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Maria Izabel de Carvalho A favela da Rocinha e a destinação inadequada de lixo: entendendo os meandros da questão Dissertação de Mestrado Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação em Serviço Social da PUC- Rio como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre em Serviço Social. Orientadora: Prof.ª Valéria Pereira Bastos Rio de Janeiro Junho de 2016

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Page 1: Maria Izabel de Carvalho A favela da Rocinha e a … de Projetos na UCP (Universidade Católica de Petrópolis) entre 2012 e 2013. Ficha Catalográfica Inclui bibliografia. Departamento

Maria Izabel de Carvalho

A favela da Rocinha e a destinação inadequada de lixo: entendendo os

meandros da questão

Dissertação de Mestrado

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação em Serviço Social da PUC-Rio como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre em Serviço Social.

Orientadora: Prof.ª Valéria Pereira Bastos

Rio de Janeiro Junho de 2016

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Maria Izabel de Carvalho

A favela da Rocinha e a destinação inadequada de lixo: entendendo os

meandros da questão

Dissertação apresentada como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre pelo Programa de Pós-Graduação em Serviço Social do Departamento de Serviço Social do Centro de Ciências Sociais da PUC-Rio. Aprovada pela Comissão Examinadora abaixo assinada.

Profª Valéria Pereira Bastos Orientador

Departamento de Serviço Social – PUC-Rio

Profª Maria Auxiliadora ramos Vargas

UNIVERSO – Juiz de Fora/MG

Prof. Rafael Soares Gonçalves

Departamento de Serviço Social – PUC-Rio

Profª Mônica Herz Vice-Decana de Pós-Graduação do

Centro de Ciências Sociais – PUC-Rio

Rio de Janeiro, 07 de junho de 2016

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Todos os direitos reservados. É proibida a

reprodução total ou parcial do trabalho sem

autorização da universidade, do autor e do

orientador.

Maria Izabel de Carvalho

Graduou-se em Serviço Social na PUC-Rio

(Pontifícia Universidade Católica do Rio de

Janeiro) em 2010. Cursou MBA em

Gerenciamento de Projetos na UCP

(Universidade Católica de Petrópolis) entre 2012

e 2013.

Ficha Catalográfica

CDD: 361

Carvalho, Maria Izabel de

A favela da Rocinha e a destinação

inadequada de lixo: entendendo os meandros

da questão / Maria Izabel de Carvalho ;

orientador: Valéria Pereira Bastos. – 2016.

165 f.: il. color.; 30 cm

Dissertação (mestrado) – Pontifícia

Universidade Católica do Rio de Janeiro,

Departamento de Serviço Social, 2016.

Inclui bibliografia.

1. Serviço social – Teses. 2. Lixo. 3. Favela

da Rocinha. 4. Política pública. 5. Resíduos

sólidos. I. Bastos, Valéria Pereira. II. Pontifícia

Universidade Católica do Rio de Janeiro.

Departamento de Serviço Social. III. Título.

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Para meus pais, Cícera e Francisco, pelo apoio

incondicional durante essa e outras jornadas da

minha vida.

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Agradecimentos

Agradeço a Deus em primeiro lugar, por me guiar sempre, pela força e sabedoria

para ultrapassar todos os obstáculos que surgiram durante essa jornada.

A toda minha família, em especial aos meus queridos pais (Cícera e Francisco),

aos meus irmãos (Helton e André) e aos meus sobrinhos por fazerem parte da

minha vida, por compreenderem as minhas ausências mesmo em momentos

importantes da nossa vida familiar e pelo amor de todos vocês.

A todos (as) que fazem parte do meu ciclo de amizade, em especial aos (as) mais

próximos (as), que acompanharam de perto todo esse período.

A minha querida e mais que amiga, Cleonice, pelo carinho, apoio, troca e

contribuição para o meu processo de reflexão sobre determinados assuntos

referentes ao mestrado.

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Os meus agradecimentos aos moradores da Rocinha e às demais pessoas que

tornaram essa pesquisa possível.

Aos meus companheiros de turma do mestrado, em especial aos que se tornaram

mais que colegas, são hoje, amigos que essa nova etapa da minha vida me deu de

presente, como: Lívia Viana, João Silva e Tatiana Bernardes.

Aos que contribuíram ao ceder seus acervos bibliográficos.

A minha querida orientadora Valéria, pela paciência, confiança, incentivo, troca e

por todos os ensinamentos.

A coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Serviço Social, Inês Stampa,

por todo o incentivo e apoio.

A todos os professores (as) do mestrado pelos ensinamentos e contribuição ao

longo de todo esse período.

Aos funcionários do Departamento de Serviço Social, por serem sempre muito

solícitos.

A PUC-Rio, pela oportunidade de retornar a casa para mais uma etapa de

aprimoramento na minha vida acadêmica. Essa instituição simboliza muito na

minha vida pessoal e profissional.

A todos (as) aqueles (as) que direta ou indiretamente contribuíram para que eu

chegasse até aqui, muito obrigada!

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Resumo

Carvalho, Maria Izabel de; Bastos, Valéria Pereira. A favela da Rocinha e

a destinação inadequada de lixo: entendendo os meandros da questão.

Rio de Janeiro, 2016. 165p. Dissertação de Mestrado – Departamento de

Serviço Social, Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro.

O presente estudo trata sobre a problemática da destinação inadequada de

lixo na favela da Rocinha e suas implicações no contexto socioambiental, e para

embasá-lo, utilizou-se a pesquisa de cunho qualitativo onde através de entrevista

semiestruturada foi possível realizar a escuta de diversos sujeitos envolvidos no

processo, tanto do poder público, de estabelecimentos comerciais, como com os

moradores dos sub-bairros existentes na favela, objetivando compreender como

veem esta problemática e os possíveis encaminhamentos para melhor gestão do

processo a luz da Lei 12.305/2010 – Política Nacional de Resíduos Sólidos.

Palavras-chave

Lixo; favela da Rocinha; política pública; resíduos sólidos.

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Abstract

Carvalho, Maria Izabel; Bastos, Valeria Pereira (Advisor). The Rocinha

and inadequate disposal of waste: understanding the intricacies of the

matter. Rio de Janeiro, 2016. 165p. MSc. Dissertation – Departamento de

Serviço Social, Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro.

This study deals with the problem of inadequate disposal of garbage in the

Rocinha slum and its implications for the socio-environmental context , and

underlies it , we used a qualitative research where through semi-structured

interviews it was possible to hear various subjects involved in the process , both

the government, commercial establishments , as with the residents of the existing

sub- districts in the slums , in order to understand how they see the problem and

possible referrals to better management of the process the light of Law 12.305 /

2010 - National Policy Solid Waste .

Keywords

Garbage; favela da Rocinha; public policy; solid waste.

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Sumário

1. Introdução 17

2. O panorama histórico, político, cultural e econômico da gestão do lixo no Brasil

25

2.1. O contexto histórico do tratamento e destinação do lixo no Brasil

25

2.2. O traço cultural brasileiro no tratamento do lixo nas capitais e no interior do Brasil

40

2.3. A importância da legislação ambiental no cenário brasileiro

44

2.4. Lixão, aterro controlado e aterro sanitário: fontes geradoras de recursos ou promotora de desigualdade social?

53

3. A favela como ambiente de organização espacial e territorial na vida cotidiana

60

3.1. A origem da favela brasileira 60

3.2. O surgimento da favela da Rocinha nos seus múltiplos aspectos

69

3.3. As Rocinhas: conhecendo os sub-bairros 79

4. A favela da Rocinha e as diversas implicações entre a geração e a destinação inadequada de lixo

88

4.1. A produção de lixo na Rocinha: os impactos que afetam a favela

88

4.2. O papel do serviço público de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos na Rocinha

102

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4.3. Descarte inadequado de lixo para além da coleta: forma de resistência social, falta de conhecimento, questão cultural ou ausência de serviços públicos?

111

4.4. 4.4. O lixo na favela da Rocinha: a percepção dos sujeitos locais

116

5. Considerações Finais 139

6. Referências Bibliográficas 144

7. Anexos - Documentos Fotográficos 152

8. Apêndices 160

8.1. Apêndice 1– questionário para entrevista com moradores 161

8.2. Apêndice 2 – Roteiro para entrevista com garis 163

8.3. Apêndice 3 – Termo de consentimento livre e esclarecido 164

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Lista de figuras

Figura 1 - Escravo varrendo rua, Debret 29

Figura 2 - “Tigre”, JC Guilhobel, Rio de Janeiro, 1814 30

Figura 3 - Gráfico da geração de RSU 36

Figura 4 - Gráfico da coleta de RSU 37

Figura 5 - Mapa da distribuição da quantidade de RSU coletado (em percentual) no ano de 2014

37

Figura 6 - Gráfico da destinação final dos RSU - 2013 versus 2014

38

Figura 7 - Mapa das iniciativas de coleta seletiva nas regiões brasileiras e no Brasil

39

Figura 8 - Gráfico com os valores médios por habitante/ano referentes aos recursos empregados na coleta de RSU e nos outros serviços de limpeza urbana

40

Figura 9 - Ilustração esquemática de um lixão 54

Figura 10 - Ilustração esquemática de um aterro controlado 55

Figura 11 - Ilustração esquemática de um aterro sanitário 56

Figura 12 - Rocinha nos primeiros anos da década de 1930 70

Figura 13 - Uma conta de luz do ano de 1981 75

Figura 14 - Mapa da Rocinha - adaptado 80

Figura 15 - Mapa da Rocinha, por AI 91

Figura 16 Lixeira da Vila Verde – lixo do comércio posto na lixeira sem o devido cuidado

95

Figura 17 - Via Ápia – lixo do comércio local 95

Figura 18 - Via Ápia – domingo pela manhã 96

Figura 19 - Lixeira em frente às UHs – transbordando 98

Figura 20 - Adaptação “laranjões” 99

Figura 21 - Lixeira Vila Verde – junção de vários tipos de lixo – poda de árvore, móveis e lixo doméstico

100

Figura 22 - Lixeira Vila Verde – junção de vários tipos de lixo – entulho de obra e lixo doméstico

100

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Figura 23 - Lixeira Vila Verde – transbordo de escombros de obra na lixeira

101

Figura 24 - Lixeira Vila Verde – entulho de obra vira lama e escorre rua a baixo (a)

101

Figura 25 - Lixeira Vila Verde – entulho de obra vira lama e escorre rua a baixo (b)

102

Figura 26 - Lixeira da Vila Verde – lixeira vazia por volta de 21h do dia 23 de jul. 2015

104

Figura 27 - Lixeira da Vila Verde – lixeira abarrotada de lixo por volta de 7h do dia 24 de jul. 2015

104

Figura 28 - Lixo a céu aberto no Caminho do Boiadeiro 106

Figura 29 - Guardiões do Rio fazendo a limpeza do Valão 110

Figura 30 - Foto que retrata a problemática do lixo na Rocinha na década de 1970 – limpeza da encosta e lixo entre as residências (a)

118

Figura 31 - Foto que retrata a problemática do lixo na Rocinha na década de 1970 – limpeza da encosta e lixo entre as residências (b)

119

Figura 32 - Foto que retrata a problemática do lixo na Rocinha na década de 1970 – valas a céu aberto com a presença de lixo (a)

119

Figura 33 - Foto que retrata a problemática do lixo na Rocinha na década de 1970 – valas a céu aberto com a presença de lixo (b)

120

Figura 34 - Retirada de lixo da encosta pela equipe do Projeto “Olho no Lixo”

122

Figura 35 - Retirada, pela equipe do Projeto “Olho no Lixo”, uma carcaça de geladeira descartada inadequadamente

122

Figura 36 - Enchente na localidade conhecida como Valão - 12/03/2016 (a)

128

Figura 37 - Enchente na localidade conhecida como Valão – 12/03/2016 (b)

128

Figura 38 - Enchente na localidade conhecida como Valão – 12/03/2016 (c)

129

Figura 39 - Aviso informando que é proibido jogar lixo (a) 132

Figura 40 - Aviso informando que é proibido jogar lixo (b) 132

Figura 41 - Aviso UPMMR-AMABB e Região Administrativa (RA) informando que é proibido jogar lixo no local

133

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Figura 42 - Cesta de lixo antiga identificada na Dionéia 152

Figura 43 - Descarte inadequado de lixo em um corredor que fica entre dois prédios na Vila Vermelha

152

Figura 44 - “Laranjões” e ao lado lixo descartado inadequadamente – Estrada da Gávea na altura da Vila Vermelha

153

Figura 45 - Lixeira do Caminho do Boiadeiro na saída da Cidade Nova

153

Figura 46 - Caçamba móvel da Comlurb - Caminho do Boiadeiro na saída da Cidade Nova

154

Figura 47 - “Laranjões” transbordando – Estrada da Gávea na altura do Portão Vermelho

154

Figura 48 - Descarte incorreto de lixo na encosta – Roupa Suja 155

Figura 49 - Descarte incorreto de lixo na vala – Roupa Suja 155

Figura 50 - Descarte incorreto de lixo na encosta – Terreirão (a) 156

Figura 51 - Descarte incorreto de lixo na encosta – Terreirão (b) 156

Figura 52 - Lixo descartado incorretamente na encosta sendo queimado – Vila Verde

157

Figura 53 - Ponto de lixo criado pelos moradores na Vila Verde que veio a ser transformado em Chafariz por uma liderança local – ANTES

157

Figura 54 - Ponto de lixo criado pelos moradores Vila Verde e transformado em Chafariz (ainda desativado) por uma liderança local – DEPOIS

158

Figura 55 - Morador varrendo um Beco na Vila Verde 158

Figura 56 - Lixo descartado incorretamente na campanha eleitoral de 2014 – Via Ápia

159

Figura 57 - Lixo descartado incorretamente – após dia de chuva na praça junto a Unidade de Pronto Atendimento (UPA) - Vila Verde

159

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Lista de tabelas

Tabela 1 - Destino do lixo por domicílios particulares permanentes no Brasil

35

Tabela 2 - Quadro de ações e/ou legislações instituídas no decorrer dos últimos anos no Brasil, voltadas para os resíduos sólidos

50

Tabela 3 - Destino do lixo nos domicílios particulares permanentes em aglomerados subnormais

88

Tabela 4 - Total de domicílios com coleta de lixo no ano de 2010

89

Tabela 5 - Distribuição do lixo na Rocinha por AI 92

Tabela 6 - Classificação, limitações, responsabilidade da coleta, destinação e disposição final do lixo pelos pequenos e grandes geradores

93

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Lista de gráficos

Gráfico 1- Como se dá o descarte do lixo produzido nas residências

105

Gráfico 2- O que segundo os entrevistados leva parte da população residente na Rocinha a descartar o lixo de forma inadequada

112

Gráfico 3- Como os entrevistados veem a problemática do descarte inadequado de lixo na Rocinha

114

Gráfico 4- Como os entrevistados veem a problemática do descarte inadequado de lixo na Rocinha

115

Gráfico 5- Tempo de permanência dos entrevistados na favela da Rocinha

125

Gráfico 6- As principais consequências negativas causadas pelo descarte inadequado do lixo para a população da Rocinha

126

Gráfico 7- Doenças causadas por vetores ligados ao descarte inadequado de lixo

126

Gráfico 8- O que os moradores fazem quando ocorre o descarte inadequado do lixo em suas portas, becos, vielas ou nas ruas

131

Gráfico 9- Se há diferença em relação ao descarte inadequado de lixo entre os sub-bairros da Rocinha

134

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A REALIDADE DO POBRE BRASILEIRO

O pobre brasileiro

Está cada dia mais derrubado

Hoje pensa que tem salário

Amanhã está desassalariado.

Por nada pode optar,

Escola e saúde vamos ver como é que está

Pois sendo serviço gratuito ao público

O fazem do jeito que dá.

A violência nem se fala

Essa cresce em disparada

E ainda dizem que a mesma está amenizada.

Essa realidade não pode ser escondida,

Pois é a partir da mesma que há de ser descoberta

Uma solução para nossa Nação querida.

Maria Izabel de Carvalho, maio 2001.

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17

1

Introdução

Esta dissertação se constitui, inicialmente, como uma resposta as minhas

indagações, iniciadas, empiricamente, em função de questões pessoais por ser

moradora da favela da Rocinha desde 2002 e observar o descarte inadequado

de lixo, sem que houvesse maiores esclarecimentos e/ou encaminhamento da

questão pelos setores públicos, e em seguida como um desdobramento da

vivência profissional e acadêmica. Desde 2009, após a graduação, onde

passamos a redobrar o olhar sobre o fato e, portanto, nos sentirmos instigadas a

pesquisar a respeito do assunto na busca de respostas e possíveis alternativas

para sua solução.

Conforme apontado acima, o nosso interesse pelo estudo se deu a partir

da observação e de experiências vividas a respeito da presença do acúmulo

desordenado de lixo em determinadas áreas da favela da Rocinha, sobretudo no

sub-bairro conhecido como Valão, em função da nossa atuação profissional

entre os anos de 2009 e 2011, quando desenvolvíamos o trabalho de

atendimento às famílias direta ou indiretamente impactadas pelas obras do

Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) na Rocinha. Nesse período, por

termos acesso, em função das obras, a uma área geográfica da Rocinha até

então não visitada por nós anteriormente, foi possível observar uma grande

quantidade de lixo descartado de forma indevida tanto nos becos quanto dentro

dos talvegues existentes nessas localidades, com destaque para a área do

Valão. Durante uma de nossas visitas de campo, presenciamos uma moradora

que, de sua janela, lançou uma fralda descartável dentro do talvegue. A partir

daí, começamos a nos perguntar quais os motivos que levavam parte da

população da Rocinha a descartar, de forma inadequada, o lixo gerado.

A base do estudo tem relação direta com a destinação inadequada de lixo

gerado na favela da Rocinha e suas implicações na vida da população residente.

Apesar da Política Pública de Resíduos Sólidos - Lei 12.305/2010, determinar

caminhos que apontam para, além da redução, reutilização e reciclagem, novas

práticas de destinação, a fim de evitar o aumento de vetores e o adoecimento

das pessoas por contaminação do lixo, assim como evitar acidentes ambientais

na época das grandes chuvas, entre outros possíveis riscos ambientais.

Registramos que é muito recente a importância dada ao processo de gestão e

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gerenciamento do lixo, pelos municípios brasileiros, e tal prática não acontece só

no nosso país, pois de acordo com Jasem (2005), os:

[...] países do “terceiro mundo”, também passaram a dar importância para o gerenciamento do lixo municipal recentemente, o que aumenta a importância do tema em termos mundiais. Uma das razões para tal mudança de postura é o fato de inúmeras pessoas que nunca tiveram acesso à renda, estarem se tornando vorazes consumidoras, o que resulta em um aumento do impacto ambiental e gera transtornos cada vez mais visíveis para a população (Jasem apud Azevedo 2010, p.12).

Isso reforça a necessidade de que seja posta em prática, também nas

áreas favelizadas, os preceitos da Política Nacional de Resíduos Sólidos – Lei

12.305/2010, pois o consumo nessas regiões tem aumentado significativamente,

como no caso da Rocinha, cuja produção de lixo se compara a de uma cidade

de médio porte, de acordo com Azevedo (2010): “no que se refere à quantidade

de resíduos produzidos, a comunidade da Rocinha apresenta números

comparáveis aos de uma cidade média” (Azevedo, 2010, p. 42).

No entanto, o que tem sido demonstrado até pela observação de campo e

levantamento dos dados, é o retrocesso legal, na aplicabilidade das

determinações da política pública, visto que sua operacionalização tem

evidenciado a incapacidade dos gestores públicos em efetivá-la, principalmente,

em se tratando de áreas favelizadas. O que pode ser comprovado a partir do

recorte deste estudo em relação ao trato com o lixo na favela da Rocinha, por

não apresentar avanços significativos na busca de melhorias, inclusive no que

diz respeito à qualidade de vida da população, que apesar da geografia não

oferecer grandes condições de coleta regular, porta a porta, em função de becos

e vielas, o que existe disponibilizado não promove a destinação correta dos

resíduos e rejeitos produzidos, e nem promove a mobilização comunitária em

prol de um bem comum, portanto, o que se verifica é o acúmulo excessivo de

lixo, ocasionador de problemas, não só de ordem ambiental, mas de saúde e de

baixa qualidade de vida para a população local.

Diante do panorama apontado, nossa abordagem tem como ponto de

partida analisar o problema de descarte inadequado do lixo em uma das favelas

mais conhecidas mundialmente, e que segundo Azevedo (2010) é a “maior

favela urbana em área de morro da América Latina: a Favela da Rocinha”

(Azevedo, 2010, p. 12).

Neste sentido, na perspectiva de organizar estruturalmente o estudo

consideramos importante abordar num primeiro momento, o panorama histórico,

político, cultural e econômico da gestão do lixo no Brasil. Logo em seguida,

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apresentaremos dados sobre a favela como ambiente de organização espacial e

territorial na vida cotidiana. E por fim, nossa abordagem será sobre a favela da

Rocinha e as diversas implicações entre a geração e a destinação inadequada

de lixo, onde realizaremos uma análise a partir dos dados da pesquisa de

campo, aplicada com os sujeitos locais.

Esse trabalho está dividido em três capítulos. O primeiro tem como título: o

panorama histórico, político, cultural e econômico da gestão do lixo no Brasil. E

os subcapítulos estão distribuídos da seguinte forma: o contexto histórico do

tratamento e destinação do lixo no Brasil; o traço cultural brasileiro no tratamento

do lixo nas capitais e no interior do Brasil; a importância da legislação ambiental

no cenário brasileiro; lixão, aterro controlado e aterro sanitário: fontes geradoras

de recursos ou promotora de desigualdade social? Nesse capítulo, nossa

proposição é apresentar um panorama geral sobre a história do lixo no Brasil,

fazendo um breve levantamento de dados e buscando alguns conceitos

importantes que nos ajudarão a compreender este contexto, faremos também

uma análise no tocante ao viés cultural do tratamento do lixo, onde levantamos

informações sobre as leis ambientais existentes no país e sobre as formas de

destinação final do lixo, analisando se contribuem para a geração de renda ou,

ao contrário disso, se geram mais desigualdade social entre os que vivenciam tal

realidade.

No segundo capítulo abordaremos: a favela como ambiente de

organização espacial e territorial na vida cotidiana. E para melhor compreensão

nos subcapítulos será abordado: a origem da favela brasileira; o surgimento da

favela da Rocinha nos seus múltiplos aspectos; as Rocinhas: conhecendo os

sub-bairros. Buscamos através dessa parte do trabalho, apresentar a história da

favela da Rocinha, onde se dá nossa pesquisa, bem como, apesar da dificuldade

encontrada, trazer dados que nos permitissem perceber as particularidades

locais, entendendo que não existe uma Rocinha, mas sim as “Rocinhas” tendo

em vista sua pluralidade.

Por fim, porém não menos importante, vem o terceiro capítulo: a favela da

Rocinha e as diversas implicações entre a geração e a destinação inadequada

de lixo. Esse capítulo está organizado da seguinte forma: a produção de lixo na

Rocinha: os impactos que afetam a favela; o papel do serviço público de limpeza

urbana e de manejo de resíduos sólidos na Rocinha; descarte inadequado de

lixo para além da coleta: forma de resistência social, falta de conhecimento,

questão cultural ou ausência de serviços públicos? E no último subcapítulo: o

lixo na favela da Rocinha: a percepção dos sujeitos locais. Serão apresentados

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os resultados obtidos na nossa pesquisa de campo, acompanhados de uma

análise sobre a percepção dos sujeitos locais.

Objetivamos com essa dissertação, analisar o cenário do descarte

inadequado do lixo na favela da Rocinha, para que possamos entender os

meandros da questão, e a partir daí, apesar de não trabalharmos com uma

pesquisa cujo fim seja a intervenção, se possível, apontar caminhos para

minimizar ou solucionar essa problemática, além de produzirmos conhecimento

acadêmico sobre a temática, cujo levantamento bibliográfico nos levou a concluir

que é escassa a produção acadêmica na área socioambiental, principalmente,

quando tratamos desse território especificamente.

Conforme exposto acima, a pesquisa se deu na favela da Rocinha, que

conta com uma extensão territorial significativa e com um grande adensamento

populacional. Em razão desses fatores, que implicaram na inviabilidade de

pesquisar toda a região, optamos por aplicar a pesquisar em alguns sub-bairros

da área considerada parte baixa e em outros da região tida como parte alta da

favela, a saber: Vila Laboriaux, Vila Cruzado, Vila Vermelha, Setor 199, Rua 1,

Portão Vermelho, Atalho, Faz de Pressa, Terreirão, Capado, Macega, Morro da

Roupa Suja, Campo Esperança (Valão), Bairro Barcelos, Cidade Nova, Vila

Verde, Cachopa, Dioneia, Sete, Rua 4. Utilizamos esse critério, visando

contemplar toda a extensão da Rocinha, mesmo sem aplicar a pesquisa em

todos os sub-bairros.

A Pesquisa de campo compreendeu ainda visita a todos os sub-bairros,

observação de campo, participação em reuniões onde a temática fora tratada e

entrevista do tipo semiestruturada com moradores antigos, para resgate da

história local.

Para tratar a problemática do descarte inadequado do lixo, optamos por

aplicar 40 questionários juntos a moradores das regiões supracitadas, entrevista

com 05 garis comunitários e 05 garis da Comlurb, entrevista com 02 membros da

gerência da Comlurb e com um funcionário dessa instituição que é responsável

pela logística da coleta de lixo no Bairro Barcelos e com 01 representante do

comércio local, que responde por alguns comércios locais.

No tocante aos instrumentos utilizados, destacamos a utilização de

questionário, pois segundo Goddard e Villanona (2005), é o mais apropriado,

tendo em vista que:

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Os questionários são instrumentos compostos de um conjunto de perguntas elaboradas, em geral, com o intuito de reunir informações sobre as percepções, crenças e opiniões dos indivíduos a respeito de si mesmo e dos objetos, pessoas e eventos presentes em seu meio (Goddard & Villanona, 1996 apud Moura & Ferreira, 2005, p. 70).

Além disso, lançamos mão da entrevista semiestruturada, isto porque,

conforme aponta Minayo, “o roteiro deve desdobrar os vários indicadores

considerados essenciais e suficientes em tópicos que contemplem a

abrangência das informações esperadas” (Minayo, 2006, p. 191), dando ao

entrevistado a possibilidade de discorrer sobre o tema em discussão, sem

respostas ou condições pré-estabelecidas pelo pesquisador.

Já para Tobar, as entrevistas semiestruturadas:

São baseadas no uso de guia de entrevistas, que consta de uma lista de perguntas ou temas que necessitam ser abordados durante as mesmas. A ordem exata e a redação das perguntas podem variar para cada entrevistado. O pesquisador pode encontrar e seguir pistas e novos temas, que surgem no curso da entrevista, mas o guia é um conjunto de instruções claras relativas às principais perguntas a serem feitas ou temas a serem explorados. (...) o propósito de uma entrevista foi focalizada ou em profundidade é adquirir um entendimento mais completo e detalhado possível do tema abordado. (...) o guia de entrevistas ajuda a mostrar que o pesquisador tem clareza sobre seus objetivos, mas é também suficientemente flexível para permitir liberdade ao pesquisador e ao informante para encontrar e/ou seguir novas pistas (Tobar & Yalour, 2001, p. 101).

Em atenção ao respeito aos sujeitos envolvidos na pesquisa, solicitamos

através do Termo de Livre Consentimento, modelo em apêndice, autorização

dos entrevistados para utilizarmos as informações concedidas para o nosso

estudo.

Levando em conta que a pesquisa envolveu parte dos sujeitos moradores

da favela ou trabalhadores da mesma, pois somente através das suas vivências

foi possível entender o cotidiano, bem como o real motivo da questão por nós

levantada, onde tanto o sujeito como o objeto são historicamente situados,

impregnados de visões sociais de mundo, é que entendemos que o melhor

posicionamento teórico para nos orientar está centrado nos fundamentos do

materialismo dialético de Marx, por dar:

(...) ênfase à dialética das relações entre indivíduo e a sociedade, entre as ideias e a base material, entre a realidade e a sua compreensão pela ciência, como também às correntes que enfatizam o sujeito histórico e a luta de classes (...) a dialética refere-se ao método de abordagem da realidade, reconhecendo-a como processo histórico em seu peculiar dinamismo, provisoriedade e transformação. A dialética é a estratégia de apreensão e de compreensão da prática social empírica dos indivíduos em sociedade (nos grupos, classes e segmentos sociais), de

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realização da crítica das ideologias e das tentativas de articulação entre sujeito e objeto, ambos históricos. (Minayo, 2006, p. 107-108).

Nesse sentido, entendemos que esta corrente de pensamento foi de suma

importância para a concepção dessa pesquisa, por auxiliar na compreensão dos

sujeitos e dos processos históricos, dentro de um contexto maior, que é a

sociedade capitalista, motor das desigualdades sociais, econômicas, culturais,

entre outras.

Complementando o posicionamento acima, encontramos a visão de

Cassab (2007), enfocando que a corrente de pensamento do materialismo

dialético é importante por:

(...) priorizar a dinâmica das relações entre sujeitos e objeto de estudo no processo de conhecimento, valorizar os vínculos do agir com a vida social dos homens e desvelar as oposições contraditórias presente entre o todo e as partes. Neste sentido, a dialética considera que o objeto de pesquisa deve ser entendido em suas determinações e transformações dadas pelos sujeitos – compreendendo-o inserido e parte de uma relação intrínseca de oposição e complementaridade, na ambiência social, entre o pensamento e a base material. Defende, também, a necessidade de se trabalhar com a complexidade, com a especificidade e com as diferenciações que existem. A abordagem dialética reconhece a realidade como complexa, heterogênea e contraditória, nas diversas facetas, nas diversas peculiaridades que a compõem (Cassab, 2007, p. 59).

Utilizamos o método crítico-dialético como alicerce de investigação para

transformação da realidade e não somente para sua contemplação, não se

concebe o procedimento metodológico elaborado independente da natureza do

objeto pesquisado, conforme aponta Minayo (2008):

(...) nas Ciências Sociais existe uma identidade entre sujeito e objeto. A pesquisa nessa área lida com seres humanos que, por razões culturais de classe, de faixa etária, ou por qualquer outro motivo, têm um substrato comum de identidade com o investigador, tornando-os solidariamente imbricados e comprometidos, como lembra Lévy-Strauss (1975): “Numa ciência, onde o observador é da mesma natureza que o objeto e o observador é, ele próprio, parte de sua observação” (Minayo, 2008, p. 13).

Nossa abordagem foi de cunho qualitativo, pois, consubstanciada na visão

de Minayo (2006), é o que melhor se aproximou do nosso propósito:

O método qualitativo é o que se aplica ao estudo da história, das relações, das representações, das crenças, das percepções e das opiniões, produtos das interpretações que os humanos fazem a respeito de como vivem, constroem seus artefatos e a si mesmos, sentem e pensam. (...) as abordagens qualitativas se conformam melhor a investigações de grupos e segmentos delimitados e focalizados, de histórias sociais sob a ótica dos atores, de relações e para análises de discursos e de documentos (Minayo, 2006, p. 57).

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Encontramos também na fala de Cassab (2007) argumentos que nos

auxiliaram quanto à escolha:

A pesquisa qualitativa tem como preocupação um nível de realidade que não pode ser quantificado – a compreensão e a explicação da dinâmica das relações sociais, as quais, por sua vez, são depositárias de crenças, valores, atitudes e hábitos, correspondendo a um espaço mais profundo das relações, dos processos e dos fenômenos. Enfatiza-se a vivência, a experiência, a cotidianidade e também a compreensão das estruturas e instituições como resultados da ação humana objetivada, o que faz das práticas sociais, da linguagem e outros aspectos da vida social, aspectos inseparáveis um do outro. O pesquisador, através da abordagem qualitativa, investiga sequências importantes de eventos como testemunha-chave e, particularmente, observa como esses eventos são determinados no contexto em que ocorrem, com predomínio da história e da cultura. (Cassab, 2007, p. 58).

O território sobre o qual nos debruçamos para fazer acontecer nossa

pesquisa, tem uma dimensão geográfica e populacional muito grande, onde hoje

é possível encontrar uma gama de serviços, tanto na área comercial, tais como:

bancos (Caixa Econômica Federal, Banco Itaú, Banco do Brasil e Bradesco),

lojas de roupas, supermercados, feira permanente de alimentos, etc. Quanto na

área de serviços, como: unidades de saúde, unidades públicas e privadas de

educação, transporte público, rádios comunitárias, associações de moradores,

jornais comunitários, instituições religiosas, entre outros.

É nesse cenário de inúmeras questões socioeconômicas e ambientais,

onde também acontece o processo exacerbado de consumo sem controle e

responsabilidade pelo que é consumido e produzido, que, segundo Bastos

(2014), chega-se em tese à quantidade de “1.326 Kg/hab/dia” (Bastos, 2014, p.

140), somados aos resíduos sólidos produzidos pelos classificados como

grandes geradores que, dependendo do consumo diário de cada

estabelecimento, chega a gerar em menor proporção cerca de mais de 100 kg

por dia.

Outro ponto que merece, a nosso ver, uma observação é a forma peculiar

como a Companhia de Limpeza Urbana da cidade do Rio de Janeiro -

COMLURB promove a coleta diferenciada de lixo na favela da Rocinha, visto que

o recolhimento de lixo e a varrição são executados de forma bem variada,

dependendo ou não do acesso aos locais. Portanto, em determinadas

localidades o serviço é executado e em outras não, o que acreditamos contribuir

para o descarte indevido dos resíduos sólidos, fazendo com que a proposta legal

de reduzir, reutilizar e reciclar, determinada pela Lei n° 12.305/2010, art. 15

inciso III, que objetiva a “não geração, redução, reutilização, reciclagem e

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tratamento dos resíduos sólidos, bem como a adequada disposição final dos

rejeitos” (PNRS, 2010, Art. 7º, Inciso II), fique bem longe de ser praticada.

Assim, como consequência, nos deparamos com a população sofrendo um

grande impacto ambiental, pois a proliferação de vetores, elementos prejudiciais

à saúde, bem como o processo gerador de riscos ambientais, é uma constante,

uma vez que são ocasionadores de desastres ambientais de grandes

proporções e de permanente vulnerabilidade social na população menos

privilegiada, como é o caso da Rocinha.

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2 O panorama histórico, político, cultural e econômico da gestão do lixo no Brasil

2.1.

O contexto histórico do tratamento e destinação do lixo no Brasil

Nesse estudo, uma das principais categorias de análise, é o lixo. Não por

acaso, optamos por utilizar a nomenclatura lixo ao invés de resíduos sólidos.

Pois o lixo é visto, tanto em sua definição oficial quanto no imaginário de muitas

pessoas, como algo que não serve mais, sem utilidade, o que leva muitos a

descartá-lo da forma que lhe é mais viável, independentemente se

adequadamente ou não. De acordo com o Dicionário Aurélio (2009), lixo é:

1. Aquilo que se varre da casa, do jardim, da rua, e se joga fora; entulho. 2. Tudo o que não presta e se joga fora. 3. Sujidade, sujeira, imundície. 4. Coisa ou coisas inúteis, velhas, sem valor. 5. Resíduos que resultam de atividades domésticas, industriais, comerciais, etc. (Ferreira, 2009, p. 1.222).

Enquanto isso, os resíduos sólidos são definidos, de acordo com a Norma

Brasileira (NBR) n°10.004/2004 da Associação Brasileira de Normas Técnicas

(ABNT), como: “resíduos nos estados sólido e semissólido, que resultam de

atividades da comunidade de origem: industrial, doméstica, hospitalar, comercial,

agrícola, de serviços e de varrição” (NBS/ABNT apud Santaella et al., 2014, p.

21). De acordo com Santaella et al. (2014):

O conceito de resíduos sólidos variou ao longo do tempo, em função dos avanços tecnológicos, da conscientização ambiental, e da necessidade financeira de reaproveitamento de materiais que não são mais úteis para um determinado fim, mas podem servir de matéria-prima para outro. Essa conceituação pode variar conforme a época, o lugar, o clima, a cultura, os hábitos e a condição socioeconômica de uma sociedade. Esse conceito é relativo, pois o que é inservível para determinada comunidade ou indivíduo, pode não ser para outros (Santaella et al., 2014, p. 21).

A Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS – Lei 12.305/2010) separa

os resíduos em:

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XV – rejeitos: resíduos sólidos que, depois de esgotadas todas as possibilidades de tratamento e recuperação por processos tecnológicos disponíveis e economicamente viáveis, não apresentem outra possibilidade que não a disposição final ambientalmente adequada. XVI – resíduos sólidos: material, substância, objeto ou bem descartado resultante de atividades humanas em sociedade, e cuja destinação final se procede, se propõe proceder ou se está obrigado a proceder, nos estados sólido ou semissólido, bem como gases contidos em recipientes e líquidos cujas particularidades tornem inviável o seu lançamento na rede pública de esgotos ou em corpos d’água, ou exijam para isso soluções técnica ou economicamente inviáveis em face da melhor tecnologia disponível (PNRS, Art. 3º, 2010).

