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MOÇÃO DE ESTRATÉGIA SETORIAL AO 28º CONGRESSO DO CDS-PP

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MOÇÃO DE ESTRATÉGIA SETORIAL AO 28º CONGRESSO DO CDS-PP

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Moção de Estratégia Setorial ao 28º Congresso do CDS-PP Renovar a Esperança

António Barreto Archer 1

ÍNDICE

1 – A situação atual do CDS e como chegamos aqui - 1 2 – Renovar o partido regressando à matriz ideológica originária - 7 3 – Afirmação de um pensamento político coerente - 11 4 – Ser oposição construtiva e aberta ao diálogo interpartidário – 16 5 – Dar voz às bases do partido e à cidadania - 17 6 – Ser farol de esperança para os portugueses - 20 7 – Conclusão - 25 Nota biográfica do 1º subscritor da moção - 28

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António Barreto Archer 2

1 – A situação atual do CDS e como chegamos aqui

Por ser o partido que à direita do espectro partidário em Portugal tem a matriz

ideológica mais sólida, o CDS teve, na legislatura passada, uma oportunidade de ouro

para se afirmar como alternativa política ao projeto socialista. Uma alternativa

apoiada na visão dos fundadores do CDS de que a Democracia Cristã e a sua conceção

de uma sociedade laica, mas inspirada nos grandes valores éticos da nossa tradição

histórico-cultural cristã, assente numa economia social de mercado, é o modelo mais

adequado para conciliar desenvolvimento económico e justiça social.

Bastaria para isso que o partido se tivesse aberto à sociedade civil, renovado o seu

pessoal dirigente, e ocupado o centro do espetro político-partidário, fazendo uma

oposição construtiva e afirmando-se como uma força política interclassista, apostada

em recuperar para a direita a defesa das causas sociais, que são hoje monopolizadas

pela esquerda.

Seria um projeto político novo num partido que, sendo um dos fundadores da

democracia portuguesa, já se encontrava socialmente implantado. Apostando na

formação ideológica dos seus militantes e na afirmação de uma cidadania

participativa, o CDS teria tido condições para se apresentar como uma nova

esperança de progresso para Portugal, mobilizadora dos portugueses.

Defendendo a credibilidade e a transparência na ação política e pugnando por uma

maior proximidade entre os dirigentes partidários e os eleitores, o CDS afirmaria a sua

vocação de governo, seguindo um caminho separado e independente de qualquer

outra força política, mas estando disponível para convergências com outros partidos

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António Barreto Archer 3

e até mesmo com o governo, quando estivessem em causa as grandes reformas do

Estado ou o superior interesse nacional.

A verdade é que nada disto aconteceu! Durante os últimos quatro anos, o CDS-PP

continuou agarrado às mesmas pessoas e às soluções governativas do passado,

assentes na austeridade neoliberal, já exorcizada no seio do PSD e dentro do próprio

Eurogrupo, e colocou uma espécie de cordão sanitário à sua volta, que o empurrou

para fora do sistema. Com esta estratégia (ou ausência dela), o CDS ficou reduzido a

um pequeno partido de inconsequente crítica e protesto, que nos últimos quatro anos

em nada foi capaz de influenciar o curso da governação ou a vida concreta dos

portugueses.

O advento da coligação parlamentar de esquerda, que assegurou a estabilidade

política na última legislatura, acabou com o velho conceito de arco da governação. O

nosso regime político semipresidencial adquiriu desse modo uma tonalidade mais

parlamentar, em que todos os votos que se traduzam em deputados contam

efetivamente para a definição das soluções de governo, que passaram a resultar

diretamente dos equilíbrios construídos e negociados no parlamento eleito. Não

adianta vociferar contra esta nova realidade política e constitucional!

Neste novo contexto, a direita portuguesa só poderá governar se os partidos que a

compõem tiverem maioria absoluta no parlamento, o que não é fácil num país em

que a esquerda é cultural e sociologicamente dominante, ou se o fizer com base num

programa de governo moderado, que não mereça a rejeição liminar e taxativa de toda

a esquerda. É esta a realidade política que o futuro nos apresenta, não só em Portugal,

mas na maior parte das democracias europeias, em que as soluções governativas

resultarão essencialmente do diálogo e dos entendimentos possíveis entre as várias

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António Barreto Archer 4

forças políticas representadas num parlamento com tendência para ser cada vez mais

diverso e atomizado.

A anterior liderança do partido foi incapaz de compreender este novo contexto

político-constitucional e prosseguiu uma linha de orientação do partido sem qualquer

renovação, centralizada e centralizadora, baseada apenas na transmissão para as

estruturas distritais e concelhias do CDS de recados e sound bytes destinados a

transformar os militantes em simples porta-vozes do discurso demagógico da direção

nacional.

Um exemplo desta orientação insensata do partido, que acabou por ser a machadada

final nas aspirações eleitorais do CDS, foi o episódio de aprovação atabalhoada de

uma lei na Comissão Parlamentar de Educação, em sintonia com o PCP e o Bloco de

Esquerda, que daria ao todo poderoso sindicato dos professores, liderado por Mário

Nogueira, ganho de causa na sua intransigente e egocêntrica luta política pela

recuperação total do tempo de serviço, isentando os professores da crise que tanto

sofrimento causou à generalidade dos portugueses. Tratava-se de um alinhamento

com a extrema esquerda que poderia colocar em causa a sustentabilidade das contas

públicas e a estabilidade social do país, ao abrir uma perigosa caixa de Pandora de

reivindicações salariais dos outros corpos especiais da função pública.

Atabalhoadamente justificada pela líder do partido, esta posição do CDS acabou por

se transformar num ato de suicídio político, pela forma hábil como foi aproveitada

pelo Primeiro-Ministro. Forçada a recuar sem assumir claramente o erro, a liderança

do partido perdeu toda a sua credibilidade, dando ao país um triste espetáculo de

irresponsabilidade política.

