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O MIRACULOSO uma boa idéia 51

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uma boa idéia 51 1 7 2 ternativa eficaz para enfrentar a degradação dos centros urbanos, como forma de democratizar e humanizar as cidades. Sim, porque a circulação de automóveis já tem ao seu lado montadoras, empreiteiras, governo, publi- cidade. A garantia dos direitos dos não-motorizados conta em sua defesa apenas com o legítimo poder de reivindicação dos cidadãos.

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Page 1: MIRACULOSO7

1O MIRACULOSO

uma boa idéia 51

Page 2: MIRACULOSO7

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Depois de algum tempo sem circular, e mais uma

vez mostrando que ainda tem fôlego, a 7ª edição

do jornal O Miraculoso traz boas idéias e come-

mora os 51 anos da nossa menina Brasília, já tão

cheia de histórias pra contar e muito ainda por

construir. Além do aniversário de Brasília, O Mi-

raculoso 7 celebra um ano de seu nascimento. E

com 7 edições cabalísticas, a equipe miraculosa

mostra sua garra e sua presença na cidade e de-

monstra que veio para ficar, apesar das tantas

adversidades e contrariedades. Sendo a primei-

ra edição de 2011, vamos trabalhar miraculosa-

mente para que 2012 seja bem preparado, no

projeto de caminhar junto com os candangos

de cada dia, que construímos Brasília todos os

dias, e seguirmos como canal alternativo brasi-

liense. De edição em edição os passos da grande

viagem são trilhados na busca do MIRACULOSO.

Nos vemos na estrada!!!

e d i t o r i a l

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Muito já foi dito sobre a tragédia de Porto Alegre, mas gostaríamos de chamar atenção nesse texto para algumas das reações a esse evento que marcou a todos nós, entusiastas das bicicletas. A maioria delas nos causou espanto, tristeza e mesmo indig-nação. São falas que misturam conformismo, con-servadorismo, preconceito e paranóia. E que acabam por reproduzir uma visão equivocada da Bicicletada e até mesmo das pessoas que utilizam bicicletas como meio de locomoção.Muitos comentários fazem referência ao direito de ir e vir dos motoristas, que supostamente seria afetado pelas manifestações da Bicicletada. Antes de mais nada: achamos uma pena essas pessoas não se levantarem com a mesma ve-emência pelo direito de ir e vir de ciclistas e pedes-tres, que é ameaçado TODOS OS DIAS. Fariam muito mais diferença.å

Sim, porque a circulação de automóveis já tem ao seu lado montadoras, empreiteiras, governo, publi-cidade. A garantia dos direitos dos não-motorizados conta em sua defesa apenas com o legítimo poder de reivindicação dos cidadãos.

O raciocínio se estende para as críticas ao ?método? da Bicicletada. Lemos várias falas condenando o fato de a Bicicletada ?fechar? vias (coisa que só fazemos de forma localizada e durante um certo tempo, diga--se de passagem). Outra vez: adorariamos vermos essas pessoas se manifestando com a mesma ve-emência contra o fechamento completo e DIÁRIO, pelo menos DUAS VEZES POR DIA, das principais vias da cidade por automóveis.

A bicicleta é um veículo, e como tal não precisa pedir autorização da polícia ou quem quer que seja para transitar. Pelo contrário: seu uso devia ser não auto-rizado, mas estimulado pelo poder público como al-

ternativa eficaz para enfrentar a degradação dos centros urbanos, como forma de democratizar e humanizar as cidades.

Aliás, quem critica o fato de a Bicicleta ?fechar? vias precisa antes de tudo superar a mentalidade de que rua é lugar só de tráfego. A rua não é só lugar de tráfego, mas também de encontro e de manifestação.

A massificação do automóvel acabou com as cidades, que nasceram para facilitar os encontros e trocas entre as pessoas. Ironicamente, o auto-móvel mostrou-se excelente para criar distâncias. Nas cidades modernas as pessoas já não se encontram mais nas praças e em outros lugares públicos. Por isso quem quer se manifestar hoje, se quiser ter visibilidade, tem mais do que nunca que ir para a rua. E isso é absolutamente legítimo, ainda mais quando se trata de uma manifestação pelo respeito daqueles

OS CARROS FECHAM AS RUAS,NÓS AS ENCHEMOS DE ALEGRIAmeio ambiente

distrito federal MANIFESTO BICICLETADA

A Bicicleta é espaço de visibilidade, encontro e festa. Iniciativa horizontal, sem líderes e aberta a tod@s. A cada mês, geralmente a última sexta--feira, no meio das buzinas e da fumaça, esta celebração permite troca

de idéias, articulação de projetos e ação direta em busca de uma cidade melhor, onde tod@s tenham direito de ir e vir com tranqüilidade.

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que também fazem parte do trânsito.

Vimos belas palavras sobre viver em sociedade. So-bre direitos e deveres que todos temos. Sobre a ne-cessidade de seguir regras. Concordamos com tudo isso. Mas viver em sociedade não é só isso. A civili-dade não brota das leis. Antes o contrário...

Viver em sociedade é antes de tudo saber que não somos indivíduos isolados, mas compartilhamos de vantagens e problemas em comum. É antes de tudo não enxergar só o próprio umbigo, mas ser capaz de olhar para o que está no seu entorno e compreen-der que somos corresponsáveis pela ?saúde? desse ?ecossistema?. Cidadania e civilidade é isso, e isso vale mais do que qualquer lei. As leis inclusive têm que ser refeitas e se for o caso desobedecidas se atentarem contra isso.

Sabemos que a cultura da bicicleta que existe em al-guns países ?não foi um presente dos poderes cons-tituídos, foi uma batalha ganha com muitos esfor-ços e de muitos?. Nada mais verdadeiro. A Holanda, por exemplo, hoje sempre citada como paraíso pra qualquer ciclista, só chegou ao que é porque muitos ?bicicleteiros? ousaram nos anos 60 criar interven-ções urbanas em favor da massificação das bicicle-tas. Quem não conhece, pode procurar saber o que foi o movimento ‘Provos’.

Mas claro, as pessoas de mente tacanha e coloniza-da vão dizer- como repetem que nem papagaio nes-se país há mais de 500 anos - que coisas assim não podem nunca dar certo no Brasil. Como se o Brasil fosse do jeito que é por obra (ou praga) divina, e não por conta de nossas escolhas e nossas iniciativas enquanto cidadãos. Como se faltasse aos brasileiros energia, criatividade, inteligência, capacidade de fa-zer diferente.Sem falar do preconceito de achar que um grupo de ciclistas com uma forma diferente de

organização significaria algo como uma ? turba sem controle?. A Bicicle-tada possui uma organização sim. Mas é uma organização horizontal, que respeita a diversidade e decide coletivamente. Não precisamos de líderes ordenando o que temos que fazer. Não precisamos oprimir alguém que comete um erro durante as bicicletadas. Não precisamos de uniformidade forçada nem disciplina militaresca.

Mulheres e homens, novatos ou veteranos, com capacete ou sem capa-cete, são tratados da mesma forma e têm o mesmo peso na nossa ?coin-cidência organizada?. E somos tão coesos e sintonizados que quando uma Bicicletada/Massa Crítica sofre um atentado como o que aconteceu em Porto Alegre, grupos de outras cidades e até de outros países repu-diam publicamente e se manifestam em solidariedade. Nossos umbigos são internacionais e se conectam a vários outros umbigos por aí.

Pior que isso, só a apologia à selvageria. Não conseguimos acreditar quan-do lemos várias pessoas defendendo a atitude do psicopata que tentou acabar com a vida de dezenas de ciclistas. Dizendo que os ciclistas ?de-ram motivo?. É como dizer que uma mulher é culpada por seu estupro por estar usando uma determinada roupa. ?Ridículo e acintoso. Um des-respeito às pessoas que por pouco escaparam da morte naquela rua. Que poderiam ser qualquer um de vocês, seus filhos, esposas, amigos. Uma lógica cruel que transforma vítimas em algozes.

Convidamos a todos/as que forem contra a barbárie motorizada e a favor da vida, contra o indivualismo e agressividade dos automóveis e a favor da gentileza, sustentabilidade e diversão das bicicletas a se juntar à Bi-cicletada Brasília toda última sexta do mês, a partir das 18h30, na Praça das Bicicletas, ao lado do Museu Nacional.

Continuaremos nas ruas, agora mais do que nunca. Quem quiser que du-vide: estamos fazendo história.

A Bicicleta é espaço de visibilidade, encontro e festa. Iniciativa horizontal, sem líderes e aberta a tod@s. A cada mês, geralmente a última sexta--feira, no meio das buzinas e da fumaça, esta celebração permite troca

de idéias, articulação de projetos e ação direta em busca de uma cidade melhor, onde tod@s tenham direito de ir e vir com tranqüilidade.

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Quinquagésimo primeiro aniversário de Brasília e novamente (a exemplo do ano passado) a Capital Federal é temário principal do Mi-raculoso: 51, uma boa idéia. Hoje com praticamente com 2,5 milhões de habitantes, o que não foi a idéia dos construtores de outrora é, sim, uma ótima idéia pra brasileiros de todas as regiões que fazem de Brasília seu lar.

