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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ LUIZ GUSTAVO TEIXEIRA PINTO A ESPIRITUALIDADE NO CUIDADO INTEGRAL À SAÚDE DA PESSOA COM CÂNCER DE MAMA NA PERSPECTIVA DOS CUIDADORES Itajaí (SC) 2014

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ

LUIZ GUSTAVO TEIXEIRA PINTO

A ESPIRITUALIDADE NO CUIDADO INTEGRAL À SAÚDE DA PESSOA COM

CÂNCER DE MAMA NA PERSPECTIVA DOS CUIDADORES

Itajaí (SC)

2014

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LUIZ GUSTAVO TEIXEIRA PINTO

A ESPIRITUALIDADE NO CUIDADO INTEGRAL À SAÚDE DA PESSOA COM

CÂNCER DE MAMA NA PERSPECTIVA DOS CUIDADORES

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Saúde e Gestão do Trabalho – Mestrado Profissional (MPSGT), da Universidade do Vale do Itajaí, como requisito parcial para obtenção de título de Mestre em Saúde. Área de concentração: Saúde da Família. Linha de pesquisa: A Família em seu ciclo vital na perspectiva interdisciplinar. Orientadora: Profª. Dra. Maria Glória

Dittrich.

Itajaí (SC)

2014

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LUIZ GUSTAVO TEIXEIRA PINTO

A ESPIRITUALIDADE NO CUIDADO INTEGRAL À SAÚDE DA PESSOA COM

CÂNCER DE MAMA NA PERSPECTIVA DOS CUIDADORES

Esta dissertação foi julgada adequada para a obtenção do título de Mestre em Saúde e Gestão do Trabalho – Mestrado Profissional (MPSGT), e aprovada pelo Programa de Pós-Graduação em Saúde e Gestão do Trabalho da Universidade do Vale do Itajaí. Área de concentração: Saúde da Família.

Linha de pesquisa: A Família em seu ciclo vital na perspectiva interdisciplinar.

Itajaí, 29 de julho de 2014.

Profª. Dra. Maria Glória Dittrich Orientadora

Prof. Dra. Maria do Rosário Knechtel Avaliadora

UFPR

Prof. Dra. Stella Maris Brum Lopes Avaliadora UNIVALI

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AGRADECIMENTOS

À Paula, ao Arthur e ao Vitor precisaria de muito mais espaço e palavras para

expressar o quanto importantes vocês são na minha vida. Reconheço que vocês são

meu maior sentido.

À minha mãe, Lucia (Luz), querida e generosa em sua amorosidade, foi por

meio de caminhos difíceis e por suas mãos que pude iniciar a compreensão da

espiritualidade.

Ao meu pai, Carlos (in memoriam). Apesar de sua aparente pouca

compreensão da complexidade do ser humano, foi sempre meu incentivador nas

conquistas da vida por meio de trabalho e dedicação.

À minha afilhada e irmã, Renata, nossa história de superação fala por nossa

amizade.

Aos meus “Pais auxiliares”, Marcio Godoy (in memoriam) e Eliana, saudades

e lembranças de muita alegria.

Agradeço sincera e amorosamente a todos do grupo Paz, Amor e Alegria e

em especial a “tia Marcia”, por “dar possibilidades” aos incontáveis momentos de paz

e firmamento que vivenciei por mais de uma década e, por meio de muito estudo

teórico e prático, pude compreender o fenômeno da espiritualidade e perceber a

potencialidade que todos nós seres humanos temos de evoluir.

Agradeço aos amigos especiais, “Velho Joaquim”, Paulo, Carmem, C.

Cachoeira, Betinho, Sebastião, Shidaha e outros tantos irmãos de uma linda e longa

história de ensinamentos, acolhimentos e infinita amorosidade.

À fascinante Dra. Maria Glória Dittrich, pela amizade e generosidade com que

me acolheu e me guiou nesta jornada científica sobre a espiritualidade.

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RESUMO

O câncer de mama se apresenta no Brasil e no mundo como um dos tumores malignos mais prevalentes, apesar de toda a evolução da tecnologia dura, por meio de exames mais sofisticados, medicamentos mais potentes e melhor acesso aos serviços especializados de saúde. O impacto de seu diagnóstico frente à pessoa atinge dimensões ampliadas do ser humano, tais como sociais, ecológicas, psicológicas, físicas e espirituais. O pensar-sentir-agir entre os profissionais da área de saúde ainda é muito fragmentado, prevalecendo a visão biologicista da doença. Essa herança da educação em saúde é historicamente atribuída ao modelo flexneriano em entender o processo saúde-doença, reduzindo-o apenas ao aspecto biológico. Todavia, nessa nova era de transformações pela qual perpassa toda a humanidade, valores até então pouco explorados, ou mesmo pouco reconhecidos, vêm ganhando maior dimensão no cuidado integral à saúde da pessoa. É neste aspecto que esta pesquisa teórico-prática tem, como objetivo principal, compreender a espiritualidade no cuidado integral à saúde da pessoa com câncer de mama na perspectiva dos profissionais da área de saúde (cuidadores). A partir de uma metodologia de orientação fenomenológica, procurou-se interpretar, por meio de uma abordagem hermenêutica, a percepção dos diferentes profissionais da área de saúde que cuidam de pessoas com câncer de mama no Projeto de Extensão Mãos de Vida, da Universidade do Vale do Itajaí, em Itajaí, Santa Catarina, conhecendo seus significados, valores e atitudes no cuidado integral à pessoa com câncer de mama e se conferem ou não importância a aspectos subjetivos, como a espiritualidade no processo de saúde-doença. Os profissionais pesquisados acusaram que ser cuidador de uma pessoa com câncer de mama é um desafio, por necessitar desenvolver um olhar ampliado em relação ao ser humano, assistindo-o de maneira integral e potencializando sua capacidade de autocura. Significaram a espiritualidade no cuidado integral da pessoa, relacionando-a ao sentido de vida, seus significados e propósitos, além da percepção de uma energia motivadora transcendente. Além disso, em suas falas, acreditaram que a espiritualidade influencia o processo saúde-doença dessas pessoas do Projeto Mãos de Vida, especialmente quanto ao enfrentamento e à possibilidade de autocura.

Palavras-chave: Espiritualidade. Cuidado integral. Câncer de mama. Saúde.

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ABSTRACT

Breast cancer is one of the most prevalent malignancies in Brazil and worldwide, despite all the evolution of hard technology, through more sophisticated tests, more potent drugs and better access to specialized health services. The impacts of his diagnosis on patients on the human being are extensive, covering many dimensions, such as the social, environmental, psychological, physical and spiritual dimensions. The thinking-feeling-acting among health professionals is still very fragmented, with a biological view of illness prevailing. This heritage of health education is historically assigned to the Flexnerian model of understanding the health-disease process, reducing it only to the biological aspect. However, this new era of transformations that is affecting all of humanity, values hitherto little explored, or even hardly recognized, are gaining greater dimensions in integral healthcare of the person. It is in this aspect that this theoretical and practical study has its main objective; to understand spirituality in comprehensive health care of the person with breast cancer, from the perspective of health professionals (caregivers). Based on a penomenological methodology, it seeks to interpret, through a hermeneutic approach, the perceptions of different health professionals who care for people with breast cancer within the Mãos de Vida (Hands of Life) Extension Project of the University of Vale do Itajaí, in the State of Santa Catarina, to find out the associated meanings, values and attitudes in comprehensive care of people with breast cancer, and whether or not they attach importance to the subjective aspects such as spirituality in the health-disease process. The professionals surveyed reported that being a caregiver of a person with breast cancer is challenging because it requires developing an expanded view of the human being, seeing the person from a holistic perspective, and enhancing his or her capacity for self-healing. Spirituality, in the holistic care of the person, relates to the sense of life, its meaning and purpose, as well as the perception of a transcendent motivating energy. Moreover, in their speech, they believe that spirituality influences the health-disease process of these individuals in the Mãos de Vida Project, particularly as regards coping ability and the self-healing process. Keywords: Spirituality. Holistic care. Breast cancer. Health.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO E JUSTIFICATIVA ..................................................................... 7

2 OBJETIVO GERAL ............................................................................................. 14

2.1 Objetivos Específicos ................................................................................... 14

2.2 Problema ...................................................................................................... 14

3 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA .......................................................................... 15

3.1 Espiritualidade: Conceitos Fundamentais .................................................... 15

3.2 Cuidado integral ........................................................................................... 18

3.3 Câncer de mama .......................................................................................... 21

4 METODOLOGIA ................................................................................................. 24

4.1 Tipo de estudo e população ......................................................................... 25

5 COMPREENSÃO DOS DADOS ......................................................................... 28

5.1 Compreensão sobre as falas dos cuidadores .............................................. 29

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................ 39

REFERÊNCIAS ........................................................................................................ 42

ANEXOS ................................................................................................................. 45

ARTIGO I ......................................................................................................................................... 45

ARTIGO II ................................................................................................................. 68

APÊNDICE A - Roteiro de entrevista ...................................................................... 80

APÊNDICE B - Dados de Identificação .................................................................. 81

APÊNDICE C - Declaração de não existência de orçamento previsto para

execução da pesquisa ................................................................... 82

APÊNDICE D - Termo de consentimento livre e esclarecido ................................ 83

APÊNDICE E - Identificação e consentimento ....................................................... 85

APÊNDICE F - Termo de utilização de dados para coleta de dados de pesquisas

envolvendo seres humanos ........................................................... 86

APÊNDICE G - Termo de aceite de orientação ..................................................... 87

APÊNDICE H - Termo de anuência de instituição para coleta de dados de

pesquisas envolvendo seres humanos ......................................... 88

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1 INTRODUÇÃO E JUSTIFICATIVA

Esta dissertação trata sobre a espiritualidade no cuidado integral à saúde da

pessoa com câncer de mama, na perspectiva dos profissionais de saúde

(cuidadores), tendo como objetivo principal perceber a compreensão dos mesmos

sobre a espiritualidade, seu conceito e significado no cuidado integral às pessoas

com câncer de mama atendidas no Projeto de Extensão Universitária Mãos de Vida,

na Universidade do Vale do Itajaí (UNIVALI) em Santa Catarina, Brasil.

Para entender espiritualidade e a sua relação no processo saúde-doença,

torna-se necessário inicialmente entender de que forma se estruturou o estilo de

pensamento do profissional da área de saúde sobre conceito próprio de saúde,

assim como entender os movimentos históricos sobre a formação deste mesmo

profissional e de sua visão reducionista sobre ser humano, saúde e cuidado.

O atual modelo de cuidado em saúde orientado para a assistência à doença,

valorizando apenas aspectos biológicos e excluindo toda a complexidade da pessoa

e do que a envolve, centrado em hospitais e especialidades médicas, além da

utilização intensiva de tecnologia laboratorial e amparado pelo complexo industrial

farmacêutico, é reconhecido como modelo flexneriano.

Abraham Flexner, em 1910, organizou, sob forte influência capital do

complexo médico-industrial norte-americano, a reforma das faculdades de medicina

nos Estados Unidos da América por meio deste modelo reducionista e pouco

reflexivo (PAGLIOSA; DA RÓS, 2008). Demais determinantes, tais como os

aspectos psicossociais, a comunidade na sua história e organização, o ecoambiente

e a espiritualidade, não eram consideradas para o cuidado à saúde, assim como não

eram percebidas no processo de saúde-doença.

As posturas eram do ponto de vista teórico-metodológico, notoriamente

positivistas, apontando como único conhecimento seguro o científico, realizado por

meio da observação, da experimentação e da reprodução. A arte foi substituída pela

ciência, sepultando de vez aspectos intrínsecos complementares, fundamentais na

formação da boa prática médica integral, tais como a percepção e a valorização da

subjetividade do ser humano.

Esta concepção flexneriana, que influenciou todo o Ocidente, também

estruturou o modelo de assistência médica previdenciária brasileira na década de

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1940, expandindo-se na década de 1950, orientando ainda a organização dos

hospitais universitários de nosso país (SILVA JUNIOR; ALVES, 2007).

A instauração do governo militar brasileiro no ano de 1964 manteve o foco na

assistência à saúde individual, expandindo o modelo biomédico de atendimento por

meio do financiamento e da compra de serviços aos hospitais privados e ampliando

o consumo de equipamentos e medicamentos. Em meados da década de 70, foram

observadas importantes evidências da limitação desse modelo de assistência,

principalmente a pouca efetividade da ação da biomedicina no enfrentamento dos

problemas de saúde gerados pelo processo acelerado de urbanização. Doenças

psicossomáticas, neoplasias, violência, doenças crônico-degenerativas e novas

doenças infecciosas desafiavam a abordagem centrada em características

epidemiológicas e puramente biológicas do adoecer (SILVA JUNIOR; ALVES, 2007).

Apesar das enormes conquistas impulsionadas pela reforma sanitária

brasileira e pela VIII Conferência Nacional de Saúde em 1986, culminando com a

criação do Sistema Único de Saúde do Brasil (SUS) e desenhando um novo modelo

de atenção à saúde mais equânime e integral, a formação curricular do profissional

de saúde brasileiro continuou limitada nesses aspectos ampliados de assistência,

permanecendo ainda muito influenciada pela disseminação do modelo (científico)

flexneriano, sendo, portanto, um entrave para a evolução da assistência integral à

saúde da pessoa.

Há mais de dez anos atuando como médico clínico, o pesquisador percorreu,

como estudante e profissionalmente, diversos cenários da assistência à saúde da

pessoa, como ambulatórios, enfermarias, emergências e também nas unidades de

terapia intensiva, deparando-se, inúmeras vezes, com a complexidade da pessoa no

papel de paciente, familiares e profissionais da área de saúde. No entanto, não

obteve, durante toda a formação no curso de medicina e também durante a

especialização médica, a oportunidade de aprender e reconhecer de forma ampliada

a valorização dos inúmeros determinantes do processo saúde-doença, além do

“puramente biológico”.

O método de ensino baseado em evidências científicas, relacionando

estatísticas e doenças (e não centrado na pessoa), amparado em “tecnologia dura”

biologicista ancorada no complexo médico-industrial e excludente da complexidade

da pessoa, ainda é o modelo atual de ensino médico e das demais áreas da saúde

no Brasil.

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Durante sua formação médica, foi comum perceber a angústia com o

sofrimento das pessoas e também as incompreensões de colegas estudantes

durante a vivência acadêmica. Até mesmo professores, durante a prática

profissional, por vezes sucumbiram e acabaram inclusive por abandonar a carreira

da assistência médica devido a pouca compreensão da complexidade da pessoa.

Nosso método de aprendizado reducionista impossibilita e desvaloriza a percepção

de sentidos frente ao sofrimento humano, e o reduz apenas às bases

fisiopatológicas e estatísticas reprodutíveis e verificáveis.

Uma disciplina na formação médica que fomente a discussão sobre

espiritualidade e sua relação com o processo saúde-doença é inexistente nos

currículos obrigatórios dos profissionais da área de saúde no Brasil, estando

presente em raras universidades brasileiras, na forma de disciplina optativa, ou

mesmo como projetos de extensão universitária e cursos de pós-graduação. Isto

causa perplexidade, quando se pensa sobre a humanização do cuidado integral da

pessoa. Todavia a necessidade de uma percepção ampliada da pessoa urge na

atualidade. Vive-se numa era de distorção intensa de valores morais e éticos, pouca

solidariedade, individualidade, desamor, consumo irreflexivo e competitividade

animalesca. As relações sociais provocadas pelo consumo chegaram a tal ponto que

todas as relações passaram a ser reduzidas a relações de consumo, inclusive as

mais profundas relações afetivas – amizades, namoros, casamentos. O outro

passou, agora, a ser tomado também como objeto de consumo, útil enquanto

oferece satisfação, e dispensável ao fim da utilidade. As relações humanas das

pessoas que se constroem pelo consumo acabam sendo, como eles próprios,

imagem do consumo, e acabam por gerar uma fluidez, uma fragilidade cada vez

mais acentuada nos relacionamentos humanos (BAUMAN, 2006).

Na área da saúde, e especificamente durante a assistência profissional, há a

grande oportunidade de não somente diagnosticar e tratar patologias, mas também

prevenir e promover saúde. É um momento de interação especial entre pessoas que

precisam se inter-relacionar de maneira profunda – um encontro de quem precisa de

auxílio e de quem, a priori, possui conhecimentos específicos para acolher, auxiliar e

aconselhar. Para que essa relação aconteça, precisa-se ter um olhar profundo sobre

o cuidar; deve-se perceber não apenas a expressão física de suas queixas, mas

também valorizar o psíquico, suas crenças, valores, significados e propósitos, enfim,

sua espiritualidade.

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Para isso, além de tempo adequado para um acolhimento solidário, tem-se

que ter as premissas básicas de uma boa relação profissional de saúde-paciente:

Atenção, intenção e amor ao próximo. Quando não se está aptos para perceber a

complexidade da pessoa em seus aspectos de significados e propósitos, sua

maneira de reconhecer seu processo de saúde-doença e sua capacidade de

recuperação, perdem-se oportunidades de realmente auxiliar na essência do

processo patológico, como no câncer de mama, por exemplo.

O grupo de profissionais de saúde (cuidadores) de pessoas com câncer de

mama foi escolhido como amostra deste estudo devido não somente pelo grande

impacto negativo da enfermidade tumoral na saúde da pessoa, mas também pela

alta prevalência e incidência de pessoas com câncer de mama em nosso país. Para

o ano de 2012, foram estimados 52.680 casos novos, que representou uma taxa de

incidência de 52,5 casos por 100.000 mulheres. A taxa de mortalidade por câncer de

mama ajustada pela população mundial apresentou uma curva ascendente e

representou a primeira causa de morte por câncer na população feminina brasileira,

com 11,3 óbitos/100.000 mulheres em 2009 (BVS/MS; INCA, 2011). O Estado de

Santa Catarina, acompanhado das demais regiões do Sul e Sudeste, são as que

apresentaram as maiores taxas, com 12,6 e 12,7 óbitos/100.000 mulheres em 2009,

respectivamente (BVS/MS; INCA, 2010).

As mulheres acometidas pelo câncer de mama têm um impacto

multidimensional profundo, vivenciando no decorrer da história natural de sua

doença a incerteza, o medo, a amputação, a finitude. Outras buscam a força, a

ressignificação da vida, a fé, a reabilitação e até mesmo um despertar para a

espiritualidade.

A percepção da espiritualidade como dimensão da pessoa fez parte do

ambiente familiar do pesquisador desde a adolescência e, sem qualquer sombra de

dúvidas, teve um papel determinante em sua formação pessoal e profissional. Tal

percepção e valorização foram decisivas também para a escolha de sua carreira

profissional.

A preocupação com a dimensão não material da pessoa encontrou pouca

reverberação no ambiente acadêmico durante sua formação médica, no entanto, já

era notório, ainda como estudante, perceber o hiato que necessitava ser preenchido

na formação profissional, relacionando saúde e espiritualidade.

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Precisava ainda aprender que não somente de uma atenção ampliada à

saúde da pessoa e seus determinantes social, biológico, psicológico eram

fundamentais para a determinação do processo saúde-doença, mas também

compreender e valorizar uma dimensão espiritual, que envolve e que tem relação

direta com a qualidade do bem- estar da pessoa e do sentido em nossa existência.

A valorização desta dimensão espiritual para o sentido frente ao sofrimento,

às perdas, às dores, à terminalidade, ou mesmo a percepção de bem-estar, a

recuperação plena, a ressignificação da vida, todas são vivências de um fenômeno,

que emerge da espiritualidade da pessoa, e como uma força que mostra em uma

maneira de ser no cuidado em saúde e que necessitou ser desenvolvida frente ao

cuidado integral da pessoa.

Espiritualidade pode ser compreendida como aquilo que traz propósito à vida

das pessoas. Uma propensão humana a buscar significado à existência por meios

que transcendem o tangível, que pode ou não incluir uma participação religiosa

(KOENIG; MCCULLOUGH; LARSON, 2001). Já a religiosidade é o aspecto

institucional da espiritualidade, relacionada com crenças, rituais, escritas, dogmas e

símbolos (MOREIRA-ALMEIDA; KOENIG, 2006). Diversos trabalhos científicos vêm

demonstrando que a espiritualidade exerce forte influência no processo saúde-

doença da pessoa, desde a prevenção até a recuperação (KOENIG;

MCCULLOUGH; LARSON, 2001).

É necessário entender que os termos “espiritualidade” e “religiosidade” estão

relacionados, mas, apesar de muitas vezes serem utilizados como sinônimos, esses

conceitos não apresentam as mesmas características (SAAD; MASIERO;

BATTISTELLA, 2001).

Trabalhos relacionando espiritualidade à qualidade de vida, bem-estar

subjetivo, resposta imunológica, enfrentamento de doenças terminais, doenças

psiquiátricas, estão sendo publicados desde a década de 80 e com um rigor

científico cada vez maior (MOREIRA-ALMEIDA, 2007).

A importância do reconhecimento da espiritualidade como estratégia de

enfrentamento e a identificação das carências espirituais da pessoa faz com que o

profissional de saúde possa planejar e fornecer uma assistência da forma mais

integral possível (GUERRERO, 2011). Além disso, outros estudos relataram a

importância do cuidado integral, acessando a dimensão espiritual da pessoa, já que

algumas delas afirmaram maior confiança no cuidado em saúde por meio da própria

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fé e referiram ainda melhor capacidade para adaptar-se a novas situações. Porém,

outros autores referiram alguns obstáculos para executar esse “cuidado espiritual”

adequado, como a falta de tempo para um diálogo prolongado entre a equipe de

saúde e a pessoa, além de dificuldades para identificar as reais necessidades da

própria pessoa (WESTMAN; BERGENMAR; ANDERSSON, 2006).

