ludwig von mises - ação humana

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Política, economia, filosofia, escola austríaca.

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  • 1. AO HUMANA Ludwig von MisesTraduzido por Donald Stewart Jr. 3 Edio 1
  • 2. Ao Humana: um tratado de economia / Ludwig von Mises: traduo de Donald Stewart Jr. - 3.ed. -Rio de Janeiro: Instituto Liberal. 1990. 872p.Traduo de: Human Action: a treatise in economics.ISBN 8585054158I. Economia Poltica (Teoria e Filosofia). II. Filosofia. I. Donald Stewart Jr. II. Instituto Liberal, Rio deJaneiro. III. Ttulo.Todos os direitos reservados para a lngua portuguesa no Brasil:INSTITUTO LIBERALRUA Professor Alfredo Gomes. 28 - BotafogoCEP 22251-080- Rio de Janeiro- RJ - BrasilTel.: (021) 539-1115 Fax: (021) 537-7206O Instituto Liberal uma instituio sem fins lucrativos e no tem - nem pode ter, de acordo comseu estatuto, - qualquer vnculo poltico-partidrio. Suas atividades so voltadas para a pesquisa,produo e divulgao de idias, teorias e conceitos que revelam as vantagens de uma sociedadeorganizada com base em uma ordem liberal.OrdemLivre.org uma organizao no-governamental sem qualquer vnculo partidrio. Fundadasobre os princpios de liberdade individual, mercado livre, paz e governo limitado, OrdemLivre.orgpromove uma ordem econmica eficiente e uma filosofia poltica moral e inspiradora por meio depublicaes e eventos.A equipe OrdemLivre.org agradece ao Instituto Liberal pela publicao da presente obra emportugus e por ter generosamente autorizado sua edio online. 2
  • 3. SUMRIOIntroduo Primeira Parte Ao HumanaI. O agente homemII. Os problemas epistemolgicos das cincias da ao humanaIII. A Economia e a revolta contra a razoIV. Uma primeira anlise da categoria da aoV. O tempoVI. A incertezaVII. Ao no mundo Segunda Parte Ao na SociedadeVIII. A sociedade humanaIX. O papel das idiasX. O intercmbio na sociedade Terceira Parte Clculo EconmicoXI. Valorao sem clculoXII. O mbito do clculo econmicoXIII. O clculo econmico como um instrumento da ao Quarta Parte Catalxia ou Economia de MercadoXIV. mbito e metodologia da catalxiaXV. O mercadoXVI. Os preos 3
  • 4. XVII. A troca indiretaXVIII. A ao na passagem do tempoXIX. A taxa de jurosXX. O juro, a expanso de crdito e o ciclo econmicoXXI. Trabalho e SalriosXXII. Os fatores de produo originais de natureza no humanaXXIII. A realidade do mercadoXXIV. Harmonia e conflito de interesses Quinta Parte A Cooperao Social sem o MercadoXXV. A construo imaginria de uma sociedade socialistaXXVI. A impossibilidade do clculo econmico no sistema socialista Sexta Parte A Interveno no MercadoXXVII. O governo e o mercadoXXVIII. O intervencionismo via tributaoXXIX. A restrio da produoXXX. A interferncia na estrutura de preosXXXI. Manipulao da moeda e do crditoXXXII. Confisco e redistribuioXXXIII. Sindicalismo e corporativismoXXXIV. A economia de guerraXXXV. Estado provedor versus mercadoXXXVI. A crise do intervencionismoXXXVII. O carter peculiar da cincia econmicaXXXVIII. A importncia do estudo da economiaXXXIX. A economia e os problemas essenciais da natureza humana 4
  • 5. INTRODUO1. Economia e praxeologia A economia a mais nova das cincias. verdade que, nos ltimos duzentos anos,surgiram muitas cincias novas, alm das disciplinas que eram familiares aos antigos gregos.Essas cincias novas, entretanto, eram apenas partes do conhecimento j existentes no sistematradicional de ensino e que se tornaram autnomas. O campo de estudo foi melhorsubdividido e tratado com novos mtodos; foram, assim, descobertos novos campos deconhecimento que at ento no tinham sido percebidos, e as pessoas comearam a ver ascoisas por ngulos novos, diferentes daqueles de seus precursores. O campo mesmo no seexpandiu. Mas a economia abriu para as cincias humanas um domnio at ento inacessvel,no qual no se havia jamais pensado. A descoberta de uma regularidade na seqncia einterdependncia dos fenmenos de mercado foi alm dos limites do sistema tradicional desaber, pois passou a incluir um conhecimento que no podia ser considerado como lgica,matemtica, psicologia, fsica, nem como biologia. Durante muito tempo os filsofos ansiaram por identificar os fins que Deus ou aNatureza estariam procurando atingir no curso da histria humana. Tentaram descobrir a leique governa o destino e a evoluo do gnero humano. Mas mesmo aqueles cuja investigaono sofria influncia de tendncias teolgicas tiveram seus esforos inteiramente frustrados,porque estavam comprometidos com um mtodo defeituoso. Lidavam com a humanidadecomo um todo ou atravs de conceitos holsticos tais como nao, raa ou igreja.Estabeleciam de forma bastante arbitrria os fins que fatalmente determinariam ocomportamento de tais conjuntos. Mas no conseguiam responder satisfatoriamente indagao relativa a que fatores compeliriam os indivduos a se comportarem de maneira talque fizesse com que o suposto objetivo, pretendido pela inexorvel evoluo do conjunto, 5
  • 6. fosse atingido. Recorreram a artifcios insensatos: interferncia milagrosa da Divindade, sejapela revelao, seja pela delegao a profetas ou lderes consagrados enviados por Deus;harmonia preestabelecida, predestinao; ou, ainda, influncia de uma fabulosa e msticaalma mundial ou alma nacional. Houve quem falasse de uma astcia da natureza, queteria implantado no homem impulsos que o guiam involuntariamente pelos caminhosdeterminados pela Natureza. Outros filsofos foram mais realistas. No tentaram adivinhar os desgnios de Deusou da Natureza. Encaravam as coisas humanas sob o ngulo do poder. Tinham a inteno deestabelecer regras de ao poltica, como se fossem uma tcnica de governo e de conduodos negcios pblicos. As mentes mais especulativas formulavam planos ambiciosos parareformar e reconstruir a sociedade. Os mais modestos se contentavam em coletar esistematizar os dados de experincia histrica. Todos estavam convencidos de que no cursode eventos sociais no existiam regularidades e invarincias de fenmenos, como j haviasido descoberto no funcionamento do raciocnio humano e no encadeamento de fenmenosnaturais. No tentavam descobrir as leis da cooperao social, porque pensavam que o homempodia organizar a sociedade como quisesse. Se as condies sociais no preenchessem osdesejos dos reformadores, se suas utopias se mostrassem irrealizveis, a culpa era atribuda deficincia moral do homem. Problemas sociais eram considerados problemas ticos. O queera necessrio para construir a sociedade ideal, pensavam eles, eram bons princpios ecidados virtuosos. Com homens honrados, qualquer utopia podia ser realizada. A descoberta da inevitvel interdependncia dos fenmenos do mercado destronouessa opinio. Desnorteadas, as pessoas tiveram de encarar uma nova viso da sociedade.Aprenderam, estupefatas, que existe um outro aspecto, diferente do bom e do mau, do justo edo injusto, segundo o qual a ao humana podia ser considerada. Na ocorrncia de fenmenossociais prevalecem regularidades s quais o homem tem de ajustar suas aes, se deseja ser 6
  • 7. bem-sucedido. intil abordar fatos sociais com a postura de um censor que os aprova oudesaprova segundo padres bastante arbitrrios e julgamentos de valor subjetivos. Devemosestudar as leis da ao humana e da cooperao social como um fsico estuda as leis danatureza. Ao humana e cooperao social vistas como objeto de uma cincia que estudarelaes existentes e no mais como uma disciplina normativa de coisas que deveriam ser esta foi a revoluo com conseqncias enormes para o conhecimento e para a filosofia, bemcomo para a ao em sociedade. Por mais de cem anos, entretanto, os efeitos dessa mudana radical nos mtodos deraciocnio foram bastante restritos porque se acreditava que s uma pequena parte do campototal da ao humana seria afetada, qual seja, os fenmenos de mercado. Os economistasclssicos, nas suas investigaes, esbarraram num obstculo que no conseguiram superar: oaparente paradoxo de valor. Sua teoria do valor era defeituosa e os forou a restringirem oescopo de sua cincia. At o final do sculo XIX a economia poltica permaneceu uma cinciados aspectos econmicos da ao humana, uma teoria da riqueza e do egosmo. Lidava coma ao humana apenas na medida em que esta fosse impelida pelo que era muitoinsatisfatoriamente considerada como motivao pelo lucro, e acrescentava que existiamoutras aes humanas cujo estudo era tarefa de outras disciplinas. A transformao dopensamento que os economistas clssicos haviam iniciado s foi levada s suas ltimasconseqncias pela moderna economia subjetivista, que transformou a teoria dos preos domercado numa teoria geral da escolha humana. Durante muito tempo os homens no foram capazes de perceber que a transio dateoria clssica de valor para a teoria subjetiva de valor era muito mais do que a substituiode uma teoria de mercado menos satisfatria por outra mais satisfatria. A teoria geral daescolha e preferncia vai muito alm dos limites que cingiam o campo dos problemaseconmicos estudados pelos economistas, de Cantillon, Hume e Adam Smith at John Stuart 7
  • 8. Mill. muito mais do que simplesmente uma teoria do aspecto econmico do esforohumano e da luta para melhoria de seu bem-estar material. a cincia de todo tipo de aohumana. Toda deciso humana representa uma escolha. Ao fazer sua escolha, o homemescolhe no apenas entre diversos bens materiais e servios. Todos os valores humanos sooferecidos para opo. Todos os fins e todos os meios, tanto os resultados materiais como osideais, o sublime e o bsico, o nobre e o ignbil so ordenados numa seqncia e submetidosa uma deciso que escolhe um e rejeita outro. Nada daquilo que os homens desejam obter ouquerem evitar fica fora dessa ordenao numa escala nica de gradao e de preferncia. Amoderna teoria de valor estende o horizonte cientfico e amplia o campo dos estudoseconmicos. Da economia poltica da escola clssica emerge a teoria geral da ao humana, apraxeologia.1 Os problemas econmicos ou catalcticos2 esto embutidos numa cincia maisgeral da qual no podem mais ser separados. O exame dos problemas econmicos temnecessariamente de comear por atos de escolha: a economia torna-se uma parte embora atagora a parte elaborada de uma cincia mais universal: a praxeologia.2. O problema epistemolgico de uma teoria geral da ao humana Na nova cincia, tudo parecia problemtico. Ela era uma intrusa no sistematradicional de conhecimento; as pessoas estavam perplexas e no sabiam como classific-lanem como designar o seu lugar. Por outro lado, estavam convencidas de que a incluso daeconomia no sistema de conhecimento no necessitava de uma rearrumao ou expanso doprograma existente. Consideravam completo o seu sistema de conhecimento. Se a economiano cabia nele, a falha s podia estar no tratamento insatisfatrio aplicado pelos economistasaos seus problemas. Rejeitar os debates sobre a essncia, o escopo e o carter lgico da economia, comose fossem apenas uma tergiversao escolstica de professores pedantes, prova de 8
