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MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
CAMPUS UNIVERSITÁRIO DE RONDONÓPOLIS
PROGRAMA DE PÓS GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
MESTRADO EM EDUCAÇÃO
MÁRCIA ORMONDE PORTELA DOS SANTOS
ALFABETIZAÇÃO E GÊNEROS TEXTUAIS: UMA ANÁLISE DAS PRÁTICAS
DOCENTES NO ÂMBITO DO PRÓ-LETRAMENTO DE MATO GROSSO
Rondonópolis - MT
2013
MÁRCIA ORMONDE PORTELA DOS SANTOS
ALFABETIZAÇÃO E GÊNEROS TEXTUAIS: UMA ANÁLISE DAS PRÁTICAS
DOCENTES NO ÂMBITO DO PRÓ-LETRAMENTO DE MATO GROSSO
Dissertação apresentada ao programa de Pós-
Graduação em Educação pela Universidade
Federal de Mato Grosso, Campus
Universitário de Rondonópolis, linha de
pesquisa Linguagens, Cultura e
Construção do Conhecimento, como
exigência para obtenção do título de Mestre
em Educação.
Orientadora: Profª Drª Cancionila
Janzkovski Cardoso
Rondonópolis - MT
2013
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
ISSN ?????????????
2011
Ficha catalográfica elaborada por Sheila Cristina Ferreira Gabriel
Bibliotecária – CRB1 1618
S237a
Santos, Márcia Ormonde Portela dos.
Alfabetização e gêneros textuais: uma análise das práticas docentes
no âmbito do pró-letramento de Mato Grosso / Márcia Ormonde
Portela dos Santos. – Rondonópolis, MT : UFMT, 2013.
202 f.
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação em
Educação da Universidade Federal de Mato Grosso, Campus
Rondonópolis, como requisito para obtenção do título de Mestre em
Educação.
Orientadora: Profª Drª Cancionila Janzkovski Cardoso.
1. Alfabetização. 2. Gêneros textuais. 3. Letramento. 4. Pró-
Letramento. I. Cardoso, Cancionila Janzkovski., orient. II. Título.
CDU 372.4
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
PRÓ-REITORIA DE ENSINO DE PÓS-GRADUAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO-RONDONÓPOLIS
Rodovia Rondonópolis-Guiratinga, km 06 MT-270 - Campus Universitário de Rondonópolis
Cep: 78735-901 - Rondonópolis/MT
FOLHA DE APROVAÇÃO
TÍTULO: "ALFABETIZAÇÃO E GÊNEROS TEXTUAIS: UMA ANÁLISE DAS
PRÁTICAS DOCENTES NO ÂMBITO DO PRÓ-LETRAMENTO DE
MATO GROSSO"
AUTORA: Mestranda Márcia Ormonde Portela dos Santos
Dissertação defendida e aprovada em 22/02/2013.
Composição da Banca Examinadora
Presidente da Banca/Orientadora: Doutora Cancionila Janzkovski Cardoso
Instituição: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
Examinador Interno: Doutora Lázara Nanci de Barros Amâncio
Instituição: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
Examinador Exterrno: Doutora Eliana Borges Correia de Albuquerque
Instituição: UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO
Examinador Suplente: Doutora Raquel Gonçalves Salgado
Instituição: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
Rondonópolis, 8 de março de 2013.
Para Carlos (in memoriam), irmão, amigo e
exemplo de vida.
Para Bruno e Thiago, filhos amados e
esperança de um futuro em construção.
AGRADECIMENTOS
A Deus e a Nossa Senhora Aparecida, por terem me dado ânimo, proteção, força e
determinação para superar os desafios e alcançar meus objetivos.
À professora Drª Cancionila Janzkovski Cardoso, exemplo de profissional apaixonada
e comprometida com a educação de qualidade, pela orientação competente, paciente e
compreensiva. Verdadeira Mestra, que sempre me auxiliou, apontando caminhos e me
incentivando com palavras encorajadoras.
Às minhas irmãs: Arlete e Marta, professoras alfabetizadoras competentes e dedicadas,
por acreditarem no meu potencial e me incentivarem na conclusão desta dissertação.
Aos demais irmãos, cunhadas e cunhados, que sempre estiveram presentes em minha
vida partilhando momentos de alegrias e tristezas.
Aos meus pais Moisés e Maria, e em especial, à minha mãe, por sua força e dedicação,
sempre preocupada com a educação de seus nove filhos e, mesmo com todas as dificuldades,
cuidou para que todos tivessem acesso à educação e ao conhecimento.
Ao meu esposo e companheiro Antonio Carlos, que sempre me compreendeu e me
incentivou a alcançar meus objetivos.
À minha sogra Orlanda, por sempre estar presente, cuidando dos meus filhos, com
amor e carinho, nos momentos de minha ausência.
À minha amiga Valderis, pela amizade, carinho e afeto, que desde o início desta
caminhada, sempre esteve disposta a ajudar.
A todos os professores do Programa de Pós-Graduação em Educação, que com
competência, entusiasmo e carisma, conduziram as disciplinas do Mestrado e proporcionaram
momentos ímpares de aprendizagem, contribuindo de forma efetiva, para minha formação.
Aos meus colegas do mestrado, pelos debates calorosos e por momentos de
significativas aprendizagens, em especial à Jane Íris, Sílvia, Rosana, Anabela e Sheila, que,
não pelo acaso, mas, pela escolha do coração, podem ser chamadas de amigas.
À Banca examinadora: Drª Eliana Borges Correia de Albuquerque, Drª Lázara Nanci
de Barros Amâncio e Drª Raquel Gonçalves Salgado pelas valiosas sugestões e contribuições,
que possibilitaram a conclusão desta dissertação.
A Anabel de Col, secretária do PPGEdu, pela disposição em esclarecer dúvidas, pela
amizade e pelo carinho que sempre dispensou a todos nós, mestrandos.
À tutora do Programa Pró-Letramento do município de Rondonópolis, Dulcilene
Rodrigues Fernandes, pela receptividade e disposição em contribuir com a pesquisa.
Aos diretores, coordenadoras e funcionários das escolas municipais: Rosalino Antônio
da Silva e José Antônio da Silva, por permitirem minha entrada nas escolas, disponibilizando
os elementos necessários para a coleta de dados.
A Marisa Inês Brescovici Araújo, pelo incentivo e por estar sempre disposta a me
ouvir nos momentos de angústia, apontando caminhos e sugerindo leituras.
À amiga Rosilene, por ter compartilhado sua experiência, enquanto mestranda, e me
incentivado a ingressar no mestrado para, assim, aprofundar meus conhecimentos.
Às professoras alfabetizadoras, sujeitos dessa pesquisa, que aceitaram meu convite e
me receberam com carinho em suas salas de aula, contribuindo de forma direta para a
concretização desta pesquisa. A vocês, meu respeito e admiração.
Às crianças, pelas produções textuais desenvolvidas e disponibilizadas para a análise.
Enfim, a todos que de forma direta ou indireta contribuíram para a realização desta
pesquisa, muito obrigada!
RESUMO
Esta pesquisa partiu da preocupação com a relação entre a formação continuada de
professores e o acréscimo de novas metodologias no trabalho em sala de aula, mais
especificamente na alfabetização. Teve como principal objetivo investigar se o programa de
formação continuada de professores dos anos iniciais, Pró-Letramento, implantado pelo MEC
em 2005, com adesão da rede municipal de ensino da cidade de Rondonópolis/MT, no ano de
2010, tem contribuído de forma efetiva para o acréscimo de novas metodologias nas práticas
docentes, notadamente para o trabalho com os gêneros textuais na alfabetização. O quadro
teórico dessa investigação envolve os conceitos de alfabetização e letramento na perspectiva
de Soares (2000; 2004; 2006), Kleiman (2008), Cardoso (2000; 2003; 2008) Mortatti (2004),
entre outros, bem como nas concepções de linguagem, na perspectiva da teoria dos gêneros de
Bakhtin (1997; 2010), e nas releituras didáticas do tema, por teóricos como Dolz e Schneuwly
(2004), Marcuschi ([2002]; 2005; 2008;). A pesquisa apresenta como procedimentos
metodológicos, a análise qualitativa dos dados, com base na pesquisa de tipo etnográfica.
Nesta vertente, de acordo com André (1995), o pesquisador deve aproximar-se das pessoas,
do local, das situações por um determinado tempo a fim de manter contato direto com o
objeto de estudo. Além disso, a descrição do ambiente, dos depoimentos, dos diálogos é uma
característica deste tipo de pesquisa, sendo que os dados coletados devem ser reconstruídos
em forma de palavras ou transcrições literais dos depoimentos, dos diálogos e das entrevistas.
Nesse intuito, a pesquisa de campo se estendeu durante o segundo semestre de 2011, com a
observação das aulas de três sujeitos de pesquisa, professoras alfabetizadoras, que
participaram do curso de formação continuada Pró-Letramento no ano de 2010, oferecido pela
Secretaria Municipal de Educação, sendo uma da primeira, outra da segunda e outra da
terceira fase do primeiro ciclo, respectivamente. Além das observações de aulas, foram feitas
entrevistas semiestruturadas, inicial e final, e análise documental, a fim de captar a dinâmica
da prática pedagógica e estabelecer relações entre as orientações do programa Pró-Letramento
e o trabalho com a escrita, desenvolvido pelos sujeitos da pesquisa, no tocante à temática dos
gêneros textuais. A análise das entrevistas realizadas possibilita afirmar que as professoras
consideram o Programa Pró-Letramento, e outros direcionados aos professores
alfabetizadores, de fundamental importância para a melhoria de qualidade na educação. Além
disso, as professoras deixam transparecer, em suas práticas, procedimentos didáticos que
estão intimamente relacionados às orientações contidas no material do Programa Pró-
Letramento, as quais sugerem ao alfabetizador um trabalho mais significativo com o uso da
língua em situações reais, características do letramento, materializadas por meio de atividades
com os gêneros textuais. Outro aspecto a ser ressaltado é que existe uma variedade de gêneros
textuais que circulam nas salas de alfabetização observadas, com uma progressão crescente
em termos de quantidade, da primeira para a terceira fase, porém, a forma como este processo
é conduzido depende de fatores internos da escola (projetos inseridos no Projeto Político
Pedagógico de cada unidade), aliados aos saberes docentes individuais.
Palavras-chave: Alfabetização. Gêneros textuais. Programa Pró-Letramento.
ABSTRACT
This research started with the concern related to teachers’ continuing education and the
increase of new methodologies in the classroom work, more specifically in literacy. Its main
goal, ProLiteracy, implemented by MEC (Ministry of Education and Culture) in 2005, in
partnership with the municipal taeching network in the municipality of Rondonópolis, State of
Mato Grosso, in the year 2010, has effectively contributed for the increase of new
methodologies in the teachers’ pratices, mostly in their work with genres in literacy. The
theoretical framework of this study involves the concepts of literacy following the perspective
by Soares (2000; 2004; 2006), Kleiman (2008), Cardoso (2000; 2003; 2008), Mortatti (2004),
among others, as well as the conceptions of language in the perspective of genre theory by
Bakhtin (1997; 2010), and in the teaching reinterpretations of the theme by theoreticians such
as Dolz and Schneuwly (2004), Marcuschi ([2002]; 2005; 2008;). The research presents as
methodological procedures the qualitative analysis of the data, based on etnographical
research. Thus, according to André (1995), the researcher must approach people, places,
situations, for a limited time in order to keep direct contact with the object of study. Besides
that, the environment, testimonies, dialogues description are characteristic of this type of
research, and the data collected must be rebuilt as words and verbatim (literal transcription) of
the testimonies, dialogues and interviews. In that order, the field research lasted throughout
the second semester in 2011, with the observation of the classes by three research subjects,
literacy teachers, who joined the ProLiteracy continuing education training in 2010, offered
by the Municipal Education Board, and herein one subject who belongs to the first, another
one to the second and the other to the third phase or stage of the first cycle, respectively.
Besides the classes observation and semi structured interviews, initial and final ones,
document analyses were carried out, in order to catch the dynamics of the pedagogical
practice and establish relationships between the orientations of the ProLitercay program and
the work with writing, developed by the subjects of the research, related to the theme genres.
The interview analysis carried out enables us to say that the teachers consider the ProLitercay
Program, and some other programs designed for literacy teachers, of fundamental importance
for the improvement of quality in the educational field. Besides that, the teachers let show, in
their practices, teaching procedures that are intimately related to orientations that are part of
the material that belong to the ProLiteracy Program, which suggest to the literacy teacher a
more meaningful work with the use of the language in real situations, literacy-related,
materialized by means of activities with the genres. Another aspect to be highlighted is that
there is a variety of genres that are used in the observed literacy classrooms, with an
increasing progression in terms of quantity; from the first to the third phase or stage, however,
the way this process is carried out depends on internal factors of the school (projects inserted
in the PPP in every unity), along with teachers’ knowledge as individuals.
Keywords: Literacy. Genres. ProLiteracy Program.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 Produção de texto pelo Isaac, aluno da Profª Ana, 1ª fase do 1º ciclo 128
Figura 2 Produção de texto pela Vitória, aluna da Profª Ana, 1ª fase do 1º ciclo 128
Figura 3 Produção de texto pela Maria Eduarda, aluna da Profª Ana, 1ª fase do 1º ciclo 129
Figura 4 Produção de texto pelo Isaac, aluno da Profª Ana, 1ª fase do 1º ciclo 130
Figura 5 Escrita das vogais vogais - pelo Isaac, aluno da Profª Ana, 1º fase do 1º ciclo 136
Figura 6 Escrita dos encontros vocálicos - pelo Isaac, aluno da Profª Ana, 1º fase do 1º ciclo 136
Figura 7 Escrita de letras e sílabas - pelo Isaac, aluno da Profª Ana, 1º fase do 1º ciclo 137
Figura 8 Formação de palavras - pelo Isaac, aluno da Profª Ana, 1º fase do 1º ciclo 137
Figura 9 Atividade de formação de frases - pelo Isaac, aluno da Profª Ana, 1º fase do 1º
ciclo
137
Figura 10 Cartazes da sala da 1ª fase confeccionados pela Profª Ana, com as letras do alfabeto 138
Figura 11 Cartazes da sala da 1ª fase confeccionados pela Profª Ana, com as letras do
alfabeto e as famílias silábicas
139
Figura 12 Produção de bilhete pelo Luiz, aluno da Profª Bia, 2º fase 1º ciclo 147
Figura 13 Produção de bilhete pela Ana Paula, aluna da Profª Bia, 2º fase 1º ciclo 147
Figura 14 Produção de bilhete pela Esthefany, aluna da Profª Bia, 2º fase 1º ciclo 148
Figura 15 Produção de texto a partir de uma música memorizada, aluna Júlia da Profª Bia, 2º
fase 1º ciclo
149
Figura 16 Produção de texto a partir de uma música memorizada, aluna Adriane da Profª
Bia, 2º fase 1º ciclo
150
Figura 17 Cartaz com a oração da manhã exposto na sala da Profª Carina 155
Figura 18 Modelos de gêneros textuais expostos na sala da Profª Carina 155
Figura 19 Modelo de carta, exposto na sala da Profª Carina 163
Figura 20 Produção textual (carta) realizada pela Elisana, aluna da Profª Carina, 3º fase 1º
ciclo
164
Figura 21 Produção textual (carta) realizada pela Iasmim, aluna da Profª Carina, 3º fase 1º
ciclo
166
Figura 22 Produção textual (carta) realizada por Giovanna e Beatriz, alunas da Profª Carina,
3º fase 1º ciclo
166
Figura 23 Produção textual (carta) realizada pela Yasmin, aluna da Profª Carina, 3º fase 1º
ciclo
167
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 Turmas da escola José Antônio da Silva, ano letivo 2011 27
Quadro 2 Funções desempenhadas na Escola Municipal José Antônio da Silva e
quantidade de agentes por função, ano letivo 2011
28
Quadro 3 Funções desempenhadas na Escola Municipal Rosalino Antônio da Silva
e quantidade de agentes por função, ano letivo 2011
29
Quadro 4 Distribuição das turmas da escola Rosalino Antônio da Silva, por
modalidade e turnos, ano 2011
29
Quadro 5 Caracterização dos sujeitos da pesquisa 32
Quadro 6 Relação das observações realizadas em sala de aula por professora no
período de Agosto a dezembro de 2011
35
Quadro 7 Distribuição das entrevistas por professora no período de agosto a
dezembro 2011
36
Quadro 8 Distribuição das Teses e Dissertações por área de conhecimento,
instituição e subtema encontrados com os descritores gêneros textuais
na alfabetização no período de 2005 a 2009
80
Quadro 9 Distribuição das Teses e Dissertações por instituição, metodologia,
instrumentos de pesquisa e subtema que versam sobre o programa Pró-
letramento no período 2005 a 2009
81
Quadro 10 Incidência dos vocábulos relacionados aos gêneros textuais nos
fascículos do Pró-Letramento (ano)
95
Quadro 11 Quadro das capacidades, conhecimentos e atitudes para a produção de
textos nos três primeiros anos do ensino fundamental.
96
Quadro 12 Propostas de produção textual que constam no material do programa
Pró-Letramento
97
Quadro 13 Atividades relativas aos gêneros textuais realizadas em aula pela Profª
Ana – 1º fase do 1º ciclo - no período de 05/agosto a 14/dezembro de
2011
1
127
Quadro 14 Incidência dos gêneros textuais trabalhados em sala de aula pela Prof ª
Ana – 1º fase do 1º ciclo no período de 05/agosto a 14/dezembro de
2011
1
127
Quadro 15 Cronograma de trabalho e exposição da produção textual da escola coordenado
pelas supervisoras Wilma e Marisa/2011
1
131
Quadro 16 Compreensão e valorização da cultura escrita do programa Pró-Letramento
133
Quadro 17 Relação das atividades desenvolvidas no caderno do aluno Isaac, no período de
22/02/2011 a 08/08/2011 (primeiro semestre)
1
135
Quadro 18 Atividades relativas aos gêneros textuais realizadas em aula pela Prof ª
Bia – 2º fase do 1º ciclo - no período de 09/agosto a 16/dezembro de
2011
1
142
Quadro 19 Incidência dos gêneros textuais trabalhados em sala de aula pela Prof ª
Bia – 2º fase do 1º ciclo no período de 09/agosto a 16/dezembro de
2011
1
142
Quadro 20 Relação das leituras realizadas pelos alunos e pela Prof ª Carina – 3º
fase do 1º ciclo no período de 09/agosto a 09/dezembro de 2011
1
156
Quadro 21 Relação das leituras realizadas pela Prof Carina – 3º fase do 1º ciclo
no período de 09/agosto a 09/dezembro de 2011
1
157
Quadro 22 Atividades relativas aos gêneros textuais realizadas em aula pela Prof
Carina – 3º fase do 1º ciclo - no período de 09 Ago a 09 Dez de 2011
1
158
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 Distribuição das dissertações nas áreas de Educação, Linguística e Letras com
os descritores gêneros textuais e produção escrita no período de 2005 a 2009
72
Tabela 2 Distribuição das teses nas áreas de Educação, Linguística e Letras com os
descritores gêneros textuais e produção escrita no período de 2005 a 2009
79
Tabela 3 Distribuição das teses e dissertações por ano sobre o programa Pró-letramento
no período 2005 a 2009
80
Tabela 4 Distribuição dos artigos em periódicos sobre gênero textual e Pró-Letramento
no período de 2005 a 2009
85
LISTA DE SIGLAS
CEALE Centro de Alfabetização, Leitura e Escrita da UFMG
CEEL Centro de Estudos em Educação e Linguagem da UFPE
CEFIEL Centro de Formação e Instituto da Linguagem da UNICAMP
CEFORM Centro de Formação Continuada de Professores da UnB
CEFORTEC Centro de Formação Continuada Desenvolvimento da Tecnologia e
Prestação de Serviços para as Redes Públicas de Ensino da UEPG
CEP Código de Endereçamento Postal
EaD Ensino a Distância
FNDE Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação
GESTAR Programa Gestão da Aprendizagem Escolar
HTPC Hora de Trabalho Pedagógico Coletivo
IBICT Instituto Brasileiro de Informação e Tecnologia
IDH Índice de Desenvolvimento Humano
INEP Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira
LDB Diretrizes e Bases da Educação Nacional
LM Língua Materna
MEC Ministério da Educação
NEES Necessidades Educacionais Especiais
OCDE Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico
PAR Plano de Ações Articuladas
PBA Programa Brasil Alfabetizado
PCN Parâmetros Curriculares Nacionais
PISA Programa Internacional de Avaliação dos Estudantes
PNLD Programa Nacional do Livro Didático
PPP Projeto Político Pedagógico
PROFA Programa de Professores Alfabetizadores
RNFC Rede Nacional de Formação Continuada de Professores da Educação Básica
SAEB Sistema de Avaliação da Educação Básica
SEB Secretaria de Educação Básica
SEMEC Secretaria Municipal de Educação e Cultura
UEPG Universidade Estadual de Ponta Grossa
UFAL Universidade Federal de Alagoas
UFES Universidade Federal do Espírito Santo
UFMG Universidade Federal de Minas Gerais
UFPB Universidade Federal de Paraíba
UFPE Universidade Federal de Pernambuco
UFS Universidade Federal de Sergipe
UFSCAR Universidade Federal de São Carlos
UnB Universidade Federal de Brasília
UNDIME União Nacional dos Dirigentes Municipais
UNICAMP Universidade Estadual de Campinas
UNIFESP Universidade Federal de São Paulo
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................. 16
2 ASPECTOS METODOLÓGICOS DA PESQUISA ......................................................... 21
2.1 Objetivos da pesquisa ................................................................................................ 21
2.2 Percurso metodológico: a abordagem qualitativa da pesquisa .................................. 24
2.3 O local da pesquisa .................................................................................................... 26
2.4 A busca pelos sujeitos da pesquisa ............................................................................ 30
2.5 Os sujeitos da pesquisa .............................................................................................. 32
2.6 Os instrumentos de coleta de dados ........................................................................... 34
3 CONCEPÇÕES TEÓRICAS DA PESQUISA .................................................................. 38
3.1 O dialogismo e o interacionismo no processo de construção do pensamento ........... 38
3.2 Gêneros do discurso: conceituação ............................................................................ 42
3.3 Gêneros textuais e ensino: compreensão e funcionalidade ........................................ 44
3.4 Interação e aprendizagem .......................................................................................... 52
4 A ALFABETIZAÇÃO E SUA RELAÇÃO COM OS CONCEITOS DE LETRAMENTO
E GÊNEROS TEXTUAIS ................................................................................................. 55
4.1 Alfabetização, letramento e gêneros textuais: usos e possibilidades da escrita ......... 55
4.2 O cenário da alfabetização no Brasil .......................................................................... 56
4.3 Alfabetização e letramento ......................................................................................... 58
4.4 O letramento e sua relação indissociável com os gêneros textuais ............................ 63
4.5 Contextualização histórica da produção de textos ..................................................... 68
4.6 O Pró-Letramento: uma das possibilidades para a melhoria da qualidade na Educação
Básica..........................................................................................................................73
5 PROGRAMA PRÓ-LETRAMENTO: O QUE SINALIZA O ESTADO DO
CONHECIMENTO ........................................................................................................... 75
5.1 Estado do conhecimento: detalhes de sua elaboração................................................ 75
5.2 Abordagem dos gêneros textuais nas pesquisas e no Pró-Letramento ...................... 77
5.3 O que indicam os periódicos? .................................................................................... 85
5.4 Delineando as pesquisas sobre o Pró-Letramento após 2009 .................................... 86
5.5 Descrição dos fascículos do Programa Pró-Letramento ............................................ 91
5.6 Abordagem da produção de textos e dos gêneros textuais no programa Pró-
Letramento: Análise documental ...............................................................................94
5.7 Formação docente: garantia de transformação da prática? ..................................... 103
6 OS GÊNEROS TEXTUAIS NAS PRÁTICAS DOCENTES: RELAÇÕES COM O
PROGRAMA PRÓ-LETRAMENTO ............................................................................. 107
6.1 A Formação continuada e o Programa Pró-Letramento sob a ótica dos sujeitos de
pesquisa ................................................................................................................... 107
6.2 O Ensino Fundamental de nove anos: o que mudou? .............................................. 114
6.3 A prática pedagógica das docentes pesquisadas ....................................................... 123
6.3.1 A prática da professora Ana – 1ª fase ..................................................................... 123
6.3.2 A prática da professora Bia – 2ª fase ...................................................................... 140
6.3.3 A Prática da professora Carina – 3ª fase ............................................................... 153
6.3.4 Sintetizando algumas percepções .......................................................................... 172
CONSIDERAÇÕES ............................................................................................................... 177
REFERÊNCIAS ............. ........................................................................................................182
APÊNDICES ................. .........................................................................................................189
16
1 INTRODUÇÃO
Seria realmente impensável que um ser assim, “programado para aprender”,
inacabado, mas consciente de seu inacabamento, por isso mesmo em
permanente busca, indagador, curioso em torno de si e de si no e com o
mundo e com os outros; porque histórico, preocupado sempre com o
amanhã, não se achasse, como condição necessária para estar sendo,
inserido, ingênua ou criticamente, num incessante processo de formação.
(FREIRE, 2001, p.12).
Esta pesquisa pretende ampliar as discussões a respeito da formação continuada e sua
relação com as práticas pedagógicas de professores alfabetizadores, notadamente no processo
de alfabetização, letramento e sua materialização por meio dos gêneros textuais.
A presente proposta de pesquisa surgiu a partir de reflexões realizadas sobre minha
prática como professora alfabetizadora, visto que, desde que iniciei minha caminhada como
docente, percebo a necessidade de buscar novas formas de ensinar, novas metodologias de
trabalho e novas formas de compreender como a criança aprende.
Ao terminar o magistério na escola Sagrado Coração de Jesus, em 1991, tive a
necessidade de ingressar no mercado de trabalho iniciando minha carreira como professora
alfabetizadora, em 1992, numa escola particular, no município de Rondonópolis – MT.
Mesmo trabalhando, continuei meus estudos e cursei Letras pela UFMT, concluindo o curso
em 1995. Neste período, após realização de concurso em 1994, ingressei como professora
alfabetizadora numa unidade municipal. Como é muito comum, os professores inexperientes e
novatos, ao chegarem às escolas não possuem poder de escolha e as turmas que “sobram” são
destinadas aos que chegam. Assim, iniciei o ano com uma turma de alfabetização (1ª série).
Muitas dúvidas se faziam presentes no meu fazer pedagógico: como ensinar a ler e a escrever?
Que métodos utilizar? Como agir frente a uma turma de crianças com ritmos diferentes de
aprendizagem? Quais as orientações a seguir? Neste período, confesso que a troca e a
interação com as colegas mais experientes foram decisivas para este início de carreira.
Porém, apenas a prática não era suficiente para me constituir enquanto alfabetizadora,
pois ainda tinha muitas dúvidas e insegurança a respeito dos métodos de alfabetização e das
dificuldades de aprendizagem das crianças. A preocupação com um ensino interessante e
significativo sempre fez parte das minhas inquietações. Participei de muitos cursos de
formação continuada ministrados pela secretaria de educação de nosso município com essa
expectativa.
17
Em 2000, ingressei, por meio de concurso, na rede estadual de educação como
professora de Língua Portuguesa e, mediante a participação em vários cursos de formação
continuada, percebi que o trabalho com os gêneros textuais chamava a atenção dos alunos e
tornava o ensino de língua materna mais significativo. Dessa forma, por sentir necessidade de
aprofundar meus conhecimentos a respeito deste tema, foi que me senti estimulada a realizar a
pesquisa de mestrado dentro da perspectiva dos gêneros textuais, sempre buscando superar os
desafios da prática.
Hoje, os meios de comunicação em massa, como a televisão, o rádio, a internet e
demais aparelhos eletrônicos existentes em nossa sociedade fazem com que as crianças
exijam muito mais da escola. Não se pode mais coagir o aluno e levá-lo a aprender a “ferro e
fogo”, é preciso cativá-lo, motivá-lo, persuadi-lo através de metodologias prazerosas e que
venham ao encontro de suas expectativas. Difícil? Com certeza. Trabalhoso? Não podemos
negar, porém necessário.
Além disso, pensar em educação pressupõe a análise do meio social em que vivemos e
nos faz refletir sobre a desigualdade social existente em nosso país. Desigualdade esta que se
reflete também, e principalmente, na escola pública.
Ao adentrarmos nas dependências de uma escola pública, verificamos que o
investimento na educação de qualidade para a classe trabalhadora ainda está longe de
acontecer. Infelizmente, vivemos uma época em que existe um desânimo latente na classe dos
profissionais desta área. Muitos não compreendem a importância do seu papel social e
acabam oferecendo o mínimo possível para seus alunos em termos de conhecimento,
contribuindo para a reprodução da desigualdade social.
O professor precisa ter clareza do seu papel enquanto educador e agente transformador
da realidade social em que vive. Para isso, faz-se necessário uma autorreflexão no sentido de
compreender e repensar constantemente sobre a sua prática. É preciso que a busca pela
formação profissional seja constante, a fim de proporcionar aos seus alunos uma educação de
qualidade.
A consciência do mundo e a consciência de si como ser inacabado
necessariamente inscrevem o ser consciente de sua inconclusão num
permanente movimento de busca. Na verdade, seria uma contradição se,
inacabado e consciente do inacabamento, o ser humano não se inserisse em
tal movimento. (FREIRE, 1996, p. 57).
18
Quando falamos em formação profissional, é preciso pensar como Paulo Freire, que
afirma que o ser humano é inacabado e inconcluso. Outrossim, acredito que devemos estar
sempre em busca de conhecimentos que nos capacitem para a atuação em sala de aula.
O professor é um edificador de pontes, é ele o responsável pela elevação do nível
intelectual do aluno, e, sendo assim, é papel do educador levar o aluno a pensar, a descobrir e
a se tornar um sujeito autônomo e reflexivo.
Um dos primeiros passos para a conquista da autonomia do ser humano pela educação
é a alfabetização. Esta, compreendida aqui no seu sentido mais amplo, não como simples
decodificação do sistema alfabético, mas sim de interação e utilização da leitura e da escrita
em situações sociais.
Dessa forma, percebo que o trabalho com os gêneros textuais, através da leitura e
escrita de vários portadores de textos, vinculados ao meio em que vivemos, propicia um maior
interesse por parte dos alunos e faz com que eles percebam e compreendam o porquê e o para
quê escrever. Além disso, sentem-se motivados expressando-se através da escrita, com
criatividade e desenvoltura de acordo com o que é proposto.
A partir da criação da Rede Nacional de Centros de Formação Continuada e
Desenvolvimento da Educação, incentivada e implantada pelo MEC, com a finalidade de
aprimorar a formação continuada de professores no Brasil, surgiram alguns cursos com a
finalidade de subsidiar professores alfabetizadores com novas metodologias de trabalho. Um
dos mais recentes é o programa Pró-Letramento, implantado pelo MEC em 2005, e
desenvolvido pela Secretaria Municipal de Educação e Cultura (SEMEC) de Rondonópolis –
MT no ano de 2010, com continuidade no ano subsequente. O Pró-Letramento define-se
como:
[...] um programa de formação continuada de professores para a melhoria da
qualidade de aprendizagem da leitura/escrita e matemática nos anos/séries
iniciais do ensino fundamental. O Programa será realizado pelo Ministério
da Educação (MEC), Universidades Parceiras e com adesão dos estados e
municípios. Podem participar todos os professores que estiverem em
exercício nos anos/séries iniciais do ensino fundamental das escolas
públicas.
O Pró-Letramento funcionará na modalidade semipresencial. Para isso,
utilizará material impresso e em vídeo e contará com atividades presenciais e
a distância, que serão acompanhadas por professores orientadores, também
chamados tutores. (MEC/SEB, 2012, p. 1).
Ao observar o material do Pró-Letramento, percebi que a metodologia e as orientações
do manual desse curso estão voltadas para o uso da escrita em situações reais, ou seja, as
19
orientações levam os participantes a refletirem que não basta apenas alfabetizar, mas também
letrar, evidenciando a necessidade de se trabalhar com os gêneros textuais.
Segundo Soares (2006, p.18) “Letramento é [...] o resultado da ação de ensinar ou de
aprender a ler e a escrever: o estado ou a condição que adquire um grupo social ou um
indivíduo como consequência de ter-se apropriado da escrita.” Ou seja, não basta apenas saber
codificar e decodificar letras, mas fazer uso da leitura e da escrita no dia-a-dia, assim, os
gêneros textuais se materializam no cotidiano através de vários portadores de textos, seja um
bilhete, uma notícia, uma receita, uma bula, um manual de instrução, etc. Tendo isso em vista,
o professor pode planejar seu trabalho no sentido de propiciar a seus educandos a
compreensão desse processo de letramento em consonância ao processo de alfabetização.
O trabalho com gêneros textuais nas escolas, de uma forma geral, ainda necessita de
aprofundamento e compreensão por parte do docente, principalmente nos anos iniciais de
alfabetização. Considero o trabalho com os gêneros textuais mais significativo para o aluno,
pois é através da contextualização da escrita no processo de alfabetização e letramento que o
educando será capaz de utilizar-se da escrita nos seus mais diversos contextos. A produção
escrita deve ter uma funcionalidade para que faça sentido, uma vez que
[...] os gêneros textuais são fenômenos históricos, profundamente vinculados
à vida cultural e social. Fruto de trabalho coletivo, os gêneros contribuem
para ordenar e estabilizar as atividades comunicativas do dia-a-dia. [...].
Caracterizam-se como eventos textuais altamente maleáveis dinâmicos e
plásticos. Surgem emparelhados a necessidades e atividades socioculturais,
bem como na relação com inovações tecnológicas, o que é facilmente
perceptível ao se considerar a quantidade de gêneros textuais hoje existentes
em relação a sociedades anteriores à comunicação escrita. (MARCUSCHI,
[2002], p. 1).
Assim, programas de formação continuada para professores alfabetizadores têm sido
implantados em todo o país no sentido de subsidiá-los com novas metodologias de trabalho.
Dessa forma, não se pode negar que as políticas de formação de professores e os programas
implantados pelo governo federal, através do MEC, oferecem subsídios aos professores para
desenvolverem um trabalho de qualidade com os alunos.
A problemática da pesquisa em questão evidencia a preocupação com a qualidade do
ensino no sentido de averiguar se o Programa Pró-letramento vem conseguindo, efetivamente,
acrescentar novas metodologias de trabalho nas salas de alfabetização, principalmente no
trabalho com os gêneros textuais.
20
O professor alfabetizador está realmente aberto a novas metodologias de trabalho? É
possível perceber esforços por parte dos professores em alfabetizar, letrando? A busca por um
ensino mais dinâmico e menos enfadonho, ligado às práticas sociais, está acontecendo
efetivamente ou isso ainda é utópico?
Para o desenvolvimento da pesquisa, optei por uma abordagem qualitativa, lançando
mão de instrumentos como entrevistas, conversas informais, observações de aula e análise de
documentos. Apresento, como sujeitos da pesquisa, três professoras das três primeiras fases
iniciais do Ensino Fundamental, de duas escolas municipais da cidade de Rondonópolis –
MT.
Para dar organização aos dados selecionados e analisados, esta dissertação foi dividida
em sete capítulos. No segundo capítulo demonstro o percurso realizado para delinear o objeto
de pesquisa, os objetivos, a opção metodológica, a escolha do local e dos sujeitos,
apresentando algumas características destes e a definição dos instrumentos apropriados para a
coleta de dados.
O terceiro capítulo foi dedicado a um estudo sobre o interacionismo e as concepções
de linguagem subjacentes aos pressupostos teóricos e filosóficos de Bakhtin (1997; 2010;) e
demais teóricos que compartilham de suas ideias, tais como Dolz e Schneuwly (2004) e
Marcuschi ([2002]; 2005; 2008).
O quarto capítulo traz algumas concepções teóricas sobre alfabetização e letramento à
luz de pensadores e educadores engajados com a pesquisa em educação são eles: Soares
(2000; 2004; 2006), Kleiman (2008), Cardoso (2000; 2003; 2008) Mortatti (2004), entre
outros.
No quinto capítulo encontra-se uma pesquisa do tipo estado do conhecimento sobre o
Programa de Formação Continuada, o Pró-Letramento, desde a sua implantação em 2005 até
2009, além de traçar um breve histórico sobre sua implantação.
O sexto capítulo traz a análise dos dados, com a abordagem da temática da formação
continuada e do Programa Pró-Letramento sob a ótica dos sujeitos desta pesquisa. Além
disso, analiso a presença dos gêneros textuais na prática pedagógica das professoras, à luz do
referencial teórico adotado, bem como procuro estabelecer relações do cotidiano escolar com
o programa Pró-Letramento.
Por fim, o sétimo capítulo será dedicado às considerações a respeito desta
investigação.
21
2 ASPECTOS METODOLÓGICOS DA PESQUISA
Ao iniciarmos um trabalho investigativo faz-se necessário que compreendamos clareza
da situação a ser analisada, evidenciando, ao leitor, os motivos que nos levaram a enveredar
pelos caminhos da pesquisa. Neste capítulo apresento os objetivos (geral e específicos), os
sujeitos e o local da pesquisa, bem como a opção metodológica que a sustenta.
2.1 Objetivos da pesquisa
Sabemos que o processo de desenvolvimento da escrita é algo que requer um trabalho
minucioso para a aquisição desta habilidade. O ensino da produção textual não é uma simples
adaptação de teorias aplicadas diretamente à escola. O objeto a ensinar e a aprender, a escrita,
é uma atividade complexa, que vai do gesto gráfico à organização e ao planejamento, que
envolve a textualização e a revisão, ou seja, escrever exige uma série de funções cognitivas
relacionadas à compreensão deste ato. Como afirmam Dolz, Gagnon e Decâncio (2010),
a escrita mobiliza múltiplos componentes cognitivos. É por isso que ela pode
ser considerada como uma atividade mental. Para escrever, o aprendiz
precisa de instrumentos sobre os conteúdos temáticos a abordar, mas
também de conhecimentos sobre a língua e sobre as convenções sociais que
caracterizam os textos a serem redigidos. (DOLZ; GAGNON; DECÂNCIO,
2010, p.15).
Ainda constatamos práticas de trabalho com a escrita que não levam em consideração
as hipóteses que o aluno tem sobre a representação gráfica da língua.
A escrita se torna mecânica baseada nas habilidades motoras, na cópia de palavras,
repetindo as sílabas trabalhadas. Assim, a escrita se torna artificial e inexpressiva, muitas
vezes, baseada em palavras soltas, as quais não formam uma unidade de sentido, tornando-se
algo enfadonho para o aluno, pois ele começa a compreender que o que ele sabe tem de ser
fragmentado para ser considerado correto.
Outro problema que ocorre neste ensino descontextualizado é o fato de não estabelecer
a relação entre a linguagem e o mundo, entre o autor e o leitor do texto. O aluno tem a
impressão que escrever é apenas exercitar a ortografia, classificar sílabas, encontros
vocálicos, dígrafos, deixando de produzir textos com coerência.
Escrever não pode ser uma tarefa improvisada, sem planejamento e sem revisão.
Escrever é algo que deve ter significado para o aluno, o qual deve compreender que a escrita
22
está voltada e interligada com o mundo que o cerca, com a realidade. Para isso é necessário
que o professor tenha essa clareza no momento de ensinar, que ele tenha segurança dos
objetivos a serem alcançados em sua prática pedagógica.
É preciso deixar de lado práticas de escrita somente como forma de exercício. Desde
os primeiros anos de alfabetização, o aluno precisa perceber que ele escreve para alguém, que
a sua escrita tem um leitor, um destinatário. Neste sentido, Bakhtin (2010, p. 117) afirma que:
“toda palavra comporta duas faces. Ela é determinada pelo fato de que procede de alguém [...]
é uma espécie de ponte lançada entre mim e os outros”.
O que a escola e o ensino de língua materna proporcionam ao educando é a
materialização da escrita muitas vezes de forma mecânica e desvinculada da realidade.
Vigotsky (2007), em um dos seus estudos sobre a linguagem, afirma que:
até agora a escrita ocupou um lugar muito estreito na prática escolar, em
relação ao papel fundamental que ela desempenha no desenvolvimento
cultural da criança. Ensinam-se as crianças a desenhar letras e construir
palavras com elas, mas não se ensina a linguagem escrita. Enfatiza-se de tal
forma a mecânica de ler o que está escrito que se acaba obscurecendo a
linguagem escrita como tal. (VIGOTSKI, 2007, p. 125).
Nesse sentido nos perguntamos: qual o nosso papel enquanto professores e
professoras? O que fazer para tornar o ensino de língua portuguesa algo mais prazeroso e
compreensível para o aluno? Qual o melhor caminho a seguir?
Existe um esforço evidente em tornar o ensino de língua materna mais significativo e
mais contextualizado, o que caracteriza a alfabetização em consonância com o letramento,
porém, é fato, que nos deparamos ainda, com práticas de trabalho com a escrita que não
levam em consideração as práticas sociais do seu uso, pois são descontextualizadas e
abstratas. Escrever é algo que deve ter significado para o aluno, o qual deve compreender que
a escrita está voltada e interligada com o mundo que o cerca, com a realidade. Para isso, é
necessário que o professor sinta-se seguro no momento de ensinar, que saiba os objetivos a
serem alcançados em sua prática pedagógica. Para Antunes,
a evidência de que as línguas só existem para promover a interação entre as
pessoas nos leva a admitir que somente uma concepção interacionista da
linguagem, eminentemente funcional e contextualizada, pode de forma
ampla e legítima, fundamentar um ensino de língua que seja individual e
socialmente produtivo e relevante. (ANTUNES, 2003, p. 52).
23
Para que haja comunicação é necessário interação e por isso o professor esclarecer o
que ele pretende do aluno, quais suas intenções com a escrita. Escrever para quem? Quem é o
outro? Qual é a finalidade da interação com o outro?
A escrita cumpre funções comunicativas específicas e relevantes em cada contexto de
comunicação, seja no trabalho, na família, na vida social em geral. Assim, ela cumpre um
papel importantíssimo, e quem escreve deve desempenhar essa função. Através da escrita,
somos capazes de informar, advertir, anunciar, descrever, explicar, opinar, registrar e divulgar
conhecimentos.
Dessa forma, a pesquisa foi desenvolvida no âmbito da linguagem buscando verificar
quais os suportes que o professor alfabetizador utiliza em sala de aula para tornar o ensino de
língua materna mais significativo para o educando.
A rede municipal de ensino de Rondonópolis – MT vem investindo na formação do
professor alfabetizador através de cursos oferecidos pela Secretaria Municipal de Educação e
Cultura (SEMEC) (Programa Gestão da Aprendizagem Escolar (GESTAR) de Língua
Portuguesa, Programa de Professores Alfabetizadores (PROFA), etc.). O curso mais recente é
o Pró-letramento, implantado em 2010, com a segunda etapa em 2011. Sua metodologia está
voltada para o desenvolvimento do letramento que, segundo Soares (2004), trata-se do uso do
sistema da escrita em atividades de leitura e escrita, nas práticas sociais. Ou seja, não basta
apenas ser alfabetizado, mas também saber se expressar de forma autônoma, de acordo com
as exigências, com a situação, com o contexto e com a necessidade das práticas sociais. Nessa
perspectiva, penso que o trabalho com os gêneros textuais nos anos iniciais de alfabetização é
imprescindível para o desenvolvimento das capacidades de expressões orais e escritas do
aluno.
Pretendo, então, fazer uma análise sobre as práticas de três professoras alfabetizadoras,
sendo uma da primeira, outra da segunda e outra da terceira fase do primeiro ciclo,
respectivamente, que participaram desse programa no ano de 2010, observando se as
metodologias utilizadas durante as aulas de produção textual apresentam indícios de
letramento.
Objetivo, assim, responder à seguinte questão da pesquisa: O programa de formação
continuada, Pró-Letramento, implantado pela SEMEC de Rondonópolis – MT, tem
contribuído para a mudança metodológica do professor no que se refere ao trabalho com os
gêneros textuais?
Diante do exposto, o objetivo principal dessa pesquisa é investigar se o programa de
formação continuada de professores dos anos iniciais, Pró-Letramento, implantado na rede
24
municipal de ensino da cidade de Rondonópolis – MT, tem contribuído de forma efetiva para
o acréscimo de novas metodologias na prática docente, notadamente para o trabalho com os
gêneros textuais, os quais privilegiam o uso da língua nos seus aspectos social, interacional e
funcional.
A partir deste objetivo principal seguem-se os específicos:
a) Analisar o material oferecido pelo Programa Pró-Letramento, com vistas a
verificar se e como os gêneros textuais são abordados e quais metodologias são
sugeridas para o trabalho desse conteúdo em sala de aula;
b) Observar de que maneiras os gêneros textuais vêm sendo explorados em sala de
aula pelas professoras alfabetizadoras no primeiro ciclo do ensino fundamental.
c) Averiguar se o programa Pró-Letramento está sendo significativo, no que diz
respeito ao acréscimo de novas metodologias no trabalho dos professores em sala
de aula.
2.2 Percurso metodológico: a abordagem qualitativa da pesquisa
O campo a ser investigado nesta pesquisa é o universo escolar e a sala de aula, bem
como as práticas que se desenvolvem em seu interior. Dessa forma, acredito que se faz
necessária a abordagem qualitativa como metodologia adequada para responder às questões
desta investigação. Bogdan e Biklen (1994) discutem o conceito de pesquisa qualitativa e
propõem fundamentos e utilização desse tipo de pesquisa em educação, mediante a
explicitação do seu percurso, métodos e bases teóricas.
Devido à complexidade e ao dinamismo do cotidiano escolar, é possível afirmar que a
abordagem qualitativa de análise é fundamental para a compreensão do significado que o
sujeito confere às suas ações e à realidade que o cerca. O pesquisador, neste tipo de
abordagem, aproxima-se das pessoas para coletar dados por meio da observação participante,
entrevistas e registros em diário de campo. É o que a pesquisadora fez no decorrer do segundo
semestre de 2011, e, a partir dos dados coletados, tomou distanciamento subjetivo da
realidade investigada para poder analisá-la e melhor compreendê-la.
Gonzaga (2006, p. 70) salienta que a pesquisa do tipo qualitativa “permite extrair
dados da realidade com o fim de serem contrastados a partir do prisma do método”. Além de
possibilitar a realização de exames cruzados com os dados obtidos, angariar informação por
meio do processo de triangulação, sem, no entanto, perder a flexibilidade.
25
Neste tipo de pesquisa, o pesquisador observa o cenário e as pessoas numa perspectiva
holística, ou seja, procura compreendê-las levando-se em consideração o contexto do passado
e a situação atual, na qual os sujeitos estão inseridos. O pesquisador qualitativo observa,
também, a influência que ele causa sobre as pessoas e os objetos estudados. Dessa forma, faz-
se necessária a sensibilidade e a perspicácia do pesquisador no sentido de compreender como
e por que essa influência acontece.
Outro aspecto a ser ressaltado em relação ao pesquisador qualitativo é o seu
distanciamento do objeto em estudo, pois ele precisa afastar suas próprias crenças,
perspectivas e predisposições observando o fato como se ele estivesse ocorrendo pela
primeira vez. No caso desta pesquisa, a pesquisadora, em virtude de ser, também, professora,
alfabetizadora, e, ainda, sentir-se envolvida diretamente com o lócus de pesquisa, procurou
manter uma visão externa, pois se obrigou a olhar os dados de forma neutra sem permitir que
sua experiência e seu juízo de valores interferissem na análise dos dados.
Além dessas características elencadas, Gonzaga (2006) ressalta os aspectos da
pesquisa qualitativa ao observar que este tipo de abordagem é uma arte, no sentido de que o
pesquisador é um artífice e tende a criar seu próprio método. Seguindo alguns procedimentos
orientadores e nunca segue regras. Nesse sentido, “os métodos servem ao pesquisador; nunca
é o pesquisador escravo de um procedimento.” (GONZAGA, 2006, p. 75).
Nesse sentido, em termos metodológicos, optei pela pesquisa qualitativa, visto que
esse procedimento mostra-se adequado dentro das concepções apresentadas por Bogdan e
Biklen (1994) que concebem as metodologias de pesquisa qualitativas mais pertinentes ao
processo de pesquisa humana.
A pesquisa qualitativa permite a coleta de dados importantes para a compreensão das
experiências vivenciadas por alunos e professores. Cinco características básicas configuram a
pesquisa qualitativa, conforme Bogdan e Biklen (1994)
1 a fonte direta de dados é o ambiente natural, constituindo o investigador
o instrumento principal;
2 é de natureza descritiva[...] os dados recolhidos são em forma de
palavras e imagens, e não de número, o interesse está mais no processo,
do que simplesmente nos resultados ou produtos;
3 a análise dos dados se dá de forma indutiva [...] não se recolhem dados
ou provas com o objetivo de confirmar ou infirmar hipóteses
construídas previamente; ao invés disso, as abstrações são construídas à
medida que os dados particulares, que foram recolhidos, vão
agrupando;
4 o significado é de importância vital na obra qualitativa. (BOGDAN E
BIKLEN, 1994, p. 47-51).
26
O desafio que configura esse tipo de pesquisa consiste no trabalho detalhado das
informações obtidas sobre o objeto em questão. Vários são os métodos de pesquisa qualitativa
tais como: estudos de casos, investigação-ação, análise do discurso, biografias, pesquisa
participante, etnografia educativa, etnografia da comunicação, entre outras. Dessa forma, por
ser uma pesquisa de cunho qualitativo, lancei mão de alguns instrumentos da etnografia. Por
isso, essa investigação traz alguns elementos que se aproximam de pesquisas do tipo
etnográfico, tais como: entrevistas, observação, aproximação dos sujeitos por um período pré-
determinado, conversas informais com os sujeitos da pesquisa, e minientrevistas.
Nesta vertente, para responder à questão de pesquisa que norteia esta investigação
iniciei este estudo aproximando-me do ambiente escolar (duas escolas da Rede Municipal de
Ensino de Rondonópolis – MT) e dos sujeitos da pesquisa. Como estratégia de pesquisa,
utilizei-me de entrevistas semiestruturadas (inicial e final), de observação de aulas, coleta de
atividades dos alunos realizadas em sala durante as aulas de produção textual, bem como
conversas informais e minientrevistas sobre o trabalho da professora no cotidiano escolar.
2.3 O local da pesquisa
O campo de pesquisa para a realização deste estudo, como será mencionado no
próximo item, não foi escolhido, mas foi conquistado mediante conversa informal com a
tutora do programa Pró-Letramento, bem como com professoras que trabalham nas escolas
onde a pesquisa foi desenvolvida. Os sujeitos da pesquisa trabalham nessas escolas e
participaram do programa de formação continuada, o Pró-Letramento, no ano de 2010.
As duas escolas estão localizadas em bairros periféricos da cidade de Rondonópolis –
MT, e são próximas uma da outra, o que facilitou o trabalho da pesquisadora.
A escola municipal José Antônio da Silva está localizada na Vila Cardoso, possui uma
estrutura pequena, visto que o espaço em que a escola foi construída, devido a uma antiga
organização da infraestrutura da cidade, comporta, no espaço de apenas uma quadra: a escola,
um posto de saúde, uma creche, uma igreja e um centro comunitário. Desse modo, a escola
possui apenas sete salas de aula, funcionando nos dois turnos, atendendo um total de catorze
turmas. Essa escola não supre a necessidade do bairro, uma vez que os alunos, ao terminarem
o 5º ano, que corresponde à 2ª fase do 2º ciclo, são obrigados a procurar outros bairros para
dar continuidade aos seus estudos. Geralmente, os alunos são encaminhados pela direção para
a escola municipal de ensino fundamental Rosalino Antônio da Silva, por se tratar de uma
escola próxima e que atende todo o segundo ciclo.
27
Apesar de a escola ter um espaço físico bem pequeno (2.700 m², sendo 1.120,40m² de
área construída) e possuir salas de aula com um espaço reduzido, a mesma compreende sete
salas de aula, climatizadas, três salas administrativas (coordenação, direção, sala dos
professores), uma sala de recursos que atende os alunos portadores de Necessidades
Educacionais Especiais (NEES), uma biblioteca, reformada recentemente, ampliada e
climatizada. Esta possui um computador, uma televisão e um aparelho de DVD. É neste local,
também, que as professoras levam os alunos para assistirem vídeos e para as aulas de apoio.
A escola também conta com um laboratório de informática climatizado, com quinze
computadores, mesas de granito, com adaptação para alunos portadores de necessidades
especiais. Possui uma cozinha, com um pequeno depósito, mas não contém refeitório e a
merenda escolar é servida na sala de aula pelas merendeiras e ajudantes. O espaço externo é
pequeno e compreende uma quadra coberta para a realização das atividades de educação física
e um pequeno parque para atividades de recreação. Possui cinco banheiros (masculino e
feminino para professores e alunos e um banheiro para portadores de necessidades especiais).
Assim, é possível afirmar que a escola dispõe de um espaço físico favorável ao bom
desenvolvimento das capacidades cognitivas dos alunos.
A escola trabalha com ciclos de formação humana, sendo o ensino fundamental
dividido em três ciclos, e, cada ciclo, em três fases (Quadro 1). Atende, também, crianças com
cinco anos na pré-escola e, atualmente, faz a correspondência fase/ano devido à mudança do
ensino fundamental de oito para nove anos. As turmas atendidas pela escola estão assim
distribuídas:
Quadro 1: Turmas da escola José Antônio da Silva, ano letivo 2011
Período
matutino
1ª fase do
1º ciclo A
2ª fase do
1º ciclo A
3ª fase do
1º ciclo A
1ª fase do
2º ciclo A
1ª fase do
2º ciclo B
2ª fase do
2º ciclo A
2ª fase do
2º ciclo B
Período
vespertino Pré A Pré B
1ª fase do
1º ciclo B
1ª fase do
1º ciclo C
2ª fase do
1º ciclo B
2ª fase do
1º ciclo C
3ª fase do
1º ciclo B
Fonte: Elaborado com base no Projeto Político Pedagógico – PPP (2008).
