não apresentavam características didáticas, estas eram apenas antologias de
autores consagrados. Neste período a concepção que se mantinha sobre a língua
era a de que a mesma funcionava como sistema.
A partir dos anos 50 a concepção de ensino de língua se modifica e a
linguagem passa a ser vista como instrumento de comunicação e como expressão
da cultura brasileira. Na qual o ensino-aprendizagem da gramática e do texto perde
lugar para o desenvolvimento das habilidades de expressão e comunicação do
aluno. Por meio desta concepção busca-se levar o aluno a usar a língua de acordo
com as necessidades estabelecidas.
Dentro desta nova concepção de linguagem surgem os livros didáticos
carregados de exercícios com o objetivo de auxiliar o professor a desenvolver no
aluno a habilidade de linguagem oral em seus usos. De certa forma a presença do
livro didático suscita uma critica sobre o papel do professor, pois tendo ele formação
superior em cursos específicos na área de ensino, por que ele precisa de um escritor
de livro didático para auxiliá-lo em sua profissão? Certamente a resposta está no
fato de que os professores são em sua maioria são originários de grupos sociais
menos letrados e por isso não dominam a nora padrão de forma satisfatória ao
ensino. E que os alunos vão à escola buscando apenas o conhecimento da norma
padrão com o único objetivo de conquistar bons empregos e vagas em boas
universidades e não de aprender a se comunica e se expressar tendo em vista que
ele inconscientemente sabe que já possui esta habilidade. Portanto pode se
considerar que as condições do sistema de ensino-aprendizagem não se
modificaram muito dentro desta concepção com relação à concepção anterior.
No final dos anos 80 e início dos anos 90 novas áreas de estudo começam a
surgir como a lingüística e a psicologia da educação que tiveram grande importância
para o surgimento de uma nova concepção de linguagem, a de linguagem como ato
de interação, segundo essa concepção é na linguagem que acontecem as
interações humanas.
Dentro desta nova concepção a linguagem passa a ser vista como enunciação,
discurso e comunicação. Desta forma a análise lingüística passa a considerar as
relações da língua com aqueles que a utilizam e com o contexto, condições
históricas e sociais em que ela é utilizada. Baseada ainda nesta última concepção o
ensino de língua passa a ser percebido como processo de interação autor – texto -
leitor, no qual os sentidos da linguagem oral são produzidos por e para uma situação
especifica de comunicação. O aluno agora é visto como sujeito ativo capaz de
construir suas habilidades e conhecimentos da linguagem em constante integração
com o outro e com a própria língua.
Com base nas novas ciências, lingüísticas e psicológicas, percebe-se que o
aluno é um sujeito autônomo e crítico. Por isso faz-se urgente a formação de
professores conscientes e habilitados, de fato, para o ensino da língua, tendo em
vista que cada vez mais cabe ao professor a função de formar não apenas futuros
profissionais, mas sim cidadãos críticos e conhecedores de sua importância para a
melhoria do sistema social vigente.
3.1. CULTURA E IDENTIDADE NA AQUISIÇÃO DA LINGUAGEM DO SURDO
Quando um professor se vê diante se um aluno surdo, certamente, se faz
vários questionamentos, tendo em vista o fato de que o processo de aquisição da
linguagem desse aluno ser diferente dos demais. Além disso, os pontos de vista
sobre a surdez variam de acordo com as diferentes épocas e os grupos sociais no
qual são produzidos.
A história de educação de surdos é repleta de controvérsias e
descontinuidades. Como qualquer outro grupo minoritário, os surdos constituíram-se
objeto de discriminação em relação à maioria ouvinte.
Estudiosos, surdos e professores ouvintes, ao longo do tempo vêm divergindo
quanto ao método mais indicado para ser adotado no ensino de surdos. Uns
acreditam que deveriam priorizar a língua falada, outros a língua de sinais e outros,
ainda, o método combinado. No entanto, propor um modelo educacional para os
surdos implica uma visão particularizada da concepção do ser surdo.
