mec^anica e ondas fasc¶‡culo 8 - fenix.tecnico.ulisboa.pt · figure 3: (a) dois blocos...

39
Mecˆanica e Ondas fasc´ ıculo 8 March 27, 2008 Contents 8.1 Movimento com for¸ca constante ................... 119 8.2 Polias ideais .............................. 121 8.3 Fri¸c˜ ao ................................. 128 8.4 For¸ca de atrito e velocidade terminal ................ 135 8.5 For¸ca resistiva proporcional `a velocidade .............. 136 8.6 Queda de corpos no ar ........................ 141 8.7 Cordas e postes ............................ 142 8.8 Trabalho e energia .......................... 148 8.9 Trabalho a 1-dim ........................... 149 8.10 For¸ca vari´ avel, trabalho ....................... 151 8.11 Trabalho em 3-dim .......................... 152 Mario J. Pinheiro Departamento de F´ ısica e Instituto de Plasmas e Fus˜ ao Nuclear Instituto Superior T´ ecnico email: [email protected] 118

Upload: truongtu

Post on 09-Dec-2018

216 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: Mec^anica e Ondas fasc¶‡culo 8 - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Figure 3: (a) Dois blocos encontram-se ligados por meio de um cabo e s~ao puxados por uma for»ca aplicada F. O cabo

Mecanica e Ondas

fascıculo 8

March 27, 2008

Contents

8.1 Movimento com forca constante . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1198.2 Polias ideais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1218.3 Fricao . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1288.4 Forca de atrito e velocidade terminal . . . . . . . . . . . . . . . . 1358.5 Forca resistiva proporcional a velocidade . . . . . . . . . . . . . . 1368.6 Queda de corpos no ar . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1418.7 Cordas e postes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1428.8 Trabalho e energia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1488.9 Trabalho a 1-dim . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1498.10 Forca variavel, trabalho . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1518.11 Trabalho em 3-dim . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 152

Mario J. PinheiroDepartamento de Fısica e Instituto de Plasmas e Fusao NuclearInstituto Superior Tecnicoemail: [email protected]

118

Page 2: Mec^anica e Ondas fasc¶‡culo 8 - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Figure 3: (a) Dois blocos encontram-se ligados por meio de um cabo e s~ao puxados por uma for»ca aplicada F. O cabo

Although nature commences with reason and ends in experience itis necessary for us to do the opposite, that is to commence withexperience and from this to proceed to investigate the reason.

- Leonardo da Vinci

NOTA PREVIA - Grande parte da materia exposta constitui uma revisao esera rapidamente exposta na aula teorica. Os exemplos apresentados sao tıpicosproblemas que o aluno deve rever em casa com atencao.

8.1 Movimento com forca constante

−→F = m−→a

Se−→F = const. entao −→a = const.

Num sistema de eixos ortogonais:∑

Fx = max∑Fy = may∑Fz = maz

(8.1)

Forcas:

• Tensao

• gravidade

• forca normal, de contacto

• fricao

• mola

Exemplo 1: Considere duas massas em tandem (Fig. 1) deslizando sobre umplano horizonta., sem fricao e despreze a massa dos cabos de ligacao.

Sobre a massa m2 agem as forcas:

F − T2 = m2a2 eixo OxN2 −m2g = 0 eixo Oy (8.2)

Sobre a massa m1 agem as forcas:

T1 = m1a1 eixo OxN1 −m1g = 0 eixo Oy (8.3)

119

Page 3: Mec^anica e Ondas fasc¶‡culo 8 - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Figure 3: (a) Dois blocos encontram-se ligados por meio de um cabo e s~ao puxados por uma for»ca aplicada F. O cabo

Figure 1: (a) Duas massas em tandem unidas por um cabo sem massa; (b):forcas actuando sobre a massa m2; (c): forcas actuando sobre a massa m1.

120

Page 4: Mec^anica e Ondas fasc¶‡culo 8 - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Figure 3: (a) Dois blocos encontram-se ligados por meio de um cabo e s~ao puxados por uma for»ca aplicada F. O cabo

Os dois corpos estao constrangidos a moverem-se juntos, e temos assim obriga-toriamente a1 = a2 = a. Um cabo ideal actua de modo que T1 = −T2 = T .

A adicao das componentes em OX resulta em

F = (m1 + m2)a (8.4)

dondea =

F

m1 + m2(8.5)

Da Eq. 8.3 obtem-seT = m1a =

m1

m1 + m2F.

8.2 Polias ideais

• Sao usadas polias ideias para mudar a direcao da forca exercida peloscabos;

• Se o cabo e a polia nao tiverem ambos massa, a tensao e a mesma deambos os lados da polia

• No caso contrario, isto ja nao e verdade;

• As polias ideais considere-se que nao tem massa e nao tem fricao.

A componente normal da forca de contacto e suposta bisectar o angulo entre osextremos do cabo (Fig. 2).

Os cabos so podem servir para puxar (exercer tensao, nao compressao).

• cabos de massa desprezavel: a tensao e a mesma por todo o lado

• Se a massa do cabo e diferente de zero, trata-se como outro corpo massivoqualquer;

• O cabo e suposto nao ter resistencia interna e alinha-se com a forca apli-cada;

• assume-se que nao ha alongamento do cabo (mantem o comprimento con-stante)

Como os blocos estao unidos a aceleracao de ambos e a.

m1 : F − T1 = m1am2 : T2 = m2amc : T1 − T2 = mca

(8.6)

O somatorio resulta emF = (m1 + m2 + mc)a

121

Page 5: Mec^anica e Ondas fasc¶‡culo 8 - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Figure 3: (a) Dois blocos encontram-se ligados por meio de um cabo e s~ao puxados por uma for»ca aplicada F. O cabo

Figure 2: A componente normal da forca de contacto bisecta o angulo entre osextremos do cabo.

Figure 3: (a) Dois blocos encontram-se ligados por meio de um cabo e saopuxados por uma forca aplicada F . O cabo tem comprimento L e massa mc.(b), (c), and (d) Diagramas das forcas actuando sobre o bloco m2, o cabo deligacao ms, e o bloco m1, respectivamente.

122

Page 6: Mec^anica e Ondas fasc¶‡culo 8 - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Figure 3: (a) Dois blocos encontram-se ligados por meio de um cabo e s~ao puxados por uma for»ca aplicada F. O cabo

Figure 4: O cabo e secionado longitudinalmente numa extensao de comprimentol e noutra de extensao L− l.

assim comoT1 = F −m1a = (m2 + mc)a

eT2 = m2a,

isto e, t1 6= T2.

Verificamos que, devido a massa do cabo, a tensao nao e a mesma ao longo doseu comprimento. Seja l o seu comprimento e Tl a tensao no ponto l (Fig. 4).

