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MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO CAMPUS UNIVERSITÁRIO DE RONDONÓPOLIS PROGRAMA DE PÓS GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO MESTRADO EM EDUCAÇÃO MÁRCIA ORMONDE PORTELA DOS SANTOS ALFABETIZAÇÃO E GÊNEROS TEXTUAIS: UMA ANÁLISE DAS PRÁTICAS DOCENTES NO ÂMBITO DO PRÓ-LETRAMENTO DE MATO GROSSO Rondonópolis - MT 2013

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MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO

UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO

CAMPUS UNIVERSITÁRIO DE RONDONÓPOLIS

PROGRAMA DE PÓS GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

MESTRADO EM EDUCAÇÃO

MÁRCIA ORMONDE PORTELA DOS SANTOS

ALFABETIZAÇÃO E GÊNEROS TEXTUAIS: UMA ANÁLISE DAS PRÁTICAS

DOCENTES NO ÂMBITO DO PRÓ-LETRAMENTO DE MATO GROSSO

Rondonópolis - MT

2013

MÁRCIA ORMONDE PORTELA DOS SANTOS

ALFABETIZAÇÃO E GÊNEROS TEXTUAIS: UMA ANÁLISE DAS PRÁTICAS

DOCENTES NO ÂMBITO DO PRÓ-LETRAMENTO DE MATO GROSSO

Dissertação apresentada ao programa de Pós-

Graduação em Educação pela Universidade

Federal de Mato Grosso, Campus

Universitário de Rondonópolis, linha de

pesquisa Linguagens, Cultura e

Construção do Conhecimento, como

exigência para obtenção do título de Mestre

em Educação.

Orientadora: Profª Drª Cancionila

Janzkovski Cardoso

Rondonópolis - MT

2013

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

ISSN ?????????????

2011

Ficha catalográfica elaborada por Sheila Cristina Ferreira Gabriel

Bibliotecária – CRB1 1618

S237a

Santos, Márcia Ormonde Portela dos.

Alfabetização e gêneros textuais: uma análise das práticas docentes

no âmbito do pró-letramento de Mato Grosso / Márcia Ormonde

Portela dos Santos. – Rondonópolis, MT : UFMT, 2013.

202 f.

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação em

Educação da Universidade Federal de Mato Grosso, Campus

Rondonópolis, como requisito para obtenção do título de Mestre em

Educação.

Orientadora: Profª Drª Cancionila Janzkovski Cardoso.

1. Alfabetização. 2. Gêneros textuais. 3. Letramento. 4. Pró-

Letramento. I. Cardoso, Cancionila Janzkovski., orient. II. Título.

CDU 372.4

MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO

UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO

PRÓ-REITORIA DE ENSINO DE PÓS-GRADUAÇÃO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO-RONDONÓPOLIS

Rodovia Rondonópolis-Guiratinga, km 06 MT-270 - Campus Universitário de Rondonópolis

Cep: 78735-901 - Rondonópolis/MT

FOLHA DE APROVAÇÃO

TÍTULO: "ALFABETIZAÇÃO E GÊNEROS TEXTUAIS: UMA ANÁLISE DAS

PRÁTICAS DOCENTES NO ÂMBITO DO PRÓ-LETRAMENTO DE

MATO GROSSO"

AUTORA: Mestranda Márcia Ormonde Portela dos Santos

Dissertação defendida e aprovada em 22/02/2013.

Composição da Banca Examinadora

Presidente da Banca/Orientadora: Doutora Cancionila Janzkovski Cardoso

Instituição: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO

Examinador Interno: Doutora Lázara Nanci de Barros Amâncio

Instituição: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO

Examinador Exterrno: Doutora Eliana Borges Correia de Albuquerque

Instituição: UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO

Examinador Suplente: Doutora Raquel Gonçalves Salgado

Instituição: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO

Rondonópolis, 8 de março de 2013.

Para Carlos (in memoriam), irmão, amigo e

exemplo de vida.

Para Bruno e Thiago, filhos amados e

esperança de um futuro em construção.

AGRADECIMENTOS

A Deus e a Nossa Senhora Aparecida, por terem me dado ânimo, proteção, força e

determinação para superar os desafios e alcançar meus objetivos.

À professora Drª Cancionila Janzkovski Cardoso, exemplo de profissional apaixonada

e comprometida com a educação de qualidade, pela orientação competente, paciente e

compreensiva. Verdadeira Mestra, que sempre me auxiliou, apontando caminhos e me

incentivando com palavras encorajadoras.

Às minhas irmãs: Arlete e Marta, professoras alfabetizadoras competentes e dedicadas,

por acreditarem no meu potencial e me incentivarem na conclusão desta dissertação.

Aos demais irmãos, cunhadas e cunhados, que sempre estiveram presentes em minha

vida partilhando momentos de alegrias e tristezas.

Aos meus pais Moisés e Maria, e em especial, à minha mãe, por sua força e dedicação,

sempre preocupada com a educação de seus nove filhos e, mesmo com todas as dificuldades,

cuidou para que todos tivessem acesso à educação e ao conhecimento.

Ao meu esposo e companheiro Antonio Carlos, que sempre me compreendeu e me

incentivou a alcançar meus objetivos.

À minha sogra Orlanda, por sempre estar presente, cuidando dos meus filhos, com

amor e carinho, nos momentos de minha ausência.

À minha amiga Valderis, pela amizade, carinho e afeto, que desde o início desta

caminhada, sempre esteve disposta a ajudar.

A todos os professores do Programa de Pós-Graduação em Educação, que com

competência, entusiasmo e carisma, conduziram as disciplinas do Mestrado e proporcionaram

momentos ímpares de aprendizagem, contribuindo de forma efetiva, para minha formação.

Aos meus colegas do mestrado, pelos debates calorosos e por momentos de

significativas aprendizagens, em especial à Jane Íris, Sílvia, Rosana, Anabela e Sheila, que,

não pelo acaso, mas, pela escolha do coração, podem ser chamadas de amigas.

À Banca examinadora: Drª Eliana Borges Correia de Albuquerque, Drª Lázara Nanci

de Barros Amâncio e Drª Raquel Gonçalves Salgado pelas valiosas sugestões e contribuições,

que possibilitaram a conclusão desta dissertação.

A Anabel de Col, secretária do PPGEdu, pela disposição em esclarecer dúvidas, pela

amizade e pelo carinho que sempre dispensou a todos nós, mestrandos.

À tutora do Programa Pró-Letramento do município de Rondonópolis, Dulcilene

Rodrigues Fernandes, pela receptividade e disposição em contribuir com a pesquisa.

Aos diretores, coordenadoras e funcionários das escolas municipais: Rosalino Antônio

da Silva e José Antônio da Silva, por permitirem minha entrada nas escolas, disponibilizando

os elementos necessários para a coleta de dados.

A Marisa Inês Brescovici Araújo, pelo incentivo e por estar sempre disposta a me

ouvir nos momentos de angústia, apontando caminhos e sugerindo leituras.

À amiga Rosilene, por ter compartilhado sua experiência, enquanto mestranda, e me

incentivado a ingressar no mestrado para, assim, aprofundar meus conhecimentos.

Às professoras alfabetizadoras, sujeitos dessa pesquisa, que aceitaram meu convite e

me receberam com carinho em suas salas de aula, contribuindo de forma direta para a

concretização desta pesquisa. A vocês, meu respeito e admiração.

Às crianças, pelas produções textuais desenvolvidas e disponibilizadas para a análise.

Enfim, a todos que de forma direta ou indireta contribuíram para a realização desta

pesquisa, muito obrigada!

RESUMO

Esta pesquisa partiu da preocupação com a relação entre a formação continuada de

professores e o acréscimo de novas metodologias no trabalho em sala de aula, mais

especificamente na alfabetização. Teve como principal objetivo investigar se o programa de

formação continuada de professores dos anos iniciais, Pró-Letramento, implantado pelo MEC

em 2005, com adesão da rede municipal de ensino da cidade de Rondonópolis/MT, no ano de

2010, tem contribuído de forma efetiva para o acréscimo de novas metodologias nas práticas

docentes, notadamente para o trabalho com os gêneros textuais na alfabetização. O quadro

teórico dessa investigação envolve os conceitos de alfabetização e letramento na perspectiva

de Soares (2000; 2004; 2006), Kleiman (2008), Cardoso (2000; 2003; 2008) Mortatti (2004),

entre outros, bem como nas concepções de linguagem, na perspectiva da teoria dos gêneros de

Bakhtin (1997; 2010), e nas releituras didáticas do tema, por teóricos como Dolz e Schneuwly

(2004), Marcuschi ([2002]; 2005; 2008;). A pesquisa apresenta como procedimentos

metodológicos, a análise qualitativa dos dados, com base na pesquisa de tipo etnográfica.

Nesta vertente, de acordo com André (1995), o pesquisador deve aproximar-se das pessoas,

do local, das situações por um determinado tempo a fim de manter contato direto com o

objeto de estudo. Além disso, a descrição do ambiente, dos depoimentos, dos diálogos é uma

característica deste tipo de pesquisa, sendo que os dados coletados devem ser reconstruídos

em forma de palavras ou transcrições literais dos depoimentos, dos diálogos e das entrevistas.

Nesse intuito, a pesquisa de campo se estendeu durante o segundo semestre de 2011, com a

observação das aulas de três sujeitos de pesquisa, professoras alfabetizadoras, que

participaram do curso de formação continuada Pró-Letramento no ano de 2010, oferecido pela

Secretaria Municipal de Educação, sendo uma da primeira, outra da segunda e outra da

terceira fase do primeiro ciclo, respectivamente. Além das observações de aulas, foram feitas

entrevistas semiestruturadas, inicial e final, e análise documental, a fim de captar a dinâmica

da prática pedagógica e estabelecer relações entre as orientações do programa Pró-Letramento

e o trabalho com a escrita, desenvolvido pelos sujeitos da pesquisa, no tocante à temática dos

gêneros textuais. A análise das entrevistas realizadas possibilita afirmar que as professoras

consideram o Programa Pró-Letramento, e outros direcionados aos professores

alfabetizadores, de fundamental importância para a melhoria de qualidade na educação. Além

disso, as professoras deixam transparecer, em suas práticas, procedimentos didáticos que

estão intimamente relacionados às orientações contidas no material do Programa Pró-

Letramento, as quais sugerem ao alfabetizador um trabalho mais significativo com o uso da

língua em situações reais, características do letramento, materializadas por meio de atividades

com os gêneros textuais. Outro aspecto a ser ressaltado é que existe uma variedade de gêneros

textuais que circulam nas salas de alfabetização observadas, com uma progressão crescente

em termos de quantidade, da primeira para a terceira fase, porém, a forma como este processo

é conduzido depende de fatores internos da escola (projetos inseridos no Projeto Político

Pedagógico de cada unidade), aliados aos saberes docentes individuais.

Palavras-chave: Alfabetização. Gêneros textuais. Programa Pró-Letramento.

ABSTRACT

This research started with the concern related to teachers’ continuing education and the

increase of new methodologies in the classroom work, more specifically in literacy. Its main

goal, ProLiteracy, implemented by MEC (Ministry of Education and Culture) in 2005, in

partnership with the municipal taeching network in the municipality of Rondonópolis, State of

Mato Grosso, in the year 2010, has effectively contributed for the increase of new

methodologies in the teachers’ pratices, mostly in their work with genres in literacy. The

theoretical framework of this study involves the concepts of literacy following the perspective

by Soares (2000; 2004; 2006), Kleiman (2008), Cardoso (2000; 2003; 2008), Mortatti (2004),

among others, as well as the conceptions of language in the perspective of genre theory by

Bakhtin (1997; 2010), and in the teaching reinterpretations of the theme by theoreticians such

as Dolz and Schneuwly (2004), Marcuschi ([2002]; 2005; 2008;). The research presents as

methodological procedures the qualitative analysis of the data, based on etnographical

research. Thus, according to André (1995), the researcher must approach people, places,

situations, for a limited time in order to keep direct contact with the object of study. Besides

that, the environment, testimonies, dialogues description are characteristic of this type of

research, and the data collected must be rebuilt as words and verbatim (literal transcription) of

the testimonies, dialogues and interviews. In that order, the field research lasted throughout

the second semester in 2011, with the observation of the classes by three research subjects,

literacy teachers, who joined the ProLiteracy continuing education training in 2010, offered

by the Municipal Education Board, and herein one subject who belongs to the first, another

one to the second and the other to the third phase or stage of the first cycle, respectively.

Besides the classes observation and semi structured interviews, initial and final ones,

document analyses were carried out, in order to catch the dynamics of the pedagogical

practice and establish relationships between the orientations of the ProLitercay program and

the work with writing, developed by the subjects of the research, related to the theme genres.

The interview analysis carried out enables us to say that the teachers consider the ProLitercay

Program, and some other programs designed for literacy teachers, of fundamental importance

for the improvement of quality in the educational field. Besides that, the teachers let show, in

their practices, teaching procedures that are intimately related to orientations that are part of

the material that belong to the ProLiteracy Program, which suggest to the literacy teacher a

more meaningful work with the use of the language in real situations, literacy-related,

materialized by means of activities with the genres. Another aspect to be highlighted is that

there is a variety of genres that are used in the observed literacy classrooms, with an

increasing progression in terms of quantity; from the first to the third phase or stage, however,

the way this process is carried out depends on internal factors of the school (projects inserted

in the PPP in every unity), along with teachers’ knowledge as individuals.

Keywords: Literacy. Genres. ProLiteracy Program.

LISTA DE FIGURAS

Figura 1 Produção de texto pelo Isaac, aluno da Profª Ana, 1ª fase do 1º ciclo 128

Figura 2 Produção de texto pela Vitória, aluna da Profª Ana, 1ª fase do 1º ciclo 128

Figura 3 Produção de texto pela Maria Eduarda, aluna da Profª Ana, 1ª fase do 1º ciclo 129

Figura 4 Produção de texto pelo Isaac, aluno da Profª Ana, 1ª fase do 1º ciclo 130

Figura 5 Escrita das vogais vogais - pelo Isaac, aluno da Profª Ana, 1º fase do 1º ciclo 136

Figura 6 Escrita dos encontros vocálicos - pelo Isaac, aluno da Profª Ana, 1º fase do 1º ciclo 136

Figura 7 Escrita de letras e sílabas - pelo Isaac, aluno da Profª Ana, 1º fase do 1º ciclo 137

Figura 8 Formação de palavras - pelo Isaac, aluno da Profª Ana, 1º fase do 1º ciclo 137

Figura 9 Atividade de formação de frases - pelo Isaac, aluno da Profª Ana, 1º fase do 1º

ciclo

137

Figura 10 Cartazes da sala da 1ª fase confeccionados pela Profª Ana, com as letras do alfabeto 138

Figura 11 Cartazes da sala da 1ª fase confeccionados pela Profª Ana, com as letras do

alfabeto e as famílias silábicas

139

Figura 12 Produção de bilhete pelo Luiz, aluno da Profª Bia, 2º fase 1º ciclo 147

Figura 13 Produção de bilhete pela Ana Paula, aluna da Profª Bia, 2º fase 1º ciclo 147

Figura 14 Produção de bilhete pela Esthefany, aluna da Profª Bia, 2º fase 1º ciclo 148

Figura 15 Produção de texto a partir de uma música memorizada, aluna Júlia da Profª Bia, 2º

fase 1º ciclo

149

Figura 16 Produção de texto a partir de uma música memorizada, aluna Adriane da Profª

Bia, 2º fase 1º ciclo

150

Figura 17 Cartaz com a oração da manhã exposto na sala da Profª Carina 155

Figura 18 Modelos de gêneros textuais expostos na sala da Profª Carina 155

Figura 19 Modelo de carta, exposto na sala da Profª Carina 163

Figura 20 Produção textual (carta) realizada pela Elisana, aluna da Profª Carina, 3º fase 1º

ciclo

164

Figura 21 Produção textual (carta) realizada pela Iasmim, aluna da Profª Carina, 3º fase 1º

ciclo

166

Figura 22 Produção textual (carta) realizada por Giovanna e Beatriz, alunas da Profª Carina,

3º fase 1º ciclo

166

Figura 23 Produção textual (carta) realizada pela Yasmin, aluna da Profª Carina, 3º fase 1º

ciclo

167

LISTA DE QUADROS

Quadro 1 Turmas da escola José Antônio da Silva, ano letivo 2011 27

Quadro 2 Funções desempenhadas na Escola Municipal José Antônio da Silva e

quantidade de agentes por função, ano letivo 2011

28

Quadro 3 Funções desempenhadas na Escola Municipal Rosalino Antônio da Silva

e quantidade de agentes por função, ano letivo 2011

29

Quadro 4 Distribuição das turmas da escola Rosalino Antônio da Silva, por

modalidade e turnos, ano 2011

29

Quadro 5 Caracterização dos sujeitos da pesquisa 32

Quadro 6 Relação das observações realizadas em sala de aula por professora no

período de Agosto a dezembro de 2011

35

Quadro 7 Distribuição das entrevistas por professora no período de agosto a

dezembro 2011

36

Quadro 8 Distribuição das Teses e Dissertações por área de conhecimento,

instituição e subtema encontrados com os descritores gêneros textuais

na alfabetização no período de 2005 a 2009

80

Quadro 9 Distribuição das Teses e Dissertações por instituição, metodologia,

instrumentos de pesquisa e subtema que versam sobre o programa Pró-

letramento no período 2005 a 2009

81

Quadro 10 Incidência dos vocábulos relacionados aos gêneros textuais nos

fascículos do Pró-Letramento (ano)

95

Quadro 11 Quadro das capacidades, conhecimentos e atitudes para a produção de

textos nos três primeiros anos do ensino fundamental.

96

Quadro 12 Propostas de produção textual que constam no material do programa

Pró-Letramento

97

Quadro 13 Atividades relativas aos gêneros textuais realizadas em aula pela Profª

Ana – 1º fase do 1º ciclo - no período de 05/agosto a 14/dezembro de

2011

1

127

Quadro 14 Incidência dos gêneros textuais trabalhados em sala de aula pela Prof ª

Ana – 1º fase do 1º ciclo no período de 05/agosto a 14/dezembro de

2011

1

127

Quadro 15 Cronograma de trabalho e exposição da produção textual da escola coordenado

pelas supervisoras Wilma e Marisa/2011

1

131

Quadro 16 Compreensão e valorização da cultura escrita do programa Pró-Letramento

133

Quadro 17 Relação das atividades desenvolvidas no caderno do aluno Isaac, no período de

22/02/2011 a 08/08/2011 (primeiro semestre)

1

135

Quadro 18 Atividades relativas aos gêneros textuais realizadas em aula pela Prof ª

Bia – 2º fase do 1º ciclo - no período de 09/agosto a 16/dezembro de

2011

1

142

Quadro 19 Incidência dos gêneros textuais trabalhados em sala de aula pela Prof ª

Bia – 2º fase do 1º ciclo no período de 09/agosto a 16/dezembro de

2011

1

142

Quadro 20 Relação das leituras realizadas pelos alunos e pela Prof ª Carina – 3º

fase do 1º ciclo no período de 09/agosto a 09/dezembro de 2011

1

156

Quadro 21 Relação das leituras realizadas pela Prof Carina – 3º fase do 1º ciclo

no período de 09/agosto a 09/dezembro de 2011

1

157

Quadro 22 Atividades relativas aos gêneros textuais realizadas em aula pela Prof

Carina – 3º fase do 1º ciclo - no período de 09 Ago a 09 Dez de 2011

1

158

LISTA DE TABELAS

Tabela 1 Distribuição das dissertações nas áreas de Educação, Linguística e Letras com

os descritores gêneros textuais e produção escrita no período de 2005 a 2009

72

Tabela 2 Distribuição das teses nas áreas de Educação, Linguística e Letras com os

descritores gêneros textuais e produção escrita no período de 2005 a 2009

79

Tabela 3 Distribuição das teses e dissertações por ano sobre o programa Pró-letramento

no período 2005 a 2009

80

Tabela 4 Distribuição dos artigos em periódicos sobre gênero textual e Pró-Letramento

no período de 2005 a 2009

85

LISTA DE SIGLAS

CEALE Centro de Alfabetização, Leitura e Escrita da UFMG

CEEL Centro de Estudos em Educação e Linguagem da UFPE

CEFIEL Centro de Formação e Instituto da Linguagem da UNICAMP

CEFORM Centro de Formação Continuada de Professores da UnB

CEFORTEC Centro de Formação Continuada Desenvolvimento da Tecnologia e

Prestação de Serviços para as Redes Públicas de Ensino da UEPG

CEP Código de Endereçamento Postal

EaD Ensino a Distância

FNDE Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação

GESTAR Programa Gestão da Aprendizagem Escolar

HTPC Hora de Trabalho Pedagógico Coletivo

IBICT Instituto Brasileiro de Informação e Tecnologia

IDH Índice de Desenvolvimento Humano

INEP Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira

LDB Diretrizes e Bases da Educação Nacional

LM Língua Materna

MEC Ministério da Educação

NEES Necessidades Educacionais Especiais

OCDE Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico

PAR Plano de Ações Articuladas

PBA Programa Brasil Alfabetizado

PCN Parâmetros Curriculares Nacionais

PISA Programa Internacional de Avaliação dos Estudantes

PNLD Programa Nacional do Livro Didático

PPP Projeto Político Pedagógico

PROFA Programa de Professores Alfabetizadores

RNFC Rede Nacional de Formação Continuada de Professores da Educação Básica

SAEB Sistema de Avaliação da Educação Básica

SEB Secretaria de Educação Básica

SEMEC Secretaria Municipal de Educação e Cultura

UEPG Universidade Estadual de Ponta Grossa

UFAL Universidade Federal de Alagoas

UFES Universidade Federal do Espírito Santo

UFMG Universidade Federal de Minas Gerais

UFPB Universidade Federal de Paraíba

UFPE Universidade Federal de Pernambuco

UFS Universidade Federal de Sergipe

UFSCAR Universidade Federal de São Carlos

UnB Universidade Federal de Brasília

UNDIME União Nacional dos Dirigentes Municipais

UNICAMP Universidade Estadual de Campinas

UNIFESP Universidade Federal de São Paulo

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................. 16

2 ASPECTOS METODOLÓGICOS DA PESQUISA ......................................................... 21

2.1 Objetivos da pesquisa ................................................................................................ 21

2.2 Percurso metodológico: a abordagem qualitativa da pesquisa .................................. 24

2.3 O local da pesquisa .................................................................................................... 26

2.4 A busca pelos sujeitos da pesquisa ............................................................................ 30

2.5 Os sujeitos da pesquisa .............................................................................................. 32

2.6 Os instrumentos de coleta de dados ........................................................................... 34

3 CONCEPÇÕES TEÓRICAS DA PESQUISA .................................................................. 38

3.1 O dialogismo e o interacionismo no processo de construção do pensamento ........... 38

3.2 Gêneros do discurso: conceituação ............................................................................ 42

3.3 Gêneros textuais e ensino: compreensão e funcionalidade ........................................ 44

3.4 Interação e aprendizagem .......................................................................................... 52

4 A ALFABETIZAÇÃO E SUA RELAÇÃO COM OS CONCEITOS DE LETRAMENTO

E GÊNEROS TEXTUAIS ................................................................................................. 55

4.1 Alfabetização, letramento e gêneros textuais: usos e possibilidades da escrita ......... 55

4.2 O cenário da alfabetização no Brasil .......................................................................... 56

4.3 Alfabetização e letramento ......................................................................................... 58

4.4 O letramento e sua relação indissociável com os gêneros textuais ............................ 63

4.5 Contextualização histórica da produção de textos ..................................................... 68

4.6 O Pró-Letramento: uma das possibilidades para a melhoria da qualidade na Educação

Básica..........................................................................................................................73

5 PROGRAMA PRÓ-LETRAMENTO: O QUE SINALIZA O ESTADO DO

CONHECIMENTO ........................................................................................................... 75

5.1 Estado do conhecimento: detalhes de sua elaboração................................................ 75

5.2 Abordagem dos gêneros textuais nas pesquisas e no Pró-Letramento ...................... 77

5.3 O que indicam os periódicos? .................................................................................... 85

5.4 Delineando as pesquisas sobre o Pró-Letramento após 2009 .................................... 86

5.5 Descrição dos fascículos do Programa Pró-Letramento ............................................ 91

5.6 Abordagem da produção de textos e dos gêneros textuais no programa Pró-

Letramento: Análise documental ...............................................................................94

5.7 Formação docente: garantia de transformação da prática? ..................................... 103

6 OS GÊNEROS TEXTUAIS NAS PRÁTICAS DOCENTES: RELAÇÕES COM O

PROGRAMA PRÓ-LETRAMENTO ............................................................................. 107

6.1 A Formação continuada e o Programa Pró-Letramento sob a ótica dos sujeitos de

pesquisa ................................................................................................................... 107

6.2 O Ensino Fundamental de nove anos: o que mudou? .............................................. 114

6.3 A prática pedagógica das docentes pesquisadas ....................................................... 123

6.3.1 A prática da professora Ana – 1ª fase ..................................................................... 123

6.3.2 A prática da professora Bia – 2ª fase ...................................................................... 140

6.3.3 A Prática da professora Carina – 3ª fase ............................................................... 153

6.3.4 Sintetizando algumas percepções .......................................................................... 172

CONSIDERAÇÕES ............................................................................................................... 177

REFERÊNCIAS ............. ........................................................................................................182

APÊNDICES ................. .........................................................................................................189

16

1 INTRODUÇÃO

Seria realmente impensável que um ser assim, “programado para aprender”,

inacabado, mas consciente de seu inacabamento, por isso mesmo em

permanente busca, indagador, curioso em torno de si e de si no e com o

mundo e com os outros; porque histórico, preocupado sempre com o

amanhã, não se achasse, como condição necessária para estar sendo,

inserido, ingênua ou criticamente, num incessante processo de formação.

(FREIRE, 2001, p.12).

Esta pesquisa pretende ampliar as discussões a respeito da formação continuada e sua

relação com as práticas pedagógicas de professores alfabetizadores, notadamente no processo

de alfabetização, letramento e sua materialização por meio dos gêneros textuais.

A presente proposta de pesquisa surgiu a partir de reflexões realizadas sobre minha

prática como professora alfabetizadora, visto que, desde que iniciei minha caminhada como

docente, percebo a necessidade de buscar novas formas de ensinar, novas metodologias de

trabalho e novas formas de compreender como a criança aprende.

Ao terminar o magistério na escola Sagrado Coração de Jesus, em 1991, tive a

necessidade de ingressar no mercado de trabalho iniciando minha carreira como professora

alfabetizadora, em 1992, numa escola particular, no município de Rondonópolis – MT.

Mesmo trabalhando, continuei meus estudos e cursei Letras pela UFMT, concluindo o curso

em 1995. Neste período, após realização de concurso em 1994, ingressei como professora

alfabetizadora numa unidade municipal. Como é muito comum, os professores inexperientes e

novatos, ao chegarem às escolas não possuem poder de escolha e as turmas que “sobram” são

destinadas aos que chegam. Assim, iniciei o ano com uma turma de alfabetização (1ª série).

Muitas dúvidas se faziam presentes no meu fazer pedagógico: como ensinar a ler e a escrever?

Que métodos utilizar? Como agir frente a uma turma de crianças com ritmos diferentes de

aprendizagem? Quais as orientações a seguir? Neste período, confesso que a troca e a

interação com as colegas mais experientes foram decisivas para este início de carreira.

Porém, apenas a prática não era suficiente para me constituir enquanto alfabetizadora,

pois ainda tinha muitas dúvidas e insegurança a respeito dos métodos de alfabetização e das

dificuldades de aprendizagem das crianças. A preocupação com um ensino interessante e

significativo sempre fez parte das minhas inquietações. Participei de muitos cursos de

formação continuada ministrados pela secretaria de educação de nosso município com essa

expectativa.

17

Em 2000, ingressei, por meio de concurso, na rede estadual de educação como

professora de Língua Portuguesa e, mediante a participação em vários cursos de formação

continuada, percebi que o trabalho com os gêneros textuais chamava a atenção dos alunos e

tornava o ensino de língua materna mais significativo. Dessa forma, por sentir necessidade de

aprofundar meus conhecimentos a respeito deste tema, foi que me senti estimulada a realizar a

pesquisa de mestrado dentro da perspectiva dos gêneros textuais, sempre buscando superar os

desafios da prática.

Hoje, os meios de comunicação em massa, como a televisão, o rádio, a internet e

demais aparelhos eletrônicos existentes em nossa sociedade fazem com que as crianças

exijam muito mais da escola. Não se pode mais coagir o aluno e levá-lo a aprender a “ferro e

fogo”, é preciso cativá-lo, motivá-lo, persuadi-lo através de metodologias prazerosas e que

venham ao encontro de suas expectativas. Difícil? Com certeza. Trabalhoso? Não podemos

negar, porém necessário.

Além disso, pensar em educação pressupõe a análise do meio social em que vivemos e

nos faz refletir sobre a desigualdade social existente em nosso país. Desigualdade esta que se

reflete também, e principalmente, na escola pública.

Ao adentrarmos nas dependências de uma escola pública, verificamos que o

investimento na educação de qualidade para a classe trabalhadora ainda está longe de

acontecer. Infelizmente, vivemos uma época em que existe um desânimo latente na classe dos

profissionais desta área. Muitos não compreendem a importância do seu papel social e

acabam oferecendo o mínimo possível para seus alunos em termos de conhecimento,

contribuindo para a reprodução da desigualdade social.

O professor precisa ter clareza do seu papel enquanto educador e agente transformador

da realidade social em que vive. Para isso, faz-se necessário uma autorreflexão no sentido de

compreender e repensar constantemente sobre a sua prática. É preciso que a busca pela

formação profissional seja constante, a fim de proporcionar aos seus alunos uma educação de

qualidade.

A consciência do mundo e a consciência de si como ser inacabado

necessariamente inscrevem o ser consciente de sua inconclusão num

permanente movimento de busca. Na verdade, seria uma contradição se,

inacabado e consciente do inacabamento, o ser humano não se inserisse em

tal movimento. (FREIRE, 1996, p. 57).

18

Quando falamos em formação profissional, é preciso pensar como Paulo Freire, que

afirma que o ser humano é inacabado e inconcluso. Outrossim, acredito que devemos estar

sempre em busca de conhecimentos que nos capacitem para a atuação em sala de aula.

O professor é um edificador de pontes, é ele o responsável pela elevação do nível

intelectual do aluno, e, sendo assim, é papel do educador levar o aluno a pensar, a descobrir e

a se tornar um sujeito autônomo e reflexivo.

Um dos primeiros passos para a conquista da autonomia do ser humano pela educação

é a alfabetização. Esta, compreendida aqui no seu sentido mais amplo, não como simples

decodificação do sistema alfabético, mas sim de interação e utilização da leitura e da escrita

em situações sociais.

Dessa forma, percebo que o trabalho com os gêneros textuais, através da leitura e

escrita de vários portadores de textos, vinculados ao meio em que vivemos, propicia um maior

interesse por parte dos alunos e faz com que eles percebam e compreendam o porquê e o para

quê escrever. Além disso, sentem-se motivados expressando-se através da escrita, com

criatividade e desenvoltura de acordo com o que é proposto.

A partir da criação da Rede Nacional de Centros de Formação Continuada e

Desenvolvimento da Educação, incentivada e implantada pelo MEC, com a finalidade de

aprimorar a formação continuada de professores no Brasil, surgiram alguns cursos com a

finalidade de subsidiar professores alfabetizadores com novas metodologias de trabalho. Um

dos mais recentes é o programa Pró-Letramento, implantado pelo MEC em 2005, e

desenvolvido pela Secretaria Municipal de Educação e Cultura (SEMEC) de Rondonópolis –

MT no ano de 2010, com continuidade no ano subsequente. O Pró-Letramento define-se

como:

[...] um programa de formação continuada de professores para a melhoria da

qualidade de aprendizagem da leitura/escrita e matemática nos anos/séries

iniciais do ensino fundamental. O Programa será realizado pelo Ministério

da Educação (MEC), Universidades Parceiras e com adesão dos estados e

municípios. Podem participar todos os professores que estiverem em

exercício nos anos/séries iniciais do ensino fundamental das escolas

públicas.

O Pró-Letramento funcionará na modalidade semipresencial. Para isso,

utilizará material impresso e em vídeo e contará com atividades presenciais e

a distância, que serão acompanhadas por professores orientadores, também

chamados tutores. (MEC/SEB, 2012, p. 1).

Ao observar o material do Pró-Letramento, percebi que a metodologia e as orientações

do manual desse curso estão voltadas para o uso da escrita em situações reais, ou seja, as

19

orientações levam os participantes a refletirem que não basta apenas alfabetizar, mas também

letrar, evidenciando a necessidade de se trabalhar com os gêneros textuais.

Segundo Soares (2006, p.18) “Letramento é [...] o resultado da ação de ensinar ou de

aprender a ler e a escrever: o estado ou a condição que adquire um grupo social ou um

indivíduo como consequência de ter-se apropriado da escrita.” Ou seja, não basta apenas saber

codificar e decodificar letras, mas fazer uso da leitura e da escrita no dia-a-dia, assim, os

gêneros textuais se materializam no cotidiano através de vários portadores de textos, seja um

bilhete, uma notícia, uma receita, uma bula, um manual de instrução, etc. Tendo isso em vista,

o professor pode planejar seu trabalho no sentido de propiciar a seus educandos a

compreensão desse processo de letramento em consonância ao processo de alfabetização.

O trabalho com gêneros textuais nas escolas, de uma forma geral, ainda necessita de

aprofundamento e compreensão por parte do docente, principalmente nos anos iniciais de

alfabetização. Considero o trabalho com os gêneros textuais mais significativo para o aluno,

pois é através da contextualização da escrita no processo de alfabetização e letramento que o

educando será capaz de utilizar-se da escrita nos seus mais diversos contextos. A produção

escrita deve ter uma funcionalidade para que faça sentido, uma vez que

[...] os gêneros textuais são fenômenos históricos, profundamente vinculados

à vida cultural e social. Fruto de trabalho coletivo, os gêneros contribuem

para ordenar e estabilizar as atividades comunicativas do dia-a-dia. [...].

Caracterizam-se como eventos textuais altamente maleáveis dinâmicos e

plásticos. Surgem emparelhados a necessidades e atividades socioculturais,

bem como na relação com inovações tecnológicas, o que é facilmente

perceptível ao se considerar a quantidade de gêneros textuais hoje existentes

em relação a sociedades anteriores à comunicação escrita. (MARCUSCHI,

[2002], p. 1).

Assim, programas de formação continuada para professores alfabetizadores têm sido

implantados em todo o país no sentido de subsidiá-los com novas metodologias de trabalho.

Dessa forma, não se pode negar que as políticas de formação de professores e os programas

implantados pelo governo federal, através do MEC, oferecem subsídios aos professores para

desenvolverem um trabalho de qualidade com os alunos.

A problemática da pesquisa em questão evidencia a preocupação com a qualidade do

ensino no sentido de averiguar se o Programa Pró-letramento vem conseguindo, efetivamente,

acrescentar novas metodologias de trabalho nas salas de alfabetização, principalmente no

trabalho com os gêneros textuais.

20

O professor alfabetizador está realmente aberto a novas metodologias de trabalho? É

possível perceber esforços por parte dos professores em alfabetizar, letrando? A busca por um

ensino mais dinâmico e menos enfadonho, ligado às práticas sociais, está acontecendo

efetivamente ou isso ainda é utópico?

Para o desenvolvimento da pesquisa, optei por uma abordagem qualitativa, lançando

mão de instrumentos como entrevistas, conversas informais, observações de aula e análise de

documentos. Apresento, como sujeitos da pesquisa, três professoras das três primeiras fases

iniciais do Ensino Fundamental, de duas escolas municipais da cidade de Rondonópolis –

MT.

Para dar organização aos dados selecionados e analisados, esta dissertação foi dividida

em sete capítulos. No segundo capítulo demonstro o percurso realizado para delinear o objeto

de pesquisa, os objetivos, a opção metodológica, a escolha do local e dos sujeitos,

apresentando algumas características destes e a definição dos instrumentos apropriados para a

coleta de dados.

O terceiro capítulo foi dedicado a um estudo sobre o interacionismo e as concepções

de linguagem subjacentes aos pressupostos teóricos e filosóficos de Bakhtin (1997; 2010;) e

demais teóricos que compartilham de suas ideias, tais como Dolz e Schneuwly (2004) e

Marcuschi ([2002]; 2005; 2008).

O quarto capítulo traz algumas concepções teóricas sobre alfabetização e letramento à

luz de pensadores e educadores engajados com a pesquisa em educação são eles: Soares

(2000; 2004; 2006), Kleiman (2008), Cardoso (2000; 2003; 2008) Mortatti (2004), entre

outros.

No quinto capítulo encontra-se uma pesquisa do tipo estado do conhecimento sobre o

Programa de Formação Continuada, o Pró-Letramento, desde a sua implantação em 2005 até

2009, além de traçar um breve histórico sobre sua implantação.

O sexto capítulo traz a análise dos dados, com a abordagem da temática da formação

continuada e do Programa Pró-Letramento sob a ótica dos sujeitos desta pesquisa. Além

disso, analiso a presença dos gêneros textuais na prática pedagógica das professoras, à luz do

referencial teórico adotado, bem como procuro estabelecer relações do cotidiano escolar com

o programa Pró-Letramento.

Por fim, o sétimo capítulo será dedicado às considerações a respeito desta

investigação.

21

2 ASPECTOS METODOLÓGICOS DA PESQUISA

Ao iniciarmos um trabalho investigativo faz-se necessário que compreendamos clareza

da situação a ser analisada, evidenciando, ao leitor, os motivos que nos levaram a enveredar

pelos caminhos da pesquisa. Neste capítulo apresento os objetivos (geral e específicos), os

sujeitos e o local da pesquisa, bem como a opção metodológica que a sustenta.

2.1 Objetivos da pesquisa

Sabemos que o processo de desenvolvimento da escrita é algo que requer um trabalho

minucioso para a aquisição desta habilidade. O ensino da produção textual não é uma simples

adaptação de teorias aplicadas diretamente à escola. O objeto a ensinar e a aprender, a escrita,

é uma atividade complexa, que vai do gesto gráfico à organização e ao planejamento, que

envolve a textualização e a revisão, ou seja, escrever exige uma série de funções cognitivas

relacionadas à compreensão deste ato. Como afirmam Dolz, Gagnon e Decâncio (2010),

a escrita mobiliza múltiplos componentes cognitivos. É por isso que ela pode

ser considerada como uma atividade mental. Para escrever, o aprendiz

precisa de instrumentos sobre os conteúdos temáticos a abordar, mas

também de conhecimentos sobre a língua e sobre as convenções sociais que

caracterizam os textos a serem redigidos. (DOLZ; GAGNON; DECÂNCIO,

2010, p.15).

Ainda constatamos práticas de trabalho com a escrita que não levam em consideração

as hipóteses que o aluno tem sobre a representação gráfica da língua.

A escrita se torna mecânica baseada nas habilidades motoras, na cópia de palavras,

repetindo as sílabas trabalhadas. Assim, a escrita se torna artificial e inexpressiva, muitas

vezes, baseada em palavras soltas, as quais não formam uma unidade de sentido, tornando-se

algo enfadonho para o aluno, pois ele começa a compreender que o que ele sabe tem de ser

fragmentado para ser considerado correto.

Outro problema que ocorre neste ensino descontextualizado é o fato de não estabelecer

a relação entre a linguagem e o mundo, entre o autor e o leitor do texto. O aluno tem a

impressão que escrever é apenas exercitar a ortografia, classificar sílabas, encontros

vocálicos, dígrafos, deixando de produzir textos com coerência.

Escrever não pode ser uma tarefa improvisada, sem planejamento e sem revisão.

Escrever é algo que deve ter significado para o aluno, o qual deve compreender que a escrita

22

está voltada e interligada com o mundo que o cerca, com a realidade. Para isso é necessário

que o professor tenha essa clareza no momento de ensinar, que ele tenha segurança dos

objetivos a serem alcançados em sua prática pedagógica.

É preciso deixar de lado práticas de escrita somente como forma de exercício. Desde

os primeiros anos de alfabetização, o aluno precisa perceber que ele escreve para alguém, que

a sua escrita tem um leitor, um destinatário. Neste sentido, Bakhtin (2010, p. 117) afirma que:

“toda palavra comporta duas faces. Ela é determinada pelo fato de que procede de alguém [...]

é uma espécie de ponte lançada entre mim e os outros”.

O que a escola e o ensino de língua materna proporcionam ao educando é a

materialização da escrita muitas vezes de forma mecânica e desvinculada da realidade.

Vigotsky (2007), em um dos seus estudos sobre a linguagem, afirma que:

até agora a escrita ocupou um lugar muito estreito na prática escolar, em

relação ao papel fundamental que ela desempenha no desenvolvimento

cultural da criança. Ensinam-se as crianças a desenhar letras e construir

palavras com elas, mas não se ensina a linguagem escrita. Enfatiza-se de tal

forma a mecânica de ler o que está escrito que se acaba obscurecendo a

linguagem escrita como tal. (VIGOTSKI, 2007, p. 125).

Nesse sentido nos perguntamos: qual o nosso papel enquanto professores e

professoras? O que fazer para tornar o ensino de língua portuguesa algo mais prazeroso e

compreensível para o aluno? Qual o melhor caminho a seguir?

Existe um esforço evidente em tornar o ensino de língua materna mais significativo e

mais contextualizado, o que caracteriza a alfabetização em consonância com o letramento,

porém, é fato, que nos deparamos ainda, com práticas de trabalho com a escrita que não

levam em consideração as práticas sociais do seu uso, pois são descontextualizadas e

abstratas. Escrever é algo que deve ter significado para o aluno, o qual deve compreender que

a escrita está voltada e interligada com o mundo que o cerca, com a realidade. Para isso, é

necessário que o professor sinta-se seguro no momento de ensinar, que saiba os objetivos a

serem alcançados em sua prática pedagógica. Para Antunes,

a evidência de que as línguas só existem para promover a interação entre as

pessoas nos leva a admitir que somente uma concepção interacionista da

linguagem, eminentemente funcional e contextualizada, pode de forma

ampla e legítima, fundamentar um ensino de língua que seja individual e

socialmente produtivo e relevante. (ANTUNES, 2003, p. 52).

23

Para que haja comunicação é necessário interação e por isso o professor esclarecer o

que ele pretende do aluno, quais suas intenções com a escrita. Escrever para quem? Quem é o

outro? Qual é a finalidade da interação com o outro?

A escrita cumpre funções comunicativas específicas e relevantes em cada contexto de

comunicação, seja no trabalho, na família, na vida social em geral. Assim, ela cumpre um

papel importantíssimo, e quem escreve deve desempenhar essa função. Através da escrita,

somos capazes de informar, advertir, anunciar, descrever, explicar, opinar, registrar e divulgar

conhecimentos.

Dessa forma, a pesquisa foi desenvolvida no âmbito da linguagem buscando verificar

quais os suportes que o professor alfabetizador utiliza em sala de aula para tornar o ensino de

língua materna mais significativo para o educando.

A rede municipal de ensino de Rondonópolis – MT vem investindo na formação do

professor alfabetizador através de cursos oferecidos pela Secretaria Municipal de Educação e

Cultura (SEMEC) (Programa Gestão da Aprendizagem Escolar (GESTAR) de Língua

Portuguesa, Programa de Professores Alfabetizadores (PROFA), etc.). O curso mais recente é

o Pró-letramento, implantado em 2010, com a segunda etapa em 2011. Sua metodologia está

voltada para o desenvolvimento do letramento que, segundo Soares (2004), trata-se do uso do

sistema da escrita em atividades de leitura e escrita, nas práticas sociais. Ou seja, não basta

apenas ser alfabetizado, mas também saber se expressar de forma autônoma, de acordo com

as exigências, com a situação, com o contexto e com a necessidade das práticas sociais. Nessa

perspectiva, penso que o trabalho com os gêneros textuais nos anos iniciais de alfabetização é

imprescindível para o desenvolvimento das capacidades de expressões orais e escritas do

aluno.

Pretendo, então, fazer uma análise sobre as práticas de três professoras alfabetizadoras,

sendo uma da primeira, outra da segunda e outra da terceira fase do primeiro ciclo,

respectivamente, que participaram desse programa no ano de 2010, observando se as

metodologias utilizadas durante as aulas de produção textual apresentam indícios de

letramento.

Objetivo, assim, responder à seguinte questão da pesquisa: O programa de formação

continuada, Pró-Letramento, implantado pela SEMEC de Rondonópolis – MT, tem

contribuído para a mudança metodológica do professor no que se refere ao trabalho com os

gêneros textuais?

Diante do exposto, o objetivo principal dessa pesquisa é investigar se o programa de

formação continuada de professores dos anos iniciais, Pró-Letramento, implantado na rede

24

municipal de ensino da cidade de Rondonópolis – MT, tem contribuído de forma efetiva para

o acréscimo de novas metodologias na prática docente, notadamente para o trabalho com os

gêneros textuais, os quais privilegiam o uso da língua nos seus aspectos social, interacional e

funcional.

A partir deste objetivo principal seguem-se os específicos:

a) Analisar o material oferecido pelo Programa Pró-Letramento, com vistas a

verificar se e como os gêneros textuais são abordados e quais metodologias são

sugeridas para o trabalho desse conteúdo em sala de aula;

b) Observar de que maneiras os gêneros textuais vêm sendo explorados em sala de

aula pelas professoras alfabetizadoras no primeiro ciclo do ensino fundamental.

c) Averiguar se o programa Pró-Letramento está sendo significativo, no que diz

respeito ao acréscimo de novas metodologias no trabalho dos professores em sala

de aula.

2.2 Percurso metodológico: a abordagem qualitativa da pesquisa

O campo a ser investigado nesta pesquisa é o universo escolar e a sala de aula, bem

como as práticas que se desenvolvem em seu interior. Dessa forma, acredito que se faz

necessária a abordagem qualitativa como metodologia adequada para responder às questões

desta investigação. Bogdan e Biklen (1994) discutem o conceito de pesquisa qualitativa e

propõem fundamentos e utilização desse tipo de pesquisa em educação, mediante a

explicitação do seu percurso, métodos e bases teóricas.

Devido à complexidade e ao dinamismo do cotidiano escolar, é possível afirmar que a

abordagem qualitativa de análise é fundamental para a compreensão do significado que o

sujeito confere às suas ações e à realidade que o cerca. O pesquisador, neste tipo de

abordagem, aproxima-se das pessoas para coletar dados por meio da observação participante,

entrevistas e registros em diário de campo. É o que a pesquisadora fez no decorrer do segundo

semestre de 2011, e, a partir dos dados coletados, tomou distanciamento subjetivo da

realidade investigada para poder analisá-la e melhor compreendê-la.

Gonzaga (2006, p. 70) salienta que a pesquisa do tipo qualitativa “permite extrair

dados da realidade com o fim de serem contrastados a partir do prisma do método”. Além de

possibilitar a realização de exames cruzados com os dados obtidos, angariar informação por

meio do processo de triangulação, sem, no entanto, perder a flexibilidade.

25

Neste tipo de pesquisa, o pesquisador observa o cenário e as pessoas numa perspectiva

holística, ou seja, procura compreendê-las levando-se em consideração o contexto do passado

e a situação atual, na qual os sujeitos estão inseridos. O pesquisador qualitativo observa,

também, a influência que ele causa sobre as pessoas e os objetos estudados. Dessa forma, faz-

se necessária a sensibilidade e a perspicácia do pesquisador no sentido de compreender como

e por que essa influência acontece.

Outro aspecto a ser ressaltado em relação ao pesquisador qualitativo é o seu

distanciamento do objeto em estudo, pois ele precisa afastar suas próprias crenças,

perspectivas e predisposições observando o fato como se ele estivesse ocorrendo pela

primeira vez. No caso desta pesquisa, a pesquisadora, em virtude de ser, também, professora,

alfabetizadora, e, ainda, sentir-se envolvida diretamente com o lócus de pesquisa, procurou

manter uma visão externa, pois se obrigou a olhar os dados de forma neutra sem permitir que

sua experiência e seu juízo de valores interferissem na análise dos dados.

Além dessas características elencadas, Gonzaga (2006) ressalta os aspectos da

pesquisa qualitativa ao observar que este tipo de abordagem é uma arte, no sentido de que o

pesquisador é um artífice e tende a criar seu próprio método. Seguindo alguns procedimentos

orientadores e nunca segue regras. Nesse sentido, “os métodos servem ao pesquisador; nunca

é o pesquisador escravo de um procedimento.” (GONZAGA, 2006, p. 75).

Nesse sentido, em termos metodológicos, optei pela pesquisa qualitativa, visto que

esse procedimento mostra-se adequado dentro das concepções apresentadas por Bogdan e

Biklen (1994) que concebem as metodologias de pesquisa qualitativas mais pertinentes ao

processo de pesquisa humana.

A pesquisa qualitativa permite a coleta de dados importantes para a compreensão das

experiências vivenciadas por alunos e professores. Cinco características básicas configuram a

pesquisa qualitativa, conforme Bogdan e Biklen (1994)

1 a fonte direta de dados é o ambiente natural, constituindo o investigador

o instrumento principal;

2 é de natureza descritiva[...] os dados recolhidos são em forma de

palavras e imagens, e não de número, o interesse está mais no processo,

do que simplesmente nos resultados ou produtos;

3 a análise dos dados se dá de forma indutiva [...] não se recolhem dados

ou provas com o objetivo de confirmar ou infirmar hipóteses

construídas previamente; ao invés disso, as abstrações são construídas à

medida que os dados particulares, que foram recolhidos, vão

agrupando;

4 o significado é de importância vital na obra qualitativa. (BOGDAN E

BIKLEN, 1994, p. 47-51).

26

O desafio que configura esse tipo de pesquisa consiste no trabalho detalhado das

informações obtidas sobre o objeto em questão. Vários são os métodos de pesquisa qualitativa

tais como: estudos de casos, investigação-ação, análise do discurso, biografias, pesquisa

participante, etnografia educativa, etnografia da comunicação, entre outras. Dessa forma, por

ser uma pesquisa de cunho qualitativo, lancei mão de alguns instrumentos da etnografia. Por

isso, essa investigação traz alguns elementos que se aproximam de pesquisas do tipo

etnográfico, tais como: entrevistas, observação, aproximação dos sujeitos por um período pré-

determinado, conversas informais com os sujeitos da pesquisa, e minientrevistas.

Nesta vertente, para responder à questão de pesquisa que norteia esta investigação

iniciei este estudo aproximando-me do ambiente escolar (duas escolas da Rede Municipal de

Ensino de Rondonópolis – MT) e dos sujeitos da pesquisa. Como estratégia de pesquisa,

utilizei-me de entrevistas semiestruturadas (inicial e final), de observação de aulas, coleta de

atividades dos alunos realizadas em sala durante as aulas de produção textual, bem como

conversas informais e minientrevistas sobre o trabalho da professora no cotidiano escolar.

2.3 O local da pesquisa

O campo de pesquisa para a realização deste estudo, como será mencionado no

próximo item, não foi escolhido, mas foi conquistado mediante conversa informal com a

tutora do programa Pró-Letramento, bem como com professoras que trabalham nas escolas

onde a pesquisa foi desenvolvida. Os sujeitos da pesquisa trabalham nessas escolas e

participaram do programa de formação continuada, o Pró-Letramento, no ano de 2010.

As duas escolas estão localizadas em bairros periféricos da cidade de Rondonópolis –

MT, e são próximas uma da outra, o que facilitou o trabalho da pesquisadora.

A escola municipal José Antônio da Silva está localizada na Vila Cardoso, possui uma

estrutura pequena, visto que o espaço em que a escola foi construída, devido a uma antiga

organização da infraestrutura da cidade, comporta, no espaço de apenas uma quadra: a escola,

um posto de saúde, uma creche, uma igreja e um centro comunitário. Desse modo, a escola

possui apenas sete salas de aula, funcionando nos dois turnos, atendendo um total de catorze

turmas. Essa escola não supre a necessidade do bairro, uma vez que os alunos, ao terminarem

o 5º ano, que corresponde à 2ª fase do 2º ciclo, são obrigados a procurar outros bairros para

dar continuidade aos seus estudos. Geralmente, os alunos são encaminhados pela direção para

a escola municipal de ensino fundamental Rosalino Antônio da Silva, por se tratar de uma

escola próxima e que atende todo o segundo ciclo.

27

Apesar de a escola ter um espaço físico bem pequeno (2.700 m², sendo 1.120,40m² de

área construída) e possuir salas de aula com um espaço reduzido, a mesma compreende sete

salas de aula, climatizadas, três salas administrativas (coordenação, direção, sala dos

professores), uma sala de recursos que atende os alunos portadores de Necessidades

Educacionais Especiais (NEES), uma biblioteca, reformada recentemente, ampliada e

climatizada. Esta possui um computador, uma televisão e um aparelho de DVD. É neste local,

também, que as professoras levam os alunos para assistirem vídeos e para as aulas de apoio.

A escola também conta com um laboratório de informática climatizado, com quinze

computadores, mesas de granito, com adaptação para alunos portadores de necessidades

especiais. Possui uma cozinha, com um pequeno depósito, mas não contém refeitório e a

merenda escolar é servida na sala de aula pelas merendeiras e ajudantes. O espaço externo é

pequeno e compreende uma quadra coberta para a realização das atividades de educação física

e um pequeno parque para atividades de recreação. Possui cinco banheiros (masculino e

feminino para professores e alunos e um banheiro para portadores de necessidades especiais).

Assim, é possível afirmar que a escola dispõe de um espaço físico favorável ao bom

desenvolvimento das capacidades cognitivas dos alunos.

A escola trabalha com ciclos de formação humana, sendo o ensino fundamental

dividido em três ciclos, e, cada ciclo, em três fases (Quadro 1). Atende, também, crianças com

cinco anos na pré-escola e, atualmente, faz a correspondência fase/ano devido à mudança do

ensino fundamental de oito para nove anos. As turmas atendidas pela escola estão assim

distribuídas:

Quadro 1: Turmas da escola José Antônio da Silva, ano letivo 2011

Período

matutino

1ª fase do

1º ciclo A

2ª fase do

1º ciclo A

3ª fase do

1º ciclo A

1ª fase do

2º ciclo A

1ª fase do

2º ciclo B

2ª fase do

2º ciclo A

2ª fase do

2º ciclo B

Período

vespertino Pré A Pré B

1ª fase do

1º ciclo B

1ª fase do

1º ciclo C

2ª fase do

1º ciclo B

2ª fase do

1º ciclo C

3ª fase do

1º ciclo B

Fonte: Elaborado com base no Projeto Político Pedagógico – PPP (2008).