Não há intenção do pesquisador, nesta dissertação, de negar os tantos

avanços tecnológicos fundamentais de nossa ciência moderna baseada em

evidências e que norteiam condutas dos profissionais da área da saúde nos dias

atuais, mas, acima de tudo, agregar valores pouco compreendidos e estudados,

contudo percebidos por alguns desses mesmos profissionais relacionados à

complexidade da pessoa em sua dimensão espiritual. Independentemente de se

possuir crenças materialistas ou espirituais, atitudes religiosas ou antirreligiosas,

necessita-se explorar a relação da espiritualidade e da saúde para aprimorar o

conhecimento sobre o ser humano e suas abordagens terapêuticas (MOREIRA-

ALMEIDA, 2007). Sendo assim, deseja-se demonstrar, por meio desta dissertação,

Qual a compreensão dos cuidadores (profissionais da área da saúde) sobre a

espiritualidade no cuidado integral à saúde da pessoa com câncer de mama.

Para responder esta questão da dissertação, oriunda de uma pesquisa

fenomenológica junto a um grupo de profissionais da área de saúde e que atua no

Projeto de Extensão Mãos de Vida - UNIVALI, Itajaí, dentro de uma metodologia de

cuidado em saúde transdisciplinar - CItranSI, e que se define como uma tecnologia

de abordagem transdisciplinar, com foco na visão da pessoa e de saúde integral,

este trabalho foi estruturado em três capítulos.

O primeiro capítulo trata dos conceitos fundamentais sobre a espiritualidade e

a sua relação com o processo saúde-doença, sobre o cuidado integral da pessoa em

toda sua complexidade multidimensional e sobre o câncer de mama e o seu impacto

na saúde da pessoa.

O segundo capítulo aborda a metodologia desta pesquisa qualitativa,

ancorada na fenomenologia existencialista e que se apresentou como recurso

apropriado para perceber, por meio de interpretação hermenêutica, as experiências

vivenciadas pelos cuidadores pesquisados sobre espiritualidade no cuidado integral

à saúde da pessoa com câncer de mama.

O terceiro capítulo trata da compreensão dos dados, quando se faz a

escrituração das falas dos conceitos explicativos sobre os objetivos da pesquisa,

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captando o significado do que é ser cuidador em saúde, do significado da

espiritualidade e da influência da espiritualidade no processo saúde-doença da

pessoa com câncer de mama.

Por último, foram feitas as considerações finais, que dizem respeito à

espiritualidade como dimensão subjetiva da pessoa e que necessita ser despertada,

percebida e valorizada por parte das pessoas e em especial por parte dos

profissionais de saúde (cuidadores) com a finalidade de prover integralidade no

cuidado em saúde e sentido de ser no mundo.

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2 OBJETIVO GERAL

Compreender a espiritualidade no cuidado integral à saúde da pessoa com

câncer de mama na perspectiva dos cuidadores (profissionais da área da saúde).

2.1 Objetivos Específicos

Os objetivos específicos dessa dissertação são:

- Apresentar as características do modelo de cuidado em saúde e sua relação com

a espiritualidade.

- Compreender o significado da espiritualidade no cuidado integral da pessoa.

- Descrever a percepção de cuidadores sobre a influência da espiritualidade no

processo saúde-doença de pessoas com câncer de mama.

2.2 Problema

Qual a compreensão de cuidadores sobre a espiritualidade no cuidado

integral à saúde da pessoa com câncer de mama?

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3 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

3.1 Espiritualidade: Conceitos Fundamentais

Desde que o ser humano se entende como ser pensante, vem usando a

espiritualidade para entender o significado da vida e da morte, da sua presença no

mundo, para melhorar a saúde e como ferramenta para lidar com o enfrentamento

às adversidades e à dor, seja ela física, mental ou espiritual (KOENIG;

MCCULLOUGH; LARSON, 2001). Na Grécia antiga, com o advento da medicina

hipocrática, o homem tentou racionalizar essas crenças e práticas, retirando-as do

mundo mítico e criando um sistema que pudesse entender de forma racional o

impacto que atitudes, crenças, hábitos, ambientes e/ou ervas causavam no

organismo humano (REALE, 2002). Platão combinava ciência com elementos

espirituais, enfatizando a necessidade de tratar a “alma”, bem como o corpo físico.

Essa associação entre espiritualidade e cuidados em saúde perpassou toda a

Idade Média, a Idade Moderna e mesmo a Idade Contemporânea, nas quais a

religião controlou o exercício da medicina. A Igreja foi a responsável pela liberação

dos diplomas daqueles que queriam exercer a medicina, tendo muitos monges como

médicos e vice-versa. Ainda hoje, em pleno século XXI, instituições religiosas

dirigem vários hospitais, casas de saúde, programas de saúde e asilos.

Com o aparecimento da psicanálise de Freud, a ciência nascente,

especialmente as ciências biológicas, as quais embasam grande parte da medicina,

iniciou-se um processo de cisão entre duas áreas do conhecimento que sempre

andaram juntas: a medicina e a espiritualidade.

Somente no final da década de 1980, epidemiologistas americanos

relacionaram práticas espirituais/religiosas com indicadores de saúde. Eles

perceberam que entre os praticantes religiosos, por meio de orações e/ou cultos

religiosos, havia melhora na qualidade de vida, longevidade, menos doença física e

mental (COMSTOCK; PARTRIDGE, 1965).

É verdade que muitas dessas associações podem ser explicadas por outras

variáveis já reconhecidamente impactantes no modus operandi da saúde, como

menor consumo de álcool e drogas, maior apoio social, maior prática de exercícios

físicos, entre outros. Entretanto, tem-se verificado que mesmo esses fatores ou

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estilos de vida têm sido influenciados por diretrizes religioso-espirituais (KING;

BUSHWICK, 1994).

Espiritualidade pode ser entendida como aquilo que traz propósito à vida das

pessoas. Uma propensão humana que busca significado à existência por meios que

transcendem o tangível, a qual pode ou não incluir uma participação religiosa

(KOENIG; MCCULLOUGH; LARSON, 2001). É um fenômeno que se explica no real

e evoca a ciência para poder compreendê-lo. Já a transcendência exigida pela

experiência espiritual é a relação entre liberdades, a qual ocorre em todo encontro

pessoal.

Tillich (2005, p.268) afirma que “Deus é imanente ao mundo como seu

fundamento criativo permanente e transcendente ao mundo pela liberdade. Tanto a

divindade infinita quanto a liberdade humana finita tornam o mundo transcendente

para Deus e Deus transcendente para o mundo”. A percepção espiritual da realidade

dá à pessoa uma dimensão mais ampla de significados para os eventos da vida

diária e pode reorganizar subjetivamente suas experiências. Esta percepção de

sentido transcendente no cotidiano é a força motriz da existência humana, podendo

ser atingida por meio da religião, ou mesmo da meditação, arte, contato com a

natureza, sofrimento e relacionamentos afetivos (FRANKL, 2000).

Espírito vem do latim spiritus, que significa sopro, e se refere a algo que dá ao

corpo sua força vital. Demonstra a relação do plano material com a dimensão

imaterial, oculta ou sobrenatural que anima a matéria, transcendendo o ser humano

à dimensão divina (KOENIG et al., 1997).

O espírito (com “e” minúsculo, adequado àquela função da vida que

caracteriza o ser humano como humano), como dimensão da vida, une o poder de

ser com o sentido de ser. Esta experiência imediata torna possível falar

simbolicamente sobre Deus como Espírito e do Espírito divino (com “E” maiúsculo)

(TILLICH, 2005).

Religiosidade é o aspecto institucional da espiritualidade, relacionada com

crenças, rituais, escritas e símbolos (MOREIRA-ALMEIDA; KOENIG, 2006). Uma

forma dogmática, podendo inclusive ser distorcida por forças socioeconômicas,

culturais e políticas (STEINHAUSER et al., 2006).

Muito embora alguns autores vejam a distinção entre religiosidade e

espiritualidade como desnecessária, a espiritualidade é considerada mais primordial,

pura e diretamente relacionada com a alma.

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Assim, pode-se notar que alguns indivíduos demonstram um alto grau de

espiritualidade sem pertencer a uma religião instituída, outros têm sua

espiritualidade fundamentada na religião, e existem ainda aqueles que se vinculam

às relações sociais da religião, expressando, frequentemente, laços étnicos e

familiares.

O termo espiritualidade começou a receber maior atenção da medicina na

última década e não há mais dúvida da importância dos aspectos religiosos ou

espirituais no cuidado dos pacientes, embora ainda haja questionamentos a respeito

de como acessar a dimensão espiritual do ser humano e em que consiste o bom

“cuidado espiritual” (WILLIAMS, 2006).

Relacionando espiritualidade com cuidado em saúde na prática médica,

percebe-se que os pacientes querem ser tratados como pessoas, e não como

doenças, e serem observados como um todo, incluindo aspectos físico, emocional,

social e espiritual (OKON, 2005).

Em pesquisas na população geral e entre médicos dos Estados Unidos, as

crenças e o comportamento religioso foram estudados. Revelou-se que 95% das

pessoas acreditam em Deus, 77% acreditam que os médicos devem considerar as

suas crenças espirituais, 73% acreditam que devem compartilhar as suas crenças

religiosas com o profissional médico e 66% demonstram o interesse de que o

médico pergunte sobre a sua espiritualidade. No entanto, apenas 10% a 20%

relataram que os médicos discutiram a espiritualidade com elas (LARSON; KOENIG,

2000; ANAYA, 2002; COWAN et al., 2003; MARR; BILLING; WEISSMAN, 2007;

PHELPS et al., 2012).

Muitos médicos dizem que se sentem desconfortáveis ao falar sobre assuntos

religiosos ou que não têm tempo para lidar com isso. Outros não consideram os

assuntos espirituais como parte de seu trabalho, não entendem por que deveriam

ser abordados, não sabem como e nem quando introduzi-los e sequer imaginam

quais seriam os resultados, caso os incluíssem (MARR; BILLING; WEISSMAN,

2007).

Na literatura médica, e em especial na área da Oncologia e dos cuidados

paliativos, o tema religiosidade e espiritualidade ganha bastante importância. O

papel da espiritualidade em pacientes com câncer ou portadores da síndrome da

imunodeficiência adquirida e da dor é revisto, ressaltando os domínios do

significado, da esperança, do amor e dos relacionamentos. As avaliações e as

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intervenções espirituais destacadas para a promoção do conforto e a diminuição da

dor foram: a vontade de escutar, a atenção e a aceitação.

Há atualmente uma tendência na formação de um modelo multidisciplinar

envolvendo aspectos espirituais no tratamento da dor no câncer, discutindo o papel

de vários profissionais das áreas da saúde, tais como psicólogos, enfermeiros,

oncologistas, psiquiatras, capelães e religiosos, em que cada um desempenha um

papel específico, relacionando-se com o paciente (NEWSHAN, 1998; KOENIG;

GEORGE; TITUS, 2004).

Esta nova etapa do conhecimento científico reconhece a espiritualidade como

dimensão fundamental da pessoa na abordagem integral no cuidado do ser humano

por meio de uma visão auto-organizativa, relacionando o sentido do viver no mundo

ao processo saúde-doença, desvelando-se a partir de um movimento da expressão

legítima da criatividade natural do ser humano em toda a sua complexidade

multidimensional.

3.2 Cuidado integral

O cuidado é uma relação intersubjetiva que se desenvolve em um tempo

contínuo, e que, além do saber profissional e das tecnologias necessárias, abre

espaço para negociação e para a inclusão do saber e das necessidades do outro

(PINHEIRO; MATTOS, 2005).

Cuidado integral em saúde não é apenas um nível de atenção do sistema de

saúde ou um procedimento técnico, mas uma ação integral que possui significados e

sentidos voltados para a compreensão de saúde, como o „direito de ser‟, e, pensar

este direito de ser na saúde é ter „cuidado‟ com as diferenças dos que são

portadores não somente de doenças, mas de necessidades específicas. É, além

disto, garantir o acesso a outras práticas terapêuticas, permitindo a participação

ativa da pessoa na decisão acerca da melhor tecnologia médica a ser por ela

utilizada (ANDRADE, 2002).

O modelo biomédico atual que orienta o conjunto das profissões em saúde,

ao se apoiar nos meios diagnósticos para evidenciar lesões e doenças, afastou-se

do ser humano sofredor como totalidade viva e permitiu que o diagnóstico

substituísse a atenção e o „cuidado‟ integral à saúde. Entretanto, mais do que o

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diagnóstico, as pessoas desejam se sentir cuidadas e acolhidas em suas demandas

e necessidades (ANDRADE, 2002).

A integralidade pode ser entendida como uma das diretrizes básicas do

Sistema Único de Saúde do Brasil, por meio de uma forma de política organizacional

de práticas e serviços de saúde e também percebida como uma atitude profissional

(MATTOS, 2001). É neste último aspecto que se ressalta a importância da

integralidade no cuidado do sujeito.

A discussão da integralidade ou mesmo de um cuidado integral à saúde da

pessoa remonta às discussões do ensino médico nos Estados Unidos da América

em meados do século XX, quando Abraham Flexner, em 1910, fundamentou, sob

influência capital do complexo médico-industrial, a reforma das faculdades de

medicina nos EUA por meio de um modelo reducionista e pouco reflexivo

(PAGLIOSA; DA RÓS, 2008).

Em suas origens, de fato, a discussão sobre o cuidado integral em saúde

remonta aos anos 1960, época em que surgiram grandes questionamentos e críticas

sobre as atitudes fragmentadas no ensino médico, as quais eram adotadas pelas

escolas médicas nos Estados Unidos desde o início do século XX. Já a atitude

reducionista era apoiada pelo investimento do complexo médico-industrial desde

1910, quando, a partir do clássico relatório de Flexner, apontava os “caminhos

científicos do cuidado”. Os investimentos em tecnologia e na indústria farmacêutica,

assim como na estruturação de hospitais naquela época, foram sem precedentes na

história dos Estados Unidos da América. A crítica à visão reducionista da saúde

recaiu sobre o privilégio dado às especialidades na formação médica, cuja tendência

era a de recortar o corpo humano de acordo com o seu funcionamento, ou seja, em

sistemas ou aparelhos, desviando o olhar da totalidade das pessoas.

A partir do século XX, a integralidade da pessoa dava lugar à fragmentação

dos sistemas, a pessoa doente não era mais o foco da investigação, mas sim a

doença. Essa situação impedia que os estudantes e, posteriormente, os médicos,

tivessem a possibilidade de apreender as necessidades mais abrangentes de seus

pacientes. Tal fragmentação era vista também como reducionista, já que o

conhecimento médico nas diversas especialidades ressaltava as dimensões

exclusivamente biológicas em detrimento das considerações psicológicas e sociais

acerca da pessoa e do processo de adoecimento (MATTOS, 2001).

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A crítica formulada pelos adeptos da medicina integral sobre a formação

acadêmica que conduzia à fragmentação levou à implementação de reformas

curriculares e à introdução de novos currículos nas escolas médicas. Estas tinham

como enfoque orientar mudanças de atitudes que promoveriam um ensino não

reducionista e menos fragmentado e, consequentemente, a formação de futuros

médicos que fossem capazes de apreender de seus pacientes suas necessidades

de modo mais integral. Desta forma, o discurso inaugural do cuidado integral à

pessoa abarca um conjunto de atitudes éticas, humanas, filosóficas, antropológicas

e técnicas desejáveis para os médicos, relacionadas à sua possibilidade de

compreensão e de apreensão ampliada das necessidades das pessoas.

No Brasil, a medicina integral não se consolidou como um movimento

institucionalmente organizado, mas se associou inicialmente à medicina preventiva,

um dos berços do movimento sanitário brasileiro (MATTOS, 2001).

A integralidade é uma característica de boa prática do cuidado em saúde, e

defendê-la aqui não implica deixar de lado todo caudal do conhecimento sobre as

doenças, o qual tem permitido significativos sucessos, mas, sobretudo, é necessário

ter uma visão ampliada das necessidades das pessoas das quais se trata.

O atual conhecimento sobre as doenças, em alguns casos, permitiu à

medicina antecipar-se à manifestação dos sintomas e, às vezes, até mesmo à

instalação da doença. Surgiram técnicas capazes de reconhecer doenças antes que

estas produzam sintomas, por meio da identificação de fatores de riscos

relacionados à probabilidade de doença (MATTOS, 2001).

A atitude de um médico ou de outro profissional de saúde diante de uma

pessoa que busca prudentemente reconhecer para além das necessidades de ações

de saúde, como as relacionadas ao diagnóstico precoce e à redução de fatores de

risco, mas também demandas relacionadas a uma valorização do sentido e

significado da experiência da pessoa, ilustra um sentido da integralidade

profundamente ligado aos ideais da medicina integral.

Este olhar ampliado se faz necessário especialmente quando se cuida de

pessoas acometidas por doenças graves, incapacitantes e mutilantes, e que interfere

em toda sua dimensão física, psíquica e espiritual, como o câncer de mama. Para

essas pessoas que vivenciam a possibilidade de uma finitude antecipada pela

doença, torna-se ainda mais necessário compreender a complexidade

multidimensional da pessoa por meio do cuidado integral, não apenas reduzindo ao

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tratamento dos sintomas físicos do processo do adoecer, mas percebendo,

valorizando e também aconselhando a própria ressignificação da vida em si.

Desta forma, a complexidade do objeto saúde exige recriar a atuação dos

profissionais de vários campos do conhecimento que atuam na saúde, já que a

complexidade não é redutível à organização da atenção em determinado nível, mas

envolve a ação dos distintos profissionais nas diversas áreas complementares do

campo da saúde – a interdisciplinaridade, com uma percepção ampliada da pessoa.

3.3 Câncer de mama

O câncer da mama é o tipo de câncer que mais acomete as mulheres em todo

o mundo, tanto em países em desenvolvimento quanto em países desenvolvidos.

Em 2012, para o Brasil, foram esperados 52.680 casos novos de câncer da mama,

com um risco estimado de 52 casos a cada 100 mil mulheres (BVS/MS; INCA,

2010).

Esse tipo de câncer também é o mais frequente nas mulheres das regiões

Sudeste (69/100 mil), Sul (65/100 mil), Centro-Oeste (48/100 mil) e Nordeste (32/100

mil). Na Região Norte é o segundo tumor mais incidente (19/100 mil). A idade

continua sendo o principal fator de risco para o câncer de mama. As taxas de

incidência aumentam rapidamente até os 50 anos e, posteriormente, esse aumento

ocorre de forma mais lenta. Outros fatores de risco já estão bem estabelecidos, tais

como a menarca precoce, a nuliparidade, a idade da primeira gestação a termo

acima dos 30 anos, o uso de anticoncepcionais orais, a menopausa tardia e a

terapia de reposição hormonal e a história familiar de câncer da mama. A exposição

à radiação ionizante, mesmo em baixas doses, também é considerada um fator de

risco, particularmente durante a puberdade, segundo mostram alguns estudos. A

ocorrência do câncer da mama também se encontra relacionada ao processo de

urbanização da sociedade, evidenciando maior risco de adoecimento entre mulheres

com elevado status socioeconômico.

A história familiar de câncer de mama está associada a um aumento de cerca

de duas a três vezes no risco de desenvolver essa neoplasia. Alterações em alguns

genes responsáveis pela regulação e pelo metabolismo hormonal aumentam o risco

de desenvolver câncer da mama. A prevenção primária dessa neoplasia ainda não é

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totalmente possível em razão da variação dos fatores de risco e das características

genéticas que estão envolvidas na sua etiologia (BVS/MS; INCA, 2011).

O câncer de mama é um grupo heterogêneo de doenças, com variável

manifestação clínica, morfológica e genética, e consequentes diferenças nas

respostas terapêuticas. O sintoma mais comum do câncer de mama á o

aparecimento de nódulo, geralmente indolor, duro e irregular. Além disso, outros

sinais poderão estar presentes, tais como: edema e retração cutânea, dor, inversão

de mamilo, hiperemia, descamação ou ulceração do mamilo e secreção papilar.

Podem também surgir linfonodos palpáveis na axila.

Novas estratégias de rastreamento factíveis para países com dificuldades

orçamentárias têm sido estudadas e, até o momento, a mamografia, para mulheres

com idade entre 50 e 69 anos, é recomendada como método efetivo para detecção

precoce (BVS/MS; INCA, 2011). A amamentação, a prática de atividade física e a

alimentação saudável com a manutenção do peso corporal estão associadas a um

menor risco de desenvolver esse câncer.

No Brasil, o exame clínico anual das mamas e o rastreamento são as

estratégias recomendadas para controle do câncer da mama. As recomendações do

Ministério da Saúde para detecção precoce e diagnóstico desse câncer baseiam-se

no Controle do câncer de mama: documento de consenso, de 2004, que considera,

como principais estratégias de rastreamento, o exame clínico anual das mamas a

partir dos 40 anos e um exame mamográfico, a cada dois anos, para mulheres de 50

a 69 anos (BVS/MS; INCA, 2011).

Para as mulheres de grupos populacionais considerados de risco elevado

para câncer da mama (com história familiar de câncer da mama em parentes de

primeiro grau antes dos 50 anos de idade; história familiar de câncer da mama

bilateral ou de ovário em parentes de primeiro grau em qualquer idade; história

familiar de câncer da mama masculina; ou mulheres com diagnóstico histopatológico

de lesão mamária proliferativa com atipia ou neoplasia lobular in situ), recomenda-se

o exame clínico da mama e a mamografia, anualmente, a partir de 35 anos

(BVS/MS, INCA, 2011).

Apesar de ser considerado um câncer de relativamente bom prognóstico se

diagnosticado e tratado oportunamente, as taxas de mortalidade por câncer da

mama continuam elevadas no Brasil, muito provavelmente porque a doença ainda é

diagnosticada em estádios avançados.