Após apresentação dos motivos que nos levaram a trabalhar com o

conceito lixo e não com o termo resíduo sólido, consideramos importante

apresentar um conciso panorama sobre a história do lixo na humanidade, a fim

de contextualizar sua existência no planeta como um fator que convive com os

seres viventes.

Na pré-história, os habitantes do planeta terra eram nômades. Viviam em

cavernas, se mantinham da caça e da pesca, suas vestimentas eram feitas de

pele e a densidade populacional era muito baixa. À medida que diminuía a oferta

de comida, os mesmos se deslocavam para outras áreas e os resíduos

produzidos durante a estadia naquela região, eram deixados no meio ambiente e

logo se decompunham pela ação do tempo, até mesmo porque não eram de

difícil degradação, por serem basicamente de origem orgânica.

Com o passar dos anos, buscando o seu conforto, o homem passou a criar

alguns objetos, tais como: roupas mais apropriadas, peças de cerâmica,

ferramentas para o plantio, dentre outros utensílios. Além disso, deu início ao

hábito de construir moradias, passando a criar animais e a cultivar alimentos

para o seu sustento, iniciando o processo de se fixar em uma determinada área,

com isso, houve consequentemente, o crescimento da produção de lixo, no

entanto, nessa fase, esses resíduos ainda não se constituíam em um problema

para humanidade.

Isso só veio há acontecer muito tempo depois, quando o desenvolvimento

começa a se acentuar, sobretudo, com a chegada da revolução industrial no

século XVIII, que com a produção de bens de consumo em grande escala, levou

as pessoas a consumirem em maior quantidade e, consequentemente, a

gerarem mais lixo, insuflando a problemática da geração e do descarte de lixo.

Mas isso ainda não representava um motivo de preocupação maior, pois o que

de fato interessava era o desenvolvimento e não os problemas que tal fato

poderia acarretar. Como podemos verificar com a fala de Padovani (2011):

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A visão do lixo como problema a ser enfrentado só se firmou no século XIX, quando a Revolução Industrial instituiu um novo patamar de tecnologia, de conforto, de produtos - e de resíduos, montanhas de resíduos. O lixo, a partir daí, e empurrado pela comprovação científica de seu papel como causador de doenças várias, começou a ser um desafio para a humanidade. A industrialização incorporou ao cotidiano das pessoas uma série de novos produtos - e, mais que todos eles, o onipresente plástico, que, por demorar um século para se decompor e nunca desaparecer completamente, hoje enfeia ruas, praias, rios e até o fundo do mar. O impulso industrial também contribuiu para o surgimento das metrópoles - e, quanto mais gente confinada em determinado espaço, mais detritos se acumulam (Padovani, 2011, p. 1).

No Brasil, de acordo com autores como Eigenheer (2009), não há uma

precisão de dados em relação ao “panorama amplo e sistemático da questão da

limpeza urbana” (Eigenheer, 2009, p. 93). O mesmo atribui isso ao fato de

vivermos num país continental, cujas dimensões são imensas e que veio a se

desenvolver de forma muito desigual, pois cada região apresenta ainda hoje,

gigantescas diferenças em diversos aspectos, sejam culturais, educacionais,

sociais, econômicos, entre outros.

Mediante essa questão e tendo em vista que o Rio de Janeiro é uma das

cidades mais antigas do Brasil e, foi capital da colônia durante quase 200 anos,

tomaremos como parâmetro para falar sobre a história do tratamento e

destinação do lixo no país e de início encontramos na fala do Dr. Gama-Roza em

1877, a seguinte questão:

É notável que esta cidade reúna em alto grau, e em tudo, as condições as mais anti-hygienicas. O que foi obra da ignorância e do puro acaso, visto hoje, na imponência ominosa do seu conjuncto, afigura-se ao hygienista haver sido o projecto assentado de uma conspiração obscurantista. É uma questão de elevado alcance para todo o paiz, o saneamento desta capital; direi mesmo, que esse melhoramento importa aos destinos futuros da nossa pátria. No estado de centralisação extrema da administração o Rio de Janeiro é o Brazil. Só quem, por algum tempo, viveu em província, póde fazer idea cabal da dependência absoluta e irresistível desses logares ao centro (Gama-Roza apud Eigenheer, 2009, p. 93).

Para que possamos ter uma melhor compreensão sobre a temática do lixo

no país, salientamos que não temos a pretensão de apresentar na integra a

história da limpeza urbana no Brasil, porém buscaremos aqui traçar linhas gerais

alguns pontos que julgamos importantes para nosso entendimento.

Os povos que ocuparam a costa brasileira há muitos anos atrás, são

considerados imprescindíveis nessa análise, pois deixaram um legado muito

importante: os sambaquis:

[...] caracterizados basicamente por ser uma elevação de forma arredondada que, em algumas regiões do Brasil, chega a ter mais de 30m de altura. São construídos basicamente com restos faunísticos como conchas, ossos de peixe e mamíferos.

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Ocorrem também frutos e sementes, sendo que determinadas áreas dos sítios foram espaços dedicados ao ritual funerário e lá foram sepultados homens, mulheres e crianças de diferentes idades. Contam igualmente com inúmeros artefatos de pedra e de osso, marcas de estacas e manchas de fogueira, que compõem uma intrincada estratigrafia (Gaspar apud Eigenheer, 2009, p. 94).

Eigenheer (2009) nos leva a crer que os sambaquis foram uma das

primeiras formas de destinação de “lixo” dos habitantes das terras brasileiras,

apontando sua estreita relação “entre lixo, morte e memória” (Eigenheer, 2009,

p. 94).

Ainda de acordo com Eigenheer (2009) há documentos disponíveis e

notícias que demonstram que “o padrão higiênico das cidades brasileiras nos

séculos XVI, XVII, XVIII e XIX deixava muito a desejar” (Eigenheer, 2009, p. 94).

Portanto, nos primeiros anos do século XIX, John Luccock faz a seguinte

observação no tocante ao Rio de Janeiro:

Se dos dormitórios continuarmos para a cozinha, outras inconveniências não se farão esperar. Entre as piores, acha-se uma tina destinada a receber todas as imundícies e refugos da casa; que, nalguns casos, é levada e esvaziada diariàmente, noutros sòmente uma vez por semana, de acôrdo com o número de escravos, seu asseio relativo e pontualidade, porém, sempre que carregado, já sobremodo insuportável. Se acontece desabar um súbito aguaceiro, logo surgem em geral essas tinas, despeja-se-lhes o conteúdo em plena rua, deixando-se que a enxurrada o leve. Nas casas em que não se usa desses barris, toda espécie de detrito é atirada ao pátio, formando uma montoeira mais repugnante do que é possível a uma imaginação limpa fazer idéia. E ali fica, ajudando a criar os insetos e originando doenças, à espera de que as chuvas pesadas do clima tropical a levem. A água que cai no pátio, depois de assim impregnada, encaminha-se para a rua, por meio de canais que passam por debaixo do assoalho da casa, ou para dentro de um poço escavado bastante fundo para que comunique com a camada arenosa inferior ao nível das águas altas, em que se dissolve, ou através da qual uma parte encontra caminho para o mar (Luccock apud Eigenheer, 2009, p. 94-95).

Os escravos limpavam a cidade, fazendo uso de enxadas para retirar o lixo

das ruas, que após recolhido era colocado em cestos de palha e, em seguida,

arremessado em uma carroça puxada a burros.

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Figura 1- Escravo varrendo rua, Debret. Fonte: EIGENHEER, 2009.

Os escravos que tinham essa função ficaram conhecidos como “tigres” e

“cabungos” e eram assim chamados por serem “encarregados de despachar

para bem longe os dejetos domésticos acumulados durante o dia. Eles levavam

os excrementos na cabeça dentro de barricas (estas, por associação, também

eram chamadas de “tigre”)” (Bastos, 2014, p. 9-10). Os barris geralmente eram

feitos de madeira ou barro:

Esses barris são geralmente de madeira. Os tampos inferiores na parte onde se firma a cabeça, com a infiltração constante da umidade, não raro, apodrecem, enfraquecendo a sua natural resistência. Um belo dia – catrapuz – a tábua carcomida desloca-se, parte-se e a extremidade circular do barril vem como um colar sobre o pescoço do negro. Esse desastre, que provoca sempre a alegria e o clamor dos outros negros, é comuníssimo até pelas ruas mais centrais, de maior trânsito, passagem obrigatória desses indesejáveis recipientes, afetando a forma estética de vaso grego; ânfora, porém, onde se não guardam perfumes... (Edmundo apud Eigenheer, 2009, p. 95-98).

Como podemos verificar a partir desses relatos, os escravos são

imprescindíveis para o entendimento da história da limpeza urbana no Rio de

Janeiro, pois por muitos anos exerceram:

A repugnante tarefa de carregar lixo e os dejetos da casa para as praças e praias era geralmente destinada ao único escravo da família ou ao de menor status ou valor. Todas as noites, depois das dez horas, os escravos conhecidos popularmente como “tigres” levavam tubos ou barris de excremento e lixo sobre a

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cabeça pelas ruas do Rio. Os prisioneiros realizavam esse serviço para as instituições públicas (Luccock apud Eigenheer, 2009, p. 94-95).

Figura 2- “Tigre”, JC Guilhobel, Rio de Janeiro, 1814. Fonte: EIGENHEER, 2009.

Encontramos registros que dizem que “à noite, por brincadeira ou

vingança, os “tigres” esbarravam de propósito nos passantes desavisados,

fazendo respingar sobre eles a carga malcheirosa, deixando todos sujos e

apavorados” (Bastos, 2014, p. 10).

As regiões urbanas do litoral brasileiro encontravam muita dificuldade para

enterrar os dejetos domésticos e o lixo, nos terrenos pertentes as suas

residências ou nas proximidades, pois como as regiões geralmente eram

pantanosas e apresentava muita umidade, uma vez que o lençol freático era

muito alto, impedia que isso fosse posto em prática:

A impossibilidade de abrir fossas num terreno em que a água se encontra a dezoito polegadas de profundidade impede o uso de latrinas como em França; nenhuma tentativa deste gênero fora ainda feita por ocasião de minha partida (Debret apud Eigenheer, 2009, p. 100).

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Ainda em 1852, comenta o vereador Dr. Thomas José Pinto: Um dos erros, que se tem cometido no sistema de despejos e limpeza desta cidade, é sem dúvida nenhuma querer-se por força que seja o mar receptáculo de todas as imundícies; estou intimamente convencido que este sistema tem concorrido e há de sempre concorrer para agravar o nosso mau estado sanitário (Arquivo Geral da Cidade do Rio de Janeiro apud Eigenheer, 2009, p. 100).

Naquela época, quando as práticas de tratamento não existiam, o

recolhimento e a destinação dos resíduos eram precários, muitos abusos eram

cometidos. Quando a corte portuguesa chegou ao Rio de Janeiro, o intendente

Paulo Vianna baixou alguns editais buscando melhorar a situação, conforme

sinalizado a seguir:

Faço saber aos que este Edital virem ou dele tiverem notícia que sendo um dos cuidados da Polícia vigiar sobre o asseio da cidade não só para a comodidade de seus moradores, mas principalmente para conservar a salubridade [...] e impedir que se infeccione com as imundícies que das casas se deitam às ruas e constando aliás que muitos de seus moradores apartando-se culposamente do costume que nela sempre havia de mandarem deitar ao mar em tinas e vasilhas cobertas as águas imundas e outros despejos se facilitam impunemente a fazê-lo das janelas abaixo, os que nunca era de sua liberdade fazê-lo no centro de uma Corte que se está estabelecendo e que se procura elevar a maior perfeição [...] fica hoje em diante vedado por esta Intendência o abuso de se deitarem as ruas imundícies e todo aquele que for visto fazer os despejos [...] serão punidos em dez dias de prisão e com a pena pecuniária de dois mil réis para o Cofre da Polícia e todos os Oficiais e a mesma Intendência e da Justiça e qualquer do povo que der parte da infração e se verificar de plano e pela verdade sabida receberá a metade da condenação pecuniária (Arquivo Nacional do Rio de Janeiro – Polícia da Corte – Códice 318 apud Eigenheer, 2009, p. 101).

A partir de meados do século XIX, na intenção de melhorar a situação foi

dado início ao ordenamento dessa prática e ficou estabelecido “horários para os

tigres, locais determinados de despejo, barris fechados e carroças para o seu

recolhimento” (Eigenheer, 2009, p. 101).

A Câmara Municipal também entrou no circuito e estabeleceu posturas em

relação à limpeza da cidade, de forma a disciplinar a difícil situação em curso.

No ano de 1854 o governo imperial passa a ser responsável pela limpeza da

urbe, no entanto quase nada mudou, ou seja, não foram percebidas mudanças

significativas.

O ano de 1864 foi marcante para a limpeza urbana do Rio de Janeiro, pois

foi nesse período que ocorreu a implantação de um sistema de esgoto na

cidade, por meio de uma companhia inglesa – a The Rio de Janeiro City

Improvementes Company Limited, ainda que somente em uma parte da cidade.

Apesar de não contemplar toda a região, representou um avanço significativo em

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relação à especialização na limpeza urbana, mais propriamente no tocante ao

lixo. De acordo com Eigenheer (2009):

A efetivação dos serviços de limpeza através ora da contratação de firmas particulares, ora com a organização de serviços públicos, esbarrava em inúmeros entraves técnicos, administrativos, financeiros e de costumes da população. Em 11/10/1876 contratou-se a firma de Aleixo Gary, que foi um marco importante para a limpeza urbana do Rio de Janeiro. Daí a designação até hoje de “gari” para alguns empregados da limpeza urbana. (Eigenheer, 2009, p. 102).

Eigenheer (2009) aponta ainda que outras novidades foram colocadas em

prática, como a utilização de “canos especiais para coleta de lixo e irrigação das

ruas, e até mesmo a instalação de quiosques urinários e latrinas” (eigenheer,

2009, p. 102), porém:

[...] problemas perduraram, já que muitos serviços foram compartilhados com outras firmas. A empresa de Gary fica até 1891. Depois dela, os serviços de limpeza ficaram a cargo da Inspetoria de Limpeza Pública, que iniciou em 1895 a construção de um forno para queima de lixo em Manguinhos. A experiência fracassou (Eigenheer, 2009, p. 102).

Após esse novo fracasso, no ano de 1907 retoma-se a discussão acerca

da incineração, o que perdura até a década de 60, e nos dias atuais a discussão

por vezes entra em pauta, mas é uma prática combatida, principalmente pela

organização dos catadores de materiais recicláveis, que justificam a extinção de

postos de trabalho, caso seja uma prática adotada no Brasil.

Com os altos e baixos dos serviços prestado pelo setor público, recorre-se

novamente às empresas particulares, que voltam a atuar em 1898. Todo esse

contexto levou a criação da Superintendência de Limpeza Urbana, no ano de

1901, que só veio a ficar inteiramente organizada em 1904, no entanto, os

serviços não melhoraram muito, e em 1940, criou-se a Diretoria de Limpeza

Urbana (DLU), e, posteriormente no ano de 1975, é fundada a Companhia de

Limpeza Urbana - COMLURB, atuante até os dias atuais na cidade do Rio de

Janeiro.

No que diz respeito à destinação do lixo na cidade do Rio de Janeiro,

Eigenheer (2009), aponta que a Ilha de Sapucaia foi utilizada para esses fins de

1865 até por volta de 1949, sendo transferido posteriormente para o aterro do

Retiro Saudoso no bairro do Caju, do Amorim e de Cavalcanti - Marechal

Hermes, mas na década de 1970 a ideia era promover a estruturação de um

aterro sanitário e então:

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[...] foi doada pelo INCRA à COMLURB, uma área de manguezal de 370.55 hectares, no fundo da Baía de Guanabara, município de Duque de Caxias, bairro Jardim Gramacho. A doação dessa área foi condicionada à implantação do Aterro Sanitário Metropolitano de Gramacho, para onde seriam levados todos os resíduos sólidos dos municípios da Região Metropolitana, a saber: Rio de Janeiro, Duque de Caxias, São João de Meriti, Nova Iguaçu, Nilópolis, Belford Roxo, Petrópolis e Guapimirim (Bastos, 2014, P. 11).

No entanto decorrer do século XX, se tornou considerável o aumento da

geração de lixo no Brasil e, consequentemente, sua disposição inadequada no

meio ambiente, diante dos fatos, buscou-se implementar inovações técnicas

para o tratamento do lixo e no na cidade do Rio de Janeiro, não foi diferente, e

segundo Eigenheer (2009), algumas alternativas foram elencadas, a saber:

Inicialmente se buscou a alternativa da incineração e, posteriormente, das usinas de triagem e compostagem. Estas procuram aproveitar a parte orgânica para compostagem, e outra para reciclagem. Entretanto, após serem misturadas na fonte e no processo de coleta, fica difícil obter-se materiais de boa qualidade. Além disso, é grande a quantidade do refugo (Eigenheer, 2009, p. 102).

Na busca por melhor tratamento e destinação do lixo, implantou-se no Rio

de Janeiro, através de recursos advindos do Programa de Despoluição da Baia

de Guanabara – PDBG, uma Usina em Irajá - 1970, e, em 1992, uma Usina no

Caju, com infraestrutura e equipamentos, no entanto essa experiência, embora

tenha sido difundida em todo o país, não obteve o êxito desejado, tanto no que

diz respeito ao tratamento dos resíduos, como na absorção de mão de obra

especializada geradora de emprego e renda como acontecia em outros países.

Já os anos de 1980 também são significativos para esse setor, pois de

acordo com Eigenheer (2009), foi nessa década que foram dados os primeiros

passos visando à diminuição do lixo que era depositado diretamente no meio

ambiente:

A coleta seletiva foi implantada no Brasil a partir de 1985, inicialmente no bairro de São Francisco, Niterói. Foi uma iniciativa do Centro Comunitário de São Francisco (associação de moradores) e da Universidade Federal Fluminense. Em 1988, Curitiba se torna a primeira cidade a ter o sistema. [...] esta forma de coleta pressupõe a separação na fonte dos materiais que se deseja tratar (Eigenheer, 2009, p. 102).

Outro acontecimento importante foi a Conferência das Nações Unidas

sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, conhecida mundialmente como ECO-

92, realizada no Rio de Janeiro no ano de 1992, pois dentre os documentos

oriundos desse encontro, foi elaborada a “Agenda 21”, que “indicava as bases

para a despoluição do planeta e a construção de um modelo de desenvolvimento

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sustentável” (Ermel apud Bastos, 2014, p. 12), porém, pouco se avançou ao logo

desses mais de 20 anos.

Dando sequência aos compromissos ambientais que marcaram os dois

séculos, mais uma vez ocorreu no Rio de Janeiro no ano de 2012, a Conferência

das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, conhecida como

Rio+20, para comemorar os vinte anos da primeira conferência no Brasil, quando

participaram líderes dos 193 países membros da Organização das Nações

Unidas, porém, infelizmente, o resultado não foi o esperado, pois muitos

impasses acerca da assunção de compromissos, sobretudo no tocante aos

interesses dos países de primeiro mundo em detrimento aos de terceiro,

frustrando expectativas de êxito do evento no tocante as assinaturas de

protocolos e tratados para diminuição dos efeitos do progresso no planeta.

Após essa breve contextualização histórica, consideramos relevante

apresentar dados referentes à geração e a destinação do lixo no Brasil, na

atualidade, pois acreditamos que contribuirá para ampliarmos nossa visão sobre

a temática e com isto redimensionarmos o olhar a respeito de que urge a

necessidade de ser colocado em prática o que preceitua a lei 12.305/2010, em

termos de reduzir, reutilizar e reciclar os resíduos, pois, caso contrário, os

prejuízos em termos de desastres ambientais serão incalculáveis.

Segundo os resultados preliminares do universo do censo demográfico

2010, quando levantados os dados sobre o destino do lixo por domicílios

particulares permanentes1 no Brasil, obteve-se o seguinte panorama2:

1 É o domicílio que foi construído a fim de servir exclusivamente para habitação e, na data de referência, tinha a finalidade de servir de moradia a uma ou mais pessoas. Disponível em: http:// www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/censo2010/resultados_preliminares/tabelas_adicionais.pdf Acessado em 03 de abril de 2015 2 A seguir, pode ser observado o que se entende por: 1- Coletado diretamente por serviço de limpeza - quando o lixo do domicílio era coletado diretamente por serviço de empresa pública ou privada; 2− Colocado em caçamba de serviço de limpeza - quando o lixo do domicílio era depositado em uma caçamba, tanque ou depósito, fora do domicílio, para depois ser coletado por serviço de empresa pública ou privada; 3− Outro destino- quando o lixo do domicílio era queimado ou enterrado no terreno ou propriedade onde se localiza o domicílio, jogado em terreno baldio, logradouro, rio, lago ou mar, ou tinha destino diferente dos descritos anteriormente. Fonte: http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/censo2010/resultados_preliminares/tabelas_adicionais.pdf Acessado em 03 de abril de 2015.

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Tabela 1- Destino do lixo por domicílios particulares permanentes no Brasil

Região Domicílios

particulares

permanentes

Destino do lixo

coletado total

Coletado

diariamente por

serviço de

limpeza

Coletado em

caçamba de

serviço de

limpeza

Outro destino

dado ao lixo

Brasil 57.324.185 50.105.492 45.991.053 4.114.439 7.218.029

Norte 3.975.533 2.952.028 2.628.636 323.392 1.023.475

Nordeste 14.922.901 11.188.267 9.537.570 1.650.697 3.734.480

Sudeste 25.199.799 23.932.281 22.448.487 1.483.794 1.267.167

Sul 8.891.279 8.146.103 7.751.514 394.589 745.100

Centro-Oeste 4.334.673 3.886.813 3.624.846 261.967 447.807

Fonte: Censo do IBGE 2010.

A partir da tabela acima, nota-se que, se levado em consideração o

número de domicílios particulares permanentes, a região centro-oeste é a que

tem a maior cobertura de coleta de lixo por domicílio particular permanente

(realizada por uma empresa de serviço de limpeza), seguida da região sul; e são

as que também apresentam, consequentemente, os menores números de

destinos alternativos de descarte de lixo, como queimar, enterrar ou até mesmo

o descarte impróprio, como jogar em terreno baldio, rios, mar, dentre outros. Já a

região nordeste, seguida da região sudeste, são as que apresentam as piores

taxas de coleta de lixo por domicílios particulares permanentes, realizada por

uma empresa de serviço de limpeza; apresentando, por consequência, os

maiores índices de descarte alternativo do lixo produzido por domicílio particular

permanente.

Em pesquisas mais recentes, como a da Associação Brasileira de

Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (ABRELPE) do ano de

2014, realizada em 400 municípios, em todas as regiões do Brasil, atingindo

45,2% (91.764.305 milhões de habitantes) da população total indicada pelo

IBGE em 2014 (202.799.518 milhões de habitantes), sobre a geração de

Resíduos Sólidos Urbanos (RSU), aponta que a produção total no Brasil em

2014 foi de aproximadamente 78,6 milhões de toneladas, o que representa um

aumento de 2,9% de um ano para o outro, índice este que supera a taxa de

crescimento populacional no país no período, que foi de 0,9%. Pode ser

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observado, a seguir, o dado de geração anual de RSU em 2014, comparado ao

ano de 20133:

Figura 3- Gráfico da geração de RSU. Fonte: http://www.abrelpe.org.br/Panorama/panorama2014.pdf.

Segundo dados da ABRELPE, em 2014 houve um aumento de 3,20% na

quantidade de RSU coletados no Brasil, quando comparados aos números de

2013. Se confrontado este índice com o crescimento da geração de RSU, pode-

se perceber que houve uma evolução, ainda que pequena, em relação à

cobertura dos serviços de coleta, chegando a 90,6%, com um total de

71.260.045 toneladas coletadas no ano. Segue abaixo o gráfico que mostra a

coleta de RSU no Brasil:

3 Os índices per capita referentes a 2014 e 2013 foram calculados com base na população total dos municípios. Disponível em: http://www.abrelpe.org.br/Panorama/panorama2014.pdf Acessado em: 06 mar. 2016.

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Figura 4- Gráfico da coleta de RSU. Fonte: http://www.abrelpe.org.br/Panorama/panorama2014.pdf

Conforme pode ser observado nos dados acima, se comparada à

quantidade de RSU produzida (78.583.405 t/ano) e a coletada (71.260.045 t/ano)

em 2014, chega-se à conclusão que, durante esse ano, mais de 7 milhões de

toneladas deixaram de ser coletadas no país e consequentemente foram

destinadas de forma inadequada.

No mapa que segue, pode ser vista a distribuição da quantidade de RSU

coletado em percentual no ano de 2014, nas cinco regiões do Brasil.

Figura 5- Mapa da distribuição da quantidade de RSU coletado (em percentual) no ano de 2014. Fonte: http://www.abrelpe.org.br/Panorama/panorama2014.pdf.

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No tocante à situação do destino final que é dado aos RSU no Brasil em

2014, manteve-se praticamente igual, se comparado ao ano de 2013. O índice

de 58,4% referente à destinação final adequada no ano de 2014 permanece

significativo, entretanto, a quantidade de RSU destinada de forma imprópria se

manteve praticamente inalterada de um ano para o outro, apresentando somente

um aumento pouco significativo, passando de 28,8 milhões de toneladas/ano em

2013 para 29,6 milhões de t/ano, que seguiram para os lixões ou aterros

controlados – que se pensarmos pelo viés ambiental, é muito similar aos lixões,

pois não respeitam os critérios necessários para a proteção à saúde pública e,

sobretudo, ao meio ambiente de forma geral.

Figura 6- Gráfico da destinação final dos RSU - 2013 versus 2014. Fonte: http://www.abrelpe.org.br/Panorama/panorama2014.pdf.

Quando se fala das iniciativas ligadas à coleta seletiva no ano de 2014,

aproximadamente 65% dos municípios registraram alguma iniciativa. Se

compararmos o período de 2013 cerca 62% dos municípios tinham alguma

iniciativa em relação a 2014, notamos que houve um aumento, ainda que pouco

significativo, de 3% de um período para outro. É válido ressaltar que, segundo a

ABRELPE, embora seja expressivo o número de municípios brasileiros com

iniciativas voltadas para a coleta seletiva, muitas vezes tais ações se resumem à

disponibilização de pontos de entrega voluntária ou convênios com cooperativas

de catadores, o que não compreende todo o território ou toda a população dos

municípios. Pode ser apreciado abaixo um mapa no qual estão postas, por meio

de porcentagem, as iniciativas de coleta seletiva nas regiões brasileiras e no

Brasil de uma forma geral:

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Figura 7- Mapa das iniciativas de coleta seletiva nas regiões brasileiras e no Brasil. Fonte: http://www.abrelpe.org.br/Panorama/panorama2014.pdf.

Partindo desse mapa, é possível perceber que no ano de 2014, a região

sudeste foi a que apresentou um maior índice 85% dos municípios de iniciativas

ligadas à coleta seletiva, seguida da região sul 84,7% dos municípios.

Segundo a ABRELPE, em 2014, os municípios brasileiros aplicaram em

média R$ 119,76 (cento e dezanove reais e setenta e seis centavos) por

habitante/ano referente à coleta de RSU e aos demais serviços de limpeza

urbana, a saber: varrição, limpeza, capina, manutenção de parques e jardins,

limpeza de córregos, despesas com a destinação final dos RSU, entre outros.

Pode ser apreciado abaixo o gráfico que apresenta os valores médios por

habitante/ano referentes aos recursos empregados na coleta de RSU e nos

outros serviços de limpeza urbana:

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Figura 8- Gráfico com os valores médios por habitante/ano referentes aos recursos empregados na coleta de RSU e nos outros serviços de limpeza urbana. Fonte: http://www.abrelpe.org.br/Panorama/panorama2014.pdf

Conforme pode ser observado, foi na região sudeste R$ 152,88, seguida

da região nordeste R$ 100,44, onde se empregou pelos municípios o maior valor

(em reais) por habitante/ano, referente aos gastos com a coleta de RSU e com

os demais serviços que compreendem a limpeza urbana. E as regiões sul R$

93,72 e centro-oeste R$ 77,40 foram as que empregaram o menor valor (em

reais) por habitante/ano, quando se trata da coleta de RSU e dos demais

serviços que compreendem a limpeza urbana.

Notamos que ao longo de muitos anos, que avanços ocorreram em relação

ao tratamento e a destinação do lixo, no entanto, ainda há muito que ser feito

para que o meio ambiente não seja tão afetado como vem sendo, devido às

consequências da ação humana, pois em função de inúmeras práticas

inadequadas ainda assistimos a adoção de práticas obsoletas e promotoras de

grandes danos ao planeta.

2.2. O traço cultural brasileiro no tratamento do lixo nas capitais e no interior do Brasil

No Brasil ainda hoje guardamos muitos traços da cultura do tratamento do

lixo, do período que ainda não havia serviço de limpeza urbana, sobretudo, mas

não só, no interior do país, onde em muitos municípios, ainda não há coleta

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regular de lixo, como por exemplo, em povoados do Estado do Ceará, como é o

caso de áreas rurais do Município de Ipueiras, Santa Luzia, Jatobá, Vagalume,

entre outros, conforme diagnóstico do Sistema Nacional de Informações de

Saneamento (SNIS) de 2014 que:

[...] mostram que aumentou a quantidade de casas atendidas por serviços de coleta regular de lixo. Entre 2013 e 2014, 700 mil pessoas passaram a ser atendidas pela coleta. Porém, o déficit de atendimento ainda é grande. No total, 17,3 milhões de pessoas moram em regiões que não fazem nenhum tipo de coleta do lixo. A pior situação é na zona rural e nos pequenos municípios. O diagnóstico estima que 47% da população rural do país não tem acesso a nenhum tipo de coleta de lixo - um total de 14,7 milhões de pessoas (Calixto, 2016, p.02).

Nas capitais apesar das inúmeras deficiências ainda existentes, a

população, devido à infraestrutura disponível, vem ao longo dos anos, mudando

a forma de tratar o lixo produzido nesses locais, tendo em vista que avanços

ocorreram em relação à limpeza urbana, porém as leis que regulamentam tais

serviços ainda não são cumpridas na integra, muitas vezes em função da cultura

no trato do lixo ou mesmo por alguma questão relacionada à qualidade do

serviço público que é prestado.

No interior do Brasil, sobretudo nas áreas rurais ainda encontramos nos

dias de hoje, conforme apontado acima, muitos povoados onde sequer acontece

a coleta regular de lixo, portanto, a população lixo de forma muito rudimentar,

pois quando não joga diretamente nos quintais para depois juntar e queimar em

um recipiente dentro de casa, a queima acontece em algum outro momento, no

entanto de uma forma ou de outra, não há o tratamento adequado do lixo nessas

localidades, porém, o destino é sempre o mesmo, isto é, destinado de forma

inadequada, oferecendo os mais diversos riscos não só os que ali residem, mas

também que vive no em torno.

Buscando compreender melhor esse contexto de como se dá o trato do

lixo, onde ainda não acontece à coleta regular, entrevistamos um morador da

Rocinha, que constantemente está em contato com um povoado no interior do

Ceará, em uma área rural de nome Santa Luzia distrito do Município de Ipueiras,

que não existe coleta de lixo regular, e nos foi relatado que:

Quando estive lá onde eu morava no ano de 2014, observei que nada mudou em relação ao tratamento do lixo, mesmo passados tantos anos continua a mesma coisa... A coleta ainda não acontece e as pessoas jogam o lixo no quintal, depois juntam tudo – saco, papel... - e queimam. Os restos de comida dão para os animais que criam, as cascas como as de batata, cenoura, banana... jogam no quintal e ali mesmo elas se decompõem, virando até adubo para a terra. Em

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algumas casas as pessoas aproveitam as sacolas melhorzinhas para usar no dia a dia, como por exemplo, na casa de uma tia minha, que minha prima, lava as sacolas e as utiliza enquanto dar para ser usada, depois quando não der mais para usar, ela a queima. Isso no nosso povoadozinho. Na cidade, que não fica muito distante, acontece a coleta. O lixo que lá é recolhido é levado para um lixão criado muito próximo da área que as pessoas moram... é um lixão a céu aberto (C. Entrevista concedida a Maria Izabel de Carvalho. Rio de Janeiro, 20 mar. 2016).

Essa fala confirmar nossa afirmação de que apesar de estarmos no século

XXI, ainda há locais onde sequer existe a coleta de lixo, o que obriga as pessoas

a perpetuarem a cultura do descarte inadequado do lixo - sobretudo por falta de

opção -, praticada desde os primórdios da história humana, o que vem se

agravando, porque o processo de consumo passou por grandes transformações

– e vem crescendo em disparada não somente na metrópole, mas também nas

cidades do interior - e as políticas públicas para tratar dessa questão, sobretudo,

em determinados territórios, inexistem.

Muitas das pessoas que residem nesses povoados saem desses locais e

vêm para a cidade grande em busca de melhores condições de vida, trazendo

consigo toda sua vivência e cultura. Não querermos colocá-las como culpadas

pelo descarte inadequado de lixo que acontece nas capitais, até mesmo porque

o praticante desse ato não faz parte de uma única classe social, tendo em vista

que é praticado, independente da pessoa ter ou não poder aquisitivo, pois já

presenciamos indivíduos de classe média alta, abrir a janela do seu carro e

arremessar guimbas de cigarro na rua, por exemplo, porém temos que levar em

consideração que muitas regiões, como as favelas, por exemplo, onde além da

deficiência das ações em relação à coleta de lixo, acontece também à prática do

descarte incorreto do lixo, são ocupadas por muitos imigrantes que se deslocam

do interior do Brasil, em busca de melhores condições de vida nas grandes

cidades, e que trazem consigo toda a sua cultura, inclusive a de jogar o seu lixo

no quintal, por não haver coleta regular onde moravam anteriormente.

Apesar de não podermos afirmar que a cultura dos imigrantes no tocante

ao tratamento do lixo dos povoados do interior do país, seja uma das variáveis

que contribuem para o descarte inadequado desse resíduo em regiões das

capitais, que são predominantemente habitadas por eles, como é o caso da

favela da Rocinha, deve-se considerar que o processo de adaptação à nova

realidade pode levar um determinado tempo, o que pode ter implicações diretas

ou indiretas na destinação do lixo por esse público no seu novo local de moradia.

Antes essa pessoa tinha o hábito de dispor o seu lixo no seu quintal, para

depois juntá-lo e queimá-lo, agora essa mesma pessoa, vivencia uma nova

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realidade completamente distinta, passando a morar em residências, na maioria

das vezes muito pequenas, onde o seu quintal é a rua ou outra casa, portanto,

acaba ainda que sem intencionalidade, por estabelecer o hábito natural

perpetuado ao longo de muitos anos, de descarte inadequado e que era natural,

por não haver coleta de lixo onde residia anteriormente, conforme aponta

Machado (2012): “como não havia um lugar específico para que os resíduos

fossem depositados, as pessoas os jogavam em todo parte” (Machado, 2012, p.

32).

Algumas pessoas logo se adaptam a nova realidade, porém outras levam

tempos ou até mesmo nunca mudam completamente sua cultura em relação ao

tratamento do lixo, tal fato se comprova através da observação de campo, pois

presenciamos, por exemplo, na casa de uma pessoa que vem dessa realidade e

que já reside em uma grande capital há muitos anos, traços dessa cultura, pois

após varrer a casa joga para a rua a sujeira recolhida, e quando questionada,

justifica alegando: “depois eu varro a rua” (C, jan. 2016), como se fosse o seu

quintal de outrora.

Essa prática é um hábito muito comum, sem generalizações, nas

residências do interior do Brasil, e como a Rocinha, segundo Leitão (2009), “é a

capital do Nordeste no Rio de Janeiro” (Leitão, 2009, p. 90), fator confirmado por

Gonçalves (2013) que em sua pesquisa no Bairro Barcelos, afirma que “a

maioria das pessoas interrogadas provinha dos estados do Nordeste (59%)”

(Gonçalves, 2013, p. 353). O que faz entendemos que apesar de não ser o único

fator determinante para o descarte inadequado de lixo nessas localidades, a

cultura trazida das regiões onde moravam – povoados do interior do país,

também tem implicações diretas na questão do tratamento do lixo nas grandes

capitais.

Temos consciência de que a população do interior do Brasil não recebe a

devida atenção, pois são totalmente esquecidos, até mais que a população da

favela das grandes cidades, visto que nessas áreas nada ou quase nada é feito

para melhorar a infraestrutura local, enquanto que a favela das grandes cidades,

ainda que muito precariamente, conta com alguns serviços em função da grita de

alguns movimentos sociais e pelos próprios moradores que por vezes

reivindicam a instalação de serviços necessários ao bem viver.

Constata-se que a cultura do tratamento do lixo nas capitais e no interior

do Brasil tem suas diferenças, principalmente, em função dos recursos e

infraestrutura disponibilizados, porém ao mesmo tempo há pontos em comum,

como por exemplo, a falta de políticas públicas eficazes que atendam de forma

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digna, sobretudo, os territórios habitados por pessoas de menor poder aquisitivo,

levando a uma mudança de hábito que vem se perpetua ao longo de muitos

anos.

