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DO ESCRITOR "" Logbook ALVARO MENDES Livro rnostrc liccao .. sutil 0 DEl,FIM, A lUAIS ). RECENTE OBRA DE JOSE CARDOSO I PIRES, E SUCESSO DE VEJ.,TJ)A E CRiTIC\ EM PORTUGAL E YAI SER LAN(:ADA TAl\'IB:El\:i PARA OS l,RANCESES Cardoso britha em Portugnt & Sm·tre ga- nha Jro cesso contra di- 1"etm :_ do Fakkel Thea- ter q-ue enceiwtt As - · maus sujas sem Ucen!;a-. Soljenitsyn tem menos s o1·te. M. Paul Morand e eleito para a Aca(}e- mie. E a foto do Corao nfio e sucesso mas nos pareceu bonita. Nent o "furd', nem o re- cem-saido, sera necessaria- , ., mente encontrado neste ro- teh·o: registro informal dos ventos e das mares, aponta- mento breve de sem olbar a genero, ou o reporter gostaria de s'e permitir a notas;ao db que, - dentro de certa 6tica, mais lhe . impressionasse a retina, en) seu oficio de ge6grafo desocupado. Que Mercfuio, o de pes li· geiros, presida a nossa via- gem. _ · PORTUGAL Jose Car .doso Pires, 0 Delfim, Moraes editoJ"e:,, Lisboa, 1968 ' Vem das fileiras do neo- realismo - caracterizado, tambem em Portugal, por formalmente conser· vadores - este autor de meia-duzia de livros tao pes- soais, e que agora, com 0 Delfim, nos diz que devemos cstar atentos. N a e uma a posteriori {e pol:. isso mais dificil) a t]Ue nos pede este autor de mm- tas mascaras e muitos re- cursos, que so parece usar 't: ?r)n !:i rlo 1"1!11"'0 n .!l ra melhor nos iludir com :ma evidente. clareza, e arma :seu jogo secreto (o jogo por den- tro) a sombra relativamente segura assim obticla: a sum· bra das opinioes cristaliza- . das. Mas, para compreender o livro, de nada serve o ape- lo a escolas (neo-realismo 1 nem a uma influ€ncia apon- tada: Hemingway. Ja nos serve de muito uma admira- confessacla: Roger Vail- land; e hos serve ainda mais o seu notavel ensaio/panfle- to A cartilha do marialva, pendant te6rico de 0 Delfim - estudos ageis e superior- mente elegantes do compl e- xo de marialvismo portu- gues, ao nivel coletivo, on- tern com touros e vinbo. ho- je com wiskhy e Jaguar , que preside a mentalidade fami- iiar da ilustre casa lusitana. Isto quanto ao tema, ou pre- texto, que 0 Delfim desen- volve agora sob forma roma- nesca. Mas Quanto ao pro- prio livro; so ha urn jeito: ler. E enquanto eu lia. fiz para mim mesmo as seguin- tes a primeira coisa que impressiona e ser o romance :fruto de urn es- pu-ito civilizado (tal como o entendia a grande tradiGao libertina), quer dizer, que procm·a compreendet, pre- ver e controlar o destlno me- diante o continuo recurso a razao, e recusa do desconhe- cido; ausencia de mitos, a nao ser os voluntariame nte criados como tatica proviso- ria; fuga ao grandiloqiiente: nenhum drama. Ao nivel das palavras, urn estilo ra-pido, siko; ardente, ansioso. gene· ro grande arte da conversa- <;ao, mas uma conversa que sabe estar sendo escrita; um modo de se colocar em cada ' palavra e na de- las, nao se· deixando absor- . ver por elas: resulta uma impressao forte de inteligen- cia raciocinadora, urn suge- tir de nao sei que ludismo superior, marca segura de .urn escritor na posse de mui- tos recursos; r esulta, . as .ve- zes,... uma especie de varti- gem ao arbitrario, dessas que nos dao todas as obras que parecem ser rnais do que mas mesrnas - de urn espu·ito gen eraliza- dor que, por acaso, encarnou ali.