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A sobrevida média, após cinco anos na população de países desenvolvidos,

tem apresentado uma taxa de cerca de 85%. Já nos países em desenvolvimento, a

sobrevida fica em torno de 60% (BVS/MS; INCA, 2011).

Por isso, além de todo o importante conhecimento epidemiológico, avanços

significativos no diagnóstico precoce e tratamentos cada vez mais eficazes do

câncer de mama, necessita-se compreender melhor a espiritualidade e a sua

importância no cuidado integral à saúde da pessoa.

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4 METODOLOGIA

A metodologia, de orientação fenomenológica, apresentou-se como recurso

apropriado para pesquisar as vivências dos cuidadores (profissionais da área da

saúde) de pessoas com câncer de mama (percepção, memória, reflexão, decisão),

possibilitando-se ampliar a compreensão em relação ao fenômeno vivido,

focalizando a experiência vivida e captando o significado atribuído pela pessoa a

essa vivência.

O desenvolvimento teórico e metodológico, então, ficou ancorado na

fenomenologia existencialista, entendendo que todo o processo vivido foi de síntese

entre o pesquisador e o seu objeto.

A fenomenologia é também uma filosofia que, na pesquisa, considera a

compreensão do fenômeno humano nas vivências de saúde desde sua existência no

mundo, a partir de sua condição de vida, valores e crenças. Kant (1992) já dizia, na

sua estética transcendental, que na busca do conhecimento a consciência do sujeito

não pode separar-se de seu objeto, pois o entendimento sobre um objeto

(fenômeno) será sempre com referência à intuição perceptiva do sujeito no seu rigor

reflexivo indutivo-dedutivo.

Fenômeno é aquilo que se apresenta à consciência do pesquisador e se

mostra numa confluência de relações, de padrões de ações que se constituem

dentro de uma rede complexa de componentes biofisiológicos e psicoespirituais

contextualizados no tempo e no espaço no corpo-criante (DITTRICH, 2004). O

fenômeno é um tecido de relações que ocorre através de múltiplas vivências e que

acontecem dentro de uma complexidade de acréscimos, tensões, confrontos,

quebras, rupturas e contradições de um determinado fato, coisa ou acontecimento

(DESAULNIERS, 2000). “Todavia, é o entendimento que „pensa‟ esses objetos e é

do entendimento que provém os conceitos” (KANT, 1992, p. 65). Esta visão do

filósofo abre à criação do pensamento fenomenológico, importante para a

metodologia de pesquisa qualitativa, quando se pode afirmar que o percurso de uma

metodologia na pesquisa teórico-prática pode dar-se desde numa hermenêutica

fenomenológica, na qual se entende que é o ser humano, na sua consciência

intuitivo-perceptiva, o nascedouro do processo do conhecimento sobre o objeto

pesquisado. O ser humano (no caso da ciência, o pesquisador) é o locus onde a

vida acontece e se expressa em pensamento sistematizado – o conhecimento.

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Como diz Maturana e Varela (1995, p. 76): “tudo que é dito, é dito por alguém”, pois

o conhecer e o fazer estão articulados numa maneira de ser do ser humano. E

continua: “O fato de o conhecer ser a ação daquele que conhece está enraizado no

modo mesmo de seu ser vivo, em sua organização” e que reflete na construção de

seus pensamentos e ações (MATURANA; VARELA, 1995, p. 76).

O ato da compreensão humana está profundamente associado às raízes mais profundas da vida, que biologicamente falando, se dinamizam em toda a estrutura molecular e celular do ser humano que tem em si, o fenômeno da cognição como possibilidade para criar, aprender e conhecer na inter-relação com o meio circundante. (DITTRICH, 2004, p. 71).

Diante disso, o processo metodológico desta pesquisa foi composto por um

movimento articulado do pesquisador na sua intencionalidade (a largada inicial, a

escolha diretiva, do olhar da consciência sobre o objeto – dados teóricos), na sua

percepção (impulso de uma intencionalidade subjetiva, forjada na consciência do

pesquisador para captar e significar, a partir de si, o que os dados da realidade

expressam) e na sua compreensão (expressão dos registros da percepção de

forma sistemática, ocorridos desde o levantamento de dados e reflexões para a

emissão de significados e problematizações possíveis, ampliando o conhecimento

sobre o tema de estudo, para descrevê-lo) (DITTRICH, 2010).

O pesquisador fenomenológico busca colocar entre parênteses todas as suas

pressuposições, ou seja, a apreensão do fenômeno não deve ocorrer a partir de

ideias preconcebidas sobre o fenômeno em estudo, mas sim a partir da

compreensão do nosso viver. Esse tipo de abordagem indica uma pesquisa

qualitativa por permitir compreender um problema na perspectiva dos sujeitos e do

pesquisador que o vivenciaram, referenciando o contexto social no qual o evento

ocorre.

4.1 Tipo de estudo e população

O tipo de estudo realizado foi de natureza teórico-prática, exploratória, com

abordagem fenomenológica. A coleta de dados se deu por meio de entrevista não

diretiva, pois foi a busca do pesquisador para compreender o seu objeto - a relação

entre saúde e espiritualidade nas falas dos profissionais da área da saúde

(cuidadores) das pessoas portadoras de câncer de mama atendidas no ambulatório

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de especialidades médicas da Universidade do Vale do Itajaí em Santa Catarina, por

meio de algumas perguntas abertas.

O objetivo geral dessa dissertação foi conhecer a importância da

espiritualidade no cuidado integral à saúde da pessoa com câncer de mama na

perspectiva dos cuidadores. Para isso, levantou-se o seguinte problema: Qual a

compreensão de cuidadores sobre a importância da espiritualidade no cuidado

integral à saúde da pessoa com câncer de mama?

A população pesquisada foi composta por oito (08) profissionais da área da

saúde, os quais foram nomeados por letra e por números. Convencionou-se como

E1 a letra e o número correspondente do primeiro entrevistado, E2 a do segundo

entrevistado, e assim por diante até o oitavo profissional entrevistado (E8), sendo 01

fisioterapeuta (E1), 02 estagiários-bolsistas (E2 e E4), 02 enfermeiras (E3 e E6), 01

médica (E5), 01 psicóloga (E7), 01 nutricionista (E8), todos participantes do Projeto

de Extensão Mãos de Vida, que atende semanalmente pessoas com diagnóstico de

câncer de mama no ambulatório de especialidades médicas da Unidade de Saúde

Familiar e Comunitária da UNIVALI, em Itajaí, Santa Catarina.

A escolha desta população de cuidadores se deveu pelo fato de se

reconhecer nesse projeto de extensão universitária uma proposta inovadora de

cuidado integral, quando, junto aos processos de atendimentos clínicos (Medicina,

Fisioterapia, Psicologia, Filosofia, Nutrição, Farmácia, Enfermagem e Educação

Física), trabalham-se, também, atividades ecoespirituais e arteterapêuticas, as quais

consideram a importância da dimensão espiritual da mulher para o cuidado em

saúde.

Inicialmente, o pesquisador procurou agendar com os sujeitos de pesquisa

um horário viável para que pudessem participar do estudo. Nesse caso, foram

realizadas duas visitas ao Projeto.

A maioria das entrevistas foi realizada na sala de reunião docente-assistencial

do ambulatório de atendimento clínico da UNIVALI.

A pesquisa foi avaliada e aprovada pelo Comitê de Ética da Universidade do

Vale do Itajaí - SC, e só depois de sua aprovação foi iniciada a coleta de dados.

Realizou-se a partir de uma aproximação do pesquisador aos profissionais de saúde,

em seu local de trabalho, ocasião em que foi solicitada a assinatura pelos

participantes do termo de consentimento livre e esclarecido, que explicitava os

objetivos da pesquisa e seus procedimentos, além de garantir sigilo. A partir daí, o

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pesquisador iniciou a entrevista com as perguntas abertas, consideradas como

roteiro para a coleta de dados: “Qual o sentido para o Sr.(Sra.) em ser cuidador de

uma pessoa com câncer de mama?” “O que significa espiritualidade para o Sr.(Sra.)

no cuidado integral à pessoa com câncer de mama?” “Na sua percepção, a

espiritualidade pode influenciar no processo saúde-doença entre as pessoas com

câncer de mama? Por quê?”

Os participantes puderam falar livremente e foram feitas poucas intervenções

no decorrer da fala dos profissionais, para ampliar e aprofundar as suas respostas

com outras questões, quando eram necessárias e relevantes para o estudo. Para

obter o material discursivo, foco do estudo de percepção das vivências dos

profissionais de saúde, foram realizadas gravações das entrevistas com o uso do

MP3 (gravador digital). Logo após cada entrevista, foi feita a transcrição na íntegra

de suas falas. Todos os participantes convidados aceitaram livremente participar do

estudo.

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5 COMPREENSÃO DOS DADOS

Esta pesquisa, sendo teórico-prática, qualitativa e fenomenológica, encontra

metodologicamente subsídios para a compreensão dos dados teóricos a serem

apreendidos para a explicitação do seu objeto na hermenêutica fenomenológica.

Aqui, hermenêutica quer dizer: uma postura, uma maneira de entender e expressar a

percepção sobre os dados da investigação teórico-prática de forma qualitativa. As

raízes hermenêuticas da compreensão humana nascem do corpo-criante, do

pesquisador em busca de respostas para os seus questionamentos, quando não se

separa de seu objeto de pesquisa.

Corpo-criante se quer entender um todo vivo, dinâmico, inter-relacionado nas suas partes com capacidade de se autocriar, que implica a sua autonomia de se fazer constantemente, causando mudanças contínuas em si e fora de si, para a preservação da própria vida. Explicitando: o homem, um corpo que cria, é um todo vivo. Ele é orgânico, pois tem em si uma auto-organização vital inteligente, sustentada por um princípio fundante – a energia criadora, que detém a vida que se impregna desde as suas micropartículas elementares, atravessando os seus átomos, suas moléculas, suas células, seus ossos seus músculos, até a sua macroconstituição corporal total. (DITTRICH, 2001, p. 81).

O percurso realizado pelo pesquisador para chegar às categorias chave da

pesquisa e para perceber a compreensão do fenômeno foi apoiado no sentido das

experiências vividas pelas profissionais de saúde entrevistadas para chegar à

essência dessas vivências, captando o significado do que é ser cuidador em saúde

(categoria 1), o significado da espiritualidade (categoria 2) e a influência da

espiritualidade no processo saúde-doença (categoria 3) das pessoas portadoras

de câncer de mama atendidas no Projeto Mãos de Vida. Logo, dessas percepções

do pesquisador nasceu a sua compreensão, que foi se explicando pelo cruzamento

dos dados da prática com os referenciais teóricos de fundamentação do seu objeto.

Todas as percepções que explicaram a pesquisa ocorreram diante de três

movimentos segundo Dittrich (2004).

O primeiro movimento é para apreender a compreensão do objeto é o da

intencionalidade. Este é o momento da abertura da consciência do pesquisador

para encontrar referências sobre o seu objeto, bem como direcionar-se para coletar

os dados da prática e selecioná-los. O segundo é o movimento da percepção do

pesquisador, para selecionar os dados teóricos e práticos e organizá-los, para assim

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refletir sobre eles, buscando uma prévia compreensão. O terceiro é a descrição da

compreensão da consciência do pesquisador sobre o objeto com os dados

coletados, quando se fará a escrituração dos conceitos explicativos sobre os

objetivos da pesquisa (DITTRICH, 2004).

5.1 Compreensão sobre as falas dos cuidadores

Segundo a percepção do pesquisador, que implica estrutura essencial à luz

da hermenêutica fenomenológica na articulação com a fundamentação teórica para

o desvelamento do conhecimento da espiritualidade no cuidado integral à saúde da

pessoa com câncer de mama, na perspectiva dos cuidadores, apresenta-se a seguir

os resultados da entrevista com os participantes da pesquisa.

Os profissionais de saúde pesquisados, quando interrogados sobre o que é

ser um cuidador de saúde, relataram que ser cuidador de uma pessoa com câncer

de mama é um desafio, por necessitar desenvolver um olhar ampliado em relação ao

ser humano, assistindo-o de maneira integral e potencializando sua capacidade de

autocura.

Nos discursos a seguir, de três profissionais de saúde (E2, E3 e E8), tornou-

se claro que significaram o ato de ser cuidador a uma ação (potencializar,

empoderar, desenvolver) que realizaram, a fim de desvelar a capacidade que a

própria pessoa possui em participar ativamente do processo de cura de sua

enfermidade. E2 diz que “É justamente potencializar o que às vezes o paciente tem,

às vezes a própria autocura que ele desconhece.” E3 confirma que “É ajudando da

forma que for possível no cuidado interdisciplinar, multidisciplinar que a gente

desenvolve. Então, é uma forma de trabalhar com a questão da humanização, e

fortalecer até mesmo o poder de cura que ela mesmo possa ter e que às vezes não

sabe que tem.” E8 também compreende que “É uma oportunidade de a gente ajudar

a pessoa para que ela entenda o que é o empoderamento e o quanto ela consegue

participar nesse processo de cura”.

Por meio de suas falas, as profissionais de saúde, aqui, entenderam que

eram capazes de despertar a potencialidade de cada enfermo, a fim de capacitá-los

para a autocura. Todavia, questões conceituais inerentes ao ser cuidador foram

pouco exploradas, e mesmo a forma de como potencializaram tal capacidade entre

os pacientes não foi elucidada.

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A concepção de cuidado integral em saúde não se caracteriza apenas por um

nível de atenção do sistema de saúde, ou por um procedimento técnico simplificado,

mas sim por uma ação integral que possui significados e sentidos voltados para

compreensão de saúde, como o „direito de ser‟.

Pensar o direito de ser na saúde é ter „cuidado‟ com as diferenças dos

sujeitos, respeitando as relações de etnia, gênero e raça, os quais são portadores

não somente de deficiências ou patologias, mas de necessidades específicas.

Pensar o direito de ser também é ainda garantir acesso a outras práticas

terapêuticas, permitindo a pessoa participar ativamente da decisão acerca da melhor

assistência a ser por ela utilizada (ANDRADE, 2002).

Já o conceito de ser humano pertence ao caráter da existência. Todo o ser

participa na estrutura do ser, mas só o ser humano está imediatamente consciente

desta estrutura dimensional biopsicoespiritual. O ser humano experimenta a si

mesmo como possuindo um mundo ao qual pertence. A estrutura ontológica, ou

seja, a do ser, é básica e emana da percepção desta relação dialética complexa

(TILLICH, 2005). E essa estrutura é complexa e dinâmica, em sua auto-organização

de sistemas - autopoiese – e é intrínseca do ser humano, fundamentada no amor

vital, fonte propulsora de energia que impulsiona os processos vital-cognitivos e que

constituem e definem o ser humano como corpo-criante no mundo (DITTRICH,

2001).

Percebeu-se ainda que um estilo de pensamento entre as profissionais de

saúde era de que uma vez explicitada a questão de um possível potencial do corpo-

criante, individual e intransferível, conseguiriam redimensionar a própria doença e a

sua história natural evolutiva. Aqui, corpo-criante significa - “um todo vivo, dinâmico,

inter-relacionado nas suas partes com capacidade de se autocriar, que implica a sua

autonomia de se fazer constantemente, causando mudanças contínuas em si e fora

de si, para a preservação da própria vida” (DITTRICH, 2001, p. 81).

A profissional E4, já traz outra ideia do sentido do que é ser uma cuidadora:

“Meu processo como cuidadora me fez crescer muito, enxergando o paciente como

um todo, né!? Não só como, ah, tem o diagnóstico de câncer positivo, mas tá! Quem

é essa pessoa? Como é que ela enxerga a vida? Como é que ela está lidando como

processo saúde-doença?” Nesta fala, entende-se que há importância de um olhar

ampliado para o sujeito enfermo, desfocando o aspecto apenas patológico e abrindo

espaço para seus sentidos perceberem as potencialidades e as necessidades da

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pessoa além da doença. De fato, torna-se fundamental essa percepção, pois o

modelo biomédico atual que orienta o conjunto das profissões em saúde, ao se

apoiar nos meios diagnósticos para evidenciar lesões e doenças, afastou-se do

sujeito humano sofredor como totalidade viva e permitiu que o diagnóstico

substituísse a atenção e o „cuidado‟ integral à saúde. Entretanto, mais do que o

diagnóstico e a terapêutica direcionada à patologia, as pessoas desejam se sentir

cuidadas e principalmente acolhidos em suas demandas e necessidades

(ANDRADE, 2002).

Na percepção da profissional E5, ser cuidadora significa ter intencionalidade

de realizar uma “comunhão de ideias e ações, a partir de sua percepção, com a

necessidade do outro. Ter o sentido de realmente fazermos uma parceria com

nossos pacientes e não o contrário. Se nós não buscarmos dar-nos as mãos e

realmente olharmos nos olhos dos nossos pacientes e ouvirmos... Termos ouvidos

para realmente escutarmos aquilo que aparece... muitas vezes a gente pouco toca

aquilo que realmente faz uma diferença no processo de saúde dos pacientes.” Tal

conceito vem ao encontro de que o cuidado é uma relação intersubjetiva que se

desenvolve em um tempo contínuo, e que, além do saber profissional e das

habilidades necessárias, abre espaço para negociação e para inclusão do saber,

dos desejos e das necessidades do outro (PINHEIRO; MATTOS, 2005). Ser

cuidador, portanto, é desenvolver este olhar ampliado, que se faz necessário

especialmente quando se cuida de pessoas acometidas por doenças, não apenas

reduzindo ao tratamento dos sintomas físicos do processo do adoecer, mas

percebendo, valorizando e também aconselhando a própria ressignificação da vida

em si.

Os profissionais de saúde significaram a espiritualidade no cuidado integral

das pessoas com câncer de mama relacionando-a ao sentido de vida de cada

pessoa, seus significados e propósitos, além da percepção de uma energia

motivadora transcendente. Aqui, E1 percebe da seguinte maneira: “Eu tenho visto

que essa fé me fez modificar como pessoa. Essa conexão..., como ela é importante

para que a reabilitação aconteça, para que a cura aconteça, ou para que a aceitação

do tratamento aconteça. A gente consegue perceber que, quando esse sentido da

vida não está presente, como elas têm um semblante mais fechado, mais escuro,

um olhar mais perdido e um discurso mais vago”. Nesta outra fala, E7 entende que

“A espiritualidade, no caso, eu acho que é a pessoa estar ligada não só com relação

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a uma religião, né? É ela acreditar em alguma coisa, ela crê que a vida dela tem um

por que maior, né?” Ambas as entrevistadas aqui, referiram ainda aspectos de

significados e sentido da vida como algo fundamental para o êxito ou o fracasso da

recuperação da saúde. Cada pessoa tem uma vocação própria ou missão específica

na vida; cada um tem uma tarefa concreta, exigindo realização. Mas tal tarefa – o

sentido – não é algo estático: o sentido muda de acordo com a pessoa e a situação,

uma vez que a existência e cada homem apresenta um caráter de algo único

(FRANKL, 1986). As profissionais E1 e E7, portanto, relacionaram o conceito de

espiritualidade ao sentido da vida de cada pessoa e a uma conexão com algo, ou

uma transcendência, para que aspectos curativos ou de resignação acontecessem.

Houve aqui nos discursos de E1 e E7 uma dificuldade da expressão do

fenômeno que se explica no real e evoca a ciência para poder compreendê-lo.

Transcender está relacionado a ligar-se à espiritualidade como postura de

conexão com o sagrado, e que traz força para o processo de cura e libertação.

A união transcendente aparece no espírito humano como movimento extático, que quer dizer movimento para fora, em êxtase, que desde um ponto de vista, é chamado de “fé” e, desde outro é chamado de “amor”. Estes dois estados manifestam a união transcendente que é criada pela Presença Espiritual no espírito humano. Deus é imanente ao mundo como seu fundamento criativo permanente e é transcendente ao mundo pela liberdade” (TILLICH, 2005, p. 584).

Pode-se definir espírito como uma dimensão da vida, que une o poder de ser

com o sentido de ser, ocorrendo apenas no ser humano. O espírito humano como

dimensão da vida é ambíguo, como o é toda forma de vida, ao passo que o Espírito

divino cria vida sem ambiguidade (TILLICH, 2005).

Espiritualidade pode ser entendida como aquilo que traz propósito à vida das

pessoas. Uma propensão humana a buscar significado à existência por meios que

transcendem o tangível, que pode ou não incluir uma participação religiosa

(KOENIG; MCCULLOUGH; LARSON, 2001). De fato, os termos “espiritualidade” e

“religiosidade” muitas vezes se confundem e estão relacionados, mas, seus

conceitos não apresentam as mesmas características (SAAD; MASIERO;

BATTISTELLA, 2001). A espiritualidade é mais ampla e pessoal, está relacionada a

um conjunto de valores íntimos, completude, interior, harmonia, conexão com os

outros; estimula um interesse pelos outros e por si; uma unidade com a vida, a

natureza e o universo. Para alcançar o espiritual, uma pessoa não necessita

pertencer a uma religião, ou seja, a um sistema de crenças organizado e

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compartilhado por um grupo e que inclui a existência de uma força divina ou um ser

superior com propostas de normas, dogmas e rituais (SAAD; MASIERO;

BATTISTELLA, 2001).

Na fala da profissional E6, houve a busca por um elo de seu significado entre

a espiritualidade e o sentido de sua existência, acreditando que, por conseguir

perceber o outro, é um ser espiritual. “Uma concepção do sentido de vida delas, por

que elas existem? Qual o sentido da existência delas, né? Acho que isso é

espiritualidade. Acho que assim: Eu me considero uma pessoa espiritualizada,

porque consigo perceber o outro, consigo ver o outro”. Aqui, cabe perceber que a

profissional não conseguiu desenvolver de que forma percebe o outro.

