marcelo neves - pesquisa interdisciplinar no brasil - o paradoxo da interdisciplinaridade (1)

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R l R454 · ----- Revista do lnstituto de Renneneutica Juridica vo l. J, n. 3 -Porto Alegre: Ins titulo de Henneneutica Juridica, 2005 v. ; 16 x 23 em. Anual l. Hermeneutica jurldica. 2. lnstituto de Henneneutica Jurldica. ISSN J 678-1864. Direito CDU: 34(05) CIP- Catalogac;ao na fonte: Paula Pcgas de Li ma CRB 1 0/J 229 ISSN 1678 -186-l- REYISTA DO INSTITUTO DE HERMENEUT ICA JURi DI CA , ' r CRITICA A DOGMATICA DOS BAN COS ACADEMICOS A PRATICA DOS TRIBUNAlS Andre Copetti Eros Roberto Grau Friedrich Muller Jacinto Nelson de Miranda Coutinho Jose Luis Bolzan de Morais Lenio Luiz Streck Leone! Pires Ohlweiler Luis Alberto Warat Luiz Antonio Rizzatto Nunes Marcelo Campos Galuppo Marcelo Neves Margarida Maria Lacombe Camargo .. · Rogerio Gesta Leal Tercio Sampaio Ferraz Junior Vicente de Paulo Barretto Porto Alegre, 2005

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R454

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Revista do lnstituto de Renneneutica Juridica vol. J, n. 3

-Porto Alegre: Ins titulo de Henneneutica Juridica, 2005 v. ; 16 x 23 em.

Anual

l . Hermeneutica jurldica. 2. lnstituto de Henneneutica Jurldica.

ISSN J 678-1864. Direito

CDU: 34(05)

CIP- Catalogac;ao na fonte: Paula Pcgas de Lima CRB 1 0/J 229

ISSN 1678-186-l-

REYISTA DO INSTITUTO DE HERMENEUTICA JURiDICA

, ' r

CRITICA A DOGMATICA DOS BAN COS ACADEMICOS A PRATICA DOS TRIBUNAlS

Andre Copetti

Eros Roberto Grau

Friedrich Muller

Jacinto Nelson de Miranda Coutinho Jose Luis Bolzan de Morais

Lenio Luiz Streck

Leone! Pires Ohlweiler

Luis Alberto Warat

Luiz Antonio Rizzatto Nunes

Marcelo Campos Galuppo Marcelo Neves

Margarida Maria Lacombe Camargo

.. ~

· Rogerio Gesta Leal

Tercio Sampaio Ferraz Junior Vicente de Paulo Barretto

Porto Alegre, 2005

cRITIC" A oooMATIC.a.

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PESQUISA INTERDISCIPl.INAR NO BRASIL: 0 PARADOXO DA INTERDISCIPliNARIDADE.

Marcelo Neves··

Quando se trata boje de pesquis imerdisc1p ' ar, pode-seperceber que, entre os pesquisadores des diversos cum a er, ha como gue urn discur­so quase consensual de _;we a interdisciplinaridade e importante e, de certa maneira, indispensavel ao desenvolvimento da ciencia, teoria e pnitica. Isso tambem vale no ambito do direito. Num certo sentido, a interdisciplinaridade afl!a como urn valor e, pottanto, e amplamente agregadora. 0 problema e que, quando se procura operacjonaljzar ess~ valor sur em serias divergencias e incon uencias a respeito do que significa a r6 · interdisci lina · como tom& Ia ule'>'BAte pa~a a~: diveriai di~:cipli"Aali eAYeh•ieas. As diferentes cidadelas do saber tendem, entao, a defender os seus metodos, conceitos e pretensoes de validade, passando a ver a interdisciplinaridade como urn mero

. instrumento de afirmac;:ao de suas exigencias, nao como urn horizonte de seus limites e possibilidades. E como o valor ' paz'. Por exemplo, Sharon e Arafat, ou melhor, o govemo de Israel e a Autoridade Palestina, declaram ser plena­mente a favor da paz, mas, quando se trata de operacionalizar concretamente

