mediação cultural 2

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1 A mediação cultural e a avaliação no ensino não formal 1 Júlia Rocha Pinto 2 Universidade Estadual Paulista - UNESP Resumo Este artigo apresenta o tema da pesquisa de mestrado que está sendo realizada e que busca compreender como os setores educativos de museus de arte e instituições culturais avaliam suas ações. Portanto, o tema é trabalhado através de duas vertentes: a mediação cultural e a avaliação. A mediação cultural como prática construtiva e dialogal é abordada por diferentes interfaces, trazendo a origem da utilização deste termo no campo da educação. A avaliação no ensino não formal de arte, por sua vez, é justificada em sua importância e também problematizada como prática. Palavras-chave Mediação cultural, ensino de arte, avaliação Na contemporaneidade a prática da mediação cultural em exposições de arte é bastante recorrente; e diversos museus e centros culturais contam inclusive com uma equipe de ação educativa exclusiva para atender o público visitante e pensar em projetos que ressignifiquem seu acervo e suas mostras. As correntes contemporâneas de ensino de arte também contemplam este campo não formal de arte-educação, obtendo fontes de pesquisa em textos, pesquisas e materiais. Percebe-se, porém, que pouco existe pesquisado e sistematizado sobre os métodos avaliativos utilizados por setores educativos. Este texto problematiza as questões iniciais de uma pesquisa de mestrado sobre as formas de avaliação realizadas ou não por setores educativos de diferentes museus de arte e centros culturais na cidade de São Paulo. Nesta perspectiva, serão abordados dois eixos teóricos que compõe a pesquisa: a mediação cultural e a avaliação. 1 Artigo científico apresentado ao eixo temático “Ensino das Artes Visuais”, do V Ciclo de Investigações PPGAV UDESC. 2 Graduada em Licenciatura em Artes Plásticas pela Universidade do Estado de Santa Catarina – UDESC. Mestranda em Artes Visuais pela Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” - UNESP. Atualmente desenvolve a pesquisa “Avaliação da mediação – Ponderações das ações educativas em três focos”, orientada pela professora Doutora Rejane Galvão Coutinho, e financiada pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – CAPES.

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    A mediao cultural e a avaliao no ensino no formal1

    Jlia Rocha Pinto2

    Universidade Estadual Paulista - UNESP Resumo Este artigo apresenta o tema da pesquisa de mestrado que est sendo realizada e que busca compreender como os setores educativos de museus de arte e instituies culturais avaliam suas aes. Portanto, o tema trabalhado atravs de duas vertentes: a mediao cultural e a avaliao. A mediao cultural como prtica construtiva e dialogal abordada por diferentes interfaces, trazendo a origem da utilizao deste termo no campo da educao. A avaliao no ensino no formal de arte, por sua vez, justificada em sua importncia e tambm problematizada como prtica. Palavras-chave Mediao cultural, ensino de arte, avaliao

    Na contemporaneidade a prtica da mediao cultural em exposies de arte

    bastante recorrente; e diversos museus e centros culturais contam inclusive com uma

    equipe de ao educativa exclusiva para atender o pblico visitante e pensar em projetos

    que ressignifiquem seu acervo e suas mostras.

    As correntes contemporneas de ensino de arte tambm contemplam este campo

    no formal de arte-educao, obtendo fontes de pesquisa em textos, pesquisas e

    materiais. Percebe-se, porm, que pouco existe pesquisado e sistematizado sobre os

    mtodos avaliativos utilizados por setores educativos.

    Este texto problematiza as questes iniciais de uma pesquisa de mestrado sobre as

    formas de avaliao realizadas ou no por setores educativos de diferentes museus de

    arte e centros culturais na cidade de So Paulo. Nesta perspectiva, sero abordados dois

    eixos tericos que compe a pesquisa: a mediao cultural e a avaliao. 1 Artigo cientfico apresentado ao eixo temtico Ensino das Artes Visuais, do V Ciclo de Investigaes PPGAV UDESC. 2 Graduada em Licenciatura em Artes Plsticas pela Universidade do Estado de Santa Catarina UDESC. Mestranda em Artes Visuais pela Universidade Estadual Paulista Jlio de Mesquita Filho - UNESP. Atualmente desenvolve a pesquisa Avaliao da mediao Ponderaes das aes educativas em trs focos, orientada pela professora Doutora Rejane Galvo Coutinho, e financiada pela Coordenao de Aperfeioamento de Pessoal de Nvel Superior CAPES.