2.3. A importância da legislação ambiental no cenário brasileiro

De acordo com alguns autores a legislação ambiental brasileira é uma das

mais completas do mundo, porém, não é cumprida de forma adequada,

sobretudo, por não existir uma fiscalização sistemática, fazendo com que muitos

crimes ambientais fiquem impunes e sem a devida apuração e não

necessariamente pela existência de recursos e capacidades técnicas para que a

lei seja posta em prática de forma plena, em todo o país.

Somente em meados da década de 1990, a legislação passa a cuidar dos

bens ambientais de forma relacionada, pois até então, eram tratados

separadamente.

A partir da aprovação da Lei de Crimes Ambientais, também conhecida

como Lei da Natureza - Lei n° 9.605 de 13 de fevereiro de 1998 a população

brasileira tem um ganho significativo, pois passa a existir um mecanismo que

pune aqueles que cometem infração contra o meio ambiente.

Com a Lei de Crimes Ambientais houve uma reordenação da legislação

ambiental no Brasil no que tange às infrações e punições. Estudiosos da

temática, afirmam que uma das maiores inovações trazidas com essa lei, foi a

responsabilidade das pessoas jurídicas o que não elimina a culpabilização das

pessoas físicas autoras ou coautoras de infração contra o meio ambiente.

Neste sentido, consideramos relevante traçarmos um breve histórico sobre

a legislação ambiental brasileira, a título de visibilizar que não é por falta de leis

que os fatos não são apurados, mas, sim, pela ausência de sua aplicabilidade,

pois de acordo com Santaella et al. (2014), é visto que:

A condição colonial existente no Brasil definiu historicamente as (im) possibilidades de florescimento de uma preocupação profunda com a forma de extração e de utilização dos recursos naturais no nosso território. A conquista portuguesa e hispânica no continente latino-americano foi capaz de gerar impactos e danos ambientais catastróficos, especialmente devido à extração desenfreada de minérios e de madeira, o desmatamento, as queimadas e a

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propagação do modelo agrícola de monoculturas, em grandes latifúndios,

desenhados a partir do regime de sesmarias (Santaella et al., 2014, p. 54).

Assim, desde o período imperial que as leis já vinham sendo formuladas,

então no ano de 1830 foi promulgado o Código Penal do Império e foram criadas

para normas para a regulamentação da comercialização de madeiras, cujo

principal objetivo era fazer com que passasse a haver controle em relação ao

corte do pau-brasil, conhecida também como madeira da lei, por seu enorme

valor de mercado e por ter proteção legal.

Ainda no período colonial também foi sancionada a Lei de Terras do Brasil,

em 1850, que “consolidava a ocupação por instituir a propriedade particular”

(Santaella et al., 2014, p. 54). Nesse período as terras brasileiras foram loteadas

de forma muito intensa, principalmente mediante estímulo dos colonizadores.

Somente posterior a Proclamação da República, no ano de 1889, é que a

sociedade brasileira passa a contar com leis próprias do país, dentre as quais:

[...] as normas do Código Civil Brasileiro (1916) e, posteriormente, a Constituição de 1934, quando foram estabelecidos os três primeiros códigos relacionados ao meio ambiente: o Código das Águas, o Código Florestal e o Código de Mineração. Em 1940, foi criado o Código Penal, no qual foram previstas penas para práticas que afetavam negativamente a saúde pública e, indiretamente, o meio ambiente (Santaella et al., 2014, p. 54).

A partir do ano de 1940 é que os órgãos públicos passam a administrar a

questão da proteção dos recursos naturais, pois até então, era comum desmatar,

queimar e a praticar a monocultura extensiva, sem que houvesse algum tipo de

medida repressiva, e assim, por aproximadamente 20 anos, foram os próprios

órgãos públicos que permitiam legalmente a exploração desses recursos.

Na década de 1960, inúmeras leis ambientais foram criadas no Brasil,

visando atender a requisições internacionais e algumas dessas ainda estão

vigentes nos dias atuais, como por exemplo: o Código de Pesca (1967) e a Lei

de Proteção à Fauna (1967).

No ano de 1973, criou-se a Secretaria Especial de Meio Ambiente (SEMA),

que estava vinculada ao Ministério do Interior, no entanto, a preocupação com a

questão ambiental ainda era quase nula, sobretudo, no ramo da economia que

avançava sem pensar nos danos futuros ao meio ambiente. De acordo com

Santaella et al. (2014), a “SEMA assumiu o comando da proteção ambiental

completando a legislação através de atos normativos. Os Órgãos Estaduais de

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Meio Ambiente (OEMA’s) foram criados a partir de 1974” (Santaella et al., 2014,

p. 55).

A Política Nacional do Meio Ambiente (PNMA) – Lei n° 6.938, de 31 de

agosto de 1981, sancionada no ano de 1981, representou:

[...] um marco importante na história da Política Ambiental Brasileira. Foi a partir desta lei que surgiram, no Brasil, importantes instituições voltadas para o meio ambiente, como o órgão consultivo e deliberativo chamado Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA), para assessorar nas decisões do Governo Federal relativas ao meio ambiente e recursos naturais, bem como para deliberar sobre normas relacionadas ao meio ambiente (Santaella et al., 2014, p. 55).

Em 1985, criou-se o Ministério do Desenvolvimento Urbano e do Meio

Ambiente, por meio do Decreto n° 91.145, que veio substituir a Secretaria

Especial de Meio Ambiente, que também depois veio a ser extinta, dando lugar

ao Ministério do Meio Ambiente - MMA.

Somente a partir da Constituição Federal de 1988, o Brasil passa a ter

assegurado constitucionalmente, a proteção ao meio ambiente, ganhando um

capítulo voltado exclusivamente para essa questão, onde está posto que:

Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. § 1º Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público: I - preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas; II - preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético; III - definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção; IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade; V - controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente; VI - promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio ambiente; VII - proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade. § 2º Aquele que explorar recursos minerais fica obrigado a recuperar o meio ambiente degradado, de acordo com solução técnica exigida pelo órgão público competente, na forma da lei. § 3º As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.

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§ 4º A Floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, o Pantanal Mato-Grossense e a Zona Costeira são patrimônio nacional, e sua utilização far-se-á, na forma da lei, dentro de condições que assegurem a preservação do meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos recursos naturais. § 5º São indisponíveis as terras devolutas ou arrecadadas pelos Estados, por ações discriminatórias, necessárias à proteção dos ecossistemas naturais. § 6º As usinas que operem com reator nuclear deverão ter sua localização definida em lei federal, sem o que não poderão ser instaladas. (Brasil, 1988, Art. 225).

Através da Lei 7.735, de fevereiro de 1989, foi criado o Instituto Brasileiro

de Meio Ambiente e dos Recursos Renováveis (IBAMA), em substituição ao

Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal – IBDF, quando também deixou

de existir a SEMA e a Superintendência do Desenvolvimento da Pesca

(SUDEPE). Segundo Santaella et al. (2014):

O IBAMA foi criado como autarquia ligada à Secretaria do Meio Ambiente da Presidência da República, com o objetivo de assessorá-la na formação e coordenação, bem como executar a política nacional do meio ambiente e da preservação, conservação e uso racional, fiscalização, controle e fomento dos recursos naturais (Santaella et al., 2014, p. 55).

É de responsabilidade do IBAMA e dos órgãos estaduais de meio

ambiente, a função de fiscalizar e conceder licenças ambientais para atividades

que porventura ofereça risco de poluição ou degradação do meio ambiente.

Anterior ao IBAMA existia o Instituto Brasileiro de Desenvolvimento

Florestal (IBDF), que foi criado pelo Decreto-Lei nº 289, de 28/02/67, autarquia

federal do governo do Brasil e estava ligada ao Ministério da Agricultura

encarregado dos assuntos pertinentes e relativos às florestas e afins, no entanto

foi extinto através da Lei nº 7.732, de 14 de fevereiro de 1989.

Em 1990, o Ministério do Meio Ambiente transformou-se em Secretaria do

Meio Ambiente, ligada à Presidência da República, que também foi extinta,

porém voltou a ser como em outrora, mediante a mudança do Governo Federal,

no ano de 1992, passando a Ministério do Meio Ambiente e da Amazônia Legal,

em 1993 e, logo em seguida, em 1995, passou a ser Ministério do Meio

Ambiente, dos Recursos Hídricos e da Amazônia Legal, sendo chamado depois

de Ministério do Desenvolvimento Urbano e do Meio Ambiente (todos já

extintos). Nessas idas e vindas, volta a ser chamado novamente de Ministério do

Meio Ambiente, em 1999, como ainda é denominado na atualidade.

Institui-se em 2000, o Sistema Nacional de Unidade de Conservação da

Natureza (SNUC) – Lei n° 9.985, que define as Unidades de proteção Integral e

Unidades de Uso Sustentável.

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Conforme apontado no item 1.1 desse capítulo, aconteceram no Rio de

Janeiro, dois eventos relevantes para o cenário ambiental, sendo um no ano de

1992, a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e

Desenvolvimento - a ECO 92; e outro em 2012, quando ocorreu a Conferência

das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, chamada de Rio+20.

No ano de 2007, com a reestruturação do IBAMA, uma parte desse órgão

passa a fazer parte do Instituto Chico Mendes de Conservação da

Biodiversidade (ICMBIo), que tem como atribuição: colocar em prática ações do

Sistema Nacional de Unidades de Conservação, podendo propor, implantar,

gerir, proteger, fiscalizar e monitorar as Unidades de Conservação instituídas

pela União, além de ser responsável por fomentar e executar programas de

pesquisa, proteção, preservação e conservação da biodiversidade e exercer o

poder de polícia ambiental para a proteção das Unidades de Conservação

federais. Já o IBAMA passa a ser responsável por:

I- Exercer o poder de polícia ambiental; II- Executar ações das políticas nacionais de meio ambiente, referentes às atribuições federais, relativas ao licenciamento ambiental, ao controle da qualidade ambiental, à autorização de uso dos recursos naturais e à fiscalização, ao monitoramento e ao controle ambiental, observadas as diretrizes emanadas do Ministério do Meio Ambiente. III- Executar as ações supletivas de competência da União, de conformidade com a legislação ambiental vigente (IBAMA apud Santaella et al., 2014, p. 59).

No contexto dos resíduos sólidos algumas legislações foram aprovadas ao

longo desses anos, dentre as quais a Política Nacional de Resíduos Sólidos

(PNRS) sancionada em 2010, depois de vinte e um anos de tramitação e

discussões no Congresso Nacional, o que, ainda que teoricamente, marca o

início de uma forte articulação institucional, envolvendo os três níveis da

federação (União, Estados e Municípios), o setor produtivo e a sociedade em

geral – com o objetivo de buscar saídas para os problemas que hoje são

encontrados na gestão lixo, o que tem implicações diretas para a qualidade de

vida da população, sobretudo, a menos favorecida.

A PNRS é importante porque além de qualificar os resíduos, aponta novos

caminhos para a discussão sobre a temática e sua correta destinação que

segundo o artigo 4° está posto que:

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A Política Nacional de Resíduos Sólidos reúne o conjunto de princípios, objetivos, instrumentos, diretrizes, metas e ações adotadas pelo governo federal, isoladamente ou em regime de cooperação com Estados, Distrito Federal, Municípios ou particulares, com vistas à gestão integrada e ao gerenciamento ambientalmente adequado dos resíduos sólidos (PNRS, 2010, Art. 4º).

Além da PNRS, que trata exclusivamente dos resíduos sólidos, elencamos

a Lei n° 11.445/07, que versa sobre saneamento básico e o relaciona a serviços

de coleta de lixo e à limpeza urbana, quando nos artigos 2°, 3°, 6° e 7° cita que:

Art. 2° Os serviços públicos de saneamento básico serão prestados com base nos seguintes princípios fundamentais: III - abastecimento de água, esgotamento sanitário, limpeza urbana e manejo dos resíduos sólidos realizados de formas adequadas à saúde pública e à proteção do meio ambiente. Art. 3° Para os efeitos desta Lei, considera-se: I - saneamento básico: conjunto de serviços, infraestruturas e instalações operacionais de: c) limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos: conjunto de atividades, infraestruturas e instalações operacionais de coleta, transporte, transbordo, tratamento e destino final do lixo doméstico e do lixo originário da varrição e limpeza de logradouros e vias públicas; Art. 6° O lixo originário de atividades comerciais, industriais e de serviços cuja responsabilidade pelo manejo não seja atribuída ao gerador pode, por decisão do poder público, ser considerado resíduo sólido urbano. Art. 7° Para os efeitos desta Lei, o serviço público de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos urbanos é composto pelas seguintes atividades: I - de coleta, transbordo e transporte dos resíduos relacionados na alínea c do inciso I do caput do art. 3° desta Lei; II - de triagem para fins de reuso ou reciclagem, de tratamento, inclusive por compostagem, e de disposição final dos resíduos relacionados na alínea c do inciso I do caput do art. 3o desta Lei; III - de varrição, capina e poda de árvores em vias e logradouros públicos e outros eventuais serviços pertinentes à limpeza pública urbana (Brasil, 2007).

Portanto, verificamos que a questão legal da produção e tratamento dos

resíduos sólidos não está determinada somente na Política Nacional de

Resíduos Sólidos, mas também em outras leis, como na Lei Federal do

Saneamento Básico entre outras, mas nem por isso sua operacionalização

ocorre conforme preceitua a legislação.

Para corroborar com a questão apontada acima, segue uma breve linha do

tempo com ações e/ou legislações instituídas no decorrer dos últimos anos no

Brasil, referentes aos resíduos sólidos, mas que efetivamente se torna inócua,

uma vez que não tem real representatividade no cenário nacional.

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Tabela 2- Quadro de ações e/ou legislações instituídas no decorrer dos últimos anos no Brasil, voltadas para os resíduos sólidos.

Ano Ações/Legislações

1991 Projeto de Lei 203/1991, que dispõe sobre: acondicionamento, coleta, tratamento, transporte e destinação dos resíduos de serviços de saúde.

1999 Proposição Conama 259, intitulada de Diretrizes Técnicas para a Gestão de Resíduos Sólidos. Esta foi aprovada pelo plenário do conselho, mas não chegou a ser publicada.

2001 Câmara dos Deputados cria e implementa Comissão Especial da Política Nacional de Resíduos com o objetivo de apreciar as matérias contempladas nos projetos de lei apensados ao Projeto de Lei 203/91 e formular uma proposta substitutiva global. Com o encerramento da legislatura, a Comissão foi extinta.

É realizado em Brasília o 1º Congresso Nacional dos Catadores de Materiais Recicláveis, com 1.600 congressistas, entre catadores, técnicos e agentes sociais de 17 estados. Eles promoveram a 1ª Marcha Nacional da População de Rua, com 3.000 participantes.

2003 No mês de janeiro deste ano realizou-se, em Caxias do Sul, o Primeiro Congresso Latino-Americano de Catadores, que propunha a formação profissional, erradicação dos lixões, responsabilização dos geradores de resíduos.

O então Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, institui Grupo de Trabalho Interministerial de Saneamento Ambiental a fim de promover a integração das ações de saneamento ambiental, no âmbito do governo federal.

Um Grupo de Trabalho reestrutura o setor de saneamento e resulta na criação do Programa de Resíduos Sólidos Urbano.

Foi realizada também a Primeira Conferência Nacional de Meio Ambiente. Tema: Fortalecimento do Sistema Nacional do Meio Ambiente.

2004 O Ministério do Meio Ambiente promove grupos de discussões interministeriais e de secretarias do ministério para elaboração de proposta para a regulamentação dos resíduos sólidos.

No mês de agosto do presente ano, o Conama realiza o seminário “Contribuições à Política Nacional de Resíduos Sólidos”, com objetivo de ouvir a sociedade e formular nova proposta de projeto de lei, pois a Proposição Conama 259 estava defasada.

2005 Cria-se um grupo interno na Secretaria de Qualidade Ambiental nos Assentamentos Humanos do Ministério do Meio Ambiente para consolidar contribuições do Seminário Conama, os anteprojetos de lei existentes no Congresso Nacional e as contribuições dos diversos atores envolvidos na gestão de resíduos sólidos.

É encaminhado anteprojeto de lei de “Política Nacional de Resíduos Sólidos”, debatido com Ministérios das Cidades, da Saúde, mediante sua Fundação Nacional de Saúde-Funasa, do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, do Planejamento, Orçamento e Gestão, do Desenvolvimento Social e Combate à Fome e da Fazenda.

É realizada a II Conferência Nacional de Meio Ambiente, para consolidar participação da sociedade na formulação de políticas ambientais. Um dos temas prioritários são os resíduos sólidos.

São realizados seminários regionais de resíduos sólidos, promovidos pelo Conama, Ministério do Meio Ambiente, Ministério das Cidades, Funasa, Caixa Econômica Federal e ainda debates com a Confederação Nacional das Indústrias (CNI), Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (FIESP), Associação Brasileira de Engenharia Sanitária (ABES), Compromisso Empresarial para Reciclagem (CEMPRE), e com outras entidades e

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organizações afins, tais como Fórum Lixo & Cidadania e Comitê Interministerial de Inclusão Social dos Catadores de Lixo.

É instituída uma nova Comissão Especial na Câmara dos Deputados.

2006 É aprovado o relatório que trata do Projeto de Lei 203/91 acrescidos da liberação da importação de pneus usados no Brasil.

2007 O Executivo propõe, em setembro, o Projeto de Lei 1991. O PL da Política Nacional de Resíduos Sólidos, considerou o estilo de vida da sociedade contemporânea, que aliado às estratégias de marketing do setor produtivo, levam a um consumo intensivo provocando uma série de impactos ambientais, à saúde pública e sociais, incompatíveis com o modelo de desenvolvimento sustentado que se pretende implantar no Brasil.

É constituído um Grupo de Trabalho (GTRESID) para analisar subemenda substitutiva proposta pelo relator, deputado Arnaldo Jardim, que envolveu reuniões com a Casa Civil.

Foi criado o PL 1991/2007, que apresenta forte inter-relação com outros instrumentos legais na esfera federal, tais como a Lei de Saneamento Básico (Lei nº11.445/2007) e a Lei dos Consórcios Públicos (Lei nº11.107/1995), e seu Decreto regulamentador (Decreto nº. 6.017/2007). De igual modo está inter-relacionado com as Políticas Nacionais de Meio Ambiente, de Educação Ambiental, de Recursos Hídricos, de Saúde, Urbana, Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior e as que promovam inclusão social. O texto é finalizado e enviado à Casa Civil.

2008 São realizadas audiências públicas, com a contribuição da CNI, da representação de setores interessados, do Movimento Nacional de Catadores de Materiais Recicláveis e dos demais membros do GTRESID.

2009 Em junho, uma minuta do Relatório Final (supracitado) foi apresentada para receber contribuições adicionais.

2010 No dia 11 de março, o plenário da Câmara dos Deputados aprovou em votação simbólica um substitutivo ao Projeto de Lei 203/91, do Senado, que institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos e impõe obrigações aos empresários, aos governos e aos cidadãos no gerenciamento dos resíduos. Depois o projeto seguiu para o Senado. Foi analisado em quatro comissões e no dia 07 de julho foi aprovado em plenário.

No dia 02 de agosto, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em cerimônia no Palácio do Itamaraty, sancionou a lei que cria a Política Nacional de Resíduos Sólidos.

No dia 03 de agosto é publicada no Diário Oficial da União, a Lei nº 12.305 que institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos e dá outras providências.

No dia 23 de dezembro é publicado no Diário Oficial da União o Decreto nº 7.404, que regulamenta a Lei no 12.305, de 02 de agosto de 2010, que institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos, cria o Comitê Interministerial da Política Nacional de Resíduos Sólidos e o Comitê Orientador para a Implantação dos Sistemas de Logística Reversa, e dá outras providências.

No dia 23 de dezembro é publicado o Decreto nº 7.405, que institui o Programa Pró-Catador, denomina Comitê Interministerial para Inclusão Social e Econômica dos Catadores de Materiais Reutilizáveis e Recicláveis. O Comitê Interministerial da Inclusão Social de Catadores de Lixo criado pelo Decreto de 11 de setembro de 2003, dispõe sobre sua organização e funcionamento, e dá outras providências.

Fonte: Maria Izabel de Carvalho – abril/2016.

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Como pode ser visto na tabela acima, a partir da década de 1990, ganha

espaço na agenda política, a discussão sobre o lixo, porém, é sabido que muito

pouco se tem feito de fato, por parte dos entes públicos, para mudar tal

realidade.

A PNRS aprovada em 2010 prega o conceito de responsabilidade

compartilhada, portanto, o ciclo de geração e destinação dos resíduos deverá

perpassa por diversas áreas, inicialmente a responsabilidade recai para quem

produz, ou seja, o setor privado, a indústria, em segundo para o governo na

proposição da coleta e destinação adequada e em terceiro a sociedade civil no

processo de controle do consumo desfreado. Assim fica instituído que o setor

privado, é o primeiro responsável pelo gerenciamento ambientalmente correto do

resíduo, inclusive determinando que retornem para a cadeia produtiva através de

inovações tecnológica de menos impacto na natureza denominado de logística

reversa, no entanto ainda esta prática não tem sido efetivada com eficácia e

eficiência no país.

Um dos pontos importantes dessa lei é a determinação do fim dos lixões

no Brasil, até agosto de 2014, uma vez que estes trazem sérios impactos para a

qualidade de vidas das pessoas que habitam próximo a estas áreas e de muitos

que tiram destes locais o seu sustento. No entanto, essa meta está longe de ser

alcançada, pois cerca de três mil municípios e o Distrito Federal ainda não

conseguiram colocar em prática o que determina a PNRS. A Confederação

Nacional dos Municípios (CNM) vinha reivindicando

[...] a flexibilização do prazo sob a justificativa da dificuldade dos prefeitos em cumprirem a lei por falta de recursos e apoio da União e dos Estados, já que o custo para transformar todos os lixões em aterros sanitários estaria estimado em R$ 70 bilhões. [...] a lei prevê multas para as prefeituras que não cumprirem as metas, com valores que variam de R$ 5 mil a R$ 50 milhões, e que os responsáveis, incluindo-se os prefeitos, respondam por crime ambiental (Mantovani, 2015, p. 26).

Mediante esse fato, iniciou-se um movimento para alteração do tempo

determinado e foi aprovado o Projeto de Lei do Senado nº 425, de 2014, que já

recebeu redação final e se reestruturou no PL 2889 que prorroga de forma

escalonada, o prazo para o fim dos lixões. De acordo com uma matéria

publicada no site do Senado Federal, em julho de 2015,

As cidades com população inferior a 50 mil habitantes terão prazo maior, enquanto as capitais de estado terão prazo mais curto. Assim, as capitais e municípios de região metropolitana terão até 31 de julho de 2018 para acabar com os lixões. Os municípios de fronteira e os que contam com mais de 100 mil habitantes, com

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base no Censo de 2010, terão um ano a mais para implementar os aterros sanitários. As cidades que têm entre 50 e 100 mil habitantes terão prazo até 31 de julho de 2020. Já o prazo para os municípios com menos de 50 mil habitantes será até 31 de julho de 2021. A emenda também prevê que a União vai editar normas complementares sobre o acesso a recursos federais relacionados ao tema (Brasil, 2015, p.1).

O não cumprimento do prazo para o fim dos lixões, pelos municípios,

mostra só mais um exemplo do descaso do poder público com a problemática

ambiental que atinge os mais pobres, uma vez que os lixões se concentram nas

áreas periféricas da cidade, não atingindo diretamente suas as áreas nobres.

Porém apesar dos retrocessos, não podemos deixar de reconhecer os

ganhos já alcançados após a PNRS. Mantovani (2015) aponta como resultado

positivo dessa lei, o aumento da destinação ambientalmente adequada do lixo

produzido nos municípios, que:

Em 2008, dos 5.564 municípios brasileiros, apenas 1.902 garantiam a destinação ambientalmente adequada aos resíduos coletados. Ao final de 2013, esse número passou para 2,2 mil, abrangendo principalmente as cidades de médio e grande porte, onde vivem 55% da população brasileira (Mantovani, 2015, p. 26).

De modo geral, quando analisamos a política ambiental brasileira, aí

englobando todas as áreas, notamos avanços significativos nas últimas décadas,

porém ainda há muito a ser feito e, como aponta Santaella et al. (2014):

Uma dificuldade na política ambiental brasileira é atender aos diversos segmentos do Governo e da sociedade que, muitas vezes, têm interesses diversificados. Embora tendo obtido ganhos coletivos e ambientais, geralmente, as políticas de desenvolvimento sustentável deparam-se com negociações de médio e longo prazo, sobre as quais o fator econômico imediato exerce pressão. O desafio, portanto, consiste em conciliar, na mesma agenda, os interesses ambientais, econômicos, políticos e sociais (Santaella et al., 2014, p. 59).

2.4. Lixão, aterro controlado e aterro sanitário: fontes geradoras de recursos ou promotora de desigualdade social?

Inicialmente nossa abordagem dará enfoque aos diversos tipos de

modalidades de disposição final do lixo do país, embora a maneira correta seja

somente uma, Aterro Sanitário, ainda nos deparamos com lixão e aterro

controlado:

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Lixão – forma inadequada de disposição final dos resíduos sólidos que se caracteriza pela simples descarga destes sobre o solo, sem medidas de proteção ao meio ambiente ou à saúde pública. No lixão, os resíduos são depositados sem preparação alguma do local, sem planejamento para escoar o chorume que penetra no solo, carreando poluentes para o lençol freático (Santaella et al., 2014, p. 25).

É muito comum ver nesses locais, ratos, insetos em geral e aves que

dividem espaço com pessoas que sobrevivem da catação de lixo. A seguir pode

ser observada uma ilustração de como se configura um lixão:

Figura 9- ilustração esquemática de um lixão. Fonte: SANTAELLA et al. (2014).

Já o aterro controlado, apesar de ser considerada uma forma de

destinação dos resíduos mais avançada que a do lixão, ainda não é a adequada,

pois também polui o meio ambiente. De acordo com Santaella et al. (2014), o

aterro controlado consiste em uma:

Técnica inadequada de disposição final de resíduos sólidos, que oferece riscos à saúde pública e ao meio ambiente, em que os resíduos são dispostos no solo, sem impermeabilização prévia, em depressões ou escavações e são recobertos com camadas de solo. Além da falta de impermeabilização, no aterro controlado não há extravasores para gases gerados, nem captação do chorume produzido (Santaella et al., 2014, p. 26).

De acordo com estudiosos da área, em um aterro controlado medidas são

tomadas visando reduzir os impactos causados ao meio ambiente e à saúde dos

seres humanos. Antes de se tornarem aterros controlados, boa parte desses

locais, eram lixões, e foram remediados, pois foram realizados tratamentos

técnicos, no entanto, não pode ser considerada a forma adequada de destinação

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final dos resíduos sólidos. Vejamos abaixo uma ilustração de como é um aterro

controlado:

Figura 10- Ilustração esquemática de um aterro controlado. Fonte: SANTAELLA et al. (2014).

No aterro sanitário diferente dos casos anteriores, o lixo é depositado em

terreno onde anteriormente é feita a sua impermeabilização, sendo

posteriormente compactado e, camadas de terra são utilizadas para recobrir os

resíduos, portanto, de acordo com Imbellon (2004), entende-se por aterro

sanitário:

A área tem dispositivos para drenagem, captação e tratamento do chorume, assim como para captação e tratamento dos gases provenientes da decomposição do lixo (principalmente metano e dióxido de carbono). Um aterro sanitário deve contar ainda com monitoramento ambiental permanente e ter um plano de encerramento de suas atividades (Imbellon, 2004, p. 1).

Santaella et al. (2014), complementa afirmando que o aterro sanitário

consiste em uma:

Técnica mais difundida no mundo de disposição final de resíduos sólidos, devido à simplicidade operacional e ao relativo baixo custo. É fundamentada em critérios de engenharia e normas operacionais específicas, para confinar os resíduos de forma segura e minimizar os impactos ambientais negativos. O solo é preparado antes da disposição dos resíduos sólidos com uma camada de argila ou coberto com mantas poliméricas (sintéticas) para impermeabilização. Deste modo, o chorume é drenado e conduzido a uma estação de tratamento de efluentes. Os gases produzidos (especialmente metano e sulfídrico) são coletados em extravasores e, posteriormente, queimados ou utilizados como combustível no próprio aterro. No aterro sanitário, os compartimentos para disposição dos resíduos sólidos são dimensionados de tal forma que devem ser preenchidos em períodos específicos. Os resíduos sólidos depositados são compactados com um trator e recobertos diariamente com cerca de 20 cm de solo, para não produzir maus odores e não atrair insetos, roedores e aves (Santaella et al., 2014, p. 26).

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Apesar de Santaella et al. (2014) afirmar que um dos pontos positivos do

aterro sanitário é o relativo baixo custo, isso não é o que argumenta a maioria

das administrações dos municípios brasileiros, que se queixa do alto custo de

manutenção desses espaços, usando como justificativa para não colocar em

prática o que preceitua a Lei nº 12.305/2010.

Podemos apreciar na sequência uma ilustração de como se dá o processo

em um aterro sanitário:

Figura 11- Ilustração esquemática de um aterro sanitário. Fonte: SANTAELLA et al. (2014).

No Brasil, ainda é possível quantificar mesmo que de forma ilegal, pois fere

o Art. 54 da Lei 12.305/2010, a existência de aproximadamente 3.000 lixões, e

com isto o processo de poluição ambiental e da presença informal de catadores

a frente do trabalho insalubre, perigoso e penoso é muito constante. Sendo

assim, nos questionamos, levantando a seguinte questão: será que estes

lugares são fontes geradoras de recursos ou promotora de desigualdade social?

Diante da indagação, fomos buscar argumentos para compreender a

questão e encontramos em Machado (2012) a tese, onde ela defende que houve

apropriação do discurso higienista por parte do poder público e da sociedade

dominante para a promoção da segregação espacial, afirmando que:

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O espaço é um instrumento político intencionalmente manipulado, mesmo se a intenção se dissimula sob as aparências coerentes da figura espacial. É um modo nas mãos de “alguém”, individual ou coletivo [...] Isto é um poder (por exemplo, um Estado), de uma classe dominante (a burguesia) ou de um grupo que tanto pode representar a sociedade global, quanto ter seus próprios objetivos (Lefebvre apud Machado, 2012, p. 23).

A partir desse pensamento almejamos entender a disposição final do lixo

gerado no Brasil, pois como é sabido, ao longo dos anos buscou-se limpar a

cidade empurrando para as periferias, não somente os pobres, mas como

também, tudo o que representa ameaça para o bem estar à classe dominante,

como é o caso também, dos lixões, aterros controlados e dos aterros sanitários,

que são sempre implantados nas áreas periféricas das cidades, com o

argumento de que por questões de saúde, os resíduos devem ficar afastados

das áreas centrais, espaço no nosso país, costumeiramente habitado pelos que

detém o poder. Segundo Machado (2012):

As transformações espaciais e sociais propostas pelos higienistas iam além da preocupação de melhorar as condições de salubridade da cidade. Suas ações buscavam também criar espaços de circulação diferenciados, demanda da nova ordem social que se desenvolvia. Para alcançar objetivo, os higienistas atacaram em duas frentes: o ambiente da cidade e seus causadores de moléstias, nesse aspecto nos interessa as ações em torno do lixo e sua forma de disposição final, e as habitações populares (cortiços) (Machado, 2012, p. 31).

A autora complementa seu pensamento afirmando que “a cidade era

encarada como um corpo social, [...] Rago (1985) acredita que o papel dos

higienistas era uma desodorização do espaço urbano” e que:

A estratégia norteadora da intervenção dos higienistas sociais na recomendação da cidade consiste, então em separar os corpos, designado a cada um deles um lugar específico. O esquadrinhamento “científico” rigoroso da população trabalhadora facilita a empresa da desodorização das casas e das ruas, interdita os contatos muito estreitos, permite exercer um controle “científico-político” do meio. [...] esta política sanitária de descongestionamento dos corpos define a produção do espaço urbano e, ao mesmo tempo, determina a invasão da casa do pobre, impondo-lhe novos regimes sensitivos e uma outra disciplina corporal (Rago apud Machado, 2012, p. 31).

Esse discurso, conforme apontado anteriormente, serviu como base para a

“separação dos usos da cidade [...] e no movimento de direcionar a população

de baixa renda para fora dos limites centrais da cidade” (Machado, 2012, p. 31),

aí também incluído, o direcionamento dos locais para onde o lixo é destinado

diariamente, caracterizando a nítida segregação espacial existente no nosso

país.

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Outra questão que merece atenção é o fato desses espaços

representarem para uma parcela da sociedade, os catadores de materiais

recicláveis, ao mesmo tempo, o único meio de sobrevivência, mas também, um

processo de exclusão social, vivenciada constantemente pelos mesmos. Em sua

análise sobre os excluídos, Bastos (2014) aponta que é:

[...] recomendável que tratemos de excluídos todos aqueles que mais do que simplesmente pobres estejam próximos da situação de miserabilidade e que, para tanto, sejam eles identificados como aqueles que não estão inseridos no mercado formal de trabalho, tendo somente a via informal como alicerce de sobrevivência (Bastos, 2014, p. 149).

Apesar dos catadores de materiais recicláveis serem massa sobrante no

mercado formal de trabalho, acabam sendo incluídos de forma precária, por

exemplo, ao participarem do mundo do consumo, o que os leva a se sentirem

muitas vezes, não pobres, conforme podemos ver na fala de Bastos (2014) ao

lançar mão do caso do lixão de Jardim Gramacho:

Embora sejam desnecessários ao mercado formal, estes trabalhadores, dentro dos limites impostos pela natureza do trabalho com o lixo, ainda conseguem, mesmo de forma perversa, serem incluídos em algumas situações de vida que por vezes leva ao entendimento de que não são pobres, conforme socialmente o imaginam, pois conseguem adquirir bens comuns como qualquer trabalhador brasileiro, embora para isto tenham que dispor de um esforço dobrado, subumano. Além deste fator, outro dado de realidade é o fato de que mesmo que adquiram estes bens e até percebam maiores quantias, há uma dificuldade quanto ao processo de mobilidade social, pois os catadores não conseguem migrar de uma classe social para outra, permanecendo sempre no mundo desenhado pelo território de jardim gramacho, onde as oportunidades de acesso são reduzidas (Bastos, 2014, p. 149-150).

A partir das falas apresentadas e da nossa análise, chegamos à

conclusão de que, apesar dos lixões, aterros controlados e aterros sanitários,

representarem para uma determinada categoria, a única fonte geradora de

recursos, indispensáveis a sua sobrevivência, também são espaços onde há

uma gritante desigualdade social, pois os que de lá tiram o seu sustento, sequer

conseguem mobilidade social, portanto, permanecem sempre no mundo dos

excluídos, à margem da sociedade.

Por fim, outro fator que nos levar a afirmar que esses espaços são

geradores de desigualdade social, já aludido inicialmente nessa análise, é o fato

de estarem dispostos em área periféricas da cidade, locais habitados por

pessoas de menor poder aquisitivo, que acabam sofrendo as consequências, por

residirem próximos a essas áreas. Podemos utilizar como exemplo o sub- bairro

de Jardim Gramacho, onde Bastos (2014), elucida que:

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[...] podemos enfatizar que ele expressa o que vem sendo apresentado no cenário de milhares de bairros brasileiros, ou seja, é mais um local periférico que revela uma grande desigualdade social atrelada a outros tipos de desigualdade, como a ambiental, por abrigar um dos maiores aterros de lixo da América Latina, o que coloca em debate os riscos ambientais aos quais a população residente e trabalhadora está exposta [...] Na medida em que a população moradora está não só expostas aos riscos ambientais por viver nas proximidades de um aterro controlado, mais conhecido como ‘lixão’ – exposta à contração de doenças, à poeira, sujeira, entre outros [...] (Bastos, 2014, p. 115).

Os lixões, os aterros controlados e os aterros sanitários, são mais que

fontes geradoras de recursos - pois ainda que de forma precária, representam a

única fonte de renda para um grande número de pessoas que vivem à margem

da sociedade sem emprego formal, como é o caso dos catadores de materiais

recicláveis, no entanto, embora sejam fontes que ajudam a movimentar a

economia do país, ao mesmo tempo são causadores de desigualdades sociais,

uma vez que fomentam a grande disparidade entre os segmentos sociais onde

os mais pobres permanecem na base da sociedade, sem nenhum processo de

ascendência, tendo em vista o não acesso a direitos.

Objetivando responder a pergunta inicial, deste item, concluímos, que os

lixões e os aterros controlados são territórios permeados pela desigualdade,

tendo em vista que não oferecem plenas condições de trabalho para quem dele

depende para sobrevivência, pois além das condições insalubres e penosa que

os catadores de materiais recicláveis são submetidos, ainda são usurpados de

seus direitos enquanto cidadão trabalhador que na via da informalidade não

encontra amparo previdenciário e assistencial, e nem mesmo de valorização de

sua mão de obra barata que promove o enriquecimento daqueles que

comandam a cadeia produtiva de reciclagem, gerando assim disparidade gritante

entre quem inicia o processo através do garimpo de produtos, e aquele que os

comercializa.