·· · ilma proposta de paz, os flancos lutam ferozmente na defesa de seus interes­·.{}es. A guerra na defesa da soberan.ia ou da autonomia passa a ser vista como

:o rneio da paz. Assim como se pode falar de um para de dificil tambem se pode falar de um xo da interdisciplinarida

vontVeJrQ'encia em tome de sua relevancia, emesmo m 1spensa tlida e, o exclui problema da dificuldade de sua operacionalizac;:ao em face da pretensao de

proferida no Workshop Legal Educarion in lAtin America, promovido pel a Escols de •M!>Ji'!l-''trelllnde Sao Paulo da Funda~iio Getulio Vargas, em 12 e 13 de dez.embro de 2003.

da Escola de Dtrcito de Sao Paulo d11 Fundapo Oetullo Vargas (FGV). LIVre­teem Direito {Fribourg) . P6s-Doutorado em Direito (Frankfurt c London).

207

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I E

I. '

CR(TJCA A DOGMATICA

autonomia das di versas disciplinas e mesmo por for9a de tendencias ao imperi­alismo disciplinar.

Nesse comentario, pretendo fazer algumas breves considerar;oes sobre as d ificulciades de supsra~ao desse [email protected] considerando os proprios limites da co~reensao adequada do conceito de interdisciplinaridade, especialmente no caso da pesquisa juridica no Brasil. Em primeiro Lugar, abordarei a c~fus~o de mterd1sciplinaridade j uridica com encic · · · · (II). Num segun· do momento, tratare1 a con sao de interdisciplinaridade com im erialismo dj.s.ciplinar (HI) . Em seguida, apontarei para o risco e con undir-se interdis· ci.e.linaridade com metadisciplinaridade (lV). Com base nessas cons1derayoes, procurare1 deli nil a inletdiS'Clphnandade juridica como espa9o de comuta~iio discursiva entre diversos campos do saber juddico (V). Por fim, farei uma breve referencia ao problema dos limites da pesquisa juridic a interdisciplinar no Br~sil em face da propria fragilidade das fronteiras do campo juridico {VI).

(J

isco ue ronda a pretensao de pesquisa juridica interdisciplinar no Brasil e com nd~ -Ia c o e · ' · · ' · . A interdisciplinaridade si~­ficaria urn somat6rio de conheciment ssa ten enc1a, que remonta a influencia da tradi9ao ibero-americana de ensino e estudos j uridicos no Brasil, esta intimamente relacionada com o chama~o ~ charelismo ' no ambito do qual urn generalismo no sentido do conhec imento a~ de varias esferas das ciencias e das humarudades era super:stima· do. Conhecimentos de economia, psicologia, ciencias sociais, filosofia, htera~­ra, matematica, etc. sobrepoem-se num amontoado de infonnayoes quanll­tativamente impresswnantes, como se tudo isso pudesse levar a uma melhor compreensao do direito e dar-lhe maior relevancia social. 0 que decorre dess.e modele enciclopedista, tao conhecido entre nos, e urn s~erficiatismo g~nerah· z~e pouca relevancia pratica e pouco significado teorico para as d1yersas areas do saber. Portanto, deve-se, parece-me, de antemao, distinguir clara· mente enciclopedismo juridico de interdisciplinaridade referente ao dircito,

m

Urn outre risco que o discurso da interdisciplinaridade pede tomar invisi· vel refere·se ao fa to de que, em seu nome, venham a desenvolver-se apenas

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NEVES, Muccio. Pcsquiso lntcrdHciplrnor ..