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    A mediao cultural em exposies de arte

    Acompanhando tendncias ps-modernas do ensino de arte, a vivncia educativa

    em exposies tem sido muito mais pautada em uma postura reflexiva e construtiva. Por

    isso, no campo no formal da educao que desempenham os museus e centros culturais

    hoje, o mediador no aquele que nos oferece dados e respostas, mas sim a figura que

    nos instiga a pensar aproximaes de nosso repertrio em relao ao universo das

    imagens.

    A noo de mediao cultural pressupe, portanto, que no ato da experincia, o

    momento da visita a uma exposio de arte, haja uma relao dialtica entre sujeito e

    objeto de conhecimento, e entre estes dois vrtices, um educador. O mediador

    posiciona-se como um contextualizador, ele promove o encontro entre o repertrio que

    o prprio pblico possui com as referncias imagticas e tericas que ele tem acerca do

    artista, da obra, do tema, do enredo, dos aspectos formais etc. Martins (2005, p. 44)

    afirma que A mediao pode ser compreendida como um encontro, mas no como

    qualquer encontro. Um encontro sensvel, atento ao outro.

    Quando os museus e campos culturais se viram diante da necessidade de ter um

    membro de sua equipe responsvel por receber o pblico, este profissional era

    conhecido como guia. Ser um guia incumbia saber e decorar o maior nmero de

    informaes acerca de determinada obra ou tema. Ele era aquele que guiava; ele

    passava informaes e detalhamentos, conforme Barbosa (2008, p. 31) o termo visita

    guiada pressupe a cegueira do pblico e a ignorncia total.

    A partir do momento em que aconteceu uma mudana, ou seja, o profissional

    no determinava mais tantos limites para o espectador, mas o comandava dentro do

    espao, o posto passou a ser do monitor. O monitor era aquele que concedia

    explicaes, o que muitas vezes aniquilava as mltiplas possibilidades de interpretaes

    dos objetos artsticos. Cocchiarale (2006, p. 14) afirma que o pblico est em uma busca

    ansiosa pela explicao verbal de obras reais e concretas, como se sem a palavra fosse-

    nos impossvel entend-las. A explicao assassina a fruio esttica, j que ao reduzir

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    a obra a uma explicao mata sua riqueza polissmica e ambgua, direcionando-a num

    sentido unvoco.

    Sendo assim, o monitor era o profissional que determinava o percurso da visita,

    os olhares e as percepes. Este, porm, tambm um termo preconceituoso, para

    Barbosa (2008, p. 30) (...) monitor quem ajuda um professor na sala de aula ou o

    que veicula a imagem gerada no HD, no caso de computadores. Atrelada palavra, vai a

    significao de veculo e de falta de autonomia e de poder prprio.

    Em decorrncia de uma ressignificao da arte, o educador de museus precisou

    desdobrar e alterar sua posio diante do pblico. Assim surge o mediador supracitado,

    aquele que relaciona, dialoga, atrai do espectador sua prpria contextualizao daquela

    obra de arte. Cocchiarale (2006, p. 15) assegura que O monitor, o educador, o

    mediador deve ser menos a pessoa que transmita contedos e mais algum que estimule

    o pblico a estabelecer algumas relaes de seu prprio modo. Compreende-se que

    enquanto mediador, o educador muito mais um propositor do que um depsito de

    informaes e dados a ser despejado. Conforme Martins (2005, p. 17):

    O papel de um mediador importante para a criao de situaes onde o encontro com a arte, como objeto de conhecimento, possa ampliar a leitura e a compreenso do mundo e da cultura. Capaz tambm de abrir dilogos internos, enriquecidos pela socializao dos saberes e das perspectivas pessoais e culturais de cada produtor/fruidor/aprendiz. Pois, o objetivo maior no propiciar contato para que todos os aprendizes conheam este ou aquele artista, mas sim que eles possam perceber como o homem e a mulher, em tempos e lugares diferentes, puderam falar de seus sonhos e seus desejos, de sua cultura, de sua realidade, da natureza sua volta e de suas esperanas e desesperanas, de seu modo singular de pesquisar a materialidade atravs da linguagem da arte.

    A prtica da reflexo e de um provocador esttico j bastante presente; ainda

    que a titulao seja lenta e a palavra monitor continue sendo usada consecutivamente.