A escola dispõe de uma equipe bem constituída, com professores qualificados que, em
sua maioria, possui pós-graduação. Vale ressaltar que o trabalho coletivo, nesta unidade
escolar, propiciou, em dois anos consecutivos, 2009 e 2011, o primeiro lugar no IDEB do
Município de Rondonópolis – MT, com o percentual de 5.8 e 6.31, respectivamente. É notório
que houve um crescimento em relação ao ano anterior e que, por esta classificação
(excelente), cumpriu a meta e pode ser vista como referência, pois está acima do que foi
proposto como meta para o município.
28
Afirmo, ainda, que a escola apresenta uma cultura escolar alicerçada, visto que o
diretor já está no cargo há mais de vinte anos e tem contado com o apoio da supervisora
durante todo esse tempo. A escola foi fundada em 1986 e registrada por meio do decreto de
criação nº 284/87 em 1987 e, desde a sua fundação, diretor e supervisora fazem parte da
equipe, e são, portanto, pioneiros da escola. As funções existentes na escola José Antônio da
Silva, no ano de 2011, estão demonstradas no Quadro 2.
Quadro 2: Funções desempenhadas na Escola Municipal José Antônio da Silva e quantidade de
agentes por função, ano letivo 2011
Função Quantidade
Agente administrativo 1
Auxiliares de serviços diversos 5
Diretor 1
Professoras
Pré-escola 2
14 I ciclo 8
II ciclo 4
Secretária 1
Supervisoras 2
Vigilantes 3
TOTAL 27
Fonte: Elaborado com base no Projeto Político Pedagógico (2008).
A segunda escola escolhida, e da qual fazem parte os sujeitos da pesquisa da 2ª e 3ª
fases do primeiro ciclo, é a Unidade Municipal Rosalino Antônio da Silva, localizada na Rua
Canindé, nº 1075, no bairro Jardim Iguassú, foi criada em 1982 com a finalidade de atender à
demanda educacional daquela região. De acordo com levantamento recente e que consta no
Projeto Político Pedagógico da escola (PPP, 2012), a maioria dos alunos é moradora do
próprio bairro e alguns de bairros adjacentes, como Lúcia Maggi I e II, Cidade Alta, Vila
Cardoso, Vila Poroxo, Jardim Rondônia e Nossa Senhora do Amparo.
No início a escola contava com apenas três salas de aula e, após várias ampliações e
reformas, atualmente possui vinte salas de aula (uma delas para atender crianças especiais,
contendo móveis e instrumentos específicos para essa clientela). Apresenta boa infraestrutura,
com dependências onde funcionam a sala dos professores, sala da coordenação, direção,
secretaria, biblioteca, cozinha, banheiro masculino e feminino para alunos e professores.
Dispõe, também, de um laboratório de informática climatizado que atende a alunos e
professores. O espaço externo é amplo e possui uma quadra esportiva para a prática de
29
educação física. Em 2011, ano em que esta pesquisa foi desenvolvida, a escola contava com
36 turmas e um quadro de funcionários de 66 agentes (Quadro 3).
Quadro 3: Funções desempenhadas na Escola Municipal Rosalino Antônio da Silva e quantidade de
agentes por função, ano letivo 2011
Função Quant.
Agente administrativo 2
Auxiliares de serviços diversos 15
Diretor 1
Professoras
Pré – escola 0
41 1º ciclo 20
2º e 3º ciclos 21
Secretária 1
Supervisoras 4
Vigilantes 2
TOTAL 66
Fonte: Elaborado com base no Projeto Político Pedagógico (2012).
A escola oferece o ensino fundamental de nove anos (Lei federal n.11.274 de 6 de
fevereiro de 2006) com o sistema de ensino organizado em ciclos de formação humana (1º, 2º
e 3º ciclos). Atende, atualmente, 1004 alunos, sendo 484 no período matutino e 520 no
período vespertino. Oferece, ainda, o segundo ciclo (1º e 2º agrupamentos) da educação
infantil (PPP, 2012). A distribuição das turmas, em 2011, ocorreu por período (Quadro 4).
Quadro 4: Distribuição das turmas da escola Rosalino Antônio da Silva, por modalidade e turnos,
ano 2011
Modalidade Turno (s) Nº turmas
Educação infantil Matutino/vespertino 8
Escola organizada por ciclos de formação humana I ciclo Matutino 11
Escola organizada por ciclos de formação humana II ciclo Matutino/vespertino 24
TOTAL 43
Fonte: Elaborado com base no PPP (2012).
Os professores dessa unidade escolar, em sua maioria, possuem pós-graduação, e
sendo, portanto, qualificados. Porém, a escola não atingiu a meta do IDEB para 2011,
mantendo-se em estado de Alerta, pois atingiu a classificação 4,7 nos anos iniciais e 4,1 nos
anos finais, ficando com índice abaixo do estipulado, que era de 4,9 para 2011. A diretora da
escola foi eleita no ano de 1998 e, até a data da pesquisa, permanecia no cargo.
30
2.4 A busca pelos sujeitos da pesquisa
Iniciei a pesquisa entrando em contato com a tutora do programa Pró-Letramento da
Secretaria Municipal de Educação, professora Dulcilene Rodrigues Fernandes, a qual trabalha
com a formação continuada de professores alfabetizadores no município de Rondonópolis –
MT desde o ano de 2000. Em 2010, foi formadora da primeira etapa do Programa Pró-
Letramento e em 2011, continuava ministrando o curso, nessa ocasião, com outra turma.
Busquei esse contato, na expectativa de que ela pudesse indicar algumas professoras
alfabetizadoras que estivessem dispostas a colaborar com a pesquisa.
Neste intuito, no dia trinta de junho, estive presente no curso Pró-Letramento na
Secretaria Municipal de Educação e Cultura, no período matutino. Na ocasião, a coordenadora
do curso me indicou algumas possibilidades de contato. Conversei, então, com a diretora
Solange, da escola Gildázia Sousa Pirozzi. Ela apontou-me algumas professoras que talvez
aceitassem a pesquisadora na sala de aula para fazer o trabalho de coleta de dados. Conversei
com três professoras que trabalham nesta escola, porém elas se recusaram a fazer parte da
pesquisa alegando que estavam com alunos muito indisciplinados em sala de aula e que a
presença de outra pessoa (pesquisadora) em sala, dificultaria o trabalho pedagógico delas.
Conversei com outras personagens deste encontro e percebi que encontrar pessoas
dispostas a colaborar com a pesquisa, não seria tarefa fácil, talvez por se sentirem invadidas,
vigiadas ou até mesmo constrangidas com a presença do pesquisador em sala de aula.
Assim, percebendo a dificuldade de encontrar os sujeitos de pesquisa, nesta segunda
etapa do curso Pró-Letramento e conversando com a professora Arlete, da escola Rosalino
Antônio da Silva, obtive a informação de que as professoras dessa escola fizeram o Pró-
Letramento no ano de 2010 e estavam trabalhando com as primeiras fases do primeiro ciclo.
Então, fui até a escola, conversei com a professora Carina1, da terceira fase, e com a
professora Bia, da segunda fase do primeiro ciclo, expliquei o objetivo da pesquisa e, a partir
deste primeiro contato, combinei que, assim que se iniciasse o segundo semestre,
começaríamos o trabalho de coleta de dados. Com a definição das professoras alfabetizadoras
da primeira e segunda fases, ainda faltava uma professora da primeira fase para completar o
trabalho. Assim, estive na escola José Antônio da Silva e conversei com a professora Ana, da
1 Optei por pseudônimos para me referir aos sujeitos da pesquisa. As professoras serão assim chamadas: Ana (1ª
fase do 1ºciclo), Bia (2ª fase do 1ºciclo) e Carina (3ª fase do 1ºciclo).
31
primeira fase do primeiro ciclo, que também participou do curso Pró-Letramento no ano de
2010. Ela se mostrou aberta e se dispôs a colaborar com a pesquisa.
No dia dois de agosto, quando se iniciou o segundo semestre, retornei às escolas
selecionadas e conversei com as professoras. Nesta ocasião, marcamos o dia da entrevista e
das observações em sala de aula. Assim, as observações foram realizadas durante todo o
segundo semestre nas terças-feiras: no primeiro horário (07:00h às 09:00h), na sala da
professora Carina e no segundo horário (09:30h às 11:00h), na sala da professora Bia.
Em contato com a professora Ana, da Escola Municipal José Antônio da Silva,
combinamos que a observação das aulas aconteceria todas as sextas feiras, no horário das
07:00h às 09:00h, que era o dia destinado ao trabalho com a produção textual. A partir deste
primeiro contato marcamos o dia para a entrevista inicial e esclarecemos o protocolo a ser
seguido nos momentos de observação e entrevistas:
a) Roteiros de entrevistas semiestruturadas, sendo um inicial (Apêndice A) e outro
final (Apêndices C, D e E), onde procurei depreender das respostas dos sujeitos de
pesquisa aspectos sobre: formação e experiência profissional, compreensão de
alfabetização e letramento, concepção de formação continuada, visão a respeito do
programa Pró-Letramento, metodologias utilizadas em sala para obtenção de bons
resultados na alfabetização.
b) Protocolos de Observação, por meio de relatórios narrativo-descritivos, escritos a
partir da observação do trabalho docente na sala de aula, constando de cabeçalho
com identificação, data, hora e linhas numeradas, nos quais procurei registrar o
maior número possível de dados considerados relevantes para a pesquisa.
c) Entrevista semiestruturada com a tutora do Programa Pró-Letramento do município
de Rondonópolis, Dulcilene Rodrigues Fernandes, com a finalidade de
compreender a dinâmica do curso, bem como análise dos seus relatórios mensais.
d) Conversas informais e minientrevistas2, as quais consistiam na explicitação dos
detalhes e nos encaminhamentos pedagógicos os quais aconteceram em momentos
nos quais a pesquisadora não estava presente em sala.
2 As minientrevistas aqui mencionadas são uma variante do que Cardoso (2008) denominou como entrevistas de
explicitação, as quais consistiam na exposição, por parte da criança da sua visão sobre o texto produzido, por
meio da interação oral. No caso desta pesquisa, devido à minha participação em eventos e congressos fora do
estado, para apresentação de trabalhos, não foi possível presenciar todas as aulas de produção de textos que
ocorreram durante o período que compreendeu esta pesquisa. Dessa forma, para não perder o fio condutor da
análise, após retornar desses compromissos, observei, nos cadernos dos alunos, todas as atividades escritas
realizadas em sala de aula e, de posse das atividades desenvolvidas, realizei minientrevistas de explicitação com
32
e) Pesquisa documental: busquei informações na proposta do Pró-Letramento, no
plano político e pedagógico da escola, nas atividades nos cadernos das crianças, e
nos documentos elaborados pela Secretaria Municipal de Educação - SEMEC.
2.5 Os sujeitos da pesquisa
Os sujeitos dessa pesquisa foram escolhidos mediante a participação no programa de
formação continuada Pró-Letramento, que, conforme já frisado, foi implantado pelo MEC em
2005 e teve a adesão da Secretaria Municipal de Educação de Rondonópolis - MT em 2010, e
continuidade em 2011. Trata-se de um curso voltado aos professores alfabetizadores que traz
contribuições no sentido de proporcionar um trabalho com a alfabetização sistematizado e
com objetivos claros, que tenham como princípio o alfabetizar letrando, ou seja, de acordo
com Rojo (2010), criando eventos de letramento que possam integrar os alunos a práticas de
leitura e escrita socialmente relevantes que estes ainda não dominam.
As personagens desta pesquisa estão caracterizadas no Quadro 5.
Quadro 5 - Caracterização dos sujeitos da pesquisa
Professora Ana Bia Carina
Formação
acadêmica
Letras; Especialização em
Língua Portuguesa
Pedagogia; Esp. em
Lazer e Recreação
Pedagogia; Esp. em
Metodologia de Ensino
Situação
funcional Efetiva Efetiva Efetiva
Idade Não informada 38 39
Experiência no
magistério 17 anos 17 anos 18 a 19 anos
Tempo nessa
escola 17 anos 17 anos 16 anos e meio
Fase em que atua 1ª fase do 1º ciclo 2ª fase do 1º ciclo 3ª fase do 1º ciclo
Fonte: Dados da pesquisa.
É notório que se trata de professoras que estão num mesmo patamar de formação e
situação funcional, são consideradas, neste caso, experientes, pois estão há cerca de dezessete
anos trabalhando com o ensino fundamental e com alfabetização. É possível afirmar que as
três professoras atuam em sala de aula por se identificarem com o trabalho pedagógico, visto
as professoras a fim de que elas esclarecessem-me qual o planejamento e as etapas seguidas para se chegar à
produção final.
33
que todas tiveram um ano de experiência na coordenação da escola, mas não se identificaram
com as responsabilidades do cargo. É o caso da professora Ana, que ficou um ano e meio na
coordenação e quis voltar para a sala de aula; da professora Bia, que passou um ano na
secretaria municipal de educação, mas não se identificou com a nova função e da professora
Carina, que, em 1998, assumiu provisoriamente a coordenação da escola por seis meses e não
gostou da experiência.
Ressalto aqui o tempo de serviço das professoras: as três possuem 17 anos de
experiência com a alfabetização no município de Rondonópolis. O momento histórico em que
elas estão coincide com o período de reorganização da SEMEC. A política de formação
continuada da secretaria de educação de Rondonópolis é uma conquista relativamente recente,
que, por esforços de uma equipe comprometida com a qualidade na educação, vem se
transformando no sentido de buscar uma melhoria substancial na educação de uma forma
geral.
Tive acesso ao documento da SEMEC intitulado Relato de uma caminhada, elaborado
por Cunha, Khun e Souza (2000), do qual é possível depreender uma série de transformações
pelas quais a secretaria passou no período de 1991 a 1999. Momento em que surge a
preocupação com uma nova concepção de escola, com a implantação do CBA (Ciclo Básico
de Alfabetização). Vários projetos foram implantados pela SEMEC, ao longo dos anos, no
intuito de propiciar a melhoria da qualidade na educação. A seguir, com base nas autoras, cito
alguns deles:
1998: Projeto Crescer Com Sucesso: com o objetivo de melhorar o processo ensino-
aprendizagem, implementando um processo de avaliação contínua e cumulativa de caráter
diagnóstico e formativo. Esse projeto tinha como objetivo maior a implantação da escola
organizada por ciclos. O que ocorreu, a princípio, em algumas escolas que dele participaram
reduziu em 50% o índice de reprovação e evasão do ano anterior.
1999: Implantação do sistema de ciclos em quatro escolas municipais.
1999: Projeto Todos Por Mim: programa de integração entre a secretaria de saúde e a
de educação com o objetivo de incluir todas as crianças numa política de educação para todos.
Neste ano, houve a realização do I seminário de saúde escolar, com palestras para pais,
educadores, técnicos, psicólogos, diretores sobre conceitos como distúrbios de aprendizagem,
fracasso escolar, integração e saúde.
2000: Curso de capacitação para todos os professores das primeiras séries e fases, a
fim de estudar a infância relacionada com as diferentes concepções, representações e
propostas pedagógicas com contribuições da Psicologia e da Alfabetização. Além disso,
34
houve a definição de um calendário de capacitação com o objetivo de fornecer subsídios ao
professor para a compreensão das mudanças na avaliação, com a implantação do caderno de
campo, do parecer descritivo e abolição da nota.
Nesse sentido, a política da SEMEC ressalta a importância de um ensino fundamental
inclusivo que promova o acesso e a permanência de todas as crianças na escola. Aconteceram
palestras nas comunidades escolares da rede, com o objetivo de divulgar informações sobre o
papel do pai e da mãe na educação dos filhos, ressaltando a importância do diálogo e do afeto.
Dessa forma, pelo cenário acima delineado, é possível afirmar que as professoras
participaram desse momento histórico que, de alguma forma, influenciou as práticas
desenvolvidas no interior da escola.
2.6 Os instrumentos de coleta de dados
Nessa etapa da pesquisa, a coleta de dados foi planejada conforme já explicitado
anteriormente, na sala da professora Bia e Carina todas as terças-feiras do segundo semestre
de 2011, sendo o primeiro horário destinado à coleta de dados na sala da professora Carina (3ª
fase do 1º ciclo) e o segundo horário na sala da professora Bia (2ª fase do 1º ciclo), horário
pontual para a produção de texto. A professora da 1ª fase, Ana, esclareceu-me que o trabalho
com a produção textual era feito todas as sextas-feiras, das 07:00h às 09:00 horas.
Dessa forma, interessada no trabalho com a produção de textos é que me adentrei nas
salas de aula no horário combinado.
As observações realizadas (Quadro 6) tiveram como objetivo principal verificar como
estava sendo desenvolvida a prática pedagógica com a produção textual, quais os recursos
utilizados pelas professoras e os gêneros textuais que circulam em sala. O enfoque maior
destas observações era como as professoras orientavam a produção de textos, se essa
atividade era prazerosa e como se dava esse processo de escrita.
Foram realizadas 90 horas de observação de aulas (Quadro 6) assim distribuídas:
a) 32 horas na sala da primeira fase, com início no dia 05/08/2011 e término no dia
14/12/2011.
b) 28 horas na sala da segunda fase, iniciando no dia 09/08/2011, com término no dia
16/12/2011.
c) 30 horas na terceira fase, sendo o início no dia 09/08/2011 e o final no dia 09/12/
2011.
35
Quadro 6: Relação das observações realizadas em sala de aula, por professora, no período de
Agosto a dezembro de 2011
Profª Ana - Escola A3 Profª Bia - Escola B
4 Profª Carina - Escola B
Protocolo Dia Horas Protocolo Dia Horas Protocolo Dia Horas
A1 05/ago 2 B1 09/ago 2 C1 09/ago 2
A2 12/ago 2 B2 23/ago 2 C2 23/ago 2
A3 26/ago 2 B3 05/set 2 C3 05/set 2
A4 09/set 2 B4 13/set 2 C4 13/set 2
A5 16/set 2 B5 20/set 2 C5 20/set 2
A6 23/set 2 B6 04/out 2 C6 04/out 2
A7 20/out 2 B7 13/out 2 C7 13/out 2
A8 12/nov 2 B8 18/out 2 C8 18/out 2
A9 18/nov 2 B9 20/nov 2 C9 29/nov 2
A10 25/nov 2 B10 29/nov 2 C10 07/dez 4
A11 02/dez 4 B11 15/dez 4 C11 08/dez 4
A12 13/dez 4 B12 16/dez 4 C12 09/dez 4
A13 14/dez 4 - - - - - -
TOTAL 13 32 12 28 12 30
Fonte: Dados da pesquisa.
É preciso esclarecer que não foi possível estar presente em todos os dias combinados,
devido aos feriados e à participação da pesquisadora em eventos e congressos, sendo
necessária a reposição dos dias faltosos, modificando alguns dias e, ao final das observações,
ampliando o horário que, a princípio, era de duas horas, para quatro horas (Quadro 6).
Como eu havia dito que observaria apenas as aulas de produção textual, as professoras
me perguntaram o porquê de ter que observar todas as aulas, então esclareci que era para que
eu tivesse um tempo maior para a coleta de dados e, como o ano letivo já estava acabando,
isso só seria possível se eu ficasse um tempo maior na sala. Expliquei às professoras que não
era preciso que elas modificassem o plano de aula traçado, ao que elas questionaram “mas
pode ser aula de qualquer disciplina?” e eu disse que sim, que estaria presente durante a aula,
para captar os dados relevantes e que me interessavam.
Levando-se em consideração o tempo em que estive na escola, aos poucos conquistei a
confiança dos alunos, pois quando era solicitada pela professora, colaborava auxiliando-os nas
atividades pedagógicas.
3 Escola A - Escola Municipal José Antônio da Silva.
4 Escola B - Escola Municipal Rosalino Antônio da Silva.
36
Foram feitas duas entrevistas (Quadro 7) com os sujeitos da pesquisa sendo uma
inicial, cujo roteiro encontra-se no Apêndice A, realizada no dia 15/08/2011 com as
professoras Bia e Carina da segunda e terceira fases do primeiro ciclo, e no dia 16/08/2011,
com a professora Ana da primeira fase do primeiro ciclo; e uma entrevista final nos dias: 19 e
20/12/2011, sendo que a professora da 1ª fase foi entrevistada no dia 19 (Apêndice C) e as
professoras da 2ª e 3ª fases, no dia 20 (apêndices D e E, respectivamente).
Quadro 7: Distribuição das entrevistas por professora no período de agosto a dezembro 2011
Professoras Entrevista inicial (2001a) Entrevista final (2011b)
Ana 16/ago 19/dez
Bia 15/ago 20/dez
Carina 15/ago 20/dez
Fonte: Dados da pesquisa.
A primeira entrevista serviu de base para a realização da segunda entrevista, no
sentido de procurar compreender a relação entre os cursos de formação continuada, a
trajetória dessas professoras e a prática pedagógica desenvolvida por elas, em sala de aula. Ao
todo, o tempo de gravação gira em torno de uma hora e vinte minutos na entrevista inicial e
uma hora e quarenta minutos na entrevista final. Essas gravações foram feitas na própria
escola, no horário destinado a Hora de Trabalho Pedagógico Coletivo (HTPC).
Após a entrevista, fiz a transcrição para arquivos de textos do Word, para leitura,
compreensão e análise das falas das professoras, procurando depreender dessas a importância
atribuída à formação continuada, ao programa Pró-Letramento, no sentido de verificar quais
as metodologias adotadas por elas a partir da participação das mesmas neste curso. Além
disso, nas entrevistas foram abordadas questões sobre método de ensino, uso de cartilhas,
compreensão das palavras alfabetização e letramento, bem como as dificuldades encontradas
na alfabetização das crianças, entre outros aspectos.
Além das entrevistas com as professoras, inicialmente, entrevistei a tutora (seguindo
roteiro constante no Apêndice B) que organiza o programa Pró-Letramento na SEMEC de
Rondonópolis – MT. Na oportunidade, procurei compreender melhor a dinâmica do curso e a
metodologia utilizada por ela no seu trabalho com a formação continuada.
Para que o leitor tenha uma visão ampla acerca das etapas de coleta de dados, a seguir
apresento um resumo dos passos dessa investigação:
1º- Orientação da professora Cancionila Janzkovski Cardoso, instigando e sugerindo a
pesquisa no campo da formação de professores alfabetizadores, o Pró-Letramento, visto que,
37
por ser uma das formadoras de tutores em nível nacional, sabe da importância desse
Programa, enquanto possibilidade de melhoria na qualidade da educação.
2º- Participação de um encontro (30/06/2011) na Secretaria de Educação do Município
de Rondonópolis - MT (SEMEC) e agendamento de entrevista com a tutora do programa.
3º- Entrevista com a tutora do programa.
4º- Procura pelos sujeitos de pesquisa, por meio de conversas informais com
professores da Rede.
5º- Reunião com as professoras sujeitos de pesquisa para agendamento da entrevista
inicial e esclarecimento do interesse da pesquisadora na perspectiva dos objetivos propostos
pelo projeto de pesquisa.
6º- Observação das aulas no período de agosto a dezembro de 2011, uma vez por
semana em cada sala, com protocolos de observação (narrativo/descritivo) e coleta de
atividades realizadas em sala.
7º- Entrevista final com os sujeitos de pesquisa.
Por estar envolvida com a pesquisa de campo, pude participar de alguns eventos
pedagógicos e culturais desenvolvidos pela escola, tais como: festa do dia das crianças, na
escola Rosalino Antônio da Silva e encerramento do projeto de escrita e comemoração dos 25
anos da escola José Antônio da Silva.
Nesse sentido, acredito que pelo trabalho realizado, pelo plano de estudo traçado, pelo
interesse e dedicação no desenvolver desta pesquisa, o detalhamento dos dados enriquecerá o
diálogo e trará discussões importantes para a questão de pesquisa que move esta investigação.
38
3 CONCEPÇÕES TEÓRICAS DA PESQUISA
No capítulo anterior apresentei o contexto em que se realizou esta pesquisa,
explicitando sua opção metodológica e os instrumentos de coleta de dados que asseguraram o
corpus para análise. A seguir, trago um estudo bibliográfico sobre a concepção de linguagem
adotada nesta pesquisa, com aprofundamento na teoria dos gêneros do discurso introduzida
por Bakhtin (1997; 2010) e ampliada por Marcuschi (2005) e Dolz e Schneuwly (2004).
3.1 O dialogismo e o interacionismo no processo de construção do pensamento
Sabemos que o processo de construção da produção de um texto não é um ato
involuntário, baseado na inspiração e no dom. O ato da escrita de um texto é algo que
envolve uma série de processos cognitivos que se baseiam em teorias complexas e que
merecem um aprofundamento maior para dar suporte ao trabalho desta pesquisa.
Buscando fundamentação teórica nos pressupostos filosóficos de Bakhtin, procurei
compreender as concepções de linguagem que o autor aborda e que perpassa este trabalho.
Uma das teorias defendidas por Bakhtin é o sóciointeracionismo que privilegia o contexto e
que defende que as informações por nós compreendidas provêm de experiências vivenciadas
pelos nossos corpos ao interagirem nos ambientes: físico, psíquico, cultural e social nos quais
nos situamos.
Nesta perspectiva sócio interacional, de acordo com Bakhtin (2010), o significado não
é inerente à linguagem, mas sim construído pelos participantes do discurso, que agem no
mundo através da linguagem. Nesse sentido, o discurso, a aprendizagem e a cognição são
entendidos como processos sociais e subjetivos.
Bakhtin, através da noção de dialogismo, advoga que cada voz é uma concepção de
mundo e que, das diferentes concepções, surge uma nova visão. Ou seja, o outro é concebido
como sujeito, com pensamentos próprios que são importantes para a construção de sentido
que emerge da síntese dialética de todas as vozes, dando origem ao que Bakhtin concebe
como polifonia. Para o autor, a produção das ideias, do pensamento, dos textos tem sempre
um caráter coletivo e social. Assim, é por meio das ideias do outro que o nosso próprio
pensamento é formado. O nosso pensamento é expresso por meio das palavras, dos signos e,
para Bakhtin (1997):
39
A palavra (e em geral, o signo) é interindividual. Tudo o que é dito,
expresso, situa-se fora da “alma”, fora do locutor, não lhe pertence com
exclusividade. Não se pode deixar a palavra para o locutor apenas. O autor
(o locutor) tem seus direitos imprescritíveis sobre a palavra, mas também o
ouvinte tem seus direitos, e todos aqueles cujas vozes soam na palavra têm
seus direitos (não existe palavra que não seja de alguém). A palavra é um
drama com três personagens (não é um dueto, mas um trio). E representado
fora do autor, e não se pode introjetá-lo (introjeção) no autor. (BAKHTIN,
1997, p. 350, grifo do autor).
Bakhtin sugere que o indivíduo deve apreender e construir a realidade a partir da
relação social com o outro e isso se dá por intermédio da linguagem, sendo que, dessa forma,
a produção do conhecimento, a cognição, é fundamentalmente um artefato social.
O autor elabora, ainda, o conceito da apropriação baseado na interlocução, ou seja, no
diálogo, pois os indivíduos se apropriam, internalizam, recriam ideias e conceitos de outros
através do contato social. O autor salienta que só há compreensão da língua dentro de um
contexto e de um meio social, mediada pela interação.
Assim “a enunciação é o produto da interação de dois indivíduos socialmente
organizados e, mesmo que não haja um interlocutor real, este pode ser substituído pelo
representante médio do grupo social ao qual pertence o locutor.” (BAKHTIN, 2010 p.116)
Percebemos, assim, que os conceitos de interação, dialogismo e apropriação estão
interligados por meio de uma noção semântica e que esses se indicam e se explicam
reciprocamente. É possível compreender que o centro organizador da enunciação não é
interior e subjetivo, mas está centrado no meio social que envolve o indivíduo.
De acordo com a perspectiva bakhtiniana, toda palavra vem de outrem, nasce na
interação interpessoal, dessa forma, toda ação de linguagem só toma forma e evolui sob o
prisma da interação contínua com os enunciados individuais do outro. Presentes, de maneira
dialógica em todo e qualquer discurso, manifestam-se os elementos ideológicos, históricos,
sociais e culturais que o sustentam. É por isso que:
[...] em toda enunciação, por mais insignificante que seja, renova-se sem
cessar essa síntese dialética viva entre o psíquico e o ideológico, entre a vida
interior e a vida exterior. Em todo ato de fala, a atividade mental subjetiva se
dissolve no fato objetivo da enunciação realizada, enquanto que a palavra
enunciada se subjetiva no ato de decodificação que deve, cedo ou tarde,
provocar uma codificação em forma de réplica. Sabemos que cada palavra se
apresenta como uma arena em miniatura onde se entrecruzam e lutam os
valores sociais de orientação contraditória. A palavra revela-se, no momento
de sua expressão, como o produto da interação viva das forças sociais. É
assim que o psiquismo e a ideologia se impregnam mutuamente no processo
único e objetivo das relações sociais. (BAKHTIN, 2010, p. 67).
40
Bakhtin considera e analisa o signo, ou seja, a palavra, em seu sentido ideológico. E,
por ser ideológico, o signo é dinâmico e passível de interpretações várias, pois aparece num
terreno interindividual entre homens organizados socialmente. Mas, para que um sistema de
signos se constitua, faz-se necessário que o meio social e ideológico dos indivíduos seja o
mesmo, para que se compreendam e formem um grupo.
O signo ideológico é pertencente tanto ao campo da ideologia, quanto do psiquismo,
pois o ser enquanto socialmente e ideologicamente constituído não está desprovido de
individualidade, ademais, por ser autor de seus pensamentos e detentor de seus desejos e
portador de uma consciência é que se pode afirmar que o mesmo apresenta-se como
fenômeno sócio ideológico. Bakhtin afirma que:
o conteúdo do psiquismo “individual” é, por natureza, tão social quanto a
ideologia e, por sua vez, a própria etapa em que o indivíduo se conscientiza
de sua individualidade e dos direitos que lhe pertencem é ideológica, história
e internamente condicionada por fatores sociológicos. Todo signo é social
por natureza, tanto o exterior quanto o interior. (BAKHTIN, 2010, p. 59 –
grifo do autor).
O autor faz uma análise a fim de distinguir o conceito do que é individual, natural e
isolado do mundo social e o conceito de individualidade que se apresenta como social, pois
se coloca acima do indivíduo. Na verdade, Bakhtin apresenta o conceito da palavra
individualidade em duas acepções: a individualidade natural e a personalidade. Assim, é
possível compreender que “Todo produto da ideologia leva consigo o selo da individualidade
do seu ou dos seus criadores, mas este próprio selo é tão social quanto todas as outras
particularidades e signos distintivos das manifestações ideológicas.” (BAKHTIN, 2010, p.
60).
Nessa perspectiva, é possível afirmar que o ser, o indivíduo, age de acordo com seu
pensamento, sua individualidade, sua forma de raciocinar, e é determinado e influenciado
pelo meio em que vive, com suas nuances históricas, culturais e sociais. Assim, nosso
pensamento pertence ao sistema ideológico e é subordinado a suas leis.
Bakhtin entende essa individualidade como introspecção e esta constitui um ato de
compreensão tendenciado ideologicamente pelo meio, por isso, pode-se afirmar que o
psiquismo e a ideologia não se separam, mas se impregnam mediados pelas relações sociais.
É nesse sentido que o pensamento, para ser exteriorizado e compreendido, passa pela
expressão, definida pelo teórico como “tudo aquilo que, tendo se formado e determinado de
41
alguma maneira no psiquismo do indivíduo, exterioriza-se objetivamente para outrem com a
ajuda de um código de signos exteriores.” (BAKHTIN, 2010, p. 115).
O autor afirma, ainda, que a expressão é formada por duas faces, o conteúdo, ou seja,
o que se forma através do psiquismo, da individualidade, e sua objetivação exterior que nada
mais é do que a materialização do pensamento para o outro ou para si mesmo, através de
algum código passível de compreensão exterior. Bakhtin afirma que, segundo a corrente do
subjetivismo individualista, a fonte da expressão está no interior, propõe-se assim um
dualismo entre expressão interior e exterior, com primazia da primeira. O filósofo, porém,
discorda dessa concepção afirmando que não há uma distinção qualitativa entre o conteúdo
interior e a expressão exterior, pois, para ele, “o centro organizador e formador não se situa
no interior, mas no exterior. Não é a atividade mental que organiza a expressão, mas, ao
contrário, é a expressão que organiza a atividade mental que a modela e determina sua
orientação.” (BAKHTIN, 2010, p. 116).
Assim, a situação social dinâmica, histórica e mutável é que redimensiona as nossas
formas de expressão, e esta não pode ser dissociada da relação com o outro, a que caracteriza
a interação. Um dos princípios colocados por Bakhtin é que a enunciação é o produto da
interação entre seres organizados socialmente.
A palavra é vista como um elo entre o locutor e o interlocutor, é por meio dela que
surge o princípio do dialogismo, da relação do homem com o outro, da interação
intermediada pelas relações sociais. Ou seja, a palavra poderá variar e/ou modificar em
função do interlocutor, se adequando às situações reais de produção. Bakhtin defende que “A
situação social mais imediata e o meio social mais amplo determinam completamente e, por
assim dizer, a partir do seu próprio interior, a estrutura da enunciação.” (BAKHTIN, 2010,
p.117).
Já a enunciação, para o autor, possui dois níveis de compreensão: tema e significação.
Entende-se por significação os elementos que são reiteráveis e idênticos em uma enunciação.
A significação de uma enunciação pode ser analisada concretamente observando seus
aspectos morfológicos, sintáticos e sua forma de entoação caracterizada pela pontuação.
O tema, por sua vez, é o sentido completo de uma enunciação, dado não só pelos
elementos verbais, como também, e fundamentalmente, por elementos extraverbais, pelas
condições externas e históricas que a enunciação pertence. Evidencia-se, assim, o caráter
múltiplo de sentido da palavra. Deste ponto de vista, não se pode separar o tema de sua
significação e vice-versa, pois o primeiro está no nível da consciência, do pensamento,
42
interligado a fatores históricos e sociais e o segundo é a concretização do primeiro, através de
um aparato técnico relativo ao funcionamento do código linguístico a que pertence.
Assim, na teoria bakhtiniana, toda e qualquer palavra se dirige a alguém, seu sentido
só se completa na medida em que a compreensão se faz ativamente, em forma de réplica ao
que foi dito, num movimento dinâmico que garante a compreensão.
Compreender é opor à palavra do locutor uma contra palavra evidenciando-se uma
forma de diálogo, ininterrupto e dinâmico. A concepção de linguagem, na teoria bakhtiniana,
é sempre dialógica, não há palavra que seja a primeira ou a última, e não há limites para o
contexto dialógico, em cada um dos pontos do diálogo que se desenrola, pode-se perceber
uma infinidade de outros diálogos, de outras vozes que perpassam o discurso estabelecido e,
quando se pensa que este está pronto e acabado, o mesmo surge numa forma renovada, num
novo contexto, festejando seu renascimento (BAKHTIN, 1997, p. 414).
Na fala cotidiana, segundo o autor, pelo menos a metade das palavras pronunciadas
provém de outrem. Na fala de todo e qualquer locutor é possível se observar citações ou
referências de outras falas, de outras expressões ditas ou veiculadas publicamente através de
jornais, revistas, livros, propagandas, leis, etc., que afloram com novos sentidos, novas
interpretações e novos significados, evidenciando-se assim o caráter dialógico da linguagem.
A partir das ideias acima discutidas e pensando no caráter dialógico da linguagem,
aprofundarei o estudo aqui proposto, redirecionando o foco para a noção de gêneros do
discurso conceituado por Bakhtin (1997), no seu livro “A estética da comunicação verbal” e
ampliado por Marcuschi (2008) e Dolz e Schenewly (2004).
3.2 Gêneros do discurso: conceituação
Bakhtin conceitua e define os gêneros como tipos de enunciados, relativamente
estáveis e normativos, que estão vinculados a situações típicas da comunicação social. Como
tipos temáticos, estilísticos e composicionais dos enunciados, individuais, os gêneros se
constituem historicamente a partir de novas situações de interação verbal, da vida social que
vão se estabilizando no interior das diferentes esferas sociais. Os gêneros, segundo o autor,
estão ligados às situações sociais da interação: qualquer mudança nessa interação ocasionará
a mudança no gênero.
As formas típicas da estruturação do gênero estão relacionadas às esferas de
comunicação verbal em que os sujeitos estão inseridos. Num simples diálogo ou na
elaboração de um artigo científico, uma resenha ou num texto publicitário é preciso moldar a
43
nossa fala às formas do gênero e, notadamente, na interação social entre indivíduos que
convivem entre si, pois
bem nas primeiras palavras é possível pressentir-lhe o gênero, prever-lhe o
volume (a extensão aproximada do todo discursivo), a dada estrutura
composicional, prever-lhe o fim ou seja, desde o início, somos sensíveis ao
todo discursivo que, em seguida, no processo da fala, evidenciará suas
diferenciações. Se não existissem os gêneros discursivos e se não os
dominássemos, se tivéssemos de criá-los pela primeira vez no processo da
fala, se tivéssemos de construir cada um de nossos enunciados, a
comunicação verbal, seria quase impossível. (BAKHTIN, 1997, p. 302).
Marcuschi (2005, p. 18) amplia o conceito de gênero introduzido por Bakhtin
afirmando que os gêneros não devem ser encarados “como modelos estanques e nem como
estruturas rígidas, mas como formas culturais e cognitivas de ação social corporificadas de
modo particular na linguagem, temos de ver os gêneros como entidades dinâmicas”. O autor
afirma que os gêneros são artefatos poderosos que condicionam a escolha do léxico, do grau
de formalidade e da natureza do tema numa determinada produção textual. Porém, apesar de
delimitar alguns aspectos da produção escrita, impondo-lhe restrições e padronizações, o
gênero também nos possibilita um convite a escolhas, estilos, criatividade e variação.
Marcuschi (2005) afirma que como a língua varia, os gêneros também o fazem,
adaptando-se, modificando-se, ampliando-se e transformando-se a fim de atender às
necessidades sociais de comunicação. Não se pode conceber o gênero dentro de uma
classificação rígida e estanque que privilegia a forma e a estrutura, pelo contrário, os gêneros
devem ser encarados como “formações interativas, multimodalizadas e flexíveis de
organização social e de produção de sentidos. Assim, um aspecto importante na análise do
gênero é o fato de ele não ser nem estático e nem puro.” (MARCUSCHI, 2005, p. 19).
Dessa forma, é possível compreender que, para se trabalhar com os gêneros textuais
em sala de aula, é preciso perceber que não basta simplesmente classificá-lo e produzi-lo de
forma solta e descontextualizada, mas sim vinculado, como afirma o autor, a uma cultura,
numa situação sócio-discursiva real. Percebe-se nesta concepção teórica de Marcuschi
(2005), que o mesmo não foge à vertente bakhtiniana, uma vez que nesta teoria a produção e
a mudança dos gêneros estão relacionadas às mudanças históricas. Bakhtin afirma que “a
língua penetra na vida através dos enunciados concretos que a realizam, e é também através
dos enunciados concretos que a vida penetra na língua.” (BAKHTIN, 1997, p. 282).
Marcuschi (2005) faz alusão ao trabalho de investigação de Lopes (2004) sobre os
gêneros que circulam no meio familiar, mesmo por quem não domina o código escrito.
44
Dentre os 30 gêneros que circulam neste meio (cartas, folhetos, conta de energia, avisos,
letreiros, nomes de rua, anúncios, publicidades, lista de compra, etc.), 24 são apenas
recebidos e não apresentam autoria.
Dos 30 gêneros apontados, segundo o autor, apenas cinco foram produzidos pelos
participantes das pesquisas. Destes cinco, somente as cartas e os avisos podem ser
considerados mais complexos, pois os demais são apenas listas que não requerem maiores
esforços cognitivos. Alguns gêneros apontados pela pesquisa de Lopes (2004), como contas
de água e energia, documentos em geral são repetitivos e pouco criativos. Cumprem sua
função social, mas são classificados por Marcuschi como gêneros minimalistas a que as
rotinas de uso recorrem. O autor afirma que as comunidades de baixo nível de letramento
entram em contato com os gêneros mais como consumidores do que como produtores de
gêneros escritos. Os gêneros minimalistas que circulam no cotidiano são “relativamente
rígidos, rotineiros, recorrentes e formulaicos. Não têm autoria característica, nem variação de
estilo. São em boa medida gêneros poderosos como os documentos que são altamente usados
e não produzidos por quem os usa.” (MARCUSCHI, 2005, p. 3).
Transpondo as concepções acima discorridas para o campo pedagógico, percebe-se
que, com a finalidade de que o falante de uma determinada esfera de comunicação seja capaz
de expressar-se com clareza através de um gênero, é necessário um trabalho sistematizado
neste sentido. Quando a criança chega à escola, ela já se comunica, expressando seu
pensamento, suas vontades, seus desejos e preferências através da linguagem oral e informal.
Trabalhar sistematicamente os gêneros textuais desde o início da vida escolar,
mostrando a importância destes na sociedade, é papel do professor. O docente precisa realizar
este trabalho, mas, para isso, é necessário que ele próprio compreenda o significado e a
relevância de determinados gêneros na sociedade. Principalmente, na fase inicial da
escolarização, o professor necessita planejar seu trabalho partindo da realidade do aluno para
que o processo de aquisição da escrita tenha sentido. Dessa forma, ressaltamos, ainda, que a
escola, notadamente na figura do docente, é que deve ter clareza dos usos e das necessidades
dos gêneros que circulam na sociedade e quais aqueles aos quais se deve dedicar com mais
afinco.
3.3 Gêneros textuais e ensino: compreensão e funcionalidade
Compreender o que são gêneros textuais e como realizar um trabalho intencional,
criativo e voltado para a realidade e interesses dos alunos não é tarefa fácil. Infelizmente, nos
45
deparamos com professores alfabetizadores que não compreendem o conceito de gêneros
textuais e tampouco sabem como trabalhar com eles. Sabemos que a orientação dos
Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) (BRASIL,1997) é para que o trabalho com a
língua materna esteja voltado para a teoria dos gêneros discursivos de Bakhtin e para
releituras didáticas dessa teoria feitas por pesquisadores do grupo de Genebra (LOPES-
ROSSI, 2005, p.79).
De acordo com Lopes-Rossi (2005), o conhecimento sobre o trabalho pedagógico
com gêneros discursivos ainda é bastante restrito, por parte dos docentes, de uma forma
geral. Muitos demonstram interessados no assunto, porém carentes de fundamentação teórica
e de exemplos práticos. Ou seja, o como fazer, como trabalhar. Às vezes ouvimos muitas
críticas sobre as ditas “receitas prontas”, mas é preciso que o professor se depare com o que é
novo de forma clara e detalhada, a fim de adaptar seus conhecimentos anteriores, sua
experiência profissional e pessoal no intuito de melhorar a qualidade do ensino.
Os pesquisadores do grupo de Genebra apontam que o trabalho pedagógico com
gêneros discursivos proporciona o desenvolvimento da autonomia do aluno no processo de
leitura e produção textual. Esse trabalho tem como benefício, para ele, o domínio do
funcionamento da linguagem em situações de comunicação, situações essas que devem estar
ligadas ao meio social, histórico e cultural em que o educando está inserido.
Ao professor, nesse contexto, cabe criar condições para que os alunos possam
apropriar-se de características discursivas e linguísticas de diversos gêneros em situações
reais de comunicação.
Os escritos de Dolz e Schneuwly (2004) nos dão uma dimensão bastante clara sobre o
trabalho pedagógico com os gêneros textuais. Ambos são professores e pesquisadores da
Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade de Genebra, são
fundadores de um grupo de pesquisa denominado como Grupo Romando de Análise do
Francês Ensinado (Grafe ). Esse grupo dedica-se a estudos sobre “diferentes temas em
didática do Francês-língua materna, tais como a transposição didática, as interações em sala
de aula e a construção dos objetos ensinados, a produção de textos orais e escritos e o ensino
de literatura.” (ROJO; CORDEIRO, 2004, p. 13).
Dessa forma, por considerar os referidos autores como fundamentais para a realização
das reflexões, é que passarei ao detalhamento de suas pesquisas no tocante a concepções da
noção de gêneros discutida e ampliada por estes autores, que muito contribuíram para a
concretização do intuito pretendido.
46
Para Schneuwly (2004), o gênero é um instrumento. O autor desenvolve esta tese,
levando em consideração os estudos da psicologia vigotskiana e questiona: “Como o
instrumento pode ser um fator de desenvolvimento das capacidades individuais?”
(SCHNEUWLY, 2004, p. 23). A partir desse questionamento, defende a tese de que a ação
do sujeito é mediada por objetos específicos, que são elaboradas socialmente, através de
experiências anteriores que são transmitidas uns aos outros e que se transformam à medida
que são vivenciadas. “Os instrumentos encontram-se entre o indivíduo que age e o objeto
sobre o qual ou a situação na qual ele age: eles determinam seu comportamento, guiam-no
afinam e diferenciam sua percepção da situação na qual ele é levado a agir.”
(SCHNEUWLY, 2004, p. 23).
Essa concepção tripolar da atividade (sujeito-instrumento-situação) permite a
transformação dos comportamentos. Pois a partir do momento em que o sujeito compreende e
apropria-se do instrumento, ele é capaz de explorar suas possibilidades transformando-o em
seu benefício para melhor utilizá-lo.
Schneuwly (2004) advoga, ainda, que o instrumento para ser compreendido apresenta
duas faces: o artefato material ou simbólico e o esquema de utilização. O primeiro trata do
produto material existente fora do sujeito, ou seja, que existe por si só, mas que para ser
utilizado, necessita da capacidade cognitiva do sujeito por meio do esquema de utilização.
Assim, o instrumento para ser utilizado pelo sujeito deve conter essas duas faces para, a partir
de sua compreensão, desenvolver-se, provocando novos saberes, ampliando suas
possibilidades, sustentando e orientando novas ações. É possível depreender que os
instrumentos são socialmente elaborados e guiam o comportamento dos sujeitos, que ao
apropriar-se do instrumento é capaz de transformá-lo.
Seguindo a vertente bakhtiniana, o autor define o gênero como: “tipos relativamente
estáveis de enunciados com três elementos que os caracterizam: conteúdo temático, estilo,
construção composicional”. Acrescenta ainda que “a escolha de um gênero se determina pela
esfera, as necessidades da temática, o conjunto dos participantes e a vontade enunciativa ou
intenção do locutor” (SCHNEUWLY, 2004 p. 25). A partir dessa definição, o autor observa
que três elementos devem ser reiterados/evidenciados:
1) A escolha do gênero se dá em função de uma situação, um contexto pré-definido,
observando-se a finalidade, o destinatário e o conteúdo da ação discursiva.
2) A partir dessa base, elege-se um gênero num conjunto de possibilidades de uma
esfera social.
47
3) Definem por si só o que é dizível, mesmo não sendo estáticos e rígidos os gêneros
têm uma composição: uma estrutura definida por sua função, um plano comunicacional. E
por último, são caracterizados por um estilo, não um estilo individual, mas um estilo próprio
do gênero.
Schneuwly (2004) afirma ainda que o gênero é um instrumento semiótico complexo,
pois nessa perspectiva há um sujeito, locutor, enunciador, que age numa situação definida por
vários fatores que lhe permitem a produção e a compreensão de textos. Nesse sentido, para se
utilizar determinado gênero, é preciso compreendê-lo e ajustá-lo às situações de produção. O
gênero, portanto, pode ser concebido como um organizador geral para produção de um texto,
ou seja, um megainstrumento que permite a organização do “conteúdo” da “comunicação” e
do “tratamento linguístico” numa situação real de interação (SCHNEUWLY, 2004, p. 28,
grifo nosso).
Em se tratando dos gêneros e de desenvolvimento da linguagem, o autor,
reinterpretando a versão Bakhitiniana, distingue os gêneros primários e secundários,
sustentando a tese de que a passagem do primeiro para o segundo acontece num movimento
de continuidade e ruptura, sendo que “os gêneros primários são os instrumentos de criação
dos gêneros secundários.” (SCHNEUWLY, 2004, P.35).
O autor define os gêneros primários como instrumentos de:
troca, interação, controle mútuo pela situação;
funcionamento imediato do gênero como entidade global controlando todo
o processo, como uma só unidade;
nenhum ou pouco controle metalinguístico da ação linguística em curso
(SCHNEUWLY, 2004, p. 29).
Já os gêneros secundários podem ser definidos como “não controlados diretamente
pela situação, como funcionando psicologicamente por entidades mais separadas; como
necessitando de outros mecanismos de controle mais potente” (SCHNEUWLY, 2004, p. 30).
É possível perceber nesta definição que os gêneros primários estão intimamente
relacionados com a ação e estabelecem uma relação muito próxima ao presente momento em
que são produzidos. Já os gêneros secundários não são imediatos, pois necessitam de uma
certa estrutura linguística convencional para serem produzidos. Não podem, porém, segundo
o autor, ser considerados descontextualizados uma vez que são estruturados na ação.
48
Os gêneros primários instrumentalizam o falante, é através dos gêneros produzidos
nas interações sociais que o sujeito é capaz de complexificá-los, tornando-os instrumentos de
novas construções.
Schneuwly (2004) define as particularidades de funcionamento dos gêneros
secundários da seguinte forma:
a) Modos diversificados de referência a um contexto linguisticamente criado, que
entendemos como a forma linguística pela qual o texto é estruturado, suas
características, sua coesão interna, assim é possível, por exemplo, entender e
classificar uma narrativa como tal, pelos elementos linguísticos utilizados;
verbos, marcação temporal, sequência de fatos, etc..
b) Modos de desdobramento do gênero.
Se os meios de referência a um contexto linguisticamente criado
caracterizam por assim dizer, os gêneros secundários do interior, asseguram
sua coesão interna e sua autonomia em relação ao contexto, outros meios
asseguram o exterior, seu controle, sua avaliação, sua definição.
(SCHNEUWLY, 2004, p. 31).
Nesse sentido, o autor sugere que os gêneros secundários criam seus
duplos, pois apresentam uma autonomia tal, que é possível modificá-los,
enriquecê-los, complexificando-os cada vez mais.
c) A gestão eficaz dos gêneros secundários pressupõe a existência e a construção de
um aparelho psíquico de produção de linguagem que não funciona mais na
imediatez. Ou seja, esta particularidade pressupõe compreensão e entendimento
para que haja uma decisão acerca das operações discursivas que são transversais
em relação aos gêneros.
Nessa perspectiva, os gêneros secundários não são espontâneos, eles surgem a partir
do domínio da leitura e da escrita, num profundo processo de continuidade e de ruptura que a
passagem do gênero primário para o secundário apresenta. O primeiro nasce na troca verbal
espontânea em situações imediatas reais e automáticas, enquanto que o segundo não está
mais ligado de maneira imediata a uma situação de comunicação, são relativamente
independentes do contexto imediato, visto que sua forma é uma construção complexa de
vários gêneros da esfera cotidiana.
E, por fim, para apropriar-se dos gêneros secundários, o aprendiz necessita transpor o
nível imediato, num esforço cognitivo maior, pois não se trata mais da “esfera das
49
experiências pessoais, mas de um mundo outro que tem motivações mais complexas, que não
são mais necessariamente pessoais (SCHNEUWLY, 2004, p. 33).
A partir dos estudos de Vygotsky, Schneuwly salienta que a fonte do
desenvolvimento de um determinado sistema se dá ora por encontro, conflito, contradição,
tensão entre duas lógicas, entre duas relações, entre dois sistemas a que o teórico denomina
como “Zona Proximal do Desenvolvimento”, que transpondo para a tese defendida pelo
teórico é o que se pode aplicar na passagem dos gêneros primários para os secundários. Nas
palavras do autor “o novo sistema não anula o precedente, nem o substitui [...] mesmo sendo
profundamente diferente, o novo sistema apoia-se completamente sobre o antigo em sua
elaboração, mas, assim fazendo, transforma-o profundamente.” (SCHNEUWLY, 2004, p.
33/34).
A passagem do gênero primário para o gênero secundário, ou seja, de um esquema
mais simples para outro considerado mais complexo não pode ser visto como processos
dicotômicos. Um apoia-se no outro, ou seja, o processo de transformação de um sistema se dá
por profundas retomadas e rupturas criando assim novas formas de organização do
pensamento.
Uma das contribuições de Dolz e Schneuwly (2004) para o ensino foi a chamada
sequência didática que possibilita ao professor a compreensão dos escritos destes autores
para a prática em sala de aula. Mas o que é uma sequência didática?
De acordo com esses pesquisadores, trata-se de atividades planejadas para serem
desenvolvidas numa determinada sequência e têm por finalidade tematizar aspectos
envolvidos na produção de textos organizados em um determinado gênero, de maneira a
possibilitar aos alunos a habilidade de produzi-lo.
São atividades que têm como objetivo as características da estrutura comunicativa
particular pertencentes ao gênero e preveem uma progressão organizada a partir do
levantamento dos conhecimentos que o aluno já possui sobre o gênero a ser trabalhado.
Partindo deste levantamento,
um mapeamento das necessidades de aprendizagem é realizado, com a
finalidade de possibilitar a priorização de aspectos a serem abordados
progressivamente, adequando o grau de complexidade da tarefa e do objeto
as possibilidades de aprendizagem dos alunos. (BRÄKLING, 2000, p. 225).
Além dos aspectos conceituais e procedimentais que o sujeito deve dominar para
realizar determinada tarefa, o desenvolvimento das atividades deve prever a organização
50
adequada do tempo da realização e sequenciação das atividades. Essa organização deverá ser
feita de forma que permita a transformação das capacidades dos alunos.
Assim, de acordo com os autores, “uma sequência didática tem precisamente a
finalidade de ajudar o aluno a dominar melhor um gênero de texto, permitindo-lhe assim,
escrever ou falar de uma maneira mais adequada numa dada situação de comunicação”
(DOLZ; SCHNEUWLY, 2004, p. 97).