QuadroNegro 1 -

Exemplo 2: Contrangimento: Considere o sistema da Fig. 5 sem atrito, caboe polia com massa desprezavel.

123

Page 7: Mec^anica e Ondas fasc¶‡culo 8 - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Figure 3: (a) Dois blocos encontram-se ligados por meio de um cabo e s~ao puxados por uma for»ca aplicada F. O cabo

Figure 5: Polia e cabos com massa desprezavel do exemplo.

Massa m1:T1 = m1a1

N −m1g = 0 (8.7)

Massa m2:m2g − T2 = m2a2

Polia:2T1 − T2 = 0.

Constrangimento: Quando m1 move-se a distancia x1 para a direita, a massam2 cai a distancia x2 = x1/2.

∴ a2 =d2x2

dt2=

12a1. (8.8)

Das Eqs. anteriores e facil obter

a2 =(

m2

4m1 + m2

)g

que deve ser resolvido com o que ja tinhamos obtido a1 = 2a2.

Exemplo 3: Massas acopladas: Assuma que nao ha fricao e os cabos tem massadesprezavel (Fig. 6).

124

Page 8: Mec^anica e Ondas fasc¶‡culo 8 - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Figure 3: (a) Dois blocos encontram-se ligados por meio de um cabo e s~ao puxados por uma for»ca aplicada F. O cabo

Figure 6: Massas acopladas.

Massa m1:eixoOx m1g sin θ − T = m1aeixoOy N1 −m1g cos θ = 0 (8.9)

Massa m2:eixoOx T = m2aeixoOy N2 −m2g = 0 (8.10)

Somando as componentes em Ox das Eqs. 8.9- 8.10, obtem-se

m1g sin θ = (m1 + m2)a (8.11)

∴ a =m1

m1 + m2g sin θ. (8.12)

8.2.1 Maquina de Atwood

Considere o conjunto de duas polias com massa desprezavel e sem atrito e umcabo com massa igualmente desprezavel (Fig. 7) - maquina de Atwood 1.

Massa m1:

(T −m1g) = m1a

Massa m2:

(m2g − T ) = m2a

1a maquina de Atwood foi inventada em 1784 pelo Reverendo George Atwood para ser umamontagem de laboratorio destinada a testar as leis do movimento uniformemente acelerado.

125

Page 9: Mec^anica e Ondas fasc¶‡culo 8 - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Figure 3: (a) Dois blocos encontram-se ligados por meio de um cabo e s~ao puxados por uma for»ca aplicada F. O cabo

Figure 7: Maquina de Atwood.

126

Page 10: Mec^anica e Ondas fasc¶‡culo 8 - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Figure 3: (a) Dois blocos encontram-se ligados por meio de um cabo e s~ao puxados por uma for»ca aplicada F. O cabo

Figure 8: Plano inclinado acelerado.

A sua soma resulta em

(m2 −m1)g = (m2 + m1)a∴ a =

(m2−m1m2+m1

)= 1

5 (m/s2)

Aplicacao numerica: m1 = 2 kg e m2 = 3 kg.

Tensao do cabo

T = m1(a + g) = m1

(m2 −m1

m2 + m1+ 1

)=

(2m1m2

m2 + m1

)g

Repare que To = 2T (vd. Fig. 7).

A maquina de Atwood ideal consiste em dois objectos de massa m1 e m2, ligadaspor um cabo de massa desprezavel colocado por cima de uma polia igualmentede massa desprezavel e sem atrito. Quando m1 = m2, a maquina fica emequilıbrio neutro, qualquer que seja a posicao das massas. Quando m2 > m1

ambas as massas experimental uma aceleracao uniforme.

A maquina de Atwood tem inumeras aplicacoes, por exemplo, nos elevadoresusa-se um contrapeso que desemepnha o mesmo papel, aliviando o motor, porqueassim nao gasta energia puxando a caixa onde se desloca a carga, bastando omotor compensar a diferenca de inercia das duas massas. O mesmo princıpio eusado nos funiculares com dois trilhos de ferro ligados num plano inclinado.

Exemplo 4: Plano inclinado acelerado. Considere um bloco de massa mdeslizando sem atrito sobre um plano inclinado fazendo um angulo θ com ahorizontal. O plano inclinado esta acelerado com aceleracao de modulo a paraa direita da Fig. 8. Calcule o angulo θc para o qual o bloco nao escorrega paracima ou para baixo do plano.

127

Page 11: Mec^anica e Ondas fasc¶‡culo 8 - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Figure 3: (a) Dois blocos encontram-se ligados por meio de um cabo e s~ao puxados por uma for»ca aplicada F. O cabo

O bloco nao deslizara se tiver aceleracao igual a do plano inclinado (porquetal significa que ele move-se em conjunto com o plano). O sistema de forcasresulta nas seguintes equacoes (escolhendo o sistema de coordenadas com Oxna horizontal):

forcasaolongodeOx N sin θ = maforcasaolongodeOy N cos θ −mg = 0.

(8.13)

Da ultima equacao resulta

N = mgcos θ

∴ mgcos θ sin θ = ma

(8.14)

ou sejaa = g tan θc.

8.3 Fricao

Superfıcies em contacto exercem duas forcas uma na outra:

• uma forca e normal e perpendicular as superfıcies;

• outra forca paralela, a forca de fricao. As forcas de fricao opoem-se sempreao movimento relativo entre as duas superfıcies.

8.3.1 Forcas de fricao

As forcas de fricao desempenham um papel muito importante no movimento dosobjectos reais, como se tornara claro com os exemplos que serao apresentados.Essas forcas resultam das forcas atractivas (do tipo de Van der Waals) que seestabelecem entre os atomos das diferentes superfıcies. A sua descricao a umnıvel microscopico e muito complexa, muito embora a sua descricao ao nıvelmacroscopico seja muito empırica 2. Essas leis sao as seguintes: a forca deatrito e

• proporcional a forca normal entre duas superfıcies

• e independente da area de contacto

• e independente da velocidade.2Leonardo da Vinci (1452-1519) foi o primeiro a fazer estudos quantitativos do problema

da fricao. A montagem experimental usada por da Vinci era muito simples. Media o angulodo plano inclinado a partir do qual um objecto colocado na sua superfıcie comecava a deslizar.

128

Page 12: Mec^anica e Ondas fasc¶‡culo 8 - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Figure 3: (a) Dois blocos encontram-se ligados por meio de um cabo e s~ao puxados por uma for»ca aplicada F. O cabo

8.3.2 Fricao cinetica

Quando as superfıcies estao animadas de movimento relativo essa forca e

fk = µkN (8.15)

onde µk e o coeficiente de fricao cinetico (0 < µk < 1), e N e a forca de contacto(normal).

