luciane viana barros pascoa[1]

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Revista Eletrônica Aboré Publicação da Escola Superior de Artes e Turismo - Edição 03/2007 ISSN 1980-6930 1 O PANORAMA DAS ARTES PLÁSTICAS EM MANAUS Luciane Viana Barros Páscoa 1 RESUMO: Este texto procura estabelecer uma visão panorâmica do movimento das artes plásticas na cidade de Manaus, reunindo as informações existentes até o momento sobre os artistas, suas obras e suas concepções estéticas. As expressões artísticas abordadas foram as seguintes: fotografia, pintura, escultura e decoração. O período de estudo compreende desde a segunda metade do século XIX até meados da década de 70 do século XX, com destaque para a produção referente ao ciclo da borracha e ao movimento artístico e literário Clube da Madrugada e seus desdobramentos. PALAVRAS-CHAVE: Artes Plásticas Manaus Séculos XIX e XX. ABSTRACT: This paper aims to show a landscape approach for visual arts movement in Manaus, amounting informations about artists, their works and aesthetic conceptions. It includes painting, sculpture, photograph, and decorative arts. The period analyzed envolves from the middle of XIXth century to 70s, featuring issues from Rubber Boom cycle and Clube da Madrugada movement with later consequences. KEYWORDS: Visual arts Manaus 19 th century and 20 th century As informações sobre as artes plásticas no Amazonas (pintura, escultura, arquitetura, fotografia e assemelhados) começam no alvorecer dos tempos provinciais, por volta de 1850, quando Hipólito Marinette tirava imagens em daguerreótipo na capital amazonense. Depois dele vieram outros fotógrafos, tais como Marco de Panigai, que manteve até 1910 o seu Atelier do Fotógrafo (PÁSCOA, 1997, p. 234). Mas particularmente interessante é o italiano Arturo Luciani, chegado a Manaus no fim do período imperial. Seus primeiros trabalhos foram como pintor decorativo de casas e prédios públicos, pois desde 1887 já se anunciava como decorador e pintor. Alguns imóveis em Manaus ainda conservam trabalhos semelhantes, ainda que não se confirme a autoria. Mas Luciani também se dedicou ao desenho artístico, chegando a ocupar o cargo de professor desta habilidade no Instituto de Educandos Artífices, 1 Doutora em História Cultural pela Faculdade de Letras da Universidade do Porto (Portugal), Mestre em História História da Arte pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), licenciada em artes plásticas e música pelo Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista «Júlio de Mesquita Filho» (UNESP- SP). É professora de Estética e História da Arte e Filosofia da Arte no curso de Música da Escola Superior de Artes e Turismo da Universidade do Estado do Amazonas (UEA).

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Revista Eletrônica Aboré Publicação da Escola Superior de Artes e Turismo - Edição 03/2007 ISSN 1980-6930

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O PANORAMA DAS ARTES PLÁSTICAS EM MANAUS

Luciane Viana Barros Páscoa1

RESUMO:

Este texto procura estabelecer uma visão panorâmica do movimento das artes plásticas na cidade de Manaus, reunindo as informações existentes até o momento sobre os artistas, suas obras e suas concepções estéticas. As expressões artísticas abordadas foram as seguintes: fotografia, pintura, escultura e decoração. O período de estudo compreende desde a segunda metade do século XIX até meados da década de 70 do século XX, com destaque para a produção referente ao ciclo da borracha e ao movimento artístico e literário Clube da Madrugada e seus desdobramentos.

PALAVRAS-CHAVE: Artes Plásticas Manaus Séculos XIX e XX.

ABSTRACT:

This paper aims to show a landscape approach for visual arts movement in Manaus, amounting informations about artists, their works and aesthetic conceptions. It includes painting, sculpture, photograph, and decorative arts. The period analyzed envolves from the middle of XIXth century to 70s, featuring issues from Rubber Boom cycle and Clube da Madrugada movement with later consequences.

