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  • 1

    DIREITO CIVIL

    PARTE GERAL

    PROF.: PABLO STOLZE GAGLIANO

    PARTE GERAL

    TEMAS: BENS JURDICOS (NOES GERAIS), O

    TRATAMENTO LEGAL E JURISPRUDENCIAL DO BEM DE

    FAMLIA: VISO JURDICA APLICADA AOS CONCURSOS

    PBLICOS

    1. Bens Jurdicos: Conceito

    Os bens jurdicos podem ser definidos como toda a utilidade

    fsica ou ideal, que seja objeto de um direito subjetivo.

    Preferimos, na linha do Direito Alemo, identificar a coisa sob o

    aspecto de sua materialidade, reservando o vocbulo aos objetos

    corpreos1.

    Os bens, por sua vez, compreenderiam os objetos corpreos ou

    materiais (coisas) e os ideais (bens imateriais). Dessa forma, h bens

    jurdicos que no so coisas: a liberdade, a honra, a integridade moral,

    a imagem, a vida.

    Ressaltamos, no entanto, que tal questo no pacfica na

    doutrina, dependendo do pensamento de cada autor.

    2. Reviso de alguns conceitos bsicos

    BENS CONSIDERADOS EM SI MESMOS

    1 De fato, nos termos do 90 do Cdigo Civil alemo (BGB), s os objetos corpreos so coisas em sentido jurdico: Begriff der Sache. Sachen im Sinne des Gesetzes sind nur krperliche Gegenstnde.

  • 2

    Bens imveis so aqueles que no podem ser transportados de

    um lugar para outro sem alterao de sua substncia (um terreno).

    Bens mveis so os passveis de deslocamento, sem quebra ou

    fratura (um computador, v.g.). Os bens suscetveis de movimento

    prprio, enquadrveis na noo de mveis, so chamados de

    semoventes (um cachorro, v.g.).

    No Cdigo Civil:

    Art. 79. So bens imveis o solo e tudo quanto se lhe incorporar

    natural ou artificialmente.

    Art. 80. Consideram-se imveis para os efeitos legais:

    I os direitos reais sobre imveis e as aes que os asseguram;

    II o direito sucesso aberta.

    OBS.:

    Importantes efeitos derivam da natureza imobiliria do direito

    sucesso aberta, a exemplo da necessidade, apontada por parcela

    respeitvel da doutrina, de se exigir a outorga uxria do cnjuge do

    renunciante, no bojo do inventrio, por se considerar que a renncia,

    no caso, opera-se de forma semelhante alienao de um imvel,

    exigindo a vnia conjugal para aqueles que no casaram no regime

    da separao absoluta de bens (art. 1647). Sobre o tema, tivemos a

    oportunidade de escrever:

    Outro aspecto a considerar que respeitvel parcela da

    doutrina sustenta a necessidade do consentimento do outro

    cnjuge do renunciante2.

    Nesse sentido, FRANCISCO CAHALI preleciona que:

    2 GAGLIANO, Pablo Stolze e PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil v. I, cit., p. 289-290.

  • 3

    Tratando a sucesso aberta como imvel (CC-16, art.

    44, III) a renncia herana depende do

    consentimento do cnjuge, independentemente do

    regime de bens adotado (CC-16, arts. 235, 242, I e

    II). Considera-se que a ausncia do consentimento

    torna o ato anulvel, uma vez passvel de ratificao

    (RT 675/102)3.

    Embora se possa imaginar que essa autorizao do

    cnjuge necessria para todo tipo de renncia inclusive a

    abdicativa, em que o herdeiro se despoja de seu quinho em

    benefcio de todo o monte partvel, indistintamente , entendemos

    que tal formalidade s necessria em se tratando da renncia

    translativa, analisada acima, hiptese em que o herdeiro renuncia

    em favor de determinada pessoa, praticando, com o seu

    comportamento, verdadeiro ato de cesso de direitos. E tanto assim

    que, como dissemos, nesta ltima hiptese, incidiro dois tributos

    distintos: o imposto de transmisso mortis causa (em face da

    transferncia dos direitos do falecido para o herdeiro/cedente) e o

    imposto de transmisso inter vivos (em face da transferncia dos

    direitos do herdeiro/cedente para outro herdeiro ou

    terceiro/cessionrio). Deve, pois, nesse particular, estar o juiz atento,

    para evitar sonegao tributria.

    Cumpre registrar ainda haver entendimento no sentido de

    no ser exigvel a autorizao do outro cnjuge para a renncia de

    direitos hereditrios.

    a posio de MARIA HELENA DINIZ, para quem,

    a pessoa casada pode aceitar ou renunciar herana

    ou legado independentemente de prvio

    3 CAHALI, Francisco Jos e HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. Curso avanado de direito civil, v. 6, cit., p. 102.

  • 4

    consentimento do cnjuge, apesar do direito

    sucesso aberta ser considerado imvel para efeitos

    legais, ante a redao dada ao art. 242 do Cdigo

    Civil pela Lei n. 4.121/62 (RT, 605:38, 538:92,

    524:207).

    Entretanto, considerando que o direito sucesso aberta

    tratado como sendo de natureza imobiliria (art. 44, III), foroso

    convir assistir razo a FRANCISCO CAHALI, quando demonstra a

    necessidade da outorga4.

    Posto isso, voltemos anlise do Cdigo Civil:

    Art. 81. No perdem o carter de imveis:

    I as edificaes que, separadas do solo, mas conservando a sua

    unidade, forem removidas para outro local;

    II os materiais provisoriamente separados de um prdio, para nele se

    reempregarem.

    Art. 82. So mveis os bens suscetveis de movimento prprio, ou de

    remoo por fora alheia, sem alterao da substncia ou da

    destinao econmico-social.

    Art. 83. Consideram-se mveis para os efeitos legais:

    I as energias que tenham valor econmico;

    II os direitos reais sobre objetos mveis e as aes

    correspondentes;

    4 GAGLIANO, Pablo Stolze. O Contrato de Doao Anlise Crtica do Atual Sistema Jurdico e os seus Efeitos no Direito de Famlia e das Sucesses. Saraiva, 2007.

  • 5

    III os direitos pessoais de carter patrimonial e respectivas aes.

    Art. 84. Os materiais destinados a alguma construo, enquanto no

    forem empregados, conservam sua qualidade de mveis; readquirem

    essa qualidade os provenientes da demolio de algum prdio.

    Bens fungveis so aqueles que podem ser substitudos por

    outros da mesma espcie, qualidade e quantidade (dinheiro por ex.).