fQ...rmas de imperialismo disciplinar no ambito do direito. Esse nao e urn proble­ma exclusivamente brasileiro, ele ronda as faculdades de direito tambem nos chamados paises deseRvolv:ilies. Assim e que, por ex.emplo, muJtas vezes, un­plicita OU expJicitamente, SQb 0 rotulo da interdiscipJinaridade, superestiiTja-se 0

pa e] da amilise ec sobretudo sob a formula aparentemen-te interdisciplina " aw an con om · ", pretende·se subordinar os criterios do direito a uma racionalidade puramente economica. N~se caso, pleiteia.;Se, por assim dizer, uma "economic jurisprudence'' QUe desconhece qua!Qu.er racionalldade juridica especifica. Ou seja, nao se trata de uma intermedjayao de racionalidade econ6m1ca e racionalidade juridica, em favor de uma pnitica juridica mais adequada economicamente, mas sim de "imperialismo economi­co" ou colonizayao economica do direito.

Mas nao s6 no concernente a economia podem·sc observar certas ten­dencias no senti do de, sob o r6tulo da interdisciplinaridade, promover o imperi­alismo disciplinar. Tambem com relayao a analise politics do direito, ha uma forte tradiyao de considerar o direito urn epifenomeno do poder ou ideologia politica, pleiteando uma ''political jurisprudence". s· ' tradiyao manifestaram-se, por ultimo, no movimento" 'tical legal studie ". ~ao_se trata nesse caso de intermediar a 16gica QQ poder e a ]Oi!Ca do dj rejtQ .. em busca de uma pratica juridica politicamente satisfat6ria, mas s jm de "imperia­lismo politico" ou colonizar;ao politica do direito.

Por fim, cabe advertir certas tendencias da sociologia j uridica de, retensao a arentemente interdisci linar, transfonnar o conhecimento

'ol6 ico do direito em adrao ultimo da ratica uri . n rna -~--· e~ ecie de "sociolo icaljurisprudence". Em vez de uma intermediayiiO ·::··interdisciplinar entre sociolog1a e ogmatica j uridica ou na fonnade "Law . and Society", trata-se, nesse caso, de " imperialismo sociologico" ou colo­

;· niza91io social do direito . Em todos esses casos, subjacente um modelo teorico que niio leva a

seno a complexidade social, desconsidera-se a propria diferencjacao do di.reito c9..mo campo de ayoes e vivencias dentro sociedade, sustentando-se u~a _d.c:sdjferenciacriio economica, politica ou social do direito, Disso decorre que a dogmatioajuridica como campo de saber destinado especificamente a auto­reflexao do direito, no ambito da qual,, com relevancia pnhica, procuram-se

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7

CrtfTICA ).. OOGMA1'1CA

definir "as condi<(oes do juridicamente possivel"'' e considerada algo presctndi­vel ou, no minima, de pouca relevancia. Isso porque nao se reconhece qualquer 16gica ou pretensao de racionalidade propria da esfera juridica. Mas a imprescindibilidade de urn a dogrmitica juridica interdisciplinarmente sensivel implies que esta tenha de teruma postura altamente seletiva em face das exi­gencias e dos conhecimentos economicos, politicos e socio16gicos que preten­dem ter validade no campo juridico. ~e fosse prescindivel, sob pretexto da interdisciplinaridade, a seletividade, pel a propria dogmatica juridica como es a-r; ~ e exao do · ectment~~onomJ.cc;>s,

P.Oliticos o sociol6 icos veis ta ' a-es dedi~ E e claro que nao .e isso que se pTetende aqui.

IV

1 LUHMANN, Niklas. Rechtssyslem und Rechtsdogmatik. Stuttgart: Kohlhammer, 1974, P·.19· No mesmo sentido, ver FERRAZ JR,, Tercio Sampaio. Funr.iio social ria dogmatlcajurldtCD· S3o Paulo: Revista dos Tribuna is, 1980, p. 99 e ss.

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NEVES, M1rcc lu. Ptrqul!D tllr.olisclpl•nur.