    Por mais que mediao j seja um termo de uso comum, sobretudo no campo especfico

    dos museus e espaos expositivos, sempre vlido lembrar que este conceito provm de

    teorias de desenvolvimento e aprendizagem da psicologia scio-histrica.

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    Mediao um conceito de Vygotsky

    Dentro da perspectiva do desenvolvimento humano, a relao entre os sujeitos e

    os meios foi amplamente estudada pela psicologia scio-histrica; cujos conceitos

    comeam com a premissa de que os fenmenos psicolgicos so constitudos

    simultaneamente enquanto os indivduos interagem socialmente. Como afirma Ratner

    (1995, p. 6) Um importante princpio bsico da psicologia scio-histrica que os

    seres humanos transformam-se ativamente medida que transformam seu mundo social

    e natural.

    Diversos tericos trabalharam dentro desta perspectiva, mas neste texto cabe

    citar aquele que empregou propriamente o verbete pesquisado: Lev S. Vygotsky.

    Segundo a teoria vygotskiana, toda relao do indivduo com o mundo feita atravs de

    instrumentos tcnicos e da linguagem que traz consigo conceitos consolidados da

    cultura qual pertence o sujeito. Segundo Vygotsky (1998, p. 24), o verdadeiro curso

    do desenvolvimento do pensamento no vai do individual para o socializado, mas do

    social para o individual.

    Vygotsky encara o processo da aprendizagem como uma ao social onde os

    indivduos formulam seus conhecimentos mediante sua interao com o campo e com

    os outros, numa relao constante entre fatores individuais e coletivos, do sujeito e do

    contexto. Outros tericos afirmaram que o social princpio bsico da aprendizagem, tal

    qual Simon, 1987 apud Passerino; Santarosa (2009, s/p):

    (...) a interao social implica na participao ativa dos sujeitos num processo de intercmbio, ao qual aportam diferentes nveis de experincias e conhecimentos. claro que nem toda interao social implica numa aprendizagem, existindo categorias de interaes das puramente sociais at as didticas. atravs dessas interaes de carter didtico, que os sujeitos "aprendem", ou seja se apropriam do conhecimento, no como um objeto, que pode ser avaliado e observado independente do sujeito-observador, mas conhecimento como uma forma de ser, isto , conhecimento como ao adequada num contexto determinado.

    Esta noo de que no existe a obrigatoriedade na relao ensino-aprendizagem,

    isto , que nem toda proposio de ensino se encaminha necessariamente para uma total

    compreenso dela bastante contempornea e autocrtica para a arte-educao e a

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    educao como um todo. Alm disso, na citao de Richard Simon compreende-se o

    porqu do termo mediao exemplificar e delimitar com exatido a prtica educacional

    que vm desempenhando as instituies contemporneas de carter cultural.

    Retomando a noo de conceito de aprendizagem trazida pela psicologia scio-

    histrica, cabe colocar que este no um processo unilateral, conforme salienta

    Toulmin, 1978 apud Ratner (1995, p. 7):

    O fato de a psicologia ser socialmente construda significa que ela no subproduto direto de mecanismos fisiolgicos internos, nem de estmulos fsicos externos. Muito pelo contrrio, a atividade psicolgica socialmente construda medeia o impacto de estmulos internos e externos de maneira seletiva, ocupando-se deles, interpretando-os, levantando hipteses sobre eles, fazendo interferncias a partir deles, sintetizando-os e analisando-os.

    Esta atividade psicolgica acima descrita nada mais do que a relao

    estabelecida numa ao educativa entre um mediador e o espectador/pblico em contato

    com o objeto artstico. o mediador que se ocupa dos conceitos, interpreta as relaes,

    levanta hipteses sobre as leituras e faz interferncias do repertrio pessoal. Sendo

    assim, percebe-se que a categorizao do profissional de museu incumbido da educao

    especificamente como mediador concreta tanto no sentido epistemolgico, quanto no

    sentido prtico da ao.

    A teoria colocada pela psicologia scio-histrica sobrepuja a questo da

    aprendizagem extremamente relacionada com a linguagem, segundo Vygotsky (1998, p.

    7), a transmisso racional e intencional da experincia e pensamento a outros requer

    um sistema mediador, cujo prottipo a fala humana, oriunda da necessidade de

    intercmbio entre o trabalho. Este sistema mediador foi transportado para dentro do

    espao cultural inicialmente como atributo para transmisso de informaes, mas hoje

    se coloca muito mais como um suscitador de reflexes pessoais.