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3 A favela como ambiente de organização espacial e territorial na vida cotidiana

3.1. A origem da favela brasileira

De acordo com alguns estudiosos, foi no Rio de Janeiro onde surgiram as

primeiras favelas brasileiras. Porém é importante ressaltar que não há consenso

quando se trata sobre a origem da favela no Brasil. Que segundo Gonçalves

(2013):

É extremamente difícil determinar o momento em que surgiram as primeiras favelas. Essa questão já foi extensamente estudada por diversos autores. O termo “favela” provém certamente da Guerra de Canudos (1896-1897). Naquela região do sertão do estado da Bahia, existia um morro chamado Favella, talvez porque fosse coberto por uma espécie de planta cujo nome era justamente “favela” (Jathropa phyllaconcha), uma euforbiácea bastante comum nas regiões Nordeste e Sudeste do país. Os soldados que retornavam da guerra se estabeleceram, com tolerância do Exército, no Morro da Providência, que se encontra atrás do prédio do antigo Ministério da Guerra, no Rio de Janeiro. Em alusão a essa campanha militar, o morro passou a ser conhecido como o “Morro da Favella” (Gonçalves, 2013, p. 44).

Apesar do Morro da Favella passar a ser denominado desta forma, não se

pode confundir o uso da categoria favela para designar as habitações precárias,

habitadas por pessoas de baixo poder aquisitivo existentes nos morros cariocas,

uma vez que a existência destas áreas é anterior ao uso do termo favela, pois é

somente na década de 1920 que “esse termo passou a designar todas as

habitações precárias do mesmo tipo, espalhadas nos diversos morros da cidade”

(Gonçalves, 2013, p. 44). Corroborando com este pensamento, Valladares

aponta que “é importante ressaltar o fenômeno da existência das favelas como

claramente anterior ao aparecimento da categoria favela” (Valladares, 2005, p.

26).

Conforme citado anteriormente, há outras versões sobre a origem da

favela, dentre as quais a de que o Morro da Favella já era ocupado antes da

chegada dos soldados vindos da Guerra de Canudos, conforme Gonçalves

(2013) elucida:

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O Morro da Favela, no entanto, já estava ocupado quando os soldados voltaram de Canudos em 1897. Um dos proprietários do cortiço Cabeça de Porco possuía terrenos nesse morro e, segundo Maurício Almeida de Abreu, alugou esses terrenos a habitantes expulsos do cortiço em 18934. Por outro lado, o Prefeito Barata Ribeiro havia autorizado os habitantes a utilizarem os restos da demolição do cortiço, o que permitiu que alguns dentre eles se instalassem no morro, construindo seus próprios barracos com esse material (Gonçalves, 2013, p. 44-45).

De acordo com essa versão, a origem da favela se dá no momento em que

a política do Rio de Janeiro tinha como objetivo limpar a cidade, tirando os

pobres do Centro da cidade, portanto, a favela é:

[...] uma consequência direta da política higienista contra os cortiços. [...] as primeiras ocupações de morros são “formas embrionárias de favelas” que guardavam uma grande semelhança com os cortiços. Essas pequenas e frágeis habitações espalhadas pelos morros da cidade ainda não podiam ser consideradas propriamente favelas, pelo menos até o final do século XIX, pois [...] faltavam-lhes alguns atributos, tais como: ‘a conotação de adensamento, ilegalidade, insalubridade, desordem, autoconstrução e falta de serviços e de infraestrutura urbana’5 (Gonçalves, 2013, p. 45).

Valladares (2005) apoia está vertente da história da favela quando expõe

que o cortiço é a semente da favela, conforme descrito no trecho abaixo:

Estudos sobre os cortiços do Rio de Janeiro demonstram que esse tipo de habitação pode ser considerado o “germe” da favela. Segundo pesquisa realizada por Vaz (1994: 591), o célebre cortiço Cabeça de Porco, destruído pelo Prefeito Barata Ribeiro, em 1893, possuía barracos e habitações precárias do mesmo tipo identificado em seguida no Morro da Providência. Outros autores também estabelecem ligação direta entre as demolições dos cortiços do Centro da cidade e a ocupação ilegal dos morros no início do século XX (Valladares, 2005, p. 24).

Outro ponto de vista sobre o surgimento da favela refere-se ao fato de que

outros morros já eram habitados em um período anterior à ocupação do Morro

da Favella, como o morro Santo Antônio. Gonçalves (2013) aponta como prova

deste fato:

[...] o telegrama enviado no dia 13 de abril de 1897 por um agente municipal (Luiz de Freitas) ao diretor-geral de Obras e Viações. Segundo esse documento, o Morro Santo Antônio estava ocupado pelo menos desde 1893; os barracos foram construídos por ocasião da revolta da Armada, ‘por ordem do governo e outros por conta própria, sendo esse trabalho feito, em data anterior ao meu exercício n’este distrito’6 (Gonçalves, 2013, p. 45).

Valladares (2005) corrobora com a colocação acima e afirma que:

4 Maurício Almeida de Abreu (“Reconstruindo uma história esquecida...”) apud Gonçalves (2013). 5 Lílian Fessler Vaz (“Modernidade e moradia...”) apud Gonçalves (2013). 6 Ofício n° 500 da Agência da prefeitura no 2° distrito de São José, datado de 13 de abril de 1897 (AGVRJ. Código 67-1-25) apud Gonçalves (2013).

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A Quinta do Caju, a Mangueira e a Serra Morena também datam do século XIX e são todas anteriores ao Morro da Favella. O povoamento de tais zonas começou em 1881, nada provando que tenha resultado de uma ocupação ilegal (Valladares, 2005, p. 26).

Há ainda quem afirme que “certas favelas se desenvolveram a partir da

estrutura de antigos quilombos periurbanos, que se disseminaram em torno da

capital durante a segunda metade do século XIX” (Campos apud Gonçalves,

2013, p. 45). Acredita-se, que um grande número de escravos libertos, se

radicou nos morros do Rio de Janeiro, logo após o final da Guerra do Paraguai,

que terminou no ano de 1970. Esses não tendo moradia popular para residirem,

passam a habitar as regiões que lhes era possível. De acordo com Gonçalves

(2013):

Carlos Bernard já afirmava, em 1860, sobre os morros do ‘Castello e Sancto Antonio’, que ‘os habitantes, que morão lá em cima, gozão de bom ar e excelente vista, e n’isso se cifra todo o benefício d’aquella eminência (Bernard apud Gonçalves, 2013, p. 45).

Já alguns estudiosos asseguram que de fato a ocupação dos morros se

deu antes mesmo da Guerra do Paraguai, ou seja, anterior à década de 1870,

como nos mostra a fala a seguir de 1865:

[...] há uma parte de nossa população pobre, que, fugindo do centro da cidade (velha) onde as casas são mais caras, vai habitar os arrabaldes ou mesmo as montanhas situadas no coração da cidade [...] (Vaz apud Gonçalves, 2013, p. 45).

Enquanto observava-se somente um baixo número de barracos, a favela

brasileira não foi alvo da intervenção pública, o que começou a mudar tão logo

esse cenário se tornou mais aglomerado. Apesar de inicialmente não ter ações

por parte do poder público nessas áreas, já se observava interesse das leis

urbanas daquele período para esse tipo de ocupação do solo urbano, como a

que segue sobre a erradicação do Morro Santo Antônio:

Contento outrossim que várias ruas se projectão no mencionado morro de Santo Antônio, e nellas edificações de prédios que sem dúvida argumentarão excepcionalmente o custo do útil se não necessário desmoronamento; tornando-se a edificação da cidade por esta forma não só mais defeituosa, como ameaçadora a sua população com construções pouco sólidas, pondo em risco, por ocasião das grandes chuvas, a segurança dos habitantes de taes prédios, e

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causando inconveniente aos que habitam nos terrenos contíguos7 (Gonçalves, 2013, p. 46).

Segundo Gonçalves (2013), constata-se o surgimento “[...] de um discurso

político criticando a expansão de construções precárias nos morros, pelo menos

desde a metade do século XIX” (Gonçalves, 2013, p. 46).

Para melhor compreendermos o processo de favelização no Brasil,

voltemo-nos um pouco para a questão habitacional no Rio de Janeiro, por volta

da última década do século XIX, que se agravou muito nesse período. Segundo

Maurício de Abreu (1992):

[...] o crescimento demográfico atingiu taxas muito elevadas (em 1890, por exemplo, a cidade já contava com 429.745 habitantes apenas em suas freguesias urbanas); por outro, o ritmo de construção de novas moradias não só não acompanhou a velocidade do crescimento populacional como, para piorar a situação, deu-se início, na mesma época, e em nome da higiene pública, a uma política deliberada de destruição das habitações coletivas da cidade, que servia de moradia a grande número de pessoas (Abreu, 1992, p. 89-90).

Essa situação foi agravada ainda mais no início do século XX, durante o

governo de Francisco Pereira Passos - prefeito do Rio de Janeiro de 1902 e

1906. A reforma urbana executada pelo mesmo teve grande impacto para as

habitações populares coletivas, conforme aponta Maurício de Abreu (1992):

As picaretas demolidoras direcionaram-se sobretudo para os quarteirões operários da área central, que se deveria transformar agora em símbolo da modernidade urbana. Consequentemente, desse Centro renovado não poderiam mais fazer parte as habitações coletivas (Abreu, 1992, p. 90).

As reformas dos cortiços ainda existentes passaram a ser proibidas por

meio de “decretos, leis, regulamentos e regimentos” (Abreu, 1992, p. 90), como

também tornaram completamente inviável toda e qualquer ação de melhoria

dessas habitações coletivas. Essa legislação “[...] passou a dificultar, por seu

lado, a ocupação de outras áreas da cidade (especialmente dos subúrbios) pela

população mais pobre” (Abreu, 1992, p. 90). Ao mesmo tempo, acontecia um

grande processo migratório para o Rio de Janeiro. Essa equação, onde havia

pouca disponibilidade de opções legalizadas de moradia para os mais pobres e

mais pessoas vindas para a região, impulsionou uma nova forma de habitação, a

favela, como afirma Maurício de Abreu (1992):

7 Ministério das Cidades, Experiência de regularização fundiária na Rocinha apud GONÇALVES, 2013.

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Atraindo grande quantidade de força de trabalho, e não oferecendo opções de residência legalizada na cidade, era inevitável que o Rio de Janeiro visse surgir, a partir de então, uma nova forma de habitação que, pela precariedade de sua construção, e pelo desafio que representava ao controle urbanístico, constitui-se em verdadeira negação da estética de modernidade que se procurava dar à cidade. Esta forma de habitação foi a favela (Abreu, 1992, p. 90).

A ocupação dos morros da cidade acabou por se tornar a melhor solução

para o problema pelo qual passava a escassez de habitação popular naquela

época e o que era para ser algo provisório, logo se tornou algo definitivo e

continua assim até os dias atuais em várias regiões da cidade. O chamado

processo de favelização dessas áreas

[...] tornou-se, então, irreversível. Apesar da repressão verificada nos primeiros anos (e que foi retomada em diversos períodos posteriores), a verdade é que, contraditoriamente, o mesmo processo de desenvolvimento capitalista que determinou a reforma urbana do início do século, exigiu também que contingentes crescentes de força de trabalho, mola mestra do processo de acumulação, passassem a ser demandados pelas atividades econômicas da cidade, incentivando, portanto, as migrações (Abreu, 1992, p. 93).

De acordo com a fala de Maurício de Abreu (1992), quando trata sobre o

surgimento da favela, considerando o seu início com a ocupação do morro da

Providência, afirma que essa forma de moradia não surge por meio de uma

invasão ou de forma arbitrária por parte dos que ali passaram a residir, mas sim

com o consentimento de autoridades competentes, no período da Guerra de

Canudos, como podemos observar a seguir:

Já presente embrionariamente na cidade desde 1897, quando foi dada autorização para que os praças retornados da campanha de Canudos ocupassem provisoriamente os morros da Providência e de Santo Antônio, esta forma de ocupação dos morros logo se revelou a solução ideal para o problema da habitação popular no Rio de Janeiro (ABREU, 1992, p. 90).

Portanto, conforme citado anteriormente, por interesse dos que detinham o

poder, “[...] de local de moradia provisório, esses morros da área central logo

foram se transformando em opção de residência permanente” (Abreu, 1992, p.

90), de tal forma que já na década de 1920 e 1930:

[...] a favela já havia chegado a Botafogo (Pasmado), a Copacabana (Tabajaras e Leme), a São Cristóvão (Mangueira), e até a Madureira. Também já galgava as encostas da serra Carioca pelo lado do Catumbi (São Carlos, Querosene), da Tijuca (Salgueiro), e do Engenho Novo (Macaco). A vertente sul do maciço logo começou também a ser atacada com vigor (Rocinha, Dona Marta). Chegada a década de 1930, e no bojo do processo de expansão industrial da cidade e de crescimento acelerado de seus bairros oceânicos, a favela se expandiu ainda

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mais: Catacumba, Pavão, Pavãozinho, Ilha das Dragas, Praia do Pinto, Borel, Macedo Sobrinho, Turano, Formiga... (Abreu, 1992, p. 93).

Mesmo crescendo em passos largos, nada se pensava enquanto política

pública para a favela, sobretudo até a década de 1940, quando, por começarem

a incomodar no que diz respeito à questão urbana da cidade, segundo Burgos

(2006), surgem às primeiras políticas públicas para essas áreas, com a

implementação dos parques proletários, voltados para uma parcela da

população pobre. Como podemos ver:

[...] a “descoberta” do problema favela pelo poder público não surge de uma postulação de seus moradores, mas sim do incômodo que causava à urbanidade da cidade, o que explica o sentido do programa de construção dos parques proletários, que tem por finalidade, acima de tudo, resolver o problema das condições insalubres das franjas do Centro da cidade, além de permitir a conquista de novas áreas para a expansão urbana (Burgos, 2006, p. 27).

De acordo com Lícia do Padro Valladares (2005), já nas primeiras décadas

do século XX, os jornalistas visitantes dos morros do Rio de Janeiro criaram uma

imagem sobre as favelas, a saber:

A imagem matriz da favela já estava, portanto, construída e dada a partir do olhar arguto e curioso do jornalista/observador. “Um outro mundo”, muito mais próximo da roça, do sertão, “longe da cidade”, onde só se poderia chegar através da “ponte” construída pelo repórter ou cronista, levando o leitor até o alto do morro que ele, membro da classe média ou elite, não ousava subir (Valladares, 2005, p. 36).

Corroborando com este pensamento, encontramos um trecho do livro “Um

Século de Favela” de Alba Zaluar et al. (2006), onde está posto que nas

composições da Música Popular Brasileira (MPB):

[...] a representação da favela tende a orientar-se por dois enfoques que, longe de serem excludentes, frequentemente se sobrepõem, o retrato da favela é feito com base em suas características intrínsecas, por outro, essa mesma imagem se constrói de forma relacional, sendo os elementos definidores traçados a partir da e com referência à cidade. Quando isso ocorre, o que chama a atenção, num primeiro plano, é a rígida demarcação que se estabelece entre ambas, fazendo com que a cidade seja vista como uma coisa e a favela como outra. Inúmeras são as referências musicais que tratam a favela como algo alheio, algo que não faz parte, algo, enfim, que é distinto da cidade, não importa a situação, os personagens ou os sentimentos que aí estejam envolvidos (Zaluar et al., 2006, p.

90).

Complementa ainda seu posicionamento a respeito de favela enfocando

que:

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A favela ficou também registrada oficialmente como área de habitações irregularmente construídas, sem arruamentos, sem plano urbano, sem esgoto, sem água, sem luz. Dessa precariedade urbana, resultado da pobreza de seus habitantes e do descaso do poder público, surgiram as imagens que fizeram da favela o lugar da carência, da falta, do vazio a ser preenchido pelos sentimentos humanitários, do perigo a ser erradicado pelas estratégias políticas que fizeram do favelado um bode expiatório dos problemas da cidade, o “outro”, distinto do morador civilizado da primeira metrópole que o Brasil teve. Lugar do lodo e da flor que nele nasce, lugar das mais belas vistas e do maior acúmulo de sujeira, lugar da finura e elegância de tantos sambistas, desde sempre, e da violência dos mais famosos bandidos que a cidade conheceu ultimamente, a favela sempre inspirou e continua a inspirar tanto o imaginário preconceituoso dos que dela querem se distinguir quanto os tantos poetas e escritores que cantaram suas várias formas de marcar a vida urbana no Rio de Janeiro (Zaluar et al., 2006, p. 8).

Apesar de passado mais de um século, desde seu surgimento, ainda é

muito atual essa visão sobre a favela, sendo então caracterizada como um lugar

a parte do resto da cidade.

Prova deste fato é a própria classificação adotada pelos órgãos oficiais do

país. Segundo o IBGE, favela é denominada de aglomerado subnormal,

entendido como:

Um conjunto constituído de, no mínimo, 51 unidades habitacionais (barracos8, casas...) carentes, em sua maioria de serviços públicos essenciais, ocupando ou tendo ocupado, até período recente, terreno de propriedade alheia (pública ou particular) e estando dispostas, em geral, de forma desordenada e densa (IBGE, 2011, p. 2).

O conceito de aglomerado subnormal é tratado pelo IBGE (2011) com

base nos seguintes critérios:

a) Ocupação ilegal da terra, ou seja, construção em terrenos de propriedade alheia (pública ou particular) no momento atual ou em período recente (obtenção do título de propriedade do terreno há dez anos ou menos); e b) Possuir pelo menos uma das seguintes características: urbanização fora dos padrões vigentes - refletido por vias de circulação estreitas e de alinhamento irregular, lotes de tamanhos e formas desiguais e construções não regularizadas por órgãos públicos; precariedade de serviços públicos essenciais (IBGE, 2011, p. 2).

O Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano Sustentável do Município do

Rio de Janeiro (Lei complementar nº 111 de 1/2/2011 - publicado no DOM em

01/02/2002. Dispõe sobre a Política Urbana e Ambiental do Município, institui o

Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano Sustentável do Município do Rio de

Janeiro e dá outras providências) também conceitua a favela como:

8 “Habitação tosca, improvisada, construída geralmente nos morros, com materiais de origem diversa e adaptados, coberta com palha, zinco ou telha, onde vivem os favelados; barracão” (FERREIRA, 2009).

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Área predominantemente habitacional, caracterizada por ocupação clandestina e de baixa renda, precariedade da infraestrutura urbana e de serviços públicos, vias estreitas e alinhamento irregular, ausência de parcelamento formal e vínculos de propriedade e construções não licenciadas, em desacordo com os padrões legais vigentes (Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano Sustentável do Município do Rio de Janeiro, Art. 234, § 3°, 2011).

Encontramos ainda, na definição do dicionário da língua portuguesa

Aurélio, que favela é um “conjunto de habitações populares toscamente

construídas (por via de regra em morros) e com recursos higiênicos deficientes”

(Ferreira, 2009, p. 879). Nessa descrição que o termo favela é muito impregnado

de preconceito e sentidos negativos, infelizmente esta é uma visão que vem

sendo perpetuada desde os primórdios das favelas brasileiras.

A favela foi e ainda continua sendo, de acordo com o ponto de vista dos

que detêm o poder sobre a cidade, um problema a ser resolvido. No Código de

Obras de 1937 aparece a visão que se tinha sobre essas regiões:

[...] por serem consideradas uma “aberração”, não podem constar no mapa oficial da cidade; por isso, o código propõe sua eliminação, pelo que também tornava proibida a construção de novas moradias, assim como melhoria das existentes (Burgos, 2006, p. 27).

Por muitos anos, por não ser reconhecida legalmente, como parte

integrante da cidade dita formal, a favela não aparecia nos mapas oficiais da

cidade, o que só ocorreu muito recentemente em alguns estados do Brasil. No

documentário “Todo mapa tem um discurso”, esse assunto é retratado,

levantando as principais questões simbólicas e práticas sobre as áreas

marginalizadas que não fazem parte do mapa oficial da cidade. Buscamos

documentos oficiais que informassem a partir de que ano algumas regiões

favelizadas passaram a aparecer em determinados mapas, porém não

encontramos tais dados. Mediante a esse fato, buscamos outros meios de

informação e encontramos uma matéria de Ivan Leonardi (2014), no site Mundo

Geo., onde está posto que:

Apesar das tentativas de mapeamento colaborativo ou dos esforços de algumas instituições não governamentais, ainda existem áreas da cidade que são representadas como “vazios cartográficos”. “Existe uma população que é invisível, porque nem num documento que deveria reconhecer toda a cidade, os moradores da favela fazem parte disso. A importância para a gente é… primeiro tem esse lado político, né?” Esclarece Eliana Sousa, presidente da Redes de Desenvolvimento da Maré. As favelas do Rio de Janeiro não são representadas nem nos mapas oficiais do Instituto Pereira Passos, nem nos mapas digitais do Google. Eram apenas nomeados e sinalizados como “favelas”, mas suas ruas e vielas não eram demarcadas.

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Porém, recentemente, a pedido da Prefeitura do Rio de Janeiro, possivelmente pela proximidade da Copa e dos Jogos Olímpicos, a palavra “favela” foi substituída por “morro” nos mapas do Google, o que sugere que tais regiões não são habitadas. Estamos falando de favelas como a Rocinha, Santa Marta, Maré, entre outras, que já são, inclusive, registradas como bairros. Em sua entrevista, Michel Silva, jornalista comunitário da Rocinha, explica: “A Rocinha é considerada bairro desde 1993, só que quando você olha no Google, não tem nenhuma rua, no caso, registrada. Só aquelas ruas lá da entrada. Não tem do Laboriaux, não tem a rua da Cachopa, são ruas tradicionais, que todo mundo conhece. A Rocinha, ela é conhecida internacionalmente e não tem nada no Google? ” (Leonardi, 2014. p.1).

Apesar de algumas favelas aparecerem em determinados mapas, isso não

se dá da mesma forma para cem por cento das regiões favelizadas, pois não são

todas que constam nas cartografias, somente as que são oficialmente bairros,

como por exemplo, a Rocinha no Rio de Janeiro, que passou a ser bairro desde

o ano de 1993, através da Lei n° 1995 de 18 de julho de 1993. Além da questão

da segregação espacial notadamente existente, outro fator que contribui para

que seja dessa forma, é o fato de não existir o levantamento topográfico9 da

maior parte das favelas brasileiras. Essa é uma questão antiga e como coloca

Ivins & Maciel (2011),

[...] a cartografia urbana fornece um palco ilustrativo, no qual as batalhas para a representação da favela dentro do retrato de identidade nacional continuam sendo travadas. Começando a partir do Código de Obras de 1937, no qual o artigo 349 proibiu a representação das favelas nos mapas da cidade do Rio de Janeiro (Ivins & Maciel, 2011, p. 7).

No primeiro plano oficial da Secretaria Geral da Saúde do Distrito Federal,

dirigido às favelas, aparecem as seguintes sugestões, de ordem sanitarista:

a) o controle da entrada, no Rio de Janeiro, de indivíduos de baixa condição social; b) o retorno de indivíduos de tal condição para os seus estados de origem; c) a fiscalização severa das leis que proíbem a construção e reforma de casebres; d) a fiscalização dos indivíduos acolhidos pelas instituições de amparo; e e) a promoção de forte campanha de reeducação social entre moradores das favelas, de modo a corrigir hábitos pessoais e incentivar a escolha de melhor moradia (Burgos, 2006, p. 27-28).

Essa foi à fase inicial da intervenção pública nas favelas, se configurou

com a ida de algumas famílias julgadas elegíveis para os Parques Proletários,

mas a justificativa é de que era um processo provisório, visto que para os

moradores a informação repassada era de que a favela seria urbanizada e que,

9 Levantamento topográfico é um conjunto de operações com a finalidade de determinar a posição relativa de pontos na superfície terrestre. As determinações dão-se por meio de medições lineares e angulares, ligando (link) os pontos descritores dos objetos a serem representados com posterior processamento em modelo matemático adequado. Disponível em: http://www.ebah.com.br/content/ABAAAAUkcAE/topografia. Acesso em: 14 de fevereiro de 2016.

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posteriormente, eles retornariam. No entanto no ato da mudança eles tinham que

assinar um documento, onde se comprometiam em respeitar as regras de

convivência dos novos locais de moradia.

Os Parques Proletários foram na verdade, não só uma política

habitacional, mas, principalmente, uma forma encontrada para controlar parte da

população empobrecida que aos olhos da elite dominante, estava solta e

precisava ser mantida sob controle, portanto, através deste empreendimento

buscava-se disciplinar o favelado, para que viesse a se tornar um “cidadão

ajustado”.

Afirmamos, que a intencionalidade do poder público sempre esteve e ainda

está nos dias atuais, ora de forma velada ora de forma explícita, voltada para o

extermínio da favela, uma vez que esse território muito incomoda aos que

dominam a sociedade brasileira, pois torna a geografia da cidade distante dos

padrões estabelecidos.

3.2. O surgimento da favela da Rocinha nos seus múltiplos aspectos

Rocinha, quando tu começou? Difícil, não sei... Pergunte aos antigos, Ó, morador! Poxa, parece banal. A história desse lugar seria sensacional. Se tu tens quarenta anos, Isso procurei saber. Começaste, suponho eu, muito antes do meu pai nascer. Ah! Não parece nada, os anos passam e não se vê. Sei que futuramente falarão muito de você... Rocinha, quando tu começou? Há muito tempo, quando inabitada eras, aqui alguém se instalou. Hoje vemos em ti algo que jamais se imaginou (Quintino apud Varal de Lembranças, 1983, p.29).

A Rocinha está localizada na zona sul da cidade do Rio de Janeiro, entre

os bairros da Gávea e São Conrado, e seu surgimento consta da década de

1930. Que de acordo com Gonçalves (2013):

[...] constitui-se a partir do loteamento de uma fazenda de 550 mil m² situada nos limites da parte oeste do bairro da Gávea (no alto do morro), incorporado pela empresa Castro Guidon em 1927 (Parisse apud Gonçalves, 2013, p. 352). Segundo o Jornal Diário de Notícias, de 27 de maio de 1943, essa empresa já se encontrava em situação de concordata em dezembro de 1933, o que a impediu de prosseguir com as obras de urbanização do terreno. O loteamento não foi aprovado pelos organismos municipais competentes não só pela precariedade da urbanização, mas também pelo fato de que não respeitava as disposições estabelecidas, posteriormente, pelo Código de obras de 1937, e pelo Decreto n° 58, de 10 de dezembro de 1938, que regulamentavam os loteamentos. Os compradores não puderam, portanto, obter o registro definitivo de seus títulos de propriedade. Os trabalhos de abertura do túnel Zuzu Angel (inaugurado em 1972), bem ao lado da favela da Rocinha, empregaram um grande número de moradores

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da favela, melhorando o acesso à sua parte plana, já no bairro de São Conrado (Gonçalves, 2013, p. 352).

Figura 12- Rocinha nos primeiros anos da década de 1930. Fonte: Facebook Rocinha On, abr. 2016.

Gonçalves (2013) aponta também que houve um grande crescimento

populacional nesta área, no período de 1960 a 1970, devido à política de

erradicação de favelas no Rio de Janeiro, fazendo com que as pessoas oriundas

das áreas mais próximas à Zona Sul se instalassem, então, na favela da

Rocinha. Segundo Brum (2009), “a maior parte das favelas removidas localizava-

se na Zona Sul, tendo sido removidas da orla da Lagoa e do Leblon as favelas

da Catacumba, Jóquei Clube, Ilha das Dragas e Praia do Pinto” (Brum, 2009,

p.3).

Voltando um pouco na história, de acordo com Leitão (2004), na década de

1940, a maior parte dos moradores da Rocinha se concentrava mais

especificamente em três regiões:

O trecho localizado no sopé da encosta, a faixa de terreno ao longo da Estrada da Gávea e os lotes situados naquela que é apontada como a primeira rua da comunidade, na época, não mais do que um caminho: o Caminho do Boiadeiro (Leitão, 2004, p. 106).

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Nessa época a Estrada da Gávea tinha uma importante função, que era

ligar o bairro de São Conrado à Gávea, passando pela Rocinha, uma vez que

ainda não existia o túnel Zuzu Angel, que veio a ser construído somente na

década de 1970, conforme citado anteriormente.

Segundo Leitão, ainda nos anos de 1940, no período de redemocratização

do Brasil, houve incentivo por parte de um dado vereador que se dizia dono de

terras na Rocinha, para ocupação das encostas, sobretudo por pessoas

oriundas do Nordeste, que, por não terem opção, acabavam construindo suas

moradias nesses locais, como podemos ver a seguir:

Em meados da década de 1940, a redemocratização do país, com o fim do regime autoritário do Estado Novo, faria com que as favelas se tornassem importantes redutos eleitorais, o que estimulou práticas clientelistas de políticos nestas comunidades. Na Rocinha, há que se destacar, nesse período, a atuação de um candidato a vereador, que se apresentava como proprietário de terras naquela área e incentivou a ocupação de terrenos na encosta, sobretudo, por migrantes vindos do nordeste do país (Leitão, 2004, p. 106).

É na década de 1950, quando se inicia a ampliação da ocupação da

região. Nas áreas inicialmente ocupadas, observavam-se muitos barracos de

madeira. Nas partes mais altas das encostas, surgem também novas moradias,

que de uma forma geral são muito precárias, com características análogas às

existentes na fase inicial de ocupação da favela. De acordo com Leitão (2004) “a

favela prosseguia, assim, na sua expansão morro acima, tendo a estrada da

Gávea e as ruas Um, Dois, Três e Quatro como vetores de crescimento” (Leitão,

2004, p. 106).

Segundo Filho (2005) a realidade de moradias feitas de barraco de

madeira, começa a mudar a partir da década de 1960. Até então, sobretudo do

seu surgimento até meados do século XX, “ser favelado na Rocinha era ser visto

como um morador de um barraco de tábuas, coberto com telha de papelão

pichado” (Filho, 2005, p. 3). Porém,

[...] já na década de 1960, os principais imóveis situados ao longo da Estrada da Gávea, eram em sua maioria casas, havendo alguns prédios de dois andares de alvenaria, bem conservados. Por volta da década de 1970, o resto da favela já exibia impudentemente suas entranhas de tijolos, regurgitando, às vezes, uma touceira de canos d’água salientes, numa feição sempre inacabada. (Filho, 2005, p. 3).

No tocante ao acesso à água encanada, inicialmente, a rede era ineficiente

e/ou inexistia em alguns locais em função do serviço ser muito caro, por esse

motivo, na década de 1930, coletava-se água das nascentes nas encostas do

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morro ou nos tanques onde havia bicas coletivas. Para conseguir água, as

pessoas tinham que enfrentar fila e era levada para as casas, conforme afirma

Filho (2005), em:

[...] latas de dezesseis litros, alimentando os latões de duzentos litros, antigos recipientes de querosene, tornados reservatórios d’água de cada barraco. Certos homens da “comunidade”, sendo fortes e estando desempregados, eram contratados, por trocados, para encher esses recipientes domésticos. Vários favelados, para facilitar o acesso ao precioso líquido, abriram poços ou construíram, dependendo do fácil acesso de suas moradas para veículos motorizados, cisternas próximas aos seus barracos, alimentadas por caminhões de pipa d’água (Filho, 2005, p. 4).

Na década de sessenta, objetivando melhorar o abastecimento de água,

um grupo de moradores conseguiu cerca de seis bicas novas e a abertura de um

poço no Largo do Boiadeiro, utilizado pelos residentes, “aberto sob os auspícios

do vereador Amando da Fonseca” (Filho, 2005, p. 4). Ainda sobre a questão da

água, encontramos relatos do morador José Martins de Oliveira, que afirma que

na década de 1970, ocorreu uma nova mobilização para trazer fornecimento de

água para a Rocinha:

[...] Isso foi na década de 1970, e eu estava fazendo a reforma do meu prédio, quando o pai da minha companheira apareceu com um abaixo-assinado pedindo água para a Rocinha. Eu assinei, mas pensei: “Esse velho está caducando. Nunca vamos ter água aqui”. Nessa época, apareceu na Rocinha o padre Cristiano, que também queria regularizar um terreno que ele havia comprado, que era da Aspa. Perguntei: “Padre, será que podemos fazer uma reunião na igreja?” E começamos a fazer encontros. Na primeira reunião, o Cristiano abriu, eu falei das coisas, meio perdido ainda. Criamos uma pequena taxa para juntar dinheiro para fazer melhoramentos na pequena sede que tínhamos no Bairro Barcelos, uma reforminha pequena. Um belo dia, vem meu sogro com o projeto da Cedae debaixo do braço, dizendo: “Está aprovado”. A Cedae aprovou o projeto dando toda a mão-de-obra, mas o material deveria ser pago pelos moradores, ao contrário do que é feito hoje. Aí surgiu a ideia de que o Batista, da grande comissão de luz da Rocinha, assumisse o projeto (Pandolfi, D. C.; Grynszpan, M. A favela fala. Rio de Janeiro, 2003. P. 37. Entrevista).

Nessa época a maior parte do esgotamento sanitário da favela, escoava

pelas valas negras a céu aberto, somente alguns barracos contavam com

fossas, ainda que muito precárias. O fato de não haver tratamento adequado do

esgotamento sanitário contribuiu para a contaminação do lençol freático,

inutilizando os poços até então construídos, isso também teve implicação direta

para as lavadeiras que:

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[...] nas décadas de 1940 e 1950, lavavam roupa nas águas ainda límpidas de um riacho corrente na favela, não podiam, na década de 1970, mais fazer: o córrego tornara-se um imenso valão porco e fétido condutor dos dejetos da favela (Filho, 2005, p. 4-5).

Somente no início da década de 1980, passados aproximadamente 50

anos é que os moradores conquistaram o acesso à água encanada. Inicialmente

o sistema de distribuição se deu pela via aérea, onde os canos que levam a

água até às residências são visíveis, e, atualmente ainda é possível observá-los:

[...] pendurados no beiral dos telhados, nas lajes ou cravados com buchas plásticas nas paredes. Essa escolha foi feita por serem as construções muito próximas, os terrenos acidentados, com pouco dinheiro para obras de infraestrutura, impedindo a danificação dos canos, ante o constante trânsito de pedestres e de cargas. Além disso, as redes aéreas apresentavam facilidades de reparos, assim como evitavam ligações clandestinas (Filho, 2005, p. 5).

No tocante a saúde, o encaminhamento ocorria de duas formas: o

atendimento para aqueles que contribuíam para a previdência social, buscavam

atendimento em uma clínica médica particular situada na Estrada da Gávea, nas

proximidades da Igreja Nossa Senhora da Boa Viagem, pertencente ao Dr. Mário

Dufles, que ainda é lembrado atualmente por moradores mais antigos. Já para

os que estavam fora do mercado de trabalho formal ou que não tinham

condições financeiras para pagar um tratamento médico, recorreriam à saúde

pública, no Hospital Miguel Couto. Conforme sinaliza Filho (2005):

Com raridade, formavam-se redes de solidariedade entre médicos e pacientes, minorando o grau de vulnerabilidade de alguns. Dona Alda [moradora], por exemplo, possuía uma relação especial com um pediatra do Miguel Couto, um tal de Doutor Ovídio, o qual considerava um bom clínico, entregando a ele o cuidado de todos os seus filhos e de seus dois netos mais velhos. Essa afinidade permitiu que, por volta de 1954, quando um de seus filhos, então com oito meses de idade, teve crupe, ela, ante a gravidade da situação, tomasse a liberdade de ir da Rocinha à residência do pediatra em Ipanema, bairro nobre carioca, às duas horas da madrugada, rogar-lhe atendimento (Filho, 2005, p. 5-6).

Nos seus primórdios à educação apresentava um quadro crítico do ponto

de vista do acesso e da permanência das crianças, pois a oferta de ensino

público à população em idade escolar era muito precária.

No censo de 1940, isso ficou muito evidente, pois foi revelado que a taxa

de analfabetismo do país era de 56,17% da população com mais de 15 anos de

idade. Já em 1960, no final do governo Juscelino Kubitschek, registrou-se uma

queda nos índices, pois passou para 39,35% de analfabetos entre essa mesma

faixa da população. E na Rocinha não foi diferente, pois o índice de pessoas

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não alfabetizadas era muito alto, sobretudo, por que a maioria de seus

moradores era advinda de áreas rurais, onde estudar não era prioridade.

A história do migrante Bernardino Francisco de Souza retrata essa

realidade:

[...] seu pai, um homem analfabeto, ante as possibilidades de sua parca e miserável vida rural no agreste nordestino, não via necessidade dele frequentar a escola, já que lá a ‘leitura não dava comida a homem’. Então, ‘a primeira caneta que [lhe] [...] deram’, em sua terra natal, ‘foi uma enxada’ (Filho, 2005, p. 6).

Hoje essa realidade, apesar de ainda não ser unânime, tem mudado

bastante, pois um maior número de pessoas tem um nível de escolaridade

melhor que em outrora, há muitas pessoas com nível superior e até mesmo com

pós-graduação.

