luiz jean lauand o xadrez na idade média

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Page 1: Luiz jean lauand   o xadrez na idade média
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Luiz Jean Lauand

O Xadrez na Idade Média Prefácio de Herman Claudius

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Page 3: Luiz jean lauand   o xadrez na idade média

CONTRA-CAPA

A imaginação medieval soube encontrar no xadrez não só o fascínio pela engenhosidade das manobras e

problemas (muitos deles autênticos desafios para o enxadrista de hoje), mas também uma base para

alegoricamente descrever e criticar a sociedade da época. O Xadrez na Idade Média apresenta ao leitor

contemporâneo estudos introdutórios e textos, como o Libro del Acedrex de D. Alfonso o Sábio - o primeiro

tratado clássico escrito no Ocidente -, que permitem uma melhor compreensão da sociedade medieval como

também na história de algumas das idéias fundamentais dos problemas de xadrez.

Próximo lançamento

A Dança do Sozinho

O Xadrez na Idade Média

Coleção Elos Dirigida por J. Guinsburg

Equipe de realização - Revisão: Cristina Ayumi Futida; Produção: Plinio Martins Filho.

obra publicada em co-edição com a

EDITORA DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

Reitor: José Goldemberg

Vice-reitor: Roberto Leal Lobo e Silva Filho

COMISSÃO EDITORIAL

Presidente: José Carneiro. Membros: Antônio Brito da Cunha,

José E. Mindlin, Luiz Bernardo F. Clauzet e Oswaldo Paulo Forattini.

Page 4: Luiz jean lauand   o xadrez na idade média

Luiz Jean Lauand

O Xadrez na Idade Média Prefácio de Herman Claudius

EDITORA PERSPECTIVA EDITORA DA UNIVERSIDADE DE SAO PAULO

Dados de Catalogação na Publicação

(CIP) Internacional (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Lauand, Luiz Jean, 1952-L388x O xadrez na Idade Média / Luiz Jean Lauand. — São Paulo:

Perspectiva: Editora da Universidade de São Paulo, 1988. (Coleção elos; 47) 1. Civilização medieval 2. Xadrez - História I. Título.II. Série: Elos; 47 88-1159 CDD-794.10902

índices para catálogo sistemático: 1. Idade Média: Xadrez: História 794.10902 2. Xadrez: História medieval 794.10902

Elos 47

Direitos reservados à

EDITORA PERSPECTIVA S.A.

Av. Brigadeiro Luís Antônio, 3025 01401 - São Paulo –

Brasil Telefones: 885-8388 / 885-6878 1988

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Para Rosa, João Sérgio, e Jan, naturalmente!

SUMÁRIO Prefácio - Hermann Claudius van Riemsdÿk

Introdução

1. O Xadrez na Idade Média

2. As Regras do Xadrez na Idade Média

3. Jogando o Xadrez Medieval: Alguns Exemplos

4. A Literatura Enxadrística Medieval

4.1. As Obras Didáticas: o Poema de Deventer

4.2. As Obras Morais

Moralitas de Scaccario

4.3. Coleções de Problemas

5. O Libro del Acedrex de Alfonso

5.1. Introdução

5.2. Libro del Acedrex de D. Alfonso o Sábio

6. O Problema de Xadrez na Idade Média

Introdução

6.1. Problemas Medievais que Não Pressupõem Regras Diferentes das Atuais

6.2. Problemas especificamente Medievais

Page 6: Luiz jean lauand   o xadrez na idade média

PREFÁCIO A Biblioteca Nacional possui uma raridade: um dos dois exemplares existentes do Arte Breve y Introducción

Muy Necesaria para Saber Jugar el Axedrez... do espanhol Lucena. O outro exemplar encontra-se no British Museum

e esta obra, provavelmente de 1497, é considerada uma das mais antigas da Europa sobre xadrez. Cita-se também,

entre os livros antigos, o Libre del Jochs Partitis del Scachs Enombre de 100, per Francesch Vincent, impresso em Valença

com a data de 15 de maio de 1495, mas não se conhece nenhum exemplar existente, supondo-se que o último (e

único?) tenha perecido no incêndio do Mosteiro de Montserrat, próximo de Barcelona, no ano de 1834. Digno de

menção é também o Guldin Spil do mestre Ingold, que foi escrito em 1432-33 e impresso em 1472 em Augsburgo

(reimpresso com o título Das goldene Spiel em Estrasburgo, no ano de 1892, por Schrõder).

Altair de Souza publicou em dezembro de 1974, no Rio de Janeiro, um fac-simile da obra de Lucena, na

realidade o segundo volume - referente ao xadrez - do Repetición de Amores & Arte de Axedrez con CL Juegos de

Partido, editado em Salamanca (juegos de partido é o que hoje denominamos "problemas").

Afora essa reprodução e a coincidência da existência desse raro volume na Biblioteca Nacional, desco-

berta pelo jogador e historiador Heydebrand von der Lasa — autor do célebre Handbuch — quando de sua visita

ao Brasil, pouca atenção foi dada em nosso país à história do xadrez (Idel Becker em seu Manual de Xadrez dedica

quatro páginas ao assunto).

A presente obra do Prof. Luiz Jean Lauand extrapola, pela razão exposta, o seu próprio e inegável valor,

para tornar-se pioneira numa relegada faixa da literatura enxadrística no Brasil.

Foi no fim da Idade Média, já com cheiro de Renascença, que o xadrez moderno encontrou a sua forma

atual e por isso a abordagem do xadrez medieval é tão importante para uma melhor compreensão de sua história.

A ênfase nos textos de Alfonso X o Sábio, também é feliz, pois trata-se de um verdadeiro inventário, ini-

ciando a tradição da grande literatura nova do xadrez e avalizando um jogo que havia sido proibido há menos de

30 anos por Luiz IX, rei da França.

É notável observar como muitos dos problemas medievais ainda mantêm interesse para o solucionista

atual. Como exemplo curioso, aponto o problema da página 113, uma verdadeira "antecipação" (um problema é

dito "antecipado" quando um problema idêntico ou muito análogo foi publicado anteriormente, por isso ao divul-

gar-se o resultado de um concurso de problemas, dá-se geralmente um certo tempo — por exemplo três meses

— para permitir a descoberta de eventuais antecipações, 14 antes de considerar-se o resultado como definitivo).

No exemplo, o problema de W. A. Shinkmann foi antecipado em centenas de anos pelo problema medieval.

A oportuna seleção e apresentação do xadrez medieval e de seus problemas pelo medievalista Lauand é obra de

valor que será acompanhada com interesse e prazer pelos leitores.

Herman Claudius van Riemsdÿk

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INTRODUÇÃO Pretendemos com este livro oferecer ao leitor brasileiro um breve contato com as origens do xadrez no

Ocidente.

Para isto apresentamos a tradução, comentário e notas a um texto que foi, na sua época, o principal tra-

tado europeu sobre o assunto: o Libro del Acedrex1, de D. Alfonso o Sábio, escrito em 1283, junto com uma

seleção de problemas de xadrez desse livro. Recolhemos também duas pequenas amostras de literatura

enxadrística medieval: o poema de Deventer e a Moralitas de Scaccario (ambas de autoria incerta).

Nosso trabalho não tem pretensões de originalidade: há muito boas histórias do xadrez, sobretudo a

clássica obra de Murray2, fartamente documentada, de que tantas vezes nos valemos neste pequeno livro.

Não é nosso objetivo fazer xadrez feérico ou alternativo, mas prestar uma contribuição — pequena e mo-

desta — à divulgação da história do xadrez propriamente dito: daí termos dado destaque aos problemas

enxadrísticos medievais que, por suas circunstâncias, são idênticos aos atuais. E, também por essa mesma razão,

procuramos mostrar como algumas idéias do xadrez de hoje já estão presentes na Idade Média.

Por isso, em alguns casos, comparamos os problemas medievais com os de uma recente antologia dos

melhores problemas do xadrez contemporâneo3.

Para a compreensão deste opúsculo não há outros pré-requisitos que os mínimos conhecimentos do

xadrez atual.

A idéia de tratar do xadrez medieval surgiu no curso de História da Educação Medieval que, em colabora-

ção com as colegas: Profa. Silvia Gasparian Colello e Profa. Cynthia Vilhena, tenho ministrado na Faculdade de

Educação da Universidade de São Paulo.

A realização deste livro, porém, só foi possível graças ao solícito concurso de três estudiosos, que tanto

nos ajudaram.

Ao Mestre Internacional, o renomado enxadrista Herman Claudius, nossos mais profundos

agradecimentos pelo prefácio com que quis nos honrar e pela colaboração que com sua vasta cultura nos prestou: sugerin-

do bibliografia, realizando uma paciente e acurada revisão e indicando oportunas notas e correções. Nossa gratidão também

ao ilustre medievalista Dr. D. João Mehlmann O.S.B., que reviu as. traduções e apontou sugestivas notas.

E a Jan Miguel Lauand, pela contínua assessoria enxadrística e estímulo ao longo de todo o trabalho.