A percepção espiritual da realidade dá à pessoa uma dimensão mais ampla

de significados para da vida e pode reorientar suas experiências. Esta percepção de

sentido transcendente na experiência cotidiana é a força motriz da existência

humana. Religião, arte, meditação, sofrimento, amorosidade ou contato com a

natureza, são todas possibilidades de atingí-la (FRANKL, 2000).

Já a profissional E2 atribuiu o significado da espiritualidade à fé ou a uma

energia motivadora que a impulsiona para um sentido de vida. “A espiritualidade, eu

acho que é, diferente da religião, a espiritualidade, ela está ali, justamente para..., é

a fé! É aquela energia motivadora, que às vezes a gente tem que buscar, que tem

que encontrar, que está perdida. Acho que a espiritualidade está justamente nesse

ponto-chave de transcender, né!?, e não viver por viver às vezes!”.

A profissional E2 revelou que acredita na diferença conceitual entre

espiritualidade e religiosidade, mas aqui foi importante trazer conceitos mais

explicativos das distinções, assim como aspectos teológicos sobre a fé.

Fé, quando definida de maneira formal (válida para qualquer tipo de fé em

todas as religiões e culturas), é o estado de ser possuído por aquilo a que aspira a

autotranscendência, o incondicional em ser e sentido. É o estado de ser tomado por

uma preocupação última, de ser possuído pela presença espiritual e de ser aberto à

unidade transcendente da vida-sem-ambiguidades (TILLICH, 2005).

Já a religiosidade é o aspecto institucional da espiritualidade, relacionada com

escritas, símbolos e dogmas, podendo ser influenciada por forças socioeconômicas,

culturais e políticas (MOREIRA-ALMEIDA; KOENIG, 2006). Muito embora alguns

autores vejam a distinção entre religiosidade e espiritualidade desnecessária, pode-

se notar que algumas pessoas demonstram um alto grau de espiritualidade sem

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pertencer a uma religião instituída, outras têm sua espiritualidade fundamentada na

religião.

Nas falas das profissionais E3 e E4, transcritas a seguir, houve um

desencontro conceitual quanto ao entendimento e ao significado da espiritualidade

no cuidado integral ao ser humano. Aqui, E3 traz o conceito de que “Espiritualidade

é um termo muito amplo, e aqui a gente trabalha bem, procura trabalhar nessa

perspectiva. É quando o sujeito mostra a fé dele. Também a fé na questão física...,

mas também não só que ele acredita efetivamente enquanto religião enfim..., mas

como isso se processa dentro dele.” O discurso anterior trouxe um conceito de

crença de questões físicas e religiosas, entendendo muito mais aspectos

psicológicos de autoconhecimento e autopercepção do que propriamente o aspecto

de conexão com uma forma de energia motivadora e transcendente. Já a

entrevistada E4 tem outro entendimento: “Pra mim é uma coisa só: a espiritualidade

e a física quântica. Só quem acha que a espiritualidade é física quântica e quem

acha que física quântica é espiritualidade. Pra mim são coisas uníssonas.”

Aqui, nesta conceituação, a entrevistada E4 relacionou ou mesmo equiparou

a espiritualidade ao conceito de física quântica, que, em verdade, é uma ciência que

envolve estudo dos sistemas físicos cujas dimensões são próximas ou abaixo da

escala atômica, tais como moléculas, átomos, elétrons, prótons e de outras

partículas subatômicas, muito embora também possa descrever fenômenos

macroscópicos em diversos casos. A Mecânica Quântica é um ramo fundamental

da Física com vasta aplicação. A teoria quântica fornece descrições precisas para

muitos fenômenos previamente inexplicados, tais como conceitos de partícula –

objeto com uma mínima dimensão de massa, que compõe corpos maiores –; e

conceito de onda – a radiação eletromagnética, invisível para nós, que não necessita

de um ambiente material para se propagar, e sim do espaço vazio (MEHRA;

RECHENBERG, 1982).

Nas falas das profissionais E5 e E8, houve uma percepção de que a

espiritualidade teve exclusivamente uma relação de autoconhecimento e o

enfrentamento espiritual - coping espiritual. E5 entende que “Acessar os sentimentos

que as pessoas têm sobre aquilo que acontece, então, a simbologia daquilo que

acontece, quer dizer. Elas falarem sobre esse processo do não estar saudável, elas

têm possibilidade de encontrarem dentro delas as respostas e, a partir disso, acabar

fazendo uma ponte também para a questão da espiritualidade, que tem haver com o

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quê? Com aquilo que a pessoa acredita! Como ela entende o seu processo do não

estar saudável e qual é o enfrentamento que ela tem sobre isso, a intencionalidade

também dela se melhorar.” E6 percebe que “A espiritualidade é a elevação do ser

mesmo. É o contato consigo, eu acho que é o processo de autoconhecimento.”

O conceito de coping religioso/espiritual está inserido nas áreas da psicologia

cognitivo-comportamental, psicologia da religião, psicologia positiva, psicologia da

saúde e do escopo de estudos sobre religião e saúde, medicina e espiritualidade,

tendo sido delineado a partir do estudo cognitivista do estresse e do coping.

Os resultados mostram que o coping religioso/espiritual é o uso da religião, da

espiritualidade ou da fé para lidar com o estresse. Estratégias de coping, conforme

consequências que trazem para quem as utiliza, podem ser classificadas como

positivas ou negativas, estando geralmente associadas, respectivamente, a

melhores ou piores resultados de saúde física/mental e qualidade de vida

(GOBATTO; ARAUJO, 2010).

Já quando as entrevistadas foram questionadas se, na percepção delas, a

espiritualidade poderia influenciar no processo saúde-doença entre as pessoas com

câncer de mama e por que, as falas foram mais concordantes, apesar de

conceituarem diferentemente os princípios fundamentais de cuidado e

espiritualidade. As entrevistadas acreditam com muita firmeza que a espiritualidade

influencia o processo saúde-doença nessas pessoas do Projeto Mãos de Vida,

especialmente quanto ao enfrentamento e à possibilidade de autocura.

As profissionais E1 e E3 acreditam com muita certeza que a espiritualidade

influenciou o processo saúde-doença das pessoas do Projeto Mãos de Vida,

especialmente quanto à possibilidade de autocura e de enfrentamento da doença.

E1 acredita que “Bom..., sim. Nós percebemos tranquilamente, e vou falar

aqui por mim, mas as minhas amigas de trabalho a mesma coisa. A diferença entre

a mulher que desenvolve essa qualidade, que trabalha sua espiritualidade, sua

crença, a sua fé e a que não trabalha com isso. A resposta ao tratamento, o seu

comportamento, a questão de como ela enfrenta, muitas, muitas desenvolvem a

resiliência, senão todas”. O processo de autocura pode ser referido como uma

capacidade própria do ser humano de se auto-organizar no seu sistema complexo

de ser vivo – autopoiese, segundo Maturana e Varela (1995). Esse ser humano, em

sua estrutura complexa e organização dinâmica, constrói-se e se reconhece por

meio da criatividade, fundamentada no amor-criante e alicerçado no amor vital, fonte

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propulsora que impulsiona os processos vital-cognitivos e que constituem e definem

o ser humano como corpo-criante (DITTRICH, 2010).

Contudo, E3, apesar de acreditar na influência da espiritualidade no processo

de saúde-doença, tem o seguinte entendimento “Eu acho que assim, ela tem tudo a

ver, né? A espiritualidade, assim... é uma coisa que eu vejo bem na prática. A

pessoa que a gente atende, já quando ela tem o diagnóstico, e ela tem uma

perspectiva de vida positiva, ela vai passar isso com tranquilidade nesse processo.

Ela vai fazer o diagnóstico, o processo de aceitação dela vai ser melhor, todo esse

processo de cirurgia, pós-operatório, quimioterapia, radioterapia ela vai levar com

muito mais tranquilidade, ela vê aquilo como uma coisa positiva pra vida dela, né?

Às vezes ela faz mudanças de estilo de vida, mudança de ela ver o outro, né? Eu

acho que isso é crescimento dentro da espiritualidade. Então ela já traz uma

positividade perante a vida, perante ela como um ser. E ai ela vai traspassar com

essa positividade dela também nesse processo de doença que ela está passando,

né?” “Eu acho que está..., estritamente ligado. Eu tenho percebido que, sem dúvida

alguma, que aquelas que desacreditam do tratamento, elas desacreditam da vida.

As que acreditam no tratamento, elas acreditam na vida.”.

Aqui, a profissional atribui que a espiritualidade influencia no processo saúde-

doença, mas especialmente relacionado ao enfrentamento e à crença individual do

que propriamente à energia sutil que envolve a pessoa e influencia amplamente a

saúde em sua totalidade.

A vida é um mistério infinito, cada sujeito é muito mais que o seu próprio

limite, tem um “núcleo pessoal” ou “centro da pessoa” que pode sempre se

desenvolver e crescer. Sob essa visão, a pessoa percebe sua exigência de ser e de

se posicionar no mundo, porque possui uma força vital. É por meio dessa força que

cada um se posiciona e se situa nas circunstâncias no mundo da vida (ALLES

BELLO, 2007).

Esta força vital, energia da vida e oriunda do amor vital, proveniente das

relações pessoais e sociais, é que impulsiona os processos vital-cognitivos (rede)

por meio de um sistema complexo que constitui o ser humano em um corpo-criante

(DITTRICH, 2001).

Nas falas das profissionais E2 e E7, apesar de concordarem com a influência

da espiritualidade no processo saúde-doença das pessoas atendidas no Projeto

Mãos de Vida, percebeu-se que elas foram além da valorização do enfrentamento e

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da crença pessoal. E2 diz “Com certeza. Eu acho que, primeiramente não sei se tem

alguma relação, mas o próprio desencontro desse lado espiritual talvez predisponha

ao próprio câncer, ao adoecimento, às doenças, facilita..., e quando a pessoa, ela se

sente com mais vitalidade talvez, talvez quando ela encontre essa própria energia

que tem dentro dela, eu acho que além de estar ajudando o processo de doença, ela

pode estar também prevenindo, né!?” Já E7 entende que “Com certeza, com

certeza. A gente percebe a diferença do atendimento das pessoas que entram e que

têm uma espiritualidade mais desenvolvida daqueles que são mais céticos,

entendeu? E as que acreditam e estão envolvidas de certa forma nessa atmosfera,

elas têm uma evolução melhor. Elas, muitas vezes, entram de um jeito, entram

carregadas, que a gente percebe que têm uma energia pesada, eu não sei te

explicar como. É só sentindo e só você estando ali para você ver o negócio, para

você sentir. E quando elas saem, você percebe que até a respiração delas está mais

calma, baixou aquela energia ruim, sabe?” Elas narraram, pois, de forma ainda que

sem estrutura conceitual ampliada, a presença de uma energia vibracional,

perceptível e variável individualmente, que influencia todo o processo de

recuperação de saúde.

Segundo o modelo quântico, todos os fenômenos (inclusive o que se chama

de energia mental e sutil, e mesmo o que chamamos de espírito) existem devido a

partículas elementares subatômicas e às suas interações, sendo que partículas

elementares formam átomos, átomos formam moléculas, moléculas formam células

e células formam toda a energia sutil (GOSWAMI, 2006). Portanto, o fazer vivo da

matéria é energia, e, nessa perspectiva, a energia é o sustentáculo de toda estrutura

e organização do corpo-criante, o ser humano (DITTRICH, 2001).

Esta nova etapa do conhecimento científico reconhece a espiritualidade na

abordagem integral no cuidado da pessoa por meio de uma visão auto-organizativa,

relacionando-a ao sentido do viver no mundo e ao processo saúde-doença,

desvelando-se a partir de um movimento da expressão legítima da criatividade

natural do ser humano em toda a sua complexidade multidimensional.

Tal criatividade estrutura e dinamiza este corpo-criante em questão que,

existencialmente falando, apresenta uma tendência inconsciente de buscar conhecer

sua fonte de origem criadora – Deus, o fundamento último – espírito de amor criante

(DITTRICH, 2010).

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A dimensão profunda, espiritual, como lócus fundamental de onde emerge a

percepção do ser humano em si e para além de si se apresenta como força criadora

inconsciente, que, na sua dinâmica vital, impulsiona o ser humano a reconhecer que

existe em si uma presença ignorada, a qual ele chamou de Deus e que o remete à

descoberta do sentido da vida, que por sua vez acontece pela criatividade do ser

humano (DITTRICH, 2010). Relacionando espiritualidade e cuidado em saúde na

prática médica, percebe-se que as pessoas desejam ser cuidadas como pessoas e

não tratados como doenças. (OKON, 2005).

Apesar de encontrar uma variação da conceituação de cuidado integral e de

espiritualidade, bem como sua influência no processo saúde-doença entre as

profissionais de saúde pesquisadas e que se apresentou desde uma propriedade de

autocura até mesmo de um enfrentamento (coping) espiritual, compreendeu-se que

a intencionalidade, a responsabilidade e, principalmente, a amorosidade com que o

grupo desenvolve o projeto são, sem dúvida, os aspectos mais relevantes desse

entendimento do cuidar ampliado, valorizando aspectos da espiritualidade no

cuidado integral à saúde da pessoa.

A importância da espiritualidade neste cuidado integral se dá pela

necessidade de compreender que a pessoa que está sendo cuidada tem, em si,

aspectos subjetivos de sentidos e propósitos de ser no mundo. Além disto, a

transcendência com o sagrado pode promover, por meio do amor vital, a

potencialidade de autocura ou mesmo da resiliência de uma inesperada finitude.

Profissionais da área de saúde que agregam ao cuidado integral a valorização dessa

subjetividade oportunizam que muitas pessoas ressignifiquem sua existência nesse

momento de incerteza quanto ao desfecho e quanto às vivências do seu processo

saúde-doença.

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6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A necessidade da realização desta pesquisa acadêmica relacionando a

espiritualidade com o cuidado em saúde era um desejo antigo e ao mesmo tempo

um sentido de entendimento de cuidado integral, que constituiu a percepção do

pesquisador como profissional da área da saúde, desde os seus primeiros passos na

formação profissional como médico.

Nenhum pesquisador é isento de intencionalidade, e certamente essa

intenção de compreender mais profundamente a espiritualidade e a sua relação com

o processo saúde-doença encontrou campo fértil nas vivências pessoais do

pesquisador por meio do amor e do sofrimento, da arte musical e do fenômeno da

espiritualidade vivido desde sua juventude.

Por se tratar de um tema complexo, desafiador e com certa resistência da

ciência contemporânea biologicista, apoiada em tecnologia dura, foi necessário

buscar conceitos estruturais em outros campos da ciência, como a Filosofia, a Física

Quântica, a Psicologia e a Teologia. Nesta jornada, encontrou-se outro ser humano,

raro em sua generosidade, artista e filósofa, que aceitou conduzir essa pesquisa em

seu objetivo desafiador. Lembra-se ainda, com emoção, quando se recebeu seu

abraço fraterno no dia que foi definida a pesquisa e seu aceite em ser orientado por

ela. Compreenderam-se, durante esta orientação, conceitos que reforçaram ainda

mais as impressões empíricas do pesquisador como ser humano e profissional

médico assistente, especialmente sobre a amorosidade e a vontade de sentido. A

metodologia de orientação fenomenológica se apresenta como recurso apropriado

para pesquisar as vivências (percepção, memória, reflexão, decisão), possibilitando

ampliar a compreensão em relação ao fenômeno vivido, focalizando a experiência

vivida e captando o significado atribuído pela pessoa a essa vivência.

O principal objetivo desta pesquisa, qualitativa, teórico-prática e exploratória,

foi alcançado a partir das entrevistas transcritas das profissionais de saúde

(cuidadoras) e interpretadas pelo pesquisador sobre a compreensão da

espiritualidade no cuidado integral à saúde da pessoa com câncer de mama,

atendida no Projeto de Extensão Mãos de Vida nas suas percepções. Os objetivos

específicos, tais como: “Qual foi o sentido de cuidador de uma pessoa com câncer

de mama?”; “O que significou espiritualidade no cuidado integral à pessoa com

câncer de mama?”; “E se em suas percepções, a espiritualidade influenciou no

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processo saúde-doença entre as pessoas com câncer de mama? Por quê?”,

também foram alcançados.

As entrevistadas acusaram que ser cuidador de uma pessoa com câncer de

mama foi um desafio, por necessitar desenvolver um olhar ampliado em relação ao

ser humano, assistindo-o de maneira integral e potencializando sua capacidade de

autocura. Sobre o significado da espiritualidade no cuidado integral das pessoas

com câncer de mama, relacionaram-na ao sentido de vida de cada pessoa, seus

significados e propósitos, além da percepção de uma energia motivadora

transcendente. Quanto à influência da espiritualidade no processo saúde-

doença, as falas foram mais concordantes, apesar de conceituarem diferentemente

os princípios fundamentais de cuidado e espiritualidade. As entrevistadas

acreditaram com muita firmeza que a espiritualidade influencia o processo saúde-

doença das pessoas do Projeto Mãos de Vida, especialmente quanto ao

enfrentamento e à possibilidade de autocura. Portanto, por mais que existam

dificuldades conceituais sobre o fenômeno da espiritualidade no processo de saúde-

doença, não se pode negar que essa dimensão do ser humano precisa ser

acessada e melhor compreendida para saber cuidar com maior humanidade.

A espiritualidade refere-se certamente a um amplo domínio da subjetividade

humana, podendo ser compreendida como aquilo que traz sentido à vida das

pessoas. Pode ser compreendida ainda como uma maneira de ser, e isto implica a

espiritualidade como um encontro com o Eu profundo da pessoa que faz contato

com o ser sagrado. Esta percepção de sentido transcendente, é a força motriz da

existência humana, podendo ser atingida por meio de inúmeros caminhos. A arte, a

meditação, o contato com a natureza, a prece, os relacionamentos amorosos ou

mesmo o sofrimento humano, ou mesmo as religiões são maneiras possíveis e

legítimas de acessá-la.

Negligenciar essa dimensão espiritual é como ignorar o aspecto social ou

psicológico da pessoa e resulta em falha ao cuidado integral.

No Brasil, a formação profissional na área da saúde ainda é

predominantemente biologicista, ou seja, direcionada para os aspectos biológicos da

doença, e pouco ampliada para o cuidado da pessoa. Em verdade, muito se tem

avançado com a valorização de outros determinantes do processo saúde-doença,

especialmente o aspecto social. Contudo, agregar ao ensino em saúde temas como

espiritualidade e sua relação com o processo saúde-doença ainda é um desafio. Das

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quase duzentas instituições de ensino superior do Brasil que formam o médico,

menos de 10% têm em sua grade curricular o tema da espiritualidade e sua interface

com a saúde, e quando o tema é oferecido, é apresentado com uma disciplina

optativa ou por meio de cursos de pós-graduação. Outros cursos da área da saúde

também não apresentam conteúdos obrigatórios que discutam aspectos do cuidado

integral da pessoa, agregando a dimensão da espiritualidade. Isto causa

perplexidade, quando se pensa sobre a humanização do cuidado integral à pessoa.

Uma questão estimulante é: “De que forma criativa se pode fomentar essa

discussão científica durante a formação profissional nos cursos da área da saúde,

objetivando uma visão integral da pessoa em suas dimensões físicas, psíquicas e

também espirituais?” Acredita-se que a inclusão do estudo das artes e da filosofia

aplicada ao cuidado nos currículos da área da saúde possa contribuir para

“sensibilizar” o estudante a um sentido de conexão, assim como discussões ético-

humanísticas aplicadas ao mundo contemporâneo e situando o jovem aprendiz, para

que o profissional de saúde, cuidador de amanhã, perceba a necessidade de um

novo olhar ampliado para a saúde da pessoa.

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REFERÊNCIAS

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ANEXOS

ARTIGO I

A IMPORTÂNCIA DA ESPIRITUALIDADE NO CUIDADO INTEGRAL

À SAÚDE DA PESSOA COM CÂNCER DE MAMA, NA VISÃO DO

CUIDADOR

Luiz Gustavo Teixeira Pinto1

Maria Glória Dittrich2

RESUMO

O câncer de mama se apresenta no Brasil e no mundo como um dos tumores malignos mais

prevalentes, apesar de toda a evolução tecnológica e maior acesso aos serviços de saúde. O

impacto de seu diagnóstico atinge dimensões ampliadas da pessoa, tais como sociais,

ecológicas, psicológicas, físicas e espirituais. O pensar-sentir-agir entre os profissionais da

área de saúde ainda é muito fragmentado, prevalecendo a visão biologicista da doença.

Todavia, nos tempos contemporâneos as transformações pelas quais perpassa o ser humano,

valores subjetivos como a espiritualidade vem ganhando maior dimensão no cuidado integral

à saúde da pessoa. É nesse aspecto que o artigo tem como objetivo descrever a importância da

espiritualidade no cuidado integral à saúde da pessoa com câncer de mama na perspectiva dos

1 Luiz Gustavo Teixeira Pinto é Médico (UGF-RJ), Especialista em Medicina Interna (Residência Médica no

Hospital Geral de Ipanema-RJ e Sociedade Brasileira de Clínica Médica - SBCM), Especialista em Medicina de

Urgência (SBCM), Pós-Graduado em Terapia Intensiva (UGF-RJ/UNIMED), Professor de Clínica Médica e

Emergências Clínicas do Curso de graduação em Medicina da Univali - SC, Mestrando em Saúde e Gestão do

Trabalho (UNIVALI). [email protected] 2 Maria Glória Dittrich é Filósofa (FEBE), Especialista em Fundamentos da Educação (FURB), Mestre em

Educação (FURB), Doutora em Teologia (EST), Professora Pesquisadora nos Programas de Mestrado

Profissional em Gestão de Políticas Públicas e no Mestrado Profissional de Saude e Gestão do Trabalho -

UNIVALI – Brasil. É artista plástica, Arteterapêuta; Membro integrante da Red de Formación Universitaria

Transdisciplinar - REDFUT e da Comunidad Internacional Científica Virtual para el Cambio – CCVC e do

Grupo ADESTE – Universidade de Barcelona - Brasil e outras. [email protected]

Endereço: Rua Uruguai, 458 Bloco F6 sala 307 Centro, Itajaí – SC, CEP 88302-901.