A escola dispõe de uma equipe bem constituída, com professores qualificados que, em

sua maioria, possui pós-graduação. Vale ressaltar que o trabalho coletivo, nesta unidade

escolar, propiciou, em dois anos consecutivos, 2009 e 2011, o primeiro lugar no IDEB do

Município de Rondonópolis – MT, com o percentual de 5.8 e 6.31, respectivamente. É notório

que houve um crescimento em relação ao ano anterior e que, por esta classificação

(excelente), cumpriu a meta e pode ser vista como referência, pois está acima do que foi

proposto como meta para o município.

28

Afirmo, ainda, que a escola apresenta uma cultura escolar alicerçada, visto que o

diretor já está no cargo há mais de vinte anos e tem contado com o apoio da supervisora

durante todo esse tempo. A escola foi fundada em 1986 e registrada por meio do decreto de

criação nº 284/87 em 1987 e, desde a sua fundação, diretor e supervisora fazem parte da

equipe, e são, portanto, pioneiros da escola. As funções existentes na escola José Antônio da

Silva, no ano de 2011, estão demonstradas no Quadro 2.

Quadro 2: Funções desempenhadas na Escola Municipal José Antônio da Silva e quantidade de

agentes por função, ano letivo 2011

Função Quantidade

Agente administrativo 1

Auxiliares de serviços diversos 5

Diretor 1

Professoras

Pré-escola 2

14 I ciclo 8

II ciclo 4

Secretária 1

Supervisoras 2

Vigilantes 3

TOTAL 27

Fonte: Elaborado com base no Projeto Político Pedagógico (2008).

A segunda escola escolhida, e da qual fazem parte os sujeitos da pesquisa da 2ª e 3ª

fases do primeiro ciclo, é a Unidade Municipal Rosalino Antônio da Silva, localizada na Rua

Canindé, nº 1075, no bairro Jardim Iguassú, foi criada em 1982 com a finalidade de atender à

demanda educacional daquela região. De acordo com levantamento recente e que consta no

Projeto Político Pedagógico da escola (PPP, 2012), a maioria dos alunos é moradora do

próprio bairro e alguns de bairros adjacentes, como Lúcia Maggi I e II, Cidade Alta, Vila

Cardoso, Vila Poroxo, Jardim Rondônia e Nossa Senhora do Amparo.

No início a escola contava com apenas três salas de aula e, após várias ampliações e

reformas, atualmente possui vinte salas de aula (uma delas para atender crianças especiais,

contendo móveis e instrumentos específicos para essa clientela). Apresenta boa infraestrutura,

com dependências onde funcionam a sala dos professores, sala da coordenação, direção,

secretaria, biblioteca, cozinha, banheiro masculino e feminino para alunos e professores.

Dispõe, também, de um laboratório de informática climatizado que atende a alunos e

professores. O espaço externo é amplo e possui uma quadra esportiva para a prática de

29

educação física. Em 2011, ano em que esta pesquisa foi desenvolvida, a escola contava com

36 turmas e um quadro de funcionários de 66 agentes (Quadro 3).

Quadro 3: Funções desempenhadas na Escola Municipal Rosalino Antônio da Silva e quantidade de

agentes por função, ano letivo 2011

Função Quant.

Agente administrativo 2

Auxiliares de serviços diversos 15

Diretor 1

Professoras

Pré – escola 0

41 1º ciclo 20

2º e 3º ciclos 21

Secretária 1

Supervisoras 4

Vigilantes 2

TOTAL 66

Fonte: Elaborado com base no Projeto Político Pedagógico (2012).

A escola oferece o ensino fundamental de nove anos (Lei federal n.11.274 de 6 de

fevereiro de 2006) com o sistema de ensino organizado em ciclos de formação humana (1º, 2º

e 3º ciclos). Atende, atualmente, 1004 alunos, sendo 484 no período matutino e 520 no

período vespertino. Oferece, ainda, o segundo ciclo (1º e 2º agrupamentos) da educação

infantil (PPP, 2012). A distribuição das turmas, em 2011, ocorreu por período (Quadro 4).

Quadro 4: Distribuição das turmas da escola Rosalino Antônio da Silva, por modalidade e turnos,

ano 2011

Modalidade Turno (s) Nº turmas

Educação infantil Matutino/vespertino 8

Escola organizada por ciclos de formação humana I ciclo Matutino 11

Escola organizada por ciclos de formação humana II ciclo Matutino/vespertino 24

TOTAL 43

Fonte: Elaborado com base no PPP (2012).

Os professores dessa unidade escolar, em sua maioria, possuem pós-graduação, e

sendo, portanto, qualificados. Porém, a escola não atingiu a meta do IDEB para 2011,

mantendo-se em estado de Alerta, pois atingiu a classificação 4,7 nos anos iniciais e 4,1 nos

anos finais, ficando com índice abaixo do estipulado, que era de 4,9 para 2011. A diretora da

escola foi eleita no ano de 1998 e, até a data da pesquisa, permanecia no cargo.

30

2.4 A busca pelos sujeitos da pesquisa

Iniciei a pesquisa entrando em contato com a tutora do programa Pró-Letramento da

Secretaria Municipal de Educação, professora Dulcilene Rodrigues Fernandes, a qual trabalha

com a formação continuada de professores alfabetizadores no município de Rondonópolis –

MT desde o ano de 2000. Em 2010, foi formadora da primeira etapa do Programa Pró-

Letramento e em 2011, continuava ministrando o curso, nessa ocasião, com outra turma.

Busquei esse contato, na expectativa de que ela pudesse indicar algumas professoras

alfabetizadoras que estivessem dispostas a colaborar com a pesquisa.

Neste intuito, no dia trinta de junho, estive presente no curso Pró-Letramento na

Secretaria Municipal de Educação e Cultura, no período matutino. Na ocasião, a coordenadora

do curso me indicou algumas possibilidades de contato. Conversei, então, com a diretora

Solange, da escola Gildázia Sousa Pirozzi. Ela apontou-me algumas professoras que talvez

aceitassem a pesquisadora na sala de aula para fazer o trabalho de coleta de dados. Conversei

com três professoras que trabalham nesta escola, porém elas se recusaram a fazer parte da

pesquisa alegando que estavam com alunos muito indisciplinados em sala de aula e que a

presença de outra pessoa (pesquisadora) em sala, dificultaria o trabalho pedagógico delas.

Conversei com outras personagens deste encontro e percebi que encontrar pessoas

dispostas a colaborar com a pesquisa, não seria tarefa fácil, talvez por se sentirem invadidas,

vigiadas ou até mesmo constrangidas com a presença do pesquisador em sala de aula.

Assim, percebendo a dificuldade de encontrar os sujeitos de pesquisa, nesta segunda

etapa do curso Pró-Letramento e conversando com a professora Arlete, da escola Rosalino

Antônio da Silva, obtive a informação de que as professoras dessa escola fizeram o Pró-

Letramento no ano de 2010 e estavam trabalhando com as primeiras fases do primeiro ciclo.

Então, fui até a escola, conversei com a professora Carina1, da terceira fase, e com a

professora Bia, da segunda fase do primeiro ciclo, expliquei o objetivo da pesquisa e, a partir

deste primeiro contato, combinei que, assim que se iniciasse o segundo semestre,

começaríamos o trabalho de coleta de dados. Com a definição das professoras alfabetizadoras

da primeira e segunda fases, ainda faltava uma professora da primeira fase para completar o

trabalho. Assim, estive na escola José Antônio da Silva e conversei com a professora Ana, da

1 Optei por pseudônimos para me referir aos sujeitos da pesquisa. As professoras serão assim chamadas: Ana (1ª

fase do 1ºciclo), Bia (2ª fase do 1ºciclo) e Carina (3ª fase do 1ºciclo).

31

primeira fase do primeiro ciclo, que também participou do curso Pró-Letramento no ano de

2010. Ela se mostrou aberta e se dispôs a colaborar com a pesquisa.

No dia dois de agosto, quando se iniciou o segundo semestre, retornei às escolas

selecionadas e conversei com as professoras. Nesta ocasião, marcamos o dia da entrevista e

das observações em sala de aula. Assim, as observações foram realizadas durante todo o

segundo semestre nas terças-feiras: no primeiro horário (07:00h às 09:00h), na sala da

professora Carina e no segundo horário (09:30h às 11:00h), na sala da professora Bia.

Em contato com a professora Ana, da Escola Municipal José Antônio da Silva,

combinamos que a observação das aulas aconteceria todas as sextas feiras, no horário das

07:00h às 09:00h, que era o dia destinado ao trabalho com a produção textual. A partir deste

primeiro contato marcamos o dia para a entrevista inicial e esclarecemos o protocolo a ser

seguido nos momentos de observação e entrevistas:

a) Roteiros de entrevistas semiestruturadas, sendo um inicial (Apêndice A) e outro

final (Apêndices C, D e E), onde procurei depreender das respostas dos sujeitos de

pesquisa aspectos sobre: formação e experiência profissional, compreensão de

alfabetização e letramento, concepção de formação continuada, visão a respeito do

programa Pró-Letramento, metodologias utilizadas em sala para obtenção de bons

resultados na alfabetização.

b) Protocolos de Observação, por meio de relatórios narrativo-descritivos, escritos a

partir da observação do trabalho docente na sala de aula, constando de cabeçalho

com identificação, data, hora e linhas numeradas, nos quais procurei registrar o

maior número possível de dados considerados relevantes para a pesquisa.

c) Entrevista semiestruturada com a tutora do Programa Pró-Letramento do município

de Rondonópolis, Dulcilene Rodrigues Fernandes, com a finalidade de

compreender a dinâmica do curso, bem como análise dos seus relatórios mensais.

d) Conversas informais e minientrevistas2, as quais consistiam na explicitação dos

detalhes e nos encaminhamentos pedagógicos os quais aconteceram em momentos

nos quais a pesquisadora não estava presente em sala.

2 As minientrevistas aqui mencionadas são uma variante do que Cardoso (2008) denominou como entrevistas de

explicitação, as quais consistiam na exposição, por parte da criança da sua visão sobre o texto produzido, por

meio da interação oral. No caso desta pesquisa, devido à minha participação em eventos e congressos fora do

estado, para apresentação de trabalhos, não foi possível presenciar todas as aulas de produção de textos que

ocorreram durante o período que compreendeu esta pesquisa. Dessa forma, para não perder o fio condutor da

análise, após retornar desses compromissos, observei, nos cadernos dos alunos, todas as atividades escritas

realizadas em sala de aula e, de posse das atividades desenvolvidas, realizei minientrevistas de explicitação com

32

e) Pesquisa documental: busquei informações na proposta do Pró-Letramento, no

plano político e pedagógico da escola, nas atividades nos cadernos das crianças, e

nos documentos elaborados pela Secretaria Municipal de Educação - SEMEC.

2.5 Os sujeitos da pesquisa

Os sujeitos dessa pesquisa foram escolhidos mediante a participação no programa de

formação continuada Pró-Letramento, que, conforme já frisado, foi implantado pelo MEC em

2005 e teve a adesão da Secretaria Municipal de Educação de Rondonópolis - MT em 2010, e

continuidade em 2011. Trata-se de um curso voltado aos professores alfabetizadores que traz

contribuições no sentido de proporcionar um trabalho com a alfabetização sistematizado e

com objetivos claros, que tenham como princípio o alfabetizar letrando, ou seja, de acordo

com Rojo (2010), criando eventos de letramento que possam integrar os alunos a práticas de

leitura e escrita socialmente relevantes que estes ainda não dominam.

As personagens desta pesquisa estão caracterizadas no Quadro 5.

Quadro 5 - Caracterização dos sujeitos da pesquisa

Professora Ana Bia Carina

Formação

acadêmica

Letras; Especialização em

Língua Portuguesa

Pedagogia; Esp. em

Lazer e Recreação

Pedagogia; Esp. em

Metodologia de Ensino

Situação

funcional Efetiva Efetiva Efetiva

Idade Não informada 38 39

Experiência no

magistério 17 anos 17 anos 18 a 19 anos

Tempo nessa

escola 17 anos 17 anos 16 anos e meio

Fase em que atua 1ª fase do 1º ciclo 2ª fase do 1º ciclo 3ª fase do 1º ciclo

Fonte: Dados da pesquisa.

É notório que se trata de professoras que estão num mesmo patamar de formação e

situação funcional, são consideradas, neste caso, experientes, pois estão há cerca de dezessete

anos trabalhando com o ensino fundamental e com alfabetização. É possível afirmar que as

três professoras atuam em sala de aula por se identificarem com o trabalho pedagógico, visto

as professoras a fim de que elas esclarecessem-me qual o planejamento e as etapas seguidas para se chegar à

produção final.

33

que todas tiveram um ano de experiência na coordenação da escola, mas não se identificaram

com as responsabilidades do cargo. É o caso da professora Ana, que ficou um ano e meio na

coordenação e quis voltar para a sala de aula; da professora Bia, que passou um ano na

secretaria municipal de educação, mas não se identificou com a nova função e da professora

Carina, que, em 1998, assumiu provisoriamente a coordenação da escola por seis meses e não

gostou da experiência.

Ressalto aqui o tempo de serviço das professoras: as três possuem 17 anos de

experiência com a alfabetização no município de Rondonópolis. O momento histórico em que

elas estão coincide com o período de reorganização da SEMEC. A política de formação

continuada da secretaria de educação de Rondonópolis é uma conquista relativamente recente,

que, por esforços de uma equipe comprometida com a qualidade na educação, vem se

transformando no sentido de buscar uma melhoria substancial na educação de uma forma

geral.

Tive acesso ao documento da SEMEC intitulado Relato de uma caminhada, elaborado

por Cunha, Khun e Souza (2000), do qual é possível depreender uma série de transformações

pelas quais a secretaria passou no período de 1991 a 1999. Momento em que surge a

preocupação com uma nova concepção de escola, com a implantação do CBA (Ciclo Básico

de Alfabetização). Vários projetos foram implantados pela SEMEC, ao longo dos anos, no

intuito de propiciar a melhoria da qualidade na educação. A seguir, com base nas autoras, cito

alguns deles:

1998: Projeto Crescer Com Sucesso: com o objetivo de melhorar o processo ensino-

aprendizagem, implementando um processo de avaliação contínua e cumulativa de caráter

diagnóstico e formativo. Esse projeto tinha como objetivo maior a implantação da escola

organizada por ciclos. O que ocorreu, a princípio, em algumas escolas que dele participaram

reduziu em 50% o índice de reprovação e evasão do ano anterior.

1999: Implantação do sistema de ciclos em quatro escolas municipais.

1999: Projeto Todos Por Mim: programa de integração entre a secretaria de saúde e a

de educação com o objetivo de incluir todas as crianças numa política de educação para todos.

Neste ano, houve a realização do I seminário de saúde escolar, com palestras para pais,

educadores, técnicos, psicólogos, diretores sobre conceitos como distúrbios de aprendizagem,

fracasso escolar, integração e saúde.

2000: Curso de capacitação para todos os professores das primeiras séries e fases, a

fim de estudar a infância relacionada com as diferentes concepções, representações e

propostas pedagógicas com contribuições da Psicologia e da Alfabetização. Além disso,

34

houve a definição de um calendário de capacitação com o objetivo de fornecer subsídios ao

professor para a compreensão das mudanças na avaliação, com a implantação do caderno de

campo, do parecer descritivo e abolição da nota.

Nesse sentido, a política da SEMEC ressalta a importância de um ensino fundamental

inclusivo que promova o acesso e a permanência de todas as crianças na escola. Aconteceram

palestras nas comunidades escolares da rede, com o objetivo de divulgar informações sobre o

papel do pai e da mãe na educação dos filhos, ressaltando a importância do diálogo e do afeto.

Dessa forma, pelo cenário acima delineado, é possível afirmar que as professoras

participaram desse momento histórico que, de alguma forma, influenciou as práticas

desenvolvidas no interior da escola.

2.6 Os instrumentos de coleta de dados

Nessa etapa da pesquisa, a coleta de dados foi planejada conforme já explicitado

anteriormente, na sala da professora Bia e Carina todas as terças-feiras do segundo semestre

de 2011, sendo o primeiro horário destinado à coleta de dados na sala da professora Carina (3ª

fase do 1º ciclo) e o segundo horário na sala da professora Bia (2ª fase do 1º ciclo), horário

pontual para a produção de texto. A professora da 1ª fase, Ana, esclareceu-me que o trabalho

com a produção textual era feito todas as sextas-feiras, das 07:00h às 09:00 horas.

Dessa forma, interessada no trabalho com a produção de textos é que me adentrei nas

salas de aula no horário combinado.

As observações realizadas (Quadro 6) tiveram como objetivo principal verificar como

estava sendo desenvolvida a prática pedagógica com a produção textual, quais os recursos

utilizados pelas professoras e os gêneros textuais que circulam em sala. O enfoque maior

destas observações era como as professoras orientavam a produção de textos, se essa

atividade era prazerosa e como se dava esse processo de escrita.

Foram realizadas 90 horas de observação de aulas (Quadro 6) assim distribuídas:

a) 32 horas na sala da primeira fase, com início no dia 05/08/2011 e término no dia

14/12/2011.

b) 28 horas na sala da segunda fase, iniciando no dia 09/08/2011, com término no dia

16/12/2011.

c) 30 horas na terceira fase, sendo o início no dia 09/08/2011 e o final no dia 09/12/

2011.

35

Quadro 6: Relação das observações realizadas em sala de aula, por professora, no período de

Agosto a dezembro de 2011

Profª Ana - Escola A3 Profª Bia - Escola B

4 Profª Carina - Escola B

Protocolo Dia Horas Protocolo Dia Horas Protocolo Dia Horas

A1 05/ago 2 B1 09/ago 2 C1 09/ago 2

A2 12/ago 2 B2 23/ago 2 C2 23/ago 2

A3 26/ago 2 B3 05/set 2 C3 05/set 2

A4 09/set 2 B4 13/set 2 C4 13/set 2

A5 16/set 2 B5 20/set 2 C5 20/set 2

A6 23/set 2 B6 04/out 2 C6 04/out 2

A7 20/out 2 B7 13/out 2 C7 13/out 2

A8 12/nov 2 B8 18/out 2 C8 18/out 2

A9 18/nov 2 B9 20/nov 2 C9 29/nov 2

A10 25/nov 2 B10 29/nov 2 C10 07/dez 4

A11 02/dez 4 B11 15/dez 4 C11 08/dez 4

A12 13/dez 4 B12 16/dez 4 C12 09/dez 4

A13 14/dez 4 - - - - - -

TOTAL 13 32 12 28 12 30

Fonte: Dados da pesquisa.

É preciso esclarecer que não foi possível estar presente em todos os dias combinados,

devido aos feriados e à participação da pesquisadora em eventos e congressos, sendo

necessária a reposição dos dias faltosos, modificando alguns dias e, ao final das observações,

ampliando o horário que, a princípio, era de duas horas, para quatro horas (Quadro 6).

Como eu havia dito que observaria apenas as aulas de produção textual, as professoras

me perguntaram o porquê de ter que observar todas as aulas, então esclareci que era para que

eu tivesse um tempo maior para a coleta de dados e, como o ano letivo já estava acabando,

isso só seria possível se eu ficasse um tempo maior na sala. Expliquei às professoras que não

era preciso que elas modificassem o plano de aula traçado, ao que elas questionaram “mas

pode ser aula de qualquer disciplina?” e eu disse que sim, que estaria presente durante a aula,

para captar os dados relevantes e que me interessavam.

Levando-se em consideração o tempo em que estive na escola, aos poucos conquistei a

confiança dos alunos, pois quando era solicitada pela professora, colaborava auxiliando-os nas

atividades pedagógicas.

3 Escola A - Escola Municipal José Antônio da Silva.

4 Escola B - Escola Municipal Rosalino Antônio da Silva.

36

Foram feitas duas entrevistas (Quadro 7) com os sujeitos da pesquisa sendo uma

inicial, cujo roteiro encontra-se no Apêndice A, realizada no dia 15/08/2011 com as

professoras Bia e Carina da segunda e terceira fases do primeiro ciclo, e no dia 16/08/2011,

com a professora Ana da primeira fase do primeiro ciclo; e uma entrevista final nos dias: 19 e

20/12/2011, sendo que a professora da 1ª fase foi entrevistada no dia 19 (Apêndice C) e as

professoras da 2ª e 3ª fases, no dia 20 (apêndices D e E, respectivamente).

Quadro 7: Distribuição das entrevistas por professora no período de agosto a dezembro 2011

Professoras Entrevista inicial (2001a) Entrevista final (2011b)

Ana 16/ago 19/dez

Bia 15/ago 20/dez

Carina 15/ago 20/dez

Fonte: Dados da pesquisa.

A primeira entrevista serviu de base para a realização da segunda entrevista, no

sentido de procurar compreender a relação entre os cursos de formação continuada, a

trajetória dessas professoras e a prática pedagógica desenvolvida por elas, em sala de aula. Ao

todo, o tempo de gravação gira em torno de uma hora e vinte minutos na entrevista inicial e

uma hora e quarenta minutos na entrevista final. Essas gravações foram feitas na própria

escola, no horário destinado a Hora de Trabalho Pedagógico Coletivo (HTPC).

Após a entrevista, fiz a transcrição para arquivos de textos do Word, para leitura,

compreensão e análise das falas das professoras, procurando depreender dessas a importância

atribuída à formação continuada, ao programa Pró-Letramento, no sentido de verificar quais

as metodologias adotadas por elas a partir da participação das mesmas neste curso. Além

disso, nas entrevistas foram abordadas questões sobre método de ensino, uso de cartilhas,

compreensão das palavras alfabetização e letramento, bem como as dificuldades encontradas

na alfabetização das crianças, entre outros aspectos.

Além das entrevistas com as professoras, inicialmente, entrevistei a tutora (seguindo

roteiro constante no Apêndice B) que organiza o programa Pró-Letramento na SEMEC de

Rondonópolis – MT. Na oportunidade, procurei compreender melhor a dinâmica do curso e a

metodologia utilizada por ela no seu trabalho com a formação continuada.

Para que o leitor tenha uma visão ampla acerca das etapas de coleta de dados, a seguir

apresento um resumo dos passos dessa investigação:

1º- Orientação da professora Cancionila Janzkovski Cardoso, instigando e sugerindo a

pesquisa no campo da formação de professores alfabetizadores, o Pró-Letramento, visto que,

37

por ser uma das formadoras de tutores em nível nacional, sabe da importância desse

Programa, enquanto possibilidade de melhoria na qualidade da educação.

2º- Participação de um encontro (30/06/2011) na Secretaria de Educação do Município

de Rondonópolis - MT (SEMEC) e agendamento de entrevista com a tutora do programa.

3º- Entrevista com a tutora do programa.

4º- Procura pelos sujeitos de pesquisa, por meio de conversas informais com

professores da Rede.

5º- Reunião com as professoras sujeitos de pesquisa para agendamento da entrevista

inicial e esclarecimento do interesse da pesquisadora na perspectiva dos objetivos propostos

pelo projeto de pesquisa.

6º- Observação das aulas no período de agosto a dezembro de 2011, uma vez por

semana em cada sala, com protocolos de observação (narrativo/descritivo) e coleta de

atividades realizadas em sala.

7º- Entrevista final com os sujeitos de pesquisa.

Por estar envolvida com a pesquisa de campo, pude participar de alguns eventos

pedagógicos e culturais desenvolvidos pela escola, tais como: festa do dia das crianças, na

escola Rosalino Antônio da Silva e encerramento do projeto de escrita e comemoração dos 25

anos da escola José Antônio da Silva.

Nesse sentido, acredito que pelo trabalho realizado, pelo plano de estudo traçado, pelo

interesse e dedicação no desenvolver desta pesquisa, o detalhamento dos dados enriquecerá o

diálogo e trará discussões importantes para a questão de pesquisa que move esta investigação.

38

3 CONCEPÇÕES TEÓRICAS DA PESQUISA

No capítulo anterior apresentei o contexto em que se realizou esta pesquisa,

explicitando sua opção metodológica e os instrumentos de coleta de dados que asseguraram o

corpus para análise. A seguir, trago um estudo bibliográfico sobre a concepção de linguagem

adotada nesta pesquisa, com aprofundamento na teoria dos gêneros do discurso introduzida

por Bakhtin (1997; 2010) e ampliada por Marcuschi (2005) e Dolz e Schneuwly (2004).

3.1 O dialogismo e o interacionismo no processo de construção do pensamento

Sabemos que o processo de construção da produção de um texto não é um ato

involuntário, baseado na inspiração e no dom. O ato da escrita de um texto é algo que

envolve uma série de processos cognitivos que se baseiam em teorias complexas e que

merecem um aprofundamento maior para dar suporte ao trabalho desta pesquisa.

Buscando fundamentação teórica nos pressupostos filosóficos de Bakhtin, procurei

compreender as concepções de linguagem que o autor aborda e que perpassa este trabalho.

Uma das teorias defendidas por Bakhtin é o sóciointeracionismo que privilegia o contexto e

que defende que as informações por nós compreendidas provêm de experiências vivenciadas

pelos nossos corpos ao interagirem nos ambientes: físico, psíquico, cultural e social nos quais

nos situamos.

Nesta perspectiva sócio interacional, de acordo com Bakhtin (2010), o significado não

é inerente à linguagem, mas sim construído pelos participantes do discurso, que agem no

mundo através da linguagem. Nesse sentido, o discurso, a aprendizagem e a cognição são

entendidos como processos sociais e subjetivos.

Bakhtin, através da noção de dialogismo, advoga que cada voz é uma concepção de

mundo e que, das diferentes concepções, surge uma nova visão. Ou seja, o outro é concebido

como sujeito, com pensamentos próprios que são importantes para a construção de sentido

que emerge da síntese dialética de todas as vozes, dando origem ao que Bakhtin concebe

como polifonia. Para o autor, a produção das ideias, do pensamento, dos textos tem sempre

um caráter coletivo e social. Assim, é por meio das ideias do outro que o nosso próprio

pensamento é formado. O nosso pensamento é expresso por meio das palavras, dos signos e,

para Bakhtin (1997):

39

A palavra (e em geral, o signo) é interindividual. Tudo o que é dito,

expresso, situa-se fora da “alma”, fora do locutor, não lhe pertence com

exclusividade. Não se pode deixar a palavra para o locutor apenas. O autor

(o locutor) tem seus direitos imprescritíveis sobre a palavra, mas também o

ouvinte tem seus direitos, e todos aqueles cujas vozes soam na palavra têm

seus direitos (não existe palavra que não seja de alguém). A palavra é um

drama com três personagens (não é um dueto, mas um trio). E representado

fora do autor, e não se pode introjetá-lo (introjeção) no autor. (BAKHTIN,

1997, p. 350, grifo do autor).

Bakhtin sugere que o indivíduo deve apreender e construir a realidade a partir da

relação social com o outro e isso se dá por intermédio da linguagem, sendo que, dessa forma,

a produção do conhecimento, a cognição, é fundamentalmente um artefato social.

O autor elabora, ainda, o conceito da apropriação baseado na interlocução, ou seja, no

diálogo, pois os indivíduos se apropriam, internalizam, recriam ideias e conceitos de outros

através do contato social. O autor salienta que só há compreensão da língua dentro de um

contexto e de um meio social, mediada pela interação.

Assim “a enunciação é o produto da interação de dois indivíduos socialmente

organizados e, mesmo que não haja um interlocutor real, este pode ser substituído pelo

representante médio do grupo social ao qual pertence o locutor.” (BAKHTIN, 2010 p.116)

Percebemos, assim, que os conceitos de interação, dialogismo e apropriação estão

interligados por meio de uma noção semântica e que esses se indicam e se explicam

reciprocamente. É possível compreender que o centro organizador da enunciação não é

interior e subjetivo, mas está centrado no meio social que envolve o indivíduo.

De acordo com a perspectiva bakhtiniana, toda palavra vem de outrem, nasce na

interação interpessoal, dessa forma, toda ação de linguagem só toma forma e evolui sob o

prisma da interação contínua com os enunciados individuais do outro. Presentes, de maneira

dialógica em todo e qualquer discurso, manifestam-se os elementos ideológicos, históricos,

sociais e culturais que o sustentam. É por isso que:

[...] em toda enunciação, por mais insignificante que seja, renova-se sem

cessar essa síntese dialética viva entre o psíquico e o ideológico, entre a vida

interior e a vida exterior. Em todo ato de fala, a atividade mental subjetiva se

dissolve no fato objetivo da enunciação realizada, enquanto que a palavra

enunciada se subjetiva no ato de decodificação que deve, cedo ou tarde,

provocar uma codificação em forma de réplica. Sabemos que cada palavra se

apresenta como uma arena em miniatura onde se entrecruzam e lutam os

valores sociais de orientação contraditória. A palavra revela-se, no momento

de sua expressão, como o produto da interação viva das forças sociais. É

assim que o psiquismo e a ideologia se impregnam mutuamente no processo

único e objetivo das relações sociais. (BAKHTIN, 2010, p. 67).

40

Bakhtin considera e analisa o signo, ou seja, a palavra, em seu sentido ideológico. E,

por ser ideológico, o signo é dinâmico e passível de interpretações várias, pois aparece num

terreno interindividual entre homens organizados socialmente. Mas, para que um sistema de

signos se constitua, faz-se necessário que o meio social e ideológico dos indivíduos seja o

mesmo, para que se compreendam e formem um grupo.

O signo ideológico é pertencente tanto ao campo da ideologia, quanto do psiquismo,

pois o ser enquanto socialmente e ideologicamente constituído não está desprovido de

individualidade, ademais, por ser autor de seus pensamentos e detentor de seus desejos e

portador de uma consciência é que se pode afirmar que o mesmo apresenta-se como

fenômeno sócio ideológico. Bakhtin afirma que:

o conteúdo do psiquismo “individual” é, por natureza, tão social quanto a

ideologia e, por sua vez, a própria etapa em que o indivíduo se conscientiza

de sua individualidade e dos direitos que lhe pertencem é ideológica, história

e internamente condicionada por fatores sociológicos. Todo signo é social

por natureza, tanto o exterior quanto o interior. (BAKHTIN, 2010, p. 59 –

grifo do autor).

O autor faz uma análise a fim de distinguir o conceito do que é individual, natural e

isolado do mundo social e o conceito de individualidade que se apresenta como social, pois

se coloca acima do indivíduo. Na verdade, Bakhtin apresenta o conceito da palavra

individualidade em duas acepções: a individualidade natural e a personalidade. Assim, é

possível compreender que “Todo produto da ideologia leva consigo o selo da individualidade

do seu ou dos seus criadores, mas este próprio selo é tão social quanto todas as outras

particularidades e signos distintivos das manifestações ideológicas.” (BAKHTIN, 2010, p.

60).

Nessa perspectiva, é possível afirmar que o ser, o indivíduo, age de acordo com seu

pensamento, sua individualidade, sua forma de raciocinar, e é determinado e influenciado

pelo meio em que vive, com suas nuances históricas, culturais e sociais. Assim, nosso

pensamento pertence ao sistema ideológico e é subordinado a suas leis.

Bakhtin entende essa individualidade como introspecção e esta constitui um ato de

compreensão tendenciado ideologicamente pelo meio, por isso, pode-se afirmar que o

psiquismo e a ideologia não se separam, mas se impregnam mediados pelas relações sociais.

É nesse sentido que o pensamento, para ser exteriorizado e compreendido, passa pela

expressão, definida pelo teórico como “tudo aquilo que, tendo se formado e determinado de

41

alguma maneira no psiquismo do indivíduo, exterioriza-se objetivamente para outrem com a

ajuda de um código de signos exteriores.” (BAKHTIN, 2010, p. 115).

O autor afirma, ainda, que a expressão é formada por duas faces, o conteúdo, ou seja,

o que se forma através do psiquismo, da individualidade, e sua objetivação exterior que nada

mais é do que a materialização do pensamento para o outro ou para si mesmo, através de

algum código passível de compreensão exterior. Bakhtin afirma que, segundo a corrente do

subjetivismo individualista, a fonte da expressão está no interior, propõe-se assim um

dualismo entre expressão interior e exterior, com primazia da primeira. O filósofo, porém,

discorda dessa concepção afirmando que não há uma distinção qualitativa entre o conteúdo

interior e a expressão exterior, pois, para ele, “o centro organizador e formador não se situa

no interior, mas no exterior. Não é a atividade mental que organiza a expressão, mas, ao

contrário, é a expressão que organiza a atividade mental que a modela e determina sua

orientação.” (BAKHTIN, 2010, p. 116).

Assim, a situação social dinâmica, histórica e mutável é que redimensiona as nossas

formas de expressão, e esta não pode ser dissociada da relação com o outro, a que caracteriza

a interação. Um dos princípios colocados por Bakhtin é que a enunciação é o produto da

interação entre seres organizados socialmente.

A palavra é vista como um elo entre o locutor e o interlocutor, é por meio dela que

surge o princípio do dialogismo, da relação do homem com o outro, da interação

intermediada pelas relações sociais. Ou seja, a palavra poderá variar e/ou modificar em

função do interlocutor, se adequando às situações reais de produção. Bakhtin defende que “A

situação social mais imediata e o meio social mais amplo determinam completamente e, por

assim dizer, a partir do seu próprio interior, a estrutura da enunciação.” (BAKHTIN, 2010,

p.117).

Já a enunciação, para o autor, possui dois níveis de compreensão: tema e significação.

Entende-se por significação os elementos que são reiteráveis e idênticos em uma enunciação.

A significação de uma enunciação pode ser analisada concretamente observando seus

aspectos morfológicos, sintáticos e sua forma de entoação caracterizada pela pontuação.

O tema, por sua vez, é o sentido completo de uma enunciação, dado não só pelos

elementos verbais, como também, e fundamentalmente, por elementos extraverbais, pelas

condições externas e históricas que a enunciação pertence. Evidencia-se, assim, o caráter

múltiplo de sentido da palavra. Deste ponto de vista, não se pode separar o tema de sua

significação e vice-versa, pois o primeiro está no nível da consciência, do pensamento,

42

interligado a fatores históricos e sociais e o segundo é a concretização do primeiro, através de

um aparato técnico relativo ao funcionamento do código linguístico a que pertence.

Assim, na teoria bakhtiniana, toda e qualquer palavra se dirige a alguém, seu sentido

só se completa na medida em que a compreensão se faz ativamente, em forma de réplica ao

que foi dito, num movimento dinâmico que garante a compreensão.

Compreender é opor à palavra do locutor uma contra palavra evidenciando-se uma

forma de diálogo, ininterrupto e dinâmico. A concepção de linguagem, na teoria bakhtiniana,

é sempre dialógica, não há palavra que seja a primeira ou a última, e não há limites para o

contexto dialógico, em cada um dos pontos do diálogo que se desenrola, pode-se perceber

uma infinidade de outros diálogos, de outras vozes que perpassam o discurso estabelecido e,

quando se pensa que este está pronto e acabado, o mesmo surge numa forma renovada, num

novo contexto, festejando seu renascimento (BAKHTIN, 1997, p. 414).

Na fala cotidiana, segundo o autor, pelo menos a metade das palavras pronunciadas

provém de outrem. Na fala de todo e qualquer locutor é possível se observar citações ou

referências de outras falas, de outras expressões ditas ou veiculadas publicamente através de

jornais, revistas, livros, propagandas, leis, etc., que afloram com novos sentidos, novas

interpretações e novos significados, evidenciando-se assim o caráter dialógico da linguagem.

A partir das ideias acima discutidas e pensando no caráter dialógico da linguagem,

aprofundarei o estudo aqui proposto, redirecionando o foco para a noção de gêneros do

discurso conceituado por Bakhtin (1997), no seu livro “A estética da comunicação verbal” e

ampliado por Marcuschi (2008) e Dolz e Schenewly (2004).

3.2 Gêneros do discurso: conceituação

Bakhtin conceitua e define os gêneros como tipos de enunciados, relativamente

estáveis e normativos, que estão vinculados a situações típicas da comunicação social. Como

tipos temáticos, estilísticos e composicionais dos enunciados, individuais, os gêneros se

constituem historicamente a partir de novas situações de interação verbal, da vida social que

vão se estabilizando no interior das diferentes esferas sociais. Os gêneros, segundo o autor,

estão ligados às situações sociais da interação: qualquer mudança nessa interação ocasionará

a mudança no gênero.

As formas típicas da estruturação do gênero estão relacionadas às esferas de

comunicação verbal em que os sujeitos estão inseridos. Num simples diálogo ou na

elaboração de um artigo científico, uma resenha ou num texto publicitário é preciso moldar a

43

nossa fala às formas do gênero e, notadamente, na interação social entre indivíduos que

convivem entre si, pois

bem nas primeiras palavras é possível pressentir-lhe o gênero, prever-lhe o

volume (a extensão aproximada do todo discursivo), a dada estrutura

composicional, prever-lhe o fim ou seja, desde o início, somos sensíveis ao

todo discursivo que, em seguida, no processo da fala, evidenciará suas

diferenciações. Se não existissem os gêneros discursivos e se não os

dominássemos, se tivéssemos de criá-los pela primeira vez no processo da

fala, se tivéssemos de construir cada um de nossos enunciados, a

comunicação verbal, seria quase impossível. (BAKHTIN, 1997, p. 302).

Marcuschi (2005, p. 18) amplia o conceito de gênero introduzido por Bakhtin

afirmando que os gêneros não devem ser encarados “como modelos estanques e nem como

estruturas rígidas, mas como formas culturais e cognitivas de ação social corporificadas de

modo particular na linguagem, temos de ver os gêneros como entidades dinâmicas”. O autor

afirma que os gêneros são artefatos poderosos que condicionam a escolha do léxico, do grau

de formalidade e da natureza do tema numa determinada produção textual. Porém, apesar de

delimitar alguns aspectos da produção escrita, impondo-lhe restrições e padronizações, o

gênero também nos possibilita um convite a escolhas, estilos, criatividade e variação.

Marcuschi (2005) afirma que como a língua varia, os gêneros também o fazem,

adaptando-se, modificando-se, ampliando-se e transformando-se a fim de atender às

necessidades sociais de comunicação. Não se pode conceber o gênero dentro de uma

classificação rígida e estanque que privilegia a forma e a estrutura, pelo contrário, os gêneros

devem ser encarados como “formações interativas, multimodalizadas e flexíveis de

organização social e de produção de sentidos. Assim, um aspecto importante na análise do

gênero é o fato de ele não ser nem estático e nem puro.” (MARCUSCHI, 2005, p. 19).

Dessa forma, é possível compreender que, para se trabalhar com os gêneros textuais

em sala de aula, é preciso perceber que não basta simplesmente classificá-lo e produzi-lo de

forma solta e descontextualizada, mas sim vinculado, como afirma o autor, a uma cultura,

numa situação sócio-discursiva real. Percebe-se nesta concepção teórica de Marcuschi

(2005), que o mesmo não foge à vertente bakhtiniana, uma vez que nesta teoria a produção e

a mudança dos gêneros estão relacionadas às mudanças históricas. Bakhtin afirma que “a

língua penetra na vida através dos enunciados concretos que a realizam, e é também através

dos enunciados concretos que a vida penetra na língua.” (BAKHTIN, 1997, p. 282).

Marcuschi (2005) faz alusão ao trabalho de investigação de Lopes (2004) sobre os

gêneros que circulam no meio familiar, mesmo por quem não domina o código escrito.

44

Dentre os 30 gêneros que circulam neste meio (cartas, folhetos, conta de energia, avisos,

letreiros, nomes de rua, anúncios, publicidades, lista de compra, etc.), 24 são apenas

recebidos e não apresentam autoria.

Dos 30 gêneros apontados, segundo o autor, apenas cinco foram produzidos pelos

participantes das pesquisas. Destes cinco, somente as cartas e os avisos podem ser

considerados mais complexos, pois os demais são apenas listas que não requerem maiores

esforços cognitivos. Alguns gêneros apontados pela pesquisa de Lopes (2004), como contas

de água e energia, documentos em geral são repetitivos e pouco criativos. Cumprem sua

função social, mas são classificados por Marcuschi como gêneros minimalistas a que as

rotinas de uso recorrem. O autor afirma que as comunidades de baixo nível de letramento

entram em contato com os gêneros mais como consumidores do que como produtores de

gêneros escritos. Os gêneros minimalistas que circulam no cotidiano são “relativamente

rígidos, rotineiros, recorrentes e formulaicos. Não têm autoria característica, nem variação de

estilo. São em boa medida gêneros poderosos como os documentos que são altamente usados

e não produzidos por quem os usa.” (MARCUSCHI, 2005, p. 3).

Transpondo as concepções acima discorridas para o campo pedagógico, percebe-se

que, com a finalidade de que o falante de uma determinada esfera de comunicação seja capaz

de expressar-se com clareza através de um gênero, é necessário um trabalho sistematizado

neste sentido. Quando a criança chega à escola, ela já se comunica, expressando seu

pensamento, suas vontades, seus desejos e preferências através da linguagem oral e informal.

Trabalhar sistematicamente os gêneros textuais desde o início da vida escolar,

mostrando a importância destes na sociedade, é papel do professor. O docente precisa realizar

este trabalho, mas, para isso, é necessário que ele próprio compreenda o significado e a

relevância de determinados gêneros na sociedade. Principalmente, na fase inicial da

escolarização, o professor necessita planejar seu trabalho partindo da realidade do aluno para

que o processo de aquisição da escrita tenha sentido. Dessa forma, ressaltamos, ainda, que a

escola, notadamente na figura do docente, é que deve ter clareza dos usos e das necessidades

dos gêneros que circulam na sociedade e quais aqueles aos quais se deve dedicar com mais

afinco.

3.3 Gêneros textuais e ensino: compreensão e funcionalidade

Compreender o que são gêneros textuais e como realizar um trabalho intencional,

criativo e voltado para a realidade e interesses dos alunos não é tarefa fácil. Infelizmente, nos

45

deparamos com professores alfabetizadores que não compreendem o conceito de gêneros

textuais e tampouco sabem como trabalhar com eles. Sabemos que a orientação dos

Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) (BRASIL,1997) é para que o trabalho com a

língua materna esteja voltado para a teoria dos gêneros discursivos de Bakhtin e para

releituras didáticas dessa teoria feitas por pesquisadores do grupo de Genebra (LOPES-

ROSSI, 2005, p.79).

De acordo com Lopes-Rossi (2005), o conhecimento sobre o trabalho pedagógico

com gêneros discursivos ainda é bastante restrito, por parte dos docentes, de uma forma

geral. Muitos demonstram interessados no assunto, porém carentes de fundamentação teórica

e de exemplos práticos. Ou seja, o como fazer, como trabalhar. Às vezes ouvimos muitas

críticas sobre as ditas “receitas prontas”, mas é preciso que o professor se depare com o que é

novo de forma clara e detalhada, a fim de adaptar seus conhecimentos anteriores, sua

experiência profissional e pessoal no intuito de melhorar a qualidade do ensino.

Os pesquisadores do grupo de Genebra apontam que o trabalho pedagógico com

gêneros discursivos proporciona o desenvolvimento da autonomia do aluno no processo de

leitura e produção textual. Esse trabalho tem como benefício, para ele, o domínio do

funcionamento da linguagem em situações de comunicação, situações essas que devem estar

ligadas ao meio social, histórico e cultural em que o educando está inserido.

Ao professor, nesse contexto, cabe criar condições para que os alunos possam

apropriar-se de características discursivas e linguísticas de diversos gêneros em situações

reais de comunicação.

Os escritos de Dolz e Schneuwly (2004) nos dão uma dimensão bastante clara sobre o

trabalho pedagógico com os gêneros textuais. Ambos são professores e pesquisadores da

Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade de Genebra, são

fundadores de um grupo de pesquisa denominado como Grupo Romando de Análise do

Francês Ensinado (Grafe ). Esse grupo dedica-se a estudos sobre “diferentes temas em

didática do Francês-língua materna, tais como a transposição didática, as interações em sala

de aula e a construção dos objetos ensinados, a produção de textos orais e escritos e o ensino

de literatura.” (ROJO; CORDEIRO, 2004, p. 13).

Dessa forma, por considerar os referidos autores como fundamentais para a realização

das reflexões, é que passarei ao detalhamento de suas pesquisas no tocante a concepções da

noção de gêneros discutida e ampliada por estes autores, que muito contribuíram para a

concretização do intuito pretendido.

46

Para Schneuwly (2004), o gênero é um instrumento. O autor desenvolve esta tese,

levando em consideração os estudos da psicologia vigotskiana e questiona: “Como o

instrumento pode ser um fator de desenvolvimento das capacidades individuais?”

(SCHNEUWLY, 2004, p. 23). A partir desse questionamento, defende a tese de que a ação

do sujeito é mediada por objetos específicos, que são elaboradas socialmente, através de

experiências anteriores que são transmitidas uns aos outros e que se transformam à medida

que são vivenciadas. “Os instrumentos encontram-se entre o indivíduo que age e o objeto

sobre o qual ou a situação na qual ele age: eles determinam seu comportamento, guiam-no

afinam e diferenciam sua percepção da situação na qual ele é levado a agir.”

(SCHNEUWLY, 2004, p. 23).

Essa concepção tripolar da atividade (sujeito-instrumento-situação) permite a

transformação dos comportamentos. Pois a partir do momento em que o sujeito compreende e

apropria-se do instrumento, ele é capaz de explorar suas possibilidades transformando-o em

seu benefício para melhor utilizá-lo.

Schneuwly (2004) advoga, ainda, que o instrumento para ser compreendido apresenta

duas faces: o artefato material ou simbólico e o esquema de utilização. O primeiro trata do

produto material existente fora do sujeito, ou seja, que existe por si só, mas que para ser

utilizado, necessita da capacidade cognitiva do sujeito por meio do esquema de utilização.

Assim, o instrumento para ser utilizado pelo sujeito deve conter essas duas faces para, a partir

de sua compreensão, desenvolver-se, provocando novos saberes, ampliando suas

possibilidades, sustentando e orientando novas ações. É possível depreender que os

instrumentos são socialmente elaborados e guiam o comportamento dos sujeitos, que ao

apropriar-se do instrumento é capaz de transformá-lo.

Seguindo a vertente bakhtiniana, o autor define o gênero como: “tipos relativamente

estáveis de enunciados com três elementos que os caracterizam: conteúdo temático, estilo,

construção composicional”. Acrescenta ainda que “a escolha de um gênero se determina pela

esfera, as necessidades da temática, o conjunto dos participantes e a vontade enunciativa ou

intenção do locutor” (SCHNEUWLY, 2004 p. 25). A partir dessa definição, o autor observa

que três elementos devem ser reiterados/evidenciados:

1) A escolha do gênero se dá em função de uma situação, um contexto pré-definido,

observando-se a finalidade, o destinatário e o conteúdo da ação discursiva.

2) A partir dessa base, elege-se um gênero num conjunto de possibilidades de uma

esfera social.

47

3) Definem por si só o que é dizível, mesmo não sendo estáticos e rígidos os gêneros

têm uma composição: uma estrutura definida por sua função, um plano comunicacional. E

por último, são caracterizados por um estilo, não um estilo individual, mas um estilo próprio

do gênero.

Schneuwly (2004) afirma ainda que o gênero é um instrumento semiótico complexo,

pois nessa perspectiva há um sujeito, locutor, enunciador, que age numa situação definida por

vários fatores que lhe permitem a produção e a compreensão de textos. Nesse sentido, para se

utilizar determinado gênero, é preciso compreendê-lo e ajustá-lo às situações de produção. O

gênero, portanto, pode ser concebido como um organizador geral para produção de um texto,

ou seja, um megainstrumento que permite a organização do “conteúdo” da “comunicação” e

do “tratamento linguístico” numa situação real de interação (SCHNEUWLY, 2004, p. 28,

grifo nosso).

Em se tratando dos gêneros e de desenvolvimento da linguagem, o autor,

reinterpretando a versão Bakhitiniana, distingue os gêneros primários e secundários,

sustentando a tese de que a passagem do primeiro para o segundo acontece num movimento

de continuidade e ruptura, sendo que “os gêneros primários são os instrumentos de criação

dos gêneros secundários.” (SCHNEUWLY, 2004, P.35).

O autor define os gêneros primários como instrumentos de:

troca, interação, controle mútuo pela situação;

funcionamento imediato do gênero como entidade global controlando todo

o processo, como uma só unidade;

nenhum ou pouco controle metalinguístico da ação linguística em curso

(SCHNEUWLY, 2004, p. 29).

Já os gêneros secundários podem ser definidos como “não controlados diretamente

pela situação, como funcionando psicologicamente por entidades mais separadas; como

necessitando de outros mecanismos de controle mais potente” (SCHNEUWLY, 2004, p. 30).

É possível perceber nesta definição que os gêneros primários estão intimamente

relacionados com a ação e estabelecem uma relação muito próxima ao presente momento em

que são produzidos. Já os gêneros secundários não são imediatos, pois necessitam de uma

certa estrutura linguística convencional para serem produzidos. Não podem, porém, segundo

o autor, ser considerados descontextualizados uma vez que são estruturados na ação.

48

Os gêneros primários instrumentalizam o falante, é através dos gêneros produzidos

nas interações sociais que o sujeito é capaz de complexificá-los, tornando-os instrumentos de

novas construções.

Schneuwly (2004) define as particularidades de funcionamento dos gêneros

secundários da seguinte forma:

a) Modos diversificados de referência a um contexto linguisticamente criado, que

entendemos como a forma linguística pela qual o texto é estruturado, suas

características, sua coesão interna, assim é possível, por exemplo, entender e

classificar uma narrativa como tal, pelos elementos linguísticos utilizados;

verbos, marcação temporal, sequência de fatos, etc..

b) Modos de desdobramento do gênero.

Se os meios de referência a um contexto linguisticamente criado

caracterizam por assim dizer, os gêneros secundários do interior, asseguram

sua coesão interna e sua autonomia em relação ao contexto, outros meios

asseguram o exterior, seu controle, sua avaliação, sua definição.

(SCHNEUWLY, 2004, p. 31).

Nesse sentido, o autor sugere que os gêneros secundários criam seus

duplos, pois apresentam uma autonomia tal, que é possível modificá-los,

enriquecê-los, complexificando-os cada vez mais.

c) A gestão eficaz dos gêneros secundários pressupõe a existência e a construção de

um aparelho psíquico de produção de linguagem que não funciona mais na

imediatez. Ou seja, esta particularidade pressupõe compreensão e entendimento

para que haja uma decisão acerca das operações discursivas que são transversais

em relação aos gêneros.

Nessa perspectiva, os gêneros secundários não são espontâneos, eles surgem a partir

do domínio da leitura e da escrita, num profundo processo de continuidade e de ruptura que a

passagem do gênero primário para o secundário apresenta. O primeiro nasce na troca verbal

espontânea em situações imediatas reais e automáticas, enquanto que o segundo não está

mais ligado de maneira imediata a uma situação de comunicação, são relativamente

independentes do contexto imediato, visto que sua forma é uma construção complexa de

vários gêneros da esfera cotidiana.

E, por fim, para apropriar-se dos gêneros secundários, o aprendiz necessita transpor o

nível imediato, num esforço cognitivo maior, pois não se trata mais da “esfera das

49

experiências pessoais, mas de um mundo outro que tem motivações mais complexas, que não

são mais necessariamente pessoais (SCHNEUWLY, 2004, p. 33).

A partir dos estudos de Vygotsky, Schneuwly salienta que a fonte do

desenvolvimento de um determinado sistema se dá ora por encontro, conflito, contradição,

tensão entre duas lógicas, entre duas relações, entre dois sistemas a que o teórico denomina

como “Zona Proximal do Desenvolvimento”, que transpondo para a tese defendida pelo

teórico é o que se pode aplicar na passagem dos gêneros primários para os secundários. Nas

palavras do autor “o novo sistema não anula o precedente, nem o substitui [...] mesmo sendo

profundamente diferente, o novo sistema apoia-se completamente sobre o antigo em sua

elaboração, mas, assim fazendo, transforma-o profundamente.” (SCHNEUWLY, 2004, p.

33/34).

A passagem do gênero primário para o gênero secundário, ou seja, de um esquema

mais simples para outro considerado mais complexo não pode ser visto como processos

dicotômicos. Um apoia-se no outro, ou seja, o processo de transformação de um sistema se dá

por profundas retomadas e rupturas criando assim novas formas de organização do

pensamento.

Uma das contribuições de Dolz e Schneuwly (2004) para o ensino foi a chamada

sequência didática que possibilita ao professor a compreensão dos escritos destes autores

para a prática em sala de aula. Mas o que é uma sequência didática?

De acordo com esses pesquisadores, trata-se de atividades planejadas para serem

desenvolvidas numa determinada sequência e têm por finalidade tematizar aspectos

envolvidos na produção de textos organizados em um determinado gênero, de maneira a

possibilitar aos alunos a habilidade de produzi-lo.

São atividades que têm como objetivo as características da estrutura comunicativa

particular pertencentes ao gênero e preveem uma progressão organizada a partir do

levantamento dos conhecimentos que o aluno já possui sobre o gênero a ser trabalhado.

Partindo deste levantamento,

um mapeamento das necessidades de aprendizagem é realizado, com a

finalidade de possibilitar a priorização de aspectos a serem abordados

progressivamente, adequando o grau de complexidade da tarefa e do objeto

as possibilidades de aprendizagem dos alunos. (BRÄKLING, 2000, p. 225).

Além dos aspectos conceituais e procedimentais que o sujeito deve dominar para

realizar determinada tarefa, o desenvolvimento das atividades deve prever a organização

50

adequada do tempo da realização e sequenciação das atividades. Essa organização deverá ser

feita de forma que permita a transformação das capacidades dos alunos.

Assim, de acordo com os autores, “uma sequência didática tem precisamente a

finalidade de ajudar o aluno a dominar melhor um gênero de texto, permitindo-lhe assim,

escrever ou falar de uma maneira mais adequada numa dada situação de comunicação”

(DOLZ; SCHNEUWLY, 2004, p. 97).