Luiz Jean Lauand

Professor da Faculdade

de Educação da Universidade

de São Paulo

1 O texto original encontra-se no Cap. V de JOSÉ BRUNET Y BELLET, El Ajedrez-Investigaciones sobre su Origen, Barcelona, L'A-vens, 1890; RAINER A. MÚLLER, Der Arzt im Schachspiel, München, Verlag Karl Thiemig, 1981, pp. 60-67 e como Apêndice ao Cap. III da Parte II da obra de Murray (vide nota seguinte). Nestes dois últimos casos, incompleto. Uma edição completa dos problemas de xadrez de D. Alfonso é a de J.B.S.P., El Ajedrez de D. Alfonso, Madrid, La Franco Espanola, 1929. 2 H. J. R. MURRAY, A History of Chess, Oxford at the Clarendon Press, 1913, reimpresso em 1962. Uma bibliografia atualizada pode ser encontrada em RICHARD EALES, Chess: The History of a Game, London, Batsford, 1985. 3 A. S. M. DICKINS e H. EBERT, 100 Classics of the Chessboard, Pergamon, 1983.

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1. O XADREZ NA IDADE MÉDIA

A história da educação na Idade Média caracteriza-se por ser um grande aprendizado: inicialmente como

assimilação da cultura antiga, romana e grega, em condições muito precárias de acesso a fontes.

E, posteriormente, sobretudo a partir do século XII, dá-se a recepção desse mesmo legado também

através dos árabes que, tendo tomado em sua expansão centros de cultura grega como Alexandria, acolheram e

desenvolveram esse patrimônio cultural.

Como sempre, os grandes impulsos culturais na Idade Média começam pelas traduções: o século XII, de

autêntico renascimento, é um século de traduções. Por meio delas, o Ocidente recebe de volta dos árabes, com

juros, a Matemática, a Filosofia, a Medicina e outras ciências.

Em Toledo, no século XII, sob o patrocínio do Bispo D. Raimundo, está o principal centro de traduções

da Europa e, naturalmente, a Espanha é lugar privilegiado da recepção da cultura árabe (que, além do mais incor-

porara a si também conhecimentos dos indianos, persas etc.).

E o xadrez será parte dessa influencia árabe na Península.

Com o xadrez ocorrerá o mesmo que com a cultura em geral: toda aprendizagem é, num primeiro momento,

assimilação, tradução, cópia; só depois é que podemos esperar originalidade. De início, o enxadrista ocidental aprende; no

século XIII, já começam a surgir suas contribuições: no livro de D. Alfonso aparecem, timidamente, as primeiras

composições de problemistas europeus. Mas o tom ainda é o da pouca originalidade do aprendiz. O futuro, porém, será —

também no xadrez — de predominância européia.

Como e quando foi o xadrez introduzido na Europa? Richard Eales responde:

Todas as conclusões devem ser tratadas com cautela; parece certo, porém, que o jogo entrou pela

Espanha como parte do intercâmbio cultural geral entre muçulmanos e cristãos na península (...) Em vista da pri-

meira aparição de fontes documentais em torno do ano 1000 e pelas evidências filológicas e arqueológicas, parece

adequado - como data de referência - o século X1.

Como se pode notar no texto alfonsino há, de fato, diversos termos tomados ao árabe para designar as peças do

xadrez: Alfil (que é como ainda hoje os espanhóis denominam a peça que nós chamamos Bispo), Alferza (que ocupa o lugar

da nossa Dama) e Roque (que é o que chamamos Torre).

Afinal, é o que costuma acontecer quando uma realidade cultural, um jogo por exemplo, é levada de um país para

outro: preserva na terminologia, ao menos de início, traços que revelam sua proveniência. Pense-se por exemplo no football e

seus termos como penalty, corner etc. E, ainda há poucos anos atrás, eram de uso corrente entre nós, por exemplo,

goal-keeper e off-side (goleiro e impedimento, respectivamente).

Se os jogos, como se sabe, tinham grande importância na educação medieval, o xadrez2 atinge em todo o

último período da Idade Média, principalmente nos séculos XIII a XV, uma extraordinária difusão.

Murray chega a afirmar que nessa época o xadrez gozou de uma popularidade jamais igualada no futuro. E

a historiadora Helena M. Gamer3 expressa exatamente o mesmo parecer para o período que se estende dos sécu-

los XII a XV.

1 Chess:TheHistory...,p.4H. 2 Para o tema das referências ao xadrez na educação e na literatura medievais, veja-se, por exemplo, MURRAY, Op. cit., Parte II, Cap. II e IX. 3 No seu artigo "The Earliest Evidence of Chess in Western Literature", Speculum, 1954, pp. 740-744.

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Há inúmeras referências ao xadrez na literatura do Ocidente; registram-se, por exemplo, sua prática por

crianças (e mesmo a reprovação de brigas e desavenças surgidas entre elas por causa do xadrez), a superioridade

do xadrez em relação a outros jogos, a perícia enxadrística como honra e distinção para o cavaleiro e a prática

freqüente do xadrez pelas mulheres4.

Sobre este último ponto, note-se que o livro de D. Alfonso afirma ser o xadrez atividade bastante apta

para as mulheres, e considera inclusive invenção feminina uma determinada modalidade de xadrez: o "jogo força-

do", de que trataremos mais adiante.

D. Alfonso explica o gosto medieval pelas diversões dizendo ser vontade de Deus que os homens estejam

alegres: e, por isso, foram inventados os esportes e os jogos de tabuleiro. O xadrez — continuamos seguindo o

Libro del Acedrex — leva vantagem sobre os esportes, pois pode ser praticado todos os dias (independendo do

bom ou mau tempo), à noite, pelas mulheres, pelos presos e - note-se a aguda observação psicológica - por

aqueles que preferem ter suas distrações privadamente. E dentre os jogos "que se fazem sentados", o xadrez é o

mais nobre, pois — como explica D. Alfonso na fábula dos três sábios — não depende da sorte, mas somente da

inteligência.

Finalmente, observemos que para se compreender a literatura enxadrística medieval — como aliás a Idade

Média em geral — é necessário que se tenha em conta o acentuado caráter alegórico da cultura da época. Procu-

ram-se símbolos em tudo: nos números, na natureza, na terra e no céu. O xadrez (como se pode verificar nos

textos que neste livro recolhemos) - não constituí exceção: o tabuleiro e as peças representam algo - a guerra, a

sociedade ou o drama moral do homem.

Desse modo, cada peça do xadrez, seu movimento, seu modo de tomar outras peças, tem um significado,

é símbolo de algo5.

Também por essa razão, para o bom entendimento dos textos da época é necessário que apresentemos

desde já as regras do xadrez medieval.

4 Como é natural, predominante entre os estratos mais altos da sociedade; fato que não deve ser apressadamente considerado como tipicamente "medieval", pois persiste ainda hoje. 5 D. João Mehlmann fez-me notar que numa das mais antigas gramáticas da língua portuguesa, a de João de Barros (que, imprecisamente afirma ser "o primeiro que pôs a nossa linguagem em arte"), ainda aparece o xadrez como princípio de comparação para as leis da linguagem: "E como pera o jogo de enxedrez se requerem dous reis, um de üa cor e outro de outra e que cada um deles tenha suas peças postas em casas próprias e ordenadas, com leis do que cada uma deve fazer (segundo o ofício que lhe foi dado), assim tôdalas linguagens têm dous reis, diferentes em gênero e concordes em ofício: a um chamam nome e ao outro verbo. "Cada um destes reis tem sua dama: à do nome chamam pronome e à do verbo advérbio. "Participio, artigo, conjunção, interjeição são peças e capitães principais, que debaixo da sua jurdição têm muita pionagem de dicções, com que comummente servem, a estes dois poderosos reis: nomes e verbo" (JOÃO DE BARROS, Gramática da Língua Portuguesa, ed. de 1540, edit. por J. P. Machado, 1957).

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2. AS REGRAS DO XADREZ NA IDADE MÉDIA Daremos a seguir as regras do xadrez medieval, tal como aparecem no livro de D. Alfonso. Essas regras são

idênticas às do xadrez árabe de onde provêm, com três ligeiras inovações que indicaremos oportunamente.

Como o xadrez de hoje tem sua origem no medieval, o melhor procedimento, parece-nos, é apontar em que o

xadrez praticado naquela época difere do atual:

1. Não havia Dama e no seu lugar estava a peça chamada Alferza (ou, em outros textos Regina, Rainha, ou outros

nomes, mas com movimento de Alferza). O Alferza move-se apenas uma casa em diagonal (para frente ou para trás) e toma

deste mesmo modo.

2. Os Alfiles (que ocupam o lugar dos atuais Bispos) saltam exatamente duas casas na diagonal (para

frente ou para trás) mesmo que haja peça de permeio. E tomam desse mesmo modo.

3. Peão que atinge a oitava casa transforma-se em Alferza, se o Alferza original já tiver sido tomado (no

regulamento árabe1 esta condição não era necessária). E, em seu primeiro lance como Alferza, goza também do

privilégio do salto de duas casas (ainda que esta regra não seja explicada no regulamento alfonsino, subjaz a

problemas como o 81, à p. 110).

4. Um jogador que perca todas as suas peças ficando só com o Rei é considerado derrotado. (Ainda que

esta regra não seja explícita no regulamento alfonsino subjaz a problemas como os de número 93 e 94, pp. 115-

116.) Como também quando, por afogamento, está impossibilitado de dar o lance.

5. Não existem os lances: tomar en passant e rocar.

Note-se na leitura do Libro del Acedrex que, à época de sua composição, está a se firmar a possibilidade do

peão mover-se duas casas em seu primeiro lance — também algo de novo em relação às regras árabes.