• a forca de fricao e proporcional a N ;

• e paralela a superfıcie de contacto;

• opoem-se a direcao do movimento;

• lei empırica e aproximada;

• µk depende da natureza dos materiais

• µk e independente de v

Exemplo 5: Um bloco de massa m = 100 kg move-se para a frente comvelocidade constante, −→a = 0. O coeficiente de fricao cinetico e µk = 0.40.Determine a forca F que actua sobre o bloco.

Componente vertical da forca:

N + F sin 30o −mg = 0

Componente horizontal da forca:

F cos 30o − fk = 0

onde fk = µkN . Donde resulta

F cos 30o − µk(mg − F sin 30o) = 0

ou sejaF =

µkmg

cos 30o + µk sin 30o

F =0.40× 100× 9.80

0.866 + 0.40× 0.50= 368N

Repare queθ = 0o F = 392Nθ = 45o F = 396Nθ = 90o F = 981N

(8.16)

129

Page 13: Mec^anica e Ondas fasc¶‡culo 8 - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Figure 3: (a) Dois blocos encontram-se ligados por meio de um cabo e s~ao puxados por uma for»ca aplicada F. O cabo

Figure 9: Bloco de massa m sobre um plano com fricao.

8.3.3 Fricao estatica

As forcas de fricao tambe actuam sobre superfıcies em repouso (sem movimentorelativo).

Objectos em repouso requerem a aplicacao de uma forca para iniciarem o movi-mento. A forca de fricao estatica e:

fs ≤ µsN, (8.17)

onde µs designa o coeficiente de fricao estatico e N a forca (normal) de contacto.

• forcas de fricao podem ter qualquer magnitude entre zero (quando naoha qualquer outra forca actuando paralelamente a superfıcie) ate ao valormaximo µsN ;

• O sinal de igualdade so se verifica quando o movimento esta prestes acomecar.

Propriedades da forca de fricao estatica:

• proporcional a forca normal;

• e independente da area;

• lei empırica;

• opoe-se a forca aplicada;

130

Page 14: Mec^anica e Ondas fasc¶‡culo 8 - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Figure 3: (a) Dois blocos encontram-se ligados por meio de um cabo e s~ao puxados por uma for»ca aplicada F. O cabo

Figure 10: (a) e (b): quando fs < fs,max, a forca de fricao e exactamente iguala forca (externa) aplicada, e nao ha aceleracao do bloco. (c): quando uma forcade suficiente magnitude e exercida de modo que o moviemento se torna possıvel,a forca de fricao e igual a µkN e a aceleracao e (F − µkN)/m.

• usualmente µs > µk, de modo que e necessario uma forca menor paramanter o objecto em movimento;

• µs depende da natureza e condicoes das superfıcies.

Exemplo 6: Bloco sobre uma superfıcie horizontal (Fig. 10).

a) Repouso: f1 < µsN (Fig. 10-(a)).

b) No limiar do movimento: f2 = µsN (Fig. 10-(b))

c) Movimento iniciado: f3 = µkN (Fig. 10)

Exemplo 7: Plano inclinado de angulo variavel destinado a medir coeficientesde fricao estaticos.

O bloco comeca a sua queda quando angulo α = 23o. Qual e o coeficiente defricao estatica, µs?

eixoOy N −mg cos α = 0eixoOx mg sin α− f = 0 (8.18)

131

Page 15: Mec^anica e Ondas fasc¶‡culo 8 - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Figure 3: (a) Dois blocos encontram-se ligados por meio de um cabo e s~ao puxados por uma for»ca aplicada F. O cabo

Repare que este angulo α constitui o limiar a partir do qual o bloco acelera,portanto ainda estamos na condicao −→a = 0. Temos assim

f

N=

mg sin α

mg cosα= tan α (8.19)

(f

N

)

max

= µs = tan 23o = 0.424.

O angulo maximo e chamado de angulo de repouso e e independente da massado bloco.

Exemplo 8: Bloco a deslizar num plano inclinado sob a ac.ao da gravidade.

eixoOx mg sin θ − f = max

eixoOy N −mg cos θ = may = 0 (8.20)

∴ N = mg cos θ. (8.21)

Por sua vez sabemos quef = µkN (8.22)

sobstituindo na Eq. projectada em Ox, temos

mg(sin θ − µk cos θ) = max (8.23)

donde resultaax = (sin θ − µk cos θ)g. (8.24)

Se ax = 0, entao obtemos o coeficiente de fricao cinetico procurado:

µk =sin θ

cos θ= tan θ. (8.25)

Assim, concluımos que um metodo razoavel para determinar µk consiste emdeterminar o angulo limite a partir do qual da-se uma aceleracao do bloco.

Exemplo 9: Bloco sobre uma parede vertical.

Considere um bloco apoiado sobre um plano vertical (por ex., o quadro negro,Fig. 12).

As duas equacoes que resultam da projecao nos eixos cartesianos Ox, e Oy, sao:∑

Fx = P −N = 0(a)∑Fy = fs − w = 0(b) (8.26)

Da Eq. 8.26-(b) temos fs = w e da Eq. 8.26-(b) temos P = N , sendo P a forcade compressao exercida pela punho. Mas fs ≤ µsP . Para que nao haja deslizee necessario que fs ≥ w,

∴ µsP ≥ w, (8.27)

132

Page 16: Mec^anica e Ondas fasc¶‡culo 8 - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Figure 3: (a) Dois blocos encontram-se ligados por meio de um cabo e s~ao puxados por uma for»ca aplicada F. O cabo

Figure 11: Bloco a deslizar num plano inclinado sob a acao da gravidade.

ouP ≥ w

µs. (8.28)

Portanto, a forca de compressao mınima para que nao haja deslize do “apa-gador” do quadro negro e:

P =w

µs. (8.29)

Exemplo 10: Bloco puxado para cima ao longo de um plano inclinado.

Consideremos agora a nova situacao de um bloco puxado ao longo de um planoinclinado (Fig. 13).

Suponha que os dados numericos sao os seguintes: m = 5 kg, F = 20 N,µk = 0.42. A pergunta e: qual e a aceleracao?

Assuma que o movimento e para cima:

eixoOx F − f −mg cos 60o = max

eixoOy N −mg cos 60o = 0 (8.30)

Ao longo de Oy nao ha aceleracao.

∴ N = mg cos 60o. (8.31)

Donde resultaf = µkN = µkmg cos 60o (8.32)

ouax =

F −mg sin 60o − µkg cos 60o

m= −6.55m/s2. (8.33)

133

Page 17: Mec^anica e Ondas fasc¶‡culo 8 - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Figure 3: (a) Dois blocos encontram-se ligados por meio de um cabo e s~ao puxados por uma for»ca aplicada F. O cabo

Figure 12: Apagador puxado por um operador na vertical contra o quadro negro.