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profissionais da área de saúde (cuidadores) do Projeto de Extensão Mãos de Vida, da

Universidade do Vale do Itajaí, Santa Catarina. A partir de uma metodologia de orientação

fenomenológica, procuramos interpretar por meio de uma abordagem hermenêutica a

percepção dos diferentes cuidadores. Os cuidadores pesquisados relataram que, ser cuidador

de uma pessoa com câncer de mama é um desafio, por necessitar desenvolver um olhar

ampliado assistindo-a de maneira integral e potencializando sua capacidade de auto-cura.

Significaram a espiritualidade relacionando-a ao sentido de vida e a uma energia motivadora

transcendente. Além disso, acreditaram que a espiritualidade influencia o processo saúde-

doença especialmente quanto ao enfrentamento e a possibilidade de auto-cura.

Palavras-chave: espiritualidade, cuidado integral, câncer de mama, saúde.

ABSTRACT

Breast cancer is present in Brazil and in the world as one of the most prevalent malignancies,

despite all the technological developments and greater access to health services. The impact

of his diagnosis reaches enlarged dimensions of the person, such as social, environmental,

psychological, physical and spiritual. The thinking-feeling-acting among health professionals

is still very fragmented, prevailing a biological view of illness. However, in contemporary

times the transformations which permeates the human being, subjective values such as

spirituality is gaining larger the comprehensive health care of the person. It is in this aspect

that the article aims to describe the importance of spirituality in the comprehensive health care

of the person with breast cancer from the perspective of health professionals (caregivers)

Project Hands of Life Extension, the University of Vale do Itajaí , Santa Catarina. From a

phenomenological methodology guidance, seek interpreted through a hermeneutic approach

to the perception of different caregivers. Caregivers surveyed reported that caregiver of a

person with breast cancer is challenging because it requires developing a broader view

watching it holistically and enhancing their capacity for self-healing. Meant spirituality

relating to the meaning of life and the transcendent motivating energy. Moreover, they

believed that spirituality influences health and disease especially regarding the coping process

and the possibility of self-healing.

Keywords: spirituality, holistic care, breast cancer, health.

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INTRODUÇÃO

Este artigo trata sobre a importância da espiritualidade no cuidado integral à saúde da

pessoa na perspectiva dos profissionais de saúde (cuidadores), tendo como objetivo apresentar

a percepção dos mesmos sobre a espiritualidade, seu conceito e significado no cuidado

integral às pessoas com câncer de mama atendidas no Projeto de Extensão Universitária Mãos

de Vida, na Universidade do vale do Itajaí em Santa Catarina, Brasil. Para compreender

espiritualidade e sua relação no processo saúde-doença torna-se necessário entender

historicamente de que forma se estruturou o estilo de pensamento do profissional da área de

saúde sobre os conceitos de cuidado e de saúde.

Desde os tempos mais remotos da humanidade, o ser humano vem vivenciando a

espiritualidade para compreender o significado de sua presença no mundo e para enfrentar as

mais diversas adversidades de sua existência. Com a evolução da nossa espécie e com a

contribuição das inúmeras áreas do conhecimento, e em especial a Filosofia, inicia-se um

processo de distanciamento gradativo da relação entre espiritualidade e os cuidados em saúde.

Tal dicotomia atinge seu ápice a partir do século XVIII, com a sedimentação de um estilo de

pensamento racionalista para entender os fenômenos que circundam a existência humana, em

especial, a saúde da pessoa.

O atual modelo de cuidado em saúde, orientado para a assistência à doença e não à

pessoa, valorizando predominantemente apenas aspectos biológicos e excluindo a

complexidade da pessoa multidimensional e do que a envolve, centrado e amparado pela

tecnologia e pelo complexo industrial-farmacêutico é reconhecido como modelo Flexneriano.

Abraham Flexner, em 1910, estruturou, sob influência capital do complexo médico-

industrial norte-americano, a reforma das faculdades de medicina nos Estados Unidos da

América por meio de um modelo reducionista e pouco reflexivo (Pagliosa, 2008). Demais

determinantes, tais como os aspectos psicosociais, a comunidade na sua história e

organização, o ecoambiente e a espiritualidade, não eram considerados para o cuidado à

saúde, assim como não eram valorizados nem percebidos no processo de saúde-doença.

Tais posturas eram do ponto de vista teórico-metodológico notoriamente positivistas,

apontando como único conhecimento seguro o científico, mediante a observação, a

experimentação, verificação e a reprodução. Esta concepção flexneriana que influenciou todo

o Ocidente também estruturou o modelo de ensino e de assistência médica previdenciária

brasileira na década de 1940, expandiu-se na década de 1950, orientando ainda a organização

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dos hospitais universitários de nosso país (Silva Junior, 2007).

Apesar das enormes conquistas impulsionadas pela reforma sanitária brasileira e pela

VIII Conferência Nacional de Saúde em 1986, culminando com a criação do Sistema Único

de Saúde do Brasil e desenhando um novo modelo de atenção à saúde mais equânime e

integral, a formação curricular do profissional de saúde brasileiro continuou limitada nesses

aspectos ampliados do cuidado, permanecendo ainda muito influenciada pela disseminação do

modelo (científico) flexneriano, sendo portanto, um entrave para a evolução da assistência

integral à saúde da pessoa.

O método de ensino baseado em evidências científicas, relacionando estatísticas e

doenças (e não centrado na pessoa), ainda é o modelo atual e hegemômico de ensino médico e

das demais áreas da saúde no Brasil. Nosso método de aprendizado reducionista impossibilita

e desvaloriza a percepção de sentidos frente a complexidade da pessoa, reduzindo-a apenas às

bases fisiopatológicas e estatísticas reprodutíveis e verificáveis.

Uma disciplina na formação médica que fomente a discussão sobre espiritualidade e

sua relação com o processo saúde-doença é inexistente nos currículos obrigatórios dos

profissionais da área de saúde no Brasil, estando presente em raras universidades brasileiras

na forma de disciplina optativa ou mesmo como projetos de extensão universitária e cursos de

pós-graduação. Isto nos causa perplexidade quando pensamos sobre a humanização do

cuidado integral da pessoa.

Todavia, a necessidade de uma percepção ampliada da pessoa urge na atualidade pois,

estamos vivendo numa era de distorção intensa de valores morais e éticos, pouca

solidariedade, individualidade, desamor, consumo irreflexivo e competitividade animalesca.

As relações sociais provocadas pelo consumo chegaram a tal ponto que todas as

relações passaram a ser reduzidas a relações de consumo, inclusive as mais profundas

relações afetivas. As relações humanas das pessoas que se constroem pelo consumo, acabam

sendo, como eles próprios, imagem do consumo, e acabam por gerar uma fluidez, uma

fragilidade cada vez mais acentuada nos relacionamentos humanos (Bauman, 2006).

Na área da saúde e especificamente durante a assistência profissional temos a grande

oportunidade de não somente diagnosticar e tratar patologias, mas também prevenir e

promover a saúde da pessoa. É um momento de interação especial entre pessoas que precisam

se interrelacionar de maneira profunda – um encontro de quem precisa de auxílio e de quem a

priori tem conhecimentos específicos para acolher, auxiliar e aconselhar.

Para que essa relação aconteça, precisamos ter um olhar profundo sobre o cuidar,

perceber não apenas a expressão física de queixas da pessoa, mas também valorizar o

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psíquico, suas crenças, valores, significados e propósitos, enfim, sua espiritualidade. Para

isso, além de tempo adequado para um acolhimento solidário, temos que ter as premissas

básicas de uma boa relação profissional de saúde-pessoa: Atenção, intenção e amor ao

próximo.

Quando não estamos aptos à perceber a complexidade da pessoa em seus aspectos de

significados e propósitos, a maneira de reconhecer o seu processo de saúde-doença e sua

capacidade de recuperação, perdemos oportunidades de realmente auxiliar na essência do

processo patológico como no câncer de mama, por exemplo.

O grupo de cuidadores (profissionais de saúde) de pessoas com câncer de mama foi

escolhido como amostra do estudo que originou este artigo, devido estarem trabalhando num

Projeto de Extensão universitária numa perspectiva transdisciplinar, atendendo pessoas com

câncer. Com efeito, não somente pelo grande impacto negativo da enfermidade tumoral na

saúde da pessoa, mas também pela alta prevalência e incidência de pessoas com câncer de

mama em nosso país e a necessidade de compreender o fenômeno da espiritualidade neste

processo.

Para o ano de 2012 foram estimados 52.680 casos novos, que representou uma taxa de

incidência de 52,5 casos por 100.000 mulheres. A taxa de mortalidade por câncer de mama

ajustada pela população mundial apresentou uma curva ascendente e representou a primeira

causa de morte por câncer na população feminina brasileira, com 11,3 óbitos/100.000

mulheres em 2009 (Inca, 2011). O Estado de Santa Catarina acompanhado das demais regiões

do Sul e Sudeste são as que apresentaram as maiores taxas, com 12,6 e 12,7 óbitos/100.000

mulheres em 2009, respectivamente (Inca, 2010).

As mulheres acometidas pelo câncer de mama têm um impacto multidimensional

profundo, vivenciando no decorrer da história natural de sua doença, a incerteza, o medo, a

amputação, a finitude. Algumas buscam a força, a re-significação da vida, a fé, a reabilitação

e até mesmo um despertar para a espiritualidade.

A preocupação com a dimensão não-material da pessoa encontra pouca reverberação

no ambiente acadêmico, principalmente na área de formação médica. No entanto

compreender e valorizar a dimensão espiritual que nos envolve e que tem relação

direta com a qualidade do bem estar da pessoa e de sentido em nossa existência torna-se

necessário na atualidade.

A valorização desta dimensão espiritual para o sentido frente ao sofrimento, as perdas,

as dores, a finitude, ou mesmo a percepção de bem estar, a recuperação plena, a re-

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significação da vida, todas são vivências de um fenômeno, que emerge da espiritualidade da

pessoa.

CONCEITUANDO CUIDADO INTEGRAL E ESPIRITUALIDADE

O cuidado é uma relação intersubjetiva que se desenvolve em um tempo contínuo, e

que, além do saber profissional e das tecnologias necessárias, abre espaço para negociação e a

inclusão do saber, dos desejos e das necessidades do outro (Pinheiro, 2005).

Cuidado integral em saúde não é apenas um nível de atenção do sistema de saúde, ou

um procedimento técnico simplificado, mas uma ação integral que tem significados e sentidos

voltados para compreensão de saúde como o „direito de ser‟. Pensar o direito de ser na saúde é

ter „cuidado‟ com as diferenças das pessoas – respeitando as relações de etnia, gênero e raça –

que são portadores não somente de deficiências ou patologias, mas de necessidades

específicas (Andrade, 2002).

O modelo biomédico atual que orienta o conjunto dos profissionais de saúde, ao se

apoiar predominantemente nos meios diagnósticos para evidenciar lesões e doenças, afastou-

se da pessoa sofredora como totalidade viva e permitiu que o diagnóstico substituísse a

atenção e o „cuidado‟ integral à saúde. Entretanto, mais do que o diagnóstico, as pessoas

desejam se sentir cuidadas e acolhidas em suas demandas e necessidades (Andrade, 2002).

A integralidade pode ser entendida como uma das diretrizes básicas do Sistema Único

de Saúde do Brasil, através de uma forma de política organizacional de práticas e serviços de

saúde e também percebida como uma atitude profissional (Mattos, 2001). É neste último

aspecto que ressaltamos a importância da integralidade no cuidado da pessoa.

A integralidade é uma característica de boa prática do cuidado em saúde, e

defendendo-a aqui não implica em deixar de lado todo caudal do conhecimento sobre as

doenças que tem permitido significativos sucessos, mas sobretudo, é necessário ter uma visão

ampliada das necessidades das pessoas as quais tratamos. A atitude de um profissional de

saúde diante de uma pessoa, que busca prudentemente reconhecer para além das necessidades

de ações de saúde, não somente as relacionadas ao diagnóstico precoce e à redução de fatores

de risco, mas também demandas relacionadas a uma valorização do sentido e significado da

experiência da pessoa, implica um sentido da integralidade.

Este olhar ampliado se faz necessário especialmente quando cuidamos de pessoas

acometidas por doenças graves, incapacitantes e mutilantes e que interfere em toda sua

estrutura multidimensional: física, psíquica, social, ecológica e espiritual, como o câncer de

mama. Para essas pessoas que vivenciam a possibilidade de uma finitude antecipada pela

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doença, se torna ainda mais necessário compreender a complexidade multidimensional da

pessoa por meio do cuidado integral, não apenas reduzindo ao tratamento dos sintomas físicos

do processo do adoecer, mas percebendo, valorizando e também aconselhando a própria re-

significação da vida em si. Espiritualidade pode ser entendida como aquilo que traz propósito

à vida das pessoas. Uma propensão humana a buscar significado à existência por meios que

transcendem o tangível, que pode ou não incluir uma participação religiosa (Koenig, 2001).

Já transcendência exigida pela experiência espiritual é a relação entre liberdades que

ocorre em todo encontro pessoal. Deus é imanente ao mundo como seu fundamento criativo

permanente e transcendente ao mundo pela liberdade. Tanto a divindade infinita quanto a

liberdade humana finita tornam o mundo transcendente para Deus e Deus transcendente para

o mundo (Tillich, 2005).

A percepção espiritual da realidade dá à pessoa uma dimensão mais ampla de

significados para os eventos da vida diária e pode reorganizar subjetivamente suas

experiências. Esta percepção de sentido transcendente na experiência cotidiana é a força

motriz da existência humana, podendo ser atingida por meio de rituais religiosos, prece,

meditação, arte, contato com a natureza, sofrimento e até mesmo relacionamentos amorosos

(Frankl, 2000).

Espírito, vem do latim, spiritus, significa sopro, e se refere a algo que dá ao corpo sua

força vital e demonstra a relação do plano material com a dimensão imaterial, oculta, divina

ou sobrenatural que anima a matéria. O espírito conecta o ser humano à sua dimensão divina

ou transcendente (Koenig, 1997). Religiosidade é o aspecto institucional da espiritualidade,

relacionada com crenças, rituais, escritas e símbolos (Moreira-Almeida e col., 2006). Uma

forma dogmática podendo inclusive ser distorcida por forças socioeconômicas, culturais e

políticas (Steinhauser, 2006).

Muito embora alguns autores vejam a distinção entre religiosidade e espiritualidade

como desnecessária, a espiritualidade é considerada mais primordial, pura e diretamente

relacionada com a alma. Por isso podemos notar que alguns indivíduos demonstram um alto

grau de espiritualidade sem pertencer a uma religião instituída, outros têm sua espiritualidade

fundamentada na religião, e existem ainda os que se vinculam às relações sociais da religião,

expressando frequentemente, laços étnicos e familiares.

O termo espiritualidade começou a receber maior atenção das ciências da saúde , e em

especial da medicina, na última década e não há mais dúvida da importância dos aspectos

religiosos ou espirituais no cuidado dos pacientes, embora ainda haja questionamentos a

respeito de como acessar a dimensão espiritual da pessoa e em que consiste o bom “cuidado

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espiritual” (Williams, 2006).

Relacionando espiritualidade e cuidado em saúde na prática médica percebe-se que os

pacientes querem ser tratados como pessoas, e não como doenças, e serem observados como

um todo, incluindo aspectos físico, emocional, social e espiritual (Okon, 2005).

Trabalhos relacionando espiritualidade à qualidade de vida, bem-estar subjetivo,

resposta imunológica, enfrentamento de doenças terminais, doenças psiquiátricas estão sendo

publicados desde a década de 80, e com um rigor científico cada vez maior (Moreira-

Almeida, 2007).

A importância do reconhecimento da espiritualidade como estratégia de enfrentamento

e a identificação das carências espirituais da pessoa faz com que o profissional de saúde possa

planejar e fornecer uma assistência da forma mais integral possível (Guerreiro, 2011). Além

disso, outros estudos relataram a importância do cuidado integral, acessando a dimensão

espiritual da pessoa, já que algumas delas afirmaram maior confiança no cuidado em saúde

por meio da própria fé e referiram ainda melhor capacidade para adaptar-se a novas situações.

Porém, os autores relataram alguns obstáculos para executar esse “cuidado espiritual”

adequado, como a falta de tempo para um diálogo prolongado entre a equipe de saúde e a

pessoa, além de dificuldades para identificar as reais necessidades da própria pessoa

(Westman, 2006).

Não temos a intenção de negar neste artigo os tantos avanços tecnológicos

fundamentais de nossa ciência moderna baseada em evidências e que norteiam condutas dos

profissionais da área da saúde nos dias atuais, mas acima de tudo, agregar valores pouco

compreendidos e estudados, contudo percebidos por alguns desses mesmos profissionais,

relacionados à complexidade da pessoa em sua dimensão espiritual. Além disso,

independentemente de possuírmos crenças materialistas ou espirituais, necessitamos

compreender melhor a relação entre saúde e espiritualidade para ampliarmos os

conhecimentos sobre o cuidado integral à saúde pessoa.

METODOLOGIA

A metodologia de orientação fenomenológica se apresentou como recurso apropriado

para pesquisar as vivências dos cuidadores (profissionais da área da saúde) de pessoas com

câncer de mama (intencionalidade, percepção, compreensão sobre espiritualidade no processo

saúde-doença). Possibilitou ampliar a compreensão em relação ao fenômeno vivido e

focalizou a experiência vivida captando o significado atribuído pela pessoa a essa vivência. O

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desenvolvimento teórico e metodológico então, ficou ancorado na fenomenologia

existencialista, entendendo que todo o processo vivido foi de síntese entre o pesquisador e o

seu objeto.

TIPO DE ESTUDO

O tipo de estudo realizado foi de natureza teórico-prática, exploratória, com

abordagem fenomenológica. A coleta de dados se deu através de entrevista não-diretiva, por

meio de algumas perguntas abertas, pois foi a busca do pesquisador para compreender o seu

objeto - a relação entre saúde e espiritualidade, nas falas dos profissionais da área da saúde

(cuidadores) das pessoas portadoras de câncer de mama atendidas no ambulatório de

especialidades médicas da Universidade do Vale do Itajaí, em Santa Catarina.

O objetivo geral da pesquisa foi conhecer a importância da espiritualidade no cuidado

integral à saúde da pessoa com câncer de mama, na perspectiva dos cuidadores. Para isso se

levantou o seguinte problema: Qual a compreensão de cuidadores sobre a importância da

espiritualidade no cuidado integral à saúde da pessoa com câncer de mama?

SUJEITOS DA PESQUISA

A população pesquisada foi composta por oito (08) profissionais da área da saúde que

foram nomeados por letra e números. Convencionou-se como E1 a letra e o número

correspondente do primeiro entrevistado, E2 a do segundo entrevistado, e assim por diante até

o oitavo profissional entrevistado (E8), sendo 01 fisioterapêuta (E1), 02 estagiários-bolsistas

(E2 e E4), 02 enfermeiras (E3 e E6), 01 médica (E5), 01 psicóloga (E7), 01 nutricionista (E8),

todos participantes do Projeto de Extensão Mãos de Vida, que atende semanalmente pessoas

com diagnóstico de câncer de mama, no ambulatório de especialidades médicas da Unidade

de Saúde Familiar e Comunitária da Univali (Universidade do Vale do Itajaí), em Itajaí, Santa

Catarina. A escolha desta população de cuidadores se deveu pelo fato de se reconhecer nesse

Projeto de Extensão universitária, uma proposta inovadora de cuidado integral, quando, junto

aos processos de atendimentos clínicos (Medicina, Fisioterapia, Psicologia, Filosofia,

Nutrição, Farmácia, Enfermagem e Educação Física) se trabalham também, atividades eco-

espirituais e arteterapêuticas que consideram a importância da dimensão espiritual da pessoa

para o cuidado em saúde.

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ASPECTOS ÉTICOS

A pesquisa foi avaliada e aprovada pelo Comitê de Ética da Universidade do Vale do

Itajaí - SC, e só depois de sua aprovação foi iniciada a coleta de dados.

Realizou-se a partir de uma aproximação do pesquisador aos profissionais de saúde,

em seu local de trabalho, ocasião em que foi solicitada a assinatura pelos participantes do

termo de consentimento livre e esclarecido, que explicitava os objetivos da pesquisa e seus

procedimentos, além de garantir sigilo.

A partir daí, o pesquisador iniciou a entrevista com as perguntas abertas, consideradas

como roteiro para a coleta de dados: “Qual o sentido para o Sr. (Sra.) em ser cuidador de

uma pessoa com câncer de mama?” “O que significa espiritualidade para o Sr. (Sra.) no

cuidado integral à pessoa com câncer de mama?” “Na sua percepção, a espiritualidade

pode influenciar no processo saúde-doença entre as pessoas com câncer de mama? Por

que?” Os participantes puderam falar livremente e foram feitas poucas intervenções no

decorrer da fala dos profissionais, para ampliar e aprofundar as suas respostas com outras

questões, quando eram necessárias e relevantes para o estudo. Para obter o material

discursivo, foco do estudo de percepção das vivências dos profissionais de saúde, foram

realizadas gravações das entrevistas com o uso do MP3 (gravador digital).

