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MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL P ROCURADORIA DA R EPÚBLICA NO M UNICÍPIO DE M ARABÁ -PA EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ FEDERAL DA VARA FEDERAL DE MARABÁ DA SEÇÃO JUDICIÁRIA DO PARÁ, “Inobstante as medidas já adotadas por esta Regional no intuito de cercear as irregularidades, inclusive com representações formuladas junto ao Ministério Público Federal e Departamento de Polícia Federal do Pará, o clima de instabilidade reinante nesses imóveis não só ofende aos mais comezinhos princípios da moralidade administrativa, como também agrava-se ainda mais, na medida em que se verifica a inexistência de medidas drásticas que visem corrigir essa grave distorção, dando margem inclusive a inaceitável impunidade” - apresentação de um “documento-denúncia” realizado pelo ex Superintendente Regional da SR-27 DARVIN BÖERNER JÚNIOR, dirigido ao Presidente do INCRA – v. Parte 2 desta inicial. “As causas para esse fenômeno talvez estejam no apanhado de fatores, bem delineados pela Ministra do STF, Cármem Lúcia Antunes Rocha, que enumera os elementos que criam o ambiente administrativo ideal para irregularidades e propenso à corrupção: a) grande dose de poder decisório concentrado em um único agente; b) multiplicidade de órgãos competentes para execução sem esquadrinhamento perfeito e exclusivo de atribuições; c) ausência de mecanismos de controle efetivo, permanente, transparente e rigoroso; d) restrita e precária publicidade administrativa; e) impunidade, inclusive para corruptores. Como será demonstrado, não por acaso todos os elementos estão presentes no INCRA/SR-27” – trecho desta inicial. 1 Procedimento Administrativo n° 1.23.001.000013/2008-84 AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL RÉU: INCRA

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Page 1: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL PROCURADORIA DA … Civil Publica - creditos... · desvios de recursos de maneira inegável. O sistema implantado não parece garantir segurança suficiente

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EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ FEDERAL DA VARA FEDERAL DE MARABÁ DA SEÇÃO JUDICIÁRIA DO PARÁ,

“Inobstante as medidas já adotadas por esta Regional no intuito de cercear

as irregularidades, inclusive com representações formuladas junto ao

Ministério Público Federal e Departamento de Polícia Federal do Pará, o

clima de instabilidade reinante nesses imóveis não só ofende aos mais

comezinhos princípios da moralidade administrativa, como também

agrava-se ainda mais, na medida em que se verifica a inexistência

de medidas drásticas que visem corrigir essa grave distorção,

dando margem inclusive a inaceitável impunidade” - apresentação de

um “documento-denúncia” realizado pelo ex Superintendente Regional da

SR-27 DARVIN BÖERNER JÚNIOR, dirigido ao Presidente do INCRA – v. Parte

2 desta inicial.

“As causas para esse fenômeno talvez estejam no apanhado de fatores,

bem delineados pela Ministra do STF, Cármem Lúcia Antunes Rocha, que

enumera os elementos que criam o ambiente administrativo ideal para

irregularidades e propenso à corrupção: a) grande dose de poder decisório

concentrado em um único agente; b) multiplicidade de órgãos competentes

para execução sem esquadrinhamento perfeito e exclusivo de atribuições;

c) ausência de mecanismos de controle efetivo, permanente, transparente e

rigoroso; d) restrita e precária publicidade administrativa; e) impunidade,

inclusive para corruptores. Como será demonstrado, não por acaso todos os

elementos estão presentes no INCRA/SR-27” – trecho desta inicial.

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Procedimento Admin ist rat ivo n° 1 .23 .001.000013 /2008- 84 AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

RÉU: INCRA

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EMENTA: Administrativo – COMBATE À CORRUPÇÃO - INCRA/SR-27 –

Créditos instalação em assentamentos de reforma agrária – normas

de execução que possibilitam irregularidades – inexistência de

estrutura para o controle – créditos “a fundo perdido” que não são

cobrados - adequação normativa e proteção dos recursos públicos –

EFETIVIDADE DO PRINCÍPIO DA MORALIDADE.

O Ministério Público Federal , através do Procurador da República

signatário, no exercício de suas atribuições legais, vem com base nos arts. 127, “caput” e 129

da Constituição da República, na Lei Complementar nº 75/93, fundamentado no

Procedimento Administrativo n° 1.23.001.000013/2008-84 , exercer

AÇ Ã O C I V I L P Ú B L I C A

A T O S J U R Í D I C O S I N F R A L E G A I S - I N T E R P R E T A Ç Ã O C O N S T I T U C I O N A L –

T U T E L A I N I B I T Ó R I A – P E D I D O C A U T E L A R P A R A S U S P E N D E R A

L I B E R A Ç Ã O D E R E C U R S O S ( t u t e l a l i m i n a r )

em face de:

INSTITUTO NACIONAL DA COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRÁRIA - INCRA – AUTARQUIA FEDERAL, COM SEDE NO SETOR BANCÁRIO NORTE, EDIFÍCIO PALÁCIO DO DESENVOLVIMENTO, 18º ANDAR, BRASÍLIA – DF, PODENDO SER CITADO NA AGRÓPOLIS DO INCRA, NÚCLEO CIDADE NOVA, MARABÁ/ PA .

A CINEMÁTICA – PRETENSÃO.

Ao longo dos últimos meses este órgão de execução ministerial percebeu que são recorrentes as representações relacionadas aos assentamentos realizados pelo INCRA, principalmente quanto aos chamados créditos instalação (Apoio Inicial;

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Aquisição de Materiais de Construção; Fomento; Recuperação de Materiais de Construção; Reabilitação de Crédito de Produção), com suas espécies definidas pela Norma de Execução/INCRA/DD/n° 67/2007.

O mesmo ocorre quanto às constantes notícias de alterações de assentados, que constam em listagens de maneira inverídica ou com mudança de seus locais originários.

Em aproximadamente três meses de levantamento, o Ministério Público Federal relacionou os procedimentos, peças de informação, inquéritos, termos de declaração e processos, relacionados ao INCRA, que passaram pela procuradoria em Marabá no exercício de sua atribuição típica (ver a relação oficial produzida em anexo). Reitere-se: apenas no curto período citado, singela parcela da totalidade existente.

Em pouco tempo chegaram 99 itens desta espécie e a constatação inicial restou confirmada: 72,72 % dos casos se referiam aos desvios na aplicação de recursos em assentamentos.

Como no mito grego de Sísifo1, os dados alcançados refletem efeitos deletérios na atuação do Poder Judiciário, Ministério Público Federal e Polícia Federal desta região. Indicam que há algo de errado na dinâmica do INCRA.

Não é normal, para um sistema que administra recursos públicos, ter um índice oficial de evidências de irregularidades tão elevado. O número apenas aumenta, enquanto o aparato persecutório, por sua vez, não consegue responder a contento.

Elementos de desvios de recursos, sobrefaturamento, descontrole na liberação, ausência de acompanhamento, inexistência de controle efetivo e corrupção, são evidências constantes.

1 No mito, Sísifo foi condenado a empurrar uma pedra montanha acima, por ofender os deuses. Quando alcançava o topo, a pedra rolava montanha abaixo. Então, Sísifo precisava refazer todo o trabalho, continuadamente. Se há ciência do problema, mas nada se faz para contorná-lo, as instituições ficarão sempre empurrando pedras montanha acima, num esforço inútil, como Sísifo.

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Dos sintomas identificados, o Ministério Público Federal concluiu, com base em recentes estudos para a mensuração da corrupção na Administração Pública, como o trabalho de SPECK2, que o INCRA/SR-27 é um ambiente fértil para o apontado mal, em altíssimo grau. De fato, para a configuração do grau, quatro elementos são fundamentais: 1 - Quantidade de casos; 2 - Quantidade de pessoas envolvidas; 3 - Freqüência das transações; e 4 - Montante financeiro envolvido.

Todos os elementos, sem exceção, são confirmados na configuração do INCRA/SR-27.

As causas para esse fenômeno talvez estejam no apanhado de fatores, bem delineados pela Ministra do STF, Cármem Lúcia Antunes Rocha, que enumera os elementos que criam o ambiente administrativo ideal para irregularidades e propenso à corrupção: a) grande dose de poder decisório concentrado em um único agente; b) multiplicidade de órgãos competentes para execução sem esquadrinhamento perfeito e exclusivo de atribuições; c) ausência de mecanismos de controle efetivo, permanente, transparente e rigoroso; d) restrita e precária publicidade administrativa; e) impunidade, inclusive para corruptores.3

Como será demonstrado, não por acaso todos os elementos estão presentes no INCRA/SR-27.

O problema se estende há anos, sem que se tenha enfrentado efetivamente a causa, a verdadeira chaga que propicia esta mazela.

O Ministério Público Federal, no mais legítimo exercício de fiscal da ordem jurídica, buscou identificar suas causas. Interrompê-las é sua missão atual, o que permitirá o resguardo dos recursos públicos e a obrigação do réu de implementar mecanismos de fiscalização e controle dos créditos em assentamentos, como forma de concretizar os princípios constitucionais da eficiência, da impessoalidade e da moralidade.

2 Ver SPECK, Bruno Wilhelm, Mensurando a corrupção: uma revisão de dados provenientes de pesquisas empíricas, in Os Custos da Corrupção, Konrad Adenauer Stiftung, Cadernos Adenauer, n° 10. Bruno Wilhelm Speck é Doutor, professor de ciência política na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e membro do Conselho Deliberativo da Transparência Brasil, organização que tem por fim o combate à corrupção. A Transparência Brasil é associada da Transparência Internacional, rede mundial com sede em Berlim.3 ROCHA, Cármem Lúcia Antunes. Princípios Constitucionais da Administração Pública. Belo Horizonte: Del Rey, 1994, pp. 200- 201.

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A abordagem será dividida em três partes: 1 – As causas – A NORMA DE EXECUÇÃO PERMISSIVA – a cronologia das irregularidades, falhas nas escolhas de destinatários, gestores e sua desconformidade ao ordenamento jurídico; 2 – A DEFICIÊNCIA ESTRUTURAL – a criação de números e a ausência de retorno dos recursos investidos - o reconhecimento administrativo de ineficiência e a Recomendação ministerial n.° 3/2003; e 3 – Medidas para proteger os recursos – Determinações normativas descumpridas - ALTERNATIVAS.

Registre-se: será sempre demonstrado, no mundo dos fatos, as irregularidades constatadas com base na norma.

PARTE 1 - As causas – A NORMA DE EXECUÇÃO PERMISSIVA – a cronologia das irregularidades, falhas nas escolhas de destinatários, gestores e sua desconformidade ao ordenamento jurídico.

Os dados fáticos já demonstram a realidade (72,72 % dos casos envolvidos). Mas na busca das causas o Ministério Público Federal analisou o amparo normativo utilizado pelo INCRA/SR-27.

Ao longo dos anos, as normas de execução utilizadas são sucessivamente substituídas, sem qualquer estabilidade, o que já indicia que o sistema não funciona. Em anexo, estão todas as normas que se sucederam desde 1998, ano a ano. Isso demonstra que há pelo menos uma década não se conseguiu realizar um modelo definitivo.

O que se concluiu foi a evidente falha de concepção normativa existente. Há uma evidente incompatibilidade entre o mundo das normas e o mundo dos fatos, especialmente no sul e sudeste do Pará.

As normas infralegais que possibilitam a liberação de créditos são falhas, repletas de medidas ineficientes, que por vezes beiram ao amadorismo em se tratando da gestão de recursos públicos. A matriz dos erros se repete e há um verdadeiro descompasso entre a realidade normativa e a realidade a ser administrada.

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A norma acaba por não proteger o que deveria e não é exagero afirmar que por vezes incentiva, de forma consciente, as mais variadas espécies de desvios e desmandos. O resultado não poderia ser outro:

“Considerando que a norma de conduta se destina a regular as relações jurídicas de determinado grupamento, em certo local e em dado período da história, sempre que o conteúdo formal da norma se distanciar da realidade que pretende regular, menores serão as perspectivas de sua efetividade. Em conseqüência, vendo-se impossibilitado de adequar seu comportamento às exigências do ordenamento jurídico, maiores serão as perspectivas de que o indivíduo trilhe o caminho da corrupção. O legislador, assim, ao dispor sobre o que deve ser, terá de atentar para o que é possível ser, isto sob pena de esvaziar o comando normativo – que se tornará inócuo ante a impossibilidade de cumprimento – e estimular a corrupção”.4

Esse dado já era empiricamente confirmado por John Peters e Susan Welch, ainda em 1978. Os estudos por três décadas confirmaram a consistência da teoria de Heideheimer, que apontava o traço essencial para a corrupção no distanciamento das normas em sua inserção social, quando não se faziam cumprir.

O cuidado deve ser maior quando as políticas públicas geram maior liberdade de ação aos agentes econômicos e menor intervenção do Estado. Mais uma vez, como será visto, é o que acontece com o sul e sudeste do Pará, sob o INCRA/SR-27.

Quanto aos créditos instalação, a Norma de Execução/INCRA/DD/n° 67/2007 é a vigente. Em diversos elementos, se assemelha na prática ao que é realizado com o PRONAF. O raciocínio jurídico, como se verá, alcança ambos. Sua análise, que vale tanto para as normas antecessoras, como para eventuais substitutas, será realizada em três etapas.

Inicialmente, sobre ela serão analisadas variadas falhas, sempre apontando, no mundo dos fatos, exemplos de casos com exata correspondência. Em seguida, serão apontadas as falhas nos mecanismos de fiscalização, nas escolhas de

4 GARCIA, Emerson e PACHECO ALVES,Rogério, Improbidade Administrativa, 3ª Ed., Lumen Juris, 2006, p. 11.

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destinatários e gestores dos recursos, para ao final demonstrar sua desconformidade com o ordenamento jurídico abstrato.

1. Cronologia das irregularidades

Assim como suas antecessoras, é possível constatar que a norma possibilita desvios de recursos de maneira inegável. O sistema implantado não parece garantir segurança suficiente para o controle de sua aplicação. A apresentação seguirá a cronologia para a liberação e controle dos recursos, o que possibilitará o melhor entendimento da dinâmica.

Segue o cronograma para a liberação dos créditos em cada etapa e suas mazelas.

1.1 A falha originária: o cadastro de candidatos aos créditos no SIPRA (Sistema de Informações de Projetos de Reforma Agrária ) – ausência de controle de acesso e real idade dos dados lançados - dados confiáveis?

Elementos que propiciam a corrupção – abordagem: “b) multipl icidade de

órgãos competentes para execução sem esquadrinhamento perfeito e

exclusivo de atribuições”; “c) ausência de mecanismos de controle

efetivo, permanente, transparente e r igoroso”; e “d) restri ta e precária

publicidade administrativa”.

a) inicialmente o INCRA recebe uma lista originária com os nomes dos beneficiários que pretendem receber os créditos (Relação de Beneficiários - RB), os projetos e as associações de assentados ou representantes que serão os gestores dos recursos (artigo 2°, § 1°, I e IV e art. 16, I, da norma). Todo o funcionamento do assentamento é garantido pelo Sistema de Informação dos Projetos de Reforma Agrária (SIPRA), mecanismo fundamental de controle.

O SIPRA é essencial na gestão dos projetos de assentamento, desde a implantação até a consolidação destes. Seus dados relacionam desde os beneficiários existentes, candidatos aos créditos, até os que efetivamente foram amparados.

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Por sua importância, deveria ser realizado com segurança, de modo a refletir com exatidão a realidade administrada. No entanto, o constatado foi exatamente o contrário: não há maiores formalidades para seu acesso e os dados podem (e são) alterados sem maiores confirmações, que fossem capazes de controlar a realidade da alteração. O resultado não poderia ser outro: em inúmeras vezes as alterações não refletem a realidade.

Inicialmente, vejamos um exemplo que demonstra essa evidência:

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IPL nº 193/2007

DPF/MBA/PAProcesso

2007.39.01.001139-1

PA Jardim - Marabá/PA

Trata-se de notitia criminis encaminhada pelo INCRA em que relata a eventual emissão de Declarações de Aptidão ao PRONAF (DAP's) falsas, tipo “A”, descentralizados ao INCRA. Cerca de 91 DAP's eram falsas. Há elementos nos autos, com depoimentos dos servidores, que demonstram a facilidade de acesso aos sistemas de registro – SIPRA para a inserção ou alteração de dados. Há evidência de inserção de pessoas que sequer são assentadas. Mais de 90 nomes, só neste caso. Estagiários e servidor do INCRA facilitariam as alterações e cadastros indevidos. Relatos da concentração de poderes nas mãos do presidente de associação.

O INCRA não faz a certificação in loco e permite o acesso ao SIPRA por qualquer pessoa, sem maiores critérios, o que permite alterações sem refletir a realidade.

Veja a declaração da servidora CLARISSA CRISTINA PEREIRA LIMA (fls. 469/470):

“QUE quando passou a exercer sua atual função, observou que não havia muito controle na emissão das DAP´s – Declaração de Aptidão ao PRONAF; QUE verificou que, em muitos casos, as próprias empresas prestadoras de serviços às Associações dos PA´s, faziam a emissão das DAP´s, no interior da própria sede do INCRA, em Marabá; QUE o Chefe da Divisão ligada às DAP´s, a partir disso, determinou que somente Servidores do INCRA poderiam efetuar a emissão das DAP´s e verificação nos sistemas próprios do Órgão; (...) QUE o procedimento, quando da emissão das DAP´s, é que seja feito a inserção de dados em sistemas e depois a emissão de documento, que então é levado para a assinatura e posterior envio às Instituições Bancárias (...) QUE também acredita que exista estagiários envolvidos nas falsificações e/ou fraudes, citando, nesta

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oportunidade, um estagiário de nome (...), atualmente lotado no Setor de Crédito...” - sic.

Como se verifica, não há delimitação daqueles que podem acessar o SIPRA. Ao se permitir o acesso de variadas pessoas sem delimitação exata, o foco para se imputar o responsável pela alteração se enfraquece.

As declarações dos servidores do INCRA confirmam a confusão entre o público e o privado, em que até mesmo as dependências do INCRA são utilizadas para a consecução de interesses desviados, com a conivência de servidores e com surpreendente naturalidade.

Em outra oportunidade, a mesma servidora aponta a fundamental influência do SIPRA para o funcionamento do sistema (fls. 488):

“...QUE foi chamada pelo estagiário para verificar do que se tratava, tendo em vista que as DAP´s são emitidas a partir do próprio SIPRA – Sistema de Informações de Projetos de Reforma Agrária, e não a partir do Word (...)QUE confrontou os nomes que estavam nas DAP´s e constatou que os supostos beneficiários não estavam em RB – Relação de Beneficiários” - sic.

O próprio juízo, em diversas ocasiões, se deparou com a situação de disparidade entre os registros no sistema, a relação de beneficiários e a realidade. Ver o seguinte exemplo, em caso de crédito instalação. O caso trata da inclusão de pessoas que sequer assentados eram:

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Processo n° 2005.39.01.001

130-1

PA 1° de Março

Os réus (representantes das associações) foram denunciados por terem se utilizado de meio fraudulento em 2001 para obter créditos para a aquisição de material de construção, fornecidos pelo INCRA. Na condição de presidente da associação gestora, o denunciado propôs aos demais acusados que assinassem contratos de concessão de crédito, mesmo não sendo clientes da reforma agrária, com o que concordaram. Facilmente incluiu os nomes dos acusados na lista de beneficiários – RB, sem a confrontação pelo INCRA da realidade do cadastro. Processo penal instaurado. Réus condenados.

No caso, a fundamentação da sentença condenatória reconheceu o fato pernicioso e rechaçou prontamente as costumeiras e enfadonhas escusas de desconhecimento ou erro (fl. 530):

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“É inconsistente a versão do acusado Klebet de que obrou em erro ao imaginar que as co-réus possuíam lotes no projeto de assentamento, uma vez que figuravam na lista de assentados (f. 253/259). Como presidente da associação tinha conhecimento suficiente para saber como e em que circunstâncias os créditos seriam liberados. As evasivas por ele apresentadas às co-rés, para justificar a falta de lotes onde poderiam trabalhar, demonstram quão ilicitamente agia, a ponto de solicitar-lhes, que nada denunciassem ao INCRA e que afirmassem que o numerário obtido fora encontrado 'quando estavam andando por aí' (f. 229). Quem age dessa maneira detém pleno conhecimento de que procede de maneira irregular ”.

O SIPRA termina por sofrer alterações de naturezas diversas, de maneira promíscua. Ali se origina uma série de desvios.

Os erros permitem a aplicação de créditos em nome de pessoas que na verdade não são assentadas, ou não moram no assentamento, ou se encontram lotadas em outros assentamentos, ou não têm o perfil de colono exigido, ou são desconhecidas das próprias associações que administram os créditos, ou não perceberam qualquer prestação, ou que perceberam inveridicamente ou até mesmo estão cadastradas em duplicidade.

Mais exemplos de casos que apresentam a dinâmica:

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Peça de Informação n°: 1.23.001.00001

6/2008-18

PA 1° de Março – São

João do Araguaia

Os declarantes afirmam viver no assentamento há anos e que o INCRA realizou cadastramento para reforma de casas. A Cooperativa COOPERPRAM recebeu créditos para reforma de casas; porém, na prestação de contas incluiu os declarantes dentre os que tiveram suas casas reformadas, sem tê-las na realidade. - CONFIRMAR. Os recursos recebidos eram para aproximadamente 130 casas, número inferior ao originalmente cadastrado na cooperativa. Os declarantes são filiados à APROCTRAM e há outros associados na mesma situação. INCRA não conferiu se suas casas realmente foram reformadas. O cadastro inverídico impede o recebimento dos recursos através de sua associação regular. / Autuação determinada. Ofício expedido ao INCRA para informar dados sobre as associações e recursos recebidos.

3

Termo de Declaração:

Maria Creuza da Silva

PA UXI - Itupiranga

Há quase um ano realizou cadastro com a servidora MARINA para recebimento de materiais de construção, cestas básicas e fomento, sem que tivesse recebido qualquer benefício, apesar de haver recebimento por outros assentados na mesma situação. / A Sra. Maria Creuza está filiada à APPRBM – Associação dos Pequenos Produtores Rurais da Barraca do Meio. Existem as seguintes associações no local: Associação dos Pequenos Produtores

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Rurais do Vale do Uxi; Associação dos Pequenos Produtores Rurais da Barraca do Meio; e Associação dos Trabalhadores Rurais do Rio Verde.

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Peça de Informação n°: 1.23.001.00017

2/2007-06

PA Sabino São Pedro –

Gleba Geladim - Marabá

O noticiante afirma que a APRUM recebeu R$ 145.000,00 em sua conta vinculada para a construção de casas no assentamento e crédito de apoio. No entanto, Francisco dos Santos Pereira, então presidente da associação, não prestou contas de todas as casas construídas. Relata que a servidora Sônia afirmou que perante o INCRA sua casa estava construída desde 2003 - o que não é verdade - e que procurasse o presidente da associação, o Sr. Baiano. Muitos outros também não receberam suas casas. Relata que a associação também recebeu recursos para a construção do muro de escola, mas que apenas uma cerca restou realizada e que houve fraude com a aquisição de notas fiscais de comerciantes. Noticia que o lote 14 foi objeto de disputas entre um assentado, o ex-presidente Baiano e o Sr. Zezinho. Aponta ameaças realizadas pelo Sr. Baiano, que busca assinaturas de professores e alunos da escola local para provar a posse do lote 14. O Sr. Baiano teria diversos lotes em nome de esposa e filhos.

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Peça de Informação n°: 1.23.001.00016

4/2007-51

PA 1° de Março – São

João do Araguaia

Noticia irregularidades como: a retirada de pessoas de RB (Relação de Beneficiários), mesmo já assentadas, sem realizar transferência de lotes e após recebidos recursos para habitação e PRONAF. O assentado Dionísio Francisco Guimarães foi substituído pelo Sr. Franciscarlos Ferreira dos Reis na RB, porém o lote ainda é ocupado por Dionísio. Apesar de comunicado, o INCRA se nega a resolver estes problemas. Noticia ainda que o INCRA faz a recuperação de casas de pessoas que não são assentadas e sequer constam da RB, o mesmo acontecendo com o fomento e o PRONAF. / O presidente da associação declarou que perante o INCRA a Sra. Jacirene vendeu seu lote sem a autorização da autarquia, mas garante que de fato isso não ocorreu e que ela continua trabalhando nele. Outros assentados, como Dionísio, Leile e Abismael se encontram na mesma situação. / Ofício expedido ao INCRA, para que informe os beneficiários assentados no PA 1° de Março, vinculados à Associações APROCTRAM e COOPERPRAM e os beneficiários dos “Créditos Instalação” em todas as suas modalidades (apoio, material de construção, reforma material de construção, fomento). Suspeita de troca intencional de beneficiários nas listas entre as associações, para que alguém desviasse os recursos, pois assim seriam destinados a pessoas que perante cada uma das associações não existiriam.

14IPL n° 080/2001 – Processo n°

2001.39.01.000516-9

Assentamento Alana

Assentamentos mencionados:

Fazenda Bamerindus e

Fazenda Macacheira.

Apura a venda irregular de lotes no Assentamento Alana. Com base na notícia de venda de lotes, Antônio Rodrigues da Silva afirmou se tratar de fato comum nos assentamentos, pois fica a cargo das associações diretamente com o INCRA. Sobre o assentamento, relata que comunicou ao servidor MARLON. Descreve como funciona a distribuição de lotes no assentamento. Relata que muitas vezes a associação distribui os lotes a pessoas que não vão trabalhar no assentamento, que passam a negociá-las. Há elementos que narram o esquema de venda de lotes, sem que se tenha notícia de qualquer medida do INCRA para combater o seu funcionamento. Mesmo sem provas efetivas, talvez em razão da repercussão na mídia, o INCRA descredenciou o sindicato em questão e anunciou a exclusão sumária dos assentados envolvidos, procedimentos que não costuma fazer em outras ocasiões. Há o reconhecimento do INCRA, por parte de Marlon, de sua incapacidade de gerenciar os assentamentos (fl. 59). Em fls. 32/51 há relação de assentados beneficiários, que receberam recursos e nota-se que alguns nomes estão em duplicidade. MARLON afirma que a servidora Aldemarina era a responsável pelo pagamento dos benefícios; fortes elementos de que há participação da servidora no pagamento em duplicidade. Fato configurado em seu depoimento. Providências: (I) Cabimento de ação por improbidade administrativa e ação penal por peculato contra os servidores do INCRA.(II) Preliminarmente, aguarde-se cumprimento de diligência pendente que iria ouvir possíveis compradores dos lotes do INCRA, a fim de delimitar a autoria dos delitos de venda irregular de lotes e estelionato, imputados inicialmente aos representantes da associação de trabalhadores do PA Alana e Sindicato de Parauapebas.

Processo nº2006.39.01.001157-6 (IPL nº 137/2006),

apenso processo nº

PA Uirapuru

Inicialmente, contrariando recomendação do INCRA, o Banco do Brasil desbloqueou recursos de modo irregular (fl. 49).Em seguida, conclui-se que a verba federal liberada não fora destinada ao devido fim (construção de moradias). Das 10 casas inicialmente indicadas para construção, apenas 06 tiveram construção iniciada – atualmente paralisadas. Verifica-se ainda a construção de casas para pessoas que não faziam parte do PA Uirapuru.A servidora Maria Ivanete, mesmo após atestar que a 1ª parcela não foi bem

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372007.39.01.000

842-0empregada (v fl 22), ainda assim liberou recursos da 2ª parcela, “acreditando no trabalho da empresa que já prestava serviços em outros projetos de assentamento”.Providências: foi autorizada quebra do sigilo bancário dos envolvidos Natal Cortez da Silva e Deurilene Meire Sousa Silva;Até a presente data, não foram apresentados os servidores do INCRA, Apio Miguel dos Santos Guesso, Ciro Antonio do Espirito Santo Melo e Maria Ivanete Maia de Oliveira, apesar de reiteradamente solicitado ao INCRA.

49

IPL nº 002/2006-DPF/MBA/PAProcesso nº

2005.39.01.001183-6

Associação dos Produtores Rurais do PA União Angico II-

APR-ANGICO

Relatam as peças informativas indícios de venda irregular de lotes do referido PA, bem como cadastro falso de clientes da Reforma Agrária, com a anuência do servidor do INCRA, conhecido vulgarmente como MORBAÇA.

58

IPL nº 055/2004DPF/RDO/PA

Processo 2003.39.01.001

091-2

APIVIDA-PA CODESPAR (Associação

dos Pequenos Produtores

Rurais Brasil Novo)

Trata-se de IPL instaurado para apurar eventual prática de apropriação ilegal de recursos públicos federais, destinado a construção de unidades habitacionais, liberados pelo INCRA em 2002, à referida associação, presidida à época pelo investigado. Relatam os PA's elaborados pelo INCRA às fls. 301/560 dos autos, que o investigado, além de não construir a totalidade das casas devidas, teria adulterado contratos e falsificado assinaturas dos colonos. Ademais, foram verificadas inúmeras duplicidades de créditos em favor de supostos beneficiados.

No mais, além de promíscuo, o sistema é primário quanto aos dados existentes. Como será visto adiante, um dos assentados – interessado direto na concessão dos créditos – é quem apresenta os documentos assinados pelos seus pares e aponta quem será incluso na relação de beneficiários. Sua assertiva ganha foros de verdade perante o INCRA, que não controla a realidade do apresentado.

Além disso, não há certificação exata dos servidores que têm acesso ao sistema e inexiste controle sobre o horário de acesso, inclusões, alterações e supressão de dados. O sistema é maleável e dificilmente se constata quem realizou o ato. Um sistema de fundamental importância para todo o funcionamento do INCRA deveria ter servidores estritamente delimitados para manuseá-lo, com senhas próprias e indelegáveis (como visto, até pessoas privadas tinham acesso, assim como estagiários), além de serem amplamente conhecidos. Assim, uma vez identificada a fraude, em princípio seria reduzido o mundo de possíveis violadores.

Por sua vez, a qualidade dos dados é infantil. Instruem a demanda documentos extraídos diretamente do SIPRA, como as Relações de Beneficiários – RB (v. p. ex. fls. 574/579, extraídas das Peças de Informação n° 1.23.001.000172/2007-06). Sobre os assentados, o INCRA sabe apenas seus nomes, identidade civil e CPF. Nada mais. Os assentados são apenas números, entes abstratos nos cadastros do governo. Não há certificação de sua existência fática, atividades desempenhadas, origens, antecedentes, parentescos e aptidão para a política de reforma agrária.

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Como demonstrado nos exemplos, isso permite as mais diversas espécies de desvios. Desde a inscrição de parentes até “assentados fantasmas”.

Por si isso já dificulta qualquer controle posterior. Mas o vício é fortalecido por mais um dado: não há publicação dos dados do SIPRA. Em plena era da informação, onde a transparência, mais que determinação constitucional (art. 37, caput), é inerente à sociedade integrada por meios informatizados, não há qualquer preocupação em deixar ao público a verificação do destino dos recursos públicos.

Como será mostrado adiante, isso viola normas das mais variadas espécies.

Se o sistema originário de cadastro e controle é falho e promíscuo, inevitável que as falhas se perpetuem. É como a máxima: “aquilo que começa mal, bem não pode terminar”.

1.2 Serviços e materiais que serão contratados – Apresentação da demanda, espécies de créditos e l ista do nome de pretendentes - apresentação unilateral pelos destinatários dos recursos (associação) – suspeição ou impedimento do presidente gestor não é reconhecida - Falhas nas escolhas de destinatários e gestores – Resultado: atribuição irregular de créditos.

Elementos que propiciam a corrupção – abordagem: “a) grande dose de

poder decisório concentrado em um único agente”; e “b) multipl icidade

de órgãos competentes para execução sem esquadrinhamento perfeito e

exclusivo de atribuições”.

b) a associação, através de seu presidente (ou comissão de representantes), apresenta a demanda e a documentação, indica a espécie de crédito e a lista dos beneficiários pretendentes. Formaliza-se o procedimento de crédito. Os créditos são concedidos mediante assinatura dos contratos de concessão pelos assentados solicitantes. Em seguida, há a abertura de conta corrente específica em instituição financeira oficial (como o Banco do Brasil), para então se realizar o empenho dos créditos e o depósito nas contas em nome das associações, que até então é bloqueada (artigos 19 a 31 da norma).

