memÓrias da ponte internacional da mizade

183
UNIVERSIDADE ESTADUAL DO OESTE DO PARANÁ CENTRO DE EDUCAÇÃO, LETRAS E SAÚDE CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU EM SOCIEDADE, CULTURA E FRONTEIRAS NÍVEL DE DOUTORADO ÁREA DE CONCENTRAÇÃO EM SOCIEDADE, CULTURA E FRONTEIRAS MILENA COSTA MASCARENHAS MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA AMIZADE: REPRESENTAÇÕES DE UM ESPAÇO BINACIONAL FOZ DO IGUAÇU PR 2021

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Page 1: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

UNIVERSIDADE ESTADUAL DO OESTE DO PARANÁ

CENTRO DE EDUCAÇÃO, LETRAS E SAÚDE

CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU EM SOCIEDADE, CULTURA

E FRONTEIRAS – NÍVEL DE DOUTORADO

ÁREA DE CONCENTRAÇÃO EM SOCIEDADE, CULTURA E FRONTEIRAS

MILENA COSTA MASCARENHAS

MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA AMIZADE:

REPRESENTAÇÕES DE UM ESPAÇO BINACIONAL

FOZ DO IGUAÇU – PR

2021

Page 2: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

MILENA COSTA MASCARENHAS

MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA AMIZADE:

REPRESENTAÇÕES DE UM ESPAÇO BINACIONAL

Tese apresentada à Universidade Estadual do Oeste do Paraná –

UNIOESTE – para obtenção do título de Doutora em Sociedade,

Cultura e Fronteiras, junto ao Programa de Pós-Graduação Stricto

Sensu em Sociedade, Cultura e Fronteira – Mestrado e Doutorado –

Área de concentração em Sociedade, Cultura e Fronteiras. Linha de

Pesquisa: Território, História e Memória.

Orientador: Prof. Dr. Samuel Klauck.

FOZ DO IGUAÇU – PR

2021

Page 3: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

Ficha de identificação da obra elaborada através do Formulário de Geração Automática do Sistema de Bibliotecas da Unioeste.

Mascarenhas, Milena

Memórias da Ponte Internacional da Amizade :

representações de um espaço binacional / Milena Mascarenhas;

orientador(a), Samuel Klauck, 2021.

181 f.

Tese (doutorado), Universidade Estadual do Oeste do

Paraná, Campus de Foz do Iguaçu, Centro de Educação, Letras

e Saúde, Programa de Pós-Graduação em Sociedade, Cultura e

Fronteiras, 2021.

1. Ponte Internacional da Amizade. 2. História. 3.

Representações. 4. Fotografias. I. Klauck, Samuel. II.

Título.

Page 4: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

MILENA COSTA MASCARENHAS

MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA AMIZADE:

REPRESENTAÇÕES DE UM ESPAÇO BINACIONAL

Esta tese foi julgada adequada para a obtenção do Título de Doutora em Sociedade, Cultura e

Fronteiras e aprovada em sua forma final pelo Programa de Pós-graduação Stricto Sensu em

Sociedade, Cultura e Fronteiras – Mestrado e Doutorado, área de concentração em Sociedade,

Cultura e Fronteiras, da Universidade Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE.

COMISSÃO EXAMINADORA

_________________________________

Prof. Dr. Samuel Klauck

Orientador

_________________________________

Prof. Dr. Leandro Baller

Membro Efetivo (Convidado)

_________________________________

Profa. Dra. Andressa Szekut

Membro Efetivo (da Instituição)

_________________________________

Prof. Dr. Paulo Renato Silva

Membro Efetivo (Convidado)

_________________________________

Prof. Dr. Valdir Gregory

Membro Efetivo (da Instituição)

Foz do Iguaçu, 14 de dezembro de 2020.

Page 5: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

AGRADECIMENTOS

À oportunidade de realizar o curso de Doutorado na UNIOESTE de maneira pública e

gratuita. Aos professores do Programa de Pós-Graduação stricto sensu, em Sociedade, Cultura

e Fronteiras Profa. Dra. Denise Rosana da Silva Moraes, Profa. Dra. Josiele Kaminski Corso

Ozelame, Prof. Dr. Mauro José Ferreira Cury, Profa. Dra. Maria de Fátima Ribeiro, Prof. Dr.

Samuel Klauck e Profa. Dra. Silvana Aparecida de Souza, pelas aulas ministradas.

Aos professores Dr. José Carlos dos Santos e Dr. Valdir Gregory participantes do

seminário de tese, primeiros leitores da pesquisa que muito contribuíram para o seu

redirecionamento. Aos professores Dra. Regina Coeli Machado e Silva, Dra. Andressa Szekut

e ao Dr. Paulo Renato Silva por participarem da banca examinadora da qualificação,

contribuindo com excelentes sugestões, apontamentos e críticas.

Em especial, ao Prof. Dr. Samuel Klauck, meu orientador, por ter ampliado a visão na

pesquisa com indicações bibliográficas e debates acerca do tema, agradeço a dedicação nas

orientações da pesquisa.

Aos colegas do doutorado que muito contribuíram com discussões, debates e feedbacks

ampliando a compreensão da minha própria pesquisa e as amizades constituídas, destaco a

parceria intelectual com Mac Donald Fernandes, Claudio Melo e Solange Portz.

Aos queridos familiares e amigos que me incentivaram e estiveram presentes na

constituição dessa jornada sabendo respeitar as ausências pacientemente nas inúmeras horas de

estudo e escrita. Destaco o Engenheiro Amin Lascani e o Arquiteto Everton Santos, pela

contribuição em dúvidas pontuais e técnicas da pesquisa.

Aos entrevistados, Engenheiro Sr. Vicente Veríssimo Júnior, chefe de serviço da

unidade do local de Foz do Iguaçu, e o Sr. José Riquelme responsável pelo Museu El Mensú

(2018), agradeço o acolhimento, esclarecimentos e testemunhos.

Agradeço, desde já, aos professores Dra. Andressa Szekut, ao Dr. Leandro Baller, ao

Dr. Paulo Renato Silva, e ao Dr. Valdir Gregory por participarem da banca de defesa final e por

suas apreciações.

À Universidade Estadual do Oeste do Paraná por propiciar as ferramentas necessárias

para o desempenho da pesquisa.

E, especialmente, ao Guilherme Kunz, minha ponte que ajuda a transpor qualquer

obstáculo, parceiro de vida, sou grata pelo exemplo, pelos debates e pelo incentivo.

Page 6: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

RESUMO

Essa pesquisa de doutorado focaliza-se na Ponte Internacional da Amizade, a primeira na

região trinacional, ligando, sobre o rio Paraná, os municípios de Ciudad del Este, Paraguai

e Foz do Iguaçu, Brasil, inaugurada em 1965. O trabalho justifica-se no sentido de dar

visibilidade as diferentes memórias entorno da ponte, muitas vezes naturalizadas em

insígnias ou discursos. O objetivo central é analisar e compreender a Ponte Internacional da

Amizade a partir de uma visão periscópica das memórias e representações no percurso de

sua construção, para isso, os seguintes objetivos específicos foram desenvolvidos: a)

discutir os conceitos de paisagem, fronteira, memória e modernidade; b) identificar os

motivos (políticas, econômicas e sociais) que levaram Paraguai e Brasil em construírem a

ponte, e os impactos pós construção; c) compreender a importância da ponte no quesito

mobilidade e ocupação da região; d) construir a história da Ponte Internacional da Amizade

a partir das imagens, apresentando as especificidades técnicas, os usos políticos e turísticos,

bem como suas representações nas imagens e discursos. Trata-se de um estudo

interdisciplinar, utilizando o aporte teórico-metodológico da História Cultural. Com esse

propósito, o método indiciário proposto pelo historiador Carlo Ginzburg é empregado na

investigação, principalmente no olhar, ao capturar rastros, sinais e vestígios que pudessem

auxiliar nessa incursão, no qual necessitou de uma leitura atenta, voltada aos detalhes,

conexões e construções. A tese estrutura-se em três capítulos, o primeiro discute as

fundamentações teorica-metodologicas que deram suporte às reflexões, análises,

interpretações, e como utilizar as fontes selecionadas, que são entrevistas, fotografias,

insígnias, discursos oficiais, revistas, jornais entre outras. O segundo capítulo, traz a

importância e relevância da construção da Ponte Internacional da Amizade sobre o rio

Paraná para os países Brasil e Paraguai, bem como os motivos para sua viabilização. Para

tal, traçou-se um panorama do espaço fronteiriço situando-o no sistema hidrográfico versus

rodoviário, procurando inquirir as causas incentivadoras para ligar fisicamente a fronteira.

E o terceiro capítulo contextualiza a construção da ponte a partir das imagens, por meio do

uso de fotografias. Conclui que a ponte é muito mais que uma obra de engenharia, tem valor

técnico, histórico, cultural e é depositária de um importante patrimônio binacional. E,

também, que é um elemento arquitetônico que une os interesses do Brasil e do Paraguai,

representando mobilidade de nível continental, transformando a paisagem integrando-se ao

cenário do rio Paraná construindo novas dinâmicas entorno da fronteira.

PALAVRAS-CHAVE: Ponte Internacional da Amizade, memórias, imagens,

representações.

Page 7: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

ABSTRACT

This research concentrates on the International Friendship Bridge,opened in 1965, the first in

the tri-national region over the Paraná River between the cities of Ciudad del Este, Paraguay,

and Foz do Iguaçu, Brazil. The work gives visibility to the different memories around the bridge

in insignia or speeches. The main objective is to analyze and understand the International

Friendship Bridge from a periscopic view of memories and representations. The specifics

objectives are: to discuss the concepts of landscape, border, memory, and modernity; to identify

the reasons (political, economic, and social) that led Paraguay and Brazil to make the bridge

and the construction impacts; understand the importance of the bridge in the prospect of

mobility and occupation in the region; make the history of the International Friendship Bridge

from the images, displaying the technical specificities, the political and tourist uses, as well as

their representations in the photos and speeches. It is an interdisciplinary approach, using the

theoretical and methodological contributions of Cultural History. The method proposed by the

historian Carlo Ginzburg is used in the investigation, mainly in the perceptions, when capturing

traces, signs, and evidence that could assist in this incursion, in which was need careful reading,

focus on details, connections, and constructions. This thesis has three chapters. The first chapter

discusses the theoretical-methodological foundations that supported the reflections, analyzes,

interpretations, and how to use the selected sources, like interviews, photographs, insignia,

official speeches, magazines, newspapers, among others. Chapter two presents the importance

and relevance of the construction of the International Friendship Bridge over the Paraná River

to Brazil and Paraguay. It shows a panorama of the border, analyzing the hydrographic versus

road system, attempting to investigate the causes of that connected frontier. The third chapter

contextualizes the construction of the bridge from the images. It concludes that the bridge is

much more than an engineering work. This bridge has technical, historical, ethnographic values.

The International Friendship Bridge is a depository of an important binational heritage.

And, also, that it is an architectural element that fuses the interests of Brazil and Paraguay,

representing continental level mobility, transforming the landscape by integrating itself with

the scenery of the Paraná River, and building a new dynamic around the border.

KEYWORDS: International Friendship Bridge, memories, images, representations.

Page 8: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

Lista de Figuras

Imagem 1 – Encontro do presidente do Brasil Ernesto Geisel (à esquerda) e do Presidente do

Paraguai Alfredo Stroessner (à direita) na Ponte da Amizade em 1978. ................................. 24 Imagem 2 – Bandeira de Foz do Iguaçu (2001). ...................................................................... 28 Imagem 3 – Bandeira de Foz do Iguaçu (1966). ...................................................................... 29 Imagem 4 – À esquerda a bandeira do Departamento do Alto Paraná, e a direita a bandeira da

Ciudad del Este. ........................................................................................................................ 29 Imagem 5 – Selo comemorativo (1961) de Inauguracion Puente Internacional Paraguay

Brasil. ....................................................................................................................................... 31 Imagem 6 – Filatelias. O primeiro de 1972 e o segundo, é o selo comemorativo (1983) de 25

anos da Ciudad Presidente Stroessner. ..................................................................................... 32 Imagem 7 – Cédula de Diez Guaranies, do Paraguai. .............................................................. 33 Imagem 8 – Moeda comemorativa – Puente de La Amistad (1975). ....................................... 34 Imagem 9 – Cartão postal com a ilustração da Ponte da Amizade. s/d. ................................... 34 Imagem 10 – Logo “Olimpiada de Historia” – Ciudad del Este e Alto Paraná. ...................... 35 Imagem 11 – Ponte da Amizade. Suplemento da Folha de Londrina, 24 mai a 07 jun. 1997.

Ano 3, Nº 66. ............................................................................................................................ 36 Imagem 12 – Desenhos do Concurso de Desenho “Diversidade e Identidade: Nosso

Patrimônio. s/a. ......................................................................................................................... 39 Imagem 13 – À esquerda a Ponte Internacional da Amizade antes da reforma e a direita após a

reforma...................................................................................................................................... 42 Imagem 14 – Vista área da região trinacional. ......................................................................... 50 Imagem 15 – Vista área da Ponte Internacional da Amizade – Paraguai (lado esquerdo) e

Brasil (lado direito). Foto: Alexandre Marchetti (2009). ......................................................... 53 Imagem 16 – Vista da Ilha de Acaray no rio Paraná. ............................................................... 54 Imagem 17 – Vista aérea da região binacional sobre o rio Paraná. .......................................... 54 Imagem 18 – Vista aérea da região binacional sobre o rio Paraná. .......................................... 55 Imagem 19 – À esquerda um empurrador de comboio-tipo e a direita um tritem. .................. 58 Imagem 20 – A Bacia do rio Paraná, com principal afluente, o rio Tietê. ............................... 59 Imagem 21 – Mapa do município de Foz do Iguaçu. 1929. s/a. ............................................... 62 Imagem 22 – Porto de Foz do Iguaçu fazendo fronteira com o Porto Presidente Franco no

Paraguai. Autor: Schinke. s/d. .................................................................................................. 63 Imagem 23 – Mapa, com destaque no Paraguai. ...................................................................... 65 Imagem 24 – Mapa da Rodovia Transversal Pan-Americana. ................................................. 71 Imagem 25 – Matéria sobre o papel do exército na conclusão da BR 277. Ano XXXIX. Nº 06.

05 de novembro de 1966. Foto: Fernando Seixas. ................................................................... 74 Imagem 26 – Perfil de avançamento da Ponte Internacional da Amizade elaborado pelo

DNER. ...................................................................................................................................... 74 Imagem 27 – Desenho da Ponte da Amizade comparando com outras edificações. ................ 77 Imagem 28 – Construções em arco........................................................................................... 78 Imagem 29 – Encontro de JK e Stroessner em Foz do Iguaçu (06/10/1956). .......................... 95 Imagem 30 – A esquerda, JK visitando as Cataratas do Iguaçu. A direita, JK e comitiva

vistoriando a construção da ponte. Ano 1958. ......................................................................... 97 Imagem 31 – A Ata da fundação da cidade Puerto Flor de Lis (Ciudad del Este), de 03 de

fevereiro de 1957. ................................................................................................................... 100 Imagem 32 – Início da construção do edifício de administração da Alfândega na cidade de

Puerto Presidente Stroessner, atual Ciudad del Este. ............................................................ 101 Imagem 33 – Mapa do Paraguai, com os 17 departamentos. ................................................. 103

Page 9: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

Imagem 34 – Ponte da Amizade (1995). ................................................................................ 107 Imagem 35 – Presidente do Brasil Arthur da Costa e Silva e Presidente do Paraguai Alfredo

Stroessner, na inauguração da BR 277 em 27 de março de 1969. .......................................... 109 Imagem 36 – A esquerda a ponte em 1965 e a direita a ponte em 2009. ............................... 111 Imagem 37 – Início da construção da superestrutura, que dará o acesso de um lado ao outro da

ponte. s/a. Fonte: Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes – DNIT, Foz do

Iguaçu, PR. Acervo digital. .................................................................................................... 116 Imagem 38 – Observando as obras. ........................................................................................ 117 Imagem 39 – Vista do rio Paraná de onde a Ponte seria construída. s/a. ............................... 118 Imagem 40 – O Sr. Ari Ojeda mostrando a foto da equipe de topógrafos que trabalharam na

Ponte da Amizade. s/a. Fonte: CLICKFOZ. Disponível em:

<https://www.youtube.com/watch?v=1mZ_H5RiqfU>. Acesso em: 30 abr. 2020. .............. 120 Imagem 41 – Foto da equipe de topógrafos em frente ao DNER. s/a. Fonte: CLICKFOZ.

Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=1mZ_H5RiqfU>. Acesso em: 30 abr.

2020. ....................................................................................................................................... 120 Imagem 42 – Propaganda da Fábrica Nacional de Motores – FNM. Ano 1960 / Edição 0051.

................................................................................................................................................ 121 Imagem 43 – Transporte das peças para a construção da Ponte da Amizade, passando por São

Miguel do Iguaçu. ................................................................................................................... 121 Imagem 44 – Pilar central. ...................................................................................................... 123 Imagem 45 – O pilar, no qual a base encontra-se a fundação da estrutura, já concretado e a

fase de construção do arco. ..................................................................................................... 124 Imagem 46 – Sistema de teleférico para transportar materiais para o outro lado do rio. ....... 125 Imagem 47 – A vista do cibramento e os trabalhadores em ação........................................... 126 Imagem 48 – Avanço simultâneo entre os vãos na construção da Ponte da Amizade. .......... 127 Imagem 49 – Arco sendo construído da Ponte da Amizade. .................................................. 128 Imagem 50 – O arco com a treliça de aço para o escoramento da parte central do concreto. A

armação abaixo é o reticulado em concreto armado............................................................... 129 Imagem 51– Retirada das treliças. Ponte Internacional da Amizade. s/a, s/d. ....................... 129 Imagem 52 – A Ponte Internacional da Amizade com a armação sustentando o arco. .......... 130 Imagem 53 – Tirando as esquadras. s/a, s/d. .......................................................................... 131 Imagem 54 – Os presidentes JK e Stroessner e comitiva vistoriando a construção da ponte.

Ano 1958. ............................................................................................................................... 132 Imagem 55 – I Inauguração da Ponte Internacional da Amizade (26/01/1961). .................... 135 Imagem 56 – Capa da Revista Estrellas, PY. Paraguai e Brasil (1940-1988). ....................... 136 Imagem 57 – Matéria sobre a Ponte da Amizade. Ao lado direito destaque da imagem

Stroessner e JK. ...................................................................................................................... 137 Imagem 58 – As madeiras colocadas para a pré-inauguração da ponte em 1961. ................. 138 Imagem 59 – Placa comemorativa da inauguração da Ponte da Amizade em 1961 pelos

presidentes Alfredo Stroessner do Paraguai e Juscelino Kubitschek do Brasil. ..................... 139 Imagem 60 – Placa informativa com os dados da Ponte da Amizade. ................................... 140 Imagem 61 – Trabalhadores na finalização dessa etapa da obra. ........................................... 141 Imagem 62 – Ponte Internacional da Amizade, em fase de finalização. ................................ 142 Imagem 63 – III Inauguração da Ponte Internacional da Amizade. ....................................... 143 Imagem 64 – III Inauguração da Ponte Internacional da Amizade. ....................................... 144 Imagem 65 – III Inauguração da Ponte Internacional da Amizade. Captura de imagem do

filme produzido pela Agência Nacional. ................................................................................ 145 Imagem 66 – Os Presidentes Castelo Branco e Alfredo Stroessner durante a inauguração da

Ponte Internacional da Amizade (27/03/1965). ...................................................................... 145 Imagem 67 – A placa comemorativa da inauguração da Ponte da Amizade (27/03/1965). ... 146

Page 10: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

Imagem 68 – Discurso do Presidente Castelo Branco durante a inauguração da Ponte da

Amizade. ................................................................................................................................. 146 Imagem 69 – Inauguração da Ponte Internacional da Amizade. ............................................ 149 Imagem 70 – Inauguração da Ponte Internacional da Amizade – 1965. Captura de imagem do

filme produzido pela Agência Nacional. ................................................................................ 149 Imagem 71 – Obelisco na Ponte Internacional da Amizade. s/a, s/d...................................... 150 Imagem 72 – Ponte Internacional da Amizade. s/d, s/a.......................................................... 150 Imagem 73 – Ponte Internacional da Amizade. ...................................................................... 151 Imagem 74 – Entrada para Aduana Brasileira. ....................................................................... 152 Imagem 75 – Família Otremba e Sottomaior — em Foz do Iguacu. ..................................... 153 Imagem 76 – Um homem posando na Ponte da Amizade. ..................................................... 154 Imagem 77 – Um homem de mochila nas costas posando no meio da pista da Ponte da

Amizade. ................................................................................................................................. 154 Imagem 78 – O rio Paraná seco sob a Ponte 1982 – Foz do Iguaçu, PR................................ 155 Imagem 79 – O rio Paraná seco sob a Ponte 2020 – Foz do Iguaçu, PR................................ 156 Imagem 80 – Cartão Postal da Ponte Internacional da Amizade, PY. ................................... 158 Imagem 81 – Cartão Postal da Ponte Internacional da Amizade. .......................................... 159

Page 11: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

Sumário

INTRODUÇÃO ........................................................................................................................ 9

CAPÍTULO I .......................................................................................................................... 18

COMO E ONDE OLHAR A PONTE? REFLEXÕES SOBRE AS

FUNDAMENTAÇÕES TEÓRICA-METODOLÓGICAS ................................................. 18

1.1 MARCO TEÓRICO-METODOLÓGICO ................................................................................... 18

1.2 SOBRE AS FONTES ............................................................................................................ 19

1.3 A PONTE DA AMIZADE: TRANSGRIDE A FRONTEIRA OU TORNA-SE FRONTEIRA? ............... 23

1.4 INDÍCIOS INVESTIGATIVOS: PONTE PARA NOVAS REFLEXÕES ........................................... 26

1.5 A CONSTRUÇÃO DA PONTE TRANSFORMANDO PAISAGENS E ELEGENDO PATRIMÔNIOS..... 37

1.6 QUANDO A MODERNIDADE ABRE NOVOS CAMINHOS ........................................................ 43

1.7 FOTOGRAFIA COMO MÉTODO PARA ANALISAR OS VESTÍGIOS ........................................... 45

CAPÍTULO II ......................................................................................................................... 52

A PONTE INTERNACIONAL DA AMIZADE .................................................................. 52

2.1. ESTACIONANDO O OLHAR NA PONTE .............................................................................. 52

2.2. O RIO PARANÁ: A DANÇA SOB A PONTE ........................................................................... 56

2.3. POR QUE PARAGUAI E BRASIL QUERIAM UMA PONTE? .................................................... 64

2.4. A ENGENHARIA DA PONTE .............................................................................................. 74

2.4.1 Estudos técnicos para a construção da ponte ......................................................... 78

2.5. A AMIZADE SELADA NA PONTE ...................................................................................... 82

2.6. ACORDOS INTERNACIONAIS ............................................................................................ 89

2.7. EFEITOS ENTORNO DA PONTE INTERNACIONAL DA AMIZADE ......................................... 99

CAPÍTULO III ..................................................................................................................... 112

A PONTE ENTRE A MEMÓRIA E A FOTOGRAFIA .................................................. 112

3.1. HISTÓRIA VISUAL: CONSIDERAÇÕES TEÓRICO-METODOLÓGICAS .................................. 112

3.2. A PONTE FOTOGRAFADA: FRAGMENTOS DO REAL ......................................................... 115

3.2.1 Análise fotográfica ................................................................................................ 115

3.2.2 Diferentes Representações sobre a Ponte ............................................................. 131

3.2.3 Cartão Postal: Obra inolvidável ........................................................................... 156

CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................................................................................... 161

FONTES ................................................................................................................................ 164

REFERÊNCIAS INFOGRÁFICAS .................................................................................... 168

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................................... 175

Page 12: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

9

INTRODUÇÃO

Pontes transformam paisagens.

A autora.

As pontes ligam, conectam, aliam, associam, unem, vinculam e relacionam. Serve para

aproximar, acessar, desobstruir e/ou desviar. Propicia passagem sobre obstáculos, serve para

beneficiar ou colocar uma sociedade em combate. Liga as pessoas ou as distancia, dependendo

dos seus objetivos. Pode-se aproximar povos ou colonizá-los a partir da apropriação do trajeto

estabelecendo tributos, pedágios e impostos.

Pontes existem desde que o homem se deu conta da sua capacidade de construir e

facilitar sua vida. A ponte também tem relação com a comunicação, pois, de uma forma lato

sensu, a palavra, nada mais é do que uma ligação entre interlocutores. Já, o estreitamento

fronteiriço entre dois países pode-se dar através de uma ponte, demarcando a fronteira, mas

também tornando-a mais acessível.

Na antiguidade, o Heródoto (480-485 a.e.c – 420-425 a.e.c), considerado o pai da

História, ficou provavelmente extasiado com a manobra militar dos persas, que em batalha com

os gregos, decidiram atravessar o Helesponto para submetê-los e, para tal feito, era necessário

construir uma ponte, assim, segue a descrição de Heródoto:

Os encarregados da construção da ponte iniciaram-na [...]. Aconteceu, porém,

que, logo que a ponte foi dada por terminada, levantou-se uma terrível

tempestade, rompendo os cordames e despedaçando os navios.

Sabedor do ocorrido, Xerxes, indignado, [...] ordenou a um dos executores que

proferisse este discurso bárbaro e insensato: “Onda traiçoeira, teu senhor

assim te pune porque o ofendeste sem que ele te houvesse dado motivo para

isso. O rei Xerxes passara por ti, quer queiras, quer não. E com razão que

ninguém te oferece sacrifícios, pois que és um rio traidor e vil”. Depois de

castigar assim o mar, fez cortar a cabeça dos que haviam dirigido a construção

da ponte (HERÓDOTO, p. 529).

E assim, procedeu Xerxes, conseguiu atravessar o Helesponto, resistindo à correnteza,

aos ventos e ondas, graças à proeza técnica dos engenheiros. Heródoto, registrou tal feito, e

deve ter se espantado com a atitude dos “barbaros” diante de uma fronteira, não a vendo como

algo intransponível, pelo contrário, não interessava se era possível ou não, ela seria

“acorrentada” e passaria por ela um caminho fixo e submisso.

Tal relato, contribuiu para a reflexão sobre a ação dos homens dominando obstáculos e

transgredindo barreiras. Com objetivos díspares, na região binacional sobre o rio Paraná,

Page 13: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

10

também lançaram uma ponte, e trouxeram desafios para a engenharia, ou seja, como construir

uma ponte mantendo a navegabilidade no rio, mesmo em grandes cheias? E eis a obra da

engenharia, um vão de 78 metros, do alto até o fundo do rio foi projetado, agregando uma

expressão estética que causa admiração até hoje. A Ponte da Amizade que abraça o rio Paraná,

com o arco de concreto, garantiu recorde mundial, considerado por alguns como uma obra de

arte da arquitetura, recebe uma passarela que oportuniza alcançar outro país, assegurando a

vista sobre o rio e a densa vegetação que contorna o espaço líquido.

Foz do Iguaçu é conhecida por uma das maiores hidrelétricas do Mundo, mas a primeira

obra de engenharia de maior importância para o município é sem dúvida a Ponte da Amizade,

destacando-se na paisagem binacional, onde diariamente é reforçada pela mídia, com o jargão

“vamos ver como está o movimento na Ponte na Amizade”, introjetando na memoria uma

mobilidade que milhares percorrem todos os dias.

O rio Paraná, esse espaço líquido, demarca a fronteira tornando-a paradoxalmente

indefinida. Qual é a água do Brasil e qual é a do Paraguai? Na impossibilidade de partilhá-la, a

fronteira torna-se fluída e indefinida. Entretanto, não deixa de ser um limite, um obstáculo, uma

barreira aos viandantes, recorrendo aos transportes aquáticos para atravessar ao encontro do

outro país. O trânsito hidrográfico no rio Paraná antes da ponte, era intenso, a circulação de

transportes e infraestrutura de portos construídos às margens refletem essa prática dinâmica

dessa “estrada fluida”.

A Ponte Internacional da Amizade, materializa no rio Paraná, um novo trânsito

fronteiriço e torna-se uma das responsáveis pela transformação da paisagem no seu entorno.

Considera-se um importante monumento1 na região fronteiriça Brasil-Paraguai, compreendida

como algo que une, diminui barreiras, facilita o acesso, aumenta o trânsito, facilita migrações,

intensifica o comércio, atrai o ilícito e oculta inúmeras outras práticas, ou seja, uma intensa vida

com milhares de pessoas que frequentemente dela fazem uso. Demarcando a fronteira entre

Brasil e Paraguai, une e distancia em muitos contextos. Representa uma complexa rede de

interesses políticos, econômicos, sociais e culturais. Ou seja, o traço da união, ligando povos e

culturas também liga contradições e multiplicidades de memórias e significados em seu

entorno.

1 No Capítulo I será desenvolvido o conceito de monumento conforme a perspectiva teórica do Jacques Le Goff

(2003, p. 525).

Page 14: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

11

A cidade de Foz do Iguaçu2 faz fronteira também com a Argentina, por isso a

preocupacão do Brasil desde 1888 em estabelecer certa “vigilância”, no caso, através da colônia

militar e políticas de ocupação, garantindo a integridade do território brasileiro. As políticas,

mais efetivas de ocupação no Oeste Paranaense, iniciaram na década de 1930 estabelecendo um

contingente populacional que servisse aos propósitos relacionados à Segurança Nacional e

estabelecimentos de fronteiras, adotadas no Governo de Vargas (1930-1945).

Além disso, havia um grande interesse em aumentar as relações com os países

fronteiriços, em especial com o Paraguai e, com a ascensão de Stroessner (1954-1989), o Brasil

percebeu uma excelente oportunidade de ampliar a influência no país vizinho a partir da

expansão territorial, a chamada “marcha para o oeste”, investindo capital brasileiro além de se

beneficiar com os inúmeros incentivos fiscais proporcionados pelo Paraguai (LAINO, 1979, p.

244).

Para o governo paraguaio, a ligação fronteiriça sobre o rio Paraná tornou-se

fundamental, pois representava uma nova rota de comércio exterior e uma possibilidade de se

tornar independente do Porto de Buenos Aires (Argentina). Para isso, aproveitando a boa

relação com o Brasil e o recíproco interesse, solicitou a construção de uma ponte sobre o rio

Paraná que ligasse os países, colocando em prática a política denominada de “marcha para o

leste”.

Entre a “marcha para o oeste” e a “marcha para o leste”, Brasil e Paraguai foram ao

encontro dos seus interesses comerciais, econômicos, sociais e políticos. Ambos os países

realizaram acordos estabelecidos em 1941 de natureza comercial, cultural e econômica,

assinados pelos respectivos presidentes do Brasil e Paraguai, Getúlio Vargas (1882-1954) e

Higinio Morínigo (1897-1983) (MENEZES, 1987, p. 43), intensificando a relação com

Juscelino Kubitschek (1902-1976), presidente do Brasil entre 1956-1961, ao materializar as

intenções do Paraguai em ter uma saída em direção a leste, assinando o acordo de construção

de uma ponte sobre o rio Paraná em 1956.

No dia 06 de outubro do mesmo ano, em um ato simbólico, se encontraram no lugar

onde seria construída a ponte, chancelando o projeto que se tornou de importância fundamental

para ambos os países, marcando a história das relações Brasil-Paraguai, “o telegrama de

Stroessner para Juscelino dizia que os acontecimentos do dia 06 de outubro eram a melhor

prova da união americana sonhada por Bolívar. A resposta de Juscelino dizia que os novos

2 Foz do Iguaçu passou a ser chamada assim a partir de 1918. O município foi elevado a essa condição em 1914,

pela Lei nº 1383, quando foi criada a Vila Iguaçu.

Page 15: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

12

fatos, incluindo aquela ponte, representavam o ideal da união americana e da parceria entre

brasileiros e paraguaios” (MENEZES, 1987, p. 53).

Três inaugurações da ponte foram registradas, a primeira ocorreu no dia 26 de janeiro

de 1961, exatos quatro dias antes do término do governo de JK, no ano seguinte é apontada uma

segunda inauguração no dia 26 de março de 1962 e a terceira inauguração no dia 27 de março

de 1965, considerada a data oficial, pois foi efetivamente o marco do término, vincada no

obelisco, em placa em bronze, localizado no Brasil.

Estes eventos trouxeram a reflexão sobre os lugares de memória que Pierre Nora (1993)

fundamenta como uma forma de “bloquear o trabalho do esquecimento”, logo as reiterações

cerimoniais tornam um elemento de suma importância na fixação mnemônica. Bem como, as

insígnias discutidas na pesquisa, no sentido de entender as representações e atribuições de

significados no entorno da ponte.

A ponte foi construída entre 1956 e 1965 ligando, sobre o rio Paraná, o Paraguai com o

Brasil. Até a inauguração em 1965, os transeuntes de ambos os lados realizavam a travessia por

balsas, seja para visitarem amigos e parentes ou para comercializar do outro lado. Após a

construção da ponte o trânsito binacional foi se ressignificando, transformando a paisagem,

construindo novas práticas e também novas memórias nesse espaço transfronteiriço.

Em 2005, no aniversário de 40 anos da Ponte da Amizade, um evento comemorativo foi

organizado pela Fundação Cultural de Foz do Iguaçu, cujo slogan era “Brasil-Paraguai 40 anos

– Para tanta amizade uma ponte só é pouco3”, ou seja, uma tentativa de demonstrar a urgência

da construção de uma segunda ponte, necessidade já ratificada desde 1992 conforme os

levantamentos dos acordos estabelecidos entre Brasil e Paraguai4.

Quase vinte anos depois, no dia 10 de maio de 2019, a pedra fundamental da segunda

ponte entre os dois países é lançada em um grande cerimonial realizado no Marco das Três

Fronteiras em Foz do Iguaçu, com os presidentes Jair Bolsonaro do Brasil e Mario Abdo Benítez

do Paraguai. A construção ligará as cidades de Foz do Iguaçu e Puerto Presidente Franco,

criando nova possibilidade de fluxo existente na Ponte da Amizade. Já se planeja a construção

3 GAZETA DO PARANÁ, 16 fev. 2005, p. 4. 4 Em 1995 no Governo Fernando Henrique Cardoso estabeleceu-se o Decreto nº 1436 em 3 de abril, promulgando

um Acordo para a construção da Segunda Ponte Internacional sobre o Rio Paraná em Foz do Iguaçu de 26.09.1992,

no Governo de Fernando Collor. Depois, firmou-se o Decreto nº 6.676, de 4 de dezembro de 2008, promulga o

Acordo entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo da República do Paraguai para a

construção da Segunda Ponte Internacional sobre o Rio Paraná, firmado em Montevidéu, em 8 de dezembro de

2005, nos Governos de Luiz Inácio Lula da Silva. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2008/Decreto/D6676.htm>. Acesso em: 15 out. 2019.

Page 16: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

13

de uma terceira ponte5, cuja responsabilidade ficaria a cargo da Itaipu Binacional do Paraguai,

no qual viabilizaria o escoamento da produção agrícola e pecuária do Brasil aos portos no

Oceano Pacífico, pois ligaria as cidades de Porto Murtinho, no Mato Grosso do Sul a Carmelo

Peralta no Paraguai.

O trabalho estruturou-se no sentido de mapear a história da construção da Ponte da

Amizade, não só da construção física, mas também o processo de construção cultural através

das representações em torno dela. Busca-se compreender a sua relevância, não somente na

obviedade que ela representa, no sentido de servir de passagem, mas também entender o que

ela representa no nível simbólico. Para isso, a imagem foi muito utilizada e questionamentos

surgiram, por exemplo, como a construção da ponte foi retratada nas fotografias da época?

Enfim, do ponto de vista político, pode-se dizer que a ponte se tornou um símbolo da geopolítica

brasileira e paraguaia a partir das décadas de 1950, pois, a obra materializou as intenções

políticas, econômicas, sociais e culturais do Brasil e Paraguai.

Reforça-se que Foz do Iguaçu compõe uma das tríplices fronteiras mais movimentadas

da América do Sul, com atrativos turísticos que trazem milhões de pessoas. Só em 2019 foram

2.020.3586 de visitantes no Parque Nacional do Iguaçu, Marco das Três Fronteiras, Cataratas

do Iguaçu, tornando muitas vezes uma cidade monumento, associada ao turismo e também às

compras de importados. Portanto, atravessar a ponte torna-se atrativo para quem vive da

revenda desses produtos e para o turista que pode consumir produtos mais acessíveis ao

comparar com o Brasil. Além disso, é a principal ligação rodoviária entre o Brasil e o Paraguai,

por onde circula a maior parte dos produtos comercializados entre os dois países7.

A Ponte da Amizade, não raro, é eclipsada pelas grandes atrações turísticas citadas

acima ficando-a muitas vezes associada a um mal necessário, a um meio para alcançar o paraíso

dos importados. A memória do ilícito é muito presente, principalmente impressa pela mídia,

onde algumas vezes é retratada como símbolo do medo, da insegurança, da anomia e outras

vezes retratada como um símbolo da união e de integração regional. Dessa forma, não há uma

memória majoritária existente, a ponte expressa outras memórias em torno de um monumento,

no qual cada grupo social compreende de múltiplas maneiras.

5 Brasil. Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Disponível em: <

https://www.gov.br/agricultura/pt-br/assuntos/noticias/ponte-entre-porto-murtinho-do-lado-brasileiro-e-o-

distrito-paraguaio-de-carmelo-peralta-vai-permitir-acesso-ao-pacifico>. Acesso em: 15 out. 2019. 6 Polo Iguassu. Disponível em: <https://poloiguassu.org/>. Acesso em: 01 jul. 2020. 7 Segundo dados da ACIFI, a ponte movimenta cerca de R$ 12 bilhões em exportações todos os anos (ano-base

2016). Disponível em: http://www.revistaacifi.com.br/edicao-12/revitalizada-ponte-da-amizade-conecta-o-

desenvolvimento-de-foz-do-iguacu/. Acesso em: 02 out. 2020.

Page 17: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

14

A academia dedica-se em pesquisar o entorno da Ponte Internacional da Amizade, desta

forma, pode-se acessar o conhecimento sob o viés dos trabalhadores na “fronteira” (DAVI,

2008)8, o tráfico de pessoas (PATRUNI, 2018)9, o tráfico das drogas ilícitas (GEMELLI,

2013)10, as crianças na ponte (REIMANN, 2013)11, o comércio fronteiriço (RABOSSI, 2004)12

entre outras pesquisas relacionadas à fronteira, propriamente dita. Destaca-se a dissertação de

Waldson Dias Jr.13, com a pesquisa sobre a Ponte Internacional da Amizade a partir das

representações no Jornal O Globo.

Nesta tese, propõe-se pesquisar a Ponte da Amizade, colocando-a como objeto de

investigação e a partir dela compreender suas representações. Para tanto, o estudo apoiar-se-á

em documentos, acordos e registros, através da produção de imagens, fotografias, imprensa,

bem como, o estudo das memórias institucionalizadas, de como se apresenta e/ou se apresentou

nos discursos oficiais e também em entrevistas pontuais.

O objetivo principal da tese é analisar e compreender a Ponte Internacional da Amizade

construída sobre o rio Paraná ligando o Brasil e Paraguai a partir de uma visão periscópica das

memórias e representações que ela traz no percurso de sua existência.

Para alcançar o objetivo principal os seguintes objetivos específicos foram

desenvolvidos:

1. Discutir os conceitos de paisagem, fronteira, memória e modernidade, conectados

com as fontes e metodologias, para a compreensão do objeto de pesquisa.

2. Identificar as principais razões (políticas, econômicas e sociais) do Paraguai e Brasil

para construírem uma ponte na região fronteiriça entre a atual Ciudad del Este e Foz do Iguaçu

e efeitos fronteiriços após a construção.

8 DAVI, Elen. Trabalhadores na "fronteira": experiências dos sacoleiros e laranjas em Foz do Iguaçu - Ciudad Del

Este (1990/2006). 2008. 140f. Dissertação (Mestrado em História) – Universidade Estadual do Oeste do Paraná,

Marechal Cândido Rondon. 9 PATRUNI, Anna. O tráfico de pessoas no contexto da exploração econômica neocolonial: dilemas, ações e

solidariedade na região da tríplice fronteira (Argentina-Brasil-Paraguai). 2018. 159f. Dissertação (Mestrado em

Sociedade, Cultura e Fronteira – Universidade Estadual do Oeste do Paraná, Foz do Iguaçu. 10 GEMELLI, Vanderleia. As redes do tráfico: drogas ilícitas na fronteira Brasil e Paraguai. 2013. 178f. Dissertação

(Mestrado em Geografia) – Universidade Estadual do Oeste do Paraná, Francisco Beltrão. 11 REIMANN, Valdirene. As Crianças da Ponte: o trabalho de crianças e adolescentes no comércio fronteiriço de

Foz do Iguaçu Paraná. 2013. 135f. Dissertação (Mestrado em Sociedade, Cultura e Fronteira) – Universidade

Estadual do Oeste do Paraná, Foz do Iguaçu. 12 RABOSSI, Fernando. Nas rus de Ciudad del Este: vidas e vendas num mercado de fronteira. 2004. 334f. Tese

(Doutorado em Antropologia Social) – Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro. 13 DIAS Jr., Waldson de Almeida. A ponte da “modernidade” representacões e relacões Brasil–Paraguai durante a

construção da Ponte da Amizade (1956-1965). 2018. 130f. Dissertação (Mestrado em História) – Universidade

Federal da Integração Latino-Americana, Foz do Iguaçu.

Page 18: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

15

3. Contextualizar o processo histórico de mobilidade e ocupação da região,

compreendendo a relevância da Ponte da Amizade não só para o trânsito binacional, mas no

trânsito continental.

4. Construir a história da Ponte da Amizade a partir das imagens, descrevendo as

especificidades técnicas, os usos políticos e turísticos, e suas representações nas imagens e

discursos.

A paisagem é um fenômeno visível e objetivo, passível de ser descrito. Mas também é

um fenômeno subjetivo, pois existe uma relação com o sujeito participante dos esquemas de

percepcão, de concepcão e de acão, conforme expressa Berque (2012), “a paisagem esta

naturalmente exposta à objetividade [...], mas ela existe em primeiro lugar, em sua relação com

o sujeito coletivo: a sociedade que a produziu, que a reproduz e a transforma em função de certa

logica” (BERQUE, 2012, n.p.).

Pode-se debruçar mentalmente em um exercício imagético para mentalizar a fronteira

Brasil-Paraguai na década de 50, região hoje denominada de Vila Portes, visualizada nas

imagens e relatos. Certamente, a paisagem difere daquela que a vemos recentemente. Porém

não é somente o tempo que propicia essas diferenças de percepção, mas também do como é

retratada, cada qual com a sua especificidade, produz uma imagem a partir de um filtro cultural.

A tese visa investigar a construção da Ponte Internacional da Amizade, através dos

indícios, vestígios e efeitos produzidos pela transformação do espaço transfronteiriço. Para

alcançar os objetivos propostos, lança-se mão de fontes capazes de subsidiar essa investigação.

As fontes coletadas e utilizadas na pesquisa foram os documentos com as tratativas

internacionais depositados no Arquivo de Relações Exteriores em Assunção, Paraguai; fotos,

esboço de projeto, entrevista e documentos sobre a ponte no Departamento Nacional de

Infraestruturas de Transportes – DNIT, unidade local de Foz do Iguaçu; fotos e entrevista

coletada no Museu el Mensú em Ciudad del Este; atos internacionais nos acervos virtuais do

Ministério das Relações Exteriores; decretos no site da Câmara dos deputados; fotografias que

documentaram as etapas de construção da ponte; insígnias colhidas na internet, tais como

cédulas, moedas e cartões postais; registros cinematográficos da construção da ponte; jornais;

revistas; além de trabalhos acadêmicos, livros e artigos em periódicos que subsidiaram

sobremaneira a pesquisa. O percurso de coleta com a descrição do quadro das fontes, será

circunscrita, trabalhada e analisada no primeiro capítulo.

As relações políticas, os interesses econômicos e alguns resultados de tal aproximação

foram possíveis de serem acessadas através de bibliografias específicas, constatando nas fontes,

como alerta Ginzburg (2007) um estímulo e um limite, já prevendo a necessidade de aprofundar

Page 19: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

16

a pesquisa exigindo uma análise dos rastros deixados pelo estabelecimento da ponte, sejam eles

voluntarios ou involuntarios, ao “ler os testemunhos historicos a contrapelo, [...] contra as

intenções de quem os produziu – embora, naturalmente, deva-se levar em conta essas intenções

[...]” (GINZBURG, 2007, p. 11).

A história cultural fundamentará a compreensão teórica e metodológica da pesquisa

entorno das questões relacionadas à ponte, ancorando-se nas discussões de Le Goff, de memória

e as conexões entre documento e monumento para o aprofundamento na pesquisa. Essa

perspectiva teórica, traz a possibilidade de desenvolver a pesquisa no âmbito da história da

memória, retratando-a como algo vivo e presente, porém corre o risco de se perder ao serem

enquadrados e reproduzidos, conforme alerta Burke:

[...] À medida que os acontecimentos retrocedem no tempo, perdem algo de

sua especificidade. Eles são elaborados, normalmente de forma inconsciente,

e assim passam a se enquadrar nos esquemas gerais correntes na cultura. Esses

esquemas ajudam a perpetuar as memórias, sob o custo, porém de sua

distorção (BURKE, 2005, p. 88).

A Ponte da Amizade não tem somente uma história, tem várias, e pode ser contada de

diferentes formas e maneiras. Pode-se contar uma história do ponto de vista paraguaio, do ponto

de vista do brasileiro ou do ponto de vista de quem se sentiu mais vigiado, ou mais distante dos

amigos, após sua construção. A travessia antes realizada por pequenos barcos enjambrados

passa a ser realizada por asfalto estabelecido a 50 metros acima do rio Paraná, percorrido em

minutos para o país vizinho.

A tese está estruturada em três capítulos. O primeiro capítulo visa discutir as

fundamentações teorico-metodologicas que orientaram a pesquisa, ancorando as reflexões,

análises, interpretações e uso das fontes selecionadas para desenvolver a tese. Para isso,

apresenta-se as fontes, bem como os locais de acesso, com o intuito de indicar o caminho

percorrido e as descobertas indiciárias possibilitadoras de novos olhares e sentidos para o objeto

de pesquisa.

O segundo capítulo visa compreender a importância e relevância da construção da Ponte

Internacional da Amizade sobre o rio Paraná para os países Brasil e Paraguai, bem como os

motivos para sua viabilização. Para tal, traçou-se um panorama do espaço fronteiriço situando-

o no sistema hidrográfico versus rodoviário, procurando inquirir as causas incentivadoras para

ligar fisicamente a fronteira. A questão da ponte foi abordada por meio de uma breve descrição

sobre a geopolítica entre Brasil e Paraguai com seus diferentes interesses ao estabelecer o

estreitamento de laços. No nível local, a ponte contribuiu significativamente para o surgimento

Page 20: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

17

da Ciudad del Este e para a transformação dos bairros próximos à ponte em Foz do Iguaçu

influenciando a dinâmica da fronteira, a economia local e o estabelecimento ostensivo do

Estado. Para isso, desenvolve-se um breve histórico do desenvolvimento das cidades e os

impactos pós construção da ponte.

O terceiro capítulo contextualiza a construção da ponte a partir das imagens, para isso,

utilizou-se fotografias, sejam de maneira individual, publicadas em periódicos, ou na forma de

cartão-postal. Para esse fim, buscou-se estudar as imagens, decompondo-as nos elementos

constitutivos, tecendo reflexões e interpretações a partir das descrições e observações

realizadas. A análise das imagens ocorreu com contribuição de outras fontes que dessem

subsídio para compreender a ponte de maneira periscópica, olhando-a sob diferentes aspectos.