Figure 13: Bloco puxado contra agravidade ao longo de um plano inclinado.

134

Page 18: Mec^anica e Ondas fasc¶‡culo 8 - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Figure 3: (a) Dois blocos encontram-se ligados por meio de um cabo e s~ao puxados por uma for»ca aplicada F. O cabo

Isto e, o bloco coom os valores numericos assumidos esta acelerado para baixo;ha que inverter o sentido da forca de atrito!

F −mg sin 60o + f = max

N −mg cos 60o = 0 (8.34)

Resolvendo obtem-se a = −2.43 m/s2. Agora a direcao do bloco e para baixo,mas e consitente com as hipoteses iniciais.

8.4 Forca de atrito e velocidade terminal

Os objectos que se movem em meio fluido (agua, ar,...) estao submetidos auma forca de atrito que se opoe ao movimento. A resolucao detalhada desteproblema e muito complexo. Geralmente considera-se existir 2 regioes distintasdo fluxo do fluido em torno do objecto.

1. Fluxo laminar: fluxo estavel em torno do objecto; FD ∼ v; a lei de Stokes 3

aplica-se (Fig. 14).

2. Fluxo turbulento: FD ∼ v2, a velocidade e suficientemente elevada demodo que o fluxo de ar atras do objecto e turbulento. As partıculas dofluido fluctuam de modo desordenado, caotico, produzindo vortices (ouvortexes), vd. Fig. 15.

O escoamento do fluido em torno de um objecto e sempre turbulento 4 nos casos:

• bola de baseball (42 m/s);

• paraquedista (5 m/s);

• ...

Em 1883 Osborne Reynolds 5 descobriu o fenomeno de turbulencia em dinamicados fluidos quando estudava o escoamento da agua atraves de tubos cilindricosdevido a um gradiente de pressao. Reynolds descobriu que quando uma ve-locidade crıtica era atingida (e bem caracterizada por um valor crıtico hoje

3In 1851, George Gabriel Stokes obteve uma expressao matematica das forcas de fricao(ou resistiva) exercida sobre objectos de forma esferica valida quando o numero de Reynoldse muito pequeno (em particular, valida para partıculas muito pequenas) num fluido viscoso,FD = 6πRµv, onde FD e a forca de fricao, R e o raio do objecto esferico, µ e a viscosidadedinamica do fluido, e v e a velocidade da partıcula.

4Conta-se que alguem teria perguntado ao celebre cientista alemao Werner Heisenberg oque ele perguntaria a Deus, se tivesse essa oportunidade. Ele teria respondido: “Quandome encontrar com Deus irei colocar-Lhe duas questoes: Porque a relatividade? E porque aturbulencia? Eu acredito deveras que Ele tera uma resposta para a primeira.”

5Osborne Reynolds (1842 1912), engenheiro irlanes, deu contribuiucoes importantes naarea da dinamica dos fluidos. Estudou igualmente os fenomenos de transferencia de calorentre solidos e fluidos, contribuindo assim nos melhoramentos em caldeiras e condensadores.

135

Page 19: Mec^anica e Ondas fasc¶‡culo 8 - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Figure 3: (a) Dois blocos encontram-se ligados por meio de um cabo e s~ao puxados por uma for»ca aplicada F. O cabo

Figure 14: Fluxo laminar (a) e turbulento (b-d) em torno de uma esfera.

chamado em sua homenagem numero de Reynolds 6, Rec) era excedida o es-coamento tornava-se turbulento. Hoje em dia compreende-se que o fenomenode turbulencia deve-se a um movimento caotico solenoidale do fluido acompan-hado por um grande incremento das propriedades de transporte tais como a vis-cosidade (transferencia de momentum), difusividade (transferencia de massa),conductividade termica (transferencia de energia), e resistividade electrica (napassagem da corrente electrica). O fluxo turbulento e mantido energeticamentepelo fluxo principal e as perdas de energia aparecem sob a forma de quedas depressao ou perdas por fricao.

8.5 Forca resistiva proporcional a velocidade

Qual a forma da forca de atrito, resistiva, exercida pelo meio sobre os objectos?

• objectos em queda atraves de um fluido;

• pequenos objectos (partıculas de poeira) no ar.

Essa forca resistiva tem a forma:

−→F D = −b−→v . (8.35)

onde6Em mecanica dos fluidos, o numero de Reynolds e uma grandeza sem dimensoes dado

pelo racio das forcas de inercia sobre as forcas de viscosidade Re ≡ uLν

, onde u e a velocidadedo fluido (em m/s), L e um comprimento caracterıstico (em metros) e ν e o coeficiente deviscosidade cinematica (em m2/s). Re quantifica a importancia relativa desses dois tipos deforca para um determinado escoamento.

136

Page 20: Mec^anica e Ondas fasc¶‡culo 8 - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Figure 3: (a) Dois blocos encontram-se ligados por meio de um cabo e s~ao puxados por uma for»ca aplicada F. O cabo

Figure 15: Um “skydiver” em queda livre...Mormalmente um “skydiver” naposicao barriga para a Terra atingira uma rapidez de cerca de 200 km/h. Estae a chamada velocidade terminal. Ha quem diga que nos anos 60 um sujeitochamado Joe Kittenger ultrapassou a barreira do som ao cair de uma altitudede cerca de 31 km. A rapidez com que uma pessoa cai pode ser ajustadacom a variacao do coeficiente de fricao. Uma pessoa com a cabeca para baixooferecendo uma menor resistencia pode atingir cerca de 300 km/h. Ao abrir opara-quedas a velocidade terminal do sujeito reduz-se para cerca de 24 km/hem 4 para 5 segundos.

• −→v - velocidade do objecto;

• b - constante que depende do meio e da forma do objecto. Por exemplo,para uma esfera, tem-se b ∼ r em unidades SI kg/s.

Considere o movimento de uma esfera de massa m atraves de um fluido. 2Forcas actuam sobre ele:

• mg - peso (eventualmente incluindo ja as forcas de impulsao)

• −bv - forca resistiva.

Aplicando a segunda lei de Newton:∑

Fy = may (8.36)

QuadroNegro 2 - Forcas resistivas sobre uma esfera.

137

Page 21: Mec^anica e Ondas fasc¶‡culo 8 - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Figure 3: (a) Dois blocos encontram-se ligados por meio de um cabo e s~ao puxados por uma for»ca aplicada F. O cabo

Figure 16: As forcas resistivas dependem da forma do objecto e em particularda area da secao transversal do objecto. Na figura mostra-se desenhos de umaviao Messerschmitt Me 262 A-1a de fabrico alemao.