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Mais uma vez o cadastro. A apresentação dos assentados pretendentes é realizada unilateralmente, sem que haja uma confirmação eficaz. Como demonstrado no tópico anterior, no máximo (quando o INCRA se preocupa em verificar), a comparação é realizada com o já falho e desacreditado cadastro SIPRA (ver os exemplos apresentados anteriormente).

Para os casos de Apoio Inicial e Fomento, espécies que não exigem qualquer tipo de contraprestação (o Fomento ao menos ainda exige uma suposta regularidade no recebimento do Apoio Inicial e na Aquisição Material de Construção, que na prática acabam não sendo verificados pelo INCRA), basta estar cadastrado na Relação de Beneficiados – RB e assinar os contratos de crédito. É verdadeiro “dinheiro público a fundo perdido”, totalmente subsidiado (art. 44 da NE 67/2007).

Como demonstrado no tópico anterior, remover o beneficiado originário do projeto de assentamento, ou mesmo cadastrar pessoas que jamais fizeram parte deste, para se ter recursos sem o lastro devido e passível de ser apropriado, parece ser um fato inegável. Ver, p. ex., o já citado PI n° 1.23.001.000164/2007-51 – Projeto de Assentamento 1° de Março:

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Peça de Informação n°: 1.23.001.00016

4/2007-51

PA 1° de Março – São

João do Araguaia

Noticia irregularidades como: a retirada de pessoas de RB (Relação de Beneficiários), mesmo já assentadas, sem realizar transferência de lotes e após recebidos recursos para habitação e PRONAF. O assentado Dionísio francisco Guimarães foi substituído pelo Sr. Franciscarlos Ferreira dos Reis na RB, porém o lote ainda é ocupado por Dionísio. Apesar de comunicado, o INCRA se nega a resolver estes problemas. Noticia ainda que o INCRA faz a recuperação de casas de pessoas que não são assentadas e sequer constam da RB, o mesmo acontecendo com o fomento e o PRONAF. / O presidente da associação declarou que perante o INCRA a Sra. Jacirene vendeu seu lote sem a autorização da autarquia, mas garante que de fato isso não ocorreu e que ela continua trabalhando nele. Outros assentados, como Dionísio, Leile e Abismael se encontram na mesma situação./ Ofício expedido ao INCRA, para que informe os beneficiários assentados no PA 1° de Março, vinculados à Associações APROCTRAM e COOPERPRAM e os beneficiários dos “Créditos Instalação” em todas as suas modalidades (apoio, material de construção, reforma material de construção, fomento). Suspeita de troca intencional de beneficiários nas listas entre as associações, para que alguém desviasse os recursos, pois assim seriam destinados a pessoas que perante cada uma das associações não existiriam.

Por outro lado, os recibos de créditos são assinados pelos assentados (ou supostamente assentados), quase sempre em datas anteriores ao próprio recebimento, sem as assinaturas de testemunhas como exigido pelo formulário padrão do INCRA, ou mesmo com a assinatura testemunhal do próprio presidente da associação (ou pessoa a ele próxima), que por ser o gestor-destinatário do recurso não se encontra em posição de isenção suficiente para testemunhar.

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Assim, o desvio ocorre e uma máscara está criada, pois o documento afirma perante o INCRA que já houve recebimento. Como contestar o recibo assinado se nada for de fato recebido? A prova é por demais dificultosa.

O fenômeno foi constatado em todos os casos apurados pelo Ministério Público Federal. Ver os vários documentos, extraídos de diversos autos, que acompanham a inicial. Se isso ocorre há tempos, em todos os casos, como garantir que não se repetirá?

Ver, por exemplo, alguns casos:

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IPL n° 061/04 – Processo n° 2004.39.01.0

00746-2

PA Buritirana - Itupiranga

O inquérito apura a suposta apropriação por José Izidoro, vulgo “Lagoa”, de valores repassados pelo INCRA ao assentamento Buritirana. Luzia Kriger Américo se cadastrou para receber crédito habitação, porém jamais recebeu e o INCRA informa que José Izidoro teria recebido os respectivos valores, assim como os de outros assentados. / O INCRA informa que à época as seguintes associações não prestaram contas perante a autarquia – setor de crédito: Associação Beneficente dos Pequenos Produtores da Vila São Pedro, Associação dos Agricultores da Vila Cruzeiro do Sul e Associação dos Agricultores da Vila Jerusalém. Apresenta supostos recibos assinados pela Sra. Luiza Kriger. Alega que não houve prestação de contas pela associação gerida pelo indiciado. Somente no exercício de 2002 foram disponibilizados recursos na ordem de R$ 65.100,00; em 2001 foram R$ 92.500,00.

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IPL n° 192/2005 – Processo n° 2005.39.01.0

00649-5

PA Progresso – Eldorado dos Carajás/PA

Desvio de verbas referentes ao crédito habitação, por parte dos representantes da empresa Construtora Planalto Ltda. Em junho de 2004 foi criada comissão para fiscalizar a aplicação dos recursos, que foram depositados pelo INCRA na conta desta e repassado à Construtora. Após receber parte do montante, a empresa abandonou a obra. O dinheiro foi transferido para a conta de Cleurismar, esposa do João Neves da Silva, representante da empresa. Em fl. 13, há documento do INCRA, assinado por Ernesto Rodrigues, em que libera a transferência de R$ 100.00,00 sem a apresentação de Nota Fiscal e/ou recibos. Alega amparo em norma de legalidade suspeita, que confirmou-se não permitir a conduta realizada. Datas de previsão dos créditos e constituição da pessoa jurídica em proximidade. Destaque para recibos e contratos assinados irregularmente.

Apenas para ilustrar, ressaltando que a dinâmica é comum a todos os assentamentos, neste último caso (IPL n° 192) quase todos os contratos e recibos estão com as mesmas irregularidades. Alguns exemplos estão em fls. 357/362 do procedimento, extraídas do inquérito e da cópia do procedimento do INCRA, realizado para a atribuição de créditos ao PA Progresso.

No caso, apenas como exemplo (já que o apanhado de outros documentos assinados pelos assentados também estão com falhas semelhantes) veja o contrato assinado pelo assentado Josivaldo Rodrigues da Silva, em 08/07/2004. Não há a assinatura de qualquer testemunha para confirmar a isenção do proceder. Na folha seguinte está o recibo. Nele também não constam as testemunhas. Mas observe o

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detalhe: a data é a mesma do contrato, ou seja, contratou algo e antes mesmo de ter seu montante transferido para a conta da associação, já firmara o recibo, ou seja, o assentado atesta sem ter recebido nada. Pura falsidade ideológica.

O mesmo ocorre com a assentada Maria Márcia Flor (fls.. 359). A distinção é que desta feita nem mesmo o Superintendente Regional assinou. Como o recurso foi liberado se nem mesmo o ordenador de despesa assinou o contrato que ampara a concessão? E assim, mais uma vez, a margem para o desvio foi criada...

O mesmo vale para todos os demais assentados no IPL/Procedimento do INCRA, com falhas semelhantes, com pessoas sem instrução suficiente para perceber a enrascada em que foram inseridos.

Qual o resultado desse proceder canhestro? Basta perceber o que houve, p. ex., com hipóteses de Recuperação Materiais de Construção, em que os recursos sequer passam pelas mãos dos assentados. Na já citada Peça de Informação n°: 1.23.001.000164/2007-51:

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Peça de Informação n°: 1.23.001.00016

4/2007-51

PA 1° de Março – São

João do Araguaia

Noticia irregularidades como: a retirada de pessoas de RB (Relação de Beneficiários), mesmo já assentadas, sem realizar transferência de lotes e após recebidos recursos para habitação e PRONAF. O assentado Dionísio francisco Guimarães foi substituído pelo Sr. Franciscarlos Ferreira dos Reis na RB, porém o lote ainda é ocupado por Dionísio. Apesar de comunicado, o INCRA se nega a resolver estes problemas. Noticia ainda que o INCRA faz a recuperação de casas de pessoas que não são assentadas e sequer constam da RB, o mesmo acontecendo com o fomento e o PRONAF. / O presidente da associação declarou que perante o INCRA a Sra. Jacirene vendeu seu lote sem a autorização da autarquia, mas garante que de fato isso não ocorreu e que ela continua trabalhando nele. Outros assentados, como Dionísio, Leile e Abismael se encontram na mesma situação./ Ofício expedido ao INCRA, para que informe os beneficiários assentados no PA 1° de Março, vinculados à Associações APROCTRAM e COOPERPRAM e os beneficiários dos “Créditos Instalação” em todas as suas modalidades (apoio, material de construção, reforma material de construção, fomento). Suspeita de troca intencional de beneficiários nas listas entre as associações, para que alguém desviasse os recursos, pois assim seriam destinados a pessoas que perante cada uma das associações não existiriam.

De modo a confirmar definitivamente a condução irregular apresentada, ver o seguinte caso:

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IPL Nº 030/05DPF/MBA/PA

Processo PA Sabino São Pedro

Relatam os autos que foram liberados em favor da referida associação R$ 149.400,00, entre os anos de 2001 e 2002, para a construção de 54 unidades habitacionais. No entanto, há notícia de não recebimento por parte dos assentados. Há declarações e documentos que demonstram os recibos assinados pelos assentados antes mesmo do recebimento. De acordo com o relato de vistoria realizada pela servidora do INCRA, Maria Ivanete Maia, houve a correta utilização dos recursos até então liberados, todavia, falta a

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2005.39.01.000809-8

realização da vistoria final para comprovação da conclusão das obras, bem como resta verificar se houve a devida prestação de contas dos recursos liberados. Chama a atenção o fato de o relatório de viagem produzido demonstrar não ter ocorrido uma vistoria in loco, contentando-se com relatos dos responsáveis pelas obras e documentação pretérita. Há indícios de apropriação indevida.

Neste caso, em depoimento prestado pelo assentado VALMI CAPRISTANO DE OLIVEIRA (fls. 429), há a confirmação:

“QUE apesar de ter assinado o contrato e o recibo, cujas cópias anexa a este, só recebeu o valor de R$ 1.400,00 e no final do mês de março/2003, faltando receber o valor de R$ 3.100,00; QUE ao ser indagado sobre o porquê de ter assinado o recibo no valor integral e datado de dezembro/2002, disse que são obrigados a fazer isso” - sic.

Até mesmo casos com hipóteses esdrúxulas ocorrem:

74

IPL 203/2007-DPF/MBA/PA(Processo nº

2007.39.01.001080-0)

PA Tuerê II – Município de

Novo Repartimento

Noticia que o presidente da APROMV teria se apropriado dos recursos referentes Créditos Instalação do PA Tuerê, e que depois se evadiu. Além da suposta apropriação indébita, o denunciante Horácio Rodrigues informa (às fls. 12) que o presidente da APROMV é homem agressivo que já o teria ameaçado de morte, e que estaria vendendo para fazendeiros áreas dentro do PA, inclusive lotes já demarcados (dentre estes o do próprio denunciante).Documentos relativos aos créditos assumidos pelos trabalhadores que abandonaram seus assentamentos foram simplesmente destruídos por servidor do INCRA. O denunciado presidente da associação não foi localizado e tem seu paradeiro desconhecido, apesar de seu vínculo ao INCRA em razão da função desempenhada.Ação penal exercida.

Nesse caso, o servidor do INCRA, sem o menor critério plausível, destruiu documentos de contratos e recibos, com uma permissividade incrível. Veja sua desculpa (fls. 547):

“...não foi possível anexar cópias de Contratos de Concessão de Créditos com respectivos Recibos – modalidade habitação, tendo em vista que, quando da assinatura dos Contratos de Concessão de Créditos com respectivos Recibos dos beneficiários que os substituíram, estes documentos passaram a não ter mais nenhum valor haja vista que os beneficiários substitutos assumiram as dívidas dos evadidos

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e, por este motivo não havia mais necessidade de guardarmos tais documentos, os quais foram destruídos, inclusive na presença do Presidente da APROMV-Associação de Pequenos Produtores Rurais de Mara Verde – Sr. Paulo Cezar Alves Cunha” - sic.

O servidor ignorou até mesmo o cadastro destes substituídos no SIPRA, o que confirma, mais um vez, que pouco importa a realidade ali descrita para o controle do sistema.

Portanto, se quiser, o responsável pela gestão, quase sempre o presidente da associação, pode se apropriar dos recursos (eventualmente junto de algum servidor traidor da causa agrária), com uma névoa sobre a situação irregular. Afinal, os documentos não são certificados pelo INCRA, mas apresentados unilateralmente pelo gestor da associação.

O ponto é ainda mais claro quando se trata de recursos para a construção de moradias. Até a construção destas, organizadas pelos gestores da associação, de fato os assentados nada receberam. Deveriam assinar o recebimento das moradias e não de meros créditos, ainda uma ficção abstrata, que sequer gerenciam. Afinal, no mundo dos fatos nada receberam.

Veja-se novos exemplos do que a norma permite:

53

IPL nº 005/2005-DPF/

RDO/PAProcesso

2005.39.01.000303-7

Associação dos Pequenos Produtores

Rurais Vale do Inapuru-PA NICOBRAN

Relatam as peças informativas, instauradas mediante ofício oriundo do INCRA, que o representante da associação supostamente teria apropriado-se de verbas do PRONAF, destinada à construção de unidades habitacionais e compra de arames, bem como falsificou assinaturas de colonos para retirar créditos de apoio junto ao INCRA.

58

IPL nº 055/2004DPF/RDO/PA

Processo 2003.39.01.001

091-2

APIVIDA-PA CODESPAR (Associação

dos Pequenos Produtores

Rurais Brasil Novo)

Trata-se de IPL instaurado para apurar eventual prática de apropriação ilegal de recursos públicos federais, destinado a construção de unidades habitacionais, liberados pelo INCRA em 2002, à referida associação, presidida à época pelo investigado. Relatam os PA's elaborados pelo INCRA às fls. 301/560 dos autos, que o investigado, além de não construir a totalidade das casas devidas, teria adulterado contratos e falsificado assinaturas dos colonos. Ademais, foram verificadas inúmeras duplicidades de créditos em favor de supostos beneficiados.

72 IPL nº 028/2004 - DPF/MBA/PA

Processo 2008.39.01.000

PA BuritiranaO denunciado, na qualidade de presidente da Associação dos Agricultores da Vila Jerusalém, se apropriou dos créditos repassados pelo INCRA. Houve vistoria realizada, quando se constatou que 15 das 20 casas previstas não foram construídas ou terminadas. Não há qualquer comprovação da utilização de pelo

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075-9 menos R$ 27.270,00. Há recibos assinados por assentados sem o efetivo recebimento.

76Processo n°

2005.39.01.001130-1

PA 1° de Março

Os réus (representantes das associações) foram denunciados por terem se utilizado de meio fraudulento em 2001 para obter créditos para a aquisição de material de construção, fornecidos pelo INCRA. Na condição de presidente da associação gestora, o denunciado propôs aos demais acusados que assinassem contratos de concessão de crédito, mesmo não sendo clientes da reforma agrária, com o que concordaram. Facilmente incluiu os nomes dos acusados na lista de beneficiários – RB, sem a confrontação pelo INCRA da realidade do cadastro. Processo penal instaurado. Réus condenados.

Enfim, assim se tem um legítimo documento garantidor de uma ilegalidade. Pode parecer paradoxal, mas é isso o que a norma e o INCRA-SR/27 permitem.

Por outro lado, a naturalidade com que o presidente de associação ou os representantes de assentados são admitidos, sem questionar sua legitimidade, é impressionante para um sistema jurídico que preza pela impessoalidade, princípio basilar da Administração Pública (CRFB, art. 37, caput). A própria força normativa constitucional já levantaria a suspeita.

Há de se ressaltar que o munus exercido pelo presidente da associação, ao ter total gestão e controle sobre a dinâmica do processo administrativo de concessão dos valores recebidos, desde a apresentação dos supostos beneficiários até a certificação das notas fiscais, demonstra seu interesse imediato na aceitação de seus atos. Não é crível que o próprio gestor fosse acusar uma irregularidade sua.

De modo a reforçar o entendimento, o ordenamento infraconstitucional concretiza o princípio para diversas hipóteses (p. ex., preceitos relativos ao impedimento e suspeição, previstos tanto para o processo judicial (Código de Processo Civil – CPC – arts. 134 a 136) quanto – em especial para a hipótese -, para o administrativo (Lei 9.784/1999 – arts. 18 a 21)5.

Como consagração definitiva do dever de imparcialidade (corolário do princípio da impessoalidade), há de se apontar que a Lei no 8.429/92 tipifica a sua inobservância como um ato de improbidade administrativa.

5 Com efeito, há de se entender o processo administrativo no sentido estatuído pela Lei de Processo Administrativo - isto é, de um roteiro constituído por um complexo de ações, juridicamente relevantes, tomadas por agentes públicos e/ou terceiros para a realização do ato administrativo. Ver "Comentários à Lei Federal de Processo Administrativo (Lei no 9.784/99) – obra coordenada por Lúcia Valle Figueiredo - Editora Fórum, 1a edição, Belo Horizonte, 2004.

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Todo o descrito apenas demonstra que a norma infralegal não preza por um mecanismo adequado de proteção de recursos públicos. Ao contrário, incentiva o desvio.

1.3 Pagamento – apresentação unilateral de comprovantes sem a constatação fática da prestação – mera declaração unilateral como comprovante – Como você quer desviar os valores? Escolha dentre as

diversas modalidades possíveis.

Elementos que propiciam a corrupção – abordagem: “a) grande dose de

poder decisório concentrado em um único agente”; “b) multipl icidade de

órgãos competentes para execução sem esquadrinhamento perfeito e

exclusivo de atribuições”; “c) ausência de mecanismos de controle

efetivo, permanente, transparente e r igoroso”; e “d) restri ta e precária

publicidade administrativa”.

c) o crédito já está apto a ser utilizado. O presidente da associação apresenta uma pesquisa de preços com três fornecedores, dentre os quais será escolhido um para fornecer a mercadoria (na espécie Apoio Inicial), o material de construção (na espécie Aquisição Materiais de Construção), ou ainda a pessoa empresária contratada (no caso da construção das moradias) - ver o art. 22 da norma. A apresentação das opções é acompanhada da escolha do vencedor, pela associação, conforme estabelecido em ata. As associações, através de seus presidentes, ou os representantes de assentados, apresentam ao INCRA as notas fiscais, faturas ou recibos, emitidos pelos fornecedores de bens ou serviços, com atestado de prestação no verso, pelo próprio presidente da associação. Enfim, o INCRA autoriza o banco a transferir os valores para a conta dos fornecedores.

Pelo parágrafo único do art. 22, ao INCRA se reserva o direito de não autorizar o gasto quando houver indícios de desvio de finalidade, ou o poder de veto quando os fornecedores não tiverem condições de assumir os compromissos pactuados. Quando isso foi realizado? Quase nunca. Há casos raros, quando há notícias de irregularidades pelo MPF, Polícia Federal ou fatos apresentados pela mídia. Por meios próprios de certificação utilizados pelo INCRA, este órgão ministerial nunca teve notícia.

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Apesar de dever certificar-se da idoneidade e capacidade de assunção do escolhido, na prática o INCRA apenas analisa o valor apresentado. O exame dos demais critérios é excepcional.

Assim, proliferam os problemas: a indicação referida é realizada pela associação, quase sempre através de seu presidente, sem maiores controles e com absoluta margem de fraude.

Um dos males que os procedimentos licitatórios buscam afastar – a escolha prévia dos pretendentes – aqui já resta afastada. Por sua vez, a falta de habilitação potencializa a frustração do objeto contratado.

O próprio Chefe do Setor de Crédito do INCRA/SR-27, em recente ofício dirigido ao Gabinete do Superintendente Regional, reconhece e confessa a situação (fls. 339), com algumas de suas conseqüências:

“Temos registrado ultimamente o crescimento de reclamações por parte de Associações e assentados, quanto ao cumprimento de contratos por parte de algumas empresas construtoras de habitações da reforma agrária. Ultimamente registrou-se um aumento significativo de empresas que se apresentam para trabalhar nos assentamentos, porém vê-se que algumas delas não possuem capacidade operacional para cumprir os compromissos firmados. Isso tem trazido grandes transtornos, visto que algumas dessas empresas têm recebido o recurso adiantado e não tem entregado as habitações ou o material adquirido dentro do prazo estipulado nos contratos firmados, além de já termos constatado através de vistoria e de informações que algumas empresas e associações desviaram recursos de habitações, no entanto as associações coniventes com o caso, ainda não

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nos comunicaram oficialmente para tomarmos as medidas previstas no Capítulo IX da NE 67/07.

(...)

Mas muitas vezes por interferência, coação, pressões externas e internas e pela própria falta de condições de estrutura e pessoal, temos que relevar o que está previsto, correndo o risco de autorizar pagamentos a empresas sem capacidade de cumprir os compromissos.”.

O sistema utilizado chega a ser esquizofrênico. Ao mesmo tempo que permite aos próprios destinatários a utilização sem critério dos recursos, parece reconhecer que os recursos merecem proteção em seu destino. Assim, realiza um proceder que faria as vezes de uma “pseudo-licitação”, mesmo consciente de sua ineficiência. Na verdade, mais uma máscara para acobertar desvios.

Como é possível desviar os valores? Basta escolher dentre as múltiplas modalidades possíveis. O mecanismo, de cunho infantil, não é difícil de entender.

Apenas para ilustrar: basta apresentar o preço do fornecedor predestinado junto a duas outras propostas, necessariamente com preços superiores, e assim a escolha estará definida. Todo esse procedimento dá margem à típica fraude de destinar parte do valor recebido pelos vencedores a alguém, a título de vantagem indevida, ou mesmo simulando as compras (o responsável pela associação “compra” as notas fiscais de comerciantes, pagando o valor do ICMS e uma comissão por elas); ou ainda permite que o eventual responsável pela associação retire o dinheiro e dele se aproprie diretamente. Sobre ele não há o mínimo controle prévio de idoneidade, como ocorre com servidores públicos.

A fraude pode muito bem utilizar empresas legalmente constituídas e com funcionamento normal. Eventualmente com o conluio dos administradores públicos cúmplices do “esquema”, tais empresas vendem produtos e serviços superfaturados, ou recebem contra a apresentação de notas que discriminam serviços não executados, produtos de baixa qualidade ou mesmo não entregues.

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No caso de notas superfaturadas, para um serviço que foi realmente prestado e teria um determinado custo, registra-se na nota fiscal um valor maior. Como o INCRA praticamente só verifica se dentre os fornecedores apresentados o preço é o menor, sem questionar se realmente refletem a realidade de mercado, a diferença entre o preço real e o valor superfaturado é dividida entre os fraudadores.

Outro mecanismo é o preenchimento de notas com uma quantidade de produtos muito superior àquela realmente entregue. Nessa modalidade, os valores cobrados a mais e que constam da nota emitida são divididos entre os “participantes” da fraude. O superfaturamento de quantidades só depende do conluio de um fornecedor com o responsável pelos assentados, que atesta o recebimento.

O que distingue este esquema apresentado é que suas falhas são garantidas – e mesmo incentivadas – normativamente.

O próprio Chefe do Setor de Crédito, no ofício dirigido ao Gabinete do Superintendente Regional, confirma que essa é uma realidade, quase natural na dinâmica do INCRA/SR-27 (fl. 339/40), com requintes do dinamismo:

“Com o aumento do número de empresas construtoras de casas, a concorrência entre elas cresceu significativamente e para conseguir entrar no mercado, algumas dessas empresas passaram a oferecer comissões (percentual do valor contratado) aos representantes responsáveis pela contratação. Essa prática se alastrou rapidamente e de forma incontrolável entre o movimento social, que adotou isso como usual, passando a exigir valores cada vez maiores, prejudicando ou até mesmo inviabilizando a correta aplicação dos valores destinados aos assentados, visto que, essa parte destinada ao pagamento de comissão no final é descontada do beneficiário, seja na qualidade do material empregado, seja no tamanho das

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habitações ou até mesmo no desvio de recursos. A situação é tão grave que chegou ao ponto de alguns fornecedores solicitarem ao INCRA, principalmente na UA´s, que interceda junto ao movimento social, que vem cobrando comissões altíssimas para dar preferência a este ou aquele estabelecimento, fato inaceitável, pois os recursos única e exclusivamente aos assentados, sendo o movimento social apenas o gestor.

Toda a situação relatada acima proporciona um ambiente favorável ao desvio, à má aplicação dos recursos e dos calotes, visto que já constatamos os casos de desvio de recursos nos PA´s Mãe Maria, Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, São Geraldo e Tuerê (que já tem denúncia formalizada na justiça), além de muitos outros PA´s que ainda não formalizaram denúncia, mas que as obras estão bastante atrasadas e as empresas já se retiraram do PA, sem dar qualquer satisfação aos assentados, à associação, nem ao INCRA”.

Exemplos de casos que apresentam a dinâmica:

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Peça de Informação n°: 1.23.001.00017

2/2007-06

PA Sabino São Pedro –

Gleba Geladim - Marabá

O noticiante afirma que a APRUM recebeu R$ 145.000,00 em sua conta vinculada para a construção de casas no assentamento e crédito de apoio. No entanto, Francisco dos Santos Pereira, então presidente da associação, não prestou contas de todas as casas construídas. Relata que a servidora Sonia afirmou que perante o INCRA sua casa estava construída desde 2003 - o que não é verdade - e que procurasse o presidente da associação, o Sr. Baiano. Muitos outros também não receberam suas casas. Relata que a associação também recebeu recursos para a construção do muro de escola, mas que apenas uma cerca restou realizada e que houve fraude com a aquisição de notas fiscais de comerciantes. Noticia que o lote 14 foi objeto de disputas entre um assentado, o ex-presidente Baiano e o Sr. Zezinho. Aponta ameaças realizadas pelo Sr. Baiano, que busca assinaturas de professores e alunos da escola local para provar a posse do lote 14. O Sr. Baiano teria diversos lotes em nome de esposa e filhos.

15

IPL n° 096/2006 – Processo n°

2007.39.01.000056-3

Assentamento Rio Negro,

localizado em São Félix do

Apura a apropriação ilegal de verba repassada pelo INCRA referente a créditos instalação na modalidade habitação para construção de 24 (vinte e quatro) casas para os assentados. O Chefe da UA-Xingu determinou a liberação dos recursos em 23/08/2004 e 10/09/2004, no entanto, até o momento não foi realizada a construção de nenhuma unidade habitacional. Apuração de responsabilidade dos gestores da associação (presidente e tesoureira), em conluio com a pessoa jurídica construtora.

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Xingu

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IPL n° 106/2005 – Processo n°

2005.39.01.001208-4

PA Açaizal, Angical e Abaubal –

Palestina do Pará/PA

Há notícia de desvio de verbas de fomento e habitação, liberadas pelo INCRA em nome das associações e geridas por seus presidentes. Há depoimentos que afastam a justificativa costumeira, quanto ao acesso difícil, para a não construção de moradias (Eudino Martins de Oliveira – fl. 16/18). Não se tem notícia do destino do dinheiro. O INCRA permitiu o pagamento de vários fornecedores, sem qualquer espécie de controle, sem a prestação dos materiais ou serviços adquiridos. Há evidência de ajuste dos presidentes de associação com os fornecedores, que lhes pagariam grande parte do valor transferido pelo INCRA em razão do fornecimento de produtos e materiais. Assim, constatou-se que apesar de notas fiscais, recibos e outros documentos, o dinheiro transferido para os empresários não tinha lastro de fato, tendo em vista que as contratações não eram cumpridas e o dinheiro apropriado. O INCRA admitia esse mecanismo maquiador. As contas foram aprovadas pelo INCRA. Ação por improbidade administrativa e denúncia oferecidas.

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Processo nº 2006.39.01.000

937-4

PA BANDEIRANTES

Prática do crime de estelionato pelo representante da MARPLAN. Para liberação dos seguintes recursos, citado representante declarou ter concluído 80% das obras (fato inverídico, pois, conforme relatório de fiscalização, apenas 21 casas foram construídas e a maioria, 63, pendentes de construção).O arranjo contaria com o auxílio do Superintendente do INCRA, encarregado da “fiscalização” e liberação dos recursos (denunciado pelo crime de peculato qualificado), e da tesoureira da associação dos produtores rurais.Providências: denúncia em 13 de junho de 2003. Não foi denunciado o presidente da associação, Ivanildo Oliveira Modesto, em face do seu óbito.Nos autos da denúncia, há cópia da inicial da ação de improbidade administrativa, de 15 de maio de 2000, relativamente aos mesmos fatos.Processo foi separado. Original segue em relação a Vitor Hugo, já citado.Cópia segue em relação a Maria Lizie e Hamilton Araújo, até agora não localizados para citação (determinada prisão preventiva deste e novas diligências para localizar aquela).

39

IPL nº 011/2001Processo

2001.39.01.000148-8

Associação dos Pequenos

Trabalhadores Rurais do Alto

Bonito do Itacaiúnas-APTRAB

O INCRA liberou em junho de 1998 o montante de R$ 667.500,00 para a construção de 267 unidades habitacionais, porém o ex-presidente José Maria não prestou contas, bem como exigia um percentual de 2% do valor do crédito dos colonos. Ademais, em conluio com comerciantes de Marabá, obrigou os colonos a comprar mercadorias com valores acima de mercado.

53

IPL nº 005/2005-DPF/

RDO/PAProcesso

2005.39.01.000303-7

Associação dos Pequenos Produtores

Rurais Vale do Inapuru-PA NICOBRAN

Relatam as peças informativas, instaurada mediante ofício oriundo do INCRA, que o representante da associação supostamente teria apropriado-se de verbas do PRONAF, destinada à construção de unidades habitacionais e compra de arames, bem como falsificou assinaturas de colonos para retirar créditos de apoio junto ao INCRA.

54

IPL nº 277/2003DPF/MBA/PA

Processo 2003.39.01.001

413-5

PA's do Município de Itupiranga/PA

Relatam as peças informativas que o ex-presidente do Sindicato de Trabalhadores Rurais, em conluio com os presidentes de PA's, aproveitando-se de sua condição de ex-presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Itupiranga, apropriou-se da quantia de R$ 79.600,00, recursos públicos federais, destinados à construção de casas, ao descumprir o contrato de compra e venda de cerâmicas com as PA's do sindicato daquela localidade, não entregando os tijolos devidos.Ademais, há denúncia contra o mesmo ex-presidente do Sindicato de que teria apropriado-se de uma quantia de R$ 318.000,00 destes PA's, adquirindo com tais desvios um caminhão, registrado no nome de seu irmão, João Silva Abreu, ex-presidente da Associação dos Trabalhadores Unidos da Comunidade João Ramos.

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IPL nº 297/03-DPF/MBA/PA

Processo 2004.39.01.000

076-8

Associação dos Produtores Rurais do Projeto

Tapirapé I, II e III-

APRUPTAMP-PA Cupu.

Relata o IPL que foram repassados recursos pelo INCRA à referida associação, no montante de R$ 433.500,00, nos exercícios financeiros de 2001/2002, para a construção de 109 casas no “Projeto Cupu”, cujo presidente à época, já falecido, construiu tão-somente 45 casas, apropriando-se do restante, ao comprar inúmeros bens, listados às fls.08/09, com as verbas públicas federais. Ocorre que a ex-secretária da Associação, esposa do falecido, passou a apropriar-se dos recursos, ao alienar os bens da Associação, descumprindo o contrato celebrado com esta.

56

IPL nº 152/2005-DPF/

MBA/PAProcesso nº

2006.39.01.000028-9

Associação dos Pequenos

Produtores e Agricultores da

Fazenda Casarão-

APAFCNI-PA CASARÃO.

O ILP foi instaurado da notitia criminis encaminhada pelo INCRA, relatando a eventual apropriação de recursos públicos liberados pela autarquia agrária, pelos representes da referida associação e proprietários da construtora. A associação celebrou 02 contratos com a referida empresa, sendo o primeiro para a construção de 26 casas populares em alvenaria, no montante de R$ 130.000,00, com data de 04/02/2004, e o segundo contrato, para a construção de 22 casas de madeira, no montante de R$ 68.200,00, liberado no dia 05/02/2004, os quais não foram cumpridos

57

IPL nº 032/04-DPF/MBA/PA

Processo 2004.39.01.000

569-5

Associação dos Trabalhadores na Agricultura Familiar do PA Nova Vitória-APFANOVI

Relatam os autos que os representantes da referida associação apropriaram-se de recursos públicos federais, repassados pelo INCRA para a construção de casas. Segundo o INCRA, às fls. 135/137, foram liberadas 03 parcelas em favor da referida associação, no montante de R$ 153.414,00, recursos estes destinados à 77 famílias para a construção de unidades habitacionais, e não houve nenhum tipo de prestação de contas por parte da associação. Ademais, a empresa construtora deixou de executar parcialmente as obras de construção.