    Para Vygotsky (1998), como mencionado anteriormente, o aprendizado est

    vinculado a incorporao da fala, visto que o desenvolvimento acontece muito antes da

    criana iniciar sua vida escolar. A formao de um conceito inicialmente provm da

    relao entre o som e o significado de uma palavra. Percebe-se ento, que a linguagem

    a principal mediadora do sujeito com o meio e que cumpre fundamental funo no

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    processo de educao. por meio da linguagem que o indivduo produz cultura;

    mediante linguagem que o homem organiza o mundo simbolicamente, criando os

    museus, por exemplo.

    Na busca de uma sntese, a mediao um processo de interveno de um

    elemento numa relao objeto-sujeito, "O uso de signos conduz os seres humanos a uma

    estrutura especfica de comportamento que se destaca do desenvolvimento biolgico e

    cria novas formas de processo psicolgicos enraizados na cultura", conforme Vygotsky

    (2007, p. 34).

    Sintetizando, segundo Vygotsky, a mediao uma propriedade da cognio

    humana, que se refere assimilao de atividades e comportamentos sociais, histricos

    e culturais; e, por sua vez, inclui o uso de ferramentas e de signos dentro de um contexto

    social. A mediao, no caso especfico dos espaos expositivos, entre pblico e objeto

    de arte, realizada no apenas pelas ferramentas, bem como pela relao com outros

    indivduos que constituem um contexto repleto de outras significaes e influenciando o

    processo de construo do prprio pensamento e da tomada de conscincia.

    Avaliao como reflexo do processo

    Conforme a terminologia mediao trouxe para o ensino de arte realizado em

    museus novas perspectivas de atuao, percebe-se que a reflexo do processo

    intrnseca e que a avaliao deve ser realizada de forma sistemtica. O exerccio

    educativo realizado em exposies se enriquece ao passar por um processo crtico de

    anlise do trabalho desempenhado para estar em constante modificao das aes e

    adaptao aos pblicos.

    Para tanto, podem ser adotadas diversas formas de avaliao da prtica do setor

    destinado ao ensino de arte. Conforme Luckesi apud Ferraz; Fusari (1993, p. 121), a

    avaliao um meio, e no um fim e preciso que ela esteja preocupada com uma

    transformao do ensino, e no com um julgamento de valor deste ou daquele

    aprendizado. Estas formas de avaliao, portanto, precisam ser embasadas dentro de

    uma perspectiva educacional e serem analisadas constantemente buscando o retorno

    necessrio.

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    A temtica da avaliao, porm, ainda pouco trabalhada no campo da arte-

    educao em geral. Mais agravante a situao quando se pensa na avaliao do ensino

    de arte no formal. Conforme Barbosa (2009, p. 22):

    Precisamos de pesquisas que avaliem os melhores procedimentos para atingir os objetivos educacionais de hoje, que se concentram principalmente na flexibilidade de pensar e agir, na capacidade de elaborar em direo melhor qualidade de vida no planeta e no aprender a aprender. H uma rejeio a avaliao no Brasil, em especial no terceiro setor, em que os belos discursos muitas vezes escondem o autoritarismo castrador do pensamento.

    Os resultados da pesquisa ampliariam as possibilidades de refletir acerca da

    avaliao dentro do sistema acadmico, mas tambm retornariam concluses, dados e

    possibilidades para a mediao em seu prprio campo, na prtica; criando fontes de

    pesquisa. Barbosa (2009, p. 22) cita Marques dizendo que

    (...) pelo caminho da pesquisa e da avaliao que se pode desenvolver o enorme potencial educativo das exposies de arte e dos museus para o entendimento do mundo que nos cerca, da cultura do nosso pas e do fortalecimento do ego cultural dos excludos.

    Segundo investigao realizada pelo Instituto de Pesquisa Econmica Aplicada

    do Ministrio da Cultura, no que tratam das caractersticas de consumo e oferta cultural,

    78% dos brasileiros nunca vo a museus e 83% das pessoas das classes D e E no

    frequenta este tipo de instituio. Estes nmeros apresentam dados muito crticos que

    evidenciam a falta de hbito dos brasileiros de ter acesso a ambientes ligados cultura.