138

Page 22: Mec^anica e Ondas fasc¶‡culo 8 - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Figure 3: (a) Dois blocos encontram-se ligados por meio de um cabo e s~ao puxados por uma for»ca aplicada F. O cabo

Quando o objecto cai no inıcio do movimento quando t = 0, tem-se suposta-mente neste caso v = 0 e a forca resistiva e nula.

No inıcio a aceleracao inicial e suposta ser a da gravidade:

a(t = 0) =dv

dt= g. (8.37)

A medida que o tempo t passa, a velocidade do objecto v aumenta, e a forcaresistiva aumenta igualmente ate que a um dado momento a aceleracao podemomentaneamente decrescer. Estabelece-se um equilıbrio natural de forcas.Quando a forca resistiva iguala o pso, a aceleracao de facto anula-se. O objectocontinua o movimento, mas com uma velocidade terminal, sem aceleracao.

QuadroNegro 3 - velocidade do objecto e velocidade terminal

Ha maneiras de contornar o efeito resistivo do meio fluido. O fenomeno decavitacao acontece quando a pressao da agua baixa ate valores inferiores ao dovapor de agua (ou quando a pressao de vapor ultrapassa a pressao da agua). Acavitacao ocorre dentro de uma bomba hidraulica ou em torno de um obstaculo,por exemplo, uma helice com alta rotatividade. As pequenas bolhas de vaporde agua formadas implodem rapidamente resultando num aumento rapido dapressao ambiente que acaba por danificar fisicamente as helices propulsores er-radamente projectadas.

A supercavitacao corresponde ao fenomeno de cavitacao descrito acima masonde o efeito e usado de forma sustentada e amplificadamente. As caracterısticasde um objecto supercavitando 7 consistem na forma do “nariz”, que deve ser

7Em ingles designa-se “supercavitating object”.

139

Page 23: Mec^anica e Ondas fasc¶‡culo 8 - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Figure 3: (a) Dois blocos encontram-se ligados por meio de um cabo e s~ao puxados por uma for»ca aplicada F. O cabo

Figure 17: (a): as asas dos avioes sao concebidas para terem um fluxo laminar.

140

Page 24: Mec^anica e Ondas fasc¶‡culo 8 - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Figure 3: (a) Dois blocos encontram-se ligados por meio de um cabo e s~ao puxados por uma for»ca aplicada F. O cabo

Figure 18: Detalhes do nariz do Shkval e destrocos do submarino “Kursk”.

plana com saliencias agudas, e com linhas aerodinamicas ou hidrodinamicas queseguem as linhas de fluxo do fluido. Quando o objecto atinge uma velocidade decerca de 440 m/s, a agua e deflectida pelo nariz com tal rapidez que o objectoacaba por “voar” dentro da bolha de vapor de agua entretanto criada. Para lade determinada velocidade, ou injectando gas para dentro da bolha de vapor deagua formada consegue-se estender a cavidade de modo a envolver por completoo corpo do objecto.

Foram propostos os mais diversos processos de propulsao, entre os quais objectossub-aquaticos propelidos por um motor de foguetao “queimando” alumınio comagua. O torpedo ‘VA-111 Shkval” e um objecto supercavitando, fabricado pelosrussos (alias, provavelmente os maiores especialistas mundiais em mecanica dosfluidos) e esta na origem do afundamento tragico do submarino russo “Kursk”(vd. Fig. 18).

8.6 Queda dos corpos no ar

A forca de atrito (ou de arrasto) e do tipo:

FD =12CρAv2. (8.38)

141

Page 25: Mec^anica e Ondas fasc¶‡culo 8 - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Figure 3: (a) Dois blocos encontram-se ligados por meio de um cabo e s~ao puxados por uma for»ca aplicada F. O cabo

Figure 19: Corda enrolada em torno de um poste.

A forca e proporcional a (velocidade)2.

• A : area transversal efectiva do objecto;

• ρ : densidade do ar;

• v : velocidade do objecto em queda;

• C : coeficiente de atrito (sem dimensao), depende da geometria do objecto(usualmente C = 0.5 → 1.0).

Quando o objecto atinge a velocidade terminal, verifica-se FD = mg, donde seobtem

∴ 12CρAv2

t = mg. (8.39)

∴ vt =√

2mg

CρA,m/s. (8.40)

8.7 Cordas e postes

Considere uma corda enrolada em torno de um poste. Queremos relacionara forca nas extremidades da corda com o comprimento da corda enrolada emtorno do poste se o coeficiente de fricao estatico for µ.

• assume-se que nao ocorre deslize;

• A seccao da corda faz um angulo dγ no centro;

• Seja N a forca normal actuando na corda por unidade de comprimentoem qualquer ponto.

QuadroNegro 4 - Corda enrolada num poste

142

Page 26: Mec^anica e Ondas fasc¶‡culo 8 - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Figure 3: (a) Dois blocos encontram-se ligados por meio de um cabo e s~ao puxados por uma for»ca aplicada F. O cabo

Considere uma corda de comprimento l enrolada em torno de um poste. Tem-se

Rγ = l

eT = To exp(

µl

R)

Por exemplo, uma corda enrolada com uma so volta em torno do poste, resultaem

γ =l

R= 2π

e seja µ = 0.40. Vem

T = To exp(0.40× 2π) = 12.3To

o que representa uma formidavel multiplicacao do esforco exercido pela tensaoda corda!

Exemplo 11: Forcas aerodinamicas 8: Equilıbrio de um aviao.

As forcas aerodinamicas exercem-se simetricamente sobre um aviao e sao medi-das em tuneis de vento criando um escoamento horizontal de velocidade deter-minada em torno de um prototipo imovel.

Como e ilustrado na Fig. 20 num objecto em voo (ex., aviao) actuam as seguintesforcas:

• forca de sustentacao,−→R

• forca de arrasto,−→F D;

• peso, −→w ;

• empuxo ou tracao,−→P

Em voo horizontal, a forca de sustentacao equilibra o peso, enquanto que a forcade arrasto deve ser equilibrada pela tracao.

Por convencao, as forcas aerodinamicas sao medidas em relacao ao eixo paraleloa velocidade de escoamento. O angulo de incidencia i (ou angulo de ataque) e oangulo que o vector velocidade de escoamento faz com o plano da asa (Fig. 20-(b)-(c)).

Suponhamos que a aeronave A-10 Thunderbolt utiliza o perfil de asas com ascaractersticas do grafico apresentado em Fig. 20. O A-10 Thunderbolt podetransportar grande quantidade de armamento. A area das asas e de S = 42m2. Calcule a forca de sustentaca do A-10 voando a 320 Km/h a uma altitude

8A materia exposta neste exemplo tem um caracter meramente informativo para resolvereste problema, nao precisa de a decorar para o exame.