Logo após cada entrevista foi feita a transcrição na íntegra de suas falas. Todos os

participantes convidados aceitaram livremente participar do estudo.

COMPREENSÃO DOS DADOS

Esta pesquisa sendo teórico-prática, qualitativa e fenomenológica encontra

metodologicamente subsídios para a compreensão dos dados teóricos a serem apreendidos

para a explicitação do seu objeto, na hermenêutica fenomenológica. Aqui, hermenêutica

quer dizer: uma postura, uma maneira de entender e expressar a percepção sobre os dados da

investigação teórico-prática de forma qualitativa. As raízes hermenêuticas da compreensão

humana nascem do corpo-criante, do pesquisador em busca de respostas para os seus

questionamentos, quando não se separa de seu objeto de pesquisa.

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Corpo-criante se quer entender “um todo vivo, dinâmico, inter-relacionado

nas suas partes com capacidade de se autocriar, que implica a sua autonomia

de se fazer constantemente, causando mudanças contínuas em si e fora de si,

para a preservação da própria vida. Explicitando: o homem, um corpo que

cria, é um todo vivo. Ele é orgânico, pois tem em si uma auto-organização

vital inteligente, sustentada por um princípio fundante – a energia criadora,

que detém a vida que se impregna desde as suas micropartículas

elementares, atravessando os seus átomos, suas moléculas, suas células, seus

ossos seus músculos, até a sua macroconstituição corporal total” (Dittrich,

2001. p. 81).

O percurso realizado pelo pesquisador para chegar às categorias chave da pesquisa e

para perceber a compreensão do fenômeno, foi apoiado no sentido das experiências vividas

pelas profissionais de saúde entrevistadas para chegar à essência dessas vivências, captando o

significado do que é ser cuidador em saúde (categoria 1), o significado da espiritualidade

(categoria 2) e a influência da espiritualidade no processo saúde-doença (categoria 3) das

pessoas portadoras de câncer de mama atendidos no Projeto Mãos de Vida. Logo, dessas

categorias o pesquisador construiu a sua compreensão que foi se explicando no cruzamento

dos dados da prática com os referenciais teóricos de fundamentação do seu objeto.

Segundo Dittrich, todas as percepções que vierem explicar a pesquisa ocorreram

diante de três movimentos. (Dittrich, 2004).

O primeiro movimento para apreender a compreensão do objeto é o da

intencionalidade, este é o momento da abertura da consciência do pesquisador para encontrar

referências sobre o seu objeto, bem como direcionar-se para coletar os dados da prática e

selecioná-los. O segundo é o movimento da percepção do pesquisador para selecionar os

dados teóricos e práticos e organizá-los para assim refletir sobre eles, buscando uma prévia

compreensão. O terceiro é a descrição da compreensão da consciência do pesquisador sobre

o objeto com os dados coletados, quando se fará a escrituração dos conceitos explicativos

sobre os objetivos da pesquisa (Dittrich, 2004).

RESULTADOS

Segundo a percepção do pesquisador, os profissionais de saúde pesquisados, quando

interrogados sobre o que é ser um cuidador de saúde, acusaram que, ser cuidador de uma

pessoa com câncer de mama é um desafio, por necessitar desenvolver um olhar ampliado em

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relação ao ser humano, assistindo-o de maneira integral e potencializando sua capacidade de

auto-cura. Nos discursos abaixo de três profissionais de saúde E2, E3 e E8, tornou-se claro

que significaram o ato de ser cuidador, a uma ação (potencializar, empoderar, desenvolver)

que realizaram, a fim de desvelar a capacidade que a própria pessoa possui em participar

ativamente do processo de cura de sua enfermidade. E2 diz que “É justamente potencializar

o que às vezes o paciente tem, às vezes a própria auto-cura que ele desconhece.” E3

confirma que “É ajudando da forma que for possível no cuidado interdisciplinar,

multidisciplinar que a gente desenvolve. Então, é uma forma de trabalhar com a questão da

humanização, e fortalecer até mesmo o poder de cura que ela mesmo possa ter e que às

vezes não sabe que tem.” E8 também compreende que “É uma oportunidade de a gente

ajudar a pessoa para que ela entenda o que é o empoderamento e o quanto ela consegue

participar nesse processo de cura”.

Através de suas falas as profissionais de saúde entenderam que eram capazes de

despertar a potencialidade de cada enfermo a fim de capacitá-los para a auto-cura. Todavia,

questões conceituais inerentes ao ser cuidador foram pouco exploradas, e mesmo a forma de

como potencializaram tal capacidade entre os pacientes, não foram elucidadas.

A concepção de cuidado integral em saúde não se caracteriza apenas por um nível de

atenção do sistema de saúde, ou por um procedimento técnico simplificado, mas sim, por uma

ação integral que tem significados e sentidos voltados para compreensão de saúde como o

„direito de ser‟, existencialmente falando. Pensar o direito de ser também é ainda garantir

acesso às outras práticas terapêuticas, permitindo ao usuário participar ativamente da decisão

acerca da melhor assistência médica a ser por ele utilizada no seu percurso de saúde-doença

(Andrade, 2002).

Com efeito, o ser humano pertence ao caráter da existência. Todo o ser participa na

estrutura do ser como organização multidimensional, o ser humano tem a capacidade de estar

imediatamente consciente desta estrutura dimensional biopsicoespiritual. O ser humano

experimenta a si mesmo como possuindo um mundo ao qual pertence. A estrutura ontológica

básica emana da percepção desta relação dialética complexa (Tillich, 2005). E essa estrutura

complexa e dinâmica, em sua auto-organização de sistemas – autopoiese - é intrínseca do ser

humano, fundamentada no amor vital, fonte propulsora que impulsiona os processos vital-

cognitivos e que constituem e definem o ser humano como corpo-criante (Dittrich, 2001).

Percebeu-se ainda que um estilo de pensamento entre as profissionais de saúde era de

que uma vez explicitada a questão de um possível potencial do corpo-criante da pessoa,

individual e intransferível, conseguiriam redimensionar a própria doença e sua história natural

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evolutiva. Aqui, corpo-criante significa - “um todo vivo, dinâmico, inter-relacionado nas suas

partes com capacidade de se autocriar, que implica a sua autonomia de se fazer

constantemente, causando mudanças contínuas em si e fora de si, para a preservação da

própria vida” (Dittrich, 2001). Nesse sentido, a profissional E4, já traz uma idéia do que é ser

uma cuidadora: “Meu processo como cuidadora me fez crescer muito enxergando o

paciente como um todo, né!? Não só como, ah, tem o diagnóstico de câncer positivo, mas

tá!: Quem é essa pessoa? Como é que ela enxerga a vida? Como é que ela está lidando

como processo saúde-doença?” Nesta fala, entendemos que a cuidadora aprendeu nas

vivências de cuidado, pois confirma que há importância de um olhar ampliado para a pessoa

enferma, desfocando apenas do aspecto patológico, e abrindo espaço para seus sentidos

perceberem as potencialidades e as necessidade da pessoa além da doença.

De fato, torna-se fundamental essa percepção, pois o modelo biomédico atual que

orienta o conjunto das profissões em saúde, ao se apoiar nos meios diagnósticos para

evidenciar lesões e doenças, afastou-se da pessoa sofredora como totalidade viva e permitiu

que o diagnóstico substituísse a atenção e o „cuidado‟ integral à saúde. Entretanto, mais do

que o diagnóstico, os sujeitos desejam se sentir cuidados e acolhidos em suas demandas e

necessidades (Andrade, 2002).

Na percepção da profissional E5, ser cuidadora significa ter intencionalidade de

realizar uma comunhão de idéias e ações, a partir de sua percepção, com a necessidade do

outro. Diz ela: “Ter o sentido de realmente fazermos uma parceria com nossos pacientes e

não o contrário. Se nós não buscarmos dar-nos as mãos e realmente olharmos nos olhos

dos nossos pacientes e ouvirmos... Termos ouvidos para realmente escutarmos aquilo que

aparece... muitas vezes a gente pouco toca aquilo que realmente faz uma diferença no

processo de saúde dos pacientes.” Tal fala vem ao encontro de que o cuidado é uma relação

intersubjetiva que se desenvolve em um tempo contínuo, e que, além do saber profissional e

das habilidades necessárias, abre espaço para negociação e a inclusão do saber, dos desejos e

das necessidades do outro (Pinheiro, 2005).

Portanto, ser cuidador é desenvolver este olhar ampliado, que se faz necessário,

especialmente, quando cuidamos de pessoas acometidas por doenças graves e que vivenciam

a possibilidade de uma finitude antecipada pela doença, não apenas reduzindo ao tratamento

dos sintomas físicos do processo do adoecer, mas percebendo, valorizando e também

aconselhando a própria re-significação da vida em si.

Os profissionais de saúde significaram a espiritualidade no cuidado integral das

pessoas com câncer de mama relacionando-a ao sentido de vida de cada pessoa, seus

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significados e propósitos, além da percepção de uma energia motivadora transcendente. Aqui,

E1 percebe a espiritualidade da seguinte maneira: “Eu tenho visto que essa fé, me fez

modificar como pessoa. Essa conexão..., como ela é importante para que a reabilitação

aconteça, para que a cura aconteça, ou para que a aceitação do tratamento aconteça. A

gente consegue perceber que, quando esse sentido da vida não está presente, como elas têm

um semblante mais fechado, mais escuro, um olhar mais perdido e um discurso mais

vago”.

Nesta outra fala de, E7 entende que “A espiritualidade, no caso, eu acho que é a

pessoa estar ligada não só com relação a uma religião, né? É ela acreditar em alguma

coisa, ela crê que a vida dela tem um porque maior, né?” Ambas entrevistadas aqui,

referiram ainda aspectos de significados e sentido da vida como algo fundamental para o êxito

ou fracasso da recuperação da saúde. Cada pessoa tem uma vocação própria ou missão

específica na vida; cada um tem uma tarefa concreta exigindo realização. Mas tal tarefa – o

sentido – não é algo estático: o sentido muda de acordo com a pessoa e a situação, uma vez

que a existência e cada homem apresenta um caráter de algo único (Frankl, 1986).

As profissionais E1 e E7 portanto relacionaram o conceito de espiritualidade ao

sentido da vida de cada pessoa e a uma conexão com algo, ou uma transcendência, para que

aspectos curativos ou de resignação acontecessem. Houve aqui nos discursos acima uma

dificuldade da expressão do fenômeno, que se explica no real e evoca a ciência para poder

compreendê-lo.

Transcender está relacionado a ligar-se à espiritualidade como postura de conexão

com o sagrado, e que traz força para o processo de cura e libertação.

A união transcendente aparece no espírito humano como movimento

extático, que desde um ponto de vista, é chamado de “fé” e, desde outro é

chamado de “amor”. Estes dois estados manifestam a união transcendente

que é criada pela Presença Espiritual no espírito humano. Deus é imanente

ao mundo como seu fundamento criativo permanente e é transcendente ao

mundo pela liberdade” (TILLICH, 2005, p. 584).

Pode-se definir espírito como uma dimensão da vida, que une o poder de ser com o

sentido de ser, somente ocorrendo no ser humano. O espírito humano como dimensão da vida

é ambíguo, como o é toda forma de vida, ao passo que o Espírito divino cria vida sem

ambiguidade (Tillich, 2005). Já espiritualidade pode ser entendida como aquilo que traz

propósito à vida das pessoas. Uma propensão humana a buscar significado à existência por

meios que transcendem o tangível, que pode ou não incluir uma participação religiosa

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(Koenig, 2001). É necessário entender que os termos “espiritualidade” e “religiosidade” estão

relacionados, mas, apesar de muitas vezes serem utilizados como sinônimos, seus conceitos

não apresentam as mesmas características (Saad, 2001). A espiritualidade é mais ampla e

pessoal, está relacionada a um conjunto de valores íntimos, completude, interior, harmonia,

conexão com os outros; estimula um interesse pelos outros e por si; uma unidade com a vida,

a natureza e o universo. Para alcançar o espiritual, uma pessoa não necessita pertencer a uma

religião, ou seja, a um sistema de crenças organizado e compartilhado por um grupo e que

inclui a existência de uma força divina ou um ser superior, com propostas de normas, dogmas

e rituais (Saad, 2001).

Na fala da profissional E6 houve a busca por um elo de seu significado entre a

espiritualidade e o sentido de sua existência, acreditando que, por conseguir perceber o outro,

é um ser espiritual. Diz ela que espiritualidade é “Uma concepção do sentido de vida delas,

por que elas existem? Qual o sentido da existência delas, né? Acho que isso é

espiritualidade. Acho que assim: Eu me considero uma pessoa espiritualizada, porque

consigo perceber o outro, consigo ver o outro”. Aqui, cabe perceber que a profissional não

conseguiu desenvolver de que forma percebe o outro. A percepção espiritual da realidade dá à

pessoa uma dimensão mais ampla de significados para os eventos da vida diária e pode

reorganizar subjetivamente suas experiências. Esta percepção de sentido transcendente na

experiência cotidiana é a força motriz da existência humana, podendo ser atingida por meio de

rituais religiosos, prece, meditação, arte, contato com a natureza, sofrimento e até mesmo

relacionamentos amorosos (Frankl, 2000). Por outro lado, deixa claro que a espiritualidade no

processo da saúde está interligado com um sentido de vida, e isto está ligado a um olhar

ampliado da realidade.

Já a profissional E2 atribuiu o significado da espiritualidade à fé ou à uma energia

motivadora que a impulsiona para um sentido de vida. “A espiritualidade, eu acho que é,

diferente da religião, a espiritualidade, ela está ali, justamente para..., é a fé! É aquela

energia motivadora, que às vezes a gente tem que buscar, que tem que encontrar, que está

perdida. Acho que a espiritualidade está justamente nesse ponto-chave de transcender né!?,

e não viver por viver às vezes!” A profissional acima revelou que acredita na diferença

conceitual entre espiritualidade e religiosidade, mas aqui foi importante trazer conceitos mais

explicativos das distinções, assim como aspectos teológicos sobre a fé.

Fé, quando definida de maneira formal (válida para qualquer tipo de fé em todas as

religiões e culturas), é o estado de ser possuído por aquilo a que aspira a auto-transcendência,

o incondicional em ser e sentido. É o estado de ser tomado por uma preocupação última, de

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ser possuído pela Presença Espiritual e de ser aberto à unidade transcendente da vida-sem-

ambiguidades (Tillich, 2005). Muito embora alguns autores vejam a distinção entre

religiosidade e espiritualidade desnecessária, podemos notar que algumas pessoas

demonstram um alto grau de espiritualidade sem pertencer a uma religião instituída, outras

têm sua espiritualidade fundamentada na religião.

Nas falas das profissionais E3 e E4 transcritas abaixo houve um desencontro

conceitual quanto ao entendimento e significado da espiritualidade no cuidado integral ao ser

humano. Aqui, E3 traz o conceito de que “Espiritualidade é um termo muito amplo, e aqui a

gente trabalha bem, procura trabalhar nessa perspectiva. É quando o sujeito mostra a fé

dele. Também a fé na questão física.., mas também não só que ele acredita efetivamente

enquanto religião enfim..., mas como isso se processa dentro dele.” O discurso acima trouxe

um conceito de crença de questões físicas e religiosas, entendendo muito mais aspectos

psicológicos de auto-conhecimento e auto-percepção do que propriamente o aspecto de

conexão com uma forma de energia motivadora e transcendente.

Já a entrevistada E4 tem outro entendimento: “Pra mim é uma coisa só: a

espiritualidade e a física quântica. Só quem acha que a espiritualidade é física quântica e

quem acha que física quântica é espiritualidade. Pra mim são coisas uníssonos.” Aqui,

nesta conceituação, a entrevistada E4 relacionou ou mesmo equiparou a espiritualidade ao

conceito de física quântica, que, em verdade, é uma ciência que envolve estudo dos sistemas

físicos cujas dimensões são próximas ou abaixo da escala atômica, tais como moléculas,

átomos, elétrons, prótons e de outras partículas subatômica, muito embora também possa

descrever fenômenos macroscópicos em diversos casos. A Mecânica Quântica é um ramo

fundamental da Física com vasta aplicação. A teoria quântica fornece descrições precisas para

muitos fenômenos previamente inexplicados, tais como conceitos de partícula – objeto com

uma mínima dimensão de massa, que compõe corpos maiores e conceito de onda – a radiação

eletromagnética, invisível para nós, que não necessita de um ambiente material para se

propagar, e sim do espaço vazio (Mehra,1982).

Nas falas das profissionais E5 e E8 houve uma percepção de que a espiritualidade teve

exclusivamente uma relação de auto-conhecimento e o enfrentamento espiritual - coping

espiritual. E5 entende que “Acessar, os sentimentos que as pessoas têm sobre aquilo que

acontece, então, a simbologia daquilo que acontece, quer dizer. Elas falarem sobre esse

processo do não estar saudável, elas tem possibilidade de encontrarem dentro delas as

respostas e a partir disso, acabar fazendo uma ponte também para a questão da

espiritualidade, que tem haver com o que? Com aquilo que a pessoa acredita! Como ela

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entende o seu processo do não estar saudável e qual é o enfrentamento que ela tem sobre

isso, a intencionalidade também dela se melhorar.” E6 percebe que “A espiritualidade é a

elevação do ser mesmo. É o contato consigo, eu acho que é o processo de auto-

conhecimento.”

O conceito de coping religioso/espiritual está inserido nas áreas da psicologia

cognitivo-comportamental, psicologia da religião, psicologia positiva, psicologia da saúde e

do escopo de estudos sobre religião e saúde, medicina e espiritualidade, tendo sido delineado

a partir do estudo cognitivista do estresse e do coping. Os resultados mostram que o coping

religioso/espiritual é o uso da religião, espiritualidade ou fé para lidar com o estresse.

Estratégias de coping, conforme consequências que trazem para quem as utiliza, podem ser

classificadas como positivas ou negativas, estando geralmente associadas, respectivamente, a

melhores ou piores resultados de saúde física/mental e qualidade de vida (Gobatto, 2010).

Já quando as entrevistadas foram questionadas sobre, se na sua percepção, a

espiritualidade poderia influenciar no processo saúde-doença entre as pessoas com câncer

de mama e por que?, as falas foram mais concordantes, apesar de conceituarem

diferentemente os princípios fundamentais de cuidado e espiritualidade. As entrevistadas

acreditaram com muita firmeza que a espiritualidade influencia o processo saúde-doença

nessas pessoas do Projeto Mãos de Vida, especialmente quanto ao enfrentamento e a

possibilidade de auto-cura.

As profissionais E1 e E3 acreditaram com muita certeza que a espiritualidade

influenciou o processo saúde-doença das pessoas do Projeto Mãos de Vida, especialmente

quanto a possibilidade de auto-cura e de enfrentamento da doença. Na fala E1 acredita que

“Bom...,sim. Nós percebemos tranquilamente, e vou falar aqui por mim, mas as minhas

amigas de trabalho a mesma coisa. A diferença entre a mulher que desenvolve essa

qualidade, que trabalha sua espiritualidade, sua crença, a sua fé e a que não trabalha com

isso. A resposta ao tratamento, o seu comportamento, a questão de como ela enfrenta,

muitas, muitas desenvolvem a resiliência, senão todas”. O processo de auto-cura pode ser

referido como uma capacidade própria do ser humano de se auto-organizar no seu sistema

complexo de ser vivo o fenômeno da autopoiese, segundo Maturana. Esse ser humano em sua

estrutura e organização, complexa e dinâmica se constrói e se reconhece através da

criatividade, fundamentada no amor-criante, que é energia criativa, vital, e alicerçado no amor

vital, fonte propulsora que impulsiona os processos vital-cognitivos e que constituem e

definem o ser humano como corpo-criante (Dittrich, 2010).

Contudo, E3, apesar de acreditar na influência da espiritualidade no processo de

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saúde-doença tem o seguinte entendimento “Eu acho que assim, ela tem tudo haver, né? A

espiritualidade, assim...é uma coisa que eu vejo bem na prática. A pessoa que a gente

atende, já quando ela tem o diagnóstico, e ela tem uma perspectiva de vida positiva, ela vai

passar isso com tranquilidade nesse processo. Ela vai fazer o diagnóstico, o processo de

aceitação dela vai ser melhor, todo esse processo de cirurgia, pós-operatório,

quimioterapia, radioterapia ela vai levar com muito mais tranquilidade, ela vê aquilo como

uma coisa positiva pra vida dela, né? Às vezes ela faz mudanças de estilo de vida, mudança

de ela ver o outro, né? Eu acho que isso é crescimento dentro da espiritualidade. Então ela

já traz uma positividade perante a vida, perante ela como um ser. E ai ela vai traspassar

com essa positividade dela também nesse processo de doença que ela está passando, né?”

“Eu acho que está..., estritamente ligado. Eu tenho percebido que sem dúvida alguma, que

aquelas que desacreditam do tratamento, elas desacreditam da vida. As que acreditam no

tratamento, elas acreditam na vida.” Aqui, a profissional atribui que a espiritualidade

influencia o processo saúde-doença, mas especialmente relacionada ao enfrentamento e a

crença individual do que propriamente a energia sutil envolve a pessoa e influencia

amplamente a saúde em sua totalidade. Esta força vital, energia da vida e oriunda do amor

vital, dinamizado nas relações pessoais e sociais é que impulsiona os processos vital-

cognitivos (rede) através de um sistema complexo que constitui o ser humano em um corpo-

criante (Dittrich, 2001).