Nesse sentido, a sequência didática deve ser realizada sobre um gênero que os alunos
não dominam, ou que ainda não o fazem de forma adequada. O planejamento a partir das
sequências didáticas permitiria, assim, tanto o acesso a esses gêneros dificilmente domináveis,
quanto a sua identificação e produção. Uma sequência didática apresenta, assim, as seguintes
etapas:
a) A “apresentação da situação” (DOLZ; NOVERRAZ; SCHNEUWLY, 2004, p.98-
grifo do autor) caracteriza-se como uma exposição detalhada do projeto que se pretende
desenvolver, em que a turma constrói uma representação da atividade a ser executada. É neste
momento que a atividade ganha significação, pois se trata de uma situação em que se reflete
sobre o que escrever os destinatários da produção (a quem se dirige?) e que forma assumirá a
produção. É nessa etapa que é possível “fornecer aos alunos todas as informações necessárias
para que eles conheçam o projeto comunicativo visado e a aprendizagem de linguagem a que
está relacionado” (DOLZ, NOVERRAZ; SCHNEUWLY, 2004, p. 100).
b) A partir desse primeiro contato com o projeto comunicacional os educandos
realizam a “produção inicial” (DOLZ; NOVERRAZ; SCHNEUWLY, 2004, p. 98- grifo dos
autores), oralmente ou por escrito. A primeira produção é de fundamental importância para o
planejamento das etapas da sequência didática, pois servirá para orientar as ações de
intervenção do professor, bem como evidenciará o caminho a ser percorrido pelo aluno.
A produção inicial é entendida como o primeiro lugar de aprendizagem da sequência,
pois trata-se de uma atividade direcionada e delimitada de maneira precisa e que apontará
possíveis limitações na aprendizagem e abrirá novos horizontes e apontará caminhos a serem
percorridos. E isso servirá para delimitar o que será trabalhado nos módulos.
c) Os “módulos” (DOLZ; NOVERRAZ; SCHNEUWLY, 2004, p. 98- grifo dos
autores) constituem-se da instrumentalização dos educandos para transpor os problemas que
foram visualizados na primeira produção. Ressaltamos que a sequência didática, proposta
pelos autores, vai do complexo para o simples, para posteriormente retornar ao complexo,
produção final.
51
Na produção de textos, os educandos se deparam com níveis diferentes de dificuldades
e com problemas específicos de produção de cada gênero. Baseando-se nas abordagens da
psicologia da linguagem, Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004, p. 104) apontam quatro níveis
principais na produção de textos: a representação da situação de comunicação, a elaboração
dos conteúdos, o planejamento do texto e a realização do texto. Esses níveis evidenciam que o
aluno deve ter uma visão ampla do que será produzido como: o destinatário do seu texto, a
finalidade, o gênero, as técnicas e o vocabulário apropriados e adequados a cada produção.
É por esse motivo que os módulos devem trazer o maior número de atividades
variadas possíveis, que permitam aos educandos a observação e a análise dos textos, para que,
a partir daí, eles possam visualizar os aspectos de funcionamento dos mesmos.
d) Nessa etapa, o educador pode sugerir “tarefas simplificadas” (DOLZ;
NOVERRAZ; SCHNEUWLY, 2004, p.105- grifo dos autores) de produção textual com a
finalidade de que o aluno se concentre em um aspecto da produção de um texto. Assim, o
professor pode propor atividades de reorganização de um conteúdo e até a revisão textual
focada em um determinado aspecto.
Uma linguagem comum entre educador e educando é que propiciará um crescimento
bastante proveitoso no que se refere à qualidade dos textos produzidos, pois este será o
momento de análise crítica a fim de melhorar o texto. Ademais, haverá uma construção
progressiva dos conhecimentos sobre os gêneros por parte dos alunos. Esses conhecimentos
são adquiridos durante a prática de revisão do próprio texto ou para melhor antecipação do
que se deve fazer frente a uma produção textual.
e) As observações dos conhecimentos podem ser listadas e afixadas em cartazes, como
um momento de síntese, antes da produção final, cada módulo é finalizado com um registro
na forma sintética de “lista de constatações, lembrete ou glossário”, denominado pelos
autores de “capitalizações das aquisições” (DOLZ; NOVERRAZ; SCHNEUWLY, 2004,
p.106- grifo do autor).
A partir dessas etapas, acima relacionadas, a sequência culmina com uma produção
final em que o educando colocará em prática os conhecimentos conquistados nos módulos. A
produção final permite ao professor realizar uma avaliação somativa, pois significa um
investimento nas aprendizagens compartilhadas durante os módulos. Nesse sentido “a
avaliação é uma questão de comunicação e de trocas. Assim ela orienta os professores para
uma atitude responsável, humanista e profissional.” (DOLZ; NOVERRAZ; SCHNEUWLY,
2004, p. 108).
52
Delineei, até aqui, as definições de gênero que foram discutidas e ampliadas pelo
grupo de pesquisadores de Genebra, e também conceituei, de acordo com os autores, Dolz e
Scheneuwly (2004), o que denomina-se como sequência didática e posso afirmar que este
trabalho, para ser desenvolvido, tem que ficar muito claro para quem o realiza, pois corre-se o
risco de ser mal interpretado e não passar de chavões e modismos nos cursos de formação
continuada. Acredito que o professor, para realizar um trabalho como este, não pode partir do
individualismo, penso que um trabalho deste nível e com essas características mereça ser
planejado, discutido e colocado em prática na coletividade.
O professor não é o detentor do saber, ao contrário, nessa árdua profissão é também
um aprendiz, que, assim considerado, coloca-se como um ser em evolução. Dessa forma, é na
interação com o outro que o educador adquire novos saberes e o par mais experiente deve
auxiliar o menos experiente, a fim de juntos construírem conhecimentos.
Para que o professor utilize determinado plano de trabalho, é necessário que ele tenha
clareza do que será realizado. Se adotar a alternativa do ensino da produção textual a partir
dos gêneros e da sequência didática, creio que o mesmo deva ter segurança em sua proposta
de trabalho, saber o que é o gênero a ser ensinado, suas características e como deve ser
realizada a sequência didática.
3.4 Interação e aprendizagem
Diante dessas concepções, fica o questionamento: Como a criança consegue
apropriar-se do conhecimento e tornar-se autônoma em relação à aquisição da linguagem
escrita? Qual é o papel do professor nesse processo? Sabe-se que é preciso fazer um trabalho
sistemático para isso, mas qual o melhor caminho a seguir?
Nessa perspectiva, pode-se afirmar que a interação exerce um papel fundamental na
aquisição, na aprendizagem e no processo de construção da linguagem do sujeito.
De acordo com os estudos realizados por Costa (1997), a interação social, na linha
comunicativo-etnográfica-interacionista, é interpretada como “andaime” facilitador da
aprendizagem. A linguagem, nesta vertente, é analisada sob o ponto de vista pragmático
designando comunicação. O autor descreve, também, a interação social do ponto de vista
sócio-construtivista, como a origem da aquisição e da aprendizagem. Sob esse enfoque, a
linguagem analisada sob o prisma discursivo é enunciação polissêmica e polifônica.
53
Pelo processo, então de interação verbal, em que o locutor e destinatário
possuem papel ativo, as vozes do outro são constitutivas do conhecimento e
da linguagem do sujeito em desenvolvimento e não mero andaime facilitador
ou âncora do processo. (COSTA, 1997, p. 26).
Mas o que vem a ser “andaime”? Na acepção literal da palavra andaime é
substantivo masculino
1 m.q. adarve (‘caminho estreito’)
2 Derivação: por extensão de sentido. Rubrica: arquitetura, construção.
m.q. bailéu (‘sacada’)
3 Rubrica: construção; estrado provisório de tábuas, fixo ou móvel,
sustentado por armação de madeira ou metálica sobre o qual os operários
trabalham nas construções; apoiamento. (HOAISS, 2001, p. 37).
Os estudos de Costa (1997) trazem uma nova acepção da palavra andaime. Baseando-
se nos escritos dos sóciointeracionistas Bruner, Wood e Ross (1975,1976 apud COSTA,
1997, p. 37), que desenvolveram a teoria da aquisição da linguagem, o autor defende que a
andaimagem parte do princípio de que a linguagem se desenvolve na criança por meio de
processos de interação social. Nessa teoria, Bruner (1975 apud COSTA, 1997) propõe um
modelo de desenvolvimento mental que envolve tanto a representação mental como a
construção ativa da realidade. Dessa forma, a linguagem é a principal ferramenta mental para
o desenvolvimento cognitivo, mediada tanto pela participação quanto pela instrução.
Bruner (1975 apud COSTA, 1997) apresenta dois componentes para explicar os
processos pelos quais as crianças aprendem a linguagem: o Language aquisition Support
Systen (LASS ) e o Language acquisition Device (LAD). O primeiro (LASS) pode ser
compreendido como a ajuda do adulto, a base, o modelo pelo qual a mãe guiaria e sustentaria
a linguagem emergente da criança, a qual aprenderia a falar e a dominar a linguagem do
grupo social, histórico e cultural em que vive.
E o segundo (LAD) pode ser compreendido como sendo a predisposição que a criança
tem para aprender a linguagem e ter uma interação social ativa. O par mais experiente, neste
caso, construiria estruturas interacionais apropriadas para que o desenvolvimento mental se
processasse. A essa estrutura Bruner (1975 apud COSTA, 1997) denominou “scaffold” (
andaime/escora/ suporte).
Este conceito pode ser comparado ou relacionado à teoria Vigotskyana (1930/1934)
que advoga que as interações com os adultos auxiliam as crianças no desenvolvimento das
funções psicológicas superiores (ação voluntária, memória, percepção e formação de
conceitos). Ou seja, a partir do apoio do adulto (par mais experiente) é que a criança será
54
capaz de agir por si mesma, pois internaliza os conhecimentos que se processam na interação
social e, a partir desse apoio, ela será capaz de executar tarefas de forma autônoma.
Para Beed et al. (1991 apud COSTA, 1997), pode-se diferenciar dois tipos de
“andaime” em pesquisas naturalísticas de aquisição de Língua Materna (LM): o acidental ou
casual e o estratégico. O primeiro refere-se a situações interativas de pais auxiliando os filhos
a se expressarem por si mesmos sem intenção ou consciência de que estão ensinando. No caso
do andaime estratégico, ao contrário, existe uma intencionalidade: jogar um tipo de jogo,
lavar pratos, montar brinquedos, etc..
Assim, apoiado nesses escritos, Costa (1997) depreende quatro características
essenciais implícitas ao conceito de andaime:
A interação se dá num contexto colaborativo onde se valoriza a intenção da
criança;
Pais e crianças trabalham na ZDP (Zona de Desenvolvimento Proximal) da
criança;
O apoio/andaime é retirado gradualmente;
O objetivo é a criança internalizar o conhecimento para se tornar
independente. (COSTA, 1997, p. 40).
Transpondo essas pesquisas acerca da aquisição da língua materna para o campo
pedagógico, é possível afirmar que as situações de interação entre professor/aluno
ou seja, as ações pedagógicas do adulto-professor é que permitirão a aprendizagem de tarefas
mais complexas pelo aluno. Tarefas essas, que envolvem o desenvolvimento cognitivo e
intelectual, levando o aprendiz à autonomia.
55
4 A ALFABETIZAÇÃO E SUA RELAÇÃO COM OS CONCEITOS DE
LETRAMENTO E GÊNEROS TEXTUAIS
As temáticas deste capítulo estão organizadas no sentido de estabelecer relações entre
os eixos: alfabetização, letramento e gêneros textuais, por defender que estes estão
interligados e que a sua compreensão tem implicação na prática pedagógica do professor
alfabetizador.
4.1 Alfabetização, letramento e gêneros textuais: usos e possibilidades da escrita
No meio acadêmico e educacional, de uma forma geral, vem se discutindo o termo
letramento e sua relação com o processo de alfabetização. Mas o que é letramento? O que
vem a ser alfabetização? Qual é a relação entre ambos?
Neste capítulo, à luz de teóricos como Soares (2000, 2004, 2006), Kleiman (2008),
Rojo (2004), Costa Val (2004), entre outros, farei uma abordagem teórica sobre tais conceitos,
ressaltando a importância da compreensão destes termos pelo professor alfabetizador, no
sentido de que, a partir dessa compreensão e entendimento, o mesmo possa fazer um trabalho
dinâmico, voltado para a apropriação da escrita pelos alunos nas suas reais situações de uso,
ou seja, a materialização da escrita nas práticas sociais através dos gêneros textuais.
Podemos afirmar, inicialmente, que a sociedade contemporânea exige de seus
membros a inserção cada vez mais precoce no mundo da escrita, haja vista que vivemos numa
sociedade grafocêntrica (que considera a escrita como centro) na qual a escrita se expande por
todos os lugares e em todos os ambientes.
Assim sendo, quando a criança chega à escola, aos seis anos de idade, normalmente,
ela não está inaugurando sua entrada no mundo da escrita, muito pelo contrário. Por estarmos
numa sociedade em que a escrita é algo comum, a criança já traz em sua caminhada um pré-
conhecimento a respeito desta habilidade. Cabe à escola fazer com que aconteça uma
continuidade desse processo de aquisição das habilidades de compreensão da escrita e sua
função no mundo em que vivemos.
De acordo com Bagno, Stubbs e Gagné (2002), a língua escrita faz uma diferença
muito grande na sociedade, já que por meio da mesma os seres humanos podem se organizar e
gerir o meio no qual vivem. É através da escrita que registramos e materializamos o nosso
pensamento, o que permite a transmissão das informações. O autor lembra que a escrita é um
termo ambíguo que se aplica tanto a um produto quanto a um processo. Como produto, ela
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pode ser tomada como objeto de estudo e como processo, deve ser aprendida. Além disso,
enquanto processo, bem como enquanto produto, tem funções sociais e pessoais. Sociais,
porque, por intermédio dela, os seres humanos podem se comunicar através do tempo e do
espaço. Pessoais, por depender de uma ação cognitiva e reflexiva para a organização de
nossas ideias. Dessa forma, fica evidente a necessidade de a escola conceber a escrita como
processo necessário ao desenvolvimento cognitivo para que ocorra a expressão oral e escrita
dos educandos de forma real e significativa para eles.
Sendo a escrita um processo, defendemos que os professores alfabetizadores devem
compreender como esse processo acontece, de que maneira as crianças se alfabetizam e qual a
relação entre conhecer a mecânica da língua escrita e saber utilizá-la de forma competente no
meio em que atuamos.
Assim considerando, o capítulo que ora se apresenta tem por objetivo traçar um breve
esboço sobre a alfabetização no Brasil, com o emprego de estatísticas sobre o assunto, bem
como teorizar acerca dos conceitos de alfabetização e letramento e suas especificidades,
demonstrando a relação entre estes processos e os gêneros textuais.
4.2 O cenário da alfabetização no Brasil
Durante muito tempo, a escola tradicional, no processo de alfabetização, pautou-se na
repetição de palavras, na recitação das letras que se dava de forma descontextualizada, sendo
que a criança passava a maior parte do tempo em atividades de repetição e cópia, muitas vezes
lendo frases desprovidas de sentido, simplesmente para que se evidenciasse a mecânica da
língua. O resultado disso foram altos índices de repetência e, consequentemente, de evasão,
que em meados do século XX, fizeram parte da triste realidade do nosso país.
Segundo Batista (2004), em 2003 jornais e revistas mencionaram o fracasso da escola
brasileira em fazer com que os alunos fossem alfabetizados. Também os índices do Sistema
de Avaliação da Educação Básica (SAEB), desenvolvido pelo Instituto Nacional de Estudos e
Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), bem como os do Programa Internacional de
Avaliação dos Estudantes (PISA), desenvolvido pela Organização para Cooperação e
Desenvolvimento Econômico (OCDE), não são nada animadores.
Os dados do SAEB mostram que, na quarta série, 50% dos estudantes apresentam
“limitações” em seu aprendizado da leitura e da escrita. Dito de outra forma: cerca de 37%
dos alunos encontram-se no estágio crítico de construção de suas competências de leitura (o
que significa que têm grandes dificuldades para ler), e 22% estão abaixo desse nível, no
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estágio muito crítico (o que significa que não possuem habilidades de leitura). (BATISTA,
2004, p. 8).
Como estágio crítico são considerados os alunos que leem de forma truncada apenas
frases simples, e como estágio muito crítico, considera-se as crianças que não sabem ler, pois
não conseguem responder aos itens da prova. Ou seja, um grande número de estudantes não
aprende a ler na escola brasileira. A esse respeito, Soares (2004) também afirma que antes o
fracasso escolar se restringia às avaliações internas à escola, à repetência, à reprovação e à
evasão que se concentravam nas séries iniciais do ensino fundamental; hoje,
O fracasso revela-se em avaliações externas à escola – avaliações como o
Saresp, o SIMAVE, nacionais (como o SAEB e o ENEM) e até
internacionais (como o PISA) - espraia-se ao longo de todo o ensino
fundamental, chegando mesmo ao ensino médio, e se traduz em altos índices
de precários ou nulo desempenho em provas de leitura, denunciando grandes
contingentes de alunos não alfabetizados ou semi-alfabetizados depois de
quatro, seis, oito anos de escolarização. (SOARES, 2004 p. 9).
Diante dessa realidade nos perguntamos: Por que isso acontece? Quais os fatores que
levam a esses dados tão desalentadores? A escola perdeu o seu papel? O que nós, enquanto
educadores, podemos fazer para reverter este quadro?
São várias as hipóteses para se responder a essas perguntas. Muitas pessoas afirmam
que a escola tradicional era melhor, que as crianças eram mais disciplinadas e estavam mais
dispostas a aprender, porém, vê-se que se trata de uma falsa afirmação, pois a escola era para
poucos. A grande maioria da população, as classes menos favorecidas, estavam fora dela. Em
1820, apenas 0,20% da população eram alfabetizadas de acordo com Hallwel (1985, p. 176).
Ser alfabetizado era privilégio da elite.
Batista (2004) informa que em 1872 o primeiro censo nacional revelou que esse índice
subiu para 17,7% entre pessoas de cinco anos e mais. Já no século XX, o índice foi
progredindo gradativamente, apesar de que até 1960 o índice de analfabetos, 71,2%, era maior
do que os índices de alfabetizados. Em 1960 a proporção de alfabetizados se inverteu em
relação aos índices de analfabetos, que eram 46,7%. Assim, as taxas caiam sucessivamente,
de “1970 a 2000, para 38,7% , 31,9%, 24,2% e 16,7%” (BATISTA, 2004, p.10).
Nesta análise, afirma-se que os índices de analfabetismo estão relacionados à
desigualdade social do nosso país. Com efeito, os dados do SAEB, por exemplo, mostram que
o fracasso na alfabetização é maior quando se trata de crianças das camadas populares das
regiões que possuem os piores indicadores sociais e econômicos.
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Todavia, apesar de os dados indicarem um quadro desanimador, há que se levar em
conta que o processo de universalização do acesso à escola pública é algo recente. Muitos
avanços podem ser apontados: “ao longo de todo século passado, conseguimos incluir novas
parcelas da população no mundo da escrita. Éramos cerca de 18% de alfabetizados, quase no
final do século XIX; no início do século XXI somos quase 83%” (BATISTA, 2004, p. 10).
Mas o que é ser alfabetizado? Segundo Soares (2004) e Mortatti (2004), o censo de
1940 adotava como critério para declarar que a pessoa era alfabetizada ou não o fato de saber
assinar o próprio nome. Já em 1950 este critério foi ampliado para a escrita de um bilhete
simples.
Porém, a discussão a ser iniciada a seguir é um pouco mais complexa, já que não se
trata apenas de conceituar “alfabetização”, palavra que não provoca dúvidas nem polêmica,
por tratar-se de um vocábulo de uso corrente em nosso meio, principalmente se for associada
ao analfabetismo, que durante muito tempo foi uma realidade e uma das principais
preocupações de nossa sociedade. Abordaremos alguns conceitos de alfabetização e o
surgimento recente de um novo fenômeno denominado letramento que causa,
simultaneamente, estranheza, confluências e divergências.
4.3 Alfabetização e letramento
Alfabetização, no entender de Soares (2004, p. 91), “é o processo pelo qual se adquire
o domínio de um código e de habilidades de utilizá-lo para ler e para escrever, ou seja, o
domínio da tecnologia − do conjunto de técnicas − para exercer a arte e a ciência da escrita”.
Neste sentido, a autora afirma que uma das causas do fracasso na alfabetização, entre
várias outras, é a falta de sua especificidade, que em meados dos anos 80 foi deixada de lado,
em favor de uma visão unilateral, ligada ao construtivismo e ao socioconstrutivismo, teoria
cognotivista que considera a criança sujeito ativo capaz de interagir com a língua escrita com
material “para ler” e não como material artificialmente produzido para “aprender a ler”
caracterizando, segundo denominou Soares (2004, p.5), como a “desinvenção da
alfabetização”.
Por outro lado, a autora em foco defende que a alfabetização como processo de
aquisição de uma tecnologia tem sua especificidade, que não se deve deixar de lado, deve-se
trabalhar na escola de forma sistemática, embora vinculada ao meio em que vivemos.
Nesta perspectiva, Mortatti (2004) afirma que
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alfabetização entendida como aquisição de habilidades de mera
decodificação e codificação da linguagem escrita e as correspondes
dicotomias analfabetismo x alfabetização e analfabetos x alfabetizados, não
bastam mais. É preciso, hoje também saber usar a leitura e a escrita de
acordo com as contínuas exigências sociais, e esse algo mais é o que vem se
designando como letramento. (MORTATTI, 2004, p. 34).
Ou seja, mais do que compreender a relação fonema - grafema, faz-se necessário
também utilizar-se dessa tecnologia para expressar-se com clareza e de acordo com as
exigências de uma sociedade em que há um avanço crescente em relação à comunicação
escrita.
Travarei, portanto, na sequência algumas discussões a respeito desse novo fenômeno,
recentemente introduzido em nossa língua sob o vocábulo letramento, termo este que,
diferentemente da palavra alfabetização, ainda não se consolidou de forma abrangente no
meio educacional.
De acordo com Costa Val (2004), o surgimento do conceito de letramento no meio
acadêmico e educacional em geral tem provocado polêmicas e equívocos, ora por exagero, ora
por simplificação. Para a autora, a fonte desses equívocos e polêmicas é a não compreensão
de que esses dois processos são complementares, e não alternativos. Não se pode privilegiar
um em detrimento do outro, mas sim fazer uso das especificidades dos dois processos para se
alcançar os objetivos propostos.
Ela acrescenta que outra fonte de equívocos está em se pensar os dois processos como
sequenciais, um precedendo o outro sem acontecerem de forma concomitante, “como se o
letramento fosse uma espécie de preparação para a alfabetização, ou então como se a
alfabetização fosse condição indispensável para o início do processo de letramento” (COSTA
VAL, 2004, p. 24). É preciso, então, conciliar as práticas de alfabetização e de letramento,
considerando os conhecimentos dos alunos, sua realidade, para a partir do que já existe
superar a condição de analfabetismo e ampliar o grau de letramento dos educandos.
Vemos nos estudos de Soares (2006), Kleiman (2008) e Mortatti (2004) que a palavra
letramento surgiu pela primeira vez no livro escrito em 1986 por Mary Kato, de 1986
intitulado No mundo da escrita: uma perspectiva psicolinguística, editado pela Ática e, de lá
para cá, este vocábulo vem ganhando espaço no campo da Educação e das Ciências
Linguísticas. Em 1988, portanto, dois anos mais tarde, Leda Verdiani Tfouni, no capítulo
introdutório do livro Adultos não alfabetizados: o avesso do avesso, Ed. Pontes; distingue
alfabetização de letramento. A partir daí, o emprego do termo letramento se amplia no meio
acadêmico, nos discursos falados e escritos e, em 1995, já surge como título do livro
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organizado por Ângela Kleiman: Os significados do letramento: uma perspectiva sobre a
prática social, editado pela Mercado de Letras.
Frente a esses fatos, Soares (2006) se questiona e, logo a seguir, responde:
O que explica o surgimento recente dessa palavra? Novas palavras são
criadas (ou as velhas dá-se um novo sentido) quando emergem novos fatos,
novas ideias, novas maneiras de compreender os fenômenos. (SOARES,
2006, p.16).
Até então, o termo analfabetismo já era bem conhecido e muito utilizado, devido à
realidade sociocultural de nosso país; porém o seu antônimo, alfabetismo, não era conhecido,
não fazia parte da realidade. A partir do momento em que a maioria das crianças já está na
escola − supõe-se que saibam ler e escrever, estando, portanto, alfabetizadas − o termo
alfabetização tornou-se insuficiente, pois “não basta apenas saber ler e escrever, é preciso
também saber fazer uso do ler e escrever, saber responder às exigências de leitura e de escrita
que a sociedade faz continuamente – daí o surgimento recente do termo letramento.”
(SOARES, 2006 p. 20).
Tanto Soares (2006) quanto Mortatti (2004) fazem uma análise da palavra letramento
do ponto de vista morfológico e semântico. Trata-se de uma tradução para o português da
palavra inglesa literacy que, fragmentada, significa: littera: palavra latina que corresponde a
letra e cy: sufixo que indica qualidade, condição, estado. Portanto, literacy é a condição de ser
letrado com sentido diferente daquele da palavra letrado que já existe no dicionário, versado
em letras, erudito.
A palavra letramento, por sua vez é formada pelos seguintes elementos: letra: forma
portuguesa da palavra latina littera + mento: sufixo que indica resultado de uma ação.
Letramento, segundo Soares (2006, p. 38 – grifo da autora) “é o resultado da ação de
‘letrar-se’, se dermos ao verbo ‘letrar-se’ o sentido de tornar-se letrado.” A autora salienta que
ter se apropriado da escrita é diferente de ter aprendido a ler e escrever: apropriar-se da escrita
é saber utilizá-la nas práticas sociais que exigem essa habilidade, enquanto aprender a ler e a
escrever é compreender e utilizar uma tecnologia, que passa pela codificação e decodificação
da língua escrita. Assim, confirma-se, não é suficiente apenas saber ler e escrever, mas
também faz-se necessário envolver-se com as práticas sociais da escrita.
Kleiman (2008, p.18) define letramento como um “conjunto de práticas sociais que
usam a escrita, como sistema simbólico e como tecnologia, em contextos específicos, para
objetivos específicos.” De acordo com a autora as práticas específicas da escola são apenas
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um dos tipos de prática e não o único, visto que leitura e escrita não se delimitam aos muros
escolares.
Assim, baseando-se nos estudos de Street (1994), a autora destaca dois modelos de
letramento: o autônomo e o ideológico. No primeiro, o processo de letramento é unilateral,
pois se caracteriza pelo fato de que a escrita seria um produto completo em si mesmo,
independente do contexto de produção. Sob esta ótica, a escrita é vista como um produto
autônomo, independente do seu contexto de produção para ser interpretado. Daí a crença de
que somente através da escola tradicional, do ensino da norma culta, elitista, vista como a
mais privilegiada socialmente, é que haverá desenvolvimento, progresso e civilidade. Trata-se
de uma visão reducionista e autoritária que se presta a alimentar o quadro do fracasso escolar.
O modelo ideológico, por sua vez, se contrapõe ao modelo autônomo, uma vez que
considera as práticas de letramento associadas ao meio social e culturalmente determinadas,
dependente do contexto e das instituições em que são produzidas. Neste modelo, afirma
Kleiman
não pressupõe uma relação causal entre letramento e progresso da
civilização ou modernidade, pois em vez de conceber um grande divisor
entre grupos orais e letrados, ele pressupõe a existência e investiga as
características de grandes áreas de interface entre práticas orais e letradas.
(KLEIMAN, 2008, p.21).
O modelo ideológico leva em consideração a determinação do social e do cultural nas
práticas de letramento da sociedade. Não elege a escola como a única instituição que garanta a
ascensão social. Em outras palavras, a escola não é o único espaço onde as práticas letradas
são desenvolvidas, é apenas uma das instâncias onde se pratica a leitura e a escrita.
Porém, em nossa sociedade grafocêntrica, a exigência de saber redigir um bilhete,
preencher um formulário, redigir um ofício, um requerimento, preencher um envelope de
depósito de banco, elaborar uma lista de compras, encontrar informações num catálogo, numa
lista telefônica, no visor de um celular, ou de um caixa eletrônico é cada vez mais impositiva
para se atender a essas demandas.
Soares (2006) chega a afirmar que precisaríamos inventar o verbo “letrar” para nomear
a ação de levar os indivíduos ao letramento. Com isso, corrobora que alfabetizar e letrar não
devem ser vistos como duas ações distintas, mas como ações que se completam; que não se
anulem reciprocamente, mas sim que se complementem:
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Dissociar alfabetização e letramento é um equívoco porque, no quadro das
atuais concepções psicológicas, lingüísticas e psicolingüísticas de leitura e
escrita, a entrada da criança (e também do adulto analfabeto) no mundo da
escrita ocorre simultaneamente por esses dois processos: pela aquisição do
sistema convencional de escrita – a alfabetização- e pelo desenvolvimento de
habilidades do uso desse sistema em atividades de leitura e escrita, nas
práticas sociais que envolvem a língua escrita- o letramento. Não são
processos independentes, mas interdependentes, e indissociáveis: a
alfabetização desenvolve-se no contexto de e por meio de práticas sociais de
leitura e de escrita, isto é, através de atividades de letramento, e este, por sua
vez, só se pode desenvolver no contexto da e por meio da aprendizagem das
relações fonema-grafema, isto é, em dependência da alfabetização.
(SOARES, 2004, p. 14 – grifo da autora).
Percebemos, felizmente, que já existem alguns esforços no sentido de alfabetizar
letrando, contudo, ainda há muito o que fazer, até mesmo porque tanto o fenômeno quanto a
palavra letramento ainda são bem recentes, e a compreensão destes termos também. Acredito
que faz-se necessário que o tema seja debatido por educadores em cursos de formação inicial
e continuada e nos grupos de estudos das horas-atividade nas escolas.
Temos que levar em consideração também as experiências de letramento dos alunos,
pois muitas vezes o enfoque que a escola procura dar à escrita, isto é, o letramento
tipicamente escolar, realizado de forma autoritária, artificial e pouco significativa, não
despertará nos discentes o interesse em mobilizar seus esforços cognitivos para aprender a ler
e a escrever.
Não se pode perder de vista, ainda, que alfabetizar na perspectiva do letramento
envolve processos complexos de compreensão do sistema de escrita, que requerem estratégias
metodológicas, as quais abrangem momentos de leitura e produção de diferentes gêneros
textuais e momentos de reflexão sobre a constituição do sistema de escrita alfabética.
Nesta vertente, Leal (2004) salienta que é de fundamental importância que, na
escolarização inicial, sejam encaminhadas atividades de apropriação do Sistema Alfabético
simultaneamente às atividades de apropriação dos usos e funções sociais da escrita, com
reflexões acerca dos diversos gêneros de textos que circulam socialmente. (LEAL, 2004, p.
2). Por outro lado, a educação vista como processo historicamente construído nos leva a
refletir que as mudanças que acontecem no meio educacional são, por vezes, lentas e
gradativas. Deparamo-nos com professores que se fecham aos novos conceitos e às novas
teorias sobre alfabetização. Acreditam que o método “tradicional” ou aquele que foi utilizado
para a sua própria aprendizagem no passado é que era melhor. Neste contexto, notamos
também que os cursos oferecidos pelas Secretarias de Educação dos municípios,
especialmente no município de Rondonópolis – MT, muitas vezes não atingem o objetivo
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maior de oferecer formação continuada a todos os alfabetizadores. Todavia, estou convicta de
que a formação inicial aliada à formação continuada, num projeto educativo maior, alcançará
o objetivo esperado.
É preciso, enfim, que os alfabetizadores compreendam que, para se alfabetizar
letrando, a escrita deve ser entendida como inerente ao cotidiano, visto fazer parte da nossa
sociedade. Os alfabetizandos vivem numa sociedade “letrada”, pois a língua escrita está
presente nas atividades diárias. O desafio lançado ao alfabetizador, então, é o de não dissociar
alfabetização de letramento, mas sim conciliar esses dois processos a fim de fazer com que os
alunos se apropriem do sistema alfabético-ortográfico e obtenham a plena condição do uso da
língua nas práticas sociais de leitura e escrita.
4.4 O letramento e sua relação indissociável com os gêneros textuais
Pode-se afirmar que o termo letramento é recente em nossa língua, visto que, como
explicitado anteriormente, seu surgimento apresenta cerca de trinta anos. A partir daí
estudiosos e teóricos do meio educacional vêm explorando suas possibilidades. Salienta-se,
porém, que a questão dos gêneros textuais, na esfera comunicativa e social já é bem mais
antiga, embora, há aproximadamente dez anos, de acordo com os PCN (BRASIL, 1997) sua
importância venha sendo colocada em evidência no meio educacional.
Considerando o aspecto sócio interacional da linguagem, é possível afirmar que os
sentidos se constroem na interação verbal entre as pessoas e são resultados da produção dos
discursos: quem diz o que, para quem, com que intenção, com que finalidade, através de qual
gênero textual, com que propósito comunicativo e com quais escolhas linguísticas.
Durante muito tempo (e, em alguns casos, até os dias atuais), nas aulas de Língua
Portuguesa, o ensino da língua restringia-se à análise das formas linguísticas, morfológicas e
sintáticas a partir da classificação de períodos, orações, classes de palavras, etc.; ressaltando o
aspecto normativo da língua.
A partir das três últimas décadas é que o eixo de um ensino normativo se desloca para
o procedimental (ROJO; CORDEIRO, 2004). A ênfase passou ao ensino de língua através de
textos. A partir das novas discussões a respeito do ensino da linguagem, da compreensão da
língua como artefato dinâmico social e histórico, dotado de função mediadora entre os
homens, o foco sobre os gêneros do discurso ganhou maior importância.
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Conforme se vê nos PCN de Língua Portuguesa para o ensino fundamental, um dos
objetivos aponta para a necessidade de que o ensino seja organizado no sentido de levar o
aluno a:
expandir o uso da linguagem em instâncias privadas e utilizá-la com eficácia
em instâncias públicas, sabendo assumir a palavra e produzir textos — tanto
orais como escritos — coerentes, coesos, adequados a seus destinatários, aos
objetivos a que se propõem e aos assuntos tratados; (BRASIL, 1997, p. 32).
A esse respeito, observa Rojo (2004, p. 39):
Desloca-se a visão corrente de ensino de Língua Portuguesa como
objetivando a construção de conhecimentos e conceitos sobre a língua e da
capacidade de análise lingüística em favor de uma visão comunicativa ou
enunciativa, em que se trata de ensinar os usos da linguagem oral e escrita,
na compreensão e produção de textos socialmente situados, com finalidades
comunicativas e ocorrendo em situações específicas de discurso. (ROJO,
2004, p. 39).
Dessa forma, percebo que o enfoque dos gêneros textuais cumpre esse papel de fazer
com que a linguagem, com a sua faceta comunicativa e interacional, seja evidenciada e tenha
sentido para seus usuários. Os gêneros “são respostas às necessidades humanas de
comunicação, são fenômenos ou entidades sócio-comunicativas.” (MENDONÇA, 2007, p.
38/39).
Os gêneros podem ser caracterizados como uma ação de linguagem que pressupõe
uma decisão, ou seja, ao expressarmo-nos faz-se necessária a escolha de um gênero do
discurso com sua finalidade e com uma intenção comunicativa. De acordo com Bakhtin (apud
SOARES, 2006, p.10), “cada esfera da utilização da língua elabora seus tipos relativamente
estáveis de enunciados, sendo isso que denominamos gênero do discurso”.
Assim, os gêneros consistem em formas culturais e cognitivas de ação social,
estabilizadas ao longo da história, corporificadas de modo particular na linguagem,
caracterizadas pela função sócio-comunicativa que preenchem (BAKHTIN, 1997;
MARCUSCHI, [2002]). Podemos, contudo, observar que os gêneros são maleáveis,
dinâmicos, modificam-se de acordo com o tempo, com a sociedade, para atender à demanda e
aos diversos eventos de letramento desta sociedade. Assim é que gêneros novos surgem (é o
caso dos blogs, das “anotações de aulas” como propõe Moraes (2011); alguns se modificam
(como é o caso dos artigos científicos que se modificaram com o tempo) e outros
desaparecem por falta de uso (como o telegrama, alguns tipos de carta).
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Conforme afirma Cardoso (2003), seguindo a vertente bakhitiniana,
a riqueza e a variedade dos gêneros do discurso são infinitas, uma vez que a
variedade virtual da atividade humana é inesgotável, e cada esfera da
atividade comporta um repertório de gêneros de discurso que, por sua vez,
também vai se diferenciando e se ampliando à medida que se desenvolve a
própria esfera. (CARDOSO, 2003, p. 73).
Nesta perspectiva, passamos por várias situações comunicativas (tanto na escola
quanto fora dela) relacionadas ao letramento e materializadas na forma de um gênero textual,
seja falado ou escrito. Como exemplo, posso citar os textos didáticos, que servem para
conhecer; notícias, para informar; seminários, para levar outros a conhecer; fábulas e
romances, para fantasiar; poemas, para expressar sentimentos e emoções; trava-línguas,
piadas, adivinhações e parlendas para divertir; mapas, para nos situarmos; placas, para
informar; cartas do leitor e artigos de opinião, para criticar e nos levar a refletir e nos
posicionar, etc.. Os gêneros são infinitos e diversos, mas não são estáticos e estanques. Uma
carta, por exemplo, pode iniciar com um vocativo ou não5; o que determinará essa
classificação é o tema, o estilo e sua estrutura composicional.
De acordo com a definição bakhtiniana (1997) o gênero se caracteriza por apresentar
um conteúdo temático, um estilo e uma construção composicional, e sua escolha é
determinada “pela esfera, as necessidade da temática, o conjunto dos participantes e a vontade
enunciativa ou intenção do locutor” (SCHNEUWLY, 2004, p. 25).
A escolha do gênero, segundo Schneuwly (2004), se dá em função de uma situação
definida a partir de um parâmetro, de uma finalidade, de um conteúdo para um determinado
destinatário. Isso condiciona a opção por um gênero, com uma certa estabilidade, uma certa
estrutura definida por sua função, caracterizada por um estilo. Não um estilo individual, mas o
estilo de um gênero. Assim, ao escrevermos uma poesia, por exemplo, levamos em conta sua
estrutura composicional, considerando versos, estrofes, rimas, musicalidade, linguagem
figurada e subjetiva, entre outros aspectos, e sua função que pode ser a de emocionar, de
expressar-se de forma criativa e artística através das palavras.
O mesmo autor ainda explicita que o gênero representa um instrumento que possibilita
a comunicação entre as pessoas; psicologicamente, “os instrumentos encontram-se entre o
5 Cito, como exemplo, o texto “Apelo”, de Dalton Trevisan, que, apesar de não seguir a estrutura de uma carta
(como data, saudação inicial, vocativo, assunto, despedida e assinatura), caracteriza-se como tal, devido ao
conteúdo. Este texto encontra-se disponível no site releituras.com/daltontrevisan_apelo.asp.
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indivíduo que age e o objeto sobre o qual ele age: eles determinam seu comportamento,
guiam-no, afinam e diferenciam sua percepção da situação na qual ele é levado a agir.”
(SCHNEWLY, 2004, p. 23). Ressaltamos, aqui, o gênero como o instrumento que determina
a mediação entre o sujeito e o objeto, acrescentando que, segundo esse autor, o instrumento é
tripolar, pois medeia a ação do sujeito em relação à situação na qual este sujeito está inserido,
ou seja, a esfera social, o contexto.
De acordo com Bagno, Stubbs e Gagné (2002), baseando-se nos escritos de Marcuschi
(2001), o gênero é uma forma textual concretamente realizada que se encontra como texto
empírico, materializado tanto de forma oral como de forma escrita no meio social em que
vivemos. Está estritamente ligado à esfera social, histórica e comunicativa. O gênero tem
existência concreta em designações diversas constituindo-se em conjuntos abertos, portanto,
dinâmicos.
Voltando à questão da alfabetização e do letramento, observamos, neste ponto, que
não se pode dissociá-los dos gêneros textuais, visto que estes funcionam como determinantes
e mediadores das ações discursivas. Dito em outras palavras, eles são a língua viva, dinâmica,
relacionada ao meio sócio-histórico-econômico-cultural em que vivemos. Por conseguinte, a
escola, vista segundo Kleiman (2008, p. 20), como “a mais importante das agências de
letramento”, não pode conceber a alfabetização desvinculada do letramento, pois isso é negar
a importância da linguagem viva e corporificada pelos gêneros textuais, orais ou escritos.
A escola deve, portanto, ampliar as experiências de letramento dos alunos,
promovendo eventos relevantes para a formação de sujeitos autônomos e críticos que tenham
segurança nas mais diversas práticas de utilização da escrita, inclusive aquelas mais
valorizadas e prestigiadas em nossa sociedade grafocêntrica.
Por isso, pensamos que o professor alfabetizador deva conhecer os gêneros textuais,
seu modo de funcionamento, sua estrutura e finalidade para realizar um trabalho didático
sobre eles, decidindo estratégias e definindo metas a atingir.
Letramento e gêneros estão intimamente ligados, pois, sempre que falamos,
escrevemos, nos comunicamos de forma oral, escrita ou televisiva, entre outras, o fazemos por
meio de um gênero.
Rojo (2004) observa que
os gêneros enquanto formas historicamente cristalizadas nas práticas sociais,
fazem a mediação entre a prática social ela própria e as atividades de
linguagem dos indivíduos. Os locutores sempre reconhecem um evento
comunicativo, uma prática de linguagem, como instância de um gênero [...].
67
O gênero funciona, então, como um modelo comum, como uma
representação integrante que determina um horizonte de expectativas para os
membros de uma comunidade confrontados às mesmas práticas de
linguagem. Os gêneros, portanto, intermediam e integram as práticas às
atividades de linguagem. São referências fundamentais para a construção das
práticas de linguagem. (ROJO, 2004, p. 41).
A autora compreende, também, que a alfabetização deve ser realizada de forma
contextualizada com as formas de letramento. Assim, é possível relacionar o conhecimento do
alfabeto com gêneros de circulação social concreta, além de promover uma aprendizagem
prazerosa, instigante, criativa, que desperta o interesse do educando, uma vez que ele vê
sentido no que lhe é proposto.
Valorizar a experiência social e cultural do aluno, compreender e aproveitar as práticas
de letramento da sociedade, bem como entender os gêneros do discurso como formas
didáticas, são atitudes importantes para que o ensino de língua materna em nossas escolas seja
cada vez mais significativo para o aluno. Este, por sua vez, além de perceber a relação entre
fonema e grafema, de se apropriar do sistema alfabético-ortográfico de nossa língua a fim de
ler e escrever com autonomia, fará isso com prazer e interesse, pois compreenderá os usos e
as possibilidades da escrita no seu cotidiano. Encarar a escrita contextualizada e ligada aos
eventos de letramento é proporcionar ao estudante momentos ímpares de aprendizagem, pois
assim ele compreenderá a utilidade e a finalidade da escrita na sociedade.
Neste capítulo, procuramos em linhas gerais aprofundar as discussões acerca da
alfabetização, do letramento e dos gêneros textuais, ressaltando a importância da compreensão
destes termos pelos professores alfabetizadores a fim de que, a partir desta, possam contribuir
de forma efetiva para que o processo de alfabetização e letramento aconteça de forma
complementar e indissociada.
Neste sentido, a escola e os professores alfabetizadores precisam realizar um trabalho
intencional e sistemático a fim de que os falantes da língua, pequenos aprendizes, possam se
alfabetizar letrando-se e compreendendo os usos dos diferentes gêneros textuais nas esferas de
utilização desses gêneros. Em outras palavras, saber se expressar de forma autônoma, clara e
objetiva, de acordo com as exigências, com a situação, com o contexto e com a necessidade
das práticas sociais.
No meio social em que vivemos não basta ser alfabetizado, mas é necessário fazer uso
desta tecnologia nas práticas sociais de utilização da escrita. Com isto, fica evidente a
necessidade de se trabalhar com os gêneros textuais, porém não de forma mecânica, mas sim
contextualizada, a fim de que consigamos alcançar o objetivo maior, que é formar pessoas
68
capazes de se expressarem com clareza e autonomia, segundo os diferentes gêneros textuais
que empregam.
Em nossa sociedade, pelas avaliações realizadas e pelos índices de analfabetismo
ainda persistentes, mostra-se urgente realizar um trabalho no sentido de conciliar
alfabetização e letramento, uma vez que ainda percebemos que o baixo letramento está
relacionado à condição da pessoa que é alfabetizada de que aprendeu técnicas de decifração
do código escrito, mas não consegue compreender textos mais complexos, localizando e
relacionando informações.
Essa é uma triste realidade que se evidencia no cotidiano de nossas escolas. Em
contraposição a isso, existem também, pessoas letradas, mas não alfabetizadas. Trata-se de
pessoas que, mesmo incapazes de ler e escrever, compreendem os papéis sociais da escrita,
distinguem gêneros ou reconhecem diferenças entre as línguas escrita e a oralidade. Assim
sendo, cabe à escola instrumentar seus educandos, no sentido de que, a partir da alfabetização,
seu nível de letramento seja valorizado e ampliado.
Nesse sentido, penso que os avanços para melhorar a qualidade do ensino e para
diminuir os índices de analfabetismo passam pelo esforço de todos, professores, governantes e
sociedade em geral. Sabemos que todas as transformações são históricas e não acontecem
repentinamente. No próximo item, exporei como a forma ensino da produção de textos
modificou-se ao longo do século XX.
4.5 Contextualização histórica da produção de textos
Um estudo realizado por Beth Marcuschi (2010) demonstra, por meio da análise de
propostas de produção textual em seletas, antologias e nos livros didáticos, as principais
perspectivas que orientavam o trabalho de elaboração textual na escola ao longo do século
XX. Baseando-me nos escritos dessa autora, farei uma breve contextualização histórica sobre
o percurso do ensino da produção textual nas escolas, desde o início do século XX até os dias
atuais.
Beth Marcuschi (2010) aponta que, desde o início do século XX até o final dos anos
1980, as aulas de língua portuguesa estiveram voltadas para a escrita correta, onde se
privilegiava o uso das regras da gramática normativa e da ortografia. O trabalho pedagógico
em sala estava voltado para a análise morfológica e sintática de palavras e frases isoladas,
associada à leitura de textos literários clássicos, e essa forma de trabalho era vista como
69
suficiente para a capacitação dos alunos para a escrita. Os textos eram considerados como um
agrupamento de palavras e frases que deveriam estar gramaticalmente corretas.
A autora afirma que, apesar de durante esse período haver uma certa linearidade nesta
tendência, não houve uma total homogeneidade nos aspectos teórico-metodológicos para o
ensino de língua escrita nesse espaço de tempo. Assim, é possível desdobrar as diferenças
neste período em três etapas, para fins de análise:
a) início do século XX aos anos 1950;
b) anos 1960 e 1970;
c) anos 1980.
No início do século XX, com resquícios dos encaminhamentos pedagógicos do século
XIX, a forma de escrita em sala de aula era solicitada em forma de composição livre, de uma
composição a vista de gravura, e de trechos narrativos ou ainda de cartas (MARCUSCHI,
2010, p. 67). A escrita, no primeiro ano, era baseada na reprodução e imitação de pequenos
trechos, de modelos escolhidos pelo professor, nas antologias adotadas oficialmente;
passando, do segundo ao quarto ano, pelas descrições e narrações breves e escrita de trechos
de cartas; no quinto ano, a escrita era a redação livre, para posterior escrita autônoma do
aluno, “composição de lauda própria”, no sexto ano. Momento em que o professor dava um
tema livre para o aluno, com um limite de 30 linhas, para que seu texto acontecesse
(MESERINI 1995 apud MARCUSCHI, 2010, p. 67).
Assim o aluno, a partir de um conjunto de informações, teria que compor um texto,
usando a imaginação, a originalidade e a correção gramatical. Além disso, a escrita era
orientada no sentido de ressaltar a formação moral e espiritual do aluno, disponibilizando
modelos que a organização e o tema escritos estivessem voltados a um ensinamento moral
visto como inquestionável. Neste período não havia uma preocupação com a interlocução e a
intencionalidade do texto, ou seja, ao aluno não eram explicitados os objetivos da atividade, o
leitor presumido do seu texto, nem o espaço de circulação deste texto. O objetivo da
composição escrita dos alunos era o de fornecer ao professor dados a respeito da
aprendizagem, das regras ortográficas, da correção gramatical e dos preceitos morais,
desconsiderando, portanto, o processo de construção dos sentidos.
As décadas de 1960 a 1980 são marcadas pela ampliação do acesso à escola, ou seja, a
democratização do ensino formal público. Nesse período, as crianças das classes menos
favorecidas passaram a frequentar a escola, modificando a forma do trabalho com a escrita,
antes baseado na escrita de textos literários e autores clássicos.
70
Com a lei 5692/71, o ensino de língua materna passou a ter uma disciplina
denominada “comunicação e expressão” em que se valorizava a capacidade do indivíduo de
se comunicar de modo “claro, lógico e fluente nas ações cotidianas, no trabalho e nas demais
esferas sociais, ainda que essa comunicação devesse ficar restrita ao ideologicamente
permitido.” (MARCUSCHI, 2010, p. 71).
Esse foi um período em que o contexto político não permitia que as pessoas
expressassem suas ideias, devido à repressão política e à ditadura militar, que o país estava
atravessando, por isso, a escola vivenciava um conflito, pois ao mesmo tempo em que
estimulava o aluno a expressar suas ideias de modo livre e criativo, com atividades de redação
livre, era pressionada a cercear a liberdade do aprendiz, no seu posicionamento diante dos
acontecimentos políticos da época.
Nesse período, com o intuito de levar o aluno a se expressar com clareza, as redações
deveriam ser produzidas levando-se em consideração a identificação do emissor, do receptor e
da mensagem. Exercícios e atividades escritas na produção de textos, com pontuação correta.
A narrativa deveria ser composta por um conjunto de elementos como: narrador, ação,
personagens, ambiente e espaço temporal, projetados para um receptor abstrato. É nesse
período que se forjam os “gêneros escolares”, dissertação, narração e descrição criados a
partir de um modelo, de uma técnica de redação que deve ser aplicada no sentido de transmitir
através do código (língua) uma mensagem clara e objetiva, padronizada dirigida para qualquer
pessoa e, ao mesmo tempo, para ninguém (MARCUSCHI, 2010, p.73).
Nos anos 1980, a autora ressalta que houve uma mudança substancial no ensino de
escrita, a partir de estudos realizados por Geraldi (1997) e Marcuschi e Leal (2009), os quais
publicam estudos que apontam a redação escolar como um não texto, pois se caracteriza como
um produto artificial que não atendia aos aspectos interlocutivos próprios dos textos que
circulam fora da sala de aula.
Esses estudos propõem que se deixe de “fazer redações” e passe a se produzir textos
com enfoque no processo envolvido no ato de escrever. Dessa forma, percebe-se que a escrita
a ser desenvolvida em sala de aula deveria priorizar a língua, no seu aspecto interacional e que
estivesse relacionada ao contexto e à ação de seus usuários.
Nesse período, priorizava-se, então, a organização textual, de modo a garantir a
produção de textos coesos, coerentes, situados, articulados e informativos, bem como que
respeitassem a estrutura início, meio e fim, próprios da narração, descrição e dissertação. Os
livros didáticos, inseridos neste contexto, traziam atividades centradas nos aspectos formais
do texto que buscavam garantir a estruturação e a hierarquização internas do mesmo.
71
Os aspectos formais do texto ainda eram priorizados, em detrimento da
contextualização, da funcionalidade e da situação em que os textos eram produzidos, o
objetivo da escrita se esgotava na produção textual em si. Apesar disso, essas reflexões foram
importantes para que a perspectiva sócio interacionista da linguagem ganhasse força nas salas
de aula nos anos seguintes, principalmente com a difusão das proposições acerca dos gêneros
textuais. Além disso, “discussões desencadeadas por políticas públicas de educação”, dentre
as quais os Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Fundamental I e II (BRASIL, 1997)
e o Programa Nacional do Livro Didático contribuíram, igualmente, para que autores de obras
didáticas de Língua Portuguesa dispensassem atenção e cuidado maiores ao ensino e
aprendizagem da escrita (MARCUSCHI, 2010, p. 75).
A partir da segunda metade dos anos 90, o estudo dos gêneros textuais tornou-se mais
presente no contexto das salas de aula. A princípio, priorizava-se a nomeação e a classificação
dos gêneros textuais, observando suas características tidas como fixas. A preocupação ainda
se centrava no ensino dos gêneros textuais em si mesmos, para identificação e classificação,
não se diferenciando dos estudos estruturais da gramática.
Com a ampliação do diálogo em torno das concepções teóricas de Bakhtin (1997;
2010), estudiosos como Dolz e Schneuwly (2004), Marcuschi (2008), Rojo (2004) passaram
a defender a importância de se relacionar os gêneros textuais às práticas sociais.
Nessa perspectiva, os gêneros textuais relacionados às “práticas sociais” são vistos
“como dinâmicos e de expressiva plasticidade, são constitutivos das práticas discursivas e
sociais, exercem funções sociocognitivas no contexto das relações humanas e não funcionam
de forma independente nem autônoma na produção de significação.” (MARCUSCHI, 2010,
p.76).
Os gêneros regulam nossa ação discursiva, possibilitando a comunicação relacionada
ao objetivo que queremos atingir. Através do gênero é possível interagir, expressar desejos,
socializar conhecimentos, convencer pessoas, dar instruções, entre outras ações que envolvem
a interação entre os participantes de uma sociedade.
Concomitante à autora, concordo que o ensino da produção textual com base em
gêneros possibilita ao aluno aquisição da competência para atuar de forma autônoma e
participativa no meio sócio cultural em que está inserido.
De acordo com o histórico acima delineado, é possível afirmar que as mudanças que
ocorreram em relação ao ensino da escrita nas escolas têm buscado um trabalho
contextualizado com a linguagem. É preciso levar o aluno a compreender que a escrita deve
ser entendida “como um processo de interlocução entre leitor-texto-autor que se concretiza
72
via gêneros textuais num contexto sócio historicamente situado.” (MARCUSCHI, 2010 p.78).
Dessa forma, a escola precisa possibilitar ao aluno a construção de conhecimento com a
finalidade de que ele saiba se expressar utilizando-se da escrita contextualizada, com
finalidades específicas e que, para ele, tenha sentido.