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António Barreto Archer 5

A estratégia de oposição delineada pela comissão política nacional do partido para

ser protagonizada por Assunção Cristas, destrutiva e centrada no ataque obsessivo à

pessoa do primeiro-ministro, devastou por completo a imagem simpática e afável

com que a líder conseguiu obter tão bons resultados na eleição para a Câmara

Municipal de Lisboa. Com o apoio e conivência de quem estava à sua volta, esta

estratégia de oposição e a aposta feita na exibição cool da sua pessoa no mundo social

e cor-de-rosa criou uma contradição insanável de personalidade e transformou a líder

numa figura radical e incoerente, que acabou por merecer a rejeição generalizada dos

eleitores.

Apesar dos avisos de muitos simpatizantes e militantes e do péssimo resultado de

Nuno Melo nas eleições Europeias, que afundou o partido com um discurso

anacrónico a lembrar os tempos do PREC, a comissão política nacional persistiu em

governar o partido com base num taticismo destinado a manter o CDS refém do

sectarismo de um punhado de pessoas que o dirigem há muito tempo como um grupo

de interesses ou um clube de amigos.

Com o aparecimento de novos partidos, bem ancorados nas suas posições ideológicas

de direita, o CDS teimou em querer ser o “albergue espanhol” da direita portuguesa,

onde caberiam todos - liberais, conservadores, democratas cristãos e nacionalistas -

não percebendo que o liberalismo exacerbado é estruturalmente imiscível com a

democracia cristã e o espaço dos liberais e dos nacionalistas estava em vias de ser

ocupado por forças partidárias nadas e criadas nesses específicos ambientes

ideológicos e sociológicos.

Com esta desorientação do CDS, o PSD teve todo o tempo para se recompor da crise

interna gerada pelo fim traumático da era de Passos Coelho. E António Costa

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António Barreto Archer 6

conseguiu, numa manobra política de antecipação a propósito da questão dos

professores, ao estilo de Sá Carneiro, salvar o PS de uma possível derrota nas eleições

europeias e catapultar o partido para uma sólida vitória nas eleições legislativas de 6

de outubro de 2019.

Não foi apenas a líder, mas toda a comissão política nacional do CDS, que conduziram

o partido à situação agónica em que este se encontra atualmente, com um resultado

eleitoral de 4,2% e um grupo parlamentar reduzido a 5 deputados. Não nos iludamos!

O estado do partido é muito mais grave do que a situação análoga que o CDS viveu

em 1987 e 1991, pois nessa altura havia a justificação do fenómeno do “arrastão” de

votos provocado pela maioria absoluta do PSD de Cavaco Silva, que, sozinho,

conseguiu obter mais de 50% de votação.

A verdade é que o CDS corre risco de extinção se continuar na mesma linha e com os

mesmos dirigentes!

Está na hora dos democratas-cristãos deste país, dos milhares de militantes e

simpatizantes do CDS fundado por Freitas do Amaral e Amaro da Costa, se

mobilizarem para dar um novo rumo ao partido, refundando-o e renovando-o, para

que este se torne, verdadeiramente, num partido defensor do humanismo

personalista, fiel à defesa dos valores fundamentais da ética cristã e exigente no que

respeita ao exercício dos cargos políticos com independência dos grupos de interesses

e com elevado sentido de Estado.

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2 – Renovar o partido regressando à matriz ideológica originária

A partir do passado dia 6 de outubro de 2019 nada será como dantes no espetro

político-partidário da direita em Portugal. Depois de algumas tentativas falhadas,

entraram finalmente na Assembleia da República dois novos partidos que se

posicionam neste campo ideológico: um partido liberal nos costumes e na economia,

capaz de defender sem timidez os grandes interesses económicos privados, que

considera serem o único motor de criação de riqueza nacional, que ocupará o espaço

político onde alguns dos atuais dirigentes do CDS se têm posicionado; e um partido

nacionalista, de direita radical, hábil na defesa das teses populistas e securitárias,

hostil à imigração e adepto de uma economia protecionista e antissocial.

Quanto ao grande partido que tem ocupado o espectro partidário à direita, o PSD,

pese embora a indefinição estratégica em que se encontra, tenderá a afirmar-se como

um partido social democrata, que se distinguirá do PS mais pela sua origem

sociológica conservadora e não marxista, na linha da social democracia escandinava,

que tanto agradava a Francisco Sá Carneiro, do que pelas políticas que preconiza.

Neste novo quadro de uma direita plural, quer em termos partidários quer em termos

ideológicos, julgo que a única hipótese de sobrevivência autónoma do CDS será a sua

afirmação como partido democrata cristão, de vocação interclassista. Teremos então,

no espectro partidário da direita em Portugal quatro partidos bem individualizados,

entre os quais o CDS poderá destacar-se como uma força política aberta a todas as

classes sociais, mobilizadora de um projeto político alternativo capaz de renovar a

esperança dos portugueses na construção de uma sociedade mais livre, mais justa e

mais solidária. Mais liberdade significa valorizar a cidadania plena e responsável e

tornar o Estado verdadeiramente democrático e independente dos interesses

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António Barreto Archer 8

económicos e sociais que o condicionam. Mais justiça significa garantir a vigência

efetiva do Estado de Direito e dar a cada cidadão o que cada um merece por direito

próprio, numa sociedade mais equilibrada, que promova o mérito e o trabalho

honesto. Mais solidariedade significa reconhecer a imanente e absoluta dignidade de

todos os homens e mulheres e assumir o cuidado pelos mais pobres, vulneráveis e

desprotegidos como um objetivo essencial da política económica.