58

IPL nº 055/2004DPF/RDO/PA

Processo 2003.39.01.001

091-2

APIVIDA-PA CODESPAR (Associação

dos Pequenos Produtores

Rurais Brasil Novo)

Trata-se de IPL instaurado para apurar eventual prática de apropriação ilegal de recursos públicos federais, destinado a construção de unidades habitacionais, liberados pelo INCRA em 2002, à referida associação, presidida à época pelo investigado. Relatam os PA's elaborados pelo INCRA às fls. 301/560 dos autos, que o investigado, além de não construir a totalidade das casas devidas, teria adulterado contratos e falsificado assinaturas dos colonos. Ademais, foram verificadas inúmeras duplicidades de créditos em favor de supostos beneficiados.

61

IPL 050/04Processo

2004.39.01.000655-0

Projeto de Assentamento Castanheira II (Brejo Grande do Araguaia).

No decorrer de 2001 e 2002 foram repassados pelo INCRA R$ 157.500,00 à Associação dos Pequenos Produtores Rurais do Projeto de Assentamento Castanheira II – APPRAC, sob a rubrica de crédito instalação (materiais de construção) de 63 casas. Das moradias previstas, apenas 33 foram construídas e houve a apropriação da diferença (aproximadamente 57.000,00), mediante a utilização de cheques da referida conta. Há declaração de servidor que afirma a liberação de recursos mediante a mera apresentação de notas fiscais e que há poucos servidores para as vistorias in loco. / Denúncia oferecida.

64

IPL nº 100/05DPF/MBA/PA

Processo 2005.39.01.001

152-4

Associação do Conselho

Comunitário Agrícola-ACCA-

PA Cinturão Verde I e II

Relatam os autos que o INCRA liberou no exercício de 2002 à aludida associação 17 “Amc”, no valor de R 3.100,00, totalizando o montante de R$ 52.700,00, na gestão do investigado (presidente da associação), que apropriou-se dos recursos públicos federais. Durante uma vistoria realizada pelo INCRA em 18/09/2004, constatou-se que somente 02 casas foram concluídas e as outras 15 estavam inacabadas e as obras estavam paralisadas.

65

IPL nº 052/05DPF/MBA/PA

Processo 2005.39.01.00

0848-5

Associação dos Pequenos

produtores Rurais da Boa Esperança-PA

Nova Esperança

Segundo a notitia criminis encaminhada pelo INCRA, foi repassado à referida associação, na gestão do ora investigado, a quantia de R$ 195.000,00, nos exercícios de 2000 e 2002, para a construção de unidades habitacionais. Foram concluídas 22 casas, no valor de R$ 55.000,00, 25 inacabadas e avaliadas aproximadamente no valor de R$ 42.000,00 e 31 casas não foram sequer iniciadas. Supostamente foram desviados pelo investigado o montante de R$ 97.500,00.

66 Relatam os autos que foram liberados em favor da referida associação R$ 149.400,00, entre os anos de 2001 e 2002, para a

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IPL Nº 030/05DPF/MBA/PA

Processo 2005.39.01.00

0809-8

PA Sabino São Pedro

construção de 54 unidades habitacionais. No entanto, há notícia de não recebimento por parte dos assentados. Há declarações e documentos que demonstram os recibos assinados pelos assentados antes mesmo do recebimento. De acordo com o relato de vistoria realizada pela servidora do INCRA, Maria Ivanete Maia, houve a correta utilização dos recursos até então liberados, todavia, falta a realização da vistoria final para comprovação da conclusão das obras, bem como resta verificar se houve a devida prestação de contas dos recursos liberados. Chama a atenção o fato de o relatório de viagem produzido demonstrar não ter ocorrido uma vistoria in loco, contentando-se com relatos dos responsáveis pelas obras e documentação pretérita. Há indícios de apropriação indevida.

67

IPL nº 113/2007DPF/MBA/PA

Processo 2007.39.01.000

668-4

Associação dos Pequenos Produtores

Rurais do Vale do Rio Preto

Relatam os autos que o ora investigado, na qualidade de presidente da referida associação supostamente teria apropriado-se de recursos públicos federais oriundos do programa reforma agrária (fomento e habitação), não prestando contas de sua gestão. Dentre as diversas irregularidades, destaca-se o registro de uma motocicleta pertencente à associação em seu próprio nome; emissão de diversos cheques sem prestação de contas; não conclusão das casas; débito de R$ 15.000,00 em nome da associação.

72

IPL nº 028/2004 - DPF/MBA/PA

Processo 2008.39.01.000

075-9

PA Buritirana

O denunciado, na qualidade de presidente da Associação dos Agricultores da Vila Jerusalém, se apropriou dos créditos repassados pelo INCRA. Houve vistoria realizada, quando se constatou que 15 das 20 casas previstas não foram construídas ou terminadas. Não há qualquer comprovação da utilização de pelo menos R$ 27.270,00. Há recibos assinados por assentados sem o efetivo recebimento.

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IPL 203/2007-DPF/MBA/PA(Processo nº

2007.39.01.001080-0)

PA Tuerê II – Município de

Novo Repartimento

Noticia que o presidente da APROMV teria se apropriado dos recursos referentes a Créditos Instalação do PA Tuerê, e que depois se evadiu. Além da suposta apropriação indébita, o denunciante Horácio Rodrigues informa (às fls. 12) que o presidente da APROMV é homem agressivo que já o teria ameaçado de morte, e que estaria vendendo para fazendeiros áreas dentro do PA, inclusive lotes já demarcados (dentre estes o do próprio denunciante).Documentos relativos aos créditos assumidos pelos trabalhadores que abandonaram seus assentamentos foram simplesmente destruídos por servidor do INCRA. O denunciado presidente da associação não foi localizado e tem seu paradeiro desconhecido, apesar de seu vínculo ao INCRA em razão da função desempenhada.Ação penal exercida.

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Processo n° 2005.39.01.001

130-1PA 1° de Março

Os réus (representantes das associações) foram denunciados por terem se utilizado de meio fraudulento em 2001 para obter créditos para a aquisição de material de construção, fornecidos pelo INCRA. Na condição de presidente da associação gestora, o denunciado propôs aos demais acusados que assinassem contratos de concessão de crédito, mesmo não sendo clientes da reforma agrária, com o que concordaram. Facilmente incluiu os nomes dos acusados na lista de beneficiários – RB, sem a confrontação pelo INCRA da realidade do cadastro. Processo penal instaurado. Réus condenados.

77IPL 151/2002-DPF/MBA/PA

Lana e Itacaiúnas Açú

Apuração de vendas de terras da União, o que caracteriza crime previsto no art. 171,§2º,I. O representante da associação é suspeito de não repassar a totalidade das verbas destinadas à construção de habitações. O representante inicialmente suspeito foi morto e a responsabilidade da Tesouraria da Associação será apurada.

78IPL 138/2007-DPF/MBA/PA

Santa Liduína Apuração de apropriação indébita de valores destinados à construção de 12 casas. O valor corresponde à R$ 60.000,00 em material para construção e R$ 4.500,00 em mão-de-obra. As casas foram terminadas no trâmite do IPL.

80IPL: 085/2000- P.A. OZIEL

O IPL em foco destina-se a apuração de apropriação indébita de verbas federais destinadas para financiar estruturação e

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DPF/MBA/PA PEREIRA produção de projeto de assentamento. Ocorrência de irregularidades no uso das verbas, bem como, decisão monocrática, no que tange ao uso destas, por parte da presidente da associação. Irregularidade na inspeção prévia à liberação dos recursos pelo BASA.

Como se verifica, a concentração de poderes em alguém com interesse direto na sua solução (presidente de associação ou representantes), com poderes para determinar de quem, para quem e quando comprar, certificar unilateralmente o cumprimento para transferir os recursos e chancelar seu recebimento, tem um efeito funesto. Todas as evidências demonstram a fragilidade do sistema e variadas maneiras de desvios são verificadas.

O INCRA se tornou um criador de feudos, composto de senhores feudais com poderes quase absolutos. Os exemplos de arbitrariedades baseadas na concentração de poderes são diversos. No já mencionado IPL nº 193/2007 – DPF/MBA/PA isso é claro. No caso, alguns assentados se dirigiram ao Superintendente Regional, Raimundo de Oliveira Filho, clamando por ajuda e providências (fls. 474):

“O Presidente da Associação vem concentrando os poderes na Entidade, não permite a livre manifestação dos associados, não dá satisfação dos seus atos à comunidade, quando age na qualidade de presidente da Associação, só atende quem ele quer, e ameaça excluir dos benefícios do Programa da Reforma Agrária, todo e qualquer assentando que discordar de suas idéias ou que tentar opinar na vida da Associação. (...) Vários assentados ficaram excluídos do Crédito Apoio, e não são atendidos pelo presidente quando pedem orientação. Há alguns assentados sendo ameaçados de serem excluídos do Crédito PRONAF . “A”. Basta a mínima discordância com a forma da qual o presidente se utiliza para dirigir a Associação, para o associado passar a ser perseguido” - sic.

Toda ameaça termina por estar fundada em algum dado da realidade. O trecho sublinhado demonstra que o presidente da associação tem poderes para escolher os beneficiários ao seu alvedrio. Ele é o focalizador, em inúmeros casos o

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único elo admitido pela norma de execução e pelo INCRA/SR-27 para determinar a realidade a ser considerada.

Ele determina a realidade. Com esse poderio passa a abusar. Mais um exemplo, no mesmo inquérito, extraído do depoimento de FRANCISCO VIEIRA CARVALHO (fls. 480), ao relatar sobre o Sr. Simplício, presidente de associação:

“...QUE ressalta que quando receberam os créditos ligados ao fomento, no valor de R$ 1.400,00, o Sr. SIMPLÍCIO ficou com R$ 200,00 de cada colono; QUE sabe que várias outras pessoas também tiveram recursos retidos pelo Sr. SIMPLÍCIO...” - sic.

Em outro depoimento, manifesta MANOEL GONÇALVES DA CRUZ, denunciando a promiscuidade entre o público e o privado permitida pelo INCRA (fl. 485):

“...QUE desconfiando de alguma irregularidade, procurou o Sr. SIMPLÍCIO MARTINS DE ALENCAR, Presidente da Associação ligada ao PA Jardim, para perguntar o motivo de sua casa não ter sido feita, pelo que ouviu, no interior da própria sede do INCRA, em Marabá, que a casa “não foi nem será feita”; QUE tem observado que não é só ele que se encontra em tal situação, tendo diversos outros moradores enfrentando situação semelhante...” - sic.

Como já demonstrado e será reforçado adiante, o sistema é covarde. Abusa da ingenuidade, falta de preparo e ignorância de pessoas simples, como inúmeros agricultores. O INCRA, que deveria protegê-los, trai a causa social e os joga na cova dos leões. Prossegue o depoimento, em semblante aplicável a qualquer espécie de crédito:

“...QUE os pagamentos ligados ao PRONAF eram feitos no banco, sendo que assinam “uns papéis”, como prova de recebimento do dinheiro, mas que a conferência entre o valor que deveria ser entregue e o valor efetivamente

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recebido, não é feita, tendo em vista que muitos são analfabetos ou semi-analfabetos...” - sic.

Ao invés de se dilargar o sistema de controle, concentra-se nas mãos de poucos (na verdade apenas o presidente). Quanto maior o poder concentrado, ou cooptado no caso das comissões, maior a tentação corruptiva. Montesquieu ficaria arrepiado...

Por vezes a situação chega a ser declarada, sob uma suposta chancela dos associados. É o exemplo contido nas peças de informação n° 1.23.001.000010/2008-41 (fl. 556) em que o Vice-presidente da Associação dos Produtores Rurais do PA Água Fria noticia que a associação concordou com o desconto de 2% dos valores de “Construção, Reforma e Crédito de Apoio” em favor da associação:

“Desse valor teria que ser repassado para a ASSOCIAÇÃO o total de R$ 1.584,00 (Um mil, quinhentos e oitenta e quatro reais), sendo R$ 72,00 (setenta e dois reais) por cada crédito de Apoio.

Ocorre que o Presidente da Associação, Sr. GALDINO AGUIAR SAMPAIO, só está liberando para Compra no Comércio local, o Valor de R$ 2.100,00 (Dois mil e cem reais) por Crédito de Apoio, o que representa um desconto de R$ 300,00 (trezentos reais) por associado, perfazendo um total de R$ 6.600,00 (Seis mil e seiscentos reais), o que representa o acréscimo de R$ 5.016,00 (cinco mil e dezesseis reais) no que teria que ser descontado dos associados ora beneficiados” - sic.

Termina relatando que o Presidente em questão utilizaria esses recursos para promover sua política partidária. Vale destacar que o próprio INCRA reconheceu essa cobrança indevida noticiada (fl. 555).

Por outro lado, a transferência dos recursos, da conta vinculada à associação para a conta do fornecedor escolhido, se dará mediante a fiscalização da Comissão de Crédito e a certificação do presidente da associação ou comissão instituída (art. 24).

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Vale destacar que o recurso somente poderá ser transferido após a entrega do produto ou a prestação do serviço (Art. 25. É expressamente vedado antecipar o pagamento à entrega do produto ou à prestação de serviço).

Pelo número de casos de desvio, como já exaustivamente apresentados nesta petição, com apropriação direta, construções inacabadas, produtos não entregues apesar de o recurso ter sido liberado, dentre outras hipóteses, já se percebe que sequer a infantil norma é cumprida.

É o que mais uma vez confessa o Chefe do Setor de Crédito do INCRA/SR-27, no ofício ao Superintendente Regional. Repare, que mais uma vez (melhor: sempre) reconhece que o sistema permitiu o crescimento de forças de pressão, já que sem o devido controle e limitações, influenciam nas decisões (fls. 340):

“E o artigo 25 prevê:

(...)

A aplicação deste artigo também tem sido deixada de lado, em razão de interferência, coação, pressões externas e internas dos interessados nas liberações, impulsionadas pelo que foi colocado no item 2, ou seja as comissões pagas aos representantes, que na pressa de abocanhar sua fatia no bolo, pressionam para o pagamento adiantado dos produtos ou serviços fornecidos pelas empresas, que em muitos casos ficam um longo tempo com o recurso rendendo juros nas contas sem iniciar as obras, além disso, essa prática proporciona a facilidade nos desvios dos recursos citados anteriormente nesse relatório”.

Se os recursos fossem liberados apenas quando efetivamente fosse recebido o produto ou prestado o serviço, tais desvios não seriam evitados em razão da falha normativa, mas no mínimo diminuiriam.

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O ponto sequer precisava de prova. É questão de lógica. Mais uma falha, nos moldes das assinaturas de recibos sem o percebimento concreto das prestações.

Mas o Ministério Público Federal quis elucidar por completo a dinâmica e constatar o que ocorre na realidade. Verificou que realmente os recursos são liberados sem que os servidores constatem na realidade a a aplicação concreta das prestações pelos fornecedores. O INCRA/SR-27 contenta-se com a declaração unilateral, mais uma vez, do senhor feudal (rectius: presidente da associação) no verso das notas fiscais ou recibos.

Como exemplo - o mesmo se verifica em todos os inúmeros procedimentos para a liberação de créditos -, ver os documentos extraídos da Peça de Informação n° 1.23.001.000172/2007-06, especialmente em fls 581 a 593 verso. São notas fiscais, com um singelo carimbo no verso, com espaços para marcar “o material foi entregue” ou “o serviço foi prestado”. Por vezes, há apenas o carimbo e a assinatura, com nada preenchido. Ressalte-se que as notas são apresentadas, sempre, pelos presidentes de associação.

Portanto, a fiscalização é mera formalidade, sem conteúdo material eficaz. A comissão de crédito – que como veremos adiante inexiste - não atua. Apenas finge existir.

No caso do já citado IPL n° 50/2004-DPF/MBA/PA, o servidor do INCRA, WILSON DIAS PEREIRA (fls. 449) afirma que não há efetivamente um controle sobre a realidade das prestações, in loco. Simplesmente o INCRA, há tempos, se contenta com a apresentação de notas fiscais apenas. Diz ele:

“QUE o declarante informa que as notas fiscais foram entregues, permitindo a liberação da segunda parcela”.

Enfim, como apresentado, há diversos casos de desvio de verbas que deram origem a procedimentos perante esta Procuradoria, assim como inquéritos policiais, termos de declaração e processos. Tudo principalmente em razão da apropriação ou malversação por parte dos vários gestores das associações. Ver, p. ex., o já mencionado PI n° 1.23.001.000172/2007-06 – Projeto de Assentamento Sabino São Pedro – Gleba Geladim (fls. 565/609).

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Os exemplos, mais um vez, são diversos e certamente este juízo tem a exata noção dos inquéritos e processos, seja de natureza penal ou ainda por improbidade administrativa, que diariamente aportam em sua serventia.

É certo que por vezes são identificadas falhas graves de gestão, fato confirmado ao se verificar que os gestores dos vultosos recursos públicos quase sempre são analfabetos funcionais. De fato, a realidade de alguns casos perante este juízo, em diversas audiências, apontam para a leviandade cometida pelo INCRA ao permitir gestores privados sem compromisso público (compromisso que seria típico dos servidores), ou despidos do mínimo preparo exigido para a situação. Isso já seria razão suficiente para não se permitir este sistema.

Mas a realidade é que na maioria dos casos a causa não é essa. Como confessado pelo INCRA, é má-fé mesmo.

Ademais, muitos desses tipos de fraude requerem, invariavelmente, a conivência de servidores. Afinal, são eles que fazem a ligação entre a realidade mundana e o erário público, devem sempre verificar o serviço realizado ou a mercadoria entregue, a área contábil tem de empenhar a despesa e pagar as notas, emitindo a ordem correspondente. Quando se trata de serviços técnicos, como a construção de moradias, a execução deve ser certificada por funcionários capacitados. Assim, quando há irregularidade, todos são coniventes, mesmo que por omissão. Em muitos casos é praticamente impossível aos presidentes de associação fraudar sozinhos.

O INCRA não entra no mérito se a nota fiscal contabilizada é “fria” ou não, se a empresa é “fantasma” ou não, se o valor é compatível com o serviço ou não, e se o procedimento “pseudo-licitatório” foi montado e conduzido adequadamente ou não.

Como a nota fiscal se tornou no Brasil a base de toda transação empresarial, base para a cobrança de tributos, para a realização de pagamentos e para a prestação de contas, a utilização desse documento fiscal se tornou também a base de inúmeras fraudes praticadas contra entidades públicas.

O que mais impressiona: com total consentimento e mando do Superintendente e da Chefia da Divisão Técnica , por vezes não precisava apresentar qualquer documento. O próprio Chefe do Setor de Crédito do

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INCRA/SR-27 reconhece a confessa a situação (fls. XX - depoimento no Processo n.° 2008.39.01.000075-9):

“Que o INCRA exigia a apresentação de notas fiscais para liberar os saques; Que os valores foram liberados em duas parcelas; Que segundo a norma de execução a liberação dos recursos dependeria da aquisição e entrega dos materiais no PA, o que seria previamente fiscalizado, mas ocorre que isso somente começou a ser feito em data muito recente; Que o procedimento consistia em liberar os recursos mediante a apresentação de notas fiscais; Que partia da Superintendência do INCRA e da Chefia da Divisão Técnica a determinação para que os recursos fossem liberados com a simples apresentação de notas fiscais e, até mesmo, sem a apresentação de qualquer documento...”.

A problemática é conhecida. Se o extenso rol de casos já apresentado não for suficiente para formar a convicção definitiva deste juízo, ou mesmo o fumus boni iuris, valerá apontar mais alguns exemplos. Eles não acabam. E a cada dia o número só faz crescer:

10

IPL 151/2007PA

Buritirana -

Itupiranga

Apropriação de recursos geridos pela Associação dos Pequenos e Médios Produtores Rurais do Rio Cajazeira, através de seu gestor, Edmar Pereira de Souza. Mencionados: Raimundo Pereira da Silva (presidente da Associação Beneficente dos Ruralistas de Vila São Pedro), Domingos Farias dos Santos (presidente da Associação dos Agricultores da Vila Jerusalém), Haroldo Lima Vasconcelos, José Guimarães de Sousa e Sônia Maria dos Santos (presidentes da Associação dos Pequenos Produtores Rurais da Vila Jerusalém) – todos referentes a créditos repassados no ano de 2002.

11

IPL n° 143/03 – Processo n° 2003.39.01.00

0679-6

PA Volta Grande -

Marabá/PA

Apropriação de recursos repassados pelo INCRA e geridos pela Associação dos Pequenos Produtores Rurais do PA Volta Grande pelo ex-presidente Raimundo Lima Oliveira. Possibilidade de envolvimento de servidores do INCRA. / Medida tomada: envio de ofício ao INCRA para fornecer todo o procedimento administrativo de liberação e prestação de contas dos recursos. IPL ficará aguardando na PRM/MAB a resposta do ofício para ulteriores providências.Acrescente-se, entretanto, que o INCRA já informara (fls. 189) acerca de inexistir qualquer prestação de contas no que pertine ao PA Volta Grande, sugerindo que a servidora Maria Ivanete e o Benedito Nascimento “poderão prestar melhores esclarecimentos”.A despeito de inexistência de prestação de contas, como exigido, o superintendente à época, sr. Marlon, continuou liberando recursos (inclusive a 2a parcela no valor de R$-37.000,00) .Já chegou a cópia do procedimento requisitado ao INCRA. O IPL foi enviado à DPF para realização de diligências.

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12

IPL n° 091/04 – Processo n°

2007.39.01.000778-9 (Ação Penal

e Ação por Improbidade

Administrativa exercidas)

PA Maravilha do

Tapiraré – Vila Cruzeiro

do Sul, Itupiranga/PA

Apropriação de recursos repassados pelo INCRA nos anos de 2001 e 2002 e geridos pela Associação dos Pequenos Produtores Rurais do PA Maravilha do Tapiraré. O Presidente da Associação comprou uma serraria e um caminhão tipo fuscão. O tesoureiro colaborou conscientemente para o desiderato do presidente. O servidor do INCRA elaborou relatório de fiscalização destoante da realidade para acobertar a prática criminosa. Ação penal e por improbidade administrativa exercidas.

17Processo n°:

2005.39.01.001478-7

Ação penal

PA CODESPAR

Complementação do crédito-habitação proveniente do INCRA em 2002, destinada aos assentados da associação. O réu desviou o montante e depositou na conta de sua esposa. Utilizou os recursos para despesas pessoais. Houve resistência por parte do INCRA em fornecer a documentação pertinente. Ameaças realizadas pelo réu ao Daniel Manuel da Silva. Ação penal exercida (art. 168 do CP).

46

Peças de Informação n°: 1.23.001.0001

32/2007-56

PA Alegria - Marabá/PA

Relatos de que o presidente da associação do referido projeto de assentamento atua de maneira arbitrária em relação aos créditos obtidos junto ao INCRA, retendo principalmente recursos da espécie material de construção.

48

Processo nº 2005.39.01.00

1792-6(Ação Penal)

PA Serra Azul

Sem prestar contas, o denunciado, Francisco Barbosa de Lima, evadiu-se com a maior parte dos recursos que deveriam ser destinados à construção de casas aos assentados do PA Serra Azul.Alegou que teria sido ameaçado de morte. Entretanto, nota-se que foi o denunciado que atentou contra a vida de um dos assentados e fugiu alegando risco de morte (v. fl. 34).Mais ou menos, um ano após o sumiço do denunciado, constatou-se que, apesar de parecer de vistoria, da lavra de Benedito Gomes da Silva (fl. 16) ter atestado que os recursos não estavam sendo devidamente aplicados, ainda assim o sr. Marlon da Silva Ferreira, então Superintendente (fl. 17), autorizou a liberação da 2ª parcela (esse fato não mereceu maior atenção durante o IPL).Providências: foi requerida prisão preventiva do denunciado.

79IPL 178/2002– DPF/MBA/PA

Associação dos

Pequenos Produtores

do Assentamento Morajuba (ASPREPA

M)

O presente IPL se presta à apuração de apropriação indébita de recursos destinados à construção de 45 casas no assentamento Morajuba, tendo sido iniciado mediante denúncia ao MPF da assentada Sra. Dilma Baldon Cruz. Alega a assentada que dos recursos repassados pelo INCRA para construção de habitações, somente parte deles foram utilizados, uma vez que somente 15 casas encontram-se acabadas e o restante a menos da metade, alega, ainda, que os materiais utilizados são de baixa qualidade e diferente do previsto inicialmente. Dificuldades em encontrar o presidente da associação para efetivar controle e responsabilização. Sequer o INCRA consegue encontrá-lo. / Aguardar o cumprimento das diligências requeridas às fls. 94.

81

IPL nº 335/2003

DPF/MBA/PAProcesso

2004.39.01.000108-8

PA OZIEL PEREIRA-Associação

dos Produtores Rurais do

Assentamento Oziel-APRAOP

Trata-se de notitia criminis encaminhada pelo INCRA relatando a suposta apropriação indébita perpetrado pela ex-presidente da associação, a Sra. Lusinete, fato este ocorrido em dezembro de 2001, ocasião em que foram liberados pelo INCRA crédito habitação na modalidade complementação, no valor de R$ 700,00 para cada uma das quatrocentos famílias. Às fls. 54, o servidor do INCRA, Ápio, afirma que 94 famílias assentadas não receberam os recursos que lhes eram devidos.

86

IPL nº 047/2007-/DPF/

MBA/PA. Processo nº

2007.39.01.001197-0

P.A. CABANAGEM

Trata-se de IPL referente à prática de apropriação indébita pelo presidente da Associação, que suspeita-se ter desviado tijolos e sacos de cimento destinados à construções de habitações para proveito próprio (pagamento de dívida pessoal).

87

IPL nº 135/03/ DPF/MAB/PAProcesso nº.: 2003.39.01.00

0612-4

PA 1º de Março

O referido IPL tem por escopo investigar a apropriação por parte dos assentado Manoel Rodrigues de recursos que deveriam ser utilizados para promoção da reforma agrária, sobretudo na construção de casas e desenvolvimento de projetos de plantio e criação de porcos e galinhas. O acusado, no entanto, segundo consta nos autos, fls. 243, faleceu no dia 24/04/2007. Requereu-se o acostamento aos autos da certidão de óbito do acusado para que se procedesse ao arquivamento do feito.

88 IPL nº P.A. Pajeú, O IPL em questão apura apropriação indébita no valor de R$ 5.240,00, pelo

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150/2006-DPF/MBA/PA.Processo nº

2007.39.01.000014-5

localizado em Novo

Repartimento/PA.

presidente da Associação dos Pequenos Produtores do Projeto de Assentamento Pajeú. Após o cometimento de tal ilícito, o responsável evadiu-se de seu domicílio e encontra-se em local incerto. A autoridade policial representou pela prisão preventiva e o bloqueio do valor subtraído, no que recebeu parecer favorável deste Parquet.

90

IPL nº 131/2004DPF/RDO/PA

Processo 2003.39.01.001

187-3

PA Novo Mundo

Cuida-se de IPL instaurado com vista a apurar a conduta delituosa de ELI, que na condição de presidente da associação, supostamente teria apropriado-se de verbas públicas federais, referente ao crédito habitacional, na modalidade crédito para aquisição de insumos, destinados aos beneficiados Antônio Rodrigues da Silva e a Raimundo Rodrigues da Silva, no montante de R$ 1400,00 para cada destes, recursos estes liberados em julho de 2001.

91

IPL nº 194/2007

DPF/MBA/PAProcesso

2007.39.01.001077-3

PA Tranquedo Neves de São Félix

do Xingu/Pará

Cuida-se de notitia criminis encaminhada pelo INCRA, em que relata a apropriação de recursos públicos federais perpetrados por Vilmar e Raimundo Pedro. O INCRA firmou contrato de concessão de créditos de instalação, na modalidade de aquisição de materiais de construção com a aludida associação, e esta, por sua vez contratou a empresa ALFAIA'S para construir 09 unidades habitacionais. Contudo, após vistoria realizada pela autarquia agrária verificou-se que foram edificadas tão-somente 05 casas. Saliente-se a mesma empresa está sendo investigada no IPL nº 137/2007-DPF/MBA/PA (Processo 2007.39.01.000732-6), em fatos semelhantes.

92

IPL nº 059/2006

DPF/RDO/PAProcesso

2006.39.01.000922-3

PA Padre Josimo Tavares

Relata o IPL indícios de recursos públicos federais noticiados pelo INCRA, durante uma vistoria realizada no PA Padre Josimo Tavares. Foram liberados 15 créditos na modalidade habitação à Associação Associação Renascer dos Trabalhadores Rurais da Colônia Carrapato, nos exercícios 2004 e 2005, no valor de R$ 75.000,00, tendo sido construídos tão-somente 05 casas No tocante à Padre Josimo Tavares sabe-se que também houve apropriação de recursos públicos federais.

93

IPL nº 057/2006

DPF/MABA/PAProcesso

2006.39.01.000927-1

PA Proposa II

Irmãos -APRODI

Trata-se de indícios de crime de estelionato contra o INCRA, tendo em vista as declarações da Sra. Maria de Fátima Fiel Menezes, de que teria sido beneficiada com crédito de instalação, na modalidade “Aquisição de gêneros de alimentação”, na quantia de R$ 1.400,00, em 09 de março de 2002. Ocorre que tais recursos foram liberados sem o conhecimento da Sra. Maria e não lhe foram repassados, havendo, portanto, indícios de falsificação de sua assinatura, supostamente praticado pelo Sr. Valteni presidente da Associação à época

94

IPL n° 025/2006 DPF/

MBA-PAProcesso

2006.39.01.000240-9

Associação de

Pequenos e Médios

Produtores Rurais da

Serra Verde - PA São José

Apurar a eventual prática de crime de apropriação indébita, atribuído a RAIMUNDO PEDRO BRITO ALFAIAS proprietário da empresa Alfaias Comércio e Serviços Ltda., relativo a aplicação de recursos de crédito instalação repassados pelo INCRA à Associação de Pequenos e Médios Produtores Rurais da Comunidade de Serra Verde, fato este constatado pelo servidor Leandro Gomes dos Santos em 28/10/2005 quando de seus trabalhos de fiscalização. Verificou-se que das 11 (onze) unidades habitacionais que deveriam ser construídas pela aludida empresa, 03 (três) não foram realizadas. Diligências: está pendente a colheita de depoimentos de RAIMUNDO PEDRO BRITO ALFAIAS e AGOSTINHO VIEIRA DA SILVA. Registre-se a mesma empresa está sendo investigada em outros inquéritos: IPL nº 137/2007-DPF/MBA/PA Processo 2007.39.01.000732-6) e IPL nº 194/2007DPF/MBA/PA Processo 2007.39.01.001077-3

95

IPL 148/2006 DPF/MBA/PA

PROC.: 2007.39.01.00

0024-8

Associação Agro-

Ambiental de Atividade de Agricultura - AGRAF/ PA Tartaruga

Trata este IPL de suposto desvio de recursos oriundos do Programa de Reforma Agrária do INCRA no PA Tartaruga. Infere-se dos autos que foram liberados recursos da ordem de R$ 105.000,00 divididos em três parcelas e cujo objetivo era a construção de casas populares naquele assentamento. Todavia, alega a atual diretoria da AGRAF que parte desses recursos teriam sido desviados pelo ex-presidente e ex-tesoureira, Sr. Manoel e Sra. Maria Santana respectivamente, vez que algumas famílias nada receberam e outras receberam apenas parcialmente os recursos a que tinham direito.

96 IPL nº 148/2005

DPF/MBA/PAProcesso

2007.39.01.0

PA Moça Bonita

Trata-se de IPL instaurado para investigar a eventual apropriação de recursos públicos federais por Milton e Gilvan, que supostamente teriam sacado as importâncias de R$ 30.400,00 e R$ 13.500,00 sem a autorização do INCRA e, posteriormente, teriam se dirigido ao referido Órgão para solicitar o envio de ofício ao Banco do Brasil para a liberação dos recursos já por eles sacado. Tais recursos foram sacados em 2002 e destinavam-se a concessão de créditos habitação e apoio. O

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01173-0 primeiro valor seria investido na construção de 8 casas e 4 créditos apoio. Saliente-se que os referidos valores foram depositados em favor da Associação dos Pequenos Agricultores do PA Agro-extrativista da Colônia 15 de Março.