  • 9. desconhecimento total do significado desses debates; um equvoco bastante comum suporque, enquanto pessoas pedantes desperdiavam seu tempo em conversas inteis acerca dequal seria o melhor mtodo de investigao, a economia em si mesma, indiferente a essasdisputas fteis, seguia tranqilamente o seu caminho. No Methodenstreit,3 entre oseconomistas austracos e a Escola Historicista Alem que se auto-intitulava guarda-costasintelectual da Casa de Hohenzollern bem como nas discusses entre a escola de John BatesClark e o institucionalismo americano,4 havia muito mais em jogo do que a simples questosobre qual seria o melhor procedimento. A verdadeira questo consistia em definir osfundamentos epistemolgicos da cincia da ao humana e sua legitimao lgica. Partindode um sistema epistemolgico para o qual o pensamento praxeolgico era desconhecido e deuma lgica que reconhecia como cientfica alm da lgica e da matemtica apenas ahistria e as cincias naturais empricas, muitos autores tentaram negar a importncia e autilidade da teoria econmica. O historicismo pretendia substitu-la por histria econmica; opositivismo recomendava substitu-la por uma ilusria cincia social que deveria adotar aestrutura lgica e a configurao da mecnica newtoniana. Ambas as escolas concordavamnuma rejeio radical de todas as conquistas do pensamento econmico. Era impossvel aoseconomistas permanecerem calados em face de todos esses ataques. O radicalismo dessa condenao generalizada da economia foi logo superado por umniilismo ainda mais universal. Desde tempos imemoriais, os homens, ao pensar, falar e agir,consideraram a uniformidade e imutabilidade da mente humana como um fato inquestionvel.Toda investigao cientfica estava baseada nessa hiptese. Nas discusses sobre o carterepistemolgico da economia, pela primeira vez na histria do homem, este postulado tambmfoi negado. O marxismo afirma que a forma de pensar de uma pessoa determinada pelaclasse a que pertence. Toda classe social tem sua lgica prpria. O produto do pensamentono pode ser nada alm de um disfarce ideolgico dos interesses egostas da classe de quem 9
  • 10. elabora o pensamento. A tarefa de uma sociologia do conhecimento desmascararfilosofias e teorias cientficas e expor o seu vazio ideolgico. A economia um expedienteburgus; os economistas so sicofantas do capital. Somente a sociedade sem classes dautopia socialista substituir as mentiras ideolgicas pela verdade. Este polilogismo, posteriormente, assumiu vrias outras formas. O historicismoafirma que a estrutura lgica da ao e do pensamento humano est sujeita a mudanas nocurso da evoluo histrica. O polilogismo social atribui a cada raa uma lgica prpria.Finalmente, temos o irracionalismo sustentando que a razo em si no capaz de elucidar asforas irracionais que determinam o comportamento humano. Tais doutrinas vo muito alm dos limites da economia. Elas questionam no apenasa economia e a praxeologia, mas qualquer conhecimento humano e o raciocnio em geral.Referem-se matemtica e fsica, tanto quanto economia. Parece, portanto, que a tarefa derefut-las no cabe a nenhum setor especfico do conhecimento, mas epistemologia e filosofia. Essa , aparentemente, a justificativa para a atitude daqueles economistas quetranqilamente continuam seus estudos sem se importar com problemas epistemolgicos nemcom as objees levantadas pelo polilogismo e pelo irracionalismo. Ao fsico, pouco importase algum estigmatiza suas teorias como burguesas, ocidentais ou judias; da mesma maneira,o economista deveria ignorar a calnia e a difamao. Deveria deixar os ces latirem e noprestar ateno aos seus latidos. conveniente que se lembre do ditado de Spinoza: Sanesicut lux se ipsamet tenebras manifestat sic veritas norma sui et falsi est.5 Entretanto, no que concerne economia, a situao no bem a mesma que emrelao matemtica e s cincias naturais. O polilogismo e o irracionalismo atacam apraxeologia e a economia. Embora suas afirmaes sejam feitas de maneira geral, referindo-sea todos os ramos do conhecimento, na realidade visam s cincias relativas ao humana.Afirmam ser uma iluso acreditar que a pesquisa cientfica pode produzir resultados vlidos 10
  • 11. para gente de todas as pocas, raas e classes sociais, e se comprazem em depreciar certasteorias fsicas e biolgicas como burguesas ou ocidentais. Mas, se a soluo de questesprticas necessita da aplicao dessas doutrinas estigmatizadas, esquecem sua desaprovao.A tecnologia da Unio Sovitica utiliza sem escrpulos todos os resultados da fsica, qumicae biologia burguesas. Os fsicos e engenheiros nazistas no desprezaram a utilizao deteorias, descobertas e invenes das raas e naes inferiores. O comportamento dos povosde todas as raas, religies, naes, grupos lingsticos ou classes sociais demonstraclaramente que eles no endossam as doutrinas do polilogismo e do irracionalismo no queconcerne matemtica, lgica e s cincias naturais. Mas, no que diz respeito praxeologia e economia, as coisas se passam de maneirainteiramente diferente. O principal motivo do desenvolvimento das doutrinas do polilogismo,historicismo e irracionalismo foi proporcionar uma justificativa para desconsiderar osensinamentos da economia na determinao de polticas econmicas. Os socialistas, racistas,nacionalistas e estatistas fracassaram nas suas tentativas de refutar as teorias dos economistase demonstrar o acerto de suas doutrinas esprias. Foi precisamente essa frustrao que osimpeliu a negar os princpios lgicos e epistemolgicos sobre os quais se baseia o raciocniohumano, tanto nas atividades cotidianas como na pesquisa cientfica. No admissvel desembaraar-se dessas objees meramente com bases nosmotivos polticos que as inspiraram. A nenhum cientista permitido presumir de antemo quea desaprovao de suas teorias deve ser infundada porque seus crticos esto imbudos depaixo ou preconceito partidrio. Ele deve responder a cada censura sem considerar seusmotivos subjacentes ou sua origem. No menos admissvel silenciar face freqente opiniode que os teoremas de economia so vlidos apenas em condies hipotticas que no severificam na vida real e que, portanto, so inteis para a compreenso da realidade. estranho que algumas escolas aprovem esta opinio e, ao mesmo tempo, calmamente, 11
  • 12. desenhem suas curvas e formulem suas equaes. No se importam com o significado do seuraciocnio e nem como este se relaciona com o mundo real da vida e da ao. Essa atitude , sem dvida, indefensvel. O primeiro dever de qualquer investigaocientfica descrever exaustivamente e definir todas as condies e suposies, com base nasquais pretende validar suas afirmaes. um erro considerar a fsica como um modelo e umpadro para a pesquisa econmica. Mas as pessoas comprometidas com esta falcia deviamter aprendido pelo menos uma coisa: nenhum fsico jamais acreditou que o esclarecimento dealgumas condies e suposies de um teorema da fsica esteja fora do campo de interesse dapesquisa da fsica. A questo central que a economia tem obrigao de responder sobre arelao entre suas afirmaes e a realidade da ao humana, cuja compreenso o objeto dosestudos da economia. Portanto, compete economia examinar minuciosamente a afirmativa segundo a qualseus ensinamentos so vlidos apenas para o sistema capitalista, durante o curto e jesvaecido perodo liberal da civilizao ocidental. dever da economia, e de nenhum outrocampo do saber, examinar todas as objees levantadas de diversos ngulos contra a utilidadedas afirmativas da teoria econmica para a elucidao dos problemas da ao humana. Osistema de pensamento econmico deve ser construdo de tal maneira que se mantenha prova de qualquer crtica por parte do irracionalismo, do historicismo, do panfisicalismo, dobehaviorismo e de todas as modalidades de polilogismo. uma situao intolervel a de queos economistas ignorem os argumentos que diariamente so promovidos para demonstrar afutilidade e o absurdo dos esforos da economia. No se pode mais continuar lidando com os problemas econmicos da maneiratradicional. necessrio construir a teoria catalctica sobre a slida fundao de uma teoriageral da ao humana, a praxeologia. Este procedimento no apenas a proteger contrainmeras crticas falaciosas, mas possibilitar o esclarecimento de muitos problemas que at 12
  • 13. agora no foram adequadamente percebidos e, menos ainda, satisfatoriamente resolvidos.Especialmente no que se refere ao problema fundamental do clculo econmico.3. Teoria econmica e a prtica da ao humana comum a muita gente censurar a economia por ser retrgrada. Ora, bvio que anossa teoria econmica no perfeita. No existe perfeio no conhecimento humano, nemem qualquer outra conquista humana. A oniscincia negada ao homem. A teoria maiselaborada que parece satisfazer completamente a nossa sede de conhecimento pode um dia seremendada ou superada por uma nova teoria. A cincia no nos d certeza final e absoluta.Apenas nos d convico dentro dos limites de nossa capacidade mental e do prevalescenteestado do conhecimento cientfico. Um sistema cientfico no seno um estgio napermanente busca de conhecimento. necessariamente afetado pela insuficincia inerente atodo esforo humano. Mas reconhecer estes fatos no implica que o estgio atual da economiaseja retrgrado. Significa apenas que a economia algo vivo e viver implica tantoimperfeio como mudana. A acusao do alegado atraso levantada contra a economia a partir de dois pontosde vista diferentes. Existem, de um lado, alguns naturalistas e fsicos que censuram a economia por noser uma cincia natural e no aplicar os mtodos e procedimentos de laboratrio. Um dospropsitos deste tratado demolir a falcia dessas idias. Nestas observaes introdutrias,ser suficiente dizer algumas palavras sobre seus antecedentes psicolgicos. comum, aquem tem mentalidade estreita, depreciar diferenas encontradas nas outras pessoas. Ocamelo, na fbula, desaprova todos os outros animais por no terem uma bossa, e os ruritnioscriticam os laputnios por no serem ruritnios. O pesquisador que trabalha em laboratrioconsidera este trabalho como a nica fonte vlida para investigao, e equaes diferenciais 13