143

Page 27: Mec^anica e Ondas fasc¶‡culo 8 - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Figure 3: (a) Dois blocos encontram-se ligados por meio de um cabo e s~ao puxados por uma for»ca aplicada F. O cabo

Figure 20: (a) Grafico do CL vs. angulo de ataque. (b) . (c) Forcas de sus-tentacao.

144

Page 28: Mec^anica e Ondas fasc¶‡culo 8 - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Figure 3: (a) Dois blocos encontram-se ligados por meio de um cabo e s~ao puxados por uma for»ca aplicada F. O cabo

proxima do nıvel do mar, com angulo de ataque de 0o (onde a densidade do are 1.22 Kg/m3.

Convertamos a rapidez: da 88 m/s. Lendo o grafico da Fig. 20, registamos CL a0o igual a cerca de 0.7. Ora, a forca de sustentacao da asa e dada pela formula:

FL =12ρV 2SCL, (8.41)

onde CL e o coeficiente de sustentacao do perfil da asa.

Introduzindo os valores numericos conhecidos na formula anterior, temos:

FL =121.22× 882 × 42× 0.07 = 13888.1N (8.42)

Isto e, temos uma forca capaz de sustentar um peso de cerca de 1300 kg, oumelhor, uma forca de cerca de para empurrar o aviao para cima. O aeorfolia comestas caracterısticas nao e capaz de empurrar o aviao A-10 para cima. Deve-seescolher outro tipo de asa!

Qual o CL necessario para que o aviao nao caia antes de tocar a pista, supondoque o aviao atinge a pista a 190 km/h?

O CL e dado por:

CL =2FL

ρV 2S.

FL deve ser exactamente igualado pelo peso da aeronave, pois no momento dopouso a aeronave toca o solo suavemente, quase em voo nivelado, e lembre-seque em voo nivelado as foras se equilibram. Verificamos assim:

CL =2× 13888.1

1.22× 532 × 42== .193

Observando o grafico, verificamos que este perfil nao atinge o CL necessario. OCL maximo ocorre quando o angulo de ataque e de cerca de 20o. A aeronaveira perder sustentacao e um acidente dramatico ocorrera...

Pode-se acrescentar : sao os “flaps” e os “Slats”. Os “flaps” distanam-se aaumentar a curvatura da asa (aumentando assim o CL), tornando desnecessariosatingir angulos de ataque elevados, proximos da perda de sustentacao, ou “stall”.Deste modo a aeronave pode voar em velocidades muito baixas para realizar umpouso seguro. Os “slats” corrigem o escoamento sobre a asa, obrigando a camadalimite a aderir ao aerofolio, e tornando possıvel a aeronave alcancar angulos deataque maiores.

Exemplo 12: Forca de sustentacao durante a re-entrada na atmosfera por umanave.

Neste exercıcio ilusttamos a aplicacao da forca centrıpeta num problema degrande importancia pratica.

145

Page 29: Mec^anica e Ondas fasc¶‡culo 8 - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Figure 3: (a) Dois blocos encontram-se ligados por meio de um cabo e s~ao puxados por uma for»ca aplicada F. O cabo

Table 1: Fracao do peso do veıculo mantido pela forca de sustentacao. Voo aaltitude constante.rapidez (milhas/s) 0 1 2 3 4 5 6 7

8FL/wg 0.96 0.84 0.64 0.36 0 -0.44 -1 -1.56

Mach number 0 4.8 9.6 14.4 19.2 24 29 3438.4

Faz mais de meio seculo que as aeronaves em voo nivelado foram desenhadospara obedecer a relacao simples:

Peso = forcadesustentacao.

Contudo, no que se refere a satelites temos que corrigir a linguagem, porque umsatelite com um voo nivelado teria uma trajectoria rectilınea, isto e, abandonariaa Terra ao longo da tangencial. Devemos entao modificar a equacao simplesanterior, tendo em atencao a curvatura da Terra. Temos que incluir uma novaforca (centrıpeta):

∑−→F = m v2

r−→n

−Rz + wg = m v2

r ∴ Rz = wg −m v2

r ,(8.43)

onde Rz representa a forca de sustentacao e wg o peso do satelite, ou seja:

Rz

wg= 1− v2

wgR. (8.44)

Desta expressao concluımos que a forca e dirigida para baixo a velocidades pe-quenas (relativamente a`quelas que normalmente sao atingidas pelos satelites),mas quando a nave atinge velocidades mais elevadas, a forca e dirigida paracima (no chamado “voo invertido”), Vd. Fig. 1. O uso da forca aerodinamicade sustentacao permite controlar o voo da nave, ou melhor, a re-entrada naatmosfera terrestre, aumentando tambem o tempo de voo.

Exemplo 13: Declive de subida em altitude de um aviao.

Como se ve pela Fig. 20, a forca de tracao (ou empuxo) e dada pela equacao:

T =12ρv2SCx (8.45)

e a forca de sustentacao e dada por

R =12ρv2SCz. (8.46)

A projecao das forcas que agem sobre o centro de massa do aviao conduz-nosde imediato a equacao de equilıbrio do aparelho:

T = R tan θ +12ρv2SCx. (8.47)

146

Page 30: Mec^anica e Ondas fasc¶‡culo 8 - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Figure 3: (a) Dois blocos encontram-se ligados por meio de um cabo e s~ao puxados por uma for»ca aplicada F. O cabo

Figure 21: (a) : formas e diferentes tipos de atritos gerados. A introducao doconceito de corpo de reentrada rombudo (“blunt-body”) foi criado por H. JulianAllen and A. J. Eggers, Jr. do “National Advisory Committee for Aeronautics”(NACA) em 1951. Eles descobriram que um corpo de reentrada rombudo era omais efectivo a criar um escudo termico, mostrando que a carga termica experi-mentada pelo veıculo de reentrada era inversamente proportional ao coeficientede atrito. Com a forma rombuda o ar nao consegue escapar rapidamente e actuacomo uma almofada que empurra a onda de choque e a camada limite termica(“heat shock layer”) para longe do veıculo. (b) : Reentrada directa ou maistangencial do veıculo espacial. (c) : Quatro imagens representando concepcoesiniciais dos veıculos de re-entrada na atmosfera. A teoria do corpo de reentradarombudo permitiu o “design” posteriormente utilizado nas capsulas espaciaisMercury, Gemini e Apollo, tornando possıvel a sobrevivencia dos astronautasdurante a reentrada da atmosfera terrestre.