Com esse princípio temos duas correntes bem distintas: a surdez na concepção
clínico-terapêutica e a surdez na perspectiva pedagógica e social
3.1.1. SER SURDO PARA A MEDICINA
Para a medicina a surdez é uma diminuição ou perda da capacidade normal
auditiva, que traz ao indivíduo uma série de conseqüências ao seu desenvolvimento,
principalmente no que diz respeito à linguagem oral. Desse modo, surdo é o
indivíduo cuja audição não é funcional na vida comum e, parcialmente surdo, aquele
cuja audição, ainda que deficiente, é funcional.
A competência auditiva é classificada como: normal, leve, moderada, severa e
profunda. A surdez severa ou profunda impede que o aluno adquira naturalmente, a
linguagem oral. Devido a esse fato os indivíduos surdos podem apresentar um
atraso intelectual de dois a cinco anos, dificuldades de abstração, generalização,
raciocínio lógico, simbolização, entre outros.
Essa incapacidade de se comunicar, da mesma forma que as demais pessoas,
atua de modo significativo em sua personalidade, fazendo com que manifeste
tendências de introspecção, imaturidade emocional, rigidez de juízos e opiniões,
prejudicando o desenvolvimento do sujeito em sua globalidade.
Afim de que estes problemas sejam evitados é aconselhável que a criança
surda seja encaminhada o mais cedo possível a uma escola especializada, para que
possa receber estimulação auditiva e oral adequada, adquirindo um
desenvolvimento próximo aos padrões de normalidade.
O domínio da linguagem oral permite a plena integração do individuo na
sociedade, uma vez que essa é a forma usual de comunicação entre as pessoas. No
entanto, quando o desenvolvimento do processo ensino-aprendizagem está
subordinado ao aprendizado da linguagem oral há uma exclusão do sujeito surdo
desse processo.
Contudo essa concepção de surdez foi e ainda é dominante no sistema de
ensino atual o que trouxe a prevalência de um modelo de educação que visava à
cura ou a reabilitação do surdo. Pois, supunha-se que ao oralizar o surdo, sua
alfabetização (leitura e escrita) ocorreria de forma mais natural e próxima ao modelo
apresentado pelas demais pessoas, favorecendo sua integração social.
Desse modo os objetivos da educação dos surdos reduziam-se a práticas
corretivas e de estimulação oral-auditiva, em um encaminhamento metodológico que
se convencionou chamar de oralismo.
Infelizmente, o sucesso desse modelo vai além das limitações naturais da
surdez, exige uma estrutura familiar envolvida com o processo e sistema público de
saúde e educação acessível, o que chega a ser praticamente impossível.
3.1.2. O SURDO E AS CORRENTES PEDAGÓGICAS
Ser surdo é uma experiência visual que traz aos sujeitos a possibilidade de
constituir sua subjetividade por meio de experiências congnitivo-linguísticas
diversas, mediadas por formas alternativas de comunicação simbólica, que
encontram na língua de sinais, seu principal meio de concretização. A realidade
heterogênea e multifacetada de cada sujeito surdo o torna único, pois sua identidade
se constituirá a depender das experiências socioculturais que compartilhou ao longo
de sua vida.
No que diz respeito ao processo de aquisição de conhecimento escolar os
surdos têm direito a uma educação bilíngüe, pois essa prioriza a LIBRAS como
língua natural e, portanto a primeira, bem como o aprendizado da língua portuguesa,
segunda língua, facilitando sua integração com o meio social no qual está inserido.
Além disso, o desenvolvimento de uma educação bilíngue de qualidade é
fundamental ao exercício de cidadania do sujeito surdo, tendo em vista que o acesso
aos conteúdos curriculares, leitura e escrita não dependerá do domínio da oralidade.
Por esse motivo, a língua portuguesa precisa ser viabilizada: Enquanto linguagem
dialógica/ funcional/ instrumental e enquanto área do conhecimento (disciplina
curricular).
A presença de educadores surdos é imprescindível no processo educacional,
pois atuam como modelos de identificação lingüístico-cultural e exercem funções e
papéis significativos dentro desse processo. São muitas as pesquisas que
demonstram que crianças surdas expostas desde cedo à língua de sinais
apresentam melhores resultados acadêmicos.