  • 14. como a nica forma adequada de expressar os resultados do pensamento cientfico. simplesmente incapaz de perceber os problemas epistemolgicos da ao humana. Para ele, aeconomia no pode ser nada alm de uma espcie de mecnica. H outros que asseguram que algo deve estar errado com as cincias sociais, porqueas condies sociais so insatisfatrias. As cincias sociais conseguiram resultadosespantosos nos ltimos duzentos ou trezentos anos e a aplicao prtica desses resultados foio que deu origem a uma melhoria, sem precedentes, no padro de vida em geral. Mas, dizemesses crticos, as cincias sociais falharam completamente no que diz respeito a tornar maissatisfatrias as condies sociais. No eliminaram a misria e a fome, crises econmicas edesemprego, guerra e tirania. So estreis e no contriburam para a promoo da liberdade edo bem-estar geral. Esses rabugentos no chegam a perceber que o tremendo progresso da tecnologia deproduo e o conseqente aumento de riqueza e bem-estar s foram possveis graas adoodaquelas polticas liberais que representavam a aplicao prtica dos ensinamentos daeconomia. Foram as idias dos economistas clssicos que removeram os controles que velhasleis, costumes e preconceitos impunham sobre o progresso tecnolgico, libertando o gniodos reformadores da camisa-de-fora das guildas, da tutela do governo e das presses sociaisde vrios tipos. Foram essas idias que reduziram o prestgio de conquistadores eexpropriadores e demonstraram o benefcio social decorrente da atividade empresarial.Nenhuma das grandes invenes modernas teria tido utilidade prtica se a mentalidade da erapr-capitalista no tivesse sido completamente demolida pelos economistas. O que comumente chamado de revoluo industrial foi o resultado da revoluo ideolgicaefetuada pelas doutrinas dos economistas. Foram eles que explodiram velhos dogmas: que desleal e injusto superar um competidor produzindo melhor e mais barato; que inquodesviar-se dos mtodos tradicionais de produo; que as mquinas so um mal porque trazem 14
  • 15. desemprego; que tarefa do governo evitar que empresrios fiquem ricos e proteger o menoseficiente na competio com o mais eficiente; que reduzir a liberdade dos empresrios pelacompulso ou coero governamental em favor de outros grupos sociais um meio adequadopara promover o bem-estar nacional. A economia poltica inglesa e a fisiocracia francesaindicaram o caminho do capitalismo moderno. Foram elas que tornaram possvel o progressodecorrente da aplicao das cincias naturais, proporcionando s massas benefcios nuncasequer imaginados. O que h de errado com a nossa poca precisamente a difundida ignorncia dopapel desempenhado por essas polticas de liberdade econmica na evoluo tecnolgica dosltimos duzentos anos. As pessoas tornaram-se prisioneiras da falcia segundo a qual oprogresso nos mtodos de produo foi contemporneo poltica de laissez-faire apenas poracidente. Iludidos pelos mitos marxistas, consideram o estgio atual de desenvolvimentocomo o resultado da ao de misteriosas foras produtivas que no dependem em nada defatores ideolgicos. A economia clssica, esto convencidos, no foi um fator nodesenvolvimento do capitalismo, mas, ao contrrio, foi seu produto, sua superestruturaideolgica, foi uma doutrina destinada a defender os interesses esprios dos exploradorescapitalistas. Conseqentemente, a abolio do capitalismo e a substituio da economia demercado e da livre iniciativa pelo socialismo totalitrio no prejudicaria o ulterior progressoda tecnologia. Ao contrrio, promoveria o desenvolvimento tecnolgico pela remoo dosobstculos que os interesses egostas dos capitalistas colocaram no seu caminho. O trao caracterstico dessa era de guerras destrutivas e de desintegrao social arevolta contra a economia. Thomas Carlyle denominava a economia de cincia triste e KarlMarx estigmatizou os economistas como sicofantas da burguesia. Charlates exaltando suaspoes mgicas e seus atalhos para o paraso terrestre se satisfazem em desdenhar aeconomia, qualificando-a como ortodoxa ou reacionria. Demagogos se orgulham do que 15
  • 16. chamam de suas vitrias sobre a economia. O homem prtico alardeia sua ignorncia emeconomia e seu desprezo pelos ensinamentos de economistas tericos. As polticaseconmicas das ltimas dcadas tm sido o resultado de uma mentalidade que escarnece dequalquer teoria econmica bem fundamentada e glorifica as doutrinas esprias de seusdetratores. O que conhecido como economia ortodoxa no ensinado nas universidadesda maior parte dos pases, sendo virtualmente desconhecida dos lderes polticos e escritores.A culpa da situao econmica insatisfatria certamente no pode ser imputada cincia queos governantes e massas ignoram e desprezam. preciso que se enfatize que o destino da civilizao moderna desenvolvida pelospovos de raa branca nos tlimos duzentos anos est inseparavelmente ligado ao destino dacincia econmica. Esta civilizao pde surgir porque esses povos adotaram idias queresultavam da aplicao dos ensinamentos da economia aos problemas de poltica econmica.Necessariamente sucumbir se as naes continuarem a seguir o rumo que tomaram,enfeitiadas pelas doutrinas que rejeitam o pensamento econmico. verdade que a economia uma cincia terica e, como tal, se abstm de qualquerjulgamento de valor. No lhe cabe dizer que fins as pessoas deveriam almejar. uma cinciados meios a serem aplicados para atingir os fins escolhidos e no, certamente, uma cinciapara escolha dos fins. Decises finais, a avaliao e a escolha dos fins, no pertencem aoescopo de nenhuma cincia. A cincia nunca diz a algem como deveria agir; meramentemostra como algum deve agir se quiser alcanar determinados fins. Para muita gente pode parecer que isso muito pouco, e que uma cincia limitada investigao do , e incapaz de expressar um julgamento de valor sobre os mais elevados edefinitivos fins no tem qualquer importncia para a vida e a ao humana. Isto tambm umerro. Entretanto, o desmascaramento desse erro no tarefa destas notas introdutrias. umdos objetivos deste tratado. 16
  • 17. 4. Resumo Estas observaes preliminares se faziam necessrias a fim de explicar por que estetratado coloca os problemas econmicos no vasto campo de uma teoria geral da ao humana.No estgio atual, tanto do pensamento econmico como das discusses polticas acerca dosproblemas fundamentais da organizao social, no mais possvel isolar o estudo dosproblemas catalcticos. Estes problemas so apenas um segmento de uma cincia geral daao humana, e s assim podem ser tratados.NOTAS1. O termo praxeologia* foi empregado pela primeira vez em 1980, por Espinas. Ver seuartigo Les origines de la technologie, Revue philosophique, p. 114 115, ano XV, vol. 30, eseu livro publicado em Paris, em 1897, com o mesmo ttulo.* Praxeologia: do grego praxis ao, hbito, prtica e logia doutrina, teoria, cincia. acincia ou a teoria geral da ao humana. Mises define ao como uma manifestao davontade humana; ao como sendo um comportamento propositado. A praxeologia, apartir do conceito apriorstico da categoria ao, analisa as implicaes plenas de todas asaes. A praxeologia busca conhecimento que seja vlido sempre que as condiescorrespondam exatamente quelas consideradas na hiptese terica. Sua afirmao e suaproposio no decorrem da experincia; antecedem qualquer compreenso dos fatoshistricos. (Extrado de Mises Made Easier. Percy L. Greaves Jr., Nova Iorque, Free MarketBooks, 1974. (N.T.)2. O termo catalxia* ou a cincia das trocas foi usado primeiramente por Whately. Ver seulivro Introductory Lectures on Political Economy, Londres, 1831, p. 6. 17
  • 18. * Catalxia a teoria da economia de mercado, isto , das relaes de troca e dos preos.Analisa todas as aes baseadas no clculo monetrio e rastreia a formulao de preos at asua origem, ou seja, at o momento em que o homem fez sua escolha. Explica os preos demercado como so e no como deviam ser. As leis da catalxia no so julgamentos de valor;so exatas, objetivas e de validade universal. (Extrado de Mises Made Easier. Percy GreavesJr., op. cit. (N.T.)3. Methodenstreit disputa, argumento ou controvrsia sobre mtodos; especificamente acontrovrsia sobre o mtodo e o carter epistemolgico da economia na dcada de 80 dosculo XIX, entre os seguidores da Escola Austraca de Economia, liderados por Carl Menger(1840-1921) e os proponentes da Escola Historicista Alem, liderados por Gustav vonSchmoller (1838-1917). A Escola Historicista Alem sustentava que a histria a nica fontede conhecimento sobre a ao humana e sobre assuntos econmicos, e que s no estudo dosdados e estatsticas histricos a economia poderia formular suas leis e teorias. (N.T.)4. Institucionalismo americano uma verso americana da Escola Historicista. Consideraque as atividades humanas so determinadas por presses sociais irresistveis, denominadasInstituies. Prope a interveno poltica como o melhor meio de mudar os hbitos dohomem e de aprimorar o gnero humano. Atribui o infortnio da humanidade ao capitalismodo tipo laissez-faire e procura mudar as instituies pela adoo de solues coletivistas eintervencionistas. (N.T.)5. Em portugus, Sem dvida que assim como a luz se manifesta a si mesma e s trevas, damesma forma a verdade , ao mesmo tempo, a norma de si e do falso. (N.T.) 18
  • 19. PRIMEIRA PARTE AO HUMANA 19