O CDS tem a obrigação histórica de defender em Portugal os valores proclamados

pela doutrina social da Igreja e, com particular acutilância, pelo Papa Francisco, que

são tão necessários no mundo atual. A defesa dos mais débeis, fragilizados e excluídos

é património ideológico da democracia cristã e não pode ser monopolizada pela

extrema esquerda, que o faz mais por razões materialistas, assentes numa dialética

económica, do que em nome da dignidade da pessoa humana. O CDS devia, por isso,

estar na primeira linha da defesa do aumento do salário mínimo, como forma de

combater a pobreza, e recusar a submissão das pessoas e das nações aos ditames dos

mercados financeiros. Sem esquecer a necessidade de criar uma cultura de trabalho,

responsabilidade e produtividade a favor do país, de modo a capacitar as empresas

portuguesas para vencerem os desafios da competitividade económica global.

Esta estratégia consistirá, em grande medida, na defesa, ao nível partidário, das ideias

que têm norteado o mandato do atual Presidente da República, Prof. Marcelo Rebelo

de Sousa, que com o seu humanismo de inspiração cristã e a sua preocupação em

falar diretamente para o povo e defender a inclusão de todos os cidadãos sem

exceção na vida do país, se transformou na grande reserva política da nação, com

elevadíssimos níveis de popularidade em todos os quadrantes políticos e sociais. O

Presidente da República Marcelo Rebelo de Sousa tem afirmado muitas vezes o seu

desejo de que exista um diálogo aberto e permanente entre todas as correntes

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políticas e ideológicas, com vista à construção de consensos nacionais que façam

Portugal avançar decisivamente num rumo de desenvolvimento sustentável.

Propomos, assim, que o CDS lidere um projeto político-partidário interclassista,

aberto à sociedade civil, protagonizado por um novo líder, que seja capaz de fazer o

que não foi feito durante a legislatura que terminou em 2019: uma oposição firme e

construtiva ao governo do Partido Socialista e a reafirmação da direita do espetro

partidário português na defesa das causas sociais e de um desenvolvimento

económico equilibrado e ambientalmente sustentável, quebrando a hegemonia dos

partidos de esquerda na preocupação por estes temas.

Não se trata da criação de um novo partido político de direita ou de centro-direita,

mas sim da reafirmação do CDS neste campo ideológico, com base num projeto

político sólido, protagonizado por novas figuras e assente numa leitura atualizada da

ideologia personalista de inspiração democrata cristã, que é hoje a grande alternativa

ao socialismo e à social-democracia. Um projeto aberto à participação de todos os

cidadãos, que aposte na formação ética e ideológica da sua base de apoio e defina,

com o contributo de todos, um programa e uma estratégia de longo prazo para o país

que possa constituir uma renovada esperança de progresso económico, social e

cultural para Portugal, verdadeiramente mobilizadora dos portugueses.

Num país desigual, onde as diferenças de rendimento são enormes, o nepotismo e o

clientelismo imperam e a autoridade é considerada repressiva, a cultura de esquerda

é naturalmente dominante. Mas isto acontece também porque não existe uma

cultura de direita capaz de acolher a esperança dos cidadãos numa vida melhor, que

é afinal o desejo de todos os seres humanos. Antes de mais é necessário construirmos

essa nova cultura. A afirmação dos valores universais do humanismo e a crítica

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fundamentada do relativismo e da negação das diferenças naturais e éticas entre as

pessoas, incluindo as de género, são a pedra de toque para uma nova cultura de

direita, moderna e solidária, que se proponha governar sem complexos uma

sociedade heterogénea, dando esperança aos cidadãos numa vida mais feliz. A defesa

da vida humana e da sua intangível dignidade é um princípio fundamental, bem como

a afirmação do papel primordial da família enquanto célula viva do tecido social.

Mas o CDS não pode reduzir o seu discurso a um registo radical, de rejeição irracional

ou odiosa das novas tendências sociais. Tem de dialogar criticamente com a esquerda,

de utilizar argumentos consistentes e de apresentar propostas adequadas ao tempo

em que vivemos, num aggiornamento permanente.

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António Barreto Archer 11

3 – Afirmação de um pensamento político coerente

Para se afirmar eleitoralmente, com o seu projeto ideológico próprio e as soluções

que propõe para o país, o CDS tem de mostrar coerência, sentido de Estado e

indisponibilidade para ceder ao oportunismo político.

Do ponto de vista da economia política, o modelo que o CDS deve propor aos eleitores

é o da Economia Social de Mercado, que, aliás, está intimamente ligado ao processo

de integração económica e política que deu origem à União Europeia. Este modelo

não é mais do que a conciliação entre a livre iniciativa, governada pelas leis do

mercado, e a justiça social, assegurada pela intervenção reguladora do Estado.

Historicamente, é um modelo de sucesso em muitos países europeus, como a

Alemanha, a Áustria, os países escandinavos ou a Itália do sorpasso, no pós-II Guerra

Mundial. E é uma alternativa clara ao modelo neoliberal capitalista que tem como

consequências a especulação financeira, que nos levou à crise económica global de

2008, e o aumento da diferença entre o topo e a base da escala de rendimentos, que

é gerador de desigualdade social e está na origem de crises e revoltas sociais, que

podem ser tão graves como as que se vivem atualmente em alguns países da américa

latina.

O modelo da Economia Social de Mercado está enraizado na doutrina social cristã e

aponta para um desenvolvimento sustentável e integrado da sociedade,

considerando não apenas os indicadores do crescimento económico e de

competitividade, mas também os indicadores que se referem à desigualdade social e

à pobreza, cuja erradicação deve ser objetivo fundamental da política económica. O

Estado tem a obrigação ética de intervir na economia com medidas reguladoras e

políticas públicas capazes de corrigir os excessos e arbitrariedades do mercado e

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impedir que os cidadãos sejam reduzidos pela globalização económica à mera

condição instrumental de consumidores, atuais ou potenciais.