Como se vê, as regras propostas por D. Alfonso são substancialmente iguais às que existiam entre os

árabes e diferentes em alguns pontos essenciais das do xadrez

No seu primeiro lance, pode o Alferza saltar duas casas (privilégio análogo ao do peão) na diagonal ou em linha

reta, para frente ou para os lados, mesmo que haja peças de permeio. Este salto inicial, no entanto, é só para mover-se: não

pode valer-se dele para tomar peças adversárias, nem o Rei inimigo estaria em xeque em alguma daquelas casas. A permissão

para saltar em seu primeiro lance é uma novidade nas regras européias: o Alferza não gozava desse privilégio no

regulamento árabe atual. Só em fins do século XV2 é que surge a disputa de popularidade entre o velho xadrez e o

recém-surgido, em que Dama e Bispo adquirem os movimentos que têm hoje3, tornando o jogo já muito próximo

do que é praticado atualmente.

Há, no entanto, uma instância em que o leitor contemporâneo vê o jogo exatamente do mesmo modo que

o enxadrista de há 700 anos atrás: os problemas em que não figuram Bispo e Dama. Por essa razão, ao selecio-

narmos os problemas, demos especial destaque aos que se encontram nesse caso.

Para nos familiarizarmos com o xadrez medieval, apresentamos, a seguir, alguns exemplos de problemas

da época e uma partida: a mais antiga de que se tem notícia.

1 Muitos problemas de D. Alfonso são cópias de originais árabes. Em se tratando de problemas, admitem-se situações artificiais, como é o caso do problema da "roda d'água" à p. 34 é do problema 94 à p. 116. Em outros casos, D. Alfonso "europeiza" o problema ou a solução do original árabe. 2 Naturalmente, a época de adoção do novo xadrez varia de região para região. 3 O que mudará também o caráter do Peão que se promove a Dama.

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3. JOGANDO O XADREZ MEDIEVAL: ALGUNS EXEMPLOS

Uma das preocupações na época - e D. Alfonso insiste neste tema — é a lentidão com que o jogo se

desenrola. Daí as tentativas de acelerá-lo: as novas regras autorizando salto de duas casas no lance inicial do

Alferza e Peões. E também uma curiosa modalidade: o xadrez com dados, onde, de acordo com o número sortea-

do, é-se obrigado a mover esta ou aquela peça.

O desejo de evitar a lentidão explica também o especial gosto pelos problemas de xadrez, pois no pro-

blema já se parte de uma posição dada e, além disso, especialmente interessante.

Assim sendo, apresentamos os seguintes exemplos de mansubat (nome que os árabes — mestres no

assunto - davam ao problema de xadrez) que tanto entusiasmaram o enxadrista medieval4.

Por razões de ordem prática, para efeitos da notação e diagramas, utilizaremos Dama, Bispo etc. (e não

Alferza, Alfil, etc.).

ALF. 54 - Problema de Dilaram5

Alguns problemas, como este, vêm acompanhados de histórias com que a imaginação dos antigos sabia

colorir a realidade:

Dilaram era a amada de um nobre que, certa vez, cometeu a imprudência de apostá-la numa partida de

xadrez. A posição era-lhe muito desfavorável, até o ponto em que o oponente poderia dar mate em seu próximo

lance. Nesse momento (Diagrama 1), Dilaram, que angustiada assistia ao jogo, interveio e gritou ao seu amado:

"Sacrifique suas duas Torres mas não a mim!" E ele assim o fez, e viveram felizes etc.

Diagrama 1: A brancas jogam e dão mate em cinco lances.

4 São os problemas de n. 83, 82 e 553 que Murray recolhe no Cap. XV da Parte I de seu livro (o 83 é o de n. 54 em D. Alfonso; o 82 é semelhante ao de n. 1 em D. Alfonso 5 Abreviaremos por ALF. n o n-ésimo problema da coleção de D. Alfonso. Quando se trata do xadrez medieval com suas regras específicas, utilizaremos diagramas como o que se vê nesta página seguinte: peças voltadas para o oponente. Para diagramas do xadrez atual, valemo-nos da convenção usual.

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1. T8T+ RXT

2. B5B+ R1C

3. T8T+ RXT

4. P7C+ R1C

5. C6T mate Problema da "Roda d'Água"

Diagrama 2: As brancas jogam e dão mate em 36 lances. 34 3. Apud MURRAY,op.cit.

1. C4T+ R2C

2. C5T+ R1B 3. C6C+ R1D 4. C7C + R2R 5. C8B + R2B 6. C8D+ R3C 7. C7R + R4C 8. C7B + R5B 9. C6C+ R6B 10. C5C+ R7R 11. C4B + R7D 12. C3B + R6B 13. C2R + R6C

14. R5T 15. C3B + R4T 16. C3C+ R3C

17. C4T+ R2C 18. R1B

(Nos lances 19 a 29 repentem-se os lances

30. C2D+ R5T

Page 13: Luiz jean lauand   o xadrez na idade média

31. C3B + R4T 32. C3C+ R3C

33. C4T+ R2C 34. C5T+ R1B

35. C6C+ 36. CXP

mate

R1D

ALF. 1 - Em D. Alfonso encontramos uma variante do belo problema anterior.

36 Diagrama 3: As brancas jogam e empatam.

1. C R1B 2. C R1R 3. C R2D 4. C R2B 5. C

8R+

R3C (Se

R1C6. C R4C 7. C R5B 8. C R6B 9. C R7D 10. C R7R 11. C R6B 12. C R6C 13. C R5T 14. C R4T 15. C R3C 16. C R2C

e, pelo xeque perpétuo (repetiu-se a posição inicial), a partida está empatada

Uma Versão Moderna Uma versão deste tipo de problema com as regras do xadrez moderno é a de W. S. Branch de 19196

Diagrama 4: As brancas jogam e dão mate em 33 lances, em 8R, movendo só os Cavalos.

6 APUD DICKINS-EBERT, 100 Classics..., p. 166.

Page 14: Luiz jean lauand   o xadrez na idade média

1. C7C+ R2D 2. C8B+ R2B

14. C4T + 15. C(3C)XT+

31. C5T+ 32. C6C+ 33. CXP mate Exércitos em Guerra

Diagrama 5: As brancas jogam e ganham (antes de incisar o problema, retire-se a Dama preta do

tabuleiro).

Uma epidemia dizimou o exército branco e seu rei vê-se forçado a tentar a paz com o rei preto. O rei

preto ordena a seu vizir (Alferza) que traga o rei branco à sua presença, mas o vizir, alegando indisposição, não

vai e ordena a dois soldados (PBD e PCD) que avancem e cumpram a ordem do rei. O rei, furioso com a

desobediência, mata o vizir (a Dama preta é excluída do tabuleiro). Tal ato convence o rei branco de que não deve

Page 15: Luiz jean lauand   o xadrez na idade média

esperar clemência e, então, envia seus fiéis cavaleiros para um desesperado ataque: à meia-noite surpreendem as

sentinelas e acossam o rei adversário. O rei preto tenta fugir. Começa uma implacável perseguição, à qual se

juntam o vizir e o elefante (D e B) brancos que liqüidam o inimigo: CXP+ R1D CXPBR+ R2B C8R+ R2C C8D+ R3T C7B + R4T C7C+ R5T D3C+ R6T BlB mate

Uma Versão Moderna: a Retirada de Napoleão de Moscou

Uma versão que retoma a temática medieval com as regras do xadrez moderno é o problema composto

por Petrov (1794-1867): "A retirada de Napoleão"7.

Diagrama 6: Mate em Paris.

O Rei preto representa Napoleão: a Dama branca, o Mal. Kutusov; o Rei branco, o Czar Alexandre I; a

casa 8TR, Paris; 1CD, Moscou; a diagonal maior de casas brancas, o rio Berezina; e, finalmente, os Cavalos bran-

cos, os cossacos.

C2D + R7T C3B + R6T C(2D)1C+ R5C C2T+ R4C C3T+ R3T C4C+ .R2T C5C+ R1C C6T+ R1B C7T+ R2D C8C+ R2R C8B + R1B C7D + R1C C7R+ R1T R2C mate

7 Apud I. M. LINDER, Chess in Old Rússia, Zürich, Kühnle, 1979, 42 p. 168. Este problema foi-nos apontado por Herman Claudius.

Page 16: Luiz jean lauand   o xadrez na idade média

A Partida Mais Antiga

Ainda para familiarizarmo-nos com as regras medievais8, transcrevemos9 a mais antiga partida que se co-

nhece: século X, Bagdá, Califa Al-Nuktadi - Al Suli: P3CR P3CR P4CR P3BR P3R P3RC2R P3DT1C P3BP3BR P3CP4B P3TD P5B PCXP PXP PXPB3TR C2RT1B T1CC3C T4CBXP P3TB3TR C2DP3D P4DP3B D2BP3C T2TP4B B3DC3B B3RPXP PXPP4D B1BR T2B D3DP4C T2BR2D P4CB3T C3CD B5BD C3BP3T R2B

28. D2B 29. TD1BR 30. C5T 31. CXP+ 32. CRXPD 33. TXB + 34. B5B + 35. C4B mate B5B T3C R1R R1D T2CD R2D R3R

8 . Lembrar que o Peão nas regras árabes não pode avançar duas casas em seu lance inicial. 9 Apud FRANÇOIS LE LIONNAIS & ERNST MAGET, Dic-tionnaire des Échecs, Paris, PUF, 1967, verb.: "Anciennes".