Os construtores do Século XXI exultantes com a crescente de-manda por moradia pouco se importam se a capital, planejada em 1960 para abrigar 500 mil pessoas tem hoje cinco vezes mais. Cons-troem incessantemente novos setores, novas cidades e promovem o surgimento de prédios de até dezenove andares em cidades onde até então mal se viam sobrados.

Não em vão matéria de janeiro de 2011 da Revista National Ge-ographic chama de Ficção Urbana a cidade satélite de Águas Claras, cidade sem escolas públicas, sem biblioteca pública, sem hospitais e postos de saúde públicos que se ergue para abrir a uma classe média que a exemplo de dos demais moradores de Brasília está em busca de moradia, a construção de Águas Claras, segundo a citada matéria é comparável ao de Dubai.

Passado meio século de vida, não há como retroceder, as pessoas precisam de moradia com dignidade e precisam de emprego na Ca-pital do País. Água, energia elétrica, saneamento, transporte públi-co, vias pavimentadas, vagas de estacionamento, hospitais e escolas, estão todos sucateados e decrépitos, isso quando existem, além de anos sem investimento estatal.

A tragédia ocorrida dia 10 de abril na UnB é prova disso, trata-se de um prejuízo que sequer deveria ser calculado em termos mone-tários, ou alguém acha que décadas de pesquisa e estudos nas mais diversas áreas são mensuráveis em dólares ou reais? Trata-se de um patrimônio imaterial que agora está perdido. Estudos do Plano Di-retor de Drenagem Urbana de 2009, já identificavam problemas na rede de drenagem pluvial próxima à UnB, por que nada foi feito? Cul-par os antecessores não resolve o problema, está claro pra todos que o Governo Arruda estava mais preocupado com desvios e atividades escusas, não à toa a população foi às ruas.

O atual governo que se diz “dos trabalhadores” e já começou ar-rochando e descumprindo compromissos de campanha com todas as categorias, de professores a policiais, tem muito que fazer, além da obrigação tácita de tratar os trabalhadores com a devida dignidade, tem que investir em saneamento, saúde e buscar formas de gerar emprego e renda à todos os desempregados, que não encontrando ocupação, buscam, muitas vezes, refúgio nas drogas e na criminali-dade.

51, a exemplo da popular e inspiradora cachaça pode, sim, ser uma boa idéia, mas pode também causar sérias dores de cabeça!

COLUNA POLÍTICApor Solano Teodoro

51 anos uma boa idéia!

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Como surgiu a Economia Solidária no mundo?

A necessidade de trabalhar em conjunto existe desde os primórdios, a exemplo dos índios e quilombolas, que já se organizavam em grupos. A Economia Solidária surge da necessidade dos trabalhadores também se organizarem de forma coletiva, a partir da

Revolução Francesa, e dos avanços tecnoló-gicos, que provocaram a exclusão de gran-de parte dos operários do mercado trabalho. Assim, eles começam a formar grupos para a geração de emprego e renda, buscando so-breviver a partir de seus próprios saberes e do enfrentamento das dificuldades através da união. A partir do movimento cooperativo iniciado em 1956, em Mondragon, na Es-panha, surgem as cooperativas e associações dos trabalhadores, primeiro no meio urba-no, e depois, no rural. No Brasil, essa nova forma de economia se difunde basicamente por volta de 1980, com a abertura de coope-rativas e associações, sendo conhecida como Economia Popular e mais tarde, passando a ser chamada de Economia Solidária. Em 2003 surge o Fórum Brasileiro de Economia Solidária e com ele, a iniciativa de enviar uma Carta de Intenções ao Governo Lula, para o direcionamento das ações de Economia Soli-dária enquanto Programa de Governo.

Cite um teórico importante na área.

Cresce o movimento pelo trabalho coletivo, que uti-liza os saberes pessoais dos trabalhadores para a superação de necessida-des e enfrentamento das injustiças do capitalismo.

ECONOMIA SOLIDÁRIAPor Allan Pimentel, Maria Pessoa e Camila Valadares

A necessidade de trabalhar em conjunto surgiu desde os primórdios. Índios e quilombolas fazem isso há séculos. Com a Revolução Francesa e o avan-ço tecnológico, começou a exclusão dos trabalhadores. Para enfrentar esse processo, grupos de operários em todo o mundo, desde os anos de 1980, tem utilizado a Economia Solidária para sobreviver dentro do sistema ca-pitalista excludente. Esse é o entendimento de Paulo de Morais, integrante

da Cooperativa Central do Cerrado e da Cáritas Brasileira, Organização Não Governamental da Igreja Católica. Na entrevista ao Jornal O MIRACULOSO, ele fala do processo de implan-tação e desenvolvimento desta nova forma de economia. Paulo é, também, importante liderança do Fórum de Economia Solidária do Distrito Federal e Entorno.

Há muitos pensadores importantes na área. Alguns autores descrevem as ações dos trabalhadores, enquanto outros come-çam a dimensionar essas ações enquanto projeto político para a sociedade. No Bra-sil, uma importante referência é o Secre-tário de Economia Solidária, Paul Singer. Ele escreveu diversos livros, no sentido de sistematizar essas ações enquanto Secreta-ria Nacional de Economia Solidária e en-quanto Movimento de Economia Solidá-ria. Moacir Gadotti, da área de educação, também é outro teórico brasileiro impor-tante; ele publicou em 2007 o livro: “Edu-car para Outro Mundo Possível”, lançan-do um olhar pedagógico sobre o Fórum Social Mundial - FSM.

Por que a Economia Solidária é uma boa ideia?

Porque ela preza por um Projeto de Desen-volvimento Econômico Solidário e Cole-tivo, trazendo a base da pirâmide: econô-

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7mica, social e ambiental. Economicamente, é direcionada para o coletivo, pensando em todos os aspectos e todos segmentos, se-jam eles os mais abastados, como boa parte dos negros, quilombolas e ribeirinhos, bem como as comunidades, sejam elas urbanas ou rurais, e também todas as classes sociais. Ambientalmente, propicia ao ser humano se perceber como responsável pelo local onde vive, vislumbrando melhorias para seus espa-ços e para o meio comunitário. Socialmente, conduz à organização política das pessoas e principalmente, de mulheres, no sentido de serem protagonistas de seus espaços, ou seja, vivenciando o trabalho num coletivo. Especialmente no plano econômico, leva à superação, no sentido do uso e compartilha-mento de saberes pessoais e coletivos diante das necessidades comunitárias. Dessa forma, o grupo pode, acima de tudo, produzir; con-sumir e propor espaços para a introdução de outras formas de consumo sustentável em seu próprio meio e para além dele. A Econo-mia Solidária traz essa ideia de um projeto coletivo, solidário e justo para a sociedade.

Como foi introduzida a Economia Solidá-ria em Brasília?

Com a formação da Secretaria Nacional de Economia Solidária, em 2003, logo em se-guida, o próprio Fórum Brasileiro de Eco-nomia Solidária veio a se formar. Em 29 de maio de 2003, o Fórum Brasileiro fez uma reunião com mais de quatrocentas pessoas, ensaiando a difusão do movimento para todo o Brasil. No Distrito Federal, começou com a junção de várias associações, Organizações Não Governamentais e pessoas interessadas no tema, formando o Fórum de Economia Solidária do Distrito Federal e Entorno.

Agora ele vem organizando tanto as associa-ções, como cooperativas e políticas públicas de economia solidária para Brasília. Esse foi o marco em que começou a Economia Soli-dária local, com a parte mais orgânica e com o instrumento deliberativo, que é o Fórum.

Como é o funcionamento do Fórum de Economia Solidária do Distrito Federal e Entorno?

O Fórum é como um catalizador de ações, sobretudo, um propulsor de ideias, onde todos se reúnem. O Fórum é formado por três segmentos: os empreendimentos, onde estão as associações e cooperativas; os ges-tores públicos; e as assessorias. Os empre-endimentos são aqueles que fazem as ações diretas na base, que produzem, consomem e também podem propor políticas públicas. Os gestores são aqueles que se organizam no Estado, para que os empreendimentos e a sociedade absorvam essas políticas públicas. As assessorias podem trazer tanto a parte or-ganizacional da formação técnica e política como ajudar a organizar os empreendimen-tos dentro das suas necessidades, de forma que possam dar sua contribuição à sociedade através de seus produtos. É importante que esses grupos participem enquanto conjunto, e o Fórum traz esse aspecto de propor po-líticas públicas, dimensionando-as nos cam-pos econômico, ambiental e social. Para a sociedade, é importante ter um instrumen-to, onde dialogamos a Economia Solidária, fazendo com que as necessidades de todas as bases, dos empreendimentos, gestores ou assessorias, sejam discutidas.

Quais são as principais experiências de Economia Solidária em Brasília?

Nós podemos citar as ações, como as de um Projeto chamado Rede de Empreen-dimentos de Economia Solidária, que é gestado pela Cáritas, que consegue orga-nizar os empreendimentos em sua base, a partir de doações feitas pela Receita. Dessa forma, os grupos são organizados nos seus espaços, onde podem desenvolver tanto a geração de renda, como a parte organizati-va e gestacional, com a recepção de produ-tos e a comercialização. Então, pode haver a inserção de recursos nos empreendi-mentos, sejam eles para formação ou para a compra direta no investimento. Temos ações de outros projetos, como as do Cen-tro de Formação em Economia Solidária – CFES, que traz a parte da formativa do que é a Economia Solidária, para os for-madores, para que sejam propulsores dessa forma de Economia em seus espaços. Há um mapeamento de Economia Solidária, que identifica empreendimentos para que eles possam propor mais políticas públi-cas. Há outras ações da Incubadora Social da Universidade de Brasília - UnB, que ajuda na assessoria dos empreendimentos, bem como na ajuda mútua entre eles.

