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Mark W. Baker O poder da personalidade de Jesus

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Mark W. Baker

O poder da personalidade de

Jesus

S U M Á R I O

IN TRO DU ÇÃO 7

CAPÍTULO 1 Jesus versus Darth Vader 11

CAPÍTULO 2 Poder pessoal 33

CAPÍTULO 3 Três formas de poder 54

CAPÍTULO 4 O poder do rico e do famoso 74

CAPÍTULO 5 Narcisismo e poder 92

CAPÍTULO 6 Poder e liderança 119

CAPÍTULO 7 O poder do amor 146

CONCLUSÃO 164

NOTAS 166

AGRADECIMENTOS 169

I n t R O d U ç ã O

Se eu soubesse o título do maior best-seller do seu país, você não

iria me perguntar que livro é esse? E se eu lhe dissesse que é o livro

mais vendido em seu país há muitos anos, você não iria querer um

exemplar? E se eu ainda acrescentasse que esse mesmo livro é o mais

vendido no mundo, você não iria querer lê-lo? Pois então: esse livro

é a Bíblia. Nenhum outro livro teve tanto impacto desde a invenção

da imprensa do que esse que conta a história de um mestre judeu

itinerante chamado Jesus.

Postei esse mesmo comentário em um site da internet há cerca

de dois anos. Eu tinha sido convidado pelo site a participar de um

debate como especialista, por ser psicólogo clínico, e mencionei na

ocasião que a Bíblia continua vendendo como “pão quente” a cada

ano que passa. Imediatamente, recebi o comentário de uma mulher

que chamarei de Amanda. A mensagem dela tinha um assunto:

“Pão quente? Tem certeza?” Ela se ofendeu com a minha referência

à Bíblia e a pôs em dúvida.¹ Eu lhe respondi afirmando que a Bíblia

vende pelo menos 25 milhões de exemplares por ano, em mais de

100 idiomas, e que, apesar da crítica atual a toda religião organiza-

da, ela ainda é o maior best-seller do planeta. Afirmei também que

achava que as pessoas deveriam lê-la, se tivessem o mínimo inte-

ressse em espiritualidade. Trocamos opiniões mais algumas vezes,

porém Amanda não aceitou nada do que eu disse, pois, aparente-

mente, já tinha uma opinião formada sobre a Bíblia e não estava

aberta a discussões.

Alguns meses mais tarde, reparei que Amanda tinha postado um

comentário de cunho muito pessoal naquele site. Ela perdera uma

amiga íntima e resolveu pegar uma Bíblia que estava jogada em

8 O poder da personalidade de Jesus

algum canto da casa. Contou que aquele livro a tocou tanto que não

conseguia parar de chorar. Amanda ainda disse algumas coisas ne-

gativas sobre as pessoas religiosas, mas queria que todos soubessem

que ela tinha se convertido pelo impacto poderoso que a Bíblia pode

ter na vida das pessoas em situação de crise.

Perto do final da história de Jesus, seus seguidores mais próximos

se reuniram com ele no Jardim do Getsêmani. Enquanto Jesus orava,

eles pensavam no que estava para acontecer com ele. Os discípulos

tinham largado tudo para segui-lo, e esperavam que ele estabele-

cesse algum tipo de estrutura de poder sob a qual eles o servissem.

Pedro, um dos amigos mais íntimos de Jesus e a personalidade mais

forte do grupo, afirmou que estava preparado para tudo. Ele chegou

a prometer a Jesus: “Mesmo que seja preciso que eu morra contigo,

nunca te negarei” (Mateus 26:35).

Quando os guardas vieram prender Jesus, Pedro tentou assumir o

controle da situação. Ele conhecia o poder de seu Mestre e sabia que

ele poderia facilmente derrubar aquele pelotão de soldados. Mesmo

assim, sacou a espada e cortou a orelha de um dos atacantes.

Jesus o repreendeu imediatamente e mandou que recolhesse

a espada. Disse a Pedro que, se fosse da sua vontade, ele poderia

dominar aquela multidão com seu próprio exército de milhares de

anjos. Mas não quis. Em vez disso, curou a orelha do homem ferido

e disse: “Todos os que empunham a espada, pela espada morrerão”

(Mateus 26:52). Quando Jesus estava sendo amarrado e preso, seus

discípulos fizeram a única coisa que acharam que podiam fazer na-

quela situa ção: fugiram.

Assim como Amanda, eles não entenderam logo. Jesus era a

pessoa mais poderosa que já tinham conhecido, e, no entanto, sua

ideia sobre poder era muito diferente da de seus seguidores. Estes

não entendiam como era possível ter todo o poder do mundo e não

usá-lo para dominar alguém quando a situação exigisse. Os judeus

estavam sendo oprimidos social e economicamente, e os discípulos

sabiam que alguma coisa precisava ser feita a respeito disso. Jesus

Introdução 9

tinha um poder ilimitado, e com certeza poderia usá-lo para corrigir

as injustiças sociais e econômicas visíveis para todos. Eles esperavam

que Jesus exercesse seu poder sobre os dominadores do povo judeu,

por causa dos benefícios que isso traria. Mas Jesus não o fez. E por

essa razão todos desertaram. Pedro chegou a negar que conhecia

Jesus – três vezes!

Jesus sabia bem o que estava para acontecer com ele, e sabia que

precisava se submeter às pessoas que queriam matá-lo. Ele agiu as-

sim para cumprir o plano de Deus para sua vida e sua obra sobre a

Terra. Mas ele estava nos ensinando também sobre poder. Ele não

estava apenas falando sobre poder; ele o estava vivendo. A maneira

como Jesus exerceu esse impacto sobre a história foi tão poderosa

que, no princípio, pouca gente entendeu. Ele não dominou os que

vieram para prendê-lo porque entendia que dominar os outros não

é a maior nem a melhor forma de poder.

O resto da história todo mundo conhece. Jesus nunca estabeleceu

o poder político que seus seguidores esperavam. Ele foi crucificado

entre dois ladrões comuns. Porém, depois de sua morte, cada um

dos discípulos mais próximos sofreu o tremendo impacto do en-

contro pessoal com Jesus. Um impacto que mudou suas vidas. A

partir daí, e da vinda do Espírito Santo em Pentecostes, perderam

o medo e saíram contando a todo mundo como suas vidas tinham

sido poderosamente transformadas por Jesus. A mensagem que eles

pregavam era tão forte que se alastrou como fogo na mata, até mes-

mo entre alguns da agressiva oposição.