Page 17: Luiz jean lauand   o xadrez na idade média

4. A LITERATURA ENXADRÍSTICA MEDIEVAL Os textos dedicados ao xadrez na literatura medieval são classificados por Murray em: 1) obras didáticas,

2) obras morais e 3) coleções de problemas.

4.1. As Obras Didáticas: Poema de Deventer São em geral poemas que não chegam a dar uma descrição clara, nem definições precisas do jogo. Como

exemplo apresentamos agora - em forma resumida por Murray1 - um desses textos, o poema de Deventer, cujo

manuscrito mais antigo que se possui é do século XIII.

Sobre o Xadrez (Poema de Deventer) Quem quiser conhecer o belo jogo do xadrez ouça este poema.

A batalha se dá num tabuleiro quadrado, com casas alternadas de cores diferentes.

Os dois Reis dispõem suas forças em duas linhas.

A vanguarda é constituída pelos oito Peões.

Atrás estão as ágeis Torres, os ferozes Cavaleiros,

que lutam deslealmente, o Rei, a Rainha e dois Bispos2.

O Peão como arqueiro inicia a batalha, ele toma na diagonal e quando atinge o fim do tabuleiro é

promovido a Alferza. O Cavaleiro vai saltando e mudando de cor, a Torre vai em linha reta e agilmente, para um

lado ou para o outro. O Bispo salta e se assemelha a um espião ou ladrão3; se começa em casa branca nunca cairá

em casa vermelha. O Alferza move-se em quatro sentidos e só percorre casas de sua cor. O Rei pode ir para

qualquer das oito casas que o circundam e deve mover-se quando recebe xeque e se não puder escapar do xeque,

então todos gritam: Mate! Mate! Mate!

4.2. As Obras Morais: Moralitas de Scaccario Já o segundo grupo, o das obras morais (homilias, sátiras etc.), é o da interpretação alegórica moral do xa-

drez.

No seguinte texto, um dos mais significativos, a famosa Moralitas de Scaccario4, vê-se como o xadrez torna-

se base para considerações morais de acentuado caráter bíblico.

Moralitas de Scaccario

Este mundo todo é como um tabuleiro de xadrez: uma casa é branca, outra é preta, e assim representa o

duplo estado de vida ou morte, de graça ou pecado.

A família que habita esse tabuleiro é formada pelos homens deste mundo, que — tal como as peças saídas

todas da mesma bolsa (sacculus) — procedem todos de um só ventre (sacculus) — materno5.

1 Op. cit., p. 505. 2 Regina, Rainha, ainda que adiante o poema designe esta peça com outros termos, como Alferza. O nome Bispo não é usado, e sim Stul-tus, o bobo, ou outros termos. 3 É freqüente a referência ao Alfil como "espião" ou "ladrão" pois é a peça mais apta a surpreender o adversário distraído. 4 Valemo-nos para esta tradução do original latino do século XIII, outrora atribuído a lnocêncio III(1198-1216), que vem recolhido em MURRAY, pp. 560-561. Veja-se também o artigo de LYNN THORNDI-KE, "All the World's a Chess-Board",Speculum, 1931, pp. 461-465. 5 De um ventre: o de Eva ou o da Terra.

Page 18: Luiz jean lauand   o xadrez na idade média

E, tal como as peças, assumem seus postos nos diferentes lugares deste mundo, cada um com sua própria

denominação. O primeiro é o Rei, depois a Rainha, em terceiro lugar a Torre (rocus), em quatro o Cavalo (miles),

em quinto o Bispo (alphinus) e em sexto o Peão.

E o caráter do jogo é tal que um toma o outro e, com o jogo terminado, assim como todos tinham saído

da mesma bolsa, a ela voltam. E então já não há diferença entre o Rei e o pobre Peão, pois acabam do mesmo

modo o rico e o pobre6.

E com freqüência acontece que, quando se devolvem as peças, o Rei fica por baixo, no fundo do saco; e

assim também acontece com os grandes que ao sair deste mundo são sepultados no inferno; enquanto os pobres

são levados ao seio de Abraão7.

Neste jogo o Rei se move e toma em todas as direções, simbolizando o fato de que tudo o que o Rei faz é tido por

justo, já que o que apraz ao Rei tem força de lei8.

A Rainha, que se denomina Ferce (ou Alferza) move-se e toma na diagonal, de modo torto, pois a mulher é tão

cobiçosa que só toma tortamente, por obra da rapina e da injustiça.

A Torre é o justiceiro que percorre toda a terra em linha reta como sinal da justiça com que tudo julga e de que por

nada deve seu ofício corromper-se. Mas, agora, se corrompe, como está escrito: "perverteste o juízo em amargor e o fruto

da justiça em absinto"9.

O movimento do Cavaleiro é composição de reto e torto. O reto, representando o direito que tem, em justiça,

como senhor da propriedade, de cobrar impostos e de impor justas penas conforme o exija o delito; representando as

injustas extorsões a que submete os súditos.

Os Alfines são os bispos com cornos (mitra), não como Moisés por ter falado com Deus, mas elevados por

mandado do rei, por influências ou alto preço. Movem-se oblíqua e tortuosamente duas casas porque muito prelados se

pervertem pelo ódio, amor, presentes ou favores para não corrigir os delinqüentes nem ladrar contra os vícios, tratando os

pecados como um terreno arrendado por uma taxa anual. E assim enriquecem o diabo, fomentando os vícios ao invés de

extirpá-los e se tornam procuradores do diabo.

Os Peões são os pobres que andam uma casa em linha reta, pois enquanto o pobre permanece na sua sim-

plicidade vive honestamente, mas, para tomar, se corrompe e o faz tortamente, pois pela cobiça de bens ou

honras, sai do reto caminho com falsos juramentos, adulações ou mentiras.

E, por ultimo, ao atingir o fim de sua carreira de Peão transforma-se em Alferza, amplia e consuma sua

iniqüidade como se diz em Alexandre: "Não há ninguém mais intratável do que um pobre que ascendeu".

Neste jogo, o diabo diz: xeque! incitando ao mal e ferindo com o dardo do pecado. E se o atingido não sai

rapidamente dizendo: livrei, pela penitência e compunção do coração, o diabo lhe diz: mate!, levando sua alma ao

inferno de onde não se poderá livrar de modo algum10.

E assim como o caçador tem diversos cães para diversas presas, também o diabo e o mundo têm diversas

tentações para apanhar os homens, pois tudo que há no mundo é concupiscência da carne ou concupiscência dos

olhos ou soberba da vida11.

6 Diz o original: simul in unwn dives et pauper o que na realidade, é o Salmo 48, 3. Esta, como as demais notas bíblicas, devo-as a D. João Mehlmann. 7 Cf. Luc. 16, 22: "... et sepultus est in inferno", morreu o rico... e foi sepultado no inferno. A Neovulgata corrige a pontuação: "... e foi sepultado. No inferno 8 É a célebre sentença do Corpus luris Civitis: "quidquid principi placet, legis habet vigorem". 9 Amos 5, 7, em citação livre. 10 Esta sentença: "in inferno nulla est redemptio" 6 do Oficio de Defuntos. 11 Cf. I/o., 2, 16.

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4.3. Coleções de Problemas Das coleções de problemas, o terceiro grupo de textos, trataremos mais adiante a propósito do Libro del

Acedrex de D. Alfonso, o Sábio.

5. O "LIBRO DEL ACEDREX" DE D. ALFONSO 5.1. Introdução Mais do que por sua discutível atuação como estadista, D. Alfonso X (1221-1284) que sucedeu a seu pai,

Fernando III, como rei de Castela e Leão em 1252, notabilizou-se por relevantes realizações culturais.

Além do Livro das Leis (Las Partidas), um dos mais importantes códigos da Idade Média, e das cantigas de

Santa Maria, considerada obra totalmente pessoal do rei e uma das mais importantes da literatura galaico-

portuguesa, sob sua coordenação escreveram-se também obras históricas, científicas e recreativas.

De especial interesse é o Livro do Xadrez, Dados e Tábulas, composto em 1283 e que, rapidamente, difundiu-

se pela Europa. A introdução dessa obra teria sido escrita pessoalmente pelo próprio D. Alfonso.

O manuscrito original tem 98 folhas (39,5x28cm) frente e verso (seis páginas em branco) e ilustrado com

150 miniaturas.

Nas folhas 1 a 64 trata-se do xadrez: Introdução (1 a 5) e problemas (5v. a 64). Já as folhas 65 a 71v. são

dedicadas a jogos de dados; 72 a 80, a jogos de tábulas (que envolvem sorte e habilidade); 81 a 85v., "Grande

Xadrez", que se joga em tabuleiro de 144 casas com dado de oito faces (ou tabuleiro de 100 casas com dado de

sete faces); 87 a 89v., ao "Acedrex de 4 Tiempos" e o jogo "O Mundo", para quatro jogadores; 91 a 93v., aos

jogos de Alquerque e as páginas finais, ao "Escaques", o jogo astronômico.

O "Grande Xadrez".