Depois das últimas décadas de neoliberalismo e após a crise financeira iniciada em

2008, que foi tão funda, dolorosa e prolongada, a pergunta essencial que se coloca é

a seguinte: que tipo de sistema económico é mais propicio ao bem-estar das pessoas,

ao bem comum da sociedade? Sabemos que, mesmo no período antes da crise, a

ordem neoliberal, não só conduziu o mundo a um crescimento económico menor do

que em épocas anteriores, como fez com que a maior parte da riqueza se acumulasse

no topo da escala de rendimentos. A própria cura para a crise económica preconizada

pela litania neoliberal, assente na receita da austeridade punitiva ou redentora,

revelou-se um erro, capaz de matar o doente mais depressa do que a doença, já

assumido pelas instituições da União Europeia e pelo próprio FMI.

Existem pelo menos três grandes alternativas políticas ao neoliberalismo: o

nacionalismo de extrema-direita, o socialismo democrático (ou social democracia) e

aquela que para nós deverá ser a opção do CDS: o humanismo social cristão. A direita

nacionalista renega a globalização, culpando os migrantes e os estrangeiros por todos

os problemas económicos e sociais e como tem demonstrado a presidência de Donald

Trump nos EUA, está empenhada em reduções fiscais para os mais ricos e na

eliminação de programas sociais. O socialismo democrático tem realmente como

objetivo moderar os excessos do mercado e reduzir as desigualdades económicas,

mas tende a ver o indivíduo mais como peça de uma engrenagem coletiva, do que

como pessoa livre e responsável pelas suas escolhas.

Dialogando com as outras perspetivas, o CDS deveria afirmar a sua prática política

através da defesa de uma espécie de capitalismo ético, assente nos valores cristãos,

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António Barreto Archer 13

tão bem enunciados e desenvolvidos pela doutrina social da igreja católica, desde há

mais de cem anos. Trata-se de construir uma agenda económica capaz de restaurar o

equilíbrio entre o mercado, o Estado e a sociedade civil, no quadro do modelo já

acima descrito de uma economia social de mercado. O fraco crescimento económico,

a crescente desigualdade, a instabilidade financeira e a degradação do ambiente são

os quatro grandes problemas da economia atual e se todos eles nasceram do mercado

não poderão certamente ser resolvidos apenas pelo mercado.

Os governos têm o dever de promover o desenvolvimento económico a um ritmo

suficiente para permitir a Portugal abandonar a cauda da Europa em termos de

riqueza criada por habitante, o que não tem acontecido. Mas esse desenvolvimento

tem de ser equilibrado e sustentável, pelo que é necessária uma efetiva regulação dos

mercados através de normas imperativas, inspiradas pelos valores éticos

fundamentais do humanismo: a proteção dos mais vulneráveis, a paz e a segurança,

a defesa do ambiente, a dignidade do trabalho, a proteção da família, a função social

da riqueza, etc. É também tarefa do governo fazer o que o mercado não pode fazer

ou não quer fazer, tal como investir decisivamente em investigação científica

fundamental, na cultura, na educação, na saúde e na eficiência dos serviços públicos

essenciais.

No mundo atual, as questões ambientais assumem uma importância fundamental e

não podem ser abandonadas ao campo da esquerda e dos partidos ecologistas, pelo

que se impõe que, à direita, o CDS desenvolva um discurso ambiental devidamente

estruturado. Este discurso deve basear-se na defesa do desenvolvimento sustentável,

por meio de soluções equilibradas e integradas, assentes na dignidade da pessoa

humana e numa visão ecocêntrica do planeta, inspirada num ideal de harmonia entre

o homem e a natureza, e na solidariedade intergeracional. Dentro desta perspetiva,

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António Barreto Archer 14

as leis do mercado não podem prevalecer sobre as exigências de proteção ambiental

e de preservação dos recursos naturais.

O CDS precisa de recuperar a herança de Freitas do Amaral e Amaro da Costa, que

fundaram o CDS como partido centrista e deram-lhe a consistência programática e

ideológica, aspirando a que o CDS se tornasse num grande partido democrata cristão

interclassista, à imagem e semelhança dos partidos equivalentes nos países mais

desenvolvidos da Europa ocidental, como a CDU na Alemanha. Durante a primeira

fase da liderança de Freitas do Amaral o CDS chegou mesmo a conseguir 16% de votos

numa eleição legislativa!

Político e estadista brilhante, graças à sua acutilante inteligência e à sua excecional

formação jurídico-política, Freitas do Amaral foi um doutrinador, com uma profunda

cultura política, filosófica e histórica, escrevendo brilhantemente em várias áreas, e

manteve sempre o seu pensamento e as suas convicções de democrata cristão. Foi

presidente da União Europeia das Democracias Cristãs, onde exerceu grande

influência para acelerar a entrada de Portugal na então CEE, em paralelo ao esforço

de Mário Soares no seio da Internacional Socialista. Afastou-se do CDS quando o

partido tomou outros rumos ideológicos, negando a sua matriz fundacional centrista

e democrata cristã, mas isso não deve impedir o CDS de honrar a sua memória, pois

Freitas do Amaral foi sempre fiel a si mesmo e às suas convicções, mesmo depois de

se tornar independente, tendo sido por várias vezes chamado a altas funções políticas

nacionais e internacionais pelos partidos social democrata e socialista, com os quais

a doutrina social da igreja, de que sempre foi defensor, permite naturais e históricas

convergências, no plano político-económico.