    Bens infungveis por sua vez, so aqueles de natureza

    insubstituvel. Exemplo: uma obra de arte.

    No Cdigo Civil:

    Art. 85. So fungveis os mveis que podem substituir-se por outros

    da mesma espcie, qualidade e quantidade.

    Bens consumveis so os bens mveis cujo uso importa

    destruio imediata da prpria substncia, bem como aqueles

    destinados alienao (um sanduche).

    Bens inconsumveis so aqueles que suportam uso

    continuado (um avio, um carro).

    No Cdigo Civil:

    Art. 86. So consumveis os bens mveis cujo uso importa destruio

    imediata da prpria substncia, sendo tambm considerados tais os

    destinados alienao.

    Obs:

    O Cdigo de Defesa do Consumidor adotou a classificao de bens

    durveis e no-durveis, para efeito de se exercer o direito

    potestativo de reclamar pelos vcios qualidade do produto ou do servio

  • 6

    (art. 26 para os durveis, prazo de 90 dias; para os no-durveis,

    prazo de 30 dias)5.

    Bens divisveis so os que se podem repartir em pores

    reais e distintas, formando cada uma delas um todo perfeito (uma

    saca de caf).

    Bens indivisveis no admitem diviso cmoda sem

    desvalorizao ou dano (um cavalo).

    No Cdigo Civil:

    Art. 87. Bens divisveis so os que se podem fracionar sem alterao

    na sua substncia, diminuio considervel de valor, ou prejuzo do

    uso a que se destinam.

    Art. 88. Os bens naturalmente divisveis podem tornar-se indivisveis

    por determinao da lei ou por vontade das partes.

    Bens singulares so coisas consideradas em sua

    individualidade, representadas por uma unidade autnoma e, por

    isso, distinta de quaisquer outras (um lpis, um livro).

    Bens coletivos ou universalidades so aqueles que, em

    conjunto, formam um todo homogneo (universalidade da fato um

    rebanho, uma biblioteca; universalidade de direito o patrimnio, a

    herana).

    No Cdigo Civil:

    5 Sobre a interessante questo envolvendo os prazos decadenciais do CDC, confira o artigo que publicamos, disponvel no http://www.pablostolze.com.br/upload/121911842_139071_178599.pdf

  • 7

    Art. 89. So singulares os bens que, embora reunidos, se consideram

    de per si, independentemente dos demais.

    Art. 90. Constitui universalidade de fato a pluralidade de bens

    singulares que, pertinentes mesma pessoa, tenham destinao

    unitria.

    Pargrafo nico. Os bens que formam essa universalidade podem ser

    objeto de relaes jurdicas prprias.

    Art. 91. Constitui universalidade de direito o complexo de relaes

    jurdicas, de uma pessoa, dotadas de valor econmico.

    BENS RECIPROCAMENTE CONSIDERADOS

    Principal - o bem que existe sobre si, abstrata ou

    concretamente (a rvore em relao ao fruto).

    Acessrio o bem cuja existncia supe a do principal (fruto

    em relao rvore)

    So bens acessrios:

    a) os frutos trata-se das utilidades renovveis, ou seja, que a

    coisa principal periodicamente produz, e cuja percepo no

    diminui a sua substncia (caf, soja, laranja).6

    Classificam-se em:

    Quanto sua natureza:

    a) naturais so gerados pelo bem principal sem

    necessidade da interveno humana direta

    (laranja, caf);

    6 Voltaremos ao tema, especialmente no que tange classificao dos frutos, em nossas aulas de Direitos Reais.

  • 8

    b) industriais so decorrentes da atividade

    industrial humana (bens manufaturados);

    c) civis so utilidades que a coisa frugfera

    periodicamente produz, viabilizando a percepo

    de uma renda (juros, aluguel).

    Quanto ligao com a coisa principal:

    a) colhidos ou percebidos so os frutos j

    destacados da coisa principal, mas ainda

    existentes;

    b) pendentes so aqueles que ainda se encontram

    ligados coisa principal, no tendo sido,

    portanto, destacados;

    c) percipiendos so aqueles que deveriam ter sido

    colhidos mas no o foram;

    d) estantes so os frutos j destacados, que se

    encontram estocados e armazenados para a

    venda;

    e) consumidos: que no mais existem;

    b) os produtos trata-se de utilidades no-renovveis, cuja

    percepo diminui a substncia da coisa principal (carvo

    extrado de uma mina esgotvel).

    c) os rendimentos - so frutos civis, como os juros e o

    aluguel.

    d) as pertenas trata-se das coisas que, sem integrarem a

    coisa principal, facilitam a sua utilizao, a exemplo do

    aparelho de ar condicionado (art. 93 do CC).

    e) as benfeitorias trata-se de toda obra realizada pelo

    homem na estrutura de uma coisa, com o propsito de

  • 9

    conserv-la (benfeitoria necessria ex.: reforma em uma

    viga), melhor-la (benfeitoria til abertura do vo de

    entrada da casa) ou embelez-la (benfeitoria volupturia

    uma escultura talhada na parede de pedra do imvel). Vide

    arts. 96 e 97 do CC. No se confundem com as acesses,

    tema que ser desenvolvido em nossas aulas de Direitos

    Reais.

    f) as partes integrantes integra a coisa principal de maneira

    que a sua separao prejudicar a fruio do todo, ou seja,

    a utilizao do bem jurdico principal (ex.: a lmpada em

    relao ao lustre).

    BENS PBLICOS7 E PARTICULARES

    Quanto ao titular do domnio, os bens podero ser pblicos (uso

    comum do povo, uso especial e dominiais) ou particulares.

    Os bens pblicos so estudados pelo Direito Administrativo.

    No Cdigo Civil:

    Art. 98. So pblicos os bens do domnio nacional pertencentes s

    pessoas jurdicas de direito pblico interno; todos os outros so

    particulares, seja qual for a pessoa a que pertencerem.

    Art. 99. So bens pblicos:

    I - os de uso comum do povo, tais como rios, mares, estradas, ruas e

    praas;

    7 Tema desenvolvido no Direito Administrativo.

  • 10

    II - os de uso especial, tais como edifcios ou terrenos destinados a

    servio ou estabelecimento da administrao federal, estadual,

    territorial ou municipal, inclusive os de suas autarquias;

    III - os dominicais, que constituem o patrimnio das pessoas jurdicas

    de direito pblico, como objeto de direito pessoal, ou real, de cada

    uma dessas entidades.

    Pargrafo nico. No dispondo a lei em contrrio, consideram-se

    dominicais os bens pertencentes s pessoas jurdicas de direito

    pblico a que se tenha dado estrutura de direito privado.