Brancas

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VERMELHAS

O Xadrez de 4 Tempos.

O Jogo de Escaques.

Entre as variedades do xadrez no tabuleiro de 64 casas, D. Alfonso fala do xadrez com dados, onde a

sorte do dado é que determina que peça há de ser movida (6-Rei, 5-Alferza,... 1-Peão). E também do "xadrez

forçado", com a regra adicional que obriga a tomar sempre que possível, o que, naturalmente, conduz a um jogo

muito fechado. D. Alfonso dá o seguinte exemplo de abertura no xadrez forçado:

Page 21: Luiz jean lauand   o xadrez na idade média

Como é óbvio, diferentes regras de movimentos de peças determinam diferentes critérios teóricos: se

nossas aberturas estão dimensionadas para explorar as possibilidades dos Bispos e da Dama; na abertura medieval

o avanço do Peão da Torre pode ser uma opção conveniente.

Alguns exemplos de aberturas medievais:

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Como também o chamado Gambito de Damiano (1. P4R P4R 2. C3BR P3BR), considerado um resquício do xadrez

medieval, seria, para a época, uma boa defesa.

O Libro del Acedrex chama a atenção do principiante para duas jogadas interessantes para a época: a alferzada e a

alfilada: Alferza e Peões em mútua defesa; Alfil e Peões em mútua defesa. E o problema 69 lembra o perigo do Cavalo que

ataca simultaneamente Rei e Torre.

Page 24: Luiz jean lauand   o xadrez na idade média

A parte mais extensa e mais importante do livro é dedicada aos problemas, de que trataremos após a leitu-

ra do regulamento e introdução ao xadrez de D. Alfonso.

Quanto à notação, D. Alfonso utiliza a descritiva, como se pode ver no seu texto de solução ao problema

78, à p. 108 (que recolhemos a título de exemplo): "a quarta casa do Rei branco", "a segunda casa do Alferza

preto" etc.

5.2. Libro del Acedrex de D. Alfonso o Sábio Introdução Deus quis que os homens naturalmente tivessem todas as formas de alegria para que pudessem suportar

os desgostos e tribulações da vida, quando lhes sobreviessem. Por isso os homens procuraram muitos modos de realizar com plenitude tal alegria e criaram diversos jogos12 que

os divertissem.

Alguns desses jogos se praticam a cavalo: bafordar13 e manejar lanças e escudos, atirar com besta ou arco, e

quaisquer outros que se pratiquem cavalgando. E embora envolvam uso de armas, são chamados jogos porque se trata de

mera simulação de combates.

Há outros que se praticam a pé como esgrimir, lutar, correr, saltar, lançar pedra ou dardo, bater a pelota e

outros jogos de diversas modalidades com que os homens fortalecem o corpo e se divertem.

Há ainda outros jogos que se praticam sentados como o xadrez, tábulas, dados e muitos outros jogos de

tabuleiro.

E ainda que todos esses jogos sejam muito bons, cada um no seu lugar e tempo adequados, os que se jo-

gam sentados são cotidianos e podem ser realizados tanto de noite como de dia, como podem também ser

praticados pelas mulheres - que não cavalgam e ficam em casa —, pelos velhos e por aqueles que preferem ter

suas distrações privadamente para não serem incomodados, ou ainda pelos que estão sob poder alheio em prisão 12 No orig.: iuegos e trebeios. Iuegos é termo mais geral, que pode designar também esportes a cavalo etc.; trebeios indica jogos de tabuleiro. D. Alfonso emprega trebeios também para as peças do xadrez. Cf. verbete "Trebelhos-I" no Elucidário das Palavras, Termos e Frases que em Portugal Antigamente se Usaram de FR. JOAQUIM SANTA ROSA VITERBO, Lisboa, ed. A.J. Fernandes Lopes, 1865. 13 Bafordar ou bofordar: brincar com lanças no jogo de armas fingindo combate militar. Cf. Elucidário...

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ou cativeiro, ou viajando pelo mar. E, para todos em geral, quando há mau tempo e não se pode cavalgar, nem

caçar, nem ir a parte alguma e forçosamente têm de ficar em suas casas e procurar algum tipo de jogo com que se

distraiam, se ocupem e se reconfortem.

Portanto, Nós, D. Alfonso, pela graça de Deus, Rei de Castela, de Toledo, de Leão, de Galícia, de Sevilha,

de Córdoba, de Múrcia, de Jaen e do Algarve, mandamos fazer este livro em que tratamos dos jogos de maior

compostura como o xadrez, dados e tábulas.

E sendo estes jogos praticados de diversas maneiras, por ser o xadrez o mais nobre e o que requer maior

maestria é dele que trataremos primeiramente.

Antes, porém, queremos expor as razões pelas quais, segundo disseram os sábios antigos, foram criados

estes três tipos de jogos: xadrez, dados e tábulas. Pois sobre este assunto muito se tem falado, cada um querendo

mostrar por que foram inventados esses jogos. Mas o mais certo e verdadeiro é o que narramos a seguir.

Segundo as antigas histórias, houve na Índia Maior14 um rei que prezava muito os sábios e os tinha sempre

consigo, e amiúde requeria deles reflexões sobre os acontecimentos que surgiam das coisas. E havia três desses

sábios que tinham ponderadas concepções: um dizia que mais vale a inteligência do que a sorte, pois quem se guia

pelo juízo inteligente faz suas coisas ordenadamente e, mesmo que perdesse não teria culpa, pois estaria agindo

segundo o modo conveniente.

Outro dizia que mais vale a sorte do que a inteligência, pois ante o fado de perder ou ganhar não há juízo

e inteligência que possam conseguir outra coisa.

O terceiro dizia que o melhor era o oportunismo: viver tomando de um e de outro. Pois para que o juízo

inteligente se realize cabal e acertadamente, são necessários enormes cuidados e, por outro lado, quanto mais se

depende da sorte, tanto maior é o perigo, pois a sorte é incerta. Assim, o oportunismo tomaria tanto da inteli-

gência quanto da fortuna, o que lhe fosse de proveito.

E, depois de exporem suas afincadas reflexões, ordenou o rei que cada um trouxesse algo que demons-

trasse o que havia exposto. Deu-lhes o prazo que lhe pediram e lá se foram eles examinar diligentemente seus

livros, cada um de acordo com sua concepção.

Findo o prazo, compareceram ante o rei trazendo cada qual sua amostra.

O que propugnava pela inteligência trouxe o xadrez com suas peças15 mostrando que aquele que maior

inteligência tivesse e mais atentamente se aplicasse poderia vencer o adversário. O segundo, que defendia a sorte,

trouxe os dados para contradizê-lo e mostrar que é pela sorte que se chega a ganhar ou a perder. O terceiro dis-

pôs peças ordenadamente em suas casas num jogo em que os movimentos dependiam dos dados, como falare-

mos mais adiante neste livro. Com o que mostrou que, para quem souber bem jogar, ainda que a sorte dos dados

lhe seja contrária, pelo oportunismo poderia com habilidade jogar as tábulas de modo a esquivar-se à derrota que

lhe poderia advir da má sorte dos dados.

E por ser o xadrez jogo mais sereno e nobre que os dados ou as tábulas, é dele que falaremos

primeiramente: mostrando como há de ser feito o tabuleiro, quantas casas há nele, quantas e quais são as peças, o

nome de cada uma delas e as casas que devem ocupar, como se movem e tomam e que vantagens têm umas peças

14 Índia Maior ou índia, em contraposição à índia Menor, a Etiópia (Nota de D.J.M). 15 No orig.: troxo Acedrex cos sus iuegos. Iuegos poderia ser traduzido também por jogos, uma vez que, como explica D. Alfonso mais 8 adiante, há diversas modalidades de xadrez.

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sobre as outras. E, também, como devem ser aplicados os jogadores a fim de que vençam e não sejam vencidos; e

como dão xeque ao Rei, que é a maior de todas as peças, sendo o xeque uma maneira legítima de afrontar o

senhor do inimigo e como lhe dão mate, que é fazer-lhe grande desonra: tal como se o vencessem ou matassem.

E outros jogos há e muito variados, mas todos foram feitos à semelhança das coisas que aconteceram se-

gundo os tempos que foram, são ou poderiam ser, mostrando como os reis em tempos de guerra — em que se

constitui exército — hão de guerrear com seus inimigos lutando por vencê-los, prendendo-os, matando-os ou, expulsando-

os da terra. Como também, em tempo de paz, mostram seus tesouros e riquezas e as coisas nobres e raras que possuem16.

E assim, fizeram-se jogos: uns de 12 casas, outros de 10, de 8, de 6 e de 4; descendo até uma casa que dividiram em

8 partes. E tudo isto se fez segundo os saberes antigos, em conformidade com os sábios. Mas, dentre todos os outros jogos

escolheu-se como o melhor e mais comum o das 8 caseis porque não é tão lento como os de 10 ou mais, nem tão rápido

como os de 6 ou menos. E por isso é jogo comum em todas as terras, mais do que os outros jogos.

O tabuleiro deve ser quadrado, com 8 linhas, cada linha com 8 casas, num total de 64. E metade das casas deve ser

de uma cor, metade de outra; e assim também as peças.

Das cores das peças do xadrez

As peças são 32. As 16, de uma cor, devem ser enfileiradas nas duas primeiras linhas do tabuleiro; as 16 da outra cor

devem ser enfileiradas do mesmo modo, defrontando, as primeiras, no outro extremo do tabuleiro.

