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Anais Eletrônicos do IX Congresso Brasileiro de História da Educação João Pessoa Universidade Federal da Paraíba 15 a 18 de agosto de 2017 ISSN 2236-1855 5995 MEMÓRIAS ESCOLARES: OS TROFÉUS CONQUISTADOS PELOS ESTUDANTES DO ATHENEU SERGIPENSE (1960-2000) Cibele de Souza Rodrigues 1 Eva Maria Siqueira Alves 2 Introdução As instituições escolares são permeadas de objetos e símbolos, ocultos ou expostos fazem parte da memória escolar, sendo contributos na investigação da cultura em determinadas épocas. Levando em consideração tais premissas, buscamos no presente estudo inquirir uma leitura da escola centenária Atheneu Sergipense por meio dos seus troféus conquistados, apontado alguns dados sobre as competições, costumes, tradições de uma sociedade, práticas desenvolvidas pelo corpo discente, docente, administrativo, personagens envolvidos e sujeitos imortalizados no cunho de seus nomes nos referidos troféus. Considerados fontes e objeto de estudo, esses artefatos despertou interesse na equipe do Centro de Educação e Memória do Atheneu Sergipense (CEMAS), que tem como finalidade preservar a memória do colégio. Ao expor o processo de edificação, fases e ações desse centro, Alves (2016) pondera: O CEMAS tem por principal objetivo preservar os vestígios escritos ou não, o testemunho histórico, além de criar informações necessárias para salvaguardar o patrimônio cultural e manter exposição permanente da memória educacional e social do Atheneu Sergipense, da instituição que desempenhou papel relevante como agência produtora e irradiadora de práticas e padrões pedagógicos, projetando vultos de destaque no panorama político e social, considerada como parte significativa da História da Educação do Estado de Sergipe (ALVES, 2016, p. 49) 3 . Dessa maneira, a catalogação e salvaguarda da coleção de troféus, composta por 157 peças, deu-se por dois motivos primordiais: perceber a estima que os materiais escolares possuem na construção de uma história da instituição, e, ao mesmo tempo, porque a escola passou a funcionar em outro prédio para iniciar-se uma reforma no edifício oficial. 1 Doutoranda em Educação/UFS [email protected] 2 Doutora em Educação/Professora Associada IV do Departamento de Educação e do Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade Federal de Sergipe [email protected] 3 Cf. Alves (2016); Silva (2016).

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Anais Eletrônicos do IX Congresso Brasileiro de História da Educação João Pessoa – Universidade Federal da Paraíba – 15 a 18 de agosto de 2017

ISSN 2236-1855 5995

MEMÓRIAS ESCOLARES: OS TROFÉUS CONQUISTADOS PELOS ESTUDANTES DO ATHENEU SERGIPENSE (1960-2000)

Cibele de Souza Rodrigues1 Eva Maria Siqueira Alves2

Introdução

As instituições escolares são permeadas de objetos e símbolos, ocultos ou expostos

fazem parte da memória escolar, sendo contributos na investigação da cultura em

determinadas épocas. Levando em consideração tais premissas, buscamos no presente estudo

inquirir uma leitura da escola centenária Atheneu Sergipense por meio dos seus troféus

conquistados, apontado alguns dados sobre as competições, costumes, tradições de uma

sociedade, práticas desenvolvidas pelo corpo discente, docente, administrativo, personagens

envolvidos e sujeitos imortalizados no cunho de seus nomes nos referidos troféus.

Considerados fontes e objeto de estudo, esses artefatos despertou interesse na equipe

do Centro de Educação e Memória do Atheneu Sergipense (CEMAS), que tem como

finalidade preservar a memória do colégio. Ao expor o processo de edificação, fases e ações

desse centro, Alves (2016) pondera:

O CEMAS tem por principal objetivo preservar os vestígios escritos ou não, o testemunho histórico, além de criar informações necessárias para salvaguardar o patrimônio cultural e manter exposição permanente da memória educacional e social do Atheneu Sergipense, da instituição que desempenhou papel relevante como agência produtora e irradiadora de práticas e padrões pedagógicos, projetando vultos de destaque no panorama político e social, considerada como parte significativa da História da Educação do Estado de Sergipe (ALVES, 2016, p. 49)3.

Dessa maneira, a catalogação e salvaguarda da coleção de troféus, composta por 157

peças, deu-se por dois motivos primordiais: perceber a estima que os materiais escolares

possuem na construção de uma história da instituição, e, ao mesmo tempo, porque a escola

passou a funcionar em outro prédio para iniciar-se uma reforma no edifício oficial.