Paulo, O MIRACULOSO agradece a sua participação na nossa 7ª Edição.

Eu é que agradeço a oportunidade de di-vulgar a Economia Solidária como uma nova economia, visando a construção de um mundo melhor.

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No dia 07 de abril (quinta-feira) o Brasil presen-ciou um ato de violência contra crianças, o caso de Realengo no Rio de Janeiro, onde um jovem de 23 anos, entrou armado em uma escola muni-cipal e efetuou vários disparos contra crianças, deixando 12 mortas e 12 feridas.O caso reacendeu a discussão de vários temas, dentre eles a questão do armamento e da segu-rança nas escolas. Porém fator que é pouco, ou nada discutido, é o de que o ocorrido não é uma coisa particular do jovem que cometeu o crime. Ao contrário do que muitas pessoas, inclusive au-toridades do governo, afirmaram, ele não era um monstro, ele era um ser humano, se ele era um monstro a sociedade também o é, pois ele é um “sintoma” de uma “doença” da sociedade, doen-ça essa chamada individualismo/egoísmo, provo-cada pelo sistema capitalista/neoliberal no qual vivemos, o qual afirma que qualquer pessoa pode ser o que desejar (ser modelo, presidente, em-

O atual Superintendente Regional (Brasília) do

IPHAN – Instituto do Patrimônio Histórico e Artís-

tico Nacional, deve ceder seu importante papel a

outro(a) pessoa que seja capaz de fazer o papel

que se espera dessa instância pública: zelar pelo

patrimônio urbanístico de Brasília, por seu título

de Patrimônio Cultural da Humanidade.

Esse papel público implica numa atitude ativa, de

educação patrimonial, de atuação preventiva, de

esclarecimento continuado de nosso empresaria-

do imobiliário e de nossos políticos de Pandora.

O IPHAN é instância que é OBRIGATORIAMENTE

ouvida em todos os planos e em todas as ações

públicas de construção, de revitalização, de me-

lhoria (ou de “pioria”) urbana que acontece em

presário, etc.), basta apenas querer, o que não ocorre de fato, pois as circunstâncias sociais, cul-turais, econômicas, dentre outras, influenciam no que cada pessoa é e será. Essa vaga ilusão é vendida constantemente a todos e todas, em par-ticular aos e as jovens adolescentes e isso colabo-ra para a construção de um sujeito frustrado, que se decepciona com tudo e todos e que por causa dessa decepção, por ter fracassado, pode vir a cometer crimes iguais a este.Nosso modelo de sociedade está fracassado e não é por causa de falta de punições para os crimes, um exemplo disso é os Estados Unidos da América (EUA), “país modelo de democracia”, onde as leis são extremamente rígidas e o índice de criminali-dade e ocorrência de crimes como o cometido no Rio é altíssimo. Esse fracasso ocorre porque não estamos preocupados e preocupadas com o outro, com o fato de haver tanta desigualdade social e, principalmente, com o ensino e mentalidade que

Brasília – que, infelizmente, é reduzida ao Plano

Piloto, aos Cruzeiros, à Octogonal.

O episódio da tentativa de expansão do Setor Su-

doeste sobre o Eixo Monumental é a mais recente

e clamorosa demonstração de que a direção lo-

cal do IPHAN deve mudar, com urgência: o repre-

sentante do IPHAN declarou que essa operação

imobiliária era “totalmente normal”, como se

o IPHAN não passasse de uma instância dos Car-

tórios de Registro Civil, e não uma instância de

inteligência cultural, responsável pela defesa de

nosso patrimônio material e imaterial.

A discussão da tentativa de expansão do Setor

Sudoeste foi promovida pela Câmara Legislativa,

está sendo passado para nossas crianças, se é um ensino (não apenas do ponto de vista da escola, mas de todas as instâncias da sociedade, inclu-sive familiar) que (re)produz esse modelo indi-vidualista e egoísta ou um modelo que colabora para a construção de uma sociedade mais justa e menos desigual. Caro leitor e cara leitora, o fato ocorrido no Rio de Janeiro deve nos fazer (re)pensar a socieda-de, como estamos atuando, se estamos (re)pro-duzindo esse modelo individualista de sociedade, o qual faz com que cada pessoa se preocupe ape-nas consigo própria, pouco importando o que leva uma pessoa a cometer um crime destes e acredi-tando que isso é um problema do governo, o que não é, esse é um problema meu e seu, é nosso.

Jardel Santana, estudante de Psicologia epesquisador de Direitos Humanos.

pela iniciativa do Deputado Chico Vigilante, em 4

de abril de 2011. Essa é uma rara iniciativa, mas

que denunciou o poder, em Brasília, da corrupção

imobiliária, que não se detém diante de nada,

nem da desfiguração do Conjunto Urbanístico

de Brasília. A corrupção do solo, do uso do solo,

para as finalidades dos negócios de um círculo de

privilegiados, envolve poderosos urbanistas, po-

derosos políticos, poderosos representantes da

própria República do Brasil.

Será mesmo um Miraculoso Milagre para tirar essa

turma do poder, ainda mais na miserável conjun-

tura moral e política que é o governo Agnelo, que

se comporta como uma renovação do pior que ha-

via no comando de Brasília.

Fora com o Tabelião do IPHAN! Fora com os Urba-

nistas do Fim de Brasília!

Prof. FREDERICO FLÓSCULO PINHEIRO BARRETO, Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da UnB

Violência na escola do Rio de Janeiro

A P I O R D E F E S A D O P A T R I M Ô N I O U R B A N Í S T I C O D E B R A S Í L I A

A sociedade é responsável !

Page 9: MIRACULOSO7

Frederico Flósculo Pinheiro Barreto, profes-sor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da UnB

O Governo Agnelo mal começou, e já se mostra venal, oportunista, fraco diante das pressões dos especuladores e do grande cír-culo da corrupção de Brasília. Agnelo pensa que é muito esperto, e acha que terá um go-verno “fácil”, na medida em que fez alianças com praticamente todo o espectro político do Distrito Federal – até com Rorizistas e ex-Ro-rizistas.

Talvez queira repetir Roriz, um político da velha escola, que usava a máquina estatal com habilidade, crescendo a partir de seu uso para o assistencialismo e eleitoralismo. Roriz tomou conta de Brasília por 18 anos (1988-2006), de porteira fechada - se não contarmos sua direta descendência e genética no Gover-

no Arruda, sua traíra cria, seu primogênito po-lítico. Roriz envolveu todo o espectro político do Distrito Federal em sua rede de influência, e Agnelo tem os olhos na velha raposa.

Somente a mídia nacional e os setores ca-pazes de pensamento e investigação autô-noma e independente de nossa República (o Ministério Público Federal e a Polícia Fede-ral) foram capazes de denunciar seu destruti-vo padrão ético de ação política. Não fosse o Brasil, Roriz jamais cairia em Brasília. Brasília inteira foi (facilmente) desvirtuada e grilada ao longo da Era Roriz, e não há como voltar atrás.

Não dou vivas a essas autoridades e fun-cionários e colegas locais, que participam de um escandaloso processo de depredação dos espaços do Distrito Federal, de grilagem de seu território, de arrasamento de suas nas-centes, de sua água pura, que desaparece. Essas poderosas autoridades locais fazem parte dos piores problemas já surgidos na História de Brasília. Nada que não possa pio-rar ainda mais, não sou otimista diante do que vejo.

Os especuladores imobiliários não param de assediar o Governo do DF, sempre com sucesso. Neste mês de março de 2011, Ag-nelo anunciou um pacote de quase MEIO BILHÃO de reais para auxiliar as ingênuas construtoras de Brasília. Imaginem se José

Roberto Arruda fosse Governador do DF e anunciasse algo assim, com um Paulo Octá-vio sentadinho a seu lado. Seria triturado pela Opinião Pública.

O que um empresário multi-imobiliário como o Sr. Paulo Octávio deve, forçosamen-te, concluir: é muito melhor estar “de fora” de um governo fraco, tíbio, oportunista, como o de Agnelo Queiróz, do que “dentro” dele. Pau-lo Octávio e outros empresários terão, ago-ra, público acesso a oportunidades que não teriam num Governo Arruda. Agora o Setor Noroeste, dedicado às pessoas que podem pagar um ou dois MILHÕES de reais a apar-tamentos medíocres, decolará, de vez.

As prioridades do Governo Agnelo se tor-nam cada vez mais claras: ele parece re-petir as manobras insensatas da turma dos Aloprados do PT do Zé-Direceu, que pensa que ceder tudo o que os especuladores de-sejam é “bom para a GOVERNABILIDADE”. O problema dessa conduta é que ela é um beco-sem-saída, que só piora com o tempo. Em tempo recorde, o esperto Agnelo deve aprender como o ambiente, a ordem urbana, as expectativas políticas deterioram rápido no pequeno quadrilátero distrital.