147

Page 31: Mec^anica e Ondas fasc¶‡culo 8 - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Figure 3: (a) Dois blocos encontram-se ligados por meio de um cabo e s~ao puxados por uma for»ca aplicada F. O cabo

A manipulacao dessas duas equacoes leva-nos a expressao

T = P sin θ +12ρv2SCx. (8.48)

Isto significa que para fazer subir um aviao de peso P com um declive de altitudeϑ (medido em %) e necessaario que a tracao gerada pelo motor (a helice o, turbo-reactor ou motor foguetao,...) seja superior a forca de atrito (ou resistiva) naquantidade adicional Pϑ.

Pode-se mostrar que a Eq. 8.48 se escreve tambem na forma:

T

P= ϑ +

Cx

Cz. (8.49)

Questao: um aparelho possui a eficieencia das asas 0.1 e o racio tracao peso de0.3. Qual e o declive maximo que pode aingir na subida?

0.3 = ϑ + 0.1∴ ϑ = 0.2 (8.50)

isto e, pode subir com um declive maximo de 20 %, onde ϑ = sin θ, ou seja sobede 20 m cada 100 metros de percurso.

8.8 Trabalho e energia

As leis de Newton estabelecem uma relacao entre as forcas actuantes numapartıcula e a aceleracao resultante, tornando possıvel predizer quais sao os fu-turos valores da posicao e da velocidade da partıcula.

Veremos em seguida como relacionar a forca com o movimento da partıculaseguindo outro processo. Sabemos ja que o produto escalar da forca pelo deslo-camento define o trabalho e que o produto da massa pelo quadrado da veloci-dade da partıcula define o dobro da energia cinetica.

Ao combinarmos trabalho com energia cinetica obtemos o princıpio trabalho-energia. Este princıpio desempenha um papel analogo ao da 2a lei de Newton,mas tem a vantagem das quantidades serem escalares.

• Princıpio trabalho-energia → Conservacao da energia;

• (Forca)×∆t = impulso linear → Conservacao do momentum

• Forca × posicao → Conservacao do momento angular.

As simetrias desempenham um papel fundamental na construcao das teoriasfısicas (nao esquecendo, porem, que a fısica e uma ciencia experimental e re-quer permanentemente a sua confrontacao). Existe um teorema matematico que

148

Page 32: Mec^anica e Ondas fasc¶‡culo 8 - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Figure 3: (a) Dois blocos encontram-se ligados por meio de um cabo e s~ao puxados por uma for»ca aplicada F. O cabo

Table 2: Leis de conservacao e suas respectivas simetrias fısicas.Momentum translacao no espaco

Energia translacao no tempoMomentum angular invariancia por rotacao

Carga electrica desfasagem quanto-mecanica da fase1

estabelece uma relacao entre a existencia (ou nao) de certas simetrias na for-mulacao matematica da realidade fısica descrita pela teoria. As leis da naturezaestao contrangidas pelas simetrias.

As simetrias em fısica referem-se aos aspectos de um sistema fısico que ex-ibem a propriedade de simetria, isto e, sob certas transformacoes ha aspectosdesses sistemas que nao sao modificados quando observados de determinadomodo peculiar. A simetria de um sistema fısico e uma particularidade fısica oumatematica do sistema (que resulta da observacao mas que tambem pode serintrınseco) que e preservado sob determinada transformacao. As transformacoespodem ser contınuas (por exemplo, rotacao de um cırculo), ou discreta (porexemplo, reflexao de uma figura simetrica bilateralmente, ou rotacao de umpolıgono regular).

O teorema de Emmy Noether (Fig. 22) estabelece que para qualquer simetriacontınua de uma teoria fısica existe uma quantidade fısica que se conserva, quenao varia com o tempo.

8.9 Trabalho a 1-dim

Uma forca Fx actuando sobre uma partıcula movendo-se ao longo de Ox realizaa quantidade de trabalho W :

W = Fx∆x, (8.51)

onde ∆x denota o deslocamento da partıcula. No Sistema SI a unidade fısica eo Joule (J).

• W > 0 : a forca e o deslocamento estao na mesma direcao (operadorexterno exercendo a forca);

• W < 0 : a forca e o deslocamento estao opostos;

• W < 0 : representa o trabalho feito pela partıcula.

O trabalho depende do referencial onde e calculado, como pode depreender dafig. 23.

149

Page 33: Mec^anica e Ondas fasc¶‡culo 8 - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Figure 3: (a) Dois blocos encontram-se ligados por meio de um cabo e s~ao puxados por uma for»ca aplicada F. O cabo

Figure 22: Emmy Noether (1882-1935) foi a primeira mulher a tornar-se numamatematica na Alemanha, donde era natural. Ela teve que obter uma autor-izacao especial para poder assistir as aulas na universidade e nao podia ensinarestudantes. Na verdade acabou por ensinar, mas usando o nome do seu colega,e excepcional matematico, David Hilbert.

150

Page 34: Mec^anica e Ondas fasc¶‡culo 8 - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Figure 3: (a) Dois blocos encontram-se ligados por meio de um cabo e s~ao puxados por uma for»ca aplicada F. O cabo

Figure 23: O trabalho depende do referencial. (a) homem-aranha com bola noreferencial do elevador: nao ha trabalho realizado. (b) homem-aranha visto doreferencial (exterior) do laboratorio: ha trabalho realizado.

8.10 Forca variavel, trabalho

Vamos supor que a forca e uma funcao da posicao, Fx = Fx(x). A questaoque nos colocamos neste momento e: qual e o trabalho realizado W (a → b) aodeslocar-se uma partıcula de x = a para x = b?

Para o calcular o metodo consiste no seguinte: divide-se o deslocamento totalnum numero muito grande de pequenos intervalos ∆x. Para cada intervalotem-se

∆WiFx(xi)∆xi, (8.52)

que corresponde a area do rectangulo de altura Fx e largura ∆xi (Fig. 24).

O trabalho total efectuado ao deslocar-se a partıcula de a para b e a soma detodos os pequenos intervalos:

W = lim∆x→0

i

Fx(xi)∆xi (8.53)

isto e,

W =∫ b

a

Fx(x)dx (8.54)

que representa um integral definido e onde Fx(x)dx representa o integrando.

151

Page 35: Mec^anica e Ondas fasc¶‡culo 8 - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Figure 3: (a) Dois blocos encontram-se ligados por meio de um cabo e s~ao puxados por uma for»ca aplicada F. O cabo

Figure 24: O deslocamento total de a para b e dividido em pequenos intervalosde largura ∆x.

O trabalho e igual a area delimitada pela curva Fx(x) e pelas linhas situadasem x = a e x = b.

Exemplo 14: Forca de uma mola. Qual a quantidade de trabalho que enecessario efectuar para mover a mola (fixo numa das extremidades) de x = aate x = b?