No tocante ao acesso a luz elétrica apenas foi viabilizado em algumas

residências na década de 1970. Segundo relato de moradores, só havia energia

elétrica nas ruas, as moradias contavam com a iluminação de lamparinas

alimentadas por querosene, de vela ou lampiões, o que não se distanciava muito

da realidade vivida nas áreas rurais de onde vinha a maior parte dos moradores

da Rocinha. Conforme afirma Filho (2005):

A fuligem gerada pela combustão do querosene irritava os olhos e as narinas, assim como enodoava as paredes do barracão. Então, a Rocinha guardava ainda um pouco do ritmo de vida rural: a falta de eletricidade nos barracos estimulava que grande parte de seus moradores se recolhesse por volta das vinte horas da noite. Tendo grande parte de sua população analfabeta, a grande forma de saber as informações eram a comunicação das novidades através das conversas, já que a inexistência de luz residencial impedia também o acesso às obtidas através do grande meio de comunicação do momento, o rádio. A iluminação elétrica nas casas chegou primeiro à Estrada da Gávea e seus habitantes, portanto, muitos moradores, inicialmente, só conseguiram a energia elétrica através da cessão realizada por aqueles favelados residentes naquela estrada (Filho, 2005, p. 6).

Há relatos no Varal de Lembranças (1983), que apontam que a instalação

dos postes para levar a energia elétrica para todos os domicílios, só aconteceu

na década de 1980 e teve início “primeiro no Bairro Barcelos, depois na Vila

União, posteriormente na Cachopa e em seguida em toda comunidade” (Varal de

Lembranças, 1983, p. 145). De acordo com relatos encontrados nesse mesmo

documento, o fato de individualizar o fornecimento de energia, significou o fim da

exploração no que diz respeito às contas de luz, que eram muito altas, além de

simbolizar a efetivação de um direito até então desrespeitado. A seguir pode ser

observado um comprovante de pagamento de energia daquela época:

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Figura 13- Uma conta de luz do ano de 1981. Fonte: Varal de Lembranças (1983).

No que diz respeito à questão do reconhecimento oficial dos logradouros, a

grande maioria dos moradores, enfrenta dificuldade, pois, por não terem seus

imóveis reconhecidos formalmente a entrega de serviços e/ou correspondências

fica inviabilizada. E a alternativa encontrada é a utilização de endereços oficiais

de amigos ou parentes em áreas da favela aonde chegam os prestadores de

serviços ou da contratação dos serviços do “Correio Comunitário” existente, para

efetivarem esse direito.

A empresa que presta esse serviço é conhecida como Carteiro Amigo e

entrega as correspondências nas casas de moradores desde o ano 2000, para

passar a receber as correspondências em suas residências, os moradores têm

que se inscrever e pagar atualmente, uma taxa mensal de R$ 20 (vinte reais) por

família, passando a usar o endereço da empresa como seu próprio.

A loja onde funciona o “Correio Comunitário” tem que estar situada num

local onde a correspondência dos Correios seja oficializada. Como coloca Filho

(2005):

Viver na Rocinha era ser, para muitos, um indivíduo “sem endereço”. E não tê-lo significava não poder exercer atos simples da vida econômica, era portar sobre si uma identidade negativa que potencializava as dificuldades para superar a sua vulnerabilidade social. Porém, além disso, apresentar a Rocinha como endereço residencial significava quase uma imediata discriminação social, então, muitos negavam-no, assumindo, por vezes, endereços de parentes e amigos “do asfalto”, ou substituíam a palavra Rocinha por São Conrado, elegante bairro contíguo. Dessa forma, as condições de vida nessa favela, não só pelo espaço desordenado e abandonado, mas também pela insuficiência de recursos financeiros advindos do trabalho, precarizavam seus habitantes, tornando-os sujeitos vulneráveis. Ou

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seja, toda essa comunicação é uma demonstração que a reprodução da força de trabalho era mais custosa para essa população do que para outros segmentos da população carioca (Filho, 2005, p. 7).

Isso é sentido pelos moradores, por exemplo, quando precisam pegar um

táxi, sobretudo no período da noite, sendo muitas vezes discriminados por

residirem em área ditas de risco. Muitos taxistas e/ou outros prestadores de

serviços, se recusam a entrar na favela.

No tocante ao recenseamento da Rocinha, o primeiro foi realizado

somente em 1950, quando foi apontada:

[...] a existência de 4.513 habitantes numa área que, devido à dispersão das moradias e ao caráter rarefeito da ocupação, apresentava características distintas de outras favelas cariocas, onde se observava um maior adensamento de edificações. A paisagem da Rocinha remete, ainda, a um vilarejo rural, da “roça” (Leitão, 2004, p. 107).

Hoje a Rocinha é uma das maiores favelas do Brasil segundo dados do

IBGE - censo de 2010 - tem cerca de 70.000 mil moradores, o que é contestado

pelas lideranças locais e até mesmo diverge do número estipulado por empresas

que prestam serviço no local, como é o caso da Light, empresa de energia

elétrica, que afirma que nessa localidade há cerca de 150.000 mil moradores.

Já algumas lideranças locais estimam que morem cerca de 200.000 mil

moradores, portanto, não se tem contabilizado ao certo, o número de moradores

da favela, o que por vezes prejudica a análise dos reais problemas existentes e

essa divergência não consta dos dias atuais, pois na tese de mestrado de

Vasconcelos (1990), está posto que:

Quanto à quantidade de moradores que habitam essas terras, tem havido uma polêmica: os dados oficiais diferem-se. Visualiza-se que: a) através dos setores de especiais de aglomerado urbano (SEAU’s), n° 152, 217 e 245 sob o título “Da Rocinha”, de 1980, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (I.B.G.E.), o número é de 32.966 habitantes; b) através da Prefeitura do Rio de Janeiro, Secretaria Municipal de Planejamento, sob o título de “Aglomerações Humanas de Baixa Renda”, de Janeiro de 1980, o número é de 97.954 habitantes. Alguns moradores estimam que, atualmente, existam aproximadamente, 250.000 habitantes na Rocinha (Vasconcelos, 1990, p. 37-38).

Apesar das inúmeras deficiências a serem sanadas, hoje a Rocinha,

oferece uma gama de serviços para seus moradores, tanto na área comercial,

tais como: bancos (Caixa Econômica Federal, Banco Itaú, Banco do Brasil e

Bradesco), lojas de roupas, supermercados, feira permanente de alimentos, etc.,

quanto na área de serviços, como: unidades de saúde - públicas e privadas,

unidades de educação - públicas e privadas, transporte público, rádios

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comunitárias, três associações de moradores, jornais comunitários, instituições

religiosas, dentre outros.

No tocante as políticas públicas, sabemos que ainda há muito que ser

feito, pois a defasagem presente ao longo dos anos repercute nos dias atuais

em todos os setores da vida na favela. Atualmente segundo Pereira (2013):

O que se observa é que a cidade vive um momento em que diversas políticas públicas são direcionadas para as favelas, envolvendo uma grande quantidade de recursos dos governos municipal, estadual e federal. No momento em que a cidade se prepara para sediar os dois maiores megaeventos esportivos do planeta (a Copa do Mundo de 2014 e os Jogos Olímpicos 2016), quais são as possibilidades para a construção de um futuro e uma cidade mais justa para a maior parte da população e não para uma minoria? (Pereira, 2013, p. 01).

Sabemos que todas as ações voltadas para as áreas favelizadas vêm

carregadas de intencionalidades, muitas vezes obscuras, que passam

despercebidas aos olhos de muitos, nada é implementado pensando-se

unicamente no bem estar dos que residem nessas regiões. Pereira (2013) faz

um breve resumo sobre algumas das políticas públicas destinadas às favelas,

desde a primeira metade do século XX, onde isso de alguma forma fica evidente:

Desde a década de 1940, foram realizadas diversas intervenções nas favelas cariocas. Ora as políticas públicas pretendiam removê-las, ora visavam urbanizá-las (às vezes as duas coisas), dependendo do cenário político, da imagem da favela e dos interesses dominantes na sociedade brasileira. Como exemplos da via remocionista, podemos destacar: - a construção dos Parques Proletários (no início da década de 1940); - o Governo de Carlos Lacerda (na primeira metade dos anos 1960); e - as ações da Coordenação da Habitação de Interesse Social da Área Metropolitana do Grande Rio – CHISAM (no período militar). Já, com o intuito de urbanizar as favelas, podemos destacar os trabalhos realizados: - pela Fundação Leão XIII (1947 – 1954); - pelo Serviço Especial de Recuperação das Favelas e Habitações AntiHigiênicas – SERFHA (na segunda metade dos anos 1950 e início dos anos 1960); - pela Companhia de Desenvolvimento de Comunidades – CODESCO (1968); e - pelo Programa Favela-Bairro (1994 – 2010). [...] o Programa de Aceleração do Crescimento – PAC em complexos de favelas (desde 2008), as Unidades de Polícia Pacificadora – UPPs (desde 2008), a ameaça de remoção de favelas em pontos estratégicos em função dos megaeventos esportivos, a construção de muros para conter o crescimento de algumas favelas (2009) e de barreiras sonoras (2010) e o Programa Morar Carioca (2010) (Pereira, 2013, p. 3-4).

Portanto, podemos afirmar que o poder público nas favelas - e na Rocinha

não é diferente, atua de acordo com o cenário político do momento, visando

mascarar e/ou dar uma resposta à sociedade dominante. Um exemplo disso, foi

a implementação do PAC 1, pois após forte pressão dos moradores de São

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Conrado, que sofrendo de alguma forma os impactos da guerra iniciada na

Rocinha em 2004, interviram para que algum serviço público fosse

implementado na favela, visando amenizar a violência nessa localidade para que

eles parassem de sofrer as consequências. Conforme fala de um morador de

São Conrado:

[...] São Conrado e Rocinha estão ligados por laços de trabalho e confiança. Por exemplo, a maioria dos funcionários aqui do bairro são da Rocinha e têm a chave dos depósitos, casas e dependências de onde trabalham. E não temos registro de problemas com isso. Temos uma boa convivência. O problema é que São Conrado já é um bairro pronto e a Rocinha precisa ser arrumada. Mas foi em 2004 que todos nós formos surpreendidos por essa guerra. Eu continuava na presidência da Amasco e presenciei não só como morador, mas como dirigente da associação aquele desastre. Durante uma semana ninguém entrava nem saía daqui. Ficamos praticamente ilhados. O Fashion Mall, que é um grande shopping do Rio e que fica aqui em São Conrado, simplesmente parou. Ficou entregue às moscas. Uma das fachadas de um dos condomínios de alto luxo aqui de São Conrado recebeu um monte de bala no meio daquela guerra. E o governo nisso? Ah, o governo... Na época não procurou nenhum de nós, nem de São Conrado, nem da Barra – que fomos os bairros mais atingidos pela loucura que aconteceu. Nenhuma instância governamental se pronunciou sobre esse absurdo, nem para falar que sim, nem que não. Nada! Foi uma sensação de abano sem igual. Quem nos procurava toda hora era a imprensa, como se estivesse fazendo cobertura de uma zona em conflito, como se fosse uma guerra. Dei inúmeras entrevistas que saíram em diversos jornais e em meio a isso tudo e aproveitando a visibilidade que a imprensa estava nos dando naquele momento eu pensei: - Nós da Associação de Moradores de São Conrado temos que fazer algo, já que um serviço público básico, como a segurança, do qual temos direito não está acessível a nós, apesar de pagarmos o IPTU mais alto da cidade, de pagarmos taxas astronômicas e impostos exorbitantes para o governo... e nada. A única coisa que tínhamos de concreto era a violência que nos isolou do resto da cidade e o valor dos nossos imóveis caindo cada vez mais. Tínhamos de encontrar uma saída! (Sarayed-Din, 2009. p. 74-75. Entrevista).

Essa realidade tem que mudar, pois os moradores da favela são tão

cidadãos quanto os que moram nas áreas ditas formais, são habitantes da

cidade que merecem ter seus direitos respeitados e necessitam ter acesso digno

a todos os serviços públicos com qualidade, pois estes sim têm sua cidadania

negligenciada diariamente e nada é feito para mudar essa realidade, o que

assistimos são medidas paliativas que não resolvem os problemas da favela, só

os mascaram.

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3.3. As Rocinhas: conhecendo os sub-bairros

Cabe aqui inicialmente, registrarmos a nossa dificuldade em encontrar

referência bibliográfica para abordarmos a história dos sub-bairros da Rocinha.

Por este motivo, encontramos como saída para tal realidade, resgatarmos

através da fala de moradores mais antigos, informações que nos ajudassem a

retratar aqui, “as Rocinhas”. Isso implicou em não conseguirmos dados

padronizados de todas as regiões da favela, além de não termos tido acesso as

informações sobre todos os sub-bairros existentes, uma vez que os

entrevistados desconheciam a história de alguns locais, portanto, a seguir, serão

descritas as histórias do que nos foi possível resgatar.

Passa muitas vezes despercebido aos olhos, sobretudo, dos que

desconhecem a realidade de uma favela, a sua heterogeneidade, fator que não

é diferente na história da favela da Rocinha, além das particularidades em

relação a outras favelas, cada um de seus sub-bairros, tem sua própria história.

A favela da Rocinha é constituída por inúmeras localidades denominados

de sub-bairros, uma vez que foi oficializada como bairro desde o ano de 1993, e

no tocante a esta divisão, encontramos divergência entre os mapas utilizados

por diferentes instituições. Mediante a esse fato, optamos por utilizar o mapa

(adaptado) disponível no Plano de Desenvolvimento Sustentável da Rocinha

(produto do Trabalho Técnico Social desenvolvido durante o PAC 1), publicado

no ano de 2011 e nesse documento a Rocinha aparece com a seguinte divisão:

Vila Laboriaux, Vila Cruzado, Vila Vermelha, Setor 199, Rua 1, Faz de Pressa,

Terreirão, Capado, Macega, Morro da Roupa Suja (Morro da Alegria), Rua 2,

Rua 3, Rua 4, Cidade Nova, Campo Esperança (Valão), Largo do Boiadeiro,

Bairro Barcelos, Curva do “S”, Vila Verde, Cachopinha, Pastor Almir, Cachopa,

Dioneia, Vila União (Paula Brito) e Portão Vermelho. A partir desses dados,

temos que a Rocinha é formada por um total de 25 sub-bairros, no entanto,

buscamos ouvir alguns moradores que identificam outros sub-bairros, mas que

não são reconhecidos oficialmente, embora as pessoas que residem no local os

reconheçam e tenham histórias e vivências do lugar, como é o caso do

Trampolim, do Sete e do Atalho.

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Figura 14- Mapa da Rocinha - adaptado. Fonte: Rocinha / Plano de Desenvolvimento Sustentável, 2011.

Com este sentido, durante nossa pesquisa de campo, identificamos que

alguns desses sub-bairros aparecem em determinados mapas com uma

identificação, porém são reconhecidos pelos moradores com outro nome, como

é o caso da região denominada Vila União, que é reconhecida pela grande

maioria, como Paula Brito.

Conforme apontado acima, reiteramos mais uma vez a escassez de

material acadêmico ou trabalhos técnicos que pudesse georeferenciar todas as

áreas habitadas da favela da Rocinha. Mediante a isso, buscamos fazer um

resgate local junto a moradores mais antigos e lançar mão do nosso próprio

conhecimento sobre a região, tendo em vista ser moradora. Portanto, as

informações que aqui apresentaremos sobre alguns dos sub-bairros, no sentido

de nos aproximarmos o máximo possível da realidade, foram baseadas no relato

de pessoas que residem no lugar há muitos anos e do nosso conhecimento, com

exceção de alguns casos, que encontramos em trabalhos existentes.

Neste sentido, faremos um breve relato, com as informações que nos foi

possível coletar, a respeito dos sub-bairros, que juntos formam a favela da

Rocinha.

Vila Laboriaux: a ocupação dessa área teve início nos anos de 1970, no

entanto o que acarretou sua expansão foi à construção de 76 residências pela

Prefeitura, no ano de 1981, para realocar as famílias que moravam na região da

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Rocinha conhecida como Canal. Registra- se ainda que no início da formação

da Rocinha, por volta de 1930, essas terras pertenciam a uma companhia

francesa. Segundo relatos, naquela época alguns guardas sanitários10 se

instalaram na região para controlar uma infestação de mosquitos que estavam

causando febre amarela na Barra da Tijuca. Chegar a essa região era muito

difícil, devido ao fato da subida ser muito íngreme e de outros fatores que

dificultavam o acesso. Por isso, começaram a chamar de Laboriaux, que

significa labor. O labor de ter que subir, para chegar a essa localidade. Essa é a

região mais alta da favela, situa-se em terreno muito acidentado e encontra-se

em uma área vizinha ao Parque da Floresta da Tijuca, sendo separadas

somente pelo eco-limite. Conta com alguns poucos comércios, com unidades de

ensino públicas e privadas, com uma associação de moradores, igrejas

evangélicas e uma capela da igreja católica (capela Nossa Senhora de Fátima),

dentre outros.

Vila Cruzado: tem esse nome porque surgiu na época da moeda chamada

cruzado. Também ficou conhecida inicialmente, como Vila Miséria. Há duas

versões para esse nome, o primeiro é que ficou assim sendo chamado devido à

composição e estrutura dos imóveis que na maioria eram barracos de tábuas,

sem nenhuma estrutura. Já a outra versão diz que recebeu esse nome por causa

de uma novela que passava na época e que era assim intitulada. A

nomenclatura que acabou prevalecendo foi Vila Cruzado - pois os moradores

achavam o nome Vila Miséria muito pejorativo, como aparece nos mapas

atualmente. Conta com pequenos comércios, igreja evangélica, entre outros.

Vila Vermelha: há duas versões para a origem do nome desse sub-bairro.

Uma diz que é assim designado por ser uma área onde os caminhos percorridos

pelos moradores eram de terra vermelha batida. Já a outra versão coloca é que

assim chamado porque as pessoas soltavam pipas e balões nesse local, e que

estes eram feitos com papel vermelho, por isso teria ficado sendo chamado de

Vila Vermelha. Essa área faz divisa com o Setor 199.

Setor 199: é assim chamado porque havia na Estrada da Gávea, um

imóvel de n° 199, que funcionava de certa forma como um ponto de referência e

acabou dando nome a essa área. Inicialmente havia grandes mansões de

famílias nobres, como “a casa branca”, que mesmo depois de demolida, dá

nome ao “Beco da Casa Branca”. É uma área íngreme. O comércio nessa área

se concentra na Estrada da Gávea, apesar de existirem pequenas biroscas

10 Profissionais da área de saúde, com formação técnica, que atuavam em campanhas como no caso do combate a febre amarela.

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(como são conhecidos os pequenos comércios) na parte mais distante da rua

central. Identificamos: igreja evangélica, Creche Comunitária, etc.

Terreirão: era uma área livre muito grande, que chamavam de terreiro,

fazendo analogia aos terreiros existentes nas frentes ou quintais das casas do

interior do Nordeste, de onde veio à maioria dos habitantes da Rocinha. Como

era considerado pelos que ali moravam, como um terreiro grande, ficou sendo

chamado de Terreirão. Hoje não há mais tanto espaço livre nessa localidade,

resta somente um local que as pessoas conhecem como quadra do terreirão,

onde acaba em alguns momentos, sendo realizados eventos de pequeno porte

pelos sujeitos locais. Nessa área fica uma capela da igreja católica (Capela São

José Operário).

Morro do Capado: segundo uma moradora antiga da Rocinha, há relatos

de que lá morava um senhor que fez vasectomia e as pessoas passaram a

chamá-lo de capado. Quando alguém perguntava, os que ali residiam onde

moravam, diziam que era ali onde mora o capado, por isso o local ficou

conhecido como Morro do Capado. Porém há também outra versão, a de que

nessa área, moravam pessoas que castravam animais, vindo moradores de

outras localidades trazendo-os para castrá-los, aí ficaram chamando a localidade

de Morro do Capado.

Faz Depressa: é assim chamado porque as pessoas que ocuparam a área

construíam as residências às pressas, conforme podemos observar na fala do

morador Ismael Elias da Silva:

Por exemplo, o largo da Rua 1, Faz Depressa, que tem esse nome porque naquele tempo, o morador que fazia barraco era muito perseguido pela ação da polícia. Naquele faz não faz, pode não pode, de uma hora para outra surgia um barraco, e daí o nome Faz Depressa. Depois chegava a polícia e pronto. Já estava morando no barraco (Leitão, 2004, p. 110).

Esses três últimos sub-bairros estão situados muitos próximos um do

outro, chegando muitas vezes a se misturarem. Os moradores chegam inclusive,

a não saber identificar ao certo em qual das três áreas residem, fazendo certa

confusão.

Portão Vermelho: havia no local um portão vermelho de uma propriedade

particular, a de n° 306, que posteriormente deu nome a esse sub-bairro.

Pertencia a um argentino que viajou para seu país e demorou a voltar, não

pagando seus funcionários, quando um senhor conhecido como Tantão invadiu

o terreno e construiu uma casa e uma oficina de laje pré-fabricada. Foi aí que

teve início a invasão dessa área. Há relatos que apontam que após a invasão

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ainda houve ação policial para tentar reverter à situação, porém não foi possível.

Segundo depoimentos, o proprietário devia muitos impostos, o que o levou a

perder o bem. Próximo a essa localidade, existe o Parque Ecológico da Rocinha.

É nessa área onde hoje está situada a sede da Unidade de Polícia Pacificadora

da Rocinha (UPP).

Atalho: tem essa nomenclatura porque existe um caminho que serve como

atalho, encurtando o trajeto entre a parte alta e a parte baixa da favela. Ao invés

de descer toda a Estrada da Gávea, passando pelo Atalho, entrada da Rua 2,

Sete, até chegar na entrada da Rua 4, ganha-se tempo fazendo esse percurso

alternativo, portanto, chega-se muito mais rápido, entrando em um beco no

Atalho, chegando logo em seguida na Estrada da Gávea – na altura da entrada a

Rua 4 – por isso o nome Atalho.

Sete: tem esse nome porque está localizado próximo ao n° 247 da Estrada

da Gávea, ficando conhecido somente pelo último número, o Sete. É uma área

bem situada geograficamente, pois está nas margens da Estrada da Gávea.

Vila União: tem esse nome porque dizem que as pessoas que ocuparam a

área assim a chamaram por consideraram que houve a união de todos para que

a localidade fosse ocupada rapidamente. Conforme citado anteriormente,

também é conhecida como Paula Brito, devido a Escola Municipal Francisco de

Paula Brito, que ali existe. Segundo relatos, os moradores mais antigos

conhecem o sub-bairro como Vila União, já os mais novos, como Paula Brito.

Ainda foi chamada em algum momento, como Barro Vermelho, porque o solo

desse local tinha uma pigmentação avermelhada, aonde as crianças brincavam,

atrás de onde hoje é a Unidade de Ensino.

Rua 1, Rua 2, Rua 3, Rua 4 e Rua 5 (atual Dioneia): são assim

denominados porque houve um loteamento pela empresa Castro Guidon,

segundo José Martins de Oliveira (antigo morador da Rocinha), ainda na década

de 1920. Identificamos:

Na Rua 1: creches comunitárias, igrejas evangélicas, uma unidade

pública de saúde, etc. Apesar de ser chamada de rua, não conta com

ruas, é na verdade uma grande área, cortada por becos, que se

expande para além da Estrada da Gávea, onde começa.

Na Rua 2: centros comunitários, creche comunitária, igrejas

evangélicas, dentre outras. Esse sub-bairro tem início na Estrada da

Gávea e se estende, encontrando com outras áreas da favela, como

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Valão e Roupa Suja. Conta com uma rua central, onde transitam

motos e carros, que dá acesso aos becos e vielas.

Na Rua 3: é uma área relativamente pequena se comparada às

demais. Essa região tem um beco central que liga a Estrada da Gávea

à Rua 2. A passagem central leva aos outros becos menores.

Na Rua 4: vasta oferta de comércios variados - ainda que de pequeno

porte, uma grande concentração de salões de beleza, entre outros. É

válido salientar que essa localidade tinha um beco principal que ligava

a Estrada da Gávea ao Caminho do Boiadeiro. Essa realidade mudou

durante as obras do PAC 1, quando cerca de 200 famílias foram

reassentadas para que a via fosse alargada, onde hoje existe uma rua,

por onde circulam veículos em geral.

Cachopa e Cachopinha: ficaram assim reconhecidas por haver no local

uma planta cujo fruto é tipo cápsula ou cachopa, muito conhecida no Nordeste

como urucum, a partir da qual se produz o colorau, corante natural/especiaria

comumente utilizado na culinária nordestina. Nesses locais há uma quadra de

esportes utilizada para lazer, igrejas evangélicas, entre outros. No ato do seu

surgimento, segundo os entrevistados, a região era um só sub-bairro, porém

achando que as terras eram extensas, os líderes locais decidiram por dividi-las

em Cachopa e Cachopinha.

Pastor Almir: era terreno de um gringo que foi embora do Brasil e deixou

seu filho para tomar conta da propriedade, porém este começou a contrair

dívidas com coisas indevidas, quando um senhor de nome Ismael passou a

pagar as contas desse rapaz, ficando posteriormente com o terreno, como forma

de pagamento das dívidas dessa família. Posteriormente o senhor Ismael

vendeu as terras para o pastor Almir, que fundou uma Igreja Batista no local.

Segundo relatos dos entrevistados, o gringo devia 12 anos de impostos ao

governo, o que o levou a perder o terreno e, como legalmente não tinha sido

passado para o nome do senhor Ismael ou do pastor Almir, tornou-se

propriedade pública. Ao descobrir isso, uma advogada de nome Eleonora

juntamente com uma líder comunitária chamada Marina, formou uma associação

de moradores que era sediada na Cachopa e começaram a distribuir a parte do

terreno que havia sobrado, pois outros lotes já haviam sido vendidos pelo pastor

Almir, antes disso acontecer. Daí vem o nome Pastor Almir, porque em algum

momento, esse terreno o pertenceu.

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Curva do S: é assim conhecida porque a parte da Estrada da Gávea que

fica na altura dessa região tem o formato de um “S”, por isso, Curva do S.

Observa-se no local clínicas médicas particulares, salões de beleza, lojas de

roupas, uma unidade pública de saúde, escala pública, etc.

Vila Verde: originalmente era uma mata, onde tudo era muito verde, por

isso ficou sendo chamado de Vila Verde. Nessa área foram identificadas: igrejas

evangélicas, um Centro Social Vila Verde Waldemar do Gás - de propriedade de

um comerciante local, um campo de futebol utilizado por determinados grupos

para o lazer, uma rádio comunitária (Rádio Brisa FM), entre outros. Na localidade

ainda há uma bica de água vinda do alto da mata, que fica atrás do CIEP Doutor

Bento Rubião, utilizada por alguns moradores tanto para lavar roupa e tomar

banho no local, quanto para levar água para casa, quando ficam sem o

fornecimento de água da CEDAE. Essa localidade conta com uma rua central –

Rua da Fonte, porém popularmente chamada de rampa da Vila Verde, onde

transitam motos e carros.

Trampolim: no local havia um motel com esse nome que com o tempo foi

desativado e os proprietários venderam alguns quartos/apartamentos para fins

de residência, além de venderem terrenos no entorno, para construção de

moradias e o restante foi ocupado por outras pessoas.

Largo do Boiadeiro: tem esse nome porque morou ali um senhor conhecido

como Zé do Boiadeiro, que hoje dá nome a rua que é conhecida por muitos

como Caminho do Boiadeiro, agora oficialmente registrada como José Belmiro

de Sousa. Há quem diga que teve gado no Largo do Boiadeiro, mas a história

que mais se escuta é que esse nome vem do senhor Zé do Boiadeiro, que vivia

nessa localidade. Na área há uma grande concentração de bares, barracas onde

é possível encontrar desde produtos nordestinos a verduras, mercados,

açougues, entre outros.

Bairro Barcelos: é assim chamado em homenagem à família Barcelos que

vendeu essas terras na década de 1960 para algumas pessoas construírem

nessa região. Gonçalves (2013) elucida que esse loteamento foi criado em 1964

pela empresa Christo Redentor11 - na parte plana da Rocinha, que apesar de

atualmente ser a área mais valorizada, por ser plana e ter mais infraestrutura

que os demais sub-bairros, e com isto os valores das casas, lajes e

11 De acordo com o Processo nº 0134908-79.2006.8.19.0001 (2006.001.140731-1), do Tribunal de justiça do Rio de Janeiro, a Companhia de Terreno Christo Redentor adquiriu em 1930, de Hermano Barcellos, a área da Estrada da Gávea, iniciando a ocupação em 1964, quando a dividiu em porções de 80 lotes, não tendo sido feito parcelamento do solo. Disponível em: http://www4.tjrj.jus.br/consultaProcessoWebV2/consultaMov.do?v=2&numProcesso=2006.001.140731-1&acessoIP=intranet&tipoUsuario= (acessado em 24 de abril de 2015 as 11h15).

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apartamentos serem mais elevados, custando entre quarenta mil (um quarto com

banheiro) e 200 mil (dois quartos, sala, cozinha e banheiro - e em alguns casos

com laje), não é regularizado devido a “conflitos fundiários entre os herdeiros da

empresa mencionada acima, e também pelo fato dos lotes terem sido projetados

com dimensões inferiores às exigências legais” da época (Parisse apud

Gonçalves, 2013, p. 352). Há relatos de que as pessoas que residem nessa área

da favela, a denominam como sendo a “zona sul da Rocinha”, ou seja, uma

analogia a valorização dessa área em relação às demais. No livro “A favela fala”

(2003), encontramos o seguinte relato do morador José Martins de Oliveira,

sobre essa questão:

Quando vendeu aqueles terrenos, a Companhia de Terrenos Cristo Redentor passou essa ideia para os moradores: vocês são diferentes, são melhores que o restante da Rocinha. O segundo ponto é que, bem ou mal, existia esgoto no Bairro Barcelos – a construção das casas e da rede de esgoto foram feitas pelos moradores. As casas do Bairro Barcelos eram todas em alinhamento, o arruamento era bom. O pessoal de cima tinha raiva do pessoal de baixo, que queria ser diferente (Pandolfi, D. C.; Grynszpan, M., 2003, p.41. Entrevista).

Campo Esperança: era um campo de futebol cujo nome era Campo

Esperança ou Clube Esperança. Houve uma forte chuva na Rocinha deixando

muitas pessoas sem ter onde morar, quando, o então presidente da Associação

de Moradores da época, o senhor Ismael, dividiu a área para que as famílias

desabrigadas construíssem suas residências, daí o nome Campo Esperança, por

ter tido início onde antes existia um campo de futebol com o mesmo nome.

Nessa área há uma grande vala que perpassa todo o sub-bairro, conhecida

como Valão. Até um determinado ponto, há rua por onde passam motos e

carros, depois do estreitamento, só é possível circular através dos becos e

vielas.

Roupa suja: fica nas proximidades do Túnel Zuzu Angel. Tem esse nome

por que quando surgiu era uma área muito pobre, habitada por pessoas de

baixíssimo poder aquisitivo e era considerado um lugar sujo, daí o nome Roupa

Suja. Ainda hoje é uma das áreas mais pobres da Rocinha. Apesar de estar

situada na parte considerada baixa da favela, é uma área muito íngreme e só é

possível chegar nesse local por meio de escadarias. Há a previsão da

implantação de um Plano Inclinado, obra iniciada durante as intervenções físicas

do PAC 1, porém ainda não finalizada até o dado momento. Identificamos nesse

local: o grupo comunitário Creche Berçário Maria Helena da Rocinha e a ONG

União Pró-Melhoramento das Mulheres da Roupa Suja.

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Todos os sub-bairros da Rocinha são residenciais, alguns com maior ou

menor presença de comércios (mine mercados, lojas de roupa, lojas de material

de construção, etc.), porém com existência predominantemente de imóveis para

fins de moradia. As áreas onde podemos ver uma maior presença de comércios

ficam situadas ao longo da Estrada da Gávea e principalmente na localidade

conhecida como Bairro Barcelos.

As residências são na maioria, sobrepostas umas às outras, há um grande

aglomerado de pessoas, ou seja, é uma área de considerável adensamento

populacional e atualmente os imóveis são predominantemente de alvenaria,

pouco se observa barracos de madeira, até mesmo em sub-bairros onde antes

era comum a presença de barracos desse padrão construtivo.

Buscamos aqui, na medida do possível, mesmo com todas as limitações

encontradas, fazer uma breve exposição de alguns dos sub-bairros da Rocinha,

dos quais conseguimos resgatar dados que nos possibilitou compreender melhor

esse território que se faz único.

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4 A favela da Rocinha e as diversas implicações entre a geração e a destinação inadequada de lixo

4.1. A produção de lixo na Rocinha: os impactos que afetam a favela

Nossa análise tem como ponto de partida, o levantamento de dados sobre

a destinação do lixo produzido na cidade do Rio de Janeiro, em função de ser o

território em que a favela da Rocinha se situa, visto que a ideia é de que

tenhamos uma visão da macro geração e destinação, para então partimos para o

entendimento no contexto micro, pois acreditamos que nos permitirá, ainda que

brevemente, ter um panorama sobre a questão.

Nos aglomerados subnormais12, no Município do Rio de Janeiro, temos os

seguintes números em relação ao destino do lixo, segundo dados do IBGE

(2010):

Tabela 3- Destino do lixo nos domicílios particulares permanentes em aglomerados subnormais

Domicílios particulares permanentes em aglomerados subnormais

Destino do lixo - total 426.479 unidades

Destino do lixo - coletado 415.403 unidades

Destino do lixo – coletado diariamente por serviço de limpeza 251.851 unidades

Destino do lixo – coletado em caçamba de serviço de limpeza 163.552 unidades

Destino do lixo - queimado 1.236 unidades

Destino do lixo - enterrado 23 unidades

Destino do lixo – jogado em terreno baldio ou logradouro 9.029 unidades

Destino do lixo – jogado em rio, lago ou mar 418 unidades

Destino do lixo – outro destino 370 unidades

Fonte: Censo do IBGE, 2010.

12 Um conjunto constituído de, no mínimo, 51 unidades habitacionais (barracos, casas...) carentes, em sua maioria de serviços públicos essenciais, ocupando ou tendo ocupado, até período recente, terreno de propriedade alheia (pública ou particular) e estando dispostas, em geral, de forma desordenada e densa Disponível em: <http://www.ibge.gov.br/home/presidencia/noticias /imprensa/ppts/00000006923512112011355415675088.pdf>. Acessado em 22 de mar. 2015.

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É muito significativo o número de domicílios particulares permanentes13,

nas regiões favelizadas do Município do Rio de Janeiro, que dão destino

inadequado ao lixo produzido, embora a COMLURB promova em quase todos os

bairros, dentro da sua dimensão territorial da cidade, a coleta regular do lixo, isso

levando em consideração que, do total de 426.479 unidades, somente 415.403

unidades têm seu lixo coletado por serviços de limpeza urbana. De acordo com

os dados do IBGE (2010), 11.076 domicílios particulares permanentes em

aglomerados subnormais dão outros destinos - classificados como irregulares,

ao lixo produzido, como jogar em terreno baldio, rio, lago, dentre outros.

Após essa breve apresentação de dados sobre a destinação do lixo nos

aglomerados subnormais no Município do Rio de Janeiro, trazemos algumas

informações sobre essa questão, especificamente referente à favela da Rocinha

- foco do nosso estudo.

Neste sentido, encontramos através das informações produzidas pela

Prefeitura do Rio de Janeiro, no ano de 2010, em relação à coleta de lixo nos

domicílios, os seguintes dados:

Tabela 4 - Total de domicílios com coleta de lixo no ano de 2010.

Total de domicílios com coleta de lixo no ano de 2010

Total 23.399 domicílio

Total coletado – coleta porta em porta ou depositado em caçambas 22.986 domicílio

Coletado por serviço de limpeza 4.295 domicílio

Coletado por caçamba de serviço de limpeza 18.691 domicílio

Outro destino 413 domicílio

Fonte: Prefeitura do Rio de Janeiro, 2010.

De acordo com os dados apresentados, verifica-se que na Rocinha, no ano

de 2010, contabilizava-se cerca de 24.543 domicílios, dos quais somente 23.399

informaram como se dá a destinação do lixo gerado nessas residências

(coletado por serviço de limpeza: 4.295 + coletado por caçamba de serviço de

limpeza: 18.691 + outro destino: 413 = 23.399 domicílios); portanto, partindo

desses dados, tem-se que 1.144 domicílios não informaram qual destino é dado

ao lixo produzido por seus habitantes. Observa-se ainda que somente 22.986

domicílios tenham seu lixo coletado por serviço de limpeza urbana – seja por

13 É o domicílio que foi construído a fim de servir exclusivamente para habitação e, na data de referência, tinha a finalidade de servir de moradia a uma ou mais pessoas. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/censo2010/resultados_preliminares/tabelas_adicionais.pdf>. Acessado em 03 de abr. de 2015.

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meio da coleta porta a porta ou através do depósito de lixo em caçambas.

Salientamos que estes são os números oficiais disponíveis mais recentes,

resultado do último censo de 2010.