O FALSO INÍCIO DO GOVERNO

AGNELO QUEIRÓZ

Page 10: MIRACULOSO7

Miraculoso entrevista Nicolas Behr

O Miraculoso conversou com o poeta cuiaba-no-candango Nicolas Behr. Além da cidade que foi sua musa inspiradora, Nicolas fala sobre meio ambiente, sobre o passado e re-vela que pretende finalizar a produção de poemas fragmentados sobre a cidade com o livro Ateus Pilotis, no qual está trabalhando. “O que eu queria dizer sobre Brasília dessa forma eu já disse”. O poeta quer partir para vôos mais inteiriços.

O Miraculoso – Como você sente esses 51 anos de Brasília?

Nicolas Behr - Bem, em primeiro lugar quero dizer que é um prazer estar aqui com vocês, eu gosto muito do Miraculoso, e já participei várias vezes. Eu acho que Brasília ainda vive os resultados dessa Caixa de Pandora nesses 51 anos. Em certo sentido a cidade é ainda refém desse escândalo, e não vai se livrar dis-so tão cedo. É muito triste Brasília estar co-memorando agora os seus 51 anos ainda com essa nuvem de suspeição, de acusações e de corrupção pairando sobre ela. Alias, Brasília virou uma cidade estigmatizada pelo Poder.

O Poder não merece Brasília. Eles tratam a cidade apenas como um balcão de negócios. Isso é muito triste.

O Miraculoso - O que que você acha que a gente pode esperar para os próximos 50 anos da cidade?

Nicolas Behr - Eu tenho uma preocupação muito grande de lembrar para os brasilienses e para os brasileiros o que que Brasília repre-sentou para o Brasil na passagem dos anos 1950 para os 1960. Com tanto escândalo, com tanta coisa ruim acontecendo, a gente esquece o que que Brasília simbolizou para o país. Brasília foi a maior realização do povo brasileiro, e inseriu o Brasil na modernidade. Foi um momento muito rico da nossa histó-ria, no qual o Brasil deu uma respirada entre a ditadura de Vargas e a ditadura militar. Eu acho que esse espírito de Brasília se perdeu. Esse espírito se burocratizou. Esse espírito ousado, criativo, se diluiu e se perdeu, e nós já temos problemas gravíssimos de cidades de dois mil anos, quando só temos cinquenta.

Nós temos vários desafios pela frente, prin-cipalmente pelo fato de Brasília ser a cidade

mais desigual do país. Essa desigualdade é um acinte, com uma periferia à explodir. as dife-renças sociais aqui são muito radicais, muito visíveis. Esse é um dos desafios, são muitos. É extremamente importante preservar o espí-rito de Brasília, que representa muito para o brasileiro apesar dele ter se esquecido disso. E por isso eu gostaria muito de que o nosso centro histórico fosse preservado.

Eu acho que o lago Paranoá vai começar a se-car, e vai ser preciso começar a buscar água da bacia do Corumbá ou do Descoberto. A Bacia do Paranoá vai ser ocupada por casas, pela cidade. As fontes naturais de água do lago são pouco protegidas. Nós temos o Par-que Nacional de Brasília, tem o Jardim Bo-tânico, com o Catetinho e a Fazenda Água Limpa, mas isso não é suficiente. Acho que a cidade vai crescer muito, vai virar uma me-trópole realmente. Brasília foi criada para ser um centro administrativo e virou um pólo de desenvolvimento, um imã, e é até hoje a eterna capital da esperança. Vamos passar um problema sério com a questão da água, que é o recurso natural mais escasso aqui no planalto central. Vamos ter que buscar água em Goiás, e isso trará alguns problemas ge-

ENTREVISTA

Nicolas Behr6

Por André Shalders e Diogo Ramalho

Brasília é bacana demais para o Poder, que não a merece

Page 11: MIRACULOSO7

Em Brasília tudo é muito oficial, muito chapa branca. Eu tenho uma teoria teoria de que Brasília só vai ser uma cidade feliz quando for

transferida a capital

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uma,

eu

acho

.

opolíticos. A gente vê cotidianamente a des-truição de nascentes aqui e as pessoas acham que isso não é nada, não é um problema. Não sei se estou sendo meio catastrofista, mas eu vejo um futuro meio sombrio, especialmente nessa parte ambiental.

O Miraculoso - Como era Brasília quando você chegou aqui?

Nicolas Behr - Em 1973 bra-sília era uma cidade bem pequena. E não era uma cidade arborizada. Quando eu digo cidade, me refiro ao plano piloto, pois fui um garoto de classe média do plano piloto, das quatrocentos, embora já houvessem cidades satélites.

E era uma cidade muito mais segura, com uma população muito menor. A gente andava pra cima e pra baixo, sem medo nenhum. O transporte público funcionava, por incrível que pareça. Eu cheguei aqui em 1974, andei doze anos de ônibus, e ia a todos os lugares dessa forma. Hoje isso é impossível.

O nosso sistema de transporte é uma ponta do iceberg do fracasso de Brasília. Eu acho que a nossa cidade em certos aspectos fra-cassou. Em outros ela teve sucesso, mas o transporte público é uma parte do nosso fra-casso. Brasília foi construída para ser uma ci-dade autorama, para ser o show-room da in-dústria automobilística que Juscelino trouxe para o país, da Ford, da Wolkswagen. Ela foi construída para o carro e vai ser destruída pelo carro.

A maior ameaça que nós sofremos em Brasília é o automóvel: sobre as áreas verdes, sobre a qualidade de vida. E isso simplesmente não é um problema, não é um assunto relevante. Eu gosto muito dessa questão do automóvel por que ela toca em vários pontos, por exem-plo na nossa cultura individualista, que diz que quem anda de ônibus é pobre. E então essa consciência individualista do carro está afogando a cidade e matando a cidade aos

poucos.

O Miraculoso - Como o sr. avalia esses cem dias de governo Agnelo?

Nicolas Behr - Eu desejo boa sorte ao Agne-lo. Acho que ele ainda não teve condições de incendiar a imaginação popular, por que o governante, quando chega, tem de dar um

baque inicial. Mas acho que ele tá tentando se desfazer das teias, das aranhas, das implicações de tudo isso. Eu acho que a cidade come-ça a dar uma respirada ago-ra, mas o choque foi muito violento.

O Miraculoso - Como é produzir produzir lite-ratura em Brasília?

Nicolas Behr - Eu sou um escritor não chapa--branca. Um escritor não oficial. Em Brasília tudo é muito oficial, muito chapa branca. Eu tenho uma teoria teoria de que Brasília só vai ser uma cidade feliz quando for transferida a capital, por que ela é bonita demais, ela é bacana demais para abrigar o poder, que não a merece. Aqui em Brasília há um ten-dencia, há uma coisa muito forte do Estado estar sempre querendo cooptar os escritores, os artistas. Temos que manter a visão crítica e não nos deixarmos levar pelo canto de se-reia das benesses oficiais.

(...)

As pessoas me perguntam muito se Brasília tem uma identidade cultural. Acho que ainda é muito cedo pra falar disso, afinal é uma ci-dade de 50 anos. Mas eu tenho uma teoria de que Brasília tem uma ideologia do Não. Não ao poder. Não à burocracia, que na verdade é a mesma coisa, Não à linha reta... Brasília é uma cidade que nasceu para ser transgres-sora. Todo esse autoritarismo da setoriza-ção nasceu para ser contestado, e Brasília é uma cidade para ser contestada. Tanto que o maior movimento cultural da cidade, que teve projeção nacional, foi o rock, e um rock

rebelde, um rock punk, não um rock bonitinho. Isso é mui-to significativo, acho que Bra-sília é a cidade do Não.

O Miraculoso - Como você caracterizaria o olhar da sua poesia sobre a cidade de Bra-sília?

Nicolas Behr - A minha poesia queria ter essa simplicidade do desenho de Brasília, essa luminosidade. Eu queria que a minha poesia fosse assim cla-ra, por que Brasília é uma cidade luminosa, uma cidade solar, muito original, muito espa-cial. Brasília são esses dois eixos se cruzando.

Minha poesia vê Brasília como uma cidade ins-tigante, um cidade provocativa, que trauma-tiza a gente, e a minha poesia é fruto desse trauma, eu acho. Como eu cheguei aqui com 14 anos, o impacto foi muito grande. Eu saí de Mato Grosso, saí do Mato para cair na Ma-quete. Brasília foi uma coisa muito estranha para mim, para alguém que era moleque de rua lá em Cuiabá, no sentido de roubar man-ga, pular muro, pescar... e aí chego aqui na 404 numa superquadra, sem árvores, aquela coisa estranhíssima, a maquete. A minha po-esia foi uma tentativa de me entender com a cidade, de sobreviver na cidade. Tanto que um dos primeiro poemas que eu fiz foi aquele que diz assim: SQS ou SOS, Eis a Questão. Mas aí eu fui me entendendo com a cidade. Até por que o modelo pode ser melhorado. Nós somos todos cobaias de uma idéia de cidade modernista: aqui se trabalha, aqui se diverte e aqui se vive. Essa é a proposta.

O Miraculoso - Quais são os seus planos para o futuro, em relação à produção?