No caso do IPL 178/2002, em outro exemplo de modalidade de malversação, os depoimentos demonstram a arbitrariedade que o sistema permite (fls. 544):

“QUE apesar dos assentados terem decidido que receberiam o material e providenciaram a construção de suas casas, o senhor MANOEL DE JESUS, agindo de forma arbitrária, contratou pedreiros e carpinteiros fora do Assentamento para construírem as casas; QUE das quarenta e cinco casas a serem construídas apenas quinze foram concluídas, sendo que as outras trinta ainda estão a menos da metade, e o dinheiro que resta a receber do INCRA é apenas R$ 14.000,00 (quatorze mil); QUE a declarante sabe que o senhor MANOEL DE JESUS gastou esse dinheiro pagando salários a membros da Associação; QUE o material comprado pelo senhor MANOEL para a construção das últimas casas é de péssima qualidade, tendo o mesmo tentado entregar a declarante algumas telhas que não apresentam a mínima condição de uso com relação as primeiras adquiridas (...) material de péssima qualidade que o senhor MANOEL entregou para construir sua casa, o que, segundo suas contas não chega a metade do valor liberado pelo INCRA” - sic.

Vale acentuar, mais uma vez, que nada do procedimento do INCRA tem a publicidade devida. Tudo fica concentrado no INCRA/SR-27. Faça uma busca nos sítios governamentais na internet. No máximo, haverá menções a valores repassados e associações destinatárias. E só. Como tudo o que começa no SIPRA, essa etapa igualmente termina na obscuridade.

O pior é constatar que essas falhas ocorrem a todo momento, tudo graças ao sistema criado pelo INCRA, verdadeiro ralo por onde escoam milhões de reais anualmente. Verdadeiro “queijo suíço”, menos pelo gosto refinado, mais pelos inúmeros furos existentes.

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1.4 Como as normas permitem fiscalizar e controlar a destinação dos recursos públicos. Permitem? - A Comissão de Crédito – verif icação local precária ou a “fiscal ização de escritório” - A prol i feração de associações – prestações de contas insuficientes – A dif iculdade de responsabil ização – onde estão os responsáveis?

Elementos que propiciam a corrupção – abordagem: “b) multipl icidade de

órgãos competentes para execução sem esquadrinhamento perfeito e

exclusivo de atribuições”; “c) ausência de mecanismos de controle

efetivo, permanente, transparente e r igoroso”; “d) restri ta e precária

publicidade administrativa”; e “e) impunidade, inclusive para

corruptores”.

d) a operacionalização dos créditos será realizada por uma Comissão de Crédito, designada por ordem de serviço específica e composta por servidores do INCRA, no mínimo de dois, para seu acompanhamento, fiscalização, apreciação da prestação de contas e encerramento (art. 2°, § 1°, II e art. 19 da norma).

Tendo em vista a natureza pública dos recursos empregados, ao menos alguma medida de fiscalização e controle o INCRA teria, ao menos aparentemente, que tomar. Isso até por determinação constitucional (CRFB/1988, art. 70, caput e parágrafo único).

Pelos sintomas apresentados anteriormente se viu que isso não ocorre. Desde o cadastro no SIPRA, é demonstrado que o desleixo é originário. Por sua vez, foi demonstrado no item anterior que pelo parágrafo único do art. 22, o INCRA se reserva ao direito de não autorizar o gasto quando houver indícios de desvio de finalidade, ou o poder de veto quando os fornecedores não tiverem condições de assumir os compromissos pactuados. No entanto, é raro e duvidoso que isso ocorra. Até pelos números da problemática.

Mas não é apenas isso. O problema tem desdobramentos. Como será demonstrado concretamente na segunda parte desta inicial, de fato a Comissão de Crédito instituída para fiscalizar a aplicação dos recursos sequer obedece aos

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requisitos da norma, ou seja, o próprio no INCRA/SR-27 reconhece que não a cumpre.

As fiscalizações são precárias. Isso quando existem, o que é extremamente raro.

Como demonstrado no item anterior, se houvesse fiscalização – como determina a norma – os desvios verificados seriam dificultados. No entanto, ao se contentar com a apresentação dos recibos e notas fiscais, aplica-se apenas uma “fiscalização de escritório”. Isso apesar da norma vedar a aplicação de recursos sem a constatação da realidade (art. 25).

Mais uma vez seguem alguns exemplos:

6

Peça de Informação n°: 1.23.001.00017

2/2007-06

PA Sabino São Pedro

– Gleba Geladim - Marabá

O noticiante afirma que a APRUM recebeu R$ 145.000,00 em sua conta vinculada para a construção de casas no assentamento e crédito de apoio. No entanto, Francisco dos Santos Pereira, então presidente da associação, não prestou contas de todas as casas construídas. Relata que a servidora Sonia afirmou que perante o INCRA sua casa estava construída desde 2003 - o que não é verdade - e que procurasse o presidente da associação, o Sr. Baiano. Muitos outros também não receberam suas casas. Relata que a associação também recebeu recursos para a construção do muro de escola, mas que apenas uma cerca restou realizada e que houve fraude com a aquisição de notas fiscais de comerciantes. Noticia que o lote 14 foi objeto de disputas entre um assentado, o ex-presidente Baiano e o Sr. Zezinho. Aponta ameaças realizadas pelo Sr. Baiano, que busca assinaturas de professores e alunos da escola local para provar a posse do lote 14. O Sr. Baiano teria diversos lotes em nome de esposa e filhos.

13IPL nº 048/05

PA Califórnia - Itupiranga/

PA

Objeto: má aplicação dos recursos disponibilizados para os assentamentos;

Constatação: recursos públicos eram liberados pelo INCRA sem a devida fiscalização quanto a correta aplicação; em alguns casos, havendo inclusive parecer de fiscalização em tese falso, expedido pelo servidor Benedito Guimarães Nascimento; ou declarações inverídicas dadas pelos diretores das associações;

Diligências/Recomendação: (I) há elementos para denúncia contra o servidor do INCRA, Benedito Guimarães Nascimento (já minutada); (II) desde que localizado, também será viável denúncia contra Marlon da Silva Ferreira, ex-superintendente; (III) há inconsistências nas justificativas dadas pelos diretores das associações – viável futuramente denúncia por apropriação indébita.

19

IPL n° 106/2005 – Processo n°

2005.39.01.001208-4

PA Açaizal, Angical e Abaubal – Palestina

do Pará/PA

Há notícia de desvio de verbas de fomento e habitação, liberadas pelo INCRA em nome das associações e geridas por seus presidentes. Há depoimentos que afastam a justificativa costumeira, quanto ao acesso difícil, para a não construção de moradias (Eudino Martins de Oliveira – fl. 16/18). Não se tem notícia do destino do dinheiro. O INCRA permitiu o pagamento de vários fornecedores, sem qualquer espécie de controle, sem a prestação dos materiais ou serviços adquiridos. Há evidência de ajuste dos presidentes de associação com os fornecedores, que lhes pagariam grande parte do valor transferido pelo INCRA em razão do fornecimento de produtos e materiais. Assim, constatou-se que apesar de notas fiscais, recibos e outros documentos, o dinheiro transferido para os empresários não tinha lastro de fato, tendo em vista que as contratações não eram cumpridas e o dinheiro apropriado. O INCRA admitia esse mecanismo maquiador. Mesmo assim, as contas foram aprovadas pelo INCRA. Ação por improbidade administrativa e denúncia oferecidas.

39

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61

IPL 050/04Processo

2004.39.01.000655-0

Projeto de Assentame

nto Castanheira II (Brejo Grande do Araguaia).

No decorrer de 2001 e 2002 foram repassados pelo INCRA R$ 157.500,00 à Associação dos Pequenos Produtores Rurais do Projeto de Assentamento Castanheira II – APPRAC, sob a rubrica de crédito instalação (materiais de construção) de 63 casas. Das moradias previstas, apenas 33 foram construídas e houve a apropriação da diferença (aproximadamente 57.000,00), mediante a utilização de cheques da referida conta. Há declaração de servidor que afirma a liberação de recursos mediante a mera apresentação de notas fiscais e que há poucos servidores para as vistorias in loco. / Denúncia oferecida.

66

IPL Nº 030/05DPF/MBA/PA

Processo 2005.39.01.00

0809-8

PA Sabino São Pedro

Relatam os autos que foram liberados em favor da referida associação R$ 149.400,00, entre os anos de 2001 e 2002, para a construção de 54 unidades habitacionais. No entanto, há notícia de não recebimento por parte dos assentados. Há declarações e documentos que demonstram os recibos assinados pelos assentados antes mesmo do recebimento. De acordo com o relato de vistoria realizada pela servidora do INCRA, Maria Ivanete Maia, houve a correta utilização dos recursos até então liberados, todavia, falta a realização da vistoria final para comprovação da conclusão das obras, bem como resta verificar se houve a devida prestação de contas dos recursos liberados. Chama a atenção o fato de o relatório de viagem produzido demonstrar não ter ocorrido uma vistoria in loco, contentando-se com relatos dos responsáveis pelas obras e documentação pretérita. Há indícios de apropriação indevida.

No caso do IPL n° 50/2004-DPF/MBA/PA, o servidor do INCRA, WILSON DIAS PEREIRA (fls. 449) afirma que não há efetivamente um controle sobre a realidade das prestações, in loco:

“QUE o declarante informa que as notas fiscais foram entregues, permitindo a liberação da segunda parcela; QUE sendo questionado a respeito das vistorias que deveriam ser realizadas para a liberação do crédito de construção, o declarante informa que não se recorda se, na época, havia necessidade de realização de relatório de vistoria para a liberação do restante dos créditos de construção (...) QUE o declarante informa que assim se deu a liberação de recursos para a associação; QUE o declarante também informa que há um grande volume de trabalho e pouco pessoal para a realização do serviço, tais como vistorias in loco” - sic.

Um outro elemento, permitido expressamente pela SR-27, é a proliferação desenfreada de associações.

Não há um controle sobre as associações constituídas em cada projeto de assentamento. Elas são criadas ao alvedrio dos assentados, como ocorre quando há qualquer desavença entre eles. Isso dificulta o mecanismo de controle social – é

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mais fácil criar sua própria associação do que consertar e denunciar a já existente -, ou quando já se está sob suspeita, basta alterar sua “máscara”, constituindo uma nova.

Mas isso é reflexo imediato de uma violação constitucional inegável. É que apesar dos créditos serem concedidos individualmente, o INCRA obriga os assentados a se associar, sob pena de nada receberem. Por isso, como já verificado nos exemplos, muitas vezes os assentados se tornam reféns dos gestores da associação.6

A proliferação de associações que podem ser beneficiadas também acentua outra mazela material: a falta de servidores. Aumenta o número de gestores e destinatários dos recursos, sem a contrapartida material de quem deve fiscalizá-los. Mais um incentivo a abusos e fraudes diversos, como se verá na segunda parte.

A permissividade na proliferação de associações atinge os mais basilares raciocínios jurídicos de gestão e logística. Basta lembrar o instituto da substituição tributária. Para que serve? É mais fácil fiscalizar o fabricante de cerveja do que todos os bares, restaurantes e estabelecimentos existentes...

Por vezes a proliferação de associações parece proposital. Ao invés de manter o controle fixado em objetos e sujeitos delimitados, permite a multiplicação desenfreada de associações, gestores privados e fornecedores. São múltiplas associações por assentamento. Tudo sem o correspondente mecanismo que viabilize um controle minimamente suficiente.

Isso somado ao número grandioso de assentamentos sob a gerência do INCRA/SR-27, aliado às grandes distâncias administradas, não pode dar certo. É mais um exemplo do fenômeno sócio-político, conhecido como “espaço público invisível”.7

6 CRFB/1988, art. 5°, inc. XX – ninguém poderá ser compelido a associar-se ou a permanecer associado.7 Em recente artigo o cientista político e professor da FGV, Fernando Abrucio, bem apresenta a caracterização do fenômeno, como algo constante verificado no Brasil: “O 'espaço público invisível´é formado por organizações que devem ser sustentadas preponderantemente por recursos recolhidos pelo governo. Embora nem todas sejam estatais, sua criação derivou de uma decisão legal, referendada pelos representantes da sociedade. Desse modo, por depender de dinheiro dos cidadãos e da ação dos políticos eleitos, esse universo institucional deveria, em tese, passar pelo controle democrático. O problema é que essas instituições, embora devessem responder ao conjunto da sociedade, são acompanhadas apenas pela parcela da população que as usa. Nem sempre os usuários diretos do 'espaço público invisível' conseguem controlá-lo de forma eficaz. (...) Pela importância simbólica e pela grande quantia de recursos que mobilizam, os 'espaços públicos invisíveis' precisam ser mais bem

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Seguem alguns exemplos em que essa característica é inquestionável. Ver os problemas que a geração descontrolada no número de associações cria. Repare na multiplicidade em cada projeto de assentamento.

4

Peça de Informação

n°: 1.23.001.000010/200

8-41

PA Água Fria – Eldorado dos Carajás

É membro da Associação Caixa Agrícola, a qual repassou R$ 2.000,00 para a construção de sua casa. Em consulta ao INCRA, seu nome consta indevidamente como pertencente a outra associação, cujo presidente se chama AGUIAR. / Em resposta a ofício o INCRA informou que no referido PA existe a Associação dos Produtores do PA Água Fria – ASPAF, que recebeu recursos. Há suspeita de má aplicação dos recursos, o que determinou a suspensão dos repasses e afirma não haver prejuízo ao erário ou aos colonos. Afirma que a Caixa Agrícola não representa o PA questionado. / Ofício expedido ao INCRA para que informe os dados da APAF e a relação dos colonos beneficiados com créditos e comprovantes.

9

IPL n° 061/04 –

Processo n°

2004.39.01.000746-2

PA Buritirana - Itupiranga

O inquérito apura a suposta apropriação por José Izidoro, vulgo “Lagoa”, de valores repassados pelo INCRA ao assentamento Buritirana. Luzia Kriger Américo se cadastrou para receber crédito habitação, porém jamais recebeu e o INCRA informa que José Izidoro teria recebido os respectivos valores, assim como os de outros assentados. / O INCRA informa que à época as seguintes associações não prestaram contas perante a autarquia – setor de crédito: Associação Beneficente dos Pequenos Produtores da Vila São Pedro, Associação dos Agricultores da Vila Cruzeiro do Sul e Associação dos Agricultores da Vila Jerusalém. Apresenta supostos recibos assinados pela Sra. Luiza Kriger. Alega que não houve prestação de contas pela associação gerida pelo indiciado. Somente no exercício de 2002 foram disponibilizados recursos na ordem de R$ 65.100,00; em 2001 foram R$ 92.500,00.

10

IPL 151/2007

PA Buritirana - Itupiranga

Apropriação de recursos geridos pela Associação dos Pequenos e Médios Produtores Rurais do Rio Cajazeira, através de seu gestor, Edmar Pereira de Souza. Mencionados: Raimundo Pereira da Silva (presidente da Associação Beneficente dos Ruralistas de Vila São Pedro), Domingos Farias dos Santos (presidente da Associação dos Agricultores da Vila Jerusalém), Haroldo Lima Vasconcelos, José Guimarães de Sousa e Sônia Maria dos Santos (presidentes da Associação dos Pequenos Produtores Rurais da Vila Jerusalém) – todos referentes a créditos repassados no ano de 2002.

69

Peça de Informação

n°: 1.23.001.000094/200

7-31

PA Tuerê Trata de recursos de crédito instalação na modalidade Aquisição Materiais de Construção destinados às seguintes associações em 2004: Associação dos Agricultores Familiares da Comunidade São José, com o valor de R$ 95.676,00, Associação dos Agricultores Pista da Ciex, com o valor de R$ 88.380,00, Associação dos Pequenos Produtores Rurais de Mata Verde, com o valor de R$ 92.466,80, Associação de Mulheres da Região Ciex, com o valor de R$ 48.933,00 e Associação dos Pequenos Produtores Rurais da Vida Nova Planaldo, com o valor de R$ 56.062,60. Os recursos foram pagos à Markensio Martins Rocha e Cia Ltda., que não cumpriu com o contratado e aparentemente se apropriou dos recursos. Há elementos que demonstram não haver controle sobre a habilitação dos contratados e favorecimento de pessoas empresárias.

71 Peça de Informação

n°: 1.23.001.000064/200

7-25

Gleba Padre Josimo

Tavares – antiga

Fazenda Bradesco

Relata problemas diversos: 1 – presidente de associação que se apropriou de recursos utilizados destinados ao pagamento de advogado em litígio contra o INCRA; 2 – Incentivo da associação para desmatar o assentamento e fornecer matéria-prima às madeireiras; 3 – venda irregular de lotes no assentamento; 4 - Desmatamento da reserva legal, constatado pelo IBAMA, em situação grave constatada.Associações existentes: Associação dos Moradores e Trabalhadores Rurais do Setor Berokã do Assentamento Padre Josimo Tavares, Associação dos Trabalhadores Rurais Araguaia Modelo, Associação dos trabalhadores do Assentamento Padre Josimo Tavares,

controlados, pois muitas vezes eles afetam mais nossa vida que o vão escândalo dos cartões corporativos” - O DINHEIRO É FARTO. A FISCALIZAÇÃO É ESCASSA, in revista Época, n° 517, 14 de abril de 2008, p. 50. No caso do INCRA isso é ainda mais grave, pois a permissividade sequer é legal, mas infralegal.

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Associação de Pequenos Produtores Rurais Campina verde, Associação Renascer dos Trabalhadores Rurais da Colônia Carrapato.

Outro elemento extremamente falho é a tomada de contas dos responsáveis pelos créditos concedidos (presidentes de associação ou comissão de representantes). São diversos os casos em que não há qualquer prestação de contas. Quando há, são repletas de falhas, como as já apontadas anteriormente (documentos meramente formais, certificação unilateral etc.).

Como exemplos:

6

Peça de Informação n°: 1.23.001.00017

2/2007-06

PA Sabino São Pedro

– Gleba Geladim - Marabá

O noticiante afirma que a APRUM recebeu R$ 145.000,00 em sua conta vinculada para a construção de casas no assentamento e crédito de apoio. No entanto, Francisco dos Santos Pereira, então presidente da associação, não prestou contas de todas as casas construídas. Relata que a servidora Sonia afirmou que perante o INCRA sua casa estava construída desde 2003 - o que não é verdade - e que procurasse o presidente da associação, o Sr. Baiano. Muitos outros também não receberam suas casas. Relata que a associação também recebeu recursos para a construção do muro de escola, mas que apenas uma cerca restou realizada e que houve fraude com a aquisição de notas fiscais de comerciantes. Noticia que o lote 14 foi objeto de disputas entre um assentado, o ex-presidente Baiano e o Sr. Zezinho. Aponta ameaças realizadas pelo Sr. Baiano, que busca assinaturas de professores e alunos da escola local para provar a posse do lote 14. O Sr. Baiano teria diversos lotes em nome de esposa e filhos.

19

IPL n° 106/2005 – Processo n°

2005.39.01.001208-4

PA Açaizal,

Angical e Abaubal – Palestina

do Pará/PA

Há notícia de desvio de verbas de fomento e habitação, liberadas pelo INCRA em nome das associações e geridas por seus presidentes. Há depoimentos que afastam a justificativa costumeira, quanto ao acesso difícil, para a não construção de moradias (Eudino Martins de Oliveira – fl. 16/18). Não se tem notícia do destino do dinheiro. O INCRA permitiu o pagamento de vários fornecedores, sem qualquer espécie de controle, sem a prestação dos materiais ou serviços adquiridos. Há evidência de ajuste dos presidentes de associação com os fornecedores, que lhes pagariam grande parte do valor transferido pelo INCRA em razão do fornecimento de produtos e materiais. Assim, constatou-se que apesar de notas fiscais, recibos e outros documentos, o dinheiro transferido para os empresários não tinha lastro de fato, tendo em vista que as contratações não eram cumpridas e o dinheiro apropriado. O INCRA admitia esse mecanismo maquiador. Mesmo assim, as contas foram aprovadas pelo INCRA. Ação por improbidade administrativa e denúncia oferecidas.

43IPL nº 056/05-DPF/MBA/PA

Processo 2005.39.01.00

0867-7

PA Maravilha-Tapirapé

O Sr. Antônio, no ano de 2002, apropriou-se de recursos liberados pelo INCRA destinado a construção de unidades habitacionais, desviando-os para fins particulares, não prestando contas ao INCRA. Ademais, o acusado cobrava taxas dos assentados, na medida que os créditos eram liberados

57

IPL nº 032/04-DPF/MBA/PA

Processo 2004.39.01.000

569-5

Associação dos

Trabalhadores na Agricultura Familiar do PA Nova Vitória-APFANOVI

Relatam os autos que os representantes da referida associação apropriaram-se de recursos públicos federais, repassados pelo INCRA para a construção de casas. Segundo o INCRA, às fls. 135/137, foi liberado 03 parcelas em favor da referida associação, no montante de R$ 153.414,00, recursos estes destinados à 77 famílias para a construção de unidades habitacionais, e não houve nenhum tipo de prestação de contas por parte da associação. Ademais, a empresa construtora deixou de executar parcialmente as obras de construção.

O “espaço público invisível” é ainda mais sentido quando os órgãos de persecução buscam atuar. Mesmo no caso de se identificar a responsabilidade do agente, isso não significa que naturalmente será alcançado. Somente através de mecanismos processuais se faz sua integração à lide deduzida, pois como este juízo

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percebe na realidade diária – é fato notório -, são inúmeros os casos semelhantes em que a citação ou mesmo intimação de assentados como testemunhas é extremamente difícil. Isso somado ao fato das grandes distâncias, em localidades sequer urbanizadas ou sem atendimento pelos correios, por vezes se mostra impossível.

O mecanismo do INCRA tirou de seus servidores o foco de imputação de responsabilidade legítimo – que é uma das razões de ser dos servidores públicos – para lançá-lo aos “seres invisíveis” mundo afora.

Vale acentuar que sequer o INCRA consegue controlar isso. Como já é praxe nesta demanda, vamos aos fatos:

74

IPL 203/2007-DPF/MBA/PA(Processo nº

2007.39.01.001080-0)

PA Tuerê II – Município

de Novo Repartimento

Noticia que o presidente da APROMV teria se apropriado dos recursos referentes Créditos Instalação do PA Tuerê, e que depois se evadiu. Além da suposta apropriação indébita, o denunciante Horácio Rodrigues informa (às fls. 12) que o presidente da APROMV é homem agressivo que já o teria ameaçado de morte, e que estaria vendendo para fazendeiros áreas dentro do PA, inclusive lotes já demarcados (dentre estes o do próprio denunciante).Documentos relativos aos créditos assumidos pelos trabalhadores que abandonaram seus assentamentos foram simplesmente destruídos por servidor do INCRA. O denunciado presidente da associação não foi localizado e tem seu paradeiro desconhecido, apesar de seu vínculo ao INCRA em razão da função desempenhada.Ação penal exercida.

79

IPL 178/2002– DPF/MBA/PA

Associação dos

Pequenos Produtores

do Assentamento Morajuba (ASPREPA

M)

O presente IPL se presta à apuração de apropriação indébita de recursos destinados à construção de 45 casas no assentamento Morajuba, tendo sido iniciado mediante denúncia ao MPF da assentada Sra. Dilma Baldon Cruz. Alega a assentada que dos recursos repassados pelo INCRA para construção de habitações, somente parte deles foram utilizados, uma vez que somente 15 casas encontram-se acabadas e o restante a menos da metade, alega, ainda, que os materiais utilizados são de baixa qualidade e diferente do previsto inicialmente. Dificuldades em encontrar o presidente da associação para efetivar controle e responsabilização. Sequer o INCRA consegue encontrá-lo. / Aguardar o cumprimento das diligências requeridas às fls. 94.

88

IPL nº 150/2006-

DPF/MBA/PA.Processo nº

2007.39.01.000014-5

P.A. Pajeú, localizado em Novo

Repartimento/PA.

O IPL em questão apura apropriação indébita no valor de R$ 5.240,00, pelo presidente da Associação dos Pequenos Produtores do Projeto de Assentamento Pajeú. Após o cometimento de tal ilícito, o responsável evadiu-se de seu domicílio e encontra-se em local incerto. A autoridade policial representou pela prisão preventiva e o bloqueio do valor subtraído, no que recebeu parecer favorável deste Parquet.

Os depoimentos não deixam dúvidas (IPL 178/2002 – v. Fls. 544):

“QUE a senhora SÔNIA, fiscal do INCRA, já esteve diversas vezes dentro do Assentamento para se reunir com o senhor MANOEL para cobrar dele uma providência na construção das casas sendo que o mesmo tem se escondido, evitando falar com a senhora SÔNIA; QUE a declarante não sabe informar se

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o senhor MANOEL DE JESUS tem algum outro endereço onde pode ser localizado” - sic.

Isso dificulta – e muito – a responsabilização. Como veremos adiante, fixar a responsabilidade em pessoas facilmente camufláveis, como permite o sistema do INCRA, é combustível seguro para o forno da impunidade. Viola todas as recomendações de combate à corrupção, como os tratados internacionais assinados pelo Brasil.

1.5 Desconformidade ao ordenamento jurídico.

Elemento que propicia a corrupção – abordagem: “c) ausência de mecanismos de controle efetivo, permanente, transparente e rigoroso” .

A forma como é conduzida a gestão de créditos pela SR-27 parece não ter o semblante de um rigoroso controle, principalmente em se tratando de recursos públicos.

A contrariedade não é apenas fática. Na vida de relação, como demonstrado, ela tem efeitos maléficos percebidos e praticados a todo momento. Mas a execução determinada pelas normas infralegais de execução transgridem o próprio ordenamento jurídico, que através de normas diversas visa combater desvios como os identificados.

Se ao menos os princípios fossem adotados, talvez parcela substancial dos desvios seria evitada, ou no mínimo dificultados e alcançariam maior probabilidade de controle e identificação de responsáveis.

Inicialmente, vejamos o amparo legal das normas de execução (na redação atualizada):

Lei 8.629/1993

Art. 17. O assentamento de trabalhadores rurais deverá ser

realizado em terras economicamente úteis, de preferência na

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região por eles habitada, observado o seguinte: (Redação dada

pela Medida Provisória nº 2.183-56, de 2001)

V - a consolidação dos projetos de assentamento integrantes

dos programas de reforma agrária dar-se-á com a concessão de créditos de instalação e a conclusão dos investimentos,

bem como com a outorga do instrumento definitivo de titulação.

(Incluído pela Medida Provisória nº 2.183-56, de 2001)

A norma definitivamente não garante concretização suficiente para sua aplicação. Por isso o INCRA realiza as sucessivas normas de execução, de modo a dar alguma base por onde os recursos poderão ser liberados.

No entanto, ao assim fazer, constituiu um sistema falho como já demonstrado e não garantiu segurança jurídica na aplicação dos recursos, o que é confirmado pelas sucessivas edições de normas, ano após ano.

A principal falha é aplicar o sistema de crédito instalação como se fosse um sistema autônomo, o que em nenhum momento é realizado pela lei. Por ser espécie de recurso público empregado em finalidade constitucional (reforma agrária), deveria se submeter aos mecanismos de proteção pública, eis que não há qualquer norma que exclua seu alcance.

Por isso sua aplicação deveria ser realizada com a noção de sistema, buscando colmatar lacunas e sustentar seu controle com base nas demais normas do sistema de gestão pública.

Nada disso foi realizado. Não há conformidade com o ordenamento jurídico.

Há a percepção de que muitos dos problemas constatados seriam evitados se os mecanismos normativos vigentes (legais e principiológicos) fossem aplicados de maneira razoável e sistemática.

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Além de todas as violações já demonstradas, vejamos algumas das transgressões normativas:

a) o sistema é paradoxal. Ao mesmo tempo em que garante liberdade aos gestores de fato, busca implantar medidas de controle. A razão é singela: os recursos são oriundos de dotações orçamentárias específicas e destinados ao cumprimento de uma política constitucional. Deixá-la ao alvedrio de terceiros seria desprezar a natureza pública da medida.

Por outro lado, no pertinente às transferências voluntárias, isto é, àquelas transferências decorrentes de convênios ou subvenções (subvenções são transferências previstas no orçamento e destinadas a despesas de certas pessoas, públicas ou privadas – v. Art. 12, § 3°, II da Lei nº 4.320/64), a fiscalização e o controle permanecem na área de competência da unidade concedente, considerando-se que não há perda do interesse do titular dos recursos, até mesmo pela singela razão de que ninguém pode dispor do patrimônio público entregando-o espontaneamente a outrem sem sequer exigir a prestação de contas relativa ao seu correto emprego no objetivo que autorizou essa transferência.

Igualmente é certo que o órgão originariamente titular dos recursos será também, por sua vez, objeto de fiscalização e, assim, deverá prestar contas da sua administração comprovando o bom emprego que fez dos recursos que lhe foram destinados. Ademais, é regra assente que a lei ou o instrumento de transferência firmado pelas partes contém a expressa previsão de fiscalização e prestação de contas, como condição para haver a liberalidade.

Não fossem suficientes esses motivos, ainda restaria a obrigação constitucional de prestação de contas por todos quantos tenham acesso a recursos públicos, pelo que não se sustenta a tese de que alguém possa ficar à margem da fiscalização (art. 70 da CRFB).

Mas como demonstrado, o que se fez foi um mecanismo torto. Há violação ao princípio licitatório (art. 37, XXI da CRFB/1988), na medida em que deixa a seleção dos fornecedores de materiais e serviços sob o crivo dos destinatários da política de

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reforma agrária, interessados diretos em seu resultado, que por questão lógica não ocupam posição de imparcialidade suficiente (art. 3° da Lei 8.666/93).

Mas se o INCRA aparentemente adota uma preocupação com o controle, com a possibilidade de veto aos fornecedores, com a comparação de valores apresentados pelos disputantes, com o teórico dever de pagar apenas após a conclusão e supostamente incumbido de exigir prestação de contas, por que não realizar logo uma licitação? Os efeitos são os mesmos e o sistema hoje prevê hipóteses que bem ponderam a eficiência, segurança e celeridade dos procedimentos. Por que insistir em algo torto?

b) há violação ao princípio da legalidade, pois este proceder não tem previsão legal específica – é típico ato infralegal -, além de não estar caracterizado como espécie de dispensa ou inexigibilidade de licitação (arts. 24 e 25 da Lei 8.666/93).

Aliás, a tentativa de receber a indicação dos fornecedores, em número de três, com poder de veto por parte do INCRA demonstra que de entrega direta do objeto contratado não se trata (quando então seria dispensa ou inexigibilidade);

c) os fornecedores/prestadores de serviços escolhidos pelas associações e consentidos pelo INCRA não preenchem os requisitos legais mínimos garantidores de sua idoneidade, com habilitação insuficiente. Sequer os parâmetros da Lei 8.666/1993 são verificados (arts. 27 e seguintes). De maneira temerária, os recursos são liberados sem a confirmação concreta da prestação dos serviços e aquisições. Vejamos exemplos em que essa evidência é clara:

18

IPL n° 192/2005 – Processo n°

2005.39.01.000649-5

PA Progresso – Eldorado dos

Carajás/PA

Desvio de verbas referentes ao crédito habitação, por parte dos representantes da empresa Construtora Planalto Ltda. Em junho de 2004 foi criada comissão para fiscalizar a aplicação dos recursos, que foram depositados pelo INCRA na conta desta e repassado à Construtora. Após receber parte do montante, a empresa abandonou a obra. O dinheiro foi transferido para a conta de Cleurismar, esposa do João Neves da Silva, representante da empresa. Em fl. 13, há documento do INCRA, assinado por Ernesto Rodrigues, em que libera a transferência de R$ 100.00,00 sem a apresentação de Nota Fiscal e/ou recibos. Alega amparo em norma de legalidade suspeita, que confirmou-se não permitir a conduta realizada. Datas de previsão dos créditos e constituição da pessoa jurídica em proximidade.