  • 20. I. O AGENTE HOMEM11. Ao propositada e reao animal Ao humana comportamento propositado. Tambm podemos dizer: ao avontade posta em funcionamento, transformada em fora motriz; procurar alcanar fins eobjetivos; a significativa resposta do ego aos estmulos e s condies do seu meioambiente; o ajustamento consciente ao estado do universo que lhe determina a vida. Estasparfrases podem esclarecer a definio dada e prevenir possveis equvocos. Mas a prpriadefinio adequada e no necessita de complemento ou comentrio. Comportamento consciente ou propositado contrasta acentuadamente comcomportamento inconsciente, isto , os reflexos e as respostas involuntrias das clulas enervos do corpo aos estmulos. As pessoas tm uma tendncia para acreditar que as fronteirasentre comportamento consciente e a reao involuntria das foras que operam no corpohumano so mais ou menos indefinidas. Isto correto apenas na medida em que, s vezes,no fcil estabelecer se um determinado comportamento deve ser considerado voluntrio ouinvoluntrio. Entretanto, a distino entre conscincia e inconscincia bastante ntida e podeser bem determinada. O comportamento inconsciente dos rgos e clulas do organismo, para o nosso ego, um dado como qualquer outro do mundo exterior. O homem, ao agir, tem que levar tudo emconta: tanto o que se passa no seu prprio corpo quanto outros dados externos, como porexemplo as condies meteorolgicas ou as atitudes de seus vizinhos. Existe, claro, umacerta margem dentro da qual o comportamento propositado pode neutralizar o funcionamentodo organismo. factvel, dentro de certos limites, manter o corpo sob controle. s vezes ohomem pode conseguir, pela sua fora de vontade, superar a doena, compensarinsuficincias inatas ou adquiridas de sua constituio fsica, ou suprimir reflexos. At onde 20
  • 21. isto seja possvel, estende-se o campo de ao propositada. Se um homem se abstm decontrolar reaes involuntrias de suas clulas e centros nervosos, embora pudesse faz-lo,seu comportamento, do nosso ponto de vista, propositado. O campo da nossa cincia a ao humana e no os eventos psicolgicos queresultam numa ao. isto, precisamente, que distingue a teoria geral da ao humana,praxeologia, da psicologia. O objeto da psicologia so os fatores internos que resultam oupodem resultar numa determinada ao. O tema da praxeologia a ao como tal. istotambm que estabelece a relao entre a praxeologia e o conceito psicoanaltico dosubconsciente. A psicanlise tambm psicologia, e no investiga a ao, mas as foras efatores que impelem o homem a agir de uma determinada maneira. O subconscientepsicanaltico uma categoria psicolgica e no praxeolgica. Quer uma ao provenha deuma clara deliberao, quer provenha de memrias esquecidas e desejos reprimidos que, dasprofundezas onde se encontram, dirigem a vontade, sua natureza no se altera. Esto agindotanto o assassino, cujo impulso subconsciente (o id) conduz ao crime, quanto o neurtico,cujo comportamento aberrante parece sem sentido para o observador superficial; ambos,como todo mundo, procuram atingir certos objetivos. mrito da psicanlise ter demonstradoque mesmo o comportamento de neurticos e psicopatas tem um sentido, que eles tambmagem com o objetivo de alcanar fins, embora ns, que nos achamos normais e sos,consideremos sem sentido o raciocnio que lhes determina a escolha de fins, e inadequados osmeios que escolhem para atingir esses fins. O termo inconsciente, como usado pela praxeologia, e os termos subconsciente einconsciente, como aplicados pela psicanlise, pertencem a dois diferentes sistemas depensamento e pesquisa. A praxeologia, no menos que outros campos do conhecimento, devemuito psicanlise. Portanto, ainda mais necessrio perceber bem a linha que separa apraxeologia da psicologia. 21
  • 22. Ao no simplesmente uma manifestao de preferncia. O homem tambmmanifesta preferncia em situaes nas quais eventos e coisas so inevitveis ou se acreditaque o sejam. Assim sendo, o homem pode preferir bom tempo chuva e pode desejar que osol disperse as nuvens. Aquele que apenas almeja ou deseja no interfere ativamente no cursodos acontecimentos nem na formao de seu destino. Por outro lado, o agente homemescolhe, determina e tenta alcanar um fim. Entre duas coisas, no podendo ter ambas,seleciona uma e desiste da outra. Ao, portanto, sempre implica tanto obter como renunciar. Expressar desejos e esperanas ou anunciar uma ao planejada podem ser formas deao, na medida em que tenham o propsito de atingir um determinado objetivo. Mas nodevem ser confundidas com as aes a que se referem; no so idnticas s aes queanunciam, recomendam ou rejeitam. Ao algo real. O que conta o comportamento totaldo homem e no sua conversa sobre aes planejadas, mas no realizadas. Por outro lado, preciso distinguir claramente ao e trabalho. Ao significa o emprego de meios para atingirfins. Geralmente, um dos meios empregados o trabalho do agente homem. Mas nem sempre assim. Em circunstncias especiais, apenas uma palavra necessria: quem emite ordens ouproibies pode estar agindo sem que esteja realizando trabalho. Falar ou no falar, sorrir ouficar srio podem ser aes. Consumir e divertir-se so aes tanto quanto abster-se doconsumo e do divertimento que nos so acessveis. A praxeologia, portanto, no distingue o homem ativo e enrgico do homempassivo e indolente. O homem vigoroso que diligentemente se empenha em melhorar suascondies age tanto quanto o homem letrgico que indolentemente aceita as coisas como lheacontecem. Porque no fazer nada a ser indolente tambm so aes e tambm determinam ocurso dos eventos. Onde quer que haja condies para interferncia humana, o homem age,pouco importando se o faz por meio de ao ou omisso. Aquele que aceita o que poderiamudar age tanto quanto aquele que interfere no sentido de obter um resultado diferente. Um 22
  • 23. homem que se abstm de influenciar o funcionamento de fatores psicolgicos e instintivostambm age. Ao no somente fazer, mas, no menos, omitir aquilo que possivelmentepoderia ser feito. Podemos dizer que ao a manifestao da vontade humana. Mas isto noacrescentaria nada ao nosso conhecimento. Porque o termo vontade significa nada mais doque a faculdade do homem de escolher entre diferentes situaes; preferir uma, rejeitar outra,e comportar-se em consonncia com a deciso tomada, procurando alcanar a situaoescolhida e renunciando outra.2. Os pr-requisitos da ao humana Chamamos contentamento ou satisfao quele estado de um ser humano que noresulta, nem pode resultar, em alguma ao. O agente homem est ansioso para substituir umasituao menos satisfatria por outra mais satisfatria. Sua mente imagina situaes que lheso mais propcias, e sua ao procura realizar esta situao desejada. O incentivo que impeleo homem ao sempre algum desconforto.2 Um homem perfeitamente satisfeito com a suasituao no teria incentivo para mudar as coisas. No teria nem aspiraes nem desejos; seriaperfeitamente feliz. No agiria; viveria simplesmente livre de preocupaes. Mas, para fazer um homem agir, no bastam o desconforto e a imagem de umasituao melhor. Uma terceira condio necessria: a expectativa de que um comportamentopropositado tenha o poder de afastar ou pelo menos aliviar o seu desconforto. Na ausnciadesta condio, nenhuma ao vivel. O homem tem de se conformar com o inevitvel. Temde se submeter a sua sina. Estas so as condies gerais da ao humana. O homem um ser que vivesubmetido a essas condies. no apenas homo sapiens, mas tambm homo agens. Seres 23
  • 24. humanos que, por nascimento ou por defeitos adquiridos, so irremediavelmente incapazes dequalquer ao (no estrito senso do termo e no apenas no senso legal), praticamente no sohumanos. Embora as leis e a biologia os considerem homens, falta-lhes a caractersticaessencial do homem. A criana recm-nascida tambm no um ser agente. Ainda nopercorreu o caminho desde a concepo at o pleno desenvolvimento de suas capacidades.Mas, ao final desta evoluo, torna-se um ser agente. Sobre a felicidade Coloquialmente dizemos que algum feliz quando consegue atingir seus fins.Uma descrio mais adequada deste estado seria dizer que est mais feliz do que estava antes.Entretanto, no h nenhuma objeo vlida ao costume de definir a ao humana como abusca da felicidade. Mas devemos evitar equvocos geralmente aceitos por todos. O objetivo final da aohumana , sempre, a satisfao do desejo do agente homem. No h outra medida de maior oumenor satisfao, a no ser o julgamento individual de valor, diferente de uma pessoa paraoutra, e para a mesma pessoa em diferentes momentos. O que faz algum sentir-sedesconfortvel, ou menos desconfortvel, estabelecido a partir de critrios decorrentes desua prpria vontade e julgamento, de sua avaliao pessoal e subjetiva. Ningum temcondies de determinar o que faria algum mais feliz. Estabelecer este fato de forma alguma o identifica com as antteses de egosmo ealtrusmo, de materialismo e idealismo, de atesmo e religio. H pessoas cujo nicopropsito desenvolver as potencialidades de seu prprio ego. H outras para as quais terconscincia dos problemas de seus semelhantes lhes causa tanto desconforto ou at mesmomais desconforto do que suas prprias carncias. H pessoas que desejam apenas a satisfaode seus apetites para a relao sexual, comida, bebida, boas casas e outros bens materiais. 24