A produção de lixo na Rocinha ainda é algo pouco estudada, visto que

durante nosso levantamento bibliográfico, sobre essa temática nesse território,

nos deparamos com a escassez de registros oficiais de dados quantitativos, o

que nos levou a buscar junto à Companhia de Limpeza Urbana da cidade do Rio

de Janeiro - COMLURB, responsável pela coleta de resíduos em todo o

município, subsídios que pudessem contribuir para agregar ao estudo, dados

referentes ao manejo de resíduos sólidos na favela, enriquecendo o rol de

informações para nossa análise.

Nesse sentido, conseguimos através de contato com o representante da

COMLURB na favela da Rocinha, que nos enviou mensagem via correio

eletrônico, informando a respeito da produção de lixo, que: “são coletadas

diariamente aproximadamente 110 toneladas de resíduos sólidos”. (MORAIS, F.

Publicação eletrônica [mensagem pessoal]. Mensagem recebida por

<[email protected]> em 29 out. 2014).

Outra referência que tivemos para analisar a geração de lixo na favela da

Rocinha, foi a partir dos dados fornecidos pela concessionária que presta serviço

de energia elétrica que inclusive difere dos dados do Censo 2010, pois a

população estimada por eles é de cerca de 150 mil pessoas, portanto,

apresentando uma produção média de lixo de 1.363 Kg/hab/dia. Porém se

considerarmos o lixo que é gerado e descartado inadequadamente, nas valas,

encostas, terrenos baldios, etc., que segundo Azevedo (2010) é de

aproximadamente 08 toneladas diárias, teríamos uma população média entre

150 e 160 mil habitantes, tendo como parâmetro, a produção de lixo estipulada

pela COMLURB, a partir da coleta diária realizada na cidade do Rio de Janeiro,

que indica que a geração per capita dia, gira em torno de 1.326 Kg/hab/dia, o

que confirma com registros segundo Bastos (2014).

Fazendo uma análise a partir desses dados, chegamos ao entendimento

de que para alcançarmos um resultado da quantidade aproximada da geração

de lixo na favela da Rocinha per capita teríamos que efetuar o seguinte cálculo:

Quando desconsiderado o descarte inadequado de 08 toneladas

diárias, temos: 150.000 mil habitantes dividido por 110 toneladas de

lixo coletadas diariamente é igual 1.363 Kg/hab/dia.

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Quando considerado o descarte inadequado de 08 toneladas diárias,

temos: 160.000 mil habitantes dividido por 118 toneladas de lixo

produzidas diariamente é igual 1.355 Kg/hab/dia.

Esses dados nos mostram que o consumo na favela não difere das demais

partes da cidade, uma vez que a geração per capita dia, a partir dessa análise,

chega a ser inclusive maior que o padrão do restante do município. O fato é que

temos um grande incentivo para o consumo nos dias de hoje, porém nada é

pensado para resolver as consequências geradas pela produção do lixo.

Para tanto, encontramos em Azevedo (2010), alguns dados, que apesar de

não serem recentes, nos ajudaram na análise, pois utilizou como referência a

divisão da favela por Áreas de Intervenção (AI) – criada pela gestão pública para

a construção do Plano Diretor, conforme mapa abaixo - que apresenta um

resumo estimado da quantidade de lixo produzida nas oito AI da favela:

Figura 15- Mapa da Rocinha, por AI. Fonte: Rocinha / Plano de Desenvolvimento Sustentável, 2011.

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Tabela 5- Distribuição do lixo na Rocinha por AI

RESUMO GERAL

Áreas de

Intervenção

Número de

Habitantes

Peso Gerado Volume Gerado (m³)

A1 24620 20927 41,85

A2 21324 16949 29,33

A3 13684 11631 23,26

A4 7900 6715 13,43

A5 17704 15048 30,10

A6 6104 5188 10,38

A7 20124 17105 34,21

A8 4592 3903 7,81

ROCINHA 116052 97467,8 190,366

Fonte: AZEVEDO, 2010.

A partir dos números estimados por Azevedo (2010), verificamos que as

três áreas onde há uma maior produção de lixo, ficam na parte baixa da favela,

que são: A1, A2 e A7, onde existe uma maior densidade populacional e um

número acentuado de estabelecimentos comerciais, sobretudo na A1 que onde

existe um número considerável de restaurantes, mercados, bares, lanchonetes,

lojas de material de beleza, lojas de roupa, bancos, entre outros.

No tocante ao comércio local, que apesar de estar mais concentrado na

parte baixa da favela, se estende também por toda a extensão da Rocinha, é

somente após a implantação da Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) na

Rocinha, que os estabelecimentos comerciais considerados de maior porte, um

dos grandes responsáveis pela produção de lixo na favela, foram notificados

tendo que passar a se adequar a Lei 3.273/01, que dispõe sobre a gestão do

sistema de limpeza urbana no município do Rio de Janeiro. De acordo com

Martarello (2013):

A primeira referência à figura do pequeno e grande gerador de resíduos ocorreu por meio do Decreto Municipal nº 9.287/1990, que aprova os Regulamentos de Limpeza Urbana e de Controle de Vetores do Município do Rio de Janeiro. Porém era exclusivamente direcionado aos geradores de entulho e galhada ou folhagem, considerando grande gerador imóveis residenciais que produzissem quantidade superior a 100 sacos de entulho de capacidade volumétrica de 20 litros e 2m³ de galhada ou folhagem. A lei nº 3.273/2001 ampliou o escopo quando incluiu os resíduos tipificados como domiciliar produzido em estabelecimentos comerciais,

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de serviços, unidades industriais, instituições públicas ou privadas e unidades de saúde, e passou a chamar de lixo extraordinário. Para esses resíduos delimitou a figura dos pequenos e grandes geradores e estabeleceu responsabilidades

(Martarello, 2013, p. 18).

Conforme descrito na tabela abaixo, a Lei 3.273/01 considera pequenos e

grandes geradores, aqueles que produzirem:

Tabela 6 - Classificação, limitações, responsabilidade da coleta, destinação e disposição final do lixo pelos pequenos e grandes geradores.

Classificação Limitações Responsabilidade da

coleta, destinação e

disposição final

Pequeno gerador Geração de resíduos que possam ser

assimilados aos resíduos domiciliares.

COMLURB

Geração até 120 litros ou 60 kg diários.

Grande gerador Geração de resíduos que não possam ser

assimilados aos resíduos domiciliares.

Do gerador

Geração superior a 120 litros ou 60 kg diários.

Fonte: MARTARELLO, 2013.

A título de melhor compreender a dinâmica do processo de destinação dos

resíduos gerados pelos estabelecimentos, entrevistamos um representante de

um dos principais restaurantes da Rocinha considerado grande gerador, onde

nos foi relatada a dinâmica da produção e disposição do lixo, para atender o que

preceitua a Lei 3.273/01:

Exatamente... foi porque a partir que teve essa mudança da pacificação da Rocinha né, aí começou a fiscalização chegar junto, aí a COMLURB passou e notificou a gente, que tinha que contratar uma empresa para recolher o lixo, porque a gente só podia colocar na lixeira 150 Kg, o restante teria que ser recolhido por uma empresa da... Aí contratamos essa Clean Ambiental, que recolhe direto para a gente, diariamente. Recolhe uma média de 03 sacos, o restante a gente coloca na lixeira mesmo. A fiscalização da COMLURB veio notificar a gente pessoalmente, aí deram um tempo para a gente contratar a empresa, mas a gente não contratou no prazo, aí eles chegaram e multaram toda a gente... O Amarelinho, aqui... Todos tiveram multa. Aí contratamos a empresa para recolher... Aí pronto, ficou tudo ok, não tivemos mais problema nenhum. Essa Clean Ambiental, aqui quem recolhe para o comércio é só ela mesmo e o carro da COMLURB. Os outros comércios maiores também tiveram que contratar essa empresa. Eles começam lá da Rua 1 pra cá, recolhendo geral. Agente começou a fazer isso, mais ou menos no mês de junho do ano passado [2015]. Aqui, em média retiramos 08 sacos de lixo por dia. O recolhimento é feito pela manhã e a tarde. Pagamos a empresa Clean mensalmente. O contrato foi feito com uma média de R$ 370,00 (trezentos e setenta reais), mas a gente sempre paga mais, porque ultrapassa a média de 03 sacos por dia, aí sempre aumenta de R$ 400,00

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(quatrocentos reais) pra cima, por causa do excedente. O lixo aqui é mais casca de legumes, sobra de comida... A tarde tudo que sobra vai para o lixo. O pessoal até recolhe... O pessoal das comunidades carentes aqui da macega recolhe, que tão boa para comer, mas não serve para o outro dia. Alguém vem pegar, mas sempre sobra, as saladas, por exemplo, vão todas para o lixo. Aqui o pessoal que cata latinha sempre passa a tarde e recolhe, mas a gente não separa para eles... Eles catam na lixeira, por conta própria. Depois que a COMLURB notificou a gente, melhorou, não prejudicou não, porque a gente ficou mais atento de não deixar o lixo na rua. Antes sempre ficava um monte de lixo para o outro dia, na rua, agora não, já tira tudo, descarrega os containers e fica tudo vazio... Ficou tudo organizado... Ficou melhor (A. Entrevista concedida a Maria Izabel de Carvalho. Rio de Janeiro, 13 abr. 2016).

No entanto, apesar da lei está em vigor desde 2001, na Rocinha, de

acordo com a fala do entrevistado, somente passou a vigorar quatorze anos

depois, obrigando os grandes geradores de lixo da favela a assumirem a

responsabilidade em destinar corretamente o lixo produzido, assim passaram a

contratar empresa especializada na área de resíduos e coletas para realizar a

retirada do lixo.

Contudo, observa-se que não existe fiscalização efetiva para acompanhar

o cumprimento da Lei 3.273/01, portanto, chegamos a ouvir em nossas

entrevistas com determinados representantes que colocam na lixeira, o volume

de lixo que querem, pois não há esse controle por parte da COMLURB.

Pelo que podemos depreender através da observação de campo, é que

embora a lei esteja vigorando, alguns comércios, sobretudo, os de pequeno

porte, ainda depositam grande parte do lixo, nos pontos de coleta designados

pela companhia sem nenhum cuidado, pois, sem fiscalização para coibir esta

prática, cada estabelecimento cumpre do modo que quer e tal fato se justifica

pela implicação do custo desembolsado para destinar de maneira correta,

portanto, contribuindo para o aumento da exposição de lixo sem o mínimo trato,

conforme na foto abaixo:

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Figura 16- Lixeira da Vila Verde – lixo do comércio posto na lixeira sem o devido cuidado. Fonte: Maria Izabel de Carvalho, abr. 2016.

Na foto que segue também fica em evidência que boa parte do lixo que

chega às lixeiras, é gerada pelos comércios locais, o que ratifica o não

cumprimento da lei, sobretudo pela falta de fiscalização.

Figura 17- Via Ápia – lixo do comércio local. Fonte: Maria Izabel de Carvalho, fev. 2016.

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Figura 18- Via Ápia – domingo pela manhã. Fonte: Maria Izabel de Carvalho, jul. 2015.

A produção de lixo, pelos considerados pequenos geradores, aqueles que

produzem resíduos que se assemelham aos domiciliares, cuja geração é de até

120 litros ou 60 kg diários, representa a maior parcela de produtores de lixo na

Rocinha. Durante nossa pesquisa, para termos uma noção da geração de

resíduos nos domicílios, perguntamos quantas vezes por semana cada família

faz a retirada de lixo da sua residência, 83% informaram que a faz de cinco a

sete vezes por semana, o que indica a alta produção de lixo, uma vez que

praticamente todos os dias, ocorre o descarte de lixo, na maior parte dos

logradouros, o que é perceptível nos recipientes dos pontos de coleta da

COMLURB, que estão constantemente abarrotados.

Quando indagado aos pesquisados sobre sua responsabilidade no tocante

ao lixo por estes produzidos, 97% disseram se sentir responsáveis por seu lixo e

quando indagados por que assim pensavam, estes expuseram os seguintes

motivos:

“Porque é um lixo meu e devo colocar no lugar adequado e não colocar na responsabilidade dos outros” (A. Entrevista concedida a Maria Izabel de Carvalho. Rio de Janeiro, 24 out. 2015). “Porque eu levo para a lixeira” (N. Entrevista concedida a Maria Izabel de Carvalho. Rio de Janeiro, 14 nov. 2015). “Porque a gente tem que se preocupar com o lixo que sai da casa da gente, para não prejudicar quem está fora” (M. Entrevista concedida a Maria Izabel de Carvalho. Rio de Janeiro, 14 nov. 2015).

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“Porque se eu consumo eu sou responsável pelo meu lixo” (I. Entrevista concedida a Maria Izabel de Carvalho. Rio de Janeiro, 24 out. 2015).

Notamos que uma parcela muito expressiva, quase cem por cento dos

participantes da pesquisa, tem consciência sobre sua responsabilidade em

relação ao lixo que produz, alguns com uma visão mais próxima do que

preceitua a Lei 12.305/2010, quando diz no Art. 28 que: “o gerador de resíduos

sólidos domiciliares tem cessada sua responsabilidade pelos resíduos com a

disponibilização adequada para a coleta ou, nos casos abrangidos pelo art. 33,

com a devolução” (Brasil, 2010), onde está posto que:

Art. 33. São obrigados a estruturar e implementar sistemas de logística reversa, mediante retorno dos produtos após o uso pelo consumidor, de forma independente do serviço público de limpeza urbana e de manejo dos resíduos sólidos, os fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes de: I - agrotóxicos, seus resíduos e embalagens, assim como outros produtos cuja embalagem, após o uso, constitua resíduo perigoso, observadas as regras de gerenciamento de resíduos perigosos previstas em lei ou regulamento, em normas estabelecidas pelos órgãos do Sisnama, do SNVS e do Suasa, ou em normas técnicas; II - pilhas e baterias; III - pneus; IV - óleos lubrificantes, seus resíduos e embalagens; V - lâmpadas fluorescentes, de vapor de sódio e mercúrio e de luz mista; VI - produtos eletroeletrônicos e seus componentes (BRASIL, 2010).

Observamos durante a pesquisa que apesar da grande maioria ter

consciência da sua responsabilidade em relação ao resíduo que gera,

percebemos nas entrelinhas da fala de alguns que logo em seguida, relatavam

que já havia, em algum momento, promovido o seu descarte incorreto, o que nos

faz concluir que há uma divergência entre o que é verbalizado pelos

entrevistados e o que muitas vezes é posto em prática pelos mesmos, talvez

seja por falta de alternativas ambientais de descarte e outras pela cultura de que

podemos jogar o lixo em qualquer lugar.

Durante nossa observação de campo percebemos que apesar do aumento

do número de lixeiras nos pontos estipulados pela COMLURB, essas ainda não

dão vazão ao volume de lixo que é gerado, pois constantemente notamos

recipientes transbordando e muitas vezes invadindo a rua, como notamos em um

dos pontos onde se concentra o maior número de containers - Estrada da

Gávea, em frente às Unidades Habitacionais (UH), construídas durante as obras

do PAC 1 na Rocinha. Esse ponto concentra o lixo vindo de parte da: Rua 4,

Rua 3, Dioneia, Vila União, Estrada da Gávea e das 144 UH – que depositam

todo o lixo produzido nesse local. Acreditamos que uma solução para mudar

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essa realidade, seria a implementação de ações socioeducativas, que

trabalhassem junto à população meios que atendessem as especificidades

locais, o que não ocorre, pois não observamos nenhuma atuação do poder

público, junto a esse público nem mesmo quando são instalados novos

equipamentos na favela, como no caso dos novos containers denominados

“laranjões”.

Os “laranjões” foram instalados recentemente, mais precisamente em

março de 2015, em algumas partes da Rocinha e também na cidade como um

todo, principalmente em áreas favelizadas e da periferia, no entanto, a

população carioca não foi orientada de como utilizar. Uma grande concentração

destes equipamentos pode ser observada em frente às Unidades Habitacionais.

Inicialmente os moradores ainda não haviam se apropriado do novo

equipamento, talvez por falta de conhecimento de como funcionasse ou mesmo

por não quererem fazer uso, ou por outros motivos, pois próximo a estes

containers era possível notar uma grande quantidade de lixo descartado no

chão, enquanto esses recipientes se encontravam, em grande parte, vazios.

Porém com o passar do tempo, notamos que essa realidade foi sofrendo

alteração e hoje os containers estão em pleno uso, em alguns pontos mais que

em outros. Hoje inclusive, já não dão mais vazão à demanda local, como é o

caso dos que foram postos nas UH, que estão sempre abarrotados de lixo, como

na foto que segue:

Figura 19- Lixeira em frente às UHs – transbordando. Fonte: Maria Izabel de Carvalho, mar. 2016.

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Em alguns pontos, como na lixeira da Vila Verde e nas UH, ainda há uma

caçamba de lixo junto aos “laranjões”, onde a princípio, segundo os moradores,

seria para colocar entulhos de obra, porém, não é assim que funciona, o

recipiente acaba funcionado para o depósito de todo e qualquer tipo de resíduo.

Na lixeira da Vila Verde, ainda hoje, essa caçamba antiga, é a que mais recebe o

lixo, pois os “laranjões” ficam mal situados (alguns metros depois do local onde

boa parte das pessoas passa e onde há um grande fluxo de veículos,

dificultando a circulação dos pedestres), o que leva as pessoas a colocarem seu

lixo na caçamba antiga, onde a acessibilidade é mais viável. Por outro lado, a

COMLURB alega que não há espaço para colocar esses containers onde hoje

está a caçamba, por isso ficam mais afastados.

Os “laranjões” são fechados e para abri-los, para colocar o lixo, é

necessário acionar um pedal. Em alguns locais, desde o início, os moradores já

começaram a fazer adaptações, colocando uma madeira na abertura do

container para deixá-lo aberto constantemente, não sendo necessário acionar o

pedal; é somente chegar e arremessar o lixo. Onde tem muitos containers,

geralmente os que estão nas extremidades são os que ficam mais abarrotados

de lixo.

Figura 20- adaptação “laranjões”. Fonte: Maria Izabel de Carvalho, mar. 2016.

Em função da ausência de propostas para que seja iniciada a separação e

entrega voluntária dos resíduos por parte dos moradores como um primeiro

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movimento para a coleta seletiva, na Rocinha, tudo que é gerado, tem a mesma

destinação, então móveis, eletrodomésticos, escombros de obra, poda de

árvore, dentre outros resíduos, acabam no mesmo lugar, isto é, nos pontos

estipulados pela COMLURB, sem nenhum tratamento adequado e em total

dissonância com a PNRS/2010 que tem como um dos seus princípios a proposta

de reduzir, reutilizar e reciclar.

Figura 21- lixeira Vila Verde – junção de vários tipos de lixo – poda de árvore, móveis e lixo doméstico. Fonte: Maria Izabel de Carvalho, mar. 2016.

Figura 22- Lixeira Vila Verde – junção de vários tipos de lixo – entulho de obra e lixo doméstico. Fonte: Maria Izabel de Carvalho, mar. 2016.

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Outra questão que observamos em nossa pesquisa é que além do entulho

que é trazido em sacos, carregados nas costas, há ainda o transbordo em maior

escala, que é feito geralmente por pessoas que vêm de carro para descarregá-lo

nas lixeiras, como observamos em um determinado ponto da favela, conforme

foto:

Figura 23- Lixeira Vila Verde – transbordo de escombros de obra na lixeira. Fonte: Maria Izabel de Carvalho, mar. 2016.

Quando chove, esse entulho, sobretudo, o que é menos espesso, escorre

rua a baixo, formando uma camada de lama, por onde as pessoas têm que

passar, como podemos observar nas fotos a seguir:

Figura 24- Lixeira Vila Verde – entulho de obra vira lama e escorre rua a baixo. Fonte: Maria Izabel de Carvalho, mar. 2016.

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Figura 25- Lixeira Vila Verde – entulho de obra vira lama e escorre rua a baixo. Fonte: Maria Izabel de Carvalho, mar. 2016.

É esse o cenário que constantemente presenciamos nos pontos de coleta

de lixo estipulados pela COMLURB, onde não há fiscalização, porque também

não são dadas condições adequadas para que o lixo produzido tenha o destino

apropriado. Os sujeitos locais, por mais que queiram agir corretamente,

agendando a retirada de entulho, pelos canais oficiais da prefeitura, não são

atendidos, pois por ser uma favela, nem todos os serviços são disponibilizados

como em outros pontos da cidade – nos bairros ditos formais.

4.2. O papel do serviço público de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos na Rocinha

LIMPAR A VALA: Vem, vem, vem comigo trabalhar! Vamos limpar a vala pra favela urbanizar! Você mora do lado de lá, eu moro do lado de cá, quando a vala se enche a gente não pode passar. Vem, vem, vem... Vamos todos trabalhar com enxada e picareta! Vamos limpar a vala para a vida melhorar. Vem, vem, vem... Com a ajuda do Cristiano e a força do Frei José, vamos limpar a vala para não sujar o pé. Vem, vem, vem!... Obrigado, comunidade lá de cima do casarão. Todos com boa vontade. Todos com bom coração. Vem, vem, vem!... Não precisa ninguém temer já falei com o Didi. Não é preciso ter medo. Ninguém vai sair daqui. Vem, vem, vem comigo trabalhar! Vamos limpar a vala pra favela URBANIZAR! (Maria das Dores de Melo apud Varal de Lembranças, 1983, p. 108).

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Na Rocinha o serviço público de limpeza urbana e de manejo dos resíduos

sólidos tem suas especificidades, apesar das semelhanças em relação a outras

favelas.

Em boa parte dos sub-bairros da Rocinha, devido à geografia da favela,

constituída de becos e vielas estreitas, o recolhimento do lixo na maioria dos

domicílios é destinado pelo próprio morador para recipientes de serviços de

limpeza, pois não recebe a coleta regular como em bairros planos com ruas

estruturadas, na modalidade porta a porta, portanto, os moradores têm que se

deslocar do alto do morro, onde residem, para depositar seu lixo nos pontos

estipulados pela COMLURB, que em grande parte estão situados na Estrada da

Gávea - via central que corta toda a localidade, onde em uma extremidade fica o

bairro de São Conrado e na outra está situada a Gávea, conforme relata o

representante da gerência da COMLURB na Rocinha em resposta ao envio de

nossa mensagem eletrônica:

É utilizada a seguinte logística para a coleta de lixo: 04 (quatro) Caminhões tipo Coleta Compactador 19m³, 02 (dois) Caminhões tipo Coletor Compactador 15m³, 04 (quatro) caminhões tipo basculante 8m³, 04 (quatro) caminhões tipo mini basculante 3m³, 02 (duas) Pás mecânicas, 01 Caixa Compactadora 7m³, 03 (três) caixas Compactadoras 15m³, 02 (dois) Micros Tratores, 01 (uma) moto, 04 (quatro) Caixas de Alvenaria e 10 (dez) caixas Metálicas 5m³. Todo o lixo que sai da Rocinha vai em destino para a Estação de Transferência do Caju, vazam em carretas para o destino final do Aterro de Seropédica. O processo da coleta de lixo, desde o recolhimento pelos caminhões até o destino final se dá: em algumas áreas são recolhidos lixo porta a porta com moto ou manualmente e outras os moradores levam seus resíduos até o ponto de descarte. Pontos de depósito de lixo estipulados pela COMLURB: são diversos pontos ao longo da Estrada da Gávea. Nos pontos de depósito de lixo pelos moradores, existem: recipientes para acondicionamento de resíduos. Há compactadoras na Roupa Suja, Esperança, 199 e Umuarama; não há mais compactadoras por falta de espaço. Há coleta domiciliar (de porta em porta) na área da Rua Um, Três, Quatro, Terreirão, Vila Vermelha, Mina, Raia e Bairro Barcelos. Tipos de coleta: Manual e Mecanizada, predominante mecanizada. Há limpeza das seguintes ruas, pelos garis da COMLURB: Estrada da Gávea, Bairro Barcelos, Ruas Dois e Quatro, Vila Verde, Laboriaux, Boiadeiro. A coleta é realizada em todos os pontos de depósito de lixo estipulados pela COMLURB duas vezes por dia, a partir da 07:00 horas e 16:00 horas. O tipo de lixo mais predominante na região são os materiais recicláveis. A retirada do lixo dos talvegues (valas) é realizada por garis da COMLURB e Guardiões do Rio (Morais, F. Publicação eletrônica [mensagem pessoal]. Mensagem recebida por <[email protected]> em 29 out. 2014).

Apesar da fala do representante da COMLURB informar que a retirada do

lixo ocorra duas vezes por dia nos pontos estipulados, já presenciamos, durante

nossa observação de campo, a coleta sendo realizada três vezes no mesmo dia,

na lixeira do escadão da Vila Verde, no entanto, no entorno do local onde se

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situa a entrega dos resíduos não permanece limpo, conforme pode ser

observado em foto abaixo:

Figura 26- Lixeira da Vila Verde – lixeira vazia por volta de 21h do dia 23 de jul. 2015. Fonte: Maria Izabel de Carvalho, jul. 2015.

Figura 27- Lixeira da Vila Verde – lixeira abarrotada de lixo por volta de 7h do dia 24 de jul. 2015. Fonte: Maria Izabel de Carvalho, jul. 2015.

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Quando abordamos os entrevistados a respeito do descarte a maioria,

85% afirmaram que o lixo gerado nas suas residências, tem como destino os

recipientes dos pontos estipulados pela COMLURB, uma vez que a coleta porta

a porta não chega a esses lugares, conforme demonstrado no gráfico abaixo:

Gráfico 1- Como se dá o descarte do lixo produzido nas residências

Fonte: Maria Izabel de Carvalho, out./nov. 2015.

Ao falar de serviço público de limpeza, consideramos importante situar o

papel e a função da COMLURB, pois é uma Companhia que surge da

transformação da CELURB – Companhia Estadual de Limpeza Urbana, cuja

construção foi autorizada, no ano de 1962, para a coleta e industrialização do

lixo, por meio da Lei 263. No entanto, somente em 1973, através do decreto

6.361 é que de fato a construção desse órgão se concretizou. Porém durou

pouco tempo, pois:

[...] em março de 1975 o Estado da Guanabara se uniu ao antigo Estado do Rio de Janeiro. Esta fusão transformou a cidade do Rio de Janeiro em município, capital do novo estado. Assim é que, pelo decreto lei 256 de 22.07.1975, transforma-se a Companhia Estadual de Limpeza Urbana (do antigo Estado da Guanabara) em Companhia Municipal de Limpeza Urbana – COMLURB – agora uma empresa da

Prefeitura do Rio de Janeiro (Aizen & Pechman, 1985, p. 116).

A Companhia Municipal de Limpeza Urbana é a responsável pelos serviços de:

[...] coleta domiciliar, limpeza dos logradouros públicos, das areias das praias, de parques públicos, do mobiliário urbano, do espelho d’água das lagoas, túneis, viadutos e, em especial, a limpeza e higienização de hospitais municipais. É responsável também pela coleta e destinação adequadas de todos os resíduos produzidos em unidades de saúde localizadas no município, bem como pela transferência, tratamento e disposição final do lixo. A companhia também dispõe de Centro de Pesquisas Aplicadas, em Jacarepaguá, Centro de Informações Técnicas da Universidade Corporativa COMLURB (UNICOM), Galpão de Artes

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Urbanas Hélio G. Pellegrino, na Gávea, e Casa de Banhos Dom João VI – Museu de Limpeza Urbana, no Caju (Bastos, 2014, p. 139).

De acordo com dados disponíveis no site da Prefeitura do Rio de Janeiro

sobre a COMLURB, a companhia é uma sociedade anônima, cuja economia é

mista, tendo como acionista majoritária a Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro.

A organização é considerada a maior do ramo na América Latina. Atua em

diversos ramos no município, inclusive na limpeza e no preparo da merenda

escolar.

Ainda de acordo com Bastos (2014) - em seu livro “Profissão: Catador Um

estudo do processo de construção da identidade”:

A COMLURB (2006), segundo seus registros, recolhe diariamente cerca de 8.500 toneladas de lixo domiciliar e de resíduos produzidos em toda a cidade, dos quais 40% são retirados das ruas. Sua produção de lixo é de 1.326 Kg/hab/dia. Para limpar a cidade do Rio de Janeiro, a companhia dispõe de uma frota de 1.120 veículos e equipamentos, sendo 397 próprios e 723 terceirizados. Possui aterros de lixo nos bairros de Bangu, localizado na Estrada do Gericinó, e em Jardim Gramacho, município de Duque de Caxias. Ambos os aterros são terceirizados, sendo o primeiro operado pela Delta Construções e o segundo, embora em outro município, pela Prefeitura do Rio de Janeiro e operado pela empresa CAENGE Construções S/A; tem ainda usinas de transferência de resíduos localizadas nos bairros de Jacarepaguá, Irajá e Caju (Bastos, 2014, p. 140).

A COMLURB tem uma gerência voltada especificamente para o bairro de

São Conrado e para a favela da Rocinha, o que é um ponto positivo, pois acaba

facilitando suas ações nesse território, mas mesmo assim, devido às

particularidades locais, há deficiências no serviço de limpeza urbana e na coleta

de lixo.

Figura 28- Lixo a céu aberto no Caminho do Boiadeiro. Fonte: Maria Izabel de Carvalho, jul. 2015.

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Durante a pesquisa de campo, identificamos que 53% dos entrevistados

afirmaram que o serviço de limpeza urbana realizado pela COMLURB na

Rocinha, não é eficiente, utilizando dentre outras, as seguintes justificativas:

“Porque é pouca gente trabalhando. E quando tem gari limpando, o povo sai sujando atrás” (F. Entrevista concedida a Maria Izabel de Carvalho. Rio de Janeiro, 17 out. 2015). “Porque é muito lixo aqui na Rocinha... Não que eles não trabalhem, é porque é muito lixo” (S. Entrevista concedida a Maria Izabel de Carvalho. Rio de Janeiro, 16 out. 2015). “Tem a deficiência do espaço e a falta de funcionários para trabalhar para a COMLURB. O ideal era ter coleta porta a porta em toda a Rocinha” (M, Bairro Barcelos). (M. Entrevista concedida a Maria Izabel de Carvalho. Rio de Janeiro, 14 nov. 2015). “Tem muito lixo jogado nas ruas, lixeiras transbordando” (S. Entrevista concedida a Maria Izabel de Carvalho. Rio de Janeiro, 14 nov. 2015).

De acordo com as falas acima, para tornar as ações da COMLURB mais

eficientes na Rocinha, temos plena convicção que deveria existir um forte

investimento em ações de educação ambiental, marketing midiático, entre outros

meios de informação, junto aos sujeitos locais; na perspectiva da redução do lixo

que chega aos pontos de coleta. Outro elemento que apontamos como uma

possível solução é a implantação da coleta seletiva para reciclagem do material

que hoje tem como destino final o Aterro de Seropédica; o aumento do número

de funcionários; a implementação da coleta regular porta a porta, em todas as

áreas da favela e o aumento do número de lixeiras ou outra medida que acabe

com o lixo jogado nas ruas.

Além da COMLURB, identificamos na Rocinha, pelo menos mais dois

grupos oficiais que participam da limpeza urbana e do manejo dos resíduos

sólidos, a saber: os Garis Comunitários e os Guardiões do Rio.

O Projeto Gari Comunitário, surgiu no ano de 1996, visando criar

alternativas para melhorar a conservação e a limpeza em algumas favelas, para

fazer esses serviços em áreas onde, sob a alegação de que funcionários da

COMLURB não conseguiam chegar, devido à presença do poder paralelo. O

projeto tem a seguintes diretrizes:

Garantir a universalização dos serviços de limpeza urbana às áreas de vilas/favelas, através da utilização de mão-de-obra da própria comunidade para execução dessas atividades; conceber formas de geração de renda e inclusão social da população vilas/favelas; promover, simultaneamente, a educação desta população para questões afeitas à limpeza urbana, à saúde pública, ao meio ambiente e à organização social (Azevedo, 2010, p. 47).

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Na Rocinha, de acordo com informações da COMLURB, esse projeto vem

sendo executado a cerca de 18 anos. Assim como em seus primórdios, sua

gestão ainda é feita pela União Pró-Melhoramentos dos Moradores da Rocinha

(UPMMR – tida como a maior associação de moradores da Rocinha), com

recursos da Prefeitura.

Inicialmente os recursos para pagamento dos garis comunitários eram

repassados para a associação de moradores, que tinha a responsabilidade de

efetuar o pagamento aos garis comunitários, o que segundo um representante

desse grupo na Rocinha, mudou há mais de 10 anos, pois enfrentavam muitos

problemas – o pagamento atrasava constantemente, quando a parte financeira

era gerida por esta instituição. Hoje o pagamento é feito diretamente na conta de

cada um, no Banco do Brasil, segundo informações da COMLURB.

Hoje de acordo com informações cedidas por um representante dos garis

comunitários, há cerca de 50 funcionários atuantes na Rocinha. Estes realizam a

varredura interna e a limpeza das valas. Do início da implementação do projeto,

quando saem de cena todos os garis da COMLURB, até a implementação da

Unidade de Polícia Pacificadora, estes executavam todos os serviços de limpeza

urbana na favela. Após a pacificação os garis da COMLURB voltam a atuar na

Rocinha.

Os garis comunitários entrevistados atuam na Rocinha entre 13 e 16 anos.

Dos cinco entrevistados, três já não moram mais na Rocinha. Até moravam

anteriormente, porém se mudaram para outras regiões da cidade.

Visando ampliar o alvo da nossa pesquisa, entendemos ser importante

entrevistar os garis comunitários. No ato da entrevista estes reclamaram muito

da falta de estrutura e alegaram que não têm sequer equipamentos de proteção

individual básicos, como bota, por exemplo. Atribuem a esse fato a questão de

contraírem doenças, como leptospirose e doenças de pele, devido ao contato

direto com o lixo e com a água suja das valas. Como podemos verificar na fala

que segue: “a gente pega doença por causa do contato com o lixo, pois os

nossos equipamentos são escassos... Nem bota temos direito” (JC. Entrevista

concedida a Maria Izabel de Carvalho. Rio de Janeiro, 01 fev. 2016).

Esse grupo se diz muito discriminado pela população local e alega que é

desrespeitado constantemente:

“A gente é muito discriminado aqui pelos moradores. Cadê a autoridade para está aqui com a gente?” (JC. Entrevista concedida a Maria Izabel de Carvalho. Rio de Janeiro, 01 fev. 2016).

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“A gente é muito esculachado pelos moradores... Falam que se eles não jogarem lixo, a gente não tem trabalho” (R. Entrevista concedida a Maria Izabel de Carvalho. Rio de Janeiro, 01 fev. 2016).

Estes relataram que já vivenciaram situações bem delicadas, como por

exemplo, um gari que disse ter encontrado restos mortais durante a limpeza de

uma vala: “já peguei até defunto na vala” (R. Entrevista concedida a Maria Izabel

de Carvalho. Rio de Janeiro, 01 fev. 2016). O projeto Gari Comunitário já foi

ameaçado de extinção, chegando inclusive a ser paralisado em algumas favelas,

porém na Rocinha não teve descontinuidade. Há um Projeto de Lei, nº 43/2013,

que tem como objetivo tornar permanente o programa comunitário de limpeza

urbana designado gari comunitário, parado na Câmara Municipal do Rio de

Janeiro.

O Projeto Guardiões dos Rios é gerido pela Secretaria Municipal de Meio

Ambiente (SMAC) e é executado atualmente pela Organização da Sociedade

Civil de Interesse Público (OSCIP) Preservar Brasil. Os guardiões do rio atuam

na limpeza e conservação de rios e canais. Na Rocinha já existiram duas

equipes, uma atuava voltada para as ações da parte baixa (próximo a São

Conrado) e outra na parte alta da favela (próximo a Gávea), porém hoje, de

acordo com informações coletadas em campo, existe somente uma equipe -

formada por 13 (treze) pessoas, sendo 12 (doze) guardiões dos rios e 01 (um)

coordenador de campo, que fica na parte baixa da favela.

Quando são acionados por moradores de uma determinada área para

limpar uma vala que está obstruída pelo lixo, se dirigem até o local para analisar

se o trabalho lhes compete ou não.

O coordenador local informou que o foco hoje tem sido a manutenção do

Canal da Rocinha (conhecido como valão), até mesmo porque a equipe não

conta com recurso para arcar com transporte para o deslocamento dentro da

favela, por isso, acabam se limitando a ficar mais na parte baixa. A equipe da

Rocinha atualmente, não conta com uma base para guardar seus equipamentos.

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Figura 29- Guardiões do Rio fazendo a limpeza do Valão. Fonte: Percy da Silva Justino, maio 2016.

De acordo com Azevedo (2010), o projeto Guardiões dos Rios tem como

finalidade:

[...] a limpeza dos rios da cidade do Rio de Janeiro, porém, no caso da Rocinha, os que antes eram cursos de água se tornaram valas negras com dejetos orgânicos e enormes quantidades de lixo. Consequentemente, a ação desse grupo na comunidade passou a estar diretamente ligada à temática dos resíduos sólidos (Azevedo, 2010, p. 49).