A Ponte Internacional da Amizade será estudada sob o ponto de vista político,

diplomático, econômico, social e cultural no que tange as relações Brasil e Paraguai,

objetivando principalmente inseri-la em um contexto maior do que normalmente a se vê, indo

além da repercussão local, compreendendo-a como algo maior do que ligar duas nações.

Page 21: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

18

CAPÍTULO I

REFLEXÕES SOBRE AS FUNDAMENTAÇÕES TEÓRICO-

METODOLÓGICAS

Uma fronteira não é o ponto onde algo termina, mas, como os gregos reconhecem,

a fronteira é o ponto a partir do qual algo começa a se fazer presente.

Martin Heidegger14.

O primeiro capítulo visa discutir as fundamentações teorico-metodologicas que

orientaram a pesquisa, ancorando as reflexões, análises, interpretações e uso das fontes

selecionadas para desenvolver a tese. Para isso, apresentam-se as fontes, bem como os locais

de acesso, com o intuito de indicar o caminho percorrido e as descobertas indiciárias que

possibilitam de novos olhares e sentidos para o objeto de pesquisa.

1.1 MARCO TEÓRICO-METODOLÓGICO

Esse tópico visa introduzir o marco teórico-metodológico da pesquisa, no sentido de

justificar o recorte, a seleção e o tratamento dado às fontes.

A Ponte Internacional da Amizade, ao ser vista ou transitada, aciona na memória

diferentes significados que passam por sentidos subjetivos, singulares e por que não,

encriptados. O papel do pesquisador é, a partir das indagações do tempo presente, exercitar a

decriptografia, desvendando as diversas vozes ressonantes.

A tese abrange diferentes facetas da construção da ponte, isso significa optar por uma

pesquisa que vai além de uma história linear, oficial e unidimensional. A ponte foi observada

de uma maneira periscópica, contemplando distintas formas de observá-la e de significá-la.

Logo, a veremos sob uma perspectiva humana, de quem a projetou, construiu, registrou,

transitou ou impactou e a experimentou.

O desafio intelectual da pesquisa guiou-se pelos caminhos da História Cultural.

Construída na interdisciplinaridade, propõe ser uma História mais abrangente e totalizante

permitindo lançar mão de outras ciências e instrumentos com vista a ampliar a compreensão do

tema investigado.

14 BHABHA, Komi K. O Local da Cultura. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 1998, p. 19.

Page 22: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

19

Cabe salientar que a História Cultural, na qual se baseia a pesquisa, está inserida em

uma nova historiografia procedente do movimento dos Annales. O marco da renovação ocorreu

com a criação da Revista dos Annales15 em 1929, no qual seus membros tiveram o mérito de

inovar no campo investigativo permitindo maior liberdade e mais possibilidade de produção.

Se antes, a História era uma disciplina mais compartimentada, que supervalorizava o

aspecto político-econômico, o documento escrito, o papel de grandes homens e a ênfase na

neutralidade, com o movimento dos Annales, desembocando na Nova História, extrapola

sobremaneira a forma de interpretar os fatos.

Burke (1997, p. 12) elenca as diretrizes da Nova História em três aspectos teórico-

metodológicos, o primeiro é a história-problema, ou seja, o pesquisador elabora questões como

eixo do seu trabalho. O segundo aspecto é em relação a diversidade de temas, considerando a

possibilidade de pesquisar todas as manifestações humanas. O terceiro é a interdisciplinaridade

e para isso ele cita Febvre e utiliza o Braudel como exemplo da necessidade de intercambiar

com outras disciplinas.

Como dizia Febvre, com o seu característico uso imperativo: Historiadores,

sejam geografos. Sejam juristas, também, é sociologos, e psicologos” (Febvre,

1953, p. 32). Ele estava sempre pronto “para pôr abaixo os

compartilhamentos” e lutar contra a especializacão estreita. De maneira

similar, Braudel escreveu O Mediterrâneo como o fez para “provar que a

historia pode fazer mais do que estudar os jardins murados” (BURKE, 1997,

p. 12).

O locupletamento historiográfico possibilitou a ampliação temática contemplando

diversos grupos e assuntos até então excluídos e marginalizados.

1.2 SOBRE AS FONTES

Este tópico visa elencar e apresentar as fontes utilizadas na pesquisa, bem como os locais

de acesso a tais materiais. Esta exposição torna-se relevante pela quantidade de fontes

utilizadas, de diferentes naturezas e locais pesquisados, portanto conhecê-las é a primeira etapa

para compreender como e porque foram produzidas e como foram utilizadas para compreender

o objeto de pesquisa.

15 Título original da revista: Annales d’histoire économique et sociale (1929-39).

Page 23: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

20

Para o desvendamento sobre a Ponte Internacional da Amizade, necessitou-se de um

levantamento documental sobre os assuntos relacionados ao objeto de pesquisa que abarcassem

a sua constituição.

Procurando abranger fontes primárias, ou seja, documentos de arquivos, fotografias da

época ou materiais publicados no próprio período pesquisado, realizou-se um trabalho de

campo com o intuito de vasculhar os vestígios sobre as tratativas binacionais e construção da

ponte. Essa etapa da pesquisa exigiu paciência e perspicácia para buscar e identificar indícios

relevantes para o desenvolvimento do trabalho.

O primeiro local visitado foi o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transporte

– DNIT de Foz do Iguaçu. O contato telefônico e marcação de horário com o responsável

precedeu a ida até o local. O Engenheiro Vicente Veríssimo Júnior, chefe de serviço da unidade

do local de Foz do Iguaçu, recepcionou a pesquisadora, oferecendo para reprodução, os

materiais sobre a ponte além de contextualizar a história da construção e reforma. Nessa

conversa, a pesquisadora solicitou a sua autorização para gravar a sua fala, para o posterior uso

enquanto fonte.

Os materiais sobre a ponte ficam armazenados em uma pasta, na qual o Sr. Vicente

apresentou e contextualizou cada um deles. Relatou que a sede do Departamento Nacional de

Estradas e Rodagem – DNER era no Rio de Janeiro, capital federal até 1960 e o prédio onde

continha os documentos foi incendiado, perdendo muitos originais. Inclusive não se tem a

planta da ponte e, portanto, para reformá-la tiveram que estimar, a partir de esboços da

construção.

Tratando-se de uma obra federal binacional, atravessar a ponte foi necessário para a

busca de rastros documentais, a pesquisadora deslocou-se até a capital do Paraguai para

investigar em arquivos, possíveis documentos e bibliografias que pudessem contribuir para a

pesquisa. A busca deu-se do Archivo Nacional de Asuncion e no Archivo de Relaciones

Exteriores em Assunção. Foi neste último, que se acessou vários documentos diplomáticos

entre Brasil e Paraguai para a viabilizar o livre acesso ao Porto de Paranaguá, por parte dos

paraguaios, a aplicação de crédito brasileiro para a construção do caminho Coronel Oviedo-

Puerto Presidente Franco e as tratativas para a construção da ponte sobre o rio Paraná. Todos

esses materiais foram reproduzidos no local e muito serviram para o desenvolvimento da

pesquisa.

Retornando a fronteira, na Ciudad del Este, a investigação partiu para o Museo

Municipal El Mensú. O termo mensú “fue acuñado para dar nombre al trabajador de los

yerbales de Alto Paraná, este era contratado para realizar actividades de los cortes de yerba

Page 24: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

21

mate en rama y llevar hasta el “barbacúa” para el laboreo de la misma (ESCURRA; TELLO,

2015), mas pouco tem no museu sobre a história dos mensú. A edificação é um fragmento da

história da ponte, pois a casa foi construída para albergar os primeiros administradores da

cidade recém fundada, cujo objetivo era criar infraestrutura necessária para receber todo o fluxo

que o trânsito demandaria com a ligação terrestre entre Brasil e Paraguai. O museu, foi fundado

em 23 de outubro de 1999 e inaugurado no dia 03 de fevereiro de 2000, e se propõe a preservar

a história da região, logo, depara-se com muitas fotos da construção da ponte, as ferramentas

utilizadas pelos trabalhadores além de outros materiais que representam para o município, a sua

história. Além da entrevista coletada com o responsável pelo museu (ano-base 2018), o Sr. José

Riquelme, a pesquisa aportou com fotografias expostas, a Ata da fundação da cidade e a placa

comemorativa da primeira inauguração da ponte, fontes importantes para pensar o objeto da

tese.

Pesquisou-se nas duas bibliotecas municipais da região. Em Ciudad del Este levantou-

se algumas bibliografias de pesquisadores paraguaios na Biblioteca Municipal e em Foz do

Iguaçu na Biblioteca Pública Elfrida Engel Nunes Rios que também abarca no seu acervo, além

de livros, outras fontes de pesquisa, a exemplo de jornais, revistas e fotos da região, utilizadas

na pesquisa. Também se pesquisou o acervo da Holoteca situada no Centro de Altos Estudos

da Conscienciologia – CEAEC, onde além de fontes jornalísticas, acessou-se também o acervo

bibliográfico sobre a região (Fozteca).

A internet possibilitou de diferentes formas a aquisição de fontes fundamentais para a

pesquisa, desde sites oficiais que disponibilizam acervos online a exemplo do Ministério das

Relações Exteriores, Câmara Legislativa, Senado Federal e do Congresso Nacional até sites não

tradicionais para pesquisa como Youtube, no qual alberga vídeos históricos da Agência

Nacional, em especial, os três utilizados na pesquisa, um de 1958, outro de 1959 e de 1965, que

de alguma forma trazem narrativas da construção da ponte.

Os acervos virtuais crescem cada vez mais com as tecnologias de digitalização

possibilitando o acesso ao histórico de periódicos, a exemplo da Revista Manchete, fonte

selecionada para ilustrar como a ponte foi retratada no nível nacional.

Outro site utilizado na pesquisa, foi o Facebook, rede social virtual, fundada em 2004,

que une diferentes interesses. Tornou-se, ao longo da investigação, um ciberespaço de

relevância para acessar informações, pessoas e fotos empregadas no trabalho. Os grupos

criados, são propícios para unir pessoas com interesses afins, aqui, destaca-se o grupo

denominado Foz do Iguaçu e Cataratas Memória e Fotos Atuais, criado por José Wille,

jornalista, cujo objetivo é criar um acervo fotográfico com a contribuição de qualquer um que

Page 25: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

22

queira disponibilizar o seu material para o público. Tornou-se um local de compartilhamento

de memórias além da interação e troca de saberes.

O grupo social virtual tem uma enorme pertinência ao oportunizar o compartilhamento

das experiências individuais, subjetivas e singulares. Indo ao encontro com o dever da

preservação da memória, acessando experiências indizíveis e de reconhecê-las significantes

historicamente e socialmente. Desta forma, ela se enquadra em uma categoria relacionada com

as recordações, com as reminiscências. Além disso envolve a própria fonte na pesquisa,

recuperando uma história não conhecida, relacionando-a com a história da comunidade.

Após contagem das imagens inseridas no grupo Foz do Iguaçu e Cataratas Memória e

Fotos Atuais, do Facebook, constatou-se mais de 3.800 (data base: 10 jun. 2020) fotos

compartilhadas, sendo dessas, mais de 180 da Ponte Internacional da Amizade, que aliás, é

representada na imagem da capa na página do grupo. Essa informação faz um pouco mais de

sentido ao comparar com a Ponte Internacional Tancredo Neves ligando Foz do Iguaçu, Brasil

a Puerto Iguazú, Argentina, inaugurada em 1985, na qual 23 fotos foram compartilhadas. Não

é o objetivo da pesquisa analisar o grupo em si, apenas destacar alguns indícios de relevância

da Ponte da Amizade para um determinado grupo, a partir de um conjunto analisado de imagens

neste ciberespaço.

O grupo constitui-se de pessoas interessadas na memória da cidade, logo há uma

predominância de fotos antigas e de diferentes pontos da cidade, não se restringindo aos locais

“turísticos”. A partir das imagens é possível acessar a transformação da cidade e sua história,

pois muitas das fotos são contextualizadas com alguma casuística particular em relação àquele

espaço. Sendo um local de compartilhamento espontâneo de imagens, o fato de ter um número

significativo de imagens da Ponte da Amizade, em especial, faz refletir sobre a topofilia,

neologismo desenvolvido pelo pesquisador Yi-fu Tuan, para explicar os laços afetivos dos seres

humanos com o meio ambiente material, “são os sentimentos que temos para com um lugar,

por ser o lar, o locus de reminiscências e o meio de se ganhar a vida” (TUAN, 1980, p. 107).

Outras fontes utilizadas na pesquisa, foram as produzidas pela pesquisadora, a partir de

um comando de busca em um programa de computador chamado Google Earth16. A ferramenta

espacial constrói uma figura a partir de várias imagens de satélites ou fotografadas de aeronaves

podendo identificar lugares, construções e/ou paisagens, possibilitando a composição das

imagens e ao utilizar o recurso do zoom, é possível alcançar uma visibilidade maior. Esse

16 Para ampliar as discussões sobre o Google Earth, sugere-se a leitura do artigo dos pesquisadores Paul Kingsbury

e John Paul Jones intitulado Walter Benjamin’s Dionysian Adventures on Google Earth. Disponível em:

<https://personalpages.manchester.ac.uk/staff/m.dodge/Kingsbury_and_Jones.pdf>. Acesso em: 12 jun. 2020.

Page 26: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

23

recurso permite conhecer geograficamente o objeto pesquisado a partir de uma dimensão

espacial mais abrangente.

A cidade de Foz do Iguaçu carece de centros de memórias, ou espaços organizados para

armazenar e acessar documentos de interesse público. Por outro lado, esses lugares que parecem

arquivos estão em muitas partes, seja num armário em um órgão público sob custódia de

funcionário, seja, na biblioteca, ou nas gavetas privadas encorajadas pelos grupos criados nas

mídias sociais em compartilhá-las.

O fato é que a pesquisa exige um caminhar, não somente no sentido metafórico, ou seja,

o trilhar um caminho de construção de um saber, mas no sentido literal, de peregrinar em

diferentes locais em busca de fontes que possam subsidiar, contextualizar, desconstruir,

compreender e/ou fundamentar o mote da investigação.

Portanto, para a pesquisa, utilizou diversas fontes e de diferentes naturezas, e, em razão

das suas especificidades, sabe-se que cada fonte produz um dado de maneira distinta, gerando

também diferentes significados discutidos ao longo da pesquisa.

1.3 A PONTE DA AMIZADE: TRANSGRIDE A FRONTEIRA OU TORNA-SE FRONTEIRA?

Para problematizar o papel da ponte no contexto fronteiriço, o seguinte questionamento

balizou as reflexões aqui expostas: a ponte transgride a fronteira ou torna mais efetiva a

fronteira? Para isso, é preciso olhá-la sob o viés político e populacional, para discriminar as

diferentes percepções do espaço.

A pesquisa debruçou-se no estudo da fronteira delimitando-se a ponte, esse espaço

binacional entre Brasil e Paraguai extremamente movimentado17, circulando uma intensa

quantidade de pessoas com uma vasta diversidade linguística e veículos com placas de

diferentes países.

A paisagem estudada caracteriza-se por ser fronteiriça e esse conceito está associado a

ideia de limite, que conforme Raffestin (1993, p. 166) não se dissocia da historicidade podendo

ser modificada e ultrapassada. Essencialmente serve para demarcar uma propriedade ou uma

apropriação de um território, ou seja, está associada com as relações de poder. A fronteira se

torna a partir do Estado Moderno um “limite sagrado” assegurando o controle territorial.

[...] Fatores ideológicos (Leste-Oeste) conduzem a uma demarcação que não

é somente um ganho em informações, mas ainda um gasto contínuo de energia

por todo o sistema de construções, para o qual é necessário assegurar

manutenção e a vigilância. [...]

17 Transitam pela ponte cerca de 20 mil pedestres e 40 mil veículos por dia, segundo a pesquisa realizada pela

UDC. Centro Universitário Dinâmica das Cataratas. Pesquisa sobre o tráfego de veículos e pessoas que atravessam

a Ponte Internacional da Amizade. Foz do Iguaçu, PR. 1ª Edição, Junho, 2018.

Page 27: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

24

A demarcação (a delimitação também, mas com riscos de contestação)

permite o exercício das funções legal, de controle e fiscal. Com efeito, a linha

fronteiriça adquire diferentes significados segundo as funções das quais foi

investida. A função legal delimita uma área no interior da qual prevalece um

conjunto de instituições jurídicas e normas que regulamentam a existência e

as atividades de uma sociedade política. Em contrapartida a função de controle

tem por dever inspecionar a circulação dos homens, dos bens e da informação

de uma maneira geral, o que vale dizer, desde já, que o controle da informação

se mostra muito difícil, na maioria dos casos (RAFFESTIN, 1993, p. 167 e

168).

Nas cabeceiras da ponte, a visibilidade da natureza arbitrária dos limites estatais e

administrativos, torna-se ostensiva, pois estruturas de controle foram construídas, cada qual

com a sua constituição fazendo-a cumprir, garantindo a obediência dos cidadãos ao país em que

se encontra. Desta forma a fronteira se liga, mas com a necessidade de estabelecer áreas

limítrofes de cada Estado-Nação. A ponte que uniu os dois país, também se tornou o símbolo

do reforço da existência de fronteira.

Nas fotografias com os chefes de Estado, por exemplo, a fronteira é bem demarcada, no

Capítulo III apresenta-se imagens da inauguração da ponte onde a delimitação é reiterada,

inclusive praticada em outras ocasiões, conforme a imagem abaixo. O encontro entre os

presidentes Ernerto Geisel (1907-1996) do Brasil e Alfredo Stroessner do Paraguai para a

solenidade de desvio do rio Paraná no dia 20 de outubro de 1978, para a construção da Usina

Hidrelétrica de Itaipu, deu-se no meio da Ponte da Amizade. Na Imagem 1 é possível visualizar

uma linha atravessando a pista demarcando a fronteira política.

Imagem 1 – Encontro do presidente do Brasil Ernesto Geisel (à esquerda) e do Presidente do Paraguai

Alfredo Stroessner (à direita) na Ponte da Amizade em 1978.

Fonte: FOZ DO IGUAÇU E CATARATAS MEMÓRIA E FOTOS ATUAIS. Foz do Iguaçu, 29 set.

2019. Facebook. Disponível em:

<https://www.facebook.com/photo.php?fbid=10215179654629643&set=g.300913676689041&type=1

&theater&ifg=1>. Acesso em: 06 mar. 2020.

Page 28: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

25

Evidente que os limites vivenciados pelos sujeitos são flexíveis e às vezes até

inexistentes, transcendendo as demarcações territoriais, formando até uma comunidade

binacional (Baller, 2014, p. 148). Essa percepção é comum às pessoas que vivenciam um espaço

binacional, onde, atravessar a fronteira todos os dias para trabalhar ou estudar é um modus de

vida, conforme Baller, “os fronteiricos que vivem na zona de contato promovem, a sua maneira,

a transnacionalizacão no interior de nacões ou de estados” (BALLER, 2014, p. 148). A

descrição em atravessar a fronteira registrada pelo pesquisador Albuquerque, exemplifica essa

condição,

Quando estava atravessando a ponte sobre o rio Paraná, pensei sobre a

arbitrariedade dos limites nacionais que dividem em duas nações uma

mesma paisagem física. Mas essa criação arbitrária é uma ilusão bem

fundamentada e altera a nossa subjetividade (ALBUQUERQUE, 2005,

p. 17).

A fronteira natural, estabelecida no rio Paraná, antes fluida, líquida, passou com a

construção da ponte, a ter uma delimitação de concreto suspensa sobre o rio. Seguindo a

perspectiva de Certeau, “muda a fronteira em ponto de passagem, e o rio em ponte”. Se o rio é

uma fronteira natural, a ponte é a transgressão desse limite e o papel dos homens seria, “encher

e construir o espaço entre dois, eis a pulsão do arquiteto; mas, ao mesmo tempo, a sua ilusão,

pois, sem o saber, trabalha para o congelamento político dos lugares [...]” (CERTEAU, 2014,

p. 196).

O pesquisador Ferretti (2014) traz a concepção de fronteira para Friedrich Ratzel (1844-

1904), considerado um dos mais importantes geógrafos europeus na segunda metade do século

XIX, definindo-a como um produto do movimento, existindo práticas, atividades e disputas que

provocam deslocamentos, e segundo Ratzel, “A fronteira natural é obra do domínio natural

tomado no sentido biogeográfico mais amplo e, sob todos os seus aspectos, no interior da

geografia política” e continua, “mesmo os limites mais naturais como Himalaia ou Hinou-

Kouch ainda oferecem passagens. [...] A espécie humana revela que, nos limites do ecúmeno,

nada pode separar os povos permanentemente” (apud FERRETTI, 2014, p. 61), ou seja, a

fronteira é sempre um movimento histórico.

Aqui cabe perfeitamente o conceito desenvolvido por CERTEAU (2014, p. 184) de

espaco, sendo um “cruzamento de moveis” ou “unidade polivalente”, o que o diferencia de

lugar que implica uma indicacão de estabilidade, “o espaco é um lugar praticado”, vivencial ou

existencial. Conforme o autor “[...] especificam “espacos” pelas acões de sujeitos históricos

(parece que um movimento sempre condiciona a produção de um espaço e o associa a uma

Page 29: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

26

historia)” (CERTEAU, 2014, p. 185, grifo do autor). O percurso está relacionado com espaço,

pois existe uma vivência do lugar, uma ação de percorrer gerando experiências singulares.

Refletindo em cima das ideias de Certeau, pode-se pensar que a fronteira enquanto

demarcacão arbitraria de um lugar inexiste no campo do espaco, que é fluido, porém “não existe

espacialidade que não organize a determinacão de fronteiras” (CERTEAU, 2014, p. 191). A

ponte é o resultado da concessão de espaços, ambos os lados abrem mão de um determinado

lugar para legitimar um novo espaco. Eis a problematica da fronteira: “[...] a quem pertence a

fronteira? O rio, a parede ou a árvore faz fronteira. Não tem o caráter de não lugar que o traçado

cartografico supõe no limite” (CERTEAU, 2014, p. 195, grifo do autor).

No quesito social de construção do espaço, os pesquisadores Kleinke, et al. (1997)

trouxeram o aspecto da população fluida na região trinacional, no caso, incluindo

evidentemente Puerto Iguaçu na Argentina, onde a transgressão da fronteira é muito bem

descrita:

À revelia das causas institucionais e/ou econômicas que provocam alterações

nas oportunidades e reforçam a demarcação de fronteiras, o cotidiano das

relações estabelece um pacto, ainda que informal, de cooperação e parcerias,

não propriamente entre os três países, mas, sim, entre as três fronteiras. Um

espaço que não pertence a nenhum país, um espaço do Mundo. Isso significa

a própria negação da fronteira (KLEINKE et al., 1997, p. 160).

Em um espaço fronteiriço há um esforço, por parte dos Estados em delimitar o seu

território e, portanto, a presença de aparatos burocráticos faz sentido não só no controle, mas

no reforço dos símbolos oficiais da pátria. E são as diferenças entre os Estados que provocam

a mobilizacão e o constante trânsito, pois muito se busca o que o “outro” pode oferecer em

relação ao que se tem no Estado de origem.

1.4 INDÍCIOS INVESTIGATIVOS: PONTE PARA NOVAS REFLEXÕES

O intuito é não olhar a Ponte da Amizade propriamente, mas olhar através dela, partindo

de um conjunto de representações sobre a ponte. Para isso, o método indiciário tornou-se

adequado no esforço de identificar sinais e possíveis decifrações.

Antes de iniciar qualquer pesquisa, o investigador estabelece certas diretrizes, que o

possibilita uma orientação na trajetória, a exemplo do problema, dos objetivos, e da

metodologia. A partir desses elementos inicia-se a aventura investigativa de coletar as fontes,

de analisá-las e de tratá-las com a metodologia escolhida, refletindo teoricamente sobre o

objeto.

Page 30: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

27

Mas a pesquisa não é linear e é preciso ficar atento aos novos percursos que a caminhada

vai indicando. Buscou-se olhar para a ponte, para ir além do conhecido, indo da sua

materialidade mais óbvia que é a experiência de estar nela, apreendendo o seu entorno, mas

também ficando aberta para que os seus pormenores não escapem ao reconhecimento e

apreciação. Para isso, a coleção de indícios tornou-se peça fundamental para pensar novas

formas de compreender o objeto.

O método indiciário, aplicado na pesquisa, consiste em desenvolver um saber

conjectural, a partir da reunião dos resíduos, das pistas, dos dados marginais, nas trivialidades

pouco observadas, do entorno, do pequeno, do implícito enfim, dos pormenores normalmente

negligenciáveis. Indo da parte para o todo, do micro para o macro. Pois, esses indícios seriam

mais ricos por tratar-se do núcleo menor do objeto, porém com capacidade de compreendê-lo

na sua totalidade.

Carlo Ginzburg identifica que as raízes desse paradigma eram muito antigas, desde a

condição do humano enquanto um caçador quando precisava desenvolver percepções além da

visibilidade, a partir de vestígios deixados por pegadas, cheiros, galhos quebrados enfim,

aperfeicoando um saber venatorio “capacidade de, a partir de dados aparentemente

negligenciaveis, remontar a uma realidade complexa não experimentavel diretamente”

(GINZBURG, 1989, p. 152). Sobre a Antiguidade, o autor cita os textos divinatórios chamando

a atenção de que ambas as competências, seja em decifrar, significando voltar-se ao passado,

seja adivinhando, significando voltar-se para o futuro, contém as mesmas operações

intelectuais.

O autor descreve, a partir de fatos observados, os primórdios de um modelo

epistemológico que ele denomina de indiciário. Ora, o que significa um dado negligenciável no

contexto dessa pesquisa? Significa estar completamente absorto na pesquisa, e alguém

despretensiosamente comenta que a bandeira de Foz do Iguaçu contém em suas insígnias a

Ponte da Amizade. Um dado que talvez tivesse passado despercebido, sem grande importância,

se não fosse a acuidade indiciária proposta pelo Ginzburg, emergindo a reflexão sobre os signos

representados na bandeira do Município.

Page 31: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

28

Imagem 2 – Bandeira de Foz do Iguaçu (2001). Fonte: Prefeitura Municipal de Foz do Iguaçu. Disponível em:

<http://www.pmfi.pr.gov.br/ArquivosDB?idMidia=104439>. Acesso em: 20 out. 2019.

Essa observação traz uma pergunta não contemplada no início da pesquisa, ou melhor,

imponderável, mas que se torna inegável a premência de sua elaboração: por que Foz do Iguaçu

considerou a ponte importante para ser contemplada na bandeira municipal? Qual o significado

para o município?

Carlo Ginzburg (1989, p. 171) traz a ideia sobre a necessidade de cada sociedade

produzir elementos de distinção, criando para isso, formas de autoidentificar-se, iniciando

evidentemente com o nome, por exemplo, Foz do Iguaçu, que por si só já revela sua síntese, é

o seu resumo, expressa o seu principal emblema, as quedas d’águas. Os símbolos são

instrumentos de mensagens e a bandeira é uma forma de epilogar o que o representa, inclusive

distinguindo-se de outros municípios.

Segundo a Lei nº 2394/2001, os símbolos representativos do Município de Foz do

Iguaçu compõem as seguintes características:

[...] No escudo chefe, encontram-se representados três dos principais pontos

de atração turística do Município, por isso mesmo, causa de sua projeção

internacional: a) A Ponte Tancredo Neves, também chamada Ponte da

Fraternidade, que sobre o Rio Iguaçu, é o elo entre nossa Pátria e a vizinha

República da Argentina, com quem mantemos os mais cordiais laços

amistosos; b) A Ponte Internacional, também chamada de Ponte da

Amizade, que por sobre o Rio Paraná é o elo entre nossa Pátria e a vizinha

República do Paraguai, com quem, também mantemos os mais cordiais

laços amistosos; c) Ao centro das duas pontes, o Marco das Três Fronteiras,

erguido pelo Marechal Cândido Rondon, às margens brasileiras de encontro

dos rios Paraná e Iguaçu, onde se assentam as divisas com as vizinhas

Repúblicas da Argentina e Paraguai.

No centro do escudo, ou faixa, a representação dos principais saltos que

integram as mundialmente famosas Cataratas do Iguaçu e a Hidrelétrica de

Itaipu, à esquerda, temos os saltos Floriano, Deodoro e Benjamim; ao centro,

a emocionante Garganta do Diabo; e a direita, a Itaipu Binacional. [grifo

nosso]

Page 32: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

29

Em 1966 com a Lei nº 502, de 31 de dezembro, assinado pelo Oziris Santos (1936-

2013), prefeito municipal (1963-1968), estabeleceu os principais símbolos de Foz do Iguaçu e,

desde a década de 60, a ponte estava representada conforme a Imagem 3.

Imagem 3 – Bandeira de Foz do Iguaçu (1966). Fonte: FOZ DO IGUAÇU E CATARATAS MEMÓRIA E FOTOS ATUAIS. Foz do Iguaçu, 03 out.

2019. Facebook. Disponível em:

<https://www.facebook.com/photo.php?fbid=10215206668304968&set=g.300913676689041&type=1

&theater&ifg=1>. Acesso em: 20 out. 2019.

A Ponte Tancredo Neves e a Itaipu Binacional foram incorporadas posteriormente à

bandeira do município.

A segunda pergunta instigada foi, será símbolo também na bandeira da Ciudad del Este?

Eis a surpresa ao deparar-se com tal obviedade. Tanto a bandeira de Ciudad del Este quanto a

do Distrito do Alto Paraná continham em suas insígnias a Ponte Internacional da Amizade.

Imagem 4 – À esquerda a bandeira do Departamento do Alto Paraná, e a direita a bandeira da Ciudad

del Este. Fonte: Gobernación de Alto Paraná e Municipalidad de Ciudad del Este. Disponíveis em:

<http://www.altoparana.gov.py/v0/> e <http://mcde.gov.py/index.php>. Acesso em: 08 jun. 2020.

Page 33: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

30

A terceira pergunta foi, onde mais a ponte foi e/ou é representada? Desta forma, a

pesquisa partiu para a coleta de vestígios, possibilitando abrir novas problemáticas

investigativas, seguindo as observações de Burke (2017, p. 24), em utilizar as imagens como

evidências historicas, evitando a “invisibilidade do visual”, trazendo-a para o campo de

reflexão.

Para isso, refletiu-se sobre o papel das imagens, no sentido, de investigar as diferenças

entre o representado e as representações. A história cultural, segundo Chartier (1990, p. 16 e

17), tem como principal objeto “identificar o modo como em diferentes lugares e momentos

uma realidade social é construída, pensada, dada a ler”. A decifracão do espaco através das

producões partilhadas “pelos quais um grupo impõe, ou tenta impor, a sua concepcão do mundo

social, os valores que são os seus, e o seu domínio”. Desta forma, a representacão para Chartier,

é entendida como classificações e divisões que organizam a apreensão do mundo social como

categorias de percepção do real.

Camargo (2001) vai ao encontro de Chartier e para ele, o conceito de representação “é

dar a alguma coisa o sentido de outra” (CAMARGO, 2011, p. 207), evidente que as imagens

da ponte, não são a ponte, mas sua representação. Ela cumpre a vocação tácita de evocar o que

está sendo representado. Neste quesito, entra a instância interpretativa, que Camargo (2011)

denominará de significação.

[...] ao tocarmos nas questões referentes às aparências das imagens, vamos

perceber que isto não basta para entendê-las em sua plenitude, é necessário ir

além da simples aparência e buscar a sua essência.

[...] além da representação, dependeríamos da significação, do sentido que

uma imagem produz na relação que exerce no contexto cultural com o qual

dialoga. [...] vale discutir um segundo aspecto importante de sua existência, o

seu uso, ou seja, as funções ou finalidades para as quais são produzidas (In:

CAMARGO, 2011, p. 207).

Então, uma representação tem em si uma significação, podendo ter várias funções

(simbólica, documental, poética), aqui se destaca o uso da representação da ponte, como um

suporte pedagogico, que Camargo (2011) define como “capaz de informar e também contribuir

para a consolidação de outras estratégias instrucionais que só podem ser realizadas mediante

visualizacão [...]” (CAMARGO, 2011, p. 210).

Existe certa intencionalidade em vincar determinadas imagens e existem inúmeras

leituras do receptor sobre essa imagem, ou seja, para cada significante há inúmeras

possibilidades de significações, não é o objetivo do trabalho mapear esses sentidos, mas de

expor um fato e trazer para discussões possibilidades interpretativas.

Page 34: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

31

Pode-se andar pela ponte, ler sua definição e características, vê-la representada em uma

fotografia, mas talvez não conseguirá se apropriar de todas as dimensões significativas do

entorno da ponte, mas o esforço em interpretar, auxilia no conhecimento sobre o objeto

pesquisado.

Por exemplo, na reunião dos vestígios das insígnias sobre a ponte, expostas abaixo,

representada no Paraguai18 (selos, cédulas, moedas, cartão etc.), com objetivo comemorativo,

ativando a partir das imagens, a memória daquilo que é considerado importante e relevante de

ser relembrando, ou seja, a “grande” obra, o “grande” feito, por “grandes” homens, cuja

intencionalidade é tornar presente um fato do passado, monumentalizando a ponte.

O trabalho de “escavacão” na pesquisa trouxe os selos comemorativos produzidos pelo

Paraguai em 1961, demarcando a “primeira” inauguração da ponte com os presidentes Juscelino

e Stroessner, conforme a Imagem 5. No selo, a ponte é retratada de baixo para cima,

aumentando a percepção do tamanho, o rio Paraná abaixo com leve percepção de movimento.

Em cima, os brasões das repúblicas do Brasil e Paraguai. Trata-se de um selo comemorativo do

sesquicentenário de independência do Paraguai, e a ponte foi eleita como um dos marcos a

serem inseridos na celebração.

O selo, em tamanho reduzido contém um texto, uma mensagem, um “o que dizer”,

contribuindo para a difusão de temas e discursos de interesse do Estado, tornando-se um

importante veículo na difusão da imagem do país, neste caso, o óbvio interesse em atribuir

construção da ponte a um projeto binacional, personificado nos presidentes de cada país.

Imagem 5 – Selo comemorativo (1961) de Inauguracion Puente Internacional Paraguay Brasil. Fonte: FOZ DO IGUAÇU E CATARATAS MEMÓRIA E FOTOS ATUAIS. Foz do Iguaçu, 20 jul.

2019. Facebook. Disponível em:

18 Até este momento, essa autora não encontrou insígnias no Brasil (data-base: out. 2019).

Page 35: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

32

<https://www.facebook.com/photo.php?fbid=10214693534716949&set=g.300913676689041&type=1

&theater&ifg=1>. Acesso em: 20 out. 2019.

Na Imagem 6 há dois selos emitidos pelo Paraguai. O primeiro de 1972, com o texto

“1972 año del turismo de las américas”, a imagem da Puente de la Amistad, neste caso, o verbal

e visual une-se na transmissão de uma mensagem, a relação do turismo nas Américas com a

Ponte da Amizade, trazendo um discurso veiculador de propaganda. O segundo é o selo

comemorativo (1983) de 25 anos da Ciudad Presidente Stroessner, fundada em 1957, tendo

como principal representação na imagem, a Ponte da Amizade e acima, o presidente Stroessner,

associando-o a comemoração, passando uma ideia de o “executor” da obra, ou o “responsável”

pelo surgimento da cidade a partir das articulações políticos-diplomáticas que possibilitaram a

construção da ponte.

Imagem 6 – Filatelias. O primeiro de 1972 e o segundo, é o selo comemorativo (1983) de 25 anos da

Ciudad Presidente Stroessner. Fonte: O SELO e PINTEREST. Disponível em:

https://www.oselo.com.br/artigo/inauguracao-da-ponte-internacional-da-amizade/ e <

https://i.pinimg.com/originals/6e/47/73/6e4773f1681454254bd30eac7ff0fee2.jpg>. Acesso em: 07 jun.

2020.

A Ponte da Amizade aparece nos selos e em versões comemorativas, cujo interesse pode

estar relacionado com a necessidade de legitimar a atuação do Estado, conforme Salcedo, “[...]

O selo postal, enquanto texto, pode ser situado no domínio discursivo publicitário, cotidiano ou

escolar, com códigos semióticos específicos e um rico manancial de veiculações discursivas

político-ideológicas” (SALCEDO, 2010, p. 57). Desta forma, o selo, visto como um veículo de

transmissão de conhecimentos, objetiva dar visibilidade aquilo que se considera importante e

relevante.

A importância da obra e da materialização do acordo internacional do Paraguai com o

Brasil é evidenciada na cédula de dez guaranis (PARO, 2016, p. 139) de 1952, onde a segunda

Page 36: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

33

emissão pelo Banco Central do Paraguai colocou em circulação em 1963 com a Ponte da

Amizade, conforme a ilustração da Imagem 7. A cédula traz as assinaturas de Oscar Stark

Rivarola e César Romeo Acosta. No verso, a figura do General Eugenio Alejandrino Garay

Argana, jornalista paraguaio e militar que se destacou na Guerra do Chaco19.

Imagem 7 – Cédula de Diez Guaranies, do Paraguai. Fonte: BILLETES DEL PARAGUAY. Disponível em:

<http://billetesdelparaguay.blogspot.com/2010/04/diez-guaranies-mc212b-partir-del-ano.html> Acesso

em: 07 jun. 2020.

A cédula tem um potencial comunicativo de extrema relevância, haja vista que a maioria

dos paraguaios tiveram acesso a essas cédulas, utilizando-as como um instrumento de troca nas

transações comerciais, circulando entre eles a imagem da Puente Internacial Paraguay-Brasil,

nomenclatura descrita na legenda. O dinheiro como símbolo do país reflete os valores que o

governo quer exaltar, neste caso, o enaltecimento da ponte binacional.

O reforço visual da ponte é apresentado também nas moedas comemorativas no

Paraguai, homenageando a inauguração de 27 de março de 1965, conforme a Imagem 8.

19 BANCO Central do Brasil. Disponível em: <https://www.bcb.gov.br/pt-br/#!/c/noticias/75>. Acesso em: 01

out. 2018.

Page 37: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

34

Imagem 8 – Moeda comemorativa – Puente de La Amistad (1975). Fonte: Portal Guarani. Disponível em:

<http://www.portalguarani.com/detalles_museos_otras_obras.php?id=17&id_obras=972&id_otras=15

7>. Acesso em: 01 out. 2018.

Abaixo, na Imagem 9, encontra-se uma espécie de cartão-postal, no qual explora-se a

especificidade deste meio de comunicação no Capítulo III, com o desenho da Ponte da Amizade

ressaltando a primeira inauguração datada em 27 de janeiro de 1961.

Imagem 9 – Cartão postal com a ilustração da Ponte da Amizade. s/d. Fonte: PORTAL GUARANI. Disponível em:

<http://www.edupratt.com/1759_alfredo_stroessner_matiauda/18606_inauguracion_del_puente_intern

acional_sobre_el_rio_parana_1961__discurso_de_alfredo_stroessner.html>. Acesso em: 07 jun. 2020.

Também se encontram logomarcas com a representação da Ponte da Amizade, a

exemplo da Imagem 10, sobre um evento denominado de “Olimpiada da Historia” organizada

pelo Paraguai.

Na logo abaixo, é possível descrever três elementos óbvios que o compõe, o primeiro

pode-se interpretar como uma representação dos estudantes; o segundo, um livro e o terceiro, a

Ponte da Amizade. Para uma olimpíada de História, inserir a ponte faz todo o sentido

Page 38: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

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dependendo da relevância para a região que pode ter no âmbito historiográfico, econômico ou

geográfico. O historiador Huizinga (apud BURKE, 2017, p. 20), declara que, “o que o estudo

da Historia e a criacão artística têm em comum é um modo de formar imagens”.

Imagem 10 – Logo “Olimpiada de Historia” – Ciudad del Este e Alto Paraná20. Fonte: MUSEU EL MENSÚ. Ciudad del Este, 29 mai. 2017. Facebook. Disponível em: <

https://www.facebook.com/museoelmensu/photos/a.1153201991469620/1218662991590186/?type=3

&theater>. Acesso em: 07 jun. 2019.

As representações iconográficas são linguagens visuais que expressam através das

imagens determinado conteúdo, servindo de suporte mnemônico. As bandeiras, as cédulas, as

moedas, os selos, os cartões postais e as logomarcas são formas de reforçar uma ideia, um

conceito, uma ideologia ou um valor em forma de uma representação iconográfica, nestes casos

selecionados, reforçando a imagem da Ponte da Amizade, lembrando a comunidade da sua

relevância.

Na busca por vestígios, localizou-se o suplemento exposto na Imagem 11. Colocado

em circulação, pela primeira vez, no dia 21 de junho de 1994, denominado Ponte da Amizade21,

produzido pela Folha de Londrina na sucursal em Foz do Iguaçu, com tiragem inicial de 30 mil

jornais, periodicidade quinzenal, cujo propósito era divulgar principalmente a parte comercial

da região trinacional (Brasil, Argentina e Paraguai), mirando no setor turístico. Em 1997 o

suplemento passou-se a chamar Folha da Amizade dobrando o número de tiragem e ampliando

a distribuição. O periódico dedica-se em “secões destinadas a atracões turísticas, hotéis,

20 A 1ª Olimpíada de História del Alto Paraná realizada em 2017. Disponível em:

<https://www.ultimahora.com/organizan-1-oiimpiada-historia-del-alto-parana-n1081827.html>. Acesso em: 07

jun. 2020. 21 Folha de Londrina. Folha da Amizade circula com 80 mil exemplares. 13 nov. 1998. Disponível em:

<https://www.folhadelondrina.com.br/cadernos-especiais/folha-da-amizade-circula-com-80-mil-exemplares-

107803.html>. Acesso em: 15 out. 2019.

Page 39: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

36

restaurantes e produtos vendidos na fronteira, a Folha da Amizade costuma ser usada pelos

turistas como confiável guia para programar passeios e compras22”.

Imagem 11 – Ponte da Amizade. Suplemento da Folha de Londrina, 24 mai a 07 jun. 1997. Ano 3, Nº

66. Fonte: CENTRO DE ALTOS ESTUDOS DA CONSCIÊNCIA - CEAEC. Disponível no acervo do

Holociclo, Foz do Iguaçu.

Um periódico que se dedica a fomentar as atividades econômicas na fronteira, mirando

na melhoria da infraestrutura, desenvolvimento do comércio e no turismo torna-se emblemático

chamar-se de Ponte da Amizade, pois se tornou um símbolo dessa tríade.

Um exemplo da apropriação da ponte para uso político-econômico, é o fato ocorrido em

1999 quando uma campanha publicitária do Itaú Seguros associou a imagem da Ponte da

Amizade ao roubo de carros no Brasil, causando reações de rechaço em um grupo de

empresários de Foz do Iguaçu com apoio da Paraná Turismo, da Secretaria Municipal de

Turismo e Desenvolvimento Econômico entre outras entidades, considerando-a ofensiva e

preconceituosa, segundo relatado na Folha de Londrina23. Conforme o jornal, “para eles, a ponte

que liga Foz do Iguaçu a Ciudad del Este é um dos símbolos que mais divulga o nome da

cidade”, portanto associa-la a criminalização não seria bom para a imagem da região.

22 Folha de Londrina. Folha da Amizade ampliará circulação. 19 jun. 1998. Disponível em:

<https://www.folhadelondrina.com.br/geral/folha-da-amizade-ampliara-circulacao-82268.html>. Acesso em: 15

out. 2019. 23 Folha de Londrina. Empresários de Foz querem impedir propaganda da Itaú Seguros. 13 jun. 1999. Disponível

em: <https://www.folhadelondrina.com.br/geral/empresarios-de-foz-querem-impedir-propaganda-da-itau-

seguros-165037.html>. Acesso em 15 out. 2019.

Page 40: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

37

A partir dos vestígios relacionados as representações sobre a Ponte da Amizade, a

exemplo das bandeiras, selos, cédulas, moedas, logos e cartão-postal, procurou-se refletir sobre

a produção de sentido. Pode-se afirmar que cada imagem vista acima foi criada por indivíduos

que concordaram sobre a importância da ponte ao representá-la nos diferentes objetos citados.

O método indiciário contribuiu para olhar um conjunto de dados que revelam mais do que uma

fonte cuidadosamente elaborada, como um discurso, por exemplo, pois as representações da

ponte permitem pensar em sua relevância.

1.5 A CONSTRUÇÃO DA PONTE TRANSFORMANDO PAISAGENS E ELEGENDO PATRIMÔNIOS

Esse tópico discute o status da paisagem binacional e a construção de patrimônio a partir

da Ponte da Amizade, para isso, discorre-se sobre as categorias conceituais de paisagem e

patrimônio. Insere-se novas fontes no sentido de ilustrar o debate.

A concepção teórica de paisagem está inserida na categoria de estudo da Geografia

Cultural, isto é, o olhar será sob o ponto de vista da relação de quem a produziu, logo se soma

na análise, variáveis objetivas e subjetivas da paisagem.

A tese se propõe a estudar a Ponte Internacional da Amizade e uma das formas de

compreendê-la é através dos sentidos a que são atribuídos a ela, mapeando a relação que os

sujeitos desenvolveram nessa paisagem. A pesquisa parte do concreto, inventariando os

elementos que a compõe, e caminha para o mapeamento da subjetividade de quem a olha. Desta

forma, o trabalho integra o objeto e as atribuições de significado no seu entorno.

Eis abaixo dois exemplos, de recortes selecionados, dos quais tentam harmonizar a

ponte na paisagem:

[...] paisagem e ponte harmonizam-se em um conjunto de sóbria beleza, em

que a concepção do engenheiro surgiu como uma imposição das condições

topográficas naturais (ESCOBAR, 1982. p. 13).

[...] É de justiça realçar-lhe sua beleza arquitetônica, tão ajustada à paisagem

em que se situa. Suas linhas esbeltas, o grande vão livre, em arco vasado, a

considerável altura do taboleiro, a flecha do arco, permitiram que nenhum

dano sofresse a vista do vale, estreito e de margens alcantiladas (Jornal Nosso

Tempo, 1982, p. 8).

A partir das duas citações, entende-se por paisagem, a Natureza, e a ponte é o elemento

incorporado nessa paisagem natural. Ambas as descrições acima, integram a ponte no contexto

maior, em seu entorno. A percepção da ponte não se dá de uma forma isolada, pois ela interage

com o meio e como consequência modifica o ambiente, compondo-o. A transformação do

espaço é percebida, conforme as citações, de maneira equilibrada entre a paisagem natural e a

Page 41: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

38

paisagem arquitetônica imposta pela necessidade geográfica, trazendo o resultado sinérgico da

“beleza” como um elemento comum.

Conforme a definição de Berque (2012),

A paisagem é uma marca, pois expressa uma civilização, mas é também uma

matriz, porque participa dos esquemas de percepção, de concepção e de ação

– ou seja, da cultura – que canalizam, em certo sentido, a relação de uma

sociedade com o espaço e com a natureza e, portanto, a paisagem de seu

ecúmeno (BERQUE, 2012, n/p, grifos do autor).

Para o autor, a marca está no campo do percebido de explicar o que produziu a paisagem,

tornando-a objetiva, logo, deve ser descrita e inventariada. Mas isso não é o suficiente do ponto

de vista da geografia cultural:

É preciso compreender a paisagem de dois modos: por um lado, ela é vista por

um olhar, apreendida por uma consciência, valorizada por uma experiência,

julgada (e eventualmente reproduzida) por uma estética e uma moral, gerada

por uma política etc.; e, por outro, ela é matriz, ou seja, determina, em

contrapartida, esse olhar, essa consciência, essa experiência, essa estética, essa

moral, essa política etc. (BERQUE, 2012, s/p).

A paisagem está no campo da visibilidade e de significação, ou seja, não se trata somente

da visão, mas de todos os sentidos, e o olhar tem a capacidade de mesclar territórios e

invisibilizar fronteiras. A própria palavra, segundo Schama (1996, p. 23), “landschaft

[paisagem]” significa uma unidade de ocupacão humana, podendo ela intervir culturalmente na

natureza.