Atualmente, a Lingüística da Língua de Sinais é uma disciplina em expansão no
mundo todo e suas pesquisas demonstram a importância dessa língua na
constituição identitária do sujeito surdo.
4. LEIS SOBRE EQUALIZAÇÃO DE OPORTUNIDADES PARA PESSOAS COM
DEFICIÊNCIAS
4.1. LEI Nº 9394/96 – LEI DE DIRETRIZES E BASES DA EDUCAÇÃO NACIONAL
– 1996
LEI Nº 9.394 de 20 de dezembro de 1996
Capítulo V
Da educação especial
Art. 58. Entende-se por educação especial, para os efeitos desta Lei, a
modalidade de educação escolar, oferecida preferencialmente na rede regular de
ensino, para educandos portadores de necessidades especiais.
§1º Haverá, quando necessário, serviços de apoio especializado, na escola
regular, para atender as peculiaridades da clientela de educação especial.
§2º O atendimento educacional será feito em classes, escolas ou serviços
especializados, sempre que, em função das condições específicas dos alunos, não
for possível a sua integração nas classes comuns do ensino regular.
§3º A oferta da educação especial, dever constitucional do Estado, tem início
na faixa etária de zero a seis anos, durante a educação infantil.
Art. 59. Os sistemas de ensino assegurarão aos educandos com necessidades
especiais:
I – currículos, métodos, técnicas, recursos educativos e organização
específicos para atender às suas necessidades;
II – terminalidade específica para aqueles que não puderem atingir o nível
exigido para a conclusão do ensino fundamental, em virtude de suas deficiências, e
aceleração para concluir em menor tempo o programa escolar para os
superdotados;
III – professores com especialização adequada em nível médio ou superior,
para atendimento especializado, bem como professores do ensino regular
capacitados para a integração desses educandos nas classes comuns;
IV – educação especial para o trabalho, visando a sua efetiva integração na
vida em sociedade, inclusive condições adequadas para os que não revelarem
capacidade de inserção no trabalho competitivo, mediante articulação com os
órgãos oficiais afins, bem como para aqueles que apresentam uma habilidade
superior nas áreas artística, intelectual ou psicomotora;
V – acesso igualitário aos benefícios dos programas sociais suplementares
disponíveis para o respectivo nível do ensino regular.
Art. 60. Os órgãos normativos dos sistemas de ensino estabelecerão critérios
de caracterização das instituições privadas sem fins lucrativos, especializadas e com
atuação exclusiva em educação especial, para fins de apoio técnico e financeiro pelo
Poder público.
Parágrafo único. O poder Público adotará, como alternativa preferencial, a
ampliação do atendimento aos educandos com necessidades especiais na própria
rede pública regular de ensino, independentemente do apoio às instituições
previstas neste artigo.
4.2. LEI N.º 10.436 DE 24 DE ABRIL DE 2002
Dispõe sobre a Língua Brasileira de Sinais - Libras e dá outras providências.
O presidente da república
Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
Art. 1º É reconhecida como meio legal de comunicação e expressão a Língua
Brasileira de Sinais - Libras e outros recursos de expressão a ela associados.
Parágrafo único. Entende-se como Língua Brasileira de Sinais - Libras a forma
de comunicação e expressão, em que o sistema lingüístico de natureza visual-
motora, com estrutura gramatical própria, constituem um sistema lingüístico de
transmissão de idéias e fatos, oriundos de comunidades de pessoas surdas do
Brasil.
Art. 2º Deve ser garantido, por parte do poder público em geral e empresas
concessionárias de serviços públicos, formas institucionalizadas de apoiar o uso e
difusão da Língua Brasileira de Sinais - Libras como meio de comunicação objetiva e
de utilização corrente das comunidades surdas do Brasil.
Art. 3º As instituições públicas e empresas concessionárias de serviços
públicos de assistência à saúde devem garantir atendimento e tratamento adequado
aos portadores de deficiência auditiva, de acordo com as normas legais em vigor.