Se analisarmos a função de cada instituição citada acima, chegamos à

conclusão de que a ausência de sinergia entre os projetos, impossibilita ações

integradas, havendo com isto sobreposição de atividades, que invés de resolver

a questão, acabam não dando conta de solucionar a problemática da limpeza

urbana e do manejo de resíduos sólidos na favela da Rocinha, pois não há uma

otimização desses serviços, como bem coloca Azevedo (2010):

(...) a falta de um projeto único, que possibilite uma interação otimizada dos mesmos, de forma a garantir a prevenção da sobreposição de atribuições e a falta de cobertura de áreas esquecidas pelo sistema, contribui para uma menor eficiência das ações propostas e executadas (Azevedo, 2010, p. 44).

Consideramos que a ausência de articulação do poder público, do terceiro

setor e da população residente, no tocante às ações em prol das questões

ligadas ao lixo, é um fator fundante. Tendo em vista que os raros grupos

existentes, não têm como foco a problemática relacionada ao descarte incorreto

de lixo, como o é o caso do grupo Rocinha Sem Fronteiras (grifo nosso), que é

de grande importância para a favela, por buscar informar a população, através

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da realização de reuniões mensais sobre temas diversos, mas que, não pautou

em sua agenda ações mais efetivas na questão do lixo.

Registramos, inclusive, nossa tentativa de pautar na agenda do grupo a

questão e só conseguimos inserir esta discussão apenas uma vez, e não surtiu o

efeito desejado, portanto, não identificamos caminhos para construção de

diferentes espaços de discussão, que tenham como prioridade o trato do

descarte inadequado de lixo na favela da Rocinha.

Em suma, seria necessário um planejamento em comum de todas as

partes para tornar as ações voltadas para a limpeza urbana e manejo dos

resíduos sólidos, existentes no território, mais eficientes.

4.3. Descarte inadequado de lixo para além da coleta: forma de resistência social, falta de conhecimento, questão cultural ou ausência de serviços públicos?

Nessa pesquisa intencionamos dentre outros objetivos, identificar os

motivos que levam parte da população da Rocinha a praticar o descarte

inadequado do lixo. Assim, uma das questões levantadas nas entrevistas tinha

relação direta com a questão do descarte inadequado de lixo, pois queríamos

saber o que os entrevistados achavam a respeito. Dos 40 participantes 95%

afirmaram que os sujeitos locais praticam o descarte incorreto do lixo. Quando

indagados sobre o que os levava a afirmar que o fato ocorre, dentre outras,

foram postas as seguintes afirmativas:

“Porque vejo o povo jogando. Não vou ser hipócrita, às vezes até eu mesmo esqueço e jogo, mas acabo pegando do chão” (A. Entrevista concedida a Maria Izabel de Carvalho. Rio de Janeiro, 24 out. 2015). “Porque ao invés do lixo está na lixeira, está no chão” (I. Entrevista concedida a Maria Izabel de Carvalho. Rio de Janeiro, 17 out. 2015). “Tem até demais. Vejo o povo desse prédio do lado jogando lixo pela janela, enquanto a lixeira fica do lado... isso várias vezes” (D. Entrevista concedida a Maria Izabel de Carvalho. Rio de Janeiro, 14 out. 2015). “Porque mesmo tendo o lugar certo para jogar, eles preferem jogar no lugar mais fácil, que é na rua e na porta dos outros” (S. Entrevista concedida a Maria Izabel de Carvalho. Rio de Janeiro, 16 out. 2015).

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“O povo joga muito lixo na rua. Já jogaram inclusive aqui no meu quintal. Quem vem lá de cima tem preguiça de descer com o lixo para a lixeira que fica aqui na frente” (A. Entrevista concedida a Maria Izabel de Carvalho. Rio de Janeiro, 14 out. 2015).

Logo em seguida perguntamos o que levava parte da população residente

na Rocinha a descartar o lixo de forma inadequada 40% das pessoas afirmaram

que o principal motivo é a preguiça de levar o lixo até um ponto de coleta

estipulado pela COMLURB. Além disso, foram apontados, em menor escala

respectivamente, que outro motivo era a “falta de educação” (15%), serem

“porcas” (12%), dentre outros motivos, como: desleixo falta de consciência, falta

de responsabilidade, má vontade, pressa, falta de cumprimento do seu dever,

falta de conhecimento, por hábito, falta de cultura, porque são sebosos, por não

acreditar que as coisas na favela podem melhorar, porque são relaxados e por

falta de respeito com a própria comunidade. Conforme demonstra o gráfico

abaixo:

Gráfico 2- O que segundo os entrevistados leva parte da população residente na Rocinha a descartar o lixo de forma inadequada.

40%

15%12%

2%

28%

3%"Preguiça"

"Falta de educação"

"Porque são porcos"

"Não tenho visto mais isso

não"

Outros

Não Respondeu

Fonte: Maria Izabel de Carvalho, out./nov. 2015.

“Preguiça... É um pessoal acomodado que não sabe guardar o lixo dentro de casa para levar quando descer. Às vezes dá para a criança, que não tem responsabilidade, aí larga no meio do caminho” (MF. Entrevista concedida a Maria Izabel de Carvalho. Rio de Janeiro, 24 out. 2015). “Hábito de muito tempo. A falta de consciência... O hábito às vezes acaba falando mais alto” (A. Entrevista concedida a Maria Izabel de Carvalho. Rio de Janeiro, 24 out. 2015). “Porque o povo é porco... Falta de orientação” (L. Entrevista concedida a Maria Izabel de Carvalho. Rio de Janeiro, 24 out. 2015).

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“Desrespeito com a própria comunidade. Porque de qualquer forma, apesar de mal colocado, a gente tem os pontos de lixo da COMLURB” (J. Entrevista concedida a Maria Izabel de Carvalho. Rio de Janeiro, 17 out. 2015). “Falta de conhecimento. Falta de cumprimento do seu dever... Aí a necessidade da campanha educativa” (M. Entrevista concedida a Maria Izabel de Carvalho. Rio de Janeiro, 14 nov. 2015). “Falta de cultura. A pessoa culta jamais vai fazer isso. Essa multa aí deveria ser aplicada não só no asfalto, mas na favela também” (MS. Entrevista concedida a Maria Izabel de Carvalho. Rio de Janeiro, 14 nov. 2015).

A partir das falas acima, notamos que os moradores tomam para si toda a

responsabilidade do descarte incorreto do lixo, não levando em consideração a

deficiência das políticas públicas que não atendem as especificidades locais em

relação à limpeza urbana. Estes ainda culpabilizam uns aos outros pelo descarte

inadequado do lixo, não que não sejam responsáveis pelo lixo que produzem,

porém não podemos eximir o poder público de suas responsabilidades com essa

população.

Temos que levar em consideração que a grande maioria da população da

Rocinha não tem acesso a coleta porta a porta, tendo que se deslocar da sua

residência, muitas vezes distante do ponto de coleta de lixo estipulado pela

COMLURB, para dar o destino mais próximo do que seria adequado ao seu lixo.

Isso porque infelizmente até mesmo quando destinado nos próprios pontos de

coleta, não podemos dizer que é o mais adequado, uma vez que há uma

precariedade considerável nesses locais, pois não dão vasão ao volume de lixo

que chega até a eles e transbordam com frequência, além da mistura dos tipos

de resíduos, conforme abordado no item 3.1.

Durante a pesquisa, almejando reafirmar a visão dos entrevistados sobre o

motivo do descarte inadequado de lixo, reformulamos a pergunta sobre o que

leva as pessoas a praticarem tal ato, dando algumas opções de resposta, e a

maior parte dos participantes, 52% disseram que veem como causa dessa

problemática a falta de educação por parte da população. Ressaltamos que na

pergunta exposta anteriormente no questionário, quando cada um podia apontar

livremente o que levava as pessoas a praticarem o descarte inadequado de lixo,

estas colocaram como sendo a preguiça, o principal motivo. No primeiro item

livre, que tratava sobre essa mesma questão, a preguiça foi apontada em

primeiro lugar e a “falta de educação” apareceu em segundo lugar – conforme

exposto em trecho anterior dessa parte do estudo. Na sequência podemos

apreciar na integra o resultado da opinião dos entrevistados:

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Gráfico 3- Como os entrevistados veem a problemática do descarte inadequado de lixo na Rocinha

13%

52%

20%

7%2% 2% 4%

Como um problema decorrente da ausência de políticas públicas eficazes

Como um problema ligado a falta de educação por parte da população

Como uma questão cultural

Como falta de conhecimento por parte da população

Como uma forma de chamar a atenção do poder público para o problema

"Falta de conscientização"

Não respondeu

Fonte: Maria Izabel de Carvalho, out. - nov. 2015.

O que nos chama a atenção é que mais uma vez, mesmo tendo como

opção de resposta, a ausência de políticas públicas eficazes, somente 13%, um

número pouco significativo, percebe como sendo esse, um fator que contribui

para o agravamento do problema. Identificam como principal responsável pela

questão, os sujeitos locais.

Em nossos questionamentos iniciais, levantamos a possibilidade do

descarte inadequado de lixo se configurar como uma expressão de resistência

social, porém, de acordo com a posição assumida pelos sujeitos locais,

entendemos que o ato praticado está longe de ser uma resistência. Para nos

certificarmos, resolvemos perguntar se eles viam o descarte indevido de lixo

como uma forma de chamar a atenção do poder público. Dos participantes,

apenas um optou por essa alternativa, o que demostra que a destinação

incorreta não está ligada a nenhuma forma de insatisfação pela ausência do

efetivo serviço de limpeza urbana na favela, podendo assim, ser configurado

como um processo de aculturamento de que na favela o descarte incorreto de

lixo é normal, sem espaço para indignação, por parte dos seus moradores.

A título de ilustrar a questão, no gráfico que segue pode ser demonstrado o

panorama geral da opinião dos participantes a respeito do tema:

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Gráfico 4- Como os entrevistados veem a problemática do descarte inadequado de lixo na Rocinha

13%

52%

20%

7%

2%

2% 4%

Como um problema decorrente da ausência de políticas públicas eficazes

Como um problema ligado a falta de educação por parte da população

Como uma questão cultural

Como falta de conhecimento por parte da população

Como uma forma de chamar a atenção do poder público para o problema

"Falta de conscientização"

Não respondeu

Fonte: Maria Izabel de Carvalho, out. / nov. 2015.

Mediante os dados apresentados, acreditamos que a ausência das ações

articuladas e, desenvolvida de forma a permitir o real entendimento da questão,

provoca isolamentos e decisões individuais com prejuízo para o coletivo, visto

ser recorrente o discurso de culpabilização entre os moradores da favela pelo

descarte indevido do lixo, promovido por eles mesmo, e a nosso ver, é efetivado

em função da incorporação do discurso público, que culpabiliza a pobreza, uma

vez que o argumento utilizado tendia para classificá-los como ato praticado por:

“pobres, negros, nordestinos, mal educados, preguiçosos, porcos”, dentre outras

expressões, ou seja, é o povo contra o povo, não percebendo que o elemento

faltante é a presença da efetividade das políticas públicas que deem conta de

atender a todas as áreas da favela nos seus diversos setores, portanto, é como

se a ausência da varrição das ruas, dos becos e vielas, e a falta de coleta de lixo

regular porta a porta, em todas as áreas da favela, fosse naturalizado sem

maiores cobranças para o poder público, responsável por este serviço.

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4.4. O lixo na favela da Rocinha: a percepção dos sujeitos locais

A Vala Os problemas das valas é algo a se pensar, não joguem entulhos grandes os que moram lá em cima, para os debaixo não prejudicar. Eu sou daqui, vou cooperar / Entulhos grandes não vou jogar. (Bis) Pensemos nos vizinhos de baixo, eles não têm culpa de lá estar. E assim todos que virem vão dizer: aprenderam a ser cristão / Aprenderam a favorecer. Nesta luta que levamos, nos sacrifícios que nos traz, o censo dá sentido / Do pobre sobreviver mais, é aqui o meu recado para as pessoas de bom senso. E assim ajudando-nos diminuir nosso sofrimento. Neste ano iniciado / Temos muito pra contar, muito a agradecer e tanto a melhorar. E assim valorizando os que tentam ajudar (Manoel Quintino apud Varal de Lembranças, 1983, p.116).

A problemática do lixo na Rocinha não consta dos dias atuais, visto ser

uma questão que vem se arrastando ao longo dos anos, sobretudo pela

deficiência das políticas públicas que não dão conta de atender as necessidades

locais, pois em décadas passadas a situação era ainda mais gritante, tendo em

vista que o serviço de limpeza urbana era mais precário do que o atual, o que

tornava mais grave a realidade do tratamento do lixo na favela.

A título de ratificar nossa fala, encontramos nos registros da história da

Rocinha, iniciativas dos moradores para resolver o problema do lixo de forma

individual, sem a participação do poder público, o que reafirma que o descaso

com a questão, é presente há muitos anos na vida da população empobrecida, e

encontramos nos relatos do Varal de Lembranças/Histórias da Rocinha (1983),

que já na década de 1970, faziam-se mutirões para a retirada do lixo das valas,

conforme fala do morador Francisco Elizeu Cosmo, o Chico Barbeiro - em

14/11/1980:

Esse tempo de mutirão foi em 1978, quando a Silvana mais a Eleonora estavam na Associação. Elas foram contra o mutirão. O mutirão foi mais a gente mesmo. Foi o padre Cristiano, foi o Raimundo, foi essa turma de senhoras de dentro da favela. Os moradores todos se reuniram pegaram pá, carrinho, deram uma geral na vala da favela (Varal de Lembranças, 1983, p.115).

A deficiência das políticas públicas, nas áreas periféricas da cidade, é

também registrada pelas falas do Varal de Lembranças/Histórias da Rocinha

(1983), e podemos verificar de acordo com o seguinte posicionamento:

No início, tinha poucos moradores na Rocinha. A água que vinha das fontes corria pelo morro e levava o esgoto formando valas. Hoje, a Rocinha tem 120.000 moradores, o que torna difícil o escoamento da água, esgoto e lixo pela vala. A Rocinha já existe há mais de 40 anos e o governo ainda não instalou os serviços

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públicos a que todo cidadão tem direito: água, esgoto, recolhimento de lixo. O lixo se acumula e multiplica os isentos: barata, pulgas, moscas, pernilongos e também os ratos. A infiltração da água da vala prejudica nossa saúde. Quando chove muito a água entra nos barracos, leva os móveis, derruba nossas paredes, não deixa nossas crianças ir para o colégio. Não podemos sair de casa para trabalhar, pois as valas transbordam e impedem o caminho. Chega a ser preciso que as mulheres entrem nas valas para tirar o lixo, prejudicando assim sua saúde (Varal de Lembranças, 1983, p.116).

Nessa linha de pensamento, trazemos Acserald (2002), que afirma que a

prática de permitir que a população que dispõe de menor poder aquisitivo, seja a

que mais sofra, as consequências ambientais causadas pela deficiência dos

serviços públicos, ainda é muito presente, assegurando que:

[...] a prática de alocar instalações de esgoto e lixo em áreas habitadas por populações trabalhadoras pobres, desprovidas e pertencentes a minorias étnicas não é recente, tendo sido observada desde a remota Antiguidade (Acserald, 2002, p. 52).

Rosane Janczura (2012), também contribuiu para nossa reflexão a respeito

do assunto, expondo o seguinte posicionamento:

Pessoas, famílias e comunidades são vulneráveis quando não dispõem de recursos materiais e imateriais para enfrentar com sucesso os riscos a que são ou estão submetidas, nem de capacidades para adotar cursos de ações/estratégias que lhes possibilitem alcançar patamares razoáveis de segurança pessoal/coletiva. A inclusão poderá viabilizar, assim, na opinião dos autores acima citados, a melhoria das condições materiais de pessoas, famílias e comunidades, bem como o acesso a serviços públicos básicos (educação, saúde, habitação, nutrição, segurança pública, justiça, cultura e recreação) para esses grupos desenvolverem sua competência, autonomia, autodesenvolvimento e capacidade de ação. Os autores finalizam sua análise dizendo que os riscos e as vulnerabilidades emergem de uma multiplicidade de fatores interdependentes. Estratégias para reduzi-los e ampliar a inclusão requerem ações em várias frentes, exigindo o planejamento para que elas sejam executadas de forma integrada e complementar (Janczura, 2012, p.304).

Outro dado observado neste processo de articulação entre a limpeza

urbana e a população favelada encontrados nos relatos do Varal de

Lembranças/Histórias da Rocinha (1983), demostram que na década de 1970,

os moradores faziam também uma relação da limpeza das valas com a questão

da remoção, visto que acreditavam que para evitar sua retirada daquele local,

pelo poder público, teriam que limpar as valas evitando que as enchentes

acontecessem, pois segundo os mesmos, se as inundações continuassem a

ocorrer, seria um argumento para a remoção dessa população, fator que

podemos identificar, em uma matéria sobre a História do Mutirão da Limpeza das

Valas:

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Um grupo de moradores se reuniu para pensar qual seria o problema mais sério da Rocinha para evitar uma remoção. Depois de algumas trocas de ideias, achamos que eram as valas entupidas que provocam enchentes. Achamos que só nós, não poderíamos resolver este problema. Teríamos que contar com as autoridades. Organizou-se reuniões na Capela do Boiadeiro, todas as 6ª feiras, para discutir o assunto e convocar os moradores para o trabalho. Nomeou-se comissões com funções diversas. Uma delas foi entender-se com o serviço de limpeza pública (a COMLURB) e conseguiu ferramentas e recolhimento do lixo acumulado. O que fizemos: pesquisas na Rocinha; organizamos o trabalho; 10 mutirões aos domingos; limpamos 1.400 metros de valas. O que reivindicamos: maior número de caçambas; melhor organização do recolhimento do lixo; canalização das valas limpas; que todos os projetos sejam discutidos por comissões compostas de técnicos do estado e moradores da Rocinha para ninguém sair prejudicado (Varal de Lembranças, 1983, p.119).

A título de ilustrar as questões levantadas, encontramos nos registros

fotográficos da década de 1970, fotos que retratam a problemática do lixo na

Rocinha e o trabalho da própria população residente procurando proceder sua

destinação:

Figura 30- Foto que retrata a problemática do lixo na Rocinha na década de 1970 – limpeza da encosta e lixo entre as residências (a). Fonte: Museu Sankofa Memória e História da Rocinha, sem data.

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Figura 31- Foto que retrata a problemática do lixo na Rocinha na década de 1970 – limpeza da encosta e lixo entre as residências (b). Fonte: Museu Sankofa Memória e História da Rocinha, sem data.

Figura 32- Foto que retrata a problemática do lixo na Rocinha na década de 1970 – valas a céu aberto com a presença de lixo (a). Fonte: Museu Sankofa Memória e História da Rocinha, sem data.

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Figura 33- Foto que retrata a problemática do lixo na Rocinha na década de 1970 – valas a céu aberto com a presença de lixo (b). Fonte: Museu Sankofa Memória e História da Rocinha, sem data.

Diante dos fatos, podemos constatar a dupla penalização da população

favelada, visto que, além de não terem acesso ao serviço público de limpeza

urbana dentre outros, os moradores se sentiam ameaçados em relação ao peso

da remoção, que poderia ocorrer diante das grandes chuvas e como

consequência ocorrer deslizamentos e soterramentos provocados pelo acúmulo

de lixo nas valas e encostas, fator de justificativa para a retirada das famílias

desta região.

Apesar de culpabilizar somente os pobres pelo descarte inadequado de

lixo, a prática de destiná-lo em locais inadequados, a saber: rios, florestas, ou

até mesmo próximo a água corrente, é uma herança de séculos passados, que

infelizmente, nos dias atuais ainda é praticada, ora pelo descaso público e

interesses econômicos, ora por ignorância ambiental, pois a ideia continua

sendo, manter longe das áreas centrais da cidade o que não se quer mais –

porém isso não é uma prerrogativa de pobre, pelo contrário, visto que a

responsabilidade por proceder a gestão dos resíduos sólidos é pública, e no

passado para além do serviço público era efetuada pelo próprio povo, portanto,

encontramos registros de quando não havia serviço de limpeza urbana na

cidade do Rio de Janeiro:

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Os rios, córregos e mares eram espaços privilegiados por terem um fluxo unidirecional, traziam consigo a ideia de que eles levariam o que não é desejável para longe. No século XVIII um dos locais que mais se atirava os resíduos, principalmente os domiciliares, era em uma vala onde hoje é a Rua Uruguaiana. Popularmente conhecida como a Rua da Vala, limitava a expansão da cidade e recebia grande parte dos detritos produzidos por seus habitantes, como consequência o curso natural das águas era constantemente impedido o que provocava o transbordamento deixando toda a área imunda (Machado, 2012, p. 32).

Neste sentido, o que verificamos é que a história se repete e as ações

parecem congeladas no tempo, visto que na década de 1970, os moradores

reivindicavam que os projetos fossem discutidos com a população local,

conforme recorte do Varal de Lembranças/Histórias da Rocinha (1983), porém

isso não acontece até hoje, e podemos utilizar como exemplo disso um projeto

recém-implementado, denominado de “Olho no lixo”, que segundo

representantes locais, não foi discutido com o público alvo, pois já veio pronto

para ser executado, sem respeitar as particularidades e anseios da população

da Rocinha.

Esse projeto começou a ser executado em maio de 2016, E segundo

informações colhidas nas redes sociais da ONG. Viva Rio, o mesmo é uma

iniciativa do Instituto Estadual do Ambiente (INEA) e sua gestão e execução é de

responsabilidade da Viva Rio Socioambiental. No projeto está posto que seu

principal objetivo é diminuir a quantidade e o impacto do lixo na favela da

Rocinha e na circunvizinhança, transformando os impactos negativos em

oportunidade e melhoria para a localidade, por meio da geração de renda e da

cidadania ecológica, de tecnologias sociais e projetos sustentáveis e também

através do desenvolvimento de atividades associadas de comunicação,

mobilização, educação, arte e cultura socioambiental.

De acordo com postagens em redes sociais da ONG. Viva Rio, o projeto

realizará ao longo de 30 meses, atividades de limpeza das ruas e vielas da

Rocinha, e a equipe é composta por 32 colaboradores, denominados agentes

socioambientais que serão responsáveis por recolher, transportar e separar

manualmente, plásticos, garrafas pets, papelões, latinhas, vidros, madeira,

metais e outros tipos de resíduos, que possam ser reciclados ou não, presentes

nas proximidades ou dentro dos canais, córregos, rios ou nas valas, além das

vielas e ruas da favela da Rocinha. E ainda serão responsáveis pela ligação

entre a favela e o meio ambiente, gerando conhecimento sobre o lixo reciclável e

instigando a participação comunitária.

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A título de ilustração, seguem fotos onde podemos observar algumas

atividades desenvolvidas pelos agentes socioambientais inseridos no projeto

recém-implantado na Rocinha:

Figura 34- Retirada de lixo da encosta pela equipe do Projeto “Olho no Lixo”. Fonte: Facebook Viva Rio, maio 2016.

Figura 35- Retirada, pela equipe do Projeto “Olho no Lixo”, uma carcaça de geladeira descartada inadequadamente. Fonte: Facebook Viva Rio, maio 2016.

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Identificamos relatos que constam no Varal de Lembranças/Histórias da

Rocinha (1983), que ainda são muito presentes atualmente, visto que perdura a

ideia de que quem mora na parte alta e descarta o seu lixo inadequadamente,

prejudica quem mora na parte mais baixa e vice-versa. Sendo assim, verifica-se

que já ocorria uma culpabilização entre os próprios moradores, desde tempos

passados, e a fim de ilustrar vejamos mais uma matéria que fala sobre a vala na

Rocinha, na década de 1970, onde esse discurso também aparece:

As Valas: o maior problema da Rocinha / Moradores: o maior problema das valas Esta talvez seja a história mais antiga dessa comunidade. Sempre se discutiu esse problema de enchente a cada vez que a chuva é um pouco mais forte. Pra quem teve sua casa cheia de água da vala, a solução é imediata: sair da Rocinha. Pra quem tem sua casa arriada sobre a vala, os culpados são sempre os de cima que jogam lixo. E para quem mora no início, os culpados são sempre os debaixo que jogam lixo dentro da vala. E agora? Quem tem culpa no final de todo esse acusa-acusa? É simples a resposta. Não são todos os de cima e nem todos os debaixo. Alguns debaixo e alguns de cima que ainda têm dificuldade de saber que seu próximo sempre está pagando pelo lixo que ele joga dentro da vala. É bem gozado o que aconteceu com a pesquisa que fizemos. Não teve um morador que tivesse jogado lixo (cadeira, colchão, mesa ou geladeira) dentro das valas. Sabe quem jogava? Eram sempre os vizinhos. E por incrível que pareça esses vizinhos nunca apareceram. Após o início da Campanha já se pode ver mais moradores carregando o seu lixo para as várias lixeiras que a COMLURB nos forneceu. Pedimos a colaboração e o apoio de todos que moram nessa localidade, principalmente quem mora próximo às valas. Cerrem fileiras conosco nesta Campanha de Limpeza. Você não está sozinho. Vamos acabar com esse problema que afeta a todos. Não jogue lixo nas valas! (Filho, 1983, p.117)14.

Passados mais de quarenta anos, esta fala ainda é presente, pois em

nossa entrevista de campo, encontramos o mesmo discurso:

“O povo que mora em cima joga lixo e prejudica quem mora mais em baixo. Quando chove as pessoas aproveitam para jogar o lixo pela janela para a chuva levar. Porque aqui no beco, a chuva desce forte ai leva tudo até algum lugar, depois engancha e entope tudo” (L. Entrevista concedida a Maria Izabel de Carvalho. Rio de Janeiro, 16 out. 2015).

Apesar de não eximirmos o poder público de sua responsabilidade em

relação ao fato da não existência de ações que atendam a realidade local e de

termos consciência que não é só quem mora na parte alta que descarta o lixo

nas valas, identificamos que o ato em si, tem um fundo de verdade, pois foi

possível observar durante nosso trabalho de campo, que as valas obstruídas

pelo lixo que vem da parte alta, começam a transbordar e ficam jorrando água

14 Artigo publicado no Tagarela, o jornal da Rocinha, n. 6, 1978.

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suja nos becos por onde as pessoas transitam ou mesmo na porta das

residências, levando os moradores a saírem de suas casas e se depararem com

uma situação deplorável, como ter que colocar, logo pela manhã, o pé em água

suja de vala. Mas também, dependendo da localidade, a mesma pessoa que

descartou o lixo na vala, sofrerá as consequências mesmo morando na parte

alta, pois para chegar à parte baixa, terá que passar pelo local onde a vala está

transbordando.

Outra questão que nos chamou a atenção na fala da moradora

entrevistada é o fato de algumas pessoas, que moram na parte alta, jogarem as

sacolas de lixo nos dias de chuva, para que a correnteza as carregue favela a

baixo. Cabe ressaltar que essa questão só foi exposta pelos entrevistados em

duas localidades, durante a pesquisa de campo, nos sub-bairros conhecidos

como Roupa Suja e Macega, segundo os moradores participantes da pesquisa,

por preguiça de descer o morro com o lixo para depositar na compactadora que

fica na parte baixa. Salientamos que para chegar a esses locais, somente é

possível por meio de longas escadarias.

Quando iniciamos nosso levantamento de indagações para o estudo,

ouvimos de alguns moradores que as pessoas praticavam o descarte incorreto

do lixo, por terem a Rocinha como um local de passagem, ou seja, pessoas que

vinham de outros estados em busca de trabalho e que só ficavam nessa

localidade por um curto período de tempo. E na busca de verificar se esse dado

se configurava como verdadeiro, efetuamos a pergunta de tempo de moradia na

Favela da Rocinha, e nos deparamos com o seguinte resultado: 58% (cinquenta

e oito por cento) já moram nessa região há mais de 30 (trinta) anos; sendo que:

38% (trinta e oito por cento) estão no local há 40 anos ou mais, 22% (vinte e dois

por cento) moram entre 20 e 29 anos e 20% (vinte por cento) residem nessa

região entre 30 e 39 anos, como podemos observar no gráfico a seguir:

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Gráfico 5- Tempo de permanência dos entrevistados na favela da Rocinha.

Fonte: Maria Izabel de Carvalho, out - nov. 2015.

Esses números nos levam a afirmar que o descarte inadequado de lixo na

Rocinha não tem relação com o sentimento de não pertencimento com o local,

uma vez que a grande maioria já reside ali há muitos anos, sem pretensão de

mudar, pois 60% (sessenta por cento) dos entrevistados afirmaram que não tem

pretensão de sair da Rocinha.

Perguntamos aos entrevistados quais as principais consequências

negativas causadas pelo descarte inadequado do lixo para a população da

Rocinha, quando 50% (cinquenta por cento) apontaram como sendo a

proliferação de doenças, o que também já ocorria na década de 1970, quando

os moradores viam as valas cheias de lixo, como sendo uma causadora de

enfermidades, como pode ser observado a seguir: “o contato com a água suja da

vala dá feridas na pele, micose, febre. Quando bebemos água do poço podemos

pegar hepatite, tifo e nossas crianças ficam cheias de vermes com diarreia”

(Varal de Lembranças, 1983, p.116). Na nossa pesquisa foi apontado também

como consequência, além da citada acima: a atração de insetos, entupimento de

vala e esgoto, desabamento, inundação, muita sujeira, mau cheiro, poluição,

atração de cachorros que rasgam os sacos de lixo, o mal que faz para os

cachorros, imundice e prejuízo à estética, conforme gráfico que segue:

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Gráfico 6- As principais consequências negativas causadas pelo descarte inadequado

do lixo para a população da Rocinha

Fonte: Maria Izabel de Carvalho, out./nov. 2015.

No tocante a doenças transmitidas por vetores ligados ao descarte

inadequado do lixo (moscas, baratas, ratos, mosquitos, etc.), 63% (sessenta e

três por cento) informaram não conhecer pessoas que já tenham sofrido de

algum problema de saúde causado em decorrência do descarte incorreto do lixo.

Dos 37% (trinta e sete por cento) que afirmaram conhecer alguém que já

teve doenças causadas por vetores ligados ao lixo, apontaram as seguintes

enfermidades:

Gráfico 7- Doenças causadas por vetores ligados ao descarte inadequado de lixo

Fonte: Maria Izabel de Carvalho, out./nov. 2015.

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Isso nos leva a afirmar que os moradores têm consciência dos danos

negativos que o ato de descartar o lixo inadequadamente pode causar, mas que

apesar disso, a situação vem se perpetuando ao longo de muitos anos, tanto

pela omissão do poder público quanto por algumas atitudes indevidas dos

sujeitos locais.

Outro ponto de preocupação em nossa pesquisa foi de saber dos

entrevistados, se esses já haviam vivenciado algum impacto negativo causado

pelo descarte inadequado do lixo na Rocinha, 50% dos entrevistados afirmaram

já sofreu ou já presenciaram algum dano negativo em função do descarte

incorreto do lixo, relatando, dentre outras, as seguintes situações:

“Os barracos eram de madeira... Lá em cima, acima da minha casa, caiu uma ribanceira, levou a casa do cara, só não levou a minha, por um milagre. Agora está muito melhor. Aqui no 199 desceu uma ribanceira na Estrada da Gávea, morreu um cara. Aqui para cima não tinha casa não” (J. Entrevista concedida a Maria Izabel de Carvalho. Rio de Janeiro, 24 out. 2015). Em 1996, quando houve um deslizamento, destruiu 12 barracos e morreu 2 crianças... Meu mesmo foram dois andares de um imóvel. As pessoas jogam cadeira, geladeira, fogão... Ninguém leva nada. Isso é aqui no lajão, aqui mais em cima... São mais sujos que a gente aqui em baixo” (S. Entrevista concedida a Maria Izabel de Carvalho. Rio de Janeiro, 17 out. 2015). “Minha casa desabou por causa do lixo, aí eu construí de novo no mesmo lugar. Não lembro o ano, porque faz muito tempo” (A. Entrevista concedida a Maria Izabel de Carvalho. Rio de Janeiro, 24 out. 2015). “Quando eu morava na Rua 3, a vala transbordou e encheu as casas. Teve gente que bebeu água da enchente. Tivemos que tomar vacina contra a leptospirose” (L. Entrevista concedida a Maria Izabel de Carvalho. Rio de Janeiro, 17 out. 2015). “Enchentes... Quando chove ali no Valão quando enche tudo, desce todo o lixo. Ali os comerciantes têm uma paredinha na porta para a água não entrar” (E. Entrevista concedida a Maria Izabel de Carvalho. Rio de Janeiro, 17 out. 2015).

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Figura 36- Enchente na localidade conhecida como Valão – 12/03/2016 (a). Fonte: facebook Musicalidade Saggaz, mar. 2016.

Figura 37- Enchente na localidade conhecida como Valão – 12/03/2016 (b). Fonte: facebook Musicalidade Saggaz, mar. 2016.

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Figura 38- Enchente na localidade conhecida como Valão – 12/03/2016 (c). Fonte: facebook Musicalidade Saggaz, mar. 2016.

A partir das falas acima percebemos que os moradores já vivenciaram

inúmeras situações como desabamentos, enchentes, conforme fotos, e até

mesmo a perda da vida de entes queridos ou conhecidos, em decorrência do ato

de descartar o lixo de forma inadequada, o que poderia ser evitado com a

implementação de ações articuladas de conscientização dos danos que podem

ser ocasionados, juntamente com a expansão dos serviços de limpeza urbana a

toda a extensão da favela.

No tocante a ações de conscientização, 98% (noventa e oito por cento)

dos moradores desconhecem a existência de projetos voltados para a educação

ambiental, que seja desenvolvido na favela da Rocinha, e a única pessoa que

disse conhecer informou que o projeto era de uma Igreja Evangélica existente no

Laboriaux, porém abordamos uma representante da Igreja, que afirmou não

haver projeto voltado para essa área na instituição.

Quando perguntados se já haviam participado de algum projeto voltado

para a educação ambiental na Rocinha, 100% (cem por cento) informaram que

não, somente duas pessoas afirmaram ter participado de ações esporádicas

voltadas para essa área do conhecimento, pois uma informou ter participado de

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palestra sobre meio ambiente no prédio da Prefeitura Rinaldo de Lamare e outra

disse ter participado de um mutirão de limpeza no Laboriaux.

É quase unânime a opinião dos entrevistados em relação à necessidade

de haver projetos de educação ambiental na Rocinha, pois 95% (noventa e cinco

por cento) das pessoas entrevistadas declararam que deveriam existir essas

ações na localidade, alegando que isso seria importante:

“Para ajudar a parar, pensar e refletir que não deve jogar lixo na rua” (J. Entrevista concedida a Maria Izabel de Carvalho. Rio de Janeiro, 17 out. 2015). “Porque acho que o pessoal ia ter mais consciência” (E. Entrevista concedida a Maria Izabel de Carvalho. Rio de Janeiro, 17 out. 2015). “Para educar mais as pessoas, para elas aprenderem que lugar de lixo é na lixeira e não na porta dos outros” (C. Entrevista concedida a Maria Izabel de Carvalho. Rio de Janeiro, 24 out. 2015). “Para conscientizar mais as pessoas... mais as crianças porque os adultos é mais difícil mudar, já as crianças são mais fácil de mudar” (S. Entrevista concedida a Maria Izabel de Carvalho. Rio de Janeiro, 16 out. 2015). “Porque melhoraria mais a realidade da favela” (A. Entrevista concedida a Maria Izabel de Carvalho. Rio de Janeiro, 14 nov. 2015). “Porque ia melhorar a qualidade de vida das pessoas, a aparência do lugar, diminuir os riscos... E até mesmo conscientizar as crianças porque são nosso futuro” (A. Entrevista concedida a Maria Izabel de Carvalho. Rio de Janeiro, 14 nov. 2015).

Sendo assim acreditamos que os moradores entrevistados veem a

necessidade de implementação de projetos que levem a população a repensar

suas atitudes em relação ao descarte inadequado do lixo, melhorando o nível de

consciência, educação e a uma melhoria na qualidade de vida da população da

favela, ao diminuir os riscos que existem em função do descarte inadequado de

lixo, sobretudo com ações que trabalhem a questão com as crianças que

segundo eles são o futuro dessa localidade.

Na intenção de identificar quais eram e/ou são as atitudes dos moradores

quando visualizam a prática de descarte inadequado do lixo em suas portas,

becos, vielas ou nas ruas, perguntamos o qual a atitude adotada diante dos

fatos, e obtivemos como respostas que 40% varre o seu beco, viela ou rua,

recolhem o lixo e o leva para a lixeira, o que demostra que o serviço público de

limpeza urbana não chega a esses locais, conforme demonstra gráfico:

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Gráfico 8- O que os moradores fazem quando ocorre o descarte inadequado do lixo em suas portas, becos, vielas ou nas ruas

22%

23%40%

15%

Fazem canteiros de plantas nos espaços livres

Colocam avisos pedindo para não jogarem lixo naquele local

Levam o lixo que foi descartado indevidamente para a lixeira

Deixam o lixo que foi descartado indevidamente no local até que outa pessoa/gari o leve para a

lixeiraVarrem o seu beco, viela ou rua, distanciando o lixo da sua residência

Varrem o seu beco, viela ou rua, recolhem o lixo e o leva para a lixeira

Outros

Fonte: Maria Izabel de Carvalho, out./nov. 2015.