Peças que ilustram os problemas no livro de D. Alfonso.

16 Há diversos jogos e uns representam as coisas que sucedem em tempos de paz; outros, a guerra. O xadrez que D. Alfonso descreve neste texto é um jogo à semelhança da guerra.

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Das 16 peças, 8 são menores, à semelhança da plebe que compõe a hoste. Das peças maiores, uma representa o Rei,

senhor do exército, e deve ficar numa das casas centrais. A seu lado, na outra casa central, fica outra peça que

representa o Alferes, portador do estandarte do Rei. Alguns não lhe sabem o nome e chamam-no Alferza. Estas

duas peças são singulares e não há nenhuma outra igual a elas.

Nas duas casas ao lado das ocupadas pelo Rei e pelo Alferza colocam-se duas peças semelhantes que em

árabe se chamam Alfiles, o que em nossa língua significa elefantes: cada Rei costumava levar nas batalhas ao

menos dois elefantes: se um morresse, ficaria o outro.

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Nas duas casas ao lado das ocupadas pelos Alfiles colocam-se duas peças iguais, comumente chamadas

Cavalos, ainda que seu nome correto seja Cavaleiro: são capitães que por mandado do Rei comandam as filas do

exército.

Nas duas casas extremas estão duas peças também iguais chamadas Torres (Roques)17 e são largas e esten-

didas à semelhança de linhas de combate de cavaleiros.

Na primeira fila ficam as peças maiores de que falamos; na segunda, os peões. E, embora sejam muitas

peças quanto às casas que ocupam, são apenas seis se contarmos o par como uma só: Alfiles, Cavalos e Torres

(contados não como 6, mas 3 peças); Rei, Alferza e Peões (contados como 1 peça só).

As peças são assim duplicadas para no caso de uma ser tomada, ficar outra de sua natureza para dar xeque

e mate ao Rei adversário, ou defender o próprio Rei. É também o caso do Alferza, que, se tomado, qualquer Peão que

atingir a última casa do outro lado do tabuleiro, onde se situam inicialmente as peças maiores do adversário, torna-se, daí em

diante, Alferza e se pode dispor dele e movê-lo como o Alferza original. E isto porque são promovidos de condição inferior

a condição superior.

O Rei não pode ser tomado mas se pode lhe dar xeque e fazê-lo sair, desonrado, do lugar onde estiver. E se o

cercam de modo a não ter casa para onde ir é o que se chama xamat, isto é, morto. E isto foi estabelecido assim para

abreviar o jogo, pois alongar-se-ia muito se fosse necessário tomar todas as peças até ficarem só os dois Reis ou um deles.

Do movimento das peças do xadrez18 O movimento das peças foi estabelecido pelas razões que diremos a seguir. Tal como o Rei, que não se deve deixar

arrebatar nas batalhas mas deve ir muito devagar, vencendo sempre seus inimigos e esforçando-se por triunfar, assim

também o Rei do xadrez não deve andar mais que uma casa em linha reta ou diagonal, como quem está atento a tudo o que

acontece a seu redor refletindo sobre o que deve fazer.

O Alferza anda uma casa na diagonal para guardar o Rei, não se afastar dele e cobri-lo de eventuais xeques e

tentativas de mate e para ir à sua frente ajudando-o a vencer quando o jogo estiver em situação favorável.

Pode, no entanto, em seu primeiro lance, saltar duas casas em linha reta ou diagonal, mesmo que haja outra peça de

permeio. E isto porque, como bom capitão, deve ir à frente nos momentos decisivos e nas batalhas, e acorrer a todas as

partes em que sua presença seja necessária. Com este movimento ajunta-se com seus Peões e volta-se para eles fazendo um

bloco, esforçando-se para que não saiam e dando o melhor de si para manter a unidade, onde ele guarda a frente

posicionando-se ante os que estão atrás, defendido por eles e defendendo-os. E, quando o Alferza está deste modo

engrenado com os Peões, diz-se que se trata de uma alferzada.

Os Alfiles saltam duas casas na diagonal à semelhança dos elefantes que outrora os reis levavam consigo. Ninguém

ousava deter-se diante deles e os que os montavam faziam-nos investir em diagonal contra as linhas do inimigo, de modo

que não se podiam defender.

Os Cavalos saltam movendo-se uma casa em linha reta e uma em diagonal (afastando-se da casa de origem). Tal

como bons oficiais que capitaneiam as linhas de combate dirigindo o cavalo para a direita e para a esquerda para defender os

seus e vencer os inimigos.

As Torres movem-se quanto quiserem em linha reta e podem ir para a frente e para trás, para a direita ou para a

esquerda. E isto à semelhança das filas de cavaleiros que investem quanto podem para a frente ou na direção mais adequada

para vencer aqueles contra quem lutam.

17 Dos trebeios que se semeiam, duas peças que se assemelham, diz o original a propósito dos 2 Alfiles, 2 Cavalos e 2 Torres. No caso dos Alfiles (um corre por casas pretas; outro, por brancas) dissemos que se parecem; já dos Cavalos e Torres, dissemos, nesta tradução, que são iguais. 18 D. Alfonso inclui na contagem a casa onde a peça está. E assim, quando diz que o Alfil salta três casas, traduzimos por duas casas, mais adequado para a compreensão do enxadrista contemporâneo.

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Os Peões não vão mais do que uma casa para a frente tal como os Peões do exército, que andam pouco porque vão

a pé e levam às costas suas armas e outras coisas de que hão mister. Alguns jogadores, porém, costumam movê-los duas

casas na primeira vez, simbolizando o fato de que os da plebe, à medida que avançam, vão roubando coisas e, assim, depois

do primeiro lance, andam mais devagar.

De que modo as peças tomam no xadrez O tomar das peças umas às outras se dá do modo como descreveremos. O Rei toma em todas as casas a que pode

ir e pode tomar qualquer peça do adversário que não esteja defendida. E o mesmo (tomar em qualquer casa a que possa ir) o

fazem as outras peças maiores como os Alfiles, os Cavalos e as Torres. O Alferza, porém, se quiser ir à terceira casa em seu

primeiro lance não o poderá fazer tomando; mas, excetuado este caso, toma tal como seu movimento, na casa diagonal.

Também os Peões que, se quiserem, podem andar — mas não tomar — duas casas na primeira vez. Os Peões não

tomam segundo seu movimento reto, mas somente nas duas casas diagonais imediatamente à sua frente. E isto é à

semelhança dos peões do exército que não se podem ferir estando um em frente do outro e atentos defendem-se, mas só

ferem em diagonal o inimigo desprevenido.

Das vantagens das peças do xadrez As vantagens que umas peças têm sobre outras são grandes. O Rei, por exemplo, é privilegiado de modo que pode

tomar qualquer peça e nenhuma o pode tomar. E isto à semelhança dos reis, que fazem justiça a todos os que o merecem

mas, por isso mesmo, ninguém pode levantar a mão contra ele: nem para prendê-lo, nem para feri-lo, nem para matá-lo;

ainda que ele fira, prenda ou mate. E, no entanto, pode-se-lhe envergonhar de três modos: obrigando-o a sair da casa onde

está, obstruindo-lhe uma casa aonde ele queria entrar ou impedindo-o de tomar o que deseja.

O Alferza tem igualmente grandes vantagens: porque, mais que as outras peças, guarda de perto o Rei e é melhor

do que os Alfiles porque tem mais casas pelas que pode andar e tomar.

E além disso — e é algo que os Peões não podem fazer -, o Alferza guarda e toma para a frente e para trás, daí que

possa fazer alferzada com eles, como dissemos acima.

Os Alfiles têm vantagens sobre os Peões porque tomam mais de longe. E fazem também alfilada com eles: o Alfil

defendido por um Peão que está em casa diagonal imediatamente anterior, e este Peão é defendido por outro Peão atrás de

si na mesma linha diagonal que, por sua vez, é defendido pelo Alfil. E deste modo defendem-se mutuamente e isto é

denominado alfilada.

O Cavalo tem mais vantagens que todas as outras peças, exceção feita à Torre, pois quem souber bem jogar o

Cavalo poderá movê-lo de um canto do tabuleiro tomando peças em qualquer das outras 63 casas: tal é seu movimento que

não falha em tomar (ver nota e ilustração na página seguinte).

A Torre é a peça que mais vantagens tem, pois pode ir em linha reta de uma só vez à casa que quiser de um a outro

extremo da fila ou da coluna da casa em que se encontra, desde que não haja no seu caminho uma peça de sua cor que a

estorve ou da cor contrária; neste caso, a Torre pode tomá-la ocupando a casa da peça que tomou.

O cavalo, como se sabe, pode percorrer todo o tabuleiro sem passar duas vezes pela mesma casa. Na

ilustração - extraída do 100 Classics... - o cavalo pode mover-se seqüencialmente também pelos números quadrados

perfeitos (1,4, 9, ...64) ou cubos perfeitos (1, 8, 27, 64).

Page 32: Luiz jean lauand   o xadrez na idade média

De como o Rei e todas as outras peças do xadrez podem andar e tomar: algumas, em todas as casas do tabuleiro; outras,

só em algumas casas

O Rei pode andar e tomar em todas as casas do tabuleiro em 64 lances e voltar para sua casa.