Nesse sentido, a sequência didática deve ser realizada sobre um gênero que os alunos

não dominam, ou que ainda não o fazem de forma adequada. O planejamento a partir das

sequências didáticas permitiria, assim, tanto o acesso a esses gêneros dificilmente domináveis,

quanto a sua identificação e produção. Uma sequência didática apresenta, assim, as seguintes

etapas:

a) A “apresentação da situação” (DOLZ; NOVERRAZ; SCHNEUWLY, 2004, p.98-

grifo do autor) caracteriza-se como uma exposição detalhada do projeto que se pretende

desenvolver, em que a turma constrói uma representação da atividade a ser executada. É neste

momento que a atividade ganha significação, pois se trata de uma situação em que se reflete

sobre o que escrever os destinatários da produção (a quem se dirige?) e que forma assumirá a

produção. É nessa etapa que é possível “fornecer aos alunos todas as informações necessárias

para que eles conheçam o projeto comunicativo visado e a aprendizagem de linguagem a que

está relacionado” (DOLZ, NOVERRAZ; SCHNEUWLY, 2004, p. 100).

b) A partir desse primeiro contato com o projeto comunicacional os educandos

realizam a “produção inicial” (DOLZ; NOVERRAZ; SCHNEUWLY, 2004, p. 98- grifo dos

autores), oralmente ou por escrito. A primeira produção é de fundamental importância para o

planejamento das etapas da sequência didática, pois servirá para orientar as ações de

intervenção do professor, bem como evidenciará o caminho a ser percorrido pelo aluno.

A produção inicial é entendida como o primeiro lugar de aprendizagem da sequência,

pois trata-se de uma atividade direcionada e delimitada de maneira precisa e que apontará

possíveis limitações na aprendizagem e abrirá novos horizontes e apontará caminhos a serem

percorridos. E isso servirá para delimitar o que será trabalhado nos módulos.

c) Os “módulos” (DOLZ; NOVERRAZ; SCHNEUWLY, 2004, p. 98- grifo dos

autores) constituem-se da instrumentalização dos educandos para transpor os problemas que

foram visualizados na primeira produção. Ressaltamos que a sequência didática, proposta

pelos autores, vai do complexo para o simples, para posteriormente retornar ao complexo,

produção final.

51

Na produção de textos, os educandos se deparam com níveis diferentes de dificuldades

e com problemas específicos de produção de cada gênero. Baseando-se nas abordagens da

psicologia da linguagem, Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004, p. 104) apontam quatro níveis

principais na produção de textos: a representação da situação de comunicação, a elaboração

dos conteúdos, o planejamento do texto e a realização do texto. Esses níveis evidenciam que o

aluno deve ter uma visão ampla do que será produzido como: o destinatário do seu texto, a

finalidade, o gênero, as técnicas e o vocabulário apropriados e adequados a cada produção.

É por esse motivo que os módulos devem trazer o maior número de atividades

variadas possíveis, que permitam aos educandos a observação e a análise dos textos, para que,

a partir daí, eles possam visualizar os aspectos de funcionamento dos mesmos.

d) Nessa etapa, o educador pode sugerir “tarefas simplificadas” (DOLZ;

NOVERRAZ; SCHNEUWLY, 2004, p.105- grifo dos autores) de produção textual com a

finalidade de que o aluno se concentre em um aspecto da produção de um texto. Assim, o

professor pode propor atividades de reorganização de um conteúdo e até a revisão textual

focada em um determinado aspecto.

Uma linguagem comum entre educador e educando é que propiciará um crescimento

bastante proveitoso no que se refere à qualidade dos textos produzidos, pois este será o

momento de análise crítica a fim de melhorar o texto. Ademais, haverá uma construção

progressiva dos conhecimentos sobre os gêneros por parte dos alunos. Esses conhecimentos

são adquiridos durante a prática de revisão do próprio texto ou para melhor antecipação do

que se deve fazer frente a uma produção textual.

e) As observações dos conhecimentos podem ser listadas e afixadas em cartazes, como

um momento de síntese, antes da produção final, cada módulo é finalizado com um registro

na forma sintética de “lista de constatações, lembrete ou glossário”, denominado pelos

autores de “capitalizações das aquisições” (DOLZ; NOVERRAZ; SCHNEUWLY, 2004,

p.106- grifo do autor).

A partir dessas etapas, acima relacionadas, a sequência culmina com uma produção

final em que o educando colocará em prática os conhecimentos conquistados nos módulos. A

produção final permite ao professor realizar uma avaliação somativa, pois significa um

investimento nas aprendizagens compartilhadas durante os módulos. Nesse sentido “a

avaliação é uma questão de comunicação e de trocas. Assim ela orienta os professores para

uma atitude responsável, humanista e profissional.” (DOLZ; NOVERRAZ; SCHNEUWLY,

2004, p. 108).

52

Delineei, até aqui, as definições de gênero que foram discutidas e ampliadas pelo

grupo de pesquisadores de Genebra, e também conceituei, de acordo com os autores, Dolz e

Scheneuwly (2004), o que denomina-se como sequência didática e posso afirmar que este

trabalho, para ser desenvolvido, tem que ficar muito claro para quem o realiza, pois corre-se o

risco de ser mal interpretado e não passar de chavões e modismos nos cursos de formação

continuada. Acredito que o professor, para realizar um trabalho como este, não pode partir do

individualismo, penso que um trabalho deste nível e com essas características mereça ser

planejado, discutido e colocado em prática na coletividade.

O professor não é o detentor do saber, ao contrário, nessa árdua profissão é também

um aprendiz, que, assim considerado, coloca-se como um ser em evolução. Dessa forma, é na

interação com o outro que o educador adquire novos saberes e o par mais experiente deve

auxiliar o menos experiente, a fim de juntos construírem conhecimentos.

Para que o professor utilize determinado plano de trabalho, é necessário que ele tenha

clareza do que será realizado. Se adotar a alternativa do ensino da produção textual a partir

dos gêneros e da sequência didática, creio que o mesmo deva ter segurança em sua proposta

de trabalho, saber o que é o gênero a ser ensinado, suas características e como deve ser

realizada a sequência didática.

3.4 Interação e aprendizagem

Diante dessas concepções, fica o questionamento: Como a criança consegue

apropriar-se do conhecimento e tornar-se autônoma em relação à aquisição da linguagem

escrita? Qual é o papel do professor nesse processo? Sabe-se que é preciso fazer um trabalho

sistemático para isso, mas qual o melhor caminho a seguir?

Nessa perspectiva, pode-se afirmar que a interação exerce um papel fundamental na

aquisição, na aprendizagem e no processo de construção da linguagem do sujeito.

De acordo com os estudos realizados por Costa (1997), a interação social, na linha

comunicativo-etnográfica-interacionista, é interpretada como “andaime” facilitador da

aprendizagem. A linguagem, nesta vertente, é analisada sob o ponto de vista pragmático

designando comunicação. O autor descreve, também, a interação social do ponto de vista

sócio-construtivista, como a origem da aquisição e da aprendizagem. Sob esse enfoque, a

linguagem analisada sob o prisma discursivo é enunciação polissêmica e polifônica.

53

Pelo processo, então de interação verbal, em que o locutor e destinatário

possuem papel ativo, as vozes do outro são constitutivas do conhecimento e

da linguagem do sujeito em desenvolvimento e não mero andaime facilitador

ou âncora do processo. (COSTA, 1997, p. 26).

Mas o que vem a ser “andaime”? Na acepção literal da palavra andaime é

substantivo masculino

1 m.q. adarve (‘caminho estreito’)

2 Derivação: por extensão de sentido. Rubrica: arquitetura, construção.

m.q. bailéu (‘sacada’)

3 Rubrica: construção; estrado provisório de tábuas, fixo ou móvel,

sustentado por armação de madeira ou metálica sobre o qual os operários

trabalham nas construções; apoiamento. (HOAISS, 2001, p. 37).

Os estudos de Costa (1997) trazem uma nova acepção da palavra andaime. Baseando-

se nos escritos dos sóciointeracionistas Bruner, Wood e Ross (1975,1976 apud COSTA,

1997, p. 37), que desenvolveram a teoria da aquisição da linguagem, o autor defende que a

andaimagem parte do princípio de que a linguagem se desenvolve na criança por meio de

processos de interação social. Nessa teoria, Bruner (1975 apud COSTA, 1997) propõe um

modelo de desenvolvimento mental que envolve tanto a representação mental como a

construção ativa da realidade. Dessa forma, a linguagem é a principal ferramenta mental para

o desenvolvimento cognitivo, mediada tanto pela participação quanto pela instrução.

Bruner (1975 apud COSTA, 1997) apresenta dois componentes para explicar os

processos pelos quais as crianças aprendem a linguagem: o Language aquisition Support

Systen (LASS ) e o Language acquisition Device (LAD). O primeiro (LASS) pode ser

compreendido como a ajuda do adulto, a base, o modelo pelo qual a mãe guiaria e sustentaria

a linguagem emergente da criança, a qual aprenderia a falar e a dominar a linguagem do

grupo social, histórico e cultural em que vive.

E o segundo (LAD) pode ser compreendido como sendo a predisposição que a criança

tem para aprender a linguagem e ter uma interação social ativa. O par mais experiente, neste

caso, construiria estruturas interacionais apropriadas para que o desenvolvimento mental se

processasse. A essa estrutura Bruner (1975 apud COSTA, 1997) denominou “scaffold” (

andaime/escora/ suporte).

Este conceito pode ser comparado ou relacionado à teoria Vigotskyana (1930/1934)

que advoga que as interações com os adultos auxiliam as crianças no desenvolvimento das

funções psicológicas superiores (ação voluntária, memória, percepção e formação de

conceitos). Ou seja, a partir do apoio do adulto (par mais experiente) é que a criança será

54

capaz de agir por si mesma, pois internaliza os conhecimentos que se processam na interação

social e, a partir desse apoio, ela será capaz de executar tarefas de forma autônoma.

Para Beed et al. (1991 apud COSTA, 1997), pode-se diferenciar dois tipos de

“andaime” em pesquisas naturalísticas de aquisição de Língua Materna (LM): o acidental ou

casual e o estratégico. O primeiro refere-se a situações interativas de pais auxiliando os filhos

a se expressarem por si mesmos sem intenção ou consciência de que estão ensinando. No caso

do andaime estratégico, ao contrário, existe uma intencionalidade: jogar um tipo de jogo,

lavar pratos, montar brinquedos, etc..

Assim, apoiado nesses escritos, Costa (1997) depreende quatro características

essenciais implícitas ao conceito de andaime:

A interação se dá num contexto colaborativo onde se valoriza a intenção da

criança;

Pais e crianças trabalham na ZDP (Zona de Desenvolvimento Proximal) da

criança;

O apoio/andaime é retirado gradualmente;

O objetivo é a criança internalizar o conhecimento para se tornar

independente. (COSTA, 1997, p. 40).

Transpondo essas pesquisas acerca da aquisição da língua materna para o campo

pedagógico, é possível afirmar que as situações de interação entre professor/aluno

ou seja, as ações pedagógicas do adulto-professor é que permitirão a aprendizagem de tarefas

mais complexas pelo aluno. Tarefas essas, que envolvem o desenvolvimento cognitivo e

intelectual, levando o aprendiz à autonomia.

55

4 A ALFABETIZAÇÃO E SUA RELAÇÃO COM OS CONCEITOS DE

LETRAMENTO E GÊNEROS TEXTUAIS

As temáticas deste capítulo estão organizadas no sentido de estabelecer relações entre

os eixos: alfabetização, letramento e gêneros textuais, por defender que estes estão

interligados e que a sua compreensão tem implicação na prática pedagógica do professor

alfabetizador.

4.1 Alfabetização, letramento e gêneros textuais: usos e possibilidades da escrita

No meio acadêmico e educacional, de uma forma geral, vem se discutindo o termo

letramento e sua relação com o processo de alfabetização. Mas o que é letramento? O que

vem a ser alfabetização? Qual é a relação entre ambos?

Neste capítulo, à luz de teóricos como Soares (2000, 2004, 2006), Kleiman (2008),

Rojo (2004), Costa Val (2004), entre outros, farei uma abordagem teórica sobre tais conceitos,

ressaltando a importância da compreensão destes termos pelo professor alfabetizador, no

sentido de que, a partir dessa compreensão e entendimento, o mesmo possa fazer um trabalho

dinâmico, voltado para a apropriação da escrita pelos alunos nas suas reais situações de uso,

ou seja, a materialização da escrita nas práticas sociais através dos gêneros textuais.

Podemos afirmar, inicialmente, que a sociedade contemporânea exige de seus

membros a inserção cada vez mais precoce no mundo da escrita, haja vista que vivemos numa

sociedade grafocêntrica (que considera a escrita como centro) na qual a escrita se expande por

todos os lugares e em todos os ambientes.

Assim sendo, quando a criança chega à escola, aos seis anos de idade, normalmente,

ela não está inaugurando sua entrada no mundo da escrita, muito pelo contrário. Por estarmos

numa sociedade em que a escrita é algo comum, a criança já traz em sua caminhada um pré-

conhecimento a respeito desta habilidade. Cabe à escola fazer com que aconteça uma

continuidade desse processo de aquisição das habilidades de compreensão da escrita e sua

função no mundo em que vivemos.

De acordo com Bagno, Stubbs e Gagné (2002), a língua escrita faz uma diferença

muito grande na sociedade, já que por meio da mesma os seres humanos podem se organizar e

gerir o meio no qual vivem. É através da escrita que registramos e materializamos o nosso

pensamento, o que permite a transmissão das informações. O autor lembra que a escrita é um

termo ambíguo que se aplica tanto a um produto quanto a um processo. Como produto, ela

56

pode ser tomada como objeto de estudo e como processo, deve ser aprendida. Além disso,

enquanto processo, bem como enquanto produto, tem funções sociais e pessoais. Sociais,

porque, por intermédio dela, os seres humanos podem se comunicar através do tempo e do

espaço. Pessoais, por depender de uma ação cognitiva e reflexiva para a organização de

nossas ideias. Dessa forma, fica evidente a necessidade de a escola conceber a escrita como

processo necessário ao desenvolvimento cognitivo para que ocorra a expressão oral e escrita

dos educandos de forma real e significativa para eles.

Sendo a escrita um processo, defendemos que os professores alfabetizadores devem

compreender como esse processo acontece, de que maneira as crianças se alfabetizam e qual a

relação entre conhecer a mecânica da língua escrita e saber utilizá-la de forma competente no

meio em que atuamos.

Assim considerando, o capítulo que ora se apresenta tem por objetivo traçar um breve

esboço sobre a alfabetização no Brasil, com o emprego de estatísticas sobre o assunto, bem

como teorizar acerca dos conceitos de alfabetização e letramento e suas especificidades,

demonstrando a relação entre estes processos e os gêneros textuais.

4.2 O cenário da alfabetização no Brasil

Durante muito tempo, a escola tradicional, no processo de alfabetização, pautou-se na

repetição de palavras, na recitação das letras que se dava de forma descontextualizada, sendo

que a criança passava a maior parte do tempo em atividades de repetição e cópia, muitas vezes

lendo frases desprovidas de sentido, simplesmente para que se evidenciasse a mecânica da

língua. O resultado disso foram altos índices de repetência e, consequentemente, de evasão,

que em meados do século XX, fizeram parte da triste realidade do nosso país.

Segundo Batista (2004), em 2003 jornais e revistas mencionaram o fracasso da escola

brasileira em fazer com que os alunos fossem alfabetizados. Também os índices do Sistema

de Avaliação da Educação Básica (SAEB), desenvolvido pelo Instituto Nacional de Estudos e

Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), bem como os do Programa Internacional de

Avaliação dos Estudantes (PISA), desenvolvido pela Organização para Cooperação e

Desenvolvimento Econômico (OCDE), não são nada animadores.

Os dados do SAEB mostram que, na quarta série, 50% dos estudantes apresentam

“limitações” em seu aprendizado da leitura e da escrita. Dito de outra forma: cerca de 37%

dos alunos encontram-se no estágio crítico de construção de suas competências de leitura (o

que significa que têm grandes dificuldades para ler), e 22% estão abaixo desse nível, no

57

estágio muito crítico (o que significa que não possuem habilidades de leitura). (BATISTA,

2004, p. 8).

Como estágio crítico são considerados os alunos que leem de forma truncada apenas

frases simples, e como estágio muito crítico, considera-se as crianças que não sabem ler, pois

não conseguem responder aos itens da prova. Ou seja, um grande número de estudantes não

aprende a ler na escola brasileira. A esse respeito, Soares (2004) também afirma que antes o

fracasso escolar se restringia às avaliações internas à escola, à repetência, à reprovação e à

evasão que se concentravam nas séries iniciais do ensino fundamental; hoje,

O fracasso revela-se em avaliações externas à escola – avaliações como o

Saresp, o SIMAVE, nacionais (como o SAEB e o ENEM) e até

internacionais (como o PISA) - espraia-se ao longo de todo o ensino

fundamental, chegando mesmo ao ensino médio, e se traduz em altos índices

de precários ou nulo desempenho em provas de leitura, denunciando grandes

contingentes de alunos não alfabetizados ou semi-alfabetizados depois de

quatro, seis, oito anos de escolarização. (SOARES, 2004 p. 9).

Diante dessa realidade nos perguntamos: Por que isso acontece? Quais os fatores que

levam a esses dados tão desalentadores? A escola perdeu o seu papel? O que nós, enquanto

educadores, podemos fazer para reverter este quadro?

São várias as hipóteses para se responder a essas perguntas. Muitas pessoas afirmam

que a escola tradicional era melhor, que as crianças eram mais disciplinadas e estavam mais

dispostas a aprender, porém, vê-se que se trata de uma falsa afirmação, pois a escola era para

poucos. A grande maioria da população, as classes menos favorecidas, estavam fora dela. Em

1820, apenas 0,20% da população eram alfabetizadas de acordo com Hallwel (1985, p. 176).

Ser alfabetizado era privilégio da elite.

Batista (2004) informa que em 1872 o primeiro censo nacional revelou que esse índice

subiu para 17,7% entre pessoas de cinco anos e mais. Já no século XX, o índice foi

progredindo gradativamente, apesar de que até 1960 o índice de analfabetos, 71,2%, era maior

do que os índices de alfabetizados. Em 1960 a proporção de alfabetizados se inverteu em

relação aos índices de analfabetos, que eram 46,7%. Assim, as taxas caiam sucessivamente,

de “1970 a 2000, para 38,7% , 31,9%, 24,2% e 16,7%” (BATISTA, 2004, p.10).

Nesta análise, afirma-se que os índices de analfabetismo estão relacionados à

desigualdade social do nosso país. Com efeito, os dados do SAEB, por exemplo, mostram que

o fracasso na alfabetização é maior quando se trata de crianças das camadas populares das

regiões que possuem os piores indicadores sociais e econômicos.

58

Todavia, apesar de os dados indicarem um quadro desanimador, há que se levar em

conta que o processo de universalização do acesso à escola pública é algo recente. Muitos

avanços podem ser apontados: “ao longo de todo século passado, conseguimos incluir novas

parcelas da população no mundo da escrita. Éramos cerca de 18% de alfabetizados, quase no

final do século XIX; no início do século XXI somos quase 83%” (BATISTA, 2004, p. 10).

Mas o que é ser alfabetizado? Segundo Soares (2004) e Mortatti (2004), o censo de

1940 adotava como critério para declarar que a pessoa era alfabetizada ou não o fato de saber

assinar o próprio nome. Já em 1950 este critério foi ampliado para a escrita de um bilhete

simples.

Porém, a discussão a ser iniciada a seguir é um pouco mais complexa, já que não se

trata apenas de conceituar “alfabetização”, palavra que não provoca dúvidas nem polêmica,

por tratar-se de um vocábulo de uso corrente em nosso meio, principalmente se for associada

ao analfabetismo, que durante muito tempo foi uma realidade e uma das principais

preocupações de nossa sociedade. Abordaremos alguns conceitos de alfabetização e o

surgimento recente de um novo fenômeno denominado letramento que causa,

simultaneamente, estranheza, confluências e divergências.

4.3 Alfabetização e letramento

Alfabetização, no entender de Soares (2004, p. 91), “é o processo pelo qual se adquire

o domínio de um código e de habilidades de utilizá-lo para ler e para escrever, ou seja, o

domínio da tecnologia − do conjunto de técnicas − para exercer a arte e a ciência da escrita”.

Neste sentido, a autora afirma que uma das causas do fracasso na alfabetização, entre

várias outras, é a falta de sua especificidade, que em meados dos anos 80 foi deixada de lado,

em favor de uma visão unilateral, ligada ao construtivismo e ao socioconstrutivismo, teoria

cognotivista que considera a criança sujeito ativo capaz de interagir com a língua escrita com

material “para ler” e não como material artificialmente produzido para “aprender a ler”

caracterizando, segundo denominou Soares (2004, p.5), como a “desinvenção da

alfabetização”.

Por outro lado, a autora em foco defende que a alfabetização como processo de

aquisição de uma tecnologia tem sua especificidade, que não se deve deixar de lado, deve-se

trabalhar na escola de forma sistemática, embora vinculada ao meio em que vivemos.

Nesta perspectiva, Mortatti (2004) afirma que

59

alfabetização entendida como aquisição de habilidades de mera

decodificação e codificação da linguagem escrita e as correspondes

dicotomias analfabetismo x alfabetização e analfabetos x alfabetizados, não

bastam mais. É preciso, hoje também saber usar a leitura e a escrita de

acordo com as contínuas exigências sociais, e esse algo mais é o que vem se

designando como letramento. (MORTATTI, 2004, p. 34).

Ou seja, mais do que compreender a relação fonema - grafema, faz-se necessário

também utilizar-se dessa tecnologia para expressar-se com clareza e de acordo com as

exigências de uma sociedade em que há um avanço crescente em relação à comunicação

escrita.

Travarei, portanto, na sequência algumas discussões a respeito desse novo fenômeno,

recentemente introduzido em nossa língua sob o vocábulo letramento, termo este que,

diferentemente da palavra alfabetização, ainda não se consolidou de forma abrangente no

meio educacional.

De acordo com Costa Val (2004), o surgimento do conceito de letramento no meio

acadêmico e educacional em geral tem provocado polêmicas e equívocos, ora por exagero, ora

por simplificação. Para a autora, a fonte desses equívocos e polêmicas é a não compreensão

de que esses dois processos são complementares, e não alternativos. Não se pode privilegiar

um em detrimento do outro, mas sim fazer uso das especificidades dos dois processos para se

alcançar os objetivos propostos.

Ela acrescenta que outra fonte de equívocos está em se pensar os dois processos como

sequenciais, um precedendo o outro sem acontecerem de forma concomitante, “como se o

letramento fosse uma espécie de preparação para a alfabetização, ou então como se a

alfabetização fosse condição indispensável para o início do processo de letramento” (COSTA

VAL, 2004, p. 24). É preciso, então, conciliar as práticas de alfabetização e de letramento,

considerando os conhecimentos dos alunos, sua realidade, para a partir do que já existe

superar a condição de analfabetismo e ampliar o grau de letramento dos educandos.

Vemos nos estudos de Soares (2006), Kleiman (2008) e Mortatti (2004) que a palavra

letramento surgiu pela primeira vez no livro escrito em 1986 por Mary Kato, de 1986

intitulado No mundo da escrita: uma perspectiva psicolinguística, editado pela Ática e, de lá

para cá, este vocábulo vem ganhando espaço no campo da Educação e das Ciências

Linguísticas. Em 1988, portanto, dois anos mais tarde, Leda Verdiani Tfouni, no capítulo

introdutório do livro Adultos não alfabetizados: o avesso do avesso, Ed. Pontes; distingue

alfabetização de letramento. A partir daí, o emprego do termo letramento se amplia no meio

acadêmico, nos discursos falados e escritos e, em 1995, já surge como título do livro

60

organizado por Ângela Kleiman: Os significados do letramento: uma perspectiva sobre a

prática social, editado pela Mercado de Letras.

Frente a esses fatos, Soares (2006) se questiona e, logo a seguir, responde:

O que explica o surgimento recente dessa palavra? Novas palavras são

criadas (ou as velhas dá-se um novo sentido) quando emergem novos fatos,

novas ideias, novas maneiras de compreender os fenômenos. (SOARES,

2006, p.16).

Até então, o termo analfabetismo já era bem conhecido e muito utilizado, devido à

realidade sociocultural de nosso país; porém o seu antônimo, alfabetismo, não era conhecido,

não fazia parte da realidade. A partir do momento em que a maioria das crianças já está na

escola − supõe-se que saibam ler e escrever, estando, portanto, alfabetizadas − o termo

alfabetização tornou-se insuficiente, pois “não basta apenas saber ler e escrever, é preciso

também saber fazer uso do ler e escrever, saber responder às exigências de leitura e de escrita

que a sociedade faz continuamente – daí o surgimento recente do termo letramento.”

(SOARES, 2006 p. 20).

Tanto Soares (2006) quanto Mortatti (2004) fazem uma análise da palavra letramento

do ponto de vista morfológico e semântico. Trata-se de uma tradução para o português da

palavra inglesa literacy que, fragmentada, significa: littera: palavra latina que corresponde a

letra e cy: sufixo que indica qualidade, condição, estado. Portanto, literacy é a condição de ser

letrado com sentido diferente daquele da palavra letrado que já existe no dicionário, versado

em letras, erudito.

A palavra letramento, por sua vez é formada pelos seguintes elementos: letra: forma

portuguesa da palavra latina littera + mento: sufixo que indica resultado de uma ação.

Letramento, segundo Soares (2006, p. 38 – grifo da autora) “é o resultado da ação de

‘letrar-se’, se dermos ao verbo ‘letrar-se’ o sentido de tornar-se letrado.” A autora salienta que

ter se apropriado da escrita é diferente de ter aprendido a ler e escrever: apropriar-se da escrita

é saber utilizá-la nas práticas sociais que exigem essa habilidade, enquanto aprender a ler e a

escrever é compreender e utilizar uma tecnologia, que passa pela codificação e decodificação

da língua escrita. Assim, confirma-se, não é suficiente apenas saber ler e escrever, mas

também faz-se necessário envolver-se com as práticas sociais da escrita.

Kleiman (2008, p.18) define letramento como um “conjunto de práticas sociais que

usam a escrita, como sistema simbólico e como tecnologia, em contextos específicos, para

objetivos específicos.” De acordo com a autora as práticas específicas da escola são apenas

61

um dos tipos de prática e não o único, visto que leitura e escrita não se delimitam aos muros

escolares.

Assim, baseando-se nos estudos de Street (1994), a autora destaca dois modelos de

letramento: o autônomo e o ideológico. No primeiro, o processo de letramento é unilateral,

pois se caracteriza pelo fato de que a escrita seria um produto completo em si mesmo,

independente do contexto de produção. Sob esta ótica, a escrita é vista como um produto

autônomo, independente do seu contexto de produção para ser interpretado. Daí a crença de

que somente através da escola tradicional, do ensino da norma culta, elitista, vista como a

mais privilegiada socialmente, é que haverá desenvolvimento, progresso e civilidade. Trata-se

de uma visão reducionista e autoritária que se presta a alimentar o quadro do fracasso escolar.

O modelo ideológico, por sua vez, se contrapõe ao modelo autônomo, uma vez que

considera as práticas de letramento associadas ao meio social e culturalmente determinadas,

dependente do contexto e das instituições em que são produzidas. Neste modelo, afirma

Kleiman

não pressupõe uma relação causal entre letramento e progresso da

civilização ou modernidade, pois em vez de conceber um grande divisor

entre grupos orais e letrados, ele pressupõe a existência e investiga as

características de grandes áreas de interface entre práticas orais e letradas.

(KLEIMAN, 2008, p.21).

O modelo ideológico leva em consideração a determinação do social e do cultural nas

práticas de letramento da sociedade. Não elege a escola como a única instituição que garanta a

ascensão social. Em outras palavras, a escola não é o único espaço onde as práticas letradas

são desenvolvidas, é apenas uma das instâncias onde se pratica a leitura e a escrita.

Porém, em nossa sociedade grafocêntrica, a exigência de saber redigir um bilhete,

preencher um formulário, redigir um ofício, um requerimento, preencher um envelope de

depósito de banco, elaborar uma lista de compras, encontrar informações num catálogo, numa

lista telefônica, no visor de um celular, ou de um caixa eletrônico é cada vez mais impositiva

para se atender a essas demandas.

Soares (2006) chega a afirmar que precisaríamos inventar o verbo “letrar” para nomear

a ação de levar os indivíduos ao letramento. Com isso, corrobora que alfabetizar e letrar não

devem ser vistos como duas ações distintas, mas como ações que se completam; que não se

anulem reciprocamente, mas sim que se complementem:

62

Dissociar alfabetização e letramento é um equívoco porque, no quadro das

atuais concepções psicológicas, lingüísticas e psicolingüísticas de leitura e

escrita, a entrada da criança (e também do adulto analfabeto) no mundo da

escrita ocorre simultaneamente por esses dois processos: pela aquisição do

sistema convencional de escrita – a alfabetização- e pelo desenvolvimento de

habilidades do uso desse sistema em atividades de leitura e escrita, nas

práticas sociais que envolvem a língua escrita- o letramento. Não são

processos independentes, mas interdependentes, e indissociáveis: a

alfabetização desenvolve-se no contexto de e por meio de práticas sociais de

leitura e de escrita, isto é, através de atividades de letramento, e este, por sua

vez, só se pode desenvolver no contexto da e por meio da aprendizagem das

relações fonema-grafema, isto é, em dependência da alfabetização.

(SOARES, 2004, p. 14 – grifo da autora).

Percebemos, felizmente, que já existem alguns esforços no sentido de alfabetizar

letrando, contudo, ainda há muito o que fazer, até mesmo porque tanto o fenômeno quanto a

palavra letramento ainda são bem recentes, e a compreensão destes termos também. Acredito

que faz-se necessário que o tema seja debatido por educadores em cursos de formação inicial

e continuada e nos grupos de estudos das horas-atividade nas escolas.

Temos que levar em consideração também as experiências de letramento dos alunos,

pois muitas vezes o enfoque que a escola procura dar à escrita, isto é, o letramento

tipicamente escolar, realizado de forma autoritária, artificial e pouco significativa, não

despertará nos discentes o interesse em mobilizar seus esforços cognitivos para aprender a ler

e a escrever.

Não se pode perder de vista, ainda, que alfabetizar na perspectiva do letramento

envolve processos complexos de compreensão do sistema de escrita, que requerem estratégias

metodológicas, as quais abrangem momentos de leitura e produção de diferentes gêneros

textuais e momentos de reflexão sobre a constituição do sistema de escrita alfabética.

Nesta vertente, Leal (2004) salienta que é de fundamental importância que, na

escolarização inicial, sejam encaminhadas atividades de apropriação do Sistema Alfabético

simultaneamente às atividades de apropriação dos usos e funções sociais da escrita, com

reflexões acerca dos diversos gêneros de textos que circulam socialmente. (LEAL, 2004, p.

2). Por outro lado, a educação vista como processo historicamente construído nos leva a

refletir que as mudanças que acontecem no meio educacional são, por vezes, lentas e

gradativas. Deparamo-nos com professores que se fecham aos novos conceitos e às novas

teorias sobre alfabetização. Acreditam que o método “tradicional” ou aquele que foi utilizado

para a sua própria aprendizagem no passado é que era melhor. Neste contexto, notamos

também que os cursos oferecidos pelas Secretarias de Educação dos municípios,

especialmente no município de Rondonópolis – MT, muitas vezes não atingem o objetivo

63

maior de oferecer formação continuada a todos os alfabetizadores. Todavia, estou convicta de

que a formação inicial aliada à formação continuada, num projeto educativo maior, alcançará

o objetivo esperado.

É preciso, enfim, que os alfabetizadores compreendam que, para se alfabetizar

letrando, a escrita deve ser entendida como inerente ao cotidiano, visto fazer parte da nossa

sociedade. Os alfabetizandos vivem numa sociedade “letrada”, pois a língua escrita está

presente nas atividades diárias. O desafio lançado ao alfabetizador, então, é o de não dissociar

alfabetização de letramento, mas sim conciliar esses dois processos a fim de fazer com que os

alunos se apropriem do sistema alfabético-ortográfico e obtenham a plena condição do uso da

língua nas práticas sociais de leitura e escrita.

4.4 O letramento e sua relação indissociável com os gêneros textuais

Pode-se afirmar que o termo letramento é recente em nossa língua, visto que, como

explicitado anteriormente, seu surgimento apresenta cerca de trinta anos. A partir daí

estudiosos e teóricos do meio educacional vêm explorando suas possibilidades. Salienta-se,

porém, que a questão dos gêneros textuais, na esfera comunicativa e social já é bem mais

antiga, embora, há aproximadamente dez anos, de acordo com os PCN (BRASIL, 1997) sua

importância venha sendo colocada em evidência no meio educacional.

Considerando o aspecto sócio interacional da linguagem, é possível afirmar que os

sentidos se constroem na interação verbal entre as pessoas e são resultados da produção dos

discursos: quem diz o que, para quem, com que intenção, com que finalidade, através de qual

gênero textual, com que propósito comunicativo e com quais escolhas linguísticas.

Durante muito tempo (e, em alguns casos, até os dias atuais), nas aulas de Língua

Portuguesa, o ensino da língua restringia-se à análise das formas linguísticas, morfológicas e

sintáticas a partir da classificação de períodos, orações, classes de palavras, etc.; ressaltando o

aspecto normativo da língua.

A partir das três últimas décadas é que o eixo de um ensino normativo se desloca para

o procedimental (ROJO; CORDEIRO, 2004). A ênfase passou ao ensino de língua através de

textos. A partir das novas discussões a respeito do ensino da linguagem, da compreensão da

língua como artefato dinâmico social e histórico, dotado de função mediadora entre os

homens, o foco sobre os gêneros do discurso ganhou maior importância.

64

Conforme se vê nos PCN de Língua Portuguesa para o ensino fundamental, um dos

objetivos aponta para a necessidade de que o ensino seja organizado no sentido de levar o

aluno a:

expandir o uso da linguagem em instâncias privadas e utilizá-la com eficácia

em instâncias públicas, sabendo assumir a palavra e produzir textos — tanto

orais como escritos — coerentes, coesos, adequados a seus destinatários, aos

objetivos a que se propõem e aos assuntos tratados; (BRASIL, 1997, p. 32).

A esse respeito, observa Rojo (2004, p. 39):

Desloca-se a visão corrente de ensino de Língua Portuguesa como

objetivando a construção de conhecimentos e conceitos sobre a língua e da

capacidade de análise lingüística em favor de uma visão comunicativa ou

enunciativa, em que se trata de ensinar os usos da linguagem oral e escrita,

na compreensão e produção de textos socialmente situados, com finalidades

comunicativas e ocorrendo em situações específicas de discurso. (ROJO,

2004, p. 39).

Dessa forma, percebo que o enfoque dos gêneros textuais cumpre esse papel de fazer

com que a linguagem, com a sua faceta comunicativa e interacional, seja evidenciada e tenha

sentido para seus usuários. Os gêneros “são respostas às necessidades humanas de

comunicação, são fenômenos ou entidades sócio-comunicativas.” (MENDONÇA, 2007, p.

38/39).

Os gêneros podem ser caracterizados como uma ação de linguagem que pressupõe

uma decisão, ou seja, ao expressarmo-nos faz-se necessária a escolha de um gênero do

discurso com sua finalidade e com uma intenção comunicativa. De acordo com Bakhtin (apud

SOARES, 2006, p.10), “cada esfera da utilização da língua elabora seus tipos relativamente

estáveis de enunciados, sendo isso que denominamos gênero do discurso”.

Assim, os gêneros consistem em formas culturais e cognitivas de ação social,

estabilizadas ao longo da história, corporificadas de modo particular na linguagem,

caracterizadas pela função sócio-comunicativa que preenchem (BAKHTIN, 1997;

MARCUSCHI, [2002]). Podemos, contudo, observar que os gêneros são maleáveis,

dinâmicos, modificam-se de acordo com o tempo, com a sociedade, para atender à demanda e

aos diversos eventos de letramento desta sociedade. Assim é que gêneros novos surgem (é o

caso dos blogs, das “anotações de aulas” como propõe Moraes (2011); alguns se modificam

(como é o caso dos artigos científicos que se modificaram com o tempo) e outros

desaparecem por falta de uso (como o telegrama, alguns tipos de carta).

65

Conforme afirma Cardoso (2003), seguindo a vertente bakhitiniana,

a riqueza e a variedade dos gêneros do discurso são infinitas, uma vez que a

variedade virtual da atividade humana é inesgotável, e cada esfera da

atividade comporta um repertório de gêneros de discurso que, por sua vez,

também vai se diferenciando e se ampliando à medida que se desenvolve a

própria esfera. (CARDOSO, 2003, p. 73).

Nesta perspectiva, passamos por várias situações comunicativas (tanto na escola

quanto fora dela) relacionadas ao letramento e materializadas na forma de um gênero textual,

seja falado ou escrito. Como exemplo, posso citar os textos didáticos, que servem para

conhecer; notícias, para informar; seminários, para levar outros a conhecer; fábulas e

romances, para fantasiar; poemas, para expressar sentimentos e emoções; trava-línguas,

piadas, adivinhações e parlendas para divertir; mapas, para nos situarmos; placas, para

informar; cartas do leitor e artigos de opinião, para criticar e nos levar a refletir e nos

posicionar, etc.. Os gêneros são infinitos e diversos, mas não são estáticos e estanques. Uma

carta, por exemplo, pode iniciar com um vocativo ou não5; o que determinará essa

classificação é o tema, o estilo e sua estrutura composicional.

De acordo com a definição bakhtiniana (1997) o gênero se caracteriza por apresentar

um conteúdo temático, um estilo e uma construção composicional, e sua escolha é

determinada “pela esfera, as necessidade da temática, o conjunto dos participantes e a vontade

enunciativa ou intenção do locutor” (SCHNEUWLY, 2004, p. 25).

A escolha do gênero, segundo Schneuwly (2004), se dá em função de uma situação

definida a partir de um parâmetro, de uma finalidade, de um conteúdo para um determinado

destinatário. Isso condiciona a opção por um gênero, com uma certa estabilidade, uma certa

estrutura definida por sua função, caracterizada por um estilo. Não um estilo individual, mas o

estilo de um gênero. Assim, ao escrevermos uma poesia, por exemplo, levamos em conta sua

estrutura composicional, considerando versos, estrofes, rimas, musicalidade, linguagem

figurada e subjetiva, entre outros aspectos, e sua função que pode ser a de emocionar, de

expressar-se de forma criativa e artística através das palavras.

O mesmo autor ainda explicita que o gênero representa um instrumento que possibilita

a comunicação entre as pessoas; psicologicamente, “os instrumentos encontram-se entre o

5 Cito, como exemplo, o texto “Apelo”, de Dalton Trevisan, que, apesar de não seguir a estrutura de uma carta

(como data, saudação inicial, vocativo, assunto, despedida e assinatura), caracteriza-se como tal, devido ao

conteúdo. Este texto encontra-se disponível no site releituras.com/daltontrevisan_apelo.asp.

66

indivíduo que age e o objeto sobre o qual ele age: eles determinam seu comportamento,

guiam-no, afinam e diferenciam sua percepção da situação na qual ele é levado a agir.”

(SCHNEWLY, 2004, p. 23). Ressaltamos, aqui, o gênero como o instrumento que determina

a mediação entre o sujeito e o objeto, acrescentando que, segundo esse autor, o instrumento é

tripolar, pois medeia a ação do sujeito em relação à situação na qual este sujeito está inserido,

ou seja, a esfera social, o contexto.

De acordo com Bagno, Stubbs e Gagné (2002), baseando-se nos escritos de Marcuschi

(2001), o gênero é uma forma textual concretamente realizada que se encontra como texto

empírico, materializado tanto de forma oral como de forma escrita no meio social em que

vivemos. Está estritamente ligado à esfera social, histórica e comunicativa. O gênero tem

existência concreta em designações diversas constituindo-se em conjuntos abertos, portanto,

dinâmicos.

Voltando à questão da alfabetização e do letramento, observamos, neste ponto, que

não se pode dissociá-los dos gêneros textuais, visto que estes funcionam como determinantes

e mediadores das ações discursivas. Dito em outras palavras, eles são a língua viva, dinâmica,

relacionada ao meio sócio-histórico-econômico-cultural em que vivemos. Por conseguinte, a

escola, vista segundo Kleiman (2008, p. 20), como “a mais importante das agências de

letramento”, não pode conceber a alfabetização desvinculada do letramento, pois isso é negar

a importância da linguagem viva e corporificada pelos gêneros textuais, orais ou escritos.

A escola deve, portanto, ampliar as experiências de letramento dos alunos,

promovendo eventos relevantes para a formação de sujeitos autônomos e críticos que tenham

segurança nas mais diversas práticas de utilização da escrita, inclusive aquelas mais

valorizadas e prestigiadas em nossa sociedade grafocêntrica.

Por isso, pensamos que o professor alfabetizador deva conhecer os gêneros textuais,

seu modo de funcionamento, sua estrutura e finalidade para realizar um trabalho didático

sobre eles, decidindo estratégias e definindo metas a atingir.

Letramento e gêneros estão intimamente ligados, pois, sempre que falamos,

escrevemos, nos comunicamos de forma oral, escrita ou televisiva, entre outras, o fazemos por

meio de um gênero.

Rojo (2004) observa que

os gêneros enquanto formas historicamente cristalizadas nas práticas sociais,

fazem a mediação entre a prática social ela própria e as atividades de

linguagem dos indivíduos. Os locutores sempre reconhecem um evento

comunicativo, uma prática de linguagem, como instância de um gênero [...].

67

O gênero funciona, então, como um modelo comum, como uma

representação integrante que determina um horizonte de expectativas para os

membros de uma comunidade confrontados às mesmas práticas de

linguagem. Os gêneros, portanto, intermediam e integram as práticas às

atividades de linguagem. São referências fundamentais para a construção das

práticas de linguagem. (ROJO, 2004, p. 41).

A autora compreende, também, que a alfabetização deve ser realizada de forma

contextualizada com as formas de letramento. Assim, é possível relacionar o conhecimento do

alfabeto com gêneros de circulação social concreta, além de promover uma aprendizagem

prazerosa, instigante, criativa, que desperta o interesse do educando, uma vez que ele vê

sentido no que lhe é proposto.

Valorizar a experiência social e cultural do aluno, compreender e aproveitar as práticas

de letramento da sociedade, bem como entender os gêneros do discurso como formas

didáticas, são atitudes importantes para que o ensino de língua materna em nossas escolas seja

cada vez mais significativo para o aluno. Este, por sua vez, além de perceber a relação entre

fonema e grafema, de se apropriar do sistema alfabético-ortográfico de nossa língua a fim de

ler e escrever com autonomia, fará isso com prazer e interesse, pois compreenderá os usos e

as possibilidades da escrita no seu cotidiano. Encarar a escrita contextualizada e ligada aos

eventos de letramento é proporcionar ao estudante momentos ímpares de aprendizagem, pois

assim ele compreenderá a utilidade e a finalidade da escrita na sociedade.

Neste capítulo, procuramos em linhas gerais aprofundar as discussões acerca da

alfabetização, do letramento e dos gêneros textuais, ressaltando a importância da compreensão

destes termos pelos professores alfabetizadores a fim de que, a partir desta, possam contribuir

de forma efetiva para que o processo de alfabetização e letramento aconteça de forma

complementar e indissociada.

Neste sentido, a escola e os professores alfabetizadores precisam realizar um trabalho

intencional e sistemático a fim de que os falantes da língua, pequenos aprendizes, possam se

alfabetizar letrando-se e compreendendo os usos dos diferentes gêneros textuais nas esferas de

utilização desses gêneros. Em outras palavras, saber se expressar de forma autônoma, clara e

objetiva, de acordo com as exigências, com a situação, com o contexto e com a necessidade

das práticas sociais.

No meio social em que vivemos não basta ser alfabetizado, mas é necessário fazer uso

desta tecnologia nas práticas sociais de utilização da escrita. Com isto, fica evidente a

necessidade de se trabalhar com os gêneros textuais, porém não de forma mecânica, mas sim

contextualizada, a fim de que consigamos alcançar o objetivo maior, que é formar pessoas

68

capazes de se expressarem com clareza e autonomia, segundo os diferentes gêneros textuais

que empregam.

Em nossa sociedade, pelas avaliações realizadas e pelos índices de analfabetismo

ainda persistentes, mostra-se urgente realizar um trabalho no sentido de conciliar

alfabetização e letramento, uma vez que ainda percebemos que o baixo letramento está

relacionado à condição da pessoa que é alfabetizada de que aprendeu técnicas de decifração

do código escrito, mas não consegue compreender textos mais complexos, localizando e

relacionando informações.

Essa é uma triste realidade que se evidencia no cotidiano de nossas escolas. Em

contraposição a isso, existem também, pessoas letradas, mas não alfabetizadas. Trata-se de

pessoas que, mesmo incapazes de ler e escrever, compreendem os papéis sociais da escrita,

distinguem gêneros ou reconhecem diferenças entre as línguas escrita e a oralidade. Assim

sendo, cabe à escola instrumentar seus educandos, no sentido de que, a partir da alfabetização,

seu nível de letramento seja valorizado e ampliado.

Nesse sentido, penso que os avanços para melhorar a qualidade do ensino e para

diminuir os índices de analfabetismo passam pelo esforço de todos, professores, governantes e

sociedade em geral. Sabemos que todas as transformações são históricas e não acontecem

repentinamente. No próximo item, exporei como a forma ensino da produção de textos

modificou-se ao longo do século XX.

4.5 Contextualização histórica da produção de textos

Um estudo realizado por Beth Marcuschi (2010) demonstra, por meio da análise de

propostas de produção textual em seletas, antologias e nos livros didáticos, as principais

perspectivas que orientavam o trabalho de elaboração textual na escola ao longo do século

XX. Baseando-me nos escritos dessa autora, farei uma breve contextualização histórica sobre

o percurso do ensino da produção textual nas escolas, desde o início do século XX até os dias

atuais.

Beth Marcuschi (2010) aponta que, desde o início do século XX até o final dos anos

1980, as aulas de língua portuguesa estiveram voltadas para a escrita correta, onde se

privilegiava o uso das regras da gramática normativa e da ortografia. O trabalho pedagógico

em sala estava voltado para a análise morfológica e sintática de palavras e frases isoladas,

associada à leitura de textos literários clássicos, e essa forma de trabalho era vista como

69

suficiente para a capacitação dos alunos para a escrita. Os textos eram considerados como um

agrupamento de palavras e frases que deveriam estar gramaticalmente corretas.

A autora afirma que, apesar de durante esse período haver uma certa linearidade nesta

tendência, não houve uma total homogeneidade nos aspectos teórico-metodológicos para o

ensino de língua escrita nesse espaço de tempo. Assim, é possível desdobrar as diferenças

neste período em três etapas, para fins de análise:

a) início do século XX aos anos 1950;

b) anos 1960 e 1970;

c) anos 1980.

No início do século XX, com resquícios dos encaminhamentos pedagógicos do século

XIX, a forma de escrita em sala de aula era solicitada em forma de composição livre, de uma

composição a vista de gravura, e de trechos narrativos ou ainda de cartas (MARCUSCHI,

2010, p. 67). A escrita, no primeiro ano, era baseada na reprodução e imitação de pequenos

trechos, de modelos escolhidos pelo professor, nas antologias adotadas oficialmente;

passando, do segundo ao quarto ano, pelas descrições e narrações breves e escrita de trechos

de cartas; no quinto ano, a escrita era a redação livre, para posterior escrita autônoma do

aluno, “composição de lauda própria”, no sexto ano. Momento em que o professor dava um

tema livre para o aluno, com um limite de 30 linhas, para que seu texto acontecesse

(MESERINI 1995 apud MARCUSCHI, 2010, p. 67).

Assim o aluno, a partir de um conjunto de informações, teria que compor um texto,

usando a imaginação, a originalidade e a correção gramatical. Além disso, a escrita era

orientada no sentido de ressaltar a formação moral e espiritual do aluno, disponibilizando

modelos que a organização e o tema escritos estivessem voltados a um ensinamento moral

visto como inquestionável. Neste período não havia uma preocupação com a interlocução e a

intencionalidade do texto, ou seja, ao aluno não eram explicitados os objetivos da atividade, o

leitor presumido do seu texto, nem o espaço de circulação deste texto. O objetivo da

composição escrita dos alunos era o de fornecer ao professor dados a respeito da

aprendizagem, das regras ortográficas, da correção gramatical e dos preceitos morais,

desconsiderando, portanto, o processo de construção dos sentidos.

As décadas de 1960 a 1980 são marcadas pela ampliação do acesso à escola, ou seja, a

democratização do ensino formal público. Nesse período, as crianças das classes menos

favorecidas passaram a frequentar a escola, modificando a forma do trabalho com a escrita,

antes baseado na escrita de textos literários e autores clássicos.

70

Com a lei 5692/71, o ensino de língua materna passou a ter uma disciplina

denominada “comunicação e expressão” em que se valorizava a capacidade do indivíduo de

se comunicar de modo “claro, lógico e fluente nas ações cotidianas, no trabalho e nas demais

esferas sociais, ainda que essa comunicação devesse ficar restrita ao ideologicamente

permitido.” (MARCUSCHI, 2010, p. 71).

Esse foi um período em que o contexto político não permitia que as pessoas

expressassem suas ideias, devido à repressão política e à ditadura militar, que o país estava

atravessando, por isso, a escola vivenciava um conflito, pois ao mesmo tempo em que

estimulava o aluno a expressar suas ideias de modo livre e criativo, com atividades de redação

livre, era pressionada a cercear a liberdade do aprendiz, no seu posicionamento diante dos

acontecimentos políticos da época.

Nesse período, com o intuito de levar o aluno a se expressar com clareza, as redações

deveriam ser produzidas levando-se em consideração a identificação do emissor, do receptor e

da mensagem. Exercícios e atividades escritas na produção de textos, com pontuação correta.

A narrativa deveria ser composta por um conjunto de elementos como: narrador, ação,

personagens, ambiente e espaço temporal, projetados para um receptor abstrato. É nesse

período que se forjam os “gêneros escolares”, dissertação, narração e descrição criados a

partir de um modelo, de uma técnica de redação que deve ser aplicada no sentido de transmitir

através do código (língua) uma mensagem clara e objetiva, padronizada dirigida para qualquer

pessoa e, ao mesmo tempo, para ninguém (MARCUSCHI, 2010, p.73).

Nos anos 1980, a autora ressalta que houve uma mudança substancial no ensino de

escrita, a partir de estudos realizados por Geraldi (1997) e Marcuschi e Leal (2009), os quais

publicam estudos que apontam a redação escolar como um não texto, pois se caracteriza como

um produto artificial que não atendia aos aspectos interlocutivos próprios dos textos que

circulam fora da sala de aula.

Esses estudos propõem que se deixe de “fazer redações” e passe a se produzir textos

com enfoque no processo envolvido no ato de escrever. Dessa forma, percebe-se que a escrita

a ser desenvolvida em sala de aula deveria priorizar a língua, no seu aspecto interacional e que

estivesse relacionada ao contexto e à ação de seus usuários.

Nesse período, priorizava-se, então, a organização textual, de modo a garantir a

produção de textos coesos, coerentes, situados, articulados e informativos, bem como que

respeitassem a estrutura início, meio e fim, próprios da narração, descrição e dissertação. Os

livros didáticos, inseridos neste contexto, traziam atividades centradas nos aspectos formais

do texto que buscavam garantir a estruturação e a hierarquização internas do mesmo.

71

Os aspectos formais do texto ainda eram priorizados, em detrimento da

contextualização, da funcionalidade e da situação em que os textos eram produzidos, o

objetivo da escrita se esgotava na produção textual em si. Apesar disso, essas reflexões foram

importantes para que a perspectiva sócio interacionista da linguagem ganhasse força nas salas

de aula nos anos seguintes, principalmente com a difusão das proposições acerca dos gêneros

textuais. Além disso, “discussões desencadeadas por políticas públicas de educação”, dentre

as quais os Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Fundamental I e II (BRASIL, 1997)

e o Programa Nacional do Livro Didático contribuíram, igualmente, para que autores de obras

didáticas de Língua Portuguesa dispensassem atenção e cuidado maiores ao ensino e

aprendizagem da escrita (MARCUSCHI, 2010, p. 75).

A partir da segunda metade dos anos 90, o estudo dos gêneros textuais tornou-se mais

presente no contexto das salas de aula. A princípio, priorizava-se a nomeação e a classificação

dos gêneros textuais, observando suas características tidas como fixas. A preocupação ainda

se centrava no ensino dos gêneros textuais em si mesmos, para identificação e classificação,

não se diferenciando dos estudos estruturais da gramática.

Com a ampliação do diálogo em torno das concepções teóricas de Bakhtin (1997;

2010), estudiosos como Dolz e Schneuwly (2004), Marcuschi (2008), Rojo (2004) passaram

a defender a importância de se relacionar os gêneros textuais às práticas sociais.

Nessa perspectiva, os gêneros textuais relacionados às “práticas sociais” são vistos

“como dinâmicos e de expressiva plasticidade, são constitutivos das práticas discursivas e

sociais, exercem funções sociocognitivas no contexto das relações humanas e não funcionam

de forma independente nem autônoma na produção de significação.” (MARCUSCHI, 2010,

p.76).

Os gêneros regulam nossa ação discursiva, possibilitando a comunicação relacionada

ao objetivo que queremos atingir. Através do gênero é possível interagir, expressar desejos,

socializar conhecimentos, convencer pessoas, dar instruções, entre outras ações que envolvem

a interação entre os participantes de uma sociedade.

Concomitante à autora, concordo que o ensino da produção textual com base em

gêneros possibilita ao aluno aquisição da competência para atuar de forma autônoma e

participativa no meio sócio cultural em que está inserido.

De acordo com o histórico acima delineado, é possível afirmar que as mudanças que

ocorreram em relação ao ensino da escrita nas escolas têm buscado um trabalho

contextualizado com a linguagem. É preciso levar o aluno a compreender que a escrita deve

ser entendida “como um processo de interlocução entre leitor-texto-autor que se concretiza

72

via gêneros textuais num contexto sócio historicamente situado.” (MARCUSCHI, 2010 p.78).