    Art. 100. Os bens pblicos de uso comum do povo e os de uso

    especial so inalienveis, enquanto conservarem a sua qualificao,

    na forma que a lei determinar.

    Art. 101. Os bens pblicos dominicais podem ser alienados,

    observadas as exigncias da lei.

    Art. 102. Os bens pblicos no esto sujeitos a usucapio.

    Art. 103. O uso comum dos bens pblicos pode ser gratuito ou

    retribudo, conforme for estabelecido legalmente pela entidade a cuja

    administrao pertencerem.

    Questo de Concurso:

    admissvel a posse de bem pblico?

    Responde-nos, com erudio, o professor ARRUDA ALVIM:

    preciso ter presente que, ao afirmar-se que o objeto da

    posse est limitado s coisas corpreas, no quer isso dizer --

    --- em alguns sistemas jurdicos ----- que todas as coisas

  • 11

    corpreas, 8 inclusive as sediadas no plano do direito pblico,

    afetadas a pessoas jurdicas de direito pblico, so suscetveis

    de posse por particulares ou no plano do direito privado.

    No direito brasileiro, todavia, essa afirmao no

    verdadeira, de que no pode haver posse de particulares

    sobre bem/coisa pblica. 9 O que se deve remarcar -----

    como assunto correlato ----- que pela Constituio Federal

    de 1988 os imveis pblicos so insuscetveis de usucapio

    (art. 191, pargrafo nico; no mesmo texto, com o mesmo

    sentido, art. 183, 3). Ou seja, o que se passa a inaptido

    do imvel pblico para ser objeto de usucapio, ainda que

    possa existir ou ter existido posse de particular sobre esse

    imvel.10

    3. O Bem de Famlia

    O bem de famlia voluntrio, disciplinado a partir do art.

    1711 do CC, aquele institudo por ato de vontade do casal, da

    entidade familiar ou de terceiro11, mediante registro pblico.

    8 V., com profundidade, Moreira Alves, Posse Estudo Dogmtico, 2. ed., 1. tiragem, Rio de Janeiro, Forense, 1991, vol. II, tomo I, n 13, a respeito do que pode ser objeto de posse, especialmente pp. 160 e ss (As coisas que podem ser objeto de posse). 9 V. Moreira Alves, ob ult. cit., vol. II, tomo I, n 13, pp. 168-171, especialmente, onde est referida legislao em que , expressamente, admitida a posse de determinados bens pblicos, dentro do contexto do sistema constitucional anterior, i.e., Emenda Constituio 1/69. 10 Texto que nos foi gentilmente cedido, de obra ainda indita. Trata-se de matria de alta complexidade (ver, em sentido diverso, o Resp. 489.732/DF). Voltaremos a esta temtica no mdulo de Direitos Reais. 11 O pargrafo do art. 1711 traz outra novidade para o ordenamento jurdico brasileiro, inspirada no Cdigo Civil Italiano de 1942. Concede ele a possibilidade de

  • 12

    J o bem de famlia legal reconhecido pela Lei n. 8009 de

    1990, independentemente de inscrio em cartrio.

    Essa espcie legal, disciplinada pela Lei n. 8009/90, traduz

    a impenhorabilidade do imvel residencial prprio do casal, ou da

    entidade familiar, isentando-o de dvidas civil, comercial, fiscal,

    previdenciria ou de qualquer natureza, contrada pelos cnjuges ou

    pelos pais ou filhos que sejam seus proprietrios e nele residam,

    ressalvadas as hipteses previstas em lei.

    Tal iseno compreende o imvel sobre o qual se assentam

    a construo, as plantaes, as benfeitorias de qualquer natureza e

    todos os equipamentos, inclusive os de uso profissional, ou mveis

    que guarneam a casa, desde que quitados (art. 1, pargrafo

    nico).

    O STJ, no entanto, tem admitido o desmembramento do bem

    de famlia, para efeito de penhora (consoante jurisprudncia

    selecionada, item 4 desta apostila).

    A impenhorabilidade, como dispe o art. 3 da Lei n. 8009/90,

    oponvel em qualquer processo de execuo civil, fiscal,

    previdenciria, trabalhista, ou de outra natureza, salvo se movido

    (excees impenhorabilidade legal):

    a) em razo de crditos de trabalhadores da prpria

    residncia (trabalhadores domsticos ou contratados

    diretamente para pequenas reformas pelo dono do

    imvel) e das respectivas contribuies previdencirias;

    terceiro instituir o bem de famlia por meio de doao ou disposio testamentria, a depender, a eficcia do ato, da expressa aceitao de todos os beneficiados (RITONDO, Domingos Pietrangelo. Bem de Famlia. Rio de Janeiro: Elsevier, 2008, pg. 50).

  • 13

    b) pelo titular do crdito decorrente do financiamento

    destinado construo ou aquisio do imvel, no

    limite dos crditos e acrscimos constitudos em funo

    do respectivo contrato;

    c) pelo credor de penso alimentcia;

    d) para a cobrana de impostos, predial ou territorial,

    taxas e contribuies devidas em funo do imvel

    familiar;

    e) para a execuo de hipoteca sobre o imvel, oferecido

    como garantia real pelo casal ou pela entidade familiar;

    f) por ter sido adquirido com produto de crime ou para a

    execuo de sentena penal condenatria a

    ressarcimento, indenizao ou perdimento de bens;

    g) por obrigao decorrente de fiana concedida em

    contrato de locao.

    Sobre a penhorabilidade do bem de famlia em virtude de

    cobrana de despesa condominial, h entendimendo do STF no

    sentido de que:

    RE 439003 / SP - SO PAULO

    RECURSO EXTRAORDINRIO

    Relator(a): Min. EROS GRAU

    Julgamento: 06/02/2007 rgo Julgador: Segunda

    Turma

    Publicao

    DJ 02-03-2007

    Parte(s)

    RECTE.(S) : ANA MARIA BRAGA DE NARDI

    ADV.(A/S) : ONEI RAPHAEL PINHEIRO ORICCHIO E OUTRO(A/S)

  • 14

    RECDO.(A/S) : CONDOMNIO EDIFCIO BRAGANA

    ADV.(A/S) : MILTON MARTINS MALVASI E OUTRO(A/S)

    Ementa

    EMENTA: RECURSO EXTRAORDINRIO. BEM DE FAMLIA.