Além das opções de resposta apontadas pelos entrevistados, alguns ainda

colocaram que: “varrem o beco e o gari leva o lixo; o gari pega e leva para a

lixeira; fico chateada e jogo no mato; não preciso fazer nada, pois aqui tem

coleta e varrição todo dia; pegava o lixo e botava na porta do outro novamente;

no meu beco não tem lixo descartado incorretamente”. Nessa última colocação,

mesmo a pessoa dizendo que no local as pessoas não descartam o lixo de

forma indevida, observamos resíduos jogados no chão.

Apesar dos entrevistados informarem que não fazem uso das estratégias,

tais como: fazer canteiros de plantas nos espaços livres ou colocar avisos

pedindo para não jogarem lixo naquele local – essa prática foi observada em

algumas áreas da Rocinha, onde há espaços livres, passíveis de se tornar um

ponto de acúmulo de lixo, pois podemos observar nas fotos que seguem que

algumas atitudes de coibir esse ato são tomadas, inclusive utilizam a sigla do

poder paralelo, talvez com o intuito de intimidar, para que o ato não se dê, porém

ainda alguns resistem e depositam inadvertidamente sacola de lixo no local:

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Figura 39- Aviso informando que é proibido jogar lixo. Fonte: Maria Izabel de Carvalho, jul. 2015.

Figura 40- Aviso informando que é proibido jogar lixo. Fonte: Maria Izabel de Carvalho, jul. 2015.

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Figura 41- Aviso UPMMR-AMABB e Região Administrativa (RA) informando que é proibido jogar lixo no local. Fonte: Maria Izabel de Carvalho, jul. 2015.

Buscando identificar se há singularidade de um sub-bairro para outro no

tocante ao descarte inadequado de lixo na Rocinha, perguntamos aos

participantes da pesquisa, se estes percebem alguma diferença, ou seja, se em

determinados locais há uma maior concentração de lixo desordenado do que em

outros, 60% dos entrevistados afirmaram que sim, pois:

“O Valão ali mesmo, a Roupa Suja, o nome já diz, é uma coisa horrível” (I. Entrevista concedida a Maria Izabel de Carvalho. Rio de Janeiro, 24 out. 2015). “Tem lugar que jogam mais. Ali no Largo do Boiadeiro tem um salão de cabeleireiro, na esquina da Travessa Roma, que o povo criou uma lixeira na porta” (MI. Entrevista concedida a Maria Izabel de Carvalho. Rio de Janeiro, 14 nov. 2015). “Tem beco que é mais sujo que aqui que é muito alto. Tem cada beco aí que tem lixo até na alma. Aqui é mais organizado” (A. Entrevista concedida a Maria Izabel de Carvalho. Rio de Janeiro, 24 out. 2015). “Tem lugar que as pessoas são mais limpas. Alguns becos são limpinhos” (L. Entrevista concedida a Maria Izabel de Carvalho. Rio de Janeiro, 17 out. 2015).

O gráfico a seguir demonstra a dimensão dada pelos participantes ao

processo de descarte inadequado e a atitude adotada por eles:

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Gráfico 9- Se há diferença em relação ao descarte inadequado de lixo entre os sub-bairros da Rocinha.

Fonte: Maria Izabel de Carvalho, out./nov. 2015.

Partindo das falas acima, podemos dizer que as particularidades locais

existem inclusive em relação ao descarte inadequado do lixo, tendo em vista que

segundo os entrevistados, em determinados lugares é possível ver mais lixo

jogado que em outros e que o fato de um determinado local ser mais alto que

outro, geograficamente falando, não é um fator determinante para o descarte

inadequado do lixo, pois segundo a fala de um morador, no alto da favela tem

beco que é mais limpo que outros que ficam na parte baixa da Rocinha.

Buscando identificar caminhos para a resolução da questão do lixo na

Rocinha, perguntamos a todos os participantes da pesquisa, tanto os moradores

quanto os que trabalham com o manejo dos resíduos sólidos, qual seria a

solução para resolver o problema do descarte inadequado de lixo na favela, e

obtivemos as seguintes colocações:

“Uma fiscalização mais pesada. Não aliviar. Na primeira vez perdoa, na segunda vez aplica uma multa” (M. Entrevista concedida a Maria Izabel de Carvalho. Rio de Janeiro, 14 nov. 2015). “O povo ser mais educado, mais consciente” (C. Entrevista concedida a Maria Izabel de Carvalho. Rio de Janeiro, 24 out. 2015). “Se a Prefeitura desse mais atenção para a gente” (J. Entrevista concedida a Maria Izabel de Carvalho. Rio de Janeiro, 17 out. 2015). “Trabalho educativo para conscientizar a população” (A. Entrevista concedida a Maria Izabel de Carvalho. Rio de Janeiro, 24 out. 2015). “Mais gari, mais container” (L. Entrevista concedida a Maria Izabel de Carvalho. Rio de Janeiro, 24 out. 2015).

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“Ter um cesto de lixo no lugar adequado para as pessoas jogarem o lixo, porque uma pessoa colocando, todas vão jogar” (T. Entrevista concedida a Maria Izabel de Carvalho. Rio de Janeiro, 24 out. 2015). “Educar o povo com palestra. Fazer o povo entender que o lixo se deve levar para a lixeira” (D. Entrevista concedida a Maria Izabel de Carvalho. Rio de Janeiro, 14 nov. 2015). “Fiscalização melhor e conscientização do povo, para eles verem a rua como a casa deles também” (I. Entrevista concedida a Maria Izabel de Carvalho. Rio de Janeiro, 24 out. 2015). “Teriam que pagar multa, porque se fosse assim, parariam de jogar lixo na rua” (S. Entrevista concedida a Maria Izabel de Carvalho. Rio de Janeiro, 16 out. 2015). “Mais caçambas de lixo mais próximo e recolhimento constante. Também deveria ter multa, pois quando dói no bolso aí a coisa muda” (L. Entrevista concedida a Maria Izabel de Carvalho. Rio de Janeiro, 16 out. 2015). “Se ali na Rua 2 eles colocassem aqueles containers que eles colocam nos outros locais ajudaria bastante, porque lá a gente tem que jogar o lixo no chão. Mais aqui em cima cada um tem que fazer sua parte, juntando o lixo e levando para a lixeira” (AS. Entrevista concedida a Maria Izabel de Carvalho. Rio de Janeiro, 16 out. 2015). “Sinceramente não sei, pois tem tanta gente mal educada aqui na Rocinha que já vem sei lá de onde e já vem do lugar dele, assim com esse hábito... Pode até mudar” (A. Entrevista concedida a Maria Izabel de Carvalho. Rio de Janeiro, 14 nov. 2015). “A gerência tomar providência, como colocar uma grade onde tem as lixeiras, para que o povo não jogue o lixo de qualquer jeito” (P. Entrevista concedida a Maria Izabel de Carvalho. Rio de Janeiro, 29 jan. 2016). “Se tivesse um lugar para multar. Os comerciantes deveriam ter uma pessoa para fiscalizar eles, pois deixam o lixo jogado na rua, não recolhem. Na vala é mais difícil, pois o povo joga e ninguém vê... Lá só se for o ‘poder lá de cima’ [poder paralelo], pois lá na descida da Rua 1, eles pararam de jogar sofá, guarda-roupa... Após o ‘poder lá de cima’ falar que não vão mais jogar. Com a gente eles falam que vão jogar mesmo porque a gente tem que trabalhar mesmo” (J. Entrevista concedida a Maria Izabel de Carvalho. Rio de Janeiro, 01 fev. 2016).

A maioria dos representantes de cada grupo participante - garis da

COMLURB, garis comunitários e os moradores - veem na punição, por meio de

multa, a saída para solucionar a problemática do descarte inadequado de lixo na

Rocinha. Além disso, também foi apontada a necessidade de conscientização da

população, por meio de ações educativas.

Acreditamos que além da necessidade urgente de implementação de

ações efetivas que deem conta de atender a demanda da geração do lixo na

Rocinha, também deve haver atuação voltada para a educação ambiental em

sua vertente crítica, pois busca incentivar “a formação do cidadão crítico,

capacitando-o, a realizar reflexões sobre seu mundo e a interferir no mesmo”

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(Dias & Bomfim, S/AP15, p. 3) de forma a levar os sujeitos locais a serem agentes

de transformação para que atitudes que vêm sendo perpetuadas ao longo de

muitos anos possam ficar no passado e que novas perspectivas sejam

almejadas pelos que moram e/ou trabalham na favela da Rocinha.

Portanto, para mudar essa realidade, assim como Loureiro e Layrargues

(2013), defendemos uma educação ambiental que não seja única no seu modo

de entender o mundo e na sua forma de agir, que parta:

[...] do pressuposto de que sua natureza conflitiva, na diversidade e na disputa de concepções e espaços na sociedade, fortalece-a e a legitima nas institucionalidades acadêmicas, nas políticas públicas e nos movimentos sociais que buscam a garantia de direitos, a afirmação das diferenças, a superação das desigualdades de classe e a construção de outro patamar societário (Loureiro & Layrargues, 2013, p. 54-55).

Defendemos, portanto, como fator contribuinte para a mudança da

problemática do descarte inadequado do lixo na favela da Rocinha, a vertente da

educação ambiental cuja identidade foi fortemente marcada pela “inserção dos

que atuavam na educação popular e adotavam a pedagogia crítica libertadora de

Paulo Freire [...] voltada para a formação humana, para a formação política”

(Loureiro & Layrargues, 2013, p. 65). O que quer dizer que:

[...] o conceito central do ato educativo deixa de ser a transmissão de conhecimentos, como se isso per si fosse suficiente para gerar um ‘sujeito ético’ que se comportaria corretamente. É a própria práxis educativa, a indissociabilidade teoria-prática na atividade humana consciente de transformação do mundo e de autotransformação que ganha a devida centralidade. Isso implica favorecer a contínua reflexão das condições de vida, na prática concreta, como parte inerente do processo social e como elemento indispensável para a promoção de novas atitudes e relações que estruturam a sociedade (Loureiro & Layrargues, 2013, p. 65).

Assim, ao darmos um lugar de destaque para a práxis educativa, crítica e

dialógica, se faz necessária a estruturação de processos que sejam

participativos e que:

[...] favoreçam a superação das relações de poder consolidadas e garantir o exercício da cidadania, principalmente daqueles que se encontram em situação de maior vulnerabilidade socioambiental. E isso significa dizer que não só a participação é fundamental, mas que a participação popular é determinante, posto ser a construção de processos em que os grupos expropriados e discriminados adquiram centralidade e condição para que as contradições e os conflitos da sociedade sejam explicitados, enfrentados e superados pelo protagonismo daqueles que portam materialmente o que o que é distinto do poder hegemônico -

15 Sem Ano de Publicação.

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portanto, a alternativa possível concretamente (Loureiro & Layrargues, 2013, p. 65).

De acordo com Loureiro e Layrargues (2013), essa vertente da educação

ambiental - a crítica - tem articulação com o movimento de justiça ambiental,

devido: [...] “a aproximação no modo como definem as causas da crise atual,

estabelecem estratégias de luta social e defendem o projeto societário

anticapitalista” (Acselrad et al. apud Loureiro & Layrargues, 2013, p. 55).

O movimento de justiça ambiental caracteriza como sendo uma injustiça

ambiental, quando em uma sociedade:

[...] destina a maior carga dos danos ambientais a grupos sociais de trabalhadores ou grupos étnicos discriminados, entre outros segmentos em estado de maior vulnerabilidade social e econômica, ameaçando a integridade da saúde ambiental e comprometendo a sua reprodução social. Essa condição, reveladora dos mecanismos de desigualdade socioambiental, estabelece-se em sociedades desiguais por meio de mecanismos políticos, sociais e econômicos que concentram os processos decisórios e privatizam os bens públicos, tornando possível e legítimo a utilização dos bens coletivos e naturais para interesses privados. Essa distribuição desigual por classe é entendida como intrínseca às economias capitalistas e necessária à reprodução ampliada do capital. Assim, na sociedade capitalista o acúmulo material das classes dominantes se dá mediado pela expropriação ambiental dos trabalhadores, e as taxas de lucro das grandes corporações empresariais se vinculam à degradação ambiental dos espaços de vida e de trabalho desses grupos e classes expropriadas (Gould apud Loureiro & Layrargues, 2013, p. 63).

A justiça ambiental também pode ser entendida como um “conjunto de

práticas organizadas de agentes sociais que se encontram na condição de

expropriados e defendem projetos societários anticapitalistas” (Loureiro &

Layrargues, 2013, p. 63).

Para Acselrad (2010) a noção de justiça ambiental demonstra:

[...] um movimento de ressignificação da questão ambiental. Ela resulta de uma apropriação singular da temática do meio ambiente por dinâmicas sociopolíticas tradicionalmente envolvidas com a construção da justiça social. Esse processo de ressignificação está associado a uma reconstituição das arenas onde se dão os embates sociais pela construção dos futuros possíveis. E nessas arenas, a questão ambiental se mostra cada vez mais central e vista crescentemente como entrelaçada às tradicionais questões sociais do emprego e da renda (Acselrad, 2010, p. 108).

A partir das informações citadas acima, podemos concluir, portanto, que a

educação ambiental crítica articulada ao movimento de justiça ambiental, são de

suma importância para a solução da problemática relacionada ao descarte

incorreto do lixo na favela da Rocinha, tendo em vista que ambas as áreas do

conhecimento, pregam a formação de um cidadão crítico que luta por seus

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direitos e por igualdade para todos, para que aqueles que dispõem de menor

poder aquisitivo, não sejam os mais expostos aos riscos ambientais, como vem

ocorrendo ao longo da história.

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5 Considerações Finais

Pudemos constatar a partir dos resultados dessa pesquisa que apesar das

demandas relacionadas às questões ambientais, não constarem somente da

pauta dos dias atuais, tendo em vista serem oriundas de décadas passadas,

consideramos que, na atualidade, vêm se agravando em função do consumo

excessivo que produz uma quantidade efetiva de lixo na sua grande maioria

destinado de forma inadequada, portanto, promovendo inúmeros prejuízos à

população, principalmente, a menos favorecida, pois além do seu acúmulo

promover desastres ambientais, por poluir rios, lençois freáticos, entre outros

prejuízos ao ecossistema, também estimula o adoecimento pela presença de

vetores, e não viabiliza a necessária qualidade de vida em prol do equilíbrio

ambiental planetário.

Esta afirmação, ganha sustentação com que aponta Schons (2011), em

seu artigo sobre “a questão ambiental e a condição da pobreza”,

Vários estudos têm identificado que os que menos contribuíram e contribuem para o aquecimento global, os pobres, serão mais uma vez os mais afetados por ele porque não têm os recursos materiais e financeiros para se adaptarem e/ou se protegerem dos impactos que a mudança climática vem provocando. Estamos acumulando uma dívida ecológica e social global insustentável que, para além das populações em situação de pobreza do mundo, compromete as gerações futuras (Schons, 2011, p.71).

Outra questão que consideramos ser levantada é a da injustiça social

gerada pela segregação espacial, e este aspecto é muito presente na favela da

Rocinha, sobretudo quando falamos dos serviços públicos a que todo cidadão

tem direito, mas que nesse território, tem inúmeras restrições, pois segundo

Machado (2012):

[...] a lógica que orienta a distribuição desigual dos recursos do sistema urbano e as exteriorizações negativas de equipamentos urbanos permanece. O processo de valorização desigual do espaço foi impulsionado pelo desenvolvimento de novos objetos técnicos que está relacionado à expansão das ideias capitalistas no Brasil. Esses objetos possibilitaram a expansão urbana da cidade do Rio de Janeiro através de eixos diferenciados criando uma segmentação social entre áreas ocupadas pela população mais abastada e áreas destinadas à classe trabalhadora. Essa lógica desigual da produção do espaço urbano gera injustiças sociais. (Machado, 2012, p. 130).

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Mesmo passados quarenta anos, as questões relacionadas à problemática

do descarte inadequado do lixo na favela da Rocinha são reincidentes nos dias

atuais, sobretudo pela deficiência das ações públicas que não dão conta de

atender as reais necessidades locais, pois as valas continuam sendo um ponto

crítico e quando ocorrem chuvas fortes, transbordam causando sérios danos aos

que habitam em sua proximidade, a exemplo do que já aconteciam na década

de 1970, quando para tentar amenizar a situação, os moradores tinham que, por

conta própria fazer a limpeza das valas, conforme material do Jornal do Brasil do

dia 20/03/1978 revela:

Rocinha de pá e picareta faz trabalho do Governo e limpa sujeira das valas Favelados da Rocinha trocaram, ontem, a sinuca, a curtição de um som e a cervejinha no bar, pelas pás e picaretas na limpeza das entupidas valas do morro. “Isto é um passo na luta contra a remoção”, diz o folheto do Grupo Jovem da Ação Social Padre Anchieta, Como Resolver o Problema das Valas? No último Natal, os moradores da Rocinha fizeram reunião na Ação Social e estudaram os problemas do morro. Como, apesar dos quarenta anos de favela, “o Governo ainda não instalou os serviços públicos a que cidadão tem direito - água, esgoto, recolhimento de lixo” -, a limpeza das valas foi considerada prioritária e chamaram a si a tarefa. MUITO LIXO Desde o final do ano passado que grupos de trabalhados se reúnem todas as sextas-feiras, à noite, para estudarem um plano de limpeza das valas. Foram criadas quatro comissões: de pesquisa, que passou questionários de barraco em barraco para saber como o trabalhado deveria ser feito; de fotografia, que permitiu determinar onde o problema era mais grave; a que entrou em contato com a COMLURB para obter o material indispensável, e a que elaborou o folheto de esclarecimento. Até uma música apareceu para animar o trabalho: “Vem, vem, vem? Comigo trabalhar/Vamos limpar a vala/Pra favela urbanizar.” E, os trabalhos começaram no domingo da semana com uma afluência de voluntários que surpreendeu frei José Antônio Echabarri, da Capela Nossa Senhora da Boa Viagem, uma das duas da favela e um dos organizadores do mutirão. E, ontem, a situação se repetiu. O ponto de encontro foi a Vala do Boiadeiro, onde a sujeira existe em maior quantidade. Com as galochas, picaretas, pás, enxadas e carrinhos de mão cedidos pela COMLURB, com água suja e detritos até os joelhos, os voluntários trabalharam das oito às quinze horas, homens, mulheres e crianças. A Vala do Boiadeiro inunda facilmente e a água suja, com detritos de mistura invade as casas. Há sujeira de toda a espécie – colchões, estrados de cama, fogão velho, até geladeira e assento de automóvel. Hoje, como já aconteceu na segunda-feira da outra semana, a COMLURB deve mandar caminhões - há oito dias mandou dez - para recolher o lixo apanhado pelos moradores. Paralelamente ao trabalho voluntário de limpeza das valas, está sendo feita a conscientização dos favelados para que não joguem entulho nas valas, explicou Frei José. E, quando todo o trabalho estiver concluído, a Ação Social Padre Anchieta e a Comissão de Organização do Condomínio do Bairro Barcelos (um grupo de casas da Rocinha) pretende criar grupos de fiscalização para impedir o despejo de lixo nas valas. “As valas existem. Porque não existe saneamento? A Rocinha (cento e vinte mil habitantes) já existe há mais de quarenta anos e o Governo ainda não instalou os serviços públicos a que todo cidadão tem direito: água, esgoto, recolhimento de lixo. Vamos nos juntar para conseguir o saneamento. Isto é um passo na luta

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contra a remoção” diz o folheto do Grupo Jovem (Jornal do Brasil apud Varal de

Lembranças, 1983, p.121).

Diferente de tempos passados, onde a mobilização dos moradores era

frequente em prol da melhoria das condições de vida na favela, conforme

registra matéria acima, atualmente, não foram identificadas iniciativas voltadas

para resolução da problemática do descarte inadequado do lixo, portanto, o que

foi observado foram atividades esporádicas em momentos específicos,

assumidas por alguma instituição local e de forma muito pontual, sem criar a

cultura da continuidade como uma prática socioeducativa.

Entendemos que embora a responsabilidade pela boa ou má gestão

efetiva dos resíduos na cidade é do poder público, no entanto o descarte

inadequado do lixo na Rocinha, vai além dos gestores das políticas públicas,

portanto, acreditamos que o processo deveria ser compartilhado, inclusive,

envolvendo os profissionais que trabalham a questão dos resíduos sólidos e sua

destinação adequada no território, no sentido de viabilizar processos de

esclarecimentos e ações socioeducativas permitindo que a população tenha

clareza do seu papel e que possa além de participar através das melhores

práticas de destinação e também de separação seletiva dos resíduos, fiscalizar e

reivindicar junto aos órgãos públicos, políticas públicas que deem conta desta

demanda, visando assegurar os seus direitos enquanto cidadão, bem como

primar pela melhor qualidade de vida.

Portanto, o que concluímos é que o acesso a bens e serviços para essa

população favelada continua sendo inviabilizado pela deficiência das políticas

públicas que não a apoia no cotidiano, principalmente, pela ausência da

instalação de projetos que no viés socioeducativo possa viabilizar a ampliação

do conhecimento e clareza a respeito das melhores práticas no trato com o lixo

gerado.

Assim, a título de encerrar a nossa análise a respeito do conteúdo

levantado na pesquisa na favela da Rocinha, que teve como finalidade

responder quais as implicações referentes à destinação inadequada de lixo são

promovidas na vida da população residente na favela, arriscamos afirmar que

com certeza, não contribuem para amenizar o maior impacto de poluição na

atmosfera, assim como na promoção da vida, pois o descaso no trato com lixo,

em muito contribuiu ao longo dos anos para o aumento do processo de

adoecimento da população, assim como promove sérios acidentes ambientais tal

qual ocorrido em uma área da favela em 2010 que vitimou de forma fatal duas

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pessoas, além de ter promovido grande deslizamento de terra deixando

inúmeras famílias desabrigadas.

Para tanto, consideramos importante apontar como uma das alternativas

de viabilização de atender o que preceitua a Lei 12.305/2010 e também por ser

socioambientalmente correta no contexto social, à adoção de novas posturas

quanto ao ato de reduzir, reutilizar e reciclar o lixo, o que possibilitará atender as

demandas dos destinatários das políticas públicas, a efetivação da educação

ambiental numa perspectiva crítica objetivando construir novas formas de lidar

com o trato do lixo na favela, uma vez que esta vertente é a que melhor se

conforma na compreensão desta questão, tendo em vista que busca pensar

cada contexto partindo das seguintes situações:

[...] a) efetuar uma consistente análise da conjuntura complexa da realidade a fim de ter os fundamentos necessários para questionar os condicionantes sociais historicamente produzidos que implicam a reprodução social e geram a desigualdade e os conflitos ambientais; b) trabalhar a autonomia e a liberdade dos agentes sociais ante as relações de expropriação, opressão e dominação próprias da modernidade capitalista; c) implantar a transformação mais radical possível do padrão societário dominante, no qual se definem a situação de degradação intensiva da natureza e em seu interior, da condição humana (Loureiro & Layrargues, 2013, p. 64).

Essa linha de pensamento a nosso ver poderá contribuir com a mudança

de hábito da população, bem como instrumentalizá-la para atuar de forma

ambientalmente correta, e cobrar na medida certa ações que efetive a

implantação da política pública de coleta seletiva na favela dentre outras práticas

exitosas que mitigarão em grande escala, o problema de destinação incorreta de

lixo nas favelas e/ou em áreas periféricas empobrecidas, uma vez que traz

subsídios para uma melhor compreensão da conjuntura como um todo, levando

em consideração que a problemática do lixo na favela da Rocinha não é um fator

isolado, muito pelo contrário, está inteiramente interligada a questão das

desigualdades sociais, ambientais, econômicas, entre outras.

Essa vertente da educação ambiental crítica ajuda também, a analisar a

forma de atuação dos projetos, sejam eles socioambientais ou de intervenção

física, os quais quase sempre vêm prontos, não permitindo a participação dos

moradores na sua formulação e não respeitando as particularidades locais de

cada lugar.

Assim, entendemos que para a situação ser transformada, onde os que

mais sofrem as consequências das mazelas sociais advindas do poder do capital

possam ganhar novos contornos, é de suma importância que exercitem sua

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condição de cidadania, expondo suas demandas com clareza do seu papel,

enquanto morador de favela que tem direitos e deveres, assim como, o poder

público possa abrir um canal de escuta efetiva para troca de conhecimento

ancorado nas técnicas necessárias de destinação de resíduos sólidos,

permitindo a busca de alternativas ambientais capazes de atender a realidade da

favela de forma justa, sustentável e ambientalmente correta.

Por este motivo, é necessário que haja ações que tenham como intuito

trabalhar com a classe que dispõe de menor poder aquisitivo, a importância

destes se tornarem cidadãos críticos e conscientes de seus direitos, na busca da

transformação da atual conjuntura, onde quem mais sofre os impactos

socioambientais, é a classe mais exposta aos diversos riscos socioambientais e

urbanos.

Percebe-se que apesar da existência de alternativas para aplicabilidade

efetiva da política socioambiental e sua transversalidade com as demais

políticas, são muitas as questões a serem trabalhadas no que se refere à

geração e destinação do lixo na favela da Rocinha, sendo o descarte

inadequado do lixo, o ponto de partida, a nosso ver, pois está presente em

diferentes localidades da favela e é praticado na sua totalidade, porém os que

habitam as encostas, nos barracos de madeira, são os que correm mais riscos

tanto ambientais como sociais, visto que estão em total situação de

vulnerabilidade, e, na maioria das vezes ficam entregues à própria sorte, sem

maiores conhecimentos a respeito do que deve efetivamente ser realizado para

solucionar o problema.

Torna-se importante para futuras pesquisas, o aprofundamento do tema

trabalhado nesse estudo, levando em consideração a sua complexidade e

importância para a sociedade como um todo, pois apesar das especificidades da

Rocinha, o conhecimento gerado, pode contribuir para compreender a

problemática do descarte inadequado do lixo em outras áreas favelizadas.

Mesmo reconhecendo a importância dessa pesquisa, não podemos deixar

de levar em consideração que a mesma nos proporcionou um conhecimento

relativo e inacabado, uma vez que a sociedade está em constante

transformação, o que implica mudança, em tudo o que dela faz parte. Como

coloca Minayo (2006), a realidade estará sempre aberta para várias direções,

por causa dos novos achados do contexto ou das novas perguntas que serão

formuladas.

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7 Anexos – Documentos Fotográficos

Figura 42- Cesta de lixo antiga identificada na Dionéia. Fonte: Maria Izabel de Carvalho, out. 2015.

Figura 43- Descarte inadequado de lixo em um corredor que fica entre dois prédios na Vila Vermelha. Fonte: Maria Izabel de Carvalho, out. 2015.

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Figura 44- “Laranjões” e ao lado lixo descartado inadequadamente – Estrada da Gávea na altura da Vila Vermelha. Fonte: Maria Izabel de Carvalho, out. 2015.

Figura 45- Lixeira do Caminho do Boiadeiro na saída da Cidade Nova. Fonte: Maria Izabel de Carvalho, nov. 2015.

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Figura 46- Caçamba móvel da Comlurb – Caminho do Boiadeiro na saída da Cidade Nova. Fonte: Maria Izabel de Carvalho, nov. 2015.

Figura 47- “Laranjões” transbordando – Estrada da Gávea na altura do Portão Vermelho. Fonte: Maria Izabel de Carvalho, nov. 2015.

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Figura 48- Descarte incorreto de lixo na encosta – Roupa Suja. Fonte: Maria Izabel de Carvalho, out. 2015.

Figura 49- Descarte incorreto de lixo na vala – Roupa Suja. Fonte: Maria Izabel de Carvalho, out. 2015.

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Figura 50- Descarte incorreto de lixo na encosta – Terreirão. Fonte: Maria Izabel de Carvalho, out. 2015.

Figura 51- Descarte incorreto de lixo na encosta – Terreirão. Fonte: Maria Izabel de Carvalho, out. 2015.

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Figura 52- Lixo descartado incorretamente na encosta sendo queimado – Vila Verde. Fonte: Maria Izabel de Carvalho, ago. 2015.

Figura 53- Ponto de lixo criado pelos moradores na Vila Verde que veio a ser transformado em Chafariz por uma liderança local – ANTES. Fonte: Maria Izabel de Carvalho, out. 2014.

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Figura 54- Ponto de lixo criado pelos moradores Vila Verde e transformado em Chafariz (ainda desativado) por uma liderança local – DEPOIS. Fonte: Maria Izabel de Carvalho, nov. 2015.

Figura 55- Morador varrendo um Beco na Vila Verde. Fonte: Maria Izabel de Carvalho, out. 2014.

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Figura 56- Lixo descartado incorretamente na campanha eleitoral de 2014 – Via Ápia. Fonte: Maria Izabel de Carvalho, out. 2014.

Figura 57- Lixo descartado incorretamente – após dia de chuva na praça junto a Unidade de Pronto Atendimento (UPA) - Vila Verde. Fonte: Maria Izabel de Carvalho, mar. 2016.

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8 Apêndices

8.1. Apêndice 1 – questionário para entrevista com moradores

Sub-bairro: Tel.:

1) Há quantos anos você mora na Rocinha?

2) Você pretende se mudar da Rocinha? ( ) Sim ( ) Não

3) Acha-se responsável pelo lixo produzido por você? ( ) Sim ( ) Não

3.1) Por quê?

4) Como se dá o descarte do lixo produzido na sua casa?

( ) É levado para um ponto de coleta da COMLURB mais próximo

( ) A COMLURB realiza a coleta na minha casa

( ) É descartado no beco, viela ou na rua

( ) É descartado na vala, córrego ou mata

5) Quantas vezes por semana você faz a retirada de lixo de sua casa?

( ) 1 vez por semana

( ) De 2 a 4 vezes por semana

( ) De 5 a 7 vezes por semana

6) Você conhece a dinâmica e as rotas (caminhos) traçadas pela COMLURB

para realização da coleta de lixo na favela da Rocinha? ( ) Sim ( ) Não

7) Você acha que o serviço de limpeza urbana realizado pela COMLURB na

Rocinha é eficiente? ( ) Sim ( ) Não

7.1) Por quê?

7.2) Se não, o que poderia mudar?

( ) Maior número de coleta por dia em cada ponto/lixeira

( ) Implantação de mais compactadoras ao longo de toda a Rocinha

( ) Implantação de papeleiras, postas em pontos estratégicos

( ) Implantação da varrição de rua nos becos e vielas

( ) Implantação de coleta seletiva

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( ) Campanhas educativas

8) Você acha que o poder público é responsável pela coleta de lixo e pelos

serviços de limpeza urbana na Rocinha? ( ) Sim ( ) Não

8.1) Justifique.

9) Você acha que na Rocinha existe descarte inadequado de lixo? ( ) Sim ( )

Não

9.1) Por quê?

10) O que leva parte da população residente na Rocinha a descartar o lixo de

forma inadequada?

11) Quais as principais consequências negativas causadas pelo descarte

inadequado do lixo para a população da Rocinha?

12) Você já vivenciou algum impacto negativo causado pelo descarte

inadequado do lixo na Rocinha? ( ) Sim ( ) Não

12.1) Se sim, discorra sobre o fato.

13) Você conhece alguém que já tenha sofrido de alguma doença transmitida

por vetores ligados ao descarte inadequado do lixo (moscas, baratas, ratos,

mosquitos, etc.)? ( ) Sim ( ) Não

13.1) Se sim, quais?

( ) Leptospirose ( ) Dengue ( ) Diarreia ( ) Outras _____________

14) Você conhece algum projeto voltado para a educação ambiental,

desenvolvido na favela da Rocinha? ( ) Sim ( ) Não

14.1) Se sim, quais os projetos e qual a sua opinião em relação a

aplicabilidade desses?

15) Você já participou de algum projeto voltado para a educação ambiental na

Rocinha? ( ) Sim ( ) Não

16) Você acha que deveria haver projetos de educação ambiental na Rocinha?

( ) Sim ( ) Não

16.1) Por quê?

17) O que os moradores fazem quando ocorre o descarte inadequado do lixo em

suas portas, becos, vielas ou nas ruas?

( ) Fazem canteiros de plantas nos espaços livres

( ) Colocam avisos pedindo para não jogarem lixo naquele local

( ) Levam o lixo que foi descartado indevidamente para a lixeira

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( ) Deixam o lixo que foi descartado indevidamente no local até que outa

pessoa o leve para a lixeira

( ) Varem o seu beco, viela ou rua, distanciando o lixo da sua residência

( ) Varem o seu beco, viela ou rua, recolhem o lixo e o leva para a lixeira

18) Há diferença em relação ao descarte inadequado de lixo entre os sub-

bairros da Rocinha? ( ) Sim ( ) Não

18.1) Se sim, discorra sobre.

19) Como você ver a problemática do descarte inadequado de lixo na Rocinha?

( ) Como um problema decorrente da ausência de políticas públicas

eficazes

( ) Como um problema ligado a falta de educação por parte da população

( ) Como uma questão cultural

( ) Como falta de conhecimento por parte da população

( ) Como uma forma de chamar a atenção do poder público para o problema

20) Na sua opinião, qual é a solução para resolver o problema do descarte

inadequado de lixo na Rocinha?

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8.2. Apêndice 2 – Roteiro para entrevista com garis

1) Você mora na Rocinha ( ) Sim ( ) Não

2) Você acha que na Rocinha existe descarte inadequado de lixo? ( ) Sim ( )

Não

2.1) Por quê?

3) O que leva parte da população residente na Rocinha a descartar o lixo de

forma inadequada?

4) Na sua opinião, qual é a solução para resolver o problema do descarte

inadequado de lixo na Rocinha?

5) Você já vivenciou alguma situação de descarte inadequado de lixo que

chamou muito a sua atenção? ( ) Sim ( ) Não

5.1) Se sim, discorra sobre.

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8.3. Apêndice 3 – Termo de consentimento livre e esclarecido

O presente termo em atendimento à Resolução CNS 196/96, destina-se a

esclarecer ao participante da pesquisa intitulada “A favela da Rocinha e a

destinação inadequada de lixo: entendendo os meandros da questão”. A

pesquisa se dará sob a responsabilidade da pesquisadora Maria Izabel de

Carvalho, aluna do curso de Pós-Graduação do Departamento de Serviço Social

da PUC-Rio, ressalvando os seguintes aspectos:

Objetivo: analisar a problemática do descarte inadequado de lixo promovido por

parte da população da Rocinha.

Metodologia: realizar-se-á pesquisa de campo através de roteiro e de

questionário, com o objetivo de apreender as percepções dos entrevistados

sobre a problemática do inadequado descarte do lixo na favela da Rocinha,

analisando os resultados da entrevista.

Justificativa e Relevância: faz-se necessária a pesquisa sobre o descarte

inadequado do lixo na Rocinha, porque permitirá ao público acadêmico e aos

demais interessados na temática, ter acesso às informações atualizadas a partir

dessa pesquisa, que não encontramos anteriormente. Assim sendo, para a

academia será de grande contribuição, tendo em vista que permitirá que outros

pesquisadores possam partir dos dados desse estudo, para aprofundar ou

propor novas metodologias de recolhimento de resíduos sólidos na favela, o que

muito contribuirá para diminuição dos riscos ambientais existentes. Ainda que

não tenhamos diretamente essa pretensão, esse estudo também poderá apontar

possíveis soluções para a problemática do inadequado descarte do lixo na favela

da Rocinha.

Confidencialidade do estudo: o estudo dar-se-á na favela da Rocinha e os dados

serão compilados pela pesquisadora. A identidade dos voluntários participantes

será preservada. Os entrevistados, quando citados no estudo, serão nomeados

por iniciais de seus nomes.

Garantia de esclarecimento: os voluntários participantes terão todas e quaisquer

formas de esclarecimento e informações sobre a pesquisa, dúvidas, bem como

da metodologia da pesquisa adotada a todo e qualquer momento.

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Participação Voluntária: A participação dos sujeitos da pesquisa no projeto é

voluntária e livre de qualquer forma de remuneração e que o mesmo pode retirar

seu consentimento em participar da pesquisa a qualquer momento.

Consentimento para participação: eu estou de acordo com a participação no

estudo descrito acima. Eu fui devidamente esclarecido quanto os objetivos da

pesquisa e aos procedimentos. Os pesquisadores me garantiram disponibilizar

qualquer esclarecimento adicional a que eu venha solicitar durante o curso da

pesquisa e o direito de desistir da participação em qualquer momento, sem que a

minha desistência implique em qualquer prejuízo à minha pessoa, sendo

garantido anonimato e o sigilo dos dados referentes à minha identificação, bem

como de que a minha participação neste estudo não me trará nenhum benefício

econômico.

Eu, _____________________________________________________________

Aceito livremente participar do estudo intitulado “A favela da Rocinha e a

destinação inadequada de lixo: entendendo os meandros da questão”,

desenvolvido pela pesquisadora Maria Izabel de Carvalho, orientador desta

pesquisa para o trabalho Dissertação de Mestrado.

Mestranda: Maria Izabel de Carvalho

Professor (a) Orientador (a): Prof.ª. Drª. Valéria Pereira Bastos

Contato do Departamento de Serviço Social da PUC-Rio: (21) 3527-1290

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