A paisagem é percebida pela cultura, convenção e cognição que formam a percepção, e

não raro realizam a “proeza de transformar uma topografia inanimada em agentes historicos

com vida propria” (SCHAMA, 1996, p. 23). Então, a apropriacão da Natureza é transformada

pela percepcão humana e “antes de poder ser um repouso para os sentidos, a paisagem é obra

da mente. Compõe-se tanto em camadas de lembrancas quanto de estratos de rochas”

(SCHAMA, 1996, p.17).

A ponte compõe a paisagem binacional construída politicamente e socialmente

emergindo uma identidade fundamentada no trânsito estabelecido a partir dela.

A título de exemplo, cita-se o 2º Concurso Identidade e Diversidade: Nosso Patrimônio,

organizado em 2019 pelo Polo Iguassu – Instituto para o Desenvolvimento da Região

Trinacional e a Prefeitura de Foz do Iguaçu, através da Secretaria Municipal de Educação, que

reúne trabalhos dos alunos do 4º ano das escolas municipais como parte do Programa Integrado

de Educação Turística – PIET.

A tarefa era os alunos expor e retratar o que considerassem representativo de patrimônio

para cada um. A organização selecionou cinquenta trabalhos para serem submetidos a votação

Page 42: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

39

final24 e desses, 4 desenhos representaram a Ponte da Amizade, conforme as imagens

selecionadas abaixo.

Imagem 12 – Desenhos do Concurso de Desenho “Diversidade e Identidade: Nosso Patrimônio. s/a. Fonte: POLO IGUASSU. Disponível em: https://www.poloiguassu.org. Acesso em: 20 out. 2019.

Dos 50 trabalhos selecionados 8% deles consideraram a Ponte da Amizade como um

patrimônio símbolo da Diversidade e Identidade. Nenhum dos desenhos considerou, por

exemplo, a Ponte Tancredo Neves em suas representações.

Como explicar a escolha dessas crianças, de preferirem a Ponte da Amizade em

detrimento da ponte, também binacional, Tancredo Neves? Talvez não se tenha uma resposta,

mas um caminho reflexivo. O pesquisador Tuan (1980) sinaliza que o afeto relacionado ao meio

ambiente pode se manifestar no modo de se expressar, podendo ser percebido como um

símbolo. No caso do concurso, as 4 crianças elegeram o que consideraram ser o patrimônio do

município, merecendo ser apreciado pela arte expressa nos desenhos, desta forma, a ponte

provavelmente trouxe o sentimento afetivo merecendo o reconhecimento.

O patrimônio histórico é uma herança reconhecida, do qual a comunidade compartilha

significados, porém, conforme discorre Choay (2006), é um termo que sofre certas

24 Segundo o regulamento, a comissão julgadora era composta por profissionais da Educação e do Polo Iguassu,

sem ônus, que avaliaram e elegeram os 50 melhores desenhos de todas as escolas participantes.

Page 43: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

40

ambiguidades diferenciando-se do conceito de monumento, que nas suas origens, a acepção

estava proxima ao que, “tudo que for edificado por uma comunidade de indivíduos para

rememorar ou fazer que outras gerações de pessoas rememorem acontecimentos, sacrifícios,

ritos ou crencas” (CHOAY, 2006, p. 18). Além disso, existe uma intencionalidade em evocá-lo

pois ele contribui para consolidar uma identidade comunitária.

Esse valor memorial, com o tempo, acabou sendo ultrapassado pelo valor arqueológico

(CHOAY, 2006, p. 19), porém no caso dos estudantes da quarta série, retratar a Ponte da

Amizade, parece ter um sentido relacionado a uma memória viva, pois ao descrevê-las os alunos

associaram a ponte à diversidade étnica e cultural, elementos reforçados na identidade do

município.

Além do manifesto, o que estaria latente no significado da ponte para essas crianças? É

por se tratar de uma obra de arte arquitetônica de referência mundial na época em que foi

construída? É pela acessibilidade aos produtos eletrônicos? É pela atratividade de um grande

número de turistas de diferentes localidades do Brasil? É por que colocou Foz do Iguaçu em

outro patamar em relação ao tráfego e acessibilidade ao restante do Paraná, integrada com o

projeto da BR 277? O que chamou a atenção das crianças? Quais marcas do tempo foram

deixadas pela ponte? As perguntas são retóricas, não se espera uma resposta e muito

provavelmente as crianças não saberão responder, porém ainda assim, vale questionar o porquê

a ponte foi contemplada como patrimônio símbolo da Diversidade e Identidade.

A associação da memória com a monumentalização é um fato que pode explicar a

ausência da Ponte Tancredo Neves nos desenhos, “[...] o esquecimento, o desapego, a falta de

uso faz que sejam deixados de lado e abandonados” (CHOAY, 2006, p. 26).

A ponte enquanto um símbolo para o município evoca um passado considerado

relevante de ser relembrado. Para John Ruskin “a arquitetura é o único meio que dispomos para

conservar vivo um laço com um passado ao qual devemos nossa identidade, e é parte de nosso

ser” (Apud CHOAY, 2006, p. 139). Essa superestimação expressa na visão de Ruskin, quanto

a arquitetura, pode ser problematizada no sentido de pensar a relevância de uma construção

para consolidações de memórias.

Segundo TUAN (1980, p. 230), a ponte, estrutura funcional, pode ser um símbolo

urbano, representando ao mesmo tempo uma construção utilitária e um símbolo de conexão. O

espaço transitório de um país para outro.

A Ponte da Amizade desempenha um papel protagonista na região, portanto, qualquer

iniciativa de intervenção nesse espaço, pode se tornar problemático. Conforme Choay, ao

discutir Ruskin, sobre o papel do monumento histórico, discorre que “elas são garantias de

Page 44: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

41

nossa identidade, pessoal, local, nacional, humana. Ela se recusa a compactuar com a

transformacão da sociedade ocidental [...]” (CHOAY, 2006, p. 181).

Ao escutar o funcionário do Museu El Mensú, em Ciudad del Este, Sr. José Riquelme,

percebe-se o vínculo criado com a ponte, e a importância que se atribui, pois ele diz que:

[...] se o Paraguai tem algum postal turístico para o mundo é a sua ponte, a

Ponte da Amizade, então é a primeira obra simbólica declarada Patrimônio

Cultural para nós é a Ponte da Amizade [...]25.

Para nós é um pouco nostálgico pois mudou a originalidade, colocaram ferros

nos guarda-corpos da ponte, pois muitas pessoas, e não faz muito tempo, se

atiravam da ponte, aqueles que por exemplo, perdiam tudo no cassino, jovens

que tinham problemas [...] se jogavam e 78 metros é profundo. Então o

governo brasileiro mandou instalar mais segurança [...], mas quando você usa

a ponte hoje já não vai admirar a natureza, antes era muito bonito você ia lá

tinha a água, você via bem longe, a Itaipu Binacional, tem uma ilha no meio

[...] agora nada [...], morreu toda essa visão, uma lástima, mas a modernização

traz consigo mais segurança (RIQUELME, 2019).26

Riquelme refere-se à reforma mais completa já realizada na ponte desde 1965, iniciada

em outubro de 2014 e finalizada em 2016. Além das substituições nas placas de concreto do

pavimento, reparos gerais, pintura e nova iluminação, também foram instalados gradis nas

laterais e cobertura para os pedestres27.

A seguir se encontram duas fotos, à esquerda antes da reforma e à direita após a reforma.

O reparo trouxe mudanças visuais e como consequência trouxe mudanças nos hábitos, pois, se

antes a ponte era utilizada por algumas pessoas, para admirar a paisagem, após a reforma, trouxe

mais segurança e conforto aos pedestres com as barras de ferro e a cobertura protegendo do sol

e chuva.

25 De acordo com a pesquisadora Barretto (2018), a Ciudad Del Este possui seis locais considerados “pontos

turísticos”: Represa Hidroeléctrica Itaipú Binacional; Ponte da Amizade; Catedral de San Blas; Scientific

Monument Moises Santiago Bertoni; Iglesia del Espiritu Santo e Estadio Antonio Oddone Sarubbi. E a Ponte da

Amizade está em segundo lugar de ponto turístico e de interesse com o maior número de avaliações (2018). 26 RIQUELME, José. Visita guiada ao Museu El Mensú. Ciudad del Este, Paraguai, 01 jul. 2019. [Transcrição e

tradução para o português]. 27 GOVERNO do Brasil. Ministro libera Ponte da Amizade revitalizada. 01 jul. 2016. Disponível em:

<https://www.gov.br/dnit/pt-br/assuntos/noticias/ministro-libera-ponte-da-amizade-revitalizada >. Acesso em: 15

out. de 2019.

Page 45: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

42

Imagem 13 – À esquerda a Ponte Internacional da Amizade antes da reforma e a direita após a

reforma. Fonte: VISITE FOZ e TRIP ADVISOR. Disponíveis em: <www.visetefoz.com.br> e

<www.tripadvisor.com.br/LocationPhotoDirectLink-g303444-d2331677-i248492153-

Ponte_Internacional_da_Amizade-Foz_do_Iguacu_State_of_Parana.html>. Acesso em: 20 out. 2019.

Sobre a reforma, entrevistamos o Chefe de Serviço do DNIT da unidade local de Foz do

Iguaçu, o engenheiro Sr. Vicente Veríssimo Júnior, no qual foi possível entender as

necessidades da reforma e também suas consequências.

Nós fizemos uma reforma entre 2015 e 2016 e a gente fez uma correção de

patologias na ponte, [...] que são pequenas coisas que vão surgindo devido ao

tempo, isso em qualquer obra de engenharia, então tem fissuras e as vezes

aparece trincas e você tem que dar um tratamento a elas para evitar maiores

problemas, então a gente tem 1965 a ponte foi inaugurada e praticamente não

se fez nada neste sentido de correção de patologias, até 2015, a gente fez uma

pintura mais ou menos em 2001 e 2002 [...]. Em 2015 a gente fez as correções

de patologia e daí no mesmo projeto por uma questão da Receita Federal deles

estarem sendo questionados pelo Ministério Público sobre contrabando e tudo

e daí acabaram envolvendo o DNIT também no pacote lá do Ministério

Público se não fizesse ia ser multado pagar 50 mil reais por dia e daí a gente

se obrigou a incluir aquelas grades que tem externas na ponte tipo uma

coberturazinha que foi colocado que tem hoje, e daí mudou essa característica,

removemos aquelas grades metálicas que a Receita tinha colocado que vivia

o pessoal arrebentando e daí foi colocado uma estrutura mais segura também

colocamos do ponto de vista com o objetivo de prevenir a ocorrência de

suicídios, porque nós tínhamos uma ocorrência, em uma época de quarto

suicídios por mês [...]. Se tem uma coisa que eu me sinto gratificado com essa

obra que nós fizemos nessa reforma, foi que a gente praticamente conseguiu

zerar, porque a gente dificultou, dizer que é impossível, não é, a pessoa que

forçar ela vai subir nas grades, mas é muito mais difícil. Antes a pessoa se

sentava no parapeito [...] e pulava.

Ao aproximar a arquitetura do presente com o passado, conseguimos explicar as suas

alterações a partir das ocorrências pretéritas. Tanto o Sr. Riquelme quanto o Sr. Vicente

comentam sobre os casos de suicídio na ponte, um de uma maneira mais nostálgica e outro de

uma maneira mais pragmática, mas ambos também reconhecem o efeito positivo após a

reforma.

Page 46: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

43

Ao refletir sobre o significado do monumento, Poulot (2009) faz a seguinte

aproximação: “o arquiteto assemelha-se ao detentor da história e da memória das civilizacões”

pois materializa na obra, ideias, valores, tecnologia, estética, funcionalidade pertencentes do

seu tempo, garantindo para a posterioridade sua perpetuação.

O dicionario de D’Aviler (Cours d’architecture avec une ample explication

par ordre alphabétique de tous les termes, 1761) definia o monumento nestes

termos: “qualquer construcão que serve para conservar a memoria do tempo e

de seu fabricante ou daquele para quem havia sido erguido, tal como um arco

de triunfo, um mausoléu ou uma pirâmide” (POULOT, 2009, p. 45).

A ponte representa uma necessidade da vida pública, ao garantir o trânsito binacional,

mas integra na sua estrutura estética uma mensagem por vezes monumentalizada. Não só ela

pode conter elementos políticos quanto podem utilizá-la para objetivos políticos. Ora, se um

monumento tem a função de vincar uma determinada memória, é evidente que existe um

esforço de selecionar a que melhor condiz para quem se apropria. Conforme Choay (2006, p.

137), “[...] a ideia de progresso e a perspectiva do futuro que determinam o sentido e os valores

do monumento historico [...]”.

A Ponte da Amizade é um patrimônio histórico, portador de valor arquitetônico,

econômico e cultural para a comunidade, cuja paisagem é reconhecida, na integração do

concreto, rio e vegetação, compondo um todo. E essa paisagem construída e tantas vezes

transformada contribui na conservação de um vínculo com o passado.

1.6 QUANDO A MODERNIDADE ABRE NOVOS CAMINHOS

Este tópico trata do conceito de modernidade e como a construção da ponte se vinculou

a modernização do espaço transfronteiriço. Para isso, estabeleceu-se alguns questionamentos,

tais como: Quando se pode dizer que uma cidade se modernizou? Quais são os elementos

constitutivos de uma cidade moderna? Existe algum exagero ao afirmar que a Ponte da Amizade

mudou o paradigma organizacional da Foz do Iguaçu? A ponte trouxe mudanças sociais

significativas?

Para responder esses questionamentos, reflexões teóricas se fazem necessárias. Logo, parte-se

para a compreensão do conceito.

O substantivo “modernidade” é utilizado por um grupo de pesquisadores para

caracterizar o surgimento histórico de uma nova cultura, normalmente em decorrência do

industrialismo de massas (Mello e Souza, 1994, p. 31). Então, esse fenômeno teria como causa

o processo de industrialização e a modernidade, e a consequência advinda deste contexto.

Page 47: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

44

Se analisarmos os efeitos da construção da Ponte da Amizade, e a compreendermos

como uma decorrência do processo global da industrialização, veremos que a aplicação do

conceito de modernidade torna-se assertiva.

Foz do Iguaçu entra na malha econômica do mercado mundial através da

industrialização, não se industrializando, mas funcionando num eficiente sistema de trocas. O

investimento em infraestrutura significa aperfeiçoar, expandir, tirar partido, dar vazão a

crescente indústria produtiva.

A seguir, tem-se a descrição do Engenheiro Gasparino Rodrigues da Silva, da região de

Foz do Iguaçu, publicada na Revista Rodovia em 1965. O retrato pintado da paisagem

binacional demarca nitidamente a diferença entre as margens do rio Paraná, reforçando a

relevância da região, ao elencar as características naturais, culturais e econômicas que

justificaram a construção de uma ponte.

As florestas subtropicais da planície do Prata envolvem as margens do rio

Paraná e se estendem por todo o Oeste paranaense. Foz do Iguaçu, cidade

madeireira por excelência, é a civilização. Aqui existem soldados, turistas,

fuzileiros navais e, sobretudo, os donos da mata. Do contrabando contam-se

tantas e tais histórias que se chega a pensar que ele não existe. Fala-se o

português, o espanhol e até o guarani. O barro, vermelho e frouxo, circunda o

Colégio, os Consulados da Argentina e do Paraguai, o Hotel do Major Castro,

a Capitania, o Batalhão, o aeroporto e o edifício do Forum – que é um primor

de arquitetura moderna. Do outro lado do rio, pardacento e traiçoeiro, o olhar

se perde na copada da floresta paraguaia. A fronteira é um rio. Porque, de um

lado e do outro, a fisionomia do terreno é igual. São milhares de árvores de

um verde escuro. Mata cerrada, compacta e impenetrável e que

ciumentamente cobre toda a terra como a querer torná-la proibida. Aqui o

Governo brasileiro convencionou com o Governo paraguaio fosse construída

uma ponte de concreto, servindo ao intercâmbio entre os dois países e

estreitando os laços culturais entre seus povos (SILVA, 1965. p. 14)28.

Na fronteira, segundo o autor, Foz do Iguaçu é a “civilização”, pois o Estado está

presente a partir dos soldados e fuzileiros navais; ha uma efetiva colonizacão, quando cita “os

donos da mata” e infraestrutura que possibilita a vinda dos turistas. Esse quadro descritivo ajuda

a criar uma imagem que justifica a relevância de uma obra de tal proporção.

A ponte sinalizava a civilização no século XIII, como destaca Le Goff, ao descrever a

visita de Henrique III (1207-1272) Rei da Inglaterra entre 1216 até seu falecimento, narrada

pelo cronista inglês, Matthew Paris (1200-1259), onde é possível a partir do seu

deslumbramento constatar a associação entre a existência de pontes e o indício de civilização.

28 Silva, Gasparino Rodrigues da. In: Rodovia. Número especial da inauguração da Ponte da Amizade Brasil-

Paraguai. Nº 263 – Ano XXV – Jan-fev, 1965. p. 14.

Page 48: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

45

Henrique III, radiante, impressiona-se com todas as pontes que são construídas

com as casas, o que parece não ter existido em Londres, nessa época. Ele acha

isso muito surpreendente e belo e, verdadeiramente, toma aquilo que hoje

chamaríamos de banhos de civilização (LE GOFF, 1998, p. 57).

Evidente que o Le Goff está tratando o conceito de civilização no período medieval,

onde a discussão era outra, distante do conceito de modernidade, porém aqui, a observação é

no sentido de refletir a associação da transformação da cidade e a percepção ou deslumbramento

com o considerado avançado para a época.

A modernidade só existe em contraposição ao arcaico, ou conforme a citação acima, o

civilizado em contraposição ao incivilizado (ARRUDA, 2000), a ponte insere-se neste contexto

ao transformar uma paisagem de “mata cerrada, compacta e impenetravel” dominando-a,

laçando sobre o rio Paraná uma estrutura que “modernizaria” o espaco. Segundo Arruda, “a

vida urbana tornar-se-ia o símbolo maior para termos comparação entre o ‘civilizado’ e o

‘incivilizado’” (ARRUDA, 2000, p. 20). A ideia de modernidade é construída a partir de

referências relacionadas à infraestrutura urbana, e mobilidade é exemplo das bases de

organização de uma sociedade.

Para isso, o domínio do espaço torna-se necessario, “iniciava-se a construção dos

discursos que legitimaram o mapeamento e transformação do espaço, tanto concretamente

como nas suas representações em forma de mapas, fotografias e descricões de viagens”

(ARRUDA, 2000, p. 20).

A monumentalização da ponte como uma representação da modernidade pode ser vista

nas insígnias, nas fotografias, nos discursos e nas matérias, as quais serão analisadas no terceiro

capítulo, aqui foram expostos os elementos conceituais balizadores das análises.

1.7 FOTOGRAFIA COMO MÉTODO PARA ANALISAR OS VESTÍGIOS

Este tópico apresenta um breve histórico do surgimento da fotografia, a relação com a

modernidade, e o seu uso por parte dos governos para propagandear os feitos. Também são

abordados os aspectos teórico-metodológicos que deram suporte as análises das fotografias da

Ponte da Amizade.

A invenção do daguerreótipo (método fotográfico) em 183929 pelo francês Louis

Deguerre (1787-1851) surge no contexto europeu de grandes transformações urbanas, culturais,

econômicas gerando também mudanças nas formas de produzir e consumir imagens,

demandando cada vez mais registros da acelerada transitoriedade da vida moderna, “a

29 Evidente que toda a invenção, está ancorada em desenvolvimentos tecnológicos anteriores auxiliando nas

descobertas e aperfeiçoamentos.

Page 49: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

46

potencialidade da nova técnica faz ainda com que ela seja absorvida por diversos setores,

urbanístico, científico, industrial [...]” (ORTIZ, 1998, p. 67).

O aperfeiçoamento técnico expandiu sobremaneira a produção fotográfica encaixando

no zeitgeist da modernidade retratando o automatismo e a racionalização aplicados na indústria

cultural. “A serializacão do processo de fabricacão dos retratos contém inclusive um germe de

divisão do trabalho: tomada, revelacão e retoque” (ORTIZ, 1998, p. 93).

As fotografias sobre grandes obras eram promovidas pelo governo para produzir registro

das suas atuações dando mais visibilidade às representações do poder, sintetizando a sua

atuação na modernização das cidades. Segundo Kossoy (1993), as diferentes ideologias sempre

tiveram na imagem fotográfica um poderoso instrumento para a veiculação de ideias e

consequentemente manipulação e formação da opinião pública, e isso acontece em parte, pela

credibilidade que se dá a materialidade que a fotografia proporciona.

Através do registro, na linguagem de imagem, é possível acessar as transformações

sociais e inventariar os principais processos de construção da Ponte Internacional da Amizade

e como a imagem foi utilizada para legitimar as intervenções do Governo na região estudada.

A imagem retratada na fotografia não será analisada como uma cópia fiel da realidade,

e sim como uma representação da realidade, ou seja, é um documento e como tal foi construído

em um determinado tempo e espaço. Caso contrário, corre-se o risco de tornar uma fonte

absoluta e como afirma Mauad (1995, p. 75), “entre o sujeito que olha e a imagem que elabora

ha muito mais que os olhos podem ver”, portanto, o tratamento dado as fotografias é o mesmo

de qualquer outro testemunho, investigando os indícios da realidade impressos na imagem.

As imagens podem propiciar diferentes interpretações dependendo que quem as

percebe, pois se trata de uma imagem estática, mas desperta imagens mentais completamente

fluidas mesclando com os apriorismos pessoais, concepções de vida, ideologias além da própria

imaginação que muitas vezes enxerta significados não expressos na fotografia, ou seja, como

qualquer outra fonte, está sujeita a múltiplas interpretações.

Conforme Kossoy (2001), a própria fotografia traz a sua história, pois existiu uma

intenção e/ou motivação em produzi-la, houve uma escolha técnica e artística do melhor ângulo

selecionado o que fica e o que descarta na imagem e por último, os caminhos onde a fotografia

percorreu, a quem atingiu e como foi interpretada. Pois, além de conter uma história, também

é um vestígio do passado, deste caso, uma fonte historiográfica, possibilitando narrar uma

história através da fotografia, sendo um instrumento de apoio para conhecer o passado.

A análise em torno das imagens registradas pelas fotografias pautou-se em responder

algumas questões de natureza metodológica, a exemplo de como interpretar as imagens? Como

Page 50: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

47

analisar o conteúdo da mensagem? Qual a motivação de tal produção? Quem patrocinou o

profissional e a revelação das fotografias? Quais foram os condicionantes históricos? Enfim,

perguntas instigadoras, que buscam ir além das aparências, exigindo decifrá-las em busca de

um sentido.

O aporte teórico-metodológico que orientou e forneceu as bases para o desenvolvimento

das reflexões acerca do uso da fotografia, foram os trabalhos de KOSSOY (2000), MAUAD

(1995; 2000), e também os historiadores BLOCH (2001) e LE GOFF (2003) para pensar o

tratamento dado as fontes historiográficas.

A abordagem de análise das fotografias não quer compreendê-las como uma cópia fiel

da realidade, mas pode-se refletir o que se considera relevante ou emblemático a ser registrado.

Nesse caso, discute-se a monumentalização da obra, tornando-a emblemática do ponto de vista

da intervenção do Estado na fronteira, imprimindo seus ideais nos espaços públicos.

O monumento entende-se como uma herança do passado, algo que, intencionalmente

ou não, tem um poder de perpetuar certas memórias (Le Goff, 2003).

A palavra latina monumentum remete à raiz indo-européia men, que exprime

uma das funções essenciais do espírito (mens), a memória (memini). O verbo

monere significa “fazer recordar”, de onde “avisar”, “iluminar”, “instruir”. O

monumentum é um sinal do passado (LE GOFF, 2003, p. 526).

Para Le Goff, o documento, estendendo-se as fontes de maneira geral, deve ser tratado

como um monumento, submetendo-o aos mesmos critérios de criticidade, pois também pode

ser um instrumento de poder. Ao contrário também se aplica, a pesquisa do monumento exige

o mesmo tratamento dado ao documento, inserindo-o no contexto histórico, decifrando os

traços, os vestígios materiais e sua representação.

Para isso, o tratamento dado a Ponte da Amizade, terá essa concepção de monumento,

[...] porque um monumento é em primeiro lugar uma roupagem, uma

aparência enganadora, uma montagem. É preciso começar por desmontar,

demolir esta montagem, desestruturar esta construção e analisar as condições

de produção dos documentos-monumentos (LE GOFF, 2003, p. 538).

A ideia de pesquisar um tema, demanda esse (des)construir o objeto para,

paradoxalmente compreender o todo. Evitar olhar o objeto como algo dado, natural e sim, com

uma abordagem minuciosa de investigação, indo além do aparente, tentando contemplar todas

as facetas da sua existência.

Todo o documento contém em si elementos interpretativos, além disso, analisar uma

fotografia também passa por um trabalho de enquadramento do pesquisador, pois também

Page 51: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

48

existe uma seleção, organização e atribuição de sentido, ou seja, o olhar seleciona e decifra

conforme o seu filtro.

A materialidade e a semântica, são duas propriedades indissociáveis para analisar as

fotografias, portanto dois recursos são imprescindíveis, o primeiro é a percepção visual da

imagem, capacidade mais objetiva, diz respeito ao ato de ver, inventariar e descrever. O

segundo recurso é o interpretativo, capacidade mais subjetiva e com certeza mais complexa,

pois envolve atribuições de significados, ou seja, buscar compreender a relação da imagem com

a sociedade, analisando os indícios de que a produziu, com que intenção e quais os sentidos de

quem a usufrui, neste caso, trata-se de uma leitura que vai além do espaço, contemplando as

construções simbólicas.

A fotografia é uma criação humana com o objetivo de recriar diferentes realidades,

portanto existe uma materialidade preenchida de significados. Afinal, é uma reprodução do

mundo, capturada pelos olhos singulares de alguém, encharcado de sentimentos, conhecimentos

e intenções.

A imagem quando contemplada, recebe novos significados e sentidos, ganhando vida

própria como um autômato, pois ela provoca no expectador referências muitas vezes não

propositada pelo autor, além disso, a cada época, novas interpretações vão se construindo.

Portanto, a interpretação em relação a essa representação diz respeito aos receptores dessas

obras fotográficas que, a partir dos conhecimentos prévios, das expectativas, da imaginação, do

vocabulário pessoal, da bagagem cultural vão dando sentido e significado a essas imagens.

E da natureza da imagem oferecer-se a contemplação, dando-se a ver. Assim,

a imagem pressupõe um espectador, o que faz com que, no momento de sua

criação, ja se encontre, implícito, um destinatário. Para aqueles que

contemplam as imagens na sua materialidade, elas são antes de tudo, visuais

e proporcionadas pelos sentidos: o olho vê o mundo e registra, na retina, uma

espécie de duplo daquilo que, materialmente, oferece-se ou exibe-se a

contemplação. As imagens resultam de uma relação primária do homem com

a realidade: elas são apreendidas pelos sentidos, por meio do órgão da visão,

e fazem parte dessa forma de conhecimento do mundo advinda da

sensibilidade (PESAVENTO, 2008, p.100).

A ponte, construída em um espaço fronteiriço, se apresenta como um tema de reflexão

no sentido de entender a realidade concreta construída na memória de um coletivo, ou seja,

como a engenharia, a arquitetura e o urbanismo portam um sentido e exercem uma função,

evocando emoções, modos de viver e valores, tornando um dos suportes da memória social da

região.

A ponte representa ineditismo, modernismo, a materialização de um projeto

desenvolvimentista, e as fotografias, além de serem uma forma de concretizar visualmente os

Page 52: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

49

anseios pela modernização, contribuem sobremaneira na veiculação da propaganda política,

conforme destaca Kossoy (2000, p. 82, grifo do autor):

Na realidade, imagens fotográficas representando as temáticas enunciadas

sempre se fizeram em todo o mundo. Fotografias dessas categorias

contribuíram para que se tivesse uma leitura dirigida das cidades e países. Sua

difusão se fazia, ainda no século XIX, através dos álbuns fotográficos

confeccionados em série, com cópias originais ou, então, impressos em

pranchas litográficas. Mais tarde, as imagens já eram multiplicadas aos

milhares, impressas por diferentes processos gráficos e veiculadas pelos

cartões postais, revistas e livros ilustrados. No Brasil essas imagens também

foram produzidas. Trata-se de imagens encomendadas que, se por um lado, se

prestaram para a fixação da memória, por outro, tinham, em geral, uma

finalidade promocional, propagandística, financiadas por instituições oficiais

ou empresas privadas interessadas em divulgar um certo tipo de progresso.

Imagens que mostram o material, mas que, em geral, omitem o social. Imagens

construídas que visam propagar uma ideia simbólica de identidade nacional

conforme a ideologia predominante num dado momento histórico.

A materialização do projeto nas fotografias além de contribuir para o registro das etapas

de construção da obra, também divulgou as dimensões da mesma, ora, se ela foi a maior ponte

em arco de concreto do mundo, as fotografias reforçariam a mensagem nela expressa, ou seja,

não significa apenas olhá-las, mas fixar uma memória relacionada à monumentalização.

No momento de consolidação do projeto desenvolvimentista, o trabalho do fotógrafo

promove a propaganda, ao registrar e difundir imagens de construções, edificações,

infraestruturas promovidas pelo Estado, gerando uma retroalimentação entre o projeto de

modernizar e o reforço da imagem de modernidade.

A modernidade está nos elementos arquitetônicos da ponte e na política de integração

entre os dois países fronteiriços, tornando mais acessível, principalmente as trocas comerciais,

promovendo o intercâmbio e facilitando o movimento das pessoas. Essa característica, Ortiz

(1998) desenvolve ao estudar as transformações de Paris no século XIX, mas pode-se

perfeitamente transpor para a realidade brasileira da metade do século XX:

Neste sentido, eu diria que o princípio de “circulacão” é um elemento

estruturante da modernidade que emerge no século XIX. Circulação de

mercadores e de objetos, [...] elemento fundamental para a materialização de

uma sociedade de consumo (tanto do ponto de vista “útil”, quanto “inútil”)

(ORTIZ, 1998, p. 195).

Os moradores de Foz do Iguaçu e região predominantemente exerciam e/ou praticavam

um comércio local, sem muita perspectiva de circular para outros locais, já que,

geograficamente situa-se no oeste do Paraná com fronteiras naturais dificultando o acesso a

Argentina em função do rio Iguaçu e ao Paraguai em função do rio Paraná, conforme a Imagem

Page 53: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

50

14. Com a construção da ponte, novas possibilidades surgem e consequentemente a circulação

entre os povos aumenta.

Imagem 14 – Vista área da região trinacional. Fonte: GOOGLE EARTH. Disponível em: <https://www.google.com.br/intl/pt-BR/earth/>. Acesso

em: 19 ago. 2018. Edição feita pela autora.

A formação da memória nacional exige um trabalho de enquadramento das memórias

individuais coletiva:

Neste sentido, a mediação entre o vivido e o imaginado, entre o visto e o

simbolizado, passa pelo filtro do olhar de quem vê, como um sujeito cultural

e histórico, recompondo o real na sua dimensão de representação. Portanto, o

próprio ato fotográfico, como modo de representar a cidade, é uma prática

social ancorada num saber ver e num saber fazer (MAUAD, 2000, p. 143).

O trabalho de enquadramento passa pela seleção do autor ao organizar no campo visual

os elementos constantes no visor da câmera e, segundo Kossoy (2000), esse trabalho

evidentemente decorre o efeito de fragmentar e congelar, pois existe recorte espacial e uma

interrupção temporal.

Toda e qualquer imagem fotográfica contém em si, oculta e internamente, uma

história: é a sua realidade interior, abrangente e complexa, invisível

fotograficamente e inacessível fisicamente e que se confunde com a primeira

realidade em que se originou” (KOSSOY, 2000, p. 36, grifo do autor).

O autor refere-se à primeira realidade aquele instante exato em que se dá o ato do registro e a

segunda realidade seria o assunto representado. Essa etapa diz respeito ao ato de construir uma

representação por parte do fotógrafo.

Rio

Par

aná

Rio Iguaçu

Ponte da Amizade

Argentina

Par

agu

ai

Foz do Iguaçu

Page 54: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

51

Esse capítulo tratou das fundamentações teorico-metodologicas que orientaram a

pesquisa, para isso, apresentamos os materiais e métodos utilizados e como foram tratados do

ponto de vista teórico. No próximo capítulo, apresenta-se a história da construção da ponte.

Page 55: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

52

CAPÍTULO II

A PONTE INTERNACIONAL DA AMIZADE

[...] Paraná é habitado, bem no fundo, por entidades guerreiras e por

velhos pagés ricos em experiência e em sabedoria. Aparentemente dócil

na superfície, esconde nas profundezas pardacentas toda a força, a

violência e o mistério de suas águas30.

Para compreender a importância e relevância da construção da Ponte Internacional da

Amizade sobre o rio Paraná para os países Brasil e Paraguai, bem como os motivos para sua

viabilização, traçou-se um panorama do espaço fronteiriço situando-o no sistema hidrográfico

versus rodoviário, procurando inquirir as causas incentivadoras para ligar fisicamente a

fronteira. Os acordos internacionais foram estudados no intuito de mapear historicamente a

trajetória, as responsabilidades, as escolhas técnicas e por fim o impacto da obra da região. Este

capítulo foi organizado em sete tópicos e um subtópico.

2.1. ESTACIONANDO O OLHAR NA PONTE

No exercício de estacionar o olhar na ponte, é possível descrever o entorno, aquele

possível de detectar pelos olhos de quem examina o “estar”, quer dizer onde se esta e o que se

vê. A experiência de estar na ponte, de fixar os pés no concreto e refletir sobre a sua existência,

depois, de caminhar sobre a ponte, de ir atrás dos indícios que possam contar a sua História. A

intenção é voltar o olhar sobre os detalhes, sinais ou achados que possam compor a

compreensão do tema.

A ponte foi pensada, planejada e construída para ser atravessada, essa é a sua vocação,

o seu propósito maior. Logo, muito se fala ou se escreve sobre as experiências na ponte, a

exemplo de quem atravessa, como atravessa, o que atravessa, como é vigiada, fiscalizada,

monitorada enfim, mas pouco se fala sobre a ponte.

Qual é a história dessa ponte com diferentes histórias? Ela permite múltiplas vivências

de atravessar a fronteira, e também uma possibilidade de sobrepairá-la, ou seja, além de transitá-

la, parar em cima e vivenciar a experiência de estar nela. Portanto, não se trata mais de circular

e sim de deter-se nela. Conforme Choay (2006, p. 231), “a arquitetura é a única arte cujas obras

exigem ser percorridas fisicamente”.

30 SILVA, Gasparino Rodrigues da. Rodovia. Número especial da inauguração da Ponte da Amizade Brasil-

Paraguai. Ano XXV, n. 263, 1965.

Page 56: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

53

A Imagem 15 mostra o rio Paraná e sobre ele, a Ponte Internacional da Amizade,

propiciando a ligação terrestre entre Brasil e Paraguai. A estrutura rodoviária e de passarela

permite diferentes usos, pode-se atravessar a pé, de bicicleta, de carro, de caminhão, de ônibus

ou de moto. Antes da ponte, a única via para transpor o rio era através de transportes aquáticos.

Imagem 15 – Vista área da Ponte Internacional da Amizade – Paraguai (lado esquerdo) e Brasil (lado

direito). Foto: Alexandre Marchetti (2009). Fonte: CEAEC. Acervo digital.

A direção determina o olhar, então ao parar no meio da ponte na direção Brasil-Paraguai

a direita, os olhos captam a Ilha de Acaray, nome de origem indígena que significa “cabeca

grande”, também denominada de a Ilha das Cobras, conforme a Imagem 16. Ao localizar-se à

direita do canal, a ilha pertence ao Brasil. E, abriga no imaginário, muitos mitos, entre eles de

se tratar de um vulcão, talvez pela associação com seu formato cônico. O olhar também percebe

ao fundo uma vegetação nas margens do rio Paraná.

Page 57: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

54

Imagem 16 – Vista da Ilha de Acaray no rio Paraná. Fonte: GSHOW. Disponível em: <https://gshow.globo.com/RPC/Estudio-C/Extras-Estudio-

C/noticia/os-misterios-da-ilha-de-acarai.ghtml>. Acesso em: 19 set. 2019.

O alcance do olhar limita a visualização da continuidade do rio Paraná, mas com o

recurso do Google Earth, é possível acessar um além.

Na imagem abaixo é possível visualizar acima, a barragem da Itaipu31. Essa barragem

principal começou a ser construída em 1978 e serve para conter o rio possibilitando gerar

energia necessária para o abastecimento elétrico. Conforme a Imagem 17, a barragem impede

que qualquer embarcação atravesse nesse local.

Imagem 17 – Vista aérea da região binacional sobre o rio Paraná. Fonte: GOOGLE EARTH. Disponível em: <https://www.google.com.br/intl/pt-BR/earth/>. Acesso

em: 19 ago. 2018. Edição feita pela autora.

Na direção Paraguai-Brasil, a paisagem muda criando outra perspectiva na região

binacional. À direita encontra-se o Paraguai e a esquerda o Brasil. Mais uma vez usando o

recurso do Google Earth, na Imagem 18, é possível acompanhar o percurso do rio Paraná.

O rio Paraná, demonstrado abaixo, visualmente tranquilo margeando as fronteiras do

Brasil e Paraguai também encontra a Argentina. No Marco das Três Fronteiras à direita, o

encontro com o rio Iguaçu. Acima a alguns quilômetros, no Parque Nacional do Iguaçu32,

31 O Tratado de Itaipu, pertencentes em condomínio aos dois países, desde e inclusive o Salto Grande de Sete

Quedas ou Salto de Guairá até a foz do Rio Iguaçu, foi assinado em Brasília em 26.04.1973 pelos presidentes Gen.

Alfredo Stroessner, do Paraguai e Gen. Emílio Garrastazu Médici, do Brasil, entrando em vigor em 13.08.1973.

Em 17 de maio de 1974, foi criada a entidade Itaipu Binacional. (MASCARENHAS, 2011). 32 O Parque Nacional do Iguaçu foi criado em 1939 (Decreto N° 1.035) pelo Presidente Getúlio Vargas. Até então

era de propriedade particular. Em 1986 foi tombado como Patrimônio Natural da Humanidade, durante conferência

geral da Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura – UNESCO realizada em Paris.

Ponte da Amizade

Brasil Paraguai

Barragem da Itaipu Binacional

Ilha de Acaray

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55

encontram-se as Cataratas do Iguaçu. Ao continuar o percurso sobre o rio Paraná, percebe-se

um longo caminho que desemboca na Bacia do Prata.

Imagem 18 – Vista aérea da região binacional sobre o rio Paraná. Fonte: GOOGLE EARTH. Disponível em: <https://www.google.com.br/intl/pt-BR/earth/>. Acesso

em: 19 ago. 2018. Edição feita pela autora.

O uso do Google Earth para extrair imagens com escalas maiores permite visualizar o

objeto de estudo abarcando o seu entorno, impossível de captar, até agora, com uma câmera

fotográfica convencional. Ao mesmo tempo em que a ferramenta permite uma ampliação da

visão, faz com que as dimensões da ponte fiquem minúsculas.

O objetivo da ferramenta, disponível no Google Earth, é tornar acessível e fácil de

monitorar, rastrear e gerenciar o ambiente e os recursos da Terra33. Para isso, fornecem acesso

a grandes quantidades de dados e de fácil uso. Pode-se comparar ao sistema panóptico proposto

por Jeremy Bentham em 1785 que permite um vigilante observar todos os prisioneiros,

conforme discorre Foucault (1987, p. 224):

O dispositivo panoptico organiza unidades espaciais que permitem ver sem

parar e reconhecer imediatamente. Em suma, o princípio da masmorra e

invertido; ou antes, de suas três funções — trancar, privar de luz e esconder

— so se conserva a primeira e suprimem-se as outras duas. A plena luz e o

olhar de um vigia captam melhor que a sombra, que finalmente protegia. A

visibilidade e uma armadilha.

33 GORELICK, Noel. et. al. Google Earth Engine: Planetary-scale geospatial analysis for everyone. Remote

Sensing of Environment, v. 102, p. 18-27, 2017. Disponível em:

<https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0034425717302900>. Acesso em: 16 jun. 2020.

Cataratas do Iguaçu

Marco das Três Fronteiras

Ponte Internacional da

Amizade

Page 59: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

56

Aqui, interessa a analogia, pois o sistema que tudo vê, atualmente é o Google Earth,

permitindo a vigilância e domínio, seguindo o princípio de Bentham de que o poder devia ser

visível e inverificável. Mas, em função do caráter público e acessível, pode-se utilizar para

atender diferentes interesses, sejam eles, econômicos, políticos, sociais e/ou científicos.

E são as imagens do Google Earth que permitem entender melhor a geografia do

município de Foz do Iguaçu e o porquê chama-se assim, pois se situa na confluência dos rios

Paraná e Iguaçu e segundo o dicionário onomástico34, o nome tem origem guarani, e ao ser

decomposto na sua grafia primitiva, o ü (água, rio) e wa`su (grande), cria-se um significado

associado a um rio caudaloso. Em um município com tantas águas no seu entorno, a existência

de pontes é quase intrínseca a sua geografia.

Este tópico objetivou situar geograficamente o local onde se encontra a Ponte da

Amizade, olhando-o de diferentes ângulos.

2.2. O RIO PARANÁ: A DANÇA SOB A PONTE

O rio Paraná, o espaço líquido sob a ponte, que desenvolve um relevante protagonismo

no sistema hidrográfico do Brasil, Paraguai e Argentina. Estabelece-se a comparação entre os

sistemas hidroviários e rodoviários, para ampliar as reflexões em relação ao investimento, em

especial, brasileiro nas rodovias. A história do trânsito no rio Paraná fez-se necessário

demonstrando ao grande fluxo fluvial responsável pelo estabelecimento de vários portos e

núcleos populacionais ao longo das margens.

O rio Paraná nasce na confluência dos rios Parnaíba (1220 km) e Grande (1000 km). Ele

passa por dentro e nas margens do Brasil e da Argentina e nas margens do Paraguai,

desembocando no estuário do Prata, na Argentina. Considerado um importante rio para sistema

hidroviário do Prata, não só por sua extensão, mas pela navegabilidade (CAUBET, 1991, p.

21). Segundo dados da Itaipu Binacional35, a extensão total até a foz do Rio da Prata, na cidade

de Buenos Aires é de 4880 km, considerado o oitavo maior rio do mundo em extensão.

Analogamente considera-se o rio como artéria de uma região, pois tal como comparado,

a artéria é responsável por carregar o sangue para todas as partes do corpo mantendo a vida, o

rio, cumpre a função de manter a vida a partir do fluxo hidrológico, além de permitir o fluxo de

pessoas e mercadorias.

34 MACHADO, José Pedro. Dicionário Onomástico Etimológico da Língua Portuguesa. In: WEBBER, Darcilo.

Foz em números. 35 Itaipu Binacional. Disponível em: <https://www.itaipu.gov.br/energia/rio-parana>. Acesso em: 11 jul. 2019.

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57

Schama (1996) ao questionar sobre o funcionamento do sistema fluvial constrói um

raciocínio interessante:

Não eram chamados de bodies of water justamente porque, desde a

Antiguidade, se comparava seu fluxo à circulação do sangue pelo corpo?

Platão acreditava que o círculo era a forma perfeita e pensava que a natureza

e nossos corpos foram construídos segundo a misteriosa lei universal da

circulação, que governava todas as formas de vitalidade. Barlow sabia que ver

um rio equivale a mergulhar numa grande corrente de mitos e lembranças,

forte o bastante para nos levar ao primeiro elemento aquático de nossa

existência intra-uterina. E, com essa torrente, nasceram algumas das nossas

paixões sociais e animais mais intensas: as misteriosas transmutações do

sangue e da água; a vitalidade e a mortalidade de heróis, impérios, nações e

deuses (SCHAMA, 1996, p. 253).

No rio Paraná também flui, além dos cursos d`água, transportes de mercadorias, pessoas,

e também mitos e histórias36.

A partir da observação da cartografia do Estado do Paraná é possível identificar os

principais afluentes do rio Paraná, os rios Piquiri, Ivaí, Tibagi e o rio Iguaçu. E no Paraguai os

principais são Acaray, Acaraymi, Arroyo e o Monday.

O afluente do rio Paraná, o rio Tietê37, constitui uma importante hidrovia para o Brasil,

pois liga-se a um sistema multimodal de escoamento da produção agrícola da região e segundo

dados do DNIT (ano-base 2020)38, a hidrovia Paraná-Tietê, seria responsável pela geração de

quase a metade do PIB brasileiro, transportando produtos como milho, soja, madeira, carvão

entre outros, ligando os estados Goiás, Minas Gerais, São Paulo, Mato Grosso do Sul e Paraná.

A hidrovia é considerada, ao comparar com ferrovias e rodovias, mais segura,

econômica e menos poluente. Segundo estudos realizados pelos estudantes em Engenharia

Naval e Oceânica na Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ existem outras vantagens

do modal hidroviário:

Maior eficiência energética, maior capacidade de concentração de cargas,

maior vida útil da infraestrutura, equipamentos e veículos, maior segurança da

carga, menor consumo de combustível, menos congestionamento de tráfego,

menor custo de infraestrutura e custo operacional, menor emissão de poluentes

e impacto ambiental (BARRETO; ZARÔR NETO, s.d.).

36 Sugere-se para aprofundamento: CAMPIGOTO, José Adilçon. Hermenêutica da Fronteira: a fronteira entre o

Brasil e o Paraguai. Florianópolis, UFSC, 2000. Tese. 37 A hidrovia Tietê-Paraná é administrado pela AHRANA – Administração Hidroviária do Paraná – Órgão

subordinado ao Diretor-Geral do DNIT e responsável por desenvolver e implementar as ações de infraestrutura

aquaviária nas hidrovias do Paraná. 38

DNIT. Hidrovia do Paraná-Tietê. Disponível em: <https://www.gov.br/dnit/pt-br/assuntos/aquaviario/hidrovia-

do-tiete-parana>. Acesso em: 7 jan. 2020.

Page 61: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

58

Na Imagem 19 à esquerda, um exemplo de um comboio-tipo da hidrovia com

capacidade de transportar 6000 toneladas de carga. Normalmente tem 139 metros de

comprimento, sendo possível passar nas eclusas39. Ao lado direito, um exemplo de um

caminhão denominado de tritrem, seria o maior modelo dessa categoria podendo suportar um

peso total de 74 toneladas40 e um comprimento de 20 metros. Apenas um transporte, na

hidrovia, equivale a mais de 80 caminhões.

Imagem 19 – À esquerda um empurrador de comboio-tipo e a direita um tritem. Fonte: DNIT e LOGÍSTICA BAHIA. Disponíveis em: <http://www.dnit.gov.br/hidrovias/hidrovias-

interiores/hidrovia-parana> e <http://logisticabahia.blogspot.com/2013/03/boa-noite-todos-romeu-e-

julieta-bitrem.html>. Acesso em: 05 jul. 2019.

Nessa comparação, somado aos estudos realizados sobre a eficácia em diferentes níveis

do sistema hidroviário, chega-se facilmente à conclusão de que a hidrovia é o melhor modo de

transporte. Porém, o Brasil esta centralizado na rodovia, em parte “era a expectativa que existia

de atingir a autossuficiência do petróleo, que permitiria investir no setor de transporte já

estruturado ao invés de reorientar a matriz de transporte que é sob um aspecto geral a maior

consumidora do petroleo” (BARRETO; ZARÔR NETO, s.d.).