    PENHORA. DECORRNCIA DE DESPESAS CONDOMINIAIS. 1. A

    relao condominial , tipicamente, relao de comunho de

    escopo. O pagamento da contribuio condominial [obrigao

    propter rem] essencial conservao da propriedade, vale

    dizer, garantia da subsistncia individual e familiar --- a

    dignidade da pessoa humana. 2. No h razo para, no caso,

    cogitar-se de impenhorabilidade. 3. Recurso extraordinrio a

    que se nega provimento.

    Vale lembrar ainda que o plenrio do STF reputou,

    lamentavelmente em nosso sentir (conforme veremos em sala de

    aula), constitucional a penhora do bem de famlia do fiador na

    locao: RE 352.940-4 So Paulo, contrariando a posio do

    Min. CARLOS VELLOSO, em deciso monocrtica, no bojo do

    referido processo.

    E tal entendimento tem se fortalecido, na Corte Suprema:

    RE-AgR 477953 / SP - SO PAULO

    AG.REG.NO RECURSO EXTRAORDINRIO

    Relator(a): Min. EROS GRAU

    Julgamento: 28/11/2006 rgo Julgador: Segunda

    Turma

    Ementa EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINRIO. PENHORA. FIADOR. BEM DE FAMLIA. LEGITIMIDADE. 1. O Plenrio do Supremo Tribunal Federal, ao

  • 15

    julgar o RE n. 407.688, decidiu pela possibilidade de penhora do bem de famlia de fiador, sem violao do art. 6 da Constituio do Brasil. Agravo regimental a que se nega provimento.

    4. Jurisprudncia Selecionada

    BEM DE FAMLIA E DEVEDOR SOLTEIRO

    "PROCESSUAL EXECUO - IMPENHORABILIDADE IMVEL -

    RESIDNCIA DEVEDOR SOLTEIRO E SOLITRIO LEI 8.009/90.

    - A interpretao teleolgica do Art. 1, da Lei 8.009/90, revela que a

    norma no se limita ao resguardo da famlia. Seu escopo definitivo

    a proteo de um direito fundamental da pessoa humana: o direito

    moradia. Se assim ocorre, no faz sentido proteger quem vive em

    grupo e abandonar o indivduo que sofre o mais doloroso dos

    sentimentos: a solido.

    - impenhorvel, por efeito do preceito contido no Art. 1 da Lei

    8.009/90, o imvel em que reside, sozinho, o devedor

    celibatrio."(EREsp 182.223-SP, Corte Especial, DJ de 07/04/2003).

    (REsp 450989/RJ, Rel. Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS,

    TERCEIRA TURMA, julgado em 13.04.2004, DJ 07.06.2004 p. 217)

    BEM DE FAMLIA E IMVEL LOCADO

    BEM DE FAMLIA IMVEL LOCADO IMPENHORABILIDADE

    INTERPRETAO TELEOLGICA DA LEI N 8.009/90.

  • 16

    O fato de o nico imvel residencial vir a ser alugado no o desnatura

    como bem de famlia, quando comprovado que a renda auferida

    destina-se subsistncia da famlia.

    Recurso especial provido.

    (REsp 439920/SP, Rel. Ministro CASTRO FILHO, TERCEIRA

    TURMA, julgado em 11.11.2003, DJ 09.12.2003 p. 280)

    APLICAO DA LEI 8009/90 A DVIDAS ANTERIORES

    A LEI 8.009/90 APLICA-SE A PENHORA REALIZADA ANTES DE

    SUA VIGENCIA.

    (SMULA 205, STJ - CORTE ESPECIAL, julgado em 01.04.1998,

    DJ 16.04.1998 p. 43)

    RE497850 / SP - SO PAULO RECURSO EXTRAORDINRIO Relator(a): Min. SEPLVEDA PERTENCE Julgamento: 26/04/2007 rgo Julgador: Primeira Turma

    Ementa EMENTA: I. Bem de famlia: impenhorabilidade legal (L. 8.009/90): aplicao dvida constituda antes da vigncia da L. 8.009/90, sem ofensa de direito adquirido ou ato jurdico perfeito: precedente (RE 136.753, 13.02.97, Pertence, DJ 25.04.97). 1. A norma que torna impenhorvel determinado bem desconstitui a penhora anteriormente efetivada, sem ofensa de ato jurdico perfeito ou de direito adquirido do credor. 2. Se desconstitui as penhoras efetivadas antes da sua vigncia, com maior razo a lei que institui nova hiptese de impenhorabilidade incide sobre a que se pretenda realizar sob a sua vigncia, independentemente da data do negcio subjacente ao crdito exeqendo. II. Recurso extraordinrio: descabimento: a caracterizao ou no do imvel como bem de famlia questo de fato, decidida pelas instncias de mrito luz da prova, a cujo reexame no se presta o RE: incidncia da Smula 279. III. Alegaes improcedentes de negativa de prestao jurisdicional e inexistncia de motivao do acrdo recorrido.

  • 17

    RENNCIA DA IMPENHORABILIDADE LEGAL DO BEM DE

    FAMLIA12

    PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTRIO. EXECUO FISCAL. BEM

    DE FAMLIA OFERECIDO PENHORA. RENNCIA AO BENEFCIO

    ASSEGURADO PELA LEI.

    8.009/90. IMPOSSIBILIDADE.

    1. A indicao do bem de famlia penhora no implica em

    renncia ao benefcio conferido pela Lei 8.009/90, mxime por tratar-se

    de norma cogente que contm princpio de ordem pblica, consoante a

    jurisprudncia assente neste STJ.

    2. Dessarte, a indicao do bem penhora no produz efeito

    capaz de elidir o benefcio assegurado pela Lei 8.009/90. Precedentes:

    REsp 684.587 - TO, Relator Ministro ALDIR PASSARINHO JUNIOR,

    Quarta Turma, DJ de 13 de maro de 2005; REsp 242.175 - PR, Relator

    Ministro RUY ROSADO DE AGUIAR, Quarta Turma, DJ de 08 de maio de

    2.000; REsp 205.040 - SP, Relator Ministro EDUARDO RIBEIRO, Terceira

    Turma, DJ de 15 de abril de 1.999) 3. As excees impenhorabilidade

    devem decorrer de expressa previso legal.

    4. Agravo Regimental provido para dar provimento ao Recurso

    Especial.