    Neste sentido que o mediador de museus pode articular sua prtica a funo de

    um formador de pblico, visto que desta estatstica a maior parte dos espectadores s

    tm acesso aos museus por meio da escola. Thistlewood (1999, p. 153) defende a

    presena de um educador dentro dos espaos culturais e refora o papel social do museu

    dizendo que

    importante compreender o enorme potencial dos museus de arte como condensadores culturais. Vrias influncias de todo o mundo tm sido sintetizadas neles, a ponto de os museus de arte de hoje (...) serem uma mistura de palcio, monumento popular, academia, laboratrio propriedade pblica e casa da moeda. Nesse sentido no uma instituio que os

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    estudantes (ou qualquer outro cidado) sejam displicentemente introduzidos, porque ser impossvel ignorar seu contedo cultural. A introduo ao museu de arte e o seu acervo deve ser orientada, isto , acompanhada de instruo.

    Falando sobre a constante ausncia da maioria da populao a estes espaos

    culturais, Bourdieu (2007) afirma que os museus abrigam preciosos objetos artsticos

    que se encontram, paradoxalmente, acessveis a todos, porm interditados maioria das

    pessoas. O socilogo compreende ainda que a inacessibilidade seja provocada pela falta

    de instruo do pblico em geral e evidencia a falta do habitus culto conceito prprio

    de Bourdieu (1989) e que no permite o leigo reconhecer o valor daquele objeto

    colocado no contexto especfico.

    Visando abrandar esta lacuna do habitus culto dentro do campo especfico o

    mediador pode ser figura importante dentro do espao museal, oferecendo dilogo entre

    os repertrios do pblico e seu conhecimento do campo em uma atividade de troca. Para

    Thistlewood (1999, p. 147) Existem essencialmente dois caminhos para encorajar a

    frequncia aos museus de arte, mas qualquer que seja a escolha inevitvel a

    responsabilidade educacional.

    Assim sendo, o educador de museus pode ser uma figura encorajadora de acesso

    aos bens culturais expostos. Franz (2001, p. 53) afirma que Diante de obras de arte,

    mais do que dar respostas, ele [o mediador] deve ensinar a fazer boas perguntas, a

    problematizar, ele deve levar o aluno a mobilizar seu prprio potencial em torno da obra

    apresentada. Desta forma, os agentes mediadores colocam-se entre as

    referncias/expectativas, o professor, o pblico e a obra, relacionando, dialogando e

    propondo um contato diferenciado com a arte.

    Todo este processo dialgico e mediador que se procede entre o educador de

    museu, o professor de sala de aula e o estudante precisa ser considerado e refletido

    continuamente. Como a ao educativa em museus no uma prtica processada de um

    componente para outro, mas sim de maneira multilgica e de cooperao entre os

    participantes da prtica, o processo de mediao acontece dessemelhante ao ambiente

    escolar.

    Diferentemente da avaliao no ensino de arte escolar, a avaliao das aes

    educativas realizadas em campos expositivos da arte no possui uma caracterizao de

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    mensurao, descrio, julgamento e negociao, caractersticas empregadas por Firme

    apud Pillotto; Mognol (2007). Muitas dessas etapas inclusive nem poderiam ser

    cumpridas, visto que na mediao cultural habitual que o educador no conhea o

    grupo previamente ao contato na exposio e nem prossiga o processo educacional aps

    o retorno do grupo escola, e por isso no possa basear a avaliao em julgamento ou

    negociao, por exemplo.

    Isso no aconteceria tambm porque a avaliao de um processo dialgico no

    unidirecional, diretiva, nem destinada a uma medida de aprendizado dos alunos. A

    referida avaliao para a mediao enquanto processo, e, portanto no mensura

    conhecimento adquirido ou qualidade na transmisso de informaes e dados. Cury

    (2005, p. 125) coloca que

    A avaliao deve ser entendida como um mecanismo que possibilite uma (re)orientao permanente dos nossos procedimentos ao implementar processos de comunicao museal elaborao, execuo e recepo pelo pblico. A avaliao, ento, est vinculada ao desenvolvimento profissional, organizacional e ao desenvolvimento do pensamento museolgico revendo, corrigindo, aprofundando e ampliando a prtica e o pensar.