Mesmo assim, o fato de se construir uma ponte, e investir em estradas já demonstra uma

prioridade no sistema rodoviário, haja vista, no caso do rio Paraná, com a construção da

39 Obra de engenharia hidráulica possibilitando às embarcações subir ou descer, rios ou mares, em locais onde há

desníveis, como é o caso de barragens. 40

Segundo o Conselho Nacional de Trânsito, desde 2003, veículos com cargas superiores a 57 toneladas ou com

comprimento total acima de 19,80 metros só podem circular portando uma Autorização Especial de Trânsito –

AET. Art. 1 da Resolução Nº 211 de 13 de novembro de 2006. Disponível em:

<https://www.gov.br/infraestrutura/pt-br/assuntos/transito/conteudo-contran/resolucoes/cons211.pdf >. Acesso

em: 10 jul. 2019.

Page 62: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

59

barragem da Itaipu que não contemplou em seu projeto uma eclusa, demonstrando certa

ausência de políticas voltadas para o incentivo das hidrovias.

Segundo a Imagem 20, o sistema hidroviário do rio Paraná com seus afluentes passa por

várias hidrelétricas e, conforme os círculos destacados, somente essas têm eclusas que garantem

a navegação em toda a extensão, no caso, a maioria encontra-se no rio Tietê. Ao navegar no rio

Tietê e descer pelo rio Paraná, encontra-se o bloqueio estabelecido pela Usina Hidrelétrica de

Itaipu, conforme o destaque retangular a esquerda abaixo, impossibilitando, por exemplo, de

alcançar a Bacia do Prata. Neste caso, as embarcações passagem pela eclusa da barragem de

Yaciretá entre Paraguai e Argentina, que permite a navegação a partir da barragem de Itaipu até

Buenos Aires.

Imagem 20 – A Bacia do rio Paraná, com principal afluente, o rio Tietê. Fonte: DNIT. Disponível em: <http://www.dnit.gov.br/hidrovias/hidrovias-interiores/hidrovia-

parana>. Acesso em: 20 out. 2019. Edição feita pela autora.

Na História do Paraná desde as primeiras ocupações ou ondas povoadoras a questão do

transporte era algo premente. Desde o século XVII com a procura do ouro, no século XVIII

com o latifúndio campeiro, no século XIX com as atividades extrativistas e no comércio da

erva-mate e madeira até café no século XX, juntamente com a criação suínos, enfim, o

transporte era uma necessidade básica para o escoamento das produções bem como a aquisição

de produtos faltantes na região.

Destaca-se na região fronteiriça o período correspondente a exploração predatória da

erva-mate e madeira entre os séculos XIX e início do século XX, porque é nesse momento que

Page 63: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

60

há uma intensificação no sistema hidroviário, dinamizando o transporte de produtores extraídos

do Brasil para a Argentina através do rio Paraná.

Constata-se uma intensa movimentação com poucas ocupações e também com poucos

investimentos em outros sistemas de transporte. Isso se dava principalmente porque os

principais circulantes na região eram argentinos, cujo maior interesse era retirar a erva-mate e

madeira e transportar para a Argentina. E conforme o pesquisador Micael Alvino da Silva

“como contrapartida, deveriam se comprometer em abrir estradas, construir linhas férreas e

outras obras de infraestrutura visando a integração do território paranaense. Na prática nada

disso ocorria” (SILVA, 2014, p. 27).

Isso significa uma predominância no transporte pelo rio Paraná, em travessias

sucessivas buscando garantir em especial o lucro, colocando a margem qualquer propósito de

povoar ou colonizar. Essa prática garantia aos obrageiros41 liberdade de atuação pois não havia

fiscalização, controle fronteiriço ou qualquer meio que limitassem as suas práticas, isso porque

“até 1940 os paranaenses não tinham como chegar a região em menos de 45 dias partindo de

Curitiba” (SILVA, 2014, p. 27), dificultando ainda mais um domínio efetivo por parte do

governo brasileiro.

Em relação aos acordos binacionais, o primeiro tratado entre Brasil e Paraguai é de 07

de outubro de 184442, compondo 36 artigos. Apesar do Brasil não ter ratificado em função de

discordância em relação às referências que determinariam as fronteiras, intencionava a garantia

da liberdade de comércio e navegação, inclusive a livre navegação no rio Paraná até o rio da

Prata.

Em 06 de abril de 1856 celebrou-se o Tratado de Amizade, Navegação e Comércio43,

regulando a navegação e o comércio fronteiriço, entre Brasil e Paraguai no qual estabelecia:

Art. II – O Brasil concede aos navios mercantes da Republica do Paraguay a

livre navegação dos rios Paraná e Paraguay, naquellas partes em que é

ribeirinho; e a Republica do Paraguay concede, nos mesmos termos, ao Brasil

o direito de navegação livre na parte daquelles dous rios em que é ribeirinha;

de modo que a navegação dos ditos rios, na parte em que cada uma das duas

nações é ribeirinha, fica sendo comum a ambas.

41 Obrageiro era o argentino, paraguaio, brasileiro ou imigrante da Europa, dono de uma obrage, que era uma

empresa privada responsável pela extração e transporte da erva-mate e da madeira. 42 Ministério das Relações Exteriores. Disponível em: <http://antigo.itamaraty.gov.br/pt-BR/ficha-pais/5635-

republica-do-paraguai>. Acesso em: 10 jul. 2019. 43

CÂMARA DOS DEPUTADOS. Decreto nº 1.782, de 14 de Julho de 1856. Disponível em:

<https://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/1824-1899/decreto-1782-14-julho-1856-571290-

publicacaooriginal-94382-pe.html>. Acesso em: 10 jul. 2019.

Page 64: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

61

O tratado compunha 20 artigos e somente esse segundo, de livre trânsito pelos rios

Paraguai e Paraná, era permanente, os demais tinham vigência de 6 meses.

Evidente que antes da oficialização da Foz do Iguaçu, havia portos em toda a costa do

rio Paraná, por onde escoavam a erva-mate e a madeira. O sistema hidroviário era um fato. Nas

margens havia muitas fazendas desde plantação de erva mate até de criação de porcos e os

portos eram estruturados ao longo do rio Paraná (GREGORY, 2014).

Segundo Westphalen (1987) encontravam-se oficialmente na região, no final do século

XIX, a Colônia Militar do Iguaçu44 e a Companhia Estrada de Ferro São Paulo-Rio Grande45.

Ou seja, a valorização de um posto de vigilância e um sistema de transporte.

Evidencia-se que para a fundação de uma colônia militar se concretizasse, era necessária

uma via de tráfego e de fato essa foi a primeira atribuição da comissão chefiada pelo Capitão

Bellarmino de Mendonça. Segundo José Maria de Brito (2005, p. 42 e 44):

Continuar a estrada de rodagem que parte da cidade do Porto da União para a

de Palmas; ligar aquela cidade à de Guarapuava; abrir uma estrada que

partindo desta atingisse o rio do Cobre; seguir por este abaixo até sua foz no

rio Paraná; atravessar este rio com o fim de ligar o Estado do Paraná ao de

Mato Grosso; construir estradas estratégicas naquele Estado; descobrir a foz

do Iguaçu; fundar uma Colônia Militar na mesma foz.

Segundo a mesma fonte, foram precisos 7 meses e 20 dias de trabalho, abrindo estradas

desde Guarapuava até chegar à foz do Iguaçu. A missão consistia em estabelecer o controle do

território nacional brasileiro, conforme o relato de Brito (2005, p. 76 e 77):

Justamente neste ponto apareceu uma turma de paraguaios, que vinha se

embrenhando em demanda da erva-mate! Em três meses apenas de realizada

a descoberta da foz do Iguaçu, já o estrangeiro aventureiro pretendia estender

suas garras no território da pátria querida! Eram uzeiros e vezeiros em

invadirem a casa alheia e dali sacarem grandes vantagens que não

encontravam na sua! Escusado é dizer que o tenente encarregado da fundação da Colônia vedou-

lhes a marcha para frente, explicando que daquela data por diante não seria

permitido explorações nas matas brasileiras sem prévia autorização do

Governo (BRITO, 2005, p. 76 e 77).

Segundo José Maria de Brito (2005), além do plano para estabelecer uma colônia

militar, também se cogitava em “estacionar uma flotilha da Marinha Nacional, nas aguas

brasileiras, no Majestoso Paraná, a fim de melhor fiscalizar os interesses brasileiros naquela

região” (BRITO, 2005, p. 29). Pois, segundo o seu relato, os portos existentes pertenciam na

44 Segundo Brito, o ano da fundação da Colônia Militar de Foz do Iguaçu corresponde a 1889 (BRITO, 2005, p.

79). 45 Concessão de 1889.

Page 65: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

62

totalidade aos estrangeiros. Mas, conforme a pesquisa realidade por GREGORY (2014) existia

empreendedores das três nacionalidades nos entornos da Tríplice Fronteira.

Havia vários portos situados na costa do rio Paraná46, conforme demonstra a Imagem

21, de 1929.

Imagem 21 – Mapa do município de Foz do Iguaçu. 1929. s/a. Fonte: WESTPHALEN (1987).

No trabalho do pesquisador Valdir Gregory encontra-se narrativas e relatos de agentes

do Estado, no início do século XX, sobre a região fronteiriça entre Brasil e Paraguai, no oeste

paranaense, descritas nos relatórios de órgãos de segurança. Nesses relatos é possível constatar

a existência de portos tanto na margem brasileira quanto na margem paraguaia. Abaixo um

exemplo desses registros:

Porto Embalse, morador Snr. Cancio Aquino (Paraguaio), porto Bella Vista,

morador Snr. Ewaldo Keneg (Argentino) que faz a travessia de passageiros

em canôa. Chacara Carvalho, do Snr. Antonio Carvalho (brasileiro). Porto

Leonor que fica em frente o porto Curupaiti no Paraguai, morador Snr. Pedro

Jeca Kuei (Argentino) com cinco filhos brasileiros. Porto Carola Cuê, morador

46 José Maria de Brito relata a existência dos seguintes portos: “Os portos situados para acima da cidade de Iguacu

e para baixo das Cataratas são: Sete de Setembro, a 60 quilômetros; Sol de Maio, a 78 quilômetros; Santa Helena,

a 96 km; Britânia ou Companhia de Madeira, a 132 km; S. Francisco ou 12 de Outubro, 143 km; Artaza ou Allica,

a 155 quilômetros; Mendes, a 156 quilômetros” (BRITO, 2005, p. 81).

Page 66: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

63

Amancio Arcamendia (paraguaio), tem uma pequena plantacão de milho,

arroz, feijão, fumo e etc.; Tem no porto duas canôas, uma de propriedade de

Antonio Carvalho e outra de Estefano Ramires. Porto Temoteo Uzuna,

morador Snr. Temoteo Uzuna, Brasileiro, tem plantacões de milho, feijão,

arroz e criacão de gado, cabritos, porcos e galinhas. A estrada até este porto é

carrocavel e boa, podendo entrar caminhões (GREGORY, 2014, p. 191).

Normalmente, esses portos estavam associados a exploração obrages, atividades típicas

do século XIX e XX de exploração das riquezas extrativas, a exemplo de erva mate e madeira,

escoando os produtos para os mercados platinos entre outros. Os portos recebiam a

infraestrutura necessária para atender os interesses dessas atividades.

Imagem 22 – Porto de Foz do Iguaçu fazendo fronteira com o Porto Presidente Franco no Paraguai.

Autor: Schinke. s/d.

Fonte: REVISTA MOSAICOS. Disponível em: <http://www.revistamosaicos.com.br/fotos-

historicas/>. Acesso em: 05 jul 2019.

Para regular as atividades náuticas e garantir a soberania nacional nas águas do rio

Paraná, em 1933, a Delegacia da Capitania dos Portos do Estado do Paraná,47 instalou-se em

Foz do Iguaçu, pois havia um intenso fluxo fluvial, porém o impacto foi bastante significativo

após o desenvolvimento de novos trajetos:

Era uma época em que a navegação no rio Paraná era intensa, na ausência de

ligações rodoviárias de Foz do Iguaçu com outros centros urbanos. A capitania

registrava o trânsito de nada menos que 130 barcos por mês, com transporte

de madeira principalmente, cereais, erva-mate e passageiros. Depois, a

abertura de estradas, instalação de aeroportos e criação de linhas aéreas fez

com que essa grande, primeira e importante “estrada” praticamente fechasse

[...] (Foz do Iguaçu – Retratos, 1997, p. 23).

47 Denominando-se em 1940 de Capitania Fluvial dos Portos do Rio Paraná, depois em 1978 de Capitania dos

Portos do Rio Paraná.

Page 67: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

64

O relato de Dionísio Campana, que chegou a Foz do Iguaçu em 1939, é emblemático ao

tratar da precariedade em se locomover na região. Ao ser questionado sobre a maior dificuldade,

considerada por ele, para o desenvolvimento de Foz do Iguaçu, respondeu:

Creio que era a dificuldade de transporte e comunicação. Nos anos 40 só vinha

de Curitiba um teco-teco por semana trazer correspondência. Para ir a Curitiba

estava disponível este roteiro: de barco até Porto Mendes: de trem até Guaíra;

de barco até Porto Epitácio, SP; de trem até Ponta Grossa e Curitiba. Uma

viagem de oito dias (Foz do Iguaçu – Retratos, 1997, p. 23).

Antes da existência da ponte, o rio Paraná era altamente navegável. Por isso, a

construção da Ponte da Amizade foi projetada de uma forma que não interrompesse a sua

navegabilidade. A altura de 78 metros até o fundo do rio, considerando grandes cheias, caso

houvesse, certificaria a passagem das embarcações. Os discursos ratificavam essa escolha no

projeto, de fazer uma obra que garantisse o melhor aproveitamento do rio, e que servisse de

mais um elemento de integração, conforme Lucas Lopes “unir esforcos para tirar do grande rio

todos os benefícios que encerra48”.

O rio Paraná não era navegável em toda a sua extensão, pois havia a barreira natural das

Setes Quedas. Porém, com o alagamento da mesma, para viabilizar a hidrelétrica da Itaipu,

poderia ter sido contemplada uma eclusa possibilitando da integralidade do potencial

hidrográfico.

Este tópico trouxe o rio Paraná como um protagonista no trânsito de mercadorias e

pessoas na história da região binacional, estabelecendo a sua importância para o escoamento

das produções bem como o papel da ponte nessa dinâmica da mobilidade.

2.3. POR QUE PARAGUAI E BRASIL QUERIAM UMA PONTE?

O Brasil e o Paraguai tinham diferentes razões para concretizar o projeto de construção

de uma ponte na região fronteiriça à leste do Alto Paraná e Oeste do Paraná.

Para o Paraguai, a ponte se tornou uma estratégia para avançar econômica e

politicamente. Para compreender melhor, é preciso conhecer a geografia do Paraguai, conforme

a Imagem 23.

48 Rodovia. Número especial da inauguração da Ponte da Amizade Brasil-Paraguai. Nº 263 – Ano XXV – Jan-fev,

1965. p. 4.

Page 68: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

65

Imagem 23 – Mapa, com destaque no Paraguai. Fonte: GOOGLE EARTH. Disponível em: <https://www.google.com.br/intl/pt-BR/earth/>. Acesso

em: 19 ago. 2018. Edição feita pela autora.

Conforme o mapa acima, o Paraguai é um país mediterrâneo, ou seja, é cercado por

terras e rios (Paraná e Paraguai) fazendo fronteira com a Bolívia, Argentina e Brasil. Isso

significa constantemente depender dos portos marítimos de seus vizinhos para estabelecer

relações comerciais com outros países.

O Paraguai tinha uma incômoda dependência econômica e uma desconfortável situação

política com a Argentina. A questão econômica era de alta vulnerabilidade, pois, a alternativa

mais viável para exportar ou importar produtos, era pelo rio Paraguai e através do Porto de

Buenos Aires, criando uma situação de dependência. A questão política estava relacionada com

o fato de a Argentina ter acolhido os opositores de Stroessner e segundo evidências apontadas

por Menezes (1987, p. 50), apoiando-os em uma possível deposição.

Para compreender a política adotada pelo Paraguai depois da década de 1950, é

necessário conhecer de maneira mais profunda o homem/personagem responsável por estreitar

a relação com o Brasil, a frente do jogo político estabelecido nesse período, ou seja, o general

Alfredo Stroessner (1912–2006). Considerando ser impossível compreender a totalidade do

processo histórico partindo de um indivíduo isolado, vamos estudá-lo no sentido de ampliar a

análise.

Apelidado de “El Rubio” e posteriormente de “El Supremo49”, Alfredo Stroessner, de

descendência alemã, nasceu e cresceu em Encarnación no Paraguai. No ano de 1929 entrou na

Escola Militar, participou da Guerra do Chaco (1932-1935) fez curso de artilharia no Brasil,

49 Em referência a Gaspar Rodríguez de Francia, Ditador Supremo entre 1814-1840 (FARINA, 2003, p. 23).

Page 69: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

66

dedicando-se a carreira militar no Paraguai. Participou da guerra civil de 1947 e de dois golpes

de Estado em 1948. Foi perseguido e perseguiu, assumiu cargos importantes aumentando a

influência política, respeito entre os militares e visibilidade internacional, a exemplo dos EUA,

Argentina e Brasil.

Filiado ao Partido Colorado, aproveitou a grave crise política no qual passava o país e

no dia 5 de maio de 1954, com o apoio dos militares e de uma parcela da população, deu o

golpe de Estado, assumindo a presidência da República no dia 15 de agosto. O Estado foi

organizado para que as forças de segurança e a burocracia trabalhassem e servissem aos seus

interesses e propósitos ditatoriais.

Internamente, a ditadura de Stroessner (1954-1989), considerada a mais longa do

Paraguai, iniciou e se manteve baseada no medo, instaurando várias práticas repressivas,

conforme discorre Laino (1979, p. 87-89) e mesmo Chiavenato (1980, p. 65-66). A primeira

fase, segundo os autores citados, iniciada em 1958 eliminou companheiros do próprio Partido

Colorado com o objetivo de permanecer no poder, instituindo práticas de assassinatos, torturas

e perseguições sob a justificativa de um combate comunista, pelo menos assim era manifestado

tanto internamente como também para a comunidade internacional.

Além da forte repressão, denunciado por Chiavenato, também existia o estabelecimento

do chamado pyrague ou soplón, que significava o “dedo duro”, gerando um ambiente ainda

mais apreensivo com a vigilância anônima, ficando a mercê de qualquer um, ser chamado a

investigaciones e submeter-se às usuais torturas. O aparelho da repressão estava nas estruturas

públicas, mantendo inclusive a oposição vigiada, até “cercá-los, isolá-los e destituí-los”

(CHIAVENATO, 1980, p. 14).

A história da repressão e resistência do Paraguai, durante o governo de Stroessner, está

sendo investigada, segundo Paulo Renato da Silva (2018), principalmente após a descoberta em

1992 das documentações produzidas pela polícia durante a ditadura, inclusive dando origem ao

Centro de Documentación y Archivo para la Defensa de los Derechos Humanos del Poder

Judicial50. Segundo o pesquisador, novas fontes, associadas com uma maior organização e

mobilização dos movimentos sociais ajudaram a “conhecer melhor o papel da sociedade

paraguaia durante o stronismo, para além do suposto colaboracionismo e apatia que teriam

predominado naqueles anos de ditadura” (SILVA, 2018, p. 6).

50 CORTE SUPREMA DE JUSTICIA. Museo de la Justicia. Disponível em:

<https://www.pj.gov.py/contenido/132-museo-de-la-justicia/334 >. Acesso em: 18 set. 2019.

Page 70: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

67

A corrupção paraguaia, que já era institucionalizada, tornando-se a base de sustentação

do sistema ditatorial. O mecanismo de controle permitia a assinatura de decretos para beneficiar

amigos e familiares, a exemplo do enriquecimento de Stroessner e sua família através do

monopólio dos jogos (do jogo do bicho aos cassinos) e do general Andrés Rodriguez que

controlava o tráfico de drogas (CHIAVENATO, 1980, p. 40-41).

Essa faceta da história do Paraguai presente nas obras de Chiavenato (1980) e Laino

(1979), é problematizada por outros pesquisadores, segundo Silva (2018), considerando o

processo de legitimação do governo de Stroessner muito mais amplo e complexo.

A pesquisadora LIMA (2018) aborda as publicações durante o regime de Stroessner, de

caráter nacionalista e patriótico, que objetiva promover e divulgar tanto a sua imagem quanto a

do governo, “principalmente, obras de infraestrutura que acusassem o “desenvolvimento”

econômico paraguaio que estava sendo promovido nestes anos através das políticas

“modernizadoras” do regime e, também, promoviam a imagem do “líder” mediante a

vinculacão da “excepcional” biografia de Stroessner (LIMA, 2015, p. 11).

Antes de Stroessner assumir a presidência, Paraguai e Brasil vinham se aproximando.

Os presidentes Higinio Morínigo (1897-1983) e Getúlio Vargas (1882–1954) em 1941

assinaram dez acordos de natureza comercial, cultural e econômico (MENEZES, 1987, p. 43)

e, com Stroessner e Juscelino Kubitschek (1902–1976), presidente do Brasil entre 1956-1961,

materializaram as intenções do Paraguai de ter uma saída em direção a leste e assinaram o

acordo de construcão da Ponte da Amizade em 1956. Além disso, “[...] A relacão pessoal entre

os dois presidentes era muito boa. Stroessner elogiava Juscelino por seu pan-americanismo e

cooperação assim também como o “grande nome da união Paraguaia-Brasileira” (MENEZES,

1987, p. 44).

Os aspectos econômicos e políticos empurraram o Paraguai para o estreitamento da

relação com o Brasil, que também estava indo ao encontro dos interesses paraguaios, pois havia

um empenho de conquistar novos mercados para os seus produtos, principalmente de

industrializados. Para manter a relação, o Brasil apoiou fortemente a ditadura de Stroessner.

O rio Paraguai desemboca no rio Paraná a uns 1000 Km de distância quando recebe o

rio Uruguai na altura que forma o rio da Prata, no qual existe o Porto de Buenos Aires e era a

melhor alternativa para o Paraguai exportar e importar seus produtos (MENEZES, 1987, p. 51)

e essa situação tornava-o vulnerável, pois se submetia a dependência com a Argentina.

No mês de agosto de 1955 o embaixador do Paraguai no Brasil, Raul Sapena Pastor

(1908-1989), formaliza a entrega de uma petição para o Ministério das Relações Exteriores do

Brasil solicitando a concessão de um porto franco em Paranaguá no Estado do Paraná. Em

Page 71: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

68

novembro ele faz um relato para o Sanchez Quell (1907-1986), ministro das Relações

Exteriores do Paraguai, em relação aos posicionamentos em audiências sobre o assunto:

Ambos Secretarios de Estado, a cuyos Departamentos se ha solicitado

informes por el Ministerio de Relaciones Exteriores del Brasil – acogieron

con viva simpatía el proyecto de conceder al Paraguay un Puerto Franco en

Paranaguá, y prometieron hacer despachar cuanto antes los respectivos

dictámenes. 51

O convênio52 é ratificado no final do ano de 1957, no qual o Brasil autoriza o Paraguai

a manter um depósito franco no Porto de Paranaguá, no litoral paranaense, tornando-o de suma

importância comercial e econômica, possibilitando importar e exportar seus produtos sem a

incidência de tributos, pagando apenas a taxação de prestação de serviços. Em contrapartida, o

Brasil é autorizado a manter um entreposto de depósito franco no porto de Concepción, cidade

localizada às margens do rio Paraguai, para as mercadorias exportadas e importadas.

Além do porto de Paranaguá no Paraná, o Paraguai também pôde acessar os portos de

Santos em São Paulo e o porto de Guanabara no Rio de Janeiro (RODOVIA, 1965, p. 24). A

dinamização comercial tornou-se um fato para o Paraguai intensificando o intercâmbio

econômico no exterior pela proximidade dos mercados europeu e americano, além da óbvia

facilidade comercial com o Brasil.

A distância entre Assunção e o Porto de Paranaguá é de 1.063 quilômetros e através do

rio Paraguai a distância torna-se maior. A ligação fronteiriça sobre o rio Paraná tornou-se

fundamental para o Governo Paraguaio e tornaria a conexão muito mais rentável, representando

uma nova rota de comércio exterior e uma possibilidade de se tornar independente do Porto de

Buenos Aires, Argentina. Conforme o emblemático relato do engenheiro e presidente do

Conselho Rodoviário Nacional – CRN, José Pedro de Escobar em 1965:

O Brasil terá facilitado o acesso do mercado paraguaio ao parque

manufatureiro de São Paulo, cujos produtos deixarão de ser onerados do

pesado encargo de um transporte em condições precárias ou da incidência de

consideráveis despesas portuárias e de uma longa viagem marítima e fluvial,

via Bueno Aires (ESCOBAR, 1965)53.

A ponte, para o Paraguai, representava uma alternativa ao trajeto que ligava Assunção

a Buenos Aires, além disso, esse percurso feito pelos rios Paraguai e Paraná tem uma extensão

51 PASTOR, Raul Sapena. Correspondência da Embaixada do Paraguai no Rio de Janeiro, Brasil – 30 de agosto

e 07 de dezembro de 1955. Acervo do Ministério das Relações Exteriores do Paraguai, Assunção, Paraguai. 52 CÂMARA DOS DEPUTADOS. Decreto nº 42.920, de 30 de dezembro de 1957. Disponível em:

<http://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/1950-1959/decreto-42920-30-dezembro-1957-381643-

publicacaooriginal-1-pe.html>. Acesso em: 15 set. 2017. 53 ESCOBAR, José Pedro de. In: Rodovia. Número especial da inauguração da Ponte da Amizade Brasil-

Paraguai. Nº 263 – Ano XXV – Jan-fev, 1965, p. 13.

Page 72: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

69

de 3.500 km e não pode ser percorrido em todas as épocas do ano em razão das eventuais secas.

Ultrapassada as dificuldades naturais, o transporte fluvial é mais econômico.

O engenheiro paraguaio Enrique Barrail, vice-secretário de obras públicas e

comunicação do Paraguai, proferiu sobre a importância da ponte para os paraguaios:

A ponte vai representar um segundo pulmão para o Paraguai, pois só tem um,

a estrada ligando Assunção a Buenos Aires, o percurso Assunção-Buenos

Aires, feito pelos rios Paraguai e Paraná, tem a extensão de 3500 km e não

pode ser percorrido durante todas as épocas do ano, devido as secas que

principalmente neste período assolam toda a parte sul do Continente. [...] Por via rodoviária o Paraguai atingirá o Atlântico Sul economizando 2.500

km, contando-se ainda as vantagens decorrentes da flexibilidade do transporte

por caminhão e as boas condições de trânsito rodoviário54.

A analogia que o Barrail elabora ao comparar a ligação terrestre através da ponte ao de

um segundo pulmão, torna evidente o “fôlego” que o país teria ao contar com uma segunda

alternativa.

A ponte, de fato, possibilitou uma autonomia para os paraguaios diversificarem as

atividades comerciais, tornando-os grandes exportadores de produtos agrícolas, e importadores

de produtos industrializados, estabelecendo uma triangulação ao reexportar esses produtos aos

países vizinhos (CÉSAR, 2016, p.21). Nas palavras de Stroessner a ponte representou a

possibilidade para “ir superando obstáculos a los efectos de impulsar el desarrollo integral de

sus industrias, de sus productos y de su comercio, como medio de la explotación de sus ingentes

riquezas naturales” (STROESSNER, apud BÁEZ, 2004, p. 155).

Para o Brasil era uma excelente oportunidade de ampliar a influência no país vizinho a

partir da expansão territorial, a chamada “marcha para o oeste”, facilidades de investir capital

brasileiro além dos inúmeros incentivos fiscais (LAINO, 1979, p. 8).

Vale observar que a historiografia brasileira cita “marcha para o oeste” ao analisar as

políticas expansionistas do Brasil em direção ao Paraguai. Na historiografia paraguaia encontra-

se a “marcha al este”, para descrever as políticas de integracão terrestre possibilitando novas

rotas trafegaveis. Ora, observamos com a construcão da ponte uma “marcha de encontro” onde

ambos os países buscaram atender os seus interesses a partir de negociações, acordos,

concessões, beneficiando-se mutuamente das iniciativas marchadas.

O cruzamento de interesses é manifestado no discurso proferido por Juscelino

Kubitschek no dia 04 de outubro de 1958 durante a inspeção às obras da ponte em Foz do

Iguaçu:

54 Rodovia. Número especial da inauguração da Ponte da Amizade Brasil-Paraguai. Nº 263 – Ano XXV – Jan-fev,

1965. p. 20.

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70

[...] Vemos, prestes a se encontrarem, as pontas das grandes rodovias que partem

de Assunção e de Paranaguá, abrindo ao Paraguai uma saída para o Atlântico,

e ao Brasil, mais amplas perspectivas no mercado da nação irmã. Para os

produtos de sua florescente indústria.

A complementação de nossas economias encontrará, nessa grande artéria, o

seu instrumento decisivo. [...]

O Brasil disporá, em Concepción, de um entreposto idêntico ao que foi

facultado ao Paraguai, em Paranaguá. [...]55.

O presidente JK percebia, com a ponte, uma ligação que transcendia o nível regional

estabelecido entre dois municípios, trazendo a relevância para as duas nações, ao construir

condições apropriadas para o melhor desenvolvimento econômico.

Além disso, a ponte significou para o Brasil não só a aproximação com o Paraguai, mas

representava uma projeção continental através da chamada Rodovia Transversal Pan-

Americana alcançando Bolívia e Peru, estabelecendo uma rota continental entre os oceanos

Atlântico e Pacífico.

No mesmo discurso do dia 04 de outubro de 1958, o Presidente JK destaca esse aspecto:

[...] É-me grato ressaltar, ainda, que no encontro de 1956 já se delineavam os

objetivos da Operação Pan-Americana, cujo alcance Vossa Excelência, com

alto descortino e como fiel intérprete do povo paraguaio, soube tão bem

compreender e prestigiar desde o primeiro momento. Com efeito, aquele

entendimento conteve, em si, a mesma ideia que mais tarde iria desabrochar

nessa iniciativa de amplo eco no Continente, iniciativa que, na realidade, não

pertenceu a nenhum país em particular, porque estava na consciência coletiva

das Américas. [...] Essa ideia, que nos congregou às margens do Paraná, ha

dois anos, frutificou esplendidamente, porque era, como disse, uma aspiração

comum, um sentimento coletivo56.

O presidente JK provavelmente refere-se aos planejamentos realizados periodicamente

entre os países da América do Sul para traçar o melhor percurso de integração continental. Por

exemplo, no VII Congresso Pan-Americano de Estradas de Rodagem ocorrido no Panamá entre

os dias 1 e 10 de agosto de 1957, estabeleceu-se a Resolução XXVII57 sugerindo os possíveis

pontos de conexão em se tratando de Brasil, ou seja, para ligar o Brasil ao Paraguai, estabeleceu-

55 Biblioteca da Presidência. Discurso do Presidente do Brasil Juscelino Kubitschek, na inspeção as obras da Ponte

da Amizade, dirigindo-se ao presidente da República do Paraguai no dia 04 de outubro de 1958. Disponível em:

<http://www.biblioteca.presidencia.gov.br/presidencia/ex-presidentes/jk/discursos/1958/64.pdf/view>. Acesso

em: 20 abr. 2020. 56 Biblioteca da Presidência. Discurso do Presidente do Brasil Juscelino Kubitschek, na inspeção as obras da Ponte

da Amizade, dirigindo-se ao presidente da República do Paraguai no dia 04 de outubro de 1958. Disponível em:

<http://www.biblioteca.presidencia.gov.br/presidencia/ex-presidentes/jk/discursos/1958/64.pdf/view>. Acesso

em: 20 abr. 2020. 57 RODRIGUES, Philuvio de Cerqueira. In: Rodovia. Número especial da inauguração da Ponte da Amizade

Brasil-Paraguai. Nº 263 – Ano XXV – Jan-fev, 1965, p. 7.

Page 74: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

71

se como possibilidades as cidades de Guaíra, Ponta Porã, Porto Murtinho e Foz do Iguaçu, esta

última foi considerada o ponto mais conveniente, no traçado da Rodovia Pan-Americana.

Em 1963, no IX Congresso Pan-Americano de Estradas e de Rodagem realizado em

Washington, nos Estados Unidos da América, reuniram-se os membros do Subcomitê da

Rodovia Transversal Pan-Americana dos quatro países componentes, ou seja, Bolívia, Brasil,

Paraguai e Peru, decidindo entre outras ações, aprovar o Porto de Paranaguá como um ponto

extremo da Rodovia Transversal Pan-Americana, substituindo o Rio de Janeiro. Desta forma,

fixaram legalmente, os pontos de conexão, sendo Lima, La Paz, Assunção e Paranaguá58.

A Rodovia Transversal Pan-Americana tem extensão total de aproximadamente 4.480

km e liga-se com a Rodovia Interamericana, oportunizando uma comunicação entre a América

do Norte e a América do Sul, conforme demonstrada na imagem 24:

Imagem 24 – Mapa da Rodovia Transversal Pan-Americana. Fonte: RODOVIA. Número especial da inauguração da Ponte da Amizade Brasil-Paraguai. Nº 263 –

Ano XXV – Jan-fev, 1965, p. 8. [grifo nosso]

58 Rodovia. Número especial da inauguração da Ponte da Amizade Brasil-Paraguai. Nº 263 – Ano XXV – Jan-fev,

1965, p. 21.

Page 75: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

72

Ao atravessar a ponte, no Paraguai chega-se às rodovias Ruta 7, Villa Rica, Ruta 2, São

Bernardino, São Lorenzo, chegando à capital de Assunção com aproximadamente 333 km. Para

acessar a ponte do lado brasileiro, a principal rodovia é a BR 27759, saindo do Porto de

Paranaguá, passando por Curitiba, Guarapuava, Laranjeiras do Sul, Cascavel e por fim Foz do

Iguaçu, totalizando 736 km.

A BR 277 foi incluída pelo Decreto nº 53.960 de 09 de junho de 196460 no Plano

Preferencial de Obras Rodoviárias desfrutando da prioridade em melhoramentos e

pavimentações com recursos específicos para isso.

Na matéria publicada na Revista O Cruzeiro de 1966, o papel do exército na construção

da BR 277 é exaltado, e interpretado como uma ação reversa, ou seja, se no passado o exército

foi responsável por impor suas fronteiras, agora constrói a infraestrutura necessária para que o

Paraguai adentre as fronteiras brasileiras para alcançar o Atlântico, conforme a matéria descrita

abaixo:

[...] Quase ninguém sabe o que ele faz por estas selvas, os açudes que semeia

no Nordeste, as estradas e as ferrovias que construiu e constrói, as fronteiras

que ele povoa – na disseminação de uma língua, de uma bandeira e de uma

pátria. Nada representa melhor a unidade brasileira que nosso exército,

formado de gente do povo, uma entidade democrática, de portas abertas a

todas as raças e aos cidadãos de todas as classes. [...].

O mesmo Exército que parou e empurrou, para além das fronteiras, o Paraguai,

no século passado, está hoje rasgando, em asfalto, uma estrada de mais de 500

quilômetros – levando o bravo e insulado Paraguai, enquistado no vegetal –

até um porto atlântico que o Brasil lhe oferece a fim de fugir à prisão

econômica e política (SOARES, Afrânio Brasil. In: Revista O Cruzeiro, 1966,

p. 81)61.

Nota-se que o Brasil, no discurso acima, não “avanca” a fronteira paraguaia e sim “para

e empurra” dando a entender que quem avançou as fronteiras foram os paraguaios e enfatiza o

papel do exército no estabelecimento de fronteiras e na construção de infraestrutura, reforçando

a “unidade brasileira” através língua, bandeira e de patria, elementos simbólicos de um Estado.

A ponte evidentemente é um elemento de ligação física entre Brasil e Paraguai,

transpondo o rio Paraná, porém também é um espaço ratificador de fronteiras, haja vista que,

em cada lado da ponte, elementos nacionais são dispostos para que não haja dúvida sobre o

59

Até 1964 a rodovia denominava-se de BR 35, com o Plano Nacional de Viação através da Lei nº 4.592 de

29.12.1964 muda-se para BR 277, passando por Paranaguá, Curitiba, Irati, Relógio e Foz do Iguaçu. Disponível

em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/1950-1969/L4592.htm>. Acesso em: 10 jul. 2019. 60

Disponível em: <https://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/1960-1969/decreto-53960-9-junho-1964-

394026-publicacaooriginal-1-pe.html>. Acesso em: 10 jul. 2019. 61 REVISTA O CRUZEIRO. Ano XXXIX. Nº 06. 05 de novembro de 1966. Disponível em:

<http://memoria.bn.br/docreader/DocReader.aspx?bib=003581&pagfis=155502>. Acesso em: 20 out. 2019.

Page 76: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

73

espaço em que está pisando, portanto, o controle fronteiriço é realizado em ambos os lados,

com a presença constante dos funcionários do Estado, seja da aduana, da Polícia Rodoviária

e/ou Polícia Federal. Conforme Raffestin (1993), “três sinais são mobilizados para caracterizar

o Estado: a populacão, o territorio e a autoridade, toda a geografia do Estado deriva dessa tríade”

(RAFFESTIN, 1993, p. 23).

Para o pesquisador Tuan (1980), o patriotismo, na sua concepção, significa amor pela

pátria, raramente está ligado a uma localidade específica, pois além do espaço ser amplo há

estabelecimentos arbitrários de fronteiras, por tanto, faz sentido a criação de símbolos como a

bandeira para ajudar na construção de uma afeição a um determinado território.

O uso do exército para assegurar a unidade e defesa do território está entre os objetivos

da Defesa Nacional62, em especial em zonas fronteiriças. Na Imagem 25, da matéria abaixo, à

esquerda, dois militares estão na frente do monumento comemorativo da construção da ponte,

com a seguinte legenda: “O militar e a bandeira, duas presencas constantes onde quer que haja

fronteira”. Ao lado, a imagem de um trecho da rodovia no Paraguai e o início da Ponte da

Amizade ao fundo, ao lado, a placa indicando o Brasil e ao fundo, o que parece ser “chão batido”

em um descampado lamacento. A fotografia constrói memórias, portanto, o enquadramento

feito pelo fotógrafo, ao disponibilizá-la aos leitores da revista, deixa implícita, certa

representação do Paraguai, somando-se a frase “o exército do Brasil traz o Paraguai até o mar”,

quase uma ação salvacionista.

62 LIVRO BRANCO DE DEFESA NACIONAL (2016). Disponível em:

<http://www.nee.cms.eb.mil.br/attachments/article/139/livro_branco_de_defesa_nacional_minuta.pdf>. Acesso

em: 17 mai. 2020.

Page 77: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

74

Imagem 25 – Matéria sobre o papel do exército na conclusão da BR 277. Ano XXXIX. Nº 06. 05 de

novembro de 1966. Foto: Fernando Seixas. Fonte: REVISTA O CRUZEIRO. Disponível em:

<http://memoria.bn.br/docreader/DocReader.aspx?bib=003581&pagfis=155502>. Acesso em: 20 out.

2019.

O Brasil e o Paraguai tinham interesses convergentes com a construção da ponte, o

Paraguai queria uma saída para o Atlântico, diminuindo sua dependência com a Argentina. O

Brasil, queria conquistar novos mercados, além de ampliar a rota continental.

Esse tópico trouxe as principais razões para Paraguai e Brasil pleiteassem a construção

da ponte sobre o rio Paraná. Nota-se que os motivos estão muito além de trânsito local,

vislumbra-se uma projeção continental.

2.4. A ENGENHARIA DA PONTE

Neste tópico serão apresentadas as especificidades técnicas da Ponte da Amizade,

procurando incluí-la no contexto da engenharia e arquitetura do Brasil das décadas de 1950 e

1960, investigando as causas da escolha do local e a opção em construir uma ponte em arco.

Pode-se dizer que a estética arquitetônica varia conforme a cultura de cada época e

região sendo expressas nos padrões de construções, desta forma, toda a arquitetura é datada e

marcada pelo estilo da época em que foi feita (CHOAY, 2006, p. 166). Por conseguinte, a Ponte

da Amizade insere-se em um contexto histórico, onde a Engenharia no Brasil na década de 60

destacava-se mundialmente no quesito da vanguarda.

O esboço abaixo foi elaborado pela Comissão Especial de Construção da Ponte

Internacional Brasil-Paraguai, contendo o planejamento das etapas de construção e, cada cor

correspondia a uma data de conclusão, então, para que a próxima etapa pudesse ser iniciada, a

anterior precisava estar concluída. A cor preta, por exemplo, diz respeito as partes da fundação,

logo encontrava-se, evidentemente, em prioridade cronológica de execução.

Imagem 26 – Perfil de avançamento da Ponte Internacional da Amizade elaborado pelo DNER. Fonte: DNIT. Acervo do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes – DNIT, Foz do

Iguaçu, PR.

Page 78: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

75

A ponte foi projetada em 1956 pelo Eng. José Rodrigues Leite de Almeida. O

escoramento do arco foi projetado pelo Prof. Eng. Sergio Marques de Souza que, segundo notas

do Prof. Eduardo C. S. Thomaz, foi um dos principais engenheiros até 1953 do Escritório

Técnico Emilio Baumgart63.

O engenheiro Emílio Baumgart (1889-1943)64 se destacou no Brasil na área da

Engenharia Civil e Arquitetura, em especial na sua atuação nas inovações em relação ao

concreto armado, não raro encontra-se o seu nome associado ao “pai do concreto armado

brasileiro”, responsavel pelos calculos estruturais, por exemplo, do primeiro arranha-céu da

América Latina, o edifício A Noite, construído em 1928 no Rio de Janeiro, demonstrando o

patamar que o Brasil estava na engenharia representada por estruturas, consideradas pela

categoria, arrojadas e modernas para a época65.

Baumgart foi responsável por inúmeras outras construções, aqui se destaca a Ponte

Herval, posteriormente batizada de Ponte Emílio Baumgart66 inaugurada em 1930 no Oeste de

Santa Catarina e foi considerada a primeira ponte em concreto armado do mundo, com 68

metros e sem escoramentos. A inovação estava em aplicar os princípios de pontes metálicas no

concreto armado. Outra inovação de Baumgart, utilizado em vários países do mundo, foi o

método de construção de pontes por balanços sucessivos possibilitando, por exemplo, transpor

rios, pois não havia necessidade de escoramento direto tornando-se mais seguras, com maior

capacidade de suporte de carga e com menos peso próprio. Este método será detalhado no

Capítulo III.

Andrade (2016) elenca algumas obras executadas pelo Brasil que o colocou em destaque

mundial no século XX, por tratar-se de recordes:

- Marquise da tribuna do Jockey Clube do Rio de Janeiro, com balanço de 22,4

m (recorde mundial em 1926); - Ponte Presidente Sodré em Cabo Frio, em 1926, com arco de 67 m de vão

(recorde na América do Sul); - Edifício Martinelli em São Paulo em 1925, com 106,5 m de altura (30

pavimentos – recorde mundial); - Elevador Lacerda em Salvador em 1930, com altura total de 73 m; - Ponte Emílio Baumgart em Santa Catarina em 1930, com o maior vão do

mundo em viga reta (68 m), onde foi utilizado pela primeira vez o processo

de balanço sucessivo;

63 THOMAZ, Eduardo. Disponível em:

<http://aquarius.ime.eb.br/~webde2/prof/ethomaz/baumgart/baumgart01.pdf>. Acesso em: 20 jul. 2019. 64 Brasileiro, nascido em Blumenau, SC. Cursou engenharia na Escola Politécnica do RJ, ainda na faculdade

calculou uma ponte de concreto armado, a Ponte Maurício de Nassau no Recife e a ponte do Areal, no RJ. 65 THOMAZ, Eduardo. Disponível em:

<http://aquarius.ime.eb.br/~webde2/prof/ethomaz/baumgart/baumgart01.pdf>. Acesso em: 20 jul. 2019. 66 A Ponte Herval foi destruída por uma enchente em 1983 no Vale do Rio do Peixe.

Page 79: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

76

- Edifício “A Noite” no Rio de Janeiro em 1928, com 22 pavimentos, o mais

alto do mundo em concreto armado, com 102,8 m de altura, projeto de Emílio

Baumgart; - Ponte da Amizade em Foz do Iguaçu em 1962, com o maior arco de

concreto armado do mundo, com 290 m de vão; - Museu de Arte de São Paulo em 1969, com laje de 30 x 70 m livres, recorde

mundial de vão, com projeto estrutural de Figueiredo Ferraz; - Edifício Itália em São Paulo em 1962, o mais alto edifício em concreto

armado do mundo durante alguns meses; - Ponte Colombo Salles em Florianópolis em 1975, a maior viga contínua

protendida do mundo, com 1.227 m de comprimento, projeto estrutural de

Figueiredo Ferraz; - Usina Hidroelétrica de Itaipu em 1982, a maior do mundo com 190 m de

altura, projetada e construída por brasileiros e paraguaios, com coordenação

americano-italiana (ANDRADE, 2016, p. 16, grifo nosso).

A Ponte da Amizade67 fez parte desse rol da engenharia de “vanguarda” pois utilizou-

se do concreto armado e da técnica dos balanços sucessivos, possibilitando a construção de um

arco com o maior vão livre do mundo para a época, de 290 metros, com vão de eixo a eixo dos

pilones de 303 metros, possuindo uma extensão de 552,4 metros; largura igual a 13,5 m; largura

da pista de rolamento igual a 9,5 m; e uma altura de 78 metros, contando desde o fundo do rio,

sendo 32 metros a partir do nível normal68.

A Imagem 27 ilustra, de modo didático, uma comparação de tamanho entre a Ponte

Internacional da Amizade e diferentes edificações, tais como (da esquerda para a direita):

Estrada de Ferro Central do Brasil – E. F. C. B., Ministério da guerra e o Itamarati. Além destas

comparações, apresenta através de uma linha horizontal a marca do nível da água da maior

cheia já registrada, ocorrida em 1905, utilizada para embasar a altura do arco. O comprimento

da ponte é comparado a distância entre as edificações do Itamarati, localizado em Brasília, e a

E.F.C.B., localizado no Rio de Janeiro, servindo de referência quanto a dimensão da obra.

67 Em 2002 realizou-se o primeiro trabalho de manutenção da estrutura, segundo o DNIT foi lavado e pintado com

produto especial. Em janeiro de 2015 a junho de 2016 foi realizada uma manutenção mais complexa com

tratamentos preventivos e corretivos de patologias (trincas, fissuras e outras anomalias) na estrutura, além de

melhorias como a colocação de grades na parte externa aos guarda corpos (DNIT, Foz do Iguaçu, PR). 68 Rodovia. Número especial da inauguração da Ponte da Amizade Brasil-Paraguai. Nº 263 – Ano XXV – Jan-fev,

1965. p. 23.

Page 80: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

77

Imagem 27 – Desenho da Ponte da Amizade comparando com outras edificações. Fonte: RODOVIA. Número especial da inauguração da Ponte da Amizade Brasil-Paraguai. Ano XXV,

n. 263, 1965, p. 24.

Para se ter uma referência internacional eis as pontes em arco de concreto com os

maiores vãos do mundo e os respectivos anos de conclusão, segundo MATTOS (2001).

Ponte País Vão (m) Ano

Wanxian China 425 1997

Krk-1 Croácia 390 1980

Jiangjiehe China 330 1995

Yongning China 312 1998

Gladesville Austrália 305 1964

Ponte da Amizade Brasil/Paraguai 290 196569

Bloukrans África do Sul 272 1983

Arrábida Portugal 270 1963

Tabela 1. Pontes em arco com os maiores vãos do mundo.

Fonte: Mattos, 2001.

As pontes em arco são construídas há muito tempo, desde a Antiguidade. Segundo

Mattos (2011), é a forma estrutural mais utilizada, sendo os sumérios, antes de 3200 a.e.c., os

primeiros a construírem pontes em arco. Estruturalmente, são mais eficientes do que vigas, e

essas estruturas foram amplamente utilizadas pelos povos da antiguidade, pois eram uma

solução estrutural viável para vencer grandes vãos (HOSS, 2014). Pode-se supor a existência

de uma influência romana no projeto da ponte, pois são os precursores no desenvolvimento de

69 O arco, da Ponte da Amizade, com o maior vão livre do mundo finalizou em 1962 com 290 metros, logo, tornou-

se na época recorde mundial.