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António Barreto Archer 15

O CDS deve, pois, recuperar a sua coerência, reconciliar-se com o seu passado e

retomar uma prática política consentânea com a sua matriz programática, idealizada

por Freitas do Amaral e Amaro da Costa, assente na doutrina democrata cristã, único

caminho que lhe permitirá crescer eleitoralmente num movimento interclassista,

aberto e tolerante, deixando de ser o pequeno partido de direita sem ideias nem

convicções em que ultimamente se tornou. É lamentável que na recente morte de

Freitas do Amaral, a líder do CDS não tenha sido capaz de dizer nada de substancial

sobre o fundador e primeiro presidente do partido, que foi uma figura ímpar da

história do Portugal moderno. Apenas os antigos líderes Ribeiro e Castro e Manuel

Monteiro salvaram a honra do partido, com as intervenções brilhantes que fizeram

na comunicação social sobre a sua figura.

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António Barreto Archer 16

4 – Ser oposição construtiva e aberta ao diálogo interpartidário

Um partido existe para defender e procurar que sejam postas em prática as ideias

que os seus membros consideram as mais adequadas para a construção de uma

sociedade mais pacífica, mais segura e mais justa, que proporcione a todos os

cidadãos maior bem-estar económico, social, cultural e ambiental. O que é necessário

ao país e valoriza o CDS, enquanto oposição ao governo, é a apresentação de

propostas construtivas, inteligentes e bem fundamentadas, que possam merecer a

aprovação no parlamento. Não basta apresentar propostas avulsas, sabendo à partida

que não serão aprovadas, apenas para ficar bem na fotografia. Há que procurar

efetivos consensos com o Partido Social Democrata e o Partido Socialista, baseados

na visão ideológica matricial do CDS, centrada na defesa de uma economia social de

mercado.

É fundamental que a prática política do CDS se mostre contrastante com a oposição

destrutiva que foi feita durante a anterior legislatura, que parecia ter como único

objetivo o regresso ao poder para contentar clientelas partidárias e retomar a política

de austeridade neoliberal. Esse período de acolhimento da Troika e dos seus ditames,

com os cortes nas pensões e nos salários, a permanente contração da economia e a

ausência de perspetivas de futuro, causou em milhões de portugueses um

traumatismo tão forte que, com o passar do tempo, se transformou numa impressão

neuronal de tipo emocional, que como nos ensinou o Prof. António Damásio no seu

“Erro de Descartes” é uma memória que dificilmente se apaga. Pelo que, enquanto o

CDS mantiver na ribalta política os protagonistas desse período e não reconhecer

humildemente os seus erros, jamais reconquistará a confiança desses inúmeros

portugueses que retêm a memória emocional das provações que sofreram durante o

período da troika.

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António Barreto Archer 17

O CDS deve ter um discurso centrado nas pessoas e na sociedade e não na crítica

cerrada da esquerda. É necessário um percurso de reconhecimento. E reconhecer é

antes de tudo saber quem é o outro e quem sou eu, ouvir melhor e aprender a ver

em profundidade. Temos de nos tornar mais próximos do cidadão comum e dos seus

legítimos anseios. Apostar num Portugal mais desenvolvido e mais moderno, mas

também mais justo e mais solidário, pois para um humanista, o ser humano e a sua

felicidade são o padrão e a medida de todas as opções políticas.

Uma alternativa partidária forte na área da direita democrática deve seguir um

caminho separado e independente de qualquer outra força política, mas tem de estar

disponível para convergências com outros partidos, quando estejam em causa as

grandes reformas do Estado ou o superior interesse nacional. Nenhum partido se

pode fechar hoje sobre si próprio. Uma postura destrutiva e injuriosa dos adversários

políticos não se coaduna com os valores éticos da direita personalista e democrata

cristã e ainda que seja motivada por mero taticismo eleitoral, é prejudicial para o país

e para os portugueses e, na prática, tem conduzido os líderes partidários que a

adotam ao suicídio político, como aconteceu com Assunção Cristas.

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António Barreto Archer 18

5 – Dar voz às bases do partido e à cidadania A nova direção do CDS deve ter como linha estruturante de ação partidária dar voz e

relevância política às bases do partido e, em especial, à juventude e aos trabalhadores

democratas-cristãos. Deve apostar na promoção de uma cidadania ativa e informada,

no apelo à participação política dos independentes e na afirmação de um partido

interclassista, qualificado através da escolha dos seus dirigentes com base na sua

elevação ética e no seu mérito cívico e profissional.

Há que romper com o modelo de organização partidária centralizadora, dominada

pelo sectarismo de um punhado de dirigentes, que gerem o partido como se este

fosse uma “quinta” sua, olhando para as estruturas e os militantes de base como

meras correias de transmissão do seu discurso demagógico de crítica obsessiva e

destrutiva dos adversários políticos.

É urgente implementar estatutariamente a eleição direta do Presidente do Partido,

que é o método mais democrático de escolha do líder, que já há muito foi adotado

por PS e PSD, uma vez que é menos propício a manobras de bastidores que possam

influenciar o resultado das votações nos congressos.

Os dirigentes nacionais do CDS e os deputados eleitos deverão dar um apoio

permanente às estruturas locais e aos militantes de base, através da disponibilização

de formação política e ideológica, de informação e de apoio técnico e logístico

adequado, pois os militantes de base são os verdadeiros impulsionadores do

crescimento e da implantação do partido.

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António Barreto Archer 19

Neste contexto, defendemos a valorização das organizações autónomas, Juventude

Popular e Federação dos Trabalhadores Democratas Cristãos, através de um

aprofundamento permanente do diálogo, ouvindo-as obrigatoriamente em parecer

antes de ser definida qualquer opção partidária em matéria de juventude ou em

matéria laboral e apoiando-as política e materialmente para que tenham condições

adequadas de dignidade e eficácia. Cada uma destas organizações, JP e FTDC, deverá

indicar um candidato a Deputado para figurar nas listas em lugar previsivelmente

elegível, para enriquecimento de um futuro grupo parlamentar do CDS nos temas

relacionados com a juventude e com o mundo do trabalho.