1 Doutoranda em Educação/UFS – [email protected] 2 Doutora em Educação/Professora Associada IV do Departamento de Educação e do Programa de Pós-graduação

em Educação da Universidade Federal de Sergipe – [email protected] 3Cf. Alves (2016); Silva (2016).

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Em conformidade com a direção, as peças que se encontravam dispostas em estantes

com portas de vidros em um dos corredores da instituição, próximas a sala da coordenação,

foram resgatadas para o acervo do CEMAS, de modo que permaneceram salvaguardadas na

escola. Além dos troféus, alguns materiais localizados nos laboratórios de Biologia, Física e

Química também foram salvaguardados e devidamente catalogados.

Foto 1: Estante de troféus do Colégio Atheneu Sergipense – Ano 2015. Fonte: CEMAS

A princípio foi realizada a higienização das peças e criada uma lista com

requisitos/características a serem preenchidos: código do objeto, identificação, ano de

obtenção e observações. De posse desses elementos, demos início ao registro fotográfico de

cada um dos artefatos, a fim de criar um banco de dados com uso de imagens. A medida que

esse processo foi avançando, o interesse em desvendar as ações e sujeitos que estiveram

envolvidos em cada conquista foi despertado, consequentemente alguns questionamentos

foram levantados, tais como: É possível resgatar memórias do Atheneu Sergipense, e assim,

inquirir uma leitura da instituição por meio dos troféus conquistados? Que relação há entre

os nomes perpetuados nos troféus de empresas e personagens da sociedade com a educação

sergipana? Quais eventos e competições o corpo discente do Atheneu Sergipense mostrou-se

mais atuante?

Percebendo, desta maneira, a possibilidade de construção de uma memória por meio de

peças da cultura escolar e material do Atheneu Sergipense, procuramos inserir o presente

estudo na perspectiva do entendimento sobre memória, cultura escolar e cultura material

escolar, apreendidos por meio dos autores: Le Goff (1984), Bencosta (2010) e Felgueiras

(2010).

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Sendo assim, o uso do termo memória está vinculado ao entendimento de

enraizamento da mesma nos objetos. O que Le Goff (1984) chama de memória coletiva vista

em monumento, neste caso, os troféus são monumentos, considerados heranças do passado.

Ao abordar sobre o desenvolvimento da memória, neste sentido, o autor explica:

No Oriente antigo, por exemplo, as inscrições comemorativas deram lugar à multiplicação de monumentos como as estelas e obeliscos. Na Mesopotâmia predominaram as estelas onde os reis quiseram imortalizar os seus feitos através de representações figuradas, acompanhadas de uma inscrição, desde o III milênio, como o atesta a estela dos Abutres (Paris, Museu de Louvre) onde o rei Eannatum de Lagash (cerca de 2470 a. c.) fez conservar através de imagens e de inscrições a lembrança de uma vitória (LE GOFF, 1984, p. 432).

As estelas que o autor se refere diz respeito às pedras erguidas que simbolizavam

alguma memória, consideradas também monumentos que perpetuaram gerações como sinal

do passado. Le Goff (1984) explica que esses monumentos tendem a especializar-se em dois

sentidos: “uma obra comemorativa de arquitetura ou escultura”, nesse sentido pode-se

considerar os troféus, e, por último, “um monumento funerário destinado a perpetuar a

recordação de uma pessoa no domínio em que a memória é valorizada: a morte” (LE GOFF,

1984, p. 536). Ou seja, são legados deixados à memória coletiva.

Consideramos os troféus localizados no Atheneu Sergipense como legados deixados por

gerações passadas, eles fazem parte da cultura escolar da instituição. Neste caso

compartilhou-se do entendimento desse conceito “[...] como possuidor de uma

multiplicidade de interpretações capazes de apresentar fragmentos explicativos do universo

escolar, aptos a contribuir para o estudo dos fenômenos educacionais em seus mais variados

aspectos históricos (BENCOSTA, 2010, p. 42).

Esse trabalho também está vinculado aos estudos sobre cultura material escolar,

termo entendido por Felgueiras (2010) como “resultados de acções, que incorporam

interesses, objectivos e tradições de quem os produz e de quem deles se apropria”. Com esse

tipo de pesquisa, é possível, segundo a autora: “instituir o estudo do quotidiano da educação

não como curiosidade mas como projecto comum; reintroduzir os actores no cenário

historiográfico” (FELGUEIRAS, 2010, p. 28). Esses materiais do passado configuram-se,

portanto, em objetos ricos a serem explorados, possibilitando ao pesquisador novos sentidos

e significados à História da Educação.