Dessa forma, a escola precisa possibilitar ao aluno a construção de conhecimento com a

finalidade de que ele saiba se expressar utilizando-se da escrita contextualizada, com

finalidades específicas e que, para ele, tenha sentido.

É necessário, portanto, que o ensino da língua materna perpasse os diferentes

letramentos (literário, jornalísticos, midiáticos) bem como, considere o contexto de produção

dos textos, observando seus objetivos, os possíveis leitores, o suporte onde o texto será

disponibilizado, e o gênero textual que se pretende utilizar: resumo, quadrinhas, poemas,

reportagem, música, fábulas, piadas, contos entre outros.

Ensinar sistematicamente a escrita envolve várias etapas, como o planejamento global

do texto, e as etapas de avaliação, revisão e reformulação. Nesse sentido, o texto, ao ser

planejado, envolve conhecimento sobre o gênero textual, sobre o assunto, a finalidade da

escrita e uma relação com o mundo. Ou seja, o interlocutor, a finalidade, os objetivos a serem

alcançados com um determinado texto. Nesse aspecto, o professor precisa ter clareza de como

realizar o trabalho pedagógico com o gênero, pois precisa estar atento ao assunto que deseja

ver abordado e que deve estar em sintonia com a prática social, com o gênero estudado e

também com a faixa etária do aluno. Nas palavras da autora:

[...] a escrita deve ser entendida como um processo de interlocução entre

leitor-texto-autor que se concretiza via gêneros textuais num contexto sócio-

historicamente situado. Por essa razão, no ensino da elaboração textual,

devem ser propostas situações que se reportem a práticas sociais e a gêneros

textuais passíveis de serem reconstituídos, ainda que parcialmente, em sala

de aula, tanto no que se refere à produção quanto no que se refere à recepção

do texto escrito. Escrever na escola, portanto, deve ser visto como um ensaio

ou mesmo uma prévia convincente do que será requerido dos jovens

aprendizes no espaço social. (MARCUSCHI, 2010, p. 78).

Por isso é necessário que o seu trabalho seja planejado no sentido de fazer com que a

escrita não seja algo que cause estranheza e aversão, mas que seja vista como prática social

que está presente no nosso cotidiano. Dessa forma, não basta apenas identificar e classificar

gêneros, como fora feito na década de 1990, mas é necessário dar condições aos alunos para

que eles sejam autônomos na produção de textos, ativando seus conhecimentos sobre a

temática, buscando informações novas e desenvolvendo a capacidade comunicativa, mediante

o conhecimento dos diferentes gêneros que circulam na esfera social.

73

4.6 O Pró-Letramento: uma das possibilidades para a melhoria da qualidade na

Educação Básica

Estudos comprovam que a formação inicial aliada à formação continuada pode

auxiliar o professor na busca por novas metodologias de trabalho que subsidiem sua prática.

Não se pode, simplesmente, cobrar resultados positivos do professor alfabetizador,

culpabilizando-o por todos os percalços da educação, mas, antes, instrumentá-lo com novas

teorias que o auxiliem e o capacitem para a sua prática docente.

O crescimento profissional docente depende de sua participação em programas de

formação continuada que tragam conhecimentos relevantes para a melhoria de sua prática em

sala de aula. Seguindo a vertente freiriana, Silva e Araújo afirmam que:

a formação continuada é concebida como um processo contínuo e

permanente de desenvolvimento profissional do professor, onde a formação

inicial e continuada é concebida de forma interarticulada, em que a primeira

corresponde ao período de aprendizado nas instituições formadoras e a

segunda diz respeito à aprendizagem dos professores que estejam no

exercício da profissão, mediante ações dentro e fora das escolas,

denominado pelo Ministério da Educação (MEC), de formação permanente

(SEF, 1999). (SILVA; ARAÚJO 2005, p. 5).

Ao observar o material do programa Pró-Letramento, percebi que o mesmo destaca

alguns aspectos ligados aos conceitos de alfabetização e letramento, ressaltando a relevância

do trabalho com os diversos gêneros que circulam em nossa sociedade. Dessa forma, o

programa propõe que os professores valorizem o trabalho com o gênero textual,

compreendendo conceitos e realizando um trabalho com a escrita voltado para as práticas

sociais. “Por isso é importante que a escola, pela mediação do professor ou da professora,

proporcione aos alunos o contato com diferentes gêneros e suportes de textos escritos.”

(MEC/SEB, 2008, p. 19).

Destaco também, neste outro trecho do material do programa mais uma observação

positiva em relação ao trabalho com os gêneros textuais:

Trabalhar conhecimentos, capacidades e atitudes envolvidas na compreensão

dos usos e funções sociais da escrita implica, em primeiro lugar, trazer para a

sala de aula e disponibilizar, para observação e manuseio pelos alunos,

muitos textos, pertencentes a gêneros diversificados, presentes em diferentes

suportes. Mas implica também, ao lado disso, orientar a exploração desses

materiais, valorizando os conhecimentos prévios do aluno, possibilitando a

ele deduções e descobertas, explicitando informações desconhecidas.

(MEC/SEB, 2008, p. 20 – grifo meu).

74

Fica bastante evidente a importância atribuída à valorização e à exploração dos

gêneros textuais que circulam na sociedade de uma forma geral, e que devem ser trabalhados

pelo professor alfabetizador, para que os alunos compreendam a função social da leitura e da

escrita.

75

5 PROGRAMA PRÓ-LETRAMENTO: O QUE SINALIZA O ESTADO DO

CONHECIMENTO

Inicio este capítulo com uma pesquisa do tipo estado do conhecimento, que teve por

objetivo investigar como as pesquisas em nível nacional abordam o trabalho com os gêneros

textuais nos anos iniciais de alfabetização, bem como, nos Programas de Formação

continuada de Professores Alfabetizadores, denominado Pró-Letramento.

5.1 Estado do conhecimento: detalhes de sua elaboração

Como este programa foi implantado pelo MEC no ano 2005, as buscas realizadas nos

sites com este descritor, contemplam os anos de 2005 a 2010. As questões que buscaram

respostas na pesquisa foram: Qual a incidência de trabalhos que abordam o tema gêneros

textuais? Qual o volume de pesquisas sobre o programa de formação para professores

alfabetizadores denominado Pró-letramento, apresentado no cenário nacional, após sua

implantação em 2005? Em que área do conhecimento o tema mencionado vem sendo

explorado? Que metodologia é utilizada nessas pesquisas? No intuito de buscar respostas nos

sites eletrônicos, do banco de teses e dissertações da Coordenação de Aperfeiçoamento e de

Pessoal de Nível Superior (CAPES), na biblioteca eletrônica - Scientific Eletronic Library

Online (SCIELO) e no Instituto Brasileiro de Informação e Tecnologia (IBCT), realizei esta

pesquisa para verificar a relevância do desenvolvimento desta investigação.

Como já frisado anteriormente, o Programa Pró-letramento foi implantado

recentemente na rede municipal de ensino de Rondonópolis – MT e está sendo desenvolvido

pela Secretaria Municipal de Educação e Cultura (SEMEC) com professores da rede

municipal de educação que atuam nos anos iniciais de alfabetização. Descobrir como os

gêneros textuais são abordados neste contexto é o objetivo desta proposta de investigação,

dessa forma, conhecer as pesquisas realizadas neste âmbito é de suma importância para que se

possa perceber o volume das produções já efetuado e, assim, ter noções sobre os temas mais

abordados e os silenciados nas pesquisas.

Neste sentido, o enfoque inicial desta investigação está voltado para os gêneros

textuais, visto que o ensino de linguagem deve privilegiar a compreensão e a valorização das

funções da escrita na sociedade, pois se escreve para registrar, preservar, informar, partilhar

sentimentos, emoções, informações e pensamentos.

76

Assim, o professor como mediador deste processo de construção das habilidades de

leitura e escrita deve procurar, por meio de sua formação, atualizar-se, a fim de compreender

o que são os gêneros textuais, para, desse modo, oferecer um ensino de boa qualidade aos seus

alunos.

O trabalho com gêneros textuais nas escolas, de uma forma geral, ainda é bastante

tímido, principalmente no tocante à alfabetização. Considero o trabalho com os gêneros

textuais mais significativo para o aluno, pois é através da contextualização da escrita no

processo de alfabetização e letramento que o educando será capaz de utilizar-se da escrita nos

seus mais diversos contextos. Para tanto, programas de formação continuada para professores

alfabetizadores têm sido implantados em todo o país, no sentido de subsidiar professores com

novas metodologias de trabalho.

No estado de Mato Grosso, alguns programas de formação continuada de professores

alfabetizadores, que trabalham com as séries iniciais, já vêm sendo desenvolvidos há algum

tempo.

Rocha (2010) aborda sobre o tema em sua pesquisa evidenciando que a formação

continuada de professores no estado de Mato Grosso, nas décadas de 1977 a 1987, foi em

torno do magistério, a fim de capacitar esses professores para atuarem nas séries iniciais, pois

a maioria deles era leiga e estavam atuando na alfabetização. Afirma a autora que somente a

partir da década de 1980, com a maior conscientização dos professores sobre seus direitos e

necessidade de enquadramento em planos de cargos de carreiras e salários, houve um maior

envolvimento dos profissionais em busca de aperfeiçoamento em sua formação. Este foi um

período de luta e mobilização no sentido de buscar acesso a referenciais teóricos e à formação

de professores. Este cenário de preocupação com a formação continuada no Estado de Mato

Grosso fez com que acontecessem encontros estaduais e municipais, no sentido de reivindicar

uma melhor formação dos professores.

Na rede municipal de educação de Rondonópolis-MT, a formação de professores

alfabetizadores vem sendo desenvolvida por programas como o Programa de Professores

Alfabetizadores (PROFA), desenvolvido no ano de 2002 e, atualmente, pelo Pró-Letramento.

Este programa foi implantado pela SEMEC/Rondonópolis – MT no ano de 2010 e teve

continuidade no ano de 2011.

Neste sentido, a pesquisa foi feita com a finalidade de verificar como o programa de

formação continuada Pró-Letramento vinha sendo abordado no cenário nacional. As pesquisas

na forma de estado do Conhecimento são utilizadas para aprofundar conhecimentos e

evidenciar o cenário da produção das pesquisas em nível nacional; “este tipo de pesquisa é

77

desenvolvido com uma metodologia de caráter inventariante e descritivo da produção

acadêmica e científica sobre o tema que busca investigar [...].” (FERREIRA, 2002, p. 258).

Para desenvolver a presente proposta do estado do conhecimento, apoiei-me na

pesquisa do tipo quantitativa/qualitativa, sendo que a quantitativa “busca a predição, a

testagem das hipóteses e a generalização” e a pesquisa qualitativa, “está mais preocupada com

a compreensão, explanação e especificação do fenômeno.” (SANTOS FILHO; GAMBOA,

2002, p. 42-43).

Sabendo que a pesquisa do tipo quantitativa está mais voltada para a compreensão

direta dos dados levantados, sem qualquer análise, foi feita a análise qualitativa, pois assim foi

possível compreender o significado dos dados levantados. A esse respeito, afirma Gatti (2004,

p. 13): “tabelas, indicadores, testes de significância, etc., nada dizem. O significado dos

resultados é dado pelo pesquisador em função do seu estofo teórico”. Ou seja, é necessário

analisar qualitativamente os dados a fim de que os mesmos se sustentem e sejam relevantes na

pesquisa.

Para o início dos trabalhos, realizei uma pesquisa sobre o foco do projeto, que está

voltado para a temática dos Gêneros Textuais na alfabetização, levando-se em consideração as

políticas de formação continuada de professores alfabetizadores, mais precisamente, o

programa Pró-letramento.

Compreendendo que o Estado do Conhecimento visa identificar e conhecer as

produções acadêmicas produzidas sobre um determinado assunto ou tema, num período pré

determinado, a fim de contribuir de forma significativa para as pesquisas realizadas, iniciei o

trabalho com os seguintes descritores: gêneros textuais - produção escrita - alfabetização e

Pró-letramento.

5.2 Abordagem dos gêneros textuais nas pesquisas e no Pró-Letramento

Para levantar o volume das produções acerca do assunto em questão, iniciei as buscas

no banco de teses e dissertações nos sites da Capes e Instituto Brasileiro de Informação e

Tecnologia (IBICT), nos últimos cinco anos, com os descritores gêneros textuais e produção

escrita, sendo que, a partir do primeiro descritor, passei à análise dos dados, verificando quais

áreas abordavam o tema em nível de mestrado e doutorado. Além disso, realizei buscas com

os mesmos descritores, nos periódicos da Capes e nas revistas eletrônicas: Educação e

Sociedade, Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos INEP, Carlos Chagas, Educação e

78

Realidade, Currículo sem fronteiras, disponíveis na base de dados Scielo, nos últimos cinco

anos.

Busquei no site da CAPES, banco de teses e dissertações nas áreas de Educação,

Letras e Linguística nos últimos cinco anos nos níveis de mestrado e doutorado e cheguei aos

seguintes resultados: com os descritores Gêneros textuais e produção escrita, recuperei no

mestrado em Educação, em nível nacional, 71 textos, sendo 14 acerca de alfabetização e

letramento, 45 sobre Linguística e Linguística Aplicada e, em Letras, 12 produções (Tabela

1).

Tabela 1: Distribuição das dissertações nas áreas de Educação, Linguística e Letras com os

descritores gêneros textuais e produção escrita no período de 2005 a 2009

Ano Educação (alfabetização e

letramento)

Linguística e

Linguística Aplicada Letras Total %

2005 1 7 - 8 11,27%

2006 4 2 4 10 14,08%

2007 2 5 2 9 12,68%

2008 2 15 3 20 28,17%

2009 5 16 3 24 33,80%

Total 14 45 12 71 100,00

%

% 19,72% 63,38% 16,90% 100,00%

Fonte: Elaborada com base nos dados coletados na CAPES/IBCT.

Dos trabalhos relacionados na Tabela 1, na área de Educação, verifica-se que, dos 14

trabalhos elencados, 5 (35,71%) estão voltados para o ensino fundamental nos anos iniciais, 4

(28,57%) para o ensino fundamental nos anos finais, 3 (21,43%) são relacionados ao ensino

médio. e 2 (14,29%) ao ensino superior.

Na área de Linguística e Linguística Aplicada, dos 45 trabalhos encontrados, apenas 2

(4,44%) trazem pesquisas sobre os anos iniciais do ensino fundamental, 15 (33,33%) são dos

anos finais do ensino fundamental, 14 (31,11%) são pesquisas no ensino médio e 14 (31,11%)

são do ensino superior.

Em Letras, dos 12 trabalhos, nenhum está voltado para os anos iniciais do ensino

fundamental, 5 (41,67%) são do ensino fundamental nos anos finais, 3 (25%) são do ensino

médio, e 4 (33,33%) no ensino superior.

Nas teses (Tabela 2), encontrei 2 produções na área de educação, 12 escritos na área

de Linguística e Linguística aplicada e 3, na área de Letras, num total de 17 produções

textuais.

79

Tabela 2: Distribuição das teses nas áreas de Educação, Linguística e Letras com os descritores

gêneros textuais e produção escrita no período de 2005 a 2009

Ano Educação (alfabetização e

letramento)

Linguística e Linguística

Aplicada Letras Total %

2005 1 1 - 2 11,76%

2006 1 1 - 2 11,76%

2007 - 5 1 6 35,29%

2008 - - 2 2 11,76%

2009 - 5 - 5 29,41%

Total 2 12 3 17 100,00

%

% 11,76% 70,59% 17,65% 100,00%

Fonte: Elaborada a partir dos dados coletados na CAPES/IBCT.

Das 2 teses encontradas no doutorado na área de Educação, 1 (50%) está voltada para

o ensino médio e 1 (50%) para o ensino superior. Em Linguística, das 12 teses relacionadas,

7 (58,33%) são do ensino superior, 2 (16,67%) do ensino médio e 3 (25%) dos anos finais do

ensino fundamental. Em letras, das 3 teses encontradas, 2 (66,67%) são do ensino superior e 1

(33,33%) do ensino médio, evidenciando que as pesquisas voltadas para a área da

alfabetização são bem restritas.

Como o interesse do trabalho com os gêneros textuais está voltado para a

alfabetização, em seguida elenquei as pesquisas encontradas neste âmbito (gênero textual,

produção escrita, alfabetização) de forma mais detalhada, explicitando o ano, a área do

conhecimento, a instituição e o subtema das dissertações e da tese encontradas no sites da

CAPES (Quadro 8).

No total foram encontradas: uma tese e seis dissertações, que apresentam assuntos

relacionados à alfabetização, vinculada ao processo de letramento e compreensão dos gêneros

textuais como forma de expressão escrita contextualizada.

Partindo para a área de interesse maior, que é o Pró-Letramento e sua abordagem nas

pesquisas em nível nacional, foi possível compreender que nenhuma dessas está voltada para

a análise dos gêneros textuais, ou seja, a relação entre gêneros textuais e Pró-letramento ainda

não foi abordada em nenhuma das pesquisas encontradas, evidenciando, assim, que o intuito

desta investigação será bastante relevante e contribuirá de forma significativa para possíveis

pesquisas sobre o tema.

80

Quadro 8: Distribuição das Teses e Dissertações por área de conhecimento, instituição e subtema

encontrados com os descritores gêneros textuais na alfabetização no período de 2005 a

2009

Ano Tese Dissertação Área do

conhecimento Instituição Subtema

2005 1 - Letras UFPE Produção oral narrativa através de

desenhos

2006 - 1 Educação UFES Observação dos eventos mediados pela

linguagem escrita

2007 - 1 Educação UNIFESP Reflexão das crianças sobre a escrita

- 1 Educação UFPE Trabalho com rimas na educação infantil

2008

- 1 Educação UFSCAR Análise dos conteúdos relevantes para o

1º ano do ensino fundamental

- 1 Linguística UFPB Letramento infantil no meio familiar

- 1 Educação UFMG Práticas de alfabetização na perspectiva

do letramento

2009 - - - - -

Total 1 6

Fonte: Elaborado a partir dos dados coletados na CAPES/IBCT.

Após esse levantamento, observando as teses e dissertações que tratavam do trabalho

com gêneros textuais na alfabetização, parti para a formação continuada de professores

alfabetizadores com o programa implantado pelo MEC denominado Pró-Letramento. Como

este programa foi implantado em 2005, encontrei poucas pesquisas relacionadas a este tema.

Com as buscas realizadas com esse descritor, localizei cinco produções (Tabela 3).

Tabela 3: Distribuição das teses e dissertações por ano sobre o programa Pró-letramento no período

2005 a 2009

Ano Tese Dissertações Total %

2005 - - - -

2006 - - - -

2007 - - - -

2008 1 1 2 40%

2009 - 3 3 60%

Total 1 4 5 100%

% 20% 80% 100%

Fonte: Elaborada com base nos dados coletados na CAPES/IBCT.

É possível perceber que o volume de pesquisas sobre o tema Pró-letramento é bastante

limitado, pois, por ser um programa implantado em 2005, poucas pesquisas abordam o tema e

nenhum dos trabalhos enfoca gêneros textuais.

As pesquisas realizadas nesta área estão detalhadas no Quadro 9.

81

Quadro 9: Distribuição das Teses e Dissertações por instituição, metodologia, instrumentos de

pesquisa e subtema que versam sobre o programa Pró-letramento no período 2005 a 2009

Ano Instituição Metodologia Instrumento de

pesquisa Subtema

2008

UnB

Pesquisa qualitativa

etnográfica e

colaborativa

Entrevistas, notas de

campo, relatórios,

gravações

Contribuições da sócio-

linguística na formação de

professores

UFAL Pesquisa qualitativa

Análise de materiais

impressos de formação

continuada

Relação entre o construtivismo

e a aprendizagem

2009

UEPG Pesquisa qualitativa Entrevistas, observação e

análise documental

Observação da eficácia do

Programa através da análise

crítica

UFPE Pesquisa qualitativa Observação, análise

documental

Observação da prática de leitura

nas aulas de professoras que

participaram do programa Pró-

letramento

UFAL

Pesquisa

quanti/qualitativa,

estudo de caso de

cunho etnográfico

Questionário, entrevista

semiestruturada e

observações

Influência da formação

continuada nas práticas

docentes

Fonte: Elaborado com base nos dados coletados na CAPES/IBCT.

Os dados acima detalhados demonstram que as pesquisas realizadas sobre o programa

de formação continuada preocupam-se com a análise da eficácia do programa em relação às

práticas docentes. Dos cinco trabalhos encontrados, destaca-se uma tese na área da

Linguística (ano 2008, da UnB), enquanto que as demais são dissertações, todas na área de

Educação. Os instrumentos da coleta de dados são entrevistas, análises de documentos,

análises de materiais impressos do programa de formação continuada investigado, bem como

observação de práticas docentes, entrevistas e questionários.

As regiões em destaque são: Nordeste, Sul e o Distrito Federal.

Ao proceder à leitura dos resumos das teses e dissertações recuperadas, por meio desta

pesquisa, foi possível depreender os objetivos e as conclusões das mesmas, que passo a

detalhar a seguir:

A tese defendida em 2008 por Ana Dilma de Almeida Pereira com o título “A

(sócio)linguística no processo de formação dos professores do ensino fundamental”, tem por

objetivo verificar as contribuições da (sócio)linguística no processo de formação dos

professores. A autora é pesquisadora e formadora de professores na Universidade Federal de

Brasília (UnB) e atuou como coordenadora pedagógica do Programa Pró-Letramento no

período de dezembro de 2005 até outubro de 2006.

A pesquisa tem a etnografia colaborativa como metodologia, uma vez que a

pesquisadora permaneceu durante dois anos no polo de formação de São Luiz do Maranhão, o

82

qual atendia vários municípios da região. Considerando que o estado do Maranhão, na

ocasião, estava em último lugar no Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), que leva em

conta a renda per capita, a longevidade, e a educação, esta última é avaliada pelo índice de

analfabetismo e a taxa de matrícula em todos os níveis de ensino.

Com a implantação do Programa Pró-Letramento que, como já foi colocado

anteriormente, tem o objetivo de melhorar a qualidade do ensino de língua portuguesa e

matemática, oferecendo suporte à ação pedagógica dos professores das séries iniciais do

ensino fundamental, Pereira (2008) desenvolveu a pesquisa e algumas de suas conclusões

apontam para “a necessidade de uma formação respaldada na perspectiva de uma educação

(sócio)linguística” (PEREIRA, 2008, p.135), “o processo de formação (inicial ou continuada)

de professores do Ensino Fundamental se beneficia das contribuições da (sócio)linguística de

modo a operar mudanças significativas na educação em língua materna”, e, ainda, que “o

curso de formação continuada, o Pró-letramento, tem contribuído para a mudança na prática

pedagógica do professor.” (PEREIRA, 2008, p. 139).

A dissertação defendida em 2008 e que recuperei por meio desta pesquisa tem por

autora Ana Maria dos Santos, com o título: “O discurso construtivista como norteador da

qualidade do processo de ensino e aprendizagem”. A pesquisa desenvolvida buscou analisar

os discursos construtivistas presentes em materiais impressos dos programas de formação

continuada de professores alfabetizadores, o PROFA e o Pró-Letramento. Para essa análise, a

autora utilizou como base teórico-metodológica a análise do discurso de linha francesa.

Entendendo o discurso como processo e como movimento de sentidos, a autora utilizou, como

corpus de análise, algumas sequências discursivas extraídas de materiais impressos destinados

à formação de professores alfabetizadores em todo Brasil.

Santos, A. (2008) afirma que o conteúdo dos materiais oferecidos pelo PROFA e pelo

Pró-Letramento, apresentam um discurso construtivista que é, ao mesmo tempo, sedutor,

encantador e alienante, uma vez que

leva o professor a considerar que é possível resolver individualmente o

problema da educação, criando situações ou intervenções pedagógicas

capazes de operar a mudança garantindo a tão propalada educação de

qualidade que, sabemos ,não tem sua origem no micro espaço da sala de

aula.(SANTOS, A., 2008, p. 18).

Em 2009, a pesquisa apontou três dissertações que serão detalhadas a seguir. Maria

Lúcia da Silva Cabral desenvolveu uma pesquisa intitulada “Programa Pró-Letramento:

interface entre formação continuada, prática docente e ensino de leitura” (CABRAL, 2009)

83

com o objetivo de analisar os impactos da formação continuada na prática docente dos

professores das séries iniciais do Ensino Fundamental, no eixo do ensino da leitura, no

Programa Pró-Letramento – Alfabetização e linguagem. A autora observou os processos de

Formação Continuada dos orientadores do programa e as práticas pedagógicas de duas

professoras, analisando as mudanças ocorridas na prática, no tocante ao trabalho com a leitura

em sala de aula, antes e durante a participação dessas professoras no referido Programa de

Formação Continuada. A análise por ela realizada evidencia que:

A formação continuada do Programa Pró-Letramento possibilitou às

professoras se apropriar de novos conhecimentos referentes à leitura, a

refletir e discutir sobre sua prática e planejar o ensino da leitura de modo a

oportunizar os alunos a percebê-la como um processo de interação entre o

leitor e o texto, levantando questões que estimulassem o uso dos

conhecimentos prévios, o levantamento e a verificação de hipóteses e a

produção de inferências. (CABRAL, 2009, p. 267).

Dessa forma, Cabral (2009) conclui que a formação continuada do Programa Pró-

Letramento contribui de forma significativa para a ampliação dos saberes dos professores

sobre a língua, aumentando as possibilidades do trabalho com a leitura em sala de aula,

envolvendo os alunos em atividades de leitura que propiciem a formação dos mesmos como

leitores autônomos, capazes de identificar informações implícitas e explícitas no texto,

estabelecer relações com outras leituras e omitir opiniões sobre seu conteúdo.

Maria Vilma da Silva realizou uma pesquisa intitulada “A formação continuada de

professoras alfabetizadoras alagoanas através dos programas PROFA e Pró-Letramento - o

que dizem os programas e as professoras?” (SILVA, 2009), com o objetivo de investigar em

que medida os referidos programas influenciaram as práticas pedagógicas das professoras

alfabetizadoras informantes. A autora utilizou, como metodologia da pesquisa, o estudo de

caso de cunho etnográfico e lançou mão dos seguintes instrumentos: questionários com

perguntas abertas e fechadas, entrevistas semiestruturadas e observação.

Por meio da análise dos dados, Silva (2009) concluiu que, embora seus informantes

“afirmam adotar os paradigmas construtivistas e sócio interacionistas defendidos pelos

programas PROFA e Pró-Letramento, ainda apresentam, no discurso e na prática pedagógica,

distorções e equívocos quanto à sua aplicação”. Nesse sentido, a autora coloca que é

necessário haver uma reflexão mais aprofundada acerca do conceito e do processo de

formação continuada pelo qual as informantes passaram.

84

Maria Aparecida Alferes fez uma análise crítica sobre o Programa Pró-Letramento, do

município de Guaruva, em Santa Catarina, defendendo em sua dissertação que o referido

programa é uma medida necessária, mas não suficiente para a melhoria na qualidade da

educação, visto que esta demanda uma série de outras ações que ultrapassam a formação

continuada dos professores, tais como:

a valorização dos profissionais da educação, a garantia da infraestrutura das

escolas, estímulo para a construção de propostas curriculares com a

participação dos professores, a existência de projetos pedagógicos

consistentes na rede de ensino e nas escolas, a utilização dos resultados

obtidos por meio de avaliações para o planejamento de estratégias de

intervenção com a participação do coletivo das escolas entre outras medidas.

(ALFERES, 2009, p. 6).

A autora aponta, também, algumas contribuições positivas do referido programa, tais

como:

a) As redes públicas de ensino tiveram a oportunidade de oferecer aos professores

uma formação contínua mais orgânica e sistematizada;

b) Pelos instrumentos de pesquisas utilizados (entrevistas, observação não

participante, e questionários), Alferes (2009) depreendeu que os tutores e cursistas

qualificam o Programa Pró-Letramento como inovador, na medida em que

enfatiza estudos sistemáticos da prática, utilizando-se de conceitos relevantes para

a prática pedagógica.

c) O programa tem sido um apoio para o planejamento pedagógico em torno do

processo de alfabetização e letramento, mediante análise dos resultados

alcançados pelas escolas e redes de ensino.

Conforme as pesquisas acima esboçadas, é possível afirmar que o Programa Pró-

Letramento tem sido objeto de análises e estudos significativos, recebendo críticas e

apontamentos de sua contribuição no processo de formação profissional e na prática

pedagógica do professor alfabetizador.

E como o objetivo desta pesquisa foi de verificar como e se os gêneros textuais eram

explorados nessas análises, foi possível concluir que as teses e dissertações recuperadas não

apontam como foco a observação dos gêneros textuais nos primeiros anos do Ensino

Fundamental. Dessa forma, fica evidente a relevância da pesquisa a ser desenvolvida nesse

âmbito.

85

5.3 O que indicam os periódicos?

Utilizando como base para a pesquisa o descritor gêneros textuais, a busca realizada

no site Scielo, que é uma plataforma de pesquisa, onde se insere uma grande variedade de

revistas com seus respectivos artigos, percebi que são poucos os artigos que tratam do tema.

A partir do descritor gênero textual e buscando temáticas que abordam a alfabetização,

realizei uma procura pelo tema observando os títulos dos artigos em várias revistas como:

Educação e Sociedade, Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, Currículo sem fronteiras,

Revista Carlos Chagas, Educação e Realidade, Cadernos Cedes, Trabalhos em Linguística

Aplicada. Foram localizadas um total de 3 artigos e, com o descritor Pró-Letramento, apenas

um artigo foi encontrado.

Tabela 4: Distribuição dos artigos em periódicos sobre gênero textual e Pró-Letramento no período

de 2005 a 2009

Ano Quantidade Percentual Periódico

2005 1 25% Cadernos Cedes

2006 - - -

2007 - - -

2008 2 50% Práxis Educativa / Delta

2009 1 25% Trabalhos em linguística aplicada

Total 4 100%

Fonte: Elaborada a partir dos dados coletados no Scielo.

Percebe-se, pelos dados da Tabela 4, que há um número restrito de artigos nos

periódicos nos últimos cinco anos. Somente um artigo do ano de 2008 da revista Práxis

Educativa está diretamente relacionado ao Programa Pró-letramento. Trata-se de um artigo de

Sônia Regina Mendes dos Santos, com o título “A rede nacional de formação continuada de

professores: o Pró-Letramento e os modos de ‘formar’ os professores” no qual a autora

analisa as possibilidades de construção da autonomia profissional de professores participantes

do Programa Pró-Letramento e, por meio de entrevistas com os três principais gestores do

programa de Duque de Caxias, no Rio de Janeiro, a autora concluiu que é possível identificar

a permanência de um modelo de formação aplicacionista.

Analisando as falas dos entrevistados, a autora afirma que:

86

Entre as promessas do Pró-Letramento de estabelecer uma formação

continuada atrelada a uma atitude investigativa e reflexiva e a realidade

encontrada de uma formação considerada “superficial“, restrita ao domínio,

à apropriação, de um conjunto de técnicas com poucos aportes teórico-

conceituais, há ainda uma distância. (SANTOS. S., 2008, p. 146).

Nesse sentido, Santos, S. (2008) conclui o artigo enfatizando a necessidade de a

formação de professores não ser vista como o único caminho para melhorar a qualidade na

educação, mas deve ser capaz de provocar tensões e impulsionar o professor para a reflexão

sobre a prática, de forma investigativa e coletiva.

A partir do estudo do Estado do Conhecimento realizado sobre o tema gêneros textuais

e sua abordagem no programa Pró-letramento, foi possível perceber que as pesquisas nesse

sentido ainda não foram realizadas. Partindo da análise inicial realizada com o primeiro

descritor foi possível perceber que das 71 dissertações encontradas, 6 tinham por assunto a

alfabetização e das 17 teses, apenas 1 trazia como foco os anos iniciais do ensino

fundamental e nenhum dos trabalhos estava relacionado ao programa de formação de

professores alfabetizadores denominado Pró-letramento.

Analisando os trabalhos apresentados com o descritor Pró-letramento, verifica-se que

as pesquisas realizadas sobre o Programa estão relacionadas à influência do mesmo nas

práticas docentes e na sua eficácia em relação à aprendizagem.

Quanto à metodologia dessas pesquisas, destaca-se a pesquisa qualitativa de cunho

etnográfico e a coleta de dados é realizada a partir de vários instrumentos, tais como

entrevistas, questionários, observações, análise documental e relatórios. As regiões brasileiras

em destaque nessas pesquisas são a região nordeste com três produções, uma produção na

região Sul e uma no Distrito Federal.

Em relação aos periódicos, os artigos encontrados nesses últimos cinco anos ainda são

poucos se comparados à quantidade de teses e dissertações encontradas.

Assim sendo, o estudo aqui descrito vem ao encontro das indagações anteriormente

formuladas no tocante à relevância da pesquisa a ser realizada, pois os estudos existentes

sobre o Programa Pró-letramento em âmbito nacional não privilegiam o enfoque aos gêneros

textuais voltados para a alfabetização.

5.4 Delineando as pesquisas sobre o Pró-Letramento após 2009

Sabe-se que a proposta de estudo que ora se inicia, não parte do ineditismo, pois

alguns estudos sobre o programa Pró-Letramento já foram realizados, porém pelos trabalhos

87

recuperados, através de uma pesquisa do tipo estado do conhecimento, observei que os

estudos desenvolvidos são direcionados à análise do material, à eficácia do programa em

relação às práticas docentes, dentre outros aspectos. Nenhum dos trabalhos recuperados

menciona a utilização dos gêneros textuais como uma das possibilidades metodológicas para

o desenvolvimento das capacidades linguísticas dos alunos.

Segue uma abordagem descritiva da implantação do Programa de Formação

Continuada em foco na qual relacionarei os demais estudos já realizados sobre essa temática,

após a pesquisa desenvolvida, visto que, como já mencionado anteriormente, o estado do

conhecimento contemplou as teses, as dissertações e os artigos redigidos até o ano de 2009.

Lucio (2010) desenvolveu um estudo sobre o Programa Pró-Letramento na perspectiva

histórico-cultural, apresentando como interlocutor de suas reflexões o filósofo e linguista

Mikhail Bakhtin e sua teoria da linguagem. A autora, considerando a abordagem

metodológica de caráter qualitativo, adotou a pesquisa documental para a análise de um

conjunto de documentos que abordam ações políticas e governamentais na formação de

professores da Rede Nacional de Formação Continuada de Professores da Educação Básica

(RNFC).

Por meio de uma pesquisa do tipo estado do conhecimento, a autora observou os

aspectos abordados nas pesquisas em nível nacional e optou pela análise do material do

Programa Pró-Letramento sob a ótica das concepções de alfabetização e letramento que

orientam o programa.

Nesta perspectiva, Lucio (2010) faz uma análise do momento histórico, político e

social em que o Programa Pró-Letramento foi implantado e a importância do papel da

linguagem e dos discursos que orientam os sujeitos numa determinada sociedade. A autora

salienta que a normatização efetiva da formação continuada para professores aconteceu

mediante a lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) de nº 9.394/96 (BRASIL,

1996).

No artigo 67 desta lei, os sistemas de ensino deverão promover a formação e a

valorização dos profissionais da educação assegurando-lhes aperfeiçoamento profissional

contínuo. Neste sentido, o poder público proporcionará aos profissionais da educação a

veiculação e a efetivação de programas de ensino à distância em todos os níveis e

modalidades, e também de formação continuada. Através do artigo 87, parágrafo 1º, inciso

III, fica explícito o dever de cada município à realização de programas de capacitação para

professores em exercício, utilizando os recursos da educação a distância.

88

Em junho de 2003, no governo do presidente Luís Inácio Lula da Silva, foi

apresentado pelo então ministro Cristovão Buarque, o programa Toda Criança Aprendendo, a

diretores da União Nacional dos Dirigentes Municipais (UNDIME) e demais personalidades

da sociedade: educadores, sindicalistas, secretários da educação, etc..

A partir desse documento, é possível compreender as origens do Programa Pró-

Letramento, pois a política governamental que estava sendo implantada no país

redimensionava as políticas delineadas pelo MEC e que seriam desenvolvidas pelas

secretarias de educação, apresentando quatro políticas básicas para a formação continuada dos

professores, a saber: implantação de uma política de valorização e formação de professores,

com o incentivo da formação continuada, ampliação do atendimento escolar tanto na extensão

da jornada quanto na duração do ensino fundamental, apoio à construção de sistemas

estaduais de avaliação da educação pública e a implementação de programas de apoio ao

letramento da população estudantil.

Com a criação deste documento, enfatizou-se também a política educacional no

formato de formação de professores através do Ensino a Distância (EaD ). A portaria nº 1403,

de 9 de junho de 2003, instituiu o Sistema Nacional de Formação Continuada de professores

que corrobora com a necessidade de se valorizar a educação básica, a formação continuada, a

avaliação em grande escala e a educação a distância. Várias entidades educacionais

protestaram contra a publicação desta portaria, pois de acordo com a carta protesto nº 34/2003

do Fórum Nacional em defesa da escola pública, intitulada “Formar ou certificar? Muitas

questões para reflexão”, a proposta do governo, no sentido de avaliar, “continuava sem

referência no projeto pedagógico de cada instituição escolar e no contexto social brasileiro.”

(LUCIO, 2010, p. 6).

Apesar das críticas recebidas, a Portaria nº 1.403 continuou em vigor e a Rede

Nacional de Formação Continuada de Professores da Educação Básica (RNFC) foi efetivada

por meio do edital nº 01/2003/SEIF/MEC, que colocou em evidência as diretrizes para o

encaminhamento de propostas das universidades ao MEC, no sentido de contribuir com o

desenvolvimento tecnológico e com a prestação de serviços para as redes públicas de ensino.

Após a portaria nº 1.403, de acordo com a proposta governamental e política em torno

da educação, em 7 de maio de 2004, por meio da portaria nº 1.472, instituiu-se o sistema

nacional de formação continuada de professores e, em março de 2005, com a aprovação pelo

Senado do plano de qualidade para a educação brasileira, a RNFC foi consolidada e partiu da

proposta de integração entre o centro de pesquisas das universidades credenciadas pelo MEC,

89

no sentido de que estas desenvolvessem materiais didáticos para subsidiar a prática dos

docentes da educação básica em exercício.

A partir dessa proposta, algumas universidades tiveram seus projetos aprovados dentro

da área da linguagem e da alfabetização; entre elas destaca-se: Universidade Federal de

Pernambuco (UFPE), Universidade Federal de Sergipe (UFS), Universidade Federal de Minas

Gerais (UFMG), Universidade de Brasília (UnB), Universidade Estadual de Campinas

(UNICAMP), que a partir dessas propostas iniciais, surgiram os centros de pesquisa e

desenvolvimento da educação: Centro de Alfabetização, Leitura e Escrita (CEALE/UFMG)6,

Centro de Estudos em Educação e Linguagem (CEEL/UFPE), Centro de Formação e Instituto

da Linguagem (CEFIEL/UNICAMP), Centro de Formação Continuada de Professores

(CEFORM/UNB) e Centro de Formação Continuada Desenvolvimento da Tecnologia e

Prestação de Serviços para as Redes Públicas de Ensino ( CEFORTEC/UEPG).

Dessa forma, a partir de 2003, estes centros produziram diversos materiais para

subsidiar a prática dos professores em exercício na educação básica, divulgando textos

científicos, de acordo com a área de atuação desses professores, tanto na forma inicial, quanto

na continuada, estabelecendo um diálogo produtivo entre universidades e redes de ensino.

É nesse contexto que surge o Programa Pró-Letramento, inserido no plano de

qualidade do MEC com a finalidade de melhorar a aprendizagem dos alunos das séries

iniciais, dando suporte aos professores nas disciplinas que apresentaram resultados críticos na

avaliação do Sistema de Avaliação da Educação Básica (SAEB), promovendo a atualização

de conteúdos na área de Língua Portuguesa e Matemática. O Programa Pró-Letramento foi

planejado para ser realizado a distância com a orientação de tutores locais, preparados em

encontros de formação por orientadores do programa, com a finalidade de estabelecer o

diálogo com os professores, no sentido de apresentar o material impresso, vídeos e atividades

presenciais, relativos ao programa em questão.

6 Apenas o CEALE é anterior à proposta do MEC, pois se trata de um órgão complementar da Faculdade de

Educação da UFMG, criado em 1990, com o objetivo de integrar grupos interinstitucionais voltados para a área

da alfabetização e do ensino de Português. Dois princípios orientam a integração de suas

atividades: compreender o multifacetado fenômeno do ensino e da apropriação da língua escrita, como parte

integrante de um processo histórico, político e social, é o primeiro deles; e intervir nesse processo, por meio da

qualificação de professores das escolas públicas e da divulgação da produção científica sobre o letramento, é o

segundo deles. O CEALE desenvolve projetos nos campos de Pesquisa, Ação Educacional, Documentação e

Publicação. E faz parte do Plano de Ações Articuladas (PAR), lançado pelo MEC. O PAR integra o Sistema

Nacional de Formação de Professores e tem como objetivo integrar e articular as ações na área de formação

continuada. (CEALE, s/d. p. 1).

90

É possível destacar que o material didático apresentado, por meio dos fascículos do

Pró-Letramento, traz contribuições significativas para o professor alfabetizador no tocante à

troca de experiências, articulação entre teoria e prática, propostas de atividades relacionadas à

compreensão do sistema alfabético pelo educando e o uso da leitura e da escrita nas práticas

sociais que requerem a utilização destas habilidades.

De acordo com a análise do material realizado por Lucio (2010), os discursos oficial,

acadêmico e docente interagem entre si. A autora ressalta que o material do Programa Pró-

Letramento é uma forma de diálogo produtivo e enriquecedor entre governo, academia,

docentes, no sentido de melhorar a qualidade da educação básica. Dessa forma, acredito que

é através da formação continuada vinculada à pesquisa e ao projeto político e social vigente

que se torna possível uma melhoria significativa na qualidade da educação.

A secretaria municipal de Rondonópolis – MT aderiu ao Programa Pró-Letramento em

2010, com sua continuidade em 2011, outros municípios também aderiram ao programa7 e,

como foi explicitado anteriormente, são realizados dois modelos de cursos: formação de

tutores e formação de professores. Na modalidade semipresencial, o curso promove a

formação de tutores locais em seminários presenciais em cada estado. Assim, os tutores

planejam e executam o mesmo curso aos professores alfabetizadores em exercício, com o

apoio das coordenadorias das secretarias de educação.

Algumas críticas são direcionadas a este tipo de modelo tutorial, pois os tutores são

vistos como “multiplicadores”, porém o Programa Pró-Letramento, numa tentativa de romper

com esse tipo de crítica, adotou o seguinte formato:

as ações de formação desenvolvidas são presenciais, em grande parte da

carga horária desenvolvida; privilegia a participação de todos os professores

que atuam em sala de aula, e não de coordenadores ou seus representantes;

promove a abordagem das temáticas e conteúdos vinculados aos projetos

pedagógicos das escolas e com as práticas que fazem parte da tradição

escolar; procura estabelecer um diálogo em torno das questões vividas e

experiências na prática de alfabetização; e articula teorias e práticas, como

pressupostos da abordagem dos conteúdos. (SILVA; CAFIERO, 2011, p.

238).

Passo agora ao detalhamento dos fascículos do Programa Pró-Letramento. Neste

sentido, apoiei-me nos estudos de Martins (2010), autora que fez análise dos fascículos do

material do programa, na área de alfabetização e linguagem, mediante uma pesquisa histórica

7 Relação completa dos municípios consta no portal do MEC (http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_

content&view=article&id=15827).

91

e documental explicitando os temas e conteúdos abordados, a forma e a estrutura em que se

apresentam; autores e instituições envolvidos na elaboração da proposta, bem como o lugar

social onde estão inseridos; os objetivos a que atendem e o público que se pretende atingir.

5.5 Descrição dos fascículos do Programa Pró-Letramento

O Programa Pró-Letramento está dividido em sete fascículos, com materiais didáticos,

quatro fitas de vídeo e um fascículo destinado aos professores orientadores do curso (tutores).

Os fascículos tratam de temas e conteúdos voltados para o ensino da leitura e da escrita nos

anos iniciais do ensino fundamental, eles se inter-relacionam pela temática e pelos aspectos

conceituais, ora pela repetição ora por notas que retomam conceitos vistos. A autora aponta

que as unidades textuais foram organizadas com base em análise de situações concretas do

cotidiano escolar em que as abordagens temáticas são registradas por meio de perguntas

pedagógicas ou narrativas que evidenciam e corroboram com reflexões a respeito das práticas

pedagógicas e possíveis intervenções no sentido de buscar soluções para os problemas de

aprendizagem, mediante estratégias metodológicas para a melhoria das práticas de leitura e

escrita na escola.

Martins (2010) ressalta ainda que a troca de experiência, a vivência dos professores,

suas concepções e dilemas fazem parte desse aspecto dialógico e narrativo que é característica

marcante em todos os fascículos do Programa Pró-Letramento.

O primeiro fascículo, intitulado “Capacidades linguísticas: alfabetização e

letramento”, apresenta os eixos organizadores do ensino aprendizado por meio de concepções

teóricas e conceitos que fundamentam a proposta do Programa Pró-Letramento. Conceitos

estes que são denominados eixos necessários à aquisição da língua escrita, a saber:

valorização e compreensão da cultura escrita, apropriação do sistema da escrita, leitura,

desenvolvimento da oralidade e produção textual.

Neste fascículo, apresentam-se as principais capacidades linguísticas que os alunos

dos anos iniciais do ensino fundamental devem ter desenvolvido de acordo com os cinco

eixos de aprendizagem, para a apropriação da língua escrita. As orientações apresentadas

neste programa também direcionam o trabalho docente, no sentido de mostrar aspectos

relevantes a serem iniciados e consolidados nos processos de alfabetização e letramento.

Assim, o material apresenta aos docentes o que as crianças precisam aprender de forma

gradual, ou seja, o professor planeja o seu trabalho através de uma sequência de atividades

que delineiam metas e objetivos que se procura atingir.

92

Considerando os níveis de intensidade do trabalho, o material do Programa Pró-

Letramento indica o que deve ser introduzido, retomado, trabalhado sistematicamente e

consolidado no processo ensino-aprendizado. Nesta perspectiva, escolas e professores devem

realizar discussões a respeito do que deve ser trabalhado adaptando a proposta às reais

necessidades dos alunos. Dessa forma, o docente deve ter uma visão reflexiva sobre sua

prática, sendo capaz de definir o que é relevante para ser trabalhado em sala de aula, de

acordo com a realidade.

No fascículo 2, “Alfabetização e letramento: questões sobre avaliação”, destaca-se a

ênfase dada à avaliação formativa e diagnóstica, em que o professor passa a encarar a

avaliação como uma forma de perceber os avanços e as dificuldades que os alunos

apresentaram, para intervir e auxiliá-los.

Desse modo, alguns instrumentos são sugeridos ao professor, para que ele possa

regular e orientar suas ações pedagógicas, a fim de obter informações sobre o processo de

aprendizagem dos alunos, que são:

- observação e registro, por meio de fichas descritivas, relatórios individuais, cadernos

ou diários de campo;

- provas operatórias, que enfocam as operações mentais, a compreensão de conceitos e

as estratégias mentais desenvolvidas pelo educando com a intervenção do professor;

- portfólio, que diz respeito à organização e arquivo de registros das aprendizagens dos

alunos, selecionados por eles próprios;

- autoavaliação, que possibilita a tomada de consciência pelo educando sobre suas

dificuldades e capacidades, para tomar atitudes que melhorem o seu desempenho. Vale

lembrar que a avaliação deve ser realizada também pela escola, de forma coletiva e

participativa, de acordo com o projeto político pedagógico de cada unidade escolar.

No terceiro fascículo, “A organização do tempo pedagógico e o planejamento do

ensino”, o foco volta-se para a análise das situações de ensino e aprendizagem da leitura e

escrita, com ênfase na organização do tempo escolar e no planejamento do ensino; discute

também a questão do espaço e do tempo dedicados à leitura na escola e a organização do

tempo de leitura em sala de aula, bem como ressalta a importância do planejamento e da

autonomia por parte do professor em escolher atividades significativas para a aprendizagem

do aluno.

O quarto fascículo, intitulado “Organização e uso da biblioteca escolar e salas de

leitura”, tem como objetivo levar o educador a refletir sobre a importância e possibilidades de

uso da biblioteca escolar ou da sala de leitura, no seu trabalho pedagógico; explora, ainda, as

93

diferentes modalidades de leitura, a diversidade de suportes de textos e a mediação do

professor no processo de ensino da leitura e escrita. Neste fascículo, discute-se, ainda, as

possibilidades de utilização do dicionário como instrumento importante para atividades de

leitura e escrita em sala de aula.

O quinto fascículo, “O lúdico na sala de aula: projetos e jogos”, apresenta

experiências positivas de professores que trabalham com jogos na alfabetização e leva os

docentes a refletirem sobre o uso de jogos e brincadeiras no processo de assimilação do

sistema alfabético. Além disso, mostra o trabalho com projetos didáticos que contemplam a

leitura e a escrita de diversos gêneros. Neste fascículo, a ênfase também está focalizada na

questão do planejamento de atividades de jogos e brincadeiras com objetivos bem definidos,

os quais auxiliam o educando a aprender com prazer, unindo sabor e saber.

O material apresenta como sugestão a confecção de um almanaque com atividades

lúdicas de leitura, escrita e expressão oral, visando a assimilação do sistema de escrita

alfabética de forma prazerosa por parte dos sujeitos envolvidos neste processo.

O sexto fascículo, “O livro didático em sala de aula: algumas reflexões”, apresenta

discussões relacionadas ao uso do livro didático em sala de aula, o processo de escolha, de

uso e de modificação dos mesmos no decorrer do tempo. Ademais, demonstra a importância

da escolha do livro didático pelo professor, e do trabalho sistemático e planejado para a

aquisição da competência linguística do educando mediada pelo professor.

Neste fascículo, descreve-se também a implantação do livro didático pelo Programa

Nacional do Livro Didático (PNLD) ressaltando o trabalho de avaliação que é feito pela

equipe da Secretaria de Educação Básica (SEB) em parceria com o Fundo Nacional de

Desenvolvimento da Educação (FNDE ) para a adoção ou não do livro didático enviado pelas

editoras, numa busca constante pelo aprimoramento e pela qualidade na educação.

O sétimo fascículo, “Modos de falar/modos de escrever”, versa sobre as

características, diferenças e semelhanças entre o texto oral e o texto escrito, conceitua

competência comunicativa, bem como ressalta a importância da valorização da linguagem

oral para construção da escrita.

O papel do professor como escriba na produção do texto coletivo é posto em

evidência, pois através deste trabalho é possível refletir sobre as hipóteses que os alunos têm

sobre a escrita, sobre as convenções da língua, sobre as variedades linguísticas, e, assim,

perceber os avanços dos alunos em relação à aquisição da competência linguística.

No fascículo complementar deste programa, os temas apresentados estão relacionados

aos relatos de experiência sobre o tema “História de Vida”, a fim de constatar a necessidade e

94

a importância de uma ação pedagógica que, nas séries ou ciclos iniciais, possibilite a todas as

crianças a participação em práticas sociais de letramento. A proposta de estudo deste fascículo

fundamenta-se na concepção interacionista da linguagem, em seu sentido discursivo, no qual

privilegia-se a apropriação do sistema alfabético escrito para a sua utilização efetiva nas

práticas sociais que exigem essa modalidade.

A apresentação da síntese dos fascículos do Programa Pró-Letramento nos possibilita

a compreensão de vários aspectos que devem estar presentes na prática do professor

alfabetizador, no sentido de alfabetizar letrando, ou seja, de propiciar aos aprendizes um

contato significativo, planejado e prazeroso com a cultura escrita.

Outro aspecto a ser considerado é que o objetivo do Programa busca oferecer suporte à

ação pedagógica dos professores para melhorar a qualidade do ensino e da aprendizagem da

língua portuguesa, propondo situações que incentivem a reflexão e a construção do

conhecimento como processo contínuo de formação docente. Dessa forma, os cursistas não

são meros ouvintes, mas participam ativamente do seu processo de formação através da troca

de experiência e da valorização de seus saberes.

5.6 Abordagem da produção de textos e dos gêneros textuais no Programa Pró-

Letramento: Análise documental

Por meio da metodologia dos gêneros textuais, a busca por um ensino de língua

materna que seja significativo e que propicie o desenvolvimento das capacidades

comunicativas dos alunos, em que eles sejam capazes de se expressar com clareza, tanto

oralmente quanto de forma escrita, utilizando-se da língua nas diversas práticas sociais, é uma

realidade cada vez mais presente, tanto nos documentos oficiais, quanto nos discursos.

Nesta vertente, Rojo (2010) argumenta que existem inúmeras práticas letradas na

sociedade contemporânea e, por isso, é preciso que façamos escolhas no sentido de organizar

as práticas e os currículos a fim de buscar um ensino que seja de interesse dos alunos. Nas

palavras dela:

Portanto, para selecionar práticas e compor currículos para a pedagogia dos

multiletramentos é preciso organizadores dessa variedade e multiplicidade.

Tenho sustentado, nos últimos anos, que dois organizadores muito úteis para

a seleção de objetos de ensino dentre essas múltiplas práticas e, logo, para a

construção do currículo, são os conceitos de “esfera de comunicação ou de

atividade humana”’ e de “gênero do discurso.” (BAKHTIN, 1992 [1952-

53/1979] apud ROJO, 2010, p. 30 – grifo do autor).

95

Penso que, até mesmo pelas orientações dos Parâmetros Curriculares Nacionais

(BRASIL, 1997) , existe uma tendência para o trabalho em sala de aula que busque explorar

os gêneros textuais, levando o aluno a conhecê-los e saber utilizá-los. É nesse sentido que o

programa de formação continuada, o Pró-Letramento, também busca este objetivo, pois

através da análise detalhada do material foi possível identificar 174 incidências do vocábulo

gênero ou expressões ligadas a ele, tais como: gênero, gêneros textuais, gênero de textos

(Quadro 10).