É necessário, portanto, que o ensino da língua materna perpasse os diferentes
letramentos (literário, jornalísticos, midiáticos) bem como, considere o contexto de produção
dos textos, observando seus objetivos, os possíveis leitores, o suporte onde o texto será
disponibilizado, e o gênero textual que se pretende utilizar: resumo, quadrinhas, poemas,
reportagem, música, fábulas, piadas, contos entre outros.
Ensinar sistematicamente a escrita envolve várias etapas, como o planejamento global
do texto, e as etapas de avaliação, revisão e reformulação. Nesse sentido, o texto, ao ser
planejado, envolve conhecimento sobre o gênero textual, sobre o assunto, a finalidade da
escrita e uma relação com o mundo. Ou seja, o interlocutor, a finalidade, os objetivos a serem
alcançados com um determinado texto. Nesse aspecto, o professor precisa ter clareza de como
realizar o trabalho pedagógico com o gênero, pois precisa estar atento ao assunto que deseja
ver abordado e que deve estar em sintonia com a prática social, com o gênero estudado e
também com a faixa etária do aluno. Nas palavras da autora:
[...] a escrita deve ser entendida como um processo de interlocução entre
leitor-texto-autor que se concretiza via gêneros textuais num contexto sócio-
historicamente situado. Por essa razão, no ensino da elaboração textual,
devem ser propostas situações que se reportem a práticas sociais e a gêneros
textuais passíveis de serem reconstituídos, ainda que parcialmente, em sala
de aula, tanto no que se refere à produção quanto no que se refere à recepção
do texto escrito. Escrever na escola, portanto, deve ser visto como um ensaio
ou mesmo uma prévia convincente do que será requerido dos jovens
aprendizes no espaço social. (MARCUSCHI, 2010, p. 78).
Por isso é necessário que o seu trabalho seja planejado no sentido de fazer com que a
escrita não seja algo que cause estranheza e aversão, mas que seja vista como prática social
que está presente no nosso cotidiano. Dessa forma, não basta apenas identificar e classificar
gêneros, como fora feito na década de 1990, mas é necessário dar condições aos alunos para
que eles sejam autônomos na produção de textos, ativando seus conhecimentos sobre a
temática, buscando informações novas e desenvolvendo a capacidade comunicativa, mediante
o conhecimento dos diferentes gêneros que circulam na esfera social.
73
4.6 O Pró-Letramento: uma das possibilidades para a melhoria da qualidade na
Educação Básica
Estudos comprovam que a formação inicial aliada à formação continuada pode
auxiliar o professor na busca por novas metodologias de trabalho que subsidiem sua prática.
Não se pode, simplesmente, cobrar resultados positivos do professor alfabetizador,
culpabilizando-o por todos os percalços da educação, mas, antes, instrumentá-lo com novas
teorias que o auxiliem e o capacitem para a sua prática docente.
O crescimento profissional docente depende de sua participação em programas de
formação continuada que tragam conhecimentos relevantes para a melhoria de sua prática em
sala de aula. Seguindo a vertente freiriana, Silva e Araújo afirmam que:
a formação continuada é concebida como um processo contínuo e
permanente de desenvolvimento profissional do professor, onde a formação
inicial e continuada é concebida de forma interarticulada, em que a primeira
corresponde ao período de aprendizado nas instituições formadoras e a
segunda diz respeito à aprendizagem dos professores que estejam no
exercício da profissão, mediante ações dentro e fora das escolas,
denominado pelo Ministério da Educação (MEC), de formação permanente
(SEF, 1999). (SILVA; ARAÚJO 2005, p. 5).
Ao observar o material do programa Pró-Letramento, percebi que o mesmo destaca
alguns aspectos ligados aos conceitos de alfabetização e letramento, ressaltando a relevância
do trabalho com os diversos gêneros que circulam em nossa sociedade. Dessa forma, o
programa propõe que os professores valorizem o trabalho com o gênero textual,
compreendendo conceitos e realizando um trabalho com a escrita voltado para as práticas
sociais. “Por isso é importante que a escola, pela mediação do professor ou da professora,
proporcione aos alunos o contato com diferentes gêneros e suportes de textos escritos.”
(MEC/SEB, 2008, p. 19).
Destaco também, neste outro trecho do material do programa mais uma observação
positiva em relação ao trabalho com os gêneros textuais:
Trabalhar conhecimentos, capacidades e atitudes envolvidas na compreensão
dos usos e funções sociais da escrita implica, em primeiro lugar, trazer para a
sala de aula e disponibilizar, para observação e manuseio pelos alunos,
muitos textos, pertencentes a gêneros diversificados, presentes em diferentes
suportes. Mas implica também, ao lado disso, orientar a exploração desses
materiais, valorizando os conhecimentos prévios do aluno, possibilitando a
ele deduções e descobertas, explicitando informações desconhecidas.
(MEC/SEB, 2008, p. 20 – grifo meu).
74
Fica bastante evidente a importância atribuída à valorização e à exploração dos
gêneros textuais que circulam na sociedade de uma forma geral, e que devem ser trabalhados
pelo professor alfabetizador, para que os alunos compreendam a função social da leitura e da
escrita.
75
5 PROGRAMA PRÓ-LETRAMENTO: O QUE SINALIZA O ESTADO DO
CONHECIMENTO
Inicio este capítulo com uma pesquisa do tipo estado do conhecimento, que teve por
objetivo investigar como as pesquisas em nível nacional abordam o trabalho com os gêneros
textuais nos anos iniciais de alfabetização, bem como, nos Programas de Formação
continuada de Professores Alfabetizadores, denominado Pró-Letramento.
5.1 Estado do conhecimento: detalhes de sua elaboração
Como este programa foi implantado pelo MEC no ano 2005, as buscas realizadas nos
sites com este descritor, contemplam os anos de 2005 a 2010. As questões que buscaram
respostas na pesquisa foram: Qual a incidência de trabalhos que abordam o tema gêneros
textuais? Qual o volume de pesquisas sobre o programa de formação para professores
alfabetizadores denominado Pró-letramento, apresentado no cenário nacional, após sua
implantação em 2005? Em que área do conhecimento o tema mencionado vem sendo
explorado? Que metodologia é utilizada nessas pesquisas? No intuito de buscar respostas nos
sites eletrônicos, do banco de teses e dissertações da Coordenação de Aperfeiçoamento e de
Pessoal de Nível Superior (CAPES), na biblioteca eletrônica - Scientific Eletronic Library
Online (SCIELO) e no Instituto Brasileiro de Informação e Tecnologia (IBCT), realizei esta
pesquisa para verificar a relevância do desenvolvimento desta investigação.
Como já frisado anteriormente, o Programa Pró-letramento foi implantado
recentemente na rede municipal de ensino de Rondonópolis – MT e está sendo desenvolvido
pela Secretaria Municipal de Educação e Cultura (SEMEC) com professores da rede
municipal de educação que atuam nos anos iniciais de alfabetização. Descobrir como os
gêneros textuais são abordados neste contexto é o objetivo desta proposta de investigação,
dessa forma, conhecer as pesquisas realizadas neste âmbito é de suma importância para que se
possa perceber o volume das produções já efetuado e, assim, ter noções sobre os temas mais
abordados e os silenciados nas pesquisas.
Neste sentido, o enfoque inicial desta investigação está voltado para os gêneros
textuais, visto que o ensino de linguagem deve privilegiar a compreensão e a valorização das
funções da escrita na sociedade, pois se escreve para registrar, preservar, informar, partilhar
sentimentos, emoções, informações e pensamentos.
76
Assim, o professor como mediador deste processo de construção das habilidades de
leitura e escrita deve procurar, por meio de sua formação, atualizar-se, a fim de compreender
o que são os gêneros textuais, para, desse modo, oferecer um ensino de boa qualidade aos seus
alunos.
O trabalho com gêneros textuais nas escolas, de uma forma geral, ainda é bastante
tímido, principalmente no tocante à alfabetização. Considero o trabalho com os gêneros
textuais mais significativo para o aluno, pois é através da contextualização da escrita no
processo de alfabetização e letramento que o educando será capaz de utilizar-se da escrita nos
seus mais diversos contextos. Para tanto, programas de formação continuada para professores
alfabetizadores têm sido implantados em todo o país, no sentido de subsidiar professores com
novas metodologias de trabalho.
No estado de Mato Grosso, alguns programas de formação continuada de professores
alfabetizadores, que trabalham com as séries iniciais, já vêm sendo desenvolvidos há algum
tempo.
Rocha (2010) aborda sobre o tema em sua pesquisa evidenciando que a formação
continuada de professores no estado de Mato Grosso, nas décadas de 1977 a 1987, foi em
torno do magistério, a fim de capacitar esses professores para atuarem nas séries iniciais, pois
a maioria deles era leiga e estavam atuando na alfabetização. Afirma a autora que somente a
partir da década de 1980, com a maior conscientização dos professores sobre seus direitos e
necessidade de enquadramento em planos de cargos de carreiras e salários, houve um maior
envolvimento dos profissionais em busca de aperfeiçoamento em sua formação. Este foi um
período de luta e mobilização no sentido de buscar acesso a referenciais teóricos e à formação
de professores. Este cenário de preocupação com a formação continuada no Estado de Mato
Grosso fez com que acontecessem encontros estaduais e municipais, no sentido de reivindicar
uma melhor formação dos professores.
Na rede municipal de educação de Rondonópolis-MT, a formação de professores
alfabetizadores vem sendo desenvolvida por programas como o Programa de Professores
Alfabetizadores (PROFA), desenvolvido no ano de 2002 e, atualmente, pelo Pró-Letramento.
Este programa foi implantado pela SEMEC/Rondonópolis – MT no ano de 2010 e teve
continuidade no ano de 2011.
Neste sentido, a pesquisa foi feita com a finalidade de verificar como o programa de
formação continuada Pró-Letramento vinha sendo abordado no cenário nacional. As pesquisas
na forma de estado do Conhecimento são utilizadas para aprofundar conhecimentos e
evidenciar o cenário da produção das pesquisas em nível nacional; “este tipo de pesquisa é
77
desenvolvido com uma metodologia de caráter inventariante e descritivo da produção
acadêmica e científica sobre o tema que busca investigar [...].” (FERREIRA, 2002, p. 258).
Para desenvolver a presente proposta do estado do conhecimento, apoiei-me na
pesquisa do tipo quantitativa/qualitativa, sendo que a quantitativa “busca a predição, a
testagem das hipóteses e a generalização” e a pesquisa qualitativa, “está mais preocupada com
a compreensão, explanação e especificação do fenômeno.” (SANTOS FILHO; GAMBOA,
2002, p. 42-43).
Sabendo que a pesquisa do tipo quantitativa está mais voltada para a compreensão
direta dos dados levantados, sem qualquer análise, foi feita a análise qualitativa, pois assim foi
possível compreender o significado dos dados levantados. A esse respeito, afirma Gatti (2004,
p. 13): “tabelas, indicadores, testes de significância, etc., nada dizem. O significado dos
resultados é dado pelo pesquisador em função do seu estofo teórico”. Ou seja, é necessário
analisar qualitativamente os dados a fim de que os mesmos se sustentem e sejam relevantes na
pesquisa.
Para o início dos trabalhos, realizei uma pesquisa sobre o foco do projeto, que está
voltado para a temática dos Gêneros Textuais na alfabetização, levando-se em consideração as
políticas de formação continuada de professores alfabetizadores, mais precisamente, o
programa Pró-letramento.
Compreendendo que o Estado do Conhecimento visa identificar e conhecer as
produções acadêmicas produzidas sobre um determinado assunto ou tema, num período pré
determinado, a fim de contribuir de forma significativa para as pesquisas realizadas, iniciei o
trabalho com os seguintes descritores: gêneros textuais - produção escrita - alfabetização e
Pró-letramento.
5.2 Abordagem dos gêneros textuais nas pesquisas e no Pró-Letramento
Para levantar o volume das produções acerca do assunto em questão, iniciei as buscas
no banco de teses e dissertações nos sites da Capes e Instituto Brasileiro de Informação e
Tecnologia (IBICT), nos últimos cinco anos, com os descritores gêneros textuais e produção
escrita, sendo que, a partir do primeiro descritor, passei à análise dos dados, verificando quais
áreas abordavam o tema em nível de mestrado e doutorado. Além disso, realizei buscas com
os mesmos descritores, nos periódicos da Capes e nas revistas eletrônicas: Educação e
Sociedade, Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos INEP, Carlos Chagas, Educação e
78
Realidade, Currículo sem fronteiras, disponíveis na base de dados Scielo, nos últimos cinco
anos.
Busquei no site da CAPES, banco de teses e dissertações nas áreas de Educação,
Letras e Linguística nos últimos cinco anos nos níveis de mestrado e doutorado e cheguei aos
seguintes resultados: com os descritores Gêneros textuais e produção escrita, recuperei no
mestrado em Educação, em nível nacional, 71 textos, sendo 14 acerca de alfabetização e
letramento, 45 sobre Linguística e Linguística Aplicada e, em Letras, 12 produções (Tabela
1).
Tabela 1: Distribuição das dissertações nas áreas de Educação, Linguística e Letras com os
descritores gêneros textuais e produção escrita no período de 2005 a 2009
Ano Educação (alfabetização e
letramento)
Linguística e
Linguística Aplicada Letras Total %
2005 1 7 - 8 11,27%
2006 4 2 4 10 14,08%
2007 2 5 2 9 12,68%
2008 2 15 3 20 28,17%
2009 5 16 3 24 33,80%
Total 14 45 12 71 100,00
%
% 19,72% 63,38% 16,90% 100,00%
Fonte: Elaborada com base nos dados coletados na CAPES/IBCT.
Dos trabalhos relacionados na Tabela 1, na área de Educação, verifica-se que, dos 14
trabalhos elencados, 5 (35,71%) estão voltados para o ensino fundamental nos anos iniciais, 4
(28,57%) para o ensino fundamental nos anos finais, 3 (21,43%) são relacionados ao ensino
médio. e 2 (14,29%) ao ensino superior.
Na área de Linguística e Linguística Aplicada, dos 45 trabalhos encontrados, apenas 2
(4,44%) trazem pesquisas sobre os anos iniciais do ensino fundamental, 15 (33,33%) são dos
anos finais do ensino fundamental, 14 (31,11%) são pesquisas no ensino médio e 14 (31,11%)
são do ensino superior.
Em Letras, dos 12 trabalhos, nenhum está voltado para os anos iniciais do ensino
fundamental, 5 (41,67%) são do ensino fundamental nos anos finais, 3 (25%) são do ensino
médio, e 4 (33,33%) no ensino superior.
Nas teses (Tabela 2), encontrei 2 produções na área de educação, 12 escritos na área
de Linguística e Linguística aplicada e 3, na área de Letras, num total de 17 produções
textuais.
79
Tabela 2: Distribuição das teses nas áreas de Educação, Linguística e Letras com os descritores
gêneros textuais e produção escrita no período de 2005 a 2009
Ano Educação (alfabetização e
letramento)
Linguística e Linguística
Aplicada Letras Total %
2005 1 1 - 2 11,76%
2006 1 1 - 2 11,76%
2007 - 5 1 6 35,29%
2008 - - 2 2 11,76%
2009 - 5 - 5 29,41%
Total 2 12 3 17 100,00
%
% 11,76% 70,59% 17,65% 100,00%
Fonte: Elaborada a partir dos dados coletados na CAPES/IBCT.
Das 2 teses encontradas no doutorado na área de Educação, 1 (50%) está voltada para
o ensino médio e 1 (50%) para o ensino superior. Em Linguística, das 12 teses relacionadas,
7 (58,33%) são do ensino superior, 2 (16,67%) do ensino médio e 3 (25%) dos anos finais do
ensino fundamental. Em letras, das 3 teses encontradas, 2 (66,67%) são do ensino superior e 1
(33,33%) do ensino médio, evidenciando que as pesquisas voltadas para a área da
alfabetização são bem restritas.
Como o interesse do trabalho com os gêneros textuais está voltado para a
alfabetização, em seguida elenquei as pesquisas encontradas neste âmbito (gênero textual,
produção escrita, alfabetização) de forma mais detalhada, explicitando o ano, a área do
conhecimento, a instituição e o subtema das dissertações e da tese encontradas no sites da
CAPES (Quadro 8).
No total foram encontradas: uma tese e seis dissertações, que apresentam assuntos
relacionados à alfabetização, vinculada ao processo de letramento e compreensão dos gêneros
textuais como forma de expressão escrita contextualizada.
Partindo para a área de interesse maior, que é o Pró-Letramento e sua abordagem nas
pesquisas em nível nacional, foi possível compreender que nenhuma dessas está voltada para
a análise dos gêneros textuais, ou seja, a relação entre gêneros textuais e Pró-letramento ainda
não foi abordada em nenhuma das pesquisas encontradas, evidenciando, assim, que o intuito
desta investigação será bastante relevante e contribuirá de forma significativa para possíveis
pesquisas sobre o tema.
80
Quadro 8: Distribuição das Teses e Dissertações por área de conhecimento, instituição e subtema
encontrados com os descritores gêneros textuais na alfabetização no período de 2005 a
2009
Ano Tese Dissertação Área do
conhecimento Instituição Subtema
2005 1 - Letras UFPE Produção oral narrativa através de
desenhos
2006 - 1 Educação UFES Observação dos eventos mediados pela
linguagem escrita
2007 - 1 Educação UNIFESP Reflexão das crianças sobre a escrita
- 1 Educação UFPE Trabalho com rimas na educação infantil
2008
- 1 Educação UFSCAR Análise dos conteúdos relevantes para o
1º ano do ensino fundamental
- 1 Linguística UFPB Letramento infantil no meio familiar
- 1 Educação UFMG Práticas de alfabetização na perspectiva
do letramento
2009 - - - - -
Total 1 6
Fonte: Elaborado a partir dos dados coletados na CAPES/IBCT.
Após esse levantamento, observando as teses e dissertações que tratavam do trabalho
com gêneros textuais na alfabetização, parti para a formação continuada de professores
alfabetizadores com o programa implantado pelo MEC denominado Pró-Letramento. Como
este programa foi implantado em 2005, encontrei poucas pesquisas relacionadas a este tema.
Com as buscas realizadas com esse descritor, localizei cinco produções (Tabela 3).
Tabela 3: Distribuição das teses e dissertações por ano sobre o programa Pró-letramento no período
2005 a 2009
Ano Tese Dissertações Total %
2005 - - - -
2006 - - - -
2007 - - - -
2008 1 1 2 40%
2009 - 3 3 60%
Total 1 4 5 100%
% 20% 80% 100%
Fonte: Elaborada com base nos dados coletados na CAPES/IBCT.
É possível perceber que o volume de pesquisas sobre o tema Pró-letramento é bastante
limitado, pois, por ser um programa implantado em 2005, poucas pesquisas abordam o tema e
nenhum dos trabalhos enfoca gêneros textuais.
As pesquisas realizadas nesta área estão detalhadas no Quadro 9.
81
Quadro 9: Distribuição das Teses e Dissertações por instituição, metodologia, instrumentos de
pesquisa e subtema que versam sobre o programa Pró-letramento no período 2005 a 2009
Ano Instituição Metodologia Instrumento de
pesquisa Subtema
2008
UnB
Pesquisa qualitativa
etnográfica e
colaborativa
Entrevistas, notas de
campo, relatórios,
gravações
Contribuições da sócio-
linguística na formação de
professores
UFAL Pesquisa qualitativa
Análise de materiais
impressos de formação
continuada
Relação entre o construtivismo
e a aprendizagem
2009
UEPG Pesquisa qualitativa Entrevistas, observação e
análise documental
Observação da eficácia do
Programa através da análise
crítica
UFPE Pesquisa qualitativa Observação, análise
documental
Observação da prática de leitura
nas aulas de professoras que
participaram do programa Pró-
letramento
UFAL
Pesquisa
quanti/qualitativa,
estudo de caso de
cunho etnográfico
Questionário, entrevista
semiestruturada e
observações
Influência da formação
continuada nas práticas
docentes
Fonte: Elaborado com base nos dados coletados na CAPES/IBCT.
Os dados acima detalhados demonstram que as pesquisas realizadas sobre o programa
de formação continuada preocupam-se com a análise da eficácia do programa em relação às
práticas docentes. Dos cinco trabalhos encontrados, destaca-se uma tese na área da
Linguística (ano 2008, da UnB), enquanto que as demais são dissertações, todas na área de
Educação. Os instrumentos da coleta de dados são entrevistas, análises de documentos,
análises de materiais impressos do programa de formação continuada investigado, bem como
observação de práticas docentes, entrevistas e questionários.
As regiões em destaque são: Nordeste, Sul e o Distrito Federal.
Ao proceder à leitura dos resumos das teses e dissertações recuperadas, por meio desta
pesquisa, foi possível depreender os objetivos e as conclusões das mesmas, que passo a
detalhar a seguir:
A tese defendida em 2008 por Ana Dilma de Almeida Pereira com o título “A
(sócio)linguística no processo de formação dos professores do ensino fundamental”, tem por
objetivo verificar as contribuições da (sócio)linguística no processo de formação dos
professores. A autora é pesquisadora e formadora de professores na Universidade Federal de
Brasília (UnB) e atuou como coordenadora pedagógica do Programa Pró-Letramento no
período de dezembro de 2005 até outubro de 2006.
A pesquisa tem a etnografia colaborativa como metodologia, uma vez que a
pesquisadora permaneceu durante dois anos no polo de formação de São Luiz do Maranhão, o
82
qual atendia vários municípios da região. Considerando que o estado do Maranhão, na
ocasião, estava em último lugar no Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), que leva em
conta a renda per capita, a longevidade, e a educação, esta última é avaliada pelo índice de
analfabetismo e a taxa de matrícula em todos os níveis de ensino.
Com a implantação do Programa Pró-Letramento que, como já foi colocado
anteriormente, tem o objetivo de melhorar a qualidade do ensino de língua portuguesa e
matemática, oferecendo suporte à ação pedagógica dos professores das séries iniciais do
ensino fundamental, Pereira (2008) desenvolveu a pesquisa e algumas de suas conclusões
apontam para “a necessidade de uma formação respaldada na perspectiva de uma educação
(sócio)linguística” (PEREIRA, 2008, p.135), “o processo de formação (inicial ou continuada)
de professores do Ensino Fundamental se beneficia das contribuições da (sócio)linguística de
modo a operar mudanças significativas na educação em língua materna”, e, ainda, que “o
curso de formação continuada, o Pró-letramento, tem contribuído para a mudança na prática
pedagógica do professor.” (PEREIRA, 2008, p. 139).
A dissertação defendida em 2008 e que recuperei por meio desta pesquisa tem por
autora Ana Maria dos Santos, com o título: “O discurso construtivista como norteador da
qualidade do processo de ensino e aprendizagem”. A pesquisa desenvolvida buscou analisar
os discursos construtivistas presentes em materiais impressos dos programas de formação
continuada de professores alfabetizadores, o PROFA e o Pró-Letramento. Para essa análise, a
autora utilizou como base teórico-metodológica a análise do discurso de linha francesa.
Entendendo o discurso como processo e como movimento de sentidos, a autora utilizou, como
corpus de análise, algumas sequências discursivas extraídas de materiais impressos destinados
à formação de professores alfabetizadores em todo Brasil.
Santos, A. (2008) afirma que o conteúdo dos materiais oferecidos pelo PROFA e pelo
Pró-Letramento, apresentam um discurso construtivista que é, ao mesmo tempo, sedutor,
encantador e alienante, uma vez que
leva o professor a considerar que é possível resolver individualmente o
problema da educação, criando situações ou intervenções pedagógicas
capazes de operar a mudança garantindo a tão propalada educação de
qualidade que, sabemos ,não tem sua origem no micro espaço da sala de
aula.(SANTOS, A., 2008, p. 18).
Em 2009, a pesquisa apontou três dissertações que serão detalhadas a seguir. Maria
Lúcia da Silva Cabral desenvolveu uma pesquisa intitulada “Programa Pró-Letramento:
interface entre formação continuada, prática docente e ensino de leitura” (CABRAL, 2009)
83
com o objetivo de analisar os impactos da formação continuada na prática docente dos
professores das séries iniciais do Ensino Fundamental, no eixo do ensino da leitura, no
Programa Pró-Letramento – Alfabetização e linguagem. A autora observou os processos de
Formação Continuada dos orientadores do programa e as práticas pedagógicas de duas
professoras, analisando as mudanças ocorridas na prática, no tocante ao trabalho com a leitura
em sala de aula, antes e durante a participação dessas professoras no referido Programa de
Formação Continuada. A análise por ela realizada evidencia que:
A formação continuada do Programa Pró-Letramento possibilitou às
professoras se apropriar de novos conhecimentos referentes à leitura, a
refletir e discutir sobre sua prática e planejar o ensino da leitura de modo a
oportunizar os alunos a percebê-la como um processo de interação entre o
leitor e o texto, levantando questões que estimulassem o uso dos
conhecimentos prévios, o levantamento e a verificação de hipóteses e a
produção de inferências. (CABRAL, 2009, p. 267).
Dessa forma, Cabral (2009) conclui que a formação continuada do Programa Pró-
Letramento contribui de forma significativa para a ampliação dos saberes dos professores
sobre a língua, aumentando as possibilidades do trabalho com a leitura em sala de aula,
envolvendo os alunos em atividades de leitura que propiciem a formação dos mesmos como
leitores autônomos, capazes de identificar informações implícitas e explícitas no texto,
estabelecer relações com outras leituras e omitir opiniões sobre seu conteúdo.
Maria Vilma da Silva realizou uma pesquisa intitulada “A formação continuada de
professoras alfabetizadoras alagoanas através dos programas PROFA e Pró-Letramento - o
que dizem os programas e as professoras?” (SILVA, 2009), com o objetivo de investigar em
que medida os referidos programas influenciaram as práticas pedagógicas das professoras
alfabetizadoras informantes. A autora utilizou, como metodologia da pesquisa, o estudo de
caso de cunho etnográfico e lançou mão dos seguintes instrumentos: questionários com
perguntas abertas e fechadas, entrevistas semiestruturadas e observação.
Por meio da análise dos dados, Silva (2009) concluiu que, embora seus informantes
“afirmam adotar os paradigmas construtivistas e sócio interacionistas defendidos pelos
programas PROFA e Pró-Letramento, ainda apresentam, no discurso e na prática pedagógica,
distorções e equívocos quanto à sua aplicação”. Nesse sentido, a autora coloca que é
necessário haver uma reflexão mais aprofundada acerca do conceito e do processo de
formação continuada pelo qual as informantes passaram.
84
Maria Aparecida Alferes fez uma análise crítica sobre o Programa Pró-Letramento, do
município de Guaruva, em Santa Catarina, defendendo em sua dissertação que o referido
programa é uma medida necessária, mas não suficiente para a melhoria na qualidade da
educação, visto que esta demanda uma série de outras ações que ultrapassam a formação
continuada dos professores, tais como:
a valorização dos profissionais da educação, a garantia da infraestrutura das
escolas, estímulo para a construção de propostas curriculares com a
participação dos professores, a existência de projetos pedagógicos
consistentes na rede de ensino e nas escolas, a utilização dos resultados
obtidos por meio de avaliações para o planejamento de estratégias de
intervenção com a participação do coletivo das escolas entre outras medidas.
(ALFERES, 2009, p. 6).
A autora aponta, também, algumas contribuições positivas do referido programa, tais
como:
a) As redes públicas de ensino tiveram a oportunidade de oferecer aos professores
uma formação contínua mais orgânica e sistematizada;
b) Pelos instrumentos de pesquisas utilizados (entrevistas, observação não
participante, e questionários), Alferes (2009) depreendeu que os tutores e cursistas
qualificam o Programa Pró-Letramento como inovador, na medida em que
enfatiza estudos sistemáticos da prática, utilizando-se de conceitos relevantes para
a prática pedagógica.
c) O programa tem sido um apoio para o planejamento pedagógico em torno do
processo de alfabetização e letramento, mediante análise dos resultados
alcançados pelas escolas e redes de ensino.
Conforme as pesquisas acima esboçadas, é possível afirmar que o Programa Pró-
Letramento tem sido objeto de análises e estudos significativos, recebendo críticas e
apontamentos de sua contribuição no processo de formação profissional e na prática
pedagógica do professor alfabetizador.
E como o objetivo desta pesquisa foi de verificar como e se os gêneros textuais eram
explorados nessas análises, foi possível concluir que as teses e dissertações recuperadas não
apontam como foco a observação dos gêneros textuais nos primeiros anos do Ensino
Fundamental. Dessa forma, fica evidente a relevância da pesquisa a ser desenvolvida nesse
âmbito.
85
5.3 O que indicam os periódicos?
Utilizando como base para a pesquisa o descritor gêneros textuais, a busca realizada
no site Scielo, que é uma plataforma de pesquisa, onde se insere uma grande variedade de
revistas com seus respectivos artigos, percebi que são poucos os artigos que tratam do tema.
A partir do descritor gênero textual e buscando temáticas que abordam a alfabetização,
realizei uma procura pelo tema observando os títulos dos artigos em várias revistas como:
Educação e Sociedade, Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, Currículo sem fronteiras,
Revista Carlos Chagas, Educação e Realidade, Cadernos Cedes, Trabalhos em Linguística
Aplicada. Foram localizadas um total de 3 artigos e, com o descritor Pró-Letramento, apenas
um artigo foi encontrado.
Tabela 4: Distribuição dos artigos em periódicos sobre gênero textual e Pró-Letramento no período
de 2005 a 2009
Ano Quantidade Percentual Periódico
2005 1 25% Cadernos Cedes
2006 - - -
2007 - - -
2008 2 50% Práxis Educativa / Delta
2009 1 25% Trabalhos em linguística aplicada
Total 4 100%
Fonte: Elaborada a partir dos dados coletados no Scielo.
Percebe-se, pelos dados da Tabela 4, que há um número restrito de artigos nos
periódicos nos últimos cinco anos. Somente um artigo do ano de 2008 da revista Práxis
Educativa está diretamente relacionado ao Programa Pró-letramento. Trata-se de um artigo de
Sônia Regina Mendes dos Santos, com o título “A rede nacional de formação continuada de
professores: o Pró-Letramento e os modos de ‘formar’ os professores” no qual a autora
analisa as possibilidades de construção da autonomia profissional de professores participantes
do Programa Pró-Letramento e, por meio de entrevistas com os três principais gestores do
programa de Duque de Caxias, no Rio de Janeiro, a autora concluiu que é possível identificar
a permanência de um modelo de formação aplicacionista.
Analisando as falas dos entrevistados, a autora afirma que:
86
Entre as promessas do Pró-Letramento de estabelecer uma formação
continuada atrelada a uma atitude investigativa e reflexiva e a realidade
encontrada de uma formação considerada “superficial“, restrita ao domínio,
à apropriação, de um conjunto de técnicas com poucos aportes teórico-
conceituais, há ainda uma distância. (SANTOS. S., 2008, p. 146).
Nesse sentido, Santos, S. (2008) conclui o artigo enfatizando a necessidade de a
formação de professores não ser vista como o único caminho para melhorar a qualidade na
educação, mas deve ser capaz de provocar tensões e impulsionar o professor para a reflexão
sobre a prática, de forma investigativa e coletiva.
A partir do estudo do Estado do Conhecimento realizado sobre o tema gêneros textuais
e sua abordagem no programa Pró-letramento, foi possível perceber que as pesquisas nesse
sentido ainda não foram realizadas. Partindo da análise inicial realizada com o primeiro
descritor foi possível perceber que das 71 dissertações encontradas, 6 tinham por assunto a
alfabetização e das 17 teses, apenas 1 trazia como foco os anos iniciais do ensino
fundamental e nenhum dos trabalhos estava relacionado ao programa de formação de
professores alfabetizadores denominado Pró-letramento.
Analisando os trabalhos apresentados com o descritor Pró-letramento, verifica-se que
as pesquisas realizadas sobre o Programa estão relacionadas à influência do mesmo nas
práticas docentes e na sua eficácia em relação à aprendizagem.
Quanto à metodologia dessas pesquisas, destaca-se a pesquisa qualitativa de cunho
etnográfico e a coleta de dados é realizada a partir de vários instrumentos, tais como
entrevistas, questionários, observações, análise documental e relatórios. As regiões brasileiras
em destaque nessas pesquisas são a região nordeste com três produções, uma produção na
região Sul e uma no Distrito Federal.
Em relação aos periódicos, os artigos encontrados nesses últimos cinco anos ainda são
poucos se comparados à quantidade de teses e dissertações encontradas.
Assim sendo, o estudo aqui descrito vem ao encontro das indagações anteriormente
formuladas no tocante à relevância da pesquisa a ser realizada, pois os estudos existentes
sobre o Programa Pró-letramento em âmbito nacional não privilegiam o enfoque aos gêneros
textuais voltados para a alfabetização.
5.4 Delineando as pesquisas sobre o Pró-Letramento após 2009
Sabe-se que a proposta de estudo que ora se inicia, não parte do ineditismo, pois
alguns estudos sobre o programa Pró-Letramento já foram realizados, porém pelos trabalhos
87
recuperados, através de uma pesquisa do tipo estado do conhecimento, observei que os
estudos desenvolvidos são direcionados à análise do material, à eficácia do programa em
relação às práticas docentes, dentre outros aspectos. Nenhum dos trabalhos recuperados
menciona a utilização dos gêneros textuais como uma das possibilidades metodológicas para
o desenvolvimento das capacidades linguísticas dos alunos.
Segue uma abordagem descritiva da implantação do Programa de Formação
Continuada em foco na qual relacionarei os demais estudos já realizados sobre essa temática,
após a pesquisa desenvolvida, visto que, como já mencionado anteriormente, o estado do
conhecimento contemplou as teses, as dissertações e os artigos redigidos até o ano de 2009.
Lucio (2010) desenvolveu um estudo sobre o Programa Pró-Letramento na perspectiva
histórico-cultural, apresentando como interlocutor de suas reflexões o filósofo e linguista
Mikhail Bakhtin e sua teoria da linguagem. A autora, considerando a abordagem
metodológica de caráter qualitativo, adotou a pesquisa documental para a análise de um
conjunto de documentos que abordam ações políticas e governamentais na formação de
professores da Rede Nacional de Formação Continuada de Professores da Educação Básica
(RNFC).
Por meio de uma pesquisa do tipo estado do conhecimento, a autora observou os
aspectos abordados nas pesquisas em nível nacional e optou pela análise do material do
Programa Pró-Letramento sob a ótica das concepções de alfabetização e letramento que
orientam o programa.
Nesta perspectiva, Lucio (2010) faz uma análise do momento histórico, político e
social em que o Programa Pró-Letramento foi implantado e a importância do papel da
linguagem e dos discursos que orientam os sujeitos numa determinada sociedade. A autora
salienta que a normatização efetiva da formação continuada para professores aconteceu
mediante a lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) de nº 9.394/96 (BRASIL,
1996).
No artigo 67 desta lei, os sistemas de ensino deverão promover a formação e a
valorização dos profissionais da educação assegurando-lhes aperfeiçoamento profissional
contínuo. Neste sentido, o poder público proporcionará aos profissionais da educação a
veiculação e a efetivação de programas de ensino à distância em todos os níveis e
modalidades, e também de formação continuada. Através do artigo 87, parágrafo 1º, inciso
III, fica explícito o dever de cada município à realização de programas de capacitação para
professores em exercício, utilizando os recursos da educação a distância.
88
Em junho de 2003, no governo do presidente Luís Inácio Lula da Silva, foi
apresentado pelo então ministro Cristovão Buarque, o programa Toda Criança Aprendendo, a
diretores da União Nacional dos Dirigentes Municipais (UNDIME) e demais personalidades
da sociedade: educadores, sindicalistas, secretários da educação, etc..
A partir desse documento, é possível compreender as origens do Programa Pró-
Letramento, pois a política governamental que estava sendo implantada no país
redimensionava as políticas delineadas pelo MEC e que seriam desenvolvidas pelas
secretarias de educação, apresentando quatro políticas básicas para a formação continuada dos
professores, a saber: implantação de uma política de valorização e formação de professores,
com o incentivo da formação continuada, ampliação do atendimento escolar tanto na extensão
da jornada quanto na duração do ensino fundamental, apoio à construção de sistemas
estaduais de avaliação da educação pública e a implementação de programas de apoio ao
letramento da população estudantil.
Com a criação deste documento, enfatizou-se também a política educacional no
formato de formação de professores através do Ensino a Distância (EaD ). A portaria nº 1403,
de 9 de junho de 2003, instituiu o Sistema Nacional de Formação Continuada de professores
que corrobora com a necessidade de se valorizar a educação básica, a formação continuada, a
avaliação em grande escala e a educação a distância. Várias entidades educacionais
protestaram contra a publicação desta portaria, pois de acordo com a carta protesto nº 34/2003
do Fórum Nacional em defesa da escola pública, intitulada “Formar ou certificar? Muitas
questões para reflexão”, a proposta do governo, no sentido de avaliar, “continuava sem
referência no projeto pedagógico de cada instituição escolar e no contexto social brasileiro.”
(LUCIO, 2010, p. 6).
Apesar das críticas recebidas, a Portaria nº 1.403 continuou em vigor e a Rede
Nacional de Formação Continuada de Professores da Educação Básica (RNFC) foi efetivada
por meio do edital nº 01/2003/SEIF/MEC, que colocou em evidência as diretrizes para o
encaminhamento de propostas das universidades ao MEC, no sentido de contribuir com o
desenvolvimento tecnológico e com a prestação de serviços para as redes públicas de ensino.
Após a portaria nº 1.403, de acordo com a proposta governamental e política em torno
da educação, em 7 de maio de 2004, por meio da portaria nº 1.472, instituiu-se o sistema
nacional de formação continuada de professores e, em março de 2005, com a aprovação pelo
Senado do plano de qualidade para a educação brasileira, a RNFC foi consolidada e partiu da
proposta de integração entre o centro de pesquisas das universidades credenciadas pelo MEC,
89
no sentido de que estas desenvolvessem materiais didáticos para subsidiar a prática dos
docentes da educação básica em exercício.
A partir dessa proposta, algumas universidades tiveram seus projetos aprovados dentro
da área da linguagem e da alfabetização; entre elas destaca-se: Universidade Federal de
Pernambuco (UFPE), Universidade Federal de Sergipe (UFS), Universidade Federal de Minas
Gerais (UFMG), Universidade de Brasília (UnB), Universidade Estadual de Campinas
(UNICAMP), que a partir dessas propostas iniciais, surgiram os centros de pesquisa e
desenvolvimento da educação: Centro de Alfabetização, Leitura e Escrita (CEALE/UFMG)6,
Centro de Estudos em Educação e Linguagem (CEEL/UFPE), Centro de Formação e Instituto
da Linguagem (CEFIEL/UNICAMP), Centro de Formação Continuada de Professores
(CEFORM/UNB) e Centro de Formação Continuada Desenvolvimento da Tecnologia e
Prestação de Serviços para as Redes Públicas de Ensino ( CEFORTEC/UEPG).
Dessa forma, a partir de 2003, estes centros produziram diversos materiais para
subsidiar a prática dos professores em exercício na educação básica, divulgando textos
científicos, de acordo com a área de atuação desses professores, tanto na forma inicial, quanto
na continuada, estabelecendo um diálogo produtivo entre universidades e redes de ensino.
É nesse contexto que surge o Programa Pró-Letramento, inserido no plano de
qualidade do MEC com a finalidade de melhorar a aprendizagem dos alunos das séries
iniciais, dando suporte aos professores nas disciplinas que apresentaram resultados críticos na
avaliação do Sistema de Avaliação da Educação Básica (SAEB), promovendo a atualização
de conteúdos na área de Língua Portuguesa e Matemática. O Programa Pró-Letramento foi
planejado para ser realizado a distância com a orientação de tutores locais, preparados em
encontros de formação por orientadores do programa, com a finalidade de estabelecer o
diálogo com os professores, no sentido de apresentar o material impresso, vídeos e atividades
presenciais, relativos ao programa em questão.
6 Apenas o CEALE é anterior à proposta do MEC, pois se trata de um órgão complementar da Faculdade de
Educação da UFMG, criado em 1990, com o objetivo de integrar grupos interinstitucionais voltados para a área
da alfabetização e do ensino de Português. Dois princípios orientam a integração de suas
atividades: compreender o multifacetado fenômeno do ensino e da apropriação da língua escrita, como parte
integrante de um processo histórico, político e social, é o primeiro deles; e intervir nesse processo, por meio da
qualificação de professores das escolas públicas e da divulgação da produção científica sobre o letramento, é o
segundo deles. O CEALE desenvolve projetos nos campos de Pesquisa, Ação Educacional, Documentação e
Publicação. E faz parte do Plano de Ações Articuladas (PAR), lançado pelo MEC. O PAR integra o Sistema
Nacional de Formação de Professores e tem como objetivo integrar e articular as ações na área de formação
continuada. (CEALE, s/d. p. 1).
90
É possível destacar que o material didático apresentado, por meio dos fascículos do
Pró-Letramento, traz contribuições significativas para o professor alfabetizador no tocante à
troca de experiências, articulação entre teoria e prática, propostas de atividades relacionadas à
compreensão do sistema alfabético pelo educando e o uso da leitura e da escrita nas práticas
sociais que requerem a utilização destas habilidades.
De acordo com a análise do material realizado por Lucio (2010), os discursos oficial,
acadêmico e docente interagem entre si. A autora ressalta que o material do Programa Pró-
Letramento é uma forma de diálogo produtivo e enriquecedor entre governo, academia,
docentes, no sentido de melhorar a qualidade da educação básica. Dessa forma, acredito que
é através da formação continuada vinculada à pesquisa e ao projeto político e social vigente
que se torna possível uma melhoria significativa na qualidade da educação.
A secretaria municipal de Rondonópolis – MT aderiu ao Programa Pró-Letramento em
2010, com sua continuidade em 2011, outros municípios também aderiram ao programa7 e,
como foi explicitado anteriormente, são realizados dois modelos de cursos: formação de
tutores e formação de professores. Na modalidade semipresencial, o curso promove a
formação de tutores locais em seminários presenciais em cada estado. Assim, os tutores
planejam e executam o mesmo curso aos professores alfabetizadores em exercício, com o
apoio das coordenadorias das secretarias de educação.
Algumas críticas são direcionadas a este tipo de modelo tutorial, pois os tutores são
vistos como “multiplicadores”, porém o Programa Pró-Letramento, numa tentativa de romper
com esse tipo de crítica, adotou o seguinte formato:
as ações de formação desenvolvidas são presenciais, em grande parte da
carga horária desenvolvida; privilegia a participação de todos os professores
que atuam em sala de aula, e não de coordenadores ou seus representantes;
promove a abordagem das temáticas e conteúdos vinculados aos projetos
pedagógicos das escolas e com as práticas que fazem parte da tradição
escolar; procura estabelecer um diálogo em torno das questões vividas e
experiências na prática de alfabetização; e articula teorias e práticas, como
pressupostos da abordagem dos conteúdos. (SILVA; CAFIERO, 2011, p.
238).
Passo agora ao detalhamento dos fascículos do Programa Pró-Letramento. Neste
sentido, apoiei-me nos estudos de Martins (2010), autora que fez análise dos fascículos do
material do programa, na área de alfabetização e linguagem, mediante uma pesquisa histórica
7 Relação completa dos municípios consta no portal do MEC (http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_
content&view=article&id=15827).
91
e documental explicitando os temas e conteúdos abordados, a forma e a estrutura em que se
apresentam; autores e instituições envolvidos na elaboração da proposta, bem como o lugar
social onde estão inseridos; os objetivos a que atendem e o público que se pretende atingir.
5.5 Descrição dos fascículos do Programa Pró-Letramento
O Programa Pró-Letramento está dividido em sete fascículos, com materiais didáticos,
quatro fitas de vídeo e um fascículo destinado aos professores orientadores do curso (tutores).
Os fascículos tratam de temas e conteúdos voltados para o ensino da leitura e da escrita nos
anos iniciais do ensino fundamental, eles se inter-relacionam pela temática e pelos aspectos
conceituais, ora pela repetição ora por notas que retomam conceitos vistos. A autora aponta
que as unidades textuais foram organizadas com base em análise de situações concretas do
cotidiano escolar em que as abordagens temáticas são registradas por meio de perguntas
pedagógicas ou narrativas que evidenciam e corroboram com reflexões a respeito das práticas
pedagógicas e possíveis intervenções no sentido de buscar soluções para os problemas de
aprendizagem, mediante estratégias metodológicas para a melhoria das práticas de leitura e
escrita na escola.
Martins (2010) ressalta ainda que a troca de experiência, a vivência dos professores,
suas concepções e dilemas fazem parte desse aspecto dialógico e narrativo que é característica
marcante em todos os fascículos do Programa Pró-Letramento.
O primeiro fascículo, intitulado “Capacidades linguísticas: alfabetização e
letramento”, apresenta os eixos organizadores do ensino aprendizado por meio de concepções
teóricas e conceitos que fundamentam a proposta do Programa Pró-Letramento. Conceitos
estes que são denominados eixos necessários à aquisição da língua escrita, a saber:
valorização e compreensão da cultura escrita, apropriação do sistema da escrita, leitura,
desenvolvimento da oralidade e produção textual.
Neste fascículo, apresentam-se as principais capacidades linguísticas que os alunos
dos anos iniciais do ensino fundamental devem ter desenvolvido de acordo com os cinco
eixos de aprendizagem, para a apropriação da língua escrita. As orientações apresentadas
neste programa também direcionam o trabalho docente, no sentido de mostrar aspectos
relevantes a serem iniciados e consolidados nos processos de alfabetização e letramento.
Assim, o material apresenta aos docentes o que as crianças precisam aprender de forma
gradual, ou seja, o professor planeja o seu trabalho através de uma sequência de atividades
que delineiam metas e objetivos que se procura atingir.
92
Considerando os níveis de intensidade do trabalho, o material do Programa Pró-
Letramento indica o que deve ser introduzido, retomado, trabalhado sistematicamente e
consolidado no processo ensino-aprendizado. Nesta perspectiva, escolas e professores devem
realizar discussões a respeito do que deve ser trabalhado adaptando a proposta às reais
necessidades dos alunos. Dessa forma, o docente deve ter uma visão reflexiva sobre sua
prática, sendo capaz de definir o que é relevante para ser trabalhado em sala de aula, de
acordo com a realidade.
No fascículo 2, “Alfabetização e letramento: questões sobre avaliação”, destaca-se a
ênfase dada à avaliação formativa e diagnóstica, em que o professor passa a encarar a
avaliação como uma forma de perceber os avanços e as dificuldades que os alunos
apresentaram, para intervir e auxiliá-los.
Desse modo, alguns instrumentos são sugeridos ao professor, para que ele possa
regular e orientar suas ações pedagógicas, a fim de obter informações sobre o processo de
aprendizagem dos alunos, que são:
- observação e registro, por meio de fichas descritivas, relatórios individuais, cadernos
ou diários de campo;
- provas operatórias, que enfocam as operações mentais, a compreensão de conceitos e
as estratégias mentais desenvolvidas pelo educando com a intervenção do professor;
- portfólio, que diz respeito à organização e arquivo de registros das aprendizagens dos
alunos, selecionados por eles próprios;
- autoavaliação, que possibilita a tomada de consciência pelo educando sobre suas
dificuldades e capacidades, para tomar atitudes que melhorem o seu desempenho. Vale
lembrar que a avaliação deve ser realizada também pela escola, de forma coletiva e
participativa, de acordo com o projeto político pedagógico de cada unidade escolar.
No terceiro fascículo, “A organização do tempo pedagógico e o planejamento do
ensino”, o foco volta-se para a análise das situações de ensino e aprendizagem da leitura e
escrita, com ênfase na organização do tempo escolar e no planejamento do ensino; discute
também a questão do espaço e do tempo dedicados à leitura na escola e a organização do
tempo de leitura em sala de aula, bem como ressalta a importância do planejamento e da
autonomia por parte do professor em escolher atividades significativas para a aprendizagem
do aluno.
O quarto fascículo, intitulado “Organização e uso da biblioteca escolar e salas de
leitura”, tem como objetivo levar o educador a refletir sobre a importância e possibilidades de
uso da biblioteca escolar ou da sala de leitura, no seu trabalho pedagógico; explora, ainda, as
93
diferentes modalidades de leitura, a diversidade de suportes de textos e a mediação do
professor no processo de ensino da leitura e escrita. Neste fascículo, discute-se, ainda, as
possibilidades de utilização do dicionário como instrumento importante para atividades de
leitura e escrita em sala de aula.
O quinto fascículo, “O lúdico na sala de aula: projetos e jogos”, apresenta
experiências positivas de professores que trabalham com jogos na alfabetização e leva os
docentes a refletirem sobre o uso de jogos e brincadeiras no processo de assimilação do
sistema alfabético. Além disso, mostra o trabalho com projetos didáticos que contemplam a
leitura e a escrita de diversos gêneros. Neste fascículo, a ênfase também está focalizada na
questão do planejamento de atividades de jogos e brincadeiras com objetivos bem definidos,
os quais auxiliam o educando a aprender com prazer, unindo sabor e saber.
O material apresenta como sugestão a confecção de um almanaque com atividades
lúdicas de leitura, escrita e expressão oral, visando a assimilação do sistema de escrita
alfabética de forma prazerosa por parte dos sujeitos envolvidos neste processo.
O sexto fascículo, “O livro didático em sala de aula: algumas reflexões”, apresenta
discussões relacionadas ao uso do livro didático em sala de aula, o processo de escolha, de
uso e de modificação dos mesmos no decorrer do tempo. Ademais, demonstra a importância
da escolha do livro didático pelo professor, e do trabalho sistemático e planejado para a
aquisição da competência linguística do educando mediada pelo professor.
Neste fascículo, descreve-se também a implantação do livro didático pelo Programa
Nacional do Livro Didático (PNLD) ressaltando o trabalho de avaliação que é feito pela
equipe da Secretaria de Educação Básica (SEB) em parceria com o Fundo Nacional de
Desenvolvimento da Educação (FNDE ) para a adoção ou não do livro didático enviado pelas
editoras, numa busca constante pelo aprimoramento e pela qualidade na educação.
O sétimo fascículo, “Modos de falar/modos de escrever”, versa sobre as
características, diferenças e semelhanças entre o texto oral e o texto escrito, conceitua
competência comunicativa, bem como ressalta a importância da valorização da linguagem
oral para construção da escrita.
O papel do professor como escriba na produção do texto coletivo é posto em
evidência, pois através deste trabalho é possível refletir sobre as hipóteses que os alunos têm
sobre a escrita, sobre as convenções da língua, sobre as variedades linguísticas, e, assim,
perceber os avanços dos alunos em relação à aquisição da competência linguística.
No fascículo complementar deste programa, os temas apresentados estão relacionados
aos relatos de experiência sobre o tema “História de Vida”, a fim de constatar a necessidade e
94
a importância de uma ação pedagógica que, nas séries ou ciclos iniciais, possibilite a todas as
crianças a participação em práticas sociais de letramento. A proposta de estudo deste fascículo
fundamenta-se na concepção interacionista da linguagem, em seu sentido discursivo, no qual
privilegia-se a apropriação do sistema alfabético escrito para a sua utilização efetiva nas
práticas sociais que exigem essa modalidade.
A apresentação da síntese dos fascículos do Programa Pró-Letramento nos possibilita
a compreensão de vários aspectos que devem estar presentes na prática do professor
alfabetizador, no sentido de alfabetizar letrando, ou seja, de propiciar aos aprendizes um
contato significativo, planejado e prazeroso com a cultura escrita.
Outro aspecto a ser considerado é que o objetivo do Programa busca oferecer suporte à
ação pedagógica dos professores para melhorar a qualidade do ensino e da aprendizagem da
língua portuguesa, propondo situações que incentivem a reflexão e a construção do
conhecimento como processo contínuo de formação docente. Dessa forma, os cursistas não
são meros ouvintes, mas participam ativamente do seu processo de formação através da troca
de experiência e da valorização de seus saberes.
5.6 Abordagem da produção de textos e dos gêneros textuais no Programa Pró-
Letramento: Análise documental
Por meio da metodologia dos gêneros textuais, a busca por um ensino de língua
materna que seja significativo e que propicie o desenvolvimento das capacidades
comunicativas dos alunos, em que eles sejam capazes de se expressar com clareza, tanto
oralmente quanto de forma escrita, utilizando-se da língua nas diversas práticas sociais, é uma
realidade cada vez mais presente, tanto nos documentos oficiais, quanto nos discursos.
Nesta vertente, Rojo (2010) argumenta que existem inúmeras práticas letradas na
sociedade contemporânea e, por isso, é preciso que façamos escolhas no sentido de organizar
as práticas e os currículos a fim de buscar um ensino que seja de interesse dos alunos. Nas
palavras dela:
Portanto, para selecionar práticas e compor currículos para a pedagogia dos
multiletramentos é preciso organizadores dessa variedade e multiplicidade.
Tenho sustentado, nos últimos anos, que dois organizadores muito úteis para
a seleção de objetos de ensino dentre essas múltiplas práticas e, logo, para a
construção do currículo, são os conceitos de “esfera de comunicação ou de
atividade humana”’ e de “gênero do discurso.” (BAKHTIN, 1992 [1952-
53/1979] apud ROJO, 2010, p. 30 – grifo do autor).
95
Penso que, até mesmo pelas orientações dos Parâmetros Curriculares Nacionais
(BRASIL, 1997) , existe uma tendência para o trabalho em sala de aula que busque explorar
os gêneros textuais, levando o aluno a conhecê-los e saber utilizá-los. É nesse sentido que o
programa de formação continuada, o Pró-Letramento, também busca este objetivo, pois
através da análise detalhada do material foi possível identificar 174 incidências do vocábulo
gênero ou expressões ligadas a ele, tais como: gênero, gêneros textuais, gênero de textos
(Quadro 10).
Quadro 10: Incidência dos vocábulos relacionados aos gêneros textuais nos fascículos do Pro-
Letramento (ano)
Fascículos do Pró-letramento Incidência dos
vocábulos
1: Capacidades Linguísticas: Alfabetização e Letramento 35
2: Alfabetização e Letramento: Questões sobre Avaliação 5
3: A organização do tempo pedagógico e o planejamento do ensino 9
4: Organização e uso da biblioteca escolar e das salas de leitura 5
5: O lúdico na sala de aula: projetos e jogos 25
6: O livro didático em sala de aula: Algumas Reflexões 42
7: Modos de falar, Modos de escrever 6
Complementar 30
Saeb - Prova Brasil, Matriz de Referência 4ª série do Ensino Fundamental 17
TOTAL 174
Fonte: Dados da pesquisa.