• it • ' • , ("d . b . ..~ . -== dtzer, autontana e Q!ma paraatxo ~ - mo esses d!~J'S<)S'caJnpOS de· vemdefinir os seus limites e relacionarem-se uns com os outros. Desconhece­s~. dessa maneira, que os diversos campos observam os problemas e procuram soluciona-los de acordo com seus pr6prios criterios, traduzindo, com base nes­tes, a linguagem de outras esferas na sua propria linguagem, do que resulta a emergencia de novos sentidos. Isso nao 6 diferente como direito e as diversas disciplinas que dele se ocupam. Nessas coodiyiSes, nao cabe confundir interdisciplinaridade com metadisciplinaridade: o resultado seria a esterilidade ret6rica do metadiscurso controlador.

" Fica a pergunta: como enfrentar e su erar o paradoxa da interdisci.

plinaridade sem cairnos falsos caminhos do enciclopedtsmo, o n~!.!!li-Smo disciplinar au dametadisciplinari d.a.de? Sem duvida, a interdisciplinaridade im­poe-se em face da relar;ao problematica entre as esferas de saber e da neces­sidade de aprendizado reciproco.lsso nao e diferente com relaylio ao direito. Mas qualquer pesquisa interdisciplinar deve pressupor a pretensao de autono­mia dos respectivos campos do saber envolvidos na pesquisa, cada um deles observando os problemas e oferecendo-lhes solur;oes de acordo com criterios pr6prios. l;{essa perspectiva a jnterdisciplinaridade niio surge para negar a ~utonomia discmlum :, easoaea ~~ necessidades e racjonalidades pr6prjas dos rernectivos camQQi_do saber, mas sim ~:na fudj 5car-lhe:.....EEtretanto, ao forta -1~~ a autonomia, busca facilitar a compreenslio reciproca dos discursos en­volvidos, em pnnc1pto hemuhicos e opacos uns para os outros. Pode-se dizer que a tnferdtsciplinaridade emerge naquele espayo urn tanto instavel e fluido em que urn discurso disciplinar, em bora insistindo na respectiva autonomia, tenta compreender outre discurso ou se fazer compreensivel por ele. M.as isso nao.e

·:. tao simples. Na interdisciplinaridade , a linguagem pr6pria de um campo do sa~ ·:: · ber, por exemplo, a economia, e traduztda n_::;._l~ntt~~~-P.!2I?Dul..Q..!l.utrom­:,:~· JfQJ)or exempla;i0'6ogmatiell jt:1riG«:a. Tal tradu<(ao e feita de acordo com os .:· criterios do-campo em que a linguagem advinda do outro campo pretende ter ·:"·relevancJa. AqUl cabe lembrar o proverb\O "lTadutton, tradittori"-. ----

Em outras palavra a interdisciplinaridade e urn espar;o iluido e instavel 1. · de scursiva. ela, o sentido originario de um discurso atravessa

um ttansfonna orpar:a ser compreendido e ganhar sentido no ambito de um

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I HITIC.A A DOGMATICA

outro discurso. Nesse sentido, a interdisciplinaridade pennite que a linguagem econ6mtca, politica ou sociol6g1ca seja compreendida e ganhe sentido no ambi­to da dogmatica juridicae vice-versa. lsso forti fica a adequavao reciproca e uma certa cooperayao num ambiente de conflituosidade disciplinar, sem que as respeclivas pretensoes de autonomia sejam negadas, Ao contrario, com s interdisciplinaridade como transfonnador entre diversos discursos sabre o di­reito, as diferentes esferas de saber enriquecem-se conceitualmente e tendem a ganhar uma maier capacidade na solur;:ao dos problemas que se lhes apres:n· tam. Uma dovnatjca Juridtca dispos~a ahrir .. 5e iuterdiscip~nnente aos tn·