Os eleitores têm consciência que, muitas vezes, elegem representantes a tempo

parcial e com outros interesses económicos ou mediáticos. Precisamos de titulares de

cargos públicos a tempo inteiro, que se entreguem totalmente ao compromisso

assumido com os eleitores, exercendo os seus cargos com responsabilidade e espírito

de missão e privilegiando o contacto direto com o povo.

Os Deputados à Assembleia da República são eleitos por círculos eleitorais

geograficamente definidos na lei, pelo que deverá abolir-se a imposição, pela direção

nacional do partido, de candidatos que não sejam residentes ou naturais do círculo

eleitoral por onde se candidatam, já que essa prática enfraquece a democracia

representativa e é uma desconsideração grave para com os militantes e simpatizantes

do partido nessas regiões.

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6 – Ser farol de esperança para os portugueses

O CDS deve apostar na instauração em Portugal de uma dinâmica social de

cooperação e concertação, aberta à integração de todos, mesmo daqueles que sejam

oriundos de outras geografias e tenham heranças culturais distintas, desde que

aceitem responsavelmente tomar parte numa sociedade que não renega os valores

éticos fundamentais em que se encontra histórica e culturalmente baseada: a paz, a

ordem pública, a justiça, o trabalho, a solidariedade. Não podemos admitir uma

imigração massificada ou descontrolada, que ponha em causa a estabilidade social do

país e os valores da nossa tradição cristã, que nos estruturaram como um dos mais

antigos Estados-Nação europeus. Uma filosofia de integração através da cooperação

responsável tem potencial para se sobrepor aos ideais da competição e do conflito,

que predominam nas relações económicas atuais, ainda hoje marcadas pelo

materialismo dialético pós-hegeliano. É necessário que as pessoas se organizem em

rede para trabalharem juntas para um futuro melhor e embora os mercados tenham

um papel crucial na interação económica e social, só cumprirão os objetivos do

desenvolvimento sustentável se forem governados pelo Estado de Direito e sujeitos

ao seu controlo democrático.

O capitalismo ético deve procurar a construção do bem comum. Para isso é necessário

enfrentar o problema da concentração excessiva de poder no mercado. Ao

explorarem as vantagens do acesso a grandes mananciais de informação sobre os

consumidores e os seus comportamentos (big data), as empresas e organizações

financeiras globais adquirem posições dominantes no mercado, que são perigosas

para os direitos fundamentais dos cidadãos. Com a sofisticação dos seus

conhecimentos tecnológicos e os enormes recursos financeiros que possuem, as

grandes empresas adquirem os potenciais concorrentes e criam barreiras à entrada

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António Barreto Archer 21

de novos players nos negócios, restringindo a concorrência e esmagando a pequena

iniciativa privada. Este fenómeno contribui para o fraco crescimento económico, para

o aumento do desemprego e para a desigualdade na escala de rendimentos. A menos

que os governos assumam um papel muito mais ativo do que aquele que o

neoliberalismo prescreve, estes problemas agravar-se-ão no futuro próximo, devido

aos previsíveis avanços da robótica e da inteligência artificial.

Como refere o Prof. Paulo Mota da Faculdade de Economia da Universidade do Porto,

no seu livro “Austeridade expansionista”, com o subtítulo “como matar uma ideia

zombie”, que é uma obra de referência escrita numa linguagem acessível mas muito

exata, a ideia da austeridade expansionista, apesar de ser uma ideia morta, continua

a caminhar, ou seja, é algo que se sabe que não funciona, mas que continua a ter

seguidores e a fazer estragos! É preciso que o CDS assuma perante os portugueses a

evidência, já reconhecida por muitos economistas e políticos conservadores, de que

a austeridade não produziu nenhum tipo de crescimento, tendo sido um fracasso em

todos os lugares e em todos os tempos.

Portugal precisa de um projeto político novo, que renove a esperança dos

portugueses numa alternativa credível à atual solução de governo liderada pelo

Partido Socialista. Um projeto que se distinga do ideário socialista, mas tenha uma

matriz ideológica sólida, assente numa visão personalista da sociedade e da vida,

inspirada nos grandes valores éticos da nossa tradição histórico-cultural, de génese

cristã.

Uma direita conservadora, personalista e democrática deve ser capaz de impedir o

Estado de controlar tudo e todos, mas deve combater também os “poderosos” que,

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António Barreto Archer 22

na sombra do poder, dominam muitas vezes os regimes políticos e a economia. O

capital não existe sem o trabalho e este é um direito fundamental, que dignifica o ser

humano, pelo que ser de direita não é opor-se ao mundo sindical ou demonizar as

conquistas sociais da esquerda, mas ser capaz de defender a conciliação entre o

trabalho e o capital, entre a liberdade individual e o bem comum da nação. A direita

não pode apresentar-se para governar apenas em situações de bancarrota, como

campeã da austeridade e da imposição de sacrifícios às classes sociais mais

desfavorecidas.