Nas falas das profissionais E2 e E7, apesar de concordarem com a influência da

espiritualidade no processo saúde-doença das pessoas atendidas no Projeto Mãos de Vida,

foram além da valorização do enfrentamento e da crença pessoal. E2 diz “Com certeza. Eu

acho que, primeiramente não sei se tem alguma relação, mas o próprio desencontro desse

lado espiritual talvez predisponha ao próprio câncer, ao adoecimento, as doenças, facilita...,

e quando a pessoa, ela se sente com mais vitalidade talvez, talvez quando ela encontre essa

própria energia que tem dentro dela, eu acho que além de estar ajudando o processo de

doença ela pode estar também prevenindo, né!?”

Já E7 entende que “Com certeza, com certeza. A gente percebe a diferença do

atendimento das pessoas que entram e que tem uma espiritualidade mais desenvolvida

daqueles que são mais céticos, entendeu? E as que acreditam e estão envolvidas de certa

forma nessa atmosfera, elas tem uma evolução melhor. Elas muitas vezes entram de um

jeito, entram carregadas, que a gente percebe que tem uma energia pesada, eu não sei te

explicar como. É só sentindo e só você estando ali para você ver o negócio, para você sentir.

E quando elas saem você percebe que até a respiração delas esta mais calma, baixou

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aquela energia ruim, sabe?” Narraram pois, de forma ainda que sem estrutura conceitual

ampliada, a presença de uma energia vibracional, perceptível e variável individualmente que

influencia todo o processo de recuperação de saúde.

Segundo o modelo quântico, todos os fenômenos (inclusive o que chamamos energia mental e

sutil, e mesmo o que chamamos de espírito) são devido a partículas elementares subatômicas

e às suas interações, sendo que partículas elementares formam átomos, átomos formam

moléculas, moléculas formam células e células formam toda a energia sutil (Goswami, 2006).

Portanto, o fazer vivo da matéria é energia, e nessa perspectiva, a energia é o sustentáculo de

toda estrutura e organização do corpo-criante, o ser humano (Dittrich, 2001).

Esta nova etapa do conhecimento científico reconhece a espiritualidade na abordagem

integral no cuidado da pessoa através de uma visão auto-organizativa, relacionando-a ao

sentido do viver no mundo, no processo saúde-doença, desvelando-se a partir de um

movimento da expressão legítima da criatividade natural do ser humano em toda a sua

complexidade multidimensional. Tal criatividade estrutura e dinamiza este corpo-criante em

questão que, existencialmente falando, apresenta uma tendência inconsciente de buscar

conhecer sua fonte de origem criadora – Deus, o fundamento último – espírito de amor criante

(Dittrich, 2010).

A dimensão profunda, espiritual, como lócus fundamental de onde emerge a percepção

do ser humano em si e para além de si, se apresenta como força criadora inconsciente, que na

sua dinâmica vital, o impulsiona a reconhecer que existe em si uma presença ignorada, a qual

ele chamou de Deus e que o remete à descoberta do sentido da vida, que por sua vez acontece

pela sua criatividade (Dittrich, 2010). Relacionando espiritualidade e cuidado em saúde na

prática médica percebe-se que os pacientes querem ser tratados como pessoas, e não como

doenças, e serem observados como um todo, incluindo aspectos físico, psíquico, social e

espiritual (Okon, 2005).

Apesar de encontrar uma variação da conceituação de cuidado integral e de

espiritualidade, bem como sua influência no processo saúde-doença entre as profissionais de

saúde pesquisadas, e que se apresentou desde uma propriedade de auto-cura até mesmo de um

enfrentamento (coping) espiritual, compreendemos que a intencionalidade, a responsabilidade

e principalmente a amorosidade com que o grupo desenvolve o projeto são, sem dúvida, os

aspectos mais relevantes desse entendimento do cuidar ampliado, valorizando aspectos da

espiritualidade no cuidado integral a saúde da pessoa. A importância da espiritualidade neste

cuidado integral se dá pela necessidade de compreender que a pessoa que está sendo cuidada

tem, em si, aspectos subjetivos de sentidos e propósitos de ser no mundo. Além disto, a

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transcendência com o sagrado, pode promover através do amor vital, a potencialidade de auto-

cura ou mesmo da resiliência de uma inesperada finitude. Profissionais da área de saúde que

agregam ao cuidado integral a valorização dessa subjetividade, oportunizam que muitas

pessoas resignifiquem sua existência nesse momento de incerteza quanto ao desfecho e nas

vivências do seu processo saúde-doença.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A necessidade da realização desta pesquisa acadêmica relacionando a espiritualidade

e o cuidado em saúde era um desejo antigo e ao mesmo tempo um sentido de entendimento de

cuidado integral, que constituiu nossa percepção enquanto profissional da área da saúde.

Nenhum pesquisador é isento de intencionalidade, e certamente essa intenção de

compreender mais profundamente a espiritualidade e sua relação com o processo saúde-

doença encontrou campo fértil em nossas vivências pessoais e profissionais.

Por se tratar de um tema complexo, desafiador e com certa resistência da ciência

contemporânea biologicista apoiada em tecnologia dura, necessitamos buscar conceitos

estruturais em outros campos da ciência como a Filosofia, a Física quântica, a Psicologia e a

Teologia. Compreendemos conceitos que reforçaram ainda mais nossas impressões empíricas

enquanto pessoa e profissional, especialmente sobre a amorosidade e a vontade de sentido.

O principal objetivo deste artigo que se estruturou partir de uma pesquisa, qualitativa,

teórico-prática e exploratória foi alcançado a partir das entrevistas transcritas das profissionais

de saúde (cuidadoras) e interpretadas pelos pesquisadores sobre a compreensão da

espiritualidade no cuidado integral à saúde da pessoa com câncer de mama, atendidas no

Projeto de Extensão Mãos de Vida nas suas percepções. Os objetivos específicos tais como:

“Qual foi o sentido de cuidador de uma pessoa com câncer de mama?”; “O que significou

espiritualidade no cuidado integral à pessoa com câncer de mama?”; “E se em suas

percepções, a espiritualidade influenciou no processo saúde-doença entre as pessoas com

câncer de mama? Por que?”, também foram alcançados.

As entrevistadas acusaram que, ser cuidador de uma pessoa com câncer de mama foi

um desafio, por necessitar desenvolver um olhar ampliado em relação ao ser humano,

assistindo-o de maneira integral e potencializando sua capacidade de auto-cura. Sobre o

significado da espiritualidade no cuidado integral das pessoas com câncer de mama

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65

relacionaram-na ao sentido de vida de cada pessoa, seus significados e propósitos, além da

percepção de uma energia motivadora transcendente. Quanto a influência da espiritualidade

no processo saúde-doença, as falas foram mais concordantes, apesar de conceituarem

diferentemente os princípios fundamentais de cuidado e espiritualidade. As entrevistadas

acreditaram com muita firmeza que a espiritualidade influencia o processo saúde-doença das

pessoas do Projeto Mãos de Vida, especialmente quanto ao enfrentamento e a possibilidade de

auto-cura. Portanto, por mais que haja dificuldades conceituais sobre o fenômeno da

espiritualidade no processo de saúde-doença, não podemos negar que tal dimensão da pessoa

precisa ser acessada e melhor compreendida para saber cuidar com maior humanidade.

A espiritualidade refere-se certamente a um amplo domínio da subjetividade humana,

podendo ser compreendida como aquilo que traz propósito ou sentido à vida das pessoas.

Pode ser compreendida ainda como uma maneira de ser, e isto implica a espiritualidade como

um encontro com o Eu profundo da pessoa que faz contato com o Ser sagrado em si e fora de

si. Esta percepção de sentido que, transcende na experiência cotidiana, é a força motriz da

existência humana, podendo ser atingida por meio de rituais religiosos, prece, meditação, arte,

contato com a natureza, sofrimento e até mesmo relacionamentos amorosos. Negligenciar essa

dimensão espiritual é como ignorar o aspecto social ou psicológico da pessoa e resulta em

falha ao cuidado integral. No Brasil, a formação profissional na área da saúde ainda é

predominantemente biologicista, ou seja direcionada para os aspectos predominantemente

biológicos da doença, e pouco ampliada para o cuidado da pessoa.

Em verdade, muito se tem avançado com a valorização de outros determinantes do

processo saúde-doença, especialmente o aspecto social. Contudo, agregar ao ensino em saúde

temas como espiritualidade e sua relação com o processo saúde-doença ainda é um desafio.

Das cento e oitenta instituições de ensino superior do Brasil que formam o médico,

menos de 10% têm em sua grade curricular o tema da espiritualidade e sua interface com a

saúde, e quando o oferece, é apresentado com uma disciplina optativa ou por meio de cursos

de pós-graduação. Outros cursos da área da saúde também não apresentam conteúdos

obrigatórios que discutam aspectos do cuidado integral da pessoa agregando a dimensão da

espiritualidade. Isto nos causa perplexidade quando pensamos sobre a humanização do

cuidado integral à pessoa.

Uma questão estimulante é, de que forma criativa poderemos fomentar essa discussão

científica durante a formação profissional nos cursos da área da saúde, objetivando uma visão

integral da pessoa em suas dimensões físicas, psíquicas e também espirituais? Acredito que a

inclusão do estudo das artes e da filosofia nos currículos da área da saúde possa contribuir

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para “sensibilizar” o estudante a um sentido de conexão, assim como discussões ético-

humanísticas aplicada ao mundo contemporâneo e situando este jovem aprendiz, e que se

tornará o profissional de saúde cuidador de amanhã, a necessidade de um novo olhar ampliado

para a saúde da pessoa.

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ARTIGO II

Espiritualidade no ensino médico no Brasil: Uma

necessidade para o cuidado integral.

Spirituality in medical education in Brazil: A need for

comprehensive care.

Luiz Gustavo Teixeira Pinto3

Maria Glória Dittrich4

Resumo

Desde os tempos mais remotos da humanidade, o ser humano vem vivenciando a

espiritualidade para compreender o significado de sua presença no mundo e para enfrentar

as mais diversas adversidades de sua existência. Com a evolução da nossa espécie e com

a contribuição das inúmeras áreas do conhecimento, e em especial a Filosofia, inicia-se um

processo de distanciamento da relação entre espiritualidade e cuidados em saúde,

especialmente após o avanço do positivismo como metodologia de compreensão sobre o

processo saúde-doença. Nos últimos 20 anos, pesquisas consistentes vem evidenciando a

importância de agregar ao ensino, predominantemente biologicista, aspectos subjetivos da

natureza do ser humano referentes principalmente à espiritualidade. Este artigo resultante

3 Luiz Gustavo Teixeira Pinto é Médico (UGF-RJ), Especialista em Medicina Interna (Residência Médica no

Hospital Geral de Ipanema-RJ e Sociedade Brasileira de Clínica Médica - SBCM), Especialista em Medicina de

Urgência (SBCM), Pós-Graduado em Terapia Intensiva (UGF-RJ/UNIMED), Professor de Clínica Médica e

Emergências Clínicas do Curso de graduação em Medicina da Univali - SC, Mestrando em Saúde e Gestão do

Trabalho (UNIVALI). [email protected] 4 Maria Glória Dittrich é Filósofa (FEBE), Especialista em Fundamentos da Educação (FURB), Mestre em

Educação (FURB), Doutora em Teologia (EST), Professora Pesquisadora nos Programas de Mestrado

Profissional em Gestão de Políticas Públicas e no Mestrado Profissional de Saúde e Gestão do Trabalho -

UNIVALI – Brasil. É artista plástica, Arteterapêuta; Membro integrante da Red de Formación Universitaria

Transdisciplinar - REDFUT e da Comunidad Internacional Científica Virtual para el Cambio – CCVC e do

Grupo ADESTE – Universidade de Barcelona - Brasil e outras. [email protected]

Endereço: Rua Uruguai, 458 Bloco F6 sala 307 Centro, Itajaí – SC, CEP 88302-901.

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de uma pesquisa teórica de cunho fenomenológico traz uma reflexão sobre o ensino

médico, através de um modelo de pensamento e aponta para novas possibilidades de

estruturação curricular sobre a inclusão na espiritualidade no cuidado em saúde. Para isso,

se utilizou pesquisas contemporâneas bem estruturadas que mostraram a importância da

espiritualidade no cuidado à saúde da pessoa, e logo a necessidade da inclusão desta como

componente curricular na formação em saúde.

Palavras chave: Ensino Médico, Espiritualidade, Saúde.

Abstract

Since the earliest times of humanity, the human being has experienced spirituality to

understand the meaning of their presence in the world and to face the adversities of their

existence. With the evolution of our species and with input from numerous areas of

knowledge, particularly Philosophy, begins a process of distancing the relationship between

spirituality and health care, especially after the advance of positivism as a methodology for

understanding the health and illness. Over the past 20 years, research has been consistent

evidence of the importance of adding the predominantly biologicist education, subjective

aspects of human nature mainly related to spirituality. This article results from a theoretical

study of nature brings a phenomenological reflection on medical education, through a model

of thought and points to new possibilities for structuring curriculum on the inclusion of

spirituality in health care. For this, we used well-structured contemporary research that

showed the importance of spirituality in health care of the person, and then the need to

include this as a curriculum component in health education.

Keywords: Medical Education, Spirituality, Health

Introdução

A espiritualidade é o fenômeno natural, que expressa uma maneira de ser da pessoa

na sua forma de existir e dar sentido aos questionamentos profundos no seu processo

saúde-doença.

Desde que o ser humano se entende como ser pensante, vem vivenciando a

espiritualidade para compreender o significado da vida e da morte, da sua presença no

mundo, para melhorar a saúde e como ferramenta para lidar com o enfrentamento das

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adversidades e a dor, seja ela física, psíquica ou espiritual1. Sua capacidade de auto-

organização de seu sistema molecular, complexo, definido por Maturana como autopoiese,

traduz a imensa criatividade deste ser humano como um corpo-criante, todo vivo sensível e

inteligível, que interage com o outro, com o mundo e consigo mesmo2.

Na Grécia antiga, com o advento da medicina hipocrática, o ser humano tentou

racionalizar essas crenças e práticas, retirando-as do mundo mítico e criando um sistema

que pudesse entender de forma racional o impacto que atitudes, crenças, hábitos,

ambientes e ou ervas causavam no organismo humano3. Platão combinava ciência com

elementos espirituais, enfatizando a necessidade de tratar a “alma” bem como o corpo

físico.

A associação entre espiritualidade e cuidados em saúde perpassou toda Idade

Média, Moderna e mesmo a Idade Contemporânea, nas quais a religião, de certa forma,

controlou o exercício da medicina. Com o aparecimento da psicanálise de Freud, a ciência

nascente, especialmente as ciências biológicas, as quais embasam grande parte da

medicina, ratificou-se um processo de cisão entre duas áreas do conhecimento que sempre

caminharam juntas: a medicina e a espiritualidade. Apesar da dificuldade consensual do

conceito, espiritualidade se refere a um amplo domínio da subjetividade humana, podendo

ser compreendida como aquilo que traz propósito à vida das pessoas, uma propensão

humana a buscar significado à existência por meios que transcendem o tangível4. É um

fenômeno que se explica no real e evoca a ciência para poder compreendê-lo, podendo ou

não, incluir uma participação religiosa.

Frankl entende o fenômeno natural da espiritualidade interconectado à dimensão

profunda, espiritual, da pessoa. Ele afirma que a dimensão espiritual é o lócus fundamental

de onde emerge a percepção do ser humano em si e para além de si5. Apresenta-se como

força criadora inconsciente, que na sua dinâmica vital, impulsiona o ser humano a

reconhecer que existe em si uma dimensão profunda que transcende os limites da

observação metodológica. Porém, o ser humano a percebe quando vive grandes desafios

no processo saúde-doença, por exemplo. Essa dimensão Frankl afirmou que se revela à

consciência do ser humano como uma presença ignorada de algo sagrado, o qual ele

chamou de Deus.

Na visão de Dittrich, a espiritualidade é a emergência de uma criatividade natural do

ser humano, que irrompe em forma de energia vital, espiritual, a qual dinamiza os processos

do pensar, do sentir e do agir pessoal e social, formando uma maneira de ser para enfrentar

as adversidades da vida e descobrir o sentido do porquê viver2,6.

O ser humano na sua criatividade é sustentado, teologicamente, pelo amor criante

como dádiva de Deus presente no ser humano como um corpo-criante, complexo e

multidimensional. Esse amor, força vital edificadora, é que faz a vida acontecer em plenitude

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na relação do eu com o mundo. Esse estado biopsicoespiritual dinâmico, restaurador, auto-

organizativo, é que impulsiona o ser humano (corpo-criante) a se religar com sua fonte

criadora de origem – Deus, o fundamento último, que dá o espírito ao ser humano para a

descoberta de poder ser-no-mundo2.

Espírito, vem do latim, spiritus, significa sopro e se refere a algo que dá ao corpo sua

força vital e demonstra a relação do plano material com a dimensão imaterial, oculta, divina

ou sobrenatural que anima a matéria. O espírito conecta o ser humano à sua dimensão

divina ou transcendente4.

Podemos definir fé como um estado de ser possuído pela Presença Espiritual, o

amor é o estado de ser integrado pela Presença Espiritual na unidade transcendente da

vida-sem-ambiguidade7. Já religiosidade é o aspecto institucional da espiritualidade,

relacionada com crenças, rituais, escritas e símbolos, sendo uma forma dogmática, podendo

ser distorcida por intenções socioeconômicas, culturais e políticas, ou mesmo gerar

intolerância entre diferentes religiões4.

Muito embora alguns autores vejam a distinção entre religiosidade e espiritualidade

como desnecessária, a espiritualidade é considerada mais primordial, pura e diretamente

relacionada com a alma. Assim podemos notar que alguns indivíduos demonstram um alto

grau de espiritualidade sem pertencer a uma religião instituída, outros têm sua

espiritualidade fundamentada na religião, e existem ainda aqueles que se vinculam às

relações sociais da religião, expressando frequentemente, laços étnicos e familiares.

Cabe ressaltar que a idéia deste artigo não é subtrair de forma irresponsável as

inúmeras contribuições no campo da Matemática, da Filosofia e especialmente da Saúde,

que pensadores racionalistas e positivistas ofereceram para o nosso desenvolvimento

biopsicosocial, tampouco, desvalorizar os avanços tecnológicos mesmo financiados por

pesquisas patrocinadas pelo complexo médico-industrial, que oportunizaram uma melhor

compreensão do ser humano biológico.

Em verdade, a intenção é despertar para a importância que a espiritualidade possui

como dimensão subjetiva ligada às outras dimensões constitutivas do ser humano,

principalmente sua interface no processo saúde-doença, e, além disto, trazer implicações e

aplicações de como esta dimensão imaterial pode ser inserida de forma científica e não

mística, na formação curricular do profissional médico no Brasil.

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Um breve histórico

A herança do estilo de pensamento biologicista em saúde remonta o início do século

XX, quando Abraham Flexner em 1910, estruturou sob influência capital do complexo

médico-industrial, a reforma das faculdades de medicina nos Estados Unidos da América

por meio de um modelo de ensino reducionista e pouco reflexivo. Neste modelo

hospitalocêntrico e biologicista centrado na doença, os demais determinantes, tais como os

aspectos psicosociais, a comunidade na sua história e organização, o ecoambiente e a

espiritualidade, não eram considerados para o cuidado à saúde, assim como não eram

percebidos no processo de saúde-doença8.

As posturas eram do ponto de vista teórico-metodológico notoriamente positivistas,

apontando como único conhecimento seguro o científico, mediante a observação, a

experimentação, a verificação e a reprodução. A arte foi substituída pela ciência, sepultando

de vez aspectos intrínsecos complementares fundamentais na formação da boa prática

médica integral, tais como a percepção e a valorização da subjetividade do ser humano.

Deste modo, nosso método de aprendizado reducionista e até a atualidade reverberado nas

escolas médicas, impossibilita e desvaloriza a percepção de sentidos frente ao sofrimento

humano, e o reduz apenas às bases fisiopatológicas e estatísticas reprodutíveis e

verificáveis.

Se por um lado, nossa ciência médica se desenvolveu através dessa “tecnologia

dura” e, sem dúvidas, trouxe inúmeros benefícios para a humanidade, tais como novas

drogas para tratamento de enfermidades, que até então eram fatais, ou conhecimento

tecnológico para procedimentos cirúrgicos minimamente invasivos, imagens radiográficas

cada vez mais precisas, contribuindo inclusive para a longevidade da nossa espécie

humana; por outro lado, desvalorizou o ser humano na sua complexidade de ser

multidimensional, reduzindo-o ao patológico.

Uma Resolução publicada na emenda da Constituição de 07 de abril de 1999, da

Organização Mundial de Saúde, propôs incluir o âmbito espiritual no conceito multidisciplinar

de saúde, que agrega ainda aspectos físicos, psíquicos e sociais. Todavia os limites

conceituais da questão da espiritualidade ainda não são bem definidos e compreendidos em

muitas práticas médicas, especialmente em relação à religiosidade9.

Nos últimos vinte anos a discussão do tema espiritualidade e sua relação com a

saúde vem ganhando reconhecimento científico, sendo inclusive introduzido no currículo

médico obrigatório de inúmeras universidades pelo mundo a fora, especialmente nas

universidades norte-americanas, a partir de pesquisas baseadas em evidências científicas,

validando a percepção desta importante dimensão no cuidado integral da pessoa. No Brasil,

o cenário do ensino médico ainda não é o mesmo. Poucas universidades discutem o tema

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na formação médica profissional, e, as que oferecem em seus componentes curriculares,

são de modo optativo ou mesmo em áreas de pós-graduação10.

Um novo olhar para o cuidado Integral

A necessidade de uma percepção ampliada de ser humano urge na atualidade, pois

estamos vivendo numa era de distorção intensa de valores morais e éticos, pouca

solidariedade, forte individualismo, desamor, consumo irreflexivo e competitividade

inconsequente.