fluxes efs""pressoes advindas da analise econ6mica, politica ou sociol6gtcTl:lo dire1t0, e mesmo aquelas eeeocrentes ~ reflexao filos6fica do at ret to, tende a te ma maJOr capacidade te6rica e pratica de enfrentar os problemas que se Jhe apresentam eo cer so ur;:oes mais apropna s os mesmos do que ~m modelo formalista, msensivel a mterdtsciplinaridade. 0 mesmo va ~do o osto: a analise economica, polittca e socto ogica e mesmo a reflexao filos6fi­ca o an o mats ncas concettua men e e mats m-nrretltes na ptati­

guanto m·ais elas forem capazes de tra uzn ou cornu ar nas soas tin ns mediante o transformadorda interdiscipimandaae,a-linguagemda @gmatica juridica. Em suma, a interdisc1p m nn1 ~que a mguagem de urn campo de saner seja traduz1da e, portanto, compreendtda em outre cam­po de saber, tornando-a praticamente relevante neste campo. Em todo caso, cabe considerar que as fronteiras dos diversos dominies do saber devem ~star definidas . Nao ha in terdisciplinaridade sem autonomia disciplinar, mas s1m a miscelanea resultante de urn ecletismo esteril.

De certa maneira, pode-se dizer, usando a ,Jinguagem d teo ria dos si """ · · · · · · · a a es eci fica ento ~que

e~trulural entre duas disciplinas, haven do varias interdisciplinaridade~, confo~~ me os cam ~A flpher o e se relacionam, como, por exemplo do attca ~r dica e analise economica do dire ito OU ogma ICa JUO IC~ e ~g1~1ca. -~~~~~~~~""~~~~~~~~~~--- mo E'ialmphca uma mfluencia concentrada entre as esferas do saber e, ao mes

· d ~ d · fl - · l indo umas e tempo, uma forte seletiv1da e em tace as tn uenc1as, exc u . . viabilizando outras. Mas, como forma de acoplamento estrutural, a interdJscl­plinaridade facilita interpenetrac;:oes sem aringir a autonomia operacional dos respectivos campos do saber, antes as fortificando. .

· Se pretendessemos [alar de urn metadiscurso interdisciplin.ar roaiS

abrangente, eJe Jimitar-se-ia a maxima elementar de que OS diverS OS dlscursOS

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I.JEVES, M•rcdo 1'uyu1Ju •M<r<lmipl•nt>r . •

devem respeitar-se reciprocamente, sem imporem a sua raciooalidade especi­fica a rase· . e de urn u Isso eo que o fil6sofo alemao Wolfgang ~lsch1 chama de ' azao transvers " : ela nao vern de cima, impon­do aos di sos Jscursos uma su · a idade, mas, ao observar a preten­sao de autonomia e racionalidade particular dos diversos discursos, sugere­lhes transversalmente o respeito eo aprendizado reciprocos. Sendo assim, a razao transversal da interdisciplinaridade rejeita tanto o "imperialismo discipli­nar" quanta o "autismo disciplinar" com relar;:iio ao direito.

VI

Para concluir, gostaria de lembrar que, no caso brasileiro, o exito da pesquisa interdisciplinar com relac;:lio ao direito complica-se sobremaneira por forc;:a da propria fragil idade das fronteiras do campo juridico. A deficienci,Ua atj.tonomja do di~ dificulta a distinc;:ao, com relevancia pnitica, entre auto­observar;:ao juridico-dogmatica e hetero-observa iio economica, sociol6 ic politica do djrejto Isso implica uma sobrecarga para a dogm hcajuridica, en-' • 'canegada sobretudo de refletir as fronteiras do direito, ou seja, a sua identida- : de. Ao c ia ocorrido no co~texto de rule.ofl~w da E4ropa.\· Ocidental e a-se amda no Bra a e di erenciar o campo juridico na fronteira de output (adequa~ao socjal). mas / ta~em e, sobretudo, de diferencici-lo na f · · · 4