Seus discípulos fugiram do jardim primeiramente porque até

aquele momento eles só conheciam o poder sobre os outros. Foi

só depois da morte e ressurreição de Jesus que eles entenderam a

importância do poder com os outros. Jesus não estava interessado

em dominar. Sua meta era a transformação dos corações huma-

nos. Jesus não precisava controlar as pessoas pelo medo; ele podia

transformá-las pelo amor e assim alcançar muito mais. Embora os

seus seguidores mais próximos não tivessem entendido a princípio,

10 O poder da personalidade de Jesus

a sua abordagem do poder foi a mais bem-sucedida que o mundo

já conheceu.

Os capítulos seguintes falam do poder pessoal com base na vida

de Jesus. Embora eu acredite que Jesus seja Deus, vou focalizar, na

maior parte das vezes, a sua humanidade. Vou me concentrar no

poder “pessoal” de Jesus, na forma como ele se relacionava com os

outros como pessoa humana. Muitos livros foram escritos falando

de seu poder divino e de seu poder miraculoso, mas este livro trata

da maneira como ele era poderoso no seu relacionamento humano

com as pessoas. Há muita coisa que nós podemos aprender com o

comportamento de Jesus como homem entre nós. Veremos como

podemos nos beneficiar da brilhante psicologia contida em seu en-

sinamento sobre o poder. Não se preocupe se achar meio confuso

no início. Você estará em boa companhia se não compreender Jesus

de imediato.

Ao longo do livro, vou me referir ao best-seller que mencionei

anteriormente – a Bíblia. Embora eu tenha passado muitos anos

estudando em seminário, não é preciso nenhum conhecimento

teológico para ler esse livro. Mesmo que você não tenha certeza de

como se sente em relação a Jesus, será possível surpreender-se com

o quanto pode crescer ao tomar conhecimento do que ele tem a

transmitir sobre poder pessoal.

C a p í t U l O 1

Jesus versus Darth Vader

As pessoas em geral se sentem poderosas quando estão no contro-

le. Elas acreditam que para se ser realmente poderoso é preciso ser

rico, famoso ou estar no topo de algum governo ou grupo empre-

sarial. No mínimo, elas acham que ser poderoso significa ter força

física para subjugar os outros. Quando a maioria das pessoas pensa

em poder, elas o associam ao Super-Homem, ao Batman ou ao vilão

de Guerra nas estrelas, Darth Vader.

Há pouco tempo fiz contato com uma psicóloga que se especiali-

zou no tratamento de sobreviventes de traumas. As pessoas que ela

ajuda passaram pela experiência de quase morte, sofreram abuso

físico ou foram confrontadas com outras situações assustadoras. Em

seu consultório, ela me mostrou como incentiva seus clientes a se-

lecionar, entre centenas de pequenas figuras que ela coloca ao redor

da sala, as que representam as histórias que eles desejam contar mas

têm dificuldade de colocar em palavras. As imagens são organizadas

sobre prateleiras com base no significado que possuem. São figuras

de pessoas, lugares e personagens facilmente identificáveis de filmes

ou histórias em quadrinhos.

Olhei em volta e fiquei surpreso ao ver o Super-Homem, o Batman

e o Darth Vader juntos em um grupo de figuras, enquanto Jesus es-

tava meio escondido em um canto, bastante solitário.

Quando perguntei à minha colega por que o Super-Homem e

Darth Vader foram colocados juntos, e Jesus em outro lugar, ela

respondeu: “Ah... porque o Super-Homem e o Darth Vader repre-

sentam poder, e Jesus é apenas uma figura pacífica.”

12 O poder da personalidade de Jesus

Tem certeza?, pensei comigo mesmo. Então é isso que a maioria das

pessoas pensa sobre o poder? Super-heróis com força bruta ou alguma

habilidade extraordinária são considerados os verdadeiros podero-

sos. Não importa quais sejam as suas intenções ou os seus atos. Para

a grande maioria das pessoas, poder é a capacidade de dominar os

outros. Jesus não fez isso, logo, para elas, ele não é poderoso. Jesus é

pacífico. Poderoso é Darth Vader. Eis o que quase todos acham.

Eu concordo com a minha colega: estar no controle é uma for-

ma de ser poderoso. De fato, Jesus demonstrou esse poder com os

milagres que realizou, mas ele sempre desconfiava das pessoas que

o seguiam apenas pelos milagres.1 Ele sabia que existiam outras

formas de poder e que a sede de domínio impedia as pessoas de

descobri-las.

Muita gente que procura ajuda em terapia acredita que precisa

de mais controle para resolver seus problemas. Elas pensam, “Se eu

fosse mais forte, isso não teria acontecido comigo”, ou “Eu preciso

parar de reclamar e de ficar remoendo o passado”. Essas pessoas

acham que expressar sentimentos dolorosos é sinal de fraqueza e

que ser capaz de controlar esses sentimentos é demonstração de for-

ça. Mas a solução para os seus problemas não é um controle maior.

Há um modo mais poderoso de viver.

AS DIFERENTES FORMAS DE PODER

A ideia de que Darth Vader é poderoso e Jesus é manso vem do fato

de as pessoas não saberem que existe mais de um tipo de poder. A

Bíblia começa narrando: “No princípio Deus criou os céus e a terra.”

Deus iniciou a história da Bíblia com o seu poder de domínio físico

supremo, que é a forma mais elementar de poder. Mas Deus não

parou nisso: “Criou Deus o homem à sua imagem...” (Gênesis 1:27).

Sua criação do mundo físico e de tudo o que há nele culminou com

a criação da humanidade. Ao criar o mundo físico, Deus estabeleceu

Jesus versus Darth Vader 13

o poder do domínio, mas, com a entrada da humanidade na criação,

uma nova forma de poder foi criada – a autoridade.

Depois de criar o mundo inanimado, Deus criou os seres vivos

para habitar nele. Primeiro, Ele criou outros animais, alguns deles

com capacidade de pensar, sentir e com vários níveis de relaciona-

mento. As formas mais avançadas desses animais podem até mesmo

sonhar. Mas então Deus criou os humanos – os únicos animais so-

bre a terra que sabem que sonham.

Ser criado à imagem de Deus significa que os seres humanos têm

uma capacidade diferenciada de relacionamento.2 Deus criou a hu-

manidade como macho e fêmea, estabelecendo os seres humanos

fundamentalmente como seres que se relacionam, tal como Deus

é também relação entre três pessoas: Pai, Filho e Espírito Santo. Ele

nos criou com a capacidade exclusiva de termos um relacionamento

de autoridade com Ele, no qual não nos sentíssemos controlados,

mas seguros. Esse poder de autoridade acontece quando o poder se

compromete com o bem-estar das pessoas que precisam dele. O ato

final da criação de Deus foi soprar “o fôlego de vida” na humani-

dade, nos animando como seres espirituais para termos relaciona-

mentos pessoais, tanto com Ele quanto uns com os outros. É nesse

relacionamento que nos descobrimos completos e nos sentimos

mais em casa.