KEYWORDS: Visual arts Manaus 19th century and 20th century

As informações sobre as artes plásticas no Amazonas (pintura, escultura, arquitetura,

fotografia e assemelhados) começam no alvorecer dos tempos provinciais, por volta de 1850,

quando Hipólito Marinette tirava imagens em daguerreótipo na capital amazonense. Depois

dele vieram outros fotógrafos, tais como Marco de Panigai, que manteve até 1910 o seu

Atelier do Fotógrafo (PÁSCOA, 1997, p. 234). Mas particularmente interessante é o italiano

Arturo Luciani, chegado a Manaus no fim do período imperial. Seus primeiros trabalhos

foram como pintor decorativo de casas e prédios públicos, pois desde 1887 já se anunciava

como decorador e pintor. Alguns imóveis em Manaus ainda conservam trabalhos semelhantes,

ainda que não se confirme a autoria. Mas Luciani também se dedicou ao desenho artístico,

chegando a ocupar o cargo de professor desta habilidade no Instituto de Educandos Artífices,

1 Doutora em História Cultural pela Faculdade de Letras da Universidade do Porto (Portugal), Mestre em História História da Arte pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), licenciada em artes plásticas e música pelo Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista «Júlio de Mesquita Filho» (UNESP-SP). É professora de Estética e História da Arte e Filosofia da Arte no curso de Música da Escola Superior de Artes e Turismo da Universidade do Estado do Amazonas (UEA).

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entre 1889 e 1899, e na Academia de Belas Artes, no departamento de Artes Objetivas por

volta de 1900 (Op. Cit, p. 96).

No começo do século XX, Luciani chegou a representar o Amazonas em uma

exposição nacional, levando consigo dezenas de telas em que estavam figuradas sobretudo as

paisagens amazônicas e algumas personalidades locais. Um pouco depois disto o italiano

empreenderia os trabalhos artístico-decorativos no velho teatro Éden, que chamar-se-ia então

Eldorado. Por volta desta mesma época abriu seu ateliê fotográfico em Manaus, restando

alguns exemplares de seu trabalho em mãos particulares e em museus na Itália. (PÁSCOA,

1997, p. 167).

Ilustração 1. Arturo Luciani. Arturo Furlai. Albumina, 162 x 107 mm. Biblioteca dell'Archiginnasio - Fondo Cervi, Bologna. (Frente)

Ilustração 2: Arturo Luciani. Arturo Furlai , albumina, 162 x 107mm, Biblioteca dell' Archiginnasio - Fondo Cervi, Bologna. (Verso)

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Entretanto, os mais afamados fotógrafos em atividade no Amazonas foram os sócios

George Hübner e Libânio do Amaral. Eles já haviam comprado a célebre Fotografia Fidanza,

do Pará, ainda no século XIX, e também possuíam uma casa comercial semelhante no Rio de

Janeiro. Em Manaus fundaram a Photographia Alemã em 1900, cuja existência chegou a

meados do século XX, já sob outra direção. Libânio do Amaral, que viveu em Manaus algum

tempo, era irmão do famoso pintor e decorador Crispim do Amaral (1858-1911) (PÁSCOA,

1997, p. 19). Este, por seu turno, envolveu-se com o Amazonas bem mais cedo. Começou a

estudar desenho e pintura em Pernambuco com o francês León Chapelin. Dedicando-se

inicialmente à cenografia, transferiu-se em 1876 para Belém e mais tarde fixou-se em

Manaus, realizando trabalhos destinados às companhias teatrais nestas duas cidades.

Permaneceu no norte durante oito anos, e depois residiu por cinco anos em Paris, onde

estudou e trabalhou. De volta ao Brasil, realizou trabalhos importantes de decoração e mesmo

de concepção visual e artística do Teatro Amazonas. Nos seus últimos anos estava no Rio de

Janeiro, onde exerceu a atividade de caricaturista em publicações como «O Malho», «A

Avenida» (1903-05), «O Pau» (1905) e «O Século» (LEITE, 1988-b, p.142).

Para desenvolver o trabalho das pinturas do Salão Nobre e do plafond do Teatro

Amazonas, Crispim do Amaral indicou o artista italiano Domenico de Angelis (1853-1900),

oriundo da antiga e renomada Academia di San Luca em Roma, fundada no século XVI. De

Angelis associou-se com o pintor Giovanni Capranesi (c.1851-1936), com quem manteve um

ateliê de artes decorativas De Angelis/Capranesi situado na Praça Vittorio Emanuele em

Roma (VALADARES, 1974, p.81). Juntos, estes artistas realizaram vários trabalhos de

grande importância na Itália, tais como a decoração de uma sala do Palácio Ferri, do Salão do