  • 25. Mas existem aquelas que se interessam mais por satisfaes comumente chamadas de ideaisou elevadas. Existem pessoas ansiosas por ajustar suas aes s exigncias da cooperaosocial; existem, por outro lado, pessoas refratrias, que desprezam as regras da vida social. Hpessoas para quem o objetivo final da peregrinao terrestre a preparao para uma vidabeata. H outras que no acreditam nos ensinamentos de nenhuma religio e no permitemque suas aes sejam influenciadas por eles. A praxeologia indiferente aos objetivos finais da ao. Suas concluses so vlidaspara todos os tipos de ao, independentemente dos objetivos pretendidos. uma cincia demeios e no de fins. Emprega o termo felicidade no sentido meramente formal. Naterminologia praxeolgica, a proposio o nico objetivo do homem alcanar a felicidade tautolgica. No implica nenhuma afirmao sobre a situao da qual o homem espera obterfelicidade. O conceito segundo o qual o incentivo da atividade humana sempre algumdesconforto e que seu objetivo sempre afastar tal desconforto tanto quanto possvel, ou seja,fazer o agente homem sentir-se mais feliz, a essncia dos ensinamentos do eudemonismo edo hedonismo. A ataraxia epicurista aquele estado de perfeita felicidade e contentamentoque toda atividade humana pretende alcanar, sem nunca ating-lo plenamente. Face importncia desta percepo, tem pouco valor o fato de que muitos representantes dessafilosofia tenham falhado em reconhecer o carter meramente formal das noes de dor eprazer e lhes tenham dado um significado carnal e material. As doutrinas teolgicas emsticas, bem como as de outras escolas de uma tica heteronmica, no abalaram a essnciado epicurismo porque no puderam levantar outras objees alm de sua negligncia emrelao aos prazeres nobres e elevados. verdade que os escritos de muitos dos primeirosdefensores do eudemonismo, do hedonismo e do utilitarismo so, em muitos aspectos, 25
  • 26. passveis de mal-entendido. Mas a linguagem de filsofos modernos e, mais ainda, aquela doseconomistas modernos to precisa e direta que no deixa margem a equvocos. Sobre instintos e impulsos O mtodo utilizado pela sociologia dos instintos no favorece a compreenso dosproblemas fundamentais da ao humana. Essa escola classifica os vrios objetivos concretosda ao humana e atribui a cada classe um instinto especfico como seu propulsor. O homem considerado um ser guiado por vrios instintos e propenses inatos. Supe-se que estaexplicao arrasa de uma vez por todas com os ensinamentos odiosos da economia e da ticautilitria. Entretanto, Feuerbach j observara corretamente que todo instinto um instinto paraa felicidade.3 O mtodo usado pela psicologia do instinto e pela sociologia do instintoconsiste numa classificao arbitrria dos objetivos imediatos da ao e uma hipstase decada um deles. Onde a praxeologia diz que o objetivo de uma ao remover algumdesconforto, a psicologia do instinto o atribui satisfao de um impulso instintivo. Muitos defensores da escola do instinto esto convencidos de terem provado que aao no determinada pela razo, mas provm das insondveis profundezas das foras,impulsos, instintos e propenses inatas que no so passveis de qualquer explicao racional.Esto certos de terem conseguido revelar a superficialidade do racionalismo e desacreditar aeconomia, comparando-a a um tecido de concluses falsas extradas de falsas pressuposiespsicolgicas.4 No entanto, racionalismo, praxeologia e economia no lidam com as causas eobjetivos finais da ao, mas com os meios usados para a consecuo do fim pretendido. Pormais insondveis que sejam as profundezas de onde emerge um impulso ou instinto, os meiosque o homem escolhe para satisfaz-lo so determinados por uma considerao racional decustos e benefcios.5 26
  • 27. Quem age por impulso emocional tambm exerce uma ao. O que distingue umaao emocional de outras aes a avaliao do seu custo e do seu benefcio. Emoesperturbam as avaliaes. Para quem age arrebatado pela paixo, o objetivo parece maisdesejvel e o preo a ser pago parece menos oneroso do que quando avaliado friamente.Ningum contesta que, mesmo agindo emocionalmente, o homem avalia meios e fins edispe-se a pagar um preo maior pela obedincia ao impulso apaixonado. Punir de formamais suave ofensas criminais cometidas num estado de excitao emocional ou de intoxicaodo que se punem outras ofensas equivale a encorajar tais excessos. A ameaa de severaretaliao no deixa de frear mesmo as pessoas guiadas por uma paixo aparentementeirresistvel. Interpretamos o comportamento animal com a pressuposio de que o animal cedeaos impulsos que prevalecem no momento. Como observamos que o animal se alimenta,coabita e ataca outros animais ou os homens, falamos de instintos de alimentao, dereproduo e de agresso. Supomos que esses instintos sejam inatos e requeiram satisfao. Mas o mesmo no ocorre com o homem. O homem no um ser que no possaabster-se de ceder ao impulso que mais urgentemente lhe exija satisfao. O homem um sercapaz de subjugar seus instintos, emoes e impulsos; que pode racionalizar seucomportamento. capaz de renunciar satisfao de um impulso ardente para satisfazeroutros desejos. O homem no um fantoche de seus apetites. Um homem no violentaqualquer mulher que excite seus sentidos; no devora qualquer pedao de comida que lheapetea; no agride qualquer pessoa que gostaria de matar. O homem organiza suasaspiraes e desejos numa escala e escolhe; em resumo, ele age. O que distingue o homem deuma besta precisamente o fato de que ele ajusta seu comportamento deliberadamente. Ohomem o ser que tem inibies, que pode controlar seus impulsos e desejos, que tem opoder de reprimir desejos e impulsos instintivos. 27
  • 28. Pode ocorrer que um impulso apresente-se com tal veemncia que nenhum nusprovocado por sua satisfao parea suficientemente forte para impedir o indivduo desatisfaz-lo. Neste caso, tambm h escolha: o homem decide por ceder ao impulso emquesto.63. Ao humana como um dado irredutvel Desde tempos imemoriais os homens tm manifestado ansiedade por saber qual afonte de toda energia, a causa de todos os seres e de toda mudana, a substncia ltima daqual tudo deriva e que a causa de si mesmo. A cincia mais modesta. Tem conscincia doslimites da mente humana e da sua busca de conhecimento. Procura investigar cada fenmenoat as suas causas. Mas compreende que esses esforos esbarram inevitavelmente em murosintransponveis. Existem fenmenos que no podem ser analisados nem ter sua origemrastreada at outros fenmenos. Estes so os dados irredutveis. O progresso da pesquisacientfica pode conseguir demonstrar que algo at ento considerado como um dado bsicopode ser subdividido em componentes. Mas haver sempre alguns fenmenos irredutveis,indivisveis, algum dado irredutvel. O monismo ensina que existe apenas uma substncia bsica; o dualismo diz queexistem duas; o pluralismo, que existem muitas. No tem sentido discutir tais questes. Someras disputas metafsicas insolveis. O presente estado do nosso conhecimento no nosproporciona os meios de resolv-las com uma explicao que um homem razovelconsiderasse satisfatria. O monismo materialista afirma que vontades e pensamentos humanos so o produtodo funcionamento dos rgos, das clulas do crebro e dos nervos. O pensamento, a vontade ea ao so produzidos apenas por processos materiais que um dia sero completamente 28
  • 29. explicados pela investigao no campo da fsica ou da qumica. Essa tambm uma hiptesemetafsica, embora seus adeptos a considerem como uma verdade cientfica inegvel einabalvel. Vrias doutrinas tm sido formuladas para explicar a relao entre corpo e mente.So meras conjecturas sem qualquer referncia a fatos reais. Tudo o que se pode afirmar comcerteza que existem relaes entre processos mentais e fisiolgicos. Quanto natureza e aofuncionamento desta conexo, sabemos muito pouco, se que sabemos alguma coisa. Julgamentos concretos de valor e aes humanas definidas no so passveis demaiores anlises. Podemos honestamente supor ou acreditar que sejam inteiramentedependentes de (ou condicionados por) suas causas. Mas, uma vez que no sabemos comofatos exteriores fsicos ou fisiolgicos produzem na mente humana pensamentos evontades definidas que resultam em atos concretos, temos de enfrentar um insuperveldualismo metodolgico. No estado atual de nosso conhecimento, os postulados fundamentaisdo positivismo, do monismo e do panfisicalismo so meros postulados metafsicos,desprovidos de qualquer base cientfica, sem sentido e sem utilidade na pesquisa cientfica. Arazo e a experincia nos mostram dois mundos diferentes: o mundo exterior dos fenmenosfsicos, qumicos e fisiolgicos e o mundo interior do pensamento, do sentimento, dojulgamento de valor e da ao propositada. At onde sabemos hoje, nenhuma ponte liga essesdois mundos. Idnticos eventos exteriores resultam, s vezes, em respostas humanasdiferentes, enquanto que eventos exteriores diferentes produzem, s vezes, a mesma respostahumana. No sabemos por qu. Face a esta realidade, no podemos deixar de apontar a falta de bom senso dospostulados essenciais do monismo e do materialismo. Podemos acreditar ou no que ascincias naturais conseguiro um dia explicar a produo de idias definidas, julgamentos devalor e aes, da mesma maneira como explicam a produo de um composto qumico: o 29
  • 30. resultado necessrio e inevitvel de certa combinao de elementos. At que chegue esse dia,somos obrigados a concordar com o dualismo metodolgico. Ao humana um dos instrumentos que promovem mudana. um elemento deatividade e transformao csmica. Portanto, um tema legtimo de investigao cientfica.Como pelo menos nas condies atuais no pode ser rastreada at suas origens, tem de serconsiderada como um dado irredutvel e como tal deve ser estudada. verdade que as mudanas produzidas pela ao humana so insignificantes quandocomparadas com a ao das poderosas foras csmicas. Do ponto de vista da eternidade e douniverso infinito, o homem um gro infinitesimal. Mas, para o homem, a ao humana esuas vicissitudes so a coisa real. Ao a essncia de sua natureza e de sua existncia, seumeio de preservar a vida e de se elevar acima do nvel de animais e plantas. Por maisperecvel e evanescente que todo esforo humano possa ser, para o homem e para sua cincia de fundamental importncia.4. Racionalidade e irracionalidade; subjetivismo e objetividade da investigaopraxeolgica Ao humana necessariamente sempre racional. O termo ao racional ,portanto, pleonstico e, como tal deve ser rejeitado. Quando aplicados aos objetivos finais daao, os termos racional e irracional so inadequados e sem sentido. O objetivo final da ao sempre a satisfao de algum desejo do agente homem. Uma vez que ningum temcondies de substituir os julgamentos de valor de um indivduo pelo seu prprio julgamento, intil fazer julgamentos dos objetivos e das vontades de outras pessoas. Ningum temcondies de afirmar o que faria outro homem mais feliz ou menos descontente. Aquele quecritica est informando-nos o que imagina que faria se estivesse no lugar do seu semelhante, 30