Art. 4º O sistema educacional federal e os sistemas educacionais estaduais,
municipais e do Distrito Federal devem garantir a inclusão nos cursos de formação
de Educação Especial, de Fonoaudiologia e de Magistério, em seus níveis médio e
superior, do ensino da Língua Brasileira de Sinais - Libras, como parte integrante
dos Parâmetros Curriculares Nacionais - PCNs, conforme legislação vigente.
Parágrafo único. A Língua Brasileira de Sinais - Libras não poderá substituir a
modalidade escrita da língua portuguesa.
Art. 5º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Brasília, 24 de abril de 2002; 181º da Independência e 114º da República. Fernando Henrique Cardoso Paulo Renato Souza
5. ANÁLISE DAS RESPOSTAS DO QUESTIONÁRIO
A fim de analisar, de fato, a construção da identidade cultural do aluno Surdo
que freqüenta a escola Neutel Maia e o seu olhar, sobre si mesmo enquanto ser
social, em meio a uma sociedade preconceituosa. Além de buscar a confirmação ou
a negação do problema levantado no início do presente trabalho, coletaram-se
dados na referida escola e os resultados alcançados na pesquisa foram comparados
aos pensamentos dos autores estudados e apresentados com precisão. A partir da
análise do corpus, foi feita a comparação entre as informações obtidas com os
Surdos para saber se os dados revelam, realmente, a identidade cultural e a
condição social desse sujeito. Além disso, foi feita a observação dos sujeitos
entrevistados durante o seu convívio escolar.
O público entrevistado é formado por alunos do 7º e 9º anos do ensino
fundamental da escola alvo. Dentre eles há duas meninas, uma do 7º ano e outra
do 9º, e seis meninos, três no 7° e três no 9º ano, todos com idade entre 15 e 20
anos. Dessa maneira temos 100% do público de Surdos. Os questionários
realizados tiveram perguntas diferentes e fechadas.
5.1. ANÁLISE DAS RESPOSTAS DO QUESTIONÁRIO DIRIGIDO PARA ALUNOS
SURDOS
Questão 1
Diante da primeira pergunta dirigida para o público Surdo, Se você pudesse
escolher, estudaria em uma escola inclusiva ou no CEES? 100% dos entrevistados
respondeu que prefere a escola inclusiva. Essa resposta é a demonstração de que
realmente a identidade surge mediante as expectativas que o sujeito tem sobre o
pensamento do outro em relação a si mesmo, pode-se dizer que o indivíduo se faz
em função do outro. Sendo assim é importante para o aluno surdo está próximo do
ouvinte para entender melhor o “mundo ouvinte” e perceber como ele visto pelos
sujeitos que pertencem a esse mundo “diferente”.
Questão 2
Ao perguntamos: Se o seu professor soubesse Libras, você acha que o
compreenderia melhor? 100% dos entrevistados revelaram que certamente
aprenderiam bem mais sem intermediários. Quando comparamos as respostas
apresentadas neste item às do item anterior temos o reforço de que a idéia
defendida por Stuart Hall de que o sujeito é capaz de assumir identidades diferentes
em situações diversas, tornando-se assim, um “eu” incoerente. Pois percebemos a
incoerência do sujeito Surdo quando afirmam preferir estudar em uma escola
inclusiva, mas ao mesmo tempo consideram que seria melhor se tivessem
professores que se comunicassem com eles em LIBRAS – Língua Brasileira de
Sinais, o que só ocorre em escolas especiais para Surdos.
Questão 3
Quando perguntamos o que os alunos pensavam sobre a preocupação por
parte do professor para com o aluno Surdo na sala de aula 50% deles acredita que
sim, os professores se preocupam com o aprendizado do Surdo. Na verdade isso
reforça a ideia de que o Surdo é um sujeito capaz de ser crítico assim como
qualquer ouvinte pode ser, quando bem orientado desde a infância são capazes de
perceber se as pessoas com as quais se relacionam realmente estão envolvidos
com o seu bem ou se apenas estão interessados em usá-los socialmente.
Questão 4
Você acredita que teria mais amigos na escola se fosse ouvinte? No momento
em que metade dos entrevistados, de ambos os sexos, responderam que teriam
mais amigos se fossem ouvintes, observamos que pelo menos 50% dos sujeitos
Surdos são conscientes de que sua forma “diferente” de perceber o mundo e de se
relacionar como outro dificulta a relação deles com os outros alunos da escola.