O Alferza pode andar todas as casas que lhe são permitidas pelo seu tipo de movimento em 32 lances19,

descontadas as casas em que forçosamente tem de entrar duas vezes numa mesma casa.

O Alfil pode andar e tomar por seis casas20 do tabuleiro — incluída a sua — e não mais.

O Peão pode ser promovido a Alferza em seis jogadas (se não andar duas no primeiro lance) e, uma vez alferzado,

pode voltar a sua casa em tantas vezes quanto o Alferza original: descontando as vezes em que não possa evitar de entrar

duas vezes na mesma casa.

O andar da Torre não pode ser contado porque anda longe e perto21 por onde quiser, desde que em linha reta,

segundo as leis de seu movimento.

Todos os que queiram bem jogar o xadrez devem conhecer estes movimentos, sem o que não entenderão o jogo

nem os problemas. Os problemas deleitam por que não exigem o desdobramento de toda uma partida, que, por alongar-se,

pode aborrecer. E esta é também a razão da introdução de dados no xadrez: para que mais breve fosse sua duração.

E assim o 6, que é o maior número do dado, corresponde ao Rei, que é a mais nobre peça do tabuleiro; o 5, ao

Alferza; o 4, à Torre; o 3, ao Cavalo; o 2, ao Alfil e o 1, a que chamam ás, ao Peão.

E como há diversos modos de jogar xadrez — alguns que envolvem as peças todas; outros, só parte delas —,

trataremos inicialmente do jogo que se faz com todas as peças e mostraremos como é feito o tabuleiro e como deve ser a

figura das peças. As peças, da maneira melhor e mais perfeita, devem ser assim feitas:

O Rei deve estar em seu trono com a coroa na cabeça e a espada na mão como se estivesse a julgar ou a fazer

justiça.

O Alferza deve assemelhar-se ao alferes-mor do rei, que porta os estandartes do rei quando começa a batalha.

Os Alfiles devem assemelhar-se a elefantes com torres superpostas, cheias de homens armados e prontos para a

luta.

19 O original diz 33 lances. 20 O Alfil, naturalmente, atinge oito e não seis casas. Neste caso, portanto, deve tratar-se de uma referência às casas a que pode chegar sem passar duas vezes pela mesma casa. 21 Como não contavam com os nossos atuais Bispo e Dama, a Torre era a única peça cujo raio de ação não era fixo.

Page 33: Luiz jean lauand   o xadrez na idade média

Os Cavalos devem assemelhar-se a cavaleiros armados, como capitães que por mandado do rei comandam as filas

do exército.

As Torres devem assemelhar-se a uma linha cerrada de cavaleiros do rei em combate.

Os Peões devem assemelhar-se à plebe que vai armada e equipada para a luta.

Mas, já que em todas as terras em que o xadrez é praticado seria muito trabalhoso fazer-se peças como estas, os

homens buscaram maneiras mais fáceis e baratas de produzi-las guardando alguma semelhança com as que descrevemos. E

a forma mais usada em todas as terras, especialmente em Espanha, é a que está aqui descrita.

Uma vez que acabamos de tratar da partida completa, 84 queremos falar a respeito dos problemas que são como

coisas novas e inauditas. Por essa razão, encontram os homens agrado neles, como também porque são mais breves: são

situações de jogo em que se sabe em quantos lances deve a partida acabar. Exporemos inicialmente problemas com todas as

peças e iremos apresentando outros com menos peças, até um mínimo delas.

E falaremos também do jogo de xadrez a que chamam forçado. E isto porque há nele uma restrição à liberdade do

jogador que o faz ir contra sua vontade em certas situações e trocar — quer queira, quer não — uma peça melhor por uma

pior pois é forçado a tomar, sempre que possível. A disposição, o movimento das peças e seu modo de tomar é igual ao do

xadrez normal; mas tomar, nessa modalidade, é obrigatório. E por isto exige especial habilidade do jogador: a de não expor

suas peças mais fortes em ocasião de serem sacrificadas em troca de peças mais fracas e vis.

Como o tomar, como dissemos, é obrigatório, este jogo é chamado jogo forçado, mas porque alguns contam que foi

inventado por donzelas de Ultramar11, chamam-no também jogo das donzelas.

Page 34: Luiz jean lauand   o xadrez na idade média

6. O PROBLEMA DE XADREZ NA IDADE MÉDIA Introdução Antes de oferecer ao leitor uma seleção de problemas do Libro del Acedrex, apresentamos algumas consi-

derações - seguindo sobretudo a criteriosa obra de Murray — sobre os problemas na Idade Média.

O problema, que é justamente considerado a poesia do xadrez, teve extraordinária importância no mundo

árabe. E basta examinar as primeiras coleções européias de problemas de xadrez para constatar que se apóiam em

fontes árabes.

Junto com a dimensão estética, o problema tem uma missão formativa: desenvolver a habilidade do

enxadrista. Além do mais, no problema desaparece o inconveniente do xadrez medieval: sua excessiva

morosidade. No problema, tanto na Idade Média como hoje, tudo se desenvolve a partir de uma posição

previamente dada; artificial, é certo, mas por isso mesmo didática. E no problema que se aprendem manobras e

seqüências fundamentais para uso nas partidas1.

O problema de xadrez é denominado em latim jocus partitus, expressão que passou para as nascentes línguas

européias: juego de partido em D. Alfonso; jeopardy em inglês (que, por extensão, passou a significar perigo) etc.

A coleção de juegos de partido do Libro del Acedrex inclui algo de novo: problemas compostos por europeus. E certo

que os juegos de partido de D. Alfonso são, em sua quase totalidade, coletados de diversas fontes árabes: o estilo é árabe e há

repetições de estruturas fundamentais de posição (11 posições se repetem duas vezes; 1, três vezes e 2, quatro vezes), o que

parece indicar que se trata de uma justaposição de coleções de problemas árabes.

E o caso, por exemplo, dos 69 primeiros problemas (dos quais mais de 50 são idênticos a problemas propostos em

manuscritos árabes mais antigos): são dispostos em ordem decrescente de número de peças: 30 no problema 1, 6 no

problema 69. O que sugere tratar-se de cópia de uma lista árabe.

Porém, como destaca Murray, há 14 problemas, os de n. 73 a 87 (87 = 82), que contrastam com os demais:

— Apresentam poucas peças, em média 8, menos da metade da média de peças dos primeiros 69 problemas: 18.

— Pede-se, além disso, em alguns desses problemas, como o 78, p. 108, mate em um número exato de lances, nem

mais nem menos (mesmo que houvesse solução mais rápida).

— Há peças, como no problema 77, p. 107, que, por condição do problema, estão atreguados, isto é, não podem ser

tomadas.

— Há problemas cuja solução exige que o peão transformado em Alferza salte 2 casas (novidade alfonsina, como

dissemos, em relação às regras árabes). É o caso do problema 81, à p. 110.

— Problemas elaborados para que não tenham solução mais que aparente, como o 78, à p. 108.

Trata-se, pois, do nascimento do problema europeu. Nos problemas que recolhemos a seguir, optamos pela

seguinte ordem de apresentação:

6.1. Problemas medievais que não pressupõem regras diferentes das atuais São problemas onde não figuram Dama e Bispo e são resolvidos de idêntico modo no xadrez medieval e no atual.

6.2. Problemas especificamente medievais Selecionamos os que nos pareceram mais bem elaborados e de maior interesse para o leitor de hoje. 6.1. Problemas Medievais que Não Pressupõem Regras Diferentes das Atuais

1 Devemos esta oportuna observação a Herman Claudius.

Page 35: Luiz jean lauand   o xadrez na idade média

São os problemas ALF: 58, 63, 65, 67, 68, 80 e 87. ALF. 58 - As pretas jogam e dão mate em três lances (na época, não vigorava a atual convenção de problemas: lance inicial das brancas etc.).

1. C5T+ 2. TXC TXC+ 3. RXT T6D mate As brancas teriam mate em um lance: 1. T1TD mate. ALF. 63 - As pretas jogam e dão mate em três lances.

1. C5C + 2. TXC T6B + 3. RXT T6R mate

Note-se que também aqui a parte contrária, no caso as brancas, teria mate em um lance: 1, T1TD mate ou

T1CD mate. Esta circunstância, ameaça de mate imediato por parte do que vai perder, freqüente nos problemas

de D. Alfonso, facilita a resolução: em geral, o primeiro lance deve ser um xeque. ALF. 65 - (Problema árabe que, após o 32 lance, recai em ALF. 65). As brancas jogam e dão mate em cinco lances.

Page 36: Luiz jean lauand   o xadrez na idade média

1. T7T+ R1C

2. C6B+ R1B

3. P7R+ CXP

4. T7B+ CXT

5. C6R mate

ALF. 67 - As brancas jogam e dão mate em três lances.

1. C6D+ R1C

2. T7C+ R1T

3. C6C mate

ALF. 68 - As brancas jogam e dão mate em três lances.

Page 37: Luiz jean lauand   o xadrez na idade média

1. C6D+ R3C (ou 1. C3R+ ou 1. C6C+ ou

1. C5R+)

2. T2C+ R4T

3. T1T mate.

Embora seja problema aristocrata (sem peões), trata-se, para os critérios atuais, de um problema muito

fraco: não admite solução única. (Nota 96 de H.C).