  • 31. ou ento est proclamando, com arrogncia ditatorial, o comportamento do seu semelhanteque lhe seria mais conveniente. usual qualificar uma ao como irracional se ela visa a obter satisfaes ditasideais ou elevadas custa de vantagens tangveis ou materiais. Neste sentido, aspessoas costumam dizer algumas vezes aprovando, outras vezes desaprovando que umhomem que sacrifica sua vida, sade ou riqueza para atingir objetivos elevados (como afidelidade s suas convices religiosas, filosficas ou polticas, ou a libertao eflorescimento de sua nao) est movido por consideraes irracionais. No obstante, atentativa de atingir esses objetivos elevados no mais nem menos racional ou irracional doque aquela feita para atingir outros objetivos humanos. um erro admitir que a vontade desatisfazer as necessidades mais simples da vida e da sade mais racional, mais natural oumais justificada que a tentativa para obter outros bens ou amenidades. claro que o apetitepor comida e abrigo comum aos homens e a outros mamferos e que, como regra, umhomem, ao qual falta comida e abrigo, concentra seus esforos na satisfao dessasnecessidades urgentes e no se importa muito com outras coisas. O impulso para viver, parapreservar sua prpria vida e para aproveitar as oportunidades de fortalecer suas foras vitais caracterstica primordial da vida, presente em todo ser vivo. Entretanto, ceder a este impulsono para o homem uma necessidade inevitvel. Enquanto todos os animais so incondicionalmente guiados pelo impulso depreservao de sua prpria vida e pelo de proliferao, o homem tem o poder de comandar atmesmo esses impulsos. Ele pode controlar tanto seus desejos sexuais, como sua vontade deviver. Pode renunciar sua vida quando as condies para preserv-la parecem insuportveis.O homem capaz de morrer por uma causa e de suicidar-se. Viver, para o homem, oresultado de uma escolha, de um julgamento de valor. 31
  • 32. O mesmo se passa com o desejo de viver com fartura. A simples existncia deascetas e de homens que renunciam a ganhos materiais por amor fidelidade, s suasconvices, preservao de sua dignidade e respeito prprio, uma evidncia de que a lutapor amenidades tangveis no inexorvel, mas, sobretudo, fruto de uma escolha.Naturalmente, a imensa maioria prefere a vida morte, e a riqueza pobreza. uma arbitrariedade considerar apenas a satisfao das necessidades fisiolgicas doorganismo como natural e, portanto, racional, e tudo mais como artificial, e, portanto,irracional. O trao caracterstico da natureza humana o de buscar no apenas comida,abrigo e coabitao, como outros animais, mas, tambm, o de buscar outros tipos desatisfao. O homem tem desejos e necessidades especificamente humanos, que podemoschamar de mais elevados do que aqueles que tem em comum com outros mamferos.7 Quando aplicados aos meios escolhidos para atingir os fins, os termos racional eirracional implicam um julgamento sobre a oportunidade e a adequao do procedimentoempregado. O crtico aprova ou desaprova um mtodo conforme seja ou no mais adequadopara atingir o fim em questo. fato que a razo no infalvel e que o homemfreqentemente erra ao selecionar e utilizar meios. Uma ao inadequada ao fim pretendidofracassa e decepciona. Embora no consiga atingir o fim desejado, racional, ou seja, oresultado de uma deliberao sensata ainda que defeituosa , uma tentativa de atingir umobjetivo determinado embora uma tentativa ineficaz. Os mdicos que h cem anos atrsempregavam certos mtodos no tratamento do cncer, mtodos esses rejeitados pelos mdicoscontemporneos, estavam, do ponto de vista da patologia de nossos dias, mal informados eeram conseqentemente ineficientes. Mas eles no agiam irracionalmente; faziam o melhorpossvel. provvel que daqui a cem anos os mdicos tenham sua disposio mtodos maiseficientes para o tratamento dessa doena. Sero, ento, mais eficientes, mas no maisracionais que os mdicos atuais. 32
  • 33. O oposto de ao no comportamento irracional, mas a resposta automtica aosestmulos por parte dos rgos e instintos do organismo que no podem ser controlados pelavontade de uma pessoa. Ao mesmo estmulo o homem pode, sob certas condies, reagirtanto por uma resposta automtica como pela ao. Se um homem absorve um veneno, osrgos reagem organizando a sua defesa; alm disso, pode haver a interferncia da sua aopela administrao de um antdoto. Quanto ao problema contido na anttese racional/irracional, no h diferena entre ascincias naturais e as cincias sociais. A cincia sempre , tem de ser, racional. um esforopara conseguir um domnio mental dos fenmenos do universo, atravs da organizaosistemtica de todo o conjunto de conhecimento disponvel. Entretanto, conforme j foiassinalado anteriormente, a decomposio de qualquer conhecimento em seus elementosconstituintes tem necessariamente de, mais cedo ou mais tarde, atingir um ponto alm do qualno pode prosseguir. A mente humana nem mesmo capaz de conceber um tipo deconhecimento que no seja limitado por um dado irredutvel, inacessvel a uma maior anlisee ao desdobramento. O mtodo cientfico que conduz a mente at esse ponto racional. Odado irredutvel pode ser considerado um fato irracional. moda, nos dias de hoje, criticar as cincias sociais por serem meramente racionais.A objeo mais freqente levantada contra a economia a de que ela negligencia airracionalidade da vida e da realidade e tenta confinar a variedade infinita de fenmenos emridos esquemas racionais ou em abstraes inspidas. Nenhuma censura podia ser maisabsurda. Como todo ramo do conhecimento, a economia vai at onde pode ser conduzida pormtodos racionais. Em determinado momento pra, reconhecendo o fato de que est diante deum dado irredutvel, isto , diante de um fenmeno que no pode ser mais desdobrado ouanalisado pelo menos no presente estgio do nosso conhecimento.8 33
  • 34. Os ensinamentos da praxeologia e da economia so vlidos para qualquer aohumana, independentemente de seus motivos, causas ou objetivos subjacentes. Osjulgamentos finais de valor e os objetivos finais da ao humana so dados para qualquer tipode investigao cientfica; no so passveis de maior anlise. A praxeologia lida com osmeios e recursos escolhidos para a obteno de tais objetivos finais. Seu objeto so os meios,no os fins. neste sentido que nos referimos ao subjetivismo da cincia geral da ao humana.Esta cincia considera os objetivos finais escolhidos pelo agente homem como dados, inteiramente neutra em relao a eles e se abstm de fazer julgamentos de valor. O nicopadro que utiliza o de procurar saber se os meios escolhidos para a obteno dos finspretendidos so ou no os mais adequados. Se o eudemonismo fala em felicidade, se outilitarismo e a economia falam em utilidade, devemos interpretar estes termossubjetivamente, como sendo aquilo que o agente homem procura obter porque, a seu juzo,considera desejvel. neste formalismo que consiste o progresso do significado moderno doeudemonismo, do hedonismo e do utilitarismo, contrapondo-se ao seu antigo significadomaterialista, bem como o progresso da moderna teoria subjetivista de valor, que contrastacom a teoria objetivista de valor como interpretada pela economia poltica clssica. Aomesmo tempo, neste subjetivismo que se assenta a objetividade da nossa cincia. Por sersubjetivista e considerar os julgamentos de valor do agente homem como dados irredutveisno passveis de qualquer outro exame crtico, coloca-se acima de disputas de partidos efaces, indiferente aos conflitos de todas as escolas de dogmatismo ou doutrinas ticas, livre de valoraes e de idias ou julgamentos preconcebidos, universalmente vlida eabsoluta e simplesmente humana.5. Causalidade como um requisito da ao 34
  • 35. O homem tem condies de agir porque tem a capacidade de descobrir relaescausais que determinam mudanas e transformaes no universo. Ao requer e pressupe aexistncia da causalidade. S pode agir o homem que percebe o mundo luz da causalidade.Neste sentido que podemos dizer que a causalidade um requisito da ao. A categoriameios e fins pressupe a categoria causa e efeito. Num mundo sem causalidade e sem aregularidade dos fenmenos, no haveria campo para o raciocnio humano nem para a aohumana. Um mundo assim seria um caos no qual o homem estaria perdido e no encontrariaorientao ou guia. O homem nem capaz de imaginar um universo catico de tal ordem. O homem no pode agir onde no percebe nenhuma relao causal. A recproca destaafirmativa no verdadeira. Mesmo quando conhece a relao causal, o homem tambm podedeixar de agir, se no tiver condies de influenciar a causa. O arqutipo da pesquisa da causalidade era: onde e como devo interferir de forma amudar o curso dos acontecimentos, do caminho que eles seguiriam na ausncia da minhainterferncia, para uma direo que melhor satisfaa meus desejos? Neste sentido, o homemlevanta a questo: quem ou o que est na origem das coisas? Ele procura a regularidade ou alei, porque quer interferir. S mais tarde que esta procura foi mais extensivamenteinterpretada pela metafsica como uma procura da causa final da vida e da existncia. Foramnecessrios sculos para fazer retornar idias extravagantes e exageradas questo bem maismodesta: de que modo algum deve interferir ou deveria ser capaz de interferir para conseguiratingir este ou aquele fim. O tratamento dado ao problema da causalidade nas ltimas dcadas foi bastanteinsatisfatrio, graas confuso provocada por alguns fsicos eminentes. Esperemos que estedesagradvel captulo da histria da filosofia seja uma advertncia para futuros filsofos. Existem mudanas cujas causas so desconhecidas para ns, pelo menos nomomento atual. Algumas vezes conseguimos adquirir um conhecimento parcial que nos 35