Controle é o poder de comandar, dominar, impedir ou fazer com

que alguma coisa aconteça por meio da força. Mas autoridade é o

poder para incluir, inspirar, transformar e soprar vida nos outros.

Uma relação pessoal com alguém que tem autoridade pode nos dar

orientação, coragem, motivação e, sobretudo, para os que procuram

terapia, tornar-se um abrigo para suas dores.3

A maior parte das pessoas que me procuram em busca de ajuda

não entende que há maneiras diferentes de poder.4 Elas tentam

desesperadamente ter mais controle sobre suas vidas para resolver

seus problemas. O que elas não percebem é que ter capacidade para

controlar temporariamente a dor é diferente de receber poder para

14 O poder da personalidade de Jesus

enfrentá-la. A capacidade de estar no controle serve para determi-

nado propósito na vida, porém os seres humanos necessitam de um

relacionamento pessoal com a autoridade para serem curados.

DANDO FORÇAS PARA UM SOLDADO

“Deus, me ajude” foi minha reação automática quando desliguei o

telefone.

Um médico do Exército me encaminhou John porque ele estava

sendo dispensado após atuar em várias frentes de combate. O médi-

co descreveu em detalhes o Transtorno de Estresse Pós-Traumático

(TEPT) de John, e ficou claro que o soldado vivia uma aflição

interna bastante significativa. Os psicólogos inventaram o diagnós-

tico TEPT para ex-combatentes, como John, que foram treinados

para serem guerreiros nas violentas situações do campo de batalha,

mas que depois voltavam para a pacífica vida civil e tinham que se

readaptar à rotina. Isso é muito difícil, e graves problemas psico-

lógicos podem surgir quando a sua vida depende de você estar no

controle a cada segundo, durante meses sem fim, e depois voltar

para casa na expectativa de que retome rápida e automaticamente

a vida normal.

John estava enredado em um conflito de poder terrível, com sen-

timentos de medo e necessitando desesperadamente de força para

lidar com esses conflitos. Mas, assim como a maioria de nós, ele de-

finia poder apenas como domínio. O poderoso é muito rico, ocupa

um cargo político, tem autocontrole absoluto ou é o mais forte da

turma e ganha qualquer briga. É por isso que tanto o Super-Homem

(um cara do bem) quanto o Darth Vader (um cara do mal) são

vistos como poderosos. Quase todo mundo só se sente poderoso

quando domina a situação, mas buscar forças em Darth Vader não é

o mesmo que buscar forças em Jesus. O que recebemos quando nos

voltamos para Jesus é bem diferente.

Jesus versus Darth Vader 15

John concordou em fazer uma entrevista terapêutica, e eu fiquei

contente e ansioso ao mesmo tempo. Eu tinha um grande respeito

por John e sua atuação como combatente nas forças armadas, e me

perguntei se ele teria o mesmo respeito por mim. Eu queria lutar por

John, já que ele tinha pago um preço alto lutando por mim e pelo

nosso país. Ainda que qualquer um o visse como uma pessoa po-

derosa, John não tinha forças para aplacar sua constante ansiedade,

ataques de raiva e pesadelos – e não sabia o que fazer a respeito disso.

– Como posso ajudar? – perguntei quando ele se sentou.

– Não sei, doutor – John respondeu.

– Você já fez terapia antes? – perguntei.

– Sim, senhor – ele assentiu.

– Foi útil para você?

– Não, senhor – John respondeu quase sem expressão, olhando

direto em meus olhos.

Aquele tratamento ia ser exatamente como eu pensava: difícil.

John não confiou em mim, e eu não o culpo. Outros tinham fra-

cassado em ajudá-lo, o que fez com que ele não falasse de suas

experiências em combate com ninguém. John contou que bebia de-

mais e que se envolvia em brigas de bar, mas, por causa de seu trei-

namento militar, quase sempre vencia nas brigas. Ele sabia como

dominar a situação quando precisava. Relatou-me um incidente

em um restaurante, quando o manobreiro lhe devolvera o carro de

um jeito que ele não tinha gostado, e ele xingou o rapaz, esperando

que ele o atacasse primeiro. Em poucos segundos, John estava cer-

cado por todos os manobreiros do estacionamento. Cuspiu em um

deles, tentando provocar uma briga, porque acreditava que seria

capaz de machucar a todos. Mas também achava que merecia ser

machucado por todos.

John tinha tentado de todas as maneiras manter sua dor emocio-

nal sob controle, e usou a palavra derrota para se referir ao fracasso

de suas tentativas. Eu posso vencer isso, ele dizia a si mesmo quando se

sentia deprimido, e Vamos esquecer isso era o que lhe vinha à mente

16 O poder da personalidade de Jesus

quando as lembranças dolorosas apareciam. Essa abordagem estoica

do tipo Darth Vader para controlar sua dor só a enterrava mais fun-

do, fazendo com que ela voltasse mais tarde em forma de pesadelos.

John estava em um carrossel de medo e de tentativa de controle do

qual não poderia saltar. O medo torna as pessoas mais controladoras,

e lutar para ter controle não cura ninguém de seus medos.

John acreditava que Deus ajuda as pessoas necessitadas. Mas não

acreditava que a ajuda de Deus se aplicasse a ele. É fácil pensar que

John estava traumatizado por tudo o que vira nos combates. Mas a

verdade é que John estava traumatizado pelas coisas que ele tinha

feito nos combates, e isso o deixava culpado e envergonhado de se

aproximar de Deus. São em momentos como esses que as pessoas

precisam do poder curativo do relacionamento pessoal com outro

ser humano. Era esse o tipo de relacionamento que eu pretendia ter

com John.

O soldado estava tentando manter as coisas sob controle. Era só o

que ele sabia fazer. Mas isso só o mantinha ansioso, isolado e preso

ao passado. John achava que homens poderosos tinham que estar no

controle. Jesus, porém, ensinou que a única maneira de encontrar

poder verdadeiro é abrindo mão do controle. Ele disse: “Pois quem

quiser salvar a sua vida, a perderá, mas quem perder a sua vida

por minha causa, a encontrará” (Mateus 16:25). Isto significa que

precisamos estar abertos para a ajuda de alguém. Só assim somos

capazes de abrir mão do controle temporário dos nossos problemas

e encontrar um poder maior que nos ajude a enfrentá-los com ho-

nestidade. Na mentalidade militar de John, renunciar era coisa de

perdedores – bons soldados tinham tudo sob controle. Mas, mesmo

sendo extremamente difícil para ele, nas semanas seguintes John foi

se abrindo aos poucos à minha influência, e descobriu que seu medo

de perder o controle fazia parte do problema.