    A relevncia de se avaliar as prticas realizadas dentro de um museu so,

    portanto, reflexo desta postura contempornea em que se coloca o educador como um

    mediador. A postura no de conceituar ou dar valor, mas de refletir sobre a prpria

    prtica. Se a questo da propriedade do trabalho desempenhado fosse critrio central

    para uma avaliao da ao educativa, isto poderia reforar a questo classificatria da

    avaliao do ensino formal; visto que neste sentido a qualidade baseia-se na

    comparao, e confunde-se com a quantidade atravs de sistemas de mdias, ndices e

    estatsticas. De acordo com Hoffmann (1993, p. 33)

    (...) qualidade, numa perspectiva mediadora da avaliao, significa desenvolvimento mximo possvel, um permanente vir a ser, sem limites pr-estabelecidos, embora com objetivos claramente delineados, desencadeadores da ao educativa. No se trata aqui, como muitos compreendem, de no delinearmos pontos de partida, mas, sim de no delimitarmos ou padronizarmos pontos de chegada.

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    A avaliao mediadora valoriza muito mais o processo da ao e os objetivos

    metodolgicos do que um resultado pragmtico e elaborado por meio de gabaritos e

    resultados nicos e fechados. A avaliao para uma ao educativa em ensino no

    formal valoriza este processo criado nas relaes estabelecidas e no dilogo, no em

    focos finais como bem afirmou Hoffmann (1993).

    Os critrios avaliativos tambm so diferenciados entre o ensino escolar e o

    ensino ocorrido em espao expositivo. O vnculo institucional agrega valor simblico ao

    processo avaliativo. E enquanto no espao escolar exige-se prioritariamente a

    memorizao de dados, notas altas, obedincia e passividade, no espao do museu

    instigam-se muito mais a aprendizagem, a compreenso, o questionamento atravs do

    dilogo e a participao no coletivo.

    Como a avaliao em arte tende a um subjetivismo, necessrio definir os

    critrios que sero ponderados para uma clareza das consideraes avaliativas. Ainda

    que estes critrios devam ser flexveis, buscando respeitar a distino dos alunos entre

    si. De acordo com Zimmerman (2008, p. 414) Ao avaliar a aprendizagem e as

    realizaes dos alunos de artes melhor empregar uma variedade de critrios e de

    medidas autnticas para diferenciar estilos de aprendizagem de estudantes de repertrios

    diversificados.

    Se voltarmos a pensar na postura reflexiva que trouxe a terminologia mediao,

    ao substituir monitoria e visita guiada, podemos ter como pressuposto que a avaliao j

    parte componente do processo e que no deva ser pensada individualmente. A reflexo

    da visita mediada aparece no desenvolvimento do processo, como coloca Cabral (2010,

    p. 5):

    Os museus devem considerar a avaliao como processo, pois no se trata de um produto pronto, e sim uma forma de buscar escutar e desarmar-se diante do outro. Pensar avaliao pensar finalidade, misso, objetivos e no h nada de natural, parcial ou neutro neste processo. A avaliao desenvolvida desse modo aumenta o valor dos espaos pblicos voltados a promover a construo da discusso e opinio espaos que representam legitimamente os visitantes e ajuda aos profissionais de museus e pesquisadores a efetivamente estabelecer estudos de avaliao em museus como prticas dialgicas.

  • 11

    A prtica dialgica da mediao precisa, portanto, ficar clara nos mtodos

    avaliativos que sero utilizados para as aes educativas. Os objetivos educativos

    devem ser respondidos atravs dos parmetros que sero observados nas avaliaes,

    afinal a mensurao de algo pressupe um planejamento das metas a serem alcanadas

    no processo.

    Enfim, importante que haja uma avaliao das visitas e tambm dos outros

    projetos concebidos e realizados pelos setores educativos de museus e instituies

    culturais visando qualificar o trabalho e promover a reflexo das prticas executadas.

    Mortara (2004, p, 24) nos traz esta relevncia em se saber dos limites e dos caminhos

    que a ao educativa pode traar:

    A avaliao fornece um retorno aos profissionais envolvidos no processo de planejamento e realizao das atividades museolgicas, assim como suporte ao planejamento de aes futuras. A avaliao fundamental para o questionamento das prticas educativas, do fazer dos educadores e dos profissionais envolvidos.

    Muito mais que oferecer respostas, a avaliao das aes educativas acaba por

    conceder questes que instigam uma qualificao do trabalho realizado junto ao pblico

    nas exposies de arte. Pensando no processo educativo travado entre mediador,

    professor e estudante dentro de uma instituio cultural, planejam-se as aes e os

    objetivos futuros, ressignificando o trabalho da mediao cultural a partir da sua prpria

    vivncia e tambm da experincia do outro.

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    Referncias

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    Resumo