Banco da Itália, do interior da Capela do Sagrado Coração na Igreja de São Inácio, para

mencionar alguns. A equipe de De Angelis e Capranesi contava ainda com os pintores

assistentes Adalberto de Andreis e Francesco Alegiani, além do arquiteto Sílvio Centofanti,

todos vindos da Itália. Pode-se afirmar que a elaboração das pinturas do Teatro Amazonas é o

resultado de um trabalho coletivo. (PÁSCOA, 1997, p.22)

Sílvio Centofanti ganhou notoriedade em Manaus, onde viveu durante algum tempo

com um escritório de arquitetura, chegando mesmo a lecionar na Academia Amazonense de

Belas Artes por volta de 1908. É de sua autoria a pavimentação da praça de São Sebastião e

são atribuídas a este artista a execução das pinturas murais da Igreja de São Sebastião e a

montagem dos altares da Catedral Metropolitana de Manaus (Igreja Matriz de Nossa Senhora

da Conceição) (VALADARES, 1974, p.95).

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O grupo de esculturas em gesso do Salão Nobre do Teatro Amazonas são obras do

toreuta Enrico Quatrini, que também trabalhou com De Angelis em dois monumentos de sua

concepção, o da Abertura dos Portos do Amazonas, na praça de São Sebastião e o monumento

ao Bispo do Pará, Dom Caetano Brandão no Largo da Sé em Belém, concebidos e erigidos

entre 1899 e 1900.

São atribuídos a De Angelis e seus assistentes a criação dos panos de boca e parte do

teto do foyer do Teatro Amazonas, além do painel que representa a fuga de Peri e Ceci,

personagens do romance «O Guarani» de José de Alencar, que inspirou a ópera homônima de

Carlos Gomes. O Teatro Amazonas é uma obra eclética que corresponde à belle époque,

revivendo estilos passados na História da Arte (VALADARES, 1974, p.56). Em Belém,

Domenico De Angelis também executou a pintura dos tetos do foyer (destruído pela

infiltração da chuva) e da sala de espetáculos do Theatro da Paz, bem com os painéis dos

altares laterais (Madalena, São Jerônimo e São Sebastião), o teto da nave e o painel do coro da

Catedral da Sé, além da pintura realizada no antigo Paço Municipal, representando a morte de

Carlos Gomes.

No início do século XX, Manaus abrigou ainda alguns outros artistas importantes,

como os pintores acadêmicos Fernandes Machado (1895-19--?), Aurélio de Figueiredo (1856-

1916) e Antônio Parreiras (1860-1937). Fernandes Machado foi pintor e decorador, estudou

na Escola Nacional de Belas Artes no Rio de Janeiro com Rodolfo Amoedo, Henrique

Bernardelli e Modesto Brocos. Recebeu em 1901 o prêmio Viagem ao Estrangeiro, através do

qual aperfeiçoou-se em Paris na Académie Julien, onde estudou com Jules Lefebvre, Robert

Fleury e Jean-Paul Laurens. Realizou uma exposição no Amazonas em 1907, encontrando-se

no acervo da Pinacoteca do Estado do Amazonas algumas de suas melhores pinturas

históricas, como A Glória Coroando Gonçalves Dias (s.d) e Primeiro Vôo de Santos Dumont

(c.1906-07). (PONTUAL, 1969, p.326)

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Ilustração 3: Joaquim Fernandes Machado. O primeiro vôo de Santos Dumont. Óleo sobre tela, c.1906. 228 x 164 cm. Coleção Pinacoteca do Estado do Amazonas.

Aurélio de Figueiredo, irmão de Pedro Américo, foi paisagista, retratista, caricaturista

e desenhista. Estudou na Academia Imperial de Belas Artes no Rio de Janeiro e completou

seus estudos em Florença, especializando-se em pintura de história, gênero e retratos. Uma

obra de caráter histórico deste artista pode ser apreciada atualmente no interior do prédio da

Biblioteca Pública do Amazonas, intitulada A Lei Áurea. No acervo da Pinacoteca do Estado

do Amazonas estão as telas O Último Baile da Ilha Fiscal (1905) e O Banho de Ceci (s.d).