– Eu tenho um pesadelo que me persegue, e o mais estranho é

que ele acontece quando estou acordado – disse John em uma das

sessões de terapia.

Jesus versus Darth Vader 17

– Você quer dizer uma lembrança? – eu lhe perguntei.

– Sim, acho que é isso – disse ele.

– Você pode me contar? – eu quis saber, mas temeroso do que

podia vir em seguida.

– Nós voltávamos do patrulhamento. Eu tentava manter os sol-

dados em estado de alerta o tempo todo, mas eles estavam muito

cansados, e nós recuamos. Eu não sei, mas às vezes nós relaxáva-

mos – disse John.

Eu escutava com toda a atenção.

– No caminho, Derek começou a conversar com um garoto que

encontramos. Ele não falava inglês, mas Derek estava tentando ser

agradável. Eu deveria ter lhe dado uma bronca por isso, mas não dei.

Não sei por que, mas não dei. Então o inferno explodiu.

– Sim – eu reagi, incentivando-o a continuar.

– O moleque tinha uma pistola Glock escondida no casaco e,

antes que pudéssemos nos mexer, ele fez dois buracos na cabeça de

Derek. – John prosseguiu como se estivesse em transe. – Então eu

acabei com o garoto. E logo um cara mais velho saiu correndo de

uma casa, vindo em nossa direção, gritando e segurando uma faca,

e eu atirei nele também. Acho que era o pai ou um parente, não sei.

Acabei com os dois. Mortos. Acho que nunca vou me esquecer disso.

Depois de um silêncio que durou uma eternidade, eu disse:

– Você guardou essa história durante muito tempo.

– Eu nunca contei para ninguém.

– Fico feliz que tenha me contado.

– Agora você deve estar achando que eu estou realmente doente –

ele disse com um sorriso afetado.

– Eu acho que manter esse tipo de história só para você é que

pode torná-lo doente. Mas, ao confiar em mim, você pode impedir

que isso aconteça – repliquei.

Durante todas as sessões com John, eu mantive uma cadeira va-

zia junto de nós. Gostava de imaginar que Jesus estava sentado ali.

Pensava no que ele podia estar querendo me dizer e no que Jesus

18 O poder da personalidade de Jesus

gostaria de dizer para John. Terapia tem o poder de curar porque

é um processo muito pessoal em que a força do relacionamento é

capaz de ter um efeito poderoso. À medida que John me dava auto-

ridade para exercer um relacionamento curativo em sua vida, eu me

voltava para Jesus como uma autoridade na minha. Este é o signifi-

cado mais profundo do que disse João Batista: “É necessário que ele

cresça e que eu diminua” (João 3:30). Precisamos mudar o signifi-

cado de poder para que Jesus possa aumentar o seu poder em nós.

Por fim, John parou de brigar nos bares e seus pesadelos dimi-

nuíram bastante. Ele começou a perceber que não seria um poder

supra-humano que controlaria seus medos e seu sentimento de

culpa. Alguma coisa realmente forte estava acontecendo entre nós,

e ela estava demolindo a sua imagem Darth Vader de poder. Isso

permitiu que John fizesse o que não podia fazer antes – renun-

ciar à sua necessidade de controle, aceitar sua vulnerabilidade,

estabelecer uma relação forte que o deixasse encarar a sua dor. A

princípio, John pensou que as consultas o ajudariam a controlar

melhor a própria vida, mas eu o ajudei a abrir mão desse controle

para encontrar algo melhor.

Não há figuras do Super-Homem e de Darth Vader em meu

consultório, apenas uma cadeira vazia onde eu imagino que Jesus

está sentado. E seu impacto sobre nós dois era muito mais do que

simplesmente pacífico.

O PODER PESSOAL DA AUTORIDADE

Assim como John, Jesus teve de enfrentar seus próprios aconteci-

mentos traumáticos. Antes de começar seu ministério que mudou o

mundo, ele foi levado ao deserto para ser tentado por Satanás. Isso

seria um pesadelo para qualquer pessoa.

Vendo que Jesus estava com fome, o tentador procurou seduzi-lo

com comida, sugerindo que ele transformasse pedras do deserto em

Jesus versus Darth Vader 19

pães para saciar a fome. Mas Jesus lhe disse: “Nem só de pão viverá

o homem” (Mateus 4:4). Ele sabia que o controle sobre as necessida-

des físicas era essencial para a vida humana, mas que a autoridade

que vinha do seu relacionamento com Deus e com as pessoas era

mais fundamental para se manter plenamente vivo. Portanto, a

possibilidade de morrer de fome não apavorou Jesus. Mais tarde, ele

disse: “Foi-me dada toda a autoridade nos céus e na terra. Portanto,

vão e façam discípulos” (Mateus 28:18,19). Seu desejo não era con-

trolar. Ele veio para ter relacionamentos poderosos.

Sigmund Freud achava que as pessoas acreditam em Deus por-

que não conseguem lidar com seus sentimentos de desamparo. Eu

acho que Freud tinha um problema com autoridade. Ele enxergava

equivocadamente a religião como uma tentativa de controlar os

sentimentos dolorosos, o que não seria uma forma autêntica de

viver. Mas Freud estava confundindo controle com autoridade.

Tentar se manter sempre no controle provoca um sentimento

de fraqueza, porque não é possível estar permanentemente nes-

sa posição. Logo, qualquer pessoa que usa a religião para tentar

controlar a si mesma ou os outros demonstra medo de sentir-se

fraca. Mas essa não é a religião de que Jesus falava. Trazer todos os

nossos sentimentos de desamparo para a relação com Deus produz

uma sensação de verdadeira paz, porque viver sob a autoridade de

Deus não apenas nos faz sentir seguros, mas também nos ajuda a

viver em verdadeira autoridade com os outros. A palavra “autori-

dade” pode ter um sentido muito negativo, porque as figuras de

autoridade em nossa vida em geral quiseram nos controlar, usan-

do até maneiras perversas. Para que entendam de que autoridade

estou falando, vou contar a história de uma mulher que viveu essa

poderosa ligação de autoridade com Deus e que, a partir desse re-

lacionamento íntimo, exerceu uma autoridade suave sobre as pes-

soas, mesmo durante as provações mais duras da vida. Por não ter

resistido a aceitar a autoridade de Deus, ela foi capaz de viver uma

existência muito poderosa.