Quadro 10: Incidência dos vocábulos relacionados aos gêneros textuais nos fascículos do Pro-

Letramento (ano)

Fascículos do Pró-letramento Incidência dos

vocábulos

1: Capacidades Linguísticas: Alfabetização e Letramento 35

2: Alfabetização e Letramento: Questões sobre Avaliação 5

3: A organização do tempo pedagógico e o planejamento do ensino 9

4: Organização e uso da biblioteca escolar e das salas de leitura 5

5: O lúdico na sala de aula: projetos e jogos 25

6: O livro didático em sala de aula: Algumas Reflexões 42

7: Modos de falar, Modos de escrever 6

Complementar 30

Saeb - Prova Brasil, Matriz de Referência 4ª série do Ensino Fundamental 17

TOTAL 174

Fonte: Dados da pesquisa.

Com o objetivo específico já delimitado em minha proposta de pesquisa, realizei a

análise do material do Programa Pró-Letramento, com o intuito de verificar se e como os

gêneros textuais são abordados e quais metodologias são sugeridas para o trabalho com a

produção textual em sala de aula.

A primeira observação a ser feita é que, em relação à produção de texto, percebe-se

que não há um fascículo específico dedicado a este tema. Pela análise do material do referido

programa, é possível observar que a produção de textos espraia-se ao longo da proposta, com

vistas a indicar caminhos ao professor alfabetizador, no sentido de delimitar as capacidades,

os conhecimentos e as atitudes a serem desenvolvidas nos três primeiros anos do ensino

fundamental (Quadro 11), detalhando o que deve ser introduzido, trabalhado e consolidado no

decorrer de cada ano. Além disso, as orientações estão centradas nas funções da escrita, ou

seja, é necessário que o texto tenha um objetivo a atingir e um leitor a quem se dirigir.

96

Quadro 11: Capacidades, Conhecimentos e Atitudes necessários para a produção de textos nos três

primeiros anos do ensino fundamental

Capacidades, conhecimentos e atitudes 1º ano 2º ano 3º ano

Compreender e valorizar o uso da escrita com diferentes funções, em

diferentes gêneros I/T/C

8 T/C T/C

Produzir textos escritos de gêneros diversos, adequados aos objetivos, ao

destinatário e ao contexto de circulação: I T/C T/C

(i) Dispor, ordenar e organizar o próprio texto de acordo com as

convenções gráficas apropriadas I T/C T/C

(ii) Escrever segundo o princípio alfabético e as regras ortográficas I/T/C T/C T/C

(iii) Planejar a escrita do texto considerando o tema central e seus

desdobramentos I/T/C T/C T/C

(iv) Organizar os próprios textos segundo os padrões de composição

usuais na sociedade I/T/C T/C T/C

(v) Usar a variedade linguística apropriada à situação de produção e de

circulação, fazendo escolhas adequadas quanto ao vocabulário e à

gramática

I/T/C T/C T/C

(vi) Usar recursos expressivos (estilísticos e literários) adequados ao

gênero e aos objetivos do texto I/T/C T/C T/C

(vii) Revisar e reelaborar a própria escrita, segundo critérios adequados

aos objetivos, ao destinatário e ao contexto de circulação previstos I T T/C

Fonte: MEC/SEB (2008, p.47 – grifo do autor).

No primeiro fascículo do programa Pró-Letramento destacam-se as capacidades que

devem ser desenvolvidas ao longo dos três primeiros anos de alfabetização. Posso afirmar que

são poucas as sugestões acerca do trabalho com a produção de textos, principalmente no

primeiro ano de alfabetização.

As sugestões para a produção de textos aparecerão nos fascículos 3, 4, 5, 7 e no

fascículo complementar. A maioria das propostas de produção (Quadro 12) está vinculada a

projetos, os quais partem de um planejamento que têm uma sequência de etapas, culminando

com uma produção textual, ou seja, um produto dessas etapas.

Fascículo 1 - Capacidades Linguísticas: Alfabetização e Letramento: Apresentam-

se, neste fascículo, as capacidades a serem desenvolvidas, conforme o quadro anterior, e que

estão ligadas às atividades que o professor pode trabalhar, no sentido de fazer com que a

leitura e a escrita estejam vinculadas. Sugere-se que o professor proporcione ao aluno o

contato com diferentes gêneros e suportes de textos, para que ele compreenda e valorize o uso

da escrita:

- leia em voz alta diversos gêneros textuais, como histórias, notícias, avisos, cartas,

propagandas, etc;

8 A letra I significa introduzir; a R, retomar; e a T, trabalhar.

97

- traga, para a sala de aula, textos escritos de diferentes gêneros, em diversos suportes,

explorando esse material com os alunos, identificando características, possíveis leitores,

organização e tipo de linguagem que o texto apresenta.

- faça uso da escrita na sala de aula com diferentes finalidades, criando quadros de

rotinas, crachás, anotações de decisões coletivas, organização de trabalhos, jogos, etc

Quadro 12: Propostas de produção textual que constam no Programa Pró-Letramento.

Fascículos do Pró-letramento Projetos Proposta de produção textual

Gêneros

1: Capacidades Linguísticas:

Alfabetização e Letramento -

-

2: Alfabetização e Letramento:

Questões sobre Avaliação -

-

3: A organização do tempo

pedagógico e o planejamento do

ensino

História de vida Confecção de um álbum com

fotografias e textos

Quadro de rotina Produção de cartas

4: Organização e uso da biblioteca

escolar e das salas de leitura Dicionário de nomes

Confecção de um dicionário com o

nome dos colegas da classe

5: O lúdico na sala de aula:

projetos e jogos

Almanaque para crianças

(3ª série)

Confecção de um almanaque em que

constava: paródias, jogos, receitas,

instrução de brincadeiras, mágicas e

histórias em quadrinhos.

Brincadeiras populares

(1ª série)

Catálogo de brincadeiras populares

produzido coletivamente.

Cantigas populares

(1ª série)

Livreto e gravação em fita cassete

de cantigas populares conhecidas

pelas crianças.

6: O livro didático em sala de aula:

Algumas Reflexões - -

7: Modos de falar, Modos de

escrever

Texto coletivo escrito

pela professora como

escriba da turma (1º ano)

Texto informativo sobre um passeio

realizado pela turma no memorial

JK em Brasília

Complementar

História de vida -Escrita do nome dos alunos em

listas, crachás, cartazes.

História de vida:

Professor como escriba

da turma, produzindo

coletivamente diversos

gêneros textuais.

-Textos em quadrinhos

-Lendas, textos folclóricos,

parlendas, quadrinhas, exploração de

situações interessantes para a

criação de notícias, texto de opinião

e relatos

Fonte: elaborado pela pesquisadora.

De acordo com as orientações do programa Pró-Letramento, é necessário que o

professor exponha ao aluno que,

98

[...]sempre que se escreve deve-se ter em mente qual o objetivo da escrita,

quem vai ler o texto, em que situação o texto será lido e, em razão desses

fatores, qual o gênero e qual estilo de linguagem são mais adequados e

devem ser adotados. (MEC/SEB, 2008, p. 49).

Dessa forma, claro está que a escrita tem um papel social e funcional que não pode ser

ignorado.

Ao trabalhar com a escrita, no sentido de fazer com que o aluno se torne autônomo

neste processo, o professor poderá iniciar com a leitura, depois com a produção coletiva do

texto, sempre instigando o aluno a responder questões como:

o que é que a gente vai dizer? Por onde a gente começa? Depois que a gente

tiver dito isso, como é que a gente vai continuar? Como é que a gente vai

continuar o texto? Será que não está faltando nada? Será que o leitor vai

entender do jeito que a gente quer que ele entenda? (MEC/SEB, 2008, p. 50).

Dessa forma, são várias as etapas de produção que culmina com a capacidade de

adequação da linguagem falada (oralizada) para a língua padrão, bem como com a capacidade

de revisão e reestruturação textual. Assim, o objetivo é que o aluno seja capaz de saber

planejar, escrever, revisar, avaliar e reelaborar o seu próprio texto.

Apresentadas as capacidades que os professores precisam fazer com que os alunos

desenvolvam, vejamos as sugestões concretas de trabalho com a produção textual.

Fascículo 3 - A organização do tempo pedagógico e o planejamento de ensino:

Neste fascículo, apresenta-se um trabalho de produção textual desenvolvido pela professora

Luciana (Campinas-SP) com o tema “História de vida”. Ela desenvolveu um projeto de

escrita que culminou com a confecção de um álbum, com textos e fotografias das memórias

da turma. Pelo fato de os alunos ainda não dominarem o sistema de escrita alfabética (SEA), a

professora convidava um parente da criança para vir à escola e trazer fotografias ou objetos

que pertenciam à mesma. A partir de roteiro de perguntas, pedia que o convidado contasse

como era a alimentação da criança, suas características, principais travessuras, etc. Depois,

registrava as informações e lia para que os alunos pudessem contribuir acrescentando

informações e sugerindo mudanças. Nesta função de escriba da turma, a professora

compartilhava o ato de escrever mostrando aos alunos a forma de organização das ideias, a

escrita convencional das palavras, a relação fonema/grafema, bem como conscientizava os

alunos de que a escrita tem uma função social, que, neste caso, são a memória e a história

registradas e recuperadas por meio da documentação.

99

Na 3ª unidade deste fascículo, intitulado “Planejamento” apresenta-se como exemplo

para planejamento do tempo escolar um quadro semanal de rotina em que professoras de uma

segunda série do ensino fundamental realizaram um trabalho com a escrita de uma carta em

diversas atividades, durante a semana, que envolveram:

- Leitura e exploração do gênero cartas,

- Pesquisa em casa sobre as cartas que os pais ou avós possuíam para exploração

coletiva,

- Leitura de diferentes tipos de cartas (pessoal, comercial, de cobrança, bancária, de

familares),

- Escolha de uma carta para reflexão e análise do texto observando as características

desse gênero,

- Produção de uma carta (primeira versão),

- Revisão e adequação quanto aos aspectos estruturais da carta, ortografia, correção

gramatical e caligrafia.

Fascículo 4 - Organização e uso da biblioteca escolar e das salas de leitura: Neste

fascículo, a ênfase recai sobre a importância da biblioteca escolar, das salas de leitura e do uso

do dicionário pelos alunos, seja para conhecer o significado das palavras, para perceber as

relações entre as palavras e a ordem alfabética, bem como consultar a ortografia. Neste

sentido, uma proposta concreta de produção de texto é a confecção de um dicionário da turma

com os nomes das crianças e a descrição física e afetiva das mesmas.

Fascículo 5 - O lúdico na sala de aula: projetos e jogos: Nele, apresenta-se um

projeto intitulado Almanaque para crianças, desenvolvido pela professora Shalimar da

Silva, numa 3ª série da Escola Municipal Odette Pereira Carneiro, localizada em Jaboatão dos

Guararapes-PE.

O projeto foi planejado minuciosamente com várias etapas de aprendizagem até

culminar em seu produto final. No caso, houve o desenvolvimento das seguintes etapas do

projeto:

- Leitura, apreciação e manuseio de um almanaque, levado pela professora.

- Delimitação dos possíveis leitores.

- Escrita coletiva do que iria compor o almanaque (estrutura, capa, ilustração,

apresentação, divulgação).

A partir da discussão sobre a confecção do almanaque, a professora desenvolveu

outras atividades de produção textual, com outros tipos de gêneros para a composição do

almanaque. São elas:

100

- Produção de uma paródia com as seguintes etapas: ouvir e cantar uma música,

interpretação e análise da canção, exploração de rimas, escolha de uma música a ser

parodiada, produção em trio de paródias e apresentação para os colegas da classe. Escolha das

paródias que comporão o almanaque.

Dessa forma, as outras produções que compuseram este almanaque partiram também

de várias etapas até culminar na produção final. Assim, foram produzidos, além da paródia,

textos instrucionais (receitas, brinquedos, mágicas), brincadeiras (jogo dos sete erros) e

histórias em quadrinhos.

Após a escrita e escolha dos melhores gêneros textuais produzidos, o almanaque foi

montado coletivamente e apresentado à comunidade escolar.

Outro projeto apresentado neste fascículo foi desenvolvido pela professora Leila

Nascimento numa 1ª série do Ensino Fundamental intitulado “Brincadeiras Populares”, no

qual a professora planejou diversas etapas, iniciando com a leitura do texto literário Infância

para introduzir o tema, levantamento oral das brincadeiras conhecidas pelas crianças, proposta

do tema do projeto e conversa sobre o produto final, que seria um catálogo de brincadeiras

populares produzido coletivamente, com discussão e tomada de decisões sobre a organização

do mesmo.

Também neste fascículo, consta o Projeto Cantigas Populares desenvolvido pela

professora Cláudia Vasconcelos que regia o 1º ano do 1º ciclo da Escola Municipal Sítio do

Berardo, no Recife. Este projeto partiu de uma sequência de etapas com o levantamento oral

das cantigas populares conhecidas pelas crianças, escrita da lista das mesmas em um cartaz,

questionário para ampliação do conhecimento das cantigas, vivência das brincadeiras

envolvendo as cantigas populares, escolha coletiva das músicas a serem gravadas em fita

cassete e que comporiam um livreto com a ilustração das músicas escolhidas.

Fascículo 6 - O livro didático em sala de aula: Algumas Reflexões: Este fascículo

fala da importância da escolha do livro didático para o trabalho do professor. É preciso

salientar que os professores têm o direito de escolher, de três em três anos, o livro didático

que vão usar com as crianças no decorrer do ano letivo. Em entrevistas com as professoras,

constatei que nenhuma delas adotou livros didáticos para o trabalho sistemático em sala de

aula.

A professora da 1ª fase alegou que os livros didáticos destinados à alfabetização

possuem textos enormes e que, para a criança que está no início desse processo, os textos são

de difícil compreensão. As professoras da 2ª e 3ª fases afirmaram que não seguem o livro do

101

início ao fim, apenas o utilizam como um material de apoio para tirar xerox de algumas

atividades e explorar alguma atividade interessante que tenham encontrado no livro.

É preciso ressaltar que os novos livros didáticos passam por uma avaliação rigorosa e

que há uma mudança significativa no que se refere à presença da diversidade textual neles

encontrada. São textos que procuram privilegiar os aspectos discursivos da linguagem numa

busca de apropriação do conceito de letramento.

O fascículo ressalta que os livros didáticos, em sua maioria, são de boa qualidade e

representam um material que cada aluno pode utilizar, o que facilita o desenvolvimento do

trabalho em sala de aula. Por isso, é importante que o professor saiba como realizar um

trabalho significativo com eles, a fim de que os alunos se alfabetizem numa perspectiva de

letramento. Creio que o professor precisa direcionar sua prática, no sentido de não privar o

aluno desse material, pois em muitos casos, devido às condições socioeconômicas de nossos

alunos, esse é um dos poucos materiais didáticos a que eles podem ter acesso.

No fascículo 7 - Modos de falar, Modos de escrever: o programa Pró-Letramento

traz uma experiência com o texto coletivo, numa sala de 1º ano em que os alunos ainda não

dominam o sistema de escrita alfabética SEA, mas a professora, como escriba dos alunos,

num processo de interação com a turma, instigou e levou os alunos a pensarem sobre a escrita

de um texto de forma contextualizada. A escrita do texto coletivo estava relacionada a um

passeio turístico realizado na cidade de Brasília, especificamente, no Memorial JK.

Primeiro, a professora pediu que os alunos desenhassem o que eles haviam gostado no

passeio e, a partir dos desenhos, ela começou a compor, em conjunto com os alunos, um texto

informativo sobre o passeio realizado. Neste evento de letramento, a professora levou os

alunos a refletirem sobre as diferenças entre os modos de falar e os modos de escrever.

Fascículo complementar: Neste, encontra-se um trabalho com a escrita dos nomes

dos alunos para se trabalhar o tema “História de vida”, iniciando com uma proposta de

trabalho em que os alunos se apresentam e, depois, se utilizam da leitura e da escrita dos

nomes como um primeiro passo para o ingresso deles no mundo alfabetizado. Esse trabalho

possibilita aos alunos a compreensão da necessidade do registro, bem como da reflexão sobre

o sistema/princípio alfabético.

O programa traz várias sugestões de atividades que podem ser desenvolvidas em sala

de aula com a escrita dos nomes dos alunos. Tais como: listas, crachás, jogos linguísticos,

dominó, bingo, caça-palavras. Neste caso, a introdução da apropriação do sistema de escrita

alfabético, por meio da escrita dos nomes dos alunos, possibilita diversos momentos de leitura

e escrita, pois os alunos são incentivados a ler e a escrever, mesmo que de forma não

102

convencional. O nome pode ser considerado uma palavra texto, pois geralmente está

carregado de significado e oferece várias possibilidades de trabalho.

Na unidade 3 do fascículo complementar do programa Pró-Letramento apresentam-se

alguns aspectos importantes sobre a produção de textos na fase inicial de alfabetização. Nesta

unidade, destaca-se a importância de se trabalhar com a produção de texto de forma

sistemática e frequente já no primeiro ano da alfabetização. Sugere-se que o professor seja o

escriba do aluno e que proponha situações de produção de texto, nas quais os alunos iniciam

utilizando uma linguagem pictórica (desenho) e também a linguagem verbal para explicar o

que os desenhos significam, para, posteriormente, passarem à linguagem escrita.

No caso da linguagem escrita, o programa Pró-Letramento sugere ao professor que

oportunize ao aluno momentos de reflexão sobre a produção textual verificando coletivamente

a coesão e a coerência dos textos. Numa narrativa, por exemplo, o professor deve levar o

aluno a perceber que a sua estrutura envolve ação (o que aconteceu), personagens (com quem

aconteceu) espaço (onde) e o tempo (quando).

Para ilustrar o trabalho com a produção textual a partir da narrativa, o programa Pró-

Letramento traz o exemplo da professora Marilene que ministrava aulas para a 3ª série do

ensino fundamental e propôs a produção de um texto narrativo a partir do tema “História de

vida”. O material traz como contribuição ao trabalho do professor alfabetizador a necessidade

do olhar reflexivo sobre o texto do aluno. Oportunidade em que, por meio da reestruturação

de textos de forma coletiva, o professor possibilitará ao aprendiz a compreensão e o domínio

dos aspectos estruturais da língua, tanto na ortografia, na paragrafação, no uso da pontuação

(entre outros aspectos), quanto na clareza e na coerência do texto. Nesta unidade, a orientação

é para que o professor trabalhe a leitura e análise de diferentes textos a fim de que os alunos

tenham boas referências para suas produções.

O programa Pró-Letramento propõe, assim, que o professor utilize:

- Textos em quadrinhos:para que as crianças percebam a organização sequencial dos

fatos (início, meio e fim).

- Trabalho com textos literários: tais como as lendas, os textos folclóricos, as

parlendas, as quadrinhas, pois nesta faixa etária, as crianças fazem uso da expressão simbólica

e da imaginação.

- A exploração de situações interessantes, engraçadas e que acontecem no cotidiano:

que poderão ser utilizadas como motivo para a produção de histórias, relatos, notícias, textos

de opinião, cartazes, cartas ou outros gêneros.

103

- Criação de oficinas de textos: para que os alunos recebam subsídios teóricos e

práticos para suas produções.

Assim, é possível afirmar que as sugestões do Pró-Letramento para o professor

alfabetizador quanto à produção textual procuram subsidiar a prática do professor com o

desenvolvimento de projetos e atividades diversas, com vistas ao alfabetizar letrando. Não se

trata apenas de compreender a tecnologia da escrita, mas, além disso, de proporcionar aos

educandos o desenvolvimento das habilidades de leitura e escrita compreendendo suas

funções sociais, interacionais e funcionais.

O Programa Pró-Letramento é mais um aliado na prática pedagógica do professor,

além disso, é necessário ressaltar que cada realidade é diferente uma da outra e que as

propostas de produção podem e devem ser adaptadas, e isso vai depender dos projetos

desenvolvidos na escola e da criatividade do professor.

5.7 Formação docente: garantia de transformação da prática?

É na sala de aula que os referenciais e concepções defendidas pelas teorias da

educação se concretizam, de forma que se espera que neste espaço ocorram mudanças e

inovações na prática pedagógica, pois a sala de aula é um importante espaço de aprendizagem

tanto do aluno quanto do professor, pois possibilita a aquisição do saber-fazer pedagógico.

Porém, saliento que essas mudanças no interior da escola não se efetivam de forma tão

direta e imediata, devido ao caráter processual da natureza formativa e das dificuldades da

transposição didática.

Não se pode negar a importância da formação docente para a melhoria na qualidade da

educação, mas é preciso ressaltar que há outros elementos que condicionam a realidade

educacional, como as questões sociais, culturais e econômicas dos sujeitos que compõem a

escola.

A formação docente é tema de inúmeros debates, pois é considerado um relevante

componente de mudança. Pesquisadores, gestores de políticas públicas, comunidade escolar

interessam-se por esta temática, por perceber que a formação modifica a prática em sala de

aula no sentido de buscar a melhoria na qualidade da educação.

Além disso, o próprio professor sente-se impulsionado e até mesmo pressionado a

transformar ou mudar a sua prática pedagógica no sentido de acompanhar as múltiplas e

aceleradas transformações da atualidade. Além disso, ao professor é conferida a

responsabilidade pela qualidade da educação na sala de aula, impulsionando-o a se preparar

104

para o enfrentamento dessas cobranças e uma constante renovação de conhecimentos,

competências e habilidades.

Com base nessas novas exigências, atualmente vivenciamos avanços nas concepções

teóricas sobre a formação docente. Nesse sentido, a formação para o exercício da docência é

expressa na compreensão de uma continuidade entre a formação inicial e a formação

continuada, com etapas diferenciadas e especificidades próprias.

Nesse percurso de formação, as experiências docentes e a realidade concreta na qual a

prática é situada têm influência significativa nas aprendizagens do professor.

A formação inicial ocorre nos cursos de licenciatura e procura subsidiar o novo

professor com teorias e métodos para atuar na docência. Porém, esta etapa de formação inicial

é objeto de inúmeras críticas quanto à falta de articulação entre teoria e prática educacional,

entre conteúdos e métodos.

Tardif (2002) afirma que os primeiros anos da atividade profissional constituem uma

etapa em que o professor acumula sua experiência fundamental. Ao iniciar sua carreira, o

professor aprende a fazer fazendo e procurando provar a si próprio e aos outros a sua

competência no ato de ensinar. Assim, com o passar do tempo, essa experiência adquirida,

transforma-se numa maneira pessoal de ensinar.

A ênfase dada aos saberes experienciais pelos professores estabelece um

distanciamento desses saberes aos adquiridos pela formação. Tardif (2002) defende a ideia de

que em alguns casos esse distanciamento ocorre pelo impacto do início da docência, quando o

professor percebe a limitação e a lacuna dos seus saberes diante da realidade educacional. Em

outras situações, essa percepção provoca a negação da sua formação anterior, afirmando que

esta não é suficiente para as demandas.

Dessa forma, os cursos de formação continuada, ou seja, formação concomitante ao

ofício docente, promovidos com a intenção de atualizar e aperfeiçoar o saber fazer dos

professores, de uma forma geral, tem se mostrado pouco eficiente para ensejar mudanças

significativas na prática pedagógica. A esse respeito, Nóvoa (1992) afirma que as mudanças

teóricas conquistadas na formação docente, ainda não produziram, de forma eficiente, uma

mudança na prática e que é preciso superar a dicotomia entre discurso teórico e prática ainda

existente nos cursos de formação de professores.

Com a justificativa de contribuir para o desenvolvimento profissional dos professores

e alcançar a desejada transformação didática necessária, universidades públicas brasileiras

vêm se mobilizando com ações voltadas à formação inicial e continuada de professores.

105

Essas ações intencionam a qualificação docente nos processos de ensino e

aprendizagem, que se desenvolvem em uma rede de Instituição de Ensino Superior, composta

por 19 centros, em diferentes regiões do país, com o objetivo de produzir materiais em

cooperação com as instituições de ensino para fomento de programas de formação continuada

de professores e implantação de novas tecnologias de ensino e gestão em unidades e redes de

ensino. As áreas de formação dessas redes são três:

a) Alfabetização e Linguagem, Educação Matemática e Científica;

b) Ensino de Ciências Humanas e Sociais;

c) Artes e Educação Física e Gestão de Avaliação da Educação.

Apesar da integração de esforços e da qualidade desses programas, dos centros de

formação e dos cursos ofertados, a realidade educacional ainda se encontra com poucos

avanços e conquistas, persistindo o fracasso escolar, principalmente em leitura e escrita.

É importante, porém, termos a clareza de que a formação dos professores, por si só,

não efetiva as tão almejadas mudanças na escola. Nóvoa (1992) lembra que:

A formação de professores deve ser concebida como um dos componentes

da mudança, em conexão estreita com outros setores e áreas de intervenção,

e não como uma espécie de condição prévia de mudança. A formação não se

faz antes da mudança, faz-se durante, produz-se nesse esforço de inovação e

de procura dos melhores percursos para a transformação da escola.

(NÓVOA, 1992, p. 28).

É imprescindível ressaltar que a mudança no ensino depende de vários elementos e a

formação continuada é apenas um deles. A transformação da realidade educacional depende

também de questões econômicas, sociais e culturais da sociedade como um todo que

interferem nos modos de vida dos professores e dos alunos.

Atualmente, o contexto educacional passa por transformações a fim de desenvolver

um ensino mais eficaz amparado em formas de organização escolar e práticas de sala que

auxiliem na evolução da aprendizagem dos alunos de origem social desfavorecida.

Nesse sentido, faz-se necessário investimento na formação dos professores, nas

condições de funcionamento das instituições escolares, bem como a efetivação de políticas

educacionais eficazes. Por isso, penso que seja imprescindível que haja uma ação conjunta de

representantes políticos, universidades, secretários de Educação, diretores, coordenadores e

professores, com o intuito de promover a melhoria da qualidade de ensino, garantindo

melhores condições de trabalho a professores e aprendizagem efetiva para alunos.

106

Acredito que o Programa Pró-Letramento, apesar de algumas críticas recebidas, vem

buscando um diálogo com educadores, universidades e com políticas de formação continuada

propostas pelo MEC, no sentido de garantir uma educação de qualidade aos aprendizes,

buscando formas de ensino que sejam significativas.

107

6 OS GÊNEROS TEXTUAIS NAS PRÁTICAS DOCENTES: RELAÇÕES COM O

PROGRAMA PRÓ-LETRAMENTO

Neste capítulo apresento a análise das falas dos sujeitos da pesquisa sobre as temáticas

formação continuada, Programa Pró-Letramento e ensino fundamental de nove anos. Inicio

apresentando o que pensam as professoras sobre essas temáticas.

Saliento que na sessão anterior apresentei as pesquisas realizadas em âmbito nacional

sobre o programa Pró-Letramento, bem como defendi a importância da formação continuada

para a melhoria da qualidade na educação ao apresentar como uma das possibilidades o

diálogo entre as universidades e as secretarias de educação por meio do referido Programa, no

sentido de diminuir a distância entre teoria e prática.

6.1 A Formação continuada e o Programa Pró-Letramento sob a ótica dos sujeitos de

pesquisa

Tardif (2002), no primeiro capítulo do seu livro “Saberes docentes e Formação

Profissional”, intitulado “Os professores diante do saber: Esboço de uma problemática e do

saber docente”, definindo inicialmente o que é um professor, afirma que “um professor, é

antes de tudo, alguém que sabe alguma coisa e cuja função consiste em transmitir esse saber a

outros” (TARDIF, 2002, p.31). Ao discorrer sobre essa afirmação, o autor se questiona: quais

seriam estes saberes? Será que os professores são apenas transmissores dos saberes científicos

produzidos ou elaborados por pesquisadores e formadores universitários, ou eles produzem

seus próprios saberes no âmbito de sua profissão?

Neste sentido, o autor afirma que, no âmbito dos ofícios e profissões, não se pode falar

do saber sem relacioná-lo com os condicionantes e com o contexto do trabalho. Assim, o

saber é sempre o saber de alguém que trabalha alguma coisa no intuito de realizar um objetivo

qualquer. O saber não é uma coisa que flutua no espaço, o saber dos professores é o

saber deles e se relaciona com a pessoa e a identidade deles, então, não provém de uma fonte

única, mas sim de várias fontes e de diferentes momentos da história de vida e da carreira

profissional.

O autor ressalta a importância da interlocução entre produção e transmissão de

conhecimentos, no sentido de assegurar o acesso sistemático e contínuo aos saberes sociais

disponíveis. Saberes sociais esses, que não são um privilégio individual, mas que são histórica

e socialmente produzidos. Ou seja, um saber plural, por isso a necessidade dos saberes e a

108

produção de saberes se complementarem, pois o corpo docente tem uma função social tão

importante quanto a comunidade científica e os grupos produtores de saberes.

Percebe-se, também, uma tendência à formação de professores críticos e reflexivos,

que saibam agir, que não sejam apenas executores de programas ou pacotes, mas que saibam

utilizar seus conhecimentos e sua experiência profissional nas situações pedagógicas.

Guimarães (2011) afirma que:

O cenário contemporâneo, entretanto, exige pensar a formação docente como

algo que seja processual. Essa formação deve concentrar-se na própria

pessoa do professor como agente e na escola como lugar de crescimento

profissional permanente, sendo a prática entendida como eixo central. Essa

modalidade de formação “permanente” ou “continuada” enfatiza a pesquisa

em educação, valoriza o conhecimento do professor e, em um processo

interativo/reflexivo, busca contribuir para uma análise do próprio fazer

docente, focalizando a pessoa do professor e sua experiência; a profissão e

seus saberes; a escola e seus projetos. (GUIMARÃES, 2011, p. 204 – grifo

da autora).

Nesse sentido, penso que a formação continuada deva ser um projeto de todos, não

apenas de projetos maiores propostos por políticas públicas e universidades, mas é preciso

que haja o engajamento de toda a escola e, principalmente, do professor. O responsável direto

pela aprendizagem do aluno não pode se acomodar, não pode olhar uma proposta e ficar sem

ação. É preciso refletir e posicionar-se a favor ou contra, e isso só é possível se o professor

estiver aberto a novos saberes, que, aliados à experiência, permitam-lhe essa tomada de

posição.

Tardif (2002, p. 35) afirma que “quanto menos utilizável no trabalho é um saber,

menos valor profissional parece ter”, por isso, o autor destaca a importância de que as

universidades tenham uma nova articulação e um novo equilíbrio entre os conhecimentos

produzidos e os saberes desenvolvidos pelos professores em sua prática cotidiana.

Nesse sentido é que o programa de formação continuada de professores

alfabetizadores, o Pró-Letramento, vem tentando colocar em evidência esse objetivo, pois

valoriza o saber profissional, a experiência e a prática pedagógica do professor.

A tutora do Pró-Letramento, Dulcilene Rodrigues Fernandes, responsável pelo

planejamento dos encontros na SEMEC/ Rondonópolis-MT, na entrevista cedida em 15 de

agosto de 2011, salientou:

[...] em todos os encontros nós temos uma rede de ideias, sempre a rede de

ideias é de trinta a quarenta minutos, é onde o professor coloca sobre a sua

prática. Ele fala das suas experiências e sempre tem alguma atividade para

109

ser desenvolvida em sala, do curso. Né? Do fascículo. Eles relatam isso [...]

(FERNANDES, 2011).

De acordo com Tardif (2002), os saberes docentes não se reduzem à simples função de

transmissão de conhecimentos produzidos, mas integram diferentes saberes, sendo

compreendidos como um saber plural, construídos através da “formação profissional, de

saberes disciplinares, curriculares e experienciais.” (TARDIF, 2002, p.36).

Os saberes da formação profissional podem ser definidos como um conjunto de

saberes transmitidos pela instituição de formação de professores, a qual procura fazer com

que este conhecimento científico seja colocado em prática pelo professor. Tardif (2002)

salienta que a prática docente não se limita apenas às ciências da educação, mas é uma

atividade que mobiliza diversos saberes e podem ser chamados de pedagógicos, os quais são

por ele definidos como “doutrinas ou concepções provenientes de reflexões sobre a prática

educativa no sentido amplo do termo, reflexões racionais ou normativas que conduzem a

sistemas mais ou menos coerentes de representação e de orientação da atividade educativa.”

(TARDIF, 2002 p. 37).

Os saberes disciplinares são o conjunto das disciplinas dos diversos campos do

conhecimento, oferecidos pelas universidades e que são considerados importantes para a

formação do professor de uma dada sociedade, pois são oriundos da tradição cultural e dos

grupos sociais produtores do saber.

Os saberes curriculares correspondem aos discursos, objetivos, conteúdos e métodos

selecionados como modelos eruditos pela instituição escolar.

E, por fim, o autor apresenta os saberes experienciais que são o conjunto dos saberes

específicos advindos do conhecimento de mundo, da prática, do saber-fazer, do saber-ser de

cada professor e do grupo em que atua (TARDIF, 2002, p.49).

Assim, podemos afirmar que o saber docente é um saber heterogêneo moldado pela

experiência pessoal de cada um, de acordo com o grupo social, cultural no qual o professor

está inserido.

Compreendendo os saberes dos professores como um saber plural, passo à análise a

respeito das falas dos sujeitos dessa pesquisa, no tocante à formação continuada e o que

pensam sobre o programa Pró-Letramento. Lembrando que, como sujeitos da pesquisa, foram

apresentadas três professoras alfabetizadoras experientes que trabalham com a primeira, a

segunda e a terceira fase do primeiro ciclo, respectivamente. Para nomeá-las utilizei-me dos

110

seguintes pseudônimos: Ana (1ª fase), Bia (2ª fase) e Carina (3ª fase). Destacando as três

primeiras letras do alfabeto, em suas iniciais.

Assim, apresento a seguir os primeiros dados da pesquisa mediante a entrevista inicial

(2011a) sobre a formação continuada e sua importância para a prática pedagógica no ambiente

escolar, cujo roteiro encontra-se no Apêndice A.

Ao questionar sobre a importância da formação continuada para professores

alfabetizadores obtive as seguintes respostas:

A formação continuada contribui muito na nossa formação, na nossa prática.

A formação continuada tem o poder de mudar a prática. Quando o professor

tem, sente a necessidade, que ele quer. É... a formação dá embasamento

teórico pra você mudar sua prática de acordo com as reais necessidades que

a sociedade está é... pedindo, buscando, né? Que a sociedade está... como

que a gente fala... tá...[exigindo?] exigindo. Que a sociedade está exigindo.

(BIA, 2011a).

Percebo, na opinião de Bia, que a professora considera que a formação continuada é

bastante relevante no sentido de mudar a prática, e essa mudança está associada às exigências

de uma sociedade. É notável também, que esta mudança está relacionada à vontade do

professor, ou seja, se ele estiver aberto às possibilidades de transformação.

A resposta de Ana, nos leva ao trabalho coletivo e à troca de experiências que, sem

dúvida, possibilita uma análise da prática, mediante a comparação e a rede de ideias que estão

sempre presentes nesses encontros:

Lá a gente estuda, troca opinião, né? Você vê outras possibilidades dentro

daquilo que você já desenvolve. Troca ideias com os colegas. Discute

mesmo assunto de sala de aula... é necessário. (ANA, 2011a ).

Outro aspecto a ser ressaltado também é o fato de que a professora não descarta o que,

em suas palavras, “já desenvolve”, o que nos leva a crer que ela não abandona o que faz, mas

acrescenta novas metodologias ao seu trabalho. Como sugere Chartier (2006),

Os bons professores inovam. Mas, por outro lado, são muito estáveis, não

mudam a toda hora. Antes de mudar um procedimento, eles o testam. E não

mudam tudo de um dia para o outro, são perseverantes no seu modo de

ensinar. Primeiro criam uma grande estabilidade que dá segurança para a

turma. Depois gastam tempo para recolher indícios, antes de resolver um

problema novo ou utilizar um procedimento inovador. (CHARTIER, 2006, p

12).

111

Claro está que, entre esses “indícios” citados pela autora, destaca-se a troca de

experiência entre professores e formadores, possibilitada pelos cursos de formação

continuada.

Na expressão oral, a professora Carina ressalta o fato de que o ser humano precisa

estar sempre em busca de novos saberes e que a graduação e a especialização devem ser

encaradas apenas como o primeiro passo para o trabalho docente.

Eu acho que é muito importante, assim , eu... no meu caso, eu acho que

contribuiu muito mesmo com minha formação. Porque o que você aprende,

às vezes, na universidade ou numa especialização você está nua e crua. A

formação continuada te dá aquela oportunidade de você crescer enquanto

profissional, né? De refletir um pouco mais sobre a sua prática. Foi isso,

assim que aconteceu comigo. Eu acho que... que... as coisas vão mudando

muito, e a gente também tem que acompanhar essas mudanças. (CARINA,

2011a).

Nestes trechos sobre a formação continuada evidencia-se a sua inegável importância.

Ressalto ainda, o aspecto que as professoras Bia e Carina apontaram: o fato das mudanças

pelas quais a sociedade vem passando, como motor de atualização profissional. A esse

respeito afirma Feldmann (2009):

A sociedade contemporânea, denominada por alguns como sociedade da

informação e por outros como sociedade do conhecimento, se apresenta

tendo como uma de suas características a acelerada transformação pela qual

passa o mundo, provocada pelos avanços tecnológicos, que incidem na

constituição de uma nova cultura do trabalho, afetando diretamente o

universo escolar. Diante dessa situação, o professor, como também outros

profissionais da escola, vê-se impelido a rever sua atuação, suas

responsabilidades e seus processos de formação e ação. (FELDMANN,

2009, p.75).

Dessa forma, a formação continuada propicia aos professores esta reflexão acerca de

sua prática enquanto seres inconclusos, na busca pela capacitação a fim de oferecer um ensino

de boa qualidade aos seus alunos.

Ainda com base em Tardif (2002, p.79), concordo com o autor que salienta que “os

saberes docentes formam uma mescla dinâmica, plural proveniente de diversas fontes. Uma

das fontes mais importantes dos saberes docentes é a sua própria prática”. Ademais, os

saberes docentes são moldados pela formação inicial, em cursos de capacitação e

aperfeiçoamento, na troca de experiências com outros professores, nas experiências cotidianas

e na história de vida de cada um.

112

É o que evidenciam as respostas das entrevistadas a respeito da seguinte questão: “No

decorrer de sua trajetória como professora alfabetizadora, o que você acha que contribuiu para

melhorar a sua prática?”

A prática. E a reflexão sobre a prática. A experiência: o que deu certo, o que

não deu certo. E o estudo, a formação. A formação nos traz novas

informações, nos traz novas contribuições e nos faz refletir sobre a nossa

prática e aí você vai buscar novas formas de trabalhar, novas formas de

ensinar, novas metodologias. (BIA, 2011a).

Neste excerto, observo que a professora salienta que a prática a faz crescer enquanto

profissional, pois refletindo sobre os seus saberes, suas experiências, ela avalia o que foi

proveitoso e busca nos cursos de capacitação novas formas de trabalhar. A esse respeito

Guimarães (2011, p. 205) afirma que “ao pensar em suas ações, redefinir caminhos e buscar

soluções, às vezes imediatas para resolver problemas, os professores têm a oportunidade de

refletir e avaliar sobre si mesmos e as experiências que re/constroem cotidianamente.” Dessa

forma, percebo que essa reflexão e ação só é possível através da prática, das experiências, do

contato com o outro.

Guimarães (2011) advoga ainda, que o eixo central da formação continuada é

desenvolver o educador pesquisador, que esteja preocupado com sua prática, no sentido de

apresentar uma atitude reflexiva sobre ela. Ou seja, o agir na e sobre a prática depende de um

movimento de ação-reflexão-ação. É por isso que a formação do professor deve privilegiar

essa tomada de consciência e fazer com que o protagonista do processo educativo não seja um

mero executor de programas, mas saiba se questionar sobre o seu fazer pedagógico, a fim de

ser sujeito de suas próprias ações, sendo capaz de responder questões como: o que ensinar?

Como ensinar? Para que e por que ensinar? Qual o melhor caminho a seguir? Quais as

possibilidades?

Não podemos negar a importância da formação continuada para o profissional da

educação, pois é através dela que a competência pedagógica do professor se solidifica e se

transforma no sentido de diminuir a distância entre teoria e prática.

Observemos o trecho em que a professora Carina fala sobre o trabalho coletivo na

escola.

Eu acho que anh...o trabalho coletivo na escola com os colegas. É uma coisa

que me ajudou muito, principalmente no início, as colegas com mais

experiências, lá na escola tem a M, tem a Z, tem assim... a I, tem várias, né?

Elas já tinham experiência. [...] E aí eu comecei a trabalhar muito com as

meninas que me ajudaram bastante, me passavam ideias, me passavam

113

textos e assim a experiência do outro contribui bastante com a gente. Sentar

junto para planejar, assim, eu acho, trocar as suas angústias, as dificuldades.

A gente faz muito disso lá... (CARINA, 2011b).

Na fala da professora Carina nota-se a importância que atribui à troca, ao diálogo, à

conversa com o outro (par mais experiente), para a sua prática e até mesmo para a sua

constituição como profissional. Como Bakhtin (2010) nos lembra, é na interação que

aprendemos uns com os outros, numa relação dialógica, é nessa relação com o outro que nos

constituímos enquanto pessoa, enquanto profissional.

No sentido de buscar respostas sobre a importância do programa de formação

continuada, o Pró-Letramento, enquanto proposta deste estudo, várias questões foram feitas.

Destaco a seguir a pergunta mais objetiva e as respectivas respostas dos sujeitos da pesquisa:

“Qual a importância deste programa para a sua prática pedagógica?”

Porque através do programa, nós temos que adequar muitas práticas ao

programa. A da oralidade, a da produção de texto, ah... da escrita, da leitura.

(BIA, 2011a).

Ele é importante, porque lá, porque... por exemplo: o termo letramento era

novo pra nós. Né? Antes você trabalhava, mas não tinha tanta abrangência

assim. Então lá você estudou aprendeu, viu coisas novas também.

Possibilidades de você tá... é só trabalhando é..., a questão de organizar

melhor o trabalho, o Pró-Letramento contribuiu, na organização porque ele

trabalha muito com o que você desenvolve, qual a etapa do trabalho por

exemplo, dentro da produção textual. O que que eu vou trabalhar sexta, na

semana que vem. Então tem um calendário que eu... que a gente... lá... eles

ensinaram a fazer um calendário,traçar um..., pra você não ficar perdido lá

nos trabalhos. (ANA, 2011a).

Eu acho que eu mudei muito assim, a forma de... de... encarar a

alfabetização, né? Ah, gente... eu mudei muito o jeito de encarar a

alfabetização no sentido assim, de ver que existem muitas possibilidades,

basta a gente correr atrás, né? A questão de se trabalhar vários gêneros em

todas as fases. Uma vez a gente tinha aquele medo. É lógico que tinha

determinados gêneros, que é apropriado pra primeira, pra segunda e pra

terceira fase às vezes tá lá na proposta tudo direitinho. Você tem que

trabalhar, o aluno no final do ano tem que saber este, este, este, né? Mas

como é que eu vou exigir que meu aluno saiba carta se ele não sabe escrever

um bilhete, né? Então você tem, acaba tendo que ver os outros gêneros.

( CARINA, 2011a).

A partir destes fragmentos foi possível compreender, parcialmente, como acontece a

dinâmica do curso proposto pela SEMEC/Rondonópolis-MT; na fala da professora Bia

destaca-se a disposição dos fascículos propostos pelo Pró-Letramento (Fascículo1:

114

capacidades linguísticas e Fascículo 6: modos de falar modos de escrever) que devem ser

contemplados no trabalho com a língua portuguesa.

No discurso da professora Ana, o aspecto mais evidente é a rotina de trabalho, que

deve ser pensada, planejada, para que o professor não se perca e consiga atingir seus

objetivos, trabalhando os cinco eixos do ensino da Língua Portuguesa. Creio que ela remete

ao Fascículo 2, que contempla a organização do tempo pedagógico e o planejamento de

ensino.

Destaco na fala da professora Carina o trabalho com os gêneros textuais, ou seja, uma

nova metodologia vista por ela com mais clareza e também com mais importância, pois

percebe-se a relação entre o que se aprende na escola e as exigências da sociedade. A escrita

com uma função social e interacional.

6.2 O Ensino Fundamental de nove anos: o que mudou?

O Brasil aprovou recentemente a lei federal de nº 11.274 no dia seis de fevereiro de

2006, que institui o ensino fundamental de nove anos para todos os sistemas de ensino. Com

isso, houve uma alteração nos artigos da LDB.

Essa mudança ao mesmo tempo em que inclui as crianças que frequentavam o

segmento final da educação infantil, também levanta algumas questões importantes,

principalmente em relação à prática da alfabetização nos primeiros anos da alfabetização.

Sabe-se que o ensino fundamental de nove anos tem como objetivos principais

“oferecer maiores oportunidades de aprendizagem no período de escolarização obrigatória e

assegurar que, ingressando mais cedo no sistema de ensino, as crianças prossigam nos estudos

alcançando maior nível de escolaridade” (MEC/SEB/DPE/COEF, 2004, p.14). Porém, a

escola deve ser um espaço preparado para isso. Não só em termos físicos, mas também na

formação do professor, na estrutura do currículo, na organização dos tempos e espaços de

aprendizagem dos alunos, no Projeto Político Pedagógico da escola, bem como nos objetivos

e metas a serem atingidas. De que adianta modificar a lei, se o professor e o ambiente escolar

não estão preparados para receber e atender às especificidades desse novo modelo de

educação?

Silva (2010) coloca que algumas inquietações fazem parte das preocupações para esta

nova modalidade de ensino, no campo do currículo e das práticas pedagógicas, tais como:

115

As crianças devem ser alfabetizadas aos seis anos? Que conhecimentos

devem ser ensinados às crianças de seis anos? Que metas de aprendizagem

devem ser definidas para o final dos primeiros anos de escolaridade? Em que

aspectos as práticas de ensino devem ser repensadas e alteradas? (SILVA,

2010, p. 37).

Diante desses questionamentos, a autora salienta que, atualmente, a exigência da

escola vai muito além do domínio da habilidade de codificar e decodificar a escrita, mas

também é necessário que se desenvolva a capacidade da criança de fazer uso da leitura e da

escrita no cotidiano, e levá-la a apropriar-se da função social dessas práticas, ou seja, letrar-

se. Nesse sentido, o desafio que se coloca hoje ao professor alfabetizador é conciliar esses

dois processos – alfabetização e letramento.

É preciso reconhecer, também, que os dois processos, embora complementares e

inseparáveis, têm suas especificidades e exigem, por parte do docente, procedimentos

didáticos e metodologias adequadas a cada um deles.

Neste sentido, necessário se faz que o professor alfabetizador organize seu trabalho de

forma que contemple os conhecimentos linguísticos que estão envolvidos no processo de

alfabetização não perdendo de foco os conhecimentos que devem ser ensinados aos alunos

nos primeiros anos de escolarização, quais os procedimentos e materiais didáticos que podem

auxiliar no processo de alfabetização. Ou seja, é preciso que o professor atue de forma

reflexiva sobre a organização e o desenvolvimento de sua prática pedagógica, delimitando

metas e objetivos a serem atingidos. Quando o professor não tem clareza quanto a esses

objetivos, ele não terá condições de responder às perguntas: Deve-se ou não alfabetizar as

crianças que são inseridas no ensino fundamental, com seis anos de idade? Qual a idade ideal

para se iniciar o processo de alfabetização? O que ensinar sobre a língua escrita nesta etapa?

Silva (2010) defende que as crianças devem ingressar no mundo das letras desde a sua

entrada na escola, pois elas já estão inseridas num universo grafocêntrico, ou seja, a entrada

da criança na escola não inaugura seu contato com o universo das letras, pois ela já tem

contato com diversas situações que envolvem letras, números, símbolos que já são lidos antes

de sua entrada na escola.

A autora advoga, ainda, que o tempo das crianças de seis anos de idade precisa ser

organizado em períodos mais longos, sem rupturas e que os professores estejam mais atentos

aos avanços de suas aprendizagens.

Esse acompanhamento é possível à medida que o professor consegue, por meio da

escola organizada por ciclos de formação humana, acompanhar sua turma desde a primeira até

a terceira fase de alfabetização.

116

Nesse sentido, é possível iniciar o processo de alfabetização no primeiro ano de

escolaridade e ter como meta sua consolidação, ao final do segundo e do terceiro ano. Por

isso, é necessário que a escola defina com clareza o que precisa ensinar em cada ano de

escolarização, projete metas a fim de que tenha delineado o ponto de partida e o ponto de

chegada de seu trabalho anual, ou seja quais as habilidades, conhecimentos e capacidades que

o educando precisa ter desenvolvidos em cada etapa do processo de alfabetização e

letramento.

No caso da rede municipal de Educação do município de Rondonópolis – MT, é

possível afirmar que, pelo fato de ser organizada por ciclos, o professor pode planejar a sua

prática pedagógica no sentido de definir um período destinado à introdução e à consolidação

dos processos de alfabetização.

De acordo com Silva (2010, p. 40), um dos avanços dessa nova política de inclusão da

criança de seis anos no ensino fundamental é o reconhecimento dos direitos da criança acerca

de uma escolarização mais extensa e também de uma alfabetização ressignificada, além disso,

as novas coleções destinadas à alfabetização a partir do Plano Nacional do Livro Didático,

PNLD de 2010 estabelecem um período de dois anos para o trabalho pedagógico na

alfabetização.

A autora ressalta que apesar de a sociedade como um todo apoiar a decisão

governamental, que antecipa a entrada da criança na escola, ainda no meio educacional, são

comuns alguns questionamentos sobre a adequação do início do processo de alfabetização das

crianças. Muitos questionamentos e dúvidas quanto a essa polêmica, em relação à

alfabetização aos seis anos, circulam no meio educacional, tais como: Não seria precoce a

alfabetização aos seis anos de idade? Toda mudança gera polêmica, e por estar habituado a

uma organização que vem de longa data, muitas vezes, o professor demora a assimilar e

modificar uma prática que já tinha sido internalizada.

Historicamente é preciso lembrar que o ensino fundamental esteve organizado de

forma seriada e que a criança entrava na escola com sete anos de idade na primeira série e as

crianças que entravam na escola com idade inferior a sete anos, frequentavam a pré-escola

que tinha como prática pedagógica o período preparatório com atividades de desenvolvimento

das habilidades motoras e visuais em que se preparava a criança para entrar no mundo da

escrita, ou seja, no período da pré-escola o objetivo principal era desenvolver as habilidades

motoras da criança para seu início ao mundo letrado.

Leal e Brandão (2010) apontam que, no Brasil, até os anos 60 do século XX, difundia-

se o discurso da maturidade na alfabetização, ou seja, acreditava-se que a criança, para

117

aprender as habilidades de leitura e escrita, deveria ter seis ou sete anos, pois nesta idade

estaria “pronta para aprender”. De acordo com as autoras, as orientações pedagógicas neste

período

deveria evitar qualquer contato direto com a leitura e a escrita e se

concentrar no estímulo aos chamados “pré-requisitos”para aprender a ler e

escrever, tais como o desenvolvimento de habilidades de coordenação viso-

motora, memória visual e auditiva, orientação espacial, articulação adequada

de palavras, certo grau de atenção e concentração, boa alimentação, entre

outros. (BRANDÃO; LEAL, 2010, p.15).

Essa concepção sobre a aprendizagem da leitura e da escrita acabou influenciando as

políticas públicas para o atendimento às crianças da pré-escola nos anos 1970 a 1980 do

século XX.

Porém, o discurso da prontidão para a alfabetização passou a ser questionado por

profissionais da área da educação, que, entre outras críticas, apontaram os exercícios

preparatórios como vazios de significados e repetitivos. Além disso, o fracasso na

alfabetização ainda era evidente. Ou seja, apesar no alto investimento no chamado período

preparatório, a tão almejada maturação não garantia efetivamente que as crianças fossem

alfabetizadas.

Diante desses argumentos, Leal e Brandão (2010) observaram três caminhos pelos

quais se desdobraram o trabalho da linguagem em sala de aula.

O primeiro caminho “A obrigação da alfabetização”, no qual as crianças devem

concluir a educação infantil, já dominando certas associações grafofônicas, reconhecendo

letras, lendo e escrevendo palavras e pequenos textos. Ou seja, ao invés de as crianças

treinarem a escrita de formas, figuras e traçados, elas passariam a coordenação motora fina

com a escrita das letras e palavras de forma mecânica e exaustiva.

O segundo caminho denominado “O letramento sem letras” ao contrário do caminho

anterior, a alfabetização era vista como um conteúdo escolar e por isso proibido para as

crianças da educação infantil, as quais deveriam participar de atividades lúdicas que

envolvessem outros tipos de linguagem, como a corporal, a musical, entre outras. A

linguagem escrita, sob este enfoque, não deveria ser trabalhada.

No terceiro momento, o caminho era “Ler e escrever com significado na educação

infantil”. Este enfoque é adverso aos dois caminhos descritos anteriormente. A partir das

ideias de Ferreiro, na década de 70, a alfabetização passa a ser entendida como um longo

118

processo que começa antes da criança entrar na escola, pois elas formulam hipóteses sobre o

funcionamento da escrita. As autoras salientam e defendem que

neste terceiro caminho aponta-se a possibilidade de ensinar a escrita na

educação infantil, de forma sistemática, incluindo aspectos relativos à

apropriação do sistema de ensino alfabético de escrita sem desconsiderar os

objetivos e as atividades no eixo do letramento, bem como outras

necessidades relativas ao desenvolvimento e vivências da infância.

(BRANDÃO; LEAL, 2010, p.21).

É necessário compreender que as crianças, antes mesmo de adentrar a escola, já vivem

em contextos grafocêntricos, a maioria convive com a escrita, seja por meio da televisão, do

computador, de atividades diárias, dos rótulos dos produtos, das propagandas, dos panfletos,

dos logotipos, das placas de trânsito, dos rótulos dos cartazes, além dos textos de revistas e

jornais. Ou seja, a criança já possui noções sobre a leitura e a escrita, pois vem de um amplo

processo cultural de alfabetização e letramento, dependendo do contexto sociocultural em que

vive.

Dessa forma, a decisão governamental de ampliar o ensino fundamental para nove

anos, além de possibilitar a democratização do acesso à escola para as crianças das camadas

populares, amplia também as oportunidades de acesso à cultura escrita. E isso é um avanço

significativo para todos, no que tange à educação. Porém, as escolas precisam rever antigos

conceitos e formas de pensar a alfabetização, é preciso definir objetivamente o que deverá ser

ensinado sobre a leitura e a escrita em cada etapa de escolarização.