  • 36. permite afirmar: em 70% de todos os casos, A resulta em B; nos casos remanescentes, resultaem C, ou mesmo em D, E, F e assim por diante. A fim de substituir esta informaofragmentada por informao mais precisa, seria necessrio decompor A em seus componentes.Enquanto isto no for conseguido, temos de aquiescer com o que conhecido como leiestatstica. Mas isso no afeta o significado praxeolgico da causalidade. Ignorncia total ouparcial em algumas reas no elimina a categoria da causalidade. Os problemas filosficos, epistemolgicos e metafsicos da causalidade e da induoimperfeita esto fora do escopo da praxeologia. Devemos simplesmente estabelecer o fato deque, para poder agir, o homem precisa conhecer a relao causal entre eventos, processos ousituaes. E, somente se conhecer essa relao, sua ao pode atingir os objetivospretendidos. Temos conscincia de que, ao fazer esta afirmativa, estamo-nos movendo numcrculo. Porque a evidncia de que percebemos corretamente uma relao causal s estabelecida quando a ao guiada por este conhecimento conduz ao resultado esperado. Masno podemos evitar este crculo vicioso precisamente porque a causalidade um requisito daao. E por ser um requisito, a praxeologia no pode deixar de dedicar alguma ateno a esseproblema fundamental da filosofia.6. O alter ego Se estamos preparados para utilizar o termo causalidade no seu lato sensu, ateleologia pode ser denominada uma espcie de investigao das causas. Causas finais so,antes de tudo, causas. A causa de um evento entendida como uma ao ou quase-ao queprocura atingir algum fim. Tanto o homem primitivo como a criana, numa ingnua atitude antropomrfica,consideram bastante plausvel que toda mudana ou evento seja o resultado da ao de um seragindo da mesma maneira que eles. Acreditam que animais, plantas, montanhas, rios e fontes, 36
  • 37. e at mesmo pedras e corpos celestes so, como eles, seres que agem, sentem e tmpropsitos. Somente num estgio mais avanado do desenvolvimento cultural que o homemrenuncia a essas idias animistas e as substitui por uma viso mecanicista do mundo. Omecanicismo se revela um princpio de conduta to satisfatrio que as pessoas acabam poracredit-lo capaz de resolver todos os problemas do pensamento e da pesquisa cientfica. Omaterialismo e o panfisicalismo proclamam o mecanicismo como a essncia de todoconhecimento e os mtodos experimentais e matemticos das cincias naturais como a nicaforma cientfica de pensamento. Todas as mudanas devem ser compreendidas comomovimentos sujeitos s leis da mecnica. Os defensores do mecanicismo no se preocupam com os problemas ainda noresolvidos da base lgica e epistemolgica dos princpios da causalidade e da induoamplificante. Para eles, esses princpios so corretos porque funcionam. O fato de queexperincias em laboratrio conseguem obter os resultados previstos pelas teorias e de quenas fbricas as mquinas funcionam da maneira prevista pela tecnologia prova assim dizemeles a confiabilidade dos mtodos e concluses da cincia natural moderna. Sendo certo quea cincia no nos pode dar a verdade e quem sabe realmente o que a verdade? , no sepode negar que ela consegue conduzir-nos ao sucesso. Mas justamente quando aceitamos este ponto de vista pragmtico que o vazio dodogma panfisicalista se torna manifesto. A cincia, como j foi assinalado acima, noconseguiu resolver os problemas da relao mente/corpo. Os panfisicalistas, certamente, nopodem sustentar que os procedimentos que recomendam tenham, em algum momento,solucionado os problemas das relaes inter-humanas e das cincias sociais. No entanto, fora de dvida que o princpio segundo o qual um ego lida com todo ser humano como sefosse um ser que pensa e age como ele mesmo j evidencia sua utilidade tanto no dia a diacomo na pesquisa cientfica. No se pode negar que este princpio correto. 37
  • 38. fora de dvida que a prtica de considerar os semelhantes como seres que pensame agem como eu, o ego, tem dado certo; por outro lado, parece ser impossvel fazer umaverificao prtica equivalente para um postulado que determine que os seres devam sertratados da mesma maneira que os objetos das cincias naturais. Os problemasepistemolgicos que so suscitados pela compreenso do comportamento de outras pessoasno so menos complicados do que os suscitados pela causalidade e pela induoamplificante. Pode-se admitir que impossvel apresentar evidncia conclusiva para aproposio de que a minha lgica a lgica de todas as outras pessoas e, certamente, a nicalgica humana; que as categorias da minha ao so as categorias da ao de todas as pessoase, certamente, tambm as categorias de toda ao humana. No obstante, o pragmtico develembrar-se de que essas proposies funcionam tanto na prtica como na cincia, e opositivista no deve esquecer que, ao dirigir-se a seus semelhantes, pressupe tcita eimplicitamente a validade intersubjetiva da lgica e, portanto, a realidade da existncia dopensamento e ao do alter ego e de seu carter eminentemente humano.9 Pensar e agir so caractersticas prprias do homem. So privilgios exclusivos detodos os seres humanos. Caracterizam o homem, independentemente de sua qualidade demembro da espcie zoolgica, mesmo como homo sapiens. No propsito da praxeologiainvestigar a relao entre pensar e agir. Para a praxeologia, suficiente estabelecer o fato deque h somente um modo de ao que humano e que compreensvel para a mente humana.Se existem, ou podem existir, em algum lugar, outros seres super-humanos ou subumanos que pensam e agem de maneira diferente, algo que est fora do alcance da mente humana.Devemos restringir nossos esforos ao estudo da ao humana. Esta ao humana, inextricavelmente ligada ao pensamento humano, estcondicionada pela necessidade da lgica. impossvel mente humana conceber relaeslgicas diferentes da sua estruturao lgica. impossvel mente humana conceber um 38
  • 39. modo de ao cujas categorias sejam diferentes das categorias que determinam suas prpriasaes. O homem s dispe de dois princpios para apreenso mental da realidade: ateleologia e a causalidade. O que no puder ser colocado em qualquer destas duas categorias inacessvel mente humana. Um evento que no possa ser interpretado por um desses doisprincpios , para o homem, inconcebvel e misterioso. Uma mudana pode ser concebidacomo conseqncia de uma causalidade mecanicista ou de um comportamento propositado;para a mente humana, no h outra hiptese disponvel.10 Na realidade, como j foimencionado, a teleologia pode ser considerada uma espcie de causalidade. Mas assinalar estefato no anula as diferenas essenciais entre essas duas categorias. A viso pan-mecanicista do mundo est comprometida com um monismometodolgico; admite apenas a causalidade mecanicista porque lhe atribui todo valorcognitivo ou, pelo menos, um valor cognitivo maior do que teleologia. Isto umasuperstio metafsica. Ambos os princpios da cognio causalidade e teleologia so, porfora das limitaes da razo humana, imperfeitos e no implicam conhecimento definitivo. Acausalidade nos leva a um regressus in infinitum11 que a razo nunca consegue exaurir. Ateleologia quer saber, to logo se coloca a questo, qual a fonte da energia primeira. Os doismtodos logo esbarram num dado irredutvel que no pode ser analisado ou interpretado. Oraciocnio e a investigao cientfica nunca podem proporcionar uma completa tranqilidadede esprito, uma certeza apodtica ou uma cognio perfeita de todas as coisas. Quempretende isso tem de recorrer f e tentar acalmar sua conscincia adotando um credo ou umadoutrina metafsica. Se no transcendermos o uso da razo e a experincia, temos de admitir que nossossemelhantes agem. No podemos negar este fato em favor de um preconceito ou de umaopinio arbitrria. A experincia do dia a dia no prova apenas que o nico mtodo adequado 39
  • 40. para estudar as condies do nosso meio ambiente no o fornecido pela categoria dacausalidade; prova ainda, convincentemente, que nossos semelhantes so seres agentes, comons tambm o somos. O nico processo vivel para interpretao e anlise da ao humana o proporcionado pela compreenso e anlise do nosso prprio comportamento propositado. O problema do estudo e anlise da ao das outras pessoas no est de forma algumaligado ao problema da existncia de uma alma ou de uma alma imortal. Enquanto as objeesdo empirismo, behaviorismo e positivismo forem dirigidas contra qualquer espcie de teoriada alma, no tm nenhum valor para a anlise do nosso problema. A questo que temos deenfrentar a de saber se possvel compreender intelectualmente a ao humana se nosrecusarmos a compreend-la como comportamento propositado, que procura atingirdeterminados fins. O behaviorismo e o positivismo querem aplicar realidade da aohumana os mtodos empricos das cincias naturais. Interpretam a ao como uma respostaaos estmulos. Mas esses estmulos, em si mesmos, no so passveis de descrio pelosmtodos das cincias naturais. Qualquer tentativa de descrev-los tem de se referir aosignificado que o agente homem lhes d. Podemos chamar de estmulo a oferta de umamercadoria venda. Mas o que essencial nesta oferta e a distingue de outras ofertas nopode ser explicado sem que se considere o significado que os agentes atribuem a essasituao. No h artifcio dialtico que possa negar o fato de que o homem movido pelodesejo de atingir determinados fins. este comportamento propositado ao que oobjeto de nossa cincia. No podemos abord-lo, se negligenciarmos o significado que oagente homem associa a uma situao, ou seja, a uma dada conjuntura, e ao seu prpriocomportamento diante da mesma. No apropriado ao fsico buscar causas finais, porque no h indicao de que oseventos que so o objeto do estudo da fsica possam ser interpretados como o resultado daao de um ser que quer atingir fins maneira humana. Tampouco apropriado ao 40