Sobre a obra O Último Baile da Ilha Fiscal, Araújo Viana comentou:

É uma concepção alegórica: irrompendo das nuvens e aos primeiros clarões da alvorada, marcha como um sonho glorioso, o carro triunfal da República, que iria ser proclamada no dia seguinte. É um tema magnífico. Embaixo, à luz das gambiarras e dos archotes, agita-se todo um brilhante mundo prestes a soçobrar, o Imperador e os grandes do império, alheios, no tumulto jovial da festa, ao perigo iminente que se anuncia nos longes do horizonte político. (VIANA apud LIMA, p.851)

No Instituto Geográfico e Histórico do Amazonas existem duas telas da autoria de

Aurélio de Figueiredo, a saber, um retrato da Princesa Isabel e um retrato de Dom Pedro II.

Este artista esteve em Manaus realizando exposições em algumas ocasiões, em 1888, 1907 e

19092. Na sua estada de 1907 na cidade, chegou também a integrar o corpo docente da

Academia Amazonense de Belas Artes (PÁSCOA, 1997, p.97). Sobre a recepção do artista

2 Conferir o periódico Diário do Amazonas, em 18 de março de 1910.

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em Manaus, sobreviveu um relato a partir das memórias do pintor, registradas por sua filha

Heloysa de Figueiredo Cordovil:

No Amazonas, principalmente, foi alvo de manifestações de grande apreço que lhe prestaram os conterrâneos ali residentes, que lhe ofereceram um banquete na residência do Major Juvêncio França, na Praça da Saudade, nº 11. Nele tomaram parte, entre outras personalidades de destaque, o Coronel Camilo Amora, o Senhor General Marques Porto, ladeados pelos Senhores Dr. Moreira Alves, Juiz da Comarca do Acre, Coronel Egydio Pinheiro, Comandante do Regimento Militar do Estado [...] (1985, p.20).

No acervo da Pinacoteca do Estado do Amazonas figuram duas obras de Antônio

Parreiras: são duas pinturas a óleo, intituladas Quarta-feira de Cinzas (1904) e Caçador

Furtivo (1903). Provavelmente estas obras foram adquiridas pelo Governo do Estado do

Amazonas durante uma exposição individual deste artista em Manaus, no Palácio Rio Negro,

em 1905. António Parreiras iniciou seus estudos na Academia Imperial de Belas Artes no Rio

de Janeiro em 1883, foi membro do Grupo Grimm e em 1888 complementou seus estudos na

Academia di Belle Arti di Venezia. Em 1905, este artista esteve em Belém para aprofundar

seus estudos sobre a paisagem amazônica e expôs no Theatro da Paz, retornando a esta cidade

em 1908, quando entregou ao Governo do Estado do Pará a tela A Conquista da Amazônia

encomendada pelo governador Augusto Montenegro, no ano de 1905. Esta obra é considerada

sua composição histórica de maior formato. (LEITE, 1988, p.386-388)

Ilustração 4: Antônio Parreira. Quarta-feira de Cinzas, 1904. Óleo sobre tela, 200 x 150 cm. Coleção Pinacoteca do Estado do Amazonas.

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Neste mesmo período, Manaus possuía uma plêiade de artistas nacionais e estrangeiros,

especialmente italianos, como os escultores da marmoraria Ítalo-Amazonense, cujas obras

mais interessantes que sobreviveram até nossos dias encontram-se no secular cemitério São

João Batista.

O ensino das artes plásticas por sua vez desenvolveu-se tanto em escolas públicas,

como o Gymnasio Amazonense, onde o professor Salvador Carlos de Oliveira teve por

discípulo o ainda pequeno Manoel Santiago, como na citada Academia Amazonense de Belas

Artes, com corpo docente mais vasto, mas de atividade mais curta. O ensino de artes visuais

nesta Academia era feito no Ateliê de Artes Objetivas, que oferecia as matérias de Desenho,

Filosofia e História da Arte, onde empregava muito dos italianos acima citados (PÁSCOA,

1997, p.98).

Manoel Santiago (1897-1987), nascido em Manaus e falecido no Rio de Janeiro é um

dos artistas amazonenses de experiência internacional e de renome nacional, cuja formação

acadêmica se deu na Escola Nacional de Belas Artes (RJ) e depois no ateliê de Eliseu

Visconti, completando-se na Europa (após ganhar o Prêmio Viagem ao Estrangeiro em 1927,

concedido pelo Salão Nacional de Belas Artes), onde recebeu influências da Escola de Paris,

adotando um estilo impressionista tardio, de paleta luminosa e vibrante.