19

IPL n° 106/2005 –

PA Açaizal, Angical e Abaubal –

Palestina do

Há notícia de desvio de verbas de fomento e habitação, liberadas pelo INCRA em nome das associações e geridas por seus presidentes. Há depoimentos que afastam a justificativa costumeira, quanto ao acesso difícil, para a não construção de moradias (Eudino Martins de Oliveira – fl. 16/18). Não se tem notícia do destino do dinheiro. O INCRA permitiu o pagamento de vários fornecedores, sem qualquer espécie de controle,

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Processo n° 2005.39.01.00

1208-4

Pará/PA sem a prestação dos materiais ou serviços adquiridos. Há evidência de ajuste dos presidentes de associação com os fornecedores, que lhes pagariam grande parte do valor transferido pelo INCRA em razão do fornecimento de produtos e materiais. Assim, constatou-se que apesar de notas fiscais, recibos e outros documentos, o dinheiro transferido para os empresários não tinha lastro de fato, tendo em vista que as contratações não eram cumpridas e o dinheiro apropriado. O INCRA admitia esse mecanismo maquiador. As contas foram aprovadas pelo INCRA. Ação por improbidade administrativa e denúncia oferecidas.

32

IPL nº 033/2006

DPF/RDO/PAProcesso nº

2006.39.01.000760-3

Associação dos Produtores Rurais da

Unida Maringá-PA Maringá/Associação

Agua Boa-PA Travessão/

Associação dos Produtores Rurais da

Colônia Monte Castelo-PA Estrela do Norte/ Associação dos Produtores Rurais da Gleba Ipanema-PA

Aricá/Associação dos Mini e Pequenos

Produtores Rurais da Região do Jequié-PA Jequié/ Associação

dos Produtores Rurais do Araguaia/

Associação dos dos Mini e Pequenos

Produtores Rurais da Colônia João Canuto-

PA João Canuto/ Associação dos Mini e Pequenos Produtores

Rurais da Colônia Vermelho Preto-PA

Vermelho e Preto/Associação dos Produtores Rurais da

Comunidade Itaipavas-PA

Itaipavas/

Narram as peças informativas a partir de um ofício oriundo do INCRA que relata acerca do envolvimento da Empresa “Só Cimento” e as aludidas PA's, tendo sido desviado por parte da empresa um montante de R$ 146.637,50 relativos ao período 2001/2002, que não repassou os materiais aos assentados para a edificação de unidades habitacionais.Saliente-se que há indícios de participação dos referidos servidores do INCRA.

41

IPL nº 124/2006 -

DPF/MBA/PA

PA Alto Pacajá

Liberação de recursos para construção de casas. Descumprimento das obrigações pela construtora contratada, a despeito de ter recebido substanciosa quantia para conclusão de parte das casas.O modo de aproximação dos empreiteiros junto às associações de assentados aparece bem descrito no relato do servidor JOSÉ HILÁRIO, cuja decisão de contratação era, conforme relata, de exclusiva responsabilidade dos líderes e associados – aparentemente sem maior controle pelo INCRA, cuja função deveria ser a fiscalização quanto ao correto emprego das verbas liberadas.

56

IPL nº 152/2005-DPF/

MBA/PAProcesso nº

2006.39.01.000028-9

Associação dos Pequenos

Produtores e Agricultores da

Fazenda Casarão-

APAFCNI-PA CASARÃO.

O ILP foi instaurado da notitia criminis encaminhada pelo INCRA, relatando a eventual apropriação de recursos públicos liberados pela autarquia agrária, pelos representes da referida associação e proprietários da construtora. A associação celebrou 02 contratos com a referida empresa, sendo o primeiro para a construção de 26 casas populares em alvenaria, no montante de R$ 130.000,00, com data de 04/02/2004, e o segundo contrato, para a construção de 22 casas de madeira, no montante de R$ 68.200,00, liberado no dia 05/02/2004, os quais não foram cumpridos

57

IPL nº 032/04-DPF/MBA/PA

Processo 2004.39.01.00

0569-5

Associação dos Trabalhadores na Agricultura Familiar do PA Nova Vitória-APFANOVI

Relatam os autos que os representantes da referida associação apropriaram-se de recursos públicos federais, repassados pelo INCRA para a construção de casas. Segundo o INCRA, às fls. 135/137, foi liberado 03 parcelas em favor da referida associação, no montante de R$ 153.414,00, recursos estes destinados à 77 famílias para a construção de unidades habitacionais, e não houve nenhum tipo de prestação de contas por parte da associação. Ademais, a empresa construtora deixou de executar parcialmente as obras de construção.

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IPL 109/2007Processo

2007.39.01.001359-0

(Processo Penal

instaurado)

Projeto de Assentamento Colônia Grotão do Severino – Nova Ipixuna.

O denunciado apropriou-se de recursos públicos federais, destinados à construção de unidades habitacionais no Projeto de Assentamento Grotão do Severino, município de Nova Ipixuna/PA, repassados pelo INCRA em favor da “Associação dos Pequenos e Médios Produtores Rurais da Colônia Grotão do Severino”, no ano de 2005. Na época do evento delituoso, o DENUNCIADO exercia o cargo de Presidente da Cooperativa na Construção Civil do Sul e Sudeste do Pará - COOCIPAR, tendo sido contratado pela Associação supra referida para a construção de habitações em Projetos de assentamentos de reforma agrária, sendo assim, o responsável pela administração dos recursos federais repassados à Associação pelo INCRA. Em agosto de 2005, o INCRA liberou o montante de de R$ 33.730,78 (trinta e três mil setecentos e trinta reais e setenta e oito centavos), referente ao crédito de “instalação na modalidade aquisição de material para construção”, objetivando a construção de 07 (sete) casas aos trabalhadores rurais radicados no PA Grotão do Severino, localizado no município de Nova Ipixuna/PA (v. fl. 04). Contudo, não houve a edificação das unidades habitacionais, tendo comunicado ainda que a representação da COOCIPAR se evadiu daquela localidade. Processo penal instaurado.

63

IPL nº 135/2007

DPF/MBA/PAProcesso nº

2007.39.01.000730-9

Associação dos Agricultores Unidos do Projeto de

Assentamento Boca Larga

Segundo a notitia criminis encaminhada pelo INCRA, foi autorizado o desbloqueio do montante de R$ 140.000,00 para a referida construtora, que após receber os valores, apropriou-se dos recursos, não concluindo a obra de construção das unidades habitacionais. O contrato previa a construção de 100 casas populares, cujo preço unitário era de R$ 5000,00. De acordo com o relatório de viagem, foram encontradas 32 casas inacabadas e 53.000 telhas de barro à disposição na Cerâmica Itapoã, adquiridos pela construtora.

69

Peça de Informação n°: 1.23.001.00009

4/2007-31

PA Tuerê

Trata de recursos de crédito instalação na modalidade Aquisição Materiais de Construção destinados às seguintes associações em 2004: Associação dos Agricultores Familiares da Comunidade São José, com o valor de R$ 95.676,00, Associação dos Agricultores Pista da Ciex, com o valor de R$ 88.380,00, Associação dos Pequenos Produtores Rurais de Mata Verde, com o valor de R$ 92.466,80, Associação de Mulheres da Região Ciex, com o valor de R$ 48.933,00 e Associação dos Pequenos Produtores Rurais da Vida Nova Planaldo, com o valor de R$ 56.062,60. Os recursos foram pagos à Markensio Martins Rocha e Cia Ltda., que não cumpriu com o contratado e aparentemente se apropriou dos recursos. Há elementos que demonstram não haver controle sobre a habilitação dos contratados e favorecimento de pessoas empresárias.

82

IPL nº 137/2007

DPF/MBA/PAProcesso

2007.39.01.000732-6

Empresa ALFAIAS

COMÉRCIO E SERVIÇOS

LTDA

Trata-se de notitia criminis encaminhada pelo INCRA, em que relata que a empresa apropriou-se indevidamente de recursos públicos federais destinados à construção de casas no PA José Cirilo Gomes, vez que deixou de construir 31 unidades habitacionais, no valor de R$ 135.502,50 (cento e trinta e cinco mil, quinhentos e dois reais e cinqüenta centavos).Saliente-se que tais recursos foram liberados em junho de 2005.

91

IPL nº 194/2007

DPF/MBA/PAProcesso

2007.39.01.001077-3

PA Tranquedo Neves de São Félix do Xingu/

Pará

Cuida-se de notitia criminis encaminhada pelo INCRA, em que relata a apropriação de recursos públicos federais perpetrados por Vilmar e Raimundo Pedro. O INCRA firmou contrato de concessão de créditos de instalação, na modalidade de aquisição de materiais de construção com a aludida associação, e esta, por sua vez contratou a empresa ALFAIA'S para construir 09 unidades habitacionais. Contudo, após vistoria realizada pela autarquia agrária verificou-se que foram edificadas tão-somente 05 casas. Saliente-se a mesma empresa está sendo investigada no IPL nº 137/2007-DPF/MBA/PA (Processo 2007.39.01.000732-6), em fatos semelhantes.

94 IPL n° 025/2006 DPF/

MBA-PAProcesso

2006.39.01.000240-9

Associação de Pequenos e

Médios Produtores

Rurais da Serra Verde - PA São

Apurar a eventual prática de crime de apropriação indébita, atribuído a RAIMUNDO PEDRO BRITO ALFAIAS proprietário da empresa Alfaias Comércio e Serviços Ltda., relativo a aplicação de recursos de crédito instalação repassados pelo INCRA à Associação de Pequenos e Médios Produtores Rurais da Comunidade de Serra Verde, fato este constatado pelo servidor Leandro Gomes dos Santos em 28/10/2005 quando de seus trabalhos de fiscalização. Verificou-se que das 11 (onze) unidades habitacionais que deveriam

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José ser construídas pela aludida empresa, 03 (três) não foram realizadas. Diligências: está pendente a colheita de depoimentos de RAIMUNDO PEDRO BRITO ALFAIAS e AGOSTINHO VIEIRA DA SILVA. Registre-se a mesma empresa está sendo investigada em outros inquéritos: IPL nº 137/2007-DPF/MBA/PA Processo 2007.39.01.000732-6) e IPL nº 194/2007DPF/MBA/PA Processo 2007.39.01.001077-3

No caso da Peça de Informação n°: 1.23.001.000094/2007-31, a ausência de controle e critérios é inquestionável. Vale ressaltar que até mesmo há o reconhecimento, posterior é claro, da inaptidão e favorecimento da empresa. Veja o seguinte trecho da manifestação dirigida ao MPF, assinada pelo Chefe de Divisão D. Proj. de Assentamento (Jandir Mella), pelo Assegurador Regional do Programa Crédito Instalação (Ápio Miguel dos Santos Ghesso) e pelo Superintendente Regional (Raimundo Oliveira Filho):

“...pois trata-se de recursos do governo Federal para aquisição de materiais e não suposto favorecimentos com intuito de beneficiar Empresa “Falida” - sic (fl. 394).

É evidente que não há qualquer controle sobre quem recebe os recursos e presta serviços. Qualquer um, desde um criminoso bárbaro, até o mais acendrado sonegador fiscal, em tese, poderiam ser escolhidos para prestar serviços e receber recursos públicos.

No caso do IPL n° 192/2005 (docs. 366/367), além do já relatado sintoma nos termos contratuais de concessão, a falha é percebida claramente. Ver o termo de contrato de prestação de serviço entre a comissão de assentados e a Construtora Planalto Ltda. Foi assinado em 08/11/2004. No dia seguinte, o recurso foi liberado pelo então Superintendente Regional substituto Ernesto Rodrigues.

Tudo sem qualquer controle quanto à idoneidade da pessoa contratada. Isso vale para todas os prestadores de serviço que aparecem.

Nesse mesmo caso, sem alternativas, os assentados clamam ao INCRA (doc. fl. 378):

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“Reivindicamos a vossa senhoria que tome uma providencia urgente sobre as habitação que foram passadas para uma firma e mais uma vez estamos sendo lesados sabemos que si for fazer casas por firma não vamos ter habitação no PA PROGRESSO porque temos conhecimento de cinco firma que pegarão casas para fazer e não concluíram as casas” - sic.

O resultado não poderia ser outro, senão a deflagração das ações penais e por improbidade decorrentes. Vale acentuar que mais uma vez o recurso foi liberado com a supressão do mecanismo de apresentação de recibos e notas fiscais, realizada pelo referido servidor sem amparo normativo.

Por sua vez, no IPL nº 124/2006, o servidor JOSÉ HILÁRIO GONÇALVES PEREIRA (agente administrativo) esclarece em definitivo a ausência de controle sobre as pessoas contratadas mediante créditos públicos (fls. 439/441):

“...que o INCRA não mantém nenhuma vinculação com as empresas construtoras, não se mantendo nem mesmo um cadastro.(...) QUE não há nenhum compromisso formal dos membros das associações em construir as referidas casas, pois a orientação é apenas verbal, não tendo o INCRA como provar que as associações se comprometeram em utilizar os recurso para tal finalidade; QUE a única forma de se provar que os membros da Associação dos Médios e Pequenos Produtores Rurais do ALTO DO PACAJÁ tinha ciência de que a liberação dos recursos era para a construção de casas é através do contrato firmado entre a referida associação e a empresa construtora às fls. 17; QUE as Associações contratam a empresa que desejar, pois o INCRA não mantém nenhuma ingerência sobre a contratação, ou seja, não recomenda a contratação ou a não contratação de determinada empresa” - sic.

A despeito de tal circunstância, segundo a qual o INCRA deixaria ao alvedrio dos assentados – ou mais especialmente a cargo dos representantes da associação dos assentados – a contratação das empresas construtoras, há casos em que

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servidores da própria autarquia agrária direcionam a escolha dos empreendedores, como se com isso quisessem tirar algum proveito.

Nesse sentido, seguem alguns casos:

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IPL n° 106/2005 – Processo n°

2005.39.01.001208-4

PA Açaizal, Angical e Abaubal –

Palestina do Pará/PA

Há notícia de desvio de verbas de fomento e habitação, liberadas pelo INCRA em nome das associações e geridas por seus presidentes. Há depoimentos que afastam a justificativa costumeira, quanto ao acesso difícil, para a não construção de moradias (Eudino Martins de Oliveira – fl. 16/18). Não se tem notícia do destino do dinheiro. O INCRA permitiu o pagamento de vários fornecedores, sem qualquer espécie de controle, sem a prestação dos materiais ou serviços adquiridos. Há evidência de ajuste dos presidentes de associação com os fornecedores, que lhes pagariam grande parte do valor transferido pelo INCRA em razão do fornecimento de produtos e materiais. Assim, constatou-se que apesar de notas fiscais, recibos e outros documentos, o dinheiro transferido para os empresários não tinha lastro de fato, tendo em vista que as contratações não eram cumpridas e o dinheiro apropriado. O INCRA admitia esse mecanismo maquiador. As contas foram aprovadas pelo INCRA. Ação por improbidade administrativa e denúncia oferecidas.

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IPL nº 057/05-DPF/MBA/PAProcesso nº

2005.39.01.000868-0

Noticiante: Associação dos

Pequenos Agricultores do

Acampamento do Rio Jordão.

Relatam as peças informativas que servidores do INCRA de Tucuruí, no uso de suas atribuições estariam favorecendo representantes de associações de madeireiros e fazendeiros da região, contra trabalhadores rurais da Associação dos Pequenos Agricultores do Acampamento Rio Jordão, acerca de projetos de reforma agrária.

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IPL 209/2007 – DPF/MAB/PA (Proc.: nº

2007.39.01.001076-0)

PA RIO NEGRO/ Associação dos Trabalhadores

Rurais do rio Negro (ALTRRN)

O IPL relata denuncias efetuadas pela Srª. Iranildes Nina de Sousa junto ao MPF sobre suposto envolvimento do chefe da UA-Xingu. Segundo conta Iranildes, foram desbloqueadas duas parcelas nos valores respectivos de R$ 25.447,50 (vinte e cinco mil, quatro centos e quarenta e sete reais e cinquenta centavos) e R$ 21.532,50 ( vinte e um mil, quinhentos e trinta e dois reais e cinquenta centavos) para construção de casas no assentamento, sendo que as mesmas foram apenas iniciadas e depois nada mais fora feito. Alegou, também que o a pessoa responsável pela construção fora escolhida pelo servidor-chefe da UA-Xingu acima referido, que este agora estaria se eximindo de responsabilidades pela não construção das casas, também não explicando qual destinação fora dada aos recursos liberados uma vez que não foram aplicados no assentamento./ Proceder às diligências requeridas pelo MPF, fls. 36, e dar continuidade às diligências já iniciadas pela PF às fls. 38.

Muitos dos problemas seriam evitados se houvesse mecanismo de controle na habilitação das pessoas empresárias que recebem os recursos.

g) violação ao princípio da eficiência (art. 37, caput da CRFB/1988), tendo em vista que os recursos públicos globalmente destinados às operações de cada assentamento são vultosos, com associações que recebem centenas de milhares de

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reais, o que permitiria aquisições com economia de escala (possibilidade de se comprar mais com menos recursos públicos, que já são escassos), o que dificilmente ocorre com a compra em montantes pequenos e isolados. A economicidade da política pública se perde (art. 70, caput, da CRFB).8

Esse aspecto econômico-jurídico é ainda mais acentuado ao se perceber que em cada projeto de assentamento há diversas associações. Em princípio todas recebem as mesmas espécies de recursos e vislumbram os mesmos objetivos, mas sabe-se lá por quais razões, terminam pulverizando os recursos e retirando a economicidade, além de dificultar seu controle.

Outras e diversas violações sistemáticas são constatadas. As já apresentadas, com percepção fática direta, já apontam a insubsistência das coisas como estão. Outras ainda serão abordadas mais adiante.

PARTE 2 - A DEFICIÊNCIA ESTRUTURAL – a criação de números e ausência de retorno dos recursos investidos - o reconhecimento administrativo de ineficiência e a Recomendação ministerial n.° 3/2003.

A permissividade normativa já é demonstração suficiente da incapacidade administrativa de se alcançar de forma eficiente os objetivos da reforma agrária. Os recursos, que já são escassos na realidade brasileira, terminam por não alcançar sua finalidade.

Basta constatar os números. Nos últimos anos o INCRA e a União anunciaram o rápido crescimento no número de famílias assentadas. No entanto, não se tem notícia de dados sobre sua eficiência. No caso, mais uma vez a máxima “quantidade não significa qualidade” pode ser empregada.

De fato, há de se lembrar que aos recursos empregados são devidas contraprestações. São créditos públicos. No entanto, o INCRA apenas apresenta os

8 Art. 70. A fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da União e das entidades da administração direta e indireta, quanto à legalidade, legitimidade, economicidade, aplicação das subvenções e renúncia de receitas, será exercida pelo Congresso Nacional, mediante controle externo, e pelo sistema de controle interno de cada Poder.

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números de assentados e respectivos assentamentos criados. Mas o retorno dos créditos? O quanto dos recursos públicos empregados retornaram aos cofres? Qual a relação custo-benefício? Enfim, qual o resultado dos assentamentos? Houve emancipação e ganho na qualidade de vida das milhares de famílias?

Eis um dos maiores mistérios encobertos pela atual dinâmica de assentamento.

O sistema falho sofre ainda mais diante de outro sintoma. No afã de assentar números (não pessoas), não há critérios e cuidados com sua implantação. Não importa o destino dos recursos.

A desproporção entre os fatos e os mecanismos de controle é tão evidente, que não resiste a qualquer análise, mesmo dos números oficiais. Veja o número de famílias assentadas sob o controle do INCRA/SR-27, nos últimos anos:

O mesmo vale para o número de assentamentos criados:

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Dentre as superintendências regionais do INCRA em todo o Brasil, a SR-27 é a quarta em número de assentamentos geridos e relação de assentados beneficiários. Vale dizer que são trinta as superintendências.

O número crescente demandaria um crescimento proporcional do aparato material, apto a geri-lo, o que inclui até mesmo o número de servidores. No entanto, não foi isso o verificado.

O reflexo desta situação é inegável. Várias são as implicações.

Como exemplo deste semblante, foi mencionado anteriormente que a suposta Comissão de Crédito, formada por servidores responsáveis pelos recursos aplicados, sequer é realizada pela SR-27 de acordo com a norma criada pelo próprio INCRA. De fato, em fevereiro de 2008 o MPF expediu ofício ao INCRA/SR-27, questionando, dentre outros pontos, os servidores responsáveis pela aplicação do créditos, como dispõem as normas de execução aplicáveis entre 2004 e 2008.

Em resposta, veio o Ofício/INCRA/SR(27)/G/N° 671/2008, que dentre a documentação apresentada, ofertou todas as ordens de serviço que designaram servidores para o mister de fiscalização entre 2005 e 2008. Em princípio, “não puderam” fornecer os anteriores a 2005.9

Com base no apresentado, se passa a demonstrar como a já falha normativa se soma à falta de apreço pela coisa pública. O que será demonstrado aponta que o objetivo é a criação de números governamentais na reforma agrária, a qualquer custo, sem se ter em conta os riscos de recursos públicos serem desviados a um fundo sem retorno.

Para sintetizar, vejamos o que ocorreu entre 2005 e 2008.

Inicialmente, a NORMA DE EXECUÇÃO Nº 46, DE 10 DE NOVEMBRO DE 2005 determina que a comissão de fiscalização seja composta por técnicos do INCRA, composta por três servidores, responsáveis pela aplicação e fiscalização do crédito.

9 Vale dizer que no fornecido há documentos sem qualquer pertinência ao tema, como as ordens de serviço 50/05 (fl. 131 – trata de comissão de avaliação de imóvel) , 193/06 (fls. 151 – tratam de levantamento de bens na sede do INCRA).

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O que houve com amparo na norma? Apesar do INCRA não ter fornecido informações sobre os créditos instalação fornecidos no período, demonstrou que os grupos formados eram compostos, apesar da norma citada exigir o mínimo de três , de apenas um componente (v. ordens de serviço n° 77/06 – fl. 147; 82/06 – fl. 148; 83/06 – fl. 149; 188/06 – fl. 150).

No entanto, isso não é o mais curioso. Por razões óbvias a norma determina que técnicos sejam os designados para a função fiscalizadora. Nada contra outras funções, tão ou mais importantes que as em questão, mas designar, p. ex., um agente de portaria para esse mister se mostra em completo desvio de função (v. o servidor Ciro Antonio do Espírito Santo Melo na ordem 82/06 – fl. 148).

Ademais, na média cada agente era o responsável por aproximadamente 29 assentamentos. Isso multiplicado pelas várias espécies de crédito fiscalizadas, além do número de associações criadas em cada assentamento, demonstra o desalento existente.

A fiscalização passou a ser mera formalidade. O próprio INCRA/SR-27 demonstra que sequer cumpre a sua criação normativa.

Mas como frisado antes, o erro persiste há anos. Já com a NORMA DE EXECUÇÃO

No 53, DE 20 DE DEZEMBRO DE 2006 , foi mantido o padrão de três servidores, todos técnicos. De fato, a única alteração percebida foi a manutenção e o acréscimo de novos assentamentos sob a “responsabilidade” de um mesmo servidor (v. ordem de serviço n° 06/07 – fl. 154).

Já sob a égide da NORMA DE EXECUÇÃO/INCRA/DD/Nº 63 DE 14 DE SETEMBRO DE 2007, que manteve o mesmo padrão, o que houve?

Com base na norma, houve acréscimo de novos assentamentos sob a “responsabilidade”, sempre, de um mesmo servidor, ou a manutenção das mesmas atribuições (v. ordens de serviço n° 122/07 – fl. 155; 123/07 – fl. 156; 124/07 – fl. 157; 125/07 – fl. 158; 126/07 – fl. 159).

Os casos de desvio de função persistiram. Agora, ver a Ordem 122/07 – fl. 155. O servidor designado é Ápio Miguel dos Santos Ghesso – artífice, que em

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princípio não se destina ao mister exigido. Vale acentuar que curiosamente ele é o Chefe do Setor. O mesmo persistiu com o agente de portaria (ordem n° 126/07).

Por fim, o que ocorreu com a NORMA DE EXECUÇÃO Nº 67 DE 29 DE NOVEMBRO DE 2007, vigente?

Já sob a égide da última norma vigente, houve acréscimo de novos assentamentos sob a “responsabilidade”, sempre, de um mesmo servidor, ou a manutenção das mesmas atribuições (v. ordens de serviço n° 12/08 – fl. 160; 13/08 – fl. 161; 14/08 – fl. 162; 15/08 – fl. 163; 16/08 – fl. 164; 17/08 – fl. 165).

Além do agente de portaria e do artífice, agora um terceiro estranho igualmente exerce a função: veja Osvaldo da Silva Nunes – auxiliar de enfermagem (Ordem n° 14/08 – fl. 162).

Mas o mais impressionante, que confirma como a norma é criada de modo a permitir o desvio ao invés de combatê-lo, é que reduziu a exigência no número de servidores responsáveis. Se antes eram três, a última norma se superou e agora permitiu apenas dois (art. 19)!

Isso apesar de o número de assentamentos, associações e créditos concedidos ter crescido substancialmente! É o reconhecimento de que a fiscalização é mera formalidade, pois para o sistema vigente, não fará diferença mesmo...

Somente para esclarecer o exaustivamente apresentado antes, ver os últimos dispositivos de cada norma mencionada. Tratam da vedação de se antecipar o pagamento à entrega do produto ou à prestação de serviço. Nunca foram cumpridas.

No entanto, a notícia de inexistência de controle não é recente. Antes já foram advertidos.

Como frisado no início, o mal é uma doença que faz agonizar há anos. Ainda em 2003, a situação alcançara patamares inaceitáveis, tanto que o Ministério Público Federal expediu a Recomendação n.° 3/2003 ao INCRA (Procedimento Administrativo 1.23.001.000264/2003-54 – em anexo - v. Fls. 302/306), por seu Presidente e Superintendente Regional, onde abordava diversos problemas crônicos. No seu objeto mais problemático, o teor foi o seguinte:

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“II – Nos casos de apropriação/desvio das verbas destinadas às diversas ações nos assentamentos:

a) que essa Superintendência efetue modificações no modo de repasse de verbas, haja vista que o repasse direto para as associações demonstra-se completamente inviável do ponto de vista do controle sobre a destinação dos recursos;

b) que essa Superintendência tome medidas efetivas para cobrança de prestação de contas e demonstração de aplicação das verbas;

c) uma vez caracterizado o desvio, que as medidas judiciais sejam adotadas por essa Superintendência, através da Procuradoria dessa Autarquia Agrária, com vistas ao ressarcimento e recomposição do dano causado” (grifos).

O que logo se apresenta é que a recomendação visava consertar três pólos problemáticos da SR-27. O primeiro, já demonstrado, está na proliferação de associações em total incompatibilidade com o controle pelo sistema; o segundo, também já abordado, se ateve ao controle inexistente das prestações e sua aplicação; por fim, como será demonstrado adiante, já se percebia que o INCRA não cobra seus créditos, não busca ressarcir o erário e não recompõe danos.

Já naquele momento, o MPF apresentou ao INCRA uma relação de casos semelhante ao realizado nesta demanda, com cerca de 30 procedimentos administrativos que existiam (e muitos ainda existem!) na Procuradoria, recentes à época (fls. 307/313). Vale dizer que nenhum deles se encontra na listagem atual desta demanda, são casos diversos, o que confirma a necessidade de uma medida que quebre o ciclo vicioso.

Em resumo dos acontecimentos e memória de reunião realizada, a Procuradora da República oficiante já alertava (fl. 20 do procedimento anexo):

“As reclamações por parte dos colonos chegam de vários modos, muitas sendo feitas por telefone. Diariamente duas ou três pessoas telefonam, perguntando como será resolvida a situação. Uma comissão formada com alguns desses colonos

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deslocou-se até Brasília, indo inclusive expor a situação à Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão”.

Vale ressaltar que o mesmo ocorre ainda hoje.

Àquela época a procuradoria do INCRA muito bem ressaltou que “fica evidenciado a obrigatoriedade do INCRA em participar ativamente na fiscalização da concessão e aplicação do Crédito Instalação” (fl. 322).

Por sua vez, em resposta à Recomendação, a então Superintendente defendeu no que toca aos créditos instalação (fls. 329):

“...não é dado a esta Superintendência Regional, por si só, modificar os procedimentos de repasses.

No entanto, por motivo de cautela, ainda que informalmente, o Setor de Crédito desta SR(27) passou a adotar as seguintes providências que a nosso ver minimizará a possibilidade de eventual desvio dos referidos créditos, a saber (doc. 03):

a) Exigência de elaboração de projeto técnico elaborado por empresa construtora credenciada junto ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária através do SICAF;

b) O repasse dos recursos será feito em parcelas mediante transferência bancária;

c) Intensificar a fiscalização e a exigência de prestação de contas”.

Ou seja, a resposta é um perfeito semblante do paradoxo chamado INCRA.

Primeiro, fala que não pode alterar a norma infralegal, para em seguida afirmar que “por motivo de cautela, ainda que informalmente” tomaria as medidas apresentadas. Se já tivesse conta de que bastaria respeito às leis e normas constitucionais existentes talvez o ”informalmente” tivesse outra feição.

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Segundo, não se tem notícia da tomada de nenhuma das medidas “informais”.

Terceiro, o repasse parcelado, como já visto, não tem amparo na própria norma do INCRA. De fato, pagamento é só após a prestação do contratado. Aliás, se o pagamento realmente fosse ao final, talvez não ocorressem com tamanha intensidade os costumeiros casos de recebimentos com o desaparecimento dos responsáveis em seguida.

Quarto, a “intensificação” parece mais uma típica promessa eleitoreira. Quais as medidas concretas se traduziram em realidade? Resposta: nenhuma.

Destaque-se que na mesma manifestação a Superintendente Regional confessa e deixa incontroverso o deletério aspecto da “pulverização de responsabilidade” e o falho sistema cadastral (SIPRA), apresentados antes. Afirma (fl. 59 do procedimento referido):

“Ademais, impende registrar que em muitos processos administrativos, imprescindível se afigura o deslinde das ações criminais, dada a não identificação dos autores do desvio (casos de associações laranjas em que subsiste apenas o contrato firmado com o assentado que sequer que era o beneficiário) – sic.

Por fim, em fls. 60 a 67 do procedimento referido em anexo, a Superintendência relata providências em cada um dos casos da listagem da época. Uma breve leitura demonstra a confirmação de tudo o que foi apresentado até então. O próprio INCRA relata que as mazelas são uma realidade e as medidas, mais uma vez, são apenas promessas.

Enfim, quase cinco anos se passaram e quase nada mudou. A situação se perpetua. A instituição há tempos está ciente da situação e de maneira ímproba nada fez.

O ambiente pernicioso é uma constante na história da SR-27. Em anexo, há declarações de servidores, assentados, presidentes de associação e até mesmo de superintendentes regionais, todos uníssonos ao afirmar a impossibilidade de se fiscalizar e controlar de forma eficiente a perversa dinâmica da SR-27:

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IPL n° 192/2005 – Processo n°

2005.39.01.000649-5

PA Progresso – Eldorado dos

Carajás/PA

Desvio de verbas referentes ao crédito habitação, por parte dos representantes da empresa Construtora Planalto Ltda. Em junho de 2004 foi criada comissão para fiscalizar a aplicação dos recursos, que foram depositados pelo INCRA na conta desta e repassado à Construtora. Após receber parte do montante, a empresa abandonou a obra. O dinheiro foi transferido para a conta de Cleurismar, esposa do João Neves da Silva, representante da empresa. Em fl. 13, há documento do INCRA, assinado por Ernesto Rodrigues, em que libera a transferência de R$ 100.00,00 sem a apresentação de Nota Fiscal e/ou recibos. Alega amparo em norma de legalidade suspeita, que confirmou-se não permitir a conduta realizada. Datas de previsão dos créditos e constituição da pessoa jurídica em proximidade. Há reconhecimento por parte das chefias e do superintendente do INCRA acerca do desvio e violação à impessoalidade na contratação de construtora.

Neste IPL n° 192/2005, há um documento (v. fls. 372) em que o superintendente e os chefes do setor de crédito e da divisão técnica, questionados pelo delegado de polícia, esclarecem o papel do INCRA em relação ao contrato de prestação de serviço, acentuando o desleixo com a utilização dos recursos públicos:

“O papel do INCRA é efetivar as contratações dos parceleiros, descentralizar verbas, orientar os colonos e a comissão, fiscalizar e acatar decisão tomada pela Comissão, ou seja, deixar à critério deles construírem ou contratar empresas”.