Page 81: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

78

estruturas em formato de arco (KAEFER, 1998), conforme três exemplos na Imagem 28, de

construções romanas.

Arco de Constantino70 em

Roma, Itália, construído em

315.

Anfiteatro romano em Arles71,

França, construído em 90. Ponte de Trajano72 em

Chaves, Portugal, construído

no final do Século I.

Imagem 28 – Construções em arco.

Fonte: Wikipédia. Acesso em: 15 jan. 2019.

A evolução do aço e do concreto armado possibilitou vãos cada vez maiores e com

menos consumo de material (MATTOS, 2001).

No caso da Ponte da Amizade, o projeto contemplando o vão livre, possibilitava o

tráfego de barcos mesmo nos casos de cheia do rio, mantendo a navegabilidade no rio Paraná.

2.4.1 ESTUDOS TÉCNICOS PARA A CONSTRUÇÃO DA PONTE

Nesse subtópico será apresentado o histórico com as etapas político-administrativas,

bem como a viabilidade financeira e os estudos técnicos para a construção da ponte.

Em 14 de novembro de 1956 o presidente Juscelino Kubitschek assinou o Decreto nº

40.350 criando a "Comissão Especial de Construção da Ponte Internacional sobre o rio Parana”,

cujo responsável pelo projeto e construção foi o Departamento de Estradas de Rodagem –

DNER73.

No dia 19 de dezembro de 1956, o Diretor da Divisão de Orçamento, Aparício Augusto

Câmara, comunica ao Diretor-Geral do DNER, com referência ao ofício nº DG/11 138, de 22

de outubro, assinado pelo presidente, a autorização da dispensa de concorrência pública para a

70 Disponível em:

<https://en.wikipedia.org/wiki/Arch_of_Constantine#/media/File:RomeConstantine%27sArch03.jpg>. Acesso

em: 15 jan. 2019. 71 Disponível em: <https://en.wikipedia.org/wiki/Arles_Amphitheatre#/media/File:Arles_amphitheater.jpg>.

Acesso em: 15 jan. 2019. 72 Disponível em: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Ponte_de_Trajano#/media/File:Ponte_romana_Chaves_01.jpg>.

Acesso em: 15 jan. 2019. 73

Senado Federal. Decreto nº 40.350, de 14 de novembro de 1956. Disponível em:

<http://legis.senado.leg.br/norma/462933/publicacao/15659781>. Acesso em: 07 jul. 2019.

Page 82: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

79

construção da ponte, sendo aprovadas pelo Conselho Executivo do DNER, as empresas

Sociedade de Terraplanagem e Grandes Estruturas – SOTEGE e a Construtora Rabello S.A.

para executar a obra.

O governo do Paraná indicou os engenheiros Almir França e Luiz Luck para comporem

a comissão, juntamente o técnico Antônio Aciolli. O projeto foi elaborado pelo engenheiro José

Rodrigues Leite de Almeida, diretor técnico da SOTEGE LTDA, e o escoramento do arco foi

projetado pelo engenheiro Sergio Marques de Souza em 1962.

A Sociedade de Terraplanagem e Grandes Estruturas Limitada – SOTEGE era uma

empreiteira do Rio de Janeiro, cujo um dos fundadores, o engenheiro João Alfredo Castilho

cultivava uma relação estreita com Juscelino, inclusive abrindo suspeitas de corrupção:

Castilho tinha forte ligação com Juscelino, o que o levou a, após construir a

Ponte da Amizade entre o Brasil e Paraguai no governo JK, erguer uma casa

no Paraguai com o formato das iniciais do presidente e lhe dar de presente, em

terreno doado pelo ditador Alfredo Stroessner, o que acarretou acusações

contra a empreiteira (CAMPOS, 2012, p. 219).

Além da SOTEGE também participou da execução da obra a Construtora Rabello S/A,

empresa mineira fundada em 1944 por Marco Paulo Rabello, que “seguiu JK no governo

estadual, realizando obras rodoviárias, e, quando de sua gestão à frente da União, ficou

incumbida da construção de todo o eixo monumental de Brasília, incluindo os palácios do

Planalto e da Alvorada” (CAMPOS, 2012, p. 102). Segundo Campos, a Rabello também tinha

relação estreita com JK acarretando acusações de que este teria beneficiado ilicitamente a

empreiteira.

Para a estrutura metálica participou a Companhia Siderúrgica Nacional de Volta

Redonda criada em 1930.

Os estudos técnicos logo iniciaram a partir da criação de uma comissão, chefiada pelo

engenheiro Almyr Franca, cujo objetivo era projetar e executar a obra.

Em 1957, nessa fase inicial de estudos batimétricos, para conhecer o relevo do fundo do

rio, um acidente ocorreu no rio Paraná e o engenheiro Tasso da Costa Rodrigues que coordenava

o estudo morreu afogado. Esse fato demonstrou a especificidade do rio Paraná, conforme a

descrição dramática do Engenheiro Gasparino Silva:

[...] Suas variações de nível constituem um dos problemas de base, a serem

resolvidos pelos técnicos. A quem, de uma de suas margens, lhe contemplar

as águas, lhe parecerá que elas estão paradas. E que o sonolento canoeiro

mestiço, de fala guarani, rema fácil. Inopinadamente, porém formam-se aqui,

lá, mais adiante, um redemoinho, outro, mais outro. As águas tomam a

coloração verde-escura da floresta ribeirinha. O mestiço então como que

desperta. Tira o poncho. Ergue o peito. Começou a batalha. Às vezes dura um,

Page 83: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

80

duas ou mais horas. Mas sempre junto às margens, o Paraná continua correndo

serenamente. O mestiço tenta jogar a canoa por um espaço liso. Mas o rio

fecha-lhe a passagem e ele, então, volta o barco no sentido oposto. Rema

vigorosamente para permanecer flutuando. A canoa gira em torno de si

mesma. O homem já é prêsa do rio. Então, em fração de segundo, canoa e

canoeiro desaparecem, sem deixar vestígio algum. Tudo desce para alguns

dias, semanas ou meses depois, quilômetros abaixo, ser lançado em qualquer

barranca recoberta e areia fina. [...] (SILVA, 1965).

Segundo SILVA (1965),74 foram estudados cinco possíveis locais para a construção da

ponte, levando em consideração as variações de nível do rio Parana, sondagens de terreno “com

sondas rotativas em ambas as margens, retirando-se mostras das rochas, sua resistência à

compressão e analise química e classificacão”.

Os documentos analisados para essa pesquisa indicam o município Puerto Presidente

Franco75 como local pretendido para a construção da ponte no lado paraguaio, e após estudos

com a avaliação de prós e contra para cada ponto, optou-se pela construção a 900 metros a

montante do marco comemorativo. Segundo os argumentos apresentados, as vantagens e

desvantagens seriam:

Vantagens: I – Ótima localização em planta, tanto para atende à futura ampliação do

aeroporto como a ligação ao trecho construído no território paraguaio; II – Ótimas ombreiras, que permitem: a) Simetria da obra; b) Comprimento de apenas 555 metros; c) Pequenos aterros de acesso; d) Atingir a cote + 74 no fecho, com rampa de apenas 2,4 %. III – Melhor aspecto do basalto por se apresentar: a) Sem fissuras aparentes (já confirmado pela sondagem); b) Sem degrau observável. IV – Aumento de atração turística do local pelo aspecto monumental da obra

devido a: a) Apresentar-se no primeiro estrangulamento do caudal, que aí se reduz de

600 metros para 300 metros de largura; b) Ser o maior arco do mundo em concreto armado. V – Ausência de possíveis questões com usuários, para efeito de ocupação

local, pela inexistência de benfeitorias. Desvantagens única: Obrigatoriedade de um vão livre com 290 metros76.

74 Silva. Gasparino Rodrigues da. In: Rodovia. Número especial da inauguração da Ponte da Amizade Brasil-

Paraguai. Nº 263 – Ano XXV – Jan-fev, 1965. p. 14. 75 A Puerto Presidente Franco foi fundada em 13 de outubro de 1929 e era um pequeno vilarejo, as margens do Rio

Paraná, contendo um centro onde se embarcavam madeiras e erva mate e desembarcavam artigos de consumo para

a pequena população local. O limite dava-se em Hernandarias (MEDINA, 2004, p.59). 76 SILVA, Gasparino Rodrigues da. In: Rodovia. Número especial da inauguração da Ponte da Amizade Brasil-

Paraguai. Nº 263 – Ano XXV – Jan-fev, 1965.

Page 84: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

81

Segundo o Sr. Vicente, a ponte era para ser construída mais próxima ao porto de

Presidente Franco, mas por razões que se desconhece na totalidade, optou-se através dos

argumentos técnicos levantados acima, a construção mais afastada do lugar acordado com o

Paraguai, mas que, haveria um acordo informal de que a segunda ponte77 obrigatoriamente seria

passando pelo município de Franco.

O fato de a arquitetura da ponte contemplar uma altura de 78 metros até o fundo do rio

teve por base pesquisas históricas sobre as cheias do rio. Segundo os registros, a maior delas

ocorreu em 1905 subindo 30 metros acima do nível normal. Desta forma, existindo outra cheia

como a registrada, ainda teriam 18 metros restantes de espaço, sem interrupção da navegação78.

A manutenção da navegabilidade do rio Paraná foi uma variável contemplada no projeto

e execução da ponte. Estudou-se às variações do nível da água, considerando que, o local

escolhido é uma área de escoamento de precipitação e calculou-se, com base na maior cheia já

registrada, a altura ideal para comportá-la sem interrupções no tráfego aquaviário.

Após o término da obra, muitos “elogios” foram tecidos no quesito da tecnicidade

brasileira, a exemplo das palavras do Juarez Távora, ministro da Viação e Obras Públicas de

1964 a 1967:

[…] Que a Ponte da Amizade – marco fulgurante da técnica brasileira na

engenharia universal – possa simbolizar, pelos tempos a vir, a solidariedade

indestrutível e o espírito de cooperação permanentes das duas grandes Nações

latino-americanas, em seu caminho para o futuro, visando à vitória

democrática sobre o subdesenvolvimento e proporcionando assim dimensão

verdadeiramente humana e social a seus grupos nacionais (TÁVORA. 1965,

p. 3)79.

O destaque dado a ponte como uma referência na engenharia brasileira se mistura com

os elementos simbólicos, vinculando-a as questões políticas e econômicas. Nesta fala de Juarez,

percebe-se uma atribuição de significados à ponte que não são visíveis, mas são acrescidas por

suas palavras.

Este tópico discorreu sobre os estudos técnicos para a construção da ponte, cujo

propósito foi compreender as escolhas em relação ao local e também a escolha do projeto

arquitetônico.

77 Segundo o Ministério das Relações Exteriores, a obra será custeada pela Itaipu Binacional e executada pelo

Governo do Paraná, com supervisão do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT).

Disponível em: <http://www.itamaraty.gov.br/pt-BR/notas-a-imprensa/20371-lancamento-da-pedra-fundamental-

da-segunda-ponte-sobre-o-rio-parana-foz-do-iguacu-10-de-maio-de-2019>. Acesso em: 10 set. 2019. 78 Rodovia. Número especial da inauguração da Ponte da Amizade Brasil-Paraguai. Nº 263 – Ano XXV – Jan-fev,

1965. p. 18. 79 TÁVORA, Juarez. In: Rodovia. Número especial da inauguração da Ponte da Amizade Brasil-Paraguai. Nº 263

– Ano XXV – Jan-fev, 1965. p. 3.

Page 85: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

82

2.5. A AMIZADE SELADA NA PONTE

A pesquisa se direcionou aos sentidos semânticos relacionados a palavra amizade,

investigou-se nos tratados entre Brasil e Paraguai do século XIX, nos discursos do século XX

e nas posturas internacionais com o intuito de compreender o significado onomástico da Ponte

Internacional da Amizade.

A palavra amizade, no senso comum, está relacionada a instância subjetiva de sentir

apreço ou estima, por algo ou alguém. Portanto, ela faz sentido quando existe outro a quem

apreciar, na qual a reciprocidade estabelece a qualidade da relação. A palavra pode ser simples,

sem grandes interpretações quanto a sua acepção, porém seu significado é muito mais

complexo.

A amizade pode ser compulsória, quando a própria geografia impõe a necessidade de

cooperação, afinal de contas, no caso do Brasil e Paraguai, partilham da mesma água, e, não

podendo dela se apropriar, o que resta é compartilhá-la. Desde 1856 ambos os países pensam e

sistematizam essa convivência, a exemplo do Tratado de Amizade, Navegação e Comércio80

estabelecido pelos representantes, o imperador do Brasil, D. Pedro II (1825-1891) e o ministro

das Relações Exteriores do Paraguai, José Berges (1820-1868), promulgado por Decreto nº

1782 de 14 de julho de 1856. E conforme o disposto no Artigo I: “Havera paz perfeita, firme, e

sincera amizade entre S. M. o Imperador do Brasil, e seus sucessores, e súditos, e a República

do Paraguay, e seus cidadãos, em todas as suas possessões, e territorios respectivos”.

A amizade foi suspensa durante a chamada Guerra da Tríplice Aliança entre 1864 e

1870 sendo reestabelecida no Tratado definitivo de paz e amizade perpétua81 firmado em

Assunção no dia 09 de janeiro de 1872, ratificado pelo Brasil no dia 26 de março do mesmo

ano. Neste tratado pós-guerra é evidente que se trata de questões no qual o país “vencedor” faz

exigências ao país “vencido”, neste caso, foi estabelecido uma indenização dos gastos de guerra

acordando como fariam o cálculo e como estabeleceriam as formas de pagamento. No artigo 8º

ja se reestabelece a navegabilidade fronteirica entre os países, com a seguinte redacão: “E livre

80

CÂMARA dos Deputados. Decreto nº 1.782, de 14 de julho de 1856. Disponível em:

<https://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/1824-1899/decreto-1782-14-julho-1856-571290-

publicacaooriginal-94382-pe.html>. Acesso em: 05 jul. 2019. 81 CÂMARA dos Deputados. Decreto nº 4.910, de 27 de março de 1872. Disponível em:

<https://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/1824-1899/decreto-4910-27-marco-1872-550977-

publicacaooriginal-67046-pe.html>. Acesso em: 05 jul. 2019.

Page 86: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

83

para o comércio de todas as nações a navegação dos rios desde a sua foz até aos portos

habilitados ou que para esse fim foram habilitados pelos respectivos Estados”.

Em 1883 novamente firmam um acordo com o Tratado de Amizade, Comércio e

Navegação82 entre o imperador do Brasil Pedro II e o presidente do Paraguai Bernardino

Caballero (1839-1912), estabelecendo no primeiro artigo o seguinte termo: “havera paz

perfeita, firme e inviolável, e sincera amizade entre o Império do Brasil e a República do

Paraguai”.

Em 1938 José Maria de Brito sargento da Expedição Militar de 1888 que culminou na

fundação da Colônia Militar de Foz do Iguaçu, elenca na sua narrativa que uma das vantagens

na “descoberta” da Foz do Iguacu era de “[...] ter concorrido para estreitar os lacos de amizade

entre o Brasil e os países vizinhos [...]”. Ao mesmo tempo, fazia a seguinte observacão “Não

temos inimigos na costa, é certo, mas não devemos desprezar o dilema do insigne “Marechal

de Ferro” – Floriano Peixoto: “Confiar desconfiando sempre” (BRITO, 2005, p. 50 e 89).

As constantes reiterações de amizade fazem sentido, pois para cumprir os acordos

intrínsecos de países fronteiriços e se beneficiar mutuamente dessa convivência, era necessário

um clima amistoso, garantindo o desenvolvimento comercial, a propriedade privada, o direito

de ir e vir, enfim a garantia dos direitos e deveres cumpridos bilateralmente.

No Paraguai, a palavra “amizade” toma uma proporcão política com o paraguaio Ramon

Artemio Bracho (1924 -), ao fundar a denominada Cruzada Mundial de la Amistad – CMA,

(World Friendship Crusade) em 1958, tornando-se o Alfredo Stroessner, o presidente

Honorário e a primeira-dama, Ligia Mora de Stroessner, Presidente da Comissão das Senhoras

da Cruzada.

Ramon Bracho formou-se em medicina em Assunção, atuou como médico nas áreas

rurais e posteriormente como médico militar do Ministério da Defesa Nacional e do Hospital

Militar Central, aposentando-se com o posto de coronel. O objetivo manifesto de criar a CMA

era promover o valor da amizade suscitando em uma sociedade mais “pacífica” superando

diferenças culturais, políticas e religiosas. Para isso, a organização de caráter filantrópico,

realizava uma série de ações recreativas.

A palavra amizade, em especial no período Stroessner (1954-1989), passou a disputar

um espaço político-ideológico típico do contexto da Guerra-Fria, encampado a CMA, inclusive

82 CÂMARA dos Deputados. Tratado de amizade, commercio e navegação entre o Império do Brazil e a

Republica do Paraguay. Disponível em:

<https://www.camara.leg.br/Internet/InfDoc/Conteudo/Colecoes/Legislacao/leis1884v1/pdf29.pdf>. Acesso

em: 05 jul. 2019.

Page 87: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

84

patrocinando através de instituições estatais, a Revista Cruzada Mundial de la Amistad,

responsável por projetar o Paraguai no contexto internacional. Segundo os pesquisadores

SOLER e BOZZOLASCO (2017), a revista era um meio para o Paraguai se posicionar nos

assuntos internacionais.

Las posiciones y discursos políticos imbricados en una matriz argumentativa

propia de la Guerra Fría, se tornan evidentes al analizar los artículos y

publicaciones de la CMA donde son atendidos temas de la política

internacional. Allí se verán plasmados muchos de los planteamientos de la

derecha regional, así como advertencias de los “avances totalitarios” que

atentan contra las bases de la civilización (entendida como la civilización

occidental y cristiana). Entre otras, la revista tomó posición en contra de la

presión internacional que ejercía la ONU a causa de las denuncias de

violación sistemática de los Derechos Humanos durante la dictadura. En

1978 la revista criticaba a la ONU por “imponer” un plebiscito a la dictadura

de Pinochet y no resolver los problemas de los países ocasionándole un gasto

oneroso. Un año más tarde, en 1979 argumentaba que “la ambición de

poder”, ahora de la mano de un proceso revolucionario, conllevaba a la

violencia y alertaba de la situación de Nicaragua, sin nombrar la Revolución

Sandinista (1979-1990) que derrocó a Anastasio Somoza Debayle, uno de los

aliados políticos del régimen stronista. Ese mismo año, el 23 de abril de 1979

La Liga Anticomunista Mundial realizó su 12va. conferencia anual en

Asunción, con todo el soporte del gobierno de Stroessner (SOLER e

BOZZOLASCO, 2017).

Os princípios da organização, promoveram, a denominada, cultura da paz, do diálogo e

da integração associando com os valores da amizade e da fraternidade, permitiu uma penetração

do país em organizações internacionais. Essa influência vai diminuir com a crise do regime

estabelecido por Stroessner (SOLER; BOZZOLASCO, 2017).

A Revista Manchete fez uma matéria profética, cujo título A Ponte da Amizade, sobre a

inauguração da mesma pelos presidentes JK e Stroessner em 1961, analisada no Capítulo III,

na qual prevê o nome da ponte: “[...] A ponte, que bem merece o nome de “Ponte da Amizade”,

tem a extensão de 552 metros e 40 centímetros, possuindo um vão livre de 303 metros, o que

se tornou possível em razão de ser metálica a sua estrutura [...].83” Até então, todos os

documentos e discursos a chamavam genericamente de Ponte sobre o Rio Paraná, ou Ponte

Internacional sobre o Rio Paraná.

A Ponte da Amizade84 foi batizada nos documentos oficiais, com esse nome em 27 de

março de 1965, data da inauguração e da assinatura do Acordo Sobre a Utilização, Conservação

83 Revista Manchete. Disponível em:

<http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=004120&Pesq=paraguai&pagfis=61764>. Acesso em:

15 jan. 2019. 84 Até 27 de março de 1965 a ponte era denominada nos documentos e discursos como Ponte Internacional sobre

o Rio Paraná.

Page 88: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

85

e Vigilância da Ponte sobre o Rio Paraná, documento pelo qual os presidentes Castello Branco

e Alfredo Stroessner, confirmaram seus entendimentos e comprometeram-se com as suas

disposições.

A primeira disposição do documento é a chancela quanto ao nome, “A Ponte

Internacional sobre o Rio Paraná que une Puerto Presidente Stroessner a Foz do Iguaçu se

denominara “Ponte da Amizade”. E esse fato nos faz lembrar a afirmação de Certeau quando

diz: “todo o poder é toponímico e instaura a sua ordem de lugares dando nomes” (CERTEAU,

2014, p. 198).

Na visita guiada pelo Museu El Mensú85, José Riquelme, responsável pelo museu, inicia

a sua fala com uma contextualização das fotografias da Ponte da Amizade, expostas logo na

entrada da casa e sua explicação parte do porquê a ponte recebeu esse nome:

A Ponte da Amizade nasceu com o objetivo de que Paraguai e Brasil voltam

a ter relação, porque durante 60 anos depois da Guerra da Tríplice Aliança não

tinha mais amizade, não tinha mais diálogo então Paraguai praticamente

terminava daqui a 200 km na cidade Coronel Oviedo e depois tudo era selva

impenetrável e daí em 1954 quando assume o Governo de Paraguai, o General

Alfredo Stroessner viaja para o Brasil e tem um encontro com o Presidente do

Brasil que era o Juscelino Kubitschek ali, eles chegam a um acordo da

possibilidade de construir uma ponte e chama-la de Amizade. A palavra que

vai simbolizar de novo a amizade entre dois povos paraguaios e brasileiros

[...] (RIQUELME, 2019)86.

Aqui a topofilia e a toponímia unem-se, segundo Candau, “a memoria e a identidade se

concentram em lugares, e em lugares privilegiados, quase sempre com um nome, e que se

constituem como referências perenes percebidas como um desafio ao tempo” (CANDAU, 2016,

p. 156). Na fala do Riquelme, a alcunha “amizade” tem um sentido simbolico onde a memória

trabalha, ou seja, permite a construção de uma narrativa que faz sentido para identidade pessoal

e/ou coletiva.

A referência da Guerra da Tríplice Aliança como um momento de ruptura com os laços

de amizade e após 60 anos o restabelecimento dos laços com a construção da ponte,

simbolizando novamente a amizade, parece a construção de um sentido que busca amenizar um

ressentimento latente desde a guerra, que conforme a pesquisadora Szekut “constitui memorias

históricas compartilhadas a partir das constantes menções e relações feitas pela sociedade

paraguaia” (SZEKUT, 2018, p. 62).

85 O Museu El Mensú localiza-se em Ciudad del Este. Foi fundado em 23 de outubro de 1999 e inaugurado no dia

03 de fevereiro de 2000. 86 RIQUELME, José. Visita guiada ao Museu El Mensú. Ciudad del Este, Paraguai, 01 jul. 2019. [Transcrição e

tradução para o português].

Page 89: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

86

Para Riquelme, a iniciativa advinda do seu país em especial na figura de Stroessner,

revela a consolidação de uma memória reforçada com discursos, insígnias e imagens, ao

associá-lo com o responsável pela aproximação com o Brasil.

Em um contexto político, a palavra amizade, pode ter certa polissemia. Ao batizar de

Ponte Internacional da Amizade, a chancela de conexão binacional é estabelecida e o que

poderia ser subjetivo ou correr o risco de se tornar efêmero, passa a ganhar concretude, através

de acordos, leis e finalmente pelo concreto armado, solidificando a relação Brasil-Paraguai.

Conforme SOLER e BOZZOLASCO (2017), el vocablo amistad operó como un

significante vacío con capacidad de aglutinar sentidos asociados a la matriz argumentativa de

las derechas, colocando o Paraguai com certa visibilidade internacional. Pois internamente, no

dia 30 de julho de 1964, por uma Resolução do Ministério da Educação do Paraguai formalizou-

se como o “Dia da Amizade”87. E em 2011, a Organização Internacional das Nações Unidas –

ONU elegeu essa data para marcar o Dia Internacional da Amizade, e em 2015 para celebrar a

data, o Ban Ki-moon (1944-), na época secretário geral da ONU, publicou a seguinte

mensagem:

O Dia Internacional da Amizade foi promovido por uma pessoa com uma

visão simples, mas profunda: que as forças de animosidade e do ódio em nosso

mundo não se comparam com o poder do espírito humano. Tive a

oportunidade, no início deste ano no Paraguai, de elogiar o pioneiro, Dr.

Ramon Bracho, por sua convicção de que, assim como a amizade constrói

pontes entre as pessoas, também pode fomentar a paz em nosso mundo (KI-

MOON, 2015, tradução livre). 88

A associação que o Ki-moon faz da amizade, um pré-requisito para construir pontes

oportunizando um futuro de pacificação traz evidentemente uma perspectiva política ao tema,

pois não se trata de algo ingênuo e despretensioso, existe uma expectativa a ser atingida no

nível das relações internacionais.

Para ampliar o significado, recorre-se a Ortega (2000) no livro Para uma Política da

Amizade: Arendt, Derrida, Foucault no qual associa a política da amizade como uma nova

forma de sociabilidade. Para isso, cita alguns autores franceses, a exemplo de Derrida que

trabalha a perspectiva da amizade não mais restrita à esfera privada da intimidade, mas em uma

87

Gold Mercury Internacional. Disponível em: <http://goldmercuryaward.org/board/ramon-artemio-bracho/>.

Acesso em: 19 jul. 2019. 88

Nações Unidas. Disponível em:

<http://web.archive.org/web/20170301035609/http://www.un.org/es/events/friendshipday/2015/sgmessage.sht>.

Acesso em: 07 jul. 2019.

Page 90: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

87

perspectiva pública, não havendo relação social sem política, portanto a amizade seria um ato

político.

Nos discursos proferidos por alguns políticos brasileiros relacionados ao nome da ponte,

a associação da palavra amizade nas relações entre Brasil e Paraguai fica explícito. Para

exemplificar, tem-se o discurso do Cunha Bueno, deputado federal em 1965 que disse:

“Denominada Ponte da Amizade, acreditamos, Sr. Presidente, que o título dado a esta obra de

arte foi dos mais felizes de vez que permitirá o entrelaçamento maior entre as Repúblicas do

Paraguai e do Brasil” (Cunha Bueno, 1965)89. O discurso traz a interpretação que o vínculo

estabelecido necessita de uma relação amistosa para que haja uma maior estreiteza.

Da mesma forma, o discurso de Stroessner também contém o apelo da amizade na

concretização do projeto.

Pueblos que se unen por encima de los ríos, que convierten sus fronteras en

motivos de paz, de concordia, de solidaridad entre vecinos; que dispuestos a

la conquista de un bien común, conjugan sus propias fuerzas sin medirlas en

la proporción que representan, y sin condiciones a compensaciones que

desnaturalizan los lazos de la amistad; que al engrandecerse a sí mismos

aman y auspician el engrandecimiento de los demás; que abren para sí y para

los otros los caminos que conducen a los centros de la civilización y de la

cultura, así como a las fuentes de provisión y a los mercados mundiales; que

suprimen los barreras y proclaman el triunfo de la inteligencia y de la buena

voluntad entre las naciones, son pueblos hacedores de la historia que

enaltecen a los destinos de la humanidad. (STROESSNER, 1961)90

Nesse discurso proferido em 1961, o presidente Stroessner exalta a união com a

supressão de barreiras e ajuda mútua no qual entende a ponte como o elemento responsável em

abrir o caminho para, sobretudo, expandir mercados.

Por sua vez, a amizade no relato do engenheiro e presidente do Conselho Rodoviário

Nacional – CRN em 1965, fica mais claro a associação com irmandade: “Conhecendo-nos

melhor, mais fundamentos encontraremos em uma amizade, que inspira tão fecundas

realizações. É que melhor e mais belo destino para uma obra de arte – ser, pelo tempo a fora,

fator de união entre os dois povos irmãos e instrumento de seu progresso91”.

Segundo Ortega, o termo irmão aparece associado nos discursos de amizade, e cita Carl

Schmitt para analisar a etimologia da palavra:

89 Diário do Congresso Nacional. Disponível em:

<http://imagem.camara.gov.br/Imagem/d/pdf/DCD26MAR1965.pdf#page=19>. Acesso em: 07 jul. 2019. 90 STROESSNER, Alfredo. Inauguración del Puente Internacional sobre el Río Paraná, 1961 - Discurso de

Alfredo Stroessner. Disponível em:

<http://www.portalguarani.com/1759_alfredo_stroessner_matiauda/18606_inauguracion_del_puente_internacion

al_sobre_el_rio_parana_1961__discurso_de_alfredo_stroessner.html>. Acesso em: 08 jul. 2020. 91 ESCOBAR, José Pedro de. In: Rodovia. Número especial da inauguração da Ponte da Amizade Brasil-Paraguai.

Nº 263 – Ano XXV – Jan-fev, 1965.

Page 91: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

88

Na língua alemã – como em muitas outras línguas –, o amigo é originalmente

somente o companheiro do clã (Sippengenosse). Amigo é assim originalmente

somente o amigo de sangue (Blutsfreund), o consanguíneo, ou o aparentado

(“verwandt Gemachte”) por matrimônio, fraternidade de juramento ou

instituições correspondentes (apud ORTEGA, 2001, p. 61).

Trata-se de um discurso que vincula a amizade a povos irmãos, comum no imaginário

da amizade as metáforas familiares. Mas também contém no discurso a associação com o

desenvolvimento, o progresso, a união, a integração, ou seja, a razões políticas. Então, pensando

em uma sociedade calcada na modernização e individualização, a amizade se constituiria em

uma alternativa às velhas formas de relação institucionalizadas (ORTEGA, 2001, p. 56).

O periódico denominado Rodovia92, publicou em 1965 um número especial sobre a

inauguração da Ponte da Amizade. Nele, constam seis artigos nos quais exploram a importância

da ponte sob o ponto de vista econômico-financeiro, o trânsito pan-americano, o valor turístico

e os dados técnicos construtivos. Na apresentação da revista, o ministro da Viação e Obras

Públicas, Juarez Távora e o diretor-geral do DNER, Lafayette Prado, celebram o término da

obra, destacando aspectos considerados relevantes para cada um. O último artigo da revista,

sem autoria, foi escrito em inglês, denominado Brazil – Paraguay Internacional Bridge, sem a

tradução para o português, no qual se desconhece as causas. Aqui se traduziu para melhor

fluidez na leitura, conforme a citação abaixo:

A ponte Brasil-Paraguai é chamada de “Ponte da Amizade” por causa das

relações amigáveis desses países que a ponte fortalecerá ainda mais. O Brasil

tem o prazer de estender a tão boas instalações vizinhas e de países irmãos

seus próprios portos marítimos e de transporte em alto mar e de fornecer a ela

uma operação livre de taxas. Através das estradas brasileiras, o Paraguai

poderá usar os portos de Paranaguá, Santos ou Rio de Janeiro, ou todos eles.

Um entreposto de depósito franco será fornecido para as operações no

Paraguai, de acordo com o convênio que os dois países assinaram93

(RODOVIA, 1965, p. 24, tradução livre).

Destaca-se a explicação do porquê a ponte se denomina de Ponte da Amizade, e essa

explicação chama a atenção dos benefícios que o Brasil estava oferecendo ao Paraguai,

omitindo a contrapartida que o Brasil estaria se beneficiando com o acordo político de trocas

mútuas. Alguma intencionalidade certamente estava por trás do conteúdo e da forma

92 Rodovia. Número especial da inauguração da Ponte da Amizade Brasil-Paraguai. Nº 263 – Ano XXV – Jan-fev,

1965, p. 24. 93 “Brazil-Paraguay bridge is called “Friendship Bridge” because of the friendly relations of these countries which

the bridge will further strengthen. Brazil is happy to extend to a so good neighbor and sister-country facilities of

its own seaports and open-sea transportation and to provide her with custom-free operation. Through Brazilian

Roads Paraguay will be able to use either Paranaguá, Santos or Rio de Janeiro ports, or all of them. Custom-free

warehouses will be provided for Paraguayan operations according to the agreement both countries signed”

(RODOVIA, 1965, p. 24).

Page 92: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

89

apresentada no periódico e algumas perguntas podem ser realizadas para melhor compreender

esse contexto, por exemplo, a quem se destina essa mensagem? quais ganhos eram almejados?

qual concepção de amizade estava sendo transmitida? Perguntas que não tem a pretensão de

responder, mas de refletir sobre o intuito de tal mensagem.

Neste tópico, abordou-se a denominacão “amizade” inserindo-a no contexto político

entre Brasil e Paraguai, procurando dissecar seus diferentes sentidos e atribuições. Conclui-se

que a palavra amizade não foi atribuída de uma forma vazia de sentido político ou de maneira

abstrata, ela é uma reafirmação do exercício político.

2.6. ACORDOS INTERNACIONAIS

Este tópico apresentará o histórico das tratativas binacionais estabelecidas entre Brasil

e Paraguai objetivando o aumento da mobilidade de ambos os países.

O Paraguai havia estudado uma via alternativa ao Porto de Buenos na Argentina, e para

isso uma aproximação com o Brasil era inevitável, até o porquê este também flertava com a

possibilidade de ampliar mercado com o país vizinho.

A existência de uma comunicação terrestre com o Brasil foi iniciada com o Projeto nº

4.975 de 195494 dispondo a aplicação de um crédito brasileiro na construção da rodovia Oviedo-

Presidente Franco (Ruta Internacional), tornando-se a Lei Nº 2.751 de 13 de agosto de 1955.

Para esse trâmite, o embaixador do Paraguai Raul Sapena, dedicou-se no convencimento

por parte dos parlamentares brasileiros para que considerem tal pleito, estado de urgência,

objetivando a celeridade do processo, conforme os apontamentos do mesmo:

El Proyecto se encuentra asi listo para ser discutido en sesión plenaria. Pero,

existiendo centenares de Proyectos entrados con anterioridad, su

consideración sería postergada por muchos meses. Por esta razón me he

enpeñado en obtener para el Proyecto nº 4.975 lo que en el procedimiento

parlamentario del Brasil se denomina “régimen de urgencia”, y a este efecto

he entrevistado: 1) AL PRESIDENTE DE LA CAMARA, Diputado Doctor Carlos Luz.

(entrevista realizada el Viernes 6 a las 13 horas); b) AL LIDER DE LA MAYORIA, Diputado Doctor Gustavo Capanema.

(entrevista realizada hoy, a las 11 horas, en el Palacio Tiradentes). c) AL LIDER DE LA MINORIA, Diputado Afonso Arinhos de Mello Franco.

(entrevista realizada en su domicilio particular, ayer 9 de Mayo a las 18 y 30

horas) (SAPENA, 1955)95.

94 Diário do Congresso Nacional. Ano IX – Nº 213. 04 de dezembro de 1954. Disponível em:

<http://imagem.camara.gov.br/Imagem/d/pdf/DCD14DEZ1954.pdf#page=18>. Acesso em: 15 set. 2019. 95 SAPENA, Raul. Embaixada do Paraguai – 10 de maio de 1955. Acervo do Ministério das Relações Exteriores

do Paraguai, Assunção, Paraguai.

Page 93: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

90

O pleito evidentemente tratava-se de criar um tráfego alternativo, e a melhoria na

infraestrutura terrestre. Após a aprovação do crédito por parte do Brasil, uma comissão mista

Paraguai-Brasil responsabilizou-se pela execução do projeto, construindo uma estrada de

Coronel Oviedo-Puerto Presidente Stroessner, atual Ciudad del Este, finalizado em 30 de junho

de 1959 (MEDINA, 2004, p. 72).

A Ruta Internacional constituiu um grande investimento para o Paraguai ao ampliar a

comunicação interna, o que segundo Medina, teria acelerado o desenvolvimento econômico da

região, “gracias a la ruta, florecieron a la vera de la misma, pequeñas villas o aldeas, que hoy

día constituyen florecientes ciudades de extraordinaria pujanza económica” (MEDINA, 2004,

p. 75).

Somava-se ao projeto da Ruta Internacional, a obtenção de uma zona franca em

Paranaguá, tornando mais real a integração viária alcançando o Atlântico, conforme Sapena

aponta:

Luego hice un esbozo de los principales aspectos que el Paraguay desea

considerar, destacando fundamentalmente sus aspiraciones a obtener una

zona franca en Paranaguá y la realización del camino Coronel Oviedo-

Presidente Franco, todo ello sin perjuicio de conservar el Puerto Franco en

Santos y proseguir el camino Concepción a Pedro Juan Caballero (SAPENA,

1955)96.

O ministro do Interior do Paraguai Edgar L. Ynsfrán (1921-1991) ficou associado com

a fundação da Cidade Puerto Presidente Stroessner, atual Ciudad del Este. Segundo o seu

depoimento, em 1956, o presidente sugeriu que ele fizesse uma viagem de reconhecimento

aéreo do Alto Paraná. Nessa viagem adquiriu uma noção dos trabalhos da Comissão Mista

Paraguai-Brasil na construção da estrada que chegaria então até a barranca do rio Paraná além

de “una viva lección de geografía y también de geopolítica” (YNSFRÁN, 2012, p. 88).

Segundo Ynsfrán, ao se deparar com a construção da estrada, aberta do meio de um

ambiente inóspito “uma selva casi impenetrable, y en la cual los obstáculos no se daban sólo

por los imponentes y gigantescos árboles, sino también por las fieras, la leishmaniasis y las

frecuentes lluvias tropicales” (YNSFRÁN, 2012, p. 89), propôs ao Presidente Stroessner a

fundação de uma cidade que se antecipasse a chegada da estrada, “se trataba de crear un centro

emplazado a su vera y sobre a margen del río y echar las bases de una ciudad, cuyo futuro era

fácil predecir, porque se situaría frente al centro brasileño de Foz do Iguazú [...] (YNSFRÁN,

2012, p. 91)”.

96 SAPENA, Raul. Embaixada do Paraguai – s/d. Acervo do Ministério das Relações Exteriores do Paraguai,

Assunção, Paraguai.

Page 94: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

91

Percebe-se uma grande preocupação em viabilizar novas alternativas trafegáveis para

sair da dependência com a Argentina, pois segundo Ynsfrán, estava inviável do ponto de vista

financeiro:

Nuestro comercio exterior sufría todos los inconvenientes del obrigado paso

por el puerto de Buenos Aires: no sólo las dificuldades creadas por la

necesidad de transbordos, sino también los precios exorbitantes que eran

exigidos para el transporte fluvial – en manos, primeiro, de la Campañía

Mihanovich y luego de la Campañía Fluvial Argentina – que llegaban a ser

três veces más elevados que el frete de Buenos Aires a puertos europeos o

norteamericanos (YNSFRÁN, 2012, p. 88).

A fundação da cidade Presidente Stroessner tem relação direta com o vislumbre que se

tinha de um novo eixo rodoviário que levaria o Paraguai ao Oceano Atlântico, colocando-a no

mapa como um ponto de interesse político e econômico do país.

O Paraguai manifesta o interesse para construção da ponte em uma correspondência

formalizada por Raúl Sapena Pastor, embaixador do Paraguai no Brasil, por troca de notas no

dia 20 de janeiro de 1956, com os seguintes argumentos:

1. El Gobierno paraguayo, deseoso de facilitar el mayor desenvolvimiento de

la política de creciente vinculación entre los pueblos del Paraguay y del

Brasil, consubstanciada en los Acuerdos realizados por cambio de notas el

20 de Enero de 1956, tiene el mayor interés en que sea construido un puente

internacional sobre el rio Paraná, que permita la ligación de la rodovia

Puerto Presidente Franco-Coronel Oviedo, en territorio paraguayo, a

Paranaguá-Foz de Iguazú, en territorio brasileño, y concretice la unión

rodoviaria entre los dos países. 2. El Gobierno paraguayo, grandemente interesado en suprimir un obstáculo

natural que embaraza las corrientes de intercambio entre las dos naciones

Hermanas, solicita del Gobierno brasileño que tome a su cargo la

construcción del referido puente. 3. El Gobierno paraguayo considerará una respuesta de Vuestra Excelencia,

en la cual este expresada la anuencia del Gobierno brasileño a esta solicitud,

como un Acuerdo formal entre los dos paises97.

O embaixador, conforme a nota acima, solicita a união rodoviária, para a transposição

da fronteira natural, ao governo brasileiro e, para isso, apela para a “irmandade” entre os países.

No dia 29 de maio de 1956, o acordo se formaliza pelo então ministro das Relações

Exteriores do Brasil, José Carlos de Macedo Soares (1883-1968) dirigindo-se ao Raul Sapena

Pastor, mediante uma troca de notas no qual o Brasil acata a solicitação do Paraguai.

Em resposta, apraz-me comunicar a Vossa Excelência que o Governo

brasileiro, em atenção ao desejo expresso pelo Governo paraguaio na

97 PASTOR, Raul Sapena. Coleção de Atos Internacionais nº 378. Acordo entre o Brasil e o Paraguai para a

construção de uma ponte sobre o Rio Paraná, publicado no Diário Oficial de 04 de julho de 1956. Disponível em:

<https://concordia.itamaraty.gov.br/>. Acesso em: 07 jul. 2019.

Page 95: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

92

mencionada nota, concorda em assumir o encargo de construir a referida ponte

sobre o rio Paraná.98

Para o Brasil, o intento de construir uma ponte, foi identificado quase uma década antes

do manifestado pelo embaixador do Paraguai no Brasil, Raul Sapena Pastor em 1956. Segundo

o deputado federal Sr. Ostoja Roguski (1913-1972) eleito pelo Estado do Paraná, declarou em

1956, que o projeto já havia sido submetido em 1947, conforme a citação abaixo:

No dia 05 do corrente foi assinado um convênio entre Brasil e o Paraguai,

objetivando a construção da ponte rodoferroviária que ligará Foz do Iguaçu a

Porto Presidente Franco, do lado do Paraguai. Sr. Presidente, desde 1947 que

a bancada do Paraná vem batalhando no sentido da concretização desta grande

aspiração dos dois povos, brasileiro e paraguaio – a ligação, por estrada de

ferro, que, partindo de Assunção, irá a Paranaguá na costa atlântica. Assim,

em 1947, o então Deputado Munhoz da Rocha apresentou projeto com esse

objetivo. Essa proposição, em 1951, foi, portanto, renovada e até agora se

encontra nessa casa, na Comissão de Finanças, aguardando, por outro lado, o

pronunciamento favorável do Conselho de Segurança Nacional99 (grifos

nossos).

Destaca-se no registro acima, a menção de uma ponte rodoferroviária, cujo termo é

ratificado mais abaixo como estrada de ferro100. Esse pronunciamento indica, ao se referir a

1947, portanto quase 10 anos antes ao acordo efetivamente firmado entre Brasil e Paraguai para

a construção da ponte, que o autor tinha como referência o projeto original apresentado pelo

Munhoz da Rocha, de uma ponte que servisse para circular além de veículos sobre rodas,

também trens.

Segundo o pronunciamento, o propositor foi o Bento Munhoz da Rocha Neto (1905-

1973), nascido em Paranaguá, deputado federal constituinte de 1946 a 1950, tornando-se no

ano seguinte governador do Paraná até 1955. Segundo informações da Casa Civil do Paraná,

defendia a reintegração do Território Federal do Iguaçu101. Essa informação se torna relevante

98 Idem. 99 Diário do Congresso Nacional. Disponível em:

<http://imagem.camara.gov.br/Imagem/d/pdf/DCD20JUN1956.pdf#page=37>. Acesso em: 05 jul. 2019. 100 Sobre essa questão de rodoferrovia, a carta de Bertoni a Brenno (1891), indica um vislumbre de uma estrada de

ferro ligando Paraguai e Brasil, para isso uma ponte rodoferroviaria sobre o Rio Parana seria necessaria, “para

hablar del Paraguay, qué me dirás de esta valiente pequeña república, que a pesar de las condiciones anormales

del comercio, la producción y el cambio, todavía encuentra la forma de terminar su vía de tren a Paraguarí-Villa

Rica-Villa Encarnación, y el coraje de aprobar una más, hace dos meses, ya concedida, la cual, sin contar una

bifurcación que unirá las pequeñas ciudades del Norte, atravesará el Paraguay de Oeste a Este y se juntará con

la linea brasilera para desembocar en el puerto de Santos! Más de 1000 Kilómetros de vías que recorren regiones

vírgenes, aún inexploradas, selvas sin fin y estepas apenas pobladas por salvajes (...) Un ponte gigantesca sobre

el Alto Paraná de 600 metros de largo, suspendido, porque el río tiene allí más de 150 metros de profundidad,

con una corriente cuya velocidad alcanza de 6 a 12 millas por hora, con crecidas que se elevan a más de 30

metros sobre el estiaje!” (BARATTI & CANDOLFI, 1994, p 333 a 342). 101 Governo do Estado do Paraná. Bento Munhoz da Rocha Netto. Disponível em:

<http://www.casacivil.pr.gov.br/Pagina/Bento-Munhoz-da-Rocha-Netto>. Acesso em: 10 nov. 2020.

Page 96: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

93

para entender o debate estabelecido no período, em especial, a preocupação com as disputas

territoriais na região Oeste de Santa Catarina e Oeste e Sudoeste do Paraná.

O Território Federal do Iguaçu foi criado no governo de Getúlio Vargas em 1943, cujo

objetivo manifesto era a ocupação efetiva e a nacionalização das fronteiras nacionais do Brasil.

O Bento Munhoz da Rocha Neto apresentou uma emenda constitucional em 1946 extinguindo

o Território Federal reincorporando parte do território ao Paraná (PRIOLI, A., et al., 2012, p.

65).

Segundo Prioli, et al. (2012), para a população do Oeste ficar favorável com a extinção

do Território Nacional, o interventor do Estado do Paraná, Brasil Pinheiro Machado se

comprometeu em criar um departamento especial para tratar especificamente das demandas da

região. O projeto da ponte estava inserido no contexto de discussão relacionada ao

desenvolvimento da região Oeste do Paraná que muito era criticada pelo abandono das

autoridades nacionais (PRIOLI , et al. 2012, p.60).

Nas pesquisas documentais, o projeto também foi discutido em 1955, sendo no ano

seguinte a primeira formalização para concretizá-lo em 1956, conforme apontamentos no

Diário do Congresso Nacional cujos relatores foram Srs. Newton Carneiro, Luis Tourinho e

Ferreira Martins:

Primeira discussão do Projeto nº 635-A de 1955 que autoriza o Poder

Executivo pelo Ministério da Viação e Obras Públicas, a abrir um crédito

especial de Cr$ 20.000.000,00 para a construção da ponte sobre o rio Paraná,

na Foz do Iguaçu, Estado do Paraná, ligando a rodovia Coronel Oviedo-Pôrto

Presidente Franco à BR-35; tendo pareceres: favoráveis das Comissões de

Diplomacia de Transportes, Comunicações e Obras Públicas e de Segurança

Nacional, e com substitutivo da Comissão de Finanças102.

No dia 07 de setembro o presidente Alfredo Stroessner sancionou o Decreto nº 23.696,

regulamentando a lei nº 390/56 relativa ao acordo paraguaio-brasileiro sobre a construção da

ponte internacional Porto Presidente Franco-Foz do Iguaçu103, que dava continuidade ao

projeto da rodovia entre Assunção e Paranaguá.

A obra foi totalmente custeada pelo governo brasileiro, sendo no dia 25 de setembro de

1956 sancionada no Brasil a Lei nº 2885104 autorizando o Poder Executivo a abrir, pelo

102 Diário do Congresso Nacional. Ano XI – Nº 121. 19 de julho de 1956. Disponível em:

<http://imagem.camara.gov.br/Imagem/d/pdf/DCD19JUL1956.pdf>. Acesso em: 10 jul. 2019. 103 QUELL, Sanchez. Correspondência da Embaixada do Paraguai no Rio de Janeiro, Brasil – 04 de fevereiro de

1957. Acervo do Ministério das Relações Exteriores do Paraguai, Assunção, Paraguai. 104 Câmara Legislativa. Lei nº 2.885, de 25 de setembro de 1956. Disponível em:

<https://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei/1950-1959/lei-2885-25-setembro-1956-355179-publicacaooriginal-1-

pl.html>. Acesso em: 10 jul. 2019.