Ilustração 5: Manoel Santiago. O curupira, 1934. Óleo sobre tela, 64 x 54 cm. Coleção Pinacoteca do Estado do Amazonas.

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O período posterior à primeira Guerra Mundial trouxe uma redução dos acontecimentos

artísticos e culturais no Amazonas. Era o fim de um tempo rico em realizações culturais e

econômicas, que correspondia ao ciclo da borracha. Somente nos anos 40 despontou um

nome. Branco Silva (1896-1959), nascido em Manaus e formado pelo Liceu de Artes e

Ofícios de Lisboa. Seu estilo acadêmico é dotado de um realismo mágico presente nas suas

obras paisagísticas e na retratística. Como pintor de retratos, destacou-se ao pintar o

presidente Getúlio Vargas, obra que se encontra no Museu da República (RJ). Destacou-se

também na elaboração de obras sacras, ganhando duas menções honrosas do Vaticano.

(PÁSCOA, 2001)

Pouco depois, a partir de 1945, despontaria Moacir Andrade (1927-), pintor autodidata

dotado de excelente domínio técnico, Em 1954, juntamente com poetas e escritores tais como

Antísthenes Pinto, Alencar e Silva e Jorge Tuffic, além de outros artistas plásticos

amazonenses, Afrânio de Castro, Oscar Ramos e Anísio Mello, fundou o Clube da

Madrugada. Sua trajetória pessoal foi marcada por diversas exposições no Brasil e no

estrangeiro. A obra pictórica de Moacir Andrade transitou entre o figurativismo

expressionista, a abstração lírica, o realismo fantástico tropicalista e o paisagismo naturalista,

com fortes implicações telúricas relacionadas com a região amazônica.

Ilustração 6: Moacir Andrade. O fazedor de bonecos de barro, 1964. Óleo sobre tela. Coleção Particular.

A partir de 1954 com o movimento cultural iniciado pelo Clube da Madrugada,

promoveram-se debates literários, cursos, palestras, festivais de cinema e exposições de artes

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plásticas. Com um caráter ideológico anárquico-libertário, o Clube da Madrugada realizou

várias ações vanguardistas nos anos 60 e 70. No campo específico das artes plásticas, realizou

o I e II Salões Madrugada, as I, II e III Feiras de Artes Plásticas, além de patrocinar

exposições coletivas e individuais de diversos artistas, dentre eles Afrânio de Castro, Álvaro

Páscoa, Horácio Elena, Getúlio Alho, Moacir Andrade, Marcos Vila, Gualter Batista, Óscar

Ramos, Paulo D Astuto, Jair Jacquemont, José Maciel, Marianne Overbeck, Paolo Ricci,

dentre outros (PÁSCOA, 2006, p.223).

Esta efervescência cultural culminou nos anos 60, com a criação Pinacoteca do Estado

do Amazonas pelo governador Arthur César Ferreira Reis. Instalada no prédio da Biblioteca

Pública, a Pinacoteca do Estado do Amazonas abrigou um acervo museológico significativo

da arte amazonense e brasileira. Os professores que lá ensinaram, foram de grande

importância para as artes. Eram ministrados cursos de desenho (Manoel Borges), pintura

(Moacir Andrade), História da Arte e Xilogravura (Álvaro Páscoa). Cabe aqui destacar o

talento retratístico de Manoel Borges (1944-1987), pintor, desenhista e fotógrafo, cujo estilo

realista e naturalista aproximou-se mais do aspecto acadêmico.

Ilustração 7: Manoel Borges. Cabocla, 1985. Aquarela sobre papel. 51 x 43cm. Coleção Pinacoteca do Estado do Amazonas.