Tanto essa as respostas desta questão quanto as do item anterior os coloca em um
“entrelugar” situando-os num espaço transitório entre a partida e a chegada, num
vazio profundo pelo fato de estar constantemente em contato com outros sujeitos, de
diferentes culturas e consequentemente com identidades diferentes. Esse múltiplo
contato cultural do indivíduo faz com que ele perca noção de si e dessa forma acabe
por se tornar um estranho para si mesmo.
Questão 5
Ao perguntarmos se na escola existe preconceito dos ouvintes em relação aos
Surdos? Observou-se que a maioria dos meninos entrevistados (66%) acredita que
há preconceito dos ouvintes em relação aos surdos. E apenas 34% dos
entrevistados já superaram esta barreira, pois não vêem preconceito nos ouvintes
em relação a eles. Quanto às meninas metade delas acredita que sim. Muitos
Surdos se sentem vítimas de preconceitos na escola Neutel Maia. Isso fica bem
mais evidente entres os alunos que têm maior potencial crítico e, por isso, observam
o que acontece ao seu redor, porém devemos ter em mente que eles estão em uma
fase da vida em que todas as relações e sentimentos se sobressaem e ganham
dimensões gigantescas. Dessa forma, há a possibilidade que ao se sentirem
contrariados atribuam isso a uma possível rejeição a sua condição de Surdo.
Questão 6
Nesse item a pergunta foi: Você acha que o aluno ouvinte se comunica com
você só por curiosidade ou porque realmente quer ser seu amigo? 100% dos alunos
surdos acreditam que quando os ouvintes resolvem se comunicar com eles é porque
realmente desejam ser amigos deles esse item mostra a necessidade de o sujeito
acreditar que o outro
Questão 7
Neste item a pergunta foi: Você se acha inferior ao ouvinte com relação ao
aprendizado? Quanto às respostas houve um equilíbrio, pois 50% responderam que
sim e 50% que não. Novamente vemos sujeitos cuja identidade mostra-se
fragmentada, pois pelo menos metade dos entrevistados tem consciência de que na
escola Neutel Maia seu aprendizado é inferior ao dos ouvintes, no entanto insistem
em permanecer estudando naquela escola.
Questão 8
Na hora do recreio, você se comunica com os alunos ouvintes ou só com os
Surdos? Aqui, 100% das meninas entrevistadas, na hora do recreio, só se
comunicam com os alunos surdos, enquanto os meninos, 17% se comunicam com
ouvintes e 83% se comunicam somente com os alunos surdos. Neste item, pode se
observar que o Surdo realmente se encontra em um “entrelugar” entre a comunidade
Surda e a ouvinte. A maioria deles não tem boa comunicação com o ouvinte, e
mesmo assim, sendo a minoria numa sociedade oral – auditiva, ainda insiste em
participar de uma comunidade que não é a sua, mas que infelizmente comanda e
rege todas as leis, sejam elas voltadas para o ouvinte ou para o Surdo. Isso
acontece porque eles ainda não têm, de fato, sua identidade formada e se
relacionam com um mundo múltiplo e preconceituoso.
5.2. QUESTIONÁRIO PARA ALUNOS OUVINTES E ANÁLISE DAS RESPOSTAS
Questão 1
Ao questionarmos os alunos ouvintes se eles acreditam que ter Surdos e
ouvintes na mesma sala atrapalha o aprendizado do aluno ouvinte 100% dos
entrevistados acreditam que estudar com surdos na mesma sala de aula não causa
nenhum prejuízo em seu aprendizado, mostrando que o ouvinte não tem problema
em estudar com o surdo.
Questão 2
Nesta questão, Se a escola oferecesse um curso de Libras você faria? Fica
claro o interesse dos alunos ouvintes em estabelecerem comunicação como os
Surdos, tendo em vista que 90% dos entrevistados responderam que SIM.
Questão 3
Todos os alunos responderam que SIM ao serem questionados se
concordavam que o aluno Surdo deve frequentar a escola regular de ensino normal.