20 O poder da personalidade de Jesus

Há COISAS NA VIDA PIORES DO QUE A MORTE

Debbie procurou terapia por causa da depressão. Era uma cristã

dedicada, mas sofria de uma depressão biológica que a debilitava

bastante. No auge das crises, ela não conseguia dormir, mal podia

comer e perdia o interesse por qualquer coisa agradável da vida.

Por vezes, até se tornava potencialmente suicida. Era humilhante

para Debbie ter uma relação profunda e comprometida com Deus

e ainda assim pensar em acabar com a própria vida. Ela custou

a compreender que uma depressão biológica não é causada por

falta de fé, mas que a presença de uma enfermidade pode incutir

pensamentos mórbidos até nas pessoas mais devotas. Suas ideias

suicidas, contudo, eram muito perigosas, pois as pessoas clini-

camente deprimidas às vezes acabam cometendo o suicídio por

causa da doença.

Depois de alguns meses de terapia e de excelente medicação,

Debbie não sofre mais dessas crises intensas de depressão. Ela sabe

que ainda está sujeita à doença, mas aprendeu a lidar com esse mal

quando ele aparece. Tragicamente, porém, quando estava em pro-

cesso de recuperação, depois de alguns meses de tratamento, Debbie

recebeu um diagnóstico de câncer de mama em estágio avançado.

Eu não sei por que algumas pessoas têm de sofrer mais do que

outras, e pretendo perguntar a Deus sobre esta aparente injustiça

quando estiver no céu. Debbie é uma dessas pessoas. Ela não apenas

teve de vencer uma depressão profunda, como agora precisava lutar

por sua vida contra um câncer agressivo.

Após meses de quimioterapia, orações e uma coragem férrea, o

câncer regrediu. Debbie o enfrentou com uma força que espantou

os médicos. Eles chegaram a pedir que ela falasse para alguns grupos

de pacientes com câncer, como exemplo inspirador de como enfren-

tar essa doença que ameaça a vida. Debbie aceitou e falou com uma

autoridade que encorajou os outros enfermos, porque a autoridade

dela derivava do seu relacionamento com Deus. Isso lhe deu a força

Jesus versus Darth Vader 21

de que precisava para atravessar as circunstâncias mais difíceis – até

o medo de perder a própria vida.

Certo dia, quando se preparava para falar a um grupo de pacien-

tes, Debbie comentou comigo que ficava surpresa com a reação que

recebia quando falava de sua batalha contra o câncer.

– É engraçado... – disse Debbie sorrindo.

– O que é engraçado? – perguntei.

– Ouvir as pessoas dizerem quanto eu sou corajosa por enfrentar

o câncer com uma atitude tão positiva.

– E por quê? – perguntei de novo.

– Bem, porque na vida há coisas piores do que a morte. Quando

se enfrenta uma depressão profunda que nos faz ter pensamentos

suicidas, descobre-se que há coisas piores do que perder a vida física.

A morte não é a nossa maior ameaça. Perder a força para enfrentar

a vida é pior.

Debbie sabia que nem só de pão viverá o homem. Nós, seres hu-

manos, temos a capacidade de transcender as necessidades mais

elementares de controle para viver com autoridade por alguma

coisa maior do que nós. No momento em que Debbie percebeu que

era Deus, e não ela, quem estava no controle, foi possível enfrentar

qualquer problema com uma confiança que impressionava a todos

que a conheciam. Esse é o tipo de poder que Satanás nunca pôde

compreender inteiramente.

MEDO, ORGULHO E DESEJO DE DOMINAÇÃO

Depois de Jesus recusar a oferta de comida naquele deserto, o demô-

nio resolveu tentá-lo novamente, dizendo-lhe que se atirasse do alto

de uma montanha para ver como Deus o salvaria. Satanás achava

que todo mundo tinha medo de morrer. Mas Jesus retrucou: “Não

ponha à prova o Senhor, o seu Deus” (Mateus 4:7). Satanás sabia

bem usar o medo para fazer as pessoas terem desejo de dominação,

22 O poder da personalidade de Jesus

mas Jesus não tinha medo, pois sabia que os pedidos feitos a Deus

por domínio físico eram extremamente superficiais se comparados

ao poder que vem de um relacionamento com ele.5

Então, por fim, o tentador levou Jesus para a montanha mais

alta de todas e ofereceu-lhe o domínio sobre o mundo e sobre tudo

o que havia nele, se ele o adorasse. Satanás achava que sabia o que

todas as pessoas secretamente desejam – o poder de governar o

mundo. Mas Jesus, mais uma vez, o venceu, por sua completa au-

sência de orgulho. Enquanto Satanás lhe oferecia o domínio sobre as

necessidades físicas, sobre a própria vida e até sobre todas as coisas

do mundo, Jesus estava focado na sua relação pessoal com Deus e

as pessoas, e não em conquistar o mundo para si mesmo. Domínio

sobre as pessoas era uma coisa insignificante se comparada com a

razão por que Jesus veio – exercer uma autoridade amorosa no co-

ração dos seres humanos.

Depois disso, Satanás retirou-se. Esse texto do Evangelho concen-

tra-se na capacidade de Jesus para escolher servir a Deus – o bem – e

não a Satanás – o mal. Ao fazer essa escolha, Jesus deu uma demons-

tração clara da natureza do poder.

Pense nisso. Por que Jesus não atacou Satanás com mil descargas

de raios e depois estabeleceu um reinado de bondade na Terra, do

qual ele seria governante supremo? Ele mesmo poderia ter escrito

a Bíblia, nomeado seus discípulos como ministros de seu reino e

estabelecido regras claras sobre como todos nós deveríamos agir.

Pense nas inúmeras guerras que poderiam ter sido evitadas, em

toda a pobreza que teria sido erradicada e em todo o sofrimento

humano sem sentido que nunca teria acontecido nos últimos 2 mil

anos. Se ele tivesse feito isso, nós seríamos mais felizes e viveríamos

em harmonia.

Mas Jesus não fez nada disso. E nós estamos apenas começando a

entender a grandeza de sua escolha. Satanás nos tenta com o desejo

de domínio para encobrir nossos medos e satisfazer nosso orgulho.

Deus, porém, nos oferece a capacidade de viver com uma autoridade

Jesus versus Darth Vader 23

pessoal que vem do nosso relacionamento com Ele e com as pessoas.

É possível conseguir um controle sobre o medo e o egoísmo, mas há

um tipo diferente de poder que não está baseado no medo ou no

orgulho e que nada tem a ver com domínio ou controle. Um poder

que multiplica nossa capacidade muitas vezes mais do que alguém

pode alcançar sozinho.