Nicolas Behr - Eu escrevi três livros sobre Brasília: Poesília, Braxília Revisitada e Brasi-líada, e tá saindo um outro chamado Ateus Pi-lotis, que é o último livro meu sobre Brasília com esse estilo de poemas. O que eu queria dizer sobre Brasília dessa forma eu já disse.

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12

Agora vou procurar fazer o roteiro de um fil-me, uma ópera rock, uma outra história, por que esse veio esgotou, esse veio de falar de Brasília através de poemas fragmentados, es-parsos, já me cansou. Eu estou começando a plagiar a mim mesmo. A idéia é lançar esse livro, o Ateus Pilotis, no ano que vem, ou da-qui a dois anos, e partir para uma coisa maior ou menos fragmentada.

O Miraculoso - Como foi a sua juventude aqui? Alguns livros seus trazem um pouco disso.

Nicolas Behr - Eu tenho o privilégio de per-tencer á primeira geração que abraçou Bra-sília. Botou uma camiseta e assumiu Brasí-lia como musa, como idéia, como história. E muita coisa boa aconteceu nessa passagem dos 1970 para os 1980. Todo mundo muito jo-vem, muito disponível, muito afim de fazer as coisas. Então foi um momento assim mágico, e tudo isso acabou desaguando no Movimento Cabeças, que tem até um livro aí. Foi uma página de um livro bom. Descer dos blocos, ocupar a quadra... foi uma coisa muito im-portante para a fixação de Brasília enquanto uma cidade de verdade, com gente na rua.

O Miraculoso - E como foi a relação com a ditadura militar?

Nicolas Behr - Eu fui preso pelo DOPS no dia 15 de agosto de 1978, por posse de material pornográfico. Eles queriam me enquadrar na lei de segurança nacional como subversivo, mas não conseguiram por que não acharam lá em casa o mimeógrafo. Todos os meus livros eram mimeografados. O Mimeógrafo hoje não existe mais, foi substituído pela fotocópia. Todos os manifestos do movimento estudantil da UnB eram mimeografados também. Então eles deduziram: “o Nicolas tá imprimindo os livrinhos dele e tá imprimindo junto os ma-nifestos do movimento estudantil”Aí foram lá em casa, já no fim do governo Geisel, e me levaram, levaram o meu quarto todo, foi

tudo apreendido. O DOPS abriu um processo contra mim. Fui julgado e absolvido.

Quando eu vou nas escolas, as crianças per-guntam “tio, como era na época da ditadu-ra?” eu respondo: naquela época, uma reu-nião como essa não seria possível. Se um professor chamasse um poeta para falar com vocês, no dia seguinte ele era era expulso do quadro, ou levava uma suspensão... Digo isso para eles terem uma idéia de como era no tempo da ditadura. Tem muita gente que diz: “Ah, no tempo da ditadura que era bom”. Não, era péssimo, era horrível.

Eu participava do movimento estudantil. Es-tudava no Setor Leste e fui preso na UnB duas vezes. E uma coisa interessante é que quando o DOPS levou todo o material do meu quar-to, a única coisa que eles não devolveram foi uma faixa escrita “pelas liberdades democrá-ticas”. Era uma faixa de pano, que eu fui o último a enrolar. O cara que me prendeu lá no DOPS foi inclusive o mesmo que prendeu o Honestino Guimarães. E ele me disse assim: “você teve sorte, por que se fosse à uns cinco ou seis anos atrás a gente sumia com você”. Então eu fui preso numa época onde já se falava em abertura, em Figueiredo, etc.

(...)

Eu acho que hoje em dia é preciso mais gente com essa disposição de pôr a cara na rua para tirar reitor corrupto, governador corrupto. A juventude está sempre com a razão, dizia o Drummond. Ele dizia que “a razão está sem-pre com a mocidade”. O jovem ele não tem muita noção do perigo. Ele não tem essa res-ponsabilidade do adulto em relação à famí-lia, emprego, etc. Ele tem muito menos coisa a perder, digamos assim.

Eu acho que hoje o mercado de trabalho fi-cou muito mais acirrado. A competição au-mentou muito, então a prioridade do cara é conseguir um emprego, terminar o curso... eu vejo essa diferença. Mas eu acho que ain-da há muita coisa pra ser feita, muitos muros para serem derrubados. Essa atuação da ju-ventude é uma coisa que a gente queria ver mais até, por que os problemas não acaba-

ram. Os problemas estão aí, e eu acho que é necessário mais atuação. Por que eu acho que foi muito bom esse movimento todo mas foi uma coisa muito espasmódica, que deve-ria ter uma continuidade.

O Miraculoso - Agradecemos muito a oportu-nidade. é uma honra ter você na nossa 7ª edi-ção. E pedimos agora as suas considerações finais.

Nicolas Behr - Vou fazer minhas considera-ções finais lendo um poema.

Os candangos comiam bolinhos

de cimento, mastigavam barro,

bebiam sucos de tinta com

argamassa, respiravam poeira,

cospiam brita, babavam

cascalho, choravam areia,

urinavam lama, defecavam

concreto,

e transpiravam esperança.

Mais unzinho para nós.

Enquanto os candangos

dormiam, a cidade surgia.

Impulsionada pelo entusiasmo

do sonho de construir.

Diz a lenda que, em Brasília, os

edifícios e os monumentos

apareceram como que por

encanto,

espontâneos,

brotando do chão.

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13

por André Shalders

“As pessoas no Haiti são loucas pelo Brasil e pelo futebol brasileiro. Retirem as tropas e mandem professores de futebol!”. Esse foi um dos pedidos do sindicalista haitiano Saint--Cyr Louis Fignolé, secretário geral da Cen-tral Autônoma dos Trabalhadores Haitianos (CATH) em sua visita à Brasília. Fignolé foi re-cebido no auditório da CUT-DF por militantes de esquerda em um ato pela retirada das tro-pas do Haiti, na noite de 29 de março. Entre eles estavam a cantora Ellen Oléria, o rapper GOG e Markus Sokol, integrante do Diretório Nacional do PT.

Mais cedo naquele dia, Fignolé havia tido uma audiência com Maria do Rosário, titular da Secretaria de Direitos Humanos da Pre-sidência da República. Além de Sokol, que vem traduzindo as palavras do sindicalista do francês, alguns parlamentares petistas acompanharam Fignolé: o deputado federal Fernando Ferro (PE) e os deputados estaduais Adriano Diogo e José Cândido, de São Paulo. Fignolé solicitou à Maria do Rosário a retirada das tropas brasileiras que comandam a Mis-são da ONU para estabilizar o Haiti (Minus-tah, na sigla em francês) no país e o envio de médicos, engenheiros, professores e outros tipos de ajuda para a reconstrução do país.

Fignolé também entregou à Maria do Ro-sário um relatório produzido pela Comissão Internacional de Inquérito sobre a situação no Haiti, formada por representantes de mo-vimentos sociais do Haiti de vários outros países, entre eles o membro da direção na-cional da CUT, Julio Turra. As conclusões do relatório são bem claras: Em sua estadia de

Retirem as tropas e mandem professores de futebol!

mais de sete anos no país, a Minustah é res-ponsável por uma gama de crimes, desde a “mera” repressão à manifestações populares até estupros e roubos. Maria do Rosário disse à Fignolé que a Secretaria desenvolve alguns programas humanitários no país, como um programa de qualificação profissional para pessoas com deficiência. Ela também disse que encaminhará as demandas aos demais ministérios do governo, mas não assumiu po-sição favorável ao pedido do sindicalista.

Intertítulo - Um balanço da situação do país

A Minustah está no Haiti desde a queda do ex-presidente Jean Bertrand Aristide, em 2004. Daquela data até hoje, a saída da “mis-são de paz” da ONU já foi adiada oito vezes. Entre outras coisas, as forças brasileiras par-ticipam do chamado Programa ABC, no qual militares da Argentina, do Brasil e do Chile treinam a pequena Polícia Nacional Haitiana (PNH). O objetivo do programa é treinar cer-ca de nove mil policiais haitianos.

Muitas evidências da tragédia humanitária provocada pela Minustah no pais foram sen-do esquecidas ao longo do tempo. Em 2005, cerca de cem soldados do Sri-lanka foram ex-pulsos do país por quebrar regras de condu-ta (ou seja, por cometer crimes que vão da prostituição infantil ao estupro). O primeiro dos comandantes das tropas brasileiras no país, general Augusto Heleno Ribeiro, con-fessou em 2005, na Câmara dos Deputados, que sofria “pressões constantes dos EUA e da França para usar a violência”. Pelas regras do acordo com a ONU, a Justiça haitiana (ou o que sobrou dela) não está autorizada à julgar os soldados da missão de paz, incentivando a quebra das “regras de conduta”.

Fignolé chegou ao país na segunda feira (28). Em Brasília, Fignolé participou também de uma audiências com o Itamaraty e com a CNBB. Ele fará um tour pelo país, visitando as cidades de Salvador, no dia 30, Recife, no dia 31, e Maceió, dia 1/04.

“Quando passa um caminhão da Minustah, os haitianos gritam ‘béééé, béééé’, imitando o balido dos carneiros. Isso por que as tropas são notórias por roubar os cabritos dos cam-poneses, no interior do país”, conta Fignolé. Ele também acusou as tropas da missão de paz de serem responsáveis por terem levado ao país o vibrião da cólera, causando a morte de mais de mil pessoas em outubro passado.