Page 97: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

94

Ministério da Viação e Obras Públicas através do Departamento Nacional de Estradas de

Rodagem, um crédito especial de Cr$ 30.000.000,00 (30 milhões de cruzeiros) para a

construção da ponte. Após essa aprovação, o embaixador do Paraguai no Brasil, Sanchez Quell

escreve um relato desse fato endereçando ao ministro das Relações Exteriores do Paraguai, o

Raul Sapena Pastor:

Tengo el honor de dirigirme a Vuestra Excelencia para informarle que el acto

realizado hoy en el Palacio Catete, con motivo de la promulgación por el

Presidente Kubitschek de la ley que abre crédito especial de 30 millones de

Cruzeiros para la construcción de un puente sobre el río Paraná, resultó no

solamente solemne sino profundamente emotivo105.

Nesse relato verificou-se a presença de algumas autoridades paraguaias e brasileiras

participando da solenidade, e cita as suas palavras proferidas ao Juscelino após a sanção da lei,

no qual teria dito:

Es enorme la emoción que me embarga en este momento. Por eso, sólo quiero

expresar a Vuestra Excelencia que transmitiré gustoso la invitación que

formula para el Presidente Stroessner. Y que, ante la nueva prueba de real

amistad hacia mi país y hacia mi gobierno que significa la construcción de

este puente, en nombre del Paraguay y del Presidente Stroessner os digo: mil

gracias, Presidente.

Também há registro do discurso pronunciado pelo Sr. Josino Alves da Rocha Loures,

Deputado Federal em 1956 onde é possível mensurar a relevância de tal feito:

[...] acontecimentos da mais alta importância para os destinos econômicos e

culturais do Brasil e Paraguai, acaba de se realizar com a sanção do

Presidência da República, Sr. Juscelino Kubitschek, da lei que autoriza a

abertura de um crédito especial de 30 milhões de cruzeiros, pelo Ministério da

Viação, destinado à construção de uma ponte no rio Paraná, que estabelecerá

a ligação rodoviária entre esses dois países vizinhos106.

O encontro entre os presidentes Alfredo Stroessner e o Juscelino Kubitschek no dia 06

de outubro de 1956107 em Foz do Iguaçu, oficializou em uma cerimônia o início dos trabalhos

para a construção da ponte, oportunizando um trajeto físico de Assunção ao porto de Paranaguá.

Para isso, celebrou-se novos acordos entorno de convênios, regulando o intercâmbio comercial

entre os dois países, cujo maior interesse era a regulamentação dos entrepostos de depósito

105 QUELL, Sanchez. Correspondência da Embaixada do Paraguai no Rio de Janeiro, Brasil – 14 de março de

1956. Acervo do Ministério das Relações Exteriores do Paraguai, Assunção, Paraguai. 106

CÂMARA dos Deputados. Diário do Congresso Nacional. 29 set. 1956. Disponível em:

<http://imagem.camara.gov.br/Imagem/d/pdf/DCD29SET1956.pdf#page=21>. Acesso em: 05 jul. 2019. 107

Ministério das Relações Exteriores. Comunicado Conjunto sobre Rodovias entre o Governo dos Estados

Unidos do Brasil e o Governo da República do Paraguai. Disponível em:

<https://concordia.itamaraty.gov.br/detalhamento-acordo/1118?page=19&s=paraguai&tipoPesquisa=1>. Acesso

em: 05 jul. 2019.

Page 98: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

95

franco nos portos de Santos e Paranaguá para o Paraguai utilizar e o porto de Concepción para

o Brasil reciprocamente usufruir.

Imagem 29 – Encontro de JK e Stroessner em Foz do Iguaçu (06/10/1956). Fonte: FOZ DO IGUAÇU E CATARATAS MEMÓRIA E FOTOS ATUAIS. Foz do Iguaçu, 22 set.

2019. Facebook. Disponíveis em:

<https://www.facebook.com/photo.php?fbid=10215131875275189&set=g.300913676689041&type=1

&theater&ifg=1>. <https://www.facebook.com/photo.php?fbid=10215131913156136&set=g.300913676689041&type=1

&theater&ifg=1>. <https://www.facebook.com/photo.php?fbid=10215131903515895&set=g.300913676689041&type=1

&theater&ifg=1>. <https://www.facebook.com/photo.php?fbid=10215131902715875&set=g.300913676689041&type=1

&theater&ifg=1>. Acesso em: 21 de nov. 2019.

Page 99: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

96

Em 14 de novembro de 1956 o presidente JK baixou o decreto nº 40.350108 no qual

criava a Comissão Especial de Construção da Ponte Internacional sobre o Rio Paraná,

subordinada ao Diretor Geral do Departamento Nacional de Estradas de Rodagem. Em 11 de

dezembro o governo paraguaio com o decreto nº 23.696 autorizou a realização da obra em seu

território.

Dois anos após esse encontro, novamente reuniram-se em Foz do Iguaçu no dia 04 de

outubro de 1958 para inspecionar as obras da ponte e mais uma vez Juscelino Kubitschek

reforça o compromisso brasileiro em aproximar-se do vizinho, conforme seu discurso abaixo:

Novamente me é dado o prazer de receber o preclaro Chefe da Nação

paraguaia em terra brasileira, e, desta vez, no instante em que entregamos ao

uso público uma casa onde paraguaios, argentinos e brasileiros terão mais um

local de fraterna convivência, a eliminar por completo a ideia de fronteiras,

que os nossos recíprocos sentimentos vêm apagando, para glória e bem das

Nações americanas. [...] (Presidência da República, JK, 1958).

Nesse discurso, o presidente JK, trata a ponte como uma “casa”, a analogia torna-se

curiosa, pois ao mesmo tempo em que a fala discorre no sentido de subverter ou sublimar a

fronteira, ao compará-la com a casa, esta pode ser interpretada no sentido de reforçar o “mando

de campo” do Brasil sobre este espaço, pois casa pode-se abrir e acolher quem for, mas sempre

será um “hóspede”.

No mesmo discurso o JK faz menção ao projeto de maior de ligação do Brasil Paraguai,

indo do Porto de Paranaguá a Assunção.

Ao mesmo tempo que se alteiam as bases dêsse monumental empreendimento,

vemos, prestes a se encontrarem, as pontas das grandes rodovias que partem

de Assunção e de Paranaguá, abrindo ao Paraguai uma saída para o Atlântico,

e ao Brasil, mais amplas perspectivas no mercado da nação irmã, para os

produtos de sua florescente indústria. A complementação de nossas economias encontrará, nessa grande artéria, o

seu instrumento decisivo. No que respeita ao escoamento da produção do

laborioso povo guarani, é-me grato assinalar que o entreposto de depósito

franco de Paranaguá já está em condições de receber as mercadorias

paraguaias, quando estas comecem a transitar pela via que estamos rasgando

em meio a tantas dificuldades [...] (Presidência da República, JK, 1958).

As vantagens recíprocas estabelecidas pela via transversal entre o Porto de Paranaguá e

Assunção são manifestadas pelo presidente JK, onde expressa que ambos os países aportariam

ganhos em suas economias através do escoamento de suas produções.

108 Câmara Legislativa. Decreto nº 40.350, de 14 de novembro de 1956. Disponível em

<https://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/1950-1959/decreto-40350-14-novembro-1956-331541-

publicacaooriginal-1-pe.html>. Acesso em: 10 jul. 2019.

Page 100: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

97

E nesse encontro, além de vistoriar a construção da ponte, o presidente Juscelino

participou da inauguração do Hotel das Cataratas e sua visita foi registrada, conforme as

fotografias abaixo.

Imagem 30 – A esquerda, JK visitando as Cataratas do Iguaçu. A direita, JK e comitiva vistoriando a

construção da ponte. Ano 1958. Fonte: FOZ DO IGUAÇU E CATARATAS MEMÓRIA E FOTOS ATUAIS. Foz do Iguaçu, 22 set.

2019. Facebook. Disponível em:

<https://www.facebook.com/photo.php?fbid=10215132163602397&set=g.300913676689041&type=1

&theater&ifg=1>. e

<https://www.facebook.com/photo.php?fbid=10215137536696721&set=g.300913676689041&type=1

&theater&ifg=1>. Acesso em: 21 nov. 2019.

A participação do presidente na inauguração do Hotel das Cataratas e na vistoria das

obras da ponte evidencia a ação do Estado brasileiro nessa região. Os presidentes da República

vieram várias vezes a Foz do Iguaçu para fazer inaugurações, e conforme a pesquisadora

Josiane Nava (2018) as memórias do município são construídas a partir do Estado, colocando-

se como protagonista, ou seja, “coadunou com grandes construtoras para a edificação de

estruturas que marcassem a modificação do espaço de características interioranas que era Foz

do Iguaçu antes da década de 1950” (NAVA, 2018, p. 83).

A formalização em relação ao uso da ponte ocorreu em 1960, com a assinatura do

primeiro acordo sobre a administração, manutenção, vigilância e segurança da ponte, elaborado

pelo ministro das Relações Exteriores do Brasil, Horácio Lafer, no dia 05 de março de 1960,

no qual estabelecia as formas de funcionamento após o término da obra. Nele, se constituiu

onze itens, dos quais 3 foram revogados na inauguração em 1965, que foram os relativos aos

itens V, VI e X:

V - As despesas decorrentes da manutenção da Ponte Internacional serão

divididas em parcelas iguais entre os Governos dos dois países;

VI. Para a solução de problemas técnicos, a Comissão Mista brasileiro-

paraguaia podera, excepcionalmente, contratar, por tempo indeterminado, os

Page 101: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

98

serviços de especialistas, cuja remuneração será dividida, em parcelas iguais,

entre os Governos dos dois países;

X – Quanto ao trânsito de veículos, será cobrada uma taxa de pedágio, cujo

montante será estabelecido, de comum acôrdo, entre o Ministério da Viação e

Obras Públicas dos Estados Unidos do Brasil e o Ministério de Obras Públicas

e Comunicações da República do Paraguai. O montante arrecadado com a taxa

de pedágio será depositado na Agência do Banco do Brasil, em Assunção, em

conta corrente da Comissão Mista brasileiro-paraguaia, que dêle poderá dispor

para despesas co- muns de manutenção da Ponte Internacional, nos termos dos

artigos V e, VI supra109.

Os três itens revogados diziam respeito as divisões de atribuições entre Brasil e Paraguai

no quesito da responsabilidade quanto as despesas de manutenção, os reparos aos eventuais

problemas técnicos e a arrecadação de taxa de pedágio, cujos dividendos seriam alocados para

despesas com a manutenção da ponte. Com esse acordo de 1960, percebe-se uma equidade de

responsabilidade, tal qual, uma sociedade, no trato com a ponte.

A retificação do acordo ocorreu em 27 de março de 1965, data da inauguração, com a

assinatura do Acordo sobre a utilização, conservação e vigilância da ponte sobre o rio Paraná,

em substituição ao acordo realizado em 05 de março de 1960, agora consolidado pelo presidente

Castello Branco. Os dispositivos acordados são:

I – A Ponte Internacional sobre o Rio Paraná que une Puerto Presidente

Stroessner a Foz do Iguacu se denominara “Ponte da Amizade”. II – A vigilância policial nas cabeceiras da Ponte estará a cargo das

autoridades competentes do Brasil e do Paraguai em seus respectivos

territórios, estabelecendo-se como limite jurisdicional a linha média

transversal do arco da Ponte. III – Os trabalhos de conservação da Ponte ficarão a cargo do Departamento

Nacional de Estradas de Rodagem do Brasil, correndo por sua conta os gastos

respectivos. IV – Em caso de destruição total ou parcial da Ponte, sua reconstrução será

financiada em partes iguais pelos dois países, correspondendo a execução das

obras ao Departamento Nacional de Estradas de Rodagem do Brasil. V – A entrada de veículos, através da Ponte nos respectivos territórios estará

sujeita a legislação pertinente de cada país. VI – Ambos os países tomarão as medidas necessárias para que a utilização

da Ponte seja efetiva durante as vinte e quatro horas do dia. VII – Não se cobrará pedágio pela utilização da ponte.110

109

Ministério das Relações Exteriores. Disponível em: <https://concordia.itamaraty.gov.br/detalhamento-

acordo/1282?page=18&s=paraguai&tipoPesquisa=1>. Acesso em: 10 jul. 2019. 110

Coleção de Atos Internacionais. Acordo sobre a utilização, conservação e vigilância da ponte sobre o rio

Paraná. Disponível em: <https://concordia.itamaraty.gov.br/>. Acesso em: 07 jul. 2019.

Page 102: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

99

A supressão dos três itens reforçou o protagonismo do Brasil trazendo para si a

responsabilidade com as despesas e manutenção, inclusive dispensando a possibilidade de

cobrança de pedágio.

Findado os acordos de uso, manutenção e vigilância da ponte, a expectativa para o seu

término era grande, pois representava para ambos os países uma oportunidade de

desenvolvimento.

A necessidade de aumentar a mobilidade tangenciou as negociações, acordos,

investimentos que possibilitassem o acesso e a comunicação além das suas fronteiras. O

Paraguai, como uma geografia mediterrânea precisou estabelecer novas rotas alternativas, o

Brasil também ambicionava novos mercados, ambos estabeleceram acordos bilaterais para

alcançar esses objetivos. Além disso, as fontes indicam que o projeto vinha sendo demandado

há muito tempo, antes da formalização por parte do Paraguai.

2.7. EFEITOS NO ENTORNO DA PONTE INTERNACIONAL DA AMIZADE

A construção de uma grande obra, como foi a Ponte da Amizade, transformou o seu

entorno e evidente que atraiu um número significativo de trabalhadores, necessitando

consequentemente de uma infraestrutura e com isso, as cidades foram se transformando e se

reconfigurando.

No caso do Paraguai a transformação foi mais significativa, pois uma cidade foi criada

para dar o suporte necessário de comportar a construção e manutenção da ponte. A primeira

edificação, por exemplo, construída em Ciudad del Este, foi em 1957, para abrigar a sede da

Comissão de Administração, posteriormente, a intendência municipal. A casa atualmente é

aberta ao público, pois se transformou no Museu El Mensú. Além de preservar as características

arquitetônicas, também comporta em seu acervo, a história do município, a exemplo da Ata de

Fundação da cidade assinada em 03 de fevereiro de 1957, em cumprimento ao Decreto nº

24.634 de 28 de janeiro de 1957 denominada inicialmente de Puerto Flor de Lis, logo mudou

para Puerto Presidente Stroessner, rebatizada de Ciudad del Este após a queda de Stroessner

em 1989.

Na ata de fundação está explícita que a implantação da cidade se deu em razão de todas

as demandas que a ponte iria gerar além da localização geopolítica e estratégica de fluxo

internacional.

[...] Visto la necesidad de fundar una ciudad en el extremo territorial del

camino internacional que unirá nuestra República con la de los EE.UU. del

Brasil, y considerando: que la buena administración del país obliga a prever

el desarrollo de la región de Caaguazú y Alto Paraná, regiones por las que

Page 103: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

100

cruza la ruta internacional; Que el extremo de dicha ruta en su embocadura

con el futuro puente internacional estará situado al norte de la actual

localidad de Puerto Presidente Franco; Que por tales circunstancias se hace indispensable la fundación de una

localidad con los recursos adecuados para su futuro desenvolvimiento, que

sea punto de concentración de las posibilidades regionales, lindero de la ruta

internacional y medio de vinculación permanente con la vecina república de

los EE.UU. del Brasil [transcrição da Ata abaixo].

Imagem 31 – A Ata da fundação da cidade Puerto Flor de Lis (Ciudad del Este), de 03 de fevereiro

de 1957. Fonte: MUSEU EL MENSÚ. Ciudad del Este, 2019. Registro da autora.

A ata de fundação de uma cidade é analogamente a certidão de nascimento de um

indivíduo, nela consta as informacões do seu “nascimento”, “comprovando” sua existência.

Conforme a pesquisadora Pesavento (2014), é a materialidade que remete os atores

participantes, deixando o momento passado marcas objetivas no espaço e esses registros

materiais contribuem para o processo de pertencimento.

Ao salvaguardar a cidade do passado, importa, sobretudo, fixar imagens e

discursos que possam conferir uma certa identidade urbana, um conjunto de

sentidos e de formas de reconhecimento que a individualizem na história

(PESAVENTO, 2014, p. 1597).

A Ciudad del Leste que passou por várias transformações, inclusive onomástica, tem,

no Museu El Mensú, um espaço com fragmentos do seu passado, abrigando partes do tempo

ocorrido.

Um desses fragmentos é o registro do local escolhido para fundar a cidade, que segundo

Ynsfrán “por mera casualidad coincidía con el proyectado extremo de la ruta a orillas del

Paraná y que luego sirvió como fundación del Puente de la Amistad” (YNSFRÁN, 2012, p.

107). Longe de explicar, a partir da “casualidade”, estrategicamente, a cidade localiza-se no

Page 104: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

101

extremo da Ruta Internacional, tornando-se posteriormente à sua fundação, um grande centro

de interesse comercial, unindo-se ao Brasil, através da ponte.

Imagem 32 – Início da construção do edifício de administração da Alfândega na cidade de Puerto

Presidente Stroessner, atual Ciudad del Este. Fonte: ÚLTIMA HORA. Disponível em: <www.ultimahora.com>. Acesso em: 04 jul. 2019.

Em 1957 o presidente Stroessner aprova uma série obras, a partir do Decreto Nº 28.282,

para garantir uma infraestrutura mínima na cidade, a exemplo, da aprovação para a construção

do aeroporto, hotel e lago artificial estimulando o estabelecimento de parques, residências e

lojas comerciais. Com isso, implementou-se uma série de projetos para criação do município

(BÁEZ, 2004, p. 96).

Com o início das obras, a cidade passou a obter um status importante, viabilizando,

juntamente com a Foz do Iguaçu, a infraestrutura para a construção projetada. Com o tempo, a

cidade foi surgindo, criando suporte, atraindo investidores, trabalhadores da construção civil,

moradores, imigrantes, comerciantes e posteriormente milhares de consumidores.

A política financeira adotada pelo Paraguai, em especial as políticas de importação,

segundo Rabossi, teria ocorrido “a partir do plano de estabilizacão acordado com o Fundo

Internacional em 1956, o governo paraguaio eliminou as tarifas externas de exportação,

diminuiu os impostos às importações” (RABOSSI, 2004, p. 17), somado a toda infraestrutura

que estava se organizando, a exemplo da construção de uma cidade na cabeceira da ponte,

“Puerto Presidente Stroessner logo se transformou no canal privilegiado de entrada das

mercadorias brasileiras e, mais tarde, da maior parte das importações que chegavam do

exterior” (RABOSSI, 2004, p. 17).

Então a Ciudad del Este se especializou no comércio triangular, ou na reexportação de

mercadorias fabricadas e/ou produzidas em outros países. Para o aprofundamento no estudo,

sugere-se a leitura da tese do Rabossi (2004), pois a pesquisa destrincha todo o movimento

Page 105: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

102

comercial centrado na Ciudad del Este que fez com que se construísse uma série de

especificidades conectadas com a ponte.

Segundo o memorandum produzido pelo Governo paraguaio, durante a década de 1970,

o PIB real do Paraguai cresceu mais de 8% ao ano, excedendo 10% entre 1976 a 1981. As

causas estariam, segundo o relatório, associadas com a construção da estrada de Assunção a

Puerto Presidente Stroessner (atualmente conhecida como Ciudad del Este), a zona franca

estabelecida em Paranaguá, a assinatura do Tratado de Itaipú em 1973 e por último a

colonização de terras111.

Para se ter uma ideia do aumento populacional na Ciudad del Este, segue o quadro

abaixo com o crescimento demográfico:

Anos Habitantes

1957 0

1973 18.315

1981 98.300

1990 120.000

Tabela 2. Crescimento demográfico na Ciudad del leste.

Fonte: Ynsfrán, 2012, p. 165.

Sobre os dados demográficos de Ciudad del Este, Ynsfrán (2012, p. 165) escreve a

seguinte observacão: “1957, año de su fundación, Ciudad del Este no tenía habitantes, salvo

dos familias: un agricultor y un obrajero cuya casa estaba emplazada a orillas del Paraná,

cerca del sitio de la fundación” (YNSFRÁN, 2012, p. 165). Desta forma, pode-se inferir a

existência de outros moradores não catalogados pelo censo.

A partir dos dados acima, que a população foi atraída para o município nos seus

primeiros anos de fundação vislumbrando oportunidades de trabalho não só com a ponte, mas

com toda a infraestrutura que uma cidade exigiria para sua efetivação. Só para manter o

funcionamento e vigilância da ponte, equipe de controle alfandegário e policiais eram

essenciais. Além disso, necessitava-se de uma infraestrutura para garantir a permanência da

população local, logo, hospital, mercados, bancos, escolas foram construídos aumentando a

demanda pela mão de obra não só para a construção civil, mas também de especialistas para as

111 Ministerio de Hacienda. Disponível em:

<https://www.economia.gov.py/application/files/1515/4948/0082/Paraguay_Final_Offering_Memorandum_201

9.pdf>. Acesso em: 08 jul. 2020.

Page 106: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

103

áreas. A partir da década de 1970, já se pode inferir uma influência maior da Itaipu no aumento

populacional, pois o salto foi bastante expressivo, triplicando o crescimento demográfico.

O Paraguai divide-se politicamente em 17 departamentos, conforme o mapa abaixo. A

estimativa populacional ultrapassa em 6 milhões de pessoas (ano-base: 2012), aumentando um

pouco mais que o dobro a população de 1982.

Imagem 33 – Mapa do Paraguai, com os 17 departamentos. Fonte: DIRECCIÓN GENERAL DE ESTADÍSTICA, ENCUESTAS Y CENSOS. Atlas Demográfico

del Paraguay 2012 (2016, p. 15).

O Alto Paraná é o segundo maior departamento do Paraguai em termos de quantidade

de habitantes. No gráfico abaixo é possível perceber o crescimento populacional principalmente

entre 1982 e 1992, duplicando também a quantidade de distritos.

Page 107: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

104

Gráfico 1 – Quantidade de distritos e crescimento populacional no Distrito do Alto Paraná. Fonte: Adaptado de DIRECCIÓN GENERAL DE ESTADÍSTICA, ENCUESTAS Y CENSOS. Atlas

Demográfico del Paraguay 2012 (2016, p. 81).

A Ciudad del Este foi considerada entre 1995 e 1996 a terceira maior zona franca do

mundo, ficando atrás de Miami e Hong Kong, movendo cifras equivalentes a três vezes o

Produto Interno Bruto do país112. Tornou-se a capital do departamento do Alto Paraná com

uma população de aproximadamente 281.422 mil pessoas113 (totalizando 21 distritos).

Atualmente, é o segundo maior centro urbano do Paraguai, depois de Assunção.

A consequência de maior impacto para o Paraguai, após a construção da ponte, foi o

aumento da imigração, em especial de brasileiros, deslocando-se ao país vizinho. Essa

imigração para o Paraguai se intensificou no Governo de Stroessner por, principalmente, dois

motivos: o primeiro diz respeito ao processo de mecanização da agricultura brasileira, por volta

de 1960, fazendo com que o agricultor olhasse para o país vizinho como uma oportunidade de

adquirir terras a um baixo custo além dos incentivos e créditos que o Paraguai proporcionava.

Conforme dados da Direção Geral de Migração (DGM)114, no âmbito do Ministério do

Interior do Paraguai, responsável por registrar e controlar o movimento migratório do país, de

112 FERREIRA, Wilson. 50 años de historia. Ultima Hora. 05 dez. 2007. Disponível em:

<https://www.ultimahora.com/50-anos-historia-n81785.html>. Acesso em: 20 abr. 2020. 113 DIRECCIÓN GENERAL DE ESTADÍSTICA, ENCUESTAS Y CENSOS. Atlas Demográfico del Paraguay

2012 (2016, p. 361). 114 Política Migratoria de la República del Paraguay. Disponível em: <http://www.migraciones.gov.py/>. Acesso

em: 01 mar. 2017.

Page 108: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

105

fato a presença brasileira115 se intensificou e até ultrapassou a quantidade de argentinos,

migrando principalmente para áreas rurais, conforme o relatório abaixo:

A partir de 1960 un gran contingente de personas originarias del Brasil

ingresó al Paraguay, poblando especialmente el Este de la Región Oriental,

sumándose y superando ampliamente a la corriente siempre creciente de

argentinos [...]. En 1982 el total de extranjeros censados en el país ascendía

a 168.000 personas, para 1992 a 191.000 y en 2002 a 173.000, siendo los de

origen brasileño mayoría absoluta en los años ochenta y noventa (58% y 57%

respectivamente), seguidos por originarios de la Argentina que representaban

el 26% del total en ambos años. En 1992 brasileños y argentinos superaban el 80% del total de extranjeros

censados en el país y, según datos de la Encuesta Permanente de Hogares de

la DGEEC, en 2010 representaban ya el 90% de los cerca de 180.000

extranjeros encuestados ese año y que, en total, constituían aproximadamente

el 3% de la población nacional de ese momento. La inmigración brasileña ha

tenido un destino esencialmente rural mientras que la argentina, al igual que

los restantes flujos de inmigración de los últimos años, se ha instalado

fundamentalmente en área urbana (Direção Geral de Migração – DGM).

O segundo motivo, é a política externa adotada pelo Paraguai de se afastar da Argentina

ao se aproximar do Brasil com o acordo de construção da Ponte Internacional da Amizade

(1965), com o Tratado de Itaipu (1973) e o Tratado de cooperação (1975) fazendo com que

muitos brasileiros investissem capital através de aquisição de terras, abertura de bancos, casas

de câmbio e diversas outras empresas. Além disso, o Paraguai, em 1967, revogou a lei que

proibia compras de terras por estrangeiros na extensão de 150km de sua fronteira, o que fez

com que muitos brasileiros aproveitassem a oportunidade de adquirir terras.

De acordo com Pereira (2015), o Paraguai é um dos países da América Latina que possui

o maior contingente de terras em posse de estrangeiros, sobretudo brasileiros e argentinos,

configurando uma gravíssima situação de estrangeirização de terras, impactando a sociedade

paraguaia do ponto de vista social, econômico, ambiental e cultural. Alguns brasileiros

tornaram-se fazendeiros associados ao agronegócio e outros atuam como trabalhadores rurais,

muitos, inclusive são participantes dos movimentos camponeses de luta pela terra.

Conforme Andressa Szekut (2018, p. 75), a situação de migração se diferencia,

destacando-se nos relatos de migrantes que viviam com muita dificuldade no Brasil e viram no

Paraguai uma oportunidade de melhorar de vida, adquirindo uma terra; ou para trabalhar como

peões, ou arrendatários.

Tem também os brasileiros que mobilizaram o capital para o país vizinho, interessados

no desenvolvimento do agronegócio no Paraguai, em geral, têm forte poder econômico, político

115 O Paraguai é considerado o segundo país de maior fluxo migratório de brasileiros, segundo o Ministério de

Relações Exteriores são 349.842 (ano-base 2014).

Page 109: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

106

e cultural, acirrando as disputas com os camponeses paraguaios. Acresce-se ao fato, a

necessidade dos grandes produtores de expandir territorialmente seus negócios para viabilizar

a monocultura, principalmente a soja, aumentando o enfrentamento com os movimentos

camponeses e indígenas. Esses últimos acabam tendo sua terra invadida pelos agricultores

paraguaios e brasileiros, agravando sua situação de sobrevivência.

O problema da terra no Paraguai se agravou na ditadura de Stroessner, aumentando a

concentração da propriedade e de aumento da pobreza rural. Segundo Albuquerque (2010), na

época de Stroessner, várias extensões de terra foram distribuídas pelo governo para militares e

para estrangeiros, principalmente imobiliárias brasileiras, e mais recentemente houve um

processo acelerado de venda de pequenos lotes dos camponeses para os grandes produtores

rurais agravando a concentração fundiária.

A construcão da Itaipu também provocou na década de 1970 esse “incentivo” de emigrar

para o Paraguai aumentando as disputas geopolíticas, problemas de titulação de terras e

conflitos com os trabalhadores rurais paraguaios. Esses imigrantes brasiguaios acabam

circulando nas fronteiras do Brasil (oeste do Paraná e Mato Grosso do Sul) e Paraguai

(Canindeyú, Amambay e Concepción).

Além desses conhecidos deslocamentos territoriais, destaca-se a prática de muitos

brasileiros optarem por, ao invés de migrar para o Paraguai, transitam diariamente pela ponte.

Atravessam a fronteira com o objetivo de trabalhar, ganhar a subsistência e retornar ao país de

origem onde mantém a residência.

Mas não só brasileiros foram atraídos para o Paraguai, mas argentinos, alemães, árabes,

chineses, coreanos enfim, um mosaico, que o pesquisador Rabossi (2004) destaca nas

manifestações físicas em Ciudad del Este:

A presença muçulmana se manifesta no tecido urbano através da bela

mesquita Omar Ibn Al-Khatab em Foz do Iguaçu ou na mesquita do Profeta

Maomé em Ciudad del Este. A presença oriental, na estátua de Chiang Kai

Chek diante da prefeitura dessa cidade ou no templo budista de Foz do Iguaçu

com a sua estátua de sete metros de um Buda que olha, com certo tom irônico,

a Ciudad del Este. Essas são tão somente algumas das tantas manifestações

físicas (praças, restaurantes, comércios, produtos) e institucionais

(associações, centros culturais e câmaras de comércio) que mostram a

presença de libaneses, chineses e também de coreanos, sírios, palestinos e

hindus, entre outros (RABOSSI, 2004, p. 38).

E segundo RABOSSI (2004), após a inauguração da ponte, Ciudad del Este

transformou-se de uma maneira vertiginosa, em 2001, por exemplo, havia 1.750

estabelecimentos comerciais no centro da cidade.

Page 110: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

107

Para muitas pessoas que chegam a Ciudad del Este, o espaço que se abre

depois de cruzar a ponte da Amizade apresenta-se como um caos intimidante:

postos e mais postos de venda na rua, negócios e galerias, construções

irregulares, pessoas... Muitas pessoas. Vendendo, comprando, fazendo

câmbio, carregando, cuidando (RABOSSI, 2004, p. 38).

Imagem 34 – Ponte da Amizade (1995). Fonte: FOZ DO IGUAÇU E CATARATAS MEMÓRIA E FOTOS ATUAIS. Foz do Iguaçu, 05 out. e

23 out. 2019. Facebook. Disponível em:

<https://www.facebook.com/photo.php?fbid=10214803625189142&set=g.300913676689041&type=1

&theater&ifg=1>. Acesso em: 06 mar. 2020.

Foz do Iguaçu também se transformou, podendo ser mensurada pelo número de

habitantes. Na década de 1970, o município contava com pouco mais de 30.000 habitantes, já

nos anos 1990 já contava com aproximadamente 190.000 habitantes.

Dados do IBGE, conforme o demonstrativo da tabela abaixo, indicam grande

crescimento demográfico no município de Foz do Iguaçu, principalmente entre as décadas de

1970 e 1980, ficando mais evidente ao comparar com o crescimento populacional em Cascavel

e Curitiba.

Cidade/Ano 1960 1970 1980 1991 2000 2010

Foz do Iguaçu 28.709 33.966 136.532 190.123 258.543 256.081

Cascavel 39.513 89.921 163.470 192.990 245.369 286.172

Curitiba 515.141 821.233 1.024.980 1.315.035 1.587.315 1.746.896

Tabela 3. Gráfico comparativo com o crescimento populacional em Foz do Iguaçu, Cascavel e

Curitiba. Fonte: Adaptado a partir do Censo Demográfico IBGE.

Proporcionalmente, observa-se aumento da população de Foz do Iguaçu de 401% entre

as décadas de 70 e 80. Ao comparar com o crescimento populacional em Cascavel 182% e

Curitiba 125%, neste mesmo período, onde houve um aumento populacional, porém com

percentual muito abaixo do demonstrado em Foz do Iguaçu.

Page 111: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

108

O aumento exacerbado da população em Foz do Iguaçu entre 1970 e 1980 pode ser

explicado pela confluência de fatores: a mecanização da agricultura ocasionando êxodo rural e

o aumento do número de pessoas nas áreas urbanas; as atrações turísticas de Foz do Iguaçu,

criando uma demanda de mão de obra para atender esse crescente negócio (estrutura hoteleira,

restaurantes, centrais de atendimento aos turistas, transporte etc.); a geografia possibilitando

grande movimentação de pessoas entre os três países, auxiliada pela construção das pontes

ligando Brasil-Paraguai e Brasil-Argentina; e, somando-se a esses fatores, a construção da

Usina Hidrelétrica de Itaipu, criando grandes expectativas de emprego para diversas regiões do

Brasil e dos países vizinhos (MASCARENHAS, 2011).

Além do desenvolvimento das cidades limítrofes, a ponte também impulsionou

investimentos na rodovia, asfaltando a BR-277 entre o Porto de Paranaguá até Foz do Iguaçu.

Internamente, no Paraguai, a infraestrutura nas rodovias estendeu-se de Ciudad del Este até

Assunção. As melhorias proporcionavam o abastecimento de materiais que viabilizassem o

investimento nas obras.

A melhoria da BR-277 era algo demandado pelos beneficiários e a ponte foi utilizada

para reforçar o argumento da sua relevância para o fluxo comercial, pressionando o executivo

a priorizá-la, conforme o discurso em 1964 do Deputado Federal por São Paulo, Sr. Cunha

Bueno (1918-1981):

Sr. Presidente, tenho defendido, nesta casa, a tese da necessidade inadiável de

o Brasil procurar acelerar a conclusão das rodovias que demandam os países

vizinhos. Entendo que somente poderemos realmente pôr em prática uma

política agressiva de exportação de produtos manufaturados a partir do

instante em que nos for possível levar até as nossas fronteiras e, portanto, aos

mercados consumidores, através do transporte rodoviário, as riquezas que

desejamos exportar. [...] ninguém desconhece que prosseguem morosamente

as providências do Governo Federal com respeito à construção da BR-35, que

será a estrada ideal a fim de que realmente possa o Paraguai ter uma saída

assegurada para o Oceano Atlântico. [...] considero essa rodovia da maior

importância para a economia nacional, não só pela circunstância de atravessar

um dos pedaços mais ricos do Brasil, mas também porque ela será o elo

permanente e o complemento indispensável para que a ponte internacional

Brasil-Paraguai possa cumprir seus destinos históricos116.

Nesta fala o deputado deixou explícito a crítica a morosidade com que o Governo

Federal estava construindo a BR-35, posteriormente denominada BR 277 e argumentou em

cima do significado econômico para o Brasil da estrada que atravessaria o Paraná em direção

ao Paraguai, pleiteando evidentemente a conclusão das obras, já que a ponte estava prestes a

116 Diário do Congresso Nacional. Junho de 1964. Disponível em:

<http://imagem.camara.gov.br/Imagem/d/pdf/DCD25JUN1964.pdf#page=17>. Acesso em: 10 jul. 2019.

Page 112: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

109

ser inaugurada. Como deputado federal por São Paulo, provavelmente advogava a favor dos

interesses econômicos do seu Estado, principal beneficiário no trânsito comercial.

A BR-277 ou Grande Estrada, só foi finalizada, ou seja, asfaltada, 4 anos após a

inauguração da ponte. A rodovia federal transversal brasileira foi oficialmente inaugurada em

março de 1969, e tem 732 km de extensão, no sentido leste-oeste, com início no Porto de

Paranaguá e término na Ponte da Amizade, em Foz do Iguaçu. Seguindo no Paraguai na mesma

orientação, alcança-se Assunção chegando até Lima, no Peru. Por isso, a BR-277 é parte

integrante da Rodovia Panamericana que de Lima, atinge Paranaguá no Atlântico, após

atravessar a Bolívia e o Paraguai.

Imagem 35 – Presidente do Brasil Arthur da Costa e Silva e Presidente do Paraguai Alfredo Stroessner,

na inauguração da BR 277 em 27 de março de 1969. Fonte: FOZ DO IGUAÇU E CATARATAS MEMÓRIA E FOTOS ATUAIS. Foz do Iguaçu, 23 out.

2019. Facebook. Disponível em:

<https://www.facebook.com/photo.php?fbid=10215369959707151&set=g.300913676689041&type=1

&theater&ifg=1>. Acesso em: 06 mar. 2020.

Nos 17 anos de conclusão da Ponte da Amizade, ou seja, em 1982, o Jornal Nosso

Tempo de Foz do Iguaçu117, fez uma reportagem especial sobre a construção e o significado

para os que vivenciaram os impactos de sua conclusão.

ANTONIO BORDIN – “[...] foi o primeiro grande impulso que Foz do Iguaçu

recebeu. A partir da construção da Ponte da Amizade, o progresso de Foz não

parou mais, nem vai parar.” OZIRES SANTOS – “A Ponte da Amizade foi o primeiro marco do progresso

implantado em Foz do Iguaçu. Foi o primeiro grande fator que deu ao

empresario de visão o início do futuro grandioso que Foz do Iguacu tem [...]”. EVALDO SEELING (Advogado) – “A construcão da Ponte da Amizade foi

o primeiro grande passo para a emancipação comercial e industrial de Foz do

Iguacu [...].” OMAR TOSI (Comerciante) – “A Ponte da Amizade foi o primeiro grande

passo importante dado para o desenvolvimento de Foz do Iguaçu, que estava

estagnado. Em 20 anos praticamente nada de novo surgira em Foz antes da

117 Fonte: Nosso Tempo, Foz do Iguaçu. 29/03/1982 – Ano 2, nº 45. p. 7.

Page 113: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

110

Ponte da Amizade [...]. Lembro que durante as obras da ponte a cidade,

especialmente o comércio, aguardava o dia do pagamento dos operários que

trabalhavam na obra para que houvesse dinheiro na praça. O comércio da

época aguardava pagamento dos operários da Ponte como hoje acontece com

a Itaipu [...]. Naquela época, para se ter uma ideia, não havia uma loja sequer

em Porto Stroessner. Mas logo que foi concluída a Ponte surgiram as casas

comerciais tanto no lado de cá como no lado de lá, e hoje todo esse

movimento, todo esse comércio fronteiriço é a alma de Foz do Iguaçu,

juntamente com o turismo. Sem a Ponte da Amizade, esse movimento seria

muitíssimo menor, sem dúvida. [...]”.

A partir das falas acima, percebe-se a importância da ponte, para “iniciar” um

dinamismo que não teria “parado” mais. Então a questão de ser o “primeiro grande impulso”,

“primeiro marco do progresso”, “início do futuro”, “primeiro grande passo”, apareceram nessas

falas dando um protagonismo para a ponte no impulso econômico que o município aportou.

Além de ter contribuído para o surgimento do comércio em ambos os lados facilitando o

intercâmbio binacional. As falas apontam os reiterados usos do termo “primeiro”, ora, se a

ponte é reconhecida como o primeiro marco, significa que tem um segundo. Em 1982, ano desta

matéria, a construção da Itaipu Binacional estava em curso, portanto provavelmente a

consideravam o segundo grande marco para o município.

Em Foz do Iguaçu, a transformação adjacente à ponte, também foi vertiginoso, com o

surgimento de dois bairros denominados de Vila Portes e Jardim Jupira (atualmente faz parte

da Vila A) ambos com grande concentração de casas comerciais voltadas para o público

frequentador da região binacional.

A transformação da paisagem no entorno da ponte, pode ser analisada através das duas

fotografias aéreas abaixo. A primeira sem datação precisa pode-se supor tratar de um período

próximo a 1965, acima da imagem é o Paraguai e abaixo o Brasil. Ao comparar com a fotografia

ao lado de 2009 é possível ter uma noção do crescimento urbano próximo as margens do rio

Paraná. Na primeira fotografia, é possível visualizar apenas uma edificação ao lado direito

próximo a ponte, tratando-se da Aduana Paraguaia. E no Brasil aparecem algumas estruturas

identificadas pelas coberturas.

Page 114: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

111

Imagem 36 – A esquerda a ponte em 1965 e a direita a ponte em 2009.

Foto 1: DNIT. Foto 2: Alexandre Marchetti.

As transformações das cidades a partir da construção da ponte foram extraordinárias e

muitas pesquisas foram realizadas no sentido de compreendê-las. Destaca-se aqui, as ações

estabelecidas entre Brasil e Paraguai que reconfiguraram a dinâmica regional. Logo, a ponte

não é só uma ponte, é muito mais do que se pode supor, e essa conclusão surge na medida em

que as pesquisas vão trazendo a complexa rede estabelecida na região binacional.

Page 115: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

112

CAPÍTULO III

A PONTE ENTRE A MEMÓRIA E A FOTOGRAFIA

Toda a imagem conta uma História.

(BURKE, 2004, p. 175)

O objetivo deste capítulo é trazer o histórico da construção da ponte a partir das imagens,

para isso, considerações teóricas e metodológicas foram retomadas para melhor compreender o

tratamento dado às fontes. As fotografias foram utilizadas, de maneira individual, publicadas

em periódicos, ou na forma de cartão-postal, cuja análise ocorrerá com contribuição de outras

fontes com o propósito de compreendê-las de maneira periscópica, olhando-as sob diferentes

aspectos.

3.1. HISTÓRIA VISUAL: CONSIDERAÇÕES TEÓRICO-METODOLÓGICAS

Neste tópico são abordados os aspectos teórico-metodológicos que dão suporte ao

estudo dos materiais delineados na pesquisa, ou seja, olhar para a Ponte da Amizade através

das fotografias produzidas durante a sua construção até a inauguração, e o seu uso inicial.

Busca-se, a partir desse exercício visual, interrogar, tal qual uma testemunha, procurando pistas,

vestígios e indícios que possam ampliar o conhecimento sobre o objeto de pesquisa ao longo

do tempo.

A ponte foi construída entre 1956 e 1965 sobre o rio Paraná, e este período, pode ser

estudado mediante os vestígios produzidos pelos homens, ou seja, através dos traços ou rastros

intencionalmente ou não, gerados pelos antepassados. O aporte teórico-metodológico que

orientou e forneceu as bases para o desenvolvimento dessa pesquisa foram os trabalhos de

Kossoy (2000), Mauad (1995; 2000), e também os historiadores Bloch (2001) e Le Goff (2003)

contribuindo para pensar e refletir sobre as fontes.

As fontes foram essenciais na investigação sobre a história da ponte, pode-se dizer

inclusive que é a matéria-prima para o seu desenvolvimento, em especial no campo

historiográfico, pois na impossibilidade de se constatar os fatos estudados, o pesquisador

recorre aos seus testemunhos, conforme constata Bloch:

[...] Em nossa inevitável subordinação em relação ao passado, ficamos

[portanto] pelo menos livres no sentido de que, condenados sempre a conhecê-

lo exclusivamente por meio de [seus] vestígios, conseguimos, todavia, saber

sobre ele muito mais do que ele julgara sensato nos dar a conhecer (BLOCH,

2001, p. 78)

Page 116: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

113

Os testemunhos, para Marc Bloch, têm um sentido lato sensu, pois abrange todas as

fontes historiograficas, “a diversidade dos testemunhos historicos é quase infinita. Tudo que o

homem diz ou escreve. Tudo que fabrica, tudo que toca pode e deve informar sobre ele”

(BLOCH, 2001, p. 79).

O desafio está na capacidade de inquirir as testemunhas, ter competência de interrogar,

saber o que e como perguntar, elaborar os questionamentos para que os documentos respondam

as indagações da pesquisa, fazer falar. Evidentemente, que a construção de fontes é

imprescindível nas pesquisas, ou seja, a coleta de documentos necessários para compreender o

objeto de investigação, mas é preciso utilizá-la de maneira crítica, extraindo o máximo de

conhecimento que nela contém.

A fotografia revela traços e vestígios, tal qual uma testemunha, por isso utilizou-se nessa

pesquisa a imagem, como uma fonte documental ou objeto de apoio para discutir a construção

de uma história visual da ponte. Para isso, realizou-se uma análise iconográfica do documento,

decodificando as práticas sociais entorno do objeto de pesquisa.

A fotografia proporcionou um acesso direto a partir do sentido visual do processo de

construção da ponte, em suas diferentes etapas, informando sobre os aspectos construtivos

relacionados a infraestrutura. Desta forma, “a fotografia [...] revoluciona a memoria: multiplica-

a e democratiza-a, dá-lhe uma precisão e uma verdade visuais nunca antes atingidas, permitindo

assim guardar a memoria do tempo e da evolucão cronologica” (LE GOFF, 2003, p. 460).

O interesse em decifrar a transformação de um espaço fronteiriço com a construção de

uma ponte, obriga o pesquisador a exercitar diferentes olhares permitindo alcançar diversas

expressões do espaço-tempo. As fotografias “representam um meio de conhecimento da cena

passada e, portanto, uma possibilidade de resgate da memória visual do homem e do seu entorno

sociocultural” (KOSSOY, 2001, p. 55).

Para compor o estudo, a primeira etapa consistiu na localização das fotografias,

coletadas em diferentes locais, retratando a construção da Ponte da Amizade. Nesse processo

observou-se uma predominância em acervos virtuais e em sua maioria faltando dados sobre a

autoria, data, tecnologia empregada e formato da foto. Após a coleta, organizou-se as fotos da

ponte em ordem cronológica, construindo um acervo pessoal com todos os achados

relacionados ao objeto de pesquisa, permitindo observar as transformações ocorridas sobre o

rio Paraná, agrupando imagens do início da construção em 1956 até a sua inauguração em 1965

e seu uso logo após a finalização. A partir dessa coleta e organização selecionou-se as

fotografias que mais expressassem cada etapa da obra, partindo posteriormente para análise e

interpretação das fontes.

Page 117: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

114

Após sucessivas buscas, não se encontrou o(s) autor(es) das fotografias, e nem o estúdio

ou agência responsável pelos registros. Também não foi possível localizar o acesso físico de

tais fotografias, que atualmente, encontram-se em diferentes websites e páginas sociais, com

amplo acesso aos interessados.

É importante frisar que estas fotografias não foram produzidas com a intenção de se

transformar em uma fonte historiográfica, mas que, ao ser selecionada pelo pesquisador, passa

por um conjunto de processos que possibilitam um conhecimento entorno do objeto estudado.

Conforme Pesavento (2008) “a imagem é uma narrativa que conta e explica algo”

(PESAVENTO, 2008, p. 108), para isso, precisa ser interrogada.

Parte-se da perspectiva que, esses registros fotográficos sobre a ponte, tinham um

caráter documental, ou seja, significam o registro sistemático cuja intenção, por inferência, é

gravar as diferentes etapas da obra, haja vista a ênfase dada à ponte, evidenciando as fases da

sua construção. Desta forma, pode-se questionar se as fotos, não foram produzidas por

fotógrafos do governo ou das empresas responsáveis pela execução da obra.

O registro era importante para uso dos governos reforçando imagens positivas

associadas à modernização, desenvolvimento e, para as empresas, evidentemente o registro

enriquecia o portfólio. Conforme alerta Kossoy, “desde cedo os governos, assim como as

grandes empresas comerciais, requereram a presença do fotógrafo para que documentassem

seus feitos, suas realizacões” (KOSSOY, 2001, p. 112), ou seja, existe uma aproximacão entre

a documentação e a propaganda.

O acervo também contribuiu na reflexão sobre a produção fotográfica na cidade de Foz

do Iguaçu, nesse caso, o conteúdo temático elencado é a construção de uma ponte na região

fronteiriça Brasil-Paraguai, delineando uma nova paisagem local. A engenharia nesse contexto

tem um papel de destaque como resultado da “modernização” e aumento das dinâmicas

econômico-sociais entre os dois países.