Com o objetivo específico já delimitado em minha proposta de pesquisa, realizei a
análise do material do Programa Pró-Letramento, com o intuito de verificar se e como os
gêneros textuais são abordados e quais metodologias são sugeridas para o trabalho com a
produção textual em sala de aula.
A primeira observação a ser feita é que, em relação à produção de texto, percebe-se
que não há um fascículo específico dedicado a este tema. Pela análise do material do referido
programa, é possível observar que a produção de textos espraia-se ao longo da proposta, com
vistas a indicar caminhos ao professor alfabetizador, no sentido de delimitar as capacidades,
os conhecimentos e as atitudes a serem desenvolvidas nos três primeiros anos do ensino
fundamental (Quadro 11), detalhando o que deve ser introduzido, trabalhado e consolidado no
decorrer de cada ano. Além disso, as orientações estão centradas nas funções da escrita, ou
seja, é necessário que o texto tenha um objetivo a atingir e um leitor a quem se dirigir.
96
Quadro 11: Capacidades, Conhecimentos e Atitudes necessários para a produção de textos nos três
primeiros anos do ensino fundamental
Capacidades, conhecimentos e atitudes 1º ano 2º ano 3º ano
Compreender e valorizar o uso da escrita com diferentes funções, em
diferentes gêneros I/T/C
8 T/C T/C
Produzir textos escritos de gêneros diversos, adequados aos objetivos, ao
destinatário e ao contexto de circulação: I T/C T/C
(i) Dispor, ordenar e organizar o próprio texto de acordo com as
convenções gráficas apropriadas I T/C T/C
(ii) Escrever segundo o princípio alfabético e as regras ortográficas I/T/C T/C T/C
(iii) Planejar a escrita do texto considerando o tema central e seus
desdobramentos I/T/C T/C T/C
(iv) Organizar os próprios textos segundo os padrões de composição
usuais na sociedade I/T/C T/C T/C
(v) Usar a variedade linguística apropriada à situação de produção e de
circulação, fazendo escolhas adequadas quanto ao vocabulário e à
gramática
I/T/C T/C T/C
(vi) Usar recursos expressivos (estilísticos e literários) adequados ao
gênero e aos objetivos do texto I/T/C T/C T/C
(vii) Revisar e reelaborar a própria escrita, segundo critérios adequados
aos objetivos, ao destinatário e ao contexto de circulação previstos I T T/C
Fonte: MEC/SEB (2008, p.47 – grifo do autor).
No primeiro fascículo do programa Pró-Letramento destacam-se as capacidades que
devem ser desenvolvidas ao longo dos três primeiros anos de alfabetização. Posso afirmar que
são poucas as sugestões acerca do trabalho com a produção de textos, principalmente no
primeiro ano de alfabetização.
As sugestões para a produção de textos aparecerão nos fascículos 3, 4, 5, 7 e no
fascículo complementar. A maioria das propostas de produção (Quadro 12) está vinculada a
projetos, os quais partem de um planejamento que têm uma sequência de etapas, culminando
com uma produção textual, ou seja, um produto dessas etapas.
Fascículo 1 - Capacidades Linguísticas: Alfabetização e Letramento: Apresentam-
se, neste fascículo, as capacidades a serem desenvolvidas, conforme o quadro anterior, e que
estão ligadas às atividades que o professor pode trabalhar, no sentido de fazer com que a
leitura e a escrita estejam vinculadas. Sugere-se que o professor proporcione ao aluno o
contato com diferentes gêneros e suportes de textos, para que ele compreenda e valorize o uso
da escrita:
- leia em voz alta diversos gêneros textuais, como histórias, notícias, avisos, cartas,
propagandas, etc;
8 A letra I significa introduzir; a R, retomar; e a T, trabalhar.
97
- traga, para a sala de aula, textos escritos de diferentes gêneros, em diversos suportes,
explorando esse material com os alunos, identificando características, possíveis leitores,
organização e tipo de linguagem que o texto apresenta.
- faça uso da escrita na sala de aula com diferentes finalidades, criando quadros de
rotinas, crachás, anotações de decisões coletivas, organização de trabalhos, jogos, etc
Quadro 12: Propostas de produção textual que constam no Programa Pró-Letramento.
Fascículos do Pró-letramento Projetos Proposta de produção textual
Gêneros
1: Capacidades Linguísticas:
Alfabetização e Letramento -
-
2: Alfabetização e Letramento:
Questões sobre Avaliação -
-
3: A organização do tempo
pedagógico e o planejamento do
ensino
História de vida Confecção de um álbum com
fotografias e textos
Quadro de rotina Produção de cartas
4: Organização e uso da biblioteca
escolar e das salas de leitura Dicionário de nomes
Confecção de um dicionário com o
nome dos colegas da classe
5: O lúdico na sala de aula:
projetos e jogos
Almanaque para crianças
(3ª série)
Confecção de um almanaque em que
constava: paródias, jogos, receitas,
instrução de brincadeiras, mágicas e
histórias em quadrinhos.
Brincadeiras populares
(1ª série)
Catálogo de brincadeiras populares
produzido coletivamente.
Cantigas populares
(1ª série)
Livreto e gravação em fita cassete
de cantigas populares conhecidas
pelas crianças.
6: O livro didático em sala de aula:
Algumas Reflexões - -
7: Modos de falar, Modos de
escrever
Texto coletivo escrito
pela professora como
escriba da turma (1º ano)
Texto informativo sobre um passeio
realizado pela turma no memorial
JK em Brasília
Complementar
História de vida -Escrita do nome dos alunos em
listas, crachás, cartazes.
História de vida:
Professor como escriba
da turma, produzindo
coletivamente diversos
gêneros textuais.
-Textos em quadrinhos
-Lendas, textos folclóricos,
parlendas, quadrinhas, exploração de
situações interessantes para a
criação de notícias, texto de opinião
e relatos
Fonte: elaborado pela pesquisadora.
De acordo com as orientações do programa Pró-Letramento, é necessário que o
professor exponha ao aluno que,
98
[...]sempre que se escreve deve-se ter em mente qual o objetivo da escrita,
quem vai ler o texto, em que situação o texto será lido e, em razão desses
fatores, qual o gênero e qual estilo de linguagem são mais adequados e
devem ser adotados. (MEC/SEB, 2008, p. 49).
Dessa forma, claro está que a escrita tem um papel social e funcional que não pode ser
ignorado.
Ao trabalhar com a escrita, no sentido de fazer com que o aluno se torne autônomo
neste processo, o professor poderá iniciar com a leitura, depois com a produção coletiva do
texto, sempre instigando o aluno a responder questões como:
o que é que a gente vai dizer? Por onde a gente começa? Depois que a gente
tiver dito isso, como é que a gente vai continuar? Como é que a gente vai
continuar o texto? Será que não está faltando nada? Será que o leitor vai
entender do jeito que a gente quer que ele entenda? (MEC/SEB, 2008, p. 50).
Dessa forma, são várias as etapas de produção que culmina com a capacidade de
adequação da linguagem falada (oralizada) para a língua padrão, bem como com a capacidade
de revisão e reestruturação textual. Assim, o objetivo é que o aluno seja capaz de saber
planejar, escrever, revisar, avaliar e reelaborar o seu próprio texto.
Apresentadas as capacidades que os professores precisam fazer com que os alunos
desenvolvam, vejamos as sugestões concretas de trabalho com a produção textual.
Fascículo 3 - A organização do tempo pedagógico e o planejamento de ensino:
Neste fascículo, apresenta-se um trabalho de produção textual desenvolvido pela professora
Luciana (Campinas-SP) com o tema “História de vida”. Ela desenvolveu um projeto de
escrita que culminou com a confecção de um álbum, com textos e fotografias das memórias
da turma. Pelo fato de os alunos ainda não dominarem o sistema de escrita alfabética (SEA), a
professora convidava um parente da criança para vir à escola e trazer fotografias ou objetos
que pertenciam à mesma. A partir de roteiro de perguntas, pedia que o convidado contasse
como era a alimentação da criança, suas características, principais travessuras, etc. Depois,
registrava as informações e lia para que os alunos pudessem contribuir acrescentando
informações e sugerindo mudanças. Nesta função de escriba da turma, a professora
compartilhava o ato de escrever mostrando aos alunos a forma de organização das ideias, a
escrita convencional das palavras, a relação fonema/grafema, bem como conscientizava os
alunos de que a escrita tem uma função social, que, neste caso, são a memória e a história
registradas e recuperadas por meio da documentação.
99
Na 3ª unidade deste fascículo, intitulado “Planejamento” apresenta-se como exemplo
para planejamento do tempo escolar um quadro semanal de rotina em que professoras de uma
segunda série do ensino fundamental realizaram um trabalho com a escrita de uma carta em
diversas atividades, durante a semana, que envolveram:
- Leitura e exploração do gênero cartas,
- Pesquisa em casa sobre as cartas que os pais ou avós possuíam para exploração
coletiva,
- Leitura de diferentes tipos de cartas (pessoal, comercial, de cobrança, bancária, de
familares),
- Escolha de uma carta para reflexão e análise do texto observando as características
desse gênero,
- Produção de uma carta (primeira versão),
- Revisão e adequação quanto aos aspectos estruturais da carta, ortografia, correção
gramatical e caligrafia.
Fascículo 4 - Organização e uso da biblioteca escolar e das salas de leitura: Neste
fascículo, a ênfase recai sobre a importância da biblioteca escolar, das salas de leitura e do uso
do dicionário pelos alunos, seja para conhecer o significado das palavras, para perceber as
relações entre as palavras e a ordem alfabética, bem como consultar a ortografia. Neste
sentido, uma proposta concreta de produção de texto é a confecção de um dicionário da turma
com os nomes das crianças e a descrição física e afetiva das mesmas.
Fascículo 5 - O lúdico na sala de aula: projetos e jogos: Nele, apresenta-se um
projeto intitulado Almanaque para crianças, desenvolvido pela professora Shalimar da
Silva, numa 3ª série da Escola Municipal Odette Pereira Carneiro, localizada em Jaboatão dos
Guararapes-PE.
O projeto foi planejado minuciosamente com várias etapas de aprendizagem até
culminar em seu produto final. No caso, houve o desenvolvimento das seguintes etapas do
projeto:
- Leitura, apreciação e manuseio de um almanaque, levado pela professora.
- Delimitação dos possíveis leitores.
- Escrita coletiva do que iria compor o almanaque (estrutura, capa, ilustração,
apresentação, divulgação).
A partir da discussão sobre a confecção do almanaque, a professora desenvolveu
outras atividades de produção textual, com outros tipos de gêneros para a composição do
almanaque. São elas:
100
- Produção de uma paródia com as seguintes etapas: ouvir e cantar uma música,
interpretação e análise da canção, exploração de rimas, escolha de uma música a ser
parodiada, produção em trio de paródias e apresentação para os colegas da classe. Escolha das
paródias que comporão o almanaque.
Dessa forma, as outras produções que compuseram este almanaque partiram também
de várias etapas até culminar na produção final. Assim, foram produzidos, além da paródia,
textos instrucionais (receitas, brinquedos, mágicas), brincadeiras (jogo dos sete erros) e
histórias em quadrinhos.
Após a escrita e escolha dos melhores gêneros textuais produzidos, o almanaque foi
montado coletivamente e apresentado à comunidade escolar.
Outro projeto apresentado neste fascículo foi desenvolvido pela professora Leila
Nascimento numa 1ª série do Ensino Fundamental intitulado “Brincadeiras Populares”, no
qual a professora planejou diversas etapas, iniciando com a leitura do texto literário Infância
para introduzir o tema, levantamento oral das brincadeiras conhecidas pelas crianças, proposta
do tema do projeto e conversa sobre o produto final, que seria um catálogo de brincadeiras
populares produzido coletivamente, com discussão e tomada de decisões sobre a organização
do mesmo.
Também neste fascículo, consta o Projeto Cantigas Populares desenvolvido pela
professora Cláudia Vasconcelos que regia o 1º ano do 1º ciclo da Escola Municipal Sítio do
Berardo, no Recife. Este projeto partiu de uma sequência de etapas com o levantamento oral
das cantigas populares conhecidas pelas crianças, escrita da lista das mesmas em um cartaz,
questionário para ampliação do conhecimento das cantigas, vivência das brincadeiras
envolvendo as cantigas populares, escolha coletiva das músicas a serem gravadas em fita
cassete e que comporiam um livreto com a ilustração das músicas escolhidas.
Fascículo 6 - O livro didático em sala de aula: Algumas Reflexões: Este fascículo
fala da importância da escolha do livro didático para o trabalho do professor. É preciso
salientar que os professores têm o direito de escolher, de três em três anos, o livro didático
que vão usar com as crianças no decorrer do ano letivo. Em entrevistas com as professoras,
constatei que nenhuma delas adotou livros didáticos para o trabalho sistemático em sala de
aula.
A professora da 1ª fase alegou que os livros didáticos destinados à alfabetização
possuem textos enormes e que, para a criança que está no início desse processo, os textos são
de difícil compreensão. As professoras da 2ª e 3ª fases afirmaram que não seguem o livro do
101
início ao fim, apenas o utilizam como um material de apoio para tirar xerox de algumas
atividades e explorar alguma atividade interessante que tenham encontrado no livro.
É preciso ressaltar que os novos livros didáticos passam por uma avaliação rigorosa e
que há uma mudança significativa no que se refere à presença da diversidade textual neles
encontrada. São textos que procuram privilegiar os aspectos discursivos da linguagem numa
busca de apropriação do conceito de letramento.
O fascículo ressalta que os livros didáticos, em sua maioria, são de boa qualidade e
representam um material que cada aluno pode utilizar, o que facilita o desenvolvimento do
trabalho em sala de aula. Por isso, é importante que o professor saiba como realizar um
trabalho significativo com eles, a fim de que os alunos se alfabetizem numa perspectiva de
letramento. Creio que o professor precisa direcionar sua prática, no sentido de não privar o
aluno desse material, pois em muitos casos, devido às condições socioeconômicas de nossos
alunos, esse é um dos poucos materiais didáticos a que eles podem ter acesso.
No fascículo 7 - Modos de falar, Modos de escrever: o programa Pró-Letramento
traz uma experiência com o texto coletivo, numa sala de 1º ano em que os alunos ainda não
dominam o sistema de escrita alfabética SEA, mas a professora, como escriba dos alunos,
num processo de interação com a turma, instigou e levou os alunos a pensarem sobre a escrita
de um texto de forma contextualizada. A escrita do texto coletivo estava relacionada a um
passeio turístico realizado na cidade de Brasília, especificamente, no Memorial JK.
Primeiro, a professora pediu que os alunos desenhassem o que eles haviam gostado no
passeio e, a partir dos desenhos, ela começou a compor, em conjunto com os alunos, um texto
informativo sobre o passeio realizado. Neste evento de letramento, a professora levou os
alunos a refletirem sobre as diferenças entre os modos de falar e os modos de escrever.
Fascículo complementar: Neste, encontra-se um trabalho com a escrita dos nomes
dos alunos para se trabalhar o tema “História de vida”, iniciando com uma proposta de
trabalho em que os alunos se apresentam e, depois, se utilizam da leitura e da escrita dos
nomes como um primeiro passo para o ingresso deles no mundo alfabetizado. Esse trabalho
possibilita aos alunos a compreensão da necessidade do registro, bem como da reflexão sobre
o sistema/princípio alfabético.
O programa traz várias sugestões de atividades que podem ser desenvolvidas em sala
de aula com a escrita dos nomes dos alunos. Tais como: listas, crachás, jogos linguísticos,
dominó, bingo, caça-palavras. Neste caso, a introdução da apropriação do sistema de escrita
alfabético, por meio da escrita dos nomes dos alunos, possibilita diversos momentos de leitura
e escrita, pois os alunos são incentivados a ler e a escrever, mesmo que de forma não
102
convencional. O nome pode ser considerado uma palavra texto, pois geralmente está
carregado de significado e oferece várias possibilidades de trabalho.
Na unidade 3 do fascículo complementar do programa Pró-Letramento apresentam-se
alguns aspectos importantes sobre a produção de textos na fase inicial de alfabetização. Nesta
unidade, destaca-se a importância de se trabalhar com a produção de texto de forma
sistemática e frequente já no primeiro ano da alfabetização. Sugere-se que o professor seja o
escriba do aluno e que proponha situações de produção de texto, nas quais os alunos iniciam
utilizando uma linguagem pictórica (desenho) e também a linguagem verbal para explicar o
que os desenhos significam, para, posteriormente, passarem à linguagem escrita.
No caso da linguagem escrita, o programa Pró-Letramento sugere ao professor que
oportunize ao aluno momentos de reflexão sobre a produção textual verificando coletivamente
a coesão e a coerência dos textos. Numa narrativa, por exemplo, o professor deve levar o
aluno a perceber que a sua estrutura envolve ação (o que aconteceu), personagens (com quem
aconteceu) espaço (onde) e o tempo (quando).
Para ilustrar o trabalho com a produção textual a partir da narrativa, o programa Pró-
Letramento traz o exemplo da professora Marilene que ministrava aulas para a 3ª série do
ensino fundamental e propôs a produção de um texto narrativo a partir do tema “História de
vida”. O material traz como contribuição ao trabalho do professor alfabetizador a necessidade
do olhar reflexivo sobre o texto do aluno. Oportunidade em que, por meio da reestruturação
de textos de forma coletiva, o professor possibilitará ao aprendiz a compreensão e o domínio
dos aspectos estruturais da língua, tanto na ortografia, na paragrafação, no uso da pontuação
(entre outros aspectos), quanto na clareza e na coerência do texto. Nesta unidade, a orientação
é para que o professor trabalhe a leitura e análise de diferentes textos a fim de que os alunos
tenham boas referências para suas produções.
O programa Pró-Letramento propõe, assim, que o professor utilize:
- Textos em quadrinhos:para que as crianças percebam a organização sequencial dos
fatos (início, meio e fim).
- Trabalho com textos literários: tais como as lendas, os textos folclóricos, as
parlendas, as quadrinhas, pois nesta faixa etária, as crianças fazem uso da expressão simbólica
e da imaginação.
- A exploração de situações interessantes, engraçadas e que acontecem no cotidiano:
que poderão ser utilizadas como motivo para a produção de histórias, relatos, notícias, textos
de opinião, cartazes, cartas ou outros gêneros.
103
- Criação de oficinas de textos: para que os alunos recebam subsídios teóricos e
práticos para suas produções.
Assim, é possível afirmar que as sugestões do Pró-Letramento para o professor
alfabetizador quanto à produção textual procuram subsidiar a prática do professor com o
desenvolvimento de projetos e atividades diversas, com vistas ao alfabetizar letrando. Não se
trata apenas de compreender a tecnologia da escrita, mas, além disso, de proporcionar aos
educandos o desenvolvimento das habilidades de leitura e escrita compreendendo suas
funções sociais, interacionais e funcionais.
O Programa Pró-Letramento é mais um aliado na prática pedagógica do professor,
além disso, é necessário ressaltar que cada realidade é diferente uma da outra e que as
propostas de produção podem e devem ser adaptadas, e isso vai depender dos projetos
desenvolvidos na escola e da criatividade do professor.
5.7 Formação docente: garantia de transformação da prática?
É na sala de aula que os referenciais e concepções defendidas pelas teorias da
educação se concretizam, de forma que se espera que neste espaço ocorram mudanças e
inovações na prática pedagógica, pois a sala de aula é um importante espaço de aprendizagem
tanto do aluno quanto do professor, pois possibilita a aquisição do saber-fazer pedagógico.
Porém, saliento que essas mudanças no interior da escola não se efetivam de forma tão
direta e imediata, devido ao caráter processual da natureza formativa e das dificuldades da
transposição didática.
Não se pode negar a importância da formação docente para a melhoria na qualidade da
educação, mas é preciso ressaltar que há outros elementos que condicionam a realidade
educacional, como as questões sociais, culturais e econômicas dos sujeitos que compõem a
escola.
A formação docente é tema de inúmeros debates, pois é considerado um relevante
componente de mudança. Pesquisadores, gestores de políticas públicas, comunidade escolar
interessam-se por esta temática, por perceber que a formação modifica a prática em sala de
aula no sentido de buscar a melhoria na qualidade da educação.
Além disso, o próprio professor sente-se impulsionado e até mesmo pressionado a
transformar ou mudar a sua prática pedagógica no sentido de acompanhar as múltiplas e
aceleradas transformações da atualidade. Além disso, ao professor é conferida a
responsabilidade pela qualidade da educação na sala de aula, impulsionando-o a se preparar
104
para o enfrentamento dessas cobranças e uma constante renovação de conhecimentos,
competências e habilidades.
Com base nessas novas exigências, atualmente vivenciamos avanços nas concepções
teóricas sobre a formação docente. Nesse sentido, a formação para o exercício da docência é
expressa na compreensão de uma continuidade entre a formação inicial e a formação
continuada, com etapas diferenciadas e especificidades próprias.
Nesse percurso de formação, as experiências docentes e a realidade concreta na qual a
prática é situada têm influência significativa nas aprendizagens do professor.
A formação inicial ocorre nos cursos de licenciatura e procura subsidiar o novo
professor com teorias e métodos para atuar na docência. Porém, esta etapa de formação inicial
é objeto de inúmeras críticas quanto à falta de articulação entre teoria e prática educacional,
entre conteúdos e métodos.
Tardif (2002) afirma que os primeiros anos da atividade profissional constituem uma
etapa em que o professor acumula sua experiência fundamental. Ao iniciar sua carreira, o
professor aprende a fazer fazendo e procurando provar a si próprio e aos outros a sua
competência no ato de ensinar. Assim, com o passar do tempo, essa experiência adquirida,
transforma-se numa maneira pessoal de ensinar.
A ênfase dada aos saberes experienciais pelos professores estabelece um
distanciamento desses saberes aos adquiridos pela formação. Tardif (2002) defende a ideia de
que em alguns casos esse distanciamento ocorre pelo impacto do início da docência, quando o
professor percebe a limitação e a lacuna dos seus saberes diante da realidade educacional. Em
outras situações, essa percepção provoca a negação da sua formação anterior, afirmando que
esta não é suficiente para as demandas.
Dessa forma, os cursos de formação continuada, ou seja, formação concomitante ao
ofício docente, promovidos com a intenção de atualizar e aperfeiçoar o saber fazer dos
professores, de uma forma geral, tem se mostrado pouco eficiente para ensejar mudanças
significativas na prática pedagógica. A esse respeito, Nóvoa (1992) afirma que as mudanças
teóricas conquistadas na formação docente, ainda não produziram, de forma eficiente, uma
mudança na prática e que é preciso superar a dicotomia entre discurso teórico e prática ainda
existente nos cursos de formação de professores.
Com a justificativa de contribuir para o desenvolvimento profissional dos professores
e alcançar a desejada transformação didática necessária, universidades públicas brasileiras
vêm se mobilizando com ações voltadas à formação inicial e continuada de professores.
105
Essas ações intencionam a qualificação docente nos processos de ensino e
aprendizagem, que se desenvolvem em uma rede de Instituição de Ensino Superior, composta
por 19 centros, em diferentes regiões do país, com o objetivo de produzir materiais em
cooperação com as instituições de ensino para fomento de programas de formação continuada
de professores e implantação de novas tecnologias de ensino e gestão em unidades e redes de
ensino. As áreas de formação dessas redes são três:
a) Alfabetização e Linguagem, Educação Matemática e Científica;
b) Ensino de Ciências Humanas e Sociais;
c) Artes e Educação Física e Gestão de Avaliação da Educação.
Apesar da integração de esforços e da qualidade desses programas, dos centros de
formação e dos cursos ofertados, a realidade educacional ainda se encontra com poucos
avanços e conquistas, persistindo o fracasso escolar, principalmente em leitura e escrita.
É importante, porém, termos a clareza de que a formação dos professores, por si só,
não efetiva as tão almejadas mudanças na escola. Nóvoa (1992) lembra que:
A formação de professores deve ser concebida como um dos componentes
da mudança, em conexão estreita com outros setores e áreas de intervenção,
e não como uma espécie de condição prévia de mudança. A formação não se
faz antes da mudança, faz-se durante, produz-se nesse esforço de inovação e
de procura dos melhores percursos para a transformação da escola.
(NÓVOA, 1992, p. 28).
É imprescindível ressaltar que a mudança no ensino depende de vários elementos e a
formação continuada é apenas um deles. A transformação da realidade educacional depende
também de questões econômicas, sociais e culturais da sociedade como um todo que
interferem nos modos de vida dos professores e dos alunos.
Atualmente, o contexto educacional passa por transformações a fim de desenvolver
um ensino mais eficaz amparado em formas de organização escolar e práticas de sala que
auxiliem na evolução da aprendizagem dos alunos de origem social desfavorecida.
Nesse sentido, faz-se necessário investimento na formação dos professores, nas
condições de funcionamento das instituições escolares, bem como a efetivação de políticas
educacionais eficazes. Por isso, penso que seja imprescindível que haja uma ação conjunta de
representantes políticos, universidades, secretários de Educação, diretores, coordenadores e
professores, com o intuito de promover a melhoria da qualidade de ensino, garantindo
melhores condições de trabalho a professores e aprendizagem efetiva para alunos.
106
Acredito que o Programa Pró-Letramento, apesar de algumas críticas recebidas, vem
buscando um diálogo com educadores, universidades e com políticas de formação continuada
propostas pelo MEC, no sentido de garantir uma educação de qualidade aos aprendizes,
buscando formas de ensino que sejam significativas.
107
6 OS GÊNEROS TEXTUAIS NAS PRÁTICAS DOCENTES: RELAÇÕES COM O
PROGRAMA PRÓ-LETRAMENTO
Neste capítulo apresento a análise das falas dos sujeitos da pesquisa sobre as temáticas
formação continuada, Programa Pró-Letramento e ensino fundamental de nove anos. Inicio
apresentando o que pensam as professoras sobre essas temáticas.
Saliento que na sessão anterior apresentei as pesquisas realizadas em âmbito nacional
sobre o programa Pró-Letramento, bem como defendi a importância da formação continuada
para a melhoria da qualidade na educação ao apresentar como uma das possibilidades o
diálogo entre as universidades e as secretarias de educação por meio do referido Programa, no
sentido de diminuir a distância entre teoria e prática.
6.1 A Formação continuada e o Programa Pró-Letramento sob a ótica dos sujeitos de
pesquisa
Tardif (2002), no primeiro capítulo do seu livro “Saberes docentes e Formação
Profissional”, intitulado “Os professores diante do saber: Esboço de uma problemática e do
saber docente”, definindo inicialmente o que é um professor, afirma que “um professor, é
antes de tudo, alguém que sabe alguma coisa e cuja função consiste em transmitir esse saber a
outros” (TARDIF, 2002, p.31). Ao discorrer sobre essa afirmação, o autor se questiona: quais
seriam estes saberes? Será que os professores são apenas transmissores dos saberes científicos
produzidos ou elaborados por pesquisadores e formadores universitários, ou eles produzem
seus próprios saberes no âmbito de sua profissão?
Neste sentido, o autor afirma que, no âmbito dos ofícios e profissões, não se pode falar
do saber sem relacioná-lo com os condicionantes e com o contexto do trabalho. Assim, o
saber é sempre o saber de alguém que trabalha alguma coisa no intuito de realizar um objetivo
qualquer. O saber não é uma coisa que flutua no espaço, o saber dos professores é o
saber deles e se relaciona com a pessoa e a identidade deles, então, não provém de uma fonte
única, mas sim de várias fontes e de diferentes momentos da história de vida e da carreira
profissional.
O autor ressalta a importância da interlocução entre produção e transmissão de
conhecimentos, no sentido de assegurar o acesso sistemático e contínuo aos saberes sociais
disponíveis. Saberes sociais esses, que não são um privilégio individual, mas que são histórica
e socialmente produzidos. Ou seja, um saber plural, por isso a necessidade dos saberes e a
108
produção de saberes se complementarem, pois o corpo docente tem uma função social tão
importante quanto a comunidade científica e os grupos produtores de saberes.
Percebe-se, também, uma tendência à formação de professores críticos e reflexivos,
que saibam agir, que não sejam apenas executores de programas ou pacotes, mas que saibam
utilizar seus conhecimentos e sua experiência profissional nas situações pedagógicas.
Guimarães (2011) afirma que:
O cenário contemporâneo, entretanto, exige pensar a formação docente como
algo que seja processual. Essa formação deve concentrar-se na própria
pessoa do professor como agente e na escola como lugar de crescimento
profissional permanente, sendo a prática entendida como eixo central. Essa
modalidade de formação “permanente” ou “continuada” enfatiza a pesquisa
em educação, valoriza o conhecimento do professor e, em um processo
interativo/reflexivo, busca contribuir para uma análise do próprio fazer
docente, focalizando a pessoa do professor e sua experiência; a profissão e
seus saberes; a escola e seus projetos. (GUIMARÃES, 2011, p. 204 – grifo
da autora).
Nesse sentido, penso que a formação continuada deva ser um projeto de todos, não
apenas de projetos maiores propostos por políticas públicas e universidades, mas é preciso
que haja o engajamento de toda a escola e, principalmente, do professor. O responsável direto
pela aprendizagem do aluno não pode se acomodar, não pode olhar uma proposta e ficar sem
ação. É preciso refletir e posicionar-se a favor ou contra, e isso só é possível se o professor
estiver aberto a novos saberes, que, aliados à experiência, permitam-lhe essa tomada de
posição.
Tardif (2002, p. 35) afirma que “quanto menos utilizável no trabalho é um saber,
menos valor profissional parece ter”, por isso, o autor destaca a importância de que as
universidades tenham uma nova articulação e um novo equilíbrio entre os conhecimentos
produzidos e os saberes desenvolvidos pelos professores em sua prática cotidiana.
Nesse sentido é que o programa de formação continuada de professores
alfabetizadores, o Pró-Letramento, vem tentando colocar em evidência esse objetivo, pois
valoriza o saber profissional, a experiência e a prática pedagógica do professor.
A tutora do Pró-Letramento, Dulcilene Rodrigues Fernandes, responsável pelo
planejamento dos encontros na SEMEC/ Rondonópolis-MT, na entrevista cedida em 15 de
agosto de 2011, salientou:
[...] em todos os encontros nós temos uma rede de ideias, sempre a rede de
ideias é de trinta a quarenta minutos, é onde o professor coloca sobre a sua
prática. Ele fala das suas experiências e sempre tem alguma atividade para
109
ser desenvolvida em sala, do curso. Né? Do fascículo. Eles relatam isso [...]
(FERNANDES, 2011).
De acordo com Tardif (2002), os saberes docentes não se reduzem à simples função de
transmissão de conhecimentos produzidos, mas integram diferentes saberes, sendo
compreendidos como um saber plural, construídos através da “formação profissional, de
saberes disciplinares, curriculares e experienciais.” (TARDIF, 2002, p.36).
Os saberes da formação profissional podem ser definidos como um conjunto de
saberes transmitidos pela instituição de formação de professores, a qual procura fazer com
que este conhecimento científico seja colocado em prática pelo professor. Tardif (2002)
salienta que a prática docente não se limita apenas às ciências da educação, mas é uma
atividade que mobiliza diversos saberes e podem ser chamados de pedagógicos, os quais são
por ele definidos como “doutrinas ou concepções provenientes de reflexões sobre a prática
educativa no sentido amplo do termo, reflexões racionais ou normativas que conduzem a
sistemas mais ou menos coerentes de representação e de orientação da atividade educativa.”
(TARDIF, 2002 p. 37).
Os saberes disciplinares são o conjunto das disciplinas dos diversos campos do
conhecimento, oferecidos pelas universidades e que são considerados importantes para a
formação do professor de uma dada sociedade, pois são oriundos da tradição cultural e dos
grupos sociais produtores do saber.
Os saberes curriculares correspondem aos discursos, objetivos, conteúdos e métodos
selecionados como modelos eruditos pela instituição escolar.
E, por fim, o autor apresenta os saberes experienciais que são o conjunto dos saberes
específicos advindos do conhecimento de mundo, da prática, do saber-fazer, do saber-ser de
cada professor e do grupo em que atua (TARDIF, 2002, p.49).
Assim, podemos afirmar que o saber docente é um saber heterogêneo moldado pela
experiência pessoal de cada um, de acordo com o grupo social, cultural no qual o professor
está inserido.
Compreendendo os saberes dos professores como um saber plural, passo à análise a
respeito das falas dos sujeitos dessa pesquisa, no tocante à formação continuada e o que
pensam sobre o programa Pró-Letramento. Lembrando que, como sujeitos da pesquisa, foram
apresentadas três professoras alfabetizadoras experientes que trabalham com a primeira, a
segunda e a terceira fase do primeiro ciclo, respectivamente. Para nomeá-las utilizei-me dos
110
seguintes pseudônimos: Ana (1ª fase), Bia (2ª fase) e Carina (3ª fase). Destacando as três
primeiras letras do alfabeto, em suas iniciais.
Assim, apresento a seguir os primeiros dados da pesquisa mediante a entrevista inicial
(2011a) sobre a formação continuada e sua importância para a prática pedagógica no ambiente
escolar, cujo roteiro encontra-se no Apêndice A.
Ao questionar sobre a importância da formação continuada para professores
alfabetizadores obtive as seguintes respostas:
A formação continuada contribui muito na nossa formação, na nossa prática.
A formação continuada tem o poder de mudar a prática. Quando o professor
tem, sente a necessidade, que ele quer. É... a formação dá embasamento
teórico pra você mudar sua prática de acordo com as reais necessidades que
a sociedade está é... pedindo, buscando, né? Que a sociedade está... como
que a gente fala... tá...[exigindo?] exigindo. Que a sociedade está exigindo.
(BIA, 2011a).
Percebo, na opinião de Bia, que a professora considera que a formação continuada é
bastante relevante no sentido de mudar a prática, e essa mudança está associada às exigências
de uma sociedade. É notável também, que esta mudança está relacionada à vontade do
professor, ou seja, se ele estiver aberto às possibilidades de transformação.
A resposta de Ana, nos leva ao trabalho coletivo e à troca de experiências que, sem
dúvida, possibilita uma análise da prática, mediante a comparação e a rede de ideias que estão
sempre presentes nesses encontros:
Lá a gente estuda, troca opinião, né? Você vê outras possibilidades dentro
daquilo que você já desenvolve. Troca ideias com os colegas. Discute
mesmo assunto de sala de aula... é necessário. (ANA, 2011a ).
Outro aspecto a ser ressaltado também é o fato de que a professora não descarta o que,
em suas palavras, “já desenvolve”, o que nos leva a crer que ela não abandona o que faz, mas
acrescenta novas metodologias ao seu trabalho. Como sugere Chartier (2006),
Os bons professores inovam. Mas, por outro lado, são muito estáveis, não
mudam a toda hora. Antes de mudar um procedimento, eles o testam. E não
mudam tudo de um dia para o outro, são perseverantes no seu modo de
ensinar. Primeiro criam uma grande estabilidade que dá segurança para a
turma. Depois gastam tempo para recolher indícios, antes de resolver um
problema novo ou utilizar um procedimento inovador. (CHARTIER, 2006, p
12).
111
Claro está que, entre esses “indícios” citados pela autora, destaca-se a troca de
experiência entre professores e formadores, possibilitada pelos cursos de formação
continuada.
Na expressão oral, a professora Carina ressalta o fato de que o ser humano precisa
estar sempre em busca de novos saberes e que a graduação e a especialização devem ser
encaradas apenas como o primeiro passo para o trabalho docente.
Eu acho que é muito importante, assim , eu... no meu caso, eu acho que
contribuiu muito mesmo com minha formação. Porque o que você aprende,
às vezes, na universidade ou numa especialização você está nua e crua. A
formação continuada te dá aquela oportunidade de você crescer enquanto
profissional, né? De refletir um pouco mais sobre a sua prática. Foi isso,
assim que aconteceu comigo. Eu acho que... que... as coisas vão mudando
muito, e a gente também tem que acompanhar essas mudanças. (CARINA,
2011a).
Nestes trechos sobre a formação continuada evidencia-se a sua inegável importância.
Ressalto ainda, o aspecto que as professoras Bia e Carina apontaram: o fato das mudanças
pelas quais a sociedade vem passando, como motor de atualização profissional. A esse
respeito afirma Feldmann (2009):
A sociedade contemporânea, denominada por alguns como sociedade da
informação e por outros como sociedade do conhecimento, se apresenta
tendo como uma de suas características a acelerada transformação pela qual
passa o mundo, provocada pelos avanços tecnológicos, que incidem na
constituição de uma nova cultura do trabalho, afetando diretamente o
universo escolar. Diante dessa situação, o professor, como também outros
profissionais da escola, vê-se impelido a rever sua atuação, suas
responsabilidades e seus processos de formação e ação. (FELDMANN,
2009, p.75).
Dessa forma, a formação continuada propicia aos professores esta reflexão acerca de
sua prática enquanto seres inconclusos, na busca pela capacitação a fim de oferecer um ensino
de boa qualidade aos seus alunos.
Ainda com base em Tardif (2002, p.79), concordo com o autor que salienta que “os
saberes docentes formam uma mescla dinâmica, plural proveniente de diversas fontes. Uma
das fontes mais importantes dos saberes docentes é a sua própria prática”. Ademais, os
saberes docentes são moldados pela formação inicial, em cursos de capacitação e
aperfeiçoamento, na troca de experiências com outros professores, nas experiências cotidianas
e na história de vida de cada um.
112
É o que evidenciam as respostas das entrevistadas a respeito da seguinte questão: “No
decorrer de sua trajetória como professora alfabetizadora, o que você acha que contribuiu para
melhorar a sua prática?”
A prática. E a reflexão sobre a prática. A experiência: o que deu certo, o que
não deu certo. E o estudo, a formação. A formação nos traz novas
informações, nos traz novas contribuições e nos faz refletir sobre a nossa
prática e aí você vai buscar novas formas de trabalhar, novas formas de
ensinar, novas metodologias. (BIA, 2011a).
Neste excerto, observo que a professora salienta que a prática a faz crescer enquanto
profissional, pois refletindo sobre os seus saberes, suas experiências, ela avalia o que foi
proveitoso e busca nos cursos de capacitação novas formas de trabalhar. A esse respeito
Guimarães (2011, p. 205) afirma que “ao pensar em suas ações, redefinir caminhos e buscar
soluções, às vezes imediatas para resolver problemas, os professores têm a oportunidade de
refletir e avaliar sobre si mesmos e as experiências que re/constroem cotidianamente.” Dessa
forma, percebo que essa reflexão e ação só é possível através da prática, das experiências, do
contato com o outro.
Guimarães (2011) advoga ainda, que o eixo central da formação continuada é
desenvolver o educador pesquisador, que esteja preocupado com sua prática, no sentido de
apresentar uma atitude reflexiva sobre ela. Ou seja, o agir na e sobre a prática depende de um
movimento de ação-reflexão-ação. É por isso que a formação do professor deve privilegiar
essa tomada de consciência e fazer com que o protagonista do processo educativo não seja um
mero executor de programas, mas saiba se questionar sobre o seu fazer pedagógico, a fim de
ser sujeito de suas próprias ações, sendo capaz de responder questões como: o que ensinar?
Como ensinar? Para que e por que ensinar? Qual o melhor caminho a seguir? Quais as
possibilidades?
Não podemos negar a importância da formação continuada para o profissional da
educação, pois é através dela que a competência pedagógica do professor se solidifica e se
transforma no sentido de diminuir a distância entre teoria e prática.
Observemos o trecho em que a professora Carina fala sobre o trabalho coletivo na
escola.
Eu acho que anh...o trabalho coletivo na escola com os colegas. É uma coisa
que me ajudou muito, principalmente no início, as colegas com mais
experiências, lá na escola tem a M, tem a Z, tem assim... a I, tem várias, né?
Elas já tinham experiência. [...] E aí eu comecei a trabalhar muito com as
meninas que me ajudaram bastante, me passavam ideias, me passavam
113
textos e assim a experiência do outro contribui bastante com a gente. Sentar
junto para planejar, assim, eu acho, trocar as suas angústias, as dificuldades.
A gente faz muito disso lá... (CARINA, 2011b).
Na fala da professora Carina nota-se a importância que atribui à troca, ao diálogo, à
conversa com o outro (par mais experiente), para a sua prática e até mesmo para a sua
constituição como profissional. Como Bakhtin (2010) nos lembra, é na interação que
aprendemos uns com os outros, numa relação dialógica, é nessa relação com o outro que nos
constituímos enquanto pessoa, enquanto profissional.
No sentido de buscar respostas sobre a importância do programa de formação
continuada, o Pró-Letramento, enquanto proposta deste estudo, várias questões foram feitas.
Destaco a seguir a pergunta mais objetiva e as respectivas respostas dos sujeitos da pesquisa:
“Qual a importância deste programa para a sua prática pedagógica?”
Porque através do programa, nós temos que adequar muitas práticas ao
programa. A da oralidade, a da produção de texto, ah... da escrita, da leitura.
(BIA, 2011a).
Ele é importante, porque lá, porque... por exemplo: o termo letramento era
novo pra nós. Né? Antes você trabalhava, mas não tinha tanta abrangência
assim. Então lá você estudou aprendeu, viu coisas novas também.
Possibilidades de você tá... é só trabalhando é..., a questão de organizar
melhor o trabalho, o Pró-Letramento contribuiu, na organização porque ele
trabalha muito com o que você desenvolve, qual a etapa do trabalho por
exemplo, dentro da produção textual. O que que eu vou trabalhar sexta, na
semana que vem. Então tem um calendário que eu... que a gente... lá... eles
ensinaram a fazer um calendário,traçar um..., pra você não ficar perdido lá
nos trabalhos. (ANA, 2011a).
Eu acho que eu mudei muito assim, a forma de... de... encarar a
alfabetização, né? Ah, gente... eu mudei muito o jeito de encarar a
alfabetização no sentido assim, de ver que existem muitas possibilidades,
basta a gente correr atrás, né? A questão de se trabalhar vários gêneros em
todas as fases. Uma vez a gente tinha aquele medo. É lógico que tinha
determinados gêneros, que é apropriado pra primeira, pra segunda e pra
terceira fase às vezes tá lá na proposta tudo direitinho. Você tem que
trabalhar, o aluno no final do ano tem que saber este, este, este, né? Mas
como é que eu vou exigir que meu aluno saiba carta se ele não sabe escrever
um bilhete, né? Então você tem, acaba tendo que ver os outros gêneros.
( CARINA, 2011a).
A partir destes fragmentos foi possível compreender, parcialmente, como acontece a
dinâmica do curso proposto pela SEMEC/Rondonópolis-MT; na fala da professora Bia
destaca-se a disposição dos fascículos propostos pelo Pró-Letramento (Fascículo1:
114
capacidades linguísticas e Fascículo 6: modos de falar modos de escrever) que devem ser
contemplados no trabalho com a língua portuguesa.
No discurso da professora Ana, o aspecto mais evidente é a rotina de trabalho, que
deve ser pensada, planejada, para que o professor não se perca e consiga atingir seus
objetivos, trabalhando os cinco eixos do ensino da Língua Portuguesa. Creio que ela remete
ao Fascículo 2, que contempla a organização do tempo pedagógico e o planejamento de
ensino.
Destaco na fala da professora Carina o trabalho com os gêneros textuais, ou seja, uma
nova metodologia vista por ela com mais clareza e também com mais importância, pois
percebe-se a relação entre o que se aprende na escola e as exigências da sociedade. A escrita
com uma função social e interacional.
6.2 O Ensino Fundamental de nove anos: o que mudou?
O Brasil aprovou recentemente a lei federal de nº 11.274 no dia seis de fevereiro de
2006, que institui o ensino fundamental de nove anos para todos os sistemas de ensino. Com
isso, houve uma alteração nos artigos da LDB.
Essa mudança ao mesmo tempo em que inclui as crianças que frequentavam o
segmento final da educação infantil, também levanta algumas questões importantes,
principalmente em relação à prática da alfabetização nos primeiros anos da alfabetização.
Sabe-se que o ensino fundamental de nove anos tem como objetivos principais
“oferecer maiores oportunidades de aprendizagem no período de escolarização obrigatória e
assegurar que, ingressando mais cedo no sistema de ensino, as crianças prossigam nos estudos
alcançando maior nível de escolaridade” (MEC/SEB/DPE/COEF, 2004, p.14). Porém, a
escola deve ser um espaço preparado para isso. Não só em termos físicos, mas também na
formação do professor, na estrutura do currículo, na organização dos tempos e espaços de
aprendizagem dos alunos, no Projeto Político Pedagógico da escola, bem como nos objetivos
e metas a serem atingidas. De que adianta modificar a lei, se o professor e o ambiente escolar
não estão preparados para receber e atender às especificidades desse novo modelo de
educação?
Silva (2010) coloca que algumas inquietações fazem parte das preocupações para esta
nova modalidade de ensino, no campo do currículo e das práticas pedagógicas, tais como:
115
As crianças devem ser alfabetizadas aos seis anos? Que conhecimentos
devem ser ensinados às crianças de seis anos? Que metas de aprendizagem
devem ser definidas para o final dos primeiros anos de escolaridade? Em que
aspectos as práticas de ensino devem ser repensadas e alteradas? (SILVA,
2010, p. 37).
Diante desses questionamentos, a autora salienta que, atualmente, a exigência da
escola vai muito além do domínio da habilidade de codificar e decodificar a escrita, mas
também é necessário que se desenvolva a capacidade da criança de fazer uso da leitura e da
escrita no cotidiano, e levá-la a apropriar-se da função social dessas práticas, ou seja, letrar-
se. Nesse sentido, o desafio que se coloca hoje ao professor alfabetizador é conciliar esses
dois processos – alfabetização e letramento.
É preciso reconhecer, também, que os dois processos, embora complementares e
inseparáveis, têm suas especificidades e exigem, por parte do docente, procedimentos
didáticos e metodologias adequadas a cada um deles.
Neste sentido, necessário se faz que o professor alfabetizador organize seu trabalho de
forma que contemple os conhecimentos linguísticos que estão envolvidos no processo de
alfabetização não perdendo de foco os conhecimentos que devem ser ensinados aos alunos
nos primeiros anos de escolarização, quais os procedimentos e materiais didáticos que podem
auxiliar no processo de alfabetização. Ou seja, é preciso que o professor atue de forma
reflexiva sobre a organização e o desenvolvimento de sua prática pedagógica, delimitando
metas e objetivos a serem atingidos. Quando o professor não tem clareza quanto a esses
objetivos, ele não terá condições de responder às perguntas: Deve-se ou não alfabetizar as
crianças que são inseridas no ensino fundamental, com seis anos de idade? Qual a idade ideal
para se iniciar o processo de alfabetização? O que ensinar sobre a língua escrita nesta etapa?
Silva (2010) defende que as crianças devem ingressar no mundo das letras desde a sua
entrada na escola, pois elas já estão inseridas num universo grafocêntrico, ou seja, a entrada
da criança na escola não inaugura seu contato com o universo das letras, pois ela já tem
contato com diversas situações que envolvem letras, números, símbolos que já são lidos antes
de sua entrada na escola.
A autora advoga, ainda, que o tempo das crianças de seis anos de idade precisa ser
organizado em períodos mais longos, sem rupturas e que os professores estejam mais atentos
aos avanços de suas aprendizagens.
Esse acompanhamento é possível à medida que o professor consegue, por meio da
escola organizada por ciclos de formação humana, acompanhar sua turma desde a primeira até
a terceira fase de alfabetização.
116
Nesse sentido, é possível iniciar o processo de alfabetização no primeiro ano de
escolaridade e ter como meta sua consolidação, ao final do segundo e do terceiro ano. Por
isso, é necessário que a escola defina com clareza o que precisa ensinar em cada ano de
escolarização, projete metas a fim de que tenha delineado o ponto de partida e o ponto de
chegada de seu trabalho anual, ou seja quais as habilidades, conhecimentos e capacidades que
o educando precisa ter desenvolvidos em cada etapa do processo de alfabetização e
letramento.
No caso da rede municipal de Educação do município de Rondonópolis – MT, é
possível afirmar que, pelo fato de ser organizada por ciclos, o professor pode planejar a sua
prática pedagógica no sentido de definir um período destinado à introdução e à consolidação
dos processos de alfabetização.
De acordo com Silva (2010, p. 40), um dos avanços dessa nova política de inclusão da
criança de seis anos no ensino fundamental é o reconhecimento dos direitos da criança acerca
de uma escolarização mais extensa e também de uma alfabetização ressignificada, além disso,
as novas coleções destinadas à alfabetização a partir do Plano Nacional do Livro Didático,
PNLD de 2010 estabelecem um período de dois anos para o trabalho pedagógico na
alfabetização.
A autora ressalta que apesar de a sociedade como um todo apoiar a decisão
governamental, que antecipa a entrada da criança na escola, ainda no meio educacional, são
comuns alguns questionamentos sobre a adequação do início do processo de alfabetização das
crianças. Muitos questionamentos e dúvidas quanto a essa polêmica, em relação à
alfabetização aos seis anos, circulam no meio educacional, tais como: Não seria precoce a
alfabetização aos seis anos de idade? Toda mudança gera polêmica, e por estar habituado a
uma organização que vem de longa data, muitas vezes, o professor demora a assimilar e
modificar uma prática que já tinha sido internalizada.
Historicamente é preciso lembrar que o ensino fundamental esteve organizado de
forma seriada e que a criança entrava na escola com sete anos de idade na primeira série e as
crianças que entravam na escola com idade inferior a sete anos, frequentavam a pré-escola
que tinha como prática pedagógica o período preparatório com atividades de desenvolvimento
das habilidades motoras e visuais em que se preparava a criança para entrar no mundo da
escrita, ou seja, no período da pré-escola o objetivo principal era desenvolver as habilidades
motoras da criança para seu início ao mundo letrado.
Leal e Brandão (2010) apontam que, no Brasil, até os anos 60 do século XX, difundia-
se o discurso da maturidade na alfabetização, ou seja, acreditava-se que a criança, para
117
aprender as habilidades de leitura e escrita, deveria ter seis ou sete anos, pois nesta idade
estaria “pronta para aprender”. De acordo com as autoras, as orientações pedagógicas neste
período
deveria evitar qualquer contato direto com a leitura e a escrita e se
concentrar no estímulo aos chamados “pré-requisitos”para aprender a ler e
escrever, tais como o desenvolvimento de habilidades de coordenação viso-
motora, memória visual e auditiva, orientação espacial, articulação adequada
de palavras, certo grau de atenção e concentração, boa alimentação, entre
outros. (BRANDÃO; LEAL, 2010, p.15).
Essa concepção sobre a aprendizagem da leitura e da escrita acabou influenciando as
políticas públicas para o atendimento às crianças da pré-escola nos anos 1970 a 1980 do
século XX.
Porém, o discurso da prontidão para a alfabetização passou a ser questionado por
profissionais da área da educação, que, entre outras críticas, apontaram os exercícios
preparatórios como vazios de significados e repetitivos. Além disso, o fracasso na
alfabetização ainda era evidente. Ou seja, apesar no alto investimento no chamado período
preparatório, a tão almejada maturação não garantia efetivamente que as crianças fossem
alfabetizadas.
Diante desses argumentos, Leal e Brandão (2010) observaram três caminhos pelos
quais se desdobraram o trabalho da linguagem em sala de aula.
O primeiro caminho “A obrigação da alfabetização”, no qual as crianças devem
concluir a educação infantil, já dominando certas associações grafofônicas, reconhecendo
letras, lendo e escrevendo palavras e pequenos textos. Ou seja, ao invés de as crianças
treinarem a escrita de formas, figuras e traçados, elas passariam a coordenação motora fina
com a escrita das letras e palavras de forma mecânica e exaustiva.
O segundo caminho denominado “O letramento sem letras” ao contrário do caminho
anterior, a alfabetização era vista como um conteúdo escolar e por isso proibido para as
crianças da educação infantil, as quais deveriam participar de atividades lúdicas que
envolvessem outros tipos de linguagem, como a corporal, a musical, entre outras. A
linguagem escrita, sob este enfoque, não deveria ser trabalhada.
No terceiro momento, o caminho era “Ler e escrever com significado na educação
infantil”. Este enfoque é adverso aos dois caminhos descritos anteriormente. A partir das
ideias de Ferreiro, na década de 70, a alfabetização passa a ser entendida como um longo
118
processo que começa antes da criança entrar na escola, pois elas formulam hipóteses sobre o
funcionamento da escrita. As autoras salientam e defendem que
neste terceiro caminho aponta-se a possibilidade de ensinar a escrita na
educação infantil, de forma sistemática, incluindo aspectos relativos à
apropriação do sistema de ensino alfabético de escrita sem desconsiderar os
objetivos e as atividades no eixo do letramento, bem como outras
necessidades relativas ao desenvolvimento e vivências da infância.
(BRANDÃO; LEAL, 2010, p.21).
É necessário compreender que as crianças, antes mesmo de adentrar a escola, já vivem
em contextos grafocêntricos, a maioria convive com a escrita, seja por meio da televisão, do
computador, de atividades diárias, dos rótulos dos produtos, das propagandas, dos panfletos,
dos logotipos, das placas de trânsito, dos rótulos dos cartazes, além dos textos de revistas e
jornais. Ou seja, a criança já possui noções sobre a leitura e a escrita, pois vem de um amplo
processo cultural de alfabetização e letramento, dependendo do contexto sociocultural em que
vive.
Dessa forma, a decisão governamental de ampliar o ensino fundamental para nove
anos, além de possibilitar a democratização do acesso à escola para as crianças das camadas
populares, amplia também as oportunidades de acesso à cultura escrita. E isso é um avanço
significativo para todos, no que tange à educação. Porém, as escolas precisam rever antigos
conceitos e formas de pensar a alfabetização, é preciso definir objetivamente o que deverá ser
ensinado sobre a leitura e a escrita em cada etapa de escolarização.