Em se tratando desta mudança, apresento o que os sujeitos desta pesquisa pensam a

respeito disso, de acordo com as respostas à seguinte pergunta: Com o Ensino Fundamental

de nove anos, crianças mais novas, de seis anos, chegam ao primeiro ano? O que você acha

dessa proposta?

Bem eu penso assim: antigamente a gente tinha que trabalhar com criança de

sete, [subentende-se anos] era muito mais fácil. Muito fácil. Muito mais

fácil. A criança tinha maturidade. Já começava ler. Era muito melhor. Com

seis é mais difícil. Eles chegam [os alunos]... às vezes não chegam com seis.

E têm escolas que mudaram o currículo, com seis anos elas trabalham como

se fosse alfabetização em pré-escola, né? Ensino infantil. E aqui na escola,

não. Por que nós temos o pré, né? E aí é difícil. Eu acho que a criança com

sete anos é melhor preparada ela tá, ela já consegue...ela é mais

independente...até a linguagem dela é diferente. Você pega a criança que

começou a ler, que ainda tem uma linguagem materna ainda... muita coisa

ele ainda não fala direito...tá acostumado em casa. E até você tirar isso

demora muito, é muito mais difícil... (Professora Ana, 2011b).

119

Eu penso que essas crianças não têm maturidade suficiente pra acompanhar

o que é determinado à aprendizagem. O objetivo da primeira fase é al-fa-be-

ti-zar [ foi enfática]. E a criança não chega com seis anos, eles chegam com

cinco anos e oito meses, cinco anos e seis [meses]... chegam com cinco

incompletos. Eles não têm maturidade, eles querem brincar, você tem que

forçar muito eles, porque eles querem é brincar. Muitos deles não têm

maturidade, tem uns que tem, mas tem outros que não tem maturidade, e eu

penso que é devido à idade. Porque antigamente, quando entrava com sete

anos, a criança tinha maturidade pra aprender. Era muito mais fácil de se

lidar com eles, quando tinha... com sete anos, hoje em dia com cinco anos e

pouco..., a criança quer brincar e ela não consegue... entender o que é que

está acontecendo... ( Bia, 2011b).

Eu acho que da mesma forma que acontecia com sete, tem crianças que são

mais amadurecidas e tem crianças que demoram um pouco mais pra atingir a

maturidade...então às vezes tem crianças que com cinco anos, você consegue

desenvolver um bom trabalho... perto de um de sete. Então, vai muiiiiito da

diferença de cada um, né? Eu acho que todas são capazes, só que a gente

percebe assim, que tem criança que no primeiro ano, parece que não vai. Aí

você acha que é dificuldade, e às vezes você confunde, porque não é o

tempo dela. E quando ela pegar o fio da meada, aí ela vai embora...,né?

Então é questão, assim, das capacidades do desenvolvimento, das

habilidades deles, da concepção de começar a perceber o mundo da escrita, o

mundo da leitura a questão da importância disso pra eles na vida... Então, eu

acho que vai de cada um. A gente pega muita criança com seis anos muito

imatura, no entanto pega outros que já vem... Assim que fala: nossa se

tivesse entrado um ano antes... E aí, mesmo os que não têm aquela

maturidade você tem que ir puxando e tendo paciência e não pode ficar

esperando muito porque você tem que ter um resultado, né? (CARINA,

2011b).

É possível perceber, através desses excertos, que se torna de fundamental importância

um planejamento didático pedagógico no ensino fundamental, o objetivo é atuar com

liberdade para assegurar a apropriação e a construção do conhecimento a todos. A inclusão

de crianças de seis anos no ensino fundamental requer diálogo entre os professores, diálogo

institucional e pedagógico, dentro da escola e entre as escolas, com alternativas curriculares

claras. O que precisa ser considerado, nesta mudança, é um Projeto Político Pedagógico (PPP)

articulado com propósitos e objetivos voltados para o ensino e a aprendizagem dos alunos.

Pelas falas das professoras, percebo que a proposta de inclusão das crianças de seis

anos no ensino fundamental ainda não está clara em termos de currículo, pois pelo

depoimento da professora Ana, a escola atende a pré-escola com crianças de cinco anos de

idade. Ao afirmar que as crianças não têm maturidade e que era mais fácil alfabetizar crianças

com sete anos, a professora se reporta ao ensino fundamental de oito anos. Penso que ainda

seria necessário que esses objetivos se tornassem claros em relação ao ponto de partida e ao

ponto de chegada, ou seja, de planejamento para a atuação dos professores alfabetizadores.

120

A esse respeito Silva (2010) afirma que:

Nesse sentido, é importante que as redes de ensino definam quais

conhecimentos serão ensinados e quais são as capacidades e habilidades

mínimas a serem atingidas pelos alunos em cada etapa de sua escolarização.

Para saber qual é o ponto de partida do trabalho a ser desenvolvido com cada

turma, é fundamental que as escolas possuam instrumentos compartilhados

para diagnosticar e avaliar os alunos e o trabalho que realizam. (SILVA,

2010, p. 42).

Não se pode cobrar do professor resultados sem esclarecer a proposta, ou seja, o que

se pretende com as mudanças voltadas ao meio educacional. Não se pode, simplesmente,

mudar uma forma de trabalho sem se preocupar com as possibilidades de realização deste.

Compreender que a inclusão das crianças de seis anos de idade no ensino fundamental é uma

questão política requer também uma adequação de práticas pedagógicas que foram

consolidadas ao longo dos anos. Os professores, os gestores, as secretarias de educação

precisam ampliar o diálogo, a fim de compreender que o fazer pedagógico precisa de

orientação e metas para que haja mudança com qualidade e respeito às capacidades cognitivas

dos educandos.

Na continuidade dessa questão de entrevista, quis compreender melhor o pensamento

da professora Bia a respeito do ensino fundamental de nove anos e perguntei-lhe: “Essas

crianças precisam de um trabalho diferente? Qual seria?”

Precisa trabalhar de uma maneira mais criativa, mais divertida, pra chamar a

atenção deles, mais lúdica... pra eles conseguirem entender e prestar a

atenção... porque senão eles não conseguem ater a atenção pra aquilo ali.

Não faz parte do mundo deles.(BIA, 2011b).

Interessante perceber que a professora sabe que é preciso trabalhar de forma diferente

e, no entanto, que isso não é fácil, pois requer criatividade, competência e dinamismo por

parte do docente. Além disso, é necessário que a escola elabore uma proposta de alfabetização

que privilegie a criação de contextos significativos de aprendizagem, que contemple temas de

interesse do universo infantil com atividades lúdicas e prazerosas que despertem a curiosidade

e que tenham relação com o que as crianças já conheçam (faça parte do mundo delas) a fim

de que seus conhecimentos sejam ampliados.

Essa mudança também implica compromisso da administração política das secretarias

de educação no que diz respeito ao investimento na formação continuada dos docentes, na

melhoria do espaço físico das escolas e dos materiais pedagógicos. Para ilustrar, atualmente, a

Secretaria de Educação de Rondonópolis – MT não possui nenhum programa de formação

121

continuada de professores alfabetizadores. Podemos citar como exemplo, o próprio Programa

Pró-Letramento que só foi ministrado nos anos de 2010 e 2011, com grande aceitação por

parte dos professores, não tendo sua continuidade em 2012, por questões políticas e

administrativas.

Além disso, o termo letramento, conforme já discutido no referencial teórico, é bem

recente e vem sendo aos poucos incorporado no discurso e nas práticas do professor

alfabetizador. Surgiu na década de 80 e vem sendo objeto de estudo de diversos teóricos.

Penso que, na perspectiva bakhtiniana, a palavra letramento é uma réplica ao termo

alfabetização, pois este último não provoca dúvidas nem polêmica, por tratar-se de um

vocábulo de uso corrente em nosso meio, principalmente se for associada ao analfabetismo,

que durante muito tempo foi uma realidade e uma das principais preocupações de nossa

sociedade. Já esse novo fenômeno, denominado letramento, ainda causa estranheza,

confluências e divergências. Surgiu para atender às exigências de uma sociedade, na qual o

termo alfabetização se tornou insuficiente.

Compreender é opor a palavra do locutor uma contra palavra numa forma de diálogo,

ininterrupto e dinâmico. A concepção de linguagem, na teoria bakhtiniana, é sempre

dialógica, não há palavra que seja primeira ou a última e não há limites para o contexto

dialógico. O diálogo pode ser em forma de complemento, em forma de réplica, de

concordância ou dissonância com o que já foi dito anteriormente.

Dessa forma, para entender como as professoras compreendem esse novo termo

perguntei: O termo letramento vem sendo utilizado há pouco tempo no meio educacional.

Você acredita que há diferença entre alfabetização e letramento? Explique:

Alfabetização e letramento, eles tem que caminhar juntos, né? Porque a

criança se alfabetiza e pra ela ter um bom desenvolvimento, ela precisa estar

numa situação de letramento, porque ela vai ler o texto, entender, criar,

modificar, emitir opinião, relacionar uma coisa com a outra, então isso se faz

na alfabetização com letramento, porque por exemplo, se a criança está

estudando o nome dela, é... estudando o nome, então você já relaciona com

outra coisa. Pra não ficar uma coisa mecânica, né? Você vai relacionando:

do que que ela gosta, abre um leque, tem um monte de coisa, né? Então, esta

é uma situação de letramento. (ANA, 2011a).

Acredito, acredito. Eu penso que alfabetização é um mero processo de

codificar e decodificar. E que o letramento, não, o letramento veio

transformar esse processo em um processo mais, mais completo onde a

criança, além dela aprender ler e escrever por ler e escrever, ela vai aprender

ler e escrever para usar na vida, no cotidiano dela, ela vai aprender pra que

serve aquele texto, onde que ela pode usar aquele texto. O letramento insere

o mundo social dentro da escola. (BIA, 2011a).

122

Eu acredito. Em função da minha prática mesmo, igual eu comentei com

você no início, que antes eu queria fazer uma coisa que eu não estava dando

conta e hoje eu descobri o quê? Que eu estava querendo alfabetizar letrando,

né? Então, eu acho que muda muito a cabeça da gente. (CARINA, 2011a).

O dialogismo presente neste discurso das professoras é bastante evidente. No

Programa Pró-Letramento, os conceitos de alfabetização e letramento são amplamente

discutidos, na tentativa de que o professor alfabetizador aproprie-se destes conceitos e, em sua

prática docente, consiga conciliar os dois processos. Sabemos que esta apropriação não é um

processo imediato. Nesse sentido, afirma Bakhtin que

Nem todos os discursos se prestam de maneira igualmente fácil a esta

assimilação e a esta apropriação: muitos resistem firmemente, outros

permanecem alheios, soam de maneira estranha na boca do falante que se

apossou deles, não podem ser assimilados por seu contexto e escapam dele; é

como se eles, fora da vontade do falante, se colocassem ‘entre aspas’. A

linguagem não é um meio neutro que se torne fácil e livremente a

propriedade intencional do falante, ela está povoada ou superpovoada de

intenções de outrem. Dominá-la, submetê-la às próprias intenções e acentos

é um processo difícil e complexo. (BAKHTIN, 1998, p.100).

No discurso, o grande desafio está no como alfabetizar, letrando. Ou seja, alfabetizar

na perspectiva do letramento é propor atividades orais, escritas com sentido, de forma

discursiva, por meio de textos variados e que fazem parte da realidade do aluno. Assim, mais

do que compreender a relação fonema - grafema, faz-se necessário também utilizar-se dessa

tecnologia para expressar-se com clareza e de acordo com as exigências do meio social em

que vivemos.

Penso que os sujeitos desta pesquisa, como muitos alfabetizadores, ainda tem dúvidas

e limitações a respeito da compreensão do como alfabetizar na perspectiva do letramento, mas

continuam buscando na interação com o outro (cursos de formação continuada) transpor suas

limitações. Creio que ainda existe a necessidade de investimentos na formação e capacitação

dos professores alfabetizadores, no sentido de fazer com que esta compreensão se efetive e se

concretize na prática. Não se pode perder de vista que alfabetizar na perspectiva do letramento

envolve processos complexos de compreensão do sistema de escrita, bem como estratégias

metodológicas, as quais abrangem momentos de leitura e produção de diferentes gêneros

textuais e momentos de reflexão sobre a constituição do sistema de escrita alfabética.

Observando o material do Pró-Letramento, é possível perceber que as orientações

contidas no Fascículo 1: As capacidades linguísticas da alfabetização - auxiliam o professor

alfabetizador a organizar e a planejar o seu trabalho no sentido de responder à polêmica

123

questão: “deve-se ou não alfabetizar as crianças de seis anos?”, pois definem com clareza e

progressivamente os conhecimentos que deverão ser ensinados aos alunos para que

desenvolvam suas capacidades e aprendam a ler e a escrever. Porém, não basta somente a

transformação da prática dos professores alfabetizadores, mas da cultura escolar como um

todo e isso não acontece somente com um curso de formação continuada. Como já ressaltei

anteriormente, as mudanças devem ser políticas, administrativas e pedagógicas.

6.3 A prática pedagógica das docentes pesquisadas

Este item contém a análise da prática docente dos sujeitos dessa pesquisa, professoras

Ana (1ª fase do 1º ciclo), Bia (2ª fase do 1º ciclo) e Carina (3ª fase do 1º ciclo).

Mediante a observação das aulas e com base nos protocolos de observação foi possível

captar a dinâmica da prática pedagógica dos sujeitos da pesquisa, relacionando-a ao programa

Pró-Letramento, no intuito de verificar quais as orientações deste, que refletem no trabalho

com a produção de textos, verificando quais os gêneros que circulam no ambiente da sala de

aula e como este trabalho é realizado.

Para facilitar a transcrição dos dados e evitar a repetição de palavras, a identificação

dos trechos dos protocolos nos parênteses reporta-se ao Quadro 6, no qual consta o nome do

sujeito de pesquisa e o dia da observação. Como exemplo, temos: PROTOCOLO A1, que

identifica o sujeito de pesquisa: Ana, protocolo 1, dia 05/08/2011.

Os dados coletados foram lidos, analisados e interpretados à luz das teorizações

correlacionadas aos gêneros textuais e às práticas de alfabetização e letramento. Para dar

maior visibilidade aos dados, foram organizados quadros com a incidência dos gêneros

textuais que circulam na sala de aula, bem como, em alguns casos, ilustração com o produto

da atividade de produção desenvolvida.

6.3.1 A prática da professora Ana – 1ª fase

As observações na sala da professora Ana ocorreram em treze episódios semanais

(Quadro 13). Nesse sentido, foi possível verificar que, como todo trabalho pedagógico, a sua

prática segue uma rotina específica para o dia da semana, pois toda sexta-feira, no horário das

sete às nove horas, desenvolve-se a produção de texto. Dessa forma, interessada no

desenvolvimento dessa atividade, compareci à sala na sala, no horário combinado.

124

A sala é bem espaçosa, climatizada, com mesinhas individuais, possui diversos

cartazes com as letras do alfabeto e das famílias silábicas, num canto do quadro tem um cartaz

com o contrato didático, o qual contém as normas de conduta da turma9. Além disso, a

professora dispõe de um armário, onde guarda seus materiais e alguns pertences dos alunos,

tais como: livros, cadernos de produção textual, lápis, borracha, etc.

A quantidade de alunos nesta sala é adequada, pois são apenas dezessete. A

professora Ana, na entrevista, revelou que eram 22, porém, devido à mudança de algumas

famílias para outros bairros, os alunos foram diminuindo e ficaram 17. Desses, 11 são

considerados, pela professora, aptos para a segunda fase. Ou seja, acompanharão sem

dificuldades. Dos outros 6, 4 devem ter um acompanhamento por meio das aulas de apoio e 2

ainda necessitam iniciar o processo de alfabetização.

A professora coloca a sua angústia em relação à descontinuidade do seu fazer

pedagógico, por causa das constantes faltas e mudanças dos alunos: “Eu diria que foi um dos

anos mais difíceis, pra trabalhar com eles porque foram alunos que você começava um

trabalho e eles eram transferidos, foi diminuindo, diminuindo os alunos e não dava...”(ANA,

2011b). Perguntei: Mas é por quê? Eles se mudam? “Eles mudam, mudam de bairro,

mudam de cidade. A maioria ganhou casa, foi embora... né?” (ANA, 2011b).

No início, os alunos estranharam a minha presença. Percebi seus olhares curiosos e

interrogativos, porém, com o passar do tempo, eles compreenderam que eu estava fazendo um

“trabalho” diferente do desenvolvido por outras pessoas na escola.

De acordo com Rockwell (1987), por mais neutro e discreto que o pesquisador procure

ser, a sua presença e permanência na escola é estranha àquele ambiente. Quando as crianças

percebem que o pesquisador não faz parte dos adultos que normalmente frequentam a escola

(diretor, coordenador, professor), elas percebem que a função do pesquisador é diferente das

demais. Nesse sentido, procurei ser o mais discreta possível, não ocupando nenhum lugar em

destaque na sala. Sempre ficava no fundo da sala, na última carteira à esquerda, com os olhos

voltados ao que estava escrevendo, às vezes mantinha um olhar vago, almejando tornar-se

desinteressante para elas. Em algumas ocasiões, as crianças tentavam conversar comigo,

9 O cartaz denominado por Contrato didático traz as seguintes normas: Fazer as tarefas de sala e de casa;

Respeitar o colega, não brigar e xingar; Manter a limpeza da sala; Pedir autorização para sair da sala; Ser rápido

ao sair da sala; Organizar os materiais da sala; Cuidar dos próprios materiais; Não mastigar borracha e lápis;

Manter um tom baixo de voz; Respeitar as professoras e os demais funcionários da escola; Lembrar de ir ao

banheiro e tomar água nos intervalos; Evitar correrias; Evitar “passeio” na sala.

125

dispersando-se da aula, ao que eu pedia: “Preste atenção, não podemos conversar, a

professora está explicando”.

A princípio, Ana ficou apreensiva, perdendo um pouco o domínio de sala, mas

esclareci que ficasse à vontade para chamar a atenção da turma e que ela agisse de forma

natural. Assim, com o passar do tempo, as crianças e Ana estabeleceram uma relação de

confiança com a pesquisadora, até mesmo porque, em alguns momentos, após a explicação

das atividades a serem desenvolvidas pelos educandos, a pesquisadora, deixava de ser mera

expectadora para auxiliar os alunos que apresentavam maiores dificuldades.

Foi possível perceber que a professora Ana tem uma relação maternal com as crianças,

corrigindo, elogiando, incentivando e cuidando dos alunos de forma carinhosa. Sempre no

início da aula, a professora organizava a sala de aula alinhando as carteiras em fileiras e

recepcionava os alunos e isso foi possível perceber desde o primeiro dia de observação:

a professora organiza a sala e recepciona os alunos, colocando-os cada um

em seu lugar [...] chegaram mais duas alunas que estavam atrasadas, uma

delas de nome Amanda estava aniversariando, a professora a recepcionou

cantando os parabéns junto com os outros alunos. (PROTOCOLO A1, linhas

2 a 9).

Verifica-se, neste episódio, que a professora valoriza este lado do cuidado e da

autoestima de cada aluno; em vários momentos de observação foi possível perceber esta

relação entre eles.

As produções de textos, realizadas durante as observações sempre partem de uma

consigna oral por parte da professora, oportunidade em que ela instrui os alunos para a

realização das produções, explorando da forma mais detalhada possível o que deverá ser feito

em cada atividade. Por exemplo, em 12/08/2011 a professora propôs a produção de um cartão

sobre o dia dos pais esclarecendo que:

neste cartão é para os alunos escreverem tudo o que sente pelo pai, agradecer

pelo o que ele faz. A professora questionou aos alunos o que eles

agradeceriam aos pais e eles foram respondendo. O que você falaria para o

seu pai? O que ele faz que você acha legal? O que o pai faz pela família? A

professora fala que devemos ter amor, carinho e respeito pelo pai, dizer o

quanto o ama e agradecê-lo por tudo. (PROTOCOLO A2, linhas 21 a 31).

A partir dessas orientações preliminares, que acontecem em todas as aulas de

produção, é que os alunos fazem o que é proposto.

A rotina que acontecia em todos os episódios de observação partia da seguinte

sequência:

126

1º A professora organiza a sala e recepciona os alunos;

2º Realiza-se a oração inicial, às vezes com orações espontâneas e outras vezes com

orações prontas (Pai Nosso, Salmo 23, etc.);

3º Apresenta-se a proposta de produção de texto com a consigna oral da atividade a

ser desenvolvida;

4º Os alunos produzem o que foi proposto;

5º A professora auxilia os alunos, reestruturando algumas palavras com a grafia

incorreta.

Durante o período de observação, treze episódios ao todo, foi possível perceber que há

uma ênfase na narrativa, até mesmo porque a professora Ana fez a leitura deleite, no início

da aula, de livrinhos infantis, sendo que sete historinhas lidas eram narrativas (O gato de

botas, Polegarzinha, Mogli: o menino lobo, O macaco Pimenta, Os três porquinhos, A

cabritinha Bébé), uma era um texto informativo sobre o Dinossauro Rex e uma leitura de gibi

(histórias em quadrinhos).

Não há uma diversidade de textos que a professora costuma utilizar, mas sempre que

lia a história, ela esclarecia as palavras mais difíceis, fazia perguntas sobre o que os alunos

entenderam da história, enfim, se empolgava e tentava fazê-lo com os alunos também.

A atividade de produção de texto sempre era explicada e exemplificada pela

professora. Se fosse uma gravura, como no caso da sequência de acontecimentos, a professora

explorava cada quadro oralmente e procurava incentivar o aluno a escrever.

A professora distribui a atividade a ser desenvolvida. Explora a gravura da

folha e pergunta aos alunos: O que vocês veem na folha? São perguntas que

direcionam a história: o roteiro. As crianças respondem: É um tatu, tia. Na

folha xerocopiada tem a ilustração de um tatu entrando na toca e questões

que conduzem às respostas: Onde você acha que ele mora? O que ele gosta

de comer? Como você acha que ele é? Imagine algo que aconteceu com ele e

escreva aqui. (PROTOCOLO A8, linhas 18 a 25).

Neste trecho é possível perceber que há uma ênfase na produção da narrativa,

iniciando-se pela descrição de um animal, no caso, o tatu.

Interessante perceber que há uma relação entre as leituras que a professora faz com a

produção que ela propõe. Percebo que Ana procura, em sua prática pedagógica com a

produção de textos, levar o aluno a escrever baseando-se no mundo da imaginação.

Com base nos protocolos de observação, relaciono as atividades relativas aos gêneros

textuais trabalhados pela professora Ana (Quadro 13).

127

Quadro 13: Atividades relativas aos gêneros textuais realizadas em aula pela Prof Ana – 1º fase do 1º

ciclo - no período de 05/agosto a 14/dezembro de 2011

Protocolo Data Horas Atividades realizadas em sala pela Prof Ana

A1 05/ago 2 Narrativa de uma história a partir de uma sequencia de figuras

A2 12/ago 2 Cartão para o dia dos pais

A3 26/ago 2 Descrição a partir de frases prontas para serem completadas

A4 09/set 2 Descrição a partir da produção de diálogo com gravura

A5 16/set 2 Conto infantil: recontar a história dos três porquinhos

A6 23/set 2 Narração a partir de uma história contada pela professora: o ursinho

Pepito

A7 20/out 2 Narração a partir de uma gravura: o macaco e o burro

A8 18/nov 2 Narração a partir de uma sequência de perguntas (roteiro) que direciona

a escrita do texto

A9 25/nov 2 Bilhete (projeto de produção de texto da escola)

A10 02/dez 2 Anúncio (projeto de produção de texto da escola)

A11 12/dez 4 Poesia (projeto de produção de texto da escola)

A12 13/dez 4 Música para apresentação

A13 14/dez 4 Escrita de uma oração

TOTAL 13 32 9 gêneros textuais trabalhados

Fonte: Dados da pesquisa.

A sistematização dos dados mostrou que, das treze observações realizadas houve a

incidência de nove gêneros textuais (Quadro 14), explorados pela professora nesse período.

Quadro 14: Incidência dos gêneros textuais trabalhados em sala de aula pela Prof Ana – 1º fase do 1º

ciclo no período de 05/agosto a 14/dezembro de 2011

Gênero Textual trabalhado em sala Prof Ana Nº de vezes

Narrativas 5

Descrições 2

Cartão 1

Bilhete 1

Anúncio 1

Poesia 1

Música (atividade oral) 1

Oração 1

Conto 1

TOTAL: 9 13

Fonte: Dados da pesquisa

Percebe-se que as tipologias textuais (narração e descrição) se sobressaem nesta

prática, visto que sua incidência é mais frequente. É possível afirmar que o objetivo da

professora, nas produções narrativas, é fazer o aluno perceber que a história a ser narrada deve

ter uma sequência lógica de início, meio e fim. Alternando a narrativa com a descrição,

percebemos que o foco dessas está voltado para a caracterização das personagens, bem como

128

na criação de nomes próprios com ênfase na escrita de letras maiúsculas no início destes. Para

exemplificar, apresento algumas dessas produções (e transcrições) realizadas durante o

período de observação (figuras 1e 2).

Figura 1: Produção de texto pelo Isaac, aluno da Profª Ana, 1º fase do 1º ciclo

+ A galinha

A galinha

tava botando

ovos e naceos

pimtinhos a mamãe

pois um nome

em cada pimtim

joão maria

e a Isabela

eso gato

veio ataca os pimtinlho

e a mamãe

bringol com o gato

e a galinha ficol

felis cooceus

pimtios. Fonte: Dados da pesquisa.

Figura 2: Produção de texto pela Victória, aluna da Profª Ana, 1º fase do 1º ciclo

Os três porquinhos

Os três porquinhos decidiram

cecuidar sózinhos a mamãe deixou

eles sairam pela florésta eles axaram

um lugar para comtruir as suas casa o

ma velho comtruiu a sua casa de

palha o do meio comtruiu a sua casa

de madera o mais dovo comtruiu sua

casa de tizolo o lobo a soprou a casa

de palha o saiu correndo correndo

para outra casa o lobo assoprou a

casa de tizolo o assoprou a casa não

caiu o lobo emtrou na faminé saiu

coma bunda queimada e viveram

felis para sempre.

Fonte: Dados da pesquisa.

129

Na criação do cartão, a professora Ana aproveitou a ocasião, data comemorativa do

dia dos pais, para produção desta atividade. Percebi que a ênfase está na valorização e no

respeito que os filhos devem ter para com os pais. São valores reforçados pela docente, sem se

aprofundar em questões sociais (pois, na maioria das vezes, há alunos que não moram com os

pais) ou culturais. Destaca-se que a professora procurou mostrar como se escreve um cartão,

levando em consideração a estrutura dessa composição, o receptor e a finalidade do texto.

Ana desenhou no quadro as linhas para o cartão. Depois falou novamente o

que cada um falaria ao papai; que devemos ter amor, carinho e respeito por

ele, nesse cartão, é para cada um escrever o quanto ama o seu pai e agradecê-

lo por tudo. Ela instrui: na primeira linha escreve-se “Papai” e nas outras

linhas é que deve se escrever a mensagem para o papai. (PROTOCOLO A2).

As outras composições realizadas em sala, como o bilhete (figura 3), o anúncio (figura

4) e a poesia, estavam sendo trabalhadas de acordo com a proposta da escola, Projeto de

Escrita (SANTOS, 2012). É interessante observar que essas composições foram realizadas

em sala de aula, quase que individualmente, pois a professora Ana ressalta que nem todos os

alunos conseguem realizar a produção e que o projeto deverá ser apresentado constando

diversos gêneros textuais produzidos pelos alunos. Ela esclarece, também, que, de acordo com

o andamento da aula e nos momentos em que os alunos desenvolvem atividades de forma

mais autônoma, ela retoma as atividades de reestruturação textual e convida os alunos, de um

a um, para reestruturarem o texto, corrigindo a grafia das palavras, para que não constem

erros nas produções para a exposição.

Figura 3: Produção de texto pela Maria Eduarda, aluna da Profª Ana, 1º fase do 1º ciclo

Oi, Maria Julia

Vempara minha casa

Fazer umchurrasco

Na minha casa nova

Temque vin ben bonita

para o almoço.

Beijos

Maria Eduarda

Fonte: Dados da pesquisa.

130

Figura 4: Produção de texto pelo Isaac, aluno da Prof ªAna, 1º fase do1º ciclo

Vende-se

Uma fazenda com porcos

galinhas, bois e touros e muitos

bichos

Ótima localisaçõe e nada de

pertube você fica no Mato

Grosso, Pantanal.

Procurar o Isaac

numero 1432-2341

Fonte: Dados da pesquisa.

É necessário aqui, retomar o Projeto de Escrita da Escola, no qual consta em seu

histórico, que o mesmo surgiu em 1998, em resposta ao levantamento e análise das disciplinas

críticas da escola. Com os apontamentos realizados através do projeto do PDE (Plano de

desenvolvimento da escola), seria urgente propor ações corretivas para as disciplinas críticas.

Assim, a coordenadora, junto com o coletivo da escola, propôs criar um projeto que desse um

tratamento mais específico às dificuldades de produções escritas dos alunos.

E assim ficou definido no projeto, de que, se trabalhassem os diversos

portadores textuais, como: panfletos, propagandas, cartas, bilhetes,

encartes, anúncios, textos literários e poéticos, informativos e outros. Que

conduzissem alunos a compreender e identificar as características e

finalidades destes estilos de textos. Que também fosse seguido um

cronograma de rotina de trabalho de reestruturação e exposição dos

mesmos. Garantindo assim, que todas as turmas de pré a 4ª série realizassem

o trabalho proposto. Que fossem trabalhados todos os portadores textuais,

diferenciando o grau de dificuldades específicas por ano escolar. Foi

definido ainda de que essas produções fossem expostas para a comunidade

escolar. (SANTOS, 2012, p. 12, grifos meus).

Dessa forma, é possível perceber que o Projeto de Escrita da Escola (SANTOS, 2012),

condiciona o trabalho com a produção escrita a se adequar à proposta dos PCN, visto que o

ano de implantação de ambos coincide. Além disso, o apelo para que se trabalhe com os

diferentes gêneros textuais, passa a ser uma exigência da escola. Assim, o professor de todo o

ensino fundamental, conforme previsto no projeto (Quadro 15), do Pré até a antiga quarta

131

série, é convidado a trabalhar com vários gêneros textuais, e a culminância deste projeto é a

exposição para a comunidade escolar realizada semestralmente, com premiação para as

melhores produções, levando-se em consideração os seguintes critérios: produção conforme a

temática, clareza de ideias, criatividade e originalidade, relação entre texto e ilustração, letra

legível e estética.

Quadro 15: Cronograma de trabalho e exposição da produção textual da escola coordenado pela

supervisoras Wilma e Marisa/2011

Gênero Mês Data da Exposição

Contos Abril

1ª semana de julho Fábulas Maio

Tiras Junho

Bilhete, convite, carta Setembro

1ª semana de dezembro Reportagem Outubro

Poesia, poema Novembro

Fonte: Elaborado com base em Santos (2012).

Percebe-se que existe um trabalho sistemático por parte do coletivo escolar, no sentido

de se trabalhar com os gêneros textuais, visto que todos os professores e alunos são

incentivados a desenvolverem atividades em que constem os gêneros textuais. E de acordo

com o projeto de escrita da escola (SANTOS, 2012), o grau de dificuldade do trabalho é

ajustado à fase, mediante a prática de cada professor, que elabora as atividades adequando-as

à realidade de sua sala de aula. De acordo com a proposta da escola,

Este projeto foi sendo ajustado ano a ano, dependendo do resultado

diagnosticado conforme as causas apontadas e objetivos propostos. No

entanto, o projeto ficou implantado enquanto ação pedagógica para melhor

conduzir o trabalho de produção escrita na escola e garantir que todos os

alunos conhecessem, compreendessem e produzissem os diversos gêneros

textuais. Haja vista, que antes do projeto a produção era mais voltada a

temas livres e de textos apenas narrativos. (SANTOS, 2012, p.13).

Neste universo da prática docente da professora Ana, foi possível captar a dinâmica

que acontece no interior da sala de aula no que se refere ao modo como o professor conduz

sua prática, deixando transparecer suas crenças, seus valores e características da sua

personalidade. Uma das características deste fazer pedagógico é que a professora Ana, nos

outros horários (que não o destinado à produção textual específica), faz o trabalho sistemático

para que a criança se aproprie do sistema da escrita alfabética. Acredito que o professor deva

ter cautela em organizar o seu trabalho pedagógico de maneira que possa envolver atividades

de leitura e de reflexão sobre o sistema de escrita e de produção dos diversos gêneros.

132

Nesse sentido, penso que as atividades desenvolvidas por Ana procuram contemplar

esses aspectos, porém, é possível salientar que a preocupação está no ensinar a ler e a

escrever, na produção de pequenos textos, na representação gráfica da escrita mediante o

conhecimento alicerçado nas tipologias textuais. Um dos gêneros trabalhados por ela, como a

carta, por exemplo, trata-se mais de uma exigência por parte do projeto de escrita da escola

(SANTOS, 2012) e das avaliações externas, do que de uma importância atribuída por ela no

desenvolver de sua prática. Vejamos um trecho de sua entrevista final:

Professora: Não. No começo do ano a gente faz um projeto pra trabalhar.

Pesquisadora: É, sei...

Professora: Pra trabalhar, e tem tudo. Tem todos os textos...mas a gente

sabe que os textos mais difíceis são os textos que eles pouco têm relação

com este texto. São as cartas, né? Aquela formalidade toda. O bilhete pra

eles é mais fácil, porque eles começam a trocar ali, né? E você só organiza,

agora a carta é uma linguagem um pouco mais formal. Aí, eles não têm esse

distanciamento. Eles querem contar história no meio da carta, então pra eles

é difícil, a carta, tanto é que agora é que eu fui... Trabalhei com eles foi

uma carta para o papai Noel, porque era mais fácil. Mais fácil falar do papai

Noel na hora de produzir. Porque a carta é muito difícil.

Pesquisadora: É... e dentro das exigências da escola, é mais por uma

exigência da escola ou é porque você acha importante trabalhar a carta?

Professora: É mais por uma exigência da escola, eu não nego não, eu não

acho importante que eles façam uma carta na primeira fase, eu não acho

não. Não é um gênero que seria pra hoje, mas como eles têm que ter contato

com tudo, e não sei... a carta como ela cai bem no finalzinho do ano. E... é

uma exigência sim, da escola que eles tem que produzir carta, bilhete,

anúncio, é uma exigência sim, porque...

Pesquisadora: Porque tá no projeto da escola? Ai você acaba trabalhando...

Professora: É, mas tem mais outra coisa: eles vão para o segundo ano e tem

a provinha Brasil, com isso, a provinha Brasil, ela tem tudo ali...ela vem

perguntando... tem o bilhete... este texto é o quê? Qual que é a intenção dele,

né? Então se você não trabalhar... Então não é só exigência da escola...

Pesquisadora: É uma exigência também das avaliações externas?

Professora: Isso. Vêm as avaliações externas e eles têm que saber... (ANA,

2011b).

Neste fragmento de entrevista, é possível depreender que ainda temos uma hierarquia

de obrigações atribuídas ao professor alfabetizador, e que muitas vezes ele próprio não

considera relevante e acaba trabalhando sem a devida importância e sem o planejamento

adequado à atividade. Beth Marcuschi (2010, p.78) nos lembra que o trabalho com a produção

de texto deve ser pensado e planejado, no sentido de priorizar as produções consideradas

importantes e que merecem ser focalizadas e privilegiadas:

No ensino da elaboração textual, devem ser propostas situações que se

reportem à práticas sociais e a gêneros passíveis de serem reconstituídos,

ainda que parcialmente, em sala de aula, tanto no que se refere à produção

133

quanto no que se refere à produção do texto escrito. Escrever na escola,

portanto, deve ser visto como um ensaio ou mesmo uma prévia convincente

do que será requerido dos jovens aprendizes no espaço social.

(MARCUSCHI, 2010, p.78).

Dessa forma, acredito que antes de ser uma exigência, o trabalho com os gêneros

textuais deveria ser encarado como necessário e importante, por estar vinculado às práticas

sociais. No caso da produção da carta proposta pela professora, para atender ao projeto de

escrita (SANTOS, 2012), privilegiou-se o mundo da imaginação ao escrever uma carta ao

Papai Noel, ainda com uma finalidade fictícia. Talvez a dificuldade esteja em trabalhar a

escrita na perspectiva do letramento, que são os usos sociais que esta escrita deve ter no meio

em que vivemos. Para privilegiar o aspecto interlocutivo da língua, a professora poderia

propor uma discussão sobre a carta, suas características, seus possíveis destinatários e, assim,

fazer com que esta produção fosse mais proveitosa e significativa.

Segundo o programa de formação continuada investigado, o processo de valorização

e compreensão da cultura escrita deve ser iniciado tão logo a criança chegue à escola, com

vistas à sua consolidação, de modo sistematizado até o fim do período (Quadro 16).

Quadro 16: Compreensão e valorização da cultura escrita do programa Pró-Letramento

Capacidades, conhecimentos e atitudes 1º ano 2º ano 3ºano

Conhecer, utilizar e valorizar os modos de produção e de circulação da

escrita na sociedade I/T/C

10 T/C T/C

Conhecer os usos e funções sociais da escrita I/T/C T/C T/C

Conhecer usos da escrita na cultura escolar I/T/C T R

Desenvolver capacidades necessárias para o uso da escrita no contexto

escolar I/T/C T R

(i) saber usar objetos de escrita presentes na cultura escolar I/T/C T R

(ii) desenvolver capacidades específicas para escrever I/T/C T R

Fonte: MEC/SEB (2008, p.16).

Penso que a professora organiza seu trabalho na perspectiva da alfabetização, ou seja,

ela procura fazer com que a criança compreenda a tecnologia da escrita (Soares, 1998) mais

do que seus usos nas práticas sociais, pelo menos, neste início da alfabetização (1ª fase do 1º

ciclo). Existe uma preocupação, por parte da professora, em ensinar a ler e a escrever. Para

ela: “Alfabetizar é ensinar a criança a ler e a escrever.” (ANA, 2011a).

10 As letras inseridas nas quadrículas: I significa introduzir; R, retomar; seu uso no quadro indica que a

capacidade merece ênfase menor, sendo ou introduzida ou retomada, conforme o caso (introduzir a novidade;

retomar eventualmente o que já tiver sido contemplado). T significa trabalhar sistematicamente. C,

consolidar. Se as três letras aparecem ao mesmo tempo, a capacidade em questão necessita ser dominada mais

cedo e, em um mesmo ano, deve ser Introduzida, Trabalhada e Consolidada. MEC/SEB (2008, p.17)

134

Como é possível perceber, a resposta é simples e direta e está focada mais no ensinar

do que no aprender. Seria devido às exigências da escola ou das avaliações externas? A

cobrança por resultados pode fazer com que a professora se sinta pressionada a ensinar a ler e

a escrever, codificar e decodificar, mais do que compreender? Certamente que esta definição

não dá conta da complexidade do que é alfabetização, mas Ana amplia esta definição ao ser

questionada: Quando você considera que uma criança aprendeu? “Quando ela está lendo

vários portadores de textos, e quando ela está escrevendo, emitindo opinião pessoal sozinha”.

(ANA, 2011a). Outras questões foram feitas: Como você sabe quando uma criança está

alfabetizada ou não? “É quando a criança desenvolve texto sozinho, lê vários tipos de textos.

Não alfabetizada é quando ele tá nas primeiras letras, ele [pensou um pouco] tá engatinhando

ainda, tá começando.” (ANA, 2011a). Que dificuldades as crianças costumam apresentar para

se alfabetizar? “A dificuldade... a primeira é no traçado das letras, que ela mistura símbolo

com letras, né? Aí à medida que elas ficam memorizando desenhando as letrinhas aí elas

começam a entender letras e sons. Relacionar as letras, conhecer as letras, eles não sabem que

escreve com letras, no começo. Muitas crianças não sabem.” (ANA, 2011a).

Nesse ponto da entrevista, é possível vislumbrarmos um pouco do trabalho da

professora em sala de aula, visto que, pela análise do caderno de um de seus alunos11

,

verificamos que, nele, encontram-se atividades de repetição de letras, encontros vocálicos,

sílabas, palavras e frases que enfatizam a mecânica do ler e do escrever, numa organização

que vai do mais simples para o mais complexo.

Por não ser foco desta pesquisa, não utilizei os cadernos das crianças como fonte de

pesquisa, embora compreenda que estes são considerados por diversos autores como ricas

fontes históricas, dos quais é possível depreender aspectos relacionados ao que pode ser

considerado relevante para ser registrado, no tocante à leitura e à escrita. Segundo Porto e

Peres (2009), os cadernos revelam indícios das práticas pedagógicas, escolhas e opções

metodológicas das professoras, concepções de língua e de ensino de uma época. As autoras

salientam que, enquanto fonte de investigação, os cadernos possuem limitações enquanto

objeto-fonte, uma vez que não dizem tudo do cotidiano de sala de aula, das professoras e dos

alunos, pois nem tudo o que se passa em sala de aula é registrado, a cultura oral, por exemplo.

Hébrard (2001) afirma que o estudo por meio dos cadernos revela-se “um testemunho

precioso do que pode ter sido e ainda é o trabalho escolar de escrita”. Além disso, o autor

indica que “o estudo dos cadernos escolares parece mostrar que, por meio do exercício, passa

11 Considerado um bom aluno, por ser frequente e desenvolver todas as atividades propostas em sala de aula.

135

a acontecer não somente uma técnica do corpo, mas também uma técnica intelectual

específica do saber de fazer gráficos.” (HÉBRARD, 2001 apud PORTO; PERES, 2009, p. 3).

No quadro 17, abaixo, elaborei uma lista das atividades do caderno do aluno Isaac, a

fim de verificar a quantidade de exercícios que levam à apropriação da mecânica da

alfabetização, desenvolvidas durante o primeiro semestre de 2011, na sala observada.

Quadro 17: Relação de atividades desenvolvidas no caderno do aluno Isaac, no período de

22/02/2011 a 08/08/2011 (primeiro semestre)

Nº Tipos de atividade Quant.

1 Cópia de vogais 08

2 Cópia de encontros vocálicos 01

3 Junção de vogais 03

4 Leitura de encontros vocálicos com desenho 01

5 Coordenação motora 02

6 Relacionar desenhos à letra inicial 04

7 Cópia das letras do alfabeto 10

8 Leitura e cópia de sílabas 05

9 Leitura e cópia de palavras 08

10 Atividade de escrita do nome do aluno 01

11 Cópia do nome do aluno 01

12 Separação de sílabas 10

13 Cópia de frases 07

14 Formação de palavras a partir de letra inicial 02

15 Formação de palavras a partir de sílabas iniciais 09

16 Formação de palavras a partir de sílabas selecionadas 12

17 Leia e copie 05

18 Junte e leia 11

19 Auto-ditado 24

20 Ditado 03

21 Leia e desenhe 03

22 Leia e ligue (relacionar palavra e desenho) 10

23 Leitura de palavras, frases e sílabas relacionada à palavra chave 08

24 Ordenar letras e formar palavras 02

25 Formação de frases 08

26 Cruzadinha 01

27 Caça-palavras 02

28 Leitura de parlenda 05

29 Leitura de Poesia 04

30 Leitura de música 04

31 Leitura de quadrinha 03

32 Completar ficha de um animal com suas características 02

33 Completar frases 03

34 Masculino e feminino ( completar com os pares) 05

35 Lista 03

36 Troca de letras para formar uma nova palavra 02

TOTAL 192

Fonte: Dados da pesquisa.

136

Assim organizados, os dados revelaram que houve uma ênfase maior na escrita de

palavras através do auto-ditado, além de atividades de cópia e leitura.

As atividades encontradas nesse caderno foram desenvolvidas durante o primeiro

semestre. No segundo, cenário desta pesquisa, Isaac já desenvolvia textos coerentes com a

proposta da professora, o que me permite afirmar que a prática da professora Ana parte de

uma organização, sedimentada na cultura escolar, que vai do tido por mais simples ao mais

complexo. Primeiro, ela apresenta as vogais, seguidas dos encontros vocálicos, letras, sílabas,

formação de palavras e frases (Figuras 5, 6, 7, 8 e 9), mostrando uma preocupação quanto à

aquisição e compreensão do código escrito, para, posteriormente, trabalhar a produção de

textos de forma sistematizada. Assim, não há como negar que Ana privilegia esta faceta da

alfabetização e ainda está construindo uma prática pedagógica voltada ao letramento.

Figura 5: Escrita das vogais - pelo Isaac, aluno da Prof ªAna, 1º fase do 1º ciclo

Fonte: Dados da pesquisa.

Figura 6: Escrita dos encontros vocálicos – pelo Isaac, aluno da Profª Ana, 1º fase do 1º ciclo

Fonte: Dados da pesquisa.

137

Figura 7: Escrita de letras e sílabas – pelo Isaac, aluno da Profª Ana, 1º fase do 1º ciclo

Fonte: Dados da pesquisa.

Figura 8: Formação de palavras – pelo Isaac, aluno da Profª Ana, 1º fase do 1º ciclo

Fonte: Dados da pesquisa.

Figura 9: Atividade de formação de frases – pelo Isaac – aluno da Prof ªAna, 1º fase do 1º ciclo

Fonte: Dados da pesquisa.

138

Das 192 atividades realizadas em sala de aula (Quadro 17), apenas 16 são leitura de

textos (quadrinhas, poesias, músicas). Percebi que foram desenvolvidas algumas atividades

sobre eles, relativas à retomada de palavras presentes nos mesmos. Não posso aqui afirmar

que a professora não tenha realizado um trabalho oral significativo com esses textos, pois a

análise se limita ao que visualizei no caderno do aluno Isaac.

Os demais exercícios são cópia e leitura de palavras, que enfatizam a mecânica da

escrita, a decifração do código e a relação fonema e grafema. Neste caderno, nota-se um

grande número de desenhos, ora relacionados à família silábica, ora à letra inicial, ora à

composição de frases. Ao todo, destacam-se 56 atividades. E ainda 02 atividades de

coordenação motora, que foram desenvolvidas no início do caderno, o que demonstra uma

visão tradicional e mecanicista de que o sucesso da aprendizagem depende de habilidades

motoras desenvolvidas no início do ano e se relacionam ao período preparatório.

Dessa forma, claro está que, pelas atividades acima relacionadas e que foram

desenvolvidas no decorrer de todo o primeiro semestre, a preocupação com a mecânica da

escrita, da codificação e decodificação de palavras, da utilização do caderno de forma correta,

revela a ênfase que a professora dá ao ensino da tecnologia da escrita (SOARES, 2004, p. 97)

em detrimento do tão polêmico e recente termo “letramento”, que, conforme definido

anteriormente, trata-se do “desenvolvimento de comportamentos e habilidades de uso

competente da leitura e da escrita em práticas sociais.” (SOARES, 2004, p.97).

Pelas observações em sala, foi possível perceber que a professora se desdobra e se

preocupa com a alfabetização das crianças, pois o atendimento individual é sistemático e a

reestruturação dos textos é constante em sua prática. Os alunos demonstram bastante

insegurança na grafia das palavras e os que não se apropriaram do sistema de escrita

alfabética, ainda, recorrem constantemente aos cartazes expostos na sala de aula, nos quais

estão ilustradas as letras do alfabeto e as respectivas famílias silábicas (Figura 10 e 11).

Figura 10: Cartazes da sala da 1ª fase confeccionados pela professora Ana, com as letras do alfabeto

Fonte: Dados da pesquisa.

139

Figura 11: Cartazes da sala da 1ª fase confeccionados pela professora Ana, com as letras do alfabeto e

as famílias silábicas

Fonte: Dados da pesquisa.

A partir da consulta aos cartazes, alguns alunos percebiam a relação fonema e

grafema, e conseguiam fazer esta correspondência com maior segurança.

Uma das orientações que consta no programa Pró-Letramento, e que percebi

claramente na prática de Ana, é o papel do professor como escriba do aluno, pois, neste caso,

a professora não faz a mera transcrição da fala, mas ajuda o aluno a organizar suas ideias de

modo que, ao perceber que ele também cria seu texto e que através da escrita sua produção é

materializada, a criança, aos poucos, compreende as funções da escrita na sociedade. Dessa

forma, ela participa ativamente do processo, pois a professora fazia os questionamentos a

respeito do que era para escrever e a criança ia dando forma ao texto.

Nessa perspectiva, acredito que há uma influência significativa do programa Pró-

Letramento e, eventualmente, de outros cursos de formação continuada, na prática de Ana, no

que se refere à produção escrita no sentido de se produzir diferentes gêneros textuais, porém,

com maior preponderância do projeto de escrita da escola (SANTOS, 2012).

Outro aspecto a ressaltar na prática de Ana é a leitura diária, ou leitura deleite, que é

uma das dinâmicas realizadas no curso do programa Pró-Letramento e que a professora

adaptou ao seu cotidiano. Não posso afirmar que a professora não lia antes de sua participação

no referido programa, mas uma das orientações no trabalho com a leitura é para que o

professor incentive o gosto pela mesma, para que a criança a perceba como um ato prazeroso

e necessário, e que tenha o adulto como modelo.

Ao ler o texto e tentar empolgar seus alunos, fazendo com que eles participassem

opinando, rindo, compreendendo e interagindo com o texto, a professora incentiva o prazer

140

pela leitura. Ao término dessa atividade, a professora deixava que os alunos manuseassem o

livro lido, ato este que fazia com que as crianças manifestassem alegria e satisfação.

Ao concluir esta seção, compartilho das ideias de Chartier (2006, p.12) quando a

autora afirma que um bom professor se forma com o tempo e não se utiliza de apenas um

procedimento, mas vários funcionando em paralelo. Por terem segurança no que fazem, “eles

podem ter uma metodologia totalmente tradicional para a aquisição do código, mas tem

sempre momentos de produção escrita ou de trabalho coletivo”. Dispõem de uma série de

instrumentos que utilizam de uma forma diferente, de acordo com cada grupo de crianças.

Reitero, ainda, que o programa Pró-Letramento e, possivelmente, outros cursos de

formação promovidos pela Secretaria Municipal de Educação - SEMEC- deixaram vestígios

na prática pedagógica de Ana, acrescentando aspectos significativos para a melhoria da

qualidade na educação.

6.3.2 A prática da professora Bia- 2ª fase

Compreender a dinâmica da prática docente que se desenrola no interior da sala de

aula é o desafio desta pesquisa. Neste sentido, na tentativa de entender de que forma os

saberes adquiridos na formação continuada influenciam o fazer pedagógico de Bia, busquei,

por meio da observação, perceber a construção de sua prática de alfabetização.

Esclareci para a professora Bia, no início de minha proposta de pesquisa, que estaria

observando seu fazer pedagógico no momento da produção de textos, com o intuito de

verificar como sua prática se efetivava no interior da sala de aula. Nesse sentido, o horário

combinado para a minha entrada na sala, seria todas as terças feiras após o intervalo, portanto,

não seria no início da aula, mas já no final do horário (Quadro 6 e 18). Dessa forma, fiquei

impossibilitada de observar a rotina da professora Bia, no sentido de perceber a organização e

o desenrolar das atividades desde o início da aula.

No primeiro dia em que estive presente na escola, a professora me apresentou a turma

e disse que eu estaria presente na sala de aula, no momento da produção de textos, para

observar a aula e também para auxiliá-la. Olhares curiosos se voltaram para mim, pareciam

questionar: O que será que ela pretende?

Sentei-me no final da sala, na última carteira e mantive meu olhar voltado ao

protocolo de observação, no intuito de que a minha presença não inibisse a turma e nem a

professora, visto que, por entrar na sala após o intervalo, a disciplina deveria ser retomada,

para que a professora prosseguisse com a aula.

141

As salas dessa escola são bem arejadas, contam com mesinhas individuais, armário

para uso da professora, varal para colocar as atividades dos alunos. Estranhei, apenas, não

haver cartazes nas paredes. A professora esclareceu-me que a escola tinha passado por uma

pintura recentemente e que, por isso, ela ainda não havia colocado nenhum cartaz na parede.

Durante o tempo em que estive observando as aulas, a professora não se utilizou desse

recurso. O espaço da sala era adequado para a quantidade de alunos, ao todo eram 23. Desses,

segundo a professora, apenas 2 apresentavam dificuldades para acompanhar a turma.

Perguntei a ela quais as dificuldades desses que não acompanhavam. Bia respondeu-me que,

os que não conseguem acompanhar a turma, é porque não têm interesse em aprender e que,

por mais que ela se esforce (ministrando aulas de apoio, conversando com os pais), não tem

conseguido um resultado positivo com essas alunas.

Bia aponta, em sua entrevista inicial, que há diferenças no ritmo de aprendizagem das

crianças, ela fala que “Tem crianças que aprendem mais rápido, tem crianças que demoram

mais um pouco, é acho que é questão de maturidade, de conhecimento, de vontade. A falta de

interesse também é um grande empecilho pra aprendizagem. A pré-disposição da criança...”

(BIA, 2011a).

Com essa fala, Bia reforça a ideia da ideologia do dom, a qual preconiza que todos

têm seu lugar na escola e o fracasso ou o sucesso depende de cada um. Segundo a ideologia

do dom, a causa dos resultados negativos ou positivos dos alunos se deve exclusivamente às

suas características individuais, aliadas à aptidão, inteligência e talento. (SOARES, 1989,

p.10). O fato é que esse tipo de explicação para o fracasso escolar é bastante criticado e deve

ser evitado, pois existem diversas pesquisas sobre a aprendizagem que mostram que as

crianças dependem de estímulos externos para aprender.

Em todas as observações, a professora conseguia, rapidamente, retomar a disciplina da

sala e todos, bem comportados, ouviam atentamente a proposta de produção textual a ser

realizada naquele momento. A consigna oral da professora para a realização da atividade era

realizada no início de cada proposta de produção e, após a explicação, todos os alunos

ficavam em silêncio para fazer a atividade. Após o término da atividade, a professora pedia

aos alunos que fossem até ela para corrigir os problemas do texto, ou seja, a refacção de

algumas palavras, no tocante à grafia. Essa, basicamente, era a rotina de trabalho da

professora.