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JOR!~AL DO ESCRITOR ""

Logbook

ALVARO MENDES

Livro

rnostrc

liccao ..

sutil

0 DEl,FIM, A lUAIS ).

RECENTE OBRA

DE JOSE CARDOSO I

PIRES, E SUCESSO

DE VEJ.,TJ)A E CRiTIC\

EM PORTUGAL E YAI

SER LAN(:ADA

TAl\'IB:El\:i PARA

OS l,RANCESES

Cardoso britha em Portugnt & Sm·tre ga­nha •Jrocesso contra di-1"etm:_ do Fakkel Thea­ter q-ue enceiwtt As ­·maus sujas sem Ucen!;a-. Soljenitsyn tem menos so1·te. M. Paul Morand e eleito para a Aca(}e­mie. E a foto do Corao nfio e sucesso mas nos pareceu bonita.

Nent o "furd', nem o re­cem-saido, sera necessaria- ,

., mente encontrado neste ro­teh·o: registro informal dos ventos e das mares, aponta­mento breve de publica~oes sem olbar a genero, ou pai~, o reporter gostaria de s'e permitir a notas;ao db que, -dentro de certa 6tica, mais lhe . impressionasse a retina, en) seu oficio de ge6grafo desocupado.

Que Mercfuio, o de pes li· geiros, presida a nossa via-gem. _ ·

PORTUGAL

Jose Car.doso Pires, 0 Delfim, Moraes editoJ"e:,,

Lisboa, 1968

' Vem das fileiras do neo-realismo - caracterizado, tambem em Portugal, por tra~os formalmente conser· vadores - este autor de meia-duzia de livros tao pes­soais, e que agora, com 0 Delfim, nos diz que devemos cstar atentos. N a v~rdad·e, e uma aten~ao a posteriori {e pol:. isso mais dificil) a t]Ue nos pede este autor de mm­tas mascaras e muitos re­cursos, que so parece usar ~ 't:?r)n f·!:i rlo rl~ ~tl t" 1"1!11"'0 n.!lr a

melhor nos iludir com :ma evidente. clareza, e arma :seu jogo secreto (o jogo por den­tro) a sombra relativamente segura assim obticla: a sum· bra das opinioes cristaliza-

. das. Mas, para compreender o livro, de nada serve o ape­lo a escolas (neo-realismo 1 nem a uma influ€ncia apon­tada: Hemingway. Ja nos serve de muito uma admira­~ao confessacla: Roger Vail­land; e hos serve ainda mais o seu notavel ensaio/panfle­to A cartilha do marialva, pendant te6rico de 0 Delfim - estudos ageis e superior­mente elegantes do comple­xo de marialvismo portu­gues, ao nivel coletivo, on­tern com touros e vinbo. ho­je com wiskhy e Jaguar, que preside a mentalidade fami­iiar da ilustre casa lusitana. Isto quanto ao tema, ou pre­texto, que 0 Delfim desen­volve agora sob forma roma­nesca. Mas Quanto ao pro­prio livro; so ha urn jeito: ler. E enquanto eu lia. fiz para mim mesmo as seguin­tes anota~;oes: a primeira coisa que impressiona e ser o romance :fruto de urn es­pu-ito civilizado (tal como o entendia a grande tradiGao libertina), quer dizer, que procm·a compreendet, pre­ver e controlar o destlno me­diante o continuo recurso a razao, e recusa do desconhe­cido; ausencia de mitos, a nao ser os voluntariamente criados como tatica proviso­ria; fuga ao grandiloqiiente: nenhum drama. Ao nivel das palavras, urn estilo ra-pido, siko; ardente, ansioso. gene· ro grande arte da conversa­<;ao, mas uma conversa que sabe estar sendo escrita; um modo de se colocar em cada ' palavra e na combina~ao de­las, nao se· deixando absor-

. ver por elas: resulta uma impressao forte de inteligen­cia raciocinadora, urn suge­tir de nao sei que ludismo superior, marca segura de

. urn escritor na posse de mui­tos recursos; r esulta, . as . ve­zes,... uma especie de varti­gem ao arbitrario, dessas que nos dao todas as obras que parecem ser rnais do que mas mesrnas - sina~s de urn espu·ito generaliza­dor que, por acaso, encarnou ali.