Em se tratando desta mudança, apresento o que os sujeitos desta pesquisa pensam a
respeito disso, de acordo com as respostas à seguinte pergunta: Com o Ensino Fundamental
de nove anos, crianças mais novas, de seis anos, chegam ao primeiro ano? O que você acha
dessa proposta?
Bem eu penso assim: antigamente a gente tinha que trabalhar com criança de
sete, [subentende-se anos] era muito mais fácil. Muito fácil. Muito mais
fácil. A criança tinha maturidade. Já começava ler. Era muito melhor. Com
seis é mais difícil. Eles chegam [os alunos]... às vezes não chegam com seis.
E têm escolas que mudaram o currículo, com seis anos elas trabalham como
se fosse alfabetização em pré-escola, né? Ensino infantil. E aqui na escola,
não. Por que nós temos o pré, né? E aí é difícil. Eu acho que a criança com
sete anos é melhor preparada ela tá, ela já consegue...ela é mais
independente...até a linguagem dela é diferente. Você pega a criança que
começou a ler, que ainda tem uma linguagem materna ainda... muita coisa
ele ainda não fala direito...tá acostumado em casa. E até você tirar isso
demora muito, é muito mais difícil... (Professora Ana, 2011b).
119
Eu penso que essas crianças não têm maturidade suficiente pra acompanhar
o que é determinado à aprendizagem. O objetivo da primeira fase é al-fa-be-
ti-zar [ foi enfática]. E a criança não chega com seis anos, eles chegam com
cinco anos e oito meses, cinco anos e seis [meses]... chegam com cinco
incompletos. Eles não têm maturidade, eles querem brincar, você tem que
forçar muito eles, porque eles querem é brincar. Muitos deles não têm
maturidade, tem uns que tem, mas tem outros que não tem maturidade, e eu
penso que é devido à idade. Porque antigamente, quando entrava com sete
anos, a criança tinha maturidade pra aprender. Era muito mais fácil de se
lidar com eles, quando tinha... com sete anos, hoje em dia com cinco anos e
pouco..., a criança quer brincar e ela não consegue... entender o que é que
está acontecendo... ( Bia, 2011b).
Eu acho que da mesma forma que acontecia com sete, tem crianças que são
mais amadurecidas e tem crianças que demoram um pouco mais pra atingir a
maturidade...então às vezes tem crianças que com cinco anos, você consegue
desenvolver um bom trabalho... perto de um de sete. Então, vai muiiiiito da
diferença de cada um, né? Eu acho que todas são capazes, só que a gente
percebe assim, que tem criança que no primeiro ano, parece que não vai. Aí
você acha que é dificuldade, e às vezes você confunde, porque não é o
tempo dela. E quando ela pegar o fio da meada, aí ela vai embora...,né?
Então é questão, assim, das capacidades do desenvolvimento, das
habilidades deles, da concepção de começar a perceber o mundo da escrita, o
mundo da leitura a questão da importância disso pra eles na vida... Então, eu
acho que vai de cada um. A gente pega muita criança com seis anos muito
imatura, no entanto pega outros que já vem... Assim que fala: nossa se
tivesse entrado um ano antes... E aí, mesmo os que não têm aquela
maturidade você tem que ir puxando e tendo paciência e não pode ficar
esperando muito porque você tem que ter um resultado, né? (CARINA,
2011b).
É possível perceber, através desses excertos, que se torna de fundamental importância
um planejamento didático pedagógico no ensino fundamental, o objetivo é atuar com
liberdade para assegurar a apropriação e a construção do conhecimento a todos. A inclusão
de crianças de seis anos no ensino fundamental requer diálogo entre os professores, diálogo
institucional e pedagógico, dentro da escola e entre as escolas, com alternativas curriculares
claras. O que precisa ser considerado, nesta mudança, é um Projeto Político Pedagógico (PPP)
articulado com propósitos e objetivos voltados para o ensino e a aprendizagem dos alunos.
Pelas falas das professoras, percebo que a proposta de inclusão das crianças de seis
anos no ensino fundamental ainda não está clara em termos de currículo, pois pelo
depoimento da professora Ana, a escola atende a pré-escola com crianças de cinco anos de
idade. Ao afirmar que as crianças não têm maturidade e que era mais fácil alfabetizar crianças
com sete anos, a professora se reporta ao ensino fundamental de oito anos. Penso que ainda
seria necessário que esses objetivos se tornassem claros em relação ao ponto de partida e ao
ponto de chegada, ou seja, de planejamento para a atuação dos professores alfabetizadores.
120
A esse respeito Silva (2010) afirma que:
Nesse sentido, é importante que as redes de ensino definam quais
conhecimentos serão ensinados e quais são as capacidades e habilidades
mínimas a serem atingidas pelos alunos em cada etapa de sua escolarização.
Para saber qual é o ponto de partida do trabalho a ser desenvolvido com cada
turma, é fundamental que as escolas possuam instrumentos compartilhados
para diagnosticar e avaliar os alunos e o trabalho que realizam. (SILVA,
2010, p. 42).
Não se pode cobrar do professor resultados sem esclarecer a proposta, ou seja, o que
se pretende com as mudanças voltadas ao meio educacional. Não se pode, simplesmente,
mudar uma forma de trabalho sem se preocupar com as possibilidades de realização deste.
Compreender que a inclusão das crianças de seis anos de idade no ensino fundamental é uma
questão política requer também uma adequação de práticas pedagógicas que foram
consolidadas ao longo dos anos. Os professores, os gestores, as secretarias de educação
precisam ampliar o diálogo, a fim de compreender que o fazer pedagógico precisa de
orientação e metas para que haja mudança com qualidade e respeito às capacidades cognitivas
dos educandos.
Na continuidade dessa questão de entrevista, quis compreender melhor o pensamento
da professora Bia a respeito do ensino fundamental de nove anos e perguntei-lhe: “Essas
crianças precisam de um trabalho diferente? Qual seria?”
Precisa trabalhar de uma maneira mais criativa, mais divertida, pra chamar a
atenção deles, mais lúdica... pra eles conseguirem entender e prestar a
atenção... porque senão eles não conseguem ater a atenção pra aquilo ali.
Não faz parte do mundo deles.(BIA, 2011b).
Interessante perceber que a professora sabe que é preciso trabalhar de forma diferente
e, no entanto, que isso não é fácil, pois requer criatividade, competência e dinamismo por
parte do docente. Além disso, é necessário que a escola elabore uma proposta de alfabetização
que privilegie a criação de contextos significativos de aprendizagem, que contemple temas de
interesse do universo infantil com atividades lúdicas e prazerosas que despertem a curiosidade
e que tenham relação com o que as crianças já conheçam (faça parte do mundo delas) a fim
de que seus conhecimentos sejam ampliados.
Essa mudança também implica compromisso da administração política das secretarias
de educação no que diz respeito ao investimento na formação continuada dos docentes, na
melhoria do espaço físico das escolas e dos materiais pedagógicos. Para ilustrar, atualmente, a
Secretaria de Educação de Rondonópolis – MT não possui nenhum programa de formação
121
continuada de professores alfabetizadores. Podemos citar como exemplo, o próprio Programa
Pró-Letramento que só foi ministrado nos anos de 2010 e 2011, com grande aceitação por
parte dos professores, não tendo sua continuidade em 2012, por questões políticas e
administrativas.
Além disso, o termo letramento, conforme já discutido no referencial teórico, é bem
recente e vem sendo aos poucos incorporado no discurso e nas práticas do professor
alfabetizador. Surgiu na década de 80 e vem sendo objeto de estudo de diversos teóricos.
Penso que, na perspectiva bakhtiniana, a palavra letramento é uma réplica ao termo
alfabetização, pois este último não provoca dúvidas nem polêmica, por tratar-se de um
vocábulo de uso corrente em nosso meio, principalmente se for associada ao analfabetismo,
que durante muito tempo foi uma realidade e uma das principais preocupações de nossa
sociedade. Já esse novo fenômeno, denominado letramento, ainda causa estranheza,
confluências e divergências. Surgiu para atender às exigências de uma sociedade, na qual o
termo alfabetização se tornou insuficiente.
Compreender é opor a palavra do locutor uma contra palavra numa forma de diálogo,
ininterrupto e dinâmico. A concepção de linguagem, na teoria bakhtiniana, é sempre
dialógica, não há palavra que seja primeira ou a última e não há limites para o contexto
dialógico. O diálogo pode ser em forma de complemento, em forma de réplica, de
concordância ou dissonância com o que já foi dito anteriormente.
Dessa forma, para entender como as professoras compreendem esse novo termo
perguntei: O termo letramento vem sendo utilizado há pouco tempo no meio educacional.
Você acredita que há diferença entre alfabetização e letramento? Explique:
Alfabetização e letramento, eles tem que caminhar juntos, né? Porque a
criança se alfabetiza e pra ela ter um bom desenvolvimento, ela precisa estar
numa situação de letramento, porque ela vai ler o texto, entender, criar,
modificar, emitir opinião, relacionar uma coisa com a outra, então isso se faz
na alfabetização com letramento, porque por exemplo, se a criança está
estudando o nome dela, é... estudando o nome, então você já relaciona com
outra coisa. Pra não ficar uma coisa mecânica, né? Você vai relacionando:
do que que ela gosta, abre um leque, tem um monte de coisa, né? Então, esta
é uma situação de letramento. (ANA, 2011a).
Acredito, acredito. Eu penso que alfabetização é um mero processo de
codificar e decodificar. E que o letramento, não, o letramento veio
transformar esse processo em um processo mais, mais completo onde a
criança, além dela aprender ler e escrever por ler e escrever, ela vai aprender
ler e escrever para usar na vida, no cotidiano dela, ela vai aprender pra que
serve aquele texto, onde que ela pode usar aquele texto. O letramento insere
o mundo social dentro da escola. (BIA, 2011a).
122
Eu acredito. Em função da minha prática mesmo, igual eu comentei com
você no início, que antes eu queria fazer uma coisa que eu não estava dando
conta e hoje eu descobri o quê? Que eu estava querendo alfabetizar letrando,
né? Então, eu acho que muda muito a cabeça da gente. (CARINA, 2011a).
O dialogismo presente neste discurso das professoras é bastante evidente. No
Programa Pró-Letramento, os conceitos de alfabetização e letramento são amplamente
discutidos, na tentativa de que o professor alfabetizador aproprie-se destes conceitos e, em sua
prática docente, consiga conciliar os dois processos. Sabemos que esta apropriação não é um
processo imediato. Nesse sentido, afirma Bakhtin que
Nem todos os discursos se prestam de maneira igualmente fácil a esta
assimilação e a esta apropriação: muitos resistem firmemente, outros
permanecem alheios, soam de maneira estranha na boca do falante que se
apossou deles, não podem ser assimilados por seu contexto e escapam dele; é
como se eles, fora da vontade do falante, se colocassem ‘entre aspas’. A
linguagem não é um meio neutro que se torne fácil e livremente a
propriedade intencional do falante, ela está povoada ou superpovoada de
intenções de outrem. Dominá-la, submetê-la às próprias intenções e acentos
é um processo difícil e complexo. (BAKHTIN, 1998, p.100).
No discurso, o grande desafio está no como alfabetizar, letrando. Ou seja, alfabetizar
na perspectiva do letramento é propor atividades orais, escritas com sentido, de forma
discursiva, por meio de textos variados e que fazem parte da realidade do aluno. Assim, mais
do que compreender a relação fonema - grafema, faz-se necessário também utilizar-se dessa
tecnologia para expressar-se com clareza e de acordo com as exigências do meio social em
que vivemos.
Penso que os sujeitos desta pesquisa, como muitos alfabetizadores, ainda tem dúvidas
e limitações a respeito da compreensão do como alfabetizar na perspectiva do letramento, mas
continuam buscando na interação com o outro (cursos de formação continuada) transpor suas
limitações. Creio que ainda existe a necessidade de investimentos na formação e capacitação
dos professores alfabetizadores, no sentido de fazer com que esta compreensão se efetive e se
concretize na prática. Não se pode perder de vista que alfabetizar na perspectiva do letramento
envolve processos complexos de compreensão do sistema de escrita, bem como estratégias
metodológicas, as quais abrangem momentos de leitura e produção de diferentes gêneros
textuais e momentos de reflexão sobre a constituição do sistema de escrita alfabética.
Observando o material do Pró-Letramento, é possível perceber que as orientações
contidas no Fascículo 1: As capacidades linguísticas da alfabetização - auxiliam o professor
alfabetizador a organizar e a planejar o seu trabalho no sentido de responder à polêmica
123
questão: “deve-se ou não alfabetizar as crianças de seis anos?”, pois definem com clareza e
progressivamente os conhecimentos que deverão ser ensinados aos alunos para que
desenvolvam suas capacidades e aprendam a ler e a escrever. Porém, não basta somente a
transformação da prática dos professores alfabetizadores, mas da cultura escolar como um
todo e isso não acontece somente com um curso de formação continuada. Como já ressaltei
anteriormente, as mudanças devem ser políticas, administrativas e pedagógicas.
6.3 A prática pedagógica das docentes pesquisadas
Este item contém a análise da prática docente dos sujeitos dessa pesquisa, professoras
Ana (1ª fase do 1º ciclo), Bia (2ª fase do 1º ciclo) e Carina (3ª fase do 1º ciclo).
Mediante a observação das aulas e com base nos protocolos de observação foi possível
captar a dinâmica da prática pedagógica dos sujeitos da pesquisa, relacionando-a ao programa
Pró-Letramento, no intuito de verificar quais as orientações deste, que refletem no trabalho
com a produção de textos, verificando quais os gêneros que circulam no ambiente da sala de
aula e como este trabalho é realizado.
Para facilitar a transcrição dos dados e evitar a repetição de palavras, a identificação
dos trechos dos protocolos nos parênteses reporta-se ao Quadro 6, no qual consta o nome do
sujeito de pesquisa e o dia da observação. Como exemplo, temos: PROTOCOLO A1, que
identifica o sujeito de pesquisa: Ana, protocolo 1, dia 05/08/2011.
Os dados coletados foram lidos, analisados e interpretados à luz das teorizações
correlacionadas aos gêneros textuais e às práticas de alfabetização e letramento. Para dar
maior visibilidade aos dados, foram organizados quadros com a incidência dos gêneros
textuais que circulam na sala de aula, bem como, em alguns casos, ilustração com o produto
da atividade de produção desenvolvida.
6.3.1 A prática da professora Ana – 1ª fase
As observações na sala da professora Ana ocorreram em treze episódios semanais
(Quadro 13). Nesse sentido, foi possível verificar que, como todo trabalho pedagógico, a sua
prática segue uma rotina específica para o dia da semana, pois toda sexta-feira, no horário das
sete às nove horas, desenvolve-se a produção de texto. Dessa forma, interessada no
desenvolvimento dessa atividade, compareci à sala na sala, no horário combinado.
124
A sala é bem espaçosa, climatizada, com mesinhas individuais, possui diversos
cartazes com as letras do alfabeto e das famílias silábicas, num canto do quadro tem um cartaz
com o contrato didático, o qual contém as normas de conduta da turma9. Além disso, a
professora dispõe de um armário, onde guarda seus materiais e alguns pertences dos alunos,
tais como: livros, cadernos de produção textual, lápis, borracha, etc.
A quantidade de alunos nesta sala é adequada, pois são apenas dezessete. A
professora Ana, na entrevista, revelou que eram 22, porém, devido à mudança de algumas
famílias para outros bairros, os alunos foram diminuindo e ficaram 17. Desses, 11 são
considerados, pela professora, aptos para a segunda fase. Ou seja, acompanharão sem
dificuldades. Dos outros 6, 4 devem ter um acompanhamento por meio das aulas de apoio e 2
ainda necessitam iniciar o processo de alfabetização.
A professora coloca a sua angústia em relação à descontinuidade do seu fazer
pedagógico, por causa das constantes faltas e mudanças dos alunos: “Eu diria que foi um dos
anos mais difíceis, pra trabalhar com eles porque foram alunos que você começava um
trabalho e eles eram transferidos, foi diminuindo, diminuindo os alunos e não dava...”(ANA,
2011b). Perguntei: Mas é por quê? Eles se mudam? “Eles mudam, mudam de bairro,
mudam de cidade. A maioria ganhou casa, foi embora... né?” (ANA, 2011b).
No início, os alunos estranharam a minha presença. Percebi seus olhares curiosos e
interrogativos, porém, com o passar do tempo, eles compreenderam que eu estava fazendo um
“trabalho” diferente do desenvolvido por outras pessoas na escola.
De acordo com Rockwell (1987), por mais neutro e discreto que o pesquisador procure
ser, a sua presença e permanência na escola é estranha àquele ambiente. Quando as crianças
percebem que o pesquisador não faz parte dos adultos que normalmente frequentam a escola
(diretor, coordenador, professor), elas percebem que a função do pesquisador é diferente das
demais. Nesse sentido, procurei ser o mais discreta possível, não ocupando nenhum lugar em
destaque na sala. Sempre ficava no fundo da sala, na última carteira à esquerda, com os olhos
voltados ao que estava escrevendo, às vezes mantinha um olhar vago, almejando tornar-se
desinteressante para elas. Em algumas ocasiões, as crianças tentavam conversar comigo,
9 O cartaz denominado por Contrato didático traz as seguintes normas: Fazer as tarefas de sala e de casa;
Respeitar o colega, não brigar e xingar; Manter a limpeza da sala; Pedir autorização para sair da sala; Ser rápido
ao sair da sala; Organizar os materiais da sala; Cuidar dos próprios materiais; Não mastigar borracha e lápis;
Manter um tom baixo de voz; Respeitar as professoras e os demais funcionários da escola; Lembrar de ir ao
banheiro e tomar água nos intervalos; Evitar correrias; Evitar “passeio” na sala.
125
dispersando-se da aula, ao que eu pedia: “Preste atenção, não podemos conversar, a
professora está explicando”.
A princípio, Ana ficou apreensiva, perdendo um pouco o domínio de sala, mas
esclareci que ficasse à vontade para chamar a atenção da turma e que ela agisse de forma
natural. Assim, com o passar do tempo, as crianças e Ana estabeleceram uma relação de
confiança com a pesquisadora, até mesmo porque, em alguns momentos, após a explicação
das atividades a serem desenvolvidas pelos educandos, a pesquisadora, deixava de ser mera
expectadora para auxiliar os alunos que apresentavam maiores dificuldades.
Foi possível perceber que a professora Ana tem uma relação maternal com as crianças,
corrigindo, elogiando, incentivando e cuidando dos alunos de forma carinhosa. Sempre no
início da aula, a professora organizava a sala de aula alinhando as carteiras em fileiras e
recepcionava os alunos e isso foi possível perceber desde o primeiro dia de observação:
a professora organiza a sala e recepciona os alunos, colocando-os cada um
em seu lugar [...] chegaram mais duas alunas que estavam atrasadas, uma
delas de nome Amanda estava aniversariando, a professora a recepcionou
cantando os parabéns junto com os outros alunos. (PROTOCOLO A1, linhas
2 a 9).
Verifica-se, neste episódio, que a professora valoriza este lado do cuidado e da
autoestima de cada aluno; em vários momentos de observação foi possível perceber esta
relação entre eles.
As produções de textos, realizadas durante as observações sempre partem de uma
consigna oral por parte da professora, oportunidade em que ela instrui os alunos para a
realização das produções, explorando da forma mais detalhada possível o que deverá ser feito
em cada atividade. Por exemplo, em 12/08/2011 a professora propôs a produção de um cartão
sobre o dia dos pais esclarecendo que:
neste cartão é para os alunos escreverem tudo o que sente pelo pai, agradecer
pelo o que ele faz. A professora questionou aos alunos o que eles
agradeceriam aos pais e eles foram respondendo. O que você falaria para o
seu pai? O que ele faz que você acha legal? O que o pai faz pela família? A
professora fala que devemos ter amor, carinho e respeito pelo pai, dizer o
quanto o ama e agradecê-lo por tudo. (PROTOCOLO A2, linhas 21 a 31).
A partir dessas orientações preliminares, que acontecem em todas as aulas de
produção, é que os alunos fazem o que é proposto.
A rotina que acontecia em todos os episódios de observação partia da seguinte
sequência:
126
1º A professora organiza a sala e recepciona os alunos;
2º Realiza-se a oração inicial, às vezes com orações espontâneas e outras vezes com
orações prontas (Pai Nosso, Salmo 23, etc.);
3º Apresenta-se a proposta de produção de texto com a consigna oral da atividade a
ser desenvolvida;
4º Os alunos produzem o que foi proposto;
5º A professora auxilia os alunos, reestruturando algumas palavras com a grafia
incorreta.
Durante o período de observação, treze episódios ao todo, foi possível perceber que há
uma ênfase na narrativa, até mesmo porque a professora Ana fez a leitura deleite, no início
da aula, de livrinhos infantis, sendo que sete historinhas lidas eram narrativas (O gato de
botas, Polegarzinha, Mogli: o menino lobo, O macaco Pimenta, Os três porquinhos, A
cabritinha Bébé), uma era um texto informativo sobre o Dinossauro Rex e uma leitura de gibi
(histórias em quadrinhos).
Não há uma diversidade de textos que a professora costuma utilizar, mas sempre que
lia a história, ela esclarecia as palavras mais difíceis, fazia perguntas sobre o que os alunos
entenderam da história, enfim, se empolgava e tentava fazê-lo com os alunos também.
A atividade de produção de texto sempre era explicada e exemplificada pela
professora. Se fosse uma gravura, como no caso da sequência de acontecimentos, a professora
explorava cada quadro oralmente e procurava incentivar o aluno a escrever.
A professora distribui a atividade a ser desenvolvida. Explora a gravura da
folha e pergunta aos alunos: O que vocês veem na folha? São perguntas que
direcionam a história: o roteiro. As crianças respondem: É um tatu, tia. Na
folha xerocopiada tem a ilustração de um tatu entrando na toca e questões
que conduzem às respostas: Onde você acha que ele mora? O que ele gosta
de comer? Como você acha que ele é? Imagine algo que aconteceu com ele e
escreva aqui. (PROTOCOLO A8, linhas 18 a 25).
Neste trecho é possível perceber que há uma ênfase na produção da narrativa,
iniciando-se pela descrição de um animal, no caso, o tatu.
Interessante perceber que há uma relação entre as leituras que a professora faz com a
produção que ela propõe. Percebo que Ana procura, em sua prática pedagógica com a
produção de textos, levar o aluno a escrever baseando-se no mundo da imaginação.
Com base nos protocolos de observação, relaciono as atividades relativas aos gêneros
textuais trabalhados pela professora Ana (Quadro 13).
127
Quadro 13: Atividades relativas aos gêneros textuais realizadas em aula pela Prof Ana – 1º fase do 1º
ciclo - no período de 05/agosto a 14/dezembro de 2011
Protocolo Data Horas Atividades realizadas em sala pela Prof Ana
A1 05/ago 2 Narrativa de uma história a partir de uma sequencia de figuras
A2 12/ago 2 Cartão para o dia dos pais
A3 26/ago 2 Descrição a partir de frases prontas para serem completadas
A4 09/set 2 Descrição a partir da produção de diálogo com gravura
A5 16/set 2 Conto infantil: recontar a história dos três porquinhos
A6 23/set 2 Narração a partir de uma história contada pela professora: o ursinho
Pepito
A7 20/out 2 Narração a partir de uma gravura: o macaco e o burro
A8 18/nov 2 Narração a partir de uma sequência de perguntas (roteiro) que direciona
a escrita do texto
A9 25/nov 2 Bilhete (projeto de produção de texto da escola)
A10 02/dez 2 Anúncio (projeto de produção de texto da escola)
A11 12/dez 4 Poesia (projeto de produção de texto da escola)
A12 13/dez 4 Música para apresentação
A13 14/dez 4 Escrita de uma oração
TOTAL 13 32 9 gêneros textuais trabalhados
Fonte: Dados da pesquisa.
A sistematização dos dados mostrou que, das treze observações realizadas houve a
incidência de nove gêneros textuais (Quadro 14), explorados pela professora nesse período.
Quadro 14: Incidência dos gêneros textuais trabalhados em sala de aula pela Prof Ana – 1º fase do 1º
ciclo no período de 05/agosto a 14/dezembro de 2011
Gênero Textual trabalhado em sala Prof Ana Nº de vezes
Narrativas 5
Descrições 2
Cartão 1
Bilhete 1
Anúncio 1
Poesia 1
Música (atividade oral) 1
Oração 1
Conto 1
TOTAL: 9 13
Fonte: Dados da pesquisa
Percebe-se que as tipologias textuais (narração e descrição) se sobressaem nesta
prática, visto que sua incidência é mais frequente. É possível afirmar que o objetivo da
professora, nas produções narrativas, é fazer o aluno perceber que a história a ser narrada deve
ter uma sequência lógica de início, meio e fim. Alternando a narrativa com a descrição,
percebemos que o foco dessas está voltado para a caracterização das personagens, bem como
128
na criação de nomes próprios com ênfase na escrita de letras maiúsculas no início destes. Para
exemplificar, apresento algumas dessas produções (e transcrições) realizadas durante o
período de observação (figuras 1e 2).
Figura 1: Produção de texto pelo Isaac, aluno da Profª Ana, 1º fase do 1º ciclo
+ A galinha
A galinha
tava botando
ovos e naceos
pimtinhos a mamãe
pois um nome
em cada pimtim
joão maria
e a Isabela
eso gato
veio ataca os pimtinlho
e a mamãe
bringol com o gato
e a galinha ficol
felis cooceus
pimtios. Fonte: Dados da pesquisa.
Figura 2: Produção de texto pela Victória, aluna da Profª Ana, 1º fase do 1º ciclo
Os três porquinhos
Os três porquinhos decidiram
cecuidar sózinhos a mamãe deixou
eles sairam pela florésta eles axaram
um lugar para comtruir as suas casa o
ma velho comtruiu a sua casa de
palha o do meio comtruiu a sua casa
de madera o mais dovo comtruiu sua
casa de tizolo o lobo a soprou a casa
de palha o saiu correndo correndo
para outra casa o lobo assoprou a
casa de tizolo o assoprou a casa não
caiu o lobo emtrou na faminé saiu
coma bunda queimada e viveram
felis para sempre.
Fonte: Dados da pesquisa.
129
Na criação do cartão, a professora Ana aproveitou a ocasião, data comemorativa do
dia dos pais, para produção desta atividade. Percebi que a ênfase está na valorização e no
respeito que os filhos devem ter para com os pais. São valores reforçados pela docente, sem se
aprofundar em questões sociais (pois, na maioria das vezes, há alunos que não moram com os
pais) ou culturais. Destaca-se que a professora procurou mostrar como se escreve um cartão,
levando em consideração a estrutura dessa composição, o receptor e a finalidade do texto.
Ana desenhou no quadro as linhas para o cartão. Depois falou novamente o
que cada um falaria ao papai; que devemos ter amor, carinho e respeito por
ele, nesse cartão, é para cada um escrever o quanto ama o seu pai e agradecê-
lo por tudo. Ela instrui: na primeira linha escreve-se “Papai” e nas outras
linhas é que deve se escrever a mensagem para o papai. (PROTOCOLO A2).
As outras composições realizadas em sala, como o bilhete (figura 3), o anúncio (figura
4) e a poesia, estavam sendo trabalhadas de acordo com a proposta da escola, Projeto de
Escrita (SANTOS, 2012). É interessante observar que essas composições foram realizadas
em sala de aula, quase que individualmente, pois a professora Ana ressalta que nem todos os
alunos conseguem realizar a produção e que o projeto deverá ser apresentado constando
diversos gêneros textuais produzidos pelos alunos. Ela esclarece, também, que, de acordo com
o andamento da aula e nos momentos em que os alunos desenvolvem atividades de forma
mais autônoma, ela retoma as atividades de reestruturação textual e convida os alunos, de um
a um, para reestruturarem o texto, corrigindo a grafia das palavras, para que não constem
erros nas produções para a exposição.
Figura 3: Produção de texto pela Maria Eduarda, aluna da Profª Ana, 1º fase do 1º ciclo
Oi, Maria Julia
Vempara minha casa
Fazer umchurrasco
Na minha casa nova
Temque vin ben bonita
para o almoço.
Beijos
Maria Eduarda
Fonte: Dados da pesquisa.
130
Figura 4: Produção de texto pelo Isaac, aluno da Prof ªAna, 1º fase do1º ciclo
Vende-se
Uma fazenda com porcos
galinhas, bois e touros e muitos
bichos
Ótima localisaçõe e nada de
pertube você fica no Mato
Grosso, Pantanal.
Procurar o Isaac
numero 1432-2341
Fonte: Dados da pesquisa.
É necessário aqui, retomar o Projeto de Escrita da Escola, no qual consta em seu
histórico, que o mesmo surgiu em 1998, em resposta ao levantamento e análise das disciplinas
críticas da escola. Com os apontamentos realizados através do projeto do PDE (Plano de
desenvolvimento da escola), seria urgente propor ações corretivas para as disciplinas críticas.
Assim, a coordenadora, junto com o coletivo da escola, propôs criar um projeto que desse um
tratamento mais específico às dificuldades de produções escritas dos alunos.
E assim ficou definido no projeto, de que, se trabalhassem os diversos
portadores textuais, como: panfletos, propagandas, cartas, bilhetes,
encartes, anúncios, textos literários e poéticos, informativos e outros. Que
conduzissem alunos a compreender e identificar as características e
finalidades destes estilos de textos. Que também fosse seguido um
cronograma de rotina de trabalho de reestruturação e exposição dos
mesmos. Garantindo assim, que todas as turmas de pré a 4ª série realizassem
o trabalho proposto. Que fossem trabalhados todos os portadores textuais,
diferenciando o grau de dificuldades específicas por ano escolar. Foi
definido ainda de que essas produções fossem expostas para a comunidade
escolar. (SANTOS, 2012, p. 12, grifos meus).
Dessa forma, é possível perceber que o Projeto de Escrita da Escola (SANTOS, 2012),
condiciona o trabalho com a produção escrita a se adequar à proposta dos PCN, visto que o
ano de implantação de ambos coincide. Além disso, o apelo para que se trabalhe com os
diferentes gêneros textuais, passa a ser uma exigência da escola. Assim, o professor de todo o
ensino fundamental, conforme previsto no projeto (Quadro 15), do Pré até a antiga quarta
131
série, é convidado a trabalhar com vários gêneros textuais, e a culminância deste projeto é a
exposição para a comunidade escolar realizada semestralmente, com premiação para as
melhores produções, levando-se em consideração os seguintes critérios: produção conforme a
temática, clareza de ideias, criatividade e originalidade, relação entre texto e ilustração, letra
legível e estética.
Quadro 15: Cronograma de trabalho e exposição da produção textual da escola coordenado pela
supervisoras Wilma e Marisa/2011
Gênero Mês Data da Exposição
Contos Abril
1ª semana de julho Fábulas Maio
Tiras Junho
Bilhete, convite, carta Setembro
1ª semana de dezembro Reportagem Outubro
Poesia, poema Novembro
Fonte: Elaborado com base em Santos (2012).
Percebe-se que existe um trabalho sistemático por parte do coletivo escolar, no sentido
de se trabalhar com os gêneros textuais, visto que todos os professores e alunos são
incentivados a desenvolverem atividades em que constem os gêneros textuais. E de acordo
com o projeto de escrita da escola (SANTOS, 2012), o grau de dificuldade do trabalho é
ajustado à fase, mediante a prática de cada professor, que elabora as atividades adequando-as
à realidade de sua sala de aula. De acordo com a proposta da escola,
Este projeto foi sendo ajustado ano a ano, dependendo do resultado
diagnosticado conforme as causas apontadas e objetivos propostos. No
entanto, o projeto ficou implantado enquanto ação pedagógica para melhor
conduzir o trabalho de produção escrita na escola e garantir que todos os
alunos conhecessem, compreendessem e produzissem os diversos gêneros
textuais. Haja vista, que antes do projeto a produção era mais voltada a
temas livres e de textos apenas narrativos. (SANTOS, 2012, p.13).
Neste universo da prática docente da professora Ana, foi possível captar a dinâmica
que acontece no interior da sala de aula no que se refere ao modo como o professor conduz
sua prática, deixando transparecer suas crenças, seus valores e características da sua
personalidade. Uma das características deste fazer pedagógico é que a professora Ana, nos
outros horários (que não o destinado à produção textual específica), faz o trabalho sistemático
para que a criança se aproprie do sistema da escrita alfabética. Acredito que o professor deva
ter cautela em organizar o seu trabalho pedagógico de maneira que possa envolver atividades
de leitura e de reflexão sobre o sistema de escrita e de produção dos diversos gêneros.
132
Nesse sentido, penso que as atividades desenvolvidas por Ana procuram contemplar
esses aspectos, porém, é possível salientar que a preocupação está no ensinar a ler e a
escrever, na produção de pequenos textos, na representação gráfica da escrita mediante o
conhecimento alicerçado nas tipologias textuais. Um dos gêneros trabalhados por ela, como a
carta, por exemplo, trata-se mais de uma exigência por parte do projeto de escrita da escola
(SANTOS, 2012) e das avaliações externas, do que de uma importância atribuída por ela no
desenvolver de sua prática. Vejamos um trecho de sua entrevista final:
Professora: Não. No começo do ano a gente faz um projeto pra trabalhar.
Pesquisadora: É, sei...
Professora: Pra trabalhar, e tem tudo. Tem todos os textos...mas a gente
sabe que os textos mais difíceis são os textos que eles pouco têm relação
com este texto. São as cartas, né? Aquela formalidade toda. O bilhete pra
eles é mais fácil, porque eles começam a trocar ali, né? E você só organiza,
agora a carta é uma linguagem um pouco mais formal. Aí, eles não têm esse
distanciamento. Eles querem contar história no meio da carta, então pra eles
é difícil, a carta, tanto é que agora é que eu fui... Trabalhei com eles foi
uma carta para o papai Noel, porque era mais fácil. Mais fácil falar do papai
Noel na hora de produzir. Porque a carta é muito difícil.
Pesquisadora: É... e dentro das exigências da escola, é mais por uma
exigência da escola ou é porque você acha importante trabalhar a carta?
Professora: É mais por uma exigência da escola, eu não nego não, eu não
acho importante que eles façam uma carta na primeira fase, eu não acho
não. Não é um gênero que seria pra hoje, mas como eles têm que ter contato
com tudo, e não sei... a carta como ela cai bem no finalzinho do ano. E... é
uma exigência sim, da escola que eles tem que produzir carta, bilhete,
anúncio, é uma exigência sim, porque...
Pesquisadora: Porque tá no projeto da escola? Ai você acaba trabalhando...
Professora: É, mas tem mais outra coisa: eles vão para o segundo ano e tem
a provinha Brasil, com isso, a provinha Brasil, ela tem tudo ali...ela vem
perguntando... tem o bilhete... este texto é o quê? Qual que é a intenção dele,
né? Então se você não trabalhar... Então não é só exigência da escola...
Pesquisadora: É uma exigência também das avaliações externas?
Professora: Isso. Vêm as avaliações externas e eles têm que saber... (ANA,
2011b).
Neste fragmento de entrevista, é possível depreender que ainda temos uma hierarquia
de obrigações atribuídas ao professor alfabetizador, e que muitas vezes ele próprio não
considera relevante e acaba trabalhando sem a devida importância e sem o planejamento
adequado à atividade. Beth Marcuschi (2010, p.78) nos lembra que o trabalho com a produção
de texto deve ser pensado e planejado, no sentido de priorizar as produções consideradas
importantes e que merecem ser focalizadas e privilegiadas:
No ensino da elaboração textual, devem ser propostas situações que se
reportem à práticas sociais e a gêneros passíveis de serem reconstituídos,
ainda que parcialmente, em sala de aula, tanto no que se refere à produção
133
quanto no que se refere à produção do texto escrito. Escrever na escola,
portanto, deve ser visto como um ensaio ou mesmo uma prévia convincente
do que será requerido dos jovens aprendizes no espaço social.
(MARCUSCHI, 2010, p.78).
Dessa forma, acredito que antes de ser uma exigência, o trabalho com os gêneros
textuais deveria ser encarado como necessário e importante, por estar vinculado às práticas
sociais. No caso da produção da carta proposta pela professora, para atender ao projeto de
escrita (SANTOS, 2012), privilegiou-se o mundo da imaginação ao escrever uma carta ao
Papai Noel, ainda com uma finalidade fictícia. Talvez a dificuldade esteja em trabalhar a
escrita na perspectiva do letramento, que são os usos sociais que esta escrita deve ter no meio
em que vivemos. Para privilegiar o aspecto interlocutivo da língua, a professora poderia
propor uma discussão sobre a carta, suas características, seus possíveis destinatários e, assim,
fazer com que esta produção fosse mais proveitosa e significativa.
Segundo o programa de formação continuada investigado, o processo de valorização
e compreensão da cultura escrita deve ser iniciado tão logo a criança chegue à escola, com
vistas à sua consolidação, de modo sistematizado até o fim do período (Quadro 16).
Quadro 16: Compreensão e valorização da cultura escrita do programa Pró-Letramento
Capacidades, conhecimentos e atitudes 1º ano 2º ano 3ºano
Conhecer, utilizar e valorizar os modos de produção e de circulação da
escrita na sociedade I/T/C
10 T/C T/C
Conhecer os usos e funções sociais da escrita I/T/C T/C T/C
Conhecer usos da escrita na cultura escolar I/T/C T R
Desenvolver capacidades necessárias para o uso da escrita no contexto
escolar I/T/C T R
(i) saber usar objetos de escrita presentes na cultura escolar I/T/C T R
(ii) desenvolver capacidades específicas para escrever I/T/C T R
Fonte: MEC/SEB (2008, p.16).
Penso que a professora organiza seu trabalho na perspectiva da alfabetização, ou seja,
ela procura fazer com que a criança compreenda a tecnologia da escrita (Soares, 1998) mais
do que seus usos nas práticas sociais, pelo menos, neste início da alfabetização (1ª fase do 1º
ciclo). Existe uma preocupação, por parte da professora, em ensinar a ler e a escrever. Para
ela: “Alfabetizar é ensinar a criança a ler e a escrever.” (ANA, 2011a).
10 As letras inseridas nas quadrículas: I significa introduzir; R, retomar; seu uso no quadro indica que a
capacidade merece ênfase menor, sendo ou introduzida ou retomada, conforme o caso (introduzir a novidade;
retomar eventualmente o que já tiver sido contemplado). T significa trabalhar sistematicamente. C,
consolidar. Se as três letras aparecem ao mesmo tempo, a capacidade em questão necessita ser dominada mais
cedo e, em um mesmo ano, deve ser Introduzida, Trabalhada e Consolidada. MEC/SEB (2008, p.17)
134
Como é possível perceber, a resposta é simples e direta e está focada mais no ensinar
do que no aprender. Seria devido às exigências da escola ou das avaliações externas? A
cobrança por resultados pode fazer com que a professora se sinta pressionada a ensinar a ler e
a escrever, codificar e decodificar, mais do que compreender? Certamente que esta definição
não dá conta da complexidade do que é alfabetização, mas Ana amplia esta definição ao ser
questionada: Quando você considera que uma criança aprendeu? “Quando ela está lendo
vários portadores de textos, e quando ela está escrevendo, emitindo opinião pessoal sozinha”.
(ANA, 2011a). Outras questões foram feitas: Como você sabe quando uma criança está
alfabetizada ou não? “É quando a criança desenvolve texto sozinho, lê vários tipos de textos.
Não alfabetizada é quando ele tá nas primeiras letras, ele [pensou um pouco] tá engatinhando
ainda, tá começando.” (ANA, 2011a). Que dificuldades as crianças costumam apresentar para
se alfabetizar? “A dificuldade... a primeira é no traçado das letras, que ela mistura símbolo
com letras, né? Aí à medida que elas ficam memorizando desenhando as letrinhas aí elas
começam a entender letras e sons. Relacionar as letras, conhecer as letras, eles não sabem que
escreve com letras, no começo. Muitas crianças não sabem.” (ANA, 2011a).
Nesse ponto da entrevista, é possível vislumbrarmos um pouco do trabalho da
professora em sala de aula, visto que, pela análise do caderno de um de seus alunos11
,
verificamos que, nele, encontram-se atividades de repetição de letras, encontros vocálicos,
sílabas, palavras e frases que enfatizam a mecânica do ler e do escrever, numa organização
que vai do mais simples para o mais complexo.
Por não ser foco desta pesquisa, não utilizei os cadernos das crianças como fonte de
pesquisa, embora compreenda que estes são considerados por diversos autores como ricas
fontes históricas, dos quais é possível depreender aspectos relacionados ao que pode ser
considerado relevante para ser registrado, no tocante à leitura e à escrita. Segundo Porto e
Peres (2009), os cadernos revelam indícios das práticas pedagógicas, escolhas e opções
metodológicas das professoras, concepções de língua e de ensino de uma época. As autoras
salientam que, enquanto fonte de investigação, os cadernos possuem limitações enquanto
objeto-fonte, uma vez que não dizem tudo do cotidiano de sala de aula, das professoras e dos
alunos, pois nem tudo o que se passa em sala de aula é registrado, a cultura oral, por exemplo.
Hébrard (2001) afirma que o estudo por meio dos cadernos revela-se “um testemunho
precioso do que pode ter sido e ainda é o trabalho escolar de escrita”. Além disso, o autor
indica que “o estudo dos cadernos escolares parece mostrar que, por meio do exercício, passa
11 Considerado um bom aluno, por ser frequente e desenvolver todas as atividades propostas em sala de aula.
135
a acontecer não somente uma técnica do corpo, mas também uma técnica intelectual
específica do saber de fazer gráficos.” (HÉBRARD, 2001 apud PORTO; PERES, 2009, p. 3).
No quadro 17, abaixo, elaborei uma lista das atividades do caderno do aluno Isaac, a
fim de verificar a quantidade de exercícios que levam à apropriação da mecânica da
alfabetização, desenvolvidas durante o primeiro semestre de 2011, na sala observada.
Quadro 17: Relação de atividades desenvolvidas no caderno do aluno Isaac, no período de
22/02/2011 a 08/08/2011 (primeiro semestre)
Nº Tipos de atividade Quant.
1 Cópia de vogais 08
2 Cópia de encontros vocálicos 01
3 Junção de vogais 03
4 Leitura de encontros vocálicos com desenho 01
5 Coordenação motora 02
6 Relacionar desenhos à letra inicial 04
7 Cópia das letras do alfabeto 10
8 Leitura e cópia de sílabas 05
9 Leitura e cópia de palavras 08
10 Atividade de escrita do nome do aluno 01
11 Cópia do nome do aluno 01
12 Separação de sílabas 10
13 Cópia de frases 07
14 Formação de palavras a partir de letra inicial 02
15 Formação de palavras a partir de sílabas iniciais 09
16 Formação de palavras a partir de sílabas selecionadas 12
17 Leia e copie 05
18 Junte e leia 11
19 Auto-ditado 24
20 Ditado 03
21 Leia e desenhe 03
22 Leia e ligue (relacionar palavra e desenho) 10
23 Leitura de palavras, frases e sílabas relacionada à palavra chave 08
24 Ordenar letras e formar palavras 02
25 Formação de frases 08
26 Cruzadinha 01
27 Caça-palavras 02
28 Leitura de parlenda 05
29 Leitura de Poesia 04
30 Leitura de música 04
31 Leitura de quadrinha 03
32 Completar ficha de um animal com suas características 02
33 Completar frases 03
34 Masculino e feminino ( completar com os pares) 05
35 Lista 03
36 Troca de letras para formar uma nova palavra 02
TOTAL 192
Fonte: Dados da pesquisa.
136
Assim organizados, os dados revelaram que houve uma ênfase maior na escrita de
palavras através do auto-ditado, além de atividades de cópia e leitura.
As atividades encontradas nesse caderno foram desenvolvidas durante o primeiro
semestre. No segundo, cenário desta pesquisa, Isaac já desenvolvia textos coerentes com a
proposta da professora, o que me permite afirmar que a prática da professora Ana parte de
uma organização, sedimentada na cultura escolar, que vai do tido por mais simples ao mais
complexo. Primeiro, ela apresenta as vogais, seguidas dos encontros vocálicos, letras, sílabas,
formação de palavras e frases (Figuras 5, 6, 7, 8 e 9), mostrando uma preocupação quanto à
aquisição e compreensão do código escrito, para, posteriormente, trabalhar a produção de
textos de forma sistematizada. Assim, não há como negar que Ana privilegia esta faceta da
alfabetização e ainda está construindo uma prática pedagógica voltada ao letramento.
Figura 5: Escrita das vogais - pelo Isaac, aluno da Prof ªAna, 1º fase do 1º ciclo
Fonte: Dados da pesquisa.
Figura 6: Escrita dos encontros vocálicos – pelo Isaac, aluno da Profª Ana, 1º fase do 1º ciclo
Fonte: Dados da pesquisa.
137
Figura 7: Escrita de letras e sílabas – pelo Isaac, aluno da Profª Ana, 1º fase do 1º ciclo
Fonte: Dados da pesquisa.
Figura 8: Formação de palavras – pelo Isaac, aluno da Profª Ana, 1º fase do 1º ciclo
Fonte: Dados da pesquisa.
Figura 9: Atividade de formação de frases – pelo Isaac – aluno da Prof ªAna, 1º fase do 1º ciclo
Fonte: Dados da pesquisa.
138
Das 192 atividades realizadas em sala de aula (Quadro 17), apenas 16 são leitura de
textos (quadrinhas, poesias, músicas). Percebi que foram desenvolvidas algumas atividades
sobre eles, relativas à retomada de palavras presentes nos mesmos. Não posso aqui afirmar
que a professora não tenha realizado um trabalho oral significativo com esses textos, pois a
análise se limita ao que visualizei no caderno do aluno Isaac.
Os demais exercícios são cópia e leitura de palavras, que enfatizam a mecânica da
escrita, a decifração do código e a relação fonema e grafema. Neste caderno, nota-se um
grande número de desenhos, ora relacionados à família silábica, ora à letra inicial, ora à
composição de frases. Ao todo, destacam-se 56 atividades. E ainda 02 atividades de
coordenação motora, que foram desenvolvidas no início do caderno, o que demonstra uma
visão tradicional e mecanicista de que o sucesso da aprendizagem depende de habilidades
motoras desenvolvidas no início do ano e se relacionam ao período preparatório.
Dessa forma, claro está que, pelas atividades acima relacionadas e que foram
desenvolvidas no decorrer de todo o primeiro semestre, a preocupação com a mecânica da
escrita, da codificação e decodificação de palavras, da utilização do caderno de forma correta,
revela a ênfase que a professora dá ao ensino da tecnologia da escrita (SOARES, 2004, p. 97)
em detrimento do tão polêmico e recente termo “letramento”, que, conforme definido
anteriormente, trata-se do “desenvolvimento de comportamentos e habilidades de uso
competente da leitura e da escrita em práticas sociais.” (SOARES, 2004, p.97).
Pelas observações em sala, foi possível perceber que a professora se desdobra e se
preocupa com a alfabetização das crianças, pois o atendimento individual é sistemático e a
reestruturação dos textos é constante em sua prática. Os alunos demonstram bastante
insegurança na grafia das palavras e os que não se apropriaram do sistema de escrita
alfabética, ainda, recorrem constantemente aos cartazes expostos na sala de aula, nos quais
estão ilustradas as letras do alfabeto e as respectivas famílias silábicas (Figura 10 e 11).
Figura 10: Cartazes da sala da 1ª fase confeccionados pela professora Ana, com as letras do alfabeto
Fonte: Dados da pesquisa.
139
Figura 11: Cartazes da sala da 1ª fase confeccionados pela professora Ana, com as letras do alfabeto e
as famílias silábicas
Fonte: Dados da pesquisa.
A partir da consulta aos cartazes, alguns alunos percebiam a relação fonema e
grafema, e conseguiam fazer esta correspondência com maior segurança.
Uma das orientações que consta no programa Pró-Letramento, e que percebi
claramente na prática de Ana, é o papel do professor como escriba do aluno, pois, neste caso,
a professora não faz a mera transcrição da fala, mas ajuda o aluno a organizar suas ideias de
modo que, ao perceber que ele também cria seu texto e que através da escrita sua produção é
materializada, a criança, aos poucos, compreende as funções da escrita na sociedade. Dessa
forma, ela participa ativamente do processo, pois a professora fazia os questionamentos a
respeito do que era para escrever e a criança ia dando forma ao texto.
Nessa perspectiva, acredito que há uma influência significativa do programa Pró-
Letramento e, eventualmente, de outros cursos de formação continuada, na prática de Ana, no
que se refere à produção escrita no sentido de se produzir diferentes gêneros textuais, porém,
com maior preponderância do projeto de escrita da escola (SANTOS, 2012).
Outro aspecto a ressaltar na prática de Ana é a leitura diária, ou leitura deleite, que é
uma das dinâmicas realizadas no curso do programa Pró-Letramento e que a professora
adaptou ao seu cotidiano. Não posso afirmar que a professora não lia antes de sua participação
no referido programa, mas uma das orientações no trabalho com a leitura é para que o
professor incentive o gosto pela mesma, para que a criança a perceba como um ato prazeroso
e necessário, e que tenha o adulto como modelo.
Ao ler o texto e tentar empolgar seus alunos, fazendo com que eles participassem
opinando, rindo, compreendendo e interagindo com o texto, a professora incentiva o prazer
140
pela leitura. Ao término dessa atividade, a professora deixava que os alunos manuseassem o
livro lido, ato este que fazia com que as crianças manifestassem alegria e satisfação.
Ao concluir esta seção, compartilho das ideias de Chartier (2006, p.12) quando a
autora afirma que um bom professor se forma com o tempo e não se utiliza de apenas um
procedimento, mas vários funcionando em paralelo. Por terem segurança no que fazem, “eles
podem ter uma metodologia totalmente tradicional para a aquisição do código, mas tem
sempre momentos de produção escrita ou de trabalho coletivo”. Dispõem de uma série de
instrumentos que utilizam de uma forma diferente, de acordo com cada grupo de crianças.
Reitero, ainda, que o programa Pró-Letramento e, possivelmente, outros cursos de
formação promovidos pela Secretaria Municipal de Educação - SEMEC- deixaram vestígios
na prática pedagógica de Ana, acrescentando aspectos significativos para a melhoria da
qualidade na educação.
6.3.2 A prática da professora Bia- 2ª fase
Compreender a dinâmica da prática docente que se desenrola no interior da sala de
aula é o desafio desta pesquisa. Neste sentido, na tentativa de entender de que forma os
saberes adquiridos na formação continuada influenciam o fazer pedagógico de Bia, busquei,
por meio da observação, perceber a construção de sua prática de alfabetização.
Esclareci para a professora Bia, no início de minha proposta de pesquisa, que estaria
observando seu fazer pedagógico no momento da produção de textos, com o intuito de
verificar como sua prática se efetivava no interior da sala de aula. Nesse sentido, o horário
combinado para a minha entrada na sala, seria todas as terças feiras após o intervalo, portanto,
não seria no início da aula, mas já no final do horário (Quadro 6 e 18). Dessa forma, fiquei
impossibilitada de observar a rotina da professora Bia, no sentido de perceber a organização e
o desenrolar das atividades desde o início da aula.
No primeiro dia em que estive presente na escola, a professora me apresentou a turma
e disse que eu estaria presente na sala de aula, no momento da produção de textos, para
observar a aula e também para auxiliá-la. Olhares curiosos se voltaram para mim, pareciam
questionar: O que será que ela pretende?
Sentei-me no final da sala, na última carteira e mantive meu olhar voltado ao
protocolo de observação, no intuito de que a minha presença não inibisse a turma e nem a
professora, visto que, por entrar na sala após o intervalo, a disciplina deveria ser retomada,
para que a professora prosseguisse com a aula.
141
As salas dessa escola são bem arejadas, contam com mesinhas individuais, armário
para uso da professora, varal para colocar as atividades dos alunos. Estranhei, apenas, não
haver cartazes nas paredes. A professora esclareceu-me que a escola tinha passado por uma
pintura recentemente e que, por isso, ela ainda não havia colocado nenhum cartaz na parede.
Durante o tempo em que estive observando as aulas, a professora não se utilizou desse
recurso. O espaço da sala era adequado para a quantidade de alunos, ao todo eram 23. Desses,
segundo a professora, apenas 2 apresentavam dificuldades para acompanhar a turma.
Perguntei a ela quais as dificuldades desses que não acompanhavam. Bia respondeu-me que,
os que não conseguem acompanhar a turma, é porque não têm interesse em aprender e que,
por mais que ela se esforce (ministrando aulas de apoio, conversando com os pais), não tem
conseguido um resultado positivo com essas alunas.
Bia aponta, em sua entrevista inicial, que há diferenças no ritmo de aprendizagem das
crianças, ela fala que “Tem crianças que aprendem mais rápido, tem crianças que demoram
mais um pouco, é acho que é questão de maturidade, de conhecimento, de vontade. A falta de
interesse também é um grande empecilho pra aprendizagem. A pré-disposição da criança...”
(BIA, 2011a).
Com essa fala, Bia reforça a ideia da ideologia do dom, a qual preconiza que todos
têm seu lugar na escola e o fracasso ou o sucesso depende de cada um. Segundo a ideologia
do dom, a causa dos resultados negativos ou positivos dos alunos se deve exclusivamente às
suas características individuais, aliadas à aptidão, inteligência e talento. (SOARES, 1989,
p.10). O fato é que esse tipo de explicação para o fracasso escolar é bastante criticado e deve
ser evitado, pois existem diversas pesquisas sobre a aprendizagem que mostram que as
crianças dependem de estímulos externos para aprender.
Em todas as observações, a professora conseguia, rapidamente, retomar a disciplina da
sala e todos, bem comportados, ouviam atentamente a proposta de produção textual a ser
realizada naquele momento. A consigna oral da professora para a realização da atividade era
realizada no início de cada proposta de produção e, após a explicação, todos os alunos
ficavam em silêncio para fazer a atividade. Após o término da atividade, a professora pedia
aos alunos que fossem até ela para corrigir os problemas do texto, ou seja, a refacção de
algumas palavras, no tocante à grafia. Essa, basicamente, era a rotina de trabalho da
professora.