Intertítulo - Diáspora africana

“Não dá pra acreditar que os militares trei-nados numa ‘missão de paz’ tenham adquiri-do todo esse know-how para subir nas favelas do Rio de Janeiro atirando e matando gente. A verdade é que as tropas praticaram com os negros haitianos antes de vir aqui reprimir os negros nas ocupações das favelas brasilei-ras”, afirmou o Gog durante o encontro.

“Não existe distância entre o povo haitiano e o povo brasileiro. Somos todos frutos da di-áspora da mãe África. E da mesma forma, o racismo também está presente em todas es-sas intervenções”. Talvez Gog não soubesse, mas o ex-presidente dos EUA, Bush, lhe deu razão durante uma terrível gafe cometida no dia 25/03, ao limpar as mãos na camisa de Bill Clinton depois de cumprimentar um hai-tiano.

Ao fim e ao cabo das discussões, Ellen Ol-léria comoveu os presentes com sua música intitulada Haiti.

Sindicalista haitiano vem ao Brasil denunciar o “jogo sujo” das tropas brasileiras em seu país.

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No dia 03 de Abril de 2011 completou-se 3 anos que o Movimen-to Estudantil da UnB ocupou a Reitoria para de lá só sair 15 dias depois.

A desocupação só ocorreu depois que o movimento de ocupação conseguiu:

a renúncia do Reitor Timothy Mulholland e do Vice Edgar Ma-miya e toda a gestão; eleição do Reitor pró-tempore; a decisão do Conselho Universitário por eleições parcialmente paritárias para eleição de Reitor e a aprovação pelo referido conselho para a realização do II Congresso Estatuinte da UnB, primeiro de sua história a vir a ser Paritário, com o objetivo de escrever-se uma nova constituição para a UnB.

Graças a esta histórica e vitoriosa ocupação e o voto decisivo dos estudantes da UnB, elegeu-se o atual Reitor José Geraldo de Sousa Junior, que entra agora no seu penúltimo ano de ges-tão sem ter cumprido a maioria e uma das principais promessas de campanha, Pauta Pétrea dentre os 26 pontos de pauta assi-nados para a desocupação da reitoria, o Congresso Estatuinte Paritário.

José Geraldo perdeu a chance histórica de promover um profun-do debate sobre a Universidade e o sentido que sua comunidade e nosso país faz dela, bem como a escritura de sua constituição de forma democrática ouvindo-se paritariamente estudantes, servidores técnicos administrativos, professores e a comunida-de do Distrito Federal.

Sem contar a promessa mote de campanha que nunca foi efe-tivada, a tal Gestão Compartilhada, José Geraldo ao deixar de realizar o Congresso Estatuinte no 1º ano de sua gestão, quando a Universidade respirava os ares da transformação, quando a UnB tinha acabado de dar um exemplo de luta para o mundo e andava rumo às profundas transformações de que necessita, curvou-se e aliou ao que retoricamente condenou na campa-nha, e seguiu sobre a mesma estrutura falida de regras e prá-ticas que levaram a UnB ao descalabro do noticiário policial cotidiano com denúncias de corrupção envolvendo toda a Admi-nistração Acadêmica.

O Magnífico deixou o Congresso Estatuinte para ser realizado a pouco menos de 1 ano da eleição para a Reitoria, quando os mais diversos interesses retomam a cena da vida acadêmica com olho na eleição, do ou da próxima mandatária da UnB no quadriênio 2012-2016.

É triste e amargo para nós que passamos tudo o que passamos na ocupação que neste dia 03 comemorou-se??, e em lutas pos-teriores, termos que admitir que em tais ou quais aspectos a

eficiência da administração Timoti se mostrava mais competen-te.

Basta ouvir a comunidade da UnB, e Ver, de 5º melhor Univer-sidade brasileira há 3 anos atrás hoje a UnB tá perto da 15º posição. E o problema disso tudo é que o legado do José ao final da sua gestão tenha sido apenas o de construir rapidamente o beijodromo e o de contribuir de maneira fundamental ao retor-no do Timotismo ao comando da UnB. O velho revezamento dos dois Feudos que dividem a história do comando da universidade.

3 anos se passaram, giramos o mundo e voltamos ao mesmo lu-gar sem termos avançado realmente. Seguimos nossas vidas, a UnB cada vez é permeada por mais pessoas vindo em busca de projetos pessoais a curto prazo e no uso da Universidade para apenas sair dela com um diploma, e o profundo significado do Universo Universitário, da Universidade como coração e mente da sociedade, fica pra um dia, o resgate da Universidade de Darcy, da Universidade do Século 21, tão prometida por José Geraldo, e tão pouca posta em prática nestes 3 lamentáveis anos.

*Diogo Ramalho é estudante de Letras Espanhol da UnB

Não havendo muito o que comemorar, pode-se rememorar, com as fotos que a SECOM publicou em razão do 1 ano da ocupação:

http://www.unb.br/portal/galeria

3 anos da ocupação e 1 Josépor Diogo Ramalho

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O que era óbvio aconteceu. E a bola foi cantada há um ano atrás, quando falávamos com antigos professores a respeito dos 50 anos da cidade e da sua Universidade. Lembro de uma conversa com um pro-fessor fundador da Universidade de Brasília, a respeito da água que escorre pelas estruturas do minhocão sempre que chove. Quando lhe perguntei desde quando as coisas são desse jeito, o professor e amigo me disse: “Desde 1962. Sempre a UnB foi desse jeito”.

Talvez tenha sido importante esta última grande enchente, com ce-nas impressionantes dos anfiteatros jorrando água, talvez seja a par-tir do pior que a UnB vá, enfim, repensar sua estrutura. Ao invés de ficar inaugurando prédios para homenagens demagógicas. Afinal, de que adianta um prédio ser erguido ao lado da Reitoria, em homena-gem a Darcy Ribeiro, as prioridades mais básicas são proteladas há décadas¿

As perdas não são apenas materiais, de aparelhos, etc. Paremos e pensemos no pequeno acervo que existia no Centro Acadêmico de História e Filosofia, acervos que já vinham sendo dilapidados pela falta de cuidado dos integrantes dos Centros, material que agora não deve estar mais acessível.

E o que terá acontecido com a Biblioteca Central¿ Este mesmo pro-fessor acima referido, tendo sido um dos que mais ajudou a erguer a nova estrutura centralizada da nossa biblioteca, certa vez comen-tou, citando o importante estudo de Frazer Poole (POOLE, Frazer G.; Universidade de Brasília. Programa para o projeto do edifício

UnB afunda às portas de seu jubileuda biblioteca central. Brasília: [s.n.], 1973. 63 p.), traduzido pelo também ex-diretor da biblioteca da UnB, o professor Elton Eugenio Volpini, que o prédio da biblioteca foi erguido em cima de uma mina d’água. O lugar mais impróprio para receber uma biblioteca. Um dia tudo aquilo vai afundar.

Pois bem...é preciso que se diga: quando chove no campus Darcy Ribeiro, toda água escorre pela entrada da biblioteca, chegando ao subsolo, inundando o depósito e umedecendo e gerando focos inten-sos de mofo para todo o acervo. Problema previsto na época da cons-trução do prédio, importa saber o que aconteceu com o acervo que existe no depósito, já que até pouco tempo atrás milhares de livros esperavam, e há décadas, a integração ao acervo, sofrendo periodi-camente com as chuvas. Como está nosso acervo hoje¿

Descentralizar a biblioteca da UnB, rever a organização arquitetada na época do regime militar, é uma das prioridades neste momento. Tal ato funcionaria, alguns já o sabem, como instrumento de salva-guarda do acervo e retorno ao Plano Orientador.

Outra curiosidade que resiste é sobre as atas proibidas por um certo chefe do Departamento na História. Simplesmente não se quer que tais atas sejam pesquisadas por uma aluna que pretendia estudar a história do curso de História por documentos deste porte. Não é im-possível imaginar que estes documentos tenham ido embora na chuva de abril, para alegria dos bandidos acadêmicos que freqüentam as saletas como pavões misteriosos, mero chefetes.

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O pesadelo da noite fria

De repente ele acorda de um sonho terrível, sente o chão tremer, eles começam a passar, são muitos e surgem mais, incessantemente, logo são obriga-dos a parar. Forma-se então uma fileira de veículos amontoados. O ronco dos mo-tores é, geralmente, seu assíduo desper-tador, mas desta vez o que o fez acordar em súbito foi o pesadelo durante a noite fria, o pesadelo do abandono social, da exclusão e da indiferença. Olha à sua vol-ta e o que vê é uma cidade que expressa sua disparidade já no centro arquitetado onde pulsa o coração, o trânsito parado, as pessoas chegando à rodoviária, sua carroça de lixos. Lá no horizonte, o sol pouco a pouco se aproxima por entre os prédios a iluminar a paisagem de concre-to, é mais um dia em Brasília, ele aperta o terço que está na mão direita e sussur-ra: “vou mudar de vida”, mas ainda não sabe por onde começar.