Veja o caso seguinte:

14IPL n° 080/2001 – Processo n°

2001.39.01.000516-9

Assentamento Alana

Assentamentos mencionados:

Fazenda Bamerindus e

Fazenda Macacheira.

Apura a venda irregular de lotes no Assentamento Alana. Com base na notícia de venda de lotes, Antônio Rodrigues da Silva afirmou se tratar de fato comum nos assentamentos, pois fica a cargo das associações diretamente com o INCRA. Sobre o assentamento, relata que comunicou ao servidor MARLON. Descreve como funciona a distribuição de lotes no assentamento. Relata que muitas vezes a associação distribui os lotes a pessoas que não vão trabalhar no assentamento, que passam a negociá-las. Há elementos que narram o esquema de venda de lotes, sem que se tenha notícia de qualquer medida do INCRA para combater o seu funcionamento. Mesmo sem provas efetivas, talvez em razão da repercussão na mídia, o INCRA descredenciou o sindicato em questão e anunciou a exclusão sumária dos assentados envolvidos, procedimentos que não costuma fazer em outras ocasiões. Há o reconhecimento do INCRA, por parte de Marlon, da incapacidade institucional de gerenciar os assentamentos (fl. 59). Em fls. 32/51 há relação de assentados beneficiários, que receberam recursos e nota-se que alguns nomes estão em duplicidade. MARLON afirma que a servidora Aldemarina era a responsável pelo pagamento dos benefícios; fortes elementos de que há participação da servidora no pagamento em duplicidade. Fato configurado em seu depoimento. Providências: (I) Cabimento de ação por improbidade administrativa e ação penal por peculato contra os servidores do INCRA.(II) Preliminarmente, aguarde-se cumprimento de diligência pendente que iria ouvir possíveis compradores dos lotes do INCRA, a fim de delimitar a autoria dos delitos de venda irregular de lotes e estelionato, imputados inicialmente aos representantes da associação de trabalhadores do PA Alana e Sindicato de Parauapebas.

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Neste caso, o então Superintendente Regional MARLON DA SILVA FERREIRA é claro quanto à dificuldade de corrigir as falhas e controlar a ampla gama de assentamentos (fls. 436):

“QUE credita a prática de tais atos à dificuldade técnica e operacional do INCRA em satisfazer a demanda de 292 Projetos de Assentamentos com 43.000 famílias assentadas e assentandas atualmente, em uma área de trinta milhões de hectares no Sul e Sudeste do Pará (...) QUE considera humanamente impossível atender a todas as exigências que essa gama de assentamentos reivindica (...) QUE no ano passado, o governo federal solicitou recadastramento das famílias assentadas até então, no qual foram gastos R$ 800.000,00 (oitocentos mil reais), crendo o declarante que o governo irá tomar uma medida a nível nacional, tendente a solucionar o problema da descaracterização da reforma agrária” - sic.

Ou seja, o então Superintendente demonstrou que o INCRA era incapaz de gerenciar os assentamentos, ainda em 2001, ocasião em que existiam “apenas” 292 assentamentos. No entanto, em 2008 o número de assentamentos totaliza 473 – acréscimo superior a 60% - sem que a estrutura tivesse um acréscimo substancial.

A crença do agente público - “que o governo irá tomar uma medida” - não se confirmou. Ao revés, como demonstrado ao longo desta petição, tanto o sistema de controle ocupacional, como o de utilização dos recursos em assentamentos, se mantiveram com a mesma feição. Ou seja, até 2008 nada mudou e as irregularidades são as mesmas.

Vale apontar que recentemente o MPF oficiou ao INCRA, questionando se a autarquia em Marabá cumpria integralmente a norma de execução vigente (GAB I/PRM/MAB/PA/N° 177/2008, v. fl. 43). No ofício ministerial não houve acusação, menções a irregularidades ou quaisquer elementos que induzissem suspeita. Mesmo assim, o Superintendente Regional substituto JANDIR MELLA e o Assegurador de Crédito ÁPIO MIGUEL DOS SANTOS GHESSO, como se “vestissem a carapuça”, responderam (fl. 128):

“Informamos que obedecemos as exigências da 63/07, hoje já estamos cumprindo a NE 67/07, mais acontece

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que a nossa Superintendência regional (SR-27), é uma das maiores do País, em todos os sentidos, programação operacional, 473 (quatrocentos e setenta e três) assentamentos, falta de servidores do quadro de pessoal, pequena frota de carros (veículos) para efetivar fiscalização de campo...” - sic.

No antes mencionado caso do IPL n° 50/2004-DPF/MBA/PA, o servidor WILSON DIAS PEREIRA (fls. 449/450) confirma que o INCRA/SR-27 dificilmente realiza vistorias in loco:

“QUE o declarante também informa que há um grande volume de trabalho e pouco pessoal para a realização do serviço, tais como vistorias in loco” - sic.

A situação que se perpetua é tão grave que antigo Superintendente Regional confirmara o “quadro desafiador, desalentador e desmoralizante” com que se deparava. Ver o seguinte caso:

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Peça de Informação n°: 1.23.001.00017

3/2007-42

P.A. Progresso e

Barreira Branca –

Eldorado dos Carajás/PA

As reservas legais dos assentamentos nunca foram cumpridas. Apesar de comunicados, INCRA e IBAMA nada fizeram. Em 2005 foram criados dois projetos de assentamento na reserva legal do PA Progresso – União do Angico e Três Lagoas – e na reserva legal do PA Barreira Branca foi realizado o PA Carumbé. Não há controle sobre a extensão dos lotes dos assentados. Há reconhecimento expresso do então Superintendente Regional, em ofício dirigido ao Presidente do INCRA, relatando a incapacidade do instituto em Marabá de contornar a série de problemas existentes, desde o desmatamento até os desvios de créditos.

A declaração em destaque é a apresentação de um dossiê (“documento-denúncia”) realizado pelo então Superintendente Regional DARVIN BÖERNER JÚNIOR, dirigido ao Presidente do INCRA, em que clamava por socorro. Vale a leitura do documento, como exemplo sintomático (v. fls. 434). Aqui, basta colar alguns trechos:

“No aludido documento, estampa-se como inconteste, várias situações que conspiram contra o patrimônio público em face da realidade suscitada, sobretudo quanto ao aproveitamento do estoque fundiário potencialmente disponível, impondo-os, ao arrepio de toda lógica programática, um quadro

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desafiador, desalentador e desmoralizante, mormente se cotejado com o propósito maior de assentamento de trabalhadores rurais, citando, à guisa de exemplo, descaracterização da ocupação por não clientes da reforma agrária, destruição da área de reserva legal e preservação permanente por madeireiros inescrupulosos, alienações de parcelas à revelia com reconcentração e formação de grandes áreas no interior dos Projetos de Assentamentos, existência de pistolagem, tráfico de armas e drogas, violência com expulsão de trabalhadores, desvios de créditos oficiais (notadamente no PA Progresso), etc.

Inobstante as medidas já adotadas por esta Regional no intuito de cercear as irregularidades, inclusive com representações formuladas junto ao Ministério Público Federal e Departamento de Polícia Federal do Pará, o clima de instabilidade reinante nesses imóveis não só ofende aos mais comezinhos princípios da moralidade administrativa, como também agrava-se ainda mais, na medida em que se verifica a inexistência de medidas drásticas que visem corrigir essa grave distorção, dando margem inclusive a inaceitável impunidade”.

Como a todo momento são noticiados e investigados casos de irregularidades no INCRA/SR-27, os órgãos de persecução intensificaram sua missão, com diversas ações penais e por improbidade recentes recebidas pelo Poder Judiciário Federal. O “choque de legalidade” traz sintomas, como a percepção de que a punibilidade pode tardar, mas chegará. Mais uma vez, o Chefe do Setor de Crédito no recente ofício dirigido ao Superintendente Regional:

“É importante ressaltar que, devido aos nossos encaminhamentos de situações de desvios anteriores ao exercício de 2003 aos Órgãos externos como Ministério Público e Polícia Federal, os mesmos estão dando especial atenção ao Setor de Crédito do INCRA, o que nos faz entender que devemos seguir a risca e com muita segurança as normativas aplicadas nesta autarquia, para não cometermos

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erros, mesmo involuntários que venham a ser considerados irregularidades, uma vez que já está constatada no âmbito do INCRA, a falta de uma proteção jurídica aos seus servidores, que para se defender na justiça de questões inerentes ao trabalho desenvolvido, necessita contratar advogado particular...”.

Considerada a outra face dos elementos apresentados na primeira parte desta peça (onde a presença de todos os elementos de corrupção foram constatados), a questão estrutural apenas alimenta os elementos do ambiente propício à corrupção, como no início mencionado (Min. Carmen Lúcia e outros) na medida em que:

1 - concentra o poderio de ditar a regularidade do procedimento nas mãos de poucos agentes, sejam representantes de associados, ou do INCRA, responsáveis do início ao fim deste (a - grande dose de poder decisório concentrado em um único agente);

2 - com o desproporcional número de assentamentos e famílias existentes, multiplicado pelo número de associações e por sua vez multiplicado pelo número de espécies de crédito, dificilmente o fiscal poderia realizar sua missão com celeridade. A multiplicidade, sem delimitação exata, acomoda corruptor e corrupto, como ocorre com os variados presidentes de associação frente aos poucos agentes do INCRA, que terminam aplicando as normas como lhes convenha, de modo a sempre desviar a responsabilidade exclusivamente para terceiros, como costumeiramente ocorre com os presidentes de associação (b - multiplicidade de órgãos competentes para execução sem

esquadrinhamento perfeito e exclusivo de atribuições);

3 – se o sistema desde a origem é obscuro, sem transparência, sem controle e sem critérios rigorosos de regulação, alterar a realidade é algo simples, permitindo aos servidores responsáveis desvirtuar a causa agrária (c - ausência de mecanismos de

controle efetivo, permanente, transparente e rigoroso);

4 – por sua vez, sem publicidade, dificilmente o controle pode ser estabelecido. Eventuais prejudicados por uma situação criada ou qualquer interessado em conferir a causa pública ficam cerceados no acesso às constatações (d - restrita e precária publicidade administrativa); e

5 – ao mesmo tempo causa e conseqüência de todos os elementos anteriores, a impunidade é o fruto de um círculo vicioso criado por um sistema que não pune

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por não conseguir identificar quem deve ser punido (e - impunidade, inclusive para

corruptores).

Por sua vez, o dispêndio crescente de recursos não é acompanhado de um controle de qualidade. Não se tem notícia do equilíbrio entre os recursos públicos investidos e o quanto retornou à sociedade.

Vejamos o quanto foi destinado apenas ao INCRA SR-27, na última década, para financiar a política de reforma agrária, somente com créditos instalação (fl. 259):

ANOORÇAMENTO GERAL

(R$) - Provisões Totais Recebidas nesta SR-27

Valores não atualizados

LIBERADO PARA CRÉDITO INSTALAÇÃO

(R$)Valores não atualizados

1998 88.533.362,11 24.788.925,001999 36.512.992,48 17.499.800,002000 34.187.635,38 19.109.400,002001 69.241.861,19 30.865.800,002002 77.092.569,01 38.892.200,002003 52.791.882,90 18.845.400,002004 74.773.915,31 22.060.400,002005 111.048.491,78 25.969.400,002006 128.286.760,54 46.548.600,002007 207.438.771,79 137.706.400,00

TOTAL: 879.908.242,49 382.286.325,00

Como créditos públicos, devem retornar aos cofres originários para ser reinvestido. Isso ocorre com qualquer espécie de política pública de financiamento, desde o SFH (Sistema Financeiro de Habitação) até o PROUNI.

A própria norma vigente (NE n° 67/07), seguindo os moldes de suas antecessoras, dispõe sobre a cobrança dos créditos:

Art. 35. As condições de pagamento e a operacionalização da cobrança dos créditos

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reembolsáveis deverão ser objeto de norma específica a ser definida pela Diretoria de Gestão Administrativa.

A questão é o quanto já retornou ao erário para viabilizar o atendimento de outras famílias e demandas sociais de reforma agrária? O quanto já foi, pelo menos, cobrado?

O Ministério Público Federal procurou desvendar o mistério. Qual foi a surpresa? Eis a resposta oficial do INCRA (fls. 268):

“Apesar das orientações contidas nos instrumentos normativos editados, esta Autarquia vem buscando os mecanismos de cobrança e controle dos créditos instalação, modalidade habitação, que pela complexidade exigem análises e diversas alternativas demandadas à área de desenvolvimento de Tecnologia da Informação, sendo que algumas, após seu desenvolvimento, se mostraram ineficientes.

Informo, por derradeiro, que até que seja implementado o sistema nacional de cobranças ora em estudo, e tendo em vista que os créditos concedidos nos exercícios de 2005, 2006 e 2007, ainda se encontram em fase de carência, os pagamentos das parcelas vencidas são efetuados mediante solicitação do tomador, junto à Divisão de Administração das Superintendências Regionais, por meio da emissão da Guia de Recolhimento da União – GRU”.

Em resumo: os créditos nunca foram cobrados.

Parece piada, mas tentando atenuar esse gravíssimo desvirtuamento da política agrária, o INCRA diz que “...os pagamentos das parcelas vencidas são efetuados mediante solicitação do tomador”. Ou seja, não é nem o “ devo, não nego; pago quando puder”. No caso é “devo, não nego; pago quando quiser”...

Lamentável o desapreço pela coisa pública.

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Mas o Ministério Público Federal apenas confirmou algo que já se aproximava da certeza. Dos depoimentos de assentados já se tinha noção da situação. P. ex. (depoimento extraído do Processo n°: 2008.39.01.000278-3, fl. 559):

“QUE o INCRA nunca vistoriou o local onde foi implantado o projeto; QUE nenhum dos projetos desenvolvidos pelos 350 assentados no PA 1° de Março teve sucesso; QUE o presidente da associação é quem apresentada a relação de beneficiários do PA e não há nenhuma fiscalização ou conferência por parte do INCRA, que lá esteve apenas para retomar alguns lotes; QUE o INCRA nunca cobrou os recursos repassados...” - sic.

Na verdade não houve surpresa. Para aqueles que atuam na região o sentimento de ineficiência sempre esteve presente. Só não se sabia explicá-la e traduzi-la em números, que confirmam o já ressaltado.

A preocupação institucional é com a criação de números para apresentar à sociedade. Há décadas milhões são anualmente drenados das escassas fontes públicas, para então alcançar uma vala sem volta. Nunca a instituição se preocupou em fazê-los retornar, pois ano após ano novos recursos estariam prontos para jorrar.

Somada ao nefasto sistema de liberação de créditos, é mais uma das razões fundamentais para a ineficiência do programa de reforma agrária implantado pelo INCRA/SR-27. A causa da reforma agrária foi traída.

É preciso destacar que o ordenamento jurídico não permite a condução desta política pública como vem sendo realizada.

Mais uma vez é salutar a interpretação do sistema. Segundo a Constituição da República:

Art. 167 São vedados:

VII - a concessão ou utilização de créditos ilimitados;

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O dispositivo constitucional já demonstra um norte interpretativo inegável. A concessão de créditos de forma ilimitada, sem o retorno do montante emprestado, põe em risco todos os critérios de responsabilidade fiscal, princípio basilar na estrutura de Estados comprometidos com políticas públicas sérias, que preservem o interesse da atual e futuras gerações.

Por se tratar de crédito, implica em elemento essencial do direito financeiro do Estado:

Lei n.° 4.320/1964

Art. 39. Os créditos da Fazenda Pública, de natureza tributária ou não tributária, serão escriturados como receita do exercício em que forem arrecadados, nas respectivas rubricas orçamentárias. (Redação dada pelo Decreto Lei nº 1.735, de 20.12.1979).

Assim sendo, isso significa que o INCRA está há anos dispondo de algo que não lhe é disponível. O recurso é bem público e não pode ser desprezado senão em virtude de lei. Se a lei diz que são créditos, devem ser restituídos; do contrário, seria doação.

Ademais, os créditos estão sendo dispostos como uma despesa obrigatória de caráter continuado, sem observância aos ditames da Lei de Responsabilidade Fiscal (LC n. 101/2000, art. 17 e parágrafos).

Portanto, a omissão do INCRA pode configurar – e configura - improbidade administrativa.10

Tudo isso afasta de imediato as constantes escusas estruturais. Como demonstrado, o que ocorre é o incentivo pela norma e o aproveitamento da

10 Lei n.° 8.429/92, art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta lei, e notadamente: II - permitir ou concorrer para que pessoa física ou jurídica privada utilize bens, rendas, verbas ou valores integrantes do acervo patrimonial das entidades mencionadas no art. 1º desta lei, sem a observância das formalidades legais ou regulamentares aplicáveis à espécie; III - doar à pessoa física ou jurídica bem como ao ente despersonalizado, ainda que de fins educativos ou assistências, bens, rendas, verbas ou valores do patrimônio de qualquer das entidades mencionadas no art. 1º desta lei, sem observância das formalidades legais e regulamentares aplicáveis à espécie; X - agir negligentemente na arrecadação de tributo ou renda, bem como no que diz respeito à conservação do patrimônio público; XI - liberar verba pública sem a estrita observância das normas pertinentes ou influir de qualquer forma para a sua aplicação irregular.

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situação. É fácil mantê-la. Todos se “beneficiam”. Como apresentado no início, a norma que não é refletida na realidade é campo fértil para a corrupção.

O próprio INCRA é desleixado. Não tem recursos para fiscalizar a si mesmo. Mas milhões jorrados irresponsavelmente todos os anos tem. Que não me venham com “reserva do possível” e outras fugas desse jaez...

Talvez estejamos diante de um dos fatores para que o problema agrário na região não seja comprometido com resultados. Não há responsabilidade. Quem recebe os créditos não se preocupa com o seu destino. Em lições preliminares de direito já se decifra ao estudante a distinção entre um dever jurídico e um dever moral. O último, despido do fator obrigacional e não sendo exigível, perde qualquer possibilidade de ser obrigado à realidade.

Afinal, que reforma agrária é esta?

O sonho da reforma agrária está sendo frustrado. De dever constitucional, passou a promessa sem correspondência. Os movimentos sociais demandam continuamente recursos de um Estado brasileiro sem condições. Se os recursos emprestados estivessem retornando, seriam reinvestidos na almejada reforma. Mas por que fariam isso? Ora, pedir é fácil. Pagar é mais difícil...

Como demonstrado, a isso se soma o sistema imundo da concessão dos créditos. Eis o tumor instalado. O câncer já se estende há décadas e as células cancerígenas entram em metástase continuadamente. Prestar auxílio é preciso. A quimioterapia é necessária, talvez com conseqüências adversas inevitáveis. Mas pode ser um caminho rumo à extração da chaga.

Seguem as alternativas, todas determinações normativas vigentes que o INCRA se nega a cumprir.

PARTE 3 – Medidas para proteger os recursos – Determinações normativas descumpridas - ALTERNATIVAS.

Nas partes anteriores foram demonstradas as múltiplas facetas de um problema crônico.

Diversos países e organizações estudam continuadamente mecanismos para reduzir a possibilidade de se criar ambientes propícios à corrupção e desvios.

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Estudam seus sintomas e apresentam alternativas. Os exemplos no mundo são diversos, desde a Austrália, Nova Zelândia e Canadá, onde o esforço para garantir acesso aos dados governamentais é constante, passando pelo Chile, excelente exemplo recente de evolução na América Latina e até a República de Botsuana, no sul da África, que passou a ser citada como referência (no ranking de corrupção da Transparência Internacional ocupa o 38° lugar, enquanto o Brasil está em 72°).

Geralmente são apontados cinco vértices na busca desse ideal: 1 – TRANSPARÊNCIA – quanto maior as informações divulgadas, menor é a criação de espaços para desvios; 2 – METAS – os recursos utilizados devem ser acessíveis à população e a administração tem de cumprir metas. Sem a percepção do quanto é gasto com cada objetivo, não se consegue detectar a qualidade dos gastos. Por sua vez, se não houver metas para a qualidade e o retorno do montante financeiro investido, há o risco do foco se perder com a alimentação constante de um objeto ineficiente; 3 – INTERNET – o chamado “governo eletrônico”, realizado através da internet, é uma das armas mais poderosas contra a corrupção. Discussões recentes no cotidiano brasileiro somente foram alimentadas graças aos dados divulgados em sítios institucionais, como o “Portal da Transparência”; 4 – RESPONSABILIZAÇÃO IDENTIFICADA – além de instrumentos de atuação, diante da notícia de desvios os órgãos de persecução têm que ter facilitados os meios de identificar os responsáveis. Há de se saber exatamente a quem foi atribuída a função de gerir os recursos públicos, com mecanismos que dificultem a pulverização da responsabilidade e; 5 - CARGOS PÚBLICOS – os países que reduziram as funções de gestão de recursos preenchidas por indicações políticas, ou sem controle de mérito, têm menos desvios ou corrupção.

De pronto se percebe que no INCRA/SR-27 não existe qualquer desses vértices. Não por acaso.

O problema não é de fácil solução e não se tem notícia na história humana de sistemas perfeitos. No entanto, se tem noção de medidas para alcançar um sistema menos propenso às irregularidades. O Ministério Público Federal não deseja exterminar o funcionamento do sistema, mas aproximá-lo de maneira mais fidedigna ao mandamento constitucional.

Alguns instrumentos serão apresentados, com a abordagem dos remédios ao alcance do doente a ser medicado. Não há nenhuma invenção. São normas vigentes que não são aplicadas pelo INCRA.

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1. As recomendações internacionais de combate à corrupção – Tratados internacionais – estatura legal e direcionador das alternativas - aplicabilidade.

A prevenção e a repressão à corrupção são mandamentos da comunidade internacional. A República Federativa do Brasil é signatária de tratados internacionais, mediante os quais se comprometeu a criar mecanismos eficientes de combate.

Os principais instrumentos são: a) Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção (CNUCC), promulgada pelo Decreto 5.687, de 31 de janeiro de 2006; e b) Convenção Interamericana contra a Corrupção, promulgada pelo Decreto 4.410, de 7/10/2002.

As convenções têm status de lei ordinária e as disposições que têm aplicação imediata podem e devem ser invocadas como fundamento para a prevenção de desvios e corrupção, ações de improbidade e procedimentos investigatórios. Quando a convenção diz “cada Estado-parte deverá adotar as medidas necessárias para combater e prevenir mais eficaz e eficientemente a corrupção” pretende não só a edição das normas respectivas mas também a imediata aplicação de suas disposições, se já houver condições para tanto.

Antes de ingressar nas medidas concretas pontuais, de modo a facilitar sua análise, vejamos, em quadro comparativo, as determinações normativas da Convenção das Nações Unidas face aos instrumentos brasileiros, com os comentários pertinentes ao demandado nesta ação11 12:

A CONVENÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS CONTRA A CORRUPÇÃO E A LEGISLAÇÃO BRASILEIRA

Convenção Legislação brasileira Comentários

11 Toma-se em parte o trabalho desenvolvido pelo Grupo de Trabalho de Combate à Corrupção da 5ª Câmara de Coordenação e Revisão do MPF.12 Muitas das disposições constantes da CNUCC encontram-se também na Convenção Interamericana contra a Corrupção, apesar de ser a Convenção das Nações Unidas mais extensa e detalhada, principalmente no que se refere à cooperação internacional. Em relação à Convenção Interamericana, em vigor no Brasil desde 2002, já foi estabelecido, no âmbito da Organização dos Estados Americanos (OEA), um mecanismo de acompanhamento de sua implementação (MESICIC), já tendo sido o Brasil, inclusive, avaliado quanto à implementação de alguns de seus artigos. Entre 27 e 31 de março de 2006, ocorreu a 9ª Reunião da Comissão de Peritos do Mecanismo de Acompanhamento da Implementação da Convenção Interamericana contra a Corrupção (MESICIC), tendo sido o Brasil avaliado quanto à implementação do artigo III, parágrafos 1, 2, 4, 9 e 11; artigo XIV e artigo XVIII, ou seja: 1) normas de conduta e mecanismos para tornar efetivo o seu cumprimento; 2) sistema para a declaração de receitas, ativos e passivos; 3) órgãos de controle superior; 4) participação da sociedade civil; 5) assistência e cooperação; e 6) autoridades centrais, com base nos seguintes critérios: 1) progresso alcançado na implementação da Convenção; 2) existência e disposições de uma estrutura jurídica e/ou de outras medidas; 3) adequação da estrutura jurídica e/ou de outras medidas; 4) resultados da estrutura jurídica e/ou de outras medidas. A íntegra do Relatório do Brasil encontra-se em www.oas.org/juridico/spanish/mec_ron1_inf.htm.

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Artigo 1 FinalidadeA finalidade da presente Convenção é:a) Promover e fortalecer as medidas para prevenir e combater mais eficaz e eficientemente a corrupção;b) Promover, facilitar e apoiar a cooperação internacional e a assistência técnica na prevenção e na luta contra a corrupção, incluída a recuperação de ativos;c) Promover a integridade, a obrigação de render contas e a devida gestão dos assuntose dos bens públicos.

Convenção Interamericana contra a Corrupção

(promulgada pelo Dec. 4.410, de 7/10/2002)

Art. II : Os propósitos desta Convenção são:l. promover e fortalecer o desenvolvimento, por cada um dos Estados Partes, dos mecanismos necessários para prevenir, detectar, punir e erradicar a corrupção; e2. promover, facilitar e regular a cooperação entre os Estados Partes a fim de assegurar a eficácia das medidas e ações adotadas para prevenir, detectar, punir e erradicar a corrupção no exercício das funções públicas, bem como os atos de corrupção especificamente vinculados a seu exercício.

Inicialmente se percebe que a prevenção é um imperativo. Reprimir apenas não basta. Ademais, se percebe a preocupação com a prevenção vinculada às funções públicas, “bem como os atos de corrupção especificamente vinculados a seu exercício”. Isso alcança justamente o que se verifica no INCRA, com a atração de extraneus, que termina por gerir os repasses públicos e pulveriza o foco de responsabilização.

Artigo 3 Âmbito de aplicação

1. A presente Convenção se aplicará, de conformidade com suas disposições, à prevenção, à investigação e à instrução judicial da corrupção e do embargo preventivo, da apreensão, do confisco e da restituição do produto de delitos identificados de acordo com a presente Convenção.2. Para a aplicação da presente Convenção, a menos que contenha uma disposição em contrário, não será necessário que os delitos enunciados nela produzam dano ou prejuízo patrimonial ao Estado.

Lei 8.429/92Art. 21. A aplicação das sanções previstas nestas Lei independe: I – da efetiva ocorrência de dano ao patrimônio público.

O exame integral das disposições da Convenção permite concluir que o termo “delitos” foi utilizado para alcançar os ilícitos criminais, civis e administrativos.As medidas de precaução, cautelares ou antecipatórias dos efeitos da tutela, são determinantes para embargar as ameaças noticiadas. Dano efetivo sequer é necessário.

Capítulo II Medidas preventivas

Artigo 5 Políticas e práticas de prevençãoda corrupção

Cada Estado Parte, de conformidade com os princípios fundamentais de seu ordenamento jurídico, formulará e aplicará ou manterá em vigor políticas coordenadas e eficazes contra a corrupção que promovam aparticipação da sociedade e reflitam os princípios do Estado de Direito, a devida gestão dos assuntos e bens públicos, a integridade, a

Convenção Interamericana Contra a CorrupçãoArtigo III Medidas

preventivas Para os fins estabelecidos no artigo II desta Convenção, os Estados Partes convêm em considerar a aplicabilidade de medidas, em seus próprios sistemas institucionais destinadas a criar, manter e fortalecer:1. Normas de conduta para o desempenho correto, honrado e adequado das funções públicas. Estas normas deverão ter por finalidade prevenir conflitos de

O resguardo dos recursos, de forma transparente e com a participação da sociedade é exatamente o que o sistema do INCRA não permite. Isso está claro diante de tudo o apresentado. A permanência das coisas como estão se traduz em inobservância, não apenas a normas legais, mas ao determinado pela Constituição.Como se verá adiante, o ordenamento jurídico tem preceitos normativos infraconstitucionais expressos que determinam providências transparentes, mas

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transparência e a obrigação de render contas.Cada Estado Parte procurará estabelecer e fomentar práticas eficazes encaminhadas a prevenir a corrupção.Cada Estado Parte procurará avaliar periodicamente os instrumentos jurídicos e as medidas administrativas pertinentes a fim de determinar se são adequadas para combater a corrupção.4. Os Estados Partes, segundo procede e de conformidade com os princípios fundamentais de seu ordenamento jurídico, colaborarão entre si e com as organizações internacionaise regionais pertinentes na promoção e formulação das medidas mencionadas no presente Artigo. Essa colaboração poderá compreender a participação em programas e projetos internacionais destinados a prevenir a corrupção.

interesses, assegurar a guarda e uso adequado dos recursos confiados aos funcionários públicos uso adequado dos recursos confiados aos funcionários públicos no desempenho de suas funções e estabelecer medidas e sistemas para exigir dos funcionários públicos que informem as autoridades competentes dos atos de corrupção nas funções públicas de que tenham conhecimento . Tais medidas ajudarão a preservar a confiança na integridade dos funcionários públicos e na gestão pública.2. Mecanismos para tornar efetivo o cumprimento dessas normas de conduta.

insistentemente negados pela autarquia.OBS: A implementação destes dispositivos da CICC pelo Brasil já foram objeto de avaliação pelo MESICIC, tendo resultado nas seguintes recomendações, constantes do Relatório Final (cf. Nota de rodapé n.° 12, supra):“Em vista dos comentários formulados nesta seção, a Comissão sugere que o Brasil considere fortalecer a implementação de leis e sistemas regulatórios em relação a conflitos de interesses, assegurando que sejam aplicáveis a todos os funcionários públicos, a fim de permitir a aplicação prática e efetiva de um sistema de ética pública. Para cumprir com esta recomendação, o Brasil poderá levar em conta as seguintes medidas:Levando em consideração as iniciativas legislativas existentes, considerar incluir, em um único conjunto de normas, um regime em matéria de conflito de interesses que se aplique à generalidade dos funcionários públicos, no sentido de permitir tanto aos servidores públicos como aos administrados ou usuários conhecer com exatidão seus deveres e direitos e, ao mesmo tempo, eliminar as lacunas existentes na cobertura dos regulamentos atuais. Tal medida, entretanto, não impediria a existência de normas dirigidas a setores que por sua especificidade possam requerer um tratamento especializado ou o estabelecimento de normas mais restritivas.Estabelecer ou fortalecer, conforme aplicável, mecanismos destinados a monitorar e resolver casos de conflitos de interesses, de modo a cobrir a totalidade dos funcionários públicos, de acordo com a recomendação anterior.

Artigo 7 Setor Público1. Cada Estado Parte, quando for apropriado e de conformidade com os princípios fundamentais de seu ordenamento jurídico, procurará adotar sistemas de convocação, contratação, retenção, promoção e aposentadoria de funcionários públicos e, quando proceder, de outros funcionários públicos não empossados, ou manter e fortalecer tais sistemas. Estes:a) Estarão baseados em princípios de eficiência e transparência e em critérios objetivos como o mérito, a eqüidade e a aptidão;b) Incluirão procedimentos adequados de seleção e

CRFB/1988, art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (...)

O dispositivo é claro ao se preocupar com os gestores públicos em especial situação de vulnerabilidade de corrupção. Isso significa que atores envolvidos em situações desse feitio devem observância estrita, sendo exatamente o que não ocorre com o sistema do INCRA na SR-27.Como demonstrado, o sistema aplicado pulverizou os responsáveis, camuflou sua situação em agentes públicos de fato que realizam a gestão de recursos públicos, o que dificulta sobremaneira a

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formação dos titulares de cargos públicos que se considerem especialmente vulneráveis à corrupção, assim como, quando proceder, a rotação dessas pessoas em outros cargos;(...)d) Promoverão programas de formação e capacitação que lhes permitam cumprir os requisitos de desempenho correto, honroso e devido de suas funções e lhes proporcionem capacitação especializada e apropriada para que sejam mais conscientes dos riscos da corrupção inerentes ao desempenho de suas funções. Tais programas poderão fazer referência a códigos ou normas de conduta nas esferas pertinentes.(...)4. Cada Estado Parte, em conformidade com os princípios de sua legislação interna, procurará adotar sistemas destinados a promover a transparência e a prevenir conflitos de interesses, ou a manter e fortalecer tais sistemas.

eventual responsabilização.Por sua vez, o item 4 do Artigo 7 apenas expressa algo que é inerente ao modelo de aplicação de normas no ordenamento brasileiro: muitas das razões jurídicas independem de preceitos legais expressos. Princípios igualmente são normas. No caso, como se verá adiante, há leis, normas infralegais e determinações constitucionais expressas.Mas eventualmente os aplicadores do direito podem (rectius: devem) buscar normatividade nos princípios para adotar sistemas transparentes e prevenir a corrupção.