142
Quadro 18: Atividades relativas aos gêneros textuais realizadas em aula pela Prof Bia – 2º fase do 1º
ciclo - no período de 09/agosto a 16/dezembro de 2011
Protocolo Data Horas Atividades realizadas em sala pela Prof Bia
B1 09/ago 2 Apelo, panfleto, conselho (projeto meio ambiente)
B2 23/ago 2 Lista
B3 05/set 2 Fábula
B4 13/set 2 Poesia
B5 20/set 2 História sequenciada através de gravura: narração
B6 04/out 2
História em quadrinho: narração dos fatos a partir de uma
sequência de figuras
B7 13/out 2
Texto narrativo a partir de uma situação de medo vivida
vivenciada
B8 18/out 2
“bilhete” trabalhado como bilhete, mas na verdade pode ser
interpretado como cartão
B9 20/nov 2 Música
B10 29/nov 2 História narrativa a partir de um título: Passeio no sítio
B11 15/dez 4 Cartão de natal
B12 16/dez 4 Atividades de matemática
TOTAL 12 28 9
Fonte: Dados da pesquisa.
Ao todo, foram realizadas vinte e oito horas de observação nesta sala, sendo que nos
dois últimos dias a observação estendeu-se por todo o período de aula (Quadro 18). Os dados
permitem visualizar que os gêneros textuais trabalhados são variados, assim como as
incidências das atividades (Quadro 18).
Quadro 19: Incidência dos gêneros textuais trabalhados em sala de aula pela Prof Bia – 2º fase do 1º
ciclo no período de 09/agosto a 16/dezembro de 2011
Gênero Textual Quant
Narrativas 4
Bilhete 1
Cartão de Natal 1
Fábula 1
História em quadrinho 1
Lista 1
Música 1
Panfleto 1
Poesia 1
TOTAL 9 12
Fonte: Dados da pesquisa.
Percebe-se que os gêneros textuais são variados. Porém, como na 1ª fase, há uma
predominância do texto narrativo. Observe que os gêneros textuais trabalhados partem de uma
143
explicação preliminar do que é para ser feito e, em seguida, as crianças desenvolvem as
atividades sozinhas, e, os que não conseguem, procuram a professora para que ela os auxilie.
Após a explicação das propostas de produção, sempre procurei auxiliar alguns alunos com
maiores dificuldades. Percebi que há os que têm medo de escrever errado, pois sabem que
todas as palavras serão corrigidas.
Um aspecto que considero bastante relevante e que vale a pena ressaltar é o trabalho
com a oralidade desenvolvido pela professora: antes de cada atividade foi oportunizada a
participação dos alunos, na discussão oral, de forma organizada. Esses momentos ocorreram
na maioria das observações. Conforme exemplificado nos seguintes trechos:
“A professora pediu para os alunos o que mais poderia ser listado para se compor uma
lista. Cada aluno ia dando exemplos: pessoas, perfumes, convidados, material escolar, motos,
etc.” (PROTOCOLO B2, linhas 17 a 19).
Após contar a história, a professora questionou aos alunos sobre o tema da
mesma. Fez questionamentos sobre a história. Depois perguntou para os
alunos do que é que eles tinham medo. Cada aluno, na sua vez, falou sobre o
que tinham medo. [...] a professora ouve e pergunta o porquê do medo. Eles
respondem os motivos. (PROTOCOLO B7, linhas 4 a 13).
Esse trabalho com a oralidade é importante para a criança se desinibir e ter ideias para
escrever. É, também, possibilidade de desenvolvimento da capacidade de raciocínio ou
posicionamento frente a algum fato ou situação, nesses momentos, as crianças são
encorajadas a buscarem outros modos de ver suas possibilidades de atuação social.
Além disso, as orientações do Pró-Letramento, no Fascículo 1, quanto ao trabalho com
a oralidade em sala de aula, sugerem que o professor oportunize a participação dos alunos nas
interações cotidianas, de forma que o pequeno aprendiz seja colocado em situações que o
levem a ouvir com atenção, responder às questões propostas, expor sua opinião a respeito do
assunto em questão, respeitando a opinião dos colegas e sendo respeitados por eles também.
Nesse sentido, a criança, aos poucos, compreenderá que, em sociedade, é necessário e
importante falar e ouvir, respeitando as regras de convivência, bem como, desenvolverá a
capacidade de interagir verbalmente segundo essas regras em diferentes ambientes e
instituições (SEB/MEC, 2008).
Albuquerque e Leal (2007) salientam que o ensino da escrita nas escolas tem
evidenciado uma tendência de atender às propostas curriculares que sugerem o trabalho com a
escrita que seja visto não só como codificação e decodificação, mas como práticas sociais,
privilegiando a concepção interacionista da língua em suas diversas tendências. Ou seja,
144
enfatizam que o trabalho com o texto deve ser o eixo norteador do ensino de língua
portuguesa, no sentido de se trabalhar os diferentes gêneros textuais, considerando sua função
social, contexto de produção, estruturas e características linguísticas.
As autoras salientam que hoje existe um debate sobre esse tema, pois há os que
defendem o trabalho mais assistemático com os gêneros em sala de aula. Trabalho este que
não se aprofunda nos aspectos linguísticos dos textos, apenas se propõe a leitura e a escrita de
diferentes gêneros. (PRIVAT; VINSON, 1994 apud ALBUQUERQUE; LEAL, 2007, p.
101/102). Outra proposta defendida pelos teóricos Dolz e Schneuwly (2004) é a de
aprofundar o trabalho com os gêneros textuais, observando sua estrutura, suas características
e oferecendo, de forma sistemática, subsídio aos alunos para que eles se apropriem dos
conhecimentos acerca dos diferentes gêneros textuais.
Creio que a tendência representada por teóricos como Privat e Vinson (1994 apud
ALBUQUERQUE; LEAL, 2007) e denominada por Dolz e Schneuwly (2004) como
interacionismo intersubjetivo, em que, através da interação em situações reais com a leitura e
escrita de diferentes gêneros, os alunos, gradativamente, vão aprendendo e internalizando as
práticas de uso da escrita, não é raridade. Pelo contrário, essa situação é bem constante no
meio educacional, pois percebemos nas práticas de sala de aula uma diversidade de gêneros
que vão sendo utilizados, porém sem aprofundamento em seus aspectos estruturais, temáticos
e linguísticos.
Tanto para Dolz e Schneuwly (2004) quanto para Albuquerque e Leal (2007, p. 102)
o interacionismo instrumental deve ser referência para a produção textual, pois esses autores
argumentam que:
a vivência de situações reais de interação, de fato, é um caminho necessário
para aprender a agir lingüisticamente, lendo e produzindo textos. No entanto
esses autores alertam que existem gêneros textuais que exigem maior nível
de atividade consciente, e que, mesmo nas práticas de linguagem
extraescolares, são aprendidos por meio de sistematizações, presentes nos
grupos que tais textos circulam. (ALBUQUERQUE; LEAL, 2007, p.102).
Trata-se da proposta da sequência didática que é defendida por esses autores, em que,
pelo grau de complexidade, existem gêneros que necessitam de um trabalho mais sistemático
e que requer planejamento e decisões por parte da escola e do professor.
Assim, é possível afirmar que a diversidade de gêneros textuais que circulam na sala
da 2ª fase, da professora Bia, parte da tendência interacionista intersubjetiva. Porém, não se
pode negar que há avanços na prática de Bia, ao contrário, os estudos linguísticos de base
145
enunciativa e sociointeracionista que modificaram e redimensionaram o processo de ensino da
produção de textos, influenciam sua prática em sala de aula. Dessa forma, é notório que a
proposta de trabalho com os diversos gêneros textuais preconizados pelo programa Pró-
Letramento, no qual a escrita tem seu papel e sua função social, tem influenciado
significativamente, ainda que de forma gradativa e pontual, o seu fazer pedagógico.
Percebi também pelo Quadro 19, que a história em quadrinhos e a narrativa pela
sequência de fatos, bem como o texto narrativo a partir de um título, seguem os parâmetros da
escrita pela tipologia, mas que fora explorado pela professora no sentido de proporcionar ao
aluno a compreensão da estrutura da sequência narrativa com início, meio e fim,
caracterização das personagens e escrita de nomes próprios, são os chamados gêneros
escolares que, a princípio, são destinados à professora, como leitora dos textos, com a
finalidade de instrumentalizar o aluno na escrita correta das palavras e na sequência da
estrutura narrativa.
Silva e Melo (2007, p. 30) salientam que se escreve no dia a dia, ou seja, fora da
escola, com finalidades concretas, com um interlocutor concreto e não imaginário. As pessoas
escrevem para convidar um amigo para um aniversário, para não se esquecerem do dia e da
hora de um compromisso, para informar os outros sobre um determinado assunto. São
inúmeras as reais situações de uso da escrita e o que a escola tem procurado, de acordo com as
orientações curriculares e também com a perspectiva do letramento, é fazer com que a escrita
na escola, seja semelhante às vivenciadas nos contextos extraescolares.
É o que percebo na prática pedagógica de Bia, pois ainda que algumas atividades de
produção escrita circulem apenas no ambiente escolar e tenha como primeira leitora e
avaliadora a professora, algumas produções textuais, como o bilhete e o cartão de natal, já
buscam extrapolar os muros escolares. Além disso, é possível perceber que os alunos
compreendem os aspectos interlocutivo e funcional da linguagem, pois as produções têm um
interlocutor real e um significado concreto.
Concordo com Silva e Melo (2007) quando os autores afirmam que na vida diária
escrevemos com uma finalidade concreta, com um destinatário concreto e por meio de um
gênero com características adequadas para a comunicação e interação a que se pretende na
escola, portanto, as atividades de produção de textos devem ser semelhantes às vivenciadas
nos contextos extraescolares. A escrita não pode ser encarada como mero exercício
descontextualizado, sem uma finalidade ou que essa finalidade se restrinja apenas para o
aprender a escrever, tendo como destinatário apenas o professor.
146
Nesse sentido, Silva e Melo (2007, p. 35) acrescentam que ensinar a escrever é
responsabilidade da escola e o papel do professor neste processo é o de escolarizar os
conhecimentos de maneira adequada, no caso específico da produção de textos “os alunos
podem e devem escrever para atender a finalidades diversas e se comunicar com
interlocutores também diversos, em situações de interação comunicativa também
contextualizadas.” (SILVA; MELO, 2007, p. 35).
Conforme o protocolo B10, exemplifico com uma atividade de produção escrita que
foi realizada em sala de aula com um destinatário real, no caso a proposta de produção era a
escrita de um cartão de natal:
A professora entregou aos alunos uma folha, para que eles fizessem uma mensagem de
natal para a pesquisadora, disse que era para desejarem um feliz natal para mim. Ela escreveu
meu nome no quadro e assim os alunos desenvolveram esta atividade. Entregaram-me o
cartão (PROTOCOLO B10, linhas 11 a 14).
“A professora entregou a mesma atividade para que os alunos escrevessem uma
mensagem para alguém que eles considerassem importante” (PROTOCOLO B10, linhas 19 a
22).
Percebi que esta atividade, apesar de singela, requer do aluno a compreensão do que
escrever (conteúdo da mensagem) para que escrever (finalidade/objetivo) e para quem
escrever (destinatário). Então penso que, neste caso, a escrita responde ao propósito funcional
de comunicação, pois possibilita a realização da atividade sócio comunicativa entre as pessoas
e está relacionada de forma direta com o contexto social no qual as crianças estão inseridas.
De forma pormenorizada, detalho a atividade solicitada aos alunos
Ao entrar na sala, a professora pede silêncio, aguarda os alunos se
acalmarem e em seguida diz que irá entregar uma folha na qual eles irão
escrever um bilhete, vão colocar a data e que o destinatário do bilhete será a
professora Márcia. Ela escreve no quadro o meu nome e em seguida diz que
a mensagem será a seguinte: desejar à professora , um feliz dia dos
professores. Ela pergunta aos alunos qual foi o dia dos professores. Alguns
alunos respondem que foi dia quinze. [...] explicou também que ao final do
bilhete deve constar a despedida e a assinatura. Os alunos fizeram a
atividade e me entregaram o bilhete. (PROTOCOLO B7, linhas 01 a 24).
Convidados pela professora a escreverem um bilhete, os alunos compõem um texto
com a estrutura de um bilhete com destinatário (no caso a pesquisadora) com local, data e no
final a professora diz que o bilhete deve conter a despedida e a assinatura.
147
Sabemos que o bilhete é um gênero textual que tem função sócio-comunicativa de
interação entre os interlocutores, ou seja, comunica alguma coisa a alguém. É um texto breve
e conciso que apresenta em sua estrutura: destinatário, saudação, sequência do texto,
despedida e assinatura. “A professora colocou o nome da pesquisadora no quadro e disse para
os alunos que a mensagem do bilhete será o seguinte: desejar a professora um feliz dia dos
professores.” (PROTOCOLO B8, linhas 7 a 11).
Nesta oportunidade a professora falou sobre a estrutura do bilhete e entregou um
pequeno pedaço de papel para que os alunos fizessem a atividade (Figuras 12, 13 e 14).
A proposta de produção de um bilhete descrita, reporta-me ao conceito dos gêneros
textuais, pois, seguindo a vertente bakhtiniana, Marcushi (2010) compreende os gêneros como
sendo dinâmicos e de expressiva plasticidade, fundam-se na recorrência e não na rigidez, ou
seja, sua estrutura composicional nem sempre obedece a regras pré estabelecidas. Pode-se
afirmar que “os gêneros textuais são ações interlocutivas que organizam a vida das pessoas no
âmbito das práticas sociais.” (MARCUSCHI, 2010, p.76).
Figura 12: Produção de bilhete pelo Luiz, aluno da Profª Bia, 2º fase 1º ciclo
18/10/2011
Professora Márcia
Feliz dia dos professor
tenha uma boua felicidade
beijos
abraços
Luiz
Fonte: Dados da pesquisa.
Figura 13: Produção de bilhete pela Ana Paula, aluna da Profª Bia, 2º fase 1º ciclo
10/11/2011
Profesora Márcia
Eu que ria falar que
felis dia do profesor.
Tedesejo muitos ano
de vida.
Fonte: Dados da pesquisa.
148
Figura 14: Produção de bilhete pela Esthefany, aluna da Profª Bia, 2º fase 1º ciclo
18/10/20
Professora Márcia
Hoje é o grande dia
é o seu dia professora
Márcia então felis dia
dos professores um
beijo para você tchau
Esthefany
Fonte: Dados da pesquisa.
De acordo com a mensagem, é possível compreender que, apesar de atender ao
contexto sociocomunicativo, ainda que artificializado (pois a pesquisadora estava em sala, não
sendo necessário receber bilhete), a mensagem encontrada no bilhete é própria dos cartões em
que se felicita alguém por algum dia especial.
Nessa perspectiva, relaciono este aspecto da produção em análise com o que Beth
Marcuschi (2010, p. 76) caracteriza como incompreensão, que pode dar origem ao mal
entendido, ou à ambiguidade. Neste caso, penso que o gênero textual proposto para os alunos
é ambíguo, uma vez que pode ser enfocado como bilhete e também como cartão. Uma outra
leitura poderia ser em relação ao suporte em que o texto aparece. Neste caso, pela
simplicidade do suporte, trata-se de um bilhete e, se caso fosse escrito em um papel mais
sofisticado, poderia ser um cartão. Se fosse uma mensagem expedida pelos correios num
formulário específico, um telegrama, se passado pela secretária eletrônica, um recado.
Marcuschi (2003) assinala que não é tão simples fazer a distinção entre gênero textual
e suporte de texto. Essa diferenciação firma-se no fato de que todo gênero tem um suporte, via
material de circulação na sociedade, assim, todo gênero necessita de um suporte específico,
pois muitas vezes é ele que determina o gênero.
Dessa forma, de acordo com Beth Marcuschi (2010, p.76) o gênero é de natureza
maleável e no seu processo de produção e circulação, no fluxo interacional entre leitor-texto-
autor, pode ter interpretações várias. O objetivo do professor em sua prática pedagógica é que
poderá oportunizar ao aluno a compreensão dessas diferenças. Além disso, a eficácia no uso
do gênero depende do nível de apropriação do sujeito da interlocução sobre esse gênero.
Não se trata apenas de ensinar a estrutura de um determinado gênero, mas quais os fins
a serem alcançados em sua produção.
149
Outra atividade que me chamou a atenção (para os conceitos trabalhados) foi a música.
A professora convida a turma: vamos cantar? Ela iniciou a proposta
entoando músicas conhecidas pelos alunos, todos a acompanham: Peixe-
vivo, a canoa virou, meu pintinho amarelinho, a galinha do vizinho. Depois,
a professora disse aos alunos que escrevessem numa folha, que ela iria
entregar a eles, uma música dessas que foram cantadas ou que os alunos
conhecessem e que mais gostassem. Ela entregou aos alunos uma atividade e
pediu que eles escrevessem. Os alunos ficaram animados e perguntaram se
podiam escrever as músicas que eles conheciam. (PROTOCOLO B8, linhas
15 a 19).
Após essa proposta, as crianças escreveram as músicas preferidas por elas e que são
sucessos nos meios de comunicação (Figuras 15 e 16) .
Figura 15: Produção de texto a partir de uma música memorizada, aluna Júlia da Profª Bia, 2º fase
1º ciclo
Na balada
Nossa, nossa, assim
você me mata, ai
seeu ti pego, ai, ai
se eu ti pego delí-
cia, delícia.
Sábado na balada
A galera começou
a dançar e
passou a menina
mais lindo
tomei coragem e comecei a
falar: Nossa, nossa assim
você me mata.
Fonte: Dados da pesquisa.
150
Figura 16: Produção de texto a partir de uma música memorizada, aluna Adriane da Prof Bia, 2º fase
1º ciclo
Gustavo Lima
Esse cabelo cor de
ouro é que
me deixa louco esse
sorriso no teu
lábios que eu metremo
todo não sei mais
da minha vida sem
você porperto amor
sem você comigo
avida é um deserto.
Adriane
Fonte: Dados da pesquisa.
Analisando a proposta de produção textual e o produto dessa atividade, é possível
perceber que o meio social no qual a criança vive, influencia, de forma extraordinária, o
universo escolar infantil. Além disso, observei que as crianças querem que suas predileções
sejam postas em evidência. Interessante perceber que apenas duas crianças optaram por
escrever as músicas cantadas pela professora, as demais escolheram escrever as músicas que
elas conheciam e que ouvem diariamente, reflexo dos meios de comunicação. Ao
conseguirem colocar a música no papel e depois irem à frente para cantar o que escreveram,
as crianças demonstraram satisfação e alegria.
Penso que esta atividade teve como objetivo, além do exercício da escrita, no caso a
codificação de fonemas, também a oralidade, pois se torna mais fácil para a criança escrever
algo que já foi memorizado do que construir seu pensamento para escrever.
Conforme nos lembra Cardoso (2008, p. 31), “a criança inicia seu processo de escrita
apoiada firmemente na sua oralidade e, portanto, a mesma vai deixar marcas na sua escrita
que, nesse momento, está ainda longe de ser convencional e ortograficamente correta”.
Chartier (2007) advoga que, como as parlendas, as canções constituem elementos da
cultura comum, foram compostas para serem memorizadas e fazem parte da cultura familiar.
A autora salienta que a leitura e a escrita desses gêneros textuais são bem prazerosas para as
crianças visto que: “elas permitem a todas as crianças, mesmo as mais lentas, a experiência
151
gratificante do ‘reconhecimento direto das palavras’, mesmo que ainda não tenham chegado a
isso nos seu processo normal de leitura.” (CHARTIER, 2007, p. 159).
Neste caso, as crianças mesmo conseguindo ler e escrever a música predileta, elas
conseguem pensar a grafia correta das palavras e, por meio da memória, escrever
raciocinando sobre a correspondência fono/grafêmica, ou seja, de que maneira o oral é
grafado.
Nesse sentido, Silva (2010) salienta a importância do desenvolvimento da consciência
fonológica12
, que pode ser realizada por meio de diversas atividades lúdicas como a repetição
de parlendas, brincadeiras com frases e versos, trava línguas, etc. Esses tipos de atividades são
fundamentais para a compreensão do princípio alfabético.
No tocante às orientações em se dedicar aos vários gêneros textuais, posso afirmar
que, pelas produções que estiveram presentes na sala de aula e pelo trabalho realizado pela
Professora Bia, existe uma influência do Programa Pró-Letramento, em relação à sua
compreensão dos eixos necessários à aquisição da língua escrita:
a) Compreensão e valorização da cultura escrita: Ao redigirem um bilhete, um cartão
de Natal, um panfleto e a lista, a professora mostra aos alunos que estes gêneros
estão além da simples codificação e decodificação de palavras, pois eles têm uma
função social, um espaço de circulação na sociedade;
b) Apropriação do sistema da escrita: Ao redigirem uma música, que sabiam de cor, os
alunos tiveram que acionar seus conhecimentos prévios a respeito da ortografia, da
segmentação correta das palavras, da relação fonema e grafema. Nesse sentido, a
tarefa, que pode até ser considerada simples para alguns alunos, torna-se complexa
para os que ainda estão aquém do processo de construção e aquisição da língua
escrita.
Assim, creio que os aspectos positivos em relação ao trabalho de Bia são vários e a
influência da formação continuada aliada à prática da professora, sua rotina e sua relação com
os educandos propicia uma aprendizagem significativa, com vistas ao alfabetizar letrando. Ao
ser questionada sobre a influência da formação continuada em sua rotina de trabalho, Bia
responde que, ao longo de sua caminhada como alfabetizadora, adotou algumas metodologias
que contribuíram para a melhoria de sua prática:
12 O conceito de consciência fonológica abrange habilidades que vão desde a simples percepção global do
tamanho das palavras e/ou de semelhanças fonológicas ente elas, até a efetiva segmentação e manipulação de
sílabas e fonemas. (BRYANT; BRIADLEY, 1985 apud SILVA, 2010).
152
No início eu usava muito a cartilha e o método silábico. A maior parte do
tempo era o método silábico era a cartilha, eram tarefas tradicionais, de
memorização... de repetição, não usava esses tipos de textos que eu uso hoje.
Eram aqueles textos fragmentados, só esses tipos de textos... não usava
receita, não usava parlenda. Não usava fábulas. Bilhetes... esses outros
gêneros textuais... de jornais e revistas... quando eu comecei eu não usava
isso não, na alfabetização. Usava somente a cartilha...e aquelas atividades de
repetição e de memorização. Hoje não, hoje é diferenciado... eu uso vários
tipos de textos, diferentes tipos de textos. Diferentes atividades. Atividades
que eles têm que pensar. Atividades que eles têm que organizar. (BIA,
2012b).
Por este excerto, percebo que a mudança de práticas pedagógicas consolidadas ao
longo dos anos depende de diversos fatores que incluem, além de políticas públicas voltadas
para uma educação de qualidade, o abandono de práticas mecanicistas de alfabetização, por
parte do professor. Não se trata apenas de inserir diversos tipos de textos na sala de aula, mas
levar a criança a se apropriar do sistema de escrita de forma significativa e prazerosa.
Pensar a alfabetização na perspectiva do letramento requer um posicionamento
reflexivo sobre a prática, em que a professora que alfabetiza compreenda os processos
envolvidos no nosso sistema de escrita alfabético e das capacidades necessárias aos alunos
para o domínio da leitura e da produção de textos. A esse respeito, Albuquerque (2005) fala
da importância de haver a inserção dos diferentes gêneros textuais na alfabetização para a
formação de leitores e escritores competentes e que cabe à escola realizar esta interação com
atividades em que os alunos sejam solicitados a ler e produzir diferentes textos. A autora
salienta que
a escola deve garantir, desde cedo, que as crianças se apropriem do sistema de escrita
alfabético, e essa apropriação não se dá, pelo menos para a maioria das pessoas,
espontaneamente,valendo-se do contato com textos diversos. É preciso o
desenvolvimento de um trabalho sistemático de reflexão sobre as características do
nosso sistema de escrita alfabético. (ALBUQUERQUE, 2005, p. 19).
Além disso, Albuquerque (2005, p. 20) salienta a importância para o fato de que haja
um trabalho sistemático para a aquisição desta compreensão. É necessário levar a criança a
perceber que o que a escrita representa é o som da palavra (notação) e não o seu significado.
Por isso, é importante que, diariamente, a professora proponha atividades com palavras que
envolvam a reflexão, comparação e exploração de palavras quanto à quantidade de letras,
número de sílabas, presença de letras e sílabas iguais e rimas, bem como atividades com
palavras estáveis e que fazem parte do cotidiano infantil. Vários são os textos que favorecem
este trabalho, tais como: cantigas, parlendas, poesias, trava-línguas, etc.
153
Dessa forma, creio que Bia, ao afirmar que propõe atividades que “as crianças têm que
pensar”, tem procurado abandonar antigas formas de alfabetização, baseada na simples
codificação e decodificação de palavras, para construir e consolidar uma prática pedagógica
mais significativa.
6.3.3 A Prática da professora Carina - 3ª fase
As observações realizadas na sala da 3ª fase do 1º ciclo da professora Carina
totalizaram trinta horas, distribuídas em doze dias. Ela já havia explicado aos alunos que uma
professora pesquisadora viria para a sala interessada em compreender a dinâmica do trabalho
com a produção de textos.
Procurei entrar na sala junto com a professora no início da aula, às sete horas da
manhã, instalei-me na última carteira da sala, no intuito de não modificar e nem atrapalhar o
desenvolvimento da aula. A professora recebia os alunos educadamente, procurava observar
onde iriam se sentar e os orientava quando necessário. O espaço nesta sala de aula favorece a
aprendizagem dos alunos. As mesinhas são individuais, o ambiente é arejado, as paredes
receberam pintura nova, a sala possui quatro ventiladores, e um armário onde a professora
guarda seus pertences e alguns materiais dos alunos.
No início das observações, perguntei à professora quantos eram os alunos
matriculados, ela me respondeu que ao todo tinha 25 só que, desses, apenas 23 estavam
frequentando, 2 estavam faltando e ela não sabia o porquê das faltas. Desses 23, perguntei
quais os que tinham maiores dificuldades, ela me disse que somente 3 não conseguiam
acompanhar o ritmo da aulas, mas que estava fazendo um acompanhamento individual para
tentar recuperá-los. A esse respeito, Carina citou como exemplo um aluno que veio
transferido de outra unidade escolar e que ainda não tinha conseguido se apropriar do sistema
de escrita alfabética. A docente falou sobre as principais dificuldades desses alunos: Quais e
quantos alunos que apresentam dificuldades e quais são essas dificuldades?
Carina: O J. que quando ele entrou ele não conseguia copiar nada do
quadro, ele não escrevia nada, o caderno que ele veio, o pouco que tinha era
assim: AAAAA pra ele copiar embaixo. Era coisa colada, pra ele passar por
cima... quando ele entrou aqui eu tinha dois problemas com ele... primeiro a
questão da interação entre nós e entre ele e os colegas. Ele não queria se
envolver. Ele não queria estar com ninguém, ele não queria sentar com
ninguém, ele não conversava...aí devagarzinho eu fui propondo, e ele foi... e
eu falei assim: não você vai fazer...igual todo mundo vai fazer, e ele sentava,
e falei... vai olhando lá... e assim... eu não sou muito de ficar pegando em
154
mão... de ficar muito assim... e eles vão indo, vai melhorando com o
tempo...aí foi indo, foi indo...[...] aí devagarzinho ele foi fazendo, foi
começando, a letra feia, tinha hora que não entendia nada, mas eu fui
deixando... e ele tem que primeiro ele tem que se propor a fazer...né? aí
depois a partir do momento que ele começou a fazer ele começou a
melhorar... cê pode ver que hoje o caderno dele, ele já copia tudo. Ele não
tem aquela letra bonita, mas já está mais legível, que antes não se entendia
nada.
Pesquisadora: Mas ele já lê?
Carina: Já. Muitas sílabas assim, ele já conhece... ele empaca muito assim
nas sílabas complexas... “AM” “PR” algumas coisas ele já consegue...
tem o V., que entrou o ano passado e o tempo todo assim de apoio... o V. não
lia nada e não escrevia nada. E também não conseguia copiar... mas aí
devagarzinho ele começou... aí ele copiava...entendeu? Virou um copista, na
verdade ele copiava... mas, no desenvolvimento das atividades tinha que
estar sempre sentando com ele, ou ajudando ou se não ele pegava pronto do
quadro ou do colega...mas assim devagarzinho ele foi melhorando bastante,
a leitura...mas o tempo que ele estudou comigo foi de apoio... e é um aluno
que eu coloquei que vai precisar ter um acompanhamento no segundo ciclo.
E você pode perceber na minha sala, os que sentam na frente, geralmente são
os que tem mais dificuldades... é o ...você viu que é os que ficam bem na
frente, né? E eu posso estar assim de olho... porque apesar de eles terem
dificuldade, eles não são bobos, eles são espertos para copiar dos outros,
sabe? Aí tem a Beatriz que também tem aquele problema de adenoide, tem
aquela questão da dicção, a fala dela tem muito problema, não sei se você
percebeu... depois da cirurgia então ela tá falando muito embolado.
(CARINA, 2011b)
É possível perceber que o trabalho com os alunos com dificuldade é constante na
prática de Carina. O atendimento individual, a preocupação com o desenvolvimento do
educando, bem como os aspectos relacionados à interação com professora e colegas é algo
positivo no seu fazer pedagógico. A esse respeito, Chartier (2006) afirma que os bons
professores têm uma boa memória das competências das crianças, apontam suas dificuldades
e sabem dizer com precisão o desenvolvimento individual da criança. A autora salienta que
isso não se aprende lendo teorias pedagógicas ou didáticas, mas com a experiência, testando
procedimentos, sem adotá-los de imediato.
Pelas observações, foi possível perceber que, no início da aula, a professora convidava
a todos para fazerem a leitura de um cartaz com a Oração da Manhã (Figura 17). Para isso,
escolhia quatro ou cinco alunos que vinham à frente, se posicionavam diante do cartaz, faziam
a leitura e o restante da turma repetia o que era lido, inclusive a professora e eu.
155
Figura 17: Cartaz com a oração da manhã exposto na sala da Profª Carina
Fonte: Dados da pesquisa.
Em seguida, a professora convidava um aluno para ajudá-la a organizar os materiais
que iria usar, retirava dos armários os cartazes que continham os modelos de gêneros textuais
(Figura 18), que ela ou estava usando ou iria usar, tais como: convite, cardápio, bilhete,
receita, anúncio, carta, poema, envelopes, etc..
Figura 18: Modelos de gêneros textuais expostos na sala da Profª Carina
Fonte: Dados da pesquisa.
A visualização conjunta dos diferentes gêneros textuais proporciona ao aluno a
compreensão dos aspectos estruturais e composicionais relativos a cada gênero. Penso que as
crianças, ao estarem em contato constante com os cartazes, aos poucos internalizam
elementos que facilitarão sua aprendizagem.
156
Um dos aspectos que me chamou bastante atenção foi o fato de a professora trazer
para a sala de aula vários livros para leitura deleite que não se resumiam apenas a narrativas
infantis. Sempre trazia textos diversos e oportunizava a leitura, por parte dos alunos, de
livrinhos infantis, escolhendo a cada dia um aluno para ler. Sempre que fazia a leitura de um
livro, a professora falava sobre o autor, sobre a obra, sobre os ilustradores e fazia relações
com acontecimentos do cotidiano, evidenciando ações na perspectiva do letramento.
Durante o período de observação, várias foram as atividades de leitura realizadas,
tanto pela professora, quanto pelos alunos. A professora Carina tinha uma caixa com diversos
livros infantis de seu acervo pessoal, os quais emprestava aos alunos, com a intenção de que
depois os lessem para a turma. Ela os incentivava para treinarem a leitura e depois lerem bem
bonito para os colegas. A relação das leituras realizadas durante o período observado totaliza
oito livros, pela professora, enquanto os alunos leram dez (Quadro 18).
Por esse quadro verifica-se que a rotina de trabalho pedagógico no âmbito da leitura
em sala privilegia diferentes gêneros textuais, com predomínio dos gêneros do campo
narrativo. De acordo com o quadro criado por Dolz e Schneuwly (2004), trata-se de gêneros
que se enquadram na cultura literária funcional que trazem como aspectos tipológicos a
mimese da ação por meio da criação da intriga e se materializam nos gêneros: contos de fadas,
fábulas, lendas narrativas de aventura, conto, crônica literária, etc.
Quadro 20: Relação das leituras realizadas pelos alunos e pela Prof Carina – 3º fase do 1º ciclo no
período de 09/agosto a 09/dezembro de 2011
Nº Lidos pela professora Lidos pelos alunos
1 O menino mais bonito do mundo – Ziraldo A cigarra e a formiga-
Fábula
2 Flictz – Ziraldo A galinha dos ovos de ouro
3 Sinopse do livro de Ziraldo redigida por Carlos Drummond
de Andrade A gata Filó
4 Porque dormimos – texto informativo A formiga e a pomba
5 Livro Não fale de boca cheia - Comportamentos e bons
hábitos O patinho feio
6 Como falar com seus amigos - Comportamentos e bons
hábitos A gata com guizos
7 Leitura de versículos da bíblia Os três porquinhos
8 Como se comportar na igreja O nascimento de Jesus
9 - A branca de Neve
10 - A cerva e o cervato
TOTAL 8 10
Fonte: Dados da pesquisa.
157
Percebe-se um trabalho sistemático organizado pela professora no sentido de
incentivar a leitura em sala de aula e fora da sala também, visto que ela criou um sistema de
empréstimo de livrinhos para a leitura, a fim de que os alunos os levassem para casa e os
devolvessem após fazerem a leitura dos mesmos para os colegas.
Dessa forma, é possível afirmar que a professora Carina sempre incentivava os alunos
a lerem. Mesmo aqueles que tinham maiores dificuldades.
A aluna Kethlyn vai à frente para fazer a leitura da fábula “A cerva e o
cervato” do livro “Fábulas de ouro”. A professora se posiciona ao lado da
aluna e diz a ela para não ficar nervosa, que pode ler devagar, sem pressa e
em voz alta para todos ouvirem. Ela faz a leitura e mostra as figuras do livro.
A leitura ainda é feita de forma fragmentada, como se estivesse
decodificando as palavras sílaba a sílaba. (PROTOCOLO C10, linhas 6 a
15).
O incentivo por parte da professora se dá por meio de elogios e, para as crianças, é
relevante o fato de a professora emprestar os livrinhos e depois querer saber se e como eles,
realmente, estão lendo.
Carina faz um breve comentário sobre a história, esclarece as palavras diferentes que
aparecem no texto, fala sobre o autor, sobre o livro, mostra a capa, a contra capa e deixa os
alunos manusearem o livro que está sendo apresentado.
Neste período de observação, a professora fez a leitura de textos com diferentes
finalidades (Quadro 21).
Quadro 21: Relação das leituras realizadas pela Profª Carina – 3º fase do 1º ciclo no período de
09/agosto a 09/dezembro de 2011
Título Domínios sociais de comunicação Objetivo
O menino mais bonito
do mundo
Cultura literária ficcional Envolver o leitor, instigando o
gosto pela leitura Narrativa
Flictz Cultura literária ficcional Envolver o leitor, instigando o
gosto pela leitura. Narrativa
Porque dormimos Transmissão e construção dos saberes:
texto expositivo e explicativo
Informar o leitor, instigando-o à
descoberta e à curiosidade
Bíblia Instrução e prescrições, descrever
ações. Regulação mútua de
comportamentos.
Prescrever comportamentos
agradáveis a Deus de acordo com a
bíblia. Compreender como se lê os
capítulos e versículos da mesma.
Como se comportar
na igreja
Como falar com seus
amigos -
Comportamentos e
bons hábitos
Instrução e prescrições, descrever
ações. Regulação mútua de
comportamentos
Prescrever comportamentos
socialmente aceitos
Fonte: Elaborado com base em Dolz e Schneuwly (2004, p. 60/61)
158
Carina sempre contextualizava o texto lido, situando-o dentro da obra de que ele fazia
parte, falava sobre o autor, mostrava a capa, a contra capa e, no caso do livro Flictz, de
Ziraldo, a professora fez a leitura da sinopse e falou da importância dessa parte para o leitor
do livro. De acordo com Cafiero (2010, p. 97), esse tipo de trabalho precisa ser realizado
sistematicamente: a cada nova leitura, pois a partir desse trabalho, o aluno vai perceber que
antes de ler, o bom leitor tira proveito de informações que estão disponíveis e que são
interessantes para ele.
Como o interesse desta pesquisa está voltado para as produções textuais, volto ao foco
proposto, porém, lembrando que a leitura e a produção escrita caminham juntas. Uma não se
dissocia da outra.
Verifiquei que a prática docente da Professora Carina parte de uma organização de
apresentação do conteúdo e retomadas no que diz respeito aos aspectos de produção e
reestruturação de textos. Parte de uma lógica que inclui leitura, interpretação de textos,
atividades e produção textual, trabalhando com diversos gêneros literários (Quadro 22).
Quadro 22: Atividades relativas aos gêneros textuais realizadas em aula pela Profª Carina – 3º fase
do 1º ciclo - no período de 09 Ago. a 09 Dez. de 2011
Protocolo Data Horas Atividades realizadas em sala pela Prof Carina
C1 09/ago 2 Biografia
C2 23/ago 2 Fábula, provérbios, biografia
C3 05/set 2 Ficha técnica de um animal : elefante
C4 13/set 2 Ficha técnica de um animal : rinoceronte
C5 20/set 2 Texto narrativo sobre um sonho.
C6 04/out 2 Poesia e bilhete
C7 13/out 2 Recado e bilhete
C8 18/out 2 Carta
C9 29/nov 2 Carta e envelope
C10 07/dez 4 Lista de convidados, cardápio
C11 08/dez 4 Carta
C12 09/dez 4 Carta
TOTAL 12 30 12 gêneros textuais trabalhados
Fonte: Dados da pesquisa.
A biografia foi uma atividade planejada a partir de uma sequência de etapas que se
relacionavam até culminar com a produção da biografia do aluno. Primeiro, a professora
Carina fez a leitura do Livro de Ziraldo: O menino mais bonito do mundo. Depois, fez a
leitura da biografia do autor, que constava no final do livro, explicou para os alunos o que é
uma biografia. Fez uma atividade de preenchimento de uma ficha Minha biografia. Nela, os
159
alunos deveriam preencher com seus dados, as lacunas da ficha e, como nem todos os alunos
sabiam completar com informações precisas, essas fichas foram levadas para casa, como
tarefa, e, na sala de aula, serviria de modelo para escrever o texto. Assim, no primeiro dia de
observação, a professora situou-me a respeito do trabalho que já havia se iniciado e dispôs os
alunos em duplas para que, juntos, pudessem realizar esta atividade e se ajudassem na
composição da escrita. Vale salientar que o aluno com maior dificuldade sentava-se com o
aluno mais experiente, para que ele pudesse auxiliá-lo.
[...] Deu um exemplo de como iniciar o texto intitulado minha biografia,
informou que cada parágrafo deveria ser redigido com a informação
preenchida na ficha. Ela esclareceu que cada informação deve ser explorada
colocando a maior quantidade de informação possível. Falou sobre a
composição dos parágrafos e das letras maiúsculas para nomes próprios e
início de frases e para nome de lugares. (PROTOCOLO C1, linhas 31 a 42).
Foi uma atividade direcionada e bem prazerosa para os alunos, pois eles estavam
escrevendo uma autobiografia, na qual suas características, sua personalidade, suas
preferências, dados sobre sua vida estavam sendo relatados e postos em evidência.
Vale ressaltar que a biografia, segundo Kaufman e Rodríguez (1995), é um gênero
textual que tem como estrutura a narração da história de vida de uma pessoa. “Quando o
autor conta sua própria vida, considera-se uma autobiografia.” (KAUFMAN E
RODRÍGUEZ, 1995 p.34).
Nesse tipo de composição, prioriza-se a ordem cronológica dos fatos, a fim de mostrar
passo a passo os acontecimentos vividos pelo biografado. Nesse sentido, as datas são
importantes e devem aparecer ao longo do texto. O protagonista da história, neste caso, é o
próprio autor, o tipo de discurso presente nesta composição é o relato, uma vez que o texto
discorre sobre fatos reais ao leitor. São textos do tipo narrativo, mas que apresentam também
descrições sobre as características do personagem biografado.
A professora Carina sempre retomava os conceitos trabalhados. Ela esclareceu-me que
muitos alunos não conseguem concluir as atividades no tempo previsto e que, com a
finalidade de que todos desenvolvam os textos iniciados, ela sempre retomava o conteúdo,
sentava-se com o aluno que não conseguia redigir sozinho e fazia a reestruturação do texto
com ele.
A atividade sobre os provérbios foi realizada seguindo também uma sequência de
atividades para conhecimentos do termo folclore que se iniciou a partir de uma pesquisa no
dicionário sobre as palavras: folclore, lenda e tradição. Depois os alunos pesquisaram, junto
160
aos familiares, os provérbios e ditos populares que eles conheciam. Após essa pesquisa os
provérbios recuperados foram socializados, lidos por todos e copiados no caderno de
produção.
Creio que para além da realização dessas etapas, importantes para a compreensão do
conteúdo, a professora poderia também verificar o conhecimento que os alunos tinham dos
provérbios, seus significados, seus vários sentidos, sua dimensão social e cultural.
Nesta análise, ainda percebi que o trabalho com os gêneros não se identifica,
completamente, com a sequência didática proposta por Dolz e Schneuwly (2004), mas se
assemelha, pois a professora organiza o trabalho com a produção de textos, a partir de uma
sequência de atividades que culmina com a escrita do gênero em estudo. Além disso, nesta
organização, a professora engloba gêneros que possuem semelhanças em relação ao propósito
comunicativo. É o caso do recado, do bilhete e dos diferentes tipos de cartas que foram
redigidos pelos alunos.
A proposta didática dos autores Dolz e Schneuwly (2004) como já detalhada
anteriormente no referencial teórico deste trabalho tem por
objetivo focalizar uma situação de comunicação e as convenções de um
gênero em particular bem como organizar e articular diferentes atividades
escolares, com a finalidade de que as dificuldades dos aprendizes possam ser
ultrapassadas”. (DOLZ; GAGNON; DECÂNCIO, 2010, p. 66).
No caso da prática docente em análise, percebo que as atividades propostas possuem
uma organização no sentido de priorizar a leitura, a interpretação do que está sendo lido, a
função social que representa, a compreensão de tema em questão, diferentemente da proposta
de uma sequência didática, que é defendida por Dolz e Schneuwly (2004) que prioriza os
problemas, ou seja, os obstáculos selecionados a partir de uma produção inicial realizada
pelos alunos e que a partir dela, organiza-se uma série de atividades de forma modular com a
finalidade de superar os obstáculos detectados.
Nesse sentido, acredito que Carina planeja várias atividades que não são “soltas”, mas
partem de uma organização gradativa para desenvolver a capacidade da leitura e da escrita, de
acordo com o conteúdo estudado. Além disso, é notório que, uma das orientações do
Programa Pró-Letramento é o trabalho a partir de uma sequência didática. Esta forma de
trabalho é sugerida pela tutora, discutida pelos participantes do curso e elaborada
coletivamente. Ademais, creio que a professora Carina acata as sugestões de forma reflexiva,
pois, conforme nos ensina Chartier (2006), os bons professores inovam, mas antes de utilizar-
161
se de um novo procedimento, testam-no a fim de avaliar seus resultados. Ou seja, são
cautelosos e agem com segurança, baseando-se na sua experiência.
A produção de texto sobre a ficha técnica dos animais em extinção faz parte do projeto
meio ambiente desenvolvido por toda a escola. As turmas da 3ª fase do 1º ciclo ficaram
responsáveis pelo tema: Animais em extinção.
Esse projeto tem como objetivo geral:
Explicar a importância da preservação dos animais para a perpetuação da
vida e da espécie humana na Terra através do Projeto Animais em extinção.
Objetivos específicos:
Execução do projeto Animais em Extinção.
Promover uma reflexão acerca dos problemas relativo aos desaparecimento
das espécies .
Adotar por meio de atitudes o respeito e a valorização dos animais, para
assim preservar.
Despertar quanto a importância da preservação dos animais.
(Projeto da escola sobre os animais em extinção, 3ª fase do 1º ciclo, 2011).
Assim, partindo desse projeto, a professora elaborou uma sequência de atividades que
vai desde a exposição oral sobre o mesmo, até a produção escrita realizada pelos alunos.
Inicia-se a aula no laboratório de informática da escola – com preenchimento da ficha técnica
do animal, no caso, o rinoceronte, depois disso a professora propôs a escrita e leitura de um
texto coletivo sobre ele. Numa outra aula, com a ficha técnica do rinoceronte em mãos, os
alunos, em dupla, passaram a escrever um texto informativo sobre ele.
Essa atividade estendeu-se por quatro aulas. A professora sempre chama a atenção dos
alunos para a estrutura do texto: Letra maiúscula, parágrafo, repetição de palavras no texto.
A professora fala da importância do uso dos parágrafos, da preocupação com
a forma de se escrever. Para que o texto fique bom não se pode repetir as
palavras o tempo todo, como o nome dos personagens. Fala da importância
de se usar os pronomes ele, ela, sem repeti-los demasiadamente. Esclarece
também a respeito da pontuação, sobre o uso das vírgulas, dos pontos de
exclamação de interrogação. Sobre o uso de letras maiúsculas no início das
frases. (PROTOCOLO C5, linhas 35 a 46).
Os gêneros como recado, bilhete e carta foram os que a professora Carina mais se
dedicou no período em que estive presente e percebi que a prioridade estava no que Bakhtin
(2003) define como gênero, visto que o caracteriza como estilo, composição e tema.
Os trabalhos com o bilhete e a carta enfatizam a estrutura composicional, ou seja, as
partes desses gêneros, tais como: data, cumprimento, assunto/mensagem, despedida, nome do
remetente, etc..
162
No caso do bilhete, percebe-se que, por ser um gênero textual mais simples, a
retomada de seus aspectos e a revisão de suas características acontece de forma bem rápida,
sempre lembrando a sua estrutura fixa.
É preciso refletir acerca do ato de escrever, pois ele implica além do domínio do
processo de codificação, uma situação específica de interação entre os sujeitos. Segundo
Grossi (2008, p. 132) “o ato de escrever constitui-se uma prática discursiva, em que o autor do
texto o produz em função da situação de interlocução”. Nesse sentido, as condições de
produção são determinantes para a escolha do gênero textual que se quer produzir, “quem
escreve o que escreve, com que objetivo, para quem, quando e onde escreve.” (GROSSI,
2008, p. 132).
Grossi (2008) afirma que, alfabetizar, na perspectiva do letramento, requer a criação
de condições para que o aluno se utilize de práticas de leitura e escrita em diferentes situações
discursivas. A autora salienta que, se na vida produzimos enunciados orais e escritos, e todo
enunciado pertence a um gênero, alfabetizar na perspectiva discursiva significa alfabetizar
utilizando-se dos diferentes gêneros textuais, mostrando ao aluno a sua relevância social.
No caso da análise em questão, a professora Carina procura mostrar aos alunos a
função social da escrita, ou seja, ela cria situações em que, para escrever, a criança vislumbra
seus possíveis interlocutores e os objetivos de seu texto. Nessa perspectiva, a professora
retoma os conceitos dos diferentes gêneros textuais e o conhecimento que os aprendizes têm
sobre eles. Em sua prática, a professora considera esses aspectos bastante relevantes, pois
questiona seus alunos sobre as intenções e as possibilidades de uso dos gêneros trabalhados,
como se constata no seguinte episódio:
A professora questionou os alunos sobre os tipos de gêneros, por exemplo:
Para que serve uma receita, uma bula, um convite, um bilhete, um recado,
um anúncio e ao serem questionados os alunos respondem as questões feitas
pela professora, elencando, oralmente, as finalidades desses gêneros.
(PROTOCOLO C7, linhas 30 a 35).
Depreendi deste excerto, que Carina compreende e considera os gêneros da mesma
forma que Marcuschi (2005, p. 03) quando afirma que é impossível nos comunicarmos
verbalmente a não ser por algum gênero, assim como é impossível nos comunicarmos
verbalmente a não ser por algum texto. Em outros termos, partimos da ideia de que a
comunicação verbal só é possível por algum gênero textual, colocando-se em evidência, os
aspectos funcionais e interativos da língua.
163
Nesse sentido, a produção da carta foi realizada levando-se em conta uma situação real
de comunicação entre dois indivíduos. Esse trabalho apresentou várias etapas e não se
restringiu a um interlocutor apenas, mas a professora criou várias situações em que esse
gênero pôde ser aprofundado. É preciso lembrar que a carta estabelece uma relação específica
em situações comunicativas também específicas. Dessa forma, é possível encontrar variações
dentro do próprio gênero, como carta pessoal, carta comercial, carta convite. De acordo com a
funcionalidade do gênero, as modalidades poderão apresentar variações de conteúdo, estilo e
estrutura composicional e isso acontece em função do contexto de circulação e da intenção do
produtor do texto.
Realizou-se, durante o período de observação, uma carta com caráter informal,
observando-se principalmente sua estrutura. Tratava-se da escrita de uma carta para uma
pessoa conhecida. A proposta de produção parte da leitura de um cartaz sobre a carta (Figura
19), já conhecido pelas crianças, pois fazia parte do cenário da sala de aula.
Figura 19: Modelo de carta, exposto na sala da Professora Carina
Fonte: Dados da pesquisa.
Nesta ocasião a professora: “Explica a estrutura da carta e sua função. Em seguida,
entrega uma carta como modelo (xerox) para que as crianças observem e identifiquem as
partes da carta e faça a interpretação do texto, destacando as partes da carta.” (PROTOCOLO
C8, linhas 19 a 24).
Além disso, a professora esclarece que existem vários tipos de carta: “Existe carta
pessoal, que se deve escrever para amigos ou pessoas conhecidas. Falou sobre a carta
comercial que é usada pelas empresas, carta bancária, oficial e que cada uma delas tem uma
164
linguagem diferente.” (PROTOCOLO C8, linhas 43 a 50). Na sequência, ela solicita que
escrevam uma carta, cuja amostra da produção consta na Figura 20. Na sala de aula, o
trabalho com esse gênero é enriquecedor, no sentido de propiciar a escrita com sentido, pois
tem um objetivo claro dentro de um contexto específico, para um interlocutor real.
As cartas comparadas a outros gêneros podem parecer simples por serem tão
abertamente ligadas às relações sociais e a escritores e leitores particulares,
mas isso só significa que elas nos revelam clara e explicitamente a
sociabilidade que faz parte de toda a escrita. (GROSSI, 2009, p. 133).
No caso desta análise, a proposta de produção textual em questão evidencia que a
professora prioriza no início do trabalho a estrutura composicional da carta, ou seja, a forma
de se compor uma carta, ela exemplifica com um modelo, explica a função da carta procura
dar sentido a esse trabalho, isto é, didatiza o gênero para poder ensiná-lo.
Figura 20: Produção textual (carta) realizada pela Elisana, aluna da Prof Carina, 3º fase 1º ciclo
Rondonópolis, 18 de novembro de 2011
Querida amiga Gisele
Como vai as coisas ai? Espero que esteja tudo bem!
Você não sabe da novidade que eu vou contar pra você! A nossa tia Lúcia deu
cavalo pra mim.
O nome dele vai ser trovão ele gosta muito de cavalgar pelo jardim. Ele brinca
muito comigo, agora eu não fico mais sozinha durante o dia, pois ele é meu com
panheiro.
Fico triste quando não posso ir ao sítio para brincar com o trovão.
Um grande abraço
De sua amiga
Elisana Fonte: Dados da pesquisa.
165
É o que sugere Schneuwly (2004) ao afirmar que: “A particularidade da situação
escolar reside no seguinte fato que torna a realidade bastante complexa: há um desdobramento
que se opera em que o gênero não é mais instrumento de comunicação somente, mas é, ao
mesmo tempo, objeto de ensino-aprendizagem.” (SCHNEUWLY, 2004, p. 76 - grifo do
autor).
Sendo objeto de ensino aprendizagem, a professora esclarece que todos são
convidados a redigirem uma carta para um primo, ou parente que mora em outra cidade e que
não conhece a cidade de Rondonópolis-MT (Figura 21). Como não estive presente em todas
as aulas, pois parti do interesse de observar as aulas de produção textual, a professora
esclareceu-me que essa atividade foi realizada de forma interdisciplinar considerando-se o
conteúdo visto na aula de geografia. Oportunidade em que ela trabalhou um texto informativo
sobre o município de Rondonópolis - MT enfocando as suas principais características. Nesse
sentido, a carta a ser redigida teria como assunto principal a referida cidade.
Ao propor uma produção textual com esse gênero, que, como já foi trabalhado de
forma mais simplificada anteriormente, a professora inova ao realizar a interdisciplinaridade,
uma vez que cria uma forma de fixar um conteúdo que, em muitos casos, é retomado em
questionários ou exercícios de memorização, para ser escrito e estudado em forma de carta.
Penso que essa forma de trabalhar um conteúdo é bem produtiva, inovadora e promove a
aprendizagem significativa.
Além disso, ela situa os aprendizes no contexto da interlocução: quem escreve (o
aluno), para quem (alguém que mora distante); objetivo do texto (informações sobre a cidade
de Rondonópolis – MT). A escrita cumpre, assim, seu papel social na perspectiva do
letramento, pois essa carta pode ser realmente endereçada a alguém que faz parte do campo de
conhecimento do educando. Percebe-se, também, que, na produção em análise, a professora
mantém a preocupação com a estrutura composicional do gênero que inclui uma data,
saudação inicial, assunto, despedida e assinatura. Assim, através dos modelos, as crianças vão
se apropriando da estrutura dos diferentes gêneros.
O trabalho desenvolvido pela professora Carina com o gênero carta partiu de várias
atividades, sendo elas: leitura de uma carta, interpretação, preenchimento de atividades,
preenchimento de envelope, carta para professora, para um amigo, para o povo brasileiro -
projeto meio ambiente (Figura 22), para a diretora da escola (Figura 23) e para o papai Noel.
Ou seja, não foi realizado apenas de forma ilustrativa ou pontual, mas houve um trabalho
criativo, contextualizado e interdisciplinar, envolvendo todos os alunos da sala, dessa forma,
creio que houve aprendizagem.