142

Quadro 18: Atividades relativas aos gêneros textuais realizadas em aula pela Prof Bia – 2º fase do 1º

ciclo - no período de 09/agosto a 16/dezembro de 2011

Protocolo Data Horas Atividades realizadas em sala pela Prof Bia

B1 09/ago 2 Apelo, panfleto, conselho (projeto meio ambiente)

B2 23/ago 2 Lista

B3 05/set 2 Fábula

B4 13/set 2 Poesia

B5 20/set 2 História sequenciada através de gravura: narração

B6 04/out 2

História em quadrinho: narração dos fatos a partir de uma

sequência de figuras

B7 13/out 2

Texto narrativo a partir de uma situação de medo vivida

vivenciada

B8 18/out 2

“bilhete” trabalhado como bilhete, mas na verdade pode ser

interpretado como cartão

B9 20/nov 2 Música

B10 29/nov 2 História narrativa a partir de um título: Passeio no sítio

B11 15/dez 4 Cartão de natal

B12 16/dez 4 Atividades de matemática

TOTAL 12 28 9

Fonte: Dados da pesquisa.

Ao todo, foram realizadas vinte e oito horas de observação nesta sala, sendo que nos

dois últimos dias a observação estendeu-se por todo o período de aula (Quadro 18). Os dados

permitem visualizar que os gêneros textuais trabalhados são variados, assim como as

incidências das atividades (Quadro 18).

Quadro 19: Incidência dos gêneros textuais trabalhados em sala de aula pela Prof Bia – 2º fase do 1º

ciclo no período de 09/agosto a 16/dezembro de 2011

Gênero Textual Quant

Narrativas 4

Bilhete 1

Cartão de Natal 1

Fábula 1

História em quadrinho 1

Lista 1

Música 1

Panfleto 1

Poesia 1

TOTAL 9 12

Fonte: Dados da pesquisa.

Percebe-se que os gêneros textuais são variados. Porém, como na 1ª fase, há uma

predominância do texto narrativo. Observe que os gêneros textuais trabalhados partem de uma

143

explicação preliminar do que é para ser feito e, em seguida, as crianças desenvolvem as

atividades sozinhas, e, os que não conseguem, procuram a professora para que ela os auxilie.

Após a explicação das propostas de produção, sempre procurei auxiliar alguns alunos com

maiores dificuldades. Percebi que há os que têm medo de escrever errado, pois sabem que

todas as palavras serão corrigidas.

Um aspecto que considero bastante relevante e que vale a pena ressaltar é o trabalho

com a oralidade desenvolvido pela professora: antes de cada atividade foi oportunizada a

participação dos alunos, na discussão oral, de forma organizada. Esses momentos ocorreram

na maioria das observações. Conforme exemplificado nos seguintes trechos:

“A professora pediu para os alunos o que mais poderia ser listado para se compor uma

lista. Cada aluno ia dando exemplos: pessoas, perfumes, convidados, material escolar, motos,

etc.” (PROTOCOLO B2, linhas 17 a 19).

Após contar a história, a professora questionou aos alunos sobre o tema da

mesma. Fez questionamentos sobre a história. Depois perguntou para os

alunos do que é que eles tinham medo. Cada aluno, na sua vez, falou sobre o

que tinham medo. [...] a professora ouve e pergunta o porquê do medo. Eles

respondem os motivos. (PROTOCOLO B7, linhas 4 a 13).

Esse trabalho com a oralidade é importante para a criança se desinibir e ter ideias para

escrever. É, também, possibilidade de desenvolvimento da capacidade de raciocínio ou

posicionamento frente a algum fato ou situação, nesses momentos, as crianças são

encorajadas a buscarem outros modos de ver suas possibilidades de atuação social.

Além disso, as orientações do Pró-Letramento, no Fascículo 1, quanto ao trabalho com

a oralidade em sala de aula, sugerem que o professor oportunize a participação dos alunos nas

interações cotidianas, de forma que o pequeno aprendiz seja colocado em situações que o

levem a ouvir com atenção, responder às questões propostas, expor sua opinião a respeito do

assunto em questão, respeitando a opinião dos colegas e sendo respeitados por eles também.

Nesse sentido, a criança, aos poucos, compreenderá que, em sociedade, é necessário e

importante falar e ouvir, respeitando as regras de convivência, bem como, desenvolverá a

capacidade de interagir verbalmente segundo essas regras em diferentes ambientes e

instituições (SEB/MEC, 2008).

Albuquerque e Leal (2007) salientam que o ensino da escrita nas escolas tem

evidenciado uma tendência de atender às propostas curriculares que sugerem o trabalho com a

escrita que seja visto não só como codificação e decodificação, mas como práticas sociais,

privilegiando a concepção interacionista da língua em suas diversas tendências. Ou seja,

144

enfatizam que o trabalho com o texto deve ser o eixo norteador do ensino de língua

portuguesa, no sentido de se trabalhar os diferentes gêneros textuais, considerando sua função

social, contexto de produção, estruturas e características linguísticas.

As autoras salientam que hoje existe um debate sobre esse tema, pois há os que

defendem o trabalho mais assistemático com os gêneros em sala de aula. Trabalho este que

não se aprofunda nos aspectos linguísticos dos textos, apenas se propõe a leitura e a escrita de

diferentes gêneros. (PRIVAT; VINSON, 1994 apud ALBUQUERQUE; LEAL, 2007, p.

101/102). Outra proposta defendida pelos teóricos Dolz e Schneuwly (2004) é a de

aprofundar o trabalho com os gêneros textuais, observando sua estrutura, suas características

e oferecendo, de forma sistemática, subsídio aos alunos para que eles se apropriem dos

conhecimentos acerca dos diferentes gêneros textuais.

Creio que a tendência representada por teóricos como Privat e Vinson (1994 apud

ALBUQUERQUE; LEAL, 2007) e denominada por Dolz e Schneuwly (2004) como

interacionismo intersubjetivo, em que, através da interação em situações reais com a leitura e

escrita de diferentes gêneros, os alunos, gradativamente, vão aprendendo e internalizando as

práticas de uso da escrita, não é raridade. Pelo contrário, essa situação é bem constante no

meio educacional, pois percebemos nas práticas de sala de aula uma diversidade de gêneros

que vão sendo utilizados, porém sem aprofundamento em seus aspectos estruturais, temáticos

e linguísticos.

Tanto para Dolz e Schneuwly (2004) quanto para Albuquerque e Leal (2007, p. 102)

o interacionismo instrumental deve ser referência para a produção textual, pois esses autores

argumentam que:

a vivência de situações reais de interação, de fato, é um caminho necessário

para aprender a agir lingüisticamente, lendo e produzindo textos. No entanto

esses autores alertam que existem gêneros textuais que exigem maior nível

de atividade consciente, e que, mesmo nas práticas de linguagem

extraescolares, são aprendidos por meio de sistematizações, presentes nos

grupos que tais textos circulam. (ALBUQUERQUE; LEAL, 2007, p.102).

Trata-se da proposta da sequência didática que é defendida por esses autores, em que,

pelo grau de complexidade, existem gêneros que necessitam de um trabalho mais sistemático

e que requer planejamento e decisões por parte da escola e do professor.

Assim, é possível afirmar que a diversidade de gêneros textuais que circulam na sala

da 2ª fase, da professora Bia, parte da tendência interacionista intersubjetiva. Porém, não se

pode negar que há avanços na prática de Bia, ao contrário, os estudos linguísticos de base

145

enunciativa e sociointeracionista que modificaram e redimensionaram o processo de ensino da

produção de textos, influenciam sua prática em sala de aula. Dessa forma, é notório que a

proposta de trabalho com os diversos gêneros textuais preconizados pelo programa Pró-

Letramento, no qual a escrita tem seu papel e sua função social, tem influenciado

significativamente, ainda que de forma gradativa e pontual, o seu fazer pedagógico.

Percebi também pelo Quadro 19, que a história em quadrinhos e a narrativa pela

sequência de fatos, bem como o texto narrativo a partir de um título, seguem os parâmetros da

escrita pela tipologia, mas que fora explorado pela professora no sentido de proporcionar ao

aluno a compreensão da estrutura da sequência narrativa com início, meio e fim,

caracterização das personagens e escrita de nomes próprios, são os chamados gêneros

escolares que, a princípio, são destinados à professora, como leitora dos textos, com a

finalidade de instrumentalizar o aluno na escrita correta das palavras e na sequência da

estrutura narrativa.

Silva e Melo (2007, p. 30) salientam que se escreve no dia a dia, ou seja, fora da

escola, com finalidades concretas, com um interlocutor concreto e não imaginário. As pessoas

escrevem para convidar um amigo para um aniversário, para não se esquecerem do dia e da

hora de um compromisso, para informar os outros sobre um determinado assunto. São

inúmeras as reais situações de uso da escrita e o que a escola tem procurado, de acordo com as

orientações curriculares e também com a perspectiva do letramento, é fazer com que a escrita

na escola, seja semelhante às vivenciadas nos contextos extraescolares.

É o que percebo na prática pedagógica de Bia, pois ainda que algumas atividades de

produção escrita circulem apenas no ambiente escolar e tenha como primeira leitora e

avaliadora a professora, algumas produções textuais, como o bilhete e o cartão de natal, já

buscam extrapolar os muros escolares. Além disso, é possível perceber que os alunos

compreendem os aspectos interlocutivo e funcional da linguagem, pois as produções têm um

interlocutor real e um significado concreto.

Concordo com Silva e Melo (2007) quando os autores afirmam que na vida diária

escrevemos com uma finalidade concreta, com um destinatário concreto e por meio de um

gênero com características adequadas para a comunicação e interação a que se pretende na

escola, portanto, as atividades de produção de textos devem ser semelhantes às vivenciadas

nos contextos extraescolares. A escrita não pode ser encarada como mero exercício

descontextualizado, sem uma finalidade ou que essa finalidade se restrinja apenas para o

aprender a escrever, tendo como destinatário apenas o professor.

146

Nesse sentido, Silva e Melo (2007, p. 35) acrescentam que ensinar a escrever é

responsabilidade da escola e o papel do professor neste processo é o de escolarizar os

conhecimentos de maneira adequada, no caso específico da produção de textos “os alunos

podem e devem escrever para atender a finalidades diversas e se comunicar com

interlocutores também diversos, em situações de interação comunicativa também

contextualizadas.” (SILVA; MELO, 2007, p. 35).

Conforme o protocolo B10, exemplifico com uma atividade de produção escrita que

foi realizada em sala de aula com um destinatário real, no caso a proposta de produção era a

escrita de um cartão de natal:

A professora entregou aos alunos uma folha, para que eles fizessem uma mensagem de

natal para a pesquisadora, disse que era para desejarem um feliz natal para mim. Ela escreveu

meu nome no quadro e assim os alunos desenvolveram esta atividade. Entregaram-me o

cartão (PROTOCOLO B10, linhas 11 a 14).

“A professora entregou a mesma atividade para que os alunos escrevessem uma

mensagem para alguém que eles considerassem importante” (PROTOCOLO B10, linhas 19 a

22).

Percebi que esta atividade, apesar de singela, requer do aluno a compreensão do que

escrever (conteúdo da mensagem) para que escrever (finalidade/objetivo) e para quem

escrever (destinatário). Então penso que, neste caso, a escrita responde ao propósito funcional

de comunicação, pois possibilita a realização da atividade sócio comunicativa entre as pessoas

e está relacionada de forma direta com o contexto social no qual as crianças estão inseridas.

De forma pormenorizada, detalho a atividade solicitada aos alunos

Ao entrar na sala, a professora pede silêncio, aguarda os alunos se

acalmarem e em seguida diz que irá entregar uma folha na qual eles irão

escrever um bilhete, vão colocar a data e que o destinatário do bilhete será a

professora Márcia. Ela escreve no quadro o meu nome e em seguida diz que

a mensagem será a seguinte: desejar à professora , um feliz dia dos

professores. Ela pergunta aos alunos qual foi o dia dos professores. Alguns

alunos respondem que foi dia quinze. [...] explicou também que ao final do

bilhete deve constar a despedida e a assinatura. Os alunos fizeram a

atividade e me entregaram o bilhete. (PROTOCOLO B7, linhas 01 a 24).

Convidados pela professora a escreverem um bilhete, os alunos compõem um texto

com a estrutura de um bilhete com destinatário (no caso a pesquisadora) com local, data e no

final a professora diz que o bilhete deve conter a despedida e a assinatura.

147

Sabemos que o bilhete é um gênero textual que tem função sócio-comunicativa de

interação entre os interlocutores, ou seja, comunica alguma coisa a alguém. É um texto breve

e conciso que apresenta em sua estrutura: destinatário, saudação, sequência do texto,

despedida e assinatura. “A professora colocou o nome da pesquisadora no quadro e disse para

os alunos que a mensagem do bilhete será o seguinte: desejar a professora um feliz dia dos

professores.” (PROTOCOLO B8, linhas 7 a 11).

Nesta oportunidade a professora falou sobre a estrutura do bilhete e entregou um

pequeno pedaço de papel para que os alunos fizessem a atividade (Figuras 12, 13 e 14).

A proposta de produção de um bilhete descrita, reporta-me ao conceito dos gêneros

textuais, pois, seguindo a vertente bakhtiniana, Marcushi (2010) compreende os gêneros como

sendo dinâmicos e de expressiva plasticidade, fundam-se na recorrência e não na rigidez, ou

seja, sua estrutura composicional nem sempre obedece a regras pré estabelecidas. Pode-se

afirmar que “os gêneros textuais são ações interlocutivas que organizam a vida das pessoas no

âmbito das práticas sociais.” (MARCUSCHI, 2010, p.76).

Figura 12: Produção de bilhete pelo Luiz, aluno da Profª Bia, 2º fase 1º ciclo

18/10/2011

Professora Márcia

Feliz dia dos professor

tenha uma boua felicidade

beijos

abraços

Luiz

Fonte: Dados da pesquisa.

Figura 13: Produção de bilhete pela Ana Paula, aluna da Profª Bia, 2º fase 1º ciclo

10/11/2011

Profesora Márcia

Eu que ria falar que

felis dia do profesor.

Tedesejo muitos ano

de vida.

Fonte: Dados da pesquisa.

148

Figura 14: Produção de bilhete pela Esthefany, aluna da Profª Bia, 2º fase 1º ciclo

18/10/20

Professora Márcia

Hoje é o grande dia

é o seu dia professora

Márcia então felis dia

dos professores um

beijo para você tchau

Esthefany

Fonte: Dados da pesquisa.

De acordo com a mensagem, é possível compreender que, apesar de atender ao

contexto sociocomunicativo, ainda que artificializado (pois a pesquisadora estava em sala, não

sendo necessário receber bilhete), a mensagem encontrada no bilhete é própria dos cartões em

que se felicita alguém por algum dia especial.

Nessa perspectiva, relaciono este aspecto da produção em análise com o que Beth

Marcuschi (2010, p. 76) caracteriza como incompreensão, que pode dar origem ao mal

entendido, ou à ambiguidade. Neste caso, penso que o gênero textual proposto para os alunos

é ambíguo, uma vez que pode ser enfocado como bilhete e também como cartão. Uma outra

leitura poderia ser em relação ao suporte em que o texto aparece. Neste caso, pela

simplicidade do suporte, trata-se de um bilhete e, se caso fosse escrito em um papel mais

sofisticado, poderia ser um cartão. Se fosse uma mensagem expedida pelos correios num

formulário específico, um telegrama, se passado pela secretária eletrônica, um recado.

Marcuschi (2003) assinala que não é tão simples fazer a distinção entre gênero textual

e suporte de texto. Essa diferenciação firma-se no fato de que todo gênero tem um suporte, via

material de circulação na sociedade, assim, todo gênero necessita de um suporte específico,

pois muitas vezes é ele que determina o gênero.

Dessa forma, de acordo com Beth Marcuschi (2010, p.76) o gênero é de natureza

maleável e no seu processo de produção e circulação, no fluxo interacional entre leitor-texto-

autor, pode ter interpretações várias. O objetivo do professor em sua prática pedagógica é que

poderá oportunizar ao aluno a compreensão dessas diferenças. Além disso, a eficácia no uso

do gênero depende do nível de apropriação do sujeito da interlocução sobre esse gênero.

Não se trata apenas de ensinar a estrutura de um determinado gênero, mas quais os fins

a serem alcançados em sua produção.

149

Outra atividade que me chamou a atenção (para os conceitos trabalhados) foi a música.

A professora convida a turma: vamos cantar? Ela iniciou a proposta

entoando músicas conhecidas pelos alunos, todos a acompanham: Peixe-

vivo, a canoa virou, meu pintinho amarelinho, a galinha do vizinho. Depois,

a professora disse aos alunos que escrevessem numa folha, que ela iria

entregar a eles, uma música dessas que foram cantadas ou que os alunos

conhecessem e que mais gostassem. Ela entregou aos alunos uma atividade e

pediu que eles escrevessem. Os alunos ficaram animados e perguntaram se

podiam escrever as músicas que eles conheciam. (PROTOCOLO B8, linhas

15 a 19).

Após essa proposta, as crianças escreveram as músicas preferidas por elas e que são

sucessos nos meios de comunicação (Figuras 15 e 16) .

Figura 15: Produção de texto a partir de uma música memorizada, aluna Júlia da Profª Bia, 2º fase

1º ciclo

Na balada

Nossa, nossa, assim

você me mata, ai

seeu ti pego, ai, ai

se eu ti pego delí-

cia, delícia.

Sábado na balada

A galera começou

a dançar e

passou a menina

mais lindo

tomei coragem e comecei a

falar: Nossa, nossa assim

você me mata.

Fonte: Dados da pesquisa.

150

Figura 16: Produção de texto a partir de uma música memorizada, aluna Adriane da Prof Bia, 2º fase

1º ciclo

Gustavo Lima

Esse cabelo cor de

ouro é que

me deixa louco esse

sorriso no teu

lábios que eu metremo

todo não sei mais

da minha vida sem

você porperto amor

sem você comigo

avida é um deserto.

Adriane

Fonte: Dados da pesquisa.

Analisando a proposta de produção textual e o produto dessa atividade, é possível

perceber que o meio social no qual a criança vive, influencia, de forma extraordinária, o

universo escolar infantil. Além disso, observei que as crianças querem que suas predileções

sejam postas em evidência. Interessante perceber que apenas duas crianças optaram por

escrever as músicas cantadas pela professora, as demais escolheram escrever as músicas que

elas conheciam e que ouvem diariamente, reflexo dos meios de comunicação. Ao

conseguirem colocar a música no papel e depois irem à frente para cantar o que escreveram,

as crianças demonstraram satisfação e alegria.

Penso que esta atividade teve como objetivo, além do exercício da escrita, no caso a

codificação de fonemas, também a oralidade, pois se torna mais fácil para a criança escrever

algo que já foi memorizado do que construir seu pensamento para escrever.

Conforme nos lembra Cardoso (2008, p. 31), “a criança inicia seu processo de escrita

apoiada firmemente na sua oralidade e, portanto, a mesma vai deixar marcas na sua escrita

que, nesse momento, está ainda longe de ser convencional e ortograficamente correta”.

Chartier (2007) advoga que, como as parlendas, as canções constituem elementos da

cultura comum, foram compostas para serem memorizadas e fazem parte da cultura familiar.

A autora salienta que a leitura e a escrita desses gêneros textuais são bem prazerosas para as

crianças visto que: “elas permitem a todas as crianças, mesmo as mais lentas, a experiência

151

gratificante do ‘reconhecimento direto das palavras’, mesmo que ainda não tenham chegado a

isso nos seu processo normal de leitura.” (CHARTIER, 2007, p. 159).

Neste caso, as crianças mesmo conseguindo ler e escrever a música predileta, elas

conseguem pensar a grafia correta das palavras e, por meio da memória, escrever

raciocinando sobre a correspondência fono/grafêmica, ou seja, de que maneira o oral é

grafado.

Nesse sentido, Silva (2010) salienta a importância do desenvolvimento da consciência

fonológica12

, que pode ser realizada por meio de diversas atividades lúdicas como a repetição

de parlendas, brincadeiras com frases e versos, trava línguas, etc. Esses tipos de atividades são

fundamentais para a compreensão do princípio alfabético.

No tocante às orientações em se dedicar aos vários gêneros textuais, posso afirmar

que, pelas produções que estiveram presentes na sala de aula e pelo trabalho realizado pela

Professora Bia, existe uma influência do Programa Pró-Letramento, em relação à sua

compreensão dos eixos necessários à aquisição da língua escrita:

a) Compreensão e valorização da cultura escrita: Ao redigirem um bilhete, um cartão

de Natal, um panfleto e a lista, a professora mostra aos alunos que estes gêneros

estão além da simples codificação e decodificação de palavras, pois eles têm uma

função social, um espaço de circulação na sociedade;

b) Apropriação do sistema da escrita: Ao redigirem uma música, que sabiam de cor, os

alunos tiveram que acionar seus conhecimentos prévios a respeito da ortografia, da

segmentação correta das palavras, da relação fonema e grafema. Nesse sentido, a

tarefa, que pode até ser considerada simples para alguns alunos, torna-se complexa

para os que ainda estão aquém do processo de construção e aquisição da língua

escrita.

Assim, creio que os aspectos positivos em relação ao trabalho de Bia são vários e a

influência da formação continuada aliada à prática da professora, sua rotina e sua relação com

os educandos propicia uma aprendizagem significativa, com vistas ao alfabetizar letrando. Ao

ser questionada sobre a influência da formação continuada em sua rotina de trabalho, Bia

responde que, ao longo de sua caminhada como alfabetizadora, adotou algumas metodologias

que contribuíram para a melhoria de sua prática:

12 O conceito de consciência fonológica abrange habilidades que vão desde a simples percepção global do

tamanho das palavras e/ou de semelhanças fonológicas ente elas, até a efetiva segmentação e manipulação de

sílabas e fonemas. (BRYANT; BRIADLEY, 1985 apud SILVA, 2010).

152

No início eu usava muito a cartilha e o método silábico. A maior parte do

tempo era o método silábico era a cartilha, eram tarefas tradicionais, de

memorização... de repetição, não usava esses tipos de textos que eu uso hoje.

Eram aqueles textos fragmentados, só esses tipos de textos... não usava

receita, não usava parlenda. Não usava fábulas. Bilhetes... esses outros

gêneros textuais... de jornais e revistas... quando eu comecei eu não usava

isso não, na alfabetização. Usava somente a cartilha...e aquelas atividades de

repetição e de memorização. Hoje não, hoje é diferenciado... eu uso vários

tipos de textos, diferentes tipos de textos. Diferentes atividades. Atividades

que eles têm que pensar. Atividades que eles têm que organizar. (BIA,

2012b).

Por este excerto, percebo que a mudança de práticas pedagógicas consolidadas ao

longo dos anos depende de diversos fatores que incluem, além de políticas públicas voltadas

para uma educação de qualidade, o abandono de práticas mecanicistas de alfabetização, por

parte do professor. Não se trata apenas de inserir diversos tipos de textos na sala de aula, mas

levar a criança a se apropriar do sistema de escrita de forma significativa e prazerosa.

Pensar a alfabetização na perspectiva do letramento requer um posicionamento

reflexivo sobre a prática, em que a professora que alfabetiza compreenda os processos

envolvidos no nosso sistema de escrita alfabético e das capacidades necessárias aos alunos

para o domínio da leitura e da produção de textos. A esse respeito, Albuquerque (2005) fala

da importância de haver a inserção dos diferentes gêneros textuais na alfabetização para a

formação de leitores e escritores competentes e que cabe à escola realizar esta interação com

atividades em que os alunos sejam solicitados a ler e produzir diferentes textos. A autora

salienta que

a escola deve garantir, desde cedo, que as crianças se apropriem do sistema de escrita

alfabético, e essa apropriação não se dá, pelo menos para a maioria das pessoas,

espontaneamente,valendo-se do contato com textos diversos. É preciso o

desenvolvimento de um trabalho sistemático de reflexão sobre as características do

nosso sistema de escrita alfabético. (ALBUQUERQUE, 2005, p. 19).

Além disso, Albuquerque (2005, p. 20) salienta a importância para o fato de que haja

um trabalho sistemático para a aquisição desta compreensão. É necessário levar a criança a

perceber que o que a escrita representa é o som da palavra (notação) e não o seu significado.

Por isso, é importante que, diariamente, a professora proponha atividades com palavras que

envolvam a reflexão, comparação e exploração de palavras quanto à quantidade de letras,

número de sílabas, presença de letras e sílabas iguais e rimas, bem como atividades com

palavras estáveis e que fazem parte do cotidiano infantil. Vários são os textos que favorecem

este trabalho, tais como: cantigas, parlendas, poesias, trava-línguas, etc.

153

Dessa forma, creio que Bia, ao afirmar que propõe atividades que “as crianças têm que

pensar”, tem procurado abandonar antigas formas de alfabetização, baseada na simples

codificação e decodificação de palavras, para construir e consolidar uma prática pedagógica

mais significativa.

6.3.3 A Prática da professora Carina - 3ª fase

As observações realizadas na sala da 3ª fase do 1º ciclo da professora Carina

totalizaram trinta horas, distribuídas em doze dias. Ela já havia explicado aos alunos que uma

professora pesquisadora viria para a sala interessada em compreender a dinâmica do trabalho

com a produção de textos.

Procurei entrar na sala junto com a professora no início da aula, às sete horas da

manhã, instalei-me na última carteira da sala, no intuito de não modificar e nem atrapalhar o

desenvolvimento da aula. A professora recebia os alunos educadamente, procurava observar

onde iriam se sentar e os orientava quando necessário. O espaço nesta sala de aula favorece a

aprendizagem dos alunos. As mesinhas são individuais, o ambiente é arejado, as paredes

receberam pintura nova, a sala possui quatro ventiladores, e um armário onde a professora

guarda seus pertences e alguns materiais dos alunos.

No início das observações, perguntei à professora quantos eram os alunos

matriculados, ela me respondeu que ao todo tinha 25 só que, desses, apenas 23 estavam

frequentando, 2 estavam faltando e ela não sabia o porquê das faltas. Desses 23, perguntei

quais os que tinham maiores dificuldades, ela me disse que somente 3 não conseguiam

acompanhar o ritmo da aulas, mas que estava fazendo um acompanhamento individual para

tentar recuperá-los. A esse respeito, Carina citou como exemplo um aluno que veio

transferido de outra unidade escolar e que ainda não tinha conseguido se apropriar do sistema

de escrita alfabética. A docente falou sobre as principais dificuldades desses alunos: Quais e

quantos alunos que apresentam dificuldades e quais são essas dificuldades?

Carina: O J. que quando ele entrou ele não conseguia copiar nada do

quadro, ele não escrevia nada, o caderno que ele veio, o pouco que tinha era

assim: AAAAA pra ele copiar embaixo. Era coisa colada, pra ele passar por

cima... quando ele entrou aqui eu tinha dois problemas com ele... primeiro a

questão da interação entre nós e entre ele e os colegas. Ele não queria se

envolver. Ele não queria estar com ninguém, ele não queria sentar com

ninguém, ele não conversava...aí devagarzinho eu fui propondo, e ele foi... e

eu falei assim: não você vai fazer...igual todo mundo vai fazer, e ele sentava,

e falei... vai olhando lá... e assim... eu não sou muito de ficar pegando em

154

mão... de ficar muito assim... e eles vão indo, vai melhorando com o

tempo...aí foi indo, foi indo...[...] aí devagarzinho ele foi fazendo, foi

começando, a letra feia, tinha hora que não entendia nada, mas eu fui

deixando... e ele tem que primeiro ele tem que se propor a fazer...né? aí

depois a partir do momento que ele começou a fazer ele começou a

melhorar... cê pode ver que hoje o caderno dele, ele já copia tudo. Ele não

tem aquela letra bonita, mas já está mais legível, que antes não se entendia

nada.

Pesquisadora: Mas ele já lê?

Carina: Já. Muitas sílabas assim, ele já conhece... ele empaca muito assim

nas sílabas complexas... “AM” “PR” algumas coisas ele já consegue...

tem o V., que entrou o ano passado e o tempo todo assim de apoio... o V. não

lia nada e não escrevia nada. E também não conseguia copiar... mas aí

devagarzinho ele começou... aí ele copiava...entendeu? Virou um copista, na

verdade ele copiava... mas, no desenvolvimento das atividades tinha que

estar sempre sentando com ele, ou ajudando ou se não ele pegava pronto do

quadro ou do colega...mas assim devagarzinho ele foi melhorando bastante,

a leitura...mas o tempo que ele estudou comigo foi de apoio... e é um aluno

que eu coloquei que vai precisar ter um acompanhamento no segundo ciclo.

E você pode perceber na minha sala, os que sentam na frente, geralmente são

os que tem mais dificuldades... é o ...você viu que é os que ficam bem na

frente, né? E eu posso estar assim de olho... porque apesar de eles terem

dificuldade, eles não são bobos, eles são espertos para copiar dos outros,

sabe? Aí tem a Beatriz que também tem aquele problema de adenoide, tem

aquela questão da dicção, a fala dela tem muito problema, não sei se você

percebeu... depois da cirurgia então ela tá falando muito embolado.

(CARINA, 2011b)

É possível perceber que o trabalho com os alunos com dificuldade é constante na

prática de Carina. O atendimento individual, a preocupação com o desenvolvimento do

educando, bem como os aspectos relacionados à interação com professora e colegas é algo

positivo no seu fazer pedagógico. A esse respeito, Chartier (2006) afirma que os bons

professores têm uma boa memória das competências das crianças, apontam suas dificuldades

e sabem dizer com precisão o desenvolvimento individual da criança. A autora salienta que

isso não se aprende lendo teorias pedagógicas ou didáticas, mas com a experiência, testando

procedimentos, sem adotá-los de imediato.

Pelas observações, foi possível perceber que, no início da aula, a professora convidava

a todos para fazerem a leitura de um cartaz com a Oração da Manhã (Figura 17). Para isso,

escolhia quatro ou cinco alunos que vinham à frente, se posicionavam diante do cartaz, faziam

a leitura e o restante da turma repetia o que era lido, inclusive a professora e eu.

155

Figura 17: Cartaz com a oração da manhã exposto na sala da Profª Carina

Fonte: Dados da pesquisa.

Em seguida, a professora convidava um aluno para ajudá-la a organizar os materiais

que iria usar, retirava dos armários os cartazes que continham os modelos de gêneros textuais

(Figura 18), que ela ou estava usando ou iria usar, tais como: convite, cardápio, bilhete,

receita, anúncio, carta, poema, envelopes, etc..

Figura 18: Modelos de gêneros textuais expostos na sala da Profª Carina

Fonte: Dados da pesquisa.

A visualização conjunta dos diferentes gêneros textuais proporciona ao aluno a

compreensão dos aspectos estruturais e composicionais relativos a cada gênero. Penso que as

crianças, ao estarem em contato constante com os cartazes, aos poucos internalizam

elementos que facilitarão sua aprendizagem.

156

Um dos aspectos que me chamou bastante atenção foi o fato de a professora trazer

para a sala de aula vários livros para leitura deleite que não se resumiam apenas a narrativas

infantis. Sempre trazia textos diversos e oportunizava a leitura, por parte dos alunos, de

livrinhos infantis, escolhendo a cada dia um aluno para ler. Sempre que fazia a leitura de um

livro, a professora falava sobre o autor, sobre a obra, sobre os ilustradores e fazia relações

com acontecimentos do cotidiano, evidenciando ações na perspectiva do letramento.

Durante o período de observação, várias foram as atividades de leitura realizadas,

tanto pela professora, quanto pelos alunos. A professora Carina tinha uma caixa com diversos

livros infantis de seu acervo pessoal, os quais emprestava aos alunos, com a intenção de que

depois os lessem para a turma. Ela os incentivava para treinarem a leitura e depois lerem bem

bonito para os colegas. A relação das leituras realizadas durante o período observado totaliza

oito livros, pela professora, enquanto os alunos leram dez (Quadro 18).

Por esse quadro verifica-se que a rotina de trabalho pedagógico no âmbito da leitura

em sala privilegia diferentes gêneros textuais, com predomínio dos gêneros do campo

narrativo. De acordo com o quadro criado por Dolz e Schneuwly (2004), trata-se de gêneros

que se enquadram na cultura literária funcional que trazem como aspectos tipológicos a

mimese da ação por meio da criação da intriga e se materializam nos gêneros: contos de fadas,

fábulas, lendas narrativas de aventura, conto, crônica literária, etc.

Quadro 20: Relação das leituras realizadas pelos alunos e pela Prof Carina – 3º fase do 1º ciclo no

período de 09/agosto a 09/dezembro de 2011

Nº Lidos pela professora Lidos pelos alunos

1 O menino mais bonito do mundo – Ziraldo A cigarra e a formiga-

Fábula

2 Flictz – Ziraldo A galinha dos ovos de ouro

3 Sinopse do livro de Ziraldo redigida por Carlos Drummond

de Andrade A gata Filó

4 Porque dormimos – texto informativo A formiga e a pomba

5 Livro Não fale de boca cheia - Comportamentos e bons

hábitos O patinho feio

6 Como falar com seus amigos - Comportamentos e bons

hábitos A gata com guizos

7 Leitura de versículos da bíblia Os três porquinhos

8 Como se comportar na igreja O nascimento de Jesus

9 - A branca de Neve

10 - A cerva e o cervato

TOTAL 8 10

Fonte: Dados da pesquisa.

157

Percebe-se um trabalho sistemático organizado pela professora no sentido de

incentivar a leitura em sala de aula e fora da sala também, visto que ela criou um sistema de

empréstimo de livrinhos para a leitura, a fim de que os alunos os levassem para casa e os

devolvessem após fazerem a leitura dos mesmos para os colegas.

Dessa forma, é possível afirmar que a professora Carina sempre incentivava os alunos

a lerem. Mesmo aqueles que tinham maiores dificuldades.

A aluna Kethlyn vai à frente para fazer a leitura da fábula “A cerva e o

cervato” do livro “Fábulas de ouro”. A professora se posiciona ao lado da

aluna e diz a ela para não ficar nervosa, que pode ler devagar, sem pressa e

em voz alta para todos ouvirem. Ela faz a leitura e mostra as figuras do livro.

A leitura ainda é feita de forma fragmentada, como se estivesse

decodificando as palavras sílaba a sílaba. (PROTOCOLO C10, linhas 6 a

15).

O incentivo por parte da professora se dá por meio de elogios e, para as crianças, é

relevante o fato de a professora emprestar os livrinhos e depois querer saber se e como eles,

realmente, estão lendo.

Carina faz um breve comentário sobre a história, esclarece as palavras diferentes que

aparecem no texto, fala sobre o autor, sobre o livro, mostra a capa, a contra capa e deixa os

alunos manusearem o livro que está sendo apresentado.

Neste período de observação, a professora fez a leitura de textos com diferentes

finalidades (Quadro 21).

Quadro 21: Relação das leituras realizadas pela Profª Carina – 3º fase do 1º ciclo no período de

09/agosto a 09/dezembro de 2011

Título Domínios sociais de comunicação Objetivo

O menino mais bonito

do mundo

Cultura literária ficcional Envolver o leitor, instigando o

gosto pela leitura Narrativa

Flictz Cultura literária ficcional Envolver o leitor, instigando o

gosto pela leitura. Narrativa

Porque dormimos Transmissão e construção dos saberes:

texto expositivo e explicativo

Informar o leitor, instigando-o à

descoberta e à curiosidade

Bíblia Instrução e prescrições, descrever

ações. Regulação mútua de

comportamentos.

Prescrever comportamentos

agradáveis a Deus de acordo com a

bíblia. Compreender como se lê os

capítulos e versículos da mesma.

Como se comportar

na igreja

Como falar com seus

amigos -

Comportamentos e

bons hábitos

Instrução e prescrições, descrever

ações. Regulação mútua de

comportamentos

Prescrever comportamentos

socialmente aceitos

Fonte: Elaborado com base em Dolz e Schneuwly (2004, p. 60/61)

158

Carina sempre contextualizava o texto lido, situando-o dentro da obra de que ele fazia

parte, falava sobre o autor, mostrava a capa, a contra capa e, no caso do livro Flictz, de

Ziraldo, a professora fez a leitura da sinopse e falou da importância dessa parte para o leitor

do livro. De acordo com Cafiero (2010, p. 97), esse tipo de trabalho precisa ser realizado

sistematicamente: a cada nova leitura, pois a partir desse trabalho, o aluno vai perceber que

antes de ler, o bom leitor tira proveito de informações que estão disponíveis e que são

interessantes para ele.

Como o interesse desta pesquisa está voltado para as produções textuais, volto ao foco

proposto, porém, lembrando que a leitura e a produção escrita caminham juntas. Uma não se

dissocia da outra.

Verifiquei que a prática docente da Professora Carina parte de uma organização de

apresentação do conteúdo e retomadas no que diz respeito aos aspectos de produção e

reestruturação de textos. Parte de uma lógica que inclui leitura, interpretação de textos,

atividades e produção textual, trabalhando com diversos gêneros literários (Quadro 22).

Quadro 22: Atividades relativas aos gêneros textuais realizadas em aula pela Profª Carina – 3º fase

do 1º ciclo - no período de 09 Ago. a 09 Dez. de 2011

Protocolo Data Horas Atividades realizadas em sala pela Prof Carina

C1 09/ago 2 Biografia

C2 23/ago 2 Fábula, provérbios, biografia

C3 05/set 2 Ficha técnica de um animal : elefante

C4 13/set 2 Ficha técnica de um animal : rinoceronte

C5 20/set 2 Texto narrativo sobre um sonho.

C6 04/out 2 Poesia e bilhete

C7 13/out 2 Recado e bilhete

C8 18/out 2 Carta

C9 29/nov 2 Carta e envelope

C10 07/dez 4 Lista de convidados, cardápio

C11 08/dez 4 Carta

C12 09/dez 4 Carta

TOTAL 12 30 12 gêneros textuais trabalhados

Fonte: Dados da pesquisa.

A biografia foi uma atividade planejada a partir de uma sequência de etapas que se

relacionavam até culminar com a produção da biografia do aluno. Primeiro, a professora

Carina fez a leitura do Livro de Ziraldo: O menino mais bonito do mundo. Depois, fez a

leitura da biografia do autor, que constava no final do livro, explicou para os alunos o que é

uma biografia. Fez uma atividade de preenchimento de uma ficha Minha biografia. Nela, os

159

alunos deveriam preencher com seus dados, as lacunas da ficha e, como nem todos os alunos

sabiam completar com informações precisas, essas fichas foram levadas para casa, como

tarefa, e, na sala de aula, serviria de modelo para escrever o texto. Assim, no primeiro dia de

observação, a professora situou-me a respeito do trabalho que já havia se iniciado e dispôs os

alunos em duplas para que, juntos, pudessem realizar esta atividade e se ajudassem na

composição da escrita. Vale salientar que o aluno com maior dificuldade sentava-se com o

aluno mais experiente, para que ele pudesse auxiliá-lo.

[...] Deu um exemplo de como iniciar o texto intitulado minha biografia,

informou que cada parágrafo deveria ser redigido com a informação

preenchida na ficha. Ela esclareceu que cada informação deve ser explorada

colocando a maior quantidade de informação possível. Falou sobre a

composição dos parágrafos e das letras maiúsculas para nomes próprios e

início de frases e para nome de lugares. (PROTOCOLO C1, linhas 31 a 42).

Foi uma atividade direcionada e bem prazerosa para os alunos, pois eles estavam

escrevendo uma autobiografia, na qual suas características, sua personalidade, suas

preferências, dados sobre sua vida estavam sendo relatados e postos em evidência.

Vale ressaltar que a biografia, segundo Kaufman e Rodríguez (1995), é um gênero

textual que tem como estrutura a narração da história de vida de uma pessoa. “Quando o

autor conta sua própria vida, considera-se uma autobiografia.” (KAUFMAN E

RODRÍGUEZ, 1995 p.34).

Nesse tipo de composição, prioriza-se a ordem cronológica dos fatos, a fim de mostrar

passo a passo os acontecimentos vividos pelo biografado. Nesse sentido, as datas são

importantes e devem aparecer ao longo do texto. O protagonista da história, neste caso, é o

próprio autor, o tipo de discurso presente nesta composição é o relato, uma vez que o texto

discorre sobre fatos reais ao leitor. São textos do tipo narrativo, mas que apresentam também

descrições sobre as características do personagem biografado.

A professora Carina sempre retomava os conceitos trabalhados. Ela esclareceu-me que

muitos alunos não conseguem concluir as atividades no tempo previsto e que, com a

finalidade de que todos desenvolvam os textos iniciados, ela sempre retomava o conteúdo,

sentava-se com o aluno que não conseguia redigir sozinho e fazia a reestruturação do texto

com ele.

A atividade sobre os provérbios foi realizada seguindo também uma sequência de

atividades para conhecimentos do termo folclore que se iniciou a partir de uma pesquisa no

dicionário sobre as palavras: folclore, lenda e tradição. Depois os alunos pesquisaram, junto

160

aos familiares, os provérbios e ditos populares que eles conheciam. Após essa pesquisa os

provérbios recuperados foram socializados, lidos por todos e copiados no caderno de

produção.

Creio que para além da realização dessas etapas, importantes para a compreensão do

conteúdo, a professora poderia também verificar o conhecimento que os alunos tinham dos

provérbios, seus significados, seus vários sentidos, sua dimensão social e cultural.

Nesta análise, ainda percebi que o trabalho com os gêneros não se identifica,

completamente, com a sequência didática proposta por Dolz e Schneuwly (2004), mas se

assemelha, pois a professora organiza o trabalho com a produção de textos, a partir de uma

sequência de atividades que culmina com a escrita do gênero em estudo. Além disso, nesta

organização, a professora engloba gêneros que possuem semelhanças em relação ao propósito

comunicativo. É o caso do recado, do bilhete e dos diferentes tipos de cartas que foram

redigidos pelos alunos.

A proposta didática dos autores Dolz e Schneuwly (2004) como já detalhada

anteriormente no referencial teórico deste trabalho tem por

objetivo focalizar uma situação de comunicação e as convenções de um

gênero em particular bem como organizar e articular diferentes atividades

escolares, com a finalidade de que as dificuldades dos aprendizes possam ser

ultrapassadas”. (DOLZ; GAGNON; DECÂNCIO, 2010, p. 66).

No caso da prática docente em análise, percebo que as atividades propostas possuem

uma organização no sentido de priorizar a leitura, a interpretação do que está sendo lido, a

função social que representa, a compreensão de tema em questão, diferentemente da proposta

de uma sequência didática, que é defendida por Dolz e Schneuwly (2004) que prioriza os

problemas, ou seja, os obstáculos selecionados a partir de uma produção inicial realizada

pelos alunos e que a partir dela, organiza-se uma série de atividades de forma modular com a

finalidade de superar os obstáculos detectados.

Nesse sentido, acredito que Carina planeja várias atividades que não são “soltas”, mas

partem de uma organização gradativa para desenvolver a capacidade da leitura e da escrita, de

acordo com o conteúdo estudado. Além disso, é notório que, uma das orientações do

Programa Pró-Letramento é o trabalho a partir de uma sequência didática. Esta forma de

trabalho é sugerida pela tutora, discutida pelos participantes do curso e elaborada

coletivamente. Ademais, creio que a professora Carina acata as sugestões de forma reflexiva,

pois, conforme nos ensina Chartier (2006), os bons professores inovam, mas antes de utilizar-

161

se de um novo procedimento, testam-no a fim de avaliar seus resultados. Ou seja, são

cautelosos e agem com segurança, baseando-se na sua experiência.

A produção de texto sobre a ficha técnica dos animais em extinção faz parte do projeto

meio ambiente desenvolvido por toda a escola. As turmas da 3ª fase do 1º ciclo ficaram

responsáveis pelo tema: Animais em extinção.

Esse projeto tem como objetivo geral:

Explicar a importância da preservação dos animais para a perpetuação da

vida e da espécie humana na Terra através do Projeto Animais em extinção.

Objetivos específicos:

Execução do projeto Animais em Extinção.

Promover uma reflexão acerca dos problemas relativo aos desaparecimento

das espécies .

Adotar por meio de atitudes o respeito e a valorização dos animais, para

assim preservar.

Despertar quanto a importância da preservação dos animais.

(Projeto da escola sobre os animais em extinção, 3ª fase do 1º ciclo, 2011).

Assim, partindo desse projeto, a professora elaborou uma sequência de atividades que

vai desde a exposição oral sobre o mesmo, até a produção escrita realizada pelos alunos.

Inicia-se a aula no laboratório de informática da escola – com preenchimento da ficha técnica

do animal, no caso, o rinoceronte, depois disso a professora propôs a escrita e leitura de um

texto coletivo sobre ele. Numa outra aula, com a ficha técnica do rinoceronte em mãos, os

alunos, em dupla, passaram a escrever um texto informativo sobre ele.

Essa atividade estendeu-se por quatro aulas. A professora sempre chama a atenção dos

alunos para a estrutura do texto: Letra maiúscula, parágrafo, repetição de palavras no texto.

A professora fala da importância do uso dos parágrafos, da preocupação com

a forma de se escrever. Para que o texto fique bom não se pode repetir as

palavras o tempo todo, como o nome dos personagens. Fala da importância

de se usar os pronomes ele, ela, sem repeti-los demasiadamente. Esclarece

também a respeito da pontuação, sobre o uso das vírgulas, dos pontos de

exclamação de interrogação. Sobre o uso de letras maiúsculas no início das

frases. (PROTOCOLO C5, linhas 35 a 46).

Os gêneros como recado, bilhete e carta foram os que a professora Carina mais se

dedicou no período em que estive presente e percebi que a prioridade estava no que Bakhtin

(2003) define como gênero, visto que o caracteriza como estilo, composição e tema.

Os trabalhos com o bilhete e a carta enfatizam a estrutura composicional, ou seja, as

partes desses gêneros, tais como: data, cumprimento, assunto/mensagem, despedida, nome do

remetente, etc..

162

No caso do bilhete, percebe-se que, por ser um gênero textual mais simples, a

retomada de seus aspectos e a revisão de suas características acontece de forma bem rápida,

sempre lembrando a sua estrutura fixa.

É preciso refletir acerca do ato de escrever, pois ele implica além do domínio do

processo de codificação, uma situação específica de interação entre os sujeitos. Segundo

Grossi (2008, p. 132) “o ato de escrever constitui-se uma prática discursiva, em que o autor do

texto o produz em função da situação de interlocução”. Nesse sentido, as condições de

produção são determinantes para a escolha do gênero textual que se quer produzir, “quem

escreve o que escreve, com que objetivo, para quem, quando e onde escreve.” (GROSSI,

2008, p. 132).

Grossi (2008) afirma que, alfabetizar, na perspectiva do letramento, requer a criação

de condições para que o aluno se utilize de práticas de leitura e escrita em diferentes situações

discursivas. A autora salienta que, se na vida produzimos enunciados orais e escritos, e todo

enunciado pertence a um gênero, alfabetizar na perspectiva discursiva significa alfabetizar

utilizando-se dos diferentes gêneros textuais, mostrando ao aluno a sua relevância social.

No caso da análise em questão, a professora Carina procura mostrar aos alunos a

função social da escrita, ou seja, ela cria situações em que, para escrever, a criança vislumbra

seus possíveis interlocutores e os objetivos de seu texto. Nessa perspectiva, a professora

retoma os conceitos dos diferentes gêneros textuais e o conhecimento que os aprendizes têm

sobre eles. Em sua prática, a professora considera esses aspectos bastante relevantes, pois

questiona seus alunos sobre as intenções e as possibilidades de uso dos gêneros trabalhados,

como se constata no seguinte episódio:

A professora questionou os alunos sobre os tipos de gêneros, por exemplo:

Para que serve uma receita, uma bula, um convite, um bilhete, um recado,

um anúncio e ao serem questionados os alunos respondem as questões feitas

pela professora, elencando, oralmente, as finalidades desses gêneros.

(PROTOCOLO C7, linhas 30 a 35).

Depreendi deste excerto, que Carina compreende e considera os gêneros da mesma

forma que Marcuschi (2005, p. 03) quando afirma que é impossível nos comunicarmos

verbalmente a não ser por algum gênero, assim como é impossível nos comunicarmos

verbalmente a não ser por algum texto. Em outros termos, partimos da ideia de que a

comunicação verbal só é possível por algum gênero textual, colocando-se em evidência, os

aspectos funcionais e interativos da língua.

163

Nesse sentido, a produção da carta foi realizada levando-se em conta uma situação real

de comunicação entre dois indivíduos. Esse trabalho apresentou várias etapas e não se

restringiu a um interlocutor apenas, mas a professora criou várias situações em que esse

gênero pôde ser aprofundado. É preciso lembrar que a carta estabelece uma relação específica

em situações comunicativas também específicas. Dessa forma, é possível encontrar variações

dentro do próprio gênero, como carta pessoal, carta comercial, carta convite. De acordo com a

funcionalidade do gênero, as modalidades poderão apresentar variações de conteúdo, estilo e

estrutura composicional e isso acontece em função do contexto de circulação e da intenção do

produtor do texto.

Realizou-se, durante o período de observação, uma carta com caráter informal,

observando-se principalmente sua estrutura. Tratava-se da escrita de uma carta para uma

pessoa conhecida. A proposta de produção parte da leitura de um cartaz sobre a carta (Figura

19), já conhecido pelas crianças, pois fazia parte do cenário da sala de aula.

Figura 19: Modelo de carta, exposto na sala da Professora Carina

Fonte: Dados da pesquisa.

Nesta ocasião a professora: “Explica a estrutura da carta e sua função. Em seguida,

entrega uma carta como modelo (xerox) para que as crianças observem e identifiquem as

partes da carta e faça a interpretação do texto, destacando as partes da carta.” (PROTOCOLO

C8, linhas 19 a 24).

Além disso, a professora esclarece que existem vários tipos de carta: “Existe carta

pessoal, que se deve escrever para amigos ou pessoas conhecidas. Falou sobre a carta

comercial que é usada pelas empresas, carta bancária, oficial e que cada uma delas tem uma

164

linguagem diferente.” (PROTOCOLO C8, linhas 43 a 50). Na sequência, ela solicita que

escrevam uma carta, cuja amostra da produção consta na Figura 20. Na sala de aula, o

trabalho com esse gênero é enriquecedor, no sentido de propiciar a escrita com sentido, pois

tem um objetivo claro dentro de um contexto específico, para um interlocutor real.

As cartas comparadas a outros gêneros podem parecer simples por serem tão

abertamente ligadas às relações sociais e a escritores e leitores particulares,

mas isso só significa que elas nos revelam clara e explicitamente a

sociabilidade que faz parte de toda a escrita. (GROSSI, 2009, p. 133).

No caso desta análise, a proposta de produção textual em questão evidencia que a

professora prioriza no início do trabalho a estrutura composicional da carta, ou seja, a forma

de se compor uma carta, ela exemplifica com um modelo, explica a função da carta procura

dar sentido a esse trabalho, isto é, didatiza o gênero para poder ensiná-lo.

Figura 20: Produção textual (carta) realizada pela Elisana, aluna da Prof Carina, 3º fase 1º ciclo

Rondonópolis, 18 de novembro de 2011

Querida amiga Gisele

Como vai as coisas ai? Espero que esteja tudo bem!

Você não sabe da novidade que eu vou contar pra você! A nossa tia Lúcia deu

cavalo pra mim.

O nome dele vai ser trovão ele gosta muito de cavalgar pelo jardim. Ele brinca

muito comigo, agora eu não fico mais sozinha durante o dia, pois ele é meu com

panheiro.

Fico triste quando não posso ir ao sítio para brincar com o trovão.

Um grande abraço

De sua amiga

Elisana Fonte: Dados da pesquisa.

165

É o que sugere Schneuwly (2004) ao afirmar que: “A particularidade da situação

escolar reside no seguinte fato que torna a realidade bastante complexa: há um desdobramento

que se opera em que o gênero não é mais instrumento de comunicação somente, mas é, ao

mesmo tempo, objeto de ensino-aprendizagem.” (SCHNEUWLY, 2004, p. 76 - grifo do

autor).

Sendo objeto de ensino aprendizagem, a professora esclarece que todos são

convidados a redigirem uma carta para um primo, ou parente que mora em outra cidade e que

não conhece a cidade de Rondonópolis-MT (Figura 21). Como não estive presente em todas

as aulas, pois parti do interesse de observar as aulas de produção textual, a professora

esclareceu-me que essa atividade foi realizada de forma interdisciplinar considerando-se o

conteúdo visto na aula de geografia. Oportunidade em que ela trabalhou um texto informativo

sobre o município de Rondonópolis - MT enfocando as suas principais características. Nesse

sentido, a carta a ser redigida teria como assunto principal a referida cidade.

Ao propor uma produção textual com esse gênero, que, como já foi trabalhado de

forma mais simplificada anteriormente, a professora inova ao realizar a interdisciplinaridade,

uma vez que cria uma forma de fixar um conteúdo que, em muitos casos, é retomado em

questionários ou exercícios de memorização, para ser escrito e estudado em forma de carta.

Penso que essa forma de trabalhar um conteúdo é bem produtiva, inovadora e promove a

aprendizagem significativa.

Além disso, ela situa os aprendizes no contexto da interlocução: quem escreve (o

aluno), para quem (alguém que mora distante); objetivo do texto (informações sobre a cidade

de Rondonópolis – MT). A escrita cumpre, assim, seu papel social na perspectiva do

letramento, pois essa carta pode ser realmente endereçada a alguém que faz parte do campo de

conhecimento do educando. Percebe-se, também, que, na produção em análise, a professora

mantém a preocupação com a estrutura composicional do gênero que inclui uma data,

saudação inicial, assunto, despedida e assinatura. Assim, através dos modelos, as crianças vão

se apropriando da estrutura dos diferentes gêneros.

O trabalho desenvolvido pela professora Carina com o gênero carta partiu de várias

atividades, sendo elas: leitura de uma carta, interpretação, preenchimento de atividades,

preenchimento de envelope, carta para professora, para um amigo, para o povo brasileiro -

projeto meio ambiente (Figura 22), para a diretora da escola (Figura 23) e para o papai Noel.