Diante do exposto, procurou-se estabelecer um diálogo com as fontes bibliográficas e

documentais, considerando textos de outros autores que tratam sobre a temática, os próprios

troféus, bem como, registros localizados nos jornais e no CEMAS.

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O trabalho age como marco inicial para futuras pesquisas sobre esses artefatos e as

possibilidades de construção da memória por meio dos mesmos, configurando, deste modo,

um impulso para pesquisadores interessados.

Os Troféus do Atheneu Sergipense – Panorama Geral

Com a reunião de um considerável número de troféus advindos de vitórias, honras e

méritos, percebemos que o Atheneu Sergipense conquistou espaços de destaque em

competições de variadas modalidades: handebol, futebol de mesa, futebol de salão, tênis de

mesa, tênis de campo, queimado, natação, polo aquático, voleibol, basquete, xadrez, corrida

rústica de integração, atletismo, judô e ciclismo.

A instituição centenária, fora criada através do Regulamento da Instrução Pública de 24

de outubro de 1870, idealizado por Manuel Luiz Azevedo D`Araujo, diretor Geral da

Instrução Pública de Sergipe naquele momento. Adquirindo relevância na vida sergipana, o

Atheneu Sergipense, tornou-se “um catalisador das produções culturais, de novas práticas e

padrões pedagógicos no Estado de Sergipe” (ALVES, 2005, p. 199). Ao longo dos anos,

passou por diversas mudanças de endereços, reformas de prédios e nomenclaturas, no

entanto, jamais fora fechado.4

Mostrando-se participativo em diversas atividades, o colégio conta com representações

monumentais, os troféus, por exemplo, que figuram parte de sua trajetória. A introdução

desses monumentos no Atheneu Sergipense tem relação direta com a Educação Física na

escola, que teve em Sergipe, “[...] sua primeira garantia de inserção oficial na Constituição

Estadual, promulgada em 16 de julho de 1947” (DANTAS JUNIOR, 2008, p. 135). No

entanto, é a Lei n.º 1.396, de 14 de setembro de 1966, dispondo sobre o Sistema Estadual de

Ensino, que regulamenta a obrigatoriedade da mesma nas escolas: “é obrigatória a prática da

educação física nos cursos primários e médio, até a idade de 18 anos, devendo seu exercício

ser motivo de regulamento específico do Conselho Estadual de Educação. (ARTIGO. 28, lei

n.º 1.396, de 14 de setembro de 1966, apud DANTAS JUNIOR, 2008, p. 135). A partir dessa

data a incidência de troféus no Atheneu Sergipense aumenta. Considerando a cronologia da

coleção disposta na instituição, o mais antigo refere-se ao ano de 1964. 5

4 Denominações do Atheneu Sergipense recebidas ao longo dos anos: “Atheneu Sergipense (1870), Lyceu Secundário de Sergipe (1881), Escola Normal de Dois Graus (1882), Atheneu Sergipense (1890), Atheneu Pedro II (1925), Atheneu Sergipense (1938), Colégio de Sergipe (1942), Colégio Estadual de Sergipe (1943), Colégio Estadual Atheneu Sergipense (1970), Colégio Estadual de Sergipe Atheneu Sergipense – Centro de Excelência (2003) (ALVES, 2005a. p.6).

5 Infelizmente só há no objeto o registro da data. Estão sendo desenvolvidas pesquisas em jornais e documentos do CEMAS, desse período, a fim de localizar evidências resultantes da conquista desse artefato.

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Foto 2: Troféu do Colégio Atheneu Sergipense – 1964. Fonte: CEMAS

Dessa década de 1960, o Atheneu Sergipense conta com 4 troféus resultantes de:

1 torneio, referenciado: “Taça Raimundo Diniz ao campeão do torneio Alcebíades Paes”, ano

de 1965, e, 2 jogos da primavera, um registrado como “II Jogos da Primavera – Campeão

Atletismo – Categoria B – masculino”, datado de 1965, e outro, como campeão geral do “IV

Jogos da Primavera”, 1967.

São identificados nos troféus nomes de dois personagens reconhecidos no cenário

sergipano, grafados na taça conquistada em um torneio de 1965, um referente a própria

nomeação da taça, trata-se, portanto, de um político, Raimundo Diniz, que fora vereador em

Aracaju no ano de 1941 e deputado federal em 1966, e o outro, à nomeação do torneio, que

teve o nome Alcebíades Paes, figura conhecida no esporte sergipano, que de acordo com

Viana Filho (1994) foi um dos presidentes e entusiasta do “ Club Sportivo Sergipe”, time

criado em 1909 na cidade de Aracaju.

Alguns nomes registrados em tais objetos podem revelar a estima de benfeitores

do esporte, que proporcionavam atividades de incentivo aos jovens estudantes, assim

também, como homenagens às pessoas ligadas a política com a finalidade, possivelmente, de

encontrar visibilidade e incentivo por parte de autoridades e governantes.

Mas, nem só de jogos e torneios os troféus do Atheneu Sergipense são

provenientes. A escola registra em sua coleção, monumentos advindos de premiação em

semana da pátria, do exército, gincana e projetos.

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Foto 3: Projeto Reutilize Alegria, 2º edição – 2011. Fonte: CEMAS

Figura 4: Gincana da Independência – Bicampeão – 1987. Fonte: CEMAS

A peça da foto 3, por exemplo, representa a parceria do Atheneu Sergipense no “Projeto

Reutilize Alegria” da campanha “Doe um brinquedo novo ou usado! Faça uma criança

sorrir!”, realizado no ano de 2011. Em matéria, no site do Instituto Marcelo Déda, é possível

visualizar imagens da ação com a presença de docentes e discentes no hall de entrada da

instituição, organizando os brinquedos para a doação.6 Por meio desse artefato localizamos

elementos que constatam o envolvimento dos agentes da escola com a comunidade,

revelando assim uma parte da cultura da instituição naquele momento, contribuindo para a

construção de uma memória coletiva.

Já com relação ao troféu da foto 4, trata-se de uma conquista em gincana, ocorrida no

dia 3 de setembro de 1987. Sem mais detalhes no objeto, investigamos no Jornal de Sergipe,

que tem circulação diária nesse período, escritos relacionados ao assunto, no entanto, não foi

localizado algo diretamente sobre o evento nos dias que antecedem e procedem a conquista.

Mas, há uma consideração de autoria da professora Graça Santos, do Atheneu Sergipense, no

dia 5 de setembro de 1987, homenageando à instituição com alusão à semana da

independência.

[...] Hoje, quando comemoramos a Semana da Pátria, quando valorizamos o grito de “INDEPENDÊNCIA OU MORTE” pronunciado às margens do rio Ipiranga, o Atheneu Sergipense, tão importante na atualidade quanto antigamente, formando, instruindo, educando, aguça sua audição e ainda consegue ouvir o eco daquela ordem que tanto representou e hoje representa para o povo brasileiro INDEPENDÊNCIA OU MORTE.

6 Cf.: http://www.institutomarcelodeda.com.br/criancas-da-creche-irma-graca-recebem-brinquedos-arrecadados-atraves-do-reutilize-alegria/ <Acesso em: 05 de março de 2017>.

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[...] Fazer independência é promover os acontecimentos educacionais com brilhantismo, com garbo e amor, é procurar o bem e o progresso dos seus compatriotas, é ir às ruas, às praças, às crianças, aos jovens, ao povo e sem medo de errar, erguer a cabeça e promover o bem, levando a todos a educação conscienciosa, regida pelos ditames cristãos em prol do progresso, do saber e da moral. No Atheneu esta atuação aconteceu e ainda hoje é uma constante. Seu alunado tem mantido a forma; o equilíbrio educacional está em evidência, seus professores, movido pelo dinamismo, pela eficiência profissional têm demonstrado o maior interesse para que exista êxito no processo ensino-aprendizagem desenvolvido naquela casa (SANTOS, 1987, p. 4).

Apesar de não sinalizar a conquista do Atheneu Sergipense na “Gincana da

Independência” realizada no dia 3 de setembro de 1987, a autora concebe alguns motivos de

reconhecimento da instituição centenária.7 Julgamos a probabilidade de o jornal ceder

espaço para a consideração da professora por mérito nesse evento.

Muitos foram os troféus conquistados pelo Atheneu Sergipense, advindos, destarte, de

homenagens, projetos, gincanas, jogos, torneios e outros. Contudo, são os provenientes dos

Jogos da Primavera que ocupam maior número na coleção. De um total de 157 peças

catalogadas, 92 delas correspondem às conquistas nesse evento, desde o ano de 1967 com o

primeiro prêmio, até o ano de 1994. Portanto, 58,6% dos troféus catalogados no Atheneu

Sergipense são provenientes dos Jogos da Primavera. 8

A Atuação nos Jogos da Primavera

Os troféus do Atheneu Sergipense advindos dos Jogos da Primavera foram

conquistados pelos estudantes da casa em diversas categorias, demonstrando uma tradição

de participação efetiva em todas as edições dos jogos. De acordo com os estudos de Dantas

Junior (2008), que se propõe analisar o processo de “esportivização” da escola pela

compreensão e representações dos Jogos da Primavera em Sergipe, entre o período de 1964 a

1995, esse evento apesar de passar por momentos de declínios com fechamentos e aberturas,

contribuiu de forma significante para o esporte na escola sergipana.

O primeiro troféu que se encontra na coleção do Atheneu Sergipense referente aos

Jogos da Primavera, corresponde à segunda edição do evento, datado 1965. Em formato de

7 A fim de apurar mais dados sobre o evento, estão sendo desenvolvidas pesquisas em outros veículos de informação da época, bem como, na documentação do CEMAS.

8 Cabe ressaltar que enquanto realizávamos a sessão de fotografias dos objetos, um funcionário do Atheneu Sergipense nos informou que existiam outros troféus espalhados dentro da sala do diretor da instituição, que não foram levados para a o novo prédio, permanecendo lá mesmo depois da mudança. Em domínio da chave do local, o funcionário nos levou até lá e assim iniciamos a segunda parte da catalogação de troféus da escola. Deste modo, os artefatos estudados no presente estudo correspondem a uma parte do acervo. A outra será investigada em estudos posteriores.

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taça, o objeto representa a conquista na modalidade “Atletismo – categoria B – masculino”9.

O mesmo possui algumas marcas do tempo, como a oxidação do material, que era metálico,

comum à época, como também, da não preservação do patrimônio material na instituição.

Localizamos o objeto na parte de baixo das prateleiras dos troféus, empoeirado e sem uma

das alças, juntamente com outros considerados mais antigos da coleção.

Foto 5: II Jogos da Primavera – Campeão Atletismo – Categoria B – masculino – 1965. Fonte: CEMAS

O tradicional evento “Jogos da Primavera”, movimentava as escolas participantes, os

dirigentes e a imprensa. Nos jornais, por exemplo, são localizadas notícias sobre sorteios das

instituições competidoras por categorias e modalidades, anúncios dos dias e locais de

partidas e outros. Deste modo, destacamos um escrito, localizado no jornal Gazeta de

Sergipe, do dia 4 de outubro de 1964, referente à notícia de abertura oficial do “I Jogos da

Primavera”. A matéria é disposta na primeira página do impresso e escrita com entusiasmo.

A grande atração da semana que hoje se inicia, em Aracaju, é a realização dos “I Jogos da Primavera”, iniciativa conjunta da Secretaria de Educação e da Federação Atlética dos Estudantes de Sergipe, cujo início está previsto para a tarde de hoje, com o desfile de abertura. Cerca de dezessete estabelecimentos de ensino, sendo cinco superiores e doze secundários, estarão a partir das 14:30 horas desfilando pelas principais ruas da cidade em direção ao Estádio de Aracaju, onde haverá a abertura oficial e o juramento do atleta (COMEÇAM..., 1964, p. 1).

9 O campeão geral dos Jogos da Primavera de 1965 foi o Colégio Tobias Barreto, que também conquistou o título em 1964 e 1966, sendo o primeiro tricampeão consecutivo do evento.

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Os jogos envolviam competições de variadas modalidades, como: atletismo, voleibol,

tênis de mesa, tênis de campo, futebol de salão, futebol de mesa, judô, karatê, natação,

ciclismo, xadrez. Deste modo, eram contemplados com troféus os vencedores de cada

categoria, além de haver o campeão geral do evento. O fato de premiar a instituição

vencedora em cada modalidade com um troféu, explica a quantidade deles no Atheneu

Sergipense, pois apenas 5 dos 92 objetos provenientes dos Jogos da Primavera são referentes

ao título de campeão geral.

Segundo o inventário dos troféus do Atheneu Sergipense, elaborado pela equipe do

CEMAS, bem como, os dados localizados nos estudos de Dantas Junior (2008), a instituição

consagrou o título de campeã geral dos Jogos da Primavera nos anos de: 1967; 1980;

1981;1982; 1983.

Os Jogos em sua primeira fase, iniciado em 1964, tiveram apenas 4 edições, as três

primeiras vencidas pelo Colégio Tobias Barreto, particular na época, e a última, conquistada

pelo colégio público Atheneu Sergipense, ou seja, IV Jogos da Primavera de 1967. Após o

período de 12 anos 10, segundo Dantas Junior (2008) o evento recomeçou em 1979 com

equívoco de nomeação, “IV Jogos da Primavera de 1979”, por esse motivo notamos

10 Nesse período ocorreram os Jogos Estudantis de Sergipe (JES).

Foto 7: VII Jogos da Primavera – Campeão – 1982.

Fonte: CEMAS

Foto 6: IV Jogos da Primavera – Campeão geral – taça centenária – 1967.

Fonte: CEMAS

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divergência de nomenclatura nos troféus do Atheneu Sergipense, no entanto, foram

respeitadas as grafias de cada objeto na confecção do inventário.

Assim, “[...] ao contrário de ratificar uma tradição, reorganizou outra sob os auspícios

dos donos do poder”. Ao longo dos anos, o evento adquiriu uma “personificação política”, os

troféus foram nominados “com cargos e nomes de políticos sergipanos, bem como de pessoas

e instituições reconhecidas socialmente” (DANTAS JUNIOR, 2008, p. 200). Deste modo,

parte significativa dos troféus do Atheneu Sergipense possuem nomes de personagens e

empresas sergipanas.

Foto8: Troféu TV Atalaia – IV Jogos da Primavera – 1979 Fonte: CEMAS

Evidenciando a introdução desses nomes nos materiais escolares, percebemos que

havia uma relação de poder e visibilidade por parte dos interessados, utilizavam-se também

desses meios para a promoção de suas marcas.

Parte considerável da construção da memória do Atheneu Sergipense, erguida por meio

dos troféus do Atheneu Sergipense, caminha pari passu com a história dos Jogos da

Primavera em Sergipe. Sua atuação no evento demonstra uma trajetória de incentivo ao

aluno pelo esporte, como também do professor de Educação Física atuante diretamente no

treino dos alunos e resultados conquistados para a instituição.

Algumas Considerações

Ao nos interessar pelo estudo dos troféus do Atheneu Sergipense, compreendíamos o

desafio que estava à frente. Cada peça ou documento/monumento, como consideramos,

traduz uma memória com variados detalhes a desvencilhar, que podem contribuir para o

entendimento de parte da cultura que permeava o local. Deste modo, o presente estudo

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caracteriza-se apenas como um projeto inicial, uma vez que investigar outras

facetas de tais objetos constitui nossa próxima investida.

Abordando um panorama geral dos troféus do Atheneu Sergipense, é possível perceber

que a instituição se envolveu em outras atividades, com reconhecimentos advindos de:

gincanas, homenagens, projetos, semanas da pátria, do exército e outros. No entanto, é certo

que a maioria das peças são resultados de vitórias em jogos e competições ligadas ao esporte,

conquistadas pelo corpo discente.

A maior quantidade deles refere-se as conquistas nos Jogos da Primavera, foi

perceptível a atuação do Atheneu Sergipense em todas as edições do evento, uma vez que,

eram premiados os vencedores de cada categoria, deste modo, mesmo que não fosse

conquistado o título de campeão geral, a escola tinha possibilidade de erguer um troféu ao

menos nas modalidades que competiam. O evento movimentava as escolas participantes e

contava com a iniciativa, principalmente, de autoridades políticas, para o seu pleno

desenvolvimento. Além de introduzir na escola o interesse pelo esporte, influenciando

diretamente nas atividades desenvolvidas na disciplina Educação Física.

Ponderando os troféus do Atheneu Sergipense, como patrimônio material da

instituição, cabe considerar que sua conservação conta atualmente com o trabalho dos

voluntários do CEMAS, que além de preservar a memória da instituição, desenvolvem

pesquisas relacionadas aos trâmites que abrangem à instituição, contribuindo sobremaneira

com os estudos da História da Educação em Sergipe.

Referências

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Page 12: MEMÓRIAS ESCOLARES: OS TROFÉUS CONQUISTADOS … · com portas de vidros em um dos corredores da instituição, próximas a sala da coordenação, foram resgatadas para o acervo

Anais Eletrônicos do IX Congresso Brasileiro de História da Educação João Pessoa – Universidade Federal da Paraíba – 15 a 18 de agosto de 2017

ISSN 2236-1855 6006

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