Isso prova que os ouvintes não têm preconceito contra os Surdos.
Questão 4
Neste item perguntou-se: Quando você faz uma pergunta para um Surdo é
porque você realmente quer aprender a Libras para ser amigo dele ou para apenas
matar a curiosidade? Como resposta 90% das meninas e 70% dos meninos
responderam que buscam aprender a Libras para ser amigo dos surdos. Assim
percebe-se que apesar de serem maioria lingüística e representarem o gênero
masculino, ou seja, o dominador na sociedade o ouvinte tentar manter a
comunicação com o Surdo mostrando que não discrimina o outro por achá-lo
diferente ou anormal.
Questão 5
A questão anterior é reforçada quando perguntamos se o aluno ouvinte vê um
Surdo como uma pessoa igual a ele ou como um “deficiente”, todos os entrevistados
responderam que o surdo é uma pessoa igual a eles. Com isso, comprovamos que
não há preconceito do ouvinte em relação ao surdo, uma vez que aquele é
consciente que o esse é um ser humano como qualquer outro e que se difere
apenas pelo modo de perceber o mundo ao seu redor.
Questão 6
Neste item a pergunta foi: A maioria dos seus amigos tenta se comunicar com
os Surdos ou evita essa aproximação? E de acordo com as reposta 90% dos
entrevistados responderam que seus amigos tentam se aproximar dos Surdos
mostrando que realmente há um interesse do ouvinte pela amizade com o outro sem
se importar com as diferenças existentes entre eles.
6. CONCLUSÃO
No espaço escolar é comum a existência de sujeitos com identidades e culturas
diferentes. Essa realidade não é diferente na escola Neutel Maia, voltada para o
ensino fundamental, ela é considerada escola inclusiva, dessa forma agrega em seu
quadro de alunos 8 Surdos adolescentes em processo de formação identitária.
Esses alunos passam por conflitos consigo mesmo e com a sociedade ouvinte,
vivem um choque com um mundo diferente, que é maioria e percebe o “mundo" por
meio da audição e se comunica usando a fala – enquanto o Surdo percebe o mesmo
“mundo” por meio da visão e se comunica por meio de sinais.
Dentro desse universo ouvinte o Surdo é obrigado a controlar seus impulsos,
reprimir a própria felicidade em prol das aparências, uma vez que é consciente de
que para seu crescimento, enquanto estudante, o melhor seria frequentar uma
escolar de ensino especial, que buscasse suprir, de fato, suas necessidades. No
entanto ele prefere participar de um ambiente que não contempla suas
necessidades e que os obriga a viver na opulência, repleto de ansiedade e solidão
por ser obrigado a assumir comportamentos mecanicistas diante de uma
comunidade cultural que o transforma em um ser desterritorializado.
Durante a pesquisa percebeu-se que o conhecimento acerca de seus direitos e
deveres, leva o sujeito Surdo a exigir querer estar em um ambiente multicultural,
mesmo que não se sinta totalmente inserido nele, visando tornar-se um sujeito livre
de preconceitos, de estereótipos e capaz de defender-se da violência. No que diz
respeito ao Surdo que freqüenta a escola Neutel Maia essa realidade se agrava,
pois os mesmos pertencem a uma minoria social que ao longo da história sofreu
muito com o preconceito e o desrespeito por parte daqueles que se consideram
seres perfeitos e superiores e esse sofrimento ainda está inserido na identidade
cultural desse sujeito. Levando-o a acreditar que o outro tem preconceito contra ele,
o que durante a entrevista verificou-se ser um engano, pois o ouvinte revelou grande
interesse em se comunicar com o Surdo além de demonstrar respeito pela diferença
cultural do outro. Sendo assim verificamos que na realidade não há, na escola
Neutel Maia, preconceito social, rejeição ou violência por parte do gênero dominador
– ouvinte – contra o gênero dominado – Surdo. Porém, infelizmente a comunicação
entre os gêneros analisados na escola é muito frágil, tendo em vista que o dominado
se sente vítima de preconceito e inferiorizado pelo outro, o que pode ser
considerado fruto da imaginação de um sujeito possuidor de uma identidade
fragmentada e inacabada.
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