Ou seja, não foi realizado apenas de forma ilustrativa ou pontual, mas houve um trabalho

criativo, contextualizado e interdisciplinar, envolvendo todos os alunos da sala, dessa forma,

creio que houve aprendizagem.

166

Figura 21: Produção textual (carta) realizada pela Iasmim, aluna da Profª Carina, 3º fase 1º ciclo

Rondonópolis, 22 de outubro de 2011.

Primo Cleverson

Desde que foi para Rio de

Janeiro Rondonópolis cresceu muito

Você não acredita! Rondonópolis

se tornou o segundo maior

município de mato grosso.

Ele tem uma posição estraté-

gica porque é o portal da Amazô-

nia e o corredor obrigatório para

a maior parte de caminhões e au-

tomóveis que transitam na região

Norte e Sul do país.

Olha Cleverson quanta coisa legal

né. Volte logo! Te espero com

braço aberto. Beijo de sua prima

Iasmim

Fonte: Dados da pesquisa.

Figura 22: Produção textual (carta) realizada por Giovanna e Beatriz, alunas da Profª Carina, 3º fase

1º ciclo Rondonópolis, 07 de novembro de 2011.

Ao povo brasileiro

Nos alunos da 3ª fase “B” da escola

Municipal Rosalino Antonio da Silva, por

meio desta carta viemos denunciar que os

homens estão matan-

do os animais.

As pessoas jogam lixo nos rios, ruas, lagos e

queimam floresta.

Queremos ajudar e conscientizar as pessoas

da importância de preservar o meio ambien-

te.

Pendimos que todos colaborem...

Gratas

Geovanna Vieira Moreira e

Beatriz da Rocha Vieira

Fonte: Dados da pesquisa.

Concordo com Dolz e Schneuwly (2004, p. 71) quando salientam que o gênero

“funciona como um modelo comum, que determina um horizonte de expectativas para os

membros de uma comunidade social” e, pela prática observada, é possível afirmar que,

dependendo do tipo de mediação entre a professora e os alunos, a aprendizagem acontece por

167

meio de atividades sistematizadas que conduzem à compreensão e à escrita do gênero,

levando os aprendizes a perceberem suas características, sua estrutura e suas funções. Os

gêneros apresentam uma estabilidade relativa e creio que, pelo trabalho desenvolvido por

Carina, os alunos serão capazes de reconhecer e nomear os gêneros conhecidos segundo a

estrutura composicional que possuem. As observações feitas na pesquisa permitem pressupor

que, para os escritores iniciantes, essa estabilidade que é destacada por Bakhtin (1997) é de

vital importância, visto que eles estão aprendendo sobre a constituição dos diferentes textos.

Figura 23: Produção textual (carta) realizada pela Yasmin, aluna da Profª Carina, 3º fase 1º ciclo

Rondonópolis 24 de novembro de 2011

Diretora Sara

Sou a Yasmim do 3º ano, aluna da professora [...].

Estou escrevendo esta carta para lhe contar como foi meu ano na escola.

Aprendi muitas coisas interessantes para o meu crescimento. Algumas delas foram:

carta, con-

tas de dividir, folclore brasileiro e muitas coisas importantes.

O que eu gostei muito foi os animais em ex-

tinção, o elefante com dentes de marfim e também sobre o nosso estado de mato grosso,

suas belezas e riquezas, enfim, coisas preciosas que levarei para toda minha vida.

Mas acho que a escola poderia nos dar mais condições de aprendizagem com aulas de

esportes, computação, música, ou seja um aprendizado di-

versificado para nos prepararmos para o mundo, enriquecendo a nossa vida escolar.

Muito obrigado pelas coisas que a Escola Rosalino me proporcionou.

Desejo a você e toda equipe um feliz natal e um próspero ano novo.

Um beijo carinhoso...

Yasmim

(3ª fase “B” I ciclo) Fonte: Dados da pesquisa.

168

Nessa perspectiva, Dolz e Schneuwly (2004, p. 75) apontam o gênero como “um mega

instrumento” que fornece um suporte para a atividade, nas situações de comunicação, e uma

referência para os aprendizes.

Dessa forma, os textos possuem algumas dimensões pertencentes aos gêneros, que lhe

conferem certa estabilidade, que não são estáticas, pois podem adquirir estruturas variadas de

acordo com a função que o escritor quer lhe imprimir. Trata-se do que Bakhtin (2003) destaca

como relativa estabilidade, pois um gênero, como uma propaganda, por exemplo, pode ser

elaborada na estrutura de uma piada, de uma poesia, de uma oração. Por nascerem de práticas

socioculturais, os gêneros são, portanto, altamente maleáveis, dinâmicos e plásticos

(MARCUSCHI, 2010), resultando, por vezes em outros gêneros.

Além disso, é de fundamental importância para os aprendizes iniciantes reconhecerem

a estrutura comum dos gêneros, pois a forma padrão dos mesmos serve como referência para

que se possa reconhecer como esses são flexibilizados. Saliento, porém, que a aprendizagem

acontece mediante a leitura e a produção do texto e não pela memorização de seus nomes e

partes constitutivas.

Nesse sentido, considero a prática docente de Carina bastante relevante e produtiva,

pois, para além de fazer com que os alunos reconheçam e identifiquem as partes de uma carta,

o trabalho por ela realizado partiu da leitura de diferentes tipos de cartas, identificação das

funções sociais e comunicativas das mesmas, redação de vários modelos, com objetivos

diversos e destinatários diferentes. Além disso, a atividade do preenchimento do envelope foi

bem significativa, visto que, com a explicação da professora, houve uma compreensão por

parte dos alunos, a respeito do trabalho do correio, que entrega a carta mediante a escrita

correta do endereço. A professora esclareceu que a correspondência só chegará ao seu destino,

caso o endereço preenchido esteja correto:

A professora entregou o envelope aos alunos para que eles observassem o

seu preenchimento, explicou o que era remetente, destinatário e falou que

um dos suportes para se escrever corretamente o endereço é a conta de água

ou de energia, pois são comprovantes de endereço que contém todas as

informações, principalmente o CEP. Disse que através do CEP, se localiza o

bairro e a rua pela internet. (PROTOCOLO C11, linhas 32 a 42).

Por este fragmento, é possível afirmar que a vida social se organiza em torno da escrita

e os aprendizes precisam compreender essa necessidade. Num preenchimento de um

envelope, quantas informações importantes foram compreendidas e vivenciadas pelos alunos?

Deparamos-nos com crianças que, muitas vezes, não sabem nem o endereço de sua residência

169

e, a partir dessa atividade, conseguem reconhecer a importância desse saber. Para o

preenchimento de endereço, foi necessária uma pesquisa como tarefa de casa. Ou seja, buscar

fora da escola, com os familiares, as informações necessárias para se desenvolver as

atividades de sala.

É o que chamamos das funções sociais da escrita, o letramento, que, para além de se

conhecer o código escrito (redigir corretamente a carta, o endereço, o Código de

Endereçamento Postal, CEP), é necessário saber também a sua utilidade no meio em que

vivemos. Ao focalizar os aspectos linguísticos do texto, como parágrafo, letra maiúscula no

começo de frase, no nome das pessoas e de lugares, cuidados com a pontuação, prioriza-se

aspectos da alfabetização e, ao enviar a carta, atentando-se para o endereço correto, o

caminho da carta até o seu destinatário, estamos no âmbito do letramento.

Portanto, concordo com Silva e Melo (2007, p. 36) quando os autores colocam que

“Produzir textos escritos é um ato complexo, pois envolve o desenvolvimento da capacidade

de coordenar e integrar operações de vários níveis e conhecimentos diversos: linguísticos,

cognitivos e sociais”. Estes preconizam que, ao redigir um texto, o escritor precisa acionar

seus conhecimentos, selecionar suas ideias, escolher e organizá-las linguisticamente e

registrar o texto de forma que ele atinja seus objetivos e chegue ao interlocutor desejado.

Para produzir um texto faz-se necessário o auxílio da professora, que planeja, explica,

ensina, incentiva, orienta seus alunos, fazendo com que eles se apropriem do conhecimento de

forma contextualizada.

Penso que ao desenvolver um trabalho com a produção textual do gênero carta, a

professora Carina planejou diversas etapas, como sugerem Silva e Melo (2007, p. 39):

“geração de ideias, consulta a outras fontes, seleção e decisão, rascunho, revisão e edição

final. No entanto, as etapas não são todas obrigatórias nem, necessariamente, sequenciais e

lineares, mas dependem das circunstâncias de produção, dos objetivos, da audiência.”

Na produção da carta para a diretora da escola, os alunos foram convidados a

pensarem o que gostariam de falar para ela, já que se tratava de uma produção realizada no

final do ano. Então, a professora sugeriu que os alunos escrevessem o que gostaram na escola,

pontos positivos e negativos da administração da diretora, sugestão ou pedido para melhoria

da escola, ao final da carta desejo de boas festas, despedida. Após a escrita do rascunho no

caderno de português, houve a reescrita do texto reestruturado e corrigido no caderno de

produção de textos para a versão final da carta propriamente dita. Essas etapas auxiliam os

escritores iniciantes a tomarem decisões conscientes, antes e durante a produção textual. Vale

enfatizar que a diretora recebeu a carta na qual os alunos exteriorizaram opiniões a respeito

170

do trabalho por ela realizado, deram sugestões para a melhoria da escola e foram cordiais,

desejando-lhe boas festas. Além disso, preencheram os envelopes com os dados da escola,

local de trabalho da diretora.

É notório salientar que a prática pedagógica de Carina privilegia os aspectos relativos

ao letramento no que tange à apropriação da escrita de forma contextualizada, prazerosa e

sistematizada. Ou seja, a professora procura fazer um trabalho significativo voltado para o

planejamento de atividades que tenha uma relação estreita com o mundo do educando, de

forma que seu conhecimento seja valorizado e ampliado.

De acordo com o programa Pró-Letramento, no fascículo 3 (A organização do tempo

pedagógico e planejamento de ensino), a elaboração das aulas deve ser um momento de

escolha e decisão. O convite realizado pelo referido programa é para que os professores, no

momento do planejamento, analisem sua classe, aprendam a conhecer seus alunos, suas

necessidades e busquem atividades, “ações e interferências para que os alunos avancem na

qualidade do domínio do conhecimento escolar”. (Fascículo 3, p. 24). O planejamento se

define como um instrumento necessário, flexível e inacabado, no qual o professor não correrá

o risco de cair no improviso e na falta de objetivos. (MEC/SEB, 2008).

Nesse sentido, a prática pedagógica de Carina revela que os eixos organizadores do

Ensino para a aquisição da língua escrita, propostos pelo referido programa, fascículo 1,

intitulado “Capacidades linguísticas: alfabetização e letramento”, são contemplados em

seu dia a dia, em seu fazer pedagógico. São eles: A compreensão e valorização da cultura

escrita, a apropriação do sistema da escrita, a leitura, a produção de textos escritos e o

desenvolvimento da oralidade.

Destaco, ainda, que a professora Carina promove, por meio da criatividade, a

interdisciplinaridade nas atividades em que esta se faz possível. Conforme o Protocolo nº 5 do

dia 20/09/2011, destaco que a professora “aproveitou” a produção de texto para explorar

gráficos e tabelas, em matemática, trabalhando de forma interdisciplinar.

Hoje a professora fala que vai trabalhar o texto “Por que sonhamos?” Ela

pergunta aos alunos, o que acontece quando dormimos. Fala sobre a revista

“Ciência Hoje” que traz curiosidades interessantes. Primeiro fez a leitura do

texto por que dormimos? [...]os alunos participaram da aula, contando suas

experiências, a professora garante a participação de todos na discussão, com

organização[...]após essa discussão a professora propõe a produção narrativa

de um texto sobre o sonho. Depois disso, os alunos leem seus textos e, junto

com eles, a professora classifica os sonhos em sonho assustador, triste,

fantasioso (na floresta encantada) surpresa (festa), passeio e a partir daí,

trabalha com noções de quantidade para a confecção de tabelas e gráficos,

171

garantindo que todos se expressem no desenvolver dessa atividade.

(PROTOCOLO C5, linhas 21 a 38).

Nessa aula percebi que a professora, com uma única atividade, conseguiu contemplar

os cinco eixos organizadores do ensino aprendizado, bem como, de forma criativa, lançar mão

da interdisciplinaridade. A professora Carina fala um pouco sobre essa nova forma de

organização de sua prática pedagógica, na qual ressalta a importância da formação (Programa

Pró-Letramento) e afirma ter modificado a sua prática em sala de aula, adotando metodologias

que contribuíram para a melhoria de sua prática:

A questão da sequência didática, quando eu participei lá do curso, eu não

entendia esse negócio da sequência didática de jeito nenhum. Depois que a

gente começa a ler, a estudar e assim a praticar, aí você começa a ter uma

compreensão melhor do que é essa questão da sequência didática. Uma

atividade puxando a outra, assim, e acaba se tornando... eu achei que foi uma

coisa que contribuiu muito pra mim. Uma coisa positiva que eu não

conseguia fazer e aí que eu comecei a compreender, a entender e a usar...né?

E acho que não tá assim bom, porque ainda tem muita dificuldade, ainda tem

muita coisa que a gente ainda fica assim muito em gavetinha... e a gente

sabe que não... não... não precisa ser assim, né? Que pra eles é muito

melhor pra aprender no global.

Saliento que não se trata apenas de seguir “uma receita” para desenvolver um trabalho,

mas de compreender uma proposta e, com competência, criatividade e dinamismo, criar

estratégias prazerosas para o ensino da língua portuguesa e da produção de textos em sala de

aula. Mesmo com limitações, a professora não tem receio de arriscar e de testar novas

possibilidades. Nesse aspecto, Carina afirma que o Pró-Letramento contribuiu para que ela

adquirisse maior segurança para organizar o seu trabalho com a produção de textos, incluindo

outros conteúdos na atividade proposta. Aproveita, também, o envolvimento da turma para

ampliar o leque de atividades:

Eu nem sei se é sequência didática. Eu procuro adequar assim o conteúdo

que eu to trabalhando, dentro da produção. Porque aí o que acontece? a

criança já tá trabalhando com determinado tipo de atividade, por exemplo...

trabalhei é...lista: lista de convidado, aí trabalhei convite... então como ela tá

envolvida naquilo ali, eu tenho a impressão que a produção vai ser mais

atraente..pra eles, né? Eles vão ter mais vontade de fazer inventar alguma

coisa [...] e daí você vai aproveitando as suas ideias... às vezes muda, às

vezes não muda. Por que às vezes a gente fazia uma atividade de produção.

Dava ali uma sequência de desenhos, e ah... vamos fazer uma produção. Só

que acaba ficando muito solto, né? Até a gente pra produzir alguma coisa,

parece que a gente tem que ter um motivo, alguma coisa pra tá envolvendo a

gente naquilo, né? E eu percebi isso, com essa turminha minha que eu

172

comecei a fazer assim, de uns tempos pra cá, eles produziram melhor...

(CARINA, 2011b).

Dessa forma, creio que o programa Pró-letramento possibilitou o acréscimo de novas

metodologias ao trabalho de Carina, principalmente na perspectiva do alfabetizar, letrando, e

percebendo que a temática dos gêneros textuais privilegia esse aspecto do ensino da língua

escrita.

Ademais, avalio que a professora se dedica, buscando novas formas de ensinar,

pesquisando e refletindo sobre sua prática. Posso afirmar que Carina não é uma mera

executora de programas de formação continuada, mas que ela internaliza os novos conceitos,

aliando-os ao seu conhecimento de mundo e à sua experiência profissional, para melhorar a

sua prática pedagógica.

6.3.4 Sintetizando algumas percepções

Neste item, faço uma síntese do que já foi analisado sobre as práticas pedagógicas dos

sujeitos dessa pesquisa tendo como “pano de fundo” a análise documental realizada no item

5.6, no qual faço um mapeamento de todas as sugestões de produções textuais que compõem

o material do Programa Pró-Letramento.

As sugestões trazidas pelo referido programa são várias e, conforme mencionado, as

mesmas contribuem com o trabalho do professor alfabetizador em exercício.

Após análise do material do Programa Pró-Letramento, Lucio (2010, p. 137) apontou,

como contribuições do referido programa, a articulação entre teoria e prática, a valorização

das experiências dos professores e o relato de experiência de outros professores como práticas

pedagógicas significativas, entre outros. Concordo com a autora quando ela afirma que

os fascículos apresentam um roteiro polifônico em que o discurso oficial, o

discurso acadêmico e o discurso docente interagem. Assim, concebemos o

material do PPL como um diálogo em que todos os comunicantes (governo,

academia e docentes) tem suas vozes pronunciadas, ouvidas e reconstruídas

num processo que se enriquece intensamente quando essas vozes emergem,

num contexto em que a profusão de discursos sociais faz-se presente.

(LUCIO, 2010, p.37).

Nesse sentido, pela análise documental foi possível perceber que as contribuições no

tocante à produção de textos privilegiam o aspecto discursivo da linguagem, trazendo

propostas de produção de textos que partem de uma sequência de passos que culminam numa

173

atividade concreta, ou seja na produção textual propriamente dita. Foi possível recuperar que

as propostas de produção textual partem do planejamento sistemático desenvolvido pelo

coletivo da escola por meio de projetos, com objetivos e ações pré-definidas, e que, ao final,

apresenta-se o resultado dessas ações.

Em termos de atividades que privilegiam o processo de apropriação do sistema de

ensino alfabético, o material traz em seu fascículo complementar sugestões que envolvem a

escrita de nomes dos alunos, dominó, bingo, caça-palavras, etc.

Não foi possível identicar nesse material atividades mais específicas para o processo

de alfabetização, pois a ênfase recai mais no que ensinar do que no como fazer. Creio que nos

encontros presenciais é que propostas mais concretas com atividades interessantes sobre a

apropriação do sistema de escrita alfabética, baseadas nas experiências reais dos participantes

do curso, são socializadas. Essa tendência pode ser relacionada ao valor que vem sendo

atribuído à importância da troca de experiência entre pares.

Chartier (2007) no texto “A ação docente: entre saberes práticos e saberes teóricos”

ressalta que

Ao se defrontarem com os textos acadêmicos, os professores privilegiam as

informações diretamente utilizáveis, o ‘como fazer’ mais do que o ‘porque

fazer’, os protocolos de ação, mais do que as explicações ou os modelos. O

trabalho pedagógico nutre-se frequentemente da troca de ‘receitas’, reunidas

graças aos encontros e aos acasos. As receitas que foram validadas pelos

colegas com quem podem discutir espontaneamente e que são

suficientemente flexíveis para autorizar variações pessoais são adotadas mais

facilmente do que aquelas que são expostas nas publicações didáticas.

(CHARTIER, 2007, p. 185).

No relatório do fascículo nº1 da tutora do programa do município de Rondonópolis,

Dulcilene Rodrigues Fernandes13

, em relação aos eixos da alfabetização, entre outros

aspectos, observa-se que houve a socialização dos exemplos de atividades que contemplam a

alfabetização. Nesse sentido, penso que existe uma tentativa de conciliar teoria e prática, visto

que os saberes teóricos são complementados com os “saberes da ação”. Ou seja, as “receitas”,

de que fala Chartier, por serem saberes da prática compartilhadas nos cursos de formação,

passam a ter importância, pois podem ser refletidos de forma coletiva. De acordo com

pesquisas, a autora afirma que os professores valorizam os “saberes da ação”, em detrimento

13 Relatório enviado à Universidade Federal de Pernambuco/CEEL, na ocasião responsável pelo Pró-Letramento

em Mato Grosso.

174

dos saberes teóricos, que são elaborados cientificamente, porém fora do campo de

investigação, não sendo, portanto, utilizáveis em sala de aula.

Segundo a análise realizada sobre as práticas pedagógicas dos sujeitos dessa pesquisa

no tocante à produção de textos e à presença dos gêneros textuais nos três primeiros anos do

ensino fundamental, posso afirmar que os documentos oficiais e os programas de formação de

professores alfabetizadores influenciam de forma significativa as práticas docentes. Porém,

isso não acontece de forma homogênea, pelo contrário, cada professora tem uma forma

particular de trabalho, que inclui seus próprios saberes, os quais não provêm de uma fonte

única, mas sim de várias fontes e de diferentes momentos da história de vida e da carreira

profissional.

A professora da 1ª fase trabalhou a produção de textos, dentro das exigências do

projeto da escola, com produções pontuais, nas quais as crianças desenvolveram pequenos

textos que partiam, principalmente, da exploração de gravuras para a composição do texto

proposto. Os gêneros textuais trabalhados por ela em sala de aula foram variados: bilhete,

cartão, poesia, música, anúncio, textos narrativos e descritivos. Para o desenvolvimento da

atividade, a professora explicava o que fazer, mostrava alguns exemplos no quadro, pedia que

os alunos se manifestassem oralmente a respeito do que estava sendo proposto. Sempre

auxiliava os alunos a redigirem de forma correta, corrigia e reestruturava palavras com a

grafia incorreta. Por vezes, agia como escriba do aluno que não conseguia desenvolver as

produções.

A professora da 2ª fase desenvolveu atividades que, em sua maioria, se tratavam de

produções pontuais, as quais iniciavam na aula observada com término na própria aula. Nesse

sentido, ela propôs produções que exploravam as histórias em quadrinhos, com sequência

lógica dos fatos (narrativas), bilhetes, fábula, lista, música, poesia e panfletos. Os alunos dessa

fase mostravam-se relativamente independentes quanto à escrita das palavras, mesmo assim,

muitas foram as vezes em que a professora reestruturou palavras que se encontravam com a

grafia incorreta.

A professora da 3ª fase realizou um trabalho com a produção de textos, que, pelos

dados utilizados para essa análise, se aproximaram mais fortemente da proposta do Pró-

Letramento, uma vez que era desenvolvido com encadeamento de atividades que seguiam

uma sequência de passos até culminar na produção final. A professora realizava também um

trabalho com a reestruturação do texto de forma individual e também através de agrupamentos

positivos, no qual o aluno com mais facilidade auxiliava os alunos com maiores dificuldades.

Os trabalhos desenvolvidos em sala de aula privilegiaram os gêneros: carta, bilhete, biografia,

175

ficha técnica, lista de convidados, cardápio. Estes foram realizados a partir de várias etapas

que envolveram leitura, atividades de interpretação, debates em sala, pesquisa na biblioteca,

pesquisa no laboratório de informática, atividades extraclasse, entre outras.

Pelos dados apresentados, creio que ainda é necessário sistematizar o ensino da

produção de textos, no sentido de trabalhar com diversos gêneros textuais no qual os alunos

sejam incentivados a ler e a escrever com finalidades e destinatários diversos, porém, não se

pode perder de vista que é necessário criar situações sistematizadas e planejadas como o

intuitode levar aluno a compreender os aspectos sociodiscursivos e estruturais de cada gênero

e penso que isso não acontece com atividades pontuais de produção textual.

Até os anos 80, o ensino da escrita baseava-se na escrita de “redações” em que se

escrevia de forma artificial obedecendo a regras e estruturas preestabelecidas em que a língua

era vista como um código que, ao ser bem utilizado pelo emissor, iria comunicar sem ruído a

mensagem. Ou seja, era necessário seguir à risca uma estrutura pré-determinada, para, assim,

garantir que a mensagem fosse compreendida por todos sem ser dirigida a ninguém.

(Marcuschi, 2010). Eram os chamados gêneros escolares que traziam como estrutura

tipológica a narração, a descrição e a dissertação.

Ainda vimos que há resquícios dessa forma de trabalho em sala de aula, por isso, creio

ser necessário subsidiar professores alfabetizadores com estudos direcionados ao

aprofundamento na compreensão dos gêneros textuais como objeto de ensino e aprendizagem.

Albuquerque e Leal (2007) nos chamam a atenção para a necessidade de deixar de

escrever redações para se produzir textos, ou seja, é preciso ver a escrita como um objeto

social, articulado ao mundo em que vivemos com funções sociais e características próprias e

que precisam ser exploradas na escola a fim de que os alunos sejam capazes de perceber suas

características e finalidade para saber como utilizá-los. As autoras salientam, também, que

Nem sempre é possível ao professor planejar a produção de textos que

preencham finalidades reais e que sejam destinados a outros leitores ( e não

apenas ao professor). Quando isso não acontece, [...] é importante pensar em

situações imaginárias, que tenham características que, pelo menos, se

aproximem de usos reais, deixando claro para o aluno que, naquele

momento, ele estará aprendendo algo que poderá ser utilizado em outras

situações. (ALBUQUERQUE; LEAL, 2007, p. 106).

Como foi possível recuperar por meio dos dados no relatório da tutora Dulcilene, as

professoras, sujeitos dessa pesquisa, desenvolveram, no ano de 2010, no curso do Programa

Pró-Letramento, projetos adaptados à realidade da escola e da turma. Constatei, neste

176

material, que as professoras tiveram contato com o como realizar, planejar e concretizar esses

projetos em sua unidade escolar: a professora da 1ª fase desenvolveu o projeto Meio ambiente,

que já estava em andamento na escola, a professora da 3ª fase trabalhou o projeto Almanaque

que foi sugerido no Programa Pró-Letramento e que ela adaptou à realidade da escola. Não foi

possível encontrar nenhum dado da professora da 2ª fase, mas creio que ela também

participou dessa etapa do curso.

Observando o quadro 11 verifica-se que, nele, apresentam-se as capacidades,

competências e atitudes que devem ser introduzidas, trabalhadas, consolidadas e retomadas ao

longo dos três primeiros anos do ensino fundamental. Essas capacidades selecionadas estão

organizadas em torno de eixos14

para a apropriação da língua escrita. Dessa forma, percebi

uma progressão da 1ª para a 3ª fase, tanto em termos de quantidade quanto de

aprofundamento no tocante à exploração dos gêneros textuais em sala de aula. Seria por conta

desta progressão que nota-se uma primazia do ensino do código em detrimento do significado

e da comunicação que foi perceptível nas diferenças entre as práticas pedagógicas dos sujeitos

dessa pesquisa? Para responder a essa questão, acredito que novas pesquisas na perspectiva

etnográfica e longitudinal poderiam ser realizadas.

Penso que as práticas docentes não podem ser homogeneizadas, mas sofrem

influências das políticas e dos conteúdos da educação, porém cada professor se apropria de

diferentes formas das orientações dos programas de formação continuada e as incorpora em

sua prática, se considerá-las importantes.

Enfim, percebo que, embora ainda haja a necessidade da compreensão dos gêneros

textuais como possibilidade de exploração e trabalho pedagógico mais sistematizado, existe

uma progressão positiva de construção e consolidação dos saberes docentes dessas

professoras alfabetizadoras, no tocante ao processo de ensino aprendizagem na perspectiva do

letramento.

14 Compreensão e valorização da cultura escrita, apropriação do sistema de escrita; leitura; produção

de textos escritos; desenvolvimento da oralidade.

177

CONSIDERAÇÕES

Ao redigir as considerações da pesquisa que aqui se delineou, reporto-me ao ensino da

língua materna que, durante muito tempo, esteve centrado na concepção de língua como um

sistema de código que deveria ser internalizado sem levar em consideração o contexto, ou

seja, a língua não era vista como um fenômeno social, histórico e interacional. Ensinava-se a

ler e a escrever de forma fragmentada, com falsos textos, compostos por frases

descontextualizadas e que não tinham relação com as práticas sociais.

Com as novas concepções de língua difundidas nas três últimas décadas, relacionadas

ao ensino de Língua Portuguesa e Alfabetização, novas ideias e novos enfoques para o ensino

de língua passaram a ser divulgadas em todo Brasil.

As concepções teóricas de Bakhtin (1997, 2010) e Marcuschi (2008), concebendo a

língua como um sistema de interação por indivíduos socialmente organizados,

redimensionaram as Propostas Curriculares Nacionais e influenciaram significativas

mudanças em materiais didáticos e em cursos de Formação Continuada.

Nesse sentido, a influência dessas concepções trouxe à tona um apelo para o ensino de

língua contextualizado, em que a alfabetização seja realizada em consonância com o

letramento. O ensino de língua passa de um enfoque normativo e prescritivo para a concepção

de linguagem articulada aos seus usos nas práticas sociais, de forma que haja interação entre

os falantes.

A compreensão de linguagem e gêneros discursivos de Bakhtin (1997) é difundida por

teóricos como: Dolz e Schneuwly (2004), Marcuschi (2008; 2010), Rojo (2010), entre outros,

e trazem as noções de gêneros textuais materializados em nossa vida diária, os quais

apresentam padrões sociocomunicativos característicos definidos por composições funcionais,

objetivos, e estilos que se concretizam em nosso cotidiano e que são realizados na

“integração de forças históricas, sociais, institucionais e técnicas.” (MARCUSCHI, 2008, p.

155).

Dessa forma, falar em ensino de língua materna é perpassar necessariamente pela

noção de gênero textual, já que, além do eco das teorias bakhtinianas, presentes nas propostas

curriculares, os cursos de formação inicial e continuada procuram subsidiar a prática docente

com metodologias voltadas ao trabalho com os gêneros textuais.

Nessa perspectiva, o programa Pró-Letramento, implantado pelo MEC em 2005,

procura subsidiar os professores alfabetizadores com novas teorias trazendo a temática da

alfabetização em consonância com o letramento, conceito este recente em nossa língua, e

178

divulgado por teóricos como Soares (1998), Costa Val (2004) e Kleiman ( 2008), os quais

defendem que a alfabetização (aquisição do sistema convencional da escrita) não pode ser

dissociada do letramento, que é o desenvolvimento de habilidades de uso dessa tecnologia nas

práticas sociais. Assim, a alfabetização e o letramento devem caminhar juntos, numa relação

de interdependência, em que um não anula a especificidade de outro, mas se complementam.

A pesquisa aqui delineada partiu da preocupação com a qualidade de ensino e o

acréscimo de novas metodologias na alfabetização, baseada na compreensão do letramento e

num ensino mais significativo para o aluno com a temática dos gêneros textuais.

Dessa forma, a questão da pesquisa que moveu esta investigação, a saber: O programa

de formação continuada para professores alfabetizadores, o Pró-Letramento, oferecido pela

Secretaria Municipal de Educação de Rondonópolis, tem contribuído de forma efetiva para

este aspecto?

Com base nas entrevistas realizadas, pode-se perceber que os sujeitos da pesquisa

consideram a formação continuada e o programa Pró-Letramento muito importantes para a

melhoria da qualidade de ensino. Além disso, as entrevistadas destacam a relevância da

experiência em sala de aula, da possibilidade de aceitação de mudanças, como fatores

decisivos para a constituição das mesmas, enquanto profissionais e enquanto pessoa. Ou seja,

o saber docente, como afirma Tardif (2002), não se reduz à simples função de transmissão de

conhecimentos produzidos, mas integra diferentes saberes podendo ser definido como um

saber plural, construído através da formação profissional, de saberes disciplinares,

curriculares e experienciais.

A entrevista realizada com a tutora do programa no ano de 2010 levou-me a afirmar

que ela considera o programa Pró-Letramento bem formulado, e que o material é muito bom,

pois constata que os professores cursistas modificam suas práticas ou acrescentam a essas,

sugestões, aliando teoria e prática.

Pelas observações e análise dos gêneros que circulam na escola, percebe-se uma

aceitação maior e melhor compreensão, por parte das professoras, das propostas curriculares e

dos conceitos divulgados pelo Programa Pró-Letramento, no tocante à compreensão do

alfabetizar, letrando. Além disso, pelos diálogos travados, conclui-se que existe uma avaliação

positiva deste programa por parte dos sujeitos dessa pesquisa, pois consideram que existe uma

relação entre a teoria e a prática. Ou seja, nos encontros presenciais é possível a troca de

experiência e a reflexão sobre os aspectos positivos do cotidiano escolar.

Neste sentido, saliento que os cursos de formação continuada que fazem essa relação

entre a teoria e a prática são mais valorizados pelas professoras. Elas apontaram o PROFA

179

como um dos cursos que trazem a temática da reflexão sobre prática e que o Pró-Letramento

foi uma continuidade desta política de formação.

Defendo, desde o início desta pesquisa, a necessidade de que os gêneros textuais sejam

tomados como objeto de ensino e percebo que ainda é preciso subsidiar os professores na

formação inicial e continuada. O Programa Pró-Letramento capacita o professor indicando

caminhos possíveis, porém, penso que ainda seja importante o planejamento e o diálogo entre

os profissionais da escola, no sentido de priorizar os gêneros a serem explorados em cada fase

do ensino.

Os sujeitos dessa pesquisa compreendem a importância de se trabalhar com os

diversos gêneros textuais, todavia, a estrutura das tipologias, principalmente da narração

(com gravuras e exploração da estrutura começo, meio e fim) ainda aparecem como

prioridade nas produções textuais, notadamente nas 1ª e 2ª fases. Existe, também, uma

preocupação latente com os aspectos gramaticais e ortográficos da escrita. Não defendo que

isso não seja importante, mas creio que o aspecto interlocutivo da língua deva ser melhor

explorado.

Ao observar a prática pedagógica das professoras alfabetizadoras, a análise levou-me a

crer que o trabalho que se desenvolve na sala de aula com a produção escrita é marcado e

influenciado pelos cursos de formação, como o Pró-Letramento, mas também pelas condições

dos contextos escolares, pela característica individual de cada professor, pela realidade de

cada unidade escolar e de cada aluno, além dos projetos desenvolvidos pela escola e que

constam em seu Projeto Político Pedagógico.

Vale salientar, ainda, que a forma de organização governamental também influencia,

gradativamente, as transformações na prática pedagógica, visto que ao constituir a Rede

Nacional de Formação Continuada de Professor da Educação Básica (RNFC), o MEC reúne

esforços, formando uma grande parceria entre Universidades e Secretarias de Educação com a

finalidade de melhorar a qualidade da educação e elevar o Índice de Desenvolvimento da

Educação Básica (IDEB) em todo País.

Desde o ano de 1998, a Secretaria Municipal de Educação e Cultura – SEMEC – do

município de Rondonópolis tem procurado implantar uma política de melhoria na qualidade

da educação, buscando diminuir os altos índices de evasão e extinguir a repetência e a

reprovação por meio da implantação do sistema de ensino organizado por ciclos. Além disso,

a valorização profissional é outra meta realizada através da diminuição da jornada de trabalho

do professor do ensino fundamental (de 40 horas para 30 horas), bem como o investimento na

formação contínua do professor na própria unidade escolar através de grupos de estudo.

180

Penso que valorizar o profissional da educação é de fundamental importância para a

melhoria na qualidade do ensino, por isso, ainda, faz-se necessário mais investimento na

formação inicial e continuada dos professores alfabetizadores. É nessa perspectiva que

compreendo a formação continuada, como um projeto permanente, que possibilite aos

professores caminhos para que, de forma coletiva e contextualizada, transformem a sua

prática docente, com o objetivo de melhorar a qualidade da educação e da aprendizagem de

seus alunos.

Quanto às produções textuais disponibilizadas para as análises, verifica-se que, ao

escreverem, as crianças conseguem responder de forma positiva, desenvolvendo a produção

textual conforme a orientação da professora. Dessa forma, penso que o planejamento

sistematizado dos gêneros textuais adequados a cada etapa do ensino precisa ser discutido

pelo coletivo escolar a fim de que os alunos sejam capazes de se expressarem com clareza de

acordo com a situação.

Cardoso (2008) desenvolveu uma pesquisa no ano de 1996 que, entre outros aspectos,

lhe possibilitou responder à pergunta “O que as crianças sabem sobre a escrita”? Por meio de

entrevistas de explicitação elas expressavam como desenvolviam suas produções, como

pensavam em seu interlocutor, como venciam suas dificuldades. Com questionamentos sobre

o que foi escrito, a autora depreende das falas das crianças o caminho cognitivo desenvolvido

por elas na construção do texto. Os dados revelam que as crianças estão numa busca em

constituírem-se como escritores, mediados pela presença de um leitor real ou imaginário de

seus textos. Assim, a criança cria estratégias de construção do texto, à medida que escreve um

rascunho, observa, apaga, corrige, consulta o adulto, num esforço metalinguístico para que

sua escrita seja significativa.

Dessa forma, todo texto é produzido, seja ele falado ou escrito, num determinado

contexto e construído sobre o modelo de um gênero pré-determinado através de seus motivos,

intenções e conteúdos temáticos a serem transmitidos. Assim, creio que é função da escola

proporcionar às novas gerações o contato com diferentes gêneros discursivos a fim de

desenvolver competências linguísticas relacionadas às formas de falar e escrever segundo

regras ortográficas, gramaticais e estilísticas específicas. Portanto, quem escreve, precisa

aprender a planejar e a desenvolver um texto de acordo com a situação, com o destinatário e

com o gênero discursivo e isso não acontece espontaneamente, é necessário um planejamento

e um trabalho sistematizado neste sentido.

Pela pesquisa aqui delineada, creio que a concepção do alfabetizar, letrando, está

sendo internalizada e posta em prática de forma gradativa. Por isso, acredito que o debate

181

precisa ser ampliado, a fim de que a teoria se efetive na prática e que o professor alfabetizador

sinta-se cada vez mais seguro no seu fazer pedagógico, proporcionando ao educando um

ensino de língua mais significativo por meio da exploração dos gêneros textuais e da

compreensão dos aspectos interlocutivos da linguagem.

182

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APÊNDICES

APÊNDICE A – Roteiro da Entrevista Inicial com as Professoras que participaram do curso

Pró-Letramento ................................................................................................................ 190

APÊNDICE B – Entrevista com as Tutoras do Programa Pró-Letramento ........................... 193

APÊNDICE C – Roteiro da Entrevista Final com a Professora Ana (1ª fase 1º ciclo) .......... 195

APÊNDICE D – Roteiro da Entrevista Final com a Professora Bia (2ª Fase 1º Ciclo) ......... 197

APÊNDICE E – Roteiro da Entrevista Final com a Professora Carina (3ª Fase 1º Ciclo)..... 199

190

APÊNDICE A – Roteiro da Entrevista Inicial com as Professoras que participaram do curso

Pró-Letramento

1 Identificação

a) Dados pessoais

Nome:_______________________________________________________________

Idade:_______

Naturalidade:_________________________________________________________

Estado civil:__________________________________________________________

b) Formação

Graduação

Curso:_______________________________________________________________

Instituição:___________________________________________________________

Ano de conclusão______________________________________________________

Pós-Graduação:

Especialização

Curso:_______________________________________________________________

Ano de conclusão:______________________________________________________

Mestrado

Curso:_______________________________________________________________

Ano de conclusão______________________________________________________

c) Atuação profissional

Tempo de serviço no magistério:__________________________________________

Tempo de serviço na alfabetização:________________________________________

Situação funcional:____________________________________________________

Escolas em que atuou:__________________________________________________

Fase em que atuou mais tempo:__________________________________________

Fase em que atua:_____________________________________________________

Cartilhas e/ou livros de alfabetização que já utilizou:__________________________

191

2 Blocos de perguntas

BLOCO 1- Informações Profissionais

1 Você atuou algum tempo no magistério sem ter formação específica? Em caso positivo,

responda onde e quando:

2 Já atuou em outra profissão? Em caso afirmativo, responda qual e por quanto tempo:

3 O que te fez se interessar pela profissão docente?

4 Qual a fase que você mais se identifica no primeiro ciclo?

5 Quais as fases em que você atuou nos últimos cinco anos?

6 Que outras funções você já desempenhou nesta escola?

7 Você está nesta fase atualmente por escolha ou por questões de pontuação?

BLOCO 2 – Alfabetização

1 O que te motiva a trabalhar com alfabetização?

2 No seu entendimento o que é alfabetização?

3 O que é alfabetizar?

4 Quando você considera que uma criança aprendeu?

5 Como você sabe quando uma criança está alfabetizada ou não?

6 Que dificuldades as crianças costumam apresentar para se alfabetizar?

7 Analisando a sua prática como professora alfabetizadora, desde o início até os dias atuais,

o que você aponta como avanço significativo de sua prática?

8 Qual ou quais os métodos que você utiliza na alfabetização? Por quê?

9 No decorrer de sua trajetória como professora alfabetizadora o que você acha que

contribuiu para melhorar a sua prática?

10 Quais as maiores dificuldades encontradas por você no trabalho com a alfabetização?

11 Quais as situações/elementos que interferem na obtenção de resultados bem sucedidos na

alfabetização das crianças?

12 Como você trabalha as dificuldades de escrita apresentadas pelos alunos na alfabetização?

13 Na sua opinião, as teorias sobre a alfabetização influenciam em sua prática em sala de

aula? De que maneira?

14 O termo letramento vem sendo utilizado há pouco tempo no meio educacional. Você

acredita que há diferença entre alfabetização e letramento? Explique:

192

15 Em sua opinião é possível trabalhar com diferentes textos na fase inicial da alfabetização?

Caso a resposta seja positiva, de que forma?

BLOCO 3 – Formação Continuada

1 Qual a importância da formação continuada para professores alfabetizadores? Comente:

2 Você costuma participar de todos os cursos oferecidos pela SEMEC (Secretaria Municipal

de Educação) que estão voltados para a alfabetização? Por quê?

3 Quais os cursos sobre alfabetização que você participou e que contribuíram de alguma

maneira para sua prática como professora alfabetizadora?

4 Como você encara a relação entre a formação continuada e o seu crescimento pessoal e

profissional?

BLOCO 4 - Programa Pró-Letramento

1 Quais os motivos que a levaram a inserir-se no programa Pró-Letramento?

2 Qual a importância deste programa para a sua prática pedagógica?

3 O programa acontece de forma semipresencial, ou seja, existe um encontro mensal e

considera-se a carga horária do curso mediante as atividades desenvolvidas em sala de

aula. Você considera essa quantidade de encontros suficiente?

4 O que você acha da metodologia e do material oferecido pelo curso?

5 Quais os pontos positivos do programa Pró-Letramento?

6 Existem pontos negativos neste programa? Aponte-os:

7 Qual a sua opinião a respeito da atuação dos tutores do programa?

8 A partir da sua participação no curso Pró-Letramento, o que você apontaria como

contribuição deste curso em sua prática pedagógica?

9 Você acha que o curso Pró-Letramento se diferencia dos outros cursos de formação de

professores alfabetizadores? Em quais aspectos?

10 Descreva as atividades que você acrescentou no seu planejamento diário a partir da sua

participação no curso do Pró-Letramento:

193

APÊNDICE B – Entrevista com as Tutoras do Programa Pró-Letramento

1 Identificação

a) Dados pessoais

Nome:_______________________________________________________________

Idade:_______

Naturalidade:_________________________________________________________

Estado civil:__________________________________________________________

b) Formação

Graduação

Curso:_______________________________________________________________

Instituição:___________________________________________________________

Ano de conclusão______________________________________________________

Pós-graduação:

Especialização

Curso:_______________________________________________________________

Ano de conclusão:______________________________________________________

Mestrado

Curso:_______________________________________________________________

Ano de conclusão______________________________________________________

c) Atuação profissional

Tempo de serviço no magistério:__________________________________________

Tempo de serviço na alfabetização:________________________________________

Situação funcional:_____________________________________________________

Escolas em que atuou:__________________________________________________

Tempo que trabalha com a formação continuada de professores: _________________

2 Perguntas:

1 Você recebeu preparação para ministrar o curso Pró-letramento para os professores

alfabetizadores? Como foi esta preparação?

194

2 A preparação recebida foi suficiente para que você se sentisse capacitada para ser

orientadora do programa?

3 Você tem recebido apoio dos órgãos educacionais para ser tutora do programa Pró-

Letramento? Quais?

4 De acordo com suas observações, a participação dos professores alfabetizadores no

Programa Pró-letramento tem contribuído de forma significativa para a melhoria da

prática pedagógica dos mesmos ? Em que aspectos?

5 Você acredita que o Programa Pró-Letramento tem atingido o objetivo proposto, que é

elevar a qualidade de ensino e de aprendizagem nas séries iniciais do ensino fundamental?

6 Existem materiais complementares para o desenvolvimento deste programa? Quais?

7 Você considera os materiais para desenvolver o Programa adequado?Justifique:

8 Como você organiza os encontros do estudo? Quais as estratégias utilizadas? Qual a

metodologia?

9 Você considera o número de encontros para estudo do material do curso adequado?

10 O local onde acontece o estudo é adequado ou faltam algumas adequações?

11 Você apontaria algumas sugestões para melhorar o Programa Pró-Letramento?Quais?

195

APÊNDICE C – Roteiro da Entrevista Final com a Professora Ana (1ª fase 1º ciclo)

1 Você acha difícil trabalhar com livro didático na alfabetização, por quê?

2 De onde você busca material pedagógico para subsidiar sua prática?

3 Você ainda usa algumas cartilhas para a elaboração de seus planos?

4 E a leitura como você trabalha? Fale um pouco sobre isso.

5 Percebi tanto na entrevista, quanto na observação em sala que você realmente é bastante

afetiva com as crianças, você acha que a afetividade interfere no desenvolvimento das

capacidades das crianças, de que maneira?

6 Numa pergunta anterior você me respondeu que os erros das crianças na escrita são

ensaios, mas percebi nas observações que a correção é feita rigorosamente, por quê? Como

você encara essas etapas da aprendizagem infantil?

7 Outra coisa que você me disse é que se utiliza de vários métodos para alfabetizar, que não

segue um apenas, mas, nesses seus dezessete anos como professora alfabetizadora, qual o

método que você mais utilizou? Qual o método que você acredita que dá resultados mais

eficazes? Por quê?

8 Você acha que os alunos estranharam a minha presença na sala? Houve alguma mudança

de comportamento deles ou não? Explique:

9 O fato de eu ter um dia específico para vir à escola nas observações em sala, fez com que o

trabalho com a produção textual se modificasse, ampliasse ou reduzisse?

10 Percebi que o caderno de produção de texto é separado do caderno de atividades de

português, por quê?

11 Você disse que trabalha a alfabetização (codificação e decodificação) junto com o

letramento (função da escrita). Você acha que é possível fazer isso com todas as atividades

propostas em sala? De que forma?

12 No decorrer das observações, percebi que você trabalhou com texto narrativo, bilhete,

poesia, anúncio, fábulas, etc. Qual o motivo da escolha desses gêneros? Você encontra

dificuldades para trabalhar algum desses gêneros na primeira fase?

13 Com o Ensino Fundamental de 9 anos, crianças mais novas, de seis anos, chegam ao

primeiro ano? O que você acha dessa proposta?

14 Essas crianças precisam de um trabalho diferente? Qual seria?

15 Como você inicia o processo de alfabetização? Aponte algumas atividades que você

desenvolve com vistas à criança perceber a correspondência letra-som.

196

16 Você aponta que o pró-letramento, lhe deu uma noção sobre a organização do trabalho, não

é? Mas como você organiza o trabalho com a produção? Você segue uma sequência de

atividades? Como é isso?

17 Na entrevista inicial, você fala da desistência dos cursistas do pró-letramento. Que o curso

começou com um grupo grande e foi diminuindo, o que você apontaria como hipóteses

para essa desistência?

197

APÊNDICE D – Roteiro da Entrevista Final com a Professora Bia (2ª Fase 1º Ciclo)

1 Pela sua fala anterior e relembrando a sua formação inicial (magistério) você me disse

que naquela época não tinha outra opção a não ser escolher o magistério (para as

mulheres) ou contabilidade (para os homens) . Se você pudesse optar por outra profissão,

qual seria? O que você pensa a respeito dessa profissão: ser professor? E para ser

professor, o que é preciso?

2 Você acompanha a sua turma desde a primeira fase, por uma determinação da escola, ou

seja, foi a escola que propôs essa organização do trabalho devido ao ciclo de formação

humana, correto? Você concorda com essa organização, ou acha que seria melhor

escolher uma fase específica, com a qual você se identifique mais?

3 Você me informou que não usa nenhuma cartilha, não segue nenhum livro. De onde você

busca material pedagógico para subsidiar sua prática? Você ainda segue algumas cartilhas

para a elaboração de seus planos?

4 Outra coisa que você me disse é que se utiliza de vários métodos para alfabetizar, que não

segue um apenas, mas, nesses seus quinze anos como professora alfabetizadora, qual o

método que você mais utilizou? Qual o método que você acredita que dá resultados mais

eficazes? Por quê?

5 E o trabalho com a leitura como ele é realizado?

6 Com o Ensino Fundamental de 9 anos, crianças mais novas, de seis anos, chegam ao

primeiro ano? O que você acha dessa proposta?

7 Essas crianças precisam de um trabalho diferente? Qual seria?

8 Você disse que trabalha a alfabetização (codificação e decodificação) junto com o

letramento (função da escrita). Você acha que é possível fazer isso com todas as

atividades propostas em sala? De que forma?

9 Com a sua participação nas formações continuada, você afirma ter modificado a sua

prática em sala de aula, que metodologia você adotou, ao longo de sua caminhada como

alfabetizadora, que contribuiu para a melhoria de sua prática? Aponte algumas:

10 Você coloca como situações que interferem na obtenção de bons resultados na

alfabetização a desestrutura social, familiar e a falta de interesse dos alunos, correto? A

que você atribuiria à falta de interesse dos alunos? Qual seria o motivo pelo qual o aluno

não se interessa?

11 Quais os alunos da sua sala de aula que você considera desinteressados e por quê?

198

12 Você aponta que o pró-letramento além de trazer conhecimentos sobre os eixos (1)

compreensão e valorização da cultura escrita; (2) apropriação do sistema de escrita; (3)

leitura; (4) produção de textos escritos; (5) desenvolvimento da oralidade; também te deu

uma noção sobre a organização do trabalho, não é? Mas como você organiza o trabalho

com a produção? Você segue uma sequência de atividades? Como é isso?

13 No decorrer das observações, percebi que você trabalhou com texto narrativo, música,

bilhete, história em quadrinho, história sequenciada, poesia, fábulas, listas. Qual o motivo

da escolha desses gêneros?

14 Você acha que os alunos estranharam a minha presença na sala? Houve alguma mudança

de comportamento deles ou não? Explique:

15 O fato de eu ter um dia específico para vir à escola nas observações em sala, fez com que

o trabalho com a produção textual se modificasse, ampliasse ou reduzisse?

16 Percebi que o caderno de produção de texto é separado do caderno de atividades de

português, por quê?

17 Observei que você corrige todas ou a maioria das palavras escritas de forma diferente da

norma padrão, ortografia, principalmente. Você faz isso desde a primeira fase? Qual seria

seu critério para essas correções? Por quê?

199

APÊNDICE E – Roteiro da Entrevista Final com a Professora Carina (3ª Fase 1º Ciclo)

1 Pela sua fala anterior e relembrando a sua formação inicial (magistério) você me disse que

naquela época não tinha outra opção a não ser escolher o magistério (para as mulheres) ou

contabilidade (para os homens). No seu caso, penso que as coisas foram acontecendo, sua

família tem um histórico de profissionais da educação (mãe, tios, tias, etc.), mas, se você

pudesse optar por outra profissão, qual seria?

2 O que você pensa a respeito dessa profissão: ser professor?

3 E para ser professor, o que é preciso?

4 Você acompanha a sua turma desde a primeira fase, por uma determinação da escola, ou

seja, foi a escola que propôs essa organização do trabalho devido ao ciclo de formação

humana, correto? Você concorda com essa organização, ou acha que seria melhor escolher

uma fase específica, com a qual você se identificasse mais?

5 Você me informou que não usa nenhuma cartilha, não segue nenhum livro. De onde você

busca material pedagógico para subsidiar sua prática?

6 Você ainda segue algumas cartilhas para a elaboração de seus planos?

7 Outra coisa que você me disse é que se utiliza de vários métodos para alfabetizar, que não

segue um apenas, mas, nesses seus dezesseis anos como professora alfabetizadora, qual o

método que você mais utilizou? Qual o método que você acredita que dá resultados mais

eficazes? Por quê?

8 Você disse que trabalha a alfabetização (codificação e decodificação) junto com o

letramento (função da escrita). Você acha que é possível fazer isso com todas as atividades

propostas em sala? De que forma?

9 Percebi que a leitura é feita regularmente, no início da aula, por uma das crianças, que

gostam muito de ler. Você que os incentiva? De que forma?

10 Quais os trabalhos que você desenvolve com a leitura e que dão bons resultados?

11 Com a sua participação nas formações continuada, você afirma ter modificado a sua prática

em sala de aula, que metodologia você adotou, ao longo de sua caminhada como

alfabetizadora, que contribuiu para a melhoria de sua prática? Aponte algumas:

12 Você coloca como situações que interferem na obtenção de bons resultados na

alfabetização a desestrutura social, familiar e a falta de interesse e de compromisso dos

pais. A que você atribuiria esse descompromisso por parte da família?

13 Com o Ensino Fundamental de 9 anos, crianças mais novas, de seis anos, chegam ao

primeiro ano? O que você acha dessa proposta?

200

14 Essas crianças precisam de um trabalho diferente? Qual seria?

15 Você aponta que o pró-letramento além de trazer novos conhecimentos, também te deu

uma noção sobre a organização do trabalho, a sequenciação de atividades, não é? Mas

como você organiza o trabalho com a produção? Você segue uma sequência de atividades?

Como é isso? Qual é o nome que você atribui a essa organização?

16 No decorrer das observações, percebi que você trabalhou com texto narrativo, bilhete,

cartas, textos informativos, poesia, fábulas, listas, cardápio, convites, etc.. Qual o motivo

da escolha desses gêneros? Quais os que você considera mais voltados para a primeira,

para a segunda e para a terceira fases? Existe alguma progressão ou não?

17 Você cita o trabalho coletivo na escola como um dos fatores que contribuíram muito na sua

prática como alfabetizadora, não é? Como é esse trabalho coletivo aqui em sua escola? Ele

ainda acontece? De que forma?

18 Você acha que os alunos estranharam a minha presença na sala? Houve alguma mudança

de comportamento deles ou não? Explique:

19 O fato de eu ter um dia específico para vir à escola nas observações em sala, fez com que

o trabalho com a produção textual se modificasse, ampliasse ou reduzisse?

20 Percebi que o caderno de produção de texto é separado do caderno de atividades de

português, por quê?

21 Observei que você corrige e reestrutura todos os textos dos alunos. Você faz isso desde a

primeira fase?

22 Quais e quantos alunos que apresentam dificuldades e quais são essas dificuldades?

23 Quais e quantos alunos você considera aptos ao segundo ciclo?