Inácia era uma jovem bonita e atraente. Trabalhava há dois anos numa empresa privada com carteira assinada e

morava só, em Ceilândia. Não tinha com-panheiro fixo, mas gostava de sair para baladas e bares da cidade à procura de alguém que a interessasse. Foi em uma dessas saídas que, acidentalmente, en-gravidou. O pai não assumiu a devida responsabilidade e ela nunca mais o en-controu. Conseguiu camuflar a gestação durante um certo período no trabalho, mas, inevitavelmente, teve que conver-sar sobre o ocorrido com seu chefe.

Quando João Paulo nasceu, recebeu a atenção dobrada de sua mãe na tentativa de cobrir a ausência do pai. Foram quatro meses de total dedicação à criança, enquanto não vencia a licen-ça-maternidade. Ao retornar à empresa, ela recebe férias. Em seguida, é chama-da para conversar a sós com seu chefe e ouve o seguinte discurso: “Inácia, você é uma ótima vendedora mas em quatro meses muita coisa mudou, chegou novi-dade na loja e você perderá muito tempo para se atualizar. Aqui nós só pensamos em lucro a cada dia, cada minuto, porque tempo é dinheiro e você sabe muito bem disso, o peso das comissões no fim do mês é que salva a todos, por isso, infelizmen-te, você está demitida, mas antes vamos acertar as contas.” Desesperada, vai em-

literaturabora meio que sem rumo e sem saber o que fazer.

No dia seguinte, Inácia vai à procura de uma creche particular que ha-via próximo à sua casa, pois a creche pú-blica era muito distante e teria que apa-nhar dois ônibus todos os dias para chegar ao local, caso matriculasse seu filho nela, posteriormente, vai em busca de outro emprego. As ofertas de salário que encon-tra são baixíssimas e não daria para arcar com os custos da casa e também da cre-che, decidi então trabalhar em casa ven-dendo din-din e vive durante seis meses nesse subemprego, em extrema miséria, mas logo cansa desse modo de vida.

Ao completar um ano de ida-de, João Paulo não dependia mais do leite materno e as condições financeiras de sua mãe só pioravam. O corpo dele já apre-sentava sinais de desnutrição. Ela precisa-va dar uma vida melhor ao seu filho, mas não podia deixá-lo sozinho durante o dia e poucas são as opções de emprego para uma mulher semianalfabeta, seria mais cabível um trabalho noturno, enquanto a criança dormia. Ela ainda era jovem e bonita, precisava de dinheiro, foi aí que veio a idéia de iniciar uma nova etapa de sua vida: a prostituição.

Veste-se vulgarmente, pinta os lábios, apanha a bolsa e põe poucas mo-edas, olha para o colchão e vê seu anjo dormindo, dá-lhe um beijo, as lágrimas caem, volta ao espelho e retoca a ma-quiagem, em passos lentos para não fazer barulho ela atravessa a porta e entra ime-diatamente numa estrada estreita, onde o dinheiro tenta compensar a humilhação, sente-se frágil e caminha questionando--se o porquê da árdua decisão. Inácia po-dia ter entrado nas curvas do caminho, mas preferiu seguir reto, primeiro porque precisava saciar suas futilidades e as ne-

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poesia

cessidades básicas do seu filho e segundo é que agora tinha um novo tipo de gasto, e também o principal, pois era ele que garantia sua fuga, mas custava caro, mui-to caro, ela virara dependente químico.

João Paulo não lembra de sua mãe quando ela era dedicada e carinhosa com ele, o vício a transformara totalmen-te. Inácia tornou-se agressiva com seu fi-lho e destrutiva consigo mesmo, chegara a um certo ponto que nem conseguia mais trabalhar, nessa época ele já tinha oito anos de idade e nunca havia freqüentado escolas, foi assim que, por necessidade, foi procurar emprego.

Começou como engraxate e ven-dedor de balas na rua, mas o pouco que recebia era para alimentar o vício de sua mãe, pois ela tomava todo o dinheiro dele e comprava drogas. Certo dia, João Pau-lo gastou tudo que recebera na rua com comida e transporte, e ela, num surto de abstinência, deu-lhe uma grande surra. No dia seguinte, ele foi trabalhar e nunca mais voltou para casa.

João Paulo cresceu na rua, aprendeu a fugir da polícia quando os via chegando com arma e cassetete na mão, prontos para bater e tirá-lo de sua casa e de sua família, porque foi na mendigagem que encontrou a solidariedade que jamais encontrara em casa. Ele também apren-deu a fugir dos bandidos que queriam for-çá-lo a usar drogas. Conhecia cada ponto da cidade e gostava mesmo é de admi-rar, de longe, a arte do grafite. Queria ser grafiteiro e mandar para os muros o que via no dia a dia, sob formas e cores.

O pesadelo da noite fria foi decisivo em sua vida, apanhou sua car-roça de lixos e foi atrás de seus amigos. João Paulo pensava em procurar moradia e queria convencê-los a sair das ruas com ele, para viver como gente, numa casa que fosse construída com suas próprias mãos onde não tivesse que passar por ne-nhuma humilhação. Alguns o seguiram, outros ficaram. E assim foram em grupo, caminhando pelas ruas de Brasília, pro-curando ferramentas no lixo e levando o pouco que tinham, todos na esperança de um dia mudar de vida.

Autora: Déborah Gomes

Veja seu corpo cober-

to de espinhos mórbidos.

Aspire a fuligem do dia-

-a-dia e deixe o irrespi-

rável ar entrar em seus

pulmões, é a sua cidade

pintada de cinza, entre

indústrias e automóveis.

(Déborah Gomes)

_____________

REPETIR

Em repetição a vida

transparece

imagens: do cavaleiro, a

toalha

dobrada; do escudeiro, o

copo

sobre a pia; do românti-

co, o aviso

pelo interfone: alegorias

cedem

à realidade espaços onde

a vida

é perdida: almofadas

campainhas

o estampido.

(Pedro Du Bois, inédito)

_______________

Page 18: MIRACULOSO7

18VAGA LUMINOSA CHAMA ACESA

LUSCO FUSCO, VAGA LUME OLHO D’ÁGUA

GIRASSOL, PASSARINHO, CANTO, ÁGUA, PEIXE

PLANTA, POTE, PEDRA

VAGA LUMINOSA AURORA DIA

NA LINHA INVISÍVEL DO TEMPO VIDA

VAGA LUZ ALADA RAJADA

*

DIZEM

QUE SACI VIRA

PASSARINHO CANTADOR

PRA CHEGAR PERTINHO DA GENTE

*

BRASÍLIA É

O MEU BOROGODÓ

COM OS SEUS BALANGANDANS

MAS BRASÍLIA TAMBÉM É

SONHO

AINDA NA PLANTA

IDÉIA

GENIAL

SENHOR LÚCIO COSTA

SETESSENTOS POMARES NORTES

BRASÍLIA É

NÃO RARA

BELEZA URBANA

EM TODO O SEU POTENCIAL

DE CALÇADAS PRESERVADAS

LIXO RECICLADO

CICLISTA DE TRANSPORTE

IGUALDADES SOCIAIS

ISSO ISSO ISSO

QUERO BRASÍLIA MAIS PERTO

DE TODO O SEU ESPLENDOR

O MEU BROTINHO

O CARRO É A MENTIRA MAIS

BADALADA DO SÉCULO PASSADO

O CARRO DESSE SÉCULO É IGUAL

AO DO SÉCULO PASSADO

O CARRO DESSE SÉCULO MATA MAIS

QUE O CARRO DO SÉCULO PASSADO

A REVOLUÇÃO TECNOLÓGICA

DOMINADORÁ AUTOMOBILÉTICA

AUTOMOBILIZOOU A CIDADE

CONGESTIONADORA

A CONGESTÃO NA VIA NASAL

CULMINOU PULMONAR NA CIDADE

A CONFUSÃO VAGA LOTADA

ENCHEU AS VAGAS CALÇADAS QUEBRA-

DAS

JARDINS ATROPELADOS

AS PISADAS GRAMAS ENPINEUSADAS

ESCARRADAS NÃO HÁ VAGAS

VÁ DE BICICLETA

AS POMBAS ATROPELADAS

CARROS

PESSOAS ATROPELADAS

CAROS

ATROPELADAS VELOCIDADES VIAS

GOIABADAS MARMELADAS

TELEGUIADAS

PROPAGANDAS

S I N H I N H O S

C H O V E U

C H O R O U

C H U V A

C H O V E

C H U V A

Á G U A

C H O R A

C H O V E

Á G U A

C H O R A

C H U V A

C H O R A

C H U V A

C H O V E

Á G U A

C H O V E

C H U V A

Á G U A

C H O R A

C H U V A

C H O R A

B i c

Page 19: MIRACULOSO7

19

NO CAMINHO, A TOR-RE DE TV DIGITAL

Dia cinza Sigo da sombra de Sobradinho à

sombra do Paranoá Estrada linda de Serrado, frio e ne-

blina combinam perfeitamente Com a torre de TV digital

Ontem parecia que ela era um con-junto de discos voadores interpla-

netáriosDia Amarelo

Sigo da luz Sobradinho à luz do Pa-ranoá

Céu lindo, estrada azul, calor e bri-lho combinam perfeitamente

Com a torre de TV digitalHoje ela parece um raio enviado

por São Arcanjo Miguel, tão mística quanto adivinhações sobre o futuroMeu caminho para o trabalho ficou

mais belo e rápido Com a presença dela, que se im-

põem aos meus olhos sedentosEla me olha arrojada, eu fito-a des-

lumbradaViramos cúmplices da grandiosidade

de Brasília.