O português é um misto de sonhador e de homem de ação. A sua motivação não tem

raízes na vontade fria, mas alimenta-se da imaginação e de um idealismo emotivo. O

português é profundamente solidário, sensível e amoroso. E o amor está sempre na

base de todas as grandes obras humanas, expressões reais do amor ao próximo numa

sociedade solidária. A mentalidade portuguesa deu origem a um estado de alma

caraterístico que denominamos saudade. Saudade daqueles que nos precederam e

construíram o presente de que nos orgulhamos enquanto seus sucessores. O

etnólogo Jorge Dias definia a saudade como um estranho sentimento de ansiedade

que resulta da combinação de três tipos mentais distintos: o lírico sonhador, mais

aparentado com o temperamento céltico, o fáustico de tipo germânico e o fatalístico

de tipo oriental. Por isso, a saudade é umas vezes um sentimento poético de fundo

amoroso. Outras vezes é uma ânsia permanente da distância, de outros mundos, de

outras vidas, que leva à realização das maiores empresas. Outras vezes ainda,

sobretudo nas épocas de infortúnio, a saudade alimenta-se morbidamente das glórias

passadas e cai no fatalismo de tipo oriental, de que parece ser expressão artística o

nosso fado, cujo nome provém do étimo latino fatu (destino, fatalidade).

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António Barreto Archer 23

Este temperamento explica os períodos de grande apogeu e de grande decadência da

história portuguesa. Mas o português não degenerou, as suas virtudes e defeitos

mantiveram-se através dos séculos. As manifestações do seu caráter é que variam

conforme as circunstâncias históricas. Quando o português é chamado a

desempenhar um papel importante e difícil põe em jogo todas as suas qualidades de

ação, espírito de sacrifício e coragem e é capaz de grandes e gloriosos feitos. Mas se

o chamam a desempenhar um papel banal ou rotineiro, que não satisfaz a sua

imaginação, o português esmorece e falha frequentemente objetivos que à partida

se pensaria serem facilmente alcançáveis.

Em épocas extraordinárias, quando determinados acontecimentos históricos

puseram à prova o seu valor ou durante a gloriosa gesta dos descobrimentos, os

portugueses encheram-se de esperança e revelaram o seu génio em obras de

excecional valia. Porém, nos períodos de crise ou de estagnação instala-se em nós

uma espécie de apatia coletiva, um sentimento exacerbado de crítica e somos

dominados pela tal saudade fatalista.

Cabe-nos a nós, pois, portugueses de hoje, encarnar este génio intemporal,

ultrapassar velhos fantasmas, e, inspirados no passado que celebramos,

reinventarmos um futuro de desenvolvimento e de solidariedade. Num mundo global

e complexo, cheio de infinitas possibilidades de desenvolvimento, mas também de

inúmeras misérias e conflitos, a nossa missão é mais importante do que nunca:

inspirar os portugueses a olhar o futuro com otimismo e renovada esperança.

Partamos para esse futuro, com criatividade, inspirados nos versos do poeta chileno

Pablo Neruda, no sublime poema que escreveu sobre Portugal, intitulado"A lâmpada

marinha":

“Portugal, volta ao mar, a teus navios

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António Barreto Archer 24

Portugal volta ao homem, ao marinheiro, volta à tua terra, à tua fragrância, à

tua razão livre no vento, de novo… à luz matutina do cravo e da espuma.

Mostra-nos teu tesouro, teus homens, tuas mulheres, não escondas mais teu

rosto de embarcação valente posta nas avançadas do Oceano.

Portugal, navegante, descobridor de Ilhas, inventor de pimentas, descobre o

novo homem, as ilhas assombradas, descobre o arquipélago no tempo.

Navega, Portugal, a hora chegou, levanta tua estatura de proa e entre as ilhas

e os homens volta a ser caminho. A esta idade agrega tua luz, volta a ser lâmpada

aprenderás de novo a ser estrela...”

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7 – Conclusão

A afirmação dos valores universais do personalismo, que vê os seres humanos como

pessoas e não como peças de uma engrenagem coletiva ou meros consumidores, e a

oposição fundamentada ao relativismo e ao individualismo devem constituir a base

doutrinária de um renovado CDS. Um CDS que se afirme numa sociedade

heterogénea e em mutação, convictamente, como alternativa política no campo da

direita moderada. Uma direita moderna e solidária, capaz de dar esperança aos

cidadãos numa vida mais feliz, que é afinal o desejo elementar de todos os seres

humanos.

A defesa da vida humana e da sua intangível dignidade é um princípio fundamental,

a afirmar contra qualquer cultura de morte, assim como o reconhecimento do papel

primordial da família natural enquanto célula viva do tecido social.

Mas o CDS não pode reduzir o seu discurso a um registo radical, de rejeição

injustificada de novas expressões sociais. Tem de saber dialogar criticamente com

todas as forças políticas, da esquerda à direita, utilizar argumentos consistentes e

apresentar propostas adequadas ao tempo em que vivemos, num aggiornamento

permanente, recusando a mera tática conjuntural ou o jogo mesquinho dos poderes.

Uma direita personalista e democrática deve recusar um Estado castrador da

iniciativa privada, mas não pode deixar de combater quaisquer formas não

escrutinadas de poder económico ou financeiro e de se opor tenazmente à corrupção

e ao nepotismo.

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António Barreto Archer 26

Eticamente, o CDS deve centrar-se na defesa do personalismo e da dignidade da

pessoa humana, fundamento básico do princípio constitucional da igualdade. Deve

combater o primado dos interesses sobre os valores, do casuístico sobre o

importante, do individualismo sobre a solidariedade, do ceticismo sobre a esperança.

Deve saber conservar os valores fundamentais da vida em sociedade, combatendo o

relativismo amoral e o consumismo desenfreado.

Economicamente, o CDS deve defender uma economia social de mercado,

transparente, eficaz, que elimine o desperdício irresponsável de recursos coletivos,

mas em que as preocupações sociais estejam presentes. Uma economia que seja

capaz de conciliar o crescimento económico com o desenvolvimento pleno do ser

humano, nos planos social, cultural e ambiental.