Jesus disse a alguns judeus que o perseguiam: “Por mim mesmo,

nada posso fazer... pois não procuro agradar a mim mesmo, mas

àquele que me enviou” (João 5:30). Esse não é o poder de domina-

ção e controle para benefício próprio. É o poder para exercer autori-

dade em relacionamentos horizontais com as pessoas, com base em

um relacionamento vertical com Deus. Domínio exterior é apenas

uma força para manter os outros submissos. Autoridade, ao contrá-

rio, é um poder que transforma os corações. Satanás nos tenta com

o desejo de dominar as pessoas e as situações, mas Deus nos criou à

sua imagem para viver com autoridade.

De um modo ou de outro, todos nós passamos pela prova que

Jesus enfrentou com Satanás naquele deserto. Sem dúvida, ter domí-

nio completo sobre o nosso mundo e sobre tudo o que há nele soa

atraente para a maioria. É verdade que se pode dominar as pessoas

pela força durante algum tempo – às vezes até por um longo tempo.

Mas Deus fez o Universo para que esse tipo de poder não dure para

sempre.

É possível obter coisas pela força, mas a única maneira legítima

para viver com os outros é por meio da autoridade que vem da in-

fluência pessoal.6 Ninguém possui autoridade legítima por si mes-

mo. A autoridade foi criada por Deus para existir entre as pessoas no

momento em que elas estabelecem um verdadeiro relacionamento

umas com as outras, mas é retirada quando não o fazem.

Muitos livros foram escritos para provar que poder pessoal

é a capacidade de estar no controle. Na verdade, a maioria dos

best-sellers sobre como ter sucesso nos negócios, levar vantagem

sobre os outros ou até sobre como conquistar as pessoas mais

24 O poder da personalidade de Jesus

atraentes tem como base essa definição de poder. O conselho que

se recebe desses livros é que precisamos estar no controle para ter

poder de conquista. Mas Jesus nos oferece uma orientação bem

diferente.

Um desses best-sellers sobre o poder7 nos diz: “Nunca confie de-

mais nos amigos, aprenda a usar seus inimigos.” Mas Jesus diz: “Eu

vos chamei de amigos.” O livro afirma também: “Mande os outros

fazerem o trabalho para você, mas sempre fique com o crédito.”

Jesus porém disse: “Bem-aventurados os humildes.” O mesmo livro

de autoajuda prossegue: “Use uma honestidade e uma generosidade

calculadas para desarmar suas vítimas.” Mas Jesus nos diz: “Dê como

lhe foi dado.” O tal livro diz ainda: “Esmague seus inimigos.” Jesus,

entretanto, nos ensina: “Ame seus inimigos.”

Se você não entendeu ainda que há formas diferentes de poder,

ficará confuso com essas contradições. Geralmente, nós queremos

dominar para obter benefícios. No entanto, precisamos é de autori-

dade para viver por algo maior do que nós mesmos. Tanto o domí-

nio quanto a autoridade podem ser definidos como poder, mas eles

produzem coisas muito diferentes para você e em você.

POR QUE AS PESSOAS QUEREM TER DOMÍNIO

Se viver com autoridade é mais eficaz, por que tanta gente quer ter

mais domínio? Há duas respostas básicas para isso.

A primeira é que as pessoas têm medo.

O meu paciente John tinha muito medo, e por isso queria deses-

peradamente ter mais domínio. A sua dor era tão intensa, que ele só

desejava que ela desaparecesse. O domínio é um antídoto para a dor

e pode aliviar-nos de nossos medos. Ele lhe permite levantar muros

de autoproteção, mas dessa forma a influência dos outros em sua

vida fica bloqueada. O objetivo do domínio é fazer as coisas ruins

pararem de acontecer. E o objetivo da autoridade é fazer as coisas boas

Jesus versus Darth Vader 25

acontecerem. Como John aprendeu, controlar os medos não gera

crescimento, mas penetrar no coração machucado que sente medo

leva ao crescimento.

Embora o medo seja uma forte motivação para que se deseje mais

controle e domínio, ele não é a única.

A segunda razão para as pessoas quererem sempre dominar é o

orgulho.

Vou dar um exemplo real de alguém que lutou com o medo, o

orgulho e o desejo de ter mais domínio na busca de poder pessoal

para a sua vida.

A HISTóRIA DE ANDERSON

Anderson cresceu em uma região muito pobre da cidade, onde

sempre se sentiu controlado, ou por traficantes de drogas, ou pela

polícia. Ele enxergava o poder em termos muito simples – lute para

ter domínio se quiser continuar vivo.

Anderson mora na favela de uma grande cidade brasileira. As

lutas por poder são um meio de vida quando se cresce em um nicho

de pobreza de um país que convive com o crime e onde a violência

é muito grande. Há poucas coisas no mundo que clamam mais pelo

uso do poder do que a pobreza extrema e a violência.

Anderson ia dormir toda noite com o barulho de tiros e de pes-

soas gritando. Ainda bem jovem, ele se envolveu com uma facção

criminosa, porque isso parecia o único jeito de conseguir proteção.

Hoje, mais da metade dos seus amigos de infância estão mortos ou

na cadeia. Vivendo entre pessoas indefesas, ele tentava desesperada-

mente encontrar poder para sobreviver.

Em agosto de 1993, aconteceu uma coisa terrível que mudou a vi-

da de Anderson. Seu irmão foi morto quando a polícia invadiu a fa-

vela. O irmão não tinha envolvimento com o tráfico, e sua morte foi

uma perda injustificável e sem sentido. Anderson ficou inconsolável

26 O poder da personalidade de Jesus

e ansioso por vingança. A polícia tinha eliminado alguém muito

precioso, e ele se sentiu no direito de buscar retaliação. Ele sabia que

os chefes do tráfico vingavam cada assassinato de seus familiares

matando policiais e quis agir da mesma forma com relação à morte

imperdoável de seu irmão inocente. Sua reação inicial era compre-

ensível, mas tinha como raiz o orgulho.

Orgulho é o sentimento da importância do que é devido a nós

mesmos e está apenas focado nas nossas necessidades. O orgulho

de Anderson o levou a querer ter o domínio da situação e acertar

contas com a polícia. Porém, ele estava tão abalado pela morte do

irmão que alguma coisa muito relevante aconteceu dentro dele. No

começo, ele mesmo estranhou quando essa pergunta brotou em seu

interior. Em vez de “Como posso me vingar?”, ouviu seu coração

dizer “Como podemos acabar com essa violência?”.

Em vez de alimentar o desejo de vingança que só causaria uma

violência maior e batalhas infindáveis pelo poder, Anderson co-

meçou a sonhar com uma vida melhor. Então decidiu lutar. Mas,

dessa vez, por uma vida melhor para ele e para sua comunidade.

Anderson percebeu que precisava conseguir poder para mudar o

seu mundo. Tentar controlar a ação da polícia ou dos chefes do

tráfico não era mais o caminho. Ele precisava de uma nova forma

de poder para sobreviver.

Anderson começou canalizando sua energia para reformar a

sua comunidade e ajudou a criar um grupo de músicos chamado

AfroReggae, que influenciaria os jovens sem rumo da favela e os

ensinaria a tocar instrumentos e a dançar. Ele proporcionou a esses

jovens uma identidade e uma visão que trouxe sentido às suas vidas.

A música e a dança de rua do AfroReggae foram tão marcantes, que

centenas de crianças da comunidade quiseram fazer parte do grupo.

Muitos dos amigos de Anderson acharam que era uma reação estra-

nha à morte do irmão, mas ela acabou sendo uma resposta muito

poderosa. Hoje, o projeto AfroReggae beneficia milhares de crianças

e jovens de diversas comunidades.

Jesus versus Darth Vader 27

Anderson abandonou as drogas, a obsessão por dinheiro e o de-

sejo de dominar os outros. Ele conseguiu alguma coisa muito mais

poderosa do que a vida na criminalidade seria capaz de lhe dar.

Hoje, Anderson inspira respeito. Ele foi impotente para evitar o que

aconteceu com seu irmão, mas aprendeu que ser ferido não faz de

alguém uma pessoa fraca. Ao contrário, é uma experiência que nos

dá a oportunidade de reagir positivamente.

Anderson resolveu parar de buscar o poder sobre os outros e, em

vez disso, decidiu criar poder com os outros. Em vez de tentar con-

trolar as pessoas, ele escolheu liderá-las com autoridade. Autoridade

é o compromisso que uma pessoa assume de servir de inspiração

para que os outros se tornem aquilo para o qual foram criados.

Para atingirem o melhor de si mesmos. Era uma nova forma de

poder, algo criado entre os membros do grupo quando trabalhavam

juntos. Uma experiência de poder criada em conjunto por pessoas

que brilharam na sua capacidade de superar circunstâncias difíceis

e limitações individuais em tempos de carência.

A Bíblia nos diz que Deus criou o mundo de modo que nós pos-

samos descobrir o poder verdadeiro se o procurarmos. “Pois desde a

criação do mundo os atributos invisíveis de Deus, seu eterno poder

e sua natureza divina têm sido vistos claramente, sendo compreen-

didos por meio das coisas criadas” (Romanos 1:20). Você escolhe.

Você pode procurar ter poder sobre as pessoas e cair na armadilha

de só investir na riqueza material, na dominação e em outros ídolos

que nunca lhe satisfarão completamente. Ou pode escolher buscar

a autoridade junto com os demais, ocupando seu lugar no Universo

como alguém que não está acima dos outros, mas que é capaz de

ficar ao lado deles e incentivá-los a buscar em primeiro lugar a vida

que Deus planejou para todos os seres humanos. Esse tipo de poder

é possível porque nós fomos criados à imagem de Deus e podemos

ser usados por ele para inspirar todas as pessoas que nos cercam.

Eu não sei como Anderson chegou a essa mudança de compreen-

são do que é o poder. Talvez eu venha a conversar sobre isso com ele

28 O poder da personalidade de Jesus

um dia. Não posso deixar de acreditar que os ensinamentos de Jesus

tiveram algum papel na sua transformação e na descoberta do poder

da autoridade. Cada um de nós é capaz de escolher seguir ou não o

exemplo de Jesus. Não se trata de uma religião, de uma filosofia ou

de uma ideologia – trata-se de uma maneira de viver. Aqueles que

descobriram esse estilo de vida mudaram tanto a própria perspecti-

va quanto o caminho de milhares de pessoas ao seu redor. Viver com

autoridade significa comprometer-se com o bem dos outros e abrir

mão do medo e da satisfação do próprio orgulho. Anderson desco-

briu que esse é o estilo de vida mais poderoso, mesmo nas situações

mais difíceis. Deus vem e nos fortalece quando escolhemos viver da

maneira para a qual fomos criados. Viver comprometido com o bem

dos outros, em vez de controlá-los e dominá-los, reflete a imagem

de Deus na Terra e mostra a sua natureza divina na criação. Quer

Anderson atribua ou não sua transformação a Deus, ele sabe que

escolheu o modo de vida mais poderoso.

PODER COM OS OUTROS OU PODER SOBRE OS OUTROS

Se lhe fosse dada a oportunidade de dominar o mundo e tudo o

que há nele, talvez não fosse fácil recusar a oferta. Jesus foi capaz de

transcender suas necessidades físicas mais básicas, mas isto segura-

mente não seria tão fácil para nós, simples mortais.

Mas não é porque uma coisa é mais básica que ela se torna mais

forte. Essa é a lição que John, Debbie e Anderson aprenderam ao lutar

para ter uma vida melhor. O controle físico pode ser tirado de nós,

mas a autoridade pode ser renovada cada vez que nos conectamos

com Deus e com as pessoas. Somos capazes de superar as situações

mais desesperadoras com o poder que emana das relações pessoais.

Como fomos criados à imagem de Deus, possuímos um poder

extraordinário que é revelado por meio dos relacionamentos. Os

Jesus versus Darth Vader 29

psicólogos constataram que o poder que emana de nossas relações

com o próximo é um fundamento indispensável para desenvolver o

potencial humano. Nós descobrimos que o poder pessoal verdadei-

ro é o poder com os outros e não sobre os outros.

RESOLVENDO AS LUTAS PELO PODER

Há muitos anos eu quis trabalhar com pré-adolescentes porque

achava que poderia fazer diferença na vida deles quando ficassem

mais velhos. Eu sabia que não iria ser fácil por tudo o que havia

escutado sobre os conflitos com jovens, mas decidi ser professor em

uma igreja local. Procurei os líderes da igreja e eles foram mais do

que receptivos. Imagino que não devia haver muitos pretendentes

para o cargo.

Eu estava ao mesmo tempo entusiasmado e temeroso antes

da primeira aula. Não sabia muito sobre ensino, mas achava que

aquele era provavelmente um bom lugar para começar. Preparei

um longo plano de aula, mas esgotei-o antes mesmo que soasse

o sinal. Sentir-se despreparado diante de um grupo de adoles-

centes é assustador. No instante em que parei de falar, os alunos

transformaram a sala de aula em um caos. Os últimos 15 minutos

exigiram mais de mim do que o tempo em que dei a aula e as horas

de preparação. Naquele momento percebi que era indispensável

estar preparado.

À medida que as aulas foram transcorrendo, pude criar um bom

relacionamento com os garotos. Lembro-me de Allen, que era filho

de um dos líderes da igreja. Por isso eu queria deixar uma boa im-

pressão nele.

Allen se vestia de maneira despojada, seu cabelo comprido caía

sobre o rosto, impedindo que as pessoas vissem seus olhos. Ele

não economizou palavras para expressar sua revolta por ter sido

obrigado a frequentar minha turma e, a fim de me ridicularizar,

30 O poder da personalidade de Jesus

abaixava a cabeça nos primeiros minutos de aula, como se estivesse

dormindo. Apesar disso, eu me recusei a entrar em conflito direto

com ele. Achava que era isso que ele queria: que eu o confrontasse

ou criticasse o seu comportamento. Optei, porém, por tratá-lo com

o devido respeito. Era a minha primeira experiência como profes-

sor e eu não tinha ideia de como controlá-lo, mas queria ser uma

influên cia positiva na vida dele. Combati meu medo de fracassar e

pedi a Deus que me inspirasse as palavras certas para me comunicar

com Allen. Isso me deu a força necessária para rebater com humor

seus comentários irados. Acho que ele não esperava que eu reagisse

dessa forma à sua falta de respeito e isso acabou gerando um novo

tipo de relacionamento entre nós dois, o que me dava esperança de

fazer alguma diferença na vida dele.

Com o passar do tempo, eu me mudei para um bairro distante

da cidade e deixei o cargo de professor da escola dominical. Avaliei

que tinha sido uma experiência de crescimento para mim. Aprendi

muitas coisas com aqueles adolescentes, mas não tinha certeza se al-

gum deles tinha aprendido algo comigo. Principalmente quando me

lembrava de Allen, eu tinha quase certeza de que ele nunca ouvira

uma palavra do que eu dizia na sala de aula.

Certa noite, anos depois, alguém tocou a campainha do meu

apartamento. Para minha surpresa, era Allen. Ainda se vestia da-

quela maneira despojada e usava cabelo comprido, mas agora preso

em um rabo de cavalo. Quase não o reconheci por causa do sorriso

largo com que me saudou.

– Mark – disse ele alegremente quando eu abri a porta.

– Allen? – reagi com surpresa.

– Bom ver você – ele replicou de maneira inesperada.

– Bom ver você também – eu disse sem disfarçar a surpresa.

– Estou feliz por tê-lo encontrado – disse Allen, apertando firme

a minha mão. Esse gesto de confiança era estranho vindo da parte

dele, mas retribuí da mesma maneira, o que fez com que nos sentís-

semos bem.

Jesus versus Darth Vader 31

– Entre – eu disse, recuperando-me. – Como me encontrou? – per-

guntei, sem saber o que dizer.

– Olha, não foi fácil. Mas eu precisava ver você – disse Allen en-

quanto entrava em meu apartamento, com a cabeça erguida.

– Então, o que está acontecendo? – perguntei um tanto timida-

mente, com medo da resposta.

– Ah, está tudo bem – ele respondeu, com um jeito animado que

eu nunca vira antes. – Eu só queria lhe dizer obrigado – completou,

me olhando direto nos olhos. – Quer dizer, aquelas coisas que você

ensinou na escola dominical realmente me tocaram. Tenho certeza

de que eu não seria o homem que sou hoje se não fosse você. Eu

entendo agora. E só queria agradecer pela influência que teve em

minha vida.

Fiquei sem palavras. Aquilo parecia surreal. O garoto que eu con-

siderava menos promissor agora me aparecia como um rapaz ma-

duro. Não sei qual de nós dois estava mais grato naquele momento.

Pude entender, então, por que os professores se dedicam tanto ao

seu trabalho. Momentos como aquele fazem tudo valer a pena.

O relacionamento com Allen me ajudou a compreender algo

importante sobre as lutas pelo poder. Lutas pelo poder são resultado

de pessoas lutando pelo controle, e só são resolvidas quando alguém se

rende à autoridade. Eu não resolvi a minha luta pelo poder brigan-

do com Allen nem cedendo a ele, mas tive que renunciar à minha

necessidade de controle para causar um impacto na vida do rapaz.

Jesus não dominava. Ele falava com tamanha autoridade que

levava as pessoas a quererem ser diferentes. Eu fui tentado a me es-

tressar com Allen, disputando o controle da sala de aula quando tive

receio de não estar fazendo um bom trabalho. Mas me voltei para

Deus, pedindo-lhe força para, em vez de tentar exercer o controle,

falar com autoridade. Ao contrário de tentar dominar Allen, eu pro-

curei inspirá-lo. Hoje percebo que esse tipo de autoridade transfor-

ma internamente as pessoas, em vez de dominá-las externamente.

Esse é o poder verdadeiro com os outros, e não sobre os outros. Não

32 O poder da personalidade de Jesus

sei o que aconteceu com o resto da turma, mas a transformação de

Allen fez tudo aquilo ter valido a pena.

Jesus ensinou que para sermos fortes precisamos ser fracos. Ele

disse que devemos ser os últimos para sermos os primeiros e que

para achar o poder verdadeiro temos, antes, que nos perder. Para Je-

sus, os realmente poderosos desejam contribuir para o crescimento

dos outros, em vez de dominá-los. Esta é a autoridade pessoal que

resolve as lutas pelo poder e que inspira as pessoas a mudarem por

dentro.

De acordo com Jesus, poder pessoal começa com renúncia. E isso

é oposto a tudo o que Darth Vader representa. Se o seu principal

desejo é dominar os outros, renunciar a esse poder significa derrota.

Porém, se você deseja ter uma autoridade verdadeira com os outros,

renunciar ao poder que controla e domina é o primeiro passo para

conquistar seu objetivo.

Apesar de não possuir nada, de ter apenas 33 anos de um minis-

tério itinerante sem apoio da mídia e de nunca ter escrito um livro,

Jesus tem cerca de 2 bilhões de seguidores dedicados no mundo de

hoje. Isto é poder. Seu estilo de influência foi diferente do estilo dos

líderes que surgiram antes dele, mas ninguém desde Jesus deixou

uma marca tão ampla e duradoura no mundo. Nenhum rei na

história, nenhum comandante de exército, nenhum líder mundial

governou uma multidão maior do a que Jesus governa no mundo

de hoje.

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