166
Figura 21: Produção textual (carta) realizada pela Iasmim, aluna da Profª Carina, 3º fase 1º ciclo
Rondonópolis, 22 de outubro de 2011.
Primo Cleverson
Desde que foi para Rio de
Janeiro Rondonópolis cresceu muito
Você não acredita! Rondonópolis
se tornou o segundo maior
município de mato grosso.
Ele tem uma posição estraté-
gica porque é o portal da Amazô-
nia e o corredor obrigatório para
a maior parte de caminhões e au-
tomóveis que transitam na região
Norte e Sul do país.
Olha Cleverson quanta coisa legal
né. Volte logo! Te espero com
braço aberto. Beijo de sua prima
Iasmim
Fonte: Dados da pesquisa.
Figura 22: Produção textual (carta) realizada por Giovanna e Beatriz, alunas da Profª Carina, 3º fase
1º ciclo Rondonópolis, 07 de novembro de 2011.
Ao povo brasileiro
Nos alunos da 3ª fase “B” da escola
Municipal Rosalino Antonio da Silva, por
meio desta carta viemos denunciar que os
homens estão matan-
do os animais.
As pessoas jogam lixo nos rios, ruas, lagos e
queimam floresta.
Queremos ajudar e conscientizar as pessoas
da importância de preservar o meio ambien-
te.
Pendimos que todos colaborem...
Gratas
Geovanna Vieira Moreira e
Beatriz da Rocha Vieira
Fonte: Dados da pesquisa.
Concordo com Dolz e Schneuwly (2004, p. 71) quando salientam que o gênero
“funciona como um modelo comum, que determina um horizonte de expectativas para os
membros de uma comunidade social” e, pela prática observada, é possível afirmar que,
dependendo do tipo de mediação entre a professora e os alunos, a aprendizagem acontece por
167
meio de atividades sistematizadas que conduzem à compreensão e à escrita do gênero,
levando os aprendizes a perceberem suas características, sua estrutura e suas funções. Os
gêneros apresentam uma estabilidade relativa e creio que, pelo trabalho desenvolvido por
Carina, os alunos serão capazes de reconhecer e nomear os gêneros conhecidos segundo a
estrutura composicional que possuem. As observações feitas na pesquisa permitem pressupor
que, para os escritores iniciantes, essa estabilidade que é destacada por Bakhtin (1997) é de
vital importância, visto que eles estão aprendendo sobre a constituição dos diferentes textos.
Figura 23: Produção textual (carta) realizada pela Yasmin, aluna da Profª Carina, 3º fase 1º ciclo
Rondonópolis 24 de novembro de 2011
Diretora Sara
Sou a Yasmim do 3º ano, aluna da professora [...].
Estou escrevendo esta carta para lhe contar como foi meu ano na escola.
Aprendi muitas coisas interessantes para o meu crescimento. Algumas delas foram:
carta, con-
tas de dividir, folclore brasileiro e muitas coisas importantes.
O que eu gostei muito foi os animais em ex-
tinção, o elefante com dentes de marfim e também sobre o nosso estado de mato grosso,
suas belezas e riquezas, enfim, coisas preciosas que levarei para toda minha vida.
Mas acho que a escola poderia nos dar mais condições de aprendizagem com aulas de
esportes, computação, música, ou seja um aprendizado di-
versificado para nos prepararmos para o mundo, enriquecendo a nossa vida escolar.
Muito obrigado pelas coisas que a Escola Rosalino me proporcionou.
Desejo a você e toda equipe um feliz natal e um próspero ano novo.
Um beijo carinhoso...
Yasmim
(3ª fase “B” I ciclo) Fonte: Dados da pesquisa.
168
Nessa perspectiva, Dolz e Schneuwly (2004, p. 75) apontam o gênero como “um mega
instrumento” que fornece um suporte para a atividade, nas situações de comunicação, e uma
referência para os aprendizes.
Dessa forma, os textos possuem algumas dimensões pertencentes aos gêneros, que lhe
conferem certa estabilidade, que não são estáticas, pois podem adquirir estruturas variadas de
acordo com a função que o escritor quer lhe imprimir. Trata-se do que Bakhtin (2003) destaca
como relativa estabilidade, pois um gênero, como uma propaganda, por exemplo, pode ser
elaborada na estrutura de uma piada, de uma poesia, de uma oração. Por nascerem de práticas
socioculturais, os gêneros são, portanto, altamente maleáveis, dinâmicos e plásticos
(MARCUSCHI, 2010), resultando, por vezes em outros gêneros.
Além disso, é de fundamental importância para os aprendizes iniciantes reconhecerem
a estrutura comum dos gêneros, pois a forma padrão dos mesmos serve como referência para
que se possa reconhecer como esses são flexibilizados. Saliento, porém, que a aprendizagem
acontece mediante a leitura e a produção do texto e não pela memorização de seus nomes e
partes constitutivas.
Nesse sentido, considero a prática docente de Carina bastante relevante e produtiva,
pois, para além de fazer com que os alunos reconheçam e identifiquem as partes de uma carta,
o trabalho por ela realizado partiu da leitura de diferentes tipos de cartas, identificação das
funções sociais e comunicativas das mesmas, redação de vários modelos, com objetivos
diversos e destinatários diferentes. Além disso, a atividade do preenchimento do envelope foi
bem significativa, visto que, com a explicação da professora, houve uma compreensão por
parte dos alunos, a respeito do trabalho do correio, que entrega a carta mediante a escrita
correta do endereço. A professora esclareceu que a correspondência só chegará ao seu destino,
caso o endereço preenchido esteja correto:
A professora entregou o envelope aos alunos para que eles observassem o
seu preenchimento, explicou o que era remetente, destinatário e falou que
um dos suportes para se escrever corretamente o endereço é a conta de água
ou de energia, pois são comprovantes de endereço que contém todas as
informações, principalmente o CEP. Disse que através do CEP, se localiza o
bairro e a rua pela internet. (PROTOCOLO C11, linhas 32 a 42).
Por este fragmento, é possível afirmar que a vida social se organiza em torno da escrita
e os aprendizes precisam compreender essa necessidade. Num preenchimento de um
envelope, quantas informações importantes foram compreendidas e vivenciadas pelos alunos?
Deparamos-nos com crianças que, muitas vezes, não sabem nem o endereço de sua residência
169
e, a partir dessa atividade, conseguem reconhecer a importância desse saber. Para o
preenchimento de endereço, foi necessária uma pesquisa como tarefa de casa. Ou seja, buscar
fora da escola, com os familiares, as informações necessárias para se desenvolver as
atividades de sala.
É o que chamamos das funções sociais da escrita, o letramento, que, para além de se
conhecer o código escrito (redigir corretamente a carta, o endereço, o Código de
Endereçamento Postal, CEP), é necessário saber também a sua utilidade no meio em que
vivemos. Ao focalizar os aspectos linguísticos do texto, como parágrafo, letra maiúscula no
começo de frase, no nome das pessoas e de lugares, cuidados com a pontuação, prioriza-se
aspectos da alfabetização e, ao enviar a carta, atentando-se para o endereço correto, o
caminho da carta até o seu destinatário, estamos no âmbito do letramento.
Portanto, concordo com Silva e Melo (2007, p. 36) quando os autores colocam que
“Produzir textos escritos é um ato complexo, pois envolve o desenvolvimento da capacidade
de coordenar e integrar operações de vários níveis e conhecimentos diversos: linguísticos,
cognitivos e sociais”. Estes preconizam que, ao redigir um texto, o escritor precisa acionar
seus conhecimentos, selecionar suas ideias, escolher e organizá-las linguisticamente e
registrar o texto de forma que ele atinja seus objetivos e chegue ao interlocutor desejado.
Para produzir um texto faz-se necessário o auxílio da professora, que planeja, explica,
ensina, incentiva, orienta seus alunos, fazendo com que eles se apropriem do conhecimento de
forma contextualizada.
Penso que ao desenvolver um trabalho com a produção textual do gênero carta, a
professora Carina planejou diversas etapas, como sugerem Silva e Melo (2007, p. 39):
“geração de ideias, consulta a outras fontes, seleção e decisão, rascunho, revisão e edição
final. No entanto, as etapas não são todas obrigatórias nem, necessariamente, sequenciais e
lineares, mas dependem das circunstâncias de produção, dos objetivos, da audiência.”
Na produção da carta para a diretora da escola, os alunos foram convidados a
pensarem o que gostariam de falar para ela, já que se tratava de uma produção realizada no
final do ano. Então, a professora sugeriu que os alunos escrevessem o que gostaram na escola,
pontos positivos e negativos da administração da diretora, sugestão ou pedido para melhoria
da escola, ao final da carta desejo de boas festas, despedida. Após a escrita do rascunho no
caderno de português, houve a reescrita do texto reestruturado e corrigido no caderno de
produção de textos para a versão final da carta propriamente dita. Essas etapas auxiliam os
escritores iniciantes a tomarem decisões conscientes, antes e durante a produção textual. Vale
enfatizar que a diretora recebeu a carta na qual os alunos exteriorizaram opiniões a respeito
170
do trabalho por ela realizado, deram sugestões para a melhoria da escola e foram cordiais,
desejando-lhe boas festas. Além disso, preencheram os envelopes com os dados da escola,
local de trabalho da diretora.
É notório salientar que a prática pedagógica de Carina privilegia os aspectos relativos
ao letramento no que tange à apropriação da escrita de forma contextualizada, prazerosa e
sistematizada. Ou seja, a professora procura fazer um trabalho significativo voltado para o
planejamento de atividades que tenha uma relação estreita com o mundo do educando, de
forma que seu conhecimento seja valorizado e ampliado.
De acordo com o programa Pró-Letramento, no fascículo 3 (A organização do tempo
pedagógico e planejamento de ensino), a elaboração das aulas deve ser um momento de
escolha e decisão. O convite realizado pelo referido programa é para que os professores, no
momento do planejamento, analisem sua classe, aprendam a conhecer seus alunos, suas
necessidades e busquem atividades, “ações e interferências para que os alunos avancem na
qualidade do domínio do conhecimento escolar”. (Fascículo 3, p. 24). O planejamento se
define como um instrumento necessário, flexível e inacabado, no qual o professor não correrá
o risco de cair no improviso e na falta de objetivos. (MEC/SEB, 2008).
Nesse sentido, a prática pedagógica de Carina revela que os eixos organizadores do
Ensino para a aquisição da língua escrita, propostos pelo referido programa, fascículo 1,
intitulado “Capacidades linguísticas: alfabetização e letramento”, são contemplados em
seu dia a dia, em seu fazer pedagógico. São eles: A compreensão e valorização da cultura
escrita, a apropriação do sistema da escrita, a leitura, a produção de textos escritos e o
desenvolvimento da oralidade.
Destaco, ainda, que a professora Carina promove, por meio da criatividade, a
interdisciplinaridade nas atividades em que esta se faz possível. Conforme o Protocolo nº 5 do
dia 20/09/2011, destaco que a professora “aproveitou” a produção de texto para explorar
gráficos e tabelas, em matemática, trabalhando de forma interdisciplinar.
Hoje a professora fala que vai trabalhar o texto “Por que sonhamos?” Ela
pergunta aos alunos, o que acontece quando dormimos. Fala sobre a revista
“Ciência Hoje” que traz curiosidades interessantes. Primeiro fez a leitura do
texto por que dormimos? [...]os alunos participaram da aula, contando suas
experiências, a professora garante a participação de todos na discussão, com
organização[...]após essa discussão a professora propõe a produção narrativa
de um texto sobre o sonho. Depois disso, os alunos leem seus textos e, junto
com eles, a professora classifica os sonhos em sonho assustador, triste,
fantasioso (na floresta encantada) surpresa (festa), passeio e a partir daí,
trabalha com noções de quantidade para a confecção de tabelas e gráficos,
171
garantindo que todos se expressem no desenvolver dessa atividade.
(PROTOCOLO C5, linhas 21 a 38).
Nessa aula percebi que a professora, com uma única atividade, conseguiu contemplar
os cinco eixos organizadores do ensino aprendizado, bem como, de forma criativa, lançar mão
da interdisciplinaridade. A professora Carina fala um pouco sobre essa nova forma de
organização de sua prática pedagógica, na qual ressalta a importância da formação (Programa
Pró-Letramento) e afirma ter modificado a sua prática em sala de aula, adotando metodologias
que contribuíram para a melhoria de sua prática:
A questão da sequência didática, quando eu participei lá do curso, eu não
entendia esse negócio da sequência didática de jeito nenhum. Depois que a
gente começa a ler, a estudar e assim a praticar, aí você começa a ter uma
compreensão melhor do que é essa questão da sequência didática. Uma
atividade puxando a outra, assim, e acaba se tornando... eu achei que foi uma
coisa que contribuiu muito pra mim. Uma coisa positiva que eu não
conseguia fazer e aí que eu comecei a compreender, a entender e a usar...né?
E acho que não tá assim bom, porque ainda tem muita dificuldade, ainda tem
muita coisa que a gente ainda fica assim muito em gavetinha... e a gente
sabe que não... não... não precisa ser assim, né? Que pra eles é muito
melhor pra aprender no global.
Saliento que não se trata apenas de seguir “uma receita” para desenvolver um trabalho,
mas de compreender uma proposta e, com competência, criatividade e dinamismo, criar
estratégias prazerosas para o ensino da língua portuguesa e da produção de textos em sala de
aula. Mesmo com limitações, a professora não tem receio de arriscar e de testar novas
possibilidades. Nesse aspecto, Carina afirma que o Pró-Letramento contribuiu para que ela
adquirisse maior segurança para organizar o seu trabalho com a produção de textos, incluindo
outros conteúdos na atividade proposta. Aproveita, também, o envolvimento da turma para
ampliar o leque de atividades:
Eu nem sei se é sequência didática. Eu procuro adequar assim o conteúdo
que eu to trabalhando, dentro da produção. Porque aí o que acontece? a
criança já tá trabalhando com determinado tipo de atividade, por exemplo...
trabalhei é...lista: lista de convidado, aí trabalhei convite... então como ela tá
envolvida naquilo ali, eu tenho a impressão que a produção vai ser mais
atraente..pra eles, né? Eles vão ter mais vontade de fazer inventar alguma
coisa [...] e daí você vai aproveitando as suas ideias... às vezes muda, às
vezes não muda. Por que às vezes a gente fazia uma atividade de produção.
Dava ali uma sequência de desenhos, e ah... vamos fazer uma produção. Só
que acaba ficando muito solto, né? Até a gente pra produzir alguma coisa,
parece que a gente tem que ter um motivo, alguma coisa pra tá envolvendo a
gente naquilo, né? E eu percebi isso, com essa turminha minha que eu
172
comecei a fazer assim, de uns tempos pra cá, eles produziram melhor...
(CARINA, 2011b).
Dessa forma, creio que o programa Pró-letramento possibilitou o acréscimo de novas
metodologias ao trabalho de Carina, principalmente na perspectiva do alfabetizar, letrando, e
percebendo que a temática dos gêneros textuais privilegia esse aspecto do ensino da língua
escrita.
Ademais, avalio que a professora se dedica, buscando novas formas de ensinar,
pesquisando e refletindo sobre sua prática. Posso afirmar que Carina não é uma mera
executora de programas de formação continuada, mas que ela internaliza os novos conceitos,
aliando-os ao seu conhecimento de mundo e à sua experiência profissional, para melhorar a
sua prática pedagógica.
6.3.4 Sintetizando algumas percepções
Neste item, faço uma síntese do que já foi analisado sobre as práticas pedagógicas dos
sujeitos dessa pesquisa tendo como “pano de fundo” a análise documental realizada no item
5.6, no qual faço um mapeamento de todas as sugestões de produções textuais que compõem
o material do Programa Pró-Letramento.
As sugestões trazidas pelo referido programa são várias e, conforme mencionado, as
mesmas contribuem com o trabalho do professor alfabetizador em exercício.
Após análise do material do Programa Pró-Letramento, Lucio (2010, p. 137) apontou,
como contribuições do referido programa, a articulação entre teoria e prática, a valorização
das experiências dos professores e o relato de experiência de outros professores como práticas
pedagógicas significativas, entre outros. Concordo com a autora quando ela afirma que
os fascículos apresentam um roteiro polifônico em que o discurso oficial, o
discurso acadêmico e o discurso docente interagem. Assim, concebemos o
material do PPL como um diálogo em que todos os comunicantes (governo,
academia e docentes) tem suas vozes pronunciadas, ouvidas e reconstruídas
num processo que se enriquece intensamente quando essas vozes emergem,
num contexto em que a profusão de discursos sociais faz-se presente.
(LUCIO, 2010, p.37).
Nesse sentido, pela análise documental foi possível perceber que as contribuições no
tocante à produção de textos privilegiam o aspecto discursivo da linguagem, trazendo
propostas de produção de textos que partem de uma sequência de passos que culminam numa
173
atividade concreta, ou seja na produção textual propriamente dita. Foi possível recuperar que
as propostas de produção textual partem do planejamento sistemático desenvolvido pelo
coletivo da escola por meio de projetos, com objetivos e ações pré-definidas, e que, ao final,
apresenta-se o resultado dessas ações.
Em termos de atividades que privilegiam o processo de apropriação do sistema de
ensino alfabético, o material traz em seu fascículo complementar sugestões que envolvem a
escrita de nomes dos alunos, dominó, bingo, caça-palavras, etc.
Não foi possível identicar nesse material atividades mais específicas para o processo
de alfabetização, pois a ênfase recai mais no que ensinar do que no como fazer. Creio que nos
encontros presenciais é que propostas mais concretas com atividades interessantes sobre a
apropriação do sistema de escrita alfabética, baseadas nas experiências reais dos participantes
do curso, são socializadas. Essa tendência pode ser relacionada ao valor que vem sendo
atribuído à importância da troca de experiência entre pares.
Chartier (2007) no texto “A ação docente: entre saberes práticos e saberes teóricos”
ressalta que
Ao se defrontarem com os textos acadêmicos, os professores privilegiam as
informações diretamente utilizáveis, o ‘como fazer’ mais do que o ‘porque
fazer’, os protocolos de ação, mais do que as explicações ou os modelos. O
trabalho pedagógico nutre-se frequentemente da troca de ‘receitas’, reunidas
graças aos encontros e aos acasos. As receitas que foram validadas pelos
colegas com quem podem discutir espontaneamente e que são
suficientemente flexíveis para autorizar variações pessoais são adotadas mais
facilmente do que aquelas que são expostas nas publicações didáticas.
(CHARTIER, 2007, p. 185).
No relatório do fascículo nº1 da tutora do programa do município de Rondonópolis,
Dulcilene Rodrigues Fernandes13
, em relação aos eixos da alfabetização, entre outros
aspectos, observa-se que houve a socialização dos exemplos de atividades que contemplam a
alfabetização. Nesse sentido, penso que existe uma tentativa de conciliar teoria e prática, visto
que os saberes teóricos são complementados com os “saberes da ação”. Ou seja, as “receitas”,
de que fala Chartier, por serem saberes da prática compartilhadas nos cursos de formação,
passam a ter importância, pois podem ser refletidos de forma coletiva. De acordo com
pesquisas, a autora afirma que os professores valorizam os “saberes da ação”, em detrimento
13 Relatório enviado à Universidade Federal de Pernambuco/CEEL, na ocasião responsável pelo Pró-Letramento
em Mato Grosso.
174
dos saberes teóricos, que são elaborados cientificamente, porém fora do campo de
investigação, não sendo, portanto, utilizáveis em sala de aula.
Segundo a análise realizada sobre as práticas pedagógicas dos sujeitos dessa pesquisa
no tocante à produção de textos e à presença dos gêneros textuais nos três primeiros anos do
ensino fundamental, posso afirmar que os documentos oficiais e os programas de formação de
professores alfabetizadores influenciam de forma significativa as práticas docentes. Porém,
isso não acontece de forma homogênea, pelo contrário, cada professora tem uma forma
particular de trabalho, que inclui seus próprios saberes, os quais não provêm de uma fonte
única, mas sim de várias fontes e de diferentes momentos da história de vida e da carreira
profissional.
A professora da 1ª fase trabalhou a produção de textos, dentro das exigências do
projeto da escola, com produções pontuais, nas quais as crianças desenvolveram pequenos
textos que partiam, principalmente, da exploração de gravuras para a composição do texto
proposto. Os gêneros textuais trabalhados por ela em sala de aula foram variados: bilhete,
cartão, poesia, música, anúncio, textos narrativos e descritivos. Para o desenvolvimento da
atividade, a professora explicava o que fazer, mostrava alguns exemplos no quadro, pedia que
os alunos se manifestassem oralmente a respeito do que estava sendo proposto. Sempre
auxiliava os alunos a redigirem de forma correta, corrigia e reestruturava palavras com a
grafia incorreta. Por vezes, agia como escriba do aluno que não conseguia desenvolver as
produções.
A professora da 2ª fase desenvolveu atividades que, em sua maioria, se tratavam de
produções pontuais, as quais iniciavam na aula observada com término na própria aula. Nesse
sentido, ela propôs produções que exploravam as histórias em quadrinhos, com sequência
lógica dos fatos (narrativas), bilhetes, fábula, lista, música, poesia e panfletos. Os alunos dessa
fase mostravam-se relativamente independentes quanto à escrita das palavras, mesmo assim,
muitas foram as vezes em que a professora reestruturou palavras que se encontravam com a
grafia incorreta.
A professora da 3ª fase realizou um trabalho com a produção de textos, que, pelos
dados utilizados para essa análise, se aproximaram mais fortemente da proposta do Pró-
Letramento, uma vez que era desenvolvido com encadeamento de atividades que seguiam
uma sequência de passos até culminar na produção final. A professora realizava também um
trabalho com a reestruturação do texto de forma individual e também através de agrupamentos
positivos, no qual o aluno com mais facilidade auxiliava os alunos com maiores dificuldades.
Os trabalhos desenvolvidos em sala de aula privilegiaram os gêneros: carta, bilhete, biografia,
175
ficha técnica, lista de convidados, cardápio. Estes foram realizados a partir de várias etapas
que envolveram leitura, atividades de interpretação, debates em sala, pesquisa na biblioteca,
pesquisa no laboratório de informática, atividades extraclasse, entre outras.
Pelos dados apresentados, creio que ainda é necessário sistematizar o ensino da
produção de textos, no sentido de trabalhar com diversos gêneros textuais no qual os alunos
sejam incentivados a ler e a escrever com finalidades e destinatários diversos, porém, não se
pode perder de vista que é necessário criar situações sistematizadas e planejadas como o
intuitode levar aluno a compreender os aspectos sociodiscursivos e estruturais de cada gênero
e penso que isso não acontece com atividades pontuais de produção textual.
Até os anos 80, o ensino da escrita baseava-se na escrita de “redações” em que se
escrevia de forma artificial obedecendo a regras e estruturas preestabelecidas em que a língua
era vista como um código que, ao ser bem utilizado pelo emissor, iria comunicar sem ruído a
mensagem. Ou seja, era necessário seguir à risca uma estrutura pré-determinada, para, assim,
garantir que a mensagem fosse compreendida por todos sem ser dirigida a ninguém.
(Marcuschi, 2010). Eram os chamados gêneros escolares que traziam como estrutura
tipológica a narração, a descrição e a dissertação.
Ainda vimos que há resquícios dessa forma de trabalho em sala de aula, por isso, creio
ser necessário subsidiar professores alfabetizadores com estudos direcionados ao
aprofundamento na compreensão dos gêneros textuais como objeto de ensino e aprendizagem.
Albuquerque e Leal (2007) nos chamam a atenção para a necessidade de deixar de
escrever redações para se produzir textos, ou seja, é preciso ver a escrita como um objeto
social, articulado ao mundo em que vivemos com funções sociais e características próprias e
que precisam ser exploradas na escola a fim de que os alunos sejam capazes de perceber suas
características e finalidade para saber como utilizá-los. As autoras salientam, também, que
Nem sempre é possível ao professor planejar a produção de textos que
preencham finalidades reais e que sejam destinados a outros leitores ( e não
apenas ao professor). Quando isso não acontece, [...] é importante pensar em
situações imaginárias, que tenham características que, pelo menos, se
aproximem de usos reais, deixando claro para o aluno que, naquele
momento, ele estará aprendendo algo que poderá ser utilizado em outras
situações. (ALBUQUERQUE; LEAL, 2007, p. 106).
Como foi possível recuperar por meio dos dados no relatório da tutora Dulcilene, as
professoras, sujeitos dessa pesquisa, desenvolveram, no ano de 2010, no curso do Programa
Pró-Letramento, projetos adaptados à realidade da escola e da turma. Constatei, neste
176
material, que as professoras tiveram contato com o como realizar, planejar e concretizar esses
projetos em sua unidade escolar: a professora da 1ª fase desenvolveu o projeto Meio ambiente,
que já estava em andamento na escola, a professora da 3ª fase trabalhou o projeto Almanaque
que foi sugerido no Programa Pró-Letramento e que ela adaptou à realidade da escola. Não foi
possível encontrar nenhum dado da professora da 2ª fase, mas creio que ela também
participou dessa etapa do curso.
Observando o quadro 11 verifica-se que, nele, apresentam-se as capacidades,
competências e atitudes que devem ser introduzidas, trabalhadas, consolidadas e retomadas ao
longo dos três primeiros anos do ensino fundamental. Essas capacidades selecionadas estão
organizadas em torno de eixos14
para a apropriação da língua escrita. Dessa forma, percebi
uma progressão da 1ª para a 3ª fase, tanto em termos de quantidade quanto de
aprofundamento no tocante à exploração dos gêneros textuais em sala de aula. Seria por conta
desta progressão que nota-se uma primazia do ensino do código em detrimento do significado
e da comunicação que foi perceptível nas diferenças entre as práticas pedagógicas dos sujeitos
dessa pesquisa? Para responder a essa questão, acredito que novas pesquisas na perspectiva
etnográfica e longitudinal poderiam ser realizadas.
Penso que as práticas docentes não podem ser homogeneizadas, mas sofrem
influências das políticas e dos conteúdos da educação, porém cada professor se apropria de
diferentes formas das orientações dos programas de formação continuada e as incorpora em
sua prática, se considerá-las importantes.
Enfim, percebo que, embora ainda haja a necessidade da compreensão dos gêneros
textuais como possibilidade de exploração e trabalho pedagógico mais sistematizado, existe
uma progressão positiva de construção e consolidação dos saberes docentes dessas
professoras alfabetizadoras, no tocante ao processo de ensino aprendizagem na perspectiva do
letramento.
14 Compreensão e valorização da cultura escrita, apropriação do sistema de escrita; leitura; produção
de textos escritos; desenvolvimento da oralidade.
177
CONSIDERAÇÕES
Ao redigir as considerações da pesquisa que aqui se delineou, reporto-me ao ensino da
língua materna que, durante muito tempo, esteve centrado na concepção de língua como um
sistema de código que deveria ser internalizado sem levar em consideração o contexto, ou
seja, a língua não era vista como um fenômeno social, histórico e interacional. Ensinava-se a
ler e a escrever de forma fragmentada, com falsos textos, compostos por frases
descontextualizadas e que não tinham relação com as práticas sociais.
Com as novas concepções de língua difundidas nas três últimas décadas, relacionadas
ao ensino de Língua Portuguesa e Alfabetização, novas ideias e novos enfoques para o ensino
de língua passaram a ser divulgadas em todo Brasil.
As concepções teóricas de Bakhtin (1997, 2010) e Marcuschi (2008), concebendo a
língua como um sistema de interação por indivíduos socialmente organizados,
redimensionaram as Propostas Curriculares Nacionais e influenciaram significativas
mudanças em materiais didáticos e em cursos de Formação Continuada.
Nesse sentido, a influência dessas concepções trouxe à tona um apelo para o ensino de
língua contextualizado, em que a alfabetização seja realizada em consonância com o
letramento. O ensino de língua passa de um enfoque normativo e prescritivo para a concepção
de linguagem articulada aos seus usos nas práticas sociais, de forma que haja interação entre
os falantes.
A compreensão de linguagem e gêneros discursivos de Bakhtin (1997) é difundida por
teóricos como: Dolz e Schneuwly (2004), Marcuschi (2008; 2010), Rojo (2010), entre outros,
e trazem as noções de gêneros textuais materializados em nossa vida diária, os quais
apresentam padrões sociocomunicativos característicos definidos por composições funcionais,
objetivos, e estilos que se concretizam em nosso cotidiano e que são realizados na
“integração de forças históricas, sociais, institucionais e técnicas.” (MARCUSCHI, 2008, p.
155).
Dessa forma, falar em ensino de língua materna é perpassar necessariamente pela
noção de gênero textual, já que, além do eco das teorias bakhtinianas, presentes nas propostas
curriculares, os cursos de formação inicial e continuada procuram subsidiar a prática docente
com metodologias voltadas ao trabalho com os gêneros textuais.
Nessa perspectiva, o programa Pró-Letramento, implantado pelo MEC em 2005,
procura subsidiar os professores alfabetizadores com novas teorias trazendo a temática da
alfabetização em consonância com o letramento, conceito este recente em nossa língua, e
178
divulgado por teóricos como Soares (1998), Costa Val (2004) e Kleiman ( 2008), os quais
defendem que a alfabetização (aquisição do sistema convencional da escrita) não pode ser
dissociada do letramento, que é o desenvolvimento de habilidades de uso dessa tecnologia nas
práticas sociais. Assim, a alfabetização e o letramento devem caminhar juntos, numa relação
de interdependência, em que um não anula a especificidade de outro, mas se complementam.
A pesquisa aqui delineada partiu da preocupação com a qualidade de ensino e o
acréscimo de novas metodologias na alfabetização, baseada na compreensão do letramento e
num ensino mais significativo para o aluno com a temática dos gêneros textuais.
Dessa forma, a questão da pesquisa que moveu esta investigação, a saber: O programa
de formação continuada para professores alfabetizadores, o Pró-Letramento, oferecido pela
Secretaria Municipal de Educação de Rondonópolis, tem contribuído de forma efetiva para
este aspecto?
Com base nas entrevistas realizadas, pode-se perceber que os sujeitos da pesquisa
consideram a formação continuada e o programa Pró-Letramento muito importantes para a
melhoria da qualidade de ensino. Além disso, as entrevistadas destacam a relevância da
experiência em sala de aula, da possibilidade de aceitação de mudanças, como fatores
decisivos para a constituição das mesmas, enquanto profissionais e enquanto pessoa. Ou seja,
o saber docente, como afirma Tardif (2002), não se reduz à simples função de transmissão de
conhecimentos produzidos, mas integra diferentes saberes podendo ser definido como um
saber plural, construído através da formação profissional, de saberes disciplinares,
curriculares e experienciais.
A entrevista realizada com a tutora do programa no ano de 2010 levou-me a afirmar
que ela considera o programa Pró-Letramento bem formulado, e que o material é muito bom,
pois constata que os professores cursistas modificam suas práticas ou acrescentam a essas,
sugestões, aliando teoria e prática.
Pelas observações e análise dos gêneros que circulam na escola, percebe-se uma
aceitação maior e melhor compreensão, por parte das professoras, das propostas curriculares e
dos conceitos divulgados pelo Programa Pró-Letramento, no tocante à compreensão do
alfabetizar, letrando. Além disso, pelos diálogos travados, conclui-se que existe uma avaliação
positiva deste programa por parte dos sujeitos dessa pesquisa, pois consideram que existe uma
relação entre a teoria e a prática. Ou seja, nos encontros presenciais é possível a troca de
experiência e a reflexão sobre os aspectos positivos do cotidiano escolar.
Neste sentido, saliento que os cursos de formação continuada que fazem essa relação
entre a teoria e a prática são mais valorizados pelas professoras. Elas apontaram o PROFA
179
como um dos cursos que trazem a temática da reflexão sobre prática e que o Pró-Letramento
foi uma continuidade desta política de formação.
Defendo, desde o início desta pesquisa, a necessidade de que os gêneros textuais sejam
tomados como objeto de ensino e percebo que ainda é preciso subsidiar os professores na
formação inicial e continuada. O Programa Pró-Letramento capacita o professor indicando
caminhos possíveis, porém, penso que ainda seja importante o planejamento e o diálogo entre
os profissionais da escola, no sentido de priorizar os gêneros a serem explorados em cada fase
do ensino.
Os sujeitos dessa pesquisa compreendem a importância de se trabalhar com os
diversos gêneros textuais, todavia, a estrutura das tipologias, principalmente da narração
(com gravuras e exploração da estrutura começo, meio e fim) ainda aparecem como
prioridade nas produções textuais, notadamente nas 1ª e 2ª fases. Existe, também, uma
preocupação latente com os aspectos gramaticais e ortográficos da escrita. Não defendo que
isso não seja importante, mas creio que o aspecto interlocutivo da língua deva ser melhor
explorado.
Ao observar a prática pedagógica das professoras alfabetizadoras, a análise levou-me a
crer que o trabalho que se desenvolve na sala de aula com a produção escrita é marcado e
influenciado pelos cursos de formação, como o Pró-Letramento, mas também pelas condições
dos contextos escolares, pela característica individual de cada professor, pela realidade de
cada unidade escolar e de cada aluno, além dos projetos desenvolvidos pela escola e que
constam em seu Projeto Político Pedagógico.
Vale salientar, ainda, que a forma de organização governamental também influencia,
gradativamente, as transformações na prática pedagógica, visto que ao constituir a Rede
Nacional de Formação Continuada de Professor da Educação Básica (RNFC), o MEC reúne
esforços, formando uma grande parceria entre Universidades e Secretarias de Educação com a
finalidade de melhorar a qualidade da educação e elevar o Índice de Desenvolvimento da
Educação Básica (IDEB) em todo País.
Desde o ano de 1998, a Secretaria Municipal de Educação e Cultura – SEMEC – do
município de Rondonópolis tem procurado implantar uma política de melhoria na qualidade
da educação, buscando diminuir os altos índices de evasão e extinguir a repetência e a
reprovação por meio da implantação do sistema de ensino organizado por ciclos. Além disso,
a valorização profissional é outra meta realizada através da diminuição da jornada de trabalho
do professor do ensino fundamental (de 40 horas para 30 horas), bem como o investimento na
formação contínua do professor na própria unidade escolar através de grupos de estudo.
180
Penso que valorizar o profissional da educação é de fundamental importância para a
melhoria na qualidade do ensino, por isso, ainda, faz-se necessário mais investimento na
formação inicial e continuada dos professores alfabetizadores. É nessa perspectiva que
compreendo a formação continuada, como um projeto permanente, que possibilite aos
professores caminhos para que, de forma coletiva e contextualizada, transformem a sua
prática docente, com o objetivo de melhorar a qualidade da educação e da aprendizagem de
seus alunos.
Quanto às produções textuais disponibilizadas para as análises, verifica-se que, ao
escreverem, as crianças conseguem responder de forma positiva, desenvolvendo a produção
textual conforme a orientação da professora. Dessa forma, penso que o planejamento
sistematizado dos gêneros textuais adequados a cada etapa do ensino precisa ser discutido
pelo coletivo escolar a fim de que os alunos sejam capazes de se expressarem com clareza de
acordo com a situação.
Cardoso (2008) desenvolveu uma pesquisa no ano de 1996 que, entre outros aspectos,
lhe possibilitou responder à pergunta “O que as crianças sabem sobre a escrita”? Por meio de
entrevistas de explicitação elas expressavam como desenvolviam suas produções, como
pensavam em seu interlocutor, como venciam suas dificuldades. Com questionamentos sobre
o que foi escrito, a autora depreende das falas das crianças o caminho cognitivo desenvolvido
por elas na construção do texto. Os dados revelam que as crianças estão numa busca em
constituírem-se como escritores, mediados pela presença de um leitor real ou imaginário de
seus textos. Assim, a criança cria estratégias de construção do texto, à medida que escreve um
rascunho, observa, apaga, corrige, consulta o adulto, num esforço metalinguístico para que
sua escrita seja significativa.
Dessa forma, todo texto é produzido, seja ele falado ou escrito, num determinado
contexto e construído sobre o modelo de um gênero pré-determinado através de seus motivos,
intenções e conteúdos temáticos a serem transmitidos. Assim, creio que é função da escola
proporcionar às novas gerações o contato com diferentes gêneros discursivos a fim de
desenvolver competências linguísticas relacionadas às formas de falar e escrever segundo
regras ortográficas, gramaticais e estilísticas específicas. Portanto, quem escreve, precisa
aprender a planejar e a desenvolver um texto de acordo com a situação, com o destinatário e
com o gênero discursivo e isso não acontece espontaneamente, é necessário um planejamento
e um trabalho sistematizado neste sentido.
Pela pesquisa aqui delineada, creio que a concepção do alfabetizar, letrando, está
sendo internalizada e posta em prática de forma gradativa. Por isso, acredito que o debate
181
precisa ser ampliado, a fim de que a teoria se efetive na prática e que o professor alfabetizador
sinta-se cada vez mais seguro no seu fazer pedagógico, proporcionando ao educando um
ensino de língua mais significativo por meio da exploração dos gêneros textuais e da
compreensão dos aspectos interlocutivos da linguagem.
182
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APÊNDICES
APÊNDICE A – Roteiro da Entrevista Inicial com as Professoras que participaram do curso
Pró-Letramento ................................................................................................................ 190
APÊNDICE B – Entrevista com as Tutoras do Programa Pró-Letramento ........................... 193
APÊNDICE C – Roteiro da Entrevista Final com a Professora Ana (1ª fase 1º ciclo) .......... 195
APÊNDICE D – Roteiro da Entrevista Final com a Professora Bia (2ª Fase 1º Ciclo) ......... 197
APÊNDICE E – Roteiro da Entrevista Final com a Professora Carina (3ª Fase 1º Ciclo)..... 199
190
APÊNDICE A – Roteiro da Entrevista Inicial com as Professoras que participaram do curso
Pró-Letramento
1 Identificação
a) Dados pessoais
Nome:_______________________________________________________________
Idade:_______
Naturalidade:_________________________________________________________
Estado civil:__________________________________________________________
b) Formação
Graduação
Curso:_______________________________________________________________
Instituição:___________________________________________________________
Ano de conclusão______________________________________________________
Pós-Graduação:
Especialização
Curso:_______________________________________________________________
Ano de conclusão:______________________________________________________
Mestrado
Curso:_______________________________________________________________
Ano de conclusão______________________________________________________
c) Atuação profissional
Tempo de serviço no magistério:__________________________________________
Tempo de serviço na alfabetização:________________________________________
Situação funcional:____________________________________________________
Escolas em que atuou:__________________________________________________
Fase em que atuou mais tempo:__________________________________________
Fase em que atua:_____________________________________________________
Cartilhas e/ou livros de alfabetização que já utilizou:__________________________
191
2 Blocos de perguntas
BLOCO 1- Informações Profissionais
1 Você atuou algum tempo no magistério sem ter formação específica? Em caso positivo,
responda onde e quando:
2 Já atuou em outra profissão? Em caso afirmativo, responda qual e por quanto tempo:
3 O que te fez se interessar pela profissão docente?
4 Qual a fase que você mais se identifica no primeiro ciclo?
5 Quais as fases em que você atuou nos últimos cinco anos?
6 Que outras funções você já desempenhou nesta escola?
7 Você está nesta fase atualmente por escolha ou por questões de pontuação?
BLOCO 2 – Alfabetização
1 O que te motiva a trabalhar com alfabetização?
2 No seu entendimento o que é alfabetização?
3 O que é alfabetizar?
4 Quando você considera que uma criança aprendeu?
5 Como você sabe quando uma criança está alfabetizada ou não?
6 Que dificuldades as crianças costumam apresentar para se alfabetizar?
7 Analisando a sua prática como professora alfabetizadora, desde o início até os dias atuais,
o que você aponta como avanço significativo de sua prática?
8 Qual ou quais os métodos que você utiliza na alfabetização? Por quê?
9 No decorrer de sua trajetória como professora alfabetizadora o que você acha que
contribuiu para melhorar a sua prática?
10 Quais as maiores dificuldades encontradas por você no trabalho com a alfabetização?
11 Quais as situações/elementos que interferem na obtenção de resultados bem sucedidos na
alfabetização das crianças?
12 Como você trabalha as dificuldades de escrita apresentadas pelos alunos na alfabetização?
13 Na sua opinião, as teorias sobre a alfabetização influenciam em sua prática em sala de
aula? De que maneira?
14 O termo letramento vem sendo utilizado há pouco tempo no meio educacional. Você
acredita que há diferença entre alfabetização e letramento? Explique:
192
15 Em sua opinião é possível trabalhar com diferentes textos na fase inicial da alfabetização?
Caso a resposta seja positiva, de que forma?
BLOCO 3 – Formação Continuada
1 Qual a importância da formação continuada para professores alfabetizadores? Comente:
2 Você costuma participar de todos os cursos oferecidos pela SEMEC (Secretaria Municipal
de Educação) que estão voltados para a alfabetização? Por quê?
3 Quais os cursos sobre alfabetização que você participou e que contribuíram de alguma
maneira para sua prática como professora alfabetizadora?
4 Como você encara a relação entre a formação continuada e o seu crescimento pessoal e
profissional?
BLOCO 4 - Programa Pró-Letramento
1 Quais os motivos que a levaram a inserir-se no programa Pró-Letramento?
2 Qual a importância deste programa para a sua prática pedagógica?
3 O programa acontece de forma semipresencial, ou seja, existe um encontro mensal e
considera-se a carga horária do curso mediante as atividades desenvolvidas em sala de
aula. Você considera essa quantidade de encontros suficiente?
4 O que você acha da metodologia e do material oferecido pelo curso?
5 Quais os pontos positivos do programa Pró-Letramento?
6 Existem pontos negativos neste programa? Aponte-os:
7 Qual a sua opinião a respeito da atuação dos tutores do programa?
8 A partir da sua participação no curso Pró-Letramento, o que você apontaria como
contribuição deste curso em sua prática pedagógica?
9 Você acha que o curso Pró-Letramento se diferencia dos outros cursos de formação de
professores alfabetizadores? Em quais aspectos?
10 Descreva as atividades que você acrescentou no seu planejamento diário a partir da sua
participação no curso do Pró-Letramento:
193
APÊNDICE B – Entrevista com as Tutoras do Programa Pró-Letramento
1 Identificação
a) Dados pessoais
Nome:_______________________________________________________________
Idade:_______
Naturalidade:_________________________________________________________
Estado civil:__________________________________________________________
b) Formação
Graduação
Curso:_______________________________________________________________
Instituição:___________________________________________________________
Ano de conclusão______________________________________________________
Pós-graduação:
Especialização
Curso:_______________________________________________________________
Ano de conclusão:______________________________________________________
Mestrado
Curso:_______________________________________________________________
Ano de conclusão______________________________________________________
c) Atuação profissional
Tempo de serviço no magistério:__________________________________________
Tempo de serviço na alfabetização:________________________________________
Situação funcional:_____________________________________________________
Escolas em que atuou:__________________________________________________
Tempo que trabalha com a formação continuada de professores: _________________
2 Perguntas:
1 Você recebeu preparação para ministrar o curso Pró-letramento para os professores
alfabetizadores? Como foi esta preparação?
194
2 A preparação recebida foi suficiente para que você se sentisse capacitada para ser
orientadora do programa?
3 Você tem recebido apoio dos órgãos educacionais para ser tutora do programa Pró-
Letramento? Quais?
4 De acordo com suas observações, a participação dos professores alfabetizadores no
Programa Pró-letramento tem contribuído de forma significativa para a melhoria da
prática pedagógica dos mesmos ? Em que aspectos?
5 Você acredita que o Programa Pró-Letramento tem atingido o objetivo proposto, que é
elevar a qualidade de ensino e de aprendizagem nas séries iniciais do ensino fundamental?
6 Existem materiais complementares para o desenvolvimento deste programa? Quais?
7 Você considera os materiais para desenvolver o Programa adequado?Justifique:
8 Como você organiza os encontros do estudo? Quais as estratégias utilizadas? Qual a
metodologia?
9 Você considera o número de encontros para estudo do material do curso adequado?
10 O local onde acontece o estudo é adequado ou faltam algumas adequações?
11 Você apontaria algumas sugestões para melhorar o Programa Pró-Letramento?Quais?
195
APÊNDICE C – Roteiro da Entrevista Final com a Professora Ana (1ª fase 1º ciclo)
1 Você acha difícil trabalhar com livro didático na alfabetização, por quê?
2 De onde você busca material pedagógico para subsidiar sua prática?
3 Você ainda usa algumas cartilhas para a elaboração de seus planos?
4 E a leitura como você trabalha? Fale um pouco sobre isso.
5 Percebi tanto na entrevista, quanto na observação em sala que você realmente é bastante
afetiva com as crianças, você acha que a afetividade interfere no desenvolvimento das
capacidades das crianças, de que maneira?
6 Numa pergunta anterior você me respondeu que os erros das crianças na escrita são
ensaios, mas percebi nas observações que a correção é feita rigorosamente, por quê? Como
você encara essas etapas da aprendizagem infantil?
7 Outra coisa que você me disse é que se utiliza de vários métodos para alfabetizar, que não
segue um apenas, mas, nesses seus dezessete anos como professora alfabetizadora, qual o
método que você mais utilizou? Qual o método que você acredita que dá resultados mais
eficazes? Por quê?
8 Você acha que os alunos estranharam a minha presença na sala? Houve alguma mudança
de comportamento deles ou não? Explique:
9 O fato de eu ter um dia específico para vir à escola nas observações em sala, fez com que o
trabalho com a produção textual se modificasse, ampliasse ou reduzisse?
10 Percebi que o caderno de produção de texto é separado do caderno de atividades de
português, por quê?
11 Você disse que trabalha a alfabetização (codificação e decodificação) junto com o
letramento (função da escrita). Você acha que é possível fazer isso com todas as atividades
propostas em sala? De que forma?
12 No decorrer das observações, percebi que você trabalhou com texto narrativo, bilhete,
poesia, anúncio, fábulas, etc. Qual o motivo da escolha desses gêneros? Você encontra
dificuldades para trabalhar algum desses gêneros na primeira fase?
13 Com o Ensino Fundamental de 9 anos, crianças mais novas, de seis anos, chegam ao
primeiro ano? O que você acha dessa proposta?
14 Essas crianças precisam de um trabalho diferente? Qual seria?
15 Como você inicia o processo de alfabetização? Aponte algumas atividades que você
desenvolve com vistas à criança perceber a correspondência letra-som.
196
16 Você aponta que o pró-letramento, lhe deu uma noção sobre a organização do trabalho, não
é? Mas como você organiza o trabalho com a produção? Você segue uma sequência de
atividades? Como é isso?
17 Na entrevista inicial, você fala da desistência dos cursistas do pró-letramento. Que o curso
começou com um grupo grande e foi diminuindo, o que você apontaria como hipóteses
para essa desistência?
197
APÊNDICE D – Roteiro da Entrevista Final com a Professora Bia (2ª Fase 1º Ciclo)
1 Pela sua fala anterior e relembrando a sua formação inicial (magistério) você me disse
que naquela época não tinha outra opção a não ser escolher o magistério (para as
mulheres) ou contabilidade (para os homens) . Se você pudesse optar por outra profissão,
qual seria? O que você pensa a respeito dessa profissão: ser professor? E para ser
professor, o que é preciso?
2 Você acompanha a sua turma desde a primeira fase, por uma determinação da escola, ou
seja, foi a escola que propôs essa organização do trabalho devido ao ciclo de formação
humana, correto? Você concorda com essa organização, ou acha que seria melhor
escolher uma fase específica, com a qual você se identifique mais?
3 Você me informou que não usa nenhuma cartilha, não segue nenhum livro. De onde você
busca material pedagógico para subsidiar sua prática? Você ainda segue algumas cartilhas
para a elaboração de seus planos?
4 Outra coisa que você me disse é que se utiliza de vários métodos para alfabetizar, que não
segue um apenas, mas, nesses seus quinze anos como professora alfabetizadora, qual o
método que você mais utilizou? Qual o método que você acredita que dá resultados mais
eficazes? Por quê?
5 E o trabalho com a leitura como ele é realizado?
6 Com o Ensino Fundamental de 9 anos, crianças mais novas, de seis anos, chegam ao
primeiro ano? O que você acha dessa proposta?
7 Essas crianças precisam de um trabalho diferente? Qual seria?
8 Você disse que trabalha a alfabetização (codificação e decodificação) junto com o
letramento (função da escrita). Você acha que é possível fazer isso com todas as
atividades propostas em sala? De que forma?
9 Com a sua participação nas formações continuada, você afirma ter modificado a sua
prática em sala de aula, que metodologia você adotou, ao longo de sua caminhada como
alfabetizadora, que contribuiu para a melhoria de sua prática? Aponte algumas:
10 Você coloca como situações que interferem na obtenção de bons resultados na
alfabetização a desestrutura social, familiar e a falta de interesse dos alunos, correto? A
que você atribuiria à falta de interesse dos alunos? Qual seria o motivo pelo qual o aluno
não se interessa?
11 Quais os alunos da sua sala de aula que você considera desinteressados e por quê?
198
12 Você aponta que o pró-letramento além de trazer conhecimentos sobre os eixos (1)
compreensão e valorização da cultura escrita; (2) apropriação do sistema de escrita; (3)
leitura; (4) produção de textos escritos; (5) desenvolvimento da oralidade; também te deu
uma noção sobre a organização do trabalho, não é? Mas como você organiza o trabalho
com a produção? Você segue uma sequência de atividades? Como é isso?
13 No decorrer das observações, percebi que você trabalhou com texto narrativo, música,
bilhete, história em quadrinho, história sequenciada, poesia, fábulas, listas. Qual o motivo
da escolha desses gêneros?
14 Você acha que os alunos estranharam a minha presença na sala? Houve alguma mudança
de comportamento deles ou não? Explique:
15 O fato de eu ter um dia específico para vir à escola nas observações em sala, fez com que
o trabalho com a produção textual se modificasse, ampliasse ou reduzisse?
16 Percebi que o caderno de produção de texto é separado do caderno de atividades de
português, por quê?
17 Observei que você corrige todas ou a maioria das palavras escritas de forma diferente da
norma padrão, ortografia, principalmente. Você faz isso desde a primeira fase? Qual seria
seu critério para essas correções? Por quê?
199
APÊNDICE E – Roteiro da Entrevista Final com a Professora Carina (3ª Fase 1º Ciclo)
1 Pela sua fala anterior e relembrando a sua formação inicial (magistério) você me disse que
naquela época não tinha outra opção a não ser escolher o magistério (para as mulheres) ou
contabilidade (para os homens). No seu caso, penso que as coisas foram acontecendo, sua
família tem um histórico de profissionais da educação (mãe, tios, tias, etc.), mas, se você
pudesse optar por outra profissão, qual seria?
2 O que você pensa a respeito dessa profissão: ser professor?
3 E para ser professor, o que é preciso?
4 Você acompanha a sua turma desde a primeira fase, por uma determinação da escola, ou
seja, foi a escola que propôs essa organização do trabalho devido ao ciclo de formação
humana, correto? Você concorda com essa organização, ou acha que seria melhor escolher
uma fase específica, com a qual você se identificasse mais?
5 Você me informou que não usa nenhuma cartilha, não segue nenhum livro. De onde você
busca material pedagógico para subsidiar sua prática?
6 Você ainda segue algumas cartilhas para a elaboração de seus planos?
7 Outra coisa que você me disse é que se utiliza de vários métodos para alfabetizar, que não
segue um apenas, mas, nesses seus dezesseis anos como professora alfabetizadora, qual o
método que você mais utilizou? Qual o método que você acredita que dá resultados mais
eficazes? Por quê?
8 Você disse que trabalha a alfabetização (codificação e decodificação) junto com o
letramento (função da escrita). Você acha que é possível fazer isso com todas as atividades
propostas em sala? De que forma?
9 Percebi que a leitura é feita regularmente, no início da aula, por uma das crianças, que
gostam muito de ler. Você que os incentiva? De que forma?
10 Quais os trabalhos que você desenvolve com a leitura e que dão bons resultados?
11 Com a sua participação nas formações continuada, você afirma ter modificado a sua prática
em sala de aula, que metodologia você adotou, ao longo de sua caminhada como
alfabetizadora, que contribuiu para a melhoria de sua prática? Aponte algumas:
12 Você coloca como situações que interferem na obtenção de bons resultados na
alfabetização a desestrutura social, familiar e a falta de interesse e de compromisso dos
pais. A que você atribuiria esse descompromisso por parte da família?
13 Com o Ensino Fundamental de 9 anos, crianças mais novas, de seis anos, chegam ao
primeiro ano? O que você acha dessa proposta?
200
14 Essas crianças precisam de um trabalho diferente? Qual seria?
15 Você aponta que o pró-letramento além de trazer novos conhecimentos, também te deu
uma noção sobre a organização do trabalho, a sequenciação de atividades, não é? Mas
como você organiza o trabalho com a produção? Você segue uma sequência de atividades?
Como é isso? Qual é o nome que você atribui a essa organização?
16 No decorrer das observações, percebi que você trabalhou com texto narrativo, bilhete,
cartas, textos informativos, poesia, fábulas, listas, cardápio, convites, etc.. Qual o motivo
da escolha desses gêneros? Quais os que você considera mais voltados para a primeira,
para a segunda e para a terceira fases? Existe alguma progressão ou não?
17 Você cita o trabalho coletivo na escola como um dos fatores que contribuíram muito na sua
prática como alfabetizadora, não é? Como é esse trabalho coletivo aqui em sua escola? Ele
ainda acontece? De que forma?
18 Você acha que os alunos estranharam a minha presença na sala? Houve alguma mudança
de comportamento deles ou não? Explique:
19 O fato de eu ter um dia específico para vir à escola nas observações em sala, fez com que
o trabalho com a produção textual se modificasse, ampliasse ou reduzisse?
20 Percebi que o caderno de produção de texto é separado do caderno de atividades de
português, por quê?
21 Observei que você corrige e reestrutura todos os textos dos alunos. Você faz isso desde a
primeira fase?
22 Quais e quantos alunos que apresentam dificuldades e quais são essas dificuldades?
23 Quais e quantos alunos você considera aptos ao segundo ciclo?