Artigo 9 Contratação pública e gestão da

fazenda pública1. Cada Estado Parte, em conformidade com os princípios fundamentais de seu ordenamento jurídico, adotará as medidas necessárias para estabelecer sistemas apropriados de contratação pública, baseadosna transparência, na competência e em critérios objetivos de adoção de decisões, que sejam eficazes, entre outras coisas, para prevenir a corrupção. Esses sistemas, em cuja aplicação se poderá ter em conta valores mínimos apropriados, deverão abordar, entre outras coisas:a) A difusão pública de informação relativa a procedimentos de contratação pública e contratos, incluída informação sobre licitações e informação pertinente ou oportuna sobre a adjudicação de contratos, a fim de que os licitadores potenciais disponham de tempo suficiente para preparar e apresentar suas ofertas;b) A formulação prévia das condições de participação, incluídos critérios de seleção e adjudicação e regras de

Constituição – art. 22, XXVIILei Federal 8.666, de 21/6/93 (Lei das Licitações)Lei Complementar n. 101, de 04/05/2000 - Lei de Responsabilidade Fiscal - LRF - estabelece normas de finanças públicas voltadas para a responsabilidade na gestão fiscal, mediante ações em que se previnam riscos e corrijam os desvios capazes de afetar o equilíbrio das contas públicas, destacando-se o planejamento, o controle, a transparência e a responsabilização, como premissas básicas.

Mais uma vez a difusão da informação pública, que deve alcançar até mesmo os contratos, as prestações adjudicadas, partes envolvidas e tudo o mais necessário para uma correição de proceder. A “caixa preta” do INCRA não permite isso. Se ele já é ciente dos equívocos, por que mostrá-los à sociedade? As causas institucionais são variadas, porém injustificáveis.

Quanto ao pessoal encarregado da contratação pública (item “e” do artigo), equivocadamente deixada pelo INCRA ao livre arbítrio de gestores privados, o tratado é claro: o responsável deve declarar de imediato se tem interesse na contratação (o que os “gestores privados” do INCRA sempre têm!), ter procedimentos de pré-seleção

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licitação, assim como sua publicação;c) A aplicação de critérios objetivos e predeterminados para a adoção de decisões sobre a contratação pública a fim de facilitar a posterior verificação da aplicação correta das regras ou procedimentos; d) Um mecanismo eficaz de exame interno, incluindo um sistema eficaz de apelação, para garantir recursos e soluções legais no caso de não se respeitarem as regras ou os procedimentos estabelecidos conforme o presente parágrafo;e) Quando proceda, a adoção de medidas para regulamentar as questões relativas ao pessoal encarregado da contratação pública, em particular declarações de interesse relativo de determinadas contratações públicas, procedimentos de pré-seleção e requisitos de capacitação.2. Cada Estado Parte, em conformidade com os princípios fundamentais de seu ordenamento jurídico, adotará medidas apropriadas para promover a transparência e a obrigação de render contas na gestão da fazenda pública. Essas medidas abarcarão, entre outras coisas:a) Procedimentos para a aprovação do pressuposto nacional;b) A apresentação oportuna de informação sobre gastos e ingressos;c) Um sistema de normas de contabilidade e auditoria, assim como a supervisão correspondente;d) Sistemas eficazes e eficientes de gestão de riscos e controle interno; ee) Quando proceda, a adoção de medidas corretivas em caso de não cumprimento dos requisitos estabelecidos no presente parágrafo.3. Cada Estado Parte, em conformidade com os princípios fundamentais de sua legislação interna, adotará as medidas que sejam necessárias nos âmbitos civil e administrativo para preservar a integridade dos livros e registros contábeis, financeiros ou outros documentos relacionados com os gastos e ingressos públicos e para prevenir a falsificação desses documentos.

e requisitos de capacitação, algo típico de servidores concursados, mas não de gestores em sua maioria analfabetos funcionais.

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Artigo 10 Informação pública

Tendo em conta a necessidade de combater a corrupção, cada Estado Parte, em conformidade com os princípios fundamentais de sua legislação interna, adotará medidas que sejam necessárias para aumentar a transparência em sua administração pública, inclusive no relativo a sua organização, funcionamento e processos de adoção de decisões, quando proceder. Essas medidas poderão incluir, entre outras coisas:a) A instauração de procedimentos ou regulamentações que permitam ao público em geral obter, quando proceder, informação sobre a organização, o funcionamento e os processos de adoção de decisões de sua administração pública, com o devido respeito à proteção da intimidade e dos documentos pessoais, sobre as decisões e atos jurídicos que incumbam ao público;b) A simplificação dos procedimentosadministrativos, quando proceder, a fim de facilitar o acesso do público às autoridades encarregadas da adoção de decisões; ec) A publicação de informação, o que poderá incluir informes periódicos sobre os riscos de corrupção na administração pública.

Em todos os sistemas de transparência adotados no Brasil os ganhos de gestão são excelentes e inegáveis, principalmente quando o acesso foi facilitado através da internet. Veremos adiante esse proceder. Hoje o sistema do INCRA sequer permite a comparação e cruzamento de dados. Basta ver a promiscuidade do SIPRA. OBS: O Portal (www.portaldatransparencia.gov.br) foi criado no âmbito da Controladoria- Geral da União, para dar mais transparência à administração, permitindo o acompanhamento da execução dos programas e ações do Governo Federal. Vários órgãos da administração pública federal e estadual dispõem de instrumentos e mecanismos voltados à transparência. Exemplo é o Projeto Transparência da PRR-3ª Região, que tem como objetivo disponibilizar as principais informações administrativas da Regional em meio eletrônico, entre as quais informações sobre almoxarifado, analistas em gabinete, calendário, compras e contratos, extração de cópias reprográficas, correspondências, cursos e eventos, estatísticas, estrutura organizacional, escala de férias e licenças, instruções de serviços, licitações, lotação de servidores, movimentação de veículos, patrimônio, portarias internas, suporte de informática.

Artigo 13 Participação da sociedade

1. Cada Estado Parte adotará medidas adequadas, no limite de suas possibilidades e de conformidade com os princípios fundamentais de sua legislação interna, para fomentar a participação ativa de pessoas e grupos que não pertençam ao setor público, como a sociedade civil, as organizações não-governamentais e as organizações com base na comunidade, na prevenção e na luta contra a corrupção, e para sensibilizar a opinião pública a respeito à existência, às causas e à gravidade da corrupção, assim como a ameaça que esta representa. Essa

Convenção Interamericana contra a CorrupçãoArtigo III Medidas

preventivasPara os fins estabelecidos no artigo II desta Convenção, os Estados Partes convêm em considerar a aplicabilidade de medidas, em seus próprios sistemas institucionais destinadas a criar, manter e fortalecer:11. Mecanismos para estimular a participação da sociedade civil e de organizações não-governamentais nos esforços para prevenir a corrupção.

A participação da sociedade na informação pública deve ser uma constante. Como já mencionado, os meios eletrônicos são aliados imprescindíveis nesse objetivo.

OBS: A implementação deste dispositivo pelo Brasil foi objeto de análise pelo MESICIC (v. nota de rodapé n.° 12, supra), que expediu as seguinte recomendações:“À luz dos comentários formulados nesta seção, a Comissão sugere que o Brasil considere as seguintes recomendações: Considerar a conveniência de integrar e sistematizar em um só diploma normativo as disposições que garantem o acesso à informação pública.Continuar estimulando a utilização dos mecanismos existentes para permitir a consulta dos setores interessados em relação com o

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participação deveria esforçar-se com medidas como as seguintes:a) Aumentar a transparência e promover a contribuição da cidadania aos processos de adoção de decisões;b) Garantir o acesso eficaz do público à informação;c) Realizar atividade de informação pública para fomentar a intransigência à corrupção, assim como programas de educação pública, incluídos programas escolares e universitários;d) Respeitar, promover e proteger a liberdade de buscar, receber, publicar e difundir informação relativa à corrupção. Essa liberdade poderá estar sujeita a certas restrições, que deverão estar expressamente qualificadas pela lei e ser necessárias para: i) Garantir o respeito dos direitos ou da reputação de terceiros; ii) Salvaguardar a segurança nacional, a ordem pública, ou a saúde ou a moral públicas.2. Cada Estado Parte adotará medidas apropriadas para garantir que o público tenha conhecimento dos órgãos pertinentes de luta contra a corrupção mencionados na presente Convenção, e facilitará o acesso a tais órgãos, quando proceder, para a denúncia, inclusive anônima, de quaisquer incidentes que possam ser considerados constitutivos de um delito qualificado de acordo com a presente Convenção.

desenho de políticas públicas e a elaboração de projetos de lei, decretos ou resoluções nos diferentes organismos do Estado”.- Estabelecer mecanismos, adicionais aos já existentes, para fortalecer e estimular a participação da sociedade civil e de organizações não-governamentais na gestão pública, especialmente nos esforços para prevenir a corrupção, e promover o conhecimento dos mecanismos de participação estabelecidos e sua utilização.- Promover, quando aplicável, mecanismos para que os funcionários públicos permitam, facilitem ou ajudem à sociedade civil e às organizações não-governamentais no desenvolvimento de atividades de acompanhamento da gestão pública e prevenção da corrupção.- Desenhar e implementar programas específicos para divulgar amplamente os mecanismos de participação no acompanhamento da gestão pública, e, quando seja apropriado, capacitar e assessorar a sociedade civil e as organizações não governamentais para que possam utilizá-los.- Continuar a ampliar a divulgação de informação oficial através de diversos meios eletrônicos (ver seção 4.2.2 do capítulo II deste relatório)”.

2. Determinações normativas descumpridas - Alternativas concretas.

Com base nas normas existentes (com primazia para as constitucionais, tratados e leis), se invoca as soluções e mecanismos existentes no ordenamento como mandamentais na Administração Pública. Tudo o que será apresentado já era para ser observado pelo INCRA. Vejamos os caminhos em cada etapa do sistema constatado:

1 – SIPRA:

a) Transparência já! Os dados do SIPRA devem sofrer amplo controle pela sociedade, com o que permitiria checar se realmente são aquelas as pessoas assentadas, se há desvios, inclusões sem o perfil devido e todas as mazelas anteriormente apontadas.

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Não há razão para a manutenção da “caixa preta” como é hoje. Seus dados não estão em quaisquer das hipóteses excepcionais de informação, como os casos de segurança de Estado. Os órgãos de persecução poderiam atuar de forma mais eficiente, bastando confrontar os dados existentes em fácil acesso.13

É o que determina, exemplarmente, o Decreto nº 5.482, de 30/6/2005, que dispõe sobre a divulgação de dados e informações pelos órgãos e entidades da administração pública federal, por meio da Internet. Tais dados referem-se à execução orçamentária e financeira, compreendendo, entre outras, matérias relativas a licitações, contratos e convênios (art. 2º do Decreto nº 5.482/2005). Como exemplo, por meio de consulta no www.portaldatransparencia.gov.br, em consulta Aplicações Diretas, é possível detalhar a despesa por ministérios e órgãos do governo podendo-se obter os beneficiários, quer pessoa física ou jurídica, dos recursos públicos gastos pela União. Apenas não são disponibilizadas as informações de caráter sigiloso, conforme definido em legislação específica (art. 4º do Decreto nº 5.482/2005).

O Decreto nº 5.482/2005 é expresso e imperativo:

Art. 2° Os órgãos e entidades da administração pública federal, direta e indireta, deverão manter em seus respectivos sítios eletrônicos, na Rede Mundial de Computadores - Internet, página denominada Transparência Pública, para divulgação, de dados e informações relativas à sua execução orçamentária e financeira, compreendendo, entre outras, matérias relativas a licitações, contratos e convênios.

Não há nenhuma razão para os recursos destinados à reforma agrária não serem divulgados, em toda a sua extensão. Todos os estudos demonstram que a construção de um sistema de informações transparente talvez seja o mais eficaz

13 Um aspecto fundamental da transparência, na medida de situações concretas, foi muito bem apontado pela cientista política Maria Tereza Sadek, uma das maiores estudiosas do sistema judiciário brasileiro, em recente entrevista: “...O que diminui o crime é a certeza da punição. Por isso, o trabalho da PF nos últimos anos tem sido fundamental na história do combate à corrupção. Basta a denúncia e o pavor da possibilidade de ser vigiado e investigado para que o crime seja inibido. O medo da exposição de uma ação da PF é maior ainda para as pessoas públicas. Um empresário só não comete sonegação fiscal se houver o risco de ele ser investigado. Senão, o estímulo é para que ele sonegue. Os prefeitos hoje em dia temem de tal forma o Ministério Público que a probidade administrativa aumentou. Por quê? Eles sabem que, se cometerem desvios, poderão ser denunciados” (Revista Época, n° 513 de 17/03/2008, fl. 81).

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meio de controle e com excepcional relação custo-benefício, entre o investimento inicial e os ganhos de qualidade na gestão e proteção contra desvios.14

A Transparência Pública atual do INCRA é extremamente limitada.

Vale ressaltar que o Tribunal de Contas da União - TCU, no processo 018.741/2005-2 – Plenário, já esposara a manifestação da relatoria na determinação de divulgação na internet, pelo INCRA, até mesmo em questão ambiental:

“41. Ainda quanto a esse item, além do acompanhamento nas contas da entidade, proposto pela unidade técnica, entendo adequado determinar ao Incra que torne públicas em seu sítio da internet as informações relativas a seu programa de regularização ambiental dos assentamentos e os relatórios de acompanhamento de suas metas, encaminhando cópia desse programa à 4ª Secex, a quem caberá, caso constate alguma irregularidade, representar imediatamente”.

Portanto, todos os dados referentes à reforma agrária e os constantes do SIPRA devem ser públicos, com fácil acesso, principalmente pela internet. Como determina o decreto, a qualidade da informação pode – e deve – alcançar outros aspectos, principalmente quando inerentes à situação específica. Vejamos.

14 Em reportagem especial da Revista Época, n° 513 de 17/03/2008, matéria acerca da corrupção brasileira consignou idéia fundamental (fls. 63/64): “A experiência de outros países ensina que um dos caminhos mais eficientes para inibir a corrupção é tornar as ações dos governos mais transparentes. A falta de informações é uma aliada dos corruptos. O segredo, nesse caso, chama-se internet. No Brasil, nos últimos anos, foram desenvolvidos alguns sites que permitem o acompanhamento detalhado de gastos do governo, a conferência de despesas e receitas de campanhas eleitorais e até as declarações de bens de parlamentares eleitos. Os mais conhecidos são o Portal da Transparência, do governo federal, o site do Tribunal Superior Eleitoral e o Projeto Excelências, mantido pela ONG Transparência Brasil. Todos eles contêm informações que, a rigor, são públicas há muitos anos, mas eram inescrutáveis, pois estavam escondidas em cartórios eleitorais ou escaninhos do governo. Transparência tende a inibir os corruptos. Como os dados podem ser rastreados, fica perigoso roubar A idéia por trás do uso da internet como ferramenta de combate à corrupção é permitir que cada cidadão seja um fiscal em potencial. É um entendimento cada vez mais comum em democracias desenvolvidas. Os órgãos de controle não têm condições de olhar tudo. Eles trabalham por amostragem ou a partir das denúncias que recebem. Ao dar transparência total às informações públicas, os sites permitem que qualquer um verifique algo que pareça estranho, a quantidade e a qualidade das denúncias aumenta. A corrupção, conseqüentemente, diminui. Há, ainda, um segundo fator positivo na divulgação de dados públicos na internet: a transparência inibe a iniciativa dos corruptos. Como os dados podem ser rastreados, fica cada vez mais arriscado roubar”.

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b) Qualidade da informação. O sistema de informações dos beneficiários deve tratar cada ser humano como pessoa e não apenas como número. A inclusão apenas de nome, CPF ou RG e no máximo, quando casados, o nome do consorte, se mostrou extremamente insuficiente e não protege adequadamente o sistema.

Basta verificar os casos com duplicidades, ou sem perfil de assentado, com favorecimento de parentes etc.

Se o cadastro fosse alimentado com maior amplitude de dados, nos moldes do que ocorre com sistemas de seguridade, p. ex., um simples cruzamento de dados eliminaria esses desvios.

Portanto, os dados referentes aos beneficiários devem alcançar seus nomes, existência fática, atividades desempenhadas, origens, antecedentes, filiação, parentescos, lotes ocupados, créditos, aquisições, bens, datas, eventos e aptidão para a política de reforma agrária (tudo de acordo com os arts. 17, inciso IV, 19, incisos I a V e seu parágrafo único, 20 integral e parte final c/c 22 da Lei 8.629/1993 e demais condições constantes do contrato de assentamento).

Mas isso ainda é insuficiente. Deverá ficar claro à sociedade os órgãos de imputação para se apurar a responsabilidade. Cada servidor responsável pelas condutas administrativas, como concessão de crédito, cadastros, vistorias etc., deverá ser divulgado na rede. Isso hoje ninguém sabe ao certo, nem mesmo no INCRA.

c) Concentração dos órgãos de imputação. O acesso ao sistema de dados deve ser restrito, focalizado em servidores previamente determinados, com senhas exclusivas e sob sua responsabilidade. Ao permitir o descontrole de acesso, com facilidades promíscuas, a quem responsabilizar em caso de alterações irregulares?

Esse princípio é preceito basilar quando se estuda a formação de um agente público, com seus deveres e garantias inerentes.

No mais, para o caso, vale mencionar que a tutela penal prevê essa proteção:

Inserção de dados falsos em sistema de informações (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)

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Art. 313-A. Inserir ou facilitar, o funcionário autorizado, a inserção de dados falsos, alterar ou excluir indevidamente dados corretos nos sistemas informatizados ou bancos de dados da Administração Pública com o fim de obter vantagem indevida para si ou para outrem ou para causar dano: (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000))

Pena - reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa. (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)

Modificação ou alteração não autorizada de sistema de informações (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)

Art. 313-B. Modificar ou alterar, o funcionário, sistema de informações ou programa de informática sem autorização ou solicitação de autoridade competente: (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)

Pena - detenção, de 3 (três) meses a 2 (dois) anos, e multa. (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)

Parágrafo único. As penas são aumentadas de um terço até a metade se da modificação ou alteração resulta dano para a Administração Pública ou para o administrado.(Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)

Como poderão os órgãos de fiscalização e persecução buscar o responsável e fazer a tutela penal eficaz se a trilha para alcançá-lo é nebulosa?

Vale dizer que há tempos o tipo penal deixou de ser mera proibição e passou a ter igualmente uma natureza mandamental15, ou seja, determina deveres e a organização da sociedade. É uma lei como qualquer outra. Sua influência é ainda maior na organização pública.

Portanto, para fazer a lei citada aplicável, os servidores autorizados com acesso ao SIPRA devem ser previamente determinados, com senhas pessoais e indelegáveis, para a utilização em sistema que controle a data e o horário de seu acesso, com registro das alterações realizadas.

15 Ver substancioso escrito, com inspiração em profunda doutrina, em TAVARES, Juarez. Teoria do Injusto Penal, Del Rey, 2002.

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Do mesmo modo, cada um dos servidores com atividades no procedimento, desde a constatação da demanda inicial, até a fiscalização, devem ser certificados e conhecidos da população.

No Brasil se vive em uma República. No trato da res pública, ninguém deve temer a transparência. Vamos procurá-la...

Vale dizer que sistemas desse feitio são cada vez mais comuns na Administração Pública. O IBAMA, que já enfrentou problema semelhante, ou a Receita Federal, disponibilizaram sistemas com tais características, como exemplo.

2 – APRESENTAÇÃO DA DEMANDA:

a) Confirmação da demanda e pretendentes pelo INCRA. Foi demonstrado que a norma se contenta com a apresentação das demandas e beneficiários de maneira unilateral, por interessado direto, quase sempre um presidente de associação. O INCRA sequer verifica se a necessidade é exatamente aquela ou se os beneficiários são realmente os constantes da relação. Libera recursos sem maiores critérios. No máximo confia no combalido SIPRA.

Portanto, as demandas devem ser constatadas por um agente público, que certifique sua pertinência com a liberação dos recursos, como p. ex., se há condições locais para as construções demandadas, se há projeto e possibilidade de se desenvolver atividades produtivas concretas, além de confirmar os assentados demandantes, de modo a não permitir que outrem desqualificado postule em seu nome.

Isso permitiria o emprego dos recursos apenas em condições próprias para tanto. Ressalte-se que esse proceder evitaria as costumeiras desculpas na região para não se realizar a obra, como o período de chuvas, ou a dificuldade de acesso, ou a perda de mercadoria. Ora, se já sabe que existe uma situação assim, por que contratou?

Vale ressaltar que a própria norma veda a aplicação de recursos onde não há infra-estrutura mínima para receber as prestações (Art. 16 São pré-requisitos para aplicação dos recursos do Programa de Crédito Instalação, além dos específicos para cada modalidade: §1°.Na modalidade Aquisição de Materiais de Construção: IV - haver condições de acesso ao PA que permitam a entrega do material de construção a ser contratado; V - o projeto das moradias estar aprovado pela comunidade, com planta e

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especificações técnicas assinadas por técnico habilitado, prevendo uma área mínima construída de 36 m2, com utilização de materiais usuais em habitações rurais da região, garantia de saneamento básico, além de conforto térmico e respeito às peculiaridades e tradições locais).

Quando isso foi cumprido? De tão óbvia, uma resposta nem precisa ser transcrita...

O próprio Chefe do Setor de Crédito do INCRA/SR-27 reconhece a confessa que não deveria fazer as liberalidades que fazem (fls. 612 - depoimento no Processo n.° 2008.39.01.000075-9):

“Que o acusado alegou que a má aplicação dos recursos decorreu da inexistência de estradas vicinais no interior do projeto de assentamento; Que o depoente não acatava mais tais tipos de alegações e acreditava que os assentados não deveriam receber os recursos, caso não houvesse acesso aos locais onde as moradias seriam construídas ; Que os recursos eram mal geridos pois o INCRA liberava em espécie e não exercia fiscalização sobre os gastos, deixava o Presidente da Associação bem a vontade em relação as despesas que efetuava; Que não sabe se o INCRA adotou alguma medida para obter restituição dos valores”.

Acreditava? Se o próprio Chefe do Setor de Crédito confirma as liberalidades, quem vai acreditar no INCRA?

b) Assine o contrato. Mas recibo, só ao final. Por sua vez, os recibos de créditos são assinados pelos assentados (ou supostamente assentados), quase sempre em datas anteriores ao próprio recebimento. Como se verifica dos inúmeros casos de prestações que realmente não são cumpridas, há na verdade a “quitação do nada”.

Portanto, de modo a garantir a legitimidade e a certificação correta da destinação dos créditos, se faz necessário que o recibo seja assinado apenas quando ele se tornar realidade. É preceito singelo da lei civil. Por exemplo, se foi destinado à construção de moradias, sem que o dinheiro passe pelas mãos dos assentados, que

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se assine o recibo quando as casas forem recebidas. Antes, só se for para camuflar fornecedores inadimplentes...

3 – A CONTRATAÇÃO E O PAGAMENTO DAS PRESTAÇÕES:

a) Contrate apenas pessoas idôneas. Certifique previamente sua aptidão. Como demonstrado, não há qualquer controle sobre aqueles fornecedores e prestadores de serviços que receberão recursos públicos. Também se verificou o quanto isso afronta o ordenamento jurídico vigente.

Qual a dificuldade em se certificar antecipadamente a idoneidade dos prestadores? Os afoitos do INCRA diriam: “mas é difícil fazer tal tarefa, pois demanda tempo...”.

A visão é por demais equivocada. Qual a distinção entre a atividade material da certificação de idoneidade e a identificação posterior que a própria norma manda fazer?

Acaba é se jogando a terceiros a atividade, com uma “pseudo-licitação”, limitada e parcial como visto. Não seria mais fácil usar instrumentos técnicos mais confiáveis? Aliás, como determinam a Constituição e as leis vigentes?

Como será visto a seguir, se cumprida a Constituição com a realização de licitações, mesmo nas modalidades céleres apresentadas a seguir, a questão da habilitação já estaria resolvida. A habilitação lhe é inerente.

Se por qualquer razão impeditiva, extintiva ou modificativa não se aplicar o sistema licitatório, há de se invocar o Decreto n.° 3.722/2001, que instituiu o SICAF - Sistema de Cadastramento Unificado de Fornecedores, instrumento aplicável a aquisições de bens e serviços em geral, inclusive obras, além da comprovação de capacidade técnica para o caso de obras, como as moradias.16 O sistema é informatizado e

16 Art. 1º O Sistema de Cadastramento Unificado de Fornecedores – SICAF constitui o registro cadastral do Poder Executivo Federal, na forma definida neste Decreto, mantido pelos órgãos e entidades que compõem o Sistema de Serviços Gerais - SISG, nos termos do Decreto nº 1.094, de 13 de março de 1994.(Redação dada pelo Decreto nº 4.485, de 2002)

§ 1º A habilitação dos fornecedores em licitação, dispensa, inexigibilidade e nos contratos administrativos pertinentes à aquisição de bens e serviços, inclusive de obras e publicidade, e a alienação e locação poderá ser comprovada por meio de prévia e regular inscrição cadastral no SICAF:(Redação dada pelo Decreto nº 4.485, de 2002)

I - como condição necessária para emissão de nota de empenho, cada administração deverá realizar prévia consulta ao SICAF, para identificar possível proibição de contratar com o Poder Público; e (Incluído pelo Decreto nº 4.485, de 2002)

II - nos casos em que houver necessidade de assinatura do instrumento de contrato, e o proponente homologado não estiver inscrito no SICAF, o seu cadastramento deverá ser feito pela Administração, sem ônus para o proponente, antes da contratação, com base no reexame da documentação apresentada para habilitação, devidamente atualizada.

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célere, com atualização do cadastro. Uma simples consulta seria capaz de espancar diversos percalços hoje verificados.

Vale destacar que o próprio INCRA/SR-27, quando de sua resposta à Recomendação n.° 3/2003, já prometia utilizar o SICAF, diante de sua relutância em licitar (ver Parte 2 desta inicial), sem que isso tenha sido efetivamente realizado.

Portanto, há de se certificar a idoneidade daqueles que perceberão pagamentos com recursos públicos, utilizando-se os modernos mecanismos vigentes, que atualmente compensam inegavelmente as antigas desculpas suscitadas. Se fosse adotado um procedimento licitatório adequado, a questão já estaria implicitamente resolvida. É o que veremos a seguir.

b) Por que não licitar? Pregão. Atividade material célere, baixo custo de realização e resultados reconhecidamente favoráveis. Demais instrumentos.

Foi demonstrado que em princípio não há razões jurídicas substanciais para se afastar a licitação. A questão parece ser mais fática. Tanto que houve época em que o INCRA desempenhava este procedimento, antes mesmo do atual diploma (Lei 8.666/1993). Era um extremo. Com o passar dos anos, a pressão por celeridade na concessão de créditos (sempre os números do governo de momento) se fez chegar ao outro extremo, justamente o atual, que fugiu ao controle.

Uma idéia inicial precisa ser repisada. Como visto, o sistema do INCRA aparentemente promove uma “pseudo-licitação”, na medida em que realiza: a) uma pseudo-habilitação, na medida em que pode vetar fornecedores (art. 22, p. ún.); b) um pseudo-recebimento de propostas, na medida em que pelo menos três ofertas devem ser apresentadas (art. 22, caput); e c) uma pseudo-avaliação das propostas, na medida em após a pesquisa de preços o vencedor será aquele que apresentar o de menor valor (art. 22, caput).

(Incluído pelo Decreto nº 4.485, de 2002)

§ 2º O SICAF deverá conter os registros dos interessados diante da habilitação jurídica, a regularidade fiscal e qualificação econômico-financeira, bem como das sanções aplicadas pela Administração Pública relativas ao impedimento para contratar com o Poder Público, conforme previsto na legislação (Redação dada pelo Decreto nº 4.485, de 2002).

§ 3o Excetuam-se das exigências para habilitação prévia no SICAF as relativas à qualificação técnica da interessada, as quais somente serão demandadas quando a situação o exigir.(Redação dada pelo Decreto nº 4.485, de 2002)

Art. 2o O processamento das informações cadastrais, apresentadas pelos interessados, será realizado por meio da utilização de recursos de tecnologia da informação, para constituição de base de dados permanente e centralizada, que conterá os elementos essenciais previstos na legislação vigente.

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Pergunta-se: qual sua diferença fundamental para um proceder licitatório?

A resposta é simples e foi verificada no decorrer desta petição: a falta de amarras. Mecanismos típicos da licitação não são realizados pelo INCRA., o que permitiu desvios em todas as etapas. Na ponderação entre segurança e celeridade, primou-se ao máximo pela última. O fato de ser extremo já demonstra que não é razoável.

Como sempre, virtus in medio.

Hoje há procedimentos licitatórios que ultrapassam satisfatoriamente muitos dos percalços fáticos existentes, tanto do modelo antigo (falta de celeridade), quanto os maléficos e imorais da atualidade (desvios, pulverização da responsabilidade, ineficiência etc.).

Já se apontou que o Pregão, principalmente em sua modalidade eletrônica (Decreto n.° 5.450/2005), permite melhor adequação do recurso público, economia de gestão e mecanismos de controle mais eficazes, o que é confirmado até mesmo pela sua destinação precípua - para aquisição de bens e serviços comuns (art. 1° da Lei 10.520/2002).

Eventualmente, para casos específicos, como a construção de moradias, em que a economia de escala (compra-se mais com menos) é uma realidade, outras modalidades licitatórias poderiam ser utilizadas, como o convite e a tomada de preços.

Tais procedimentos seriam úteis para evitar as variadas modalidades de desvios que o sistema atual permite (v. item 1.3 da Primeira Parte). O mecanismo a seguir os tornaria mais céleres.

c) Por que pagar mais? Registro de preços. Mecanismo legalmente previsto para evitar o sobrefaturamento de preços.17 Já se apresentou que a todo momento há casos de vantagens indevidas, motivadas por ganhos dos fornecedores facilmente predestinados. Como conseguem dividir seus ganhos? Várias formas foram constatadas anteriormente. Mas a principal resposta é fácil: sobrefaturamento.

17 “O Sistema de Registro de Preços (SRP) é uma das mais úteis e interessantes alternativas de gestão de contratações colocada à disposição da Administração Pública. As vantagens propiciadas pelo SRP até autorizam a interpretação de que sua instituição é obrigatória por todos os entes administrativos, não se tratando de uma mera escolha discricionária.” - JUSTEN FILHO, Marçal, Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos, 11ª Ed., Dialética, 2005, p. 144.

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Um mecanismo normativo, criado para auxiliar nesse controle, mas quase sempre ignorado (por vezes “esquecido”) é o Sistema de Registro de Preços, regulamentado pelo Decreto n.° 3.931/200118. Vejamos sua aplicabilidade:

Art. 1º As contratações de serviços e a aquisição de bens, quando

efetuadas pelo Sistema de Registro de Preços, no âmbito da

Administração Federal direta, autárquica e fundacional, fundos

especiais, empresas públicas, sociedades de economia mista e

demais entidades controladas, direta ou indiretamente pela União,

obedecerão ao disposto neste Decreto (Redação dada pelo Decreto nº

4.342, de 23.8.2002).

Art. 2º Será adotado, preferencialmente, o SRP nas seguintes

hipóteses:

III - quando for conveniente a aquisição de bens ou a contratação de

serviços para atendimento a mais de um órgão ou entidade, ou a

programas de governo.

Art. 3º § 2º Caberá ao órgão gerenciador a prática de todos os atos de

controle e administração do SRP, e ainda o seguinte:

IV - realizar a necessária pesquisa de mercado com vistas à

identificação dos valores a serem licitados.