    12 Recentemente, fora veiculada notcia de acrdo do TJDFT admitindo a renncia do bem de famlia: Ao proferir seu voto, a relatora da 1 Turma Cvel do TJ-DFT, desembargadora Vera Andrighi registra que a Lei n 8.009/90 no constitui norma de ordem pblica - natureza atribuda apenas ao direito social de moradia, assegurado pela Constituio". Refere mais que "a legislao se trata, portanto, de direito disponvel da parte, no qual vlido o exerccio do direito de renncia impenhorabilidade, inexistindo bice penhora efetivada sobre o imvel. O acrdo afirma que no momento da formao do negcio jurdico, a contratante, de acordo com seus interesses ou necessidades para efetivao do contrato, renunciou impenhorabilidade, atribuindo ao outro contratante a garantia para a negociao. A deciso foi unnime (confira a ntegra da notcia no http://www.espacovital.com.br/noticia_ler.php?idnoticia=12149, acessado em 17 de agosto de 2008).

  • 18

    (AgRg no REsp 813.546/DF, Rel. Ministro FRANCISCO

    FALCO, Rel. p/ Acrdo Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado

    em 10.04.2007, DJ 04.06.2007 p. 314)

    PROCESSUAL CIVIL. EXECUO. EMBARGOS. RECURSO

    ESPECIAL.

    PREQUESTIONAMENTO INSUFICIENTE. SMULA N. 211-STJ.

    BEM DE FAMLIA.

    NICO BEM. RENNCIA INCABVEL. PROTEO LEGAL. NORMA

    DE ORDEM PBLICA. LEI N. 8.009/90.

    I. "Inadmissvel recurso especial quanto questo que, a

    despeito da oposio de embargos declaratrios, no foi apreciada pelo

    tribunal a quo" - Smula n. 211-STJ.

    II. A proteo legal conferida ao bem de famlia pela Lei n.

    8.009/90 no pode ser afastada por renncia ao privilgio pelo

    devedor, constituindo princpio de ordem pblica, prevalente sobre a

    vontade manifestada, que se tem por viciada ex vi legis.

    III. Recurso especial no conhecido.

    (REsp 805.713/DF, Rel. Ministro ALDIR PASSARINHO JUNIOR,

    QUARTA TURMA, julgado em 15.03.2007, DJ 16.04.2007 p. 210)

    BEM DE FAMLIA E DESMEMBRAMENTO

    PROCESSO CIVIL - IMPENHORABILIDADE - BEM DE FAMLIA -

    INVIABILIDADE DE FRACIONAMENTO DO IMVEL - REEXAME DE

    PROVA - SMULA 7/STJ - DISSDIO JURISPRUDENCIAL - INEXISTNCIA

    - CONTEXTO FTICO DIVERSO

    1. A impenhorabilidade do bem de famlia, trazida pela Lei

    8.009/90, se estende ao imvel em que se encontra a residncia

    familiar, nos termos do art. 1, pargrafo nico da lei. O fracionamento

  • 19

    do imvel para efeito de penhora, que a princpio se admite, se afigura

    invivel no presente caso, conforme atestaram as instncias ordinrias.

    2. No se admite o recurso especial amparado em pressuposto

    ftico diverso do revelado pelos juzos ordinrios, cuja constatao

    dependa do reexame do conjunto ftico-probatrio, a teor do que dispe

    o enunciado n. 7 da Smula do STJ.

    3. Dissdio jurisprudencial no verificado.

    4. Recurso especial no conhecido.

    (REsp 510.643/DF, Rel. Ministro JORGE SCARTEZZINI,

    QUARTA TURMA, julgado em 17.05.2005, DJ 30.05.2005 p. 383)

    Execuo. Bem de famlia. Precluso. Penhora de parte

    comercial do imvel. Precedentes da Corte.

    1. A Corte j assentou que indeferida a impenhorabilidade em

    deciso no atacada por recurso, sobre esta desce o manto da

    precluso.

    2. possvel a penhora da parte comercial do imvel,

    guardadas as peculiaridades do caso, mesmo sem que haja matrculas

    diferentes.

    3. Recurso especial conhecido e provido.

    (REsp 515.122/RS, Rel. Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES

    DIREITO, TERCEIRA TURMA, julgado em 16.12.2003, DJ 29.03.2004 p.

    233)

    BEM DE FAMLIA E TRABALHADORES DA RESIDNCIA

    PROCESSUAL CIVIL. BEM IMPENHORVEL. ARTIGO 3, INCISO I DA LEI 8.009/90. MO DE OBRA EMPREGADA NA CONSTRUO DE OBRA. INTERPRETAO EXTENSIVA. IMPOSSIBILIDADE. 1. A impenhorabilidade do bem de famlia, oponvel na forma da lei execuo fiscal previdenciria, consectrio do direito social moradia. 2. Consignada a sua eminncia constitucional, h de ser restrita a exegese da exceo legal. 3. Consectariamente, no se confundem os serviais da residncia, com empregados eventuais que trabalham na construo ou reforma

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    do imvel, sem vnculo empregatcio, como o exercido pelo diarista, pedreiro, eletricista, pintor, vale dizer, trabalhadores em geral. 4. A exceo prevista no artigo 3, inciso I, da Lei 8.009, de 1990, deve ser interpretada restritivamente. 5. Em conseqncia, na exceo legal da "penhorabilidade" do bem de famlia no se incluem os dbitos previdencirios que o proprietrio do imvel possa ter, estranhos s relaes trabalhistas domsticas. 6. cedio em sede doutrinria que: "Os trabalhadores a que a Lei se refere so aqueles que exercem atividade profissional na residncia do devedor, includos nessa categoria os considerados empregados domsticos - empregados mensalistas, governantas, copeiros, mordomos, cozinheiros, jardineiros e mesmo faxineiras diaristas se caracterizado o vnculo empregatcio, bem como os motoristas particulares dos membros da famlia. No se enquadram nessa categoria pessoas que, embora realizem atividade profissional na residncia do devedor, no so seus empregados, exercendo trabalho autnomo ou vinculado a empregador. Nesse contexto esto os pedreiros, pintores, marceneiros, eletricistas, encanadores, e outros profissionais que trabalham no mbito da residncia apenas em carter eventual. Tambm no esto abrangidos pela exceo do inc.I, os empregados dos condomnios residenciais - entre os quais, porteiros, zeladores, manobristas - por no trabalharem propriamente no mbito das residncias, e, principalmente, porque so contratados pelo prprio condomnio, representado pelo sndico ou por empresas administradoras."(comentrios de Rita de Cssia Corra de Vasconscelos em artigo de revista intitulado "A impenhorabilidade do Bem de Famlia e as novas entidades familiares). Destaque-se ainda a posio do professor Rainer Czajkowski, no sentido que "quanto aos dbitos previdencirios, previstos na segunda parte do inc. I, a referncia s contribuies devidas para a Previdncia Social, pblica, no tocante aos dbitos daquelas relaes trabalhistas domsticas. No se incluem na exceo cobranas de empresas de previdncia privada, e nem outros dbitos previdencirios que o proprietrio do imvel possa ter estranhos s relaes trabalhistas domsticas.(in "A Impenhorabilidade do Bem de Famlia - Comentrios Lei 8.009/90", 4 edio, Editora Juru, pgina 153). Sobre o thema confira-se o recente posicionamento monocrtico do ilustre Ministro Carlos Mrio Velloso, no RE 352.940-4/SP, deciso julgada em 25/04/2005, que se transcreve, in litteris: "A Lei 8.009, de 1990, art. 1, estabelece a impenhorabilidade do imvel residencial do casal ou da entidade familiar e determina que no responde o referido imvel por qualquer tipo de dvida, salvo nas hipteses previstas na mesma lei, art. 3, inciso I a VI. Acontece que a Lei 8.245, de 18.10.91, acrescentou o inciso VII, a ressalvar a penhora "por obrigao decorrente de fiana concedida