• • ' •

qica ou

fOJ£as sociais ex.ercem nesta frontej ra3 Dai result a mva tentat;:ao peonanente .. .: de subordinar muitas vezes em nome !la itltcl'9i&;if!liflas:idade. o conhecimento :\. e;j;ecificame~te jiiridico-dogmatico a analise ecpnOmica, a as esh1dos &aeielo­·~· gicos ou aos modelos polmco-ideol6gicos. Tal tentar;:ao parece-me apontar na ;; contramao da ntstona, porque leva anegar;:ao da complexidade social e da

:.~,; necessidade de definir com maior clareza as fronteiras do campo juridico. A ~.~~ fortificayi!.o da pesquisa interdisciplinar no Brasil depende paradoxalmente de

1 WELSCH, Wolfgang. Vernunft: Die zeitgenossische Vemunfikritik und das Konzept der trans­

Verso len Vermmfi. 2. ed. Frankfurt am Main: Suhrkamp, 1996; __ . Gesellschafl ohne Mela­Ertiihlung7 In: ZAPF, Wolfgang (Hg.). Die Modernisienmg moderner Gesellschafien: Verhall· dlungen des 25. Deulschetl Soziologen.toges in Frankfurt am Main 1990. Fran1<fur1 am Main; New York: Campus, 1991 , p. 174-184.

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CRITICA A OOGMATICA

uma m~or delimitar,:ao p,peracional da esfera juridica, o que implica o fortale­cimento da autonomia disciplinar da dogmatjcajuridica como plano de auto­reflexao do direito com relevancia pnitica. 0 resto e camaval juridico, com suas belas alegorias cheias de reverberayoes eloquentes, sem pratican1ente nenhum significado para a pratica nem para o desenvolvimento juridicos.

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chriftfiir Neuere Rechtsgt!:rchichte, 12, Wien, Man2., 1990, p. 1·13, 5.

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0 PRINCiPIO DA PROPORCIONALIDADE SOB UMA

PERSPECfi VA HERMENEUTICA EARGUMENTATIVA

Margari da Maria Lacombe Camargo'

1 INTRODU~AO

Ap6s a irrupyiio de uma crise no Direito, experimentada pelo interven ­cionismo estatal da segunda metade do seculo XX, que niio media esforyos<em regulamentar to doe qualquer aspecto da realidade e da vida social, notadamente as relay5es economicas, o Estado foi chamado a Jegitimar seus atos cada vez mais presentes na vida diaria dos cidadaos. Por isso, o Poder JudiciArio se viu cada vez mais envolvido com quest5es de ordem tecnica, estranhas aos Jimites ~teen tao estabelecidos pel a dogmatica juridica, ao rnesmo tempo em que o mcremento do exercicio da cidadania, eo crescimento da consciencia demo­cratica, passou a exigirque as iniciativas do Govemo, pormais especificas que foss em, encontrassem fundarnento nos direitos consagrados constitucionalmente, de forma a garantir sua legihmidade. 0 Poder Judiciirio reassume entao o ~ape! de guardiiio da Constituiyao , i.nvalidando todo e qua! ~uer ;to mfraconstitucional que viesse a agredir seu texto, ou os valores nela guameci­d?s·. Tal instancia de controle, a seu turno, fortalece o aspecto objetivo dos d1re1tos fundamentais que, pel a sua forya irradiante, passam a garantir o liame

' de senti do capaz de unificar a ordcm juridica positiva, controlando os efeitos · ~ai decorrentes. 0 relevo dado, por conseguinte, a jurisdi~ao constitucional,

vem alterar substancialmente o equilibria entre os poderes, atingindo especial-a soberania popular expressa na representa9iio politica parlamentar, por

sua vez incapaz de representar os d1versos interesses cad a vez mais presentes

'Doutor em Direito (UGF). Mesrre em Direito (PUC/RJ). Coordenadora e Professora do de P6s-Gradua,.:iio em Direito da Un1versidade Gam a Filho (RJ). Professor a Adjunte

Faculdade Nacional de Dinito da Universidade F'ederal do R10 de Janeiro (RJ). Pesqu1sador.l Casa de Rui Barbosa (RJ).

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