Socialmente, o CDS deve desenvolver os ensinamentos da doutrina social cristã, na

defesa dos pobres, dos excluídos, dos que sofrem a solidão e a ignorância, fazendo

suas as causas socias e assegurando a sustentabilidade do Estado Social. O CDS deve

saber exprimir equilibradamente o direito ao trabalho e o dever de trabalhar,

valorizando o mérito e defendendo a conciliação entre o trabalho e a vida familiar,

bem como a indispensável regulação ética do capitalismo, tendo em vista o objetivo

maior da prossecução do bem comum.

Ambientalmente, o CDS deve defender o desenvolvimento sustentável, por meio de

soluções equilibradas e integradas, assentes na dignidade da pessoa humana e numa

visão ecocêntrica do planeta, inspirada num ideal de harmonia entre o homem e a

natureza. Dentro desta perspetiva, as leis do mercado não devem prevalecer sobre as

exigências de proteção ambiental e de preservação dos recursos naturais, face ao

imperativo da solidariedade intergeracional.

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António Barreto Archer 27

Do ponto de vista europeu, o CDS deve saber exprimir o direito à afirmação das

culturas e línguas dos diferentes povos e nações e defender o aprofundamento do

princípio da subsidiariedade com a menor erosão possível da soberania. O CDS deve

lutar contra uma Europa burocrática, adormecida, egoísta e espiritualmente

redutora.

Estruturalmente, o CDS deve preconizar o robustecimento ético do Estado de Direito

Democrático enquanto garante da paz e do bem comum. Um Estado de rigor, que

esteja realmente ao serviço da sociedade e não das suas próprias conveniências.

O CDS deve pugnar por uma melhor e mais célere administração da justiça, por uma

segurança eficaz e humanizada, pela coesão do território e por um sistema fiscal

redistributivo, que favoreça o trabalho, a iniciativa privada e a natalidade. O CDS deve

empenhar-se numa educação que não seja apenas informativa, mas verdadeiramente

formativa, tanto da inteligência como do carácter.

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António Barreto Archer 28

Nota biográfica do 1º subscritor da moção

António Casimiro de Freitas Borges Barreto Archer nasceu em Guimarães em 22 de

dezembro de 1967, vive e trabalha no Porto. Ingressou no CDS após as eleições

autárquicas de 2017, nas quais foi mandatário da candidatura de António Parada à

Câmara Municipal de Matosinhos, baseada no movimento independente SIM, que

teve o apoio eleitoral do CDS e obteve 15% dos votos. A sua filiação no CDS ocorreu

na sequência de um convite que lhe foi feito pelo então Presidente da Comissão

Política Concelhia de Matosinhos, convite esse que aceitou porque sempre foi,

ideologicamente, um democrata cristão, na linha do pensamento de Freitas do

Amaral e Adelino Amaro da Costa, e entendeu ser seu dever ético, na fase da vida em

que se encontrava, pôr os conhecimentos académicos e profissionais que teve a

felicidade de adquirir e alguma experiência de intervenção cívica e associativa que foi

obtendo, ao serviço dos seus concidadãos.

É Licenciado em Direito pela Universidade Católica Portuguesa (2001) e Pós-Graduado

em Direito do Ordenamento, Urbanismo e Ambiente pela Faculdade de Direito da

Universidade de Coimbra (2005). É também Licenciado em Engenharia Química pela

Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (1990) e Mestre em Engenharia

do Ambiente pela mesma Faculdade (1997). Realizou cursos de pós-graduação

especializada em Inovação Tecnológica (Agência de Inovação, 1993), Avaliação de

Impacte Ambiental (IPAMB, 1996) e Direito do Petróleo (Sociedade Portuguesa de

Direito Internacional, 2014).

Exerce a sua atividade profissional como advogado, com escritório no Porto, tendo,

para além do patrocínio de mais de quinhentos processos judiciais, liderado mais de

uma centena de projetos na área jurídica, incluindo projetos de investimento público

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António Barreto Archer 29

e empresarial, na área da agricultura e setor primário (petróleo e gás), indústria,

comércio e serviços. Atualmente, é o líder e CEO do Consórcio de Advogados Archer

& Associados, projeto que integra 6 advogados e da sociedade Archer Consulting,

dedicada à consultoria económico-financeira, onde atua também como

engenheiro/jurista e consultor. É ainda professor na Universidade Lusófona do Porto

e na Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto, onde tem lecionado cadeiras

de direito e engenharia, nos domínios do ambiente, da política energética, da

proteção civil, do urbanismo e da ética.

É autor de diversos trabalhos científicos e académicos, vinte e cinco publicações nas

áreas da engenharia, direito e ética e do livro "Direito do Ambiente e

Responsabilidade Civil", publicado em 2009 pela editora Almedina. Tem participado

como orador em diversos colóquios, seminários e conferências sobre temas técnicos

e jurídicos e foi formador durante mais de 15 anos nos Cursos de Ética e Deontologia

da Ordem dos Engenheiros. Fez ainda três estágios profissionais em Itália, nas áreas

da gestão e engenharia industrial (1994, 2002 e 2005), abrangendo domínios como o

tratamento de efluentes industriais líquidos e gasosos, a refinação de óleos e a

produção de biodiesel.

Na Ordem dos Advogados exerceu os cargos de Presidente de Delegação, Vogal do

Conselho Geral entre 13 de maio de 2013 e 10 de janeiro de 2014 e Presidente da

Comissão Nacional de Estágio e Formação entre 2014 e 2017. É Membro Sénior da

Ordem dos Engenheiros, onde exerceu os cargos de Vogal do Conselho Regional do

Norte do Colégio de Engenharia Química no triénio 1998/2001, Vogal do Conselho

Disciplinar da Região Norte no triénio 2001/2004 e de Vogal do Conselho Jurisdicional

no triénio 2016/2019.