F = −kx

W =∫ b

aF (x)dx = intba(−kx)dx

= −kx2

2 |ba−k

2 (b2 − a2)(8.55)

W < 0, isto e, realiza-se trabalho sobre a mola quando ela e distendida.

8.11 Trabalho em 3-dim

Em geral,W = (

−→F ·∆−→r )

F (∆r) cos θ(8.56)

Verifica-se de imediato que quando−→F ⊥∆−→r → W = 0.

152

Page 36: Mec^anica e Ondas fasc¶‡culo 8 - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Figure 3: (a) Dois blocos encontram-se ligados por meio de um cabo e s~ao puxados por uma for»ca aplicada F. O cabo

A projecao nas suas componentes resulta em

W = Fx(∆x) + Fy(∆y) + Fz(∆z). (8.57)

Se F = F (x) depende da posicao, entao o procedimento utilizado na Sec. 8.10pode ser empregue.

Temos

∆W =∫ P2

P1

−→F · d−→r . (8.58)

que e um integral de linha. Decomposto nas suas componentes cartesianastemos

W =∫ P2

P1(Fxdx + Fydy + Fzdz)

= W =∫ P2

P1Fxdx +

∫ P2

P1Fydy +

∫ P2

P1Fzdz

(8.59)

Exemplo 15: Forca gravitacional.

Uma partıcula algures no sistema solar e atraıda por todas as outras do sistemacom uma forca

−→F que varia em modulo e direcao de posicao para posicao.

Portanto,−→F e uma funcao vectorial dependente da posicao:

−→F = Fx

−→i + Fy

−→j + Fz

−→k . (8.60)

Este exemplo ilustra muito bem a ideia geral que se tem de um campo deforcas.

A forca gravitacional na proximidade da superfıcie terrestre tem as seguintescomponentes cartesianas:

Fx = 0Fy = 0

Fz = −mg(8.61)

W =∫ x2

x1

Fxdx +∫ y2

y1

Fydy +∫ z2

z1

Fzdz. (8.62)

W =∫ z2

z1

(−mg)dz = −mg(z2 − z1) = −mg(∆z) (8.63)

onde ∆z representa a variacao em altura.

Conclui-se que o trabalho efectuado pela gravidade depende da distancia verticalentre dois pontos P1 e P2. E irrelevante o caminho (mais ou menos) complicadoque levou o objecto de massa m de um ponto ao outro; so interessa a distancia∆z!

Exemplo 16: Um bloco e empurrado ao longo de um plano horizontal comvelocidade constante. O coeficiente de fricao cinetico e µk. Qual o trabalhorealizado ao exercer a forca F ao longo da distancia s?

153

Page 37: Mec^anica e Ondas fasc¶‡culo 8 - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Figure 3: (a) Dois blocos encontram-se ligados por meio de um cabo e s~ao puxados por uma for»ca aplicada F. O cabo

Figure 25: Bloco empurrado num plano horizontal a velocidade constante.

F cos θ − f = 0−F sin θ + N −mg = 0 (8.64)

donde obtemosf = µkN = µk(F sin θ + mg) (8.65)

∴ F cos θ − µk(F sin θ + mg) = 0 (8.66)

∴ F =µkmg

cos θ − µk sin θ(8.67)

O trabalho e dado pelo produto

WF = (−→F · d−→s ) (8.68)

porque F e constante, e finalmente

WF = Fs cos θ =µkmgs

1− µk tan θ(8.69)

O resultado anterior possui uma singularidade quando µk tan θ = 1, i.e.,

tan θ =1µk

⇒ W →∞.

Exemplo 17: Trabalho efectuado sobre um astronauta.

154

Page 38: Mec^anica e Ondas fasc¶‡culo 8 - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Figure 3: (a) Dois blocos encontram-se ligados por meio de um cabo e s~ao puxados por uma for»ca aplicada F. O cabo

Qual e o trabalho realizado pela forca da gravidade sobre um astronauta de 80kg ao desloca-lo do ponto A sobre a superfıcie terrestre ate ao ponto B a umaaltitude de 2RT (RT e o raio terrestre).

−→F = −−GmT m

r2−→u r (8.70)

W = − ∫ 3RT

RT

GmT mr2 dr∫

1r2 dr = − 1

r

(8.71)

W = +GmT m

r|3RT

RT= GmT m

(1

3RT− 1

RT

)= −2

3GmT m

RT= −2

3mgRT

(8.72)E realizado um trabalho de valor negativo porque a forca e dirigida na direcaodo centro da Terra, mas o deslocamento e dirigido radialmente para fora daTerra.

W = −3.34× 109J.

Podemos referir como curiosidade que em torno de dois corpos massivos sujeitosao campo gravıtico mutuo, existem 5 posicoes do espaco onde uma terceiramassa m3 mais pequena pode orbitar a distancia fixa de ambos. Sao chamadospontos de Lagrange porque foram descobertos pelo matematico fraco-italianoJoseph-Louis Lagrange. Os Pontos de Lagrange sao pontos onde a resultanteda atracao gravitacional exercida por ambos os corpos compensa exactamentea forca centrıpeta necessaria para rodar com eles.

Dos 5 Pontos de Lagrange, 3 sao instaveis e 2 sao estaveis. Na Fig. 26 os pontosL1, L2 e L3 sao instaveis; os pontos L4 e L5 sao pontos estaveis.

O ponto L1 do sitema Terra-Sol permite colocar um satelite em permanenteobservacao do Sol e e onde se encontra actualmente “Solar and HeliosphericObservatory Satellite” (SOHO). No ponto L2 do sistema Terra-Sol encontra-se a nave “WMAP” (e provavelmente no ano 2011 sera tambem aı colocado o“James Webb Space Telescope”. Os pontos L1 e L2 sao instaveis numa escala detempo de 23 dias mas, apesar disso, sao utilizados pelos satelites com frequenciapara correcoes de atitude. O ponto L3 nao tem sido utilizado porque situa-sepor detras do Sol. Apesar de ser um ponto instavel numa escala de tempo de150 anos, tem sido referido nos escritos de ficao cientıfica como o ponto onde seencontra ocultado o “Planet-X”.

Conhecem-se apesar de tudo a presenca de 2 satelites “trojans” nos dois pontosde Lagrange L4 e L5 acima referidos. Esses satelites Trojanos sao Telesto eCalypso.

155

Page 39: Mec^anica e Ondas fasc¶‡culo 8 - fenix.tecnico.ulisboa.pt · Figure 3: (a) Dois blocos encontram-se ligados por meio de um cabo e s~ao puxados por uma for»ca aplicada F. O cabo

Figure 26: Na presenca de dois corpos massivos exercendo uma forca gravita-cional mutua existem 5 Pontos de Lagrange.

156