O Sistema de Registro de Preços auxilia muito na celeridade e otimização dos gastos.19 Nada impede – ao contrário, se incentiva – sua aplicação no programa de reforma agrária.

Por sua vez, de modo a proteger a melhor utilização dos recursos, há de se invocar os instrumentos de pesquisa de preços oficiais existentes, como os realizados pelo IBGE20 em convênio com a Caixa Econômica Federal21, adotado pelo

18 Base normativa no art. 15 da Lei n.° 8.666/1993, acerca das aquisições com recursos públicos, em qualquer caso, com ou sem licitação: Art. 15. As compras, sempre que possível, deverão: II - ser processadas através de sistema de registro de preços; § 1o O registro de preços será precedido de ampla pesquisa de mercado. § 2o Os preços registrados serão publicados trimestralmente para orientação da Administração, na imprensa oficial. 19 Marçal Justen Filho resume muito bem as vantagens do sistema: “A primeira grande vantagem do sistema de registro de preços reside na supressão da multiplicidade de licitações contínuas e seguidas, versando sobre objetos semelhantes e homogêneos (...) A Administração elimina a burocracia, os custos e os desgastes referentes a uma grande quantidade de licitações (...) A segunda vantagem reside na rapidez da contratação, relativamente à gestão dos recursos financeiros”, op. cit., fl. 145.20 Sistema Nacional de Pesquisa de Custos e Índices da Construção Civil – periodicidade mensal, INPC e outros. 21P. ex. o SINAPI – Sistema Nacional de Pesquisa de Custos e Índices da Construção Civil.

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próprio INCRA para suas aquisições,22 mas que não se sabe a razão para a SR-27 não utilizar, ou ainda o utilizado pelo TCU, CGU ou demais órgãos de controle.23

Portanto, de modo a melhorar a aplicação de recursos e minimizar os sobrefaturamentos, que se aplique o determinado por lei, com o Sistema de Registro de Preços e constante auxílio das pesquisas de preços oficiais.

d) Pagamento? Somente após constatação local e integral prestação ou realização das obras. Já se demonstrou que o INCRA insistentemente realiza os pagamentos antes da entrega de mercadorias ou prestação efetiva das obras. Basta verificar os casos de moradias não construídas, apesar do pagamento já realizado.

Isso é violação frontal até mesmo às normas de direito financeiro. É vedado o pagamento antes da liqüidação, que consiste na verificação da prestação efetivada e confirmação de valores.24

Portanto, os pagamentos somente devem ser realizados após a confirmação real e efetiva do cumprimento, como determinado por lei, plenamente constatado pelo servidor responsável pela fiscalização. Mais uma vez, se o sistema licitatório fosse adotado, tal providência já lhe seria inerente.

4 – AS ASSOCIAÇÕES E O CONTROLE:

a) Associe-se como quiser. Mas para receber recursos não é obrigatório se associar. Como visto não há um controle sobre as associações constituídas em cada projeto de assentamento. Elas são inúmeras, criadas ao alvedrio dos assentados, sem qualquer fiscalização. Como já explicado (item 1.4 – Primeira Parte), são mais um exemplo do fenômeno sócio-político, conhecido como “espaço público invisível”.

22 http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/indicadores/precos/sinapi/default.shtm, p. 8 do relatório de abril de 2008.23 A União mantém sistema de controle de preços de construções eficiente, do Ministério da Fazenda, aplicável a toda a administração pública brasileira no sistema comprasnet (www.comprasnet.gov.br).24 Lei 4.320/1964, Art. 62. O pagamento da despesa só será efetuado quando ordenado após sua regular liquidação. Art. 63. A liquidação da despesa consiste na verificação do direito adquirido pelo credor tendo por base os títulos e documentos comprobatórios do respectivo crédito. § 1° Essa verificação tem por fim apurar: I - a origem e o objeto do que se deve pagar; II - a importância exata a pagar; III - a quem se deve pagar a importância, para extinguir a obrigação. § 2º A liquidação da despesa por fornecimentos feitos ou serviços prestados terá por base: I - o contrato, ajuste ou acôrdo respectivo; II - a nota de empenho; III - os comprovantes da entrega de material ou da prestação efetiva do serviço.

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A existência de inúmeras estruturas associativas apenas dificulta a fiscalização e sua proliferação não traz qualquer ganho na aplicação dos créditos. É apenas mais uma intermediário entre os recursos liberados pelo INCRA e seus destinatários, que são os assentados. Além de criar feudos e todos os problemas exaustivamente demonstrados, apenas aumenta gastos com um novo corpo burocrático falível.

A Constituição da República permite o livre associativismo. Porém, a livre associação não significa que qualquer delas esteja apta a receber recursos públicos.

Um raciocínio que parece ser esquecido é que os signatários dos créditos são as pessoas, individualidades assentadas. Por isso cada um deles assina um contrato. Não são as associações, cooperativas ou quejandos. O mecanismo do INCRA de contato com entidades representativas foi motivada por sua dificuldade em tratar as individualidades e se tornou um cancro de politicagem.

No entanto, essa dificuldade é própria do sistema canhestro que realizou. Se o sistema fosse controlado, com certificação das famílias alcançadas e seus membros deixassem de ser meros números, para serem tratados como pessoas, o INCRA não os obrigaria a se associar para receber suas prestações, como de fato faz.25

O sistema controlado de licitação, como apontado acima, se levado a contento dispensaria essa figura esdrúxula de obrigar as pessoas a se associar para receber seus créditos, contratados individualmente. Isso nada tem a ver com a utilização coletiva dos recursos. As contratações promovidas pelo INCRA são para cada projeto de assentamento, assim como a infra-estrutura mínima exigida pelas normas, porém jamais vista na região. A contratação para o assentamento permitiria comprar mais por menos (v. adiante – eficiência), sem intermediários, como é próprio de uma estrutura associativista (ver casos de remuneração dos presidentes) e que somente serve para pulverizar responsabilidade e encobrir falcatruas. Após o recebimento confirmado, cada beneficiário daria quitação.

Portanto, a aquisição dos produtos e serviços do assentamento independe da formação de associações. Estas podem existir e devem ser incentivadas como auxiliares na fiscalização; mas não como gestoras de recursos públicos.

25 CRFB/1988, art. 5°, XX - ninguém poderá ser compelido a associar-se ou a permanecer associado.

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Subsidiariamente, se alguma causa impeditiva, suspensiva ou modificativa (originária ou superveniente) demonstrasse que a representação obrigatória por associações é algo razoável, de duas uma: ou o INCRA limita aquela que representará o assentamento; ou há de se aumentar a capacidade do INCRA exercer sua função fiscalizadora, o que demandará novos servidores, necessariamente, para acompanhar o elevado número de entidades gestoras criadas.

b) “CONTROLE DE ESCRITÓRIO” NUNCA MAIS. Como será abordado adiante, o princípio da precaução não é mero mandamento ambiental, mas da Administração Pública em todas as suas funções. Cuidado, previdência, apreço pela coisa pública. Tudo o que não foi visto até hoje pelo INCRA/SR-27.

Se não fiscaliza, controla e exerce a aplicação consoante sua própria norma, como amplamente reconhecido e confessado a todo momento pelos administradores de TODAS as esferas na SR-27, por que insistir em liberar recursos?

A única explicação é o que já se abordou: a criação de números. Da forma como vem ocorrendo nos últimos anos, isso é claro. A motivação: irresponsabilidade. É improbidade pura em seu esplendor deletério.

Diante desse quadro, o que fazer?

As medidas anteriores auxiliariam bastante nesse objetivo. Concentrariam os responsáveis, que teriam suas identificações públicas; permitiria a participação de fornecedores previamente certificados; evitaria preços abusivos etc.

No entanto, o acompanhamento e a confirmação, real e concreta dos resultados, devem ser realizadas para certificar a correta utilização dos recursos. Liberação irresponsável não mais.

Portanto, de duas uma: ou o INCRA diminui a liberação de recursos ao montante que consegue controlar, ou disponibiliza condições materiais proporcionais e suficientes para uma regular atuação.

5 – EFICIÊNCIA E A BOA UTILIZAÇÃO DOS RECURSOS PÚBLICOS COM RESPONSABILIDADE – DANOS MORAIS DIFUSOS E EFETIVIDADE AO PRINCÍPIO DA MORALIDADE:

Uma outra razão fortalece a permissibilidade com que muitos assentados, como visto, se deixam levar pelo sistema, seja com o pagamento de comissões,

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desvios e demais sintomas. Como não precisam prestar contas do que fazem, o dinheiro não é cobrado e sobre eles não há metas a seguir, não há responsabilidade na utilização idônea dos recursos. Isso apesar da Constituição determinar que quem recebe recursos públicos, de qualquer natureza, deve prestar contas (art. 70, parágrafo único).

Como visto, créditos devem ser cobrados. Ao saber que serão cobrados pelo recebido, a preocupação com o desempenho dos recursos aumenta, pois terão de fazer o crédito produzir efeitos. É o instrumento para liberar-se da obrigação e intenção da natureza creditícia pública. Basta lembrar a teoria das obrigações.

Portanto, o INCRA deverá cobrar os créditos empregados. As condições normativas existentes são bem razoáveis. Prazo de 20 anos, com três anos iniciais de carência, aplicando-se a correção, taxas anuais e juros de acordo com as previsões.

Com a idéia de que ao INCRA não é permitido dispor livremente de recursos públicos, a cobrança deve alcançar todos os créditos já aplicados e futuros.

Indiretamente será uma forma de se constatar o quanto o método de reforma agrária empregado pelo INCRA é eficaz. A sociedade saberá se aos assentados que recebem recursos, há prazo considerável, foi possível alcançar melhoria de vida e capacidade de se sustentar, sem precisar drenar indefinidamente as fontes estatais.

É importante frisar: o que se questiona não é a finalidade da reforma agrária, mas como ela é conduzida pelo INCRA.

Portanto, há de se recuperar e cobrar os créditos públicos empregados.

Como demonstrado, todas as violações, comissivas e omissivas do INCRA, acarretam violações à moralidade, o que alcança inegavelmente a sociedade, que não suporta uma entidade pública como nascedouro das mais diversas aberrações com a coisa pública. Se nada for alterado, com medidas compensatórias como demonstrado nesta demanda, a sociedade deverá ser indenizada pelos danos morais difusos inegavelmente provocados.26

26 Inciso V do art. 1º da Lei n° 7.347/85.

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4. Técnica de decisão – Nulidade, interpretação conforme ou a declaração parcial de nulidade (inconstitucionalidade ou ilegal idade) sem redução de texto.

Ao juízo, de acordo com seu livre convencimento, se abrem diversas técnicas decisórias adequadas à situação. Seguem algumas alternativas, dentre outras possibilidades existentes: 1 – Diante de todas as violações às normas Constitucionais (principiológicas ou não) e legais, a norma infralegal é insubsistente, o que determina sua nulidade ou anulação (para aqueles que a admitem em sede de Direito Administrativo). Por ser norma infralegal, nada há que impossibilite essa apreciação incidentalmente pelo juízo, ou mesmo de forma principal; 2 – Interpretação conforme a Constituição e as leis, na medida em que a aplicação da norma infralegal deverá se ater aos preceitos legais e constitucionais, como demonstrado nesta demanda; ou 3 – Declaração parcial de nulidade (inconstitucionalidade ou ilegalidade) sem redução de texto, tendo em vista que como demonstrado, sua aplicação é difícil ou mesmo impossível faticamente, diante das condições existentes na realidade do sul e sudeste do Pará com o INCRA/SR-27.

De modo a evitar controvérsias, o juízo é livre para realizar ou não tais considerações, caso ache necessário, realizadas incidentalmente.

5. Da inversão do ônus probatório.

Além da prova documental já produzida, o Ministério Público Federal, no intuito de demonstrar a veracidade dos fatos apontados, protesta por todos os meios de prova admitidos, especialmente por depoimento pessoal, prova testemunhal, pericial e documental.

Com base na documentação juntada, que no mínimo confere às alegações a qualidade da verossimilhança, é aplicável conforme o art. 6º, VIII da Lei 8.078 (Código de Defesa do Consumidor), a inversão do ônus da prova. Embora não se trate de demanda referente a matéria consumerista, é de se ressaltar que o art. 21 da Lei 7.347 (Lei da Ação Civil Pública) determina que a todas as ações civis públicas sejam aplicadas as regras processuais trazidas pelo CDC, pelo que se requer a inversão do ônus da prova.

6. TUTELA CAUTELAR DE URGÊNCIA - técnica inibitória – o perigo na demora - tutela l iminar requerida.

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À unanimidade, a doutrina tem salientado que a partir da Constituição de 1988, o Estado brasileiro assumiu o dever de assegurar, de forma efetiva, os direitos. Daí porque o princípio da inafastabilidade da Jurisdição (art. 5o, XXXV) já não pode ser compreendido apenas como garantia do acesso à justiça, com o conseqüente direito à sentença.27

A garantia da tutela jurisdicional contra a ameaça a direito é, pois, o fundamento da tutela preventiva no direito brasileiro. Diante do texto constitucional, o jurisdicionado já não precisa estar na iminência de sofrer um dano para buscar proteção judicial, podendo fazê-lo com vistas a impedir ou afastar a própria contrariedade ao direito, independentemente da possibilidade de vir a sofrer prejuízo.

Consoante ensina Marinoni, “quando se pensa em tutela inibitória, imagina-se uma tutela que tem por fim impedir a prática, a continuação ou a repetição do ilícito, e não uma tutela dirigida à reparação do dano” (Tutela Inibitória, RT, 1998, p. 26).

Marinoni distingue as categorias do ilícito e do dano, afirmando ser o dano algo absolutamente acidental na vida do ilícito, o que, em outras palavras, significa que o ato ilícito pode ou não provocar um dano. De um modo ou de outro, o certo é que hoje, à vista do art. 5o, XXXV, da Constituição e do art. 461 do CPC, todo cidadão dispõe de proteção jurisdicional preventiva contra o próprio ilícito – haja ou não dano.

Nesse contexto, considerando a natureza eminentemente preventiva da tutela inibitória, naturalmente que sua efetividade dependerá quase sempre da possibilidade de sua antecipação. Pensar, pois, em tutela inibitória é pensar em antecipação dos efeitos da tutela. Inequívoca, no caso, a presença dos elementos autorizadores da tutela inibitória antecipada.

De se ver que a jurisprudência pátria tem adotado a teoria da tutela inibitória em seus julgados. Veja-se, a propósito, a seguinte decisão do TRF da 1ª Região, em caso que envolve o INCRA, verbis:

27 Nas palavras de Marinoni, “não há dúvida de que o direito de acesso à justiça, assegurado pela nossa Constituição Federal, garante o direito à adequada tutela jurisdicional e, por conseqüência, o direito à tutela preventiva. (...) Admitida a existência de um direito constitucional à tutela preventiva, fica o legislador infraconstitucional obrigado a estabelecer os instrumentos adequados para garanti-la, sob pena de descumprir o preceito constitucional consagrador do direito de acesso à justiça” (Tutela Inibitória, RT, 1998, p. 66/67).

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“Havendo dúvida fundada a respeito dos elementos com os

quais lidou o INCRA na vistoria administrativa - erro na

contagem dos animais -, não merece censura a decisão do juiz

que, em tutela inibitória, suspende os trabalhos

administrativos, para o esclarecimento da situação” (AG

2003.01.00.007549-8 /BA, rel. Desembargador Olindo

Menezes, DJ em 12.03.2004).

Fato é que a “fumaça do bom direito” (fumus boni iuris) está demonstrada com os elementos anteriormente apresentados. O conjunto de falhas identificadas e as inconsistências do sistema de gestão verificados, que por si já afrontam o ordenamento jurídico abstratamente, foram cabalmente demonstrados na realidade fática.

Mas apesar de não ser exigência típica das tutelas inibitórias, sendo inerente à sua natureza, o Ministério Público Federal demonstrará que inegavelmente ainda se corre o risco na demora caso a tutela liminar não seja concedida.

6.1 O perigo na demora e o princípio da precaução.

Alguns elementos demonstram o risco de se manter as coisas como estão. Há de se ter precaução, que ao contrário do que geralmente se pensa, não é apenas um princípio típico de direito ambiental, mas de toda a Administração Pública.28

Nas palavras do Prof. JUAREZ FREITAS:

“De fato, em matéria ambiental (mas não só), o princípio da

precaução, dotado de eficácia direta, impõe ao Estado

Democrático um conjunto de diligências não-tergiversáveis, ou

seja, a obrigação de salvaguardar o direito fundamental ao

meio ambiente sadio, com a adoção de medidas

antecipatórias e proporcionais, ainda nos casos de

incerteza quanto à produção de danos fundadamente

temidos (juízo de verossimilhança).

A não-observância desse dever – pelo Estado – configura

omissão antijurídica, a qual, à semelhança do que sucede

28 V. FREITAS, Juarez, in “O Princípio Constitucional da Precaução e o Dever Estatal de Evitar Danos Juridicamente Injustos”.

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com a ausência da prevenção exigível, tem o condão de gerar

dano (material e/ou moral) injusto e, portanto, indenizável.

(...)

Dito às claras, presentes os requisitos, o Estado

Democrático tem o dever incontornável de agir

preventivamente.

Naturalmente, a certeza resulta condicionada e limitada pelos

conhecimentos dominantes na época da decisão, de sorte a

não se pretender uma certeza apodíctica ou mecânica.

Como quer que seja, se houver certeza suficiente de que

determinado prejuízo acontecerá, a rede de causalidade

precisa ser tempestivamente interrompida”.29

Percebe-se que os fatos apresentados nesta demanda vão além da própria precaução e alcançam até mesmo o conceito de prevenção, algo mais contundente, tendo em vista que os fatores em torno do risco não são meras possibilidades, mas elementos plenamente conhecidos e comprovados.30

No caso, apesar da tutela inibitória dispensá-los, como reforço do requerido ainda configuram como elementos do perigo:

1) Foi constatado que os recursos são liberados de forma temerária. Se isso está demonstrado, é razoável se permitir sua liberação antes que se promova mecanismos de controle?

Se já se sabe que os mecanismos são falhos, o que permitiria o escoamento de recursos sem retorno previsto, reforçado até pela ausência de cobranças, permitir que sejam liberados significa chancelar o temerário e consentir com a malversação, verdadeiro salvo-conduto;

29 Op. Cit. fls. 2 e 3.30 “Em outras palavras, na prevenção, antevê-se, com segurança, o resultado maléfico e, correspondentemente, nos limites das atribuições normativas, surge a obrigação de o Estado tomar as medidas interruptivas da rede causal, de molde a evitar o dano antevisto. Para ilustrar, trata-se de iniludível dever de prevenção (não de precaução) o combate a futuros danos trazidos pela prática do tabagismo em lugares como cafés e aviões, uma vez que tais malefícios são sobejamente conhecidos. Não se mostra remotamente plausível a argumentação contrária, salvo por arte do sofisma. Viável, assim, a outorga da tutela judicial específica para que o Poder Público tome as providências obrigatórias de caráter preventivo” (Op. Cit. fls. 4).

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2) Foi demonstrado que são milhões de reais liberados todos os anos. Na segunda parte foi demonstrado que nos últimos anos os recursos são crescentes. Mas pelo menos um dado causa estranheza.

Vale ressaltar que como ocorrera em 2007, em que nenhum assentamento fora criado, neste igualmente não há tal previsão, assim como possivelmente nos vindouros. Até mesmo em razão da estatística judicial em Marabá: o número de ações de desapropriação ajuizadas em 2007 caiu vertiginosamente em comparação com os anos anteriores (fls. 262/265), e não se tem notícia de regularização fundiária suficiente, nem mesmo a delimitação em terras da União para outros projetos.

Isso somado ao fato notório (art. 334, I do CPC) , como este juízo constata, que os pagamentos dos valores devidos em razão das desapropriações anteriores geralmente não são realizados corretamente, como ocorre com os TDAs (v. fls. 618/619), reclama outra indagação: por que então aumentar os recursos para créditos se as áreas para criação de assentamentos diminuem e demandas desapropriatórias estão a desejar por recursos?

É perceptível que os créditos são continuadamente demandados pelas sanguessugas do fundo perdido. Muitos assentamentos e alguns movimentos sociais hoje, infelizmente, se tornaram verdadeiros mercados. Como visto, é um mecanismo que atende ao julgo da massa, infelizmente reduzida aos gestores dos feudos.

Mas ainda resta um dado fundamental, a confirmar o desvirtuamento que se demonstrou.

3) No Termo de Declaração n° 2008000521, o declarante FAUSTO DA CONCEIÇÃO relatou que um servidor do INCRA, responsável pelo setor de crédito, acompanhado de pré-candidato à vereador pelo Município de Parauapebas, que também é Secretário de Agricultura (Produção Rural) do mesmo Município, foi ao PA Rio Branco apenas realizar campanha antecipada para esse candidato. Em seu depoimento (fls. 550/551):

“No dia 03/03/2008, o servidor do INCRA Ápio foi até o PA,

levando junto um candidato à vereador pelo Município de

Parauapebas, José Alves, que também é Secretário de

Agricultura de Parauapebas. Nessa oportunidade o servidor do

INCRA foram até o PA só para fazer campanha para esse

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candidato, deixando pessoas que se deslocaram de longe

sem terem suas dúvidas elucidadas. Algumas pessoas que

estavam acompanhando o sr. José Alves afirmaram que

ele era candidato à vereador” - sic.

É um dado fundamental que levanta a imediata conclusão de como o INCRA se utiliza dos créditos como instrumento de política partidária. Mas não por acaso. Segue um teste: acesse o sítio do Município de Parauapebas na internet (http://www.parauapebas.pa.gov.br/portalpmp/index.php). Ver cópias do sítio nas fls. 613/615. Com base na imagem inicial, caso fosse um sítio de partido político, qual seria este?

A confirmação: o atual prefeito é filiado ao Partido dos Trabalhadores – PT e os elementos já demonstram a utilização eleitoreira dos instrumentos do INCRA pelo titular da Secretaria Municipal de Produção Rural, igualmente filiado ao mesmo partido (ver documentos em fls. 616/17). É o mesmo partido que precipuamente ocupa a governança atual da União, que por sua vez indica os cargos comissionados no Instituto. Coincidência? A precaução administrativa faz ponderar pela negativa.

Já nas peças de informação n° 1.23.001.001.000010/2008-41, consta documento (fl. 556) em que o Vice-Presidente da Associação dos Produtores Rurais do PA Água Fria noticia, ainda em dezembro de 2007, além de irregularidades na gestão dos recursos, a utilização política destes pelo seu presidente, Sr. Galdino Aguiar Sampaio:

“Vale ainda ressaltar que o Presidente em questão esta usando

desses recursos para promover sua política partidária, pois é

do conhecimento público que o mesmo pretende ser

candidato nas eleições do próximo ano” - sic.

Definitivamente, a utilização política dos recursos do INCRA, em suas mais variadas espécies, é uma constante natural ao INCRA/SR-27. Ver trecho do seguinte comunicado, no final de 2007, realizado por uma associação ao Superintendente Regional (fls. 563):

“Comunicamos a V. Sa, em forma de denúncia, que o Sr. CARLOS

JACARÉ, funcionário desta instituição, vem agindo de forma arbitrária,

em relação a esta associação, numa tentativa de desmobilização dos

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nossos acampados, inclusive usando as cestas básicas do governo

federal, para fins políticos...”.

Isso tudo ocorre porque a facilidade de liberação de créditos e o poder político dele decorrente é moeda de troca em qualquer rincão da região. Os senhores feudais - presidentes de associação – e agentes públicos misturam, mais uma vez, o público e o privado. Na administração do INCRA não é algo inédito a ascensão política pós-gestão. Em síntese, se trata de típico caso de abuso do poder político e econômico, vedado com todas as forças pela Constituição da República e legislação vigente.31

Enfim, a situação chega a ser fato notório na região. Em manifestação recente (meados de maio de 2008), o próprio chefe do setor de crédito do INCRA/SR-27, em tom de desabafo, ressalta seu temor e preocupação com a situação calamitosa a que se chegou neste ano eleitoral. Vale a leitura integral do documento, em que confessa as violações apresentadas nesta demanda. No documento, após destacar que no setor de crédito instalação é constante a sujeição a diversas pressões, clama ao Superintendente Regional (fl. 341) que dê condições para o setor funcionar:

“Diante do exposto, solicitamos dessa Superintendência, que nos

proporcione o amparo necessário, seja de estrutura, de pessoal,

jurídico ou mesmo político, para que possamos cumprir na íntegra o

que prevê a Norma de Execução 67/2007, em especial os artigos 22,

24 e 25, sem que haja interferência, coação ou pressão externa e

interna de pessoas ou entidades com interesses políticos e/ou

financeiros”.

Enfim, tudo faz parecer inegável a utilização política do programa de reforma agrária pelo INCRA/SR-27. Não por acaso se tem notícia de anteriores gestores do INCRA que realizaram ascensão social ou política.

Portanto, pelo somatório de razões apresentadas, com a consideração de se encontrar em ano eleitoral municipal, e ressaltando se tratar de medidas cautelares e inibitórias, requer o Ministério Público Federal a concessão liminar da tutela, consoante os pedidos a seguir aduzidos.

7. DOS REQUERIMENTOS E PEDIDOS

31 CRFB/1988, art. 14, parágrafo 9° e LC n.° 64/1990, art. 1°, I, d).

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Posto isso, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL requer e pede:

1) a notificação do INCRA, na pessoa de seus representantes legais, para pronunciar-se nos termos do artigo 2°, da Lei nº 8.437/92, sobre os seguintes pedidos de tutela li-minar:a) a suspensão liminar da liberação de créditos instalação pelo INCRA/SR-27, em todas as suas modalidades, esteja ou não empenhado ou depositado em contas bancárias, até o julgamento definitivo do mérito; subsidiariamente, no mínimo, seja suspenso nas mesmas condições até o encerramento das eleições municipais em 2008; eb) caso não atendido o pedido liminar principal anterior, ou ultrapassado o prazo concedido ao pleito subsidiário, que o INCRA/SR-27 seja compelido, até o julgamento definitivo do mérito:1 – a permitir o acesso ao SIPRA, ou a sistema que o venha substituir, ape-nas a servidores previamente delimitados e certificados, com senhas pesso-ais indelegáveis;2 - a constatar, certificar e condicionar, através de agente público, as de-mandas de créditos, quanto ao projeto prévio necessário, condições locais para a sua instalação, possibilidades existentes para sua implantação, exis-tência de infra-estrutura mínima e demandantes atuais; 3 – a utilizar, para a admissão de fornecedores, do sistema SICAF ou outro que o venha substituir; e4 - a realizar pagamentos somente após a confirmação real e efetiva do cumprimento, plenamente constatado pelo servidor responsável pela fisca-lização.

2) após o recebimento da presente petição inicial, a CITAÇÃO do requerido, para mani-festar resposta no prazo legal;

3) a produção de todas as provas admitidas, em especial o depoimento pessoal do réu, através de seus agentes responsáveis, a oitiva de testemunhas, eventual prova peri-cial, juntada de documentos, eventual inspeção judicial, além de outras que se mos-trarem necessárias após o transcurso do prazo de resposta. Ressalta que todos os documentos e depoimentos transcritos nesta inicial foram trazidos em anexo e quais-quer elementos dos processos, peças, inquéritos e procedimentos mencionados são públicos e plenamente disponíveis, podendo ser acessados por quaisquer das partes ou se assim este juízo eventualmente requisitar. Requer a inversão do ônus pro-

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batório, nos termos do art. 6°, da Lei 8.078/90 c/c o art. 21 da Lei 7.347/1985;

4) a condenação, em definitivo, do INCRA:

Pedidos Principais:

1) a permitir o acesso ao SIPRA, ou a sistema que o venha substituir, ape-nas a servidores previamente delimitados e certificados, com senhas pes-soais indelegáveis, com mecanismos de registros eletrônicos para data, hora, certificação de introdução, modificação ou supressão de informa-ções, além do responsável pelos atos, o que pode tomar por base os mo-delos existentes em outras instituições ou órgãos públicos; 2) a realizar cadastro e o recadastramento no SIPRA, ou em sistema que o venha substituir, de informações certificadas faticamente a respeito dos créditos concedidos, o que alcança os nomes dos assentados, atuais e fu-turos, sua existência fática, atividades desempenhadas, origens, antece-dentes, filiação, parentescos, lotes ocupados, créditos, aquisições, bens, datas, eventos e aptidão para a política de reforma agrária, a ser realiza-do por servidores identificados, responsáveis pela verificação da realida-de no local;3) certificar a cadastrar cada agente responsável pelos atos do procedi-mento de liberação de crédito, em sua totalidade, desde a certificação de assentados, verificação da demanda, confirmação dos demandantes e be-neficiários, controle, fiscalizações incidentais e até a fiscalização final rea-lizada; 4) a constatar, certificar e condicionar, através de agente público, as de-mandas de créditos, quanto ao projeto prévio necessário, condições locais para a sua instalação, possibilidades existentes para sua implantação, existência de infra-estrutura mínima e demandantes atuais;5) a publicar permanentemente em seu sítio na internet, em sua integrali-dade, todos os dados e informações constantes dos pedidos 1), 2) e 3) an-teriores;6) a exigir o preenchimento de recibos apenas quando as prestações ma-teriais obtidas através dos créditos forem efetivamente cumpridas;

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7) a utilizar em qualquer hipótese, tanto atual ou futura, além dos meca-nismos de habilitação caso realizada licitação, o SICAF ou outro sistema que o venha substituir; 8) a licitar as prestações a serem adquiridas com os créditos instalação, com a utilização da modalidade pregão, sempre que possível, ou com a tomada de preços, convite, ou outra modalidade quando justificadamente a primeira estiver impossibilitada; 9) a realizar, para aceitar as prestações de fornecedores de bens, merca-dorias e serviços, a utilização do Sistema de Registro de Preços, ou outro sistema que o venha substituir;10) a utilizar, para aceitar as prestações de fornecedores de bens, merca-dorias e serviços, as pesquisas de preços oficiais, dentre aquelas utiliza-das adequadamente pelos órgãos públicos; 11) a realizar as contratações das prestações englobando cada assenta-mento, sem a intermediação de associações, com aproveitamento dos re-cursos globais para obter maior eficiência nas aquisições;12) a realizar pagamentos somente após a confirmação real e efetiva do cumprimento, plenamente constatado pelo servidor responsável pela fis-calização;13) a realizar as funções de gestão, procedimento e fiscalização de crédi-tos por técnicos capacitados;14) pedidos alternativos (art. 288 do CPC): i - ou o INCRA libera recursos no montante que consegue controlar e fiscalizar, material e efetivamente (art. 286, III do CPC); ou ii – disponibiliza condições materiais proporcio-nais e servidores suficientes para controlar e fiscalizar, material e efetiva-mente, todo o procedimento de liberação de recursos em todas as suas etapas (art. 286, III do CPC); 15) a cobrar os créditos instalação, já aplicados e futuros, com as implica-ções legais aos inadimplentes, condicionando a liberação de novos recur-sos a esta cobrança, de modo a evitar o emprego indefinido e ilimitado de recursos públicos;16) que o INCRA forneça e mantenha servidores ao INCRA/SR-27 em nú-mero diretamente proporcional ao demandado para a correta operação dos créditos instalação (art. 286, III do CPC).

Pedidos subsidiários (art. 289 do CPC) aos pedidos anteriores (correspon-dência respectiva aos números de cada pedido principal):

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11-b) subsidiariamente, segue um pedido alternativo (art. 288 do CPC): i – ou que limite a associação que representará o assentamento; ou ii – que o INCRA forneça número de servidores diretamente proporcional ao número de entidades representativas (art. 286, III do CPC);15-b) subsidiariamente, a cobrar os créditos instalação, já aplicados e fu-turos, com as implicações legais aos inadimplentes;- A todos os pedidos anteriores (principais e subsidiários) – subsidiaria-mente, a condenação do INCRA por DANOS MORAIS DIFUSOS e COLETI-VOS, em valor a ser arbitrado pelo juízo, revertendo-se o montante ao Fundo de Defesa de Direitos Difusos (art. 13 da Lei nº 7.347/85, art. 1° § 2° da Lei n° 9.008/95).

5) a dispensa do pagamento das custas, emolumentos e outros encargos, em vista do disposto no artigo 18, da Lei n° 7.347/85;

Determina-se o valor da causa no montante de R$ 1.000.000,00.

Marabá - PA, 02 de junho de 2008.

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