ALF. 80 - As pretas jogam e dão mate em três lances.

1. TXC

2. P5B+ R3R

3. R8R T1B mate

Page 38: Luiz jean lauand   o xadrez na idade média

ALF. 87 (= ALF. 82) - "As brancas dão mate em três lances, na segunda casa do Rei preto, jogando o Rei

e as duas Torres."

1. TXC R8D

2. R2B R7D

3. TR3D mate

6.2. Problemas Especificamente Medievais Selecionamos os seguintes:

ALF. 55, seguido de uma partida (moderna) de Paul Morphy.

ALF. 72, seguido de um problema (moderno) de S. Loyd.

ALF. 76

ALF. 77

ALF. 78, (recolhemos, a título de exemplo, o texto da solução do próprio D. Alfonso a este problema).

ALF. 81

ALF. 83, seguido de um problema medieval (da Casanatense) e de um problema (moderno) de Shinkmann.

ALF. 93

ALF. 94

ALF. 96, seguido de um problema medieval (do Bônus Socius), de um problema (moderno) de Carpenter e

de um problema medieval de mate inverso (do Bônus Socius).

ALF. 55 - As pretas jogam e dão mate em três lances.

Page 39: Luiz jean lauand   o xadrez na idade média

1. T1C +

2. R2T T7C +

3. TXT C6B mate

É o surgimento do tradicional mate por afogamento. No xadrez moderno, encontramos um belo exemplo

na seguinte partida do legendário 100 Paul Morphy (Apud 100 Classics..., p. 6).

1 P4R P4R 9. CXC B3R 17. C7B+ DXC

2 C3BR C3BD 10. CD5C B5C 18. B5C+ B2R 3. B4B C3B 11. TXB+ PXT 19. C6R+ R1B 4 P4D PXP

12. CXP(6R) D2B 20. C5B+ R1C 5. O-O CXP 13. C(3B)5C D2R 21. C7D + R1B 6. T1R P4D 14. D2R B3D 22.

C6C+ R1C 7. BXP DXB 15. CXPC+ R2D 23.. D8B+ TXD ,S D4TR 16.D4C+ R1D 24.C7D mate

(diagrama)

ALF. 72 - Um problema do tipo "2 em 1".

Page 40: Luiz jean lauand   o xadrez na idade média

As pretas jogam e dão mate em dois lances.

1. T(7T)XP+

2. R3D T(7B)7D mate

ou

As brancas jogam e dão mate em cinco lances.

1. C8R + RXB

2. C7D+ R4C

3. C6D+ R4T

4. C7C+ R4C

5. B3D mate

Um problema "2 em 1" do xadrez moderno é o da "Roda na Roda" de S. Loyd (Apud 100 Classics...,p.

167): quem tiver o primeiro lance dá mate em 2.

1. DXC+ RXD

2. R5C mate

OU

1. C2R+

2. R4R TXB mate

O problema também comporta 2 mates inversos em 2 lances.

1. D3C+ DXD

2. C6C+ D(ouB) XC mate

ou, também em dois lances (de cada cor).

1. C2R+

2. R4R C4C + 4 3. D(ouB)XC mate

Page 41: Luiz jean lauand   o xadrez na idade média

ALF. 76 - "As pretas jogam e dão mate com o Bispo, na casa do Cavalo, em exatamente cinco lances."

1. T7D

2. R1C T8D +

3. R2T T8T +

4. RXT R6C

5. R1C B6D mate

ALF. 77 - As brancas jogam e dão mate em sete lances, com as seguintes condições: o Rei preto deve

mover-se sempre que possível e não pode tomar os Alferzas, que estão atreguados.

Page 42: Luiz jean lauand   o xadrez na idade média

1. D7B P5B

2. D8D R1C

3. D7C R2T

4. D7B P6B

5. D6T R1T

6. D8C P7B

7. D7C mate

ALF. 78 (Texto original de D. Alfonso)

Este é outro problema com 11 peças, dispostas como se vê no tabuleiro. E é o seguinte; as brancas jogam

primeiro e devem dar mate ao Rei preto em três lances, nem em mais, nem em menos. Se as pretas conseguirem

resistir por mais de três lances, as brancas se consideram derrotadas.

O primeiro lance é pôr o peão branco na segunda casa do Alfil preto, dando xeque. Se o Rei for para a

casa de seu Alfil, o segundo lance será pôr o Alfil branco na quarta casa do Alfil preto e nem o Rei nem as Torres

podem dar lance que impeça o mate no terceiro lance: peão branco na segunda casa do Cavalo preto, ou com o

Cavalo branco dando xeque-mate ao Rei preto.

Assim, é melhor para as pretas - ante o xeque do peão branco - que seu Rei vá para a casa da Torre. O

melhor lance para as brancas é agora o Alfil na sua quinta casa. Para defender-se, as pretas devem jogar a Torre

tomando o Peão que está em sua terceira casa e assim ficam as brancas vencidas, pois não podem dar mate no

terceiro lance como se pedia (o peão fica 108 cravado). O problema é engenhoso porque, afinal, não tem

solução.

Page 43: Luiz jean lauand   o xadrez na idade média

ALF. 81 - As pretas jogam e dão mate em sete lances.

1. D(8C)6C

2. R1C D(8R)7D

3. R1T D6T

4. R1C D6D

5. R1T D6B

6. R1C D(6D)7B +

7. RlT ou (RlB) D(6T)7C mate

ALF. 83 - As brancas jogam e dão mate em cinco lances, na quarta casa do Rei branco.

Page 44: Luiz jean lauand   o xadrez na idade média

1. B5B RXP

2. T8C RXD

3. T7C RXP

4. T6C RXC

5. T6R mate

Ainda com as regras do xadrez medieval, num manuscrito do século XV (da Bibl. Casanatense) figura o

seguinte problema (Apud 100 Clas-sics..., p. 164).

As brancas jogam e dão mate em seis lances.

1. C3C RXP

2. T8T RXP

3. T7T RXP

4. T6T RXP

Page 45: Luiz jean lauand   o xadrez na idade média

5. T5T RXP

6. T5R mate

No xadrez moderno temos um problema análogo: mate em oito lances.

W. A. Shinkmann (1847-1933), St. Louis Globe Democrat, 1887.

1. R2D! RXP

2. T1R RXP

3. T7R RXP

4. T6R RXP

5. T5R RXP

6. R3B! RXP (Se 6...... R5T

7. T1R R6T 7. T5D R6T

8. TIT mate 8. T5T mate).

Outra variante:

1. R2D! RXP

2. T1R R1C

3. T8R+ R2T (Se 3...... R2B

4. R3B RXP por exemplo

5. T7R RXP 4. P7T R3B

6. T6R RXP 5. P8T = D+ R2B

7. T5R RXP 6. D8D+ R3B

8. T5T mate 7. T7R R4B

8. T7B mate).

Ou ainda, a solução original.

1. O-O-O! RXP

2. T8D RXP

Page 46: Luiz jean lauand   o xadrez na idade média

3. T7D RXP

4. T6D RXP

5. T5D RXP

6. T4D RXP

7. T3D R8T 114 8. T3T mate

ALF. 93 - As brancas jogam e ganham em exatamente três lances. (Rei que perde todas suas peças está

derrotado.)

1. P7C+ CXP

2. C6B C joga

3. Toma C

ou

1. P7C+ R joga 1. P7C+ R joga

2. C6B+ CXC 2. C6B+ R joga

3. RXC ou 3. CXC

ALF. 94 — Lance inicial das pretas, mas as brancas ganham.

Page 47: Luiz jean lauand   o xadrez na idade média

1. TXB +

2. R5C T8B

3. R6T T8T+

4. DST T8C

5. D7C+ TXD

6. D(5T)6C T joga

7. toma T e ganha porque o Rei preto perdeu todas suas peças.

ALF.96 - Um exemplo medieval de Zugzwang.

As pretas jogam e dão mate com a Torre no quarto lance.

A obrigação de dar o lance é fatal para as brancas.

1. P7C+

Page 48: Luiz jean lauand   o xadrez na idade média

2. R2T P6C+

3. R3T C3C

4. D7B T1T mate

Um exemplo semelhante no xadrez moderno: as brancas jogam e dão mate em dois lances (Apud 100

Classics..., p. 53)

G. Carpenter (1844-1924) Dubuque Chess Journal, 1873.

1. D3TR! R5R

2. T4B mate

No Bônus Socius, coletânea também do século XIII, figura o seguinte problema, onde também a obrigação

de dar o lance é fatal:

As brancas jogam e dão mate em dois lances (Apud 100 Classics..., p. 52). ____

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1. TR7CR C joga

2. T8.. mate

Finalmente, ainda no Bônus Socius, surge o curioso problema de mate inverso que apresentamos a seguir:

As brancas forçam as pretas a dar-lhes mate (Apud 100 Classics..., p. 126)

1. C6B R3C

2. C5T R4C

3. C4B R5C

4. C3T R6C

5. C2B R7C

6. C1T R8C

7. T(8B)8C + R8B

8. T2T R8D

Page 50: Luiz jean lauand   o xadrez na idade média

9. T8BD R8R

10. T8D R8B

11. T3D R8R

12. C3C R8B

13. C4D R8R

14. C3B+ R8B

15. T2CR PXT mate

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