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    em contrato de locao.' dizer, o bem de famlia de um fiador em contrato de locao teria sido excludo da impenhorabilidade. Acontece que o art. 6 da C.F., com a redao da EC n 26, de 2000, ficou assim redigido: "Art. 6. So direitos sociais a educao, a sade, o trabalho, a moradia, a segurana a previdncia social, a proteo maternidade e infncia, a assistncia aos desamparados, na forma desta Constituio." Em trabalho doutrinrio que escrevi - "Dos Direitos Sociais na Constituio do Brasil", texto bsico de palestra que proferi na Universidade de Carlos III, em Madri, Espanha, no Congresso Internacional de Direito do Trabalho, sob o patrocnio da Universidade Carlos III e da ANAMATRA, em 10.3.2003, registrei que o direito moradia, estabelecido no art. 6, C.F., um direito fundamental de 2 gerao e o direito social, que veio a ser reconhecido pela EC 26, de 2000. O bem de famlia, a moradia do homem e sua famlia justifica a existncia de sua impenhorabilidade: Lei 8.009/90, art. 1. Essa impenhorabilidade decorre de constituir a moradia um direito fundamental. Posto isso, veja-se a contradio: a Lei 8.245, de 1991, excepcionando o bem de famlia do fiador, sujeitou o seu imvel residencial, imvel residencial prprio do casal, ou da entidade familiar penhora. No h dvida que a ressalva trazida pela Lei 8.245, de 1991. no inciso VII do art. 3 feriu de morte o princpio isonmico, tratando desigualmente situaes iguais, esquecendo-se do velho brocardo latino: ubi eadem ratio, ibi eadem legis dispositio, ou em vernculo: onde existe a mesma razo fundamental, prevalece a mesma regra de Direito. Isto quer dizer que, tendo em vista o princpio isonmico, o citado dispositivo, inciso VII do art. 3, acrescentado pela Lei 8.245/91, no foi recebido pela EC 26, de 2000. Essa no recepo mais se acentua diante do fato de a EC 26, de 2000, ter estampado, expressamente, no art. 6, C.F., o direito moradia como direito fundamental de 2 gerao, direito social. Ora, o bem de famlia da Lei 8.009/90, art. 1 encontra justificativa, foi dito linha atrs, no constituir o direito moradia um direito fundamental que deve ser protegido e por isso mesmo encontra garantia na Constituio. Em sntese, o inciso VII do art. 3 da Lei 8.009, de 1990, introduzido pela Lei 8.245, de 1991, no foi recebido pela CF, art. 6, redao da EC 26/2000. Do exposto, conheo do recurso e dou-lhe provimento, invertidos os nus da sucumbncia. Publique-se. Braslia, 25 de abril de 2005. Ministro CARLOS VELLOSO - Relator." 7. A Corte j assentou que "a exceo prevista no artigo 3, inciso I da Lei 8.009, de 1990, deve ser interpretada risca" (Resp n 187052/SP, Relator Ministro Ari Pargendler, publicado no DJ 22.10.2001). 8. A hermenutica e a aplicao do Direito, impe obedincia a certas regras, no dizer do maior exegeta brasileiro que foi Carlos Maximiliano. Consoante as suas insuperveis lies, expressas em seu livro "Hermenutica e Aplicao do Direito", publicado pela Editora Forense, 19 Edio, s pginas 191/193, in litteris "(...) 271

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    - O Cdigo Civil explicitamente consolidou o preceito clssico - 'Exceptiones sunt strictissimoe interpretationis' ("interpretam-se as excees estritissimamente") no art. 6 da antiga Introduo, assim concebido: "A lei que abre exceo a regras gerais, ou restringe direitos, s abrange os casos que especifica, , 265 O). O princpio entronca nos institutos jurdicos de Roma, que proibiam estender disposies excepcionais, e assim denominavam as do Direito exorbitante, anormal ou anmalo, isto , os prceitos estabelecidos contra a razo de Direito; limitava-Ihes o alcance, por serem um mal, embora mal necessrio (2). Eis os mais prestigiosos brocardos relativos ao assunto:'Quod vero contra rationem, juris receptum est, non est producendum ad consequentias' (Paulo, no Digesto, liv. 1, tt. 3, frag. 14) - "o que, em verdade, admitido contra as regras gerais de Direito, no se estende a espcies congneres". 'In his quoe contra rationem, juris constituta sunt, non possumus sequi regulam juris' (Juliano, em o Digesto, liv. 1 , t. 3, frag. 15) - "no tocante ao que estabelecido contra as normas comuns de Direito, aplicar no podemos regra geral". 'Quoe propter necessitatem recepta sunt, non debent in argumentum trahi' (Paulo, no Digesto, liv. 50, tt. 17, frag. 162) -"o que admitido sob o imprio da necessidade, no deve estender-se aos casos semelhantes". Os trs apotegmas faziam saber que as regras adotadas contra a razo de Direito, sob o imprio de necessidade inelutvel, no se deviam generalizar: no firmavam precedente, no se aplicavam a hipteses anlogas, no se estendiam alm dos casos expressos, no se dilatavam de modo que abrangessem as conseqncias lgicas dos mesmos. Os sbios elaboradores do Codex Juris Canonici (Cdigo de Direito Cannico) prestigiaram a doutrina do brocardo, com inserir no Livro I, ttulo I, cnon 19, este preceito translcido: "Leges quoe poenam statuunt, aut liberum jurium exercitium crctant, aut exceptionem a lege continent, strictae subsunt interpretation" ("As normas positivas que estabelecem pena restringem o livre exerccio dos direitos, ou contm exceo a lei, submetem-se a interpretao estrita"). Menos vetusta a parmia - Permittitur quod non, prohibetur: "presume-se permitido tudo aquilo que a lei no probe". Hoje se no confunde a lei excepcional com a exorbitante, a contrria razo de Direito (contra rationem, juris), aquela cujo fundamento jurdico se no pode dar ('cujus, fatia reddi non potest'). O Direito Excepcional subordinado a uma razo tambm, sua, prpria, original, porm reconhecvel, s vezes, at evidente, embora diversa da razo mais geral sobre a ual se baseia o Direito comum (3).A fonte mediata do art. 6 da antiga Lei de Introduo, do repositrio brasileiro, deve ser o art. 4 do Titulo Prelimina do Cdigo italiano de 1865, cujo preceito decorria das leis civis de Npoles (4) e era assim formulado: "As leis penais as que restringem o livre exerccio dos