  • 41. praxeologista desconsiderar a existncia da vontade e da inteno dos seres agentes; so fatosinquestionveis. Quem desconsider-los no estar mais estudando a ao humana. Algumasvezes mas no sempre os eventos em questo podem ser investigados tanto pelo ngulo dapraxeologia como pelo ngulo das cincias naturais. Mas quem lida com a descarga de umaarma de fogo, sob o ngulo da fsica ou da qumica, no um praxeologista. Negligencia oprprio problema que a cincia do comportamento propositado do homem procura esclarecer. Sobre a utilidade dos instintos A prova do fato de que s existem duas vias para a pesquisa humana causalidadeou teleologia fornecida pelos problemas relacionados com a utilidade dos instintos.Existem tipos de comportamento que, por um lado, no podem ser interpretados pelosmtodos das cincias naturais e, por outro lado, no podem ser considerados como aohumana propositada. Para compreender esses tipos de comportamento, temos de recorrer aum artifcio. Atribumos-lhes o carter de uma quase-ao; estamo-nos referindo aos instintosteis. Destacamos duas observaes: primeira, a tendndcia, inerente a um organismo vivo,de responder a um estmulo, de acordo com um mesmo padro; segunda, os efeitos favorveisdeste tipo de comportamento para o fortalecimento ou a preservao das foras vitais doorganismo. Se pudssemos interpretar tal comportamento como o resultado de aopropositada visando a determinados fins, poderamos qualific-lo como ao e lidar com elede acordo com os mtodos teleolgicos da praxeologia. Mas como no encontramos nenhumvestgio de uma mente consciente por trs desse comportamento, supomos que um fatordesconhecido chamamo-lo instinto o provocou. Dizemos que o instinto dirige este quase-propositado comportamento animal, bem como as respostas teis, embora inconscientes, dosmsculos e nervos do homem. Entretanto, o simples fato de hipostasiar o elemento 41
  • 42. inexplicado desse comportamento como uma fora, e cham-lo de instinto, no aumentanosso conhecimento. No devemos esquecer que a palavra instinto apenas um marcodivisrio que indica um ponto alm do qual somos incapazes, pelo menos at o presentemomento, de prosseguir com nossa investigao. A biologia conseguiu descobrir uma explicao natural, isto , mecanicista, paravrios processos que anteriormente eram atribudos ao funcionamento dos instintos. Noobstante, muitos outros subsistem que no podem ser interpretados como respostas mecnicasou qumicas a estmulos mecnicos ou qumicos. Os animais manifestam atitudes que nopodem ser compreendidas, a no ser pela assuno da existncia de um fator atuante. O intuito do behaviorismo de estudar a ao humana, exteriormente, com os mtodosda psicologia animal, ilusrio. To logo o comportamento animal vai alm dos simplesprocessos fisiolgicos, como a respirao e o metabolismo, s pode ser investigado com aajuda dos conceitos desenvolvidos pela praxeologia. O behaviorista aborda o objeto de suasinvestigaes com as noes humanas de propsito e xito. Aplica inadvertidamente ao objetode seus estudos os conceitos humanos de utilidade e perniciosidade. Ilude-se ao excluirqualquer referncia verbal conscincia e busca de objetivos. Na verdade, sua menteprocura por objetivos em toda parte e mede cada atitude com o gabarito de uma noodeturpada de utilidade. A cincia do comportamento humano a no ser a fisiologia nopode deixar de se referir a significado e propsito. No pode aprender nada da psicologiaanimal nem da observao das reaes inconscientes de crianas recm-nascidas. Aocontrrio, a psicologia animal e a psicologia infantil que no podem rejeitar a ajudaproporcionada pela cincia da ao humana. Sem as categorias praxeolgicas, no teramoscondies de conceber e compreender o comportamento tanto de animais como de crianas. A observao do comportamento instintivo de animais enche o homem de espanto elevanta questes s quais ningum pode responder satisfatoriamente. No entanto, o fato de 42
  • 43. animais e at mesmo plantas reagirem de uma maneira quase propositada no mais nemmenos milagroso do que a capacidade do homem para pensar e agir, do que o fato deprevalecerem, no universo inorgnico, as correspondncias funcionais descritas pela fsica, oudo que o fato de ocorrerem processos biolgicos no universo orgnico. Tudo isso milagrosono sentido de que so um dado irredutvel para a nossa mente perscrutadora. O que chamamos instinto tambm um dado irredutvel. Como os conceitos demovimento, fora, vida, conscincia, o conceito de instinto tambm , simplesmente, umtermo para designar um dado bsico. Com toda certeza, no explica nada nem indica umacausa ou uma causa final.12 O objetivo absoluto Para evitar qualquer possvel mal-entendido quanto s categorias praxeolgicas,parece ser necessrio enfatizar um trusmo. A praxeologia, como as cincias histricas da razo humana, lida com a aopropositada do homem. Se menciona fins, o que tem em vista so os fins que o agente homemprocura atingir. Se fala de significado, refere-se ao significado que o agente homem atribui ssuas aes. A praxeologia e a histria so manifestaes da mente humana e, como tal, estocondicionadas pela aptido intelectual dos homens mortais. A praxeologia e a histria nopretendem saber nada sobre as intenes de uma mente superior e objetiva, sobre umsignificado objetivo inerente ao curso dos acontecimentos e evoluo histrica; nem sobreos planos que Deus ou a Natureza ou Weltgeist ou o Destino est tentando realizar ao dirigir ouniverso e os negcios humanos. No tm nada em comum com o que se chama de filosofiada histria. No pretendem revelar informaes sobre o verdadeiro, objetivo e absoluto 43
  • 44. significado da vida e da histria, como pretendem faz-lo Hegel, Comte, Marx e muitosoutros autores.13 O homem vegetativo Algumas filosofias aconselham o homem a buscar como objetivo final de suaconduta a renncia completa a qualquer ao. Encaram a vida como um mal, cheia de dor,sofrimento e angstia, e apoditicamente negam que qualquer esforo humano possa torn-latolervel. A felicidade s pode ser alcanada pela completa extino da conscincia, davontade e da vida. A nica maneira de alcanar a glria e a salvao tornar-se perfeitamentepassivo, indiferente, inerte como as plantas. O bem supremo o abandono do pensamento eda ao. Esta a essncia dos ensinamentos de vrias filosofias indianas, especialmente dobudismo, e de Schopenhauer . A praxeologia no tem nada a comentar sobre elas. neutra emrelao a todos os julgamentos de valor e escolha de objetivos finais. Sua tarefa no a deaprovar ou desaprovar, mas a de descrever o que . O objeto do estudo da praxeologia a ao humana. Lida com o homem e no com ohomem transformado numa planta e reduzido a uma existncia meramente vegetativa.NOTAS1. A expresso acting man freqente em toda esta obra de Ludwig von Mises. Por seu poderde sntese que facilita a sintaxe sem trair a semntica preferimos traduz-la literalmentepor agente homem, em vez de utilizar as formas homem em ao ou homem que age,como o fizeram as tradues francesa e espanhola. (N.T.) 44
  • 45. 2. Cf. Locke, An Essay Concerning Human Understanding, Oxford, Fraser, 1894, vol. 1, 331-333; Leibniz, Nouveaux essais sur l entendement humain, Flammarion, p.1193. Cf. Feuerbach, Sammtliche Werke, Stuttgart, Bolin and Jodl, 1907, vol. 10, p. 2314. Cf. William McDougall, An Introduction of Social Psychology, 14 ed. Boston, 1921, p. 115. Cf. Mises, Epistemological Problems of Economics. Trad. G. Reisman, Nova Iorque, 1960,p.52 e segs.6. Nestes casos, tem especial importncia a circunstncia de que as duas satisfaes emquesto aquela esperada se cedermos ao impulso e aquela que teramos se evitssemos suasconseqncias desagradveis no so simultneas. Ver adiante p. .........7. Sobre os erros na lei de ferro dos salrios veja adiante p. .....; sobre o mal-entendido acercada teoria de Malthus, ver adiante p. .......8. Veremos mais adiante (p. ......) como as cincias sociais empricas lidam com o dadoirredutvel.9. Cf. Alfred Schtz, Der sinnhafte Aufbau der sozialen Welt, Viena, 1932, p. 1810. Cf. Karel Englis, Begrndung der Teleologie als Form des empirischen Erkennens.Brnn, 1930, p. 15 e segs.11. Processo de procurar indefinidamente em cada situao a etapa precedente. (N.T.)12. La vie est une cause premire qui nous chappe comme toutes les causes premires etdont la science exprimentale na pas se proccuper. Claude Bernard, La scienceexprimentale. Paris, 1878, p. 13713. Sobre a filosofia da histria, ver Mises, Theory and History. New Haven, 1957, p. 159 esegs. 45
  • 46. II. OS PROBLEMAS EPISTEMOLGICOS DAS CINCIAS DA AO HUMANA1. Praxeologia e histria Existem dois ramos principais das cincias da ao humana: a praxeologia e ahistria. Histria o conjunto e a arrumao sistemtica de todos os dados relativos experincia da ao humana. Lida com o contedo concreto da ao humana. Estuda todos osesforos humanos na sua infinita variedade e multiplicidade, e todas as aes individuais comtodas as suas implicaes acidentais, especiais ou particulares. Examina as idias que guiam oagente homem e o resultado de suas aes. Abrange todos os aspectos das atividadeshumanas. , por um lado, histria geral e, por outro, a histria de vrios segmentos maisespecficos. Existe a histria da ao poltica e militar, das idias e da filosofia, das atividadeseconmicas, da tecnologia, da literatura, arte e cincia, da religio, dos hbitos e costumes ede muitos outros aspectos da vida humana. H tambm a etnologia e a antropologia, desdeque no sejam uma parte da biologia, e h ainda a psicologia enquanto no seja fisiologia,nem epistemologia, nem filosofia. Existe ainda a lingstica, enquanto no seja lgica nemfisiologia do idioma.1 O tema de todas as cincias histricas o passado. Elas no nos podem ensinar algoque seja aplicvel a todas as aes humanas, ou seja, aplicvel tambm ao futuro. O estudo dahistria torna um homem sbio e judicioso. Mas no proporciona conhecimento e habilidadeque possam ser utilizados na execuo de tarefas concretas. As cincias naturais tambm lidam com eventos passados. Toda experincia umaexperincia de algo que j se passou; no h experincia de acontecimentos futuros. Mas aexperincia qual as cincias naturais devem todo seu sucesso aquela em que os elementosespecficos que sofrem alterao podem ser observados isoladamente. As informaes assim 46
  • 47. acumuladas podem ser usadas para induo, um processo peculiar de inferncia que j deuevidncia pragmtica de sua utilidade, embora ainda necessite de uma satisfatriacaracterizao epistemolgica. A experincia com a qual as cincias da ao humana tm de lidar sempre umaexperincia de fenmenos complexos. No que diz respeito ao humana, no se poderealizar experincia em laboratrio. Nunca temos condio de observar a mudana em umelemento isolado, mantendo-se todos os demais inalterados. A experincia histrica, nacondio da experincia de fenmenos complexos, no nos fornece fatos,