(Maria Cleudes Pessoa)

Vida, Emoção! (Por Camila Valadares)

Para entender o que acontece Não há muito que racionalizar

Basta abrir os olhos e ver Ouvir os sons emitidos pelo uni-

verso Sentir com alma, coração e vida

Para com os sentimentos do mun-do

Construímos uma forma de lidar Mecanismos de defesa

Já dizia Freud Assim seguimos a trajetória

Caminhamos sem cessar...

E eis que eles surgem Novos valores Novos afetos

Novos sentimentos Novos sentidos

No tempo e no espaço Eles sempre vêm! Ver, ouvir, sentirDe forma surreal

Com emoção, viver!

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20

Em novembro de 1989, a Casa do Incesto,

Produções Culturais, integrada por Alex Co-

jorian , Carolina Vieira, Gustavo Simas e Da-

niel Búrigo organizaram, na FUNARTE –DF, a

Exposição de Imprensa Alternativa. Após o

evento, publicaram um catálogo constando a

participação de 187 títulos enviados de diver-

sos Estados brasileiros, sendo 30 do Distrito

Federal. As publicações foram expostas reve-

lando uma multiplicidade de temas em suas

páginas. Revistas, fanzines, folhas mimeogra-

fadas, revistas literárias, jornais, enfim uma

quantidade expressiva de uma produção com

pouquíssima visibilidade, geralmente circu-

lando entre aficionados.

As publicações do DF apresentaram uma di-

versidade de linhas editoriais contribuindo

com um painel de propostas estéticas que

dialogam com a tradição, ora rompendo, ora

retomando determinados conceitos. Em se

tratando de revistas de poesia, a Bric-A-Brac

foi a única presente na Exposição .As demais

participantes foram JornaLetras, a Folha Po-

ética de Brasília, Brasiléia Desencantada,

Nós Alternativos, Ofensiva, Pégaso, A Prosa,

O Rochedo de Sísifo. Essa produção talvez te-

nha se perdido no tempo, quem sabe ainda

resida guardada nas casas dos seus produto-

res.

O primeiro registro encontrado, até o mo-

mento, sobre a primeira revista literária pu-

blicada no DF, é a Revista de Poesia e Crítica,

lançada em julho de 1976. Tudo nos indica

que tenha sido a primeira revista de crítica li-

terária no DF. O grupo de formação Literária,

como assim era chamado , tinha os seguintes

membros: Afranio Zuccolotto, Cyro Pimentel,

Domingos Carvalho da Silva, Péricles Eugenio

da Silva Ramos. Seu proprietário era Antonio

Fábio Carvalho da Silva. O Diretor, José Jézer

de Oliveira e continha poemas, artigos, en-

trevistas, resenhas e fotos. Originários da ge-

ração de 45, os seus principais articuladores

mantiveram durante os 20 anos de existência

da Revista de Poesia e Crítica um espaço de

debate intenso divulgando trabalhos de mais

de uma centena de escritores. Seu último

provável número data de outubro de 1996,

número 20.

Fundada pelo escritor Nilton Maciel quando

aqui residia, e mantida por um número re-

duzido de escritores, a Literatura – Revista

do escritor brasileiro foi lançada em janeiro

de 1992. Seguindo uma linha editorial flexí-

vel a propostas estéticas, a Literatura, agora

editada em Fortaleza, tendo em vista que o

escritor Nilton Maciel para lá voltou em 2002,

vem contribuindo, divulgando e incentivando

novos escritores. Em sua fase inicial promo-

via concursos de poema e contos.

A Câmara Legislativa do DF lançou, aproxi-

madamente em 1993, a Revista intitulada DF

Letras – A Revista Cultural de Brasília, ideali-

zada, segundo Gustavo Dourado, por Salviano

Guimarães, sob orientação de Paulo Bertran

e Maria Félix. A revista foi desativada . Tenho

em meu acervo a edição nº 97/102, ano VIII,

meses de julho a dezembro de 2003. A sua

tiragem era de 5 mil exemplares. Há outras

duas revistas que constam em meu acervo;

Elysium, editada por Mendelsohn Ildefonso

da Silva, lançada em 1991, tinha como dire-

tor Elisio Augusto Napoleão, o seu segundo

volume saiu em 1992. Vale ressaltar o tra-

balho da Academia Brasiliense de Letras que

vem desde 1983 publicando sua Revista.

Brasília em Revista51 anos de crítica e experiências poéticas

(parte 1)

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21

Aproximação com as Vanguardas

A revista Grande Circular, uma publicação da

Galeria Cabeças, lançada em 1979, editada

por Eurico Rocha, Lúcia, Tetê Catalão, Luis

Turiba e Sérgio, tanto no seu formato como

sua proposta estética foi um canal de expres-

são de artistas que romperam com a serieda-

de das linhas ortodoxas, tanto de esquerda

como de direita. A Grande Circular expressou

uma produção já encontrada em várias revis-

tas brasileiras, propondo o diálogo e mistura

entre linguagens artísticas. Essa geração de

poetas contribuir com publicações posterio-

res. Da Grande Circular não se tem notícia

de outros números, parece que só teve uma

edição.

Em setembro de 1983, Armando Velo-

so, Chico Leite, José Adércio Leite e Paulo

Joe lançaram Há vagas. Tetê Catalão, que

assina a apresentação da Revista, disse: “A

pior recessão será aquela capaz de desfibrar

sonho por sonho, letra por letra, carícia por

carícia. Use e ouse. Ouse ou use.” Há Vagas

circulou até o terceiro número lançado em

agosto de 1985.

A Revista que mais sintetizou aproxi-

mação com as vanguardas, considerada pelos

seus editores como uma revista de Experiên-

cias, foi a Bric-A-Brac, editada em 1986 por

Ivan Presença, João Borges, Luis Turiba, Lucia

Leão, Luiz Eduardo Resende (Resa). Contando

com a colaboração de uma infinidade de po-

etas – os irmãos Campos, Sílvio Back, Chacal,

Antônio Risério, Arnaldo Antunes, Angélica

Torres, Reynaldo Jardim, Ademir Assunção,

Glauco Matoso e tantos outros. Uma cons-

telação de criadores que será preciso outras

tantas páginas para se falar da importância

desta singular revista que obteve um alcan-

ce Nacional. A revista Bric-A-Brac sobreviveu

por seis números, sendo a sexta edição lança-

da em 1991. Em 2007, seus editores organiza-

ram a exposição Bric-A-Brac Maior de Idade,

lançando um número comemorativo dos vinte

um ano de existência dessa aventura de ex-

periências poéticas.

A produção de revistas literárias em

Brasília merece uma investigação mais apu-

rada, para que se possa resgatar vozes que

permanecem subterrâneas no panorama lite-

rário brasileiro.

Paco Cac

Poeta. Colecionador de revistas literárias. Publi-

cou, em 2006, o primeiro volume do álbum; Re-

vistas Literárias Brasileiras – 1970 – 2005; com

apoio FAC - Fundo de Apoio à Cultura do GDF.

Pretende ainda este ano publicar o segundo volu-

me desse álbum que contemplará as revistas literá-

rias do século XX.

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22

Equipe do Jornal O MIRACULOSO

André Shalders

Andrés Sugasti

Bruno Borges

Camila Valadares

Cleudes Pessoa

Diogo Ramalho

Fernando Aquino

Jardel Santana

Leonardo Ortega

Maíra Marins

Paloma Amorim

Caixa Postal 743 agencia de

correios do Lago Norte.

CNPJ: 04811 396/0001-08

Publique n’O MIRACULOSO

[email protected] n’O MIRACULOSO

[email protected]

Page 23: MIRACULOSO7

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coma! Lançamento!!!

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• 3 ovos• 1 copo de óleo• 1/2 colher (sopa) de manteiga• 1 copo de leite• 2 copos de polvilho azedo• 400 gramas de queijo redondo curado• sal a gosto

EscaldarLevar ao fogo a mistura de óleo, leite, 1 colher de manteiga e o sal (não deixe ferver).

MassaEm outra panela acrescente o polvilho. Despeje lentamente a mistura e mexaparaficaruniforme.Deixeamassadescançarpor30minutos.Acrescente o queijo ralado e 1/2 colher de manteiga. Misture. Jogue os ovosumaum.Mexabem.Amassadeveficarmolenga.

TrempaUnte uma travessa de bolo (metal ou cerâmica) com óleo. Despeje a massa.Assaremfogoaltopré-aquecidoatéficarmorenoporcima.

AcompanhamentosBrigadeiro, requeijão, queijo, café, linguiça, molhos pastosos.

Receita adaptada de Belchior Cardoso(Alquímico da Cachaça Rancharia) Araújos-MG

RECEITA - ˜Pão-de-queijo-deitado˜

Coma coma coma pão-de-queijo-deitado! | Coma coma coma pão-de-queijo-deitado! | É uma delícia, serve esparramado | Sirva pra família e pro namorado | Incognoscível de polvilho abstrato | Coma coma coma pão-de-queijo-deitado!

www.minaspadrao.wordpress.comwww.tabuletas.net

Realização

Apoioswww.foradoeixo.org

A . G E N T ETTTUTTAMÉIA

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