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    direitos, ou formam excees a regras gerais ou a outras leis, no se estendem alm dos casos e tempos que especificam". (...) 272 - As disposies excepcionais so estabelecidas por motivos ou consideraes particulares, contra outras normas jurdicas, ou contra o Direito comum; por isso no se estendem alm dos casos e tempos que designam expressamente. Os contemporneos preferem encontrar o fundamento desse preceito no fato de se acharem preponderantemente do lado do princpio geral as foras sociais que influem na aplicao de toda regra positiva, como sejam os fatores sociolgicos, a Werturteil dos tedescos, e outras. O art. 6 da antiga Lei de Introduo abrange, em seu conjuntos, as disposies derrogatrias do Direito comum; as que confinam a sua operao a determinada pessoas, ou a um grupo dehomens parte; atuam excepcionalmente, em proveito, ou prejuzo, do menor nmero. No se confunda com as de alcance geral, aplicveis a todos, porm suscetveis de afetar duramente alguns indivduos por causa da sua condio particular. Refere-se o preceito quela que, executadas na ntegra, s atingem a poucos, ao passo que o resto da comunidade fica isenta (3). Impe-se tambm a exegese estrita norma que estabelece uma incapacidade qualquer, ou comina a decadncia de um direito: esta designada pelas expresses legais - "ou restringe direitos" (4). 286 - Parece oportuna a generalizao da regra exposta acerca de determinadas espcies de preceitos, esclarecer como se entende e aplica uma norma excepcional. de Direito estrito; reduz-se hiptese expressa: na dvida, segue-se a regra geral. Eis porque se diz que a exceo confirma a regra nos casos no excetuados. 287 - O processo de exegese das leis de tal natureza sintetizado na parmia clebre, que seria imprudncia eliminar sem maior exame - 'interpretam-se restritamente as disposies derrogatrias do Direito comum'. No h efeito sem causa: a predileo tradicional pelos brocardos provm da manifesta utilidade dos mesmos. Constituem snteses esclarecedoras, admirveis smulas de doutrinas consolidadas. Os males que lhes atribuem so os de todas as regras concisas: decorrem no do uso, e sim do abuso dos dizeres lacnicos. O exagero encontra-se antes na deficincia de cultura ou no temperamento do aplicador do que no mago do apotegma. Bem compreendido este, conciliados os seus termos e a evoluo do Direito, a letra antiga e as idias modernas, ressaltar ainda a vantagem atual desses comprimidos de idias jurdicas, auxiliares da memria, amparos do hermeneuta, fanais do julgador vacilante em um labirinto de regras positivas. Quanta dvida resolve, num relmpago, aquela sntese expressiva - interpretam-se restritivamente as disposies derrogatrias do Direito comum! Responde, em sentido negativo, primeira interrogao: o Direito Excepcional comporta o recurso analogia? (2). Ainda enfrenta, e com vantagem, a segunda: ele compatvel com a

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    exegese extensiva? Neste ltimo caso, persiste o adgio em amparar a recusa; acompanham-no reputados mestres (3); outros divergem (4), porm mais na aparncia do que na realidade: esboam um sim acompanhado de reservas que o aproximam do no. Quando se pronunciam pelo efeito extensivo, fazem-no com o intuito de excluir o restritivo, tomado este na acepo tradicional. Timbram em evitar que se aplique menos do que a norma admite; porm no pretendem o oposto - ir alm do que o texto prescreve. O seu intento tirar da regra tudo o que na mesma se contm, nem mais, nem menos. Essa interpretao bastante se aproximada que os clssicos apelidavam declarativa; denomina-se estrita: busca o sentido exato; no dilata, nem restringe (5). Com as reservas expostas, a parmia ter sempre cabimento e utilidade. Se fora lcito retocar a forma tradicional, substituir-se-ia apenas o advrbio: ao invs de restritiva, estritamente. Se prevalecer o escrpulo em emendar adgios, de leve sequer, bastar que se entenda a letra de outrora de acordo com as idias de hoje: o brocardo sintetiza o dever de aplicar o conceito excepcional s espcie que ele exprime, nada acrescido, nem suprimido ao que a norma encerra, observada a mesma, portanto, em toda a sua plenitude (6). 288 - Releva advertir que todo preceito tem valor apenas relativo. A regra do art. 6 da antiga Lei de Introduo ao Cdigo Civil consolida o velho adgio - interpretam-se restritivamente as disposies derrogatrias do Direito comum, brocardo este correspondente ao dos romanos - exceptiones sunt strictissimoe interpretationis. Qualquer dos trs conceitos aplica-se com a maior circunspeo e reserva, e comporta numerosas excees (1): da a divergncia na maneira de o entender, at entre pontfices das letras jurdicas. 289 - As palavras - que especifica, do Cdigo brasileiro, parfrase de - in esse espressi, do repositrio italiano, no se interpretam no sentido literal, de exigir individuao precisa, completa, de cada caso a incluir na exceo. Comporta esta as hipteses todas compatveis com o esprito do texto. Exclui-se a extenso propriamente dita; porm no a justa aplicao integral dos dispositivos. Restries ao uso ou posse de qualquer direito, faculdade ou prerrogativa no se presumem: isto que o preceito estabelece. Devem ressaltar dos termos da lei, ato jurdico, ou frase de expositor. Cumpre opinar pela inexistncia da exceo referida, quando esta se no impe evidncia, ou dvida razovel paira sobre a sua aplicabilidade a determinada hiptese .(...)" 9. Voto pelo improvimento do recurso especial interposto pelo Instituto Nacional de Seguridade Social, divergindo do Relator. (REsp 644.733/SC, Rel. Ministro FRANCISCO FALCO, Rel. p/ Acrdo Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 20.10.2005, DJ 28.11.2005 p. 197)

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    BEM DE FAMLIA E ALIMENTOS DECORRENTES DE ATO ILCITO

    AGRAVO INTERNO - DIREITO PROCESSUAL CIVIL - BEM DE FAMLIA - IMPENHORABILIDADE - OBRIGAO ALIMENTCIA - ATO ILCITO - EXCEO. A exceo ao regime de impenhorabilidade do bem de famlia prevista no artigo 3, III, da Lei 8.008/90 em favor do credor de penso alimentcia compreende o crdito originrio de indenizao por ato ilcito. Precedentes. Agravo improvido. (AgRg no Ag 772.614/MS, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 13.05.2008, DJe 06.06.2008 )

    5. Fique por Dentro

    Como fizemos em material de apoio anterior, neste tpico

    apresentaremos outras importantes notcias para voc estar afinado

    com a jurisprudncia do STJ.