O desconhecimento autoral das fotografias não inviabilizou o levantamento de hipóteses

sobre as suas intenções, criações e razões no registro, pois há uma priorização ou seleção de

uma imagem a ser destacada, neste caso, a ponte, com muitas possibilidades de ver, optar e

fixar um determinado aspecto da realidade, conforme reflexões de Kossoy:

O assunto, tal como se acha representado na imagem fotográfica, resulta de

uma sucessão de escolhas; é fruto de um somatório de seleções de diferentes

naturezas – idealizadas e conduzidas pelo fotógrafo – seleções essas que

ocorrem mais ou menos concomitantemente e que interagem entre si,

determinando o caráter da representação (KOSSOY, 2000, p. 27).

Page 118: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

115

Observa-se, por exemplo, a não priorização no registro dos trabalhadores na obra. Algo

que só se percebe quando se analisa o acervo na sua totalidade, examinando o que tem em

comum entre elas. A seleção e descarte de elementos pode significar valores subjacentes que,

compondo com outras fontes, é possível extrair um significado.

Além das fotografias da construção e inauguração também se utilizou imagens

compartilhadas nas mídias sociais de “turistas” que posaram na ponte e com a ponte, o que

demonstra certo valor atribuído que justificaria um registro, materializando a experiência.

Utilizou-se na pesquisa as fotografias publicadas nas Revistas Manchete e Estrellas, neste caso,

caracterizam-se pelo foto-jornalismo cuja análise ocorre da imagem e do texto associado à

imagem, e por último apresenta-se a imagem expressa no cartão-postal, objeto de grande

divulgação e promoção visual.

3.2. A PONTE FOTOGRAFADA: FRAGMENTOS DO REAL

Neste tópico serão analisadas as fotografias, os discursos de Juscelino Kubitschek, do

presidente Stroessner, do Museu el Mensú e do filme produzido pela Agência Nacional, além

das representações expressas em alguns periódicos, a exemplo da Revista Estrellas editada no

Paraguai e as edições da inauguração da ponte pelo Juscelino em 1961 e pelo Castelo Branco

em 1965 na Revista Manchete. O objetivo é analisar e compreender a Ponte da Amizade a partir

dos vestígios visuais.

3.2.1 ANÁLISE FOTOGRÁFICA

Nesse subtópico serão analisadas as fotografias das etapas construtivas da ponte. Para

compreender a evolução da construção utilizou-se entrevistas com ex-funcionários, matérias de

revistas, jornais e propaganda da época.

De acordo com o acervo pesquisado das fotos da ponte, a Imagem 37 registra a fase

inicial de construção. O fotógrafo posiciona-se na frente da margem oposta do rio Paraná no

Paraguai, para o observador é possível acompanhar com os olhos onde a ponte faria a ligação

em linha contígua. Também é possível observar uma paisagem com o predomínio de vegetação

e com poucas construções, o desmatamento no entorno onde ocorrerá a obra também é

observado. Nota-se a existência de uma espécie de sistema de teleférico, do outro lado da

margem, no qual será explorado mais para frente da pesquisa.

Page 119: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

116

Imagem 37 – Início da construção da superestrutura, que dará o acesso de um lado ao outro da ponte.

s/a.

Fonte: Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes – DNIT, Foz do Iguaçu, PR. Acervo

digital.

Também chama a atenção a ausência de trabalhadores na obra, constatando uma

intencionalidade de retratar especificamente a construção ainda incipiente. Ortiz (1998),

inclusive, chama a atenção na sua pesquisa, ao debruçar-se sobre a França do século XIX,

evidenciando a preferência dos fotógrafos em retratar aquilo que, monetariamente, daria mais

retorno, desta forma, “a fotografia pouco se interessou pelo mundo do trabalho [...]” (ORTIZ,

1998, p. 105), e quando os registra, retrata-os muito menores em relação à monumentalidade

da obra.

Segundo dados do DNIT havia cerca de 250 trabalhadores alocados para a construção

da ponte, criando inclusive uma estrutura de moradia próximo à margem para abrigá-los, mas

conforme a análise das fotografias encontradas, poucas registram a ação e o protagonismo

destes trabalhadores. As poucas fotos encontradas dos trabalhadores foram compartilhadas por

eles próprios, com orgulho de contribuírem na materialização de tal projeto. As imagens de

“especialistas”, ou pessoas com “autoridade”, essas sim, eram “merecedoras” do registro,

conforme a Imagem 38.

Na Imagem 38, nota-se uns 11 homens próximos a obra, com calças e sapatos social,

um inclusive com uma calça clara, vestidos com casacos e alguns com chapéus, o que se pode

inferir tratar-se de pessoas que estavam observando as obras, seja fiscalizando, avaliando,

verificando encaminhamento da construção, pois estão perto de uma estrutura que parece um

Page 120: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

117

canteiro de obras a esquerda, com madeiramento aparente. Também há dois carros próximos,

ou seja, provavelmente não chegaram até ali a pé e sim, com um veículo típico off road haja

vista a pista claramente lameada. Na margem do lado oposto do rio Paraná, o pilone sendo

edificado.

Imagem 38 – Observando as obras. Fonte: FOZ DO IGUAÇU E CATARATAS MEMÓRIA E FOTOS ATUAIS. Foz do Iguaçu, 04 out.

2019. Facebook. Disponível em: <https://www.facebook.com/photo.php?fbid=10215215934016605&set=g.300913676689041&type=1

&theater&ifg=1>. Acesso em: 06 mar. 2020.

O acesso ao cronograma da construção foi possível através da Revista Memórias de Foz

do Iguaçu. Segundo a fonte, a obra teria efetivamente sido iniciada em setembro de 1957, após

a fase preparatória entre 56 e 57. Segue abaixo o detalhamento do cronograma sistematizado

pela revista:

[...] Em janeiro de 58 foram parcialmente montadas as ensecadeiras para a

construção dos blocos de apoio do arco e pilone, visto que, em meio a

concretagem da ensecadeira do lado paraguaio, o rio subiu interrompendo os

serviços, que só puderam ser retomados em princípios de maio. Daí até fins

de agosto, devido à altura das águas, não foi possível sequer iniciar a

construção dos blocos para o cimbramento – estrutura de suporte do arco –,

limitando-se o serviço a obras nas barrancas e na escavação e concretagem

nos blocos de apoio do arco e pilone, serviço realizado sob a proteção das

ensecadeiras. No dia 1º de agosto, baixando o rio, atacou-se simultaneamente nos dois lados,

a construção dos blocos. No dia seis de setembro, porém, o rio voltou a subir,

obrigando a interrupção desse serviço, que somente pôde ser retomado em 7

de julho de 1959, e os blocos foram concluídos em 25 de julho naquele ano. Em fevereiro de sessenta, achavam-se prontos os pilones, os viadutos de

acesso e todo o escoramento de concreto. Em seis de abril de sessenta iniciou-se a concretagem da parte do arco

definitivo, que dispunha de cimbre de concreto já pronto. Em 20 de julho de sessenta, já se achavam na obra toneladas de material

metálico para o início de montagem da parte metálico do cimbre, tarefa

concluída em 1º de dezembro do mesmo ano.

Page 121: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

118

A partir da instalação da estrutura metálica, as obras passaram a se resumir à

concretagem [...]118.

Nota-se no histórico acima, o quanto o rio Paraná era um importante elemento na

execução da obra, podendo atrasar o ritmo de trabalho, a depender do nível das águas,

concentrando o labor nos períodos de baixa do rio.

O rio Paraná, fronteira natural entre Brasil e Paraguai, é visto na imagem abaixo livre

de um vão, prestes a mudar a sua paisagem. O percurso fluido, o móvel líquido, o ir e vir

cortando a corrente d’agua estava se preparando em ambas as margens para receber sobre ele

um arco. Na Imagem 39, é possível visualizar os dois assentamentos as margens, já concluídos,

cada um equivalem em altura a dois edifícios de 26 andares119

Imagem 39 – Vista do rio Paraná de onde a Ponte seria construída. s/a. Fonte: FOZ DO IGUAÇU E CATARATAS MEMÓRIA E FOTOS ATUAIS. Foz do Iguaçu, 04 out.

2019. Facebook. Disponível em: < https://www.facebook.com/photo.php?fbid=10215215936016655&set=g.300913676689041&type=1

&theater&ifg=1>. Acesso em: 06 de mar. 2020.

Antes da construção da ponte, a cidade limítrofe a Foz do Iguaçu, hoje denominada

Ciudad del Este, no Paraguai, inexistia enquanto tal. Era um local predominantemente rural.

118 Revista Memória Foz do Iguaçu, junho de 1982. Acervo da Biblioteca Municipal de Foz do Iguaçu. 119 Arquivo Nacional. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=gNcBusxARWc&t=10s>. Acesso em:

07 jul. 2017.

Page 122: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

119

Esse cenário é descrito, em uma entrevista concedida ao Clickfoz do Iguaçu120, pelo Sr. Ari

Ojeda, topógrafo do DNER, responsável pelo nivelamento e contranivelamento da ponte e

lembra como era a atual Ciudad del Este: “do outro lado na margem paraguaia só tinha um

abacaxizal lá, só sertão né, sertão... e quando vinha aí para trabalhar só tinha uma picada lá

na beira do rio Paraná, tinha uns trator lá em baixo fazendo a limpeza para começar a obra

né [...]”. E sobre a percepcão da necessidade da construção de uma ponte, o Sr. Clementino

Acevedo, motorista responsável pelo transporte dos funcionários, comenta: “Eu vou falar a

verdade, quando falaram em construir aquela ponte eu falava para que construir aquela ponte

no meio do matão, isso aqui para que? [...]”. São as percepções subjetivas, individuais e

singulares de ver e interpretar determinada realidade.

Nessa mesma entrevista o Sr. Ari Ojeda, mostrando a foto da inauguração da ponte com

os presidentes Juscelino e Stroessner, ri e comenta “essa ponte teve umas duas ou três

inauguracões”, informacão que esta no palimpsesto de histórias institucionais. Pois

oficialmente a data de inauguração da ponte está registrada no dia 27 de março de 1965,

portanto, os registros de inauguração pelo JK no Brasil, estão nas memórias pessoais e nos

registros fotográficos, que ajudam a emergir histórias além dos oficiais.

A perspectiva teórica da História Cultural traz a possibilidade de desenvolver a pesquisa

no âmbito da história da memória, retratando-a como algo vivo, presente e vivenciada pelos

moradores, porém corre o risco de se perder ao serem enquadrados e reproduzidos, conforme

alerta Burke (2005, p. 88):

[...] À medida que os acontecimentos retrocedem no tempo, perdem algo de

sua especificidade. Eles são elaborados, normalmente de forma inconsciente,

e assim passam a se enquadrar nos esquemas gerais correntes na cultura. Esses

esquemas ajudam a perpetuar as memórias, sob o custo, porém de sua

distorção.

E foram os trabalhadores da obra que acabaram compartilhando mais como

testemunhos, as suas experiências de participarem da efetivação da Ponte da Amizade,

conforme a Imagem 41, em que o Sr. Ari Ojeda mostrou a foto com o registro da equipe de

topógrafos que trabalharam na Ponte da Amizade, indicando que apenas três estavam vivos

(ano-base 2017).

120 Clickfoz do Iguaçu. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=1mZ_H5RiqfU>. Acesso em: 07 jul.

2017.

Page 123: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

120

Imagem 40 – O Sr. Ari Ojeda mostrando a foto da equipe de topógrafos que trabalharam na Ponte da

Amizade. s/a.

Fonte: CLICKFOZ. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=1mZ_H5RiqfU>. Acesso

em: 30 abr. 2020.

Outra foto que aparece na entrevista com o Sr. Ari, é do setor administrativo organizado

pelo DNER em Foz do Iguaçu, na Imagem 41, lê-se na placa “M.V.O.P.121 DNER Comissão

Especial de Construção da Ponte Internacional Brasil-Paraguai”. Abaixo 12 homens, todos de

camisa e calça social, dois deles, estão agachados, sendo um deles, da ponta a direita está com

uma criança, o que se pode inferir não se tratar de um dia normal de trabalho, talvez tenham se

reunido com a intenção de registrar tal evento.

Imagem 41 – Foto da equipe de topógrafos em frente ao DNER. s/a.

Fonte: CLICKFOZ. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=1mZ_H5RiqfU>. Acesso

em: 30 abr. 2020.

Para a construção da ponte, uma grande logística teve que ser organizada para abastecer

com as matérias primas e equipamentos necessários que viabilizassem a obra. Na propaganda

abaixo (ver imagem 42) da Fábrica Nacional de Motores – FNM122 descreve a “operacão

121 M.V.O.P. é Ministério de Viação e Obras Públicas. 122 A Fábrica Nacional de Motores – FNM, foi criada em 1942 sob a presidência de Getúlio Vargas e encerrada

em 1985.

Page 124: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

121

ponte”, nesse caso, o transporte de enormes estruturas de aco responsaveis pela sustentacão do

arco de concreto. Produzidos pela Companhia Siderúrgica Nacional de Volta Redonda, no Rio

de Janeiro, foram transportadas cerca de 1.275 toneladas de aço, por vários caminhões até Foz

do Iguaçu.

Imagem 42 – Propaganda da Fábrica Nacional de Motores – FNM. Ano 1960 / Edição 0051. Fonte: REVISTA O CRUZEIRO. Disponível em: <http://memoria.bn.br/docreader/003581/132441>.

Acesso em: 20 out. 2019.

A Imagem 43 registra os caminhões passando pela cidade de São Miguel, na rodovia,

ainda sem asfalto. Pode-se imaginar o impacto das pessoas testemunhando esse evento singular

para a pacata região do oeste paranaense. Na imagem, à esquerda, tem um carro parado com as

pessoas ao lado de fora, provavelmente contemplando ou surpresos com tal singularidade.

Imagem 43 – Transporte das peças para a construção da Ponte da Amizade, passando por São Miguel

do Iguaçu. Fonte: FOZ DO IGUAÇU E CATARATAS MEMÓRIA E FOTOS ATUAIS. Foz do Iguaçu, 03 out.

2019. Facebook. Disponível em: https://www.facebook.com/photo.php?fbid=2479352498946825&set=g.300913676689041&type=1&t

heater&ifg=1. Acervo de Jorge Luiz Pizzolo. Acesso em: 21 nov. 2019.

Page 125: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

122

A construção da ponte mobilizou um contingente de 100 trabalhadores paraguaios e 150

trabalhadores brasileiros, segundo o DNIT. Uma vila foi instalada em Foz do Iguaçu para

comportá-los contendo casas, depósitos para armazenar os equipamentos e materiais, refeitório,

estradas de acesso, além do fornecimento e distribuição de energia elétrica e água. Também

colocaram à disposição dos funcionários, ônibus para transportarem seus filhos às escolas nas

áreas centrais da cidade.

Na margem paraguaia também foi criado um bairro, denominado de Barrio Obrero,

alterado posteriormente para Bernardino Caballero123, para receber os trabalhadores da ponte,

foi o primeiro núcleo habitacional da cidade. Segundo o ABC Color, os trabalhadores vieram

de diferentes lugares do Paraguai e foram contratados pela empresa brasileira SOTEGE.

Uma matéria da Ultima Hora traz o depoimento de quem trabalhou na ponte ao lado

paraguaio:

Juan Lidio Ávalos Villalba (85) vino de Villarrica, tras escuchar por radio que

se necesita de obrajeros para construir el puente sobre el Paraná para unir a

Paraguay y Brasil; el mismo dijo que llegó el 3 de mayo de 1.957, luego de 6

días de viaje; caminando en las picadas y valiéndose de aventones.

"Fueron 10 años de trabajo sacrificado cerca del rio, trabajábamos 10 horas

seguidas, con suerte comíamos 3 veces al día o si no nos alimentábamos con

arroz, feijao (poroto), locro o reviro” [...].

El reconocido obrero fue capataz del grupo de carpinteros en la zona del

Puente de la Amistad [...].

Ávalos, al igual que otros constructores del Puente de la Amistad siguen

residiendo en el barrio Obrero, llamado así en homenaje a ellos, quienes en

los comienzos abrieron dos cuadras de calle que desde el 2010 se llama, por

ordenanza municipal "Obreros del Puente de la Amistad".

[...]124.

A construção da ponte atraiu os interessados para trabalhar, no caso do Sr. Juan,

conforme o seu relato, o sacrifício não foi só chegar ao local da contratação, mas também a alta

carga horária de trabalho despendido para dar cabo do projeto. E ele, assim como outros

estabeleceram a residência no município, atualmente denominado Ciudad del Este no bairro

Obrero, que em 2010 passou a ser chamado Obreros del Puente de la Amistad, antes do atual

nome. O reconhecimento, deste caso, não está somente no operário, mas sobretudo na ponte,

123 ABC Color. Homenaje a constructores del puente. Disponível em:

<https://www.abc.com.py/especiales/homenaje-a-constructores-del-puente-810839.html>. Acesso em: 05 abr.

2020. 124 UltimaHora. Solo nos recuerdan cada 3 de febrero y no recibimos ningún tipo de asistencia. Disponível em:

<https://www.ultimahora.com/solo-nos-recuerdan-cada-3-febrero-y-no-recibimos-ningun-tipo-asistencia-

n500776.html>. Acesso em: 05 abr. 2020.

Page 126: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

123

ela é que está protagonizada na denominação do bairro, portanto, o vínculo mnemônico, neste

caso está na toponímia, ligando a história do município com a obra.

A fotografia, também é um recurso de memória ou suporte mnemônico que auxilia no

exercício mental de reconstituição de um determinado evento pretérito. Pois, na impossibilidade

de retornar no tempo, a foto cristaliza, mesmo que minimamente esse instante de tempo,

auxiliando a acessar aquilo que já desapareceu, e documenta, no caso da construção da ponte,

uma nova fisionomia na fronteira Brasil-Paraguai.

No registro abaixo, é possível visualizar a fundação dos pilares centrais que,

posteriormente, sustentaram o arco de concreto. Segundo o DNIT, se deu de maneira direta,

formada por blocos de concreto armado ancorados em rocha (basalto), assim como os pilares

que sustentam a estrutura dos dois viadutos (lado brasileiro e lado paraguaio)125.

Imagem 44 – Pilar central. Fonte: FOZ DO IGUAÇU E CATARATAS MEMÓRIA E FOTOS ATUAIS. Foz do Iguaçu, 04 out.

2019. Facebook. Disponível em: <https://www.facebook.com/photo.php?fbid=10215215936616670&set=g.300913676689041&type=1

&theater&ifg=1>. Acesso em: 6 mar. 2020.

A fotografia, enquanto um registro de um cenário, sinaliza a opção técnica do fotógrafo

ao optar por um enquadramento predominantemente horizontal, centralizando o objeto a ser

destacado, conforme a imagem abaixo. Ao modo de uma testemunha ocular, é possível

visualizar o pilar de concreto já construído (a esquerda) que dará sustentação às aduelas

125 DNIT. Disponível em:

<http://www.consultaesic.cgu.gov.br/busca/dados/Lists/Pedido/Item/displayifs.aspx?List=0c839f31%2D47d7%2

D4485%2Dab65%2Dab0cee9cf8fe&ID=1333313&Source=http%3A%2F%2Fwww%2Econsultaesic%2Ecgu%2

Egov%2Ebr%2Fbusca%2FSitePages%2Fresultadopesquisa%2Easpx%3Fk%3Dponte%2520da%2520amizade&

Web=88cc5f44%2D8cfe%2D4964%2D8ff4%2D376b5ebb3bef>. Acesso em: 10 jun. 2019.

Page 127: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

124

(estruturas de concreto armado). Na construção do arco, vê-se, através da Imagem 45, as escoras

(madeira aparente) sendo fixadas.

Imagem 45 – O pilar, no qual a base encontra-se a fundação da estrutura, já concretado e a fase de

construção do arco. Fonte: DNIT. Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes – DNIT, Foz do Iguaçu, PR.

Acervo digital.

Para compor os registros fotográficos, outras fontes foram pesquisadas no sentido, tanto

de enriquecer as indagações em relação às imagens, quanto para compreendê-las em um

contexto maior.

Neste sentido, utilizou-se a descrição da obra realizada pela Agência Nacional em 1959,

no qual acompanhou o andamento da construção juntamente com o representante do presidente

da república, o Coronel Lino Romualdo Teixeira, que na época exercia o cargo de subchefe do

Gabinete Militar.

Uma obra de engenharia monumental será a ponte Brasil-Paraguai que está

sendo construída em tempo recorde sobre o caudaloso rio Paraná, linha

divisória entre as duas repúblicas do continente. Os dois assentamentos da

ponte já concluídos as margens do rio, equivalem em altura a dois edifícios de

26 andares. O arco de cimento armado sustentado pelos dois pilones terá a

extensão de 303 metros e ficará a 78 metros de altura acima do nível do rio,

as variações do nível do Paraná constituíam grandes obstáculos já vencidos

pela técnica e o arrojo da engenharia brasileira[...]126.

As expressões “engenharia monumental” e “arrojo da engenharia brasileira” trazem um

tom ufanista, auto enaltecedor dos feitos brasileiros, prevendo uma construcão em “tempo

126 Arquivo Nacional. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=gNcBusxARWc>. Acesso em: 05 jun.

2019.

Page 128: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

125

recorde” o que de fato não ocorreu, pois, a obra foi finalizada 5 anos depois da previsão da

agência.

Em outro trecho do mesmo vídeo, descrevem como a obra foi acelerada para cumprir o

prazo, conforme a transcrição abaixo:

Para assegurar maior rendimento nos trabalhos e acelerar a construção da

ponte que estará construída em fins de 1960, instalou-se ali um sistema

teleférico para o transporte de concreto e outros materiais por cima do rio. As

caçambas correm a uma altura de 80 metros até o ponto desejado e onde

descem verticalmente para deixar o concreto nos caixões das armações

metálicas, desta forma será edificado todo o majestoso arco e as pilastras que

o vão sustentar [...]127.

O sistema teleférico foi uma solução para que o transporte de materiais acima do rio

fosse possível. Abaixo na Imagem 46, encontra-se o registro do teleférico, ou seja, era um

transporte aéreo temporário que utilizava cabos para sustentar a caçamba com os materiais no

deslocamento dos mesmos. Pela descrição acima, os segmentos foram concretados no local, por

meio de fôrmas que se deslocavam em balanço, sendo suportados por trechos já concluídos.

Imagem 46 – Sistema de teleférico para transportar materiais para o outro lado do rio. Fonte: FOZ DO IGUAÇU E CATARATAS MEMÓRIA E FOTOS ATUAIS. Foz do Iguaçu, 04 out.

2019. Facebook. Disponível em: <https://www.facebook.com/photo.php?fbid=10215215935776649&set=g.300913676689041&type=1

&theater&ifg=1>. Acesso em: 06 mar 2020.

Na Imagem 47, observa-se mais de perto o cibramento, que são estruturas de madeira

que faz o trabalho do escoramento da laje até que o concreto armado esteja pronto. No rio,

avistam-se embarcações de madeira responsáveis pela mobilização dos trabalhadores e de

materiais e acima à direita (no destaque) o sistema de teleférico que sustentava as caçambas no

127 Arquivo Nacional. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=gNcBusxARWc>. Acesso em: 05 jun.

2019.

Page 129: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

126

transporte do concreto por cabos aéreos. O enquadramento, assim como, a perícia do fotógrafo,

permite observar com nitidez os detalhes da obra e o seu movimento na construção ao mostrar

as embarcações e os trabalhadores na lida. Nota-se que quando trabalhadores aparecem, são

focados em plano secundário, diferente de quando se tratam de autoridades, técnicos mais

graduados.

Imagem 47 – A vista do cibramento e os trabalhadores em ação. Fonte: DNIT. Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes – DNIT, Foz do Iguaçu, PR.

Acervo digital.

Os escoramentos, formando um arrimo para a colocação do concreto, foram possíveis

em função do desenvolvimento tecnológico de aperfeiçoamento do concreto ocorrido no século

XX, dominando as grandes construções de arranha-céus, barragens, torres, plataformas entre

outras. O concreto é um “material plastico, que é moldado de maneira a adquirir a forma

desejada antes que desenvolva um processo de endurecimento, adquirindo resistência suficiente

para resistir sozinho aos esforços que o solicitam” (KAEFER, 1998, p. 3). E, os estudos indicam

o seu uso desde meados do século XVIII, mas na contemporaneidade, a evolução tecnológica

permitiu extrapolar sua aplicação para grandes construções.

Em relação à estrutura, Prentzas (2009), descreve os elementos essenciais, certificados

pelos projetistas para avaliar a segurança de uma ponte.

[…] Para funcionar sem desabar, uma ponte precisa suportar uma combinação

de três coisas: sua carga morta, sua carga viva e sua carga ambiental. O próprio

peso de uma ponte compõe sua carga morta. Pessoas, carros, caminhões e

outros tipos de tráfego que passam pela ponte são sua carga viva. Água, vento

ou terremotos constituem a carga ambiental de uma ponte. Os projetistas de

Nota-se

nessa foto o

sistema de

teleférico

descrito

acima pela

Agência

Nacional.

Page 130: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

127

pontes certificam-se de que suas pontes possam suportar esses três tipos de

cargas (HAW, 2005, n.p., tradução livre)128.

No caso nas pontes modernas, os próprios materiais de construção são usados para

superar as forças físicas que os afetam, portanto o concreto armado tornou-se o mais apropriado,

resistindo a compressão e tração.

Na Imagem 48 fica visível o avanço simultâneo entre os vãos, técnica imprescindível

para o contrabalanceamento da estrutura. Conforme mencionado no segundo capítulo, a técnica

de balaços sucessivos é executada alternadamente para cada lado até a totalidade da execução

do vão, com as inserções de treliças metálicas. O objetivo é chegar ao ponto de encontro dos

dois conjuntos fechando o arco com a máxima precisão.

Imagem 48 – Avanço simultâneo entre os vãos na construção da Ponte da Amizade. Fonte: REVISTA MEMÓRIA (1982).

Com o método por balanços sucessivos foi possível construir a ponte sem escoramento

direto, em seções progressivas a partir dos pilares já estabelecidos apoiando-se no balanço da

etapa anterior realizada. Nota-se tanto na Imagem 48 quanto na Imagem 49 o arco sendo

construído com 32 metros de altura a partir do nível normal do rio e sem escora sob o rio.

128 Texto original: […] To work without collapsing, a bridge has to hold up to a combination of three things: its

dead load, its live load, and its environmental load. A bridge's own weight makes up its dead load. People, cars,

trucks, and other types of traffic passing over the bridge are its live load. External se water, wind, or earthquakes-

constitute a bridge's environmental load. Bridge designers make sure that their bridges can hold up to these three

types of loads (HAW, 2005, n.p.).

Page 131: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

128

Imagem 49 – Arco sendo construído da Ponte da Amizade. Fonte: DNIT. Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes – DNIT, Foz do Iguaçu, PR.

Acervo digital.

A Companhia Siderúrgica Nacional de Volta Redonda foi a responsável pela edificação

do arco de sustentação da ponte, montando um cimbre metálico de 157,3 metros de

comprimento contendo 1.200 toneladas de aço, o seu transporte foi realizado por dez carretas

do Departamento Nacional de Estradas de Rodagem – DNER (Foz do Iguaçu: Retratos, 1997,

p. 17).

O arco da ponte é o elemento arquitetônico e estrutural curvo que transmite o seu peso

próprio e as sobrecargas a dois apoios (NUNES, 2009, p. 9), conforme uma citação de Leonardo

da Vinci (1452-1519) “o arco não é outra coisa senão uma fortaleza de duas fraquezas”, ou seja,

sua atribuição é conter e distribuir os esforços gerados por elas. O arqueamento tem função

dupla, primeiro permite o tráfego, ou seja, circulação de pessoas e veículos e segundo tem a

função de garantir a navegabilidade do rio Paraná.

Na Imagem 50, a composição, também encontrada em outras fotografias, compondo o

pano de fundo com o céu, a vegetação e a água, mas a maior proporção está no monumento.

Observa-se uma pequena embarcação com duas pessoas minúsculas ao comparar com a

magnitude retratada. As características da simetria, harmonia, proporção, centralização e

organização destacam-se, refletindo nessas imagens a interferência da ação humana, o domínio

da técnica expressa na estrutura em arco.

Arco

definitivo de

concreto

armado

Vão = 303m

Treliça de

escoramento

em concreto

armado.

Page 132: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

129

Imagem 50 – O arco com a treliça de aço para o escoramento da parte central do concreto. A armação

abaixo é o reticulado em concreto armado. Fonte: DNIT. Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes – DNIT, Foz do Iguaçu, PR.

Acervo digital.

Ao comparar a Imagem 50 acima, com a Imagem 51 abaixo, observa-se etapas distintas

da construção, pois em cima é possível visualizar as treliças de aço utilizadas para escorar a

parte central do arco e na imagem abaixo aparece apenas resíduos dos ferros, não mais as

treliças. Também é possível visualizar o nível do rio Paraná bem abaixo do normal na Imagem

51 sendo possível observar a base da fundação da ponte à direita.

Imagem 51– Retirada das treliças. Ponte Internacional da Amizade. s/a, s/d. Fonte: IBGE. Disponível em: <https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/fotografias/GEBIS%20-

%20RJ/pr45494.jpg>. Acesso em: 20 out. 2019.

Na Imagem 52, a ponte é protagonizada a partir da centralização que o fotógrafo a

representa. No canto direito um homem está sentado aparentemente visualizando a paisagem a

Treliça de aço

para escora-

mento da parte

central do arco

em concreto.

Reticulado em

concreto armado.

Page 133: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

130

sua frente. Proporcionalmente, representa uma pequena fração desse enquadramento mostrando

a magnitude da obra, duplicada no reflexo com o rio Paraná.

Em uma entrevista concedida em 2010 para o Clickfoz do Iguaçu, o Sr. Ari Ojeda,

topógrafo do DNER, relata tratar-se dele “essa fotografia da ponte ainda com a armacão nela,

eu estou sentado aqui [indica na fotografia onde ele estava] de costas e o fotógrafo falou para

mim – senta olhando para a ponte para dar vida”129.

Imagem 52 – A Ponte Internacional da Amizade com a armação sustentando o arco. Fonte: DNIT. Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes – DNIT, Foz do Iguaçu, PR.

Acervo digital.

Abaixo, na Imagem 53, o fotógrafo retratou o arco mais de perto, e com isso, pode-se

ver a inexistência das treliças de aço e uma parte do escoramento em concreto armado. O

fotógrafo está posicionado aparentemente na margem do rio Paraná podendo fotografar a ponte

a partir da sua altura, por isso o ângulo registrou apenas parte da estrutura em função da altura

e distância de quem a registrou. O destaque desta foto está nos menores elementos, ou seja, três

indivíduos em cima do arco, criando na imagem, certa referência em relação a dimensão da

obra, transformando o homem em minúsculas criaturas diante da obra colossal.

129 Entrevista concedida para o ClickFoz. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=1mZ_H5RiqfU>.

Acesso em: 05 abr. 2020.

Page 134: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

131

Imagem 53 – Tirando as esquadras. s/a, s/d. Fonte: FOZ DO IGUAÇU E CATARATAS MEMÓRIA E FOTOS ATUAIS. Foz do Iguaçu, 23 out.

2019. Facebook. Disponível em: <https://www.facebook.com/photo.php?fbid=10215370094110511&set=g.300913676689041&type=1

&theater&ifg=1>. Acesso em: 6 mar. 2020.

As seis últimas fotos acima, o arco está se definido na paisagem, o que vai caracterizar

a arquitetura da ponte. A estrutura semicircular, com um amplo vão livre, capaz de suportar

grandes volumes, causa um impacto visual, segundo Tuan (1980, p. 231),

o significado do arco provém de uma antiga tradição: como o domo, simboliza

o céu, os lados conduzem o olho para cima, para a curva no ápice; e por

analogia, o portal monumental que se abre para a cidade ou palácio,

suntuosamente convida o viajante a entrar na terra prometida.

No caso da Ponte da Amizade, a “terra prometida” pode ter varios significados variando

de quem atravessa, para onde está atravessando e quando atravessou ou atravessará, mas pode-

se generalizar que todos esperam algo do outro lado.

Neste tópico, procurou-se, a partir das fotografias, estabelecer de maneira cronológica

a análise da construção da ponte, para isso, estabelecemos os seguintes passos, descrição das

imagens e a busca pela significação das mesmas.

3.2.2 DIFERENTES REPRESENTAÇÕES SOBRE A PONTE

Neste subtópico serão analisados os discursos de Juscelino Kubitschek, do presidente

Stroessner, do Museu el Mensú e do filme produzido pela Agência Nacional, além das

representações expressas em alguns periódicos, a exemplo da Revista Estrellas editada no

Paraguai e as edições da inauguração da ponte pelo Juscelino em 1961 e pelo Castelo Branco

em 1965 na Revista Manchete. Além disso, novas fotografias serão analisadas com o intuito de

perceber a finalização da obra e o seu posterior uso.

Page 135: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

132

Conforme descrição no Capítulo II, no dia 04 de outubro de 1958, os presidentes JK e

Stroessner se encontraram em Foz do Iguaçu para inspecionar as obras da ponte. O registro de

tal solenidade foi realizado com a presença de autoridades, engenheiros, jornalistas e militares

cujo interesse era evidentemente vincar acordos binacionais e também propagandear suas

ações.

Na foto abaixo, dezenas de pessoas acompanharam a vistoria junto com os presidentes.

A solenidade de tal evento é percebida pelas vestimentas, cujos trajes indicam uma ocasião

formal e a presença de militares, compõe a comitiva. A caminhada se deu sobre uma plataforma

de madeira, com estruturas ao redor também do mesmo material. O registro fotográfico, de

cima para baixo, conseguiu captar a comitiva, uma parte da extensão da ponte e a direita acima

da imagem, o rio Paraná e a densa vegetação.

Imagem 54 – Os presidentes JK e Stroessner e comitiva vistoriando a construção da ponte. Ano 1958. Fonte: FOZ DO IGUAÇU E CATARATAS MEMÓRIA E FOTOS ATUAIS. Foz do Iguaçu, 22 set.

2019. Facebook. Disponível em:

<https://www.facebook.com/photo.php?fbid=10215137536696721&set=g.300913676689041&type=1

&theater&ifg=1>. Acesso em: 21 nov. 2019.

Na ponte, ambos os presidentes inspecionaram a execução da obra e evidentemente

firmaram e consolidaram suas intenções políticas e econômicas. O discurso de JK

implicitamente indica a superioridade técnica do país, ao expressar o empenho nos estudos que

resultaram num dos “maiores” projetos na América do Sul. É preciso ressaltar que existia uma

Page 136: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

133

superioridade técnica, mas também é preciso reforçar a existência de uma disparidade

econômica entre os dois países, o que impede comparar as realidades ou naturalizá-las, portanto,

o discurso, também é um elemento que visa monumentalizar a obra.

[...] Árduos estudos tiveram de ser feitos para a execução dessa obra

monumental, que será um dos maiores empreendimentos levados a cabo na

América do Sul. [...] nessa ponte que é uma das mais belas obras de arte, senão

a mais bela, de todas quantas concebeu a engenharia sul-americana130.

O discurso de JK, na acepção de Chartier, precisa relacionar com “os discursos

proferidos com a posicão de quem os utiliza”, neste caso, o presidente está reforçando as ações

empreendidas pelo Brasil para beneficiar o Paraguai, em contrapartida também se beneficiará

com tal empreendimento, mas sob o protagonismo brasileiro.

Outra fonte utilizada na pesquisa foram duas matérias publicadas na Revista

Manchete131. O objetivo não é discutir a revista, mas utilizar as fontes produzidas por ela, em

especial fotorreportagens, neste caso, as imagens estão contextualizadas com as matérias,

dialogando com o texto escrito.

Analisam-se a produção de duas formas de linguagem, a gráfica e a fotográfica. A

matéria jornalística se propõe em retratar o que de fato sucedeu e a fotografia tem a mesma

pretensão de registar a realidade tal qual ocorreu, em ambos os casos se ambiciona “retratar a

realidade” através de um conjunto de sinais.

Segundo Ortiz (1998), os artistas no século XIX desqualificavam a fotografia e diziam

que “o fotografo é um pintor fracassado”. Esse mesmo repúdio era dispensado aos jornalistas132,

deslegitimando sua atuacão, conforme a citacão de Emile Zola “A informacão transformou o

jornalismo, matou os grandes artigos, matou a crítica, dando cada vez mais lugar aos despachos,

as grandes notícias e processos verbais, as reportagens e entrevistas” (ORTIZ, 1998, p. 108). A

modernidade industrializada fez com que acelerasse a vida como um todo, a rapidez é o ritmo

que emerge, a demorada pintura de um retrato agora ganha a velocidade de uma revelação, a

literatura disputa lugar com a leitura telegráfica, encurtando o tempo despendido em tais

hábitos. Tanto a foto quanto o jornalismo foram duramente criticados nos seus surgimentos.

130 Biblioteca da Presidência. Discurso do Presidente do Brasil Juscelino Kubitschek, na inspeção as obras da Ponte

da Amizade, dirigindo-se ao presidente da República do Paraguai no dia 04 de outubro de 1958. Disponível em:

<http://www.biblioteca.presidencia.gov.br/presidencia/ex-presidentes/jk/discursos/1958/64.pdf/view>. Acesso

em: 20 abr. 2020. 131 Segundo Martins (1999), a Revista Manchete não estava oficialmente vinculada ao Estado Militar, porém

produzia uma propaganda oficialesca. E considerando-a de maneira geral, não possuía um perfil ideológico claro

e definido, optando normalmente por um posicionamento neutro ou favorável ao governo. 132 Segundo Ortiz (1998), o jornalismo entrou no dicionário de profissões em 1851.

Page 137: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

134

No Brasil, a fotorreportagem insere-se nas revistas, não somente para ilustrar as

matérias, mas também apresentar um posicionamento visual sobre os acontecimentos. No caso

da Revista Manchete, fundada em 1952 por Adolpho Bloch, de periodicidade semanal,

exemplifica essa nova estética utilizando fotos e compondo-as aos temas jornalísticos. O

objetivo dessa pesquisa, não é analisar a revista, outros trabalhos já realizaram essa pesquisa133.

Importa ressaltar, que nenhum periódico é desprovido de tendenciosidades e parcialidades.

Aqui, utilizou a revista para ilustrar como a foto foi empregada no contexto da informação sobre

o evento de inauguração da ponte, procurando trazer uma nova abordagem da utilização da

fotografia.

A Imagem 55, a Revista Manchete de 1961 retrata, abaixo à esquerda da imagem, os

respectivos presidentes Juscelino Kubitschek, vestido com terno escuro e Alfredo Stroessner,

vestido um terno de cor clara, acompanhados por um grupo de oficiais. É possível visualizar

uma plataforma de madeira, ao fundo a pista de rolamento com o passeio para os pedestres e

abaixo o rio Paraná.

Proporcionalmente a fotografia ocupa um espaço de quase ¾ da página da revista

compondo com a matéria sobre o tema A Ponte da Amizade, destacado pela diagramação com

fundo vermelho.

A matéria noticia a inauguração da Ponte da Amizade no dia 26 de janeiro, ou seja,

quatro dias antes do término do governo de JK. Neste dia, os presidentes teriam desatado as

fitas em um ato simbólico, abraçaram-se e participaram da solenidade com discursos sobre a

significação da obra.

133 Para compreender melhor a Revista Manchete no contexto do Governo de Juscelino Kubitscheck sugere-se o

trabalho da Rosemary Guerra Amorim. O Governo JK e a Revista Manchete: a criação do mito dos anos dourados.

Rio de Janeiro, 2008 (dissertação de mestrado).

Page 138: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

135

Imagem 55 – I Inauguração da Ponte Internacional da Amizade (26/01/1961). Fonte: REVISTA MANCHETE134. Ano 1961. Edição 0460. p. 78.

Para os paraguaios esse momento demarcou os acordos, os tratados e também foi uma

forma de reconhecer, na figura do Juscelino Kubitschek, os esforços do Brasil na execução do

projeto.

A Revista Estrellas135 – una revista paraguaya para las americas de 1988, por exemplo,

elabora um panorama do processo de desenvolvimento do Paraguai no Governo de Stroessner,

pontuando os acontecimentos considerados importantes para o país e a capa é emblemática, no

sentido de sintetizar o que, para o editorial da revista foi mais relevante, conforme a Imagem

56.

Dois projetos são destaques na revista e os associam nas figuras de Juscelino

Kubitschek, presidente responsável por assinar o decreto para a construção da ponte e José

Sarney, o primeiro presidente eleito após a ditadura civil-militar associando-o com a Usina

Hidrelétrica de Itaipu, e chama a atenção pelo fato da revista não destacar o governo militar do

Brasil, pois poderiam ter colocado a foto da inauguração da ponte com o presidente Castelo

Branco em 1965 e a foto da inauguração da Usina em 1982, pois as negociações para a

construção da Itaipu se deram predominantemente no período da ditadura civil-militar. A

seleção das imagens coloca o Stroessner ao lado de presidentes brasileiros de períodos

democráticos, lembrando que restava apenas ele e Augusto Pinochet (1915-2006) do Chile

como ditadores em 1988 na região e existia uma forte pressão pelo término das ditaduras.

134 Acervo da Biblioteca Nacional Digital. Disponível em: <http://memoria.bn.br>. Acesso em: 14 jan. 2019. 135 A Revista Estrellas foi fundada em 30 de outubro de 1949 e segundo os seus objetivos “la divulgación regular

de las actividades públicas y de la actuación de nuestros gobernantes; así como también la exposición de las

orientaciones que sirvieron y sirven para llegar a la práctica los idearios políticos, sociales, diplomáticos,

económicos que hacen impacto o influyen en el desarrollo del país”. Disponível em:

<http://www.revistaestrellas.com/estrellas---directorio---historia.html>. Acesso em: 05 abr. 2020.

Page 139: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

136

Imagem 56 – Capa da Revista Estrellas, PY. Paraguai e Brasil (1940-1988). Fonte: REVISTA ESTRELLAS (1988).

Em relação à ponte, conforme a matéria “La unión espiritual se ha logrado con la

comprensión y decidida activación de las relaciones entre ambas naciones, bajo la sabia

orientación de ambos gobernantes: General de Ejército D. Alfredo Stroessner y Dr. Juscelino

Kubitschek”, percebe uma atribuição sobrenatural dessas duas figuras, quase os santificando.

A imagem montada ou trabalhada pela revista ratifica essa percepção, ou seja, tem a imagem

da Ponte da Amizade e na frente a foto dos dois presidentes com um trabalho de edição que

lembra duas representações de santos, reforçado por um fundo de nuvens e uns raios de

iluminação, enfatizando e superestimando o papel dos presidentes na concretizacão do “sueño

de nuestra salida al mar!”, conforme a Imagem 57.

A Revista Estrellas destaca também a primeira inauguração da ponte, em 27 de março

de 1961, “dos extraordinarios Estadistas Americanos firmando autógrafos. Fue en oportunidad

de la primera inauguración del Puente Internacional sobre el rio Paraná, que une fisicamente

al Paraguay y al Brasil”.

Page 140: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

137

Imagem 57 – Matéria sobre a Ponte da Amizade. Ao lado direito destaque da imagem Stroessner e JK. Fonte: REVISTA ESTRELLAS (1988).

A Revista ao afirmar que a ponte “une fisicamente al Paraguay y al Brasil”,

desconsidera mais de 400 km de fronteira seca entre Brasil e Paraguai, ou seja, todos os elos de

ligação são invisibilizados, para ressaltar a importância da construção da ponte. O próprio rio

Paraná, conforme explorado no Capítulo II, é um elo intensamente movimentado,

estabelecendo diferentes contatos econômicos e culturais.

A Imagem 58, exposta no Museu El Mensú, apresenta a passarela construída com

madeiras. Ao fundo 4 bandeiras do Paraguai e 4 bandeiras do Brasil. Nota-se pela imagem,

tratar-se do local simbólico da fronteira entre os dois países estando no primeiro plano a

bandeira paraguaia e no segundo plano a bandeira brasileira, desta forma, infere-se uma

fotografia tirada no Paraguai. Além disso, ao fundo à direita, parece trata-se do obelisco

construído no início da ponte, ao lado direito do Brasil em direção ao Paraguai.

Destaque

dessa

imagem

Page 141: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

138

Imagem 58 – As madeiras colocadas para a pré-inauguração da ponte em 1961. Fonte: MUSEO EL MENSÚ. Ciudad del Este, PY. Registro da autora (2019).

O responsável pelo Museu El Mensú, José Riquelme, ao apresentar a foto desta

inauguração contextualiza da seguinte forma:

[...] Em 1961 foi uma inauguração provisória, que nós chamamos de pré-

inauguração que ainda não está pronta, e foi colocado tábuas, o Presidente

Stroessner mandou colocar as tábuas para passar a pé porque Brasil estava

mudando de presidente, estava saindo Juscelino e estava entrando creio que o

Castelo Branco136, então em homenagem ao mentor da ponte, o Presidente

Stroessner em agradecimento fez uma pré-inauguração, mas no dia 27 de

março de 1965 terminou completamente a ponte [...] (RIQUELME, 2019)137.

O fato de a iniciativa ter vindo do presidente Stroessner e vir dele o empreendimento do

madeiramento, não pôde ser checado com outras fontes para ratificar essa fala, porém pode-se

supor que ambos os governos tinham interesse em utilizar a ponte para promover seus feitos,

tanto JK que estava finalizando sua gestão quanto Stroessner para a manutenção da imagem.

Cabe ressaltar que o museu é um espaço de representação da memória e do patrimônio

local, visando construir uma ideia ou narrativa distante de qualquer neutralidade e às vezes

distante também do real. Portanto, ao acessar o museu, a distinção entre representado e

representação precisa estar cônscio, conforme o alerta de Chartier.

Segundo Chartier (1988, p. 20), “[...] a representação é instrumento de um conhecimento

mediato que faz ver um objeto ausente através da sua substituição por uma imagem capaz de o

reconstituir em memória e de o figurar tal como ele é”. Neste caso, sempre há um

136 A sucessão à Presidência da República após Juscelino Kubitschek foi, Jânio Quadros em 1961, João Goulart

entre 1961 a 1964 e Castelo Branco entre 1964 a 1967. 137 RIQUELME, José. Visita guiada ao Museu El Mensú. Ciudad del Este, Paraguai, 01 jul. 2019. [Transcrição e

tradução para o português].

Page 142: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

139

enquadramento, no sentido de se apropriar de uma interpretação sobre o passado (POLLAK,

1989, p. 7).

Pode-se utilizar o exemplo de enquadramento, a partir da placa comemorativa da

“inauguracão” realizada em 26 de janeiro de 1961, alocada ao lado de fora do Museu El Mensú.

Segundo José Riquelme, foi colocada no lixo e posteriormente resgatada, preservada e exposta

na frente do museu.

A placa foi produzida pelo Paraguai, em espanhol e fez parte das comemorações do

sesquicentenário de independência do país que completaria no dia 14 de maio de 1961. O

registro demonstra a gratidão e reconhecimento do Governo Paraguaio, na figura de Stroessner

aos esforços técnicos e financeiros investidos pelo Brasil, na figura de JK e também registra os

acordos que viabilizaram tal obra.

Imagem 59 – Placa comemorativa da inauguração da Ponte da Amizade em 1961 pelos presidentes

Alfredo Stroessner do Paraguai e Juscelino Kubitschek do Brasil138. Fonte: MUSEO EL MENSÚ. Ciudad del Este, PY. Registro da autora (2019).