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A vertente expressionista e neo-realista faz-se presente nas obras do escultor,

entalhador, gravurista e professor Álvaro Reis Páscoa (1920-1997), artista português

naturalizado brasileiro, radicado em Manaus desde 1958. Iniciou sua formação artística no

Porto, onde tomou contato com movimento neo-realista e participou das atividades

vanguardistas do Teatro Experimental do Porto. Além de atuar no Clube da Madrugada e

contribuir para o suplemento literário Caderno Madrugada com xilogravuras e outras

ilustrações, exerceu durante sua trajetória um importante papel na política cultural do Estado

do Amazonas nos anos 70. Sua atividade pedagógica na Pinacoteca do Amazonas formou

uma geração de artistas plásticos, dentre eles Hahnemann Bacelar (1948-1971), Enéas Valle

(1951-), Zeca Nazaré (1952-), Van Pereira (1952-), Thyrso Muñoz (1952-), Jair Jacquemont

(1947), dentre outros que continuam ativos atualmente. (PÁSCOA, 2006, p.246-257)

Ilustração 8: Álvaro Páscoa. Mãe embalando filho. 1967. Xilogravura, 23 x 12 cm. Coleção Pinacoteca do Estado do Amazonas.

Hahnemann Bacelar, jovem talento premiado em 1966, destacou-se na pintura e foi

profundamente influenciado pelo caráter expressionista de seu mestre Álvaro Páscoa. A

temática dominante de sua obra é a figura humana e a denúncia social, com colorido intenso e

vibrante.

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Ilustração 9: Hahnemann Bacelar. Miséria, 1968. Óleo sobre tela, 98 x 77cm. Coleção Pinacoteca do Estado do Amazonas.

Van Pereira (1952 -), desenhista, pintor e ilustrador, integrou o Clube da Madrugada

nos anos 70, para o qual colaborou com inúmeras ilustrações de livros. Das mostras coletivas

que participou, destacam-se as seguintes: I Salão de Artistas Jovens do Pará, Belém (1971),

Bienal Nacional de São Paulo, São Paulo (1974) e Paço das Artes, São Paulo (1979). Em

1991, foi convidado pela Editora Fukuinkan de Tókio, Japão, para realizar uma série de

ilustrações para um livro da escritora japonesa Suma Jinnai, trabalho que o projetou

internacionalmente.

Ilustração 10: Van Pereira. Sem Título, 1974. Óleo sobre duratex, 65 x 51 cm. Coleção Pinacoteca do Estado do Amazonas.

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Da geração mais recente, a figura mais destacada, tanto pela composição da obra

quanto pela difusão, é a de Roberto Evangelista. A partir da década de 70 contribuiu ao

panorama local com criações nas tendências da arte conceitual e land art no Amazonas.

Participou de diversas exposições no Brasil e no exterior, tais como na XIV Bienal

Internacional de São Paulo (1977), na Clocktower Gallery em (Nova York, 1989) e no Royal

Museum of Fine Arts (Bélgica, 1992), com destaque para a sua participação na XXIII Bienal

Internacional de São Paulo, no segmento Universalis Brasil em 1996.

Referências Bibliográficas:

CORDOVIL, Heloysa de Figueiredo. Aurélio de Figueiredo:meu pai. Rio de Janeiro:

Gráfica Vida Doméstica, 1985.

LEITE, José Roberto Teixeira. Dicionário Crítico da Pintura no Brasil. Rio de Janeiro:

Artlivre, 1988.

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Araújo; Indústria de freios KNORR, MWM Motores, 1988. (b)

LIMA, Herman. História da Caricatura no Brasil. Rio de Janeiro: José Olympio, 1963.

PÁSCOA, Luciane. Relações Culturais e Artísticas entre Porto e Manaus através da

obra de Álvaro Páscoa, em meados do século XX. Porto: Faculdade de Letras da

Universidade do Porto, 2006. (Tese de Doutorado)

PÁSCOA, Márcio. A Vida Musical em Manaus na Época da Borracha (1850-1910).

Manaus: Imprensa Oficial do Estado do Amazonas/FUNARTE, 1997.

PÁSCOA, Márcio. Branco e Silva. Série Memória nº 78.Manaus: Governo do Estado do

Amazonas, 2001.

PONTUAL, Roberto. Dicionário de Artes Plásticas no Brasil. Rio de Janeiro, Civilização

Brasileira, 1969.

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SAMPAIO, Patrícia; SANTOS, Francisco. (Org.) Estado do Amazonas em Verbetes,

Manaus: Governo do Estado do Amazonas, 2001.

TUFIC, Jorge. Clube da Madrugada: 30 anos. Manaus: Imprensa Oficial, 1984.

VALADARES, Clarival do Prado. Restauração e Recuperação do Teatro Amazonas.

Manaus: Governo do Estado do Amazonas, 1974.

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