    STJ - O Tribunal da Cidadania Ex-esposa tem direito metade da indenizao trabalhista recebida pelo ex-marido 13/08/2008 Integra a comunho a indenizao trabalhista correspondente a direitos adquiridos durante o tempo de casamento sob o regime de comunho universal. Com esse entendimento, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justia (STJ) manteve o direito da ex-mulher meao dos valores recebidos pelo ex-marido aps a separao de fato do casal. De acordo com os autos, a sentena de divrcio determinou a partilha de todos os bens adquiridos pelo casal na proporo de 50% para cada um, mas negou a meao da indenizao obtida em ao trabalhista e o pedido de alimentos formulados pela esposa. Em grau de apelao, a Primeira Cmara Cvel do Tribunal de Justia de Santa Catarina, por maioria, reconheceu parcialmente o direito da esposa e aceitou o pedido de meao dos valores relativos indenizao trabalhista. O ex-marido recorreu ao STJ alegando a existncia de dissdio jurisprudencial. Sua defesa tambm sustentou que os frutos civis do trabalho ou da indstria de cada cnjuge so excludos da comunho

  • 26

    quando as verbas pleiteadas na ao dizem respeito ao tempo em que no mantinha relacionamento com a recorrida e o produto s foi recebido aps a ruptura conjugal. Segundo o relator, ministro Lus Felipe Salomo, o tema foi objeto de divergncia entre as Turmas que integram a Segunda Seo do STJ, mas a Corte j pacificou o entendimento de que integra a comunho a indenizao trabalhista correspondente a direitos adquiridos durante o tempo de casamento sob o regime de comunho universal. Para o relator, na hiptese sob julgamento, no restam dvidas de que os crditos trabalhistas foram adquiridos na constncia do casamento. O acrdo recorrido afirma que, embora no se possa vislumbrar com segurana a data efetiva da separao de fato do casal entre abril de 1997 e maro de 1998 , o fato que, ainda que os valores relativos aos crditos trabalhistas tenham sido recebidos aps a dissoluo da sociedade conjugal, certo que eles foram adquiridos na constncia do casamento, realizado em janeiro de 1993 sob o regime de comunho universal de bens. Incontroverso, pois, o ponto relativo ao tempo da aquisio dos direitos trabalhistas, tem-se que o decisrio combatido no ofendeu o preceito de lei federal invocado pelo recorrente, tampouco dissentiu do entendimento traado por esta Corte, concluiu o relator em seu voto. Assim, por unanimidade, a Turma decidiu pela aplicao da smula 83/STJ, segundo a qual no se conhece do recurso especial pela divergncia, quando a orientao do Tribunal se firmou no mesmo sentido da deciso recorrida. Processos: Resp 878516

    STJ - O Tribunal da Cidadania Bens deixados em testamento podem ser penhorados para pagar dvida do autor da herana 22/02/2008 O Superior Tribunal de Justia (STJ) admitiu a penhora de dois imveis deixados por uma senhora de So Paulo a seus dois filhos. O entendimento da Terceira Turma que possvel a penhora em execuo contra o esplio (conjunto de bens deixado pelo falecido) devido a dvidas deixadas pelo autor da herana, independentemente de haver testamento com clusula de inalienabilidade e impenhorabilidade dos bens deixados. A senhora tinha contrado uma dvida com o Unibanco Unio de Bancos S.A e, antes de morrer, deixou em testamento bens gravados com clusulas de impenhorabilidade e inalienabilidade. Os herdeiros

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    alegavam ao STJ que os imveis deixados pela me no responderiam pela dvida. O Unibanco, por sua vez, alegou que a dvida havia sido feita pela empresria e seus bens que deveriam acobertar a dvida, mesmo a partir dos imveis deixados para os filhos. As instncias inferiores entenderam que o procedimento era legal e no haveria fraude no processo de execuo. O Tribunal de So Paulo valeu-se da leitura do artigo 1.676 do antigo Cdigo Civil, segundo o qual as dvidas dos herdeiros no sero pagas com os bens que lhes foram transmitidos em herana, quando gravados com clusulas de inalienabilidade e impenhorabilidade, por disposio de ltima vontade. O ministro Humberto Gomes de Barros, relator do processo, acentuou que no foi inteno do legislador escancarar uma porta para fraudes. Para a turma julgadora, a impenhorabilidade instituda em testamento protege os bens deixados aos herdeiros em casos de dvidas contrados por eles, no entanto as dvidas dos mortos devem ser pagas com o patrimnio por ele deixado. A clusula testamentria de inalienabilidade no impede a penhora em execuo contra o esplio, resume o ministro. Processos: REsp 998031

    1996 - 2008 - Superior Tribunal de Justia. Todos os direitos reservados. Reproduo permitida se citada a fonte

    6. Bibliografia e Contato

    Bibliografia: Novo Curso de Direito Civil Parte Geral

    Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho, Ed. Saraiva

    (www.editorajuspodivm.com.br e www.saraivajur.com.br ).

    Confira tambm: Bem de Famlia lvaro Villaa

    Azevedo, RT.

    Planto de Dvidas: www.lfg.com.br

    Consulte outros textos interessantes no site:

    www.novodireitocivil.com.br

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    7. Mensagem

    MENSAGEM:

    O telefone pode ser um indesejvel adversrio.

    Concentrao muito importante: trs horas de estudo em

    concentrao valem mais do que cinco, seis ou sete horas com

    interrupes constantes.

    Desligue o telefone. No permita, na medida do possvel, que

    o interrompam. E sempre d uma pausa entre uma matria e

    outra, ou aps ler por muito tempo.

    Tenha certeza de que o seu sucesso questo de tempo!

    E nunca esquea: F em Deus acima de tudo!

    Um abrao!

    O amigo,

    Pablo.

    C.D.S. 2008.2.Revisado.ok