No espaço expositivo do museu, encontra-se uma parede com fotos da construção da

ponte em diferentes etapas da obra, a placa informativa compondo a exposição, traz a data da

inauguração da ponte de 26 de março de 1962 onde a obra teria sido finalizada, conforme a

138 Transcrição da placa: siendo Presidente de la Republica del Paraguay el General de Ejercito Alfredo Stroessner

fue inaugurado este puente proyectado, financiado e ejecutado por el gobierno de los E.E.U.U. del Brasil bajo la

presidencia del Dr. Juscelino Kubitschek de Oliveira de conformidad con el convenio para la construcción del

Puente Internacional sobre el Rio Paraná suscrito en Rio de Janeiro entre la republica del Paraguay e los

E.E.U.U. del Brasil el 29-V-1956 aprobado y ratificado por ley nacional nº xxx del 07-IX-1956 sea esta obra

magistral de la técnica y de la industria del Brasil el símbolo perenne de la unión solidaria de dos naciones, tan

vecinas como hermanas que así honran a los comunes destinos de los pueblos de nuestra América 26-I-1961. Ano

del sesquicentenario de la independencia nacional.

Page 143: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

140

Imagem 60. O fato de ter sido “oficialmente” inaugurada três anos apos sua finalizacão ainda é

uma incógnita. Após pesquisas, encontrou-se uma matéria no Jornal do Iguaçu139 (14/06/2001),

onde a manchete era exatamente um questionamento sobre este fato “Três anos para inaugurar:

Por quê?” a assinatura da matéria é de Rossana Schimitz, que apos entrevistar o assessor DNER

de Brasília, ele teria explicado uma possível indisponibilidade de agenda dos presidentes

daquela época. Também questionou o Sr. João Cid Fürstenberger funcionário do DNER desde

o início da construção da ponte, em 2001, ano da matéria, ele atuava como chefe do núcleo de

operações rodoviárias e relata que houve um impasse com a construtora que fez o projeto do

escoramento do arco e que segundo ele, a obra não parou e sim diminuiu o ritmo e que a ponte

teria sido oficialmente concretada em 1964.

Imagem 60 – Placa informativa com os dados da Ponte da Amizade. Fonte: MUSEO EL MENSÚ. Ciudad del Este, PY. Registro da autora (2019).

Pode-se deduzir que essa data de 26 de março de 1962 tenha sido marcada para que a

ponte entrasse nos registros oficiais de recorde mundial de “maior vão livre do mundo”, ao

mesmo tempo foi uma data pouco registrada, pois a pesquisa realizada encontrou apenas em

uma placa no Museu El Mensú, no site do Paraguai da Itaipu Binacional e no jornal do Iguaçu.

A ausência de mais indícios pode estar relacionada a figura de João Goulart, presidente do

Brasil até o Golpe Militar de 1964. A intenção de não querer associar a imagem de Stroessner

ao João Goulart, pode explicar a falta de holofote para tal data.

139 Jornal do Iguaçu (14/06/2001). Disponível na Biblioteca Púbica Municipal Elfrida Engel N. Rios – Foz do

Iguaçu, PR, Brasil.

Page 144: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

141

O ato de inaugurar é uma forma de comemorar, é deixar registrado no espaço e tempo a

celebracão de algo e conforme a reflexão de Candau (2016, p. 148) “a comemoracão é sempre

seletiva”, “aquela imaginada do acontecimento comemorado e do grupo que o comemora”. A

placa é o monumento que visa perpetuar uma memoria, mesmo que a não “oficial”, mas ela

está salvaguardada dentro de um lugar de memória, aqui, no caso, no Museu el Mensú,

compondo a narrativa sobre a história do município.

As obras continuaram após as duas “inauguracões”. Na Imagem 61, é uma das poucas

que retrata os trabalhadores de uma forma mais nítida, pelo menos 5 homens aparecem na lida,

mesmo assim chama a atenção a proporcionalidade. Ao analisar a foto, a máquina se sobrepõe

aos trabalhadores. Também se percebe a diferença entre a altura do homem que está em pé em

relação ao calçamento da ponte, quase na altura do joelho. Nessa foto nota-se da esquerda para

a direita, o guarda-corpo (proteção aos pedestres), o passeio (local de tráfego de pedestres) e a

pista de rolamento (para o tráfego dos veículos). A vegetação ao fundo é a cidade Presidente

Stroessner, hoje Ciudad del Este, e a estrada aberta é que se tornaria parte da Ruta Internacional.

Ao comparar com a imagem da inauguração de 1961, é notória o acabamento na pista.

Imagem 61 – Trabalhadores na finalização dessa etapa da obra. Fonte: DNIT. Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes – DNIT, Foz do Iguaçu, PR.

Acervo digital.

O fotógrafo escolhe e seleciona o que quer deixar visível e o que quer invisibilizar,

existindo evidentemente uma relação de poder e controle, ao mesmo tempo existe uma demanda

latente de quem o contratou para produzir, neste caso, dar ênfase a obra.

A fotografia abaixo registra a fase final das obras. Neste caso, o olhar do fotógrafo foi

posicionado acima do nível da pista, gerando um efeito de diminuir a dimensão do piso,

Page 145: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

142

enfatizando deste caso, a extensão da ponte, através do efeito da perspectiva escolhida,

indicando a distância da pista de rolamento através da profundidade da imagem fotografada.

Ao fundo, o Brasil, sendo possível identificar pelo obelisco a direita.

Imagem 62 – Ponte Internacional da Amizade, em fase de finalização. Fonte: FOZ DO IGUAÇU E CATARATAS MEMÓRIA E FOTOS ATUAIS. Foz do Iguaçu, 16 ago.

2019. Facebook. Disponível em:

<https://www.facebook.com/photo.php?fbid=10214884713576301&set=g.300913676689041&type=1

&theater&ifg=1>. Acesso em: 21 nov. 2019.

Em 1965 a obra oficialmente é concluída, e nova solenidade foi organizada para que os

respectivos presidentes Castelo Branco e Alfredo Stroessner, celebrassem a ligação das cidades

de Foz do Iguaçu, Brasil e Puerto Presidente Stroessner, Paraguai e entregasse a ponte para o

tráfego público.

A inauguração da Ponte da Amizade novamente é noticiada na Revista Manchete de

1965140, quatro anos depois da realizada pelo JK. Na primeira foto, abaixo, o registro destacou

a fita inaugural cortada pelo presidente brasileiro Castelo Branco, atrás ao alto as bandeiras dos

países Brasil e Paraguai hasteadas lembrando a binacionalidade do projeto. Tal ato é

testemunhado por “numerosas personalidades”, conforme a descricão da revista, o que se pode

pressupor tratar-se de pessoas elegidas para estarem ali. Na segunda imagem, os passos de

ambos os presidentes foram registrados por dezenas de fotógrafos e pela posição do fotógrafo

desta imagem, pode-se inferir que do outro lado também havia outros com o mesmo objetivo,

de retratar o momento solene. Na terceira imagem, o aperto de mão, gesto trivial de aparente

cordialidade, mas que, nesta situação tem um aspecto extraordinário, pois se trata de dois chefes

de Estado chancelando o término da obra e selando o acordo de uso comum da ponte.

140 REVISTA MANCHETE. Ano 1965. Edição 0677. p. 31 e 32.

Page 146: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

143

Imagem 63 – III Inauguração da Ponte Internacional da Amizade. Fonte: REVISTA MANCHETE. Ano 1965. Edição 0677. p. 33.

Na matéria da Revista Manchete, os objetivos e características de tal empreendimento

são descritos conforme a transcrição abaixo:

Une agora, sobre as águas do caudaloso Paraná, o povo guaraní a seus irmãos

do Sul do Brasil. Maior comércio e intercâmbio cultural, mais progresso e

maior identidade de pontos de vista, eis alguns dos muitos e elevados objetivos

da Ponte da Amizade, glória de nossa engenharia e obra construída em região

distante 700 km de Curitiba e 390 de Assunção. Ela custou a metade dos

gastos da ponte de Arrábida, em Portugal, e um quinto da de Sidney, na

Austrália (Revista Manchete, 1965, p. 32).

O discurso da Revista Manchete não difere do discurso proferido pelos representantes

do Estado. Há uma reprodução dos discursos oficiais na reportagem ao elencar os elementos

que conferem a qualidade da obra e o do seu significado, inclusive trazendo dados comparativos

financeiros que a tornam ainda mais eficiente, ou seja, além de todos os benefícios citados ainda

custou menos que outras pontes construídas por outros países.

Abaixo, na Imagem 64, a revista divulga que os dois chefes de Estado, o presidente

Castelo Branco e Alfredo Stroessner encontraram-se no meio da “grande obra”, cortando a fita

simbólica sob aplausos de 40 mil pessoas de ambos os países. Três fotos compõe a matéria,

uma é da ponte propriamente dita tirada a uma distância que permite vê-la na quase totalidade,

outra é com os presidentes assinando a declaração que regulamenta o uso da ponte e a terceira

foto é o registro com centenas de pessoas transitando sobre a ponte.

O dado sobre a quantidade de pessoas participantes na inauguração pode ser

problematizado, no sentido de talvez estar superestimado. A desconfiança está embasada nos

Page 147: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

144

dados demográficos de ambas as cidades fronteiriças. Pois ao comparar com a quantidade de

habitantes em Ciudad del Este e Foz do Iguaçu nas décadas de 1960 e 1970, somadas, não

chegam a 40 mil pessoas. Erro ingênuo, discurso ufanista, marketing do governo, são algumas

possibilidades explicativas em relação à supervalorização deste evento.

Imagem 64 – III Inauguração da Ponte Internacional da Amizade. Fonte: REVISTA MANCHETE. Ano 1965. Edição 0677. p. 30 e 31.

Na Imagem 65, duas capturas de cenas do vídeo produzido pela Agência Nacional

traduzem o simbolismo na inauguração. Sobre a ponte organizaram-se de um lado os paraguaios

estando a frente o general Stroessner, do outro, os brasileiros estando a frente o Marechal

Castelo Branco, e em ambos os lados foram colocadas as faixas de inauguração, cada presidente

seguindo o ritual, desata o laço e avança em direção a linha demarcatória do meio da ponte,

para o “encontro” entre as duas nações. Primeiro tem a separação, dividindo as nacionalidades,

depois tem a barreira fronteiriça simbolizada pelas faixas e depois a marcha do encontro.

Page 148: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

145

Imagem 65 – III Inauguração da Ponte Internacional da Amizade. Captura de imagem do filme

produzido pela Agência Nacional. Fonte: AGÊNCIA NACIONAL. Ano 1965. Disponível em:

<https://www.youtube.com/watch?v=VnyWeEVzg7U>. Acesso em: 6 jun. 2020.

A Imagem 66 registra o cumprimento, o aperto das mãos que selaria o término das obras.

Ao lado esquerdo, o primeiro presidente da Ditadura civil-militar, Humberto de Alencar Castelo

Branco (1897-1967) e a direita o presidente Stroessner. Ao fundo, fotógrafos e expectadores

compõe a formalidade de tal evento. Essa fotografia foi executada por um fotógrafo que estava

do outro lado da passarela e deixou que uma câmera fosse percebida no seu registro (canto à

esquerda), isso é, um fotógrafo fotografando fotógrafos, demonstrando a relevância e a

importância do evento.

Aos pés, um tapete estendido com uma linha dividindo ou demarcando a fronteira, um

lembrete que a ponte une, mas dentro de campos geográficos definidos e politicamente

reforçado.

Imagem 66 – Os Presidentes Castelo Branco e Alfredo Stroessner durante a inauguração da Ponte

Internacional da Amizade (27/03/1965). Fonte: DNIT. Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes – DNIT, Foz do Iguaçu, PR.

Acervo digital.

Dois presidentes militares, a frente de Ditaduras, a presença militar é ostensiva. No

vídeo,141 registrou-se o general Stroessner passando em revista as tropas do I Batalhão de

Fronteiras.

A placa comemorativa foi construída para vincar tal solenidade, e foi alocada no

obelisco, que simbolizaria a união entre as nações.

141 Cinejornal Informativo n. 5 (1965). Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=VnyWeEVzg7U>.

Acesso em: 02 set. 2019.

Page 149: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

146

Imagem 67 – A placa comemorativa da inauguração da Ponte da Amizade (27/03/1965)142. Fonte: DNIT. Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes – DNIT, Foz do Iguaçu, PR.

Acervo digital.

No dia da inauguração discursos exaltavam a importância da obra estabelecendo novas

relações, conforme o discurso do presidente Castelo Branco:

Sobre a fronteira fluvial que nos separava, lançamos esta armação de concreto

apoiada em terras brasileiras e paraguaias, que é fronteira a nos unir. Passagem

central dos novos caminhos que aproximam o Paraguai do oceano, eleva-se

esta Ponte como monumento a amizade de povos irmãos e como testemunho

de fé nos destinos da América Latina. Ao deixar as margens do Paraná, de

retorno a Brasília, tenho revigorada a confiança nos nossos povos143.

Imagem 68 – Discurso do Presidente Castelo Branco durante a inauguração da Ponte da Amizade. Fonte: FOZ DO IGUAÇU E CATARATAS MEMÓRIA E FOTOS ATUAIS. Foz do Iguaçu, 19 ago.

2019. Facebook. Disponível em:

<https://www.facebook.com/photo.php?fbid=10214905973027774&set=g.300913676689041&type=1

&theater&ifg=1>. Acesso em 21 nov. 2019.

142 Transcrição da placa: A Ponte da Amizade. Ligando Brasil e Paraguai, inaugurada em 27 de março de 1965,

com a presença do Presidência da República dos Estados Unidos do Brasil, Marechal Humberto de Alencar Castelo

Branco e do Presidente da República do Paraguai, General Alfredo Stroessner, aviva a confiança e reitera a

amizade de dois povos, abrindo caminhos mais amplos para o futuro do continente. 143 Biblioteca da Presidência. Discurso do Presidente do Brasil Castelo Branco, na inauguração da Ponte da

Amizade, dirigindo-se ao presidente da República do Paraguai no dia 27 de março de 1965.

Page 150: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

147

E, segundo, discorreu Stroessner:

Mi Patria, Excelentísimo Señor, festeja alborozada esta inauguración, y mi

Gobierno asociándose a este júbilo legítimo, ha tenido la satisfacción de

decretar feriado nacional, para que el pueblo paraguayo rinda así su

homenaje sincero al acontecimiento memorable que nos tiene aquí

congregados, en un solo haz de corazones y en un unánime sentimiento

patriótico que perdurara en nuestros anales republicanos lo que dure esta

magnífica estructura de acero y de cemento. Me cabe el orgullo de proclamar

que hemos llegado desde Asunción hasta este histórico monumento erigido a

la confraternidad de dos países, por la ruta que mi Gobierno ha construido,

puesta su voluntad al servicio de los altos intereses de la Nación abriendo en

plena selva, una nueva vía para el progreso y lo civilización144.

Ambos os presidentes, atribuem a Ponte da Amizade um status de monumento, e

conforme se discorreu no primeiro capítulo, “o monumento é tudo aquilo que pode evocar o

passado, perpetuar uma recordação (LE GOFF, 2003, p. 526). No discurso de Stroessner, a

monumentalização da ponte é importante principalmente associada ao seu Governo, essa

intenção está manifesta ao reforçar nas palavras “y mi Gobierno asociándose a este júbilo

legítimo” e “este histórico monumento erigido a la confraternidad de dos países, por la ruta

que mi Gobierno ha construído”, e ainda se atribui a si a responsabilidade de abrir no meio da

selva, uma nova forma de progresso e civilização.

Neste período da inauguração da ponte, o Stroessner já estava há aproximadamente 11

anos no poder, e para manter-se no poder, além do aparato repressivo, típico de uma ditadura,

também se efetivava através do consenso145 entorno de publicidades, por exemplo, ao vincular

a sua imagem aos feitos desenvolvimentista. Ricardo Martins Filho, na dissertação sobre

Ditadura Militar e propaganda política, indicou a relação da vinculação do governo com os

atos de propagandear, no caso de Stroessner, nesse caso, pode-se associar os discursos, como

uma das formas de criar consenso:

No que se refere especialmente aos governos ditatoriais, a utilização da

propaganda política enquanto artifício de manipulação de massas fez parte do

cotidiano de vários Estados autoritários que pretenderam, de modo geral,

impor socialmente projetos políticos que atendiam aos interesses de grupos

econômicos específicos disfarcados de projetos “nacionais”, e que requeriam

união entre as classes sociais enquanto pressuposto de sua realização

(MARTINS, 1999, p. 1)

144 Disponível em:

<http://www.portalguarani.com/1759_alfredo_stroessner_matiauda/18606_inauguracion_del_puente_internacion

al_sobre_el_rio_parana_1961__discurso_de_alfredo_stroessner.html>. Acesso 07 de julho de 2017. 145 Segundo Gramsci, em uma sociedade de classes, a supremacia de uma delas se exerce sempre através da coerção

e do convencimento, com a construção de uma hegemonia (DIAS, 1996, p. 25).

Page 151: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

148

Segue abaixo, uma descrição da ponte elaborada pela Agência Nacional em 1965,

demonstrando um discurso conciliador entre os dois países e ufanista, enaltecedor do Brasil.

A Ponte da Amizade, colosso de concreto, orgulho da engenharia brasileira,

construída pelo Departamento Nacional de Estradas e Rodagens, essa

estupenda obra de arte é a maior do mundo em vão livre e tem mais de meio

quilômetro de comprimento. A SOTEGE sua construtora mereceu o

reconhecimento mundial pela elevada técnica empregada na sua realização.

Material e mão de obra do Brasil sob a direção de engenheiros brasileiros

resultaram nesse verdadeiro monumento e é um marco novo ao unir duas

nações vizinhas e a inspirar a consolidação da amizade entre os povos latinos

americanos146.

A Agência Nacional mencionou a mão de obra do Brasil, porém dados do DNIT

afirmam que eram 100 trabalhadores do Paraguai e 150 trabalhadores do Brasil e reforça na

narrativa a “maior obra do mundo em vão livre” que só foi possível porque o “término” da obra

foi registrado na data de 26 de março de 1962.

A ponte em arco de vão livre, pintada de branco destoando com o verde da vegetação e

o tom amarronzado do rio Paraná, trouxe ao projeto elogios técnicos e estéticos e tratando-se

de uma obra brasileira com investimento brasileiro, evidente que isso foi muito explorado nos

discursos que finalizavam, não raro, exaltando a união das nações. Cabe definir o significado

de obra de arte no contexto da arquitetura, segundo o arquiteto Everton Santos147, pode-se dizer

que, uma construção se aproxima da arte quando seus componentes/elementos possuem formas

que através da harmonia, equilíbrio, cores e outras características, provocam deleite estético,

ressaltando, que estes elementos variam de acordo com o observador.

A Imagem 69 mostra as pessoas reunidas para a inauguração da ponte. Pode-se supor

que tenha sido um evento de grande importância para as cidades fronteiriças, pois foi a primeira

construção dessa magnitude, com traços arquitetônicos considerados modernos para a época e

com a possibilidade de atravessar a fronteira com a família de uma forma autônoma, não mais

dependendo de uma embarcação. A fotografia abaixo contém uma narrativa visual da cena, com

as pessoas reunidas no espaço entorno da ponte, aparentemente se dispersando, alguns homens

de terno podendo inferir certa formalidade que o evento exigia, no meio da rua uma

concentração de crianças com roupas claras o que parece tratar-se de um desfile organizado e

146 Cinejornal Informativo n. 5 (1965). Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=VnyWeEVzg7U>.

Acesso em: 02 set. 2019. 147 O professor e arquiteto Everton Santos contribuiu nessa pesquisa ao orientar a pesquisadora, nos conceitos

relacionados a “obra de arte arquitetônica”.

Page 152: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

149

as bandeiras hasteadas, provavelmente do Brasil, Paraguai, Foz do Iguaçu e Puerto Presidente

Stroessner.

Imagem 69 – Inauguração da Ponte Internacional da Amizade. Fonte: DNIT. Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes – DNIT, Foz do Iguaçu, PR.

Acervo digital.

Para a inauguração, um monumento comemorativo foi construído, conforme a Imagem

70, o objetivo era simbolizar a união de brasileiros e paraguaios. Abaixo do obelisco reuniram-

se os presidentes para a assinatura da declaração conjunta sobre a Ponte da Amizade citada no

Capítulo II.

Imagem 70 – Inauguração da Ponte Internacional da Amizade – 1965. Captura de imagem do filme

produzido pela Agência Nacional. Fonte: AGÊNCIA NACIONAL. Ano 1965. Disponível em:

<https://www.youtube.com/watch?v=VnyWeEVzg7U>. Acesso em: 20 mai. 2020.

Page 153: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

150

O obelisco está localizado ao lado esquerdo da aduana na Ponte da Amizade, no sentido

Brasil-Paraguai. E a presença militar evidencia o caráter fronteiriço desse espaço, lembrando

que, mesmo com certa caraterística de espaço contínuo, existe vigilância e controle.

Imagem 71 – Obelisco na Ponte Internacional da Amizade. s/a, s/d. Fonte: IBGE. Disponível em: <http://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/fotografias/GEBIS%20-

%20RJ/pr45509.jpg>. Acesso em: 20 out. 2019.

Captada de outro ângulo, na Imagem 72, é possível vê-la de frente da pista de rolamento,

o fotógrafo localizou-se quase no meio do canteiro para registrá-la. Nota-se uma continuidade

entre a BR 277 e a Ponte, quase não se nota diferença, percepção expressa de maneira assertiva

pelos pesquisadores Kleinke et al. (1997, p. 151), “a Ponte da Amizade que, para Foz do Iguaçu

e Ciudad del Este, é como uma avenida de um mesmo espaco urbano”, nesse período, a

urbanização ainda estava incipiente.

Imagem 72 – Ponte Internacional da Amizade. s/d, s/a. Fonte: IBGE. Disponível em: <http://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/fotografias/GEBIS%20-

%20RJ/pr45495.jpg>. Acesso em: 20 out. 2019.

Page 154: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

151

Diante das três inaugurações, nas datas de 26 de janeiro de 1961, em 26 de março de

1962 e 27 de março de 1965 pode-se pensar no poder das práticas comemorativas de

fortalecimento da imagem dos governos consagradas, por exemplo, nas grandes obras. As três

inaugurações da ponte, descritas na pesquisa, podem ser problematizadas, no sentido de

compreendê-las como cerimônias de “posse”, que vão além de se apropriar do objeto

propriamente dito, mas de se apoderar da memória correspondente ao objeto. A Ponte da

Amizade estrutura-se nas cidades fronteiriças no campo da materialidade e no campo das

representações trazidas nos discursos.

Neste sentido, Nora (1993) discorre sobre os lugares de memória, ou lugares onde a

memoria se cristaliza, ou seja, inexistindo uma memoria espontânea é necessario “criar

arquivos, que é preciso manter aniversários, organizar celebrações, pronunciar elogios

fúnebres, notariar atas, porque essas operações não são mais naturais, mas construções

ideologicas” (NORA, 1993, p. 13). As inauguracões funcionam para criacão de um vínculo

mnemônico, reforçado em rituais públicos, celebrando feitos e assegurando uma fixação do

projeto da ponte com os Governos.

A fotografia também contribuiu nos lugares de memória, veja-se na Imagem 73, a ponte

foi registrada no sentido de inserir elementos que pudessem contextualizá-la. O ângulo da foto

produz uma noção de profundidade e distância enfatizando a tridimensionalidade da mesma, no

primeiro plano mais próxima a lente do fotógrafo a vegetação em relevo, abaixo uma estrada

onde mais abaixo se encontra o rio Paraná. Ao fundo a vegetação às margens paraguaia. O

elemento arquitetônico constituiu-se na natureza transformando a paisagem.

Imagem 73 – Ponte Internacional da Amizade. Fonte: IBGE. Disponível em: <https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/fotografias/GEBIS%20-

%20RJ/pr45496.jpg>. Acesso em: 20 out. 2019.

Page 155: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

152

Na fala do Ynsfrán, ao descrever a Ponte da Amizade percebe-se a importância que ela

representa “el inmenso arco del Puente de la Amistad recortándose en el horizonte, simbolizó

el salto final hacia las costas atlánticas del antiguo Mar del Paraguay” (YNSFRÁN, 2012, p.

158). Quer dizer, não era somente uma aproximação com o Brasil, mas também a possibilidade

de se aproximar mais do mundo. Saber que a ponte proporciona alcançar novos países indica

outros significados.

Na Imagem 74, o fotógrafo posiciona-se de uma forma a captar o obelisco ao fundo a

esquerda, o controle aduaneiro148 do Brasil, o canteiro com um paisagismo entre a BR 277 e o

acesso abaixo da aduana onde era possível visitar.

Imagem 74 – Entrada para Aduana Brasileira. Fonte: DNIT. Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes – DNIT, Foz do Iguaçu, PR.

Acervo digital.

Essa série de registros fotográficos da Ponte Internacional da Amizade atua como

atestado da “eficiente” política de aproximação com o Paraguai, materializando as intenções há

muito verbalizadas por ambos os governos. Além disso, documentou as transformações

arquitetônicas na fronteira, mudando completamente as relações econômicas e sociais da

região.

A Ponte da Amizade pode não ser um espaço propício para um turista parar e contemplar

a paisagem, tirando uma foto para eternizar a experiência do cruzamento sobre o rio Paraná,

conforme os motivos citados pela pesquisadora Regina Coeli Machado e Silva (2013, p. 18-

19):

Na Ponte da Amizade, essa situação especial [travessia] é vivida muitas vezes

com ansiedade, pois o desejo latente é fazer a travessia de modo mais rápido

148 Em 2006 entrou em funcionamento a nova aduana no lado brasileiro.

Page 156: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

153

possível. Muitos justificam essa ansiedade por medo de assaltos, por estarem

expostos a violência sem direção e sem controle que, como se sabe, são

também sentimentos encarnados no medo difuso do outro, do desconhecido.

Isso é visível quando acaba a travessia: o ritmo dos pedestres se torna mais

lento e por isto mais perigoso em meio ao trânsito caótico e intenso.

Apesar o imenso fluxo turístico em direção ao Paraguai a ponte representa apenas um

meio para alcançar o objetivo final que, muitas vezes é consumir no país vizinho. Conforme

Tuan (1980, p. 107), “o turismo tem uma utilidade social e beneficia a economia, porém não

une o homem a natureza. A apreciação da paisagem é mais pessoal e duradoura quando está

mesclada com lembranças de incidentes humanos”.

Entretanto, ao olhar para o passado, encontram-se registros da ação em desfrutar a

paisagem. Desta forma, destacam-se três imagens expostas abaixo. A Imagem 75,

aparentemente é de uma família reunida, posando para o registro fotográfico que atestassem a

visita a construção da ponte, pois conforme a imagem, ainda não está finalizada, então se trata

de um registro anterior a 1965. O enquadramento fotográfico indica a preocupação em registrar

a arquitetura da ponte em uma apreciação estética, inserindo-a em um contexto em que

mostrasse o rio Paraná abaixo e a vegetação na margem.

Imagem 75 – Família Otremba e Sottomaior — em Foz do Iguacu. Fonte: FOZ DO IGUAÇU E CATARATAS MEMÓRIA E FOTOS ATUAIS. Foz do Iguaçu, 04 out.

2013. Facebook. Disponível em:

<https://www.facebook.com/photo.php?fbid=610439048999394&set=a.490909620952338&type=3&t

heater>. Acesso em: 09 jun. 2020.

A Imagem 76, destaca-se um homem escorado no corrimão da ponte, à esquerda, a

sombra de quem está registrando a fotografia, ao fundo a aduana brasileira com alguns carros,

aparentemente estacionados, pois ao lado direito vê-se crianças caminhando na pista e somente

uma está de mãos dadas com uma pessoa adulta, como se carros não estivessem passando. Nota-

se algumas pessoas escoradas no corrimão, logo no início da pista, aparentemente conversando.

Page 157: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

154

Essa fotografia narra o uso da ponte antes da intensificação do comércio com o Paraguai, onde

provavelmente as pessoas iam ao local para passear, conversar e contemplar o entorno. E ao

fundo, a vegetação, onde hoje se encontra a Vila Portes com suas inúmeras salas comerciais.

Imagem 76 – Um homem posando na Ponte da Amizade. Fonte: FOZ DO IGUAÇU E CATARATAS MEMÓRIA E FOTOS ATUAIS. Foz do Iguaçu, 04 set.

2019. Facebook. Disponível em:

<https://www.facebook.com/photo.php?fbid=10215011822833953&set=g.300913676689041&type=1

&theater&ifg=1>. Acesso em: 09 jun. 2020.

Na Imagem 77, destaca-se um homem no centro da imagem com uma mochila de

viagem nas costas e outra bolsa ao lado direito, aparentemente um turista. A fotografia expressa

a importância para o retratado de posar neste local, enquadrando ao fundo à direita o obelisco,

à esquerda a aduana e as duas pistas de rolamento da Ponte da Amizade.

Imagem 77 – Um homem de mochila nas costas posando no meio da pista da Ponte da Amizade. Fonte: FOZ DO IGUAÇU E CATARATAS MEMÓRIA E FOTOS ATUAIS. Foz do Iguaçu, 23 jul.

2019. Facebook. Disponível em:

https://www.facebook.com/photo.php?fbid=10214713859545057&set=g.300913676689041&type=1

&theater&ifg=1. Acesso em: 09 jun. 2020.

Page 158: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

155

Nas duas últimas fotografias acima, o parar e posar para a foto, indica a relevância de

registrar a ação de estar na Ponte da Amizade, pois a centralidade nas imagens não está no rio

Paraná, na vegetação ou na arquitetura da ponte, e sim na experiência de estar no lugar,

indicando um ritmo mais lento no trânsito binacional oportunizando esse “estacionar” e

registrar. Nota-se também, nesses dois registros, que a direção da câmera aponta em direção ao

Brasil, podendo questionar se existe uma afeição para com o próprio país expressa na escolha

do “o que” registrar. Segundo YUAN (2008, p. 117), “a lealdade para com o lar, cidade e nacão

é um sentimento poderoso” e ele aparece principalmente nos contrastes, ou seja, a fronteira

(nacional-internacional) evocaria certo patriotismo.

As fotografias contribuem para a construção de uma memória coletiva sobre esse

momento histórico. Os vestígios revelados a partir das imagens ultrapassa o mero registro

técnico, pois fornece o conhecimento da construção de um espaço de relevância para ambos os

países fronteiriços.

Quando o espaço sai do ordinário ou do usual, a fotografia merece registrar tal

excepcionalidade. O rio Paraná em outubro de 1982 foi represado no trecho abaixo do rio

Paraná devido ao fechamento das comportas da represa da Itaipu entre 13 e 27 de outubro de

1982, provocando uma insólita paisagem de secura do rio, conforme a Imagem 78.

Imagem 78 – O rio Paraná seco sob a Ponte 1982 – Foz do Iguaçu, PR.

Fonte: O PRESENTE. Autor Rotildo Brusniski. Disponível em:

<https://www.opresente.com.br/municipios/imagem-historica-do-dia-em-que-o-rio-parana-secou-

viraliza-nas-redes-sociais/>. Acesso em: 30 abr. 2020.

Quase 38 anos depois, novos registros da ponte sobre o rio Paraná, conforme a Imagem

79, mostram o rio abaixo do nível normal. O mês de abril de 2020 fez com que muitas pessoas

fossem até o local para tirar fotos, fazer vídeos, mostrando não somente a seca do rio, mas

também explorando o entorno, alguns inclusive atravessaram a pé o rio Paraná até alcançar a

Page 159: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

156

Ilha de Acaray. As mídias sociais foram recheadas com esses registros pessoais, cujo interesse

em compartilhar a experiência de algo insólito contribui para salvaguardar histórias de quem

vivencia a fronteira.

Imagem 79 – O rio Paraná seco sob a Ponte 2020 – Foz do Iguaçu, PR. Fonte: Gazeta do Povo. Autor: Christian Rizzi. Disponível em:

<https://www.gazetadopovo.com.br/parana/rio-parana-vira-corrego-e-e-atravessado-a-pe-por-

moradores-de-foz/>. Acesso em: 19 jun. 2020.

O registro de uma imagem serve para materializar ou “congelar” uma experiência, ao

modo de “salvar” um arquivo no computador, daquilo que se julgou importante. A foto permite

tornar a memória mais concreta, não só para si, como também no compartilhamento com o

outro.

Nesse tópico, procurou-se, a partir das imagens, estabelecer de maneira cronológica a

análise da finalização da obra, a inauguração e o seu posterior uso, quando o ato de estar na

ponte e registrar era habitual.

3.2.3 CARTÃO-POSTAL: OBRA INOLVIDÁVEL

Neste subtópico será analisada a imagem fotográfica da Ponte da Amizade impressa no

cartão postal, para isso, aborda-se a origem dos cartões-postais e a sua função no registro,

promoção e divulgação arquitetônica.

A utilização das imagens para divulgar e promover feitos com a intenção de propagar

ideias relacionadas ao progresso foi realizada de diversas formas em diferentes veículos de

comunicação, pois era uma forma de enfatizar visualmente as transformações nas cidades.

Aqui, destaca-se o papel do cartão-postal.

Segundo DALTOZO (2006), apesar de existirem várias ideias de cartões-postais, só foi

implementado em 1869 na Áustria (correspondezkarte). O cartão correspondia a um tamanho

Page 160: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

157

de 8,5 X 12 cm e continha na frente apenas o selo do Império Austro-Húngaro impresso no

canto superior direito e espaço para alocar as informações do destinatário. A ideia era atender

a uma necessidade de um meio de comunicação mais fácil, rápido e barato.

A grande adesão na Europa aos cartões, logo se tornou mais popular ao adicionar

imagens. Primeiro acrescentaram gravuras, depois fotografias.

“Esse foi o passo decisivo para difundi-lo definitivamente, em todo o mundo.

As pessoas estavam ávidas para ter em mãos as fotos de monumentos famosos,

de cidades interessantes, dos fatos históricos, [...] enfim, tudo que era possível

registrar pelas lentes das maquinas fotograficas” (DALTOZO, 2006, p. 16).

Os alemães criaram os Gruss aus (saudações de...), cartões com ilustrações das cidades

com sua identificação, considerados os precursores dos atuais postais turísticos. O passeante

poderia levar um pedaço da experiência vivenciada de uma maneira econômica. Desta forma,

o cartão-postal socializou o acesso ao mundo, ao torná-lo um veículo de correspondência

consumido em quase todos os lugares. Este conhecimento visual do mundo, certamente

contribui para influenciar mentalidades e comportamentos.

Segundo a pesquisadora Franco (2006, p. 28), no início do século XX os postais de

paisagens eram oito vezes mais requisitados do que os de “fantasia”, as pessoas queriam

adquirir a imagem do lugar, logo o cartão-postal associou-se ao registro da história urbana, das

construções e desenvolvimentos.

O postal mais antigo no Brasil é o do Estabelecimento Gráfico V. Steidel, de São Paulo,

ilustrando o edifício do Tesouro em São Paulo datado de 24 de novembro de 1898 (DALTOZO,

2006, p. 19). Segundo Kossoy (2000), a “idade de ouro” dos cartões postais foi entre 1900-

1925 e no Brasil esse modismo foi absorvido e muitas imagens do Brasil incorporou nas

correspondências internacionais.

No Paraguai evidentemente a fotografia também era uma forma de exaltar a

modernidade através da implantação de infraestrutura urbana compatível com países

desenvolvidos. As obras significavam o desenvolvimento, perpetuadas e difundidas nos cartões

postais, atuando como instrumentos de propaganda. Nas palavras de José Riquelme,

responsável pelo Museu El Mensú, em Ciudad del Este, ao descrever a ponte, complementa

“toda essa característica técnica foi admirada no mundo inteiro, se Paraguai tem um postal

turístico para o mundo é sua ponte. [...], a primeira obra simbólica declarado patrimônio cultural

para nós (RIQUELME, 2019).”149

149 RIQUELME, José. Visita guiada ao Museu El Mensú. Ciudad del Este, Paraguai, 01 jul. 2019. [Transcrição e

tradução para o português].

Page 161: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

158

A Imagem 81, o cartão-postal da Ponte da Amizade, retratada por Klaus:

Imagem 80 – Cartão Postal da Ponte Internacional da Amizade, PY. Cartão Postal Puerto Pte. Stroessner – Puente de la Amistad – Autoria Klaus Henning (1921-2008).

O fotógrafo responsável pela difusão da Ponte da Amizade pelo mundo a partir dos

cartões postais foi o Klaus Henning (1921-2008). Nascido em Trier na Alemanha, chegou ao

Paraguai em 1934 quando emigrou com a família para a colônia de Carlos Pfannel, trabalhando

como livreiro, especializou-se em fotografia, tornando-se membro da Photographic Society of

America. Autor de diversos livros fotográficos, publicando inclusive na Alemanha, retratou o

Paraguai de diferentes ângulos contemplando diferentes lugares, contribuindo para a construção

da história da imagem do Paraguai150.

Klaus viajava pelo interior do Paraguai fotografando as mais diversas paisagens e depois

imprimia em formato de cartões postais, segundo o Jornal Color ABC151, “las únicas postales

que había del Paraguay eran las suyas y se vendían con mucho éxito”, atualmente é objeto de

colecionadores.

Um segundo cartão-postal encontrado na pesquisa sobre a ponte, pertence ao acervo de

Claimar Erni Granzotto, um dos proprietários da Livraria Kunda fundada em 1989 em Foz do

Iguaçu. Claimar é um colecionador de cartões postais sobre Foz do Iguaçu e grande parte do

seu acervo foi adquirido no exterior, a exemplo do exposto na Imagem 81.

Este cartão-postal, produzido entre os anos 60/70, contém a paisagem binacional, e

expressa o olhar de quem aparentemente esta no “lado” brasileiro. A ponte esta ao fundo,

150 ABC. Fotos de Henning en Viedma. 16 nov. 2015. Disponível em: <http://www.abc.com.py/edicion-

impresa/artes-espectaculos/fotos-de-henning-en-viedma-1427372.html>. Acesso em: 09 out. 2018. 151 ABC. Que la imagen no se desvanezca. Disponível em: <http://www.abc.com.py/edicion-

impresa/opinion/que-la-imagen-no-se-desvanezca-1087006.html>. Acesso em: 09 out. 2018.

Page 162: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

159

entorno de uma rica vegetação; a tonalidade do azul é ressaltado no céu e na água, no qual

proporcionalmente o rio Paraná toma o maior percentual no enquadramento. O destaque na

imagem está nos barcos, o principal meio de transporte binacional antes da ponte.

Imagem 81 – Cartão Postal da Ponte Internacional da Amizade. Fonte: Acervo pessoal de Claimar Erni Granzotto – Sem autoria.

O cartão-postal, não raro, torna-se um complemento nas memórias dos turistas, pois

além das fotografias tiradas por eles, ainda adquirem o cartão-postal como uma forma de

adicionar detalhes a paisagem visitada. Por tanto, torna-se um rico documento a ser pesquisado,

no sentido dos diferentes registros das cidades, das construções e até de hábitos cotidianos.

O cartão-postal é visto como um importante elemento de documentação da

história da atividade turística, do destino turístico, e dos hábitos e das práticas

associados ao turismo. Considera-se que o período de ouro dos cartões-postais

(1890-1940) é também um período extremamente importante na formação da

indústria do turismo, dos hábitos e comportamentos do turista e dos destinos

enquanto locais de visitação e tours (FRANCO, 2006, p. 34).

A fotografia ja é um elemento “comprobatorio” de experiências, a “prova” de ter ido até

a um dado lugar, e com a aquisição do cartão-postal, torna-se o “dossiê” mais testemunhal das

vivências.

Conforme Le Goff, “As fotografias tiradas pessoalmente junta-se a compra de postais.

Tanto as fotos quanto os postais constituem os novos arquivos familiares, a iconoteca da

memoria familiar” (LE GOFF, 2003, p. 461). Os cartões postais passaram a ser grandes

difusores de imagens, representando um conjunto de testemunhos históricos de como a

alteridade era praticada e socializada, à circular imagens em diferentes locais de espaços

considerados emblemáticos para quem os produzia.

Page 163: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

160

O cartão-postal funciona como um propagador das cidades, evidenciando ambientes

urbanos e tecnológicos e, além de alimentar as memórias com as vivências e experiências dos

turistas, também atrai novos turistas curiosos em conhecer estes locais. Desta forma, o postal

acaba monumentalizando paisagens.

Neste subtópico, procurou-se, a partir das imagens impressas no cartão-postal discutir

seus usos e significados.

Este capítulo trabalhou com a análise e interpretação das imagens impressas nas

fotografias, ora composta de maneira a registrá-la intencionalmente no sentido de documentar

suas fases construtivas, ora contextualizada com uma reportagem, ora produzida

individualmente com o intuito de documentar a experiência de “estar na ponte” e também no

registro de fatos extraordinários. Nesta sequência de imagens com diferentes intencionalidades

de registro é possível compreender a construção da ponte indo além do senso comum, olhando-

a de diferentes maneiras e ângulos.

Page 164: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

161

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A Ponte Internacional da Amizade não raro é eclipsada pelas “grandes” atracões

turísticas de Foz do Iguaçu (Hidrelétrica, Cataratas, Marco das Três Fronteiras), ficando-a

muitas vezes associada a um meio para alcançar um fim (compras, trabalho, estudo). A memória

do ilícito é muito presente, constantemente reiterada pela mídia, divulgando práticas de

contrabando e tráfico. Algumas vezes é retratada como um símbolo do medo, da insegurança,

da anomia e outras vezes como símbolo de união e de integração. Não há uma memória e sim

várias memórias entorno deste monumento.

A ponte é um elemento arquitetônico que impactou a região binacional, aumentou a

mobilidade e transformou a paisagem integrando-se ao cenário do rio Paraná. A ponte tem valor

técnico, histórico, cultural e é depositária de um importante patrimônio para a comunidade.

Assim, como a ponte uniu dois países, essa pesquisa procurou reunir significados.

O espaço fronteiriço de intensa movimentação no rio Paraná ao receber sobre ele uma

ponte, ganha outra dinamicidade. A modernidade expressa na arquitetura, no concreto, na

infraestrutura urbana e na mobilidade, trouxe as bases de uma cidade moderna que foi aos

poucos se configurando na paisagem.

A paisagem estudada é binacional, por isso, a inevitabilidade de estudar a fronteira,

problematizando a função da ponte, pois ora une, ora ratifica um limite assegurado pelo controle

de cada Estado-nação. É uma paisagem que transcende a sua localidade pois está na bandeira,

na moeda, na cédula ou em um cartão-postal. O conceito de espaço desenvolvido por

CEARTEAU (2014), contribui para pensar a ponte além do lugar, pois espaco é “um lugar

praticado”, o que explica o reconhecimento de um pequeno grupo de crianças, elegendo a ponte

como um símbolo de “Diversidade e Identidade” e também pelos constantes e espontâneos

compartilhamentos de suas imagens, indicando tratar-se de um patrimônio histórico, na qual a

herança é reconhecida pela comunidade.

A Ponte da Amizade também está no campo da monumentalização, no sentido de,

intencionalmente servir para vincar uma memória, nesse modo, indicou-se insígnias e discursos

cumpridoras de um papel de perpetuar o passado no presente. Além disso, as fontes apontam

para a existência de três inaugurações, ou seja, as celebrações reforçadoras de mensagens,

principalmente dos grupos que celebram, apropriando-se não só do objeto em si, mas na

representação do objeto. Conforme Nora (1993), os lugares de memória, longe da

espontaneidade, necessitam de um trabalho constante para evitar o esquecimento.

Page 165: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

162

A pesquisa investigou a construção da Ponte Internacional da Amizade, e procurou

compreender os pormenores relacionados às motivações do Brasil e Paraguai, bem como os

acordos binacionais para viabilizar tal projeto. O esforço da pesquisa trouxe uma percepção da

ponte além da usualmente manifesta, encarando-a como de extrema relevância binacional. A

ponte é importante para a economia do Paraguai e Brasil, porém é importante também para

mobilidade no continente.

A partir dela, a região oeste do Paraná se aproximou fisicamente do Paraguai, e o Brasil

não transpôs somente o rio Paraná, mas representou uma projeção continental através da

chamada Rodovia Transversal Pan-Americana alcançando Bolívia e Peru, estabelecendo uma

rota continental entre os oceanos Atlântico e Pacífico. O Paraguai concretizou o seu projeto de

ter alternativas além do Porto de Buenos de Aires, garantindo uma zona franca no Porto de

Paranaguá no Paraná, em contrapartida o Brasil se beneficiou com uma zona franca no Porto

de Concepción no Paraguai.

A Ponte Internacional da Amizade representou, na época de sua construção (1956-

1965), uma obra de arte arquitetônica, inovando na técnica construtiva ao viabilizar o maior

arco em vão livre do mundo, a partir das técnicas do balanço sucessivo e a utilização do concreto

armado, fato que demonstra o nível que a Engenharia e Arquitetura estavam no Brasil. E o que

significava o arco da ponte? Mais do que uma característica do seu tempo, o arco representava

a mobilidade, a navegabilidade do rio Paraná, pré-requisito para o projeto da ponte.

Buscou-se a partir dos vestígios materiais e imateriais expressos em imagens e

entrevistas compor a história dessa primeira ponte internacional na região da tríplice fronteira.

Para o descortino do tema buscou-se averiguar diferentes fontes com o objetivo de compreender

os sentidos e significados da ponte e as consequências nas dinâmicas da paisagem. Para isso, o

olhar para aspectos econômicos, políticos, sociais e afetivos foi alocado, no sentido de retratar

e decifrar a complexidade no entendimento do tema.

A transformação no entorno da obra foi visível, a Ciudad del Este, por exemplo, foi

fundada para recepcionar a ponte, oferecendo a infraestrutura necessária e, da mata existente,

nasceu a segunda maior cidade do Paraguai, tornando-se no ano de 2009 a terceira maior zona

franca do mundo. A cidade de Foz do Iguaçu, tem na ponte, uma protagonista do impulso

econômico que o município aportou, considerada por alguns depoentes como o “primeiro marco

do progresso”, portanto faz sentido acolhê-la na bandeira do município.

Estradas foram abertas, construídas e asfaltadas para que o acesso fosse facilitado.

Paraguai vislumbra o Atlântico, o Brasil, vislumbra o Pacífico e ambos se beneficiam ao

acordarem em viabilizar o acesso de suas fronteiras.

Page 166: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

163

Para alcançar os resultados almejados, procuramos no primeiro capítulo discutir

aspectos teóricos e metodológicos já apresentando fontes de pesquisa para aprofundar a reflexão

sobre o objeto. Fundamentada na interdisciplinaridade, a História Cultural ancorou as reflexões

sobre as diferentes representações sobre a ponte com seus significados e significações, além de

auxiliar no uso e tratamento de diferentes fontes.

O segundo capítulo trouxe uma contextualização sobre a construção da ponte, para isso,

buscou-se explorá-la em sua totalidade. Buscou-se os elementos geográficos que explicam a

sua transposição, bem como a importância do rio Paraná no trânsito fronteiriço. A inserção da

ponte em um pequeno trecho de um projeto muito maior da chamada Rodovia Transversal Pan-

Americana, e as intenções políticas, econômicas e sociais do Brasil e Paraguai que viabilizaram

tal construção. Por último, o capítulo trouxe alguns efeitos e consequências na construção da

ponte para a região binacional.

O terceiro capítulo buscou construir a história da construção da ponte a partir das

imagens, nessa etapa trabalhou-se com as fotografias de diferentes etapas da obra,

oportunizando acessar a ponte em diferentes períodos sob distintos ângulos. O esforço para

descrever as especificidades técnicas foi despendido para entender a parte a engenharia

construtiva. A discussão deu-se tanto no aspecto histórico do registro quanto dos seus

significados.

A ponte não é somente uma obra arquitetônica monumentalizada, é também um objeto

onde orbita no entorno milhares de vidas, que olham-na com diferentes sentidos e significados,

aqui, procurou-se abordar apenas uma parte, mas tem um todo possível e merecido de ser

investigado.

Page 167: MEMÓRIAS DA PONTE INTERNACIONAL DA MIZADE

164

FONTES

Documentos

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Embaixada do Paraguai Acervo do Ministério das Relações Exteriores do Paraguai, Assunção,

Paraguai.

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Paraguai.

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de março de 1956. Acervo do Ministério das Relações Exteriores do Paraguai, Assunção,

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de Janeiro, Brasil – 25 de setembro de 1956. Acervo do Ministério das Relações Exteriores do

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