As relações sociais provocadas pelo consumo, chegam a tal ponto que todas as

relações passam a ser reduzidas às relações de consumo. Inclusive as mais profundas

relações afetivas – amizades, namoros, casamentos. O outro diante do eu, passa agora, a

ser tomado também como objeto de consumo, útil enquanto oferece satisfação, e

dispensável ao fim da utilidade. As relações humanas dos indivíduos que se constroem pelo

consumo, acabam sendo, como eles próprios, imagem do consumo, e acabam por gerar

uma fluidez, uma fragilidade cada vez mais acentuada nos relacionamentos humanos11.

Na área da saúde e especificamente durante a assistência médica temos a grande

oportunidade de não somente diagnosticar e tratar patologias, mas também prevenir e

promover saúde. É um momento de interação especial entre pessoas que precisam se

interrelacionar de maneira profunda – um encontro de quem precisa de auxílio e de quem, a

priori, tem conhecimentos específicos para acolher, auxiliar e aconselhar. Para que essa

relação aconteça, precisamos ter um olhar profundo sobre o cuidar da pessoa, perceber não

apenas a expressão física de suas queixas, mas também valorizar o psíquico (sentimentos,

emoções, intuições, razões), suas crenças, valores, significados e propósitos de vida, enfim,

sua espiritualidade, como uma maneira de ser diante dos desafios da vida no processo

saúde-doença. Embora alguns autores vejam a distinção entre religiosidade e

espiritualidade como desnecessária, a espiritualidade é considerada mais primordial, pura e

diretamente relacionada com a alma. Assim podemos notar que algumas pessoas

demonstram um alto grau de espiritualidade sem pertencer a uma religião instituída, outras

têm sua espiritualidade fundamentada na religião. Para isso, além de tempo adequado para

um acolhimento solidário, temos que ter as premissas de uma boa relação médico-paciente:

atenção, intenção e amor ao próximo.

Quando não estamos aptos a perceber a complexidade do ser humano

multidimensional em seus aspectos de significados e propósitos, sua maneira de reconhecer

seu processo de saúde-doença e sua capacidade de recuperação, perdemos oportunidades

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de realmente auxiliar na essência do processo patológico. Contudo, a contemporaneidade

tem renovado seu interesse no assunto e, cada vez mais, pesquisas na área da saúde são

conduzidas para validar a importância dessa interface medicina, saúde e espiritualidade.

No final da década de 1980, epidemiologistas norte-americanos relacionaram

práticas espirituais/religiosas com indicadores de saúde, percebendo de forma inédita que

entre os praticantes religiosos, através de orações e ou cultos religiosos havia melhora na

qualidade de vida, longevidade, menos doença física e mental4. É verdade que muitas

dessas associações podem ser explicadas por outras variáveis já reconhecidamente

impactantes no modus operandi da saúde, como menor consumo de álcool e drogas, maior

apoio social, maior prática de exercícios físicos, entre outros. Entretanto tem-se verificado

que mesmo esses fatores ou estilos de vida têm sido influenciados por diretrizes religioso-

espirituais9.

O termo espiritualidade começou a receber maior atenção da medicina na última

década e não há mais dúvida da importância dos aspectos religiosos ou espirituais no

cuidado das pessoas, embora ainda haja questionamentos a respeito de como acessar a

dimensão espiritual do ser humano10.

Na área da pesquisa médica, as principais publicações de relevância em periódicos

indexados com elevados níveis de evidência estão entre outras, nas áreas de cuidados

paliativos em oncologia, na síndrome da imunodeficiência adquirida e na saúde mental. E a

forma interessante que vem à tona à (re)descoberta da importância da dimensão espiritual

no cuidado integral da pessoa é que essa demanda vem exatamente da pessoa enferma,

nosso principal centro de cuidado e que tem clamado por uma percepção de olhar ampliado,

como um ser físico, psíquico e espiritual12. Além disso, pesquisas na área da neurociências

vem desvelando o eixo psiconeuro-endocrinoimunológico e sua relação com o altruísmo, a

solidariedade, a amorosidade, enfrentamento (coping) religioso/espiritual e bem-estar, ou

mesmo resposta imunológica reacional ao estresse. Tais publicações já não são mais

novidades entre produções científicas de relevância internacional. Será que estamos

entrando na era da “Medicina baseada em espiritualidade”?

A percepção espiritual da realidade dá à pessoa uma dimensão mais ampla de

significados para os eventos da vida diária e pode reorganizar subjetivamente suas

experiências. Esta percepção de sentido, transcendente na experiência cotidiana, é a força

motriz da existência humana, e pode ser atingida por meio de rituais religiosos, prece,

meditação, arte, contato com a natureza, sofrimento e até mesmo relacionamentos

amorosos5. Relacionando espiritualidade e cuidado em saúde na prática médica percebe-se

que os pacientes querem ser tratados como pessoas, e não como doenças, e serem

observados como um todo, incluindo aspectos físico, psíquico, social e espiritual13. A partir

desta visão ampliada de que o processo saúde-doença perpassa dimensões biofísicas,

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psíquicas, espirituais e sócio-culturais, precisamos criar, de forma inovadora, métodos de

acessar e principalmente valorizar a espiritualidade, fazendo com que nosso cuidado à

pessoa seja realmente integral. Alguns destacados pesquisadores na área médica, entre

eles Harold Koenig e Christina Puchalski, recentemente validaram escalas de como e

quando acessar informações relevantes sobre a espiritualidade/religiosidade relacionando-

as com a saúde, não somente entre pessoas enfermas, mas também entre profissionais

assistenciais da área da saúde10.

As dificuldades não são poucas, pois existem conflitos de entendimento, crenças

distintas e muita resistência entre os próprios profissionais de saúde, professores, alunos,

médicos e mesmo de algumas pessoas enfermas sobre quando acessar, como acessar, por

que acessar, e se essa abordagem do cuidado em saúde ampliado realmente trará

benefícios ao paciente14,15. Tais dúvidas podem se relacionar ao desconhecimento, e, como

o navio Beagle para Darwin em sua importante viagem exploratória, nos ajudando a

entender o processo evolutivo, ou mesmo o telescópio para Copérnico iniciar a elaboração

teórica do heliocentrismo, a compreensão da espiritualidade, sua pesquisa e aplicação,

poderão ser instrumento para trazer enormes contribuições à saúde e ao bem-estar do ser

humano.

Em relação ao ensino médico, uma disciplina na formação médica que fomente a

discussão sobre espiritualidade e sua relação com o processo saúde-doença é inexistente

nos currículos obrigatórios dos médicos no Brasil, como já se abordou anteriormente10. Isso

nos causa perplexidade quando pensamos sobre a humanização do cuidado integral à

pessoa. Tão essencial quanto perceber a influência da espiritualidade no cuidado de

condições patológicas, é compreender a maneira como esse assunto poderá ser abordado

durante a formação do graduando em medicina.

Os Estados Unidos da América perfazem a maior fonte de literatura científica a

respeito de educação médica em espiritualidade, o que é um reflexo do grande número de

escolas que já vêem na espiritualidade um tema a ser discutido durante a graduação.

Segundo a Associação Médica Americana, em 1992 apenas 2% dos cursos de medicina

norte-americanos disponibilizava uma disciplina que oferecia aos médicos graduandos

temas relacionados com a espiritualidade. Em 2004 esse número cresceu para 67%. Os

métodos de ensino utilizados nesses programas incluem palestras sobre o tema, discussões

em pequenos grupos, leituras e aplicações de questionários15,16. No Reino Unido, 59% das

escolas médicas já oferecem algum tipo de curso relacionado à espiritualidade17.

Já no Brasil, apesar de ser um dos maiores países religiosos do mundo,

pouquíssimas escolas médicas oferecem cursos sobre a interface medicina/espiritualidade.

Menos de 10% das aproximadamente 180 Faculdades de Medicina no Brasil abordam o

tema nos currículos médicos10. Esta dicotomia de pensamentos e necessidades entre os

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profissionais da área da saúde de formação biologicista estrita, e de pessoas que valorizam

sua religiosidade/espiritualidade, merece ser pesquisada na tentativa de entender o que

impede a ampliação do olhar do cuidador frente ao ser humano em sua

multidimensionalidade?

A Universidade Santa Cecília, localizada em Santos, São Paulo, foi a pioneira em

2002, incluindo em seu currículo médico optativo disciplinas que trata da saúde e

espiritualidade, seguida da Universidade Federal do Ceará, somente em 2006. Em anos

posteriores, Universidade de São Paulo, do Rio Grande do Norte e Triângulo Mineiro

completaram o cenário atual de instituições que oferecem a discussão do assunto em nível

acadêmico de graduação médica, sendo todas as disciplinas abordadas no currículo

optativo18. A resistência na introdução de cursos sobre espiritualidade no currículo médico é

não somente pela escassez de estudos nacionais sobre o assunto, mas também pelo estilo

de pensamento biologicista e fragmentado, predominante entre os docentes e profissionais

da área da saúde que atuam na formação profissional. A dicotomia aparentemente existente

entre a medicina, ciência objetiva, e a espiritualidade, a dimensão subjetiva do ser humano,

torna a maioria dos médicos formados, no tradicional modelo flexneriano, pouco receptivos à

aceitar e lidar com questões metafísicas de seus pacientes.

Pesquisas realizadas entre a população geral e médicos norte-americanos

estudando crenças e o comportamento religioso/espiritual relacionando-os com a

assistência médica foram desenvolvidas nesta última década, revelando que 95% das

pessoas acreditam em Deus, 77% acreditam que os médicos devem considerar as suas

crenças espirituais, 73% acreditam que devam compartilhar as suas crenças religiosas com

o profissional médico e 66% demonstram o interesse de que o médico pergunte sobre a sua

espiritualidade. No entanto apenas 10% a 20% relataram que os médicos discutiram a

espiritualidade com elas19,20. Muitos médicos dizem que se sentem desconfortáveis ao falar

sobre assuntos religiosos/espirituais, ou que não tem tempo para lidar com isso. Outros não

consideram os assuntos espirituais como parte de seus trabalhos, não entendem por que

deveriam ser, não sabem como e nem quando introduzí-los, e sequer imaginam quais

seriam os resultados caso os incluíssem21,22,23.

Na literatura médica em cuidados paliativos e saúde mental, o tema religiosidade e

espiritualidade ganha bastante importância e destaque. O papel da espiritualidade em

pacientes com câncer ou portadores da síndrome da imunodeficiência adquirida é revisto,

ressaltando os domínios do significado, da esperança, do amor e dos relacionamentos.

Avaliações e intervenções espirituais destacadas para a promoção do conforto e a

diminuição da dor foram: a vontade de escutar, atenção e aceitação23,24.

Há atualmente uma tendência na formação de modelo multidisciplinar envolvendo

aspectos espirituais no tratamento da dor no câncer, discutindo o papel de vários

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profissionais das áreas da saúde tais como, psicólogos, enfermeiros, oncologistas,

psiquiatras, capelães e religiosos, em que cada um desempenha um papel específico,

relacionando-se com a pessoa enferma23.

Esta nova etapa do conhecimento científico reconhece a espiritualidade na

abordagem integral no cuidado do ser humano, através de uma visão auto-organizativa,

relacionando-a ao sentido do viver no mundo e ao processo saúde-doença, desvelando-se a

partir de um movimento da expressão legítima da criatividade natural do ser humano, em

toda a sua complexidade multidimensional.

A atitude de um médico que, diante de uma pessoa, busca prudentemente

reconhecer para além das demandas explícitas relacionadas às necessidades de ações de

saúde, como as relacionadas ao diagnóstico precoce e à redução de fatores de risco; mas,

também, à uma valorização da experiência de significado e de sentido dessa pessoa frente

ao sofrimento, ilustra um sentido de integralidade no cuidado da pessoa profundamente

ligado aos ideais da medicina integral.

A complexidade do objeto da saúde exige recriar a atuação dos profissionais de

vários campos do conhecimento que atuam na área saúde, especialmente os médicos, já

que a complexidade do ser humano não é redutível à organização da atenção em

determinado nível, mas sim à uma necessidade de percepção ampliada da pessoa em todas

as suas dimensões físicas, psíquicas, espirituais e sócio-culturais, por meio de ações

interdisciplinares no cuidado integral.

Considerações finais

Necessitamos agregar ao já consagrado modelo científico flexneriano de ensino da

medicina e, que responde bem ao conhecimento “das partes”, o modelo holístico,

familiarizando aspectos da espiritualidade para sensibilizar a percepção por parte dos

estudantes de graduação e médicos para o (re)conhecimento do ser humano como um “

todo complexo na sua multidimensionalidade”. Áreas de atuação médicas como a saúde

mental, a medicina paliativa em pacientes oncológicos em finitude e as principais doenças

auto-imunes estão em destaque nesse início de mudança de paradigma do cuidado integral.

Ter essa abertura de consciência para a valorização da dimensão espiritual da

pessoa e a sua relação com o processo saúde-doença é fundamental; especialmente,

porque tais patologias têm em seu substrato etiopatogênico, aspectos intimamente

relacionados à experiências vividas, sentidas e significadas, e que desejam um melhor

conhecimento da subjetividade e sentido de enfrentamento humano, para se chegar a

efetividade de um cuidado integral à saúde da pessoa, bem como, a um ensino médico mais

abrangente e ciente de uma visão ampliada de ser humano.

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Nestes aspectos o modelo cartesiano de explicação para os mecanismos de doença

estão pouco ou nada elucidativos, pois não percebe a singularidade da pessoa na sua

complexidade dimensional, apenas considera a dimensão biofísica da doença, observável,

verificável e reprodutível. O papel da pesquisa fenomenológica nestes novos tempos,

que valoriza a percepção e a subjetividade dos pacientes frente ao processo saúde-doença,

assim como da neurociência e da saúde mental já estão sendo e serão fundamentais para

“cientificar” o fenômeno da espiritualidade a partir de muita criatividade, rigor e humildade

acadêmica.

No âmbito do ensino médico, necessitamos, portanto, desenvolver, baseado em

pesquisas cada vez mais estruturadas, discussões interdisciplinares ampliadas frente ao

fenômeno da espiritualidade e sua relação com o cuidado em saúde, especialmente no

Brasil, país altamente religioso/espiritualizado, cuja população clama por um olhar mais

integral do ser humano.

A partir desta nova postura acadêmica, poderemos conseguir minimizar as mútuas

angústias, pois, se de um lado há um ser humano na condição de pessoa enferma e

necessitando ser melhor acolhido e percebido, de outro lado, há um ser humano médico,

que necessita de forma urgente ampliar o olhar sobre o cuidado, mas que já reconhece,

mesmo de forma tímida, que o modelo tradicional não lhe responde minimamente em

inúmeras situações vivenciadas em sua prática. Com efeito, esta ideia coloca um desafio

pró-ativo – o da inclusão do tema espiritualidade no cuidado em saúde, nos currículos do

ensino médico e de outros ensinos no campo da saúde.

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APÊNDICE A - Roteiro de entrevista

1 Qual o sentido para o(a) Sr.(Sra.) em ser cuidador(a) de uma pessoa com câncer

de mama?

2 O que significa espiritualidade para o(a) Sr.(Sra.) no cuidado integral à pessoa

com câncer de mama?

3 Na sua percepção, a espiritualidade pode influenciar no processo saúde-doença

entre os pacientes com câncer de mama? Por quê?

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APÊNDICE B – Dados de Identificação

Dados de Identificação

Nome:

Idade:

Formação profissional:

Tempo de formação profissional:

Atuação Profissional:

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APÊNDICE C - Declaração de não existência de orçamento previsto para

execução da pesquisa

Na qualidade de pesquisador responsável pela pesquisa aqui intitulada A

espiritualidade no cuidado integral à saúde da pessoa com câncer de mama na

perspectiva dos cuidadores, declaro para os devidos fins éticos, em conformidade

com o documento do SISNEP/registro da pesquisa, que a mesma não apresenta

financiamento de qualquer instituição com este fim, e que, portanto, não necessita

de orçamento detalhado incluído.

Profª. Dra. Maria Glória Dittrich Professora responsável

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APÊNDICE D - Termo de consentimento livre e esclarecido

Você está sendo convidado (a) a participar, como voluntário, de uma

pesquisa. Após ser esclarecido (a) sobre as informações a seguir, no caso de aceitar

fazer parte do estudo, deverá rubricar todas as folhas e assinar ao final deste

documento, que está em duas vias. Uma delas é sua e a outra é do pesquisador

responsável. Em caso de recusa, você não será penalizado (a) de forma alguma.

INFORMAÇÕES SOBRE A PESQUISA

Título do Projeto: A espiritualidade no cuidado integral à saúde da pessoa com

câncer de mama na perspectiva dos cuidadores.

Professora Responsável: Dra. Maria Gloria Dittrich contato: (47) 3366-3210

Pesquisador: Luiz Gustavo Teixeira Pinto contato: (47) 9101-9081

O presente projeto tem como objetivo investigar a percepção sobre a

espiritualidade no cuidado integral à saúde da pessoa com câncer de mama na

perspectiva dos cuidadores, inseridos no Projeto de Extensão Universitária “Mãos

de Vida”. Esta pesquisa certamente colaborará para o avanço dos conhecimentos

para o cuidado às pessoas com câncer de mama, especialmente no que diz respeito

à espiritualidade na saúde.

O roteiro de entrevista apresenta 03 (três) questões predefinidas e abertas, de

forma que poderá haver acréscimo de outras perguntas, de acordo com a

necessidade. A entrevista será realizada individualmente em dia e hora previamente

acordados. Quanto aos aspectos éticos, os pesquisadores informam que:

Os dados pessoais do participante serão mantidos em sigilo, garantindo seu

anonimato, bem como o resultado dos dados sobre a importância da

espiritualidade na saúde da pessoa.

A aceitação não implica que seja obrigado(a) a participar da pesquisa até seu

final. A qualquer momento poderá interromper sua participação, bastando, para

isto, comunicar o pesquisador.

A participação é voluntária, não terá direito à remuneração.

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Esta pesquisa é de cunho acadêmico e não visa a uma intervenção imediata,

tampouco causará constrangimento de ordem psíquica, política, social e religiosa.

Se o participante tiver alguma reclamação do ponto de vista ético, poderá contatar

com o responsável desta pesquisa.

Os resultados serão divulgados na apresentação da pesquisa perante defesa

para uma banca examinadora, de forma pública, até julho de 2014.

Posteriormente, a apresentação será publicada em revista científica.

Ao final da pesquisa, a devolutiva dos resultados ocorrerá por meio de uma cópia

impressa de um relatório que será entregue à coordenadora da pós-graduação do

Mestrado Profissional em Saúde e Gestão do Trabalho UNIVALI – Campus Itajaí.

Para participar dessa pesquisa, o(a) Senhor(a) deverá assinar o Termo de

Consentimento Livre e Esclarecido (a seguir), rubricando todas as páginas. Esse

termo determina que aceita participar da pesquisa como voluntário(a) e pode

desistir de fazê-lo, se não se sentir à vontade, sem que sofra qualquer coação.

Luiz Gustavo Teixeira Pinto Pesquisador

Nome do pesquisado/a:

Assinatura do pesquisado/a:

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APÊNDICE E - Identificação e consentimento

Eu, ________________________________________________________________

RG:________________ CPF:____________, declaro estar ciente dos propósitos da

pesquisa e da maneira como será realizada e no que consiste minha participação

como sujeito. Ademais, poderei retirar-me da pesquisa quando quiser, sem sofrer

nenhum tipo de penalidade, como também não receberei remuneração para isso.

E-mail:

Itajaí,____/____/________.

Assinatura do pesquisado

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APÊNDICE F - Termo de utilização de dados para coleta de dados de

pesquisas envolvendo seres humanos

Declaro que conheço e cumprirei os requisitos da Res. CNS 196/96 e suas

complementares no desenvolvimento do projeto de pesquisa “A espiritualidade no

cuidado integral à saúde da pessoa com câncer de mama na perspectiva dos

cuidadores”, assim como afirmo que os dados descritos no protocolo serão obtidos

em absoluto sigilo e utilizados apenas para os fins especificados deste, aprovado

pelo Comitê de Ética.

Itajaí,____/____/________.

Maria Glória Dittrich Professora orientadora

Luiz Gustavo Teixeira Pinto Mestrando

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APÊNDICE G - Termo de aceite de orientação

Eu, Maria Glória Dittrich, professora do Mestrado em Saúde e Gestão do

Trabalho da UNIVALI, concordo orientar o projeto de pesquisa para dissertação de

mestrado do acadêmico Luiz Gustavo Teixeira Pinto, tendo como título “A

espiritualidade no cuidado integral à saúde da pessoa com câncer de mama na

perspectiva dos cuidadores”.

Itajaí,____/____/________.

Maria Glória Dittrich Professora orientadora

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APÊNDICE H - Termo de anuência de instituição para coleta de dados de

pesquisas envolvendo seres humanos

Declaro que conheço e cumprirei os requisitos da Res. CNS 196/96 e suas

complementares e como esta instituição tem condições para o desenvolvimento do

projeto de pesquisa A ESPIRITUALIDADE NO CUIDADO INTEGRAL À SAÚDE DA

PESSOA COM CÂNCER DE MAMA NA PERSPECTIVA DOS CUIDADORES e

autorizo sua execução pelos pesquisadores Luiz Gustavo Teixeira Pinto e Maria

Glória Dittrich.

Nome da Instituição: Universidade do Vale do Itajaí

Endereço: Rua Uruguai, 458 – Centro, Itajaí/SC. Telefone: 47 3341-7500

Nome completo do responsável legal: Enfª. Clarice Maria Specht

Cargo: Chefe do ambulatório de especialidades médicas da Unidade Saúde Familiar

e Comunitária (USFC)

Assinatura:

Data: