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Mário de Andrade e a Cultura Afro Brasileira 1

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Linha do Tempo que mostra as relações de Mário de Andrade, autor de Macunaíma, com a cultura afro-brasileira

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Page 1: Mario de Andrade Afro - linha do tempo

Mário de Andrade e a Cultura Afro Brasileira

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Mário de Andrade e a Cultura Afro Brasileira (Linha do tempo)

Renato Araújo ([email protected]), 2012.

1904 – Em Agosto, Nina Rodrigues lança “As Belas Artes nos Colonos Pretos do Brasil”.

1905 – Nina Rodrigues termina a redação do livro “Os Africanos no Brasil”, a respeito desse livro, Mário de Andrade absolve as ideias raciais obsoletas do autor dizendo: “Se as conclusões a que [Nina Rodrigues] chegou sobre o negro e o mestiço caíram com as teorias raciais do seu tempo, a documentação mantém todo o seu valor, pela sua qualidade e pela situação histórica, pois Nina Rodrigues ainda alcançou africanos puros no Brasil".

1907 – Pablo Picasso Pinta Les Demoiselles d' Avignon, quadro inaugural do cubismo, concebido sob o influxo da arte africana. (início do interesse das vanguardas europeias no “primitivismo” indigeno-africano).

1915 – Nasce (18 de Outubro) em Uberlândia (MG) o ator Grande Otelo, que imortalizaria a personagem do anti-herói “Macunaíma” no cinema nacional.

1918 – Arthur Ramos lança O Colono Preto como Fator de Civilização Brasileira. Ramos, futuramente, estreitará seus laços de amizade com Mário de Andrade, enviando-lhe livros seus e discutindo por meio de cartas as questões referentes aos negros brasileiros.

1919 – Viagem a Minas Gerais - “descoberta” de Aleijadinho

1920 – Mário publica o livro resultante de sua visita a Minas Gerais e da conferência que organizou no ano anterior “A Arte Religiosa no Brasil”, nesse livro o escritor inicia a busca dos parâmetros daquela que considerará “a maior mulataria” presente nas artes plásticas dos setecentos e oitocentos. A busca por uma arte genuinamente brasileira faz o autor considerar que Aleijadinho, “é o único artista brasileiro que eu considero genial, em toda a eficácia do termo”.

1924 – “Viagem de descoberta do Brasil” realizada pelo grupo modernista às cidades históricas de Minas Gerais (Mário, Oswald de Andrade, Tarsila, Blaise Cendrars entre outros).

1925 – Encontro com Pixinguinha, que lhe informa sobre a macumba carioca (informações estas que foram incluídas, posteriormente, no seu texto Macunaíma.

1926 – Começo da redação de Macunaíma.

1928 – Viagem ao Nordeste (relatadas em “O Turista Aprendiz”) com objetivo de pesquisa do folclore musical (catimbó, bumba-meu-boi, congo, caboclinho, cocos, entre outros – o autor pretendia publicar um livro “útil aos músicos” que imaginou chamar-se “Na Pancada do Ganzá”, incacabado, mas posteriormente organizado com outros títulos por Oneyda Alvarenga, sua ex-aluna e grande divulgadora de sua obra). Além disso, Nessa viagem, por

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extensão, parece completar para si, em anotações, sua análise da característica colonial nordestina em complemento à que estudou em Minas Gerais.

– Participa de ritual afro brasileiro em que “fecha o corpo” (no Catimbó de dona Plastina, em Natal).

– Escreve o texto “O Aleijadinho e sua posição nacional” (texto que será reformulado até 1935).

– Encontro em Maceió com o poeta Jorge de Lima (autor de “Calunga”, “poemas negros” e “invenção de Orfeu”) e com José Lins do Rego (então, “fiscal de bancos” e posterior autor de “Fogo Morto” e “Cangaceiros”).

1928 – Em Agosto, publica o artigo “Romance do Veludo” na Revista de Antropofagia, a.1, no. 4. Nesse artigo Mário de Andrade analisa a história do palhaço de pele negra e a herança musical afro-brasileira. Em setembro, no mesmo periódico, publica o texto “Lundu do Escravo”.

1929 – Visita rápida à Bahia em Fevereiro, onde vê obras de José Teófilo de Jesus, que considerou “tiepolesco”(referência ao pintor italiano Giovanni Battista Tiepolo (1696-1770) cujas pinturas possuiam um estilo grandioso e opulento).

– Início das visitas ao interior paulista procurando conhecer as manifestações populares existentes em torno da cidade de são Paulo (Piracicaba, Santa Isabel, Lindóia, São Luís do Paraitinga, Carapicuíba, Mogi das Cruzes, Embu, São Miguel, entre outras). Em suas anotações e algumas filmagens, vê-se que documentou em Piracicaba os “Congos, Moçambiques e Caiapós”; em Santa Isabel, esperando assistir a “congada”, deparou-se com um “moçambique”, presenciando, por fim a “congada”, apenas em Lindóia; em São Luís do Paraitinga (provavelmente) anotou informações sobre o “Jongo”, a “Festa do Divino” em Mogi (que inclui filmagens) e a “Dança de Santa Cruz” em Carapicuíba.

1930 – Publica em abril o artigo: A Negrada. Movimento Brasileiro, a. 2, no. 16 (contando com ilustração de Di Cavalcanti).

1931 – As figas em sua maioria, com a cor preta e vermelha, também fazem parte da coleção de Mário de Andrade. Comuns no Xangô de Recife e no imaginário afro-católico, uma figa alongada em especial pertencente ao acervo foi fruto de uma batida policial em um centro espírita de Guarulhos, São Paulo, em 1931. Sua dona foi presa e a peça foi apreendida pela polícia (uma de muitas que foram incluídas posteriormente ao acervo do escritor).

1934 – 1º. Congresso Afro-Brasileiro (Recife). Embora tenha sido convidado a palestrar, Mário de Andrade não participou, porém, enviou sua comunicação “A calunga dos Maracatus”, publicada no 1º. Volume de trabalhos do Congresso, onde faz uma longa análise da boneca do maracatu, apresentando-a antropologicamente como um atributo político-religioso dos chefes africanos e ressaltando seu significado religioso: “um objeto de função e finalidade mística, derivado de costumes congueses tradicionais”.

1933 – Inicia o texto Música de Feitiçaria no Brasil.

– Início de sua Correspondência com Arthur Ramos discutindo trabalhos sobre os negros brasileiros e suas contribuições.

– Gilberto Freyre publica Casa Grande e Senzala no Rio de Janeiro.

1935 – Nina Rodrigues publica Os Africanos no Brasil em São Paulo.

– “Descoberta” da pintura do Padre Jesuíno Monte Carmelo, da qual Mário será um grande entusiasta, estudando-a a fundo.

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– Publica o artigo “O Aleijadinho e Álvares de Azevedo” pela R. A. editora, no Rio de Janeiro.

1937 – 2º. Congresso Afro-Brasileiro (Salvador), Mário também não participa, porém, enquanto Diretor do Departamento de Cultura envia como representante o compositor Camargo Guarnieri (quem visitou terreiros de candomblé e grafou em partituras as melodias de cultos afros na Bahia, coletando cerca de 30 instrumentos musicais e objetos de culto para o museu da Discoteca, sendo um dos possíveis coletores das peças afro-brasileiras (sobretudo do complexo cultural iorubano) que passaram a pertencer ao acervo pessoal de Mário de Andrade, especialmente um Oxê de Xangô – assim nomeado por Mário em 1944, mas possivelmente confundido como uma Iemanjá ou Janaína, na década de 30 – e uma estatueta de Exu). Também faz parte da coleção do escritor exemplares de cultura Banto, por exemplo, um bastão antropomorfo do povo Kuyu (República Democrática do Congo).

– Escreve artigo sobre o “Samba Rural Paulista”, fruto de suas pesquisas de campo na cidade de Pirapora..

– Viagem a Atibaia (SP) aonde assiste a “Congadas” e manifesta a intenção de trazer grupos de lá para apresentarem em São Paulo nas comemorações do Cinquentenário da Abolição da Escravatura. João Batista Conti (então prefeito de Atibaia) dá-lhe alguns exemplares da indumentária da Congada.

– O autor vinha preparando um discurso para abertura das Congadas (não pronunciado devido seu cancelamento). Parte desse discurso foi publicado por Mário no ano seguinte com o título “A superstição da cor preta” e em diversas edições posteriores, primeiramente em Publicações Médicas (jun./jul) 1938 e em Boletim da Sociedade Luso Africana, dez. 1938; e ainda em Pensamento da América, set. 1942. Perguntado a respeito das fontes para esse trabalho, Mário, em tom desgostoso e irônico, responde por carta: “A Superstição da cor preta não foi publicada em livro, nem sabia que fora transcrita no Boletim da Sociedade Luso-Africana, (...). Minha nota foi publicada aqui, numa revista de propaganda de remédios, Publicações Médicas. Fez parte do discurso inaugural das festas do Cinquentenário da Abolição (...). Mas isto se dava durante a mudança de governo, eis que eu saía do meu lugar e o prefeito novo, aliás sob muitos aspectos admirável, acabou com o resto das celebrações, porque também sofria da superstição.”

1938 – No dia 2 de Maio, Mário ainda era Diretor do Departamento de Cultura, foi realizada uma sessão solene das associações negras de São Paulo. Outros eventos relacionados às comemorações do Cinquentenário, como as Congadas de Atibaia que viriam a São Paulo, foram cancelados.

– Luiz Saia (“parceiro” e “fornecedor” de obras a Mário de Andrade) “descobre” a abundante produção nordestina de ex-votos, identificando nessas peças a permanência de características da escultura africana apontadas no livro Escultura Popular Brasileira (1944). Ainda no final dos anos 30, adquire na feira da Penha, em São Paulo, alguns “nó-de-pinho” (santos-miniatura), alguns dos quais farão parte da coleção de Mário de Andrade.

– Missão de Pesquisas Folclóricas – financiado pelo departamento de cultura, Mário de Andrade (então diretor deste departamento) reuniu em viagens pelos interiores do país diversos objetos da cultura popular. Alguns desses objetos hoje pertencentes ao IEB (Institutos de Estudos Brasileiros) da Universidade de São Paulo, são objetos de culto afro-brasileiros provindos Recife.

– No dia 13 de Fevereiro, Luiz Saia chega a recife com objetivo de coletar peças para o Departamento de Cultura e, consequentemente, para Mário de Andrade. Os jornais noticiam neste mesmo dia o fechamento de 22 centros de Xangô e Catimbó, a prisão de seus chefes e participantes, com apreensão dos objetos rituais. Frutos da repressão policial, (ocorridas também em Maceió, Salvador realçadas desde o final do século xix até as primeiras décadas do séc. xx.) parte desses objetos foram perdidos ou espalhados por coleções diversas, dentre elas, a do próprio Departamento de Cultura de São Paulo (e hoje, algumas poucas fazem parte da Coleção de Artes Visuais do IEB-USP

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e as peças que pertenceram ao museu da Discoteca encontram-se atualmente(2004) no Centro Cultural São Paulo, bem como a documentação e os registros das tentativas de classificação dos objetos). Entre as peças que ficaram com Mário de Andrade, chama-nos a atenção os objetos de culto e amuletos, especialmente os cachimbos de candomblé-de-caboclo e xangô-de-caboclo. O escritor estudou detidamente o Catimbó do recife, do qual também possuía um cachimbo entalhado em madeira.

– Comunicações apresentadas em reuniões da Sociedade de Etnografia e Folclore neste ano, particularmente a de Dalmo Belfort de Matos “As Macumbas em São Paulo”, dão conta de que Mário de Andrade havia frequentado casas de culto na cidade e que “também constatou a pobreza dos objetos rituais”. O escritor apresentou sua comunicação sobre as “cavalhadas”.

1939 – 29 de março, escreve o artigo “Linha de Cor”, publicado em O Estado de São Paulo, em que apresenta alguns ditados populares que fazem referencia a negros como indicativos da existência de discriminação no país e a frente do seu tempo distinguindo o preconceito racial do preconceito de classe. Afirma em seu artigo: “O preconceito de cor existe incontestavelmente entre nós. Porém, me parece que na sua complexidade e sutileza temos que não confundi-lo com um problema de classe, não só para não exagerá-lo em sua importância, como para lhe dar melhor luz de ciência e não enfraquecê-lo em suas provas legítimas.” O escritor reforça ainda “(...) um novo preconceito de liberalismo que de tudo isso nos veio e que faz a espécie de ‘ariano’ brasileiro dar sem nenhuma reserva a sua mão a um negro, seriam provas concludentes de que no Brasil não existe linha de côr. Mas se formos auscultar a pulsação mais íntima da nossa vida social e familiar, encontraremos entre nós uma linha de côr bastante nítida (...)

1944 – Em 25 de janeiro, Mário de Andrade escreve o poema, publicado postumamente “Nova Canção de Dixie” em que critica o racismo norte-americano e que, embora achasse que a sátira tinha sido mal feita, gostaria que tivesse um “efeito corrosivo”. Cinco dias antes, diante da primeira versão do poema, o escritor envia uma carta a Manuel Bandeira com intenção de tirar dúvidas com o texto em inglês e dizer que não quer publicar sua sátira de combate “porque não convém, pois sou ‘Nações-Unidas’, eu esculhambo os EUA por causa da linha-de-cor. A ideia nasceu da irritação que me causaram as várias recusas (que fui obrigado a explicar) escusas dolorosas aos convites de ir visitar os States. Pois não vou numa terra que tem a lei do Linch.” (Linch = referência uma lei norte-americana usada desde antes da guerra civil, que consistia em linchamento público sem direito a julgamento de defensores dos direitos civis, negros, judeus, índios e imigrantes asiáticos. Essa lei deu origem à palavra “linchamento”, pratica utilizada pela ku klux klan contra negros desde o fim do séc.xix até a década de 1960, onde cerca de 5 mil pessoas foram assassinadas deste modo, sendo que menos de 1% dos participantes dos linchamentos foram presos).

Nova Canção de Dixie - Mário de Andrade (25/01/1944)

Kennst du das Land Où fleurit l’oranger?... [Conheces essa terra/ onde crescem laranjeiras?...]É a terra maravilhosaNascida duma barquinha“Flor de Maio” se chamava.Onde tudo o que é bom dava,Que tudo o que é rico tinha...

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Lá quem queira gozar gozaCom toda a felicidade,É só passear pela rama,É só não ser tagarela:É a terra maravilhosa,Parece com a liberdadePois já tem a estátua dela.

É a terra dos plutocratas,Palácios de cem andares,Você sai se faz questão,Mas pode ficar nos ares,É só apertar o botão,

No. I’ll never never beIn Colour Line Land [Não. Eu jamais estarei/ Na Terra da Linha de Cor]

Mas porque tanta esquivança!Lá tem Boa VizinhançaCom prisões de ouro maciço;Lá te darão bem bom lancheE também muito bom linche,Mas se você não é negroO que você tem com isso!

No. I’ll never never beIn Colour Line Land [Não. Eu jamais estarei/ Na Terra da Linha de Cor]

É a terra maravilhosaChamada do Amigo Urso,Lá ninguém não cobra entradaSe a pessoa é convidada.Depois lhe dão com discursoAbraço tão apertadoQue você morre asfixiado,Feliz de ser estimado.

No. I’ll never never beIn Colour Line Land [Não. Eu jamais estarei/ Na Terra da Linha de Cor]

1950 – Exposição póstuma do seu acervo “Coleção da família Andrade” de imagens de santos e oratórios.

Referências

ANDRADE, Mário de. Padre Jesuíno do Monte Carmelo. BARSALINI, Maria S. Ianni & MARQUES, Aline Nogueira (Eds.). Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2011.

BATISTA,Marta Rossetti (ORG.) Coleção Mário de Andrade São Paulo: Imprensa Oficial do Estado de São Paulo/Edusp, 2004. P.17/41/29/73/76.

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BOSI, A. Poesia versus Racismo Estudos Avançados vol.16 no.44 São Paulo Jan./Apr. 2002 p.235

GRILLO, Angela Teodoro Processo de Criação do Estudo ‘preto’ um inédito de Mário de Andrade Vols. 1 e 2. São Paulo: Dissertação de Mestrado – Departamento de letras Clássicas e Vernáculas, Pós Graduação em Literatura Brasileira, USP, 2010.

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